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Anatália de Souza Melo Alves

Anatália nasceu em Pernambuco, mas logo na infância mudou-se para Mossoró-

RN, local onde veio a conhecer seu cônjuge o bancário Luiz Alves Neto, funcionário do
Banco do Brasil da agência de Mossoró e militante do Partido Comunista Brasileiro
Revolucionário (PCBR). Por influência do mesmo, ela que já era costureira e ajudava
nas finanças de sua casa com as aulas de costura que conseguia, também passou a fazer
parte da luta militante colaborando com as atividades do cotidiano partidário, no qual
realizava diversas tarefas de apoio às lutas desenvolvidas pelo partido. Seguindo as
regras de segurança da organização, recebe o codinome de Marina, com o qual passa a
ser conhecida entre os companheiros.

Anatália Melo Alves foi sequestrada em 17 de dezembro de 1972, em sua


residência na cidade de Gravatá, por agentes do Destacamento de Operações de
Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), conforme relatos
de seu marido Luiz Alves Neto. A mesma de acordo com o testemunho dos seus
companheiros foi vítima repetida vezes de violência sexual perpetrada por vários de
seus torturadores, entre os quais, Luiz Martins Miranda, conhecido como um dos mais
violentos e sádicos elementos da repressão.

Após 26 dias de seu sequestro (não havia registro de sua prisão), Anatália foi
removida para o Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) quando teve
oficializada sua detenção em 13 de janeiro de 1973, conforme atesta documento oficial
existente em seu prontuário, denominado “Registro de Presos”. Segundo este
documento, ela teria sido escoltada por agentes do DOI, procedentes do IV Exército e
recebida no DOPS pelo policial Hilton Fernandes da Silva. A comunicação oficial do
suposto suicídio nas dependências do DOPS encontra-se em documento datado de 22 de
janeiro de 1973, dirigido ao delegado de Segurança Social, pelo delegado adjunto, bel.
Amauri Leão Brasil nos seguintes termos:

Ocorrência – Levo ao conhecimento de V.S. que, hoje (22.01), às


17h20, a acusada Anatália Melo Alves, pediu ao Agente Artur Falcão Vizeu,
que se achava na sua custódia, para ir ao sanitário, o que foi permitido, tendo
dito Agente ficado no seu posto de vigilância, minutos após (20 minutos),
estranhando a demora da custodiada, bateu por diversas vezes na porta que se
achava fechada, chamando a atenção do mesmo e, como notasse algo de
anormal, empurrou a dita porta, com violência, deparando-se com a acusada,
caída ao chão, o que motivou o alarme para o socorro urgente/necessário do
acontecido, que com a minha presença e dos funcionários Genival Ferreira da
Silva, Hamilton Alexandrino dos Santos, foi retirada a pessoa do caso em
tela, para os devidos socorros, notando-se logo em seguida que a mesma se
achava sem vida, e com um cordel de sua bolsa, atado em sua garganta.
Outrossim, imediatamente foi providenciado médico-legista e da Polícia
Técnica, que se fizeram presentes, tomaram todos os apontamentos
necessários, como também compareceu toda a imprensa falada e escrita,
atuantes desta Secretaria.
Segundo o laudo do instituto de perícia técnica de Pernambuco, Anatália foi
encontrada deitada numa cama de campanha, o que contraria a versão de que teria
morrido no banheiro. De acordo com a análise sua morte teria sido causada por asfixia
por enforcamento, ainda quanto à análise das fotos do laudo em questão, a vítima
apresentava queimaduras em seus órgãos genitais, ainda sendo evidenciado que duas
peças de roupa utilizada pela vítima apresentavam também sinais de queima. Esse laudo
corrobora com o depoimento de diversas testemunhas sobre as circunstâncias da morte
da mesma, foram unânimes também em declarar que em nenhum momento, no DOI-
CODI ou no DOPS, teriam ficado de posse de seus documentos ou quaisquer outros
pertences, daí estranharem que uma presa política incomunicável pudesse portar uma
bolsa de alça com seus respectivos documentos. .
A vítima foi sepultada sem que sua família tomasse conhecimento e sem que
lhes fosse entregue a certidão de óbito. Entretanto, após as investigações realizadas pela
CEMVDHC, de Pernambuco, conseguiu-se localizar o seu atestado de óbito, assim
como informação sobre o local do sepultamento no cemitério Santo Amaro em Recife-
PE. Seu corpo já havia sido exumado e sua urna lacrada, supostamente contendo os
restos mortais de Anatália, foi entregue a seus familiares em 1975, com a recomendação
de que não abrissem em nenhuma circunstância. Sendo assim, os restos mortais carecem
ainda de plena identificação.
A violência sexual praticada contra Anatália de Melo Alves é sem dúvida, um
exemplo significativo das graves violações humanas cometidas pela ditadura contra as
mulheres. Muitos são os relatos de ex-presas políticas denunciando as particularidades
do tratamento a que foram submetidas por elementos da repressão. Ocupar o espaço
público envolver-se em um combate político ousado, colocavam as mulheres em uma
posição duplamente transgressora: desafiavam a ditadura e rompiam com os padrões
tradicionais do comportamento que lhes é reservado, não apenas pela repressão, mas,
em geral, pela sociedade.
Em 9 de março de 2015, em solenidade comemorativa do dia Internacional das
Mulheres, a Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara, através do
Exmo. Senhor Governador do Estado de Pernambuco, Paulo Câmara, em cerimônia
realizada no Palácio do Campo das Princesas, sede do Governo do Estado de
Pernambuco, fez a entrega oficial da Certidão de Óbito Retificada de Anatália Alves de
Melo aos seus familiares, representados na ocasião pelo viúvo da vítima, Luiz Alves
Neto. A CEMVDHC desqualificou, nesse evento, a versão oficial anteriormente
difundida.

Referências Bibliográficas
https://www.comissaodaverdade.pe.gov.br/uploads/r/arquivo-publico-estadual-jordao-
emerenciano/9/4/a/
94a8d0409e65656ae7713a30bcfbc89b432441bbd9f379db193df97d375ae35c/c62c299a-
be95-44fe-8ec6-26e79d24860c ANATALIA_DE_SOUZA_MELO.pdf
http://memoriasdaditadura.org.br/memorial/anatalia-de-souza-melo-alves/
http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/nilmario/dosfilhosdeste/anatalia.html

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