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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

INSTITUTO DE PSICOLOGIA

CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL

SUED DE ARAGÃO SOUZA

SÍNTESE DO ARTIGO “PENSAR O GÊNERO: Diálogos com o Serviço


Social”

Salvador
2019
SUED DE ARAGÃO SOUZA

SÍNTESE DO ARTIGO “PENSAR O GÊNERO: Diálogos com o Serviço


Social”

Avaliação III apresentada à disciplina de Fundamentos


Históricos Teórico-Metodológicos do Serviço Social III, do
Curso de Serviço Social, Instituto de Psicologia, Universidade
Federal da Bahia..

Docente: Prof. Cristiana Mercuri

Salvador
2019
1. LEVANTAMENTO DO TEMA: “PENSAR O GÊNERO: Diálogos
com o Serviço Social”

Para a realização do panorama de debate acerca de Gênero e Serviço Social, foi feito
um levantamento do tema nas três revistas a seguir: Serviço Social e Sociedade,
Katalasys e Revista de Políticas Públicas (UFMA), do período de 2010 a 2019.
Na revista Serviço Social e Sociedade, apenas um trabalho foi encontrado:

Formação profissional em serviço social e gênero: algumas considerações*


Autora: Rita de Lourdes de Lima

Na revista Katalasys, não foi encontrado nenhum artigo sobre Gênero e Serviço
Social em nenhum periódico.
Já na Revista de Políticas Públicas (UFMA), foram encontrados 6 artigos sobre
Gênero atrelado diretamente ao Serviço Social, sendo eles:

MUNDO DO TRABALHO, GÊNERO E POLÍTICAS PÚBLICAS: o papel do


feminismo estatal nessa relação
Autora: Barby de Bittencourt Martins

GÊNERO E SEXUALIDADE NA PAUTA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO


BRASIL
Autores/as: Cecilia Nunes Froemming, Bruna Andrade Irineu, Kleber Navas

GÊNERO, GERAÇÃO E O LUGAR DAS AVÓS: estudo com famílias de bairro


popular em Belém
Autora: Selma Suely Lopes Machado

Dossiê - Políticas Públicas: gênero, etnia e geração


Autoras: Raimunda Nonata do Nascimento Santana, Salviana de Maria Pastor Santos
Sousa

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, GÊNERO E POLÍTICAS PÚBLICAS:


problematizando a notificação compulsória no Município de São Gonçalo/RJ
Autoras: Mariana Frizieiro da Silva Cruz Freire, Rachel Gouveia Passos

PROJETO MULHERES DA PAZ: uma mirada de gênero


Autoras: Fabiana dos Santos Rocha, Márcia Santana Tavares

Por mais que cada um apresente um enfoque diferente para pensar o Gênero, foi
possível perceber um padrão de abordagens ao atrelar o tema com o Serviço Social,
limitando-o à esfera das Políticas Públicas. É de notável importância trazer para o debate
as Políticas Públicas voltadas para as mulheres, mas é possível que o foco dessas
discussões não apresente uma preocupação em pensar o Gênero enquanto Relação
Social hierárquica, uma vez que em todas as publicações encontradas no levantamento
o Gênero é sinônimo de “mulheres”, sendo o s homens meras derivações das discussões
abordadas. Ao se tratar de Violência, pensa-se na dominação masculina; ao se tratar das
mulheres nos âmbitos profissionais, pensa-se nas desigualdades salariais; e, então, ao se
pensar o Serviço Social neste âmbito, pensa-se em Políticas Públicas, não apelando para
o aporte teórico que poderia subsidiar teorias sociais a fim de explicar a vida social e as
relações sociais a partir da distinção entre o masculino e o feminino.
2. SÍNTESE

O artigo "Pensar o gênero: diálogos com o Serviço Social" da Doutora em


Antropologia e professora da Escola de Serviço Social da UFRJ, Andrea Moraes Alves,
inicia-se com a proposta de apresentar as três abordagens sobre gêneros mais comuns no
Serviço Social, sendo elas o marxismo, as relações de sexo e a interseccionalidade. A
autora aponta que a categoria gênero é muito discutida em pesquisas da área, e a maior
parte deles tem um enfoque em subtemas como a violência e o direito reprodutivo.
O sentido de gênero pode variar, mas no Serviço Social há compreensão geral de
que gênero trata das relações de poder na vida social, relações hierárquicas entre o
feminino e o masculino. Três advertências são feitas no início do texto: a primeira delas
é que a autora não possui a intenção de limitar todas as perspectivas presentes no campo
ao tratar apenas das três mais significativas; a segunda é que todas as perspectivas
apresentadas são igualmente relevantes, embora o marxismo e as relações sociais de sexo
sejam as mais utilizadas enquanto que a interseccionalidade esteja apenas começando a
adentrar nas produções acadêmicas em Serviço Social; e a terceira, por fim, é que se pode
observar um trânsito entre perspectivas, porque todas dialogam entre si.
Ao começar o diálogo entre Gênero e Marxismo, Alves se apoia na leitura de
Nancy Holmstrom em "Como Karl Marx pode contribuir para a compreensão do
gênero?", cuja defende que, com a abordagem de Marx, é possível entender relações de
gênero como relações sociais. Para Marx, as relações humanas são ao mesmo tempo
biológicas quanto sociais, de forma que as posições de homens e de mulheres são
componentes da produção e da reprodução, apresentando-se de maneira natural, mas
sendo socialmente construídas. No entanto, a autora traz que a inserção das mulheres na
ordem capitalista é tratada por Marx mais como um processo que diz respeito à lógica da
acumulação capitalista do que como uma questão que, de fato, afeta as mulheres.
Dessa forma, Engels publica em 1884 um trabalho intitulado como "A origem da
família, da propriedade privada e do Estado (2014)" que se desenvolveu como uma teoria
que ligou as relações de dominação das mulheres pelos homens à formação da família
monogâmica e ao advento da propriedade privada. No entanto, Engels sofreu muitas
críticas por deixar em aberto lacunas sobre a dominação masculina também já existir nas
sociedades pré-classistas que não conhecem a propriedade privada. Essas críticas
serviram como um pontapé para uma renovação na abordagem marxista no que diz
respeito aos lugares das mulheres.
A autora cita a tese de doutorado de Saffioti, escrita no ano de 1969, intitulada "A
mulher na sociedade de classes: mito e realidade" para explicar que a incorporação das
mulheres à força de trabalho no capitalismo varia de acordo com o grau de
desenvolvimento das forças produtivas. O desenvolvimento do sistema capitalista de
produção expele o trabalho feminino em um processo de marginalização das mulheres,
levando-as ao trabalho parcial ou ao papel de "dona de casa", no qual a mulher ficaria
submetida às tarefas de reprodução, aquelas que produzem e reproduzem as gerações
atuais e futuras de trabalhadores assalariados. Esse processo é permeado pelo o que
Saffoti denomina de "mística feminina", o que legitima a ideia do lugar subalterno da
mulher na sociedade. Para ela, o sexo é uma característica da estratificação social, um
princípio de hierarquia entre classificações sociais e um catalisador das tensões sociais na
ordem capitalista, porque mesmo com a incorporação da mulher à classe trabalhadora,
alcançando outros ambientes se não mais só o domiciliar, ela ainda se manteve atrelada à
subordinação social das mesmas, expressa nos baixos salários e na segregação
ocupacional.
Já ao falar sobre relações sociais de sexo e gênero, faz-se necessária a
compreensão de que as relações de trabalho são sexuadas e portadoras de hierarquias de
gênero, como já apontado anteriormente. O trabalho da mulher é trabalho explorado e
expropriado, na medida em que são força de trabalho disponível para o capital, e, além
disso, tarefas como cozinhar, lavar e cuidar de crianças também são classificadas
socialmente como femininas. Nessa perspectiva, o conceito de trabalho é modificado e
passa a referir-se a uma produção do viver em sociedade ou um conjunto de atividades
necessárias para a produção material e reprodução da vida, incluindo a família como
também esfera produtiva, embora não produtora de mais-valia. É a partir disso que entra
o conceito de "cuidado", ou "care", transbordando a perspectiva clássica do trabalho
como produção de valor.
Por fim, na perspectiva da interseccionalidade, a autora traz mais um destaque às
relações étnico-raciais. A ideia de que os sistema patriarcal é uma forma de dominação
dos corpos e da sexualidade das mulheres pelos homens e para proveito deles foi
levantada como questão pelo feminismo negro, uma vez que esse paradigma projetou uma
sombra sobre as experiências corporais e sexuais das mulheres negras, marginalizando-
as como mulheres e reduzindo-as à sua raça. A autora não se aprofunda no feminismo
negro, mas o julga se inegável importância para iniciar a discussão sobre
interseccionalidade, pois foi o berço da sua origem e que isso faz toda a diferença na
forma como a interseccionalidade opera com a raça.
A abordagem interseccional coloca a raça e a sexualidade no centro da
problematização das relações de gênero. A autora aponta o quão é importante levar a
sério o cruzamento de raça e gênero para a explicação das formas de subordinação e de
resistência produzidas em sociedade. Nessa abordagem, a raça funciona como experiência
de constituição do eu e como criação de uma concepção que se articula à sexualidade e
gênero de uma forma constitutiva e inextrincável. Por fim, a autora coloca que para
compreendê-la é necessário trabalhar com a perspectiva dos sujeitos que vivem essas
relações e que é por isso que as situações de opressão, marginalização e fronteiras sociais
são o terreno propício para investigações interseccionais, considerando
fundamentalmente o ponto de vista daquele que se encontra marcado por essas relações.
Em suas considerações finais, Andrea Moraes Alves retoma alguns pontos
relacionados à presença das três perspectivas nas produções acadêmicas do Serviço Social
e explica o objetivo do artigo de sistematizar essas concepções e indicar aspectos os quais
ela considera importantes. Ela menciona algumas lacunas do Serviço Social em relação a
gênero que permanecem abertas, como o fato de que gênero tem sido muito mais discutido
na categoria voltado para pensar apenas as mulheres, porque quando os homens aparecem
é mais por derivação, de forma o conhecimento acerca da população masculina se dá a
partir da investigação sobre mulheres. Esses dados são menores ainda quando se tratam
de formas para além da binaridade dos gêneros, embora alguns estudos já tratem dos
temas das sexualidades e corpos que não se identificam com um, nem outro.
Por fim, ela aponta que o debate interseccional no Serviço Social ainda é periférico
e que essa incorporação precisa ser trata com mais atenção, pois há o risco de raça ser lida
como sinônimo de cor, com enfoque no negro, e não como sinônimo de relações raciais,
ou seja, relações entre os brancos e negros em que um oprime e o outro é oprimido.
Exprime a necessidade de pensar raça como categoria sociológica e finaliza com a
conclusão de que é preciso um maior aprofundamento sobre a história das relações raciais
no Brasil recente.
3. NOTAS SOBRE OS FUNDAMENTOS TEÓRICOS

A autora subsidiou-se a partir de inúmeros autores ao decorrer do artigo, utilizando


da suas conceituações para fundamentar o diálogo das três perspectivas abordadas e seu
diálogo com o Serviço Social.
Para iniciar, ela conceitua Gênero apoiando-se em Joan Scott (2012), e inicia o texto
com uma leitura de Nancy Holmstrom (2014) sobre a abordagem de Marx a cerca de
Gênero enquanto Relação Social. Continua com o trabalho de F. Engels, "A origem da
família, da propriedade privada e do Estado" (2014), publicado originalmente em 1884
para conceituar a relação de Dominação Masculina, ligando-a à formação da família e à
Propriedade Privada.
Em sequência, utiliza a tese de doutorado de Saffioti (1969) para discutir a cerca
da Mística Feminina e da Estratificação Social. Cita Kergoat (2016, p. 20) para ilustrar o
conceito de Antagonismo, e Aruzza (2015, p. 55) para explicar a ressignificação do
conceito de Trabalho. De acordo com Helena Hirata (2010, p. 48), a autora menciona o
termo "Care" ou "Cuidado", e, já abordando a Interseccionalidade, ela traz o Feminismo
Negro, citando Jabardo, 2012. Mara Viveros (2009), em seu artigo, traz a feminista negra
norte-americana Kimberle Crenshaw (2005) como a primeira a usar o termo
Interseccionalidade. Angela Davis (1981/2016) traz como enfoque as Desigualdades
Raciais, e Lélia Gonzalez (1984) é uma referência ao se tratar da articulação entre
Racismo e Sexismo.
Para o Serviço Social, os conceitos relacionados à profissão aparecem como
rápidas citações aos enfoques dos trabalhos acadêmicos que se referem à Violência,
Direitos Reprodutivos e Desigualdades de Gênero. É trazido também o conceito de Vida
Social, Marxismo, Relações Sociais, Produção, Reprodução, Trabalho, Acumulação
Capitalista, Classe e Raça que, mesmo não sendo termos exclusivos do Serviço Social,
possuem uma grande recorrência nas leituras do curso.
REFERÊNCIAS

ARRUZZA, C. Considerações sobre gênero: reabrindo o debate sobre patriarcado


e/ou capitalismo. Outubro Revista, 23, p. 35-58, jan. 2015.

DAVIS, A. Mulheres, raça e classe. São Paulo: Boitempo, 2016.

ENGELS, F. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Rio de


Janeiro: Bestbolso, 2014.

HIRATA, H. S. Teorias e práticas do care: estado sucinto da arte, dados de pesquisa


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HOLMSTROM, N. Como Karl Marx pode contribuir para a compreensão do


gênero? In: CHABAUD-RYCHTER, D. et al. (Orgs.). O gênero nas ciências sociais.
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JABARDO, M. (Org.). Feminismos negros: una antología. Madri: Traficantes de


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KERGOAT, D. O cuidado e a imbricação das relações sociais. In: ABREU, A. R. P.;

HIRATA, H.; LOMBARDI, M. R. (Orgs.). Gênero e trabalho no Brasil e na França:


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SAFFIOTI, H. Gênero, patriarcado e violência. São Paulo: Fundação Perseu Abramo,


2004.

SAFFIOTI, H. A mulher na sociedade de classes: mito e realidade. São Paulo:


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2012.
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CHABAUD-RYCHTER, D. et al. (Orgs.). O gênero nas ciências sociais. Brasília:
EdUNB, 2014. p. 359-372.

VIVEROS, M. La sexualización de la raza y la racialización de la sexualidad en el


contexto latinoamericano actual. Universidad de Caldas, 2009. Disponível em: <http://
www.ucaldas.edu.co/docs/seminario_familia/Ponencia_MARA_VIVEROS.pdf>.
Acesso em: 28 dez. 2017.

GONZALEZ, L. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Ciências Sociais Hoje, São


Paulo, p. 223-244, 1984.

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