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CENTRO UNIVERSITÁRIO DO NORTE FLUMINENSE


FACULDADE DE DIREITO DE CAMPOS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM DIREITO

LICENCIAMENTO AMBIENTAL MUNICIPAL:


UM INSTRUMENTO LOCAL DE EFETIVAÇÃO DE
DIREITOS FUNDAMENTAIS
BRASIL 1988 - 2008

JEFERSON NOGUEIRA FERNANDES

Campos dos Goytacazes - RJ


2008
2

JEFERSON NOGUEIRA FERNANDES

LICENCIAMENTO AMBIENTAL MUNICIPAL: UM INSTRUMENTO LOCAL

DE EFETIVAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

Dissertação apresentada ao Curso de


Mestrado, em Direito, da Faculdade de
Direito de Campos, como requisito à
obtenção do título de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Manoel Messias


Peixinho

Campos dos Goytacazes - RJ


2008
3

JEFERSON NOGUEIRA FERNANDES

LICENCIAMENTO AMBIENTAL MUNICIPAL: UM INSTRUMENTO LOCAL

DE EFETIVAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS

Dissertação apresentada ao Curso de


Mestrado, em Direito, da Faculdade de
Direito de Campos, como requisito à
obtenção do título de Mestre.

COMISSÃO EXAMINADORA

______________________________________
Prof. Dr. Manoel Messias Peixinho.
Faculdade de Direito de Campos -
UNIFLU/FDC

______________________________________
Prof.ª Dr.ª Miriam Fontenelle
Faculdade de Direito de Campos –
UNIFLU/FDC

______________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Lucia de Paula Oliveira
Universidade Candido Mendes – UCAM

Campos dos Goytacazes-RJ, ____ de____________ de 2008.


4

DEDICATÓRIA

Dedico esta dissertação à memória de minha


mãe, Maria Gilda Nogueira Fernandes, a
meu pai, Lenilson Gualda Fernandes e a
minha irmã, Karina Nogueira Fernandes e
também a todas as pessoas, que de
algumas forma contribuíram para a
realização das pesquisas que ensejaram o
término deste trabalho científico.
5

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos professores do Mestrado da


Faculdade de Direito de Campos, em
especial ao meu orientador Professor
Manoel Messias Peixinho, que incentivou a
pesquisa e apresentou um conhecimento
jurídico necessário à realização deste
trabalho dissertativo. Agradeço ainda a
Direção da Faculdade de Direito de Campos,
na pessoa de seu Diretor o Professor Levi
Quaresma que sempre contribui no meu
aperfeiçoamento jurídico. Por fim agradeço
aos colegas e funcionários da Secretaria
Municipal de Meio Ambiente de Campos dos
Goytacazes que através dos fatos concretos
demonstraram a necessidade de um
aprofundamento das questões ambientais na
Administração Pública municipal.
6

“Daqui a duzentos ou trezentos anos, ou mesmo


mil anos – haverá uma vida nova. Nova e feliz.
Não tomaremos parte nessa vida, é verdade...
Mas é para ela que estamos vivendo hoje. É
para ela que trabalhamos e, se bem que
soframos, nós a criamos.
E nisso está o objetivo de nossa existência aqui”.
Tchekhov, Três irmãs
7

SUMÁRIO

RESUMO .................................................................................................... 10
RIASSUNTO .............................................................................................. 11
INTRODUÇÃO ........................................................................................... 12
CAPÍTULO I – DIREITO FUNDAMENTAL AO EQUILIBRIO E OS
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS AMBIENTAIS...................................... 17
1 - O Direito e o Ambiente .......................................................................... 17
2 - Análise dos Direitos Fundamentais ....................................................... 19
2.1 - Desenvolvimento dos Direitos Fundamentais ............................... 20
2.2 - O Sistema Jurídico dos Direitos Fundamentais ............................ 25
2.3 – As Dimensões dos Direitos Fundamentais ................................... 28
3 – Os Princípios Constitucionais do Equilíbrio Ambiental ......................... 35
3.1 – Os Princípios no Ordenamento Jurídico ....................................... 36
3.1.1 - Os Princípios e Regras de Direitos Fundamentais ............... 41
3.2 – Os Princípios Ambientais ............................................................. 43
3.2.1 – Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ......................... 44
3.2.2 – Princípio da Participação e Democrático .............................. 46
3.2.3 – Princípio da Precaução ........................................................ 49
3.2.4 – Princípio da Prevenção ........................................................ 51
3.2.5 – Princípio da Responsabilidade ............................................. 54
3.2.6 – Princípio do Poluidor-Pagador .............................................. 56
3.2.7 – Princípio do Usuário-Pagador .............................................. 58
3.2.8 – Princípio da Função Socioambiental da Propriedade .......... 60
8

CAPÍTULO II – A INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS FUNDAMENTAIS


AMBIENTAIS E A PONDERAÇÃO DE INTERESSES NO 62
LICENCIAMENTO AMBIENTAL ...............................................................
1 - A Interpretação das Normas ................................................................. 62
1.1 - Sentido e Conceito de Interpretação ............................................. 63
1.2 - A Interpretação Constitucional ...................................................... 68
1.3 - Interpretação dos Direitos Fundamentais e a Possibilidade de
Restrição .................................................................................................... 74
1.3.1 -. A Possibilidade das Restrições dos Direitos Fundamentais 78
1.4 - Contributos do Neoconstitucionalismo para a Interpretação das
Normas Ambientais .................................................................................... 85
2 - A Ponderação de Interesses no Licenciamento Ambiental ................... 89

CAPÍTULO III – LICENCIAMENTO AMBIENTAL ..................................... 103


1 – Federalismo e Competência no Licenciamento Ambiental .................. 103
1.1 – Competência Ambiental ............................................................... 108
1.2 – Competência no Licenciamento Ambiental .................................. 114
2 – O Poder de Polícia do Estado .............................................................. 119
2.1 – Poder de Polícia Ambiental .......................................................... 125
3 – Licenciamento Ambiental no Brasil ...................................................... 130
3.1 – O Procedimento Administrativo do Licenciamento Ambiental ...... 138
3.2 – A Natureza Jurídica da Licença Ambiental ................................... 145

CAPÍTULO IV – LICENCIAMENTO AMBIENTAL MUNICIPAL ................ 155


1 – Os Municípios e a sua Autonomia dentro do Estado Federado ........... 156
1.1 – A Autonomia Ambiental ................................................................ 161
2 - O Licenciamento Ambiental Municipal .................................................. 167
2.1 - Impacto Local ................................................................................ 177
2.2 - A Participação da Sociedade na Identificação dos Objetos a
serem Licenciados ...................................................................................... 182
2.2.1 - Os Conselhos de Políticas Públicas ...................................... 188
2.2.2 - A Identificação dos Objetos do Licenciamento Ambiental
Municipal pelos Conselhos de Políticas Públicas ....................................... 190
3 - O Licenciamento Ambiental no Município de Campos dos Goytacazes 194
9

CONCLUSÃO ............................................................................................ 201


REFERÊNCIAS .......................................................................................... 216
10

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo demonstrar a possibilidade dos


Municípios brasileiros de exercerem autonomamente o licenciamento ambiental das
atividades e empreendimentos de impacto local, sendo esse um instrumento local de
efetivação de direitos fundamentais. Inicia-se o estudo tratando dos direitos
fundamentais, sua origem e seu desenvolvimento, até os dias atuais, visualizando,
em especial, o ambiente como sendo um desses direitos, compondo um ramo dentro
do ordenamento jurídico com princípios próprios que influenciam os outros ramos do
direito, objetivando a efetivação de um ambiente sadio e equilibrado para todas as
gerações. Posteriormente busca-se apresentar a interpretação que deve ser
exercida para a efetivação dos direitos fundamentais, observando que os métodos
interpretativos tradicionais não conseguem demonstrar um resultado satisfatório de
efetivação, em especial ao ambiente e que atualmente a inserção de valores e
princípios inclusive os não jurídicos são necessários para obter resultados
interpretativos adequados à realidade e aos direitos existentes, sendo o método da
ponderação de interesses um dos mais adequados para auxiliar a interpretação dos
casos em que se observa aparentes conflitos entre direitos fundamentais, podendo
esse método ser utilizado pela Administração Pública na realização do licenciamento
ambiental. Por fim, estuda-se o licenciamento ambiental e suas principais
características e como se desenvolve dentro do modelo de Federação adotado no
Brasil. E ainda demonstrando a competência dos entes federativos na defesa e no
controle ambiental, sendo o licenciamento um dos instrumentos ambientais. Explicita
também a nova estrutura constitucional dos Municípios e a sua função de proteção
do ambiente e a possibilidade do desenvolvimento do licenciamento ambiental
municipal de forma autônoma e independente dos outros entes federativos. Conclui-
se ao final que é possível o exercício do licenciamento ambiental pelos Municípios e,
além disso, é de grande importância para a efetivação dos direitos fundamentais
contidos nos objetos de interesse local.

Palavras-chave: Direitos Fundamentais; Ponderação; Federação; Licenciamento


Ambiental; Municípios.
11

Riassunto

Questo lavoro mira a dimostrare la possibilità di Comuni


brasiliani di esercitare indipendentemente dalla concessione di licenze ambientali e
delle attività commerciali di impatto locale, che essere un luogo di esecuzione dei
diritti fondamentali. Fino trattamento inizia lo studio dei diritti fondamentali, delle loro
origini e lo sviluppo, fino a oggi, soprattutto la visualizzazione della ambiente come
uno di tali diritti, la composizione di una succursale nel sistema giuridico, con i suoi
propri principi che influenzano gli altri settori della destra. Al fine di effettuare una
sana ed equilibrata per tutte le generazioni. Più tardi ricerca per rendere
l'interpretazione che deve essere esercitato per l'effettuazione di diritti fondamentali,
rilevando che i tradizionali metodi interpretativi non riescono a dimostrare un risultato
soddisfacente di efficaci, soprattutto per l'ambiente e che attualmente l'inserimento di
valori e di principi tra cui non giuridico sono necessarie per conseguire risultati
interpretativi adeguati all'evoluzione della realtà e i diritti esistenti e l'equilibrio di
interessi metodo di uno dei più adatto per aiutare l'interpretazione dei casi in cui
abbiamo osservato apparente conflitto tra i diritti fondamentali, questo metodo può
essere utilizzato dal governo per quanto riguarda completamento del rilascio delle
licenze ambientali. Al fine di studiare la concessione di licenze ambientali e le sue
principali caratteristiche e come esso si sviluppa all'interno della Federazione del
modello adottato in Brasile. E ancora dimostrare la potenza di entità federali per la
difesa e il controllo ambientale e il rilascio delle licenze di strumenti ambientali.
Explicita anche la nuova struttura costituzionale dei Comuni e il loro ruolo nella tutela
ambientale e la possibilità di sviluppare la concessione di licenze ambientali comunali
in modo autonomo e indipendente da altri enti federali. Ne consegue la fine è
possibile l'esercizio delle competenze di concessione di licenze ambientali da parte
dei comuni e, del resto, è di grande importanza per l'effettuazione di diritti
fondamentali contenute negli oggetti di interesse locale.

Parole chiave: diritti fondamentali; ponderazione; Federazione; le autorizzazioni


ambientali; Comuni.
12

INTRODUÇÃO

1- Objetivo

O objetivo central desta dissertação é identificar e comprovar a


possibilidade dos Municípios brasileiros poderem implantar o licenciamento
ambiental independente de delegação por outros entes da Federação.
O licenciamento ambiental é um instrumento de controle, que
tem diversos pontos a serem estudados, inclusive a definição do âmbito de atuação
de cada ente federativo no exercício desse instrumento ambiental.
Atualmente alguns Municípios vêm implantando o
licenciamento ambiental como instrumento de controle ambiental, mas outros, em
especial os Municípios dos Estados do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul, estão
implantando tal instrumento através de convênio entre o Município e o Estado-
membro correspondente, o qual delega a competência para os Municípios.
Este estudo busca ainda apresentar a colocação do Município
na Federação brasileira e sua autonomia diante dos outros entes federativos,
justificando, dessa forma, o poder de implementação do licenciamento ambiental
independente de delegação dos Estados-membros ou da União para exercício do
instrumento de controle ambiental e conseqüentemente a sua implantação gerará a
concretização de direitos fundamentais que aparentemente se apresentam
conflitantes.
Também foram identificados os elementos definidores da
competência municipal, no que tange ao poder de licenciar objetos que de alguma
forma causam intervenções na qualidade ambiental e, ainda, o dever de participação
da sociedade no licenciamento ambiental a ser implantado pelos Municípios
brasileiros.
13

2- Problema central

A proteção e preservação ambiental é um dever do Poder


Público, inclusive dos Municípios e da Sociedade, tendo em vista o dever
constitucional imposto pela Constituição Federal de 1988 e pelo fato do ambiente
equilibrado e sadio corresponder a um direito fundamental da pessoa humana. Com
isso, torna-se impossível que exista restrições a esse dever pelo ordenamento
jurídico infraconstitucional.
Dentro deste contexto, se faz necessária uma nova
hermenêutica da Lei da Política Nacional de Meio Ambiente e em especial do
sistema de licenciamento ambiental desenvolvido no Brasil, de forma que se possa
efetivar o enunciado constitucional de proteção ambiental e afastar a impossibilidade
do Município de poder implantar o licenciamento ambiental municipal, posição que
era adotada anterior ao atual ordenamento constitucional. Além disso, importante
que se definam os limites da competência municipal para submeter determinadas
condutas ao licenciamento ambiental.

3 - Hipóteses

As hipóteses lançadas são as seguintes: 1) O licenciamento


ambiental municipal é constitucional, vez que a Constituição Federal de 1988
considerou os Municípios como ente da federação e o art. 225 exige que o Poder
Público proteja o meio ambiente, sendo o controle ambiental uma das formas de
proteção ambiental, devendo todos os entes da federação exercerem esse poder
inclusive o Município, independente de delegação de outro ente, vez que a norma
constitucional é clara ao exigir que todos os entes têm o dever de proteção. Assim, o
Município tem autonomia própria para promover o licenciamento ambiental
municipal. 2) Os objetos que deverão ser licenciados pelos Municípios são os que
têm preponderância municipal, ou seja, causam impacto local e por conseqüência
são de interesse local. São objetos que em muitas vezes não são integrados aos
objetos licenciáveis pelos outros entes que também têm o dever de proteção
ambiental. A identificação dos objetos deverá ser obtida através das características
14

locais e a influência que causam nos limites do território do Município. 3) O


licenciamento ambiental é um instrumento local de efetivação de direitos
fundamentais que incidem em casos concretos e que aparentemente apresentam-se
conflitantes, pois é através da ponderação de valores que o licenciamento
proporciona a adequada efetivação de cada direito fundamental.

4 - Metodologia

A pesquisa, sempre nos limites dos objetivos propostos, se


desenvolveu da seguinte forma: 1) levantamento bibliográfico referente a cada um
dos objetivos propostos; 2) identificação das fontes de regulamentação dos bens
ambientais; 3) obtenção e análise da legislação internacional, nacional, estadual e
municipal; 4) aquisição e análise da motivação legislativa na proposição e
elaboração da legislação nacional; 5) estudo crítico do material doutrinário; 6)
seleção e análise de decisões jurisprudenciais dos principais tribunais nacionais; 7)
apontar os caminhos necessários à implementação do Licenciamento Ambiental
Municipal.

5 - Fontes

As fontes são extraídas da doutrina elaborada pelos autores


clássicos versados tanto em direito constitucional quanto administrativo e ambiental.
Há, ainda, a utilização da Constituição Federal de 1988, as Constituições Estaduais
e a legislação federal, estadual e municipal; dos anteprojetos de leis; da
jurisprudência e dos periódicos especializados.

6 - Síntese do conteúdo dos capítulos

A dissertação está dividida em quatro capítulos, além da


introdução, da conclusão e das referências bibliográficas.

6.1 - Capítulo I
15

No Capítulo I, examinarei a colocação do Direito Ambiental


como ramo das Ciências Jurídicas e a sua importância para as pessoas e para todo
o sistema ambiental, demonstrando a importância desse direito para a manutenção
da qualidade de vida dos seres vivos, em especial dos humanos.
Para tal, será explicitado a origem dos direitos fundamentais, a
divisão destes direitos em dimensões e a identificação do ambiente sadio e
equilibrado como sendo um direito de terceira dimensão e por tal essencial às
pessoas humanas.
Serão também demonstrados os princípios constitucionais
ambientais que norteiam toda interpretação jurídica ambiental que visam à
preservação e à proteção dos sistemas ambientais e conseqüentemente a qualidade
de vida das pessoas humanas, apresentando ainda a forma com que esses
princípios devem ser utilizados e a sua adequação com todo o ordenamento jurídico.

6.2 - Capítulo II

O Capítulo II trata da interpretação das normas ambientais e


apresenta o conceito de interpretação e a importância desta em relação às normas
constitucionais e como deve ser realizado o trabalho interpretativo das normas
fundamentais, que não podem ser afastadas em detrimento de outras normas, mas
que, ao mesmo tempo, apresentam-se conflitantes e que os métodos tradicionais de
interpretação não apresentam uma solução satisfatória para os casos concretos. Daí
a necessidade de se estudar e desenvolver um método que possa contribuir para a
interpretação dos direitos fundamentais, inclusive das normas ambientais e, neste
momento, é que se fazem presentes as contribuições do neoconstitucionalismo para
a solução das normas de cunho fundamental, em especial, as normas ambientais.
Ainda nesse Capítulo, será analisada a utilização do método da
ponderação de interesses, que é uma técnica para que o Poder Público possa
adequar na medida do seu ideal cada direito fundamental incidente no caso
concreto, que se submete ao licenciamento ambiental.

6.3 - Capítulo III


16

No Capítulo III será analisado o federalismo brasileiro e


as competências dos entes federativos, em especial no que se refere às
questões ambientais e à competência de cada ente para exercer o
licenciamento ambiental. Ainda, analisar-se-á o poder de polícia estatal, seus
limites e a sua função diante a efetivação de direitos fundamentais, como do
ambiente sadio e equilibrado. Finaliza-se o Capítulo com o estudo do
licenciamento ambiental ao serem analisandos seus procedimentos e a
natureza jurídica da licença ambiental e as suas conseqüências.

6.4 - Capítulo IV

O Capítulo IV trata exatamente da possibilidade dos


Municípios brasileiros poderem implantar o licenciamento ambiental na sua
estrutura administrativa de controle ambiental. Para tal, foi estudada a figura
no Município na Federação brasileira após a Constituição Federal de 1988 e
a necessidade de uma nova interpretação das normas anteriores ao
ordenamento constitucional atual bem como a identificação de diversos
sistemas inconstitucionais em relação ao licenciamento ambiental municipal,
no qual violam as autonomias municipais, conforme vem sendo feito pelo
Estado do Rio de Janeiro. Ainda será identificada a participação da
Sociedade diretamente afetada com as condutas que, de alguma forma,
intervenham no ambiente, demonstrando a necessidade de sua participação,
por se tratar de um direito fundamental e para a concretização do Estado
Democrático de Direito. Finalizando o Capítulo com perspectivas para a
implantação do licenciamento ambiental no Município de Campos dos
Goytacazes no Estado do Rio de Janeiro.
17

CAPÍTULO I – DIREITO FUNDAMENTAL AO AMBIENTE EQUILIBRADO E OS


PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS AMBIENTAIS.

1. O Direito e o Ambiente

Existe a necessidade de inicialmente apontarmos neste estudo


as características do ambiente e sua amplitude, tendo em vista a sua qualificação
como sendo um direito fundamental de grande e vital importância para o
ordenamento jurídico pátrio, vez que afeta diretamente a existência do homem.
Devemos diferenciar alguns conceitos para evitarmos
colocações imprecisas que podem induzir ao erro a verdadeira amplitude do
ambiente, principalmente na definição de ecologia e ambiente, que por vezes se
confunde o âmbito de abrangência entre a ecologia e o ambiente. A ecologia
caracteriza-se por meio dos acontecimentos naturais no ambiente através dos seres
vivos. É o estudo dos seres vivos e de suas características e como se relacionam
entre si. Aliás, o homem deve estar incluído nesta categoria, vez que é um ser vivo e
como tal interage com seus semelhantes e o meio. Vladimir Passos de Freitas nos
apresenta uma clara definição: “A ecologia define-se usualmente como o estudo das
relações dos organismos ou grupos de organismos com o seu ambiente, ou a
ciência das inter-relações que ligam os organismos vivos ao seu ambiente”. 1
O conceito de ambiente tem amplitude muito maior do que o de
ecologia, tendo em vista que o ambiente compreende todos os aspectos sejam vivos
ou não, podendo ser naturais, artificiais e culturais.2 Com isso, podemos observar

1
FREITAS, Vladimir Passos de. A Constituição Federal e a Efetividade das Normas Ambientais, 3ª ed., São
Paulo: RT, 2005, p. 13.
2
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, 7ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 6-7. O termo
ambiente é, por essência, extremamente amplo e pode abrigar as inúmeras realidades que se encontram no
interior da legislação protetora do meio ambiente. Basta que se observe a inserção dos chamados bens culturais
18

que o conceito de ambiente é mais abrangente que o de ecologia e, ainda, que este
encontra-se inserido naquele. Assim, o ambiente, além dos estudos de
relacionamento entre os seres vivos, também os estuda em outros aspectos além da
relação existente entre eles. No Brasil o conceito jurídico de ambiente veio com a Lei
da Política Nacional de Meio Ambiente. Observa-se que apesar de ter sido um
avanço para o país, o legislador infraconstitucional ao conceituar o ambiente
somente mencionou os aspectos referentes aos recursos naturais, não abarcando os
outros aspectos mencionados.3
Através dos apontamentos realizados anteriormente é que se
pode considerar que a ecologia está totalmente inserida no ambiente, conforme
mencionado, mas o inverso não ocorre, pois se pode ter um impacto ambiental sem
ter um impacto ecológico. Exemplificando: podemos ter um dano ambiental com a
destruição de um patrimônio cultural.
Por conseguinte, o Direito Ambiental surge com o objetivo de
proteger o ambiente contra “o aumento cada vez mais rápido e até agora
incontrolado da degradação do ambiente”.4 Por diversos anos o homem utilizou-se
dos recursos ambientais de forma descontrolada e predatória, o que deu ensejo à
necessidade de controlar a degradação através de um ordenamento jurídico
específico de proteção ambiental em decorrência de uma visão de não
compatibilidade entre a preservação ambiental e o desenvolvimento humano. Tal
situação justificou a existência no ordenamento jurídico de um direito especializado
na proteção e preservação ambiental.
Para a concretização da proteção dos recursos ambientais
essenciais para o homem, os Estados e a Sociedade devem estabelecer políticas
protecionistas do ambiente e a interpretação jurídica deve ser voltada para a
proteção e preservação dos recursos ambientais. Assim, a construção deste direito
especializado na proteção do ambiente e, conseqüentemente, da vida humana,
necessitou, na sua elaboração, da interferência de outras ciências através do

no interior do amplíssimo conceito de meio ambiente para que se compreenda as limitações causadas pela
designação de nossa disciplina como Direito Ecológico. A insuficiência da denominação demonstra-se evidente.
3
MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Meio Ambiente Direito e Dever Fundamental, Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2004, p. 40
4
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 49.
19

“conhecimento e pesquisa permanente em áreas interdisciplinares”5 para a


construção válida das normas ambientais.
O Direito Ambiental disciplina as condutas que o homem deve
ter quando relaciona-se com outros elementos do ambiente, especialmente quando
essa conduta interferir no equilíbrio ambiental existente, causando uma alteração
nas características ambientais. Deve-se, portanto, quando ocorrer um desequilíbrio
ser o agente da conduta responsabilizado civil, administrativa e penalmente.
Há tempos já se observou que o ambiente é um sistema no
qual existem diversos elementos. Sendo o homem um desses, e não tendo este um
papel principal no sistema, mas sim como sendo mais um elemento. Não existe um
grau de importância entre os elementos integrantes do sistema ambiental, vez que
se busca um equilíbrio e não a existência de uma supervalorização de um elemento
em prol de outro. Conclui-se tal observação através da obra de Aristóteles no qual
aduz que “a natureza é o real fim de todas as coisas. A respeito dos diversos seres,
dizemos portanto que eles estão integrados na natureza assim que atinjam o
completo desenvolvimento que lhes é próprio”.6 A partir dessa concepção quando o
homem age de forma a degradar o ambiente, há um retrocesso no processo de
desenvolvimento humano, vez que desequilibra o sistema ambiental no qual deve
ser integrante.
Assim, considerando a importância deste ramo do Direito para
a manutenção e a permanência do homem no mundo e a sua essencial necessidade
de permanecer integrado ao sistema ambiental para alcançar um desenvolvimento
humano, no qual se traduz numa existência digna, com qualidade, harmonia e
equilíbrio. Esse direito é consagrado como um direito fundamental do ser humano,
que passamos a analisá-lo de acordo com os direitos fundamentais.

2. Análise dos Direitos Fundamentais


É necessário que preliminarmente se faça uma análise sobre
os Direitos Fundamentais para que se possa demonstrar por meio do seu
desenvolvimento, suas fases e sua posição no ordenamento jurídico, cuja proteção e
a permanência de um ambiente sadio é, para a pessoa humana, um direito
fundamental.

5
FREITAS, Vladimir Passos de. Op. cit., p. 12.
6
ARISTÓTELES. Política, São Paulo: Martin Claret, 2005, p. 14.
20

Tais direitos têm por objetivo a proteção dos indivíduos de


forma individual e coletiva contra as atuações do Estado e de outros indivíduos;
inclusive, o fortalecimento das instituições, a melhoria do desenvolvimento humano e
o cumprimento dos direitos necessários aos homens.

2.1 Desenvolvimento dos Direitos Fundamentais

O aparecimento dos direitos fundamentais como direitos


necessários e explícitos do homem não aconteceu de forma imediata e programada,
mas através de um processo de desenvolvimento com conquistas de diversas
classes, que em determinado momento histórico viram a necessidade de afirmar ou
reafirmar direitos inexistentes ou adormecidos em sua maioria pela opressão que o
Estado proporcionava contra os indivíduos.
Na antiguidade eram mínimos os direitos dos homens, quase
que inexistentes, pois não existia um tratamento igualitário entre os seres humanos,
ou seja as diferenças eram fator preponderante nas sociedades. Uns tinham direitos
e outros na total inexistência. Nessa época, a escravidão era considerada uma
situação natural em que o saber era privilégio de alguns e, com isso, estes poderiam
ter o comando do Estado. Os que não detinham tal poder deveriam ser submissos
aos mandos das pessoas do grupo comandante, ao passo que os subjulgados eram
apontados como uma subespécie, caracterizando uma hierarquia da humanidade.
Esse pensamento não era único na antiguidade porque existiam também os que
com base na natureza biológica, acreditavam que os homens não poderiam ser
diferenciados pelo critério exposto, vez que, biologicamente, eram iguais e, com
isso, deveriam ser tratados como tal.7
Observou-se que as leis existentes sejam elas divinas, naturais
ou positivadas deveriam se interpenetrar, pois emanavam direitos indicativos e
essenciais do homem, caminhando para a existência de uma justiça, não em um
sentido de órgão de decisão ou somente de uma decisão, mas aproximando do
conceito de justo ao homem. Com essa idéia de se buscar a justiça, houve a
inclusão de valores existentes em todas as leis para a concretude do direito do

7
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 2ª ed., Portugal:
Almedina, 1998, p.350 – 351.
21

homem.8 Assim, os direitos fundamentais incluem, na sua conceituação, diversas


categorias de direitos, como os naturais, os humanos, as liberdades públicas, os
direitos públicos subjetivos, os civis e os direitos morais9, sendo que cada um atua
nos direitos fundamentais de forma integrada, interpenetrando todos esses direitos
de forma relativizada entre si e dos quais nenhum existe absolutamente como direito
fundamental, pois já tem seus conceitos próprios e seus efeitos. Por tal razão, não
se pode falar que os direitos humanos são direitos fundamentais, pois estes são
mais do que os direitos humanos, já que têm valores de outros direitos na sua
concretização.
A humanidade durante o seu desenvolvimento começou a
perceber que deve existir uma harmonia e um equilíbrio entre os interesses dos
homens, sejam individuais ou coletivos, e que os segundos são mais relevantes dos
que os primeiros, pois afetam uma gama maior de indivíduos. Entretanto, os
primeiros não deveriam ser afastados, pois tinham, e até hoje têm, um grau de
importância para a dignidade humana. Assim, dever-se-ia coexistir de forma
conjunta, harmoniosa e equilibrada na sua concretização.
A partir do século XVII e XVIII passa-se a desenvolver os
direitos fundamentais através dos modelos inglês, americano e francês, nos quais se
considerava a influência dos direitos naturais e da história na formação da
racionalização dos direitos fundamentais, inclusive o da necessidade, naqueles

8
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 351-352. As concepções cristãs medievais, especialmente o
direito natural tomista, ao distinguir entre lex divina, lex natura e lex positiva, abririam o caminho para a
necessidade de submeter o direito às normas jurídicas naturais, fundada na própria natureza dos homem. Mas
como era a consciência humana que possibilitava ao homem aquilatar da congruência do direito positivo com o
direito divino, colocava-se sempre o problema do conhecimento das leis justas e das entidades que, para além da
consciência individual, sujeita a erros, captavam a conformidade da lex positiva com a lex divina. Ora, foi a
secularização do direito natural pela teoria dos valores objectivos da escolástica espanhola (Francisco de Vitória,
Varquez e Suarez) que, substituindo a vontade divina pela “natureza ou razão das coisas”, deu origem a uma
concepção secular do direito natural, posteriormente desenvolvida por Grotius, Pufendorf e Locke.
9
Para Manoel Messias Peixinho, em sua Tese de Doutorado, afirma que os direitos naturais são aqueles
anteriores ao direito positivo e que esse último só deve existir em concordância com o primeiro, já os direitos
humanos são aqueles nos quais todos os homens devem ter e não podem ser privados, sendo esses
imprescindíveis para existência digna dos homens, enquanto que as liberdades públicas são direitos que os
Estados devem efetivar e protegê-las para os homens, caso contrário, tem eles o direito de oposição contra as
atitudes estatais que venham a violar tais direitos efetivados, os direitos civis caracterizam como sendo os
atrelados à cidadania dos indivíduos em determinado Estado e dos direitos que essa cidadania traz para o
cidadão, já os direitos morais são aqueles anteriores ao direito que devem estar fundamentando o direito a ser
positivado, e, por fim, os direitos públicos subjetivos são direitos exercidos contra o Estado visando proteger o
interesse individual. Evidente que não se pretendeu aqui fundamentar todos esses direitos, mas somente
explicitar um mínimo do conteúdo desses direitos segundo a leitura da tese.
22

momentos, da positivação constitucional dos direitos naturais, para serem


considerados como fundamentais.10
A origem da generalização dos direitos fundamentais, na
modernidade, iniciou-se com a “Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia” em
1776, que tinha como fundamento direitos baseados na existência do homem,
consagrando os princípios da liberdade, da igualdade, da autonomia, do dever do
Estado de atuar condizente com os interesses da sociedade e a separação dos
poderes11 para evitar o absolutismo, a arbitrariedade e buscar a aproximação com a
democracia.12
Os princípios explicitados na “Declaração de Direitos do Bom
Povo da Virgínia” norteiam os direitos fundamentais até os dias atuais,
demonstrando-se totalmente aplicados às necessidades do homem de hoje são a
base de todos os outros direitos fundamentais surgidos posteriormente. Isso,
portanto, configura um verdadeiro nascedouro dos direitos fundamentais.
Após este momento os Estados Unidos da América
consagraram e introduziram em sua Constituição direitos fundamentais do homem
com o objetivo da formação do Estado Federal, composto por treze colônias, que
posteriormente fundamentaram o Bill of Rights Americano ao assegurar uma série
de direitos essenciais ao povo americano.13
Afirmo que os direitos fundamentais consagrados e explicitados
pela Declaração Norte-Americana de 1791 reportavam-se, em sua maioria, aos
direitos contemplados na “Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia” de 1776,
com uma série de aperfeiçoamentos, tendo em vista as necessidades do homem no
momento da Declaração. Na verdade, acredito que até a atualidade, o que ocorre é

10
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Curso de derechos fundamentales. Teoria Geral. Universidad Carlos,
III de Madrid: 1999, p. 146. Desde el siglo XVII se podrá hablar de modelo inglés y desde el XVIII de modelos
americanos y francés. El modelo inglés está vinculado a la historia, y arranca de una evolución Del
constitucionalismo medieval y del viejo y buen derecho delos ingleses. El americano será um modelo mixto, que
parte, sobre todo em los textos de las colonias em el siglo XVII, de una idea del Derecho y de los derechos, toma
de la metrópoli, pero que recibirá progresivamente la influencia de las fundamentaciones del iusnaturalismo
racionalista y pasará de los derechos históricos a los derechos naturales em los textos de la independência. El
modelo francés rechazará su vinculación con el constitucionalismo histórico de las Leyes fundamentales de la
monarquía francesa, y se construirá desde um racionalismo laico, que contrasta también, en ese sentido, con el
modelo americano, más impregnado de valores religiosos.
11
MONTESQUIEU, Charles de Secondat. O Espírito das Leis, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 1992, p. 165. Estaria
tudo perdido se um homem, ou um mesmo corpo de principais ou de nobres, ou do Povo, exercesse estes três
poderes: o de fazer leis; o de executar as resoluções públicas; e o de julgar os crimes ou as demandas dos
particulares.
12
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 162.
13
Ibidem, p. 158-159.
23

a complementação desses direitos a partir das carências e das existências do


homem para sua existência.
Com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de
1789, surge a preocupação de universalizar alguns direitos fundamentais que
modifica o modelo até então existente. Cada Estado consagrava os direitos
essenciais do seu povo, ocorrendo o aparecimento de três elementos fundamentais
para a universalização: o intelectualismo, que buscava a formação de um Estado
ideal, com instauração de um poder legítimo, obtido através do fortalecimento e do
surgimento da participação popular; o mundialismo, que apontava que os preceitos
existentes nas declarações ultrapassavam os limites dos Estados e que na verdade
eram direitos do homem e não dos indivíduos de um Estado e por tal devem ser
visto como preceitos universais; e o individualismo, que consagra a liberdade dos
indivíduos, devendo ser garantido contra as ações do Estado e dos próprios
indivíduos.14
A internacionalização dos direitos, na atualidade, tem grande
importância para o desenvolvimento e a concretude da teoria dos direitos
fundamentais, que será posteriormente estudada, vez que o reconhecimento dos
direitos no plano internacional é o primeiro passo para a positivação dos direitos
fundamentais nos Estados. Em se tratando do direito ao ambiente equilibrado, a
proteção internacional é fundamental, pois as conseqüências da degradação
ambiental não se limitam a um espaço territorial que afetam todos os povos. Tal
processo de internacionalização é recente e surge principalmente após a segunda
guerra mundial com a edição de diversos tratados internacionais de proteção do
homem.15 Vários Estados a partir de uma positivação internacional dos direitos
fundamentais vêm positivando em seus ordenamentos jurídicos direitos já
consagrados internacionalmente, como o próprio ordenamento ambiental16. Essa
consagração no plano internacional do ambiente, como um direito fundamental que
deve ser protegido, já vem sendo consagrado por diversos Estados em seus

14
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 152-154.
15
Ibidem, p. 174-175.
16
Devido as conseqüências da degradação ambiental não terem fronteiras e por tal a manutenção desse bem é
imprescindível para homem, podendo ser considerado como sendo um bem comum a nível internacional, pois
segundo (HABERLE, Peter. El Estado Constitucional, México: Universidad Nacional Autónoma de México,
2001, p. 244.) “el bien común se revela como uma fórmula que constituye a la convivencia humana.”. sendo
assim, impossível uma convivência humana adequada sem um ambiente equilibrado, o que demonstra ser o
ambiente um bem comum.
24

ordenamentos jurídicos, como Portugal17; Espanha18; Cuba19; Chile20; Argentina21 e


Brasil22.

17
PORTUGAL. Constituição da República Portuguesa. promulgada em 2 de abril de 1976, Disponível em:
<http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT/Portugal/Sistema_Politico/Constituicao/05Revisao/constituicao_p07.htm
>. Acesso em: 21 de julho de 2007.
Artigo 66.º (Ambiente e qualidade de vida)
1. Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o
defender.
2. Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por
meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos:
a) Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão;
b) Ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um
equilibrado desenvolvimento sócio-económico e a valorização da paisagem;
c) Criar e desenvolver reservas e parques naturais e de recreio, bem como classificar e proteger paisagens e
sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação de valores culturais de interesse histórico ou
artístico;
d) Promover o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a
estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre gerações;
e) Promover, em colaboração com as autarquias locais, a qualidade ambiental das povoações e da vida urbana,
designadamente no plano arquitectónico e da protecção das zonas históricas;
f) Promover a integração de objectivos ambientais nas várias políticas de âmbito sectorial;
g) Promover a educação ambiental e o respeito pelos valores do ambiente;
h) Assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de
vida.
18
ESPANHA, Constituição da Espanha, de 31 de outubro de 1978. Disponível em :
<http://narros.congreso.es/constitucion/constitucion/indice/titulos/articulos.jsp?ini=10&fin=55&tipo=2>. Acesso
em: 21 de julho de 2007.
Artigo 45
1. Todos tienen el derecho a disfrutar de un medio ambiente adecuado para el desarrollo de la persona, así como
el deber de conservarlo.
2. Los poderes públicos velarán por la utilización racional de todos los recursos naturales, con el fin de proteger
y mejorar la calidad de vida y defender y restaurar el medio ambiente, apoyándose en la indispensable
solidaridad colectiva.
3. Para quienes violen lo dispuesto en el apartado anterior, en los términos que la ley fije se establecerán
sanciones penales o, en su caso, administrativas, así como la obligación de reparar el daño causado.
19
CUBA, Constituição da República de Cuba. Disponível em: <http://www.cuba.cu/gobierno/cuba.htm>.
Acesso em: 21 de julho de 2007. Art. 27 . El Estado protege el medio ambiente y los recursos naturales del país.
Reconoce su estrecha vinculación con el desarrollo económico y social sostenible para hacer más racional la vida
humana y asegurar la supervivencia, el bienestar y la seguridad de las generaciones actuales y futuras.
Corresponde a los órganos competentes aplicar esta política.
Es deber de los ciudadanos contribuir a la protección del agua, la atmósfera, la conservación del suelo, la flora, la
fauna y todo el rico potencial de la naturaleza.
20
CHILE, Constitución Política de la República del Chile, Decreto Supremo no. 1.150, de 1980. Disponível em:
< http://www.bcn.cl/leyes/pdf/actualizado/242302.pdf >. Acesso em: 21 de julho de 2007. Art. 19. La
Constitución asegura a todas las personas:
8º.- El derecho a vivir en un medio ambiente libre de contaminación. Es deber del Estado velar para que este
derecho no sea afectado y tutelar la preservación de la naturaleza.
La ley podrá establecer restricciones específicas al ejercicio de determinados derechos o libertades para proteger
el medio ambiente;
21
ARGENTINA, Constitucion De La Nacion Argentina, de 24 de agosto de 1994. Disponível em:
<http://www.argentina.gov.ar/argentina/portal/documentos/constitucion_nacional.pdf >. Acesso em: 21 de julho
de 2007. Artículo 41- Todos los habitantes gozan del derecho a un ambiente sano, equilibrado, apto para el
desarrollo humano y para que las actividades productivas satisfagan las necesidades presentes sin comprometer
las de las generaciones futuras, y tienen el deber de preservarlo. El daño ambiental generará prioritariamente la
obligación de recomponer, según lo establezca la ley.
Las autoridades proveerán a la protección de este derecho, a la utilización racional de los recursos naturales, a la
preservación del patrimonio natural y cultural y de la diversidad biológica, y a la información y educación
ambientales.
25

2.2 O Sistema Jurídico dos Direitos Fundamentais

Conceituar os direitos fundamentais é imprescindível para que


possamos entender a sua profundidade e necessidade para a formação de um
Estado Democrático de Direito e para os indivíduos e as instituições.
O sistema jurídico dos direitos fundamentais é um subsistema
do ordenamento jurídico de um Estado e é norma básica para a concretude de todo
o ordenamento jurídico. Todos os outros subsistemas estão sob o comando
normativo fundamental. Esse poder irradiante dos direitos fundamentais sobre as
outras normas do ordenamento jurídico é que produz uma humanização das normas
jurídicas, podendo ter diferentes soluções quando aplicados aos casos concretos, a
depender do grau de valorização e de penetração dos direitos fundamentais. A
irradiação dos direitos fundamentais deve acontecer freqüentemente, não só no

Corresponde a la Nación dictar las normas que contengan los presupuestos mínimos de protección, y a las
provincias, las necesarias para complementarlas, sin que aquellas alteren las jurisdicciones locales.
Se prohibe el ingreso al territorio nacional de residuos actual o potencialmente peligrosos, y de los radiactivos.
22
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 21 de julho de 2007. Art.225 - Todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e
ecossistemas.
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à
pesquisa e manipulação de material genético
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção.
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa
degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem
risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação
do meio ambiente.
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função
ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
§2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com
solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
§3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou
jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona
Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à
proteção dos ecossistemas naturais.
§6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não
poderão ser instaladas.
26

momento da análise do caso concreto ou abstrato, mas durante todas as condutas,


seja do Estado, da Sociedade ou do Indivíduo, passando esses a todo instante
exercerem certo posicionamento a partir das normas fundamentais.23
De vital importância para a existência de direitos fundamentais
em um Estado é a sua positivação, preferencialmente nas Constituições, de direitos
e valores éticos dos homens para o ordenamento jurídico constitucional. Ressalta-se
que a positivação carece de ser realizada no texto máximo do Estado para que
sejam normas basilares de todo o ordenamento jurídico estatal, caso contrário,
poderá ser reduzido a proposições de idéias e não de normas para os indivíduos.24
Ocorre que a positivação das normas fundamentais na Constituição é um critério
formal, tendo em vista o poder irradiante da norma. Por ser ela básica no
ordenamento, deve então ocupa o lugar normativo máximo do ordenamento jurídico.
Alexy25 aduz que o modelo puramente formal de um ordenamento no qual as
normas fundamentais não estão na Constituição não trazem nenhuma força
vinculante diante o legislador, já que essas normas poderiam ser restringidas
sempre que esses decidissem, desconsiderando a força material das normas
fundamentais. Tal modelo não demonstra adequadamente a força do subsistema
das normas fundamentais, pois não é a localização no ordenamento jurídico que dá
força para norma fundamental ser básica para todo o ordenamento: independe onde
esteja positivada a normas. São normas materialmente constitucionais
fundamentais, pois estão espalhadas em todo o ordenamento jurídico, podendo
inclusive não estarem positivadas no ordenamento jurídico de um país, mas serem
consagradas internacionalmente; e por tal, devem vincular os países, por
normatizarem direitos de todos os homens e não de uma determinada parcela.

23
SARMENTO, Daniel. A Dimensão Objetiva dos Direitos Fundamentais: Fragmentos de uma Teoria. In:
BINENBOJM, Gustavo. Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro:
Direitos Fundamentais. V. XII. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2003, p. 312-313. e PECES BARBA MARTÍNEZ,
Gregorio. Op. cit., p. 354-355. e ALEXY, Robert. Teoria dos Derechos Fundamentales, Madrid: Centro de
Estúdios Contitucionales, 1997, p 507-508.
24
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 357-358. La jerarquía de los subsistemas jurídicos,
dependeria por consiguiente Del grado de proximidad o de alejamento respecto de la norma básica. Así si
comparamos estos subsistemas, que son creaciones intelectuales Del pensamento jurídico, com las diversas
fuentes del Derecho, o formas de producción normativa del Derecho positivo, podemos constatar que la norma
básica formal y material ocupa más preeminente en la Constitución, que es así la sede de la identificación de las
normas en un Estado de Derecho, y que los subsistemas jurídicos que derivan inmediatamente, sin
intermediarios, de dicha norma básica, se suelen situar igualmente en la Constitución.
25
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 504. A este modelo corresponde una teoria de los derechos fundamentales según
la cual los derechos fundamentales no tiene frente al legislador ninguna fuerza vinculante, es decir, el legislador
posee competencia para restringirlos según lo desee, aunque em determinada forma.
27

Em países em que a Constituição somente normatiza a


organização dos poderes e dos procedimentos, como a Grã-Bretanha, não há
abertura de espaço para a positivação constitucional dos direitos fundamentais. Mas,
nem por isso, tais direitos inexistem no ordenamento jurídico sem uma forma
constitucional, pois, mesmo assim existem por serem normas materialmente
constitucionais, devido a sua natureza de norma básica de um ordenamento e
principalmente do homem.26
Além da positivação na Constituição dos Direitos
Fundamentais, que são normas constitucionais de elevado grau de rigidez, dever-se-
ia também existir a inclusão de valores e princípios a essas normas na sua
aplicação, a demonstrar um perfil do Estado que as consagra porque existe uma
especificação dos direitos fundamentais em cada Estado.27
É complexo o problema da identificação de direitos
fundamentais que não estão consagrados nas Constituições, mas que diante de sua
universalidade incidem sobre o ordenamento jurídico. Esses são direitos que
independe da vontade dos Estados, tendo em vista que, em sua maioria, afetam
toda a população mundial.
O ambiente é um exemplo evidente desse tipo de direito
fundamental que independe de positivação no ordenamento jurídico dos Estados,
vez que os efeitos da sua devastação ocorrem em todo o planeta, sendo um dever
universal a sua proteção. Esses direitos não podem ser afastados pelo simples fato
de não estarem nas Constituições, pois são normas materialmente fundamentais e
independente de positivação pela Constituição28, inclusive por serem necessários à
vida digna da pessoa, como condição essencial à sua existência. “Aunque no se
trata de um estúdio del Derecho positivo del medio ambiente, sí se debe señalar
que, por las mismas razones filosóficas que hemos explicado para equilibrar el
desarrollo económico con la protección de la naturaleza y de sus especies, con el
objetivo de una mejor calidad de vida”.29
As normas materialmente fundamentais não positivadas nos
ordenamentos jurídico dos Estados e em sua maioria são identificadas através dos
Tratados e Documentos Internacionais que se impõem a toda a comunidade

26
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 503. e Gregório Peces-Barba Martinez. Op. cit., p. 357-358.
27
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 19ª, São Paulo: Malheiros, 2006, p. 561.
28
MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Op. cit., p. 85.
29
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 187.
28

internacional o cumprimento dos deveres para com o homem.30 Para Peces-Barba31,


os direitos fundamentais devem ser positivados no ordenamento jurídico,
independentemente se essas normas de conteúdo materialmente fundamental
estiverem protegendo e consagrando direitos para os homens, assim como as
normas de direito natural. Segundo o autor supracitado sem a positivação estes
direitos não passam de mero ideal moral sem possibilidade de complementação do
ordenamento jurídico. É importante analisar se essa positivação pode ocorrer
somente em âmbito internacional, vindo a fundamentar o ordenamento jurídico dos
Estados ou se deve ocorrer na positivação do ordenamento jurídico de cada Estado.
Os direitos fundamentais são essenciais à existência do
homem de forma digna no planeta, sendo estes consagrados universalmente32 ou
identificados como direitos particulares de determinado Estado, podendo os
primeiros encontrarem-se positivados na Constituição ou não para sua eficácia,
enquanto os segundos devem estar expressamente contidos nas Constituições, ou
seja, são esses direitos fundamentais identificados como essenciais para a
população de dado Estado e que podem não ser de grande relevância para outros.
O que importa nesses casos são as características de cada Estado para sua
positivação como norma fundamental constitucional.

2.3 As Dimensões dos Direitos Fundamentais33

A importância dos direitos fundamentais para o ordenamento


jurídico passa por etapas os quais dividem-se, segundo alguns autores, em
gerações; ou, para outros, o melhor termo seria dimensões. A denominação

30
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais, 2ª ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2001, p. 59-60. A partir da Declaração Universal da ONU, constata-se a existência de uma nova fase,
caracterizada pela universalidade simultaneamente abstrata e concreta, por meio da positivação – na seara do
Direito Internacional – de direitos fundamentais reconhecidos a todos os seres humanos, e não apenas (mas
também) aos cidadãos de determinado Estado. Verifica-se, nesta fase, que se encontra em pleno processo de
maturação, a gradativa e intensa aproximação dos direitos humanos (considerados como os reconhecidos a todos
os homens pelo Direito Internacional) e dos direitos fundamentais, mediante a construção, a exemplo do que já
foi referido alhures, do que vem sendo denominado de um direito constitucional internacional.
31
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 160.
32
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., 571.
33
A teoria das Gerações de Direitos foi desenvolvida pelo jurista francês KAREL VASAK (de origem dele é
checa), em Conferência proferida no Instituto Internacional de Direitos Humanos, no ano de 1979. Karel
classificou em três gerações os Direitos Humanos e fundou o seu pensamento em um dos dísticos da Revolução
Francesa de 1789 (liberté, egalité et fraternité), qual seja, a solidariedade. Cf. VASAK, Karel. For the third
generation of human rights: the rights of solidarity. Inaugural Lecture, Tenth Study Session, International
29

“gerações” poderia aparentar que os direitos consagrados teriam inicio e término,


sendo que, para começar uma geração teria de terminar a anterior. Assim, o
entendimento condizente às dimensões traduz uma idéia de que tais direitos se
complementam34. “Com efeito, não há como negar que o reconhecimento
progressivo de novos direitos fundamentais tem caráter de um processo cumulativo,
de complementaridade, e não de alternância(...)”.35 Acredito que esse processo de
cumulação de dimensões é interminável, tendo em vista o desenvolvimento da
humanidade, na qual provavelmente surgirão outros direitos a serem consagrados,
como essenciais ao homem.
A primeira dimensão da teoria dos direitos fundamentais refere-
se ao direito às liberdades, os quais se encontram nos países democráticos com
grande efetividade, uma vez que inexiste um Estado Democrático de Direito sem a
consolidação dos direitos de primeira dimensão.36 Estes, por sinal, são direitos do
indivíduo que podem ser efetivados através de uma não interferência do Estado na
esfera dos homens. É na certeza de que o mesmo Estado atue a impedindo que
esses direitos sejam violados por atitudes de outras pessoas. O Estado deve ter uma
dupla posição, tendo uma ação que possa impedir que os indivíduos violem seus
direitos e, também, exerça uma ação de controle sobre sua própria atuação.37
Têm os Estados o dever de concretizar a proteção das
liberdades dos indivíduos através da instrumentalização da defesa contra as
medidas do próprio Estado e de entes privados.38 Assim, dever-se-ia estabelecer

Institute of Human Rights, July, 1979. Ver, ainda, VASAK, Karel. The international dimension of human rights.
Vols. I e II, Paris:UNESCO, 1982.
34
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 68; BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 571-572. Força é
dirimir, a esta altura, um eventual equívoco de linguagem: o vocábulo “dimensão” substitui, com vantagem
lógica e qualitativa, o termo “geração”, caso este último venha a induzir apenas sucessão cronológica e, portanto,
suposta caducidade dos direitos das gerações antecedentes, o que não é verdade. Ao contrário, os direitos da
primeira geração, direitos individuais, os da segunda, direitos sociais, e os da terceira, direito ao
desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são infra-estruturais, formam
a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia;(...).
35
SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit., p. 49.
36
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 563.
37
PEIXINHO, Manoel Messias.Teorias e Métodos de Interpretação dos Direitos Fundamentais. Tese (Doutorado
em Direito) – Pontifica Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: PUC, 2004, p. 29. O Professor
Peixinho em sua Tese de Doutorado demonstra que esse direito configuram como sendo direitos de oposição
contra a atuação arbitrária do Estado, que mesmo quando a atuação é livre o ente estatal deve agir de forma
proporcional para que não promova uma violência com os indivíduos e quando isto não ocorre tal dimensão lhe
concede o direito de se opor ao modelo arbitrário imposto pelo Estado. Mais que exigir uma atuação comedida
do Estado, o professor na página 47 de sua tese, aduz que além desta atuação estatal também cabe ao indivíduo
requisitar do Estado ação protetiva contra a atuação violenta e opressora de outros indivíduos.
38
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, RE 201.819, relator: Min. Celso de Mello, j. 11/10/2005.
Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 16 ago. 2007. Eficácia dos direitos fundamentais nas
30

limites para a liberalidade privada quando esta pode causar a invasão de direitos de
outros indivíduos, criando um conflito entre interesses e, ao mesmo tempo, limitando
a sua própria atuação, o que demonstra ser um dever de prestação na concretização
desses direitos.
A limitação de atuação do Estado não está somente incluída na
esfera de atuação privada, mas em todo o processo de atuação estatal, vez que se
deve limitar a ação até mesmo quando exista uma área de livre atuação do Estado.
Por isso, devem os cidadãos participar da condução estatal para evitar abusos sob a
justificativa da não interferência nos direitos de primeira dimensão.39 Ingo Wolfgang
Sarlet menciona que tais direitos têm origem nos preceitos do direito natural e se
desdobram em diversos outros direitos, além dos de liberdade, devido ao seu caráter
individualista.40
A segunda dimensão dos direitos fundamentais é caracterizada
pelos aspectos social, cultural e econômico, tendo o Estado o dever de efetivação.
São direitos prestacionais positivados com o objetivo da realização de justiça.41 Os
direitos dessa dimensão complementam os da primeira dimensão, pois exigem do
Estado a efetivação dos direitos sociais, econômicos e culturais, ocorrendo através

relações privadas. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o
cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado.
Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes
públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. Os princípios
constitucionais como limites à autonomia privada das associações. A ordem jurídico-constitucional brasileira não
conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em
especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República,
notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada
garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que
asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras
limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de
terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere
aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas
e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no
âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais.
39
PEIXINHO, Manoel Messias. Op. cit., p. 29.
40
SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit., p. 50 – 51. Assumem particular relevo no rol desses direitos,
especialmente pela sua notória inspiração jusnaturalista, os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e à
igualdade perante a lei. São, posteriormente, complementados por um leque de liberdades, incluindo as assim
denominadas liberdades de expressão coletiva (liberdades de expressão, imprensa, manifestação, reunião,
associação, etc.) e pelos de direitos de participação política, tais como o direito de voto e a capacidade eleitoral
passiva, revelando, de tal sorte, a íntima correlação entre os direitos fundamentais e a democracia. Também o
direito de igualdade, entendido como igualdade formal (perante a lei) e algumas garantias processuais (devido
processo legal, habeas corpus, direito de petição) se enquadram nesta categoria.
41
O Brasil não positivou os direitos econômicos no título destinado aos direitos e garantias fundamentais, mas
tais direitos foram positivados em título próprio posteriormente no corpo constitucional, demonstrando que, o
texto constitucional está repleto de direitos fundamentais e não só no título próprio, vez que o importante e a
análise do conteúdo da norma e não o local de sua positivação na Constituição.
31

de uma ação positiva que, se não forem efetivados, afetam as liberdades e


desequilibra a igualdade entre os cidadãos.
Ocorre uma verdadeira transição das liberdades formais e
abstratas da primeira dimensão para as liberdades materiais e concretas com a
segunda, uma vez que concedem aos indivíduos direitos que devem ser prestados
pelo Estado, que são as prestações sociais, culturais e econômicas. Ressalta-se,
também, que tais direitos ainda estão relacionados à pessoa individualmente e não
de forma coletiva ou difusa.42 Contudo, mesmo sendo direitos de caráter individual,
trazem consigo valores que a comunidade aspira que se efetivem, embora não tão
marcantes como os direitos de terceira dimensão.43
Os direitos da segunda dimensão se dividem em dois aspectos:
os de cunho positivo; caracterizado como sendo o direito à assistência social, à
saúde, ao trabalho e à educação; os de cunho negativo, que permitem que os
indivíduos exerçam liberdades concretas sem a intervenção do Estado. Esses se
caracterizam pelo direito de greve, de sindicalização, de férias aos trabalhadores e
outros.44
Na Constituição Federal do Brasil de 1988, o direito ao
ambiente é normatizado também como um direito social, vez que no capítulo VI, que
trata da matéria ambiental, está inserido no Título VIII, destinado à ordem social.
Acredito que o ambiente é um direito prestacional, pois exige do Estado uma
prestação de fato em relação aos bens ambientais, no qual o mesmo tem o dever de
não se omitir, mas de promover a proteção ambiental. Ele deve executar ações de
restauração de ambientes danificados e impedir as possíveis intervenções
promovidas por entes privados, pois se está a preservar o direito à vida e à
dignidade das pessoas. Para Alexy45, tal direito seria distinto dos direitos sociais,
pois seria mais do que direitos individuais ou de um grupo identificado. Na verdade,
o direito fundamental ambiental realmente encontra-se numa posição de proteção
que transcende o indivíduo ou um grupo determinado, mas nem por isso deixa de
ser um direito prestacional, pois exige do Estado prestações de defesa e de

42
SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit., p. 51 – 52. e SARMENTO, Daniel. A Dimensão Objetiva dos Direitos
Fundamentais: Fragmentos de uma Teoria. In: BINENBOJM, Gustavo. Revista de Direito da Associação dos
Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro: Direitos Fundamentais. V. XII. Rio de Janeiro, Lumen Juris,
2003, p. 298 – 299. e BOBBIO, Norberto. Op. cit., p. 69.
43
PEIXINHO, Manoel Messias. Op. cit., p. 48
44
SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit, p. 72.
45
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 428-429.
32

proteção, que passam a ter nessas prestações, além do Estado, a Sociedade como
o agente prestacional.46
As instituições, nesse momento, passam a ter um valor de
grande importância para a concretude dos direitos sociais, culturais e econômicos. A
partir desse aspecto vislumbra-se que elas deveriam ser protegidas, com as
garantias dos valores e dos princípios, surgindo com essa proteção, as garantias
institucionais. Ressalta-se que para que as instituições sejam vistas como
verdadeiras garantidoras dos direitos de segunda dimensão, deveriam ter alguns
elementos: “(...) primeiro, que haja uma garantia e que esta, de ordinária, seja de
natureza constitucional; a seguir que a garantia tenha um objeto específico, a saber,
uma “instituição”, visto que do contrário não se poderia falar de “garantia
institucional”; e, finalmente, que se refira a algo atual, presente e existente, dotado
de forma e organização, a que já se prende também uma situação jurídica
constatável;(...)”.47
De grande relevância para este estudo é a terceira dimensão
dos direitos fundamentais, pois está relacionada com o desenvolvimento da
humanidade através do ambiente sadio e equilibrado, as comunicações e ao
patrimônio comum da humanidade e outros.48 Com isso, o principal protagonista
dessa dimensão deixa de ser o homem como titular desses direitos e passa a ser a
humanidade, que é a destinatária dos direitos consagrados na terceira dimensão.
Os direitos da terceira dimensão são direitos ligados a uma
conduta fraterna e solidária49, pois são metaindividuais. Para sua efetividade,
transcendem os territórios geográficos e, até mesmo, a soberania dos Estados,

46
Acredito que o direito ao ambiente sadio e equilibrado inicia-se como um dever prestacional do Estado no qual
a sociedade não tinha um dever de proteção ambiental e que posteriormente observa-se que este dever
prestacional do Estado é insuficiente para a proteção ambiental e que o direito ao ambiente automaticamente
corresponde a um dever correlato de proteção e preservação, passando a ter uma visão muito mais ampla de que
a prestação de direitos aos indivíduos. Daí Alexy estar certo quando afirma se tratar de um direito muito maior
do que um direito prestacional de segunda dimensão, pois tem seus fundamentos próprios, mas entendo que a
proteção ambiental inicia-se como um direito social e que, posteriormente, este direito ainda social, por estar
atrelado diretamente à vida das pessoas passa a ter uma amplitude que transcende as fundamentações da segunda
dimensão.
47
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 566.
48
MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura de. Op. cit., p. 73.
49
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 68. Asì, como los derechos de las genereciones anteriores
responden a los valores superiores de la liberdad, de la igualdad, o en caso de fórmulas de síntesis, a la liberdad
igualitaria, en este caso el fundamento se encuentra en el valor solidaridad o fraternidad, o en el valor seguridad
jurídica en ciertos casos, conjuntamente con el de solidaridad. Sin intentar un elenco exhaustivo que es siempre
imposible, sin llegar a una moralidad cerrada y dogmática, se pueden señalar tres dimensiones diferentes de estos
derechos: los referidos al medio ambiente y a la protección del entorno natural; el derecho al desarrollo; y el
derecho a la paz.
33

necessitando de uma atuação plena entre os Estados e os indivíduos. Esses são


direitos de essencialidade coletiva e difusa50.
O Supremo Tribunal Federal do Brasil, em recente julgado,
reconhece o ambiente como um direito fundamental e reconhece também o princípio
da solidariedade, vez que existe um dever do Poder Público e da coletividade de
manter o ambiente equilibrado para a atual e para as futuras gerações.
Apropriadamente, destaca-se então o voto do Ministro relator Celso de Mello. 51
Posso observar ainda com o julgado do STF que a Corte Constitucional do Brasil
reconhece o ambiente equilibrado como fundamental, independente de positivação
expressa na Constituição, tendo em vista seu caráter de solidário e seu dever de
proteção para as presentes e futuras gerações.
A dimensão em análise, devido ao compromisso de
52 53
solidariedade entre os Estados e estes com os indivíduos , tem o dever de prestar
auxilio aos que necessitam de ajuda, no alcance do equilíbrio necessário que
reclamam estes direitos para a existência do homem, caracterizado como direitos de
grande universalidade. Daí, surge a comprovação de que são direitos que
independem de positivação expressas nas Constituições; em sua maioria, são
declarados no plano internacional, no qual novamente podemos afirmar que o Poder
Judiciário já assentou que esse direito é universal e que extrapola o poder de
positivação constitucional interna dos Estados.54

50
GRECO, Leonardo. Estudos de Direito Processual, Campos dos Goytacazes – RJ: Faculdade de Direito de
Campos, 2005, p. 472. (...) a tutela dos interesses de grupos é bastante abrangente através das ações coletivas,
pois inclui os chamados interesses difusos (metaindividuais de natureza indivisível, de que são titulares pessoas
indeterminadas ligadas por circunstâncias de fato; exemplo: o meio ambiente), os coletivos (metaindividuais de
natureza indivisível de que são titulares grupos de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma
relação jurídica base; exemplo: a qualidade de um produto oferecido ao consumo (...)
51
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, ADIN nº 3.540-1 DF, relator: Min. Celso de Mello, j.
01/09/2005. Disponível em http://www.stf.gov.br. Acesso em 16 ago. 2007. Trata-se, consoante já o proclamou
o Supremo Tribunal Federal, com apoio em douta lição expedida por Celso Lafer, de um típico direito de terceira
geração (ou de novíssima dimensão), que assiste, de modo subjetivamente indeterminado, a todo o gênero
humano, circunstância essa que justifica a especial obrigação – que incumbe ao Estado e à própria coletividade
de defende-lo e de preserva-lo em benefício das presentes e futuras gerações, evitando-se, desse modo, que
irrompam, no seio da comunhão social, os graves conflitos intergeneracionais marcados desse bem essencial de
uso comum de todos quantos compõem o grupo social.
52
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 262.
53
Essa solidariedade entre Estados e entre indivíduos, segundo Peces-Barba, os atores envolvidos, que são os
Estados e os indivíduos, estabelecem entre eles uma conduta, na qual exista uma relação de amor com o ser
humano, tendo uma visão de que todos formam uma unidade humana e que tais bens protegidos por essa
dimensão são de uso comum, sendo de todos os uso e assim de todos são o dever de proteção e principalmente o
entendimento de ajuda para a existência da viva digna de todos.
54
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, ADIN nº 3.540-1 DF, relator: Min. Celso de Mello, j.
01/09/2005. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 16 ago 2007. A preocupação com a
preservação do meio ambiente – que hoje transcende o plano das presentes gerações, para também atuar em
34

Poder-se-ia dizer, inicialmente, que a fundamentação da


proteção ambiental consagrada na terceira geração demonstra-se contraditória com
55
as outras dimensões dos Direitos Fundamentais, principalmente com o direito de
liberdade; e, ainda aparentemente, se contradiz com outro direito consagrado na
terceira geração que é o direito ao desenvolvimento. Tal perspectiva não procede,
pois a liberdade ainda existe, desde que não afete outros direitos consagrados como
fundamentais. Da mesma forma que esses novos direitos não podem excluir os
direitos já consagrados anteriormente. Daí, novamente, retorno ao entendimento que
essas dimensões se complementam e não se caracterizam com a definição de
geração. No tocante ao desenvolvimento, em especial ao econômico, deveria existir
um novo modelo, no qual se buscaria a preservação da vida, vinculando medidas
protecionistas ao ambiente e criando uma interação desses dois valores, os
econômicos e os ambientais, essenciais ao homem, sendo desenvolvida a partir de
uma concepção constitucional, para que venha a vincular todo o ordenamento
jurídico.56 Essa vinculação entre as necessidades econômicas e ambientais é que
impõe um novo padrão de desenvolvimento que atenda aos anseios econômicos e
ambientais do homem, sendo esse um desenvolvimento sustentável.
É importante observar que tais direitos, de terceira dimensão,
surgem a partir do desenvolvimento tecnológico e dos impactos que estes provocam
nos indivíduos. E, devido à grande abrangência dos impactos tecnológicos, é que
eles se materializam de forma ampla e coletiva, ultrapassando a consagração das
dimensões anteriores. Na verdade, as novas tecnologias começaram a ampliar o
espectro das liberdades, pois, até então, a liberdade era restringida quando afetava
de forma individual e não de uma forma coletiva e/ou difusa, ainda que fosse para a
preservação dos direitos para as próximas gerações.57

favor das gerações futuras tem constituído, por isso mesmo, objeto de regulamentações normativas e de
proclamações jurídicas, que ultrapassando a província meramente doméstica do direito nacional de cada Estado
soberano, projetam-se no plano das declarações internacionais, que refletem, em sua expressão concreta, o
compromisso das Nações com o indeclinável respeito a esse direito fundamental que assiste a toda Humanidade.
55
PECES BARBA MARTÍNEZ, Gregorio. Op. cit., p. 184.
56
HABERLE, Peter. El Estado Constitucional, México: Universidad Nacional Autónoma de México, 2001, p.
259 – El desafio a la teoria constitucional es tanto mayor por cuanto en Ocidente se extiende un nuevo
economicismo o materialismo (mercantilización de casi todos los ámbitos de la vida), en que deben ser
vinculados la ecologia y la economia, y que desdde el punto de vista de la política constitucional, hay que decidir
en todos los processos constituyentes actuales (por ejemplo, en Europa oriental y anteriormente en Alemanha del
este) aquello que, en materia de mercado y economía de mercado, debe convertirse en textos constitucionales, y
cómo debe hacerlo.
57
SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit., p. 52 –53.
35

Com a globalização, passou a surgir a ameaça de


enfraquecimento da soberania e dos valores dos Estados, tendo em vista a
influência da globalização econômica que, a partir de um ideário econômico, começa
a influenciar na política dos Estados de forma a minimizar a soberania e os direitos e
garantias consagrados pelos Estados.58 Em contrapartida, uma globalização política
de maior amplitude e benéfica para o homem, é a globalização política dos direitos
fundamentais para torná-los cada vez mais universais. Isso propicia uma melhor
existência do homem, partindo da liberdade, da igualdade e da fraternidade, sendo
isso uma cumulação de todas as outras dimensões e de outras que vierem a surgir.
Tal situação entende que esses direitos fundamentais e universais são
desnecessários de processo de positivação pelos Estados para que sejam
considerados direitos fundamentais.
A globalização política dos direitos fundamentais dá origem a
quarta dimensão da teoria dos direitos fundamentais, que se concretiza através do
direito à democracia, à informação e ao pluralismo, transformando-se em um
processo de interação entre a coletividade e o Poder Estatal. Origina-se daí o direito
à participação da vida política dos Estados. Para isso, a democracia deve ser plena,
em sua efetivação, assim como a informação deve ser clara e verdadeira, não
sofrendo manipulação nem interferências do poder estatal e nem do poder
econômico. Tal como o pluralismo59 também dever ser livre e igualitário.60
A dimensão defendida por Paulo Bonavides, ainda não
reconhecida pelo Direito Internacional61, é o direito do indivíduo e da sociedade de
participar do destino do Estado e de sua gestão, que vem se efetivando no Brasil
através da criação crescente de Conselhos Nacional, Estadual e Municipal, inserindo
a sociedade na gestão do Estado. Existindo também, na seara processual, a ação
popular e a ação civil pública na defesa da cidadania.

3. Os Princípios Constitucionais do Equilíbrio Ambiental

58
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., 570-571.
59
QUARESMA, Regina; GUIMARAENS, Francisco. Princípios Fundamentais e Garantias Constitucionais. In:
PEIXINHO, Manoel Messias (Org). Os Princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001,
p. 403. O pluralismo político pressupõe a existência de diversos grupos, muitos com interesses opostos, devendo
ser garantido a cada um deles espaço para manifestação e expressão políticas de suas idéias. Assim, a liberdade
de associação, a liberdade partidária, a liberdade de reunião e de pensamento são direitos que se vinculam
diretamente ao pluralismo político, sem os quais não se pode falar em possibilidade de manifestação livre dos
grupos sociais.
60
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., 571.
36

Procuro, a partir do ponto em evidência, apresentar os


princípios ambientais consagrados na atual Constituição Federal do Brasil, princípios
que devem interpenetrar na interpretação do ordenamento jurídico quando o
ambiente for afetado, de alguma forma, buscando a efetivação da norma jurídica
ambiental.

3.1 – Os Princípios no Ordenamento Jurídico


Inicialmente irei esclarecer as diferenças existentes entre as
normas, os princípios e as regras, em que todos compõem o ordenamento jurídico.
Para Alexy, as regras e os princípios são espécies de normas
existentes no ordenamento jurídico, pois ambos conduzem a um juízo do que deve
ser, tendo como diferença a sua tipologia62. Esses, por sua vez, são normas de tipos
diferentes, mas ambas integram um comando normativo.63. Assim, com a inserção
de princípios e/ou regras na interpretação surgem as normas jurídicas. Tal posição
não é a única a respeito do conceito de regras e princípios. Um segundo
posicionamento defendido por Dworkin, aborda que os princípios não são normas,
uma vez que o autor não considera que os princípios conduzem a um juízo do dever
ser, como diz Alexy, pois pode existir, numa mesma situação, a validez de dois ou
mais princípios, diferentemente do que ocorre com as normas que demonstram, na
sua efetividade, um único deve ser.64 Assim, entendo que a grande abstratividade
existente nos princípios não possa deixá-los de conduzir a um dever ser, quando
vistos isoladamente. Contudo, quando são inseridos na interpretação de
determinada situação concreta, essa abstratividade e a validez de diversos
princípios irão gerar uma norma específica, que deverá ser aplicada ao caso
concreto. No futuro, ou em outra situação, na qual se utilize os mesmos princípios,
concluo que, para aquele caso, a norma dita no primeiro não é mais válida. Deve-se

61
SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit., p. 55.
62
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 83. A menudo, no se contraponen regla y principio sino norma y principio o
norma y máxima. Aquí lãs reglas y los princípios serán resumidos bajo el concepto de norma. Tanto lãs reglas
como los princípios son normas porque ambos dicen lo que debe ser. Ambos pueden ser formulados com la
ayuda de lãs expresiones deónticas básicas Del mandato, la permisión y la prohibición. Los distinción entre
reglas y princípios es pues uma distinción entre dos tipos de normas.
63
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 1034.
64
DWORKIN, Robert. Los Derechos en Serio, 4ª reimpresion, Barcelona: Ariel, S.A., 1999, p. 74-75. La
diferencia entre princípios jurídicos y normas jurídicas es uma distinción lógica. Ambos conjuntos de estándares
apuntan a decisiones particulares referentes a la obligación jurídica en determinadas circunstancias, pero difieren
en el carácter de la orienteción que dan. Las normas son aplicables a la manera de disyuntivas. Si los hechos que
estipula uma norma están dados, entonces o bien la norma es válida, en cuyo caso la respuesta que da debe ser
aceptada, o bien no lo es, y entonces no aporta nada a la decisión.
37

ter uma nova norma para aquela nova situação. Portanto, esse nascimento de
normas específicas a partir de princípio, nos faz acreditar que, quando um princípio é
analisado isoladamente, ele não deve ser considerado como uma norma, mas, na
aplicação com outros princípios na busca da solução de determinada situação,
entendo que estaria diante de uma norma jurídica.
Entre os princípios e as regras65 existem diversas diferenças,
principalmente entre o grau de abstração, de determinabilidade, de
fundamentalidade, de aproximação com os ideais de direito e justiça e de diferenças
de base, pois as regras são constituídas a partir dos princípios.66 Tal diferenciação
gera, segundo Alexy67, três teses: a primeira vislumbra a divisão da norma em
classes, em que os princípios são normas que têm conteúdo valorativo que serviriam
para o desenvolvimento do ordenamento jurídico, e são as bases para
fundamentação da aplicação de outra norma de classe diferente que seria a regra.
Na segunda tese, considera que as normas jurídicas são divididas através de graus

65
Neste estudo irei adotar a denominação regra e princípio, considerando que, segundo a doutrina de Dworkin, a
denominação de regra e princípio é muito próxima da denominação que ele propõe sobre princípio e norma.
66
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 1035– 1036. Os princípios interessar-nos-ão, aqui, sobretudo
na sua qualidade de verdadeiras normas, qualitativamente distintas das outras categorias de normas ou seja, das
regras jurídicas. As diferenças qualitativas traduzir-se-ão, fundamentalmente, nos seguintes aspectos. Em
primeiro lugar, os princípios são normas jurídicas impositivas de uma optimização, compatíveis com vários
graus de concretização, consoante os condicionalismo fácticos e jurídicos; as regras são normas que prescrevem
imperativamente uma exigência (impõem, permitem ou proíbem) que é ou não é cumprida (nos termos de
Dworkin: applicable in all-or-northing fashion); a convivência dos princípios é conflitual (Zagrebelsky), a
convivência de regras é antinômicas; os princípios coexistem, as regras antinômicas excluem-se.
Consequentemente, os princípios, ao constituírem exigências de optimização, permitem o balanceamento de
valores e interesses (não obedecem, como as regras, à «lógica do tudo ou nada»), consoante o seu peso e a
ponderação de outros princípios eventualmente conflitantes; as regras não deixam espaço para qualquer outra
solução, pois se uma regra vale (tem validade) deve cumprir-se na exacta medida das suas prescrições, nem mais
nem menos. Como se verá mais adiante, em caso de conflito entre princípios, estes podem ser objecto de
ponderação, de harmonização, pois eles contêm apenas «exigências» ou «standards» que, em «primeira linha»
(prima facie), devem ser realizados; as regras contêm «fixações normativas» definitivas, sendo insustentável a
validade simultânea de regras contraditórias. Realça-se também que os princípios suscitam problemas de
validade e peso (importância, ponderação, valia); as regras colocam apenas questões de validade (se elas não são
correctas devem ser alteradas).
67
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 85-86. Sobre la base de este tipo de critérios son posibles tres tesis totalmente
diferentes sobre la distinción entre reglas y princípios. La primeira reza: todo intento de dividir las normas em
dos clases, la de las reglas y la de los principios, es vano debido a la pluralidad realmente existente. Esto se
mostraría, por ejemplo, en el hecho de que los criterios propuestos, de los cuales algunos sólo permiten
distinciones de grado, son combinables entre sí de la manera que se desee. Así, no habría ninguna dificultad en
imaginar una norma que tuviera un alto grado de generalidad pero que no fuera aplicable sin más, que no hubiera
sido establecida expresamente, que lleve en la frente su contenido valorativo, presente una estrecha relación con
a idea de derecho, tenga gran importancia para el ordenamiento jurídico y encuentre aplicación como
fundamento de reglas y como criterio para la evaluación de argumentos jurídicos. A ello se agregaría el hecho de
que aquello que estos criterios, tomados en sí mismo, separan es, a su vez, de um tipo muy heterogéneo.(…)La
segunda tesis es sostenida por quien considera que las normas pueden dividirse de una manera relevante en la
clase de las reglas y la de los principios pero, señala que esta distinción es sólo de grado. Partidarios de esta tesis
son, sobre todo, los numerosos autores que piensan que el grado de generalidad es el criterio decisivo. La tercera
38

e que, devido à existência de normas de maior ou menor generalidade, esse seria o


critério de fundamentação entre as regras, que têm um pequeno grau de
generalidade, enquanto os princípios detêm um alto grau de generalidade. Por
último, e segundo o autor, a correta tese relata que as normas jurídicas são divididas
entre regras e princípios através de um critério não só gradual, mas também
qualitativo, o que torna, por muitas vezes, difícil a classificação de uma norma como
sendo princípio ou regra, pois a diferenciação estará na sua fundamentação.
A dificuldade mencionada acima, para a identificação de uma
regra/norma ou um princípio, é comum, visto que, em certas ocasiões, a atuação de
ambos é muito semelhante, e até mesmo a interpretação de um enunciado
normativo pode levar o intérprete a classificar a norma de forma diferente. Assim,
muitas vezes, a identificação do princípio ou da regra só poderá ser feito diante de
uma situação fática, até porque não podemos deixar de observar que toda
regra/norma nasce a partir de princípios, estando estes no início da formação do
ordenamento jurídico e da regra/norma. Os que estão na base do raciocínio
influenciam na solução dos conflitos, tendo em vista seu caráter plurissignificativo
cuja existência é fundamental para a concretude da regra/norma que posteriormente
será positivada. Dworkin demonstra claramente essa dificuldade na classificação
entre princípios e normas por meio da emenda primeira da Constituição dos Estados
Unidos da América em que alguns entendem que esse enunciado trata-se de uma
norma e, por tal, deve ser aplicada de forma absoluta e, outros, entendem que
refere-se a um princípio, podendo ser relativizado mas não excluído.68
A diferenciação diz respeito a critérios qualitativos, tendo em
vista que os princípios são normas que se inserem na medida da sua possibilidade
em graus diferenciados e de acordo com a necessidade de sua atuação, enquanto
que as regras se introduzem diretamente do fato à norma, não existindo uma
aplicação gradativa; o que demonstra que a diferença existente entre essas normas
é qualitativa.69 Com os princípios, existe mais do que uma relação de validade da
norma, o que ocorre é a preponderância de um determinado princípio em uma
situação fática, que pode não acontecer diante de outra situação. Mesmo não sendo

tesis dice que las normas pueden dividirse en reglas y principios y que entre reglas y principios existe no sólo
una diferencia gradual sino cualitativa. Esta tesis es correcta.
68
DWORKIN, Robert. Op. cit., p. 78-79.
69
PEIXINHO, Manoel Messias. A Interpretação da Constituição e os Princípios Fundamentais, 3ª ed., Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 136.
39

preponderante em uma determinada situação, ele não é afastado, pois incide, mas
não de forma preponderante, diferentemente do que ocorre com as regras que a
predominância de uma, em determinada situação, elimina do ordenamento jurídico
outras regras que poderiam ser aplicadas à situação.70 Entendo que os princípios
são preceitos que direcionam os intérpretes na construção da norma e é através da
fundamentação e do contexto fático que os mesmos princípios utilizados na
elaboração de uma norma, para determinado caso, podem determinar solução
distinta a um caso semelhante ou diferente. Vislumbro tal situação no julgado do
Superior Tribunal de Justiça71, que aduz sobre as limitações da propriedade no que
tange à preservação de áreas verdes, julgando as situações em que a preservação
das áreas conduziriam a uma diminuição da possibilidade econômica da
propriedade, determinou o STJ que caberia ao Poder Público pagar a devida
indenização; mas, se não houvesse, não caberia, principalmente se estiver
localizada em área de preservação permanente. Desta forma, vejo que, na análise
do julgado, o Ministro utilizou diversos princípios do direito para sua decisão, em
especial, os princípios relacionados à propriedade e ao ambiente, principalmente a
questão da função sócio-ambiental da propriedade, que, em outro caso, poderia não
ter tanta relevância.
Dentre os princípios existentes no ordenamento jurídico,
destacamos os princípios gerais do direito e os princípios constitucionais. Os
primeiros, inicialmente, eram encontrados nos códigos, em especial no Código Civil,
e com a constitucionalização do direito passaram a integrar o ordenamento
constitucional.72
Nem todos os princípios existentes na Constituição são
princípios gerais do direito. Não houve somente uma nova alocação desses

70
OLIVEIRA, Fábio Corrêa Souza de. Por Uma Teoria dos Princípios. O Princípio Constitucional da
Razoabilidade, Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 43. A relação é de preponderância, não meramente de
validade. Entre dois princípios, por exemplo, aquele que cede em benefício da concreta prevalência do outro não
é nulificado (eliminado do ordenamento), até porque frente a uma diversa situação os mesmos princípios podem
ter a polaridade invertida: o que antes cedeu é possível que agora prepondere. Aqui não se debate a validade dos
princípios, pois esta é pressuposta.
71
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 670255-RN, relator: Min. Luiz Fux, j. 28/03/2005.
Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 16 ago 2007. 2. A jurisprudência tem oscilado no
entendimento quanto à indenização das matas nativas, mas pacificou-se no sentido de indenizar as que possam
ser exploradas comercialmente. O entendimento afasta a possível indenização das matas situadas em área de
preservação ambiental, por serem bens fora do comércio. 3. A indenização por desapropriação indireta prescreve
em vinte anos (Súmula 119/STJ). 4. As limitações estabelecidas pela administração, ao criar os parques de
preservação ambiental, configuram-se em desapropriação indireta e, conseqüentemente devem ser indenizadas,
na medida em que atinjam o uso e gozo da propriedade.
40

princípios, tirando-os dos Códigos e inserindo-os nas Constituições, mas existem


também princípios Constitucionais que se diferem na identificação dos princípios
gerais do direito, mesmo que aqueles tenham se concretizado sob o fundamento
desses. Assim, segundo o pensamento de Manoel Messias Peixinho, alguns
princípios constitucionais são princípios gerais do direito, principalmente os
fundamentais. Mas existem outros princípios constitucionais que não se identificam
como princípios gerais do direito que, apesar de serem princípios constitucionais,
não têm, em sua base, fundamentação oriunda dos princípios gerais, como é o caso
dos princípios da área econômica.73
Em relação às regras, conforme já mencionei, sua rigidez é
muito maior que os princípios, pois não interagem entre si. Uma regra incide
absolutamente sobre determinado fato ou não incide, não existindo, para as mesmas
uma relativização na sua aplicação. 74 Assim, sempre que uma regra incidir sobre
determinado fato, ela deve ser aplicada e, quando mais de uma regra
aparentemente incidir sobre o mesmo fato, devem-se aplicar a de maior completude
com a situação de fato, afastando e/ou anulando outras regras que estejam
aparentemente em conflito.
Os possíveis e aparentes conflitos entre regras se
desenvolvem na dimensão da validade, já que não existe um claro conflito de regras.
Na verdade, o que ocorre é um conflito aparente de regras, pois, como disse, a
dimensão na qual ele se desenvolve é o da validade; assim, a regra vale ou não
para aquela situação, não ocorrendo a utilização de diversas regras para a solução
do caso, como poderia ocorrer com os princípios. Estes percorrem um caminho
externo ao da validade e, por sinal, também incidem na situação de forma graduada
através da inserção de valores.75 Dessa forma, no momento em que o intérprete
apóia-se em uma regra para determinada situação, está invalidando outras regras
existentes que poderiam ser utilizadas naquela situação. Não existe, portanto, a

72
PEIXINHO, Manoel Messias. A Interpretação da Constituição e os Princípios Fundamentais, Op. cit., p. 125.
73
Ibidem, p. 127.
74
COELHO, Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1997, p. 80.
Com efeito – em razão mesmo da sua estrutura normativo-material (se A, deve ser B) -, as regras são aplicadas à
maneira de proposições disjuntivas, isto é, se ocorrerem os fatos descritos na sua hipótese de incidência e se elas
forem normas válidas, de acordo com a regra de reconhecimento do sistema jurídico a que pertencem, as suas
prescrições incidirão, necessariamente, sobre esses fatos, regulando-os na exata medida do que estatuírem e
afastando a incidência de outras regras, que, eventualmente, possam concorrer ou entrar em conflito com elas; e
Vide nota 62.
75
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 280.
41

possibilidade de se adotar uma aplicabilidade gradual de regras, já que a regra não


utilizada é eliminada do ordenamento jurídico para aquela situação.76
Alguns poderão entender que a escolha pelo intérprete de uma
regra, para determinada situação fática, e não de outra, estaria o elevando à
qualidade de legislador positivo e negativo do ordenamento jurídico.77 Tal fato não
ocorre quando entendemos que o conflito entre regras para uma determinada
situação fática, é um conflito aparente. Na verdade, o intérprete não estará
legislando, mas aplicando a regra que melhor se adéqua, sendo ela a regra
existente no ordenamento jurídico para determinado fato. Nesse caso, não houve
uma escolha, mas sim uma aplicação direta da regra correspondente ao fato. Se
entender que existem conflitos entre regras e que o intérprete deve escolher entre as
possíveis regras válidas, ao que melhor se aplicar ao fato, da mesma forma, não
estará legislando, já que se trata de uma escolha e não de uma inovação do
ordenamento jurídico.

3.1.1 – Os Princípios e Regras de Direitos Fundamentais

Na interpretação dos direitos fundamentais, o intérprete deve


analisar se está diante de uma regra ou de um princípio de direito fundamental, visto
que esses direitos compõem o ordenamento jurídico e como tal, também se
apresentam nas duas classificações. Tal entendimento é conhecido como a teoria
dos princípios na qual é aceita, dentro do ordenamento jurídico, a presença de
regras e princípios de direitos fundamentais. Entretanto, não posso deixar de
mencionar a existência de outras duas formas de classificação desses direitos que
são o modelo puro de regras e o de princípios.78
A partir desses três modelos, surge o questionamento aos que
consideram os direitos fundamentais como sendo princípios; e a aceitação da teoria
dos princípios, pois se os direitos fundamentais são princípios, então podem ser
relativizados? E, ainda, se podem ser princípios ou regras como classificá-los, já que
tais direitos são essenciais e não podem ser eliminados do ordenamento jurídico?
Buscarei solucionar a questão utilizando a Constituição Federal do Brasil de 1988 e

76
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 88 e DWORKIN, Robert. Op. cit., p. 78.
77
COELHO, Inocêncio Mártires. Op. cit., p. 81.
78
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Interpretação Constitucional e Direitos Fundamentais, Rio de Janeiro:
Renovar, 2006, p. 122; e ALEXY, Robert. Op. cit., p. 115 et seq.
42

em especial o artigo 225, que trata sobre o ambiente, conjuntamente com o artigo 23
VI79, que estabelece o dever dos entes da Federação de proteger o ambiente.
Acredito que o modelo da teoria dos princípios é o mais adequado à Constituição
brasileira, seguindo o posicionamento de Jane Reis Gonçalves Pereira.80
A proteção ambiental é uma regra de direito ambiental, na qual
o Poder Público tem o dever de desenvolver instrumentos de controle para sua
efetivação, sendo o licenciamento ambiental um dos instrumentos criados, mas nem
todas as interferências no ambiente devem ser objeto de licenciamento. Quando
determinada interferência tem de ser licenciada, estamos diante de um instrumento
gerado a partir de uma regra de direito fundamental e é dever do Estado assegurar a
efetivação do direito ao ambiente equilibrado, conforme o §1º do artigo 225 da
Constituição Federal do Brasil. Assim, para que possa intervir no ambiente através
de uma atividade potencialmente poluidora, é necessário se submeter ao
licenciamento ambiental, caso contrário, não poderá haver tal interferência. Quem
tem o dever de efetivar a proteção ambiental das atividades possivelmente
poluidoras é o Poder Público, pois este é quem concede a intervenção. Ocorre que,
para existir essa proteção ambiental, é necessário considerar diversos fatores
jurídicos ou não para que a autoridade competente possa conceder a licença,
analisados a partir de estudos ambientais que compatibilizam os impactos positivos
e negativos advindos da interferência no ambiente. Nesse momento, utiliza-se de
princípios de direito fundamental ambiental, como o da prevenção, precaução e
outros, conforme podemos vislumbrar na normatização do §1º, IV do artigo 225 da
Constituição Federal do Brasil de 1988.
Os princípios constitucionais fundamentais são princípios
superiores no ordenamento jurídico que, por sua vez, devem nortear todo o
ordenamento jurídico. São princípios utilizados obrigatoriamente para a interpretação
dos direitos essenciais do homem e que não podem ser afastados pelo intérprete,
pois exercem a função de integrar-se ao direito, sendo a base de todo o
ordenamento jurídico pátrio. Neste sentido afirma Manoel Peixinho: “Estes princípios
fundamentais estão, sem dúvida, numa posição hierarquicamente superior às outras

79
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 21 de julho de 2007. Art. 23. É competência comum da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
VI- proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
80
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 126.
43

normas constitucionais, porque, sendo os princípios o húmus fecundo de que se


alimenta todo o projeto constitucional, aqueles dependem destes como fonte diretiva
da missão política do Estado”.81
Os princípios fundamentais são valorações fundamentais
diferentemente dos princípios gerais do direito que, na Constituição, “servem de
base à estruturação do Estado”82, e estando esses inseridos na teoria geral do
direito. Já os fundamentais são “normas que contêm decisões políticas fundamentais
que o constituinte acolheu no documento constitucional”83. Assim, é perfeitamente
possível a existência, no ordenamento jurídico, de regras e princípios de direito
fundamental, uma vez que disciplinam condutas e valores essencias ao homem,
podendo ter regras que não permitem restrição como o caso do dever de proteção
do ambiente e princípios que permitem um determinado nível de restrição em prol de
outros também essenciais.

3.2 Os Princípios Ambientais

Considerando a essencialidade do Direito Ambiental e visando


proteger os recursos ambientais contra as condutas do próprio homem, é que se
demonstra ser esse direito especial inclusive no ordenamento jurídico com princípios
próprios dos quais irei apontar. Dessa forma, acredito que, com o desenvolvimento
humano, outros princípios irão surgir, não sendo possível classificá-los de forma
taxativa. Tais princípios devem ser utilizados tanto pelo Estado quanto pela
sociedade, objetivando a melhoria da qualidade de vida das pessoas e
compatibilizando outras necessidades do homem com a preservação ambiental.84
Esses princípios têm por base a solidariedade, pois o Direito
Ambiental é um direito consagrado com tais bases e também por ser um direito de
todos e não de indivíduos. Com isso, a inclusão dos princípios ambientais busca
efetivar condutas preservacionista para as presentes e futuras gerações, com o
interesse de minimizar os impactos negativos já existentes e os que possam surgir.85

81
PEIXINHO, Manoel Messias. A Interpretação da Constituição e os Princípios Fundamentais, Op. cit., p. 137.
82
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 27ª ed., São Paulo: Malheiros, 2006, p. 95.
83
Idem.
84
ANTUNES, Paulo Bessa. Op.cit., p. 31.
85
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional Ambiental Português e da União Européia. In:
CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro,
São Paulo: Saraiva, 2007, p. 8. O significado básico do princípio é obrigar as gerações presentes a incluir como
44

3.2.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

O Brasil, somente a partir da Constituição Federal de 1988,


consagrou o ambiente como um direito constitucional através do enunciado do artigo
225, informando ser o ambiente um bem essencial e que deve ser preservado tanto
pelo Poder Público como também pela Sociedade. A Constituição enunciou, em seu
texto o que internacionalmente já estava consagrado pela Declaração de Estocolmo
86
em seus princípios 1 e 2 , que aduz que o ambiente é um bem essencial para o
homem e a sua destruição afeta a dignidade da pessoa humana. Tal princípio é
orientador de todo o ordenamento jurídico brasileiro, já que, quanto maior a
preservação ambiental e o controle das atividades potencialmente poluidoras,
melhor será a qualidade de vida dos seres humanos.87 Assim, a identificação desse
direito como sendo intimamente ligado à dignidade humana impede que exista um
retrocesso na proteção ambiental, criando uma espécie de limitação para a liberdade
legislativa.88 O princípio em análise engloba o da sadia qualidade de vida, pois, por
ser o ambiente um direito fundamental para homem, relacionando sua vida com a
qualidade com que ela se desenvolve, pois não basta estar vivo para ser declarado
efetivo, mas sim necessita estar vivo e com um ambiente propício para se viver
dignamente. Não é só uma comprovação biológica de estar vivo, mas tem que ter
relevância outros aspectos fundamentais como: saúde, lazer, segurança,

medida de acção e de ponderação os interesses das gerações futuras. Os interesses destas gerações são
particularmente evidenciáveis em três campos problemáticos: (i) o campo das alterações irreversíveis dos
ecossistemas terrestres em conseqüência dos efeitos cumulativos das actividades humanas (quer no plano
espacial, quer no plano temporal); (ii) o campo do esgotamento dos recursos, derivado de um aproveitamento
não racional e da indiferença relativamente à capacidade de renovação e da estabilidade ecológica; (iii) o campo
dos riscos duradouros.
86
MODÉ, Fernando Magalhães. Tributação Ambiental, Curitiba – PR: Juruá, 2004, p.135.
Declaração de Estocolmo 1972.
Princípio 1 – O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e a condições de vida satisfatórias,
num ambiente cuja qualidade lhe permita viver com dignidade e bem-estar, cabendo-lhe o deve solene de
proteger e melhorar o ambiente para as gerações atuais e vindouras. Por conseqüência, são condenadas e devem
ser elimadas as políticas que promovam ou perpetuem o apartheid, a segregação racial, a discriminação e as
formas, coloniais ou outras, de opressão e de domínio estrangeiro.
Princípio 2 – Os recursos naturais do Globo, incluindo o ar, a água, a terra, a flora e a fauna e, em especial,
amostras representativas dos ecossistemas naturais, devem ser salvaguardados no interesse das gerações
presentes e futuras, mediante planejamento e ou gestão cuidadosa, como apropriado.
87
GUERRA, Isabella Franco. e LIMMER, Flávia C. Princípios Constitucionais Informadores do Direito
Ambiental. In: PEIXINHO, Manoel Messias (Org). Os Princípios da Constituição de 1988. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2001, p. 565.
88
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional Ambiental Português e da União Européia. In:
CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Op. cit., p. 5.
45

desenvolvimento e tantos outros. Com isso, a busca pela qualidade é um dever do


poder público na sua atuação contribuindo para a realização da felicidade dos seres
humanos e fazendo com que os indivíduos busquem muito mais o ser do que o ter
no desenvolvimento de suas vidas.89
O dever imposto ao poder público na efetivação da proteção
ambiental, por ser um direito essencial à vida humana, vem a fundamentar as
condutas estatais em prol da preservação ambiental e do ser humano que
inicialmente poderiam ser consideradas como uma invasão aos direitos privados.
Mas todas as condutas do Estado, justificadas em prol da proteção ambiental,
automaticamente estão vinculadas aos princípios gerais do Direito Público, em
especial, o princípio da primazia do interesse público e da indisponibilidade do
interesse público. Como disse, o ambiente é um bem essencial para o ser humano,
sendo impossível a sua disponibilidade e concomitantemente, o interesse pela sua
existência equilibrada, é que se considera superior a qualquer outro interesse.90 É
evidente que esse dever não é exclusivo do Estado, uma vez que a Constituição
concede o mesmo para a coletividade, que deve também participar da efetivação da
proteção ambiental. Ela não pode ser entendida como sadia qualidade de vida à
manutenção dos aspectos naturais somente para esta geração, mas também para
as futuras. E para tal norma preservacionista ser eficaz é necessária a participação
de todos, até porque, como tratado anteriormente, esse direito fundamental é de
todos, sendo mais amplos que os direitos sociais e, por tal, todos devem participar
garantindo a sua proteção.
O Supremo Tribunal Federal91, em julgado recente, evidencia
claramente a essencialidade do direito ambiental para o homem na sua qualidade de
vida, demonstrando que a má qualidade de vida afeta a dignidade humana, que é
princípio basilar do ordenamento jurídico constitucional brasileiro. Deve-se então,

89
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 2005, p. 54.
90
MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente, 4ª ed., São Paulo: RT, 2005, p. 160. De certa maneira, mantém o
princípio ora em exame estreita vinculação com o princípio geral de Direito Público da primazia do interesse
público e também com o princípio do Direito Administrativo da indisponibilidade do interesse público. É que o
interesse na proteção do ambiente, por ser de natureza pública, deve prevalecer sobre os direitos individuais
privados, de sorte que, sempre que houver dúvida sobre a norma a ser aplicada a um caso concreto, deve
prevalecer aquela que privilegie os interesses da sociedade – a dizer, in dúbio pro ambiente. De igual sentir, a
natureza pública que qualifica o interesse na tutela do ambiente, bem de uso comum do povo, torna-o também
indisponível. Não é dado assim, ao Poder Público – menos ainda aos particulares – transigir em matéria
ambiental, apelando para uma disponibilidade impossível.
91
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, ADIN nº 3.540-1 DF, relator: Min. Celso de Mello, j.
01/09/2005. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 16 ago 2007.
46

todo ordenamento jurídico, ter uma concepção ambientalista para que não viole a
dignidade humana; e não seja posteriormente declarada sua inconstitucionalidade.
Da mesma forma, a interpretação das normas ambientais deve se orientar na busca
da maior efetividade possível da proteção ambiental.

3.2.2 Princípio da Participação e Democrático.

Este princípio advém do fato da Constituição brasileira ter


disciplinado que a proteção do ambiente é um dever tanto do Poder Público como
também da coletividade, de forma que deve existir uma participação efetiva da
sociedade na concretização das políticas ambientais. Com isso, observo que se
deve pensar e agir em relação ao ambiente, deixando de lado a visão individualista
para se ter uma idéia de coletividade na proteção ambiental; tanto para o Poder
Público quanto para a Coletividade. Essa proteção não pode ser adstrita a um
território ou a idéia tradicional de cidadania92, mas a uma conduta humana de
cidadão mundial.
É evidente, para que exista um ambiente equilibrado e
ponderado com outros fatores fundamentais, que o cidadão possa intervir nos
procedimentos de implantações de atividades que causem um possível mal
ambiental, sendo a informação fator preponderante para justa participação da
sociedade na proteção ambiental. Cabe ao Poder Público tornar tal princípio efetivo
através das audiências públicas, da implementação dos conselhos do ambiente, do
direito de petição, da ação civil pública e da ação popular.93
Por ser o ambiente um bem essencial ao ser humano, este não
viveria sem o devido equilíbrio ambiental, sendo, assim, mais do que coerente que o
mesmo venha a participar das decisões que de alguma forma causam possíveis
interferências no ambiente, não podendo admitir que se interfira num bem essencial
a todos em prol de uns, sem que haja a aquiescência da sociedade, que de forma
coletiva, tem o dever de proteção e preservação ambiental. É evidente que qualquer
atuação no ambiente afeta a qualidade de vida das pessoas, podendo vir a melhorar
ou piorar; e ainda dependendo da localidade e principalmente da coletividade, uma

92
LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de Risco e Estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE,
José Rubens Morato. Op. cit., p. 160.
93
ANTUNES, Paulo Bessa. Op. cit., p. 33-34.
47

possível interferência benéfica, em um local, pode não ser para a opinião da


coletividade, de outro local. Na verdade, esse princípio vem efetivar a democracia no
país por meio de uma distribuição de poderes e principalmente de
94
responsabilidades , já que passa a sociedade a ter o poder de decidir, através de
organizações plurais, o desenvolvimento das políticas públicas ambientais.
Conforme aduz Isabella Franco Guerra e Flávia Limmer95, a
participação da sociedade na formação das políticas públicas ambientais não pode
ser considerada como uma delegação do Poder Público para a sociedade, nem
também pode ocorrer uma omissão por parte da primeira no planejamento e na
efetivação das políticas, justificada pela inexistência de empenho da sociedade de
participar, sendo a primeira missão do poder público, em relação ao princípio da
participação, que é desenvolver meios para atrair a sociedade para a discussão das
decisões ambientais.
Uma das formas dos cidadãos participarem das políticas
públicas ambientais é através das ONGs e OSCIPs, que visam à criação de
organismos de proteção ambiental. Não se busca, com essas instituições, o
enfraquecimento da democracia, nem estabelecer uma concorrência com o poder
público, mas de intervir nas decisões e no planejamento de forma que possa
complementar, com suas atitudes, na formação do Estado Ecológico de Direito. É
evidente que essa existência deve ser independente, não sendo manipulada pelo
Poder Público ou por agentes público com interesses contrários à proteção
ambiental da mesma forma que não podem ser transformadas em organismos de
manobra do setor privado. A eficácia dessas instituições só existirá se tiverem
credibilidade moral, pluralidade e idoneidade na sua formação além da busca das
diretrizes estatutárias.96
No Brasil, a participação nas decisões ambientais já se
encontra ordenada, tanto constitucionalmente quanto infraconstitucionalmente, nas
três esfera de poder, como podemos observar na Constituição Federal de 1988 art.

94
BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia. Uma Defesa das Regras do Jogo, 6º ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1997, p. 64. Tudo está, portanto em conexão: refazendo o percurso em sentido contrário, a liberdade de
dissentir tem necessidade de uma sociedade pluralista, uma sociedade pluralista consente uma maior distribuição
do poder, uma maior distribuição do poder abre as portas para a democratização da sociedade civil e, enfim, a
democratização da sociedade civil alarga e integra a democracia política.
95
GUERRA, Isabella Franco. e LIMMER, Flávia C. Princípios Constitucionais Informadores do Direito
Ambiental. In: PEIXINHO, Manoel Messias (Org). Os Princípios da Constituição de 1988. Op. cit., p. 576.
96
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. cit., p. 90-91.
48

225, §1º, IV97. Na legislação infraconstitucional podem ser citadas as seguintes


legislações: Lei 6.938/81 sobre a Política Nacional do Meio Ambiente98, Resoluções
Conama nº(s) 001/86, artigo 1199, sobre estudo de impacto ambiental para
implantação de atividades e empreendimentos; 009/87100 sobre procedimento para
realização de audiências públicas e 237/97, artigo 3º101, sobre o licenciamento
ambiental e outros atos normativos. Na esfera Judiciária, podemos vislumbrar a
caracterização desse princípio nas Legislações sobre a ação civil pública, Lei nº
7.347/85102 e ação popular Lei nº 4.717/65103. No Legislativo, temos a iniciativa
popular de lei e as audiências públicas para os debates referentes aos projetos de
lei.
Ainda assim, com todos os instrumentos do ordenamento
jurídico, cabe, ainda, uma conduta solidária em prol de todos, colocando os
interesses particulares em segundo plano e visando um entendimento de proteção à

97
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em: 05/10/1988. Disponível em <URL:
http://www.planalto.gov.br> [10 dez 2006]. Art.225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa
degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.
98
BRASIL, Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981 – Dispõe sobre a
Política Nacional do Meio ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br> . Acesso em: 10 dez 2006.
99
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 001 de 23 de janeiro de 1986. Disponível em
<http://www.conama.gov.br>. Acesso em: 10 dez 2006. Art 11 - Respeitado o sigilo industrial, assim solicitando
e demonstrando pelo interessado o RIMA será acessível ao público. Suas cópias permanecerão à disposição dos
interessados, nos centros de documentação ou bibliotecas da SEMA e do estadual de controle ambiental
correspondente, inclusive o período de análise técnica,
§ 1º - Os órgãos públicos que manifestarem interesse, ou tiverem relação direta com o projeto, receberão cópia
do RIMA, para conhecimento e manifestação,
§ 2º - Ao determinar a execução do estudo de impacto ambiental e apresentação do RIMA, o estadual
competente ou o IBAMA ou, quando couber o Município, determinará o prazo para recebimento dos
comentários a serem feitos pelos órgãos públicos e demais interessados e, sempre que julgar necessário,
promoverá a realização de audiência pública para informação sobre o projeto e seus impactos ambientais e
discussão do RIMA.
100
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 009 de 03 de dezembro de 1987.
Disponível em < http://www.conama.gov.br> . Acesso em: 10 dez 2006.
101
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 237 de 19 de dezembro de 1997.
Disponível em <http://www.conama.gov.br>. Acesso em: 10 dez 2006. Art. 3º- A licença ambiental para
empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do
meio dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio ambiente
(EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando couber, de
acordo com a regulamentação.
102
BRASIL, Lei da Ação Civil Pública, Lei nº 7.347 de 24 de julho de 1985 – Disciplina a ação civil pública de
responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico (vetado) e dá outras providências. Disponível em <URL:
http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 10 dez 2006.
103
BRASIL, Lei da Ação Popular, Lei nº 4.717 de 29 de junho de 1965 – Regula a ação popular. Disponível em
<URL: http://www.planalto.gov.br> . Acesso em: 10 dez 2006.
49

vida das próximas gerações. Para tal, depende-se “uma soberania menos egoísta
dos Estados e mais solidária no aspecto ambiental, com a incorporação de sistemas
mais efetivos de cooperação entre Estados, em face das exigências de preservação
ambiental”104, conforme preconiza o princípio 10 da Declaração do Rio de 1992.105

3.2.3 Princípio da Precaução

O princípio da precaução é de grande importância para a


permanência dos recursos ambientais, pois se relaciona com a dúvida dos possíveis
impactos que as intervenções do homem no ambiente poderá causar. Trata-se da
necessidade de cautela na implantação de atividades e empreendimentos que
possam causar alguma degradação ambiental.
Assegura tal princípio que no caso de incerteza dos efeitos ao
ambiente, não se produza nenhuma intervenção até que se desenvolva um método
adequado para que se possa identificar os possíveis impactos. Tal princípio
reconhece o “in dúbio pro ambiente”, uma vez que, enquanto não se identifica quais
os impactos que uma possível intervenção humana possa causar ao ambiente,
deve-se impedir a conduta em prol de um bem coletivo que está intimamente ligado
à dignidade humana.106 Nesse princípio, não se tem o objetivo de evitar o
desenvolvimento de atividades humanas sob o fundamento da dúvida, mas, na
verdade, pretende-se a manutenção e a existência equilibrada do ambiente para as
presentes e futuras gerações.
A utilização desse princípio conduz a dois comportamentos. O
primeiro entende que o possível risco existente, por não se ter conhecimento das

104
LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de Risco e Estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE,
José Rubens Morato. Op. cit., p. 169.
105
MODÉ, Fernando Magalhães. Op. cit., p.143.
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992.
Princípio 10 – A melhor maneira de tratar questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de
todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações
relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e
atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar em processos de tomada de
decisões. Os Estados devem facilitar e estimular a conscientização e a participação pública, colocando a
informação à disposição de todos. Deve ser propiciado acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos,
inclusive no que diz respeito a compensação e reparação de danos.
106
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. cit., p. 63. A implementação do princípio da precaução não tem por
finalidade imobilizar as atividades humanas. Não se trata da precaução que tudo impede ou que em tudo vê
catástrofes ou males. O princípio da precaução visa à durabilidade da sadia qualidade de vida das gerações
humanas e à continuidade da natureza existente no planeta. e ARAGÃO, Alexandra. Direito Constitucional
50

conseqüências daquela atividade, gera uma atitude de não implementar a atividade,


demonstrando uma conduta cautelosa com o ambiente e conseqüentemente, com a
existência humana. Em outra posição, pode-se ter uma conduta segundo a qual
diante do risco e da necessidade da implementação da atividade a segunda é
privilegiada, devendo após a implementação observar o que acontecerá com o
ambiente e identificar os possíveis impactos que advieram da atividade.107 Acredito
que, dentre as duas condutas possíveis apresentadas, pelo princípio da precaução a
primeira é mais eficaz e cautelosa, já que visa proteger antes mesmo que ocorra o
pior ou aconteçam impactos negativos de difícil reparação e até mesmo irreparáveis.
Assim, o homem estaria diminuindo seu ambiente e sua qualidade de vida, pelo
simples fato de querer suportar uma dúvida para se ter conhecimento das
conseqüências da atividade no ambiente. Muito mais eficaz é o desenvolvimento
tecnológico, visando identificar os possíveis impactos antes que se implemente a
atividade. E enquanto isso não ocorre deve-se optar pela não interferência no
ambiente.
No ordenamento jurídico brasileiro, o princípio em comento
pode ser observado no art. 170, VI da Constituição Federal, no qual disciplina que,
para a implantação de qualquer empreendimento econômico deve-se levar em conta
os aspectos ambientais. Com isso, identifico que qualquer atividade econômica que
não considere o ambiente está em desacordo com a ordem econômica do país,
devendo, portanto, ser interrompida. Assim, para que se possa ter a certeza e
também para alcançar a dúvida sobre os impactos, a Constituição Federal
normatizou a exigência da realização do Estudo de Impacto Ambiental para
atividades potencialmente poluidoras. E é através desse instrumento que se pode
identificar os impactos e também chegar a um estágio de dúvida que determinada
atividade poderá causar ao ambiente. Alguns autores108 aduzem que o Estudo de
Impacto Ambiental também é um princípio do ordenamento jurídico brasileiro, do
qual descordo, pois entendo que esse é um instrumento intimamente ligado à
prevenção e à precaução ambiental e não um princípio, visto que é através dele que
se detecta os impactos e surgem as possíveis dúvidas e ao final apresenta possíveis

Ambiental Português e da União Européia. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens
Morato. Direito, Op. cit., p. 41.
107
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. cit., p. 64-65.
51

condutas em prol do ambiente, mas a sua realização é feita considerando diversos


princípios ambientais de características anteriores aos impactos, como a prevenção,
precaução e do usuário-pagador. Na verdade é um instrumento que demonstra a
viabilidade de determinada intervenção ambiental.
Edis Milaré afirma que é através do estudo de impacto
ambiental que se pode aplicar o princípio da consideração da variável ambiental no
processo decisório de políticas de desenvolvimento.109 Realmente é através do
EIA/RIMA que se pode considerar a variável ambiental, não somente por esse
estudo, mas por qualquer outro estudo ambiental, já que o EIA/RIMA é um estudo
para atividades potencialmente poluidoras. Contudo, isso não quer dizer que outras
atividades que não estão relacionadas como potencialmente poluidoras não vão
causar variáveis ambientais, que deverão ser consideradas no momento de uma
decisão política.
O princípio da precaução alcançou generalidade com a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,
popularmente conhecida como ECO 92, que originou a Declaração do Rio de
Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, vislumbrando-se, tão somente, a
necessidade de uma conduta cautelar nas intervenções ao ambiente110.

3.2.4 Princípio da Prevenção

Este princípio visa minimizar ou compensar os impactos


ambientais causados pela intervenção humana no ambiente. É através dele que se
justifica a necessidade e a importância de se obter informações e a realização de
pesquisas sobre os possíveis impactos, aplicando-se o princípio da prevenção111 em

108
MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Fundamentos do Direito Ambiental no Brasil, Revista dos Tribunais, ano 83, v.
706, São Paulo: RT, agosto 1994, p. 17, e GUERRA, Isabella Franco. e LIMMER, Flávia C. Princípios
Constitucionais Informadores do Direito Ambiental. In: PEIXINHO, Manoel Messias (Org). Op. cit, p. 572.
109
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 161.
110
MODÉ, Fernando Magalhães. Op. cit., p.143 – 144.
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992.
Princípio 15 – De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado
pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a
ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e
economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.
111
Esse princípio conforme aduz José Rubens Morato Leite em sua obra, Direito Constitucional Ambiental
Português e da União Européia. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Op. cit.,
p. 171, é da mesma família do princípio da precaução estudado anteriormente, uma vez que exerce funções
muito próximas, que é propiciar uma melhor relação entre as condutas humanas e o ambiente de forma que se
52

situações nas quais os impactos já são conhecidos ou se podem detectar. Nesse


caso, os elementos impactantes são identificados através de estudos
especializados, no qual se observa diversos fatores que estão atrelados ao
ambiente. Dentre tais estudos, um dos mais conhecidos, embora não único, é o
Estudo de Impacto Ambiental.112 Paulo Affonso Leme Machado aduz, em sua obra,
os requisitos necessários para a perfeita utilização do princípio da prevenção,
através da identificação dos objetos a serem avaliados na realização dos estudos
ambientais113
O Poder Público e a Sociedade devem exigir a realização das
pesquisas para a obtenção das informações necessárias para a outorga do
funcionamento de qualquer atividade que vá intervir no ambiente. É um dever
jurídico do empreendedor submeter ao Poder Público e a Sociedade a intenção de
intervir no ambiente com a implantação de alguma atividade ou empreendimento
impactante, sob pena de ser responsabilizado.114
O Superior Tribunal de Justiça115 enfrentando caso sobre a
possibilidade de exploração econômica relativa à extração mineral, na qual fora
indeferida pelo DNPM visto a ausência de documentos e estudos necessários à
operação próxima de uma área de preservação permanente. O julgado em comento
demonstra que o DNPM atua utilizando em seus atos de outorga, o princípio em tela,
pois tem conhecimento dos danos que a atividade pode provocar, já que a mesma
causa a desestabilização das margens dos rios, afetando, assim, o equilíbrio
ambiental. E, por tal, o órgão responsável pela outorga exclui integralmente qualquer
avanço desse tipo de atividade nas margens dos rios. Assim, buscando a efetivação

preserve o ambiente para a atual e futuras gerações, mas também que se desenvolva outras necessidades do
homem. A principal diferença entre os dois princípios é quanto a identificação dos impactos ambientais, visto
que na precaução, o impacto é desconhecido ou indeterminado, o risco com a interferência no ambiente é
incalculável, enquanto que na prevenção os impactos são reconhecidos ou podem ser e são aplicadas medidas
que visem proteger o ambiente e permitir as intervenções desejadas, nesse princípio o risco é mensurável.
112
ANTUNES, Paulo Bessa. Op. cit., p. 37.
113
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. cit., p. 82. (...) divido em cinco itens a aplicação da prevenção: 1º)
identificação e inventário das espécies animais e vegetais de um território, quanto à conservação da natureza e
identificação das fontes contaminantes das águas e do mar, quanto ao controle da poluição; 2º) identificação e
inventário dos ecossistemas, com a elaboração de um mapa ecológico; 3º) planejamento ambiental e econômico
integrados; 4º) ordenamento territorial ambiental para a valorização das áreas de acordo com a sua aptidão; e 5º)
Estudo de Impacto Ambiental.
114
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental, 3ª ed., São Paulo: Saraiva, 2000. p.38. Sob
o prisma da administração, encontramos a aplicabilidade do princípio da prevenção por intermédios das licenças,
das sanções administrativas, da fiscalização e das autorizações, entre outros tantos atos do Poder Público,
determinantes da sua função ambiental de tutela do meio ambiente.
115
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Mandado de Segurança nº 9.101-DF, relator: Min. Luiz Fux, j.
09/06/2004. Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 24 de ago de 2007
53

ambiental, o Tribunal em questão também utilizou o princípio da prevenção, visto


que impediu qualquer exploração dessa atividade enquanto não forem apresentadas
as devidas informações necessárias para dirimir as possíveis dúvidas.
Na verdade, a liminar judicial mencionada tem como
fundamento dois princípios ambientais da prevenção e o da precaução, haja vista
que até o momento da liminar não houve apresentação de nenhuma informação
sobre os possíveis danos ambientais com aquela atividade, que só poderiam ser
esclarecidos a partir das informações prestadas. Essas seriam obtidas através de
estudos e pesquisas no qual poderia se conhecer os impactos da atividade; mas ao
mesmo tempo, poderia não ser. Assim, poder-se-ia ter posicionamentos
diferenciados em relação à predominância, conforme tratei anteriormente sobre a
atuação dos princípios no ordenamento jurídico. Assim, depois de obtidas as
informações, poderia ser predominante tanto o princípio da prevenção quanto o da
precaução. Este princípio, como já mencionei, deve ter relevância em todos os
poderes do Estado, já que todos têm por dever proteger o ambiente e, mais, efetivar
políticas públicas com a inclusão desses princípios. Portanto, quando identificado os
impactos ambientais, e sendo os negativos relevantemente menores do que os
positivos, o Estado deve outorgar a pretendida atividade, não deixando de minimizar
ou compensar ao máximo os impactos negativos que irão ocorrer. Isso, por sinal,
aconteceu recentemente em relação à liberação da Licença Prévia para a
Construção de uma Hidroelétrica no rio Madeira, na região amazônica, a qual ficou
condicionada diversas medidas, num total de 33 condições específicas, visando
diminuir os impactos daquele empreendimento no ambiente.116
A utilização desse princípio integra todos os atos de possível
liberação de intervenção do homem no ambiente. Ele é fator fundamental na
ponderação dos interesses econômicos, sociais e ambientais, conforme trabalharei
no próximo capítulo. Todos são direitos fundamentais essenciais para o homem e
por tal devem ser efetivados.

3.2.5 Princípio da Responsabilidade

116
BRASIL, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis: licença prévia nº 251/2007,
Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/novo_ibama/paginas/materia.php?id_arq=5401>. Acesso em:
03/09/2007.
54

Este princípio consagra a necessidade de responsabilizar os


agentes causadores de danos ambientais seja por atos lícitos ou ilícitos. A
responsabilidade ambiental no Brasil é objetiva, salvo a criminal e, por tal, independe
do elemento culpa do agente causador do dano, demonstrando que se busca, com
esse princípio, manter o equilíbrio ambiental que, conforme afirmei anteriormente, é
fundamental para a existência digna do homem117, tanto que a partir da Constituição
Federal de 1988118, passou-se a inovar o ordenamento jurídico brasileiro com a
possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica por crimes ambientais, sendo
posteriormente regulamentado pela Lei nº 9605/98 em seu artigo 3º119. Toda essa
inovação vem a comprovar que o equilíbrio ambiental deve ser mantido e todos que
interferem nele devem ser responsabilizados a recuperar o desequilíbrio promovido
pela suas condutas, independente de se tratar de um ente físico ou jurídico.
Infelizmente, esse princípio se justifica no ordenamento jurídico
devido a pouca efetivação das condutas preventivas e principalmente educativas,
sobre a necessidade de se manter o equilíbrio ambiental, e por se tratar de um bem
reconhecidamente fundamental para o homem. Dever-se-ia, então, ter uma ampla
responsabilização pelos agentes responsáveis pelo desequilíbrio ambiental.120
Não se pode confundir impacto com dano ambiental. O primeiro
pode ocorrer de uma forma lícita e ser compensado e minimizado, não criando um

117
DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil, 11ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 92. O conflito
de interesses não é permanente, como quer fazer crer a doutrina extremista, mas ocasional. E quando ele ocorra,
então, sem nenhuma dúvida, o que há de prevalecer é o interesse da coletividade. Não hesitamos em consentir na
amputação do membro que põe em risco a nossa vida. Não podemos, por qualquer motivo, permitir que o direito
do indivíduo todo-poderoso atinja, não outro indivíduo, mas toda coletividade. Na doutrina do risco, nitidamente
democrática, não se chega jamais à conseqüência de afirmar o princípio, aparentemente individualista, mas, em
essência, de sentido oposto, nitidamente autocrático, de que o direito de um pode prejudicar a outro, pode
ultrapassar as raias da normalidade e fazer do seu titular um pequeno monarca absoluto.
118
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em: 05/10/1988. Disponível em
<URL: http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 10 dezembro 2006. Art.225 - Todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
§3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou
jurídicas, a sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados.
119
BRASIL, Lei de Crimes Ambientais, Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998 – Dispõe sobre as sanções
penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providencias.
Disponível em <URL: http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 10 dezembro 2006.
Art. 3º - As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto
nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de
seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
120
MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Op. cit., p. 18. Dessa forma, sem negligenciar a extraordinária relevância da
prevenção das degradações, é preciso admitir que um sistema completo de preservação e conservação do meio
ambiente supõe necessariamente a responsabilização dos causadores de danos ambientais e da maneira mais
ampla possível envolvendo as esferas civil, penal e administrativa.
55

desequilíbrio ambiental. Na forma que explicitei, nos princípios da precaução e da


prevenção, os impactos são detectados mitigando seu dano ou, até quando não são
detectados, existe uma conduta para evitar o dano ambiental. Assim, conforme dito
acima, nem todo impacto pode ser considerado como dano, mas todo dano gera um
impacto negativo ao ambiente e conseqüentemente ao homem.
Para Paulo Bessa Antunes, o equilíbrio ambiental seria um
princípio, e o da responsabilidade, seria outro na estrutura principiológica do Direito
Ambiental. 121 Com todo respeito ao autor supracitado, acredito que o equilíbrio está
inserido na fundamentação do princípio da responsabilidade ambiental, já que o que
se pretende com a responsabilização do agente causador do dano é manter o
equilíbrio necessário ao homem.
A responsabilização do agente causador de um dano pode
ocorrer conforme a Constituição Federal de 1988 versa no artigo 225, §3º122, ou
seja, em três âmbitos: administrativo, penal e civil. Cada um com sua importância na
proteção do ambiente, pois todos têm natureza reparatória, preventiva e punitiva,
mas com predominâncias diferenciadas, dependendo da responsabilidade ser civil,
penal ou administrativa.123
A Declaração do Rio de Janeiro, sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, consagrou o princípio da responsabilidade através do dever dos
Estados de desenvolver a legislação pátria no tocante à responsabilização dos
agentes e o dever de indenizar as vítimas dos acidentes ambientais124. Paulo
Affonso Leme Machado125 afirma que a declaração foi imperfeita, já que se tratou

121
ANTUNES, Paulo Bessa. Op. cit., p. 37.
122
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em: 05/10/1988. Disponível em
<URL: http://www.planalto.gov.br> . Acesso em: 10 dezembro 2006. Art.225 - Todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
§3º - As condutas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais
e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
123
DESTEFENNI, Marcos. A Responsabilidade Civil Ambiental e as Formas de Reparação do Dano Ambiental,
Campinas – SP: Bookseller, 2005, p. 76-78.
124
MODÉ, Fernando Magalhães. Op. cit., p.143 – 144.
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992.
Princípio 13 – Os Estados deverão desenvolver legislação nacional relativa à responsabilidade e à indenização
das vítimas da poluição e outros danos ambientais. Os estados deverão cooperar, da mesma forma, de maneira
rápida e mais decidida, na elaboração das novas normas internacionais sobre responsabilidade e indenização por
efeitos adversos advindos dos danos ambientais causados por atividades realizadas dentro de sua jurisdição ou
sob seu comando, em zonas situadas fora de sua jurisdição.
125
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. cit., p. 83.
56

somente da indenização das vítimas e não normatizou o dever de reparar o


ambiente danificado em prol da coletividade.
O Superior Tribunal de Justiça em alguns de seus julgados,
considera fundamental a manutenção do equilíbrio ambiental que deve existir entre
os elementos ambientais e o homem, no qual demonstra que toda a legislação
ambiental nacional busca a efetivação desse equilíbrio em prol da sadia qualidade
de vida, devendo ter o Poder Público e a Sociedade condutas que venham a manter
essa relação entre ambiente e o homem com o intuito de reequilibrar os ambientes
afetados e manter os que se encontram em conformidade.126
Através da parte do julgado, posso observar que o dever de
permanência e restauração do equilíbrio ambiental pela responsabilização dos
agentes vai além de suas condutas ativas. Pode ser responsabilizado a reparar um
bem ambiental aquele que não foi causador do seu desequilíbrio, como é o caso de
adquirentes de propriedades sem a reserva legal, que são responsabilizados pela
sua restauração, independente de terem colaborado com a supressão da reserva.

3.2.6 Princípio do Poluidor-Pagador

Este princípio é o responsável pelo dever de reparar os danos


causados ao ambiente pela utilização de forma ilícita dos recursos ambientais para
fins econômicos. Aquele que usa o ambiente fora dos padrões permitidos deve ser
responsabilizado por sua conduta. Assim, trata-se somente da reparação por
condutas ilícitas, pois o princípio está relacionado a uma atividade poluidora127.

126
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 263.383-PR, relator: Min. João Otávio de
Norolha, j. 16/06/2005. Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 24 de ago de 2007. Não há,
portanto, por que se falar em ilegitimidade passiva ad causam do adquirente do imóvel para responder a ação
civil pública mediante a qual se busca proteger a área de reserva florestal legal no domínio privado, uma vez que
é sua a responsabilidade pela ocorrência de danos ambientais. Em outras palavras, é o proprietário, ao tempo da
exigência do cumprimento da obrigação de reparação ambiental, que deve responder por ela, visto que adquiriu a
propriedade na vigência da legislação impositiva de restrição ao seu uso, além de que, se assim não fosse, jamais
as reservas legais no domínio privado seriam recompostas, o que abalaria o objetivo da legislação de assegurar a
preservação e equilíbrio ambientais.e BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 195274 - PR,
relator: Min. João Otávio de Norolha, j. 07/04/2005. Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 24 de
ago de 2007 e BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 343.741 - PR, relator: Min. Franciulli
Netto, j. 04/06/2002. Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 24 de ago de 2007.
127
BRASIL, Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981 – Dispõe sobre a
Política Nacional do Meio ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
providências. Disponível em <URL: http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 10 dez. 2006. Art. 3º - Para fins
previstos nesta Lei, entende-se por:
IV – poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por
atividade causadora de degradação ambiental.
57

Aquele que atua fora das normas e padrões de permissibilidade ou aquele que atua
de forma lícita, e mesmo assim vier a causar algum dano, também deverá ser
responsabilizado. Mas não poderá ter sua atividade considerada como poluidora,
pois foi exercida nos limites do permitido, e sua atividade sofreu o controle exercido
pelo poder público.128
Tal princípio tem como elemento fundamental o fato do dano
ter sido causado com o intuito de se ter um retorno econômico. Evidente que não
corresponde a uma permissão econômica para que se possa utilizar os recursos
ambientais de forma irracional, mas uma forma de responsabilizar pelo uso não
racional dos bens ambientais, forçando os empreendimentos e atividades
econômicas a se legalizarem e atuarem nos limites das normas e dos padrões de
permissibilidade. Outra questão que também deve ocorrer diz respeito à atividade
econômica. Os custos decorrentes da responsabilidade, pelo uso irracional, não
podem ser repassados para o consumidor ou para o Estado, visando à reparação do
dano, pois caso contrário, os indivíduos serão duplamente prejudicados, já que terão
seu ambiente danificado em prol do benefício econômico de outro e, ainda, serão
obrigados a reparar o dano promovido pelo poluidor. 129
Observo que o referido princípio do poluidor-pagador não é um
princípio primário do direito ambiental, mas um subprincípio da responsabilidade que
explicitei anteriormente. Não pode ser considerado como sendo o mesmo princípio
em sua amplitude, conforme faz Cristiane Derani, de que o poluidor-pagador
corresponde somente a uma parte do princípio da responsabilidade130, pois este
princípio é muito maior. Ele pune o agente causador de um dano tanto por uma
conduta lícita quanto ilícita, enquanto o poluidor-pagador está relacionado
exclusivamente por danos provocados por condutas ilícitas, tendo somente um
elemento identificador que é o benefício econômico do agente, que no princípio da
responsabilidade também pode existir, mas não é elemento obrigatório.

128
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 160-161.
129
ARAGÃO, Alexandra. ARAGÃO, Alexandra. Direito Constitucional do Ambiente da União Européia. In:
CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Op. cit., p. 49.
130
A autora, em sua obra, (Direito Ambiental Econômico. São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 158) equipara o
princípio do poluidor-pagador como sendo o mesmo princípio da responsabilidade o que não ocorre, já que,
como dito, o segundo é muito mais amplo do que o primeiro até porque não há a necessidade de um benefício
econômico para ser responsabilizado pelos danos causados ao ambiente, salvo na questão da penalização da
pessoa jurídica, no qual o benefício é elemento fundamental para a responsabilização criminal não dispensando
os sócios, gerentes e outros
58

3.2.7 Princípio do Usuário-Pagador

O princípio do usuário-pagador está relacionado a uma ação


anterior ao impacto, que poderá ser promovido pela outorga de uma atividade com
fins econômicos. Ele é muito confundido com o princípio estudado anteriormente e
com o da responsabilidade, conforme aduz Alexandra Aragão, em sua obra, na qual
identifica o princípio do poluidor-pagador como sendo o princípio ora em estudo.131
Assim, esse princípio tem por objetivo dar valor econômico aos recursos ambientais
para que o usuário possa utilizá-los de forma racional132, ressarcindo o ambiente e
conseqüentemente, a Sociedade pelos impactos promovidos com a utilização dos
bens ambientais, pois não seria adequado um indivíduo, gratuitamente, utilizar-se de
um bem coletivo. E de fato, esse princípio tem por objetivo promover o acesso
racional aos recursos ambientais, tendo em vista que estes devem ser preservados.
Mas, ao mesmo tempo, eles devem ser utilizados, pois os seres humanos
necessitam interagir com esses elementos ambientais para a sua sobrevivência.
Com isso, deve o direito compatibilizar essa interação promovendo um
desenvolvimento sustentável para o homem.
Mesmo que o direito venha a proteger a fauna e a flora através
do ordenamento jurídico, essa proteção deve estar direcionada à proteção das
necessidades humanas, e não exatamente aos elementos anteriores; pois a
proteção jurídica surge no momento em que se vislumbra a essencialidade daquele
elemento para o homem. Antagonicamente, alguns autores133 entendem que, em
determinados momentos, visando uma harmonia com a natureza, o homem não é
tido como o centro das atenções. Realmente isso ocorre para manter essa dita
harmonia, mas toda a construção do direito é realizada com o fim de atender as
necessidades humanas, diferentemente do que pode ocorrer com outras ciências

131
ARAGÃO, Alexandra. Direito Constitucional do Ambiente da União Européia. In: CANOTILHO, José
Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Op. cit., p. 48. Voltamos a lembrar que o PPP não é um princípio
de responsabilidade, que actue a posteriori, impondo ao poluidor pagamentos para ressarcir as vítimas de danos
passados. O PPP é um princípio que actua sobretudo a título de precaução e de prevenção, que actua, portanto,
antes e independentemente dos danos ao ambiente terem ocorridos, antes e independentemente da existência de
vítimas.
132
DANTAS. Fabiana Santos. Gerenciamento de Recursos Hídricos: Uma Análise Crítica da Lei 9433/97. In:
Krell, Andreas Joachim. A Aplicação do Direito Ambiental no Estado Federativo, Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2005. p. 275. (...) possui uma feição predominantemente preventiva, pois parte da idéia de que, conferindo um
valor econômico ao bem ambiental, pode-se racionalizar o seu uso, através da atribuição aos usuários de uma
contrapartida pecuniária pela utilização dos recursos hídricos, até então gratuita, não obstante a previsão do art.
103 do Código Civil.
133
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Op. cit., p. 56.
59

que o homem é mero elemento do sistema. Com isso a pessoa, seja física ou
jurídica, que utiliza os recursos ambientais deve pagar por essa utilização, ocorrendo
uma conversibilidade econômica do uso desses bens, que são de todos. Não pode
existir um benefício econômico pela utilização de um bem de todos em prol de uma
pessoa, que causa com sua atividade impactos ambientais que todos irão suportar.
Como dito, esse princípio tem íntima relação com os possíveis impactos134 que uma
determinada atividade possa causar, e este não se relaciona com a idéia da
promoção de uma degradação, pois a atividade é lícita, demonstrando assim a sua
separação do princípio anterior, considerando que usuário poluidor é utilizador de
recursos de todos e por tal deve pagar por este uso.
Acredito que esse princípio pode ser dividido em duas
classificações: uma na qual o usuário utiliza os recursos como meio para se
beneficiar economicamente, através da produção de algum produto ou pelo
fornecimento de algum recurso ambiental, como é o caso da água fornecida pelas
concessionárias de serviços públicos e a segunda classificação, na qual os usuários
utilizam-se dos recursos naturais para seu próprio sustento, não existindo um
benefício econômico, mas sim um custo pela sua utilização, e por tal faz com que
utilize de forma racional.
Considero que esse princípio tem uma natureza preventiva,
pois atua antes da utilização dos recursos ambientais de forma que já possa calcular
o valor a ser compensado pelo impacto promovido pela utilização dos bens
ambientais da coletividade. 135 Observo, com isso que o princípio do usuário-pagador
não tem nenhuma função reparatória, pois incide anteriormente sobre os possíveis
atos que possam impactar o ambiente, enquanto que a ação reparatória deve
ocorrer após a existência do dano ambiental. Com isso, acreditar que o princípio do
usuário-pagador tem natureza reparatória é distorcê-lo com o princípio da

134
COELHO. Maria Célia Nunes. Impactos ambientais em áreas urbanas – Teorias, conceitos e métodos de
pesquisa. In: GUERRA, Antônio José Teixeira; Cunha, Sandra Baptista da (coords.). Impactos Ambientais
Urbanos no Brasil, Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001, p. 64. Para a autora impacto ambiental é: “o processo
de mudanças sociais e ecológicas causado por perturbações (uma nova ocupação e/ou construção de um objeto
novo: uma usina, uma estrada ou uma indústria) no ambiente. Diz respeito ainda à evolução conjunta das
condições sociais e ecológicas estimulada pelos impulsos das relações entre forças externas e internas à unidade
espacial e ecológica, histórica ou socialmente determinada. É a relação entre sociedade e natureza que se
transforma diferencial e dinamicamente”.
135
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 170.
60

responsabilidade, o que causa uma abstração não recomendada entre os princípios


e a sua efetivação diante dos casos concretos.136
O Princípio 16 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento de 1992137 normatizou a referida matéria, passando a ser um
princípio universal e devendo ser adotado por toda Comunidade Internacional. No
Brasil o primeiro dispositivo legal que valorou um bem ambiental foi a Lei 9433/97138,
que consagrou a água como sendo um bem de valor econômico.

3.2.8 Princípio da Função Socioambiental da Propriedade

Este princípio consagra a função social da propriedade,


condicionando que ela exerça uma função social. Nesse sentido, a Constituição
Federal em seu artigo 5º, incisos XXII e XXIII139, declara ser a propriedade um direito
fundamental, desde que a mesma tenha uma função social. Com isso, a propriedade
não é mais vista de uma forma absoluta sem limitações e deveres dos proprietários
com a propriedade e mais ainda com a coletividade. É importante observar que a
propriedade aqui apresentada é tanto a propriedade rural como a urbana, sendo que
esta é qualificada pelo artigo 182, § 2º140 da Constituição Federal, que disciplina que

136
ARAGÃO, Alexandra. Direito Constitucional do Ambiente da União Européia. In: CANOTILHO, José
Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Op. cit., p. 47. A prossecução dos fins de melhoria do ambiente e
da qualidade de vida, com justiça social e ao menor custo económico, será indubitavelmente mais eficaz se cada
um dos princípios se “especializar” na realização dos fins para os quais está natural e originalmente mais
vocacionado.
137
MODÉ, Fernando Magalhães. Op. cit., p.144.
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992.
Princípio 16 – Tendo em vista que o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo decorrente da poluição, as
autoridades nacionais devem procurar promover a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos
econômicos, levando na devida conta o interesse público, sem distorcer o comércio e os investimentos
internacionais.
138
BRASIL, Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei nº 9433 de 08 de janeiro de 1997 – Institui a
Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos,
regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art. 1º da Lei 8.001, de 13 de março de
1990, que modificou a Lei 7.990, de 28 de dezembro de 1989. Disponível em <http://www.planalto.gov.br> .
Acesso em: 10 dez 2006. Art 1º A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos:
II- A água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico.
139
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em: 05/10/1988. Disponível em
<URL: http://www.planalto.gov.br> . Acesso em 10 dez. 2006. Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXII – é garantido o direito de propriedade; XXIII – a propriedade atenderá a sua função social;
140
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em: 05/10/1988. Disponível em
<URL: http://www.planalto.gov.br> . Acesso em 10 dez. 2006. Art. 182. A política de desenvolvimento urbano,
executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o
pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. § 2º - A
61

a propriedade urbana deve exercer sua função social quando cumpre as exigências
contidas no Plano Diretor da cidade. Este estabelece o ordenamento do crescimento
da cidade e a forma com que a população desejar viver. É a sociedade intervindo no
processo de desenvolvimento da sua qualidade de vida urbana. Na área rural, a
função social é disciplinada no artigo 186141 da Constituição Federal, no qual tem
como requisito expresso o dever de utilizar, de forma racional, os recursos
ambientais e o de proteger o ambiente.
O princípio da função socioambiental tem uma amplitude maior
do que uma limitação da propriedade, pois o proprietário, que além de se abster de
uma conduta prejudicial à coletividade, deve ter também uma postura positiva
imposta pelo ordenamento jurídico. Isso demonstra que no desenvolver de alguma
atividade na propriedade deve-se precaver de possíveis prejuízos ambientais, além
de comprovar que a sua atividade irá contribuir para a qualidade de vida do ser
humano, fundamentando a imposição da regeneração de reserva legal mesmo não
tendo sido o atual proprietário responsável pela supressão.142 Também existe a
necessidade de se apontar os impactos positivos promovidos pelas atividades para
que se possa analisar quais os benefícios que aquela atividade trará para o
ambiente e conseqüentemente para o homem.
Acredito que os princípios apresentados são a base do
ordenamento jurídico ambiental e que os outros princípios proclamados pela
doutrina e pela jurisprudência são subprincípios dos que aqui foram expostos. E é
através da utilização desses e outros, que vierem a surgir com o desenvolvimento
desse direito, que se poderá efetivar o direito fundamental ao ambiente sadio e
equilibrado para as presentes e futuras gerações, visando um desenvolvimento
sustentável do ser humano no planeta.

propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade
expressas no plano diretor.
141
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em: 05/10/1988. Disponível em
<URL: http://www.planalto.gov.br> . Acesso em 10 dez. 2006. Art. 186. A função social é cumprida quando a
propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos
seguintes: I – aproveitamento racional e adequado; II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e
preservação do meio ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV –
exploração que favoreça o bem estar dos proprietários e dos trabalhadores.
142
MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Princípios fundamentais do Direito Ambiental. Revista de Direito Ambiental,
nº 2, São Paulo: RT, 1996, p. 59-60. e MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 169. É com base neste princípio que se tem
sustentado, por exemplo, a possibilidade de imposição ao proprietário rural do dever de recomposição da
vegetação em áreas de preservação permanente e reserva legal, mesmo que não tenha sido ele o responsável pelo
desmatamento, certo que tal obrigação possui caráter real – propter rem -, isto é, uma obrigação que se prende ao
titular do direito real, seja ele que for, bastando para tanto sua simples condição de proprietário ou possuidor.
62

CAPÍTULO II – A INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS FUNDAMENTAIS


AMBIENTAIS E A PONDERAÇÃO DE INTERESSES NO LICENCIAMENTO
AMBIENTAL.

1. A Interpretação das Normas

Neste capítulo tratarei da interpretação das normas


fundamentais ambientais, tendo em vista que se trata de um ramo especializado do
direito, como afirmei no capítulo anterior, devendo, para a sua concretização, ser
interpretada de forma conjunta com todo o ordenamento jurídico. Conforme
esclarecido, o ambiente é um direito fundamental de terceira dimensão por ser de
todos, impõe deveres e são normas materialmente constitucionais, não dependendo
de uma positivação na Constituição Federal para que sejam interpretadas como
normas constitucionais, pois sua essência e sua importância para a existência digna
do homem já a tornam hierarquicamente superiores às normas materialmente
infraconstitucionais. Com isso, discutirei da hermenêutica143 dessas normas, diante
de outras normas materialmente constitucionais, bem como sua concretização para
que se obtenha a melhor eficácia. Após apresentar o conceito de interpretação, seu
desenvolvimento e a interpretação dos direitos fundamentais, essencial para este
estudo, irei abordar o método ponderativo no licenciamento ambiental, visto que tal

143
Preferi adotar como sinônimas as palavras hermenêutica e interpretação, já que a diferença existente entre as
palavras não é de conteúdo, mas sim temporal, pois a hermenêutica tem sua origem na mitologia grega, na qual o
hermeneuta tinha o dever de reconhecer a vontade dos deuses e também a dos homens, e acredito que esse
reconhecimento era relativo à vontade dos deuses para os homens, assim a hermenêutica está inicialmente ligada
à matéria de cunho religioso, já a interpretação é o afastamento da Igreja da interpretação da vontade de Deus
para os homens, passando estes a realizarem sua própria interpretação a partir do conhecimento do homem que lê
a vontade de Deus, surgindo no começo da Idade Média. Observo que ambas buscam o mesmo objetivo, mas sua
diferenciação é histórica e não de conteúdo, como disse inicialmente, PEIXINHO, Manoel Messias. A
Interpretação da Constituição e os Princípios Fundamentais, 3ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 1-3.
63

instrumento de controle ambiental exerce uma ponderação entre os interesses da


preservação ambiental e os econômicos, sociais e outros direitos fundamentais que
devem ser efetivados e que aparentemente se encontram em conflito.

1.1- Sentido e Conceito de Interpretação.


Importante preliminarmente apontar o conceito de interpretação
e o sentido que a mesma exerce na concretização da norma constitucional,
demonstrando posteriormente a forma com que se interpretam e concretizam as
normas materialmente constitucionais ambientais. Assim, a interpretação é o
desenvolvimento mental para dar um significado a determinado enunciado normativo
para que se identifique a norma que irá incidir na solução de uma determinada
situação concreta144 e, ainda, orientar a aplicação do direito através de sua
hierarquia de normas, realizando o intérprete uma interpretação por um processo no
qual a norma superior interpretada orienta a inferior.145 Assim, a interpretação busca
encontrar o direito existente no enunciado normativo que por vezes não está claro e
que também pode se alterar com o desenvolvimento humano, passando o
enunciado que, em uma determinada época correspondia a uma norma,
posteriormente corresponder a outra mais condizente à realidade humana, sendo a
norma aplicada ao caso concreto o enunciado normativo interpretado.146 Sendo
assim, é uma atividade intelectual que visa identificar problemas e solucioná-los a
partir de fontes e métodos específicos de interpretação jurídica, conciliando o texto
normativo com a realidade existente, o que demonstra que a interpretação jurídica
não é absoluta, podendo no máximo ser considerada correta para aquela época ou
simplesmente para aquele caso.147

144
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Op. cit., p. 1074.
Interpretar uma norma constitucional consiste em atribuir um significado a um ou vários símbolos linguisticos
escritos na constituição com o fim de se obter uma decisão de problemas práticos normativo-constitucionalmente
fundada.
145
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito, 6ªed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 387. A interpretação é,
portanto, uma operação mental que acompanha o processo da aplicação do Direito no seu progredir de um
escalão superior para um escalão inferior.
146
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Op. cit., p. 1074-1075.
e BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 438.
147
LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 5ª ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1983, p.
378. Se bem que toda e qualquer interpretação, devida a um tribunal ou à ciência do Direito, encerre
necessariamente a pretensão de ser uma interpretação «correcta», no sentido de conhecimento adequado, apoiado
em razões compreensíveis, não existe, no entanto, uma interpretação «absolutamente corresta», no sentido de
que seja tanto definitiva, como válida para todas as épocas. Nunca é definitiva, porque a variedade inabarcável e
a permanente mutação das relações da vida colocam aquele que aplica a norma constantemente perante novas
questões. e PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 30-31.
64

É evidente que a interpretação não é uma operação exclusiva


do direito, já que é um ato utilizado para outras ciências além das jurídicas, não
existindo uma hermenêutica que interprete todas as ciências da mesma forma num
sentido geral, mas sim o que existe é uma pluralidade de possíveis interpretações
com métodos próprios, dependendo da especialidade de cada ciência a ser
interpretada148. Ressalto que também pode ocorrer interpretações que utilizem
diversas ciências para a concretização de uma norma jurídica, não podendo ser a
interpretação um modelo estático no qual as ciências não podem se interagir para a
obtenção de um resultado interpretativo. Tal fato ocorre na interpretação das normas
ambientais, visto que há a necessidade de observar as relevâncias de outras
ciências para que o intérprete possa identificar uma norma ambiental válida para as
situações reais, pois os elementos ambientais não são constituídos pela vontade
humana, mas podem ser alterados pela sua ação.149 Com isso, o direito ambiental
busca diminuir os possíveis impactos que as condutas humanas proporcionam ao
ambiente, mas essa concretização da norma ambiental não pode ignorar as normas
biológicas, físicas, químicas e outras que compõem o ambiente.150
Segundo Kelsen, a interpretação se divide em duas espécies
bem definidas, e que se relacionam com o intérprete, se este é um aplicador do
direito ou de uma pessoa que aplica o direito para a realização de suas condutas
como indivíduo. Essas espécies são classificadas em autêntica e não autêntica,
sendo a primeira a interpretação realizada pelo órgão aplicador do direito que
através de sua vontade, cria uma lei ou um tratado que irá influenciar nas condutas
gerais, mas também, para Kelsen, a interpretação autêntica pode ser realizada
quando cria um comando normativo individual em um determinado caso concreto,
quando não mais cabe a reforma da norma aplicada pelo órgão que interpretou o

148
PEIXINHO, Manoel Messias. A Interpretação da Constituição e os Princípios Fundamentais, Op. cit., p. 5.
149
ANTUNES, Paulo Bessa. Op. cit., p. 58. Tem sido reconhecida, unanimemente, pela doutrina, como uma das
características fundamentais do Direito Ambiental, a sua marcante interdisciplinariedade. Não se pode pensar a
proteção jurídica do meio ambiente sem se considerar dados relevantíssimos que são trazidos para o interior do
universo do Direito por outros ramos do conhecimento humano. Dentre estes vários conhecimentos que
influenciam a construção do Direito Ambiental podem ser destacadas a biologia, a química, a meteorologia, as
ciências sociais etc. Muitas vezes, o jurista recorre a conceitos de outras ciências para que possa dar solução a
um problema que, aparentemente, estava alicerçado em uma questão puramente jurídica. e FERREIRA, Heline
Sivini. Política Ambiental Constitucional, In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato.
Op. cit., p. 231.
150
O próprio conceito jurídico adotado pela legislação ambiental brasileira para ambiente, através da Lei nº
6.938/81 que trata da Política Nacional de Meio Ambiente, considera que o ambiente é formado por interações
de ordem física, química e biológica. Assim, a interpretação jurídica ambiental não pode desconsiderar a
65

caso.151 Enquanto que a interpretação feita pelo indivíduo, que diante de um


enunciado normativo busca se adequar àquele para a realização de uma conduta
não contrária à lei é uma interpretação não autêntica, uma vez que o indivíduo faz a
interpretação da conduta que acredita ser a correta na indeterminabilidade deixada
pelo enunciado normativo, mas a conduta aplicada pelo indivíduo que interpretou o
enunciado, para que não se conduzisse contra o ordenamento jurídico, não vincula
os órgãos aplicadores do direito, podendo essa interpretação está contraditória em
relação à interpretação do aplicador do direito que exerce de forma autêntica.152
Observo que o aplicador do direito que exerce uma interpretação autêntica cria o
direito, visto que sua criação gera uma força coercitiva para o indivíduo, podendo ser
aplicada uma sanção pelo seu descumprimento. É uma hermenêutica criadora do
ordenamento jurídico, que deve ser realizada pelos poderes do Estado e também
pela coletividade quando participa das decisões do Estado Democrático de Direito.
Enquanto a interpretação não autêntica se caracteriza pela falta de um vínculo que
crie o dever de cumprimento de determinada conduta, sendo a conduta gerada pela
hermenêutica individual na busca de estar em conformidade com a norma jurídica.
Para o positivismo de Kelsen, existe uma área de livre
interpretação para o intérprete, espaço este, que não é determinado pela
Constituição ou pela lei. Assim, no momento da concretização da norma, deve existir
a vinculação do enunciado normativo superior com o inferior, mas o ordenamento
sempre permite uma margem de indeterminação que o intérprete, na aplicação da
norma, venha a preencher essa margem de indeterminação com a sua própria
apreciação. Ocorre que essa indeterminação deixada pelo legislador pode ser
intencionalmente ou não, podendo ser tanto no ato de criação da norma jurídica
como também na execução, o direito regularia algumas ações, deixando outras

hermenêutica de outras ciências relacionadas ao ambiente, sob pena de se ter uma norma não condizente com a
realizada.
151
KELSEN, Hans. Op. cit., p. 394-395. Através de uma interpretação autêntica deste tipo pode criar-se Direito,
não só no caso em que a interpretação tem caráter geral, em que, portanto, existe interpretação autêntica no
sentido usual da palavra, mas também no caso em que é produzida uma norma jurídica individual através de um
órgão aplicador do Direito, desde que o ato deste órgão já não possa ser anulado, desde que ele tenha transitado
em julgado. É fato conhecido que, pela via de uma interpretação autêntica deste tipo, é muitas vezes criado
Direito novo – especialmente pelos tribunais de última instância.
152
Ibidem, p. 395. Se um indivíduo quer observar uma norma que regula a sua conduta, quer dizer, pretende
cumprir um dever jurídico que sobre ele impende realizando aquela conduta a cuja conduta oposta a norma
jurídica liga uma sanção, esse indivíduo, quando tal conduta não se encontra univocamente determinada na
norma que tem de observar, também tem de realizar uma escolha entre diferentes possibilidades. Porém, esta
escolha não é autêntica. Ela não é vinculante para o órgão que aplica essa norma jurídica e, por isso, corre
66

desvinculadas do ordenamento jurídico, podendo o executor ou criador realizar a


ação que melhor lhe convenha ao caso. Quando a indeterminação não é intencional,
porque o legislador, ao editar o enunciado normativo, não permitiu através da
expressão verbal uma única significação, cabe ao intérprete o dever de investigar a
real significação do enunciado normativo a partir de outras fontes, podendo estas
serem utilizadas livremente pelo intérprete do enunciado normativo. Segundo o
autor, também uma situação de indeterminação não intencional acontece quando
dois enunciados que têm a mesma validade e eficácia e aparentemente encontram-
se em colisão, devendo ter uma área de livre vontade na aplicação das fontes para
concretizar a norma.153 Tal situação poderia ocorrer caso a Constituição Federal, em
seu art. 170, não tivesse positivado o enunciado do inciso VI, no qual a proteção
ambiental está inserida na ordem econômica, pois, em situação contrária, estaria
diante de um conflito aparente de enunciados, uma vez que a proteção ambiental
também está positivada na Constituição Federal e ambas são direitos fundamentais
para a pessoa humana, conforme demonstrei no capítulo anterior. Tal
indeterminação tem maior incidência nas Constituições do que nas leis, pois as
segundas contêm um nível de determinação maior do que as primeiras,
necessitando estas de uma maior análise por parte do intérprete.154
Para Ronald Dworkin, essa atuação, principalmente do juiz
quando age discricionariamente na solução de casos concretos, por existir uma
indeterminação no ordenamento jurídico, é na verdade uma atuação de legislador
positivo, pois este estaria criando novos direitos, o que na verdade não acontece155,

sempre o risco de ser considerada como errônea por esse órgão, de forma a ser julgada como delito a conduta do
indivíduo que nela se baseou.
153
KELSEN, Hans. Op. cit., p. 388-389.
154
COELHO, Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional, Porto Alegre – RS: Sergio Antonio Fabris
Editor, 1997, p. 26. Com efeito, enquanto a Lei ostenta um grau de relativamente alto de determinação material e
de precisão de sentido, podendo, por isso, ser diretamente aplicável, a Constituição – pela sua natureza, estrutura
e finalidade – apresenta-se como um sistema aberto de regras e princípios que necessitam da mediação de
legisladores e juízes para lograrem efetividade.
155
DWORKIN, Ronald. Op. cit., p. 146. En el positivismo jurídico encontramos una teoría de los casos difíciles.
Cuando un determinado litigio no se puede subsumir claramente en una norma jurídica, establecida previamente
por alguna institución, el juez – de acuerdo con esa teoría – tiene «discreción» para decidir el caso en uno u otro
sentido. Esta opinión supone, aparentemente, que una u otra de las partes tenía un derecho preexistente a ganar el
proceso, pero tal idea no es más que una ficción. En realidad, el juez ha introducido nuevos derechos jurídicos
que ha aplicado después, retroactivamente, al caso que tenía entre entre manos. En los dos últimos capítulos
sostuve que esa teoría de la adjudicación de competencias al juez es totalmente inadecuada; en este capítulo he
de presentar y defender una teoría mejor.
Mi argumento será que, aun cuando ninguna norma esclarecida resuelvo el caso, es posible que una de las partes
tenga derecho a ganarlo. No deja de ser deber del juez, incluso en los casos difíciles, descubrir cuáles son los
derechos de las partes, en vez de inventar retroactivamente derechos nuevos. Sin embargo, debo decir sin demora
67

já que o juiz, diante dessas indeterminações, utiliza-se de princípios e regras para


descobrir o direito já existente, considerando diversas condições da realidade.156 Daí
o papel da jurisprudência que, através da interpretação dos juízes, dá determinações
aos espaços deixados pelo legislador, corrigindo possíveis antinomias existentes.157
O escopo da interpretação ainda pode ser dividida de duas
formas, segundo a vontade do legislador e outra sobre o sentido da norma legislada;
dessas duas formas surgiram as teorias subjetivista e objetivista, em que a primeira
visa dar um sentido à norma, segundo a vontade manifestada pelo legislador através
da lei, enquanto na segunda, o intérprete deve buscar alcançar o sentido da própria
158
lei. As duas teorias podem ser utilizadas conjuntamente, pois cada uma delas
reflete verdades, visto que, na subjetivista, demonstra-se que a lei é a expressão da
vontade dirigida à formação de um ordenamento jurídico necessário à determinada
época, na qual pesa as valorações que ensejaram a formulação de determinada lei,
mas também é verdade que os valores utilizados pelo legislador, no momento da
realização da lei, podem ter se alterado com o tempo e que, na época de sua
elaboração, não se tinha pensado nas questões que existem no futuro, questões
estas que o intérprete enfrenta no momento que se encontra diante do caso a ser
interpretado e, mesmo assim, a lei irradia uma ação normativa sobre o caso no qual
o legislador não imaginou na sua elaboração.159 Realmente acredito ser
extremamente difícil a realização de uma interpretação correta, utilizando-se
exclusivamente uma das teorias, uma vez que se o intérprete utilizar somente a
objetivista não entenderá qual o contexto fático que fez surgir aquela lei e de que
forma esta deve interagir no ordenamento jurídico e, em contrapartida, se utilizar

que esta teoría no afirma en parte alguna existencia de ningún procedimiento mecánico para demostrar cuáles
son los derechos de las partes en los casos difíciles.
156
HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição, Porto Alegre - RS: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991,
p. 15. Essa pretensão de eficácia (Geltungsanspruch) não pode ser separada das condições históricas de sua
realização, que estão, de diferentes formas, numa relação de interdependência, criando regras próprias que não
podem ser desconsideradas. Devem ser contempladas aqui as condições naturais, técnicas, econômicas, e sociais.
A pretensão de eficácia da norma jurídica somente será realizada se levar em conta essas condições.
157
PEIXINHO, Manoel Messias. A Interpretação da Constituição e os Princípios Fundamentais, Op. cit., p. 63.
Aqui entra o papel da jurisprudência, que através de seus constantes julgados, permite corrigir possíveis
antinomias produzidas pelo legislador. Na verdade, pode-se objetar que no atual sistema não existe a vinculação
dos precedentes, mas também é inegável a força que hodiernamente assumem os Tribunais na missão
interpretativa, consolidando as suas súmulas que materializam de decisões reiteradas.
158
LARENZ, Karl. Op. cit. p. 380.Vimos na Parte Histórica que se formaram na literatura jusfilosófica e
metodológica, já na segunda metade do século XIX, duas teorias sobre o escopo da interpretação da lei, das quais
a primeira, a «teoria subjectivista» ou «teoria da vontade», considera escopo da interpretação a indagação da
vontade histórico-psicológico do legislador, e a segunda, a «teoria objectivista» ou teoria da interpretação
imanente à lei, exploração do sentido que é inerente à própria lei.
159
LARENZ, Karl. Op. cit. p. 381.
68

somente a teoria subjetivista não poderá inserir na sua interpretação novos


princípios e valores que surgirem com o tempo, causando uma falha na
concretização da norma final.

1.2- A Interpretação Constitucional.

É importante analisar a interpretação das normas


constitucionais no ordenamento jurídico, pois o Direito Ambiental, como dito, foi
positivado no texto constitucional brasileiro a partir da Constituição Federal de 1988,
passando as normas desse direito, que antes da positivação, eram materialmente
constitucionais a serem também qualificadas formalmente. Mas a interpretação
constitucional tem peculiaridades próprias, diferenciando dos direitos
infraconstitucionais e da interpretação tradicional, devido à natureza de suas
normas, tendo em vista que elas contêm um significado, em sua maioria, aberto,
chegando a se defender, pois as questões constitucionais não podem ser
classificadas como questões jurídicas, uma vez que são questões políticas e as
diretrizes constitucionais são a expressão de poder de determinados grupos
detentores de poder. Para Hesse160, tal entendimento não é adequado, já que a
Constituição não pode ficar adstrita a uma realidade motivada pela relação de poder
de determinados grupos, pois o Direito Constitucional é uma ciência jurídica que
busca normatizar, segundo a realidade, um ordenamento jurídico justo e adequado a
toda sociedade e não fundamentando as relações de poder existentes e o seu
domínio sobre a realidade e a sociedade.
A norma constitucional estabelece uma relação entre a
realidade e a norma, entre o que é e o que deve ser, constituindo assim um vínculo,
no qual inexiste norma constitucional sem relação com a realidade fática.161 Acredito
que essa relação não é somente uma constatação através do ordenamento jurídico

160
HESSE, Konrad. Op. cit., p. 11. Essa negação do direito constitucional importa na negação do seu valor
enquanto ciência jurídica. Como toda ciência normativa; Diferencia-se, assim, da Sociologia e da Ciência
Política enquanto ciências da realidade. Se as normas constitucionais nada mais expressam do que relações
fáticas altamente mutáveis, não há como deixar de reconhecer que a ciência da Constituição jurídica constitui
uma ciência jurídica na ausência do direito, não lhe restando outra função senão a de constatar e comentar os
fatos criados pela Realpolitik. Assim, o Direito Constitucional não estaria a serviço de uma ordem estatal justa,
cumprindo-lhe tão-somente a miserável função – indigna de qualquer ciência – de justificar as relações de poder
dominantes. Se a Ciência da Constituição adota essa tese e passa a admitir a Constituição real como decisiva,
tem-se a sua descaracterização como ciência normativa, operando-se a sua conversão numa simples ciência do
ser. Não haveria mais como diferençá-la da Sociologia ou da Ciência Política.
161
Ibidem, p. 14-15.
69

da realidade existente, mas de uma realidade a ser buscada. Separar essa relação é
retirar a essência necessária para a eficácia da norma constitucional.162 Assim,
quanto mais forte o vínculo entre a realidade e a norma constitucional, maior eficácia
esta terá e conseqüentemente maior será a força normativa da Constituição.163 Tal
força é perceptível a partir do poder irradiante das normas constitucionais, nos quais
vão pautar toda a interpretação do ordenamento infraconstitucional, disciplinando as
condutas estatais e sociais, sendo estas uma das diferenciações existentes entre a
hermenêutica constitucional e a interpretação das normas não constitucionais.164
Outra diferenciação diz que as normas constitucionais detêm, em sua maioria, um
alto grau de abstração e, diferentemente do que ocorre com as normas abstratas
infraconstitucionais, aquelas não têm parâmetro de valor superior, pois estão no
ápice do ordenamento jurídico pátrio, devendo utilizar na sua concretização, valores
extrajurídicos que existem na realidade social. Daí, a necessidade da existência da
relação entre a norma jurídica e a realidade na concretização da norma
constitucional que visa dar direção ao ordenamento inferior, inserindo-se com
valores culturais, econômicos, políticos, ambientais, sociais e outros para que possa
estabelecer uma norma eficaz no presente e que sirva de fundamento para a
construção da norma do futuro.165 Caso contrário, a força normativa constitucional é
inexistente e volta simplesmente a representar a expressão da vontade de grupos de
poder.
Esse vínculo entre realidade e a norma jurídica é estabelecido
através do sentimento constitucional existente para que a norma constitucional tenha
eficácia, visto que tais normas não podem ser aplicadas de forma forçada e, pelo
contrário, sua força normativa advém do sentir a necessidade de efetividade da
norma constitucional.166 Observo que essa ligação existente entre o sentimento e a
eficácia da norma constitucional se justifica por ser a Constituição um texto jurídico

162
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, ADI 2083-8DF, relator: Min. Moreira Alves, j.
03/08/2000. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 10 de set. 2007. No julgado em questão o
relator expõe as alegações da Consultoria Jurídica do Ministério de Meio Ambiente, no qual afirma que existe
um vínculo entre a norma e a realidade para possa ocorrer a efetiva da norma jurídica e para tal é necessário que
a norma esteja em compasso com a realidade existente, sob pena que se criar um distanciamento entre o
ordenamento jurídico e a realidade existente e concreta.
163
HESSE, Konrad. Op. cit., p. 16. A Constituição adquire força normativa na medida em que logra realizar essa
pretensão de eficácia.
164
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 49.
165
HESSE, Konrad. Op. cit., p. 18.
166
VERDÚ. Pablo Lucas. O Sentimento Constitucional, Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 3 e PEREIRA, Jane
Reis Gonçalves. Op. cit., p. 53.
70

altamente político e, por ser assim, as opções políticas que o Estado e a Sociedade
tomam, fundamentam-se através do sentimento existente no momento da decisão.
Tal aspecto faz com que as normas constitucionais representem mais do que
normas jurídicas, pois valores extrajurídicos compõem a sua formação, mantendo
sua eficácia enquanto o sentimento que incluiu os valores extrajurídicos
permaneçam existentes e continuem fundamentando a aplicação dessas normas.167
Penso que a relação entre sentimento e eficácia normativa pode ser vislumbrada
através das questões ambientais, já que o sentimento pela existência de uma efetiva
e necessária proteção ambiental para a permanência do homem de forma digna no
planeta, concretiza o direito fundamental de terceira dimensão de se ter um
ambiente equilibrado e sadio, tornando cada vez maior a força das normas
ambientais. Assim, os movimentos da Sociedade pela preservação e proteção
ambiental168 fazem com que as instituições políticas sintam o sentimento por uma
efetiva proteção ambiental pelo direito.
Uma Constituição afastada do sentimento de efetivação das
normas constitucionais, em que a sociedade não enxerga a necessidade da
aplicação das normas contidas na Constituição, na sua realidade, não são
efetivadas pelas instituições, não trazem nenhuma força normativa a essa
Constituição, pois esta não é vivida, não há um sentimento que faça a sociedade
viver a norma constitucional de forma voluntária e não coativa, fazendo com que a
norma constitucional não exerça sua função integradora.169 A Constituição, para ter
força ativa, necessita de que as tarefas impostas no seu corpo sejam vividas, que
exista a vontade de concretização dessas normas. Após o surgimento de tal vontade
da Constituição é que a norma constitucional deixa de ser uma tarefa abstrata que

167
VERDÚ. Pablo Lucas. Op. cit., p. 6-7. O sentimento jurídico-constitucional não é a causa de tal efetividade
por si só; é uma prova significativa da consonância entre norma e realidade, ainda que também, ao lado de outros
fatores, seja capaz de colaborar com essa consonância. Dito de outra maneira: quando um ordenamento jurídico
é capaz de suscitar ampla e intensa adesão efetiva quanto à sua normação e, sobretudo, quanto às instituições
mais enraizadas em suas bases sociais, então tal ordenamento é algo vivo. Não está ali, afastado, nutrindo-se
solidariamente de suas próprias interconexões e interpretações formais. Penetra nas entranhas populares para
converter-se em ordenamento sentido.
168
JB Ecológico. O que você acha melhor mudar, A Fonte de Energia ou o Clima? Ano 5 nº 65, Rio de Janeiro:
Jornal do Brasil, junho de 2007, p. 44; JB Ecológico. Uma Bolsa para salvar o Planeta, Ano 5 nº 66, Rio de
Janeiro: Jornal do Brasil, julho de 2007, p. 38 e JB Ecológico. SOS Mata Atlântica, Ano 4 nº 44, Rio de Janeiro:
Jornal do Brasil, setembro de 2005, p. 44.
169
VERDÚ. Pablo Lucas. Op. cit., p. 5. Sendo assim, podemos concluir que o sentimento jurídico brota da
convicção de que determinadas normações, escritas ou consuetudinárias (evidentemente, dada a espontaneidade
destas últimas, nelas opera mais profundamente tal convicção), são convenientes e justas para a convivência. E
mais, essa adesão emocional pode ser tão sentida que aqueles que a expressam atuam com a íntima satisfação de
71

aguarda o momento de sua concretização e passa a ter força ativa para incidir em
todo ordenamento jurídico.170
A existência desse sentimento para a concretude das normas
constitucionais faz com que a Constituição não possa ser vista por uma única
perspectiva, podendo existir outras normas constitucionais advindas do mesmo
enunciado normativo constitucional que também são válidas.171 Assim, é o
sentimento constitucional que irá conduzir a melhor norma para determinada
situação, uma vez que ele estará integrando a norma à realidade existencial. No
Brasil, o Supremo Tribunal Federal172 já pacificou o entendimento que a
interpretação para ser válida, tem de ser razoável com a realidade. Importante é que
a norma interpretada seja razoável e fundamentada principalmente quando ela vem
a modificar uma interpretação razoável que já vem sendo utilizada para determinada
situação, visto que a motivação é imprescindível, pois a nova interpretação busca,
através de sua fundamentação, concluir que aquela norma interpretada não é mais
razoável para determinada situação que anteriormente seria.173
Sendo a interpretação constitucional um procedimento no qual
busca apresentar uma norma jurídica constitucional ligada a uma realidade que tem
como ligação a norma, a realidade e o sentimento na efetividade da norma
constitucional. Acredito que a interpretação deve ocorrer de forma aberta, no qual

cumprir um dever cívico. Obedecem sem temor nem coação alguma, porque, com tal adesão emocional,
experimentam a fruição de integra-se livremente no projeto solidário comum.
170
HESSE, Konrad. Op. cit., p. 19. Embora a Constituição não possa, por si só realizar nada, ela pode impor
tarefas. A Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se existir a
disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os
questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se puder identificar a vontade de
concretizar essa ordem. Concluindo, pode-se afirmar que a Constituição converter-se-á em força ativa se
fizerem-se presentes, na consciência geral – particularmente, na consciência dos principais responsáveis pela
ordem constitucional -, não só a vontade de poder (Wille zur Macht), mas também a vontade de Constituição
(Wille zur Verfassung).
171
KELSEN, Hans. Op. cit., p. 390-391. e LARENZ, Karl. Op. cit., p. 410 – 411.
172
BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Súmula 343, Disponível em: <http: ∕∕ www.stf.gov.br> Acesso em: 22
de setembro de 2007. – Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão
rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos Tribunais. e BRASIL. Supremo
Tribunal Federal, Súmula 400, data de aprovação 03/04/1964. Disponível em: <http: ∕∕ www.stf.gov.br> Acesso
em: 22 de setembro de 2007. Decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não seja a melhor, não
autoriza recurso extraordinário pela letra do art. 101, III, da Constituição Federal.
173
COELHO, Inocêncio Mártires. Op. cit., p. 60. Por isso é que o abandono dos precedentes exige não apenas a
explicação ordinária das razões de fato e de direito que fundamentem essa decisão, como também uma
justificação adicional dos motivos que levaram o intérprete a se afastar do critério anterior. Quem resolve
desprezar um precedente, assume o ônus da argumentação, pois não parece sensato renunciar sem justificação ao
que até então vinha sendo adotado como prevalecente.
72

todos que sintam e vivam a Constituição devam ter o dever de interpretá-la.174 Todos
os grupos da sociedade deverão participar da efetivação da Constituição, sendo a
interpretação proveniente de uma sociedade aberta que vivencie as modificações da
realidade e busque inseri-las na interpretação constitucional.
O fato de a Constituição pautar toda a interpretação
infraconstitucional e ser o eixo principal entre a norma jurídica e a realidade, faz com
que todos os que têm algum dever constitucional tenham que interpretar os
enunciados constitucionais, inserindo valores aos enunciados. Assim, o Poder
Executivo é um intérprete constitucional no momento que tem de exercer sua função
dentro do Estado, devendo interpretar a Constituição na tomada de decisões, da
mesma forma que o Poder Legislativo, quando legisla, também é um intérprete da
Constituição, pois deve elaborar uma legislação condizente às normas
constitucionais sob pena de inconstitucionalidade. O Poder Judiciário é outro que
deve interpretar a Constituição e buscar manter a compatibilidade do ordenamento
jurídico infraconstitucional com o constitucional, caso contrário, declarar-se-á a
inconstitucionalidade das leis e atos normativos que não estejam correspondendo ao
sentimento e, por conseqüência, à norma constitucional.175
Além dos poderes do Estado, cabe também a interpretação
constitucional à sociedade, inclusive acredito que essa é a principal intérprete da
Constituição, visto ser ela que irradia o sentimento da necessidade de eficácia de
determinada norma constitucional, servindo ele de base de fundamentação da
interpretação de todos os outros intérpretes. Presumo que, esses outros intérpretes,
no momento de sua hermenêutica, exercem a função de lapidar o sentimento da
sociedade.
Esse mesmo sentimento dará fundamentação para a
regulamentação dos preceitos constitucionais abertos, em especial, para este
trabalho. A definição de interesse local, contido no art. 30, inciso II da Constituição

174
HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional, Porto Alegre – RS: Sergio Antonio Fabris Editor, 1997, p.
13. Interpretação constitucional tem sido, até agora, conscientemente, coisa de uma sociedade fechada. Dela
tomam parte apenas os intérpretes jurídicos ¨vinculados às corporações¨ (zünftmässige Interpreten) e aqueles
participantes formais do processo constitucional. A interpretação constitucional é, em realidade, mais um
elemento da sociedade aberta. Todas as potências públicas, participantes materiais do processo social, estão nela
envolvidas, sendo ela, a um só tempo, elemento resultante da sociedade aberta e um elemento formador ou
constituinte dessa sociedade (...weil Verfassungsinterpretation diese offene Gesellschaft immer Von neuem
mitkonstituiert und Von ihr konstituiert wird). Os critérios de interpretação constitucional hão de ser tanto mais
abertos quanto mais pluralista for a sociedade.
175
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 56.
73

Federal, relata quem melhor do que a sociedade, que vive a norma176, para informar
qual o interesse que deve existir em determinado Município, pois somente aquela
sociedade que vive naquele local tem possibilidade de interpretar o preceito
constitucional. É evidente que aos órgãos estatais cabem validar a interpretação
dada pela sociedade através de seus atos, em especial, o Poder Judiciário no
pertinente à constitucionalidade, em relação aos interesses regionais e nacionais,
para que não ocorra uma invasão dos interesses dos entes da Federação,
objetivando manter a harmonia entre eles.
A própria Constituição brasileira de 1988 possibilitou a
interpretação aberta de seus preceitos, incluindo a sociedade e conseqüentemente o
cidadão na tarefa de interpretá-la, uma vez que no art. 225, que trata sobre o
ambiente, matéria deste estudo, foi consagrado o ambiente sadio e equilibrado como
sendo um direito de todos e, por tal, gera um dever a todos de preservá-lo e protegê-
lo. Com isso, para que a sociedade possa exercer esse dever constitucional para
obter o direito consagrado, ela deve ser intérprete de tal norma com o objetivo de
obter condutas ambientalmente corretas em relação ao ambiente e,
conseqüentemente, a todos os seres humanos. Assim, observo que, em especial,
mas não unicamente, os direitos fundamentais de terceira dimensão são direitos que
a sociedade tem grande participação da interpretação das normas materialmente
constitucionais.
Alguns autores vislumbram que a interpretação constitucional
não poderia ocorrer da mesma forma que a tradicional e positivista através da
subsunção. Assim construíram uma teoria que dava uma hierarquia às normas
constitucionais por meio de sua eficácia criando vários graus para as normas
constitucionais dependendo de sua natureza jurídica.177 Segundo essa teoria, que
no Brasil veio a surgir com José Horácio Meirelles Teixeira178 e posteriormente
difundida por José Afonso da Silva, as normas constitucionais poderiam ser
classificadas hierarquicamente da seguinte forma: normas de eficácia plena179, que

176
HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional, Op. cit., p. 13. O conceito de interpretação reclama um
esclarecimento que pode ser assim formulado: quem vive a norma acaba por interpretá-la ou pelos menos por co-
interpretá-la.
177
PEIXINHO, Manoel Messias.Teorias e Métodos de Interpretação dos Direitos Fundamentais. Op. cit., p. 217.
178
TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Curso de direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
1991.
179
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais, 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p.
101. Mas podemos adiantar que estabelecem conduta jurídica positiva ou negativa com o comando certo e
74

são as que tendem a possibilitar a sua aplicação de imediato sem que haja uma
regulamentação posterior pelo legislador ordinário; as normas de eficácia limitada 180,
que são normas que o legislador constituinte regulamentou a matéria de forma
possível à sua aplicabilidade, dando oportunidade para que o legislador ordinário
pudesse restringir o seu campo de eficácia: as normas de eficácia limitada181, que se
assemelham com as normas programáticas, já que necessitam de uma norma de
integração posterior para alcançar sua eficácia imediata. Acredito que essas
classificações, para as normas constitucionais, não podem ser vistas e admitidas de
forma estática, uma vez que, com o desenvolvimento da sociedade e do sentimento
de efetividade das normas constitucionais, elas vão alcançando uma classificação
superior na hierarquia das normas constitucionais em sua eficácia.

1.3- Interpretação dos Direitos Fundamentais e a Possibilidade de Restrição.

No mesmo contexto das normas constitucionais, temos as


normas constitucionais fundamentais182, que são as que concedem direitos aos

definido, incrustado-se, predominantemente, entre as regras organizativas e limitativas dos poderes estatais, e
podem conceituar-se como sendo aquelas que, desde a entrada em vigor da constituição, produzem, ou têm
possibilidade de produzir todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações,
que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular.
180
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais, Op. cit., p. 116. Normas de eficácia
contida, portanto, são aquelas em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a
determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do Poder
Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas enunciados.
181
Ibidem, p. 125. apoiada na jurisprudência italiana, que as considera como preceptivas, dotadas de comandos
jurídicos de aplicação direta, mas não imediata, porque requerem outras normas jurídicas integrativas, com o
quê, salvo a terminologia, podemos concordar, e as programáticas seriam diretivas, destituídas de preceito
concreto, mas dando só indicação ao legislador futuro.
182
No referido julgado, o Ministro relator reconhece que a Constituição não pode ter uma concepção somente
conceitual, mas deve existir uma pluralidade de conceitos e que devem estes serem impregnados em todo o
ordenamento jurídico, sendo a Constituição mais do que um documento formal, pois abrange conceitos materiais
que extrapolam a norma positivada, conforme transcrevo parte do julgado do STF que afirma tal
posicionamento. BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, ADI 595/ES, relator: Min. Celso de
Mello, j. 18/02/2002. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 10 de set. 2007. “ Não foi por outra
razão que o Supremo Tribunal Federal, certa vez, e para além de uma perspectiva meramente reducionista, veio a
proclamar – distanciando-se, então, das exigências inerentes ao positivismo jurídico – que a Constituição da
República, muito mais do que o conjunto de normas e princípios nela formalmente positivados, há de ser
também entendida em função do próprio espírito que a anima, afastando-se, desse modo, de uma concepção
impregnada de evidente minimalismo conceitual (RTJ 71/289, 292 – RTJ 77/657). É por tal motivo que os
tratadistas – consoante observa JORGE XIFRAS HERAS (“Curso de Derecho Constitucional”, p. 43) -, em vez
de formularem um conceito único de Constituição, costumam referir-se a uma pluralidade de acepções, dando
ensejo à elaboração teórica do conceito de bloco de constitucionalidade (ou de parâmetro constitucional), cujo
significado – revestido de maior ou de menor abrangência material – projeta-se, tal seja o sentido que se lhe dê,
para além da totalidade das regras constitucionais meramente escritas e dos princípios contemplados, explicita ou
implicitamente, no corpo normativo da própria Constituição formal, chegando, até mesmo, a compreender
normas de caráter infraconstitucional, desde que vocacionadas a desenvolver, em toda a sua plenitude, a eficácia
75

indivíduos e a coletividade, visto que são direitos essenciais da pessoa humana para
que os mesmo tenham uma vida digna no planeta. Assim, além da diferenciação da
interpretação constitucional para a infraconstitucional, há também diferenças para as
normas fundamentais, tendo em vista um grau muito maior de abertura,
necessitando de uma vinculação da interpretação das normas que explicitam direitos
fundamentais a uma teoria da Constituição e, por conseguinte, a teoria dos direitos
fundamentais, utilizando os valores e direitos consagrados nas dimensões dos
direitos fundamentais para fundamentar a norma interpretada. A partir da inclusão de
princípios e valores externos aos positivados, no qual o processo democrático é
fundamental para tal interpretação, exige-se necessariamente a participação intensa
da Sociedade no processo interpretativo183, já que é ela que permitirá uma
interpretação dos direitos fundamentais necessários para a pessoa humana que, por
muitas vezes, se colidem entre eles. Portanto, é a Sociedade que poderá levar esses
aparentes conflitos para a esfera pública184 de discussão para que possam ser
interpretados segundo uma visão geral para aquela sociedade que detectou os
conflitos, uma vez que um problema entre direitos fundamentais em um local pode
não ocorrer em outro. Daí vislumbra-se a importância do sentimento da sociedade
para que possa dar efetividade ao texto constitucional e aos direitos fundamentais.
Tais direitos extrapolam o formato tradicional da interpretação,
não podendo ser realizado segundo um método formal positivista, o qual tem como
ponto fundamental a literalidade do enunciado normativo, significando a restrição
dos Direitos Fundamentais185 que pode ocorre, mas não de uma forma literal, mas
através de um contexto de situações e realidade existentes, conforme demonstrarei
posteriormente.
A interpretação dos direitos fundamentais deve permitir a maior
amplitude possível desses direitos, pois reconhecem valores essenciais ao homem,
em especial, o da dignidade da pessoa humana que predominantemente se alcança
a partir da existência de um Estado de Direito, Social e Ambiental, pois as normas

dos postulados e dos preceitos inscritos na Lei Fundamental, viabilizando, desse modo, e em função de
perspectivas conceituais mais amplas, a concretização da idéia de ordem constitucional global.
183
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 581.
184
HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia entre a facticidade e validade, v. II, Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1997, p. 92. A esfera pública pode ser descrita como uma rede adequada para a comunicação de
conteúdos, tomadas de posição e opiniões; nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a ponto de
se condensarem em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. Do mesmo modo que o mundo da vida
tomado globalmente, a esfera pública se reproduz através do agir comunicativo, implicando apenas o domínio de
uma linguagem natural; ela está em sintonia com a compreensibilidade geral da prática comunicativa cotidiana.
76

ambientais visam permitir a sadia qualidade de vida das pessoas. Não se restringe
somente à vida, entretanto a uma qualidade de vida sadia e, por tal função, as
normas fundamentais interagem em todo o sistema jurídico, complementando e
delimitando os direitos da mesma forma que outros direitos fundamentais
complementam e delimitam o espectro de incidência das normas ambientais,
devendo existir uma proporcionalidade na conjugação dos direitos fundamentais,
tendo em vista que compõem o mesmo sistema e não podem ser vistos de forma
estanque de outras normas de natureza diversa.186
Diante desse aspecto diferenciado no qual existe uma grande
inserção de valores extrajurídicos para uma interpretação constitucional fundamental
adequada, visa-se concretizar os direitos fundamentais através de uma concepção
de bem comum.187 Tendo em vista que a atuação da sociedade é fundamental para
o desenvolvimento da humanidade, porque a mesma estabelece diretivas para a
ordem constitucional fundamental, através da pluralidade de intérpretes188, que têm
missão de manter atualizado o vínculo entre a realidade e a norma jurídica e pelo
aspecto aberto dessa interpretação, alguns entendem que ela conduz a uma
arbitrariedade do intérprete da norma constitucional fundamental, uma vez que
inexiste uma determinação de valores fixados que podem ser utilizados na

185
PEIXINHO, Manoel Messias.Teorias e Métodos de Interpretação dos Direitos Fundamentais. Op. cit., p. 220.
186
LARENZ, Karl. Op. cit., p. 413. mas é verdade que subjaz à Lei fundamental o reconhecimento de
determinados valores humanos gerais como, sobretudo, a dignidade humana e o valor da personalidade humana,
e que para a tutela destes valores foram atribuídos ao indivíduo direitos fundamentais amplamente tutelados,
como também se elevou a Direito vigente de escalão constitucional certos princípios éticos-jurídicos e políticos-
constitucionais – como o princípio da igualdade, o princípio do Estado de Direito e do Estado Social. É também
verdade que estes direitos fundamentais e princípios não estão uns a par dos outros, sem conexão, mas que se
relacionam uns com os outros de acordo com o sentido e, por isso, podem tanto complementar-se como
delimitar-se entre si. Não é outra coisa o que pretende dizer o Tribunal Constitucional Federal quando fala da
Constituição como «um todo de sentido» ou da «unidade deste sistema fundamentalmente de valores». e
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 581.
187
HABERLE, Peter. El Estado Constitucional, Op. cit., p. 245. J) Mientras que el concepto de bien común en el
Estado constitucional debe elaborar cada vez nuevos instrumentos y procedimientos, para impedir los déficit del
bien común (consumidores, contribuyentes, minorías de las minorías, acciones colectivas), la discusión
interdisciplinaria del bien común tiene que prepararse para los enormes desafíos de tipo ideal y material (por
ejemplo, en materia de “desarrollo sustentable”). La concepción abierta del bien camún surge y cae con la
Constitución del pluralismo y con la fertilidad del diálogo entre las disciplinas particulares.
188
Ibidem, p. 39-40. A possibilidade e a realidade de uma livre discussão do indivíduo e de grupos ‘sobre’ e
‘sob’ as normas constitucionais e os efeitos pluralistas sobre elas emprestam à atividade de interpretação um
caráter multifacetado. (Acentua-se que esse processo livre está sempre submetido a ameaça e que também a
nossa ordem liberal-democrática apresenta déficit em relação ao modelo ideal). Teoria de Democracia e Teoria
de Interpretação tornam-se conseqüência da Teoria da Ciência. A sociedade é livre e aberta na medida que se
amplia o círculo dos intérpretes da Constituição em sentido lato.
77

interpretação da norma.189 Acredito que a possível arbitrariedade é superada pela


fundamentação do intérprete, por meio de uma adequada motivação da inclusão dos
valores que foram utilizados na interpretação do caso concreto e que a inserção de
valores essenciais a uma realidade justifica a norma interpretada como a adequada
para a situação existente.190 Tentando exemplificar esse entendimento de que,
possivelmente, a inserção de valores ambientais como o da função socioambiental
da propriedade no período da industrialização não se justificava naquele momento,
já que não correspondia à realidade existente, mas atualmente vislumbra-se a
necessidade de uma efetiva proteção ambiental e, por tal, passa a ser uma realidade
a inserção da função socioambiental da propriedade.
Diante desse vínculo entre realidade e a norma, é que se pode
observar, no sistema normativo constitucional, a eficácia que as normas de Direitos
Fundamentais ocupam no ordenamento jurídico, pelo fato de tais direitos serem
essenciais e interferirem diretamente na vida dos homens, podendo afetar a sua
dignidade a fim de se obter a máxima eficácia191 possível para que se possa efetivar
tais direitos. Assim, diante de vários possíveis resultados interpretativos dos direitos
fundamentais, deve-se optar por aqueles que maior eficácia proporcione e tenha
maior compatibilidade com a realidade fática, pois esta estará em maior equilíbrio
com o sistema.192 Ocorre que os direitos fundamentais dão eficácia à lei e não o
contrário, assim para que os direitos fundamentais tenham eficácia, é necessário lei
lhe concedendo determinada eficácia e da mesma forma, a efetividade dessas
normas não resulta do formalismo legal, mas de um processo interpretativo no qual o
intérprete vincula a realidade com a norma e passa, naquele momento, a dar uma
determinada eficácia àquela norma, podendo ocorrer que, em determinado
momento, uma norma seja considerada programática e que, com a alteração da

189
LARENZ, Karl. Op. cit., p. 439. e OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula. A Interpretação dos Direitos
Fundamentais e a Constituição de 1988. In Direito Constitucional Brasileiro. QUARESMA, Regina e Oliveira,
Maria Lúcia de Paula. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p.284.
190
Ibidem, p. 438.
191
BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas, 8ª ed., Rio de Janeiro:
Renovar, 2006, p. 81. A eficácia dos atos jurídicos consiste na sua aptidão para a produção de efeitos, para a
irradiação das conseqüências que lhe são próprias. Eficaz é o ato idôneo para atingir a finalidade para a qual foi
gerado. Tratando-se de uma norma, a eficácia jurídica designa a qualidade de produzir, em maior ou menor grau,
os seus efeitos típicos.
192
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 594-595.
78

realidade, a mesma passe a ser interpretada como norma de eficácia plena, vez a
necessidade de uma maior efetivação dessa norma diante do contexto fático.193
No ordenamento jurídico brasileiro, os direitos fundamentais
são formalmente de aplicação imediata194 e, por tal, de eficácia plena, mas
materialmente necessitam de uma realidade fática para serem efetivados e, para tal,
carece que os intérpretes tenham o sentimento entre a realidade e a norma e que os
mesmos estejam vivenciando a necessidade da efetivação dos direitos
fundamentais.195 Para as normas fundamentais ambientais, tal vínculo é fundamental
para a efetivação de um direito ao ambiente equilibrado e sadio, pois a sociedade é,
conjuntamente com o Poder Público, responsável pelo dever de concretizar esse
direito fundamental.

1.3.1 – A Possibilidade das Restrições dos Direitos Fundamentais

Uma questão que deve ser analisada é a possibilidade de


restrições dos direitos fundamentais através da interpretação dessas normas no
ordenamento jurídico. O fato é que os direitos fundamentais não são absolutos196,

193
SALVATORE, Villari. Apud, SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais, Op. cit.,
p. 93. Quando as normas da constituição formal coincidem com as da constituição efetiva, segundo Villari,
dizem-se preceptivas (de eficácia plena, de acordo com nossa terminologia), se não houver tal coincidência, são
diretivas (de eficácia limitada, programáticas) e servem para indicar ao legislador a necessidade de manifestar a
vontade do Estado, emitindo uma lei que faça cessar a eficácia de outra que tem força cogente própria e continua
a ter vigor mesmo depois da emanação de uma constituição escrita que, não tendo força cogente própria, não
pode automaticamente ab-rogar uma norma preexistente em contraste com a constituição formal.
194
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em: 05/10/1988. Disponível em
<URL: http://www.planalto.gov.br> Acesso em: 02 out 2007. Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. § 1º
- As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
195
VERDÚ. Pablo Lucas. Op. cit., p. 7. Em definitivo, uma Constituição afastada da realidade é muito distinta
da living Constitucion e/ou da lebenden Verfassung. Está vigente, mas no fundo é ignorada pelo comum das
pessoas. Uma Constituição vivida é assim considerada, em grande parte, porque é sentida pelo povo e aparece
como símbolo político que tem razão de ser em virtude de sua função integradora.
196
Segundo Jane Reis em sua obra (PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Interpretação Constitucional e Direitos
Fundamentais, Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 132-134.), os direitos fundamentais não podem ser
considerados absolutos, devido a diversos fatores que impossibilitam a totalidade de incidência de um direito
fundamental. Inicialmente a autora vislumbra a questão da universalidade dos direitos fundamentais, que por tal
fator necessita de uma limitação, uma vez que é impossível que estes venham a fruir para todos de forma
permanente e simultânea sem que haja uma limitação, caso contrário seria impossível universalizar tais direitos,
pois os mesmo não iriam conseguir se harmonizar. Outro fator importante para a autora é que os direitos
fundamentais não são vistos de uma forma isolada perante eles, já que são um conjunto não existindo uma
hierarquia entre os direitos fundamentais, tendo em vista que as dimensões dos direitos fundamentais se
complementam e não se apresentam como gerações, no qual esses direitos teriam início e fim. Assim, tais
direitos essenciais ao homem formam um conjunto, no qual visa proteger diversos bens fundamentais que muitas
vezes parecem em colisão ou conflitos e, para que sejam efetivados no seu máximo, deve existir uma limitação
desses direitos quando aparentemente em conflitos. Outro autor que defende que os direitos fundamentais não se
79

devido a vários fatores que impossibilitam tais direitos serem absolutos e, até
mesmo, os próprios direitos fundamentais impedem que sejam vistos e admitidos
dessa forma, pois freqüentemente, nos casos concretos, há a incidência de diversos
direitos fundamentais para a mesma situação, até porque, como mencionei
anteriormente, as dimensões dos direitos fundamentais não podem ser vistas como
direitos de início e fim, mas como direitos que se complementam e que não
permitem a existência de uma hierarquia entre os direitos fundamentais. Daí, diante
de um caso concreto, no qual vários direitos fundamentais incidem sobre a mesma
situação, poderia haver uma restrição de um desses direitos em relação ao outro?
Tal situação acontece freqüentemente com relação ao direito da pessoa humana ter
um ambiente equilibrado e sadio, consagrado na terceira dimensão dos direitos
fundamentais e o direito ao desenvolvimento social, econômico e outras formas
desse direito, que também é um direito fundamental de terceira dimensão e que é
essencial ao homem e a sua qualidade de vida, tanto quanto o direito ao ambiente
equilibrado.
Diante dessas situações que apresentam possíveis conflitos ou
colisões entre direitos fundamentais, seria possível e adequado resolver questões
mediante uma restrição desses direitos? Deve-se compatibilizar a incidência de
todos os direitos fundamentais que possivelmente podem ser aplicados a
determinado caso concreto, pois, da mesma forma que não são absolutos, também
vislumbro que não podem ser totalmente expurgados de sua aplicação. Assim,
certos direitos que a princípio aparecem como antagônicos devem ser arrumados
através de uma interpretação que possibilite a aplicação de todos os direitos de
forma restringida.197
Dessa forma, Alexy aduz que existem duas formas de
apresentação do direito. Uma delas é o direito em si em que não há nenhuma
restrição e que aparentemente deve ser aplicado em sua totalidade, e a outra forma
seria o direito restringido que é o substrato do direito após a incidência de diversos
outros direitos que também podem incidir em determinado caso. Assim, a título de
exemplo para um melhor esclarecimento, entendo que o direito ao ambiente

apresentam de forma absoluta é José Carlos Vieira de Andrade que menciona em sua obra (ANDRADE, José
Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 2ª ed., Coimbra: Almedina,
2001, p. 275), que os direitos fundamentais não podem ser considerados como absolutos, uma vez que é
inevitável os conflitos entre tais direitos na incidência de um caso concreto e também os mesmo direitos devem
ser limitados para que todos possam tê-los.
80

ecologicamente sadio pode ser considerado como um direito em si, enquanto que a
possibilidade de exercer alguma atividade que venha a impactar o ambiente, quando
permitida, no qual ocorra incidência de diversos direitos, que também são
essenciais, como o direito a economia, fez com que houvesse uma restrição da
proteção ambiental, correspondendo assim, ao direito restringido. Tal concepção,
segundo Alexy, advém da teoria externa dos limites dos direitos fundamentais, a
qual diz que deve haver uma compatibilização de todos os possíveis direitos
incidentes à determinada situação, de forma que concilie todos os interesses e
direitos dos indivíduos e da coletividade.198 Através dessa teoria, o intérprete inicia
seu trabalho a partir da identificação dos direitos incidentes e depois deve observar
os limites de tais direitos, que são marcados por meio de fatores externos. Tal teoria
parte da concepção da existência de conflitos e colisões de direitos fundamentais e
visualiza que o método da ponderação é o adequado para solucionar os possíveis
conflitos existentes, pois entende que esses direitos são princípios e se apresentam,
não de forma definitiva, mas uma primeira imagem do direito e que posteriormente
essa norma passa a ser restringida e aplicada. Com isso, para essa teoria os direitos
fundamentais não podem ser admitidos como regras, mas somente como
princípios.199
Outra teoria dos limites dos direitos fundamentais é a interna,
que considera que não existem duas formas de apresentação do direito, conforme
afirma a teoria anterior, mas somente uma, na qual o limite do direito fundamental é
extraído do seu próprio conceito, dessa forma, segundo Alexy, “el concepto de
restricción es sustituido por el de limite”.200 Para tal teoria não existem conflitos e
colisões de direitos fundamentais e, por tal, não deve-se utilizar o método
ponderativo para a concretização do direito concreto, devendo o intérprete somente
realizar um trabalho de adequação do fato à norma após a identificação do conteúdo

197
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 134.
198
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 268. Si la relación entre derecho y restricción ha de ser definida de esta manera,
entonces existe, primero, el derecho en sí, que no está restringido, y, segundo, lo que queda del derecho
restringido. Esta es la teoría que suele ser llamada – por lo general, con intención crítica – “teoría externa”. La
teoría externa puede, por cierto, admitir que en los ordenamientos jurídicos los derechos se presentan primordial
o exclusivamente como derechos restringidos pero, tiene que insistir en que también son concebibles derechos
sin restricciones. Por ello, según la teoría externa, no existe ninguna relación necesaria entre el concepto de
derecho y el de restricción. La relación es creada sólo a través de una necesidad externa al derecho, de
compatibilizar los derechos de diferentes individuos como así también los derechos individuales y los bienes
colectivos.
199
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 151.
200
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 268-269.
81

de proteção da norma, não existindo um espaço para possíveis restrições de


direitos.201 Evidente que podem incidir diversos direitos fundamentais em dado caso
concreto, mas todos preencherão um determinado âmbito de incidência de forma
que preserve um núcleo essencial de todos os direitos, mas o âmbito é previamente
estabelecido.202 Essa teoria busca excluir, da interpretação o subjetivismo e
fortalecer as normas constitucionais e fundamentais, visto que a interpretação
resume-se a uma adequação entre a norma já delimitada em seu conteúdo e o fato
e, visando tal delimitação do conteúdo, a teoria interna afirma que as limitações
somente poderão ocorrer caso sejam expressamente autorizadas pela Constituição,
sendo que a ausência de norma delimitativa somente permite ao legislador identificar
os limites delimitados na norma constitucional.203
Alexy entende que a diferenciação entre as teorias está em se
considerar os direitos fundamentais princípios ou regras e também se são posições
definitivas ou de primeira imagem, pois, caso seja adotada a teoria externa, os
direitos fundamentais devem ser considerados como princípios e, por tal, são
posições de primeira imagem, mas, se prevalecer a teoria interna, os direitos
fundamentais serão considerados como regras e definitivos. Conforme já explicitei,
no capítulo anterior, os direitos fundamentais podem ser classificados em um mesmo
ordenamento jurídico como princípios e regras, dependendo do seu conteúdo.
Novamente tentarei exemplificar a existência de regras e princípios fundamentais no
ordenamento jurídico brasileiro a partir das normas de Direito Ambiental, uma vez
que o caput do artigo 225 da Constituição Federal de 1988 consagra o dever do
Poder Público e da Coletividade de defender e preservar o ambiente para as
presentes e futuras gerações. Assim, observo que tal norma é uma regra já que ou
ela incide e o ambiente é defendido e protegido pelo Poder Público e pela
Coletividade ou não, inexistindo a possibilidade de ponderação quanto a esse dever
e o conteúdo essencial dessa regra é fundamental, visto ser a proteção do ambiente
um direito consagrado na terceira dimensão da teoria dos direitos fundamentais.

201
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 141.
202
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 2ª ed.,
Coimbra: Almedina, 2001, p. 297. O limite ao poder legislativo residirá, então, em não poder ele atentar contra
as exigências (mínimas) de valor que, por serem a projecção da idéia de dignidade humana, constituem o
fundamento (a essência) de cada preceito constitucional nesta matéria. O que o legislador não pode, sob pena de
ultrapassar este limite absoluto, é destruir ou restringir gravemente a liberdade física em geral ou a intimidade do
cidadão comum. Não pode é subverter ou desfigurar o valor e a garantia constitucionais ínsitos em cada um dos
diversos preceitos relativos aos direitos fundamentais.
203
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 140.
82

Ocorre que, também no texto constitucional no parágrafo 1º inciso IV, exige-se a


realização de Estudo de Impacto Ambiental e que seja dada publicidade ao mesmo,
isso é evidentemente, um princípio, uma vez que esse estudo é um instrumento no
qual utiliza diversos princípios do direito ambiental e, até mesmo, outras ciências
para identificar os possíveis impactos inclusive os danos que surgirão com a
implantação da atividade ou empreendimento, sendo límpida a utilização de uma
ponderação com os princípios ambientais tais como: o da precaução, prevenção,
reparação, transparência; com princípios do direito econômico, social, do trabalho e
outros, mas, da mesma forma, estamos diante de uma norma constitucional
essencial ao homem e, que por esse motivo, é um direito fundamental. Com isso, é
necessário que haja outras concepções para a possibilidade de restrições dos
direitos fundamentais que admitam a existência tanto de regras como de princípios
fundamentais num mesmo ordenamento jurídico.
Novamente Alexy relata que é possível adequar o conceito de
restrição tanto para regras como para princípios e que o método da ponderação
seria o melhor para estabelecer uma restrição diante da incidência de diversos
princípios de direitos fundamentais em colisão ou conflitos, estabelecendo uma
delimitação definitiva do alcance dos direitos fundamentais contrapostos para
determinado caso concreto. E desse trabalho ponderativo, poderia se ter a aplicação
de todos os direitos em uma proporção correspondente à necessidade da incidência
para determinada situação, pois os princípios permitiriam uma melhor otimização,
tendo em vista que podem ser aplicados de forma gradativa diferentemente das
regras que são normas de aplicação ou não, que não permitem uma gradação,
conforme mencionamos no capítulo anterior. Com isso, não deve existir uma posição
restritiva, a qual afasta por completo determinado direito fundamental em
decorrência de uma maior proteção de outro direito. Dessa forma, não deve existir
uma restrição que exclua por completo e definitivamente direitos fundamentais, até
porque tais direitos são essenciais ao homem, que não pode viver dignamente sem
a efetivação deles.204

204
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 275. Hasta ahora, el concepto de restricción de derecho fundamental ha sido
definido sólo para las reglas. Pero, también principios pueden ser restricciones de derechos fundamentales.
Cuando el Tribunal Constitucional Federal dice que “derechos fundamentales de terceros que entren en colisión
y otros valores jurídicos de rango constitucional” pueden limitar derechos fundamentales, se refiere a
restricciones de derechos fundamentales que tienen el carácter de principios. Desde luego, por sí solos, tales
principios restringentes no pueden colocar al individuo en determinadas posiciones definitivamente restringidas
(no-libertades, no-derechos). Para llegar a restricciones definitivas, se requiere una ponderación entre el
83

Partindo da idéia que realmente existem conflitos e colisões


entre direitos fundamentais e que é necessário que haja uma restrição desses
direitos para que possam ser efetivados, surge outra questão de grande relevância.
Poderiam ocorrer essas restrições somente se fosse autorizadas expressamente nos
textos constitucionais ou poderiam ser realizadas sem tal autorização, através de
uma interpretação na qual observam-se os limites imanentes desses direitos? Vieira
de Andrade entende que as restrições só podem ocorrer se autorizadas pela
Constituição, caso contrário, a colisão existente seria solucionada de outra forma
que não através de uma restrição, provavelmente a partir de uma harmonização dos
205
direitos conflituosos. No ordenamento constitucional brasileiro, observo a
restrição expressa de um direito fundamental por meio dos incisos do artigo 170,
mas especificadamente o inciso VI, o qual restringe um crescimento econômico que
não atenda a defesa e preservação do ambiente, demonstrando que aquela
atividade econômica não assegura a existência digna. É evidente que o enunciado
constitucional evita parcialmente um conflito entre dois direitos fundamentais que é o
do ambiente sadio e equilibrado e o desenvolvimento econômico, mas, mesmo com
a restrição, é necessário que haja uma interpretação para que se possa identificar
até que ponto uma atividade está causando um nível de impacto ambiental que
possa ser considerada como confrontante à dignidade humana. Nesse momento é
que se insere, no trabalho hermenêutico, os princípios dos direitos em colisão para
que se possa aferir os limites dessa defesa ambiental e a possibilidade da
implantação de uma atividade econômica digna ao homem.
Com isso, observo que existem limites que não estão ou não
podem estar expressos na Constituição, já que não é em todos os casos que o
resultado hermenêutico final será o mesmo, pois uma atividade impactante
ambientalmente, em um território, pode não ser em outro. Assim, o âmbito de
proteção da norma ambiental cede espaço ao desenvolvimento econômico. Diante

respectivo principio de derecho fundamental y el (los) principio(s) que lo restringe(n). por ello, podría pensarse
que sólo las reglas – que, de acuerdo con la ley de colisión, representan el resultado de la ponderación – y no los
principios pueden ser restricciones. Esta concepción equipararía, en un cierto sentido, los principios, en tanto
meros creadores potenciales de restricciones, con las normas de competencia. Sin embargo, en contra de una
equiparación tal existe un argumento importante. Principios contrapuestos restringen materialmente las
posibilidades jurídicas de la realización de principios iusfundamentales. Si no tuvieran vigencia los principios
contrapuestos o si no tuvieran rango constitucional, aquellas posibilidades serían más amplias. Por ello, el
problema no es el carácter de restricciones sino la constatación del alcance de su restricción definitiva.
205
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Op. cit., p. 281.
84

dessa questão é que existem limites imanentes206 dos direitos fundamentais e estes
só poderão ser identificados durante a interpretação do caso e, principalmente, nas
questões de cunho ambiental. Tal interpretação, feita através de limites imanentes, é
muito relevante, tendo em vista que a participação popular é fundamental para as
intervenções nos bens ambientais, pois são os homens os titulares dos direitos
fundamentais, e, assim, podem flexibilizá-los e isso é feito a partir dos limites de
proteção que aquela população deseja impor à proteção dos direitos
fundamentais.207 É evidente que o grau de participação e os legitimados para
participar das decisões que poderão flexibilizar os direitos fundamentais fica adstrito
ao nível de impacto possível daquela atividade, caso contrário, uns poderão
sacrificar a qualidade de vida de alguns em prol da sua, o que também não deve ser
tolerado, devendo existir um equilíbrio.
Diante do exposto acima, as restrições aos direitos
fundamentais podem ocorrer através de três tipificações208, visto que podem ser
diretamente constitucionais quando a restrição encontra-se expressamente no texto
constitucional, como é o caso do inciso VI do artigo 170 da Constituição Federal de
1988, também podem ser indiretamente constitucional quando estabelecido por lei
inferior à Constituição, mas quando esta permite que uma lei de status inferior possa
restringir ou limitar direitos fundamentais, conforme pode ser visualizado no inciso IV
do artigo 225 também da Constituição Federal de 1988, ela determina que a lei
inferior venha a delimitar o nível de exigência para que se possa exigir o estudo de
impacto ambiental, caso contrário, todas as atividades teriam o dever jurídico de
realizar o referido estudo, pois todas causam um impacto ambiental, necessitando
que se identifique quais podem causar significativa degradação ambiental e, por fim,

206
Importante salientar que os limites imanentes devem ter uma demarcação que seria o limite de não violação
de um direito em favor de outro, dessa forma, um direito não poderia, através de uma interpretação, ser tão
amplo ao ponto de causar o esvaziamento de outro direito, deve existir um limite mínimo de proteção aos
direitos incidentes que é o que Vieira Andrade chama de “limites da não-pertubação” em sua obra. (ANDRADE,
José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, p. 286.)
207
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Op. cit., p. 284. No entanto, haverá limites imanentes dos direitos
fundamentais que só são determináveis por interpretação, pelo facto de estarem apenas implícitos no
ordenamento constitucional. Se é mais ou menos fácil saber qual o bem jurídico ou a esfera da realidade que o
preceito visa abranger através de um direito fundamental, já é muitas vezes difícil determinar os contornos da
respectiva protecção, sobretudo quando o seu exercício se faça por modos atípicos ou em circunstâncias
especiais, que afetam, de uma maneira ou de outra, valores comunitários ou outros direitos também
constitucionalmente protegidos.
208
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 1143. e ALEXY, Robert. Op. cit., p. 276-286. Importante
ressaltar que para Alexy os tipos de restrições são as diretamente constitucionais sendo estas divididas nas
expressas e tácitas e as indiretamente constitucionais.
85

através dos limites imanentes não expressos nas Constituições, já que é a inclusão
de valores que buscam salvaguardar o núcleo fundamental da proteção do direito.
Dessa forma, de grande importância para este estudo, é
observar que a Constituição Federal Brasileira de 1988 não restringiu diretamente
nem indiretamente a competência dos entes da federação no que tange à proteção e
defesa do ambiente, tendo em vista que o artigo 23 do ordenamento constitucional
estabelece uma competência comum e, em seu parágrafo único, disciplina que lei
complementar fixará normas de cooperação, o que não pode ser considerada como
uma restrição que permita excluir algum dos entes da proteção ambiental, o que
contribui, com a possibilidade do Município no seu dever constitucional de proteção
e defesa ambiental, estabelecer o licenciamento ambiental municipal, visto que
considero que somente a Constituição poderia excluir a utilização desse instrumento
pelos Municípios.

1.4 – Contributos do Neoconstitucionalismo para Interpretação das Normas


Ambientais.
É importante tecer algumas considerações a respeito das
possíveis contribuições do neoconstitucionalismo para a interpretação das normas
ambientais até porque, como já afirmei anteriormente, o direito ambiental é formado
também por valores e conceitos de natureza não jurídica, pois os aspectos
biológicos, físicos e químicos influenciam na justificativa da formação do
ordenamento jurídico ambiental. Nesse contexto, o neoconstitucionalismo é
fundamental para a interpretação das normas ambientais, conforme irei demonstrar.
Inicialmente, devo explicitar o que se entende por
neoconstitucionalismo, também chamado de constitucionalismo contemporâneo.
Para o jurista Paolo Comanducci existe um duplo significado entre os termos
constitucionalismo e neoconstitucionalismo, os quais podem ser divididos de duas
formas. A primeira pode representar uma teoria ou uma ideologia ou um método de
se analisar o direito, podendo, ainda, ser todos os três ao mesmo tempo. Já no
segundo significado representa um modelo constitucional que, através de seus
instrumentos desenvolvidos historicamente, limitam o poder do Estado e também
protegem os direitos fundamentais.209 Tal divisão não é única, pois existem juristas

209
COMANDUCCI, Paolo. Formas de (Neo)Constitucionalismo: Un Análisis Metateórico. In: CARBONELL,
Miguel. (Org). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Editorial Trota, 2003. p. 75. Me parece oportuno subrayar
86

como Luis Prieto Sanchís, que visualiza, através de três acepções, mas, que na
verdade, representa o mesmo conteúdo da divisão feita anteriormente, sendo que o
autor preferiu dividir em dois o significado ao afirmar que o neoconstitucionalismo
pode ser visto como uma teoria ou ideologia, uma ideologia pode apresentar
diferentes níveis ou projeções.210
Através do neoconstitucionalismo modifica-se o lugar das
normas constitucionais, passando estas a ocupar posição suprema no ordenamento
jurídico do Estado e, ao mesmo tempo, as normas passam a proteger direitos dos
indivíduos e também da coletividade. A Constituição tem um papel de coordenadora
entre as questões sociais e políticas do Estado, devendo concretizar, de forma
igualitária, tanto os direitos individuais como os políticos do cidadão, e este passa a
influenciar no desenvolvimento de um Estado Democrático de Direito.211 Ainda, o
novo constitucionalismo é um projeto político para os indivíduos, através de
diretrizes e programas a serem efetivados, e dependendo da necessidade da
efetivação desses programas, passam as normas que representam a terem eficácia
mais emergente e imediata, uma vez que os indivíduos, que são participantes do
processo político, passam a exigir a participação na formação e efetivação das
normas que os conduzirão.212 A Constituição deixa de ser somente texto que
estabelece a formação do Estado e passa a orientar a condução dele, através da
proteção de direitos fundamentais com a inclusão de princípios e regras que
conduzirão toda a interpretação do ordenamento jurídico e, principalmente,

desde el inicio, a fin de evitar ambigüedades en el análisis que me propongo cumplir, el doble significado
vehiculado por los términos «constitucionalismo» y «neoconstitucionalismo». Designan, en una primera
acepción, una teoría y/o una ideología y/o un método de análisis del derecho. En una segunda acepción designan,
en cambio, algunos elementos estructurales de un sistema jurídico y político, que son descritos y explicados por
el (neo)constitucionalismo como teoría, o que satisfacen los requisitos del (neo)constitucionalismo como
ideología. En esta segunda acepción «constitucionalismo» y «neoconstitucionalismo» designan un modelo
constitucional, o sea el conjunto de mecanismos normativos e institucionales, realizados en un sistema jurídico-
político históricamente determinado, que limitan los poderes del Estado y/o protegen los derechos
fundamentales.
210
SANCHÍS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo y Ponderación Judicial. In: CARBONELL, Miguel. (Org).
Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Editorial Trota, 2003. p. 137. Creo que son tres las acepciones principales.
En primer lugar, el constitucionalismo puede encarnar un cierto tipo de Estado de Derecho, designado por tanto
el modelo institucional de una determinada forma de organización política. En segundo término, el
constitucionalismo es también una teoría del Derecho, más concretamente aquella teoría apta para explicar las
características de dicho modelo. Finalmente, por constitucionalismo cabe entender también la ideología que
justifica o defiende la fórmula política así designada.
Aquí nos ocuparemos preferentemente de algunos aspectos relativos a las dos primeras acepciones, pero
conviene decir algo sobre a tercera. En realidad, el (neo)constitucionalismo como ideología presenta diferentes
niveles o proyecciones.
211
Ibidem, p. 124-125.
212
VERDÚ. Pablo Lucas. Op. cit., p. 5.
87

atribuindo ao texto constitucional uma vida, tendo em vista que este passa a
representar um valor em si mesmo, o que diferencia do constitucionalismo
tradicional.213
Com o advento da Constituição Federal de 1988, o Brasil
passa a inserir, no texto constitucional, os princípios e regras de direito ambiental
que, anteriormente, apesar de ser um direito materialmente constitucional, uma vez
que trata-se de um direito fundamental e, assim, essencial aos seres humanos, não
se encontravam positivados no texto constitucional. E, com a inserção explícita e
impressa, esse direito, segundo a concepção neoconstitucional, passa a influenciar
todo o ordenamento jurídico, obrigando que as interpretações jurídicas, que passem
a considerar os aspectos ambientais para a definição dos direitos, modificando as
interpretações realizadas antes da positivação e do neocontitucionalismo. Saliento
que anteriormente esse direito não tinha uma fundamentação constitucional e
também não irradiava o ordenamento jurídico como um todo ao atribuir um valor
através de seus princípios e regras ao ordenamento jurídico infraconstitucional.
Um exemplo evidente dessa nova interpretação constitucional é
a que se refere à propriedade e sua função social, na qual está inserida a proteção
ambiental214. Da mesma forma que a Constituição e o ordenamento
infraconstitucional protegem o direito à propriedade também estabelecem limitações
a tal direito por meio de uma fundamentação também constitucional.215 A partir
dessa nova concepção da interpretação judicial, na qual o ambiente está inserido, o

213
COMANDUCCI, Paolo. Formas de (Neo)Constitucionalismo: Un Análisis Metateórico. In: CARBONELL,
Miguel. (Org). Op. cit., p. 84. En el primero modelo «Constitución» designa un conjunto de reglas jurídicas
positivas, contenidas en un documento o consuetudinarias, que son, respecto a las otras reglas jurídicas,
fundamentales (y por tanto fundantes del entero ordenamiento jurídico y/o jerárquicamente superiores a las otras
reglas).
En el segundo modelo «Constitución» designa un conjunto de reglas jurídicas positivas, contenidas en un
documento o consuetudinarias, que son, respecto a las otras reglas jurídicas, fundamentales (y por tanto
fundantes del entero ordenamiento jurídico y/o jerárquicamente superiores a las otras reglas) – hasta aquí se
recalca la definición precedente - , «a condición de que tengan determinados contenidos a los que se atribuye un
especial valor». En este modelo, como afirma Dogliani, la Constitución está «cargada de un valor intrínseco: la
Constitución es un valor en sí».
214
Outro exemplo da modificação da concepção de propriedade a partir de uma interpretação fundada pelo
neoconstitucionalismo, no qual as normas constitucionais passam a impregnar todo o direito infraconstitucional,
são as unidades de conservação, que correspondem à área de especial interesses ambientais, que são instituídas
em áreas privadas, nos quais houve não uma modificação do direito do proprietário sobre determinada área, mas
sim no seu exercício, (ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental, 7ª ed., Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004, p.
621-625.) até porque ele continua sendo proprietário, mas com ônus especiais pela característica da área para a
coletividade. Assim, nas unidades de conservação como: Reserva Particular do Patrimônio Natural; Área de
Relevante Interesse Ecológico; Áreas de Proteção Ambiental; Refúgio de Vida Silvestre e Monumento Natural
devem conciliar os interesses particulares, dentre estes o de exploração econômica, com os interesses públicos.
215
COMANDUCCI, Paolo. Formas de (Neo)Constitucionalismo: Un Análisis Metateórico. In: CARBONELL,
Miguel. (Org). Op. cit., p. 132.
88

Estado se conduz à formação de um Estado de Direito Ambiental ou, como diz


Canotilho, em um “Estado de Direito Ecológico”.216
Para esse novo constitucionalismo a Constituição é a reunião
de elementos de formação do Estado, já contido no constitucionalismo tradicional
com fortes garantias aos direitos dos cidadãos, através da participação democrática
nas decisões que regem a sociedade. Além disso, passa a oportunizar outros
agentes a exigir a efetivação de determinados direitos essenciais à sociedade,
configurando a Constituição um verdadeiro instrumento de transformação e
efetivação dos direitos a partir das decisões da maioria.217 O neoconstitucionalismo
demonstra que a Constituição é um documento normativo que impõe diversas
obrigações a serem efetivadas tanto pelo Poder Público como também pelos
indivíduos enquanto membros da sociedade. A efetivação desses direitos e deveres,
podem ser realizados tanto pelo Poder Executivo, Legislativo como, também,
Judiciário, pois as normas constitucionais quando buscam a proteção de direitos
fundamentais, não dependem de nenhuma atuação legislativa, salvo nos casos
expressos na Constituição para terem eficácia imediata e fazerem surtir seus efeitos,
podendo o juiz de primeiro grau utilizar, na fundamentação de determinada sentença
que ordene um fazer ou não fazer, uma normativa constitucional independentemente
da existência de um Tribunal Constitucional, pois todos os órgãos jurisdicionais
passam a proteger a Constituição e utilizar suas normas para a interpretação
jurisdicional.218 Tal questão pode ser visualizada no tocante ao artigo 225 da

216
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estado Constitucional Ecológico e Democracia Sustentada. In: GRAU,
Eros Roberto. e CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Estudos de Direito Constitucional, São Paulo: Malheiros, 2003.
217
SANCHÍS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo y Ponderación Judicial. In: CARBONELL, Miguel. (Org).
Op. cit., p. 126-127.
218
Ibidem, p. 128-129. Constituciones garantizadas sin contenido normativo y Constituciones con un más o
menos denso contenido normativo, pero no garantizadas. En cierto modo, éste es el dilema que viene a resolver
el neoconstitucionalismo, apostando por una conjugación de ambos modelos: Constituciones normativas
garantizadas. Que una Constitución es normativa significa que, además de regular la organización del poder y las
fuentes del Derecho – que son os aspectos de una misma realidad – genera de modo directo derechos y
obligaciones inmediatamente exigibles. Los documentos jurídicos adscribibles al neoconstitucionalismo se
caracterizan, efectivamente, porque están repletos de normas que les indican a los poderes públicos, y con ciertas
matizaciones también qué deben hacer. Y dado que se trata de normas y más concretamente de normas
supremas, su eficacia ya no depende de la interposición de ninguna voluntad legislativa, sino que es directa e
inmediata. A su vez, el carácter garantizado de la Constitución supone que sus preceptos pueden hacerse valer a
través de los procedimientos jurisdiccionales existentes para la protección de los derechos: la existencia de un
Tribunal Constitucional no es, desde luego, incompatible con el neoconstitucionalismo, pero sí representa un
residuo de otra época y de otra concepción de las cosas, en particular de aquella época y de aquella concepción
(kelseniana) que hurtaba el conocimiento de la Constitución a los jueces ordinarios, justamente por considerar
que aquélla no era una verdadera fuente del Derecho, sino una fuente de las fuentes, cuyos conflictos habían de
dirimirse ante un órgano especialísimo con un rostro mitad político y mitad judicial. Pero si la Constitución es
una norma de la que nacen derechos y obligaciones en las más diversas esferas de relación jurídica, su
89

Constituição, quando firma ser um dever do Poder Público e da Coletividade a


preservação e proteção do ambiente e, diante de um caso de violação desse
preceito, pode o juiz de primeiro grau, com base no artigo supracitado, requisitar um
fazer ou não fazer em se tratando de proteção ambiental para o Poder Público como
também para os membros da Coletividade.
Através desse modelo neoconstitucional, a interpretação
jurídica passa a ter elementos não contidos no constitucionalismo tradicional de
bases positivistas, uma vez que existe inserção de princípios que irão justificar a
relação entre direito e moral219. Assim, a lei passa a ser não mais a referência
principal para a interpretação jurídica, mas sim um elemento integrante para uma
decisão adequada. E a partir dessa modificação da lei na interpretação que se passa
a ter conseqüentemente uma nova orientação interpretativa, na qual surge mais
princípios do que regras no ordenamento jurídico. As regras, em sua maioria, não
atendem a todas as conseqüências jurídicas. Da mesma forma deve ocorrer mais
ponderação do que subsunção, existindo a presença das normas constitucionais, em
todos os ramos dos direito, uma maior participação judicial na efetivação dos direitos
constitucionais que afastem a exclusividade do legislador nessa missão, e a
existência de uma grande inserção de valores extrajurídicos que, por muitas vezes,
apresentam-se contraditórios e inaplicáveis em conjunto.220

2- A Ponderação de Interesses no Licenciamento Ambiental.

A partir deste momento, tratarei do método da ponderação de


interesses de bens e valores que pode ser utilizado no processo de licenciamento
ambiental, visto que tal procedimento administrativo, do qual tratarei mais
especificamente dos aspectos administrativos no próximo capítulo, é a utilização do
método da ponderação, pois é a forma com que a Administração Pública pode

conocimiento no puede quedar cercenado para la jurisdicción ordinaria, por más que la existencia de un Tribunal
Constitucional imponga complejas y tensas fórmulas de armoniazación.
219
COMANDUCCI, Paolo. Formas de (Neo)Constitucionalismo: Un Análisis Metateórico. In: CARBONELL,
Miguel. (Org). Op. cit., p. 87. El neoconstitucionalismo metodológico sostiene por el contrario – al menos
respecto a situaciones de Derecho constitucionalizado, donde los principios constitucionales y los derechos
fundamentales constituirían un puente entre Derecho y moral – la tesis de la conexión necesaria, identificativa
y/o justificativa, entre Derecho y moral.
220
SANCHÍS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo y Ponderación Judicial. In: CARBONELL, Miguel. (Org).
Op. cit., p. 131-132.
90

efetivar o máximo possível de certos direitos fundamentais em colisão, já que, em


sua maioria, essas colisões não podem ser solucionadas com os métodos
tradicionais de interpretação jurídica. Assim, a ponderação não pode ser vista como
uma oposição à subsunção, mas é uma complementação na solução de casos que
se demonstram de difícil solução, tendo em vista os direitos fundamentais envolvidos
na questão.221
Em relação ao tema específico desta pesquisa, posso
vislumbrar diversos direitos fundamentais em colisão com o direito ao ambiente
sadio e equilibrado até mesmo porque, segundo o conceito de impacto ambiental222,
poucas são as ações humanas que não provocam alterações ambientais, daí a
importância de se determinar e controlar a forma com que as atividades humanas
serão desenvolvidas, sendo esse o papel do licenciamento ambiental, porque é
através dele que o Poder Público pode controlar as atividades que causam algum
impacto ambiental e serve também como meio de a coletividade ter conhecimento
das atividades que estão impactando o ambiente e se manifestar sobre as mesmas.
Os conflitos existentes entre o direito fundamental ao ambiente e outros direitos são
de grande quantidade, pois pode existir colisão entre o direito ambiental e o direito à
223
moradia . Mas acredito que tais colisões acontecem em maior quantidade e
complexibilidade no tocante às questões econômicas, já que são interesses que
colidem, mas ao mesmo tempo devem existir, por se tratar de dois direitos

221
PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 217-218.
222
BRASIL, Conselho Nacional de Meio Ambiente, Resolução 01 de 17 de fevereiro de 1986, Dispõe sobre
critérios básicos e diretrizes gerais para a avaliação de impacto ambiental. Disponível em:
<http://www.conama.org.br>. Acesso em 18 de out. 2007. Art. 1o Para efeito desta Resolução, considera-se
impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada
por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente,
afetam:
I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
II - as atividades sociais e econômicas;
III - a biota;
IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;
V - a qualidade dos recursos ambientais.
223
Tal situação pode ser vislumbrada através do número excessivo de construções em áreas de preservação
permanente, tendo como exemplo a situação dos moradores da localidade de Rio Preto, distrito do Município de
Campos dos Goytacazes - RJ, no qual grande parte dos moradores encontram-se localizados na faixa marginal do
rio Paraíba do Sul e que os mesmos estabeleceram suas vidas naquele local há décadas e atualmente encontram-
se em conflito devido estarem em uma área irregular ambientalmente e por tal foram autuados pela Secretaria
Municipal do Meio Ambiente e são investigados pelo Ministério Público Estadual, conforme se comprova pelos
autos de infração lavrados, (BRASIL, Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Campos dos Goytacazes – RJ,
Auto(s) de Infração (ões) nº(s) 2151; 2209; 2208; 2207; 2206; 2205; 2204; 2203; 2202; 3338; 3445; 2201.
Acesso em: 09 de nov. 2007.). Observo clara colisão entre direitos fundamentais, uma vez que ao mesmo tempo
em que não podem estar na área ambientalmente protegida, também não podem ser despejadas e suas casas
derrubadas, ficando sem moradia.
91

fundamentais intimamente ligados ao desenvolvimento. Com isso, deve o intérprete


dessas normas, diante do caso conflitante, realizar a interpretação que possa
conjugar todos os interesses fundamentais envolvidos224, o que inevitavelmente irá
estabelecer certas restrições diante do caso concreto e provavelmente uma das
técnicas adequadas será a ponderação.225 Nas questões ambientais, Canotilho
alerta que, mais do que um controle das atividades impactantes, deve existir uma
integração entre as possíveis atividades e o Poder Público e principalmente com a
coletividade que irá conviver com os benefícios e malefícios advindos das atividades,
devendo assim existir um acompanhamento permanente de todos os aspectos
ambientais durante a existência da atividade, na qual, para o autor, deve ser
desenvolvida mediante a técnica da ponderação que poderá balancear os interesses
existentes. Tal processo, segundo o jurista português, altera toda a relação de
direitos como o ambiental e o urbanístico, tendo de existir interligações entre os
aspectos desses direitos, os quais conduzem a efetivação de um Estado
Democrático de Direito Ambiental.226
É necessário, após o que foi dito anteriormente, conceituar o
que é a técnica da ponderação e qual seu objetivo diante dos possíveis conflitos que
surjam no desenvolver das atividades que tenham, de alguma forma, relação com o
ambiente e, ainda, quem deve exercer essa técnica de auxílio no processo de
interpretação das normas, em especial das normas ambientais.
A ponderação é a técnica que possibilita a elaboração de uma
norma para determinado caso concreto a partir da solução de conflitos entre direitos,
através da utilização de bens e valores para a construção da norma. É um processo
hermenêutico que irá balancear os aspectos valorativos e os bens protegidos pelos
direitos em conflito, os quais não conseguem ser solucionados pela hermenêutica

224
LARENZ, Karl. Op. cit., p. 491.
225
Ibidem, p. 413.
226
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Estado Constitucional Ecológico e Democracia Sustentada. In: GRAU,
Eros Roberto. e CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Estudos de Direito Constitucional, São Paulo: Malheiros, 2003, p.
106. Não se trata apenas de policiar os perigos das “instalações” ou das “actividades”, mas também de
acompanhamento todo do processo produtivo e de funcionamento sob um ponto de vista ambiental. A imposição
de um direito ambiental integrativo obriga, em segundo lugar, à passagem de uma compreensão monotemática
para um entendimento multitemático que obriga a uma ponderação ou balanceamento dos direitos e interesses
existentes de uma forma substancialmente inovadora. Assim, a concepção integrativa obrigará a uma avaliação
integrada de impacto ambiental incidente não apenas sobre projectos públicos ou privados isoladamente
considerados, mas sobre os próprios planos (planos directores municipais, planos de urbanização). Isto implica
uma notável alteração das relações entre as dimensões ambientais e as dimensões urbanísticas. Em terceiro lugar,
um direito de ambiente integrativo produz conseqüências no modo de actuação dos instrumentos jurídicos do
Estado de Direito Ambiental.
92

tradicional227, uma vez que a vinculação entre a norma e o fato apresenta diversas
decisões válidas e de mesma hierarquia, não permitindo a exclusão de uma norma
em favor de outra, pois apresentam a mesma força normativa, como é o caso dos
direitos fundamentais em colisão, eles são normas da mesma hierarquia e força
normativa, não podendo ser excluída uma norma fundamental em prol de outra,
tendo em vista que todas protegem bens e valores essenciais à existência do
homem.228 Assim, é uma técnica que visa atribuir a melhor medida de efetividade
das normas em colisão, através de critérios materiais para a orientação do
intérprete, evitando que exista uma arbitrariedade na solução dos casos a serem
ponderados e, para tal, é necessária a inclusão de princípios materialmente
constitucionais fundamentais para que se obtenha uma solução proporcional e
razoável ao caso.229 Ávila afirma que a ponderação pode ser uma técnica que busca
delimitar a abrangência das normas indefinidas que também podem ser
apresentadas como regras de modo que a técnica irá auxiliar o intérprete para que
este possa demarcar o âmbito da regra posta e ainda é utilizada em processos nos

227
SANCHÍS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo y Ponderación Judicial. In: CARBONELL, Miguel. (Org).
Op. cit., p. 137. Desde luego, no de todas: no de aquellas que puedan resolver-se mediante alguno de los criterios
al uso, jerárquico, cronológico o de especialidad.
228
BARCELLOS, Ana Paula de. Alguns Parâmetros Normativos para a Ponderação Constitucional. In:
BARROSO, Luis Roberto. A Nova Interpretação Constitucional, Rio de Janeiro: Renovar: 2003, p. 55. De
Forma muito geral, a ponderação pode ser descrita como uma técnica de decisão própria para os casos difíceis
(do inglês hard cases), em relação aos quais o raciocínio tradicional da subsunção não é adequado. A estrutura
geral da subsunção pode ser descrita da seguinte forma: premissa maior – enunciado normativo – incidindo sobre
a premissa menor – fatos – e produzindo como conseqüência a aplicação da norma ao caso concreto. O que
ocorre comumente nos casos difíceis, porém, é que convivem, postulando aplicação, diversas premissas maiores
igualmente válidas e de mesma hierarquia que, todavia, indicam soluções normativas diversas e muitas vezes
contraditórias. A subsunção não tem instrumentos para produzir uma conclusão que seja capaz de considerar
todos os elementos normativos pertinentes; sua lógica tentará isolar uma única norma para o caso. e PEREIRA,
Jane Reis Gonçalves. Op. cit., p. 261. O vocábulo ponderação, em sua acepção mais correta, significa a operação
hermenêutica pela qual são contrabalançados bens ou interesses constitucionalmente protegidos que se
apresentem em conflito em situações concretas, a fim de determinar, à luz das circunstâncias do caso, em que
medida cada um deles deverá ceder ou quando seja o caso, qual deverá prevalecer.
229
SANCHÍS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo y Ponderación Judicial. In: CARBONELL, Miguel. (Org).
Op. cit., loc. cit. De las distintas acepciones que presenta el verbo “ponderar” y el sustantivo “ponderación” en el
lenguaje común, tal vez la que mejor se ajusta al uso jurídico es aquella que hace referencia a la acción de
considerar imparcialmente los aspectos contrapuestos de una cuestión o el equilibrio entre el peso de dos cosas.
(…) Ponderar es, pues, buscar la mejor decisión (la mejor sentencia, por ejemplo) cuando en la argumentación
concurren razones justificatorias conflictivas y del mismo valor. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios, 6ª
ed., São Paulo: Malheiros, 2006, p. 130-131. A ponderação de bens consiste num método destinado a atribuir
pesos e elementos que se entrelaçam, sem referência a pontos de vista materiais que orientem esse sopesamento.
Fala-se, aqui e acolá, em ponderação de bens, de valores, de princípios, de fins, de interesses. Para este trabalho
é importante registrar que a ponderação, sem uma estrutura e sem critérios materiais, é instrumento pouco útil
para a aplicação do Direito. É preciso estruturar a ponderação com a inserção de critérios. Isso fica evidente
quando se verifica que os estudos sobre a ponderação invariavelmente procuram estruturar a ponderação com os
postulados de razoabilidade e de proporcionalidade e direcionar a ponderação mediante utilização dos princípios
constitucionais fundamentais. Nesse aspecto, a ponderação, como mero método ou idéia geral despida de
critérios formais ou materiais, é muito mais ampla que os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade.
93

quais existam a impetração de razões e contra-razões em determinado caso


concreto de forma que o intérprete possa sopesar entre as argumentações
apresentadas e obter a melhor solução através da técnica da ponderação.230
Expressões indefinidas como “preservar”, “proteger” ou até mesmo como “atividades
potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente”
necessitam de uma delimitação que pode ser obtida através da técnica da
ponderação.231
Outra questão que deve ser esclarecida é quem pode utilizar a
técnica da ponderação na interpretação das situações existentes. Segundo
Sarmento, a referida técnica pode ser utilizada pelo Poder Judiciário quando este
tem a necessidade de realizar restrições aos direitos quando não foram feitos pelo
Poder Legislativo, acrescentando ainda que já se aceita, em algumas situações, que
até mesmo a Administração Pública possa valer-se de tal método para solucionar
possíveis conflitos existentes no exercício da função administrativa.232 O processo
de licenciamento ambiental é um dos possíveis casos em que a Administração
Pública exercita essa técnica para solucionar os conflitos existentes, nos quais o
ambiente saudável colide com outros direitos também fundamentais, visto que é
através deles que são analisados todos os aspectos existentes, inclusive a opinião
da coletividade sobre os possíveis conflitos e colisões inerentes aos casos e que,
após a análise de todos os aspectos, sejam eles de diversas naturezas, é que se

230
ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios, 6ª ed., São Paulo: Malheiros, 2006, p. 57. Afirma o autor que
“atividade de ponderação de regras verifica-se na delimitação de hipóteses normativas semanticamente abertas
ou de conceitos jurídicos-políticos, como Estado de Direito, certeza do Direito, democracia. Nesses casos o
intérprete terá de examinar várias razões contra e a favor da incidência da regra, ou investigar um plexo de
razões para decidir quais elementos constituem os conceitos jurídicos-políticos.” e BARCELLOS, Ana Paula de.
Alguns Parâmetros Normativos para a Ponderação Constitucional. In: BARROSO, Luis Roberto. Op. cit., p. 91.
O exemplo mais evidente dessa situação é dado pelas regras que contém conceitos jurídicos indeterminados ou
cláusulas de indeterminação de outra natureza – como “mulher honesta”, “relevante interesse social”, dentre
outros. Nessas hipóteses, muitas vezes é possível superar o conflito externo da regra com outras normas
dependendo do sentido que se atribua ao conceito jurídico indeterminado nela contido.
231
ANTUNES, Paulo Bessa. Op. cit., p. 58.
232
SARMENTO, Daniel. Colisões entre Direitos Fundamentais e Interesses Público. In: SARMENTO, Daniel e
Galdino, Flavio (orgs). Direitos Fundamentais: Estudos em Homenagem ao Professor Ricardo Lobo Torres, Rio
de Janeiro: Renovar, 2006, p. 294. A doutrina e a jurisprudência dominantes, no Brasil e no Direito Comparado,
admitem também a realização de restrições a direitos fundamentais operadas no caso concreto, através de
ponderação de interesses feitas diretamente pelo Poder Judiciário, em casos de conflitos entre princípios
constitucionais não solucionados previamente pelo Legislativo, ou quando o equacionamento da questão
empreendido por ele se revele inconstitucional. Em algumas hipóteses, tem-se aceitado até mesmo a ponderação
de interesses feita diretamente pela Administração Pública.
94

toma uma decisão233, obtida pela ponderação em outorgar ou não a licença para a
atividade ou empreendimento.
Mas parece claro que a Administração Pública poderá utilizar-
se da técnica da ponderação para a solução dos conflitos e colisões de direitos, já
que ela também é um intérprete do ordenamento jurídico e, por conseguinte, pode
utilizar-se de tal técnica que vem para auxiliar os métodos tradicionais que
demonstram como conseguir solucionar esses casos difíceis. Peter Häberle, em uma
de suas obras234, deixa evidente que todos os que vivem a Constituição são
legítimos intérpretes da mesma e não pode existir uma relação predeterminada de
intérpretes, pois estes podem ser grupos organizados, órgãos públicos e os
cidadãos.235 Com isso, todos esses atores podem e devem-se utilizar da técnica da
ponderação para efetivar a interpretação do ordenamento jurídico.
A aplicação da técnica pela Administração Pública no processo
de licenciamento ambiental deve seguir por etapas para que o intérprete possa
acompanhar criteriosamente todos os aspectos relevantes, até porque pode ocorrer
um conflito entre a efetivação dos direitos fundamentais e o interesse público
existente em determinada coletividade, pois o conceito de interesse público é
altamente indeterminado e, ao mesmo tempo, um conflito entre os direitos
fundamentais e o interesse público pode gerar sérios problemas, visto que os
primeiros devem ser efetivados independente da vontade da sociedade, ao mesmo
tempo, os interesses públicos que, muitas vezes correspondem à efetivação dos
direitos fundamentais, podem não corresponder a maior efetivação de um direito em
prol de outro para determinada sociedade.236 Assim, é totalmente justificada a
aplicação da técnica da ponderação pela Administração Pública, dividindo em três

233
BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional, Rio de Janeiro: Renovar,
2005, p. 27. Ponderação, nesse sentido, é a atividade pela qual se avaliam não apenas enunciados normativos ou
normas, mas todas as razões e argumentos relevantes para o discurso, ainda que de outra natureza (argumentos
morais, políticos, econômicos etc.) e LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 5ª ed., Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 1983, p. 501.
234
HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional, Op. cit., p. 13.
235
Idem. Propõe-se, pois, a seguinte tese: no processo de interpretação constitucional estão potencialmente
vinculados todos os órgãos estatais, todas as potências públicas, todos os cidadãos e grupos, não sendo possível
estabelecer-se um elenco cerrado ou fixado com numerus clausus de intérpretes da Constituição.
236
Mais adiante, quando tratar da participação, a Sociedade Civil na identificação dos objetos do licenciamento
ambiental municipal, poderei esclarecer melhor a atuação da sociedade na efetivação dos direitos fundamentais
de forma que a mesma possa influenciar no grau de efetivação dos direitos essenciais para a sobrevivência com
dignidade humana. De forma que Daniel Sarmento em sua obra: (SARMENTO, Daniel. Colisões entre Direitos
Fundamentais e Interesses Público. In: SARMENTO, Daniel e Galdino, Flavio (orgs). Direitos Fundamentais:
Estudos em Homenagem ao Professor Ricardo Lobo Torres, Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 297) expõe com
bastante clareza os possíveis conflitos que podem surgir entre os direitos fundamentais e o interesse público.
95

etapas para alcançar um resultado possível e metodológico, afastando a


arbitrariedade do intérprete.
Essas etapas são demonstradas por Ana Paula Barcellos. Esta
divide o método da ponderação em três etapas definidas para que se possa ao final
ter um resultado efetivado na sua maior amplitude. Irei expor essas etapas no
licenciamento ambiental que, conforme já afirmei, é um procedimento segundo o
qual é necessária a utilização da técnica da ponderação para que a Administração
Pública possa outorgar a licença ambiental para o desenvolvimento de alguma
atividade ou empreendimento.
Inicialmente deve o intérprete na primeira etapa, identificar
todos os enunciados normativos que se encontram em conflito para que possa ter
uma radiografica dos possíveis direitos envolvidos na causa. Em se tratando das
questões ambientais e principalmente da licença para implantação de algumas
atividades, que devem ser licenciadas, têm, preliminarmente, os enunciados do
artigo 225 da Constituição o qual determina que cabe ao Poder Público e a
Coletividade a proteção ambiental, o que nos informa que tanto a Administração
Pública, no desenvolver de sua atividade de controle ambiental quanto a
coletividade, na qual está inserida o agente responsável pela atividade ou
empreendimento, tem o dever e não a faculdade de proteção ambiental.237 Seguindo
na identificação dos enunciados, posso apontar o §1º do artigo supracitado e seus
incisos, que disciplinam uma série de deveres238 que o Poder Público tem para
efetivar a preservação e proteção ambiental. Ainda na Constituição Federal identifico
o artigo 170, VI o qual enuncia que o desenvolvimento, de uma ordem econômica
adequada, deve ser pautado pela proteção ambiental. Identifico, também, outros
enunciados necessários para o cumprimento da primeira etapa como o artigos 22,
23, 24 e 30 os quais determinam as competências dos entes federativos na proteção
ambiental, como também devem ser identificados os enunciados que se encontram
em aparente colisão com os direitos expostos pelos enunciados acima apontados.

237
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 188-189. De outra parte, deixa o cidadão de ser mero titular (passivo) de um
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e passa também a ter a titularidade de um dever, o “de
defendê-lo e preservá-lo”. Estabelece-se, nesse ponto, claramente uma relação jurídica do tipo denominado em
doutrina “função”.
238
Ibidem, p. 188. (...) cria-se para o Poder Público um dever constitucional, geral e positivo, representado por
verdadeiras obrigações de fazer, isto é, de zelar pela defesa (defender) e preservação (preservar) do meio
ambiente. Não mais tem o Poder Público uma mera faculdade na matéria, mas está atado por verdadeiro dever.
Quanto à possibilidade de ação positiva de defesa e preservação, sua atuação transforma-se de discricionária em
vinculada.(...)
96

Assim, posso ver o próprio artigo 170 da Constituição que visa a desenvolver uma
adequada ordem econômica fundada na livre iniciativa, o direito à saúde do artigo
196, da moradia, do artigo 6º e tantos outros.
Ana Paula Barcellos aduz que, nessa fase, deve o intérprete
preocupar-se em não confundir os interesses em questão com enunciados
normativos. Com isso, os interesses existentes só podem ser considerados em tal
fase se puderem ser vislumbrados a partir de um determinado enunciado normativo
seja ele explícito ou implícito.239 Para uma correta utilização da técnica da
ponderação, não se pode, na etapa em evidência, considerar enunciados que não
podem ser jurisdicizados e é nesse momento que o intérprete, no licenciamento
ambiental, deve identificar os princípios que estão envolvidos nos casos, princípios
estes como os que foram expostos no capítulo anterior como a responsabilidade,
prevenção, precaução, dignidade da pessoa humana, participação e outros, como
também devem ser identificados os princípio referentes ao direito aparentemente
conflitante.
Evidente que se torna muito abstrata a identificação como foi
feita nos parágrafos acima, uma vez que falta o caso concreto para que se possa
iniciar a identificação dos enunciados normativos que incidem naquela situação e
que podem estar em conflito, até porque um princípio abstrato pode não se
apresentar em conflito com outros, mas, diante do caso concreto, observa-se a
conflitualidade existente, conforme afirma Luis Prieto Sanchís.240 Então, para melhor
visualização da questão, utilizarei um julgado do Tribunal de Justiça do Estado do
Rio Grande do Sul241, no qual o litígio versava sobre o interesse pela desativação de
um lixão, demonstrado pelo autor da ação popular contra o Município de Tapes, já
que o respectivo lixão causava danos ao ambiente. Ocorre que, como pode ser visto
no julgado, o Município alegava que o “lixão” tratava-se de um aterro controlado e

239
BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional, Op. cit., p. 96-97. Em
outras palavras, é comum que a primeira coisa a captar a atenção de quem esteja examinando o caso sejam as
conveniências dos envolvidos, seus interesses e, de forma geral, a justiça ou injustiça de suas pretensões. Não
obstante isso, quando se vai iniciar a primeira fase da ponderação, interesses genericamente considerados só
podem ser levados em conta se puderem ser reconduzidos a enunciados normativos explícitos ou implícitos.
240
SANCHÍS, Luis Prieto. Neoconstitucionalismo y Ponderación Judicial. In: CARBONELL, Miguel. (Org).
Op. cit., p. 147. Lo que ocurre es que la ponderación resulta um procedimiento idóneo para resolver casos donde
entran en juego principios tendencialmente contradictorios que en abstracto pueden convivir sin dificultad, como
pueden convivir – es importante destacarlo – las respectivas leyes que constituyen una especificación o
concreción de tales principios.
241
BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Agravo de Instrumento Nº 70008935074,
Quarta Câmara Cível, Relator: Des. Vasco Della Giustina, j. 18/08/2004, Disponível em:
<http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 26 de out. de 2007.
97

que se encontrava legalmente instalado, pois estava licenciado pelo órgão ambiental
competente e cumpria as determinações legais impostas, visto que somente eram
depositados no local lixo doméstico, conforme foi determinado. Ficou ainda
demonstrado, nos autos do processo, que a situação do “lixão” era ruim, chegando a
se falar em situação de calamidade pública devido à má disposição do lixo, o que
comprova que a atividade estava causando danos ambientais. Mas por outro lado, o
Município também não tinha outro local adequado e legalizado para a disposição
dos resíduos coletados pela cidade e, caso não pudesse depositá-los no respectivo
local, os referidos resíduos ficariam pelas ruas da cidade sem serem coletados por
falta de lugar para depósito final. Evidente que existe um conflito no caso em
questão, no qual posso identificar preliminarmente dois enunciados normativos, que
é da preservação do ambiente equilibrado e sadio, o que faz com que a atividade
seja interrompida e o enunciado no qual garante o direito à saúde para todos e o
dever do Estado em efetivar esse direito que ficaria violado, caso o Município ficasse
sem coleta de lixo na cidade.
Assim, a Administração Pública, que tem o poder-dever de
executar o licenciamento ambiental, deverá identificar todos os enunciados
normativos que possivelmente possam estar em conflito, exercendo, dessa forma, a
primeira etapa da técnica da ponderação, para que a mesma tenha um parâmetro
dos direitos que estão envolvidos com aquela atividade ou empreendimento que
busca a licença ambiental para sua implantação.
Após a identificação dos enunciados normativos incidentes no
caso concreto, que possivelmente têm conflitos de direitos e que necessita da
técnica da ponderação, inicia-se a segunda etapa, que é a identificação dos fatos
relevantes que o caso apresenta. Daí percebe-se que a técnica da ponderação
somente pode ser realizada diante de casos concretos, ou até mesmo hipotéticos,
mas o mesmo não tem como acontecer em casos abstratos, tendo em vista que não
existirão os fatos relevantes a serem identificados e, por sua vez, não se poderá
saber quais as repercussões que advirão.242 Nesse momento, a identificação tanto
dos enunciados normativos quanto dos fatos relevantes, é feita de forma separada
sem que haja uma interação entre eles. Mas antes da identificação dos fatos
relevantes, que é o principal trabalho da segunda etapa, é necessário que o
intérprete saiba o que pode ser considerado como fato relevante para que possa ser
98

ponderado. Assim, para Ana Paula Barcellos, os fatos relevantes podem ser
considerados através de dois fundamentos243, nos quais o primeiro é apresentado
pelo senso comum construído pela sociedade por meio de sua história, tradições e
principalmente a partir da construção de determinada sociedade. Com isso, um fato
relevante para uma determinada localidade pode não ser para outra, tendo em vista
que as sociedades que estarão inseridas nos fatos é que podem considerar
relevantes ou não. De grande importância é para o licenciamento ambiental
municipal a identificação dos fatos relevantes pela sociedade, uma vez que esta é
que deve ser a responsável na identificação dos objetos a serem licenciados,
conforme irei tratar mais detalhadamente adiante. O segundo fundamento para a
identificação dos fatos relevantes é a própria disposição normativa que faz concluir
que determinados fatos, por si sós, independentes dos aspectos da sociedade, já
são relevantes. Esses fatos poderão posteriormente contribuir para que se observe
qual dos enunciados normativos irão incidir com maior ou menor eficácia. Ao final
dessa etapa, deve o intérprete identificar todos ou o maior número possível de
possibilidade para que possa enquadrar os fatos relevantes aos enunciados
normativos, obtendo diversas soluções para o caso concreto aparentemente
conflitante, tentando alcançar a maior satisfação possível para os enunciados
normativos em conflito.244
Retornando ao exemplo exposto anteriormente sobre a
questão do depósito de lixo no Município de Tapes no Rio Grande do Sul, posso
identificar dois fatos relevantes, o primeiro no qual a atividade em si está provocando
uma degradação ambiental negativa e que deve ser interrompida, e o segundo
corresponde ao fato de que se não for depositado o lixo no local adequado ter-se-ão
de manter os resíduos sólidos produzidos nas ruas da própria cidade, o que irá
aumentar a proliferação de doenças na população do Município, ambos os fatos são
identificados a partir das disposições normativas, conforme os artigos 196 e 225 da
Constituição Federal. Diante desses fatos, observo as seguintes possibilidades
anteriores à utilização da técnica da ponderação: primeiro pode ser interrompido o

242
BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional, Op. cit., p. 115-116.
243
Ibidem, p. 116-117.
244
Ibidem, p. 122-123. Nesta segunda fase, e sempre que isso seja possível, o intérprete deverá cogitar de todas
as possibilidades fáticas por meio das quais as diferentes soluções indicadas pelos grupos normativos da primeira
fase podem ser realizadas, desde a que atende mais amplamente às suas pretensões, até a que as restringe de
forma importante, na linha exemplificada acima. Cada uma dessas soluções, na verdade, corresponde a uma
99

depósito de lixo no local, já que tal atividade causa degradação ambiental e,


conseqüentemente, a própria degradação do homem, e a continuidade da atividade
viola o princípio fundamental de terceira dimensão de ter um ambiente sadio e
equilibrado. Nesse sentido, foi a decisão da juíza de primeira instância que
determinou antecipadamente a interrupção da atividade, por ser prejudicial ao
ambiente. 245 Outra possibilidade seria a permanência da atividade, tendo em vista
que o Município não tem outro local legalizado em que se possa realizar o depósito
de resíduos sólidos de origem doméstica e, também, pelo fato de que a permanência
dos resíduos nas vias públicas da cidade provocaria o aumento do número de casos
de doenças ocasionadas pelo acúmulo de lixo nas ruas da cidade, violando, assim, o
direito fundamental à saúde, o qual deve o Estado proporcionar a todos a adequada
manutenção. Ambos os direitos estão relacionados à sadia qualidade de vida das
pessoas e acabam correspondendo à efetivação de uma vida digna.
No licenciamento ambiental, cabe à Administração Pública
identificar os fatos relevantes que determinado empreendimento ou atividade
proporcionará com a sua implantação e, nesse caso, a opinião da sociedade é
primordial, já que ela suportará tanto os benefícios quanto os malefícios que irão
advir da implantação, inclusive analisará se será vantajoso alterar os ecossistemas
em prol de outros valores e bens como o aumento de trabalho e circulação de
riquezas. Esses fatos é que a Administração Pública deverá analisar e, até mesmo,
o fato da não implantação e conseqüentemente a não outorga da licença ambiental
deverá ser cogitado.
A partir da identificação dos enunciados normativos em tensão
e incidentes ao caso e os fatos relevantes com as possíveis alternativas não
ponderadas para o caso, deve o intérprete passar para a terceira e última etapa da
técnica da ponderação para que se possa tentar combinar todos os enunciados
envolvidos e os fatos relevantes e dar um peso para eles a fim de que possa ter uma
solução que proporcione a mais ampla efetivação dos direitos envolvidos.
Nessa etapa, o intérprete deverá ter o compromisso com três
diretrizes para tomar sua decisão, pois esta deve ter um caráter universal. Deve

norma possível, isto é, a uma possibilidade normativa a ser extraída do conjunto de enunciados pertinentes no
caso.
245
BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Agravo de Instrumento Nº 70008935074,
Quarta Câmara Cível, Relator: Des. Vasco Della Giustina, j. 18/08/2004, Disponível em:
<http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 26 de out. de 2007.
100

existir, inclusive, uma concordância prática dos enunciados em conflito e, também,


deve o intérprete observar o núcleo dos direitos fundamentais. Segundo Ana Paula
Barcellos, a universalização da decisão ocorre porque a Administração Pública,
intérprete no processo de licenciamento ambiental, adotará a decisão que seja
compreendida por toda a sociedade. Com isso, os argumentos utilizados devem ser
claros e compreensivos. Não pode existir uma argumentação fundada para
determinado grupo, mas deve haver coerência na argumentação da decisão.246
Outra importante característica para a universalização da decisão é que esta possa
ser generalizada para outras situações semelhantes. Quanto à concordância prática,
há de se harmonizar todos os enunciados normativos em tensão de modo que não
se exclua um enunciado que corresponda a um direito em prol de outro. Com isso, o
intérprete deverá escolher a decisão que representar a melhor harmonização entre
os enunciados conflitantes.247 Por fim, deve ser identificado o núcleo essencial dos
direitos fundamentais envolvidos no caso concreto, visto que não deve permitir que a
ponderação leve ao esvaziamento de um direito fundamental, pois se trata de um
direito essencial para a pessoa humana e, portanto não deve ser restringido ao
ponto de não ter nenhuma incidência na solução do caso. Dessa forma, a decisão
ponderada não poderá restringir os direitos fundamentais ao ponto de invadir o
núcleo de tais direitos, sob pena de a decisão atentar contra a dignidade humana.248
Retornando ao exemplo do julgado do Tribunal de Justiça do
249
Rio Grande do Sul sobre o depósito de resíduos sólidos em local licenciado, mas

246
BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional, Op. cit., p. 126-127.
247
Ibidem, p. 136.
248
A identificação do núcleo essencial de cada direito fundamental é visualizada por duas teorias: a relativa ou
absoluta que também podem ser denominadas de núcleo flexível e núcleo duro, no qual a primeira afirma que o
núcleo essencial somente pode ser detectado diante do caso concreto, pois existe um núcleo essencial dos
direitos fundamentais, de forma abstrata, ele somente surge no momento da existência de um conflito. Enquanto
que a teoria do núcleo duro diz que o núcleo essencial dos direitos fundamentais é delimitado abstratamente e
por tal o intérprete quando for ponderar os direitos envolvidos, não poderá restringir esse núcleo essencial pré-
estabelecido. BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional, Op. cit., p.
142-143.
249
BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Agravo de Instrumento Nº 70008935074,
Quarta Câmara Cível, Relator: Des. Vasco Della Giustina, j. 18/08/2004, Disponível em:
<http://www.tj.rs.gov.br>. Acesso em: 26 de out. de 2007. “A situação pode ser contornada, com diligência do
juízo originário, determinando-se a realização de estudo técnico no local, por perito da confiança da Magistrada,
ainda que de maneira expedita, com a concessão de prazo para a Municipalidade, no caso de conclusão técnica
no sentido da contaminação do solo, para adequar o processo de tratamento do lixo urbano, ou mesmo para
designar local alternativo para o depósito do material. Mas a solução adotada pelo juízo de primeiro grau, da
forma posta, inviabiliza qualquer atitude preventiva da Administração, que ver-se-á obrigada a manter nas ruas,
por tempo indeterminado, ocasionado, isso sim, um agravamento na já delicada questão ambiental narrada na
inicial da demanda popular.
101

que não estava adequado, pois foi comprovado que o mesmo degradava o
ambiente. Observo que o Tribunal, ao decidir o recurso interposto para suspender os
efeitos antecipatórios concedidos pelo juízo a quo, realizou um processo de
ponderação, tendo em vista que não adotou nenhuma das possíveis decisões,
afastando totalmente um dos direitos envolvidos: ambiente e saúde, mas adotou um
procedimento que pudesse evitar um dano maior e, ao mesmo tempo, visualizou que
a melhor solução seria a promoção de estudos técnicos no local para aferir o
tamanho do possível dano ambiental e a fixação de prazo para que o Município
pudesse realizar um adequado sistema de depósito de lixo, que não causasse danos
ao ambiente.
O julgado demonstra que a decisão que ponderou diversos
direitos fundamentais envolvidos e cumpriu os parâmetros mencionados na terceira
etapa da técnica da ponderação, mostrando que tal decisão pode ser considerada
universal, tanto que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro julgou caso
semelhante referente ao recolhimento e depósito de lixo no Município de Niterói250.
No julgado anterior, também posso vislumbrar que o magistrado buscou equilibrar os
direitos envolvidos no caso, uma vez que observou que a interrupção do depósito de
resíduos no local iria causar um dano maior do que o existente, permitindo assim a
continuação da atividade, o que preserva o direito à saúde da população e o estudo
dos danos causados ao ambiente pela inadequação da atividade. E, por fim,
preserva o núcleo dos direitos fundamentais envolvidos, pois evita possível
proliferação de doenças causadas pelo não recolhimento do lixo doméstico e
preserva também o núcleo do direito ao ambiente sadio e equilibrado, através da
realização dos estudos ambientais para a comprovação dos danos para uma
possível reparação posterior.
A Administração Pública, quando for licenciar alguma atividade
ou empreendimento, deverá também utilizar os parâmetros apresentados na terceira

“Vale registrar que a situação não é recente, tendo os documentos acostados pelo próprio autor popular noticiado
que os problemas ambientais decorrentes da má administração do aterro sanitário remontam à década de 80, não
se vislumbrando, ao menos num juízo de verossimilhança, risco de dano irreparável. Essa a solução que melhor
atende à lógica do razoável, e viabiliza a adoção de medidas para solucionar o problema até o julgamento do
mérito da ação.
“Com tais considerações, por presentes os pressupostos do art. 558 do CPC, defiro o efeito suspensivo requerido
pelo agravante, ao fim de sustar os efeitos da liminar concedida na instância originária.”(fls. 157/159).
250
BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Agravo de Instrumento nº 2007.002.01035,
Vigésima Câmara Cível, Relator: Des Marco Antonio Ibrahim, j. 18/01/2007. Disponível em:
<http://www.tj.rj.gov.br> . Acesso em: 26 de out. 2007.
102

etapa da técnica da ponderação, pois a decisão final para a outorga da licença


ambiental deverá ser universal, ter uma concordância prática e preservar o núcleo
essencial dos direitos fundamentais envolvidos. A partir do que foi exposto acima,
vejo que a técnica da ponderação é perfeitamente adequada para os processos de
licenciamento ambiental, uma vez que este instrumento de controle ambiental
permite a Administração Pública analisar os direitos e os fatos envolvidos para que
possa ponderá-los e decidir da melhor forma para a proteção e efetivação dos
direitos conflitantes.
103

CAPÍTULO III – LICENCIAMENTO AMBIENTAL

Após a análise do direito ambiental como sendo um direito


fundamental da pessoa humana e a sua interpretação a partir de uma visão
diferenciada da tradicional, na qual é necessária para sua concretização a utilização
de técnicas diferentes das utilizadas nos direitos delimitados como o direito civil e
penal. Abordarei os aspectos relevantes desse instrumento de concretização de
direitos fundamentais, que é o licenciamento ambiental. Trata-se de um
procedimento em que o Poder Público, mais especificadamente o Poder Executivo,
utiliza para realizar a união de todos os elementos incidentes em determinada
atividade ou empreendimento que possa impactar o ambiente, ocorrendo uma
ponderação de todos os interesses envolvidos em determinada situação concreta
para que, ao final, a Administração Pública outorgue ou não a licença ambiental, na
qual o empreendedor possa implantar sua atividade.
Neste capítulo, a abordagem será em sua abrangência no que
diz respeito às características administrativas de tal instrumento de concretização do
direito ambiental e também do econômico, social e de todos os direitos existentes
nas dimensões dos direitos fundamentais que apresentei no primeiro capítulo. Não é
objetivo detalhar os aspectos procedimentais desse instrumento, mas sim ao direito
material existente. Para poder estudar o licenciamento ambiental é necessário, por
se tratar de um instrumento ambiental administrativo à disposição da Administração
Pública, analisar outras questões de direito constitucional e administrativo, como a
competência dos entes federativos, o poder de polícia e os atos administrativos afim
de que se possa compreender as características desse instrumento.

1. Federalismo e Competência no Licenciamento Ambiental.


104

É importante que se aponte a competência dos entes


federativos brasileiros no que diz respeito às matérias ambientais, principalmente, no
tocante ao licenciamento ambiental, uma vez que tais competências são
extremamente complexas e imprecisas quanto à abrangência do poder de cada ente
federativo. Ainda há conflitos que surgem na doutrina e na jurisprudência sobre a
competência ambiental, em especial, no que se refere ao licenciamento ambiental, já
que, com a elevação do Município, a ente federativo e a recepção de leis anteriores
à Constituição Federal de 1988 e a falta de precisão e regulamentação do texto
constitucional causam uma série de interpretações sobre o dever de atuação de
cada ente da federação. Devo assim, iniciar o esclarecimento sobre a competência
ambiental dos entes da federação brasileira, através da formação do Estado251 e
suas espécies, passando-se a explicitar a formação do Estado Federado Brasileiro
na atualidade para que só posteriormente adentrar na questão das competências
ambientais dos entes da federação brasileira e ao final a atribuição no que se refere
ao licenciamento ambiental.
Inicialmente, a origem do Estado federal é muito controvertida,
já que alguns afirmam que se iniciou na antiguidade, enquanto outros entendem que
o Estado federal demonstra algumas de suas características já no século IV a.C. e
por fim dizem alguns autores que na Idade Média existiam manifestações do
federalismo252. Da mesma forma, outros afirmam que o Estado federal é uma
organização política moderna, que não utilizou de nenhum exemplo da antiguidade,
já que naquela época não existia tal organização, sendo todas confederações.253 O

251
MIRANDA, Pontes. Comentários à Constituição de 1967, Tomo I, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1967, p.
299. Estado é o poder estabelecido em certo território e sôbre certa população, com competência derivada,
primariamente, da comunidade supra-estatal, ainda que não a exerça sòzinho, desde que permaneça em contacto
pontencial com a ordem jurídica originária, que é a do direito das gentes. e CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Op. cit., p. 83-84. O Estado é, assim, uma forma histórica de
organização jurídica do poder dotada de qualidades que a distinguem de outros “poderes” e “organizações de
poder”. Quais são essas qualidades? Em primeiro lugar, a qualidade de poder soberano. A soberania, em termos
gerais e no sentido moderno, traduz-se num poder supremo no plano interno e num poder independente no plano
internacional. Se articularmos a dimensão constitucional interna com a dimensão internacional do Estado
poderemos recortar os elementos constitutivos deste: (1) poder político de comando; (2) que tem como
destinatários os cidadãos nacionais (povo = sujeitos do soberano e destinatários da soberania); (3) reunidos num
determinado território. A soberania no plano interno (soberania interna) traduzir-se-ia no monopólio de edição
do direito positivo pelo Estado e no monopólio da coação física legítima para impôr a efetividade das suas
normas noutras normas jurídicas.
252
BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria Geral do Federalismo, Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 11-12.
e BARROSO, Luis Roberto. Direito Constitucional Brasileiro, Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 6-7.
253
BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado, 3ª ed., São Paulo: Malheiros, 2001, p. 79. e FILHO, José dos Santos
Carvalho. Pacto Federativo: Aspectos Atuais, In: QUARESMA, Regina. e OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula.
(Coord.), Direito Constitucional Brasileiro: perspectivas e controvérsias contemporâneas, Rio de Janeiro:
Forense, 2006, p. 408.
105

federalismo atual surgiu a partir dos Estados Unidos da América, o qual uniu seus
Estados, deixando de ser uma Confederação e passando a ser uma Federação,
buscando superar alguns problemas internos, já que todos os Estados tinham
soberania, o que causava sérios conflitos entre os mesmos, e fez que, de forma
voluntária, unissem-se e formassem uma nova organização política, na qual passava
a existir um governo nacional. Dessa forma, surgiu o primeiro formato de Estado
federal em 1787.254 No Brasil, a Federação255 foi inspirada pelo modelo americano,
mas com uma grande diferenciação, pois, nos Estados Unidos, os Estados
passaram de um modelo de confederação para uma federação, através de uma
imposição dos fatos, nos quais a sociedade percebia que a Confederação era um
modelo precário que não atendiam aos anseios dos americanos256, enquanto que no
Brasil a formação do Estado federal não surge de um movimento social, mas através
de uma criação jurídica, visando à formação da República e à rejeição da monarquia
que se apresentava como sendo um Estado Unitário.257

254
BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado, Op. cit., loc. cit.. Fê-lo partindo da Constituição dos Estados Unidos,
que ele toma por paradigma na matéria, pois foram os juristas americanos da Revolução os adminiráveis
construtores de uma organização de governo – o Estado Federal – que exprime, com autenticidade, criação nova
da ciência política; aquele modelo, segundo notara Jellinek, que se não compadece com as categorias tradicionais
e serve para separar, entre muitos outros traços de originalidade e distinção em que se apóia o mederno
pensamento político, a concepção nova do Estado da antiga concepção clássica. e BARROSO, Luis Roberto.
Direito Constitucional Brasileiro, Op. cit., p. 8-9.
255
BARROSO, Luís Roberto. A Derrota da Federação: O Colapso Financeiro dos Estados e Municípios, In:
QUARESMA, Regina. e OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula. (Coord.), Op. cit., p. 397. O Brasil é uma República
Federativa, na dicção expressa do art. 1º da Constituição de 1988. Federação traduz a forma de Estado, o modo
como se reparte o poder político no âmbito do território, e tem por pressuposto a descentralização política. Daí
resulta, segundo fórmula clássica, a existência de duas ordens jurídicas: a federal, titularizada pela União, e a
federada (ou estadual), na qual cada Estado-membro exerce sua autonomia, isto é, sua capacidade de auto-
organização, autogoverno e auto-administração nos limites definidos na Constituição. No caso brasileiro,
reconhece-se, ainda, um terceiro nível de poder, representado pelos Municípios, igualmente investidos de
autonomia pela Carta de 1988 (arts. 18, 29 e 30).
256
BARBOSA, Rui. Organização das Finanças Republicanas, Sessão de 16 de novembro de 1890, Disponível
em: <http://www.casaruibarbosa.gov.br>, Acesso em: 07 de dezembro de 2007. Ao adotar o pacto, que os
incorporava numa só nacionalidade, os treze estados na Nova Inglaterra constituíam sociedades ligadas entre si
pela origem, pelo idioma, pela fé, mas politicamente separadas, diversas na sua organização doméstica, alheias
umas às outras, absolutamente autônomas. Entrando para a comunhão de um governo extensivo a todas, cada
uma, portanto, sacrificava parte de sua entidade peculiar, concorrendo para o tesouro da autoridade coletiva com
um contingente de direitos renunciados a benefício da convivência nacional. Cada uma, separando-se da
metrópole, poderia organizar-se em nação independente, reservando intacta para si mesma a totalidade da
soberania conquistada. Preferindo, porém, a esse alvitre o de fundirem-se numa personalidade comum, as
colônias emancipadas, depois de experimentarem por muitos anos a autonomia política em sua plenitude,
resolveram aliená-la nas mãos de um governo politicamente centralizado. Com a implantação do regímen
federativo, portanto, só tinham que perder em matéria de soberania. Alienaram-na voluntariamente em proveito
de interesses superiores.
257
BARROSO, Luis Roberto. Direito Constitucional Brasileiro, Op. cit., p. 29. O federalismo brasileiro não foi
uma imposição dos fatos, mas uma criação legal, surgida com a República, que segundo muitos – inclusive Rui
Barbosa – se instaurara mais pela necessidade da adoção da forma de Estado federal, do que por rejeição ao
regime monárquico. Ainda que ao sabor de fortes reivindicações, o federalismo se impôs, com o advento da
106

Rui Barbosa258 foi um dos principais incentivadores do


federalismo no Brasil, que objetivou o fortalecimento da República através da
influência norte americana da formação do federalismo de 1787 e devido a tal
atraso, forma-se no Brasil um federalismo tradicional e com mais de cem anos de
atraso em relação aos americanos. Conforme assevera Paulo Bonavides, o poder da
União tratava-se das questões econômicas, em que, segundo o autor, chegava a
quase configurar uma intervenção no modelo atual de federalismo, mas ao mesmo
tempo reconhece que Rui Barbosa foi fundamental para a formação do federalismo
brasileiro.259
Dessa forma, após explicar como ocorreu a formação do
Estado federal, explicito o que vem a ser essa organização política do Estado, já que
pode ocorrer a formação como sendo Unitário, Confederado ou Federado.260 No
primeiro, o poder político é exercido por um único ente estatal de forma centralizada
ou não. Tendo em vista não acontecer uma delegação política constitucional para
outros membros do Estado, todas as decisões políticas emanam de um único poder
central261. Já nos Estados confederados, existe aderência ao poder central de ordem
interna, através de um tratado estabelece competências próprias para os Estados-
membros da Confederação, mas a nível externo estes apresentam-se inalterados,
preservando sua soberania e sua independência perante a comunidade
internacional, podendo a, qualquer momento, retirar-se da formação confederativa e
exercer seus poderes estatais de forma ilimitada.262 Por fim, a Federação

República, de forma artificial, com a transformação de um modelo americano que se fulcrara em bases
radicalmente distintas. Em síntese, por assim dizer, a teoria atropelou o fato social.
258
BARBOSA, Rui. Op. cit. Eu era, senhores, federalista, antes de ser republicano. Não me fiz republicano,
senão quando a evidência irrefragável dos acontecimentos me convenceu de que a monarquia se incrustara
irredutivelmente na resistência à federação. Esse non possumus dos partidos monárquicos foi o seu erro fatal. A
mais grave responsabilidade, a meu ver, dos que presidiram à administração do país no derradeiro estádio do
Império está na oposição obcecada, inepta, criminosa de uns, na fraqueza imprevidente e egoística de outros
contra as aspirações federalistas da nação. A federação teria demorado o advento do regímen republicano por
pouco tempo; mas teria poupado à república as dificuldades de organização, com que temos arcado, e
continuaremos a arcar talvez por não breves dias.
259
BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado, Op. cit., p. 86.
260
FILHO, José dos Santos Carvalho. Pacto Federativo: Aspectos Atuais, In: QUARESMA, Regina. e
OLIVEIRA, Maria Lúcia de Paula. (Coord.), Op. cit,, p. 407. As clássicas formas de Estado são representadas
pela confederação, pela federação e pelo regime unitário. Em virtude das variadas modalidades que os Estados
podem assumir, na conformação de seu perfil político, nenhum delas ostenta rigidez que impossibilite eventuais
particularidades, nem impede que seja adotada forma de certo modo híbrida, com a presença de alguns
elementos de uma das modalidades clássicas e outros próprios de modalidade diversa.
261
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de Direito Constitucional, 18º ed., São Paulo: Saraiva, 1990, p.
42.
262
MIRANDA, Pontes. Op. cit., p. 299. Desde que o tratado os não fundiu e deixou a cada Estado a sua
qualidade de Estado (quer dizer: não os excluiu da distribuição primária por parte da comunidade supraestatal), -
só o tratado (portanto, a unanimidade dos Estados) pode modificar a situação estabelecida: a Confederação
107

corresponde a uma descentralização de poder, através da distribuição de


competência do Poder Central para os Estados-membros, caracteriza-se por meio
de um dualismo - “União soberana, Estados autônomos”.263 Dessa forma, a
Federação pode ocorrer através da união de Estados soberanos que dispensam a
sua soberania em detrimento da formação de um único Estado, mas mantêm a sua
autonomia, como ocorreu nos Estados Unidos, ou através da concessão aos
Estados-membros de autonomia e competências próprias, como foi o caso do Brasil.
Assim, o Estado federativo é uma união de entes autônomos e com organização
política própria, concedidos pela Constituição Federal que atribui competências
próprias para todos os entes formadores da federação, enquanto que a soberania
estatal é exercida pelo Poder Central que representa externamente e internamente
os interesses do Estado.264
A definição acima é um critério objetivo de formação do
federalismo, no qual para que o Estado seja federado é necessário ter essa
formação, em que o Poder Central detém a soberania e os Estados-membros são
autônomos, mas deve existir nessa formação um critério subjetivo, pois tal criação
não pode ser advinda meramente de uma fórmula a ser aplicada, mas pela vontade
dos indivíduos que compõem esse Estado em querer essa organização política e
novamente deve existir um sentimento constitucional para a existência da
Federação.265
Diferentemente do que ocorreu nos Estados Unidos em que o
povo americano que vivia nos Estados Confederados sentiu a necessidade de
transformar-se em uma Federação, objetivando defender seus interesses. No Brasil,
não ocorreu dessa forma, uma vez que foi implantada a Federação brasileira sem
base em fatos sociais que vislumbravam tal necessidade. Assim, não ocorreu a

nasceu no domínio supra-estatal, e nêle permanece; quer o tratado dê podêres autoconstituintes à Confederação,
quer não os dê, existe cerne constitucional, que é reflexo dos princípios de direito das gentes regedores do
tratado. e FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Op. cit, p. 41.
263
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Teoria do Estado, 2ª ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1969, p. 169.
264
BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Op. cit., p. 54. Tecnicamente, o federalismo é uma divisão
constitucional de poderes entre dois ou mais componentes dessa figura complexa que decorre da existência de
um Estado que possa apresentar formas de distribuição das tarefas políticas e administrativas. e CAVALCANTI,
Themistocles Brandão. Op. cit., p. 171. Define-se o sistema federativo de maneira muito simples; é um estado
soberano constituído de diversos estados autônomos. Este é que é o sistema federativo em sua simplicidade: a
soberania da união interna e externamente, autonomia dos Estados.
265
MIRANDA, Pontes. Op. cit., p. 300. Com a fórmula que ante apontamos (pág. 264) e a inexistência de
critério seguro, uno, que nos diga onde começa e ser federal o Estado, encontramos na explicação acima a única
solução possível: é de ordem subjetiva, interior a cada povo, ao seu passado e ao seu presente, o sentir-se
unitário ou federativo.
108

formação a partir da necessidade social para a implantação desse modelo de


organização política. Resumindo, o povo brasileiro não sentia a necessidade da
formação do Estado Federal.266
Paulo Bonavides267 afirma que o federalismo atual não pode
ser mais considerado único e exclusivamente como o modelo clássico, mas,
atualmente, é necessário um federalismo que se aproxime da realidade do povo que
vive no Estado e que possa promover um melhor viver aos indivíduos que compõem
o Estado federado; caso contrário, o federalismo nunca se implantará de forma
correta. É necessário que exista uma conjugação entre o Estado federado e a
realidade, de forma que o texto constitucional esteja em compasso com os fatos
reais e que os poderes estatais exerçam, de forma democrática e igualitária, os
anseios da sociedade ao invés de se omitirem nas suas competências, objetivando
exatamente a incerteza e a falta de efetividade das normas constitucionais. Tais
condutas causam o enfraquecimento da Federação e, conseqüentemente, sua crise,
abrindo espaço para o crescimento e o ressurgimento do Estado absolutista e
centralizador.268 Exemplo evidente da conduta omissiva dos poderes da Federação
e vem causando uma crise no federalismo brasileiro é a falta de regulamentação do
art. 23 da Constituição Federal no tocante à matéria ambiental, tendo em vista a falta
do estabelecimento de critérios para a existência de cooperação entre os entes
federados na busca da efetivação do direito fundamental ao ambiente e o bem-estar
da coletividade.269

1.1. Competência Ambiental

266
BARROSO, Luis Roberto. Direito Constitucional Brasileiro, Op. cit., p. 29.
267
BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado, Op. cit., p. 89. O federalismo verdadeiro é aquele que se não aparta
da realidade, não teme o intervencionismo em si mesmo, e escrupulosamente combate, e com razão, o
desvirtuamento da prática intervencionista, a politização dos fins a que serve a intervenção do Estado. E não só a
politização senão também o favorecimento ilícito que essa intervenção prodigaliza a grupos econômicos e
financeiros privilegiados. Atuando contra o interesse público, à sombra da proteção oficial, agravam a
desigualdade econômica
268
Ibidem, p. 91. O que há no âmago da crise do federalismo nacional é a inadequação da realidade aos meios de
que dispõe o governo para atacá-la; é a Constituição atrasada com os fatos; é a imperiosa necessidade de
institucionalizar-se juridicamente poderes que a vocação democrática de nosso tempo, ditando aos povos
sentimentos igualitários na esfera social e econômica, parece impor decisivamente, com impaciência algo
revolucionário de quem está a impetrar novos conceitos – e por que não, também? – novos métodos, novos
intérpretes, novos caminhos!
269
GRECO, Leonardo. Competências Constitucionais em Matéria Ambiental, In: Revista Brasileira de Direito
Comparado, nº 14, Instituto de Direito Comparado Luso Brasileiro: Rio de Janeiro, 1993, p. 87.
109

Foi necessário a explicação sobre o federalismo e a


organização política do Estado para que se possa entender a distribuição de
competência contida na Constituição Federal de 1988 e, conseqüentemente, os
deveres de cada ente da Federação brasileira, diferenciando as competências
privativas, exclusivas, concorrentes e comuns. Localiza-se a matéria ambiental na
classificação das mesmas, de forma que se possa entender e contribuir para o
esclarecimento das divergências entre os deveres da União, dos Estados-membros
e dos Municípios. Inclusive porque, com o advento da Constituição Federal de 1988,
o Brasil instituiu uma nova formação federalista, na qual o Município passou a
integrar e passou a ter competências próprias de atuação sem existir a possibilidade
de intervenções dos outros entes federativos, com algumas exceções.
A Constituição Federal de 1988 definiu a competência dos
entes federativos em sua maioria, através dos artigos 21 a 25 e 30, de forma que as
competências exclusivas da União ficaram arroladas no artigo 21, dos Estados-
membros no artigo 25 e dos Municípios no artigo 30. Enquanto que as competências
privativas, que correspondem ao poder-dever de legislar de forma única, ficaram
definidas para a União no artigo 22, não tendo os outros entes tal competência. É
importante apontar que a competência privativa corresponde ao poder que a União
tem de legislar sobre todo o país, através de lei de caráter eminentemente nacional e
não federal, de forma que essa competência não se restringe única e
exclusivamente a normas gerais270, mas em pormenorizar e detalhar a forma com
que todos devem tratar a questão. Não há espaço para complementação pelos
outros entes, tendo em vista seu caráter nacional.271 Seguindo a distribuição de
competências estabelecida na Constituição cabe, excetuando o Município, a
competência de legislar concorrentemente sobre as matérias arroladas no artigo 24
e para os Municípios o poder-dever de legislar está definido no artigo 30, através de
matérias exclusivamente de interesse local. Enquanto que a competência
administrativa, ou também chamada de comum, ficou definida no artigo 23 do texto

270
Ibidem, p. 96. Normas gerais são normas uniformes, isonômicas, aplicáveis a todos os cidadãos e a todos os
Estados.
271
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Federalismo, Amianto e Meio Ambiente: Julgado sobre Competência, In:
CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. (Orgs), Op. cit., p. 225. A norma geral
federal diferencia-se da norma privativa federal. A norma geral situa-se no campo da competência concorrente
limitada e a norma privativa não tem limite de extensão, pois pode conter não só o geral como o pormenor ou o
detalhe.
110

constitucional. Heline Sivini Ferreira272 define a competência quanto a sua extensão


em: exclusivas, privativas, comuns, concorrentes e suplementares, sendo que as
primeiras correspondem a poderes e deveres que somente poderão ser exercidos
pelo ente que o detêm constitucionalmente273; enquanto as outras competências já
explicitei, acima a sua abrangência. A autora ainda divide as competências quanto a
sua natureza, podendo ser classificadas em: executiva, administrativa e legislativa.
Interessante é a diferenciação que faz entre as executivas e administrativas, já que
as primeiras seriam as correspondentes a definir estratégias e políticas, enquanto
que as administrativas seriam as eminentemente ligadas ao poder de polícia da
Administração Pública. Acredito ser essa separação entre as duas competências um
pouco sem propósito, pois ambas partem da Administração Pública e
automaticamente estão interligadas, já que em matéria ambiental não irá existir
efetividade do poder de polícia sem o estabelecimento de estratégias e políticas
ambientais. A atuação, na proteção do ambiente, não pode ser atingida sem uma
interligação entre o pensamento e a ação de proteção. É importante também
explicitar que a Constituição Federal de 1988, seguindo outras anteriores, manteve a
competência remanescente em regra destinada aos Estados-membros e reservando
a União e aos Municípios uma relação específica, de forma que o que não for da
competência dos dois entes anteriores será do Estado.274
Após explicar a distribuição das competências dos entes da
Federação, de uma forma geral, irei tratar especificamente da matéria ambiental.
Assim, posso afirmar que apesar de existirem diversos elementos que compõem o
ambiente, contidos na competência administrativa exclusiva da União, como por
exemplo, à instituição do sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos,
não existe nenhuma definição quanto a uma competência abrangente ambiental a
nível nacional. Da mesma forma que a competência privativa, para legislar, não
determina que a União deva legislar nacionalmente sobre a proteção ambiental,
impondo condutas pormenorizadas aos outros entes federativos. Apesar de tratar de

272
FERREIRA, Heline Sivini. Competências Ambientais. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José
Rubens Morato. (Orgs). Op. cit., p. 205-206.
273
Essas competências podem ser percebidas nos artigos: 21 para a União, 25 e parágrafos para os Estados-
membros, e 30 para os Municípios.
274
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Op. cit., p. 479. e CAVALCANTI,
Themistocles Brandão. Op. cit., p. 172. Como se exerce a competência? Existem três processos principais: ou a
Constituição declara quais são os podêres dos Estados e o restante fica com a União, ou o contrário: a
Constituição determina qual a competência da União e o remanescente fica com os Estados; ou, então, estabelece
regime de podêres ocorrentes.
111

assuntos ligados a alguns elementos ambientais, como a água, uma vez que a
competência do inciso IV, do artigo 22 é que permite a instituição do sistema
nacional de gerenciamento de recursos hídricos e a definição dos critérios de
outorga do direito de uso.
Na verdade, a competência para a proteção do ambiente de
forma plena, agregando todos os seus elementos, somente é definida explicita e
impressa no artigo 23, competência comum ou administrativa e no artigo 24, na
competência concorrente legislativa e por fim, através do interesse local contida no
artigo 30, todos da Constituição Federal de 1988. Assim sendo, as competências
concorrentes correspondem para a União ao poder-dever de editar leis federais e
não nacionais, sendo limitadas às normas gerais. Da mesma forma, em relação aos
Estados-membros, quando editam leis de proteção ambiental devem somente
pormenorizar no tocante à Administração Pública Estadual e generalizar no que diz
respeito aos Municípios que compõem os Estados-membros, restando somente para
os Municípios o poder de exclusivamente legislar, com base no artigo 30, I e II, sobre
normas específicas de interesse local.
Dito isso, a lei da Política Nacional de Meio Ambiente foi
recepcionada pela Constituição Federal de 1988, como sendo uma lei federal e não
mais nacional, pois o texto constitucional não possibilita tal competência à União,
como ocorria na Constituição anterior, na qual apesar de não existir um texto próprio
para proteção ambiental, a Política Nacional de Meio Ambiente foi editada segundo
critérios de proteção à saúde humana o que possibilitava a edição a nível
nacional.275 Paulo Bessa, afirma que o crescente número de políticas nacionais
relacionadas aos elementos ambientais, visam criar uma centralidade de poder na
questão ambiental nas mãos da União, que causa uma série de problemas de
atuação e da compatibilização dos fatos ao texto constitucional no que tange à
atuação administrativa dos entes federativos. E diante desse quadro, o sistema
federativo brasileiro encontra-se em crise devido a uma incessante condução, pela
União, das políticas ambientais. 276 Com isso, acredito que as normas contidas na

O nosso regime estabelece a competência da União, os remanescentes ficam para os Estados.


275
ANTUNES, Paulo de Bessa. Federalismo e Competências Ambientais no Brasil, Rio de Janeiro: Lumen Júris,
2007, p. 116-117.
276
ANTUNES, Paulo de Bessa. Federalismo e Competências Ambientais no Brasil, Op. cit., p. 35. Estas
políticas nacionais exercem o importante papel político de subordinar os Estados e Municípios às decisões
tomadas pelo Executivo Federal, em seu interesse exclusivo. Eles desempenham, igualmente, o mister de força
112

Política Nacional de Meio Ambiente que determinam condutas administrativas aos


entes federativos não foram recepcionadas pela Constituição Federal de 1988.
Foram somente recepcionadas as normas gerais de proteção ambiental, não
existindo, assim, um Sistema Nacional de Meio Ambiente por falta de possibilidade
constitucional para a instituição desse sistema, diferentemente do que ocorre com o
sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos, que tem base
constitucional.277
A competência concorrente em matéria ambiental, contida no
artigo 24, possibilita que cada ente, União, Estados-membros e Distrito Federal
elabore suas próprias estratégias, princípios e normas gerais para os Estados-
membros e Municípios específicos, enquanto atuação da sua própria pessoa. Dessa
forma, pode ocorrer a edição de uma lei da política estadual ambiental que
determine normas gerais devido às peculiaridades específicas daquele ente
federativo e que devem nortear também as legislações municipais, como também
editar o desenvolvimento de gerenciamento e planejamento ambientais a serem
executados em todo o Estado, através de sua própria atuação ou por meio de
convênios.278 É evidente assim, que obrigatoriamente os Estados, ao editarem leis
com base no artigo 24 da Constituição, devem ter presentes o princípio da
predominância do interesse, não podendo editar normas restritas a determinado
interesse de um ou de uma minoria de Municípios, pois a predominância do
interesse local cabe aos Municípios, conforme o artigo 30 da Constituição Federal.279
No artigo 23 da Constituição Federal de 1988, tem-se a
competência comum ou administrativa, na qual está relacionada a uma atuação
administrativa, em especial através do poder de polícia, com o objetivo de
compatibilizar e manter o equilíbrio necessário entre todas as pessoas humanas
para que possam viver de forma harmoniosa. São atuações que buscam proteger o

centrípeta que, em razão da distribuição de recursos delas advindos, atrai os Estados e Municípios para um
círculo cada vez mais próximo do Executivo Federal, em “revival” da “política dos governadores”.
277
Desta forma cada ente federativo poderá instituir sua própria política ambiental, respeitando as normas gerais
da União e conseqüentemente aos Municípios o dever de respeitar as normas gerais editadas pela União e
Estados-membros. Com isso e com a falta de previsão constitucional da instituição de uma política nacional
sobre o ambiente, entendo que a Lei 6.938/81 atualmente corresponde a Política Federal de Meio Ambiente.
278
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, Op. cit., p. 105.
279
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Op. cit., p. 478. O princípio geral que
norteia a repartição de competência entre entidades componentes do Estado federal é o da predominância do
interesse, segundo o qual à União caberão aquelas matérias e questões de predominante interesse geral, nacional,
ao passo que aos Estados tocarão as matérias e assuntos de interesse local, tendo a Constituição vigente
desprezado o velho conceito do peculiar interesse local que não lograra conceituação satisfatória em um século
de vigência.
113

ambiente através do controle das condutas humanas, em especial pela fiscalização


e pelo licenciamento ambiental.280 Ocorre que essa competência é comum para
todos os entes federativos, o que causa uma série de inseguranças para as pessoas
no que tange à competência do ente federativo. Diante disso, alguns autores
entendem que somente após a edição da lei complementar, que visa estabelecer à
cooperação entre os entes da federação na competência comum ambiental, será
resolvida a insegurança, regulamentando qual o ente que poderá atuar diante de
determinada conduta ambiental, estabelecendo a competência de cada ente
federativo.281 Já outros entendem e também me posiciono dessa forma, que não é
através de lei complementar de que trata o artigo 23 que se definirá a competência
comum dos entes federativos em matéria ambiental, e que a lei em comento que se
aguarda irá definir critérios para a cooperação entre os entes, sendo esta facultativa
e não um dever constitucional282, porque toda a definição do ente competente para
atuar com base no artigo 23, encontra-se no ordenamento jurídico constitucional,
sendo assim plena a competência comum dos entes, mas cada um exercendo o seu
poder constitucional nos limites da predominância do interesse. Daí ser errôneo
afirmar que na ausência de lei do ente competente o mesmo poderá utilizar a
legislação com base no artigo 23 de outro ente como, por exemplo, Município que
não tem uma legislação de infrações e sanções ambientais, mas tem a fiscalização e
utiliza a legislação ambiental do Estado ou da União.283 A atuação da competência
comum deve ser exercida mediante lei própria definidora da conduta estatal e dos
limites da sua intervenção nos direitos fundamentais da pessoa humana, tendo em
vista o princípio da legalidade que pauta a atuação administrativa e ainda pelo
sistema federativo que define que os entes tenham autogoverno, auto-administração
e auto-organização.284

280
FARIAS, Talden. Licenciamento Ambiental: aspectos teóricos e práticos, Belo Horizonte – MG: Fórum,
2007, p. 123. Depreende-se do entendimento de parte da doutrina e da jurisprudência que a competência
administrativa comum em matéria ambiental pode ser dividida em competência administrativa fiscalizatória e em
competência administrativa licenciatória.
281
TRENNEPOHL, Curt. e TRENNEPOHL, Terence. Licenciamento Ambiental, Niterói – RJ: Impetus, 2007, p.
13-14. e FARIAS, Talden. Op. cit., p. 150.
282
FREITAS, Vladimir Passos. Op. cit., p. 78.
283
FERREIRA, Heline Sivini. Competências Ambientais. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José
Rubens Morato. (Orgs). Op. cit., p. 217-218.
284
ANTUNES, Paulo de Bessa. Federalismo e Competências Ambientais no Brasil, Op. cit., p. 116-117,
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Op. cit., p. 171. e SILVEIRA, Patrícia Azevedo. Competência
Ambiental, Curitiba – PR: Juruá, 2002, p. 59-60. Tanto a competência administrativa quanto a competência
legislativa são fundadas na lei, com a diferença de que esta é explicitamente legislativa e aquela implicitamente
legislativa e explicitamente legislativa para designá-las, ao invés de utilizarmos a convenção tradicional. Aliás,
114

Na contribuição para a determinação da cooperação


necessária para a proteção ambiental, o princípio da subsidiariedade é norma
importante para a efetividade do direito ambiental, já que evita a centralização de
poder na União e, conseqüentemente, permite a possibilidade de se efetivar a
proteção ambiental nos entes não preparados administrativa e tecnicamente para a
função estatal ambiental e evitar, com isso, o conflito entre os entes federativos, que
respeita cada um a predominância de interesse específica de cada ente. E somente
em casos de necessidade administrativa ou técnica poderia outro ente intervir na
proteção ambiental e na predominância de outros entes. Paulo Bessa285 entende ser
a melhor forma para se ter uma interpretação plenamente adequada da competência
comum dos entes da Federação em matéria ambiental, respeitando o Estado
Democrático de Direito e a dignidade da pessoa humana. Talvez, com a aplicação
de tal princípio, possa alcançar também o respeito mútuo entre os entes e suas
autonomias, conforme aduz Themistocles Brandão Cavalcanti.286 Através desse
princípio, a União somente poderia assumir as competências dos Estados-membros
e dos Municípios caso estes não tivessem condições para cumprir o mandamento
constitucional de forma eficiente, da mesma maneira em relação aos Estados com
seus Municípios, que somente poderiam atuar nas atribuições municipais, caso
estes não tivesse condições para se estruturarem para o cumprimento do dever
constitucional de proteção ambiental.287

1.2 Competência no Licenciamento Ambiental

Após os apontamentos realizados acima sobre a competência


ambiental, restringirei especificamente a competência dos entes federativos na
possibilidade de realização do instrumento de controle ambiental que é o
licenciamento, buscando novamente contribuir para o esclarecimento e a definição
dos entes competentes, tendo em vista que atualmente diversos são os
questionamentos sobre quem pode e quais os objetos que cada um pode licenciar.
Tais conflitos são observados na questão da possibilidade de o Município utilizar

todo ato administrativo deriva da lei, ou dito de outra forma: a atividade da Administração Pública rege-se pelo
princípio da legalidade (art. 37, caput).
285
ANTUNES, Paulo de Bessa. Federalismo e Competências Ambientais no Brasil, Op. cit., p.178-179.
286
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Teoria do Estado, 2ª ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1969, p. 190.
115

esse instrumento e, mais conflituoso ainda, é a necessidade de se determinar qual o


melhor critério para se definir quem irá licenciar os objetos, se seria pela
abrangência do impacto, pelo território ou pelo domínio.
Inicialmente a possibilidade do exercício do licenciamento tem
sua base normativa na Constituição Federal nos artigos 23 e 225, pois todos os dois
dispositivos determinam que cabe à Administração Pública o controle das atividades
que possam causar alguma forma de poluição e, conseqüentemente, degradação
ambiental. A nível infraconstitucional a lei federal nº 6.938/81, em seu artigo 10288,
cria o atual licenciamento ambiental de âmbito federal, tendo sua regulamentação
através do decreto nº 99.274/90, respectivamente do artigo 17 ao 22, é interessante
que o parágrafo 1º, do artigo 17 concede ao CONAMA o estabelecimento de critérios
básicos para o licenciamento, surgindo a resolução CONAMA 237/97 e passando a
resolução CONAMA 01/86 a integrar o licenciamento ambiental. Dessa forma, não
há dúvida sobre a possibilidade da União, como ente integrante da Federação, de
exercer o licenciamento. Para os Estados-membros, também é pacificada a sua
possibilidade do exercício do licenciamento, tendo em vista a sua competência
residual, na qual o próprio artigo 10 da lei federal nº 6.938/81 explicita que,
excetuando os casos que se enquadrem no parágrafo 4º, o exercício do
licenciamento ambiental será exercido pelos Estados-membros. Na verdade, o artigo
mencionado somente reafirma o sistema de distribuição de competência feita pela
Constituição Federal. O que ocorre é que não é a lei federal nº 6.938/81 que

287
FERREIRA, Heline Sivini. Competências Ambientais. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José
Rubens Morato. (Orgs). Op. cit., p. 218
288
BRASIL, Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981 – Dispõe sobre a
Política Nacional do Meio ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br> . Acesso em: 10 dez 2006. Art. 10 - A construção,
instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais,
considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar
degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema
Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis. (Redação dada pela Lei
nº 7.804, de 1989). § 1º - Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão publicados
no jornal oficial do Estado, bem como em um periódico regional ou local de grande circulação. § 2º Nos casos e
prazos previstos em resolução do CONAMA, o licenciamento de que trata este artigo dependerá de homologação
do IBAMA. (Redação dada pela Lei nº 7.804, de 1989). § 3º O órgão estadual do meio ambiente e o IBAMA,
esta em caráter supletivo, poderão, se necessário e sem prejuízo das penalidades pecuniárias cabíveis, determinar
a redução das atividades geradoras de poluição, para manter as emissões gasosas, os efluentes líquidos e os
resíduos sólidos dentro das condições e limites estipulados no licenciamento concedido. (Redação dada pela Lei
nº 7.804, de 1989). § 4º Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis -
IBAMA o licenciamento previsto no caput deste artigo, no caso de atividades e obras com significativo impacto
ambiental, de âmbito nacional ou regional. (Redação dada pela Lei nº 7.804, de 1989)
116

possibilita os Estados-membros de utilizar o licenciamento para o controle de


atividades potencialmente poluidoras, mas a própria Constituição Federal, tendo em
vista, como já explicitei, a referida lei não é de natureza nacional, mas federal. Assim
não gera poder de impossibilitar ou possibilitar a utilização desse instrumento. Da
mesma forma que a União, os Estados-membros deverão ter suas próprias
legislações instituidoras do licenciamento e suas resoluções aprovadas pelos
Conselhos do Ambiente, de âmbito estadual e respeitando as normas gerais da
União e ainda os critérios também gerais das resoluções do CONAMA.
Em relação à competência dos Municípios poderem exercer o
licenciamento ambiental, a questão ainda não se encontra pacificada, já que alguns
autores não vislumbram a possibilidade do exercício do instrumento pelos
Municípios, tendo em vista que a lei federal nº 6.938/81, em seu artigo 10, exclui o
Município dessa possibilidade, pois não houve previsão expressa como ocorreu em
relação aos Estados-membros e a União. E que, inclusive o CONAMA, não poderia
ter enunciado o artigo 6º, que possibilita os Municípios a exercerem o licenciamento
ambiental de âmbito local, pois a Lei da Política Nacional de Meio Ambiente não teria
conferido aos Municípios essa competência e, por conseguinte, seria ilegal e
inconstitucional a referida resolução.289 Particularmente, entendo que não há nada
de ilegal ou inconstitucional na resolução CONAMA, o que é necessário é uma nova
interpretação do artigo 10, da lei federal nº 6.938/81, já que os que ainda afirmam
que o Município não tem competência para o licenciamento ambiental, fazem uma
interpretação aos moldes da Constituição Federal passada, que substanciou a
edição da referida lei e que não pode ser mais realizada dessa forma, mas
condizente ao novo ordenamento jurídico constitucional que possibilita o exercício
do licenciamento aos Municípios preparados para tal.290 É evidente que pelo
princípio da legalidade da Administração Pública, cada Município deverá ter sua
própria lei instituindo o licenciamento ambiental e resoluções dos Conselhos do
Ambiente de âmbito municipal, assim como os Estados-membros que devem
respeitar as normas e os critérios gerais estabelecidos pela União. Também deverão
os Municípios respeitarem a generalidade estabelecida pelos Estados-membros. Tal

289
OLIVEIRA, Antônio Inagê de Assis. Introdução à Legislação Ambiental Brasileira e Licenciamento
Ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2005, p. 353-354. e MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito
Ambiental Brasileiro, Op. cit., p. 110.
117

questão ficará melhor explicitada a partir do próximo capítulo que trata


exclusivamente da implementação nos Municípios do licenciamento ambiental e dos
aspectos para a sua efetivação.
Passada a fase de quem pode licenciar diante o sistema
federativo, torna-se importante observar em que circunstância cada ente deverá
licenciar, quer dizer, quais os objetos que ficarão sob o controle licenciatório da
União, dos Estados-membros e dos Municípios. Para se obter uma solução, observei
três critérios que seriam: o da propriedade do bem, o território e a abrangência do
impacto ambiental. Penso que nenhum desses critérios isoladamente conseguirá
definir de forma correta qual o ente competente para exercer o licenciamento
ambiental, mas somente com a interpretação dos três é que se definirá quem é
competente. Dessa forma, adotando uma interpretação conjunta, o projeto de lei
complementar nº 388/2007291, referente ao parágrafo 1º do artigo 23 da Constituição
Federal que, como já explicitei, visa instituir critérios para a cooperação dos entes
federativos no que tange às questões administrativas ambientais relacionou de
forma explícita o que a Constituição Federal já informava implicitamente, reservando
para a União o licenciamento das atividades e empreendimentos localizados em
alguns de seus bens e ou competências privativas, para os casos de implementação
nos limites com outros países e entre Estados-membros e, ainda, para as atividades
e empreendimentos causadores de impactos ambientais sejam positivos ou
negativos de nível nacional ou regional292. Enquanto, para os Estados-membros, o
projeto define que ficarão sob seu controle as atividades e empreendimentos
localizados em unidades de conservação estadual e nas atividades e

290
JUNIOR, Hamilton Alonso. Da Competência para o licenciamento Ambiental, In: FINK, Daniel Roberto.; JR,
Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Aspectos Jurídicos do Licenciamento Ambiental, 3ª ed., Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 49. e FARIAS, Talden. Op. cit., p. 158-159.
291
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Complementar - PLP nº 388/2007: Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br > . Acesso em: 12 de fev. 2008.
292
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Complementar - PLP nº 388/2007: Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br > . Acesso em: 12 de fev. 2008. Art. 6º Para fins do art. 5º, são ações
administrativas da União, dentre outras: XIII – exercer o controle e a fiscalização das atividades e
empreendimentos cuja competência para licenciar, ambientalmente, for cometida à União; XV – promover o
licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos a saber: a) que causem ou possam causar impacto
ambiental direto de âmbito nacional ou regional; b) localização ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em
país limítrofe; c) localizados na plataforma continental, na zona econômica exclusiva, em terras indígenas ou em
unidades de conservação da União, exceto em Área de Proteção Ambiental – APAs, onde deverá ser observado o
critério do impacto ambiental direto das atividades ou empreendimentos; d) destinados a pesquisar, lavrar,
produzir, beneficiar, transportar, armazenar e dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem
energia nuclear em qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da Comissão Nacional de Energia
Nuclear – CNEN; e e) empreendimentos e atividades militares que servem a defesa nacional, na forma da lei.
118

empreendimentos que causem impacto estadual293. Finalmente, em relação aos


Municípios, ficam expressamente competentes para os casos que causem impactos
ambientais de abrangência local e nas unidades de conservação municipais.294 É
evidente que se trata de um projeto de lei complementar, ainda sem força de lei para
que possa determinar algum tipo de dever estatal de cooperação.
Com isso, a definição da competência ambiental, para o
exercício do licenciamento ambiental, deve ser retirada a partir da interpretação do
ordenamento jurídico, principalmente do constitucional. Dessa forma, continua a
incerteza de qual critério ou elemento seria responsável pela definição do ente
federativo competente para o licenciamento ambiental; se seria como dito
anteriormente pela dominialidade, pela abrangência do impacto ambiental a ser
proporcionado pelo objeto a ser licenciado, pelo critério geográfico ou pela
segurança nacional.295 Com isso, também os Tribunais do país ainda não
pacificaram suas decisões na adoção de um único critério definidor ou de um
método que pudesse resolver o problema da definição da competência para o
licenciamento ambiental.296 Penso que o melhor método é a compatibilização de

293
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Complementar - PLP nº 388/2007: Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br > . Acesso em: 12 de fev. 2008. Art. 7º Para os fins do art. 5º, são ações
administrativas dos Estados e do Distrito Federal, dentre outras: XII – exercer o controle e a fiscalização das
atividades e empreendimentos cuja competência para licenciar, ambientalmente, for cometida à União; XIV –
promover o licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos a saber: a) que causem ou possam
causar impacto ambiental direto de âmbito estadual; e b) localizados em unidades de conservação do Estado ou
do Distrito Federal, exceto em Áreas de Proteção Ambiental – APAs, onde deverá ser observado o critério do
impacto ambiental direto das atividades ou empreendimentos;
294
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Complementar - PLP nº 388/2007: Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br > . Acesso em: 12 de fev. 2008. Art. 8º Para fins do art. 5º, são ações
administrativas dos Municípios, dentre outras: XII - exercer o controle e a fiscalização das atividades e
empreendimentos cuja competência para licenciar, ambientalmente, for cometida ao Município; XIV – promover
o licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos a saber: a) que causem ou possam causar impacto
ambiental direto de âmbito local; e b) localizadas em unidades de conservação do Município, exceto em Áreas
de Proteção Ambiental – APAs, onde deverá ser observado o critério do impacto ambiental direto das atividades
ou empreendimentos;
295
TRENNEPOHL, Curt. e TRENNEPOHL, Terence. Op. cit., p. 03. A diversidade de entendimentos sobre
fator determinante da competência para o licenciamento ambiental se reflete, também, nas decisões dos
Tribunais. Conforme pode ser visto nos seguintes Acórdãos, alguns julgadores acatam o critério da abrangência
do impacto, outros optam pelo critério geográfico, enquanto outros, ainda, escolhem o critério da domicialidade
ou o da segurança nacional.
296
BRASIL, Tribunal Regional Federal, 4ª Região, Proc. nº 200272080031198, Quarta Turma, Relator: Juiz
Valdemar Capeletti, julgado em 27 de jul. de 2005: Disponível em: <http://www.trf4.gov.br> . Acesso em: 16 de
fev. 2008; BRASIL, Tribunal Regional Federal, 1ª Região, Proc. nº 200501000378659, Sexta Turma, Relator:
Juíza Maria Isabel Gallotti Rodrigues, julgado em 28 de nov. de 2005: Disponível em: <http://www.trf1.gov.br>
. Acesso em: 16 de fev. 2008; BRASIL, Tribunal Regional Federal, 4ª Região, Proc. nº 1998804010096842,
Quarta Turma, Relator: Juiz Joel Ilan Paciomik, julgado em 18 de dez. de 2005: Disponível em:
<http://www.trf4.gov.br> . Acesso em: 16 de fev. 2008; BRASIL, Tribunal Regional Federal, 1ª Região, Proc. nº
200001001367046, Quinta Turma, Relator: Juíza Selene Maria de Almeida, julgado em 24 de nov. de 2003:
Disponível em: <http://www.trf4.gov.br> . Acesso em: 16 de fev. 2008, e BRASIL. Superior Tribunal de Justiça,
119

todos esses critérios para a definição do ente licenciador, conforme pretende o


projeto de lei complementar 388/2007, que aperfeiçoou o projeto 12/2003, que
também tramita na Câmara e atualmente, encontra-se em apenso ao primeiro.

2. O Poder de Polícia do Estado.

O Estado é o ente responsável pela organização e efetivação


das vontades e dos direitos das comunidades, devendo promovê-los e defendê-los,
protegendo os interesses existentes em delimitado espaço geográfico. É a
personificação política e jurídica dos interesses da comunidade existente.297 Assim,
para a Administração Pública equilibrar os interesses existentes na comunidade,
deve intervir de algumas formas, sendo o poder de polícia uma das formas
encontradas para o Estado restringir alguns direitos de maneira democrática e
conceder cidadania aos indivíduos.298 A polícia é o Estado exercendo seu poder nas
pessoas e nas coisas para promover o bem estar social e a qualidade de vida dos
indivíduos.299 Masagão300 afirma que, inicialmente, o poder de polícia significava a
orientação que o Príncipe dava aos seus vassalos, com o objetivo de promover o
bem comum, através da segurança e do bem estar, com características
eminentemente autoritária e repressiva, fundamentando muito mais um Estado de
Polícia do que um Democrático de Direito, uma vez que não tinha participação dos
administrados na elaboração das permissibilidades administrativas, pois somente o
Príncipe que exercia o poder de orientar as condutas que entendesse viável para o
estabelecimento da segurança e do bem estar. Diferente do que ocorre hoje, a

Proc. nº 200301597545, Primeira Turma, Relator Ministro José Delgado, julgado em 17 de fev. de 2004:
Disponível em: <http://www.trf4.gov.br> . Acesso em: 16 de fev. 2008.
297
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo, 8ª ed., Rio de Janeiro: Livraria
Freitas Bastos S.A., 1967, p. 115.
298
BENVENUTI, Feliciano. Appunti di Diritto Amministrativo, Parte Generale, 3ª ed, Itália: Padova, 1955, p.
165. Infine lo Stato esplica la propria azione inqradrando i soggetti individuali nella collettività soprattutto
mediante l’atto di concessione di cittadinanza (legge 13 giugno 1912 n. 555 e R.D.L. 1 dicembre 1934 n. 1997) il
quale è propriamente un atto di attribuzione di status ed ha carattere costitutivo.
299
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo, Op. cit., p. 116. Do poder de
polícia – Nesta expressão compreende-se, em sentido amplo, o exercício do poder sôbre as pessoas e as coisas,
para atender ao interêsse público.
Inclui tôdas as restrições impostas pelo poder público aos indivíduos em benefício do interêsse coletivo, saúde,
ordem pública, segurança, e, ainda mais, os interêsses econômicos e sociais.
300
MASAGÃO, Mario. Curso de Direito Administrativo. 3ª ed. São Paulo: Max Limonad, 1962, p.181. O
sentido da palavra polícia sofreu acentuada evolução. A princípio significava ela tôda ação do Príncipe,
destinada a promover o bem-estar e a segurança dos vassalos, identificando-se dessa forma, quase
completamente, com a ação administrativa em geral. Daí o falar-se em Estado-policial.
120

participação da sociedade nos processos de restrição de direitos é fundamental para


a sua efetivação.
O poder de polícia nasce nas cidades onde as pessoas
exercem seus direitos e deveres e estabelecem suas vidas, não tendo ainda essa
denominação, mas há muito tempo o Estado exerce uma restrição de direitos.301
Não importa que o Estado exerça sua polícia sobre os indivíduos na forma de um
Estado-policial ou como um Estado Democrático, tendo uma característica
essencialmente administrativa ou como administração jurídica e podendo ser ainda
caracterizada como a administração social do Estado, já que, como afirmei acima, a
polícia é utilizada para restringir direitos particulares em detrimento dos interesses
da sociedade.302 Tal situação de indefinição da polícia do Estado, poderia ser a de
prestar segurança pública e manutenção da ordem pública, numa visão repressiva,
mais adequada ao direito penal, com a polícia. Logo, o Estado deveria restringir
direitos particulares ligados a coisas e pessoas como seu dever de organização da
vida em coletividade, que tem aspecto muito mais administrativo. Começou, assim, a
solucionar a indefinição a partir do aparecimento da Ciência do Direito
Administrativo, consagrada a partir do direito positivo, regendo a administração
pública de forma geral.303
A expressão “poder de polícia” surge no direito norte-
americano através da jurisprudência, sendo a atividade administrativa que tinha o
objetivo de preservar e promover a ordem pública, a segurança e o bem estar das
pessoas, por meio de medidas preventivas e repressivas.304 Podendo ser

301
SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. Poder de Polícia, In: Revista da Faculdade de Direito de São
Bernardo do Campos, v. 6 tomo I, São Bernardo do Campo: Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo,
2000, p. 223. A palavra polícia deriva do latim politea e do grego politeo, estando relacionada ao termo política
e, conseqüentemente, ao vocábulo polis que corresponde à cidade. Desta maneira, a Antiguidade denotou a
significação de polícia como o ordenamento político do Estado ou cidade.
302
JUNIOR, José Cretella. Poder de Polícia, Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 4. O poder de polícia, em geral,
sempre existiu no Estado, qualquer que tenha sido sua natureza e funções, no que diz respeito aos fins da
sociedade a ele referida, quer tenha tido um caráter amplo de política interna (concepção originária da polícia
como governo), quer tenha sido concebido como instituição essencialmente administrativa, quer como
administração jurídica, ou administração social do Estado. A idéia de Estado é inseparável da idéia de política. e
MASAGÃO, Mario. Op. cit., p. 182 – 183.
303
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo, Op. cit., p. 116. No Direito
português, como em nossos primeiros autores, a palavra era tomada em seus diversos significados, seguindo
mais ou menos a orientação dos autores franceses, que chegavam a confundir o Direito Administrativo com a
polícia. e MASAGÃO, Mario. Op. cit., p. 182 – 183.
304
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo, Op. cit., p. 118. e JUNIOR, José
Cretella. Op. cit., p. 5.
121

considerada como a atuação estatal na restrição dos direitos dos indivíduos305,


evitando que o exercício de um direito por uma pessoa venha a ferir outro, ou até o
mesmo direito de pessoa diversa ou da coletividade, visando à estabilidade social.306
No Brasil, o poder de polícia se positivou através da
Constituição Federal de 1824, mas tal poder era denominado de “posturas policiais”,
que atribuía a função aos Municípios, seguindo a origem desse poder como sendo
um ordenamento da cidade, e, após a positivação constitucional, ocorreu a nível
infraconstitucional com a lei 1º de outubro de 1828307 que enunciava as matérias que

305
Destaco que durante o estudo deste capítulo a utilização da expressão “indivíduos” compreende tanto as
pessoas físicas como jurídicas, já que o poder de polícia restringe direitos de ambas, tendo em vista que a
restrição à implantação de uma determinada atividade pode ser tanto para uma pessoa física quanto para jurídica.
Dessa forma a Administração Pública através do seu poder de polícia pode e dever restringir direitos das
pessoas, podendo ser de direito público ou privado até porque esse poder visa equilibrar os direitos das pessoas
não diferenciando-os, conforme aduz Paulo Affonso Leme Machado, quando em uma de suas obras trata de
quem pode ter seu direitos restringidos pela polícia ambiental. (MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito
Ambiental Brasileiro, 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 2005, p. 319-320).
306
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Tratado de Direito Administrativo, 2ª ed., v. V, Rio de Janeiro:
Livraria Freitas Bastos, 1950, p. 363. Nesta expressão, compreendida em sentido amplo, entende-se o exercício
do poder sôbre as pessoas e as coisas, para atender ao interêsse público.
Não se pode definí-lo de maneira rígida, e isto mesmo reconhecem os autores que mais proficientemente
estudaram o assunto.
Inclui tôdas as restrições impostas pelo poder público aos indivíduos, em benefício do interesse coletivo, saúde,
ordem pública, segurança, e ainda mais, os interêsses econômicos e sociais.
307
BRASIL, Lei 1º de outubro de 1828, Disponível em: <http://www.brasilimperial.org.br/c24a73.htm> Acesso
em: 07 de dezembro de 2007. Art. 66. Terão a seu cargo tudo quanto diz respeito á policia, e economia das
povoações, e seus termos, pelo que tomarão deliberações, e proverão por suas posturas sobre os objetos
seguintes: § 1º Alinhamento, limpeza, iluminação, e desempachamento das ruas, cáes e praças, conservação e
reparos de muralhas feitas para a segurança dos edifícios, e prisões publicas, calçadas, pontes, fontes,
aqueductos, chafarizes, poços, tanques, e quaesquer outras construcções em benefício commum dos habitantes,
ou para decoro e ornamento das povoações. § 2º Sobre o estabelecimento de cemiterios fóra do recinto dos
templos, conferindo a esse fim com a principal autoridade ecclesiastica do lugar; sobre o esgotamento de
pantanos, e qualquer estagnação de aguas infectas; sobre a economia e asseio dos curraes, e matadouros
publicos, sobre a collocação de cortumes, sobre os depositos de immundices, e quanto possa alterar, e corromper
a salubridade da atmosphera. § 3º Sobre edifícios ruinosos, escavações, e precipícios nas vizinhanças das
povoações, mandando-lhes pôr divisas para advertir os que transitam; suspensão e lançamento de corpos, que
possam prejudicaqr, ou enxovalhar aos viandantes; cautela contra o perigo proveniente da divagação os loucos,
embriagados, de animaes ferozes, ou damnados, e daquelles, que, correndo, podem incomodar os habitantes,
providencias para acautelar, e atalhar os incendios. § 4º Sobre as vozeiras nas ruas em horas de silencio, injurias
e, obscenidades com a moral publica. § 5º Sobre os damninhos, e os que trazem gado solto sem pastor em
lugares aonde possam causar qualquer prejuízo aos habitantes, ou lavouras; extirpação de reptis venenosos, ou de
quaesquer animaes, e insectos devoradores das plantas; e sobre tudo o mais que diz respeito á polícia. § 6º Sobre
construcção, reparo, e conservação das estradas, caminhos, plantações de arvores para preservação de seus
limites á commodidade dos viajantes, e das que forem uteis para a sustentação dos homens, e dos animaes, ou
sirvam para fabricação de polvora, e outros objetos de defesa. § 7º Proverão sobre lugares onde pastem e
descancem os gados para o consumo diario, em quanto os Conselhos os não tiverem proprios. § 8º Protegerão os
criadores, e todas as pessoas, que trouxerem seus gados para os venderem, contra quaesquer oppressões dos
empregados dos registros, e curraes dos Conselhos, aonde os haja, ou dos marchantes e mercadores deste genero,
castigando com multas, e prisão, nos termos do titulo 3º art. 71, os que lhes fizerem vexames, e acintes para os
desviarem do mercado. § 9º Só nos matadouros publicos, ou particulares, com licença das Camaras, se poderão
matar, e esquartejar as rezes; e calculado o arrobamento de cada uma rez, estando presente os exactores dos
direitos impostos sobre a carne; permitir-se-há aos donos dos gados conduzi-los depois de esquartejados, e
vendel-os pelos quiserem, e aonde bem lhes convier, com tanto que o façam em lugares patentes, em que a
Camara possa fiscalizar a limpeza, e salubridade dos talhos, e da carne, assim como a fidelidade dos pesos. § 10º
122

as Câmaras Municipais tinham de deliberar, tendo em vista o dever de exercer as


posturas policiais, que estavam inseridos diversos temas, inclusive os ambientais. A
utilização do termo poder de polícia ocorreu através de Aurelino Leal, na sua obra
“Polícia e Poder de Polícia”, mas a positivação do termo veio com o Código
308
Tributário Nacional no seu artigo 78.
É importante estabelecer a diferenciação do poder de polícia
administrativo do poder da polícia denominada de polícia judiciária, que tem uma
ação muito mais repressiva do que preventiva, mas ressalto que a polícia
administrativa também atua de forma repressiva, quando autua o infrator do
ordenamento administrativo, e a polícia, enquanto órgão de segurança pública,
também atua preventivamente, quando evita a ocorrência de determinado crime.
Masagão309 afirma que, enquanto atividade do Estado, tanto a polícia administrativa
quanto à judiciária são representações do poder de polícia estatal, mas no que diz

Proverão igualmente sobre a commodidade das feiras, e mercados, abastança, e salubridade de todos os
mantimentos, e outros objetos expostos á venda publica, tendo balança de ver o peso, e padrões de todos os
pesos, e medidas para se regularem as aferições; e sobre quanto possa favorecer a agricultura, commercio, e
industria dos seus districtos, abstendo-se absolutamente de taxar os preços dos generos, ou de lhes pôr outras
restricções á ampla liberdade, que compete a seus donos. § 11º Exceptua-se a venda da pólvora, e de todos os
generos susceptiveis de explosão, e fabrico de fogos de artifício, que pelo seu perigo, só se poderão vender, e
fazer nos lugares marcados pelas Camaras, e fóra de povoado, para o que se fará conveniente postura, que
imponha condemnação, aos que a contravierem. § 12º Poderão autorizar espectaculos publicos nas ruas, praças, e
arraiaes, uma vez que não offendam a moral publica, mediante alguma modica gratificação param as rendas do
Conselho, que fixarão por suas posturas. Art. 67. Cuidarão os Vereadores, além disto em adquirir modelos de
machinas, e instrumentos ruraes, ou das artes, para que se façam conhecidos aos agricultores, e industriosos. Art.
68. Tratarão de haver novos animaes úteis, ou de melhorar as raças dos existentes, assim como de ajuntar
sementes de plantas interessantes, e arvores frutíferas, ou prestadias para as distribuírem pelos lavradores. Art.
69. Cuidarão no estabelecimento, e conservação das casas de caridade, para que se criem expostos, se curem os
doentes necessitados, e se vaccinem todos os meninos do distrito, e adultos que o não tiverem sido, tendo
Medico, ou Cirurgião de partido. Art. 70. Terão inspecção sobre as escolas de primeiras letras, e educação, e
destino dos orphãos pobres, em cujo numero entram os expostos; e quando estes estabelecimentos, e os de
caridade, de que trata o art. 69, se achem por Lei, ou de facto encarregados em alguma cidade, ou villa a outras
autoridades individuais, ou collectivas, as Camaras auxiliarão sempre quanto estiver de sua parte para a
propriedade, e augmento dos sobreditos estabelecimentos. Art. 71. As Camaras deliberarão em geral sobre os
meios de promover e manter a tranqüilidade, segurança, saúde, e comodidade dos habitantes; o asseio,
segurança, elegancia, e regularidade externa dos edifícios, e ruas das povoações, e sobre estes objectos formarão
as suas posturas, que serão publicadas por editaes, antes, e depois de confirmadas. Art. 72. Poderão em ditas suas
posturas comminar penas até 8 dias de prizão, e 30$000 de condemnação, as quaes serão aggravadas nas
reincidências até 30 dias de prisão, e 60$000 de multa. As ditas posturas só terão vigor por um anno em quanto
não forem confirmadas, a cujo fim serão levadas aos Conselhos Geraes, que tambem as poderão alterar, ou
revogar. Art. 73. Os cidadãos, que se sentirem aggravados pelas deliberações, acórdãos, e posturas das Camaras,
poderão recorrer aos Conselhos Geraes, e na Côrte para a Assembléia Geral Legislativa; e aos Presidentes das
províncias, e por estes ao Governo, quando a materia fôr meramente economica e administrativa.
308
BRASIL, Código Tributário Nacional, Lei nº 5.172 de 25 de outubro de 1966, Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br> Acesso em: 11 de dezembro de 2007. Art. 78. Considera-se poder de polícia
atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a
prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem,
aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de
concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos
individuais ou coletivos.
123

respeito ao seu exercício deve existir uma separação, já que são regidos por direitos
diferentes. Com isso, a polícia, como atividade administrativa ou aparelhamento,
corresponde às ações estatais do poder de polícia em detrimento dos direitos da
coletividade.310 Alguns autores entendem que a diferenciação entre a polícia
administrativa e a judiciária está relacionada ao objeto de atuação. Na primeira é a
restrição do exercício de uma conduta lícita dos indivíduos, enquanto que na
segunda é o impedimento de condutas ilícitas, sendo que essa polícia auxilia o
Estado e o Poder Judiciário na repressão ao cometimento de ilícitos criminais.311
Acredito que esse meio de distinção não é o mais adequado, já que as atividades
ditas como lícitas, referentes à policia administrativa são lícitas diante de outros
ramos do direito, mas não são lícitas no Direito Administrativo, tendo em vista a
necessidade de lei para estabelecer as condutas ilícitas administrativamente e,
ainda, a polícia judiciária não auxilia o Estado, ela faz parte dele, é uma espécie do
gênero poder de polícia estatal.
A polícia administrativa é o poder que tem a Administração
Pública de restringir direitos, visando garantir outros direitos de âmbito coletivo e até
mesmo do próprio indivíduo que teve o direito restringido, pois o poder de polícia
ambiental, que tratarei mais posteriormente, consubstancia no dever que tem a
Administração Pública de preservar e proteger o ambiente para as presentes e
futuras gerações e, por ser um direito difuso, a restrição da atuação individual que
possa prejudicar o ambiente é a proteção da coletividade e, por tal, o indivíduo que
teve restringido seu direito em prol do ambiente também está inserido na
coletividade, portanto a restrição também visa a protegê-lo. Assim, a polícia
administrativa tem o dever de proporcionar um equilíbrio entre os direitos individuais
e coletivos, através de restrições dos direitos que muitas vezes não podem ser
totalmente afastados, pois representam normas de interesse essencial para a

309
MASAGÃO, Mario. Op. cit., p.184.
310
BENVENUTI, Feliciano. Op. cit., p. 166. Si tratta, come è agevole compreendere, di tutta quella serie di
compiti di polizia ( protezione dei bene, delle persone, dei costumi), che vanno sotto il nome di polizia di
sicurezza o più comunemente di pubblica sicurezza e che si esercitano mediante limitazione imposte a
determinate categorie de cittadini ( mendicanti, Liberati dal cárcere, ammoniti, confinati, ecc), o mediante
limitazioni e controlli sulla libertà di stampa, di riunione, di associazione, di stabilimento (es. foglio di via
obbligatorio), oppure attengono all’aspetto sociale (non a quello economico perchè altrimenti si tratta di azione
connessa all’esercizio di um servizio reso dal privato allá collettività: v. infra Capitolo XVII) di alcune attività
private (ad es. spettacoli, giochi di abilità ecc.) e JUNIOR, José Cretella. Op. cit., p. 14. Se a polícia é uma
atividade ou um aparelhamento, o poder de polícia é o princípio jurídico que informa essa atividade, justificando
a ação policial, nos Estados de Direito.
311
SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. Op. cit., p. 226 – 227 e GASPARINI, Giogenes. Direito
Administrativo, 4ª ed., São Paulo: Saraiva, 1995, p. 109.
124

pessoa humana. Para tal exercício, o Estado pode e deve intervir nas atividades
industriais, comerciais e todas as outras de âmbito privado, que ameaçam em seus
exercícios os direitos da coletividade.312
A restrição proporcionada pelo poder de polícia é abstrata,
tendo em vista que não é realizada na incidência de determinado caso concreto,
conforme acontece na interpretação do direito através do método da ponderação de
interesses e valores. Diferentemente do que ocorre no Judiciário, no qual o juiz ao
julgar determinada situação concreta, pode ponderar os direitos aparentemente
conflitantes ou não e utilizar os métodos tradicionais de interpretação jurídica. Já a
Administração Pública, para poder restringir direitos, deverá estar autorizada por lei,
tendo em vista o princípio da legalidade. Caso contrário, os indivíduos ficariam
desprotegidos contra a atuação do Estado que poderia restringir todos os direitos
nos limites de sua conveniência, apresentando-se como um Estado totalitário. Com
isso, o poder de polícia não é ilimitado em se tratando de um Estado Democrático de
Direito, da mesma forma que os direitos individuais não são. É necessário que haja
proporcionalidade e razoabilidade para que o Estado venha restringir direitos
individuais, sob pena de a atuação ser configurada como abusiva. Dessa maneira,
para que se evite uma ilegalidade mediante abuso de poder, deve existir um
equilíbrio entre os direitos individuais e coletivos, de forma que os indivíduos
exerçam seus direitos e ao mesmo tempo sejam preservados os direitos da
coletividade.313 Não estou afirmando que a Administração Pública não possa utilizar
o método da ponderação, mas para tal é necessário que ocorra previsão normativa
para o exercício de tal poder de restrição. Além disso, o âmbito de incidência do
poder de polícia do Estado em seu exercício pode ser diferenciado, uma vez que
existem atuações em que a Administração Pública pode restringir ou não o direito
dos indivíduos de uma forma geral e outras vezes individualmente. Buscando
esclarecer melhor, exemplificarei através da proibição da captura e comercialização
de animais em extinção, como sendo uma restrição de caráter geral, enquanto que o

312
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo, Op. cit., p. 117.
313
JUNIOR, José Cretella. Op. cit., p. 16. Do mesmo modo que os direitos individuais são relativos, assim
também acontece com o poder de polícia, que, longe de ser onipotente, incontrolável, é circunscrito, jamais
podendo pôr em perigo a liberdade e a propriedade. Importando, via de regra, o poder de polícia em restrições a
direitos individuais, a sua utilização não deve ser excessiva ou desnecessária, de modo a não configurar um
abuso de poder. Não basta que a lei possibilite a ação coercitiva da autoridade para justificação do ato de polícia.
É necessário, ainda, que se objetivem condições materiais que solicitem ou recomendem a sua inovação. A
coexistência da liberdade individual e do poder de polícia repousa na conciliação entre a necessidade de respeitar
essa liberdade e a de assegurar a ordem social.
125

requerimento para a implantação de uma determinada atividade, que poderá


impactar o ambiente, pode ser restringida em determinada região e não em outra.314

2.1 Poder de Polícia Ambiental

O poder de polícia ambiental é uma fração, um segmento do


poder de polícia estatal e corresponde ao poder que o Estado tem de restringir
direitos individuais em detrimento da coletividade, visando à preservação ambiental
e a manutenção dos aspectos ambientais necessários à existência da pessoa
humana.315 Assim, as condutas que de alguma forma possam causar impactos ou
degradações ambientais são limitadas pelo Poder Público, que somente permite o
exercício da conduta individual após a realização de análise para saber o grau de
interferência que aquela conduta poderá causar ao ambiente e conseqüentemente à
sociedade, e analisar se o interesse individual não afeta o público.
Sendo o poder de polícia ambiental, como disse, uma faceta
do poder de polícia do Estado, é necessário também que seu âmbito seja delimitado
por lei, tendo em vista que é a concessão de um poder para Administração Pública
atuar, impedindo, controlando e sancionando os indivíduos, visando à manutenção
de interesses maiores que os individuais e, para tal exercício, é estritamente
necessário o respeito ao princípio da legalidade, por se tratar de uma conduta da
Administração Pública e, ainda, objetivando equilibrar a atuação, de forma que não
se torne uma administração absolutista e ilimitada. Outro fator importante é que, por
se tratar de uma restrição de direitos, nada mais adequado que seja realizado, ou
melhor, delimitado pelos representantes legítimos do povo e além do que a própria
norma constitucional ordena em seu artigo 5º II, que os indivíduos somente poderão
ser condicionados a um fazer ou não fazer mediante lei. As imposições referentes ao

314
MASAGÃO, Mario. Op. cit., p. 185. Todavia sendo tal atividade simplesmente discricionária, podem ser
indicados os seus limites negativos, que consistem nos direitos, que ela deve respeitar. Assim, pode a polícia
preventiva fazer tudo quanto se torne útil a sua missão, desde que com isso não viole direito de quem quer que
seja. Os direitos que principalmente confinam a atividade da polícia administrativa são aquêles que, por sua
excepcional importância, são declarados na própria Constituição.
315
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, Op. cit., p. 317-318. Poder de polícia
ambiental é a atividade da Administração pública que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a
prática de ato ou a abstenção de fato em razão de interesse público concernente à saúde da população, à
conservação dos ecossistemas, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas ou
de outras atividades dependentes de concessão, autorização/permissão ou licença do Poder Público de cujas
atividades possam decorrer poluição ou agressão à natureza. e DAWALIBI, Marcelo. O Poder de Polícia em
Matéria Ambiental, In: Revista de Direito Ambiental, ano 04, v. 14, abril-junho São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999, p. 96.
126

poder de polícia nada mais são do que enunciados normativos de fazer e não fazer
em benefício do interesse público. Assim, a lei que delimita o exercício do poder de
polícia da Administração Pública, é a mesma que conduz o indivíduo no exercício de
sua conduta.316 Dessa forma, quando a Administração Pública, no exercício do seu
dever de proteção ambiental, sanciona o indivíduo que, por exemplo, podou uma
espécie arbórea, tal restrição não tem origem na polícia da administração, mas no
Poder Legislativo que limitou a conduta individual, impedindo que se podassem
árvores ao bel prazer. E caso descumprido essa limitação da liberdade individual
cabe ao Poder Público através da Administração sancioná-lo. Assim, a limitação não
nasce e não tem sua origem na vontade da Administração Pública, mas na lei, sendo
o poder de polícia o meio que o Estado tem de impedir ou sancionar os indivíduos
que pretendem ou violam a lei.317
No ordenamento jurídico brasileiro, tanto constitucional quanto
infraconstitucional, exige uma atuação por parte do Poder Público de controle das
condutas que interfiram no equilíbrio ambiental. A nível constitucional, observo os
artigos 24 VI, VII, VIII e 30, I e II que exigem dos Entes Federativos que legislem
sobre a proteção ambiental, inclusive concedendo à Administração Pública meios
legais, através do poder de polícia para que possam cumprir os seus deveres
ambientais. Já no artigo 23 III, IV, VI, VII do texto constitucional está disposto ser o
dever administrativo de proteção ambiental, no qual uma de suas formas é o
exercício do poder de polícia ambiental delimitado pela lei. Enquanto a nível

316
DAWALIBI, Marcelo. O Poder de Polícia em Matéria Ambiental, Op. cit., p. 95. Todavia, é importante
ressaltar que o ato de polícia de aplicação de pena administrativa depende da previsão em lei da conduta descrita
como infração administrativa e também da sanção correspondente.
317
Dessa forma, para que os indivíduos tenham suas condutas limitadas, é necessária à existência de lei que o
faça e diante ao dever do Estado de quando tiver o objetivo de limitar ou delinear as condutas que faça mediante
lei e não por outro tipo de ato normativo. Com isso, entendendo que a limitação aos direitos só pode ocorrer
através de lei, é que corroboro com autores como Toshio Mukai (Atuação Administrativa e Legislativa dos
Poderes Públicos em Matéria Ambiental, In: Interesse Público, ano 04, nº 15, julho/setembro, Fórum: Nota Dez,
2002, p. 117.) que afirma que o decreto nº 3.179 de 21 de setembro de 1999, que dispõe sobre as infrações e
sanções administrativas em matéria ambiental, é inconstitucional por restringir direitos e delimitar condutas por
um instrumento normativo que não é lei. Ainda o tipo infracionário ambiental deve ser bem definido, de modo
que o indivíduo possa ter a certeza que determinada conduta é proibida pelo Estado e caso a pratique será
sancionado pelo mesmo através da Administração Pública. Em Campos dos Goytacazes, Município do Estado do
Rio de Janeiro, a muito tempo vem implementando uma legislação ambiental para o seu cumprimento
constitucional de proteção ambiental, tanto que as infrações ambientais municipais é anterior a edição da Lei
9605 de 12 de fevereiro de 1998, mas atualmente a Lei Municipal 5419 de 29 de abril de 1993 apresenta-se com
algumas imperfeições que são compreendidas, tendo em vista a época de sua elaboração, na qual o direito
ambiental ainda era pouco estudado e desenvolvido, mas dentre as imperfeições da Lei Municipal está na
tipificação, já que algumas são imprecisas e de difícil estabelecimento entre a conduta e a norma, mas ainda é de
grande eficácia para o exercício do poder de polícia ambiental municipal e um avanço na proteção do ambiente,
uma vez que diversos Municípios ainda não possuem nenhum tipo de legislação municipal ambiental e o de
Campos dos Goytacazes já tem e aplica há aproximadamente 15 anos.
127

infraconstitucional já existem legislações que concedem à Administração Pública o


poder de impedir e sancionar as condutas contra o ambiente, sob o fundamento da
prevalência do interesse público, antes mesmo do advento da atual carta
constitucional, na qual posso mencionar os Códigos: Florestal; Proteção à Fauna;
Pesca e a Lei da Política Nacional de Meio Ambiente que acredito, veio ordenar a
relação entre os indivíduos e o ambiente, pautando tal lei sob fundamentos
ambientais. Com essa última surgem de forma ordenada alguns instrumentos de
proteção ambiental e que, conseqüentemente, representam no seu exercício atos de
poder de polícia ambiental, até porque visam controlar a utilização dos elementos
ambientais e, para isso, faz-se necessário que o Estado restrinja direitos em favor
dos interesses públicos, objetivando a fixação de uma ordem pública ambiental,
conforme aduz Paulo Bessa Antunes, que através do estabelecimento de padrões
de qualidade ambiental e condutas adequadas para os indivíduos e sendo a
Administração Pública, através do poder de polícia, responsável pela fiscalização e
sancionamento das condutas que violam as regras ambientais.318 Ressalto que os
instrumentos enunciados não são taxativos e nem impositivos, já que cabe a cada
ente federativo escolher qual dos instrumentos poderá ser efetivado em sua
competência e, ainda, poderá criar novos instrumentos para efetivação da proteção
ambiental em seu âmbito de atuação.319
Para que se torne efetivo o dever do Estado de manter a
ordem ambiental, através do seu poder de polícia, mediante atuação da
Administração Pública, é necessário que exista certa liberdade de atuação diante
das condutas dos administrados. Assim, para fazer cumprir e sancionar os que não
cumprem o ordenamento ambiental, a Administração Pública deve exercer o atributo
da auto-executoriedade, o qual permite que a mesma possa atuar independente de
ordem judicial320, sendo o atributo dividido na exigibilidade e na executoriedade. O
primeiro, corresponde a uma exigência que a Administração Pública faz aos seus
administrados, uma coação indireta para que se possa evitar um dano ambiental.

318
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, Op. cit., p. 136. Uma das principais atribuições do Direito
Ambiental é a de fixar parâmetros normativos capazes de estabelecer um patamar mínimo de salubridade
ambiental. A obediência e o respeito de tais patamares é o que significa a ordem pública do meio ambiente. A
ordem pública do meio ambiente é o cumprimento e a manutenção de tais padrões. Se os níveis ambientais
legalmente estabelecidos estiverem sendo observados, a ordem pública ambiental estará sendo cumprida. A
polícia do meio ambiente, no intuito de assegurar a obediência às normas ambientais, poderá agir
preventivamente ou repressivamente. A atuação preventiva ou repressiva faz-se mediante a utilização de
medidas de polícia ambiental.
319
DAWALIBI, Marcelo. O Poder de Polícia em Matéria Ambiental, Op. cit., p. 97.
128

Parece-me que é a aplicação dos princípios ambientais da precaução e da


prevenção, no exercício do poder de polícia ambiental, pois caso o administrado não
cumpra as exigências administrativas não poderá exercer uma possível conduta
almejada. Para melhor visualizar o tema deste estudo, esse atributo pode ser
percebido quando o administrado busca a outorga pela Administração Pública de
uma licença ambiental para o exercício de determinada atividade; mas, para obter o
alvará de licença, tem o dever de se submeter ao licenciamento ambiental, pois não
há outra forma legal de exercer a atividade, e ainda deve contribuir com a
Administração, apresentando documentos e informações necessárias, pois caso não
cumpra a exigência de apresentação será indeferido seu requerimento de licença
ambiental.321 Assim, evitando um dano maior com a implantação de uma atividade
que possa causar impactos e danos ambientais, a Administração Pública coage
indiretamente aos administrados a se submeterem as suas exigências, sob pena de
não conseguirem alcançar seus objetivos individuais. Já a executoriedade está
relacionada a uma coação direta exercida pela Administração Pública contra os
administrados, uma vez que compele a realizar um dever imposto, e caso não o
faça, a própria Administração Pública deverá fazer e se for preciso com o uso da
força para obter o fim desejado, que é a manutenção da ordem pública ambiental
através da prevalência dos interesses da coletividade.322 Dessa forma, também para
melhor visualização de tal atributo do poder de polícia ambiental, exemplificamos
através da possibilidade de interdição de atividade de significativo impacto ambiental
que opere sem licença ambiental, sem a qual a Administração Pública deve interditar
a atividade mediante lavratura de auto de infração e, caso não seja atendida, deve a
mesma diretamente realizar a interrupção da atividade para que evite ou interrompa
possíveis danos ambientais.
Ressalto que a executoriedade não é ilimitada, já que a
Administração Pública, visando manter a ordem pública ambiental e,
conseqüentemente, proteger um direito fundamental da pessoa humana, que é o

320
JUNIOR, José Cretella. Dos Atos Administrativos Especiais, 2ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 116.
321
BANUNAS, Ioberto Tatsch. Poder de Polícia Ambiental e o Município, Porto Alegre: Sulinas, 2004, p. 142.
322
JUNIOR, José Cretella. Dos Atos Administrativos Especiais, Op. cit., p. 121. Fundamenta-se a
executoriedade não só na natureza púbica da atividade que, por meio dos atos chamados executórios, a
Administração traduz sua vontade, como também na concretização rápida dos interesses coletivos, em benefício
dos quais se editam os referidos atos. A faculdade de exigir coativa e diretamente a execução dos próprios atos
deriva do conceito de poder de público e é essencial a este. Sem tal prerrogativa, o interesse público ficaria
equiparado e, por vezes, preterido, em face do interesse privado, ao mesmo tempo que a decisão do Estado seria
129

ambiente, não pode no exercício desse poder causar violação a outros direitos
também fundamentais e tão importantes de serem efetivados quanto o direito
ambiental. Daí a conduta da Administração Pública deve ser proporcional ao dano
que os administrados estão causando ou na iminência de causar ao ambiente e a
executoriedade tem de ser configurada como sendo a única ou a última medida a
ser exercida, não havendo outra de menor prejuízo ao administrado a ser tomada.323
Assim, a Administração Pública, através de seu poder de polícia, somente poderá
exercer um ato executório se este não vier a violar direitos fundamentais da pessoa
humana, uma vez que estaria agindo contra o interesse público que também é a
efetivação dos direitos fundamentais, não poderá em detrimento ao direito
fundamental de ter um ambiente equilibrado e sadio; esvaziar o âmbito de outros
direitos: o direito à moradia, à saúde, à educação, à liberdade e tanto outros direitos
consagrados. Acredito, que a Administração Pública tem total poder executório na
proteção ambiental se a conduta infracionária ainda não concretizou outro direito
fundamental e mais, cabe a mesma o dever de evitar que isso ocorra sob pena de
omissão, tendo em vista que o Estado terá de encontrar meios para equilibrar os
direitos fundamentais envolvidos e concretizados pela falta de ação de polícia
pretérita e tendo como possível técnica para a solução da situação de fato existente,
a ponderação de interesses, que não poderá excluir de forma absoluta um direito
fundamental em decorrência de outro, conforme explicitei no capítulo anterior.
Situação expositiva da questão foi enfrentada pelo Poder Judiciário do Rio de
Janeiro que julgou em primeira instância possível cometimento de dano ambiental
devido à construção de uma pousada na faixa marginal do rio Bela Joana, localizado
no Município de Campos dos Goytacazes, que teve como réus os proprietários da
área e da pousada, devido à construção em área de preservação permanente e, o
Município, por não ter coibido a construção e posteriormente não ter demolido,
através de um ato executório inerente ao seu poder de polícia. Acredito que a
sentença alcançou uma parte de seu objetivo, já que condenou os proprietários que
reparassem os possíveis danos ambientais causados com a construção, mandando
que os referidos réus demolissem a construção dando um depósito adequado ao
passivo da demolição e evitando, dessa forma, que permanecesse a violação ao

inócua, porque inoperante. O caráter público de “potestas administrativa” matiza o ato executório e dá-lhe a
força necessária para atuar, realizando a aspiração de grande parte da coletividade, da qual o Estado é intérprete.
323
MUKAI, Toshio. Atuação Administrativa e Legislativa dos Poderes Públicos em Matéria Ambiental, In:
Interesse Público, ano 04, nº 15, julho/setembro, Belo Horizonte - MG: Fórum, 2002, p. 117.
130

ordenamento jurídico, que não permite edificações nas áreas de preservação


ambiental. Mas entendo que a sentença foi infeliz, quando julgou improcedente o
pedido de condenação do Município por não ter demolido o imóvel quando em
construção, uma vez que se tivesse feito teria evitado a consumação de uma
situação de fato que deu ensejo à efetivação de outros direitos fundamentais de
caráter social e econômico, tendo em vista que o Município permitiu o término da
construção automaticamente. Entendo que perdeu seu poder de executoriedade
para poder demolir a construção terminada, já que se o fizesse violaria os outros
direitos fundamentais ali concretizados. Ao meu ver, o Município deveria ter sido
condenado por não ter tido uma conduta pautada pelo princípio da prevenção
ambiental, conforme foi estudado no primeiro capítulo.324
O poder de polícia ambiental possibilita a Administração
Pública a exigir dos indivíduos que se submetam a um procedimento administrativo
que visa ponderar interesses existentes para a implantação de determinadas
atividades que possam causar algum tipo de degradação ambiental. Esse
procedimento é o licenciamento ambiental, que, conforme já mencionei, é um
instrumento criado com a Lei da Política Nacional de Meio Ambiente e tem por
objetivo analisar os elementos envolvidos em determinados casos e ao final outorgar
ou não ao particular, através de um ato administrativo, a licença ambiental.

3. Licenciamento Ambiental no Brasil.

No Brasil o licenciamento ambiental existente, atualmente,


surge a partir da Lei da Política Nacional de Meio Ambiente325, e é um dos
instrumentos que o Poder Público tem para proteger e preservar o ambiente e assim
garantir a efetivação do direito fundamental ao ambiente saudável e equilibrado. O
licenciamento ambiental, no seu aspecto formal, é um instrumento que possibilita o
poder público, através da Administração Pública, exercer uma das facetas do seu
poder de polícia, uma vez que impõe a todos os que desejam ter implantada uma

324
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Ação Civil Pública, nº 2005.014.024771-2, 4ª Vara
Cível da Comarca de Campos dos Goytacazes, Juiz: Geraldo da Silva Batista, julgado em: 23 de agosto de 2007.
Disponível em: <http://www.tj.rj.gov.br>. Acesso em: 18 de ago. 2007.
325
BRASIL, Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981 – Dispõe sobre a
Política Nacional do Meio ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
providências. Disponível em <URL: http://www.planalto.gov.br> . Acesso em: 18 dez 2007. Art 9º - São
131

atividade ou um empreendimento que se submetam ao grifo do Estado, mas em seu


aspecto material esse instrumento serve para que a Administração Pública possa
reunir todos os valores e interesses inerentes aos direitos inseridos na possível
atividade ou empreendimento a ser implantado e exerça a técnica da ponderação,
auxiliando a interpretação jurídica para uma possível outorga ao particular. Tem por
objetivo ponderar outros direitos fundamentais envolvidos restringindo alguns, mas
visando à efetivação de todos na sua ideal medida diante de determinado caso
concreto.326 Dessa forma, compatibiliza com o direito ao ambiente, o econômico, o
social e principalmente o direito ao desenvolvimento todos direitos fundamentais
essenciais para o homem.327 Posso então afirmar que o licenciamento ambiental é
um instrumento de efetivação de direitos fundamentais, já que possibilita a inserção
ao máximo possível de todos os direitos fundamentais existentes em determinada
situação, de modo que não haja a exclusão de nenhum em detrimento de outro.
Trata-se de um instrumento de controle ambiental328, que
compatibiliza direitos essenciais que aparentemente encontram-se em conflito e por
tal cabe ao Estado solucionar o aparente conflito, através de alguma forma que
reúna todos os elementos necessários para o exercício da interpretação jurídica
auxiliada pela técnica da ponderação. Esses elementos, conforme referidos no
capítulo segundo, são necessários para a aplicação da ponderação. Assim, deve a
Administração Pública reunir os enunciados normativos incidentes, os fatos
relevantes e, ao final, compatibilizar os enunciados e fatos aparentemente
conflitantes da atividade ou empreendimento que visa ser licenciada, com o objetivo
de proporcionar a incidência e a existência de todos os direitos fundamentais

instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente: IV - o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou


potencialmente poluidoras;
326
FINK, Daniel Roberto. e MACEDO, André Camargo Horta de. Roteiro para Licenciamento Ambiental e
outras Considerações, In: FINK, Daniel Roberto.; JR, Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Op. cit., p. 03.
Assim, seu escopo maior é conciliar o desenvolvimento econômico com a preservação do meio ambiente, ambos
de vital importância para a vida da população. Esse procedimento, portanto não é um impedimento ao direito
constitucional de liberdade empresarial e à propriedade privada, mas, sim um limitador e condicionador, a fim de
que se impeça que o exercício ilimitado de um direito atinja outros também muito importantes.
327
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 534-535. Como ação típica e indelegável do Poder Executivo, o licenciamento
constitui importante instrumento de gestão do ambiente, na medida em que, por meio dele, a Administração
Pública busca exercer o necessário controle sobre as atividades humanas que interferem nas condições
ambientais, de forma a compatibilizar o desenvolvimento econômico com a preservação do equilíbrio ecológico.
Isto é, como obstáculo do poder de polícia administrativa, não deve ser considerado como obstáculo teimoso ao
desenvolvimento, porque este também é um ditame natural e anterior a qualquer legislação. Daí sua classificação
como “instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente”.
328
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 30. O licenciamento ambiental tem como objetivo efetuar o controle ambiental
das atividades efetiva e potencialmente poluidoras, através de um conjunto de procedimentos a serem
132

envolvidos no caso, mas cada um numa proporção ideal para determinada


situação.329
Em se tratando de um instrumento que se caracteriza como
sendo um exercício de polícia preventivo do Estado330, através da Administração
Pública, e por tal motivo, sua conduta deve ser pautada pelo princípio da legalidade.
Então, o licenciamento ambiental tem de ser precedido de lei que autorize o
exercício de tal instrumento. Assim, para que a Administração Pública possa
ponderar direitos fundamentais e interesses relacionados à determinada situação a
ser submetida ao licenciamento é extremamente necessária lei que conceda o poder
de restrição de direitos particulares em favor da coletividade. Daí, por se tratar de
uma limitação, somente o Poder Legislativo pode conceder, tendo em vista o Estado
Democrático de Direito que existe no Brasil, sendo impossível que o chefe do
Executivo venha através de decreto, limitar direitos individuais.331 Da mesma forma
por ser um instrumento de controle ambiental, o qual expressa uma competência
comum do poder público e, conseqüentemente, um dever executivo, consagrado no
enunciado constitucional, art. 23 VI, que demonstra que o exercício desse
instrumento é exclusivo da Administração Pública. Tal entendimento é pacífico,
tendo em vista o julgado do Supremo Tribunal Federal, que, ao julgar a ADIN nº
1506ES332, determinou ser da competência exclusiva da Administração Pública o

determinados pelo órgão administrativo de meio ambiente ecologicamente equilibrado e de defender a qualidade
de vida da coletividade.
329
BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional, Op. cit., p. 300 – 302.
330
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 533.
331
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, Op. cit., p. 268-269. Razoável, portanto,
concluir-se que as licenças, autorizações, aprovações prévias e permissões só possam ser criadas por lei ou a lei
deverá prever a sua instituição por outro meio infralegal. O decreto do Presidente da República, do Governador
do Estado ou do Prefeito Municipal somente poderá criar uma licença ambiental se a lei anterior expressamente
cometer-lhe tal tarefa. Da mesma forma, as licenças ambientais não podem ser instituídas por portaria do Ibama-
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, pelos órgãos públicos ambientais e
dos Estados e dos Municípios, pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA ou por outros conselhos.
332
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, ADI nº 1505 ES relator: Min. Eros Grau, j. 24/11/2004.
Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 26 dez. 2007. O Tribunal julgou procedente, em parte,
pedido de ação direta ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria – CNI contra o §3º do art. 187 da
Constituição do Estado do Espírito Santo, que determinou que o relatório de impacto ambiental relativo a
projetos de grande porte fosse submetido à apreciação de comissão permanente e específica da Assembléia
Legislativa local. Entendeu-se caracterizada a ofensa ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes,
já que a norma em questão conferiu ao Poder Legislativo prerrogativas exclusivas do Poder Executivo
(aprovação e concessão de licenciamento), ressaltando-se inexistir no texto constitucional atribuição de cunho
decisório às comissões parlamentares (art. 58, §2º). Declarou-se a inconstitucionalidade da expressão “e
submetida à apreciação da comissão permanente e específica da Assembléia Legislativa, devendo ser custeada
pelo interessado, proibida a participação de pessoas físicas ou jurídicas que atuaram na sua elaboração” contida
no dispositivo impugnado.
133

exercício do licenciamento ambiental, tendo em vista o respeito ao princípio da


independência e harmonia dos poderes.
Assim, para que a Administração Pública possa liberar a
implantação de uma atividade ou empreendimento que, de alguma forma, cause
degradação ambiental, deverá realizar um procedimento administrativo em que
reúna todos os elementos necessários para a interpretação ponderativa. Esse
procedimento é o licenciamento ambiental que, realizado pelo órgão competente da
Administração Pública, deverá analisar os direitos incidentes e compatibilizá-los,
através das restrições e medidas de controle de caráter ambiental, visando à
permanência de uma proporção adequada de todos os direitos incidentes e
aparentemente conflitantes, surgidos a partir do interesse de implantar a atividade
ou empreendimento.
Devido a essa necessidade de reunir vários elementos para
que se compatibilize os direitos, é que torna o licenciamento ambiental um
procedimento administrativo complexo, apesar de ser uno, no qual vários são os
agentes que podem auxiliar na decisão final do órgão ambiental competente. Além
disso, pode haver a inclusão do resultado de outros instrumentos de proteção
ambiental para instruir o procedimento administrativo333, que tem como fim verificar
se o objeto a ser licenciado está adequado para a sociedade e, após isso, se
outorga ou não a licença ambiental.334 Dentre os instrumentos possíveis, um dos
principais é o EIA/RIMA335 - que tem por objetivo analisar o custo benefício da
implantação da atividade ou empreendimento, mas não por uma visão somente

333
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 32-33.
334
FRAGA, Jesús Jordano. La Protección Del Derecho A Un Medio Ambiente Adecuado, Barcelona: J. M.
Bosch Editor, S.A., 1995, p. 249. Desde otro punto de vista, la autorización en el Derecho ambiental se
generaliza como acto condición de trato sucesivo, adquiriendo pleno carácter operativo. Los fines de
preservación han determinado una progresiva configuración dinámica de la autorización, que deja de ser un mero
acto aislado de control, para convertirse en un instituto configurador de parámetros de una conducta diferida en
el tiempo. Por último, la afección de derechos colectivos ha determinado la incorporación de elementos de
formación y control del posible acto autorizatorio, convirtiendo los trámites de información pública en
preceptivos y esenciales. La autorización en el Derecho ambiental ha dejado ser una relación bilateral (particular
ejercitante de una actividad potencialmente agresora del medio ambiente Administración) para convertirse en
multilateral. El otorgamiento de una autorización en el Derechos ambiental no es algo que sólo afecte a un
núcleo reducido de personas, sino que afecta directamente a la comunidad en su conjunto poseedora del derecho
a un medio ambiente adecuado. e FINK, Daniel Roberto. e MACEDO, André Camargo Horta de. Roteiro para
Licenciamento Ambiental e outras Considerações, In: FINK, Daniel Roberto.; JR, Hamilton Alonso e
DAWALIBI, Marcelo. Op. cit. p. 03.
335
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, Op. cit., p. 264. Os EIA são uma evolução das análises do
tipo custo/benefício, cujos objetivos básicos podem ser resumidos como uma análise custo/benefício do projeto,
tomando-se como parâmetro a repercussão sobre o meio ambiente.
134

econômica, mas principalmente por um foco socioambiental, no qual as


repercussões ambientais devem estar no centro do estudo.336
Os agentes integrantes do licenciamento ambiental que podem
intervir diretamente no procedimento de forma que possa contribuir para a reunião
de elementos necessários à interpretação são os integrantes do SISNAMA, já que
todos os entes da federação, de alguma forma, suportam os impactos advindos da
atividade ou empreendimento que se submete ao licenciamento, então todos podem
apresentar contribuições que influenciem no resultado final do licenciamento337. O
decreto nº 99.274/1990 que regulamenta parte da Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente em seu art.19 § 5º enuncia o dever do órgão licenciador federal de
considerar os estudos técnicos estaduais e municipais na análise do licenciamento
ambiental de âmbito federal. Ressalto que dentre os entes da federação, o único que
pode excluir a implantação de algum objeto de ser licenciado é o Município, uma vez
que é requisito inicial para a abertura do procedimento de licenciamento ambiental a
certidão de que o objeto a ser licenciado está de acordo com a legislação de uso e
ocupação do solo.338 Assim, lei municipal que não permita a possibilidade da
implantação de atividade ou empreendimento que, de alguma forma, possa causar
degradação ambiental será impossível o exercício do poder de polícia dos outros
entes, visando o licenciamento ambiental, pois o Município não permite a existência
da atividade ou empreendimento em seu território.
Necessariamente nem todos os objetos a serem licenciados
utilizaram os mesmo instrumentos, pois depende da potencialidade de degradação e
das características que envolvem a sua implantação. Dessa forma, o EIA/RIMA não
é obrigatório para todos os licenciamentos ambientais, mas somente àqueles casos
em que o objeto a ser licenciado é possivelmente causador de significativa
degradação ambiental. Enquanto que a obrigatoriedade do licenciamento é para

336
Acredito que o Estudo de Impacto Ambiental deve se restringir à única e exclusivamente analisar o custo
benefício da implantação, dando as alternativas possíveis para a implantação e as suas conseqüências e até
mesmo sugerir a não implantação, mas ao meu entender a decisão de compatibilizar os direitos existentes está
inserido no licenciamento, tendo em vista que o EIA/RIMA é um dos instrumentos que auxiliam e não o único.
Com isso o EIA/RIMA deve atender a patrões técnicos apresentando indicativos positivos e negativos que a
implantação causará no ambiente e na sociedade.
337
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 535. e FARIAS, Talden. Op. cit., p. 45.
338
FINK, Daniel Roberto. e MACEDO, André Camargo Horta de. Roteiro para Licenciamento Ambiental e
outras Considerações, In: FINK, Daniel Roberto.; JR, Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Op. cit., p. 05.
Deverá constar obrigatoriamente, entre os documentos que instruem o requerimento da licença ambiental, a
certidão da Prefeitura Municipal, declarando que aquele tipo de empreendimento e o respectivo local de sua
instalação estão de acordo com a legislação de uso e ocupação do solo. e FARIAS, Talden. Op. cit., p. 42.
135

todos os objetos que causem algum tipo de degradação ambiental, não importando
o nível de potencialidade de degradação, mas não se sabendo qual o nível de
degradação que determinado objeto poderá causar no ambiente, é prudente e com
base no princípio da precaução à realização do Estudo de Impacto Ambiental.
Assim, não se deve considerar que a realização do EIA/RIMA seja obrigatório para
todos os objetos a serem licenciados, a não ser que a legislação estadual ou
municipal, para os seus objetos, exija a obrigatoriedade de tal instrumento além dos
que provocam significativa degradação ambiental, como é o caso das Constituições
dos Estados do Ceará339, do Amazonas340 e do Pará.341

339
BRASIL, Constituição do Estado do Ceará. promulgada em: 05 de outubro de 1989. Disponível em:
<http://www.al.ce.gov.br>. Acesso em: 15 de abr. 2008. Art. 264. Qualquer obra ou atividade pública ou
privada, para as quais a Superintendência Estadual do Meio Ambiente – SEMACE, exigir Estudo de Impacto
Ambiental, deverá ter o parecer técnico apreciado pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente – COEMA, com a
publicação da resolução, aprovada ou não, publicada no Diário Oficial do Estado. *Com nova redação dada pela
Emenda Constitucional nº 22, de 14 de dezembro de 1991 - D.O. de 21.12.1991.
§ 1º A lei estabelecerá os tipos de obra ou atividades que podem ser potencialmente causadoras de significante
degradação do meio ambiente e/ou que comportem risco à vida e à qualidade de vida, e disporá sobre o Conselho
Estadual do Meio Ambiente, órgão subordinado diretamente ao Governador do Estado, em que é garantida a
participação da comunidade através das entidades representativas de classe de profissionais de nível superior das
áreas de engenharia, arquitetura, agronomia, biologia, medicina e direito.
§ 2º Só será licitada, aprovada ou executada a obra ou atividade, cujo relatório conclusivo do estudo prévio de
que trata o caput deste artigo, apreciado pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente, for favorável à licitação,
aprovação ou execução.
340
BRASIL, Constituição do Estado do Amazonas, promulgada em: 05 de outubro de 1989, Disponível em:
<http://www.aleam.gov.br>. Acesso em: 15 de abr. 2008. ART. 235. O estudo de impacto ambiental será parte
integrante e obrigatória do processo de licenciamento, além de outras exigências de ordem normativa ou legal,
nos casos de:
I - implantação de áreas ou pólos industriais ou agroindustriais;
II - alteração de uso de área objeto de zoneamento;
III - transformação de área rural em área urbana;
IV - área de expansão urbana;
V - implantação de projetos ou atividades potencialmente causadores de modificações significativas no meio
ambiente;
VI - outras, por determinação de normas do SISNAMA - Sistema Nacional de Meio Ambiente ou do Conselho
Estadual de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia.
§ 1º. A implantação, no território estadual, de usinas de energia nuclear, instalação de processamento e
armazenamento de material radioativo e implantação de unidades de grande porte, geradoras de energia
hidroelétrica, respeitadas as reservas estabelecidas em lei e áreas indígenas, de acordo com o disposto no art.
231, da Constituição da República, além da observância das normas e exigências legais e constitucionais, estarão
sujeitas ao que estabelece o art. 234, desta Constituição, ao parecer conclusivo do Conselho Estadual de Meio
Ambiente, Ciência e Tecnologia e, na hipótese de indicação favorável, aprovação por dois terços dos membros
da Assembléia Legislativa, após consulta plebiscitária aos habitantes da área onde se pretende implantar o
projeto.
§ 2º. Os estudos de previsão de impacto, para os casos de que trata o “caput” deste artigo, incluirão,
obrigatoriamente, as áreas em torno e de influência do empreendimento.
341
BRASIL, Constituição do Estado do Pará. promulgada em: 05 de outubro de 1989. Disponível em:
<http://www.pa.gov.br>. Acesso em: 15 de abr. 2008. Art. 255. Compete ao Estado a defesa, conservação,
preservação e controle do meio ambiente, cabendo-lhe:
§ 1°. Todo e qualquer plano, programa, projeto, atividade ou obra potencialmente causadora de desequilíbrio
ecológico ou de significativa degradação do meio ambiente, exigirá, na forma da lei, estudo prévio de impacto
ambiental e só será autorizada sua implantação, bem como liberado incentivo, financiamento ou aplicação de
136

Foi dito anteriormente que o licenciamento ambiental é um


instrumento de exercício prévio pela Administração Pública, mas de forma
excepcionalmente foi aceito para as atividades que já se encontravam em operação
antes da MP 2.163-41/2001 que incluiu o art. 79 – A342 na Lei de Crimes e Infrações
Ambientais, possibilitando que o empreendedor e o Poder Público pudessem
celebrar termo de ajustamento de conduta, que tinha como objetivo o
enquadramento das atividades às regras e medidas ambientais e conseqüentemente
a obtenção da licença ambiental. Tal medida foi objeto de Ação de

recursos públicos, após aprovação, na forma da legislação aplicável, pelo órgão técnico de controle ambiental do
Estado, ouvido o órgão de atuação colegiada de que trata o inciso VIII.
342
BRASIL, Lei de Crimes e Infrações Ambientais, Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998 – Dispõe sobre as
sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras
providências. Disponível em <URL: http://www.planalto.gov.br> . Acesso em: 18 dez 2007. Art. 79-A. Para o
cumprimento do disposto nesta Lei, os órgãos ambientais integrantes do SISNAMA, responsáveis pela execução
de programas e projetos e pelo controle e fiscalização dos estabelecimentos e das atividades suscetíveis de
degradarem a qualidade ambiental, ficam autorizados a celebrar, com força de título executivo extrajudicial,
termo de compromisso com pessoas físicas ou jurídicas responsáveis pela construção, instalação, ampliação e
funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou
potencialmente poluidores. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001)
§ 1o O termo de compromisso a que se refere este artigo destinar-se-á, exclusivamente, a permitir que as pessoas
físicas e jurídicas mencionadas no caput possam promover as necessárias correções de suas atividades, para o
atendimento das exigências impostas pelas autoridades ambientais competentes, sendo obrigatório que o
respectivo instrumento disponha sobre: (Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) I - o nome,
a qualificação e o endereço das partes compromissadas e dos respectivos representantes legais; (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) II - o prazo de vigência do compromisso, que, em função da
complexidade das obrigações nele fixadas, poderá variar entre o mínimo de noventa dias e o máximo de três
anos, com possibilidade de prorrogação por igual período; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41, de
23.8.2001) III - a descrição detalhada de seu objeto, o valor do investimento previsto e o cronograma físico de
execução e de implantação das obras e serviços exigidos, com metas trimestrais a serem atingidas; (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) IV - as multas que podem ser aplicadas à pessoa física ou jurídica
compromissada e os casos de rescisão, em decorrência do não-cumprimento das obrigações nele pactuadas;
(Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) V - o valor da multa de que trata o inciso IV não
poderá ser superior ao valor do investimento previsto; (Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41, de
23.8.2001) VI - o foro competente para dirimir litígios entre as partes. (Incluído pela Medida Provisória nº
2.163-41, de 23.8.2001) § 2o No tocante aos empreendimentos em curso até o dia 30 de março de 1998,
envolvendo construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de
recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores, a assinatura do termo de compromisso
deverá ser requerida pelas pessoas físicas e jurídicas interessadas, até o dia 31 de dezembro de 1998, mediante
requerimento escrito protocolizado junto aos órgãos competentes do SISNAMA, devendo ser firmado pelo
dirigente máximo do estabelecimento. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) § 3o Da data
da protocolização do requerimento previsto no § 2o e enquanto perdurar a vigência do correspondente termo de
compromisso, ficarão suspensas, em relação aos fatos que deram causa à celebração do instrumento, a aplicação
de sanções administrativas contra a pessoa física ou jurídica que o houver firmado. (Incluído pela Medida
Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) § 4o A celebração do termo de compromisso de que trata este artigo não
impede a execução de eventuais multas aplicadas antes da protocolização do requerimento. (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) § 5o Considera-se rescindido de pleno direito o termo de
compromisso, quando descumprida qualquer de suas cláusulas, ressalvado o caso fortuito ou de força maior.
(Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) § 6o O termo de compromisso deverá ser firmado
em até noventa dias, contados da protocolização do requerimento. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41,
de 23.8.2001) § 7o O requerimento de celebração do termo de compromisso deverá conter as informações
necessárias à verificação da sua viabilidade técnica e jurídica, sob pena de indeferimento do plano. (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.163-41, de 23.8.2001) § 8o Sob pena de ineficácia, os termos de compromisso deverão
137

Inconstitucionalidade, tendo em vista que os requerentes entendiam que a medida


provisória estaria violando o art. 225, §1º, I,II, III, IV, V, VII e §3º da Constituição
Federal além de afrontar o princípio da reserva legal e normas de competência em
matéria ambiental. Esse entendimento fundamentou-se pelo fato de a medida
provisória ter possibilitado a realização de termo de ajustamento de conduta entre o
Poder Público e empreendedores que não tinham suas atividades licenciadas e, com
isso, os órgãos públicos ambientais estariam contribuindo, dessa forma, para a
degradação ambiental. Alegavam ainda que a referida medida ofendia o princípio da
proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que, em favor de interesses
econômicos afastava-se a proteção ambiental e conseqüentemente um direito
fundamental essencial para a pessoa humana. Ao final, a referida medida provisória
foi julgada constitucional, permanecendo a possibilidade de realização de termo de
compromisso para as atividades que já se encontravam em operação na época de
sua edição, pois o Ministro-Relator visualizou a necessidade de ponderar os direitos
envolvidos, tendo em vista que a suspensão imediata das atividades que se
encontravam em operação corresponderia em uma violação aos direitos
fundamentais de caráter social e que era necessário que o ordenamento jurídico
oferecesse alguma forma de transição para que pudesse compatibilizar a
permanência das atividades já existentes e a proteção ambiental.343
Afirmo ainda que o procedimento do licenciamento ambiental é
uno, mas com etapas separadas devido a sua complexidade, visto que são
analisados determinados elementos ambientais em cada etapa, e após a aprovação

ser publicados no órgão oficial competente, mediante extrato. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.163-41, de
23.8.2001)
343
BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, ADI 2083-8DF, relator: Min. Moreira Alves, j.
03/08/2000. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 28 de dez. 2007. Como se vê das informações,
elas sustentam a constitucionalidade das demais normas do dispositivo ora atacado sob o fundamento de que elas
também têm a natureza de normas de transição, uma vez que “o mencionado Termo de Compromisso vem a ser
um instrumento que permitirá ao empreendedor estabelecer cronograma para o cumprimento de etapas de
adequação do seu empreendimento aos novos padrões ambientais ora exigidos, submetidos à fiscalização pelos
órgãos de gestão da Política Ambiental, desde sua implantação e cumprimento, sujeitando-se, no caso de
descumprimento, à imediata aplicação das multas previstas na Lei de Crimes Ambientais”, e isso porque, para
manter-se “a ordem social, tendo por base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça social,
´rescritos que estão nas Disposições Gerais, da Ordem Social, prevista no art. 193 e seguintes da Carta Magna”,
“não se pode, da noite para o dia se interditar fábricas, um sem número de empreendimentos e atividades
geradoras de impostos, empregos, que a norma tachou, de uma hora para outra ilegais, desconsiderando o
Princípio do Direito Adquirido, previsto no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição”, o que acarreta, inclusive,
que “a urgência da questão tratada na indigitada Medida Provisória é latente, porquanto diz respeito à premente
necessidade de se estabelecer um mecanismo de transição”. Sob esse prisma de norma de transição, essas
ponderações do requerido retiram, nesse exame preliminar, a força da relevância da fundamentação da argüição
de inconstitucionalidade que é necessária para a concessão dessa medida excepcional que é a liminar em ação
direta.
138

de cada etapa, o interessado tem direito à outorga de uma licença ambiental com
prazo de validade determinada. Tais etapas são divididas em três e,
conseqüentemente, para que a atividade ou empreendimento venha a ser
implantado é necessária a outorga das três licenças, mas todas estão interligadas a
um mesmo fim que é a liberação, pelo Poder Público, do exercício de alguma
atividade ou empreendimento, que possam, de alguma forma, causar degradação
ambiental após a análise dos direitos essenciais da pessoa humana envolvidos no
objeto requerido. Assim, posso afirmar que o licenciamento ambiental é um
instrumento de controle ambiental estabelecido pela Política Nacional de Meio
Ambiente que visa, através de um procedimento administrativo uno e complexo
exercido exclusivamente pela Administração Pública, compatibilizar, através da
técnica interpretativa da ponderação, os direitos fundamentais da pessoa humana
que encontram-se aparentemente em conflito, objetivando a efetivação dos direitos
em sua maior proporção possível e tendo como referencial a proteção dos aspectos
ambientais.

3.1 – O Procedimento Administrativo do Licenciamento Ambiental

Apesar deste estudo não ter por objetivo aprofundar as


questões procedimentais do licenciamento ambiental, mas em seus aspectos
materiais e na sua constitucionalização, tendo em vista ser um instrumento de
efetivação de direitos fundamentais, acredito, mesmo assim, ser necessário alguns
apontamentos a respeito do procedimento administrativo do licenciamento
ambiental, explicitando suas principais etapas e características e de que forma o
ordenamento jurídico positivo brasileiro vem disciplinando o procedimento para se
ter aprovada ou reprovada344 a implantação de uma atividade ou empreendimento,
que irá utilizar bens ambientais ou poderá causar algum tipo de degradação
ambiental.
A Política Nacional de Meio Ambiente instituiu o licenciamento
ambiental como um instrumento de controle ambiental. Em seu art. 9º, IV e

344
ANTUNES, Paulo de Bessa. A Proteção Ambiental nas Atividades de Exploração e Produção de Petróleo
Aspectos Jurídicos, Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 81. O procedimento de licenciamento ambiental
admite que, se indeferida a licença, o empreendedor possa apresentar recurso perante o órgão ambiental,
podendo chegar ao Ministro de Meio Ambiente.
139

posteriormente no art. 10345 dispôs as principais características dos objetos que


devem se submeter ao referido instrumento e, ainda, explicitou questões referentes
à competência para o exercício do licenciamento, mas o detalhamento do
procedimento para obtenção da licença ambiental só veio a ser normatizado através
do Decreto nº 99.274 de 06 de julho de 1990 que regulamentou a Política Nacional
de Meio Ambiente, e conseqüentemente, os procedimentos e etapas necessárias
para o devido licenciamento ambiental. Posteriormente, o CONAMA editou a
resolução 237, de 19 de dezembro de 1997, que estabeleceu critérios referentes ao
licenciamento ambiental. Os procedimentos ambientais, regulamentados tanto pelo
decreto como pela resolução, são obrigatórios para o licenciamento dos objetos de
competência da União, devendo os outros entes licenciadores estabelecerem
procedimentos próprios para os objetos de sua competência346, tendo em vista que,
caso se entenda obrigatória a adoção desse procedimento para todos os objetos a
serem licenciados, ocorreria flagrante violação do princípio da autonomia dos entes
federativos. Assim, para esta etapa do estudo, utilizarei o procedimento geral federal
para o licenciamento ambiental.347
Em se tratando de um procedimento uno e complexo e mais
ainda de alta complexidade técnica, o licenciamento ambiental é divido em sua
maioria em três etapas, cada uma com sua respectiva licença ambiental. Sendo as
duas primeiras de caráter preliminar e, a última, final e definitiva até o término do

345
BRASIL, Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981 – Dispõe sobre a
Política Nacional do Meio ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
providências. Disponível em <URL: http://www.planalto.gov.br> Acesso em: 18 dez 2007. Art. 10 - A
construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos
ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de
causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do
Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos
Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis. (Redação dada
pela Lei nº 7.804, de 1989). § 1º - Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão
publicados no jornal oficial do Estado, bem como em um periódico regional ou local de grande circulação. § 2º
Nos casos e prazos previstos em resolução do CONAMA, o licenciamento de que trata este artigo dependerá de
homologação do IBAMA. (Redação dada pela Lei nº 7.804, de 1989). § 3º O órgão estadual do meio ambiente e
o IBAMA, esta em caráter supletivo, poderão, se necessário e sem prejuízo das penalidades pecuniárias cabíveis,
determinar a redução das atividades geradoras de poluição, para manter as emissões gasosas, os efluentes
líquidos e os resíduos sólidos dentro das condições e limites estipulados no licenciamento concedido. (Redação
dada pela Lei nº 7.804, de 1989). § 4º Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis - IBAMA o licenciamento previsto no caput deste artigo, no caso de atividades e obras com
significativo impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional. (Redação dada pela Lei nº 7.804, de 1989)
346
TRENNEPOHL, Curt. e TRENNEPOHL, Terence. Op. cit., p. 13-14.
347
Além dos procedimentos apresentados pelo Decreto nº 99.274/99 e da resolução CONAMA nº 237/97,
existem outros procedimentos específicos para o licenciamento ambiental, como é o caso dos empreendimentos
elétricos com pequeno potencial de impacto ambiental – Resolução 279 de 27 de junho de 2001; os referentes ao
140

prazo, o qual o empreendedor somente será obrigado a renovar a última licença.348


Assim, após o cumprimento dos requisitos necessários para a obtenção da licença e
sendo a análise favorável ao que tange aos aspectos ambientais, já que o
empreendedor cumpriu todas as exigências técnicas e jurídicas para causar o menor
impacto possível, a Administração Pública é obrigada a expedir a licença ambiental
da etapa que a atividade ou empreendimento foram analisados.349
O art. 19 do Decreto nº 99.274/99 enuncia as três etapas e
conseqüentemente as três licenças necessárias para a implantação e exercício de
quase todas as atividades que utilizam ou possam causar degradação nos bens
ambientais que são: o Licenciamento Prévio, o de Instalação e Operação cada um
com sua respectiva licença, sendo o primeiro uma etapa de análise do planejamento
e da viabilidade técnica no que se refere à utilização do solo, observando os planos
dos entes da federação no tocante ao parcelamento e ocupação do solo.350 No
segundo, trata-se de uma etapa de análise dos projetos apresentados e sua
conformidade com os padrões de qualidade ambiental e, por fim, o terceiro
procedimento, caracteriza-se por ser uma etapa na qual depois de cumprida todas
as exigências das anteriores e sendo a maioria dos elementos integrantes do
licenciamento favoráveis ao exercício da atividade ou empreendimento, concede-se
a licença de operação.351 Dentre essas etapas, ocorre uma série de análises e
apresentações de documentos para auxiliar o órgão licenciador no seu dever de
compatibilizar os direitos envolvidos e aparentemente conflitantes. O art. 10 da
Resolução CONAMA 237/97 expõe uma relação mínima de diretrizes para a
obtenção da licença ambiental, que são: I - Definição pelo órgão ambiental
competente, com a participação do empreendedor, dos documentos, projetos e

licenciamento de estabelecimentos destinados ao recebimento de embalagens vazias de agrotóxicos – Resolução


334 de 03 de abril de 2003;
348
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, Op. cit., p. 144. FARIAS, Talden. Op. cit., p. 78. O
licenciamento ambiental não é composto de uma única fase ou ato, mas de uma seqüência de fases ou atos
diretamente relacionados, que têm como objetivo verificar se uma determinada atividade está efetivamente
adequada aos padrões de qualidade ambiental prescritos pela legislação ou pelo órgão ambiental competente.
Contudo, ainda que dividido em etapas diferenciadas, não se pode esquecer que é o licenciamento ambiental um
único processo administrativo.
349
FINK, Daniel Roberto. e MACEDO, André Camargo Horta de. Roteiro para Licenciamento Ambiental e
outras Considerações, In: FINK, Daniel Roberto.; JR, Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Op. cit., p. 09.
Vencidas todas as etapas do procedimento, será concedida ou não a licença ambiental. E, esse ponto, é muito
importante ressaltar que, cumprindo o empreendedor todas as exigências legais e técnicas inerentes ao
empreendimento e ao próprio licenciamento, fará jus a licença ambiental, a qual não poderá ser negada pelo
Poder Público, sendo portando, vinculada.
Vale dizer, o licenciamento é condicionante da atividade, e não impeditivo.
350
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 80.
141

estudos ambientais, necessários ao início do processo de licenciamento


correspondente à licença a ser requerida; II - Requerimento da licença ambiental
pelo empreendedor, acompanhado dos documentos, projetos e estudos ambientais
pertinentes, dando-se a devida publicidade; III - Análise pelo órgão ambiental
competente, integrante do SISNAMA, dos documentos, projetos e estudos
ambientais apresentados e a realização de vistorias técnicas, quando necessárias;
IV - Solicitação de esclarecimentos e complementações pelo órgão ambiental
competente integrante do SISNAMA, uma única vez, em decorrência da análise dos
documentos, projetos e estudos ambientais apresentados, quando couber, podendo
haver a reiteração da mesma solicitação caso os esclarecimentos e
complementações não tenham sido satisfatórios; V - Audiência pública, quando
couber, de acordo com a regulamentação pertinente; VI - Solicitação de
esclarecimentos e complementações pelo órgão ambiental competente, decorrentes
de audiências públicas, quando couber, podendo haver reiteração da solicitação
quando os esclarecimentos e complementações não tenham sido satisfatórios; VII -
Emissão de parecer técnico conclusivo e, quando couber, parecer jurídico; VIII -
Deferimento ou indeferimento do pedido de licença, dando-se a devida
publicidade.352 Trata-se de diretrizes mínimas para serem observadas durante o
licenciamento, uma vez que o CONAMA estabelece normas gerais sobre o
licenciamento ambiental, podendo os outros entes licenciadores estabelecerem
normas específicas com características próprias, da mesma forma que as leis e os
decretos federais deverão regulamentar normas gerais, deixando as específicas
para os outros entes.353 Dessa forma, as diretrizes expostas conduzem a um mínimo
necessário que deve existir em todos os procedimentos. Vejo que é necessário que
o intérprete observe o conteúdo da norma regulamentada a nível federal, pois o
mesmo documento normativo que regulamenta normas gerais, também regulamenta
o procedimento de licenciamento ambiental a nível federal e que, nesse caso,
apresenta certas especificidades. Como exemplo posso citar o prazo de validade
das licenças, que foi estabelecido pela Resolução CONAMA 237/97, em seu art.

351
Ibidem, p. 86-88.
352
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 237 de 19 de dezembro de 1997.
Disponível em <URL: http://www.conama.gov.br> Acesso em: 18 dez 2007.
353
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, Op. cit., p. 276
142

18354, o qual determina que a validade da licença de operação é de no mínimo 4 e


no máximo 10 anos, e a de instalação não poderá ser superior a 6 anos e, por fim, a
prévia não ultrapassará 4 anos. Acredito que o CONAMA, quando estabeleceu o
prazo máximo, afirmou que qualquer atividade independente do nível de impacto
que possa produzir deve ser revista nesse prazo, tendo em vista que, ultrapassado
esse período máximo, o ambiente poderá ser prejudicado pela incerteza da
compatibilidade da atividade com a proteção ambiental, apresentando-se como clara
aplicação do princípio da prevenção e precaução que norteia todo o ordenamento
jurídico como sendo princípio basilar do direito ambiental. Sendo assim, o
estabelecimento pelo CONAMA de um prazo máximo para as licenças ambientais é
claramente uma regra geral, podendo o outro ente federativo, no exercício do
licenciamento que lhe couber, reduzir esse prazo máximo para as atividades e
empreendimentos a serem licenciados por ele. Diferentemente ocorre no que tange
ao estabelecimento de um prazo mínimo de validade da licença de operação, já que
condiciona outro ente à validade mínima da licença das atividades que vier a
licenciar, que não é adequado, uma vez que tal prazo mínimo pode ser superior ao
adequado para a revisão. Não poderia o CONAMA regulamentar uma norma que
viesse a influenciar o procedimento em outro ente federativo, tendo em vista que não
saberiam quais as atividades poderiam vir a ser licenciadas. Assim sendo, o prazo
mínimo para a licença de operação contida na resolução CONAMA 237/97 é um
prazo específico para os licenciamentos de âmbito federal. É importante atentar, que

354
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 237 de 19 de dezembro de 1997.
Disponível em <URL: http://www.conama.gov.br> Acesso em: 18 dez 2007. Art. 18. O órgão ambiental
competente estabelecerá os prazos de validade de cada tipo de licença, especificando-os no respectivo
documento, levando em consideração os seguintes aspectos: I - O prazo de validade da Licença Prévia (LP)
deverá ser, no mínimo, o estabelecido pelo cronograma de elaboração dos planos, programas e projetos relativos
ao empreendimento ou atividade, não podendo ser superior a 5 (cinco) anos. II - O prazo de validade da Licença
de Instalação (LI) deverá ser, no mínimo, o estabelecido pelo cronograma de instalação do empreendimento ou
atividade, não podendo ser superior a 6 (seis) anos. III - O prazo de validade da Licença de Operação (LO)
deverá considerar os planos de controle ambiental e será de, no mínimo, 4 (quatro) anos e, no máximo, 10 (dez)
anos. § 1o A Licença Prévia (LP) e a Licença de Instalação (LI) poderão ter os prazos de validade prorrogados,
desde que não ultrapassem os prazos máximos estabelecidos nos incisos I e II. § 2o O órgão ambiental
competente poderá estabelecer prazos de validade específicos para a Licença de Operação (LO) de
empreendimentos ou atividades que, por sua natureza e peculiaridades, estejam sujeitos a encerramento ou
modificação em prazos inferiores. § 3o Na renovação da Licença de Operação (LO) de uma atividade ou
empreendimento, o órgão ambiental competente poderá, mediante decisão motivada, aumentar ou diminuir o seu
prazo de validade, após avaliação do desempenho ambiental da atividade ou empreendimento no período de
vigência anterior, respeitados os limites estabelecidos no inciso III. § 4o A renovação da Licença de Operação
(LO) de uma atividade ou empreendimento deverá ser requerida com antecedência mínima de 120 (cento e vinte)
dias da expiração de seu prazo de validade, fixado na respectiva licença, ficando este automaticamente
prorrogado até a manifestação definitiva do órgão ambiental competente.
143

a nível geral deve, o legislador federal regulamentar normas que assegurem um


mínimo necessário para a proteção ambiental que deve ser seguido pelos Estados-
membros e Municípios e conseqüentemente evitar uma concorrência entre esses,
tendo em vista a liberdade de estabelecer parâmetros mínimos, além desse dever,
cabe dar liberdade aos mesmos para regulamentar critérios e parâmetros de melhor
proteção.355
Outro dever do licenciamento ambiental e, nesse caso, em
todos os níveis da Federação, é o de dar publicidade das informações contidas no
procedimento de licenciamento, tal dever encontra-se em todos os âmbitos do
Estado, pois corresponde a uma necessidade imposta pelo princípio da participação,
uma vez que a informação é necessária para que a coletividade possa opinar na
compatibilização dos direitos envolvidos com a implantação de alguma atividade ou
empreendimento, questionando os possíveis impactos que irão ao final suportar, e
até, proporcionando que os mesmos possam evitar a implantação através de medida
judicial, por considerar que serão vítimas futuras com a outorga da licença
ambiental.356 Dessa forma, Paulo Affonso Leme Machado explicita que, para a
efetivação do dever de informação e posteriormente sua publicação, há a
necessidade de o empreendedor fornecer todas as informações necessárias,
independente de entender ser oportuna, mas que forneça o que lhe for solicitado.
Posteriormente o dever do órgão público responsável pela análise cumpre seu dever
de estudar as informações recebidas de forma crítica e, por fim, surge o dever de o
Poder Público de fornecer todas as informações legalmente possíveis, independente
de solicitação, pois entendo que é um dever dele proporcionar a informação através
de sua publicação para toda a coletividade, e tal ato se justifica por se tratar de um
bem de todos.357
Em relação ao licenciamento ambiental, a Lei da Política
Nacional de Meio Ambiente358 determinou que determinados atos do procedimento

355
ANTUNES, Paulo de Bessa. Federalismo e Competências Ambientais no Brasil, Op. cit., p. 165.
Efetivamente, em matéria ambiental, duas ordens de preocupações devem estar presentes, seja para o legislador,
seja para o intérprete da norma: (i) há a necessidade de que a legislação de proteção ao meio ambiente assegure
níveis nacionais mínimos de tutela ambiental, evitando-se que a possibilidade de poluir mais seja um
diferenciador competitivo entre os estados e municípios e (ii) que a proteção ambiental feita localmente seja
capaz de gerar melhores resultados.
356
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, Op. cit., p. 179.
357
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente, São Paulo: Malheiros, 2006, p.
181-182.
358
BRASIL, Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981 – Dispõe sobre a
Política Nacional do Meio ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
144

de licenciamento deverão ser publicados de forma abrangente, utilizando tanto a


imprensa oficial como também a regional e a local. Evidente que esses atos
correspondem a um dever de publicação do Poder Público, mas a prestação de
informações pode ocorrer a qualquer tempo independente de disposição legal
quanto ao seu momento. A Lei supracitada determinou quais os atos do
procedimento devem ser publicados, resumindo-os em três etapas359, mas não
determinou quais dos atos poderiam ser informados, até porque não poderia ser de
outra forma, pois a informação é parte integrante e essencial para a correta análise
dos elementos que compõem o licenciamento ambiental, sendo uma das formas de
efetivação do princípio da participação, sobre o qual já mencionei. É claro que os
outros entes da Federação também poderão estabelecer etapas que devem ser
publicadas durante o licenciamento dos objetos de sua atribuição, já que a lei
federal, nesse caso, estabelece o mínimo de publicação, além de efetivar o princípio
da publicidade do Direito Administrativo que não pode ser afastado, já que se trata
de um procedimento administrativo ambiental promovido pelo Poder Público através
da Administração Pública.
Buscando contribuir para efetivação do dever de informar, foi
publicada a Lei nº 10.650/2003360, que dispõe sobre a obrigatoriedade de se
proporcionar acesso às informações e à publicação das mesmas quando tiverem
alguma ligação com os aspectos ambientais. Na verdade, a lei surge para
regulamentar o direito constitucional à informação e à publicidade dos atos públicos
e, além disso, entende Paulo Affonso Leme Machado que, cabe ao Poder Público

providências. Disponível em <URL: http://www.planalto.gov.br> Acesso em: 18 dez 2007. Art. 10 - A


construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos
ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de
causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do
Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos
Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis. (Redação dada
pela Lei nº 7.804, de 1989). § 1º - Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão
publicados no jornal oficial do Estado, bem como em um periódico regional ou local de grande circulação.
359
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente, Op. cit., p. 182 - 183. A lei
brasileira estabeleceu três momentos para que sobre uma mesma atividade ou um mesmo estabelecimento haja
comunicação ao público. Primeiro, quando é pedido o licenciamento, quando se saberá o local onde fica o
empreendimento, o tipo ou a natureza da atividade ou estabelecimento. Ao ser ter conhecimento do início do
licenciamento, as pessoas e as organizações não-governamentais poderão acompanhar o procedimento, inclusive,
quando for o caso, o Estudo de Prévio de Impacto Ambiental. Segundo, pedindo-se a renovação de um
licenciamento, para que possa o público apontar razões para a conveniência, ou não, de um novo licenciamento.
Terceiro, a concessão do licenciamento deve ser publicada, para que se saiba quais os motivos dados para o
deferimento do pedido.
360
BRASIL, Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei nº 10.650 de 16 de abril de 2003 – Dispõe sobre o
acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do Sisnama. Disponível em
<URL: http://www.planalto.gov.br> Acesso em: 05 de jan. 2008.
145

quando não tiver as informações, buscá-las para que possa informar a coletividade
sobre as possíveis ameaças ao ambiente e, dessa forma, evita-se que, por falta de
informação, não se exerça o dever constitucional. É flagrante que a referida norma
insere o princípio da precaução quando exige que se busque a informação para que
possa informar, sendo proibido informar que não há nada para ser informado.361
Em relação ao licenciamento ambiental, a referida lei obriga os
órgãos públicos a permitir o acesso às informações contidas nos procedimentos
administrativos que tenham o ambiente como um dos elementos de análise e, por
tal, como o licenciamento ambiental é um procedimento administrativo, o acesso a
suas informações é livre, a não ser que haja restrições legais a determinados atos,
mas não ao procedimento completo e, além de o Poder Público possibilitar o acesso,
deve ele fornecer a toda a coletividade as informações necessárias para a sua
participação nos procedimentos administrativos ambientais, como é o caso do
licenciamento ambiental.362 Acredito que o direito às informações ambientais no
licenciamento divide-se em três possibilidades distintas, pelas quais uma é o dever
do Poder Público de proceder às informações obrigadas pelo ordenamento positivo,
através de publicação, outra, a que possibilita a publicação das informações que
entender necessárias; por último, fornecer todas as informações contidas no
procedimento de licenciamento ambiental, que não forem proibidas por lei aos que
requererem, independente de comprovação de interesse, uma vez que a
preservação e proteção ambiental é naturalmente um interesse de toda a
coletividade.

3.2 A Natureza Jurídica da Licença Ambiental

Importante também, para este estudo, é apontar qual a


natureza jurídica do ato que finaliza o procedimento do licenciamento ambiental,
quando é positiva para a implantação de uma atividade ou empreendimento, que é a
licença ambiental que corresponde a um ato administrativo que outorga ao particular

361
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente, Op. cit., p. 205. O Poder Público
deve informar sobre as matérias que lhe compete controlar ou fiscalizar. Não pode desculpar-se por não informar
alegando que não detém as informações. A admissão dessa desculpa significaria a concordância com o
descumprimento da obrigação constitucional, pois a omissão governamental se tornaria praxe. Além do mais,
abre-se uma porta para a conivência do Poder Público com os agressores da Natureza e com os poluidores,
estimulando-se os órgãos públicos a não saber, para não informar.
146

o exercício de alguma conduta que possa utilizar os recursos ambientais ou que


possa de alguma forma impactá-los.363 Assim, a licença ambiental é o último ato que
a Administração Pública realiza no licenciamento ambiental, mas, apesar de o
enunciado normativo ter denominado que o particular, para implantar qualquer
atividade ou empreendimento que utilize de recursos ambientais, ou crie impactos ao
ambiente, deve se submeter ao licenciamento ambiental. O ato da licença ambiental
não tem pacificado a sua natureza, uma vez que alguns autores entendem que se
trata de verdadeira autorização administrativa em matéria ambiental364, enquanto
outros afirmam se tratar de licença administrativa com características próprias do
Direito Ambiental365, que ocasiona algumas alterações dos elementos das licenças
administrativas tradicionais, mas não chegam a descaracterizá-la ao ponto de ter a
natureza de autorização.366
Uma das críticas evidencia que o ato administrativo final do
licenciamento ambiental tem natureza de autorização devido à discricionariedade367
e da falta de definitividade, que correspondem a duas características das
autorizações do Direito Administrativo, conforme aduz o espanhol Jesús Jordano

362
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 558. e MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à Informação e Meio
Ambiente, Op. cit., p. 206-208.
363
FRAGA, Jesús Jordano. Op. cit., p. 243. Mediante las técnicas autorizatorias se pretende controlar las
actividades potencialmente agresoras al medio ambiente antes de que éstas comiencen. Las autorizaciones en el
Derecho ambiental a menudo no persiguem controlar las actividades potencialmente agresoras sólo ab initio,
sino que extienden esa voluntad de control al ejercicio sucesivo de la actividad autorizada de que se trate.
364
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente, Op. cit., p. 266-267; MUKAI,
Toshio. Direito Ambiental Sistematizado, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998, p. 80- 81. e
TRENNEPOHL, Curt. e TRENNEPOHL, Terence. Op. cit., p. 13.
365
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 242. A licença ambiental tem uma natureza jurídica própria e possui
características específicas que a diferenciam tanto da licença administrativa quanto da autorização, pois caso se
admitisse que a licença ambiental é uma autorização e que por conseqüência pudesse ser revogada a qualquer
momento pela simples discricionariedade da Administração Pública, não existiria segurança jurídica para as
atividades econômicas de uma maneira geral. Por outro lado, querer que a licença ambiental se perpetue no
tempo seria legalizar a degradação ambiental e instituir o direito adquirido a degradar o meio ambiente e a ir de
encontro à qualidade de vida da coletividade.
366
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 537-539; ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, Op. cit., p. 140;
BRAGA, Rodrigo Bernardes. Considerações sobre o Direito Adquirido em Matéria Ambiental, Revista de
Direito Ambiental, nº 35, São Paulo: RT, 2004, p. 88; FINK, Daniel Roberto. e MACEDO, André Camargo
Horta de. Roteiro para Licenciamento Ambiental e outras Considerações, In: FINK, Daniel Roberto.; JR,
Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Op. cit., p. 15. e DAWALIBI, Marcelo. Licença ou Autorização
Ambiental?, Revista de Direito Ambiental, nº 17, São Paulo: RT, 2000, p. 187.
367
JUNIOR, José Cretella. Dos Atos Administrativos Especiais, Op. cit., p. 153. Possibilita o poder
discricionário certa margem de desvinculação do agente, permitindo-lhe a formulação de juízos de valor, síntese
convergente de uma série infinita de operações emotivo-intelectivas, que dão como resultado, na prática, ao
pronunciamento administrativo, ação ou inércia, palavra ou silêncio, consubstanciada, muitas vezes, a conduta,
em seu momento final, no ato administrativo discricionário. O agente administrativo deve ter sensibilidade para
ajustar a ação administrativa ao meio.
147

Fraga368, tendo em vista que os autores que defendem que se trata de uma
autorização entendem que a licença ambiental é discricionária e precária, pois pode
a Administração Pública através da análise da oportunidade e conveniência,
conceder ou não a licença ambiental. Assim, tentarei contribuir para o
esclarecimento da questão, dando algumas considerações a respeito dos dois
elementos criticados pela doutrina que defende se tratar de uma autorização
administrativa de cunho ambiental.
Inicialmente, o Direito Administrativo não poderá ser visto de
forma isolada do ordenamento jurídico como um todo, ele deverá assim como os
outros ramos do direito se integrar a todo o sistema jurídico da mesma forma que o
Direito Ambiental.369 Mas nesse caso esse instrumento de gestão pública ambiental,
conforme já explicitado, visa compatibilizar direitos envolvidos e aparentemente
conflitantes, principalmente os direitos fundamentais da pessoa humana, de forma
que a estrutura administrativa do direito deve-se amoldar aos elementos e
necessidades ambientais e dos outros direitos envolvidos nesse procedimento
ponderativo. Assim, as licenças ambientais têm algumas características próprias,
mas que não descaracterizam a sua natureza de licença, uma vez que as
tradicionais licenças administrativas têm como elemento base a sua vincularidade à
lei370 e à definitividade, e esses dois elementos estão inseridos, também, nas
licenças ambientais.
Primeiramente, deve-se separar o procedimento de
licenciamento ambiental do ato da licença ambiental, já que, como disse
anteriormente, o primeiro é a reunião de uma série de atos e instrumentos, que
podem ser vinculados ou discricionários, enquanto a licença ambiental é o ato
administrativo final de ênfase ambiental que outorga a determinado interessado a
possibilidade de implantar a atividade ou empreendimento desejado.371 Dessa
forma, não se pode afirmar que o licenciamento ambiental é um procedimento
totalmente vinculado e nem discricionário, pois como dito, é um processo de juntada

368
FRAGA, Jesús Jordano. Op. cit., p. 245. A pesar de las dificultades de extraer conclusiones generalizables de
tan diverso conjunto, es osible establecer, con las debidas prevenciones, las líneas básicas del régimen jurídico
de las autorizaciones en el Derecho ambiental. Estas líneas básicas son: la necesidad de la obtención previa de
las mismas, y la posibilidad de suspensión o de modificación de las condiciones por circunstancias sobrevenidas,
así como de su revocación en caso de incumplimiento de sus condiciones.
369
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno, 2ª ed. São Paulo: RT, 1998, p. 39.
370
FIGUEIREDO. Lucia Valle. Curso de Direito Administrativo, 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 2001, p. 165.
148

de informações, sejam elas jurídicas ou não. Ao final da ponderação de todas as


informações existentes, emite-se um ato administrativo vinculado que é a licença
ambiental, caso seja viável à implantação, pois pode ao final não permitir a
implantação da atividade ou empreendimento. Assim, quando o particular reúne
todas as informações requisitadas pelo Poder Público e os estudos realizados
comprovam que a atividade ou empreendimento que requer a licença não irá causar
degradação ambiental e que seus impactos podem ser mitigados ou compensados,
ele passa a ter direito à outorga da licença para a implantação do requerido.372
Como explicitado no primeiro capítulo são, inicialmente e em sua grande maioria,
dois direitos fundamentais a serem analisados pela Administração Pública e por
terem está característica, não cabe ao Estado a escolha se irá efetivar ou não esses
direitos, devendo efetivá-los gradualmente de forma que proteja o ambiente e
proporcione o desenvolvimento necessário, não havendo espaço para
discricionariedade para a outorga da licença ambiental, pois uma vez preenchidos os
requisitos legais, comprovando que a atividade ou empreendimento requerido para
implantação não será degradante do ambiente, pois seus impactos podem ser
mitigados ou compensados, e essa constatação é apresentada pelos estudos
ambientais e pela própria manifestação da sociedade, que informará se está apta a
suportar os efeitos positivos e negativos da implantação. Tais espaços de análise
não totalmente definidos pela lei e que se pode até considerar como espaços vazios
da norma, são preenchidos, conforme aduz Édis Milaré pela discricionariedade
técnica.373 Acredito que o vazio da norma é necessário e proposital, tendo em vista o

371
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 220. Primeiramente, é preciso destacar que não se deve confundir a licença
ambiental com o licenciamento ambiental. ao se falar em licença ambiental, está-se referindo ao ato final de cada
etapa do licenciamento ambiental, ato de concessão do pedido feito pelo particular ao Poder Público.
372
OLIVEIRA, Antonio Inagê de Assis. O Licenciamento Ambiental, São Paulo: Iglu, 1999, p. 28. Essa licença
formalizada em alvará, representa a anuência da autoridade ambiental competente, depois de verificado que a
construção ou atividade atendeu aos condicionantes constitucionais e legais para sua localização, instalação e
operação. Uma vez que se constitui em direito, garantido a todos o exercício tanto do direito de propriedade
como de desempenhar atividades industriais ou comerciais (ou mesmo de prestação de serviços – liberdade do
exercício de atividade profissional), desde que atendidas as restrições legais, não padecem dúvidas que no
sentido técnico-jurídico, se trata efetivamente de uma licença e não de uma autorização, com conseqüência de
gerar direitos subjetivos ao seu titular, frente à Administração Pública. e FARIAS, Talden. Op. cit., p. 224.
373
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 536. No tocante às licenças ambientais, entretanto, dúvidas podem surgir, já que é
muito difícil, senão impossível, em dado caso concreto, proclamar cumpridas todas as exigências legais. Sim
porque, ao contrário do que ocorre, por exemplo, na legislação urbanística, as normas ambientais são, por vezes,
muito genéricas, não estabelecendo, via de regra, padrões específicos e determinados para esta ou aquela
atividade. Nestes casos, o vazio da norma legal é geralmente preenchido por exame técnico apropriado, ou seja,
pela chamada discricionariedade técnica, deferida à autoridade., FARIAS, Talden. Op. cit., p. 234. e GARCEZ,
Rochelle Jelinek. Licenciamento Ambiental e Urbanístico para o Parcelamento do Solo Urbano. In: BENJAMIN,
Antônio Herman de Vasconcellos e (Org). Paisagem, Natureza e Direito. São Paulo: Instituto O Direito por um
Planeta Verde, 2005. v2, p. 365.
149

grande número de atividades e empreendimentos que podem surgir além das


características de localização e da sociedade em que se pretende implantar.
Paulo Affonso Leme Machado374 e Curt e Terence Trennepohl375
afirmam, ainda, que o referido ato administrativo não pode ter natureza de licença,
pois a própria Constituição Federal de 1988, em seu artigo 170, menciona que o
exercício das atividades econômicas é livre e independe de autorização, com
exceção dos casos previstos em lei. Assim, para o autor, o exercício de atividades
que utilizem recursos, ou que possam degradar o ambiente, deveria receber em
sendo positivo o procedimento de analise, ou seja, uma autorização ambiental para
o seu efetivo exercício, tendo em vista que o próprio texto constitucional assim
determinou. Penso que o legislador constitucional, ao editar o referido enunciado,
não tinha por intenção apontar o tipo específico de ato administrativo, mas sim
determinar que a lei poderia condicionar algumas atividades econômicas,
necessitando para o seu exercício da aquiescência do Poder Público, de uma
autorização no sentido de concordância com a implantação da atividade e não
especificando o ato administrativo, além do mais o licenciamento ambiental não é
exclusivo para análise do direito ambiental com o econômico, mas precisa também
de outros direitos que estejam envolvidos e que, para sua efetivação, possam causar
alguma degradação ambiental, se não for efetivado na proporção adequada.
Retornando a questão da existência de uma discricionariedade da
Administração Pública para a outorga da licença ambiental, não existe
discricionariedade na licença ambiental, uma vez que o ato é obrigatório para a
Administração Pública quando o procedimento administrativo que reúne a análise da
possibilidade da implantação é favorável, pois está-se efetivando direitos essenciais
à pessoa humana. A discricionariedade está no procedimento do licenciamento
ambiental, no qual existem situações que estão vinculadas à lei e outras não,
demonstrando ser um procedimento misto, sendo o Estudo de Impacto Ambiental376
um instrumento discricionário que, ao final, deve apresentar diversas alternativas
para a implantação de medidas mitigatórias e compensatórias, inclusive a negativa

374
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito à Informação e Meio Ambiente, Op. cit., p. 266. Desta forma,
razoável é concluir que o sistema de licenciamento ambiental passa a ser feito pelo sistema de autorizações
conforme entendeu o texto constitucional.
375
TRENNEPOHL, Curt. e TRENNEPOHL, Terence. Op. cit., p. 12. A própria Constituição Federal de 1988
demonstra a impropriedade terminológica do termo licença pois, no art. 170, que trata do exercício das
atividades econômicas, emprega o termo autorização.
150

pela implantação da atividade.377 Dessa forma, conforme diversos autores, como


Themistocles Brandão378, Édis Milaré379 e Odete Medauar380, explicitam não existir
um procedimento totalmente vinculado ou discricionário, mas a predominância de
uma das características. A discricionariedade existente no licenciamento ambiental
não chega a naturalizar o ato administrativo final como sendo autorização, pois se o
interessado cumprir todas as exigências legais do licenciamento ambiental surge
para o mesmo o direito subjetivo à licença e também para a coletividade o direito de
ter efetivado outros direitos envolvidos em sua ideal proporção, como o direito
econômico e do desenvolvimento. Assim, permitir a Administração Pública o poder
de escolher se determinada atividade ou empreendimento serão implantados ou
não, mesmo que se tenha cumprido todas as exigências legais e tenha sido
comprovado que pode existir uma concretização de direitos em proporções ideais, é
dar a oportunidade de violar direitos que a própria Administração tem o dever de
concretizar, além dessa questão, reduzir a licença ambiental à natureza de
autorização causa uma insegurança na implementação de diversas atividades tendo
em vista os altos custos de algumas atividades que somente justificam sua
implementação diante de alguma definitividade.381

376
FIQUEIREDO, Lúcia Valle. Discriminação Constitucional das Competências Ambientais, In: Revista de
Direito Ambiental, nº 35, São Paulo: RT, 2004, p. 52.
377
Acredito que existindo entre as alternativas finais do EIA a não implantação da atividade, fica, nesse caso, a
Administração Pública vinculada pela não outorga da licença, uma vez que o estudo comprovou que a possível
atividade ou empreendimento não consegue se compatibilizar com a proteção ambiental e a sua implantação
viola um direito fundamental que deve ser protegido. Assim, penso que a discricionariedade da escolha final esta
adstrita a quais medidas serão exigidas para que o interessado possa ter a licença para a implantação da atividade
ou empreendimento.
378
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Curso de Direito Administrativo, Op. cit., p. 44. É que todo ato
administrativo contém, no seu exercício, uma parcela de poder discricionário, quando a autoridade, usando de
um poder próprio à administração, entra na esfera do exame da conveniência ou oportunidade da medida.
Não existe em nosso regime jurídico nenhum ato de todo discricionário, mas todo ato contém em si uma parcela
de discrição mais ou menos vinculada à lei. É, por conseguinte em função da quantidade de subordinação à lei
que se justifica a discriminação aqui feita.
379
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 538-539. A resposta a tão intrigante questionamento só pode ser encaminhada de
maneira satisfatória se nos convencermos, na linha da mais moderna doutrina, de que, na realidade, não há atos
inteiramente vinculados ou inteiramente discricionários, mas uma situação de preponderância, de maior ou
menor liberdade deliberativa do seu agente.
380
JUNIOR, José Cretella. Dos Atos Administrativos Especiais, Op. cit., p. 158. e MEDAUAR, Odete. Op. cit.,
p. 117. A doutrina contemporânea vem afirmando que, no geral, no cotidiano das atividades administrativas, são
poucas as situações de vinculação pura e de discricionariedade pura, daí ser insustentável a oposição rígida entre
poder vinculado e poder discricionário. Melhor parece levar em conta o aspecto predominante no exercício do
poder mencionando-se decisão ou medida em que predomina o poder vinculado ou o poder discricionário.
381
BRAGA, Rodrigo Bernardes. Op. cit., p. 89. Do contrário, estar-se-ia atentando contra a liberdade de
iniciativa econômica (CF, art. 170), se se pudesse simplesmente negar o exercício do direito de empreender.
Demais disso, os elevados custos de investimentos e a necessidade que o País atravessa de retornar o
crescimento econômico em bases sustentáveis não permitem outra conclusão que não a de ato vinculado da
licença ambiental, a qual deve ser deferida ao interessado toda vez que forem satisfeitos os requisitos legais. Tal
resulta de um direito subjetivo do particular. e ANTUNES, Paulo de Bessa. Federalismo e Competências
151

A questão da definitividade é outro ponto controvertido das


licenças ambientais, pois as mesmas têm prazo e não são perpétuas como são as
tradicionais do direito administrativo e, além disso, são passíveis de revisão ao
término do prazo de validade e por tal motivo Paulo Affonso Leme Machado entende
que essa falta de definitividade naturaliza a licença ambiental como verdadeiro ato
de autorização, tendo em vista que a existência de um prazo de validade e a
necessidade do particular, para continuar em funcionamento, renovar sua licença ao
final do prazo, tornar o ato precário e configuram características típicas das
autorizações administrativas.382 Ocorre que tal posição não é única na doutrina
brasileira, já que Édis Milaré, Paulo Bessa e outros juristas entendem de forma
contrária esse posicionamento, pois o fato da existência de prazo e da necessidade
de renovação ou revisão da atividade para continuar em operação não
descaracteriza a definitividade da licença ambiental, uma vez que durante o período
de validade da licença ela é definitiva, não existindo a possibilidade de sua
revogação de forma discricionária383, mesmo existindo o interesse público,
necessário na função administrativa, só poderia ser revogada a licença mediante
indenização384, caso contrário a Administração Pública estaria atuando de forma
arbitrária385 . Dessa forma, o particular tem a segurança que, enquanto estiver válida
a sua licença ambiental, o mesmo pode atuar dentro dos padrões de qualidade

Ambientais no Brasil, Op. cit., p. 140. Aqui está o ponto mais delicado de todo o sistema de licenciamento
ambiental. A licença ambiental não pode ser reduzida à condição jurídica de simples autorização, pois os
investimentos econômicos que se fazem necessários para a implantação de uma atividade utilizadora de recursos
ambientais, em geral, são elevados. Por outro lado, a concessão de licenças com prazos fixos e determinados
demonstra que o sentido de tais documentos é o de impedir a perenização de padrões que, sempre, são
ultrapassados tecnologicamente.
382
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, Op. cit., p. 267. assim, tanto o termo
“renovação” como o termo “revisão” indicam que a Administração Pública pode intervir periodicamente para
controlar a qualidade ambiental da atividade licenciada. Não há na “licença ambiental” o caráter de ato
administrativo definitivo; e, portanto, com tranqüilidade, pode-se afirmar que o conceito de “licença”, tal como o
conhecemos no Direito Administrativo brasileiro, não está presente na expressão “licença ambiental”.
383
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 234. (...) De resto, da mesma maneira que as licenças administrativas, a licença
ambiental é definitiva dentro daquele prazo estabelecido, comportando intervenções somente naqueles casos
legalmente previstos, o que está longe de torná-la uma autorização.
384
TRENNEPOHL, Curt. e TRENNEPOHL, Terence. Op. cit., p. 12 – 13. Não obstante clara a diferença
conforme se tratar de matéria ambiental ou administrativa, em alguns aspectos a licença ambiental guarde
semelhanças com a licença administrativa. Na hipótese de superveniência de norma que impeça a continuidade
de atividade regularmente aprovada, sem possibilidade de adequação às novas regras, a suspensão ou revogação
da licença ambiental ou negativa de sua renovação obrigam à indenização do favorecido. e FARIAS, Talden.
Licenciamento Ambiental: aspectos teóricos e práticos, Belo Horizonte – MG: Fórum, 2007, p. 236-237.
385
JUNIOR, José Cretella. Dos Atos Administrativos Especiais, Op. cit., p. 154-155. No primeiro caso,
incompatível, aliás, com o Estado de direito, ocorre o chamado ato arbitrário, que se concretiza através da
vontade pessoal do titular de um órgão administrativo, que age impulsionado por paixões, caprichos ou
preferências, desamparado, portanto, de qualquer fundamento legal. Neste caso, o agente deixa de ser
administrador, para ser dominus, substituindo o equilíbrio pela emoção.
152

aprovados no licenciamento ambiental. Após o término da validade, ele deverá


submeter sua atividade a novos padrões de qualidade, visando a uma adequação
com a realidade ambiental, caso queira continuar atuando.386
Evidente que uma definitividade perpétua para as licenças
ambientais como ocorre com as tradicionais do direito administrativo não pode ser
efetivada, tendo em vista que o Direito Ambiental não é formado única e
exclusivamente por formações jurídicas, mas também por outros ramos da ciência
que dão fundamento para a construção do ordenamento jurídico ambiental. Dessa
forma, a modificação dos parâmetros físicos, químicos e biológicos influenciam no
ordenamento ambiental, visto que conduz a uma modificação dos padrões
estabelecidos de proteção. Assim, é necessário mais uma vez ponderar-se sobre as
atividades que se encontram licenciadas e que durante o período de validade esses
padrões são modificados, pois os empreendedores que, em grande parte exercem
alguma atividade econômica, não podem a todo tempo modificar suas características
a cada alteração de padrões ambientais, ao mesmo tempo, o Poder Público tem o
dever de impor que toda a coletividade cumpra os novos padrões de proteção
ambiental. Diante desse impasse, Paulo Bessa Antunes e Antonio Inagê de Assis
Oliveira entendem que a melhor solução é a ponderação através da negociação
entre os empreendedores e o Poder Público, tendo em vista que uma imposição a
qualquer tempo poderia causar uma insegurança dos primeiros e conseqüentemente
uma paralisia do desenvolvimento, pois os investimentos econômicos podem ser
altos demais diante o risco de serem obrigados a gastos constantes para
compatibilizar suas atividades aos padrões ambientais.387

386
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 539. Em síntese, a licença ambiental, apesar de ter prazo de validade estipulado,
goza do caráter de estabilidade, de jure; não poderá, pois, ser suspensa por simples discricionariedade, muito
menos por arbitrariedade do administrador público. Sua renovabilidade não conflita com sua estabilidade; está,
porém, sujeita a revisão, podendo ser suspensa e mesmo cancelada, em caso de interesse público ou ilegalidade
supervenientes ou ainda, quando houver descumprimento dos requisitos preestabelecidos no processo de
licenciamento ambiental. Mais uma vez se pode chamar a atenção para disposições peculiares do Direito do
Ambiente, peculiaridades essas fundadas na legislação e corroboradas por práticas administrativas correntes na
gestão ambiental. e ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, Op. cit., p. 140. A situação, portanto, deve
ser posta nos seguintes termos: enquanto uma licença for vigente, a eventual modificação de padrões ambientais
não pode ser obrigatória para aquele que esteja regularmente licenciado segundo os padrões vigentes à época da
concessão da licença. O Poder Público, entretanto, poderá negociar com o empreendedor a adoção voluntária de
novos parâmetros de proteção ambiental. Uma vez encerrado o prazo de validade de uma licença ambiental, os
novos padrões são imediatamente exigíveis. e BRAGA, Rodrigo Bernardes. Op. cit., p. 89.
387
ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, Op. cit., p. 140. A questão não é legal: é econômica. Nem
sempre o capital para os investimentos necessários estão disponíveis e, evidentemente, existem diversos fatores
que impedem o fechamento tout court de uma atividade produtiva. Resulta, deste conjunto de circunstâncias, que
a negociação para o atendimento de novos padrões é o único caminho que pode, de fato, assegurar o
aprimoramento dos padrões é o único caminho que pode, de fato, assegurar o aprimoramento dos padrões
153

Já para outros juristas, a modificação dos padrões deve ocorrer de


forma imediata, tendo como característica das licenças ambientais uma cláusula
rebu sic stantibus e à medida que os padrões ambientais se alteram também deve o
empreendedor alterar suas atividades visando adequá-las à realidade ambiental,
podendo até ser retirada a licença, caso não se consiga alcançar as modificações
necessárias, o que comprovaria que aquela atividade da forma que está implantada
não atende ao ordenamento jurídico ambiental e atenta contra a pessoa humana e
por tal motivo deve ser paralisada através da retirada da licença, caso contrário,
estaria tanto o Poder Público como a própria Coletividade, da qual o empreendedor
faz parte, violando os princípios constitucionais de proteção ambiental. Assim, por
ser um dever tanto do Poder Público como da Coletividade, a proteção ambiental
deve ter consciência: o empreendedor deve a todo o tempo estar adequado aos
padrões de qualidade ambiental, independente dos padrões que foram aprovados no
momento do licenciamento ambiental.388 Acredito que o legislador ao editar a
obrigatoriedade do licenciamento ambiental buscou estabelecer um período de
segurança para o empreendedor, mostrando que os padrões aprovados no
licenciamento ambiental só seriam revistos no momento da renovação da licença,
até porque se o empreendedor tivesse de constantemente e de forma imediata se
adequar aos novos padrões ambientais de forma impositiva, não haveria
necessidade de prazo de validade para as licenças ambientais, pois presumiria-se
que todos estão adequados e os que não estivessem bastaria a comprovação da
fiscalização ambiental.
Com isso, é inegável que a natureza jurídica do ato que outorga o
exercício de algumas atividades ou empreendimentos, que utilizará recursos
ambientais ou que tem algum potencial de degradação ambiental, que após

efetivos de proteção ambiental. e OLIVEIRA, Antonio Inagê de Assis. O Licenciamento Ambiental, Op. cit., p.
47. Na verdade, o licenciamento ambiental foi concebido e deve ser entendido como se fosse um compromisso
estabelecido entre o empreendedor e o Poder Público. De um lado, o empresário se compromete a implantar e
operar a atividade segundo as condicionantes constantes dos alvarás de licença recebidos e, de outro lado, o
Poder Público lhe garante que durante o prazo de vigência da licença, obedecidos as condicionantes, em
circunstâncias normais, nada mais lhe será exigido a título de proteção ambiental.
388
FINK, Daniel Roberto. e MACEDO, André Camargo Horta de. Roteiro para Licenciamento Ambiental e
outras Considerações, In: FINK, Daniel Roberto.; JR, Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Op. cit., p. 17.
Em outras palavras, enquanto as condições fixadas pela licença ambiental atenderem ao fim maior que é a
preservação do meio ambiente saudável, será mantida; caso deixe de atendê-lo, a licença deverá ser revista.
Infere-se, portanto, que a licença ambiental é dotada, implicitamente, de uma verdadeira cláusula rebu sic
stantibus, ou seja, se as condições originais que deram ensejo à concessão da licença mudarem, esta também
pode ser alterada ou até retirada. Ademais, essas licenças são revistas periodicamente, já que concedidas por
154

preencher todos os requisitos necessários para a obtenção da outorga,


principalmente comprovando se sua atividade ou empreendimento pode ser
compatível com a preservação ambiental por determinado período, é um ato
administrativo classificado como licença e não autorização.

prazos certos. e MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 551. e FIQUEIREDO, Lúcia Valle. Discriminação Constitucional
das Competências Ambientais, Op. cit., p. 54.
155

CAPÍTULO IV – LICENCIAMENTO AMBIENTAL MUNICIPAL

A partir deste momento passo a tratar especificamente do


objeto principal deste estudo, que é a possibilidade dos Municípios brasileiros
poderem exercer o licenciamento ambiental como instrumento municipal de controle
ambiental para as atividades e empreendimentos que estejam em sua competência
ambiental constitucional. É evidente que a Constituição Federal de 1988 não traz
uma relação especifica de atividades e empreendimentos que podem ser licenciados
pelos Municípios de forma explícita em seu texto e até mesmo o próprio
licenciamento não é claramente contemplado para nenhum dos entes da Federação
na Constituição. Dessa forma, a possibilidade de o exercício do licenciamento
ambiental pelos Municípios brasileiros é obtida através da interpretação do texto
constitucional, inserindo nesta os princípios e regras constitucionais tais como: os
princípios da Federação, da predominância de interesse, do interesse local, dentre
outros mencionados anteriormente neste estudo. Com isso, este capítulo conterá
algumas etapas das quais irei tratar inicialmente da autonomia municipal na
formação da Federação brasileira e após a aplicabilidade do instrumento nos
Municípios, observar-se-á a constitucionalidade em parte da resolução CONAMA
237/97 e a inconstitucionalidade de alguns modelos adotados atualmente de
delegação de competência dos Estados-membros para os Municípios, os quais ao
meu ver, não têm amparo legal e constitucional.
Posteriormente, abordarei as definições do impacto local e
uma possível interpretação deste conceito, diferenciando este com o de relevância
ambiental e, em outra etapa, será explicitada a identificação dos objetos a serem
licenciados pelos Municípios em um Estado Democrático de Direito e, por fim, serão
traçadas algumas diretrizes para o Município de Campos dos Goytacazes, localizado
156

no Estado do Rio de Janeiro, exercer adequadamente o licenciamento ambiental de


algumas atividades e empreendimentos em seu território.

1. Os Municípios e a sua Autonomia dentro do Estado Federado.

Inicialmente, para entender a autonomia municipal e a sua


amplitude no atual sistema federativo brasileiro, é necessário algumas
considerações a respeito do que vem a ser o próprio Município e a sua importância
para as pessoas humanas que pretendem viver de forma comunitária. A natureza
jurídica do Município é, segundo a doutrina, diversa, pois vários são os estudiosos
que definem diferentes naturezas aos Municípios em que, para a escola legalista
esta pessoa é única e exclusivamente uma criação da lei; para a escola materialista
corresponde a um agrupamento de famílias, que se desenvolvem através de
interesses econômicos; para a escola realista, o Município é uma rede de serviços
públicos de âmbito local; para escola institucionalista, entende-se que corresponde a
uma célula fundamental da formação do Estado e, por fim, a escola sociológica que
afirma que, a nível local, o Município é uma organização política, que o Estado não
cria, mas sim reconhece sua existência, pois é uma unidade natural. Acredito que a
melhor definição de sua natureza jurídica seja obtida através da união de todas
estas escolas, uma vez que o Município, para exercer seus poderes de pessoa
jurídica, necessita de lei que o institua como se fosse uma criação, pois sua
formação e os requisitos essenciais para sua existência não carecem de lei para
surgirem, o que nos faz acreditar que essa entidade advém do direito natural e,
ainda, o Município é realmente uma rede de prestação de serviços públicos
essências para as pessoas humanas viverem com dignidade e, por tal, é
fundamental para a formação do Estado independente que faça parte ou não da
Federação e, por fim, é nele que se desenvolvem as relações entre pessoas com
fins econômicos e sociais.389
Para Carmem Lúcia Antunes Rocha, o Município é oriundo das
cidades, já que estas surgiram primeiro, pois nelas e o homem desenvolvia sua vida
e escrevia sua história como pessoa humana, é o principal referencial político que

389
MASAGÃO, Mario. Op. cit., p. 131 – 132.
157

marca toda a trajetória da sua vida, como integrante de uma organização política.390
Enquanto isso, o Município é uma estrutura com atribuições próprias, que tem como
responsabilidade a ordenação da cidade e suas comunidades na abrangência de
seu território, de forma que possa proporcionar um melhor bem estar às pessoas
que vivem no seu espaço, seja no campo, seja na própria cidade.391 Acredito que as
marcas políticas que a cidade deixa nos indivíduos também acontecem nos
Municípios, visto que as pessoas ainda vivem em cidades ou comunidades que
existem no âmbito de abrangência dos Municípios.
No sistema federativo brasileiro, o Município foi elevado a ente
da Federação392, que está no mesmo nível de igualdade perante a União e os
Estados-membros, transformando as características até então existentes de um
federalismo dual para uma formação tripla, formando um terceiro ente autônomo393,
uma vez que, a partir da Constituição Federal de 1988, o Município passou a ter
autonomia plena, pois adquiriu o poder-dever de se autogovernar, auto-administrar e
auto-organizar, que não existia nas Constituições anteriores, tendo em vista que
somente se autogovernavam e auto-administravam seus interesses, não existindo a
possibilidade de se organizarem como ente político. Dessa forma, o Município
alcançou a melhor posição na estrutura política brasileira até então concebida,

390
ROCHA. Cármen Lúcia Antunes. República e Federação no Brasil, Belo Horizonte – MG: Del Rey, 1997, p.
261. A cidade marca mais que a história política imediata do homem; constitui a sua história emocional primária.
O indivíduo descobre-se na cidade, faz-se nela e é, em parte, resultado dela. O ambiente que deixa o seu sinal
mais profundo no homem é aquele que se configura em sua cidade. Nela o indivíduo descobre o seu “eu”
político.
391
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 14ª ed., São Paulo: Malheiros, 2006, p. 34 – 35. O
Município no mundo moderno diversificou-se em estrutura a atribuições, ora organizando-se por normas
próprias, ora sendo organizado pela Estado segundo as conveniências da Nação, que lhe regula a autonomia e lhe
defere maiores ou menores incumbências administrativas no âmbito local. O inegável é que na atualidade o
Município assume todas as responsabilidades na ordenação da cidade, na organização dos serviços públicos
locais e na proteção ambiental de sua área, agravadas a cada dia pelo fenômeno avassalador da urbanização, que
invade os bairros e degrada seus arredores co habitações clandestinas e carentes dos serviços públicos essenciais
ao bem-estar dessas populações.
392
José dos Santos Carvalho. Pacto Federativo: Aspectos Atuais, In: QUARESMA, Regina. e OLIVEIRA, Maria
Lúcia de Paula. Op. cit., p. 410-411. Se nas federações em geral a afirmação é exata, com mais razão ela o é no
regime federativo pátrio, em que, diversamente de outras nações, a Constituição adota federação de três graus,
composta de União, Estados-membros e Municípios. Não cabe aqui entrar na discussão sobre se os Municípios
são (ou devem ser) membros da federação. Cabe-nos somente trazer à colação o art. 18 da vigente Constituição,
que não deixa qualquer margem a dúvida sobre a matéria: os Municípios são entes participantes da federação e
são dotados de autonomia, a mesma, aliás, conferida aos demais entes integrantes, embora com demarcação
diferente. Sendo integrantes da federação, não há como alijá-los do pacto federativo, pois que pacto é exatamente
o vínculo político-constitucional que deixa as entidades federativas atreladas entre si como células do Estado
num todo.
393
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, Op. cit., p. 345.
158

passando a ter um real poder municipal, sem a possibilidade de influência dos outros
entes federativos, a não ser para preservar o próprio sistema.394
O Município adquiriu competências privativas que impedem a
intervenção dos outros entes no exercício de tais competências, solidificando sua
autonomia, que anteriormente se restringia à administração de seus interesses e ao
governo, pois passou a se organizar como ente político e com funções próprias e
privativas, fazendo ressurgir fortalecidamente o princípio da autonomia municipal e o
poder de organização política torna-se garantia constitucional, através do dever dos
Municípios elaborarem suas próprias Leis Orgânicas, que alguns consideram como
verdadeiras Constituições Municipais, e é por meio dessas Leis que os Municípios
estabelecem a sua organização política, seus princípios e regras a serem aplicados
no território municipal respeitando as normas gerais nacionais, federais e estaduais.
Importante apontar que esses princípios e regras nacionais, federais e estaduais a
serem respeitados não correspondem a condutas municipais, mas a normas gerais
ou condutas estabelecidas a nível nacional.395 Cármen Lúcia Antunes Rocha396
afirma que a obediência às normas gerais não compromete o raio de atuação dos
Municípios, visto que o cumprimento dessas normas pode ser exercido de diversas
formas e consubstanciam princípios constitucionais que devem ser uniformemente
estabelecidos em toda Federação brasileira, mas a forma de estabelecer e aplicar
esses princípios e regras é atribuição do legislador municipal, através da Lei
Orgânica e as outras normas municipais.
Importante explicitar que a autonomia municipal não tem
obrigatoriamente relação com o sistema federativo, até porque, no Brasil, os
Municípios sempre tiveram algum raio de autonomia, pois, dependendo do momento
político, administraram seus interesses e se autogovernaram, elegendo seus

394
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, Op. cit., p. 347. A concepção política desse poder
transitou de uma modalidade “política” e abstrata, historicamente frágil e passageira, não obstante sua amplitude
teórica, para uma versão mais sólida, porém menos larga, ou politicamente menos ambiciosa, a qual, em
compensação, lhe confere, dentro de quadros formais rígidos, uma superior conotação de juridicidade
institucional, de máxima autonomia possível. Um poder municipal realisticamente concebido, pois, no Estado,
em contraste com aquele esboçado contra o Estado, conforme constava das primeiras versões políticas da
filosofia da liberdade. e ROCHA. Cármen Lúcia Antunes. República e Federação no Brasil, Belo Horizonte –
MG: Del Rey, 1997, p. 291.
395
ROCHA. Cármen Lúcia Antunes. Op. cit., p. 291.
396
Ibidem, p. 292. Poder-se-ai asseverar que o imperioso acatamento dos princípios constitucionais nacionais e
estaduais tolheria o legislador municipal, impedindo criações significativas nesse plano. Não é isso exatamente
verdade, quando se leva em conta que os princípios limitadores, materialmente, do legislador municipal são
aqueles que se referem à Democracia, à República, à participação popular, enfim, princípios que podem ser
aplicados e exercidos de variadas formas, o que permite um raio de ação do legislador bastante interessante.
159

dirigentes, com exceção de alguns períodos ditatoriais, em que os prefeitos eram


nomeados397. Dessa forma, não há relação obrigatória entre a autonomia municipal
com o sistema federativo, mas a conjugação da auto-administração, autogoverno e
auto-organização e a formação do Estado pelo texto constitucional, como fez o
artigo 18 da Constituição Federal de 1988, é que faz com que o ente municipal
venha a integrar o sistema federativo. Primordial que, para compor o sistema, que o
próprio ente se organize, sendo essa característica elemento essencial à
configuração do ente federativo.398 Dessa forma, é errado afirmar que a autonomia
municipal é inerente ao federalismo, mas a conjugação tripla das autonomias é
característica do sistema federativo, não sendo obrigatório, no sistema federativo, o
reconhecimento da autonomia municipal.399
A competência da autonomia municipal no Brasil é delimitada
segundo um conceito indeterminado, que é o “interesse local” que, nos
ordenamentos constitucionais anteriores, era utilizada a expressão, “peculiar
interesse local”, o qual a meu ver representa o mesmo sentido, mas é necessário
que se entenda o que venha a ser o interesse local, pois este não representa um
interesse exclusivo do Município, que exclua os outros entes federativos, mas sim
um interesse predominantemente municipal e que indiretamente possa interessar ao
Estado-membro e a União.400 Assim, tudo que poderá influenciar diretamente a vida
da comunidade municipal será interesse local, são interesses advindos das
exigências de determinado povo de um território e que podem não ser em outro, pois
são os elementos existentes em cada Município que determinará o que é necessário
para cada coletividade.401 Importante ressaltar que a caracterização do interesse
local depende muito de um momento histórico, já que o que hoje pode não ser de
interesse local, amanhã será ou até mesmo o que é diretamente municipal amanhã
passa a ser um interesse diretamente regional ou nacional, de forma que sempre
para a identificação do interesse local haverá a necessidade de se interpretar o

397
MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 40 – 43.
398
BARROSO, Luis Roberto. Direito Constitucional Brasileiro, Op. cit., p. 23. Ressalta-se, por oportuno, que a
capacidade de auto-organização é, do ponto de vista formal, a mais relevante manifestação da autonomia,
conferindo às unidades federadas o poder de se estruturarem tal qual um Estado, gozando da titularidade de
funções da mesma natureza daquelas que compõem o Estado federal.
399
MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 92 – 93.
400
MASAGÃO, Mario. Op. cit., p. 137 – 138.
401
CAVALCANTE, Themistocles Brandão. Teoria do Estado, Op. cit., p. 230. Os interêsses locais são aqueles
mais imediatamente necessários às exigências do povo, em sua vida cotidiana e no exercício de suas atividades
elementares. O indivíduo deve encontrar nas autoridades locais e nos serviços a seu cargo os meios necessários
para satisfazer êsses interêsses.
160

momento histórico em que vive a comunidade municipal. É evidente que algumas


matérias nunca serão de interesse local como as relativas à segurança nacional e
outras sempre serão de interesse puramente local, como a formação da estrutura
administrativa das Prefeituras Municipais, mas em outros temas, o desenvolvimento
da humanidade faz com que a abrangência ou o próprio interesse modifique ou
venha a surgir.402 Acredito que é o que acontece nas questões ambientais, pois
provavelmente, tempos atrás, tal assunto não era de interesse dos Municípios,
contudo, atualmente, constata-se que, em se tratando de questões ambientais, o
Município tem primordial interesse, tendo em vista que quem suporta os males
advindos das condutas degradantes são as comunidades municipais que estão mais
próximas dos focos poluidores. Outra forma de exclusão de delimitação de um
interesse local é quando a própria Constituição Federal delimita através de um rol o
que não é e o que vem a ser de interesse local, impedindo dessa forma o exercício
da competência por outro ente federativo.403
Com isso, cada ente da Federação brasileira tem sua
competência definida a partir do texto normativo constitucional e da predominância
de interesse, não podendo existir delegação de um ente para outro, a não ser que o
próprio ordenamento constitucional permita, como faz no artigo 22, parágrafo único
da Constituição Federal de 1988. Dessa forma, não pode um Estado-membro
delegar sua competência constitucional definida pela predominância de interesse
estadual para um Município e igualmente se passa em relação à União com os
Estados-membros no que tange ao interesse nacional e regional. Assim, quando um
Estado-membro delega a um Município competências de âmbito local, na verdade,
não delega, já que tal competência nunca foi sua, pois como já explicitado, a
competência estadual é residual, mas deixa de aplicar o princípio da
subsidiariedade, tendo em vista que o Município passa a poder efetivamente exercer
a sua competência fundamentada no interesse local.404 Assim, não podem os
Estados-membros delegar competências próprias, uma vez que não existe
autorização constitucional e porque a predominância do interesse estadual não pode

402
ROCHA. Cármen Lúcia Antunes. Op. cit., p. 293.
403
Ibidem, p. 294. É de se enfatizar que o que pode ser interesse municipal pode ser alterado no curso da
história, e normalmente isso ocorre, além de não se poder fazer tal cogitação quando determinado serviço ou
matéria estiver alocada, constitucionalmente, no rol de competências de outra entidade, porque aí então o próprio
constituinte nacional terá definido a exclusão do serviço ou função da apreciação do interesse de outra pessoa.
161

ser exercida pelo Município e quando o Estado-membro atua dessa maneira age de
forma inconstitucional.
Outra questão interessante é delimitar o conteúdo do interesse
local, como se pode identificar o que vem a ser interesse local e o que são
interesses nacional, federal e estadual. Uma forma é através do texto constitucional
quando de forma expressa enuncia o que vem a ser o interesse local, como faz no
artigo 30, da Constituição Federal, outra forma decorre do texto constitucional
estadual, que declara os assuntos de interesse local405 e por fim, o mais importante
meio de definição do conteúdo do interesse local, é o feito pelo próprio Município,
visto que, dessa forma, parte-se de uma definição realística e não abstrata, que além
de ser positivado no texto da Lei Orgânica Municipal, também pode advir de diversos
fatores em desenvolvimento nos Municípios e nesse momento, que é fundamental a
participação da sociedade na definição dos interesses que devem existir no
Município e que por serem interesses locais devem ser regulamentados.406 É a fiel
efetivação do princípio democrático, fundamental em um Estado Democrático de
Direito.

1.1 – A Autonomia Ambiental

Em relação à matéria, o Município detém uma série de


competências próprias, como a regulamentação do uso e ocupação do solo e outras
competências baseadas através da interpretação do interesse local, ao qual refiro a
respeito do artigo 23 da Constituição Federal de 1988, que como já explicitado
anteriormente, trata-se de competências de nível administrativo, estando incluído
nestas o licenciamento ambiental, uma vez que este é um instrumento administrativo
de controle ambiental. Assim, as matérias ambientais de interesse local são de
competência dos Municípios, quando eles têm possibilidade de atuação, caso
contrário utiliza-se do princípio da subsidiariedade para que o Estado-membro venha

404
GUIMARÃES, Juliana Pita. Competência Constitucional dos Municípios em Matéria Ambiental, In:
COUTINHO, Ronaldo. e ROCCO, Rogério. O Direito Ambiental das Cidades, Rio de Janeiro: DP&A, 2004, p.
81-82.
405
KRELL, Andreas J. Autonomia Municipal e Proteção Ambiental: Critérios para Definição das Competências
Legislativas e das Políticas Locais. In: KRELL, Andreas J. e MAIA, Alexandre da. A Aplicação do Direito
Ambiental no Estado Federativo, Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2005, p. 181.
406
Ibidem, p. 182. O interesse local é, portanto, variável em função da localização geográfica, dimensão,
população, tradição, aspectos históricos e culturais, potencialidades, níveis de urbanização, características do
solo, aspirações do povo, proximidade ou afastamento de centros polarizadores, etc.
162

exercer as competências locais, até que o Município adquira capacidade para o


exercício da competência constitucionalmente definida. Excluir os Municípios do
exercício de competências ambiental é um erro, uma vez que são nesses lugares
que se pode constatar e identificar os problemas ambientais e, principalmente, as
soluções adequadas de controle ambiental. É também neles que se efetiva o
princípio do agir localmente, pensar globalmente, até porque são nos Municípios que
as pessoas desenvolvem suas vidas.407
Dessa forma, as competências municipais de interesse local
são privativamente exercidas pelos Municípios, através da edição de um
ordenamento jurídico municipal de proteção ambiental e da ação administrativa, com
base nas abrangências locais de atuação. Assim, é inconstitucional que a União ou
os Estados-membros venham a intervir nos assuntos definidos como sendo de
interesse local, através de leis, decretos ou resoluções como vem fazendo
atualmente.408 Com isso, não podem outros entes que compõem a Federação
Brasileira editar normas que venham diminuir, excluir, ou pior, controlar a atuação
municipal. Tal situação pode ser vislumbrada em alguns atos normativos que tentam
estabelecer um vínculo entre o Município e outros entes federativos. Assim, acredito
que a resolução CONAMA 237/97 no seu artigo 5º e 6º409, quando enuncia que

407
KRELL, Andreas J. Autonomia Municipal e Proteção Ambiental: Critérios para Definição das Competências
Legislativas e das Políticas Locais. In: KRELL, Andreas J. e MAIA, Alexandre da. Op. cit., p. 180 – 181. Os
municípios representam, em geral, a esfera da administração pública na qual as pessoas são mais confrontadas
com as necessidades diárias de proteção ao seu meio ambiente e também onde esses problemas se apresentam de
maneira mais nítida. É no município que se manifestam os chamados conflitos de alvo: a proteção ambiental
local normalmente entra em concorrência com as áreas tradicionais da política econômica, habitacional e de
transporte. São justamente as decisões dos órgãos da política municipal que afeiçoam e organizam o mundo local
e a vida do ser humano e, ao mesmo tempo, transformam o seu meio ambiente natural e social. e ANTUNES,
Paulo de Bessa. Federalismo e Competências Ambientais no Brasil, Op. cit., p. 112 – 113.
408
ROCHA. Cármen Lúcia Antunes. Op. cit., p. 294.
409
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 237 de 19 de dezembro de 1997.
Disponível em <URL: http://www.conama.gov.br> Acesso em: 18 dez 2007. Art. 5o Compete ao órgão
ambiental estadual ou do Distrito Federal o licenciamento ambiental dos empreendimentos e atividades:
I - localizados ou desenvolvidos em mais de um Município ou em unidades de conservação de domínio estadual
ou do Distrito Federal;
II - localizados ou desenvolvidos nas florestas e demais formas de vegetação natural de preservação permanente
relacionadas no artigo 2o da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, e em todas as que assim forem
consideradas por normas federais, estaduais ou municipais;
III - cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais de um ou mais Municípios;
IV – delegados pela União aos Estados ou ao Distrito Federal, por instrumento legal ou convênio.
Parágrafo único. O órgão ambiental estadual ou do Distrito Federal fará o licenciamento de que trata este artigo
após considerar o exame técnico procedido pelos órgãos ambientais dos Municípios em que se localizar a
atividade ou empreendimento, bem como, quando couber, o parecer dos demais órgãos competentes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, envolvidos no procedimento de licenciamento.
Art. 6o Compete ao órgão ambiental municipal, ouvidos os órgãos competentes da União, dos Estados e do
Distrito Federal, quando couber, o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades de impacto
ambiental local e daquelas que lhe forem delegadas pelo Estado por instrumento legal ou convênio.
163

poderá ocorrer delegação de um ente para outro, mediante instrumento legal ou


convênio, apresenta-se diante o ordenamento constitucional como sendo uma
norma inconstitucional, uma vez que não pode ocorrer delegação de competência
constitucional sem previsão expressa no próprio texto constitucional, estaria violando
o princípio da predominância de interesse, pois ilegítimo que um ente estadual
venha exercer uma competência delegada de âmbito federal ou mesmo que um
Estado-membro delegue para um Município uma atribuição cuja predominância é
estadual. Dessa forma, mais confuso ainda fica a interpretação do artigo 6º da
resolução, quando afirma em seu enunciado que as atividades e empreendimentos
de impacto local já são licenciados pelos Municípios e também os delegados pelos
Estados-membros, o que faz concluir que estes também poderiam delegar a
competência de licenciar objetos de impacto além do local para os Municípios. Tal
fato faz acreditar que, diante do ordenamento jurídico constitucional, o artigo 5º-IV e
parte do 6º da resolução CONAMA 237/97 são inconstitucionais, visto que violam o
princípio da predominância do interesse e porque não existe, no ordenamento
jurídico, possibilidade de delegação em matéria ambiental em especial no que tange
ao licenciamento ambiental e, assim, essa delegação ofende a Federação brasileira.
Observo, dessa forma, como sendo totalmente
inconstitucionais os convênios, que os Estados-membros delegam aos Municípios
brasileiros o exercício do licenciamento ambiental, como faz o Rio Grande do Sul
com o Código Estadual do Meio Ambiente410 e o Rio de Janeiro411, que atualmente
busca promover, sem nenhuma base legal, a descentralização do licenciamento
ambiental, uma vez que essa possibilidade de exercer esse instrumento ambiental
tem por base o próprio sistema federativo, não podendo o Estado-membro delegar
suas competências administrativas e muito menos se apropriar das competências de
predominância local de forma permanente, pois penso que todo o exercício de
competências locais exercidas pelos Estados-membros é provisório e tem por
fundamento o princípio da subsidiariedade, até porque, em matéria ambiental, está-

410
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - BR, Lei nº 11.520, de 03 de agosto de 2000 Código Estadual do
Meio Ambiente, Disponível em: <http://www.sema.rs.gov.br>. Acesso em: 18 de mar. 2008. Art. 69 - Caberá
aos municípios o licenciamento ambiental dos empreendimentos e atividades consideradas como de impacto
local, bem como aquelas que lhe forem delegadas pelo Estado por instrumento legal ou convênio.
Parágrafo único - O órgão ambiental competente proporá, em razão da natureza, característica e complexidade, a
lista de tipologias dos empreendimentos ou atividades consideradas como de impacto local, ou quais deverão ser
aprovados pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente.
411
ESTADO DO RIO DE JANEIRO – BR. Decreto nº 40793, de 05 de junho de 2007. Disponível em:
<http://www.feema.rj.gov.br>. Acesso em: 01 de mar. 2008.
164

se tratando de um direito fundamental no qual não se justifica a sua não efetivação


por falta de aparato financeiro e administrativo, devendo de alguma forma, o ente
mais próximo da coletividade abraçar essas competências temporariamente até que
o ente constitucionalmente competente possa exercer de forma eficaz.
No Estado do Rio de Janeiro tem ocorrido através do decreto
nº 40.793 de 05 de junho de 2007, que busca descentralizar a fiscalização e o
licenciamento ambiental, a celebração de diversos convênios com os Municípios,
visando delegar aos mesmos a possibilidade de exercerem o licenciamento
ambiental de atividades de empreendimentos de impacto local. A meu ver, é de
duvidosa constitucionalidade, uma vez que, como já afirmei, não é a lei e muito
menos um decreto que delega ou cria competências para os Municípios, mas o
ordenamento jurídico constitucional. Assim, o Estado do Rio de Janeiro busca
delegar para os Municípios o que já é competência dos mesmos, independente de
delegação, tendo em vista que os objetos a serem licenciados serão somente os de
impacto local e por tais esses estão inseridos na predominância do interesse local.
Tais convênios causam flagrante violação à autonomia municipal e
conseqüentemente também ao sistema federativo, visto que afeta o requisito da
auto-administração, pois o decreto nº 40.793, em seu artigo 4º412 obriga que os
Municípios apresentem uma série de informações, única e exclusivamente de cunho
administrativo sobre os processos de licenciamento, podendo interferir na atuação
municipal, o que de forma límpida permite um controle administrativo do Estado-
membro em relação à atuação administrativa de um ente autônomo e independente
e de mesmo nível hierárquico federativo. Além de ferir a autonomia administrativa
também afeta a auto-organização dos Municípios, pois exige que para que os
mesmos possam exercer o licenciamento ambiental, tenham que ter uma
organização estatal disciplinada com base no decreto413 e, por fim, o referido decreto

412
ESTADO DO RIO DE JANEIRO – BR. Decreto nº 40793, de 05 de junho de 2007. Disponível em:
<http://www.feema.rj.gov.br>. Acesso em: 01 de mar. 2008. Art. 4º - A celebração de convênio de que trata este
ato normativo não desobriga o Estado do exercício do poder de polícia ambiental, quando caracterizada a
comissão ou inépcia do município no desempenho da atividade de licenciamento e fiscalização, não impedindo a
adoção pelo Estado, de medidas urgentes necessárias a evitar ou minorar danos ambientais. § 1º - Os
Órgãos/Entidades ambientais municipais deverão apresentar ao órgão/entidade ambiental estadual,
bimestralmente, o cadastro georeferenciado das atividades licenciadas, juntamente com a cópia das licenças
ambientais outorgadas em meio digital. § 2º - O órgão/entidade ambiental estadual poderá exigir, quando
necessário, o Relatório de Auditoria Ambiental de empreendimentos licenciados pelos municípios.
413
ESTADO DO RIO DE JANEIRO – BR. Decreto nº 40793, de 05 de junho de 2007. Disponível em:
<http://www.feema.rj.gov.br>. Acesso em: 01 de mar. 2008. Art. 5º - É condição para celebração de convênio e,
conseqüentemente, para a realização do licenciamento ambiental municipal, que o município: III – Possua
legislação própria disciplinando o licenciamento ambiental municipal e as sanções administrativas pelo seu
165

afronta a autonomia financeira dos Municípios, tendo em vista que obriga que os
mesmos repassem ao Estado-membro um percentual de 20% decorrente
obviamente do exercício do poder de polícia, que é a taxa de licenciamento
ambiental, devido à orientação e supervisão.414 Importante observar que esse
decreto estadual é inconstitucional, uma vez que não pode, no sistema federativo
brasileiro, um ente obrigar, para o exercício de uma atuação administrativa, que
outro ente venha a se organizar da forma que o primeiro deseja. A auto-organização
é elemento essencial no federalismo brasileiro, sendo inconstitucional qualquer
imposição de um ente em relação a outro para o exercício de competências
constitucionais. Dessa forma, não pode o decreto estadual exigir que os Municípios
tenham, para exercer o licenciamento ambiental, plano diretor ou leis de diretrizes
urbanas, pois o ordenamento jurídico em nada exigiu a esse respeito; somente
exigiu que os Municípios promovessem a proteção ambiental através do artigo 23 e
225, afastando a possibilidade de restrições ou imposições dos outros entes
federativos, pois a base do exercício do licenciamento ambiental municipal é a
mesma do federal e estadual.
Quanto ao repasse de 20%, decorrente do recebimento da
taxa de licenciamento, tal enunciado viola a autonomia financeira, uma vez que o
licenciamento ambiental municipal não é uma delegação voluntária do Estado-
membro que possa exigir repasse pelo exercício de poder de polícia, mas um poder
municipal constitucional. E por ser assim, não há que se ter repasse pelo exercício
de poder de polícia originário, nascido com a Constituição Federal, e pior é a
justificativa para o repasse por ser em decorrência da orientação e supervisão o que
não procede, uma vez que não cabe ao Estado-membro no exercício do Poder
Executivo supervisionar as competências constitucionais dos Municípios e, quanto à
orientação, está vinculada a uma cooperação voluntária e não obrigatória. Assim

descumprimento; IV – Possua Plano Diretor, Município com a população superior a 20.000 (vinte mil)
habitantes, ou lei de diretrizes urbanas, o Município com população igual ou inferior a 20.000 (vinte mil)
habitantes. V – dê ciência ao órgão/Entidade ambiental estadual sobre as informações relativas aos seguintes
instrumentos de controle vigentes, conforme respectivas Deliberações CECA: Procon Ar, Procon Água,
Inventário e Manifesto de Resíduos;
414
ESTADO DO RIO DE JANEIRO – BR. Decreto nº 40793, de 05 de junho de 2007. Disponível em:
<http://www.feema.rj.gov.br>. Acesso em: 01 de mar. 2008. Art. 9º - Deverá repassado à FEEMA o valor
correspondente a 20% (vinte por cento) do total arrecadado pelos Municípios no procedimento de licenciamento
ambiental, a título de ressarcimento pelas atividades efetivamente realizadas, referentes a orientação e
supervisão.
166

observo que o referido decreto é flagrantemente inconstitucional, por violar o sistema


federativo e a distribuição constitucional de competências.
Atualmente, alguns Municípios como Rio de Janeiro, Niterói,
Macaé, Rio das Ostras, Barra do Piraí, Casimiro de Abreu e outros já celebraram o
convênio de descentralização ambiental, reafirmo, não ser necessário e até mesmo
inconstitucional, pois os Municípios têm autonomia e competência própria para o
exercício do licenciamento ambiental de impacto local e os convênios até então
celebrados, como é de se imaginar, reproduzem as imperfeições do decreto nº
40793/2007, que estabelece como obrigação municipal a utilização na análise dos
requerimentos de licença da legislação ambiental sobre licenciamento estadual e
não a observância das normas municipais. Dessa forma, o Município licencia com
base no ordenamento jurídico do procedimento de licenciamento ambiental estadual
e não municipal. Como demonstrei no capítulo anterior, quando explicitei sobre a
Federação brasileira e a distribuição de competências, cada ente tem de ter sua
própria legislação em matéria ambiental de cunho administrativo, tendo em vista o
princípio da legalidade da Administração Pública e porque a matéria ambiental vista
de forma plena não é uma matéria de cunho nacional, mas concorrente e comum
entre os entes federativos. Assim, não pode o Município analisar um requerimento
de licença ambiental com base na legislação específica estadual ou federal, uma vez
que ele está exercendo o seu poder de polícia municipal e por tal deve ser
delimitado por lei municipal.
Dessa forma, com a autonomia municipal, a inclusão dos
Municípios nos entes da federação e a distribuição de competências constitucional,
fundamentam a possibilidade dos Municípios, em matéria ambiental e especialmente
no licenciamento ambiental, de exercerem este instrumento de forma plena,
independente de delegação de outros entes de mesmo nível federativo415, já que a
própria Constituição Federal de 1988 concedeu tal competência aos Municípios,
através dos artigos 23, 30 e 225 e que as possibilidades de delegação de

415
KRELL, Andreas J. Autonomia Municipal e Proteção Ambiental: Critérios para Definição das Competências
Legislativas e das Políticas Locais. In: KRELL, Andreas J. e MAIA, Alexandre da. Op. cit., p. 171. Sob o
aspecto formal, o município brasileiro certamente é a entidade territorial local investida da autonomia mais
abrangente no mundo inteiro. No exercício das suas atribuições, ele atua em absoluta igualdade de condições
com as outras esferas governamentais; os atos municipais independem da prévia autorização ou de posterior
ratificação de qualquer outra entidade estatal.
167

competências constitucionais apresentam-se inconstitucionais diante do


ordenamento jurídico atual.416

2. O Licenciamento Ambiental Municipal

Como já afirmei no capítulo anterior, a possibilidade de o


Município exercer o licenciamento ambiental ainda é uma questão controvertida e
que precisa ser solucionada, tendo em vista ser tal instrumento de vital importância
para o controle ambiental. Além disso, alguns Municípios brasileiros estão
implementando o licenciamento mediante convênio administrativo com os Estados-
membros através da delegação de competência, o que também já afirmei ser
desnecessário para que o ente local possa licenciar, mas tais convênios podem ser
peça fundamental de cooperação entre os entes federativos, objetivando contribuir
para desburocratização e a melhoria dos procedimentos de análise contidos no
licenciamento417, mas ainda continuo a afirmar que a delegação de competência
como vem sendo feita através desses convênios, que deveriam ser de cooperação e
não de delegação, são absolutamente inconstitucionais, já que o fundamento do
licenciamento ambiental municipal tem por base a própria Constituição Federal de
1988 e por tal as competências constitucionais, com algumas exceções, não podem
ser delegadas.418
O licenciamento ambiental municipal tem sua base na
Constituição Federal de 1988, pois o ambiente é um direito fundamental e, assim,
essencial para a pessoa humana, classificado na terceira dimensão dos direitos
fundamentais, conforme apontei no primeiro capítulo, e por tal deve ser efetivado,
buscando a melhoria da qualidade de vida das pessoas presentes e para as

416
KRELL, Andreas J. Autonomia Municipal e Proteção Ambiental: Critérios para Definição das Competências
Legislativas e das Políticas Locais. In: KRELL, Andreas J. e MAIA, Alexandre da. Op. cit., p. 171. Não existe
nenhuma hierarquia formal entre as leis da União, as dos estados e as dos municípios: cada um desses sistemas
possui o seu próprio espaço de soberania enquanto se desenvolve nos limites da sua competência constitucional.
Dentro dessa esfera de autonomia, a norma municipal possui um status de inviolabilidade, podendo derrogar
também normas superiores que a contrariem, sendo inconstitucionais a lei estadual e a lei federal que,
desbordando dos limites das respectivas competências, invadirem o campo da competência municipal.
417
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 168. O convênio administrativo tende a racionalizar a atuação dos órgãos
administrativos de meio ambiente, porque evita a duplicidade de ações e permite que um maior número de
atividades seja devidamente licenciado e fiscalizado. Com isso o licenciamento ambiental será mais efetivo e o
seu objetivo maior, que é a concretização do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
estará mais próximo.
418
Ibidem, p. 158. É sabido que é da Constituição Federal que deve se retirar o esclarecimento quanto à
competência dos Municípios para fazer licenciamento ambiental.
168

gerações futuras que têm o direito de ter um ambiente adequado para quando
vierem a existir. Dessa forma o texto constitucional, em capítulo próprio, que trata do
ambiente, normatizou como sendo um dever a proteção e preservação ambiental
pelo Poder Público e pela Coletividade, não excluindo nenhum ente público, visto
que Poder Público compreende todo um complexo de representação estatal,
estando incluído a União, Estados-membros, Municípios e o Distrito Federal, ainda
na distribuição de competências o Município tem o dever de proteger o ambiente
concorrentemente com os outros entes federativos.419 Assim, a Constituição Federal
de 1988 impõe que os entes federativos locais exerçam o controle ambiental e o
licenciamento ambiental, como dito, é um instrumento de controle e por ser o
Município ente da Federação, esses entes têm competência para a instituição do
licenciamento ambiental, ainda porque em nenhum momento o ordenamento
constitucional impossibilitou expressamente o exercício desse instrumento pelos
entes locais.420 Além disso, por se tratar de um instrumento administrativo de
controle ambiental que tem por objetivo ponderar os direitos fundamentais incidentes
em determinado caso concreto, que aparentemente se apresentam conflitantes,
esse é um instrumento que visa à efetivação de direitos fundamentais que também é
um dever constitucional do Município e que somente poderia ser restringido através
do próprio ordenamento constitucional, conforme os apontamentos do segundo
capítulo deste estudo, que tratou da adequada interpretação das normas ambientais
e da possibilidade de restrição dos direitos fundamentais.
Ocorre que, pelo fato de a Lei da Política Nacional do Meio
Ambiente ter sido editada em momento anterior a Constituição vigente, a sua
interpretação deve adequar-se ao novo ordenamento constitucional e não acreditar
que a interpretação dessa lei a época que foi editada permaneça adequada,
simplesmente pelo fato de ela ter sido recepcionada pela Constituição Federal de
1988, deve o intérprete jurídico estabelecer um entendimento dessa lei federal e não
mais nacional, com a Constituição Federal em vigor, que passou a inserir o
Município no quadro dos entes federativos e atribuiu competências próprias no que

419
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 159.
420
JUNIOR, Hamilton Alonso. Da Competência para o licenciamento Ambiental, In: FINK, Daniel Roberto.; JR,
Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Op. cit., p. 48 – 49. Portanto, União, Estados, Distrito Federal e
Municípios devem sem qualquer sobreposição ou hierarquia administrativa (executiva), “...proteger o meio
ambiente e combater a poluição ...”, utilizando para tanto os instrumentos postos à disposição na legislação,
respeitando, cada qual, a autonomia alheia.
169

tange à proteção e controle ambiental. É necessário, dessa forma, retirar do sistema


jurídico pátrio uma nova interpretação da Lei Federal nº 6.938/81, de maneira que
preserve o texto legal e ao mesmo tempo compatibilize com a nova ordem
constitucional. Assim, este estudo busca contribuir para esta nova interpretação do
ordenamento jurídico ambiental em especial no que tange ao licenciamento
ambiental e os entes federativos competentes para o exercício.
A nova interpretação constitucional da Lei federal nº 6.938/81,
em especial para este estudo do artigo 10, que institui o licenciamento ambiental em
nível nacional na época de sua edição e atualmente tem força normativa em relação
somente à União, deve ter uma interpretação conforme a Constituição Federal em
vigor, objetivando manter o enunciado constitucional e evitar que o mesmo seja
declarado não recepcionado pela atual ordem constitucional. Manoel Messias
Peixinho afirma que a interpretação conforme a Constituição é um processo
hermenêutico em que o intérprete estabelece uma ligação do ordenamento jurídico
infraconstitucional com a carta constitucional de modo que esta ordene uma função
útil para o enunciado inferior, para que este continue válido.421 Assim, a proteção e o
controle ambiental não podem ser interpretados pela lei, mas pela Constituição
Federal que estabelece atualmente um ordenamento, no qual todos os entes da
Federação têm o dever de controlar o ambiente, não podendo uma lei inferior ao
ordenamento jurídico constitucional restringir tal dever, sob pena de
inconstitucionalidade, ou não receptividade. Dessa forma, afirmar que os Municípios
brasileiros não podem exercer o licenciamento ambiental, pelo fato de o artigo 10 da
Lei federal nº 6.938/81 não ter incluído esses entes na utilização desse instrumento
de controle ambiental, é realizar uma interpretação conforme o ordenamento jurídico
infraconstitucional, afastando dessa lei as normas constitucionais que devem estar
fundamentando todo o trabalho interpretativo, causando um desequilíbrio no sistema
jurídico, uma vez que a carta constitucional normatiza que o controle ambiental é
dever de todos os entes federativos, enquanto a legislação infraconstitucional
restringe a possibilidade de controle por um dos entes que constitucionalmente tem

Dentre esses instrumentos temos, com grande eficácia, em face do caráter preventivo, o licenciamento ambiental
(art. 9º, IV, da Lei nº 6.938/81).
421
PEIXINHO, Manoel Messias. A Interpretação da Constituição e os Princípios Fundamentais, Op. cit., p. 109.
A interpretação conforme a Constituição permite a independência dos órgãos que a promovem, caracterizando
uma posição ativa e quase criadora do controle constitucional. Imprescindível é que a interpretação conforme a
Constituição não permite que o preceito legal fique sem qualquer função útil ou acolha critérios e soluções
170

este dever. É uma clara interpretação da norma inferior que restringe norma superior
e tal hermenêutica retira a Constituição Federal do ápice do ordenamento jurídico
pátrio.
Ao mesmo tempo, afirmar que o artigo 10 da Lei federal nº
6.938/81 não foi recepcionado pelo ordenamento constitucional em vigor é
extremamente exagerado e prejudicial ao controle ambiental de nível federal, pois é
esse artigo que, segundo o princípio da legalidade, permite que a União possa
exercer o licenciamento ambiental das atividades de sua competência, até porque é
ela que instituiu a utilização de tal instrumento e alguns critérios definidores dos
objetos a serem licenciados pelo órgão ambiental federal, determinado que cabe
atualmente ao IBAMA o licenciamento de atividades e empreendimentos que
possam causar impactos de âmbito nacional ou regional. A não recepção do artigo
10 da lei em comento causa um sério prejuízo à proteção ambiental, pois inexistiria
órgão competente para licenciar as condutas que causem um significativo impacto
de nível nacional ou regional, até porque mesmo a União tendo a competência sobre
os assuntos de predominância nacional e regional, faltaria lei que pudesse autorizar
o exercício desse instrumento, até que fosse editada nova lei federal que instituísse
o licenciamento a nível federal. Evidente que nem todo o artigo 10 poderá ser tido
como recepcionado, tendo em vista que violam a autonomia dos entes federativos,
conforme faz o §2º do artigo em questão, pois o mesmo enuncia que alguns
licenciamentos ambientais somente terão validade após a homologação do IBAMA.
Tal norma fere o sistema federativo brasileiro, uma vez que como dito anteriormente,
cada ente tem sua autonomia administrativa e um não pode condicionar o exercício
administrativo do outro, e é o licenciamento ambiental um instrumento de proteção
ambiental que funciona formalmente através de um procedimento administrativo e
por tal é impossível que uma lei federal estabeleça um condicionamento ao exercício
administrativo dos Estados-membros e dos Municípios. Com isso, para evitar um
prejuízo ao procedimento administrativo de licenciamento ambiental a nível federal é
extremamente importante que se estabeleça uma hermenêutica conforme a
Constituição Federal referente ao licenciamento instituído pela Lei Federal nº
6.938/81.

absolutamente contrárias às do legislador constituinte, o que já demonstra os riscos de distorção e insegurança


jurídica que pode proporcionar.
171

Portanto, acredito que uma interpretação adequada do artigo


10 seria através da competência residual estadual, consagrada pela Constituição
Federal de 1988, a qual determina que o que não for da competência da União ou
do Município é do Estado-membro. Dessa forma, o artigo em comento institui o
licenciamento ambiental a nível federal e expressa no texto legal que os objetos que
não são licenciados pela União serão pelos Estados-membros, da mesma maneira
que os Municípios, ao editarem lei instituidora de licenciamento ambiental municipal
também poderão expressamente enunciar que os objetos que não forem de sua
competência serão licenciados pelo Estado-membro, o que constitui a formalização
escrita da competência residual normatizada pela Constituição Federal de 1988.
Com isso, o artigo 10, da Lei Federal nº 6.938/81, não exclui os Municípios de
instituírem e exercerem o licenciamento ambiental e também não institui nos
Estados-membros o exercício de tal instrumento, uma vez que o que permite à
Administração Pública Estadual o exercício desse instrumento é a lei estadual que
institui o licenciamento ambiental a nível estadual. Da mesma maneira ocorre com o
licenciamento ambiental municipal, pois para o exercício deste instrumento, carece a
Administração Pública Municipal de uma lei municipal que instituirá as regras e
procedimentos jurídicos do licenciamento a nível municipal, respeitando as regras
gerais de âmbito federal e estadual no que tange à proteção ambiental. Penso que
através dessa interpretação preserva-se a recepção do artigo 10, da Lei Federal nº
6.938/81 e conseqüentemente, a validade legal do licenciamento ambiental federal.
Assim, possibilitando uma adequada alocação da norma infraconstitucional no
ordenamento jurídico construído a partir dos preceitos constitucionais.
A partir dessa interpretação, posso dizer que outras normas
infraconstitucionais passam a estar de acordo com o ordenamento jurídico, pois são
normas que hierarquicamente encontram-se em nível inferior à Lei Federal nº
6.938/81, como é o caso das resoluções do CONAMA; que por vezes são
consideradas inconstitucionais e ilegais422, por extrapolarem a competência atribuída
a esse órgão colegiado.423 Tratando-se do licenciamento ambiental, a resolução

422
BRASIL, Tribunal Regional Federal, 4ª Região, Proc. nº 200004011184978 UF: RS, Terceira Turma, Relator:
Juiz Luiz Dias Cassales, julgado em 09 de out. de 2001: Disponível em: <http://www.trf4.gov.br> . Acesso em:
18 de mar. 2008. 2. A Resolução Conama 237/97, que introduziu a municipalização do procedimento de
licenciamento, é eivada de inconstitucionalidade, posto que exclui a competência da União nessa espécie de
procedimento.
423
ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental, Op. cit., p. 145 – 147.
172

CONAMA 237/97424 estabeleceu, nos artigos 4º, 5º e 6º, que cabe à União o
licenciamento ambiental das atividades e empreendimentos que causem significativo
impacto de nível nacional ou regional, apresentando uma relação exemplificativa de
situações em que o impacto é nacional ou regional, já no artigo 5º, a mesma
resolução determina que cabe aos Estados-membros o licenciamento de atividades
e empreendimentos relacionados nos incisos do artigo, cabendo, neste momento,
apontar algumas observações, já que o caput do artigo em comento não estabelece
que cabe aos Estados-membros o licenciamento ambiental das condutas que
causem significativo impacto estadual, sendo somente mencionado nos incisos, o
que me faz acreditar que nem todas as atividades relacionadas e possivelmente
licenciadas pelos Estados-membros estão atreladas ao impacto estadual. Tal
situação, penso, vem reafirmar meu posicionamento a respeito da competência
residual dos Estados-membros, inclusive no exercício do licenciamento ambiental,
uma vez que se houvesse uma obrigatoriedade do licenciamento ambiental estadual
somente para atividades de impacto estadual, não poderiam os entes estaduais
exercerem o licenciamento que compreendesse impactos locais, como acontece nos

424
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 237 de 19 de dezembro de 1997.
Disponível em <URL: http://www.conama.gov.br> . Acesso em: 26 de mar de 2008. Art. 4o Compete ao Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, órgão executor do SISNAMA, o
licenciamento ambiental a que se refere o artigo 10 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, de empreendimentos e
atividades com significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional, a saber: I - localizadas ou
desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental; na zona
econômica exclusiva; em terras indígenas ou em unidades de conservação do domínio da União. II - localizadas ou
desenvolvidas em dois ou mais Estados; III - cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais do
País ou de um ou mais Estados; IV - destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar e
dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear em qualquer de suas formas e
aplicações, mediante parecer da Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN; V - bases ou empreendimentos
militares, quando couber, observada a legislação específica.§ 1o O IBAMA fará o licenciamento de que trata este artigo
após considerar o exame técnico procedido pelos órgãos ambientais dos Estados e Municípios em que se localizar a
atividade ou empreendimento, bem como, quando couber, o parecer dos demais órgãos competentes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, envolvidos no procedimento de licenciamento. § 2o O
IBAMA, ressalvada sua competência supletiva, poderá delegar aos Estados o licenciamento de atividade com
significativo impacto ambiental de âmbito regional, uniformizando, quando possível, as exigências. Art. 5o
Compete ao órgão ambiental estadual ou do Distrito Federal o licenciamento ambiental dos empreendimentos e
atividades: I - localizados ou desenvolvidos em mais de um Município ou em unidades de conservação de
domínio estadual ou do Distrito Federal; II - localizados ou desenvolvidos nas florestas e demais formas de
vegetação natural de preservação permanente relacionadas no artigo 2o da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de
1965, e em todas as que assim forem consideradas por normas federais, estaduais ou municipais; III - cujos
impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais de um ou mais Municípios; IV – delegados pela
União aos Estados ou ao Distrito Federal, por instrumento legal ou convênio. Parágrafo único. O órgão
ambiental estadual ou do Distrito Federal fará o licenciamento de que trata este artigo após considerar o exame
técnico procedido pelos órgãos ambientais dos Municípios em que se localizar a atividade ou empreendimento,
bem como, quando couber, o parecer dos demais órgãos competentes da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, envolvidos no procedimento de licenciamento. Art. 6o Compete ao órgão ambiental municipal,
ouvidos os órgãos competentes da União, dos Estados e do Distrito Federal, quando couber, o licenciamento
ambiental de empreendimentos e atividades de impacto ambiental local e daquelas que lhe forem delegadas pelo
Estado por instrumento legal ou convênio.
173

casos em que os Municípios não implementaram esse instrumento ambiental, não


existiria a possibilidade da aplicação do princípio da subsidiariedade. Ao final, o
artigo 6º da resolução CONAMA estabelece o licenciamento ambiental municipal
para as atividades de empreendimentos de impacto local. Os artigos mencionados
somente reafirmam e encontram-se compatíveis com a norma constitucional no que
tange à proteção e controle ambientais, possibilitando o licenciamento ambiental por
todos os entes federativos.425
Importante também mencionar que o inciso IV, do artigo 5º e a
parte final do artigo 6º, que disciplina sobre a possibilidade da atuação dos entes nos
objetos delegados é inconstitucional, sendo impossível a delegação dos objetos de
impacto nacional ou regional para os Estados-membros ou dos de impacto estadual
para os Municípios, tendo em vista que tal delegação viola o princípio da
predominância do interesse, e que os Municípios não têm competência diante de
situações de predominância estadual, pois falta-lhes base constitucional para poder
exercer o licenciamento dos objetos que não está dentro da predominância do seu
interesse.426 O exercício do licenciamento ambiental estadual sobre os objetos de
interesse local é a adoção do princípio da subsidiariedade, o que me faz acreditar
que esses objetos nunca serão de competência originária dos Estados-membros,
eles exercem o licenciamento porque os Municípios não o fazem, seja porque não
são capacitados para o exercício ou simplesmente por não desejarem implantar
esse instrumento na Administração Pública local. Mas ao instituírem o licenciamento
ambiental municipal, penso que automaticamente os objetos de impacto local que
estão sendo controlados pelo ente estadual passam ao Município, já que
constitucionalmente a competência de controle dessas atividades e
empreendimentos é do ente local. Dessa forma, a resolução CONAMA 237/97
compatibilizou de forma que apresentou expressamente o ditame constitucional para

425
BRASIL, Tribunal Regional Federal, 4ª Região, Proc. nº 200272080031198 UF: SC, Quarta Turma, Relator:
Juiz Valdemar Capeletti, julgado em 27 de jul. de 2005: Disponível em: <http://www.trf4.gov.br> . Acesso em:
16 de fev. 2008. Não se vislumbra inconstitucionalidade impingida na Resolução 237 do CONAMA, tendo-se
em vista que foi expedida em harmonia com a Constituição da República e com a legislação federal, sendo,
portanto, meio legislativo idôneo para esmiuçar e regulamentar o comando legal que, por sua natureza geral, não
se ocupa de questões específicas e particulares.
426
JUNIOR, Hamilton Alonso. Da Competência para o licenciamento Ambiental, In: FINK, Daniel Roberto.; JR,
Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Op. cit., p. 55. Por vezes, no entanto, a referida resolução afasta-se do
critério constitucional da predominância do interesse vinculado à influencia direta do impacto ambiental,
entrando em rota de colisão com a autonomia dos entes federativos. Quando isso ocorre, o dispositivo
desrespeitador da Lei Maior evidentemente deve ser desconsiderado diante da sua inconstitucionalidade ou dever
ter tal vício declarado em sede própria.
174

o controle ambiental através do licenciamento, enunciando a possibilidade de todos


os entes federativos de implantarem e aplicarem esse instrumento ambiental de
ponderação de direitos fundamentais é a reprodução constitucional do dever de
promoção dos direitos fundamentais.427
Outra crítica a resolução CONAMA 237/97 refere-se ao artigo
428
20 que determina que os entes, para poder exercer o licenciamento ambiental,
devem ter na estrutura da Administração Pública uma equipe de profissionais
habilitados para análise dos requerimentos de licença e ainda devem ter
implementado o Conselho Ambiental de caráter deliberativo e com a participação da
sociedade. Assim, para que os Municípios possam implementar o licenciamento
ambiental na Administração Pública local é fundamental o preenchimento desses
dois requisitos contidos no artigo 20 da resolução em questão. Para Talden
Farias429, o artigo em comento é inconstitucional, por violar a autonomia dos entes
federativos ao exigir para o exercício do licenciamento ambiental que seja
implementado o Conselho Ambiental de caráter deliberativo e com participação
popular, e ainda que o ente tenha um corpo de profissionais habilitados para a
análise dos requerimentos de licença, pois essa norma corresponde a uma
imposição de um ente federativo a outro sem base constitucional.430 Realmente, não
existe a possibilidade de um ente da Federação impor através de sua legislação que
os Municípios façam ou deixem de fazer alguma conduta, somente a Constituição
Federal tem tal poder, mas acredito que o artigo 20 da resolução somente enuncia
uma realidade essencial, inclusive o próprio Talden Farias reconhece a necessidade

427
JUNIOR, Hamilton Alonso. Da Competência para o licenciamento Ambiental, In: FINK, Daniel Roberto.; JR,
Hamilton Alonso e DAWALIBI, Marcelo. Op. cit., p. 55. A Resolução nº 237, de dezembro de 1997,
compatibilizou o sistema de competência nos licenciamentos aos ditames da Carta Magna, dando competência
implementadora a quem constitucionalmente a tem, possibilitando, outrossim, que o ente federativo diretamente
atingido dentro do raio de influência do dano ambiental (potencial ou concreto) ocupe-se com a questão que lhe
diz de perto.
428
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 237 de 19 de dezembro de 1997.
Disponível em <URL: http://www.conama.gov.br> . Acesso em: 26 de mar de 2008. Art. 20. Os entes federados,
para exercerem suas competências licenciatórias, deverão ter implementados os Conselhos de Meio Ambiente, com
caráter deliberativo e participação social e, ainda, possuir em seus quadros ou a sua disposição profissionais
legalmente habilitados.
429
FARIAS, Talden. Op. cit., p. 160.
430
MUKAI, Toshio. Política Ambiental: responsabilidade do Poder Público por danos ao meio ambiente. In:
Fórum de Direito Urbano e Ambiental, nº 11, Belo Horizonte – MG: Fórum, 2003, p. 1090. Em nenhuma
hipótese, a título de legislação concorrente, União e Estados podem invadir matérias puramente locais, que são
de competência exclusiva do Município, nem obrigar o Município a fazer ou deixar de fazer algo, salvo se
prevista a obrigação na Constituição. Destarte, não há confundir-se: as competências para a atuação
administrativa e legislativa dos três entes federados é de natureza exclusiva, ressalvando-se que todos terão que
observar, nas suas legislações, as normas gerais da União e/ou suplementares dos Estados, quando se tratarem de
175

para o adequado exercício do licenciamento ambiental, que o ente municipal tenha


uma equipe de profissionais habilitados, até porque o procedimento administrativo
do licenciamento ambiental é eminentemente técnico e não político; assim, ele deve
ser analisado segundo argumentos técnicos no que tange ao respeito dos padrões
técnicos ambientais e para que ocorra tal análise, é necessário que seja feito por
profissionais habilitados. Em relação à necessidade do Município ter em sua
estrutura administrativa, o Conselho Municipal do Ambiente de caráter deliberativo e
participação da sociedade corresponde à efetivação do princípio da participação
democrática nos processos ambientais, pois é a sociedade que irá suportar os
efeitos benéficos e maléficos decorrentes da outorga da licença ambiental. O artigo
20 somente enuncia ser necessária uma estrutura mínima para a gestão ambiental
que corresponde a esses dois requisitos que já são exigidos pelo próprio
ordenamento principiológico do Direito Ambiental.431
Inconstitucionais são atribuições que não têm base no
ordenamento jurídico, que obrigam os Municípios a estabelecerem uma estrutura
não necessária para o exercício do licenciamento ambiental e novamente me refiro
ao Decreto do Estado do Rio de Janeiro que criou a descentralização do
licenciamento ambiental, tendo em vista que determina que os Municípios, para
exercerem o licenciamento ambiental, implantem o fundo municipal de meio
ambiente que é um instrumento de estrita conveniência da Administração Municipal
e que não cabe ao Estado-membro a obrigatoriedade de sua implementação. O
Decreto estadual impõe que os Municípios possuam Plano Diretor ou nos entes
locais com uma população inferior a 20.000 habitantes que tenham leis de diretrizes
urbanas. Vejo que essa obrigatoriedade não procede, até porque o licenciamento
ambiental municipal não se restringe ao perímetro urbano, mas em todo o território
municipal. Além disso, o decreto em comento causa uma insegurança jurídica, tendo
em vista que o convênio é temporário e tem vigência durante quatro anos, podendo
ser renovado por igual período e, nessa questão, é que se demonstra mais
claramente a insegurança jurídica que esse convênio produzirá, pois os Municípios
irão editar uma legislação específica sobre o licenciamento ambiental

Municípios; e a este título (concorrente) não cabe nem à União, nem aos Estados, invadir as atribuições de
polícia puramente locais, sob pena de ofensa às autonomias dos Muncípios.
431
MILARÉ, Edis. Op. cit., p. 547. Um tal sistema reclama base legal e mecanismos gerenciais que lhe garantam
legitimidade, eficiência e eficácia, para que as intervenções feitas sob sua inspiração venham adequar-se ao
176

regulamentando o procedimento administrativo, que deverão submeter os


interessados em requerer a outorga da licença ambiental municipal. Diante do
caráter provisório da vigência do convênio, pergunta-se ao final dela quem irá
analisar os requerimentos em andamento no Município e principalmente qual será o
procedimento administrativo a ser cumprido, o estadual ou o municipal? Ainda
poderá o ente estadual revogar a licença ambiental outorgada pelo Município, após
o termino da vigência do convênio? Estas são algumas dúvidas que me fazem
acreditar que esse instrumento é ineficaz e, conseqüentemente, causa uma
insegurança jurídica à sociedade.
Andreas J. Krell432 afirma que não é necessário a celebração
de convênio entre o Município e os Estados para que os primeiros possam licenciar
os objetos de impacto local, uma vez que a própria Constituição Federal concedeu
tal poder aos entes federativos locais. A autonomia municipal que sempre existiu no
Brasil não possibilita a restrição ou a concessão de um poder através de um ente
federativo para outro, pois as competências são determinadas pelo ordenamento
jurídico constitucional, que somente prevê que lei complementar regulamentará
normas de cooperação e não de distribuição de competência, uma vez que esta
somente através da Constituição Federal, segundo o autor acima mencionado a
referida lei complementar contribuiria na solução dos possíveis conflitos
433
institucionais entre os órgãos ambientais de entes federativos diferentes.
Dessa forma, com os fundamentos apontados, o Município é
plenamente competente para exercer o licenciamento ambiental das atividades de
impacto local e dos possíveis objetos que venham a surgir no ordenamento jurídico,
como tenta incluir o projeto de lei 388/2007, já que tal poder-dever é concedido pela
Constituição Federal e pelo sistema federativo brasileiro que atribui aos Municípios
autonomia administrativa, política e organizacional e por tal, é impossível que um

tratamento correto à gestão ambiental – no que se refere ao Município – e ao tratamento do meio ambiente como
patrimônio da coletividade.
432
KRELL, Andreas. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos
jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo, Porto Alegre – RS:
Livraria do Advogado, 2004, p 118. No entanto, não faz muito sentido a exigência de convênio para o
licenciamento local para atividades cujos impactos se limitam ao território municipal, onde o município
tradicionalmente já é competente para atuar.
433
Ibidem, p. 117. A tradição da autonomia administrativa sempre dominante no Brasil nunca permitiu uma
restrição das tarefas e dos serviços municipais pela legislação estadual ou federal. Uma reformulação dessas
competências administrativas comuns seria possível somente através da citada lei complementar, que deve
regulamentar o art. 23, parágrafo único, CF. na falta dessa lei, são comuns os conflitos institucionais entre os
diferentes órgãos administrativos, gerando ineficiência na consecução das políticas ambientais dos diferentes
entes estatais, o que acaba beneficiando os poluidores e causadores de degradações do ambiente.
177

ente venha a restringir ou possibilitar o exercício de uma competência originária da


ordem constitucional, que é o controle ambiental pelos Municípios. Com isso, penso
que são inconstitucionais os convênios que tenham por objetivo permitir que os
Municípios exerçam o licenciamento ambiental através da adoção de procedimentos
e condutas a esses entes locais.
Assim, torna-se necessário que, após justificar
constitucionalmente a implementação do licenciamento ambiental municipal, seja
importante delimitar os contornos do impacto local e a forma de identificação dos
objetos a serem licenciados pelos Municípios.

2.1 Impacto Local.

Importante para a definição do ente licenciante é, atualmente,


a abrangência do impacto que a atividade ou empreendimento poderá causar à
coletividade, uma vez que, seguindo a orientação constitucional do princípio da
predominância do interesse, os impactos de âmbito nacional ou regional serão
obviamente licenciados pela União e os que se restringirem ao âmbito estadual terão
como ente licenciador o Estado-membro e, conseqüentemente, os de impacto local
serão licenciados pelos Municípios.434 Evidente que somente esse elemento não é
suficiente, diante dos conflitos existentes, para definir o ente licenciador, mas
acredito que é o principal elemento definidor, já que é impossível que um ente local
venha a licenciar uma atividade ou empreendimento que os impactos ultrapassem a
predominância do interesse local; como também, um Estado-membro não poderá
licenciar objetos que os impactos sejam de predominância de interesse nacional ou
regional, pois ultrapassa o seu interesse.435

434
BRASIL, Tribunal Regional Federal, 5ª Região, Apelação Cível nº 393786 - RN, Terceira Turma, Relator:
Juiz Élio Siqueira, julgado em 05 de out. de 2006: Disponível em: <http://www.trf5.gov.br> . Acesso em: 20 de
mar. 2008. Na espécie, os elementos colacionados nos autos me conduzem à conclusão de que o impacto era
eminentemente local, alusivo ao equilíbrio ambiental da cidade de Natal e à questão da contaminação de
aqüíferos responsáveis pelo abastecimento de água da mesma. Nestas circunstâncias, não entendo a razão pela
qual se deva exigir o licenciamento do órgão ambiental estadual. O “caput”, do artigo 10, deve ser
compatibilizado com a Carta Magna de 1988, que contemplou os municípios entre os entes federativos
responsáveis pelo licenciamento e pela própria definição de zonas de proteção ambiental, observados os
parâmetros definidos por lei.
435
BRASIL, Tribunal Regional Federal, 5ª Região, Apelação Cível nº 327.022 - RN, Terceira Turma, Relator:
Juiz Rivaldo Costa, julgado em 22 de abr. de 2004: Disponível em: <http://www.trf5.gov.br> . Acesso em: 21 de
mar. 2008. A competência para licenciar projeto de obra ou atividade potencialmente danosa ao meio ambiente
não se fixa pela titularidade dos bens nele contemplados, mas pelo alcance dos seus possíveis impactos
ambientais.
178

Inicialmente devo definir e conceituar o que vem a ser impacto


ambiental, visto que o direito não considera qualquer alteração das características
ambientais como sendo um impacto ambiental, é necessário que exista uma conduta
humana voluntária sobre o ambiente, até porque não se pode considerar para o
direito todas as condutas humanas como sendo geradoras de impacto, tendo em
vista que os seres humanos também compõem o ambiente e, suas condutas,
quando não voluntárias, devem ser consideradas como acontecimentos naturais.436
Dessa forma, o impacto ambiental é uma alteração das características ambientais
causado de forma não natural pela conduta humana e causador de um desequilíbrio,
pois altera os elementos constitutivos do ambiente.437 Com isso, toda vez que o
homem, diante de sua necessidade de utilizar os recursos ambientais, causar um
desequilíbrio da ordem ambiental estará causando conseqüentemente um impacto
ambiental, podendo ser este de abrangência positiva ou negativa. Tendo
características do primeiro, essas atividades devem ser incentivadas tanto pela
Coletividade como pelo Poder Público, mas se as condutas resultarem em impactos
negativos, essas devem ser paralisadas e evitadas.438 O ordenamento jurídico
infraconstitucional definiu no artigo 1º da resolução CONAMA 01/86439 o conceito
jurídico de impacto ambiental, arrolando os elementos que, caso sejam afetados,
podem vir a causar um impacto no equilíbrio da ordem ambiental.
Após definir o conceito de impacto ambiental, retorno ao
licenciamento ambiental municipal, que tem como elemento definidor do ente
municipal como licenciante o impacto local que a atividade ou empreendimento
produzirá e, para isso, torna-se necessário que seja definido o que representa o
impacto local para que, posteriormente, possa enquadrar os objetos a serem
licenciados, de forma que ocorra uma compatibilidade entre a abrangência do
impacto promovido e o órgão ambiental competente para o licenciamento ambiental.

436
ANTUNES, Paulo Bessa. Direito Ambiental, Op. cit., p. 267. É desnecessário dizer que os EIA somente se
destinam a examinar os impactos ambientais decorrentes da intervenção humana voluntária sobre o meio
ambiente. Os impactos ambientais ocorridos em razão de acontecimentos naturais não possuem interesse para o
presente trabalho.
437
Idem.
438
Ibidem, p. 271-272.
439
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 001 de 23 de janeiro de 1986. Disponível
em <http://www.conama.gov.br> . Acesso em: 23 de mar. de 2008. Art. 1º Para efeito desta Resolução,
considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio
ambiente causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que direta ou
indiretamente, afetem: I – a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II- as atividades sociais e
econômicas; III – a biota; IV – as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V – a qualidade dos
recursos ambientais.
179

A resolução CONAMA 237/97, em seu artigo 1º somente definiu o conceito do


impacto regional, faltando uma definição para os impactos estaduais e locais. Tais
conceitos são de fundamental importância para a definição do ente licenciador, tanto
que o Projeto de Lei nº 388/2007440 traz as definições, atrelando a abrangência dos
impactos ao território. Com isso, uma conduta humana voluntária que cause um
impacto de abrangência local corresponde que os efeitos deste não ultrapassem os
limites territoriais do Município; da mesma forma ocorre com os Estados-membros
na definição do impacto estadual, sendo este o que a abrangência dos seus efeitos
não ultrapassem o território estadual. Evidente que a definição ainda não tem força
normativa, uma vez que corresponde a um projeto de lei, devendo atualmente a
doutrina e a jurisprudência definir esses conceitos.
Na verdade, o impacto local corresponde ao elemento de
interesse do Município, é o fator que determina a predominância do interesse de tal
ente federativo. Dessa forma, é através do impacto que se define o ente licenciador,
visto que é necessário um elemento definidor do princípio da predominância do
interesse e esse elemento é o impacto, que sendo de abrangência local, quer dizer
dentro dos limites geográficos do ente local ele será o competente para exercer o
licenciamento do objeto promovedor do impacto. Esta identificação do elemento
definidor do interesse foi feita pela resolução CONAMA 237/97 ao definir que cabe
aos Municípios o licenciamento dos objetos que promovam impactos locais.
Importante é a identificação dos objetos que produzem
impactos locais e como tal identificação pode ser realizada seguindo a orientação do
interesse local predominante. Penso que as formas de identificação são várias, mas
todas devem estar atreladas a estudos técnicos comprovadores, mostrando que os
efeitos positivos e negativos decorrentes dos impactos não irão ultrapassar os limites
geográficos do Município. Uma das formas é através do próprio ordenamento
constitucional que disciplinou no artigo 30, VIII e IX, o dever constitucional do
Município em ordenar o seu território e também a proteção do patrimônio histórico-
cultural local. Evidente que esse rol constitucional não é taxativo, tendo em vista o

440
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Complementar - PLP nº 388/2007: Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br > . Acesso em: 12 de fev. 2008. Art. 10. Para os efeitos desta Lei, considera-se: I -
impacto ambiental direto de âmbito nacional ou regional: aquele que afete diretamente, no todo ou em parte, o
território de dois ou mais Estados Federados ou cujos impactos ambientais significativos diretos ultrapassem os
limites territoriais do País; II - impacto ambiental direto de âmbito estadual: aquele que afete diretamente, no
todo ou em parte, o território de dois ou mais Municípios; e III - impacto ambiental direto de âmbito local:
aquele que afete direta, no todo ou em parte, o território de um município sem ultrapassar o seu limite territorial.
180

inciso I. Outra forma seria através do reconhecimento pelas Constituições Estaduais,


da falta de interesse do ente estadual, que indiretamente se não é um interesse nem
nacional, regional ou estadual conseqüentemente é municipal.441 É claro que deverá
ter o reconhecimento pelos Municípios, tendo em vista a competência residual dos
Estados-membros, que caso não haja uma concordância sobre a predominância do
interesse, este conflito deverá ser solucionado pelo Poder Judiciário. E, por fim,
acredito que outra forma de identificação dos objetos a serem licenciados pelos
Municípios, por promoverem impactos de abrangência local, é através da própria
Sociedade afetada pelos impactos, que será ponto de análise adiante. Importante
alertar que devido ao conceito de impacto ambiental estar vinculado aos efeitos do
impacto nos elementos existentes dentro do território municipal, causa uma
impossibilidade absoluta de afirmar quais os objetos que produzem impactos locais,
já que os impactos produzidos de uma atividade ou empreendimento, quando
implantados em um Município de grandes dimensões geográficas, podem não
ultrapassar o seu território, mas o mesmo objeto quando implantado em um ente
local de pequenas dimensões, os seus impactos podem ultrapassar seu território e
conseqüentemente, não poderão ser considerados como sendo impactos locais.
Dessa forma, a classificação de uma atividade ou empreendimento como sendo
causadora de impacto local e de grande subjetividade, pois não tem como definir, de
forma taxativa, quais os objetos são da competência licenciatória do Município e
quais não são. A partir disso, observo que é primordial que o próprio Município
reconheça que determinado objeto é gerador de impacto local.
Outra questão relevante é não confundir a relevância com o
impacto ambiental, visto que toda a utilização dos recursos ambientais e o seu
respectivo controle são de grande relevância ambiental, da mesma forma que todos
os bens ambientais também são de relevância ambiental para a pessoa humana,
mas se for vincular a relevância ambiental com o conceito de impacto,
automaticamente não existiriam as classificações de nível nacional, regional,
estadual e local, pois todos seriam de nível mundial, tendo em vista que qualquer

441
KRELL, Andreas J. Autonomia Municipal e Proteção Ambiental: Critérios para Definição das Competências
Legislativas e das Políticas Locais. In: KRELL, Andreas J. e MAIA, Alexandre da. Op. cit., p. 179. Pode-se
atribuir aos textos estaduais, que tratam das competências municipais, o seguinte significado: onde a Carta
Estadual declara os municípios a serem competentes para determinar tarefas, o próprio estado reconhece, de
maneira indireta, que tais funções – salvo raras exceções – não são de interesse predominantemente regional (=
estadual) e que, portanto, estão os municípios facultados e “exortados” a editar suas próprias legislações nessas
áreas, podendo incluí-los, desde o início, nas suas Leis Orgânicas Municipais.
181

degradação ambiental provoca um desequilíbrio do sistema ambiental e os efeitos


não se restringem aos territórios. A relevância está atrelada aos impactos indiretos,
mas os que devem ser considerados para a definição do ente federativo licenciante
são os impactos diretos.442 Novamente me reporto ao Projeto de Lei Complementar
388/2007443, que traz em seu texto as definições para impacto direito de nível
nacional, regional, estadual e local que deixa evidente a vinculação do ente
licenciante ao impacto direto, nos artigos 6º, XV, a; 7º, XIV, a e 8º, XIV, a. 444
Objetivando um melhor entendimento sobre a questão, utilizarei como exemplo a
existência de uma espécie endêmica da flora que é a Begonia ibitiocensis E. L.
Jacques & Mamede, sp.nov. (Begonisceae), que devido a sua característica, ocorre
principalmente na Mata Atlântica, mais detalhadamente na região de Ibitioca, em
Campos dos Goytacazes – RJ.445 Assim, qualquer conduta sobre essa espécie da
flora é de grande relevância, tanto do ponto de vista positivo, através de sua
proteção, como também negativamente através de atos que venham a degradá-las.
Dessa forma, caso seja necessário a implantação de uma atividade ou
empreendimento no local em questão, deve-se considerar a abrangência do impacto
que os objetos a serem licenciados irão produzir para definir o ente federativo que irá
exercer o licenciamento ambiental. Para tal definição não se deve considerar a
relevância desse bem ambiental, uma vez que é certo que é de grande valia para
todas as pessoas humanas. A degradação dessa espécie endêmica poderá não
produzir impactos diretos além do território do Município de Campos dos
Goytacazes, diferentemente dos possíveis impactos indiretos que poderão ter uma
abrangência muito maior. Sendo assim, no exemplo acima, a existência de uma flora
endêmica não define o ente licenciador, mas o complexo de fatores que
determinaram a abrangência do impacto direto promovido.

442
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 237 de 19 de dezembro de 1997.
Disponível em <URL: http://www.conama.gov.br> . Acesso em: 26 de mar de 2008. Art. 1º Para efeito desta
Resolução são adotadas as seguintes definições: IV - Impacto Ambiental Regional: é todo e qualquer impacto
ambiental que afete diretamente (área de influência direta do projeto), no todo ou em parte, o território de dois ou
mais Estados.
443
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Complementar - PLP nº 388/2007: Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br > . Acesso em: 12 de fev. 2008.
444
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Complementar - PLP nº 388/2007: Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br > . Acesso em: 12 de fev. 2008.
445
BRASIL, Universidade Estadual do Norte Fluminense – UENF, Centro de Biociência e Biotecnologia – CBB,
Herbário, Campos dos Goytacazes – RJ: Disponível em: <http://www.uenf.br/uenf/pages/cbb/herbario>, Acesso
em: 30 de out de 2007.
182

2.2 A Participação da Sociedade na Identificação dos Objetos a serem Licenciados.

Para que se possa entender a importância da participação da


Sociedade na idenficação dos objetos a serem licenciados pelos Municípios, deve-
se entender o processo democrático e os seus tipos; além da forma de atuação dos
cidadãos nos diversos tipos de democracias e a fundamentação dos conselhos de
políticas públicas para a Administração Pública.
Assim, a democracia é a forma de desenvolvimento do convívio
das pessoas humanas, que com o tempo tende a melhorar e aperfeiçoar a sua
abrangência na condução dos Estados e tal melhora ocorre quando os sistemas
democráticos aproximam-se da efetivação dos direitos fundamentais do homem,
pois quanto mais consagrados esses direitos, mais concreta é a democracia. Esse
446
é um direito de quarta dimensão , como foi afirmado no primeiro capítulo e, por tal,
essencial à pessoa humana, já que é o direito de participar da condução do Estado
do qual faz parte. Estados absolutistas e ditatoriais, nos quais a pessoa humana
não tem efetivado seus direitos fundamentais, ou quando são relativamente pouco
efetivados, são Estados contrários aos direitos fundamentais e conseqüentemente,
são violadores das pessoas humanas que vivem em seus territórios. Dessa forma,
para que se possa efetivar o direito fundamental à democracia, e mais o direito à
participação da vida do Estado, é necessário a existência de uma “sociedade aberta
do futuro, em uma dimensão de máxima universalidade”447, no qual a sociedade
participe efetivamente das decisões que incidirão sobre o seu modo de vida e de
seus semelhantes, uma vez que somente dessa forma as pessoas humanas terão
uma existência digna, conforme seus próprios desejos coletivos.
A democracia é muito mais ampla do que um sistema político
de um Estado: “é um processo de afirmação do povo e de garantia dos direitos
fundamentais que o povo vai conquistando no correr da história”.448 Por ser uma
conquista popular, acredito que somente deve ser relativizada pelos seus
conquistadores, pois esses direitos alcançados durante a história estão agregados à
vida das pessoas que sentem e exercem tais direitos. Assim, após a conquista dos
direitos, não cabe mais o seu retrocesso, e abolir a sua incidência sobre as pessoas

446
BONAVIDES, PAULO. Curso de Direito Constitucional, Op. cit., p. 571.
447
Idem.
448
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Op. cit., p. 126.
183

humanas, admite-se somente a sua relativização mediante a participação do povo,


pois são direitos essenciais à existência digna e, por tal, somente seus titulares é
que tem legitimidade para relativizá-los, e tendo em vista que a vontade dos titulares
não é igual e comum, a democracia apresenta-se como um sistema de convivência e
tolerância no modo de vida.449 O poder político que regula o modo de vida dos
cidadãos advém da sociedade que impõem seus interesses, exigindo condutas
administrativas pelo Estado. São “interesses superiores, que podem ser defendidos
de modo mais ou menos racional; pode-se, pois, conceber o “poder político” como
uma forma de poder social abstrato duradouro, que permite intervenções no “poder
administrativo””450, sendo o poder político uma engenharia do poder da sociedade
sobre o Estado e que para ela deve existir.
Na democracia, o povo é detentor do poder é ele que deve
apontar a forma que será exercitado o poder democrático, sendo o representante
escolhido mero interlocutor das escolhas do titular do poder. Dessa forma, surge um
vínculo entre o poder e o povo, que é a democracia e quando inexiste essa relação
conseqüentemente não existe democracia, pois o povo não participa das decisões
do Estado. Em tais casos ocorre o surgimento dos regimes autoritários, em que o
poder emana de poucas pessoas que são representantes de si mesmas e não do
povo.451 Diante disso, a democracia fundamenta-se na vontade do povo de poder
escolher e decidir através da vontade da coletividade, a forma com que o Estado
intervém nos seus direitos, sem que ocorra uma violação dos direitos essenciais da
pessoa humana.
A escolha das maiorias é fator importantíssimo para a
democracia, uma vez que é um sistema exercido pela vontade da maioria sobre a
minoria, até porque se houver o contrário, democracia não irá ser, pois a prevalência
das minorias está muito mais caracterizada pela oligarquia, na qual o poder
encontra-se exercido por poucos. “A democracia, porém, apenas existe quando os
cidadãos livres e pobres, constituindo a maioria, são donos do governo e para que
exista oligarquia, é necessário que a soberania pertença a uma minoria de ricos e

449
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Op. cit., p. 126. Diz-se que é um processo
de convivência, primeiramente para denotar sua historicidade, depois para realçar que, além de ser uma relação
de poder político, é também um modo de vida, em que, no relacionamento interpessoal, há de verificar-se o
respeito e a tolerância entre os conviventes.
450
HABERMAS, Jürgen. Op. cit., p. 11.
451
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Op. cit., p. 133.
184

pobres”.452 É importante observar, que a democracia não se caracteriza pela maioria


de pobres ou ricos no poder, mas pela vontade igualitária da maioria dos cidadãos,
independente da classe social em razão. Para a democracia, as pessoas humanas
são iguais, não importando as suas características próprias.453 É claro que a
igualdade entre os ricos e pobres que compõem um Estado não pode ser
considerada como uma igualdade formal; uma vez que as necessidades são
diferentes e por tais, devem ser tratados de forma diferente; os ricos,
conseqüentemente, conseguem efetivar seus direitos com mais facilidade do que os
pobres, que para tal necessitam de uma maior atenção por parte do Estado na
igualdade democrática.454 Além da igualdade entre os cidadãos do Estado, estes
também, para exercerem a democracia, devem ser livres, pois a liberdade é valor
essencial para a escolha dos representantes e das decisões do Estado quando
interferir nos direitos fundamentais da pessoa humana, já que como dito
anteriormente, somente os titulares dos direitos essenciais podem relativizá-los, pois
a democracia é um processo de efetivação de direitos fundamentais, os quais
ocorrem através da participação efetiva do povo na tomada de decisões sobre a
condução do Estado.
A democracia pode ser exercida de diversas formas, mas é
imprescindível que todas tenham o objetivo de efetivar os direitos fundamentais da
pessoa humana e a formação do Estado Democrático de Direito Social, no qual
todos são tratados como iguais e o Estado é responsável em concretizar as normas
necessárias para o desenvolvimento digno da pessoa. Deve ocorrer uma ligação
entre a norma jurídica e a sociedade de forma que a primeira represente a realidade
da segunda, diferenciando do Estado Democrático Liberal que afastava a realidade
da sociedade da norma jurídica, pois tal modelo de Estado não tem como objetivo a
concretização dos direitos sociais inerentes à pessoa humana como membro de uma
sociedade.455 Bonavides identifica como sendo ultrapassado o modelo liberal de
Estado Democrático devido à sua falta de consistência em relação à realidade
social. “O Direito Constitucional do Estado liberal, em nome da juridicidade, podia

452
ARISTÓTELES. Op. cit., p. 177.
453
Ibidem, p. 180. O primeiro tipo de democracia é a que tem a igualdade como base. Nos termos da lei que
regula essa democracia, a igualdade vem a significar que os ricos e os pobres não possuem privilégios políticos,
que tanto uns como os outros não são soberanos de um modo exclusivo, e sim que todos o são precisamente em
igual proporção.
454
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, 3ª ed, 14ª tiragem, São
Paulo: Malheiros, 2006, p. 12 –13.
185

assim elevar-se a posições extremas de formalismo, as quais, despolitizando o


Direito, instauravam uma neutralidade aparentemente absoluta, mas em verdade
impossível perante o substrato ideológico das instituições.456
Dentre os modelos de exercícios de poder democrático pelo
povo, podemos destacar o surgimento da democracia direta, indireta ou
representativa e a semidireta ou participativa.
Na democracia direta, o povo exercita o poder democrático de
forma direta sem representante, é ele que elabora as leis, administra o Estado e
julga. O povo exerce todos os poderes ao mesmo tempo. Tal modelo tem origem na
Grécia antiga e através da ágora era exercida, era próximo de uma abdicação da
vida particular em prol da vida pública, em prol da condução do Estado Democrático.
É importante alertar, que naquela época o conceito de povo era diferente do
conceito atual, pois naquele período o povo correspondia à conjugação de homens
livres e por tal não correspondia à maioria das pessoas, uma vez que os escravos
457
representavam um número superior aos homens livres. Dessa forma, esse
modelo democrático exercido na Grécia antiga não corresponde com a atual
definição de democracia, pois era uma pequena parcela da sociedade que
participava da condução do Estado.458 Imprescindível que o povo, através da
sociedade, venha participar diretamente da condução do Estado Democrático, mas
evidente que não no formato da democracia direta da Grécia antiga, pois não
comporta atualmente esse modelo; mas a participação deve ocorrer em
determinadas matérias em que as decisões possam afetar direitos essenciais da
pessoa humana, neste momento cabe a participação do soberano da democracia.
Esta participação deve ocorrer somente em momentos específicos para que se evite
a existência do cidadão total, como diz Bobbio459 que corresponderia a um perigo
igualitário ao Estado totalitário.

455
BONAVIDES, PAULO. Curso de Direito Constitucional, Op. cit., p. 372-380.
456
Ibidem, p. 372.
457
GOULART, Clovis de Souto. Formas e Sistemas de Governo. Uma Alternativa para a Democracia Brasileira,
Porto Alegre - RS: Sergio Antonio Fabris Editor, 1995, p. 88.
458
Idem. Mas a democracia ateniense – para nos referirmos apenas ao Estado-cidade que mais se notabilizou
pela prática do governo direto – conforme já observamos em outro momento, não foi, a rigor, “democrático”,
pelo menos na acepção moderna do termo, como governo do povo, posto que a maioria era escrava e, nesta
condição, nenhuma participação tinha no exercício do poder.
459
BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia. Uma Defesa das Regras do Jogo, Op. cit., p. 42.Mas o
indivíduo rousseauniano conclamado a participar da manhã à noite para exercer os seus deveres de cidadão não
seria o homem total mas o cidadão total (como foi chamado com evidentes intenções polêmicas por Dahrendorf).
E, bem vistas as coisas, o cidadão total nada mais é que a outra face igualmente ameaçadora do estado total.
186

O segundo modelo de exercício a ser apresentado é a


democracia indireta ou também denominada de representativa, na qual o povo elege
seus representantes, que irão responder em nome do povo nas escolhas para a
condução do Estado Democrático de Direito na concretização de direitos essenciais
para a sociedade.460 Na democracia representativa, o povo não está limitado a
simplesmente escolher seus representantes, mas quando exerce seu direito de
escolha está participando ativamente, através de sua vontade na escolha do modelo
de governo que deseja e por tal, consente que determinado grupo possa representá-
lo e governá-lo. Para Bobbio, o “estado representativo é um estado no qual as
principais deliberações políticas são tomadas por representantes eleitos, importando
pouco se órgãos de decisão são o parlamento, o presidente da república, o
parlamento mais os conselhos regionais, etc”461
Na atualidade, esse modelo de exercício de democracia é
insuficiente para as necessidades, pois inexiste um vínculo entre o representado e o
representante após o processo de escolha e, em sua grande maioria, o escolhido
não corresponde, depois de eleito, às expectativas dos eleitores, pois não buscam a
efetivação dos direitos necessários ao povo que o escolheu.462 Dessa forma, o povo
atualmente exerce um poder de escolha, visto inexistir uma imperatividade entre a
atuação do representante e a vontade do representado, causando uma
impossibilidade de atuar na condução do Estado durante o período legítimo de
representação. Essa característica da não imperativa dos mandatos representativos
surgiu na atualidade, pois no período medieval os representantes dos burgueses
tinham poderes delimitados, e nas matérias nas quais os poderes tinham sido
expressamente concedidos, sendo um dever do representado ouvir suas bases nas
matérias que não tinha poder para decidir com fundamento na sua

460
Para GOULART, Clovis de Souto, em sua obra (Formas e Sistemas de Governo. Uma Alternativa para a
Democracia Brasileira, Porto Alegre - RS: Sergio Antonio Fabris Editor, 1995 p. 93.) A origem deste modelo de
democracia surgiu verdadeiramente na segunda metade do século XVIII, tendo anteriormente um caráter
eminentemente aristocrático, bastando para isso observar a formação da Câmara dos Lordes na Inglaterra no qual
os contribuintes passaram a serem representados, mas esta representação não tinha nenhuma conotação política
popular. Os parlamentos medievais configuram-se como verdadeiros nascedouros da democracia representativa,
vez que nestes existiam a participação política popular, pois eram constituídos de três estados: nobreza, clero e
burguesia. Esta última por ser altamente numerosa intervinha nos parlamentos através de representantes eleitos
da vontade dos burgueses.
461
BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia. Uma Defesa das Regras do Jogo, Op. cit., p. 44.
462
COSTA, Juliana Pedrosa. Gestão Democrática das Cidades, Revista de direito Municipal – RDM, Belo
Horizonte: Fórum, ano 5, nº 13, p, 81-102, jun/set. 2004, p. 88. O desvanecimento do poder representante do
cidadão, limitado no seu poder de escolha do mandatário, e a liberdade do mandatário, agindo sem vínculo com a
187

representatividade.463 O distanciamento entre o representante e o representado


desestrutura o conceito de democracia, pois a vontade do povo resume a escolha de
um representante que, como dito, não tem relação de compromisso com o povo que
o escolheu, o que causou uma diminuição da influência popular nas decisões
estatais. Para evitar esse enfraquecimento, deverá ocorrer a inclusão e o
fortalecimento das instituições populares e de classes, em que posso citar as
associações comunitárias, os sindicatos, a imprensa, que tem a obrigação de
informação sobre os acontecimentos e demonstrar as necessidades e os anseios do
povo para com seus representantes. Também de grande importância são os partidos
políticos que têm a função de exigirem de seus filiados a correspondente conduta
programática, na qual o povo se vincula a sua escolha; portanto, de suma
importância é o fortalecimento desses partidos através da obrigatoriedade da
fidelidade partidária e conseqüentemente, com a definição do verdadeiro detentor do
mandato representativo, conforme fez o TSE no julgamento da consulta nº
1398/2007 que recentemente julgou sendo do partido político o mandato
representativo e não do sujeito que se candidatou representando o partido nas
eleições.464
Assim, uma possível solução para a manutenção da
credibilidade da democracia representativa, seja a inclusão da sociedade na tomada
de decisões de forma direta, principalmente nas questões relacionadas à
concretização de direitos fundamentais. Evidente que não estou propondo que a
sociedade independentemente venha exercitar os Poderes do Estado, mas que
possa ser essencial à influência da mesma nas decisões estatais, incluindo a
vontade da sociedade para legitimar as decisões do Estado e, para que ocorra de
forma organizada esta influência, é necessário um espaço legítimo para que se
possa ocorrer a manifestação e a imposição da vontade coletiva da população.
O último modelo de democracia que demonstrarei é a
465
semidireta , em que o povo, que é o titular do poder, atua de forma mista,

representação, agravam a falência da democracia representativa tanto mais quanto outros órgãos, organismos,
instituições e entidades, sem raízes na vontade popular, sem pouso na soberania do voto e sem legitimidade.
463
GOULART, Clovis de Souto. Op. cit., p. 93.
464
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Op. cit., p. 140-141.
465
GOULART, Clovis de Souto. Op. cit., p. 99. Se, de um lado, se consolida o pensamento de que o Estado
moderno, por razões múltiplas que vão desde a extensão territorial e densidade demográfica, até a complexidade
dos encargos de governo, tornou-se inviável a democracia direta (nada obstante o caso isolado de cantões
suíços), de outro, surge o convencimento de que é possível, com a criação e exercício de alguns instrumentos de
atuação popular.
188

escolhendo seus representantes e, também, atuando diretamente nos processos


decisórios da condução do Estado. Tal é a forma de exercício, no qual a cidadania
se exerce através de alguns institutos, em que o cidadão em nome próprio, sem
necessidade de representantes, pleiteia diretamente a concretização de seus
direitos essenciais. Essa forma é o nascedouro da democracia participativa.466. As
instituições de participação popular direta estão consagradas na Constituição
Federal de 1988 que são: a iniciativa popular, o referendum, o plebiscito e a ação
popular. Estes instrumentos são utilizados pela população em situações de grande
relevância para que o povo possa manifestar suas vontades e também para
defender a manutenção de seus direitos essenciais. A democracia semidireta é
consagrada no Brasil através do ordenamento jurídico constitucional que enuncia
que o titular do poder é o povo e o exercício deste será realizado por representantes
eleitos ou através da participação direta, demonstrando que a democracia
consagrada no Brasil permite a atuação direta do povo nas decisões de maior
importância para a coletividade.
Evidente que somente os institutos da democracia semidireta
não são suficientes para a concretização de todos os direitos fundamentais dos
cidadãos, necessitando ainda manter legitimamente uma influência nas decisões
dos representantes, especialmente nas decisões tomadas pelo Poder Executivo
para que se evite a formação e o desenvolvimento de um Estado afastado da
realidade da sociedade. Acredito que atualmente a mais adequada forma de
participação constante nas decisões estatais, em especial da Administração Pública,
são os conselhos de políticas públicas, que têm como objetivo, em sua maioria,
deliberar e aconselhar através de uma formação com a participação igualitária da
sociedade e do poder público.

2.2.1 Os Conselhos de Políticas Públicas

A existência dos conselhos de políticas públicas na tomada de


decisões de maior importância para a sociedade é vital para a formação de um
Estado Democrático de Direito e para a concretização dos direitos fundamentais da

466
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Op. cit., p. 141. As primeiras
manifestações da democracia participativa consistiram nos institutos de democracia semidireta, que combinam
instituições de participação direta com instituições de participação indireta(...).
189

pessoa humana, mas os órgãos que compõem a Administração Pública não


correspondem a instrumentos da democracia semidireta, pois como dito
anteriormente nesse exercício democrático o povo atua diretamente por meio de
alguns instrumentos, mas nos conselhos o povo continua sendo representado por
grupos organizados em defesa de causas em comum ou particulares, mas todos
visando a concretização de direitos essenciais às pessoas humanas. É uma
forma de atuação da sociedade civil na condução do ente federativo conjuntamente
com o poder público de forma paritária467 na efetivação de direitos necessários à
sociedade.
Inicialmente, torna-se necessário identificar a sociedade civil no
âmbito do Estado, pois sua concepção atual é diferente, uma vez que anteriormente
esta era um sistema voltado para as necessidades do trabalho e do comércio,
estando ligada a uma visão estritamente econômica e de efetivação dos direitos
468
privados. A sociedade civil de hoje é um espaço no qual as associações ou
grupos organizados absorvem as questões sociais e as necessidades essenciais
que o povo carece que sejam efetivados. Assim, a sociedade civil aponta os
problemas na esfera privada e coloca em debate para que seja resolvido o problema
na esfera pública469, pois a partir da inclusão do problema identificado na esfera
privada, na pública esse problema passa a ser de interesse geral, já que acredito
que em sua grande maioria esses problemas estão vinculados a direitos
fundamentais. 470 Acredito que, atualmente, o espaço mais adequado para que os
problemas identificados na esfera privada sejam discutidos e resolvidos na esfera
pública, sejam os conselhos de políticas públicas e por ser um órgão que delibera
sobre a vontade da sociedade, suas decisões devem ter um caráter eminentemente
de efetivação obrigatória, não devendo o Poder Público desconsiderar a vontade da

467
KRELL, Andreas Joachim. Autonomia Municipal e Proteção Ambiental: Critérios para Definição das
Competências Legislativas e das Políticas Locais. In: KRELL, Andreas Joachim e MAIA, Alexandre da. Op. cit.,
p. 164.
468
HABERMAS, Jürgen. Op. cit., p. 99.
469
Ibidem, p. 92. A esfera pública pode ser descrita como uma rede adequada para a comunicação de conteúdos,
tomadas de posição e opiniões; nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a ponto de se
condensarem em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. Do mesmo modo que o mundo da vida
tomado globalmente, a esfera pública se reproduz através do agir comunicativo, implicando apenas o domínio de
uma linguagem natural; ela está em sintonia com a compreensibilidade geral da prática comunicativa cotidiana.
470
Ibidem, loc. cit. A sociedade civil compõe-se de movimentos, organizações e associações, os quais captam os
ecos dos problemas sociais que ressoam nas esferas privadas, condensam-nos e os transmitem, a seguir, para a
esfera pública política. O núcleo da sociedade civil forma uma espécie de associação que institucionaliza os
discursos capazes de solucionar problemas, transformando-os em questões de interesse geral no quadro de
esferas públicas.
190

sociedade, pois a deliberação do conselho é oriunda do debate entre a sociedade


civil e o poder público. É o espaço de confronto de vontades e por tal deve ser
respeitado a vontade da maioria, sendo ilegítima a atuação estatal contrária ou
omissa à deliberação. Os conselhos são “portanto mais que um canal
comunicacional para ressonância das demandas sociais, os conselhos possuem
dimensão jurídica e têm poder de tornar efetivos as questões, os valores e os
dilemas vivenciados no espaço da sociedade civil”.471
Dessa forma, os conselhos são órgãos colegiados criados
pelos entes federativos com características próprias para a configuração de um
órgão de políticas públicas e efetivação de direitos em que, na sua composição,
devem existir membros do poder público e da sociedade civil que efetivamente
participem da identificação dos problemas da esfera privada e pública e que tenham,
em sua finalidade, a concretização de direitos essenciais à pessoa humana, além
disso, cabe aos conselhos servir de controle social e de promover a participação da
sociedade nas decisões do Estado.472 Tais órgãos têm o dever de contribuir para a
concretização dos direitos fundamentais, através da participação social na
identificação dos direitos que devem ser concretizados e protegidos.473

2.2.2. A identificação dos Objetos do Licenciamento Ambiental Municipal pelos


Conselhos de Políticas Públicas.

Como já foi explicitado no primeiro capítulo deste estudo, o


ambiente é um bem fundamental à existência digna da pessoa humana e por tal
característica, manter o equilíbrio ambiental é um direito das presentes e também
das futuras gerações, e conseqüentemente o dever do Poder Público e também da
coletividade a manutenção desse direito ao ambiente sadio e adequado para o
desenvolvimento da vida digna das pessoas humanas. Assim, tal direito foi
consagrado como um direito fundamental de terceira geração, tendo em vista seu

471
CARNEIRO, Carla Bronzo Ladeira. Conselhos de Políticas Públicas: Desafios para sua Institucionalização,
Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2002, v 36(2), p. 277- 292,
mar/abr., 2002, p. 280.
472
SIRAQUE, Vanderlei. Controle Social da Função Administrativa do Estado, Rio de Janeiro: Saraiva, 2005, p.
123.
473
Ibidem, p. 126-127. Formalmente, talvez não houvesse a necessidade de criação de conselhos de políticas
públicas para a aplicação dos princípios que fundamentaram a República do Brasil. Mas, a bem da verdade,
historicamente não foi possível dar eficácia plena às normas definidoras dos direitos fundamentais sem esses
191

caráter transgeracional e a característica que para sua concretização necessita da


participação do Poder Público conjuntamente com a sociedade, sendo um direito
que, como já foi dito, tem, em sua principiológica, a participação popular como base
de seu fundamento. Dessa forma, acredito que o meio mais adequado para os
debates permanentes das questões ambientais sejam os conselhos de políticas
públicas destinados a desenvolver a qualidade de vida das pessoas humanas, vez
que é o local em que pode ocorrer o encaminhamento dos problemas ambientais
ocorridos na esfera privada para o público por serem interesses de cunho geral.
Com isso, a partir da promulgação da Constituição Federal de
1988, que consagrou constitucionalmente o ambiente como um direito fundamental,
apesar de que, materialmente, ele já era consagrado como essencial às pessoas
humanas474. A participação popular passou a ser fundamental ao desenvolvimento
de políticas públicas ambientais, pois somente através da vontade da sociedade, é
que se poderia relativizar direitos fundamentais em detrimento de outros direitos
também necessários à pessoa humana, passando a participar dos processos que
podem causar alguma interferência na qualidade ambiental que a sociedade está
submetida.
Conforme já explicitado, o licenciamento ambiental é um dos
instrumentos de controle ambiental que visa ponderar direitos aparentemente
conflitantes com o direito fundamental ao ambiente equilibrado e através deste o
poder público outorgar ou não a implantação de uma atividade ou empreendimento
nos limites de sua competência expedindo o alvará de licença ambiental caso seja
possível a compatibilização dos direitos fundamentais aparentemente em colisão. É
através desse instrumento que o Poder Público e a sociedade podem ficar sabendo
dos possíveis efeitos que uma conduta poderá causar ao equilíbrio ambiental, já que
reúne diversas informações técnicas ou não sobre o desejo de implantação da
atividade ou empreendimento. A participação da sociedade é fundamental no
processo de licenciamento de algum objeto, visto que é a própria que suportará os

meios de participação efetiva da sociedade no planejamento e acompanhamento da execução das políticas


públicas necessárias para que essas normas tenham efetividade.
474
MODÉ, Fernando Magalhães. Op. cit., p.135. Declaração de Estocolmo 1972. Princípio 1 – O homem tem o
direito fundamental à liberdade, à igualdade e a condições de vida satisfatórias, num ambiente cuja qualidade lhe
permita viver com dignidade e bem-estar, cabendo-lhe o deve solene de proteger e melhorar o ambiente para as
gerações atuais e vindouras. Por conseqüência, são condenadas e devem ser eliminadas as políticas que
promovam ou perpetuem o apartheid, a segregação racial, a discriminação e as formas, coloniais ou outras, de
opressão e de domínio estrangeiro. Princípio 2 – Os recursos naturais do Globo, incluindo o ar, a água, a terra, a
192

efeitos advindos da implantação, sejam eles positivos ou negativos. Assim, é mais


do que adequado que a sociedade faça parte dos legitimados a identificarem os
objetos que de alguma forma colocam em risco a sua qualidade de vida, por
ameaçar o direito fundamental ao ambiente sadio e equilibrado, até porque, qualquer
atividade que for outorgada e, conseqüentemente, obtiver a licença ambiental
atenderá o interesse público. É evidente que, quando a sociedade se manifesta
contra determinada implantação, ocorre violação ao interesse público da
coletividade. Tal participação ocorrerá em todos os entes federativos que se
propõem a exercitar o licenciamento ambiental seja a União, por meio do CONAMA;
os Estados-membros, através dos Conselhos Estaduais e os Municípios com os
Conselhos Municipais.
Desta forma, posso afirmar que o artigo 20 da resolução
475
CONAMA 237/97 é totalmente legal e constitucional, já que somente vem positivar
o princípio da participação popular nas decisões estatais que possam causar alguma
interferência na qualidade ambiental. A obrigatoriedade da existência de Conselhos
Ambientais para o exercício do licenciamento ambiental não é devido à resolução,
mas do próprio ordenamento jurídico ambiental, que obriga a participação da
sociedade na manutenção e proteção ambiental. Também constitucional e legal é a
segunda parte do artigo supracitado que exige do ente licenciante a existência de
um quadro técnico legalmente habilitado, visto que o licenciamento ambiental não é
um instrumento de decisões políticas, mas de técnicas e devido isto, somente
profissionais habilitados em determinadas áreas é que poderão compor uma equipe
para análise dos requerimentos de licenças ambientais.
A divisão da competência comum dos entes da federação deve
estar atrelada à predominância de interesses, como já afirmamos anteriormente, em
que a União tem interesse nacional, os Estado-membros interesse regional e os
Municípios com predominância no interesse local476. Tal competência pode ser
comprovada a partir da resolução 01/2004 do Conselho Municipal de Meio Ambiente
e Urbanismo da cidade de Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro, que

flora e a fauna e, em especial, amostras representativas dos ecossistemas naturais, devem ser salvaguardados no
interesse das gerações presentes e futuras, mediante planejamento e ou gestão cuidadosa, como apropriado.
475
BRASIL, Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 237 de 19 de dezembro de 1997.
Disponível em <URL: http://www.conama.gov.br> Acesso em: 18 dez 2007. Art. 20. Os entes federados, para
exercerem suas competências licenciatórias, deverão ter implementados os Conselhos de Meio Ambiente, com
caráter deliberativo e participação social e, ainda, possuir em seus quadros ou a sua disposição profissionais
legalmente habilitados.
193

embargou a construção de uma ponte sobre o rio Paraíba do Sul, tendo em vista
que o conselho requereu ao órgão licenciador que exigisse o estudo de impacto
ambiental e o de vizinhança que foi dispensado, tendo em vista que o Conselho
Municipal entendeu que os impactos advindos daquela obra afetariam a qualidade
ambiental e urbanística dos munícipes. Tal conduta do conselho comprova que a
construção da respectiva ponte causava um ameaça à vida dos munícipes e, por tal,
caracterizava-se que ela era eminentemente uma construção de interesse local; já
que o âmbito de incidência dos seus impactos diretos restringem-se ao território
municipal, entretanto o licenciamento ficou sob a competência do Estado-membro,
uma vez que o Município afetado não tem implementado o licenciamento ambiental,
o que nada impede que o ente local possa requerer ao ente licenciante a realização
de estudos como foi solicitado com base no princípio de participar dos processos
que possam intervir na qualidade ambiental das pessoas humanas. Infelizmente, o
órgão ambiental do Estado-membro responsável pelo licenciamento ambiental, não
ordenou a realização dos estudos ambientais e de vizinhança, na forma requisitada
pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo de Campos dos
Goytacazes, sendo a questão levada ao Poder Judiciário, que desconsiderou a
possibilidade da intervenção popular no processo de licenciamento ambiental da
ponte sobre o Rio Paraíba do Sul.477
É necessário que exista um conselho municipal do ambiente
para que o Município possa licenciar, pois deve existir nesses processos, a
participação da sociedade, seja representada nas plenárias dos conselhos, seja
através das audiências públicas. A existência do conselho justifica-se porque
qualquer atividade que esteja alterando as características ambientais estará violando
um direito fundamental que é o ambiente equilibrado, a não ser que seja relativizado
através da vontade da sociedade, por meio de um processo ponderativo com os

476
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Op. cit., p. 478.
477
Tal resolução deu ensejo ao mandado de segurança nº 2005.014.016044-8, ajuizado na Comarca de Campos
dos Goytacazes pelo Estado do Rio de Janeiro. O juiz da 4ª Vara Cível entendeu que o Município não teria
competência para exigir os estudos de impacto ambiental e de vizinhança, tendo em vista não ser o órgão
licenciador, configurando invasão de competência. A referida sentença foi mantida em sede de recurso
necessário nº 2005.009.00916, pelo Tribunal de Justiça 12ª Câmara Cível. Penso que tal posicionamento do
Poder Judiciário demonstra que ainda não está preparado para decidir segundo a interpretação do
neoconstitucionalismo, visto que permanece arraigado ao positivismo clássico, que não consegue concretizar e
compatibilizar as questões ambientais, pois no caso em particular os impactos do empreendimento são
suportados pelos munícipes, que poderão ter seu direito fundamental a um ambiente equilibrado e uma qualidade
de vida adequada violados, por não poderem opinar ou até mesmo ter as informações necessárias sobre a
atividade e empreendimentos que serão submetidos caso licenciados.
194

outros direitos fundamentais aparentemente conflitantes com o ambiente. 478 Diante


da necessidade de consentir ou dissentir sobre a relativização de direitos
fundamentais é que a sociedade apresenta-se como poder legítimo para avaliar o
que deseja que seja analisado pelo Poder Público através do licenciamento
ambiental, já que é a própria sociedade que irá suportar os efeitos da sua própria
decisão.479 Acredito que o legislador constituinte, quando concedeu aos Municípios
competência para legislar sobre interesse local no artigo 30 I da Constituição Federal
de 1988, vislumbrou que os interesses dos Municípios seriam tão diversificados e
divergentes que não poderiam ser arrolados na Constituição Federal como fez em
relação à União e aos Estados-membros. Daí, a necessidade e a legitimidade dos
Conselhos Municipais de Meio Ambiente identificarem os objetos a submeterem-se
ao licenciamento ambiental municipal, tendo em vista o interesse local de ter o
ambiente e o desenvolvimento equilibrados, deixando para a União e os Estados-
membros a identificação de atividades e empreendimentos de macro alteração
ambiental.480 É a sociedade civil concretizando os direitos fundamentais através da
atuação nos Conselhos de Políticas Públicas Ambientais, inserindo-se no debate
sobre o desenvolvimento da própria qualidade de vida e das intervenções que
desejam que ocorram no local em que vivem as pessoas inseridas na sociedade
participativa. 481

3. O Licenciamento Ambiental no Município de Campos dos Goytacazes.

Finalizando este estudo, abordarei o licenciamento ambiental


para o Município de Campos dos Goytacazes, localizado na região Noroeste
Fluminense, com aproximadamente 500.000 (quinhentos mil) habitantes, sendo
atualmente o maior Município do Estado do Rio de Janeiro. Até a presente data, o

478
BONAVIDES, PAULO. Curso de Direito Constitucional, Op. cit., p. 571-572.
479
BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia. Uma Defesa das Regras do Jogo, Op. cit., p. 64. Tudo está
portanto em conexão: refazendo o percurso em sentido contrário, a liberdade de dissentir tem necessidade de
uma sociedade pluralista, uma sociedade pluralista consente uma maior distribuição do poder, uma maior
distribuição do poder abre as portas para a democratização da sociedade civil e, enfim, a democratização da
sociedade civil alarga e integra a democracia política.
480
RONZANI, Dwight Cerqueira. O Município como Alternativa à Vitalização Federativa no Brasil, Revista da
Faculdade de Campos, ano VI, nº 7, Campos dos Goytacazes – RJ: Faculdade de Direito de Campos, dezembro
de 2005, p. 123.
481
KRELL, Andreas Joachim. Autonomia Municipal e Proteção Ambiental: Critérios para Definição das
Competências Legislativas e das Políticas Locais. In: KRELL, Andreas Joachim e MAIA, Alexandre da. Op. cit.,
p. 162-163.
195

referido não implementou nenhuma ação administrativa para o exercício do


licenciamento ambiental municipal, ficando todas as atividades e empreendimentos
que, de alguma forma intervenham no ambiente sendo licenciados e submetidos ao
licenciamento ambiental estadual ou federal, já que o Município ainda não se
estruturou para absorver suas próprias competências constitucional no tocante ao
dever de proteção ambiental, enunciado no artigo 23, VI da Constituição Federal de
1988. Assim, o Estado-membro do Rio de Janeiro absorve subsidiariamente o
licenciamento ambiental dos objetos de impacto local e, conseqüentemente, a
idenficação dos objetos a serem licenciados ficam sob a responsabilidade do ente
licenciante subsidiário. Dessa forma, acredito que o Município deve implementar um
sistema próprio de licenciamento ambiental, vez as suas características particulares
no que tange à indústria cerâmica, canavieira e outras que se vem implantando no
Município em decorrência de financiamentos públicos municipais e pela construção
de um porto na Barra do Furado, localizado na divisa entre Campos dos Goytacazes
e Quissamã. Evidente que o licenciamento do porto é de competência estadual,
tendo em vista o âmbito do impacto ambiental direto, mas juntamente com o porto
são implantadas diversas atividades e empreendimentos acessórios que a sua
atuação ambiental e, conseqüentemente, o seu impacto ficam restritos ao nível local.
Com isso, torna-se necessário uma análise da situação jurídica do Município para a
implantação do sistema municipal de licenciamento ambiental de forma própria e
autônoma.
A princípio, devo iniciar a análise a partir do ápice do
ordenamento jurídico municipal que é a Lei Orgânica do Município que, reproduzindo
a Constituição Federal de 1988, afirma a necessidade da concretização do direito
ambiental e o dever do Poder Público municipal e da sociedade campista de
proteger e manter o ambiente sadio e equilibrado para as presentes e futuras
gerações, estabelecendo um capítulo próprio para disciplinar o ambiente no
Município de Campos dos Goytacazes. Assim do artigo 242 ao 251482 são

482
CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ. Lei Orgânica do Município de Campos dos Goytacazes – RJ, In:
FERNANDES, Jeferson Nogueira. Legislação Ambiental de Campos dos Goytacazes, Campos dos Goytacazes –
RJ: Faculdade de Direito de Campos, 2006, p.121 -128. Art. 242 - Todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente sadio e equilibrado, bem de uso comum e essencial à qualidade de vida, cabendo à sociedade e,
em especial ao Governo, o dever de recuperá-lo e protegê-lo em benefício das presentes e futuras gerações, que
devem recebê-lo enriquecido. Art. 243 - Incumbe ao Governo Municipal, respeitando as orientações dos
Governos Federal e Estadual, ou colaborando com eles e com a participação da sociedade, através de seus
organismos representativos: I - proceder ao zoneamento econômico-ecológico do território do Município; II -
restaurar e defender as unidades de proteção ambiental e as reservas ecológicas, assim consideradas pela
196

legislação vigente, situadas total ou parcialmente nos limites do Município; III - inventariar, mapear e gravar
todos os ecossistemas nativos, ou parcelas deles, localizados no território do Município, vedando a sua redução e
adulteração e promovendo, direta ou indiretamente, a sua restauração de acordo com solução técnica dos órgãos
públicos competentes; IV - estimular e promover o florestamento e o reflorestamento ecológicos em áreas
degradadas, visando especialmente à proteção de encostas e de margens de ecossistemas aquáticos; V - criar
unidades de preservação e de conservação ambiental, com a finalidade de proteger e permitir a restauração de
amostras de todos os ecossistemas ou de seus remanescentes, existentes no território do Município,
providenciando com brevidade a sua efetivação por meio de indenizações devidas e a manutenção de serviços
públicos indispensáveis à sua integridade; VI - tomar medidas que permitam a compatibilização de atividades
econômicas e a proteção do meio ambiente, estimulando, principalmente, o desenvolvimento de técnicas e
tecnologias apropriadas à utilização auto-sustentada, múltipla, integrada e ótima dos ecossistemas, especialmente
com relação às coleções hídricas existentes nos limites do território municipal; VII - impor e exigir dos órgãos
competentes a adoção de normas conservacionistas para extração e utilização dos recursos não-renováveis e
renováveis; VIII - estimular e promover a arboricultura, de preferência com essências autóctones e diversificadas
em áreas adequadas, para o suprimento de energia e de matéria-prima; IX - elaborar e executar programas de
arborização urbana compatíveis com as características ambientais e culturais do Município; X - impedir a coleta
conjunta de águas pluviais e de esgotos domésticos ou industriais; XI - exigir que os lançamentos finais dos
sistemas públicos e particulares de coletas de esgotos sanitários sejam precedidos, no mínimo, por tratamento
primário completo, na forma da lei; XII - proibir o despejo, nas águas, de caldas ou vinhoto, bem como de
resíduos de dejetos capazes de torná-las impróprias, ainda que temporariamente, para o consumo e a utilização
normais ou para sobrevivência das espécies; XIII - adotar medidas para prevenir, controlar ou impedir a poluição
de qualquer tipo; XIV - zelar pela boa qualidade dos alimentos; XV - estimular a pesquisa, o desenvolvimento e
a utilização de fontes energéticas renováveis e não-poluentes e tecnologias poupadoras e energia, assegurando a
todas as pessoas, nos meios rural e urbano, o direito de utilizá-las; XVI - tomar medidas que assegurem a
diversidade e a integridade genética no Município e na região em que este se insere; XVII - coibir práticas que
ameacem as espécies vegetais e animais, notadamente as consideradas em perigo de extinção, vulneráveis e
raras; XVIII - a tutela sobre a fauna silvestre autóctone, proibindo sua caça, captura e práticas que submetam
animais a crueldade; XIX - a tutela sobre animais domésticos, assegurando-lhes existência e coibindo toda e
qualquer prática que implique em crueldade, inclusive exigindo a adoção de equipamentos e procedimentos
adequados para os animais de tração e de métodos de insensibilização para animais de abate; XX - coibir,
mediante instrumentos legais, a pesca predatória; XXI - proibir a realização de eventos que impliquem no
consumo de animais capturados em seus ambientes nativos; XXII - proteger os monumentos e os sítios
paleontológicos e paleoecológicos; XXIII - promover a educação ambiental formal e informal em todos os níveis
existentes na rede de ensino, ministrando-a através de disciplina específica e das outras disciplinas, dos meios de
comunicação social e de outros recursos; XXIV - divulgar mensalmente, através dos meios de comunicação
social, informações obtidas pela monitoragem do meio ambiente e da qualidade da água distribuída à população,
a serem fornecidas pelos órgãos governamentais competentes e pelas empresas concessionárias ou
permissionárias ou ainda produzidas pela própria municipalidade, ficando assegurado a todos os interessados o
acesso a tais informações; XXV - criar o Conselho Municipal do Meio Ambiente e Urbanismo, de composição
paritária, do qual participarão os Poderes Executivo e Legislativo, a comunidade científica e as organizações
não-governamentais, na forma da lei. * Inciso alterado pela emenda 11/93. § 1º - Fica excluído da proibição
referida no inciso XII deste artigo, o lançamento de resíduos em áreas especialmente reservadas para este fim,
denominadas águas de lagoas de estabilização.
§ 2º - Incumbe ao Governo Municipal, direta ou indiretamente, providenciar a restauração dos ecossistemas
vegetais nativos destruídos, de forma a atingir pelo menos o mínimo da cobertura exigido pela legislação
vigente, de acordo com solução técnica apresentada pelos órgãos governamentais competentes.
§ 3º - Ficam proibidas obras de drenagem e retificação ou aterros, parciais ou totais, de todos os ecossistemas
aquáticos situados inteiramente nos limites do Município, ainda que integralmente localizados no interior de
propriedade particular, incumbindo ao Governo Municipal alinhar suas margens e orlas, bem como definir suas
respectivas faixas marginais de proteção, na forma da lei, até que o órgão governamental competente do Estado
tome tais providências. § 4º - Todo e qualquer padrão ambiental adotado pelo Governo Municipal deverá ser
igual ou mais restritivo que os padrões adotados pelo Governo do Estado. § 5º - As unidades de preservação e de
conservação ambientais serão criadas por lei ordinária, medida provisória ou decreto, este último ratificado por
lei, e somente alteradas e suprimidas através da lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade
dos atributos que justifiquem a sua proteção. Art. 244 - Na ausência de ação dos Governos Federal e Estadual,
cumpre ao Governo Municipal efetuar a transferência das populações e dos estabelecimentos indevidamente
instalados em caráter permanente, em áreas destinadas por lei à proteção ambiental inteiramente situadas nos
limites do Município, observados os seguintes princípios: I - recurso à ação administrativa e judicial para retirada
de invasores comprovadamente detentores de bens que tornem desnecessário o uso das áreas invadidas; II -
197

enunciadas diversas normas entre diretrizes, metas e deveres para o Poder Público
como também para a sociedade. Em relação ao licenciamento ambiental municipal
no que se refere à efetivação desse instrumento administrativo pela Administração
Pública, torna-se imprescindível a alteração, por meio de emenda, do artigo 245 da
Lei Orgânica, uma vez que o texto, do referido artigo, exclui a possibilidade de
implantação do instrumento, pois exige para a aprovação e autorização de qualquer
obra, projeto ou atividade que, de alguma forma, possa causar alteração nos
aspectos ambientais, a apresentação da licença ambiental expedida pelos órgãos
ambientais competentes da União ou do Estado, excluindo o Município da
possibilidade de poder licenciar, visto que a licença ambiental expedida pelo ente
local não teria eficácia para fundamentar a autorização ou aprovação de obras,
projetos ou atividades. Dessa forma, é necessário que primeiramente seja alterado o
texto da Lei Orgânica para que posteriormente possa ser editada uma lei municipal
com base na Constituição Federal, Estadual e na Lei Orgânica Municipal para a
efetivação do licenciamento ambiental municipal, por ser um instrumento de
proteção ambiental que auxilia o Município no cumprimento do seu dever
constitucional de proteger o ambiente, conforme os artigos 23, VI e 225.

implantação de programas econômico-sociais que permitam a transferência das populações de baixa renda, sem
qualquer ônus para elas, para áreas seguras e legalizadas; III - implantação de programas que reduzam ao
mínimo os impactos ambientais causados pela transferência e proporcionem às populações transferidas melhor
qualidade de vida. Art. 245 - Todo e qualquer projeto, obra e atividade que possa causar, direta ou indiretamente,
efetiva ou potencialmente, danos ao meio ambiente, só terá sua instalação e operação aprovadas e autorizadas
pela Prefeitura mediante apresentação de licença do órgão competente da União ou do Estado, exigindo-se, caso
necessário, relatório de impacto ambiental e sua apresentação em audiência pública na forma da lei. § 1º - É
dever inadiável da Prefeitura embargar todo e qualquer projeto, obra ou atividade que, instalando-se ou operando
clandestinamente, cause, direta ou indiretamente, potencial ou efetivamente, danos ao meio ambiente e contrarie
a legislação em vigor, ainda que conte com a aprovação e a autorização dos órgãos governamentais competentes.
§ 2º - Para defender o meio ambiente no Município e a qualidade de vida de seus habitantes, o governo
Municipal deverá, sempre que necessário, recorrer a todos os meios cabíveis, administrativos e judiciais. Art.
246 - Os servidores públicos encarregados da execução da política municipal de meio ambiente que tiverem
conhecimento de infrações persistentes, intencionais ou por omissão dos padrões e normas ambientais, deverão,
imediatamente, comunicar o fato ao Ministério Público, indicando os elementos de convicção, sob pena de
responsabilidade administrativa, na forma da lei. Art. 247 - Após o prazo de 90 (noventa) dias da criação do
Conselho Municipal de Meio Ambiente, as ações do Governo Municipal concernentes a esta matéria serão
norteadas por política específica, na forma da lei. Art. 248 - O Poder Executivo poderá, através de convênio com
qualquer órgão, efetuar ou fiscalizar a limpeza e conservação de rios e canais dentro do Município, ouvido o
Legislativo. Art. 249 - Fica o Poder Público obrigado a efetuar os despejos de lixos ou detritos em áreas a serem
determinadas pelos órgãos competentes, conforme dispuser a lei no prazo de 120 (cento e vinte) dias. Art. 250 -
As usinas de açúcar sediadas no Município ficam obrigadas a adotar, no prazo mínimo de 180 (cento e oitenta)
dias a contar da promulgação desta Lei, dispositivos que impeçam o lançamento de fuligem pelas suas chaminés.
Parágrafo único - O não cumprimento do disposto neste artigo implicará em multa a ser estabelecida em lei.
Art. 251 - Fica proibida a queima de canaviais nas propriedades localizadas na periferia da cidade, bem como
nas proximidades das sedes dos distritos. Parágrafo único - O não cumprimento do disposto neste artigo
implicará em multa a ser estabelecida em lei.
198

Necessário também que o Município tenha uma lei de infrações


e sanções em matéria ambiental para que possa coibir as condutas contrárias ao
ordenamento jurídico administrativo ambiental normatizados pelo Município. A Lei
Municipal nº 5419/93483 disciplina o tema, enumerando diversas situações
consideradas como infração ao ordenamento ambiental e também disciplina uma
série de sanções a serem aplicadas pelos agentes de fiscalização ambiental, mas é
importante alertar que atualmente a respectiva Lei Municipal não atende mais às
necessidades municipais e nem às jurídicas, já que é de grande imprecisão os tipos
infracionários e da sanção correspondente.
A Lei Municipal nº 7.972/2007 correspondente ao Plano Diretor
Municipal de Campos dos Goytacazes definiu dentre os instrumento de gestão
ambiental, em seu artigo 331, as diretrizes para a instituição do sistema de
licenciamento ambiental, com base próprias e independente de convênio de
delegação, que, como já afirmei, demonstra-se totalmente ilegal pelos fundamentos
apresentados no início deste capítulo. Importante ressaltar que o anteprojeto de Lei
do Plano Diretor foi um trabalho de participação da sociedade campista
conjuntamente com o Poder Público, durante um período de aproximadamente dois
anos de tratados consultivos; através de diversos Seminários, Audiências Públicas,
Reuniões Comunitárias e Específicas entre os membros do poder público local e a
sociedade civil.484 O sistema enunciado pelo Plano Diretor compreende a
participação integrada do Conselho Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, de
caráter deliberativo, da formação de uma equipe técnica própria do órgão ambiental
responsável pelo licenciamento e por fim do Fundo Municipal de Meio Ambiente e
Urbanismo, sendo que o conselho já existe através da Lei Municipal nº 5.664/94 e
funciona efetivamente no Município. Basta, para o exercício do licenciamento
ambiental, a criação das câmaras técnicas permanentes para a análise dos
procedimentos referentes ao sistema de licenciamento, conforme o artigo 14 do

483
CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ. Lei nº 5419, de 29 de abril de 1993 – Dispõe sobre o Sistema
Municipal de Fiscalização do Meio Ambiente com base nos incisos VI e VII do art. 23 e nos incisos I e II do art.
30 da Constituição Federal; no parágrafo 1º do Art. 11 da Lei Federal 6.938, de 31/08/81; no inciso I do Art. 1º
do Decreto Federal nº 99.274, de 06/06/90; nos incisos VI e VII do Art. 73 da Constituição Estadual; e nos
parágrafos 1º e 2º do Art. 245 da Lei Orgânica do Município de Campos dos Goytacazes. In: FERNANDES,
Jeferson Nogueira. Legislação Ambiental de Campos dos Goytacazes, Campos dos Goytacazes – RJ: Faculdade
de Direito de Campos, 2006, p.186 – 195.
484
UM PLANO debatido a exaustão. Plano Diretor Participativo. Campos dos Goytacazes: Prefeitura Municipal
de Campos dos Goytacazes, mar. 2007, p. 4.
199

Decreto nº 17/95485 que aprova o regimento interno do Conselho Municipal de Meio


Ambiente e Urbanismo. Em relação ao Fundo Municipal de Meio Ambiente, existe
juridicamente através da Lei Municipal nº 5.576/93.486 Necessário, então, para a
adequação da Administração Pública Municipal ao sistema de licenciamento
ambiental municipal, disciplinado no Plano Diretor, é a formação de um quadro
técnico na Secretaria Municipal de Meio Ambiente para a análise dos requerimentos
de licença ambiental e a reestruturação técnica do próprio órgão. Dentre os
profissionais, posso sugerir a formação de uma equipe composta inicialmente de
Engenheiros, Biólogos, Arquitetos, Geólogos, Químicos, Advogados, todos com
formação complementar em gestão ambiental.
O Plano Diretor Municipal ainda consagra, no sistema
municipal de licenciamento ambiental, o princípio da participação da sociedade nos
processos interventivos no ambiente, visto que o artigo 313 § 1º487 determina que a
identificação dos objetos a serem licenciados pelo Município serão definidos através
de resolução pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo. Evidente que
essa identificação deverá pautar-se pelo impacto local do objeto a ser licenciado,
tendo em vista o princípio da predominância do interesse do ente federativo. Dessa
forma, a Sociedade participará conjuntamente com o Poder Público nos debates
para a definição dos objetos a serem submetidos ao licenciamento ambiental
municipal e como dito anteriormente, nada mais adequado, uma vez que ela
suportará os efeitos advindos da implantação de alguma atividade ou
empreendimento no território municipal.

485
CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ. Decreto nº 15, de 10 de março de 1995 – Aprovando o Regimento
Interno do Conselho Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo. In: FERNANDES, Jeferson Nogueira.
Legislação Ambiental de Campos dos Goytacazes, Campos dos Goytacazes – RJ: Faculdade de Direito de
Campos, 2006, p.198 – 200. Art. 14 – O plenário do C.C.M.M.A.U. criará câmaras técnicas e grupos de trabalho
de caráter permanente ou temporário, definindo sua composição, objetivos e atribuições.
486
CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ. Lei nº 5.576, de 22 de novembro de 1993 – Institui o Fundo Municipal
do Meio Ambiente (FUMMAM), e dá outras providências. In: FERNANDES, Jeferson Nogueira. Legislação
Ambiental de Campos dos Goytacazes, Campos dos Goytacazes – RJ: Faculdade de Direito de Campos, 2006,
p.198 – 200.
487
CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ. Lei nº 7.972, de 10 de dezembro de 2007 – Institui o Plano Diretor de
Campos dos Goytacazes. Disponível em: www.campos.rj.gov.br, Acesso em: 13 de maio de 2008. Art.313. Lei
de iniciativa do Poder Executivo regulamentará o instrumento referido no artigo anterior, identificando as
principais características dos empreendimentos e atividades que estarão sujeitos ao Licenciamento Ambiental
Municipal e à elaboração de Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo Relatório – EIA/RIMA,
complementando as normas federais e estaduais para o controle das obras, atividades ou instalações
potencialmente poluidoras ou que degradem o meio ambiente natural. §1º - A definição dos empreendimentos e
atividades sujeitos ao Licenciamento Ambiental Municipal serão identificados pelo Conselho Municipal de Meio
Ambiente e Urbanismo através de resolução, devendo enquadrar os empreendimentos e atividades às
características mencionadas na regulamentação do Licenciamento Ambiental Municipal.
200

Assim, após as alterações legislativas necessárias no


ordenamento jurídico ambiental municipal, deverá ser editada uma Lei Municipal que
regulamentará o sistema municipal de licenciamento ambiental, criando as
modalidades de Licenças Ambientais expedidas pelo órgão competente e
estabelecerá o órgão ambiental competente responsável pelo exercício do
licenciamento ambiental e o órgão que reexaminará a decisão final do licenciante,
caso o requerente discorde da decisão proferida, da mesma forma, deverão ser
definidos os prazos de validade das licenças ambientais e, por fim, os procedimentos
administrativos para a análise dos requerimentos submetidos ao licenciamento
ambiental municipal.
201

CONCLUSÃO

1. É de extrema importância a existência de um ramo do Direito


que seja especializado no objetivo de proteção e preservação ambiental, tendo em
vista que as condutas humanas voluntariamente não se compatibilizam com a
manutenção dos sistemas ambientais, provocando um constante desequilíbrio entre
o ambiente e o homem. Tal situação obriga que o direito venha intervir nas condutas
humanas, responsabilizando as que de alguma forma contribuam com o
desequilíbrio ambiental.
Além da necessidade da existência desse ramo do direito,
observei também que o Direito Ambiental, por ter em sua formação o dever de
considerar elementos e teorias relevantes por outras ciências, torna-se um direito
diferente dos ramos tradicionais que, para a sua formação, basta considerar
somente os elementos e teorias jurídicas e sociais, como o direito civil e o penal. No
Direito Ambiental, suas normas e princípios devem-se compatibilizar com as ciências
físicas, biológicas, químicas, além das sociais e também das jurídicas que compõem
o ordenamento jurídico pátrio.
2. O ambiente sadio e equilibrado é um direito essencial às
pessoas humanas, e o desequilíbrio afeta a qualidade de vida e conseqüentemente
a própria dignidade da pessoa humana, sendo assim, um direito fundamental. Os
direitos fundamentais surgem com os modelos francês, inglês e americano, sendo a
conjugação dos direitos: humanos, subjetivos, civis, morais, naturais e das
liberdades públicas, e a partir da Declaração do Bom Povo da Virgínia ocorreu a
generalização dos direitos fundamentais, o qual posso considerar como sendo o
nascedouro dos direitos fundamentais da atualidade. Posteriormente, outras
declarações surgiram, reafirmando esses direitos essenciais da pessoa humana
como o Bill of Rights, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, a
202

Declaração Norte Americana. É necessário para efetivação dos direitos


fundamentais que estes sejam universalizados, já que é importante que todas as
pessoas humanas tenham efetivados e garantidos os seus direitos fundamentais
para uma existência digna no planeta. O direito ao ambiente é um exemplo de direito
que deve ser garantido de forma universal para que as pessoas humanas possam
ter uma qualidade de vida adequada, pois um país que não protege o ambiente,
estará causando um desequilíbrio, no qual os efeitos negativos advindos serão
suportados por pessoas de outros países, uma vez que não existe limite geográfico
para os efeitos ambientais.
3. Karel Vasak idealizou a divisão dos direitos fundamentais a
partir de dimensões, nas quais cada uma consistia em um conteúdo de direitos que
deveriam ser promovidos e garantidos pelos Estados e também pela Sociedade.
Inicialmente a divisão compreendia três dimensões e atualmente o jurista brasileiro
Paulo Bonavides admite o surgimento de uma quarta dimensão. Acredito que as
dimensões dos direitos fundamentais surgem à medida que a Sociedade se
desenvolve e, conseqüentemente, surge a necessidade de concretização de direitos
que antes não eram relevantes ou até mesmo não existiam.
A primeira dimensão tratou dos direitos às liberdades, que
impõe ao Estado a proteção das liberdades contra os que buscam violar esse direito,
inclusive contra o próprio Estado que também pode ser um violador dos direitos
fundamentais, principalmente quando atua de forma coativa sobre os direitos e bens
das pessoas humanas. A segunda dimensão consagra os direitos sociais, com o
dever do Estado de promovê-los, estando inicialmente incluído a proteção ambiental,
mas posteriormente observa-se que o direito ao ambiente é uma prestação muito
mais ampla e que não pode ficar única e exclusivamente sobre a responsabilidade
do Estado, mas também da Coletividade, pois é um direito de todos e por tal gera
deveres ambientais para todos. A terceira dimensão, na qual está inserido o direito
ao ambiente sadio e equilibrado, corresponde a direitos que devem ser efetivados
conjuntamente entre o Poder Público e a Sociedade e de uma forma universal, visto
que são direitos que afetam todas as pessoas humanas, independente dos limites
territoriais, ainda esse direitos se caracterizam por seu conteúdo solidário e fraterno.
Por fim, a quarta dimensão que busca consagrar a globalização dos direitos
fundamentais.
203

4. Os princípios materialmente constitucionais consagrados e


existentes no direito ambiental, servem de fundamento para a interpretação das
normas e dos fatos em matéria ambiental, mas é necessário que se diferencie as
regras dos princípios ambientais. As primeiras correspondem a normas jurídicas sem
abstratividade, que diante de um caso elas atuam em sua totalidade ou não,
inexistindo um grau de inserção da regra. Enquanto os princípios são normas
jurídicas de grande abstratividade que atuam no caso concreto inserindo-se na
medida do necessário. Acredito que os princípios são considerados normas quando
atuam no caso concreto, já que a partir de sua inserção é que se extrai a norma
jurídica concebida através dos princípios incidentes.
Os princípios do direito ambiental brasileiro é o da dignidade da
pessoa humana, por ser o direito ambiental intimamente ligado à qualidade de vida
das pessoas e conseqüentemente com a sua dignidade, pois sem qualidade não se
tem vida digna. Outro princípio é o da participação que valoriza as decisões da
coletividade, no que tange às questões ambientais e conseqüentemente à
necessidade que a Coletividade venha a participar dos processos ambientais que
poderão de alguma forma interferir diretamente na qualidade de vida das pessoas
que a compõem. O princípio da precaução consagra o dever de ter uma conduta
para o ambiente, já que, quando não se detecta os possíveis impactos que uma
conduta no ambiente possa causar, deve-se agir com cautela, buscando
desenvolver técnicas que possam descobrir os efeitos das incertezas, preservando,
dessa forma, o ambiente e também evitando que alguma atividade
desenvolvimentista possa ser impedida eternamente pelo desconhecimento, mas
enquanto não se detecta os impactos a atividade deve ser impedida, buscando a
proteção ambiental e conseqüentemente do homem. Muito semelhante, mas não
igual, é o princípio da prevenção, pois este age em cima dos impactos ambientais
conhecidos, buscando minimizar e compensar e até mesmo impedir a existência dos
impactos detectados. O princípio da responsabilidade busca manter o equilíbrio
ambiental que é fundamental para o homem, devendo os agentes serem
responsabilizados pelas condutas lícitas e ilícitas que causem degradação
ambiental, nas esferas criminais, administrativas e civis. Outro princípio ambiental
que ainda não tem uma definição muito delimitada é a do poluidor-pagador que
acredito ser um subprincípio do anterior, uma vez que responsabiliza os agentes
poluidores que se beneficiam economicamente dos bens ambientais. Já o princípio
204

do usuário-pagador incide sobre os usuários, já que visa valorar economicamente os


bens ambientais e cobrar pela sua utilização, objetivando o uso racional e
proporcionando a compensação pelo uso dos recursos, podendo ser divididos entre
usuários com finalidade de meio e de fim. Finalizando o princípio da função
socioambiental da propriedade, que determina que toda a propriedade seja ela rural
ou urbana tem como função a proteção ambiental. Esses princípios é que
contribuem para a fundamentação do Direito Ambiental e devem ser utilizados pelos
intérpretes para que possam obter a melhor e mais adequada solução para a
proteção do ambiente e a efetivação de outros direitos.
5. Necessário para que se tenha uma adequada efetivação das
normas ambientais, é que ocorra uma interpretação destas normas, de forma que se
possa compatibilizá-las com outros ramos do sistema jurídico, e também com outras
ciências, pois, tendo em vista que tais normas jurídicas são materialmente
constitucionais e por tal, devem interagir com todas as outras normas no momento
de serem interpretadas.
Como a interpretação é um trabalho mental, que visa dar
significado aos enunciados normativos para que seja adequada aplicação, deve
esse trabalho ser exercido por todos os que convivem com os enunciados e as
realidades fáticas existentes. Com isso, é através da interpretação que o intérprete
consegue compatibilizar o enunciado normativo com a realidade no momento que é
necessário a sua incidência de forma concreta, ela fixa o âmbito e o significado da
norma para determinado caso concreto, criando a norma específica para cada caso
específico. Com o direito ambiental, essa compatibilização é fundamental para a sua
efetivação, já que, para a interpretação das normas ambientais, é necessário que se
compatibilize além dos enunciados jurídicos e com a realidade vivida, também com
outros elementos de diferentes ciências que estão inseridas no ambiente.
6. Para que a norma interpretada consiga ser efetivada é
necessário que a mesma esteja de acordo com a realidade da sociedade que a vive,
sendo necessário que, a própria sociedade venha reclamar pela sua efetivação,
havendo um sentimento de essencialidade da norma. Da mesma forma, o
cumprimento da norma só se efetiva de forma adequada a partir do sentimento de
cumprimento pelos que estão submetidos a essa norma interpretada. Tal situação
pode ser observada a partir da efetivação do direito ambiental, que passou a ter
força quando se observou a necessidade da existência de um ordenamento de
205

proteção ambiental efetivo, visto que a proteção voluntária sem a existência de


sanção e poderia até dizer sendo mera norma programática, não mais correspondia
às necessidades das pessoas humanas, que percebem a essencialidade do
ambiente equilibrado para a sua devida qualidade de vida. Tal ligação faz com que
exista um desenvolvimento dentre as classificações das normas jurídicas, quanto a
sua eficácia, porque a norma, que não tem sua eficácia como sendo algo de
importância imediata, passa a ser no momento que a sociedade necessita de sua
efetivação. Da mesma forma ocorre com as normas que, ao momento da
promulgação da Constituição, eram tidas como programáticas, mas que com o
passar do tempo e com as modificações da sociedade passaram a ser consideradas
normas de eficácia imediata, tendo em vista a sua importância para a sociedade,
que determina a efetivação do direito correspondente àquela norma antes
programática.
7. Com as características do Direito Ambiental, acredito que a
subsunção não é o melhor método para a interpretação de suas normas, assim
como também para todas as normas de cunho materialmente constitucional, já que
essas normas são dotadas de um alto grau de abstração e também pelo seu
conteúdo político, tendo em vista, que para interpretá-las, deve haver a inserção de
valores e interesses que não compõem os elementos utilizados na subsunção.
8. Nas normas constitucionais fundamentais, temos as normas
ambientais, que devem ser efetivadas no momento da sua necessidade pela
sociedade e por tal não podem ser afastadas pelo intérprete do ordenamento
jurídico, já que são direitos essenciais da pessoa humana, mas tais direitos diante de
casos concretos podem parecer conflitantes e, nesses casos, é possível a restrição
deles na medida necessária ao caso concreto a ser interpretado. Para que o
intérprete possa chegar a uma interpretação que compatibilize todos os direitos
fundamentais envolvidos, é necessário a inserção de princípios e valores externos
ao enunciado normativo e, a partir dessa inserção, é que se obtém a norma
adequada para aquele caso concreto. É imprescindível que a Sociedade participe
dos processos de relativização dos direitos fundamentais, uma vez que são direitos
que afetam diretamente a qualidade de vida das pessoas que se encontram
inseridas na Sociedade e que vivam o caso concreto a ser interpretado, dependendo
de uma norma adequada para aquela Sociedade.
206

9. Com a observância de uma nova colocação do Direito


Constitucional no ordenamento jurídico, que este passa a se colocar de maneira que
as normas constitucionais passaram a figurar de forma suprema na interpretação
jurídica, deixando de ser a Constituição Federal um texto que tinha como objetivo
organizar o Estado, passando a ter o objetivo de além de organizar também garantir
e proteger os direitos essenciais das pessoas humanas, através da proteção dos
direitos individuais e coletivos, sendo uma coordenadora das questões sociais e
políticas existentes na Sociedade e que devido a sua importância devem ter uma
resposta do Estado, visando à formação de um Estado Democrático de Direito. Essa
nova função da Constituição que ela orienta a condução do Estado, através da
inserção de princípios e valores e também pela participação ativa da Sociedade é
denominada de Neoconstitucionalismo, que penso ser atualmente a melhor
concepção para a efetivação das normas materialmente e formalmente
constitucionais, em especial, as normas ambientais que necessitam, como já foi dito,
da inserção de diversos outros valores e princípios não jurídicos para a adequada
efetivação da Sociedade que deverá participar desse trabalho interpretativo.
10. Especialmente em se tratando do licenciamento ambiental,
acredito ser este um procedimento administrativo que realiza um trabalho de
relativização dos direitos fundamentais aparentemente conflitantes e o principal e
melhor método, atualmente para se obter a adequada compatibilização, é o da
ponderação de interesses e valores. Com a utilização desse método de auxílio à
interpretação jurídica, o Poder Executivo, responsável pela outorga de atividades e
empreendimentos que de alguma forma irão interferir nos elementos ambientais,
poderá pondera todos os direitos essenciais, que devem ser efetivados e que
necessitam ser relativizados na medida do ideal para cada Sociedade.
11. No que se refere ao modelo Federalista do Brasil, que
surgiu diferentemente do modelo americano, que se originou a partir da vontade dos
Estados, enquanto que o brasileiro ocorreu independente da vontade dos Estados e
dos cidadãos da época. A Federação brasileira originou-se de uma necessidade
política de diferenciar-se do modelo centralizador existente na monarquia para um
modelo descentralizado para a república. Devido à falta de vínculo entre a origem do
federalismo brasileiro com a vontade dos Estados e cidadãos, a Federação brasileira
surgiu com as bases do federalismo americano, mas sem existir uma adequada
função para o Brasil. Atualmente o federalismo no Brasil encontra-se em crise, já
207

que este modelo não consegue concretizar direitos fundamentais para as pessoas
humanas, tal modelo para ser adequado à realidade, deve ter como base a
cooperação entre os Estados na busca da concretização dos direitos que as
pessoas necessitam.
O Brasil tem uma divisão federativa diferenciada dos outros
modelos de Federação, pois nele não se adotou um modelo dual, mas uma divisão
com quatro entes federados que são: União, Estados-membros, Municípios e o
Distrito Federal, sendo que este último aglutina as competências dos entes
estaduais e municipais. Todos os entes detêm as características necessárias para
que sejam enquadrados como entes da Federação, já que eles têm autonomia,
independência administrativa, organizacional e política, cada qual atuando nos
limites de suas competências, que é definida pelo princípio da predominância do
interesse.
12. As competências constitucionais ambientais estão
contempladas na Constituição Federal de 1988 em diversos artigos e de diversas
maneiras, podendo ser vistas de forma ampla ou restrita e expressas ou implícitas,
conforme posso observar nos artigos 21 ao 25 e no 30 e 225, sendo que em alguns
incisos o ambiente não é tratado de forma abrangente, sendo somente um elemento
a ser disciplinado por determinado ente, mas somente nos artigos 23, 24 e 225 são
tratados de forma ampla e explícita e nos artigos 25 e 30 estão contidos de forma
implícita, que dependem de outros critérios que leve o intérprete a possibilidade de
atuação com base nesses artigos, sendo um a competência residual ou
remanescente e o outro o interesse local.
13. Dentro do contexto infraconstitucional, é importante que se
analise a recepção da Lei nº 6.938/81, visto que a mesma foi editada antes da
promulgação da Constituição Federal de 1988 e por tal suas normas devem estar
conforme o ordenamento jurídico constitucional, sob pena de não recepção. Dessa
forma, a interpretação da Lei, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, não
será realizada da mesma forma que era anterior a atual carta constitucional.
Inclusive houve uma alteração da sua incidência sobre os entes da Federação, já
que, quando editada em 1981, a matéria estava contida na competência privativa da
União, sendo uma matéria de âmbito nacional, e que após a promulgação da
Constituição Federal de 1988, passou a matéria a ser tratada de forma concorrente e
não mais nacional, impedindo que tenha em seu conteúdo condutas para os outros
208

entes federativos, devendo ser consideradas somente as normas gerais e as


condutas a serem exercidas pelos órgãos ambientais federais. Com isso, a divisão
de competências ambientais encontra sua base na própria Constituição Federal, não
sendo permitido que lei infraconstitucional venha estabelecer distribuição de
competência.
14. Em relação ao licenciamento ambiental, todos os entes da
Federação têm competência para exercerem esse instrumento de controle
ambiental, visto que a Constituição Federal de 1988, através do artigo 23, determina
o dever dos entes na proteção e preservação do ambiente. Alguns autores, afirmam
que os Municípios não podem exercer o licenciamento ambiental, pelo fato de a Lei
nº 6.938/81 não ter incluído o Município como ente licenciante. Conforme foi dito
acima, a referida lei foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 não mais
como uma lei nacional, mas federal e por tal a devida interpretação do artigo 10 da
referida lei é a que determina quais critérios definidores para que a União possa
licenciar, colocando de forma expressa que as atividades que não forem licenciadas
pela União serão pelos Estados-membros, expressando assim, a competência
residual que tais entes federativos têm. Assim, não pode uma lei federal restringir
uma competência constitucional, que determina que o Município deve proteger o
ambiente e um dos instrumentos de proteção é o licenciamento ambiental.
A regulamentação do artigo 23 da Constituição Federal de 1988
será de grande valia para que ocorra uma cooperação entre os entes da Federação,
no que tange à proteção ambiental, mas não poderá a lei restringir ou possibilitar os
Municípios de licenciar, já que esta possibilidade encontra-se no próprio
ordenamento jurídico constitucional. Ainda a regulamentação poderá definir critérios
para a identificação do ente licenciante para cada atividade ou empreendimento,
estabelecendo elementos definidores da predominância do interesse de cada ente
licenciante, conforme faz o projeto de lei complementar 388/2007.
15. O licenciamento ambiental é um instrumento que visa
compatibilizar de forma preventiva os direitos aparentemente em conflito e que de
alguma forma devem ser efetivados, por se tratar, em sua maioria, de direitos
essenciais à pessoa humana e de mesma importância quanto o ambiente sadio e
equilibrado. Assim, para poder compatibilizar através de um trabalho ponderativo, é
necessária a reunião de todas as informações possíveis sobre a atividade ou
empreendimento que se submete ao licenciamento e para obter essas informações
209

várias são as formas, seja através de estudos ambientais com as audiências


públicas ou outros meios de obtenção de informações. Dessa forma, para que o
Estado possa reunir todas as informações, é necessário que exista um procedimento
administrativo, que é o licenciamento ambiental, e devido a essa característica de
reunir diversas informações, torna o procedimento do licenciamento ambiental
complexo, apesar de ser único. Deve o empreendedor submeter-se a etapas
distintas para a obtenção da licença correspondente de cada etapa. Estas etapas
são definidas para o licenciamento ambiental federal como sendo: a licença prévia,
instalação e operação, podendo cada ente estipular as etapas para o exercício do
licenciamento que lhe cabe. Ainda por ser um procedimento com base na
competência administrativa, o exercício do licenciamento é exclusivo da
Administração Pública; não podendo ter a interferência do Legislativo ou do
Judiciário, com exceção de flagrante vício no seu procedimento.
16. Quanto à natureza jurídica da licença ambiental, penso que se
deve separar o ato final do licenciamento ambiental, que é a licença, que permite a
implantação do objeto que se submeteu ao licenciamento, do procedimento
administrativo que é o licenciamento ambiental. Importante essa separação, pois por
ser o licenciamento ambiental um procedimento que busca reunir informação, é
possível a existência de diversos instrumentos, alguns vinculados e outros
discricionários; mas acredito, que a licença ambiental é um ato vinculado que gera
um direito subjetivo, desde de que o interessado tenha cumprido todas as exigências
do órgão responsável pelo licenciamento e, depois de cumprida, o órgão licenciante
analisando as informações conclui que a atividade ou empreendimento é legalmente
possível a sua implantação. Não se trata de uma discricionariedade do órgão
licenciante, deseja-se ou não outorgar a licença, já que existem outros direitos
contidos nos objetos sujeitos ao licenciamento que devem ser efetivados. Assim
sendo, no que tange ao ato administrativo da licença ambiental é totalmente
vinculado. Quanto à precariedade, que alguns juristas defendem que a licença
ambiental tem natureza de autorização, acredito não ser suficiente para
descaracterizar a natureza de licença, uma vez que não existe precariedade na
licença ambiental, pois durante seu tempo de validade ela é definitiva. Assim, a
licença ambiental tem natureza jurídica de licença administrativa, não sendo nem
autorização, muito menos uma nova modalidade de ato de outorga pela
Administração Pública.
210

17. O licenciamento ambiental é um procedimento administrativo


que visa compatibilizar direitos aparentemente em conflitos, através de um método
de ponderação de direitos a serem efetivados na medida ideal para cada situação e
localização, e o resultado final depende da reunião de diversas informações,
técnicas ou não, para que o órgão licenciante possa avaliar os benefícios e os
malefícios que a outorga da licença ambiental, a determinado objeto, poderá causar
ao ambiente e, conseqüentemente, às pessoas humanas que estarão submetida aos
efeitos advindos das atividades e empreendimentos implantados.
18. O Município com a promulgação da Constituição Federal de
1988 passou a integrar a Federação como ente, visto que adquiriu autonomia
política, administrativa e organizacional. Com isso, passou a se organizar como
entidade política do Estado, através da elaboração da Lei Orgânica, que representa
a norma fundamental de todo o ordenamento municipal, já que toda legislação
municipal deve estar condizente aos preceitos da Constituição Federal e Estadual e
às normas gerais editadas e também com às normas e princípios contidos na Lei
Orgânica Municipal, sendo esta lei considerada por diversos autores como sendo a
Constituição Municipal.
19. No Brasil, a autonomia municipal é definida por um conceito
indeterminado que é o “interesse local”, indeterminado porque depende das
características e as peculiaridades de cada Município para que certos interesses
sejam considerados como locais. Assim, após a identificação de um interesse local,
passa o Município a ter competências para tratar de matérias relacionadas a esse
interesse. Dessa forma, a autonomia municipal atrelada ao interesse local e a sua
capacidade de atuação advém do princípio da predominância do interesse do ente
federativo, que é parcialmente definido na Constituição Federal de 1988, já que
define o interesse da União de forma taxativa e também parte do interesse
municipal, pois o restante da competência municipal fica a critério da definição pelos
próprios Municípios, através de sua sociedade e, por fim, o interesse residual para
os Estados-membros.
20. No que se refere à autonomia municipal em matéria
ambiental, esse ente federativo detém todas as competências, legislativa e
administrativa que os outros entes da Federação brasileira; sendo para tal orientado
pela predominância do interesse local. Esta afirmativa se retira do próprio
ordenamento jurídico constitucional que atribui à competência municipal ambiental
211

em seus artigos 23 e 225 e ainda o artigo 30, I, que atribui à competência municipal
sobre todas as matérias de interesse local, inclusive às ambientais, possibilitando o
controle de atividades interventoras no ambiente através da implementação de
instrumentos, como o licenciamento ambiental municipal. Com isso, é
inconstitucional a edição de normas jurídicas que venham a condicionar o exercício
administrativo e legislativo dos Municípios na proteção do ambiente, como ocorre em
diversos casos no ordenamento jurídico ambiental brasileiro, como exemplo na
resolução CONAMA 237/97, em seu artigo 5º e 6º, que possibilitam a delegação de
um ente para outro através de instrumento legal ou convênio de objetos que devem
ser licenciados. Acredito que tal situação é inconstitucional, visto que não é permitido
a transferência de competência constitucional através de delegação entre os entes
federativos, com exceção das possibilidades apontadas pela Constituição Federal.
Tal impossibilidade ocorre devido ao princípio da predominância do interesse, que
impede que a União, ente competente para o licenciamento de objetos que
produzem impactos nacionais ou regionais, sejam licenciados pelos Estados-
membros; como também, ocorre a impossibilidade quando Municípios buscam
licenciar objetos de impacto direto estadual. Com isso, utilizando-se do mesmo
raciocínio, inconstitucionais são os atuais convênios ou instrumentos legais que
delegam aos Municípios o exercício do licenciamento ambiental dos objetos que
geram impactos locais, uma vez que não há o que se delegar aos Municípios, pois
estes já são competentes, tendo em vista o princípio constitucional da
predominância do interesse.
Ocorre que, quando o ente local passa a ter a capacidade para
o exercício do licenciamento ambiental, através da capacitação técnica, financeira,
administrativa e legislativa, os objetos, que até então vinham sendo licenciados pelo
Estado-membro correspondente, passam automaticamente para o ente local
capacitado, pois o ente estadual agia subsidiariamente no licenciamento ambiental
dos objetos de impacto local e, por tal, inexigível a delegação, seja através de
convênio ou de lei, pois a competência originária é dos Municípios e não dos
Estados-membros no que tange ao interesse local. Com isso, afirmo que o Decreto
estadual nº 40793/2007 do Estado do Rio de Janeiro e o Código Estadual de Meio
Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul, no que se referem ao licenciamento
ambiental municipal, apresentam-se inconstitucionais, já que condicionam um
exercício administrativo constitucional do Município, que é a proteção ao ambiente
212

através do licenciamento, a uma deliberação e fiscalização do ente estadual, ferindo


assim os princípios da predominância do interesse e do pacto federativo, ambos
constitucionais.
21. O licenciamento ambiental municipal tem sua
fundamentação no próprio texto constitucional que prevê o dever do Poder Público
em proteger o ambiente, consagrado pelos artigos 23 e 225, não podendo nenhuma
norma infraconstitucional reduzir ou excluir esse dever dos entes federativos, isso se
justifica por ser o ambiente um direito fundamental e que deve ser efetivado,
inexistindo a possibilidade de não efetivação por falta de um aparato técnico ou
financeiro, o que faz surgir a aplicação do princípio da subsisdiariedade para que os
Estados-membros possam licenciar os objetos de impacto local. Muitos Municípios
que compõem a Federação, ainda não têm condições para a implementação de uma
adequada política ambiental municipal e muito menos a criação de um sistema de
licenciamento ambiental municipal, que possa atender os interesse locais da
sociedade.
21. É importante diante do atual ordenamento jurídico
constitucional que o artigo 10 da Lei federal 6.938/81 sofra uma nova hermenêutica,
já que considerar que o referido artigo exclui do exercício do licenciamento ambiental
o Município, é considerá-lo inconstitucional, causando a sua não recepção pela nova
ordem jurídica, e conseqüentemente, a extinção do licenciamento ambiental a nível
federal, pois tal instrumento de controle ambiental federal é respaldado pelo artigo
10. Acredito que a mais adequada hermenêutica para o artigo 10 da Lei federal
6.938/81, que mantém a sua conformidade com a ordem constitucional atual é de
que tal artigo cria o licenciamento ambiental federal e indica os objetos a serem
licenciados pelo órgão ambiental responsável da União e, ao mesmo tempo,
expressa que os objetos não licenciados pela União serão pelos Estados-membros,
já que estes detêm a competência residual, não impedindo assim, que os Municípios
criem seus próprios licenciamentos e expressem o que não é de predominância local
sejam licenciados pelos Estados-membros, novamente devido à competência
residual. Alerto que não estou a desenvolver uma forma de delegação, mas
afirmando que pode os entes federativos, no momento da delimitação das suas
competências, expressarem no enunciado normativo a competência residual dos
Estados-membros.
213

22. A partir da nova hermenêutica proposta acima deve-se


adequar todo o ordenamento jurídico infraconstitucional à possibilidade dos
Municípios poderem licenciar, independentes de delegação pelos Estados-membros.
Com isso, os artigos 4º, 5º e 6º da resolução CONAMA 237/97, encontram-se em
perfeita constitucionalidade e legalidade, já que reafirma o que foi disposto
implicitamente pela Constituição Federal de 1988. Evidente que nem toda a
resolução encontra-se em conformidade com a atual ordem constitucional, visto que,
em alguns artigos, a mesma vai de encontro ao princípio federativo e o da
predominância do interesse, como pode ser visto no inciso IV do artigo 5º e na parte
final do artigo 6º que possibilita a delegação do exercício do licenciamento, que
como já afirmei é inconstitucional.
No artigo 20 da resolução CONAMA 237/97, acredito que o
mesmo está em conformidade com a Constituição Federal de 1988, porque
determina um dever para que os entes possam licenciar, que é a existência de um
conselho de políticas públicas ambientais, efetivando, dessa forma, o princípio
ambiental da participação democrática nos processo em que o ambiente esteja
envolvido. Penso que tal dever não corresponde a uma conduta imposta pela União,
mas pela própria principiológica constitucional ambiental. No que se refere ao dever
da existência de uma estrutura de profissionais habilitados para que os entes
possam exercer o licenciamento é também a efetivação do princípio da prevenção e
da precaução, já que o licenciamento não é um instrumento de decisões políticas,
mas técnicas.
23. O licenciamento ambiental municipal é um instrumento
totalmente possível de ser efetivado pelos Municípios brasileiros que desejam ter
esse instrumento de controle ambiental, pois sua base legal encontra-se no
ordenamento jurídico constitucional, não sendo necessário que haja delegação para
que os entes locais possam licenciar; já que a competência de controle ambiental
das condutas que, de alguma forma, possa intervir no ambiente, quando de
proporções locais cabe aos Municípios, devido ao princípio da predominância do
interesse e dos enunciados constitucionais do artigo 23, VI, 30, I e 255. Assim, cabe
ao Município editar a lei, criando o licenciamento ambiental municipal e seus devidos
procedimentos, incluindo os prazos e as licenças a serem outorgadas pelos
Municípios e também as principiais características dos objetos que promovam
impactos locais.
214

24. Quanto à definição do ente licenciante, diversos podem ser


os elementos definidores, mas acredito que o melhor a ser utilizado se refere ao
impacto local, visto que acredito representar o melhor elemento a identificar o
princípio da predominância do interesse, que deve ser buscado sob pena do ente
local violar o seu âmbito de competência. Importante que os impactos a serem
identificados como elementos definidores da competência local sejam os diretos, até
porque, sendo o ambiente um bem de todos, qualquer intervenção no mesmo, causa
um impacto na sociedade. Dessa forma, somente os impactos diretos serão
considerados para identificar a conduta como sendo geradora de impacto local ou
não, e este pode ser definido pelo âmbito de pessoas que irão suportar os impactos
provenientes da conduta.
25. Importante função, no exercício do licenciamento ambiental
municipal, é a participação da sociedade diretamente afetada pelos efeitos
geradores das condutas que venham a intervir no ambiente, sejam os efeitos
positivos ou negativos. Dessa forma, acredito que, para a identificação dos objetos a
serem submetidos ao licencimento ambiental municipal, deve ser realizado pelos
Conselhos de Políticas Públicas de caráter ambiental, pois estes têm a participação
da sociedade em sua composição, e por tal estaria a sociedade identificando quais
as condutas devem ser licenciadas ou não. Como dito anteriormente, no
licenciamento, existem diversos direitos fundamentais que devem ser efetivados e
encontram-se aparentemente em conflito, e por serem fundamentais não podem ser
afastados e ao mesmo tempo tem de ser efetivados na proporção ideal para cada
caso concreto, devendo o licenciamento exercer essa função e nada mais correto
que a sociedade, titular de tais direitos, que irá suportar os efeitos das condutas
sobre o ambiente, participe do sistema municipal de licenciamento ambiental,
informando quais objetos devem ser submetidos ao licenciamento por gerarem
impactos de âmbito local, pois é através dos conselhos que a sociedade vive o
Estado Democrático de Direito, participando de sua condução e manifestando e
impondo as necessárias condutas a serem efetivadas.
26. No Município de Campos dos Goytacazes, localizado no
Estado do Rio de Janeiro, a implementação do licenciamento ambiental municipal é
de extrema importância, tendo em vista as suas características próprias, em
especial, a extração mineral, o cultivo da cana de açúcar, a existência do parque
industrial da CODIN e os diversos empreendimentos que vêm se implantando no
215

Município, mas para tal é necessário que o Poder Público realize uma série de
atitudes para a implantação do sistema de licenciamento ambiental. Creio que as
condutas necessárias pelo Município, já vêm ocorrendo, tendo em vista a vigência
do novo Plano Diretor Municipal que estabelece um Sistema de Licenciamento
Ambiental, mas para a efetivação desse sistema, primeiramente é necessária a
alteração da Lei Orgânica Municipal que atualmente inviabiliza o exercício do
licenciamento pelo Município, posteriormente a reestruturação do órgão ambiental
municipal que não tem em seus quadros efetivos profissionais habilitados para o
exame dos processos de licenciamento, além disso, é necessário também que se
reestruture o Conselho Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo para que venha,
portanto, desenvolver de forma adequada a competência de identificar os objetos
que deverão ser submetidos ao licenciamento.
216

REFERÊNCIAS

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VERDÚ. Pablo Lucas. O Sentimento Constitucional, Rio de Janeiro: Forense, 2006.


228

ANEXOS
229

PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR488

Fixa normas para a cooperação entre a


União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, nas ações administrativas
decorrentes do exercício da competência
comum relativas à proteção das paisagens
naturais notáveis, à proteção do meio
ambiente, ao combate à poluição em
qualquer de suas formas e à preservação
das florestas, da fauna e da flora,
previstas no art. 23, incisos III, VI e VII, da
Constituição.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1o Esta Lei Complementar fixa, nos termos do parágrafo único do art. 23
da Constituição, normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios, nas ações administrativas decorrentes do exercício da
competência comum relativa à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção
do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à
preservação das florestas, da fauna e da flora, previstas no art. 23, incisos III, VI e
VII, da Constituição Federal.

Art. 2o Constituem objetivos fundamentais da União, dos Estados, do Distrito


Federal e dos Municípios, no exercício da competência comum a que se refere esta
Lei Complementar:

488
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei Complementar - PLP nº 388/2007: Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br > . Acesso em: 12 de fev. 2008.
230

I - proteger, defender e preservar o meio ambiente ecologicamente


equilibrado;
II - garantir o desenvolvimento ecologicamente sustentável;
III - harmonizar as ações administrativas para evitar a sobreposição de
atuação dos entes federativos;
IV - garantir a unicidade da política ambiental para todo o país, respeitadas as
peculiaridades regionais e locais; e
V - promover a gestão compartilhada, democrática e eficiente.

Art. 3o As ações administrativas decorrentes da competência comum de que


trata esta Lei Complementar deverão observar o critério da predominância do
interesse nacional, regional e local na proteção ambiental.
Parágrafo único. O disposto no caput não afasta a atuação subsidiária dos
demais entes federativos, de acordo com o disposto nesta Lei Complementar.

CAPÍTULO II
DOS INSTRUMENTOS DE COOOPERAÇÃO

Art. 4o Os entes federativos poderão valer-se dos seguintes instrumentos com


vistas ao compartilhamento das atividades pr nesta Lei Complementar:
I - Conselhos de Meio Ambiente;
II - consórcios públicos ou convênios de cooperação, nos termos da
legislação em vigor, para o exercício das competências fixadas nesta Lei
Complementar;
III - convênios, acordos de cooperação técnica e outros instrumentos similares
com órgãos e entidades do Poder Público, para auxiliar no desempenho de suas
atribuições; e
IV - Fundos de Meio Ambiente.
Parágrafo único. Os instrumentos mencionados no inciso III poderão ser
firmados com prazo indeterminado.

CAPÍTULO III
DAS AÇÕES DE COOPERAÇÃO
231

Art. 5o As ações de cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal


e os Municípios serão desenvolvidas de modo a harmonizar as políticas
governamentais setoriais com a política nacional do meio ambiente.

Art. 6o Para os fins do art. 5o, são ações administrativas da União, dentre
outras:
I - formular, executar e fazer cumprir, no nível nacional, a Política Nacional do
Meio Ambiente;
II - exercer a gestão dos recursos ambientais, no âmbito de sua competência;
III - promover ações relacionadas à Política Nacional do Meio Ambiente, nos
âmbitos nacional e internacional;
IV - promover a integração de programas e ações de órgãos e entidades da
Administração Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
relacionados à proteção e à gestão do meio ambiente;
V - articular a cooperação técnica, científica e financeira, em apoio à Política
Nacional do Meio Ambiente;
VI - promover o desenvolvimento de estudos e pesquisas direcionados à
proteção e à gestão ambiental, divulgando os resultados obtidos;
VII - promover a articulação da Política Nacional do Meio Ambiente com a de
Recursos Hídricos;
VIII - organizar e manter, com a colaboração dos órgãos e entidades da
Administração Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, o Sistema
Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente - SINIMA;
IX - elaborar o zoneamento ambiental de âmbito nacional e regional;
X - definir espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos;
XI - promover e orientar a educação ambiental;
XII - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o
meio ambiente;
XIII - exercer o controle e a fiscalização das atividades e empreendimentos
cuja competência para licenciar, ambientalmente, for cometida à União;
232

XIV - exercer o controle e a fiscalização das atividades e empreendimentos


cuja competência para autorizar, ambientalmente, for cometida à União;
XV - promover o licenciamento ambiental das atividades ou
empreendimentos, a saber:
a) que causem ou possam causar impacto ambiental direto de âmbito
nacional ou regional;
b) localizados ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe;
c) localizados na plataforma continental, na zona econômica exclusiva, em
terras indígenas ou em unidades de conservação da União, exceto em Áreas de
Proteção Ambiental - APAs, onde deverá ser observado o critério do impacto
ambiental direto das atividades ou empreendimentos;
d) destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar
e dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear em
qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da Comissão Nacional de
Energia Nuclear - CNEN; e
e) empreendimentos e atividades militares que servem a defesa nacional, na
forma da Lei;
XVI - elaborar a relação de espécies raras ou ameaçadas de extinção, da
fauna e da flora, no território nacional;
XVII - autorizar a introdução no País de espécies exóticas da fauna e da flora;
XVIII - autorizar a liberação de exemplares de espécie exótica da fauna e da
flora em ecossistemas naturais;
XIX - autorizar a exportação de espécimes da flora e fauna brasileiras, partes
ou produtos deles derivados; e
XX - autorizar a supressão de vegetação e o manejo de florestas e de
formações sucessoras em florestas públicas e unidades de conservação da União,
bem como em empreendimentos potencialmente causadores de impacto ambiental
nacional ou regional, observadas as atribuições dos demais entes federativos
previstas nesta Lei Complementar.

Art. 7o Para os fins do art. 5o, são ações administrativas dos Estados e do
Distrito Federal, dentre outras:
I - executar e fazer cumprir, no nível estadual, a Política Nacional de Meio
Ambiente;
233

II - exercer a gestão dos recursos ambientais do âmbito de sua competência


estadual;
III - formular, executar e fazer cumprir, no nível estadual, a Política Estadual
de Meio Ambiente;
IV - promover, no âmbito estadual e distrital, a integração de programas e
ações dos órgãos e entidades da Administração Pública da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, relacionados à proteção e à gestão ambiental;
V - articular a cooperação técnica, científica e financeira, em apoio às
Políticas Nacional e Estadual de Meio Ambiente;
VI - promover o desenvolvimento de estudos e pesquisas direcionados à
proteção e à gestão ambiental, divulgando os resultados obtidos;
VII - organizar e manter, com a colaboração dos órgãos municipais
competentes, o Sistema Estadual de Informações sobre Meio Ambiente;
VIII - prestar informações à União para a formação e atualização do Sistema
Nacional de Informações sobre Meio Ambiente;
IX - elaborar o zoneamento ambiental de âmbito estadual ou distrital, em
conformidade com o zoneamento nacional;
X - definir espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos;
XI - promover e orientar a educação ambiental em todos os níveis de ensino e
a conscientização pública para a proteção do meio ambiente;
XII - exercer o controle e a fiscalização das atividades e empreendimentos
cuja competência para licenciar, ambientalmente, for cometida aos Estados ou ao
Distrito Federal;
XIII - exercer o controle e a fiscalização das atividades e empreendimentos
cuja competência para autorizar, ambientalmente, for cometida aos Estados ou ao
Distrito Federal;
XIV - promover o licenciamento ambiental das atividades ou
empreendimentos, a saber:
a) que causem ou possam causar impacto ambiental direto de âmbito
estadual; e
b) localizados em unidades de conservação do Estado ou do Distrito Federal,
exceto em Áreas de Proteção Ambiental - APAs, onde deverá ser observado o
critério do impacto ambiental direto das atividades ou empreendimentos;
234

XV - autorizar a supressão de vegetação e o manejo de florestas e de


formações sucessoras incidentes em florestas públicas e unidades de conservação
de do Estado e do Distrito Federal, bem como em propriedades rurais, observadas
as atribuições dos demais entes federativos prevista nesta Lei Complementar;
XVI - elaborar relação de espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção
no respectivo território;
XVII - autorizar a apanha de espécimes da fauna silvestre, ovos e larvas
destinadas à implantação de criadouros e a pesquisa científica;
XVIII - autorizar o funcionamento de criadouros da fauna silvestre; e
XIX - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o
meio ambiente.
Art. 8o Para os fins do art. 5o, são ações administrativas dos Municípios,
dentre outras:
I - executar e fazer cumprir, no nível municipal, as Políticas Nacional e
Estadual de Meio Ambiente;
II - exercer a gestão dos recursos ambientais do âmbito de sua jurisdição;
III - formular, executar e fazer cumprir a Política Municipal de Meio Ambiente;
IV - promover, no município, a integração de programas e ações de órgãos e
entidades da Administração Pública Federal, Estadual e Municipal, relacionados à
proteção e à gestão ambiental;
V - articular a cooperação técnica, científica e financeira, em apoio às
Políticas Nacional, Estadual e Municipal de Meio Ambiente;
VI - promover o desenvolvimento de estudos e pesquisas direcionados à
proteção e à gestão ambiental, divulgando os resultados obtidos;
VII - organizar e manter o Sistema Municipal de Informações sobre Meio
Ambiente;
VIII - prestar informações aos Estados e à União para a formação e
atualização dos Sistemas Estadual e Nacional de Informações sobre Meio Ambiente;
IX - elaborar o zoneamento ambiental de âmbito municipal, em conformidade
com o zoneamento nacional e estadual;
X - definir espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos;
235

XI - promover e orientar a educação ambiental em todos os níveis de ensino e


a conscientização pública para a proteção do meio ambiente;
XII - exercer o controle e a fiscalização das atividades e empreendimentos
cuja competência para licenciar, ambientalmente, for cometida ao Município;
XIII - exercer o controle e a fiscalização ambiental das atividades e
empreendimentos cuja competência para autorizar, ambientalmente, for cometida ao
Município;
XIV - promover o licenciamento ambiental das atividades ou
empreendimentos, a saber:
a) que causem ou possam causar impacto ambiental direto de âmbito local; e
b) localizados em unidades de conservação do Município, exceto em Áreas
de Proteção Ambiental - APAs, onde deverá ser observado o critério do impacto
ambiental direto das atividades ou empreendimentos;
XV - autorizar a supressão de vegetação em unidades de conservação do
Município e em áreas efetivamente urbanizadas, observadas as atribuições dos
demais entes federativos prevista nesta Lei Complementar;
XVI - autorizar o corte seletivo de árvores para utilização no próprio município,
observadas as atribuições dos demais entes federativos prevista nesta Lei
Complementar; e
XVII - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o
meio ambiente.

Art. 9o A construção, instalação, operação e ampliação de estabelecimentos e


atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e
potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar
degradação ambiental dependerão de prévias licenças do ente federativo
responsável por promover o licenciamento ambiental, nos termos desta Lei
Complementar.
§ 1o Os demais entes federativos interessados poderão se manifestar, de
maneira não vinculante, no procedimento de licenciamento ambiental.
§ 2o A supressão de vegetação decorrente de licenciamentos ambientais será
autorizada pelo ente federativo licenciador.
236

Art. 10. Para os efeitos desta Lei, considera-se:


I - impacto ambiental direto de âmbito nacional ou regional: aquele que afete
diretamente, no todo ou em parte, o território de dois ou mais Estados Federados ou
cujos impactos ambientais significativos diretos ultrapassem os limites territoriais do
País;
II - impacto ambiental direto de âmbito estadual: aquele que afete
diretamente, no todo ou em parte, o território de dois ou mais Municípios; e
III - impacto ambiental direto de âmbito local: aquele que afete direta, no todo
ou em parte, o território de um município sem ultrapassar o seu limite territorial.

Art. 11. A ação administrativa subsidiária dos entes federativos dar-se-á, em


caráter geral, por meio de apoio técnico, científico, administrativo ou financeiro, sem
prejuízo de outras formas de cooperação.

Art. 12. As ações administrativas subsidiárias, de que tratam o parágrafo


único do art. 3o desta Lei, nas hipóteses do art. 7o, incisos XIV, XV, XVII e XVIII, e
do art. 8o, incisos XIV, XV e XVI, dar-se-á da seguinte forma:
I - inexistindo órgão ambiental no Estado ou no Distrito Federal, a União
desempenhará as ações administrativas estaduais ou distritais até a sua criação; e
II - inexistindo órgão ambiental no Município, o Estado desempenhará as
ações administrativas municipais até a sua criação.

Art. 13. Nos casos de iminência ou ocorrência de dano ambiental o ente


federativo que tiver conhecimento do fato deverá agir para evitar ou cessá-lo.
Parágrafo único. O ente que atuou para evitar ou cessar o dano ambiental
comunicará imediatamente o ente federativo responsável, para as providências
devidas.

Art. 14. Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília,

EM Nº 62/MMA/2006
237

Brasília, 22 de agosto de 2006.

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,


1. Submeto a Vossa Excelência o anexo projeto de lei complementar que fixa
normas para a cooperação entre a União, e os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, no que se refere às competências comuns previstas nos termos do art.
23, incisos III, VI e VII e parágrafo único, da Constituição Federal.
2. A Constituição, ao criar a Federação, fez com que o poder não fique
concentrado nas mãos de uma única pessoa jurídica de direito público, mas que se
reparta entre os entes coletivos que a compõem. Ao adotar do federalismo a
Constituição brasileira, determina a existência de várias ordens, com autonomia
político-administrativa: a União como a ordem nacional, os Estados como ordens
regionais e os Municípios como ordens locais.
3. A autonomia federativa caracteriza-se pela existência, em cada ente
federado, de órgãos governamentais próprios e posse de competências exclusivas.
4. Essa múltipla composição, conseqüentemente, permite que sobre o mesmo
povo e sobre o mesmo território, seja sentida a incidência de diversas ordens
estatais, o que só se torna possível em razão da repartição de competências dentre
os entes federativos.
5. Assim, dentro de um estado federado, o sistema de repartição de
competências é um aspecto fundamental, sendo apontado como um dos principais
responsáveis por viabilizar uma atuação pública eficiente.
6. De maneira sintética, é possível dizer que a Constituição Federal separa a
competência legislativa (formal) da competência material (administrativa ou de
execução).
7. A competência administrativa é aquela relacionada ao desempenho de
tarefas, à tomada de providências, à prestação de serviços, enfim, à execução de
toda e qualquer atividade, com exceção das legislativas.
8. No que se refere ao tema meio ambiente, a Constituição Federal
estabelece uma competência comum à União, aos Estados e aos Municípios para
articularem políticas públicas ambientais, ou seja, para exercerem suas
competências administrativas e para protegerem o meio ambiente.
9. Manifesta o art. 23 da Constituição Federal:
238

"Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e


dos Municípios:
I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e
conservar o patrimônio público;
II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas
portadoras de deficiência;
III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e
cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de
outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;
VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas
formas;
VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;
VIII - fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar;
IX - promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições
habitacionais e de saneamento básico;
X - combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a
integração social dos setores desfavorecidos;
XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e
exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios;
XII - estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito.
Parágrafo único. Lei complementar fixará normas para a cooperação entre a
União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o
equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional." (grifamos)
10. Entende-se que a competência comum é prevista para aquelas matérias
em que há a coincidência entre os interesses geral, regional e local, revelando, por
isso mesmo, temas de grande relevância social que devem ser amplamente
tutelados por todos os entes federativos.
11. A definição do papel da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios é tema de fundamental importância para eficácia das normas de proteção
ambiental.
12. Na temática ambiental a ausência de critérios claros na definição das
atribuições entre os diversos entes federados vem trazendo uma série conflitos na
239

aplicação de instrumentos da gestão ambiental como a sobreposição ações de entes


federados ou mesmo a inexistência destas, causando sérios prejuízos ao meio
ambiente.
13. A tradicional centralização das ações administrativas de cunho ambiental
na União e nos Estados vem impedindo que os Municípios assumam suas
responsabilidades constitucionais na matéria ambiental. Neste sentido, a excessiva
carga de atribuições à União e aos Estados impede uma melhor cooperação entre
todos os entes federados.
14. A regulamentação do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal é
de fundamental importância para a melhor cooperação entre a União, os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios na defesa do meio ambiente. Ademais, trata-se de
elemento fundamental para o fortalecimento do Sistema Nacional do Meio Ambiente-
SISNAMA, criado pela Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, bem como para
proporcionar maior controle e melhor qualidade na prestação de serviços à
coletividade.
15. A presente minuta de Projeto de Lei Complementar é resultado dos
esforços de Grupo de Trabalho formado por representantes do Ministério do Meio
Ambiente, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis-IBAMA, Agência Nacional de Águas-ANA, da Associação Brasileira de
Entidades Estaduais de Meio Ambiente-ABEMA e da Associação Nacional dos
Municípios e Meio Ambiente-ANAMMA.
16. Considerando que incumbe ao Poder Público assegurar e dar efetividade
do direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, e, tendo em vista que o
legislador constituinte delimitou uma área de competência comum, relacionadas ao
meio ambiente, que deve ser exercida de maneira cooperada entre a União,
Estados, Distrito Federal e Municípios.
17. O texto do Projeto de Lei Complementar busca definir de forma cooperada
e racional as atribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
para o exercício da gestão ambiental. Tal regulamentação trará inúmeros benefícios
à nação tendo em vista harmonizar as relações entre os órgãos integrantes do
SISNAMA.
240

18. Estas, Senhor Presidente, as razões que justificam o encaminhamento do


anexo projeto de lei complementar que ora submeto à elevada consideração de
Vossa Excelência.
Respeitosamente, Assinado eletronicamente por: Marina Silva
241

DECRETO Nº 40793, DE 05 DE JUNHO DE 2007.489

DISCIPLINA O PROCEDIMENTO DE
DESCENTALIZAÇÃO DA FISCALIZAÇÃO E
DO LICENCIAMENTO MABIENTAL
MEDIANTE A CELEBRAÇÃO DE CONVÊNIOS
COM OS MUNICÍPIOS DO ESTADO DO RIO
DE JANEIRO QUE POSSUAM
ÓRGÃO/ENTIDADE AMBIENTAL
COMPETENTE DEVIDAMENTE
ESTRUTURADO E EQUIPADO E DÁ OUTRAS
PROVIDÊNCIAS.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, no uso de suas


atribuições constitucionais e legais, e tendo em vista o consta no processo E-
07/0337/2007.

DECRETA:

Art. 1º - Pode ser objeto de convênio a ser celebrado com os Municípios do


Estado do Rio de Janeiro o licenciamento ambiental de atividades cujo impacto
ambiental seja restrito aos seus limites territoriais e classificados como de pequeno
potencial poluidor.

Art. 2º - Compete ao Estado o licenciamento dos empreendimentos:


I – localizados ou desenvolvidos em mais de 1 (um município;
II – localizados em Unidades de Conservação do Estado, exceto nas Áreas de
Proteção Ambiental quando situados em Zonas de Ocupação Controlada, de acordo
com o respectivo plano diretor;
III – que sejam potencialmente causadores de significativa degradação do
meio ambiente e necessitem de EIA/RIMA, incluindo aqueles listados na Lei
Estadual nº 1356/88.

Art. 3º - Poderá o Estado, mediante e celebração de convênios próprios,


transferir ao Município as atividades referentes ao procedimento de licenciamento
ambiental e a respectiva legislação dos empreendimentos e atividades cujos
impactos ambientais locais diretos.
Parágrafo Único – São atividades com impacto ambiental direto aquelas
capazes de ensejar comprometimento aos meios físicos e biológicos no Município,
desde que não ultrapassem seus limites territoriais e sejam classificadas como
potencial poluidor, salvo aos empreendimentos e atividades sujeitas à elaboração de
EIA/RIMA, tais como os constantes do Anexo deste Decreto.

Art. 4º - A celebração de convênio de que trata este ato normativo não


desobriga o Estado do exercício do poder de polícia ambiental, quando
caracterizada a comissão ou inépcia do município no desempenho da atividade de
licenciamento e fiscalização,
489
ESTADO DO RIO DE JANEIRO – BR. Decreto nº 40793, de 05 de junho de 2007. Disponível em:
<http://www.feema.rj.gov.br>. Acesso em: 01 de mar. 2008.
242

não impedindo a adoção pelo Estado, de medidas urgentes necessárias a evitar ou


minorar danos ambientais.
§ 1º - Os Órgãos/Entidades ambientais municipais deverão apresentar ao
órgão/entidade ambiental estadual, bimestralmente, o cadastro georeferenciado das
atividades licenciadas, juntamente com a cópia das licenças ambientais outorgadas
em meio digital.
§ 2º - O órgão/entidade ambiental estadual poderá exigir, quando necessário,
o Relatório de Auditoria Ambiental de empreendimentos licenciados pelos
municípios.

Art. 5º - É condição para celebração de convênio e, conseqüentemente, para


a realização do licenciamento ambiental municipal, que o município:
I – possua corpo técnico especializado, integrante do quadro funcional do
Município, para a realização da fiscalização e do licenciamento ambiental;
II – tenha implantado e em funcionamento o Conselho Municipal de Meio
Ambiente, instância normativa, colegiada, consultiva e deliberativa de gestão
ambiental, com representação da sociedade civil organizada paritária è do Poder
Público;
III – Possua legislação própria disciplinando o licenciamento ambiental
municipal e as sanções administrativas pelo seu descumprimento;
IV – Possua Plano Diretor, Município com a população superior a 20.000
(vinte mil) habitantes, ou lei de diretrizes urbanas, o Município com população igual
ou inferior a 20.000 (vinte mil) habitantes.
V – dê ciência ao órgão/Entidade ambiental estadual sobre as informações
relativas aos seguintes instrumentos de controle vigentes, conforme respectivas
Deliberações CECA: Procon Ar, Procon Água, Inventário e Manifesto de Resíduos;
VI – tenha implantado o Fundo Municipal do Meio Ambiente.

Art. 6º - As despesas financeiras e econômicas decorrentes da execução dos


convênios a serem celebrados deverão correr à conta de dotações próprias de cada
um dos Municípios.

Art. 7º - Nos convênios a serem celebrados com cada município, dependendo


de suas peculiaridades, a relação de atividades, elencadas no Anexo do presente
Decreto, poderá ser acrescida de outras, desde que a administração municipal
comprove a impossibilidade de faze-lo.
Parágrafo único – A relação de atividades, constantes do Anexo deste
Decreto,
poderá ser revisada a cada 2 (dois) anos.

Art. 8º - Cumpre à FEEMA a orientação e a supervisão dos procedimentos de


licenciamento atribuídos aos Municípios.

Art. 9º - Deverá repassado à FEEMA o valor correspondente a 20% (vinte por


cento) do total arrecadado pelos Municípios no procedimento de licenciamento
ambiental, a título de ressarcimento pelas atividades efetivamente realizadas,
referentes a orientação e supervisão.
243

Art. 10º - A instrução dos procedimentos referentes a cada convênio deverá


compreender a manifestação da Assessoria Jurídica da Secretaria de Estado do
Ambiente – SEA.

Art. 11º - Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação.

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2007.

SERGIO CABRAL

ANEXO AO DECRETO Nº 40793 DE 05.06.2007.

RELAÇÃO DAS ATIVIDADES MENCIONADAS NOS ARTIGOS 3º E 8º DO


PRESENTE DECRETO:
1. Transporte de resíduos industriais, hospitalares e carga perigosa;
2. Coleta e tratamento de esgoto doméstico público acima de 1m3/segundo;
3. Centrais terceirizadas de tratamento de efluentes industriais;
4. Fabricação de cimento e clínquer e co-processamento de resíduos;
5. Metalurgia dos metais não ferrosos em formas primárias, com operação de
têmpera, cementação e tratamento térmico;
6. Fabricação de inseticidas, germicidas e fungicidas;
7. Fabricação de explosivos à base de celulose, nitroglicerina, cloratos e percloratos,
nitrato de amôneo, trinitrotolual;
8. Recuperação de óleos lubrificantes – inclusive óleo queimado;
9. Fabricação de lâmpadas incandescentes, fluorescentes, a gás de mercúrio e
néon, de arco, de raio infravermelho e ultravioleta e semelhantes – inclusive
lâmpadas miniaturas e lâmpadas descartáveis “flash”;
10. Estaleiros para construção de navios para transporte de cargas ou passageiros,
construção de barcos pesqueiros, rebocadores, embarcações esportivas e
recreativas, estruturas flutuantes;
11. Empreendimentos destinados à construção, montagem e reparação de aviões e
outros materiais de transporte aéreo – inclusive a fabricação de peças e acessórios,
e a reparação de turbinas e motores de avião;
12. Fabricação de veículos automotores;
13. Unidades de recuperação de baterias em geral;
14. Atividade de extração mineral (pedreiras de brita, de bloco, calcário, concha
calcária), substâncias minerais para construção civil não artesanal;
15. Certificado de Registro de Agrotóxico.
244

DECRETO Nº 40.980 DE 15 DE OUTUBRO DE 2007490

DÁ NOVA REDAÇÃO AOS ARTS. 1º, 3º E AO


TÍTULO DO ANEXO DO DECRETO Nº. 40.793
DE 05 DE JUNHO DE 2007, QUE DISCIPLINA
O PROCEDIMENTO DE
DESCENTRALIZAÇÃO DA FISCALIZAÇÃO
AMBIENTAL MEDIANTE A CELEBRAÇÃO DE
CONVÊNIOS COM MUNICÍPIOS DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO E
DETERMINA OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, no uso de suas


atribuições constitucionais e legais e tendo em vista o que consta do processo nº. E-
07/000350/2007.

DECRETA:

Art. 1º - Os artigos 1º, 3º e o título do Anexo, todos do Decreto n° 40.793 de


05 de junho de 2007, publicado no D.O. de 06 de junho de 2007, passam a vigorar
com a seguinte redação:

“Art. 1º - Pode ser objeto de convênio a ser celebrado


com os Municípios do Estado do Rio de Janeiro, o
licenciamento ambiental de atividades cujo impacto
ambiental seja restrito aos seus limites territoriais e
classificados como de pequeno potencial poluidor, bem
como das atividades que importem em supressão de
vegetação”.

“Art. 3º - Poderá o Estado, mediante a celebração de


convênios próprios, transferir ao Município as atividades
referentes ao procedimento de licenciamento ambiental e
a respectiva fiscalização de empreendimentos e
atividades cujos impactos ambientais diretos.
“§ 1º - São atividades com impacto ambiental direto
aquelas capazes de ensejar comprometimento aos meios
físicos e biológicos no Município, desde que não
ultrapassem seus limites territoriais e sejam classificados
como pequeno potencial poluidor, salvo os
empreendimentos e atividades sujeitos à elaboração de
EIA/RIMA previstos na Lei Estadual nº. 1.356, de 03 de
outubro de 1988, alem daquelas constantes do Anexo
deste Decreto.
§ 2º - O Estado poderá delegar competência ao Município
para autorizar a supressão de vegetação na Área de
Preservação Permanente, na forma prevista no art. 4º e
490
ESTADO DO RIO DE JANEIRO – BR. Decreto nº 40.980, de 15 de outubro de 2007. Disponível em:
<http://www.feema.rj.gov.br>. Acesso em: 01 de mar. 2008.
245

seus §§ da Lei nº. 4.771 de 15 de setembro de 1965, que


institui o novo Código Florestal, e na Resolução
CONAMA nº. 369, de 28 de março de 2006, que dispõe
sobre os casos excepcionais, de utilidade pública,
interesse social ou baixo impacto ambiental, que
possibilitam a intervenção, ou supressão de vegetação
em Área de Preservação Permanente – APP”.

“ANEXO AO DECRETO Nº. 40.793 DE 05.6.2007


RELAÇÃO DAS ATIVIDADES MENCIONADAS NO § 1º,
IN FINE DO ART. 3º”.

Art. 2º - Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas


as disposições em contrário, produzindo efeitos a partir de 06 de junho de 2007

Rio de Janeiro, 15 de outubro de 2007

SÉRGIO CABRAL

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