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INSTITUTO APHONSIANO DE ENSINO SUPERIOR - IAESup

FACULDADE DE DIREITO
COORDENAÇÃO ADJUNTA DE TRABALHO DE CURSO
MONOGRAFIA JURÍDICA

A FALTA DE LEGITIMIDADE DAS TERRAS DEVOLUTAS E A


POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO DEVIDO À AUSÊNCIA DA
FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE.

ORIENTANDO: EDUARDO BUENO SOARES


ORIENTADOR: PROF. MS. ISAC CARDOSO DAS NEVES

Trindade – GO
2018
INSTITUTO APHONSIANO DE ENSINO SUPERIOR - IAESup
FACULDADE DE DIREITO

ORIENTANDO: EDUARDO BUENO SOARES

A FALTA DE LEGITIMIDADE DAS TERRAS DEVOLUTAS E A


POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO DEVIDO À FUNÇÃO SOCIAL DA
PROPRIEDADE

Projeto de Monografia Jurídica apresentado à disciplina de


Trabalho de Curso I, do Departamento Ciências Jurídicas,
curso de bacharelado em Direito do Instituto Aphonsiano
de Ensino Superior- IAEsup sob a orientação do Prof. Me.
Isac Cardoso das Neves.

Trindade – GO
2018
EDUARDO BUENO SOARES

A FALTA DE LEGITIMIDADE DAS TERRAS DEVOLUTAS E A


POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO DEVIDO À FUNÇÃO SOCIAL DA
PROPRIEDADE

Trindade ___ de ________ de 2018.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________________________________
Orientador: Prof. Ms. Isac Cardoso das Neves Nota

_________________________________________________________________________
Prof. Nota

_________________________________________________________________________
Prof. Nota

Nota Final_____________
Primeiramente agradecer a Deus, por me guiar e
iluminar todo meu caminho e me acompanhar à conclusão
deste árduo trabalho.
Gostaria também de agradecer e cumprimentar
meu professor e orientador, professor Me. Isac Cardoso
das Neves, que de forma criteriosa e paciente contribuiu
intensamente com seu brando saber e serenidade à
produção deste projeto.
Agradecer também à minha mãe, pessoa e mulher
mais importante da minha vida, aquela que sempre me
apoiou e se desdobrou para me dar sempre o melhor, e que
serviu de exemplo e de espelho para toda minha
experiência social e profissional.
Ao meu irmão, que sempre esteve comigo em
todas as situações, que sempre me impulsionou e que hoje
é o modelo de pessoa que desejo ser.
A minha namorada, amiga, mulher e companheira,
que está diariamente ao meu lado, sentindo também o
quão é laborioso a produção desta pesquisa.
A toda minha família, especialmente meu pai,
avós, tios e padrinhos, que participam e estão presentes
sempre em minha vida direta ou indiretamente perante
qualquer ocasião, me dando total apoio e servindo-me
como um alicerce para o que me tornei.
Enfim, agradecer também a todos meus amigos e
colegas de curso, com quem passei tantos momentos
especiais e difíceis nestes 5 anos, amigos estes que estarão
sempre presentes em toda a minha vida.
RESUMO
Este projeto é o resultado de uma branda pesquisa qualitativa, onde aborda sobre os Direitos
Individuais e Coletivos de propriedade da sociedade atual, sob o viés da Constituição Federal
de 1988 e a posição atual do Supremo Tribunal Federal. Com o enfoque direcionado
preponderantemente para os bens dominicais dos entes federativos, especificamente, tratando
da posse e obtenção do direito de propriedade sobre a terra devoluta. Colocou-se em foco a
falta de legitimidade dessas terras, não reconhecidas pelos seus entes e a falta do cumprimento
de sua função social, dever que é garantia fundamental de todo e qualquer indivíduo. A
pesquisa procurou mostrar que a legislação atual se contraria à ideia, se promovendo e
fortalecendo em texto constitucional sua posição, e que mesmo diante do exposto, demonstrar
o lado do direito exequível dado aos indivíduos, que se colocam e se esforçam para dar
destinação à aquele bem esquecido. Neste estudo, levou-se ainda em consideração que
atualmente o Supremo Tribunal Federal adota posições contrárias à própria legislação,
homologando a usucapião em alguns casos específicos, onde as terras nunca foram
reconhecidas pelo ente que a detém. Ao final, mostrou também, que devido à não
discriminação desses bens, o não reconhecimento e devido registro, põem-se consentido
adquirir-lhe à propriedade desses bens.

Palavras-chave: Propriedade; Terras Devolutas; Função Social da Propriedade; Usucapião;


Bens Públicos.
ABSTRACT
This project is the result of a qualitative qualitative research, which deals with individual and
collective rights owned by current society, under the bias of the Federal Constitution of 1988
and the current position of the Federal Supreme Court. With the predominantly focused
approach to the federal assets of the federative entities, specifically, dealing with the
possession and obtaining of the right of ownership on the land returned. The lack of
legitimacy of these lands, not recognized by their entities and the lack of fulfillment of their
social function, a duty that is the fundamental guarantee of every individual, was put in focus.
The research sought to show that current legislation is contrary to the idea, promoting and
strengthening its position in the constitutional text, and that even in the face of the above,
demonstrating the feasible right side given to individuals, who stand and strive to assign the
one well forgotten. In this study, it was also taken into account that currently the Federal
Supreme Court adopts positions contrary to the legislation itself, approving usucapião in some
specific cases, where the lands were never recognized by the entity that holds it. In the end, he
also showed that, due to the non-discrimination of these goods, non-recognition and due
registration, they are allowed to acquire ownership of these goods.

Keywords: Property; Wastelands; Social Function of Property; Usucapião; Public Goods.


LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
Art. Artigo
CF/88 ou CF/1988 Constituição Federal de 1988
NCC Novo Código Civil
CC/02 Código Civil de 2002
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Supremo Tribunal de Justiça
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................... 09
1. USUCAPIÃO E O DIREITO À 10
PROPRIEDADE.............................................
1.1 Da Usucapião ....................................................................................................... 10
1.1.1 Breve Abordagem Histórica, Conceito de Usucapião e seus 10
Requisitos............
1.1.2 Previsão Legal da 11
Usucapião..............................................................................
1.1.3 Das Modalidades de 12
Usucapião..........................................................................
2. A PROPRIEDADE E SUA FUNÇÃO 17
SOCIAL ................................................
2.1 Propriedade........................................................................................................... 17
2.1.1 Propriedade 20
Pública............................................................................................
2.1.1.1 Terras Devolutas ............................................................................................ 21
2.2. A Função Social da Propriedade.......................................................................... 23
2.2.1 Evolução Histórica ............................................................................................ 23
2.2.2 Função Social da Propriedade e a Constituição Brasileira de 25
1988.....................
2.2.3 Função Social da Propriedade 26
Pública................................................................
3. A POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO EM IMÓVEL PÚBLICO.................. 28
3.1 O Artigo 191 da Constituição Federal de 28
1988.....................................................
3.2 A Possibilidade de Usucapião de Terras Devolutas não 29
Discriminadas................
3.3 Julgados, entendimentos, 30
tribunais........................................................................

CONCLUSÃO........................................................................................................... 32

REFERÊNCIAS........................................................................................................ 33
9

INTRODUÇÃO

Atualmente no cenário brasileiro, ainda nos debatemos com várias faixas de terras sem
dono e sem destinação, muitas das vezes, nem o próprio governo tem ciência da existência
dessas propriedades, diante disso, muitas pessoas, se apropriam dessas terras, em sua maioria
de boa -fé, tentando após um período de tempo, adquirir-lhe-á com à usucapião.

A usucapião é um instituto do Direito Civil que visa a aquisição da propriedade de


maneira originária, ou seja, todos os encargos ou todos os direitos inerentes à aquela terra se
tornam de certa forma excluídos e começa então uma nova propriedade.

Nesse trabalho irá ser abordado sobre a previsão legal que torna a usucapião
impossível quando recair sobre bens públicos, por se tratar de bens coletivos, assim como os
bens dominicais que devido ao direito sumular é considerado também um modelo de bem
público.

Porém, surge diante de alguns julgados e posições doutrinárias, que a terra devoluta,
ou seja, a terra que não tem “dono” ou nenhuma destinação, por se tratar de um bem
dominical, em algum dos casos poderá haver a possibilidade da usucapião sobre tais bens,
contrariando assim a Carta magna de 1988 e demais previsões legais.

O corrente trabalho tem como estrutura, pesquisas bibliográficas por meio de


doutrinas, jurisprudências, sentenças e leis para que tenhamos total ideia sobre o conceito de
Usucapião e suas modalidades, os bens públicos em espécie, a função social da propriedade e
posteriormente a possível hipótese de utilizar do instituto da Usucapião sobre o bem público
devido à função social da propriedade.
10

CAPÍTULO I – A USUCAPIÃO E O DIREITO À PROPRIEDADE.

1.1 DA USUCAPIÃO

1.1.1 BREVE ABORDAGEM HISTÓRICA, CONCEITO DE


USUCAPIÃO E SEUS REQUISITOS.

A usucapião é modo originário de aquisição da propriedade móvel e imóvel, tal


instituto é aplicável ao indivíduo que obtém a posse prolongada e ininterrupta de determinado
imóvel, durante o prazo legal estabelecido para a prescrição aquisitiva. Significa então que
inexiste a partir de consolidado o direito, relação jurídica entre o antigo e o atual proprietário
do imóvel que o adquiriu perante a usucapião. Sua origem vem do latim uso capio, que
significa “adquirir pelo uso”.
Neste sentido, Farias e Rosenvald (2014, p. 342) fazem uma abordagem histórica
sobre a utilização desde meio de aquisição da terra, ao aludirem que:
“A usucapião restou consagrada na Lei das Doze Tábuas, datada de 455 antes de
Cristo, como forma de aquisição de coisas móveis e imóveis pela posse continuada
um ou dois anos. Só poderia ser utilizada pelo cidadão romano, eis que os
estrangeiros não gozavam dos direitos preceituados no ius civile. Desta forma, os
romanos mantinham os seus bens perante os peregrinos e podiam reivindica-los
quando bem entendessem. Sendo a transmissão da propriedade romana cercada de
diversas solenidades, no início a ação de usucapião era utilizada para convalidar
aquisições formalmente nulas ou aquelas ineficazes por vicio ou defeito de
legitimação, quando presente e boa-fé do possuidor.”
Ao passar dos tempos, a sociedade em constante evolução, muitos preceitos e
fundamentos antigos foram modificados e melhorados em relação à usucapião, principalmente
se tratando deste instituto praticado pelo “estrangeiro”, o qual fora citado acima, onde o
mesmo não era beneficiado com a usucapião como os demais cidadãos romanos. Assim, como
afirmam os autores supramencionados (2014. p. 342).
“Com o tempo, expandem-se as fronteiras do império, concedendo-se ao possuidor
peregrino que não tinha acesso à usucapião, uma espécie de prescrição, como forma
de exceção fundada na posse por longo tempo da coisa, nos prazos de 10 e 20 anos,
servindo de defesa contra ações reivindicatórias. O legitimo dono não mais teria
acesso à posse se fosse negligente por longo prazo, mas a exceção de prescrição não
implicava perda de propriedade.”
11

Até o momento não havia direitos e garantias para o possuidor peregrino, ele poderia
garantir sua posse, porém, não conseguia ter o título de proprietário, com a denominada
exceção de prescrição, apenas se protegendo de ações reivindicatórias. No entanto, tudo foi se
aprimorando, até que no ano de 528 d.C ocorrem mudanças alarmantes na legislação, quando
os Justinianos unificaram a usucapio e a praescriptio, pois já não existia diferenças entre as
propriedades civis e as dos peregrinos (pretoriana). Assim se tornou então unificado o
instituto da usucapião, concedendo-se aos detentores da posse o direito de pleitear ação
reivindicatória e a possibilidade de tirar o domínio do proprietário se estivesse durante certo
tempo naquela terra. (FARIAS E ROSENVALD, 2014)
A prescrição aquisitiva pela usucapião, para a validade jurídica do instituto, é
necessário alguns requisitos essenciais, são eles:
 Posse.

Requisito indispensável no instituto da usucapião, que se conceitua como posse a


ligação direta do possuidor da coisa, sendo ele móvel ou imóvel, exercendo sobre a mesma
poderes inerentes à propriedade “animus domini”, mostrando que tem a intenção de ser o
proprietário.
 Espaço temporal.

Um outro requisito essencial, que a maioria das pessoas não levam em consideração
para a configuração da usucapião é o tempo necessário para se fazer valer do direito.
A usucapião exige para cada modalidade um determinado tempo para se consolidar,
lembrando que se conta o tempo a partir da posse legitima e que todo esse tempo não tenha
oposição da pessoa titular da propriedade.
 Coisa hábil.

São passíveis de usucapião apenas as coisas que possam ser apropriadas, inseridas no
comércio. Assim, são insuscetíveis de usucapião direitos pessoais, bens gravados com
cláusula de inalienalidade, bens indivisíveis, bens de incapazes e bens públicos de uso comum
e especial, dentre outros.
Diante do exposto, podemos considerar que no instituto da usucapião, deve ser
considerado por seus requisitos principais abordados, pois sem os mesmos, se torna
desconsiderado o seu direito.

1.1.2 DA PREVISÃO LEGAL DA USUCAPIÃO.


12

A usucapião tem sua previsão legal no artigo 1.238 do Código Civil, onde prevê a
possibilidade de aquisição de propriedade, independente de título e boa-fé:
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir
como seu um imóvel, adquirir-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-
fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de
título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo Único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se á há dez anos se o
possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado
obras ou serviços de caráter produtivo.

Com fulcro no referido artigo, há então a se imaginar que para que se configure o
instituto da usucapião e o direito sobre determinado bem móvel, é necessário a posse
ininterrupta e sem oposição por quinze anos, mesmo não feito por boa-fé, bastando então
respeitar o período estipulado em lei, sem que nem o proprietário legitimo e portador do justo
título e nem terceiro interessado haja com oposição contra as ações.
Logo após, no parágrafo único, podemos observar que o período de tempo estipulado
no CAPUT do artigo reduz para dez anos se o possuidor fazer da coisa sua moradia habitual e
torná-la produtiva, ou seja, cumprir sua função social. A lei nos traz a modalidade de
usucapião extrajudicial, modalidade esta que não necessita da via jurídica para a declaração
do direito.
Todavia, o instituto da usucapião cresceu a abrange diversidades e modalidades,
ambas para cada tipo de situação, tendo suas características, peculiaridades e requisitos
individuais.

1.1.3 DAS MODALIDADES DE USUCAPIÃO.

Ante o exposto, podemos avaliar que tal modo de aquisição de propriedade se torna
um direito expressamente declarado, pois preenchidos os requisitos, não é necessário que essa
decisão seja decidida pelas vias judiciais, porém, existem diversos modos de aquisição por
meio deste instituto.

DÉBORA MARIA BARBOSA SARMENTO (2013), coloca então diante dos


requisitos, as modalidades de usucapião que a lei e a própria doutrina nos traz, vejamos:
(a) Usucapião extraordinária.
13

É denominada de extrajudicial, pelo fato de independer da justiça comum para o


exercício do direito, a aquisição pelo usucapião nesta modalidade, respeitando os requisitos
formais, se declare instantaneamente.
A primeira ideia desta modalidade foi colocada pelo art. 550 do Código Civil de 1916
e tinha como pressupostos, inicialmente, a posse, por 30 anos, sem interrupção ou oposição,
com animus domini.
A Lei nº. 2.437, de 1955, reduziu tal lapso temporal para 20 anos, mantendo os demais
requisitos para aquisição do domínio.
O Código de 2002 em seu artigo 1.238, então, vendo a evolução da sociedade, reduziu
para 15 anos o prazo necessário para alcançá-lo. Concluindo e relembrando que não necessita
ter a boa-fé nesta modalidade, pois não corre na via judicial.
(b) Usucapião extraordinária com prazo reduzido.

Modalidade instituída pelo parágrafo único do artigo 1.238 do NCC:


“O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se á há dez anos se o possuidor houver
estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços
de caráter produtivo.”
(c) Usucapião ordinária.

O justo título e a boa-fé se tornam requisitos importantes para essa modalidade, tendo
que os possuidores devem cumpri-los para pleitear desse direito.
Tal modalidade é embutida na letra do Código Civil de 2002, que por força do mesmo,
pode o possuidor usucapir o imóvel no prazo de 10 anos entre os presentes e de 20 anos entre
os ausentes, se não houvesse contestação ou oposição de outrem quanto à posse do possuidor
que pretende pleitear o direito.
O Código Civil, em seu art.1.242, reduziu o prazo de 10 anos para a usucapião
ordinária, assim como ocorreu na modalidade extraordinária.
(d) Usucapião ordinária com prazo reduzido.

O legislador entendeu e colocou na redação do parágrafo único do art. 1242 do Código


Civil de 2002, que diante da hipótese de o possuidor adquirir o imóvel em caráter meramente
oneroso, com a boa-fé, ter o justo título e o registro houver sido cancelado, que poderá reduzir
o prazo do usucapião ordinário para 5 anos, desde que tenha estabelecido moradia no imóvel
ou nele tenha realizado investimentos e benfeitorias.
Então, a aquisição a caráter oneroso, devidamente registrado, posteriormente
cancelado, somado a benfeitorias e investimentos feitos no local são necessários para a
redução exclamada.
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(e) Usucapião especial urbana.

O art. 183 da Constituição Federal, o art. 9º do Estatuto da Cidade e o art. 1.240 do


Código Civil em vigor nos mostra tal modalidade de usucapião, in verbis:
“Art. 1.240 - Aquele que possuir como sua área urbana até duzentos e cinquenta
metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a
para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja
proprietário de outro imóvel urbano ou rural”.
Então, podemos ver que o rol dos requisitos das modalidades especiais existem
algumas peculiaridades e requisitos vistos somente em sua modalidade. A usucapião especial
urbana tem, portanto, como requisitos principais: área urbana não pode ultrapassar 250m², e
por 5 anos fazer como sua moradia habitual, a posse tranquila e sem oposição e não possuir
outro imóvel gravado em seu nome.
A área a que se refere a norma abrange o terreno e eventual construção sobre ele
erguida, ante o conteúdo do art. 9º. do Estatuto da Cidade.
Quando a posse é exercida sobre área superior a 250 m2, não é possível a aquisição da
propriedade através da usucapião especial urbana, ainda que o pedido restrinja a dimensão do
que se quer usucapir.
(f) Usucapião especial rural.

No art. 191 da Carta Magna de 88, dispõe então sobre a usucapião rural:
“Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como seu,
por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a
cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela
moradia, adquirir-lhe-á a propriedade”.
A referida modalidade tem características similares à Usucapião Especial Urbana,
citada anteriormente, com o mesmo prazo de 5 anos estipulado no art. 1239 do CC/02, quando
se fala da modalidade urbana e que também com limitação na proporção da terra, pleiteando
então o direito, aquele que possuir terra menor que 50 hectares.
A propriedade para ser considerada própria para a modalidade apresentada, além dos
requisitos citados acima, necessita também nesse período de 5 anos, ser uma terra produtiva, e
cumprir devidamente sua função social, ou seja, deve ter o máximo de aproveitamento,
estabelecendo-se como moradia habitual e não podendo ter outra propriedade imóvel em seu
nome.
(g) Usucapião coletiva.

Ao se falar em coletivo, já nos vem na cabeça que tal modalidade necessita de mais de
uma pessoa, e a ação é pleiteada por toda a massa, ou seja, todos que vivem naquele local
pleiteiam ação coletiva para a obtenção de uma resolução para ambos.
15

Estamos diante da sétima modalidade de usucapião, regulado esta pelo art. 10 do


Estatuto da Cidade, que coloca a possibilidade de usucapião coletiva quando uma população
de baixa renda, faz como moradia área urbana com área superior a 250m², por 5 anos
ininterruptos, sem oposição por parte do titular perante a matricula da propriedade ou terceiro
interessado. Tal modalidade exige que neste terreno, não há de que se falar em terreno
próprio, onde não vê a possibilidade de marcação individual de espaço de cada possuidor, e
que todos os que habitam não sejam proprietários de outro imóvel rural ou urbano.
O objetivo principal da usucapião coletiva é fazer com que essas comunidades de
baixa renda sito à zona urbana, com diversas famílias, possam ter suas ocupações legitimadas.
O Estatuto da Cidade no seu art. 10, especificamente exposto no parágrafo único do
mesmo, coloca que é admissível a soma do tempo de posses, devendo então que o Juízo
competente atribua fração do terreno ideal e igual a cada possuidor, desconsiderando o
tamanho real que cada um tem ocupado.
(h) Usucapião indígena.

Estamos diante de então da modalidade especial de usucapião indígena, com clareza


ofuscante, a Lei nº 6.001/73, que trata sobre o Estatuto do Índio, traz expressamente em seu
artigo 33, uma modalidade raramente utilizada, que se consagrou como especial indígena, que
coloca: “O índio, integrado ou não, que ocupe como próprio, por dez anos consecutivos,
trecho de terra inferior a cinquenta hectares, adquirir-lhe-á a propriedade plena”.
No mesmo dispositivo, em seu parágrafo único, conseguimos ainda ter expresso que
tal modalidade não pode ser exercido perante terras que são de cunho da União, ou seja,
apenas em terras de particulares que se aceita a usucapião especial indígena.
Caso o indígena esteja reintegrado à comunhão nacional ou tenha êxito em sua
solicitação da liberação da tutela, poderá diretamente propor a ação de usucapião, ou, então,
deverá fazê-lo com a assistência da FUNAI.
Como requisitos, o índio deve possuir em zona rural, área inferior a 50 hectares, tê-la
como sua, por período igual ou superior a 10 anos consecutivos, ou seja, sem interrupção ou
oposição.
(i) Usucapião especial urbana por abandono de lar.

A recente Lei n. 12.424, de 16 de junho de 2011, em seu artigo 9º, disciplinou nova
espécie de usucapião, denominada usucapião especial urbana por abandono de lar, acrescentando
o artigo 1.240-A ao Código Civil:
16

Com toda certeza, uma das espécies mais recentes deste instituto abordado, a Lei
12.424/11, trouxe em seu texto, e ainda acrescentando o artigo 1.240-A ao Código Civil, a nova
modalidade denominada usucapião especial urbana por abandono de lar. O artigo citado do
código civil coloca então no ordenamento jurídico tal modalidade, in verbis:
“Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos, ininterruptamente e sem oposição,
posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e
cinquenta metros quadrados) cuja propriedade dívida com ex-cônjuge ou ex
companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família,
adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel
urbano ou rural.
§ 1º O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de
uma vez”.
A nova categoria pretende solucionar as situações em que um dos cônjuges ou
companheiros abandona o lar conjugal, sem renunciar ou partilhar o bem comum.
O dispositivo citado, vem com o intuito e objetivo de resolução de conflitos e
situações que um dos conjunges ou companheiros abandona o lar, sem renunciar ou partilhar
o bem comum.
A hipótese prevista na lei envolve a separação de fato de um casal e o abandono do lar
por um dos membros desse casal, sem fazer a regular partilha do bem, quando é o caso. Se o
ex-cônjuge ou ex companheiro permanecer no imóvel de até 250 m² durante dois anos, sem
oposição daquele que abandonou o lar e, ainda, não seja proprietário de outro imóvel urbano
ou rural, adquire a propriedade do bem. Deve-se observar que, considerando o regime de
comunhão de bens (seja parcial ou universal), a aquisição é da meação do cônjuge que
abandonou o lar, embora seja possível se falar em aquisição do todo, nos casos em que há o
regime de separação.
Havendo disputa, judicial ou extrajudicial, relativa ao imóvel, não ficará caracterizada a
posse ad usucapionem, afastando-se a possibilidade de se invocar tal modalidade de usucapião.
17

CAPÍTULO II – A PROPRIEDADE E SUA FUNÇÃO SOCIAL.

2.1 PROPRIEDADE

A propriedade da terra, surgiu da agricultura e da criação de animais, onde os então


“proprietários” viviam em conjunto, tendo como o único objetivo perceber os frutos por eles
produzidos, deixando então de lado a importância do próprio bem imóvel.

Conseguimos então observar que o objetivo hoje vai além do citado acima, temos
vários problemas relacionados a proprietários e suas propriedade, neste modo se cessou a vida
em conjunto, pois, esse direito à propriedade é complexo, absoluto, perpétuo e exclusivo.

A Constituição Federal de 1988, através de seus textos e dispositivos, nos mostra que
um dos pilares vem a ser, primordialmente, a supremacia do interesse social, versa também o
bem da coletividade como finalidade de muitos de seus artigos, se tratando também de
Direitos e Garantias Fundamentais. Contudo, a mesma lei coloca a propriedade como um
direito individual e absoluto, em contrapartida impõe uma função social a ser devidamente
cumprida.

A propriedade é um termo jurídico que dá ao “dono” (proprietário) o direito de usar,


gozar, dispor de um bem e reaver do poder de quem ilegalmente ou injustamente o possua. A
própria língua portuguesa em seu sentido literal e gramatical traz diversos conceitos para a
18

propriedade, dos quais cito “qualidades inerentes aos seres, pertença ou direito legal de
possuir (algo); porção considerável de terra com tudo que existe nela, pertencentes a um dono;
imóvel pertencente a alguém; coisa possuída com exclusividade.

Diante do exposto, temos uma definição concreta e dominante, tanto no ramo da


Economia quanto no Direito, Farias e Rosenvald (p. 241, 2015) nos mostra que:

“A propriedade é um conjunto de direitos sobre um recurso que o dono está livre


para exercer e cujo exercício é protegido contra interferência por outros agentes.
Esse conjunto de direito, pode, exemplificadamente, incluir o direito de vender a
terra, deixa-la de herança, subdividi-la, cerca-la e impedir que outros a atravessem.”

(a) FACULDADE DE USAR


Conforme Farias e Roselvald (2015), é a faculdade do proprietário de servir-se da
coisa de acordo com sua destinação econômica. O uso será direto ou indireto conforme o
proprietário conceda utilização pessoal ao bem, ou em prol de terceiro, ou deixo-o em poder
de alguém que esteja sob suas ordens – servidor da posse.
Seguindo o mesmo pensamento, Farias e Roselvald (2015, p. 243) expõem:

Ao contrário do que muitos acreditam, o direito de uso concede ao seu titular o


acesso aos frutos naturais da coisa, pois não seria lógico que o beneficiário dessa
faculdade fosse privado do acesso imediato aos bens que a coisa produza por sua
própria natureza, como os frutos das árvores ou o leite das vacas. Não se trata de uso
puro como concebido em certo momento do Direito Romano, onde usar não incluía
acesso a nenhuma espécie de fruto do bem. Aliás, ao abordar o direito de uso, o art.
1.412 do Código Civil dispõe que “o usuário usará da coisa e perceberá os seus
frutos”.

Quando nos falamos de uso, não necessariamente precisa ser algo habitual, pois é
bastante que o proprietário preserve o bem em condições para o servir quando for necessário.
Exemplificando: se A é proprietário de uma casa de praia e só frequenta o local no verão, não
estará privando-a de seu uso no resto do ano, já que o bem estará ao seu alcance, se preciso, a
qualquer tempo.
Com efeito, as faculdades não prescrevem pelo não uso. Destarte, só a posse
prolongada de terceiro pelos prazos legais provocará a mutação subjetiva da faculdade.
Caso ninguém exercite poder de fato sobre a coisa, intocado restará o direito subjetivo,
malgrado a desídia quanto a uma de suas faculdades.
Porém, vale salientar que o proprietário pode se ausentar, contudo, nunca abandonar o
imóvel, pois o mesmo perderá seu direito de propriedade, em caso que se mostrar antissocial.
O instituto da desapropriação por interesse social entende que o abandono ocorre pela inação
do proprietário, ou seja, o não uso do bem. E nos mostra que a faculdade ou poder de usar,
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acaba se tornado um dever jurídico de todo proprietário, que poderá perder a coisa se o não
uso perdurar por mais de três anos (art. 1276 do CC)*.

(b) FACULDADE DE GOZAR OU FRUIR

Consiste na exploração econômica, ou seja, a possibilidade de retirar os frutos e


produtos da coisa, que podem ser naturais (provenientes da natureza, sem necessidade de
intervenção humana), industriais (resultantes da transformação do homem sobre a natureza)
ou civis (são utilidades que a coisa frugífera periodicamente produz, viabilizando a percepção
de uma renda. Ex.: o juros e o aluguel) que seria a verdadeira faculdade de fruir – antigamente
denominado como ius fruendi –. A título de exemplo, o proprietário de imóvel urbano locá-lo
a terceiro interessado, utilizando assim então o seu direito de propriedade.

Há o que se falar sobre a diferença entre frutos e produtos, onde o primeiro é dado
como utilidades renováveis, ou seja, que a coisa principal produz e é constantemente
renovada, à medida que são retirados. Já os produtos são utilidades não-renováveis, ou seja,
vão se extinguindo, à medida em que forem percebidos. (v. g., carvão mineral)

O Código Civil, em seu artigo 1.232, coloca que o proprietário tem o direito de
perceber tanto os frutos quanto os produtos advindos de sua coisa. Ambos se encaixam na
categoria de bens acessórios, aplicando então o principio geral que “o acessório segue o
principal”.

(c) FACULDADE DE DISPOR

Entende-se segundo Farias e Roselvald (2015) como a faculdade que o proprietário


tem de alterar a própria substancia da coisa, ou seja, há a viabilidade de disposição da coisa,
seja por atos inter vivos ou mortis causa.

A disposição pode ser material ou jurídica. Ambas as hipóteses, exclusivamente, o


proprietário pratica atos físicos que importam a perda da propriedade. A disposição material, é
aquela que o proprietário dispõe através de atos tais como o abandono da coisa ou a
destruição da mesma. Essa modalidade de disposição somente aparece de forma total.

Já se tratando da disposição jurídica, entende-se que poderá aparecer de forma total,


como citado anterior, e também de maneira parcial. Vem a ser disposição total, os casos em
20

que o proprietário, de forma onerosa (venda) ou gratuita (doação), praticar ato de alienação,
em ambos os casos, o alienante cederá todos os poderes e faculdades inerentes à aquela
propriedade.

A disposição parcial nesse caso se revelaria com a instituição de ônus reais sobre o
bem, ou seja, coloca parte da coisa como garantia de alguma obrigação. Exemplificando: O
proprietário dispõe parcialmente da coisa quando institui um gravame sobre ela, tal como o
usufruto ou a hipoteca (Farias e Rosenvald, 2015).

(d) FACULDADE DE REAVER OU REIVINDICAR


Como ultima modalidade, temos a faculdade de reaver ou reivindicar, como conceito
comum, é dado como o poder de demandar esforços para recuperar algo que pertence a (ou
está na posse de) outra pessoa.
Vimos até então as faculdade de usar, gozar e dispor e que ambas compreendem de
elementos internos ou econômicos do direito de propriedade, ou seja, o proprietário obterá
vantagens decorrentes de sua titularidade e o exercício do poder será de maneira imediata,
trata-se da parte positiva do direito de propriedade, que se vem a ser apenas o domínio
daquela coisa.
O poder de reivindicar se encontra em condições contrárias aos das outras faculdades
citadas, pois é denominada como elemento externo no direito de propriedade, pois o
proprietário nessa modalidade, por ser titular do direito subjetivo, tem a faculdade de excluir a
coisa de terceiros que a utilizam de forma indevida, mantendo sua dominação sobre a coisa. O
código civil, ao se tratar de posse, coloca ainda a possibilidade do possuidor usar da própria
força para reivindicar sua propriedade, desde que seja logo e que não ultrapasse o necessário,
nesse caso, por analogia podemos equiparar ao proprietário, que de certa forma pode ter a
posse direta ou indireta da propriedade.
Esse direito será exercido por meio de ação petitória, fundada na propriedade, sendo a
mais comum a ação reivindicatória, principal ação real fundada no domínio. Pode-se afirmar
que a proteção da propriedade é obtida por meio dessa demanda, aquela em que se discute a
propriedade visando à retomada da coisa, quando terá pessoa, de forma injustificada, a tenha,
dizendo-se dono.
21

Para concluir, o direito de reaver, segundo preceitua o caput do art. 1.228 do CC/2002,
a ação reivindicatória tem como sujeito passivo o possuidor ou detentor, que injustamente
tenha a coisa. Vimos então que o ato de reaver, não e tão somente em casos de invasão ou
esbulho, mas também, em casos de que o proprietário deseja reaver o bem de um caseiro ou
mesmo de um inquilino. Exemplificando: o proprietário de um imóvel loca-o para terceiro e
durante o percurso da locação, o mesmo decide reavê-lo para que o imóvel fique à sua
disposição para outra destinação.

2.1.1 A PROPRIEDADE PÚBLICA

O texto do novo Código Civil não traz modificações no conceito e matérias


relacionadas aos bens públicos. Coloca, que os bens públicos são bens pertencentes às pessoas
jurídicas do direito publico interno e que fazem parte do domínio nacional, colocando um rol
taxativo para essa modalidade:

Art. 99. São bens públicos:


I – os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;
II – os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou
estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal,
inclusive os de suas autarquias;
III – os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito
público, como objeto de direito pessoal, ou real,
Faz parte, ainda, somando ao rol citado, segundo ao artigo 1.276 do Código Civil
vigente007, os bens públicos abandonados ou sem dono.
Os bens públicos, como observamos, se dividem em três formas, cada uma com sua
característica específica, Maria Helena Diniz, as expõe:
Os bens públicos de uso comum do povo são aqueles, que mesmos pertencentes ao
direito público interno, podem ser utilizados por todos, sem restrições ou permissões para sua
plena utilização, contando que os indivíduos sigam as condições impostas para cada bem.
Os bens públicos de uso especial, Diniz conceitua que:
São igualmente pertencentes ao direito público, todavia, são de uso exclusivo do
próprio poder público, normalmente representados por imóveis que tem finalidade de serviço
ou estabelecimento de um serviço publico federal, estadual ou municipal, como tribunais,
escolas e órgãos públicos.
Já os bens dominicais, segundo nos traz a Constituição Federal de 1988, são
exclusivamente bens pertencentes aos três entes federativos, à União (Arts. 20, I a XI); aos
22

Estados (art. 26, I a IV) ou aos Municípios. Os bens dominicais são os de maior proporção,
englobam as estradas de ferro, as terras devolutas, ilhas e etc.
As terras devolutas seriam aquelas que, embora pertençam ao poder público, não há
nenhum planejamento para com as mesmas, nem mesmo finalidade especifica e destinação
futura. Muita das vezes são terras onde o poder publico nem tem o conhecimento de sua
existência. O termo “devoluta” se relaciona com o a palavra devolvida, levando em
consideração então que é uma terra a ser devolvida para quem a pertença, nesse sentido, o
Estado.
2.1.1.1 TERRAS DEVOLUTAS
Terras devolutas são terras públicas, sem destinação pelo poder público, incluídas
dentre os bens dominicais pertencentes ao Estado, e que em nenhum momento fizeram parte
do patrimônio particular, mesmo que alguém a detenha ou possua de forma irregular. O termo
“devoluta” se relaciona com o conceito de terra devolvida ou a ser devolvida ao estado.
Após a descoberta do Brasil, o nosso território se tornou integralmente pertencente ao
domínio da Coroa Portuguesa, e nesse período, os mesmos adotaram o sistema de sesmarias
para a distribuição de terras, criando então as capitanias hereditárias. Basicamente eram
formadas por faixas de terra que partiam do litoral para o interior, comandadas por donatários
e cuja posse era passada de forma hereditária, a estes era dada a missão de medi-las, demarca-
las e cultivá-las, sob a pena de reversão das terras à Coroa.
Logo, as terras que não foram passadas hereditariamente e não foram revertidas à
Coroa, formaram então as terras devolutas, que após a independência, tornara-se então
integrantes do patrimônio do Estado como um todo, fazendo que todas as terras que não
pertencessem legitimamente a particulares e que não houvesse nenhuma destinação por parte
do Poder Público seriam consideradas devolutas e consequentemente bens do Estado
brasileiro.
Em 1850, surge então a Lei nº 601, devidamente conhecida como a Lei de Terras, que
passou a nortear sobre questões de domínio no nosso ordenamento jurídico. Veio como
principal objetivo a resolução de conflitos e a regularização das terras públicas, evitando
assim os abusos em posses e ocupações irregulares. A mesma lei, trata em seu artigo 3º sobre
esta modalidade de bens dominiais, as terras devolutas, que in verbis:

Art. 3º. São terras devolutas:

§ 1º As que não se acharem aplicadas a algum uso público nacional, provincial, ou


municipal.
23

§ 2º As que não se acharem no domínio particular por qualquer titulo legítimo, nem
forem havidas por sesmarias e outras concessões do Governo Geral ou Provincial,
não incursas em comisso por falta do cumprimento das condições de medição,
confirmação e cultura.

§ 3º As que não se acharem dadas por sesmarias, ou outras concessões do Governo,


que, apesar de incursas em comisso, forem revalidadas por esta Lei.

§ 4º As que não se acharem ocupadas por posses, que, apesar de não se fundarem em
titulo legal, forem legitimadas por esta Lei.

O Estado para não haver conflitos, usa, para estabelecer se a terra é devoluta ou
particular de ações chamadas “discriminatórias”, que são reguladas pela Lei 6383/76.
A nossa Constituição Brasileira de 1988, especificamente em seu artigo 20, II, nos
coloca que:
Art. 20. São bens da União: [...] II - as terras devolutas indispensáveis à defesa
das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de
comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei [...]

Então, as demais terras que não fazem parte desse rol do texto acima se compreendem
aos Estados. Adentrando também no âmbito fundiário, as terras devolutas devem ser
compatíveis com a politica agrícola e com a reforma agrária.
2.2 A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

A Função Social da Propriedade é um principio constitucional, encontrado diretamente


na Constituição Federal de 1988, em seu Art. 5º, inciso XXIII. Tal princípio nasceu da
prerrogativa de que toda pessoa deveria dar uma parcela de ajuda para o bem-estar da
coletividade. Cria-se então o Princípio da Função Social, onde “todo indivíduo tem o dever
social de desempenhar determinada atividade, de desenvolver da melhor forma possível sua
individualidade física, moral e intelectual, para com isso cumprir sua função social da melhor
maneira” (FIGUEIREDO, 2008).

Nesta concepção vemos então que a lei maior coloca em ênfase a importância da
consciência de cada individuo em prol da melhoria na qualidade de vida da própria sociedade.

Ao se falar sobre a função social de propriedade, temos de ter a consciência sobre o


que seria uma propriedade, pois veremos que o proprietário desse bem, além de se favorecer
com os diretos, em contrapartida encontra vinculado à uma obrigação juntamente à coisa,
chamada então de função social.
24

Contudo, quando tratamos deste princípio, estamos referindo à modalidade de bens


considerados em si mesmo, especificamente na classificação de bem imóvel, rural ou urbano.
Vale considerar, que quando se trata de função social, temos de saber diferenciar o imóvel
rural e o urbano, pois cada um detém uma finalidade e um modelo de função social diferente.

2.2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA


No inicio dos tempos, particularmente dentro ao direito romano, terceiros ou estranhos
não poderiam adentrar na propriedade privada sem ofender as entidades que protegiam aquele
lar. O direito de propriedade era absoluto, direito este que nem mesmo o Estado poderia
intervir em decisões feitas pelo proprietário do bem.

Tal liberdade se tornou algo de muita revolta e escândalo por não haver limites para a
proteção dessa propriedade privada, onde a violência e os abusos se tornavam normais diante
dessa proteção ilimitada. Eis que surgiu então o Estado intervencionista que coloca então
através de imposições limites, até mesmo a um direito que se dizia absoluto.

O primeiro defensor dessa ideia onde a propriedade constituía um direito-dever foi


Leon Duigit, que em sua obra Las Transformaciones Generales Del Derecho Privado desde el
Código de Napoleón colocou que: A propriedade é uma instituição jurídica que se formou
para responder a uma necessidade econômica, como, por outra parte, todas as instituições
jurídicas e que evoluciona necessariamente com as necessidades econômicas.

O nobre pensador via a constante evolução da sociedade e com isso defendia que a
propriedade deveria sempre acompanhar o mesmo ritmo, no mesmo contexto, também
pregava que deveria existir leis, que até então não existiam, que regulassem essas
propriedades e colocasse também junto ao direito, o dever de estabelecer uma finalidade à
aquela terra, tornando-a produtiva e visando assim além do interesse privado, uma parcela de
contribuição para um benefício coletivo.

Esta concepção nasce a partir de um pensamento, onde coloca que, o individuo fizer
parte da sociedade, logicamente, deve o mesmo se esforçar em dar uma contribuição para um
bem estar coletivo em detrimento dos interesses próprios e particulares. Daí então resplandece
a teoria da função social, visando então o objetivo principal de determinar que todo indivíduo
tem o dever social para com o coletivo.
25

A partir desse momento a propriedade deixa de ser um direito absoluto e começa a ter
o entendimento de subjetivo, por nela ter a obrigação de cumprir sua função social. Por mais
que a principio a propriedade fosse algo conquistado e o seu principal objetivo era o proveito
próprio e individual, com a evolução natural da sociedade e a vida em conjunto e
aglomerados, foi então mudada a concepção desse direito, passando então a ter como
principal entrando no arcabouço jurídico, respeitando então que o direito público sobrepõem o
particular.

A função social da propriedade, veio a ser consagrada como principio no arcabouço


jurídico brasileiro através da Lei n. 4.504/64, que veio a se chamar “Estatuto da Terra”, que
veio em prol de tratar disciplinas agrárias, que até então era definidas pela antiga Lei de
Terras (1850).

A propriedade nunca deixou de possuir o interesse econômico, porem, outros atributos


foram colocados em prol desse direito, antes da Carta Magna de 88, especificamente no texto
da Constituição de 1824, o direito não era totalmente declarado em sua plenitude, em exceção
de casos que se tratasse de desapropriação por necessidade ou utilidade social.

Passaram-se os tempos e logo na constituição seguinte, em 1934 aparece então pela


primeira vez indícios da atividade do proprietário, porem, somente na constituição de 1937
que foi então colocada em pratica e garantida em lei a intervenção estatal, apenas em casos
excepcionais.

Então, tal principio veio a se tornar parte do texto constitucional em 1967, sendo
colocado entre o rol dos princípios da ordem econômica e social, in verbis:

“Art.157. A ordem econômica tem por fim realizar a


justiça social, com base nos seguintes princípios: (...)

III - função social da propriedade.”

Começou a partir daí, um processo de evolução desse principio da função social da


terra, selando então na Constituição de 1988, uniu, definitivamente o direito propriedade ao
dever de cumprir a sua função social.

2.2.2 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE E A CONSTITUIÇÃO


BRASILEIRA DE 1988.
26

Obtivemos várias mudanças de no âmbito nacional após a Carta Magna de 88, a


propriedade individualista do passado, onde toda relação jurídica era puramente privada, de
caráter sagrado e absoluto passou a ser múnus, ou seja, passou a ser um direito – dever. Dessa
forma, o artigo 5º, incisos XXII e XXIII, da Constituição exposta, que trata exclusivamente
dos direitos e garantias fundamentais do ordenamento jurídico, coloca:

Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
[…]
XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;"
XXIV – a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou
utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em
dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;
Logo mais, há também referência ao principio da função social, associando então o
mesmo à propriedade, em assunto de ordem econômica e financeira, que diz:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na
livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade;

Do mesmo modo, mais a frente, a Carta Magna, expõem expressamente quando o


assunto se refere a politica urbana, que temos a função social também como um caminho a ser
seguido conjuntamente com a propriedade:
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo poder público
municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o
pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus
habitantes.
[...]
§2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
Conjuntamente com a Constituição de atual, o novo Código Civil de 2004,
especificamente em seu Art. 1.228, traz a seguinte redação sobre o direito de propriedade e o
principio da função social:

"O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com suas finalidades
econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o
estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio
ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e
das águas."
27

Deste modo, o principio da função social da propriedade se torna definitivo ao se


tornar matéria em diversos dispositivos de âmbito constitucional.

2.2.3 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE PÚBLICA

Deve-se entender que a função social enquanto principio, foi criada e destinada para
acompanhar o direito de propriedade, onde o absolutismo era vigente nessa modalidade de
direito, então, se deve compreender que o principio da função social da terra, é atributo da
propriedade, tanto privada quanto da pública, ou seja, ambas necessitam seguir e cumprir o
seu dever social para um melhor desenvolvimento e bem estar coletivo.
Cesar Luiz Pasold (1984, p. 17 ), afirma que:
Não há sentido na criação do Estado senão na condição – inarredável – de
instrumento em favor do Bem Comum. Há nessa criatura da sociedade um
compromisso com a sua criadora, sob pena de perda de substância e de razão de ser
do ato criativo. Tal compromisso se configura concretamente, na dedicação do
Estado à consecução do Bem Comum.
E a conclui, ainda,
A condição instrumental do Estado é consequência de dupla causa: ele nasce na
Sociedade, e existe para atender demandas que, permanente ou conjunturalmente,
esta mesma Sociedade deseja sejam atendidas.
O desconhecimento ou o desrespeito a esta dupla motivação é causa de um “leviatã”
que, muitas vezes se presta a oprimir os elementos socioeconômicos mais fracos em
favor de elementos privilegiados.
Podemos observar que toda ação partida do Estado deve ter então o objetivo de
alimentar o bem estar social, em prol de promover o sempre o beneficio coletivo. Logo,
considerando o citado, somente se justifica a propriedade ser do Estado se a mesma é voltada
para o atendimento e bem estar da sociedade, e se por isso necessitar de uso de bens imóveis,
conclui que o Estado então, como parte necessária deve atender também à função social.
Porém, houve grande repercussão quando o assunto entrou no entorno das terras
devolutas, e o cumprimento da função social por parte do Estado, pois, vemos que o principio
é integrado juntamente com o direito de propriedade, logo, se o Estado tem o direito sobre
esses bens, deve o mesmo cumprir essa prestação.
28

CAPÍTULO III – A POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO EM


IMÓVEL PÚBLICO.
3.1 O ARTIGO 191 DA CONSTITUIÇAO FEDERAL DE 1988
Podemos observar que diante o ordenamento jurídico, não há a possibilidade de se
usucapir terras públicas, por estarem devidamente protegidas pela Carta Magna de 88.
O artigo 191 da CF/88, nos mostra a modalidade de usucapião especial, seja ele na
modalidade rural ou urbano, in verbis:

Art. 191. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua
como seu, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural,
não superior a cinquenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua
família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.
Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.
Conseguimos ver então, que essa modalidade poderia se estender às terras devolutas,
porém, o próprio parágrafo único do mesmo artigo coloca que os imóveis públicos não podem
ser adquiridos pela usucapião.
Acontece um desencontro, onde no primeiro momento tinha uma série de requisitos
preenchidos para o gozo do direito de usucapião e ao final uma letra de lei impedindo ou
deixando o rol desse instituto taxativo ao negar a possibilidade em terras públicas,
29

consequentemente abrangendo os bens dominicais ou ainda mais especificadamente, as terras


devolutas.
Eis que, surge então as terras que o Poder público, não há nem conhecimento de sua
existência, onde não ocorre nem mesmo o zelo ou o cumprimento de sua devida função social,
uma terra ou propriedade que nem se quer é reconhecida como devoluta, onde não se deve
entrar em qualquer categoria, por relativamente não existir para os entes responsáveis.
As terras não discriminadas não fazem parte dessa letra de lei, visto que, mesmo uma
terra abandonada ou sem destinação deve ter o devido conhecimento por parte do Estado, ou
ser registrada em seu nome para que assim, possa adquirir plenos direitos e agregar a letra da
Constituição a seu favor.
Portanto abre a possibilidade de usucapião de terras devolutas não discriminadas, que
já acontece por não haver qualquer tipo de conhecimento sobre tais bens.
3.2 A POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO DE TERRAS DEVOLUTAS NÃO
DISCRIMINADAS.
Então, diante todo o exposto, podemos conceituar a terra devoluta como aquela que
não tem destinação ao uso do Poder Público e não estão sob o domínio de um particular,
cabendo à União, Estados e Municípios distinguir o que é propriedade publica ou de um
particular, através do procedimento discriminatório de terras.
Quando não há registro da propriedade do imóvel e o Estado não realiza a
discriminação de determinada terra, considerando-a como pública, este perde o domínio sobre
a coisa, originando a possibilidade de usucapião.
São reservadas à União as faixas de fronteira, construções militares, terrenos da
marinha e estradas de ferro. No entanto, mesmo que haja essa reserva, cabe a União
apresentar o registro de domínio, caso contrário, não existe nada que impeça a aquisição
prescritiva da terra por parte do particular.
Nessa mesma ótica, os Tribunais estão também definindo que há direito à aquisição da
propriedade por meio da usucapião de terras devolutas não discriminadas pelo Poder Público.
Vejamos um julgado do Supremo Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL N° 674.558 – RS (2004/0071710-7)


RELADOR: MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE: UNIÃO
RECORRIDO: NAIR NOGUEIRA DE VASCONCELOS – SUCESSÃO
ADVOGADO: PEDRO JERRE GRECA MESQUITA E OUTROS(S)
EMENTA
30

RECURSO ESPECIAL. USUCAPIÃO. FAIXA DE FRONTEIRA.


POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE REGISTRO ACERCA DA PROPRIEDADE
DO IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE PRESUNÇÃO EM FAVOR DO ESTADO
DE QUE A TERRA É PÚBLICA.
1. O terreno localizado em faixa de fronteira, por si só, não é considerado de
domínio público, consoante entendimento pacífico da Corte Superior.

2. Não havendo registro de propriedade do imóvel, inexiste, em favor do Estado,


presunção iuris tantum de que sejam terras devolutas, cabendo a este provar a
titularidade pública do bem. Caso contrário, o terreno pode ser usucapido.

3. Recurso especial não conhecido.

Podemos observar, que nesse julgado, o STJ não atendeu ao pedido da União de
extinção da ação de usucapião proposta por duas mulheres referentes a uma área localizada
no município de Bagé – RS.

Onde no transcorrer do processo, a União tentou colocar a propriedade como terreno


de fronteira, e que nesse sentido, teria garantia constitucional e de direito privativo da
União. Contudo, mesmo se considerando um terreno de fronteira, o STJ coloca a
necessidade de comprovar a titularidade, ou seja, provar ser o verdadeiro dono do imóvel.

Portanto podemos ver, que a simples presunção não configura que o imóvel é da
União ou dos Estados, necessariamente ambos precisam de comprovar seu título de
domínio, devidamente registrado no cartório de registro de imóveis e com o nome
integrando à matricula do imóvel.

Tal entendimento vem sendo quase que pacificado em nossos tribunais, tendo o STJ,
inclusive, já se manifestado sobre a matéria, quando assim se posicionou. Vejamos:

RECURSO ESPECIAL: STJ - REsp 964.223 – (2007/0145963-0)


RELADOR: Min. Luis Felipe Salomão
JULGAMENTO: 04/10/2011
ORGÃO JULGADOR: SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
EMENTA:
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL -USUCAPIÃO -
IMÓVEL URBANO - AUSÊNCIA DE REGISTRO ACERCA DA
PROPRIEDADE DO IMÓVEL - INEXISTÊNCIA DE PRESUNÇÃO
EM FAVOR DO ESTADO DE QUE A TERRA É PÚBLICA –
1 - A inexistência de registro imobiliário do bem objeto de ação de
usucapião não induz presunção de que o imóvel seja público (terras
devolutas). cabendo ao Estado provar a titularidade do terreno como
óbice ao reconhecimento da prescrição aquisitiva.
31

2 - Recurso especial não provido.

Considerando o mesmo pensamento e raciocínio, o TJPI (Tribunal de Justiça do


Estado do Piauí), tem tido como entendimento majoritário que é necessário uma
comprovação para caracterizar uma terra como devoluta:

AÇÃO RESCISÓRIA: AR 2009.0001.002979-0


RELATOR: Des. José James Gomes Pereira
JULGAMENTO: 20/09/2010
ÓRGÃO JULGADOR: Câmara Reunidas Cíveis
EMENTA
AÇÃO RESCISÓRIA - PRELIMINAR DE INÉPCIA DAINICIALVIOLAÇÃO DE
LEI PELO ACÔRDÃO RESCINDENDO - TERRAS DEVOLUTAS - ÔNUS DA
PROVA - USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO - AUSÊNCIA DE TRANSCRIÇÃO
NO OFICIO IMOBILIÁRIO –
1- Inépcia da inicial, portanto, é a irregularidade formal gravíssima que impede, de
forma absoluta, que o órgão jurisdicional se pronuncie sobre o direito de que o autor
se diz titular. Não é inepta a inicial quando da narrativa dos fatos decorrer
logicamente o pedido, o que é o caso dos autos.
2 - A súmula 343. do supremo tribunal federal, não é aplicável ao caso em tela em
virtude da decisão rescindenda não está baseada em texto legal de interpretação
controvertida nos tribunais.
3 - Não existo, em nosso ordenamento jurídico. qualquer presunção, relativa ou
absoluta, de que toda terra não particular é pública.
4 - Para a procedência do pedido discriminatório é necessária prova inequívoca e
contundente de que a área objeto da ação é efetivamente devoluta. O simples fato
de o imóvel não possuir registro não gera a presunção de que se trata de terra
pública - (APELAÇÃO CÍVEL N° 268486- 8/00. TJ-MG. REL. DES. WANDER
MAROTTA. J. EM 21/10/2002).
5 - Orientação do STF que prosseguiu no STJ. a ausência de transcrição no ofício
imobiliário não induz à presunção de que o imóvel se inclui no rol das terras
devolutas.  
6 - Acórdão mantido.  
7 - Decisão unânime.
Concluindo, diante de exemplos e fatos, podemos observar que o estado do Piauí
pleiteia o domínio sobre a terra, na qual, a considera como devoluta pelo simples fato da
ausência de transcrição no Oficio Imobiliário. Diferentemente do Tribunal de Justiça do
Estado, que coloca que o Estado tem o ônus da prova de comprovar seu domínio
patrimonial sobre o imóvel, e que a simples presunção não gera seu justo título.

Deste modo então, o Estado deve realizar o procedimento discriminatório da terra,


para que assim, adquira o título de domínio sobre a mesma, para evitar e restringir a
possibilidade de usucapião por parte de terceiros.
32

CONCLUSÃO

O presente trabalho teve por finalidade abordar todo o Direito Objetivo em prol dos
bens públicos, da usucapião e da função social da propriedade, colocando em discussão que
tais normas, nem sempre possuem um caráter benéfico, pois sabemos que muitas das vezes, o
Estado nem tem conhecimento sobre esses bens (terras devolutas ou de fronteiras), e o
particular a torna bem mais produtiva, colocando assim uma melhor finalidade diante ao ente
que a rege.

Então conseguimos ter a possibilidade do instituto da usucapião a esses tipos de


propriedades, pois o ente que é “proprietário”, não exerce seu Direito/Dever sobre a terra,
colocando então a propriedade como coisa hábil para ser usucapida.

Como sabemos, a lei e a maioria da doutrina nos traz uma impossibilidade quando se
trata da Usucapião sobre os bens públicos. Vários institutos do direito têm posições contrárias,
a própria Constituição Federal de 1988, o Código Civil detém uma norma escrita colocando
sempre barreiras a fim de que não haja tentativa de nenhuma parte privada.

Porém, ao observarmos que se torna “inútil” a terra estar sem finalidade alguma,
ficamos então com o pensamento de oposição à própria lei, pois se um particular exerce a
função social dessa propriedade e consegue usar a mesma de forma proveitosa para si e sua
33

família ou em prol de uma coletividade, teremos então um melhor resultado em todos os


aspectos.

Após diversos pensamentos, e julgados, tivemos recentemente alguns pedidos que


obtiveram então algum êxito nesse sentido, os Tribunais Superiores estão conseguindo
enxergar além da lei, de forma benéfica a todos, já que o próprio Estado não exerce a função
sobre a terra, torna então apto a usucapião em alguns casos de extrema relevância.

Portanto, ainda que se considere a terra devoluta como patrimônio público impossível
de se usucapir, esta condição terá de ser comprovada pelo Estado. E este, sem dúvida, tem
sido o entendimento da jurisprudência, em especial, do Superior Tribunal Tribunal de Justiça,
para quem a inexistência de prova do registro em nome do Estado autoriza a consolidação do
domínio em nome do possuidor interessado, mediante usucapião

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado


Federal.

BRASIL. Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. 1ª edição. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2002.

BRASIL. Lei de Terras, Lei 601, de 18 setembro de 1850. 1ª edição. Disponível em:
<http://abral.org.br/lielos-licencia-personagens-da-mattel-e-da-warner/>. Acessado em
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