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Patriarcalismo
Por Letícia Rodrigues Ferreira Netto

Licenciatura Plena e Bacharelado em Ciências Sociais (Faculdade de


Ciências e Letras UNESP, 2015)
Mestrado em Ciências Sociais (Faculdade de Ciências e Letras
UNESP, 2017)

Categorias: Sociedade

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O patriarcalismo é uma forma de construção social


baseada no patriarcado. O patriarcado é o domínio
social ou uma estrutura de poder social centralizada
no homem ou no masculino. É baseada na própria
ideia de paters, figura do pai. E relaciona instâncias
públicas e privadas da vida social. É uma estrutura
bastante comum na sociedade humana, mas é
contestada por diferentes grupos sociais em vários
momentos da história, devido à pouca ou nenhuma
ação que impõe às mulheres. O patriarcado associa
a biologia à cultura, no sentido de diferenciar os
papeis sociais baseados em papeis sexuais. Em
geral, cargos de maior importância cultural são
destinados a homens, enquanto cargos de
importância familiar são relegados às mulheres.

Weber ressalta que os sistemas religiosos


estabelecem uma relação íntima entre
sociedade, sexualidade e erotismo, porquanto
eles são também sistemas de controle da
sexualidade e da reprodução. Associando
sexualidade com práticas mágicas e com o
comportamento religioso comunal, Weber
observa, ainda, que tanto as religiões místicas,
quanto as ascéticas, são hostis à sexualidade
[...]Para que este controle social se efetue as
mulheres são assemelhadas, pelos sistemas
religiosos, às criaturas irracionais (ou de difícil
autocontrole, isto é, com grande capacidade
de ocasionar o descontrole, ou como seres
capazes de causar emoção em quem as
circunda, inclusive pelos desejos que podem
despertar (Weber, 1964, p. 238). A contenção
desses sentimentos muitas vezes se
estabelece pela instituição de regras sobre as
vestimentas, normatizando que sejam
cobertas as partes do corpo feminino que
podem suscitar desejos nos homens.
(AGUIAR, 2000, pp. 309-310).

A ideia de patriarcalismo, como estrutura social, é


ainda uma construção social considerada
androcrática e androcêntrica. Androcracia se refere
às diferentes dominações e estruturas de poder que
um homem, por ser especificamente homem, pode
construir em sua sociedade. E Androcentrismo se
relaciona às preponderâncias que as ações
masculinas terão nessa sociedade, ou seja, a
atenção e mesmo a importância que essas ações
possuem e tem capacidade de transformar
atividades ou situações sociais.

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Nos últimos 12 meses, 1,6 milhão de mulheres


foram espancadas ou sofreram tentativa de
estrangulamento no Brasil, enquanto 22
milhões (37,1%) de brasileiras passaram por
algum tipo de assédio. Dentro de casa, a
situação não foi necessariamente melhor.
Entre os casos de violência, 42% ocorreram
no ambiente doméstico. Após sofrer uma
violência, mais da metade das mulheres (52%)
não denunciou o agressor ou procurou ajuda.
(FRANCO, 2019).

O conceito do patriarcado e as dominações sociais


relacionadas ao poder masculino preponderante na
sociedade são temas abordados, em geral, por
estudos de gênero. Esses estudos, principalmente
da linha feminista, identificam que existe uma
situação de desigualdade de gêneros na sociedade
que vem em decorrência da associação cultural de
papeis sociais a biologia. Esses papeis determinam
que a mulher estaria em desigualdade com o
homem e seria inferior a este. Essas ideias são
amparadas em dados estatísticos de violências
contra a mulher, de construção de discursos e de
ideias sociais sobre o que é o feminino como
pejorativo, frágil e menor.

“As mulheres foram criadas para obedecer e


servir aos homens. Os homens devem ser
fortes para prover sua família, para
desenvolver estratégias e liderar – e também
podiam esperar ser servidos. Esses são os
papeis de gênero aparentes em todas as
instituições de uma comunidade, desde
famílias, escolas e estádios, até os tribunais.
Quando desafiadas, tais ideias podem ser
impostam pela violência. Mas, às vezes, um
olhar mais frio ou a gozação de colegas são o
suficiente para fazer que alguém mude seu
comportamento, para que seja mais
condizente com seu papel de gênero. Um
menino chorão ou uma menina agressiva
talvez percebam, com certa rapidez, que
transgrediram os papeis de gênero para eles.
Uma das coisas mais traiçoeiras a respeito do
patriarcado, diz hooks, é que não se fala dele
[...] Os homens quase nunca sabem o que a
palavra “patriarcado” quer dizer – eles não a
usam no cotidiano a despeito de aplicarem
suas regras ao mesmo tempo que sofrem com
elas.” (THORPE et al, 2016, p. 94)

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Como o discurso do patriarcado é inerente à nossa


condição cultural, existe a argumentação que esta é
uma situação “natural”. As autoras feministas
questionam essa associação percebendo que as
condições físicas das mulheres não são
consideradas nesta afirmação, visto que ambos os
gêneros são igualmente capazes de construir
socialmente, trabalhar e se relacionar. Porém, a
partir de um entendimento cultural do que é a
biologia feminina, considerada frágil até mesmo
pela ciência até o século XX, isso se estenderia a
condição social da mulher, tornando-a um ser que
sofre ações e não que é protagonista dessas ações.

“Enquanto as primeiras feministas focaram a


identificação de uma única causa do
patriarcado, ligada a uma era histórica, ou
cultura particular, Walby define o patriarcado
como “um sistema de estruturas e práticas
sociais no qual os homens dominam, oprimem
e exploram as mulheres”. Ela alega que
existem seis estruturas em interação: a família,
o trabalho pago, o Estado, a violência
masculina, a sexualidade e as instituições
culturais.” (THORPE, 2016, p. 96)

Pensar o patriarcalismo como estrutura de poder


que deriva do patriarcado, envolve observar
também estruturas históricas. Em termos de Brasil,
a construção patriarcal envolve as particularidades
da formação nacional e do pensamento social
brasileiro.

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“Uma importante contribuição para a análise


do patriarcado a partir do contexto brasileiro é
oferecida por Jeni Vaitsman (1994). A autora
examina criticamente o sistema de
classificação das famílias que as diferencia
entre patriarcal ou extensa e nuclear ou
burguesa, apontando que a família burguesa,
de fato, é uma família patriarcal. Com a
separação entre casa e trabalho, inaugura-se
a divisão do sexual e do trabalho, com
especialização das funções de provisão da
casa e de cuidados com os filhos. O processo
de modernização brasileiro, portanto, inaugura
uma nova modalidade de patriarcado. A
concepção de uma família patriarcal burguesa,
portanto, permite explicar porque o
desenvolvimento capitalista e a
industrialização geram iniquidades de gênero.”
(AGUIAR, 2000, p. 325-326)

Autores da sociologia brasileira associam a


formação da sociedade e do Estado brasileiro com
a construção de estruturas patriarcais,
relacionando-as com o patrimonialismo. A figura do
pai, ou do senhor de terras, é extremamente forte
na nossa sociedade a ponto de organizar por
séculos as dinâmicas sociais, econômicas, políticas
e domesticas. Nesta estrutura, todas as mulheres
estão sujeitas a uma posição de inferioridade por
sua posição ser vista como um apêndice do
patriarca, destinadas a geração de filhos (legítimos
ou bastardos) para domínio e herança daquele. O
destino da mulher, neste sentido, é biológico pois a
sua função social é apenas a construção da família
e a manutenção dos filhos. Isso se torna ruim pois
acaba por diminui a importância e capacidade de
uma pessoa, restringindo-a a uma condição inferior,
controlada por outros e sem ação social.

“Um dos autores que mais se detém na


Ad
análise do patriarcado é Gilberto Freyre.
Independentemente das relações entre a
organização do grupo doméstico e a forma de
dominação estatal, o autor mostra que o
patriarcalismo estabeleceu-se no Brasil como
uma estratégia da colonização portuguesa. As
bases institucionais dessa dominação são o
grupo doméstico rural e o regime da
escravidão. A estratégia patriarcal consiste em
uma política de população de um espaço
territorial de grandes dimensões, com carência
de povoadores e de mão-de-obra para gerar
riquezas. A dominação se exerce com homens
utilizando sua sexualidade como recurso para
aumentar a população escrava. A relação
entre homens e mulheres ocorre pelo arbítrio
masculino no uso do sexo. (AGUIAR, 2000, p.
308)

“A Igreja, por intermédio dos conventos, é a


principal proprietária de escravos. Em função
disso, Nabuco demonstra como nos EE.UU.
[EUA] a religião se torna a campeã dos direitos
civis, lugar institucional em que se refugia a
população negra. No caso do Brasil, esta nega
os sacramentos aos escravos. Na ausência de
racionalização das relações sociais pelo
caminho religioso, os escravos se vêem
lançados à promiscuidade e à magia, aponta o
autor. O que Nabuco caracteriza como uma
forma de primitivismo pode ser compreendida
como uma resistência das mulheres à
escravidão, rejeitando serem usadas como
aparelho reprodutivo pelos senhores de terra.
As mulheres (Nabuco, 1988, p.38) usam ervas
daninhas e venenos, matando o feto no ventre,
e enterrando-o no mato. [...]Observa também
que o feto era de propriedade do senhor,
estando condenado à escravidão. O estado de
gravidez, todavia, não isenta a escrava de
prestar serviços forçados. A paternidade
inexiste, observa Nabuco, pois a família é
negada, e a escrava está sujeita à luxúria dos
brancos. A amamentação realiza-se
conjuntamente com os trabalhos cativos.”
(AGUIAR, 2000, 310-311).

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O que percebe-se é que o patriarcalismo é uma


estrutura social de poder que institui uma
desigualdade entre homens e mulheres, com os
primeiros exercendo dominação sobre as segundas
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e estruturando sua ação no social. Essa estrutura,
porém, é construída social e historicamente e
demanda o entendimento de igualdade entre as
pessoas para que se possa diminuir e apagar seus
efeitos nocivos. O patriarcalismo envolve
necessariamente opressão e dominação social, por
práticas e ideias que se perpetuam pela reprodução
social impensada.

“Na introdução do livro, Beauvoir ressalta que


o homem pode “persuadir-se de que não
existe hierarquia social entre os sexos e de
que, grosso modo, através das diferenças, a
mulher é sua igual”. Essa igualdade abstrata
nega a desigualdade concreta: salários mais
altos, cargos e lugares mais importantes na
indústria e na política. A igualdade de direitos
precisa estar inegociavelmente atrelada à
igualdade de oportunidades materiais e
simbólicas. Sendo a desigualdade simbólica
ainda mais difícil de combater, já que ela
envolve educação, hábitos, costumes e um
sistema de coerção, dominação e exploração
que beneficia os homens: “o presente envolve
o passado e no passado a história foi feita
pelos homens”.” (LIMA, 2015)

REFERENCIAS:

AGUIAR, Neuma. Patriarcado, sociedade e


patrimonialismo. Sociedade e estado, v. 15, n. 2, p.
303-330, 2000. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-
69922000000200006&script=sci_arttext

FRANCO, Luiza. Violência contra a mulher: novos


dados mostram que 'não há lugar seguro no Brasil'.
BBC News Brasil, São Paulo, 26 fev. 2019.
Disponível em:
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-47365503

LIMA, Daniela. A mulher é um devir histórico:


rastros de Beauvoir no Brasil. Blog da Boi Tempo.
08 set 2015. Disponível em:
https://blogdaboitempo.com.br/2015/09/08/a-
mulher-e-um-devir-historico-rastros-de-beauvoir-no-
brasil/

PÉREZ, Victoria A. Ferrer; FIOL, Esperanza Bosch.


Violencia de género y misoginia: reflexiones
psicosociales sobre un posible factor explicativo.
Papeles del psicólogo, n. 75, p. 13-19, 2000.

THORPE, C. et al. O livro da Sociologia. São


Paulo: GloboLivros, 2016.

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