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MASCULINIDADES EM (RE) VISTA: A CONSTRUÇÃO DA HEGEMONIA E O

CONSUMO
Jorge Luiz da Silva Alves1

Resumo: Este artigo é parte de uma pesquisa apresentada como trabalho de conclusão de curso para a obtenção das
habilitações em Licenciatura e Bacharelado em História pela Universidade Federal de Goiás – Regional Catalão e tem
como objetivo fomentar de maneira diferente o debate sobre as masculinidades e suas interações internas, tendo como
fonte a revista GQ Brasil publicação especializada em moda e estilo de vida. Neste sentido, procuramos olhar de
maneira diferente a dinâmica interna das masculinidades, fazendo uma análise sobre as construções e desconstruções
das mesmas. Partindo dos pressupostos dos Estudos de Gênero e dos estudos que englobam as masculinidades,
procuramos perceber de maneira mais profunda, o processo de construção do modelo de masculinidade hegemônica,
enxergando o mesmo como um processo “dialético”. Para tanto discutimos uma suposta crise masculina ou crise no
padrão hegemônico de masculinidade, crise esta que teria gerado um “Novo Homem” uma nova possibilidade de
vivenciar a masculinidade “hegemônica” na contemporaneidade. Em meio ao neoconservadorismo que avança cada vez
mais sobre as culturas, as discussões em torno dos papeis sociais, sexuais dentre outros, nunca foram tão importantes
para a compreensão das construções culturais acerca dos papeis femininos e masculinos nas sociedades. Com isto, nos
propomos a perceber como a metrossexualidade atua no espectro da dinâmica interna das masculinidades, se
constituindo como um modelo possível de hegemonia.
Palavras chave: Gênero, Masculinidades, Metrossexualidade, Consumo e Hegemonia.

Introdução

Acompanhando a perspectiva de compreender a História e a produção do conhecimento


histórico, o interesse em trabalhar com a revista GQ Brasil (abreviação de Gentlemen´s Quarterly),
surgiu na medida em que foi possível pensar a moda como um vasto campo de possibilidades e
acontecimentos que influenciam o cotidiano de seus/suas admiradores/as. Para ser mais específico,
me propus a compreender como as masculinidades estão representadas nesse meio de comunicação,
considerado um dos mais sofisticados e bem-sucedidos em seu segmento, qual seja, o de moda e
estilo de vida produzido para o público masculino. (SOUZA, 2013, p.36).

Considerando que os valores, comportamentos, modismos, dentre vários outros conceitos


levados ao cotidiano de milhares de leitores que na maioria das vezes, incorporam tais revistas
como guias em seus comportamentos cotidianos, veremos que este meio de comunicação,
representa um enorme campo de pesquisa para a História. Com suas especificidades, a imprensa
deve ter sua importância reconhecida, enquanto fonte para a pesquisa histórica, conforme Capelato:
“Conhecer a história através da imprensa pressupõe um trabalho com método rigoroso, tratamento
adequado de fonte e reflexão teórica. Sem esses ingredientes corre-se o risco de repetir para o
leitor, aliás sem o charme do jornal (ou revista), a história que ele conta” (CAPELATO, 1988, p.
23). Assim, é partindo da perspectiva da construção das “masculinidades” e de “homem” como
1
Licenciado e Bacharel em História pela Universidade Federal de Goiás – Regional Catalão. Atualmente é professor
contratado do Estado de Goiás e atua no CPMG de Catalão (GO) – Brasil.

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categorias sociais variáveis, que me proponho a discutir e analisar a construção da hegemonia
através do consumo na revista GQ Brasil, entre o período de 2013 a 2015. “Focar a masculinidade
como objeto de reflexão teórica no campo historiográfico nacional, ainda significa uma
perspectiva inovadora” (BOTTON, 2007, p. 109). Para tanto, consideramos que nos últimos anos, a
publicidade veicula um novo modelo de masculinidade, o do metrossexual, quebrando o padrão de
uma masculinidade hegemônica construída dentro do patriarcado.

No campo teórico, utilizamos ainda dos aportes dos estudos de gênero, que pensam as
masculinidades como construções sociais, e não como uma versão única, fixa, essencial e completa.
Tal recurso foi necessário, uma vez que os estudos sobre as masculinidades são bastante recentes no
meio acadêmico, surgindo na esteira das discussões realizadas pela epistemologia feminista sobre o
conceito de gênero. Assim, esta pesquisa buscou pensar uma dada construção de “homem” que seria
disseminada no imaginário social da moda e da publicidade direcionados a determinados segmentos
sociais considerados privilegiados (classes A e B), por meio de imagens, discursos e conceitos
expressos por essa revista. Para pensar a pluralidade de masculinidades vivenciadas por diferentes
homens, primeiro teremos que dialogar com os estudos de gênero, para em seguida refletir sobreas
categorias de análise circulantes no meio acadêmico de masculinidades, masculino e homem.
Partimos do pressuposto que a categoria masculinidades refere-se às práticas sociais constituídas a
partir de construções sociais e culturais, enquanto “homem” é uma categoria social que designa o
sujeito histórico que vivencia essas construções. Enquanto campo estudos interdisciplinar, os
estudos de gênero procuram compreender as relações e construções de gênero vigentes em nossa
sociedade. Foi no interior do movimento feminista, que surgiu a categoria “gênero”. De acordo com
Pedro (2008): “quando falamos em gênero, estamos nos referindo a uma categoria de análise, da
mesma forma como quando falamos de classe, raça/etnia, geração. ” (p.179).
Assim, o uso da categoria gênero, possui uma história que é tributária dos movimentos
sociais de mulheres, feministas, gays e lésbicas.
Na utilização mais recente, o termo “gênero” parece ter feito sua aparição inicial
entre as feministas americanas, que queriam enfatizar o caráter fundamentalista
social das distinções baseadas no sexo. A palavra indicava uma rejeição do
determinismo biológico implícito no uso de termos como “sexo” ou “diferença
sexual”. O termo “gênero” enfatizava igualmente o aspecto relacional das
definições normativas da feminilidade. Aquelas que estavam preocupadas pelo fato
de que a produção de estudos sobre mulheres se centrava nas mulheres de maneira
demasiado estreita e separada utilizaram o termo “gênero” para introduzir uma
noção relacional em nosso vocabulário analítico. Segundo esta visão, as mulheres e
os homens eram definidos em termos recíprocos e não se poderia compreender
qualquer um dos sexos por meio de um estudo inteiramente separado. Assim,

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Natalie Davis afirmava, em 1975: “Penso que deveríamos nos interessar pela
história tanto dos homens como das mulheres, e que não deveríamos tratar somente
do sexo sujeitado, assim como um historiador de classe não pode fixar seu olhar
apenas sobre os camponeses. Nosso objetivo é compreender a importância dos
sexos, isto é, dos grupos de gênero no passado histórico. Nosso objetivo é descobrir
o leque de papéis e de simbolismos sexuais nas diferentes sociedades e períodos, é
encontrar qual era o seu sentido e como eles funcionavam para manter a ordem
social ou para muda-la”. (SCOTT, 1995, p. 72).

1. A imagem de si no universo do consumo.

A primeira edição da GQ Brasil foi lançada em abril de 2011 com a topmodel brasileira
Alessandra Ambrósio estampando a primeira capa. Com uma trajetória de sucesso, a revista vem
mostrando que veio para ficar e que no que diz respeito a público masculino a mesma é expert. Com
menos de cinco anos de existência no mercado editorial brasileiro, a GQ se consolidou entre as
maiores revistas em publicidade do país e já é a maior e mais importante referência em estilo de
vida no que diz respeito ao universo masculino brasileiro. Apresentando uma qualidade excelente
no sentido editorial e gráfico, a GQ conquistou e vem conquistando cada vez mais prestígio junto ao
mercado leitor e de anunciantes o que vem conferindo ainda mais destaque em vários veículos de
imprensa.
Sendo assim, a GQ Brasil é cada vez mais engajada com sua missão de levar ao público
masculino brasileiro o melhor dos aspectos relacionados ao mesmo:

A missão de GQ Brasil é ser o guia essencial de estilo, cultura e lifestyle do


homem brasileiro sofisticado, oferecendo a ele, em diversas plataformas, o melhor
do universo masculino: um conteúdo eclético e inteligente com reportagens
investigativas, entrevistas reveladoras com pessoas que fazem a diferença na
sociedade brasileira e internacional, e as últimas novidades nas áreas de tecnologia,
saúde e cuidados masculinos (Grooming), esportes e fitness, música, moda e estilo,
viagem, gastronomia, bebidas, carros e motos, consumo, entretenimento, mulher e
política. Mensamente, na revista e no tablet, e diariamente, no site e em aplicativos
para smart phones, GQ Brasil conectará os seus leitores extremamente qualificados
socio e culturalmente a novas tendências, anunciantes e produtos prime.
(EDITORAGLOBO.COM, 2016).

Na edição de fevereiro de 2014, a estrutura editorial da revista se organizava de maneira


diferente de edições anteriores. A publicação agora possui uma organização que é feita em torno de
seis seções que são: Essencial, Motor, Manual, Diálogos, Neste Mês e Corpo uma nova seção da
revista que surge para substituir as seções Detalhes e Ação.

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Assuntos como música, arte, cinema, livros, designs, humor, política, ensaios sensuais com
uma ‘musa’ eleita para cada edição da revista, assim como o ‘homem do mês’, podem ser
encontrados na seção Essencial.
Novidades relacionadas ao setor automotivo são apresentadas na seção Motor, que possui
como slogan “Sobre máquinas fantásticas do céu, da terra e do mar”. Nesta seção são apresentados
veículos de última geração que possuem preços nada acessíveis para a maioria da população
brasileira. Através da apresentação destas verdadeiras joias em fotos que instigam ainda mais o
imaginário de seu público leitor, esta seção serve como um verdadeiro desfile do que supostamente
há de melhor no mercado automotivo.
Na seção Manual, são apresentadas as últimas novidades da moda masculina no “Guia
prático de estilo para homens impecáveis”. Através desta seção o leitor de GQ Brasil obtém
informações sobre moda e estilo, além de ficar por dentro das tendências que dizem respeito ao
guarda-roupa masculino.
Na seção Diálogos são apresentadas crônicas e artigos curtos sobre os mais variados
assuntos entre eles estão sexo, meio ambiente, esportes, política entre outros assuntos abordados
pelos colunistas e especialistas convidados para compor esta seção.
Na seção Neste Mês, são trazidas reportagens especiais sobre os mais variados temas e as
principais entrevistas da edição. Nesta seção encontramos diversos ensaios de moda, assuntos como
negócios, tecnologia entre outros temas abordados de maneira única em cada edição.
Por último, temos a seção Corpo, que não fazia parte da publicação no ano de seu
lançamento em 2011. Esta seção surgiu como forma de unificar as seções Detalhes e Ação que
traziam assuntos ligados ao cuidado com o corpo, cabelos, pele e também tudo sobre nutrição,
esportes radicais e tudo do mundo fitness. Sendo assim na seção Corpo são abordados os mesmos
assuntos trazidos antes pelas as outras duas seções.
Partindo desta estrutura editorial que compõe a revista em suas edições, nos propomos a
entender qual o discurso e qual homem é projetado dentro da GQ Brasil. No entanto devido ao
número de revistas analisadas, decidimos nos ater apenas a três seções da revista, sendo elas:
Essencial, Manual e Corpo. Esta escolha se deu pelo fato de que em uma análise prévia das
publicações, nos incitou saber com uma maior profundidade o que a revista coloca como
“Essencial” para o homem que a lê, o que deve ser seguido dentro do Manual e por último qual
Corpo é construído pela publicação. Juntas, elas compõem um verdadeiro arranjo de valores e
comportamentos do “Novo Homem”.

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As seções Manual e Corpo juntas compõem um arranjo prescritivo de como o ethos do Novo
Homem (acima descrito) deve ser expresso através de uma hexis corporal. A expressão de um “si”
através do corpo não é um processo novo e nem se restringe à figura do metrossexual ou de outras
masculinidades; trata-se de um resultado histórico de um processo de estetização do mundo que tem
como epicentro a valorização das superfícies na sociedade de consumo. Em uma sociedade que se
tornou cada vez mais definida pelo anonimato (e menos pelos laços comunitários tradicionais), a
aparência externa se torna a prerrogativa para uma “definição pessoal” na esfera pública, um
condicionante fundamental que possibilita habilidade em fazer julgamentos rápidos baseados na
imediaticidade visual. O “estilo” se torna a forma de manifestação subjetiva (da personalidade) e é
amplamente mediada pelos padrões e bens de consumo; a pessoa é aquilo que ela aparenta ser
através do que usa, veste, se alimenta e faz. E O valor das coisas e das pessoas é cada vez menos
definido através das qualidades materiais, o conteúdo propriamente dito é cada vez mais associado
ao apelo estético, a embalagem. (MARTINEZ, 2009).

1.2 O Manual dos manuais


Quando a GQ Brasil foi lançada em 2011, a seção Manual era pautada como um “Guia
Prático de Estilo para Homens Impecáveis” que se propunha levar ao público leitor da revista as
últimas novidades do universo de moda masculino. Como apresentado anteriormente, a GQ norte-
americana surge como um suplemento de moda de uma revista masculina, assim como a GQ Brasil
Style. A partir disso, a publicação passou a ser ligada a moda masculina em todos os lugares que
possuía publicações.
Pensando por este ângulo, e tendo uma preocupação em manter um certo nível em relação a
moda na edição brasileira, que pode ser percebida pela contratação do primeiro editor do Manual, o
stylist e jornalista Sylvain Justum. Possuindo em seu curriculum trabalhos em títulos como Vogue,
Homem Vogue, Estado de São Paulo além de seu badalado blog de moda masculina o Hypercool,
Sylvain Justum se mostrou mais do que qualificado para ocupar o cargo. No entanto a estadia de
Sylvain como editor desta seção durou até 2011 quando Antônio Branco assumiu o cargo.
No Guia Prático encontravam-se algumas colunas que variavam mensalmente, começando
pela capa do Manual, que na maioria das vezes apresentava temas que seriam a pauta principal da
seção. Apresentando mini editoriais com modelos utilizando peças de marcas e grifes conceituadas,
(representadas através de fotos que apresentavam seus valores, na maioria das vezes estratosféricos)
o Manual servia de deleite para leitores que buscavam por luxo.

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Colunas esporádicas que marcavam presença na maioria das edições preenchiam o Manual,
sempre procurando levar as últimas tendências da moda masculina a seu público. A coluna
“Guarda-roupa” apresentava diversos itens relacionados informações sobre a moda, como as cores
que iriam dominar a estação, produções que poderiam ser montadas a partir de uma peça curinga
em voga nos dos guarda roupas masculinos. Outra coluna que fazia parte de várias edições do
Manual, muito recorrentes no Guia Prático, era a “Lista de Pedidos”. Nela, grandes nomes do
mundo executivo, da música, do design, da moda e de outras áreas, representantes de um “homem
brasileiro sofisticado” escolhem objetos que consideram essenciais em seus cotidianos, ou que tem
o desejo de possuir.
A editora de moda da revista Vogue, Bárbara Migliori, possuía uma coluna dentro do
Manual chamada “Para Ela”, apresentava mensalmente, tendências e itens que interessassem às
mulheres. Na coluna “Futuro do Presente”, a editora de moda Helena Montanarini apresentava as
principais tendências da moda masculina através de um texto bem redigido, que poderia soar muito
bem aos interessados em moda.
Entretanto, algumas alterações na estrutura da revista afetaram a seção Manual. O Guia
Prático para Homens Impecáveis foi retirado da seção, as colunas Para Ela e Futuro do Presente
também foram extintas juntamente com a Lista de Pedidos. Estas mudanças começaram em 2013 e
se fortaleceram com o retorno do stylist Sylvain Justum ao posto de editor da seção. Agora com um
viés editorial mais voltado a moda masculina em si, o Manual aborda somente editoriais de moda
masculina, levando informações de desfiles de moda e da moda rua ao seu público leitor, através de
editorias que contam com relógios, sapatos, bolsas, roupas e vários outros elementos do guarda-
roupa de um homem verdadeiramente sofisticado.
Um tema recorrente nas edições analisadas, mas que pode ser situado na própria dinâmica da
moda, o resgate de décadas passadas se faz presente no guarda-roupa masculino deste novo homem.
Seja através de um óculos espelhado com armação inspirada nos anos 80, ou de uma suposta
releitura da icônica calça da Levi´s 501 (criada em 1873), a nostalgia de tendências também se faz
presente no cotidiano masculino no que tange a moda. Tendo como objetivo mostrar que o homem
que lê GQ Brasil é alguém que conhece moda as tendências de cada estação, a edição de fevereiro
de 2013 traz como único tema dentro do Manual, uma lista de 10 itens que não poderiam faltar no
guarda-roupa de um homem preparado para o verão daquele ano: Blazers de algodão
desestruturados, gravatas de seda, jaqueta jeans, camiseta listrada, costume sem forro, polos, cinto
de algodão, tênis clássicos, calçados tipo bucks e calças chino.A edição de novembro de 2014

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trouxe como pauta do Manual a releitura de uma peça quase unanime no guarda-roupa masculino: o
blazer. Apresentando uma nova cartela de cores para a escolha da peça, a seção abordou o blazer
como uma “peça curinga”, capaz de transformar qualquer produção desde uma proposta casual onde
entra como substituto de peças mais esportivas como jaquetas, até propostas mais formais. Já em
julho de 2014, a proposta de casaco era uma peacoat, peça usada originalmente pelos marinheiros,
mas que usada de “maneira correta”, poderia se tornar versátil, transitando desde ocasiões mais
casuais até as mais formais.
Pensando na mescla entre momentos formais e informais do cotidiano masculino, a edição
de abril de 2015 trouxe na forma de painéis, tendências que misturavam-se aos clássicos com
sugestões para o trabalho e diferentes momentos do lazer (sair à noite, pedalar e curtir o fim de
semana). Enfocando principalmente os momentos de lazer, a edição de setembro de 2015, abordou
os finais de semana e os dias de folga. Mantendo uma linearidade entre estas duas edições, a seção
Manual deixou claro que um autêntico Gentleman não se descuida da elegância nem mesmo nessas
horas. O conceito de loungewear elevaria tricôs e moletons luxuosos à categoria de peças icônicas e
para usar, inclusive, fora de casa.
Percebemos que há uma grande preocupação da revista com os momentos de lazer de seu
público. Para isso, o Manual explica como vivenciar estes momentos sem se descuidar e sem perder
o estilo. No entanto, se de um lado, o Manual aborda o lazer do público leitor de forma suave e
agradável, ele também demonstra que para este Novo Homem, o mundo do trabalho, também deve
ser permeado pelos conceitos de elegância, do glamour e o estilo, essenciais para seu sucesso
profissional.
Assim, na edição de fevereiro de 2015, com a frase “Hora de voltar ao trabalho, de energias
e espírito revigorados. E de roupa nova também, por que não? ”, o Manual trouxe um editorial com
sapatos sociais e mocassins, falando da diferença entre lugares em que se pode usar cada um deles.
Também abordou os relógios, trazendo o modelo com um reversor “A maioria dos ponteiros
usados em relógios gira sobre o marcador. Mas isto também pode ser diferente. Em alguns
exemplares os ponteiros se movem sobre um segmento circular e saltam ao chegar ao final,
voltando a posição inicial. Este complicador se chama revisor”, aceito por alguns e muito criticado
por outros. Também utilizados para se referir ao mundo do trabalho, os relógios apareceram na
edição de julho de 2014, onde foi feita uma seleção de relógios para quem trabalha em escritórios; o
modelo com pulseira de couro foi o mais indicado.

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Ainda nesta perspectiva, na edição de março de 2015 o Manual trouxe um editorial sobre
dicas de moda para quem está iniciando uma nova carreira ou prestes a ser promovido seja
trabalhando tanto em áreas formais quanto nas mais descontraídas. Abordando a vestimenta como o
melhor cartão de visitas de um profissional, o Manual diz que as aptidões são muito importantes,
mas que uma boa roupa pode ajudar.
Mostrando que o homem também vivencia dilemas relacionados à escolha de peças a cada
estação, a edição de janeiro de 2013 enfocou o impasse nas produções masculinas entre a escolha de
camisa e ou camisetas. Estas poderiam ser coordenadas juntas e/ou separadas em determinadas
produções para aproveitar o melhor de cada momento e lugar.
Neste sentido, a edição de fevereiro de 2014 abordando as calças e bermudas chino, também
fazia menção a uma dificuldade masculina no que se refere a moda e a ousadia exigidas de cada
sujeito. Nesta edição o foco era “um passo de cada vez” para aqueles que não dão conta de
mudanças de maiores proporções. Sendo assim o Manual propõe que os homens comecem a utilizar
os modelos chino de maneira diferente, partindo de uma mudança de padronagem e utilizando
modelos que prezam o minimalismo, para depois ir se adaptando a outras mudanças como a cor por
exemplo.
Ainda no que se refere a ousadia masculina na hora de se vestir, a edição de março de 2015
abordou uma releitura do estilo dândi, se referindo a releitura do estilo como Novo Dândi 2, o
Manual mostrou que o estilo com referências nos dândis tinha suas bases no contraste de cores do
blazer, colete, camisa e gravata o que seria segundo a seção “ousadia nível A.A” e então o Manual
pergunta “Tem coragem?”, questionando seu público se eles teriam coragem de aderir ao estilo do
Novo Dândi, arriscando-se entre os contrastes de cores.
Também no sentido de apostas ousadas para o vestuário masculino, a edição de outubro de
2015 trouxe visuais mais monocromáticos propondo ouso de meias de cores vivas e sapatos
marrons como uma alternativa elegantíssima aos tradicionais e sisudos modelos pretos; no entanto o
Manual afirma que a aposta é “Para homens seguros”.
Após ler, observar e analisar todas estas 11 edições da publicação GQ Brasil com enfoque
sobre a seção Manual, percebemos que os vários editoriais citados acima, se alinham em diversos
pontos aos temas como editoriais de relógios, de sapatos e roupas, abordados no Manual nestas
publicações. Portanto, entender o homem contemporâneo e a masculinidade gestada pela revista

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“O dândi inglês e seu análogo francês, o “incroyable”, entraram em evidência nos anos 1790. Ele era um cavalheiro
que aplicava a máxima da discrição como o princípio supremo da elegância masculina. Era essa discrição que o
distinguia do janota do século XVIII – o tolo vestido com exagero”. (STEVENSON, 2012, p.24).

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através de suas publicações, e mais estritamente na seção Manual é importante para percebermos
como a moda possibilita arquitetar identidades através das escolhas do vestuário feitas pelos
indivíduos.
De modo geral, a seção Manual apresenta uma multiplicidade no sentido de diversidade de
símbolos, estilos de vida, valores e identidades que estão univocamente ligados a um arranjo
específico de masculinidades. Neste sentido, acreditamos que a revista se dirija a um homem
contemporâneo, se detendo em aspectos específicos das identidades masculinas hegemônicas. Ao
abordar uma pluralidade de estilos dentro do Manual, a revista se dirige a vários homens que
supostamente vivenciam de maneiras distintas a masculinidade e expressam isto através do
vestuário também.
Supondo a metrossexualidade como uma construção idealizada dentro e para o consumo, é
possível afirmar que a revista GQ Brasil idealiza e reproduz a mesma nos exatos mesmos termos em
que foi concebida: através de forte relação com o consumo e com a estética produzida através dos
corpos. Neste sentido os metrossexuais podem se sentirem representados de alguma forma dentro da
publicação.
Dentro disso, também a categoria denominada de power-seekers3 se sentiria representada
pela revista, principalmente dentro do Manual, uma vez que a seção aborda vários aspectos
relacionando o vestuário ao mundo do trabalho, seja em grandes editoriais seja com pequenas peças
que fariam a diferença em uma produção executiva. Como vimos nas informações anteriores, o
Manual também aborda certos paradigmas na moda masculina que precisam ser quebrados, mas aos
poucos sem perder a clareza do estilo que cada um possui.
Sendo assim, creditamos que a seção Manual também aborda de maneira pretensiosamente
sofisticada e descontraída as especificidades de estilos variados, proporcionando ao seu leitor a
escolha de estilos variados, abordando tendências, peças, estilos e formas variadas de adaptar o
universo das passarelas para o dia-a-dia do seu leitor que necessariamente não precisa acompanhar
desfiles, pois o necessário se encontra no Manual. Acompanhando todas as temporadas de moda
importantes no mundo como Londres, Paris, Milão, New York e até o salão Pitti Uomo em
Florença, o Manual fornece sempre as principais tendências que vão dominar os guarda-roupas
masculinos “mais atualizados” na moda. Além de fornecer informações de moda provenientes das
passarelas, a seção também aborda os aspectos do street style que é nada mais nada menos do um

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“Os power-seekers por sua vez, são homens que ambicionam o poder e usam a vaidade para conquistar posições
almejadas, em especial no mercado de trabalho. Suas relações e práticas de consumo estão ligadas ao universo
profissional, pois estão sempre em busca do sucesso.” (SOUZA, 2013, p.27).

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estilo que se instala com maior força durante as temporadas de moda e possuem mais influência até
do que as tendências abordadas nos desfiles.
Dentro disso, o Manual também traz informações sobre os grandes nomes deste universo da
alta cultura de moda: Ermenegildo Zegna, Salvatore Ferragamo, Ralph Lauren, Armani entre
outros, dão nome as peças apresentadas na maioria dos editoriais.
Isto nos leva a acreditar que por mais que múltiplos homens possam se identificar com os
estilos, roupas, sapatos, acessórios entre outras coisas dentro da seção, de modo mais amplo ela é
direcionada a uma categoria especifica de homens privilegiados que podem vivenciar a experiência
de consumo dos valores gestados pelo Manual. Pois mesmo acreditando que o homem
contemporâneo possa ser unificado na figura de um homem em si, a revista veicula um material que
pode servir de identificação para mais de um homem, no entanto todas estas vivências necessitam
de um poder aquisitivo alto para consumir o estilo de vida com o qual elas se identificam além claro
de estarem alinhados com o projeto heteronormativo. Logo, a seção Manual não é uma ilha de um
homem só, mas também não é para todos.

Considerações finais

Partindo dos estudos de gênero que possuem um papel primordial no que tange o
entendimento dos papeis socioculturais de homens e mulheres em suas performances no cotidiano,
nos fiamos na construção cultural das masculinidades, não perdendo jamais a noção de que as
masculinidades, além de múltiplas, são construções que emanam informações necessárias para
entender os processos de opressão constituídos por meio do machismo, homofobia entre outras
ferramentas usadas na demarcação das relações de poder constituídas entre homens e mulheres e
homens e homens.
Percebendo que a revista não veicula a imagem de um modelo de homem apenas mas sim
múltiplas masculinidades que possuem um alinhamento com o modelo hegemônico, pois o público
que consome a revista é composto pelos aspectos que fomentam a hegemonia. Sabendo disto,
percebemos que para além de um guia para homens finos e elegantes, a revista serve como uma
espécie de arena imaginária onde são apresentadas e contempladas múltiplos modelos de
masculinidade hegemônica o que nos levou a abordá-las enquanto masculinidades concorrentes que
são passiveis de se tornarem o padrão hegemônico em si.

Referências
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CONTEMPORÂNEO ATRAVÉS DA MODA NA REVISTA GQ BRASIL. 2013. 56 f. TCC

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X
(Graduação) - Curso de Comunicação Social/ Jornalismo, Departamento de Comunicação Social,
Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2013.

STEVENSON, Nj. Cronologia da moda: de Maria Antonieta a Alexander McQueen. Rio de


Janeiro: Zahar, 2012. 288 p.

Sites

http://editora.globo.com/midiakit/gq/midiakit_gq.pdf acesso em 08 de janeiro de 2016, às 08:00.

MASCULINITIES IN THE (RE) VIEW: THE CONSTRUCTION OF HEGEMONY AND


CONSUMPTION

This article is part of a research presented as a course conclusion work for the attainment of
qualifications at Degree and Bachelor's degree in History from the Federal University of Goiás –
Regional Catalão and has as objective to promote a different way the debate on masculinities and
their interactions and internal, having as a source the magazine GQ Brazil publication specialized in
fashion and lifestyle. In this sense, we try to look at it in a different way the internal dynamics of
masculinities, making an analysis about the construction and deconstruction of the same. Starting
from the assumptions of Gender Studies and of studies that encompass masculinities, we seek to
realize in a deeper way, the process of the construction of the model of masculinity hegemonic,
seeing the same as a process of “dialectical”. For both we discuss a supposed crisis in male or crisis
in the standard hegemonic masculinity, a crisis that would have generated a “New Man” a new
possibility of experiencing masculinity “hegemonic” in the contemporary world. In the middle of
the neoconservadorismo that advances each time more about the cultures, the discussions around
the social roles, sexual among others, never were so important to the understanding of cultural
constructions about the roles of female and male societies. With this, we propose to understand how
the metrossexualidade acts in the spectrum of the internal dynamics of masculinities, being as a
possible model of hegemony.

Keywords: Gender, Masculinities, Metrossexualidade, Consumption and Hegemony.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),
Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

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