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Interpretando Mateus 18-19: tu és Pedro.

Eu pretendo ser breve neste artigo. Apenas desejo apresentar uma interpretação deste
maravilhoso versículo que trás muitas discordâncias e brigas. Não creio que haja necessidade
para tal contenda, assim como não creio haver necessidade de contenda para a maioria das
brigas bobas que versículos avulsos acabam por gerar.

“Tendo chegado à região de Cesareia de Filipe, Jesus interrogou os discípulos, dizendo: “Quem
dizem os homens que é o Filho do homem?”. Eles responderam: “Uns dizem que é João Batista,
outros que é Elias, outros que é Jeremias ou algum dos profetas”. Jesus disse-lhes: “E vós quem
dizeis que eu sou?”. Respondendo Simão Pedro, disse: “Tu és Cristo, o Filho de Deus vivo”.
Respondendo Simão Pedro, disse-lhe: “Bem-aventurado és, Simão Bar-Jona, porque não foi a
carne e o sangue que te revelaram, mas meu Pai que está nos céus. E eu digo-te que tu és
Pedro, é sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão
contra ela. Eu te darei as chaves do reino dos céus; tudo o que ligares sobre a terra, será ligado
também nos céus, é tudo o que desatares sobre a terra, será desatado também nos céus”.

Contexto e intenção de Cristo:


Tais versículos decorrem em sequência da admoestação de Cristo a seus discípulos quanto a
doutrina dos fariseus. Jesus, em alguns versículos anteriores diz aos apóstolos: “Atenção!
Guardai-vos do fermento dos fariseus e dos saduceus”. Afim de explicar-lhes melhor a
intenção de Cristo nesta admoestação aos apóstolos, Hilário de Poitiers nos diz em “In
Matthaeum”: Com estás palavras o Senhor aconselha Seus apóstolos a não se misturarem com
a doutrina dos judeus, porque as obras da lei foram estabelecidas em direção à fé como figura
das coisas futuras. E eles, em cujo o tempo a verdade chegou, não deveriam mais buscar nada
na figura da verdade, para a doutrina dos fariseus, que não conhece Cristo, não corrompa os
efeitos da verdade do Evangelho”. Creio que Hilario captou de forma concisa o ensinamento
de Cristo em tal versículo, portanto, os versículos subsequentes demonstram Cristo
construindo os alicerces e os fundamentos profundos da doutrina de seu Evangelho aos
apóstolos. Assim, Cristo começa a interrogar os apóstolos sobre o que os homens (não os
escribas e fariseus, que já possuem inclinação a maldade) pensavam dele. Hilário faz mais uma
interessante colocação a ser analisada: “Ao dizer “Quem dizem os homens que é o Filho do
homem?”, insinuou ser algo além daquilo que viam n’Ele. Ele era, de fato, Filho do homem.
Não devemos pensar que, perguntando o que diziam d’Ele, confessou algo de si mesmo. Ele
perguntou sobre algo que estava oculto, e é sobre isso que versa a nossa fé. A razão da
confissão que devemos conservar é que Cristo não somente Filho de Deus, mas também Filho
do homem; sem ambas as coisas, não há esperança alguma de salvação. Por isso Ele
enfaticamente disse: “Quem dizem os homens que é Filho do homem?”.

Posterior a tal contestação, o Senhor pergunta aos discípulos: “E vós quem dizeis que eu sou?”.
Ele realiza tal pergunta depois de ter realizado os mais diversos milagres; depois de ter
multiplicado os pães, curado enfermos, andado sobre as águas, e etc. dessa maneira, é claro
que se é esperado que os apóstolos venham a ter uma opinião distinta sobre quem é Cristo.
Jesus poderiam ter-lhes interrogado mais cedo em sua jornada, mas optou por lhes interrogar
neste momento (um momento crítico de divisão pois, logo depois disto, Cristo profeticamente
revela os seus futuros tormentos, morte e ressurreição), depois de já terem o conhecido e
visto a vasta gama de milagres que Ele realizou. Assim, como diz Rábano Mauro: “Não
questiona a opinião dos discípulos e das outras pessoas porque não a soubesse. Interroga a
dos discípulos para que a confissão de sua reta fé fosse remunerado como digna recompensa,
e a dos outros para que, pela exposição dos erros, provasse aos discípulos que a verdade de
sua confissão não provinha da opinião do vulgo, mas de terem percebido o segredo mesmo da
revelação do Senhor”. Assim, quando interroga sobre a opinião da plebe, todos os apóstolos
respondem de imediato, e quando interroga a opinião dos apóstolos, Pedro, como boca e
cabeça dos profetas responde: “Tu és o Cristo, o Filho de Deus”. Pedro confessa ali a
verdadeira e inviolável fé: Deus filho procede de Deus Pai, e Sua eternidade procede da
eternidade do Pai. Que esse Deus assumiu um corpo e se fez homem.

A confissão de Pedro mereceu grande recompensa, por isso é dito: “Bem-aventurado és,
Simão Bar-Jona, porque não foi a carne é o sangue que te revelam”. Jerónimo nos diz mais
sobre tal versículo: “Cristo réplica ao apóstolo por causa do testemunho que deu d’Ele. Pedro
disse: tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo, é o Senhor lhe disse: Bem aventurado és, Simão Bar-
Jona. Por que? Porque não foi a carne é o sangue que te revelaram, mas meu Pai que está nos
céus. O que nem a carne nem o sangue podem revelar foi revelado pela graça do Espírito
Santo. Logo, de sua confissão ele recebeu um título, porque teve a revelação do Espírito Santo,
de quem foi também chamado de filho; pois Bar-Jona significa, em nosso idioma, Filho da
pomba”. A passagem acima da a entender que está é a primeira vez que Pedro confessou
Cristo como Filho de Deus vivo. Pôde-se dizer que quando os apóstolos começaram a pregar,
eles criam que Jesus fosse o Cristo, mas, conforme o conheceram, progrediram, o entendendo-
o propriamente como o Filho de Deus vivo. Jerônimo complementa: “como se dissesse “já que
disseste ‘Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo’, também eu te digo que tu és Pedro”. Assim
como, sendo Ele a luz e dando-a aos apóstolos, para que fossem chamados de “luz do mundo”
e de tantos outros nomes que o Senhor escolheu, agora a Simão, que creu em Cristo, a Rocha,
da o nome de Pedro”, seguindo a metáfora da pedra, Jesus também diz: e sobre esta pedra
edificarei a minha igreja. Aqui começasse geralmente a confusão sobre, se a Pedra que a igreja
é edificada, é propriamente Pedro, mas, João Crisóstomo nos revela sobre o que a igreja de
fato está edificada: “Ou seja, “sobre esta fé e sobre esta confissão edificarei minha igreja”,
mostrando que muitos creriam naquilo mesmo que Pedro confessou, confirmando o seu
sentido e fazendo dele pastor”. Oportunamente Agostinho também nos diz: “Eu disse, em
outro lugar, falando do apóstolo Pedro, que sobre ele, como sobre uma pedra, foi edificada a
Igreja. Mas não ignoro, e depois o expus em muitas ocasiões, que as palavras do Senhor: tu és
Pedro e sobre essa pedra edificarei a minha Igreja significam que a Igreja está edificada sobre
Aquele que Pedro confessou ao dizer: Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo; como se Pedro,
chamado de pedra por Aquela pedra, figurasse a pessoa da Igreja, que está edificada sobre
esta Pedra. O Senhor não disse a ele “Tu és a pedra”, mas tu és Pedro, pois a pedra era Cristo
(1 Cor 10, 4), o qual Simão confessou, assim como confessa toda a igreja.

Por fim, só nos resta analisar o que são as chaves do reino dos céus entregues a Pedro. Rábano
Mauro nos diz: “Aquele que confessou o Rei dos céus com mais devoção que os outros tem
mais mérito que os outros para receber as chaves do reino dos céus. Isto fez com que todos
soubessem que, sem está fé e sem está confissão, ninguém entraria no reino dos céus. Por
chaves do reino dos céus Ele quer dizer o discernimento e o poder: poder para atar e desatar,
discernimento para distinguir os dignos e os indignos”. Rábano Mauro, nos diz também, que
esse poder foi concedido a Pedro, contudo, também foi concedido a todos os apóstolos, e que
tal poder é extensivo aos bispos e presbíteros da igreja ainda hoje. Claramente Pedro é um
principal, do qual os bispos poderiam recorrer em caso de discordância. Assim, tal poder é de
grande valia a Igreja (a Igreja que possui Cristo como alicerce), mas, tal poder e justiça está
ancorada sobre a Palavra de Jesus, a igreja não tem poder de condenar os inocentes e salvar os
condenados.

Dessa forma eu termino a breve análise de tais versículos. Tentei ao máximo não ser partidário
de nenhuma posição, muito menos comentar por demasia sobre elas. Creio ser muito
vantajoso analisarmos os versículos sem pré-concepções do que gostaríamos que a Palavra nos
dissesse.

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