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O ESPIRRA-PORRA

Eu não vou dizer que adorava meu trabalho, porque… Bem, a menos que você seja uma estrela
do rock ou um ator pornô bem-sucedido com um corpo sarado e dois palmos de bengala, ninguém
realmente adora o próprio trabalho. No máximo, não acha ruim. Esse era o meu caso, eu imagino.
Porém, se tinha uma coisa que eu considerava uma merda em ser operador de transmissão audiovisual
na empresa em que trabalhava, essa coisa era a porra do tédio.
Deixa eu explicar melhor. A companhia que me empregava era uma produtora de conteúdo
audiovisual especializada na cobertura de grandes eventos científicos da área da Medicina, como
congressos internacionais, simpósios, colóquios, essas paradas. A gente era responsável pela montagem
de toda a aparelhagem técnica, iluminação, computadores, projetores, câmeras, microfones, caixas de
som, e também pelo pleno funcionamento de tudo isso ao longo das atividades. A empresa cobrava uma
fortuna pelo aluguel dos materiais e a coordenação dos eventos, mas isso nunca era problema para
instituições cheias da grana como a Sociedade Brasileira de Câncer no Cu, o Comitê Internacional da
Cabeça da Minha Rola, etc. Em muitos desses eventos pomposos, repletos de grandes autoridades da
área médica, as apresentações dos pesquisadores eram transmitidas em tempo real para canais
especializados ou pela internet. Era aí que eu entrava: minha função era unicamente a de ficar em uma
cabine apertada, operando computadores e servidores e cuidando para que as filmagens estivessem
sendo transmitidas adequadamente pelos sites dos eventos ou para canais especializados. Minha
interação com o pessoal das câmeras, os operadores das mesas de som e os apresentadores se dava
sempre através de um microfone. Para eles, eu era apenas uma voz que dizia “no ar em 5… 4… 3…
2… 1…” e só voltava a abrir a boca para declarar o final de cada transmissão. Ou (e é aí que reside o
pesadelo da profissão) quando algo dava errado nas aparelhagens e precisava ser consertado às pressas.
Voltaremos a esse ponto mais adiante.
O que eu quero dizer com essa baboseira toda é que, para alguém que preferia o isolamento à
interação social, esse emprego até que me agradava. A grana era boa e eu trabalhava, em média, apenas
uns 8 ou 9 dias por mês. O problema era ficar de seis a dez horas por dia dentro de um cubículo sem ter
muito o que fazer além de dizer “no ar em 5… 4… 3… 2… 1…”, realizar transições de câmera de
tempos em tempos, checar conectividade dos servidores, mexer num cabo aqui e noutro ali. Sim, eu
poderia assistir às apresentações e aprender um pouco sobre tudo aquilo, mas você se interessaria em
acompanhar um velho de 100 anos ou um engomadinho arrogante tagarelando em termos técnicos por
horas enquanto mostra slides com fotos de intestinos ensaguentados, cérebros com tumor ou operações
de rinoplastia? Pois é…
Assim sendo, já que, na maioria das vezes, meu local de trabalho era uma cabine improvisada
de compensado sem janelas, e como ninguém viria me importunar enquanto tudo estivesse funcionando
conforme o esperado, a minha mais frequente distração para aquelas horas entediantes era a boa e velha
punheta remunerada. Bastava apenas acessar um site de putaria num monitor livre e descabelar o
palhaço enquanto os médicos lá fora mudavam os rumos da ciência. Na minha mochila, havia sempre
um rolo de papel higiênico preparado para ser gasto todinho até o final do evento, e eu, é claro, sempre
batia a meta. Aprendi, certa vez, num evento da Sociedade Brasileira de Pau e Bolas, que um homem
saudável jorra entre 80 e 300 milhões de espermatozoides toda vez que goza. O Brasil tem pouco mais
de 200 milhões de habitantes. Dá pra imaginar? A cada esporrada, é uma população inteira de
brasileirinhos se contorcendo em líquido seminal até morrerem ressequidos em papel higiênico
amassado. Esse é outro motivo pelo qual eu não gosto de assistir às apresentações desses eventos de
merda. Ou você fica com nojo do que existe dentro de você mesmo, ou com medo dos efeitos causados
por todo o tipo de merda que você mais gosta de fazer, ou se sente culpado por genocídios
consecutivos. Convenhamos, é muito melhor tocar uma bronha enquanto se assiste a duas gostosas
enfiando o punho no cu uma da outra.
E era isso mesmo que eu fazia, até o dia em que dei uma bobeira que não apenas me custou o
emprego, como também me deixou com uma má reputação que me impossibilitou de assumir qualquer
outra profissão relacionada à produção audiovisual desde então. Eu me tornei uma lenda do ramo, e não
de uma maneira positiva.
Aconteceu durante o último dos três dias de um puta encontro de cardiologia. Congresso
internacional. Salão de eventos lotado, com inúmeros estandes de companhias farmacêuticas e de
tecnologia especializada. Tinha médicos e estudantes de medicina de todo o Brasil. Um monte de
pesquisadores da gringa. Macbook pra tudo quanto era lado. Daqueles tipos de encontros de gente
importante que fazem você se sentir um completo bosta, sabe. Por sorte, eu ficaria isolado daquilo tudo
dentro da minha cabine de compensado, discretamente montada num dos cantos do salão. De lá, eu
teria apenas que coordenar a transmissão filmada das palestras e cursos sendo oferecidos no palco
principal para centenas de ouvintes do Brasil e de vários outros países, os quais acompanhariam as
atividades de modo remoto, através do próprio site do evento.
Com exceção de alguns poucos contratempos relativos à captação de microfones e instabilidade
de conexão, tudo ocorreu bem nos dois primeiros dias do congresso. Deu pra punhetar sossegado.
Enquanto um gringo bam-bam-bam da cirurgia cardiovascular anunciava uma descoberta
revolucionária para o tratamento da obstrução das artérias coronárias, eu assistia a uma suruba de
negões pirocudos fazendo desgraça com uma safadinha. Durante a palestra entediantíssima de um
mauricinho que nunca deve ter fritado um ovo na vida sobre possíveis novas causas para infarto do
miocárdio, eu me deliciava vendo mulheres competirem para ver quem lançava jato de mijo mais longe
enquanto trepavam. Enquanto um sujeito que mais parecia um ciborgue sem alma apresentava um
método de transplante de coração 9,7% mais eficaz, eu gozava para um compilado de garotas fazendo
gargarejo com porra. Os dois primeiros dias se passaram assim, em santa e abençoada pupunha. Após
eu anunciar que estava tudo certo para o início das apresentações e fazer minha voz soar nas caixas de
som do palco principal dizendo “no ar em 5… 4… 3… 2… 1…”, o mundo se resumiu a descascar a
banana, esvaziar os queijos, espancar o careca, pedir carona pro céu, tropeçar no tigre… Foi rola na
mão e pornografia pesada no monitor reserva, meu camarada.
Até a fatídica tarde do terceiro dia.
Como eu já mencionei, eu havia me acabado na punheta nos dois dias anteriores. Já tinha usado
um rolo e meio de papel higiênico, e a chapelota do meu amigão estava mais esfolada que joelho de
freira em Semana Santa. Por isso, havia decidido por passar a manhã inteira do terceiro dia me
recuperando. Foi um porre, porque eu não tinha mais nada para fazer além de assistir tabelas e mais
tabelas com índices de insuficiência cardíaca na terceira idade, efeitos do tabagismo sobre o coração,
hipertensão na gestação, e ablação por cateter para tratamento de fibrilação atrial, que consiste,
basicamente, em enfiar tubos pelas artérias de alguém com arritmia até eles chegarem ao coração para
fazê-lo bater direito na base da cauterização por radiofrequência ou congelamento. Você não precisava
saber disso, e eu também não, mas cá estamos, pensando em como deve ser uma merda você acordar da
anestesia enquanto seu coração é queimado por fios que entram no seu corpo lá pela virilha. É, foi mal.
Minha intenção foi apenas a de dar uma amostra da maravilhosa manhã que tive em meu terceiro dia de
trabalho no Congresso Internacional dos Semi-Deuses de Jaleco e Terno Giorgio Armani.
Pois bem, após a marmita do almoço, eu ainda teria que aguentar aquela chateação por mais
umas cinco horas. Então você pode imaginar como foi fácil cair na tentação de abrir um site de
fodelança no monitor reserva e assistir a um festival de pau-na-xota. Eram três da tarde quando eu
desisti de ser um reles espectador e abri o zíper da calça. Foda-se, eu pensei. Meu caralho esfolado que
lutasse. No monitor principal, um conferencista de nariz empinado falava qualquer coisa sobre
cardiopatia em diabéticos enquanto apontava com sua caneta de laser para a projeção de gráficos
estatísticos. No monitor reserva, uma safada coberta de lubrificante rebolava com uma rola enorme
enfiada em cada orifício. Como resistir? Com o painel do servidor mostrando conexão estável e a
transmissão da apresentação no site do evento indo de vento em popa, eu comecei a acariciar meu
pokémon. Cuspi na cabeça dele para minimizar a ardência causada por dois dias de ordenha, e
continuei o trabalho, focado no show de entra e sai das duas piroconas na xoxota e no cu da gostosa
lambuzada.
O vídeo atingiu o clímax quando a mulher se ajoelhou diante dos dois caras, com a maquiagem
borrada e a língua de fora, pronta para receber uma carga sobre-humana de porra na boca e brincar com
ela antes de engolir tudinho. Eu não esperei por esse momento. Antes que o primeiro jato de esperma
dos atores saísse, eu já jorrava como uma fonte por cima dos equipamentos elétricos, produzindo
faíscas e chiados e fumaça. No meu êxtase, eu havia esquecido de aparar a gozada com papel higiênico.
Meu pau ainda secretava porra enquanto eu via o desastre se desenrolar diante de meus olhos. Lembra
de quando eu falei sobre os imprevistos com a aparelhagem? O pesadelo da profissão? Pois bem, este
momento havia chegado.
Entre 80 e 300 milhões de brasileirinhos eram eletrocutados vivos pelo servidor em curto-
circuito. No monitor principal, aberto no site do evento, a transmissão da conferência do engomadinho
havia sido interrompida, e o chat de ouvintes já começava a pipocar com mensagens de reclamação. Eu
tinha que fazer alguma coisa, e rápido. Em questão de segundos, o coordenador responsável pelo
evento entraria pela porta do cubículo num ataque de nervos, querendo saber o que diabos havia
acontecido com a transmissão simultânea. Ainda com o pau de fora, eu tirei os cabos conectados ao
servidor principal e os pluguei no servidor reserva, sem nem me importar com a fumaça que saía do
aparelho queimado. Eu teria que pagar uma fortuna por aquela porcaria, mas aquele não era o momento
para se lamentar. Com a conectividade restabelecida, eu precisava apenas atualizar, no site do evento, o
proxy do novo servidor para que a transmissão voltasse ao ar. Nunca pensei e agi de maneira tão rápida
em toda minha vida. Desliguei o monitor reserva, peguei um punhado de porra que ainda pingava do
pau e espalhei no nariz para fingir um espirro. Por fim, lembrei de colocar o peru pra dentro da calça.
Mal havia terminado de fechar o zíper quando o coordenador do evento entrou no cubículo,
com o rosto vermelho e bufando. Eu expliquei que havia espirrado sobre os aparelhos e dado pane no
sistema, mas salientei que o problema já estava resolvido. Sem tirar os olhos furiosos de mim, ele
apenas apontou para o monitor principal, e só então eu percebi o tamanho da merda: enquanto que, no
palco principal, o médico pesquisador talvez continuasse apresentando a sua ladainha e fazendo
floreios com a caneta de laser, na página do evento, centenas – talvez milhares – de ouvintes remotos
assistiam a dois caralhos fenomenais jorrando entre 160 e 600 milhões de espermatozoides na boca de
uma mulher nua e com a maquiagem borrada, a qual fazia gargarejo com o líquido esbranquiçado antes
de engolir tudinho.

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