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Embora talvez pouco conhecido pela maioria dos cristãos, o Avivamento de Shantung é

considerado um dos avivamentos mais significativos na China e foi, com certeza, o mais
poderoso que já houve no meio dos batistas. Shantung (ou Shandong) é uma província no
litoral nordeste da China. Pouco antes da invasão do país pelo Japão em 1937, no meio da
turbulência política causada por atividade comunista na região, Deus enviou uma poderosa
onda de avivamento que durou aproximadamente dez anos (1927-1937). A seguir, a
primeira parte de uma série de relatos e testemunhos sobre o que aconteceu.

Ao estudar as ações extraordinárias de Deus em avivamentos, é sempre maravilhoso


constatar como ele prepara tanto pessoas quanto circunstâncias durante anos antes de
uma visitação. Embora a característica principal de avivamento seja a ação soberana de
Deus, produzindo efeitos que jamais seriam alcançados pelo esforço natural, vemos que
mesmo nessas ocasiões Deus continua realizando sua obra por meio de instrumentos
humanos.

No caso do Avivamento em Shantung, duas pessoas muito importantes na preparação e no


desencadeamento da visitação foram Bertha Smith e Marie Monsen.

Bertha Smith

Dois anos depois de sua conversão em 1905, Bertha teve uma experiência marcante com
Deus durante uma série de reuniões especiais em sua cidade natal de Cowpens, na
Carolina do Sul, EUA. Ao render-se totalmente à vontade soberana do Senhor, ela
determinou que aceitaria qualquer coisa que ele lhe pedisse e que absolutamente nada
seria “pedir demais”. Foi nessa ocasião também que recebeu o enchimento do Espírito pela
primeira vez. No seu entendimento, ser cheio do Espírito era uma experiência que deveria
repetir-se continuamente na vida do cristão. Para isso, porém, era necessário manter a vida
sempre purificada, livre de pecados não-confessados e não-renunciados, e sempre rendida
à liderança do Espírito Santo. Como Paulo escreveu aos gálatas: “Se vivemos no Espírito,
andemos também no Espírito” (Gl 5.25).

Algum tempo depois, Bertha recebeu o chamado de Deus para o serviço missionário.
Estudante de faculdade na época (1910), ela lutou durante várias semanas com a idéia,
considerando os sacrifícios que seriam exigidos. Envolveria, certamente, deixar o lar e a
família por anos, talvez para o resto da vida. Será que a família aprovaria? No fim, porém, o
que a levou a tomar uma decisão foi reconhecer que Jesus deixou toda a glória do Céu para
viver aqui na Terra e morrer uma morte vergonhosa em seu lugar – tudo para cumprir a
vontade do Pai. Como ela poderia agora fazer menos do que tomar atitude semelhante? Ao
render-se ao chamado de Deus, uma grande alegria invadiu o coração que nunca mais a
deixou.

Em 1917, com 28 anos de idade, Bertha foi enviada pela Junta de Missões da Convenção
Batista do Sul como missionária à China. Logo que chegou, ficou preocupada com o baixo
nível de compromisso e espiritualidade entre os chineses convertidos. Os outros
missionários sentiam o mesmo. À medida que buscavam renovação em suas próprias
vidas, chegavam cada vez mais à conclusão de que só um avivamento mudaria a condição
de impotência e superficialidade da obra que estavam tentando levantar.

Começaram separando o primeiro dia de cada mês para orar nesse sentido. Pouco a
pouco, foram aumentando a freqüência, até chegar a duas reuniões de oração todos os
dias. Havia sede por Deus, descontentamento com o nível de vida e ministério e um desejo
cada vez mais forte de ver Deus intervir sobrenaturalmente na situação. A intensidade da
oração e do desejo de conhecer a Deus e de experimentar a plenitude do Espírito foi uma
preparação tremenda para o que haveria de vir.

Marie Monsen
Enquanto isso, Deus estava trabalhando numa outra pessoa, em outro continente, chamada
Marie Monsen. Da Igreja Luterana da Noruega, Marie era uma mulher decidida, original
(não se enquadrava em padrões comuns de pensamento ou comportamento) e ousada.
Antes de ser enviada para a China como missionária em 1901, já havia acumulado uma
bagagem expressiva de experiências com Deus, viajando sem recursos, dependendo dele
em tudo, recebendo provisões sobrenaturais.

Durante sua primeira temporada na China, porém, passou por várias provações difíceis que,
na sabedoria de Deus, contribuiriam para seu aperfeiçoamento e preparação. Ao cair de
uma escada em Xangai, sofreu concussão cerebral. Além disso, assim que chegou ao local
que seria seu campo missionário, foi acometida por um ataque muito sério de malária, a
ponto de quase morrer. Durante os primeiros anos, estudando a língua, sentia fortes dores
de cabeça no meio de uma luta constante com a malária.

No verão de 1906, finalmente, veio alívio. Através de oração, Marie foi completamente
curada. A partir daí, ela teve várias outras oportunidades para recorrer ao Grande Médico
em favor de si própria e de outros, e de testemunhar a cura. A partir de 1911, numa
segunda temporada na China, trabalhou com a Missão Luterana na província de Honan.

Um Retiro Espiritual

Em 1927, diante da situação tensa e instável na região causada por atividade comunista e
movimentos anticristãos, o governo dos Estados Unidos recomendou fortemente que todos
os missionários abandonassem a província de Shantung e se refugiassem,
temporariamente, na cidade portuária de Chefoo, até que as coisas se acalmassem.

Mais de vinte missionários ficaram alojados precariamente num espaço bem limitado, sem
muito a fazer, esperando o desenrolar dos acontecimentos. Resolveram, depois de alguns
dias, aproveitar o tempo e fazer um retiro espiritual. O grupo, que era quase todo de batistas
da Missão do Norte da China, convidou Marie Monsen para compartilhar suas experiências
de evangelismo e cura divina no campo missionário. Muitos estavam cansados e frustrados
depois de anos sem fruto, sem avanço espiritual. Alguns haviam pensado até em
abandonar o trabalho missionário, a tal ponto havia chegado a sensação de impotência e
fracasso na obra de Deus.

Com sua ousadia e abordagem direta, Marie não tinha receio algum de confrontar quem
quer que fosse com exposições claras de verdades fundamentais e perguntas pessoais.
Sua marca registrada por onde viajava e ministrava eram as duas perguntas diretas que
fazia a todos que encontrava, indiferentemente se eram visitantes, membros de igreja,
ministros ou missionários: “Você já nasceu de novo?” e “Você já foi batizado com o Espírito
Santo?”

“É preciso confessar e abandonar todo e qualquer pecado conhecido se quiser que Deus o
encha com seu poder”, ela enfatizava. “Deus requer santidade.”

Um dos missionários que Marie Monsen conheceu nesta ocasião foi o dr. Charles
Culpepper, respeitado líder da Missão Batista e diretor do Seminário Batista em Shantung.
Anos depois, ele relatou as primeiras palavras de Marie para ele: “Você já foi batizado no
Espírito Santo?”. Naquele momento, ele não teve resposta, mas a pergunta desencadeou
uma busca pessoal que durou quatro anos, como veremos adiante.

O Início do Avivamento

A ministração de Marie e os testemunhos de cura que relatou tocaram profundamente o


grupo de missionários batistas, apesar de representaram um conceito novo e estranho para
eles. Para alguns, qualquer manifestação do sobrenatural em dons era associada com o
temor de tornar-se “pentecostal”, o que era considerado símbolo de fanatismo e
desequilíbrio.

Deus já havia preparado, porém, uma situação para começar a mudar tudo isso. Se houve
um único evento que pode ser considerado o “início” do avivamento, foi uma reunião
poderosa que aconteceu em março de 1927, durante o retiro em Chefoo. A esposa de
Culpepper, Ola, havia sofrido há anos de neurite óptica, com visão apenas parcial no olho
afetado e muita dor. Um especialista mundial na doença não lhe dera esperança alguma.
Depois dos testemunhos de Marie, ela disse ao marido que estava convicta de que Deus a
queria curar e pediu a Marie que reunisse o grupo de missionários para orar por ela.

Apesar de ser algo totalmente inédito para o grupo, eles concordaram. Em preparação para
a reunião, cada um procurou colocar a vida espiritual “em dia”, confessando pecados e
buscando purificação. Havia uma sensação elétrica de expectativa no ar: Deus estava para
fazer algo incomum.

Quando chegou o dia, o grupo formou um círculo em volta de Ola, que colocou os óculos
em cima da lareira. Charles Culpepper leu o texto de Tiago 5.14-16: “Está alguém entre vós
doente? Chame os presbíteros da igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com
óleo em nome do Senhor. E a oração da fé salvará o enfermo, e o Senhor o levantará; e, se
houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados. Confessai, pois, os vossos pecados uns
aos outros, e orai uns pelos outros, para serdes curados. Muito pode, por sua eficácia, a
súplica do justo.”

Charles, então, ungiu Ola com óleo e pediu que os outros missionários lhe impusessem as
mãos e orassem pela cura.

De repente, Bertha Smith interrompeu a reunião. Mais tarde, ela descreveu o que lhe
aconteceu naquele momento:

Eu havia entrado naquela sala, até onde sabia, com minha vida em dia com o Senhor.
Jamais teria ousado entrar em outra condição. Porém, quando estendi minha mão para a
cabeça de Ola Culpepper, fui obrigada a retirá-la. Ali, diante de mim, estava a srta. Hartwell,
uma missionária com quem eu tivera problemas algum tempo antes.

Na época, nós trabalhávamos na mesma escola da missão. De forma bem presunçosa, em


virtude da minha formação superior em educação, eu havia desprezado os métodos da srta.
Hartwell de alfabetizar garotos e fizera comentários que a feriram.

Ali mesmo, diante de todos, tive de confessar: “Srta. Hartwell, minha atitude naquele
assunto da escola estava errada. Peço que me perdoe!”

Somente depois disso é que pude juntar minha mão com as dos outros e orar por Ola
Culpepper.

Caso eu tivesse me recusado a confessar aquele pecado e tentado orar com ele encoberto,
creio que a oração do grupo e a cura de Ola poderiam ter sido impedidas.

Com esse problema resolvido, o grupo se pôs a orar – com muita união e poder. De acordo
com o testemunho de várias pessoas presentes, os céus desceram e houve grande
presença do Espírito durante aproximadamente duas horas. O poder de Deus estava tão
forte que duas cozinheiras chinesas que trabalhavam na missão e tinham muito
ressentimento uma com a outra, ao entrarem na sala, foram tocadas na mesma hora.
Sentiram convicção do Espírito, confessaram o ódio que tinham no coração, buscaram
perdão e foram maravilhosamente convertidas.

Foi tão glorioso que o grupo até se esqueceu do objetivo da reunião: a cura de Ola. Quando
se lembraram de perguntar, ela testificou que não sentia mais dor alguma. Apesar de não
ter a visão totalmente restaurada, ela nunca mais precisou dos óculos nem sentiu dor.

Uma chama foi acesa que começaria a espalhar-se por toda a província quando os
missionários voltaram para casa…

Fontes: “Women on the Frontlines” (Mulheres na Linha de Frente), de Michal Ann Goll e
“Women of Awakenings” (Mulheres de Despertamentos), de Betty Drummond.

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