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PSICOLOGIA

APLICADA À
SAÚDE
Autoria
CRISTINA ABRANTES
E JULIA LEME
Presidente da Divisão de Ensino Prof. Paulo Arns da Cunha
Reitor Prof. José Pio Martins
Pró-Reitor Prof. Carlos Longo
Coordenação Geral de EAD Prof. Everton Renaud
Coordenação de Metodologia e Tecnologia Profa. Roberta Galon Silva
Autoria Profa. Cristina Gonçalves de Abrantes
Profa. Julia Severi Leme Fonseca
Parecerista Profa. Fabiana Sekiguchi
Supervisão Editorial Felipe Guedes Antunes
Projeto Gráfico e Capa DP Content

DADOS DO FORNECEDOR
Análise de Qualidade, Edição de Texto, Design Instrucional,
Edição de Arte, Diagramação, Design Gráfico e Revisão.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Biblioteca da Universidade Positivo – Curitiba – PR

© Universidade Positivo 2019


Rua Prof. Pedro Viriato Parigot de Souza, 5300 – Campo Comprido
Curitiba-PR – CEP 81280-330
*Todos os gráficos, tabelas e esquemas são creditados à autoria, salvo quando indicada a referência.
Informamos que é de inteira responsabilidade da autoria a emissão de conceitos.
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem autorização.
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Compreenda seu livro
Metodologia

Caro aluno,
A metodologia da Universidade Positivo tem por objetivo a aprendizagem e a comu-
nicação bidirecional entre os atores educacionais. Para que os objetivos propostos se-
jam alcançados, você conta com um percurso de aprendizagem que busca direcionar a
construção de seu conhecimento por meio da leitura, da contextualização prática e das
atividades individuais e colaborativas.
A proposta pedagógica da Universidade Positivo é baseada em uma metodologia dia-
lógica de trabalho que objetiva:

valorizar suas incentivar a estimular a oportunizar a


experiências; construção e a pesquisa;
reflexão teórica
reconstrução do
conhecimento; e aplicação
consciente dos
temas abordados.

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Metodologia
Com base nessa metodologia, o livro apresenta a seguinte estrutura:

OBJETIVOS DO CAPÍTULO
Indicam o que se espera que você
aprenda ao final do estudo do ca- TÓPICOS QUE SERÃO ESTUDADOS
pítulo, baseados nas necessidades Descrição dos conteúdos que
de aprendizagem do seu curso. serão estudados no capítulo.

CONTEXTUALIZANDO O CENÁRIO
Contextualização do tema que será PERGUNTA NORTEADORA
estudado no capítulo, como um Ao final do Contextualizando o cená-
cenário que o oriente a respeito do rio, consta uma pergunta que esti-
assunto, relacionando teoria e prática. mulará sua reflexão sobre o cenário
apresentado, com foco no desenvol-
vimento da sua capacidade de análi-
PAUSA PARA REFLETIR se crítica.
São perguntas que o instigam a
refletir sobre algum ponto BOXES
estudado no capítulo. São caixas em destaque que podem
apresentar uma citação, indicações
de leitura, de filme, apresentação de
um contexto, dicas, curiosidades etc.
PROPOSTA DE ATIVIDADE
Sugestão de atividade para que você
desenvolva sua autonomia e siste-
matize o que aprendeu no capítulo. RECAPITULANDO
É o fechamento do capítulo. Visa
sintetizar o que foi abordado, reto-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS mando os objetivos do capítulo, a
São todas as fontes utilizadas no pergunta norteadora e fornecendo
capítulo, incluindo as fontes mencio- um direcionamento sobre os ques-
nadas nos boxes, adequadas tionamentos feitos no decorrer do
ao Projeto Pedagógico do curso. conteúdo.

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Boxes

AFIRMAÇÃO
Citações e afirmativas pronunciadas por teóricos de relevância na área de estudo.

ASSISTA
Indicação de filmes, vídeos ou similares que trazem informações complementares

ou aprofundadas sobre o conteúdo estudado.

BIOGRAFIA
Dados essenciais e pertinentes sobre a vida de uma determinada pessoa
relevante para o estudo do conteúdo abordado.

CONTEXTO
Dados que retratam onde e quando aconteceu determinado fato; demonstra-se
a situação histórica do assunto.

CURIOSIDADE
Informação que revela algo desconhecido e interessante sobre o assunto tratado.

DICA
Um detalhe específico da informação, um breve conselho, um alerta, uma
informação privilegiada sobre o conteúdo trabalhado.

ESCLARECIMENTO
Explicação, elucidação sobre uma palavra ou expressão específica da área de
conhecimento trabalhada.

EXEMPLO
Informação que retrata de forma objetiva determinado assunto.

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Sumário
Capítulo 1 - A Psicologia aplicada à saúde
Objetivos do capítulo ....................................................................................................15
Contextualizando o cenário ..........................................................................................16

1.1 A Psicologia aplicada à saúde ................................................................................... 17


1.1.1 Introdução à Psicologia..............................................................................................................................17
1.1.2 Fundamentos da Psicologia ........................................................................................................................23
1.1.3 Relação da Psicologia com outras ciências .............................................................................................25
1.1.2 Psicologia da Saúde e Psicologia hospitalar ...........................................................................................26

1.2 Psicologia Clínica ................................................................................................... 28


1.2.1 Objeto e métodos ........................................................................................................................................28
1.2.2 Abordagens psicológicas............................................................................................................................29

1.3 Amplitude e aplicação da Psicologia da Saúde ........................................................ 33


1.3.1 Promoção, prevenção e reabilitação em saúde ......................................................................................35
1.2.2 O cuidado em saúde ....................................................................................................................................37

Proposta de Atividade .................................................................................................. 38


Recapitulando ............................................................................................................. 38
Referências bibliográficas ...........................................................................................40

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Sumário
Capítulo 2 - A Psicologia e as relações de trabalho em saúde
Objetivos do capítulo ....................................................................................................41
Contextualizando o cenário ......................................................................................... 42

2.1 A comunicação em saúde ........................................................................................ 43


2.1.1 Comunicação entre pacientes, familiares e profissionais da saúde ...................................................45
2.1.2 Comunicação de notícias difíceis ..............................................................................................................49
2.1.3 Comunicação terapêutica .........................................................................................................................52

2.2 O trabalho em equipe ............................................................................................. 53


2.2.1 A multidisciplinaridade ..............................................................................................................................54
2.2.2 A interdisciplinaridade ...............................................................................................................................54
2.2.3 A transdisciplinaridade ..............................................................................................................................55

2.3 Relacionamento interpessoal .................................................................................57


2.3.1 Empatia .........................................................................................................................................................57
2.3.2 Assertividade ...............................................................................................................................................58
2.3.3 Ética...............................................................................................................................................................61

Proposta de Atividade .................................................................................................. 63


Recapitulando ............................................................................................................. 63
Referências bibliográficas ........................................................................................... 65

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Sumário
Capítulo 3 - A Psicologia e o desenvolvimento humano
Objetivos do capítulo ....................................................................................................67
Contextualizando o cenário ......................................................................................... 68

3.1 O estudo do desenvolvimento humano ....................................................................69


3.1.1 Conceito de desenvolvimento humano.....................................................................................................69
3.1.2 Fatores determinantes no processo de desenvolvimento humano .......................................................70
3.1.3 Comportamento ..........................................................................................................................................74

3.2 Ciclo do desenvolvimento humano ..........................................................................76


3.2.1 Infância ......................................................................................................................................................... 77
3.2.2 Adolescência ................................................................................................................................................84
3.2.3 Vida adulta ...................................................................................................................................................87
3.2.4 Velhice ..........................................................................................................................................................91

3.3 O processo de adoecimento ...................................................................................95


3.3.1 Conceito de saúde .......................................................................................................................................95
3.3.2 Aspectos psicossociais do processo saúde/doença ...............................................................................97

Proposta de Atividade .................................................................................................100


Recapitulando ............................................................................................................100
Referências bibliográficas .......................................................................................... 101

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Sumário
Capítulo 4 - A Psicologia e a Tanatologia
Objetivo do capítulo....................................................................................................102
Contextualizando o cenário ........................................................................................103

4.1 Tanatologia ...........................................................................................................104


4.1.1 Conceito de Tanatologia .......................................................................................................................... 104
4.1.2 Área de conhecimento e aplicação ........................................................................................................ 104
4.1.3 Temas em Tanatologia.............................................................................................................................. 105

4.2 Dor e sofrimento ................................................................................................... 107


4.2.1 Conceito de dor .........................................................................................................................................107
4.2.2 Sofrimento humano ................................................................................................................................. 109
4.2.3 Espiritualidade no contexto da saúde ................................................................................................... 110
4.2.4 Cuidados paliativos e cuidados no fim da vida .................................................................................... 111

4.3 A morte e o morrer .................................................................................................113


4.3.1 Conceito de morte.................................................................................................................................... 113
4.3.2 Perspectivas da morte na infância, adolescência, fase adulta e velhice .......................................... 114
4.3.3 Educação para a morte ............................................................................................................................117

4.4 Perdas e luto..........................................................................................................118


4.4.1 Estudos sobre o luto ................................................................................................................................ 119
4.4.2 Cuidados com as pessoas enlutadas ..................................................................................................... 121
4.4.3 Comportamentos autodestrutivos ......................................................................................................... 122
4.4.4 Suicídio ...................................................................................................................................................... 124

Proposta de Atividade ................................................................................................. 127


Recapitulando ............................................................................................................128
Referências bibliográficas ..........................................................................................129

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PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 11
APRESENTAÇÃO

Bem-vindos à disciplina de Psicologia Aplicada à Saúde. Aqui, mostraremos que exis-


tem diferentes jeitos de se debruçar e pensar sobre essa vasta ciência.
Quando ela “conversa” com a saúde, surgem uma série de especificidades no que diz
respeito ao cuidado e à promoção da saúde mental.
Há muita coisa para pensarmos, como: quais são os cuidados necessários com os
pacientes? E com os familiares? E com a equipe? Como usar de ética, assertividade e em-
patia nesses ambientes?
E o ser humano, como ele se desenvolve? O que engloba os processos de saúde e
doença? Se me refiro à enfermidade, necessariamente estou falando em dor e sofrimen-
to? Uma vida saudável está isenta de sofrimentos? Se sofremos em relacionamentos, por
que isso não ocorreria na nossa relação com a alimentação?
Para além da dor, como compreender a morte? Como cada um de nós pode lidar com
uma temática que ainda é vista como um tabu?
Neste material, você vai se deparar com essas e outras questões, que suscitarão refle-
xões sobre a beleza da complexidade humana, reunida em emaranhados de conteúdos
psíquicos e socioambientais.
Esperamos que vocês embarquem conosco nesse mundo e permitam ser provocados
por dúvidas sobre aspectos que, até agora, pareciam intocáveis.

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A autora

A Professora Cristina Gonçalves de Abran-


tes é especialista em Orientação Profis-
sional e de Carreira pela USP e graduada
em Psicologia pelo Mackenzie. Atua como
psicóloga clínica, já ministrou aulas de de-
senvolvimento cognitivo e socioemocional
e trabalhou em ambulatório de hospital
público.

Currículo Lattes:
http://buscatextual.cnpq.br/buscatex-
tual/visualizacv.do?id=K8728819J6

“Dedico este trabalho à minha família


e ao Daniel, que sempre me apoiaram
em minhas estradas pessoais e
profissionais; à Julia e nossa equipe
pela incrível parceria desde o início.”

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A autora

A Professora Julia Severi Leme Fonseca é


especialista em Psicologia Clínica pelo CE-
FAS (Campinas) e em Orientação Profis-
sional e de Carreira pela USP. É graduada
em Psicologia pela Unesp de Bauru. Atua
como psicóloga clínica.

Currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/5982760818787158

“Dedico este trabalho aos alunos em


formação; ao meu marido, que sempre
me apoia e estimula no enfrentamento
de novos desafios; à Cristina e nossa
equipe de trabalho pela parceria e
sintonia incomparáveis.”

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TÓPICOS DE ESTUDO
Objetivo do capítulo
Compreender a Psicologia como ciência, A PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE
• Introdução à Psicologia
conhecer seu objeto, seus métodos e
• Fundamentos da Psicologia
sua aplicação na saúde.
• Relação da Psicologia com outras
ciências
• Psicologia da Saúde e Psicologia
hospitalar

PSICOLOGIA CLÍNICA
• Objeto e métodos
• Abordagens psicológicas

AMPLITUDE E APLICAÇÃO DA
PSICOLOGIA NA SAÚDE
• Campo de atuação
• Promoção, prevenção e reabilitação
em saúde
• O cuidado em saúde

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Contextualizando o cenário
A Psicologia surgiu pela primeira vez na Filosofia grega, na tentativa de ser estudar a in-
terioridade humana. A razão, as ideias e o ambiente chamavam atenção dos primeiros
pensadores.
Muitos aspectos avançaram e se transformaram até os tempos de hoje. Áreas de espe-
cialização foram criadas para nos aprofundarmos nessas temáticas.
Os processos de saúde e doença não poderiam ser deixados de fora. Afinal, eles reque-
rem atenção especial em pesquisa e intervenção.
Pensando nisso, pergunta-se: como a Psicologia pode contribuir para a sociedade no
que diz respeito aos processos de saúde e doença?

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1.1 A Psicologia aplicada à saúde
A Psicologia Aplicada à Saúde é uma especialidade da área da Psicologia que busca com-
preender as questões relativas à saúde física e psíquica humana. Tem por objetivo instru-
mentalizar o desenvolvimento e preservação da saúde, tanto na prevenção quanto na cura das
enfermidades, bem como na investigação de causas e diagnósticos das doenças e na melhoria
da qualidade das políticas públicas de saúde do sistema nacional.
Para isso, a visão de ser humano é integral, não havendo dissociação entre a mente e o or-
ganismo. Há nessa área uma integração total dos aspectos psíquicos, físicos e sociais para se
pensar no processo de cura da enfermidade.
Os profissionais dessa área têm a responsabilidade de criar mecanismos que promovam o
bem-estar da saúde da sociedade, prevenindo patologias e as atenuando. Também preparam
o grupo social para que ele esteja disposto a aceitar, respeitar e compreender aquelas doen-
ças que não podem ser evitadas. Desse modo, esta disciplina se interliga à Psicologia social, à
comunitária, à organizacional, à hospitalar, entre outras.

1.1.1 Introdução à Psicologia


A Psicologia é a ciência que estuda a mente e o comportamento humano. Ela busca
compreender as interações das pessoas com o seu ambiente e os seres humanos em seus
processos psíquicos e mentais (percepção, linguagem, inteligência, criatividade, motivações,
memória, emoções, etc.).

Figura 1. Símbolo da Psicologia. Fonte: GRATISPNG. Acesso em: 22/03/2019.

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Essas questões constituem a subjetividade. Esta seria a construção que cada pessoa vai
formando conforme se desenvolve e vivencia experiências socioculturais. Seria, então, a ma-
neira de sentir, pensar, sonhar, amar e fazer de cada um; o que constitui o jeito de ser de cada
indivíduo.
É importante ressaltar que as pessoas não nascem com sua subjetividade formada e com-
pleta, mas que ela é construída e transformada aos poucos a partir de suas vivências. Afinal,
quando se cria e se transforma o mundo externo, constrói-se e transforma a si próprio.
Vale lembrar que a subjetividade se pauta por uma individualidade, ou seja, a unicidade,
os comportamentos únicos em cada pessoa. Já a personalidade se pauta em um repertório
de comportamentos que uma pessoa tem e outras também. Nesse caso, existem semelhanças
de comportamentos médios emitidos por um grupo de indivíduos. Esse conjunto de compor-
tamentos que podem se repetir em várias pessoas.

CURIOSIDADE:
O termo Psicologia vem do grego psyché, que significa alma, e de lógos,, que significa
razão. Portanto, Psicologia significa estudo da alma.. A alma era concebida como a
parte imaterial do ser humano e abarcaria o pensamento, os sentimentos, o desejo,
a sensação e a percepção.

Objetivo básico do psicólogo


Promover a saúde mental do ser humano por meio do respeito à dignidade e integridade,
proporcionando condições satisfatórias de vida na sociedade.
Atribuições do psicólogo
• Analisar e estudar os processos intra e interpessoais, possibilitando a compreensão do
comportamento humano tanto individual quanto em grupo;
• Aplicar conhecimentos teóricos e técnicos da Psicologia, com o objetivo de identificar e in-
tervir em questões determinantes das pessoas e da sociedade, visando à promoção de saúde
mental. Utiliza-se de caminhos relacionais, pessoais, familiares e sociais, vinculando-as tam-
bém a condições políticas, históricas e culturais;
• Analisar como os fatores hereditários, ambientais e psicossociais influenciam os sujeitos
em seu funcionamento intrapsíquico e nas suas relações sociais;
• Prevenir e tratar distúrbios psíquicos, atuando para favorecer um amplo desenvolvimento
psicossocial;
• Elaborar e aplicar técnicas de avaliação psicológica, com práticas metodológicas específi-

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cas, para conhecimento dos processos intrapsíquicos e das relações interpessoais. Deve enca-
minhar a atendimentos apropriados, conforme a necessidade;
• Formular hipóteses e sua comprovação experimental, observando a realidade e efetivan-
do experiências para obter elementos relevantes ao estudo dos processos mentais e compor-
tamentais.
Áreas de atuação do psicólogo
• Clínica - atua na área específica da saúde, colaborando para a compreensão dos proces-
sos intra e interpessoais, utilizando enfoque preventivo ou de tratamento. Realiza pesquisa,
diagnóstico, acompanhamento psicológico e intervenção psicoterápica individual ou em grupo;
• Trabalho - atua onde quer que se deem as relações de trabalho nas organizações sociais
formais ou informais, visando a aplicação do conhecimento da Psicologia para a compreensão,
intervenção e desenvolvimento das relações e dos processos intra e interpessoais;
• Trânsito - atuar com os processos psicossociais, psicológicos e psicofísicos das pessoas in-
seridas em um contexto de trânsito. Investiga participantes, contextos e lugares, construindo
conhecimento que serve para aplicação prática e teórica e avalia características e personalida-
de sob esse contexto;
• Educacional - colabora para a compreensão e para a mudança do comportamento de
educadores e educandos, no processo de ensino-aprendizagem, nas relações interpessoais e
nos processos intrapessoais, referindo-se sempre às dimensões política, econômica, social e
cultural. Também realiza pesquisa, diagnóstico e intervenção psicopedagógica individual ou
em grupo, e participa da elaboração de planos e políticas para promover a qualidade, a valori-
zação e a democratização do ensino;
• Jurídico - atua no âmbito da Justiça, colaborando no planejamento e na execução de po-
líticas de cidadania, direitos humanos e prevenção da violência. Contribui para formulação,
revisões e interpretação das leis;
• Esporte - atua sobre os fatores psicológicos que influenciam o desempenho físico e com-
preende como a participação nessas atividades afeta o desenvolvimento emocional, a saúde e
o bem-estar dos profissionais nesse ambiente;
• Social - analisa o sujeito por uma perspectiva histórica, considerando a permanente inte-
gração entre o indivíduo e o social. Nesse sentido, operar como psicólogo social significa de-
senvolver um trabalho a partir dessa perspectiva de homem e sociedade, possibilitando atuar
em qualquer área da Psicologia;
• Saúde - atua na promoção e manutenção da saúde, bem como na prevenção e tratamento
da patologia, na identificação da etiologia, do diagnóstico, e do aperfeiçoamento do sistema de
política da saúde.

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Ciência x senso comum
Senso comum: o tipo de conhecimento que se acumula no nosso cotidiano é chamado de
senso comum. A sabedoria cotidiana produz certas teorias – como uma professora que sabe
que deve recompensar a boa disciplina de seu pequeno aluno, pois isso tende a aumentar a
frequência de comportamento obediente.
Por esse motivo, pode-se entender que esse tipo de conhecimento é intuitivo e espontâneo.
Ele costuma ser construído por tentativas e erros. O senso comum percorre um caminho que
vai do hábito à tradição, que passa de geração para geração.
Quando ouvimos expressões como “cara paranoico”, “moça louca”, ou “criança hiperativa”,
isso expressa a comunicação do senso comum acerca do comportamento humano. Isso não
querer dizer que corresponda à forma científica de se construir o conhecimento. Esses termos
podem até ser da Psicologia científica, mas são usados sem a preocupação de definir as palavras.
Ciência: mas, afinal, o que é essa tal de ciência? Ela é um conjunto de conhecimentos sobre
partes da realidade e fatos que são, necessariamente, obtidos por meio de metodologia científica.
Para se produzir Psicologia como ciência, requer utilizar de forma sistematizada o conheci-
mento metodológico, de forma que seja experimentado, testado e comprovado por meio de
uma linguagem precisa e rigorosa. Portanto, o conhecimento não deve estar embasado em
achismos ou observações superficiais. A ciência permite que o saber seja transmitido, verifica-
do, utilizado e desenvolvido.
Dessa forma, a Psicologia deve contribuir para a produção do conhecimento científico atra-
vés de observação, descrição e análise dos processos comportamentais.
Com métodos e técnicas específicas, utiliza entrevistas estruturadas, avaliações psicoló-
gicas, técnicas de terapia, dentre outras, obtidas de maneiras programadas, sistemáticas e
controladas, para que se permita a verificação da validade da ciência e a reprodução da expe-
riência. Como um saber científico, sabe-se que um novo conhecimento é produzido a partir de
outro anteriormente desenvolvido. Negam-se, reafirmam-se e descobrem-se novos aspectos.
Umas das particularidades da Psicologia é que a concepção de ser humano que o profissional
traz consigo mesmo “contamina” inevitavelmente a sua pesquisa em Psicologia. Isso quer dizer
que, em certa medida, há uma mistura entre o cientista e objeto a ser pesquisado.
Visões de homem
Defende-se que o mais adequado para essa ciência é o termo “psicologias”. Isso acontece
pelo fato de estudarmos esses fenômenos das mais diversas formas. Conforme a definição de
ser humano adotada, teremos uma concepção de objeto da Psicologia que combine com ela.
Veja, na Tabela 1, algumas dessas visões pelas quais as psicologias compreendem o ser hu-
mano:

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Tabela 1. Diferentes visões de indivíduo

Abstrato, com características definidas e que não


VISÃO DETERMINISTA mudam, a despeito das condições sociais a que
esteja submetido.

VISÃO ROUSSEAUNIANA Puro e que foi corrompido pela sociedade.

Datado, determinado pelas condições históricas e


VISÃO SOCIO-HISTÓRICA
sociais que o cercam.

VISÃO ANALÍTICO-COMPORTAMENTAL Influencia e é influenciado pelo seu meio.

Psicologia e Psiquiatria
Psiquiatria: a Psiquiatria é uma especialidade médica que se destina ao estudo e ao trata-
mento de patologias mentais. O profissional psiquiatra cursou a faculdade de Medicina e se
especializou em Psiquiatria. Dentre suas funções, estão previstas o diagnóstico, o tratamento
medicamentoso (de forma exclusiva), a prevenção e a reabilitação das mais variadas doenças
mentais. Exemplos desse tipo de quadro são: a depressão, a esquizofrenia e a bipolaridade.
O modelo biomédico, no qual os psiquiatras se baseiam, detém uma visão cartesiana do
mundo. A visão cartesiana consiste na ideia de que o mundo podia ser comparado a uma
máquina, e que o conhecimento do universo passaria assim pelo conhecimento detalhado do
funcionamento de tal máquina. Por essa perspectiva, o que importa são os fenômenos obser-
váveis – ou seja, o corpo –, ficando, assim, o homem centrado em seus aspectos biológicos e
processos biológicos e físico-químicos.
Sob essa perspectiva, a doença seria um defeito mecânico localizado em uma máquina físi-
ca e bioquímica. Esse defeito pode ser reparado por meios físicos (como é o caso da cirurgia)
ou químicos (com o uso de medicações, por exemplo). Logo, a parte doente pode ser tratada
isoladamente de todo o resto do corpo.
Psicologia: o psicólogo cursou a faculdade de Psicologia, que não adota o modelo biomé-
dico para a compreensão do ser humano, e sim por seu aspecto biopsicossocial. Todas as
pessoas sofrem influências biológicas, psicológicas e sociais, de forma que todos se interligam,
mas não se sobrepõem uns aos outros.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 21


Fatores Psicológicos

Fatores Sociais

Fatores Biológicos

Figura 2. Influências que o indivíduo sofre.

O ser humano é determinado por aspectos orgânicos, como genéticos e fisiológicos, por
sua própria percepção e por experiências próprias (ações, pensamentos e sentimentos) conso-
lidadas no mundo (interação com grupos familiares, institucionais sociais e culturais).

CURIOSIDADE:
Muitas áreas são importantes para a análise do comportamento humano. Por
exemplo: afetiva, biológica (doenças), familiar, conjugal, sexual, ambiente cultural,
interpessoal, amizades, trabalho, lazer, social, questões morais, escolar, religiosa,
regras sociais e hábitos.

Na Tabela 2, existem algumas diferenciações de quando se deve procurar um psiquiatra ou


um psicólogo, a depender da forma como os sintomas aparecem (físicos ou emocionais). Em
muitos casos, os sintomas surgem de forma mesclada. Por isso, é muito importante o acompa-
nhamento com ambos os profissionais.

Tabela 2. Psiquiatria e Psicologia


PSIQUIATRIA E PSICOLOGIA

QUANDO BUSCAR O PSICÓLOGO QUANDO BUSCAR O PSIQUIATRA


(SINTOMAS EMOCIONAIS): (SINTOMAS FÍSICOS):
• Perdas (sejam elas de um relacionamento, um ente • Taquicardia, sudorese, preocupação excessiva (relacio-
querido ou emprego); nados à ansiedade);
• Traumas recentes ou do passado (assalto, sequestro, • Perturbações no sono;
acidente, desastres naturais, violência); • Choro recorrente, baixa autoestima, fadiga, desmotiva-
• Sensação de paralisia para tomada de decisões (mu- ção (relacionados à depressão);
dança de emprego, término de relacionamento, escolha • Sentimento de vazio, pensamentos suicidas (diminui-
profissional); ção ou aumento de apetite);
• Conflitos (familiares, relacionados à orientação sexual); • Alucinações (visuais, auditivas ou olfativas);
• Dificuldades nos relacionamentos interpessoais (timi- • Delírios ou oscilação emocional.
dez, baixa autoestima).

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 22


1.1.2 Fundamentos da Psicologia
Foi entre os filósofos gregos que surgiram as primeiras tentativas de sistematizar uma Psi-
cologia. Eles já haviam formulado duas “teorias”:
a) Platônica: postulava a imortalidade da alma e a concebia separada do corpo;
b) Aristotélica: afirmava a mortalidade da alma e seu pertencimento ao corpo.

Platão Aristóteles

Figura 3. Platão e Aristóteles, respectivamente. Fonte: MÚSICA E SOCIEDADE. Acesso em: 22/03/2019.

Império Romano
A Psicologia no Império Romano e na Idade Média estava atrelada ao conhecimento religio-
so, já que a Igreja Católica monopolizava o saber, inclusive o estudo do psiquismo.
Nesse período, também havia duas teorias:
a) Santo Agostinho: inspirou-se em Platão, pois também fazia uma cisão entre alma e cor-
po, e a alma também era imortal por ser o elemento que liga o ser humano a Deus. A diferença
é que a alma não era somente a sede da razão, mas a prova de uma manifestação divina no
homem;
b) São Tomás de Aquino: inspirou-se em
Aristóteles e na distinção entre essência e
existência. Entendia que a essência humana
busca a perfeição por meio de sua existên-
cia. A diferença se pautava no entendimento
de que somente Deus seria capaz de reunir a
essência e a existência. Portanto, a busca de
perfeição pelo ser humano seria a busca de
Figura 4. Santo Agostinho e São Tomás de Aquino, respectivamen-
Deus. te. Fonte: FILOVIDA. Acesso em: 22/03/2019.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 23


Renascimento
A principal teoria dessa época era de
René Descartes, que postula a separação
entre mente (alma, espírito) e corpo. Afirma-
va que o ser humano possuía uma substân-
cia material e uma substância pensante, e
que o corpo, desprovido do espírito, é ape-
Figura 5. Filósofo René Descartes. Fonte: Domínio público. Acesso
nas uma máquina. em: 22/03/2019.

Psicologia científica
O primeiro laboratório psicológico foi fundado pelo fisiólogo alemão Wilhelm Wundt em
1879. Portanto, a Psicologia é considerada uma ciência jovem, se comparada a outras áreas. Ele
publicou o livro Princípios da Psicologia Fisiológica, na Alemanha.

Figura 6. Primeiro laboratório de Psicologia do mundo. Fonte: EX-ISTO. Acesso em: 22/03/2019.

Seu status de ciência foi obtido na medida em que se liberta da Filosofia, definindo seus
objetos de estudo, que são o comportamento, a vida psíquica, a consciência. Com isso, passa
a ser necessário formular métodos de estudo para esses objetos e teorias enquanto corpo
consistente de conhecimentos na área.
Essas teorias devem obedecer aos critérios básicos da metodologia científica, isto é, deve-se
buscar a neutralidade, os dados devem ser passíveis de comprovação e o conhecimento deve
ser cumulativo, servindo como ponto de partida para outros experimentos e pesquisas na área.
No entanto, foi nos Estados Unidos que ela encontrou campo para um rápido crescimento,
resultado do grande avanço econômico do país. É ali que surgem as primeiras abordagens ou
escolas em Psicologia, as quais deram origem às inúmeras teorias que existem atualmente.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 24


São elas:
a) Estruturalismo: essa escola foi inaugurada por Wundt, mas foi Titchner que a nomeou
dessa forma. Preocuparam-se com a consciência e a estudaram por seus aspectos estruturais,
como estruturas do sistema nervoso central. Os conhecimentos psicológicos produzidos são
eminentemente experimentais, isto é, produzidos a partir do laboratório;
b) Funcionalismo: W. James buscou responder “o que fazem os homens” e “por que o fazem”.
Para isso, também elege a consciência como o centro de suas preocupações e busca a com-
preensão de seu funcionamento, na medida em que ser humano a usa para se adaptar ao meio;
c) Associacionismo: Thorndike formulou a primeira teoria de aprendizagem na Psicologia. Enten-
de que a aprendizagem se dá por um processo de associação das ideias que vão das mais simples às
mais complexas. Também formulou a Lei do Efeito, que prevê que todo comportamento de um or-
ganismo vivo tende a se repetir, se nós o recompensarmos assim que emitir o comportamento. Por
outro lado, o comportamento tenderá a não acontecer, se o organismo for castigado após sua ocor-
rência. Ainda por essa perspectiva, o organismo irá associar tais situações com outras semelhantes.

1.1.3 Relação da Psicologia com outras ciências


A Psicologia estuda o ser humano, ainda que para compreendê-lo em seu comportamento
seja necessário estudar outras espécies.
As interações que ocorrem dentro do organismo são estudadas pela Biologia. Já as que
ocorrem entre grupos de indivíduos são estudados pelas Ciências Sociais. Ora, se a Psicologia
entende o ser humano como um ser biopsicossocial, a Biologia e as Ciências Sociais auxiliam
diretamente estudos na área da Psicologia. Por esse motivo, surgiram áreas denominadas de
Psicofisiologia, Neurociência do Comportamento, Psicologia Social, dentre outras.
Vale lembrar que, dificilmente, o psicólogo trabalha sozinho. Seja qual for sua área de atua-
ção, o trabalho com outros profissionais costuma ser necessário, pois ao lidar com pessoas,
precisará recorrer a outros conhecimentos que constituem a complexidade humana.
Exemplos disso são:
• O psicólogo clínico tende a fazer parcerias com psiquiatras para que haja tratamento mú-
tuo com o paciente;
• O psicólogo da saúde trabalha com outros profissionais da área, gerando o cuidado total
ao usuário do serviço;
• Psicólogos e assistentes sociais tendem a trabalhar em conjunto em núcleos especializa-
dos ao suporte psicossocial para a sociedade;
• O psicólogo escolar trabalha com professores e pais para o bom andamento da instituição.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 25


1.1.4 Psicologia da Saúde e Psicologia hospitalar
A Organização Mundial de Saúde (OMS) não entende saúde como mera ausência de enfer-
midade, mas sim “um estado de completo bem-estar físico, mental e social”.

PAUSA PARA REFLETIR


Tendo em vista o conceito de saúde da OMS, quem está efetivamente saudável? Você se consi-
deraria saudável agora?

Nesse sentido, a Psicologia da Saúde tem como objetivo compreender como os fatores
biológicos, comportamentais e sociais influenciam a saúde e a doença.
Ela é um campo de especialização da Psicologia que aplica seus princípios, técnicas e ciência
para avaliar, diagnosticar, tratar, modificar e prevenir patologias físicas, mentais ou qualquer
outro ponto relevante para os processos de saúde e doença.

ESCLARECIMENTO:
Ambientes nos quais se aplica Psicologia da Saúde: hospitais, centros de saúde co-
munitários, organizações não governamentais e nas próprias casas dos indivíduos.
Conhecimentos utilizados: pauta-se nas ciências biomédicas, Psicologia Clínica e
Psicologia Social Comunitária.

A saúde é classificada nos setores primário, secundário e terciário. Pelo Sistema Único de
Saúde (SUS), o paciente se dirige nesta ordem de atendimento:
a) Nível primário: neste nível de atenção, há o atendimento inicial ou de casos mais sim-
ples. Nesse momento, não se dispõe de tratamentos mais complexos e são marcados exames
e consultas, além da realização de procedimentos básicos como troca de curativos. É também
neste nível em que são organizadas as ações para a promoção da saúde pública em espaços
comunitários. O atendimento na atenção primária pode encaminhar para um médico especia-
lista da atenção secundária, por exemplo. São nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) onde se
configura a porta de entrada do sistema único de saúde;
b) Nível secundário: aqui, são realizados procedimentos de intervenção, atendimento
emergencial, bem como tratamentos de casos crônicos e agudos de doenças. Nesse setor,
estão os primeiros especialistas, como oftalmologista, cardiologista, etc. Portanto, são encon-

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 26


trados também equipamentos para exames mais avançados. Aqui estão as clínicas e Unidades
de Pronto Atendimento (UPA), os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), ambulatórios e hos-
pitais-escolas;
c) Nível terciário: aqui, são realizadas manobras mais invasivas e de maior risco à vida.
Também são realizadas cirurgias, condutas de manutenção dos sinais vitais, como suporte
básico à vida. São os hospitais de grande e maior complexidade porte, tanto os mantidos pelo
Estado quanto os mantidos pela rede privada.

SERVIÇOS HOSPITALARES DE MAIOR COMPLEXIDADE


Hospitais terciários e quaternários de caráter regional, estadual, ou nacional.

ATENÇÃO
SERVIÇOS HOSPITALARES DE MAIOR COMPLEXIDADE
TERCIÁRIA

SERVIÇOS AMBULATORIAIS
Serviços ambulatórios com especialidades clínica e cirúrgicas.
ATENÇÃO
Serviços de apoio diagnóstico e terapêutico.
SECUNDÁRIA
Serviços de atendimento de urgência e emergência.
HOSPITAIS GERAIS

UNIDADES DE SAÚDE
ATENÇÃO PRIMÁRIA Atenção primária à grupos populacionais situados em
uma área de abrangência delimitada.

PORTA DE ENTRADA do sistema para níveis superior


de maior complexidade.

Figura 7. Pirâmide de atenção primária, secundária e terciária.

O psicólogo da saúde pode atuar em qualquer setor. Já a Psicologia Hospitalar tem sua
função centrada nos âmbitos secundário e terciário de atenção à saúde, realizando atividades
como atendimento psicoterapêutico, grupos psicoterapêuticos, enfermarias em geral, grupos
de psicoprofilaxia, atendimentos em ambulatório e unidade de terapia intensiva, pronto aten-
dimento, avaliação diagnóstica, psicodiagnóstico, consultoria e interconsultoria.
Rodriguez-Marín (2003) sintetiza as tarefas básicas do psicólogo que trabalha em hospital:
1) Coordenação: relativa às atividades com os funcionários do hospital;
2) Auxílio à adaptação: intervenção na qualidade do processo de adaptação e recuperação
do paciente internado;
3) Interconsulta: atuação como consultor, ajudando outros profissionais a lidarem com o
paciente;
4) Enlace: intervenção, através do delineamento e execução de programas junto com outros
profissionais, para modificar ou instalar comportamentos adequados dos pacientes;
5) Assistencial: atuação direta com o paciente.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 27


1.2 Psicologia Clínica
A Psicologia Clínica, enquanto uma das grandes subáreas de atuação do psicólogo, muitas
vezes é erroneamente compreendida e associada exclusivamente ao espaço da clínica particu-
lar. Entretanto, com desenvolvimento da psicologia enquanto ciência, a atuação da Psicologia
Clínica, com seu objeto e métodos específicos, pôde se expandir para diferentes contextos.
Conforme o próprio Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP/SP) aponta, o psi-
cólogo especialista em Psicologia Clínica atua na área da saúde, em diferentes contextos e por
meio de intervenções que visam a redução do sofrimento humano, as quais podem ocorrer
em nível individual, grupal, social ou institucional, executando-as de maneira autônoma ou
inserindo-as em equipes multidisciplinares.

1.2.1 Objeto e métodos


A Psicologia é uma ciência ampla que contempla várias subáreas de estudos e atuações,
tendo como objeto de estudo o ser humano. Cada área e abordagem psicológica apresenta
características e enfoques diferentes a respeito desse objeto – por exemplo, teorias compor-
tamentais centralizam as pesquisas e atuações em comportamentos passíveis de observação
e nos processos de aprendizagem; já as teorias que focam os processos mentais investigam o
inconsciente e consideram a introspecção.
O método clínico se caracteriza como uma das práticas mais antigas dentro do campo de
atuação da Psicologia. Na década de 30, ainda muito influenciada pelo modelo médico, a prá-
tica clínica focava na investigação e compreensão dos transtornos mentais, bem como no tra-
tamento da doença, preocupando-se com o ajustamento do indivíduo. Sendo assim, é comum
a associação do método clínico à apenas a prática de psicoterapia, inclusive restringindo tam-
bém o local onde é exercida (consultório particular).
Entretanto, na atualidade, considerando a complexidade do ser humano e de sua subjetivi-
dade, somados aos avanços das pesquisas científicas, da construção e validação de diferentes
metodologias, a concepção de Psicologia Clínica se expandiu, visando a promoção do bem-es-
tar individual e social a partir da atuação no diagnóstico e prognóstico das questões de saúde
mental, como também nas ações preventivas.
Muito mais do que um local de trabalho, a Psicologia Clínica se caracteriza como o olhar do
profissional sobre o fenômeno humano, ou seja, tendo como ênfase o vínculo paciente-psi-
cólogo, configura-se como uma atuação de investigação e ação reflexivas sobre o ser humano,
em sofrimento ou em desenvolvimento, sua subjetividade e suas relações com o meio social.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 28


A Psicologia Clínica utiliza diferentes instrumentos, tais como: entrevistas, testes e avalia-
ções psicológicas, orientações e processo educativos, atendimentos terapêuticos (na modali-
dade individual ou grupal) e pesquisas, que se diferenciam de acordo com a abordagem psico-
lógica utilizada.
É importante ressaltar que esses instrumentos não são específicos do método clínico, po-
dendo ser utilizados sob a perspectiva de outras metodologias e contextos de atuação, por
exemplo: ambientes escolares, sendo desenvolvido o acompanhamento psicopedagógico e
testes de inteligência; há o tão conhecido teste psicotécnico para habilitação da carteira de
motorista; e atuações em espaços organizacionais por meio de pesquisas de clima, avaliações
de desempenho, entrevistas para seleção de pessoal.

1.2.2 Abordagens psicológicas


Existem diferentes abordagens psicológicas para a prática clínica, cada qual com uma
compreensão de indivíduo e métodos específicos. O profissional psicólogo atua de acordo
com a teoria com a qual mais se identificada, usando-a como base para estudos e condu-
ção de sua prática.
Foram quatro as principais perspectivas que contribuíram para a construção da ciência psi-
cológica: behaviorista, cognitiva, humanista e psicanalítica.

CURIOSIDADE:
A Psicologia enquanto ciência ainda se mantém em construção. Assim, novas abor-
dagens têm sido elaboradas e utilizadas na prática clínica, tais como: Psicologia Ana-
lítica Junguiana, Psicoterapia Corporal (Reich), Gestalt-terapia, Psicologia Positiva,
entre outras.

Visão behaviorista
O fundador do behaviorismo foi John Watson. Segundo ele, para transformar a Psicologia
em uma ciência “respeitável”, era necessário que os psicólogos usassem métodos objetivos
(experimentação e observação) e estudassem comportamentos observáveis.
Os princípios behavioristas se baseiam nos estudos dos eventos ambientais (chamados
de estímulos) e os comportamentos observáveis (denominados de respostas). Um tópico
central de investigação é a aprendizagem pela experiência a, qual tem influência sobre o
comportamento.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 29


Esta linha teórica orienta os psicólogos a atuarem com objetivos científicos, tais como a des-
crição, a explicação, a predição e o controle – além de desempenharem ações práticas como o
aconselhamento de familiares, de educandos e homens de negócios.
A visão behaviorista acredita que os comportamentos de animais não humanos deve ser
objeto de investigação em paralelo com o comportamento humano, uma vez que os organis-
mos simples são mais fáceis de serem estudados do que os complexos.
O movimento behaviorismo dominou a Psicologia entre as décadas de 1930 e 1960, estando
hoje ainda presente, mas com uma perspectiva mais flexível. Mantém seu foco em estímulos,
respostas e processos de aprendizagem, mas também buscam estudar e compreender cada
vez mais fenômenos complexos que não podem ser observados diretamente – como o amor,
o estresse, a empatia e a sexualidade.

Figura 8. John Watson. Fonte: Domínio público. Acesso em: 22/03/2019.

Visão cognitiva
Um grande número de psicólogos, na década de 70, contestaram o modelo estímulo-respos-
ta do behaviorismo, enfatizando ser necessário que os psicólogos buscassem compreender os
processos mentais. As ideias behavioristas não foram rejeitadas completamente, uma vez que
nas sessões terapêuticas foi incorporado o princípio de fazer perguntas precisas e conduzir
pesquisas e métodos objetivos, mas abriu espaço para a auto-observação e a introspecção.
Segundo essa teoria, é a mente que caracteriza o comportamento especificamente huma-
no. Sendo assim, o objeto de estudo passa a ser o funcionamento da mente, buscando com-
preender a estrutura, as funções e os processos mentais. Além disso, foca-se em estudos e
pesquisas sobre o conhecimento (processos cognitivos) e atuação prática.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 30


Visão humanista
Uma grande parte dos psicólogos humanistas se identificam com a filosofia europeia deno-
minada Fenomenologia, na qual tem-se a compreensão de que as pessoas veem o mundo a
partir de sua perspectiva única e própria.
Por essa abordagem, o ponto central de toda atividade humana é a interpretação subjetiva,
e esta não deve ser ignorada. Ou seja, para se obter um conhecimento válido sobre qualquer
experiência ou processo humano, é preciso focalizá-lo a partir de diferentes quadros de refe-
rência e das diversas formas que cada indivíduo vivencia.
De modo geral, os psicólogos humanistas enfatizam que separar o indivíduo em funções
– como percepção e aprendizagem – não oferece informações substanciais. Logo, é impor-
tante estudar o ser humano como um todo, sendo objeto de investigação problemas tais
como: responsabilidade, objetivos de vida, compromisso, satisfação, criatividade, solidão
e espontaneidade.
Os psicólogos humanistas compreendem que as pessoas são basicamente boas, sendo
que o psicólogo deve auxiliar o ser humano a compreender a si próprio e a se desenvolver
ao máximo.
Visão psicanalítica
Sigmund Freud é comumente conhecido como o pai da Psicanálise por ter sido o criador
desta teoria. Freud era médico e se especializou no tratamento de problemas do sistema ner-
voso, mas observou que sua prática médica – focada nos sintomas físicos do paciente – eram
pouco eficientes no tratamento de transtornos mentais.

Figura 9. Sigmund Freud. Fonte: UNIVERSO RACIONALISTA. Acesso em: 22/03/2019.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 31


Gradativamente, Freud desenvolveu um novo método de atuação, a associação livre: o
paciente, relaxado e deitado em um divã, é estimulado a dizer qualquer coisa que lhe passar
pela mente, abrindo espaço também para relatos de sonhos. Todo esse material era analisado,
sendo identificados aspectos além da consciência do paciente – por exemplo, desejos, medos,
conflitos, memórias e impulsos.
Dessa forma, a teoria psicanalítica enfatiza o estudo do inconsciente, da personalidade, do
comportamento anormal e do desenvolvimento infantil, áreas anteriormente negligenciadas
nas pesquisas psicológicas.
As concepções, portanto, da perspectiva psicanalítica, baseiam-se no aspecto essencial do
inconsciente e que este deve ser trazido para a consciência, como forma de tratamento dos
distúrbios mentais.

ESCLARECIMENTO:
O psicólogo de abordagem psicanalítica é o profissional que cursou a graduação
de Psicologia, especializou-se e atua segundo os conceitos da Psicanálise. Os psi-
canalistas são profissionais de diferentes áreas de atuação que passam por uma
formação específica em instituição reconhecida na área.

Tabela 3. Comparação entre as principais abordagens teóricas

BEHAVIORISTA COGNITIVA HUMANISTA PSICANALÍTICA

Perguntas sobre a
Personalidade
pessoa como um todo,
Qualquer pergunta normal e anormal
experiência subjetiva,
bem definida sobre O funcionamento da (leis, determinantes,
OBJETO problemas significativos;
o funcionamento de mente. aspectos inconscientes);
o extraordinário e
qualquer animal. tratamento de
individual como também
anormalidade.
o usual e universal.

Em primeiro lugar, ajuda


OBJETIVOS PRINCIPAIS Conhecimento, aplicação. Conhecimento, aplicação. e enriquecimento; em Ajuda e conhecimento.
segundo, conhecimento

Respeitado o
conhecimento intuitivo
do observador; aceitáveis Paciente: introspecção
METÓDOS DE PESQUISA Métodos objetivos e
Métodos objetivos. todos os procedimentos, informal; analista:
ENFATIZADOS introspectivos.
mesmos osnão observação e análise.
científicos, como o de
análise literária.

Pessoas (geralmente
POPULAÇÃO ESTUDADA Todos os animais. Principalmente pessoas. Pessoas.
adultos em terapia).

Fonte: DAVIDOFF, 2001. (Adaptado).

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 32


1.3 Amplitude e aplicação da Psicologia da saúde
Os conteúdos expostos até o momento evidenciaram o quanto a psicologia é uma ciên-
cia complexa e com possibilidades de atuação em diversos contextos e, dentre eles, está o
campo da saúde.
A Psicologia da saúde com base no modelo biopsicossocial, aborda vastos conhecimen-
tos das Ciências Biomédicas, da Psicologia clínica e da Psicologia Social Comunitária, tendo
como fundamentos de atuação a promoção e educação para a saúde.
Sendo assim, a aplicação da Psicologia da saúde envolve tanto contribuições e desenvol-
vimento científico, quanto ações educativas e profissionais, propondo um trabalho amplo,
atendendo as necessidades do ser humano de modo integral, em diferentes níveis de atua-
ções: primário, secundário e terciário.

1.3.1 Campo de atuação


O profissional psicólogo da área da saúde pode exercer atividades atuando como professor
e pesquisador científico e/ou clínico.
No campo de trabalho como professor, são responsáveis pelo processo de ensino e apren-
dizagem de estudantes de diversas áreas relacionadas à saúde, como a Fisioterapia, Nutrição,
Enfermagem e Medicina.
Como pesquisadores, investigam os processos psicológicos e questões relacionadas ao
bem-estar do ser humano pela perspectiva biopsicossocial. A maioria das pesquisas focavam
a identificação e classificação de doenças e comportamentos que comprometessem a saúde,
bem como a avaliação da efetividade de determinadas intervenções. Entretanto, com o desen-
volvimento da perspectiva biopsicossocial e da Psicologia positiva, tem-se dado maior atenção
ao funcionamento humano saudável, com temas de pesquisas diversos, por exemplo, a felici-
dade e a as características das pessoas que vivem até uma idade avançada.
É importante ressaltar que existem diver-
sas formas de se executar uma pesquisa, a
qual apresenta especificidades de acordo
com o problema a ser pesquisado, a metodo-
logia utilizada e os objetivos de cada pesqui-
sa. Confira a Tabela 4 com a comparação dos
principais métodos de pesquisa em Psicologia
da saúde.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 33


Tabela 4. Comparando métodos de pesquisa

MÉTODOS DE CENÁRIO DE MÉTODO DE


VANTAGENS DESVANTAGENS
PESQUISA PESQUISA COLETA DE DADOS

Informações Não há controle direto sobre as


Estudos de aprofundadas variáveis; sujeito a tendências
caso, inquéritos sobre uma pessoa; do observador; casos únicos
Estudo Campo ou
e entrevistas, frequentemente leva a podem ser enganosos; não
descritivo. laboratório.
observações novas hipóteses; detecta determina causalidade;
naturalísticas. relações de ocorrência correlação pode mascarar
natural entre variáveis. variáveis estranhas.

Alto grau de controle


sobre variáveis
Comparação A artificialidade do laboratório
dependentes e
estatística limita a generalização dos
Estudos Normalmente independentes;
de grupos resultados; certas variáveis não
experimentais. laboratório. atribuição aleatória
experimentais e podem ser investigadas por
elimina diferenças
controles. razão práticas e éticas.
preexistentes entre
grupos.

Comparações
Úteis para determinar Certas variáveis devem ser
Normalmente estatísticas entre
Estudos a etiologia da doença; controladas por seleção em
conduzidos no grupos expostos a
epidemiológicos. fácil replicação, boa vez de manipulação direta;
campo. diferentes fatores
generalização. demorado, caro.
e risco.
Combinação
Não são Ajuda a compreender Tendências potenciais
estatística dos
Metanálise. coletados relatos conflitantes, decorrentes da seleção dos
resultados de
dados novos. replicáveis. estudos incluídos.
vários estudos.

Fonte: STRAUB, 2003. (Adaptado).

Na posição de professores e pesquisadores, há o trabalho de ensino e pesquisa em diferen-


tes universidades e faculdades.
A Psicologia da saúde não é uma especialidade existente no Brasil, como nos países estran-
geiros. Aqui, entende-se que os psicólogos que trabalham com questões relacionadas à saúde
e doença são os chamados psicólogos clínicos e hospitalares.
De forma geral, os psicólogos da saúde com o olhar clínico têm como foco de atuação a
promoção de saúde, uma vez que as intervenções não se limitam àquelas pessoas que já estão
doentes ou em sofrimento, mas entende-se que é possível que os indivíduos saudáveis pos-
sam aprender comportamentos preventivos. Para isso, o profissional tem como metodologia
de intervenção as diversas técnicas terapêuticas, educacionais e de avaliação diagnóstica que
o campo da Psicologia da saúde proporciona.
Esses profissionais são comumente encontrados em hospitais, equipes multidisciplinares,
organizações de saúde, clínicas de reabilitação, consultórios diversos e programas de insti-
tuições governamentais, por exemplo, os Programa de Saúde da Família (PSF) do Ministério
da Saúde.
Além desses, o psicólogo da saúde também tem atuado no mundo corporativo, orientando
colaboradores e intervindo no local de trabalho, abordando diversas questões de saúde, tendo
como exemplo, ações preventivas e adaptativas de lidar com o estresse, atenção aos acidentes
de trabalho, campanhas de exames preventivos, entre outros.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 34


1.3.2 Promoção, prevenção e reabilitação em saúde
O campo de atuação dos psicólogos da saúde é vasto e está em constante transfor-
mação e crescimento por influências da perspectiva biopsicossocial e também da teoria
sistêmica, a qual compreende a natureza como um sistema complexo, composto por uma
hierarquia de sistemas, sendo cada qual composto simultaneamente por subsistemas me-
nores e sistemas maiores, estando todos inter-relacionados.

Cultura

Sistema endócino

Sociedade Vizinhos

Células Genes

Sistema cardiovascular
Sistema nervoso

Fibras nervosas Músculos

Sistema imune
Comunidade Família

Figura 10. Teoria sistêmica e de saúde. Fonte: STRAUB, 2003. (Adaptado).

Compreendendo o ser humano de forma integral, como um ser único que influencia e é
influenciado por diversos contextos e subsistemas, a Psicologia da saúde apresenta basi-
camente três principais atuações: a promoção, a prevenção e a reabilitação.
Promoção
A promoção de saúde engloba ações que possibilitam melhorar a saúde das pessoas. É
um processo que inclui não somente ações direcionadas ao desenvolvimento de habilida-
des e potencialidades do indivíduo, mas também ações amplas que visam a modificações
das condições econômicas, sociais e ambientais de forma a minimizar o impacto desses
fatores na saúde individual e pública.
Ou seja, não tem como foco apenas o tratamento de doenças específicas, mas se preocupa
em também desenvolver ações transversais, articuladas com demais estratégias e políticas do
Sistema Único de Saúde (SUS), buscando impulsionar e gerar saúde e bem-estar.
Associa-se à prática de promoção de saúde, valores tais como: vida, saúde (física e mental),
solidariedade, equidade, democracia, cidadania, desenvolvimento, participação e parceria.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 35


DICA:
Para saber mais, acesse a Política Nacional de Promoção à Saúde, pela portaria
de número 687, aprovada em 30 de março de 2006, validando o compromisso
de ampliação das ações de promoção nos serviços e na gestão do Sistema Único
de Saúde.

Prevenção
Segundo o Sistema Único de Saúde (SUS) (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2010), existe a concepção
de três níveis de prevenção: a primária, a secundária e a terciária. Esses três níveis organizam,
principalmente, as formas de acesso ao serviço.
Independentemente da classificação do SUS, há uma compreensão diferente desses ní-
veis, tendo como parâmetro o momento de atuação (antes, durante ou depois da doença ter
surgido). Ambos, pesquisadores e profissionais, desempenham ações e processos educativos
orientados para evitar o surgimento de doenças específicas, reduzindo sua incidência e preva-
lência na população.
• Primária: esforços para detectar e enfraquecer os fatores de risco de enfermidades, pre-
venindo a ocorrência de doenças e lesões. O exemplo de não fumar corresponde a uma ação
de prevenção ao tabagismo que é fator de risco ao câncer de pulmão, entre outras doenças.
Já o exemplo de usar cinto de segurança é entendido como fator de proteção e prevenção de
lesões em casos de acidente;
• Secundária: busca identificar e tratar a doença logo no início de seu aparecimento. No
caso de uma pessoa diagnosticada com diabetes, será feito o acompanhamento diário de sua
glicemia, bem como serão realizadas orientações para uma boa nutrição;
• Terciária: atuações com foco em conter ou retardar danos de uma doença já em estado
avançado. Em muitos casos, essa atenção também busca reabilitar o paciente. Um exemplo de
ação nesse nível são as radioterapias e quimioterapias como forma de tratamento de tumores.
Reabilitação
Esse processo trabalha com a restauração de movimentos e funções comprometidas, seja
em decorrência de uma doença ou de um acidente, com o objetivo de a pessoa recuperar seu
bem-estar biopsicossocial, ou seja, reabilitar e manter sua funcionalidade ideal em diversos
âmbitos (físico, sensorial, intelectual, psicológico e social), na relação sujeito-ambiente, favore-
cendo o alcance de sua independência.
A reabilitação contempla diferentes ações: diagnóstico, intervenção precoce, diversidade de
modalidades de atendimento e avaliação. Essa diversidade no atendimento é a característica

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 36


principal da reabilitação, sendo então uma proposta de atuação multiprofissional e interdisci-
plinar. Entre as áreas comumente presentes no processo de reabilitação estão: a Psicologia, a
terapia ocupacional, o serviço social, a Fisioterapia e a Medicina.

Diagrama 1. O processo de reabilitação

Identificar problemas
e necessidades

Avaliar efeitos

Relacionar os problemas aos


fatores modificáveis e limitantes

Planejar, implementar e
coordenar intervenções
Definir problemas e mediadores
alvo; selecionar as medidas adequadas

1.3.2 O cuidado em saúde


O cuidado tem emergido como ponto central nas práticas de qualquer profissional da saú-
de, sendo essencial a compreensão dos elementos que constituem este fazer tão importante.
Cuidar é mais do que um simples ato; cuidar é uma atitude, a qual integra diversas ações,
tais como: dar atenção, zelo, preocupar-se com o outro, dedicação, vínculo e afeição.
Logo, o cuidado não se restringe ao corpo biológico e aos atos de intervenção. A atitude de
cuidar incorpora os elementos subjetivos da interação profissional-paciente, requisitando do
profissional alguns atributos necessários, como a ética nas relações humanas, a solidariedade
e a confiança.
O cuidado em saúde traz consigo a concepção de humanização do atendimento, a qual não
se constitui como uma abordagem teórica, mas diz respeito a uma diretriz de trabalho.
É um modelo de atuação que valoriza o cuidado do ponto de vista técnico em conjunto com o
reconhecimento dos direitos dos usuários – há um sujeito por detrás daquela dor ou doença –, consi-
derando a subjetividade e os referenciais culturais de cada profissional e de sua equipe de trabalho.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 37


Portanto, o cuidado integral e as práticas de humanização buscam valorizar os aspectos
subjetivos, históricos e culturais da relação profissional-paciente e de cada um em sua singula-
ridade, objetivando a melhora nas condições de trabalho e a qualidade de atendimento.

PAUSA PARA REFLETIR


É bem provável que você já tenha uma ideia de como gostaria que fosse atendido em um ser-
viço de saúde, certo? Mas você já chegou a pensar de que forma é possível se preparar e se
capacitar para oferecer essa mesma atitude de cuidado que acredita ser ideal?
Este tema também elucida a importância do cuidado com o cuidador, pois todos os cuidadores
e profissionais da saúde se desgastam física e emocionalmente ao acompanharem as mais
diversas doenças, lidando muitas vezes com a realidade da morte.
Portanto, é de extrema importância que haja espaço para que o profissional de saúde cuide
de si, uma vez que ele é um ser humano dotado de capacidades, mas também de limites e
dores que devem ser respeitados e cuidados com o mesmo olhar atento do cuidado integral e
humanização do atendimento.

Proposta de Atividade
Agora é a hora de pôr em prática tudo o que você aprendeu neste capítulo! Elabore uma sín-
tese destacando as principais ideias abordadas ao longo do capítulo. Ao produzir sua síntese,
considere as leituras básicas e complementares realizadas.
Dica: uma boa síntese é um texto curto, mas que aborda as ideias centrais do capítulo a
partir da sua perspectiva. Para ficar mais fácil, você pode fazer “pequenas sínteses” para cada
subtítulo do capítulo.

Recapitulando
Neste capítulo, buscamos compreender a Psicologia como uma ciência. Conhecemos seus
objetos, métodos e aplicação na saúde. Verificamos o que compõe a Psicologia, e como ela é
diferente daquela que conhecemos em nosso cotidiano. Para isso, foi fundamental compreen-
der sua história e fundamentos epistemológicos.
Vimos que existem várias psicologias. E isso quer dizer que existem várias formas de estu-
dar a psique, adentrando em diversos objetos e áreas. Compreendemos que a Psicologia da
saúde é uma área dessa ciência, sendo a Psicologia hospitalar uma subárea, pois existem di-

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 38


versos campos de atuação. É nessa vasta área que haverá preocupação com as pessoas antes
de seus processos puros de saúde-doença.
Nos perguntamos, em uma de nossas Pausas para Refletir, sobre o conceito de saúde dado
pela Organização Mundial da Saúde e refletimos sobre quem está efetivamente saudável, de
acordo com ele. Ora, se a saúde se basear nesse conceito tão amplo, percebe-se que dificil-
mente será alcançada em todos os âmbitos, uma vez que estamos submetidos a diversos tipos
de sofreres.
Também verificamos que a saúde em si é um conceito tão amplo que procura delinear o
mais completo bem-estar, e que isso dificilmente é alcançado em todos os âmbitos, uma vez
que estamos submetidos a diversos tipos de sofrimentos.
Pensamos sobre o desafio de estruturar direcionamentos em políticas públicas e preparar
profissionais da saúde, sendo que esse é um trabalho importante de ocorrer em conjunto, de
forma micro e macrossocial.
Não podemos esquecer que o cuidado em saúde é primordial para a humanização dos
serviços, luta que a Psicologia precisa protagonizar através de promoção, prevenção e reabi-
litação.
Esperamos que você tenha aprendido conosco, e que saia motivado a refletir e a se trans-
formar a partir da aproximação consigo próprio e com os outros.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 39


Referências bibliográficas
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venção de riscos e doenças na saúde suplementar. 3. ed. Rio de Janeiro: ANS, 2009.
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Thomson Learning, 2004.
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cologia. São Paulo: Saraiva, 2001.
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dociencia-escondida-a-vista-de-todos/>. Acesso em: 22 mar. 2019.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 40


TÓPICOS DE ESTUDO
Objetivo do capítulo
Dominar aspectos ligados às relações A COMUNICAÇÃO EM SAÚDE
• Comunicação entre pacientes,
de trabalho no cuidado em saúde.
familiares e profissionais da saúde
• Comunicação de notícias difíceis
• Comunicação terapêutica

O TRABALHO EM EQUIPE
• A multidisciplinaridade
• A interdisciplinaridade
• A transdisciplinaridade

RELACIONAMENTO INTERPESSOAL
• Empatia
• Assertividade
• Ética

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 41


Contextualizando o cenário
Nós, seres humanos, somos essencialmente seres sociais, ou seja, convivemos em socie-
dade e diariamente nos relacionamos uns com os outros nos mais variados contextos:
na nossa família, no trabalho, na escola, etc.
A base das relações interpessoais é a comunicação. Seja falando, seja escrevendo ou até
mesmo por meio de um gesto ou expressão facial, estamos o tempo todo nos comuni-
cando, cada qual a sua maneira.
Pensando na área da saúde, a comunicação está presente na relação entre o profissional,
o paciente e os familiares, bem como nas relações entre os profissionais da equipe de tra-
balho. Em outras palavras, são muitas pessoas e informações circulando o tempo todo e,
para complexificar, há diversos fatores e questões que afetam diretamente essas relações.
Diante de todo esse cenário, como é possível construir e manter um bom relacionamento
entre a equipe de trabalho, e entre os profissionais, os pacientes e os familiares?

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 42


2.1 A comunicação em saúde
A palavra comunicar tem origem no latim communicare, que significa “tornar comum”. Tor-
nar comum significa compartilhar em comunidade, tornar uma informação ou conhecimento
um bem comum, é ter afinidades, empatia e pensar junto.
Segundo a teoria da comunicação, existem seis elementos que estão sempre presentes,
sem os quais pode-se dizer que não há comunicação. São eles:
• Emissor: aquele que transmite a mensagem.
• Receptor: é o destinatário, ou seja, o destino final da comunicação, é quem recebe e inter-
preta a mensagem.
• Mensagem: é o objeto da comunicação, constituída pelo conteúdo das informações.
• Código: conjunto de regras a partir do qual a mensagem se organiza (os signos e significa-
dos de cada elemento, como a linguagem falada ou a de sinais) e deve ser de conhecimento de
ambos os envolvidos (emissor e receptor).
• Contexto: é o espaço no qual se realiza o ato da comunicação (situação/circunstância
comunicativa).
• Canal: via pela qual circulam as mensagens (por exemplo, meio físico ou virtual).

Diagrama 1. O processo de reabilitação

Referente/Contexto:
assunto, situação

Emissor: Mensagem: Receptor:


produtor (escritor, falante...) texto destinatário (leitor, ouvinte...)

Código:
língua

Canal:
meio de veiculação

A comunicação verbal abarca tanto a linguagem escrita quanto a falada. É uma das formas
de comunicação mais utilizada devido a sua capacidade de transmitir ideias e conceitos de
grande complexidade, além de ser o tipo de comunicação em que as pessoas mais tem cons-
ciência e identificam em seu dia a dia.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 43


Todavia, antes mesmo do surgimento da escrita e da padronização da linguagem verbal, o ho-
mem se utilizava de uma outra importante ferramenta de comunicação: a linguagem não verbal.
Nós podemos deixar de verbalizar, mas não necessariamente deixamos de nos comunicar,
uma vez podemos utilizar outras formas de expressão, tais como: a postura corporal, distância
entre as pessoas, as expressões faciais, o vestuário, a aparência física, o movimento do corpo,
imagens, gestos e até mesmo o silêncio.
Esse tipo de linguagem é algo inerente ao homem e permite entender e perceber o que as
palavras não conseguem expressar, ou até mesmo não desejam expressar. Ela está presente
no cotidiano, mas muitas vezes não temos consciência dela, ou não nos atentamos com fre-
quência para suas expressões.
A comunicação é um processo no qual nem sempre a troca de informações é bem-sucedida.
Um dos problemas em comunicação que ocorre com frequência é quando o significado inter-
pretado pelo receptor pode não ser exatamente aquele que o emissor quis transmitir.

MEIO

Você vai ser


promovido!

Meu Deus,
vou ser
demitido!

RUÍDO

MENSAGEM

Figura 1. Problemas de comunicação. Fonte: Adm. da Comunicação. Acesso em: 29/03/2019.

Essa confusão ocorre pela presença de ruídos, bloqueios e filtragens. Com os ruídos, a men-
sagem é distorcida ou mal interpretada; com os bloqueios, a mensagem não é captada e a
comunicação fica interrompida; já com as filtragens, a mensagem é recebida apenas em parte.
Além desses fatores que interferem na comunicação, é preciso lembrar que cada indivíduo
possui suas próprias crenças, valores, religião e está inserido em uma determinada cultura
e ambiente de convivência, ou seja, são condições que podem influenciar na transmissão da
mensagem ou na forma como a informação é interpretada.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 44


Por vivermos em sociedade e sermos seres humanos essencialmente sociais, estamos em
constante relação com o outro. Nessa perspectiva, a comunicação se torna o meio pelo qual
estabelecemos vínculos, contatos e ligações com as demais pessoas, além de emitirmos, trans-
mitirmos e capturarmos as mensagens, denominadas informações.
A comunicação em saúde pode ser caracterizada como um tema transversal e de relevân-
cia em contextos variados, uma vez que ela pode apresentar mensagens que atravessam fi-
nalidades diferentes, tais como: promover, educar e prevenir a saúde, sugerir e recomendar
mudanças de comportamento, informar sobre exames necessários e seus resultados, receitar
medicamentos e tratamentos, etc.
E os contextos se referem às relações entre profissionais, pacientes e as relações interpro-
fissisonais, a disponibilização e uso de informações entre serviços de saúde, escolas, famílias,
locais de trabalho e comunidade, a transmissão de informações para tratamento nos diversos
meios de comunicação, a qualidade do atendimento e a formação dos profissionais da saúde.

2.1.1 Comunicação entre pacientes, familiares e


profissionais da saúde
O relacionamento entre a tríade usuário, profissional da saúde e família tem como base a
comunicação, a qual tem sido discutida cada vez mais como uma importante ferramenta de
promoção à saúde.
Os processos de comunicação e transmissão de informações, pelo seu potencial crítico e
estratégico, podem influenciar os resultados das ações dos profissionais da saúde no que se
refere à morbidade, bem-estar psicológico e qualidade de vida dos pacientes, além de serem
ótimos dados de análise sobre a qualidade dos cuidados e das competências técnicas e sociais
destes profissionais.
Como em todo processo comunicativo, existem as problemáticas de comunicação entre os
envolvidos, e no campo da saúde, dois aspectos fundamentais podem ter relação com essas
problemáticas: a transmissão de informação pelos profissionais da saúde e as atitudes dos
profissionais e dos pacientes/familiares em relação à comunicação:
• Transmissão de informações pelo profissional da saúde
As informações trocadas entre o profissional da saúde e o usuário do serviço durante uma
consulta/atendimento costumam ser essenciais para formular diagnósticos assertivos e deci-
dir as ações do tratamento, além de garantir que o paciente receba e siga as informações do
que deve ser feito.
Para isso, é necessário que a informação em saúde seja clara, compreensível, baseada em

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 45


evidências e personalizada. Esta personalização diz respeito ao fato do profissional adaptar
as informações ao nível cultural e cognitivo do paciente e também oferecer as informações “à
medida” das necessidades do paciente naquele determinado momento.
Entretanto, as informações muitas vezes se caracterizam como fontes de ansiedade e de
insatisfação dos pacientes com as consultas, principalmente quando são insuficientes ou am-
bíguas, excessivamente técnicas e complexas ou, ainda, o tempo de atendimento foi escasso.
Pesquisas demonstram que quanto mais tempo os médicos passam com seus pacientes,
mais satisfeitos eles ficam, principalmente quando esses profissionais decidem despender um
pouco de tempo para conversar durante a consulta. Os pacientes também são mais propensos
a seguir o plano de tratamento até um encerramento exitoso quando são compreendidos e
apresentam chances de opinar. Já os médicos que atendem um maior número de pessoas a
cada dia apresentam pacientes menos satisfeitos, que também demonstram menos probabili-
dade de estar em dia com suas vacinas, seus exames diagnósticos e outros procedimentos de
saúde (ZUGER, 1998 apud STRAUB, 2014).
• Atitudes dos profissionais e dos pacientes/familiares
Tanto os profissionais quanto os pacientes e seus familiares têm responsabilidade na efi-
cácia da comunicação, uma vez que os papéis de emissor e receptor das informações são in-
tercambiáveis entre os envolvidos. Sendo assim, atitudes negativas e desfavoráveis de ambos
levam às problemáticas de comunicação e interação.
É comum encontrar o modelo paternalista
de relacionamento, no qual os profissionais da
saúde são os peritos, tendem a falar mais do
que a ouvir, não se interessam pela perspecti-
va do paciente (suas preocupações e expecta-
tivas), enquanto este adota uma postura pas-
siva e dependente, como um leigo no assunto,
estando muitas vezes despreparado para se
comunicar sobre suas questões de saúde.
Além disso, o modelo de atendimento bio-
médico, o qual valoriza em demasia as técni-
cas de diagnóstico e de tratamento, favorece
para a evidência dos problemas de comunica-
ção na relação entre os profissionais da saúde
e os pacientes e familiares.
O profissional, com base neste modelo de

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 46


atendimento, pode se colocar distante afetivamente, atuando de maneira defensiva frente aos
assuntos difíceis, demonstrando desinteresse pelas preocupações e sofrimento do usuário,
além de dificultar o uso desta relação como apoio emocional e de transmissão de segurança
ao longo do tratamento.
A qualidade do relacionamento entre pacientes, familiares e profissionais da saúde tem
impacto direto sobre o bem-estar de todos os envolvidos, uma vez que a transmissão de infor-
mações de modo inadequado pode causar dor emocional e prejuízos à eficácia do tratamento.
A esse respeito, é possível desenvolver algumas ações visando à melhora dos processos de
comunicação destas relações. São ações com o objetivo desenvolver as habilidades de comu-
nicação, tanto para os profissionais da saúde, quanto para os pacientes sendo, portanto, uma
intervenção dupla.

ESCLARECIMENTO:
Dentro do conjunto de habilidades sociais, uma das principais classes é o das habi-
lidades de comunicação, a qual é composta por fazer e responder perguntas, dar e
pedir feedback, elogiar, iniciar, manter e encerrar uma conversação.

Os profissionais da saúde, em conjunto com as competências técnicas e acadêmicas, devem


buscar a formação e treinamento de alguns aspectos centrais da comunicação, tais como: a
escuta ativa (o profissional ecoa, repete e tenta esclarecer declarações dos pacientes para al-
cançar a compreensão compartilhada de sintomas, preocupações e expectativas em relação
ao tratamento), prática de perguntas abertas, técnicas de facilitação, resolução de conflitos
e negociação, como desenvolver sintonia com o paciente (contato visual adequado e outras
respostas preparadas para reconhecer os sentimentos dos pacientes e ajudá-los a falar), como
transmitir más notícias, informações sobre o tratamento e exames (enfatizando mais os com-
portamentos desejáveis do que os fatos técnicos) e a construção de diretrizes do tratamento.
Para os pacientes e familiares, é importante o desenvolvimento e elaboração de ações de
empoderamento, que ensinam e permitem um posicionamento mais ativo na transmissão e
na procura de informações sobre sua saúde, expressando seus sentimentos, dúvidas e sinto-
mas, sem ser intimidado pela vergonha ou pela ansiedade. Busca-se, portanto, o aumentando
do nível de participação dos usuários, promovendo ações tanto nos serviços de saúde quanto
na comunidade, favorecendo a acessibilidade de todos às informações de saúde.
No que diz respeito ao acesso de informações da saúde, um fato da realidade atual é que a
internet tem se caracterizado como uma importante ferramenta no cuidado em saúde.

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Figura 2. Transformação digital da saúde. Fonte: Ventrix. Acesso em: 29/03/2019.

Os modos de comunicação foram evoluindo e, com o avanço da internet, estamos cada vez
mais conectados e com acesso às informações na palma das mãos.
A grande questão da era digital que se faz presente no campo da saúde é até que ponto es-
ses avanços tecnológicos têm realmente favorecido a aproximação das pessoas e a produção
de uma comunicação eficaz, ou seja, aquela comunicação que cria vínculos, que de fato torna
comum os pensamentos, os comportamentos, as ideias e o que se almeja comunicar.
Trata-se de uma questão complexa: de um lado a transformação digital da saúde pode
ser utilizada em demasia e de modo indiscriminado, pautando-se em informações que não
são legítimas e confiáveis, além de favorecer o crescimento do autodiagnóstico e autome-
dicação; por outro lado, os avanços tecnológicos têm possibilitado os atendimentos online
em saúde, favorecendo as trocas de informações e pesquisas em níveis mundiais, maior
probabilidade de diagnósticos precoces e precisão no tratamento e, consequentemente, o
aumento de sobrevida dos pacientes, além de favorecer o posicionamento ativo do pacien-
te na busca por informações.

PAUSA PARA REFLETIR


Você já pesquisou na internet a descrição de sintomas e ou resultados de exames, buscando
compreender o diagnóstico e as possibilidades de intervenção? Para você, tendo como base o
uso que tem feito, esta tecnologia tem sido um obstáculo no estabelecimento de vínculos para
a promoção da saúde ou é algo positivo que favorece as relações?

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2.1.2 Comunicação de notícias difíceis
Apesar dos avanços tecnológicos, a comunicação ainda é a ferramenta essencial a partir da qual
o profissional da saúde e o paciente trocam informações. Essa troca engloba não apenas aquilo que
o paciente necessita saber, mas também a forma apropriada de passar a informação, assegurando
que ele tenha compreendido a mensagem.
Com objetivos aparentemente simples, a comunicação entre profissionais da saúde e pacientes
nem sempre ocorre de forma satisfatória, havendo pouca empatia e grande controle por parte dos
profissionais, o que torna mais complicada a detecção e valorização adequada da aflição dos pacien-
tes e seus familiares.
Essas dificuldades se tornam mais evidentes ainda quando dizem respeito à comunicação de no-
tícias difíceis aos pacientes e/ou familiares. Provavelmente, no campo da saúde, comunicar más
notícias é uma das tarefas mais difíceis dos profissionais, uma vez que elas englobam forte impacto
psicológico do paciente e sua rede apoio.

AFIRMAÇÃO:
“[...] quem recebe uma má notícia dificilmente esquece onde, como e quando ela foi
comunicada”. (ALMANZA-MUÑOS e HOLLAND apud VICTORINO et al, 2007, p. 55)

A experiência dessa comunicação é vista pelos profissionais como uma situação limite, e um dos
fatores que podem favorecer a dificuldade de comunicação das más notícias são os próprios medos
dos profissionais da saúde, os quais estariam relacionados aos receios de incomodar com a comuni-
cação de uma notícia difícil, de serem culpados pelos pacientes e familiares, do desconhecido e de
dizer “não sei”, de expressar emoções e, por fim, da própria morte.
Assim, muitas vezes, sem saber lidar com a reação emocional do paciente e familiares, o profissio-
nal pode expressar promessas falsas de cura, negligenciar o sofrimento ao fazer uma comunicação
abrupta e diretiva, sem muitas explicações e espaços para expressão do paciente.
• O que são más notícias?
As más notícias podem ser compreendidas como aquelas que alteram de maneira trágica e ne-
gativa a perspectiva do paciente em relação a seu futuro. Por essa definição, compreende-se que a
reação do paciente depende, dentre outras coisas, de sua visão de futuro, sendo essa visão única,
individual e influenciada pelo contexto psicossocial ao qual ele está condicionado.
De maneira ampla, as más notícias incluem situações de ameaça à vida, ao bem-estar pessoal,
familiar e social, diagnósticos de doenças terminais e/ou crônicas, perdas familiares, diagnósticos e

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 49


comunicações de saúde que acarretem repercussões físicas, sociais e emocionais.
Considerando o momento de comunicação da má notícia não apenas como um procedimento a
ser realizado de maneira técnica e prática, mas também como um processo que requer atenção e
cuidados especiais, vários autores buscam elencar algumas das principais recomendações para este
momento, tornando-o mais suportável e acolhedor.
Seguem algumas dessas recomendações:
• Estabelecer uma relação adequada entre profissional da saúde e paciente: colocar
em prática as ações de empatia e compreensão, demonstrando interesse e respeito. A condu-
ta e o comportamento profissional são aspectos essenciais para que o paciente se sinta bem.
• Conhecer cuidadosamente a história médica: oferecer consistência às escolhas clínicas
e possibilitar uma comunicação mais clara e fluída.
• Ver o paciente como pessoa: buscar compreender quem é essa pessoa, de onde ela vem,
quais são suas crenças e valores, seus medos e projetos futuros, pois são explorações impor-
tantes na compreensão do sujeito-paciente de forma integral.
• Preparar o setting: lugar com conforto e privacidade, evitando as possibilidades de interrupção.

ESCLARECIMENTO:
O termo norte-americano Setting é usado na área da saúde para se referir ao am-
biente, ao cenário e à condição do atendimento.

• Organizar o tempo: para que haja espaço suficiente para informações, reflexões e esclareci-
mento de dúvidas.
• Aspectos específicos da comunicação: expressões faciais e corporais, uso de linguagem sim-
ples e clara, atenção ao tom de voz; solicitar que o paciente explique com suas próprias palavras o
que compreendeu da informação.
• Reconhecer o que e o quanto o paciente quer saber: oferecer o espaço para que o paciente
coloque sua vontade sobre os assuntos de esclarecimento.
• Encorajar e validar as emoções: período de silêncio para processamento da má notícia, legiti-
mar o que o paciente está sentindo; questionar as necessidades emocionais do paciente, oferecendo
referências de serviços interdisciplinares.
• Atenção e cuidado com a família: a família costuma servir de apoio e suporte para o paciente.
Por isso, se faz importante o cuidado com ela.
• Planejar o futuro: o profissional pode auxiliar na redução da ansiedade do paciente, resumindo
o que foi discutido e apresentando o planejamento e os próximos passos.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 50


• Trabalhar os próprios sentimentos: o profissional deve buscar se conscientizar de suas pró-
prias reações, preocupações e sentimentos em relação ao paciente, se permitindo reconhecê-las e
senti-las, favorecendo o desenvolvimento de suas habilidades de comunicação.
É importante ressaltar que cada processo de comunicação exige uma técnica adequada ao seu
conteúdo e ao paciente que irá recebê-la. Portanto, não há uma técnica específica que caiba para
todas as diversas situações no contexto da saúde.
A maneira de conduzir a informação da má notícia pode variar de acordo com a idade, o sexo,
os contextos social, educacional, cultural e familiar, a situação do indivíduo etc. Portanto, a eficácia
do processo de comunicação está diretamente relacionada à flexibilidade de utilização das técnicas
adequadas em cada circunstância.
Além das recomendações descritas acima, há ainda o protocolo denominado SPIKES, criado por
Robert Buckman (2000), utilizado para orientação dos profissionais da saúde na comunicação de
más notícias.

BIOGRAFIA:
Robert Alexander Amiel Buckman (22 de agosto de 1948 – 9 de outubro de 2011) era
médico britânico e autor. Ficou famoso por seus escritos sobre medicina e ciência
popular. Ele se especializou em oncologia e ensinava habilidades de comunicação
nesta área. Foi dessa forma que ele criou o protocolo SPIKES.

É um protocolo prático que apresenta seis passos que visam proporcionar maior segurança ao
profissional da saúde, o qual tem como objetivos principais: saber o que o paciente e seus familiares
estão compreendendo no momento (isso auxilia o profissional a saber por onde começar), fornecer
informações de acordo com o que o paciente e sua família suportam receber, acolher qualquer reação
que possa vir ocorrer e, por último, o desenvolvimento de uma estratégia ou plano de tratamento.

Tabela 1. O protocolo SPIKES


S Setting up Preparando-se para o encontro

P Perception Percebendo o paciente

I Invitation Convidando para o diálogo

K Knowledge Transmitindo as informações

E Emotions Expressando emoções

S Strategy and Summary Resumindo e organizando Estratégias

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2.1.3 Comunicação terapêutica
Na área da saúde, a comunicação está presente em todas as ações realizadas com o pacien-
te, se tornando o instrumento básico de cuidado, por meio do qual é possível compreender o
paciente de maneira integral, conhecendo seu modo de pensar, sentir e agir no mundo.
A comunicação terapêutica se caracteriza como um tipo específico de comunicação inserida
no campo da saúde. É utilizada por profissionais para estabelecer um relacionamento efetivo
e consciente com o paciente, oferecendo-lhe apoio, informação, educação e capacitação nos
processos de transição de saúde-doença e/ou na adaptação às dificuldades, despertando seu
sentimento de confiança e autoestima.
Esta comunicação é definida como a habilidade do profissional da saúde em ajudar as pes-
soas a enfrentarem as tensões temporárias, a se relacionarem melhor consigo e com os ou-
tros, a adaptarem-se às condições de saúde e ao contexto de vida, ajustarem-se ao que não
pode ser mudado, a superar os bloqueios de autorrealização e a descobrir suas possibilidades.
A comunicação terapêutica necessita de interação, envolve troca, colaboração e comparti-
lhamento de informações entre o profissional da saúde e paciente. Por meio dessa ferramenta
de comunicação, o paciente se sente acolhido e cria-se uma relação de confiança.
O profissional, ao praticar este tipo de comunicação, visa à obtenção de ganhos terapêuti-
cos em seu exercício profissional. Além disso, estimula o desenvolvimento de ações orientadas
para a humanização das relações, adaptando os serviços de saúde às especificidades de cada
indivíduo e comunidade, favorecendo, assim, os ganhos em saúde.
A comunicação terapêutica requer do pro-
fissional um conjunto de habilidades e técni-
cas de comunicação verbal e não verbal nas
quais a escuta ativa e assertividade desempe-
nham papel central.
Segundo Stefanelli (1993), a classificação
didática das estratégias de comunicação te-
rapêutica é organizada em três grupamentos:
expressão, clarificação e validação.
As técnicas presentes no grupo expres-
são são: ouvir reflexivamente, verbalizar
interesse, fazer perguntas, usar terapeuti-
camente o silêncio, entre outras. Elas têm
como objetivo estimular a formação do vín-

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 52


culo e ajudar o paciente a demonstrar e exteriorizar suas ideias e sentimentos, como tam-
bém a descrever fatos.
No segundo grupo, clarificação, encontramos o esclarecimento de termos incomuns, co-
locar eventos em uma sequência lógica e precisar o agente da ação. Essas técnicas visam ao
esclarecimento das ideias expressas pelo paciente.
Por fim, as técnicas encontradas no grupo validação são: repetir a mensagem do paciente,
pedir que ele repita o que foi dito e sumarizar a interação. Essas ações permitem verificar se
a mensagem expressa pelo paciente foi entendida de maneira correta ou, ainda, se ele com-
preendeu o que o profissional disse.
O conhecimento dessas técnicas contribui para que o paciente seja mais bem cuidado e
para que o profissional seja consciente do uso da comunicação terapêutica e o modo como ela
tem influência sobre o comportamento do paciente.
É dever ético e de responsabilidade de qualquer profissional da saúde o estabelecimento de
uma comunicação adequada com o paciente, tendo como foco o indivíduo e seu contexto. Nes-
se sentido, o potencial da comunicação terapêutica se faz presente, a qual deve ser ensinada,
aprendida e aprimorada na formação e prática dos profissionais da saúde.

2.2 O trabalho em equipe


Nessa parte do capítulo, descreveremos diferentes tipos de modalidade de trabalho, sendo
essencial que os trabalhadores da área os compreendam, já que não trabalham isoladamente
e precisam dos saberes de outros profissionais para que os resultados sejam alcançados, ga-
rantindo um cuidado integral do paciente.
Muitas vezes, nos deparamos com um saber na área da saúde que se caracteriza pela frag-
mentação disciplinar a partir das especialidades e subespecialidades. Essa subdivisão do saber
se dá pela expertise resultante do aprofundamento e aperfeiçoamento em determinada ques-
tão. Isso ocorre pelo fato de ser impossível para qualquer pessoa conhecer todas as facetas de
estudo possíveis com a devida profundidade.
Os benefícios dessa questão são as possibilidades de qualidade e detalhamento de aprendi-
zagem, e de desenvolvimento em cada campo do conhecimento. Por outro lado, pode-se per-
der a noção do funcionamento global do organismo, cuja dinâmica é extremamente complexa,
justamente por ser indivisível.
Por essa perspectiva, diferentes modelos de atuação entre profissionais da equipe da saúde
são criadas, na tentativa de que as equipes e instituições remodelem e transformem alguns
princípios e conceitos para alcançar uma prática mais coesa e completa na promoção da saúde.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 53


2.2.1 A multidisciplinaridade
A multidisciplinaridade é um conjunto de saberes que tratam uma mesma questão ao mesmo
tempo, sem que os profissionais implicados estabeleçam efetivas trocas entre si. Neste caso,
cada profissional emprega sua metodologia, baseando-se em suas hipóteses, métodos, técnicas
e teorias, sendo que o objeto em questão é visto por vários pontos de vista. Isso quer dizer que
o mesmo tema é abordado por vários ângulos, sem que haja uma síntese dessas compreensões
ou ganhos colaborativos.
Busca-se solucionar problemas a partir do próprio conhecimento, sem troca com outros sa-
beres que funcionam de forma segmentada.
O trabalho da equipe de saúde pela perspectiva multidisciplinar busca avaliar o paciente de
forma independente. Nesse modelo, não há um trabalho coordenado por parte dessa equipe, e
também não há uma identidade grupal. É muito comum que os profissionais se adequem à visão
e decisão do médico.

Multidisciplinaridade
Existe uma temática comum
Não existe nenhuma relação nem cooperação entre disciplinas

Figura 3. Multidisciplinaridade.

2.2.2 A interdisciplinaridade
A interdisciplinaridade, como o próprio nome sugere, trata da ação recíproca de um elemento
sobre o outro e vice-versa. Com ela, há troca de instrumentos, técnicas, metodologias e esque-
mas conceituais entre os saberes, levando ao diálogo, enriquecimento e transformação desses
entendimentos.
Nesse modelo, se contempla as intersubjetividades e o respeito às diferenças existentes dian-
te de múltiplos olhares e compreensões sobre um determinado objeto. Isso ocorre, no entanto,
perante a consciência dos limites e das potencialidades de cada campo do saber, na busca de um
fazer coletivo. Aqui, se visa ao intercâmbio mútuo e à interação de diversos conhecimentos de
forma recíproca e coordenada, mas com uma perspectiva metodológica comum a todos. Busca-

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 54


-se integrar os resultados, gerando uma solução de problemas que parte da articulação com as
outras disciplinas.
O trabalho da equipe de saúde pela perspectiva interdisciplinar deve ser comum a tudo que
diz respeito à assistência médica, com a colaboração de várias especialidades que denotam co-
nhecimentos e qualificações distintas. Enfermeiros, médicos, terapeutas ocupacionais, psicólo-
gos, nutricionistas e outras especialidades trocam saberes de forma horizontal para que possam
atender os usuários de forma total.

Interdisciplinaridade
Existe cooperação e diálogo entre as disciplinas
Existe uma ação coordenada

Figura 4. Interdisciplinaridade.

2.2.3 A transdisciplinaridade
A transdisciplinaridade parte da impossibilidade de abarcar o mundo no âmbito de alguma
disciplina. Entende, portanto, que as relações entre as disciplinas não apenas interagem, mas
são um sistema total, impossibilitando separar as matérias. Nesse sentido, se iguala os saberes
por sua integração total. Por esse motivo, construir conhecimento implica em construir novos
modos de ser a partir da plasticidade própria do ser humano. O propósito é a relação complexa
dos diversos saberes, sendo que nenhum é mais importante do que o outro. Dessa forma, é um
nível bem superior e complexo de integração contínua e ininterrupta dos conhecimentos.
Nesse modelo, busca-se suprir uma anomalia do sistema anterior, não destruindo o anterior,
mas se abrindo a novos saberes. A necessidade da transdisciplinaridade decorre do desenvol-
vimento dos conhecimentos, da cultura e da complexidade humana. Nesse caso, é necessário
tecer laços entre a genética, o biológico, o psicológico e a sociedade.
O trabalho da equipe de saúde pela perspectiva transdisciplinar iguala o trabalho do médico,
enfermeiro, fisioterapeuta, psicólogo, etc.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 55


PAUSA PARA REFLETIR
Seria possível ou utópico esse modelo em equipes de trabalho? Em que medida a especifici-
dade e especialização de cada área podem trazer benefícios ou prejuízos para promoção da
saúde integral ao usuário?

Transdisciplinaridade
Cooperação entre todas as disciplinas e interdisciplinas

Figura 5. Transdisciplinaridade.

Sendo assim, para se desenvolver um nível cada vez maior de integração disciplinar, pode-se
investir em novos modelos de formação de equipe, já que a equipe de saúde pode funcionar como
um ambiente facilitador em prol da saúde e do desenvolvimento das pessoas em tratamento.
A renovação das concepções a respeito do ser humano e de seu funcionamento por um ponto
de vista amplo precisa abarcar sua dimensão social, relacional, cultural, psíquica e corporal como
dimensões indissolúveis.
Para isso, é preciso investir na capacitação dos profissionais para o trabalho em equipe. Para
além das teorias e conceitos, é preciso contar com profissionais sensibilizados e abertos a elabo-
rações conjuntas.
Se olharmos para a equipe de saúde como um todo, perceberemos suas particularidades e di-
nâmicas próprias, bem como suas complexidades. Dessa forma, devemos entender a equipe como
um organismo em busca da criação de condições necessárias para seu funcionamento saudável.
O funcionamento saudável de uma equipe de saúde seria a capacidade de se apropriar, en-
quanto todo, das potencialidades e contribuições de cada profissional que a compõe. Então,
cada um tem certo grau de permeabilidade que lhe permite modificar e ser modificado no pro-
cesso de construção de um saber e um fazer que transcenda o limite do individual, e gere a ho-
meostase da equipe.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 56


2.3 Relacionamento interpessoal
As relações interpessoais se estabelecem a partir do processo de interação entre os mem-
bros de uma mesma equipe, por meio dos vínculos profissionais, para que executem uma ação
coletiva e alcancem um objetivo em comum.
No caso de equipes de saúde, como a jornada dessas instituições é de no mínimo seis e no
máximo de 12 horas consecutivas de trabalho, pode-se dizer que são longos os períodos de
interação entre profissionais e muitos os desafios a serem enfrentados.
Trataremos agora de algumas questões que são triviais para o bom relacionamento da equi-
pe em relação ao trabalho. No entanto, vale ressaltar que elas por si não garantem esse pleno
desenvolvimento. A insatisfação da equipe com as condições de trabalho costumam levar a
dificuldades nas relações interpessoais.
Um profissional da saúde pode estar insatisfeito com seu trabalho por muitos fatores, dentre eles
a estrutura física inadequada, recursos materiais insuficientes, falta de autonomia, sobrecarga de
trabalho, baixa remuneração, falta de reconhecimento profissional, gestão ineficiente, dentre outros.
Condições como essas precisam ser reparadas concomitantemente com a promoção de
empatia, assertividade e ética no trabalho.

2.3.1 Empatia
Por definição, empatia pode ser a característica de compreender emocionalmente alguém
ou a capacidade de se identificar com o outro.
Ela pode ser o processo de identificação em que o indivíduo se coloca no lugar do outro e, com
base em suas próprias suposições ou impressões, tenta compreender o comportamento do outro.
Praticar empatia é ter como hábito o exercício afetivo e cognitivo de buscar inte-
ragir, percebendo a situação sendo vivida pela pessoa que a vive. Isso não quer dizer
que ao praticar a empatia, o sujeito deve se confundir com o outro, mas sim procurar
compreender a dor ou prazer do outro como se estivesse no lugar dele. Essa condição
separa o “eu” do “outro” e, ao mesmo tempo, os une pela compreensão emocional do
que o outro vive.
Ela envolve, segundo estudos sociológicos, três componentes:
• Afetivo: pauta-se na compreensão de estados emocionais de outros.
• Cognitivo: refere-se à capacidade de perceber estados mentais de outros.
• Regulação das emoções: lida com o grau das respostas empáticas (diferenciação de emoções
vividas por mim e pelo outro, pela percepção das próprias respostas emocionais automáticas).

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 57


A empatia caracteriza-se pela tomada de perspectiva do outro, ausência de julgamento,
reconhecimento da emoção nos outros e capacidade de comunicar esse estado emocional.
Empatia no caso de profissionais da saúde com os pacientes: no caso de profissionais
da saúde, essa atitude não se baseia em ser um mero observador da condição do doente, mas
sim na sua capacidade de se compreender a dor dele, buscando conhecê-lo melhor, recorren-
do ao conhecimento que tem de si próprio. Esse tipo de atenção fará toda diferença para o
paciente, que será devidamente acolhido e cuidado em situação de doença.

AFIRMAÇÃO:
“Curar ocasionalmente, aliviar frequentemente e consolar sempre”, de Ambroise
Paré (BARROS FILHO, 2007), remete à sensibilização dos profissionais da saúde por
cada condição que se transforma, momento a momento, do paciente.

Empatia no caso da equipe de profissionais da saúde: será com empatia que toda equi-
pe poderá formar laços de confiança e colaboração, por meio da reciprocidade que cultiva as
boas relações entre equipes, gestão, pacientes e instituição. Nesse sentido, os gestores das
equipes podem, com a empatia, compreender seus subordinados e manter um interesse ativo
por suas preocupações e orientarem-se para servir, antever, identificar e satisfazer as neces-
sidades dos profissionais, identificando e aprimorando seus pontos fracos e reforçando suas
aptidões. Além disso, os colaboradores podem, pela empatia, entender as necessidades da ins-
tituição, do setor, dos pacientes e da gestão, e trabalhar sobre essas premissas sem esquecer
das próprias necessidades.

ASSISTA:
O Óleo de Lorenzo:: baseado em fatos reais, o filme mostra a trajetória de uma pessoa
leiga que busca a cura de determinada doença por se deparar com o sofrimento de
seu filho. Nessa busca, a personagem entra em contato com uma comunidade de
crianças que sofrem das mesmas condições e aprende com exercício da empatia.

2.3.2 Assertividade
Definição: Assertividade é uma competência emocional baseada na manifestação de uma
posição clara, educada e coerente, com transparência na atitude, respeitando o ouvinte e ter-

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 58


ceiros. Segundo as definições clássicas, o comportamento assertivo seria a expressão de sen-
timentos de maneira socialmente adequada, preservando tanto os direitos e interesses da
própria pessoa, quando dos outros.
Comunicação assertiva: para se comunicar com assertividade, é necessário defender as
próprias convicções sem ofender nem se submeter a outras pessoas. Isso precisa ser realizado
de forma clara, objetiva, transparente e honesta.
Comunicar-se assertivamente é dizer a coisa certa, de forma correta, na hora e locais cer-
tos. Para isso, é necessário fornecer informações, expressar sentimentos, escutar o que as
pessoas falam, buscar mudanças no comportamento próprio e do outro quando necessário.
Essa capacidade ajuda na administração de conflitos, em ser respeitado, em negociar melhor,
desenvolver autoconfiança e autoestima.
Tipos de comportamento: também há outros tipos de comportamentos, além da asser-
tividade. Mas vale ressaltar que uma pessoa demonstra mais de um tipo de comportamento,
podendo se manifestar diferentemente em situações e contextos divergentes, mesmo que
tenha alguns padrões.
Comportamento passivo: comportamento que consiste em agradar as pessoas, mesmo
que para isso se abra mão de seus próprios direitos e desejos. As opiniões são omitidas e há
dificuldade para dizer não. Ele pode gerar sentimentos de insatisfação e infelicidade diante
de outras pessoas ou de fatos ocorridos.
Comportamento agressivo: comportamento que consiste em sustentar uma postura
intimidadora e desafiadora, chegando, muitas vezes, a ofender as pessoas, para se con-
seguir o que quer. Há também a dificuldade em aceitar divergência de opiniões. esse
comportamento pode acarretar em ser evitado por terceiros, bem como dificuldade
para cultivar relacionamentos e até mes-
mo se manterem em empregos.
Comportamento assertivo: caracteriza-
-se por segurança ao agir e se expressar,
demonstrando uma postura firme e res-
peitosa. Faz parte desse comportamen-
to lutar por seus direitos, ouvir críticas e
compreender o posicionamento do outro.
Ele pode gerar relacionamentos saudáveis
e satisfação pessoal.
Veja na Tabela 2 a comparação entre os
três tipos de comportamento.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 59


Tabela 2. Os três tipos de comportamento

PASSIVO AGRESSIVO ASSERTIVO

Não expressa Expressa desejos, ideias Expressa desejos,


desejos, ideias e sentimentos à custa ideias e sentimentos
e sentimentos dos outros. de forma direta e
Características do ou expressa-os apropriada.
comportamento de forma auto-
Objetivo: dominar ou
depreciativa.
humilhar. Objetivo: comunicar

Objetivo: agradar

Ansioso, Convencido da sua Confiante,


desapontado superioridade. sentimentos
consigo próprio. Por vezes, positivos acerca
Sentimentos do Frequentemente envergonhado depois de si próprio. quer
próprio revoltado e do comportamento no momento,
amargurado depois ocorrer. quer depois do
do comportamento comportamento
ocorrer. ocorrer.

Sentimentos do Irritacão, pena, Revolta, desejo de Habitualmente,


interlocutor desagrado. vingança. respeito.

Não alcança Alcança os objetivos Frequentemente


objetivos desejados magoando alcança os objetivos
desejados. os outros. desejados.
Efeito
Aumento de revolta. Os outros encontram
justificação para se
“vingar”.

Evitamento Descarga da revolta, Sentimentos


de situações sentimentos de positivos, respeito
desagradáveis, superioridade. dos outros. Aumento
Resultado final
evitamento de de autoconfiança.
conflitos, tensão e Promoção dos
confronto. relacionamentos.

Fonte: MARCHEZINI-CUNHA; TOURINHO, 2010.

Assertividade para profissionais da saúde: como descrito anteriormente, faz parte do


comportamento assertivo saber e lutar pelos próprios direitos de forma respeitosa. Veja na
Tabela 3 os direitos de afirmação pessoal para profissionais da saúde.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 60


Tabela 3. Direitos de afirmação pessoal para profissionais da saúde

DIREITOS DE AFIRMAÇÃO PESSOAL PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDE

1. Tenho o direito de expressar os meus sentimentos e opiniões.


2. Tenho o direito de determinar as minhas necessidades e estabelecer as minhas prioridades
como pessoa, independentemente dos papéis que possa assumir na vida.
3. Tenho o direito de ser tratado com respeito, como um ser humano inteligente, capaz e
igualitário.
4. Tenho o direito de dizer “não” e “sim” por mim mesmo.
5. Tenho o direito de cometer erros e ser responsável por esses erros.
6. Tenho o direito de mudar de ideia.
7. Tenho o direito de dizer “Eu não compreendo” e pedir mais informação.
8. Tenho o direito de pedir o que desejo.
9. Tenho o direito de declinar responsabilidade pelos problemas das outras pessoas.
10. Tenho o direito de lidar com outras pessoas sem estar dependente da aprovação delas.

Fonte: MARCHEZINI-CUNHA; TOURINHO, 2010.

Esse treino assertivo permite que o profissional de saúde se comunique de forma mais
adequada com o paciente, possibilitando que ele compreenda melhor a informação que lhe
é transmitida. Isso auxilia diretamente na adesão ao tratamento e também é um importante
instrumento na gestão do estresse no trabalho.
Veja alguns pontos essenciais para se trabalhar a assertividade em profissionais da saúde:
a) Moderação da expressão emocional (em excesso ou déficit).
b) Elaboração de perguntas e respostas das mesmas.
c) Elaboração de críticas justas e respostas das mesmas.

PAUSA PARA REFLETIR


E como costuma ser o seu padrão comportamental no dia a dia? Dos aspectos citados até
agora, em relação à assertividade e empatia, como você se autoavalia?

2.3.3 Ética
A palavra “ética” vem do grego ethos e significa caráter, disposição, costume, hábito.
A ética, como um conceito, é diferente da moral, pois, enquanto esta se fundamenta

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 61


nos costumes e hábitos consolidados em uma sociedade, a ética, ao contrário, busca fun-
damentar tais ações pela razão, ou seja, a ética estuda a moral.
Podemos dizer, portanto, que a ética estuda um conjunto de regras morais que regulam
a conduta e as relações humanas.
A ética investiga o significado e escopo do “certo e errado”, do “bom e mau” em relação
à conduta humana. Ela é estudada no campo da filosofia. Busca-se refletir sobre questões
como: “Que ação particular atenderá os critérios de justiça sob tais e tais circunstâncias?”
ou “Que grau de ignorância permitirá que essa pessoa em particular, nesse caso particular,
exima-se ou não de responsabilidade?”.
Ela, sempre determinada na vida social, é fundamental para regulamentar as relações
entre uma sociedade por meio de “acordos sociais”, que podem se manifestar em leis, em
princípios de educação e relações. Vale lembrar que ela não é rígida ou natural, mas que os
valores que vão sendo instituídos em uma sociedade também podem suprir interesses de
determinados grupos sobre outros.
É importante ressaltar que as condutas morais dependem da localização histórico-cul-
tural do sujeito que a emite, pois os códigos morais da sociedade são construídos e conso-
lidados ao longo da história. Por exemplo, se as pessoas do século XIX vissem as mulheres
usando calças, trabalhando e tendo os mesmos direitos civis que os homens, isso seria
para eles, considerado uma imoralidade.

CONTEXTO:
O significado da palavra ética vem do grego “Ethos”, e diz respeito ao modo de
ser do indivíduo, ou ao caráter do ser humano. Na Grécia Antiga, os filósofos
foram os primeiros a pensar o conceito de ética, associando à ideia de moral e
cidadania.

Nesse sentido, e aplicando o conceito ao trabalho dos profissionais de saúde, uma con-
duta ética no trabalho, assim como seguir padrões e valores, tanto da sociedade quanto da
própria organização, é essencial para o alcance da excelência profissional.
Na prática dos profissionais de saúde, a ética é analisada sob três aspectos:
1) A relação com o paciente;
2) A relação da equipe;
3) A relação com a sociedade.
Veja quais são as premissas éticas importantes na relação com o paciente:

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 62


1. Respeitar a necessidade do paciente, e buscar conquistar gradualmente a sua confian-
ça. Para isso, todo procedimento realizado deve ser esclarecido.
2. Manter registros, relatórios e evoluções clínicas dos pacientes sempre atualizados.
3. Manter sigilo sobre as informações clínicas ou de estudo clínico compartilhadas entre
a equipe.
4. Aproximar-se profissionalmente do paciente, com o devido respeito.
5. Admitir os limites de intervenção técnica e ética de sua profissão, encaminhando
questões não resolvidas a um especialista ou partilhando-as com a equipe.
Veja quais são as premissas éticas importantes na relação com a equipe de saúde:
1. Manter um bom relacionamento com os demais membros da equipe em saúde.
2. Nunca diminuir o respeito e a consideração técnica do paciente a outro profissional.
3. Tratar o outro profissional com horizontalidade para troca de informações e bom re-
lacionamento.
4. Respeitar as normas internas, titulações, condutas éticas específicas e as legislações,
estabelecidas pela ordem profissional de cada profissão.
5. As dúvidas diagnósticas devem ser primariamente debatidas em equipe.
Veja quais são as premissas éticas importantes na relação com a sociedade:
1. Atuar para promoção e prevenção da saúde de forma a alcançar o maior número
possível de pessoas.
2. Respeitar a condição do outro em seu sofrimento.
3. Trabalhar para a amenização dos processos de doença da sociedade.

Proposta de Atividade
Agora é a hora de pôr em prática tudo o que você aprendeu neste capítulo! Elabore uma sín-
tese destacando as principais ideias abordadas ao longo do capítulo. Ao produzir sua síntese,
considere as leituras básicas e complementares realizadas.
Dica: uma boa síntese é um texto curto, mas que aborde as ideias centrais do capítulo, a
partir da sua perspectiva. Para ficar mais fácil, você pode fazer “pequenas sínteses” cada qual
de um subtítulo do capítulo.

Recapitulando
Neste capítulo, buscamos compreender as relações de trabalho no campo da saúde.
A partir de uma pequena introdução com conceitos gerais sobre a teoria da comunicação,

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 63


foi posto em evidência o quanto algumas habilidades de comunicação e questões como a in-
formação de notícias ruins acabam interferindo na qualidade da relação entre o profissional de
saúde, o paciente e seus familiares. Além disso, foi exposto um tipo específico de comunicação,
muito utilizado na área da saúde, como uma ferramenta possível para se construir um vínculo
positivo e gerador de benefícios aos envolvidos: a comunicação terapêutica.
Convidamos você, aluno, a refletir se em algum momento já pesquisou na internet a descri-
ção de sintomas ou um diagnóstico específico, de forma a evidenciar o quanto a internet tem
influenciado cada vez mais as relações e o cuidado na área da saúde, pois este comportamento
de busca na internet é visto como algo corriqueiro ou natural para as pessoas. Entretanto, não
há uma resposta conclusiva para a reflexão se esta tecnologia tem sido um obstáculo ou algo
positivo para o estabelecimento de vínculos para a promoção de saúde, visto ser um assunto
bastante complexo.
Compreendemos, também, os diferentes tipos de construção do saber a partir das diferen-
ças entre a multidisciplinaridade, a interdisciplinaridade e a transdiciplinaridade.
Sobre os questionamentos da pausa para refletir, muitos estudiosos alegam que a transdis-
ciplinaridade é utópica na medida em que derruba todas as barreiras do saber, não havendo
nenhuma especificidade disciplinar. Um enfermeiro sabe coisas diferentes de um fisioterapeu-
ta, por exemplo, e igualar completamente esses dois profissionais pode acabar não ajudando
o próprio paciente que requer cuidado de um ou outro saber.
Nesta apresentação, é posto em questão qual modelo e forma de atuação em equipe me-
lhor integra as mudanças de concepções do ser humano e dos olhares para o cuidado integral,
visando um saber, portanto, integrativo, compreendendo a equipe enquanto um organismo
complexo, que requer condições essenciais para o seu bom funcionamento. Condições estas
que envolvem três fatores (a empatia, a assertividade e a ética), os quais afetam diretamente
o modo como os vínculos são estabelecidos.
Sendo assim, ao longo de todo o capítulo foram expostos os fatores e questões essenciais
para se pensar em como construir um bom relacionamento entre a equipe de trabalho e tam-
bém entre os profissionais, os pacientes e os familiares.
Além disso, vocês foram provocados a refletir como é o seu próprio padrão comportamen-
tal no dia a dia, sendo a autoavaliação um elemento significativo que contribui para o bom re-
lacionamento com o outro, uma vez que compreendendo como você age e o porquê (estando
aberto a mudanças e melhorias), isso poderá te auxiliar a agir de maneira mais adequada e
eficaz nas suas relações, podendo inclusive contribuir para o bom funcionamento de todo o
grupo e das relações interpessoais das quais você faz parte.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 64


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PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 66


TÓPICOS DE ESTUDO
Objetivo do capítulo
Compreender aspectos do O ESTUDO DO DESENVOLVIMENTO
HUMANO
desenvolvimento humano.
• Conceito de desenvolvimento humano
• Fatores determinantes no processo
de desenvolvimento humano
• Comportamento

CICLO DO DESENVOLVIMENTO HUMANO


• Infância
• Adolescência
• Vida adulta
• Velhice

O PROCESSO DE ADOECIMENTO
• Conceito de saúde
• Aspectos psicossociais do processo
saúde/doença

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 67


Contextualizando o cenário
Saúde e desenvolvimento humano estão sempre interligados, pois não existe nenhum
processo de desenvolvimento (seja ele físico, psicológico ou social) sem a consolidação
do direito à saúde. A promoção da saúde é uma estratégia que busca transformações
nas pessoas a fim de que exerçam seus direitos e sintam-se efetivamente cidadãos.
Pensando nisso, pergunta-se: como os processos de saúde e doença e sua efetivação
como promoção do direito básico do cidadão condicionam os aspectos do desenvolvi-
mento humano?

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 68


3.1 O estudo do desenvolvimento humano
O estudo do desenvolvimento humano se dá pela pesquisa em todos os seus aspectos,
como físico, intelectual, afetivo-emocional e social, desde o nascimento até a velhice e morte.
O campo do desenvolvimento humano busca conhecer a evolução do ser humano ao longo
da vida, e as características que permanecem razoavelmente estáveis durante cada fase do ciclo.
Atualmente, a maioria dos cientistas do desenvolvimento reconhece que esse processo
ocorre durante toda a vida, pois cada fase tem características específicas, que nos unem en-
quanto espécie humana, e outras que se manifestam em singularidade. Esse conceito de um
processo vitalício de desenvolvimento é conhecido como desenvolvimento no ciclo vital, e tem
sido estudado cientificamente, com avanços significativos nas últimas décadas.

3.1.1 Conceito de desenvolvimento humano


São princípios fundamentais de uma abordagem do desenvolvimento no ciclo vital:
a) Vitalício: cada período do desenvolvimento da vida é influenciado pelo que aconteceu
antes, e isso irá afetar o que está por vir. Assim, cada fase tem suas próprias características e
nenhuma é mais ou menos importante do que qualquer outra.
b) Depende de história e contexto: cada pessoa desenvolve-se dentro de um conjunto es-
pecífico de circunstâncias ou condições definidas por tempo e lugar. A humanidade condiciona
seu contexto histórico e social e é influenciada por ele.
c) Multidimensional e multidirecional: o desenvolvimento durante toda a vida envolve um
equilíbrio entre crescimento e declínio. Se por um lado as pessoas ganham em um aspecto,
elas também podem perder em outro, de forma variável. As pessoas procuram maximizar ga-
nhos e minimizar perdas, aprendendo a administrá-las ou compensá-las.

ASSISTA:
O filme O Curioso Caso de Benjamin Button é uma ficção que conta a história de
uma pessoa que nasce na fase da velhice e, à medida que sua vida passa, vai reju-
venescendo até virar um bebê. É interessante para se pensar nas peculiaridades
de cada fase da vida.

Aspectos físico, cognitivo e psicossocial do desenvolvimento: para uma compreensão


didática, a comunidade científica fala sobre o desenvolvimento físico, cognitivo e psicossocial, e

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 69


esses aspectos ou domínios do desenvolvimento estão interligados e cada um deles influen-
cia os outros. Dessa forma, podemos dizer que o desenvolvimento é um processo unificado.
Veja alguns exemplos:
• O crescimento do corpo e do cérebro, das capacidades sensórias, das habilidades motoras
e da saúde são parte do desenvolvimento físico e condicionam outros aspectos do desenvol-
vimento também. Uma fase em que isso fica evidente é na puberdade, quando as mudanças
fisiológicas e hormonais afetam o desenvolvimento do senso de identidade.
• O desenvolvimento cognitivo está intimamente relacionado ao crescimento físico e emo-
cional. Um exemplo disso é sobre a capacidade de falar, que depende do desenvolvimento
físico da boca e do cérebro.
• A constituição da personalidade e os relacionamentos sociais são formados junto ao de-
senvolvimento psicossocial, que pode influenciar no funcionamento cognitivo, físico e vice e
versa. Por exemplo, o apoio social pode ajudar as pessoas a lidar com os efeitos negativos do
estresse, e isso pode auxiliar na própria saúde física da pessoa.

3.1.2 Fatores determinantes no processo de desenvolvimen-


to humano
Algumas diferenças entre os seres humanos (como gênero, personalidade e inteligência)
podem ajudar a explicar as peculiaridades de cada indivíduo. Acontece que o desenvolvimento
é complexo e os fatores que o afetam nem sempre podem ser medidos com precisão. Ainda
assim, estuda-se como as pessoas reagem às muitas influências internas e externas, e como
elas podem desempenhar melhor seu potencial. Alguns fatores determinantes para o desen-
volvimento humano são: hereditariedade, ambiente e maturação.
Pensando em hereditariedade como a dota-
ção genética inata dos pais biológicos de uma
pessoa, procura-se entender como cada uma
delas influencia o desenvolvimento humano.
Muitas mudanças típicas da infância es-
tão vinculadas à maturação do corpo e do
cérebro, já que as condições genéticas in-
fluenciarão nas mudanças físicas e padrões de comportamento, incluindo a facilidade para
adquirir novas habilidades, como caminhar e falar.
Conforme a pessoa vai crescendo, as experiências de vida desempenham um papel mais
importante do que as condições inatas.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 70


Dessa forma, para se compreender as semelhanças e as diferenças no desenvolvimento, é
necessário observar as características herdadas que dão a cada pessoa um começo específico
na vida, além dos inúmeros fatores ambientais que influenciam os indivíduos.
Também se analisa as questões que afetam a maioria das pessoas em uma determinada
idade ou em uma determinada época na história, além daquelas que afetam somente certos
indivíduos ou grupos.
Influências contextuais
Pode-se dizer que os seres humanos são seres sociais, afinal, seu desenvolvimento é deter-
minado pelos contextos sociais, culturais e históricos em que vivem. Para um bebê, o contexto
imediato normalmente é a família (de laços genéticos ou não), ou a instituição de acolhimento.
Mas, esses grupos estão sujeitos às influências mais amplas, como comunidade, sociedade,
religião, Estado etc.

Cronossistema
(dimensão de tempo)

Macrossistema

Exossistema
hierarquia religiosa

Mesossistema
Si cac
ed
ria e

st io

Local de trabalho
u
dú cio

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Local de
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Lar trabalho Igreja

Lar Igreja
Indivíduo

Escola Bairro
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Grupo de
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amigos
m

na
ad

Ó
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Grupo de
go

ns

amigos
ito

Meios de
comunicação
em massa

Crenças e ideologias
dominantes

Figura 1. Sistemas que circundam e constituem o indivíduo. Fonte: PAPALIA; FELDMAN, R. D., 2013. (Adaptado).

Vamos, a seguir, verificar como cada um desses contextos pode influenciar o desenvolvi-
mento do ser humano:

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 71


Família
A família pode ter significado diferente em épocas e lugares diferentes, sendo que seu con-
ceito é constituído historicamente. Podemos dizer que o “modelo de família” mudou muito nas
últimas décadas, afinal, a própria dinâmica da sociedade mudou e acelerou.
Atualmente, muitas mulheres trabalham fora de casa, e uma criança tende a receber os cui-
dados de parentes, creches e instituições. Se um casal é divorciado, seus filhos podem viver com
um dos pais, ou podem mudar entre as duas casas. É muito comum a figura de meio-irmão ou
meia-irmã, ou ainda do parceiro ou da parceira atual do pai ou da mãe. Existe um número cada
vez maior de adultos solteiros e sem filhos, mães solteiras e lares de relações homoafetivas.
Essas questões influenciam diretamente no desenvolvimento da pessoa, não pela confi-
guração familiar em si, mas pela forma como é dada. Um divórcio litigioso pode ser difícil
emocionalmente para uma criança lidar, mas a colega de classe dessa criança que foi criada
pelo avô tem uma ótima relação com ele, por exemplo. Isso quer dizer que o modelo familiar
propriamente dito não determina o sucesso ou fracasso no desenvolvimento infantil, mas sim
as questões que se configuram em relação a esse aspecto.
Condição socioeconômica
A condição socioeconômica mescla diversos fatores, como renda, nível de instrução e pro-
fissão. São as influências que cada classe socioeconômica pode proporcionar que alteram a
forma como se dá o desenvolvimento da pessoa. Dentre elas, podemos pensar nos tipos de
lares e bairros em que as pessoas residem, acesso à saúde e educação escolar etc.
Veja na Tabela 1, por exemplo, os riscos que crianças pobres correm em detrimento das
crianças que não são pobres.

Tabela 1. Más consequências para as crianças pobres


Maior risco de crianças pobres em relação a
Consequências
crianças não pobres

Saúde

Óbito na infância 1,5 a 3 vezes mais provável

Crescimento tolhido 2,7 vezes mais provável

Deficiência de ferro na época da pré-escola 3 a 4 vezes mais provável

Surdez parcial ou completa 1,5 a 2 vezes mais provável

Cegueira parcial ou completa 1,2 a 1,8 vezes mais provável

Deficiências físicas ou mentais graves Cerca de 2 vezes mais provável

Ferimentos acidentais fatais 2 a 3 vezes mais provável

Pneumonia 1,6 vezes mais provável

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 72


Educação

QI médio aos cinco anos 9 pontos mais baixo

Notas de desmpenho médias aos três anos ou


11 a 25% mais baixas
mais

Deficiências de aprendizagem 1,3 vezes mais provável

Transferência para educação especial 2 a 3% mais provável

2% mais provável para cada ano de infância


Série abaixo do usual para idade da criança
passado na pobreza

2 vezes mais provável do que jovens de renda


Evasão entre idades de 16 e 24 média; 11 vezes mais provável do que jovens
abastados

Fonte: PAPALIA; FELDMAN, 2013.

Cultura
A cultura refere-se ao modo de vida de um grupo ou sociedade, incluindo costumes, tradi-
ções, crenças, valores, idioma etc. Ela está sempre mudando, seja pela dinâmica que se recon-
figura em contextos maiores ou pela própria cultura.
Pensar em cultura como uma forma ampla, não se deixa compreender a complexidade dos
povos. Por isso é muito importante pensar nos subgrupos que podem consistir em pessoas
unidas por descendência, raça, religião, língua e/ou nacionalidade, o que contribui para um
sentido de identidade comum. Isso quer dizer que muitas atitudes, crenças e valores são com-
partilhados.
Esses grupos e subgrupos se constituem de histórias, culturas e condições socioeconômicas
variáveis, que podem se assemelhar em determinados aspectos e se diferenciarem em outros.
Pensar nessas redes pode parecer bastante complexo.
Uma forma de aproximação a esse fenômeno são os padrões culturais que podem influen-
ciar a composição da unidade domiciliar, as brincadeiras das crianças, o tipo de comida que
comem, seus recursos econômicos e sociais, a forma como seus integrantes agem entre si, o
modo como os jovens aprendem etc. Todos esses aspectos constituem as fases de desenvolvi-
mento na qual o indivíduo está inserido.
Questões normativas e não normativas
Outro fator a ser pensado pelos cientistas do desenvolvimento são os eventos que tendem
a ocorrer com quase todas as pessoas em determinado período (influência normativa), e ques-
tões individuais (não normativas).
O evento normativo é experimentado de modo semelhante pela maioria das pessoas em
um grupo. Alguns tipos são:
a) Influências normativas etárias: semelhantes para pessoas de uma determinada faixa
etária, que estão vivenciando os mesmos eventos biológicos (como puberdade e menopausa)

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 73


e os mesmos convívios sociais (escola, faculdade, trabalho, casamento, aposentadoria etc.). O
tempo de ocorrência dos eventos biológicos é fixo, dentro de uma faixa normal, já que um ado-
lescente não entra na menopausa, por exemplo. Já o tempo de ocorrência dos eventos sociais
é mais flexível e muda conforme a época e lugar, não ocorrendo necessariamente com todas
as pessoas daquela sociedade.
b) Influências normativas históricas: são comuns a um determinado grupo de pessoas
que partilham uma experiência semelhante, como crescer na mesma época e no mesmo lugar
(período de guerra em determinado país, ou ascensão econômica).
As questões não normativas são eventos incomuns que têm grande impacto sobre vidas
individuais, como a morte de um dos pais quando o filho ainda é pequeno, ter um problema
congênito, ou obter uma bolsa de estudos.
As pessoas, muitas vezes, ajudam a criar seus próprios eventos de vida não normativos,
sempre cerceadas pelo próprio contexto em que vivem.

3.1.3 Comportamento
Alguns estudos tentam descrever e explicar o desenvolvimento humano, predizendo que
tipos de comportamento poderiam ocorrer sob certas condições. O modo como os teóricos
explicam o desenvolvimento depende das seguintes questões:
O que é mais importante, a hereditariedade ou o ambiente?
Os teóricos diferem quanto à importância relativa que dão ao que é inato (genético, da or-
dem do natural) e à experiência (influências socioambientais e culturais). Quando se pesquisa
determinada pessoa, quase todas as características dela apontam para uma mescla de heran-
ça e experiência. Por exemplo, ainda que a inteligência tenha um forte componente hereditá-
rio, os fatores de estimulação dos pais e educação também são determinantes.
As “tendências naturais” das crianças, como as voltadas para música ou esportes, podem
ser desenvolvidas se praticarem atividades que reforcem essas tendências. Da mesma forma,
elas provavelmente não serão potencializadas se não forem treinadas.
O desenvolvimento é ativo ou passivo?
Para responder a essa pergunta, foram desenvolvidas duas grandes teorias que se contra-
dizem: a mecanicista e organísmica.
Alguns teóricos do modelo mecanicista entendem que as pessoas são como máquinas, que
reagem ao que lhes chega do ambiente, sendo que o comportamento dos organismos é muito
semelhante diante dos mesmos estímulos. Essa perspectiva busca identificar e isolar os fato-
res que fazem as pessoas reagirem de determinada forma.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 74


Já o modelo organísmico, vê as pessoas como organismos ativos em crescimento que põem
em marcha seu próprio desenvolvimento. Por essa perspectiva, as próprias pessoas desenca-
deiam os eventos, e não simplesmente reagem a eles, e o ímpeto para a mudança é interno.
Entende-se aqui, que as influências ambientais não causam desenvolvimento, embora possam
acelerá-lo ou retardá-lo, e a totalidade do comportamento de um ser humano é maior do que
a soma das partes que o compõem.
O desenvolvimento é contínuo ou ocorre em etapas?
Esses mesmos modelos diferem em relação a essa questão.
Os teóricos mecanicistas veem o desenvolvimento como algo contínuo, sendo governado
pelos mesmos processos, permitindo a previsão de comportamentos posteriores a partir dos
que já aconteceram. Esses pensadores concentram-se na mudança quantitativa, como a quan-
tidade de vezes que um organismo respondeu daquela forma.
Já os teóricos organísmicos enfatizam a mudança qualitativa, compreendendo o desenvol-
vimento como algo que ocorre em uma série de etapas distintas. Para eles, em cada etapa, as
pessoas lidam com diferentes tipos de problemas e desenvolvem diferentes tipos de capacida-
des. Cada fase é constituída pelas fases anteriores, e esta prepara o caminho para a seguinte.
Uma tendência científica
A ciência é construída por perspectivas epistemológicas diferentes, e é comum que os pes-
quisadores discordem entre si e, depois, de si (ao amadurecerem os próprios estudos).
As teorias tendem a se enquadrar em várias perspectivas teóricas amplas. Cada uma de-
las enfatiza diferentes tipos de processos de
desenvolvimento e possui diferentes concep-
ções sobre essas questões.
É válido lembrar que os cientistas não ne-
cessariamente se posicionam em uma ou outra
teoria, mas que tendem a compreender o ser
humano mais de uma forma do que de outra.
O que vem ocorrendo ultimamente na comunidade científica é uma tendência dialética, no
sentido do ser humano que constitui e é constituído em seu desenvolvimento ser tanto ativo
quanto passivo. Isso quer dizer que estudos das últimas décadas estão consolidando olhares
que englobam questões biopsicossociais no desenvolvimento humano, existindo forte influên-
cia tanto genética como ambiental.
Essas perspectivas influenciam as perguntas que os pesquisadores fazem, os métodos que
utilizam e os modos como interpretam os dados. Portanto, para avaliar e interpretar a pesqui-
sa, é importante reconhecer a perspectiva teórica em que ela se baseia.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 75


3.2 Ciclo do desenvolvimento humano
Quando falamos em desenvolvimento humano, logo associamos aos períodos do ciclo de
vida, como a infância, adolescência, vida adulta e velhice.
Porém, ressalta-se que o conceito dos ciclos de vida é uma construção social, ou seja, é um
conceito construído a partir dos valores e significados sociais compartilhados por uma deter-
minada cultura.
Desta forma, há o reconhecimento que as pessoas pensam, sentem e agem de maneiras
específicas a depender de sua idade e fase do desenvolvimento, porém, cada sociedade divide
os ciclos de vida sob parâmetros diferentes.
Além disso, apesar de serem descritas as idades de cada ciclo de vida, não há parâmetros
rígidos quanto ao início e fim de cada fase, pois além do tempo cronológico, há influência dos
aspectos físicos, psicológicos e dos marcos sociais (os rituais) que caracterizam as mudanças
de um ciclo para o outro.
Desde o momento da concepção, os indivíduos passam por diferentes processos de de-
senvolvimento, os quais são descritos, de forma didática, em três dimensões: físico, cognitivo
e psicossocial.
As mudanças do corpo, o crescimento
do cérebro, o desenvolvimento das capaci-
dades sensoriais, habilidades motoras e os
aspectos da saúde constituem o desenvol-
vimento físico.
As alterações e a estabilidade das capaci-
dades mentais, como memória, aprendiza-
gem, pensamento, linguagem, julgamento
moral e criatividade fazem parte do desen-
volvimento cognitivo.
As mudanças e a estabilidade na personali-
dade e nos relacionamentos sociais integram
o desenvolvimento psicossocial.
Apesar da distinção destas três dimensões, o desenvolvimento é um processo unificado,
pois, ao longo de toda a vida, os aspectos físico, cognitivo e psicossocial estão interligados, ou
seja, mudanças que ocorrem em uma dimensão influencia a outra e vice-versa.
No campo do desenvolvimento humano existem diferentes abordagens teóricas e com-
preensões sobre os estágios da vida, conforme mostra a Tabela 2.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 76


Tabela 2. Seis perspectivas sobre o desenvolvimento humano
Perspectiva Teorias Importantes Crenças Básicas

Teoria psicossexual O comportamento é controlado por poderosos


de Freud impulsos inconscientes.
Psicanalítica
Teoria psicossocial de A personalidade é influenciada pela sociedade e
Erikson desenvolve-se através de uma série de crises.

Behaviorismo ou teoria
da aprendizagem As pessoas são reativas; o ambiente controla o
tradicional (Pavlov, comportamento.
Aprendizagem Skinner, Watson)

Teoria da aprendizagem As crianças aprendem em um contexto social


social (sociocognitiva) pela observação e imitação de modelos; a pessoa
(Bandura contribui ativamente para a aprendizagem.

As pessoas têm a capacidade de tomar


Teoria da auto-
Humanista conta de suas vidas e promover seu próprio
realização de Maslow
desenvolvimento.

Mudanças quantitativas no pensamento ocorrem


Teoria dos estágios
entre a primeira infância e a adolescência.
congnitivos de Piaget
Pessoa desencadeia ativamente o desenvolvimento.
Cognitiva
Teoria do
processamento de Seres humanos são processadores de símbolo.
informações

Os seres humanos possuem mecanismos para


sobreviver; dá-se ênfase aos períodos críticos
Teoria do apego de
Etológica ou sensíveis; bases biológicas e evolucionistas
Bowlby e Ainsworth
para o comportamento e predisposição para a
aprendizagem são importantes.

O desenvolvimento ocorre através da interação


Teoria bioecológica entre uma pessoa em desenvolvimento e cinco
de Bronfenbrenner sistemas contextuais de influências circundantes,
Contextual interligados, do microssistema ao cronossistema.

Teoria sociocultural O contexto sociocultural da crença tem importante


de Vygotsky impacto sobre o desenvolvimento.

Fonte: PAPALIA; FELDMAN, 2013 (Adaptado).

3.2.1 Infância
A palavra infância tem origem no latim infantia, do verbo fari = falar, em que fan = falante e in cons-
titui a negação do verbo. Sendo assim, infans refere-se ao indivíduo que ainda não é capaz de falar.

CURIOSIDADE:
Na história da infância, nota-se que a preocupação com as crianças é vista somente
a partir do século XIX, tanto no Brasil como em outros lugares. Na era medieval, por
exemplo, as crianças eram vistas como mini adultos, sendo tratadas sem discrimi-
nação e não tinham cuidados especiais.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 77


De modo geral, a infância é compreendida como o período que se inicia com o nascimento
e vai até a puberdade. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069 de 13 de
julho de 1990), considera criança a pessoa com até 12 anos incompletos.
As mudanças que ocorrem durante os primeiros anos de vida são as mais amplas e rápidas
quando comparadas com qualquer outro momento da vida.
Com o intuito de facilitar a compreensão destas múltiplas transformações e o grande de-
senvolvimento deste ciclo de vida, alguns autores chegam a dividir esta fase em três períodos:
primeira infância (0 – 3 anos), segunda infância (3 – 6 anos) e terceira infância (6 – 11 anos).
A mente infantil era descrita como similar à do adulto, e acreditava-se que as crianças ape-
nas sabiam menos do que os adultos. Porém, novas experiências e pesquisas foram eviden-
ciando que, na verdade, as crianças pensam de maneira diferente, e não meramente menos
que os adultos.
O psicólogo suíço Jean-Piaget elaborou a
perspectiva construtivista, baseando suas
teorias do pensamento lógico a partir de ob-
servações das capacidades das crianças em
interpretar ou construir a realidade, e assim
propôs uma sequência de estágios do de-
senvolvimento cognitivo (sensório-motor,
pré-operatório, operações concretas e opera-
ções formais), os quais serão descritos deta-
lhadamente em cada fase correspondente da
infância e adolescência.
Primeira infância
O bebê recém-nascido, nas primeiras quatro semanas de vida, é chamado de neonato. Ao
nascer, ele pesa em média três quilos e mede aproximadamente entre 45 e 53 centímetros, e
eles são bastante responsivos, ativos e atentos.
Durante o parto, é possível existir algumas complicações que ocasionam trauma no nasci-
mento, baixo peso natal e o nascimento hipermaturo, que colocam em risco a vida do recém-
-nascido. Entretanto, o ambiente pós-natal e outros fatores de proteção contribuem para a
melhora do desenvolvimento destes bebês que sofreram complicações no nascimento.
Desde o nascimento, o bebê tem ampla gama de capacidades sensoriais, como o olfato e
paladar, os quais começam a se desenvolver desde a vida intrauterina (os sabores e aromas
dos alimentos que a gestante consome, são transmitidos para o feto por meio do líquido am-
niótico). O tato é inicialmente o sistema sensório mais maduro.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 78


Embora não consigam focar com exatidão em um objeto, os recém-nascidos têm um nível
de visão que consegue acompanhar objetos em movimento, assim como a percepção de cores
(aos dois meses distinguem o verde do vermelho; com três meses podem identificar o azul; aos
quatro meses sabem identificar o vermelho, o verde, o azul e o amarelo).
Em relação à audição, sabe-se que os bebês ouvem desde o momento de vida intrauterina,
chegando ao mundo com preferências de sons com os quais já estão acostumados.
As necessidades de alimentação e sono mudam muito rápido, principalmente durante o
primeiro ano de vida, sendo fatores essenciais para um crescimento saudável.
Os bebês apresentam comportamentos reflexos, que são reações inatas, involuntárias e
automáticas diante uma estimulação. Estes comportamentos desempenham um importante
papel na estimulação do desenvolvimento inicial do sistema nervoso central e dos músculos.

Tabela 3. Comportamentos reflexos dos bebês

Comportamento do Idade típica de Idade típica de


Reflexo Estimulação
bebê aparecimento desaparecimento

Estica pernas, braços e


Bebê é derrubado ou Sétimo mês de
Moro dedos; curva-se e joga a Três meses
ouve um estampido. gestação
cabeça para trás.

Fecha o punho com


Darwiniano Acaria-se a palma da força; pode ser erguido Sétimo mês de
Quatro meses
(preensão) mão do bebê. se ambos os punhos gestação
agarrarem um bastão.

Vira a cabeça para o


lado, assume posição
de “esgrimista”, estende
Tônico- Deita-se o bebê de Sétimo mês de
braços e pernas para Cinco meses
cervical costas. gestação
o lado preferido e
flexiona os membros
opostos.

Abre a boca, fecha


Acariciam-se as duas
os olhos, flexiona o
Babkin palmas da mão do bebê Nascimento Três meses
pescoço, inclina a
ao mesmo tempo.
cabeça para frente.

Acaricia-se a planta do Abre os dedos dos pés


Babinski Nascimento Quatro meses
pé do bebê. em leque; pé se retorce.

Toca-se a bochecha ou Vira a cabeça; abre


Sucção lábio inferior do bebê a boca, inicia os Nascimento Nove meses
com o dedo ou mamilo. movimentos de sucção.

Segura-se o bebê por


Faz movimentos
baixo dos braços, com
Marcha semelhantes aos do Um mês Quatro meses
pés nus tocando uma
caminhar.
superficie plana.

Bebê é colocado na Faz movimentos


Natação água com o rosto natatórios Um mês Quatro meses
voltado para baixo. coordenados.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 79


Reflexo de sucção Reflexo de darwiniano Reflexo tônico-cervical

Reflexo de moro Reflexo de babinski Reflexo de marcha

Figura 2. Reflexos humanos iniciais. Fonte: PAPALIA; FELDMAN. 2013.

A aquisição da linguagem é um aspecto importante do desenvolvimento cognitivo. Inicial-


mente, a forma de comunicação do bebê é o choro, depois evolui para o balbucio, imitação dos
sons das palavras e uso de gestos. A primeira palavra aparece tipicamente entre os 10 e 14 me-
ses, sendo que aos três anos, as capacidades de comunicação já estão bastante desenvolvidas.
Neste desenvolvimento, o fato de ler em voz alta para a criança desde tenra idade favorece
a alfabetização. Além do fato de que a fala dirigida à criança, traz benefícios cognitivos, emo-
cionais e sociais.
Adquirir a linguagem se torna um fator importante para o desenvolvimento da personalida-
de, uma vez que ao ouvir os outros dizendo sobre ela, a criança começa a reconhecer certas
sensações, sentimentos e características como suas.
As habilidades motoras desenvolvem-se por meio de uma série de marcos, assim toda capa-
cidade adquirida prepara a criança para lidar com a etapa seguinte, como por exemplo erguer
e segurar a cabeça quando deitado de bruços, engatinhar pelo chão e caminhar suficiente-
mente bem.
De zero a dois anos, os bebês estão no estágio de desenvolvimento cognitivo “sensório-mo-
tor”. Eles entendem e percebem o mundo por meio de suas experiências sensoriais e motoras,
ou seja, pela visão, tato, paladar, olfato e manipulação.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 80


Aprendem que comportamentos específicos apresentam determinadas consequências, por
exemplo, puxar faz o móbile se movimentar.
Neste estágio, algo que esteja fora do campo de visão do bebê, equivale a não existir. Por
isso, os bebês gostam tanto da brincadeira de esconde-esconde, pois eles acreditam que
a pessoa ou o objeto realmente sumiu, demonstrando surpresa e contentamento quando
eles reaparecem.
Os bebês apresentam também a capacidade de imitar novas respostas que vivenciam, por-
tanto, há o início da formação de representações mentais simples.
Desenvolve-se a autoconsciência e há progressiva mudança da dependência para a
autonomia.

CURIOSIDADE:
Terríveis dois anos é o termo usado para se referir ao período dos dois anos de
idade, em que as crianças querem experimentar suas próprias decisões e exercitar
suas preferências. Geralmente, esse comportamento ocorre na forma de negativis-
mo, na tendência de exclamar o “Não!”, opondo-se à autoridade.

No que diz respeito ao desenvolvimento social, gradativamente, desde a fase da amamen-


tação, a criança vai adquirindo comportamentos e conceitos que favorecem sua participação
na convivência em grupo.
Chamado de socialização, este processo ocorre na medida em que os pais e outras pessoas
orientam as crianças para os comportamentos e valores da sociedade em que estão inseridos.
Através do tato e da troca de afetos, há a formação de vínculos entre a criança, seus pais e
outras pessoas. Os padrões de apego (seguro, inseguro evitativo, ambivalente ou desorganiza-
do) podem depender do temperamento do bebê bem como das qualidades dos cuidados que
receberam, apresentando implicações a longo prazo no desenvolvimento social da criança.
Segunda infância
Nesta fase, o crescimento físico é constante. Há a manifestação da preferência no uso de
uma das mãos, e a força e habilidades motoras (simples e complexas) aumentam. Nesta faixa
etária, é comum o aparecimento do altruísmo, da agressividade e dos medos.
Aumenta-se a independência, a iniciativa e o autocontrole. Nesta fase, as brincadeiras são
mais imaginativas (faz de conta), complexas e sociais. A família ainda se configura como o foco
da vida social, mas outras crianças começam a se tornar figuras mais importantes na medida
em que têm contato com colegas na pré-escola.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 81


Figura 3. Dos três aos seis: Segunda infância. Fonte: Shutterstock. Acesso em: 08/04/2019.

Dos dois aos sete, as crianças passam pelo estágio de desenvolvimento cognitivo, chamado
“pré-operatório”.
Neste estágio, as crianças se orientam pelas percepções que tem da realidade, e conseguem
resolver problemas manipulando objetos concretos, como por exemplo, identificar entre três
caixas qual é a maior; entretanto, ainda apresentarão dificuldades com questões abstratas.
Durante a fase pré-escolar há a expansão da curiosidade intelectual, sendo recorrente as
perguntas “o que é isso? ” e “por que?”
Apresentam pensamento egocêntrico, centrados no eu. Tendem a enxergar o mundo essen-
cialmente com base nas próprias perspectivas, sendo difícil para elas se colocarem no lugar
de outras pessoas e compreender a existência de outras perspectivas. Neste aspecto, nota-se
também, em conjunto com a curiosidade, que a criança faz aquilo que ela tem vontade, bus-
cando o prazer imediato.
Terceira infância
Neste momento do desenvolvimento, o crescimento físico desacelera. Os meninos são ligei-
ramente mais altos do que as meninas no início desta fase, porém, as meninas apresentam o
estirão da adolescência mais cedo e, assim, tendem a ser mais altas comparadas aos meninos
no fim da terceira infância.
Há o aperfeiçoamento da força e das habilidades físicas, bem como do desenvolvimento motor,
ampliando as possibilidades de atividades motoras que antes eles já eram capazes de realizar.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 82


Figura 4. Dos seis aos 11 anos: Terceira infância. Fonte: UFMS, 2018.

O egocentrismo diminui e a memória e habilidades linguísticas aumentam. O autoconceito


que a criança tem de si mesma torna-se mais realista e tem influência direta com a autoestima.
Em idade escolar, as crianças internalizam a vergonha e o orgulho, sendo capazes de com-
preender e controlar as emoções negativas.
As amizades tornam-se mais importantes nessa fase, e geralmente o grupo de amigos é
formado tendo como referência a mesma idade, gênero e quando moram perto um do outro
ou frequentam a mesma escola.
Dos sete aos 11 anos de idade, a criança está no estágio de desenvolvimento cognitivo das
operações concretas, no qual há o desenvolvimento da capacidade de usar a lógica.
As crianças passam a conquistar a habilidade de realizar operações mentais silenciosas.
Assim, com o raciocínio para resolver problemas, os recursos de categorização e classificação
dos objetos é expandido.
A capacidade de raciocínio lógico está atrelada à habilidade de levar em consideração os
múltiplos aspectos de uma situação, mas ainda se restringem ao aqui e agora.
Nota-se que, apesar deste desenvolvimento, as crianças neste estágio ainda apresentam
dificuldades com ideias e conceitos abstratos e resolvem os problemas por tentativa e erro.
A base estabelecida na primeira série é muito importante, visto que a escolarização se ca-
racteriza como um processo cumulativo. Os pais têm influência significativa no aprendizado,
principalmente quando se envolvem na vida escolar de seus filhos, motivando-os e transmitin-
do atitudes e modelos positivos em relação ao ensino-aprendizagem.
Algumas crianças, nessa fase escolar, podem apresentar dificuldades de aprendizagem, po-
dendo ser necessária uma atenção individualizada e diferenciada.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 83


3.2.2 Adolescência
A adolescência é considerada uma fase de transição entre a infância e a vida adulta. Entre-
tanto, o seu começo e seu fim não são claramente definidos. As definições legais, sociológicas
e psicológicas variam de uma cultura para outra, apresentando rituais especiais que sinalizam
a chegada da maioridade.
No Brasil, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069 de 13 de
julho de 1990), é considerado adolescente a pessoa que tem entre doze e dezoito anos de ida-
de. Após esta idade, o jovem já responde como um adulto e tem os mesmos direitos e deveres
que o mesmo.

CURIOSIDADE:
Considerando os modelos atuais de vida: os jovens saem mais tarde da casa dos
pais, prolongamento dos estudos, maior período de dependência financeira etc.,
novos estudos enfatizam que esteja ocorrendo um prolongamento da adolescên-
cia, sendo esta considerada até os 24 anos.

O adolescente é um ser em conflito que precisa, ao mesmo tempo, desprender-se do seu


mundo infantil, que é cômodo e prazeroso, e enfrentar o mundo adulto, tendo que lidar
muitas vezes com exigências e expectativas
conflitantes e com diversas responsabilida-
des ainda desconhecidas.
De modo geral, considera-se que a ado-
lescência tem início na puberdade, processo
biológico que conduz à maturidade sexual, ou
seja, a capacidade de reprodução.
Neste processo, ocorrem mudanças hor-
monais que podem afetar tanto o humor
quanto o comportamento do adolescente.
Essas mudanças são sentidas como verdadeiras invasões, pois independentemente do de-
sejo do adolescente, elas irão ocorrer. Como resultado, há o rápido aumento de altura e peso,
mudanças nas proporções e na forma do corpo, além da obtenção da maturidade sexual (para
os homens é a produção do esperma e para as mulheres a primeira menstruação). A Tabela 4
mostra a sequência usual das mudanças fisiológicas na adolescência:

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 84


Tabela 4. Mudanças fisiológicas na adolescência

CARACTERÍSTICAS FEMININAS IDADE DE APARECIMENTO

Crescimento dos seios 6-13

Crescimento dos pelos pubianos 6-14

Crescimento corporal 9,5-14,5

Menarca 10-16.5

Cerca de dois anos após o aparecimento de pelos


Pelos axilares
pubianos.

Aumento na produção das glândulas sebáceas e Aproximadamente na mesma época que o


sudoríparas (o que pode causar acne) aparecimento de pelos axilares

CARACTERISTICAS MASCULINAS IDADE DE APARECIMENTO

Crescimento dos testículos, escroto 10-13,5

Crescimento dos pelos pubianos 12-16

Crescimento corporal 10,5-16

Crescimento do pênis, da próstata, das vesículas


11-14,5
seminais

Aproximadamente na mesma época que o


Alteração na voz
crescimento do pênis

Aproximadamente um ano depois do início do


Primeira ejaculação de sémen
crescimento do pênis

Aproximadamente dois anos após o aparecimento


Pelos faciais e axilares
de pelos pubianos

Aumento na produção das glândulas sebáceas e Aproximadamente na mesma época que o


sudoríparas (o que pode causar acne) aparecimento de pelos axilares

Fonte: PAPALIA; FELDMAN., 2013 (Adaptado).

Não é só a aparência física que exibe mudanças na transição da infância para adolescência,
o modo de pensar também muda.
Seguindo a teoria dos estágios cognitivos de Piaget, os adolescentes estão na fase das ope-
rações formais, momento em que desenvolvem o pensamento abstrato, apresentando a ca-
pacidade de antecipação, análise, compreensão de metáforas e construção de teorias.
Além disso, começam a ser capazes de planejar o futuro de maneira mais realista, pois não
se restringem ao aqui e agora, passando a assimilar também o tempo histórico.
Neste estágio, os adolescentes tendem a analisar os acontecimentos de maneira mais crítica e
reflexiva. Analisam questões mais amplas e complexas, buscando compreender a vida, a própria
identidade, questões sociais e de religião, e demonstram incômodo frente às contradições.
Sendo assim, apesar do pensamento dos adolescentes ainda não estar completamente ma-
duro, eles são capazes de raciocinar de maneira abstrata e, ao abandonar o pensamento ego-
cêntrico, passam a elaborar juízos morais tendo como base o senso de justiça.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 85


Além destas mudanças corporais e mentais, a adolescência se caracteriza como um período
de vida bastante intenso, no qual o jovem está buscando conhecer a si mesmo, e nesta busca
tem-se a construção de sua identidade, que engloba componentes da identidade profissional,
sexual e também relativos aos valores nos quais acredita e os quais quer viver.
Nesse processo de amadurecimento, os pais são figuras que desempenham grande influên-
cia, geralmente a aprovação e a desaprovação por parte deles tende a ser muito poderosa.
Grande parte dos conflitos com os familiares ocorre em torno do ritmo de desenvolvimento
dos adolescentes rumo à independência, englobando o “quanto” ou “quando” os adolescentes
querem ter e/ou devem ter de liberdade.
No período da adolescência, os pares – os companheiros da mesma faixa etária – estão mais
presentes do que em qualquer outra fase. Os adolescentes se voltam fortemente para seus
pares, sendo comum a tendência grupal. O adolescente busca, na interação com outros, apoio
emocional e uniformidade, que traz segurança e estima pessoal.
Diferentemente dos pais, o grupo tende a interagir como iguais, compartilham as mesmas
ideias, gostos, experiências etc. Assim, o adolescente tem sua identidade reconhecida ao fazer
parte de um grupo.
As famosas “panelinhas” são características desta fase. A partir do meio e no fim da adoles-
cência, a formação de grupos mistos entre meninos e meninas se tornam cada vez mais comuns.
O grupo de pares podem ter influências tanto positivas quanto negativas. Se for rejeitado
pelos amigos, por exemplo, o jovem pode apresentar algumas dificuldades de adaptação.

Figura 5. Tendência grupal. Fonte: ICIJ, 2018.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 86


Na adolescência, a questão da orientação sexual se torna mais evidente, pois é justamente
o período de descobertas e experimentações. Neste contexto, é muito importante a educação
e orientação dos jovens para os cuidados necessários a fim de se prevenir contra os riscos de
gravidez e de doenças sexualmente transmissíveis.
Além dos riscos sexuais, há outros problemas de saúde e riscos comuns da adolescência,
tais como: transtornos de alimentação (obesidade, anorexia e bulimia nervosa) e o uso/abuso
de substâncias químicas.
Soma-se a estes riscos, as questões de saúde emocional: os jovens estão cada vez mais
apresentando dificuldades em lidar com as frustrações, ao mesmo tempo em que estão en-
frentando grandes pressões para ser bem-sucedido e conquistar muitas coisas. Além disso,
estão lidando com os novos modelos de relacionamentos pelo mundo virtual, sendo assim,
existem os casos de depressão, suicídio, bullying e sofrimento emocional, casos que reque-
rem atenção e cuidados de profissionais da saúde.

ASSISTA:
Assista a série 13 reasons why,, que trata do suicídio de uma adolescente e as con-
sequências dessa ação na vida de seus amigos e familiares. A série retrata também
outras vivências características da adolescência: bullying, uso de substâncias quími-
cas, tendência grupal e descobertas sexuais.

3.2.3 Vida adulta


Na vida adulta, há a compreensão de duas fases: a de jovem adulto, entre os 20 e 40 anos,
e a meia-idade, dos 40 aos 65 anos.
Por volta dos 20 anos, a maioria das funções corporais estão plenamente desenvolvidas,
possibilitando dizer que os jovens adultos são pessoas que estão no auge de sua condição fí-
sica: o paladar, o olfato e a sensibilidade à dor e à temperatura, normalmente não apresentam
mudanças até, pelo menos, os 45 anos de idade.
Entretanto, essa condição física se correlaciona diretamente com hábitos saudáveis de vida
e à prática de exercícios físicos. A vida saudável também se correlaciona com a educação e com
a renda superior, que favorecem o acesso a melhores condições de saúde.
No que se refere ao estágio cognitivo do adulto, há a descrição de um pensamento pós-for-
mal, que é relativista, uma vez que possibilita ao adulto transcender o sistema lógico único,
conciliando e selecionando ideias a partir de sua própria perspectiva. Ou seja, se caracteriza

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 87


por ser um tipo de pensamento maduro, no
qual o adulto utiliza sua experiência subjetiva
e a intuição, em conjunto com a lógica, para
lidar com um mundo que apresenta ambigui-
dades, incertezas e contradições.
Na fase adulta jovem, o trabalho e os rela-
cionamentos se caracterizam como dois de-
safios centrais da vida adulta.
No campo do trabalho, inicialmente, o jovem adulto tem que lidar com as escolhas educacionais
e profissionais após o ensino médio. Depois, há a busca por uma colocação no mercado de traba-
lho, sendo que nos dias atuais, não há um único trajeto correto a ser seguido, em decorrência de
um mercado de trabalho instável e aberto a mudanças. Além disso, as habilidades e competências
comportamentais do profissional também são aspectos relevantes em paralelo à formação.
Tanto no período de estudos universitários ou técnicos, quanto nos espaços de trabalho,
são ótimas as oportunidades de descoberta intelectual e de desenvolvimento pessoal.
Em geral, o desempenho no trabalho aumenta conforme a idade e a experiência, pelo me-
nos, até a meia-idade, e algumas pessoas continuam desenvolvendo sua produtividade ainda
em idades avançadas.
No que se refere aos relacionamentos, o início da idade adulta se caracteriza como uma fase
de mudanças, na qual o jovem estabelece, renegocia e consolida laços baseados na amizade,
na sexualidade e no amor.
As pessoas tendem a escolher parceiros que sejam semelhantes a si mesmas, pois a simi-
laridade proporciona uma base para o compartilhamento de atividades agradáveis, além de
favorecer a autoconfiança.
Desde a metade do século XX, as sociedades ocidentais deixaram de se orientar pelo reló-
gio social, que são as normas ou expectativas da cultura para o momento apropriado de cada
evento da vida (idade certa para casar-se, ter filhos, começar a trabalhar etc.). Sendo assim,
essas cobranças e comparações se tornaram menos rígidas, evidenciando a importância de
valorizar e respeitar o ritmo de desenvolvimento de cada pessoa, considerando também todo
o seu contexto e trajetória.

PAUSA PARA REFLETIR


Você alguma vez já se descreveu como “atrasado”, “adiantado” ou “em época” para, por exem-
plo, se fixar em uma carreira, se casar, se aposentar, ou qualquer outra expectativa cultural?

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 88


Assim, há uma liberdade maior de se seguir estilos de vida adequados aos desejos e interes-
ses de cada um, seja solteiro, casado, morando junto ou escolhendo se separar, bem como na
decisão de se ter ou não filhos.
Decisões estas que terão impactos no desenvolvimento e amadurecimento do adulto, prin-
cipalmente na consolidação de sua identidade, posições sociais, ganho de experiências e esta-
belecimento de novas formas de se relacionar, como por exemplo, a existência de diferentes
estruturas familiares.
A meia-idade, até pouco tempo atrás, era um dos períodos do ciclo de vida menos estuda-
dos, com exceção da ideia da crise da meia-idade. Era considerado um período monótono
entre as grandes transformações do início da vida adulta e da velhice.
O termo meia-idade passou a ser utilizado na Europa e nos Estados Unidos na virada do
século XX, sendo relativamente um conceito novo e socialmente construído a partir do prolon-
gamento da expectativa de vida.
As pessoas de meia-idade tornam-se progressivamente introspectivas e reflexivas, tenden-
do a pensar mais a respeito do “tempo que resta a viver” ao invés do “tempo desde o nasci-
mento”. Normalmente, elas relatam preocupar-se com o corpo, algo denominado pelos psicó-
logos como o monitoramento físico, principalmente porque pertencem a uma sociedade que
valoriza padrões de beleza e a jovialidade. Essas pessoas tendem a adotar comportamentos e
estratégias protetoras para manter a aparência ou o desempenho em algum nível desejável.
É uma época de reavaliação da vida, e aqueles que são pais e mães, tendem a examinar seus
relacionamentos com os filhos adolescentes e adultos. Como também tendem a se preocupar
com os próprios pais, ao mesmo tempo em que são relembrados de seu próprio envelheci-
mento: eles se preocupam com o fato de que ficarão velhos, terão as mesmas doenças dos pais
e irão ficar dependentes dos filhos.
Apesar dos estudos sobre os aspectos da personalidade apontarem notável consistência
ao longo do tempo, durante a meia-idade há evidência de mutação ou abrandamento. As ex-
periências de vida passam a influenciar e alterar as qualidades de autoestima, valores e senti-
mento de controle. De modo geral, tanto homens quanto mulheres de meia-idade sentem-se
mais livres para demonstrar suas características e interesses pessoais que haviam sido rejeita-
dos ou parcialmente realizados.
A crise da meia-idade tem como uma das características as preocupações relacionadas à se-
xualidade e ao funcionamento reprodutivo: os homens têm sua fertilidade diminuída e as mulhe-
res vivenciam a menopausa, entretanto, o prazer sexual permanece durante toda a vida adulta.
Vejamos a Tabela 5 com as principais mudanças nos aparelhos reprodutivos durante a
meia-idade:

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 89


Tabela 5. Mudanças nos aparelhos reprodutivos na meia-idade

FEMININO MASCULINO

Diminuição de estrogênio e de
Mudança hormonal Diminuição da testosterona
progesterona

Calorões, secura vaginal e


Sintomas Indeterminados
disfunção urinária

Perda de excitação psicológica,


ereções menos frequentes,
Excitação menos intensa,
organismos mais lentos,
Mudanças sexuais orgasmos menos frequentes e
recuperação mais lenta entre
mais rápidos
ejaculações, maior risco de
disfunção erétil

Continua: pode ocorrer certo


Capacidade Reprodutiva Término
decréscimo na fertilidade

Fonte: PAPALIA; FELDMAN., 2013. (Adaptado).

Acredita-se que as mudanças hormonais nas mulheres de meia-idade tenham amplas


consequências: os sintomas físicos (calorões, perda de cálcio, dores de cabeça etc.) e o de-
senvolvimento de rugas e flacidez da pele.
Soma-se a estas consequências a depressão, que entre suas causas de desenvolvimento,
há a menopausa, mas também outros aspectos próprios do envelhecimento, aumento de
estresse e propensões individuais.
O momento destas alterações físicas e hormonais coincide, geralmente, com a cessação
do papel principal de mãe e, com isso, para algumas mulheres (especialmente aqueles que
se dedicavam integralmente ao cuidado dos filhos), o envelhecimento pode estar atrelado à
perda de status e medo da solidão e rejeição.
Para os homens, as mudanças hormonais são mais gradativas, e as causas do mal-estar
da meia-idade também são variadas e complicadas. Uma das questões predominantes é
encontrar sentido na vida em paralelo com a questão do trabalho: atribuições desgastan-
tes e possibilidades de progresso são cada vez menores, pois, atingir o cargo máximo,
pode se configurar como uma crise, evidenciando a crença de que não tem mais progresso,
somente o declínio.
Apesar da maioria das pessoas de meia-idade serem saudáveis e não terem limitações
funcionais, iniciam-se algumas precauções e atenção para alguns fatores e riscos à saúde,
como: hipertensão, doenças cardíacas, osteoporose, entre outros.
O estresse aparece nesta fase, relacionado a uma variedade de problemas físicos e psico-
lógicos. Uma fonte relevante de estresse é o desgaste relacionado ao trabalho (sobrecarga,
conflitos interpessoais, esgotamentos etc.), como também a situação de desemprego.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 90


3.2.4 Velhice
A cultura exerce influência significativa na experiência do envelhecimento, pois ela afeta as
percepções sobre este ciclo de vida, que podem estar carregadas de preconceitos, ora conside-
rando a velhice como a “melhor idade” ou como o “anticlímax da vida”. Entretanto, a velhice é
um período como qualquer outro do ciclo de vida, com seus próprios desafios e perspectivas.
Especialistas no estudo do envelhecimento
referem-se a três grupos de pessoas mais ve-
lhas: idosos jovens (entre 65 e 74 anos), ido-
sos velhos (a partir de 75 anos) e idosos mais
velhos (com mais de 85 anos). Apesar de ser
uma categorização bastante usual, pesquisas
têm destacado o quão o processo de envelhe-
cimento é uma experiência heterogênea, en-
quanto algumas pessoas aos 60 anos já apre-
sentam incapacidades, outras aos 85 estão
“cheias de vida”.
Portanto, uma nova classificação utilizada é feita por idade funcional, ou seja, considera-se
o quão bem a pessoa funciona em um ambiente físico e social em comparação com outras de
mesma idade cronológica.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o número de pessoas com idade
superior a 60 anos chegará a dois bilhões de pessoas até 2050, representando um quinto da
população mundial.
Diante deste cenário, se faz presente a necessidade de as sociedades refletirem sobre os
papéis, direitos e responsabilidades dos idosos, como também direcionar os sistemas de cui-
dado e apoio a esta população.
Em culturas em que a juventude é valorizada, o envelhecer costuma ser aterrorizante, pois
significa perder as qualidades valorizadas. Assim como a beleza, a força e a agilidade, declinam
também os papéis desempenhados e a renda financeira.
Neste contexto, há a desvalorização do idoso pela perda de certas capacidades sensoriais
e motoras, principalmente quando associado ao fato de não ser uma pessoa ativa e produtiva
profissionalmente.
A maioria das pessoas nesta fase se aposenta, entretanto, algumas continuam trabalhando
por necessitarem da remuneração e outras começam novas carreiras, buscando seu senso de
identidade e valor, os quais estão atrelados ao permanecer ativo em uma profissão.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 91


Os processos sensoriais de ver, ouvir e saborear declinam com o avanço da idade, assim
como as habilidades motoras. Dessa maneira, os idosos levam mais tempo para realizar deter-
minadas tarefas. Entretanto, exercícios físicos podem auxiliar a manter as capacidades moto-
ras em pessoas que ultrapassam os 90 anos.
No que diz respeito à lentidão, de fato ela é presente nesta faixa etária. Aparece tanto no
movimento físico quanto no processamento de informações sensoriais, e nas habilidades inte-
lectuais, demonstrando ter relação com alguma mudança no sistema nervoso.
Além da lentidão, fatores como menor força muscular, perda da visão e da percepção de
profundidade contribuem para que os idosos sejam mais suscetíveis ao risco de quedas.
Com o avanço da idade, o interesse e a atividade sexual ainda são presentes, mas apresen-
tam algumas modificações: os homens necessitam de mais tempo para ter uma ereção e para
ejacular, experimentando maiores intervalos entre as ereções. Já as mulheres, apresentam
sinais de excitação menos intensos. Além disso, algumas disfunções sexuais podem aumentar,
mas são passíveis de tratamento.

Figura 6. Sexualidade do idoso. Fonte: BBC, 2017.

Em relação às capacidades cognitivas, algumas habilidades intelectuais podem se deterio-


rar, porém outras tendem a persistir ou até mesmo se expandir.
A capacidade de raciocinar rapidamente e de relembrar grande quantidade de informações
em um curto espaço de tempo são exemplos de inteligência fluída, a qual pouco se beneficia
do nível de instrução ou de experiências culturais, sendo uma das capacidades que declina na
fase da velhice, paralelamente às mudanças cerebrais.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 92


Já a inteligência cristalizada, que contem-
pla os conhecimentos gradativamente acu-
mulados e o potencial para solução de pro-
blemas, se mantém ao longo da vida.
Com a idade, as mudanças físicas são variá-
veis, tendo influência direta no estilo e hábito
de vida. É comum ocorrer a perda de colora-
ção, de textura e elasticidade da pele, bran-
queamento dos cabelos, diminuição na esta-
tura física, na espessura dos osso e tendência
a dormir menos. Os transtornos mentais co-
muns da velhice são: depressão, alcoolismo,
demência, mal de Alzheimer e de Parkinson.
Com o avanço da idade, a pessoa tem que lidar com diversos desafios, sendo a perda a mais
proeminente: do trabalho, de pessoas próximas que faleceram, do senso de competência pes-
soal e de autoridade.
Em relação à morte, os idosos relatam pensar nela mais do que as pessoas de outras faixas
etárias, entretanto, negam temê-la.
De modo geral, na velhice há uma maior dependência dos outros, entretanto, o desejo de
domínio e de controle por parte dos idosos tende a permanecer de maneira intensa, se refe-
rindo, no mínimo, às decisões cotidianas como horário de tomar banho, acordar e ir dormir.
Esse sentimento de domínio é benéfico à saúde mental e física, pois quando os idosos acre-
ditam possuir algum controle sobre o que está a sua volta, há tendências de melhora na saúde,
sociabilidade e mortalidade.
Além disso, o apoio social (familiares e amigos) apresenta efeitos positivos para o bem-estar
do idoso.
As pessoas idosas, ao lidar com estas transformações, apresentam modos de enfrentamen-
to diferentes, ou seja, desenvolvem pensamentos ou comportamentos adaptativos que visam
à redução ou alívio do estresse causado pelas condições prejudiciais e desafiadoras.
As estratégias de enfrentamento podem ser de enfoque no problema, com o objetivo de
eliminar ou administrar a condição estressante, ou nas emoções, com foco na administração
da resposta emocional frente a situação estressante, de modo a aliviar o impacto físico e psi-
cológico.
Conforme a Tabela 6, a religião foi citada por adultos mais velhos como uma das principais
estratégias de enfrentamento enfocado nas emoções.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 93


Tabela 6. Estratégias de enfrentamento de regulação das emoções menciona-
das por adultos mais velhos

FREQUÊNCIA DE MENÇÃO

ORDEM DE CLASSIFICAÇÃO NÚMERO %

Religioso 97 17.4

Manter-se ocupado 84 15.1

Aceitação 63 113

Apoio da família e dos amigos 62 11.1

Ajuda de profissional 34 6,1

Atitude positiva 31 5,6

Viver um dia de cada vez 29 53

Envolver-se em atividade sociais 19 3.4

Planejamento e preparação antecipados 15 2,7

Comunicação otimizada 13 2,3

Atividades limitadas; não se comprometer em demasia II 2,0

Busca de informação 8 1,4

Exercício físico 8 1,4

Ajudar outros mais necessitados 7 13

Percepção de que o tempo cura


7 13
todas as feridas

Evitar a situação 6 1,1

Experiência de dificuldades anteriores 5 0.9

Agir pelo bem dos outros 5 0.9

Ingestão de álcool, tranquilizantes 5 0.9

Agir como de costume 4 0,7

Tirar férias 3 0,5

Percepção de outros na mesma ou em pior situação 3 0,5

Liberação de emoção (chorar ou praguejar) 3 0.5

Expectativas reduzidas ou desvalorização 3 0,5

Diversos 31 5,6

Totais 556 100.6

Nota: 100 adultos mais velhos descreveram 556 comportamento de enfrentamento para 289
experiências estressantes.
Os percentuais somam mais do que 100 devido ao arredondamento.
Fonte: Koenig, George e Siegler, p. 306.

Fonte: PAPALIA; FELDMAN., 2013. (Adaptado).

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 94


3.3 O processo de adoecimento
Adoecer está ligado a ideia do surgimento de doenças ou dores, portanto, pode ser conside-
rado um desequilíbrio na saúde. O processo de adoecimento está vinculado às mais diversas
categorias humanas, ocorrendo o padecimento do aspecto biológico, psicológico ou social.
Como os seres humanos vivem todos os aspectos ao mesmo tempo, uma dimensão condicio-
na a outra. Nesse caso, uma pessoa que passa por desordem física, provavelmente terá seus
aspectos psicológicos e sociológicos abalados.
Para entender o que pode ser efetivamente uma doença ou um quadro patológico, pode-se
debruçar sobre o conceito de saúde.

3.3.1 Conceito de saúde


A saúde, etimologicamente, vem do latim salus, e significa um bom estado físico e sauda-
ção, relacionado à salvus, que quer dizer salvo.

AFIRMAÇÃO:
“Em geral, nove décimos da nossa felicidade baseiam-se exclusivamente na saúde.
Com ela, tudo se transforma em fonte de prazer”. (Arthur Schopenhauer).

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS): Saúde é um estado de completo bem-es-


tar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade.

PAUSA PARA REFLETIR


Se para estar saudável o ser humano deve estar gozando de bem-estar em todas as áreas, será
que todas as áreas do conhecimento deveriam focar na promoção da saúde?

O bem-estar, segundo a OMS, é a expressão que nos remete a um estado de ausência de


transtornos físicos, psíquicos e sociais. Isso quer dizer, então, que a saúde vai muito além do
corpo físico, pois precisa de um equilíbrio emocional, das relações entre os seres, e também do
equilíbrio socioeconômico para ser saudável.
Os aspectos citados levam a um olhar sobre o ser humano de um modo integral. Então, a
saúde verdadeira seria um estado no qual se leva em consideração que tudo depende de tudo,

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 95


já que todos os aspectos da vida humana estão interligados e ocorrem concomitantemente.
Essa ideia da integralidade é uma visão holística. Estar saudável engloba se conhecer, ter
consciência das próprias limitações e potencialidades, cavando possíveis caminhos para se
desenvolver e aprender com as próprias vivências.
Outro aspecto que faz parte da saúde é o entendimento e disponibilidade total da vida,
incluindo seus aspectos bons e difíceis. Aprender a viver com o desprazer é necessário, já
que a perfeita felicidade de uma pessoa dentro da civilização constitui algo impossível. Pela
perspectiva psicanalítica, a própria organização social e a condição da existência humana em
grupos baseiam-se em uma renúncia dos próprios impulsos. Viver em civilização proporciona
certos benefícios, mas também gera um constante sentimento de mal-estar.
Isso leva à problematização da definição da OMS, que se pauta no estado de completo bem-
-estar. Muitos pesquisadores questionam esse conceito e fazem crítica à romantização desse
tema. Por essas mesmas condições, não se pode falar em “perfeito bem-estar”.

CURIOSIDADE:
Recentemente, médicos dos EUA criaram uma entidade nosológica e lhe deram um
C.I.D.: é a “síndrome da felicidade”, incompatível com a situação do homem, com
suas dificuldades, dúvidas, medos e incertezas.

Ser saudável não é se adaptar passivelmente a tudo. Questionar, criticar, sofrer e se mobili-
zar diante de contradições sociais e frustrações faz parte do processo de estar vivo. O estado
extremo de hiperadaptação mental é pautado em uma vida psíquica severamente empobre-
cida, já que a fantasia se torna amortecida, havendo um rebaixamento da criatividade e da
possibilidade de transformação da realidade.
Saúde no Brasil
Há, também, uma forma complementar e essencial para se compreender o conceito de saú-
de no contexto brasileiro, que é como um direito à cidadania. Ele foi expresso na Constituição
Brasileira de 1988, abordando a saúde na perspectiva política, econômica e social.
Pela legislação, a saúde é um direito de todos e dever do estado, garantido perante medidas
políticas públicas e intervenções sociais e econômicas, que visem à redução do risco à doença
e garantam acesso universal e igualitário dos cidadãos às ações e serviços para a sua promo-
ção, proteção e recuperação.
O Sistema Único de Saúde (SUS) é uma nova formulação política e organizacional para a
efetivação do que foi proclamado em legislação. Seus princípios doutrinários foram estabe-

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 96


lecidos pela Lei Orgânica de Saúde. São eles: a universalidade (acesso à saúde para todos os
brasileiros, sem qualquer discriminação), integralidade (serviços de promoção, proteção, cura
e reabilitação) e equidade (tratar as diferenças em busca de igualdade).
Além dos princípios, do ponto de vista do funcionamento do SUS, devem-se considerar
suas diretrizes organizativas, as quais buscam garantir um melhor funcionamento do sistema.
São eles: a descentralização (municipalização da gestão), a regionalização (melhor distribuição
dos recursos entre as regiões) e a hierarquização (ordenar o sistema por “níveis de atenção e
estabelecer fluxos assistenciais entre os serviços) de princípios organizacionais.
Veja no Diagrama 1 a sintetização dos princípios do SUS:

Diagrama 1. Princípios do SUS

Princípios do SUS

Ideológicos
Organizacionais
ou doutrinários

Universalidade Descentralização
Integralidade Regionalização
Equidade Hierarquização

Fonte: PLS, 2018. (Adaptado).

Vale lembrar que o SUS é um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo. Ele abrange
desde o simples atendimento ambulatorial até o transplante de órgãos, oferece consultas, exames
e internações, promove campanhas de vacinação e ações de prevenção e vigilância sanitária.

3.3.2 Aspectos psicossociais do processo saúde/doença


Existem várias formas de se compreender o processo de saúde e doença humana. A pers-
pectiva biopsicossocial enfatiza a inter-relação das dimensões biológica, psicológica e socioló-
gica nestes processos.
Ela se pauta na teoria sistêmica, que preconiza a saúde e qualquer outra questão enredada
em uma hierarquia de sistemas. Cada um deles é composto de modo simultâneo a outros sub-
sistemas e a uma parte maior do sistema abrangente. Veja na Fig. 7 como se relacionam essas
dimensões e, em seguida, alguns exemplos concretos das inter-relações dos sistemas:

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 97


Hierarquia de sistema

Podemos classificar os siste- Supersistema


mas segundo sua hierarquia: (ecossistema)

• Sistema Sistema
O que se está estudando no
momento
Subsistema
• Subsistema
As partes identificadas que Subsistema
integram o sistema

• Supersistema
(ecossistema)
O todo, o sistema é parte dele

Figura 7. Hierarquia de sistemas sob a perspectiva da teoria sistêmica. Fonte: SlidePlayer, 2014. (Adaptado).

Pensar em saúde na abordagem sistêmica se pauta no conceito fundamental de que um


sistema, em determinado nível, acaba sendo afetado por sistemas de outros níveis, afetando-
-os de volta. Isso permite compreender o ser humano em todas as suas dimensões, ou seja,
de forma integral.
Um exemplo do conceito de saúde na abordagem sistêmica é: alguém que tem o sistema
imunológico enfraquecido, pode ter seus órgãos internos afetados, o que leva à sensação de
mal-estar no corpo e afeta a relação dessa pessoa com amigos e familiares, podendo gerar um
possível quadro de tristeza e exaustão.
Por essa perspectiva, pode-se entender que a doença, efetivamente, possui caráter históri-
co e social. Mas quando se pensa no conceito de saúde, ela parece se definir social e psicologi-
camente, e quando se pensa na palavra “doença”, tende-se a pensar em um processo biológico
que ocorre na população.
Para isso, é importante entender que tanto o processo de saúde quanto o processo de
doença são atravessados pelos aspectos biopsicossociais.
Aspecto biológico
Tudo que acontece no ser humano, como pensamentos, comportamentos e sonhos, neces-
sariamente passam pela estrutura biológica, já que exige um corpo físico e vivo para ocorrer, e
um cérebro em funcionamento.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 98


No processo de saúde e doença, é sempre válido atentar-se para questões genéticas, siste-
ma nervoso, imunológico e endócrino.
Para compreendê-la em profundidade, estudiosos debruçam-se na história evolutiva da es-
pécie humana pela perspectiva da seleção natural. Por exemplo, algum gene selecionado que
facilitou a emissão da necessidade da fome diante de um aroma agradável, possibilitando a
sobrevivência da espécie.
Outra tarefa bem importante que a perspectiva biológica se encarrega é a de analisar como
essas mesmas questões genéticas influenciam no comportamento humano.
Aspecto psicológico
O aspecto psicológico influencia diretamente no processo do adoecer. Um exemplo claro
disso é que reações diferentes podem se manifestar diante de um mesmo estímulo estres-
sante, por meio da interpretação que se dá desse fenômeno. Alguns estudos sugerem que
pensar, lembrar ou vivenciar situações estressantes gera resposta semelhante no cérebro, não
havendo essa efetiva separação. Por esse motivo, hipotetiza-se que determinados padrões
psicológicos possam ser construídos (como mais depressivos ou ansiosos) mediante o contato
constante com esses tipos de estímulos.
Outra questão importante é o papel da crença do paciente em relação à efetividade do
tratamento. Respostas aversivas diante da medicação podem gerar quadros ansiogênicos, em
que tensões sempre são provocadas, dificultando a evolução do processo, por exemplo.
Finalmente, as intervenções psicológicas costumam ajudar na aderência do tratamento e
manejo das situações estressantes no processo de saúde e doença.
Aspecto social
O aspecto social debruça-se nos estudos sobre a forma como uma pessoa se relaciona,
e o contexto que ela está inserida é influenciado nos processos de saúde e doença. Gênero,
raça, grupo, nação, classe social, geração e fatores históricos condicionam fortemente o
modo de se vivenciar esses processos. Um soldado iraquiano, por exemplo, pode lidar com
um acidente de guerra de uma forma diferente de uma criança com câncer do subúrbio
dos Estados Unidos. Em relação ao contexto histórico, sabemos que uma pessoa nascida
no início do século XX tinha outra expectativa de vida de uma pessoa que nasceu no mes-
mo local há dez anos.
Assim, compreendemos que a perspectiva psicossocial sobre saúde e doença pode trazer
contribuições efetivas e diminuir a distância social entre o profissional da saúde e o paciente.
Isso possibilita levar a uma compreensão da visão de mundo específica dos diversos grupos
sociais que buscam o serviço de saúde, e motivar os profissionais da saúde a buscarem formas
de atuação mais compatíveis com os objetivos do atendimento em que estão inseridos.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 99


Proposta de Atividade
Agora é a hora de pôr em prática tudo o que você aprendeu nesse capítulo! Elabore um
mapa conceitual destacando as principais ideias abordadas ao longo do capítulo. Ao produzir
seu mapa, considere as leituras básicas e complementares realizadas.
Dica: comece com um termo ou expressão principal, em seguida conecte esse termo ou
expressão a palavras de ligação, para dar sentido ao texto.
Elabore o mapa com até 25 conceitos.

Recapitulando
Nesse capítulo, buscamos compreender aspectos do desenvolvimento humano, as influên-
cias hereditárias e ambientais, sendo o desenvolvimento vitalício, contextual, multidimensio-
nal e multidirecional.
Para isso, entendemos o conceito de desenvolvimento humano, e seus fatores determinan-
tes, sendo eles normativos ou não.
Debruçamo-nos sobre as especificidades de cada uma das fases da vida humana, começan-
do pela infância (que pode ser analisada sobre três grandes subfases), a adolescência e seus
aspectos transitórios, a vida adulta e as diferenças históricas sobre essa maior parte da vida,
bem como diferenças entre o jovem adulto e a meia-idade. Finalmente, compreendemos a
velhice, englobando a morte no fim da vida.
Para respondermos à pergunta norteadora, nos aprofundamos no conceito de saúde e ve-
rificamos as complexidades de se chegar no “completo bem-estar”, analisamos ainda a saúde
como um direito garantido ao cidadão no contexto brasileiro e a necessidade de se compreen-
der o ser humano de forma integral, verificando seus aspectos biopsicossociais.
Se para estar saudável o ser humano deve gozar de bem-estar em todas as áreas, será que todas
as áreas do conhecimento deveriam estar na promoção da saúde? Podemos dizer que sem a pro-
moção efetiva da saúde, tende-se a comprometer o desenvolvimento de toda uma população, uma
vez que verificamos as importantes determinações contextuais para cada fase da vida humana.
Foi proposta também a reflexão de que se alguma vez vocês já se descreveram como “atrasa-
dos” ou qualquer outra comparação ou parâmetro para se casar, se aposentar etc. Fizemos essa
indagação acreditando que, em algum momento, mesmo que de modo passageiro ou de manei-
ra não intencional, vocês já se compararam com outro colega ou se impuseram alguma cobrança
desse tipo. Sendo assim, gostaríamos de evidenciar o quão facilmente nos deixamos levar pelo
relógio social imposto pela nossa cultura, estando impregnado em nossas ações e pensamentos.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 100


Referências bibliográficas
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pulacao-mais-idosa-do-mundo/>. Acesso em: 07/03/2019.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 101


TÓPICOS DE ESTUDO
Objetivo do capítulo
Conhecer o conceito do estudo sobre TANATOLOGIA
• Conceito de Tanatologia
a morte e o morrer.
• Área de conhecimento e aplicação
• Temas em Tanatologia

DOR E SOFRIMENTO
• Conceito de dor
• Sofrimento humano
• Espiritualidade no contexto da saúde
• Cuidados paliativos e cuidados no fim
da vida

A MORTE E O MORRER
• Conceito de morte
• Perspectivas da morte na infância,
adolescência, fase adulta e velhice
• Educação para a morte

PERDAS E LUTO
• Estudos sobre o luto
• Cuidados com as pessoas enlutadas
• Comportamentos autodestrutivos
• Suicídio

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 102


Contextualizando o cenário
Quando falamos em processo de morte e luto, é comum o associarmos, incialmente, à
ideia de doenças crônicas e fases terminais. Entretanto, cada vez mais somos lembrados
da finitude da vida em momentos inesperados e, às vezes, até mesmo trágicos, como,
por exemplo, acidentes fatais, exacerbação dos casos de violência em nossa sociedade e
aumento dos casos de suicídio.
O tema da morte ainda pode ser considerado como um tabu. Além de sermos pouco
ensinados a falar sobre ela, não somos educados a lidar e enfrentar situações de perda
e sofrimento.
Algumas mais focadas na cura, outras na compreensão do sentido da vida, o fato é que
os processos de viver e morrer se entrecruzam por diferentes áreas como a Psicologia, a
Medicina, a Filosofia e a espiritualidade.
Considerando esse cenário, propomos a seguinte reflexão: Como a compreensão da
morte e dos processos de morrer afetam as relações e o cuidado no campo da saúde?

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 103


4.1 Tanatologia
A Tanatologia se encarrega de encontrar sentido nos processos de morte, observando seus
diferentes rituais e significados que integram os aspectos do sujeito (biopsicossocial).
Estudiosos da área buscam compreender os aspectos psicossociais dos processos de morte
e luto, aproximando e humanizando esses conceitos. Eles visam atenuar a dor e o sofrimento,
aprimorando a qualidade de vida das pessoas que passam por um quadro terminal, bem como
de seus familiares enlutados.

4.1.1 Conceito de Tanatologia


Thánatos significa morte, e lógos significa estudo. Assim, a Tanatologia é compreendida
como o estudo da morte e do morrer, buscando entender os processos do morrer e do luto,
desde aspectos forenses de morte, até aspectos sociais mais amplos. A Tanatologia pode ser
definida como “o estudo da vida que inclui a morte”.

CURIOSIDADE:
Thánatos é a personificação do deus da morte na mitologia grega. Ele é um perso-
nagem que aparece em inúmeros mitos e lendas. É filho de Nix (a Noite) e Érebo (a
Escuridão), e irmão gêmeo de Hipnos (o Sono). Habitava, juntamente com Hades, o
mundo dos mortos.

4.1.2 Área de conhecimento e aplicação


Segundo o Instituto Mexicano de Tanatologia, a área tem por objetivo promover qualidade
de vida para pacientes terminais e seus familiares, propiciando uma morte adequada, que con-
siste na atenção ao sofrimento físico e psicológico, às relações significativas do enfermo, aos
seus últimos desejos e aos aspectos legais envolvidos.
No entanto, essa definição não esgota o assunto em nenhuma medida, apenas serve como
um importante direcionamento de pesquisa. Numa tentativa de reunir alguns conhecimentos
sobre a área, estudiosos de alguns países construíram núcleos de pesquisa e intervenção
para estabelecer redes de interação com profissionais que lidavam com o tema, promovendo
encontros, workshops e produzindo material escrito para divulgar o assunto e incrementar a
educação para a morte, bem como o preparo de profissionais que atuam na área.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 104


Veja na Tabela 1 as principais áreas de conhecimento em Tanatologia.

CONTEXTO:
Os periódicos fundamentais para a sistematização da Tanatologia começaram
em 1970, nos Estados Unidos. No Brasil, as principais fontes de referência são o
Laboratório de Estudos e Intervenções sobre o Luto (LELu) da Pontifícia Univer-
sidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e o Laboratório de Estudos sobre a Morte
(LEM) do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP).

Tabela 1. Principais áreas de conhecimento em Tanatologia


As Principais Áreas de Conhecimento em Tanatologia:

Estuda-se casos que vão além da


Perdas significativas morte física, como desaparecimentos e
separações abruptas.

Referem-se aos cuidados com pacientes


Cuidados paliativos
terminais e pessoas próximas.

Pauta-se nos processos psicossociais de


Pessoas enlutadas
pessoas no processo de luto

Atua-se na prevenção e posvenção do


Suicídio
suicídio e educação sobre a temática

Trabalha-se para os cuidados de equipes


Equipes de saúde de saúde, que lidam com a temática da
morte e luto cotidianamente.

Aplicações da Tanatologia:
• auxiliar as pessoas a desmitificar a morte como uma fantasia de castigo, introduzindo a
ideia de morte como um processo natural;
• preparar as pessoas para assumirem perdas;
• educar e tratar de forma humana e inteligente quem está próximo da morte, procurando
compreender a dinâmica das emoções envolvidas nesse processo;
• promover o princípio de autonomia, que permite que os sujeitos tomem suas próprias
decisões no processo de morte e vida, pois a dignidade de cada um vem por meio do respeito
e liberdade.

4.1.3 Temas em Tanatologia


Acompanhe a linha do tempo sobre os estudos em Tanatologia:

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 105


LINHA DO TEMPO: PRINCIPAIS AUTORES EM TANATOLOGIA

Élie Metchnikoff Kübler-Ross e Saunders Jessica Mitford

1903 1960 1978

Hermann Feifel Kastenbaum Bluebond Lagner

1959 1970 1987

Figura 1. Linha do tempo sobre os estudos em Tanatologia.

• Élie Metchnikoff (1903): o cientista russo iniciou os estudos em Tanatologia por entender
que, sem uma atenção sistemática ao tema da morte, as ciências da vida não estariam com-
pletas. Afinal, estudos acadêmicos poderiam ajudar aqueles que enfrentam a morte a ter uma
melhor compreensão do fenômeno, amenizando o medo por ela suscitado.
• Herman Feifel (1959): o psicólogo norte-americano escreveu, logo após a Segunda
Guerra Mundial, o clássico O significado da morte. Discute-se, na obra, a importância da te-
mática, refutando-se mitos detidos por cientistas e profissionais através da filosofia, arte,
religião e sociologia.
• Kübler-Ross e Saunders (1960): revolucionaram o trabalho com pacientes em estágio
terminal e trouxeram o tema da morte para discussão pública.
• Kastenbaum (1970): foi o responsável por criar o periódico Omega: Journal of Death and
Dying, a primeira sistematização de bibliografia da área.
• Jessica Mitford (1978): escreveu The american way of death, obra que causou grande po-
lêmica, traçando um retrato da morte no Ocidente e apontando o trato da morte como tabu.
• Bluebond Langner (1987): questionou sobre a real contribuição que algumas pesquisas
ofereciam por se preocuparem mais com definições operacionais, tratando de detalhes e iso-
lando alguns aspectos do tema da morte. Isso ocorreria pelas exigências de rigor metodológico
da mesma década.

PAUSA PARA REFLETIR


A tendência à quantificação científica pode levar à repetição de temas e reduzir a profundida-
de da discussão de uma temática tão complexa?

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 106


Segundo esses autores, a ciência estava pautada em um mecanismo de defesa que não per-
mitia a entrada em contato com temas que envolvessem a subjetividade em relação à morte,
o medo da extinção ou da aniquilação etc.

4.2 Dor e sofrimento


Apesar de similares, dor e sofrimento não são exatamente a mesma coisa. A dor é uma ex-
periência em que a subjetividade se fecha sobre si própria, não havendo lugar para o outro no
mal-estar da pessoa. A dor se limita, então, ao indivíduo, sem haver interlocução com o outro.
Nesse sentido, há um ensimesmamento do indivíduo. A pessoa é dominada por certa passivi-
dade e espera que alguém tome uma atitude em seu lugar com relação a sua dor.
Em contrapartida, o sofrimento é uma experiência que partilha a existência de mais alguém.
O outro está sempre presente para a subjetividade que sofre. Isso ocorre porque a subjeti-
vidade da pessoa em sofrimento reconhece que ela não é autossuficiente, como ocorre na
experiência da dor.

4.2.1 Conceito de dor


A Associação Internacional para o Estudo da Dor – IASP (International Association for the
Study of Pain) caracteriza a dor como uma experiência sensorial e emocionalmente desagradá-
vel, associada à lesão tecidual real ou potencial, ou descrita em termos dessa lesão.
A dor, como conceito mais amplo, vai além da dor física, pois envolve o componente sub-
jetivo. É, portanto, uma experiência biopsicossocial. A cultura, portanto, desempenha um
importante papel na determinação de como interpretamos e expressamos a dor, pois esta é
constituída por substratos emocionais, culturais e ambientais.
A dor é pessoal e intransferível, somente quem está na própria pele vivencia e sabe o que
sente. Ela é vivenciada no tempo presente, mas pode ser potencializada pelas vivências do pas-
sado ou pelo planejamento do futuro, pois recorre às memórias de como as dores da pessoa
foram tratadas, legitimadas ou rejeitadas. A possibilidade de a dor aumentar pode tornar o
processo ansiogênico e gerar mais sentimentos adversos.
Dessa forma, a dor é única para cada pessoa e se manifesta em meio a vivências subjetivas,
localizadas em determinado contexto social, etnia e momento da vida, devendo, portanto, ser
entendida em sua complexidade.
É importante lembrar que os profissionais de saúde devem ter consciência dos próprios pa-
drões culturais e reações frente à dor para poder avaliar melhor a perspectiva cultural e indivi-

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 107


dual da pessoa de quem cuidam. Assim, é possível se preparar para ultrapassar barreiras, que
normalmente causam sofrimento desnecessário, e desigualdades na prestação de cuidados à
pessoa com dor.

PAUSA PARA REFLETIR


Será que a dor pode servir de alerta para a pessoa, funcionando como um aviso persistente
da necessidade de ajuda? Ela seria apenas uma sensação indesejada que deve ser abolida ou
também uma experiência que pode trazer cuidado e gerar outros benefícios e possibilidades
de ressignificação?

A dor também pode ser classificada, em termos temporais, como:


• transitória: dores de curta duração nas quais o dano real é quase inexistente. Geralmente
são reparáveis e raramente vêm acompanhadas de intensidade.
• aguda: é uma combinação de lesão tecidual, dor e ansiedade em um lapso de tempo
muito curto.
• crônica: é uma doença que conduz à debilidade e gera, muitas vezes, uma depressão pro-
funda por “não passar”.
Na Fig. 2 podemos perceber, inclusive, que a dor é capaz de causar e é causada por tensão
muscular e estresse.

Estresse

Maior tensão Tensão


muscular muscular

Dor

Figura 2. Causas da dor.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 108


4.2.2 Sofrimento humano
Segundo Hayes e Smith (2005, p. 1):
As pessoas sofrem. Elas não têm simplesmente dor – o sofrimento é muito mais

que isso. Os seres humanos lutam contra suas formas de dor psicológica; suas

emoções e pensamentos difíceis, suas lembranças desagradáveis, e suas neces-

sidades e sensações não desejadas. Elas pensam nisto e se preocupam com isto,

têm ressentimento disto, antecipam e temem isto (...) ao mesmo tempo demons-

tram uma enorme coragem, profunda compaixão e uma habilidade notável de

seguir em frente mesmo a despeito de suas histórias pessoais difíceis. Mesmo

sabendo que podem se machucar, os humanos amam outros humanos. Mesmo

sabendo que vão morrer um dia, eles se preocupam com o seu futuro. Mesmo

sabendo da falta de sentido em muitas coisas da vida, abraçam ideais.

Como percebemos, o próprio conceito de dor não se pauta em apenas uma categoria da
vida das pessoas, mas passa por inúmeras variáveis, como, por exemplo, questões ambientais,
subjetivas e culturais.
De forma genérica, podemos pensar no
sofrimento humano como um estado de afli-
ção severa, associado a acontecimentos que
ameaçam a integridade de alguém. Ele atinge
várias dimensões, como as emoções e as rela-
ções com o corpo. Essas formas de sofrer não
se dão de maneira isolada, mas em contínua
e complexa manifestação, de modo que uma
forma de sofrer quase sempre leva a outras.
Uma pessoa com dificuldades familiares pode, por exemplo, desenvolver depressão, com
perda de apetite e dificuldade para dormir. Na prática, as relações causais não são tão simples
e separadas, uma vez que todas as dimensões do ser humano andam juntas.
Podemos aprofundar essas questões na seguinte medida:
a) sofrimento físico: vai além dos sintomas que se dão no corpo em si, voltando-se a todas
as questões que levam a desconforto, mal-estar e perda da qualidade de vida por problemáti-
cas vigentes no corpo;
b) sofrimento psicológico: refere-se às dores emocionais que podem ou não repercutir
no corpo. Sintomas decorrentes são: ansiedade, depressão, preocupação, irritabilidade, culpa,
isolamento psíquico, sentimento de impotência etc.;

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 109


c) sofrimento social: refere-se ao sofrer do ser humano em meio a suas relações, como, por
exemplo, o isolamento, a ruptura de laços importantes por morte ou separação, o sentimento
de não pertencimento etc.;
d) sofrimento espiritual: baseia-se na busca transcendente de um sentido maior para lidar
com o fato de passarmos por experiências de dor, sofrimento, perda, angústia e até mesmo
com o medo da morte.
Na Fig. 3 podemos entender o conceito de dor total, que se refere à situação de uma pessoa
que passa por todos os tipos de sofrimento de uma só vez, já que na prática eles não ocorrem
necessariamente em apenas uma dimensão:

Dimensão
espiritual

Dimesão DOR Dimensão


social
TOTAL psíquica

Dimensão
física

Figura 3. Dor total.

4.2.3 Espiritualidade no contexto da saúde


É somente através da morte que o ser humano se depara com a questão básica da vida:
tudo termina. Pode-se pensar na espiritualidade como o campo que engloba a relação da
pessoa com o transcendente, o que é diferente de questões existenciais e religiosas.
A dimensão entre os aspectos existencial e transcendente é a espiritual. As religiões instituí-
das estão alicerçadas nos aspectos culturais e sociais, e propõem intermediar a relação com o
sagrado e com o transcendental.
A espiritualidade humana, advinda ou não das instituições religiosas, de certa forma pro-
cura responder ao questionamento do sentido da vida. Geralmente, a morte é lida como uma
forma de transcender, como a possibilidade de o espírito humano voltar a sua essência.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 110


A morte é a última crise a ser enfrentada e a última oportunidade para o crescimento es-
piritual, sendo desafiador para o paciente terminal manter íntegra sua identidade diante da
desintegração total. Nesses casos, a espiritualidade costuma ter um importante papel para
sustentar essa situação, tanto do paciente como dos familiares. Muitos estudos realizados com
pacientes terminais apontam para o fato de que as questões espirituais e religiosas ajudam os
enfermos e familiares a buscarem recursos para lidar com essa situação.
Nesse sentido, há o desejo de transcen-
dência dos próprios limites, sejam eles cor-
porais, da finitude ou da alma. Essa questão
leva ao avanço da Medicina, por exemplo, que
prolonga a vida por meio da tecnologia, não
eliminando a morte, mas dando dignidade ao
processo do fim da vida.
Encarar a finitude é a possibilidade de transcendência do sofrimento humano, para dar a ele
um significado. Enquanto houver significado na experiência humana, há esperança.

AFIRMAÇÃO:
“A morte tem o poder de colocar todas as coisas nos seus devidos lugares. Longe do
seu olhar, somos prisioneiros do olhar dos outros, e caímos na armadilha de seus
desejos” (ALVES, 2002).

4.2.4 Cuidados paliativos e cuidados no fim da vida


Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os cuidados paliativos são abordagens
que visam melhorar a qualidade de vida dos pacientes e pessoas próximas que enfrentam
doenças incuráveis, mas que avançam na vida por intermédio de prevenção e alívio do sofri-
mento físico, psicológico e espiritual. Isso quer dizer que devemos reafirmar a vida, mas consi-
derando a morte como um processo natural, sem acelerá-la ou postergá-la.
Os cuidados paliativos buscam promover a qualidade, e não a duração da vida. Oferecem
assistência humana e compassiva para pessoas que se encontram na última fase de doenças
incuráveis para que possam viver da forma mais confortável possível. Consistem no tratamen-
to para o alívio dos sintomas relacionados à doença, sem o intuito curativo. Nesse sentido,
buscam promover dignidade ao processo do fim da vida, com pessoas queridas próximas,
amenização dos sintomas e cuidado integral com equipe de vários profissionais da saúde.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 111


Tabela 2. Princípios dos cuidados paliativos

Princípio Premissa

Controlar a dor Amenizar a dor e outros sintomas.

Afirmar a vida e considerar a morte como um processo natural.


Respeitar a morte
Para isso, não se deve acelerar nem adiar a morte.

Integrar os aspectos psicológicos e espirituais no cuidado


Integração ao paciente, considerando o aspecto físico apenas uma parte
desse processo.

Oferecer um sistema de suporte que possibilite ao paciente viver


Vida ativa
ativamente até o momento de sua morte.

Oferecer sistema de suporte psicológico para auxiliar os


Suporte a familiares familiares durante a doença do paciente e, posteriormente, no
enfrentamento do luto.

Equipe Promover a abordagem de vários profissionais da saúde para


multiprofissional focar nas necessidades dos pacientes e de seus familiares.

Comunicação para Comunicação transparente ao paciente e familiares para melhorar


qualidade de vida a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da vida.

Os quatro grandes pilares dos cuidados paliativos englobam os princípios descritos na Fig. 4:

PILARES DOS CUIDADOS PALIATIVOS

Controle dos Equipe


sintomas multidisciplinar

Apoio à família Comunicação

Figura 4. Pilares dos cuidados paliativos.

É importante ressaltar que tais cuidados são um direito do paciente e um dever dos profis-
sionais da saúde e do Estado, e não um “luxo” para essa fase, já que podem durar de alguns
dias a até mesmo anos. Um aspecto importante que os cuidados paliativos promovem é o es-
tado ativo do paciente no processo de adoecer, a partir do suporte familiar e da competência
dos profissionais envolvidos.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 112


4.3 A morte e o morrer
A morte em si é um evento biológico que assinala o término de uma vida. A morte e o mor-
rer em meio à vida humana podem ser vistos como um processo, como um fenômeno pro-
gressivo, e não mais como um momento ou evento. Esse processo é construído socialmente e
não se distingue das outras dimensões do universo e das relações sociais. Assim, a morte está
presente em nosso cotidiano e, independentemente de suas causas ou formas, seu grande
palco continua sendo os hospitais e instituições de saúde. Sabemos que a morte é o destino
certo de todos os seres vivos, mas apenas a espécie humana se conscientiza sobre sua própria
morte. Por esse motivo, nos debruçaremos sobre os processos de morte e morrer.

4.3.1 Conceito de morte


Existem muitos conceitos de morte. Vamos adentrar como ela pode ser definida a partir de
diferentes perspectivas científicas.
Biologia
Para a Biologia, a morte assinala o fim da existência, e não da matéria. Mas esse concei-
to não é assim tão simples. Enquanto estamos vivos, há milhares de células que nascem e
morrem o tempo inteiro, e, por esse motivo, não é possível separar claramente os estados
de vida e de morte.
Bioquímica
Para a Bioquímica, a morte se configura como falta de regeneração, mas é difícil descobrir
quais suas causas e processos. É a mesma questão descrita anteriormente: somos em parte
mortais e em parte imortais.
Medicina
Hipócrates, considerado o pai da Medicina, entende que quando a morte ocorre algumas
estruturas anatômicas mudam, como, por exemplo, o enrugamento da testa, o nariz, (que se
torna mais saliente), a epiderme (que resseca) etc. No entanto, a Medicina foi evoluindo ao lon-
go dos séculos, e hoje podemos definir a morte com precisão técnica e científica.
Morte pela função
No que diz respeito à função, a morte seria a interrupção completa e definitiva das funções
vitais de um organismo vivo, com o desaparecimento da coerência funcional do organismo e
destruição progressiva das células até sua totalidade.
Segundo essa perspectiva, cabe atualmente ao médico definir o momento da morte, consta-
tando-a como definitiva e irreversível. Também cabe a esse profissional determinar sua causa.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 113


Os critérios que definem a ocorrência da morte são:
• não receptividade e não reação total a estímulos externos;
• ausência de movimentos respiratórios;
• ausência de reflexos, mesmo condicionados (como não reação da pupila, córnea etc.);
• encefalograma plano, comprovando destruição cerebral plena e irreversível.
Morte clínica
A morte clínica corresponde ao estado em que todos os sinais de vida (consciência, res-
piração, atividade cardíaca, reflexos) estão suspensos, embora uma parte dos processos me-
tabólicos continue a funcionar. Durante esse processo, tem início a destruição das células de
órgãos altamente especializados, como o cérebro, que depois passa para os órgãos menos
especializados. Em caso de dúvida, é possível que mais de um médico confirme o óbito. Uma
vez dado o atestado, começam os ritos funerários.
Vale lembrar que do ponto de vista psicológico existem inúmeras mortes nas suas mais
variadas representações socioculturais, inclusive podendo-se agir como se ela não existisse.

CURIOSIDADE:
A morte clínica se tornou um conceito, pois atualmente muitas funções vitais po-
dem ser substituídas por máquinas, prolongando-se a vida indefinidamente. Esses
são os casos de “coma”, popularmente conhecidos como “estados vegetativos”.

4.3.2 Perspectivas da morte na infância, adolescência, fase


adulta e velhice
A morte sempre fez parte da história da vida. Por algumas perspectivas, a vida só pode ser
considerada vida se houver morte. No entanto, a forma como vivenciamos e compreendemos
a morte varia de acordo com o estágio de desenvolvimento da pessoa, além da sociedade e
cultura em que se vive.
Bebê
O recém-nascido sofre em seus primeiros meses com a ausência da mãe, sentindo que ela
não é onipresente, como ocorrera em sua fantasia.
Imagine que o bebê sente fome. Não será a partir de seu desejo que receberá o alimento.
Ele precisa gritar pela falta (chorar, se manifestar etc.). Essas primeiras experiências de frustra-
ção são ausências vividas como mortes. Esse bebê se percebe sozinho e desamparado. Ele não
é capaz de sobreviver sozinho, então logo (ou nem tanto) alguém aparece. O intervalo entre

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 114


o sentimento de fome e ser alimentado surge como uma marca da representação da morte
como ausência, perda e separação.
Infância
De acordo com o senso comum, propaga-se a ideia de que a criança deve ser poupada da
morte por não a compreender. Mas vamos pensar sobre o cotidiano da criança? Inevitavelmente,
ela, ainda que sem querer, pisou em um inse-
to que, esmagado, parou de se mexer. Muitas
perderam animais de estimação, viram na tele-
visão ou tiveram algum familiar que se foi. Elas
observam isso, suscitando diversas reações
emocionais, como curiosidade ou terror.
Se alguém morre e não contam à criança,
ela não vai expressar sua dor porque não li-
dou diretamente com o fenômeno. No entan-
to, ela percebe que algo aconteceu, pois todos
estão agindo de forma diferente.
Na percepção da criança, a morte é o não movimento, a cessação de algumas funções vitais
como alimentação ou respiração. No entanto, no entendimento da criança, a morte é reversí-
vel, isto é, pode ser desfeita.
Então, como a criança vai lidar com a contradição da morte no plano da fantasia (reversível)
e no da realidade (irreversível)?
O luto infantil também precisa processar suas perdas. A criança chora, se desespera e de-
pois se conforma, assim como o adulto.
Nessa fase, no entanto, há o pensamento mágico e a onipotência. Então, a criança pode se
perguntar: será que morrerei também? Uma das principais formas de se defender desse ques-
tionamento é a crença de que a morte só ocorre com os outros.
Vista em filmes, noticiários e na própria vida, a morte vai passando à concepção do desco-
nhecido e o mal passa a adquirir alguns de seus contornos principais: o caráter de violência,
repentinidade, acaso e culpa. Esta última ocorre porque, nessa fase do desenvolvimento, é
comum que em brincadeiras, ou quando a criança está com raiva no cotidiano, ela deseje a
morte de alguém. Justamente pela onipotência se estabelece uma relação entre esses desejos
e a morte efetiva.
Adolescência
Adquirir conhecimento, tornar-se adulto, ter um corpo desenvolvido e desafiar são momen-
tos inerentes à adolescência.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 115


A onipotência se transforma nessa fase: antes era infantil e embasada no pensamento má-
gico; agora, está baseada em um auto-olhar mais potente, com um corpo mais forte e uma
mente mais aguçada. O jovem se vê com todas as possibilidades de criação e execução, mas
não atua segundo a razão e a maturidade adultas.
A morte aqui é vista como fracasso, derrota e incompetência. Estamos exagerando ao falar
de um ideal adolescente de onipotência em que há força, impulso, coragem e vontade sem
espaço para a morte.
Pelo seu desenvolvimento cognitivo, o adolescente sabe que a morte não é reversível, mas
sim definitiva, podendo viver mortes concretas de pessoas próximas.
Entretanto, emocionalmente falando, ele tende a compreender que a morte ocorreu por
imprudência ou negligência, e que o verdadeiro herói – ele próprio – não vai morrer.
Como o adolescente se configura pelas ambivalências, fica a dúvida: será ele apenas um
humano frágil que terá o mesmo destino do outro? Vale lembrar que essa ambiguidade se ma-
nifesta em diversos momentos da experiência do jovem, como, por exemplo, no romantismo,
no amor, na sexualidade, nas drogas, entre outros.
Fase adulta
Responsabilidade em relação à comunidade e colaboração com o seu desenvolvimento são
tarefas próprias da fase adulta. Consolidar intimidade afetiva, constituir família e criar filhos
também pode fazer parte desse período. Entretanto, o espaço da morte na consciência ainda
pode estar muito distante.
Na meia idade se faz um balanço do que foi a existência até aquele momento. Dados concre-
tos permitem avaliar o que se alcançou em relação à profissão, às posses, à família, aos filhos
ou a quaisquer outros pontos considerados vitais. Ao fazer um balanço da grande primeira
etapa da vida, uma transformação interna se processa.
Nesse ponto, a morte não se configura mais como algo que acontece somente aos outros,
mas que também pode acontecer com a própria pessoa. Então, a vida passa a ser ressignifi-
cada pela possibilidade da morte. Não há mais todo o tempo do mundo e limites precisam ser
admitidos.
Outros atributos frequentemente associados à morte nesse período são o mistério, o poder
e a força.
Velhice
A velhice é a fase do desenvolvimento humano que carrega mais estigmas e atributos ne-
gativos. O fim dessa fase é marcado pela morte. Isso se justifica, em parte, porque passam a
ocorrer dificuldades corporais, financeiras, de produtividade e, às vezes, a separação da pró-
pria família se torna algo inevitável.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 116


Entretanto, a maneira de representar cada uma dessas perdas se vincula ao processo de
desenvolvimento e à consciência de cada pessoa.
Pode-se preparar para a morte vivendo-se intensamente, convivendo com ela em busca de
seu significado. Os atributos voltados à representação da morte podem ser a sabedoria e o
desconhecido, que provocam profundas transformações. A morte como limite pode ajudar a
crescer, mas também é dor, perda das funções corporais, da carne, de companhias e afetos. É
também solidão, tristeza e pobreza.
Veja na Tabela 3 a síntese do que estudamos agora.

Tabela 3. Morte em diferentes fases do desenvolvimento

Sobre a morte em diferentes fases do desenvolvimento:

Como a morte é Representação da


Fases: Característica da fase
compreendida Morte

Se deparam com Ausência, perda e


O bebê Na ausência da mãe.
impotência. separação.

Pensamento mágico e Desconhecida, ruim,


Infância Reversível.
onipotência. culposa.

Cogntivamente
A onipotência pela
Fracasso, derrota e como reversível e
Adolescência possibilidade de criação
incompetência. emocionalmente
e ação.
como negligência.

Responsabilidade em
relação à comunidade e Pode acontecer O mistério, o poder
Adulto
colaboração com o seu consigo. e a força.
desenvolvimento.

Solidão, tristeza,
Dificuldades corporais,
Com convívio e vida, pobreza, ou
Velhice financeiras, de
ou dor e perda. sabedoria e
produtividade.
tranformação.

4.3.3 Educação para a morte


Em nossa sociedade, há uma perspectiva que trata a morte como interdita e negada.
Alguns exemplos disso são: o desenvolvimento de uma Medicina fundamentalmente ligada
à cura, prolongando a vida a qualquer custo; o ato de maquiar o corpo da pessoa falecida,
a fim de tornar a morte menos perceptível; e a televisão e a internet mostrando constantes
cenas de violência.
Como, em muitas situações, a sociedade não permite que as pessoas expressem seu pesar
ou falem sobre o assunto, elas podem sofrer intensamente, pois é como se não pudessem en-
trar em contato com esse sofrimento real.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 117


Muitas pessoas acabam não sabendo se o que estão sentindo faz parte do processo de luto.
Isso ocorre porque socialmente há a cobrança para estarem felizes tão rapidamente que nem
ao menos é possível “digerir” a dor do luto.
Por esses motivos, a educação para a morte deve ser baseada no questionamento, na pro-
cura de autoconhecimento, na busca de sentido para a vida – o verdadeiro sentido de apren-
dizagem significativa. Isso tudo é bastante complexo e delicado em nossa sociedade, por isso
não se trata de receitas ou fórmulas prontas, respostas simples e mágicas, padrões, normas
ou qualquer doutrinação. Trata-se da busca do sentido para toda a existência.
Como, então, educar para a morte? Nesse caso, livros, sites, vídeos e redes sociais podem
ajudar porque, a partir dos relatos apresentados, os enlutados e vários grupos da sociedade
poderão observar semelhanças entre os processos vividos, bem como com as dificuldades
encontradas. Surge a possibilidade, assim, de pensarem em estratégias de enfrentamento,
formando uma importante rede de apoio firmada nos vínculos em vida e suporte mútuo.

DICA:
Na bibliografia básica deste material, encontra-se a obra Sobre a morte e o morrer
de Elizabeth Kübler-Ross (1987). O livro oferece a um público leigo o esclarecimento
de questões envolvendo o tema da morte, por meio do processo de luto de pessoas
que relatam sua experiência de perda. Vale a pena!

Esse tipo de trabalho pode apresentar fortes repercussões para algumas pessoas e ser irre-
levante ou até mesmo danoso para outras, provocando ainda mais ansiedade. É por isso que
todo esse processo deve ser feito com muito cuidado.
Outra estratégia interessante é a abordagem da morte nas escolas e a preparação de edu-
cadores para essa atividade. Esse tema seria muito importante, pois estão aumentando signifi-
cativamente as mortes de crianças e adolescentes por diversas causas, principalmente violên-
cia, abuso de drogas, suicídio e outras situações de risco. É importante, também, abrir espaços
de discussão sobre a morte para o público leigo, bem como para estudantes e profissionais
interessados, a fim de que a temática alcance a todos (já que faz parte da vida de todos).

4.4 Perdas e luto


O luto é uma profunda transição existencial a partir da perda de alguém. A perda de
pessoas próximas que amamos costuma afetar as estruturas de significado da vida. Nos

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 118


debruçaremos, a seguir, sobre os aspectos psíquicos, sociais e emocionais envolvidos nos
processos de luto e perda.

4.4.1 Estudos sobre o luto


O luto é uma profunda transição existencial que ocorre a partir da morte de alguém.
Primeiramente, é importante lembrar que
os conceitos de morte e luto se dão de dife-
rentes formas a depender da localização so-
ciocultural e história de cada grupo. Os cris-
tãos, por exemplo, entendem a morte como
uma passagem para a vida eterna. Dentro
dessa perspectiva, o Dia de Finados se pau-
ta em silêncio e oração; os mexicanos, por
sua vez, realizam grandes festividades du-
rante o Dia dos Mortos, acreditando que os
parentes falecidos vêm visitá-los. Do mesmo
modo, no antigo Egito, havia a mumificação
pelos sacerdotes para que se preservassem
os órgãos dos indivíduos. Na Índia, por outro
lado, os corpos dos mortos são queimados devido à crença de que estes não precisarão mais
deles, seja pelas reencarnações futuras ou por terem encontrado o nirvana. A maneira como
a sociedade em que o sujeito está inserido lida com a morte tem influência direta em como
se dará o processo de luto.
O luto pode se manifestar de várias formas. Em casos mais densos, é comum haver sin-
tomas físicos e psicológicos. Podem ocorrer sentimentos ambivalentes: tristeza pela perda e
raiva pelo abandono, desejo da morte para alívio do sofrimento e culpa.
Vale ressaltar que, antigamente, vários sintomas psíquicos eram identificados como doen-
ças físicas em pessoas em processo de luto. Esses pacientes buscavam o médico por apresen-
tarem depressão, insônia, anorexia e aumento no uso de substâncias psicoativas. Hoje isso
não é mais visto como patologia. Entende-se que questões como essas podem ser inerentes
ao processo de luto.
Fatores complicadores do luto
Quando se fala em fatores complicadores do luto, são apontados os aspectos que podem
tornar o processo mais difícil.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 119


É claro que é necessário tomar muito cuidado para não culpar o enlutado por suas dificul-
dades, já que há em nossa sociedade a constante pressão para sermos felizes, quando isso
nem sempre é possível. Afinal, existe a tendência social de “adequar” as pessoas, buscando-se
a normatização, que não deixa espaço para a tristeza. Essa pressão, inclusive, costuma gerar
o sentimento de solidão.
Existem alguns aspectos que atuam como sobrecarga de luto, ou seja, que sobrecarregam
ou dificultam a “digestão emocional” do processo de luto.
Entre os fatores complicadores do processo de luto, merecem destaque:
a) mecanismos de defesa: observa-se negação e repressão ligadas à perda e à dor;
b) expressão: adiamento e inibição quando o processo é cronificado.
c) tipo de morte: casos de suicídios e acidentes mais graves, ou processos de morte de
longa duração;
d) relação anterior com o falecido: vínculos que envolvam ambivalência e dependência,
transtornos psiquiátricos e a percepção da falta de apoio social;
e) tipos de perda: perdas repentinas, múltiplas (morte de várias pessoas da mesma família),
invertidas (filhos e netos que morrem antes de pais e avós) e mortes lentas em meio ao proces-
so de doenças crônicas ou degenerativas;
f) apresentação dos corpos: presença de corpos mutilados, desaparecimento de corpos e
cenas de violência;
g) luto não autorizado: quando não se pode chorar a perda por motivo de um segredo
iminente, como no caso de um amante ou de aborto sigiloso;
h) fase da vida: adolescentes frequentemente se isolam ou se retraem mediante o luto.
Isso geralmente é interpretado como se não estivessem envolvidos na situação, o que pode
agravar seu quadro, pois o seu sofrimento não é percebido. Idosos podem ficar em situação
de risco por problemas financeiros, isolamento ou doenças, o que pode se agravar com as
perdas da vida;
i) viuvez ou morte de filhos: há maior vul-
nerabilidade imunológica nesses casos e alta
incidência de morte pós-perdas.
Vale ressaltar que há consequências sérias
quando pessoas que apresentam risco para
processos de luto complicados não recebem
o cuidado adequado, pois para elas isso tam-
bém é vivido com muito pesar. Por esse moti-
vo, é importante identificar os fatores de ris-

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 120


co, delinear as tendências socioculturais e tecnológicas que possam aumentá-los, e observar o
que deve ser trabalhado a fim de evitar um luto de maior complicação.
Entende-se que para elaborar o luto, é importante:
• reconhecer o luto;
• reagir à separação;
• recolher e ressignificar as experiências com a pessoa perdida;
• avaliar as relações antigas;
• reajustar-se a uma nova situação;
• reinvestir energia em novas relações.

4.4.2 Cuidados com as pessoas enlutadas


A primeira coisa a se pensar sobre o cuidado com pessoas enlutadas é que não há um pa-
drão a ser imposto sobre aqueles que acabaram de perder alguém.
No primeiro impacto é comum que haja raiva e desespero, e a maioria das pessoas prefere
ficar sozinha, ou em contato com sua rede de apoio.
Nos primeiros dias, podem surgir os sinais de mágoa, revolta, ou a sensação de estar
“sedado”. Geralmente, até o funeral, há uma grande quantidade de coisas a se fazer, e mui-
tos lidam fazendo esses ajustes finais, geralmente, como forma de defesa: uma “reação”
ao que aconteceu.
Depois disso, é comum vir o sentimento de vazio e, nessa hora, o suporte dos que ficam
é importante, seja para conversar e ouvir, ou para suportar o choro e o silêncio. Algumas
pessoas lidam com a morte conversando com o falecido, como se estivesse vivo, muitas
vezes isolando-se das pessoas. Por mais que isso gere estranhamento ou preocupação,
seria cruel censurar essa prática, uma vez que essa é a forma que a pessoa encontra para
reagir ao ocorrido.
Para apoiar o enlutado, é muito importante permitir que ele se manifeste: que grite, cho-
re, durma, ou faça o que desejar. Dizer claramente que está à disposição ajuda essa pessoa a
saber que não está só, e que pode contar com outros.
É fundamental entender as necessidades dos enlutados e ajudá-los em uma orientação
construtiva para amenizar os sentimentos adversos, tais como culpa, vergonha, raiva, ou
medo do castigo.
Lidar com esses sentimentos pode não ser tarefa fácil, pois também temos nossos “escu-
dos”. O importante é pensar que, se ajudarmos essa pessoa a lidar com a raiva, seja dirigida a
você, ao falecido, ou a Deus, isso a aproximará da aceitação da morte, sem que carregue culpa.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 121


4.4.3 Comportamentos autodestrutivos
Cotidianamente, a morte e a destruição são apresentadas como ocorrências terríveis, e,
portanto, entende-se que a humanidade faria de tudo para fugir delas. Entretanto, é cada vez
mais evidente que parte da destruição do mundo e das sociedades decorre da autodestruição,
em forma de um ataque à própria existência.
Assim, tendências construtivas e destrutivas da personalidade estão em constante intera-
ção para criar, destruir e construir.

Figura 5. Usos autodestrutivos. Fonte: Shutterstock. Acesso em: 12/04/2019.

A intencionalidade da ação autodestrutiva é diferente da intenção de suicídio, embora nem


sempre seja fácil de ser avaliada. Precisam ser avaliados dois aspectos:
• A (im)possibilidade de reversão do método empregado para morrer;
• Providências que tornam possível a ação de terceiros para que isso não ocorra.
É importante saber que a autodestruição começa muito tempo antes do ato suicida. É como
se a pessoa tivesse uma espécie de “encontro com a morte”, embora, aparentemente, pareça
fugir dela.
Há três grandes comportamentos autodestrutivos que podem levar ao suicídio:
Desejo de matar: essa pulsão, em pequenas doses, é inerente ao ser humano. Desde muito
pequena, uma criança pode manifestar esse desejo ao identificar o outro em uma situação de
rivalidade. Em todo o ato destrutivo, pode existir uma erotização parcial, como um tipo de prazer
neste ato, conhecido como sadismo. O mesmo pode ocorrer nos atos autodestrutivos. Algumas
vezes, o amor e o ódio são desligados dos objetos externos e voltam-se contra a própria pessoa.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 122


Também há, no ato suicida, o elemento vingativo, que envolve a possibilidade de infligir
sofrimento ao outro. A pessoa melancólica pode descarregar contra si próprio os ataques so-
fridos e as hostilidades antes ocultas em relação ao outro que amava ou estimava.

ASSISTA:
O filme Sociedade dos poetas mortos,, do diretor Peter Weir, indica que, quando ocor-
re um suicídio, pode haver o desejo de assassinar o outro. É possível haver interfe-
rência de fatores eróticos, tornando difícil matar a quem se ama.

Desejo de ser morto: assim como matar


é uma forma de agressão, ser morto é uma
forma extrema de submissão. Neste caso,
existe a questão do masoquismo, isto é, de
sentir prazer na dor. Isso ocorre porque o ego
sofre na dimensão de sua destrutividade diri-
gida para fora. Então, se há um ataque para
fora, a mesma proporção precisa ser dirigida
para dentro. É necessário que haja sentimento de culpa para haver a necessidade de punição.
Desejos homicidas, mesmo que inconscientes ou que não sejam efetivamente consumados,
demandam punição.
Muitos métodos punitivos são aliados a fatores eróticos ligados ao prazer. Exemplos disso
são: queimar-se na tentativa simbólica de se aquecer, afogar-se para voltar ao bem-estar da
vida intrauterina, ingestão de veneno pelas fixações orais etc.
Alguns desses comportamentos têm caráter exibicionista, relacionando-se a um desejo de
ser descoberto e, mais uma vez, punido. Essa característica narcísica de se matar ao invés de
ser morto é uma forma de conservar, no íntimo, a ilusão da onipotência, e, pelo ato do suicídio,
tornar-se senhor da vida e da morte. Isso acontece, inclusive, porque muitos se pautam na
ideia de que, após a morte, haverá uma vida futura que será melhor do que esta. Desta forma,
o suicídio não seria o fim definitivo.
Desejo de morrer: há muitos casos em que alguém tenta se matar, e depois pede encareci-
damente que a salvem. Isso pode indicar o paradoxo de se matar e não desejar morrer. Como
uma forma de defesa, fantasia-se sobre a ideia de se matar e não morrer, ou poder voltar.
Nesse sentido, o desejo de morrer pode estar ligado a fantasias de nascimento e de retorno ao
útero. Esse processo ocorre de forma inconsciente.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 123


Quando os impulsos destrutivos se sobrepõem aos construtivos, de forma completa, o sui-
cídio tende a ocorrer, principalmente se há um contato precário com a realidade.

4.4.4 Suicídio
O suicídio é um ato individual, mas que
carrega características da sociedade que o
produz. É complexo e indefinido, caracteri-
zando-se como um homicídio intencional de
si mesmo. São várias as formas que as pes-
soas renunciam às suas existências, e este
ato consolida a atitude desesperada de quem
não quer viver. Em um sentido mais amplo, o
suicídio inclui processos autodestrutivos in-
conscientes, lentos e crônicos.
Existem também os parassuicídios, que
são atos que não se expressam de modo ex-
plícito e manifesto, mas sim de forma incompleta, deslocada, ou até mesmo simbólica, como
se verifica em certos acidentes e automutilações.
O suicídio é resultado de uma indução social, e não de uma livre determinação individual.
Entretanto, cada pessoa articula, a sua maneira, os recursos com os quais a sociedade as co-
loca em contato.
O indivíduo que atenta contra a sua vida atenta também contra a sociedade, sendo esta
uma denúncia trágica sobre uma crise coletiva. Quando uma pessoa se mata, fracassa uma
proposta coletiva daquela sociedade.
Pelo fato de o suicídio ser um ato e um processo muito complexo, ele não pode ser considera-
do sempre como psicose, ou como decorrente de desordem social. Também não pode ser ligado,
de forma simplista, a um determinado acontecimento, afinal, não existe uma simples e única
resposta. Trata-se de um processo, que pode ocorrer no início ou em qualquer fase da vida.

AFIRMAÇÃO:
“O suicídio é o único problema filosófico verdadeiramente sério, pois julgar se a vida
vale ou não a pena ser vivida é responder à questão fundamental da filosofia.”
(Albert Camus, O mito de Sísifo).

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 124


DADOS ALARMANTES SUICÍDIOS CONSUMADOS

Anualmente, 1 milhão de casos de 2623


suicídio são registrados no mundo.
Segundo dados da Organização
Mundial de Saúde (OMS), 90% dos
casos poderiam ser evitados.
9198

Homens (77.81%)
Mulheres (22.19%)

Figura 6. Dados de suicídios consumados. Fonte: TV Gazeta, 2018. (Adaptado).

Tipos de suicídio
Suicídio egoísta: como somos seres sociais, a socialização costuma ser essencial no que diz
respeito ao sentido que se dá à vida. No caso do suicídio egoísta, o indivíduo se isola do âmbito
social, ou o aponta como fonte de sofrimento. O suicídio egoísta resulta de uma individualiza-
ção excessiva em sociedades desagregadas, gerando sentimento de solidão e desespero.

Tabela 4. Fatores de risco


TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS ASPECTOS SOCIAIS

• Depressão;
• Gênero masculino;
• Transtorno bipolar;
• Idade entre 15 e 30 anos e acima de 65 anos;
• Transtornos psiquiátricos relacionados ao uso
• Sem filhos;
de álcool e outras substâncias;
• Moradores de áreas urbanas;
• Transtornos de personalidade;
• Desempregados ou aposentados;
• Esquizofrenia;
• Isolamento social;
• Aumento do risco com associação de
• Solteiros, separados ou viúvos;
transtornos psiquiátricos: paciente bipolar que
• População especiais: indígenas, adolescentes
também seja dependente de álcool terá risco
e moradores de rua.
maior do que se ele não tiver essa dependência.

ASPECTOS PSICOLÓGICOS CONDIÇÕES DE SAÚDE LIMITANTES

• Doenças orgânicas incapacitantes;


• Perdas recentes;
• Dor crônica;
• Pouca resistência;
• Doenças neurológicas (epilepsia, Parkinson,
• Personalidade impulsiva, agressiva ou de
Hungtinton);
humor instável;
• Trauma medular;
• Ter sofrido abuso físico ou sexual na infância;
• Tumores malignos;
• Desesperança, desespero e desamparo.
• AIDS.

Suicidabilidade:
Ter tentado suicídio, ter familiares que tentaram ou consumaram suicídio, ter ideias e/ou planos
de suicídio.

Fonte: TV Gazeta, 2018. (Adaptado).

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 125


Suicídio altruísta: o indivíduo também pode se matar quando está muito integrado em um
grupo, mas perdeu a estima pública (desonra e condenação social).
Suicídio anômico: às vezes, o indivíduo não tem consciência de seus limites e do que neces-
sita, precisando de um parâmetro social. Em alguns casos, a sociedade falha nesse aspecto e
gera-se um sentimento de desorientação.
Prevenção ao suicídio
É necessário observar e cuidar dos indivíduos que pedem ajuda. Uma ocorrência que gera
grande perigo é o fato de que, muitas vezes, estas pessoas não são levadas a sério. É comum
ouvir frases como “quem quer se matar, se mata” ou “isso é frescura”.
As tentativas de suicídio são, muitas vezes, taxadas pejorativamente como atos histéricos.
Posturas como esse julgamento são invalidações do sofrimento do outro, o que corrobora ain-
da mais para a confirmação desse ato.
Às vezes, o indivíduo planeja tudo, mas, internamente, ainda tem a esperança de que será
salvo. Ao ver a reação contrária, pode se sentir ainda mais desesperado.
Já é sabido que a pessoa que tenta suicídio tem alto risco de repetir o ato se não rece-
ber a ajuda de que necessita, procurando formas cada vez mais letais. Muitas pessoas que
cometeram suicídio já haviam tentado o ato outras vezes e, em algum momento, o suicídio
em si acabou acontecendo.
Como sociedade, faz parte de nossa responsabilidade nos dispor a ajudar o outro em seu
sofrimento. É importante cuidar de questões como apoio dos valores pessoais, possibilidade
de expressão de sentimentos, ênfase em novas relações e elevação da autoestima.
Infelizmente, muitos profissionais de saúde tratam os pacientes com propensão ao suicídio
ou com pensamentos relacionados com desprezo, agressão, chegando até a maltratá-los. Essa
atitude costuma ocorrer porque esses profis-
sionais pensam, de forma simplista, que es-
tão em seus cargos para salvar a vida e ame-
nizar o sofrimento, mas os desejos podem ser
conflitantes: “um quer salvar e o outro quer
morrer”. Isto gera uma sensação de impotên-
cia, culpa e remorso por parte da equipe.
É preciso saber que o indivíduo que tenta suicídio é o que mais tem alto risco de recorrência,
necessitando, portanto, de mais ajuda. O desprezo nesse momento pode ser extremamente letal.
Para lidar com questões como essas, é importante que o profissional ou indivíduo se dispo-
nibilize a ouvir a pessoa em sofrimento, além de incentivar a procura por ajuda de um psiquia-
tra e psicólogo.

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Figura 7. Prevenção do suicídio: sinais para saber e agir. Fonte: MS, 2018. (Adaptado).

Proposta de Atividade
Agora é a hora de pôr em prática tudo o que você aprendeu neste capítulo! Elabore uma sín-
tese destacando as principais ideias abordadas ao longo do capítulo. Ao produzir sua síntese,
considere as leituras básicas e complementares realizadas.

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Dica: uma boa síntese é um texto curto, mas que aborda as ideias centrais do capítulo, a
partir da sua perspectiva. Para ficar mais fácil, você pode fazer “pequenas sínteses” cada qual
de um subtítulo do capítulo. Após a elaboração, como uma forma de auxiliar na fixação e com-
preensão dos conteúdos, você pode apresentar sua síntese para um colega.

Recapitulando
Neste capítulo, foi apresentado o conceito de tanatologia e as aplicações desta área de
estudos. Perguntamo-nos se a tendência à quantificação poderia levar à repetição de temas
e reduzir a profundidade da discussão de uma temática complexa como esta. Quanto a isso,
verifica-se que, tratando-se de um campo de pesquisas com influência do rigor científico, a
apresentação de temáticas repetidas e a pouca exploração do lado subjetivo do assunto po-
dem levar a certa redução.
Entretanto, observamos também crescente compreensão dos aspectos subjetivos, amplian-
do os conceitos de dor e sofrimento, de forma a considerar os âmbitos físicos, psicológicos,
sociais e até mesmo espirituais.
Também refletimos se a dor poderia ter outros objetivos para a pessoa, por ser um aviso
persistente da necessidade de ajuda. Perguntamo-nos se ela seria apenas uma sensação inde-
sejada que necessita ser abolida, ou também uma experiência que pode ser cuidada, e gerar
outros benefícios e possibilidades de ressignificação.
Podemos responder que, sendo a dor vista como uma possibilidade de expressão, não so-
mente da sensação física imediata, mas também do pedido de ajuda e cuidado, uma vez que
esses sinais são atendidos, evidencia-se uma série de benefícios ao paciente em fases termi-
nais, bem como na atenção aos familiares e pessoas enlutadas.
Neste capítulo ainda foram citadas as diferenças de cada fase do desenvolvimento quanto à
concepção e à vivência da morte. Além disso, foram expostos estudos sobre as perdas e o luto,
evidenciando os cuidados necessários e atenções especiais aos comportamentos autodestru-
tivos e ao suicídio.
Como reflexão final, evidenciamos que a compreensão da morte e dos processos de morrer
a partir dos aspectos biopsicossociais presentes afetam positivamente as relações e o cuidado
no campo da saúde. Isso porque esse processo favorece o autoconhecimento e o respeito para
com as dores do outro, sem fazer pré-julgamentos, ofertando espaço de fala e expressão de
sentimentos e oferecendo acolhimento integral, tanto para os pacientes e familiares quanto
entre os profissionais.

PSICOLOGIA APLICADA À SAÚDE 128


Referências bibliográficas
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