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A Fonte
A Fonte
um regador;
INÍCIO: CD Eterna Fonte: só o instrumental inicial e a primeira estrofe. Dança com cântaros ou
pequenos baldes. Terminada a dança, saem Fausta e Águeda. As outras permanecem.
DÉBORA: Esse seu balde parece ser muito bom. Cadê bastante água. Pretende trazê-lo cheiro?
SUSANA: É, ele é muito bom. Espero no Senhor para conseguir trazê-lo cheiro cada vez que eu
for à fonte. Mas, se eu não conseguir enchê-lo, guardarei com todo o cuidado de que eu for
capaz, todas as gotinhas que trouxer nele para regar o meu jardim.
DÉBORA: As suas disposições são muito boas, Susana. Eu também pretendo ir com muita
atenção pelo caminho. (diz radiante): Eu sei que essa fonte tem arroios que manam sem cessar.
Se eu não puder beber direto da sua nascente, não me deixarei abater.
SUSANA: Isso que você diz me faz lembrar as palavras do Santo Evangelho: “na casa de meu Pai
há muitas moradas.” Veja, Débora, certamente que haverá nessas moradas uns jardins maiores
e outros menores. Todos, porém, com a mesma vitalidade, pois regados com água da mesma
fonte.
SUSANA: Olhe lá! O Teóforo está vindo. Vamos falar com ele. Fui informada de que ele conhece
muito bem a fonte. E é verdade: veja só a beleza do seu jardim!
TEÓFORO: O caminho da oração é árduo, minha filha; é um constante ir e vir, entende? Você vai
a Deus, e volta aos irmãos. Vai à fonte e volta ao jardim.
SUSANA: E por falar em fonte, é melhor eu ir andando, afinal de contas eu ainda estou
trabalhando a minha terra para receber a boa semente. Até outra vez!
DÉBORA: Eu??!!!... Bem, às vezes eu tenho medo. Sou muito fraca. De mim mesmo não tenho
nada. Meu único arrimo é a minha vontade decidida. Eu não sinto gosto algum de andar debaixo
do sol ou da chuva, exposta a riscos sem conta. Mas não faço caso das dificuldades: tenho o meu
objetivo; irei à fonte, custe o que custar.
(Entra a Fausta, toda elegante, com joias, leque, salto, e um balde pequenino; e com voz afetada
de riquinha, “patricinha”).
FAUSTA: Licença! Licença, moço! Posso assentar-me um pouco para me recuperar? – Obrigada,
moço! Bom dia, senhorita! – Gente, eu não estou incomodando, não é mesmo?!
TEÓFORO: Não se preocupe. Fique à vontade. ( Volta-se para Débora e diz): Siga com esse
propósito e logo verá que o seu jardim atrairá os olhares do Jardineiro Celeste. Até outro dia!
DÉBORA: Obrigada, mestre amigo! É bom contar com você. (sai feliz)
TEÓFORO: Veja como são as coisas!: estou há anos aqui, e não sabia da existência desse clube
de festas juvenis. A senhorita está acompanhada?
FAUSTA: ( espantada, quase ofendida): Eu não estou entendendo, senhor! Eu não estou indo a
nenhuma festa. Na verdade eu estou indo à fonte. Já vim até prevenida com este balde – o que
comporta enorme sacrifício por ser ele tão pesado. ( exclama cansada): Ai!, como estou exausta!
TEÓFORO: A senhorita sabe algo sobre esse caminho que quer percorrer?
FAUSTA: Pode me chamar de Fausta. – O caminho? Ó sim, tenho amplo conhecimento sobre
ele. Vasta experiência.
FAUSTA: ( com um sorriso crítico): Bem, percebo que o senhor é um principiante. Mas não se
preocupe. Fique tranquilinho. Vou lhe dar uns conselhos, como pessoa experimentada que sou
nessa matéria: é preciso andar prevenido. Olhe que pessoas de cabeça fraca já se deram mal
por ir de qualquer jeito.
TEÓFORO: É mesmo?! Vejo que você é muito humilde! E os seus trajes são um louvor à pobreza.
FAUSTA: O senhor me confunde. Mas, de qualquer forma, obrigada! Devo aprender a conviver
com a verdade sobre minha pessoa. Realmente sou muito virtuosa. Oh! Quisera que o Senhor
escondesse minha luz dos olhares das pessoas. Mas isso é quase impossível. Já estou
desapegada de tudo. Agora o meu ornato é o Senhor, o Senhor pobre e despojado de tudo.
Suponho que, muito brevemente atingirei o cume da perfeição. Já estou até pensando em
marcar a data do meu matrimônio espiritual.
TEÓFORO: ( com a mão no queixo, perplexo): Ah!!! Entendo!!!... Eu... eu acho melhor você ir
andando, moça virtuosa. Se precisar deste pobre pecador indigno, é só aparecer.
FAUSTA: Claro, já vou andando. Mas não precisarei de nada. A minha pobreza é extrema. Adeus!
TEÓFORO: Quanta ilusão! Espero que desperte algum dia desse sono. ( sai)
DÉBORA: Porque será que tão poucas pessoas se lançam no caminho da oração? Algumas até
tentam, mas desistem logo depois.
DÉBORA: É verdade. (Sentam-se para conversar): Você se lembra da Teodora? Ela colocou na
cabeça que este caminho não é para todos. Disse que “ Fulano rezava tanto e deu no que deu”,
“ que há perigos”. “ Que Aquele se enganou”, Aquela se perdeu”. “ Que basta reza o Pai Nosso”,
“ que rezar não é para mulheres”. Enfim.
SUSANA: ( levantando-se com ímpeto): É por isso que eu não vou parar enquanto não chegar à
fonte, venha o que vier.
ÁGUEDA: O senhor acha que eu devo levar um balde menor, mestre Teóforo?
ÁGUEDA: É que eu preciso de tanta água!... Diga-me Teóforo, o senhor já foi muitas vezes à
fonte?
TEÓFORO:(emocionado):Oh!, eu não tinha outra ocupação mais importante e necessária. ( Para
um pouco para pensar; em seguida, suspira profundamente, e diz com emoção): Ah!... eu não
sei mais viver sem essa água ( pausa; olha para o céu): Mas agora eu já tenho um outro modo
de regar. Aliás, não tenho mais de ir lá, porque o Dono da Fonte me traz a água.
ÁGUEDA: Como assim? O senhor está dizendo que é Jesus quem rega o seu jardim???
(suplicante): Por favor, Mestre Teóforo, ensine-me esse caminho! Eu preciso de um Mestre.
TEÓFORO: É uma longa história!... E então, você acha que conseguirá trazer o seu balde cheio?
ÁGUEDA: Mestre, tudo o que eu sei é que quero ir à fonte. Por isto eu trouxe este balde grande,
a fim de não perder de vista a minha finalidade. Sei que uma boa motivação fortalece a vontade.
FAUSTA: Que horror! Os meus pés estão calejados de tanto andar! Oh!, sempre senti lá no meu
íntimo um chamado especial para o martírio. Oh! Quanta aspereza! ( lança um olhar de súplica
para o alto): Até quando terei de viver longe de ti?! Já percebo em meus membros as dores da
flagelação! Oh, Jesus! Só por ti eu carrego estas algemas. Por ti é que eu me visto com os trajes
de maltrapilho. (e mostrando o balde para o Senhor): Transforma este pesado fardo em delícias
para os pobres pecadores. Para mim só quero cruzes. Todas as cruzes. ( começa a gritar por
causa de uma picada de inseto, e lança repelente no ar e pelo corpo): Ai! Ai, ai, aaaai!!! Precisa
chamar a Vigilância Sanitária! Esse jardim está repleto de insetos. Ai! Sai, bicho imundo!
FAUSTA: (ofendida): E você acha que estou regalada??!! Eu, que estou quase no ponto de
receber os estigmas?! (novamente clama ao céu): Oh, Senhor, porque me destes tantos
carismas? Tire-me logo desde mundo a fim de que eu não tenha de viver entre pessoas que não
entendem a nossa intimidade. Ninguém me entende! Sou uma mártir. Nunca imaginei que fosse
capaz de sofrer tanto por ti! (sai se lamentando)
ÁGUEDA: Ela está indo a alguma festa? Tem roupas tão elegantes!
TEÓFORO: O quê? Não, não; é apenas uma alma que não compreendeu o Espírito do Evangelho.
– Quanto a nós, vamos à fonte! (saem animados ao som do instrumental inicial)
DÉBORA: Veja, Susana, são flores do meu jardim. Tudo está cheio de vida. Tudo floresce! (diz
gozosa): e, dentro de mim, eu sinto como se essa água ateasse um fogo de alcatrão! Quanto
mais eu me refresco com essa água, mais cresce esse fogo.
SUSANA: Por favor, Débora, não fale mais, pois já estou me sentindo queimar também. Eu sinto
o suave odor da alma purificada por essa água viva, água celestial, água cristalina que cai do céu
sem lodo, e tudo torna transparente.
ÁGUEDA: Oh, irmãs, que coisa estranha! Está água, matando nos farta, e, fartando nos faz
morrer! Feliz daquele que se afoga nessa água! (sai, e volta com uma flor e com o cântaro da
dança)
ÁGUEDA: Eu é que sei!: Sem os seus conselhos eu não teria sequer chegado à fonte.
TEÓFORO: Agradecei, vós, ao Senhor nosso Deus, por este benefício que é devido certamente à
humildade com que me pedistes ajuda e quisestes ser ensinadas por criatura tão miserável como
eu.
TODAS: Bendito e louvado seja o Senhor, de quem procede todo o bem que falamos, pensamos
e fazemos. Amém!
Fim