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TOMO 6
COORDENAÇÃO DO TOMO 6
Nelson Nery Jr.
Georges Abboud
André Luiz Freire
Editora PUCSP
São Paulo
2020
ENCICLOPÉDIA JURÍDICA DA PUC-SP
DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS
DIRETOR
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA
Pedro Paulo Teixeira Manus
DE SÃO PAULO
DIRETOR ADJUNTO
FACULDADE DE DIREITO Vidal Serrano Nunes Júnior
CONSELHO EDITORIAL
1.Direito - Enciclopédia. I. Campilongo, Celso Fernandes. II. Gonzaga, Alvaro. III. Freire,
André Luiz. IV. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
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DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS
INTRODUÇÃO
SUMÁRIO
Introdução ......................................................................................................................... 2
2
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DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS
4.1.2. Conceito......................................................................................... 11
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Referências ..................................................................................................................... 47
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EIV, Relatório Ambiental Preliminar - RAP e outros. Esse tipo de avaliação prévia é
disciplinado pela Lei Federal 6.938/1981 e por outros instrumentos legais e infralegais,
como se poderá conferir mais abaixo.
No caso do planejamento ambiental, o processo avaliativo se encerra na
Avaliação Ambiental Estratégica - AAE. Esta não se ocupa de impactos ou efeitos
nocivos a um determinado ambiente, mas, sim, de uma escolha ou decisão necessária à
formulação de uma política de governo que se preocupe em determinar, com acerto,
área geográfica e tempo para implantar um programa ou projeto de desenvolvimento,
como estratégia política, econômica e social. Essa avaliação considera a viabilidade
“macro” ou a oportunidade do intento, levando em conta a natureza dos ecossistemas
ou do bioma como alvos da intervenção. Nesse caso predominam critérios
geoeconômicos, socioeconômicos, geográficos, culturais e políticos. Um dos modelos
possíveis de aplicar é o Zoneamento Ecológico-Econômico - ZEE. Evidentemente, a
metodologia da AAE é bem diversa daquela empregada nos tipos de AIA e trabalhará
intensamente com estatísticas.
Em síntese, a AIA encontra-se na esfera do Licenciamento Ambiental, ao passo
que a AAE está na seara do Planejamento Ambiental.
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1
Art. 9º, incisos III e IV, da Lei Federal 6.938/1981.
2
MOREIRA, Iara Verocai Dias. Vocabulário básico de meio ambiente, p. 33.
3
OLIVEIRA, Antonio Inagê de Assis. Revista de direito ambiental, p. 141.
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3. PASSOS DA NORMATIZAÇÃO
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NEPA- National Environmental Policy Act, que introduziu a AIA- Avaliação de Impacto Ambiental nos
Estados Unidos.
5
Note-se que, na Lei Federal 6.938/1981, a AIA e o Licenciamento constam como instrumentos distintos,
não necessariamente vinculados. “Isso denota o caráter amplo da avaliação de impactos, que supera os
procedimentos de licenciamento ambiental, podendo, portanto, ser aplicada na esfera de planejamento de
políticas, planos e programas que afetem o meio ambiente. A AIA é compreendida também como um
processo que deve possibilitar ampla articulação entre setores governamentais, e destes com a sociedade,
ou seja, como uma prática democrática de planejamento e execução de políticas públicas que deve abrir os
processos decisórios à participação social. Entretanto, a AIA se efetivou, no Brasil, apenas no processo de
licenciamento ambiental, por força da Resolução CONAMA 001/1986 - segundo a qual a condução do
procedimento de licenciamento requer, quando a obra ou atividade for potencialmente causadora de
significativa degradação do meio ambiente, a elaboração de Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo
Relatório (EIA/RIMA). Posteriormente, essa exigência ficou estabelecida na Constituição federal de 1988”
(Deficiências em estudos de impacto ambiental: síntese de uma experiência, p. 10). Vale anotar, a título de
ilustração, que “em alguns países, a exemplo do Brasil, os procedimentos administrativos de análise e
aprovação de projetos tiveram que ser adaptados à AIA (por exemplo, a concessão de licença para
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experiência e práticas acumuladas, que a AIA não pode ser reduzida a uma de suas
modalidades, isto é, ao EIA/RIMA.
A Lei Maior, ao insculpir, no art. 225, inciso IV, a obrigação de o poder público
“exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora
de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que
se dará publicidade”, atribuiu à expressão “estudo prévio de impacto ambiental” sentido
amplo, não restringindo ou fazendo coincidir as avaliações de impacto ao EIA/RIMA,
que, em verdade, trata-se, como dito de espécie do gênero Avaliação de Impacto
Ambiental - AIA.
Deveras, não faz mal repetir, a Lei criou uma tipologia de estudos ambientais
destinados a prever e a resguardar o meio ambiente contra interferências que possam
causar-lhe qualquer tipo de degradação. De lege lata, ditos estudos, podem ser resumidos,
como a seguir.
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BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da
discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, p. 33.
9
CF, art. 225, § 1º, IV; Lei Federal 6.938/1981, art. 8º, II; Decreto 99.274/1990, art. 7º, II, com a redação
determinada pelo Decreto 3.942/2001; e Resolução CONAMA 237/1997, art. 3º.
10
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 275.
10
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público”.11
4.1.2. Conceito
11
BENJAMIN, Antonio Herman V. Op. cit.., p. 33.
12
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua portuguesa.;
AULETE, Caldas. Dicionário contemporâneo da língua portuguesa..
13
CUSTÓDIO, Helita Barreira. A avaliação de impacto ambiental no direito brasileiro. Revista de direito
civil, vol. 45, p. 72.
14
Art. 1º da Resolução CONAMA 1, de 23.1.1986.
15
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Regulamentação do estudo de impacto ambiental, p. 69.
11
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4.1.3. Objetivo
16
JAIN, R. K. et al. Environmental impact analysis, p. 3.
17
BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da
discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, p. 30.
18
PRIEUR, Michel. Droit de l’ environnement, pp. 90-91.
19
STASSINOPOULOS, Michel D.. Traité des actes administratifs., p. 205.
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No Brasil, o EIA não nasceu com a moldura que hoje tem. Surgiu em pleno
regime ditatorial, quase que à sorrelfa, como se os responsáveis pela sua introdução no
ordenamento desejassem escondê-lo dos grupos de pressão da época.
O tratamento legal do EIA foi dado pela Resolução CONAMA 1, de 23.1.1986,
que o elegeu como modalidade de avaliação de impacto ambiental para as obras elencadas
no seu art. 2º, com os seguintes termos:
“Art. 2º Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e
respectivo relatório de impacto ambiental- RIMA, a serem submetidos à
aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA em caráter supletivo,
o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, tais como22:
I – estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento;
II – ferrovias;
III – portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos;
IV – aeroportos, conforme definidos pelo inc. I do art. 48 do Decreto-lei 32,
de 18.11.1966;
V – oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de
esgotos sanitários;
VI – linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230 kV;
VII – obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como:23
barragem para fins hidrelétricos, acima de 10 mW, de saneamento ou de
irrigação, abertura de canais para a navegação, drenagem e irrigação,
retificação de cursos d’água, abertura de barras e embocaduras, transposição
20
Art. 225, § 1º, IV, da CF.
21
BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da
discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, pp. 29-32.
22
Grifos nossos.
23
Grifamos.
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de bacias, diques;
VIII – extração de combustível fóssil (petróleo, xisto, carvão);
IX – extração de minério, inclusive os da classe II, definidos no Código de
Mineração;24
X – aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou
perigosos;
XI – usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia
primária, acima de 10 mW;
XII – complexo e unidades industriais e agroindustriais (petroquímicos,
siderúrgicos, cloroquímicos, destilarias de álcool, hulha, extração e cultivo de
recursos hídricos);
XIII – distritos industriais e zonas estritamente industriais- ZEI;
XIV – exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100
ha ou menores, quando atingir áreas significativas em termos percentuais ou
de importância do ponto de vista ambiental;
XV – projetos urbanísticos, acima de 100 ha, ou em áreas consideradas de
relevante interesse ambiental a critério do IBAMA e dos órgãos municipais e
estaduais competentes;
XVI – qualquer atividade que utilizar carvão vegetal, derivados ou produtos
similares, em quantidade superior a dez toneladas por dia;25
XVII – projetos agropecuários que contemplem áreas acima de 1.000 ha ou
menores, neste caso, quando se tratar de áreas significativas em termos
percentuais – ou de importância do ponto de vista ambiental, inclusive nas
áreas de proteção ambiental;26
XVIII – nos casos de empreendimentos potencialmente lesivos ao patrimônio
espeleológico nacional”.27
Pois bem. Para que se possa analisar corretamente a questão referente à
exigibilidade e aos limites de aplicação da Resolução CONAMA 1/1986, cumpre
enfatizar novamente que ela foi editada sob o anterior regime constitucional, o da Emenda
24
O art. 5º do Decreto-lei 227, de 28.02.1967 (Código de Mineração), que estabelecia as classes de jazidas,
foi revogado pelo art. 3º da Lei Federal 9.314, de 14.11.1996.
25
Redação determinada pela Resolução CONAMA 11, de 18.3.1986.
26
Inciso acrescentado pela Resolução CONAMA 11, de 18.3.1986.
27
Inciso acrescentado pela Resolução CONAMA 5, de 6.8.1987. Esta Resolução foi revogada pela
Resolução CONAMA 347, de 10.9.2004, que dispõe sobre a proteção do patrimônio espeleológico.
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Constitucional 1/1969, época em que não havia nenhuma disposição nomeada como
“proteção ambiental” ou algo que o valha.
As matérias que compõem essa nova designação eram tratadas sob a forma de
competência legislativa da União para dispor sobre “defesa e proteção da saúde”;
“jazidas, minas e outros recursos minerais”; “metalurgia, florestas, caça e pesca” e
“águas”.
Nesse contexto, amenizado com uma pitada dos novos ventos que indicavam já
a necessidade de uma melhor disciplina das atividades que pudessem causar algum dano
ao meio ambiente, é que veio a ser editada a Resolução CONAMA 1/1986, que atendia
aos então objetivos perseguidos pela Lei Federal 6.938/1981.
Nos termos, pois, dessa Resolução, todas as “atividades modificadoras do meio
ambiente”, nela exemplificativamente listadas, dependiam da elaboração de “estudo de
impacto e respectivo relatório de impacto ambiental”, sem o que não poderiam ser
licenciadas.
Ocorre, no entanto, que essa Emenda é página virada na história republicana do
Brasil.
Desde o dia 5.10.1988 o País vive sob novo regime constitucional, no qual, entre
outras inovações, somente é exigível EIA/RIMA “para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente” (art. 225, § 1º,
IV, da CF).
Ou seja, nos termos da nova ordem constitucional, somente quando houver
significativa degradação do meio ambiente poderá ser exigido o EIA/RIMA. Isso, e
apenas dessa forma, está na Constituição. Qualquer outra disposição que houver na
legislação infraconstitucional deve se conformar e assim ser interpretada.
Assim é que, dessa aplicação da lei no tempo, alcança-se a conclusão de que os
casos exemplificativamente listados na Resolução CONAMA 1/1986 só são passíveis de
apresentação de EIA/RIMA se e quando houver significativa degradação ambiental.
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sensíveis objetivos dessa política, que diz com a incessante busca da possível
“compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade
do meio ambiente e do equilíbrio ecológico”.28
Por seu alto custo e complexidade, deve ser usado com parcimônia e prudência,
de preferência para os projetos mais importantes sob a ótica ambiental.
Este o sentido da lei brasileira, ao fazer depender o seu desencadeamento apenas
ante o vislumbre de significativa degradação que o empreendimento possa causar ao
ambiente.29
Não constitui tarefa fácil, entretanto, precisar o conceito de significativa
degradação, dado que na implantação de um projeto sempre haverá “alteração adversa
das características do meio ambiente”.30 Muitas vezes o insignificante se reveste da maior
significância, como ocorre, por exemplo, quando “um determinado projeto tenha
exatamente o condão de romper o ponto de saturação ambiental de uma certa área. Neste
caso, evidentemente, seu impacto não pode ser considerado insignificante por menor que
seja”.31
Como saber, então, se uma obra ou atividade será potencialmente causadora de
significativa degradação sem ter antes um estudo de impacto ambiental?
Para fugir à incômoda situação referida, o critério engendrado pelo legislador
brasileiro foi o de e/laborar uma lista positiva enumerando as obras e atividades capazes
de produzir efeitos ambientais indesejáveis. Fê-lo, basicamente, por meio do art. 2º da
Resolução CONAMA 1/1986.
28
Art. 4º, inciso I, da Lei Federal 6.938/1981.
29
Art. 225, § 1º, inciso IV, da CF; art. 8º, inciso II, da Lei Federal 6.938/1981; art. 7º, II, do Decreto
99.274/1990, com a redação determinada pelo Decreto 3.942/2001, e art. 3º da Resolução CONAMA
237/1997.
30
Art. 3º, II, da Lei Federal 6.938/1981.
31
BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da
discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, p. 42.
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Neste aspecto, vale lembrar caso em que o Ministério Público paulista obteve liminar em ação civil
pública promovida em face da Municipalidade de São Paulo, obstando celebração de contratos e o início
de obras para instalação de quatro usinas incineradoras e de compostagem de lixo urbano, nos bairros de
Sapopemba e Santo Amaro. O argumento central residia exatamente na ausência de prévio estudo de
impacto ambiental para o licenciamento de atividades tão agressivas ao meio ambiente, dado que a queima
daqueles resíduos poderia produzir complexos de compostos orgânicos clorados, genericamente
denominados policloro-dibenzo-dioxinas - PCDD e policloro-dibenzo-furanos - PCDF, dentre os quais se
contam algumas das substâncias mais tóxicas conhecidas pelo homem.
33
Revista de direito ambiental, vol. 12, pp. 166-177.
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Grifo nosso.
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Assim, BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da
discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, pp. 40-41; Paulo Affonso Leme Machado, para
quem “a vantagem de se arrolarem algumas atividades no art. 2º obriga também a própria Administração
Pública, que não pode transigir, outorgando a licença e/ou autorização sem o EPIA” (Direitoi ambiental
brasileiro, p. 274); Sílvia Cappelli, mais incisiva, assevera: “[a] vantagem do rol exemplificativo constante
da Resolução do CONAMA é retirar a discricionariedade da Administração Pública para licenciar tais
empreendimentos. Constem eles daquele rol, o órgão licenciador não poderá dispensar o EIA/RIMA, sob
pena de nulificar o procedimento administrativo, eis que se trata de ato vinculado” (O estudo de impacto
ambiental na realidade brasileira, Revista do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, nº 27, p.
54). ÁVILA, Elna Leite; ALMEIDA, Ione Monteiro de, de seu turno, sustentam que o licenciamento de
qualquer atividade listada na Resolução 001/1986, sem o EIA, pode ensejar a prática do crime de
prevaricação, sem prejuízo da responsabilidade civil e administrativa do agente público (O estudo de
impacto ambiental – Licenciamento – Responsabilidade criminal. Revista do Ministério Público do Estado
do Rio Grande do Sul, pp. 179-180); MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Impacto ambiental. Aspectos da
legislação brasileira, pp. 54-63.
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Esse posicionamento encontra-se estampado no Parecer PJ 130, de 03.07.1989, aprovado pelo Conselho
Estadual do Meio Ambiente de São Paulo, por meio da Deliberação CONSEMA 20, de 27.7.1990, e
posteriormente ratificado pelo Parecer PJ 241, de 16.11.1989, ambos publicados no documento Avaliação
de Impacto Ambiental, pp. 11-23.
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Grifos nossos.
38
Grifos nossos.
39
Avaliação de Impacto Ambiental, pp. 5-8.
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Dado o seu papel de instrumento preventivo de danos, é claro que, para cumprir
sua missão, deve ser elaborado antes da decisão administrativa de outorga da licença para
a implementação de obras ou atividades com efeito ambiental no meio considerado. Daí
o nomen juris que lhe dá a Constituição: “estudo prévio de impacto ambiental”.40
Integrando o processo de licenciamento, o EIA não pode ser enxergado como
40
Art. 225, § 1º, IV, da CF.
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BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da
discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, p. 30. Neste aspecto, Sílvia Cappelli sustenta
que “o licenciamento ambiental deferido antes do julgamento do EIA/RIMA determina responsabilidade
objetiva da Administração pelos danos advindos ao meio ambiente, nos termos do art. 37, § 6º, da CF” (O
estudo de impacto ambiental na realidade brasileira, Revista do Ministério Público do Estado do Rio
Grande do Sul, nº 27, p. 57).
42
Cf. art. 12, §§ 1º a 5º, da Resolução CONAMA 6/1987. Lembre-se, a propósito, de avaliação de impacto
ambiental encetada 11 anos após o início das obras da Usina Hidroelétrica de Três Irmãos, localizada no
baixo curso do Rio Tietê, em Pereira Barreto/SP, em razão de se ter detectado impactos ambientais e
socioeconômicos de vulto, não equacionados pela empreendedora. A liminar prontamente concedida pelo
Poder Judiciário, a pedido do Ministério Público, em 1990, impediu o fechamento das adufas da
barragem até a aprovação dos estudos referente à obra (Proc. 16/1990). No Estado de São Paulo, a
Secretaria do Meio Ambiente, pela Resolução SMA 1, de 02.01.1990, visando ao controle mais eficaz
das condições ambientais, criou a possibilidade de se exigir estudos ambientais para atividades iniciadas,
mesmo que já tenham alguma licença.
22
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4.1.8. Elaboração
43
OLIVEIRA, Antonio Inagê de Assis. O licenciamento ambiental, p. 129.
44
Arts. 127, caput, e 129, III, da CF.
23
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45
Neste sentido: MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Impacto ambiental. Aspectos da legislação brasileira, p.
87; BUGALHO, Nelson R. Estudo prévio de impacto ambiental. Revista de direito ambiental, vol. 15, p.
22.
46
COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente, pp. 292-294.
47
Arts. 9º, VIII e 17, I, da Lei Federal 6.938/1981.
48
Art. 2º da Resolução CONAMA 1/1988.
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Hoje essa exigência não mais prevalece, ante a expressa revogação do referido
dispositivo pelo art. 21 da Resolução CONAMA 237/1997.
Aliás, na prática, tal independência era mesmo ilusória, na medida em que, por
falta de norma regulamentar, as consultorias vinham sendo contratadas pelo
empreendedor, por conta de quem também corriam todas as despesas e custos referentes
à realização do EIA.49
Sempre duvidamos da pertinência de tal desígnio, tendo mesmo escrito, ainda
sob o império do comando legislativo anterior, que a contratação para a elaboração de um
estudo de impacto ambiental estabelece, de imediato, um forte vínculo de dependência
econômica e jurídica entre contratante e contratado, circunstância que a Resolução quis
impedir.
Realmente, a fórmula legislativa então insculpida no art. 7º da Resolução
CONAMA 1/1986, proclamando a independência da equipe, foi além do que queria o
legislador (lex plus dixit quam voluit), gerando indisfarçável contradição.
Em primeiro lugar, por ter extravasado o conteúdo de normas de superior
hierarquia, visto que nem a Constituição Federal,50 nem a legislação federal
regulamentadora do assunto contêm a condição limitativa prevista no revogado art. 7º da
citada Resolução. O art. 17, § 2º, do Decreto 99.274/1990, que regulamentou a Lei Federal
6.938/1981, dispõe expressamente que “o estudo de impacto ambiental será realizado por
técnicos habilitados e constituirá o Relatório de Impacto Ambiental- RIMA, correndo as
despesas à conta do proponente do projeto”. Nenhuma alusão, como se vê, à
independência da equipe.
Em segundo lugar, por ensejar o florescimento da chamada “indústria do
EIA/RIMA” pelos escritórios de consultoria privada,51 marginalizando os técnicos
vinculados ao empreendedor (público ou privado), muitas vezes os mais competentes e
bem informados a respeito da situação objeto do estudo.
49
Art. 8º da Resolução CONAMA 1/1986.
50
Art. 225, § 1º, IV, da CF.
51
Há registros de estudos estandardizados, elaborados em série, “ao gosto do freguês”, apenas com espaço
em branco para a inserção do nome do empreendedor. Lembra, com efeito, Paulo Nogueira Neto, um dos
pioneiros da causa ambientalista no Brasil, de certa consultora contratada para elaborar estudo de impacto
ambiental sobre um projeto de exploração de jazida mineral para a produção de pedregulho, e que, por
engano, fez constar do documento argumentação dirigida ao licenciamento de uma padaria! (EIA/RIMA –
O conflito e a solução. Bio – Revista da associação brasileira de engenharia sanitária e ambiental, p. 21).
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52
ALVES, Alaor Caffé. Elaboração de EIA/RIMA diretamente pelo proponente. Parecer CJ 73, de
22.2.1990, emitido em razão de consulta da Companhia Energética de São Paulo- CESP, a respeito da
possibilidade de aceitação, pela Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo, de estudo de impacto ambiental
elaborado por sua equipe técnica, pp. 3 e 4 (inédito).
53
CLAUDIO, Celina F. Bragança Rosa. Implicações da avaliação de impacto ambiental. Revista CETESB
de tecnologia, p. 162.
54
Art. 5º, par. único, da Resolução CONAMA 1/1986.
55
Art. 11, § 2º, da Resolução CONAMA 1/1986.
56
Art. 10, caput, da Resolução CONAMA 1/1986.
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57
ALVES, Alaor Caffé. Op. cit., p. 7. Permanece, é certo, a dificuldade hoje enfrentada por alguns órgãos
ambientais de Estados menos desenvolvidos, não estruturados com equipes preparadas para atender tal
atribuição com a desejável eficiência. Pertinente, nessa conjuntura, a recomendação de Michel Prieur no
sentido de que o controle do conteúdo dos estudos pelos poderes públicos seja feito em colaboração com
institutos científicos independentes. Um verdadeiro estudo de impacto – completa o renomado jurista
francês – implica pesquisas pluridisciplinares que levam a disciplinas científicas diferentes. É por isso que
os institutos de pesquisa e principalmente as universidades parecem ser os órgãos mais importantes e
competentes, capazes de reunir equipes pluridisciplinares, oferecendo o máximo de garantia, objetividade
e seriedade (PRIEUR, Michel. Droit de l’ environnement, pp. 104 e 105).
58
Art. 5º, LXXIII, da CF.
59
Art. 11, par. único, da Resolução CONAMA 237/1997.
60
Art. 2º, XI, da Resolução CONAMA 1/1986.
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OLIVEIRA, Antonio Inagê de Assis. O licenciamento ambiental, p. 206.
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Art. 14, § 1º, da Lei Federla 6.938/1981.
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4.1.9. Custeio
63
O TJSP, por acórdão da 3ª Câm. Civ., na Ap 80.345-1, da Comarca de Santos, Rel. Des. Toledo César,
votação unânime, de 07.04.1987, encampou esse entendimento ao repudiar discussão de conduta culposa
de terceiro nos mesmos autos de processo que apurava responsabilidade civil por danos ao meio ambiente.
64
Art. 3º da Lei Federal 9.605/1998.
65
BUGALHO, Nelson R. Estudo prévio de impacto ambiental. Revista de direito ambiental, vol. 15, p. 26.
66
Art. 17, § 2º, do Decreto 99.274/1990; art. 8º da Resolução CONAMA 1/1986; art. 11 da Resolução
CONAMA 237/1997.
67
Art. 13 da Resolução CONAMA 237/1997.
29
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O EIA se insere na categoria dos atos formais, dado que preso a diretrizes e
atividades técnicas mínimas previstas em lei, que não podem, em hipótese alguma, ser
descuradas, sob pena de invalidação.
Seu procedimento, com efeito, deve ser simples e objetivo, obedecendo,
basicamente, às seguintes diretrizes gerais:
I – Contemplar as alternativas tecnológicas e de localização do projeto,
confrontando-se com a hipótese de sua não execução:68 a discussão das alternativas
tecnológicas e locacionais constitui o coração do EIA,69 dado que, muitas vezes, a melhor
opção será a não execução do projeto, em função dos altos custos sociais e ecológicos
dele decorrentes.
II – Identificar e avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas
fases de implantação e operação da atividade:70 trata-se de operação tendente a definir
as medidas corretivas e mitigadoras dos impactos negativos ao ambiente, para eventual
responsabilização do autor do projeto.
III – Definir os limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada
pelos impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em todos os
casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza:71 cuida-se de estabelecer as áreas de
incidência dos impactos, abrangendo os distintos contornos para as diversas variáveis
enfocadas, considerando-se, sempre, a bacia hidrográfica correspondente. A
administração do meio ambiente no âmbito de bacias hidrográficas constitui a mais
moderna concepção de gerenciamento de recursos públicos, posto que conduz a um
planejamento coordenado das ações de todos os órgãos de governo, com expressiva
diminuição de custos.
IV – Considerar os planos e programas governamentais, propostos e em
implantação na área de influência do projeto, e sua compatibilidade:72 importa ter
presente, na execução do EIA, a conformidade do projetado empreendimento com
68
Art. 5º, inciso I, da Resolução CONAMA 1/1986.
69
CAPPELLI, Sílvia. O estudo de impacto ambiental na realidade brasileira, Revista do Ministério Público
do Estado do Rio Grande do Sul, nº 27, p. 56; MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental
brasileiro, p. 278.
70
Art. 5º, inciso II, da Resolução CONAMA 1/1986.
71
Art. 5º, inciso III, da Resolução CONAMA 1/1986.
72
Art. 5º, inciso IV, da Resolução CONAMA 1/1986.
30
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73
Art. 9º, inciso II, da Lei 6.938/1981.
31
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74
Ver art. 17, § 1º, do Decreto 99.274/1990 e art. 6º da Resolução CONAMA 1/1986.
75
Art. 6º, inciso I, da Resolução CONAMA 1/1986.
76
Art. 6º, inciso II, da Resolução CONAMA 1/1986.
77
Estudo de Impacto Ambiental- EIA, Relatório de Impacto Ambiental- RIMA, Manual de orientação, p. 5.
78
Art. 6º, inciso III, da Resolução CONAMA 1/1986.
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79
Estudo de Impacto Ambiental- EIA, Relatório de Impacto Ambiental- RIMA, Manual de orientação, p. 5.
80
Art. 6º, inciso IV, da Resolução CONAMA 1/1986.
81
Art. 9º, parágrafo único, da Resolução CONAMA 1/1986.
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82
Art. 9º da Resolução CONAMA 1/1986.
83
“Art. 11. Os estudos necessários ao processo de licenciamento deverão ser realizados por profissionais
legalmente habilitados, às expensas do empreendedor. Par. único. O empreendedor e os profissionais que
subscrevem os estudos previstos no caput deste artigo serão responsáveis pelas informações apresentadas,
sujeitando-se às sanções administrativas, civis e penais”.
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que qualquer cidadão tem de conhecer os atos praticados pelos seus agentes públicos”. O
segundo, de maneira extensiva, “aplica-se ao direito que tem o cidadão, organizado ou
não, de intervir – porque parte interessada – no procedimento de tomada da decisão
ambiental”.84
Coerente com tais princípios, e na linha do comando estabelecido no art. 225, §
1º, IV, da CF, que obriga o poder público a dar publicidade ao Estudo Prévio de Impacto
Ambiental, a Resolução CONAMA 237/1997, em seu art. 3º, determina que ao EIA/RIMA
“dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas”.
4.1.13.1. Publicidade
84
BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da
discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, p. 38.
85
Art. 5º, XXXIII, da CF.
86
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 117.
87
PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. A publicidade e o direito de acesso a informações no
licenciamento ambiental. Revista de direito ambiental, vol. 8, pp. 29-30.
35
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88
Cf. art. 4º, VII, da Lei Federal 10.650, de 16.4.2003.
89
Art. 1º da Resolução CONAMA 9/1987.
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90
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro, p. 303.
91
Art. 2º, caput, da Resolução CONAMA 9/1987. No Estado de São Paulo, a Deliberação CONSEMA
Normativa 1, de 14.9.2011, que estabelece normas para solicitação, convocação e realização de audiências
públicas, dispôs: “Art. 3º. A realização de Audiência Pública será promovida pela Secretaria do Meio
Ambiente, sempre que a julgar necessária, ou quando for fundamentadamente solicitada: a) pelo Poder
Público Estadual ou Municipal do Estado de São Paulo; b) pelo CONSEMA- Conselho Estadual do Meio
Ambiente; c) pelo Ministério Público Federal ou do Estado de São Paulo; d) por entidade civil sem fins
lucrativos, constituída há mais de um ano e que tenha por finalidade social a defesa de interesse econômico,
social, cultural ou ambiental, que possa ser afetado pela obra ou atividade objeto do respectivo EIA/RIMA;
e) por 50 (cinquenta) ou mais cidadãos que tenham legítimo interesse”.
92
Art. 2º, § 2º, in fine, da Resolução CONAMA 9/1987.
93
E municipal, acrescentamos nós.
94
Art. 11, caput, da Resolução CONAMA 1/1986.
95
Art. 11, § 1º, da Resolução CONAMA 1/1986.
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96
Art. 2º, § 5º, da Resolução CONAMA 9/1987.
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Cidade”, que instituiu a Política Nacional Urbana. Em mais de uma passagem essa lei
refere-se à necessidade – e até mesmo obrigatoriedade – da participação da sociedade
interessada nos debates e nas tomadas de decisão, relativos ao meio ambiente urbano. Ao
tratar do Plano Diretor, no art. 40, § 4º, I, é prescrita “a promoção de audiências públicas
e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários
segmentos da comunidade”.97
Tanto o EIA/RIMA quanto o EIV/RIVI (Estudo de Impacto de Vizinhança e seu
respectivo Relatório) incluem a audiência pública entre seus grandes momentos. Verdade
é que a aplicação desse instituto pode variar em pormenores e peculiaridades, de acordo
com as circunstâncias; porém, na sua essência – que é a consulta da população sobre os
interesses dessa mesma população –, está atrelada a princípios básicos comuns. Isto já
fora anteriormente estabelecido como uma das diretrizes gerais, a saber: “Audiência do
Poder Público municipal e da população interessada nos processos de implantação de
empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio
ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população” (art. 2º, XIII,
da Lei Federal 10.257/2001).
Estabelecidos assim os fundamentos jurídico-legais do papel da audiência
pública, é oportuno e necessário tecer alguns comentários sobre o seu significado como
instrumento de gestão do meio ambiente.
Ressalte-se, uma vez mais, que ela visa a considerar o empreendimento sob a
ótica direta e final da comunidade. Neste sentido, ela contribui para os necessários ajustes
metodológicos e de conteúdo do EIA/RIMA. Proporciona ideias, argumentos e sugestões
ditadas pelo interesse da população, vez que, por suposto, está ela representada pelos
participantes da audiência pública. Trata-se de uma participação organizada, que obedece
a um ritual estabelecido em normas legais e gerenciais, não podendo ser descurados os
requisitos elementares de ordem e disciplina social, assim como de educação cívica, sem
os quais a assembleia se tornaria balbúrdia e não conduziria nenhuma das partes aos
objetivos colimados.
O caráter democrático e participativo da audiência pública é fundamentado, e
também limitado, pelos dispositivos legais. Como mecanismo legal de participação ainda
97
Grifamos.
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recente, a realização de uma audiência pública pode esbarrar com algumas deformações
conceituais e práticas que, apesar dos seus inconvenientes, não invalidam o procedimento
como tal. As instituições democráticas brasileiras são ainda frágeis, eivadas da
inexperiência e do açodamento de setores da sociedade mais empenhados em suas causas
e agressivos em seus métodos. Deve-se, pois, compreender tais inconvenientes e fatores
limitantes, sem, contudo, solapar os fundamentos legais e sociais desse mecanismo, nem
mesmo criar boicotes e obstáculos reais ou fantasiosos à sua realização.
Nesse contexto, não é de surpreender o fato de a audiência pública ser marcada
por posições diferentes, contrárias ou mesmo contraditórias. Ela, como procedimento
democrático, deve acolher quantos queiram manifestar-se legitimamente sobre o objeto
da convocação. Audiência pública não é um comício em que determinado partido se
promove ou apresenta seu programa. Não é, também, um plebiscito em que os
participantes estão circunscritos ao “sim” ou ao “não”, até mesmo porque a audiência
pública não tem caráter deliberativo, mas, ao contrário, é um procedimento estritamente
consultivo.
O fato de que, muitas vezes, a audiência pública tem sido “palco de torcidas
organizadas” demonstra que ainda não há uma compreensão clara da natureza e do
alcance do mecanismo em questão. Eventuais excessos na tomada de partido, ou pró ou
contra, assim como nas manifestações daquele dado momento, devem ser debitadas ao
processo de amadurecimento das instituições democráticas. Melhor se diria, devem ser
“creditadas” a esse processo de crescimento da cidadania, pois que o avanço social
procede por erros e acertos. Tais deficiências na realização das audiências públicas
seriam, antes, circunstanciais; não são estruturais, nem mesmo conjunturais, porquanto
não são desejadas, nem sequer previstas, pelo legislador, embora pareçam inerentes à fase
histórica de conscientização democrática que vive a sociedade brasileira.
Não se pode impor, ou sequer pretender, que uma audiência pública seja
convocada e realizada sem “torcidas”. Isto só seria possível se ela fosse precedida de um
patrulhamento, mediante o qual os interessados na participação ficassem sabendo do que
pode ou não pode ser dito, do que deve ou não ser objeto de análise e discussão (desde
que não seja impertinente ao tema e objetivo da audiência pública), de forma que, em vez
de “torcidas organizadas”, houvesse apenas um coro uníssono previamente convocado.
Ora, isto é política e socialmente inconcebível num regime democrático, além de ser
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98
PRIEUR, Michel. Droit de l’ environnement, pp. 123-165.
99
SÁNCHEZ, Luís Enrique. Os papéis da avaliação de impacto ambiental. Revista de direito ambiental,
pp. 145-148.
41
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100
Nesse particular, é totalmente acurada a observação de CUSTÓDIO, Helita Barreira de que, apesar da
exigência legal (e agora constitucional), nota-se que, “lamentavelmente, na prática, pela própria notoriedade
dos fatos, patente é a inaplicação das normas legais e regulamentares correlatas, diante da permanência e
do evidente agravamento da deterioração de nosso patrimônio ambiental” (A avaliação de impacto
ambiental no direito brasileiro. Revista de direito civil, vol. 45, p. 87).
42
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101
No Estado de São Paulo, o RAP foi instituído pela Resolução SMA 42, de 2.12.1994.
102
SILVA, Pedro Paulo de Lima et al. Dicionário brasileiro de ciências ambientais, p. 80.
103
Idem, p. 181.
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104
Idem , p. 14.
105
Ver Anexo II da Portaria Interministerial 60/2015.
106
Idem.
45
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107
Idem.
108
Idem.
109
“Ação civil pública. Dano ambiental. Bacia Hidrográfica do Rio Tibagi. Usina hidrelétrica. Estudo de
impacto ambiental. Avaliação ambiental integrada. Necessidade” (Destacamos) (TRF-4ª Reg., AC
1999.70.01.007514-6/PR, 3ª Turma, Rel. Des. Fernando Quadros da Silva, DJe 04.5.2011).
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outros mais) e sociais (situação e condições das comunidades circunstantes). Essas são
apenas algumas referências para exemplificar.
Na realidade, toda e qualquer avaliação ambiental deve, por sua própria natureza,
ser integrada, porquanto o meio ambiente é uma realidade holística, sistêmica e
interdisciplinar, como já se sabe pela boa ciência. Melhor seria se essa avaliação
ambiental se chamasse “contextual” ou outro adjetivo equivalente, dispensando-se o
termo “integral” que, por sua natureza (e como já se disse), é inerente à avaliação
ambiental e, ademais, constitui para ela um requisito essencial. Aguardemos, pois, que a
doutrina, a legislação ou a jurisprudência consagrem a denominação adequada.
REFERÊNCIAS
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