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Julho 2017
Campo Grande –MS
1. ANTECEDENTES E JUSTIFICATIVA DO PROBLEMA A SER ABORDADO
1
MACIULEVICIUS, Paula. Após 15 anos no time masculino, Mikaella mudou de lado e é a primeira trans no
vôlei. Disponível em: < https://www.campograndenews.com.br/lado-b/comportamento-23-08-2011-08/apos-
15-anos-no-time-masculino-mikaella-mudou-de-lado-e-e-a-1a-trans-no-volei>. Acesso em: 22 jul. 2017.
2
BRUM, Adriana. Jogadora transexual de vôlei ganha aval para disputar torneio no Paraná. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/esporte/2017/03/1867803-jogadora-transexual-de-volei-ganha-aval-para-
disputar-torneio-no-parana.shtml>. Acesso em: 23 jul. 2017.
3
RODRIGUES, João Gabriel. Na Itália, transexual quebra barreiras e entre as mulheres. Disponível em: <
http://globoesporte.globo.com/volei/noticia/na-italia-transexual-brasileira-quebra-barreiras-e-joga-entre-as-
mulheres.ghtml>. Acesso em: 23 jul. 2017.
[...] nem sempre se constituiu de maneira coerente ou consistente nos
diferentes contextos históricos, e porque o gênero estabelece interseções
com modalidades raciais, classistas, étnicas, sexuais e regionais de
identidades discursivamente constituídas. Resulta que se tornou
impossível separar a noção de “gênero” das intersecções políticas e
culturais em que invariavelmente ela é produzida e mantida (2016, p.21).
Bem como neste trabalho o gênero será abordado também como um processo de
incorporação prostético (PRECIADO, 2002), pois
Estes padrões específicos referidos pela autora, considerando contato prévio com a
bibliografia e o próprio campo de estudos, podem ser experienciados, inclusive, pela
mesma pessoa, considerando o manejo identitário da categoria travesti e mulher transexual
em diferentes contextos, como no de competições entre times de voleibol feminino em
Campo Grande. Feita essas considerações, é possível identificar, ainda que sob rasura, a
mulher transexual como uma pessoa que nasce assignada como sendo do sexo masculino,
mas que não corresponde a sua autoidentificação enquanto mulher ao longo da sua
experiência de vida, o que leva muitas delas buscarem a cirurgia de redesignação sexual.
Em suma, é desta maneira que as pessoas transexuais estão sendo trabalhadas na literatura
acadêmica no campo das Ciências Sociais, bem como nos movimentos sociais. Porém, é
preciso pensar naquelas pessoas transexuais que não queiram e/ou possam fazer uma
cirurgia de redesignação sexual, afinal, nem todas se dispõem de tempo, dinheiro e
paciência para isso. Não o bastante, ainda é preciso passar pelos processos judiciais de
retificação do nome masculino (VENCATO, 2003).
Sobre esses dois campos, tanto o médico, como o jurídico, segundo Tiago Duque
(2016), não se trata de reconhece-los como sendo absolutamente distintos e não
comunicáveis, antes, como campos de legitimidades socioculturais que se retroalimentam.
Segundo ele, “Contemporaneamente, quando o assunto é integilibidade e reconhecimento no campo
do gênero e da sexualidade, não é possível afirmar onde inicia um e termina o outro” (2016, p.127).
Mas, para além destes dois campos, as pessoas transexuais se submetem nas palavras de
Vencato, “as constantes negociações que precisam fazer para, digamos, ter alguma
aceitabilidade numa sociedade que não tem como característica principal o respeito à
diferença” (2003, p.204).
As travestis, por sua vez, procuram (de forma continua e cotidianamente) romper
com os traços/excessos masculinos que insistem em aparecer. Por isso, elas tentam ao
máximo aproximar-se de um modelo hegemônico do que é um corpo feminino por meio
de “processos de construção corporal”. Esses processos variam conforme a situação
financeira das travestis podendo ser frugal ou sofisticado (VENCATO, 2003).
As travestis são ainda quase sempre associadas à prostituição de rua, a vida noturna
e a comportamentos agressivos (VENCATO, 2003). Como Duque descreve em sua
pesquisa com travestis adolescentes,
É considerado esporte de alto rendimento aquele que tem como objetivo a busca
por vitória em competições, sejam elas intermunicipais, interestaduais, nacionais ou até
mesmo mundiais, como exemplo as Olimpíadas. Para tanto é necessário que haja árduos
treinamentos que são realizados (de forma geral) diariamente, cumprindo cargas horárias
de seis a oito horas por dia, passando assim dos limites dos seus próprios corpos (VIANA e
MEZZAROBA, 2013).
Segundo Camargo e Rial (2009), as competições do sistema esportivo seguem um
padrão heteronormativo, pois são divididas em equipes femininas e masculinas, compostas
por atletas homens, mulheres não transexuais e pessoas não travestis, além das/os
competidoras/es buscarem um alto desempenho nos termos do padrão masculino exigido.
Tratando-se destes jogos de alto rendimento, o trabalho aqui busca entender como
se é possível a inserção e reconhecimento das travestis e mulheres transexuais no voleibol,
uma vez que em 2016 foi bastante noticiada pela mídia (Jornais Estadão 4 e CNN Español5,
por exemplo) a divulgação do COI (Comitê Olímpico Internacional - referência mundial
4
ZUCCHI, Gustavo. COI muda regra e permite atletas trangêneros na olímpiada. Disponível em:
<http://esportes.estadao.com.br/noticias/jogos-olimpicos,coi-muda-regra-e-permite-atletas-transgeneros-nas-
olimpiadas,10000053822>. Acesso em: 12 mar. 2017.
5
CNN. Atletas transgénero podrán competir en Río 2016 sin cirugía de reasignación. Disponível em:
<http://cnnespanol.cnn.com/2016/01/26/atletas-transgenero-podran-competir-en-rio-2016-sin-cirugia-de-
reasignacion/#0>. Acesso em: 12 mar. 2017.
no que se diz respeito a esporte), por meio de um relatório “IOC Consensus Meeting on
Sex Reassignment and Hyperandrogenism November” (2015), informações sobre as
mudança nas diretrizes para a participação de atletas transgêneros nas Olímpiadas. Passou-
se a exigir apenas que as mulheres transexuais tenham a taxa de hormônio masculino
(testosterona) regulada, isto é, abaixo de 10 nanomol por litro de sangue durante os 12
últimos meses e perante todo período da competição. Além disso, que elas sejam
devidamente reconhecidas pelo gênero feminino, diferente do decreto anterior cujas
mulheres transexuais só poderiam participar de jogos femininos se tivessem feito à cirurgia
de redesignação sexual.
Mesmo com esse documento publicado pelo COI, existem muitas barreiras que as
travestis e as mulheres transexuais enfrentam ao tentar uma vaga em um time feminino,
pois apenas um decreto de nível mundial não bastou para que o preconceito e estigmas em
relação às suas experiências identitárias sejam desconstruídos.
2. OBJETIVOS
3. REVISÃO DA LITERATURA
Por um longo período da minha vida tive a oportunidade de jogar vôlei e vivenciar
este esporte de maneira competitiva, bem como para fins de lazer. Entre um e outro jogo
conheci muitas pessoas e sempre, com um olhar questionador e inquieto, observava
jogadoras travestis e transexuais em quadra jogando em times mistos e/ou masculinos e
nunca em times femininos.
Essas inquietações e questionamentos me acompanharam durante toda a minha
graduação em Educação Física Licenciatura, mas ainda de forma obscura, principalmente
pelo curso tratar as questões de gênero e sexualidade no esporte com um certo
determinismo biológico e naturalizado.
Após algum tempo tive a oportunidade de participar de um Grupo de Estudos o
qual me foi apresentado outras maneiras de pensar sobre gênero e sexualidade que não
fosse a que me havia sido apresentada na graduação.
Neste Grupo de Estudos o meu interesse em estudar gênero, sexualidade e esporte
foi provocado, principalmente, por ter conhecido autoras como Guacira Lopes Louro
(2000), Judith Butler (2003), Avtar Brah (2006), Berenice Bento e Larissa Pelúcio (2012)
bem como o autor Paul B. Preciado (2002), que me proporcionaram todo o aparato teórico
utilizando da abordagem pós-estruturalista e da teoria queer para pensar sobre gênero de
forma fluida, performática, não natural, não patologizante e entender que só é possível
estudar gênero de forma intersecionada com os outros marcadores sociais de diferença.
Portando, usufruindo deste e destas autor e autoras, busquei produções mais
especificas que pensassem sobre travestis e transexuais. Dentre várias e vários autores e
autoras, destaco Ana Paula Vencato (2003) que me possibilitou pensar travestis e
transexuais como identidades não fixas e não permanentes, contribuindo assim para os
estudo de Tiago Duque (2011 e 2016) o qual viabilizou o meu entendimento sobre, mais
especificamente, as travestis e a passabilidade e não passibilidade destes mesmos sujeitos
trans.
Pedro Paulo Pereira (2012) e Maria Lúcia Chaves Lima (2013) também foram
importantes nessa construção de aporte teórico, pois por meio dele e dela, bem como de
todo o conjunto de autores e autoras já citados e citadas, foi possível começar a
compreender esses sujeitos através de intersecções e suas construções corporais.
Uma vez iniciadas as buscas e encontros de aportes teóricos no que diz respeito a
gênero, sexualidade e outros marcadores sociais de diferenças, me empenhei em pesquisar
autores/autoras que me propiciassem entender e melhor teorizar sobre o esporte. Foi
quando me deparei com Dante Jr. De Rose, Silvia Despachamps e Paula Korsakas (2001)
que muito me ajudaram a pensar o esporte de maneira ampla, fazendo com que eu
buscasse obras que fossem mais especificas tratando de esporte de alto rendimento. Foi
quando tive o a contribuição de Danielle Freire W. Viana e Cristiano Mezzaroba (2013),
bem como de Carmem Rial e Wagner Xavier Camargo (2009), que para além de pensar
sobre o esporte de alto rendimento, me deram subsídios para entender os sujeitos que
vivem nas margens e que têm o esporte como um meio de ascensão social e profissional, e
também como é constituído o sistema esportivo.
Por fim, compreendo que o melhor método para entender e viabilizar minha
pesquisa é o método etnográfico tanto online como off-line, o qual tenho como referência
o autor José Guilherme C. Magnani (2009), Richard Miskolci (2011) e as autoras Adriana
Amaral, Geórgia Natal, Luciana Viana (2008).
4. METODOLOGIA
Etnografia virtual (online), é um método que vem sendo mais usado na área de
Antropologia e Ciências Sociais (AMARAL, NATAL, VIANA, 2008). Isso consiste em
investigar os espaços online e interagir com as interlocutoras que acessam essas
tecnologias, as quais Richard Miskolci chamou de “mídias digitais”. Segundo ele,
Além da etnografia on-line, também utilizarei da internet para fazer parte das
entrevistas, sabendo que:
10 º
11 º
12 º
13 º
14º
15º
16º
17º
18º
19º
20º
21º
22º
23º
24º
2º
3º
4º
5º
6º
7º
8º
9º
1º
Pesquisa Bibliográfica X X X X X X X X X X X X X X X X X X X
Etnografia X X X X X X X X X
Entrevistas X X X X X X X X
Transcrição das
X X X X X
entrevistas
Atividades mensais
Banca de Qualificação X
Banca de Defesa X
Relatório Final X X
Mas, para que o esporte seja um direito à todos (as), segundo o Plano Nacional do
Esporte (2001), ainda há uma desigualdade na “prática esportiva feminina” que precisa ser
enfrentada. Por isso é necessário que haja estudos que perpassam a realidade profissional
dentro dos esportes de rendimento com as mulheres, inclusive travestis e mulheres
transexuais, para que se tenha visibilidade e melhor entendimento do processo de inserção,
uma vez que, aos olhos da população em geral e da legislação, o esporte é um meio de
inclusão, ascensão social e profissional, logo, também pode contribuir para que travestis e
mulheres transexuais consigam sair de diferentes contextos de vulnerabilidades.
Sobre a realidade de preconceito, discriminação e violência (vulnerabilidades) que
vivem os sujeitos trans no Brasil, segundo os dados de uma pesquisa publicada em
novembro de 2016, pela ONG Transgender Europe (TGEu), o Brasil é o país que mais
mata travestis e transexuais no mundo. Segundo TGEu, são praticamente 868 mortes em
2016. Ainda se tratando de índices de violência, segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB),
em uma pesquisa feita em 2014, o Mato Grosso do Sul é o estado mais violento da região
Centro-Oeste para a população LGBT. Nesse sentido, a importância dessa pesquisa se
destaca, particularmente em nossa região, por investigar essas questões relacionada as
travestis e as mulheres transexuais no esporte, principalmente o de alto rendimento.
Além disso, do ponto de vista teórico, considerando o pouco acúmulo nacional e
internacional de pesquisas sócio-antropológicas sobre travestis e mulheres transexuais no
voleibol de alto rendimento, este estudo também se faz necessário pelas contribuições que
trata para a área de estudos de gênero e sexualidade, tanto na região, como no país. Sua
importância se dá, ainda, pela contribuição para melhor entendimento quanto às travestis e
mulheres transexuais e suas (im)possibilidades dentro do esporte sul-mato-grossense,
contribuindo para o conhecimento sistematizado dessa realidade, gerando dados que
podem inspirar a criação e/ou efetivação de políticas públicas na região.
8.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS