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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

EDUARDO AZUMA NISHI

NOVOS PARADIGMAS DE APURAÇÃO DE HAVERES NA ORDEM


JURÍDICA

MESTRADO EM DIREITO COMERCIAL

SÃO PAULO
2020
EDUARDO AZUMA NISHI

NOVOS PARADIGMAS DE APURAÇÃO DE HAVERES NA ORDEM


JURÍDICA

MESTRADO EM DIREITO COMERCIAL

Dissertação apresentada à Banca


Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo – PUC-SP, como
requisito parcial para a obtenção do título
de MESTRE em Direito Comercial, sob a
orientação do Prof. Dr. Marcus Elidius
Michelli de Almeida.

SÃO PAULO
2020
BANCA EXAMINADORA

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________
Dedico este trabalho à minha esposa, Daniela, e aos meus
filhos, Camila, Tatiana, João Antonio e Maria Eduarda, a quem
agradeço pelo incentivo e apoio na minha decisão de retorno
tardio aos bancos acadêmicos e, sobretudo, pela compreensão
na privação do convívio familiar, na elaboração da presente
dissertação, como na dedicação necessária para cumprimento
dos créditos e dos estudos do mestrado.
AGRADECIMENTOS

Meus agradecimentos a todos que participaram de forma direta ou indireta,


auxiliando-me com material de apoio, bibliografias ou sugestões, em especial à
Victoria da Silva Prado Godoy Perpetuo, jovem e talentosa advogada, cuja
contribuição foi de inestimável valor.

Aos meus pais, por minha criação, educação e pelo incentivo que sempre
deram aos estudos e à dedicação ao trabalho.

Em especial, ao meu orientador, Professor Doutor Marcus Elidius Michelli de


Almeida, pela oportunidade conferida, pelas preciosas sugestões, trocas de
conhecimento, impressões e incentivo dado.

Não posso deixar de agradecer as orientações, convívio e o rico aprendizado


obtidos com os Professores Ivo Weinsberg e Manoel de Queiroz Pereira Calças,
além de manifestar a honra de suas participações como componentes da banca
examinadora da presente dissertação.
“Quanto mais aumenta nosso
conhecimento, mais evidente fica nossa
ignorância”

(John F. Kennedy)
RESUMO

Em matéria de contencioso societário, a apuração de haveres de sócio que deixa de


integrar a sociedade, constitui, indiscutivelmente, a tônica principal das demandas
judiciais societárias. A jurisprudência se consolidou no sentido de admitir uma ampla
apuração dos haveres do sócio retirante, com vistas à avaliação da participação do
sócio retirante, reconhecendo, inclusive, a inclusão do fundo de comércio e outros
itens patrimoniais intangíveis. Mesmo com o advento de inovações legislativas
específicas sobre o tema, Código Civil de 2002 e Código de Processo Civil de 2015,
que prestigiam o quanto disposto no contrato social e, na sua ausência, a apuração
baseada em balanço especialmente levantado para essa finalidade, que toma por
base a posição patrimonial contábil, com ajustes dos itens ativos e passivos a
valores de realização, ou de saída, esta posição jurisprudencial não se alterou,
passando-se a mitigar a força vinculante da previsão contratual em relação ao
critério de avaliação a ser adotado na apuração de haveres do sócio retirante,
prevista expressamente na novel legislação. A presente pesquisa abordará as
hipóteses de dissolução parcial da sociedade, aspectos procedimentais trazidos pelo
Código de Processo Civil de 2015, passando pelos modelos de avaliação da
participação do sócio retirante, concentrando a discussão na propriedade da
inclusão do fundo de comércio na base de apuração de haveres e finalizando com a
compreensão sobre o procedimento da apuração de haveres no atual contexto legal.

Palavras-chave: Dissolução parcial da sociedade. Apuração de haveres. Resolução


da sociedade em relação a um sócio. Fundo de comércio na apuração de haveres.
ABSTRACT

In matters of corporate litigation, the determination of the assets of a partner who


ceases to be part of the company constitutes, undoubtedly, the main tonic of the
corporate legal demands. The jurisprudence was consolidated in the sense of
admitting a wide assessment of the assets of the withdrawing partner, with a view to
assessing the withdrawing partner's participation, including recognizing the inclusion
of the goodwill and other intangible assets. Even with the advent of specific
legislative innovations on the subject, the Civil Code of 2002 and the Code of Civil
Procedure of 2015, which honor the provisions of the social contract and, in their
absence, the assessment based on a balance sheet specially drawn up for this
purpose, which it is based on the equity accounting position, with adjustments of the
assets and liabilities items to realization values, or outflow, this jurisprudential
position has not changed, starting to mitigate the binding force of the contractual
forecast in relation to the evaluation criteria to be adopted in determining the
withdrawing partner's assets, expressly provided for in the new legislation. This
research will address the hypotheses of partial dissolution of the company,
procedural aspects brought by the Code of Civil Procedure of 2015, passing by the
models of evaluation of the participation of the withdrawing partner, concentrating the
discussion on the property of the inclusion of the goodwill in the basis of calculation
of and ending with an understanding of the procedure for determining assets in the
current legal context.

Keywords: Partial dissolution of society. Calculation of assets. Company resolution in


relation to a partner. Goodwill in the determination of assets.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

AED Análise Econômica do Direito


BP Balanço Patrimonial
BPD Balanço Patrimonial de Determinação
BPE Balanço Patrimonial Especial
BPO Balanço Patrimonial Ordinário
CC Código Civil
CCoB Código Comercial Brasileiro
CCOM Código Comercial
CF/88 Constituição Federal de 1988
CFC Conselho Federal de Contabilidade
CPC Código de Processo Civil
DDLE Declaração de Direitos de Liberdade Econômica
DJ Data do Julgamento
DJe Diário da Justiça Eletrônico
FASB Financial Accounting Standards Boards
IASC International Accounting Standards Committee
LINDB Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro
LSA Lei das Sociedades Anônimas
Min. Ministro (a)
RE Recurso Extraordinário
Rel. Relator
REsp Recurso Especial
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justiça
TJSP Tribunal de Justiça de São Paulo
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................. 11
1 DA EXTINÇÃO DO VÍNCULO SOCIETÁRIO EM SOCIEDADES
LIMITADAS................................................................................... 14
1.1 Da Dissolução Total.................................................................... 14
1.2 Da Dissolução Parcial................................................................. 18
1.2.1 Hipóteses de Dissolução Parcial................................................... 26
1.2.1.1 Dissolução Parcial Stricto Sensu................................................... 26
1.2.1.2 Morte............................................................................................. 31
1.2.1.3 Direito de Recesso e de Retirada.................................................. 33
1.2.1.3.1 Direito de Recesso........................................................................ 33
1.2.1.3.2 Direito de Retirada......................................................................... 35
1.2.1.4 Exclusão........................................................................................ 36
1.2.1.4.1 Exclusão Extrajudicial de Sócio que coloca a continuidade da
empresa em risco pela prática de atos de inegável gravidade..... 39
1.2.1.4.2 Exclusão Judicial de Sócio por falta grave no cumprimento de
obrigações sociais......................................................................... 42
1.2.1.4.3 Exclusão Judicial de Sócio por incapacidade superveniente........ 43
1.2.1.4.4 Exclusão de Pleno Direito do Sócio falido ou do Sócio, cujas
quotas tenham sido liquidadas a pedido de credor....................... 44
1.2.1.4.5 Exclusão de Sócio Remisso.......................................................... 46
2 ASPECTOS PROCEDIMENTAIS DA AÇÃO DE DISSOLUÇÃO
PARCIAL DE SOCIEDADE.......................................................... 48
2.1 A Ação de Dissolução Parcial nas Legislações Pretéritas...... 48
2.2 A Positivação da Ação de Dissolução Parcial como
Procedimento Especial pelo Código de Processo Civil de
2015............................................................................................... 50
2.2.1 Legitimidade Ativa......................................................................... 53
2.2.2 Legitimidade Passiva..................................................................... 59
2.2.3 Objeto............................................................................................ 63
2.2.4 Competência................................................................................. 65
2.2.5 Procedimento................................................................................ 66
2.2.5.1 Fase de Resolução da sociedade em relação ao Sócio............... 67
2.2.5.2 Fase de Apuração de Haveres...................................................... 69
2.2.6 Decisões e Meios de Impugnação................................................ 69
2.2.7 Cumprimento de Sentença............................................................ 72
3 APURAÇÃO DE HAVERES......................................................... 73
3.1 Conceito e Natureza Jurídica..................................................... 73
3.2 Conceito de Valor e Critérios de Avaliação.............................. 82
3.2.1 Modelos de Avaliação que refletem o Valor Contábil da
Empresa........................................................................................ 86
3.2.1.1 Modelo do Valor Contábil.............................................................. 87
3.2.1.2 Modelo do Valor Contábil ajustado e Balanço Patrimonial de
Determinação................................................................................ 89
3.2.1.3 Modelo do Valor de Liquidação..................................................... 91
3.2.2 Conceito de goodwill e Valor da Empresa.................................... 94
3.3 Discussão sobre a Inclusão do Fundo de Comércio na
Avaliação da Quota do Sócio Retirante.................................... 95
3.4 Disciplina da Apuração de Haveres no CPC/2015.................... 114
3.5 Análise Crítica sobre o Procedimento Judicial de Apuração
de Haveres................................................................................... 123
3.5.1 Papel condutor do Juiz na definição do Critério de Avaliação...... 123
3.5.2 Despacho Inaugural – Artigo 604 CPC......................................... 125
3.5.3 Balanço Patrimonial de Determinação.......................................... 126
3.5.4 Disposição Contratual................................................................... 126
3.5.5 Critério Legal de Apuração de Haveres........................................ 127
3.5.6 Avaliação dos Intangíveis - Critério Legal..................................... 132
3.5.7 Tratamento do Fundo de Comércio............................................... 133
3.5.8 Jurisprudência em relação à Avaliação do Fundo de Comércio... 136
3.5.9 Discussão quanto ao Critério na Apuração dos Haveres.............. 141
3.5.10 Utilização Excepcional de Critérios Alternativos........................... 142
4 CONCLUSÃO............................................................................... 144
BIBLIOGRAFIA............................................................................. 148
11

INTRODUÇÃO

Em matéria de contencioso societário, a apuração de haveres de sócio que


deixa de integrar a sociedade, constitui, indiscutivelmente, a tônica principal das
demandas societárias.

A legislação vigente prevê a prevalência do critério de apuração de haveres


do sócio retirante pactuado pelos sócios no contrato social, não havendo parâmetros
ou restrições a serem observadas, sendo livre e preponderante o quanto avençado.
Na ausência de disposição no contrato social, a Lei estabelece a apuração de
haveres do sócio retirante mediante a apuração em balanço especialmente
levantado para essa finalidade, que prestigia a posição patrimonial contábil,
ajustando os ativos e passivos a valores de realização, ou de saída, devendo ser
considerados tanto os elementos corpóreos como os incorpóreos.

O instituto da dissolução parcial de sociedade, em que a resolução da


sociedade se dá apenas em relação ao um ou a determinados sócios, veio a ser
positivada apenas na redação do Novo Código de Processo Civil (CPC), Lei nº
13.105, de 16 de março de 20151, tendo a jurisprudência, quanto à apuração de
haveres do sócio retirante da sociedade, se formado anteriormente ao atual quadro
legal, acompanhando as mudanças e os fenômenos empresariais da atividade
negocial e das relações societárias.

Nesta linha, a dissolução parcial da sociedade, é uma construção doutrinária


e jurisprudencial em prestígio à preservação da atividade empresarial. Ainda que
para a unanimidade dos sócios não seja mais interessante a manutenção do vínculo
societário, não há a dissolução total da sociedade, de forma a se preservar a
atividade empresarial, cabendo ao sócio que dela deseja sair o recebimento do valor
de sua participação societária que se extinguirá em favor dos sócios remanescentes.
Trata-se, portanto, de uma solução para que a saída do sócio não venha a acarretar
a extinção total da sociedade, de forma a evitar graves prejuízos para os demais
sócios e para a atividade empresarial, cuja extinção traria danos aos funcionários,

1BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm Acesso em: 14 set. 2020.
12

que perderiam seus empregos, e para a economia de uma forma geral, pois
impactaria os fornecedores e os que contavam com a oferta de seus produtos e
serviços, além de prejuízos para o fisco, que sem a continuidade da atividade
empresarial, não arrecadaria os tributos decorrentes de sua atividade econômica.

Tal jurisprudência se consolidou no sentido de admitir uma ampla apuração


dos haveres do sócio retirante, admitindo-se a avaliação inclusive do fundo de
comércio e outros itens intangíveis.

Mesmo com o advento de inovações legislativas especificas sobre o tema,


seja com o Código Civil (CC), Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 20022, como com o
CPC de 2015, esta posição jurisprudencial não se alterou, passando-se a, inclusive,
mitigar a força vinculante da previsão contratual em relação ao critério de avaliação
a ser adotado na apuração de haveres do sócio retirante, prevista expressamente na
novel legislação.

É de se notar que a legislação demora anos para incorporar os aspectos


entendidos como pacíficos e importantes pela doutrina e jurisprudência, como foi o
caso do instituto da resolução parcial da sociedade. Entretanto, embora a
positivação tenha recepcionado o instituto da resolução parcial da sociedade, o
critério legal de apuração de haveres que veio a ser introduzido, além de prestigiar o
quanto convencionado pelos sócios, em contrato social, também prestigiou o quanto
apurado e expresso nas demonstrações financeiras (valor patrimonial), que segue
os princípios da escrituração baseada na história da empresa e não no seu futuro.

A jurisprudência anteriormente formada, então, se mostrou aparentemente


incompatível com as novas disposições legais, não ocorrendo, contudo, alteração no
rumo jurisprudencial que antes havia se consolidado.

O trabalho abordará as hipóteses de dissolução parcial da sociedade,


aspectos procedimentais trazidos pelo CPC 2015, passando pelos modelos de

2BRASIL. Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm#:~:text=LEI%20N%20o%2010.40
6%2C%20DE%2010%20DE%20JANEIRO%20DE%202002&text=Institui%20o%20C%C3%B3digo%2
0Civil.&text=Art.,e%20deveres%20na%20ordem%20civil. Acesso em: 14 set. 2020.
13

avaliação da participação do sócio retirante, concentrando a discussão na


propriedade da inclusão do fundo de comércio na base de apuração de haveres e
finalizando com a compreensão sobre o procedimento da apuração de haveres no
atual contexto legal.
14

1 DA EXTINÇÃO DO VÍNCULO SOCIETÁRIO EM SOCIEDADES LIMITADAS

1.1 Da Dissolução Total

José Waldecy Lucena inicia o capítulo sobre dissolução em sua obra “Das
Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada” com o seguinte verso do
poema “Vida de Mármore” de Murilo Mendes: “Toda realidade do mundo é
provisória, o mundo é provisório.”3

As sociedades são constituídas com o intuito de se desenvolverem ao longo


do tempo, exercendo seu objeto social. A dissolução, pois, simboliza o fim do
propósito social, materializando a provisoriedade das sociedades, mesmo daquelas
constituídas por prazo indeterminado, conforme bem o ilustra o referido autor com a
adoção do trecho do poema acima transcrito.

O conceito jurídico de dissolução de sociedade possui diversas acepções4.


Em sentido genérico, dissolução pode ser entendida como a própria extinção ou
ruptura de uma relação jurídica, de maneira que, no caso das sociedades,
significaria o rompimento em si do vínculo societário5. Também é possível
compreendê-la como o marco inicial dos atos que resultarão na extinção da
sociedade6, ou, até mesmo, como o próprio processo de extinção7, sendo esta
última acepção mais ampla.

3 LUCENA, José Waldecy. Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada. Rio de
Janeiro: Renovar, 1996, p. 625.
4 “O conceito de dissolução suscita divergências na doutrina. Uma primeira vertente entende que a

dissolução equivaleria à extinção. Segunda vertente considera a dissolução um momento que


equivale à cessação da atividade negocial da companhia, e o ponto de partida para sua liquidação e
sequente extinção. E há uma terceira tendência, que empresta à dissolução um significado amplo,
abrangendo todo o período que vai da declaração que determina a cessação da atividade negocial da
sociedade até a liquidação definitiva de seu patrimônio, partilha e extinção.” CARVALHOSA,
Modesto; KUYVEN, Fernando. Sociedades Anônimas. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo:
Thomson Reuters Brasil, 2018. (Tratado de Direito Empresarial; v. 3), p. 1191.
5 PERIN JUNIOR, Écio. A dissolução da sociedade limitada de acordo com o novo Código Civil. In:

ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de (Coord.). Aspectos Jurídicos da Sociedade Limitada. São
Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 302.
6 VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Sociedades – Teoria Geral das Sociedades – As

Sociedades em Espécie no Código Civil. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2014. (Direito Comercial; v. 2), p. 206; CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do
Código Civil. 13. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2014, p. 131.
7 MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 37. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense,

2014. E-book, p. 216.


15

Tendo em vista a pluralidade semântica do conceito, importante a


diferenciação doutrinária entre dissolução lato sensu e dissolução stricto sensu. A
primeira expressão indica o processo de encerramento da sociedade, composto por
três fases – dissolução em sentido estrito, liquidação e partilha –, enquanto a
segunda diz respeito somente à causa que deflagra referido processo trifásico.
Dessa forma, conforme ensina Marlon Tomazette8, dissolução stricto sensu “pode
ser entendida como a causa do encerramento da sociedade, ou seja, o fato que
desencadeia todo o processo de dissolução em sentido amplo.”

Fábio Ulhoa Coelho fala em dissolução-procedimento e em dissolução-ato,


referindo-se, respectivamente, à dissolução lato sensu e à dissolução stricto sensu.
Segundo o autor:

Dissolução é um conceito ambíguo, no direito societário. Em sentido


amplo, significa o procedimento de terminação da personalidade
jurídica da sociedade empresária, isto é, o conjunto de atos
necessários à sua eliminação, como sujeito de direito. A partir da
dissolução, compreendida nesse primeiro sentido, a sociedade
empresária não mais titulariza direitos, nem é devedora de
prestação. Em sentido estrito, a dissolução se refere ao ato, judicial
ou extrajudicial, que desencadeia o procedimento de extinção da
pessoa jurídica. Os atos de encerramento da personalidade jurídica
da sociedade empresária (a dissolução, em sentido amplo)
distribuem-se nas fases de dissolução (sentido estrito), liquidação e
partilha (Bulgarelli, 1978:87). Para contornar a ambiguidade, quando
necessário, farei uso das expressões dissolução-procedimento e
dissolução-ato.9

Especificamente com relação às sociedades limitadas, o Decreto nº


3.708/191910 nada previu quanto à disciplina de sua dissolução total. A doutrina,
então, dividiu-se entre aqueles que sustentavam que à dissolução das limitadas
aplicar-se-ia o disposto no Código Comercial (CCOM) de 185011 e aqueles que

8 TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: Teoria geral e direito societário. 8. ed. rev. e
atual. São Paulo: Atlas, 2017, v. 1. E-book, p. 495.
9 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora

Revista dos Tribunais, 2016, v. 2, p. 435.


10 BRASIL. Decreto no 3.708, de 10 de janeiro de 1919. Regula a constituição de sociedades por

quotas, de responsabilidade limitada. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d3708.htm#:~:text=DECRETO%20No%203.708%
2C%20DE,Art. Acesso em: 14 set. 2020.
11 BRASIL. Lei nº 556, de 25 de junho de 1850. Código Comercial. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM556compilado.htm Acesso em: 14 set. 2020.


16

entendiam pela incidência do regime dissolutório das sociedades anônimas.12

O CC/02 pôs fim à controvérsia e passou a prever expressamente a


dissolução total das sociedades limitadas em seu artigo 1.087. Referido dispositivo
prevê que se dissolvem as sociedades limitadas pelas causas previstas no artigo
1.044 do mesmo diploma legal, o qual, por sua vez, faz remissão às hipóteses
contidas no artigo 1.033, além de acrescentar a possibilidade de dissolução de
sociedade empresária em caso de falência. Outras hipóteses de dissolução total
stricto sensu – ou seja, causas de dissolução lato sensu – encontram-se previstas
nos artigos 1.03413 e 1.03514.

A doutrina não é unânime ao classificar as hipóteses de dissolução stricto


sensu. Para os fins do presente trabalho, adotaremos a divisão mais aceita, e que
também pode ser extraída pela interpretação dos artigos do CC/02 acima indicados,
segundo a qual a dissolução total pode ser operada (i) de pleno direito; (ii)
judicialmente; ou (iii) de forma consensual.

As causas de dissolução de pleno direito geram efeitos independentemente

12 A discussão acerca do regramento aplicável à dissolução de sociedades limitadas girava em torno


do caráter híbrido desse tipo societário, que pode ter feição tanto de sociedade de capital, como de
sociedade de pessoas. Para elucidar a controvérsia doutrinária a respeito do tema, explica Haroldo
Malheiros Duclerc Verçosa explica que “No sentido acima, Egberto Lacerda Teixeira entendeu que
não se deveria reger a sociedade por quotas de responsabilidade limitada segundo um único critério,
dada sua característica de sociedade híbrida, de pessoas ou de capitais, à escolha dos sócios,
conforme os termos do contrato social. Para aquele autor, a dissolução de tal tipo societário deveria
ter em vista o caráter particular adotado por cada uma delas, fosse este especificado diretamente
pelo contrato social ou, no silêncio deste, de acordo com a índole capitalista ou personalista que de
sua leitura se pudesse inferir. Para efeito da identificação da referida índole, o comercialista em
questão relacionou alguns elementos característicos dela esclarecedores. [...] Esclarecendo estar na
companhia da maior parte dos doutrinadores, José Waldecy Lucena enunciou discordar de Egberto
Lacerda Teixeira, favorável à aplicação das regras do CCoB nas questões da dissolução das
sociedades por quotas de responsabilidade limitada, tendo em vista a imprecisão dos critérios
adotados pelo primeiro, do que resultariam ‘insegurança e graves disceptações, já que a opção por
um ou outro regime dependeria, não raras vezes, de nuances propiciadoras de interpretações
subjetivas, que jamais se harmonizariam’. Segundo a crítica feita pelo primeiro, esta seria matéria em
relação à qual não se aplicaria o disposto no artigo 18 do Dec. 3.708/19 [...].” VERÇOSA, Haroldo
Malheiros Duclerc. Sociedades – Teoria Geral das Sociedades – As Sociedades em Espécie no
Código Civil. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. (Direito
Comercial; v. 2), p. 211-212.
13 Artigo 1.034. A sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos

sócios, quando:
I – anulada sua constituição;
II – exaurido o fim social ou verificada sua inexequibilidade.
14 Artigo 1.035. O contrato pode prever outras causas de dissolução, a serem verificadas

judicialmente quando contestadas.


17

de da concordância dos sócios ou de manifestação do Poder Judiciário. Nesses


casos, basta que se verifique a ocorrência de um determinado fato para que a
sociedade possa ser considerada dissolvida e, assim, prosseguir-se com a sua
liquidação e posterior extinção. Impende ressaltar que, nessas hipóteses, a atuação
do Poder Judiciário não é vedada, mas, caso suscitado a se pronunciar, sua
manifestação deverá ser apenas no sentido de declarar a ocorrência ou não da
dissolução, não devendo decretá-la15-16.

Além das causas de dissolução de pleno direito, o artigo 1.034 do CC/02


prevê hipóteses em que a dissolução é classificada como judicial. Assim, para que
os eventos elencados nos incisos do referido dispositivo passem a produzir os
efeitos da dissolução, eles precisam ser reconhecidos e decretados pelo Poder
Judiciário. É necessário, portanto, o ajuizamento de uma ação contra a sociedade
para decretar sua dissolução. Outra causa de dissolução judicial é a decretação de
falência, prevista no artigo 1.044 do CC/02 para as sociedades empresárias. Cabe
anotar ainda que, se o contrato social previr outras causas de dissolução e sobre
elas houver impugnação de um ou mais sócios, estas deverão ser decretadas
judicialmente, conforme previsão do artigo 1.035 do CC/02. Por fim, a dissolução
consensual, como já bem traduz o nome a ela conferido, é a hipótese de dissolução
de sociedade decorrente da manifestação favorável da maioria de seus sócios.

Ocorrendo qualquer uma das hipóteses de dissolução stricto sensu

15 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 29. ed. rev. e atual. por Rubens Edmundo
Requião. São Paulo: Saraiva, 2012, v. 2. E-book, p. 232-233.
16 Convém anotar o seguinte apontamento de Fábio Ulhoa Coelho sobre a classificação das causas

de dissolução de sociedades: “Não considero útil a classificação porque não orienta adequadamente
o tratamento da matéria. Não é correto dizer que determinada causa sempre dissolve a sociedade,
independentemente de provimento judicial, se os sócios não se pões de acordo quanto à sua
verificação. Até o evento mais singelo, como o decurso do prazo de duração, pode, em determinados
casos, ser objeto de divergência. Se o ato constitutivo ressalva, na cláusula sobre o prazo, a
continuidade da sociedade por mais tempo, para alcançar as metas negociadas entre os sócios, o
seu decurso pode tornar-se matéria controvertida, a ser solucionada necessariamente em juízo. A
dissolução será judicial ou extrajudicial não em função da causa que a animar. Quando os sócios
estão de acordo que o negócio se mostra inviável, dissolvem extrajudicialmente a sociedade; mas, se
apenas a minoria está convencida da inviabilidade da empresa, a dissolução só poderá ser judicial. O
que distingue, assim, as espécies de dissolução-ato é o instrumento pelo qual se viabilizam: a
extrajudicial é instrumentalizada por ato dos sócios (deliberação assemblear formalizada em ata e
distrato ou só distrato), e a judicial, por decisão do Judiciário. Nesse sentido, a identificação da
natureza pleno jure da dissolução, quando motivada esta por determinadas causas, não importa
necessariamente a dispensa da declaração judicial.” COELHO, Fábio Ulhoa. A sociedade limitada
no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 144.
18

(dissolução-ato), encerram-se as atividades negociais da sociedade, a qual,


procedendo em estado de liquidação, somente poderá praticar os atos necessários à
apuração de seu patrimônio para posterior partilha e extinção.

É preciso, ainda, averbar o instrumento da dissolução – nos casos em que a


dissolução se operou de pleno direito ou consensualmente – ou a sentença – nas
hipóteses de dissolução judicial – no registro da sociedade, que passará a ser
identificada por sua denominação social acrescida da expressão “em liquidação”.

1.2 Da Dissolução Parcial

Ao contrário da dissolução total, que, como visto no item anterior, implica na


liquidação e posterior extinção da sociedade, a dissolução parcial permite o
afastamento de um sócio, pelas mais diversas razões, sem prejuízo à continuidade
da sociedade. Referido instituto, contudo, nem sempre existiu, sendo fruto de
construção doutrinária e jurisprudencial que reconheceu a centralidade dos
princípios da função social da empresa e da preservação da empresa 17.

17 “A aludida construção doutrinária começou a ser erigida de longa data, como esclarece Trajano de
Miranda Valverde nas reflexões que fez sobre a aplicação, na espécie, do princípio da preservação
da empresa, consolidando-se mercê inúmeros estudos posteriores, inclusive tese específica de
Rubens Requião, disseminando-se nos Cursos e Manuais de Direito Comercial, de sorte a ganhar
acolhimento com latitude extrema e até censurável, por nossos Tribunais. E isto por pelo menos três
motivos: o primeiro deles de índole constitucional, na medida que entre os postulados que informam
nossa ordem econômica, figuram o da justiça social e o da função social da propriedade Constituição
Federal de 1988, artigo 170), e é indisputável que às sociedades mercantis está assinada tal função
(Lei nº 6.404, artigo 116, parágrafo único); em segundo lugar, e conseqüentemente, porque, tal seja a
participação do quotista na sociedade e o perfil patrimonial e organizacional desta, a resilição parcial
com a retirada do sócio poderá levá-la à dissolução e liquidação total, fora das hipóteses em que a
Lei sanciona essa solução drástica, dada a impossibilidade do prosseguimento das atividades sociais
com o desfalque dos valores necessários ao pagamento dos haveres – o que importa na negação do
princípio que inspirou tal elaboração doutrinária; por fim, o tipo societário pode ter feição
predominantemente capitalista, que o aproxima da própria sociedade por ações fechada – e, nesse
caso, a admissibilidade da dissolução parcial equivale praticamente a deferir o direito de recesso ou
de retirada, sem que se verifique uma das hipóteses taxativas, previstas em Lei. Tudo isso está a
recomendar que os referidos pleitos sejam examinados com maior profundidade – modus in rebus –,
com a devida atenção para o princípio da preservação da empresa, que não se compadece com o
aniquilamento desta em razão de iniciativas muitas vezes engendradas com propósitos
exclusivamente egoísticos ou especulativos.” PENTEADO, Mauro Rodrigues. Dissolução e
liquidação de sociedades. Brasília: Livraria e Editora Brasília Jurídica, 1995, p. 141-142.
19

Conforme ensina Hernani Estrella18, em retrospectiva histórica, o Direito


Romano permitia que causas subjetivas referentes exclusivamente aos sócios, e não
ao ente social por eles formado, ocasionassem a extinção das sociedades. Eram
essas causas subjetivas (i) a declaração unilateral de vontade de qualquer sócio
(renúncia), (ii) a morte, ou (iii) a incapacidade superveniente de qualquer sócio. A
conclusão pela dissolução total nessas hipóteses ocorria, pois o contrato de
sociedade era celebrado em virtude da pessoa individual de cada um dos sócios, de
forma que, se “um dos consortes faltasse ou se tornasse incapaz, desapareceria
aquele elemento aglutinador”19, sendo necessária a ruptura total do vínculo
societário.

A extinção da sociedade em decorrência de fatos subjetivos exclusivamente


relacionados aos sócios impunha grande fragilidade ao vínculo societário. Por
diversas vezes tentou-se atenuar essa imposição, mas a doutrina e os jurisconsultos
romanos não aceitavam flexibilizá-la.

Foi somente na Idade Média, continuando a narrativa histórica apresentada


por Hernani Estrella, com o desenvolvimento do comércio e da economia, que a
rigidez da dissolução total começou a ser mitigada. Os comerciantes passaram a
incluir nos contratos de sociedades cláusulas prevendo sua indissolubilidade,
mesmo no caso de morte ou incapacidade de sócio, com fundamento na liberdade
contratual e na liberdade de adesão.20

Enfim, o Código Napoleônico, impulsionado pelos ideais liberais da Revolução


Francesa, mesmo prevendo que causas subjetivas relacionadas aos sócios
pudessem ocasionar a dissolução total do ente social, passou a permitir a
estipulação da cláusula de indissolubilidade das sociedades, flexibilizando, portanto,
a dissolução total em virtude de fatos relacionados exclusivamente aos sócios.

No ordenamento jurídico brasileiro, a dissolução parcial demorou a chegar. O

18 ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração dos Haveres de Sócio. 5. ed.
atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 20.
19 ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração dos Haveres de Sócio. 5. ed.

atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 20.


20 ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração dos Haveres de Sócio. 5. ed.

atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 21-22.


20

CCOM de 1850 previa somente hipóteses de dissolução total das sociedades21,


inexistindo a possibilidade de afastamento de apenas um sócio sem que todos os
vínculos societários fossem rompidos. Merecem destaque as disposições dos artigos
335.5 e 336.2 do diploma comercialista, que, respectivamente, previam a dissolução
total do ente social em decorrência de vontade unilateral ou incapacidade dos
sócios, hipóteses que traduziam o forte teor individualista da legislação ao
permitirem a extinção total da sociedade por razões que diziam respeito apenas a
algum ou alguns dos contratantes.

A única exceção apresentada pelo referido diploma legal encontrava-se em


seu artigo 335.4, hipótese em que, diante da morte de um dos sócios, a dissolução
total poderia ser afastada se assim fosse determinado em convenção firmada pelos
demais sócios remanescentes.

Tendo em vista que o CCOM de 1850 foi elaborado com base na doutrina
individualista que marcava a produção jurídica no século XIX, a previsão da
dissolução de sociedades tinha como finalidade liberar o sócio de suas obrigações
sociais.22 Nesse modelo prevalecia a vontade individual do sócio em detrimento do
interesse da sociedade da qual ele fazia parte.

Compartilhando o mesmo espírito individualista, o CC/1916 manteve a


previsão da dissolução total diante da extinção do vínculo de qualquer um dos
sócios para com o ente social. Inovou ao prever a renúncia aos sócios de
sociedades firmadas por tempo indeterminado, condicionado este direito à boa-fé do
contratante e à notificação prévia. Nas palavras de Alfredo de Assis Gonçalves Neto:

O Código Civil de 1916, também determinou a dissolução da


sociedade pelo simples rompimento de um de seus vínculos, em

21 Artigo 335. As sociedades reputam-se dissolvidas:


1 – Expirando o prazo ajustado da sua duração
2 – Por quebra da sociedade, ou de qualquer dos sócios
3 – Por mútuo consenso de todos os sócios
4 – Pela morte de um dos sócios, salvo convenção em contrário a respeito dos que sobreviverem
5 – Por vontade de um dos sócios, sendo a sociedade celebrada por tempo indeterminado
Em todos os casos deve continuar a sociedade, somente para se ultimarem as negociações
pendentes, procedendo-se à liquidação das ultimadas.
22 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 29. ed. rev. e atual. por Rubens Edmundo

Requião. São Paulo: Saraiva, 2012, v. 2. E-book, p. 235.


21

relação a qualquer de seus membros. Facultou ao sócio, porém,


renunciar à sociedade quando ajustada por prazo indeterminado,
contanto que o fizesse de boa-fé e com aviso de antecedência, sem
prejudicar os negócios em curso. Deu a esse ato efeito dissolutivo e
admitiu a exclusão do renunciante pelos demais sócios, se a
renúncia fosse de má-fé (artigos 1.399 e 1.404 a 1.406).23

O desenvolvimento econômico e capitalista foi aos poucos enfraquecendo a


teoria individualista.24 A empresa, agora considerada como instituição econômica,
passou a ser, além de instrumento destinado a atingir lucro, o centro de diversas
relações sociais que justificavam a sua continuidade mesmo com a saída de um ou
alguns sócios.25

Para além do enfraquecimento da teoria individualista no Direito Comercial e


do reconhecimento da função social da empresa, outro pilar teórico que embasou o
surgimento da dissolução parcial de sociedades foi o princípio da preservação da
empresa26, concebido no início do século XX por Cesare Vivante.

Sobre a contribuição do referido comercialista para o advento do instituto da


dissolução parcial, afirma Cristiano Gomes de Brito que:

Com uma visão moderna, Cesare Vivante, no começo do século XX,


esboçou a teoria da preservação da empresa. Essa teoria veio ao
encontro das novas realidades econômicas das empresas, pois
estas, com o passar dos tempos, tornaram-se a alavanca do
desenvolvimento econômico de seus países.

23 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de empresa – comentários aos artigos 966 a 1.195
do Código Civil. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 303.
24 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres: critérios para a sociedade empresária

do tipo limitada. 2008. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 2008, p. 43.
25 Nas palavras de José Waldecy Lucena: “Ademais, outros eram os tempos. A doutrina individualista

esmaecera-se. O ideal social ganhou terreno. Aos interesses individuais passaram a se contrapor os
interesses coletivos. Para logo, instituiu-se que a empresa, como organização de fatores de
produção, formava um núcleo econômico de interesses que não eram somente dos sócios, mas
também dos empregados, do fisco, dos consumidores, dos fornecedores, em suma, de toda a
comunidade em que atua, ou até mesmo, conforme seu porte, do próprio País.” LUCENA, José
Waldecy. Das sociedades por quotas de responsabilidade limitada. Rio de Janeiro: Renovar,
1996, p. 734-735.
26 “Como visto na introdução, o princípio da preservação da empresa é implícito, pois decorre dos

outros que estão expressos e consagrados na Constituição, como o da busca do pleno emprego, da
função social da propriedade dos meios de produção e do direito ao trabalho na construção de uma
sociedade justa (item XIX supra)” GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de empresa –
comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2017, p. 303-304.
22

Nesse contexto, a doutrina individualista, que imperava no início do


século, começou a ser substituída pela escola institucional. Em
pouco tempo, a teoria contratualista não resistiu à realidade e aos
interesses econômicos que envolviam as empresas.
Assim, tendo em vista o princípio da preservação da empresa, a
dissolução parcial de sociedade foi concebida pela jurisprudência,
que passou a considerar a sociedade pela sua função social; ao
invés de dissolvê-la totalmente, passou a admitir sua dissolução
parcial, equacionando com isso os interesses tanto da empresa
como dos sócios retirantes e dos remanescentes.27

Outro fundamento teórico que sustentou a criação da dissolução parcial foi a


teoria do contrato plurilateral das sociedades, pelo qual se possibilita a
harmonização dos interesses individuais dos sócios com o propósito de se atingir o
objeto social da sociedade.

Ensina Tullio Ascarelli que o contrato de sociedade possui peculiaridades que,


ainda que compatíveis com os princípios fundamentais dos contratos, diferenciam a
sociedade dos demais contratos em geral, sendo possível identificar o contrato de
sociedade à subespécie dos contratos plurilaterais.28

A principal característica distintiva do contrato plurilateral é a possibilidade de


mais de duas partes dele participarem, de maneira que todas assumem,
simultaneamente, direitos e obrigações para com todas as demais. Todas essas
partes, obrigadas entre si, atuam comungando seus interesses em prol de uma
finalidade comum.

Assim, ao contrário do que ocorre nos contratos bilaterais, nos quais duas
partes obrigam-se uma perante a outra com o objetivo de verem satisfeitos
interesses individuais, no contrato plurilateral, as diversas partes obrigam-se perante
todas as demais, empreendendo suas atividades para a consecução de uma
finalidade comum a todos os contratantes.

A existência de diversas partes comungadas entre si nos contratos

27 BRITO, Cristiano Gomes de. Dissolução parcial de sociedade anônima. Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo, v. 123, jul./set. 2001, p. 149.
28 ASCARELLI, Tullio. Problemas das Sociedades Anônimas e Direito Comparado. 2. ed. São

Paulo: Saraiva, 1969, p. 265.


23

plurilaterais faz com que o inadimplemento de uma delas não implique na extinção
do contrato como um todo, mas apenas na adesão da parte em falta, subsistindo,
assim, o liame entre as demais.

Dessa forma, constatando-se que o afastamento de uma parte de um contrato


plurilateral não põe fim à avença entre os demais, estamos diante da possibilidade
da dissolução parcial.

Sinteticamente, ensina Priscila da Fonseca que:

Assim, o contrato de sociedade, como avença plurilateral que é, pode


abranger um número superior a duas, mas sempre incerto, de partes,
possibilitando, destarte, que outras a ele venham aderir. E, ao
contrário do que sucede nos contratos bilaterais – nos quais os
direitos e obrigações são exercidos diretamente em relação ao outro
contratante – nos contratos plurilaterais as partes são titulares de
direitos e obrigações para com todas as outras, já que o exercício
desses direitos e obrigações destina-se à satisfação do interesse
comum.
Por essas razões, na primeira modalidade, a não execução da
obrigação de uma das partes pode acarretar a extinção do contrato.
Na segunda, porém, essa extinção já não ocorre, porquanto o
inadimplemento afeta apenas a adesão da parte, permanecendo
íntegro o contrato quanto as demais.
Deriva daí a conclusão de que o afastamento do sócio não acarreta a
dissolução da sociedade. E pouco importa que o desligamento do
sócio se apresente como decorrência do não-cumprimento de
obrigações sociais, de mera manifestação de vontade ou de fato ao
quotista não necessariamente imputável, como, v.g., a morte. Em
todos esses casos, não se revelando a participação do sócio
essencial à continuidade da sociedade – quer pela natureza da
prestação a ele afeta, quer pelo grau de repercussão que a
desvinculação acarretará ao capital social – o contrato social não se
rompe. Desatam-se apenas os laços existentes entre o sócio
retirante e os demais sócios e a sociedade.29

Com base nesses argumentos30 a doutrina, então, passa a defender a

29 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 1-2.
30 “Como referido anteriormente, partindo do elenco das causas dissolutórias das sociedades de

pessoas contidas nos ora revogados artigos 335 e 336 do Código Comercial de 1850, durante a
vigência do Decreto nº 3708/19, a jurisprudência, tendo em vista a natureza plurilateral do contrato de
sociedade, que permite sua continuidade a despeito do desfazimento do vínculo societário com
relação a um dos sócios, e o princípio essencial de preservação da empresa, passou a colher a
chamada dissolução parcial da sociedade quando da verificação de causas de dissolução
relacionadas apenas à pessoa de um ou mais sócios que não prejudicassem a permanência da
24

possibilidade de dissolução parcial das sociedades. O posicionamento doutrinário


reverbera nos Tribunais, que adotam o entendimento inovador, permitindo que, nos
casos em que pudesse resistir a sociedade ante o rompimento do vínculo societário
de apenas um de seus sócios, assim deveria sê-lo.

Em 1919, com a edição do Decreto nº 3.708/19, outra exceção à dissolução


total, para além das já citadas constantes no artigo 335.4, do CCOM/1850 e nos
artigos 1.404 a 1.406 do CC/1916, passou a ser prevista no ordenamento jurídico
brasileiro. O artigo 15 do referido decreto garantiu aos sócios de limitadas o direito
de se retirarem das sociedades das quais pertencessem, mediante o reembolso da
quantia correspondente ao seu capital social, caso divergissem de alteração
contratual empreendida no contrato social.

Referido dispositivo representou avanço no tema da dissolução parcial, mas


se mostrou muito restrito, pois condicionava o direito de retirada de sócio à
discordância de alteração contratual havida.

Em que pese a construção doutrinária da dissolução parcial e a sua aplicação


jurisprudencial pelos Tribunais, foi apenas com a promulgação do CC/02 que o
instituto finalmente foi incorporado ao Direito Brasileiro, sob a alcunha de “resolução
da sociedade em relação a um sócio”, tendo seu aspecto processual sido regulado
somente com o advento do CPC/15.

Antes de analisarmos as hipóteses de dissolução parcial, faz-se necessário


comentar a crítica feita por parcela da doutrina à nomenclatura dada ao instituto.

Hernani Estrella entende que, justamente pelo fato de a dissolução parcial ter
sido desenvolvida com a intenção de afastar a aplicação da dissolução total, os
institutos não poderiam ter a denominação assemelhada. Ainda, afirma o autor que o
termo “dissolução” implica em extinção do ente, não podendo se cogitar uma

sociedade, [...] Essa construção jurisprudencial fundamenta-se no reconhecimento da função social


da empresa (artigo 170, III, da Constituição Federal de 1988), vista como instituição em torno da qual
existe interesse público relevante.” CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil: parte
especial – do direito de empresa (artigos 1.052 a 1.195). 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
(Comentários ao Código Civil; v. 13 / Coordenação Antônio Junqueira de Azevedo). E-book, p. 265.
25

extinção apenas parcial de algo. No mesmo sentido, é também contrário à utilização


da expressão “liquidação parcial”, uma vez que o afastamento de um sócio da
sociedade gera unicamente uma relação de crédito em favor do primeiro, não
havendo que se falar em liquidação – processo pelo qual, segundo o autor,
convertem-se os ativos sociais em dinheiro para os atos de solução da sociedade. 31

Como indicado acima, o CC/02 passou a prever a dissolução parcial sob a


denominação de “resolução da sociedade em relação a um sócio”. A terminologia foi
alvo de críticas por Celso Barbi Filho32, uma vez que a expressão “resolução” denota
extinção contratual culposa, não podendo ser associada ao caso da dissolução, uma
vez que esta pode ocorrer independente de culpa da parte.

No mesmo sentido, Alfredo de Assis Gonçalves Neto:

Entretanto, a escolha do título que encima a Seção V, ora em


análise, não foi feliz, visto que ‘não se trata de resolução no sentido
próprio do termo, que supõe inadimplemento imputável a um dos
contratantes, mas de ruptura de vínculos societários’ por motivos
bastante diversos. De fato, não há ‘resolução’ no exercício do direito
de retirada, pois o que aí há é a ‘resilição’; por igual, não existe essa
figura jurídica nos casos de falecimento de sócio, de exclusão por
incapacidade superveniente ou por falência, mas pura extinção do
vínculo sem ação humana. Só na exclusão por descumprimento de
obrigação ou de dever de sócio é que se pode falar em resolução
(parcial) do pacto societário. Por isso, é preferível usar o vocábulo
‘rompimento’ de vínculo societário em relação a sócio para catalogar
e reunir essas figuras, que não podem ser mais tratadas como
espécies de dissolução (total ou parcial) de sociedade.33

31 “Entendemos que, se o pensamento e finalidade da cláusula em estudo é, precisamente, afastar a


dissolução, substituindo-a por procedimento de todo em todo substancialmente diverso, identificá-los
ou sequer assemelhá-los é distorcer, de modo flagrante, a vontade que os signatários do pacto
expressaram por forma assaz inequívoca. É, ainda, admitir, data vênia, conceito desprovido de
sentido, por isso que, conforme argutamente observou Umberto Navarrini, é inconcebível a
dissolução parcial do ente coletivo. Este ou se dissolve, para extinguir-se por completo, ou não. [...].
Não é mais feliz a expressão ‘liquidação parcial’, em substituição àquela outra para afastar a ideia de
desmembração da pessoa fictícia. O sócio que se retira, ou é excluído da sociedade, torna-se,
apenas, credor dela pela importância de seus haveres; para a verificação destes não se procede
nenhuma liquidação da sociedade, porque liquidar, nesse sentido, é concluir as operações
societárias, verificando-se o valor exato de seu ativo, transformando-o em dinheiro, de modo que seu
patrimônio se torne inteiramente em capital em espécie, a fim de serem pagos os credores, para final
partilha do reste entre os sócios.” ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração
dos Haveres de Sócio. 5. ed. atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 67.
32 BARBI FILHO, Celso. Dissolução parcial de sociedades limitadas. Belo Horizonte: Editora

Mandamento, 2004, p. 236-240.


33 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis; FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Empresa

Individual de Responsabilidade Limitada e Sociedades de Pessoas. 2. ed. rev., atual. e ampl.


26

Em que pesem as críticas acima indicadas, salienta-se que, ao longo do


trabalho, será utilizado o termo “dissolução parcial”, tendo em vista que este é o
termo de uso comum na doutrina e jurisprudência.

1.2.1 Hipóteses de Dissolução Parcial

Uma vez elucidado o processo de criação do instituto da dissolução parcial,


passemos à análise dos casos que levam à ruptura do vínculo societário de apenas
um sócio para com a sociedade, sem implicar, contudo, na completa extinção do
ente social.

1.2.1.1 Dissolução Parcial Stricto Sensu

O primeiro caso a ser estudado trata-se de hipótese que, infelizmente,


compartilha a denominação com o próprio instituto.

A confusão semântica tem motivos históricos: a dissolução parcial em sentido


estrito se trata, justamente, da dissolução parcial criada doutrinária e
jurisprudencialmente no século passado. É a hipótese em que os Tribunais, diante
de pedido de sócio pela dissolução total da sociedade, determinavam, se viável no
caso concreto, a preservação da empresa com o rompimento do vínculo societário
exclusivamente do sócio que pleiteasse a extinção do ente social.

A dissolução parcial em sentido estrito, portanto, não deve ser confundida


com as causas hoje disciplinadas pelos artigos 1.028 a 1.032 do CC/02, que versam
sobre hipóteses de resolução da sociedade em relação a um sócio. Isso porque a
primeira consiste na ruptura de um dos vínculos societários determinada
judicialmente diante de um pedido de dissolução total, ao passo que as causas de
dissolução parcial em sentido amplo – causas de resolução da sociedade em
relação a um sócio – representam hipóteses que, sem a necessidade de serem
convertidas para tanto, implicam a ruptura parcial do contrato de sociedade.

São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. (Tratado de Direito Empresarial; v. 2 / Coordenação
Modesto Carvalhosa), p. 615.
27

Desta feita, tem-se que a dissolução parcial em sentido estrito é espécie do


gênero igualmente denominado de dissolução parcial, o qual conta, também, com as
hipóteses de resolução da sociedade em relação a um sócio.

Para melhor esclarecimento, trecho da obra de Priscila Fonseca sobre o


tema:

Malgrado a expressão dissolução parcial tenha seu uso generalizado


na doutrina e na jurisprudência – quer nacional, quer alienígena –,
para designar precisamente os modos de rompimento unilateral do
contrato social, a jurisprudência, no Direito brasileiro, concebeu outra
forma de ruptura parcial do vínculo societário, a qual batizou,
também, de ‘dissolução parcial’.
Esta teve lugar como sucedâneo da dissolução total preconizada
pelo artigo 335.5 do Código Comercial de 1850, isto é, em vez de
deferir ao sócio a faculdade de extinguir a sociedade em virtude de
mera manifestação de vontade, a jurisprudência, em homenagem à
relevância social e econômica da empresa, concedeu a este que
assim requeresse outro direito: o de retirar-se da sociedade. Esse
recesso, no entanto, viria acompanhado de uma peculiaridade: o
sócio teria o valor de seus haveres calculado da mesma forma como
ocorreria na liquidação total do organismo social, tal como, aliás, o
artigo 335.5 do Código Comercial de 1850 lhe assegurava.34

Ainda no mesmo sentido, afirma a autora:

Pois bem, a dissolução parcial tal qual concebida pelos tribunais –


entendida por esta o direito de retirada que se confere ao quotista
que tem direito à dissolução total, com a apuração do valor de sua
quota do mesmo modo como seria nesta liquidada – também
configura modalidade de extinção parcial do vínculo societário e, por
consequência, de dissolução parcial lato sensu.
A crítica que se pode fazer à expressão não pode ser outra senão a
de que a dissolução parcial, criação pretoriana, é espécie do gênero
amplo de dissolução parcial, compreensiva, portanto, de todas as
circunstâncias em que se verifique a ruptura limitada do contrato
social, inclusive aquela. Daí por que poderá a expressão dar margem
à utilização equivocada: a simples referência à dissolução parcial,
com efeito, não elucida se a respectiva utilização reporta-se ao
gênero ou à espécie.35

34 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 3.
35 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 58.


28

Convém refletir, contudo, qual a utilidade da dissolução parcial em sentido


estrito nos dias de hoje, uma vez que não mais existe a possibilidade de dissolução
total de sociedades por vontade unilateral de sócio36, bem como tendo em vista que
parcela das causas que antes levavam à extinção das sociedades hoje implicam a
“resolução da sociedade em relação a um sócio”, ou seja, dissolução parcial em
sentido amplo.

Pois bem; conforme visto na seção anterior, a dissolução parcial em sentido


estrito é uma criação pretoriana com fins de preservar a atividade empresarial – e
todos os efeitos econômicos e sociais que ela produz – diante de pedido pela
dissolução total da sociedade. O instituto foi elaborado pela doutrina e jurisprudência
em razão da omissão legislativa.

Hoje, contudo, a ruptura parcial dos vínculos que formam o contrato social é
disciplinada pelo ordenamento jurídico. Dentre os casos que levam à dissolução
parcial lato sensu, o CC/02 garante aos sócios o direito de retirada imotivada –
denúncia unilateral do contrato social –, exigindo para tanto a notificação aos demais
sócios com antecedência mínima de sessenta dias, para sociedades firmadas por
prazo indeterminado, ou a prova judicial da justa causa, para as sociedades de
prazo determinado.37

Além disso, diferentemente do previsto pelo artigo 335.5 do CCOM/1850, hoje


o ordenamento jurídico não mais alberga a possibilidade de a vontade unilateral de
somente um sócio levar à dissolução total das sociedades. De maneira expressa, os
incisos II e III do artigo 1.033, do CC/02 dispõem que será dissolvida a sociedade,
respectivamente, pelo consenso unânime dos sócios ou pela deliberação da maioria
absoluta.

36 Hoje, conforme apontado na seção 2.1., a dissolução total das sociedades limitadas encontra-se
regulada pelo artigo 1.087 do CC/02, o qual faz remissão ao artigo 1.044, dispositivo que, por sua
vez, indica como hipóteses de dissolução total aquelas constantes no artigo 1.033, além da falência
para sociedades empresárias. Dentre as causas elencadas pelo CC/02 nos referidos dispositivos, não
mais encontra-se prevista a denúncia unilateral do contrato por vontade de apenas um sócio.
37 Artigo 1.029. Além dos casos previstos na Lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da

sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência
mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.
Parágrafo único. Nos trinta dias subseqüentes à notificação, podem os demais sócios optar pela
dissolução da sociedade.
29

Dessa forma, considerando a garantia do direito de retirada e a extinção da


dissolução total por vontade unilateral de apenas um sócio, qual a utilidade prática
da dissolução parcial em sentido estrito?

Para Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, a dissolução parcial
stricto sensu hoje se mostra irrelevante, uma vez que o direito de retirada previsto no
artigo 1.029 do CC/02 opera o rompimento do liame societário por si só,
diferentemente das regras pretéritas. No caso do artigo 1.029 do CC/02, para os
autores, eventual discussão entre os sócios restringe-se ao montante a ser
reembolsado ao sócio que se afasta da sociedade, uma vez que, se verificado
questionamento judicial, a retirada já teria sido operada e o contrato social,
modificado.38

Por outro lado, Priscila Fonseca, ainda que reconheça a previsão do direito de
retirada e a extinção da possibilidade de dissolução total por vontade unilateral de
sócio, entende que a dissolução parcial stricto sensu ainda é viável quando
decretada em duas situações: nos casos previstos pelos artigos 1.033, III e 1.034, II,
ambos do CC/02.39

O primeiro dispositivo acima indicado trata da hipótese de dissolução total


deliberada pela maioria absoluta dos sócios de sociedades firmadas por prazo
indeterminado. Nesse caso, sustenta a referida autora que, diante do princípio da
preservação da empresa, a minoria dissidente da deliberação pode desejar
continuar exercendo a atividade empresarial, devendo a sociedade continuar

38 “2. Retirada imotivada. Sociedade formada por tempo indeterminado. Sócio que quiser se retirar de
sociedade formada por tempo indeterminado deve notificar os demais sócios, com antecedência
mínima de 60 dias. A denúncia, diferentemente da regra que vigia anteriormente (CC/1916 1399 e
CCOM 335 V), opera efeito de rompimento do vínculo societário, dispensando posterior ação judicial
para pôr termo à sociedade. Por essa regra, dispensa-se posterior negócio jurídico, diferente do
contrato – atos coletivos (Gesamtakte); deliberações (Beschlüsse) ou acordos (Vereinbarungen) –,
para o aperfeiçoamento da retirada do sócio e da alteração do contrato social, pois a denúncia opera
os efeitos do rompimento do liame societário por si. Eventual celeuma entre os sócios, para a aferição
de valores devidos pela sociedade ao que se retira, poderá vir a ser objeto de questionamento
posterior em ação judicial. Porém, a essa altura, a retirada já se operou e o contrato social já se
considera modificado, e cessada a posição jurídica de sócio do retirante, com todos os consectários
lógicos e jurídicos dessa retirada. V. CPC 1218 VII e CPC/39 655 a 674.” (grifos nossos). NERY
JUNIOR, Nelson; ANDRADE NERY, Rosa Maria de. Código Civil Comentado. 11. ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2014. E-book, p. 2397.
39 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 64-65.


30

existindo com o afastamento dos sócios que votaram a favor de sua dissolução total.
Esse afastamento, conforme aponta Priscila Fonseca, deve ser efetuado mediante
apuração dos haveres dos sócios como se se tratasse de dissolução total, pois
“como tinham esses últimos direito a dar fim à sociedade, a eles deverá ser
conferida a apuração de seus haveres como se a dissolução total tivesse
prevalecido.”40

A outra possibilidade atual de dissolução parcial em sentido estrito estaria na


hipótese do artigo 1.034, II, do CC/02, ou seja, no direito do sócio de requerer a
dissolução total da sociedade por inexequibilidade de seu fim social. Estando o
pedido de dissolução por inexequibilidade de fim social baseado em quebra de
affectio societatis, pode o juiz do caso concreto, se concordarem os demais sócios,
determinar a saída apenas do sócio insatisfeito, o que implicaria a dissolução parcial
stricto sensu da sociedade. Seguindo a mesma lógica da hipótese anterior, a
apuração de haveres nesse caso também deveria ser, segundo a autora, conforme
ocorreria se operada a dissolução total.

Antes de encerrar o tema da dissolução parcial em sentido estrito, cumpre


elucidar a reflexão de Alfredo de Assis Gonçalves Neto sobre o tema.

Para o autor, as hipóteses hoje listadas como “resolução da sociedade em


relação a um sócio” não implicam em dissolução parcial: “[a] ruptura do vínculo
social continua a ocorrer, porém, tão somente, para a liquidação da quota de
participação do sócio realizada mediante a apuração dos respectivos haveres, sem
levar a sociedade à dissolução, total ou parcial.”41

Em que pese entender que as hipóteses dos artigos 1.028 a 1.032 do CC/02
não levam à dissolução parcial de sociedades, afirma o autor que o diploma legal
não impede a decretação de dissolução parcial em sentido estrito nos casos
previstos como hipóteses de dissolução total. Nas palavras de Alfredo de Assis

40 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 64.
41 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis; FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Empresa

Individual de Responsabilidade Limitada e Sociedades de Pessoas. 2. ed. rev., atual. e ampl.


São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. (Tratado de Direito Empresarial; v. 2 / Coordenação
Modesto Carvalhosa), p. 615.
31

Gonçalves Neto:

Como será visto adiante e já observei em outra obra, o Código Civil,


apesar de não mais admitir a dissolução por falecimento,
inadimplemento, incapacidade, pelo simples querer de sócio ou em
razão de sua falência pessoal, não repele a dissolução parcial
quando se verificam as causas de dissolução que regula em seus
artigos 1.033 a 1.035. Todas as causas de dissolução que não
envolvam normas de ordem pública, como a falência da sociedade
ou a cassação de autorização para seu funcionamento, ‘propiciam a
aplicação da teoria da dissolução parcial para assegurar o exercício,
pelos sócios remanescentes, do seu indeclinável direito de manter os
vínculos que entre si ajustaram’ (dos quais não participa, nem
participava, o sócio ou o grupo de sócios que almeja a dissolução)
‘para assegurar a permanência da pessoa jurídica e a continuidade
da empresa.42

1.2.1.2 Morte

A atual codificação civil, em linha com o princípio da preservação da empresa


construída pela doutrina e jurisprudência, prestigia, com a morte de sócio, a
continuidade da sociedade, diferente do que dispunha o CCOM.

O artigo 335, item 4 do CCOM dispunha que reputar-se-ia dissolvida a


sociedade pela morte de um de seus sócios, salvo convenção em sentido contrário
pelos sobreviventes. Esse dispositivo representava a única atenuação da dissolução
total das sociedades, tendo em vista que o diploma comercial, conforme visto no
item 3.2 acima, não previa hipóteses de subsistência das sociedades com
afastamento de um de seus sócios.

Assim, pela regulação anterior, ocorreria a dissolução total da sociedade pela


morte de um dos sócios, caso o contrato social nada dispusesse sobre sua
continuidade com os herdeiros do falecido, os sócios remanescentes ou terceiros,
em sua substituição.

Hoje, tendo em vista a referida construção doutrinária e jurisprudencial, e a

42GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis; FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Empresa
Individual de Responsabilidade Limitada e Sociedades de Pessoas. 2. ed. rev., atual. e ampl.
São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. (Tratado de Direito Empresarial; v. 2 / Coordenação
Modesto Carvalhosa), p. 616.
32

consequente positivação do instituto da dissolução parcial, o artigo 1.028 do CC/02


prevê que, ocorrendo a morte de um dos sócios, opera-se a resolução da sociedade
em relação ao sócio falecido – dissolução parcial –, sem que seja necessária
previsão contratual a respeito, devendo sua quota ser liquidada.

Assim, em regra, a morte de um sócio não dissolve a sociedade, apenas


implica na liquidação de sua quota. Contudo, o artigo 1.028 prevê que assim não
ocorrerá se (i) o contrato social dispuser diferentemente; (ii) os sócios
remanescentes optarem pela dissolução total da sociedade; ou se (iii) por acordo
com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.

A morte de um sócio pode, portanto, também resultar na dissolução total da


sociedade, o que dependerá dos sócios remanescentes, se assim optarem, seja
pela inviabilidade de prosseguimento da empresa, tendo em vista a centralidade da
prestação que vinha sendo realizada pelo sócio falecido, seja pela
representatividade da parcela a ser paga aos herdeiros frente ao capital total da
sociedade. Nesse caso, a deliberação pela dissolução total da sociedade deve ser
determinada pelo quórum de três quartos do capital social, conforme dispõe o artigo
1.076, I do CC/02.

No caso do contrato social prever que na morte de um dos sócios este será
substituído por seus herdeiros, é necessário que tanto os herdeiros concordem com
a substituição, quanto os sócios remanescentes, tendo em vista que estes não
precisam se associar com quem não lhes interesse. Nesse sentido, Fábio Ulhoa
Coelho:

Se falece o sócio da sociedade limitada, isso pode implicar a


dissolução parcial desta. De fato, a participação societária, como os
demais elementos do patrimônio do falecido, será atribuída, por
sucessão causa mortis, a um herdeiro ou legatário. Se o sucessor do
sócio morto quiser fazer parte da sociedade e os sobreviventes
concordarem, nada obriga a liquidação da quota. Substitui-se o sócio
falecido pelo sucessor ou sucessores e não se verifica nenhuma
dissolução parcial da sociedade.43

43COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 20. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2016, v. 2, p. 448.
33

Há corrente que entende, contudo, que a substituição do sócio falecido por


seus herdeiros depende unicamente da aceitação destes, uma vez que a
substituição encontra-se prevista no contrato social, devendo os sócios
remanescentes respeitar a disposição contratual.

Em sendo necessária a anuência também dos sócios remanescentes para a


substituição do sócio falecido, opção que nos parece mais acertada 44, utiliza-se
analogicamente o quórum do artigo 1.057 do CC/02, segundo o qual é permitida a
cessão de quotas a terceiro estranho à sociedade desde que, na deliberação para
tanto, não haja oposição de titulares detentores de mais de um quarto do capital
social.45

1.2.1.3 Direito de Recesso e de Retirada

Conforme ensina José Waldecy Lucena:

[é] entendimento generalizado o de que ninguém pode ser forçado,


contra a vontade, a permanecer no estado de sócio, o que feriria a
liberdade do homem de dirigir seu próprio destino, ou, como querem
alguns mais específicos, haveria violação à liberdade de trabalho. 46

Assim, traduzindo o direito constitucional de liberdade de associação,


preconizado no artigo 5º, incisos XVII e XX da Constituição Federal de 1988
(CF/88)47, o ordenamento jurídico prevê aos sócios os direitos de recesso e de
retirada, que serão, respectivamente, analisados nas seções seguintes.

1.2.1.3.1 Direito de Recesso

Prevê o artigo 1.077 do CC/02 que o sócio que houver discordado de


deliberação pela qual for determinada alteração contratual, fusão ou incorporação
44 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 51-52.
45 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres: critérios para a sociedade empresária

do tipo limitada. 2008. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 2008, p. 52-53.
46 LUCENA, José Waldecy. Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada. Rio de

Janeiro: Renovar, 1996, p. 762.


47 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acesso em: 14 set. 2020.


34

terá o direito de retirar-se da sociedade nos trinta dias subsequentes à reunião


deliberativa.48

Referido artigo prevê o direito de recesso aos sócios de sociedades limitadas,


que é justificado pela total aversão do sócio à alteração contratual empreendida, que
torna incompatível sua permanência na sociedade. Ao sócio dissidente é garantido o
direito de recesso, uma vez que este não é obrigado a permanecer em sociedade
cujo contrato social a ele não mais se afigura coerente. Conforme Marcelo Fortes
Barbosa Filho:

As alterações contratuais representam uma repactuação do ajuste


inserido no contrato social, o que, dependendo do conteúdo e da
relevância da matéria deliberada, pode acarretar o rompimento da
affectio societatis antes construída. Prevê, por isso, em consonância
com o artigo 15 do revogado Decreto nº 3.708/19, a conferência de
direito de recesso ao quotista dissidente, podendo ele se retirar do
quadro social desde que manifestada inequivocamente sua vontade,
mediante restituição do montante correspondente a sua participação
do capital social.49 (grifos nossos)

O direito de recesso possui prazo decadencial de trinta dias, contado da data


da deliberação da qual discorda o sócio dissidente. Findo este prazo, não mais
poderá o sócio exercer seu direito.

Manifestado o desejo pelo recesso, aos administradores e demais sócios,


nada mais cabe fazer, a não ser promover o pagamento dos haveres do sócio
dissidente. Assim, “a eficácia do direito de recesso, uma vez notificada a sociedade,

48 Sobre as hipóteses elencadas para o exercício de recesso, importante pontuar que o legislador
expressamente deixou de prever as hipóteses de recesso pela deliberação de cisão ou de
transformação do tipo societário. Sobre o tema, convém transcrever lúcida ponderação de Priscila
Fonseca: “A cisão, tal como a fusão e a incorporação, revela-se fruto de deliberação social,
implicando, pois, alteração contratual e a discordância relativamente a esta, por seu turno, enseja o
direito de retirada. Já no que pertine à transformação, a situação mostra-se um pouco diferente. É
que o artigo 1.114 do Código Civil reclama deliberação unânime dos sócios para a aprovação do
referido ato, motivo pelo qual se mostra incabível, no caso, o direito de recesso. Apenas na hipótese
de o contrato social estabelecer quórum diverso para a aprovação da transformação do tipo societário
é que se poderá cogitar do direito de recesso, tal como, aliás, está expressamente previsto no mesmo
artigo 1.114.” FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio.
5. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 15.
49 BARBOSA FILHO, Marcelo Fortes. Comentários aos artigos do Livro II do Código Civil de 2002 –

Do Direito de Empresa. In: PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil Comentado – doutrina e
jurisprudência. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Manole, 2014, p. 994.
35

não pode ser obstaculizada por qualquer ulterior deliberação da sociedade”.50

A apuração de haveres do sócio dissidente será regulada pelos critérios


contratualmente previstos, ou, no caso de silêncio do contrato social, será operada
conforme a disciplina do artigo 1.031 do CC/02 e do Capítulo V do Título III do
CPC/15, que trata do procedimento especial para apuração de haveres.

1.2.1.3.2 Direito de Retirada

Além da possibilidade do recesso, poderá o sócio denunciar unilateralmente o


contrato pelo exercício de seu direito de retirada. Referido direito encontra-se
previsto nas regras relativas às sociedades simples, mas, supletivamente, é também
garantido aos sócios de sociedades limitadas.51-52

O direito de retirada está disposto no artigo 1.029 do CC/02. Nas sociedades


de prazo indeterminado, o exercício do direito de retirada pode dar-se
imotivadamente, bastando que o sócio retirante informe sua decisão aos demais
sócios com antecedência mínima de sessenta dias.

Por outro lado, no caso das sociedades constituídas com prazo determinado,
é exigido ao sócio retirante a comprovação, por decisão judicial, de justa causa.
Referida exigência é justificada, pois a retirada do sócio impõe o pagamento de seus
haveres, do que decorre redução de capital. A redução de capital, como bem

50 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 11.
51 BARBOSA FILHO, Marcelo Fortes. Comentários aos artigos do Livro II do Código Civil de 2002 –

Do Direito de Empresa. In: PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil Comentado – doutrina e
jurisprudência. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Manole, 2014, p. 994.
52 Vale apenas anotar a controvérsia acerca do regime supletivo das sociedades limitadas. Há

corrente doutrinária no sentido de que às limitadas, aplicam-se os dispositivos do CC/02


expressamente a elas destinados e, supletivamente, as regras das sociedades simples, podendo o
contrato social prever, ainda, a incidência da Lei das Sociedades Anônimas (LSA), que seria
considerada uma fonte supletiva opcional. Por outro lado, outra corrente entende que se aplicam às
limitadas as disposições específicas do CC/02, devendo o contrato social prever qual será o regime
supletivo, o referente às sociedades simples ou o atinente às sociedades anônimas. Referida
discussão, contudo, não é objeto central do presente trabalho, no qual será analisado tanto o direito
de recesso, expressamente previsto às sociedades limitadas, quanto o direito de retirada, previsto
nas regras das sociedades simples, mas também aplicado às sociedades limitadas.
36

pondera Roberta de Oliveira e Corvo Ribas53, “pode prejudicar a consecução do


objetivo social, ao qual ele se obrigou, e até mesmo impedir que ele se concretize no
tempo determinado que se estipulou em contrato social.”

Ao conceito de justa causa, contudo, o CC/02 não previu nenhum parâmetro.


Sendo um conceito amplo e indeterminado, deve o magistrado, no caso concreto,
verificar se os fatos alegados pelo sócio retirante são suficientemente relevantes
para embasar o pedido de retirada, uma vez que a sua saída pode, inclusive, pôr em
risco a preservação da empresa constituída por prazo determinado.

Embora seja possível admitir, pela interpretação literal do artigo 1.029 do


CC/02, que os sócios podem se retirar de forma completamente imotivada das
sociedades por tempo indeterminado, hipótese em que a mera manifestação do
sócio retirante já produziria o efeito de rompimento do vínculo societário, há corrente
doutrinária no sentido de que a completa ausência de motivação, sem qualquer
baliza ou condicionamento, pode permitir casos de abuso de direito e violação da
boa-fé. Dessa forma, pela interpretação do artigo 1.029, conforme o sistema do
CC/02 e, tendo em vista a função social do contrato e o princípio da boa-fé, a
retirada do sócio poderia possuir condicionantes subjetivas.

1.2.1.4 Exclusão

Conforme ensina Priscila Fonseca, exclusão “nada mais significa do que o


afastamento compulsório do sócio descumpridor de suas obrigações sociais.” 54.

Referida autora, ainda, apresenta três teorias sobre o fundamento da


exclusão, aqui sinteticamente reproduzidas55.

A primeira, denominada teoria da disciplina taxativa legal, indicava como

53 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres: critérios para a sociedade empresária
do tipo limitada. 2008. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 2008, p. 55.
54 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 21.


55 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 22-25.


37

fundamento jurídico da exclusão a necessidade de conservação da empresa por


interesse econômico56. Contudo, em virtude das consequências geradas ao sócio
expulso, essa primeira corrente preconizava que a exclusão de sócio poderia ocorrer
somente nos casos expressamente previstos em Lei e sempre a título sancionatório.
Esse entendimento foi abandonado, uma vez que o interesse público, base da teoria
da disciplina taxativa legal, não poderia ser verificado. Ainda que houvesse interesse
público, deveria prevalecer o interesse dos sócios na preservação da empresa. Além
disso, não se pode pensar na exclusão meramente como ato sancionador, uma vez
que esta pode ocorrer, em certos casos, independente de culpa do sócio.

A segunda corrente era denominada de teoria do poder corporativo disciplinar


e entendia que a exclusão decorreria da soberania estatutária disciplinar que as
sociedades exercem sobre seus membros. O direito de exclusão seria, portanto,
manifestação do poder disciplinar da sociedade. O fundamento pelo qual esse
entendimento prevaleceu é, como explicado no parágrafo anterior, o fato de a
exclusão não ter exclusivamente caráter sancionador, tendo em vista as hipóteses
em que ocorre sem a presença de culpa do sócio expulso.

Por fim, para a teoria contratualista, a exclusão seria decorrente do


descumprimento do contrato social, prevalecendo a existência da sociedade ao
vínculo com o sócio inadimplente. Esse é o fundamento da exclusão de sócio mais
aceito na doutrina. José Waldecy Lucena, por exemplo, entende que a exclusão é
fundamentada, como nesta terceira vertente doutrinária, pelo “princípio preservativo
da empresa conjugado ao princípio geral da resolução contratual por
inadimplemento”57. Ainda, sob essa terceira corrente, pode-se dizer que o
fundamento da exclusão não está na prova de culpa do sócio, mas na falta de
colaboração para atingimento do objeto social, que impeça a sociedade de alcançar

56 “Há um fundamento econômico para a exclusão, que está na necessidade de se conceder à


sociedade um mecanismo de defesa contra o sócio que esteja agindo na contramão dos interesses
sociais, de um ponto de vista imediato, e contra os interesses dos próprios sócios, sob um ângulo
mediato. Estes poderão ser prejudicados em relação ao objetivo último da busca de lucros, como
resultado da ação nefasta de algum sócio. A ação deletéria deste poderá, em certos casos, até
mesmo acarretar a quebra da sociedade.” VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Sociedades –
Teoria Geral das Sociedades – As Sociedades em Espécie no Código Civil. 3. ed. rev., atual. e ampl.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. (Direito Comercial; v. 2), p. 142.
57 LUCENA, José Waldecy. Das Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada. Rio de

Janeiro: Renovar, 1996, p. 760.


38

seus fins.58

As hipóteses de exclusão de sócios encontram-se espalhadas em diversos


dispositivos do CC/02. Especificamente em relação às limitadas, o principal
fundamento da possibilidade de exclusão é o artigo 1.085 do CC/02, que prevê a
exclusão extrajudicial de sócio desde que expressamente constante no contrato
social.

Referido dispositivo, ainda, faz remissão ao artigo 1.030, cujo caput prevê
duas hipóteses de exclusão judicial de sócios, quais sejam, a exclusão pelo
cometimento de falta grave no cumprimento de obrigações sociais e a exclusão por
incapacidade superveniente do sócio. O parágrafo único do mesmo artigo dispõe,
ainda, que serão excluídos de pleno direito os sócios declarados falidos ou aqueles
cujas quotas tenham sido liquidadas em virtude de execução empreendida por
credor, conforme previsto no artigo 1.026. Impende salientar que todas as hipóteses
de exclusão do artigo 1.030, ainda que previstas como regramento das sociedades
simples, são aplicáveis às limitadas por expressa disposição do artigo 1.085.

Por sua vez, referido artigo 1.030 indica que também será excluído o sócio na
hipótese do artigo 1.004, parágrafo único, dispositivo que prevê a exclusão de sócio
remisso, ou seja, sócio que se encontra em mora com a sociedade pela falta de
integralização das quotas subscritas. O artigo 1.004 é regramento referente às
sociedades simples. No que tange às limitadas, a possibilidade de exclusão de sócio
remisso encontra-se prevista no artigo 1.058, conforme quadro abaixo:

58 VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Sociedades – Teoria Geral das Sociedades – As


Sociedades em Espécie no Código Civil. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2014. (Direito Comercial; v. 2), p. 143.
39

Quadro 1 - Possibilidade de exclusão de sócio remisso prevista no artigo 1.058

Fonte: Elaborado pelo autor.

Tendo em vista que a disciplina da exclusão de sócios das sociedades


limitadas encontra-se disciplinada em diversos dispositivos do CC/02, com
remissões e interpretações conjugadas de artigos, apresenta-se abaixo a
representação gráfica sintetizando as hipóteses acima elucidadas para melhor
compreensão do leitor.

1.2.1.4.1 Exclusão Extrajudicial de Sócio que coloca a continuidade da empresa em


risco pela prática de atos de inegável gravidade

Preconiza o artigo 1.085 do CC/02 que:

Artigo 1.085. Ressalvado o disposto no artigo 1.030, quando a


maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital
social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a
continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade,
poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato
social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa.
Parágrafo único. Ressalvado o caso em que haja apenas dois sócios
na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser
determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada
para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu
comparecimento e o exercício do direito de defesa. (g.n.)
40

Percebe-se que o CC/02 autoriza a exclusão de sócio nas sociedades


limitadas sem que seja necessário pronunciamento do Poder Judiciário, bastando
que a exclusão seja deliberada e, posteriormente, seja o contrato social alterado
para fazer constar a saída do sócio excluído.

Para que a exclusão possa se dar de forma extrajudicial, como acima


indicado, é necessário que o contrato social preveja cláusula que autorize a
exclusão extrajudicial. Se, porventura, o contrato social não dispuser sobre a
exclusão de sócio, esta somente poderá ser alcançada por meio de pronunciamento
do Poder Judiciário.59

A validade da exclusão extrajudicial depende da sua realização em reunião ou


assembleia especialmente convocada para sua discussão, devendo também estar
ciente o sócio contra quem existe a pretensão de exclusão a fim de que possa
exercer seu direito de defesa. A exclusão, ainda, deverá ser determinada pelos
votos correspondentes a mais da metade do capital social.

Importante frisar que a hipótese aqui comentada, prevista pelo artigo 1.085,
não se trata de denúncia vazia do contrato em relação a um sócio, uma vez que a
exclusão extrajudicial a ser deliberada deve ser embasada em justa causa, como se
denota da parte final do dispositivo em comento. Assim, “devem os sócios
interessados fazer, na assembleia a ser especialmente convocada, a prova do risco
à continuidade da empresa como resultado da prática de atos de inegável gravidade
– de conceituação extremamente fluída.”60

Os conceitos de “atos de inegável gravidade” e “justa causa” são amplos,


também identificados pela doutrina como cláusulas gerais. Nesse sentido, para
esboçar possível síntese, afirma Roberta de Oliveira e Corvo Ribas:

59 “A ausência de cláusula contratual não implica a impossibilidade da exclusão, mas apenas haverá
a necessidade de uma decisão judicial para tanto. Ora, a exclusão é um direito inerente à finalidade
comum do contrato de sociedade e, por isso, independe de previsão contratual ou legal. A presença
ou não da previsão contratual influirá apenas na forma da exclusão, judicial ou extrajudicial, e não na
sua possibilidade.” TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: Teoria geral e direito
societário. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2017, v. 1. E-book, p. 479.
60 VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Sociedades – Teoria Geral das Sociedades – As

Sociedades em Espécie no Código Civil. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2014. (Direito Comercial; v. 2). p. 487.
41

Assim, entende-se, em linhas gerais, que atos de inegável gravidade


seriam, em primeiro lugar, atos praticados por quem viola a Lei;
ainda, inadimplemento do contrato social que resulte na falta de
colaboração para com a atividade social, sendo tão grave que tenha
por consequência o rompimento da affectio societatis; também
representam atos de inegável gravidade aqueles que, mesmo sem
serem contrários à Lei ou ao contrato social, provocam grave dissídio
entre os sócios, implicando quebra da affectio societatis. Fábio Ulhoa
Coelho destaca que são atos que ensejam justa causa o
descumprimento do dever de lealdade que os sócios devem ter em
relação aos demais sócios e à própria sociedade, que seria traduzido
por uma “noção geral de colaboração para o sucesso do
empreendimento comum”. Não estão adstritos apenas à gestão do
negócio, mas principalmente a não praticar atos que sejam
prejudiciais aos interesses comuns. Como se pode observar, trata-se
de um critério subjetivo, que pela doutrina e jurisprudência vem
tomando forma. Alguns exemplos na doutrina: (i) recusa sistemática
de tomar parte nas deliberações a fim de não assumir
responsabilidades juntamente com os demais sócios, (ii) o uso
abusivo da firma ou razão social, (iii) negar o sócio administrador a
qualquer sócio o exame de livros, papéis e documentos, (iv)
concorrência desleal etc.61 (grifos nossos)

Pode-se, portanto, indicar como requisitos cumulativos para a exclusão


extrajudicial de sócios nas sociedades limitadas: (i) previsão contratual de exclusão
por justa causa; (ii) atos de inegável gravidade do sócio a ser excluído que estejam
pondo em risco a continuidade da sociedade; (iii) reunião ou assembleia
especialmente organizada para a decisão acerca da exclusão, com a ciência do
sócio acusado para que possa exercer seu direito de defesa; e (iv) a deliberação
favorável à exclusão por votos correspondentes a maioria do capital social.

Preenchidos os requisitos acima, será excluído o sócio por mera alteração do


contrato social. Contudo, este poderá impugnar a decisão tomada pelos sócios
remanescentes no Judiciário, pleiteando a anulação da medida. Disso se extrai que,
em que pese extrajudicial a exclusão, é possível haver o controle judicial de sua
validade, que será tomada a posteriori.62

61 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres: critérios para a sociedade empresária
do tipo limitada. 2008. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 2008, p. 58.
62 “Ao sócio excluído, na forma do artigo 1.085, assiste postular a anulação da alteração contratual,

comprovando a ausência de causa justificadora de sua exclusão. A matéria, portanto, sempre ficará
adstrita ao controle judicial, bastando a provocação por parte do minoritário excluído. Poderá,
outrossim, pretender a declaração de nulidade do ato, quando preteridas as formalidades legais para
sua implementação pela maioria, como, por exemplo, na falta de sua ciência, em tempo hábil, da
42

1.2.1.4.2 Exclusão Judicial de Sócio por falta grave no cumprimento de obrigações


sociais

Conforme ensina Luis Felipe Spinelli:

A exclusão do sócio por falta grave ou pela prática de atos de


inegável gravidade é o instrumento de caráter privado assentado no
seio do Direito das Obrigações, permitindo que a sociedade
responda ao descumprimento grave de deveres por parte de um dos
sócios.63

A possibilidade de excluir um sócio faltoso é faculdade da sociedade e


depende de deliberação dos demais sócios, na qual se verifica se a exclusão pode
gerar mais prejuízos do que a manutenção do sócio. Justamente por isso, é lícito à
sociedade não expulsar sócio que tenha cometido falta grave ou ato de inegável
gravidade.

Assim, como pontuado no item anterior sobre a abertura dos conceitos de


“justa causa” e “atos de inegável gravidade”, a expressão “falta grave” é fluída e
indeterminada, opção adotada para dar liberdade à sociedade para verificar, no caso
concreto, quais os deveres descumpridos capazes de, ante o juízo de conveniência
dos sócios, levar a exclusão, ou não, do sócio em falta.

Luis Felipe Spinelli não vislumbra diferença entre os conceitos de “falta


grave”, do artigo 1.030 do CC/02, e de “atos de inegável gravidade”, do artigo 1.085
do mesmo diploma. Segundo o autor:

Não conseguimos enxergar, entre as referidas hipóteses, qualquer


diferença de intensidade da conduta que possa justificar a exclusão
de sócio; o que se altera, em ambos os casos, não é o pressuposto
material da exclusão, mas sim o procedimento de como a exclusão
se opera (judicial, nos termos do artigo 1.030, ou extrajudicial, de
acordo com o artigo 1.085). Ambos os dispositivos legais tratam da
exclusão de sócio em decorrência do descumprimento de seus
deveres sociais (da mesma forma como o fazem os artigos
1.004 e 1.058 do CC no caso do sócio remisso), podendo eventual

realização do conclave de sua expulsão.” CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do


Código Civil. 13. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2014, p. 228.
63 SPINELLI, Luis Felipe. Exclusão de sócio por falta grave na sociedade limitada. São Paulo:

Quartier Latin, 2015, p. 53.


43

falta ser censurada por quaisquer dos dois artigos.64

No mesmo sentido, entendem não haver diferença entre os descumprimentos


contratuais por “falta grave” ou “atos de inegável gravidade”, mas apenas no
procedimento a ser utilizado para a exclusão, Marcelo Vieira von Adamek65 e
Ricardo Negrão66.

1.2.1.4.3 Exclusão Judicial de Sócio por incapacidade superveniente

Assim como a exclusão por falta grave, a exclusão por incapacidade


superveniente de sócio encontra-se prevista no artigo 1.030 do CC/02 e deve ser
empreendida por procedimento judicial.

Ensina Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa67 que a incapacidade como


fundamento de exclusão de sócio pode ser tanto civil, quanto contratual. O primeiro
caso refere-se às hipóteses de incapacidade previstas nos artigos 3º e 4º do CC/02,
sendo incapaz o sócio em que se verificar a “perda da capacidade de agir por si
só”68, e que, consequentemente, não pode contribuir para atingir o objeto social. Por
sua vez, a incapacidade contratual decorre do impedimento quanto ao exercício de
uma determinada atividade de um sócio pela cassação de sua inscrição pelo órgão
de classe.

Impende destacar, ainda, que o reconhecimento da incapacidade deve


obrigatoriamente ser obtido junto ao Poder Judiciário, não podendo haver a exclusão

64 SPINELLI, Luis Felipe. Exclusão de sócio por falta grave na sociedade limitada. São Paulo:
Quartier Latin, 2015, s.p.
65 VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Anotações sobre a exclusão de sócio por falta grave no regime do

Código Civil. Revista de Direito Mercantil, São Paulo, v. 158, abr./jun. 2011, p. 112.
66 “As hipóteses de falta grave, mediante reconhecimento judicial, referem-se a qualquer ato ou

conjunto de atos que, praticados por um ou mais sócios, impeçam o prosseguimento da atividade
comum. Diferem das de justa causa somente porque, naquelas, por previsão contratual, os sócios
decidem por maioria, e, nestas, o reconhecimento será sempre judicial (artigo 1030).” NEGRÃO,
Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa – teoria geral da empresa e direito societário. 9.
ed. São Paulo: Saraiva, 2012, v. 1, p. 417.
67 VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Sociedades – Teoria Geral das Sociedades – As

Sociedades em Espécie no Código Civil. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2014. (Direito Comercial; v. 2), p. 320.
68 TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: Teoria geral e direito societário. 8. ed. rev. e

atual. São Paulo: Atlas, 2017, v. 1. E-book, p. 408.


44

de sócio por deliberação extrajudicial dos demais sócios. Nos casos de incapacidade
temporária, bem lembra Ricardo Negrão69 que deverá o juiz avaliar a extensão da
incapacidade, bem como sua perspectiva temporal, para determinar ou não a
exclusão do sócio.

1.2.1.4.4 Exclusão de Pleno Direito do Sócio falido ou do Sócio, cujas quotas


tenham sido liquidadas a pedido de credor

A exclusão de sócio em decorrência da decretação de sua falência ou a


pedido de liquidação de suas quotas por credor individual encontra-se regulada no
parágrafo único do artigo 1.030 do CC/02.

Nesses dois casos, a exclusão do sócio opera-se de pleno direito. Significa


dizer que tanto a decretação da falência, quanto a penhora da quota solicitada por
credor individual do sócio operam seus efeitos tão logo sejam decretadas pelo Poder
Judiciário.

Diz-se que a exclusão do sócio será de pleno direito, pois independe de


decisão judicial. Importante destacar que a manifestação do Judiciário é
desnecessária no que toca a declarar a exclusão do sócio, mas é essencial, em
momento anterior, para declarar a falência do sócio ou a penhora das quotas, fatos
que, independentemente de qualquer manifestação posterior do Judiciário ou
deliberação dos demais sócios, operam seus efeitos.

Em ambos os casos, a quota deixa de existir, por ter sido liquidada em favor
de terceiros. É o processo natural de liquidação.

Gladston Mamede reforça que a exclusão aqui opera-se independente de


deliberação dos sócios, não sendo uma faculdade que deva ser exercida, mas um
imperativo decorrente da falência ou penhora de quotas.

69 NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa – teoria geral da empresa e direito
societário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, v. 1, p. 371.
45

É preciso estar atento para o fato de não caber aos sócios, cientes
da sentença declaratória, ir ao Judiciário pedir a exclusão do falido
ou insolvente ou providenciar alteração contratual para fazê-lo, não
se interpretando a expressão exclusão de pleno direito, anotada no
artigo 1.030, parágrafo único do Código Civil, como faculdade que
lhes diga respeito. Com efeito, a declaração de falência ou
insolvência tem por efeito imediato a arrecadação de todos os bens
do devedor, que não terá sobre ele direito de administração. A
exclusão de pleno direito se dará como resultado do processo de
falência ou insolvência; a liquidação da quota ou quotas, nos termos
definidos pelo artigo 1.031 do Código Civil, será processada perante
o juízo de execução coletiva, até que o exercício dos respectivos
direitos sociais estará a cargo do administrador da massa insolvente
ou falida.70

No caso do credor que faz recair execução sobre as quotas do sócio, esse
requerimento somente poderá ser realizado na insuficiência de outros bens do
devedor, como se extrai do artigo 1.026 do CC/02.

Importante frisar que dois tipos de credores não podem solicitar a liquidação
das quotas do sócio, na forma do artigo 1.027 do CC/02, os herdeiros do cônjuge de
sócio ou o cônjuge do sócio que se separou judicialmente. Esses credores não
podem exigir a parte que lhes couber no capital social, mas podem concorrer à
divisão periódica dos lucros até a liquidação da sociedade.

Com relação â falência, o artigo 123 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de


200571 estabelece três maneiras para a liquidação dos haveres do falido. A primeira
delas, prevista no caput do referido artigo, dispõe que entram para a massa falida os
haveres de sócio apurados na forma estabelecida no contrato social. As demais
formas de liquidação estão disciplinadas no §1º do artigo 123. Omisso o contrato
social sobre a apuração de haveres, estes deverão ser apurados judicialmente.
Ainda, se for o caso de liquidação da própria sociedade, os haveres do falido
deverão ser utilizados para pagar o passivo social e, somente depois, poderão entrar
para a massa falida.

70 MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro – Direito Societário: sociedades simples e


empresárias. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010, v. 2, p. 156-157.
71 BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e

a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm Acesso em: 14 set. 2020.
46

1.2.1.4.5 Exclusão de Sócio Remisso

A última hipótese de exclusão de sócio é a referente ao sócio remisso,


prevista no artigo 1.004 do CC/02 para as sociedades simples e, especificamente às
sociedades limitadas, no artigo 1.058 do mesmo diploma.

A obrigação de integralizar o capital subscrito é uma das obrigações


fundamentais dos sócios. Ao contrário dos demais casos de exclusão, em que o
sócio excluído tem direito de receber seus haveres, o sócio remisso excluído será
apenas reembolsado no valor que eventualmente integralizara. Se não houver
integralizado em nada o valor por ele subscrito, não terá direito a nenhum
reembolso.

Verificado o inadimplemento de sócio quanto sua obrigação de integralização


do capital, o artigo 1.058 do CC/02, em remissão ao parágrafo único do artigo 1.004,
não impõe a exclusão imediata do sócio remisso, dando aos demais sócios, além da
exclusão, a possibilidade de cobrar o valor devido ou, se o sócio já tiver integralizado
parcela do montante subscrito, reduzir sua participação social ao valor efetivamente
integralizado.72

Optando pela exclusão, os sócios remanescentes deverão pagar o sócio


excluído pelas quotas integralizadas, ou transferi-las a terceiros, também mediante
indenização. Podem, ainda, pagar o valor das quotas ao sócio a ser excluído e, não
desejando introduzir novo sócio, manter o capital social distribuindo a quota do sócio
excluído pelos demais, ou, operar a redução do capital social contratualmente.

Como pondera Priscila Fonseca:

72 “Observe-se que em atenção ao princípio da preservação da empresa- aqui de forma mais


acentuada (por se tratar do tipo societário mais utilizado em nosso meio), no que merece encômios,
visto quer oferece alternativas à manutenção de toda a base patrimonial do empreendimento (o
capital) – o dispositivo transcrito [artigo 1.058 do CC/02] autoriza os sócios remanescentes a tomar
para si a quota do sócio remisso, ou agregar terceiro, que irá adquiri-la. Mas não descarta a hipótese
de dissolução parcial (remissão ao artigo 1.004 e seu parágrafo único, comentados no início deste
tópico). Trata-se, como é fácil deduzir, de pragmática aplicação da teoria dos contratos plurilaterais.”
PENTEADO. Mauro Rodrigues. Dissolução parcial da sociedade limitada (da resolução da sociedade
em relação a um sócio e do sócio em relação à sociedade). In: RODRIGUES, Frederico Viana
(Coord.). Direito da empresa no novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 275-276.
47

É claro, contudo, que a opção por esta última alternativa estará


sempre na pendência do grau em que tal redução possa afetar o
capital social. É que, muitas vezes, a diminuição poderá ser de tal
ordem que torne inviável o prosseguimento da empresa.73

73FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 27.
48

2 ASPECTOS PROCEDIMENTAIS DA AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE


SOCIEDADE

2.1 A Ação de Dissolução Parcial nas Legislações Pretéritas

A Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, conhecida como Novo CPC ou CPC


de 2015, foi o primeiro instrumento legal a regulamentar especificamente a “ação de
dissolução parcial de sociedade”.

A despeito de alguns juristas considerarem que tal posição teria sido


previamente assumida pelo CPC de 1939, cujos artigos 655 a 674 tratavam a ação
de dissolução de sociedade, inclusive sendo-lhes atribuída ultratividade pelo artigo
1218, inciso VII, do CPC de 1973, razão não lhes assiste.

Conforme bem explicitado por Cassio Scarpinella Bueno74, Priscila M. P.


Côrrea da Fonseca75, Erasmo Valladão e Marcelo Vieira Von Adamek76, o título
XXXVIII daquele diploma legal, intitulado “Da dissolução e liquidação das
sociedades”, regulamentava tão somente a dissolução total das sociedades, isto é,
sua extinção.

Consigne-se que do mesmo mal padecem as disposições insertas em

74 “Em rigor, contudo, aqueles dispositivos não se ocupam com a “ação de dissolução parcial de
sociedades”, mas diferentemente, com a “ação de dissolução de sociedades” ou, como eles são
intitulados, por aquele diploma legislativo, “Da dissolução e liquidação das sociedades”. Dissolução
no sentido de se buscar em juízo a dissolução total da sociedade, isto é, sua extinção e, por isto
mesmo, como quer aquela Lei, sua liquidação.” BUENO, Cassio Scarpinella. Ação de dissolução
parcial de sociedades. In: COELHO, Fábio Ulhoa (Org.). Tratado de Direito Comercial. São Paulo:
Saraiva, 2015, v. 8, p. 391.
75“A dissolução parcial é criação pretoriana. Carece, por essa razão, de regramento processual. Tal

carência tem levado o intérprete a socorrer-se ora das normas pertinentes aos procedimentos da
dissolução total – artigos 655 usque 674 do Código de Processo Civil de 1939 (Decreto- Lei nº 1.608,
de 18 de setembro de 1939) em vigor por força da determinação contida no artigo 1218, VII, da Lei
Processual Civil vigente -, ora daquelas constantes do Capítulo XVII da Lei nº 6404, de 15 de
dezembro de 1976, relativas à dissolução, liquidação e extinção das sociedades por ações (artigos
206 usque 219).” FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de
sócio. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 75.
76 “Apesar disso, nenhuma delas estava autonomamente disciplinada no CPC/1973 e, destarte,

sujeitavam-se ao procedimento comum, ordinário ou sumário, conforme o valor da causa (CPC/1973,


artigo 272).” FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação
de Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros,
2016, p. 17.
49

capítulo XVII da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 197677, pois também versam


sobre a dissolução, liquidação e extinção de sociedades por ações, omitindo-se
acerca de qualquer tipo de previsão sobre a dissolução parcial da sociedade.

Sobre o tema, leciona Priscila M. P. Côrrea da Fonseca:

Sucede, todavia, que nenhum desses diplomas legais amolda-se à


dissolução parcial, já que esta – ao contrário da dissolução total –
não visa à liquidação e à extinção da sociedade, mas apenas à
retirada do sócio descontente, com a consequente apuração de
haveres a este devidos. E essa apuração de haveres não se
confunde, em absoluto, com a liquidação tal qual verificada ao cabo
da existência da sociedade, pois que não objetiva à alienação do
ativo e, tampouco, ao pagamento do passivo. Colima, isto sim –
pode-se afirmar com um certo esforço -, uma liquidação ficta, já que
o pagamento ao retirante é levado a efeito, em princípio,
independentemente de qualquer ato que implique a venda de bens
ou mesmo o pagamento do passivo.78

Parcela doutrinária imputa a ausência de previsão legal do instituto em


instrumentos normativos anteriores ao subdesenvolvimento de que padecia o direito
material à época79. Nesse sentido, apenas a partir do ano de 196080, a “teoria da
preservação da empresa” começou a ser largamente defendida e aplicada tanto pela
doutrina quanto pela jurisprudência, dando azo à positivação da dissolução parcial
de sociedade.81 Por se tratar de inovação jurídica posterior à edição e promulgação

77 BRASIL. Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações.
Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm#:~:text=LEI%20No%206.404%2C%20DE%2
015%20DE%20DEZEMBRO%20DE%201976.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20as%20Sociedades
%20por%20A%C3%A7%C3%B5es.&text=Art.,das%20a%C3%A7%C3%B5es%20subscritas%20ou%
20adquiridas. Acesso em: 14 set. 2020.
78 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, s.p.


79 BUENO, Cassio Scarpinella. Ação de dissolução parcial de sociedades. In: COELHO, Fábio Ulhoa

(Org.). Tratado de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 2015, v. 8, p. 392.


80 “Vale destacar que Trajano de Miranda Valverde, em parecer datado de 1930, já defendia a

possibilidade da dissolução parcial da sociedade, sendo certo que a teoria da preservação da


empresa ganhou força nos anos 1960, mas apenas a partir da década de 1970 o princípio da
preservação da empresa firmou-se em definitivo.” ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de. Sociedade
Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSCHI, Gilberto Gomes et al.
(Coords.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de
Queiroz Pereira Calças. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 549.
81 “O princípio da preservação da empresa, esculpido na doutrina e na jurisprudência principalmente a

partir dos anos 1960, recomenda a dissolução parcial da sociedade limitada, como forma de resolver
conflitos entre os sócios, sem comprometer o desenvolvimento da atividade econômica nem sacrificar
empregos, reduzir o abastecimento do mercado de consumo ou prejudicar pessoas direta ou
50

do CPC de 1939, jamais teria sido considerada pelo Poder Legiferante em seu
ofício, mostrando-se justificável, pois, a inexistência de previsão legal.

Diante de tal situação, passou a jurisprudência a admitir o ajuizamento de


ações de dissolução parcial de sociedade tomando como normas balizadoras os
artigos 655 a 674 do CPC de 1939, que tratavam sobre a dissolução total de
sociedade, moldando-os às peculiaridades do direito material aplicável ao caso em
apreço e, subsidiariamente, valendo-se de normas concernentes ao procedimento
comum ordinário do próprio CPC de 1973.82

Apesar disso, devido à ausência de normas procedimentais capazes de


direcionar inequivocamente o deslinde do feito, eventuais adaptações restaram
facultadas aos magistrados encarregados de apreciar tais demandas, que
promoviam alterações de acordo com seu melhor entendimento, situação que
perdurou até o advento do CPC de 2015, como se verá a seguir.

2.2 A Positivação da Ação de Dissolução Parcial como Procedimento Especial


pelo Código de Processo Civil de 2015

A regulamentação do procedimento da ação de dissolução parcial de


sociedade adveio com a vigência do novo CPC, a partir de seus artigos 599 a 609,
que a enquadraram como um dos procedimentos especiais disciplinados pelo texto
legal.

Como bem ressaltado por Alexandre Ferreira de Assumpção Alves e Allan


Nascimento Turano83, sua qualificação como procedimento especial decorre das
inúmeras especificidades inerentes ao direito material que regula a matéria,
característica que torna inadequada a aplicação de normas referentes ao
procedimento comum, exigindo, dessa forma, a regulamentação por mandamentos
legais próprios e exclusivos.

indiretamente beneficiadas com a empresa.” COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial.
20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, v. 2, p. 445.
82 BUENO, Cassio Scarpinella. Ação de dissolução parcial de sociedades. In: COELHO, Fábio Ulhoa

(Org.). Tratado de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 2015, v. 8, p. 393.


83 ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção; TURANO, Allan Nascimento. Resolução da sociedade

limitada em relação a um sócio e a ação de dissolução parcial. Curitiba: Juruá, 2016, p. 97.
51

A inovação legislativa, contudo, não passou indene de críticas. Nesse sentido,


Erasmo Valladão e Marcelo Vieira Von Adamek tecem severas reprimendas à
técnica legislativa utilizada, indicando que, em verdade, não há qualquer
especialidade no procedimento positivado pelo Novel Codex capaz de fazer jus à
categoria dos “procedimentos especiais”.84.

De outra banda, teria o legislador se afastado de seu real escopo, positivando


normas atinentes ao direito material, dignas de serem categorizadas como
especiais, todavia, que melhor se enquadrariam se inseridas no próprio CC.

Tamanho equívoco incorrido pelo Poder Legislativo há de dar causa a alguns


problemas aos operadores do direito, porquanto, como amplamente sabido, a
aplicação de normas no tempo se diferencia quanto a sua natureza. Consoante o
artigo 14 do CPC, as normas processuais aplicam-se imediatamente aos processos
em curso, peculiaridade não partilhada pelas normas de direito material, o que
inviabiliza, consequentemente, sua aplicação às demandas pendentes.85

A respeito do tema, de opinião diversa perfilha Flávio Luiz Yarshell:

É certo - e isso precisa ser bem destacado - que boa parte das
regras constantes do Projeto, nesse particular, não regula
propriamente o procedimento, isto é, a prática de atos do processo.
Na verdade, em muitos casos, as regras propostas não são sequer
processuais, porque não estabelecem posições jurídicas integrantes
da relação processual. Dessa forma, muitas das normas têm
natureza substancial. Mas isso, embora não seja o ideal, continua a
ser conveniente porque, como dito inicialmente, positiva disciplina
mais moderna e, principalmente, mais segura para os interessados.86

Outro ponto passível de críticas foi a lacuna normativa gerada quanto ao

84 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 18.
85 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de

Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 21.
86 YARSHELL, Flávio Luiz. A opção (feliz) do Projeto de CPC pela disciplina do procedimento

especial de dissolução parcial de sociedade. Disponível em:


http://cartaforense.com.br/conteudo/colunas/a-opcao-feliz-do-projeto-de-cpc-pela-disciplina-do-
procedimento-especial-de-dissolucao-parcial-de-sociedade/7433. Acesso em: 06 nov. 2019.
52

procedimento a ser aplicado nos casos de dissolução total da sociedade. Como


claramente dispõe o artigo 2º, § 1º, da Lei de Introdução às normas do Direito
Brasileiro, a Lei posterior revoga a anterior quando regule inteiramente a matéria de
que tratava a Lei anterior. Com a revogação do CPC de 1973 pelo CPC de 2015,
extinguiu-se a ultratividade atribuída às disposições contidas no CPC de 1939 que
tratavam dos trâmites procedimentais referentes à dissolução total de sociedades,
sem, contudo, regulamentar o tema na legislação vigente.

A solução conferida pela doutrina decorre de interpretação do artigo 1.046, §


3º, do CPC de 2015, que impõe a aplicação do procedimento comum àqueles casos
em que os procedimentos previstos pelos diplomas legais pretéritos não tenham sido
incorporados, como bem disserta Fábio Ulhoa:

De acordo com o CPC, a ação de dissolução de sociedade poderá


seguir o procedimento comum ou especial. Será comum, na hipótese
de dissolução total; e especial, na de dissolução parcial. O artigo
1046, § 3º, do CPC estabelece que “os procedimentos mencionados
no artigo 1218 da Lei nº 5869, de 11 de janeiro de 1973, cujo
procedimento ainda não tenha sido incorporado por Lei submetem-se
ao procedimento comum previsto neste Código.”. A ação de
dissolução total de sociedades enquadra-se perfeitamente na
hipótese desta regra de transição. Seu procedimento está
mencionado no inciso VII do artigo 1218 do Código revogado, e não
foi disciplinado (“incorporado”), desde 1973, por nenhuma outra Lei.
Submete-se assim, a dissolução total ao procedimento comum,
sujeitando-se a dissolução parcial ao especial, por força dos artigos
599 a 609.87

Na opinião de Erasmo Valladão e Marcelo Vieira von Adamek, pecou o


legislador ao não instituir procedimento especial apto a comportar as minúcias
abarcadas pela dissolução total da sociedade, em especial aquelas ligadas à fase de
liquidação, posto que as funções desempenhadas pelo liquidante de forma alguma
se assemelham àquelas desenvolvidas em uma simples liquidação de sentença ou
mero aferimento do quantum debeatur. Em busca de solução, sugerem a importação
das disposições referentes à liquidação convencional das sociedades, previstas nos
artigos 1102 a 1112 do CC, ao âmbito do processo judicial de dissolução total e

87COELHO, Fábio Ulhoa. A dissolução de Sociedades no Código de Processo Civil. In: YARSHELL,
Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário – Volume III. São
Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 166.
53

liquidação de sociedades, conferindo ao liquidante judicial as mesmas atribuições


legais do liquidante convencional, medida que detém amplo assentimento de
Humberto Theodoro Junior.88

Como se pode depreender, o modo pelo qual se deu a positivação do referido


procedimento especial causou ampla divergência doutrinária, arrancando aplausos
de grandes juristas como Flávio Luiz Yarshell e Fábio Ulhoa89, mas também o
descontentamento de notáveis nomes do Direito Societário, como Erasmo Valladão
e Marcelo Vieira von Adamek.

Conquanto o texto legal padeça de algumas falhas, é inegável que


representou grande avanço no que tange ao Direito de Empresa, mormente por ter
tipificado prática que anteriormente só era possível através de entendimento
jurisprudencial e doutrinário, fornecendo sólidos parâmetros aptos a direcionar a
atuação dos julgadores para a apreciação de demandas que versem sobre o tema,
algo que garante maior segurança jurídica ao sistema, bem como fomenta o estudo
doutrinário do tema, o que, em última análise, há de acarretar grande
desenvolvimento e constantes melhoras ao procedimento.

2.2.1 Legitimidade Ativa

Consoante entendimento doutrinário90, a legitimidade ativa pode ser definida


como a qualidade de se apresentar em juízo como demandante decorrente de
intrínseca relação entre o autor e a causa, que se resume na relevância em que o
resultado desta virá a ter sobre sua esfera de direitos, seja para favorecê-la ou
restringi-la.

O CPC, em seu artigo 600, prevê o rol de legitimados a ajuizarem ação de


dissolução parcial de sociedade. Trata-se de nítida norma de direito material inserta
88 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 20.
89 COELHO, Fábio Ulhoa. A dissolução de Sociedades no Código de Processo Civil. In: YARSHELL,

Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário – Volume III. São
Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 171.
90 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual. 6. ed. rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2009, p. 313.


54

em Código de Direito Adjetivo, contudo, com eventual gravame, visto que, como
sustentam alguns autores, tal disposição haveria por alterar o próprio direito material
societário relativo à dissolução parcial de sociedades, afastando-se por completo de
seu objetivo de formulação de normas meramente procedimentais.91

A redação conferida ao inciso primeiro do referido dispositivo atribui ao


espólio a possibilidade de figurar como sujeito ativo da ação de dissolução parcial de
sociedade, desde que a totalidade dos sucessores do de cujus não ingresse na
sociedade, seja por sua livre vontade, seja por vedação instituída por deliberação
dos demais sócios remanescentes.

Na visão de Erasmo Valladão e Marcelo Vieira von Adamek, trata-se de


legitimidade ativa para o ajuizamento de demanda visando à apuração de haveres,
não havendo que se falar em dissolução parcial do liame societário na espécie. Isso
porque, tanto os sucessores quanto o de cujus não integrariam a sociedade, pois
aqueles não teriam adentrado ao quadro societário e este teria deixado o mesmo
após seu falecimento.92

Do mesmo entendimento perfilham Alexandre Ferreira de Assumpção Alves e


Allan Nascimento Turano:

Contudo, é necessário salientar que o legislador foi impreciso e


incorreu em uma série de equívocos. Preliminarmente, o espólio não
possui legitimidade para propositura da ação de dissolução parcial
cujo objeto seja a resolução da sociedade, que não seja de natureza
declaratória. Ora, em regra, o evento morte por si só implica na
extinção parcial do contrato social em relação ao de cujus
(subsistindo todos os efeitos em relação aos demais, por se tratar de
contrato plurilateral). Nos casos em que os sucessores não
ingressam na sociedade, o espólio verdadeiramente só possui

91 “O artigo 600 do CPC trata, em seus diferentes incisos, basicamente da legitimação ativa para a
ação de dissolução parcial lato sensu. E, também neste particular, o tratamento unitário criado para
as demandas de dissolução parcial stricto sensu e de apuração de haveres é pernicioso, sobretudo
porque os incisos foram redigidos de maneira a aparentemente alterar o próprio direito material
societário subjacente, o que não deveria jamais ser a preocupação do legislador no bojo do Código
de Processo Civil.” FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira.
Da ação de Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo:
Malheiros, 2016, p. 33.
92 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de

Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 34.
55

interesse de agir – e, portanto, legitimidade – para propor ação de


dissolução parcial cujo objeto seja a apuração de haveres do sócio
falecido. O mesmo se aplica aos sucessores, quando concluída a
partilha de bens do de cujus.93

Tomando por base o raciocínio previamente elencado, ao interpretar o inciso


II do referido dispositivo, nota-se que, de forma análoga ao anterior, garante aos
sucessores tão somente a legitimidade para a apuração de haveres. Tal conclusão
fundamenta-se no fato de que os sucessores do sócio falecido somente se investem
na posição de sócios, caso admitidos pelo contrato social. Antes disso, detêm tão
somente o direito patrimonial equivalente as suas quotas societárias, motivo pelo
qual se mostra descabida qualquer tentativa de desconstituição do vínculo societário
até então inexistente.

Seu inciso III, qualificado como ilógico por parte da doutrina, dispõe que, nos
casos em que haja previsão expressa de ingresso dos sucessores do de cujus à
sociedade pelo contrato social, se estes enfrentarem oposição pelos sócios
sobreviventes, restará legitimada a sociedade para propor ação de dissolução
parcial de sociedade.

Inicialmente, tendo em vista a nítida inexistência de vínculo societário entre os


sucessores e a sociedade, cristalina se mostra a impossibilidade de ajuizamento de
ação de dissolução parcial de sociedade stricto sensu, revelando-se como real
objeto da ação apenas a apuração de haveres dos herdeiros.

Sua falta de coerência é claramente constatada pelo fato de o legislador


garantir à sociedade a legitimidade de ajuizamento da ação pelo descumprimento de
obrigação prevista em contrato social que fere unicamente direito dos herdeiros.
Seguindo a lógica processual civil, caberia àqueles que foram lesados pelo
inadimplemento impugnarem o ato praticado pelos demais sócios pelo veículo
adequado, qual seja, ação de obrigação de fazer.94

93 ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção; TURANO, Allan Nascimento. Resolução da sociedade


limitada em relação a um sócio e a ação de dissolução parcial. Curitiba: Juruá, 2016, p. 108.
94 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de

Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 35.
56

Avançando com o raciocínio, depreende-se que o intuito da sociedade, ao


ajuizar a ação de dissolução parcial de sociedade nos moldes assinalados, é liberar-
se de sua obrigação de pagar os haveres aos herdeiros do sócio falecido não
admitidos à sociedade, algo que se confunde com o próprio objeto de ação
consignatória em pagamento, mostrando-se desnecessária, dessarte, a inclusão do
inciso ora examinado ao bojo do artigo 600 do CPC.95

Já o inciso IV prevê que, decorridos dez dias do exercício de direito de


retirada pelo sócio retirante sem a alteração contratual de forma consensual, restará
este legitimado a propor demanda de dissolução parcial de sociedade.

Aplaudido por Fábio Ulhoa, entende ele que, nos moldes tipificados, a Lei
estaria a primar pela dissolução extrajudicial da sociedade, entretanto,
demonstrando-se esta infrutífera, assegurou ao sócio retirante a possibilidade de
tutelar seu direito por via judicial, o que lhe é benéfico, pois garante maior
concretude à efetivação do mesmo.96

Discordam Erasmo Valladão e Marcelo Vieira von Adamek, apontando que o


mero exercício do direito potestativo pelo sócio retirante basta para desconstituir seu
vínculo societário com a sociedade. Nesse sentido, a referida disposição poderia
ocasionar o efeito inverso, gerando ao retirante o dever de ajuizar ação de
dissolução parcial de sociedade para desvincular-se, caso não se procedesse com a
alteração do contrato social pelos sócios remanescentes no prazo outorgado.97

Parece assistir razão aos últimos. Ao manifestar o ânimo de exercer seu


direito de retirada, o sócio retirante vale-se de direito potestativo, impondo à
sociedade e aos demais sócios a sujeição a sua vontade. Dessa forma,
independentemente de posterior formalização perante os órgãos competentes ou

95 SCHMITZ, Leonard Ziesemer; BERTONCINI, Rodrigo Junqueira. A ação de dissolução parcial de


sociedades no CPC/2015: aspectos destacados de direito material. Revista de Direito Privado, São
Paulo, v. 70, out. 2016, p. 214.
96 COELHO, Fábio Ulhoa. A dissolução de Sociedades no Código de Processo Civil. In: YARSHELL,

Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário – Volume III. São
Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 151.
97 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de

Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 37.
57

não, o vínculo societário já teria sido extinto, carecendo, portanto, de interesse de


agir para o ajuizamento de demanda que verse sobre dissolução parcial stricto
sensu, haja vista que é impossível desconstituir algo que não mais existe.

Conquanto sob tal vertente careça de condições da ação para o ajuizamento


de ação de dissolução parcial de sociedade stricto sensu, nada impede que se utilize
da mesma em seu sentido lato, visando à apuração de seus haveres, bem como seu
devido pagamento.

Ao condicionar a legitimidade ativa da sociedade à ausência de autorização


legal para a exclusão extrajudicial de sócio, o inciso V do artigo ora analisado
acabou por positivar o entendimento majoritário da doutrina98, que considera como
inexistente o interesse de agir da sociedade nos casos em que se mostra cabível a
exclusão por meios não adjudicatórios.

Nesse sentido, versa Priscila M. P. Côrrea da Fonseca:

A questão referente à falta de interesse de agir na exclusão, mais


frequentemente suscitada em nossos pretórios, diz respeito à
propositura de ação, pela sociedade, tendente à exclusão de sócio,
quando é certo que tal eliminação pode ser alcançada mediante
mera deliberação de sócios. Ora, a falta de interesse processual para
o ingresso daquela demanda, por parte da sociedade é manifesta.
Não por outra razão, o Superior Tribunal de Justiça, examinando
processo em que a sociedade objetivava o afastamento compulsório
do sócio, concluiu ser “desnecessária a tutela jurisdicional para o fim
de excluir a sócia minoritária, visto que isto pode ser feito mediante
simples alteração do contrato social, por deliberação dos sócios que
detenham a maioria do capital”.99

Divergem Erasmo Valladão e Marcelo von Vieira Adamek. Consoante os


autores, a utilização pela via judicial justifica-se pela ausência de prejuízo ou
limitação de ordem processual ao excluendo. Ademais, em certos casos, a
alternativa judicial se mostraria como melhor opção à sociedade e aos demais

98 COELHO, Fábio Ulhoa. A dissolução de Sociedades no Código de Processo Civil. In: YARSHELL,
Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário – Volume III. São
Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 151; NERY JUNIOR, Nelson; ANDRADE NERY, Rosa Maria. Código
de Processo Civil Comentado. 16. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2016. p. 1529.
99 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 92.


58

sócios, em especial em quadros de incerteza, em que o afastamento extrajudicial


intentado poderia ser invalidado posteriormente, deflagrando, com isso, certas
consequências como a reintegração do sócio ao quadro societário, com pagamento
de todos os lucros e benefícios distribuídos no período, sem prejuízo de eventual
indenização por danos morais.100

Assim concluem:

Mesmo diante do CPC/15, continuamos a pensar da mesma forma,


em que pese a maneira infeliz com que se expressou o legislador.
Negar-se aos interessados o recurso à via judicial, em casos onde
exista uma dúvida objetiva acerca do cabimento ou da viabilidade da
exclusão extrajudicial, ou simplesmente porque assim desejam, é
antítese da noção de instrumentalidade do processo e, portanto,
transformar tal instrumento em um fim em si mesmo, dissociado
daquele inerente à boa distribuição da Justiça.101

Superada a questão referente ao interesse de agir para sua propositura,


denota-se que, sob os parâmetros delimitados pelo inciso examinado, a ação de
dissolução parcial de sociedade detém nítido caráter constitutivo-negativo, visto que
visa à desconstituição de vínculo societário firmado com o excluendo.

Por fim, quanto ao seu inciso VI e parágrafo único, não há grandes


considerações a serem tecidas, posto que suas composições apresentam-se como
claras e incapazes de originar pluralidade de vertentes interpretativas.

Trata-se de hipóteses em que o legislador conferiu legitimidade ativa tanto ao


sócio excluído quanto ao cônjuge ou companheiro que detém direito à meação de
participação societária de sócio com quem mantinha relacionamento para
requererem a apuração de seus haveres.

Cumpre consignar que, a respeito de norma heretópica contida em parágrafo

100 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 41.
101 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de

Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 42.
59

único, dissertam alguns autores que teria o condão de revogar norma de direito
material contida em artigo 1027 do CC, autorizando a formulação de pedido de
apuração de haveres tão logo que concretizada a separação judicial de seu ex-
cônjuge ou ex-companheiro.102

2.2.2 Legitimidade Passiva

De acordo com o caput do artigo 601 do CPC, deverão ser citados os sócios e
a sociedade para, no prazo de quinze dias, concordarem com o pedido ou
apresentarem contestação.

Sob a ótica da doutrina, cuida-se de péssima técnica legislativa empregada


pelo legislador. Tamanha reprovação embasa-se em princípio basilar do próprio
Direito Societário, que determina a distinção entre a pessoa jurídica da sociedade e
os sócios que a compõem.

Ao impor a presença de litisconsórcio passivo necessário e unitário, na visão


de Erasmo Valladão e Marcelo Vieira von Adamek, o CPC de 2015 cerrou os olhos
quanto às peculiaridades atinentes ao Direito Material que englobam todos os
possíveis objetos da ação de dissolução parcial de sociedade. Assinalam que tal
máxima é facilmente verificada quando analisada a propositura da referida ação com
escopo de apuração haveres. Como amplamente sabido, por força da teoria do
contrato plurilateral, a sociedade figura como única devedora dos haveres de sócio
que não integra mais seu quadro societário, fazendo-se, dessa forma, inútil a
presença dos demais sócios no polo passivo da demanda, haja vista que não terão
sua esfera jurídica atingida. Assim concluem os referidos autores:

102 “O legislador viu dois interesses confrontados: de um lado, o do cônjuge (ou seus herdeiros) do
sócio no caso de extinção do casamento; e de outro, o da sociedade e dos demais sócios, de ver
preservada a sociedade, blindada em relação às relações conjugais de sócio. Inicialmente, preservou
o segundo interesse (artigo 1.027 CC). Agora, preserva o primeiro (parágrafo único do artigo 600 do
NCPC). Estaria, então, revogado tacitamente o artigo 1.027 do CC? Parece-nos que sim, mas o novo
dispositivo depende de interpretação extensiva, uma vez que trata apenas do interesse do ex-cônjuge
de sócio em caso de extinção da relação, mas não dos herdeiros de tal cônjuge quando da sua
morte. Sendo idênticos os interesses, não se admitem tratamentos diversos. – Pablo Gonçalves
Arruda – A dissolução (total e parcial) de sociedade no novo CPC.” ARRUDA, Pablo Gonçalves e. A
dissolução (total e parcial) de sociedade no novo CPC. Disponível em:
https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI234881,71043A+dissolucao+total+e+parcial+de+sociedad
e+no+novo+CPC. Acesso em: 04 nov. 2019.
60

A solução unitária adotada agora no CPC/2015 traz imenso ônus de


transformar fatidicamente a simples detenção de uma participação
societária em sementeira de ações – o sócio, só porque sócio é e
nada mais, acabará sendo guindado a juízo e sofrendo todas as
restrições e dificuldades daí inerentes, só por ser sócio! E isso ainda
quando porventura tenha ficado vencido, por exemplo, em alguma
deliberação de exclusão de outro membro – não importa! Ainda neste
caso terá de figurar no polo passivo ou ativo da ação só para integrar
relação processual, apesar de não se ter deduzido contra ele
nenhuma pretensão.103

Do mesmo entendimento partilha Priscila M. P. Côrrea da Fonseca:

A legitimidade passiva, nas ações de apuração de haveres


resultantes da retirada, é apenas da sociedade. E não, também, dos
sócios em litisconsórcio necessário, porquanto, nesta, o afastamento
do sócio já se verificou, o mesmo ocorrendo em relação à
modificação do contrato social.104

A despeito da divergência quanto à necessidade de presença dos demais


sócios nos casos em que ainda há de ser apurado o valor devido a ser pago a título
de haveres ao indivíduo que não mais integra a sociedade, perfilham do mesmo
entendimento os autores Alexandre Ferreira de Assumpção Alves e Allan
Nascimento Turano, dispondo que, nos casos em que já houver crédito líquido
exercível pelo sócio ao qual a sociedade se resolveu, deve somente esta ingressar
no polo passivo da demanda.105

Entendo, no entanto, que, embora indiscutível a distinção entre a pessoa

103 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 48.
104 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 105.


105 “No que tange à ação cujo objeto seja tão somente o pagamento dos haveres, entende-se possível

relativizar a supracitada regra, em prol da economicidade processual. Isso porque aqui o direito de
crédito exercível pelo ex-sócio se dá tão somente em face da sociedade, que responde com seu
patrimônio próprio. A via adequada, contudo, não é a da ação de dissolução parcial. Se já há um
crédito líquido exercível pelo sócio ao qual a sociedade se resolveu, o procedimento adequado é o da
execução de quantia certa. Vale ressaltar que o raciocínio não se estende às demandas em que se
apuram os haveres, haja vista a necessidade de participação dos demais sócios no processo, aos
quais se deve garantir o contraditório e a ampla defesa para todos os fins, em especial para eventual
questionamento quanto ao critério e forma de contabilização do montante devido ao sócio ao qual a
sociedade se resolveu.” ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção; TURANO, Allan Nascimento.
Resolução da sociedade limitada em relação a um sócio e a ação de dissolução parcial.
Curitiba: Juruá, 2016, p. 113-114.
61

jurídica da sociedade e a de seus sócios e o fato de que, em última análise, é


apenas o acervo da sociedade que responderá pelo pagamento do quinhão de
patrimônio correspondente à participação societária do sócio retirante, não se pode
negar o interesse dos sócios remanescentes na apuração de haveres e liquidação
da quota social, vez que remanescem na sociedade os demais sócios que são
detentores do quinhão restante do acervo social, além do que podem ter interesses
divergentes ao da sociedade, no que toca à apuração de haveres do sócio retirante.

Neste sentido, decisão do egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP),


em acórdão do ilustre Desembargador Cesar Ciampolini, prestigiando o comando do
artigo 601 CPC:

Ação de apuração de haveres ajuizada por sócios retirantes. Decisão


que declarou os sócios remanescentes da pessoa jurídica partes
ilegítimas. Agravo de instrumento dos autores.
O litisconsórcio passivo necessário entre sócios e sociedade decorre
do artigo 601 do CPC, aplicável tanto à dissolução parcial de
sociedade, quanto à apuração de haveres. Jurisprudência do STJ,
desta 1ª. Câmara Reservada de Direito Empresarial e outros
Tribunais pátrios.
Interpretação sistemática do CPC que conduz à mesma conclusão,
até porque sempre se há de prestigiar interpretação que conduza à
vigência de dispositivo legal (no caso, o artigo 601 do CPC), não ao
contrário. A norma em análise pelo exegeta deve ter seu significado
e seu valor encontrados no contexto da Lei em que inserida, ou no
de todo Direito Positivo: “ Commodissimum est, id accipi, quo res de
qua agitur, magis valeat quam pereat” (prefira-se a inteligência dos
textos que torne viável seu objetivo, em vez da que os reduza à
inutilidade). Segunda linha de fundamentação da reforma da decisão
recorrida buscada na doutrina de CARLOS MAXIMILIANO. Decisão
agravada reformada. Recurso provido.106 (grifos nossos)

Relevante os ensinamentos constantes da declaração de voto convergente


vencedor do eminente Desembargador Marcelo Fortes Barbosa, em que considera
caso de litisconsórcio passivo facultativo, sendo, portanto, possível o litisconsórcio
passivo dos sócios remanescentes:

(...) O CPC de 2015, no “caput” de seu artigo 601, apesar de não ter
sido empregada uma redação clara e direta, continuou prevendo, no

106BRASIL. TJSP. Agravo de Instrumento 2056902-75.2019.8.26.00000; julgado em 21 de agosto


de 2019; 1ª. Câmara Reservada de Direito Empresarial - Rel. Designado Des. Cesar Ciampolini; Fls.
145-155.
62

novo rito especial, a possibilidade de composição plural do polo


passivo da relação processual, trazidos os sócios remanescentes e a
sociedade para responder em juízo pelo pleito de dissolução, mas,
também, trouxe uma inovação importante, no parágrafo único do
mesmo artigo, ao prever, de maneira conjugada, a possibilidade,
como pessoa jurídica, a partir da inclusão de todos seus sócios
remanescentes como réus, efetivada uma excepcional expansão da
eficácia da coisa julgada.
Ficou descaracterizada a hipótese de litisconsórcio passivo
necessário com relação à sociedade; porém, o texto legal, a meu ver,
viabiliza um litisconsórcio facultativo, além de tornar obrigatório trazer
os sócios remanescentes a juízo.
Apesar do desembolso de valores realizado após a apuração de
haveres atingir, por regra, apenas a sociedade (dado, inclusive, o tipo
societário em pauta e o contexto do artigo 1.052 do próprio Código
de 2002), o que lhe confere legitimidade primária, os sócios
remanescentes têm seus interesses patrimoniais reflexamente
atingidos, potencializada a recomposição do capital social da pessoa
jurídica ou a admissão de novo sócio estranho, para ocupar a antiga
posição do retirante. Esta legitimidade dos sócios remanescentes
pode ser resvalada numa atuação substituta da pessoa jurídica, com
caráter exclusivo, sempre presente, de toda maneira, a pertinência
subjetiva.107

Neste julgamento, ao atuar como 4º Juiz, diante da maioria de votos que se


formou em favor da legitimidade passiva dos sócios remanescentes, em declaração
de voto convergente vencedor, reconheci, além do argumento da clara opção
legislativa contida no caput do artigo 601 do CPC, pelo litisconsórcio necessário da
sociedade e dos sócios remanescentes, o seguinte arrazoado que justifica a
inclusão dos sócios remanescentes no polo passivo:

Considerando que uma ação de dissolução parcial acarreta a


modificação da estrutura jurídica da sociedade, é impossível
promover esse tipo de ação sem que todos os quotistas estejam
presentes no feito, sendo eles majoritários, controladores ou
minoritários. Em outras palavras: quando as vinculações de direito
material são tão fortes que a sentença de procedência frente a um
quotista majoritário implica em repercussão no patrimônio jurídico e
na situação de direito material de outro (ou de outros, tenham eles
uma quota ou menos), essa alteração na situação jurídica não
poderá́ ser realizada — sob pena de infringência ao devido processo
legal e ao contraditório — sem que na relação processual estejam os
demais quotistas.108

107 BRASIL. TJSP. Agravo de Instrumento 2056902-75.2019.8.26.00000; julgado em 21 de agosto


de 2019; Declaração de voto convergente do Des. Marcelo Fortes Barbosa.
108 BRASIL. TJSP. Agravo de Instrumento 2056902-75.2019.8.26.00000; julgado em 21 de agosto

de 2019; Declaração de voto convergente do Des. Eduardo Azuma Nishi.


63

No que tange à edição do parágrafo único do mesmo dispositivo, nada


obstante tenha incorporado entendimento jurisprudencial largamente utilizado em
Tribunais Superiores109, equivocou-se o legislador. Conforme dito anteriormente, a
pessoa jurídica da sociedade não se confunde com seus sócios, que podem,
inclusive, possuir interesses díspares e até mesmo contrários aos desta. Dessa
forma, faz-se imprescindível a devida citação da sociedade para a defesa de seus
interesses, não havendo que se falar em presunção de que os mesmos serão
tutelados uma vez presentes todos os seus sócios no polo passivo da demanda.
Errou, assim, por não ter previsto a existência de litisconsórcio passivo necessário
unitário nestes casos.

2.2.3 Objeto

A ação de dissolução parcial de sociedade, conforme texto legal disposto no


artigo 599 do CPC, pode ter como objeto: i) somente a resolução da sociedade, ii)
somente a apuração de haveres ou iii) a resolução da sociedade cumulada com a
apuração de haveres. Quanto à ação que tem como finalidade a obtenção de
sentença constitutivo-negativa, convencionou-se em denominá-la “ação de
dissolução parcial stricto sensu”, com o intuito de diferenciá-la daquela que versa tão
apenas acerca da apuração de haveres, hipótese que, consigne-se, trata de nítida
imprecisão da nomenclatura atribuída ao procedimento.

De plano, ao se efetuar uma breve leitura do texto legal, constata-se que


foram utilizados dois tipos de conjunções entre os incisos pelo legislador, sendo a
primeira encontrada entre os incisos I e II, a conjunção aditiva “e”, e a segunda entre
os incisos II e III, a conjunção alternativa “ou”.

Da forma como elaborada a construção de sua composição, depreende-se


que, por ser possível o ajuizamento de demanda que vise unicamente à dissolução
parcial da sociedade, não mais se mostra como consequência lógica deste processo
a posterior apuração de haveres do sócio que deixa o quadro societário, devendo,

109 AgRg no REsp 947.545/MG, Rel. Min. SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em
08/02/2011, DJe 22/02/2011; REsp 1121530/RN, Rel. Min. MARCO BUZZI, QUARTA TURMA,
julgado em 13/09/2011, DJe 26/04/2012; AgRg no REsp 751.625/RN, Rel. Min. MASSAMI UYEDA,
QUARTA TURMA, julgado em 04/03/2008, DJe 24/03/2008.
64

para tanto, ser formulado pedido expresso pelo autor ou pedido contraposto pelo
réu, não comportando sua determinação de ofício pelo magistrado.

Sobre o tema, dissertam Erasmo Valladão e Marcelo Vieira von Adamek:

Seja como for, assim estruturados os incisos, exsurge a conclusão,


um tanto quanto desconcertante, de que, na ação de dissolução
stricto sensu, a apuração de haveres não é mais consequência lógica
e necessária da resolução do vínculo societário, mas uma pretensão
autônoma a ser eventualmente cumulada à antecedente de
dissolução (e, que, portanto, ao deixar de ser expressamente
deduzida, não poderá mais ser atendida de ofício).110 (grifos nossos)

No mais, em decorrência dos diversos tipos de pedidos possíveis de serem


deduzidos em sede do procedimento especial, pode a ação assumir naturezas
jurídicas distintas a depender do precípuo escopo pelo qual foi ajuizada e,
consequentemente, ao direito material subjacente ao caso.

Assinalam os autores Alexandre Ferreira de Assumpção Alves e Allan


Nascimento Turano que a ação será meramente declaratória caso o autor não mais
integre a sociedade, contudo, tenha sido proposta a fim de que se obtenha o
reconhecimento de tal situação perante o Judiciário. Todavia, se houver pleiteado
cumulativamente por apuração de haveres, a ação passará a ser declaratória-
condenatória.

De outra banda, revestir-se-á como desconstitutiva quando os efeitos da


resolução do contrato de sociedade forem produzidos por meio de decisão judicial
transitada em julgado, como no caso do artigo 600, inciso V, do CPC, que prevê o
ajuizamento da ação pela sociedade com o intuito de excluir sócio pela prática de
atos de inegável gravidade. De forma análoga a anterior, caso haja a cumulação de
pedido requerendo a apuração de haveres, se qualificará como desconstitutiva-

110 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 24.
65

condenatória.111

Por fim, como derradeira observação que merece ser elencada no presente
tópico, mostra-se a possibilidade de a sociedade formular pedidos indenizatórios em
face do sócio que terá seus haveres apurados, que, caso sejam julgados
procedentes, deverão ser deduzidos do montante a ser pago a título de seus
haveres. Trata-se de previsão tipificada pelo artigo 602 do CPC que, inclusive, já era
possibilitada pelo artigo 927 do CC.

2.2.4 Competência

Não há qualquer disposição específica a respeito de qual seria o foro


competente para a propositura da ação de dissolução parcial de sociedade. Por
conta disso, necessário socorrer-se das regras gerais de competência, tratadas nos
artigos 42 a 53 do CPC.

No que tange às ações em que figuram a sociedade e os demais sócios no


polo passivo, diverge a doutrina quanto qual seria o foro competente para a
apreciação da demanda. A primeira vertente, apoiada por Erasmo Valladão e
Marcelo Vieira von Adamek112, Priscila M. P. Côrrea da Fonseca e Theotônio
Negrão113, defende que, como o legislador não definiu a prevalência do foro da sede
da sociedade sobre os demais, cabe ao sujeito ativo, com respaldo no artigo 46, §
4º, CPC, propor a ação no foro de qualquer um dos réus.

Nesse sentido, leciona Priscila M. P. Côrrea da Fonseca:

Entretanto, a despeito da possível conveniência da propositura da


ação da dissolução parcial no foro da sede da sociedade, em razão
da norma do artigo 94, §4º, do Código de Processo Civil, prevalece a
possibilidade de o Autor optar pelo foro do domicílio de qualquer dos

111 ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção; TURANO, Allan Nascimento. Resolução da


sociedade limitada em relação a um sócio e a ação de dissolução parcial. Curitiba: Juruá, 2016,
p. 99-100.
112 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de

Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 29.
113 NEGRÃO, Theotonio. et al. Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 47. ed.

atual. e reformulada. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 130.


66

sócios.114

De outro modo, corrente doutrinária diversa, detentora de adeptos de grande


renome como: Alexandre Ferreira de Assumpção Alves e Allan Nascimento115
Turano, Cássio Scarpinella Bueno116 e Hernani Estrella, perfilha do entendimento de
que a ação sempre deverá ser proposta perante o foro correspondente à sede da
sociedade, nos termos do artigo 53, inciso III, do CPC, ainda que haja pluralidade de
réus na demanda.

Justifica a escolha Hernani Estrella:

A razão que leva a firmar competência pelo lugar onde a sociedade


tenha a sede social é outra e se prende, por um lado, à tutela da
escrituração e arquivo da sociedade, que devem permanecer no
centro principal de seus negócios, e, pelo outro, à própria
conveniência de uma completa verificação de todos os elementos
que podem concorrer para a exata apuração dos cabedais do sócio
egresso. Conciliam-se, assim, os interesses de preservação dos
livros e arquivos, que a Lei substantiva manda ter e conservar, não
apenas a benefício do proprietário, mas, sobretudo, para resguardo
do direito de terceiros com as exigências processualísticas de
apuração da verdade, para realização da justiça.117

Já com relação à hipótese em que figura no polo ativo a sociedade, a opinião


doutrinária se mostra uníssona quanto à necessidade de prosseguimento em
consonância com artigo 46, caput, do CPC, devendo a ação, portanto, ser ajuizada
no foro do domicílio do réu.

2.2.5 Procedimento

A ação de dissolução parcial de sociedade, quando utilizada com o fim de


desconstituição de vínculo societário cumulado com posterior apuração de haveres,
114 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 82.
115 ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção; TURANO, Allan Nascimento. Resolução da

sociedade limitada em relação a um sócio e a ação de dissolução parcial. Curitiba: Juruá, 2016,
p. 115.
116 BUENO, Cassio Scarpinella. Ação de dissolução parcial de sociedades. In: COELHO, Fábio Ulhoa

(Org.). Tratado de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 2015, v. 8, p. 400-401.


117 ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração dos Haveres de Sócio. 5. ed.

atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 162.


67

respeita, no âmbito de sua etapa cognitiva, procedimento bifásico.

Durante a primeira fase, deve ocupar-se o julgador de apreciar todas as


razões que se referem à dissolução parcial da sociedade. Por outro lado, na
segunda fase, cabe ao mesmo o exame das teses relativas à apuração de haveres.
Frise-se que a existência da segunda fase condiciona-se à prolação de sentença
procedente em primeira fase, que reconhece prévia dissolução parcial de sociedade
ou desconstitui o liame societário em debate.

2.2.5.1 Fase de Resolução da sociedade em relação ao Sócio

Neste momento processual, incumbe ao magistrado a análise de todas as


causas suscitadas capazes de ensejar a resolução da sociedade em relação ao
sócio. Não havendo oposição deste ao exercício de tal pretensão, será decretada a
dissolução parcial da sociedade, prosseguindo-se imediatamente à fase de
liquidação, nos termos do artigo 603, caput, do CPC.

Com o intuito de imprimir maior celeridade ao processo, bem como reduzir a


litigiosidade inerente a este tipo de demanda, os legisladores editaram o parágrafo
primeiro, cujo teor exime de condenação em honorários advocatícios e promove o
rateio das custas processuais nos casos em que haja a concordância expressa e
unânime das partes pela dissolução.

Nada obstante a clareza do texto legal, que se refere somente à concordância


quanto à dissolução, defendem Erasmo Valladão e Marcelo Vieira von Adamek que,
nos casos em que houver aquiescência com relação ao pedido de dissolução, mas
não com relação ao de apuração de haveres, haverá litigiosidade na demanda,
cabendo ao magistrado conferir solução à controvérsia em sentença. Dessa forma,
não seria possível a aplicação dos comandos legais que determinam tanto o
prosseguimento imediato para fase de liquidação, quanto a isenção de condenação
em honorários sucumbenciais, que deverão ter seu pagamento imputado ao
68

vencido.118

Discorda Helder Moroni Câmara:

Contudo, o artigo 603 estabelece que a apuração de haveres será


realizada por meio de liquidação, sendo certo que os artigos 609 a
611 deste mesmo CPC/2015 previram duas modalidades de
liquidação: por arbitramento (artigo 610) e pelo procedimento comum
(artigo 611).
E em se tratando de liquidação pelo procedimento comum, que é
regido pelos artigos 318 e seguintes deste CPC/2015, haverá a
prolação de nova sentença, oportunidade na qual poderá haver
fixação de honorários de sucumbência, em que pese terem as partes
concordado com a dissolução (concordam com a dissolução, mas
seguem litigando no tocante à apuração).119

Como se vê, à semelhança do que pensa Cassio Scarpinella Bueno 120, o


autor entende que deverão ser prolatadas duas decisões diversas: a primeira
julgando a dissolução parcial da sociedade e, portanto, de natureza constitutiva, e a
segunda solucionando questão atinente à apuração de haveres e, pois,
condenatória. Assim, verificada a concordância expressa e unânime em relação à
desconstituição do vínculo societário, não há que se falar em condenação em
honorários sucumbenciais naquela, inexistindo óbices, contudo, para que se faça
nesta se verificada a litigiosidade da demanda.

No que tange à impossibilidade do prosseguimento do feito para fase de


liquidação por conta de ausência de consenso quanto ao montante a ser pago a
título de haveres, de entendimento diverso perfilha o TJSP, que, em alguns casos121,

118 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 56.
119 CÂMARA, Helder Moroni (Coord.). Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Almedina,

2016, p. 788-789.
120 120 “Do ponto de vista classificatório tradicional, não há dúvidas, nem para o CPC/1973 e nem para

o CPC/2015, de que a sentença (ou capítulo) relativa à dissolução parcial de sociedade tem natureza
constitutiva, enquanto a sentença (ou capítulo) relativa ao pagamento dos haveres é condenatória.”
BUENO, Cassio Scarpinella. Ação de dissolução parcial de sociedades. In: COELHO, Fábio Ulhoa
(Org.). Tratado de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 2015, v. 8, p. 415.
121 Representação processual. Procuração outorgada pela inventariante, em nome próprio, aos

advogados. Irregularidade sanada com a apresentação de novo instrumento de mandato pelo espólio.
Nulidade inocorrente. Legitimidade passiva. Ação de dissolução parcial de sociedade ajuizada pelo
espólio em face da outra sócia remanescente. Desnecessidade de citação da sociedade, conforme
artigo 601, parágrafo único, do CPC. Dissolução de sociedade. Existência de duas fases distintas.
69

houve por bem apreciar as questões concernentes à apuração de haveres do sócio


durante a segunda fase.

Por fim, disciplina o parágrafo segundo do referido artigo que, havendo


contestação da pretensão do autor, a primeira fase da ação deverá se subsumir ao
procedimento comum, devendo ser aplicada as normas dispostas no capítulo que
trata do procedimento especial somente em sua segunda fase, comumente
denominada como fase de liquidação.

2.2.5.2 Fase de Apuração de Haveres

Por razões didáticas, trataremos da previsão processual pelo CPC/15 da fase


de apuração de haveres no próximo capítulo.

2.2.6 Decisões e Meios de Impugnação

Como já visto em tópico relativo ao estudo do objeto da ação de dissolução


parcial de sociedade, a análise cognitiva realizada pelo magistrado sobre os pedidos
deduzidos pelas partes pode ensejar a prolação de decisões de natureza
declaratória, constitutiva ou condenatória.

Nesse sentido, os veículos processuais adequados para impugnação de


decisão previamente expedida hão de depender de sua natureza jurídica. Ao
analisar o artigo 603, nota-se que, manifestada a aquiescência de ambas as partes
quanto ao pedido de dissolução parcial de sociedade, o magistrado a decretará.

Inteligência dos artigos 603 e seguintes do CPC. A primeira para desconstituir o vínculo societário ou
julgar improcedente o pedido e a segunda, no caso de procedência, de apuração de haveres
(liquidação). Havendo concordância das partes quanto à dissolução, a r. sentença de procedência
deve ser mantida, devendo as demais questões postas no apelo ser discutidas no momento oportuno.
Recurso desprovido. (BRASIL. TJSP. Apelação Cível 1011683-47.2016.8.26.0037; Rel. Araldo
Telles; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de Araraquara - 1ª Vara
Cível; Data do Julgamento: 10/06/2019; Data de Registro: 10/06/2019).
DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE – Duas fases – Exibição dos documentos contábeis,
apuração de haveres e nomeação de perito que se dá na fase de liquidação da sentença (NCPC,
artigos 603 e 604, III) – Apelação improvida Dispositivo: negam provimento. BRASIL. TJSP.
Apelação Cível 4003820-59.2013.8.26.0565; Rel. Ricardo Negrão; Órgão Julgador: 2ª Câmara
Reservada de Direito Empresarial; Foro de São Caetano do Sul - 6ª Vara Cível; Data do
Julgamento:30/08/2017; Data de Registro: 30/08/2017.
70

Tomando por base a redação conferida ao texto legal, tem-se que a natureza
jurídica do pronunciamento exarado pelo juiz em tal momento processual põe fim à
primeira fase do procedimento, classificando-se, portanto, como sentença. Faz-se
conveniente consignar que, como bem pontuado por Alexandre Ferreira de
Assumpção Lopes e Allan Nascimento Turano122, a respectiva decisão somente será
passível de impugnação através de recurso de apelação quando apresentada
contestação, nos termos do artigo 603, § 2º, do CPC. Isso porque, descabida a
manifestação de inconformismo pelas partes frente à decisão que versa acerca de
matéria sobre a qual concordaram expressamente, mostrando-se, dessa forma,
como incontroversa, conforme prevê o artigo 603, caput.

Diferentemente do que ocorre na primeira fase, em que a doutrina se mostra


uníssona ao apontar o recurso de apelação como aquele cabível para a impugnação
do pronunciamento judicial que dissolve a sociedade, na fase de apuração de
haveres, duas são as vertentes defendidas pelos estudiosos.

Representante de corrente minoritária, Helder Moroni Câmara123 sustenta a


possibilidade de que a liquidação dos haveres do sócio se dê pelo procedimento
comum, nos termos do artigo 611 do CPC. Uma vez eleita tal via, haverá,
necessariamente, a prolação de nova sentença extinguindo a fase de apuração de
haveres, que será impugnável por meio de recurso de apelação. Já com relação às
decisões interlocutórias, serão recorríveis por agravo de instrumento somente
aquelas que se enquadrem no rol elencado pelo artigo 1.015 do CPC, interpretado à
luz da teoria da taxatividade mitigada reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça
(STJ).

De outro modo, corrente majoritária da doutrina, apoiada por grandes


expoentes como Alexandre Ferreira de Assumpção Alves124, Allan Nascimento

122 ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção; TURANO, Allan Nascimento. Resolução da


sociedade limitada em relação a um sócio e a ação de dissolução parcial. Curitiba: Juruá, 2016,
p. 130.
123 CÂMARA, Helder Moroni (Coord.). Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Almedina,

2016, p. 788-789.
124 ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção; TURANO, Allan Nascimento. Resolução da

sociedade limitada em relação a um sócio e a ação de dissolução parcial. Curitiba: Juruá, 2016,
p. 130.
71

Turano, Erasmo Valladão125 e Marcelo Vieira von Adamek, defende que, por se
tratar de fase de liquidação de sentença, todas as decisões interlocutórias serão
impugnáveis por agravo de instrumento, nos termos do artigo 1.015, parágrafo
único, do CPC. Nesse sentido, até mesmo a decisão que define a quantia a ser paga
comportaria a interposição de tal recurso, pois, entende parte da doutrina 126, tratar-
se de decisão interlocutória.

Da decisão que deliberar sobre a data da resolução da sociedade ou do


critério de apuração de haveres, a que trata o artigo 604 do CPC, parece-nos ser
cabível agravo de instrumento, embora a hipótese não se enquadre no rol previsto
no artigo 1.015 do CPC, sob o prisma do prejuízo processual. Justifica-se o caráter
excepcional do conhecimento do agravo, uma vez que não é razoável aguardar a
prolação da sentença para posteriormente apreciar questões fundamentais
relacionadas à essência do procedimento especial de apuração de haveres, em
eventual recurso de apelação ou contrarrazões, eis que o resultado da discussão
poderia acarretar a anulação da decisão de primeiro grau com retorno dos autos à
origem para complementação ou refazimento do laudo pericial, o que acabaria por
contrariar a própria razão da inovação do CPC 2015, em atenção à garantia do
princípio constitucional de celeridade processual. Aliás é o que se reconheceu
recentemente no julgamento de repetitivos – Recurso Especial (REsp) 1.696.396 e
REsp 1.704.520 REsp, pelo STJ, em que se concluiu pela possibilidade da mitigação
da taxatividade do artigo 1.015 do CPC.

Não havendo maiores peculiares merecedoras de destaque no que tange à


recorribilidade das decisões prolatadas em sede deste procedimento especial,
passa-se a examinar, por fim, a fase de cumprimento de sentença da ação de
dissolução parcial de sociedade.

125 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 75.
126 “Dessa forma, nos termos do artigo 1.080 do CPC/2015, a decisão que define o quantum debeatur

nesse contexto é interlocutória, impugnável por meio de agravo de instrumento.” TURANO, Allan
Nascimento. Resolução da sociedade limitada em relação a um sócio e a ação de dissolução
parcial. Curitiba: Juruá, 2016, p. 130.
72

2.2.7 Cumprimento de Sentença

Nas ações de dissolução parcial de sociedade cujo objeto seja unicamente a


resolução da sociedade quanto a um de seus sócios, por deter nítida natureza
jurídica de ação constitutivo-negativa ou declaratória, prescinde de instauração de
fase de cumprimento de sentença para que seus efeitos sejam deflagrados, pois sua
eficácia decorre automaticamente do trânsito em julgado da sentença como já
esmiuçado anteriormente.

Assim, somente nas ações que apresentem certa carga condenatória,


decorrente de pedido de apuração e pagamento de haveres, há que se falar em
implementação de cumprimento de sentença. Nesse sentido, caberá ao magistrado
a realização de intimação da devedora, qual seja, a sociedade, na pessoa de seu
advogado, para que proceda com o pagamento espontâneo da quantia determinada,
sob pena de incidência de multa, nos termos do artigo 523, § 1º, do CPC.

Por fim, é conveniente pontuar que, ainda que a sociedade não tenha
integrado no polo passivo da ação de dissolução de sociedade por força de norma
inserta em artigo 601, parágrafo único, do CPC, deverá ser comunicada para que
passe a integrar a relação jurídico processual em nome próprio e, dessa forma,
arque com o pagamento da obrigação, pois se mostra como a única devedora dos
haveres do sócio dissidente ou excluído.
73

3 APURAÇÃO DE HAVERES

Analisamos, no primeiro capítulo, o instituto da dissolução de sociedades,


passando pela construção do conceito de dissolução parcial e examinando cada
uma das hipóteses de dissolução parcial de limitadas; então, tendo em vista o
advento do CPC/15, refletimos sobre a positivação dos aspectos processuais da
dissolução parcial.

O foco do presente capítulo é a consequência lógica da dissolução parcial: a


apuração de haveres. Aqui analisaremos os conceitos e controvérsias que envolvem
o tema, bem como a maneira pela qual o legislador positivou o procedimento da
apuração de haveres no CPC/15.

3.1 Conceito e Natureza Jurídica

Decretada a dissolução parcial da sociedade, seja por determinação judicial


ou em virtude de consenso entre as partes, surge para o sócio que se afasta o
direito de ser reembolsado por sua participação social, sendo a apuração de haveres
o procedimento pelo qual é calculado o montante que lhe será pago. Conforme
ensina Roberta de Oliveira Corvo e Ribas:

[U]ma vez que se tenha por certa a continuação da sociedade após a


saída de determinado sócio, segue-se à apuração dos haveres
sociais deste que se afasta, como efeito imediato e direto daquela
causa. Para se determinar esse quantum debateur, é que deve a
sociedade proceder à apuração de haveres.127 (grifos nossos)

Sinteticamente, afirma Écio Perin que “a apuração de haveres é procedimento


aplicado às hipóteses de dissolução parcial das sociedades para se aquilatar o valor
do sócio pré-morto, dissidente, ou excluído.”128

127 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres: critérios para a sociedade empresária
do tipo limitada. 2008. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 2008, p. 78.
128 PERIN JUNIOR, Écio. A dissolução de sociedade limitada de acordo com o novo Código Civil. In:

ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de (Coord.). Aspectos Jurídicos da Sociedade Limitada. São
Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 335.
74

O cálculo dos haveres e o pagamento do reembolso é a regra. A única


hipótese de dissolução parcial em que não se procede à apuração de haveres diz
respeito à exclusão do sócio remisso, caso em que o crédito detido pelo sócio frente
à sociedade é restrito ao montante por ele integralizado, não havendo que se
calcular o valor de sua participação societária.129

Ainda no que tange ao conceito de apuração de haveres, importante


diferenciá-lo do instituto da liquidação de sociedades, tendo em vista que, por vezes,
referidos conceitos são empregados como sinônimo, sem, contudo, o serem.

Enquanto o objeto da apuração de haveres é a determinação do montante a


ser reembolsado a quem se afasta da sociedade, que continuará exercendo sua
atividade social – do que é possível extrair que o espírito da apuração de haveres é
a preservação da empresa –, a liquidação de sociedade é o processo empregado
para levar o ente social à sua completa extinção.130

Alfredo de Assis Gonçalves Neto, ainda, diferencia os conceitos de apuração


de haveres e de liquidação da quota de sócio. Para o autor, enquanto o primeiro é o
procedimento pelo qual somente se calcula o valor devido ao sócio que se afasta, o
último representa todo o processo de pagamento do montante apurado,
compreendendo os atos empreendidos desde o cálculo até a conversão dos bens
materiais em pecúnia para realizar o crédito do sócio. Nas palavras do comercialista:

129 “Exceção ao disposto no artigo 1.031, no que tange ao ‘balanço especialmente levantado’, é a
hipótese de expulsão do sócio remisso. Nesse caso, não cabe apuração por meio de levantamento
contábil, mas tão somente a verificação do montante do capital integralizado, descontado das
indenizações (despesas, juros de mora) devidas à sociedade pelo atraso no cumprimento do primeiro
dever social (artigo 1.058, CC/2002)” ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de; STEFANO, Marcelle
Silbiger. Questões polêmicas sobre apuração de haveres na dissolução parcial de sociedade limitada
– Análise segundo a Jurimetria. Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da
Arbitragem, v. 65, p. 335.
130 “A apuração de haveres consiste no procedimento judicial em que se apura o valor a ser pago ao

sócio pela sua participação societária, quando do seu afastamento da sociedade. Distingue-se,
portanto, do procedimento de dissolução e liquidação das sociedades porque, ao cabo deste, as
atividades sociais encerram-se e a personalidade jurídica extingue-se; ao passo que, na apuração de
haveres, busca-se exatamente o contrário: a preservação da empresa e a sobrevivência do ente
jurídico, malgrado a ausência de um de seus integrantes.” CHINAGLIA, Olavo Zago. Destinação dos
elementos intangíveis do estabelecimento empresarial e do aviamento na extinção parcial do
vínculo societário. 2008. 169 f. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, São Paulo, 2008, p. 94.
75

Liquidação de quota é termo mais abrangente que apuração de


haveres: enquanto a última limita-se à determinação do valor da
participação, a primeira tem por fim transformar os direitos
patrimoniais abstratos de sócio em prestação pecuniária exigível. Ela
se estende aos atos necessários à conversão da quota liquidanda
em dinheiro para pagamento ao sócio ou, se for o caso, a seus
sucessores, sendo a apuração de haveres uma de suas fases.131-132

Para Hernani Estrella, a diferença entre apuração de haveres e liquidação da


quota reside tanto na natureza da prestação que cada um representa, quanto em
critério temporal que encadeia os dois institutos. Para o autor, enquanto a apuração
de haveres é uma obrigação de fazer – porquanto a sociedade deve promover o
cálculo do montante devido – a liquidação da quota consiste na obrigação de dar a
quantia apurada ao sócio que se afasta, sendo esta uma consequência lógica, e
temporal, da primeira.133

Pois bem. O estudo da apuração de haveres é de extrema importância, uma


vez que o tema é palco de grande parte das desavenças societárias. Na apuração
de haveres verifica-se forte conflito de interesses entre o sócio que se afasta, a
sociedade e os sócios remanescentes, desejando o primeiro a valorização de seus
haveres, enquanto os demais buscam reduzir ao máximo o montante a ser pago. As
discussões envolvem toda a composição do cálculo dos haveres, compreendendo
debates sobre quais bens devem ser considerados e quais critérios contábeis e
financeiros devem ser aplicados.134

131 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis; FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Empresa
Individual de Responsabilidade Limitada e Sociedades de Pessoas. 2. ed. rev., atual. e ampl.
São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. (Tratado de Direito Empresarial; v. 2 / Coordenação
Modesto Carvalhosa), p. 653.
132 A diferença apresentada reside no entendimento do autor, demonstrado na seção 2.2.1.1, de que

as causas de resolução da sociedade em relação a um sócio, previstas nos artigos 1.028 a 1.032 do
CC/02, não versam sobre hipóteses de dissolução parcial, mas sim de mera ruptura do vínculo
societário com consequente liquidação de quota do sócio que se afasta.
133 “A determinação concreta da quota (ou apuração de haveres, como diz a Lei) se resolve num

facere, por força do qual a sociedade (sujeito passivo) tem de fazer quanto caiba, pelo contrato ou
pela Lei, a favor do sócio afastado (sujeito ativo). Para que se chegue a determinar o exato montante
de seus haveres. A liquidação, ou mais designadamente o pagamento, vem a ser a prestação
posterior, que se traduz num dare, cuja exigibilidade não só se subordina ao que houver sido
convencionado, senão ainda tem caráter potencial, já que bem pode suceder inexista crédito algum a
favor do ex-sócio.” (grifos nossos). ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração
dos Haveres de Sócio. 5. ed. atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 82.
134 “A apuração de haveres do sócio sempre foi tema dos mais problemáticos no direito societário,

tendo em vista a natureza multidisciplinar da questão, sendo necessária a composição de elementos


jurídicos, contábeis e financeiros e econômicos, tanto para a determinação da melhor forma de
cálculo do montante devido ao sócio retirante, quanto para a sua efetiva execução, quer pelo perito
76

Tendo em vista que, conforme verificado ao longo do trabalho, a dissolução


parcial foi fruto de criação doutrinária e pretoriana, a apuração de haveres dela
consequente não teve seus procedimentos, critérios e balizas positivados senão
com a promulgação do CC/02. Até então, discutia-se como deveria ser calculado o
reembolso do sócio que se afastasse da sociedade em razão da dissolução parcial –
que, como visto na seção 2.2.1.1., até o advento do CC/02 consistia na dissolução
parcial em sentido estrito, sucedâneo da dissolução total.

A primeira norma que deu breves contornos à apuração de haveres antes do


CC/02 foi o artigo 15 do Decreto nº 3.708/19135, dispositivo que determinava o
pagamento de reembolso ao sócio de sociedade limitada que, discordando de
alteração havida no contrato social, exercesse seu direito de retirada. Referido
dispositivo, ainda, previa que a quantia reembolsada deveria corresponder ao capital
do sócio verificado proporcionalmente no último balanço.

O CPC/1939, em que pese tenha previsto o instituto da apuração de haveres


para os casos de morte ou retirada de sócios, não determinou qualquer
procedimento ou baliza para sua realização. Em seu artigo 668, dispunha o pretérito
diploma processual que: “[s]e a morte ou a retirada de qualquer dos sócios não
causar a dissolução da sociedade, serão apurados exclusivamente os seus haveres,
fazendo-se o pagamento pelo modo estabelecido no contrato social, ou pelo
convencionado, ou, ainda, pelo determinado na sentença”. Percebe-se que a Lei não
determinou qualquer critério ou elucidou quais bens deveriam ser contabilizados no
cálculo, dispondo, somente, que a apuração poderia ser empreendida pelo modo
contratualmente previsto, convencionado pelas partes ou determinado judicialmente.

indicado pelo juízo competente, quer pelas próprias partes envolvidas. A celeuma apenas aumenta
por se tratar da dissolução parcial da sociedade, pois, ao contrário da dissolução total da sociedade
(onde não há continuidade da atividade empresária, tampouco sócios remanescentes), há nítido
conflito de interesses entre o sócio retirante (interessado em receber o valor máximo como haveres) e
a sociedade e sócios remanescentes, (preocupados em perpetuarem a atividade empresarial
perpétua e financeiramente sadia, logo, em pagarem o mínimo possível ao sócio retirante), devendo-
se inibir enriquecimento sem causa por qualquer das partes.” WAISEBERG, Ivo; KUGLER, Herbert
Morgenstern. Apuração de haveres na dissolução parcial envolvendo grupo de sociedades limitadas.
In: YARSHELL, Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário –
Volume III. São Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 327-328.
135 Artigo 15. Assiste aos sócios que divergirem da alteração do contracto social a faculdade de se

retirarem da sociedade, obtendo o reembolso da quantia correspondente ao seu capital, na proporção


do último balanço aprovado. Ficam, porém, obrigados às prestações correspondentes às quotas
respectivas, na parte em que essas prestações foram necessárias para pagamento das obrigações
contrahidas, até a data do registro definitivo da modificação do estatuto social.
77

Já a LSA, nos parágrafos de seu artigo 45, melhor delimitou os procedimentos


e critérios a serem empreendidos para apuração do valor da quota a ser pago ao
acionista dissidente de deliberação da assembleia-geral.

Ainda que tanto o artigo 15 do Decreto nº 3.708/19 e o artigo 45 da LSA


tenham previsto critérios para apuração de haveres, referidos dispositivos não foram
utilizados para calcular o reembolso devido ao sócio em caso de dissolução parcial,
uma vez que, conforme já explanado anteriormente, a dissolução parcial – aqui
referindo-me à modalidade stricto sensu – era sucedâneo da dissolução total.
Dessa forma, entendia-se que, ao sócio que se afastava por dissolução parcial não
poderia ser devido montante diferente do que este receberia em dissolução total,
porquanto esta poderia ser por ele requerida, conforme disposição do artigo 335.5
do CCOM.

Didaticamente, ilustra Roberta de Oliveira Corvo e Ribas que:

A fundamentação da mencionada inaplicabilidade do único critério


até então existente em Lei estava no inciso 5, do artigo 335 do
Código Comercial, que concedia a qualquer dos sócios o direito de
pedir a dissolução total da sociedade. Se o sócio tinha o direito –
concedido por Lei – de dissolver a sociedade quando bem
entendesse e, em decorrência deste ato, receberia saldo em partilha
após liquidação [da sociedade], qualquer causa até então aceita de
dissolução parcial deveria levar o sócio afastado à mesma situação
se dissolução total fosse. Uma vez dissolvida, a sociedade passaria
pelo procedimento de liquidação e o saldo existente após realizado
todo o ativo e pago todo o passivo seria detido pelos sócios em co-
propriedade, até a final partilha. Assim, a dissolução total, como já
antes mencionado, levaria à participação de todos os sócios no
acervo da sociedade após a liquidação. Se, pensava-se, a dissolução
parcial nada mais era do que uma sub-espécie da dissolução total,
nada mais acertado do que concluir que a apuração de haveres
neste caso devesse levar em conta a totalidade do patrimônio social
em liquidação, vez que esse era o direito do sócio em dissolução
total.136

No mesmo sentido, Fabio Toledo Pedroso de Barros:

136RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres: critérios para a sociedade empresária
do tipo limitada. 2008. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 2008, p. 93.
78

Se o contrato social numa sociedade limitada por prazo


indeterminado não previr cláusula permitindo a retirada do sócio com
anuência dos demais, resta a dissolução social nos termos do artigo
335, V, do Código Comercial. Da mesma forma, na sociedade
limitada de prazo determinado, se não houver previsão contratual
possibilitando a despedida do sócio com a concordância dos demais,
impera-se o aguardo do termo final estipulado no prazo de vigência
contratual. Deste exercício do direito de retirada trata o contrato
social, sendo exercido voluntariamente.
Uma vez estipulado contratualmente o exercício do direito de
retirada, deve ser respeitada a liberdade de contratar, a livre iniciativa
das partes fazendo o contrato Lei entre as partes.
Porém, poderá este direito ser exercido através de mandamento
judicial quando tiver origem no abalo da affectio societatis, porquanto
constituir esse elo em elemento essencial do contrato societário.
Neste caso, a intervenção judicial restará consequente de pedido de
dissolução societária e não de retirada. Ou seja, quer-se a dissolução
da sociedade em relação ao sócio e não a simples retirada
voluntária.
[...]
Ao retirar-se o sócio da sociedade deve a ele ser restituído o valor
correspondente à cota social com que colaborou na constituição do
capital social.
Estabeleceu-se que o valor correspondente à cota social do retirante
seria apurado com base no último balanço comercial aprovado por
previsão expressa do artigo 15 do Dec. 3.708/1919.
O contrato social poderá prever o exercício do direito de retirada
voluntário com o reembolso, integral ou parceladamente, do valor
correspondente às cotas sociais daquele que se despede.
Tratando-se de voluntária retirada impera-se a preservação da
autonomia da vontade das partes contratantes, que ao constituírem a
sociedade realizaram o ato jurídico perfeito que será preservado,
posto que se faz Lei entre as partes. Dessa forma, juridicamente
aceitável a cláusula contratual que prevê a forma parcelada do
reembolso ao sócio retirante.
Contudo, tratando-se de direito de retirada exercido fundado na
quebra da affectio societatis, conforme mencionado no capítulo
antecedente, a dissolução – parcial – em relação ao sócio retirante
será efetuada como se de dissolução total tratasse e não uma mera
apuração de haveres do valor das cotas sociais com base no último
balanço aprovado.
Dessa forma, tem-se que, nesse caso, o pagamento do valor do
reembolso há de ser integral e não parcelado, pois se dissolveu a
sociedade em relação ao sócio retirante.137 (grifos nossos)

Esse entendimento – pela não aplicabilidade dos artigos 15 do Decreto nº


3.708/19 e 45 da LSA – foi corroborado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no
julgamento do famoso Recurso Extraordinário (RE) 89.464-SP, no qual pacificou-se

137BARROS, Fábio Toledo Pedroso de. Direito de retirada do sócio na sociedade limitada: o valor do
reembolso. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 770, dez./1999.
79

que na dissolução parcial a apuração de haveres deveria ser realizada conforme


liquidação em dissolução total. O julgado apresentou a seguinte ementa:

COMERCIAL. Dissolução de sociedade limitada. Pedida a dissolução


total por sócio dissidente, não é possível, em princípio, decretar a
dissolução parcial, com simples apuração contábil dos haveres do
autor. Admitida que seja a dissolução parcial em atenção à
conveniência da preservação do empreendimento, dar-se-á ela
mediante forma de liquidação que a aproxime da dissolução total.
Nesse caso, deve ser assegurada ao sócio retirante situação de
igualdade na apuração de haveres, fazendo-se esta com a maior
amplitude possível, com a exata verificação, física e contábil, dos
valores do ativo.138

Sobreveio, então, o CC/02, que, em seu artigo 1.031 passou a regular a


apuração de haveres da seguinte forma:

Artigo 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação


a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante
efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em
contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da
resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
§1º - O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os
demais sócios suprirem o valor da quota.
§2º - A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa
dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual
em contrário.139

Percebe-se que o diploma legal estabeleceu que, preferencialmente, deve


prevalecer a autonomia privada dos contratantes ao determinar que a apuração de
haveres baseada na situação patrimonial da sociedade, verificada em balanço
especialmente levantado, somente teria lugar diante da inexistência de disposição
contratual sobre o tema.

Acerca da autonomia privada para determinar o critério a ser utilizado no


cálculo do reembolso, entende Sérgio Campinho que a disposição contratual deve,
ao menos, utilizar como base a previsão do artigo 1.031, não podendo impor aos

138BRASIL. STF. 2ª Turma; RE n. 89.464-SP; Rel. Min. Décio Miranda; julgado em 12/12/1978.
139 BRASIL. Artigo 1031 da Lei nº 10.406 de 10 de Janeiro de 2002. Disponível em:
https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10669979/artigo-1031-da-lei-n-10406-de-10-de-janeiro-de-
2002#:~:text=1.031.,verificada%20em%20balan%C3%A7o%20especialmente%20levantado. Acesso
em: 14 set. 2020.
80

sócios reembolso inferior ao legalmente garantido.140

Importa salientar, contudo, que a jurisprudência assumiu posicionamento de


que seria aplicado o critério legal – situação patrimonial da sociedade – tanto na
inexistência de disposição contratual, quanto na hipótese desta ser imprecisa ou de
haver discordância entre os sócios quanto à sua aplicação. Segundo Mariana
Pargendler, este entendimento representa grande acerto dos Tribunais, haja vista
que o número de sociedades que preveem em seus contratos sociais cláusula
específica que discipline apuração de haveres não é elevado e, dentre as que
possuem referido regramento, as disposições se mostram insuficientes.141

Em seção posterior, estudaremos os diferentes critérios de avaliação de


empresas, dentre eles o chamado Balanço Patrimonial de Determinação (BPD),
espécie de balanço que se difere dos balanços patrimoniais ordinário e especial. Em
que pese o artigo 1.031 do CC/02 indique que a situação patrimonial da sociedade
deverá ser verificada mediante “balanço especialmente levantado”, a doutrina
compreende que, em verdade, versava o legislador sobre o BPD.142

Importante avanço trazido pelo diploma civil foi a equiparação do direito de

140 “Em nossa opinião, a previsão contratualmente chancelada somente poderá validamente
materializar-se para veicular outra forma de liquidação do valor da quota que garanta valor igual ou
superior àquele apurado segundo a fórmula acima enunciada. Do contrário, a cláusula seria
abusivamente estabelecida, em prejuízo do sócio retirante, excluído ou dos herdeiros, legatários ou
cônjuge meeiro do falecido. Não se pode validar regra que conspire para o enriquecimento ilícito da
sociedade em prejuízo do sócio. Interpretação contrária viria a representar uma inovação na matéria,
eis que a jurisprudência há muito condena qualquer método de apuração de haveres que não se faça
segundo o balanço especial de determinação que reflita os valores reais e atualizados do ativo, sem
qualquer sanção ao sócio ou a seus sucessores ou cônjuge, com a inclusão de todos os bens
corpóreos e incorpóreos da sociedade.” CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do Código
Civil. 13. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2014, p. 131.
141 Ainda que o universo amostral da pesquisa realizada por Mariana Pargendler se mostre reduzido,

é uma boa representação da realidade das sociedades limitadas no Brasil, como corrobora a
experiência prática do tema no Poder Judiciário. De acordo com a autora: “Apenas 52% das 200
sociedades limitadas em exame apresentam regra específica para a apuração e pagamento de
haveres – e, mesmo estas, frequentemente o fazem de forma insuficiente. Cláusulas contratuais que
especifiquem os critérios de cálculo ou ofereçam à sociedade um prazo mais dilatado para realização
do pagamento são absolutamente raras, não obstante a importância destas questões para a
simultânea proteção do sócio e da sociedade.” PARGENDLER, Mariana. O Direito Societário em
ação: análise empírica e proposições de reforma. Revista de Direito Bancário e do Mercado de
Capitais, São Paulo, v. 59, jan./2013.
142 “Note que o Código Civil, no artigo 1.031, fala em ‘balanço especial’, mas o conceitualmente

correto seria falar em ‘balanço de determinação’. O artigo 592 do CPC-projetado corrige a imprecisão
da Lei.” COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação
Legislativa, Brasília, v. 48, n. 190, abr./jun. 2011, p. 147.
81

recesso às demais hipóteses de dissolução parcial, de forma que, atualmente, todas


as causas de dissolução parcial implicam, de acordo com a Lei, a utilização do
mesmo procedimento de cálculo na apuração de haveres.143

A previsão do CC/02, ainda que tenha sido importante e inovadora por


finalmente positivar algum regramento da apuração de haveres em dissolução
parcial, não esclareceu todas as controvérsias sobre o tema. Isso porque deixou de
prever quais bens constantes do patrimônio social devem ser computados no cálculo
dos haveres, bem como não precisou o critério a ser utilizado – mesmo referindo-se
expressamente ao BPD, não indicou os critérios a serem considerados em sua
elaboração – ou estabeleceu de forma clara o significado de “situação patrimonial da
sociedade” – objeto a ser buscado pela apuração de haveres para calcular o
reembolso do sócio.

Nesse sentido, crítica de Alfredo de Assis Gonçalves Neto:

Realmente, o que vem a ser a situação patrimonial da sociedade


verificada em balanço especialmente levantado? Pode-se sustentar
que é um retrato contábil dos valores econômicos que se encontram
escriturados, que nem sempre corresponde ao valor real e efetivo do
patrimônio social; pode-se entender, também, que o termo
“especialmente levantado” indica que devem ser levados em conta
outros elementos que não figuram no balanço ordinário.144

Como será visto em momento posterior do presente estudo, o CPC/15 deu


mais um passo adiante no tema da apuração de haveres, prevendo em seu artigo
606 que devem ser considerados bens e direitos, tangíveis e intangíveis, mediante
BPD para o cálculo do reembolso.

Conforme afirmado anteriormente, a apuração de haveres é matéria na qual

143 Vale anotar o entendimento de Priscila Fonseca, explanado na seção 2.2.1.1, segundo o qual
subsiste a possibilidade de dissolução parcial em sentido estrito nos casos previstos pelos artigos
1.033, III e 1.034, II, ambos do CC/02, cabendo, assim, adoção de apuração de haveres como se de
dissolução total se tratasse. Seguindo a mesma corrente, Alfredo de Assis Gonçalves Neto entende
cabível a dissolução parcial em sentido estrito nas hipóteses de dissolução total previstas pelo
diploma civilista.
144 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis; FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Empresa

Individual de Responsabilidade Limitada e Sociedades de Pessoas. 2. ed. rev., atual. e ampl.


São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. (Tratado de Direito Empresarial; v. 2 / Coordenação
Modesto Carvalhosa), p. 655.
82

reside a grande maioria das desavenças societárias. As controvérsias giram em


torno, principalmente, de dois temas, quais sejam, (i) os critérios de avaliação
aplicáveis e (ii) os bens a serem computados no cálculo. Nos itens a seguir
analisaremos criticamente cada uma das controvérsias apontadas.

3.2 Conceito de Valor e Critérios de Avaliação

Considerando que uma das controvérsias discutidas na apuração de haveres


diz respeito aos critérios utilizados para calcular o reembolso devido ao sócio que se
afasta da sociedade, o presente capítulo será destinado ao estudo de conceitos de
avaliação de empresas que possam esclarecer a discussão sobre o tema.

Antes de analisarmos os métodos de avaliação mais utilizados em apuração


de haveres de sociedades, mister se faz diferenciar os conceitos de valor e preço,
que permeiam todo o debate sobre o valor justo e devido ao sócio.

De acordo com Johannes Hessen, valor “pertence ao número daqueles


conceitos supremos, como os do ‘ser’, ‘existência’, etc. que não admitem definição.
Tudo o que pode fazer-se é simplesmente tentar uma clarificação ou mostração do
seu conteúdo.”145

Essa impossibilidade de se precisar o que é valor confere ao conceito carga


subjetiva e, como veremos a seguir, contribui com a complexidade do processo de
avaliação de empresas. Nesse sentido, ensina Eliseu Martins que:

O processo de avaliação envolve uma série de decisões subjetivas.


A percepção dos agentes perante um empreendimento pode variar.
Enquanto alguns destacam as ameaças, outros enfatizam as
possibilidades de implementação de ajustes estratégicos geradores
de bons retornos. Logo, a identificação do valor de uma empresa
depende tanto do sujeito que a avalia quanto do objeto avaliado.146

145 HESSEN, Johannes. Filosofia dos valores. 5. ed. Coimbra: Arménio Amado, 1980. p. 37. apud.
MARTINS, Eliseu (Org.). Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. 1. ed. 6.
reimpr. São Paulo: Atlas, 2009, p. 15.
146 MARTINS, Eliseu (Org.). Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. 1. ed. 6.

reimpr. São Paulo: Atlas, 2009, p. 263.


83

Importante salientar que o valor das empresas pode ser representado de


diversas formas, a depender do método utilizado para ser calculado, bem como do
objetivo que se almeja refletir.

Não se pode afirmar, dessa forma, que um bem ou uma empresa possui um
valor único e certo: não será único, pois existem diferentes propósitos e facetas que
os mais distintos métodos de avaliação podem captar; também não será
inteiramente certo, pois, como será observado, o seu processo de estimativa é
complexo e eivado de análises subjetivas.147

Por outro lado, o preço é um conceito objetivo e pontual. Ele representa o


montante efetivamente pago ao final de uma negociação de compra e venda entre
partes; é a expressão monetária acordada a ser entregue como contraprestação de
determinado bem ou serviço.

O seguinte exemplo pode demonstrar a diferença entre valor e preço. Em um


antiquário, um broche está exposto à venda por R$1.000,00. Um consumidor, ao
entrar na loja, se depara com o item e, analisando não se tratar de raridade ou peça
fabricada com materiais de alta qualidade, indaga o vendedor se poderia adquirir o
bem por R$200,00. Cada um dos montantes até agora indicados representam
valores que as partes projetaram no bem em análise: enquanto peça pertencente a
diversas gerações de sua família, o broche é de elevada estima ao vendedor, que o
expõe à venda por um valor considerado alto para o possível comprador; por outro
lado, sob a análise subjetiva do cliente, que, sem contar o valor afetivo do bem,
considera em sua estimativa apenas a raridade e a qualidade do item, a peça passa
ao valor referente a um quinto do quanto pretendido pelo vendedor. Após as partes
negociarem, acordam que o bem pode ser adquirido pelo preço de R$500,00, que
finalmente é pago pelo comprador.

Com o exemplo acima, podemos perceber que o valor de um bem pode

147“Ainda, segundo Martinez (1999), não existe um valor ‘correto’ para um negócio. O valor deve ser
determinado para um propósito específico e considerar as perspectivas das partes na transação.
Damodaran (1997) complementa demonstrando que quaisquer percepções que o analista trouxer ao
processo de avaliação acabarão por se incorporar ao ‘valor’.” FAMÁ, Rubens; PEREZ, Marcelo
Monteiro. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Caderno de Pesquisas
em Administração (USP), São Paulo, v. 10, n. 4, out./dez., 2003, p. 48.
84

representar diversos fatores, bem como se encontra sujeito a análises pessoais e de


utilidade do avaliador. Já o preço apresenta-se como figura objetiva alcançada por
negociantes após tratativas sobre um determinado ativo.

Necessário ressaltar que, por óbvio, em processos de avaliação de empresas,


ao contrário do exemplo proposto, a subjetividade do avaliador não reflete seus
gostos íntimos ou pessoais, mas fatores que devem ser considerados na avaliação,
como, por exemplo, a percepção sobre o funcionamento do mercado, a escolha por
um ou outro critério de avaliação, a análise sobre a intensidade dos riscos
envolvidos em uma operação, etc.148

Ainda que algumas variáveis no processo avaliativo estejam sujeitas a


diferentes interpretações, necessário compreender que estão contidas dentro de um
espectro de possibilidades, o que impede que a tomada de decisões do avaliador
fuja demasiadamente do propósito pretendido com a avaliação.

Dessa forma, afirmar que a busca pelo valor de empresas está sujeita à
subjetividade do avaliador não significa dizer que o procedimento e a ciência nele
envolvida não possuem qualquer parâmetro ou baliza, mas sim que existem
diferentes interpretações e escolhas que podem afetar, dentro de um universo
esperado, o resultado da avaliação.

Pois bem. Feita essa distinção, e considerando que no processo de apuração


de haveres buscamos identificar o valor da sociedade para calcular o reembolso do
sócio que se afasta, passaremos agora a analisar os métodos de avaliação de
empresas.

148 “Os métodos econômicos de avaliação de empresas, que constituem etapa fundamental na
avaliação do fundo de comércio, são dotados de grande subjetividade, tendo em vista que muitas das
variáveis utilizadas têm que ser arbitradas de acordo com premissas pré-estabelecidas pelo
avaliador. Dessa forma, a consistência da aplicação de qualquer um desses métodos repousa não na
amplitude de eventuais fórmulas utilizadas, mas na veracidade das premissas adotadas. As variáveis
a serem consideradas são, essencialmente: a) Período de tempo, passados e futuros; b) Parâmetros
de resultados passados, para projeção dos fluxos de caixa futuros; c) Taxas de crescimento dos
resultados sociais (que podem ser negativas); d) Custo do capital, taxas de juros e taxa de risco, que
servirão para descontar os resultados esperados no futuro a valor presente.” CHINAGLIA, Olavo
Zago. Destinação dos elementos intangíveis do estabelecimento empresarial e do aviamento
na extinção parcial do vínculo societário. 2008. 169 f. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008, p. 135.
85

Sobre a avaliação de sociedades, afirma Eliseu Martins que:

Há duas formas de se avaliar uma empresa em circunstâncias


normais:
- pelo seu valor de liquidação ordenada, ou seja, pelo que valem
seus ativos avaliados a preço de venda, diminuídos dos gastos para
se efetuar essa venda (comissão, impostos, transportes etc.) e o
valor necessário para saldar seu passivo para com terceiros; e
- pelo seu valor de funcionamento, que depende basicamente dos
futuros benefícios econômicos que ela é capaz de produzir.
E o valor de uma empresa será, desses dois, o maior. Ninguém
venderia uma empresa em funcionamento por menos do que obteria
se a fechasse; e ninguém cerraria as portas de uma empresa se ela
pudesse ser vendida por valor melhor em pleno funcionamento.149

Essas duas formas de avaliação retratam, respectivamente, o valor


patrimonial – também denominado de contábil – e o valor econômico da sociedade.
No que tange à apuração de haveres, essas diferentes formas de avaliação –
patrimonial/contábil e econômica – refletem diferentes interpretações sobre os
direitos do sócio que se afasta da sociedade. De acordo com Marcus Elidius Michelli
de Almeida e Marcelle Silbiger de Stefano:

Por um lado, a avaliação contábil parte da premissa de que o sócio


que se desvincula da sociedade não pode receber quantia diferente
da que receberia em caso de dissolução total da empresa. Assim, é
realizado um balanço de liquidação com base nos livros contábeis da
sociedade a qual, embora permaneça em plena atividade, é
virtualmente dissolvida para fins de apuração dos haveres do sócio
retirante: [...]
Por outro lado, o método doravante denominado fluxo de caixa
descontado trazido a valor presente resulta de uma avaliação
econômica e dinâmica da empresa, cujo procedimento, segundo
Palepu, Haley e Bernard: ‘is to value the assets of the firm, that is, the
claims of equity and net debt, and then to deduce the value of net
debt to arrive at the final equity estimate’.
Isso quer dizer que a sociedade é avaliada no meio em que está
inserida, levando em consideração o seu atual patrimônio e o
mercado [...].150 (grifos nossos)

No mesmo sentido, explicação de Fábio Ulhoa Coelho sobre as duas classes


de avaliação de empresas:
149 MARTINS, Eliseu (Org.). Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. 1. ed. 6.
reimpr. São Paulo: Atlas, 2009, p. 264.
150 ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de; STEFANO, Marcelle Silbiger. Questões polêmicas sobre

apuração de haveres na dissolução parcial de sociedade limitada – Análise segundo a Jurimetria.


Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem, v. 65, p. 336.
86

Uma quota de sociedade anônima pode ser avaliada segundo duas


perspectivadas diferentes. Em primeiro lugar, pode-se avaliá-la
privilegiando-se a história da sociedade, ou seja, o que ela amealhou
em seu patrimônio, em razão da atividade econômica explorada até o
momento da dissolução; Nesse caso, faz-se a mensuração do valor
patrimonial das quotas. Outra forma de avaliação mira o futuro, e
procura estimar quanto a sociedade tende a gerar de lucros aos seus
sócios num determinado horizonte temporal. É feita, então, a
mensuração do valor econômico das quotas.151

Tanto o valor patrimonial/contábil quanto o valor econômico da empresa


podem ser obtidos por diversos métodos de avaliação. É justamente a escolha
desses métodos, que ora refletem o valor patrimonial da sociedade, ora refletem seu
valor econômico, que gera conflitos em matéria de apuração de haveres.

Nas seções seguintes, analisaremos modelos de avaliação baseados no


Balanço Patrimonial (BP) – que refletem o valor contábil da empresa – bem como no
fluxo de caixa descontado – método avaliativo que traduz o valor econômico da
empresa.

3.2.1 Modelos de Avaliação que refletem o Valor Contábil da Empresa

Dentre os diversos modelos de avaliação, aqueles que refletem o valor


contábil são baseados no BP das empresas. De acordo com ensinamento de Fábio
Ulhoa Coelho, “quando se define o valor patrimonial como critério para a apuração
de haveres, isso significa que a base de cálculo do reembolso será uma rubrica de
um documento contábil, chamado balanço patrimonial.”152

O ponto negativo de se utilizar modelos baseados no BP é que eles


determinam o valor da empresa de um ponto de vista estático, focado em
informações que refletem o passado ou, no máximo, o presente. Além disso, não
levam em consideração fatores que influenciam a atividade empresarial e que não
se encontram expressos na escrituração contábil – como, por exemplo, o
funcionamento do mercado em que a empresa está inserida e seu posicionamento

151 COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação
Legislativa, Brasília, v. 48, n. 190, abr./jun. 2011, p. 145.
152 COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação

Legislativa, Brasília, v. 48, n. 190, abr./jun. 2011, p. 146.


87

frente aos concorrentes, sinergias ou problemas operacionais, questões contratuais


ou de recursos humanos etc. 153

3.2.1.1 Modelo do Valor Contábil

O modelo do valor contábil considera como valor da empresa aquele referente


ao seu próprio patrimônio líquido, que representa, por sua vez, a rubrica do BP
obtida por meio da “soma algébrica dos ativos e passivos exigíveis mensurados em
conformidade com os princípios contábeis tradicionais.”154 É o patrimônio líquido,
portanto, resultado da seguinte equação matemática:

Os balanços utilizados no modelo de avaliação do valor contábil são


denominados “Balanço Patrimonial Ordinário (BPO)” e “Balanço Patrimonial Especial
(BPE)”. Sinteticamente, explica Fabio Ulhoa Coelho que:

O primeiro tipo é o balanço patrimonial ordinário (BPO), que a


sociedade deve levantar no último dia de cada exercício social (que
recai, na maioria das vezes, em 31 de dezembro). O critério
fundamental para a elaboração do BPO é o do “custo de aquisição”.
[...] No BPO, por outro lado, é inadmissível a contabilização, no ativo,
dos chamados intangíveis da empresa, como o valor da marca ou de
uma patente, por exemplo. Assim deve ser, também, em função do
princípio do conservadorismo. [...]
O segundo tipo de balanço patrimonial é o especial (BPE). Difere-se
do ordinário apenas em relação à época do levantamento. O BPE
tem por referência temporal qualquer dia do exercício social, exceto o
último. [...] Quanto aos critérios de apropriação, por isto, o BPE deve
sempre adotar os mesmos empregados no levantamento do BPO,
fundados no princípio do conservadorismo, isto é, a regra geral do
“custo de aquisição” e a inadmissibilidade de contabilização dos
intangíveis, entre outros.155

153 MÜLLER, Aderbal Nicolas. Fluxo de caixa descontado, lucros capitalizados e lucros
excedentes – o desempenho dos modelos de avaliação de empresas. 2003. Tese (Doutorado em
Engenharia de Produção) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2003, p. 37-38.
154 MARTINS, Eliseu (Org.). Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. 1. ed. 6.

reimpr. São Paulo: Atlas, 2009, p. 269.


155 COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação

Legislativa, Brasília, v. 48, n. 190, abr./jun. 2011, p. 147.


88

A principal crítica feita ao modelo do valor contábil reside justamente no fato


de que, como apontado no trecho acima, neste método de avaliação, as operações
são contabilizadas com critérios históricos. Dessa forma, os ativos e passivos –
elementos utilizados para se apurar o patrimônio líquido e, consequentemente, o
valor da empresa – são registrados por seus valores originais, ou seja, sob os custos
históricos pelos quais foram adquiridos, no caso dos ativos, ou formados, no caso
dos passivos.

Marcelo Monteiro Perez e Rubens Famá apontam como limitações da


avaliação patrimonial contábil os seguintes fatores:

Entre os fatores que dificultam a utilização deste método como


indicador efetivo de valor econômico de uma empresa, podem-se
destacar:
- As demonstrações contábeis estão, normalmente, baseadas em
custos históricos, não atribuindo aos ativos seus valores correntes;
- A contabilização de acordo com o princípio de competência,
associada com os conceitos da realização de receitas e da
confrontação de despesas, torna a contabilidade desbalanceada com
relação a alguns direcionadores de valor, como o conceito do valor
do dinheiro no tempo e do risco associado;
- Existem várias operações não registradas nas demonstrações
contábeis tradicionais que, entretanto, são muito relevantes para a
apuração do valor econômico de uma empresa, como operações de
arrendamento mercantil, derivativos, garantias oferecidas, entre
outras, além, é claro, de grande parte dos chamados ativos
intangíveis, em especial o goodwill, que será destacado adiante.156
(grifos nossos)

Conforme tais críticas, a utilização do critério histórico para o registro de


ativos e passivos impede que se verifique o valor atual de tais elementos do
balanço.157

156 FAMÁ, Rubens; PEREZ, Marcelo Monteiro. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de
determinação. Caderno de Pesquisas em Administração (USP), São Paulo, v. 10, n. 4, out./dez.,
2003, p. 50.
157 “Conforme Shanklin, Hunter e Ehlen (2011), o modelo contábil de reconhecimento pelo custo

histórico vigorou por muitos anos. Entretanto, devido a períodos de instabilidade econômica a partir
dos anos 1970 este procedimento passou a receber críticas mais intensas. Nessa década, o FASB,
após estudos e discussões, e, posteriormente, o IASC incorporaram o conceito de valor justo nas
demonstrações financeiras como forma de corrigir limitações e inconsistências do custo histórico
tradicional (SHANKLIN; HUNTER; EHLEN, 2011). Os proponentes do valor justo argumentavam que
os custos históricos dos ativos evidenciados no balanço guardavam pouca relação com o seu valor
atual (POZEN, 2009).” CARÍSSIMO, Cláudio Roberto. Análise da preferência dos peritos
contadores quanto à escolha do método de avaliação de sociedades em perícias de apuração
89

O critério de apuração de haveres do sócio retirante previsto no artigo 1.031


do CC/02, se ausente disposição contratual em contrário, é a “situação patrimonial
da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado”.
A interpretação de tal dispositivo se mostra direta no sentido de se prestigiar, de
forma inequívoca, os dados contábeis para fins de determinação do quinhão da
quota do sócio retirante, devendo um balanço ser especialmente levantado, para a
data da resolução da sociedade em relação ao sócio retirante, com a aplicação de
todos os procedimentos, princípios e normas contábeis aplicáveis ao balanço
ordinário.

Assim, o balanço especial levantado na data da resolução é aquele referido


no CC/02 como aquele a servir para a apuração do quinhão da sociedade que cabe
ao sócio que ser retira da sociedade. Porém, como veremos, a jurisprudência,
anteriormente ao advento do CC/02 e mesmo depois, tem admitido outras formas de
apuração dos haveres do sócio retirante, seja pelas limitações das demonstrações
contábeis de refletir o valor atualizado do patrimônio liquido da sociedade, seja pela
incapacidade de aferir certos elementos que integram o valor econômico do negócio.

3.2.1.2 Modelo do Valor Contábil ajustado e Balanço Patrimonial de Determinação

Assim como no modelo anterior, a avaliação por meio do valor contábil


ajustado considera que o valor da empresa corresponde ao seu patrimônio líquido.
Este modelo, contudo, difere do método anterior pelo fato de prever ajustes e
revisões nos critérios contábeis utilizados a fim de retratar o valor real dos itens do
balanço.

O BPD consiste em um BP levantado especialmente para apuração de


haveres judicial. Este balanço tem como única finalidade identificar o valor da
empresa para que se calcule o reembolso devido ao sócio que se afasta da
sociedade, não afetando em nada a contabilidade regular da empresa – dessa
forma, quando o contador for elaborar outros balanços regulares para a sociedade,

de haveres com base na análise hierárquica (AHP). 2014. Dissertação (Mestrado em Ciências
Contábeis) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014, p. 48.
90

ele deverá ignorar o BPD judicialmente levantado.158

No BPD, assim como no modelo do valor contábil ajustado, e ao contrário do


que se verifica nos balanços patrimoniais ordinário e especial, são utilizados critérios
para avaliar os itens do ativo e do passivo que refletem seus valores de mercado,
utilizando como base de avaliação para os bens e direitos, por exemplo, seu valor
corrente, valor presente, valor de reposição, entre outros.159

Fabio Ulhoa conceitua o BPD da seguinte forma:

O terceiro e último tipo de balanço é o de determinação (BPD). Esse


tipo pode ter por referência temporal qualquer dia do exercício,
inclusive o último. O que o distingue dos demais tipos de balanço são
os critérios de apropriação dos bens e direitos do ativo (e, em alguns
casos, também do passivo). Nele, o contador deita ao largo os
parâmetros ditados pelo princípio do conservadorismo e contabiliza
cada item pelo valor de mercado ou custo de saída; isto é, pelo valor
que cada bem ou direito da sociedade tem ou teria, casso fosse
vendido. [...] O BPD também deve levar em conta os intangíveis da
sociedade e apropriá-los como ativos, pelo valor que teriam no
mercado, caso fossem negociados.160

O critério do artigo 606 do CPC/2015, aplicável para apuração de haveres do


sócio retirante, na falta de estipulação diversa no contrato social, é o do valor
contábil ajustado. O valor patrimonial contábil, apurado na data da resolução da
sociedade perante o sócio que se retira, deverá ser ajustado mediante a avaliação
dos bens, direitos, sejam eles tangíveis e intangíveis, além dos passivos, a preço de
saída ou de realização.

Ainda que a previsão dos ativos e passivos por seus valores reais de mercado
represente avanço, o modelo do valor contábil ajustado ainda é passível de críticas,

158 “Pode-se definir Balanço de Determinação como um balanço patrimonial especial, elaborado para
fins judiciais por perito contábil a partir do balanço patrimonial oficial da empresa, que não afeta a
contabilidade da mesma e é utilizado para determinar o montante dos haveres que cabe ao sócio
dissidente, excluído ou falecido.” FAMÁ, Rubens; PEREZ, Marcelo Monteiro. Métodos de avaliação
de empresas e o balanço de determinação. Caderno de Pesquisas em Administração (USP), São
Paulo, v. 10, n. 4, out./dez., 2003, p. 54.
159 SANTOS, Nivaldo João dos. Metodologia para determinação do valor econômico de

empresas de capital fechado em processos de apuração de haveres de sócio. 2011. Tese


(Doutorado em Engenharia de Produção) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
2011, p. 134.
160 COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação

Legislativa, Brasília, v. 48, n. 190, abr./jun. 2011, p. 147.


91

uma vez que não considera o goodwill da empresa. Nesse sentido, afirma Nivaldo
João dos Santos que:

De fato, o enfoque do valor patrimonial ajustado também não


compreende valores relativos ao goodwill criado, nem incorpora as
sinergias e vantagens de natureza imaterial que se formam pela
operação dos ativos tangíveis ao longo da existência da empresa.161
(grifos nossos)

Eliseu Martins aponta, ainda, que o modelo do valor contábil ajustado,


também denominado de “modelo de avaliação patrimonial pelo mercado”, não
compreende eventuais benefícios futuros que a empresa pode gerar:

Embora válida para um número maior de situações específicas, a


adoção do modelo de avaliação patrimonial pelo mercado costuma
desconsiderar os benefícios líquidos futuros que o conjunto de ativos
e passivos exigíveis seria capaz de gerar. Na realidade, tem
fundamento quando ele é superior ao valor da empresa em
marcha.162

Assim, o BPD compreende a situação patrimonial atual da empresa, bem


como elementos não contábeis, mas que são relevantes para o valor de mercado do
empreendimento. Contudo, este método de avaliação não traduz as expectativas de
lucros futuros que a empresa possa ter, aspecto capturado pela avaliação
econômica da sociedade, analisada a seguir, no item 3.2.2.

3.2.1.3 Modelo do Valor de Liquidação

Como bem sugere a denominação, o modelo do valor de liquidação considera


como valor da empresa aquele obtido como “se essa fosse liquidada, encerrando
suas atividades, com a venda de todos os seus ativos e o pagamento de todas as

161 SANTOS, Nivaldo João dos. Metodologia para determinação do valor econômico de
empresas de capital fechado em processos de apuração de haveres de sócio. 2011. Tese
(Doutorado em Engenharia de Produção) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
2011, p. 65.
162 MARTINS, Eliseu (Org.). Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. 1. ed. 6.

reimpr. São Paulo: Atlas, 2009, p. 270.


92

suas obrigações.”163 Além disso, deve-se subtrair do valor final os gastos


decorrentes do encerramento.

Este método, justamente por não avaliar a empresa em marcha, mas em


liquidação, não compreende o valor do goodwill da sociedade ou o potencial de
geração de benefícios financeiros futuros e acaba por refletir, portanto, o valor
mínimo de uma empresa.

Considerando que, hoje, a dissolução parcial figura como instituto autônomo,


não faz sentido pensarmos, como era a interpretação no passado, que sua apuração
de haveres deve ser realizada como seria no caso de dissolução total da sociedade.
Por isso, o modelo do valor de liquidação não se mostra eficaz para cálculo do
reembolso do sócio que se afasta de sociedade.

Sinteticamente, o ensinamento de Hernani Estrella:

O balanço de liquidação, por seu turno, visa à determinação o mais


possível aproximada do real valor do patrimônio, na data do balanço,
levando em conta a probabilidade de realização do ativo e do que
possa produzir para solução do passivo, ensejando ainda eventual
repartição remanescente. O critério, assim, da enumeração dos
bens, como por igual das avaliações, difere essencialmente do
adotado nas duas espécies precedentes. Como é a perspectiva de
realização (venda) que preside a feitura do balanço de liquidação,
deste se excluem certos bens incorpóreos que aderem à empresa e
comente têm existência e valimento em função dela.164

Modelos de avaliação para determinar o valor econômico de uma empresa


baseiam-se na estimativa dos fluxos de caixa a serem gerados no futuro, trazidos a
valores presentes, descontados a uma taxa condizente com o risco envolvido na
geração de tais fluxos (risco do negócio). São modelos muito aceitos no mercado de
consultoria e largamente aplicados nas avaliações de ativos e avaliações
empresariais, seja no mercado de capitais como no mercado financeiro e nas
operações de aquisições de empresas.

163 MÜLLER, Aderbal Nicolas. Fluxo de caixa descontado, lucros capitalizados e lucros
excedentes – o desempenho dos modelos de avaliação de empresas. 2003. Tese (Doutorado em
Engenharia de Produção) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2003, p. 40.
164 ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração dos Haveres de Sócio. 5. ed.

atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 120.


93

Fábio Ulhoa Coelho destaca que quando a participação societária é objeto de


negociação entre partes racionais e livres, o preço de negociação tende a se
aproximar do valor econômico do negócio. Entende o ilustre professor, no entanto,
não ser esse o valor mais adequado quando a obrigação de pagar pelas quotas
sociais não decorre de negociação racional e livre, mas de um fato jurídico de
natureza não contratual, como a retirada, exclusão ou morte de sócio, mostrando a
sua predileção, nestes casos, pela avaliação patrimonial das quotas. 165 A avaliação
pelo valor econômico, nestes casos, em que o ex-sócio participa dos lucros futuros,
é, na sua visão, incompatível coma ausência da tomada de risco, inerente à toda
atividade ou investimento empresarial.

Damodaran 166explica que "o valor de uma empresa é o valor presente de


seus fluxos de caixa previstos ao longo de sua vida".

As empresas são vistas como sendo geradoras de fluxo de caixa e seu valor
é obtido pelo valor presente desses fluxos, dada uma taxa de desconto. São
modelos que se baseiam em cuidadosas previsões, para cada período, de cada item
financeiro relacionado com a geração de fluxos de caixa correspondentes às
operações corporativas, como por exemplo, o valor das vendas, os gastos com
pessoal, matérias-primas, custos e despesas administrativas, comerciais etc.
Também relevantes e determinantes na projeção do fluxo de caixa as perspectivas
de crescimento e rentabilidade.

As limitações deste método residem nas premissas a serem necessariamente


consideradas pelo avaliador, o que acarreta um elevado grau de subjetividade no
que toca à taxa de desconto, ao horizonte de projeção de tal fluxo de caixa, as taxas
de crescimento e rentabilidade, que definem o fluxo de caixa operacional, e ainda, o
valor residual da empresa ou o valor da perpetuidade. Olavo Chinaglia167 entende
que os benefícios deste modelo superam suas limitações.

165 COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação
Legislativa, Brasília, v. 48, n. 190, abr./jun. 2011, p. 145.
166 DAMODARAN, Aswath. A face oculta da avaliação. São Paulo: Makron Books, 2002, p. 214.
167 CHINAGLIA, Olavo Zago. Destinação dos elementos intangíveis do estabelecimento

empresarial e do aviamento na extinção parcial do vínculo societário. 2008. 169 f. Tese


(Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
94

Por trabalhar com expectativas futuras, a grande dificuldade deste método é


prever com exatidão e antecedência o comportamento futuro das relevantes
variáveis que definem o desempenho dos negócios.

O método do fluxo de caixa baseia-se no conceito do valor do dinheiro no


tempo e na evidência de que um ativo representa o somatório dos valores presentes
de fluxos de caixa futuros.168

Segundo Perez e Famá 169tal método é o que mais expressa os enunciados


da teoria das finanças, posto que evidencia a efetiva capacidade de geração de
riqueza de uma empresa sendo consagrado pelo mercado financeiro e de capitais e
nos processos de fusões e aquisições.

Dentre os modelos mais utilizados estão o do fluxo de caixa livre, o do fluxo


de dividendos, o equity cash flow e o capital cash flow.

3.2.2 Conceito de goodwill e Valor da Empresa

A avaliação baseada no fundo de comércio ou goodwill fundamenta-se no


pressuposto de que a atividade empresarial não se limita aos valores dos ativos e
passivos, devendo-se verificar a existência ou não do chamado efeito sinérgico
decorrente da combinação dos elementos patrimoniais agrupados e organizados
para o exercício da atividade empresarial.

Segundo Ornélas, tal efeito sinérgico é a capacidade que uma empresa


possui de gerar lucros acima do que pode ser considerado normal.170

Segundo Martins, se uma empresa gera lucros tidos como normais e


razoáveis para o setor da atividade em que atua, poucos investidores estariam
dispostos a pagar por ela mais do que gastariam para montá-la, tendendo o valor da

168 GALDI, Fernando C.; LOPES, Alexandro B.; TEIXEIRA, Aridelmo J. C. Análise empírica de
modelos de valuation no ambiente brasileiro: fluxo de caixa descontado versus modelo de ohlson
(riv).(Portuguese). Revista Contabilidade & Finanças - USP, (47), 31-43, 2008.
169 PEREZ, Marcelo M; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de

determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, p. 101-112, 2004.


170 ORNÉLAS, M. M. G. de. Avaliação de sociedades. São Paulo: Editora Atlas, 2001.
95

empresa se restringir àquele representado pelo valor do patrimônio a preços de


mercado. Um investidor estaria disposto a pagar mais do que gastaria para
montagem da empresa somente se o empreendimento fosse capaz de produzir
lucros classificados acima de um padrão mínimo admitido como normal. Se a
expectativa de retorno se situar abaixo desse padrão julgado razoável, o valor da
empresa poderá inclusive não atingir o patrimônio líquido a preços de mercado, de
maneira que uma empresa somente tem seu valor fixado acima do valor de seu
patrimônio líquido se possuir um goodwill, uma mais valia, uma vantagem
competitiva que permita produzir um retorno acima dos resultados operacionais
mínimos do seu setor de atuação.171

Nos dizeres de Perez e Famá, tecnicamente a bibliografia considera goodwill


a diferença entre o Valor Econômico da Empresa e seu Valor Patrimonial a valores
de mercado, de maneira que, são características do goodwill: não estar refletido no
BP, não ser depreciável ou amortizável; e, pertencer à empresa como um todo, não
existindo separadamente.172

O método de avaliação pelo goodwill, considera o conjunto dos ativos e


passivos alocados à atividade empresarial, procurando avaliá-lo em seu conjunto
enquanto atividade organizada, procurando identificar o valor adicional, se existente,
acima da mera somatória dos elementos patrimoniais ativos e passivos expressos
no BPD a valores de mercado.

3.3 Discussão sobre a Inclusão do Fundo de Comércio na Avaliação da Quota


do Sócio Retirante

Existem na apuração de haveres do sócio, por ocasião de sua retirada da


sociedade, interesses natural e obviamente divergentes e em oposição. O da
sociedade e dos sócios que nela remanescem, de um lado, visando a preservação
da atividade empresarial e evitando uma descapitalização pelo pagamento dos

171 MARTINS, Eliseu. Contribuição à avaliação do ativo intangível. Tese (Doutoramento) –


Departamento de Contabilidade da FEA. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1972.
172 FAMÁ, Rubens; PEREZ, Marcelo Monteiro. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de

determinação. Caderno de Pesquisas em Administração (USP), São Paulo, v. 10, n. 4, p. 47-59,


out./dez., 2003.
96

haveres, e, de outro lado, o do sócio retirante que busca o maior valor possível de
seu quinhão na sociedade. Afora os interesses meramente econômico-financeiros
envolvidos, a saída de sócio não raras vezes acarreta ressentimentos que, embora
não devesse afetar o montante dos haveres do sócio retirante, acabam por interferir
na sua escorreita apuração, impondo-lhe adicional dificuldade.

Eduardo Bastos de Barros e Marcia Carla Pereira Ribeiro destacam a


imprecisão da aplicação dos conceitos de fundo de comércio, estabelecimento
empresarial e aviamento pela jurisprudência brasileira.173 Apontam que a maioria
dos doutrinadores nacionais, notadamente os mais antigos, consideram “fundo de
comércio” como sinônimo de “estabelecimento comercial”. Entendem, no entanto,
que hodiernamente o fundo de comércio é empregado com mais frequência para
designar o “goodwill”, isto é o aviamento do estabelecimento, que consiste na
aptidão para produzir bons resultados futuros, levando em consideração diversos
fatores e atributos que o estabelecimento pode apresentar, de forma a torná-lo mais
valioso que a simples somatória do valor conjunto dos bens que o compõem.

Destacam que a jurisprudência acabou por abranger, indevidamente, como


fundo de comércio, ao lado do aviamento, todos os elementos imateriais integrantes
do estabelecimento, como o nome, marca, local, direito ao arrendamento etc.174 A
expressão “fundo de comércio” ora é empregada como sinônimo do estabelecimento
empresarial, que é o conjunto de bens reunidos pelo empresário para o exercício da
empresa, ora como sinônimo de aviamento ou goodwill, que é instituto distinto do
estabelecimento, representado pela capacidade de geração de resultados positivos
que o estabelecimento empresarial em atividade possui, ou o “sobrevalor nascido da
atividade organizacional do empresário relativamente aos bens que compõem o
estabelecimento”, fazendo referência aos dizeres de Fábio Ulhoa Coelho.175

173 BARROS, Eduardo Bastos; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Apontamentos sobre a inclusão do
aviamento no cálculo da apuração de haveres. Revista de Direito Empresarial – RDEmp, Belo
Horizonte, ano 10, n. 3, set./dez. 2013.
174 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 218-224.


175 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, v.1, p.

114.
97

Dado o uso impreciso da expressão “fundo de comércio” que na visão desses


autores restringe-se ao aviamento ou goodwill, preferem se referir a estabelecimento
comercial como o conjunto de bens reunidos pelo empresário ou sociedade
empresária na exata forma estabelecida no artigo 1.142 do CC.176 Entendem mais
preciso denominar aviamento, e não fundo de comércio, dado o uso impreciso desta
expressão, o potencial de geração de negócio do estabelecimento comercial, que é
um atributo do estabelecimento e com ele não pode ser confundido. Para isso,
utilizando o escólio de Bertoldi e Ribeiro177 que entendem que o aviamento é o
sobrevalor verificado com a reunião de todos os bens integrantes do
estabelecimento empresarial que, agrupados, têm o propósito de gerar riquezas,
partindo do pressuposto de que quanto melhor administrados os elementos
integrantes do estabelecimento, maior é a aptidão de obtenção de lucros. Assim, o
aviamento é a mais valia gerada pela expectativa de rentabilidade que é conferida
ao conjunto de bens organizados pelos empresários ou sociedades empresárias
para a exploração da atividade empresarial, o que decorre do fato de que os bens
que compõem o todo que é empregado na atividade empresarial, quando
individualmente considerados não possuem o mesmo potencial de geração de lucros
para o seu proprietário que a sua reunião, organização e exploração ativa fazem
emergir.

Neste contexto, discute-se na doutrina a propriedade da inclusão ou não dos


intangíveis e do aviamento na composição dos haveres do sócio afastado.

Priscila M.O. Corrêa Fonseca defende a não inclusão do aviamento e dos


elementos intangíveis do fundo de empresa, porque entende que com a dissolução
parcial da sociedade deve-se chegar a um resultado mais próximo possível do que
seria a sua dissolução total. A parcela do sobrevalor atribuído ao aviamento, como
ponto comercial, os direitos de propriedade industrial e outros elementos intangíveis
pode prejudicar ou mesmo inviabilizar a continuidade da empresa, produzindo um
efeito contrário daquele almejado com a criação da dissolução parcial, que é a
preservação da empresa. Entende, ainda, que o interesse particular do sócio quando

176 CC – era. 1.142 – “Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para
exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária”.
177 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Curso Avançado de Direito Comercial.

3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 99-100.


98

se retira da sociedade não pode prevalecer sobre o interesse da sociedade, sendo


que, mesmo eventual enriquecimento desta e dos sócios remanescentes às custas
do empobrecimento do sócio afastado, não seria antijurídico. Dizia ainda, em sua
obra178, datada de 2002, que não existia norma legal que dispusesse sobre a
avaliação de bens intangíveis, o que veio a ser posteriormente expressamente
previsto no artigo do 606 do CPC/2015. Entende ainda que os bens intangíveis do
estabelecimento e o aviamento aderem de tal modo à empresa, de maneira que não
podem ser transferidos ou cedidos isoladamente.

Ao contrário da corrente jurisprudência dominante Olavo Chinaglia179 entendia


que a única maneira coerente de avaliar o quinhão do sócio retirante ou excluído
seria considerar o patrimônio social de forma estática, independente da continuidade
dos negócios sociais, devendo ser processada como se dissolução total fosse.
Entendia que não haveria que se falar de bens intangíveis ou em aviamento pois a
premissa da liquidação parcial é o encerramento das atividades sociais em relação
ao sócio que se desliga da sociedade, não havendo razão de se depender de
resultados futuros e incertos. Para ele, a orientação jurisprudencial à época
dominante “é ilógica e frontalmente contrária a Lei”, pois nenhuma forma de balanço,
seja do exercício, seja de liquidação, seja de determinação, teria o condão de
capturar o valor instrumental dos bens integrantes do patrimônio social, razão pela
qual não poderiam de forma alguma os intangíveis e o aviamento integrar a base
dos haveres do sócio retirante.

Entretanto, Olavo Chinaglia180 admite que negar o direito do sócio que se


afasta da sociedade à indenização dos ativos intangíveis e do aviamento, a despeito
de sua provável contribuição para a organização do estabelecimento empresarial,
pode caracterizar injustiça, especialmente se o afastamento tiver sido operado
contra a sua vontade ou de forma abusiva. Entende que o reconhecimento de
indenização do aviamento e dos elementos intangíveis do estabelecimento
178FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2012, p. 219 a 221.
179 CHINAGLIA, Olavo Zago. Destinação dos elementos intangíveis do estabelecimento

empresarial e do aviamento na extinção parcial do vínculo societário. 2008. 169 f. Tese


(Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
180 CHINAGLIA, Olavo Zago. Destinação dos elementos intangíveis do estabelecimento

empresarial e do aviamento na extinção parcial do vínculo societário. 2008. 169 f. Tese


(Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
99

empresarial, que em sua essência significa a antecipação dos lucros futuros da


sociedade, não pode ser feita de forma indiscriminada ao sócio que se desliga, pois
poderia servir a propósitos oportunistas de transformar a mera expectativa de lucros
futuros em disponibilidade atual por meio da extinção parcial do vínculo societário,
citando ensinamento de Hernani Estrella181, segundo o qual, embora a perspectiva
de lucros seja o fim último da celebração de contrato de sociedade comercial, esta
perspectiva poderá não se realizar ou realizar em medida inferior à vislumbrada,
diante de fatores inúmeros dentre os quais a aleatoriedade inerente à toda
especulação mercantil.

Estrella em sua clássica obra sobre apuração de haveres182, além de destacar


a dificuldade de avaliação de um bem intangível, discorre sobre o cabimento da
inclusão do aviamento no cálculo dos haveres do sócio que se retira da sociedade.
Pondera que por ser o aviamento atributo do estabelecimento e por ser inegável que
os intangíveis têm valor econômico, a não consideração no cômputo dos haveres do
sócio que se retira imporia enriquecimento indevido aos sócios remanescentes.
Todavia, este argumento é suplantado pelo princípio da preservação da empresa,
pois a venda de bens materiais para fazer face ao pagamento dos intangíveis
poderia pôr em risco a continuidade dos negócios da sociedade, cuja preservação é
a essência do instituto da dissolução parcial da sociedade, admitida inicialmente
pela jurisprudência e normatizada pelo CPC 2015. Baseado em tal princípio, o
interesse do sócio seria sobrepujado pelo interesse social, estando presentes no
artigo 974 do CC e na Lei de Recuperações e Falências (Lei nº 11.101/2005).
Ademais, se a dissolução fosse total, atributos do estabelecimento como clientela, e
aviamento não seriam convertidos em pecúnia quando da liquidação da sociedade,
razão pela qual não faria sentido que o sócio que se retira recebesse valores a esse
título na dissolução parcial. E arremata Estrella no sentido de que o sócio que se
retira da sociedade não tem o direito de compartilhar dos bens incorpóreos, dentre
os quais o aviamento, pela óbvia consideração de se conservarem integrados na
sociedade enquanto esta não se extinguir.

181 ESTRELLA, Hernani. Apuração dos Haveres de Sócio. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p.
133.
182 ESTRELLA, Hernani. Apuração dos Haveres de Sócio. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p.

194-199.
100

Também Bulgarelli 183nega a inclusão do aviamento no cálculo dos haveres


por poder prejudicar o prosseguimento da atividade empresarial, vital para a
economia, podendo a sua inclusão produzir efeitos contrários à finalidade para a
qual a dissolução parcial foi concebida, que é a preservação da empresa.

Além dos citados autores também contra a inclusão do aviamento nos


haveres do sócio dissidente encontram-se Fábio Ulhoa Coelho, Luiz Autuori, Herman
Junior, Marco Antonio Marcondes Pereira e Marcio Tadeu Guimarães Nunes.

Além dos argumentos já apresentados está o de que não existiria norma legal
que determinasse a avaliação do aviamento quando do desligamento dos sócios.

Henrique Avelino Lana invocando a Análise Econômica do Direito (AED)


entende que, ao incluir o aviamento na apuração do valor da quota do sócio
retirante, estar-se-ia se agindo de forma ineficiente, pois o indivíduo que se
beneficiasse (sócio retirante) ganharia menos do que perderiam os agentes
prejudicados (sócios remanescentes, sociedade empresária e a sociedade em
geral). Ou seja, o benefício trazido para determinado indivíduo de forma
individualizada não seria maior quantitativamente do que o prejuízo ocasionado a
outros agentes econômicos, não se contribuindo para o aumento geral da riqueza
econômica da população.184

Priscila M.O. Corrêa Fonseca elenca as razões daqueles que defendem a


inclusão dos intangíveis185, dentre as quais o enriquecimento indevido da sociedade
e dos sócios remanescentes em detrimento do sócio afastado; o fato de que os bens
intangíveis e o aviamento constituem, em muitos casos, a verdadeira essência de
determinados negócios; e, diante do fato de que o estabelecimento comercial integra
o patrimônio da sociedade.

183 BULGARELLI, Waldirio. O novo direito empresarial. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 178.
184 LANA, Henrique Avelino. Anotações, reflexões e ponderações acadêmicas sobre o aviamento e
sua inclusão nos haveres do sócio que se desliga da sociedade. Revista PGM – Procuradoria Geral
do Município de Fortaleza, 27 mar. 2019. Disponível em:
https://revista.pgm.fortaleza.ce.gov.br/revista1/article/view/5/277 Acesso em: 14 set. 2020.
185 FONSECA, Priscila M. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio. 5. ed. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 219 a 221.


101

Marcus Elidius Michelli de Almeida ao citar as palavras de Alfredo Rocco no


sentido de que “a organização dos vários elementos da produção atinge um certo
grau de eficiência, o valor complexo organizado é superior ao da soma dos
diferentes elementos que o compõem”, destaca a realidade unitária do
estabelecimento que possui valor superior à soma dos registros contábeis dos itens
que o integram. Na sua visão, a apuração deve ser a mais ampla possível, levando o
fundo de comércio, os bens corpóreos e incorpóreos, o goodwill da empresa, sob
pena de trazer distorções, injustiças e verdadeiro enriquecimento sem causa, para
um ou para outro sócio. O aplicador da Lei deve voltar os olhos para critérios de
avaliação que possam identificar o valor real e justo da sociedade, destacando o
critério baseado no fluxo de caixa descontado trazido a valor presente, que se
destaca como sendo uma tecnologia científica contábil capaz de dimensionar a
geração de riqueza de determinado empreendimento. Tal critério é, a seu ver,
compatível com a regra instituída pelo CC, tendo em vista o teor da Resolução nº
1.121/2008 do Conselho Federal de Contabilidade (CFC)186, que estabelece, de
forma expressa, que modelos e conceitos que possam demonstrar de forma mais
apropriada a realidade econômica e financeira da empresa podem ser utilizados na
elaboração das demonstrações contábeis. Ademais, o CC não define os critérios
contábeis para elaboração do BPD, sendo, na sua visão, perfeitamente possível a
utilização do fluxo de caixa para este fim. Arremata concluindo que o critério como
se dissolução total fosse seria o valor de piso, pois ninguém venderia uma empresa
em funcionamento por menos que obteria se a fechasse, mas, dependendo do
negócio em que a sociedade atua, o fluxo de caixa deverá melhor avaliar a
sociedade, diante do pressuposto de que ninguém cerraria as portas de uma
empresa se ela pudesse ser vendida por valor melhor em pleno funcionamento.187

186BRASIL. Resolução CFC nº 1.121/08. Aprova a NBC TG ESTRUTURA CONCEITUAL – Estrutura


Conceitual para a Elaboração e Apresentação das Demonstrações Contábeis. Disponível em:
https://www1.cfc.org.br/sisweb/sre/detalhes_sre.aspx?Codigo=2008/001121&Codigo=2008/001121
Acesso em: 14 set. 2020.
187 ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e

apuração de haveres. In: BRUSCHI, Gilberto Gomes et al. (Coords.). Direito Processual
Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2012, p. 550-553.
102

Olavo Chinaglia em estudo de janeiro de 2008188 apontou corrente


jurisprudencial dominante no sentido de admitir a inclusão do goodwill e dos
elementos intangíveis do fundo de empresa nos haveres do sócio retirante. Nota-se,
no entanto, ao compilar julgados do STJ e tribunais estaduais, que é certo que tal
posição não considerava as alterações na legislação trazidas pelo CC de 2006 e,
mais recentemente, pelo CPC de 2015. A despeito da constatação da corrente
jurisprudencial dominante à época, apontou a sua absoluta inconsistência, vez que
“o conteúdo econômico dos bens intangíveis e do aviamento decorre da sua
instrumentalidade em relação à empresa e da organização do estabelecimento,
pressupondo, portanto, a continuidade das atividades. Sendo assim, o valor dos
mesmos está intrinsecamente associado a – mais do que isso, é uma função
matemática de – perspectiva de resultados futuros da sociedade, sendo que sua
expressão pecuniária não é nada mais do que uma antecipação desses resultados.
“(...) Por outro lado, (...) a atividade e o risco empresarial cessam para o sócio no
exato momento do seu desligamento, de modo que nem as perdas nem os lucros
futuros da sociedade lhe interessam”.189

Os tribunais têm admitido o aviamento na apuração de haveres do sócio que


se retira da sociedade mesmo com o advento do Novo CPC de 2015, apesar deste
trazer, no artigo 606190, o termo “balanço”. A jurisprudência anterior ao Novo CPC
era clara quanto à apuração do “Fundo de Comércio” para a dissolução da
sociedade limitada e assim permanece, mesmo com o advento do CPC de 2015.
Aliás, o Decreto-Lei nº 1.608/1939 (CPC/1939)191 em seu artigo 660, inciso I
também utilizava o termo “balanço da sociedade”, o que continuou ocorrendo com
o CPC de 1973, uma vez que seu artigo 1.218, VIII, determinava que a ação de

188 CHINAGLIA, Olavo Zago. Destinação dos elementos intangíveis do estabelecimento


empresarial e do aviamento na extinção parcial do vínculo societário. 2008. 169 f. Tese
(Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008, p.
104-109.
189 CHINAGLIA, Olavo Zago. Destinação dos elementos intangíveis do estabelecimento

empresarial e do aviamento na extinção parcial do vínculo societário. 2008. 169 f. Tese


(Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008, p.
108.
190 CPC 2015 – “Artigo 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de

apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando -se por
referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a
preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma”.
191 BRASIL. Decreto-Lei nº 1.608, de 18 de setembro de 1939. Código de Processo Civil. Disponível

em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1937-1946/del1608.htm Acesso em: 14 set. 2020.


103

dissolução e liquidação das sociedades continuasse a ser disciplinada pelo


Decreto-Lei nº 1.608/1939. Também, o CC, em seu artigo 1.021, já mencionava o
valor patrimonial, alusão ao valor contábil, para apuração dos haveres do sócio
retirante. Ou seja, essa dissonância entre o texto legal e a visão dos tribunais não
é recente.

É o que mostram os julgados das Câmaras Reservadas de Direito


Empresarial do TJSP:

Sociedade anônima fechada. Dissolução parcial. Antecipação


da apuração de haveres, realizada no curso da instrução probatória.
Produção de perícia contábil, seguida de avaliação do ativo
imobilizado. Apuração de haveres que não poderia ter se fundado no
artigo 45 da LSA. A sociedade familiar em exame, por ser anônima
fechada, tem notoriamente características de limitada, o que leva à
aplicação do artigo 1031 do Código
Civil na apuração dos haveres devidos ao réu. Precedentes desta
Câmara e do E. STJ. Necessária elaboração do balanço especial,
que tem o fim de apurar o valor real da empresa. Provas periciais
realizadas que se afastaram deste método. Anulação da perícia
contábil, por ter observado apenas o disposto no artigo 45 da LSA.
Prova, ademais, que deve ser produzida após a avaliação dos bens
corpóreos e incorpóreos, consoante determina o balanço especial.
Avaliação do ativo imobilizado que deve ser complementada.
Necessária avaliação do fundo de comércio e nova avaliação do
imóvel onde foi estabelecida a sede principal da empresa.
Complementado o laudo referente aos bens corpóreos e incorpóreos,
em liquidação de sentença, nova perícia contábil deve ser realizada
para que se possa, enfim, apurar os haveres devidos ao réu, nos
termos do artigo 1031 do Código Civil. Usufruto que recaiu apenas
nas ações doadas às filhas do acionista fundador, sem qualquer
repercussão na apuração dos haveres devidos ao réu. Sentença
mantida apenas no tocante à dissolução parcial da sociedade com
registro da retirada do réu. Recursos parcialmente providos.192

Agravo de instrumento. Dissolução de sociedade. Impugnação ao


cumprimento de sentença. Apuração de haveres. Insurgência da
agravante quanto à metodologia utilizada pelo perito judicial
Impossibilidade. Balanço especial de determinação utilizado na
elaboração do laudo contábil. Fundo de empresa que foi considerado
no valor intangível apurado. Ciclo futuro. Possibilidade. Precedente
do Superior Tribunal de Justiça. Lei que não explicita critérios
contábeis para o balanço de determinação. Critério de fluxo de caixa
descontado. Proximidade do valor real da sociedade. Confirmação do
método de avaliação do perito. Haveres apurados mantidos.
Ausência de demonstração da existência do passivo fiscal e da

192BRASIL. TJSP. Apelação 0051688-73.2010.8.26.0576; Rel. Des. Alexandre Marcondes; São José
do Rio Preto; 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do Julgamento: 04/02/2019.
104

contingência trabalhista. Inexistência de qualquer prova apta a


afastar as conclusões do perito judicial. Concorrência desleal não
configurada. Abertura de empresa atuante no mesmo ramo de
atividade pela sócia retirante. Migração de clientela que é efeito
natural da concorrência. Recurso improvido.193

DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE


COM APURAÇÃO DE HAVERES. Insurgência que se circunscreve à
indenização do fundo de comércio em sociedade
empresária de médicos. O fundo empresarial (goodwill) normalmente
deve compor o valor dos haveres do sócio, pois constitui ativo
intangível, mas economicamente mensurável. Nas sociedades que
têm por objeto o exercício de profissões regulamentadas, contudo,
deve ser aferida caso a caso a existência de aviamento.
Sociedade de médicos prestadores de serviços reunidos em clínica
tradicional, estabelecida há vinte anos em bom ponto, com sólida
clientela, inclusive de planos de saúde. Existência de aviamento que
se traduz pelo atrativo à clientela decorrente do bom nome, da
tradição e dos contratos de plano de saúde. Abatimento de parte
do aviamento, em razão da clientela que acompanhará o sócio
excluído. Recurso provido em parte. 194 (grifos nossos)

DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE – Desistência do


pedido de dissolução parcial em razão da exclusão do autor do
quadro societário – Sentença que homologou o pedido –
Alegação de ofensa ao artigo 505 do CPC – Inocorrência –
Homologação que ocorreu apenas na sentença, não havendo coisa
julgada anterior – Preliminar rejeitada. REINTEGRAÇÃO DE POSSE
– Sentença de extinção se julgamento do mérito – Matéria objeto da
ação de dissolução parcial de sociedade – Ausência de interesse
processual – Sentença mantida – Recurso improvido. DISSOLUÇÃO
PARCIAL DE SOCIEDADE COM APURAÇÃO DE HAVERES –
SOCIEDADE LIMITADA – Dissolução parcial de sociedade –
Apuração de haveres – Cabimento do balanço
especial de determinação (CC, artigo 1.031, caput) para as
hipóteses de dissolução parcial da sociedade – Método que, para
apurar o valor do fundo de comércio, se utiliza da média histórica dos
lucros operacionais líquidos, do lucro normal, da
taxa de custo de capital próprio e da perpetuidade financeira –
Impropriedade também da apuração com base somente no balanço
patrimonial – Apuração de haveres que deveria ser realizada
mediante balanço especial de determinação – Precedente do STJ –
Sentença mantida – SUCUMBENCIA – Apelantes que sucumbiram
em maior parte – Sucumbência mantida – Recurso improvido.
Dispositivo: negaram provimento ao recurso. 195

193 BRASIL. TJSP. Al. 2246670-88.2-17.8.26.0000; Rel. Des. Hamid Bdine; Barueri; 1ª. Câmara
Reservada de Direito Empresarial; Data do Julgamento: 15/01/2018.
194 BRASIL. TJSP. Agravo de Instrumento 2045721-19.2015.8.26.0000; Rel. Des. Francisco

Loureiro; Santo André; 1ª. Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do Julgamento:
21/10/2015.
195 BRASIL. TJSP. Apel. 0021363-13.2013.8.26.0576; Rel. Des. Ricardo Negrão; São José do Rio

Preto; 2ª. Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do Julgamento: 25/07/2018.


105

Neste acórdão de lavra do Des. Ricardo Negrão, embora se reconheceu a


propriedade da apuração do fundo de comércio, pela previsão expressa no artigo
1.031, caput do CC, baseada na “situação patrimonial da sociedade, verificada em
balanço especialmente levantado, à data da resolução”, e do fato de que o método
de fluxo de caixa descontado é o que melhor reflete o valor econômico da empresa,
entendeu o ilustre magistrado que não há que se adotar tal método do fluxo de caixa
descontado, vez que o “sócio dissidente não responderá pelos insucessos
supervenientes à sua saída, igualmente não pode auferir os supervenientes
sucessos da sociedade”.

Citando artigo de Marcelo Monteiro Perez e de Rubens Famá, que discorre


sobre o método do fluxo de caixa descontado como sendo o “que atende com maior
rigor aos enunciados da teoria das finanças, pois revela a efetiva capacidade de
geração de riqueza se uma empresa”196, reconhece a adequação de tal método para
avaliação de empresas no caso de trespasse, cisão, fusão ou incorporação, “[m]as
justamente por projetar lucros futuros parte da jurisprudência não aceita o método de
fluxo de caixa descontado, partindo da premissa de que se o sócio se retira da
sociedade, não tem direito ao que a sociedade poderá vir a lucrar”197. A decisão cita
julgado do STJ da lavra do Min. Antonio Carlos Ferreira – REsp 907.014/MS, j.
11/10/2011), em que diz que “para a avaliação do fundo de comércio, deverão ser
excluídos os lucros futuros, tendo em vista que, enquanto o sócio excluído não
responderá pelos insucessos supervenientes à sua saída, igualmente não poderá
auferir os supervenientes sucessos da sociedade”.

No mesmo sentido, pela inclusão do fundo de comércio na avaliação da quota


do sócio retirante, é a posição do STJ:

PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL.


AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE LIMITADA
COM APURAÇÃO DE HAVERES. FATOS OCORRIDOS ANTES
DA VIGÊNCIA DO NOVO CÓDIGO CIVIL. INAPLICABILIDADE DA
LEI NOVA. FORMA DE PAGAMENTO DOS HAVERES DO SÓCIO
RETIRANTE. OBEDIÊNCIA AO CONTRATO SOCIAL. JUROS DE

196 PEREZ, Marcelo M; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de


determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, p. 101-112, 2004.
197 PEREZ, Marcelo M; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de
determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, p. 101-112, 2004.
106

MORA A PARTIR DA CITAÇÃO INICIAL. 1. São inaplicáveis


dispositivos do Código Civil de 2002 a fatos constituídos em
momento anterior a sua vigência. 2. "A apuração de haveres -
levantamento dos valores referentes à participação do sócio que se
retira ou que é excluído da sociedade - se processa da forma
prevista no contrato social, uma vez que, nessa seara, prevalece o
princípio da força obrigatória dos contratos, cujo fundamento é a
autonomia da vontade, desde que observados os limites legais e os
princípios gerais do direito" (REsp n. 1.239.754/RS). 3. Nas ações
de dissolução de sociedade com apuração de haveres relativas a
fatos anteriores à vigência do Código Civil vigente, os juros de mora
contam-se desde a citação inicial, mesmo que não tenha ainda sido
quantificada a dívida. 4. Recurso especial parcialmente provido.
Voto. O recurso especial veio fundado na alínea a do permissivo
constitucional e suas razões sustentam negativa de vigência dos
seguintes artigos: 219, caput, do CPC e 405 do Código Civil, bem
como da Súmula n. 163⁄STF, no que diz respeito aos juros
moratórios; 219, § 5º, do CPC quanto à correção monetária; 1.031,
§ 2º, do Código Civil em relação à forma de pagamento dos
haveres; 1.031, caput, do Código Civil no que tange à necessidade
de inclusão de marca, imóvel, estoque, benfeitorias e fundo de
comércio na relação de bens a serem avaliados no processo de
apuração de haveres; 131, 436 e437 do CPC no tocante à nulidade
da perícia realizada; e, finalmente, 435 do CPC no que se refere à
ausência de esclarecimentos por parte do expert a respeito de
questões relevantes para o resultado final da perícia. 198 (grifos
nossos)

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


AGRAVO DE INSTRUMENTO.
1. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE COMERCIAL.
RETIRADA DO SÓCIO DISSIDENTE. APURAÇÃO DE HAVERES.
ABRANGÊNCIA DO FUNDO DE COMÉRCIO. INCIDÊNCIA DA
SÚMULA 83/STJ. 2. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO COM
BASE APENAS NA ALÍNEA A DO PERMISSIVO
CONSTITUCIONAL. APLICAÇÃO DA SÚMULA 83/STJ.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 3. AGRAVO PARCIALMENTE
PROVIDO APENAS PARA A CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL. 1.
Com efeito, a conclusão delineada no aresto impugnado encontra-se
em conformidade com a jurisprudência desta Corte Superior no
sentido de que o fundo de comércio (no qual se inserem os bens
corpóreos) integra a apuração de haveres à época da retirada do
sócio dissidente. Incidência da Súmula 83/STJ. 2. É pacífico, nesta
Casa, que a aplicação da Súmula 83/STJ abrange os recursos
especiais interpostos com amparo nas alíneas a e/ou c do permissivo
constitucional. Precedentes. 3. Agravo interno parcialmente provido
tão somente para a correção de erro material.199 (grifos nossos)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


DIREITO SOCIETÁRIO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE.

198 BRASIL. STJ. REsp: 1413237 SP 2012/0035329-0; Rel. Min. João Otávio de Noronha; Terceira
Turma; DJe 09/05/2016.
199 BRASIL. STJ. AgInt no REsp 1651901 / MT. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL

2017/0021925-5; Min. Rel. Marco Aurélio Bellizze; Terceira Turma; DJe 08/05/2017.
107

APURAÇÃO DE HAVERES. INCLUSÃO DO FUNDO DE


COMÉRCIO. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 1.031, CAPUT, DO CC. NÃO
OCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 7/STJ.
AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O fundo de
comércio integra o montante dos haveres da sociedade
empresária quando da exclusão de sócio. Precedentes. 2. A
revisão do critério adotado pelo Colegiado a quo, para a fixação dos
honorários, demandaria nova incursão no acervo fático-probatório da
causa, o que é vedado em âmbito de especial, atraindo a incidência
da Súmula 7 deste Tribunal. 3. Agravo regimental a que se nega
provimento.200 (grifos nossos)

EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO NO RECURSO


ESPECIAL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E
DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE COMERCIAL.
ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL. COMPOSIÇÃO DO
PATRIMÔNIO. - O estabelecimento empresarial (fundo de
comércio) deve ser considerado para fins de apuração dos
direitos do sócio retirantes. - Agravo no recurso especial não
provido.201 (grifos nossos).

DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES.


FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE DO ACÓRDÃO. JULGAMENTO
EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. INCLUSÃO DOS FUNDOS DE
COMÉRCIO E DE RESERVA E DOS DIVIDENDOS DENTRE OS
HAVERES. INTERESSE DE AGIR. SÓCIO RETIRANTE.
EXISTÊNCIA AINDA QUE A SOCIEDADE E O SÓCIO
REMANESCENTE CONCORDEM COM A DISSOLUÇÃO. OFENSA
AO CONTRATO SOCIAL. INVIABILIDADE DE EXAME NO
RECURSOESPECIAL. ENUNCIADO Nº 5 DA SÚMULA/STJ.
JUROS MORATÓRIOS. INCIDÊNCIA. CARACTERIZAÇÃO DA
MORA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. SUCUMBÊNCIA
PARCIAL. ARTIGOS 20, 21, 131, 165, 293, 458-
II, 460, CPC, 668, CPC/1939, 955, 960, 963, CC. RECURSO
DESACOLHIDO202

DIREITO EMPRESARIAL. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE


SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA.
SÓCIO DISSIDENTE. CRITÉRIOS PARA APURAÇÃO DE
HAVERES. BALANÇO DE DETERMINAÇÃO. FLUXO DE CAIXA.
1. Na dissolução parcial de sociedade por quotas de
responsabilidade limitada, o critério previsto no contrato social
para a apuração dos haveres do sócio retirante somente
prevalecerá se houver consenso entre as partes quanto ao
resultado alcançado.
2. Em caso de dissenso, a jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça está consolidada no sentido de que o balanço de

200 BRASIL. STJ. AgRg no AREsp 78175 / MS AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM


RECURSO ESPECIAL 2011/0191536-3; Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma; DJe 24/09/2015.
201 BRASIL. STJ. AgRg no REsp 1147733 / BA AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL

2009/0129485-8; Rel. Min. Nancy Andrighi; Terceira Turma; DJe 21/09/2012.


202 BRASIL. STJ. REsp: 271930 SP 2000/0080731-1; Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira,

Quarta Turma, Data de Publicação: DJ 25/03/2002, p. 290.


108

determinação é o critério que melhor reflete o valor patrimonial da


empresa.
3. O fluxo de caixa descontado, por representar a metodologia
que melhor revela a situação econômica e a capacidade de
geração de riqueza de uma empresa, pode ser aplicado
juntamente com o balanço de determinação na apuração de
haveres do sócio dissidente.
4. Recurso especial desprovido.203 (grifos nossos)

Esta decisão não só admite a adoção da metodologia do fluxo de caixa


descontado na apuração do BPD para fins de apuração dos haveres do sócio
retirante, por entender que melhor revela a situação econômica da empresa e a sua
capacidade de geração de riqueza, como valida o critério previsto em contrato
social apenas se houver consenso entre as partes quanto ao resultado alcançado na
apuração dos haveres.

Segundo a ilustre Min. Nancy Andrighi:

O atual posicionamento doutrinário e jurisprudencial dominante


acerca da apuração de haveres na dissolução parcial de sociedades
por quotas de responsabilidade limitada tem como pilar central o
julgamento, pelo STF, do RE 989.464/SP, 2ª. Turma, Rel. Min.
Cordeiro Guerra, Rel. p/ acórdão Min. Décio Miranda, DJ de
04.05.1979, no qual ficou decidido que “deve ser assegurada ao
sócio retirante situação de igualdade na apuração de haveres,
fazendo-se esta com a maior amplitude possível, com a exata
verificação, física contábil, dos valores do ativo”.204

O raciocínio então desenvolvido foi de que se deveria conceber uma forma de


liquidação que assegurasse, concomitantemente, a preservação do empreendimento
e uma situação de igualdade entre os sócios. “(...) O STJ, ao assumir o papel
unificador da legislação infraconstitucional, ratificou o entendimento, fixando que, “na
dissolução de sociedade de responsabilidade limitada, a apuração de haveres (...)
há de fazer-se como se dissolução total se tratasse”, salientando-se que a medida
“tem por escopo preservar o quantum devido ao sócio retirante (...), evitando-se o

203 BRASIL. STJ. REsp 1335619/SP, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão - Min. JOÃO
OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 27/03/2015.
204 BRASIL. STJ. REsp 1335619/SP, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão - Min. JOÃO

OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 27/03/2015.


109

locupletamento indevido da sociedade ou sócios remanescentes em detrimento dos


retirantes”.205

Nesse contexto – e em respeito à premissa adrede fixada, de preservação da


sociedade e do montante devido ao sócio dissidente – “mesmo que o contrato
social eleja critério para a apuração de haveres, este somente prevalecerá
caso haja a concordância das partes com o resultado alcançado”.206 (grifos
nossos).

Por esta decisão, a rigor, tira-se o caráter vinculante do quanto estipulado


pelos sócios no contrato social, em evidente contrariedade ao texto legal, seja o do
artigo 606 CPC quanto o do artigo 1.031 do CC, vez que em tais diplomas se
estampa a prevalência do quanto estipulado pelos sócios, no contrato social.

Em tal julgado, entretanto, relevante ressaltar a posição divergente do


eminente Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, no sentido de que há nítida ofensa ao
artigo 668 do CPC 1939, ressalvando se tratar de normas de direito material,
aplicável aquelas situações à época dos fatos e não as contemporâneas ao
julgamento da causa. Assim, refere-se ao artigo do CPC 1939, que dispunha
expressamente que os haveres deveriam ser pagos pelo modo estabelecido no
contrato social, ou pelo convencionado, aliás, a teor do que dispõe os atuais artigos
1.031 do CC e 606 do CPC. Prossegue dizendo que: “[h]á, também, clara violação
dos preceitos legais que regem o princípio do pacta sunt servanda, que como
cediço, assumem superlativa relevância quando se trata de relações inseridas no
âmbito do direito empresarial”.207 (grifos nossos)

Reproduz as lições de Hernani Estrella e Caio Mário da Silva Pereira, que


entende atuais e com adequação perfeita ao tema em debate:

205 BRASIL. STJ. REsp 35.702/SP, 3ª. Turma, Rel. Min. Nilson Naves, DJ de 04/08/1997; REsp
105.667/SC, 4ª. Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ de 06.11.2000; e REsp 197.303/SP, 4ª. Turma,
Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 15.04.2002.
206 BRASIL. STJ. REsp 1335619/SP, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão - Min. JOÃO

OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 27/03/2015.


207 BRASIL. STJ. REsp 1335619/SP, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão - Min. JOÃO

OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe 27/03/2015.


110

(...) Finalmente, também a revisão do contrato deve ser evitada


porque, se a estipulação não contém vício algum e é
suficientemente clara quanto às obrigações dos estipulantes,
toda a intervenção judicial acabará por deformá-la, com perigo
de comprometimento da estabilidade e segurança das relações
jurídicas. Precavenham-se os magistrados contra certos
postulantes que, tomando ares de vítimas, lhes suplicam os
libere de compromisso conscientemente assumidos, em nome
da pretensa espiritualização ou humanização do direito. Pois se
é inegável a valia de todos aqueles princípios e instituições que
contribuem para o aprimoramento da justiça, também é inegável
que, se não forem manejados com muita circunspeção e
prudência, podem levar a consequências porventura mais
perniciosas.208 (grifos nossos)

São de transcrever-se aqui estas agudíssimas observações de Caio Mário da


Silva Pereira:

Sempre que um indivíduo não retirar da convenção livremente


pactuada o interesse que inicialmente supunha obter; sempre que
um verificar que o contratante sacou melhor proveito que ele da
recíproca obrigação ajustada – erguerá os braços para o céu, e
clamará que foi lesado. (...) Ter-se-á assim, sob pretexto de
resguardar a regra moral e restabelecer a justiça no contrato,
um resultado que na essência é divorciado da mesma regra
moral e atentatório da mesma justiça. Uma vez que o direito
positivo forneça o meio de faltar o contratante à fé jurada, e
venha em abono da atitude assumida pela parte inadimplente, é
todo o comércio jurídico que sofre, é a insegurança que se
institui como norma, é a infidelidade protegida pela Lei que
abala e ameaça todo do edifício do direito obrigacional,
lançando o germe da desconfiança e do receio nos meandros da
vida econômica. Se o pretexto de fazer justiça é que leva à
própria injustiça e se é o direito que consagra a quebra da
fidelidade sob calor de afinar-se com a regra moral, no fundo
quem se desprestigia é a justiça e quem se desvaloriza é o
direito.209 (grifos nossos)

Cita, ainda, a orientação da corte em prestígio do princípio da força


obrigatória dos contratos na apuração de haveres do sócio retirante, expressa nos
seguintes julgados: REsp 1.239.754/RS. Rel. Min. Lis Felipe Salomão, Quarta
Turma, DJe 22/05/2012; REsp 654.288/SP e REsp 450.129/MG, Rel. Min. Carlos
Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, DJ 18/06/2007 e 08/10/2002,

208 ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração dos Haveres de Sócio. 5. ed.
atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 104-105.
209 ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração dos Haveres de Sócio. 5. ed.

atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, s.p.


111

respectivamente; REsp 83.031/RS, Rel. Min. Ari Pargendler, Terceira Turma, DJ


13/12/1999; REsp 33.458/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, Terceira Turma, DJ
22/08/1994.

Em seu voto divergente, ainda, faz críticas à adoção da metodologia do fluxo


de caixa descontado na apuração de haveres do sócio dissidente, desaconselhando
a sua adoção, entendendo que:

Não se presta a avaliação, com base no valor econômico, feita por


modelos como o de fluxo de caixa descontado, destinado a nortear
negociações ou investimentos, porquanto comporta, como visto,
relevante grau de incerteza e prognose, sem total fidelidade aos
valores reais do ativo. [....] tendo em vista que a rentabilidade de
cada setor empresarial é muito diversa, há grande variação dos
múltiplos utilizados. Há também muita subjetividade quanto à taxa de
desconto aplicável, sem contar o fator risco envolvido. Comprador e
vendedor fazem, na verdade, uma aposta de que determinada
sociedade continuará a se comportar de certa maneira no futuro, com
certa rentabilidade estável e crescente, tudo baseado em avaliações
de especialistas, por vezes discrepantes quanto ao desempenho
futuro da empresa e do setor. A álea, portanto, é parte essencial do
negócio que se resolve graças à bilateralidade e ao acordo de
vontades. Na determinação do preço a pagar ao sócio retirante,
por outro lado, só haverá encontro de vontades se estipulada
cláusula contratual prevendo o cálculo na respectiva apuração
de haveres. Caso contrário, ocorrerá imposição de valor em que
deve ser, por força da Lei, da doutrina e da jurisprudência, o
mais próximo possível do real, ou seja, sem elementos
arbitrários como as prognoses cerca de eventos futuros e
incertos (faturamento e lucratividade futuros, taxas de juros
utilizada no desconto, etc.210 (grifos nossos)

Na linha do voto divergente do Min. Villas Boas Cueva, destaca-se posição do


ilustre Desembargador Marcelo Fortes Barbosa Filho, integrante da 1ª. Câmara
Reservada de Direito Empresarial do TJSP:

Sociedade limitada - Ação declaratória, de dissolução parcial de


sociedade, apuração de haveres e prestação de contas -
indeferimento de tutela provisória de urgência, fixação de critério
para a apuração de haveres e arbitramento de honorários periciais
provisórios - Premissa incorreta adotada pela parte recorrente,
confundido o herdeiro menor, que não participa da relação
processual, com o espólio composto pelos bens deixados por sua
mãe falecida - Falta de preenchimento dos requisitos previstos no

210ESTRELLA, Hernani; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Apuração dos Haveres de Sócio. 5. ed.
atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, s.p.
112

artigo 300 do CPC de 2015 - Critério patrimonial proposto pelo perito


oficial compatível com a avaliação projetada - Método de avaliação
pelo fluxo de caixa descontado que não se compatibiliza com a maior
parcela das sociedades limitadas, nada impedindo possa ser
apresentada alguma fórmula alternativa de apuração dos haveres -
Arbitramento de honorários periciais compatível com o trabalho
profissional previsto para ser realizado - Impugnação genérica -
Recurso desprovido. 211

Neste acórdão, o eminente desembargador Fortes Barbosa entendeu que o


método de avaliação pelo fluxo de caixa descontado não se compatibiliza com a
maior parcela das sociedades limitadas, amoldando-se com maior pertinência à
avaliação de investimento, para fins de fusão e aquisição, não tendo correlação com
a avaliação de patrimônio para fins de apuração de haveres. Ressalva, no entanto,
que nada impede que o assistente técnico apresente fórmula alternativa de
apuração de haveres, que pode utilizar a citada metodologia, cabendo ao juiz, ao
pronunciar o seu veredicto, verificar a sua adequação e pertinência, uma vez que
não está adstrito ao resultado exposto pelo perito oficial em seu laudo.

Eduardo Bastos de Barros e Marcia Carla Pereira Ribeiro apontam hipótese


em que é descabida a inclusão de valores a título de aviamento na apuração de
haveres do sócio que sai da sociedade, nas situações em que ele leva consigo o
potencial de geração de negócios, de maneira que o aviamento deixa de existir ou é
duramente afetado. É o caso em que a saída do sócio impacta de forma significativa
a realização de novos negócios ou a obtenção de resultados da sociedade
parcialmente dissolvida, por conta de suas habilidades técnicas especificas ou
vínculo pessoal com os clientes, que acabam por acompanhá-lo. Nestes casos,
verifica-se o que se chama de aviamento subjetivo, decorrente de habilidades
pessoais do sócio, como conhecimento técnico, habilidades ou talentos específicos
que permitem a sociedade gerar resultados significativos, situação em que não se
deve cogitar da inclusão de valores a título de aviamento na apuração de haveres.
Nestes casos, o valor dos haveres deverá ser calculado sem a inclusão de montante
a título de aviamento, sendo descabida a avaliação deste, pois pressupõe-se que
houve locupletamento do sócio que sai da sociedade. É o caso, por exemplo, de

211
BRASIL. TJSP. AI.2071665-81.2019.8.26.0000; Rel. Des. Fortes Barbosa; Itaquaquecetuba; 1ª.
Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do Julgamento: 07/08/2019.
113

sociedades de advogados ou de médicos, em geral, em que o resultado da


sociedade está de forma significativa atrelado à atuação pessoal e personalizada do
sócio, de maneira que a sua saída do quadro social afetaria os resultados da
sociedade que passaria a prescindir de sua contribuição na atividade desenvolvida
por ela. O mesmo acontece no caso de restaurante que perde o sócio que
desempenha uma destacada posição como chef de cozinha, que vê o seu negócio
esvaziado, uma vez que a sociedade perde a capacidade de gerar resultados
significativos, a despeito de remanescer, com o sócio que permanece na sociedade,
os ativos tangíveis alocados na atividade empresarial, como talheres, louças,
decoração e mobiliário.

Outra situação, lembrada como descabida a indenização pelo aviamento, é


aquela em que a atividade ou negócio, em virtude das circunstancias do mercado,
se mostra em vias de ser extinto quando do ajuizamento da ação de dissolução
parcial ou de apuração haveres, vez que o aviamento pressupõe a existência de
uma perspectiva de geração de resultados em níveis superiores ao custo de
oportunidade e à taxa de risco do negócio. Assim, se a perspectiva da sociedade,
com a saída do sócio é de extinção ou não realização de lucros, não há que se falar
em aviamento, diante da derrocada do aproveitamento econômico do negócio. É o
caso, por exemplo de atividades outrora lucrativas, que, por razões de mercado, de
obsolescência dos produtos, de mudança tecnológica ou alteração no hábito dos
consumidores, deixaram de ser atrativos economicamente, como fotografias,
máquinas de escrever, papel carbono, chapéus, etc.

Assim, deverão o avaliador e o julgador estarem atentos às peculiaridades do


caso concreto, tal como ressalva Gonçalves Neto, no sentido de que:

Não nos parece possível firmar uma posição prévia a respeito [do
cabimento ou não da inclusão do fundo de comércio na apuração dos
haveres], senão pela análise de cada caso concreto, onde devem ser
dimensionadas as particularidades que poderão justificar ou não a
inserção do fundo de comércio no cálculo do valor da quota do sócio
em relação ao qual é rompido o vínculo societário.212

212GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de empresa – comentários aos artigos 966 a 1.195
do Código Civil. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 225.
114

Em determinados negócios e mercados, a aplicação do critério baseado no


valor patrimonial de mercado acaba gerando evidentes distorções. É o caso, por
exemplo, do segmento de tecnologia e comércio eletrônico, que apresentam
estrutura patrimonial e de negócios em que o valor patrimonial contábil não reflete
nem de longe o seu valor econômico diante da grande perspectiva futura de geração
de resultados, todavia, muitas vezes, apresentando resultados presentes e
patrimônio líquido negativos.

Assim, a decisão sobre a inclusão do aviamento no cálculo dos haveres do


sócio retirante, além da análise jurídica do cabimento ou não da avaliação do fundo
de comércio no caso concreto, não prescinde também da ponderação quanto aos
reais reflexos da saída do sócio da sociedade, o que implica na análise da relação
de dependência entre os resultados da sociedade e a pessoa do sócio que se retira,
além da análise de eventual distorção no caso concreto, seja do critério legal ou do
convencionado no contrato social, traduzida na vedação ao enriquecimento indevido,
seja do sócio que se retira ou daqueles remanescentes e da sociedade dissolvida
parcialmente

3.4 Disciplina da Apuração de Haveres no CPC/2015

O procedimento de apuração de haveres encontra-se disciplinado pelos


artigos 604 a 609 do CPC, cujo principal objetivo é a determinação de quantia
devida ao sócio que não mais integra o quadro societário da sociedade.

O CPC 2015, diploma de caráter procedimental, pelo menos em sua


preponderância, possui disposições de direito material a regular direitos e
obrigações entre sócios, sociedade e partes relacionadas. A despeito das críticas
pela inclusão no código processual de regras de direito material 213, inegável a
validade de tais disposições. O Direito é um sistema único, não existindo divisão
sistemática clara e estanque entre diferentes matérias e especialidades, que atende
aos fins acadêmicos e didáticos.

213 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 18.
115

As regras processuais se aplicam desde o início de sua vigência, de maneira


imediata, aos processos pendentes, tal como dispõe o artigo 1.046 do CPC 2015
que “[a]o entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos
processos pendentes (...)”214, que ratifica o artigo 14 do mesmo diploma legal, de
idêntico teor, no sentido de que “[a] norma processual não retroagirá e será aplicável
imediatamente aos processo em curso, respeitados os atos processuais praticados e
as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da Lei revogada”.215

Às disposições de direito material não se aplicam aquelas dos artigos 14 e


1.046 do CPC, pois o fato de estarem inseridos em um diploma legal de cunho
preponderantemente processual não altera a sua substância, mantendo a sua
natureza de direito material, devendo a sua vigência respeitar o ato jurídico perfeito,
o direito adquirido e a coisa julgada, a teor do que dispõe a regra geral do artigo 6º
do Decreto-Lei nº 4657/1842 - Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro
(LINDB).216 Assim, nos termos da Lei, o ato jurídico perfeito é o já consumado
segundo a Lei vigente ao tempo em que se efetuou, o que se coaduna com o
mandamento constitucional previsto no artigo 5º., inciso XXXVI da CF, que
estabelece que a Lei não retroagirá para atingir o ato jurídico perfeito.

Optou-se por elencar, no bojo do artigo 604, as providências e diretrizes


gerais a serem tomadas pelo magistrado para a apuração de haveres, que são
objeto de regramento específico e dotado de maior detalhamento nos artigos que o
sucedem.

Interessante ponderação deve ser tecida quanto ao seu parágrafo primeiro,


que institui dever à sociedade ou aos seus sócios remanescentes de depositarem
tão logo, em juízo, a parte incontroversa dos haveres devidos. Ao examinar-se tal
disposição, nítido se mostra o esforço do legislador em conferir maior economia,

214 BRASIL. Artigo 1046 da Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015. Disponível em:
https://www.jusbrasil.com.br/topicos/28886675/artigo-1046-da-lei-n-13105-de-16-de-marco-de-2015
Acesso em: 14 set. 2020.
215 BRASIL. Artigo 1046 da Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015. Disponível em:

https://www.jusbrasil.com.br/topicos/28886675/artigo-1046-da-lei-n-13105-de-16-de-marco-de-2015
Acesso em: 14 set. 2020.
216 BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do

Direito Brasileiro. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del4657.htm Acesso


em: 14 set. 2020.
116

celeridade e resultado ao procedimento, visto que, conforme redação do parágrafo


segundo, o depósito poderá ser levantado a qualquer tempo pelo ex-sócio, espólio
ou sucessores.

A despeito da intenção louvável do legislador, acabou-se por afrontar


preceitos jurídicos básicos do Direito Societário ao direcionar também aos sócios a
ordem judicial de depósito. Como já esmiuçado em páginas anteriores, a única
devedora dos haveres do sócio é a sociedade, ainda que se trate de sociedade com
responsabilidade ilimitada. Assim, errou a Lei ao instituir tal obrigação a indivíduos
que não se revestem da qualidade de devedores de tal montante.

Ao debruçarem-se sobre o tema, concluem Erasmo Valladão e Marcelo Vieira


von Adamek:

Diante disso, não seria razoável emprestar à regra processual o


efeito de subverter o sistema societário; parece-nos mais correto
interpretar que a alusão feita aos sócios remanescentes só se aplica
às sociedades não personificadas em que o patrimônio social seja
titulado em comum pelos demais sócios (CC, artigos 988 e 994).
Fora daí, porém, não podem estes ser instados a depositar os
haveres daquele que se desligou da sociedade.217

O artigo 605 foi palco de regulamentação da data de resolução da sociedade.


Sua tamanha importância para o cálculo dos haveres de sócio que se desliga da
sociedade não passou despercebida pelo Legislativo, que editou uma série de
normas de cunho material com o intuito de amparar o julgador em sua decisão de
fixação da data de referência em suas mais diversas hipóteses.

Inicialmente, cumpre salientar sua grande relevância para a consecução do


procedimento. A data de resolução da sociedade estabelece o momento em que
ocorre a desconstituição do liame societário que associava o sócio à sociedade, de
modo que, a partir deste instante, perde aquele seu status de sócio e todas as
prerrogativas a ele inerentes, passando a deter tão somente o crédito

217 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 58.
117

correspondente ao valor de suas quotas, sobre o qual fluem juros de mora, cujo
termo inicial é a data em que se resolveu a sociedade com relação a si.

Como primeira hipótese tipificada pelo artigo ora em comento, tem-se o


falecimento do sócio. Nesses casos, a resolução da sociedade se opera com o
próprio óbito, não havendo que se falar em subsistência do vínculo societário pela
ascensão automática dos sucessores à posição anteriormente ocupada pelo de
cujus, o que somente há de ocorrer caso sejam regularmente admitidos pelos sócios
remanescentes.

Já nos casos em que o sócio exerce seu direito de retirada por denúncia
vazia, o que lhe é facultado pelo artigo 1.029 do CC, a data de resolução da
sociedade será fixada depois de decorrido o prazo de pré aviso estipulado
legalmente, qual seja, o período de sessenta dias contados a partir do recebimento
de notificação pelos demais sócios. Findo o prazo, perde automaticamente seu
status de sócio, tornando-se credor da sociedade.

Diferentemente do caso de retirada imotivada, quando a retirada do sócio que


se desvencilha da sociedade embasar-se em seu direito de recesso, insculpido no
artigo 1.077 do CC e nos artigos 109 e 137 da LSA, a extinção do vínculo societário
terá sua data fixada no dia em que a declaração unilateral do sócio retirante chegar
ao conhecimento da sociedade.

Cumpre ressaltar que a distinção entre recesso e retirada formulada pelo


legislador desagradou parte da doutrina, que considera tal diferenciação como
insubsistente quando analisada à luz do direito material.218

Com relação aos sócios que participam de sociedades constituídas por prazo
determinado e se valem de seu direito de retirada mediante comprovação de justa
218 “O Código de Processo Civil de 2015, extrapolando do conteúdo que lhe seria próprio, faz uma
distinção entre retirada e recesso (artigos 600, inc. IV, e 605, incs. II e III), que não encontra apoio
nas normas do direito material, assim nacional, como estrangeiro. O termo recesso tem duplo
significado: ou se refere a um período de suspensão temporária de uma atividade (v.g., recesso
forense), ou é utilizado na acepção de retirada, por um italianismo que foi absorvido pela Lei das
Sociedades por Ações.” GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de empresa – comentários
aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2017, p. 463.
118

causa, conforme prevê a segunda parte do artigo 1.029 do CC, disciplina o texto
legal que a data de resolução da sociedade será a do trânsito em julgado da decisão
que a dissolve. A lógica por trás da disposição repousa no fato de a sentença
constitutivo-negativa produzir seus efeitos tão somente após seu trânsito em julgado,
como esclarecem Erasmo Valladão e Marcelo Vieira von Adamek.219 Dessa forma,
até a prolação de decisão final sobre o feito, salvo nos casos em que deferida tutela
de urgência antecipada para seu afastamento, conserva o sócio retirante as
qualidades de sócio, o que, em contrapartida, inviabiliza a incidência de juros de
mora sobre seus haveres, já que ainda não se tornou credor da sociedade.

Destaca-se que por partilhar de certas semelhanças à hipótese


supramencionada, em especial a imprescindibilidade de expedição de sentença
constitutivo-negativa para resolução da sociedade em face de sócio, seguem os
mesmos parâmetros da situação anterior os casos em que se busca a exclusão
judicial de um dos sócios.

Por fim, no que tange à data de resolução da sociedade por exclusão


extrajudicial de sócio, prescreve o texto legal que será fixada na data em que
realizada assembleia ou reunião de sócios que deliberou por sua expulsão. De
grande utilidade mostrou-se a disposição, visto que dirimiu dúvida doutrinária a
respeito de quando se daria a perda status socii, se na data da deliberação ou do
arquivamento da ata no registro público, optando o legislador pela primeira.

Superada a questão atinente à data de resolução da sociedade, prossegue o


CPC quanto à regulação dos critérios a serem adotados por perito judicial para
apuração de haveres.

Nesse sentido, o artigo 606 deve ser lido à luz do que disciplina o artigo 604,
inciso II, que versa sobre o emprego preferencial de critério para apuração de
haveres disposto no contrato social. Não havendo qualquer menção a respeito em
seu bojo, caberá ao magistrado defini-lo em consonância com as diretrizes

219 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 65.
119

assinaladas no artigo 606, caput.

Dispõe o CPC 2015 em seu artigo 606 que, não havendo regra prevista no
contrato social, nos termos do artigo 604 do CPC, deverá o juiz fixar como critério de
apuração de haveres o “valor patrimonial apurado em BPD, tomando-se por
referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e
intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual
forma".

Tal disposição, por dispor sobre a mesma matéria constante do artigo 1.031
do CC, revogou tal dispositivo, a teor do artigo 2º. §1º. da LINDB 220 .

O artigo 1.031 do CC 221 previa a apuração do valor da quota do sócio


retirante, se não existente estipulação a respeito no contrato social, o critério
baseado na situação patrimonial da sociedade, apurada no balanço especialmente
levantado na data da resolução. Embora possa haver alguma discussão sobre o
alcance de tal disposição, a interpretação mais direta é a que utiliza o valor
patrimonial contábil a ser verificado em balanço especialmente levantado na data da
resolução do vínculo societário.

Já o critério do artigo 606 do CPC 2015 parte do mesmo valor patrimonial


contábil constante do CC, e o ajusta a cada um dos itens patrimoniais ativos e
passivos pelo seu valor de saída ou de realização, além de expressamente
mencionar os bens tangíveis e intangíveis.

Poder-se-ia dizer que o critério trazido pelo CPC 2015, na ausência de


estipulação específica no contrato social, é o do valor patrimonial real, nos dizeres
de Fábio Ulhoa, para quem o critério legal de apuração de haveres do sócio que se
retira da sociedade é aquele “estabelecido pelo artigo 1.031 do CC, reproduzido,
220 LINDB - Artigo 2 — Não se destinando à vigência temporária, a Lei terá vigor até que outra a
modifique ou revogue. §1º. A Lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare,
quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a Lei
anterior.
221 CC – Artigo 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da

sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição
contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução,
verificada em balanço especialmente levantado.
120

com pequena correção de ordem técnica, pelo artigo 606 do CPC; vale dizer o do
valor patrimonial real, derivado do BPD.”222

Na visão de emérito comercialista o critério trazido pelo CPC não inova em


relação àquele do CC, mas o aprimora, passando a apuração dos haveres do sócio
retirante a ser baseado no BPD, diferenciando do BPE a que se referia o artigo 1031
do CC. Se o BPE, difere do balanço ordinário da sociedade apenas em relação à
época do levantamento (data da resolução do vínculo societário do sócio que se
retira), o BPD difere do BPE quanto aos critérios de apropriação dos bens e direitos
do ativo e em alguns casos também do passivo.

Nele o contador deita ao largo dos parâmetros ditados pelo princípio


do conservadorismo e contabiliza cada item pelo valor de mercado
ou custo de saída; isto é, pelo valor que cada bem ou direto da
sociedade tem ou teria, caso fosse vendido. (...) O BPD, em suma, é
o instrumento de uma simulação, de uma projeção, de uma
estimativa. Ele simula, projeta, estima como seria a liquidação da
sociedade, caso se tratasse de dissolução total, e não parcial. Na
liquidação, todos os bens do ativo seriam vendidos e, após a
cobrança de todos os devedores da sociedade, seriam pagos os
credores, partilhando-se, então, entre os sócios, o acervo
remanescente. O BPD mensura quanto seria este acervo
remanescente (patrimônio líquido), caso acontecesse, naquele
momento, a dissolução total da sociedade. O BPD não interfere com
a contabilidade regular da sociedade; quando chegar o momento de
se levantar o BPO seguinte, o contador deve simplesmente ignorar o
BPD.223

Assim, como a contabilidade é apurada segundo os princípios contábeis


geralmente aceitos, notadamente o do conservadorismo e do custo de aquisição
para escrituração dos ativos, e normas contábeis específicas, o valor patrimonial
contábil, base do critério de apuração do valor da participação do sócio retirante
previsto no CC, acaba não refletindo, por vezes, o valor de mercado dos itens
patrimoniais de ativo e passivo, pois tomam por base o custo de aquisição, e não o
custo de reposição, de mercado, ou de saída. A valorização ou desvalorização de
mercado dos ativos, notadamente dos imóveis, além de itens como máquinas e

222 COELHO, Fábio Ulhoa A dissolução de Sociedades no Código de Processo Civil. In: YARSHELL,
Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário – Volume III. São
Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 153.
223 COELHO, Fábio Ulhoa A dissolução de Sociedades no Código de Processo Civil. In: YARSHELL,
Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário – Volume III. São
Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 164-165.
121

equipamentos exauridos contabilmente por depreciações, amortizações e provisões,


acabam por distanciar os valores de livros do seu valor de mercado, ou do ‘preço de
saída’, como define o artigo 606 do CPC. Além disso, a contabilidade não expressa
o valor dos ativos intangíveis como marcas, patentes e fundo de comércio. Assim,
poder-se-ia dizer que o critério do CPC de 2015 parte do valor patrimonial contábil a
ser apurado na data da resolução da sociedade, e o ajuste aos valores de mercado
(ou de realização ou a preços de saída) dos itens patrimoniais do ativo e do passivo,
além dos intangíveis.

Por seu turno, o parágrafo único do artigo 606 determina que, havendo
necessidade de pessoa dotada de conhecimentos técnicos para a aferição do
montante devido a ser pago ao sócio que se desliga da sociedade, dever-se-á
nomear, preferencialmente, perito judicial especialista em avaliação de sociedades.

Acerca do tema, interessante ponderação realiza Nelson Nery:

Embora o dispositivo mencione que a indicação de perito especialista


em avaliação de sociedades ocorrerá preferencialmente, dando a
entender que outro profissional sem essa capacidade (notadamente
alguém apenas com formação contábil) pode ser convocado, a
jurisprudência anterior ao CPC já decidia que o perito contábil não
poderia ser substituído por liquidante, nem tampouco por perito
economista e advogado, muito embora o contabilista possa ser
auxiliado por outros experts, tendo em vista a necessidade de
avaliação de diversas ordens de bens.224

Como se vê, ainda que o Código tenha se valido do advérbio


“preferencialmente” em seu texto legal, faz-se necessária a designação de indivíduo
detentor de conhecimentos contábeis para a definição do quinhão a ser pago a título
de haveres, facultando-se, entretanto, a indicação de outros experts para auxiliá-lo
em seu ofício. Esse entendimento jurisprudencial mostra-se de grande serventia,
haja vista que inviabiliza a nomeação de peritos que, provavelmente, seriam
incapazes de exercer o ofício para o qual foram designados de forma satisfatória, o
que, em última instância, ensejaria ou a eleição de outro auxiliar de justiça pelo
magistrado ou, até mesmo, a homologação de cálculos que não refletem a

224NERY JUNIOR, Nelson; ANDRADE NERY, Rosa Maria. Código de Processo Civil Comentado.
16. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. p. 1536.
122

realidade, chancelando manifesta injustiça.

Sob a ótica do artigo 607, tanto a data da resolução quanto o critério de


apuração de haveres poderão ser revistos pelo juiz, desde que em momento prévio
ao início da perícia. A propósito, dissertam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz
Arenhart e Daniel Mitidiero225 que, conquanto não tenha sido explicitado pela norma,
tal revisão condiciona-se à apresentação de novos elementos capazes de ensejar a
adoção de parâmetros diversos daqueles já delimitados. Isso porque, trata-se de
nítida exceção à regra geral da preclusão sobre as questões já decididas e, caso o
ordenamento jurídico comportasse tal prática sem quaisquer exigências, estar-se-ia
a atentar contra a própria segurança jurídica do sistema.

Tendo em vista a clareza com que se expressou o legislador, bem como a


objetividade das normas ali elencadas, desnecessário se mostra a elaboração de
qualquer ponderação a respeito do artigo 608226, motivo pelo qual se avança para a
análise do artigo subsequente.

Como derradeiro dispositivo que compõe o arcabouço normativo do


procedimento especial em exame, tem-se o artigo 609, que regulamenta a forma de
pagamento dos haveres.

Como bem pontuado por Helder Moroni Câmara227, patente foi o propósito do
legislador em garantir a supremacia da vontade das partes, definindo que, caso haja
disposição contratual acerca do modo como será realizado o pagamento dos
haveres, este deverá reger o cumprimento da obrigação.

Já nos casos em que o contrato social quedar-se omisso, caberá ao

225 MARINONI, Luiz Guilherme; SRENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de
processo civil: tutela dos direitos mediante procedimentos diferenciados. 3. ed. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2017, v. 3. E-book, p. 142.
226 CPC - Artigo 608. Até a data da resolução, integram o valor devido ao ex-sócio, ao espólio ou aos

sucessores a participação nos lucros ou os juros sobre o capital próprio declarados pela sociedade e,
se for o caso, a remuneração como administrador. Parágrafo único. Após a data da resolução, o ex-
sócio, o espólio ou os sucessores terão direito apenas à correção monetária dos valores apurados e
aos juros contratuais ou legais.
227 CÂMARA, Helder Moroni (Coord.). Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Almedina,

2016, p. 793.
123

magistrado aplicar os mandamentos legais presentes no artigo 1.031, parágrafo


segundo, do CC, que disciplina o pagamento em dinheiro a ser efetuado em prazo
não superior a noventa dias contados da liquidação dos haveres, salvo acordo ou
estipulação contratual em contrário.

Explicam Erasmo Valladão e Marcelo Vieira von Adamek o porquê da


previsão legal impondo o pagamento em dinheiro:

A quota liquidada será, de regra, paga em dinheiro (CC. artigo 1031,


§2º). O sócio que se despede, o seu herdeiro ou credor não tem
direito a uma quota proporcional dos bens sociais, mas apenas o
direito de crédito contra a sociedade, o direito de receber a soma em
dinheiro que represente o valor da quota. Essa regra, como bem
acentuam Jaeger, Denozza e Toffoletto, tem o “fim evidente de
impedir o desmembramento do patrimônio social”. Trata-se, segundo
Gastone Cottino, de verdadeiro princípio geral do Direito Societário:
“ninguém, pendente societate, pode de regra subtrair fatias do
patrimônio comum alterando-lhe a destinação”.228

Assim, depreende-se que a Lei buscou prezar pela preservação da empresa,


garantindo-lhe a manutenção de toda a estrutura necessária para o prosseguimento
de suas atividades e consecução de seu objeto social, bem como visando à
minoração dos efeitos que eventual redução de seu quadro societário haveria por
lhe causar.

3.5 Análise Crítica sobre o Procedimento Judicial de Apuração de Haveres

3.5.1 Papel condutor do Juiz na definição do Critério de Avaliação

Caberá ao juiz estabelecer o critério de avaliação do quinhão patrimonial do


sócio retirante, à luz do que dispõe a Lei, conforme consta do artigo 606 do CPC e
do artigo 1.031 do CC.

Ao definir o critério de apuração dos haveres no despacho inaugural desta


fase (artigo 604 CPC), o juiz fará o balizamento indispensável para a produção

228 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; VON ADAMEK, Marcelo Vieira. Da ação de
Dissolução Parcial de Sociedade: comentários breves ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016,
p. 79-80.
124

pericial. É o juiz quem deve determinar a data base e o critério de apuração a ser
adotado, cabendo ao perito efetuar o seu trabalho de levantamento e apuração dos
haveres, baseado nas diretrizes por ele estabelecidas.

A propósito, não é esta a constatação feita por Marcus Elidius Michelli de


Almeida quando analisa a apuração de haveres segundo a Jurometria, que é uma
análise metodológica das decisões dos tribunais, indo além da simples subsunção
do fato à norma legal, mas interpretando tais decisões como o resultado de uma
conjunção de fatores normativos, sociais e políticos, sendo o estudo do direito em
termos concretos. Concluiu, em seu estudo publicado em 2014, que na maior parte
das vezes o juiz é omisso quanto ao método de avaliação dos haveres, relegando ao
perito esta definição, demonstrando a falha do Judiciário no controle desta atividade,
cuja função passa a ser simplesmente homologar o laudo pericial, sem decisão
sobre o método mais adequado àquele caso concreto. Notou que o fundamento das
decisões, de avaliação da quota do sócio retirante mais utilizado, é o jurisprudencial,
que se pauta em julgados anteriores para decidir em relação ao método de
avaliação da sociedade. Se por um lado há a vantagem na uniformização das
decisões que seguem determinado padrão, de outro lado, o fundamento
jurisprudencial peca por deixar de analisar a fundo o caso concreto, que muitas
vezes mereceria outra avaliação, distinta da escolhida.229

Neste ponto o CPC 2015, em seu artigo 604, inovou ao destacar o papel
condutor do juiz na definição do critério de avaliação a ser adotado, quando define
que caberá a ele definir o critério de apuração de haveres, critério esse que pode ser
revisto a qualquer tempo antes do início da perícia, a pedido da parte (artigo 607).
Porém, o juiz não tem atuação discricionária ou aleatória na fixação das balizas para
a apuração do quantum, devendo se circunscrever aos parâmetros legais.

229 ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de; STEFANO, Marcelle Silbiger. Questões polêmicas sobre
apuração de haveres na dissolução parcial de sociedade limitada – Análise segundo a Jurimetria.
Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem, v. 65, p. 333-344, 2014.
125

3.5.2 Despacho Inaugural – Artigo 604 CPC

Uma vez superada a questão da dissolução parcial da sociedade, seja no


âmbito da própria ação de dissolução parcial da sociedade, em que há concordância
expressa e unânime dos sócios quanto à dissolução (artigo 603 CPC), ou mesmo
após concluído o procedimento comum referido no § 2º. do artigo 603 CPC, no caso
de contestação quanto à dissolução da sociedade, parte-se para a fase de
liquidação, em que haverá a apuração de haveres propriamente dita. No despacho
inaugural da fase de liquidação, o juiz fixará a data da resolução, o critério de
apuração dos haveres e nomeará o perito, a teor do que define o artigo 604 do CPC.

Os parâmetros temporais da data da apuração do BPD são aqueles definidos


no artigo 605 do CPC, que é a data da resolução da sociedade, cuja definição
depende da causa da saída do sócio da sociedade. Dependendo do motivo da saída
do sócio da sociedade, define-se com exatidão a data da resolução para fins de
apuração de haveres, seja ocasionada pelo falecimento do sócio, retirada imotivada,
recesso decorrente de dissidência ou na exclusão extrajudicial.

Já, os parâmetros de quantificação dos haveres do sócio retirante estão


definidos no artigo 606 CPC, segundo o qual, no caso de omissão do contrato social,
o juiz deverá adotar o critério do valor patrimonial apurado em BPD, que deverá
tomar por base a avaliação de bens e direitos, tangíveis e intangíveis a preço de
saída.

Definida a data da exclusão, deverá a sociedade levantar o BPE e específico


para tal data, que não se confunde com as datas de levantamento ordinário das
demonstrações financeiras, em geral de periodicidade anual, relativas ao
encerramento do exercício social, nos termos do que dispõe o contrato social. Tal
balanço deverá ser elaborado com o mesmo rigor com que levantado o balanço
ordinário, aplicando-se todos os princípios e normativos da boa técnica contábil,
inclusive o registro das provisões, depreciações e amortizações. Tal balanço é a
base para a elaboração do BPD previsto no artigo 606 do CPC, que deverá ser
definido mediante ajustes dos valores de saída ou de realização dos bens e direitos
do ativo, tangíveis e intangíveis, bem como dos itens do passivo.
126

3.5.3 Balanço Patrimonial de Determinação

O perito deverá, em seu trabalho, primeiramente certificar-se da adequação e


propriedade do balanço contábil apurado na data da resolução, se foram utilizados
os princípios e normas da boa prática contábil. Tal verificação é de fundamental
importância pois, a partir daí, é que se efetuará os ajustes necessários para o
levantamento do BPD, mediante o cotejo dos itens patrimoniais ativos e passivos
escriturados, inclusive dos intangíveis, com os respectivos valores de realização ou
de saída.

Embora no parágrafo único do artigo 606 do CPC exista menção à nomeação


preferencial de perito especializado em avaliação de sociedades, a escolha do perito
não prescinde de sua qualificação de contador ou auditor, pois, embora o BPD não
se esgote no balanço contábil, ele é o elemento de partida, cuja atestação de sua
adequação é imprescindível para o correto levantamento do BPD definido no artigo
606 do CPC.

No exame de avaliação do balanço contábil levantado para a data da


resolução da sociedade em relação ao sócio retirante, caberá ao perito verificar à
adequação dos critérios adotados na contabilização, devendo propor ajustes que
indiquem desconformidade com as normas e princípios contábeis aplicáveis, diante
do impacto na apuração dos haveres do sócio retirante.

3.5.4 Disposição Contratual

Quanto ao critério a ser definido pelo juiz no seu despacho inicial da fase de
apuração de haveres (artigo 604 do CPC), a primeira referência, expressamente
prevista em Lei (inciso II do mesmo artigo), é a vontade das partes manifestada no
contrato social, em claro prestigio à autonomia, validade e prevalência da vontade
das partes. Se no contrato social elege-se como critério de apuração de haveres do
sócio retirante aquele definido no artigo 1.031 do CC, por exemplo, que prevê o valor
patrimonial em balanço especialmente levantado na data da resolução da
sociedade, é este o critério que deverá prevalecer. Aliás, o próprio mencionado
dispositivo do CC já prestigiava a validade e prevalência do acordo de vontade das
127

partes, ao prever o critério baseado no valor patrimonial contábil apenas se não


existente disposição contratual em sentido contrário. Se, no entanto, o contrato
social prever a apuração de haveres do sócio retirante baseado no valor econômico
da empresa, assim deverá ser procedido, em respeito ao que fora convencionado
pelos sócios.

Neste ponto, o posicionamento do STJ em REsp 1335619/SP DJe


27/03/2015, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, referido no item 3.3. retro, em que
estabeleceu-se o princípio mitigado da pacta sunt servanda em relação ao critério
eleito pelas partes na apuração de haveres do sócio retirante, data vênia, parece ir
na contramão do princípio basilar do direito empresarial de respeito ao quanto
livremente convencionado, e reforçado pela Lei de Liberdade Econômica (LLE), que
alterou o artigo 442 do CC prevendo o princípio da intervenção mínima do Estado
nas relações contratuais privadas, sendo excepcional a sua revisão contratual de
forma externa. Ademais, tal mitigação contraria disposição expressa de Lei que
prevê a primazia do critério contratualmente definido em contrato social (artigo 606
CPC e artigo 1.031 CC).

3.5.5 Critério Legal de Apuração de Haveres

Apenas em caso de omissão do contrato social é que o juiz definirá, como


critério de apuração de haveres a ser seguido pelo perito, aquele definido no artigo
606 do CPC, que é o valor patrimonial ajustado a valores de mercado ou a preço de
saída, ou mesmo o critério definido no artigo 1.031 do CC, observada a disciplina da
aplicação do direito material no tempo (artigo 2º. da LINDB). Ou seja, não há
discricionariedade ou liberdade para o juiz definir o critério da apuração de haveres,
sendo a sua determinação absolutamente condicionada à aplicação da Lei, nos
termos do CPC, que é o diploma legal que atualmente rege a questão. Quando o
artigo 604 do CPC proclama que o juiz ‘definirá’ o critério de apuração de haveres
não lhe deu liberdade de estabelecer aquele que ele melhor entender aplicável para
determinar o quinhão da participação do sócio retirante, sendo a sua atuação restrita
e vinculada, ao estabelecido pelos sócios em contrato social, ou, na sua falta, ao
valor patrimonial de mercado. Ao juiz não cabe definir de ofício critérios outros que
128

não aquele definido em Lei. Caberá às partes levantar, se for o caso, as razões que
entendem aplicáveis para afastar o critério legalmente estabelecido.

É importante destacar que quanto ao critério legal, o partido adotado pelo


CPC foi o baseado no patrimônio da sociedade, na sua atividade econômica
desenvolvida até o momento de sua dissolução. Nos dizeres de Fábio Ulhoa,
“privilegia-se a história da sociedade, ou o que ela amealhou, em seu patrimônio, em
razão de sua atividade econômica explorada até o momento da sua dissolução”. 230

Da mesma forma, é o critério do CC ao prever o valor patrimonial contábil,


para fins de apuração de haveres do sócio retirante. Distingue, Fábio Ulhoa, tal
partido, adotado pela legislação pátria, baseado na história da sociedade daquele
baseado no futuro, no que a sociedade tende a gerar de lucros no futuro aos seus
sócios, que se baseia na mensuração do valor econômico das quotas ou ações.
Conclui, ainda, Ulhoa que:

O valor patrimonial, e não o econômico, é o critério mais ajustado à


avaliação das quotas da sociedade limitada, quando se trata de
apurar haveres de sócio retirante, excluído ou dos sucessores do
falecido, e também das ações da sociedade anônima heterotípica
parcialmente dissolvida, na definição do reembolso devido ao
acionistas que se desliga.231

Justifica o seu posicionamento principalmente no fato de que, na avaliação


pelo valor econômico, que não é o partido adotado, seja pelo CPC ou pelo CC,
procura-se captar o quanto os sócios lucrarão com a sociedade no futuro, fixando-se
determinado prazo para o cálculo, de maneira que o reembolso do sócio retirante, a
partir deste critério, implicaria na noção de que se estaria lucrando sem correr risco
algum, vez que o sócio retirante não mais faz parte da sociedade e, portanto, não
participa do risco empresarial, que é a contrapartida básica do lucro numa atividade
empresarial.

230 COELHO, Fábio Ulhoa. A dissolução de Sociedades no Código de Processo Civil. In: YARSHELL,
Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário – Volume III. São
Paulo: Quartier Latin, 2018, p. 161-162.
231 COELHO, Fábio Ulhoa. A dissolução de Sociedades no Código de Processo Civil. In: YARSHELL,

Flávio Luiz; PEREIRA, Guilherme Setoguti J. (Coords.). Processo Societário – Volume III. São
Paulo: Quartier Latin, 2018, p.162.
129

Afora essa questão de fundo, de incompatibilidade da participação nos lucros


futuros, pelo sócio retirante, sem incorrer em risco, também a avaliação do valor
econômico baseia-se na adoção de premissas e juízo de valor quanto aos fatores
que determinam os resultados futuros da sociedade, que, por serem futuros, são
incertos e de caráter subjetivo, que varia em função da perspectiva subjetiva do
avaliador em relação ao negócio, o que acaba por dificultar a fixação do valor da
quota social sem ensejar discussões entre as partes, diante do natural conflito de
interesses na definição do justo valor do quinhão da parcela do sócio retirante da
sociedade.

Muito se fala sobre a adoção do método do fluxo de caixa descontado para


melhor avaliar o valor de um negócio ou de uma empresa. Tal metodologia
pressupõe a avaliação baseada no fluxo de caixa esperado nos anos seguintes,
portanto, avaliação tendo como critério o ‘valor econômico’ das quotas ou ações,
‘com mira no futuro’, nos dizeres de Fábio Ulhoa. Tal metodologia não tem abrigo
nos critérios expressos no artigo 606 do CPC nem no artigo 1.031 do CC, que
consideram a história da sociedade e não o seu futuro, a despeito de algumas
respeitadas e balizadas posições doutrinárias.

Assim, não há que se falar em avaliação das quotas sociais baseada na


perspectiva futura de resultados da sociedade, pelo menos não é o que a Lei define
como o critério legal, na falta de estipulação contratual a respeito.

O critério do artigo 606 do CPC prevê ajustes ao valor patrimonial contábil


apurado em balanço levantado na data da resolução da sociedade, pelo valor dos
ativos, tangíveis e intangíveis, pelo seu preço de saída. A preços de saída entende-
se a valores de realização, venda ou liquidação, considerados os valores líquidos,
ou seja, descontadas as despesas para a realização das vendas, como custos com
corretagem e demais despesas.

É nestes ajustes que reside a mudança trazida pela Lei processual em


relação ao critério definido no artigo 1.031232 do CC, que estabelecia como critério o

232CC - Artigo 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da
sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição
130

valor patrimonial contábil levantado em balanço especial na data da resolução da


sociedade. Embora possa haver alguma discussão quanto à exata interpretação
deste dispositivo do CC, clara a opção legislativa baseada na escrituração contábil,
devendo o valor do quinhão do sócio retirante basear-se no patrimônio líquido
contábil, atendidos os princípios contábeis geralmente aceitos e normativos
contábeis aplicáveis, dentre os quais o custo de aquisição como base de avaliação
dos ativos e o conservadorismo, que são incompatíveis com a metodologia do valor
econômico baseado em premissas e projeções futuras, que por princípio envolve
incertezas decorrentes do risco próprio de cada negócio, além de fatores
conjunturais e macroeconômicos muitas vezes não controláveis ou precisamente
avaliáveis pelos agentes econômicos.

Ao se reconhecer que os itens patrimoniais, do ativo e do passivo, podem,


com o tempo, se distanciar dos valores de realização ou de mercado ou mesmo não
representá-los adequadamente, é que o CPC veio inovar, de forma a prever ajustes
aos valores contábeis do ativo e do passivo, aos valores de realização (ou de saída),
contemplando não só os tangíveis como os intangíveis, como forma de melhor
avaliar o patrimônio que é de direito do sócio que se retira ou é excluído da
sociedade.

A despeito das críticas existentes em relação ao critério constante do artigo


606 do CPC, a Lei processual veio aprimorar o critério do artigo 1.031 do CC, para
que o quinhão do sócio retirante ou excluído melhor reflita o valor de mercado ou de
realização dos itens que compõem o acervo social da empresa, de forma a evitar
apropriação indevida ou enriquecimento ilícito, seja por parte do sócio retirante,
quanto pelos sócio remanescentes ou pela própria sociedade. Isso porque é
inegável que os valores contábeis, por terem critérios de contabilização distintos do
de realização ou venda, acabam tendo a sua representação quantitativa distanciada
dos valores de saída, que o legislador elegeu como o mais adequado para mensurar
o quinhão do patrimônio da sociedade atribuída ao sócio retirante ou excluído. Tal
ajuste a valores de realização dos itens patrimoniais das contas do ativo e do

contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução,


verificada em balanço especialmente levantado.
131

passivo pode ser para mais ou para menos, inclusive em relação aos intangíveis
como mencionaremos adiante.

Imagine que determinado imóvel esteja escriturado na contabilidade por R$


10.000,00, aplicando-se os princípios e normas contábeis. O perito avaliador, deverá
cotejar tal valor àquele de realização ou de venda, baseado em pesquisas de
mercado, resultando no valor de R$ 50.000,00, já descontados todos os custos
envolvidos na venda desse ativo, como comissão de corretores. O ajuste para este
item do ativo deverá ser então da ordem de R$ 40.000,00, que deverá ser crescido
ao valor patrimonial contábil. Se, no entanto, o valor de determinado equipamento
registrado na contabilidade, já abatido do valor de depreciação, mediante a correta
aplicação dos princípios e normas contábeis for de, digamos, R$ 100.000,00, e este
equipamento tiver um valor de realização (ou de saída, nos termos da Lei) de R$
50.000,00, deverá ser feito ajuste redutor do patrimônio líquido contábil da ordem de
R$ 50.000,00.

Tal cotejo entre o valor escriturado e o valor de venda ou saída deverá ser
feito para todos os itens patrimoniais do ativo e do passivo, devendo, daí, resultar
ajustes ao valor patrimonial contábil levantado em balanço especial na data da
resolução parcial da sociedade.

Pouco se comenta na doutrina em relação aos passivos a serem


considerados no BPD, sendo as contingências objeto de frequentes discussões
quando da apuração de haveres do sócio retirante. A par dos critérios contábeis
para a contabilização de determinada contingência, seja de ordem fiscal, trabalhista
ou cível baseado na probabilidade da efetivação da perda, baseado no estágio do
processo judicial ou administrativo, deverá o perito judicial avaliar eventual ajuste a
ser feito nos valores contabilmente provisionados ou sequer provisionados, baseado
na avaliação do efetivo valor de realização, vez que o artigo 606 CPC refere-se a
valores de saída, que no caso dos passivos e contingências deverá seguir o critério
de efetiva liquidação, o que faz sentido em se tratando de ajuste final de contas com
o sócio retirante, cabendo ao perito projetar o valor provável de realização do
passivo ou contingência, se este risco houver, trazido ao valor presente.
132

3.5.6 Avaliação dos Intangíveis - Critério Legal

O critério previsto no CPC veio inovar em relação à avaliação dos intangíveis,


que não havia previsão no critério do artigo 1.031 do CC, avaliação essa que
também deverá ser feita ao preço de saída, de venda ou de realização. Diferente
dos tangíveis, como equipamentos, máquinas, imóveis e estoques, cujos valores de
realização podem ser obtidos pelo método comparativo, baseado em ofertas ou
negócios realizados com itens idênticos ou similares, a avaliação dos intangíveis,
que são desprovidos de substância física mas possuem valor econômico, como
marcas, patentes e fundo de comércio, impõem ao avaliador desafio especial.
Caberá ao perito avaliador a adoção da metodologia mais adequada para o caso
concreto e não ao juiz, diante do pressuposto de que o expert em avaliações saberá
adotar a metodologia que julgar mais apropriada para a avaliação de tais itens
patrimoniais intangíveis, cabendo ao juiz e às partes o controle da razoabilidade da
metodologia utilizada pelo perito avaliador.

Como o valor dos intangíveis como marcas, patentes e fundo de comércio


não possuem valor intrínseco, mas têm o seu valor determinado quanto à
contribuição econômica no negócio explorado pela sociedade, o perito avaliador
deverá procurar dimensionar tal contribuição econômica aplicando a melhor técnica
para cada caso concreto, diante das peculiaridades do negócio.

O valor de uma patente é baseado no valor que pode criar ao seu titular.
Baseia-se na contribuição econômica que pode gerar ao seu detentor. Essa
contribuição não é definida apenas baseado no que pode a patente render, mas
também no quanto ela pode significar em economia ou em vantagem competitiva,
como um aprimoramento no processo produtivo ou racionalização da produção, por
exemplo. Não havendo a patente a capacidade de gerar diferencial competitivo
eficaz para conquista de mercado, aprimoramento de margens ou redução de
despesas ou custo, não há que se falar em valor incremental além dos valores
expressos na contabilidade, que, em geral, representam os custos incorridos para
aquisição ou desenvolvimento da patente e despesas relacionadas ao registro.
Caberá ao perito avaliador identificar e apurar, por meio de técnicas de avaliação,
esse benefício econômico que a patente pode gerar, que resultará no valor de
133

mercado da patente a ser adotado no levantamento do BPD previsto no artigo 606


CPC.

Já as marcas podem exercer importante papel como fator competitivo da


empresa para garantir uma identidade única e destacada frente à concorrência, para
proteger um produto, serviço ou a própria empresa contra imitações e para estimular
compras e fidelizar clientes. O valor de uma marca está estritamente relacionado à
força e ao conceito que tem no mercado em que atua e à capacidade de criar
benefícios econômicos futuros para o seu titular. A mensuração de tal valor reside
na identificação do benefício para o seu detentor enquanto capacidade de gerar
maior volume de vendas ou a prática de maiores margens de lucro do que
conseguiria sem o nome da marca, de maneira que lhe confere uma vantagem forte,
sustentável e diferenciada sobre os concorrentes. Se a marca não possui a
capacidade de gerar tal benefício, não há valor. Assim, o perito avaliador na
apuração do valor de mercado da marca deverá primeiramente fazer uma análise da
existência ou não de tal valor, para então prosseguir na utilização adequada de
técnicas com vistas a mensuração dos efeitos econômicos da marca para o negócio
da empresa. As técnicas de avaliação da marca, em geral, utilizam-se de projeções
de resultados futuros, tal como na apuração do valor econômico da empresa ou de
um negócio. Aliás, o valor econômico da empresa ou do negócio contempla o valor
da marca, que é um dos vários elementos da atividade empresarial, devendo o
perito ter a habilidade de segregar o valor da marca do valor econômico da empresa.

3.5.7 Tratamento do Fundo de Comércio

Dentre os intangíveis, especial destaque deve ser dado ao fundo de


comércio, também denominado goodwill ou aviamento, discutido no item 3.2.3. e
3.3., retro, que, em termos gerais, é a capacidade que o empreendimento tem de
gerar lucros.

Segundo a doutrina, fundo de comércio é sinônimo de estabelecimento. Nas


palavras de Rubens Requião, “o fundo de comércio ou estabelecimento comercial é
134

o instrumento da atividade do empresário. Com ele o empresário aparelha-se para


exercer sua atividade.”233

O estabelecimento vem regulamentado no título III, artigos 1.142234 e ss


do CC. O artigo 1.142 o define como um complexo organizado de bens para
exercício da atividade empresarial. São bens, corpóreos e incorpóreos,
organizados de forma a possibilitar o exercício da atividade empresarial.

Portanto, o estabelecimento comercial é composto pelo conjunto de bens


corpóreos e incorpóreos, que o empresário une e organiza para o exercício de sua
atividade. O complexo de bens deve estar organizado de forma que possibilite o
exercício das atividades da empresa, ou seja, os bens devem estar ligados de
forma funcional, pois a valia se encontra no todo e não de forma individual. O fundo
de comércio não é um item específico do ativo ou do passivo, sendo um conjunto
organizado de itens ativos e passivos, tangíveis e intangíveis.

E é evidente que o fundo de comércio ou o estabelecimento integra o


patrimônio do empresário ou da sociedade, sendo relevante analisar se deve ser
considerado quando da dissolução parcial da sociedade e da apuração do quinhão
do patrimônio a que o sócio retirante faz jus.

A resposta é positiva se houver disposição no contrato social no sentido de


se dimensionar o valor da participação do sócio retirante ou excluído baseado no
critério do valor econômico ou aplicando-se o método do fluxo de caixa
descontado, que se baseiam na projeção de rentabilidade da sociedade, após a
saída do sócio.

Não havendo disposição no contrato social, aplica-se o critério da Lei, mais


especificamente, aquele previsto no artigo 606 do CPC, que, conforme já
mencionamos, considera a história da sociedade culminada no momento de sua

233 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 29. ed. rev. e atual. por Rubens Edmundo
Requião. São Paulo: Saraiva, 2012, v. 2. E-book.
234 CC - Artigo 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para

exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária.


135

dissolução. O critério previsto no CPC, e que já era o definido no CC, não


contempla os resultados futuros, mas considera o valor contábil, apurado segundo
princípios de contabilidade, notadamente os de conservadorismo e escrituração
pelo custo de aquisição, apurado em balanço especialmente levantado na data da
dissolução, ajustado pelos valores de saída ou de realização. O critério de
avaliação baseado no valor econômico da empresa, que é aquele utilizado para
dimensionar o valor do fundo de comércio, é incompatível com o critério legal. Tal
critério de avaliação é alternativo e incompatível com o do valor patrimonial contábil
levantado na data da resolução, tendo os itens de ativo e passivo ajustados aos
preços de saída ou de realização, vez que partem de princípios diferentes. O
primeiro baseado na história construída da sociedade e, o segundo, baseado no
futuro.

Entender que o critério do CPC, quando fala da avaliação dos intangíveis,


significa admitir a avaliação da empresa pelo valor econômico ou pelo fluxo de
caixa descontado, é uma visão equivocada, pois além de contrariar o princípio da
apuração do valor baseado na história da sociedade, acabaria por reconhecer uma
participação do sócio retirante ou excluído nos lucros futuros da sociedade, ainda
que não mais participe do risco do negócio, o que é incompatível com a lógica da
atividade empresarial, em que o lucro é contrapartida direta do risco e do capital
empregado em determinado negócio, que, com a saída do sócio, não mais
subsistiriam.

Como o fundo de comércio constitui uma combinação de ativos, tangíveis e


intangíveis, além de passivos gerados ou tomados no exercício da atividade
empresarial, podemos dizer que a sua avaliação constitui a própria avaliação da
empresa ou da sociedade, que detem esse composto organizado de ativos e
passivos para desempenho de sua atividade empresarial. O fundo de comércio não
constitui um item específico de ativo, nem corresponde a apenas os itens
intangíveis, constituindo, sim, uma universalidade de fato que integra o patrimônio
do empresário. Ou seja, o fundo de comércio não constitui um item intangível, tais
como as marcas e patentes, mas o conjunto de todos os elementos, ativos e
passivos organizados, dentre eles os intangíveis. Assim, quando a Lei se refere à
avaliação de intangíveis (além dos tangíveis), não está se referindo à avaliação do
136

fundo de comércio que é um critério de avaliação alternativo ao do valor


patrimonial de mercado, que não tem previsão legal, por ser incompatível com o
partido legal de avaliação da empresa baseada na sua história e não no seu futuro.

3.5.8 Jurisprudência em relação à Avaliação do Fundo de Comércio

Consolidou-se no STJ, o entendimento de que apuração de haveres deveria


contemplar incorpóreos, inclusive fundo de comércio. Tal posicionamento se
consolidou antes do advento do CC 2002 e CPC 2015, conforme abaixo colacionado
em ordem cronológica:

➢ RESp 77.122-PR, Rel. Min. Ruy Rosado Aguiar, DJ de 08/04/1996 – “O fundo


de comércio e o fundo de reserva instituído pela vontade dos sócios integram
o patrimônio da sociedade e, por isso, devem ser considerados na avaliação.
Se excluídos, enriqueceriam o patrimônio dos sócios remanescentes, em
prejuízo do retirante, que também contribuiu, com a sua quota e participação
social, para a formação dos dois fundos.”

➢ REsp 43.395-SP, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 28/06/1999 (RJADCOAS,


vol. 2, p. 159; RSTJ, vol. 122, p. 212). “COMERCIAL. DISSOLUÇÃO DA
SOCIEDADE. O 'fundo de comércio' é parcela do patrimônio da sociedade e
deve ser indenizado ao sócio que se retira, na medida da respectiva
participação social. Recursos especiais não conhecidos.”

➢ REsp 52.094⁄SP, Rel. Min. NILSON NAVES, TERCEIRA TURMA, julgado em


13⁄06⁄2000, DJ 21⁄08⁄2000 – “Sociedade por quotas de responsabilidade
limitada. Retirada de sócio. 1. Fundo de comércio. Entre os haveres, inclui-se
o denominado fundo de comércio (REsp-77.122, DJ de 08.04.96). Caso em
que o especial se apresentou deficiente, à míngua de indicação de específica
disposição contrariada.”

➢ REsp 271.930⁄SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, QUARTA TURMA,


julgado em 19⁄04⁄2001, DJ 25⁄03⁄2002 – “O fundo de comércio e o fundo de
reserva instituído pela vontade dos sócios integram o patrimônio da
137

sociedade e, por isso, devem ser considerados na apuração dos haveres, por
ocasião da dissolução, sem que a sua inclusão caracterize julgamento extra
petita.”

➢ REsp 130.617⁄AM, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA


TURMA, julgado em 18⁄10⁄2005, DJ 14⁄11⁄2005 – “Afastado o sócio minoritário
por desavenças com os demais, admite-se que a apuração dos haveres se
faça pelo levantamento concreto do patrimônio empresarial, incluído o fundo
de comércio, e não, exclusivamente, com base no último balanço patrimonial
aprovado antes da ruptura social.”

➢ REsp 564.711⁄RS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, QUARTA TURMA, julgado
em 13⁄12⁄2005, DJ 20⁄03⁄2006 – “Firme o entendimento deste Sodalício no
sentido da integração do fundo de comércio ao quinhão do sócio retirante.”

➢ REsp1.113.625 - MG (2009⁄0005226-0) Rel. Min. Massami Uyeda,


19/08/2010, DJe 03/09/2010 – “APURAÇÃO DOS HAVERES DOS SÓCIOS
RETIRANTES - CONSIDERAÇÃO DOS BENS CORPÓREOS E
INCORPÓREOS, ATIVOS E PASSIVOS DA SOCIEDADE. (...)III - Para a
apuração dos haveres do sócio, deve ser considerado o valor da
universalidade do patrimônio, incluindo-se todos os bens corpóreos e
incorpóreos, ativos e passivos, a fim de que o quinhão do sócio retirante
represente, efetivamente, a participação que tinha na sociedade.”

➢ REsp 907.014 - MS (2006⁄0265012-4) DJe 19/10/2011, Rel. Min. Antonio


Carlos Ferreira. “De acordo com a jurisprudência consolidada do Superior
Tribunal de Justiça, o fundo de comércio (hoje denominado pelo CC de
estabelecimento empresarial - artigo 1.142) deve ser levado em conta na
aferição dos valores eventualmente devidos a sócio excluído da sociedade.
(...) O fundo de comércio é o conjunto de bens materiais (imóveis, bens,
equipamentos, utensílios etc) e imateriais (marcas registradas, invenções
patenteadas etc), utilizados por empresário individual ou sociedade
empresária no exercício de sua atividade empresarial. O fato de a sociedade
ter apresentado resultados negativos nos anos anteriores à exclusão do sócio
138

não significa que ela não tenha fundo de comércio. Precedentes citados:
REsp 52.094-SP, DJ 21/8/2000; REsp 271.930-SP, DJ 25/3/2002; REsp
564.711-RS, DJ 20/3/2006, e REsp 130.617-AM, DJ 14/11/2005.”.

A despeito da clara opção legislativa introduzida no nosso ordenamento


jurídico pelo CC 2002 e pelo CPC 2015, em notório prestígio ao valor patrimonial
histórico que considera a evolução patrimonial construída no passado e
materializado no momento da dissolução do vínculo societário, e não na apuração
baseada no futuro, a jurisprudência, mesmo com o advento dos referidos diplomas
legais, manteve o entendimento em relação à captura, em favor do sócio retirante,
de resultados futuros, tal como apontado no item 3.3 retro. Assim, a avaliação do
valor da quota do sócio retirante, considerando o valor econômico da empresa, já
era reconhecida e prestigiada, antes mesmo do CC 2002 e do advento do CPC
2015, que claramente passaram a prestigiar o valor patrimonial contábil como base
do valor para fins de apuração dos haveres do sócio retirante, e, a despeito da
alteração do ambiente legal, manteve, a jurisprudência, tanto no STJ com nos
tribunais estaduais, o entendimento inercial de outrora.

A adoção deste entendimento dominante, pela jurisprudência, da apuração


mais abrangente e benéfica em favor do sócio retirante, inclusive com a admissão
da metodologia do valor econômico, se deu no âmbito da ausência de uma
positivação legislativa em relação ao critério de apuração de haveres, que,
posteriormente, com o advento do CC e do CPC, passou a existir a previsão
expressa quanto ao critério de apuração do quinhão do sócio retirante.

Esta interpretação benéfica ao sócio retirante, considera o fundo de comércio


como um valor adicional a ser conferido ao sócio retirante, além daquele apurado
com base no valor patrimonial real, cujo conceito adveio com o CPC 2015, que,
como já dito, aprimorou o critério do CC, ao ajustar o valor patrimonial aos valores
de realização ou de saída dos itens do ativo e do passivo.

O advento do CPC 2015 não trouxe uma alteração em prol de um tratamento


benéfico ao sócio retirante, conferindo-lhe um valor adicional aos haveres do sócio
retirante baseado no fundo de comércio ou nos resultados futuros projetados da
139

sociedade. O artigo 606 desse diploma legal não prevê a avaliação de fundo de
comércio, diferente do quanto reconhecido pela jurisprudência dominante. Pelo
contrário, veio reforçar o conceito do CC de prestígio da apuração dos haveres do
sócio retirante baseada na história da sociedade e não em seu futuro, uma vez que
tem por base da apuração o valor patrimonial contábil, ajustado a valores de saída
ou de mercado.

A redação do artigo 606 do CPC ao prever a avaliação dos intangíveis a


preço de saída não implica na adoção da metodologia do fluxo de caixa
descontado ou do valor econômico da empresa, embora resida neste ponto o
principal fundamento daqueles que entendem que a Lei veio prestigiar a apuração
do fundo de comércio e, consequentemente, a adoção da metodologia baseada no
valor econômico ou no fluxo de caixa descontado.

Embora seja inegável a preponderância do uso do valor econômico e do fluxo


de caixa no mercado de aquisições de empresas (merges and acquisitions) e no
mercado de capitais, na apuração de haveres de sócio retirante, não há uma
situação negocial de valores da participação do sócio retirante. Houvesse uma
situação de negociação em que as partes livremente chegassem ao valor
consensado de negociação da participação societária, provavelmente se chegaria a
um valor de conclusão do negócio próximo ao valor econômico da quota, se ambas
as partes tivessem interesse na realização do negócio, que é a compra e venda da
participação na sociedade, pelo simples motivo de que, se não se chegassse a um
valor de consenso, a operação não se realizaria. Mas não é essa a situação do sócio
retirante, em que a saída é fato certo, e resta apenas a avaliação da quota do sócio
que já se retirou. Não há situação negocial, devendo o montante ser apurado por
meio de critérios definidos, como dispõe o artigo 606 CPC, que é incompatível com a
apuração baseada no valor econômico, que depende da adoção de uma série de
premissas não objetivas, pois envolve a projeção de resultados futuros, o que
contraria a necessária segurança jurídica, e beneficia o sócio retirante em detrimento
da sociedade e dos sócios remanescentes, pois atribui um valor adicional, além do
valor patrimonial de mercado, baseado em resultados futuros da sociedade, cujos
riscos não incorrerá.
140

Existe clara visão protetiva da jurisprudência em favor do sócio retirante, de


forma a atribuir-lhe o melhor valor, baseado no melhor critério de avaliação, em
franca contradição ao princípio da preservação e proteção da empresa e em
contrariedade aos dispositivos legais que regem a matéria. Esta protetividade se
encontra na mitigação da pacta sun servanta, ao colocar o critério do quanto
pactuado em contrato social como uma mera referência bem como na interpretação
elástica (indevida) do critério legal de apuração de haveres, contemplando, além do
que prevê a Lei, o quinhão do fundo de comércio ao sócio retirante, como vimos
anteriormente.

Conceitualmente, o valor econômico da sociedade será maior que o valor


patrimonial se os resultados futuros da sociedade se mostrarem superiores
aqueles necessários para remunerar o fator de risco da atividade ou do negócio.
Não significa apenas gerar lucros, mas lucros em patamares superiores ao custo
do capital empregado na atividade empresarial compatível com o risco do negócio.
Se as projeções feitas não indicarem geração de lucros superiores a tal patamar, o
valor econômico da sociedade tende a ser inferior ao seu valor patrimonial, o que
significa que a atividade não gera valor, mas o corrói com o passar do tempo.

Existe uma falsa crença de que a avaliação da empresa pelo valor


econômico ou pelo fluxo de caixa descontado é sempre mais vantajoso para o
sócio retirante ou excluído, o que não é verdade. Só é verdade se a perspectiva da
geração de resultados da sociedade for extraordinária, ou seja, superior ao fator de
risco baseado no qual deve ser remunerado o capital empregado no negócio.
Estudo da Mc Kinsey & Company, analisando o desempenho de 300 das maiores
empresas de capital aberto, no período de 1995-2016, indicou que a maioria das
companhias ficou em situação muito próxima ao chamando break even econômico,
ou seja, mantém o valor econômico próximo ao valor patrimonial ajustado a
mercado.

No Brasil, ao longo dessas duas décadas, mais de 75% das


empresas operam em níveis de retorno muito próximo ao seu custo
de capital. Ou seja, apesar dos esforços para crescer e obter
resultados atrativos para seus acionistas, a grande maioria das
empresas brasileiras não gera lucro econômico expressivo e
sustentável. (...) Apenas um grupo reduzido de empresas gera lucro
141

econômico expressivo e sustentável – ou seja, rentabilidade acima


do custo de capital. A grande maioria das empresas no Brasil, e no
mundo, opera em break even econômico.235

Imagine que o valor patrimonial ajustado a mercado (ou a valores de saída)


de determinada sociedade, tal como prevê o artigo 606 do CPC seja de, digamos
R$ 1.000.000,00. A avaliação pelo valor econômico apurado aplicando-se a
projeção de resultados futuros trazidos a valores presentes pela taxa de risco do
negócio seja de R$ 1.500.000,00. Segundo a corrente dominante da
jurisprudencial, o valor base para a apuração de haveres do sócio retirante seria de
R$ 1.500.000,00.

Suponha, no entanto, que o valor econômico seja inferior ao valor


patrimonial de mercado, pois a perspectiva futura de resultados indica
incapacidade de remunerar o fator de risco da atividade, sendo de, digamos R$
800.000,00. A jurisprudência tem entendido que, neste caso, não há valor
incremental a ser conferido ao sócio retirante além do valor patrimonial ajustado a
valores de saída. O que se evidencia é que o método baseado no valor econômico
não é tido como alternativo, mas incremental àquele previsto no CPC e no CC, em
clara proteção ao sócio retirante, e em desprestigio do princípio da preservação da
empresa.

3.5.9 Discussão quanto ao Critério na Apuração dos Haveres

As partes poderão contestar o critério adotado, podendo o juiz alterar o


critério desde que não iniciada a perícia (artigo 607 CPC), de maneira que a referida
contestação, quanto ao critério constante do contrato social ou aquele definido pelo
juiz, deverá ser feita até o início da produção pericial, sob pena de preclusão, pelo
menos em primeiro grau. Uma vez definido o critério pelo juiz, caberá recurso em
sede de agravo, tal como comentamos no item 2.2.6 retro, ainda que não haja
previsão no artigo 1.015 do CPC, ou poderá ser objeto de discussão em preliminar

235 MC KINSEY & COMPANY. Grandes movimentos empresariais – Como os CEOs mais bem-
sucedidos criam valor. Nov. 2019. Disponível em:
https://www.mckinsey.com.br/~/media/McKinsey/Locations/South%20America/Brazil/Our%20Insights/
Grandes%20movimentos%20empresariais/201911_Grandes%20Movimentos%20Empresariais_FINA
L.pdf Acesso em: 14 set. 2020.
142

de apelação ou nas contrarrazões, de acordo com o quanto estabelecido no artigo


1.009, § 1º do CPC. Ou seja, caso o critério definido pelo juiz não seja contestado
em primeiro grau, a matéria não fica coberta pela preclusão, por não ser matéria
contemplada no rol das hipóteses do agravo do artigo 1.015. Porém, a matéria fica
preclusa, em segundo grau, caso seja suscitada em agravo e este for conhecido,
exceção de vícios ocorridos na fase cognitiva como cerceamento de defesa ou
incompetência.

Havendo ou não interposição de agravo, nada impede que as partes


formulem quesitos ao laudo de avaliação e aposição de críticas após a sua
elaboração, quanto à metodologia e critérios utilizados para o dimensionamento dos
intangíveis, bem como apresentação de laudos alternativos contendo a avaliação
por critérios alternativos baseados em fluxo de caixa descontado e valor econômico
da atividade, que poderá subsidiar a discussão do critério em sede de apelação.

3.5.10 Utilização Excepcional de Critérios Alternativos

Como mencionado, a jurisprudência tem reconhecido a adoção de critérios


diferentes do disposto em Lei (previsto em contrato social ou aquele definido no
artigo 606 CPC ou 1.031 CC), quando estes acabam não representando uma
adequada avaliação da quota do sócio retirante.

Não se pode negar que cabe ao juiz corrigir distorções na aplicação dos
critérios previstos em Lei, diante das alegações das partes no caso concreto, o que
não pode ser ignorado, para se evitar enriquecimento indevido da sociedade e dos
sócios remanescentes.

Assim, embora não previsto em Lei, o juiz poderá admitir a adoção de outros
critérios ou ajustes, tais como o baseado no valor econômico ou no fluxo de caixa
descontado, se existirem indícios de distorções relevantes, trazidos pelas partes, se
aplicado o critério legal.

É o caso das empresas da nova economia baseada em tecnologia de


informação, que possuem uma estrutura patrimonial totalmente diferente das
143

empresas da chamada indústria tradicional ou convencional. Se tomarmos por base


negócios como a Uber, Arbnb, Mercado Livre ou Google, que muitas vezes
apresentam patrimônio líquido e resultados negativos, quase sem ativos fixos em
seu patrimônio, o valor patrimonial, ainda que real ou a valores de mercado ou de
saída, certamente não representará o valor dos respectivos negócios, sendo
imperativo considerar, na avaliação de tais empresas, o aviamento e outros
elementos intangíveis, sendo plenamente justificável a avaliação destas empresas
baseada no valor econômico, que considera a projeção futura de lucros e caixa,
mesmo porque, muitas dessas empresas, sequer chegaram a gerar lucros ou
distribuir resultados.

Assim, o juiz, diante das especificidades do caso concreto e do


reconhecimento da incapacidade dos critérios eleitos pelas partes ou dos previstos
em Lei para mensurar razoavelmente o quinhão do sócio retirante, poderá, em
caráter excepcional, diante das alegações das partes, admitir critério alternativo,
dentre os quais a avaliação pelo valor econômico ou pelo método do fluxo de caixa
descontado. Ou seja, a adoção de critério alternativo que não o legal é a exceção, e
não a regra, e como tal deve ser tratada.
144

4 CONCLUSÃO

O CC de 2002 veio positivar a resolução da sociedade em relação a um sócio,


que já era reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência como forma de
preservação da atividade comercial da sociedade, vez que a legislação até então
contemplava apenas a da dissolução total da sociedade. No artigo 1.031 do CC
2002 reconheceu-se, como critério de apuração de haveres do sócio retirante, a
validade e preponderância do critério contratualmente definido, e, na sua ausência a
situação patrimonial levantada em balanço especialmente levantado no momento da
resolução.

Com o advento do CPC 2015, previu-se um procedimento especial que é a


Ação de Dissolução Parcial de Sociedade, que além de disposições de natureza
processual, introduziu disposições de direito material, como a constante do artigo
606, que veio a alterar o comando do artigo 1.031 do CC.

Tal artigo 606, além reafirmar o prestígio do quanto definido em contrato


social, definiu como critério legal de apuração de haveres do sócio retirante, no caso
de omissão contratual, o valor patrimonial apurado em BPD, a ser levantado na data
da resolução, avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço
de saída o de realização de mercado, devendo o passivo ser apurado de igual
forma.

A alteração trazida no texto do artigo 1.031 CC foi no sentido de ajustar os


valores contábeis aos valores de saída, considerados inclusive os itens intangíveis,
dado o reconhecimento de que as demonstrações financeiras, pela aplicação das
normas e princípios contábeis, que prestigiam o conservadorismo e o custo de
aquisição como base da escrituração, acabavam por acarretar distorções que
pudessem afetar a avaliação do quinhão patrimonial do sócio retirante.

O CPC 2015 não inovou em relação ao princípio de apuração de valor


baseado no valor patrimonial contábil, que passou a ser ajustado pelos valores de
saída, baseado no passado e presente da sociedade e não no futuro. Tal como no
CC, o CPC estabelece a avaliação dos haveres do sócio retirante com os olhos na
145

história da sociedade, e não no futuro, baseado no pressuposto de que o sócio


retirante não mais participa do risco inerente dos negócio empresariais e, portanto,
não faz sentido participar dos lucros futuros. Assim, tanto o critério do CC, quanto o
do CPC, que veio a alterá-lo, é incompatível com a avaliação do fundo de comércio,
que se materializa na capacidade de geração de lucros futuros da sociedade.

Tais diplomas legais ao reconhecerem que o sócio retirante não participa do


fundo de comércio da sociedade, adotou um partido em favor da sociedade ou da
atividade que continuaria conduzida pelo sócio remanescente, ainda que pudesse tal
sócio fazer jus também à quota parte do fundo de comércio, se houvesse uma
situação negocial de saída da sociedade.

Ao prever a saída imotivada (artigo 1.029 CC), nos casos de sociedades


constituídas por prazo indeterminado, e ao não prever diferenciação nos haveres do
sócio retirante, em relação às causas e motivos da retirada (por morte, exclusão ou
saída voluntária), o CC claramente não conferiu incentivo à saída do sócio,
restringindo os seus haveres ao valor patrimonial contábil, que, com o CPC, veio a
ser aprimorado, para ajustá-lo ao valor de saída ou de realização.

Na AED, tais dispositivos legais conferiram desincentivo à saída do sócio e


prestígio à atividade econômica da sociedade, vez que é inegável que a saída do
sócio representaria inevitavelmente descapitalização da empresa, dada a retirada de
recursos financeiros empregados no negócio da sociedade para pagar o quinhão de
sua participação.

É de se notar, que ao mesmo tempo em que o fundo de comércio e a


participação nos resultados futuros não são contemplados, atribui-se uma rapidez no
pagamento dos haveres ao sócio retirante, seja pelo pagamento imediato do
montante incontroverso (§ 2º. do artigo 604 CPC) seja pelo pagamento em 90 dias,
se não houver disposição especifica no contrato social (§ 2º. do artigo 1.031 CC).

Tanto o CC quanto o CPC, ao estabelecer o critério de apuração de haveres


do sócio retirante, não se preocupou em lhe atribuir o valor justo ou o melhor valor
baseado nas possíveis formas de avaliação. O que tais disposições legais
146

conferiram ao sócio retirante foi a posição patrimonial contábil, devendo ser


ajustadas as distorções que possam ocorrer diante das regras e procedimentos de
contabilização, reconhecidas pelo CPC ao prever em BPD o valor patrimonial real
(ou de saída), assegurando-se o pagamento com rapidez (garantia de liquidez).

Embora a jurisprudência anterior aos citados diplomas legais já havia


reconhecido a dissolução parcial da sociedade, o critério que havia se consolidado
até então era diferente. Prestigiou-se o sócio retirante, devendo ser utilizado o
critério que melhor avaliasse o valor da sociedade e consequentemente o quinhão
do sócio retirante, em nítido prestígio ao princípio de se evitar o enriquecimento
indevido da sociedade e dos sócios remanescentes, em franco desprestigio da
preservação da empresa.

A posição da jurisprudência se mostrara protecionista em relação ao sócio


retirante, seja pela mitigação do quanto previsto no contrato social, se não contasse
com a concordância das partes, seja pela admissão, por meio da inserção do fundo
de comércio na base indenizável dos haveres do sócio retirante, passando este a
fazer jus a lucros futuros, ainda que não realizados. Admitiu-se a inclusão do fundo
de comércio e a utilização dos métodos baseados no valor econômico e no fluxo de
caixa descontado, largamente utilizados nos negócios de aquisições no mercado
financeiro e de capitais, em situações negociais em que se busca consenso quanto
a valores e condições para concretização de negócios de compra e venda, que não
é a situação da saída litigiosa de sócio, em que a decisão da dissolução parcial é
unilateral, seja do sócio retirante ou dos sócios remanescentes.

Ou seja, a posição da jurisprudência consolidada anteriormente ao advento


do CC e do CPC pressupunha a apuração dos haveres da forma mais abrangente
possível, inclusive reconhecendo o cômputo do fundo de comércio, de forma a
conferir ao sócio retirante não só o quinhão do patrimônio social amealhado
historicamente, mas também a perspectiva de resultados futuros, materializado pela
avaliação do fundo de comércio.

Tal posicionamento jurisprudencial dominante persistiu mesmo com o advento


do CC e do CPC e permanece até os dias de hoje, o que parece contrariar a
147

segurança jurídica, pois afronta disposição legal expressa e a força vinculante dos
contratos, ao se negar vigência do quanto estipulado em contrato social quanto ao
critério de apuração de haveres, pilar das relações comerciais e na contramão da
recente Lei nº 13.874/2019 - Declaração de Direitos de Liberdade Econômica
(DDLE)236, trazendo ameaças à atividade empresarial.

Paradoxalmente, diante da atual posição jurisprudencial dominante, o instituto


da dissolução parcial, que surgiu de uma construção doutrinária e jurisprudencial,
como alternativa à dissolução total da sociedade, e, em prestigio à preservação da
atividade empresarial, acaba por conferir risco a continuidade da atividade
empresarial, por meio de uma descapitalização da sociedade, uma vez que confere
ao sócio retirante posição privilegiada na apuração de seus haveres.

236 BRASIL. Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019. Institui a Declaração de Direitos de


Liberdade Econômica; Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-
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12/12/1978.

______. STF. 2ª Turma. RE n. 89.464-SP; Rel. Min. Décio Miranda; julgado em


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______. STJ. REsp: 1413237 SP 2012/0035329-0; Rel. Min. João Otávio de


Noronha; Terceira Turma; DJe 09/05/2016.

______. STJ. AgInt no REsp 1651901 / MT. AGRAVO INTERNO NO RECURSO


ESPECIAL 2017/0021925-5; Min. Rel. Marco Aurélio Bellizze; Terceira Turma; DJe
08/05/2017.

______. STJ. AgRg no AREsp 78175 / MS AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO


EM RECURSO ESPECIAL 2011/0191536-3; Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma;
DJe 24/09/2015.

______. STJ. AgRg no REsp 1147733 / BA AGRAVO REGIMENTAL NO


RECURSO ESPECIAL 2009/0129485-8; Rel. Min. Nancy Andrighi; Terceira Turma;
DJe 21/09/2012.
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______. STJ. REsp: 271930 SP 2000/0080731-1; Rel. Min. Sálvio de Figueiredo


Teixeira, Quarta Turma, Data de Publicação: DJ 25/03/2002.

______. STJ. REsp 1335619/SP, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Min.
JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/03/2015, DJe
27/03/2015.

______. STJ. REsp 35.702/SP, 3ª. Turma, Rel. Min. Nilson Naves, DJ de
04/08/1997; REsp 105.667/SC, 4ª. Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ de
06.11.2000; e REsp 197.303/SP, 4ª. Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira,
DJ de 15.04.2002.

______. TJSP. Agravo de Instrumento 2056902-75.2019.8.26.00000; julgado em


21 de agosto de 2019; Declaração de voto convergente do Des. Marcelo Fortes
Barbosa.

______. TJSP. Agravo de Instrumento 2056902-75.2019.8.26.00000; julgado em


21 de agosto de 2019; Declaração de voto convergente do Des. Eduardo Azuma
Nishi.

______. TJSP. Agravo de Instrumento 2056902-75.2019.8.26.00000; julgado em


21 de agosto de 2019; 1ª. Câmara Reservada de Direito Empresarial; Rel.
Designado: Des. Cesar Ciampolini; Fls. 145-155.

______. TJSP. Apelação Cível 1011683-47.2016.8.26.0037; Rel. Araldo Telles;


Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de Araraquara -
1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 10/06/2019; Data de Registro: 10/06/2019.

______. TJSP. Apelação 0051688-73.2010.8.26.0576; Rel. Des. Alexandre


Marcondes; São José do Rio Preto; 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial;
Data do Julgamento: 04/02/2019.

______. TJSP. Apelação Cível 4003820-59.2013.8.26.0565; Rel. Ricardo Negrão;


Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de São Caetano
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do Sul - 6ª Vara Cível; Data do Julgamento: 30/08/2017; Data de Registro:


30/08/2017.

______. TJSP. Al. 2246670-88.2-17.8.26.0000; Rel. Des. Hamid Bdine; Barueri; 1ª.
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______. TJSP. Agravo de Instrumento 2045721-19.2015.8.26.0000; Rel. Des.


Francisco Loureiro; Santo André; 1ª. Câmara Reservada de Direito Empresarial;
Data do Julgamento: 21/10/2015.

______. TJSP. Apel. 0021363-13.2013.8.26.0576; Rel. Des. Ricardo Negrão; São


José do Rio Preto; 2ª. Câmara Reservada de Direito Empresarial; Data do
Julgamento: 25/07/2018.

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