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Psico-USF, Bragança Paulista, v. 19, n. 2, p.

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Regulação Emocional em Psicoterapia: um guia para o terapeuta cognitivo-comportamental

Robert L. Leahy, Dennis Tirch & Lisa A. Napolitano (2013). Trad. Ivo Oliveira. Porto Alegre: Artmed. 331 p.

Este texto apresenta o livro Regulação Emocional disso, acerca da importância e implicação da regulação
em Psicoterapia: um guia para o terapeuta cognitivo- emocional nos processos psicoterapêuticos baseados
-comportamental, que se trata de uma importante e em TCC (terapia cognitivo-comportamental). Neste
bastante atualizada publicação, voltada para terapeutas capítulo, as emoções são consideradas um conjunto de
da psicoterapia cognitivo-comportamental contemporâ- processos multidimensionais e “indissociáveis”, sendo
nea. O livro é demasiadamente rico em detalhes práticos estes “requisitos” para a sua constatação. Adicional-
e ele aborda os temas a partir de um arcabouço teórico mente, as emoções são citadas com a função de ajudar a
bastante consistente e de fácil compreensão. Estas são avaliar as alternativas possíveis, oferecendo a motivação
características das obras do autor Robert Leahy, sendo para a apresentação de um comportamento (fazer algo).
ele considerado uma referência entre profissionais e As emoções se consolidam como uma representa-
estudantes da abordagem cognitivo-comportamental. ção mais abrangente na experiência humana, conforme
O livro é composto por 331 páginas, estando divi- exemplificam os autores:
dido em 11 capítulos. É possível entender a obra, a partir
de três partes fundamentais. A primeira parte visa apre- Ao ter a emoção “ansiedade”, reconhece-se que há uma preo-
sentar o conceito de emoção e discutir a importância da cupação, baseada em uma avaliação (ex. não conseguirá ou de
regulação emocional nos processos psicoterapêuticos, que não dará certo), associado a isso, o ritmo cardíaco acelera
sendo composta exclusivamente pelo primeiro capí- (sensação), então o sujeito concentra-se na competência (inten-
cionalidade), tem sentimentos em relação à vida (sentimento),
tulo. Já a segunda parte compõe-se pelos 10 capítulos
e dessa forma, acaba tornando-se agitado (comportamento
seguintes, os quais versam a respeito de técnicas/prá-
motor), e pode, quem sabe ainda, dizer a alguém que está em
ticas para a regulação emocional, finalizando com um um dia ruim (interpessoal) (p .19).
capítulo mais geral, de conclusão. Por fim, a terceira
parte é formada por uma ampla gama de formulários
Para os autores, as emoções revelam de alguma
e atividades para reprodução e utilização no cotidiano
forma, as necessidades humanas, e ainda neste primeiro
da clínica, disponibilizados no apêndice do livro. Neste
capítulo são apresentados os aspectos neurobiológicos
texto, optou-se por dar maior foco às duas primeiras
envolvidos nas emoções, os quais estão descritos pelos
partes, em função de o seu conteúdo ser mais genérico,
dos modelos “descendente” e “ascendente”.
sendo a terceira parte, relativamente “aplicada”, não
Neste capítulo faz-se um resgate teórico sobre a
sendo, por isso, alvo de maiores detalhes neste texto.
evolução da “curiosidade”, da importância e do con-
Como uma breve apresentação do “esqueleto”
ceito das emoções ao longo da história. Este resgate tem
do livro, o capítulo 1 é intitulado “Por que a regula-
início em Platão, na Filosofia Ocidental, perpassando
ção emocional é importante?”, seguido do capítulo
os filósofos estoicos, influenciando, mais tarde, os tra-
chamado “Terapia do esquema emocional”. O capítulo
balhos de Darwin, tornando-se alvo de investigação até
seguinte foi intitulado “Validação”, seguido do capí-
os dias de hoje. Na sequência, o livro se direciona para
tulo quatro, denominado “Identificação e refutação de
as estratégias em lidar com as emoções, apresentando
mitos emocionais”; o capítulo cinco, “Atenção Plena
algumas delas e introduzindo o conceito de regulação.
(Mindfulness)”; o capítulo seis, “Aceitação e disposição”;
Regulação emocional é definida como uma estratégia de
e o capítulo sete “Treinamento da mente compassiva”.
enfrentamento, podendo sê-la, de duas formas: proble-
Além desses, ainda há o capítulo número oito, o qual
mática ou adaptativa.
foi denominado “Como melhorar o processamento das
Segundo os autores, saber lidar com as emoções
emoções”, o capítulo nove, “Reestruturação cognitiva”;
de maneira adaptativa pode levar a redução da intensi-
e, por fim, o capítulo intitulado “Redução do estresse”.
dade das mesmas e da sua exacerbação. São exemplos
A respeito do capítulo 1, o qual foi intitulado “Por
de estratégias adaptativas: os exercícios de relaxamento,
que a regulação emocional é importante”, percebe-se
os exercícios físicos, a distração temporária, a conexão
que o mesmo constrói uma discussão a respeito do con-
entre as emoções e valores mais abrangentes, manipula-
ceito, das funções e da regulação das emoções, e, além
ção das emoções (substituição das emoções), mindfulness,

Disponível em www.scielo.br http://dx.doi.org/10.1590/1413-82712014019002016


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aceitação, entre diversas outras. Ainda neste capítulo, os dialética). Nessa abordagem busca-se delimitar as
autores sugerem que a regulação das emoções desem- crenças equivocadas referentes às emoções, descritas
penha importante papel em vários transtornos, dentre nesta abordagem como os “mitos emocionais”. Nesse
eles o TAG (transtorno de ansiedade generalizada), o modelo há certo incentivo no desafio às crenças refe-
TPB (transtorno de personalidade borderline), além dos rentes às emoções e é voltado para o TPB (transtorno
de ordem alimentar. Para a finalização deste capítulo, há de personalidade borderline). Como técnicas para tal,
uma discussão sobre a causalidade entre “razão e emo- são apresentadas: identificação dos mitos emocionais,
ção”, não havendo, segundo os autores, primazia entre apresentação de uma teoria sobre as emoções para
os termos. o cliente, a identificação da origem dos mitos emo-
O segundo capítulo apresenta a TEE (terapia do cionais, dentre outras. No capitulo são apresentados,
esquema emocional), abordagem cuja epistemologia se da mesma forma que nos demais, questões a serem
baseia em autores como Beck e Young. O enfoque cen- propostas durante as intervenções, tarefas de casa,
tral dessa abordagem está nos esquemas de associação exemplos clínicos e as sugestões dos formulários con-
entre as emoções e as áreas da vida do indivíduo, bem tidos no apêndice do livro.
como nas estratégias individuais para lidar com elas. O quinto capítulo trata das práticas de mindfulnes
Os esquemas emocionais são descritos como “filoso- (atenção plena) como uma das formas para alcançar
fias individuais” que se têm a respeito das emoções. autorregulação emocional, em razão de a mesma levar
Considerando este cenário no contexto terapêutico, o praticante a um distanciamento de “si próprio”, a fim
identificam- se as emoções e as estratégias esquema- de permitir a observação das emoções sem julgamento,
tizadas para lidar com elas. Neste capítulo também para, então, a aplicação de técnicas para sua autorre-
estão descritas as seguintes técnicas: identificação das gulação, tais como o escaneamento corporal, a atenção
emoções, rotulação das emoções, normalização de sobre a respiração, a aceitação consciente, dentre outras.
emoções, percepção da temporalidade das emoções, Neste capítulo os autores ainda fazem um breve resgate
além da técnica de exploração das emoções como bibliográfico referente às primeiras aplicações das prá-
meta, dentre outras. São sugeridas, também, questões a ticas em psicoterapia, bem como apresentam algumas
serem propostas durante a intervenção com os clientes, discussões acerca de sua epistemologia, associada à cul-
exemplos clínicos práticos, tarefas de casa e a designa- tura oriental. Além disso, exemplos clínicos envolvendo
ção de formulários específicos, estando exclusivamente as práticas de atenção plena, questões a serem aborda-
estes últimos no apêndice do livro (em torno de 80 das com o cliente durante as intervenções e algumas
sugestões). tarefas de casa, são apresentados.
O capítulo seguinte é chamado de “Validação” e Com intuito de desenvolver aceitação no cliente,
aborda, de início, a teoria do apego de Bowlby, sendo, este capítulo se associa aos dois seguintes, desig-
para os autores, associada com a forma como se deu nados “Aceitação e disposição” e “Treinamento da
a validação dos sentimentos por parte dos adultos, a mente compassiva”, no qual são apresentados téc-
partir da comunicação das emoções feita pelas crianças. nicas e fundamentos da ACT (terapia da aceitação e
Validar as emoções está relacionado com percebê-las e compromisso/comprometimento), dentre os quais
aceitá-las e, por isso, está associado com questões como a técnica da desfusão cognitiva e o uso de metáforas.
empatia e olhar positivo incondicional, tanto por parte Adicionalmente, apresenta-se a TFC (terapia focada na
do terapeuta com seu cliente (Rogers), como do cliente compaixão), a qual busca o desenvolvimento da “com-
com suas próprias vivências e emoções. Neste capítulo paixão”, sendo esta definida como um facilitador do
ainda são apresentadas as seguintes técnicas: resistência processo de autorregulação. Os autores também fazem
à validação, exame do significado da invalidação, desen- uma pequena discussão com relação aos termos mind-
volvimento de estratégias para lidar com a invalidação, fulness e meditação.
dentre outras. Adicionalmente são propostas questões Já no capítulo oito, chamado “Como melhorar o
para serem operacionalizadas durante as sessões tera- processamento das informações”, são discutidas algu-
pêuticas, bem como exemplos clínicos práticos e a mas técnicas e fundamentos da TFE (terapia focada nas
designação de formulários específicos, referentes a isso. emoções), a qual se volta para a aliança psicoterápica
No quarto capítulo, intitulado “Identificação como “regulador” das emoções, de forma que esse vín-
e refutação de mitos emocionais”, são apresentados culo possa ser generalizado para a vida cotidiana dos
alguns conceitos da TCD (terapia comportamental clientes. Complementarmente, o capítulo nove volta-se

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para a TCC (terapia cognitivo comportamental), mas as imagens mentais positivas, dentre outras, e, adi-
especificamente sobre o processo de reestruturação cionalmente, são disponibilizados exemplos clínicos
cognitiva, cujo objetivo é modificar as interpretações práticos, questões propostas para as intervenções e os
que são dadas aos eventos para, com isso, haver uma formulários específicos para essa demanda.
redução no impacto das emoções. Nestes dois capítulos Concluída a apresentação do livro, faz-se signifi-
também são descritas algumas técnicas, tarefas de casa, cativo destacar que aqueles terapeutas que percebem
além de alguns exemplos clínicos práticos, questões a a necessidade de utilizar técnicas para desenvolver
serem abordadas durante as intervenções terapêuticas a regulação emocional de seus clientes encontrarão
e, por fim, a indicação de formulários. neste guia uma rica fonte de informações. Além disso,
Denominado “Redução do estresse”, o décimo cabe salientar que o livro cumpre o papel que se pro-
capítulo inicia discutindo o conceito de estresse, põe, apresentando temáticas que se relacionam com a
referindo-se a um estado de alarme, através da ati- questão da regulação emocional em processos psicote-
vação do eixo hipotalâmico-hipofisário-suprarrenal rapêuticos, de maneira didática.
(HHSR), estando o fenômeno associado com os pro- O livro discute os principais conceitos referentes à
cessos de regulação emocional e com a adaptação do área, de maneira diversificada, apresentando referências
indivíduo, de uma forma geral. Incorporado a esse atuais, excelente argumentação, além de exemplos clíni-
funcionamento de ativação do estresse estão os pro- cos bastante compreensíveis. Outro ponto positivo do
cessos implícitos de avaliação cognitiva. Ainda neste livro é que ele apresenta uma extensa fonte de materiais
capitulo, o relaxamento é descrito como um compe- para serem utilizados no dia a dia da clinica cognitivo-
tidor, dentro do organismo, das reações do estresse, -comportamental, ou mesmo das demais abordagens
uma vez que “transporta” o organismo do sistema apresentadas no mesmo. Para finalizar este texto, rei-
nervoso simpático (associado ao estresse) para o tera-se que qualquer profissional, independente do
parassimpático (associado ao relaxamento). Por fim, nível e do tempo de capacitação e mesmo da experiên-
são apresentadas algumas técnicas, como a respiração cia enquanto psicoterapeuta, poderá se beneficiar com
diafragmática, o relaxamento muscular progressivo, este material.

Sobre o autor:

Jeferson Pires é psicólogo e aluno do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa
Catarina, na linha de avaliação em saúde e desenvolvimento, em nível de mestrado. Atualmente integra o Laboratório
de Pesquisa em Avaliação Psicológica e o Laboratório de Educação Cerebral, ambos na UFSC.

Contato com o autor:

Universidade Federal de Santa Catarina


Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Departamento de Psicologia
Trindade – 88040-970 – Florianopolis, SC – Brasil
E-mail: jefersongp@gmail.com
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