Você está na página 1de 12

Revista Serviço Social em Perspectiva

Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. www.periodicos.unimontes.br/sesoperspectiva


Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social

A MULHER TRANS COMO PONTO DE CONVERGÊNCIA ENTRE O MOVIMENTO


FEMINISTA E O MOVIMENTO LGBT

Larissa Noronha Chaves1

Resumo

O artigo se propõe a estudar as semelhanças entre as lutas do movimento feminista


e do movimento LGBT. A análise se pauta na investigação histórica e as bandeiras
de cada um dos movimentos. Busca identificar os conceitos de gênero e patriarcado
para orientar o estudo baseado nas mulheres trans.

Palavras-chave: Movimento feminista; Movimento LGBT; Gênero; Patriarcado;


Mulher trans.

Abstract

The article proposes to study the similarities between the struggles of the feminist
movement and the LGBT movement. The analysis is based on historical research
and the flags of each of the movements. It seeks to identify the concepts of gender
and patriarchy to guide the study based on trans women.

Keywords: Feminist movement; LGBT movement; Genre; Patriarchate; Trans


woman.

1
Advogada, graduada pelas Faculdades Santo Agostinho (FADISA). Especialista em Direito Tributário pelo Instituto
ElpídioDonizetti. Pós-graduanda em Gestão Pública Municipal pela Universidade Federal do Vale do Jequitinhonha e Mucuri
(UFVJM). Participante do Grupo de estudos do Projeto de Extensão Observatório Empoderamento do Feminino da
Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).
E-mail: larissanchaves@gmail.com
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

INTRODUÇÃO

A proposta de estudar as semelhanças entre os movimentos feminista e o


movimento LGBT traduz a bandeira maior do feminismo, igualdade. Equiparar as
lutas feministas e compreender as relações entre os enfrentamentos da mulher
trans, assume importante papel na eliminação de desigualdades dentro do próprio
movimento feminista. É preciso compreender as diferenças, sem fragmentar o
movimento de forma que abranger um de seus braços não signifique discriminar
outro. Traçar parâmetros, agregar as diferenças é proporcionar soluções aos
embates.
A discussão sobre o patriarcado e gênero, por exemplo,contribui para a
convergência entre as mulheres segregadas por raças, classes, etnias e ideologia
de gênero. O estudo pretende contribuir com a compreensão das distinções, mas
sem que haja fragmentação prejudicial aos movimentos. A união entre o movimento
LGBT e o movimento feminista são de extrema relevância para êxito das pautas
propostas.
O método utilizado para elaboração deste trabalho é a revisão bibliográfica,
pautada em estudiosos que abordam o tema. O texto se divide em três partes. A
primeira trata das definições de gênero e patriarcado. A segunda parte consiste na
compreensão da história e das lutas do movimento feminista. Na terceira parte
pontua-se a história e as bandeiras levantadas pelo movimento LGBT.

GÊNERO E PATRIARCADO

Cumpre a este trabalho, antes de discorrer sobre os movimentos, tratar, de


forma breve, sobre as definições de gênero e patriarcado. De acordo com Scott
(1989), a definição de gênero na gramática é a forma de classificar o sistema de
distinções socialmente acordado, mais do que uma descrição objetiva de traços
inerentes. Ressalta ainda, o fato de as classificações sugerirem uma relação entre
categorias que permitiria distinções ou agrupamentos separados.

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
524
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

Ocorre que a definição do termo é controversa do ponto de vista de distinção


de gêneros em função das características biológicas ou decorrentes da construção
histórica social, por exemplo; pois essa separação não atende toda a coletividade.
Sobre a questão, Scott (1989) dispõe:

Mais recentemente – recentemente demais para que possa encontrar seu


caminho nos dicionários ou na enciclopédia das ciências sociais – as
feministas começaram a utilizar a palavra “gênero” mais seriamente, no
sentido mais literal, como uma maneira de referir-se à organização social da
relação entre os sexos. A relação com a gramática é ao mesmo tempo
explícita e cheia de possibilidades inexploradas. Explícita, porque o uso
gramatical implica em regras formais que decorrem da designação de
masculino ou feminino; cheia de possibilidades inexploradas, porque em
vários idiomas indoeuropeus existe uma terceira categoria – o sexo
indefinido ou neutro. (SCOTT, 1989, p.2-3)

A definição binária de gênero, utilizada para definir a organização social,


como propôs Scott (1989), é a maneira utilizada pelas feministas para se
reafirmarem enquanto mulheres e sujeitos de direito, já que toda a organização
jurídica e social é construída sobre essa base.
As diversas concepções de gênero são definidas por Saffioti (2011) da
seguinte forma:

Gênero também diz respeito a uma categoria histórica, cuja investigação


tem demandado muito investimento intelectual. Enquanto categoria
histórica, o gênero pode ser concebido em várias instâncias: como aparelho
semiótico (LAURETIS, 1987); como símbolos culturais evocadores de
representações, conceitos normativos como grade de interpretação de
significados, organizações e instituições sociais, identidade subjetiva
(SCOTT, 1988); como divisões e atribuições assimétricas de característicos
e potencialidades (FLAX, 1987); como, numa certa instância, uma gramática
sexual, regulando não apenas relações homem–mulher, mas também
relações homem–homem e relações mulher–mulher (SAFFIOTI, 1992,
1997b; SAFFIOTI e ALMEIDA, 1995) etc. Cada feminista enfatiza
determinado aspecto do gênero, havendo um campo, ainda que limitado, de
consenso: o gênero é a construção social do masculino e do feminino.
(SAFFIOTI, 2011, p.45)

A autora elenca diversas categorias para a investigação de gênero buscando


abranger o maior numero de indivíduos possíveis, não se limitando a definição da
construção social decorrente do sexo biológico.

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
525
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

Em relação às definições de patriarcado, a definição de Saffioti (2011, p. 44),


de que o patriarcado “é o regime de dominação-exploração das mulheres pelos
homens” é a definição mais simples e autoexplicativa do próprio termo.
A hierarquia decorrente da exploração e de certo modo apropriação da mulher
é decorrente da construção social de que os homens possuem direito natural sobre
as mulheres, conferindo a elas uma situação de submissão naturalizada
historicamente.
A construção social de que há hierarquia entre os gêneros é a base da
sociedade patriarcal e dos abusos contra as mulheres, justificando a exploração e
apropriação do feminino.

O MOVIMENTO FEMINISTA

Em resposta aos abusos da sociedade patriarcal, surge o movimento


feminista, que propõe criar uma rede de ajuda e proteção à mulher em situação de
desigualdade.
O feminismo foi definido por Scott (2005, p. 21), como “um protesto contra a
exclusão das mulheres na política; seu objetivo foi o de eliminar a diferença sexual
na política”. Ocorre que, apesar de o feminismo pautar uma igualdade de gêneros,
seu foco são as questões da mulher.
É um conceito histórico de construções e lutas por liberdade e superação das
desigualdades em busca de uma sociedade solidária, para compreender a trajetória
do movimento no Brasil, deve-se conhecer brevemente sua história.
A trajetória do movimento feminista no Brasil a partir dos anos 70, após a
ditadura militar, rompeu com a tradição na qual as mulheres manifestavam
publicamente apenas os valores conservadores, como na Marcha da Família com
Deus e a Propriedade, que precedeu ao golpe militar (SOARES, 1994). A mulher
brasileira, posterior à ditadura, denuncia as desigualdades e luta por seus direitos e
necessidades.
As mulheres brasileiras exiladas começaram, nessa época a se identificar
com o feminismo estrangeiro, conforme Pinto (2010):

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
526
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

Enquanto as mulheres no Brasil organizavam as primeiras manifestações,


as exiladas, principalmente em Paris, entravam em contato com o
feminismo europeu e começavam a reunir-se, apesar da grande oposição
dos homens exilados, seus companheiros na maioria, que viam o feminismo
como um desvio na luta pelo fim da ditadura e pelo socialismo. A Carta
Política, lançada pelo Círculo da Mulher em Paris, em 1976 dá uma medida
muito boa da difícil situação em que estas mulheres encontravam-se:
“Ninguém melhor que o oprimido está habilitado a lutar contra a sua
opressão. Somente nós mulheres organizadas autonomamente podemos
estar na vanguarda dessa luta, levantando nossas reivindicações e
problemas específicos. Nosso objetivo ao defender a organização
independente das mulheres não é separar, dividir, diferenciar nossas lutas
das lutas que conjuntamente homens e mulheres travam pela destruição de
todas as relações de dominação da sociedade capitalista” (PINTO,
2003, p. 54). (PINTO, 2010, p. 17).

O movimento de mulheres, segundo Soares (1994) se mostrou heterogêneo e


trouxe à cena política mulheres diversas, influenciadas pelo feminismo que ressurgia
no período. O feminismo do início do século XX era pautado na conquista do voto e
direito à educação.
Ainda de acordo com a autora:

O movimento feminista que reapareceu no Brasil a partir de meados dos


anos 70 teve algumas características dos movimentos que surgiram na
Europa e Estados Unidos nos anos 60. No entanto, as condições políticas
locais, dadas pelas peculiaridades da primeira fase do governo militar, não
deram lugar à emergência de um movimento de liberação radicalizado como
os que mobilizaram mulheres da mesma geração e camada social naquelas
sociedades, mulheres com trajetórias e questionamentos "identitários"
semelhantes aos de muitas jovens brasileiras. (SOARES, 1994, p. 13)

Apesar da grande influência da Europa e dos Estados Unidos no movimento


feminista brasileiro, o Brasil, pelas condições políticas distintas, decorrentes do
contexto histórico de colonização e exploração, não abriu espaço para a chegada do
feminismo nos moldes daquelas sociedades.
Essa mesma situação política brasileira, segundo Soares (1994, p. 13)
propiciou “a emergência do feminismo no seio das militantes dos partidos de
esquerda e de mulheres engajadas na luta pela restituição da democracia no país.”.
O ano de 1975, eleito pelas Organizações das Nações Unidas (ONU), como o
ano internacional da mulher, foi o ano em que várias organizações feministas
tomaram forma e vários jornais feministas apareceram. Os grupos feministas da

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
527
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

década de 70 tinham como compromisso inicial a luta pela igualdade das mulheres,
a abertura democrática e a anistia (SOARES, 1994).
Naquele ano, aconteceu no Brasil a semana intitulada “O papel e o
comportamento da mulher na realidade brasileira”, com o patrocínio do Centro de
Informações da ONU. Na oportunidade, Terezinha Zerbini lançou o Movimento
Feminino pela Anistia, que teve papel relevante na luta pela anistia, em 1979
(PINTO, 2010).
Segundo Soares (1994), o feminismo aumentou os temas dos movimentos de
mulheres, que posteriormente foram incorporados pelos partidos políticos, como os
direitos sexuais e reprodutivos, questões como o aborto e a violência doméstica,
principalmente após a redemocratização em 1980.
O movimento feminista é uma expressão do movimento de mulheres, de
acordo com Soares (1994, p.15): “as feministas fazem do conhecimento e da
eliminação das hierarquias sexuais seu objetivo central, e a partir daí articulam-se
com as outras vertentes do movimento de mulheres.”.
De acordo com Pinto (2010), a partir de 1980, o feminismo no Brasil entra em
uma fase de luta pelos direitos das mulheres. A agenda feminista passou a tratar de
temas como a violência, sexualidade, direito ao trabalho, igualdade no casamento,
direito à terra, direito à saúde materno-infantil, luta contra o racismo e orientações
sexuais.
Pinto (2010, p. 17) assevera ainda, que ”o movimento feminista brasileiro,
apesar de ter origens na classe média intelectualizada, teve uma interface com as
classes populares, o que provocou novas percepções, discursos e ações em ambos
os lados.”.
Ainda hoje, a militância feminista segue buscando afirmar os direitos das
mulheres, as pautas de igualdade e o combate ao patriarcado.
Sobre a luta contra o patriarcado, Saffioti (2011) disciplina que:

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
528
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

Ninguém, nem mesmo homossexuais masculinos e femininos, travestis e


transgêneros, fica fora do esquema de gênero patriarcal. Do ângulo
quantitativo, portanto, que é o indicado pela palavra usada por Johnson
(larger), o patriarcado é, nas sociedades ocidentais urbano-industriais
informacionais, o mais abrangente. Da perspectiva qualitativa, a invasão por
parte desta organização social de gênero é total. Tomem-se, por exemplo,
as religiões. Estão inteiramente perpassadas pela estrutura de poder
patriarcal. A recusa da utilização do conceito de patriarcado permite que
este esquema de exploração-dominação grasse e encontre formas e meios
mais insidiosos de se expressar. Enfim, ganha terreno e se torna invisível.
Mais do que isto: é veementemente negado, levando a atenção de seus
participantes para outras direções. Cumpre, pois, um desserviço a ambas
as categorias de sexo, mas, seguramente, mais ainda à das mulheres.
(SAFFIOTI, 2011, p. 122-123).

Por fim, cumpre salientar que, diferentemente do que os historiadores sociais


propunham, as mulheres não são uma categoria homogênea, pois de acordo com
Soihet (1997, p. 96), os historiadores categorizavam as mulheres como “pessoas
biologicamente femininas que se moviam em papéis e contextos diferentes, mas
cuja essência, enquanto mulher, não se alterava.”.
Essa leitura foi importante para firmar a identidade coletiva do movimento,
mas há de se considerar a fragmentação por classes, raças, etnias e orientações
sexuais. A luta contra as desigualdades é a pauta feminista e se estende a toda
sociedade, inclusive a comunidade LGBT, mas devem-se considerar as
particularidades de cada movimento.

O MOVIMENTO LGBT

O enfrentamento das mulheres ao patriarcado se estende às mulheres


transexuais, cujas pautas de luta se assemelham e convergem em muito com as
questões feministas, em função da identidade de gênero.
O período de 60 e 70 foi marcado por intensas mudanças no Brasil, conforme
Facchini (2013, p.165):

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
529
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

Esse período está relacionado a um conjunto de eventos históricos e


movimentos sociais nos quais despontaram sensibilidades gestadas a partir
de novas formas de entender o poder e a política. A luta contra o
colonialismo e o nascimento, em várias partes do mundo, do movimento
pelos direitos civis, dos movimentos ecológicos e pacifistas e, em especial,
a emergência da contracultura e das reivindicações políticas e
epistemológicas dos movimentos feministas e homossexuais possibilitaram
o engendramento de novas práticas, ferramentas conceituais, sistemas de
conhecimento, saberes científicos e linguagens jurídicas que modificaram
as maneiras de viver, conceber e entender as relações antes restritas ao
mundo privado e da intimidade. (FACCHINI, 2013, P.165).

O movimento LGBT, assim como o feminismo no Brasil, começa a se


desenvolver a partir da década de 70, junto com o aparecimento dos jornais
Lampião da Esquina e Chana com Chana, nos mesmos termos do ressurgimento do
feminismo na época.
De acordo com Ferraz (2017), O Lampião da Esquina foi fundado em 1978 e
era abertamente homossexual, frequentemente denunciava a violência contra os
LGBTs. Em 1981, um grupo de lésbicas fundou o ChanacomChana, que era
comercializado no Ferro’s Bar, frequentado por lésbicas. Os donos do bar não
aprovavam a venda e, em 1983, expulsaram as mulheres de lá. Então, em 19 de
agosto do mesmo ano, lésbicas, feministas e ativistas LGBTs se reuniram no
Ferro’s, onde fizeram um ato político que resultou no fim da proibição da venda do
jornal. Este episódio ficou conhecido como o “Stonewall brasileiro” e, por causa
dele, a data é comemorada como o Dia do Orgulho Lésbico em São Paulo.
Ferraz (2017) afirma ainda que:

Na década de 80, a comunidade LGBT sofreu um grande golpe. No mundo


todo, uma epidemia do vírus HIV matou muitos LGBTs e alterou
significativamente as organizações políticas do movimento. A síndrome
trouxe de novo um estigma para a comunidade, agora vista como portadora
e transmissora de uma doença incurável, à época chamada de “câncer
gay”. As consequências dessa crise são sentidas até hoje.

O movimento feminista e o movimento homossexual da década, que hoje é


conhecido como movimento LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e
transexuais) questionaram a naturalização e patologização de papéis de gênero e de
condutas sexuais. (FACCHINI, 2013, P.165).
Surgem novos de prazeres e corpos, novas moralidades sexuais, novas
noções jurídicas, como os direitos reprodutivos e sexuais. O sujeito agora é
Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
530
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

valorizado pela autonomia de sua vontade e liberdade individuais (FACCHINI, 2013,


p.166). Facchini (2013, p. 166) dispõe ainda, que os ideais de responsabilidade,
respeito, consentimento e igualdade são as condições para o estabelecimento de
parcerias afetivo-sexuais e para a sexualidade.
Facchini (2013) define o real objetivo da patologização da sexualidade como
um fenômeno social, forma de demonstração de poder e apropriação:

(...)as formas contemporâneas de medicalização e de patologização da


sexualidade e da diferença sexual envolvem simultaneamente a
reconfiguração da vida erótica, o controle social, a disputa por discursos
considerados legítimos, a produção, a proliferação e a politização de
identidades, sujeitos e subjetividades, além de estarem inseridas em
processos e projetos amplos e complexos de modernidade e globalização.
(FACCHINI, 2013, P.166).

A partir do século XXI, a antropologia começa a estudar as


homossexualidades masculinas, incluindo variações sexuais e de gênero,
intensificando os estudos sobre a homossexualidade feminina e as variações de
gênero (travestis, crossdressers, transexuais, intersex) (FACCHINI, 2013, p. 166).
A ONU e a Anistia Internacional adotam a sigla “LGBT” (lésbicas, gays,
bissexuais e transexuais). Dentro do movimento propriamente dito, as siglas podem
variar, atualmente, a versão mais completa da sigla é LGBTPQIA+. A representação
da sigla é: L: Lésbicas, G: Gays, B: Bissexuais, T: Travestis, Transexuais e
transgêneros, P: Pansexuais, Q: Queer, I: Intersex, A: Assexuais, +: Sinal utilizado
para incluir pessoas que não se sintam representadas por nenhuma das outras sete
letras (FERRAZ, 2017).
As principais bandeiras do movimento, na atualidade, de acordo com Ferraz
(2017) são: a criminalização da homo-lesbo-bi-transfobia; fim da criminalização da
homossexualidade (e consequentemente das punições previstas pelas leis que
criminalizam a prática); reconhecimento da identidade de gênero (que inclui a
questão do nome social); despatologização das identidades trans; fim da “cura gay”;
casamento civil igualitário; permissão de adoção para casais homo-afetivos;
laicidade do Estado e o fim da influência da religião na política; leis e políticas
públicas que garantam o fim da discriminação em lugares públicos, como escolas e

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
531
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

empresas; fim da estereotipação da comunidade LGBT na mídia (jornais e


entretenimento), assim como real representatividade nela.
Recente e relevante conquista do movimento aconteceu em 01 de março de
2018, quando o Supremo Tribunal Federal decidiu, por unanimidade, ao reconhecer
que pessoas trans podem alterar o nome e o sexo no registro civil sem que se
submetam a cirurgia. A partir da decisão, o interessado na troca poderá se dirigir
diretamente a um cartório e solicitar a mudança, não precisará comprovar sua
identidade psicossocial, que deverá ser atestada por autodeclaração.
Pauta comum aos movimentos feminista e LGTB são as questões referentes
às mulheres transexuais, definida por Jesus (2012, p. 8) como “toda pessoa que
reivindica o reconhecimento como mulher.”.
O que determina a condição transexual é como as pessoas se identificam, e
não um procedimento cirúrgico. Assim, muitas pessoas que hoje se consideram
travestis seriam, em teoria, transexuais. (JESUS, 2012, p. 8).
Mulheres transexuais adotam nome, aparência e comportamentos
socialmente definidos como femininos, e devem ser tratadas como mulheres que
são. Ao tratar de transexuais e travestis a atenção abre para além das relações
entre gênero e sexualidade abrangendo questões de classe, geração, regionalidade
e raça.
Mulheres trans, se enquadram tanto nas pautas do movimento LGBT quanto
do movimento feminista, e sofrem igualmente as pressões do patriarcado com a
violência de gênero, violência contra a mulher, por conseguinte contra as mulheres
transexuais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Primeiramente, cumpre ressaltar que não se busca com o presente estudo


deturpar o "lugar da fala" das mulheres trans, mas sim trazer a tona um debate de
suma importância. Investigar o modo como se constroem e institucionalizam as
diferenças e as desigualdades, com fins à exclusão do sexismo, do racismo, da
homofobia e do neocolonialismo.
Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
532
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

A mulher sempre foi alvo de controle e apropriação, vítima de violência em


razão do gênero. As mulheres trans sofrem para além dessa questão, pois estão
abrangidas no movimento LGBT e no movimento feminista, dessa forma,
compartilha das lutas e das dificuldades de ambos os “segmentos”.
Vítima do discurso misógino e heteronormativo em relação ao feminino trans,
as mulheres trans devem buscar pautas comuns de luta e resistência. Propor
militância e denunciar qualquer tipo de abuso.
O movimento feminista deve abranger essa vertente em seu conjunto, sem
desfragmentar a luta, pelo contrário, alcançando também as pautas LGBT, já que o
principio do feminismo é a promoção de igualdade entre os gêneros.

REFERÊNCIAS

CARVALHO, Mário. CARRARA, Sérgio. Em direção a um futuro trans?


Contribuições para a história do movimento de travestis e transexuais no Brasil. In:
Sexualidad, Salud e Sociedad, Revista Latinoamericana ISSN 1984-6487 / N.14,
ago. 2014. p. 319-351. Disponível em
<http://www.scielo.br/pdf/sess/n14/a15n14.pdf> Acesso em 13 de março de 2018.

FACCHINI, Regina. FERREIRA, Carolina B. de Castro. Medicalização, sexualidade


e gênero: sujeitos e agenciamentos. In: Sexualidad, Salud e Sociedad, Revista
Latinoamericana ISSN 1984-6487 / N.14, ago. 2013. Dossier n. 2 - p. 164 - 171.
Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/sess/n14/a08n14.pdf > Acesso em 13 de
março de 2018.

FERRAZ, Thais.Conheça A História Do Movimento Pelos Direitos LGBT. Politize!,


Publicado em: 28 de junho de 2017. Disponível em <http://www.politize.com.br/lgbt-
historia-movimento/ > Acesso em 13 de março de 2018.

JESUS, Jaqueline Gomes de. Orientações sobre a população transgênero:


conceitos e termos. Brasília: Autor, 2012.

PINTO, Céli Regina Jardim. Feminismo, história e poder. Revista de Sociologia e


Política,
Curitiba, v. 18, n. 36, jun. 2010, p. 15-23.

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
533
CHAVES, L.N
A mulher trans como ponto de convergência entre o movimento feminista e o movimento
lgbt.

POMPEU, Ana. Direito à Autodeterminação: STF autoriza pessoa trans a mudar


nome mesmo sem cirurgia ou decisão judicial. Consultor Jurídico. Publicado em: 1º
de março de 2018. Disponível em <https://www.conjur.com.br/2018-mar-01/stf-
autoriza-trans-mudar-nome-cirurgia-ou-decisao-judicial > Acesso em 13 de março de
2018.

SAFFIOTI, Heleieth. Gênero, patriarcado, violência. 2ª ed. São Paulo: Expressão


Popular: Fundação Perseu Abramo, 2011, p.44-62.

SCOTT, Joan. Gender: a useful category of historical analyses. New York,


Columbia University Press. 1989. TRADUÇÃO: Christine Rufino Dabat e Maria
Betânia Ávila, p. 2-5.

SCOTT, Joan W. O enigma da igualdade. Estudos Feministas, Florianópolis, 13(1):


216,
janeiro-abril/2005, p. 11-30.

SOARES, Vera. Movimento Feminista: paradigmas e desafios. Estudos Feministas.


Ano 2,
2ª semestre, 1994, p. 13-24.

SOIHET, Rachel. História, Mulheres, Gênero: contribuições para um debate. In:


AGUIAR, Neuma. (Org.). Gênero e ciências humanas: desafio às ciências desde a
perspectiva das mulheres. Rio de Janeiro: Record: Rosa dos Tempos, 1997, p. 95-
114

Revista Serviço Social em Perspectiva – Montes Claros, Edição Especial, março de 2018. p.523-534
Anais do I Encontro Norte Mineiro de Serviço Social – I ENMSS
534

Você também pode gostar