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18.mar.2021 às 14h02
Atualizado: 6.abr.2021 às 20h52
O mais recente, nesta terça-feira (6), é a marca dos mais de 4.000 mortos
registrados num único período de 24 horas. Média de óbitos em 7 dias vai a
2.740. Há 3 semanas acima de 2.000 mortes diárias, país vê pandemia acelerar.
:
Funcionário faz a contagem das covas recém abertas para receber vítimas da Covid-19 no cemitério Sã…
A Folha abriu um espaço para os leitores e leitoras que perderam alguém para a
doença contarem como estão lidando com a ausência deixada pelos seus entes
queridos.
Perdi minha mãe, Maria Aldivani Oliveira, para a Covid-19. Ela tinha 72 anos, foi
internada no dia 6 de fevereiro com poucos sintomas, porém, estava com uma
saturação abaixo de oxigênio abaixo de 90. O dia da internação foi a última vez
que tive a oportunidade de abraçá-la. Ela estava bem, consciente e andando.
Após esta data, somente o boletim médico uma vez por dia por telefone. Doze
dias depois, ela veio a óbito. Já era asmática grave, e isso piorou mais a situação.
A dor maior foi não poder me despedir. Tive que fazer o reconhecimento do
corpo através de uma foto no celular da assistente social e acreditar que era ela
dentro do caixão. Não desejo isso pra ninguém.
Marcelo Oliveira, 48, engenheiro, São Paulo (SP)
Em menos de 24 horas, perdi meu pai e minha mãe para a Covid-19. Ele se foi
no dia 6 de abril de 2020, aos 85 anos, e ela, no dia seguinte, aos 75. Eles
estavam em hospitais diferentes, e jamais souberam da morte um do outro.
Estavam casados há 55 anos, eram inseparáveis, o que se mostrou verdade,
tanto na vida como na morte. Formaram uma família muito feliz e deixaram
duas filhas, que na época também pegaram Covid, mas com sintomas leves. Sou
uma dessas filhas, e até hoje a dor da perda me acompanha, de algum modo
relativizada somente quando vejo em perspectiva as milhares de outras famílias
que, como a minha, também foram destruídas por esta pandemia. Quase um
ano depois, percebo com tristeza que a situação no Brasil, ao contrário de
melhorar, só piora. Porém, temos que seguir em frente, vivendo um dia de cada
vez, com cuidado, esperança e ética.
Ana Maria Correa da Silva, 54, funcionária pública, Rio de Janeiro (RJ)
Perdi meu irmão no dia 14 de janeiro de 2021, no dia do colapso dos hospitais
por falta de oxigênio em Manaus. Egberto Rodrigues era um homem cheio de
vida que amava seus dois filhos e esposa. Funcionário público de carreira da
Seduc-Am, estava realizado e planejando seu mestrado. Amava a vida e isso foi
tirado dele pela má gestão de todas as esferas governamentais. Essa pandemia
do descaso reflete o quanto a vida humana perdeu o seu valor no país. Quanta
dor! E temos que suportar o vazio dessa angústia, pois fomos privados de
:
enterrar nosso ente querido. Sei que um dia esse país ainda irá funcionar. Já
este momento trágico de nossa história, espero que nunca mais se repita.
Dalton Rodrigues, 32, professor de matemática, Manaus (AM)
Perdi meu irmão no dia do colapso dos hospitais por falta de oxigênio
em Manaus
DALTON RODRIGUES
professor de matemática, 32, Manaus (AM)
Entre 6 de fevereiro e 2 de março deste ano, perdi quatro entes queridos para a
Covid. Primeiro minha mãe, a professora aposentada Raimunda Mangabeira, de
73 anos, no dia 6 de fevereiro. Em seguida, no dia 16 de fevereiro, meu irmão,
Joao Marcelo. No dia seguinte, minha irmã Natália. E, por último, no dia 2 de
março, minha tia Delta Mangabeira. Uma verdadeira tragédia vivenciada na
minha família.
CLOTILHO FILGUEIRAS
advogado, 46, Boa Vista (RR)
Meu pai morreu por Covid em 4 de junho de 2020, aos 75 anos, no Rio de
Janeiro. Seu nome era Hilton Leal e eu não pude me despedir dele, em função
da forma como se deu sua morte e por morar na França. Acompanhei seu
funeral por chamada de vídeo, assim como meu irmão, que ficou internado,
também por Covid, no mesmo hospital em que meu pai morreu. Quase perdi
meu irmão, que felizmente pôde se recuperar e não deixou duas sobrinhas
menores de 10 anos órfãs.
:
Falar do meu pai não é difícil. Difícil é aprender a viver sem ele. Meu pai era um
homem muito bom, com um sorriso largo no rosto, que iluminava os lugares
mais escuros. Sempre foi muito honesto e justo, ajudava a quem pudesse,
mesmo não tendo muitos bens.
Era um louco apaixonado pela sua família e amigos, vivia triste com a situação
atual do seu tão amado Brasil. Sempre propus que viesse morar na França
comigo, mas ele sempre negava, dizendo que jamais deixaria o Brasil. Falava
que na França fazia muito frio e que a comida não tinha gosto.
Sua paixão pelos netos era visível, amava os quatro com a mesma intensidade.
O mesmo amor que tinha por mim e pelo meu irmão. Era uma pessoa que
espalhava o amor e palavras de conforto. Amava meus amigos como se fossem
seus filhos. Era apaixonado pela esposa do meu irmão e pelo pai dos meus
filhos. Amava minha mãe, sua companheira de vida, de um jeito lindo e
engraçado. Como todo ser humano, não era perfeito, mas suas qualidades
compensavam os defeitos, já que era muito nervoso e falava sempre a verdade,
sem pensar nas consequências.
Meu relacionamento com o meu pai era o mais amoroso possível. Ele era o meu
melhor amigo, o amor da minha vida. Deus me deu um filho, que é fisicamente
a cópia do meu pai e agradeço a Deus misericordioso por isso. Minha filha tem
o nome da mãe do meu pai. Homenagens merecidas por aquele que foi o meu
herói em carne e osso. Eu perdi meu amigo, meu companheiro para discutir
política e futebol, para ir ao estádio, para rezar junto, para chorar junto pelas
mazelas do mundo.
Minha irmã mais nova foi embora por causa da Covid-19. Seu nome era Kátia
Maria Martins de Oliveira Carvalho, tinha 56 anos e nos deixou no dia 9 de
junho de 2020. Como acontece nesses casos, não houve velório nem despedida.
Durante seu tempo com a doença, não pudemos chegar perto. Nesse período,
seu filho Felipe Martins Bandeira, 31, portador da Síndrome de Down, também
contraiu o coronavírus. Ela cuidou bravamente dele, mesmo doente. Só se
permitiu ser internada quando viu o filho fora de perigo. Já era tarde. Depois de
uma semana no melhor hospital de Maceió, ela foi intubada e faleceu.
Guerreira. Enquanto ela não viu seu filho fora de perigo, não cuidou dela.
Minha irmã era pedagoga e trabalhava na rede municipal de ensino de Maceió.
Protegia e lutava pelos seus alunos da periferia da cidade. Levou seu filho Down
para uma universidade, onde ele se formou em Gastronomia. Sua filha mais
velha é advogada. Criou seu filho Down para o mundo. Deixou na família um
sentimento de orgulho por tanto ter lutado pela inclusão social. Sua trajetória
foi de mãe, guerreira e mulher. Essa doença mata e não nos dá nem a chance de
velar nossos parentes. Tenho orgulho de ser irmã de uma pessoa tão especial.
Regina Célia Martins de Oliveira, 62, jornalista aposentada, Maceió (AL)
A Covid destroçou minha família em Uberlândia (MG). Minha avó foi internada
:
com pneumonia no dia 30 de janeiro. Apesar da suspeita dos médicos, os
exames para coronavírus deram negativo. Dois dias depois, minha mãe e uma
de minhas tias começaram a apresentar sintomas da doença. Essa tia foi a
primeira a fazer o teste, que deu positivo.
A doença tem um aspecto social muito cruel. Meu pai e meu irmão ficaram
viúvos com apenas um dia de diferença. Meu irmão perdeu as 3 principais
mulheres de sua vida: a esposa, a mãe e a avó.
Como moro em Brasília, não vejo a minha família desde o início da pandemia.
Quis ir em fevereiro, quando todos estavam doentes, para cuidar deles,
sobretudo da minha mãe. Mas minha família pediu que eu não fosse para
Uberlândia, afinal, seria mais um a se contaminar e, portanto, a demandar
cuidados a uma família sobrecarrega e atenção médica numa cidade com o
sistema de saúde também sobrecarregado.
:
Enfim, não consegui ver minha mãe pela última vez, não pude me despedir, não
pude cuidar dela, não tivemos como conseguir-lhe os últimos sacramentos, não
pude sequer ir ao enterro. O caixão saiu lacrado do hospital para túmulo. Não
pude abraçar minha família ou ganhar um abraço.
Leonardo Prudente, 40, gerente de projetos, Brasília (DF)
Não consegui ver minha mãe pela última vez, não pude me despedir,
não pude cuidar dela, não pude sequer ir ao enterro
LEONARDO PRUDENTE
gerente de projetos, 40, Brasília (DF)
Minha mãe morreu de Covid e achei que deveria quebrar o silêncio destes dias
de luto. Ela tinha o dom de tocar o coração de quem se aproximava, fosse por
sua delicadeza e humildade, pela comida e convite à mesa, por cada ponto
esperançoso de crochê, pelo pouso sempre generoso, pelas histórias de vida e
lições cotidianas. Desde março, quando o coronavírus se alarmou no Brasil,
redobramos os cuidados com nossa mãe, que foi diagnosticada com câncer no
sangue em 2016. Estávamos nos preparativos finais para um transplante de
medula que seria realizado logo após a Páscoa, mas precisou ser adiado em
razão da pandemia.
Nessa pandemia, perdi duas pessoas. Uma prima de 43 anos que só conhecia
por foto, enfermeira que trabalhava na linha de frente em combate ao Covid-19
na Paraíba. E uma tia que morava aqui em São Paulo e também faleceu em
decorrência da doença. Minha tia era uma mulher alegre e sempre disponível
na hora de preparar algum prato doce para as festas familiares.
Cássia da Silva Cunha, 41, assessora de imprensa, São Paulo (SP)
Foi um dia triste. Acordei pela manhã e soube da notícia: um grande professor e
amigo partiu. Eu sei que ele sempre tomou todas as medidas preventivas, ele
dizia que tinha medo de pegar Covid. A cidade em peso orava, rezava, cuidava
dele, mesmo que distante. Minha tia Rita, grande amiga dele, ficou muito
fragilizada nesse período, e o luto que ela está vivendo no momento diz o
quanto ela o amava e admirava. São muitos os alunos órfãos, são muitas as
pessoas enlutadas, alunos, familiares, colegas de trabalho, a cidade de 6 mil
habitantes está triste.
Fica a dor da perda, o luto necessário que todos temos que enfrentar. Mas
também fica todo o amor que ele cultivou, ficam as plantas na Secretaria de
Educação, na entrada da cidade. Ele é gigante e deixou um legado gigante
também. Por isso, o que damos a Cézar é todo amor, admiração e gratidão por
:
ter contribuído para tornar o mundo um lugar melhor.
Pedro Obede Medeiros Costa, 29, psicólogo, Japi (RN)
Fui acordado pelo telefone às quatro da manhã de uma noite angustiante. Era
meu irmão dizendo que o hospital entrou em contato com ele pedindo que
fossemos até lá com urgência. Eu moro em João Pessoa (PB) e era minha
primeira noite em Cuiabá (MT), para onde fui às pressas depois que meu pai e
minha mãe foram internados com Covid, sem UTI para serem internados caso
precisassem. Peguei o carro e dirigi até o hospital apreensivo e angustiado,
lembrando que não via meus pais havia mais de 6 meses e que meu pai estava
com 80% do pulmão comprometido, em quadro grave.
Depois de muita dor, angústia e três dias na porta do hospital ligando para
hospitais em cinco estados diferentes, conseguimos vaga num hospital em João
:
Pessoa (PB). Depois de mais uma semana, para nosso alívio e alegria, minha
mãe teve alta do hospital. Perdemos meu pai mas ganhamos duas novas
crianças na família. No meio de toda tristeza e agonia, ver o rostinho sorridente
da Mariana e da Catarina nos animou de muitas formas.
Até hoje eu choro a perda do meu pai, quando algo me lembra dele. Tenho
comigo que isso tudo é reflexo da situação, afinal, apesar de toda fraqueza e
fragilidade naquele dia, eu tentei ser forte. Mas passei por isso inteiro porque
não passei só. O que eu aprendi nisso tudo é que o mais importante da vida é
viver cercado de amigos e da família. A generosidade, a empatia e o amor são os
maiores bens da humanidade.
Felipe Monteiro, 34, empresário, João Pessoa (PB)
Informar minha irmã grávida que seu pai havia morrido foi mais
difícil do que ver o caixão do meu pai sendo enterrado
FELIPE MONTEIRO
empresário, 34, João Pessoa (PB)
Perdi um colega de profissão. Ele tinha 65 anos, trabalhava muito, tinha muita
coisa ainda por fazer. Estou inconformada, só acreditamos de fato na doença
quando perdemos alguém próximo, infelizmente.
Helena Alves da Silva, 66, advogada, Guarulhos (SP)
Foi muito difícil receber a notícia de sua partida, sua morte tão prematura,
amigo Anderson. A gente não quer acreditar, né? Na verdade, a gente deseja
crer muito mais do que a realidade nos impõe. Assim como eu esperava receber
uma resposta sua no WhatsApp para todas as minhas mensagens, enviadas
desde que você foi para a UTI. Pensei comigo que você ficaria feliz em saber que
durante este período todo de internação estávamos lá torcendo, rezando. Mas
nada, não veio sua mensagem de volta, a cada dia aumentava a nossa agonia e a
:
verdade dos fatos se tornava mais aberta, dilacerante.
No mesmo dia de sua morte eu rezei muito por você e por sua família, mas eu
também pensei muito que, nos dois dias anteriores, o Brasil havia batido o
triste recorde de mortes por Covid. Quantos corações dilacerados como os
nossos, quantas famílias arrasadas? Eu tento achar fé, positividade, mas talvez
seja a hora de agir diferente. E não é porque sentimos na pele, mas sim porque
este vírus é real sim, ele mata e mata de uma forma que nunca ousamos
imaginar. A máscara é importante, sim, o isolamento é fundamental e a vacina é
nosso desejo. Que os egocêntricos e negacionistas acreditem de uma vez por
todas que não é sobre eles, é sobre todos nós. Vá em paz! Até um dia,
companheiro!
Roberto Mancuzo, 46, jornalista, Presidente Prudente (SP)
Aos 87 anos, vivendo o melhor de sua vida, minha irmã mais velha faleceu
alguns dias atrás por um infarto, ocasionado por Covid. Paraibana e carioca
“honorária”, vivia em Pirassununga com a filha, o genro, a neta e o bisneto.
Estava no auge de sua vida! Tinha paz! Usufruía do amor familiar e era sempre
amorosa ao se relacionar com parentes e amigos. Teve como única companhia
no seu funeral a neta Ana Letícia. O mal se combate com o bem. Bolsonaro é a
personificação do mal. É só uma pessoa ruim que está no poder. Não é para
sempre. Os únicos que o aplaudem são os beneficiários de sua proximidade.
Triste Bolsonaro. É tolo. Não sabe o que é amar.
Ivan Alves de Oliveira, 61, aposentado, Rio de Janeiro (RJ)
No dia 1º de janeiro de 2021 perdi minha avó, que na verdade havia sido mãe,
pois perdi a minha para o câncer quando eu tinha 12 anos. Ela lutou desde 22
de dezembro do ano passado contra um vírus implacável com idosos. Resistiu
por muito tempo com oxigenação em 15 litros, lutando para manter a saturação
acima de 90. O barulho da régua de oxigênio era ensurdecedor. No quarto do
hospital, enquanto ela estava deitada na cama fazendo exercícios de respiração
:
para subir a saturação, víamos o Bolsonaro destilando negacionismo na TV dia
após dia. Não sabia o que dizer a ela, que me olhava de canto de olho e falava
com dificuldade: "Ele é maluco!".
Ok, ela tinha idade, tinha doença pulmonar obstrutiva crônica por causa dos
anos de fumante, mas era completamente normal. Era completamente
presente, bem-humorada, interessada nas pequenas coisas da vida,
completamente participante da vida de todos os netos. Minha avó já tinha
perdido o marido e os três filhos mas, mesmo assim, não se abalava.
Continuava contando piadas, adorando uma festa. Conseguiu participar, em
outubro de 2020, do meu casamento, que, por causa da pandemia, foi um
almoço com quatro pessoas na minha casa.
O nome dela era Maria de Lourdes, como muitas de sua idade. Tinha 91 anos,
mas bastante força. Sempre imaginei que, pela idade, a qualquer momento
teríamos a notícia de sua morte. Mas que ela teria passado mal enquanto
tricotava, deitado e ido embora dormindo. Nunca por Covid. Fizemos de tudo
para que a doença não chegasse nela.
Mony Lacerda, 42, arquiteto, São Paulo (SP)
Sete dias antes de ser intubada, minha mãe comeu frutos do mar e churrasco.
Sabíamos que ela estava com Covid, mas estava "bem", com sintomas leves. Mal
sabíamos que ela estava à beira do precipício! Em uma noite, ela foi dormir com
oxigenação a 92% e acordou com 85%. Levei-a imediatamente para a UPA, onde
foi prontamente colocada para receber oxigênio. Ficou em observação e, em
menos de 24h, foi para a UTI. Foi intubada e, durante todos os 10 dias que
permaneceu no hospital, eu aguardava pela ligação da médica, entre as 10h e as
18h.
Minha irmã veio dos EUA visitar minha mãe, ficou 10 dias em casa com ela.
Retornou para sua casa em uma quarta à noite. Na quinta, levei minha mãe para
o hospital. Eu, que morei fora da cidade por 4 meses, decidi pedir minhas
contas, voltei para casa e ainda pude passar exatos 7 dias com a minha mãe. Foi
muito súbito o que aconteceu, não houve um aviso prévio, a não ser a queda da
oxigenação.
Trinta dias antes de falecer, minha mãe comprou um rosário para cada um dos
filhos, inclusive para mim, mas não chegou a entregar. No luto, aprendi a rezar
o terço sozinho e isso aliviou a dor. Sou testemunha do poder da oração. Agora
prestamos as homenagens a ela através do exemplo do bom comportamento
que ela deixou: discrição, generosidade, doçura, perdão, simplicidade.
Tínhamos planos para depois da pandemia, conhecer a Itália. Ela falava italiano
fluentemente e estava aprendendo inglês por conta própria. Antes de estourar a
pandemia, ela reuniu os documentos e conseguiu a cidadania italiana para ela e
os três filhos. Passados três meses do falecimento, noto que a tristeza vira
saudade e as lágrimas viram boas lembranças. Até mesmo os cachorros e a gata
sentiram o momento da morte dela. Meu pai teve um sonho bonito e minha
irmã escutou uma batida de porta dentro de casa. Eu estava no banho, ardendo
em febre.
É triste enterrar uma mãe, ainda mais uma mãe jovem, de 67 anos. Só sabe a
dor quem passou por isto. Muitos minimizam o luto ou o perigo da Covid
:
porque a morte está visitando a casa dos outros. Se as pessoas tivessem plena
consciência do risco que correm, não colocariam nem a cara na janela. O luto
fica latente na alma, pois cada vez que vejo uma senhora na rua, ouço uma
música bonita, vejo uma reportagem sobre Covid, emociono-me. Mas me
conforta o fato de não ter havido sofrimento, pois não faltou oxigênio, não
faltou leito, não faltou medicamento. Diante de tanto sofrimento em busca de
um alento, vejo que Deus foi misericordioso com minha mãe e com todos nós
em casa.
Marcos Triacchini Garcia, 41, oficial de náutica, Curitiba (PR)
Obrigada por abrir este espaço para falar da dor de perder um ente querido
nesta pandemia. Minha mãe morreu em agosto passado, aos 85 anos. Estou
lutando contra a Covid desde março, fazendo protocolos, treinando
profissionais de saúde, ajudando como posso. Estou enfrentando, sim. Mas a
dor de perder alguém tão querido é imensa.
Cada vez que vejo uma senhora ou um senhor recebendo a vacina, tenho um
misto de sentimentos: alívio para estas pessoas e seus familiares, e tristeza
porque a vacina não chegou a tempo para minha mãe. Cada vez que vejo na
televisão quantos morreram por Covid, lembro da minha mãe. Já faz seis meses,
mas a dor permanece.
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