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Capı́tulo 1

Probabilidade

A teoria de probabilidade é o ramo da matemática que se preocupa com a modelagem de


fenômenos ditos aleatórios, que são aqueles que mesmo quando observados repetidamente sob
as mesmas condições, produzem resultados diferentes, de forma imprevisı́vel. Tais fenômenos
podem ser vistos como o resultado de experimentos aleatórios.
Jogos de azar, como o lançamento de um dado, ou uma rodada de roleta, ou a distribuição
de mãos de carteado, têm resultados imprevisı́veis, e podem ser então considerados como expe-
rimentos aleatórios.
Fenômenos práticos, como o tempo que fará no final de semana, o resultado de um evento
esportivo, o rendimento de uma carteira de investimentos, medições com instrumentos, também
podem ser considerados como resultados de experimentos aleatórios em muitas situações. O
resultado de uma amostragem aleatória em uma população é um outro exemplo. A natureza,
por sua vez, também fornece muitos exemplos de fenônemos aleatórios: caracterı́sticas diversas
de animais e plantas, comportamentos climáticos, sı́smicos, marı́timos, cósmicos etc.
Nosso propósito neste capı́tulo é desenvolver uma estrutura matemática formal, chamada
espaço de probabilidade ou modelo probabilı́stico, que forma a base para o tratamento ma-
temático de fenômenos aleatórios. Grosso modo, um espaço de probabilidade associado a um
dado experimento aleatório é formado por três ingredientes:
• um conjunto contendo todos os possı́veis resultados do experimento;

• uma lista contendo todos os eventos que podem ocorrer como consequência do experi-
mento. Intuitivamente, um evento é uma afirmação acerca do resultado do experimento;

• uma atribuição de probabilidades (incertezas) a esses eventos.


Por exemplo, se um experimento consiste em lançar um dado comum (de 6 lados) com-
pletamente simétrico e homogêneo (neste caso, dizemos que o dado é honesto ou equilibrado)
e observar o número da face voltada para cima, então um espaço de probabilidade adequado
seria o seguinte:
• o conjunto {1, 2, 3, 4, 5, 6} de possı́veis resultados;

• uma lista de eventos tais como

– o resultado é 3,

1
– o resultado é no mı́nimo 4,
– o resultado é um número primo.
• cada face 1, 2, 3, 4, 5, 6 teria a mesma chance de ser o resultado do lançamento.
Dado qualquer experimento envolvendo aleatoriedade, existe um espaço de probabilidade
associado. A seguir, veremos como construir formalmente tais espaços mais explicitamente.

1.1 Espaço de Probabilidade


Espaço amostral
Considere um experimento real ou imaginário que estamos procurando modelar. A primeira
coisa que devemos fazer é identificar os possı́veis resultados do experimento. O conjunto de
todos esses possı́veis resultados é chamado de espaço amostral e é usualmente denotado por
Ω. A letra grega w denota um tı́pico elemento de Ω, e chamamos cada elemento w um evento
elementar.
Exemplo 1. a) Se um experimento consiste em lançar um dado honesto e observar o
número da face voltada para cima, então temos
Ω = {1, 2, 3, 4, 5, 6}.

b) Por outro lado, se o experimento for lançar o dado até que, digamos a face 6, apareça
pela primeira vez e, então, anotar o número de lançamentos executados, o espaço amostral seria
Ω = {1, 2, . . .} = N.

c) Agora, considere o experimento que consiste em selecionar uma lâmpada de um lote e


medir seu “tempo de vida” antes de queimar. Pode-se perceber que os valores possı́veis para o
tempo de vida da lâmpada dependem do instrumento de medição. Entretanto, por se tratar de
tempo, pode ser conveniente definir o espaço amostral como simplesmente a parte não negativa
da reta, ou seja,
Ω = {t : t ≥ 0} = [0, ∞),
porque um valor negativo para o tempo de vida não faz nenhum sentido.
d) Porém, se é sabido que todas as lâmpadas do lote terão tempo de vida menor do que,
digamos 100 unidades, então o espaço amostral poderia ser
Ω = {t : 0 ≤ t < 100} = [0, 100).

e) Agora, se o objetivo do estudo for classificar a lâmpada em defeituosa (D) ou boa (B),
então o espaço amostral mais conveniente é
Ω = {D, B}.
que indica se a peça selecionada é ou não defeituosa. Com esses exemplos, vemos, portanto,
que o espaço amostral é definido baseado nos objetivos do experimento.

2
O outro ingrediente são as probabilidades, que em princı́pio devem ser atribuı́das aos resul-
tados possı́veis (na linguagem do modelo, aos pontos de Ω). Por exemplo, no lançamento do
dado equilibrado, nenhum valor teria mais chance de sair do que os outros, e terı́amos
1
P(1) = P(2) = P(3) = P(4) = P(5) = P(6) =
6
onde P(i) lê-se “probabilidade de (sair) i (como resultado do lançamento do dado)”.
De forma mais geral, pode ocorrer de uma atribuição de probabilidades aos pontos de Ω
(como fizemos acima) não fazer muito sentido ou não ser o suficiente.

Exemplo 2. Um experimento aleatório razoavelmente familiar (bastante, para quem faz si-
mulações) é: escolha ao acaso e de maneira uniforme um número do intervalo [0, 1]. A unifor-
midade implica que de certa forma cada resultado possı́vel deve ter a mesma probabilidade.
Mas não podemos atribuir probabilidade igual a todos os pontos de Ω = [0, 1] (há um infinito
contı́nuo de possibilidades), sem que essa probabilidade seja zero. E mesmo fazendo isto, esta
atribuição é insuficiente.
A maneira adequada de fazer a atribuição neste caso é, por exemplo, atribuir probabilidades
aos intervalos. Da uniformidade, seria natural impor que para todo subintervalo I de [0, 1],

P(I) = comprimento de I,

em que P(I) significa probabilidade de (o número escolhido pertencer a) I. (Note que neste
caso a probabilidade de um ponto é igual ao seu comprimento, que se anula.)

Note ainda no exemplo acima que não basta atribuir probabilidades aos pontos de Ω: é
necessário considerarmos subconjuntos adequados, no caso, os intervalos.
Genericamente então, num modelo probabilı́stico, as probabilidades são atribuı́das a sub-
conjuntos de Ω, os eventos.

Eventos
Grosso modo, um evento é qualquer afirmação acerca do resultado de um experimento. For-
malmente, um evento é qualquer subconjunto de Ω. (Usualmente, usamos as letras maiúsculas
A, B, C, . . . para representar eventos). Assim, dado um espaço amostral Ω (para certo experi-
mento aleatório) e um subconjunto A ⊂ Ω, dizemos que A é um evento, e que, no contexto do
experimento aleatório, A ocorre se o resultado do experimento (um elemento de Ω) pertencer a
A. Note que Ω e ∅, o conjunto vazio, são eventos; ∅ é chamado evento impossı́vel e Ω, evento
certo, uma vez que algum elemento de Ω irá certamente ocorrer.

Exemplo 3. No Exemplo 1 a), se A indicar o evento “a face voltada para cima é par”, então
temos A = {2, 4, 6}.

Exemplo 4. Agora, no Exemplo 1 b) o subconjunto B = {1, 3, 5, . . .} representa o evento “o


número de lançamentos realizados é ı́mpar”.

3
Espaço de Eventos — σ-álgebra
O espaço de eventos do modelo probabilı́stico, que podemos denotar por F, é o conjunto (ou
classe) de eventos que queremos considerar (e atribuir probabilidades). Vamos definir operações
(entre eventos) nesta classe, que deverá ser rica o suficiente para ser preservada pelas operações
(isto é, quando aplicarmos as operações a eventos da classe, o resultado deve ser um elemento
da classe). As operações são as seguintes:

1. com dois eventos ou mais eventos:

• intersecção (ocorrência simultânea);


• união (ocorrência alternativa);

2. com um evento:

• complementação (não ocorrência).

Dados dois eventos, A, B ∈ F, a interseção de A com B, que denotamos por

A ∩ B,

é um evento (da classe F): a ocorrência simultânea de A e B; e a união de A e B, que denotamos


por

A ∪ B,

é um evento (de F) e representa a ocorrência de, pelo menos, um dos eventos A ou B.


Dado um evento A ∈ F, o complemetar de A, denotado por Ac , também é um evento e
representa a não ocorrência de A.
Seja ainda a diferença entre A e B:

A \ B = A ∩ Bc

que é o evento ocorre A mas não ocorre B. (Em termos de conjuntos, A \ B é o conjunto de
elementos de A que não pertencem a B.).

Observação 1. As operações acima podem e devem ser pensadas como as operações usuais
entre conjuntos com a mesma terminologia e notação, de modo que valem propriedades análogas
àquelas válidas para operações entre conjuntos:

i) (A ∩ B)c = Ac ∪ B c v) A ∩ Ac = ∅, A ∪ Ac = Ω
ii) (A ∪ B)c = Ac ∩ B c
vi) A ∪ ∅ = A, A ∪ Ω = Ω
iii) A ∩ ∅ = ∅, A ∩ Ω = A
iv) ∅c = Ω, Ωc = ∅ vii) A ∩ (B ∪ C) = (A ∩ B) ∪ (A ∩ C)

4
Usando argumentos simples, pode-se mostrar que se A1 , A2 , . . . , An são conjuntos em F,
então
n
� n

Ai = A1 ∪ A2 ∪ · · · ∪ An e Ai = A1 ∩ A2 ∩ · · · ∩ An
i=1 i=1

também são eventos de F. Exigiremos, contudo, que F seja fechada não somente sob um número
finito de operações (intersecções e uniões), mas também sob um número infinito enumerável.
Isso motiva a seguinte definição.

Definição 1. Uma coleção F = {A : A ⊂ Ω} de subconjuntos de um espaço amostral Ω é


chamado um espaço de eventos ou σ-álgebra, se satisfaz:

(i) Ω ∈ F;

(ii) Se A ∈ F, então Ac ∈ F;

(iii) Se A1 , A2 , . . . é uma coleção enumerável de eventos em F, então




Ai ∈ F
i=1

Vejamos alguns exemplos de pares (Ω, F), de espaços amostrais e σ-álgebras.

Exemplo 5. A menor σ-álgebra associada a um espaço amostral Ω é a coleção F = {∅, Ω}.

Exemplo 6. Ω é qualquer conjunto não vazio e F = {∅, A, Ac , Ω}, em que A ⊂ Ω é não vazio.

Exemplo 7. Ω = {1, 2, 3, 4, 5, 6} e F = P(Ω), isto é, o conjunto (das partes) contendo todos
os subconjuntos de Ω, ou F sendo a coleção

∅, {1, 2}, {3, 4}, {5, 6}, {1, 2, 3, 4}, {3, 4, 5, 6}, {1, 2, 5, 6}, Ω

Exemplo 8. Se Ω é qualquer conjunto não vazio, P(Ω) é obviamente uma σ-álgebra. Porém,
por razões que estão fora do escopo deste curso, quando Ω é infinito não enumerável (um
intervalo, por exemplo), sua coleção das partes é grande demais, de modo que é impossı́vel
atribuir probabilidades a todos os seus elementos.

Probabilidade
Chegamos agora ao problema de associar probabilidades aos eventos em F, escrevendo P(A)
para a probabilidade do evento A ocorrer. Assumiremos que isso pode ser feito de tal forma
que a função probabilidade P satisfaz certas condições intuitivas:

(a) cada evento A em F tem uma probabilidade P(A) satisfazendo que 0 ≤ P(A) ≤ 1,

(b) o evento certo Ω tem probabilidade 1, e o evento impossı́vel ∅ tem probabilidade 0.

(c) se A e B são eventos disjuntos (isto é, A ∩ B = ∅), então P(A ∪ B) = P(A) + P(B).

5
Formalmente, temos a seguinte definição.
Definição 2. Uma função P : F → [0, 1] é chamada uma medida de probabilidade (ou simples-
mente, probabilidade) sobre (Ω, F), se
(i) P(A) ≥ 0, para todo A ∈ F.

(ii) P(Ω) = 1.

(iii) Se A1 , A2 , . . . ∈ F são eventos disjuntos, ou seja, para todo i �= j, Ai ∩ Aj = ∅, então


�∞ � ∞
� �
P Ai = P(Ai ). (1.1)
i=1 i=1

Enfatizamos que uma medida de probabilidade P sobre (Ω, F) é definida somente para
aqueles subconjuntos de Ω que estão em F.
Definição 3. A tripla (Ω, F, P) é o que chamaremos de espaço de probabilidades ou modelo
probabilı́stico (para dado experimento aleatório).
Observação 2. Sem P, os pares (Ω, F) são chamados espaços mensuráveis e construir um
espaço de probabilidade é associar ao par alguma função P, escolhida com domı́nio F e imagem
no intervalo [0, 1] satisfazendo as condições da Definição 2.
Exemplo 9. Uma moeda, possivelmente viciada, é lançada uma vez. Neste caso, representando
“cara” por C e “coroa” por K, podemos tomar Ω = {C, K} e F = {∅, {C}, {K}, Ω}, e uma
possı́vel probabilidade P : F → [0, 1] é dada por

P(∅) = 0, P({C}) = p, P({K}) = 1 − p, P(Ω) = 1,

em que p é um número real fixo no intervalo [0, 1]. Se p = 12 , dizemos que a moeda é honesta,
equilibrada ou não viciada.
Exemplo 10 (Espaços amostrais finitos). Sejam Ω = {w1 , w2 , . . . , wN } um conjunto finito com
exatamente N pontos e F = P(Ω) (o conjunto das partes de Ω). Claramente, o par (Ω, F) é
um espaço mensurável, e a atribuição de probabilidades pode ser feita aos conjuntos unitários,
da seguinte forma, que é geral.
Sejam p1 , p2 , . . . , pN números reais não negativos somando 1. Isto é,
N

pi ≥ 0, i = 1, 2, . . . , N e p1 = 1.
i=1

Então, se fizermos a atribuição

pi = P({wi }), ∀i = 1, 2, . . . , N,

pode-se verificar que a probabilidade de um evento qualquer A ∈ F fica definida por



P(A) = pi , ∀A ∈ F.
i∈A

6
Exemplo 11. Seja (Ω, F, P) um espaço de probabilidade. Se B ∈ F é tal que P(B) > 0, então
a função PB : F → [0, 1] definida por

P(A ∩ B)
PB (A) = , A∈F (1.2)
P(B)

é uma probabilidade em (Ω, F). Consequentemente, a tripla (Ω, F, PB ) é um espaço de proba-


bilidade.

Observações
É importante enfatizar que as condições na Definição 2 não determinam completamente uma
atribuição de probabilidades a eventos. Na verdade, elas servem para cortar atribuições incon-
sistentes com as noções intuitivas de probabilidade. Dessa forma, a pergunta natural que surge
é: como atribuir probabilidades aos diversos eventos do espaço amostral? Em termos gerais,
há duas maneiras principais de responder essa questão.
A primeira delas consiste na atribuição de probabilidades, baseando-se em caracterı́sticas
teóricas da realização do experimento. Por exemplo, ao lançarmos um dado, temos o espaço
amostral Ω = {1, 2, 3, 4, 5, 6}. Admitindo que o dado foi construı́do de forma homogênea e com
medidas rigorosamente simétricas, não temos nenhuma razão para privilegiar essa ou aquela
face. Assim, consideramos
1
P({1}) = P({2}) = P({3}) = P({4}) = P({5}) = P({6}) = .
6
E usando a propriedade de aditividade, isto é, a propriedade (iii) da Definição 2, temos que
para todo evento A,
� �
� � 1� #A
P(A) = P {i} = P({i}) = 1= ,
i∈A i∈A
6 i∈A
6

em que #A é a cardinalidade ou número de elementos de A. Vemos então que é suficiente neste


caso atribuir probabilidades aos conjuntos unitários. As probabilidades dos demais eventos
ficam determinadas pela aditividade.
Uma outra maneira é por meio das frequências de ocorrências. Dado um experimento
aleatório qualquer e um seu evento A, a probabilidade de A seria o limite da frequência de
ocorrência de A em n repetições do experimento quando n → ∞, se tal limite existir. Isto é,
se Nn (A) denotar o número de vezes em que A ocorre em n repetições do experimento, então

Nn (A)
P(A) = lim .
n→∞ n
Mas note que isto pressupõe que o experimento seja (infinitamente) repetitı́vel e que o limite
exista. Questões dessa natureza não serão discutidas aqui e fazem parte da teoria de inferência
estatı́stica. Por ora, vamos assumir que, à medida que o número de repetições vai aumentando,
as frequências relativas se estabilizam em um número que chamaremos de probabilidade.

7
1.1.1 Exercı́cios
1. Preencha a lacuna com a relação (entre conjuntos ou entre elemento e conjunto) apropri-
ada.

(a) {a} {a, b, c, d}.


(b) {∅} {∅, a, b}.
(c) {−3, 3} {x ∈ N : x2 − 9 = 0}.
(d) ∅ {x ∈ R : x2 + 1 = 0}.
(e) {2} {2, {2}}.

2. Sendo A, B e C subconjuntos quaisquer de um espaço amostral Ω, expresse em notação


matemática os conjuntos cujos elementos:

(a) Estão em A e B, mas não em C.


(b) Não estão em nenhum deles.
(c) Estão, no máximo, em dois deles.
(d) Estão em A, mas no máximo em um dos outros.
(e) Estão na interseção dos três conjuntos e no complementar de A.

3. Para cada um dos experimentos abaixo, descreva o espaço amostral Ω adequado e apre-
sente o número de elementos, quando for o caso.

(a) Um dado é lançado três vezes e a sequência de números obtida é anotada.


(b) Numa determinada cidade, no mês de janeiro, conta-se o número de problemas nas
tubulações de água do bairro X.
(c) Um fichário com 13 nomes contém três nomes de mulheres. Seleciona-se ficha após
ficha, até o último nome de mulher ser selecionado, e anota-se o número de fichas
selecionadas.
(d) De um grupo de seis pessoas {A, B, C, D, E, F }, sorteiam-se duas, uma após outra,
sem reposição, e anota-se a configuração formada.
(e) Como ficaria o espaço amostral do item (c) se as retiradas fossem com reposição?
(f) De um pocote contendo 20 jujubas, observa-se quantas têm a cor vermelha.
(g) Registram-se o número de dias chuvosos e a precipitação total (em centı́metros)
durante uma semana em uma localidade.
(h) Um dado é lançado em um alvo circular de raio unitário e observa-se o ponto acer-
tado.
(i) Numa linha de produção, conta-se o número de peças defeituosas num intervalo de
uma hora.

4. Em cada um dos casos, verifique se F é σ-álgebra de subconjuntos de Ω.

(a) Ω = {a, b, c} e F = {{a, b}, {c}, ∅}.

8
(b) Ω = {1, 2, 3} e F = {∅, {1}, {2}, {3}, {1, 2}, {1, 3}, {2, 3}, {1, 2, 3}}.
(c) Ω = N e F = {A ⊆ N : A ou Ac é finito}.

5. Seja F uma σ-álgebra de subconjuntos de um espaço amostral Ω. Mostre que, se A, B ∈


F, então

(a) A ∪ B ∈ F.
(b) A ∩ B ∈ F.
(c) A \ B ∈ F.

6. Suponha que F1 e F2 são σ-álgebras de subconjuntos de um espaço amostral Ω. Mostre


que F = F1 ∩ F2 também é uma σ-álgebra de subconjuntos de Ω.

7. Dados Ω = {w1 , w2 , . . .} e F = P(Ω), mostre que a função P : F → R definida por



1, se w1 ∈ A,
P(A) =
0, se w1 ∈/ A,

é uma probabilidade.

8. Sejam Ω = {w1 , w2 , . . . , wN } e F = P(Ω), e considere a função P : F → R dada por

#A
P(A) = , A ∈ F.
N
Prove que P assim definida é uma probabilidade sobre (Ω, F).

9
1.2 Propriedades da Probabilidade
Derivaremos nesta seção algumas propriedades adicionais de uma medida de probabilidade que
são consequência de sua própria definição e que serão usadas constantemente ao longo do curso.
Teorema 1 (Propriedades da Probabilidade). Seja (Ω, F, P) um espaço de probabilidade e
suponha que A, B, C abaixo sejam todos eventos em F. Então, valem as seguintes propriedades:
(a) (Complementaridade)

P(Ac ) = 1 − P(A). (1.3)

Demonstração. Notando-se que Ω = A ∪ Ac e A ∩ Ac = ∅ (isto é, são disjuntos), segue que

1 = P(Ω) = P(A) + P(Ac ),

donde concluı́mos que P(Ac ) = 1 − P(A).

(b)

P(∅) = 0. (1.4)

Demonstração. Tomando A = Ω em (1.3), temos Ac = ∅ e logo

P(∅) = 1 − P(Ω) = 1 − 1 = 0.

(c) Se A e B são eventos disjuntos, então

P(A ∪ B) = P(A) + P(B). (1.5)



Demonstração. Tomando A1 = A, A2 = B e An = ∅, n ≥ 3, em (1.1), obtemos ∞ n=1 An =
A ∪ B, e daı́,
�∞ � ∞
� � (1.4)
P(A ∪ B) = P An = P(An ) = P(A1 ) + P(A2 ) = P(A) + P(B).
n=1 n=1

(d) (Monotonicidade) Se A ⊂ B, então

P(A) ≤ P(B). (1.6)

Demonstração. Escrevendo o evento B = A ∪ (B \ A), em que A e B \ A são disjuntos, obtemos

P(B) = P(A) + P(B \ A) ≥ P(A),


� �� �
≥0

já que P é uma função não negativa.

10
(e) (Regra da soma)

P(A ∪ B) = P(A) + P(B) − P(A ∩ B) (1.7)

e
P(A∪B ∪ C)
(1.8)
= P(A) + P(B) + P(C) − P(A ∩ B) − P(A ∩ C) − P(B ∩ C) + P(A ∩ B ∩ C).

Demonstração. Primeiro, note que A ∪ B = A ∪ (B \ A), onde a última união é disjunta (isto
é, A e B \ A são disjuntos). Aplicando então (1.5), obtemos que

P(A ∪ B) = P(A) + P(B \ A). (1.9)

Agora, note que B \ A = B \ (A ∩ B). Aplicando agora o Exercı́cio com A ∩ B no lugar de A


(note que A ∩ B ⊂ B), temos que

P(B \ A) = P(B) − P(A ∩ B). (1.10)

Substituindo agora (1.10) no lado direito de (1.9), obtemos finalmente que

P(A ∪ B) = P(A) + P(B) − P(A ∩ B).

A demonstração de (1.8) fica como exercı́cio.

(f) (Subaditividade)
�∞ � ∞
� �
P Ai ≤ P(Ai ). (1.11)
i=1 i=1

Demonstração. Considere B1 , B2 , . . . em F definidos da seguinte forma:


�n−1 �

B 1 = A1 e B n = An \ Ai , n = 2, 3 . . .
i=1

Por construção, todos os Bn ’s são disjuntos, Bn ⊂ An para todo n ≥ 1 e ∞ ∞
n=1 Bn = ∪n=1 An .
Logo, pela aditividade da probabilidade,
�∞ � �∞ � ∞ ∞
� � � (1.6) �
P An = P Bn = P(Bn ) ≤ P(An ).
n=1 n=1 n=1 n=1

Exemplo 12. Considere um experimento aleatório e os eventos A e B associados, tais que


P(A) = 12 , P(B) = 13 e P(A ∩ B) = 14 . Então temos:
(a) P(Ac ) = 1 − P(A) = 1 − 1
2
= 1
2
e P(B c ) = 1 − P(B) = 1 − 1
3
= 23 .

11
(b) P(A ∪ B) = P(A) + P(B) − P(A ∩ B) = 1
2
+ 13 − 1
4
= 7
12
.

(c) P(Ac ∩ B c ) = P ([A ∪ B]c ) = 1 − P(A ∪ B) = 1 − 7


12
= 5
12
.

(d) P(Ac ∪ B c ) = P ([A ∩ B]c ) = 1 − P(A ∩ B) = 1 − 1


4
= 34 .

Exemplo 13. Seja P uma probabilidade sobre uma σ-álgebra F de um espaço amostral Ω.
Sejam A e B eventos tais que P(A) = 23 e P(B) = 49 . Mostre que P(A ∪ B) ≥ 23 e 19 ≤
P(A ∩ B) ≤ 49 .
Para a primeira desigualdade, basta observar que A ⊂ A ∪ B, logo
2
= P(A) ≤ P(A ∪ B).
3
Para a segunda, primeiro note que A ∩ B ⊂ B, que nos leva a
4
P(A ∩ B) ≤ P(B) = .
9
Para o outro lado, note que
4 1 1
P(A ∩ B) = P(B) − P(B \ A) ≥ P(B) − P(Ac ) = − = .
� �� � 9 3 9
=B∩Ac

Existe ainda uma outra propriedade de medidas de probabilidade que será bastante útil
neste curso, e que descreveremos na sequência. Para falarmos dela, começaremos introduzindo
o seguinte conceito.
Uma sequência A1 , A2 , . . . de eventos em um espaço de probabilidade (Ω, F, P) é dita ser
crescente, e escrevemos An ↑, se

A1 ⊂ A2 ⊂ · · · ⊂ An ⊂ An+1 ⊂ · · ·

A união


A= An
n=1

de tal sequência é chamada o limite da sequência, e é uma consequência imediata da definição


de σ-álgebra que A é um evento.

Teorema 2 (Continuidade da Probabilidade). Seja (Ω, F, P) um espaço de probabilidade. Se


A1 , A2 , . . . é uma sequência crescente de eventos em F, então

lim P(An ) = P(A). (1.12)


n→∞

Antes de provarmos o teorema acima, vejamos uma aplicação do resultado.

12
Exemplo 14. Considere uma sequência infinita de lançamentos de uma moeda honesta. Parece
ser bastante intuitivo que a chance de não sair nenhuma cara nessa sequência é 0. Mas será
possı́vel verificar essa afirmação? Uma prova rigorosa é a seguinte.
Seja An o evento “sair ao menos uma cara nos primeiros n lançamentos”. Então, podemos
concluir que
An ⊂ An+1 , ∀n = 1, 2, . . .
(se existe ao menos uma cara até o n-ésimo lançamento, então continuará existindo ao menos
uma cara até o (n+1)-ésimo), de modo que os An ’s formam uma sequência crescente de eventos.
O conjunto limite A é o evento “sair ao menos uma cara” (na sequência de lançamentos). Assim,
pela continuidade de P, Teorema 2,
P(sair ao menos uma cara) = P(A) = lim P(An ).
n→∞

Agora, como
1
P(An ) = 1 − P(Acn ) = 1 − ,
2n
concluı́mos que
� �
1 1
P(sair ao menos uma cara) = lim 1− n = 1 − lim = 1 − 0 = 1,
n→∞ 2 n→∞ 2n

de modo que
P(não sair nenhuma cara) = P(Ac ) = 1 − P(A) = 1 − 1 = 0,
como querı́amos.
Demonstração. Seja B1 , B2 , . . . em F tal que
B 1 = A1 e Bn = An \ An−1 , n = 2, 3, . . .
Claramente, todos os Bn ’s são disjuntos por definição. Além disso, não é difı́cil ver que
n
� ∞
� ∞

An = Bk e A= An = Bn .
k=1 n=1 n=1

Portanto,
� n
� n ∞
�∞ �
� � � �
lim P(An ) = lim P Bk = lim P(Bk ) = P(Bk ) = P Bk = P(A).
n→∞ n→∞ n→∞
k=1 k=1 k=1 k=1

A conclusão do Teorema 2 está dada em termos de uma sequência crescente de eventos.


Contudo, o mesmo resultado também vale para uma sequência decrescente de eventos: Se
B1 , B2 , . . . são eventos em F, tais que B1 ⊃ B2 ⊃ · · · ⊃ Bn ⊃ Bn+1 ⊃ · · · , então
lim P(Bn ) = P(B), (1.13)
n→∞
�∞
em que B = n=1 Bn é o limite da sequência Bn quando n → ∞.

13
Exercı́cios
1. Sejam A e B eventos num espaço de probabilidade (Ω, F, P). Mostre que:

(a) Se A ⊂ B, então P(B \ A) = P(B) − P(A).


(b) A ocorrência, não simultânea, de A ou de B é P(A) + P(B) − 2P(A ∩ B).
(c) P(A ∩ B) ≥ P(A) + P(B) − 1.
(d) P(Ac ∩ B c ) = 1 − P(A) − P(B) + P(A ∩ B).

2. Sejam A, B e C eventos num espaço de probabilidade (Ω, F, P). Prove que

P(A∪B ∪ C)
= P(A) + P(B) + P(C) − P(A ∩ B) − P(A ∩ C) − P(B ∩ C) + P(A ∩ B ∩ C).

3. Sejam A e B eventos num espaço de probabilidade (Ω, F, P), tais que P(A) = 21 , P(B) = 3
4
e P(A ∪ B) = 1, quanto vale

(a) P(Ac ) e P(B c )?


(b) P (A ∩ B)?
(c) P (Ac ∩ B c )?
(d) P (A ∩ B c )?
(e) P (Ac ∩ B)?

4. Se A e B são dois eventos em (Ω, F, P) satisfazendo que P(A) = 0, 2, P(B) = p, P(A ∪


B) = 0, 5 e P(A ∩ B) = 0, 1, quanto vale p?

5. Sejam A e B eventos num espaço de probabilidade (Ω, F, P), tais que P(A) = 3
4
e P(B) =
1
3
1
. Mostre que 12 ≤ P(A ∩ B) ≤ 13 .

6. Uma moeda não necessariamente honesta é lançada repetidamente. Qual a probabilidade


de que no n-ésimo lançamento:

(a) Uma cara apareça pela primeira vez?


(b) O número de caras e coroas observadas sejam iguais?

7. Se A e B são eventos disjuntos, P(A) = 1


2
e P(A ∪ B) = 35 , quanto é P(B)?

14
1.3 Espaços Equiprováveis
Nesta seção, consideraremos uma situação historicamente importante, denominada de espaço
equiprovável. À saber, aquela em que temos um espaço amostral finito

Ω = {w1 , w2 , . . . , wN }; (1.14)

a σ-álgebra F como sendo P(Ω), e a probabilidade P definida de tal modo que cada evento
unitário (isto é, os elementos de Ω) tem a mesma probabilidade de ocorrer:
1
P({w1 }) = P({w2 }) = · · · = P({wN }) = . (1.15)
N
Neste caso, pela aditividade de P, para qualquer evento A (isto é, qualquer subconjunto de Ω),
a probabilidade de A é
� �
� � � 1 1 � #A #A
P(A) = P {w} = P({w}) = = 1= = , (1.16)
w∈A w∈A w∈A
N N w∈A N #Ω

onde, relembremos, #A representa o número de elementos de A.


Neste caso, note, não é necessário explicitar completamente o espaço amostral Ω e o evento
A, bastando apenas calcular #A e #Ω, usualmente chamados, respectivamente, número de
casos favoráveis e número de casos possı́veis. O cálculo de probabilidades nestes casos pois se
reduz essencialmente à um problema de contagem (do número de elementos dos eventos em
questão). Para tanto, são usados os métodos clássicos de análise combinatória, que veremos
abaixo. Antes, para motivar, vejamos o exemplo.

Exemplo 15. Seja o experimento aleatório em que dois dados equilibrados são lançados um
após o outro. Um modelo para este experimento seria um espaço equiprovável em que

Ω = {1, 2, 3, 4, 5, 6}2 = {1, 2, 3, 4, 5, 6} × {1, 2, 3, 4, 5, 6}


= {(1, 1), (1, 2), . . . , (1, 6)
(2, 1), (2, 2), . . . , (2, 6)
...,
(6, 1), (6, 2), . . . , (6, 6)}.

Neste caso, temos N = 36, e (i, j) ∈ Ω indica os números do primeiro e segundo dados,
respectivamente. Se, por exemplo, estivermos interessados na probabilidade de que a soma dos
números lançados seja 7, representando por A esse evento, temos que ele pode ser descrito como

A = {(i, j) ∈ Ω : i + j = 7} = {(1, 6), (2, 5), (3, 4), (4, 4), (5, 2), (6, 1)}.

Daı́, por (1.16),

#A 6 1
P(A) = = = .
#Ω 36 6

15
Uma forma alternativa de obter a cardinalidade de A é escrever Ω em forma de matriz
 
11 12 · · · 16
21 22 · · · 26
 
Ω =  .. .. .. . ,
. . . .. 
61 62 · · · 66
e notar que os elementos de A dispõem-se na diagonal secundária da matriz. Logo, A tem 6
elementos, que é o número de elementos da diagonal.

1.3.1 Métodos de Contagem


Nesta subseção, apresentaremos algumas técnicas básicas que nos permitem determinar o
número de elementos de conjuntos formados de acordo com certas regras, sem que seja necessário
enumerar seus elementos. Começaremos com a que é conhecida como princı́pio fundamental da
contagem.

Princı́pio básico da contagem


O princı́pio básico da contagem é fundamental para se determinar o número de elementos de
um conjunto. De maneira bem simples, ele diz o seguinte.

Princı́pio multiplicativo. Se uma decisão pode ser tomada em duas etapas, a primeira
podendo ser tomada de n maneiras e, após tomada a primeira, a segunda pode ser tomada de
m maneiras, então as duas podem ser tomadas simultaneamente de n × m maneiras. Esse é o
chamado princı́pio multiplicativo.
Exemplo 16. Numa sala há 3 homens e 4 mulheres. De quantos modos é possı́vel selecionar um
casal homem-mulher? Primeiro, note que para formar um casal devemos tomar duas decisões:
decisão 1: escolha do homem (ou da mulher);
decisão 2: escolha da mulher (ou do homem).
Como a decisão 1 pode ser tomada de 3 maneiras e, depois disso, a decisão 2 pode ser tomada
de 4 maneiras, então o número de maneiras de se formar um casal (isto é, de tomar as decisões
1 e 2) é 3 × 4 = 12.
Exemplo 17. As placas (antigas) de automóveis são formadas por três letras (K, Y e W
inclusive) seguidas por quatro algarismos. Quantas placas podem ser formadas? Cada letra
pode ser escolhida de 26 modos e cada algarismo de 10 modos distintos. A resposta então é
26 × 26 × 26 × 10 × 10 × 10 × 10 = 263 × 104 .
Observação 3. O princı́pio multiplicativo também vale quando temos mais do que duas tarefas
a serem realizadas, a saber, um número finito de tarefas.
Exemplo 18. Quantos números naturais de três algarismos distintos existem? O primeiro
algarismo pode ser escolhido de 9 modos (não podemos usar o zero!); o segundo algarismo de
9 modos (não podemos usar o algarismo usado anteriormente), e o terceiro de 8 modos (não
podemos usar os dois algarismos já utilizados anteriormente). A resposta é 9 × 9 × 8 = 648.

16
Exemplo 19. Quantos são os números naturais pares que se escrevem com três algarismos
distintos? Há várias maneiras de se resolver esse problema. Uma forma é determinar todos
os números de três algarismos distintos (9 × 9 × 8 = 648) e abater os números ı́mpares de 3
algarismos distintos (5 na última casa, 8 na primeira e 8 na segunda, num total de 5 × 8 × 8 =
320). Logo, a resposta é 648 − 320 = 328.

Permutações Simples
Dados n objetos distintos a1 , a2 , . . . , an , de quantos modos é possı́vel ordená-los? Por exemplo,
para os números 1, 2 e 3, há 6 ordenações: 123, 132, 213, 231, 312 e 321.
Pensando no caso geral, note que temos n maneiras de escolher o objeto que ocupará o
primeiro lugar, n − 1 maneiras de escolher o que ocupará o segundo lugar, n − 2 maneiras de
escolher o que ocupará o terceiro lugar, e assim sucessivamente até escolhermos o objeto que
ocupará o último lugar, que só tem 1 maneira. Portanto,
O número de modos de ordenar n objetos distintos é
n · (n − 1) · · · 2 · 1 = n! (1.17)
Na terminologia de combinatória, cada ordenação dos n objetos é chamada uma permutação
simples de n objetos e o número de permutações simples de n objetos distintos é representado
por Pn . Assim, Pn = n! (Já que 0! = 1, define-se P0 = 1).
Exemplo 20. Quantos são os anagramas da palavra PRÁTICO? Cada anagrama de PRÁTICO
nada mais é que uma ordenação das letras P, R, A, T, I, C e O. Assim o número de anagramas
de PRÁTICO é P7 = 7! = 5040.
Exemplo 21. Quantos são os anagramas da palavra PRÁTICO que começam e terminam
por consoante? A consoante inicial pode ser escolhida de 4 maneiras, a consoante final de 3
maneiras e as 5 letras restantes podem ser ordenadas entre essas duas consoantes de P5 = 5!
modos. A resposta portanto é 4 × 3 × 5! = 1440.
Exemplo 22. Quantos diferentes anagramas podem ser formados a partir das letras PEPPER?
Primeiro, notemos que as letras P1 E1 P2 P3 E2 R geram 6! permutações quando os 3 P’s e os 2
E’s são diferentes uns dos outros. Contudo, considere qualquer umas destas permutações, por
exemplo, P1 P2 E1 P3 E2 R. Se agora permutarmos os P’s e os E’s entre si, então o arranjo
resultante continuará a ser PPEPER, e há 3!2! permutações que são desta forma. Como cada
permutação tem outros 3!2! arranjos exatamente iguais a si, a nossa contagem de 6! contou
cada permutação 3!2! vezes. A resposta portanto é
6!
= 60.
3!2!
Observação 4. Em geral, o mesmo raciocı́nio usado no exemplo acabamos de ver mostra que
há
n!
= Pnn1 ,n2 ,...,nr
n1 !n2 ! · · · nr !
permutações diferentes de n objetos, dos quais n1 são do tipo 1, n2 são do tipo 2, ..., nr são do
tipo r.

17
Exemplo 23. Quantos são os anagramas da palavra PROBABILIDADE? Como temos 2 letras
B, 2 letras A, 2 letras I, 2 letras D, 1 letra P, 1 letra R, 1 letra O, 1 letra L e 1 letra E, a
resposta é

2,2,2,2,1,1,1,1,1 13! 13!


P13 = = .
2!2!2!2!1!1!1!1!1! 16

Combinações simples
De quantos modos podemos escolher p objetos distintos dentre n objetos distintos dados? Ou,
o que é o mesmo, quantos são os subconjuntos com p elementos do conjunto {a1 , a2 , . . . , an }?
Cada subconjunto de p elementos é chamado de uma combinação simples de p elementos
dos n objetos a1 , a2 , . . . , an . Assim, por exemplo, as combinações simples de 3 dos objetos
a1 , a2 , a3 , a4 , a5 são

{a1 , a2 , a3 } {a1 , a2 , a4 } {a1 , a2 , a5 } {a1 , a3 , a4 } {a1 , a3 , a5 }


{a1 , a4 , a5 } {a2 , a3 , a4 } {a2 , a3 , a5 } {a2 , a4 , a5 } {a3 , a4 , a5 }

O número de combinações simples de p elementos dentre n objetos distintos é representado por


Cnp . Assim, C53 = 10.
Analisemos esta resposta: a escolha do primeiro elementos da combinação pode ser feita de
5 maneiras; a do segundo, de 4 maneiras e a do terceiro, de 3 maneiras. A resposta correta
parece ser 5×4×3 = 60. Entretanto, se pensarmos numa combinação, por exemplo {a1 , a2 , a3 },
observamos que as combinações {a1 , a2 , a3 }, {a2 , a1 , a3 }, {a3 , a2 , a1 } etc. são idênticas e foram
contadas como se fossem distintas. Em suma, na resposta 60 estamos contando cada combinação
uma vez para cada ordem de escrever seus elementos. Como em cada combinação os elementos
podem ser escritos em P3 = 3! = 6 ordens, cada combinação foi contada 6 vezes. Logo, a
resposta correta é
60
= 10.
6
No caso geral temos que

n · (n − 1) · · · (n − p + 1)
Cnp = , 0 < p ≤ n, e Cn0 = 1. (1.18)
p!
Uma expressão alternativa pode ser obtida multiplicando o numerador e o denominador por
(n − p)!. Obtemos,

n!
Cnp =
p!(n − p)!
� � (1.19)
n
= ,
p

para qualquer p = 0, 1, . . . , n.

18
Exemplo 24. Quantas saladas contendo exatamente 4 frutas podemos formar se dispomos de
10 frutas diferentes? Para formar uma salada basta escolher 4 das 10 frutas, o que pode ser
feito de

4 10 · 9 · 8 · 7
C10 = = 210 modos.
4!
Exemplo 25. De um grupo de cinco mulheres e sete homens, quantas comissões diferentes
compostas por duas mulheres e três homens podem ser formados? E se dois dos homens
estiverem brigados e se recusarem a trabalhar juntos? Como há C52 grupos de 2 mulheres
possı́veis e C73 grupos de 3 homens possı́veis, o princı́pio multiplicativo diz que há
5·47·6·5
C52 × C73 = = 350 comissões possı́veis.
2·13·2·1
Suponha agora que 2 dos homens se recusem a trabalhar juntos. Como há um total de
C52 ×C51 = 5×10 = 50 comissões contendo os dois homens brigados, basta abater essa quantidade
do número total de comissões possı́veis. A resposta correta é então 350 − 50 = 300 comissões
possı́veis.
� �
Os valores Cnp = np são usualmente chamados de coeficientes binomiais por que eles apa-
recem no Teorema Binomial.
Teorema 3 (Teorema Binomial).
n � �

n n
(x + y) = xi y (n−i) . (1.20)
i=0
i

Uma imediata aplicação do Teorema Binomial é a seguinte.


Exemplo 26. Quantos �n� subconjuntos existem num conjunto de n elementos distintos? Como
i
há um total de Cn = i subconjuntos de tamanho i, i = 0, 1, . . . , n, a resposta desejada é
n � �
� n � �

n n (1.20)
= 1i 1(n−i) = (1 + 1)n = 2n .
i=0
i i=0
i

1.3.2 Exercı́cios
1. Quantas palavras contendo 3 letras diferentes podem ser formadas com um alfabeto de
26 letras?

2. De quantos modos diferentes podem ser escolhidos um presidente e um secretário de um


conselho composto de 12 membros?

3. Considere um grupo formado por 7 homens e 5 mulheres, do qual se quer extrair uma
comissão constituı́da por 4 pessoas. Quantas são as comissões:

(a) Possı́veis?
(b) Formadas por 2 homens e 2 mulheres?

19
4. Quantas palavras podemos escrever com as seis letras a, b, c, d, e, f, sem repetir letras,
de modo que as letras a, b, c sempre apareçam na ordem alfabética?

5. O número 2016 tem quatro algarismos distintos, sendo um ı́mpar e três pares, com um
deles 0. Quantos números possuem exatamente essas caracterı́sticas?

6. Com relação a palavra TEORIA.

(a) Quantos anagramas existem?


(b) Quantos anagramas começam com T?
(c) Quantos anagramas começam com T e terminam com A?
(d) Quantos anagramas começam com uma vogal?

7. Determine o número de possı́veis anagramas da palavara SUSSURRO.

1.3.3 Exemplos
Amostragem aleatória em populações
Começaremos discutindo uma situação importante em estatı́stica, a amostragem aleatória. Su-
ponha que

P = {I1 , I2 , . . . , IM } (1.21)

seja uma população com M indivı́duos (em que o j-ésimo indivı́duo é indicado por Ij , j =
1, 2, . . . , M ).
Uma amostra aleatória de P é grosso modo um subconjunto de P escolhido aleatoriamente.
O exemplo mais simples é a amostra aleatória (ou casual) simples de tamanho 1. Esta é formada
pelo sorteio de 1 indivı́duo de P em que cada indivı́duo tem a mesma chance de ser sorteado
que os demais. Isto nos leva a considerar um espaço equiprovável para o sorteio em que Ω = P.

Exemplo 27. Suponha que dada população tenha 55 mulheres e 45 homens. Se tomarmos
uma amostra casual simples de tamanho 1 (ou, dito de outra forma, selecionarmos ao acaso
uma pessoa) desta população, qual a probabilidade de sortearmos uma mulher?
Indicando por A o evento “o indivı́duo sorteado é uma mulher”, é fácil concluir que A tem
55 elementos. Assim, como #Ω = 100, obtemos
#A 55
P(A) = = = 0, 55.
#Ω 100
Para amostras de tamanho maior do que 1, temos dois casos: amostragem com e sem
reposição.

20
Amostragem casual simples com reposição. Suponha que queiramos uma amostra de
tamanho n ≥ 2 escolhida da seguinte forma: sorteamos o primeiro indivı́duo de P para a
amostra, como na no caso n = 1; devolvemos o indivı́duo sorteado à população, e repetimos o
procedimento, e assim até o n-ésimo sorteio.
Um modelo para esta amostragem é um espaço equiprovável com

Ω = Pn = P × · · · × P
� �� �
n vezes (1.22)
n
= {(Ij1 , . . . , Ijn ) : (j1 , . . . , jn ) ∈ {1, . . . , M } } .

Note que pode haver repetições, ou seja, um mesmo indivı́duo pode ser sorteado mais do que
uma vez. Note ainda que, pelo princı́pio multiplicativo,

#Ω = M n . (1.23)

Exemplo 28. Suponha que tomemos uma amostra casual simples de tamanho 5 (ou, seleci-
onamos ao acaso 5 pessoas) com reposição da população do Exemplo 27. Neste caso, temos
#Ω = 1005 = 1010 . Seja A o evento “não há mulheres na amostra”. Para acharmos a probabi-
lidade deste evento, basta determinar o seu número de elementos. Para tanto, suponha que Ph
e Pm sejam os subconjuntos de homens e mulheres de P, respectivamente. Temos então que
#Ph = 45 e #Pm = 55. Temos também que A é o subconjunto de Ω com amostras de apenas
homens. Este subconjunto pode ser descrito como Ph5 , e logo

#A = #Ph5 = 455 .

Portanto,
� �5
#A 455 45
P(A) = = = ≈ 0, 018.
#Ω 1005 100

Amostragem casual simples sem reposição. Esta amostragem é semelhante à com re-
posição, com uma diferença importante: não há a devolução do indivı́duo sorteado à população
no final de cada sorteio, de forma que não há repetições: cada indivı́duo aparece no máximo
uma vez na amostra. Desta forma, temos um modelo equiprovável com

Ω = {(Ij1 , . . . , Ijn ) : (j1 , . . . , jn ) ∈ {1, . . . , M }n , ji �= jk se i �= k}. (1.24)

Isto naturalmente obriga a que n ≤ M . Vamos também estipular que amostras dos mesmos
indivı́duos em ordem distinta só contam uma vez; desta forma, a cardinalidade de Ω é o número
de escolhas de um grupo de n indivı́duos numa população de M indivı́duos distintos. Logo,
� �
M n
#Ω = = CM . (1.25)
n

Exemplo 29. Vamos tomar a mesma população, tamanho de amostra e evento A do Exem-
plo 28, mas com amostragem sem reposição. Para determinar #A, note que o número de

21
amostras com apenas homens é igual ao número de escolhas de 5 indivı́duos distintos de uma
população, Ph , com 45 indivı́duos. Logo,
� �
45
#A =
5
e portanto,
�45� 45!
#A 45 · 44 · 43 · 42 · 41
P(A) = 5
= �100 �= 40!5!
100!
= ≈ 0, 016.
#Ω 5 95!5!
100 · 99 · 98 · 97 · 96

Exemplo 30. Suponha que num lote com 20 peças existam 5 defeituosas. Escolhemos 4 peças
do lote ao acaso, sem reposição. Qual a probabilidade de que a amostra contenha 2 peças
defeituosas? � �
Neste caso, o número de amostras com 4 elementos que podemos extrair do lote é 20 4
.
Agora, representando por
� �� � A o evento que consiste em escolher 2 peças defeituosas na amostra,
temos que #A = 52 15 2
. Logo,
�5��15�
P(A) = 2
�20�2 ≈ 0, 217.
4

Exemplo 31 (Chaves). Uma pessoa tem um molho com n chaves das quais só uma abre sua
porta. Ao chegar em casa, ela vai testando as chaves ao acaso (sem reposição), até achar a chave
correta e abrir a porta. Qual a probabilidade de ela ser bem sucedida na k-ésima tentativa?
(k = 1, . . . , n)
Vamos modelar esta situação por um espaço equiprovável em que os resultados são todas
as possı́veis ordenações das n chaves. Temos então que #Ω = n!. No evento em questão,
digamos A, a chave que abre a porta deve aparecer na k-ésima posição, e as demais n − 1
chaves aparecem em qualquer ordem. Logo, #A = (n − 1)!, e

(n − 1)! 1
P(A) = = .
n! n

22
1.3.4 Exercı́cios
1. Dentre seis números positivos e oito negativos, dois números são escolhidos ao acaso (sem
reposição) e multiplicados. Qual a probabilidade de que o produto entre eles seja positivo?

2. Uma mão de poquer consiste de 5 cartas extraı́das de um baralho comum de 52 cartas.


Qual a probabilidade de que a mão tenha exatamente 2 reis.

3. Uma caixa contém r bolas vermelhas e b brancas. Extrai-se, sem reposição, da caixa uma
amostra aleatória de tamanho n, n ≤ r + b. Qual é a probabilidade de que a amostra
contenha exatamente k bolas vermelhas, em que k ≤ n?

4. Uma caixa contém 20 peças em boas condições e 15 em más condições. Uma amostra,
sem reposição, de 10 peças é extraı́da da caixa. Calcular a probabilidade de que ao menos
uma peça na amostra seja defeituosa.

5. De uma população, composta por 6 mulheres e 4 homens, seleciona-se uma amostra


aleatória de tamanho 5, com reposição. Qual a probabilidade de que não haja nenhum
homem na amostra? E de que haja ao menos um homem?

6. Numa classe com n alunos, qual a probabilidade de ninguém fazer aniversário no mesmo
dia? (Considere o ano com 365 dias.)

7. Uma moeda honesta é lançada n vezes. Calcule a probabilidade de se obter exatamente


k caras, k ≤ n.

8. Uma urna contém 4 bolas brancas, 4 bolas pretas e 4 bolas vermelhas. Extrai-se 6 bolas
dessa urna. Calcule a probabilidade de serem sacadas 2 bolas de cada cor supondo a
extração:

(a) com reposição.


(b) sem reposição.

9. Num jogo, em que 2 dados equilibrados são lançados simultaneamente, Paula ganha se o
maior valor dentre os dados lançados é 1, 2, 3 ou 4, enquanto que se o maior valor é 5 ou
6, Pedro que ganha. Quem tem a maior probabilidade de vencer o jogo?

23
1.4 Probabilidade Condicional e Independência
Consideremos o experimento que consiste em jogar um dado equilibrado. Logo, um modelo
apropriado para esse experimento é o espaço equiprovável, com Ω = {1, 2, 3, 4, 5, 6}. Considere
os eventos A = {1, 2, 4} e B = {2, 4, 6}. Calculando a probabilidade de A, temos
#A 3 1
P(A) = = = .
#Ω 6 2
Esta é chamada a probabilidade de A a priori, isto é, antes que o experimento se realize. En-
tretanto, muitas vezes, é importante reavaliar as probabilidades quando informações adicionais
a respeito do experimento se tornam disponı́veis.
Por exemplo, suponhamos que, uma vez jogado o dado, alguém nos diga que o resultado do
mesmo é um número par, ou seja, que o evento B ocorreu. Obviamente, nossa opinião sobre
a ocorrência de A muda diante desta informação, já que, então, somente poderá ter ocorrido
A se o resultado do experimento tiver sido 2. Esta opinião é medida com a introdução de uma
“probabilidade a posteriori” ou, como vamos chamá-la doravante, probabilidade condicional de
A dado B, denotada por P(A|B) e dada por
#(A ∩ B) 2
= .
#B 3
Em geral, a probabilidade condicional é definida da seguinte forma.
Definição 4 (Probabilidade Condicional). Seja (Ω, F, P) um espaço de probabilidade e seja
B ∈ F tal que P(B) > 0. Definimos a probabilidade condicional de A dado B por
P(A ∩ B)
P(A|B) = , A ∈ F. (1.26)
P(B)
Note que a função P(·|B) : F → [0, 1] é, de fato, uma probabilidade em (Ω, F).
Exemplo 32. Considere o lançamento de duas moedas idênticas e perfeitamente equilibradas.
(a) Determine a probabilidade condicional de se obter duas caras dado que se obteve cara
na primeira moeda.
(b) Determine a probabilidade condicional de se obter duas caras dado que se obteve pelo
menos uma cara.
Para resolver este problema, um espaço adequado é o espaço equiprovável em que
Ω = {CC, CK, KC, KK},
onde C indica cara e K coroa, com cada evento unitário tendo probabilidade 1/4. Seja A o
evento obter cara na primeira moeda e B obter cara na segunda. Então, notando que o evento
“obter duas caras” é o mesmo que A ∩ B, temos em (a) que
P((A ∩ B) ∩ A) P(A ∩ B) P({CC}) 1/4 1
P(A ∩ B|A) = = = =1 = ,
P(A) P(A) P({CC, CK}) /2 2
e em (b) que
P((A ∩ B) ∩ (A ∪ B)) P(A ∩ B) P({CC}) 1/4 1
P(A ∩ B|A ∪ B) = = = =3 = .
P(A ∪ B) P(A ∪ B) P({CC, CK, KC}) /4 3

24
Observação 5. Se P(B) = 0, P(A|B) pode ser arbitrariamente definida. Muitos autores faz
P(A|B) = 0, mas é mais interessante fazer P(A|B) = P(A) para que P(·|B) seja também uma
probabilidade sobre (Ω, F).
Da Definição (1.26) de probabilidade condicional segue a chamada regra do produto:

P(A ∩ B) = P(B)P(A|B) = P(A)P(B|A), (1.27)

e esta igualdade é válida também quando P(B) = 0. Intuitivamente, podemos interpretá-la


como a ocorrência do evento A ∩ B em 2 estágios. Primeiro, vemos se B ocorre, então vemos
a probabilidade de ocorrer A dado que B ocorreu. Na verdade, esta igualdade se generaliza,
conforme diz o teorema a seguir.
Teorema 4 (da Multiplicação). Para eventos A1 , A2 , . . . , An em um espaço de probabilidade
(Ω, F, P), se P(A1 ∩ · · · ∩ An−1 ) > 0, então

P(A1 ∩ · · · ∩ An ) = P(A1 )P(A2 |A1 ) · · · P(An |A1 ∩ · · · ∩ An−1 ). (1.28)

Demonstração. Por indução em n = 2, 3, . . .. Para n = 2, (1.28) reduz-se à (1.27). Agora,


suponha que (1.28) vale para n = k (nossa hipótese de indução H.I.). Vamos mostrar que (1.28)
também vale para n = k + 1. Com efeito,

P(A1 ∩ · · · ∩ Ak+1 ) = P((A1 ∩ · · · ∩ Ak ) ∩ Ak+1 )


(1.27)
= P(A1 ∩ · · · ∩ Ak )P(Ak+1 |A1 ∩ · · · ∩ Ak )
H.I.
= P(A1 )P(A2 |A1 ) · · · P(Ak |A1 ∩ · · · ∩ Ak−1 )P(Ak+1 |A1 ∩ · · · ∩ Ak ).

Exemplo 33. Selecionar três cartas de um baralho comum, ao acaso e sem reposição. Qual
a probabilidade de tirar 3 reis? Seja Ai o evento “tirar rei na i-ésima seleção”, i = 1, 2, 3.
Então,
4 3 2
P(tirar 3 reis) = P(A1 ∩ A2 ∩ A3 ) = P(A1 )P(A2 |A1 )P(A3 |A1 ∩ A2 ) = · · .
52 51 50
Exemplo 34. Suponha que a população de uma certa cidade é constituı́da por 40% de homens
e 60% de mulheres. Suponha ainda que 50% dos homens e 30% das mulheres são fumantes.
Determine a probabilidade de que uma pessoa selecionada ao acaso e que fuma seja homem.
Representemos por H o evento de que a pessoa selecionada é homem e por M o evento de
que a pessoa selecionada é mulher. Seja F o evento de que a pessoa selecionada é fumante e
por N o de que a pessoa não é fumante. Então os dados do problema são:

P(F |H) = 0, 5; P(F |M ) = 0, 3; P(H) = 0, 4 e P(F ) = 0, 6.

O problema consiste em determinar P(H|F ). De acordo com (1.26),

P(H ∩ F )
P(H|F ) = .
P(F )

25
Agora, de (1.27), temos que P(H ∩ F ) = P(H)P(F |H) = 0, 4 · 0, 5 = 0, 20. Além disso, como
F = (F ∩ H) ∪ (F ∩ M ), e essa união é disjunta, temos que
P(F ) = P(F ∩ H) + P(F ∩ M ) = 0, 20 + P(M )P(F |M ) = 0, 20 + 0, 6 · 0, 3 = 0, 38.
� �� � � �� �
=0,20 (1.27)
= P(M )P(F |M )

Portanto,
0, 2
P(H|F ) = ≈ 0, 53.
0, 38
O problema discutido no exemplo acima é um caso especial de uma situação mais geral
que passamos agora a considerar. Suponha que A1 , A2 , . . . , An , . . . sejam eventos mutuamente
exclusivos (disjuntos) cuja união é o próprio Ω, isto é,


Ω= An .
n=1

Neste caso, dizemos que A1 , A2 , . . . , An , . . . formam uma partição de Ω. A Figura 1.1 a seguir
ilustra esse conceito.

Figura 1.1: Partição do espaço amostral (n = 7).

Vamos admitir que a sequência A1 , A2 , . . . , An , . . . seja finita ou infinita enumerável. Então,


por exemplo, A e Ac formam uma partição de Ω, para todo A ∈ F.
Seja B um evento tal que P(B) > 0 e suponha que P(B|An ) e P(An ) são conhecidas
para todo n = 1, 2, . . .. Queremos pois responder a pergunta: Qual é o valor de P(Ak |B)?
(k = 1, 2, . . .)
Para determinar esta probabilidade, observe primeiro que, como os eventos A1 , A2 , . . . for-
mam uma partição de Ω, podemos escrever B como
�∞ � ∞
� �
B =B∩Ω=B∩ An = (B ∩ An ),
n=1 n=1

26
e essa última união é disjunta (veja a Figura 1.2),

Figura 1.2: A elipse sombreada representa o evento B.

de modo que pela aditividade da probabilidade,



� ∞

(1.27)
P(B) = P(B ∩ An ) = P(An )P(B|An ). (1.29)
n=1 n=1

Este resultado é conhecido na literatura como Lei da Probabilidade Total. Usando este resultado
e (1.26), podemos calcular a probabilidade Ak dado a ocorrência de B:

P(Ak ∩ B) P(Ak )P(B|Ak )


P(Ak |B) = = �∞ . (1.30)
P(B) n=1 P(An )P(B|An )

Esta é a famosa regra (ou fórmula) de Bayes, e tem aplicação bastante frequente. Uma forma de
interpretá-la é a seguinte: Suponha que pensemos nos eventos An ’s como as possı́veis “causas”
do evento observado B. Então P(Ak |B) é a probabilidade de que o evento Ak foi a causa de
B, dado que B ocorreu. A regra de Bayes também forma a base de um método estatı́stico
bastante conhecido hoje em dia, o chamado método Bayesiano.

Exemplo 35. Suponha que numa urna haja 2 bolas azuis e 3 bolas brancas, e que lhe retiramos
2 bolas sem reposição (ou seja, uma amostra casual simples de tamanho 2 sem reposição). Sejam
os eventos

A1 = {sai bola azul na 1a. retirada},


A2 = {sai bola azul na 2a. retirada}.

Vamos calcular P(A2 ).


Neste tipo de problema, em que temos um experimento com dois estágios, que são as duas
retiradas, é mais adequado usar a lei da probabilidade total, com os resultados de um estágio

27
servindo como partição para avaliar eventos do estágio seguinte. Assim, usando que A1 e Ac1
formam uma partição de Ω, temos que
P(A2 ) = P(A1 )P(A2 |A1 ) + P(Ac1 )P(A2 |Ac1 ).
O cálculo de P(A1 ) é claro: de 2 + 3 = 5 possibilidades, tem que ocorrer uma de 2 possibilidades
favoráveis a A1 . Então,
2
P(A1 ) = ,
5
e pela complementaridade,
2 3
P(Ac1 ) = 1 − P(A1 ) = 1 − = .
5 5
Agora, dado A1 , para a 2a. retirada temos 1 bola azul e 3 bolas brancas na urna, logo 1
possibilidade favorável a A2 de 1 + 3 = 4 possibilidades no total. Assim,
1
P(A2 |A1 ) = .
4
Procedendo de modo semelhante, pode-se obter também que
2
P(A2 |Ac1 ) = ,
4
de sorte que
2 1 3 2 8 2
P(A2 ) = P(A1 )P(A2 |A1 ) + P(Ac1 )P(A2 |Ac1 ) = · + · = = .
5 4 5 4 20 5
Exemplo 36. Uma vacina tem 90% de eficiência na imunização contra certa doença, que
acomete 50% da população não vacinada. Suponha que, após uma campanha de vacinação
em que 70% da população seja atingida, um paciente chegue a um hospital com a doença em
questão, mas sem saber se tomou a vacina ou não. Qual é a probabilidade de que a tenha
tomado?
Sejam os eventos
A = {paciente foi acometido pela doença}
B = {paciente tomou a vacina}.
Queremos pois determinar P(B|A). Para tanto, as informações que temos são as seguintes:
P(A|B) = 0, 10; P(A|B c ) = 0, 50; P(B) = 0, 70
Da regra de Bayes (1.30),
P(A|B)P(B) 0, 10 · 0, 70
P(B|A) = =
P(A|B)P(B) + P(A|B )P(B )
c c 0, 10 · 0, 70 + 0, 50 · 0, 30
0, 07
=
0, 07 + 0, 15
≈ 0, 32

28
Um outro conceito bastante importante em Probabilidade é o de independência de eventos,
que definimos agora.
Definição 5 (Independência de dois eventos). Dados um espaço de probabilidade (Ω, F, P) e
dois eventos A e B em F, dizemos que A é independente de B (ou que A e B são independentes)
se

P(A ∩ B) = P(A)P(B). (1.31)

Observe que se A é independente de B, então B é independente de A. Além disso, podemos


verificar que se A e B são independentes, então

P(A|B) = P(A) e P(B|A) = P(B). (1.32)

Exemplo 37. Considere um experimento que consiste em escolher um elemento do conjunto


Ω = {1, 2, 3, 4} ao acaso. Considere os eventos: A = {1, 2}, B = {1, 3} e C = {1, 4}. Vamos
verificar que A e B, B e C, e A e C são independentes.
De fato, basta ver que
1
P(A ∩ B) = P(A ∩ C) = P(B ∩ C) = P({1}) = ,
4
e que
1 1 1
P(A) = P(B) = P(C) = + = ,
4 4 2
de modo que
1 1 1
P(A)P(B) = P(A)P(C) = P(B)P(C) = · = .
2 2 4
Vejamos agora o conceito de independência para três eventos.
Definição 6 (Independência de três eventos). Dizemos que os eventos A, B e C são indepen-
dentes se, e somente se,
P(A ∩ B) = P(A)P(B),
P(A ∩ C) = P(A)P(C),
(1.33)
P(B ∩ C) = P(B)P(C),
P(A ∩ B ∩ C) = P(A)P(B)P(C).

Se apenas as três primeiras relações de (1.33) estiverem satisfeitas, dizemos que os eventos
A, B e C são independentes por pares. É possı́vel que três eventos sejam independentes por
pares, mas não sejam independentes. Vejamos no exemplo.
Exemplo 38 (Continuação do Exemplo 37). De acordo com a definição acima, é claro que os
eventos A, B e C do Exemplo 37 são independentes por pares. Porém, eles não são indepen-
dentes, pois
1 1 1 1 1
P(A ∩ B ∩ C) = P({1}) = �= = · · = P(A)P(B)P(C).
4 8 2 2 2
29
Exemplo 39. Considere agora o experimento que consiste em lançar uma moeda 3 vezes. Seja
Ci o evento “sair cara no i-ésimo lançamento”, i = 1, 2, 3. Vamos verificar que C1 , C2 e C3 são
independentes.
Com efeito, primeiro, note que
C1 = {CKK, CCK, CKC, CCC},
C2 = {KCK, CCK, KCC, CCC},
C3 = {KKC, CKC, KCC, CCC},
em que C indica cara e K coroa, de modo que não é difı́cil concluir que para todo 1 ≤ i �= j ≤ 3,
2 1 1 1 4 4
P(Ci ∩ Cj ) = = = · = · = P(Ci )P(Cj ).
8 4 2 2 8 8
Para concluir, basta agora observar que
1 1 1 1
P(C1 ∩ C2 ∩ C3 ) = P({CCC}) = = · · = P(C1 )P(C2 )P(C3 ).
8 2 2 2
Definição 7 (Independência — caso geral). (a) Dizemos que os eventos A1 , A2 , . . . , An são
independentes se, para todo I ⊂ {1, . . . , n}, vale a igualdade
� �
� �
P Ak = P(Ak ). (1.34)
k∈I k∈I

(b) Os eventos A1 , A2 , . . . são ditos independentes se para todo n ≥ 2, A1 , A2 , . . . , An são


eventos independentes
Observação 6. Vale reforçar que, em geral, não é suficiente assumir que P(Ak ∩ Aj ) =
P(Ak )P(Aj ), para todo k �= j, para que os eventos A1 , . . . , An sejam independentes. Uma
famı́lia finita de eventos que satisfaz esta última propriedade é dita ser independente por pares.
Evidentemente, independência implica em independência por pares. Porém, a recı́proca não é
válida, como vimos anteriormente.
Exemplo 40. Uma moeda não necessariamente honesta é lançada sucessivamente de maneira
independente. Qual a probabilidade de nunca obtermos uma coroa? Seja An o evento sair
coroa no n-ésimo lançamento, n = 1, 2, . . .. Então, o evento “nunca obtermos uma coroa” é,
em notação matemática, igual ao evento


A= An ,
n=1

e note que os An ’s são independentes, pois os lançamentos da moeda são independentes. Escreva
P(An ) = p, para todo n ≥ 1, em que p ∈ [0, 1] é a probabilidade de sair cara.
�M Escolha agora um
número M ≥ 1 qualquer (a ideia é depois fazer M → ∞). Como A ⊂ n=1 An , temos, pela
monotonicidade da probabilidade, que
�M � M M
� ind.
� �
P(A) ≤ P An = P(An ) = p = pM .
n=1 n=1 n=1

30
Agora, tomando o limite com M → ∞ em ambos os lados da desigualdade anterior, segue que

P(A) ≤ lim pM = 0,
M →∞

Como P(A) ≥ 0, concluı́mos que a probabilidade de nunca obtermos uma coroa é zero, o que
significa que eventualmente (ou seja, com probabilidade 1) uma coroa será obtida como resultado
de um lançamento da moeda.

1.4.1 Exercı́cios
1. Sejam A e B eventos com probabilidade não nula de ocorrência. Mostre que:

(a) Se B ⊂ A, então P(A|B) = 1.


P(A)
(b) Se A ⊂ B, então P(A|B) = P(B)
.
(c) Se A ∩ B = ∅, então P(A|B) = 0.

2. Um indivı́duo tem quatro moedas no bolso, sendo que uma delas tem cara nas duas
faces e as demais são honestas. Ele fecha os olhos, escolhe uma delas ao acaso e lança.
Pergunta-se:

(a) Qual é a probabilidade de que a face da moeda que fica para cima seja cara?
(b) Ele abre os olhos e observa que a face para cima é cara. Qual é a probabilidade de
que a outra face da moeda também seja cara?

3. Um exame de laboratório tem eficiência de 95% para detectar uma doença quando essa
doença de fato existe. Entretanto, o teste aponta um resultado “falso positivo” para 1%
das pessoas sadias testadas. Se 0,5% da população tem a doença, qual é a probabilidade
de uma pessoa ter a doença dado que o seu exame foi positivo?

4. Pedro que enviar uma carta a Marina. A probabilidade de que Pedro escreva a carta é
de 0, 8. A probabilidade de que o correio não a perca é de 0, 9. A probabilidade de que o
carteiro a entregue é de 0, 9. Dado que Marina não recebeu a carta, qual a probabilidade
condicional de que Pedro não a tenha escrito?

5. Três urnas I, II e III contêm respectivamente 2 bolas brancas, 2 pretas, e 1 branca e 1


preta. Uma urna é escolhida ao acaso e dela é retirada uma bola, que é branca. Qual é
a probabilidade condicional de que a urna escolhida foi a I? E de que a segunda bola que
ficou sozinha na urna escolhida seja preta?

6. Numa fábrica de parafusos, as máquinas A, B, C produzem respectivamente 20, 30 e 50


por cento do total. De sua produção, 6, 8, e 7 por cento são defeituosos. Um parafuso
é retirado ao acaso da produção e se verifica que o mesmo está defeituoso. Qual é a
probabilidade que ele tenha sido produzido pela máquina A?

7. Suponha que A, B e C são eventos independentes com probabilidades 1/10, 1/5 e 1/2,
respectivamente.

31
(a) Calcule P(A ∩ B ∩ C).
(b) Calcule P(A ∪ B ∪ C).
(c) Qual é a probabilidade que exatamente um dos eventos A, B ou C ocorra?

8. Um experimento consiste em lançar duas vezes uma moeda honesta. Considere os eventos:
A: o 1o lançamento resulta em cara;
B: o 2o lançamento resulta em cara;
C: o resultado do 1o lançamento coincide com o resultado do 2o lançamento.
Verifique que os eventos A, B e C são independentes aos pares, porém não são indepen-
dentes.

9. Mostre que um evento A é independente de si mesmo se, e somente se, P(A) = 0 ou 1.

10. Mostre que se A e B são independentes, então A e B c , Ac e B, e Ac e B c também são


independentes.

11. Suponha que numa fábrica de peças automotivas, a probabilidade de uma peça produzida
ser defeituosa é de 0, 01. Calcule a probabilidade da fábrica nunca produzir uma peça
defeituosa.

32

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