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Universidade​ ​Federal​ ​do​ ​Mato​ ​Grosso​ ​do​ ​Sul

Programa​ ​de​ ​Pós-Graduação​ ​em​ ​Antropologia​ ​Social​ ​-​ ​Faculdade​ ​de​ ​Ciências
Humanas

“(Não)​ ​faço​ ​porque​ ​gosto”:​ ​uma​ ​análise​ ​sócio-antropológica​ ​da​ ​prostituição


universitária​ ​de​ ​mulheres​ ​em​ ​Campo​ ​Grande​ ​-​ ​MS

Carla​ ​Cristina​ ​de​ ​Souza

10/08/2017
Campo​ ​Grande-MS
1.​ ​ ​ANTECEDENTES​ ​E​ ​JUSTIFICATIVA​ ​DO​ ​PROBLEMA​ ​A​ ​SER​ ​ABORDADO

A prostituição é uma ocupação ligada a uma rede de mercado sexual extensa que,
segundo Adriana Piscitelli (2005), vem se expandindo para uma enorme diversidade,
variedades de trabalhos sexuais que não se restringe somente a prostituição, mas em muitas
outras atividades, entre elas linhas telefônicas eróticas, sexo virtual através da internet,
casas​ ​de​ ​massagem,​ ​submissão/sadomasoquismo,​ ​prostituição​ ​na​ ​rua​ ​e​ ​muitas​ ​outras.
A prostituição feminina, que é o foco deste estudo, em meio a esse amplo contexto do
mercado sexual, traz a possibilidade para várias problematizações teórico-políticas no que
se refere a sua definição e, até mesmo, na visão sobre as mulheres que a praticam. Por
exemplo, para Elisiane Pasini, esse tipo de prática sexual se define como uma atividade em
que mulheres estabelecem relações sexuais com diferentes homens em troca de dinheiro,
este homem é classificado por ela como sendo o cliente, isto é, clientes “são aqueles
homens com quem as garotas mantêm relações sexuais no contexto da prostituição,
caracterizadas,​ ​principalmente,​ ​pelo​ ​contato​ ​sexual​ ​e​ ​pelo​ ​dinheiro”​ ​(2000,​ ​p.​ ​183).
Porém, vejo que há possibilidades de os clientes serem outros sujeitos para além da
categoria restrita de homens, tendo em vista que limitar o cliente como um homem, seria
afirmar que as profissionais do sexo estão exclusivamente ligada a uma norma
heterossexual.
Além disso, segundo Piscitelli, há dois pólos extremos de discussões que abordam a
prostituição, um é visto “como caso extremo do exercício abusivo do sexo, portanto, quem
oferece serviços sexuais é percebida como inerentemente vítima de violência” (2005, p.
13) e outro que vê a “vinculação das mulheres com o sexo a fonte de seu maior poder”
(Idem), isto é, em uma das abordagens as profissionais do sexo são vistas através de uma
objetificação sexual e em outra como possuidora de sua autonomia sexual. Ambas
abordagens possuem limites: se por um lado a agência é apagada, por outra deixamos
muito​ ​simplista​ ​a​ ​complexidade​ ​que​ ​existe​ ​nas​ ​relações​ ​de​ ​poder.
Não é recente que a prostituição de mulheres é uma problemática no campo acadêmico
e/ou para muitos movimentos feministas. A partir de uma perspectiva de dominação
masculina e do “patriarcado”, alguns grupos colocam este tipo de atividade como mais
uma forma de opressão das mulheres, tanto de um sistema capitalista (do mercado sexual)
como de uma estrutura, onde os homens estariam submetendo-as em uma posição de
submissão. Não nego, porém, que tenha, em algum contexto, violência no comércio sexual
envolvendo a prostituição de mulheres, mas não pretendo utilizar essa ideia como uma
verdade fixa e absoluta para entender todos os aspectos desta prática sexual, isto é,
pretendo compreender os processos de subjetivação e constituição dos sujeitos a partir da
voz​ ​das​ ​próprias​ ​interlocutoras​ ​do​ ​trabalho,​ ​não​ ​necessariamente​ ​entendidas​ ​como​ ​vítimas.
Entre as diversas correntes do feminismo, o que se destaca contra a prostituição de
mulheres, são as abolicionistas. De acordo com Piscitelli (2012), os movimentos que
adotam essa perspectiva, da teoria abolicionista, tendem ver a prostituição e o tráfico de
mulheres como indissociáveis. Ela afirma que o abolicionismo mais radical e
contemporâneo tende a olhar para a prostituição como uma violência sexista, que resulta de
um processo iniciado na publicidade, incluindo espetáculos, o mercado matrimonial, a
pornografia e enfim se encerra na prostituição. Através desta perspectiva, a prostituição
seria resultado de carências afetivas e violências físicas, sexuais vividas no período da
infância, negando qualquer forma de prostituição livre, o direito de prostituir-se. O
abolicionismo, vê a prostituição como mais uma forma de exploração sexual “porque nela
se obtém prazer sexual mediante a utilização abusiva da sexualidade de uma pessoa,
anulando​ ​os​ ​seus​ ​direitos​ ​à​ ​dignidade,​ ​igualdade,​ ​autonomia​ ​e​ ​bem​ ​estar”​ ​(2012,​ ​p.​ ​21​ ​-22).
Contestando as correntes universalistas, a teoria pós-estruturalista traz uma crítica a
este modelo de explicação estruturante que, através da interseccionalidade, argumenta que
a opressão não se dá de forma fixa e universal, tendo em vista, entre muitas
argumentações, a de que há um agenciamento do sujeito, e de que o poder não é algo dado
a alguém, onde uma pessoa tem o poder e outra não, mas segundo a teoria foucaultiana, se
dá nas relações, segundo o contexto em que elas ocorrem. Deste modo, Piscitelli (2008)
contribui fazendo uma reflexão onde diz que, não há como pensar num processo de
opressão que perpassa todos os sujeitos, como por exemplo, o de dominação universal de
um homem sobre uma mulher, pois o sujeito possui uma agência, que o possibilita a agir,
mediada​ ​cultural​ ​e​ ​socialmente.
Compreendendo as divergências das discussões sobre a prostituição, Marco Vieira
(2005), em relação ao mercado do sexo transnacional, afirma que as discussões que
ocorrem em torno da prostituição como um meio de vida, ainda está longe de chegar a um
consenso, ainda mais se as mulheres envolvidas com esse trabalho continuarem a
permanecer sem voz ativa e estigmatizadas, principalmente por um contexto abolicionista
que enxerga exploração sexual e prostituição, como dito anteriormente, dois pontos
indissolúveis.
Além da problematização referida pelo autor anteriormente citado, outra questão diz
respeito a estigmatização da profissão do sexo. Anne McClintock (2003), ao se referir ao
período vitoriano, ao refletir sobre a prática de sadomasoquismo e fetichismo, a partir do
1
diário​ ​de​ ​Hannah​ ​Cullwick ,​ ​afirma​ ​que

[...] as prostitutas e as mineiras, as criadas domésticas ficavam no perigoso limiar


do trabalho normal, do dinheiro normal e da sexualidade normal, e vieram a ser
representadas na iconografia da “poluição”, “desordem”, “pragas”, “contágio
moral”​ ​e​ ​“degeneração”​ ​racial.​ ​(p.​ ​40-41).

Isto é, assim como esses outros trabalhos moralmente desprestigiados, a prostituição


também era - desde há muito tempo - tida como o “sexo sujo”. O mantimento desta
concepção contribui para uma desvalorização e reprodução do estigma diante da profissão,
que resulta por uma exclusão social e restrições na busca pelos direitos da prática
profissional.
Um dos estigmas é apontado por José Miguel Olivar (2013), que fez um estudo sobre
as mudanças e transformações relacionadas à prostituição. Este autor afirma que, “entre
esposa e prostituta, as relações têm variado significativamente, têm se juntado, fundido,
distanciado novamente, aliado; mas continuam sendo duas posições intensivamente
diferenciadas e, portanto, inimigas.” (p. 339). Isto é, mesmo embora a prostituta seja uma
esposa, ambas identidades são conflitantes, as duas podem (ou não) fazer parte do mesmo

1
Ela foi uma doméstica da época vitoriana, que em uma de suas atividades como diarista despertou a
atenção de Arthur Munby. Ambos casaram-se posteriormente em segredo e mantinham uma relação de
fetichismos, que incluía trocas de papéis, que proporcionava um certo erotismo em suas relações. Cullwick
relatou​ ​essas​ ​experiências​ ​em​ ​um​ ​diário​ ​com​ ​fotografia​ ​e​ ​relatos.
sujeito, mas possuem atribuições morais extremamente polarizadas, pois ser prostituta
ainda​ ​é​ ​ser​ ​vista​ ​como​ ​a​ ​praticante​ ​do​ ​“sexo​ ​sujo”,​ ​e​ ​ser​ ​esposa​ ​do​ ​sexo​ ​legítimo.
Há, entretanto, outras formas pelas quais a prostituição de mulheres é abordada, por
exemplo, como argumenta Érika de Moraes (2017), se por um lado temos a prostituição
vista como algo marginalizado e estigmatizado, por outro, a atividades é por vezes
representada como algo glamouroso, especialmente nos cinemas, que possui inclusive
filmes renomados e populares que representam de diferentes formas as mulheres na
prostituição, como o clássico Bonequinha de Luxo (lançado em 1961), Uma Linda Mulher
(1990), e o filme brasileiro que contou a história real de uma ex-profissional do sexo,
Bruna Surfistinha (2011), ficando famosa pelo seu blog e depois pelo lançamento de um
livro. Desta forma, há uma multiplicidade de visões na qual perpassa a prostituição, ora
estigmatizada, ora vista através do cinema (um importante artefato cultural), como uma
profissão​ ​de​ ​luxo.
Dado uma breve dimensão sobre o tema, vejo que são diversas questões que envolvem
o mercado sexual, mais especificamente a prostituição de mulheres, marcada como a
profissão da imoralidade, isto é, uma prática que é vista muitas vezes como a transgressora
da ordem, que foge a “normalidade social” (OLIVAR, 2013), e que, por isso, precisa ser
analisada, tendo em vista que ela modifica os sujeitos, que envolve escolhas e não
escolhas, desejos, prazeres, novas identificações que se alteram nas relações e contextos,
portanto,​ ​um​ ​ato​ ​que​ ​excita​ ​o​ ​conhecimento.
Entre todos os diferentes dessas profissionais, este estudo destaca-se pelo foco nas
estudantes universitárias, isto é, as profissionais do sexo mulheres maiores de 18 anos que
também se identificam como acadêmicas, pensando essa identificação como uma das
“categorias” do/no mercado sexual. Quando essas profissionais se posicionam como
estudantes, aparentemente há uma valorização no mercado, caso o contrário não haveria
porque elas usarem, por exemplo, em suas descrições em sites de anunciação essa
característica de identidade. O termo “estudantes”, no comércio sexual, está relacionado
com a baixa idade, assim como certos gestos, falas, alguns padrões estéticos, corpos, entre
outros aspectos que a clientela espera de uma profissional do sexo reconhecida como
universitária.
Isso pode ser conferido em livros onde profissionais do sexo nos contam suas
experiências. Gabriela Natalia Silva (2014), mais conhecida como Lola Benvenutti, na
primeira frase de seu livro diz: “Sou Lola Benvenutti e faço porque gosto” (SILVA, 2014,
p. 11). A frase demonstra um outro lado da profissão, não limitada somente a uma
necessidade​ ​financeira,​ ​mas​ ​a​ ​uma​ ​satisfação​ ​íntima​ ​e​ ​pessoal.
No livro, a mesma descreve algumas de suas experiências, práticas quanto profissional
do sexo universitária. Em seus relatos, percebe-se que ela é uma prostituta de luxo. Ela nos
conta que iniciou suas buscas por clientes na internet, em salas de bate papo, isto aponta
como são importantes as ferramentas online para a expansão do mercado sexual, assim
como​ ​um​ ​local​ ​facilitador​ ​para​ ​marcar​ ​encontros.
2
No documentário, “Entre Livros e Lençóis” , que tem como foco a prostituição
universitária, Benvenutti conta que algumas e alguns de seus clientes valorizavam como
um diferencial ela ser estudante, e que essa característica era percebida pelo desenrolar da
conversa​ ​que​ ​ela​ ​mantinha​ ​durante​ ​o​ ​trabalho.
Em outro livro, quem nos conta suas experiências é a travesti, universitária, e
prostituta Amara Moira (2016). Mesmo a prostituição de travestis universitárias não sendo
o foco deste estudo, Moira traz importantes contribuições para pensar a relação entre
mercado do sexo, gênero feminino e universidade. Em sua obra, ela relata alguns de seus
trabalhos na prostituição de rua, uma perspectiva da profissão totalmente contrária aos
relatos de Benvenutti, tendo em vista entre eles o contexto em que se dava a prática, na rua.
Entre seus relatos, esta universitária narra as negociações de preços, e algumas práticas
abusivas que ocorrem quando se prostituia, como a insistência ao não uso de camisinha por
parte dos clientes. Um lado menos “romantizado” da profissão na qual apresentou
Benvenutti.
3
Em termos de contextos locais, uma notícia recém publicada em um jornal da cidade,
trata de um “ponto” de prostituição de rua em uma região de Campo Grande. Segundo o
depoimento de Dani Barros, uma prostituta universitária de vinte e seis anos, ela vê nos

2
​ ​ ​Documentário​ ​disponível​ ​em:​ ​<​https://www.youtube.com/watch?v=bZSwz6nCpP0​>​ ​ ​Acessado​ ​em:​ ​26​ ​de
julho​ ​2017
3
​ ​ ​Notícia​ ​disponível​ ​em:​ ​<
http://www.midianews.com.br/cotidiano/prostitutas-faturam-ate-r-1-mil-por-dia-na-regiao-do-zero-km/25828
6​>​ ​ ​Acesso​ ​em:​ ​04/03/2017.
estudos uma possibilidade para sair da profissão. Mesmo afirmando que vê como esse
trabalho​ ​como​ ​qualquer​ ​outro,​ ​ela​ ​pretende​ ​sair​ ​após​ ​terminar​ ​o​ ​curso​ ​de​ ​Educação​ ​Física:

Antes de entrar para a prostituição eu tinha muito preconceito, como muitas


pessoas ainda tem hoje. Mas depois que eu entrei, vi que não é assim. É só uma
profissão, realmente. Pra mim, é uma profissão restrita até porque, quando chego
na minha casa, esqueço tudo que acontece aqui, cuido da minha filha, faço janta,
4
vou​ ​para​ ​a​ ​academia,​ ​para​ ​a​ ​faculdade,​ ​tenho​ ​uma​ ​vida​ ​normal,​ ​tranquila.

Portanto, atentar-se para experiências possibilitará dar maior visibilidade as


pluralidades e perspectivas da prostituição na contemporaneidade e no contexto no qual
este​ ​estudo​ ​se​ ​desenvolverá.
A presente pesquisa se justifica pela atual percepção social sobre o mercado do sexo e
a prostituição em particular. Trazer o tema da prostituição de mulheres que se identificam
como universitárias para o âmbito da pesquisa acadêmica, é uma alternativa para
analisarmos as necessidades de política públicas em volta da temática, pensando em
possíveis​ ​estratégias​ ​de​ ​ações​ ​que​ ​garantam​ ​uma​ ​menor​ ​vulnerabilidade​ ​das​ ​mulheres.
Em 2012, o deputado Jean Wyllys (PSOL/RJ) foi autor da proposta de um projeto de
5
lei (​PL 4211/2012 ) ​cujo teor era regulamentar as atividades das e dos profissionais do
sexo que, aqui no Brasil, embora a prostituição não seja crime, sofrem uma criminalização
moral. Segundo a proposta, seu objetivo não era apenas desmarginalizar as profissionais,
mas também possibilitar um melhor acesso a saúde, ao Direito do Trabalho, a segurança
pública, e o direito a dignidade humana, além disso, a regularização da profissão do sexo,
será um instrumento eficaz para combater à exploração sexual, pois irá possibilitar a
fiscalização​ ​dos​ ​locais,​ ​casas,​ ​de​ ​prostituição​ ​e​ ​o​ ​controle​ ​do​ ​Estado​ ​sobre​ ​o​ ​serviço.
Embora exista o interesse em se regularizar a prostituição, afim de desmarginaliza-lá,
ainda há um imenso campo a percorrer para que se diminua os problemas relacionados a
essa​ ​atividade,​ ​entre​ ​eles​ ​a​ ​violência.
Em uma pesquisa da área de saúde pública realizada em dez cidades brasileiras, entre
elas Campo Grande, foram preenchidos 2.523 questionários pelas mulheres profissionais

4​ ​Ver​ ​nota​ ​3.


5​ ​Proposta​ ​de​ ​lei​ ​disponível​ ​no​ ​site​ ​da​ ​câmara​ ​dos​ ​deputados.​ ​Disponível​ ​em:
<​http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1012829&filename=PL+4211/20
12​>​ ​Acesso​ ​em:​ ​04/03/2017.
do sexo, onde buscava-se “estimar as taxas de prevalência de HIV e sífilis e estabelecer o
conhecimento, as atitudes e as práticas relacionadas à infecção pelo HIV e outras doenças
sexualmente transmissíveis” (LIMA et al. 2017, p. 2). Neste estudo, segundo os autores, o
desfecho foi a ocorrência de violências, ligados a fatores que eles chamaram de
“sociodemográficos (idade, escolaridade, raça/cor, renda mensal)”. Assim, a violência está
intimamente ligada aos marcadores sociais da diferença. Além disso, relatou-se neste
estudo que em comparação com outras mulheres que não são profissionais do sexo, o
índice de violência são extremamente distantes, sendo mais incidente na prostituição, na
população em geral, segundo os resultados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013 (PNS),
a violência cometida contra as mulheres por qualquer desconhecido era de 2,7%, por
conhecidos, incluindo cônjuge, namorado, entre outros, e familiares, de 3,1%,
diferentemente e em números maiores, a violência física contra mulheres profissionais do
sexo variou de 7,9%, para violência cometida por policiais, até 25,2% por parceiros
íntimos​ ​(Idem).
Esses dados demonstram a importância de visibilizar esta temática no que corresponde
a necessidade de direitos e políticas públicas para as profissionais do sexo, tendo em vista
que deixá-la marginalizada comumente contribui para a violência incluindo como
apresentado​ ​acima,​ ​a​ ​cometida​ ​por​ ​policiais.
Conforme já discutido neste projeto, este estudo reconhecerá que a prostituição
universitária nem sempre é uma condição de exploração como geralmente a prostituição é
socialmente vista. Embora haja casos onde isso ocorre, ela também envolve outros
processos que não os da violência, por isso, precisamos olhar para esta profissão também
por outro viés, pensando na multiplicidade de histórias ligadas às mulheres que se
prostituem e as suas possibilidades de agência, via os já citados marcadores sociais da
diferença. Isto é, há uma extrema importância em se ressaltar as vozes dessas mulheres a
respeito de suas ambições, expectativas, visões, entre outras experiências, problematizando
a ideia intransmutável que nem sempre corresponde à experiência que vivem na
prostituição. Desta forma, pesquisas sobre esta temática pode se tornar um dos meios para
a​ ​desconstrução​ ​de​ ​uma​ ​idéia​ ​generalizante​ ​sobre​ ​essas​ ​experiências​ ​no​ ​mercado​ ​do​ ​sexo.
Outro ponto que vejo como sendo relevante é observar quais poderiam ser os corpos
esperados, padrões estéticos, características valorizadas em uma profissional do sexo tida
como universitária, na tentativa de entender as diferenciações entre a prostituição
universitária de rua, de luxo entre outras possíveis categorias que possam existir dentro do
mercado sexual, assim como compreender se a universidade e as relações sociais que a
permeia, pode afetar ou não a profissão, como elas se relacionam. Essas análises podem
trazer novas contribuições ao estudo desta temática, especialmente por esta pesquisa ser
feita​ ​em​ ​uma​ ​capital​ ​do​ ​centro​ ​oeste,​ ​de​ ​maneira​ ​inédita​ ​quanto​ ​ao​ ​foco​ ​aqui​ ​proposto.​ ​
Sabendo do poder das expectativas em termos de gênero no mercado do sexo, e,
portanto, do manejo identitário comum a este campo, pretendo não somente me ater as
profissionais do sexo que de fato são universitárias, isto é, estão vinculadas às faculdades
ou universidades. Antes, partindo da escolha delas poderem se descrever como
“estudantes”, mesmo não sendo, pretendo estudar também aquelas que, por diversos
motivos, agenciam seus corpos para “passar por” universitárias. Ainda que o “passar por”
6
aqui não tenha sido o mesmo estudado por Tiago Duque (2017), a reflexão deste autor
possibilita compreender a identificação enquanto “universitária” na prostituição como via
uma espécie de regime de visibilidade que se dá via agência de marcadores sociais da
diferença​ ​como​ ​gênero,​ ​raça/cor,​ ​etnia,​ ​sexualidade,​ ​idade,​ ​região,​ ​etc.
Dentro desse cenário universitário e de prostituição, é relevante compreender as
possibilidades de existirem práticas homoeróticas entre as profissionais do sexo
universitárias e clientes, observar como elas agenciam suas sexualidades interseccionada
com essa prática, que por um caráter heteronormativo, este ainda é um fator pouco
trabalhado​ ​dentro​ ​da​ ​prostituição​ ​de​ ​mulheres.

2.​ ​OBJETIVOS

2.1.​ ​Objetivo​ ​Geral

6
Seu estudo teve como foco de análise discutir as experiências de passabilidade no que se refere às
performances de gênero, feminilidades e masculinidades, mostrando que passar por homem e/ou mulher
envolve estratégias de (in)visibilidade e conhecimento. Ele nos revela que o (não) ​passar por não se restringe
somente às diferenças de gênero e sexualidade mas, há uma intersecção com outros marcadores sociais da
diferença.
Analisar​ ​a​ ​prostituição​ ​universitária​ ​exercida​ ​por​ ​mulheres​ ​em​ ​Campo​ ​Grande​ ​-​ ​MS.

2.2.​ ​Objetivos​ ​Específicos

● Analisar os processos que acarretam na escolha de mulheres que vivem


experiências​ ​de​ ​prostituição​ ​universitária​ ​em​ ​Campo​ ​Grande;
● Analisar as características da prostituição universitária exercida por mulheres em
Campo​ ​Grande;
● Analisar as relações entre formação acadêmica e a prática da prostituição
universitária​ ​por​ ​mulheres​ ​em​ ​Campo​ ​Grande;
● Analisar o manejo identitário de mulheres em torno da prostituição universitária em
Campo​ ​Grande.

3.​ ​REVISÃO​ ​DA​ ​LITERATURA

Em minha trajetória durante a graduação em Ciências Sociais, na Universidade


Federal do Mato Grosso do Sul, surgiu o interesse em estar participando de grupos de
pesquisas que abordavam a temática de gênero e sexualidade, durante esse processo de
aprendizado, que ainda faz parte da minha atual vida acadêmica, surgiu o interesse de
estudar​ ​a​ ​prostituição​ ​universitária.
O conhecimento por mim obtido sobre essa temática até então, antes de me adentrar
aos grupos de pesquisa, era relacionado a uma ideia de vitimização dessas mulheres, isso
porque eu tinha acesso somente a perspectivas que abordavam a prostituição através do
tráfico de mulheres. Porém com os novos diálogos, a partir de teorias que trabalhavam com
a ideia das intersecções fui observando que na realidade havia outros possíveis olhares
sobre​ ​a​ ​prostituição​ ​e​ ​outras​ ​possibilidades​ ​de​ ​experiências,​ ​o​ ​tema​ ​é​ ​mais​ ​abrangente.
A participação na 11​a edição do Fazendo Gênero junto ao 13° Mundos de Mulheres,
particularmente da Mesa Redonda, “Um Século e Meio de Abolicionismo: Prostituição,
criminalização e o controle do corpo feminino”, e do Simpósio Temático, “Feminismo,
trabalho sexual e as políticas do estado: do novo abolicionismo ao putafeminismo”,
possibilitou que minha atenção voltasse também para produções, blogs, experiências para
além da produção literária produzida pela academia, isto é, trarei também como referências
os diálogos elaborados por movimentos sociais, grupos como o Observatório da
7 8
Prostituição que trazem como pauta a prostituição, o grupo Rede Brasileira de Prostitutas ,
9
o​ ​blog​ ​da​ ​já​ ​citada​ ​Amara​ ​Moira,​ ​(E​ ​se​ ​eu​ ​fosse​ ​Puta )​ ​e​ ​entre​ ​outros.
Os trabalhos apresentados neste Simpósio Temático, acima citado, tiveram forte
influência sobre o olhar lançado nesta pesquisa. Diversas produções trouxeram, inclusive,
uma expansão sobre o campo da prostituição em uma perspectiva para além do Brasil,
entre eles a pesquisa da Jessica Gabriela Gutiérrez Gómez (Universidad de Buenos Aires),
“Las víctimas que no quieren ser rescatadas: clasificación de tipos de víctimas de trata en
Argentina”, apresentando como opera, a partir de uma influência abolicionista, a indústria
do “resgate” de profissionais do sexo na Argentina. A pesquisa do Santiago Morcillo
(CONICET UNSJ IISE) e Cecilia Ines Varela (CONICET UBA ICA), “La campaña
antitrata y las estrategias del movimiento abolicionista de la prostitución en Argentina”,
busca compreender algumas das dinâmicas que organizam a abolição da prostituição na
Argentina,​ ​entre​ ​outras​ ​e​ ​também​ ​relevantes​ ​pesquisas​ ​com​ ​a​ ​temática​ ​da​ ​prostituição.
Uma das pesquisas produzidas no Brasil que irá contribuir para esse trabalho está no
livro da Adriana Piscitelli, ​Trânsitos​: brasileiras nos mercados transnacionais do sexo
(2013),​ ​que​ ​traz​ ​experiências​ ​de​ ​uma​ ​etnografia​ ​no​ ​campo​ ​da​ ​prostituição.
Os dois primeiros já citados, ​E se eu fosse Puta da Amara Moira (2016), ​O prazer é
todo nosso de Lola Benvenutti (2014), e o seu mais recente livro ​Por Que Os Homens Me
Procuram? ​(2017), surgem como um pré campo para compreender os contextos em que
duas​ ​diferentes​ ​profissionais​ ​do​ ​sexo​ ​universitárias​ ​vivenciaram​ ​suas​ ​experiências.
As produções de José Miguel Nieto Olivar, como o aqui citado, ​Devir Puta​: ​políticas
da prostituição de rua na experiência de quatro mulheres militantes (2013), também

7
​ ​Disponível​ ​em​ ​<​http://www.observatoriodaprostituicao.ifcs.ufrj.br/​>​ ​Acessado​ ​em:​ ​11​ ​de​ ​agosto​ ​de​ ​2017.

8
​ ​Disponível​ ​em​ ​<​http://www.redeprostitutas.org.br/​>​ ​Acessado​ ​em:​ ​11​ ​de​ ​agosto​ ​de​ ​2017.
9
​ ​Disponível​ ​em<​http://www.eseeufosseputa.com.br/​>​ ​Acessado​ ​em:​ ​11​ ​de​ ​agosto​ ​de​ ​2017.
aparece​ ​como​ ​importante​ ​reflexão​ ​para​ ​o​ ​diálogo.
Além disso, autoras/es que dialogam com gênero e sexualidade dentro das
perspectivas pós estruturalistas, como Judith Butler em seu livro ​Problemas de Gênero:
Feminismo e Subversão da Identidade (2015), Paul B. Preciado, Manifesto Contrasexual:
práticas subversivas de identidade sexual (2002), e adentrando no mercado sexual
composto também de artefatos culturais como revistas e pornôs, a obra ​Pornotopía​:
arquiterura y sexualidad en Playboy durante la guerra fría ​(PRECIADO, 2010) e ​Nas
redes do sexo: os bastidores do pornô brasileiro​, escrito por María Elvira Díaz-Benítez
(2010),​ ​também​ ​serão​ ​de​ ​extrema​ ​importância​ ​para​ ​minhas​ ​reflexões.
Por fim, acredito que essas/es autoras/es, assim como blogs mencionados que
trabalham com a prostituição, podem contribuir como base para essa pesquisa, e para o
debate​ ​contra​ ​perspectivas​ ​conservadoras,​ ​como​ ​a​ ​já​ ​mencionada​ ​abolicionista.

4.​ ​METODOLOGIA

Inicialmente, o trabalho deverá ter um levantamento bibliográfico sobre autoras e


autores que abordam as temáticas das relações de gênero, sexualidade, feminismo e
prostituição dentro de uma perspectiva pós-estruturalista. Além disso, será feito um
levantamento bibliográfico sobre os estudos que tiveram como foco a prostituição
universitária, como, por exemplo, no banco de teses e dissertações da CAPES, plataformas
de buscas de periódicos científicos (como Scielo), revistas científicas da área de Ciências
Humanas, além da participação em eventos acadêmicos, especificamente nas atividades
que​ ​incluam​ ​simpósios​ ​temáticos​ ​sobre​ ​o​ ​tema​ ​da​ ​prostituição.
Concomitantemente com a pesquisa bibliográfica, minha aproximação como
voluntária em um dos projetos do IBISS|CO- Instituto Brasileiro de Inovações
10
Pró-Sociedade Saudável do Centro Oeste , que possui uma atuação na área dos direitos
humanos e está intimamente próximo dessas profissionais do sexo, será utilizado como
estratégia para ter o primeiro contato com essas mulheres. Ressalto que minha pesquisa
aparecerá neste trabalho voluntário como algo externo ao projeto proposto pela instituição,

10
Projetos do IBISS|CO disponível em: <​http://www.ibiss-co.org.br/site/projetosVer/1/​> Acesso em: 23 de
julho​ ​2017.
não estando vinculados, e sendo apresentado para essas profissionais a pesquisa e o projeto
como dois pontos distintos e desvinculados, para que não sobreponha um mal entendido
com as prostitutas ou a própria instituição. Essa postura metodológica já foi apresentada e
aceita​ ​pelos​ ​responsáveis​ ​do​ ​referido​ ​projeto​ ​do​ ​IBISS|CO.
Também torna-se importante nesta pesquisa a investigação das redes sociais,
primeiramente por esta ser uma das ferramentas utilizadas por essas profissionais em
Campo Grande, além disso porque facilita uma interação com elas, tendo em vista que,
este meio de sociabilidade online nos possibilita o contato com sujeitos que preferem
permanecer anônimos, ou mesmo para aquelas que possuem certa resistência para uma
11
entrevista offline. Por exemplo, cito o site Photo Acompanhantes , com diversas fotos de
profissionais do sexo, onde elas descrevem algumas características que vão lhe valorizar
quando clientes forem fazer suas buscas por preferências. Entre essas descrições, encontrei
algumas com a ​tag “estudantes” e “universitárias”. Sites de anunciação como este, assim
como as salas online do Bate papo Uol Campo Grande, são importantes ferramentas para
dar​ ​expansão​ ​e​ ​maior​ ​visibilidade​ ​a​ ​esse​ ​mercado​ ​sexual.
Desta forma, a primeira parte do campo de pesquisa será feita através de uma
etnografia desses espaços online, isto é, uma pesquisa de campo online, adaptada ao
ambiente das mídias digitais, onde serão observados e analisadas imagens, vídeos,
mensagens, descrições entre outras possíveis informações sobre as profissionais do sexo
universitárias,​ ​que​ ​se​ ​encontram​ ​publicamente​ ​no​ ​ambiente​ ​virtual.
Entendo por “etnografia online”, algo semelhante ao que alguns autores chamaram de
“netnografia”, isto é, um método que visa abordar o espaço virtual, online (NOVELI,
2008). O método da “netnografia” vem sido utilizada, porém, por pesquisadores da área de
marketing e da administração, diferente da etnografia virtual (online), que vem sendo mais
usada na área de Antropologia e Ciências Sociais (AMARAL, NATAL, VIANA, 2008).
Deste modo, compreendo que seja mais adequado utilizar “etnografia online”. Isso consiste
em investigar os espaços online e interagir com as interlocutoras que acessam essas
tecnologias, as quais Richard Miskolci (2013) chamou de “mídias digitais”. Segundo ele,

11
Site Photo Acompanhantes disponível em:
<​https://www.photoacompanhantes.com/acompanhantes/campo-grande-ms​>​ ​Acesso​ ​em:​ ​05​ ​de​ ​mar.​ ​2017.
em uma etnografia (offline) a aproximação com os sujeitos da pesquisa costuma ser mais
paulatina, dado em uma esfera pública e adentrando-se ao pouco na intimidade do/a
colaborador/a, diferente nas mídias digitais, onde costuma-se criar um contato no privado,
de forma que a relação entre interlocutor/a com o/a investigador/a permite um acesso mais
rápido à intimidade, o que não deixa de criar, evidentemente, alguns embaraços e dilemas
éticos​ ​(Idem).
Por isso, o mesmo autor ressalta alguns cuidados metodológicos ao fazer pesquisa
neste campo online, dizendo que “o uso de fotos também precisa ser autorizado e usado
com parcimônia e cuidado para tornar as pessoas não-identificáveis” (Idem, p. 19). Assim,
tomarei todo o cuidado, como o que habitualmente se tem em uma etnografia offline, para
não expor as profissionais do sexo que se dizem universitárias. Esta parte do campo, me
ajudará a fazer levantamentos qualitativos dos sites e espaços onde elas transitam, que
terão​ ​como​ ​objetivo​ ​auxiliar​ ​posteriormente​ ​nas​ ​análises.
Através do campo online será feito um convite, a fim de propor para as interlocutoras
um encontro para uma entrevista offline e semiestruturada. Esta abordagem, será realizada
de modo onde será apresentado um Termo de Consentimento Livre Esclarecido explicando
os fins da pesquisa, para que não haja qualquer constrangimento ou problemas posteriores,
ficando restrito com a pesquisadora qualquer informação pessoal dessas mulheres. As
entrevistas,​ ​caso​ ​autorizadas,​ ​serão​ ​gravadas​ ​em​ ​gravador​ ​digital​ ​para​ ​posterior​ ​transcrição.
Para as entrevistas serão convidadas 10 mulheres, cujo perfis serão escolhidos em
termos de idade, cor, raça, classe social, estilo corporal, entre outros marcadores. As
entrevistas serão realizadas em um espaço reservado da Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul, em que esta pesquisadora está vinculada, a fim de garantir o anonimato e as
condições necessárias para evitar qualquer constrangimento, inclusive para garantir que a
gravação tenha uma boa qualidade. No entanto, caso alguma interlocutora não queira dar a
entrevista nessa instituição, ela poderá propor um outro lugar em que se sinta confortável
para​ ​participar​ ​do​ ​estudo.
O critério de elegibilidade para que se possa participar deste estudo são: se identificar
como mulher que se reconhece como atuante na prostituição universitária (se prostituindo),
ter maior de 18 anos, e que exerça a prostituição em Campo Grande (mesmo que não
resida​ ​na​ ​cidade).

5.​ ​ATIVIDADES​ ​E​ ​CRONOGRAMA​ ​DE​ ​EXECUÇÃO

Cronograma​ ​de​ ​Atividades​ ​de​ ​Pesquisa

(24​ ​meses​ ​-​ ​abril​ ​de​ ​2017​ ​a​ ​abril​ ​de​ ​2019)

Descrição​ ​das 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 2 2 2 2 2
1 2 3 4 5 6 7 8 9
ações 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 0 1 2 3 4
A Pesquisa
x x x x x x x X x x x x x x x x x
t Bibliográfica
i Etnografia x X x x x x x x x x
v
i Observação
x x x x x x x x
d Participante
a Conversas
x x x x x x x
d Informais
e Entrevistas x x x x x x
s
Transcrição​ ​das
x x x x
m entrevistas
e Análise​ ​dos
x x x x
n dados
s Escrita​ ​para
x x x x
a qualificação
i Banca​ ​de
x
s qualificação
Escrita​ ​final
x x x
dissertação
Banca​ ​de​ ​defesa x

6.​ ​RESULTADOS​ ​ESPERADOS,​ ​PRODUTOS​ ​E​ ​AVANÇOS

A presente pesquisa, visa apresentar uma outra perspectiva a respeito da prostituição


de mulheres, especificamente as universitárias, em Campo Grande - MS. Buscando trazer e
evidenciar parte de uma realidade social experienciada por essas mulheres, onde ainda há
pouca produção teórica na área de Antropologia Social em Campo Grande, que aponte
como​ ​são​ ​as​ ​experiências​ ​desse​ ​grupo​ ​de​ ​sujeitos.
A falta de produções científicas que abordem a temática da prostituição, em Campo
Grande, influência, em certa medida, para que haja uma maior vulnerabilidade por parte
dessas profissionais do sexo, tendo em vista que não há um reconhecimento por parte da
academia e produções que apontem possíveis demandas a partir das experiências dessas
mulheres.
Esta problemática fica evidente quando apresentei, no decorrer deste projeto, a grande
diferença entre as mulheres que não praticam a profissão, e as profissionais do sexo, em
relação a violência vivida. Há quase 8 vezes mais violência praticada contra as
profissionais do sexo e isto parte principalmente de policiais (LIMA et al. 2017), que
deveria,​ ​evidentemente,​ ​ao​ ​contrário​ ​de​ ​praticar​ ​violência,​ ​proporcionar​ ​maior​ ​segurança.
Em termos de avanço, a pesquisa pode contribuir para um melhor aprofundando nos
estudos da prostituição universitária no Mato Grosso do Sul, dando uma panorama sobre a
constituição do mercado sexual de Campo Grande, tendo em vista que ainda há pouca
produção teórica sobre o assunto, que muitas vezes se voltam somente para a área da
saúde, problematizando algumas moralidades sociais e discordâncias de uma política
pública que não corresponde as demandas apresentadas por essas profissionais do sexo.
Desta forma, o interessante é que os resultados da pesquisa cheguem no âmbito público
para a construção dessas políticas pública, como um campo, um produto, reflexo de uma
realidade​ ​social.

7.​ ​IMPACTOS​ ​E​ ​BENEFÍCIOS​ ​ESPERADOS​ ​PARA​ ​MATO​ ​GROSSO​ ​DO​ ​SUL

A princípio, acredito que a pesquisa possa ser uma iniciativa para a revisão do projeto
de lei, já apresentado acima solicitado pelo deputado Jean Wyllys, conhecido como PL
12
Gabriela Leite , que visa regulamentar a prostituição de forma a garantir direitos
elementares​ ​para​ ​a​ ​dignidade​ ​humana​ ​das​ ​profissionais​ ​do​ ​sexo.
Isto é, a pesquisa aqui em questão pode apontar uma demanda por parte dessas
mulheres para a necessidade de se repensar a continuidade da tramitação desse projeto,
visando um melhor bem-estar para essas profissionais, sejam elas as que residem em
Campo Grande (cidade foco da pesquisa), ou para as que vêm de outras regiões do estado
para fazerem seus programas na cidade, pois trazer essa visibilidade ao tema pode
contribuir intimamente para a diminuição de agressões tendo em vista a exposição e
enfrentamento​ ​a​ ​essa​ ​problemática​ ​da​ ​violência​ ​e​ ​vulnerabilidade.

12
​ ​Uma​ ​ex-prostituta​ ​reconhecida​ ​como​ ​a​ ​principal​ ​ativista​ ​dos​ ​direitos​ ​das​ ​prostitutas​ ​no​ ​Brasil.
Além disso, a pesquisa contribui para uma despatologização da Síndrome do
Estocolmo, uma condição psicológica usada como discurso por feministas com
perspectivas abolicionistas, que vê em todas as mulheres que se prostituem um processo de
vitimização, em que elas, sofrendo dessa síndrome, teriam depois de um longo período de
intimidações por parte de seus agressores (entenda-se clientes), se simpatizado com eles.
Esta perspectiva, tem como problema, ignorar o agenciamento de mulheres que optaram
por​ ​entrar​ ​na​ ​profissão,​ ​colocando-as​ ​em​ ​posições​ ​passivas.
Por conseguinte, a perspectiva sobre a qual essa pesquisa irá percorrer é ainda escassa,
os estudos mostram, segundo a revista publicada em 2013 pela Associação Brasileira
13 14
Interdisciplinar de AIDS (ABIA), em parceria com Davida e Fiocruz (com
financiamento do Ministério da Saúde – Departamento de DST/AIDS e Hepatites Virais),
que ainda são poucas as iniciativas de produções científicas que vincule a prostituição aos
direitos humanos, a temática possui uma invisibilidade em relação as políticas nacionais,
exceto quando essas pesquisas relacionam a prostituição com questões criminais, ao tráfico
15
de pessoas, exploração e prostituição infanto juvenil. Desta forma, torna-se importante a
produção​ ​de​ ​pesquisas​ ​que​ ​trarão​ ​a​ ​prostituição​ ​sobre​ ​o​ ​viés​ ​dos​ ​direitos​ ​humanos.

8.REFERÊNCIAS​ ​BIBLIOGRÁFICAS

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13
​ ​Informações​ ​disponível​ ​em​ ​<​http://www.davida.org.br/​>​ ​Acessada​ ​em​ ​10​ ​de​ ​agosto​ ​de​ ​2017.
14
​ ​Informações​ ​disponível​ ​em​ ​<​https://portal.fiocruz.br/pt-br​>​ ​ ​Acessada​ ​em​ ​10​ ​de​ ​agosto​ ​de​ ​2017.
15
Essas informações podem ser acessadas no seguinte link, disponível em
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