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SOB O SIGNO DA AVENTURA

The gemini man

ANNETE BROADRICK

Conhecer Joel Kramer fez Melissa entender que sua vida era um
tédio!
"Minha querida, você tem as pernas mais incríveis que eu já vi, olhos que
perseguem meu sono, e um sorriso que me faz querer entrar em sérios problemas."
Com esta declaração, Joel Kramer fez a autoconfiança de Melissa subir às alturas.
Embora quisesse atirar-se nos braços dele e saciar a sede de amor que
queimava seu corpo, Melissa conteve-se, pois Joel era um aventureiro que mudava de
cidade tanto quanto de amor!

Digitalização: Simoninha
Revisão: Maria Rocha
Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick

Copyright © 1991 by Annette Broadrick


Originalmente publicado em 1991 pela Silhouette Books,
divisão da Harlequin Enterprises Limited.

Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução


total ou parcial, sob qualquer forma.

Esta edição é publicada através de contrato com a


Harlequin Enterprises Limited, Toronto Canadá.
Silhouette, Silhouette Desire e o colofão são marcas
registradas da Harlequin Enterprises B.V.

Todos os personagens desta obra são fictícios.


Qualquer semelhança com pessoas vivas ou
mortas terá sido mera coincidência.

Titulo original: The gemini man


Tradução: Miriam Marinho Rodrigues
Copyright para a língua portuguesa: 1991
EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.

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PRÓLOGO

"Se uma mulher está procurando por uma vida caseira e um companheiro
estável, sua primeira escolha não deve recair sobre um homem de Gêmeos, apesar de
todo o charme e agilidade mental dos filhos desse signo. Uma mulher inteligente deve
olhar além da aparência juvenil e do rosto atraente do geminiano e lembrar-se que ele
só se interessa por uma coisa: mudança.”
"De fato, o geminiano só floresce verdadeiramente quando às voltas com
desafios, aborrecendo-se com facilidade diante de qualquer tipo de rotina. Regido pelo
planeta Mercúrio, que governa as comunicações de toda a espécie, é
conseqüentemente comunicativo, embora nunca se deixe conhecer a fundo.”
"Essa ambivalência, aliás, é uma das características marcantes do signo em
vários aspectos. O geminiano muda de roupa, de residência, de trabalho e de amor com
impressionante regularidade. Ele busca a excitação e o desafio constantes, mantendo
os desejos e sentimentos verdadeiros escondidos dos que o rodeiam.”
"Todavia, sua alta energia, comunicabilidade e amizade podem valer o risco de
uma abordagem amorosa. Se ele se deixar envolver e partir para uma vida em comum,
o ponto essencial para não perdê-lo, é evitar a rotina e a monotonia do cotidiano."
Joel Kramer olhou as páginas do suplemento do jornal de domingo, que acabara
de ler, sentindo-se desconfortavelmente exposto, apesar de estar sozinho no pequeno
apartamento.
Sem nada para fazer, embora não acreditasse em astrologia, lera a descrição
do signo de Gêmeos e impressionara-se com a precisão com que vira retratadas as
características básicas de sua personalidade.
Irritado com a idéia de que alguém pudesse conhecê-lo tão bem, colocou o
jornal de lado sobre a mesa, ergueu-se e começou a caminhar pela sala, indo, por fim,
na direção da janela, onde se deteve na contemplação da paisagem de inverno.
Em momentos de inatividade como aquele, pegava-se questionando a decisão de
haver seguido os passos do pai na carreira de agente secreto do governo. A profissão
mal lhe permitira conhecer o velho quando criança, porém foi preciso apenas uma única
tarefa para torná-lo "viciado" no perigo e na variedade de aventuras que o cargo
oferecia.
Fazia já doze anos que militava nesse ramo de atividades, sendo tutorado por
Max, que lhe reconhecera o talento para extrair informações das fontes mais

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improváveis. Não via como voltar atrás, mesmo não sabendo sequer para qual depar-
tamento do serviço de inteligência trabalhava. Max era seu único contato com o
governo.
De qualquer modo, era bom no que fazia e tinha orgulho disso, embora, como
descrevia o horóscopo, vivesse uma vida dupla em quase todas as circunstâncias.
Para os vizinhos do prédio, era um homem tranqüilo, que não incomodava
ninguém e se ausentava por longos períodos de tempo. Para Max, era o faz-tudo que
colhia informações, espiava pessoas etc. Como um camaleão, ele se amoldava ao
ambiente circundante com extrema facilidade.
Além disso, gostava do trabalho, do desafio de ludibriar os inimigos, de estar
sempre um passo à frente dos mesmos.
Enfim, como dizia o horóscopo, que tanto o aborrecera com sua acuidade,
apreciava o desafio.
O telefone interrompeu-lhe o fio do pensamento com seu tilintar constante.
Apressou-se a atendê-lo, consciente de que só poderia ser Max, com um novo serviço,
pois não conhecia mais ninguém na cidade tão próximo a ponto de ligar-lhe.
— Sim?
— Kramer? Parece um pouco aborrecido. Cansado da inatividade? Pronto para
outra aventura?
— Sabe muito bem que sim.
— Dessa vez tenho algo um tanto diferente para você, mas entenderei se não
aceitar a tarefa. De qualquer forma, não é assunto para ser tratado ao telefone.
Precisará encontrar com alguém que lhe explicará melhor toda a situação.
Dito isso Max lhe passou o nome de um hospital e o número de um quarto, que
reconheceu como sendo de alta segurança.
— Estarei lá — disse Joel, desligando o telefone, enquanto sentia a adrenalina
lhe bombeando nas veias à medida que deixava o apartamento rumo ao hospital. Em
segundos, já esquecera o perfil astrológico que tanto o incomodara.
A última vez que entrara num hospital estava inconsciente. As lembranças
daquele período, quando se tornara frágil e dependente dos outros, inundavam-lhe a
mente conforme ia reconhecendo as dependências, os sons e cheiros típicos do local.
Com muito custo, conteve os pensamentos desagradáveis até aproximar-se do quarto
designado e ser interceptado por Max, que o conduziu a algumas cadeiras num dos
vãos de espera.
— Obrigado pela rapidez — afirmou ele, oferecendo-lhe a mão.
— Não há de quê — respondeu Joel olhando ao redor. — E então, de que se
trata?

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— Bem, parece que temos um caso importante aqui, embora não estejamos
totalmente certos. O dr. Peter Feldman, um dos mais eminentes cientistas deste país,
está desenvolvendo uma pesquisa de grande interesse para o governo.
Joel procurou acomodar-se da melhor forma possível na cadeira, tentando
amenizar a expectativa quanto ao assunto em questão.
Max continuou:
— O dr. Feldman está pesquisando uma substância que servirá de antídoto
contra o álcool e outras drogas, o que muito nos ajudará no combate ao narcotráfico.
Joel se inclinou na direção do amigo.
— Quer dizer, uma droga que substituirá outras causadoras de dependência?
— Mais ou menos. Na verdade, o dr. Feldman está tentando criar uma
substância que não só desintoxique o corpo, como também ajude na superação do vício.
O objetivo é fazer com que o viciado adquira uma aversão permanente a todos os tipos
de droga.
Joel assobiou suavemente.
— Nossa! Isso demoliria o tráfico de drogas.
— Exatamente.
— E você acha que alguém está a par do trabalho do dr. Feldman?
— Esse projeto de pesquisa tem sido trancado a sete chaves, porém hoje
sucedeu algo que nos fez suspeitar de sua segurança.
— E o que foi?
— O dr. Feldman decidiu ir pegar uns papéis no laboratório, ontem à noite, e,
ao voltar para casa, foi jogado fora da estrada, perto de um dique. Só Deus sabe como
conseguiu saltar do carro, antes que este soçobrasse. Mesmo assim, quebrou uma
perna e sofreu vários cortes e escoriações. Foi socorrido por alguém que, por sorte,
tinha um telefone celular, e ligou para nós de imediato. Fomos apanhá-lo e o trouxemos
para cá.
— Ele viu o carro que o atirou fora da estrada?
— Não. Estava escuro, era um trecho muito arborizado da rodovia e o carro
que o atingiu vinha com as luzes apagadas.
— E você quer que eu investigue o acidente? — perguntou Joel, já começando a
ordenar os fatos mentalmente.
— Não, há outras pessoas trabalhando nisso. Sua tarefa está relacionada com
a assistente do dr. Feldman, com quem ele se mostra muito preocupado.
Joel franziu as sobrancelhas.
— Ele acredita que a assistente está por trás do acidente?
Max sacudiu a cabeça negativamente.

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— Não. Ele acha que, se esse acidente tem algo que ver com a pesquisa em
curso, ela poderá ser o próximo alvo.
— E qual seria meu trabalho?
Max se ergueu e convidou o amigo a entrar no quarto mais próximo, onde se
dirigiu ao leito de um homem preso a vários aparelhos por uma infinidade de tubos.
Lutando contra as lembranças da própria hospitalização, Joel também se
aproximou da cama e observou o homem, com ataduras nos braços, mãos e cabeça, a
perna engessada e uma das faces vermelha e inchada.
— Dr. Feldman — bradou Max —, este é o homem de quem lhe falei antes, Joel
Kramer.
Joel achegou-se ainda mais, fitando os vividos olhos azuis do cientista, que não
escondiam a dor dos ferimentos.
— Lamento encontrá-lo nessas circunstâncias, dr. Feldman, Max me falou
sobre suas pesquisas.
— Obrigado por ter vindo — respondeu o dr. Feldman, com voz fraca. — Max
me disse que você é um de seus homens mais competentes.
Joel olhou o parceiro de relance e murmurou em tom jocoso.
— Eu lhe lembrarei disso quando chegar a hora de meu aumento.
Ignorando a brincadeira, Max foi direto ao assunto.
— Dr. Feldman, o senhor não gostaria de explicar a Joel as razões de sua
preocupação com a segurança da dra. Jordan nas atuais circunstâncias?
O cientista concordou com um leve aceno de cabeça.
— Sim. Max quer que eu mantenha o acidente em segredo e ligue para o
laboratório amanhã adiantando as férias da próxima semana, com a desculpa de haver
adoecido.
— Não concorda com isso, dr. Feldman? — indagou Joel.
— Bem, entendo a razão para o segredo, mas temo pela segurança da dra.
Jordan* pois ela não está ao corrente da verdadeira natureza de nossa pesquisa.
O cientista fez uma pausa, fechando os olhos por um momento, e depois
prosseguiu:
— Fiz isso para protegê-la, porém, após o acidente, percebi que tal precaução
de nada lhe adiantará. Quem tentou matar-me concluirá automaticamente que minha
assistente conhece o verdadeiro teor de nossos experimentos e poderá querer
eliminá-la também.
Nesse momento, ele sorriu e lançou um olhar encabulado para os homens que
rodearam a cama.
— Além disso — ele acrescentou —, mesmo que eu lhe dissesse toda a verdade

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e a avisasse do perigo, não me acreditaria. Sabe que sou fã de romances de aventura e
os leio todos os dias antes de dormir, e insistiria em dissociar o acidente de qualquer
atentado. Diria que é minha imaginação febril funcionando.
— Entendo — replicou Joel, voltando-se em seguida para Max. — Não confia
nela o suficiente para dizer-lhe a verdade?
— Não é questão de confiança. Quero apenas que tudo continue como se nada
houvesse ocorrido, para o caso de haver alguém espionando o laboratório. De qualquer
modo, reforçamos a segurança para que ninguém possa abordá-la no trabalho.
— Está sugerindo, então, que devo iniciar uma espécie de vigilância protetora
sobre a dra. Jordan? Esse não é exatamente o meu tipo de trabalho.
— Sei disso, e acho que podemos encontrar outra pessoa para a tarefa. Porém,
como andou me ligando insistentemente à cata de serviço, pensei em ocupá-lo um
pouco.
Joel suspirou. Max o conhecia muito bem e sabia que não rejeitaria um
trabalho, fosse qual fosse. Por isso, em silêncio, aguardou que ele continuasse a
explicação do caso.
— Como não temos certeza de se ela está em perigo ou não — prosseguiu Max
—, melhor não alarmá-la. Portanto, você deve aproximar-se dela de forma sutil. Joel
levantou uma das sobrancelhas.
— Em outras palavras, devo mentir para ela.
— Não se trata de mentir. Ela simplesmente não precisa saber a verdade. Por
sorte, uns vizinhos do apartamento em frente ao dela, em Alexandria, mudaram-se
recentemente para a Flórida, perto da filha, e o imóvel está vago. É um lugar confor-
tável, e você não terá problemas em instalar-se enquanto estabelece relações de boa
vizinhança com a dra. Jordan.
— E quando me mudo? — interrogou Joel, por fim concluindo que, apesar do
inusitado da tarefa, qualquer coisa era melhor do que ficar parado.
Fingindo surpresa, Max exclamou:
— Então, você aceita!
— Melhor do que ficar esperando indefinidamente por algo para fazer.
Nesse ponto, o dr. Feldman os interrompeu.
— É preciso deixar claro que a srta. Jordan não deve se sentir espionada,
embora essa não seja uma tarefa difícil. Ela é uma cientista brilhante, mas muito
jovem e inexperiente. Seus pais já morreram, e era filha única. Tenho sido como um
pai para ela e não quero magoá-la.
— Quantos anos ela tem? — perguntou Joel.
— Vinte e dois.

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— Ela não é muito jovem para o tipo de trabalho que exerce?
— Ah, sim! Contudo, como disse, ela é brilhante. Doutorou-se com apenas
dezenove anos.
Joel visualizou uma jovem extremamente tímida, de lentes grossas, temerosa
do mais leve ruído, e imaginou, inutilmente, como faria para abordá-la. Voltando-se
para Max, indagou:
— E aí, quando me mudo?
— Amanhã está bom — ele replicou, sorridente. — Aliás, antes que me esqueça,
sabe datilografar?
— Não. Por quê?
— Tem de inventar uma desculpa para o fato de não sair para trabalhar
diariamente. Creio que estar escrevendo um romance pode ser uma boa saída.
Fitando Max com irritação, Joel retrucou:
— Ora, Max, olhe para mim. Acha que tenho cara de escritor?
O amigo deu de ombros.
— Não tem importância a aparência. Diga-lhe que está perseguindo o grande
sonho de sua vida. Talvez ela até lhe dê algumas idéias para a história.
Joel meneou a cabeça. Às vezes, as racionalizações de Max o impressionavam.
— Tem certeza de que é só isso que quer de mim?
Max fez um aceno positivo com a cabeça, no rosto uma expressão de
divertimento.
— Tudo bem, então. Dê-me o endereço. Vou para casa fazer as malas — ele
respondeu, olhando depois para o homem na cama. — Enquanto isso, dr. Feldman, trate
de se recuperar e não se preocupe. Tomarei conta de sua assistente.
O cientista riu com dificuldade da forma como Joel falara, e replicou:
— Ela não é minha, sr. Kramer. Aliás, creio que apenas o próprio trabalho
possui Melissa Jordan. Não parece ter outros interesses ou hobbies.
— Sem dúvida, ela e Joel se darão bem — interferiu Max. — Ambos vivem em
função das carreiras.
Joel franziu a testa, lembrando-se repentinamente do artigo sobre astrologia
que o descrevera tão bem. De fato, não gostava que as pessoas soubessem muito a seu
respeito, incluindo o próprio chefe.
Ele olhou para Max de relance.
— Manterei contato.
Dito isso, Joel deixou o quarto e o hospital, o mais depressa que pôde,
refletindo a respeito de sua reação alérgica àquele tipo de recinto.
Enquanto caminhava para casa, sorriu para si mesmo. Finalmente tinha algo

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para fazer novamente, mesmo que fosse bancar a babá de uma notável cientista.
Talvez Max estivesse certo, e eles possuíssem algumas coisas em comum.

CAPÍTULO I

Melissa Jordan desceu do automóvel, um carro esporte vermelho, na garagem


do prédio onde morava, com uma imensa sensação de alívio. Voltar para casa depois
daquele dia estafante era mesmo uma bênção.
Como se não bastasse todo o trabalho que tinha normalmente, o dr. Feldman
resolvera adiantar as férias da semana seguinte, em conseqüência de uma forte gripe,
tornando-a ainda mais atarefada. Agora só lhe restava esperar que ele voltasse em
duas semanas, e fazer o melhor possível para manter as coisas em andamento.
Caminhando até o elevador, estremeceu de frio, embrulhando-se ainda mais no
pesado casaco de inverno. Olhou ao redor do estacionamento, tomada de uma estranha
sensação de desconforto, como se temesse algo. Considerando a alta segurança do
edifício, em cuja garagem apenas entrava um carro por vez e ainda assim por meio de
cartão magnético, cada qual com um código específico, a sensação só podia advir do
cansaço excessivo.
Felizmente chegara em casa, e em minutos poderia tirar o grosso casaco, o
tailleur vermelho, os sapatos de salto alto, e mergulhar num delicioso banho quente de
banheira. A água não só lhe esquentaria o corpo enregelado, como também ajudaria a
remover a tensão dos músculos.
Saindo do elevador, começou a vasculhar a bolsa em busca da chave, enquanto
caminhava pelo corredor rumo ao apartamento.
Um pequeno ruído a fez erguer a cabeça e deparar com um homem pouco mais
alto que ela, colocando a chave na porta em frente à dela.
Ao notá-la, o homem voltou a cabeça em sua direção, deixando-a ver os olhos
verdes atrás de óculos sem aro, o cabelo castanho-claro com mechas claras, a pele
bronzeada.
Normalmente, Melissa não falava com estranhos, mas o olhar espantado que o
homem lhe deu, revelando certa timidez, e o fato de ser o novo vizinho inclinaram-na a
abrir uma exceção.
— Acaba de mudar? — ela perguntou, amistosa.
— Sim, hoje de manhã — ele respondeu, olhando-a novamente, com ar aturdido
e de relance.
A aparente timidez do estranho a deixava mais confiante em aproximar-se e,

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impulsivamente, estendeu-lhe a mão.
— Sou Melissa Jordan, sua vizinha, ou melhor, sua única vizinha neste andar.
Só há dois apartamentos aqui.
Por alguns segundos, o homem pareceu estudar-lhe a mão, apertando-a, em
seguida, de forma hesitante.
— Prazer em conhecê-la — ele disse baixinho.
— O prazer é meu — exclamou Melissa, sorridente, voltando-se depois para
abrir a porta do seu apartamento. Antes de entrar, despediu-se do estranho com um
adeuzinho.
— Se precisar de alguma coisa, é só chamar.
Ela fechou a porta, entre perplexa e divertida com a expressão de espanto nos
olhos do homem. Talvez ele não estivesse acostumado com vizinhos calorosos, mas, de
qualquer jeito, teria de se acostumar com o fato.
Seus antecessores no apartamento, o casal de velhinhos que se mudara para a
Flórida para ficar mais perto da filha, haviam sido sempre muito amáveis com ela,
convidando-a para jantar, oferecendo-lhe biscoitos e um bom bate-papo, e estava
decidida a manter a mesma política de boa vizinhança com o recém-chegado. Talvez
mais adiante até lhe fizesse também uns biscoitinhos.
No momento, entretanto, queria gozar do tão esperado descanso; por isso,
chutando os sapatos, caminhou para o quarto, onde se despiu, e entrou no banheiro.
Joel permaneceu no corredor, olhando para a porta, marcada com o número
5A. Então, aquela era Melissa Jordan? Será que Max decidira pregar-lhe uma peça?
A moça não correspondia em nada à imagem tradicional da cientista. Muito pelo
contrário; alta, de grandes olhos azuis, cabelos cor de mel, presos num coque, e um
lindo sorriso. Não faria feio se participasse de um concurso de beleza.
Embora tivesse por princípio em sua carreira nunca misturar negócios com
prazer, via-se agora diante da difícil tarefa de travar um relacionamento platônico
com uma mulher que, à primeira vista, já o impressionara profundamente.
Teria Max lhe atribuído aquele serviço por considerá-lo de confiança, após o
fracasso da última empreitada? Já podia vê-lo rindo da situação, quando se queixasse
de que a aparência de Melissa Jordan o distrairia de sua missão.
De qualquer modo, o primeiro passo no sentido de aproximar-se da bioquímica
já fora dado. Passara o dia todo se familiarizando com o edifício e o sistema de
segurança e, de posse de uma descrição do carro de Melissa, avistara-a chegando e se
colocara no corredor para fingir um encontro casual.
Tudo saíra como planejado, apesar de a aparência da moça haver sido um dado
inesperado. Ela já o reconhecera como o novo vizinho. Agora precisava dar mais um

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passo no sentido de uma aproximação maior.
Mergulhada na água tépida da banheira, sentindo o perfume estimulante do
óleo essencial, Melissa podia perceber a tensão se desvanecendo aos poucos, à medida
que o tempo passava.
Desfrutando o relaxamento, deixou os pensamentos vagarem por instantes,
acabando por concentrar-se no novo vizinho, cuja reação a sua pessoa fora tão
peculiar. De fato, pensando bem, além do espanto, percebera igualmente no olhar do
homem uma clara apreciação de sua aparência, coisa que a surpreendera.
Vivendo para a carreira, desacostumara-se a olhares daquela natureza. Sexo
para ela se encontrava arquivado numa parte da mente que rotulara de "informação
secundária".
Entretanto, não sabia ao certo por que sempre fora assim. Chegou a cogitar
que o fato de haver sido filha única contribuíra para seu desinteresse por rapazes.
Todavia, conhecia muitas crianças filhas únicas que acabaram por levar vida normal.
Talvez nisso residisse todo o problema. Nunca levara uma vida normal. Seus
pais, acadêmicos devotados à pesquisa e à teoria, ao perceberem-lhe a inteligência
incomum, mantiveram-na em escolas onde era sempre a mais jovem das alunas.
Ninguém jamais lhe sugerira que procurasse relacionar-se com pessoas da
própria idade. Pós-graduara-se quando ainda era adolescente, jovem e inexperiente
demais para saber como reagir diante de rapazes que a olhavam como o vizinho o
fizera.
De qualquer forma, provavelmente não se encontraria com o mesmo
freqüentemente, a não ser nas ocasiões em que desejasse exercitar-se na arte da boa
vizinhança, e poderia, portanto, contornar aquele inconveniente com facilidade.
Lembrou-se, então, de que nem sequer sabia o nome do homem e ficou
imaginando no que trabalharia e se seria casado. De repente, riu de si mesma,
criticando-se por estar parecendo com uma amiga de faculdade, Karen, cujo único
interesse na vida era o gênero masculino.
Por certo a amiga, para ter a curiosidade saciada, teria rapidamente arrumado
um pretexto para ver o homem de novo. Melissa riu novamente dessa reflexão e
concluiu que, às vezes, tinha vontade de ser como Karen, extrovertida, afável e sem
juízo.
A verdade é que, quando se encontrava com um homem charmoso, Melissa
mostrava-se titubeante, sem ter o que dizer. Considerava o novo vizinho bem
atraente, e só esperava que o fato de ele também parecer muito tímido a ajudasse na
futura convivência.
Saindo com relutância da banheira, a qual esvaziou em seguida, secou-se,

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colocou um robe confortável, que ia até o chão, e o abotoou. Depois, escovou o cabelo
com vigor e se encaminhou para a cozinha, onde se preparou para esquentar a comida
congelada que preparara no final de semana.
Estava tentando decidir-se sobre o prato que escolheria para o jantar, quando
a campainha da porta tocou, provocando-lhe um sobressalto. Quem poderia ser àquela
hora? O jeito era atender o chamado.
Abriu a porta com certa relutância e deparou com o novo vizinho, um sorriso
nos lábios e as mãos nos bolsos.
— Olá! Lamento incomodá-la tão cedo, mas, como me disse para procurá-la caso
precisasse de algo, resolvi vir pedir-lhe uma informação. É que...
Ele fez uma pausa como se procurasse as palavras certas, após o que continuou
de forma hesitante:
— É que talvez pudesse me informar onde fica a mercearia mais próxima.
Detesto dirigir por aí, sem rumo.
— Há uma a uns três quarteirões daqui, à esquerda.
— Oh, obrigado — ele agradeceu, voltando-se na direção do elevador e pondo-
se a andar.
Melissa o observou por uns instantes, e num impulso chamou-o:
— Ei, você!
Ele virou a cabeça para encará-la.
— Olhe, estou esquentando um jantar que dá tranqüilamente para duas
pessoas. Não quer experimentá-lo?
— Está me convidando para jantar? — ele indagou, caminhando de volta
lentamente. — Mas nem me conhece. Costuma sempre ter tanta confiança nas
pessoas?
Melissa enrubesceu levemente, sentindo-se um tanto tola, porém reagiu,
retrucando:
— Bom, é verdade que não o conheço; contudo, se passou pela rígida seleção da
administração do prédio, no mínimo não deve ser má pessoa. De qualquer jeito, se não
quiser aceitar meu convite, não há problema. Talvez não tenha sido uma grande idéia,
afinal.
— Ah, por favor, não me leve a mal! Terei prazer em aceitar o convite. Gosto
muito de comida caseira. Você apenas me pegou de surpresa.
Melissa não sabia o que responder, nem teve tempo para tal. Antes que
descobrisse as palavras certas, o homem já entrara no apartamento e lhe dizia:
— Não tive chance de apresentar-me quando nos cruzamos há pouco. Meu
nome é Joel Kramer. Muita bondade sua me convidar para jantar. Obrigado.

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Novamente ela notou certa timidez nos modos do homem, que a fizeram
sentir-se mais confiante. Embora ainda estivesse perplexa com a própria iniciativa de
tê-lo convidado para comerem juntos, respondeu com um sorriso:
— Fico feliz por ter decidido aceitar minha oferta. Ando cansada de comer
sozinha.
Tentando disfarçar o nervosismo, Melissa o guiou para a área de estar do
apartamento, convidando-o a sentar-se no sofá.
Ele se acomodou, enquanto olhava ao redor, e comentou:
— Gosto da disposição de seus móveis. Espero conseguir arrumar os meus de
maneira tão acolhedora. Os empregados da transportadora colocaram a mobília nos
cômodos sem a mínima preocupação com conforto ou beleza.
Nesse momento, ele parou de falar, porém continuou a encará-la com ar
zombeteiro.
— Vou esquentar o jantar — ela se apressou a dizer, desaparecendo na cozinha
enquanto refletia sobre o contra-senso de haver convidado aquele homem, a quem mal
conhecia, para entrar no apartamento. Agora só podia esperar que ele não encarasse o
convite como algo além de um gesto amigável.
— Quer um copo de vinho? — ela perguntou, espiando, pela porta da cozinha, o
visitante que olhava os quadros da parede.
Ele se voltou abruptamente para encará-la, meio sem graça.
— Será um prazer.
— Tinto ou branco?
— Tanto faz.
Melissa colocou a comida no forno, despejou o vinho em duas taças e, com uma
em cada mão, retornou à sala.
— Seus pés não estão gelados? — ele indagou, pegando uma das taças.
Ela concordou com um aceno de cabeça.
— Tinha acabado de sair do banho quando tocou a campainha. Se me dá licença,
vou me vestir e já volto.
— Claro — ele respondeu, observando-a entrar no quarto, enquanto bebericava
o vinho suave. Após alguns segundos, ergueu-se silenciosamente e caminhou até a
janela, de onde espiou o carro que seguira Melissa, ainda estacionado do outro lado do
prédio. Já o havia notado assim que a cientista chegara, relatando o número da placa
para Max, antes de improvisar o encontro "casual" no corredor. Não acreditava,
entretanto, que a moça houvesse percebido alguma coisa.
Voltando para o sofá, assumiu uma posição estudadamente à vontade,
esperando a dona da casa.

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Melissa retornou rapidamente, num conjunto azul como a cor de seus olhos, e
se sentou na poltrona em frente ao sofá. Joel sorriu para ela, agradecendo
mentalmente a Max a tarefa que este lhe designara.
Cuidar de Melissa Jordan não lhe parecia mais um grande problema.
A cientista, porém, embora houvesse ensaiado alguns temas para iniciar a
conversa enquanto se vestia, encontrava-se agora sem palavras. Após alguns instantes
de silêncio, foi Joel quem retomou o diálogo.
— Vive aqui há muito tempo?
— Há pouco mais de cinco anos — ela respondeu, bebendo mais um gole de
vinho, na esperança de que este a ajudasse a relaxar.
— Você é da Virgínia?
— Não, de Massachusetts. Novamente se fez um longo silêncio.
— No que você trabalha? — perguntaram, por fim, os dois ao mesmo tempo,
calando-se em seguida.
— De onde você...?
— Onde você...?
Outra vez os dois falaram ao mesmo tempo, caindo na risada diante de tanto
desajeitamento.
— O que você ia me interrogar? — indagou Joel, interrompendo o riso.
— Ia lhe perguntar de onde é — ela falou, afastando do rosto uma mecha de
cabelo.
Joel sempre tinha uma história falsa a respeito de suas origens para contar,
mas, dada a natureza particular daquele serviço, decidiu ater-se o máximo possível à
verdade.
— Passei a infância no Colorado, até entrar na faculdade. Fui criado num
rancho por meus avós maternos, pois minha mãe faleceu quando eu era muito pequeno
e meu pai viajava muito, não podendo tomar conta de mim.
Melissa imaginou se ele fora uma criança tão solitária quando ela e perguntou:
— Você é filho único?
— Sim. E você?
— Também. Meus pais já estavam quase na faixa dos quarenta quando nasci.
Ele sorriu.
— Nesse caso temos algo em comum. Ser filho único pode ser muito solitário
às vezes, não é?
— Consegui manter-me ocupada a maior parte do tempo — ela disse, admitindo,
de forma indireta, o que ele colocara, com um sentimento de empatia pelo estranho.
— Eu também. Passava um tempo enorme trabalhando, ao ar livre.

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Naquele aspecto, então, eram muito diferentes, pensou Melissa, porque
passara a infância com a cara enfiada nos livros.
— E o que faz agora?
— Sou escritor. E você?
— Trabalho para uma indústria farmacêutica.
— Fazendo o quê? — ele indagou, testando-lhe a espontaneidade.
— Bem... — ela começou, hesitante —, trabalho no laboratório de
desenvolvimento e pesquisa.
— Ah, fazendo fantásticos experimentos, hein?!
— Não é tão excitante, infelizmente. A maior parte do tempo lido com montes
de papéis sobre aquilo que não funciona por lá.
Joel pôde perceber, naquele momento, as razões da preocupação do dr.
Feldman com a assistente. Ela estava de fato sendo seguida e, se fosse interceptada,
seria presa fácil de um interrogatório.
— A respeito do que você escreve? — ela perguntou, tirando-o do devaneio.
— De um faroeste — ele respondeu, optando pelo tipo de leitura que mais
apreciava.
— E vai sempre ao Colorado buscar inspiração? A Virgínia não me parece uma
boa fonte de dados para seu gênero de literatura.
— Não — ele se apressou a dizer, sentindo-se incomodado com a própria
mentira e ansioso para mudar de assunto. — O rancho foi vendido há anos e também
não existe mais ninguém a quem visitar. E quanto a você? Vai sempre a
Massachusetts?
Ela sacudiu a cabeça num gesto negativo.
— Não. Meus pais também já se foram. Ele se inclinou e sorriu, dizendo:
— Bem, estamos os dois sozinhos no mundo. Talvez pudéssemos adotar um ao
outro, para o mundo não parecer tão solitário.
— Não creio que precise mais de adoção na minha idade — ela respondeu,
tentando reconhecer até que ponto ele estava brincando.
— Sim, entendo o que diz. Que tal, então, sermos amigos?
— Infelizmente, não tenho muito tempo para amizades.
— Nem eu — admitiu Joel, recordando que, desde a faculdade, nunca mais
precisara de amigos ou quisera tê-los. Em seu ramo de negócio, amizades podiam ser
muito arriscadas.
— Você escreve em casa?
— Sim.
— Não é de estranhar que seja solitário. Quais são seus passatempos?

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— Adoro caminhar pela praia — ele declarou, puxando pela memória — e às
vezes também velejo quando posso. Gosto muito de água.
— Parece divertido — ela bradou, com uma ponta de tristeza.
— Não quer velejar comigo um dia desses? — ele interrogou, feliz por ter tido
uma idéia que o tirava da área de risco por uns momentos.
— Não sei. Atualmente meu chefe está de férias, e tenho trabalhado até dizer
chega.
Ele tomou o último gole da taça de vinho.
— Bem, medite no assunto e veja se arruma tempo livre no próximo fim de
semana.
— Não está muito frio para velejar?
— Pensei mais em ir à praia,
O som do timer do forno, avisando que o jantar estava pronto, interrompeu-
lhes a conversa, para alívio de Melissa, que se apressou em rumar para a cozinha.
Joel a seguiu vagarosamente, consciente de que ela lhe opunha resistência. De
qualquer forma, refletiu, já dera mais um passo na direção de uma maior proximidade
com a vizinha.
Agora, necessitava insinuar-se em sua vida diária, mas ainda não sabia bem
como.
— O que posso fazer para ajudá-la? — ele quis saber, enquanto se aproximava
e aspirava o delicioso aroma da caçarola fumegante.
De súbito, deu-se conta de que precisava lembrar constantemente de estar
sendo pago para realizar aquele serviço!

CAPÍTULO II

A primeira atitude que Joel tomou, ao voltar ao seu apartamento, foi espiar
pela janela se o carro que seguira Melissa ainda estava estacionado em frente ao
prédio.
A olhada revelou que o carro partira, porém fora substituído por outro
também de cor neutra. Esperando que as luzes dos faróis de algum automóvel de
passagem iluminassem a placa de veículo espião, anotou os números e imediatamente
transmitiu-os a Max por telefone.
— Conseguiu alguma informação sobre a placa anterior?
— É fria. O carro está registrado em nome de uma companhia fantasma.
Estamos tentando descobrir quem está por trás dela.

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— De qualquer forma, julgo que se trata de algo sério. Ninguém vai ficar dias e
noites estacionado nesse frio, só para admirar uma loira bonita e atraente.
— Hum! Então ela é atraente, hein? E agora, ainda quer sair do caso?
— Muito engraçado.
— E já fez contato com ela?
— Sim — respondeu Joel, sorrindo para si mesmo. — Na realidade, acabamos
de jantar juntos no apartamento dela.
— Quanta eficiência! — exclamou Max, zombeteiro.
— Tive sorte. De qualquer maneira, uma coisa é certa, O dr. Feldman tem
razão em se preocupar com ela. Confia demais em pessoas que mal conhece.
Max deu uma risada.
— Não sei por que, mas tenho a impressão de que mandei o lobo tomar conta do
Chapeuzinho Vermelho.
— Piada de mau gosto, Max. Creio que ela corre perigo real.
— Bem, vamos investigar o segundo carro como fizemos com o primeiro.
— Acho que tentarão outros métodos de espionagem também. De amanhã em
diante, bancarei o motorista particular dela.
— Estou impressionado com sua rapidez. Como conseguiu convencê-la a aceitar
um guarda-costas?
— Bem, na verdade ela ainda nem sabe que terá um. Vou apenas fazer o papel
do vizinho prestativo, que lhe dará carona quando o carro não pegar amanhã de manhã.
Também me oferecerei para deixar o automóvel num mecânico... para um conserto
demorado, é claro.
— Se considera que esse estratagema pode dar certo, vá em frente.
— É o que me vem à mente no momento. Mais adiante, gostaria de levá-la para
fora da cidade. Não tem como arranjar isso?
— Estamos conversando com o pessoal da indústria farmacêutica para
convencê-los a fechar por algumas semanas, até conseguirmos solucionar o caso.
— Contudo, tal coisa não pode facilitar o trabalho do inimigo?
— Talvez, mas, sem desconfiarem de que também estão sendo vigiados, agirão
mais livremente, dando-nos maiores chances de interceptá-los antes que matem
alguém. Quanto a você, mantenha-se próximo de sua "tarefa" e deixe o resto por nos-
sa conta.
— Ok. Qualquer novidade, avisarei — finalizou Joel, desligando em seguida,
contente com o andamento do trabalho. Aproximara-se de Melissa rapidamente,
conseguira convencê-la de que era escritor... Agora, só precisava estar na garagem na
hora em que ela fosse sair para o emprego, e dar-lhe uma mão adequada.

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Atrasada para o serviço, Melissa se vestiu às pressas e, deixando o café de
lado para ganhar tempo, saiu do apartamento e correu para a garagem.
Ao descer do elevador, acenou para um vizinho que saía, avançou para o seu
carro e, depositando o casaco e a bolsa no banco de passageiros, girou a chave de
ignição.
Para seu desespero, todavia, o carro não pegava. Fez outras tentativas
igualmente inúteis. Nada. Quando já estava para desistir, foi abordada por Joel, com
um sorriso radiante.
— Oi. Problemas com o carro?
— Não pega. Não sei o que houve.
— Posso dar uma olhada?
— Seria um grande favor — ela disse, soltando o capo, enquanto ele fingia
examinar os fios do distribuidor e da bateria que desligara na noite anterior. Após
examinar por alguns minutos, caminhou até a porta do lado do motorista.
— Não entendo muito de carros, porém parece que está com um problema no
distribuidor.
Ela gemeu, fechando os olhos.
— Posso lhe dar uma carona para algum lugar?
— Se não for muito incômodo, eu apreciaria muito. Preciso chegar ao trabalho
imediatamente.
Estendendo-lhe a mão, para ajudá-la a sair do carro, e guiando-a depois até o
dele, bradou:
— Não é nenhum incômodo. Ia mesmo fazer compras na mercearia. Quanto a
seu carro, vai precisar levá-lo ao mecânico. Não quer que veja isso para você?
— Oh, mas não posso lhe dar tanto trabalho!
— Que é isso? Afinal, amigos e vizinhos precisam ser solidários.
Melissa não pôde resistir ao sorriso amplo e caloroso de Joel. Que homem
agradável ele era! Simples, sincero, prestativo, tão diferente das pessoas com quem
mantinha contato, ambiciosas e aferradas ao trabalho, a ponto de negligenciarem a
própria saúde. Como o dr. Feldman, por exemplo, que, por certo, gastaria as semanas
de férias simplesmente se recuperando do resfriado.
Enfim, era bom variar as companhias. Podia aprender coisas novas com Joel
Kramer
— Confortável? — ele perguntou.
— Sim. Obrigada pela carona. Você caiu do céu.
— Posso apanhá-la também quando sair do trabalho?
— Oh, não se preocupe! Pegarei um táxi.

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— Ora, para que gastar dinheiro quando tem a mim disponível?
— Mas não vai te atrapalhar?
— Não, terei o dia todo para escrever. Além disso, já fiz uma boa parte do
trabalho. Sou uma pessoa diurna.
— Bem, se tem certeza de que não vai te atrapalhar...
— Será um privilégio. Assim, quem sabe você aceita meu convite para
jantarmos num restaurante perto daqui, que serve uma comida muito saborosa. É uma
forma de retribuir sua gentileza de ontem à noite.
— Jantar? — Ela o olhou, perplexa.
Entrementes, ele já se aproximava do local de trabalho de Melissa. Depois de
estacionar em frente ao prédio que ela indicara e de abrir-lhe a porta, perguntou com
olhar suplicante:
— Por favor, Melissa, tenha pena de um solitário recém-chegado à cidade!
Jante comigo.
Ela riu.
— Está bem. Saio às seis — ela respondeu, apressando-se em descer do carro,
já com a mente concentrada nas tarefas que a aguardavam.
— Até lá — ele se despediu, fechando a porta e partindo de imediato, só
parando ao deparar com uma cabine telefônica, de onde ligou novamente para Max. No
decorrer do telefonema ficou acertado de Max providenciar a remoção do carro de
Melissa para algum lugar, até que ela pudesse voltar a dirigir em segurança.

Melissa avistou o carro de Joel assim que deixou o edifício e, quando correu
para ele, já encontrou a porta aberta, esperando para acolhê-la naquele dia frio.
— Que ótimo ter um carro quentinho me aguardando no fim do dia!
Ele sorriu.
— Espero que esteja com fome. Esqueci de almoçar e, agora, estou faminto.
— Como vai o livro?
— Quem sabe? No momento, estou escrevendo num fluxo contínuo, sem parar
para avaliar o texto. Quando terminar, repasso tudo.
— Bem pensado — ela exclamou. — E, quanto ao restaurante, aonde vamos?
Joel pronunciou o nome de um restaurante do qual ouvira falar, mas onde nunca
estivera.
Melissa, por sua vez, sentia-se feliz por estar indo jantar em companhia de um
homem atraente e afável como Joel. Na realidade, apesar de o dia de trabalho haver
sido tão caótico quanto o anterior, conseguira atravessá-lo de excelente humor, pela
simples perspectiva da noite com o charmoso vizinho.

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Sentia-se orgulhosa de haver iniciado aquela amizade, provando a si mesma que
não era tão inepta socialmente quanto sempre se julgara.
— Como foi seu dia hoje? — indagou Joel enquanto seguiam para o restaurante.
— Atarefado — ela respondeu com um sorriso.
— Gosta do que faz, Melissa?
— Muito!
— Fico feliz por você — ele bradou dando-lhe uma palmadinha na mão, pousada
no colo. — É tão bom quando se pode ganhar a vida fazendo o que se gosta.
Minutos depois, chegaram ao restaurante. Entre um prato e outro, envolveram-
se em toda sorte de assunto que lhes veio à cabeça: livros, filmes, política, os pratos
preferidos, passatempos... Descobriram que tinham muito em comum, principalmente a
atitude em relação ao trabalho que os absorvia por completo, privando-os, muitas
vezes, de momentos de lazer. À medida que a conversa fluía, Melissa ia ficando cada
vez mais à vontade e feliz. Ao terminarem o jantar e voltarem para casa, tinha a
impressão de que conhecia o vizinho fazia muitos anos.
— Que vai fazer agora? — ele interrogou, tomando-lhe a chave do
apartamento das mãos e abrindo-lhe a porta.
— O de sempre. Ler um pouco e ir para a cama.
— Peguei umas fitas de vídeo quando fui às compras, hoje de manhã. Não
gostaria de ver alguma comigo?
— Ainda não se cansou de mim, Joel? O modo como ele a olhou a fez corar.
— Não creio que isso possa acontecer algum dia, Melissa. Ela o estudou em
silêncio, refletindo que não lhe custaria nada tomar outra decisão audaciosa.
— Tudo bem. Deixe-me colocar algo mais confortável, e eu o encontrarei daqui
alguns minutos.
— Ótimo. Até já, então.
Entrando no seu apartamento, Joel tratou de arrumar algumas coisas em
desordem na sala, enquanto meditava, feliz no trabalho, que transcorria a contento.
Depois, dirigiu-se ao quarto onde fingia trabalhar, verificando se tudo estava
dando mesmo a impressão de que alguém andara escrevendo por ali: os livros de
referência ao lado do computador, a impressora com papel no tensionador, pronta para
funcionar...
Em seguida, rumou para o quarto de dormir. Aí, recolheu para o banheiro uma
toalha que estava jogada na cama e ato contínuo voltou à sala, a tempo de ouvir um
toque-toque suave na porta.
Abriu a porta com um sorriso, porém, ao deparar com a expressão do rosto da
cientista, percebeu que algo estava errado.

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— O que houve?
Enquanto entrava na sala, Melissa respondeu:
— Recebi um telefonema da companhia dizendo para eu tirar o resto da
semana de folga. Parece que encontraram uma falha na segurança do prédio, e
precisam arrumá-la. Sinceramente, achei a história pouco verossímil, mas enfim estou
de férias temporárias.
— Não brinque! — exclamou Joel, fingindo espanto. — Que bom!
Melissa começou a olhar os livros da estante do vizinho, ao mesmo tempo em
que continuava a conversa.
— O que há de tão bom nisso?
— Bem, você pode ir a algum lugar interessante.
Ela se voltou para encará-lo e sorriu, percebendo que propiciara um engano de
interpretação.
— Sucede que não quero ir a nenhum lugar. Gosto muito de meu trabalho e me
divirto com ele. Preenche todas as minhas necessidades. Na realidade férias me
aborrecem. Não aprecio ficar sem fazer nada.
Nesse momento, Joel se aproximou dela, tomou-a pela mão e a levou para o
sofá, onde se sentaram em frente à televisão.
— Quem disse que tirar férias é para não fazer nada? Tiram-se férias para
fazer algo diferente, desenvolver programas novos.
Ela olhou na direção da janela e comentou:
— Está muito frio para praticar esportes ao ar livre.
— Tem razão, porém quando penso em férias, não me ocorre esquiar, por
exemplo. Tenho em mente ir para um lugar quente, uma praia de preferência, tomar
sol, nadar um pouco, quem sabe mergulhar ou andar de barco. Nunca quis esquecer de
tudo e sumir por aí?
— Não.
Ele a encarou incrédulo.
— Sabe, Melissa, creio que está na hora de você pôr um pouco de excitação em
sua vida.
— Por quê?
— Como assim, por quê? Sua pergunta revela, por si só, que você está em
péssimo estado psicológico. Tem se privado de alguns dos mais deliciosos momentos da
vida, os inesperados, os que dão razão de ser ao monótono dia-a-dia.
Ele lhe tomou a mão, como se para confortá-la, e sorriu, indagando:
— Melissa, por que não foge comigo por uns dias? Dê uma chance à vida.
Ela o fitou por alguns instantes em silêncio, refletindo que, só para variar,

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gostaria de ser do tipo impulsivo, embora tivesse consciência da impossibilidade de
fazer tal tipo. Além disso, mal conhecia o homem. Uma coisa era jantar com ele
algumas vezes: outra, bem diferente, era fugirem juntos sabe lá para onde.
Com relutância, Melissa respondeu, amenizando a recusa com um sorriso:
— Lamento, mas não posso.
Joel decidiu não insistir e, levantando-se do sofá, apanhou três fitas de vídeo,
que apresentou a Melissa como sendo uma comédia, um drama e um filme de ação.
— O que prefere? — ele indagou.
— Pensei que tinha de terminar seu livro. Ele a olhou um tanto confuso.
— Ver um filme não atrapalha meu trabalho.
— Estava me referindo a viajar — ela esclareceu, sorrindo.
— Consigo escrever em qualquer lugar. Todavia não pense mais nisso. Está
certa em recusar meu convite. Mal me conhece. Foi um idéia maluca.
Melissa notou que, apesar da declaração, ele ficara um pouco irritado, e
decidiu se desculpar.
— Espero não tê-lo ofendido.
— Esqueça. Só pensei que poderíamos nos conhecer melhor, se fôssemos
passear juntos. A idéia me faz recordar que ainda não tirei férias este ano,
provavelmente porque, entre outras coisas, não tenho companhia.
Passando a mão pelos cabelos, Joel continuou, mudando de assunto:
— E então, que filme quer ver? — ele interrogou, dizendo o nome das três
fitas.
Melissa escolheu uma, e o vizinho a colocou no vídeo, ligando o aparelho. Logo
após voltou para o sofá, acomodando-se o melhor que pôde ao lado da cientista.
Entretanto, embora não tivesse visto o filme, considerou praticamente
impossível prestar atenção no mesmo, os pensamentos vagando de retorno à conversa
sobre férias.
Irritara-se de fato com a recusa de Melissa em acompanhá-lo num passeio,
esquecendo-se de que era um profissional a serviço e tomando a resposta como uma
rejeição pessoal.
Na verdade, vira-se retratado em Melissa, em sua obsessão pelo trabalho, e
percebeu, de súbito, o quanto aquele comportamento era linear. Como ele, ela se
recusava a tomar atitudes novas ou mesmo a considerá-las, limitando em muito a vida.
Lembrou-se também de como ficara furioso quando Max lhe sugerira umas
semanas de descanso, exigindo que este lhe arrumasse um novo serviço, o mais
depressa possível.
O som de uma gostosa risada arrancou-o daqueles pensamentos, trazendo-o de

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volta ao filme. De fato, nem conseguiu atinar por que Melissa rira com tanto
entusiasmo, e decidiu forçar-se a prestar atenção na fita, pois ela poderia querer
discuti-la depois. Se não conhecesse o teor da película, Melissa poderia pensar que a
sessão de cinema fora aborrecida.
Olhando para ela de soslaio, disse a si mesmo que, independente do filme, não
poderia ficar aborrecido com uma mulher tão bela a seu lado. Vestida de maneira
informal com um jeans e um suéter, e com os cabelos soltos, Melissa estava muito
atraente.
Com dificuldade, conteve o desejo de acariciar-lhe os cabelos, esforçando-se
para lembrar que se aproximara dela por questões de trabalho.
Nessa altura, Melissa voltou a rir de uma longa cena, toda ela muito cômica,
sendo, desta vez, seguida por Joel, que acompanhara a seqüência.
Após umas boas risadas e do clima de companheirismo reinante, ele concluiu
que não faria tanta diferença, para sua tarefa de protegê-la, levá-la para longe ou
continuar vigiando-a por ali mesmo.
— Quer tomar algo? — ele perguntou, fazendo as vezes de bom anfitrião. —
Tenho cerveja, vinho e refrigerante. O que deseja?
— Um refrigerante — ela respondeu, sorridente. — A propósito, não quer que
pare a fita enquanto vai à cozinha?
— Não é preciso. Torno num segundo.
E, realmente, num piscar de olhos, Joel estava de volta, oferecendo-lhe um
copo de refrigerante com gelo, todo borbulhante.
Enquanto Melissa bebia, concentrada no filme, ele não pôde evitar de
contemplá-la, embevecido com sua beleza. Julgava-a atraente, com as pequenas sardas
no nariz, a boca carnuda e provocante e os cílios longos, os mais longos que já vira. Não
conseguia prestar atenção na película por mais que tentasse.
Quando ela tomou conhecimento de que era observada, fitou-o e indagou:
— Algo de errado?
Ele sacudiu a cabeça de forma negativa.
— Pelo contrário. Acho você fascinante — ele replicou, divertindo-se com o
rubor que lhe assomou às faces. — Desculpe, não quis embaraçá-la. Supus que já
deveria estar acostumada a esse tipo de elogio.
Ela o encarou imóvel e em silêncio.
Num impulso, Joel se aventurou a tocá-la no rosto, sentindo a maciez da pele e
deslizando depois a mão pela nuca. Em seguida, com suavidade, beijou-a nos lábios, que,
surpreendentemente, se abriram para recebê-lo, embora pudesse senti-la estremecer.
— Não tirarei vantagem de você, Melissa — ele procurou acalmá-la, fitando-a

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enquanto falava. — Pode me fazer parar quando quiser.
Contudo, para alegria de Kramer, ela não queria parar. De forma vacilante, que
ele considerou encantadora, abraçou-o pelo pescoço e o puxou para mais perto de si.
Ele a prendeu pela cintura, num enlace apertado, e continuou a beijá-la, por
todo o rosto, até que as carícias foram se tornando mais ardentes, e o desejo se
acendeu entre os dois.
Atraindo-a ainda mais para junto de si, gemeu ao perceber que ela inclinava a
cabeça, oferecendo-lhe a linha do pescoço. Era tão bonita, e a queria tanto, que
chegou a espantar-se com a intensidade do anseio.
— Melissa — ele murmurou, ofegante. — Eu...
Ela abriu os olhos, devagar, parecendo tão aturdida quanto ele, e disse, num fio
de voz:
— Não creio que seja uma boa idéia, Joel.
Com relutância, ele a soltou, um pouco encabulado com o fato de Melissa ter
percebido o quanto a desejava.
— Desculpe-me — ele sussurrou —, não deveria ter...
— Não há de que se desculpar — ela o tranqüilizou. — Não fez nada de errado.
É só que não sou muito boa nesse tipo de coisas e... e não gostaria de estragar nossa
amizade indo longe demais... tão cedo.
Joel se ergueu e foi sentar-se longe dela. Precisava manter distância até o fim
do filme.
Quando este enfim terminou, Melissa se levantou e olhou para Joel Kramer,
em pé em frente à janela, dizendo:
— Bem, melhor eu ir indo. Está ficando tarde.
— Obrigado por ter vindo — ele declarou, acompanhando-a até a porta.
— E, antes que me esqueça, quanto a meu carro? Quando ficará pronto?
— Ainda não sabem. Dei-lhes meu número de telefone, para quando tiverem um
orçamento, porquanto não sabia o seu. Assim que me ligarem, eu te aviso.
— Ilido bem — ela bradou, enquanto ele abria a porta, acrescentando em
seguida: — Já que não vou trabalhar amanhã, talvez pudéssemos fazer alguma coisa
juntos, se ainda quiser.
Joel sorriu.
— Eu adoraria. E o que gostaria de fazer?
— Qualquer coisa...
— Pensarei em algo.
Parados na soleira da porta, ambos pareciam relutar em se despedir.
Decorreram ainda alguns segundos para que Joel tomasse a iniciativa de quebrar o

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silêncio.
— Vou levá-la em casa. Ela deu um sorriso.
— Moro na porta em frente.
— Não tem importância. Assim posso dar-lhe um beijo de boa-noite.
Joel a acompanhou uns passos adiante e esperou que ela abrisse a porta do
apartamento. Logo após tomou-a entre os braços e a beijou com sofreguidão,
revelando toda a emoção que se acumulara em seu corpo.
Melissa correspondeu inteiramente, abraçando-o pelo pescoço, enquanto
pensava que, mesmo com aquela vizinhança podendo colocar-lhe a vida de ponta-
cabeça, não havia como abdicar de suas delícias.

CAPÍTULO III

— Qual foi a última vez que esteve aqui? — perguntou Joel, quando ele e
Melissa se aproximavam do Monumento Washington.
— Creio que quando-criança, numa excursão escolar. Lembro que era verão.
— No inverno, de qualquer forma, tudo parece diferente. Melissa olhou a sua
volta e suspirou.
— Foi uma grande idéia termos vindo. Fico feliz por você haver insistido.
— Senão você estaria encaramujada no apartamento, lendo um livro.
— Talvez. Poderia também ter saído para dar uma caminhada.
— Assim matamos dois coelhos com uma cajadada só: aqui você faz seu
exercício e ainda visita a capital do país.
Duas horas mais tarde, Joel sugeriu que parassem para almoçar, dando a
Melissa o privilégio da escolha do local. Ela optou, então, por uma casa de chá
confortável, de decoração delicada.
— Que tal sopa? — ela indagou, após haverem sido servidos.
— Boa — replicou Joel. — E a salada?
— Experimente — ordenou Melissa, estendendo-lhe o garfo com um bocado da
comida.
— Hum. Ótimo tempero. Tome uma colher de sopa também — e ele a serviu,
igualmente estendendo seu talher.
Melissa provou o alimento e, fitando-o, declarou:
— Nunca encontrei alguém como você.
Erguendo o rosto da tigela fumegante, ele interrogou:
— É um elogio ou uma crítica?

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— Um elogio. Você nem ligou de almoçar aqui neste lugar de aspecto tão
feminino.
— Não sou o único homem aqui. Além do mais, comida não tem gênero.
— Nem se importaria se fosse o único por aqui. É disso que falo. Parece à
vontade em qualquer lugar.
— Você não?
— Não. Sempre soube que era diferente.
Arqueando as sobrancelhas, com um semblante interrogativo, ele perguntou:
— Se importaria de me explicar melhor essa frase?
— Sempre estudei com pessoas mais velhas que eu e, fora as lições de casa,
nunca tive coisa alguma em comum com elas. Por outro lado, no lugar onde morava, era
a criança mais nova do quarteirão, e as meninas e meninos da mesma idade não se
sentiam bem comigo.
— Então, não aprendeu a brincar.
— Não mesmo.
— Nesse aspecto somos diferentes. Tive muitos amigos quando criança.
— E ainda os vê?
— Não. Dois foram mortos no Vietnã, e os demais nunca mais vi desde a venda
do rancho de meus avós.
— A única amiga que tenho é Karen. Mora em Nova York. Mas mantemos
contato. Sempre insiste em que eu saia de férias com ela e a família. Casou-se logo
depois da formatura, enquanto continuei engordando o currículo escolar. Sou melhor
nisso do que em relações sociais.
Joel se reclinou na cadeira e contemplou-a com um sorriso maroto.
— Hum, eu não diria tal coisa. Não tem se saído mal desde que nos conhecemos.
— Você torna tudo tão fácil...
— Nunca ninguém havia notado esse aspecto de minha personalidade.
— Sempre me encabularam os contatos sociais, sem saber o que falar ou fazer.
— Seja você mesma.
— Gostaria de ser capaz. Só com você falo pelos cotovelos.
— Considero isso um cumprimento — ele agradeceu sorrindo, indagando em
seguida: — O que quer fazer agora à tarde?
— Continuar a ser turista. Visitar a Casa Branca, o Capitólio, o Memorial de
Jefferson, o Memorial de Lincoln, o Instituto Smithsoniano...
Joel começou a rir.
— Opa, opa! Vamos com calma. Poderíamos visitar alguns desses lugares, porém
não todos. O Instituto Smithsoniano, por exemplo, leva dias para conhecer.

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
Ela também sorriu, cheia de expectativa.
— Ainda tenho o resto da semana de folga; contudo, você... — Melissa fez uma
cara meio decepcionada. — Tem de escrever, não é?
— Sim, mas acordo cedo e posso trabalhar umas três horas. Lá pelas dez
poderíamos sair para um passeio turístico. Calculo que, desse jeito, dará para ver tudo.
Ela o olhou com ar enternecido e, pousando a mão sobre a dele, declarou:
— Obrigada.
— Pelo quê?
— Por ser você.
Dias mais tarde, contemplando a baía de Chesapeake, sob um lindo céu azul,
Melissa bradou:
— Foi bom você ter escolhido um dia quente para virmos aqui. Está frio demais.
Mãos nos bolsos, também contemplando a baía, Joel exclamou:
— Fiquei de olho nas previsões meteorológicas, esperando por um dia quente,
de céu claro.
— Pensa em tudo, não é?— ela declarou, começando a rodopiar de braços
abertos.
— Tento — ele replicou modestamente, rindo em seguida ao vê-la girar como
uma menina. Prendendo-a pela cintura quando parou, e puxando-a para perto do corpo,
murmurou-lhe: — Parece uma garotinha, quando ri desse jeito.
— Sinto-me assim desde que começamos a sair juntos todos os dias. Só me
preocupa pensar que desta forma não terminará o livro. Não há prazo de entrega?
— Não. Decidi dar-me um ano só para escrever. Ainda tenho vários meses pela
frente.
— Que fazia antes?
— Trabalho de escritório. Nada interessante.
— Difícil imaginar algo desinteressante a seu respeito.
— Ora, dra. Jordan, desse jeito a senhora me encabula. Ela riu novamente, um
riso claro e franco, que pareceu ecoar ao redor.
— Não imagina como tenho me divertido — ela confessou. — Tenho sido
sempre séria. Está me ensinando a brincar. Fiquei até com vontade de enfim aceitar a
proposta de Karen, e neste verão ir com ela e o marido para as ilhas Virgens, onde
possuem uma casa de praia.
— Boa idéia — ele concordou colocando-lhe o braço sobre o ombro e guiando-a
até o carro. — Aonde quer ir agora?
Melissa olhou para o relógio e fez uma careta.
— Que pena! Já está tarde demais para pegar meu carro. Prometeram que

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ficaria pronto hoje, depois do almoço.
— Não há pressa, há?
— Pressa! Deve estar gracejando. O carro está lá há tanto tempo que dava
para ter sido montado e remontado vezes sem conta.
— Oficinas mecânicas têm muito serviço.
— Bem, pelo menos poderei apanhá-lo amanhã e dispensar seus serviços de
chofer. Deve estar cansado de me dar carona.
— De modo algum. Além disso, se meu livro não der certo, poderei contar com
suas boas referências para arranjar outro emprego.
Melissa riu, encantada com o brilho nos olhos de Joel. Cheios de alegria, e com
o companheirismo que nascera entre os dois. Já haviam trocado tantas confidencias
sobre as respectivas infâncias que sentia como se tivesse partilhado de sua vida no
rancho do Colorado. Da mesma forma, agora, quando pensava em seu tempo de criança
solitária, era como se ele tivesse estado o tempo todo com ela, fazendo-lhe
companhia.
— No que está pensando? — ele interrogou, enquanto dirigia.
— Na sorte que tive em tê-lo como vizinho.
— O sentimento é mútuo — disse Joel, tocando-lhe a mão.
— Sinto-me mais confiante com você por perto, embora ria constantemente de
meus foras.
— Tenho a mesma sensação, apesar de seus títulos acadêmicos serem um
bocado intimidadores, sabia?
— Não parece nada intimidado. Aliás, isto é o que me encanta em você
especialmente. Trata-me como uma pessoa comum.
Ele lhe tomou a mão e a beijou, declarando:
— Fico feliz pelo fato de você ser assim.
Quilômetros adiante, após breve silêncio, ele voltou a perguntar:
— O que vai fazer amanhã?
— Pretendo dar uma passadinha no serviço. O dr. Feldman volta em alguns dias,
e preciso colocar um pouco de ordem na bagunça reinante. Espero que ele tenha
aproveitado as férias tanto Quanto eu.
Joel não respondeu, porém lembrou que, de acordo com Max, o dr. Feldman já
estava trabalhando, mas em um laboratório conhecido de poucos. Ainda de
conformidade com Max, as investigações a respeito do atentado ao cientista, assim
como as espionagens sobre Melissa, continuavam em andamento, e muito bem.
Só o que parecia não estar indo muito bem era seu envolvimento com a moça.
Sabia que vinha perdendo o senso de objetividade e quanto isso era perigoso, contudo

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não via saída para a situação.
Nunca conhecera ninguém como Melissa Jordan e estava fascinado. Fascinado
por sua alegria de viver, antes oculta sob a timidez, pela jovialidade, por tudo aquilo
que ela o vinha ensinando sobre si mesmo.
Pela primeira vez, não se sentia incomodado em trocar confidencias. Pelo
contrário, o que, de fato, o incomodava era não poder revelar-lhe a verdadeira
identidade.
Olhando-a agora, em seu jeans e pulôver de lã, refletiu em quão pouco tempo
aquela mulher lhe fizera questionar velhos padrões de comportamento. Não conseguia
se imaginar sozinho de novo. Compreendera que ainda podia gozar da vida, e queria
fazê-lo ao lado de Melissa.
— Que tal um jogo de palavras depois do jantar? — indagou Melissa na noite
seguinte, no apartamento de Joel.
— Ora, vamos! Escritores conhecem mais palavras que todo mundo.
Joel ficou embaraçado, embora disfarçasse bem o constrangimento. Seu
vocabulário não era dos mais pobres, porém, se fosse testado e se saísse mal, o que
ela não iria pensar dele?
De qualquer forma, não haviam locado fitas de vídeo e a programação da
televisão estava desinteressante. Cinema já havia sido descartado por Melissa,
portanto só lhe restava aceitar o convite.
— Certo, vamos jogar.
— Ótimo. Vou pegar o jogo e volto num minuto. Ela correu para a porta e
desapareceu rapidamente.
Joel começou a arrumar a mesa para o jogo, pensando em quanto Melissa era
encantadora, vibrante e de bom humor. Por trás da cientista séria e profissional, jazia
latente uma mulher exuberante, que parecia, agora, abrir-se para a vida.
Sentiu-se orgulhoso de haver sido o catalisador de seu processo de
desabrochamento e ao mesmo tempo ciumento daquela conquista.
— Aqui está! — ela exclamou de volta, tirando-o do devaneio.
— Que tal tomarmos café primeiro?
Melissa caminhou para a cozinha e voltou com duas xícaras de café, que Joel
lhe tirou das mãos e pôs na mesinha, em frente ao sofá da sala. Ato contínuo abraçou-
a pela cintura e diante de seus olhos arregalados, interrogou:
— Com todo seu currículo, doutora, ainda não sabe quando um homem pretende
beijá-la?
Sem esperar resposta, Joel a tomou nos braços e a beijou com paixão,
erguendo-a depois do solo e a levando até o sofá, onde se deitaram lado a lado,

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entregues a carícias amorosas.
Passaram-se alguns momentos para que ele voltasse a falar, com voz ofegante
e rouca:
— Não agüento mais isso, Melissa. Quero muito mais do que beijá-la.
— Tudo bem, porém não seria mais confortável na cama? — ela perguntou, com
incrível naturalidade, deixando Joel perplexo.
— Melissa! — ele exclamou indeciso.
— Hum?
— Tem certeza do que está fazendo?
Ela acenou com a cabeça, num gesto afirmativo.
Joel se levantou do sofá com a mente em torvelinho. Aquela história estava
indo longe demais. Sentia-se como se estivesse tirando vantagem da situação. Teria de
dizer-lhe a...
Uma súbita explosão interrompeu-lhe os pensamentos e sacudiu a sala.

CAPÍTULO IV

O impacto da explosão os atirou ao solo. Joel abraçou Melissa protegendo-a


dos estilhaços de vidro, enquanto o cheiro de explosivos impregnava o ar.
Erguendo a cabeça, ele pôde ver, através de um imenso buraco na parede, o
corredor em chamas e o que restara da sala de estar do apartamento de Melissa.
Embora aturdido, a experiência lhe dizia que outra explosão deveria ocorrer
em minutos. Tinham de sair dali.
Olhou para a cientista, que estava com a fisionomia de criança assustada, e
depois ao redor dos dois, percebendo que o fogo se alastrava rapidamente. Labaredas
já consumiam o sofá onde haviam estado deitados segundos antes.
— Você está bem? — ele indagou a Melissa.
— Acredito que sim — ela respondeu, com voz incerta.
— Precisamos sair daqui imediatamente — ele disse, erguendo-se e levantando-
a pelos pulsos. — Este lugar pode explodir a qualquer instante.
Imediatamente, puxando-a por uma das mãos, correu para o quarto, onde
apanhou dois casacos com capuz do armário e um revólver do criado-mudo.
Melissa que observava a sala de estar em chamas, tomou ciência, pela primeira
vez desde a explosão, da perigosíssima situação em que se encontravam, sentindo o
pânico começar a instalar-se em sua mente. Como haveriam de sair do apartamento?
Passando um dos casacos para Melissa, Joel ordenou:
— Vista-o. Vai precisar dele.

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Enquanto a moça colocou o casaco, ele pôs a arma na cintura, o próprio casaco
e, dando uma última olhada no quarto, rumou para a janela.
— Aonde vamos? — interrogou Melissa, a quem ele arrastava pela mão. — São
cinco andares. Não podemos...
— Há uma escada de incêndio alguns metros à frente — ele explicou com
decisão, pois havia checado todas as possíveis saídas do prédio assim que chegara.
— Abrindo a janela, o agente se equilibrou em seu peitoril, ajudando Melissa a
imitá-lo ao mesmo tempo em que lhe cobria o cabelo loiro com o capuz do casaco.
Ficava menos exposta daquela forma, embora quem quer que houvesse planejado o
atentado devesse estar verificando a conseqüência do outro lado do prédio. Ninguém
sabia que a cientista estaria com ele naquela noite.
Com essa esperança em mente guiou-a até a escada e depois, quando atingiram
o solo, para longe do prédio, por uma pista de corrida que levava ao parque das
redondezas.
Enquanto corriam de mãos dadas, ele se recriminou por haver afrouxado tanto
a vigilância sobre o prédio, envolvido que estava com a cientista. Não conseguia atinar
com o modo como os criminosos haviam conseguido colocar os explosivos no corredor
do andar em que morava, sem que ele ao menos percebesse o ocorrido.
Fosse como fosse, o atentado mudava tudo. Estava na hora de iniciar o Plano B,
e a primeira coisa a fazer era contatar Max e pedir-lhe orientação e ajuda. Para
tanto, precisava encontrar um telefone público que fosse seguro.
Lembrou-se então de que na frente da loja de miudezas mais próxima havia
uma série de orelhões. Acelerando o passo, rumou para lá com Melissa, que começou a
sentir o ritmo da corrida.
— Para onde estamos indo? Por que estamos correndo? Não deveríamos ficar e
descobrir o que aconteceu?
Embora percebesse a voz ofegante da cientista, Joel manteve o passo e, sem
olhar para trás, respondeu:
— Não lhe ocorreu ainda que alguém está tentando matá-la? Quer ficar por
aqui e dar ao assassino uma nova chance?
Nesse momento, Melissa parou por completo, obrigando-o a fazer o mesmo.
Perplexa, olhou-o como se desconfiasse de que ele enlouquecera e indagou:
— Eu? Por que alguém iria querer me matar? A explosão deve ter sido um
acidente. Precisamos voltar e responder às perguntas dos bombeiros, senão vão
pensar que morremos.
Ele meneou a cabeça.
— Melissa, que tipo de acidente poderia causar uma explosão como aquela?

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
Alguém estava muito interessado em destruir nossos apartamentos, conosco dentro.
Quer voltar e dar-lhe chance de terminar o trabalho?
— Não consigo entender nada disso — ela respondeu, confusa, afastando o
capuz do rosto. — Porém, se ainda estivéssemos naquele sofá... poderíamos ter
morrido.
— Incrível como o instinto de sobrevivência pode motivar uma pessoa, não é?
— ele murmurou, com delicadeza, enquanto a confortava com um abraço.
Melissa estava trêmula, como ele próprio, porém precisavam continuar
andando. A pista de corrida, que atravessava o parque, ainda era muito visível, e
poderiam ser interceptados a qualquer momento.
— Querida, é necessário localizar um telefone e descobrir aonde vamos ficar
esta noite. Não podemos dormir no parque.
— Eu sei. Mas, Joel, por que julga que alguém está tentando me matar? Não
sou ninguém importante. Talvez o atentado tenha sido contra você.
— Sempre há uma possibilidade, porém duvido. Nenhum dos editores, a quem
mostrei meu trabalho, expressou sua rejeição através de métodos tão severos. Agora,
vamos sair daqui.
— Mas para onde?
Tomando-lhe a mão outra vez, Joel explicou, enquanto voltavam a correr:
— Quero telefonar a um amigo para que nos ajude a encontrar um local onde
possamos nos refugiar. Não creio que um hotel seja uma boa alternativa no momento.
Para alívio do agente, Melissa não disse mais nada e procurou apenas
acompanhá-lo na corrida estafante.
Enquanto fugiam, agora que o perigo iminente passara, Joel pôde recordar, por
instantes, a cena imediatamente anterior à detonação, a maciez e o perfume da pele
de Melissa. Só mesmo uma explosão poderia tê-lo impedido de fazer amor aquela
noite.
Quando alcançaram uma parte bem iluminada do parque, ambos estavam
completamente sem fôlego e foram obrigados a parar. À medida que se recuperavam,
entretanto, Melissa resolveu relaxar a tensão, com um pouco de bom humor.
— Gostaria muito de saber por que estamos correndo como se perseguidos
pelos cães do inferno, mas acredito que deve ter suas razões para tal. Você se
importaria de dizer quais são?
— Quem pode assegurar que não há marginais escondidos nos arbustos?
Melissa o fitou, com olhar divertido, e exclamou:
— Meu herói!
— E não se esqueça disso — ele respondeu, inclinando-se para beijar-lhe o

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nariz.
Ao chegarem, enfim, à loja de miudezas, já estavam mais calmos,
assemelhando-se a qualquer casal que saíra para um breve passeio.
— Por que não vai apanhar algo para bebermos, Melissa, enquanto telefono? —
interrogou Joel. Fez o pedido calculando que, como a parede da frente da loja era de
vidro, não correria o risco de perder a moça de vista ao ligar para Max.
— O que quer beber?
— Surpreenda-me.
Ela lhe lançou um sorriso maroto, com o qual procurava esconder o choque por
que passara. Controlando o desejo de abraçá-la e confortá-la, ele apenas lhe retribuiu
o sorriso e rumou para um dos telefones.
Vasculhando o bolso à cata de moedas, pegou uma e a colocou no aparelho. A
chamada foi atendida no primeiro toque.
— Sou eu, Max. Joel.
— Joel! Onde está? E a dra. Jordan? — perguntou, afobado, revelando que já
sabia da explosão.
— Ela está comigo, ilesa, porém agora precisamos alterar nossos planos. Tem
informações sobre a explosão?
Max suspirou aliviado, respondendo em seguida:
— Só a de que os bombeiros ainda estão lutando contra as chamas com pouca
chance de salvar o prédio. Quase pegaram vocês, Joel.
— Eu sei. Acho que, dadas as circunstâncias atuais, precisamos contar a
verdade à dra. Jordan.
— Não necessariamente. Por que alarmá-la ainda mais?
— Está brincando? Pode haver algo mais alarmante do que ver a própria casa
reduzida a pó?
— Quero dizer que não há razão para deixá-la saber que é alvo de um possível
assassinato.
— Ora, vamos, Max! A mulher não é estúpida. Como espera que a convença a se
refugiar comigo, se não lhe disser a verdade?
— Use seu charme para convencê-la a irem superar juntos o choque do
atentado, em algum lugar tranqüilo.
— Já havia pensado em acompanhá-la nas férias de verão, quando planejava ir
à casa de uma amiga nas ilhas Virgens, mas isso ainda vai levar um bom tempo. Que
faremos agora?
— Por que não tenta convencê-la á ir agora? Seria perfeito.
— Sem narrar-lhe a verdade? Pleno conhecimento da situação pode garantir-

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lhe a sobrevivência nesse caso.
—- Se tirá-la de circulação por uns tempos, enquanto pomos tudo isso em
pratos limpos, não precisará contar-lhe a verdade.
— E se eu não conseguir, Max? Assumirá o risco? Fez-se um longo silêncio
entre os dois, quebrado finalmente por Max, que bradou em tom imperativo:
— Não estrague seu disfarce, Joel. Se puder alertá-la sem revelar quem é,
tudo bem. Senão, esqueça. É uma ordem.
A contragosto, Joel reconheceu que Max estava com a razão. De algum modo,
tinha de continuar fingindo ser um escritor.
— Se a amiga dela não quiser cooperar, tem outra sugestão de lugar onde
possa levá-la?
— Há a casa da praia. Poucas pessoas vão para lá nessa época do ano, e seria
mais fácil vigiá-los. Poderia colocar alguns homens à espreita, sem que ela note.
— Bem, se tivermos de ir à praia, prefiro as caribenhas — ele declarou,
apressando-se a desligar, ao ver Melissa se aproximando. — Olhe, falo com você mais
tarde. Ela está chegando.
— Certo. Mantenha contato e tente não ficar muito entediado.
— Não acredito que isso seja possível. Tchau.
Joel desligou o telefone e se voltou para receber Melissa.
— Não parece muito feliz de haver falado com seu amigo — ela sussurrou,
passando-lhe uma xícara de café. — Algo deu errado?'
— Não exatamente. — Ele procurou ganhar tempo. — Meu amigo ouviu uma
reportagem sobre a explosão no rádio do carro, e disse que, embora todos os
moradores tenham escapado ilesos, o prédio foi totalmente destruído. Disse ainda que
há muito tumulto por lá. O melhor que temos a fazer é manter distância.
Melissa sentiu um calafrio e exclamou:
— Temos sorte de estar vivos.
— Sim — ele afirmou, apressando-se a entrar no assunto das férias. —
Lembra-se de nossa conversa sobre as ilhas Virgens? Ela o olhou, surpresa.
— Sim, por quê?
— Estive pensando que seria ótimo se pudéssemos fugir do frio e dessa tensão
toda, indo para a casa de sua amiga. Será que ela se importa de nos oferecer abrigo
temporário? Afinal, agora estamos sem lar.
A objetividade daquela declaração atingiu Melissa como um raio, dando-lhe
uma visão mais abrangente da situação em que se encontrava. Perdera tudo. A única
coisa que lhe restara foi a roupa do corpo, e ainda assim com um casaco emprestado.
Sem que mesmo se desse conta, lágrimas começaram a descer-lhe copiosas pelas

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faces.
Ao percebê-las, Joel imediatamente se apressou a enxugá-las, depositando a
xícara de café no chão e abraçando Melissa com toda a força.
— Não chore, amor! Daremos um jeito em tudo! Se não quiser pedir a casa a
sua amiga, poderemos ir para a costa da Carolina do Norte, onde meu amigo tem um
chalé. Só precisamos relaxar essa tensão toda, e deixar a polícia descobrir o que
sucedeu. Quero cuidar de você, Melissa. Apenas isso.
Abraçado à cientista, o agente esqueceu do papel que devia desempenhar.
Interessava-lhe no momento, tão somente, proteger e amparar aquela mulher que
tanto o atraía, com seu misto de inocência e sabedoria, independência e doçura.
— Nunca passei por nada semelhante antes — ela conseguiu dizer, enfim.
— Certo. Nem tudo está perdido, porém perdemos nossos apartamentos, e eu,
meu carro. Mas ainda temos o seu, além de amigos que podem nos oferecer abrigo em
dois locais tranqüilos. Acredita que sua amiga nos cederia a casa nas ilhas Virgens?
— Creio que sim. Sempre me disse que poderia usá-la quando quisesse.
— Você se importaria se eu fosse junto?
— Se é o que quer — ela respondeu, recuperando um pouco do humor.
— Não penso em outra coisa.
Melissa permaneceu aninhada nos braços de Joel, tentando pôr alguma ordem
na vertiginosa sucessão dos acontecimentos das últimas semanas. Tanta coisa
ocorrera!
De qualquer forma, a sugestão de Joel parecia lógica, pois não tinham lugar
para ficar, ainda estava de folga e, acima de tudo, precisava muito descansar num
lugar calmo e seguro. Além do mais, ele estaria com ela todo o tempo.
Dando um grande suspiro, ela recuou a cabeça e o encarou, dizendo, com um
sorriso trêmulo:
— Ligarei para Karen imediatamente.

CAPÍTULO V

Com esforço, melissa abriu os olhos pesados de sono e fitou ao redor do


terminal do aeroporto de Miami, localizando Joel, reclinado sobre o balcão de uma
companhia aérea, num bate-papo animado com a recepcionista.
Eram duas da madrugada e a idéia de viajar para uma ilha ensolarada já não lhe
parecia tão excitante. Tudo o que desejava no momento era um local para dormir.
Fechou os olhos e começou a pensar no que lhe sucedeu ultimamente.

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
Karen cedera, de bom grado, a casa de veraneio para ela e Joel passarem uns
dias, rindo um bocado com as explicações de que eram apenas bons amigos com
repentinos problemas de moradia.
Não podia condenar as suspeitas da amiga. Ela própria sabia que, dados os
últimos acontecimentos, não dava para considerar-se apenas uma boa amiga do
charmoso vizinho.
— Melissa! — Joel a chamou, interrompendo-lhe os pensamentos.
Abrindo os olhos, avistou-o acocorado a seus pés, e sorriu.
— Você está bem? — ele perguntou.
— Sim. Apenas cansada.
— O primeiro vôo só sairá daqui a três horas. Se preferir, podemos procurar
um hotel.
— Como quiser — ela respondeu, sonolenta.
Joel olhou a sua volta. Estavam muito expostos no terminal quase vazio, e um
bom sono ajudaria na recuperação das forças.
— Acho que estamos precisando de descanso. Se vamos sair de férias, não há
razão para chegarmos exaustos.
Ele se ergueu e a puxou pelas mãos, para que ficasse de pé. Conclamou-a:
— Vamos para a cama!
— Hum, que oferta romântica! Como poderia recusar? Abraçando-a pelos
ombros e atravessando a área de espera, na direção da saída, Joel lembrou mais uma
vez o que ocorrera com os dois, segundos antes da explosão. De certa forma, ficou
feliz pelo fato de que o atentado o houvesse impedido de cometer o grande erro de
envolver-se ainda mais com Melissa. Embora fosse difícil controlar o desejo que os
atraía, precisava manter-se atento apenas ao próprio trabalho.
— Vamos arrumar um quarto e partir para o Sul amanhã — ele disse a Melissa,
enquanto caminhavam.
Cansada demais para responder, ela simplesmente acenou com a cabeça,
concordando.
Quando chegaram ao hotel, Joel escolheu um quarto com duas camas,
preocupado em manter a doutora à vista, e observou que a mesma parecia em estado
quase comatoso, os olhos inchados de sono, o cabelo desgrenhado, a expressão vaga.
Ao entrarem no dormitório, ela se dirigiu imediatamente para a cama, onde se
sentou com o olhar perdido.
Joel tirou-lhe o casaco e os sapatos, e em seguida ergueu-a um pouco, para que
pudesse puxar as cobertas. Depois, deitou-a na cama e a cobriu com delicadeza. Ela
tivera uma noite por demais agitada e estava morta de sono.

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
Após acomodar Melissa, ele rumou para o banheiro, onde se deixou ficar por
uns minutos, sob uma ducha relaxante. Precisava manter-se bem atento no dia
seguinte, e não poderia fazê-lo sem o descanso necessário. Checara o aeroporto e o
caminho por onde haviam alcançando o hotel. Não percebera ninguém observando-os.
Por algumas horas, no mínimo, poderia baixar a guarda.
Fechando a torneira, saiu do boxe, pegou a roupa e o revólver e entrou no
quarto, pé ante pé. Melissa não se moveu.
Depositando o revólver na beira da cama, soltou a toalha enrolada na cintura e
se enfiou debaixo das cobertas. Nunca um colchão havia lhe parecido tão confortável.
Em segundos adormeceu.
Após horas de sono, Melissa acordou sem saber onde estava. A não ser por um
minúsculo facho de luz que atravessava uma fresta da persiana, o quarto se
encontrava completamente às escuras.
Aos poucos, os últimos acontecimentos lhe vieram à mente, até pelo menos a
espera no aeroporto. Depois disso, estava tudo nebuloso. Não conseguia recordar como
chegara ali.
Com a vista mais acostumada ao escuro, pôde distinguir o vulto de Joel na
cama ao lado, deitado de bruços, com o dorso desnudo. Por instantes, refletiu que
estivera prestes a conhecer-lhe todo o corpo, e a idéia a fez enrubescer. Talvez a
explosão tivesse tido um lado positivo, afinal, impedindo um maior envolvimento entre
os dois.
De qualquer forma, nunca se sentira tão próxima de alguém anteriormente,
nem mesmo dos pais. Embora atenciosos, estes não eram muito afetivos, e os abraços
e toques constantes de Joel, algo tão natural nele, deixavam-na encantada. Isso sem
falar nos beijos, é claro, dos quais parecia nunca se fartar.
Esgueirando-se até o banheiro, despiu-se e entrou no boxe, onde se banhou e
lavou os cabelos com o xampu do hotel, já que, entre outras coisas, também perdera a
bolsa e os documentos no atentado.
Recordou-se, então, do que Joel lhe dissera à guisa de conforto. Como não
perdera a carteira, pois estava em seu bolso quando fugiram, ele comprometera-se a
pagar-lhe todas as despesas, incluindo roupas novas, até que tudo se acertasse. Era
apenas uma questão de tempo, declarara, solidário.
Por enquanto, porém, tinha de se contentar em recolocar o mesmo jeans e
suéter da noite anterior, e ainda agradecer a Deus o fato de estar viva.
Concluiu que o destino lhe dera uma nova chance de descobrir a vida, a qual não
pretendia desperdiçar. Daquele momento em diante, pretendia manter-se de olhos
abertos para tudo que a circundava.

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Saindo do banho e vestindo-se, Melissa caminhou de volta ao quarto, o
estômago roncando de fome. Não se lembrava da última vez que comera, mas parecia
fazer muito tempo.
Ao abrir a porta do banheiro, encontrou Joel sentado na cama, enrolado nas
cobertas, com ar sonolento.
— Você está bem? — ele perguntou assim que a viu. -
— Claro. Por que não deveria estar?
— Fiquei preocupado com você a noite passada. Parecia em coma.
— Não exagere. — Ela riu. — Estava apenas exausta. Tivemos um dia e tanto
ontem. Agora, mudando de assunto, tem um pente para me emprestar?
Ele riu também.
— É tudo o que precisa no momento para ser feliz, senhorita?
— Bem, um pente e um café reforçado já seriam um bom começo no caminho da
felicidade.
Joel se inclinou, alcançou a calça na cômoda e tirou do bolso um pente, que
passou para Melissa.
— Obrigada — ela lhe agradeceu, voltando ao banheiro. Enquanto ela se
penteava, ele se vestiu, lembrando como se
assustara quando, ao despertar, não a vira na cama. Levou alguns segundos até
acalmar-se e poder ouvir o barulho da ducha, revelando a presença da cientista no
banheiro.
Nunca fora responsável por outra pessoa que não ele mesmo, e concluiu que não
suportaria tal tensão diariamente. Encontravam-se na rua havia apenas vinte e quatro
horas, porém seus nervos estavam à flor da pele.
Entretanto, ao avistar Melissa voltando do banheiro, perfumada e penteada,
relaxou um pouco e, com bom humor, exclamou:
— Vamos comer algo, fazer umas compras e pegar o primeiro avião para o Sul.
Ela fez um gesto afirmativo com a cabeça.
— Plenamente de acordo.
Já estava entardecendo quando eles se aproximaram, num velho táxi, do chalé
de Karen, após uma viagem de avião e outra de barco.
Sentada no banco de trás do velho carro, Melissa surpreendeu-se ao ouvir Joel
conversando em espanhol com o motorista.
— Não sabia que se falava espanhol nas ilhas Virgens — ela comentou com Joel,
que se voltou para explicar.
— Tem razão. Espanhol não é a língua nativa, mas Carlos vem de Porto Rico.
— E onde você aprendeu espanhol?

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
— Bem, o rancho de meus avós ficava próximo da fronteira mexicana, e naquela
época eu ainda não considerava aprender línguas coisa difícil.
O carro diminuiu a marcha e entrou num atalho estreito, atingindo uma clareira
alguns metros adiante, de onde já foi possível divisar o chalé da amiga de Melissa.
Embora pequeno, parecia bem construído e confortável, rodeado de arvoredos
florescentes. O ar tropical e a exuberância da vegetação fizeram com que ela
exclamasse:
— Oh, Joel, aqui é lindo!
Ele saiu do carro, abriu a porta para Melissa, e em seguida pegou as duas malas
que haviam adquirido com as outras compras.
Depois pagou o motorista, combinando com ele de vir apanhá-los no dia
seguinte e levá-los até o porto da cidade. E voltou-se na direção da casa.
— Vamos entrar? — ele convidou Melissa, que parecia receosa de mover-se,
como se ao fazê-lo pudesse quebrar a espécie de encantamento produzido pelo lugar.
Após subirem os degraus, que davam para uma varanda espaçosa, ela procurou
as chaves no local indicado por Karen. Logo em seguida abriu a porta do chalé, dando
espaço suficiente para Joel passar tranqüilamente com as malas.
Todos os quartos, por sua vez, davam para a praia, acessível por meio de
portas corrediças, que Melissa abriu para contemplar a paisagem.
— Nunca vi nada parecido antes! — ela declarou embevecida.
Joel juntou-se a ela.
— Boa forma de passar o inverno, não? E, agora, que tal irmos até a praia?
Descendo a escada, rumaram para a praia, que ficava numa pequena enseada,
terminando num grupo de rochas. Escalando-as, puderam ver a vegetação que cobrira
completamente a outra entrada, próxima à de onde haviam vindo, e estendera-se mar
adentro por poucos metros.
Melissa se voltou na direção da casa, emoldurada por palmeiras, recortadas
contra o céu azul-escuro, entremeado de raios rosa e azul-claros. A areia era
incrivelmente branca, e a cena toda parecida um cartão-postal.
— Sinto como se fosse acordar a qualquer momento — ela sussurrou. — Nem
parece real. Nunca vi nada tão bonito.
Acostumada a lidar com fatos concretos, onde tudo podia ser analisado,
processado e provado, Melissa não estava preparada para apreciar a beleza pura da
natureza em todo seu esplendor.
Observando o vaivém preguiçoso das ondas na praia, com suas rendas de
espuma, ela desceu das rochas e, assim que alcançou a areia, tirou os sapatos e
começou a caminhar à beira da água, tocando-a, vez por outra, com a ponta dos pés.

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
— É tão quente — ela bradou para Joel que a seguira. — Nunca imaginei que
fosse assim.
Ele olhou de relance para o céu e murmurou:
— Melhor voltarmos para casa. Escurece rápido nos trópicos.
De volta a casa, cada um escolheu um quarto e depois foram para a cozinha
conferir os mantimentos.
— Amanhã, precisamos ir às compras — disse Joel. — Por hoje, há enlatados
suficientes para um banquete.
Melissa bocejou, apressando-se em cobrir a boca com a mão.
— Ainda está cansada — ele observou.
— Mas não da companhia.
— Assim espero, pelo menos não tão cedo. Mal acabamos de chegar.
— Não vamos poder ficar muito, você sabe, não é? — ela o lembrou,
delicadamente.
— Sim, eu sei.
— Em breve terei de voltar e procurar um novo lugar para viver, tentar
receber algo do seguro... Não vai ser fácil.
— É verdade. Porém, por enquanto, esqueça tudo isso e aproveite o presente,
que é o único tempo sobre o qual temos controle.
Ela concordou com um aceno de cabeça.
— Tem razão. Tenciono aproveitar cada segundo. Por esse motivo, após
saborearmos o jantar, irei direto para a cama. Há tanta coisa para fazer, que não sei
por onde começar.
Joel tomou-lhe as mãos e as levou rumo ao peito.
— Obrigado por haver me convidado para este paraíso.
— Nunca seria o mesmo sem você. Fico feliz por ter sugerido a viagem.
Ele se inclinou e a beijou suavemente nos lábios.
— Tê-la encontrado foi a experiência mais encantadora que tive depois de
adulto. Nem sei ao certo se você é real.
— A recíproca é verdadeira — ela respondeu, lançando-lhe os braços em volta
do pescoço e beijando-o com paixão.
Sua grande aventura acabara de começar, e pretendia vivê-la intensamente.

CAPÍTULO VI

Através das frestas da persiana, pequenos raios de sol iluminaram a cama onde

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Melissa acabava de acordar, deleitando-se com o colchão confortável, o calor, o som
das ondas na praia e da brisa nas plantas da varanda.
Não resistindo à tentação de rever a magnífica paisagem local, levantou-se e
caminhou descalça até a janela, abrindo-a de par em par.
O verde luxuriante que avançava até a beira da praia, o sol, a areia e o mar a
incitaram a sair do quarto imediatamente. Embora apenas de camiseta, abriu a porta
ao lado da janela e caminhou para a praia, deserta àquela hora.
Lá chegando, deixou-se tomar por intensa emoção, diante da força da
Natureza. Queria rir, chorar, saltar no ar. Abrindo os braços, começou a cantar,
passando a rodopiar também ao sentir uma onda tocando-lhe os pés.
À medida que girava e avançava mar adentro, as ondas iam lhe batendo nas
coxas, depois na cintura, na camiseta, até molhá-la por completo. Rindo muito,
mergulhou na água tépida, imaginando a felicidade dos golfinhos. E nadou por bom
tempo, só parando ao perceber-se sem fôlego e com os músculos doloridos.
Então, jogando os cabelos molhados para trás, retornou a casa, bem rápido,
dirigindo-se ao banheiro, onde tirou a camiseta para tomar uma ducha.
Todo o tempo seu rosto resplandecia de felicidade. O dia começara
esplendidamente.
Joel estava em pé, na sala de estar, próximo à janela, quando Melissa entrou
no chalé, desaparecendo em seu quarto. Estivera observando-a atentamente na praia,
uma criança descobrindo a alegria de brincar no mar, uma mulher, uma ninfa das águas
tentadora e desejável com a camiseta colada ao corpo, caminhando, de volta a casa,
pelo atalho de pedras.
O coração disparou-lhe no peito. O que acabara de testemunhar o afetara, a
ponto de sentir-se fisicamente fraco. Desde quando aquela mulher se tornara tão
importante para ele? Desde quando deixara de ser apenas mais um serviço para se
converter em algo de tal importância emocional?
Não podia mais esconder ou ignorar os próprios sentimentos. Ele a amava, e
assim fora desde o primeiro instante que a vira, embora não identificasse tal emoção a
princípio. Nunca tivera, entretanto, reação tão avassaladora em relação a uma mulher,
e se perguntava o que fazer diante disso.
— Bom dia! — cumprimentou-o Melissa, interrompendo-lhe os pensamentos,
adorável em um short e blusa sem manga, com o cabelo preso em uma trança única.
— Gostou do mar?
Por um momento, ela pareceu surpresa, mas depois riu.
— Sim, muito, deve ter pensado que eu enlouqueci lá na praia.
— De jeito algum. Fiquei com inveja.

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— Então, por que não veio nadar comigo?
— Porque poderíamos perder nosso passeio até a cidade — ele explicou,
olhando o relógio.
— Nossa, é mesmo! Nem percebi que já era tarde. Deixe-me pegar minha bolsa.
Mesmo sem nenhum tostão, sinto-me mais segura com ela. — Nesse ínterim, o som da
buzina do táxi começou a chamá-los, e ela acrescentou: — Nosso amigo acaba de
chegar. Já volto com a bolsa.
A caminho da cidade, sentada no banco de trás do táxi, com Joel a seu lado,
Melissa se deu conta, subitamente, de que o agente perdera o manuscrito do livro que
vinha escrevendo. Consternada, exclamou:
— Oh, Joel! Com tudo o que me aconteceu acabei esquecendo suas perdas. Ao
me ajudar você abandonou completamente seu manuscrito. E agora?
Como sempre e cada vez mais, ele se sentiu constrangido em dar-lhe uma
resposta evasiva.
— Não é o fim do mundo. Recordo-me da maior parte de minhas referências e
posso reconstituir tudo.
Em seguida, calou-se embaraçado, imaginando quando poderia contar-lhe toda
a verdade, quando Max lhe daria carta branca para revelar-se. Nunca quisera abrir-se
com ninguém e, agora que queria fazê-lo, via-se impedido por questões profissionais. O
remédio era ter paciência.
Tomando-lhe uma das mãos, acariciou-a, enquanto dizia:
— No momento, tudo a que quero é apreciar esta ilha tropical. Ela apertou-lhe
a mão, sorrindo.
— Eu também.
Horas mais tarde, não era apenas a identidade secreta que incomodava Joel,
mas também seu desejo por Melissa. Não podia imaginar como conseguiria impedir que
fizessem amor.
A beleza do lugar, o clima, a visão da cientista com o biquíni ou o vestido sem
alças, que escolhera durante as compras, as pernas que o short revelava, tudo parecia
contribuir para excitá-lo.
Sentados num dos restaurantes locais, o agente tentava afugentar aqueles
pensamentos, olhando fixamente para o mar.
— Joel! — ela o chamou, baixinho.
— Hum! —ele sussurrou, voltando o rosto para encará-la.
— Estava pensando no manuscrito, não é?
— Por que pergunta?
— De vez em quando, você fica com uma fisionomia de quem está tentando

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solucionar um problema difícil. Calculo quanto esforço não vai lhe custar reescrever
tudo o que foi perdido.
Joel olhou para a mesa, mais uma vez se odiando por ter de inventar outra
mentira. Optou então por tentar desconversar, sem muito sucesso.
— Lamento. Sei que não estou sendo boa companhia no momento.
Ela lhe tocou a mão, estendida sobre a mesa, e replicou, confortando-o:
— Não precisa se desculpar. Entendo o que sente. É difícil olhar para trás e
ver que se perdeu tudo, que vai ser necessário começar da estaca zero. Se ao menos
conseguisse entender a razão do atentado. Tem certeza de que não tem inimigos
perseguindo-o?
— Não. E por que a explosão teria algo que ver comigo?
— E com quem mais? A bomba foi colocada no nosso andar. Pretendiam atingir
um de nós dois. Por acaso ofendeu alguém durante seu trabalho de pesquisa? Onde
estava antes de vir para a Virgínia?
Por instantes, Joel chegou a pensar em seu último serviço, descartando-o,
porém, quase de imediato. Sabia contra quem fora o atentado, apenas não poderia
esclarecer Melissa sobre o assunto. Na realidade algumas vezes as exigências do
governo quanto à questão do sigilo lhe pareciam inteiramente absurdas. Seria muito
mais simples, naquele caso, se pudesse dizer a verdade.
Não tinha outra saída senão mentir outra vez.
— No Sul do Texas.
De fato, ele chegara de avião a Brownsville, via México, após ter saído
clandestinamente da América Central.
— E não se lembra de ninguém que tenha ficado ofendido com seu trabalho?
— Realmente não — ele replicou, embora não pudesse deixar de pensar em
algumas pessoas que não o apreciavam nem um pouco.
Ela pareceu desapontada.
— E quanto a você? Não tem inimigos? — ele perguntou, tentando deixar de
ser o centro do assunto.
Melissa deu uma sonora gargalhada, que repercutiu a sua volta.
— Creio que não — ela respondeu, por fim. — Minha vida e meu trabalho são
tão comuns!
— Nunca me disse o que faz exatamente — ele continuou.
— É sigiloso — ela disse, com um sorriso.
— Não brinque. Trabalha para o governo?
— Não. É uma empresa particular. Mas você sabe como o setor é competitivo,
cheio de espiões industriais. Aliás — ela o olhou com fingida suspeita — , você bem

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podia ser um desses espiões tentando ganhar minha confiança para arrancar alguns
segredos.
Ele riu.
— E como vou indo?
— Melhor tentar outra linha de ação. Não me parece do tipo que guarda
profundos segredos. Ao contrário, você se me afigura alguém até fácil de ler.
Ele se recostou na cadeira e a desafiou:
— Certo. Então, leia-me.
Ela ficou séria por instantes, olhando-o fixamente, e depois prosseguiu:
— Está bem. Você não gosta de trabalhar para os outros, pois não acata ordens
com civilidade. Tem um imenso desejo de ser independente, abominando a rotina.
Entedia-se com facilidade, em razão de sua inteligência e da forte necessidade de ser
continuamente estimulado do ponto de vista intelectual.
Joel se empertigou abruptamente, sentindo-se tal qual se sentira por ocasião
da leitura do horóscopo sobre o homem de Gêmeos. Ressentiu-se com o fato de que ela
pudesse descrevê-lo de forma tão acurada.
— Quem é você, alguma espécie de feiticeira? — ele perguntou, tomando um
gole do copo de rum para relaxar. — Parece uma daquelas astrólogas.
Ela riu, tocando-lhe a mão novamente e, com voz solene indagou:
— Qual é seu signo, senhor?
— Diga-me o seu primeiro.
— Libra — ela respondeu de imediato.
— O meu parece ser Gêmeos.
— Ah, ah, um homem de Gêmeos.
— Ela exclamou, voltando a ficar séria em seguida. — E eu, sou fácil de ler?
— Talvez.
— Então, quero ver — ela o desafiou também, embora seus olhos revelassem
certa temeridade.
Ele ficou quieto por um momento, fitando-a sem pestanejar. E aí iniciou sua
análise numa voz grave.
— Você fica corada nos momentos mais inesperados, como agora, fazendo-me
pensar no que se passa nessa cabecinha.
Joel se interrompeu, erguendo uma das sobrancelhas, e depois, interrogou:
— Posso continuar?
Ela balançou a cabeça concordando, embora suas faces estivessem realmente
rosadas.
— Bem, vejamos. Você é muito dedicada a seu trabalho, sai pouco e aprecia

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ficar sozinha. Tem as pernas mais incríveis que já vi, olhos que perseguem meu sono,
um sorriso que me derrete o coração e lábios que me fazem querer entrar em sérios
problemas.
Melissa ficou que nem pimentão.
— Não está sendo muito pessoal?
— Você também foi.
— Não fiz comentários sobre sua aparência física e o efeito me que causa.
— Sinta-se à vontade para fazê-lo — ele fez um movimento convidativo com a
mão. — Não se incomode de ficar ainda mais vermelha. Estou acostumado com suas
mudanças de cor. De fato, considero-as uma de suas características mais charmosas.
Ela não respondeu, mas Joel estava empenhado em ouvir a impressão de
Melissa a seu respeito. Com um gesto de mão, chamou o garçom para que lhes servisse
outra rodada do drinque da casa, uma especialidade da ilha de considerável dosagem
alcoólica, bem como algo para comer.
Durante a refeição, regada a generosas doses da bebida forte, a cientista
acabou tomando coragem para revelar a "leitura" do amigo. Falando numa voz baixa e
apressada, como se para evitar perder a coragem de dizer o que tinha em mente, ela
começou:
— Você tem um jeito de caminhar macio e silencioso, como um felino acuando a
presa. Quando se aproxima de mim, sinto como se não pudesse mover-me e fico apenas
aguardando o que vai fazer.
Fez uma pausa, tomou outro gole da bebida e continuou:
— Você tem um ar autoconfiante que me intriga e me atrai. Considero-o um dos
homens mais atraentes que já conheci e me sinto uma desajeitada adolescente com o
primeiro namorado.
À medida que Melissa ia fazendo a "leitura", Joel foi se sentindo mais e mais
excitado. Quando ela terminou, apressou-se a sacar a carteira, jogar algumas notas
sobre a mesa e preparar-se para deixar o local, segurando a cientista pela mão e
dizendo:
— Precisamos sair daqui, senão vou cometer uma loucura!

CAPÍTULO VII

Minutos mais tarde, após deixarem o restaurante, passeando pelo porto, com
uma brisa suave lhe refrescando o rosto e as idéias, Joel ainda se encontrava perplexo
com a honestidade de Melissa e sua conseqüente vulnerabilidade.

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Poderia feri-la facilmente, embora isto fosse a última coisa que desejasse.
Conveniente ou não, ético ou não, o fato é que estava apaixonado pela dra. Melissa
Jordan e não podia mais escondê-lo.
Alcançando o fim da plataforma, desceram a escada em direção à praia, à luz
das estréias.
— Melissa — Joel exclamou, aproximando-se da cientista.
— Sim! — ela respondeu, parando para encará-lo.
Ele se voltou e a tomou nos braços, sentindo-lhe o coração bater apressado.
— Melissa, menti para você.
— O que quer dizer?
— Lembra-se de quando nos vimos a primeira vez e lhe disse que gostaria de
ser seu amigo?
Ela concordou, com um aceno de cabeça.
— Bem, eu quero mais do que isso — ele afirmou, com voz emocionada,
tomando-lhe o rosto entre as mãos. — Sei que é muito cedo, que acabamos de nos
conhecer... Mas pense no assunto nos próximos dias. Quero você em meu futuro.
Inclinando-se, Joel a beijou ternamente e acrescentou:
— Nunca me deixe. Não sei se conseguiria viver sem você. Em seguida, beijou-a
novamente, selando o que acabara de dizer e sentindo o corpo trêmulo, como se seu
coração estivesse nas mãos de Melissa e não soubesse onde ela o guardaria.
Abraçando-o pela cintura, a cientista retribuiu-lhe o beijo de forma ardente,
respondendo com a linguagem do corpo o que não dissera com palavras.
Quando Melissa abriu os olhos na manhã seguinte, o sol já estava alto no céu.
Ela suspirou e se espreguiçou, recordando a noite anterior.
Sem dúvida, aprendera quanto Joel Kramer era cavalheiro. Embora houvesse
respondido positivamente às suas declarações, ele não procurara tirar partido da
situação para forçá-la a uma maior intimidade.
Na verdade, sentira-se até um pouco desapontada com tanta cortesia. Ele a
atraía, e o sentimento era recíproco. Na realidade, desde que o conhecera vinha
tentando, em vão, descobrir uma forma de entender suas reações em relação àquele
homem. Passara a vida com a cabeça enterrada nos livros, onde era mais simples
encontrar respostas. Na atual situação, entretanto, tudo era completamente
diferente.
Só lhe restava relaxar e apreciar a companhia de Joel, sem expectativas
quanto ao resultado do namoro. O tempo e o paraíso tropical onde estavam haveriam
de ajudar na concretização de seus sonhos.
— Bom dia! — ele exclamou, interrompendo-lhe os pensamentos, vindo da

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entrada da porta com duas xícaras nas mãos.
Melissa se apoiou em um dos cotovelos, lutando contra o impulso de agarrar o
lençol e puxá-lo até o pescoço. Queria parecer à vontade perto dele.
— Bom dia. Parece que dormi demais outra vez.
Ele riu, avançando quarto adentro e, ao aproximar-se dela, passou-lhe o café.
— É para tal que são as férias. Para descansar, esquecer os horários, as
obrigações. Além do mais também só acordei há pouco e, diga-se de passagem, com
uma enorme dor de cabeça.
Acho que tomamos rum demais ontem à noite. Não ficou de ressaca? Melissa
bebericou o café e respondeu:
— Creio que sim. Minha cabeça está martelando. Mas fora isso, você dormiu
bem?
Ele desviou o olhar e declarou:
— O bastante. O que gostaria de fazer hoje?
— Nadar e tomar banho de sol.
— Ótima idéia — ele concordou sorrindo, apontando depois para a cozinha com
um gesto de cabeça. — O motorista de táxi me recomendou uma mulher que mora aqui
perto para cozinhar pratos típicos para nós. Ela está agora na cozinha, preparando um
belo desjejum.
— Com essa ressaca, no momento o café me basta. Quem sabe depois de um
bom banho eu consiga ingerir algo mais consistente.
Joel se voltou e começou a caminhar na direção da porta. Então, interrompeu o
passo e, olhando para Melissa, sussurrou:
— Agradeça a Karen por haver nos emprestado a casa. É ótimo poder sair da
rotina de vez em quando.
— Eu lhe agradecerei, assim como agradeço a você a brilhante idéia dessas
férias. Sinto-me uma nova pessoa. Realmente, creio que você é um especialista na arte
do espairecimento. Talvez porque seja escritor.
— Talvez — ele respondeu, apressando-se a sair do quarto, para evitar outras
colocações naquela linha.
A demora em receber notícias de Max que lhe possibilitassem contar toda a
verdade a Melissa angustiava-o. Ligara para o chefe de um telefone público, e ele lhe
dissera que em mais um par de dias teria o caso solucionado.
O remédio era, mais uma vez, aguardar o desfecho do caso e, enquanto isso,
evitar maiores intimidades com Melissa.
Não queria estragar o futuro que planejava para os dois, arriscando-se a ser
mal interpretado. Não queria dar a impressão de estar tirando vantagem da situação.

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Preferia esperar e continuar passando noites em claro, sabendo que ela estava no
quarto ao lado, talvez ansiosa para recebê-lo.
Determinado, Joel retornou à cozinha, onde a mulher preparava vários pratos,
para que pudessem comer quando desejasse. Ao vê-lo, ela sorriu e perguntou:
— Sua esposa já levantou?
— Sim — ele respondeu, rindo da suposição da cozinheira —, mas não está
muito disposta no momento. Comerá mais tarde.
A mulher também apenas sorriu em resposta, um sorriso de quem imaginara
uma esposa bem-amada relutante em deixar a cama que acabara de partilhar com o
marido.
O pensamento o perturbou a tal ponto que quase o fez gemer alto. Olhando
pela janela, ansiou por banhar-se nas águas do mar, como um calmante para o presente
estado de nervos que ameaçava permanecer ainda por um bom tempo.
Melissa pedira a Joel para ir na frente, repentinamente envergonhada do
minúsculo biquíni que escolhera durante as compras. Agora, com o corpo coberto por
uma saída-de-praia, vasculhava a redondeza à procura do agente. Para seu alívio,
encontrou-o nadando em direção a um dos recifes que ponteavam a enseada.
Sabia que precisava livrar-se daquela timidez ridícula, porém não atinava como.
O fato é que nunca tivera um relacionamento com um homem, ou melhor, nunca como
com Joel. Ele parecia inconsciente do poder de seus carinhos sobre ela. Levara horas
para pegar no sono na noite anterior,' tentando acalmar a excitação causada pela
simples presença dele.
De qualquer modo, estava decidida a não bancar a- caipira. Apertando o passo
em direção à praia, tirou a saída e a jogou ao lado da toalha, que estendera na areia.
Em seguida, de queixo erguido, rumou para o mar.
As ondas lhe batiam no corpo, e uma repentina sensação de euforia a fez
correr quanto pôde e, por fim, mergulhar na última onda preguiçosa que se aproximava
da praia.
Quando emergiu, estava quase sem fôlego, mas sorridente.
Como não descobrira antes aquilo que a vida tinha para oferecer fora das
paredes do laboratório? A água e o sol lhe acariciando a pele, e o perfume de
folhagens e flores tropicais, o sabor das frutas nativas, tudo era tão prazeroso!
Nadando um pouco mais para o fundo, virou de costas e ficou boiando ao sabor
das ondas, o corpo coberto de óleo agradecendo os beijos do sol.
De repente, entretanto, algo a cutucou no calcanhar e num segundo a
submergiu. Em pânico, lutou com todas as forças, até que se viu içada para a superfície
pelos braços fortes de Joel, com o rosto quase colado ao dele.

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— Quase me mata de susto! — ela exclamou, arfante.
— Pensei que tinha me visto nadando em sua direção — ele explicou,
abraçando-a pela cintura, as pernas entrelaçadas nas dela. — Está bem agora?
— Sim — ela respondeu, procurando afastar-se daquele contato tão íntimo e
excitante. — Estava muito distraída. Só isso.
— Vamos de novo para a praia, então?
Ela concordou com um aceno de cabeça, nadando de volta à praia, com Joel a
acompanhá-la, lamentando a poderosa atração que o homem exercia sobre ela,
principalmente porque ele nem parecia percebê-la como membro do sexo oposto.
Ao se aproximar da toalha que deixara na areia, todavia, já se achava mais
calma, embora hesitasse em se manter só de biquíni. De qualquer maneira, queria
adquirir um tom trigueiro e, portanto, precisava vencer a timidez. Vasculhando a bolsa
à procura de bronzeador, encontrou-o e, com movimentos vigorosos, espalhou-o por
todo o corpo.
— Precisa de ajuda? — indagou Joel, que estendera sua toalha perto da dela.
— As costas não foram atingidas pelo bronzeador. Deite-se e eu o passo em você.
.
Ela se virou de bruços, entregou-lhe a loção e fechou os olhos.
Com movimentos cuidadosos, ele cobriu toda a parte não atingida, devolvendo o
bronzeador em seguida. Em nenhum momento dera a impressão de que estava fazendo
algo que não fosse ajudar uma amiga.
Depois de recolocar a tampa do bronzeador, ela se acomodou ao lado dele.
— Melissa — ele a chamou, com voz preguiçosa — fale-me de sua infância, do
que fazia para se divertir.
Ela fechou os olhos e deixou o pensamento vagar pelo passado, respondendo:
— Creio que não tive uma infância no sentido comum do termo. Fui uma
surpresa para meus pais, que, como em tudo o mais, aceitaram a tarefa de me criar
como algo necessário e, conseqüentemente, para ser feito da melhor maneira possível.
— Por isso foi filha única?
— Sem dúvida. Eles obviamente aprendiam com os próprios erros.
— E eles a viam como um erro?
Ela meditou por instantes e respondeu:
— Nunca disseram nada nesse sentido, mas sempre senti dessa maneira, pela
impaciência com que encaravam qualquer atraso na execução de seus pedidos.
— Por isso diz que não teve infância? Nunca teve chance de brincar?
— Não me recordo exatamente. Comecei a ler e a freqüentar a escola muito
cedo, como forma de obter aprovação de meus pais. Creio que não pensava em brincar.

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— Eles nunca te trouxeram à praia?
— Algumas vezes, porém não me permitiam brincar na areia ou no mar. Eram
rígidos quanto à limpeza.
— Mencionou certa vez que não teve amigos na infância. Não sentia falta de
ter alguém com quem partilhar coisas?
— Ninguém parecia interessado em ser amigo do que chamavam um "cérebro".
— A não ser seus pais, talvez.
Ela riu.
— Naturalmente. Havia discussões quase diárias à mesa do jantar sobre os
livros que eu lera ou o que aprendera durante o dia.
— Que estimulante! — Joel fez uma careta. Melissa deu uma gargalhada.
— Precisa entender que eu realmente não me ressentia com a atitude deles,
pois não conhecia outro tipo de mundo. Crianças são muito flexíveis e, na verdade, foi
uma graça possuir pais que incentivavam minha curiosidade, encorajando-me.
— Mas eles não lhe ensinaram a brincar.
— Não, não fazia parte do currículo.
Joel se calou por uns instantes, depois recomeçou a entrevista.
— Não disse que conheceu Karen na faculdade?
— Sim. Foi minha primeira e mais íntima amiga, embora bem mais velha que eu.
Ensinou-me tudo que sei a respeito de homens.
Joel mudou de posição na toalha, aproximando-se mais de Melissa.
— Verdade?
Ela riu com expressão maliciosa nos olhos e declarou:
— Karen costumava voltar ao dormitório depois de um encontro e contar-me
aonde havia ido, o que os caras haviam tentado fazer com ela. Você sabe.
Joel arregalou os olhos ligeiramente.
— Não sei, pois não completei a faculdade.
— Ora, as coisas que todos os caras tentam.
— Como esta, por exemplo? — ele interrogou, acariciando-lhe a cintura.
Melissa sentiu um calafrio no estômago.
— Esta pode bem ter sido uma dessas coisas.
— E ela lhe disse o que fazer quando um rapaz se comporta assim, de maneira
tão repreensível?
— Está me gozando.
— Sim, um pouco, porque é uma pessoa muito contraditória. É tão inteligente,
tão eminente em seu campo de trabalho, mas age como se eu fosse te atacar cada vez
que me aproximo. Fica sempre tão nervosa com todos os homens ou apenas comigo?

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— Você não me deixa nervosa — ela replicou, em tom de desafio.
Ele moveu o braço de modo que um dos seios ficasse na palma da mão.
— Tem certeza? Então, por que seu coração está batendo tão depressa?
Ela fechou os olhos, refletindo que não deveria deixá-lo perceber quanto o
queria.
— Você me surpreendeu. É só.
— Não me espanta. Deve estar imaginando todos os diabólicos esquemas que
montei para tê-la aqui sozinha.
— Duvido que qualquer um dos seus planos possa ser diabólico.
Ele se aproximou ainda mais, os lábios bem rentes aos dela.
— Contudo não tem certeza absoluta, não é? Ela piscou.
— Não.
— Então, está consciente de que eu poderia tirar vantagem de sua ingenuidade,
não?
Antes que ela pudesse responder, porém, Joel a beijou com intensidade,
fazendo-lhe todo o corpo estremecer. Tocando o ombro do agente, Melissa deslizou-
lhe os dedos pelos músculos do braço, sentindo o coração batendo mais e mais
descompassado. Amedrontada com aquela forte atração, voltou-lhe o rosto.
Ele, entretanto, manteve uma mão sobre seu seio, fazendo a região arder como
se estivesse febril, enquanto com a outra segurava-lhe o queixo e, gentilmente, girava-
lhe a cabeça, de modo que a encarasse de novo.
— Pode confiar em mim, Melissa. Precisa acreditar nisso.
— Venho tentando. Você é o primeiro homem com quem fico tanto tempo, sem
ser por motivo de trabalho. Sempre fui tão desajeitada em relacionamentos sociais!
Mas você tem o dom de me deixar esquecer minha falta de habilidade para essas si-
tuações.
— Melissa, não há nada errado com você. Precisa apagar essa falsa imagem que
fez de si mesma. É calorosa, afável e... — Ele a beijou novamente. — Sempre serei
grato ao destino por tê-la colocado em meu caminho.
Mesmo?
Joel concordou com um aceno de cabeça.
Ela lhe tocou a face.
— Sinto-me da mesma forma em relação a você.
Olhos nos olhos, os dois enamorados se deixaram ficar nas toalhas, em silêncio
por um bom tempo, rompido apenas pela ousada iniciativa de Melissa de voltar a beijar
Joel.
Ele refletiu que sua vontade de ferro nunca fora testada de tal forma, pois só

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mesmo esta vontade conseguia impedi-lo de fazer amor com Melissa naquele exato
momento.

CAPÍTULO VIII

— Ela está ficando impaciente para voltar? — indagou Max.


— Não disse nada nesse sentido — explicou Joel, que aproveitara enquanto
Melissa fora comprar lembranças para os colegas de trabalho para ligar para o chefe.
— Venho mantendo-a bem ocupada, com aulas de mergulho, passeios de barco e carro
pela ilha.
— E quanto ao trabalho? Falou quando precisará retornar ao emprego?
— Ligou para o serviço ontem, mas recebeu informações de que ainda há
problemas a serem solucionados, antes de o prédio poder reabrir. Pretende telefonar
amanhã novamente.
— Então, tudo me parece sob controle.
— E quanto a Feldman? Está bem? Tem perguntado por Melissa?
— Sim, está praticamente recuperado e vem trabalhando todo o tempo. Ficou
preocupado com o atentado, porém se acalmou quando lhe disse onde Melissa se
encontra e com quem.
— É, o atentado também mudou meus planos. De qualquer maneira estou
preocupado com a demora da solução desse caso. Em nossa última conversa, você disse
que tudo estaria resolvido em questão de dias. Isso já foi há uma semana.
— Estamos fazendo todo o possível para encontrar uma solução, mas, em
situações como essa, os prazos não podem ser rígidos.
— De um dos donos de um restaurante local consegui que concordasse em
anotar recados para mim. Assim que tiver uma resposta positiva, avise-me, por favor.
— Sabe, Kramer, estou começando a ficar preocupado com você. Descansando
numa ilha tropical, ao lado de uma linda mulher, e só pensa em terminar o serviço!
— Você deve saber quanto sou dedicado ao trabalho — respondeu Joel, com
voz arrastada, tentando desconversar. Obviamente seu interesse, quanto ao final do
trabalho, era no sentido de pode revelar-se a Melissa e pedi-la em casamento.
Max riu.
— "A inatividade está te incomodando.
— Digamos que ando cansado da profissão de escritor.
— Trate apenas de manter a dra. Jordan feliz, certo?
— Estou fazendo tudo o que posso. Agora, deixe-me desligar. A gente se fala

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depois.
Joel desligou. O sentimento de frustração que o vinha acompanhando desde o
reconhecimento da paixão pela cientista vinha aumentando cada vez mais.
Não gostava de trair a confiança de Melissa. Sentia-a como uma flor delicada,
a quem podia destruir facilmente. Ela acreditava na bondade inerente a todo o ser
humano, e ele não queria desfazer-lhe essa ilusão. Pretendia continuar a protegê-la
dos aspectos mais duros da vida.
— Joel!
Ele se voltou e fitou Melissa, que segurava uma imensa sacola.
— Parece que decidiu comprar a loja inteira! Ela riu.
— Quase. Obrigada pelo empréstimo.
— Não há de quê. Ela olhou o relógio.
— Se vamos mergulhar hoje, é melhor voltarmos agora.
— Tem razão.
Eles sorriram um para o outro, e Joel pegou a mão de Melissa e a guiou até o
carro. Durante a corrida de volta ao chalé, ela interrogou:
— Anda preocupado por não estar escrevendo?
— Por que pergunta?
— Ouvi seus passos ontem à noite para cima e para baixo no quarto e, depois,
observei-o andando pela praia.
Ele a olhou, pensativo, e indagou:
— Por que não se juntou a mim?
— Achei que queria ficar sozinho.
Sem saber o que dizer, pois de fato sua insônia tinha como causa principal a
própria Melissa, o agente preferiu ficar em silêncio, provocando outra pergunta da
cientista.
— Não quer voltar para casa?
Enquanto estacionava o carro, ele respondeu:
— É o que quer?
— Creio que é o que você quer fazer. Joel sorriu brincando.
— Julga mesmo que eu preferia estar escrevendo um manuscrito, num inverno
tenebroso, a andar nadando e tomando sol numa ilha tropical?
Ele saiu do carro, contornou-o e abriu a porta para Melissa.
— Agora, se está ficando entediada...
— Não é isso — Melissa respondeu, consciente de que Joel não estava sendo
completamente honesto com ela. Suas noites mal-dormidas demonstravam que ele não
vinha se divertindo tanto quanto dizia, mesmo com as incessantes atividades diárias.

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Na realidade, era impressionante como ele ainda tinha energia para
caminhadas noturnas, após dias tão agitados.
Ela mesma algumas vezes chegava a ansiar pela letargia do laboratório, apesar
dos imensos benefícios que aquela temporada vinha lhe trazendo para o corpo e o
espírito.
A despeito da tez bronzeada, do cabelo clareado pela luz do sol, dos músculos
mais firmes pelos constantes exercícios, Melissa não se sentia inteiramente feliz,
porque acreditava que Joel começara a se cansar dela.
O pior é que a recíproca não era verdadeira. Quanto mais convivia com o
agente, mais queria estar perto dele. Naquele momento, já não conseguia ocultar de si
mesma que estava apaixonada por Joel Kramer.
Este, porém, embora continuasse a beijá-la e a tocá-la, não fazia nenhuma
outra tentativa de aumentar a intimidade entre os dois. Era como se pretendesse
enlouquecê-la. Dia após dia carícias e mais carícias, mas à noite cada um seguia para os
respectivos quartos.
— Eu te encontro na praia em quinze minutos — ele disse, assim que entraram
na casa.
Melissa foi para o quarto, onde, após guardar as compras da manhã, trocou de
roupa, colocando o biquíni sumário, do qual não mais se envergonhava.
Ao chegar à praia, encontrou Joel próximo à água, o equipamento de mergulho
nos pés. Sua pele bronzeada e os músculos bem delineados fizeram Melissa ter
vontade de deslizar-lhe a mão pelo peito musculoso, seguindo o caminho dos pêlos
encaracolados, que se estendiam até o abdome. Por sorte, ela usava óculos escuros, o
que o impedia de ver-lhe o brilho malicioso nos olhos.
— Pronta? — ele perguntou, com um sorriso.
Ela concordou com um gesto de cabeça, temerosa de que sua voz lhe traísse os
sentimentos.
Joel se ajoelhou para colocar-lhe as nadadeiras, enquanto lhe passava a
máscara e os óculos de mergulho.
— Lá vou eu — ela disse, acenando para o agente e rumando para a água.
Após colocar os apetrechos, ele a seguiu, e juntos passaram a tarde
explorando o recife e as milhares de espécimes que o habitavam. Joel já confiava nas
habilidades aquáticas que Melissa adquirira nos exercícios de mergulho, mas, por
segurança, nunca a deixava fora de alcance da vista.
Tal cuidado, entretanto, não foi o bastante para impedir que uma cobra,
surgida em meio aos corais, a picasse. Tentou alertá-la, nadando rapidamente em sua
direção para tentar evitar o bote, porém foi em vão. Ao aproximar-se dela, Melissa já

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se dobrava e começava a afundar.
Bem treinado nas selvas da América Central, Joel sabia que em poucos minutos
o veneno do ofídio atingiria a corrente sangüínea da cientista, tornando mínimas suas
chances de sobrevivência.
Em desespero, nadou até a praia, arrastando-a pelo pescoço, enquanto também
cuidava de manter-lhe a cabeça fora da água. Chegando a terra firme, arrancou as
nadadeiras e, com Melissa segura nos braços, correu para casa. No caminho, ainda
conseguiu arrancar-lhe a máscara para facilitar a respiração. O rosto da moça estava
lívido, apesar do bronzeado.
Entrando em casa, levou Melissa direto para o quarto, colocando-a na cama. Em
seguida, rumou às carreiras para a cozinha, onde, após apanhar uma faca, esterilizou-a
no fogo e dirigiu-se imediatamente para o quarto.
Lá chegando, tirou a parte de baixo do biquíni da doutora e localizou a picada
da cobra no alto de sua coxa, próximo à virilha. Então fez um X sobre o ferimento já
bastante avermelhado, e iniciou um movimento de sucção do veneno com a boca, que
durou vários minutos.
Quando finalmente parou, rezando para que tivesse agido a tempo, ela
começou a tremer com o choque e os calafrios. Ele lhe aplicou uma cataplasma na
ferida, embrulhou-a nos cobertores e aguardou, segurando-lhe uma das mãos, que o
pior passasse.
Após algum tempo, Melissa recobrou a consciência, mas estava febril e com
dificuldade para distinguir os objetos.
— Joel? O que houve? — ela perguntou.
— Foi picada por uma cobra venenosa, porém ficará boa. Ela fechou os olhos.
— Só me recordo de estar nadando e, subitamente, de ter sentido uma dor
terrível e... Sinto-me tão estranha.
— Você vai ficar boa — ele assegurou, embora não estivesse tão certo disso. —
A cataplasma vai tirar o resto do veneno que eu não pude sugar, mas, infelizmente,
você terá de suportar alguns incômodos.
Com dificuldade para engolir, Melissa sussurrou:
— Que bom que sabe tratar desses casos! Enxugando-lhe o suor do rosto, ele a
aconselhou:
— Tente descansar, certo?
— Eu poderia ter morrido afogada. Você está sempre me salvando — ela disse,
com um meio sorriso entre os lábios pálidos.
— Sabe que jamais deixaria lhe suceder alguma coisa de mal. Agora durma.
Ela obedeceu, embora não conseguisse o merecido descanso. Passou as horas

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seguintes lutando contra os efeitos do veneno, com febre e calafrio, debatendo-se na
cama e resistindo às tentativas de Joel de ministrar-lhe líquidos.
Chegou um ponto em que ele teve de deitar-se ao lado dela e prendê-la junto
ao corpo, para que se aquietasse. Ao proceder assim, ele acabou por adormecer,
acordando mais tarde ao ouvi-la delirando de febre e tentando arrancar as cobertas.
— Mas não entende? — ela dizia numa voz arrastada. — Eu o amo e não sei o
que fazer.
Joel, que voltara a enxugar-lhe o suor do rosto sentiu aquelas palavras como
um golpe no estômago. Ela estava apaixonada por alguém? Por que nunca havia falado
no assunto? Pensara que sabia tudo a respeito da cientista, porém ela parecia haver
lhe escondido o mais importante.
— Ele me beija e me abraça... — ela continuou, em tom lamurioso —, contudo,
depois vai embora. Talvez só queira ser meu amigo... Mas eu o amo.
Joel compreendeu que ela se referia a ele mesmo e soltou o ar, preso nos
pulmões desde o início dos delírios. Um imenso alívio tomou conta do seu corpo, e ele
relaxou os músculos tensos.
Continuou Joel a banhá-la, num esforço para reduzir-lhe a febre e a agitação.
Ela sacudia a cabeça, os braços e as pernas, só se acalmando quando ele lhe falava e
aplicava o pano úmido no corpo.
Enquanto a observava e sentia-lhe a pele de seda sob os dedos, o agente
refletiu que poderia havê-la perdido antes de amá-la. Agora que sabia dos sentimentos
da moça por ele, não via mais por que esperar que o caso do atentado se resolvesse pa-
ra possuí-la.
Amava-a, desejava-a e acreditava que ela o compreenderia inteiramente,
quando lhe dissesse a verdade. Então, por que esperar pelo fim nebuloso daquele
serviço para poder amá-la? Quando Melissa estivesse bem novamente, tudo seria
diferente.
E ela precisava ficar bem. Q medo de perdê-la o afetava mais do que o sentido
quando fora trazido da América Central, no ano anterior, quase sem vida.
Fachos de luz começaram a entrar no quarto, e Joel percebeu que estava
começando a amanhecer. Inclinando-se para apagar a luz do abajur, ao lado da cama de
Melissa, notou que ela respirava de forma méis regular. Tocando-lhe a testa, percebeu
que a febre cedera.
Com lágrimas nos olhos, que a custo conseguiu conter, foi ao outro quarto da
casa, à procura de lençóis limpos. De volta, cuidadosamente trocou a roupa de cama da
cientista, sem acordá-la.
Finda essa tarefa, rumou para seu quarto e só teve forças para tirar os

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sapatos, antes de cair num sono profundo.
— Tome isto para a dor. Vai ajudar — disse Joel a Melissa, horas mais tarde,
erguendo-a pelos ombros.
Uma persistente enxaqueca martelava a cabeça da doutora, num ritmo
constante.
— Abra a boca — ele ordenou, colocando-lhe um comprimido na boca e
fazendo-a engolir vários goles de água.
Para sua boca ressecada, aquilo pareceu um néctar dos deuses.
— Obrigada — ela murmurou.
Joel a recostou na cama de novo, acrescentando outro travesseiro ao já
existente.
— Acha que consegue comer alguma coisa?
— Creio que sim — ela respondeu, tentando acostumar os olhos à claridade do
quarto. — Desculpe estar lhe causando tanto incômodo.
Quando, por fim, conseguiu enxergar direito, ficou impressionada com a
aparência do agente, a vista vermelha com olheiras profundas, a barba por fazer.
— Fico feliz por vê-la desperta e consciente. Admito, entretanto, que me
deixou um bocado preocupado esta noite.
Melissa tocou a cabeça, esfregando as têmporas, e percebeu que, quando se
movia, a enxaqueca piorava.
— O comprimido vai fazer efeito em minutos — ele a acalmou, caminhando em
direção à porta.
— Joel!
Ele voltou o rosto para encará-la.
— Sim!
—- Obrigada.
— Disponha — ele respondeu, com um sorriso que fez o coração de Melissa
bater mais forte.
Ao ver-se sozinha, percebeu, pela primeira vez, que estava nua. Afastando os
lençóis, observou onde a cataplasma fora colocada e enrubesceu. Agora não tinha mais
segredos a esconder daquele homem.
Apesar da terrível dor de cabeça e da sensação de fraqueza, decidiu levantar-
se, pois precisava ir ao banheiro e não queria que ele a ajudasse também nisso.
Apoiando-se nos móveis, alcançou o toalete. Ao olhar-se no espelho, levou um
susto. Com profundas olheiras e o cabelo desgrenhado, não parecia nada glamourosa.
Após usar o banheiro, concluiu que o programa do dia seria realmente
permanecer na cama, tentando recuperar-se daquele estado lamentável. Apoiando-se

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outra vez nos móveis, alcançou o armário, de onde tirou uma camisola e rumou para a
cama, sendo, todavia, interrompida pela voz alterada de Joel, que quase a fez cair de
susto. Na verdade, se ele não a tivesse segurado, era o que ocorreria.
— Que está fazendo?!
— Tinha de ir ao banheiro — ela resmungou, enquanto ele a ajudava a deitar-se
de novo.
— Por que não me chamou?
— Não queria incomodá-lo.
Ele sacudiu a cabeça e, em seguida, voltou-se para pegar a tigela de flocos de
milho com leite que trouxera, passando-a para ela.
— Quase me fez derrubar tudo.
Dito isso, saiu do quarto, deixando-a meio constrangida por tê-lo desagradado,
depois de haver sido tão prestativo.
Ao terminar de comer, contudo, Melissa percebeu que não conseguiria ficar
muito mais tempo acordada. Quando Joel voltou, um pouco mais tarde, para verificar
se precisava de algo, ela nem lhe notou a presença.
Em pé ao lado da cama, ele, porém percebeu que havia alguma coisa diferente
na cientista, além da volta de um pouco da cor do rosto. Tratava-se da camisola. Ao
percebê-la, sorriu divertido, imaginando como não havia sido a reação dela ao perceber
que a despira. Prometeu se lembrar do fato posteriormente, para provocá-la.
Agora precisava planejar como a pediria em casamento. A experiência de quase
perdê-la para uma fatalidade do destino o fizera entender quanto a queria. Não podia
correr o risco de vê-la afastar-se dele por alguma razão.
Iria pedi-la em casamento assim que estivesse recuperada, mas saberia
escolher o momento certo para fazê-lo. Não queria que Melissa se sentisse
pressionada nem que tivesse a sensação de ele estar tirando partido da situação.
Enquanto isso, continuaria com os banhos frios e os exercícios diários, não só
para esquecer o desejo de amá-la, como também para acalmar o nervosismo de não
saber se sua proposta seria aceita ou não.

CAPÍTULO IX

Três dias se passaram para Melissa recuperar-se por completo. Sentada na


toalha, próxima ao mar, observava Joel nadar em sua direção.
Incrível como não cansava de apreciá-lo, de admirá-lo. Ele vinha sendo
maravilhoso com ela nos últimos dias, cuidando que se sentisse confortável todo o

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tempo, tornando-a ainda mais apaixonada. Todavia, além dessas manifestações de
amizade, o agente não se declarava de forma alguma.
Saindo da água, Joel caminhou a passos largos para onde ela se achava
movendo-se com a leveza costumeira. Ao encontrá-la, abriu um sorriso largo, cuja
brancura contrastava com o bronzeado da pele.
— Está se parecendo com você mesma novamente — ele declarou, deitando-se
a seu lado na outra toalha disponível.
— Não acho. Creio que ainda posso fazer concorrência com Matusalém.
Ele deu uma risada.
— Depois do que passou, ninguém fica parecendo uma estrela de cinema. — Ele
lhe puxou a trança. — Como conseguiu desembaraçar o cabelo?
— Nem sei. Confesso-lhe que fiquei seriamente tentada a cortá-lo, mas não
descobri nada apropriado para tal.
— Que bom! — ele exclamou, rindo. — Seu cabelo é tão bonito!
— Um pouco fora de moda. Nunca tive tempo para acompanhar os modelos em
voga.
— Sabe, Melissa — ele começou a mudar de assunto, ainda lhe segurando a
trança entre os dedos —, estive pensando que este lugar é ótimo para uma lua-de-mel.
Embora seu tom de voz fosse sério, Joel não ousava fitar Melissa, que, por sua
vez, confusa, ficou aguardando uma explicação para o comentário.
Quando seus olhos finalmente se cruzaram, entretanto, foi ela que acabou
perguntando, curiosa com a estranha fisionomia do rosto dele.
— O que está tentando dizer?
— Que quero casar com você.
Melissa o olhou, incrédula, imaginando se ainda não estava sob efeito de algum
delírio remanescente.
— Você disse que quer... casar comigo?
Ele pegou um punhado de areia e o observou desaparecer-lhe entre os dedos,
enquanto murmurava com voz rouca:
— Sim.
Embora pelo jeito que beijava e acariciava ninguém pudesse atribuir-lhe
timidez, naquele momento Joel Kramer não conseguia olhar Melissa nos olhos.
Ela, por sua vez, perplexa com a proposta de casamento, passou a ver o
comportamento recente do amigo de um outro ponto de vista. Pensara que ele andava
cansado da companhia, mas seu problema, como o dela, talvez fosse simplesmente
frustração por não poder dar vazão aos impulsos que o empurravam para ela, por
temer ser mal interpretado.

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Isso significava que ele queria algo além de um caso com ela. Significava que
estava lhe oferecendo a oportunidade de partilharem a vida juntos, oferta
naturalmente irrecusável.
Quando por fim conseguiu responder, sua voz estava trêmula.
— Quer dizer que quer se casar aqui mesmo na ilha? Ele pegou mais um
punhado de areia e o observou dissolver-se entre os dedos.
— Talvez prefira um grande casamento, com os amigos por perto...
— Joel! Você se importa de olhar para mim?
Com relutância ele a encarou, e a fragilidade expressa em seus olhos encheu
de ternura o coração de Melissa.
— Não consigo imaginar nada mais maravilhoso do que casar com você... agora.
Meus amigos entenderão nossa pressa. E os seus?
O fato de Melissa ter-lhe aceito a proposta deixou-o meio atordoado por uns
momentos, fazendo com que demorasse a dar uma resposta.
— Meus amigos? — Ele pensou em Max, que não entenderia aquele casamento
de forma alguma. — Não importa o que meus amigos possam pensar. — Joel lhe tomou
a mão, acariciando-a. E prosseguiu: — Tem certeza? Não quero apressá-la. — Embora,
na verdade, sua vontade fosse casar o mais rápido possível, para finalmente poder tê-
la em sua cama e em sua vida para sempre.
Refletindo quanto sua vida mudara desde que conhecera Joel, de menina
introvertida à mulher exuberante, Melissa resolveu confiar nos próprios instintos e
declarou:
— Sim.
— Sim? — ele indagou, ainda cauteloso. — Vai casar comigo agora?
— Talvez devêssemos esperar por um casamento mais formal, não acha? — ela
gracejou.
Joel, porém, não lhe respondeu mais com palavras. Atraindo-a contra si,
beijou-a com paixão inteiramente correspondida, só parando para sussurrar:
— Eu te amo, Melissa. Nunca te magoarei. Sempre cuidarei de você e te
protegerei. Jamais se esqueça disso.
Beijando-a outra vez, deixou-a mais leve que o ar de tanta alegria. Ele a amava,
e iria se casar. Tudo o mais eram simples detalhes.
Quando se separaram, ele a olhou com as pupilas brilhando.
— Vamos ver como podemos fazer para casar-nos imediatamente.
Após três dias de impaciente espera, durante os quais trataram da papelada e
de outros detalhes, uniram-se, diante de um padre, na única igreja existente no
lugarejo. A pedido de Melissa, Joel concordara em também casar-se no religioso, pois

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para ele o que importava era torná-la uma esposa feliz.
Ao retornarem para casa, o sol já se punha, anunciando a noite pela qual o
agente vinha esperando fazia tantos dias. Nem podia crer que o período de
autocontenção acabara.
— Está com fome? — ela perguntou, espiando na geladeira. — Nossa cozinheira
deixou vários pratos deliciosos para saborearmos. Vou esquentá-los.
— Ótimo. Também comprei champanhe. Ela o olhou de relance, corando um
pouco.
— Nunca tomei champanhe.
— Sempre há uma primeira vez para tudo.
— Tem razão — ela respondeu, apressando-se a aquecer a comida, enquanto ele
verificava se o champanhe estava bem gelado.
Eles jantaram à luz de velas, na varanda da casa. Após o segundo copo de
bebida, Melissa começou a relaxar.
— Ninguém no serviço vai acreditar quando eu contar que, no prazo de algumas
semanas, conheci um homem e casei com ele numa ilha tropical. O dr. Feldman vai
pensar que perdi o juízo definitivamente.
— Dr. Feldman?
— Meu chefe. Eu o mencionei antes, recorda? Deve estar retornando das
férias agora. A propósito, teremos de voltar logo para casa. Tenho de reassumir o
emprego.
— Não havia dito que o escritório ainda está fechado?
— Bem, no mínimo preciso estar lá quando o dr. Feldman voltar. Por certo, ele
permitirá que entremos no laboratório.
— Como julga que ele vai encarar nosso casamento?
— Dr. Feldman? Desde que eu continue no emprego, não se importará. Aliás —
ela o olhou interrogativamente —, você não vai ser daquele tipo de marido despótico,
que não deixa a mulher trabalhar fora, não é?
— E se for?
— Então terá uma grande batalha pela frente. Ele sorriu.
— Sendo assim, guardarei minha energia para coisas mais interessantes.
Após o jantar, levaram os pratos para a cozinha e os lavaram rapidamente.
Joel sentiu que era hora de dar o último passo.
— Melissa, não quer outra taça de champanhe?
Ela o olhou por sobre o ombro, enquanto guardava os pratos no armário da
cozinha.
— Está tentando me embebedar?

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— Há algum mal nisso?
— Não precisa usar de artifício para me levar para sua cama — ela respondeu,
caminhando para ele e o enlaçando pelo pescoço.
Melissa lhe tocou os lábios, suavemente, fagulha suficiente para provocar a
explosão das emoções há tanto tempo contidas. Sem mais uma palavra, Joel a levantou
nos braços e a levou para o quarto, deixando-a de pé próxima à cama.
Em seguida, passou a despi-la, peça por peça. Embora já a tivesse visto nua
durante a doença provocada pela picada da cobra, agora a sensação era outra. Seu
corpo estava vibrantemente vivo e ansioso para ser amado.
Ela começou a despi-lo também, desabotoando-lhe a camisa e o cinto, sob a luz
da lua que entrava pela janela.
Joel se sentou na cama e a atraiu contra si, de modo que ela ficou de pé entre
suas pernas. Depois, começou a acariciar-lhe os flancos, as laterais dos seios, a
cintura. Aí chegando, desceu-lhe a calcinha, ajudando-a a descartar-se dela e beijou-
lhe o umbigo.
Ela estremeceu com o toque e, sentando-se em uma de suas pernas, começou a
acariciar-lhe os ombros, o pescoço e a mandíbula, terminando por roçar os lábios nos
dele.
— Não quero desapontá-lo, Joel.
— Como poderia desapontar-me, querida? Se soubesse como tenho ansiado por
este momento, como tive medo de que não aceitasse minha proposta de casamento...
Ela não respondeu, preferindo tocar-lhe o peito e seguir a trilha de pêlos
espessos que ornamentava o tórax, o abdome e o baixo ventre. Enfim, conseguiria
realizar aquele desejo que a inquietava havia tempo.
Ele se inclinou lentamente até deitar-se na cama, murmurando, com voz rouca:
— Isso é tão bom!
— Não imagina há quanto tempo venho querendo fazê-lo!
— Por que não o fez antes?
— Deve estar brincando.
Melissa teve de vencer a vergonha de tocar o corpo nu do marido. Deitada ao
lado dele, começou a explorar-lhe as superfícies e reentrâncias, divertindo-se ao
perceber que a pele ficava mais e mais arrepiada a cada toque.
Deparando com os mamilos, fascinou-se ao vê-los intumescerem-se sob seus
dedos. Não resistindo à tentação, lambeu-os delicadamente, provocando um
verdadeiro curto-circuito no corpo de Joel, que estremeceu.
— Por Deus, está querendo me matar, mulher?
Ela ergueu a cabeça e sorriu para ele, continuando a pesquisa. Seguindo a

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trilha de pêlos, a partir do peito, deslizou-lhe os dedos tronco abaixo, terminando por
tocá-lo em seu ponto mais sensível.
Novamente ele deu um estremecimento, exclamando:
— Não agüento mais isso!
— Por quê? — ela indagou, fingindo inocência. Num átimo, ele rolou na cama e
se colocou sobre ela.
— Agora lhe mostro — ele murmurou, distribuindo-lhe beijinhos nos ombros,
no peito, na parte interna da coxa, atrás do joelho, na curva do braço, numa série de
pontos sensíveis, que a fizeram sentir como se seu corpo fosse um instrumento sendo
tocado por um mestre da música.
Por fim, ajoelhado entre suas pernas, ele se inclinou sobre ela, sussurrando:
— Não quero machucá-la!
— Nunca poderia me ferir, Joel! Sei disso. Confiante, Melissa o puxou contra
si, enquanto levantava os quadris para encontrá-lo.
O pequeno desconforto que se seguiu não foi nada perto do prazer desfrutado
pelos dois, após a união completa. Ele mergulhou inteiramente em seu corpo, sabendo
que, por fim, a possuía e desejando perpetuar aquele momento para sempre.
No meio da noite, Joel acordou sentindo que a brisa aumentara, arrepiando-lhe
a pele e a de Melissa, enroscada em seu corpo. Com cuidado para não acordá-la,
esticou a coberta sobre os dois, encantado de vê-la em seus braços, parecendo tão
jovem e feliz.
Embora a diferença de idade entre ambos não ultrapassasse dez anos, a de
experiência e estilo de vida era imensa.
Ela lhe trouxera de volta muito do que julgava perdido para sempre: amor,
juventude, vitalidade, entusiasmo, alegria, porém não se importava com o esforço que
o aguardava.
Estava ali uma tarefa que teria todo o prazer de desempenhar, a despeito dos
riscos de ficar completamente perdido de amor.

CAPÍTULO X

O som de batidas insistentes na porta do chalé atingiu finalmente a


consciência de Joel, que, com um grunhido, levantou-se para atendê-la. Melissa dormia
serenamente a seu lado.
Colocando o jeans, constatou que estava com dor de cabeça, motivada pelo
champanhe e pela falta de sono. Enquanto caminhava para a sala, resmungou que as

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pessoas deviam ao menos ter respeito por recém-casados, atinando em seguida,
entretanto, que bem pouca gente sabia de sua nova condição.
Tal consciência não lhe melhorou o humor, e foi com um gesto brusco que
escancarou a porta, pronto a trucidar o intruso. Deparou, porém, com o filho do
proprietário do restaurante que ficara de lhe passar os recados, com um ar
desenxabido.
— Lamento incomodá-lo, senhor, porém meu pai recebeu uma mensagem
dizendo que deve ligar imediatamente para seu escritório.
Joel enfiou a mão no bolso da calça e retirou uma nota dobrada, passando-a
para o rapaz.
— Obrigado.
O garoto agradeceu com um aceno de cabeça e correu para sua bicicleta.
Joel passou a mão pelos cabelos, imaginando o que Max poderia querer naquela
hora. Desde a doença de Melissa, tentara apagar o mundo a sua volta, procurando viver
apenas em função do amor que os unia. Não se incomodava mais com o que podia estar
ocorrendo nos Estados Unidos. Por ele, ficaria na ilha para sempre, num sonho
contínuo.
Entretanto, não havia como esquecer a realidade, por mais que o desejasse.
Tinha de ligar para Max. Para tanto, voltou ao quarto, vestiu uma camisa e colocou os
sapatos, tudo da maneira mais silenciosa possível, para não acordar Melissa. Com
sorte, poderia estar novamente com ela em poucos minutos, sem que notasse diferença
alguma.
— Por que não ligou esta semana? — perguntou Max, assim que atendeu a
chamada. — Não lhe ocorreu que eu poderia estar preocupado?
— Não — respondeu Joel, que se sentara em uma das mesas do restaurante e
pedira uma xícara de café ao garçom.
— Melissa está bem?
— Sim. Apenas não dormiu muito a noite passada.
— Quer me explicar isso um pouco melhor?
— Não. Agora, diga-me o que houve.
— Conseguimos pegar o grupo que estava atrás do dr. Feldman e de sua
assistente.
— Que alívio!
— Logicamente estão negando qualquer ligação com o atentado a bomba, mas é
apenas questão de tempo para que confessem toda a realidade.
— Então, poderemos voltar para casa — disse Joel, devagar, aliviado porque
agora iria poder revelar sua verdadeira identidade a Melissa.

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— Sim. Já tenho inclusive outro serviço para você na Ásia, algo mais no seu
estilo.
— Bem, Max, há um aspecto novo neste caso que preciso te contar.
— Diga.
Joel pigarreou, visivelmente nervoso.
— Eu e Melissa... bem, nós... nós nos casamos ontem.
— Vocês o quê?
Joel afastou o fone do ouvido, podendo ainda assim ouvir a voz alterada do
chefe.
— Você enlouqueceu? Essa é a coisa mais antiética que já fez, Kramer. Revelar
a verdadeira identidade e, ainda por cima casar-se com uma pessoa sob sua guarda.
— Não revelei nada. Como uso meu nome real, não houve o problema de provar
identidade.
— Quer dizer que ela pensa haver casado com um escritor?
— Sim.
— Oh, Deus!...
Joel passou a mão pelos cabelos de novo num gesto nervoso. -f Não acho que
fará muita diferença para ela, quando souber a verdade. — Kramer, poderia te
despedir por isso.
— Estava demorando muito para dizer isso, Max. Por que não me fala sobre o
dr. Feldman? Como está ele?
— Ansioso pela volta de Melissa.
— Prepararei tudo para retornarmos ainda hoje.
— É o que espero.
Joel ouviu o clique do aparelho de Max, e vagarosamente recolocou o fone no
gancho.
Degustando á xícara de café que o garçom acabara de trazer, ficou refletindo
sobre as ironias da vida. Se Max houvesse ligado um dia antes, Melissa teria sabido de
toda a verdade em plena cerimônia de casamento. Talvez nem quisesse aceitar mais a
proposta.
Fora melhor que não soubesse então. Agora, os laços entre ambos eram mais
fortes, e ela haveria de compreender suas razões para mentir. Ao terminar o café,
pagou o garçom e voltou ao chalé.
Encontrou Melissa ainda adormecida, o cabelo na testa, ombros e braços
descobertos. Sorriu ao lembrar-se da noite de amor recém-vivida e caminhou para o
banheiro, onde tomou uma ducha.
Ao retornar acomodou-se ao lado da bem-amada, daquela que se entregara a

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ele de forma tão ardente, o coração palpitando de emoção. Agora, estavam casados, e
não havia como desfazer aquela união. Podia levá-la de volta ao trabalho sem medo.
Além disso, se, de qualquer maneira, ela ficasse aborrecida por haver
escondido sua verdadeira profissão, ainda poderia dizer-lhe que de outro modo não
haveriam se conhecido. Certamente, ela entenderia os motivos profissionais que o
haviam impedido de ser franco.
— Melissa? — ele exclamou, inclinando-se sobre seu corpo.
— Hein?
— Melissa, está pronta para voltarmos ao Estados Unidos? Ela abriu os olhos.
— Hoje? Mas não vamos passar a lua-de-mel aqui?
— Recebemos uma ligação de casa esta manhã. Estão esperando por sua volta
imediata. Isso não quer dizer que a lua-de-mel precisa terminar.
Ela sorriu, sonolenta, os olhos semi-abertos, passando-lhe a mão pelo peito.
— Acho que não. Você é tão gostoso!
— Digo o mesmo de você — ele respondeu, tomando-a nos braços e começando
a beijá-la. Max podia esperar. Feldman também. A única coisa importante para Joel,
naquele momento, era a mulher que apertava contra o corpo.
Quando acordou de novo ele notou que estava sozinho na cama. Segundos
depois, ouviu um ruído na cozinha e se sentou na cama.
— Melissa?
Outro ruído, agora de vidro sendo quebrado, fê-lo levantar-se de um salto,
colocar a calça, pôr as sandálias e rumar para a cozinha.
O que estaria sucedendo? Por que Melissa não respondia?
Ao entrar na cozinha, teve a enregelante resposta a suas perguntas. Melissa
derrubara um copo provavelmente assustada com o sujeito que agora tinha um braço
em volta de seu pescoço e uma faca na outra mão.
— E aí, encontramo-nos novamente, hein, amigo? — cumprimentou-o Benito
Ortiz, o homem que já tentara matá-lo na América Central. Como o havia descoberto
ali? Max lhe prometera que outros agentes o poriam fora de ação, mas, pelo visto, não
haviam tido sucesso.
— Que quer, Ortiz? — esbravejou Joel.
O homem deu um sorriso amarelo, talvez reflexo do dente de ouro que
ostentava.
— Isso são modos de tratar um amigo?
— Quando está mantendo minha esposa sob a ponta de uma faca...
— Esposa?
Ortiz começou a rir.

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— Não sabia que era casado, hombre. Ela não deve ter ficado satisfeita com
seu aspecto, depois que nos encontramos da última vez
— Ela não sabe nada a respeito.
— Ah, segredo! Gosto disso.
— Solte-a, Ortiz.
— Não posso. Levei muito tempo para chegar aqui, e agora quero toda a sua
atenção.
— O que quer?
— Para começar, saber como escapou da bomba em seu apartamento.
— Meu apartamento?
— Apartamento 5A, certo?.
— Errado. Meu apartamento era 5B.
— Ah, entendo! Recebi informação errada.
— De quem?
— Alguém pago para espioná-lo.
— A mim ou a minha esposa?
Ortiz olhou para a mulher sob seu poder.
— Nem sabia da existência dela. Além disso, por que haveria de espioná-la?
— Nesse caso, tem me seguido durante todo o tempo.
— Claro. Como julga que cheguei aqui? Você é bom, mas não infalível, meu
amigo.
Joel se esforçou para manter a calma.
— E agora, o que quer?
— Informações. Só soube quem você era depois de haver tentado matá-lo o
ano passado.
Joel observou Melissa sobressaltar-se mais uma vez, diante da resposta de
Ortiz.
— Que espécie de informação?
— Quem é seu contato em meu país? E quantos de vocês estão lá?
— E, claro, se lhe der essa informação — disse Joel Kramer começando a se
mover vagarosamente na direção de Ortiz —, você nos deixará em paz.
— Não tenho nada contra sua esposa. Só contra você, amigo. Joel continuou a
aproximar-se e a falar macio.
— Bem, você não me dá opção. Então, se soltar minha esposa, eu...
Rápido como um raio, Joel arrancou a faca da mão de Ortiz, derrubando-o em
seguida com um pontapé na cabeça. Antes de cair, o criminoso já soltara Melissa,
agora nos braços do marido.

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— Você está bem?
— Quem é você? — Ela o olhou como a um estranho.
— Seu marido, para começar. Agora fique aqui que preciso encontrar alguma
coisa para amarrar esse canalha enquanto dou um telefonema.
Dito isso, ele saiu da cozinha, voltando instantes depois com uma corda na mão.
Melissa estava sentada em uma das cadeiras, completamente absorta na contemplação
de Ortiz.
— Lamento o que ocorreu, querida, porém agora preciso levar Ortiz à cidade e
fazer uma chamada. Quer vir comigo?
Ela sacudiu a cabeça, sem olhá-lo.
Joel se apressou em amarrar o terrorista, deixando-o imobilizado, e depois
voltou-se novamente para Melissa, ajoelhando-se perto dela e tomando-lhe as mãos
que estavam muito frias.
— Querida, tenho de ir, mas voltarei assim que possível para conversarmos.
Tem certeza de que ficará bem sozinha?
Como ela não respondesse, ele lhe segurou o queixo e a obrigou a encará-lo. O
que viu, entretanto, no semblante de Melissa o assustou muito. Ela o fitava como se
fosse completamente estranho.
Joel concluiu que era o choque, mesmo porque precisava deixar as
especulações para mais tarde. Erguendo-se, disse:
— Olhe, tenho de ir. Quando voltar, explicarei tudo. Você entenderá.
Colocando Ortiz amarrado no banco traseiro do carro, ele partiu à procura de
um telefone público de onde pudesse ligar para Max, tomando cuidado de que ninguém
visse o prisioneiro.
Após explicar toda a situação a Max, indagou o que deveria fazer com Ortiz.
— Tenho contatos na área. Diga-me onde pode ser encontrado, que darei
alguns telefonemas, pedindo ajuda.
Por costume, Joel estudara a ilha ao chegarem, e conhecia uma velha casa
abandonada, onde poderiam esconder-se sem levantar suspeitas. Passou o endereço
para Max, que, após anotá-lo, perguntou:
— Como Melissa está encarando tudo isso?
— Nada bem.
— Não é para menos. Quero vocês dois fora daí o mais rápido possível. Quanto
a Ortiz, alguém irá acompanhá-lo num curto espaço de tempo.
— Pensei que Ortiz já havia sido eliminado.
— Eu também. Um corpo foi identificado como sendo o dele.
— Naturalmente, alguém se enganou.

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— Joel, essas coisas acontecem.
— Sim, eu sei. Principalmente no nosso negócio sujo.
— O que seria do mundo sem gente como nós, Joel?
— Não sei e não me importo em saber. Tudo o que consigo recordar é de minha
mulher sob a ponta de uma faca. Podia ter morrido. Nada vale tal risco.
— Entendo. Quando voltar, falaremos disso.
— Conversarmos não vai mudar nada. Simplesmente não posso deixar que
coisas como essa ocorram de novo.
Ele desligou e voltou ao carro, encontrando Ortiz ainda inconsciente. Deu a
partida e rumou para o lugar combinado, retornando ao chalé mais de uma hora depois.
Ao entrar em casa, começou a chamar por Melissa desde a porta da frente.
Sem resposta, teve um princípio de pânico ao imaginar, de repente, que Ortiz podia
ter um comparsa. Droga! Onde ela estava?
Finalmente, ao olhar pela janela, avistou-a andando na praia, uma pequena e
solitária figura a distância.
Correndo pela areia à beira-mar, partiu em seu encalço.
— Melissa?
Ela se voltou para encará-lo, sendo segura pelos ombros.
— Agora está tudo bem, querida. Não há mais com o que se preocupar. Eu lhe
prometi que nunca deixaria alguém ou algo magoá-la, lembra-se?
Ela o olhou, com expressão calma, levemente curiosa.
— Você não é escritor, é?
Tomando-lhe uma das mãos, Joel a levou até onde pudessem sentar-se,
lamentando o rumo que a conversa parecia estar tomando.
— Não, não sou escritor — ele declarou, após sentar-se ao lado dela.
— É um assassino, não?
Ele a fitou, perplexo. Como podia chegar a semelhante conclusão?
— O que a levou a pensar tal coisa de mim?
— A maneira como tratou aquele homem terrível. Não sentiu medo. Sabia que
conseguiria dominá-lo. É um profissional e deixou isso bem claro.
Estupefato, Joel apenas retrucou:
— Não sou um assassino.
Havia tanto a dizer, que não sabia por onde começar. Enquanto buscava as
palavras certas, ela voltou a interrogá-lo.
— Para quem trabalha?
— Para o governo.
— O nosso? — ela indagou com suspeita.

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— Sim, para o governo americano — ele replicou, começando a irritar-se de
verdade com toda a situação.
— Por que se mudou para o apartamento vizinho ao meu?
Naquele momento, ele se recordou do que Ortiz dissera sobre o engano quanto
ao apartamento onde a bomba deveria explodir.
— Tinha razão, Melissa, o atentado não foi contra você. Foi contra mim.
— É claro — ela bradou, irada.
— Fique calma, que lhe explicarei tudo. Já tinha havido um atentado contra o
dr. Feldman. Quase o mataram num acidente de carro.
— Dr. Feldman?! — ela exclamou, chocada. — Por que ninguém me disse? Ele se
machucou muito? E como soube?
— Além dos hematomas e contusões, ele quebrou a perna, mas preferiu não
aborrecê-la. Temeroso, entretanto, de que alguém pudesse também atentar contra
sua vida, ele contatou meu chefe.
— Seu chefe? — Ela repetiu a frase bem devagar. — Então, todo o tempo em
que fingiu estar fazendo amizade comigo, na realidade encontrava-se apenas
executando seu trabalho.
— Claro que não! Havia a possibilidade de que corresse real perigo, por isso me
mudei para o apartamento vizinho com o objetivo de protegê-la. Entretanto, quando
nos conhecemos,
Melissa, tudo mudou de figura. Quanto mais ficava perto de você, mais
apreciava sua companhia. Nem havia me dado conta de como minha vida era vazia, até
você surgir e preenchê-la. Quando viemos para cá...
— O que teria feito se Karen não cedesse a casa? — ela o interrompeu
bruscamente.
Ele deu de ombros.
— Teríamos de descobrir outro lugar seguro.
Ela concordou com um aceno de cabeça, depois olhou na direção do mar e
afirmou:
— Fui uma simples marionete em suas mãos, não é? E pensar que acreditei
haver adquirido capacidade para fazer amigos, para entreter e agradar um homem. E
todo o tempo você estava sendo pago para me fazer companhia.
Ela o fitou com desprezo.
— Não passa de uma babá sofisticada, Joel Kramer.
— Melissa! Não é nada disso. Por favor... Ela se ergueu.
— Mas agora o jogo acabou, ou, pelo menos, a minha participação nele
terminou. Disse que me querem de volta ao trabalho imediatamente. Já estou de

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partida.
Ele também se levantou, colocando as mãos nos bolsos.
— Há mais fatos que precisa conhecer, Melissa. Pegaram os homens que
atentaram contra a vida de Feldman. Eles não queriam que ele terminasse a pesquisa
atualmente em curso.
Ela jogou a cabeça para trás, olhando-o com ar de desafio.
— Ninguém sabe o que ele está pesquisando. Nem eu.
— Alguém descobriu. Por isso ele queria que ficasse sob guarda. Podiam pensar
que você também conhecia o segredo da pesquisa. Queria protegê-la, sem alarmá-la.
Ela começou a caminhar de volta para a casa.
— E ele não confiou o bastante em mim, para dizer que eu poderia estar
correndo perigo?
— Não é questão de confiança. Queríamos apenas mantê-la segura.
Ela repetiu a palavra segura entre dentes, como se fosse uma obscenidade.
Estavam quase alcançando a casa, quando ela interrogou:
— Por que quis casar comigo? Faria amor com você quando quisesse. Bastaria
ter demonstrado que me desejava.
Ele a segurou pelo ombro, interrompendo-lhe a caminhada.
— Pare com isso, Melissa. Nada mudou entre nós. Somos as mesmas pessoas
que casaram há apenas vinte e quatro horas.
— Como pode me dizer que nada mudou entre nós? Nosso relacionamento foi
construído em cima de mentiras. Você não é o homem com quem pensei estar casando.
Ela voltou o rosto para enxugar as lágrimas, que começavam a rolar-lhe pelas
faces. Depois, deu uma risada amarga, meio histérica.
— Não é uma piada? Eu pensando que você era um homem tímido, quando, de
fato, não passava de um agente do governo. Ainda não havia compreendido como posso
ser ingênua... estúpida. Aposto que deve ter rido muito de toda a situação.
Ela subiu a escada que levava a casa, atravessou a varanda e se dirigiu à porta
de seu quarto.
Desesperado, Joel a seguiu, tentando fazê-la entender como, na realidade, se
sentira durante todo o caso.
— Melissa, todo homem se intimida ao encontrar uma mulher que o afeta, como
você fez comigo. Não estava errada. Quando percebi que havia me apaixonado por
você, comecei a sentir-me cada vez pior, por não poder dizer-lhe a verdade. Por isso,
tentei manter certa distância entre nós, mas não pude manter tal distância depois de
ouvir você dizer que me amava.
Ela empalideceu.

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— Do que está falando?
— Na noite em que a cobra a picou, em meio aos delírios, você revelou seus
sentimentos a meu respeito.
— Então, calculou que, se eu estava apaixonada, não recusaria sua proposta de
casamento.
— Experimentei, naquela noite, como me sentiria se a perdesse, e não quis mais
correr risco. Eu já te amava. Quando soube que o sentimento era recíproco, acreditei
que podíamos resolver quaisquer problemas futuros.
Ela sacudiu a cabeça negativamente.
— Esqueceu de um pequeno detalhe.
— Qual?
— Nosso relacionamento foi baseado em mentiras. Não é o homem com quem
pensei haver casado. É um mentiroso. Como pode esperar que acredite em você?
A reação hostil e inesperada de Melissa abalou Joel profundamente. Não tinha
mais explicações, mais argumentos. Apenas se deixou ficar em pé, na frente dela,
olhando-a em silêncio, enquanto continuava a massacrá-lo psicologicamente.
— Talvez ter casado comigo tenha lhe dado paz à consciência. Sei lá. Quanto a
mim, tudo o que quero é voltar para casa, para o trabalho e nunca mais vê-lo na vida.
Depois dessa última frase, ela se virou, entrou no quarto e bateu a porta.

CAPÍTULO XI

Deitado na praia, próximo ao mar azul-turquesa, Joel deleitava-se com as


carícias do sol e da brisa tropical em seu corpo.
Pouco tempo depois, essas carícias passaram a vir dos dedos de Melissa,
tocando-lhe o peito. Sem abrir os olhos, sorriu, feliz porque ela decidira juntar-se a
ele de novo. O delicioso perfume floral que usava invadiu-lhe as narinas, provocando
nele um aumento das batidas do coração.
Quando ela lhe roçou os mamilos com a ponta da língua, o ritmo cardíaco se
acelerou ainda mais, e era como se tivesse um tambor dentro do peito. Ela deslizou-lhe
as mãos pelos cabelos e aproximou o rosto para beijá-lo.
Virando-se, ele a colocou sob seu corpo enquanto a acariciava e beijava com
paixão crescente. Ela era sua mulher e sempre o seria. Amava-a muito. Nem podia
imaginar a vida sem sua presença, nem podia...
De repente, ela desapareceu, sem deixar traço, como a bruma da manhã se
dissipa ao ser tocada pelo sol. Desaparecera, e ele não podia fazer nada a respeito,

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nada...
Joel se ergueu da cama, abruptamente, apoiado nos cotovelos, e olhou para o
relógio digital na cabeceira, que marcava quatro horas da manhã.
Droga, mais uma vez acordara cedo demais. Mais uma vez a imagem de Melissa
lhe perseguira nos sonhos, como vinha fazendo havia três meses, quando a vira pela
última vez.
Já tentara de tudo para conseguir um sono profundo, sem sonhos, desde
excesso de trabalho até uma boa garrafa de bebida. Nada dera certo. As imagens e
sensações da maravilhosa noite que haviam passado juntos se reproduziam em seu
inconsciente, variando apenas o cenário.
Cruzando as mãos atrás da cabeça, passou a recordar seus momentos finais de
convívio, a raiva que ela sentira ao saber toda a verdade, a viagem silenciosa até o
aeroporto.
Bem que tentara trocar algumas palavras com ela, durante o vôo, mas só
conseguira arrancar-lhe respostas monossilábicas. Ela parecia estar ausente do
próprio corpo.
Quando chegaram a Miami, ele a deixou numa das salas de espera do
aeroporto, enquanto ia comprar passagens para Washington. Ao retornar, entretanto,
deparou com sua maleta sobre uma das cadeiras, surpreendendo-se com a ausência de
Melissa.
Passou as duas horas seguintes checando cada uma das filas dos passageiros
que partiam. Foi inútil. Ela simplesmente evaporara.
Mesmo depois de retornar a Washington, continuou a busca. No dia seguinte a
sua chegada, ligou para o trabalho de Melissa, o lugar mais provável onde poderia
estar, já que perdera a moradia, porém quem o atendeu foi um homem.
— Feldman.
— Bom dia, doutor. Aqui é Joel Kramer. Fiquei contente de saber que já está
completamente recuperado.
— Joel! Graças a Deus ligou! Pensei que havia raptado minha valiosa assistente.
Vocês ainda estão na ilha?
Ele sentiu uma pontada no peito.
— Estou na Virgínia, doutor. Esperava que Melissa tivesse voltado a trabalhar.
Por isso liguei... para falar com ela.
— Quer dizer que não sabe onde ela está? Mas foi contratado para protegê-la!
— exclamou Feldman, com voz alterada,
— Quando ela descobriu minha verdadeira identidade, ficou profundamente
aborrecida e desapareceu no aeroporto de Miami.

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— Entendo — disse o cientista, agora mais calmo.
— Olhe, doutor, ficaria muito grato se anotasse meu endereço e telefone, e os
passasse para ela quando ligar para o senhor ou aparecer por aí. Precisamos muito
conversar.
Uma semana se passara desde essa ligação, sem nenhuma notícia de Melissa.
Aí, Joel telefonou mais uma vez para o dr. Feldman, que o informou haver passado o
recado para Melissa quando ela o contatara. Afirmou também que a doutora não
voltaria ao trabalho por uns tempos, tendo pedido para enviar seu último salário e
pertences para um endereço em Nova York.
Com um pouco de esforço, Joel conseguiu obter o telefone de Karen, em Nova
York, que, entretanto, não foi de muita serventia. Disse que não conversava com
Melissa desde sua volta da ilha e perguntou sobre a estada dos dois na praia. Por últi -
mo, anotou-lhe o telefone e endereço para os passar à cientista, caso ela telefonasse.
Nos três meses seguintes, continuara ligando, esporadicamente, para Karen e
para o dr. Feldman, à cata de notícias, sem nunca obtê-las.
Desesperado, acabou tentando a ajuda de Max, que poderia descobrir se ela
estava trabalhando no país e em que lugar. Se estivesse, por certo teria uma conta
bancária, cartões de crédito...
Max descobriu não só que ela possuía uma conta, mas também que a havia
encerrado. Sacara todo o dinheiro da poupança, inclusive.
Resignado, Joel concluiu que ela não poderia viver sem trabalhar, sendo, mais
cedo ou mais tarde, obrigada a aparecer em algum lugar.
Para confortá-lo, Max prometeu que ficaria de olho em qualquer possível pista
do paradeiro da cientista e insistiu em enviá-lo para o novo trabalho na Ásia. Melhor
do que ficar andando para cima e para baixo no apartamento, como uma fera
enjaulada.
Agora já fazia uma semana que voltara aos Estados Unidos, e Max ainda não
tinha descoberto nenhuma pista de Melissa.
Como podia ela haver desaparecido daquela forma? Como podia fingir que o
casamento dos dois nunca existira? Chegara a pregar a cópia do registro de
casamento na parede sobre a cama, como para certificar-se de que não havia sonhado
uma história de amor.
Nem sequer tinha uma foto dela. Só lembranças, sonhos e, às vezes,
pesadelos...
Pesadelos de que Ortiz escapara da cadeia e a raptara, apesar de Max lhe
assegurar o contrário. O bandido estava num presídio de total segurança.
Finalmente, Joel compreendeu que só lhe restava esperar por um milagre.

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Perdera a confiança de Melissa, e não adiantava ficar se mortificando com isso,
imaginando que, se houvesse agido assim ou assado, o resultado não teria sido tão
desastroso.
Sentado na beira da cama, afagou o rosto, notando a barba por fazer.
Levantando-se, colocou os chinelos, o roupão de ginástica, e seguiu depois para a
cozinha, onde começou a preparar o café.
Enquanto o coava, voltou à sala, para pegar o jornal de domingo, e se espantou
por ter demorado a entender o sentido da manchete.
"Anunciada descoberta no controle do vício de drogas."
A maior parte da matéria estava na segunda página, relatando como os
voluntários para o teste com a nova substância declaravam, entusiasmados, haver
perdido o desejo de tomar drogas. Embora houvesse ainda meses de outros testes, a
experiência já podia ser considerada um sucesso. Dr. Feldman havia conseguido seu
intento e agora, protegido pela opinião pública, nada o poderia deter.
Joel continuou folheando outros cadernos do jornal, até deparar com o
suplemento dominical, cuja capa ostentava o seguinte título: "Seu futuro pode ser lido
nas estrelas".
Desta vez, não sentiu raiva pela descrição das características de seu signo. De
fato, alguns dados batiam com sua personalidade. Realmente preferia mudança à
rotina. Entretanto, no que se referia ao amor, o horóscopo falhara redondamente.
Nada o atraía mais no momento do que a idéia de um relacionamento estável
com Melissa Jordan. Por ela, abandonaria a carreira agitada de agente por um
emprego burocrático em qualquer lugar, caso fosse necessário.
Não que tais pensamentos valessem alguma coisa agora, pensou, jogando o
jornal no chão. Melhor era dar uma arrumada na sala, tomar um banho, talvez barbear-
se, e sair um pouco, pois já estava ficando cansado da vida solitária.
Descartou a hipótese de pegar outro trabalho, já que, no fundo do coração,
agradava-lhe a simples idéia de estar ao menos com Melissa no mesmo país. Sim,
porque, se ela houvesse viajado, teria de usar algum tipo de identificação, sendo
detectada por Max.
No banheiro, decidiu barbear-se antes de tomar a ducha. Estava quase
terminando, quando o telefone tocou. Apressado, saiu para atendê-lo, mas, quando o
alcançou, já havia ficado mudo. Só podia ser Max.
Imediatamente discou para o chefe indagando:
— Acaba de me ligar?
— Não, Joel. Tenho coisas mais interessantes para fazer. Joel refletiu por uns
segundos, depois deu de ombros.

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— Deve ter sido engano.
— Ou uma de suas fãs implacáveis.
— Ora, vá pro inferno — ele resmungou, desligando de imediato, ao som da
risada de Max.
Em seguida, dirigiu-se ao banheiro, onde se deleitou com a programada ducha,
enquanto planejava o que faria depois. Estava com vontade de tomar café fora de
casa. Sentia falta de gente em torno.
Uma das revelações importantes que tivera, durante a esta da na ilha, fora a
de sua capacidade de relaxai, de apreciar momentos de lazer. Descobrira, em seu
último trabalho, que podia ficar entediado mesmo nas mais excitantes aventuras.
Ao sair do boxe e enquanto se enxugava, ouviu a campainha da porta. Ainda
pingando, foi atendê-la, com a toalha presa à cintura. Imaginando que fossem os
garotos da vizinhança, em mais uma traquinagem, abriu a porta disposto a repreendê-
los com veemência.
— Agora escutem aqui...
A visão de Melissa, num vestido leve e sandálias de salto alto, interrompeu-lhe
não só a frase como a respiração.
— Parece que cheguei na hora errada — ela disse, tranqüila.
— Melissa! — ele exclamou, com os olhos úmidos de emoção. — Por favor,
entre. Espere só um minuto enquanto me visto. Hum, sente-se e... sirva-se de café.
Acabei- de coar.
Correndo para o quarto, Joel recolocou o agasalho, enxugou o cabelo molhado e
voltou à sala, encontrando-a vazia. Por um instante, sentiu-se atônito até ouvir, na
cozinha, o som de xícaras tocadas.
Suspirando de alívio, caminhou para lá, recostando-se no batente da porta,
para observar Melissa em seus afazeres. Mais calmo, pôde observar que ela
emagrecera, cortara o cabelo, agora na altura do pescoço, e perdera o bronzeado.
— Onde esteve? — ele perguntou subitamente, assustando-a.
— Nossa, que susto! — ela se virou para encará-lo, sobres-saltada.
— Não lhe ocorreu que seu desaparecimento também podia me deixar
assustado? Fiquei sem saber se alguém ligado a Ortiz podia ter te pegado...
Ela apanhou a xícara e, sem olhá-lo, dirigiu-se à mesa da cozinha, sendo
seguida por Joel, que se acomodou na cadeira a sua frente.
— Não tinha pensado nisso. Houve problemas no emprego por minha causa?
— Do que está falando? Fiquei como um louco atrás de você, ligando para os
conhecidos, checando todas as pistas, imaginando como estaria sobrevivendo sem
emprego... Pode me explicar o que aconteceu, por que sumiu e agora voltou a me

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
procurar?
— Tentei falar com você por telefone, mas ninguém atendeu. Então resolvi vir
aqui para deixar um bilhete com o porteiro, porém ele disse que você estava em casa.
Assim, decidi falar-lhe pessoalmente.
Ele se inclinou na cadeira.
— Bem, encontrou-me. Não sou tão difícil de achar quanto você.
Ela corou levemente.
— É verdade. Karen e o dr. Feldman me transmitiram os recados.
— E você me atendeu imediatamente, não é? — ele retrucou, irritado.
— Não o vejo assim desde aquele terrível episódio com o bandido.
— Ah, sim! Está aborrecida porque não sou o escritor tímido e amável que
tanto apreciava.
— Que você fingia ser.
— Por questões profissionais, Melissa. Fui instruído para proceder dessa
forma, mesmo contra minha vontade. Entretanto, o que lhe disse sobre meu passado é
totalmente verdadeiro. Não sou mentiroso, muito menos um assassino, como afirmou.
Nervoso, Joel se levantou e caminhou até a janela da sala.
— Sei disso — ela respondeu em voz baixa.
— Desde quando mudou de idéia? — ele interrogou, sem olhá-la.
Ela também se levantou e foi acomodar-se no sofá da sala, recostando a
cabeça e dizendo:
— Não sei ao certo. Só me recordo de ter estado tão confusa! Em seguida,
Melissa se calou por alguns instantes, pausa que foi respeitada por Joel, apesar de sua
ansiedade e de seu nervosismo.
Na realidade, desde que ela chegara, Joel vinha tentando disfarçar o tremor
das mãos e do corpo de uma maneira geral. Apesar de já ter passado por inúmeras
situações difíceis, nada o abalara tanto quanto rever Melissa assim tão
repentinamente.
Por fim, ela recomeçou.
— Eu estava na cama, há algumas semanas, quando comecei a entender, com
mais clareza, o que senti no último dia de nossa estada na ilha.
Joel voltou o rosto para observá-la.
— Desde que nos vimos, minha vida mudou por completo, adquirindo certa
mágica que, para uma moça inexperiente como eu, foi deslumbrante. Projetei em você
o pai afetivo, o irmão brincalhão, o primeiro namorado, o príncipe encantado enfim...
Então, quando disse que me amava, senti-me como uma princesa de conto de fadas.
Impressionado com a franqueza de Melissa, Joel foi sentar-se a seu lado no

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
sofá.
— Foi aí que aquele homem horrível apareceu e o sonho acabou. Eu culpei você
pelo fim das fantasias, pelo fim do que despertava em minha vida: amizade, ternura,
paixão... Passei de menina prodígio a mulher adulta, sem passar pela adolescência, e
você permitiu que a adolescente emergisse em mim.
Neste momento, ela sorriu para ele, com lágrimas nos olhos, tocando-lhe
também uma das mãos.
— Demorei para refazer-me do choque de perder tão rápido a adolescência
recém-adquirida, mas depois descobri que fora injusta com você. Na verdade, vim para
te agradecer os cuidados, a amizade, a tolerância, a compaixão...
— Melissa — ele sussurrou segurando-lhe a mão — por que acha que quis casar
com você?
— Porque queria fazer amor comigo. Só que não era necessário interpretar tal
papel apenas por essa razão.
Ele lhe soltou a mão erguendo-se e disse:
— Espere um pouco. Já volto.
Indo ao quarto, pegou a cópia do registro de casamento e a levou para Melissa,
que a leu vagarosamente, reconhecendo a sua assinatura, a de Joel e a do escrevente
que os havia casado.
Ela olhou para o agente, visivelmente confusa e abalada.
— Quer dizer que o original desse registro está arquivado no cartório... que
estamos de fato casados?
Joel sentiu uma pontada no coração.
— Então, realmente pensou que eu mentira até a respeito disso.
— Bem, dadas as circunstâncias, supus que se tratasse de uma encenação. Não
vi por que quisesse levar nosso relacionamento a tal ponto.
— Esqueceu de um detalhe, cara doutora — ele retrucou, com voz embargada.
Ela o fitou interrogativamente.
— Eu te amo, Melissa. Não sou nenhum príncipe encantado, porém me apaixonei
realmente por você, a ponto de esquecer considerações éticas, meu emprego, tudo o
mais. Acreditei que também me amasse o bastante para entender, posteriormente, a
razão de haver te ocultado minha verdadeira identidade.
— Oh, Joel! — ela exclamou. — Perdoe-me.
Ele a abraçou e a atraiu contra o corpo, consciente de que Melissa, como ele,
já havia sofrido o suficiente.
— Voltou para casa, Melissa... ao lugar a que pertence.

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CAPÍTULO XII

Joel mal podia respirar, tal a força do abraço com que Melissa o envolvera.
Erguendo-a do sofá, carregou-a até o quarto, colocando-a na cama, onde também se
deitou.
Rapidamente, tirou-lhe os sapatos e as meias, bem como a combinação e o
vestido.
— Você emagreceu — ele murmurou, beijando-lhe os seios, a cintura, o
abdome.
— Você também.
— Será que emagrecemos pela mesma razão?
Ele lhe separou as pernas, de modo que pudesse beijar-lhe a parte interna das
coxas.
— Oh, Joel, tenho sido tão estúpida! — ela clamou, com voz entrecortada.
Estirando-se de corpo inteiro sobre Melissa, Joel beijou-a na boca, a princípio
com suavidade, depois com paixão, sendo inteiramente correspondido.
Horas mais tarde, as cobertas estavam no chão, e Joel e Melissa um nos
braços do outro, ela com a cabeça aninhada no peito do agente, ele com uma perna
trançada entre as dela.
— É o seu estômago ou o meu que está roncando?
— Acho que os dois, em perfeita harmonia. Entre beijos e carícias, Joel
continuou:
— Mas você não me respondeu onde esteve.
— Depois que saí do aeroporto em Miami, fui para o centro da cidade de onde
liguei para meu banco para conseguir transferência de dinheiro. Acabei por obtê-lo,
apesar da dificuldade de provar minha identidade, por causa da falta de documentos.
— Tive muitos pesadelos com você, faminta e sem dinheiro, sem saber como
entrar em contato comigo. Costumava acordar molhado de suor.
— Depois de conseguir o dinheiro, fui para o terminal de ônibus interestaduais
e peguei o primeiro que ia em direção oeste. Terminei perto do golfo, em algum lugar
no Mississipi. Descobri uma pensão barata perto da praia e lá fiquei, refletindo.
— Se ficou na praia, como perdeu o bronzeado? — ele perguntou, enquanto lhe
segurava a mão com a qual insistia em provocar-lhe arrepios.
— Fiquei doente. Não dormia nem comia direito. Um belo dia, não consegui
levantar da cama, e a proprietária da pensão mediu minha temperatura e disse que
estava com febre. Demorei para sarar.

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
— Mas nem assim quis me chamar.
— Não me achava em condições de ver ninguém e, ainda por cima, senti-me
envergonhada pela maneira como vinha me comportando desde nossa partida da ilha.
— Alguém já lhe disse que é muito severa consigo mesma? Ninguém é perfeito,
ora bolas — ele a censurou, acariciando-a da cintura até a coxa —, embora você
chegue bem perto disso.
— Sabe — ela continuou —, fiquei chocada quando me afirmou que tinha
descoberto que eu te amava, pois nunca havia te falado nada a respeito.
— E por que não?
— Não queria embaraçá-lo, nem fazê-lo sentir-se coagido a corresponder
àquilo que vai dentro de mim.
— Incrível que tenha obtido tantos diplomas, Melissa, sendo assim tão iletrada
em termos de amor.
— Pois é. As coisas são contraditórias. Ele a apertou entre os braços.
— Tenho uma confissão a fazer. Também não sou nenhum perito na arte do
amor. Apenas aprendo muito rápido quando estou envolvido com alguém.
— É algo que temos de experimentar para podermos entender, não é?
Ele a beijou na fronte.
— Creio que sim.
— A propósito de nosso casamento — ela questionou com voz mais séria —
vamos viver aqui ou este é um lugar temporário para você?
— Bem, este é o único lar que conheço, mas podemos encontrar algo maior, uma
casa. Como preferir.
— Acho que vou ligar para o dr. Feldman amanhã.
— Ótimo. Acabamos ficando amigos, durante seu sumiço. Também andou muito
preocupado com você.
— Ele sabe que casamos?
— Julguei melhor você mesma contar, caso voltasse.
— E Max, sabe?
— Claro. Quase fui despedido por causa disso.
— E quanto a seu emprego? Vai continuar vigiando donzelas em perigo?
Joel riu.
— Acredita que tenho jeito para o serviço? Ela o cutucou nas costelas.
— Seu trabalho parece ser muito perigoso, e eu o preferia em casa, são e
salvo, mas se ele o faz feliz...
— Geralmente não é tão perigoso, porém tem seus momentos de grande ação.
Agora, quanto ao que me faz feliz, nada se compara a você.

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
— Que galante!
— Mais tarde, quando você deixar de ser uma distração tão grande para meus
sentidos, quero discutir alguns planos para nosso futuro, nos quais já havia pensado
antes de sermos brutalmente interrompidos por Ortiz.
— E enquanto isso?
— Enquanto isso, quero aproveitar este momento como se fosse o último de
nossas vidas. Que me diz?
— Como quiser, Joel — ela murmurou, enlaçando-o pelo pescoço.
Joel se inclinou sobre ela, beijando-a novamente, com renovado ardor. A
felicidade nunca lhe parecera tão excitante.

EPÍLOGO

Joel jogou a folha de papel que estivera lendo sobre a escrivaninha, e


caminhou até a janela. Após horas sentado, sentia que estava precisando de um pouco
de exercício.
Contemplando a paisagem do interior da Virgínia, lembrou-se da sorte que
haviam tido em encontrar aquela casa não muito distante da cidade e também cercada
de verde e privacidade.
As colinas pareciam convidá-lo a selar um cavalo e dar um galope. Olhando o
relógio, refletiu que poderia convidar alguém para fazer-lhe companhia.
Uma batida leve na porta o fez virar-se e dizer:
— Entre.
Um par de grandes olhos azuis, emoldurados por longos cachos dourados,
espiou pela abertura da porta. Ele riu.
— Entre, Lisa.
— Lucy disse para não incomodá-lo, papai — sussurrou a menininha de cinco
anos.
Joel caminhou até a filha e a pôs no colo.
— E se estivesse incomodando? O que poderia lhe acontecer?
— Lucy iria ralhar comigo.
— Com razão, mas agora não estou trabalhando.
— Então, quer jogar? — perguntou Lisa, inclinando-se para trás, de modo que
pudesse olhar o pai.
— Pode ser, porém estava pensando em dar um passeio a cavalo.
— No Blaze?

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
— Sim.
— E eu posso ir?
— Se quiser.
— E o Tony também?
Joel caminhou até o corredor, onde Lisa pulou de seus braços.
— Se ele quiser.
— Tony! Papai falou que podemos ir cavalgar com ele. — Ela saiu gritando em
direção ao lado leste da casa.
Joel foi então para a cozinha, onde Lucy, a cozinheira de meia-idade que
haviam contratado, estava trabalhando.
— Há café por aqui, Lucy?
— Sempre deixo café pronto para o senhor. São ordens da patroa.
Ele se serviu de uma xícara, inclinando-se no balcão para conversar com a
empregada.
— Há quanto tempo trabalha conosco, Lucy? Ela o olhou, surpresa.
— Calculo que faz mais de oito anos. Vim para cá logo depois que Tony nasceu.
Não lembra?
Ele acenou com a cabeça, sorrindo.
— Como poderia esquecer?
Tony nascera dois anos depois de estarem casados. Foi também quando
encontraram a casa sonhada, e Joel descobrira um talento oculto que mudaria o curso
de sua vida. Até aquele dia, ainda não tinha certeza se Max o havia perdoado pela
descoberta.
— Pai! — exclamou um furacão de jeans e camisa desbotada, invadindo a
cozinha, com os olhos brilhando de excitação. — Vai me deixar montar a Lady?
— Acredita que há condições?
— Claro. Tenho praticado com Roy, embora ele não me deixe sair do curral.
Posso mesmo ir com o senhor?
Joel passou a mão na cabeça do filho, despenteando-o.
— Pode apostar.
— Vou dizer a Roy para aprontar os cavalos! — exclamou o garoto,
desaparecendo em instantes.
Lucy sacudiu a cabeça.
— Esse menino tem mais energia do que três pessoas juntas. Não sei a quem
puxou.
Joe terminou a xícara de café.
— Melhor eu ir mudar de roupa, antes que aqueles dois partam sem mim.

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
Subindo a escada, seguiu pelo corredor que dava para seu quarto, parando no
caminho para observar o filho mais novo, de dois anos, Christopher, dormindo no
berço.
Às vezes, encontrava dificuldade de recordar como era sua vida antes da
chegada de Melissa e das crianças. Eles haviam se tornado o centro de sua existência.
O mesmo pensamento lhe ocorreu, horas mais tarde na cama, quando abraçava
a esposa.
— Sabe, não consigo lembrar como podia viver sem você e as crianças.
Com a cabeça recostada em seu peito, uma das pernas sobre as dele,
afagando-lhe o tórax, como sempre o fazia desde o começo do namoro, Melissa
concordou:
— Entendo o que quer dizer. O mesmo acontece comigo.
— Quem diria no que Max iria me meter quando me designou como seu
protetor?
— E quem diria que iria deixar de trabalhar para ele? Joel ficou em silêncio
por uns momentos.
— Pior que isso. Quem diria que iria ganhar a vida como escritor?
— E na lista de best-sellers do New York Times. Ambos riram, recordando
como tudo começara.
Após quase dois anos de casamento, Joel continuava trabalhando para o
governo e viajando muito, mas, sempre que possível, ia anotando as experiências,
idéias, fazendo pesquisas... Quando voltava para casa, procurava estudar um pouco de
redação nos velhos livros de escola, bem como burilar alguns textos.
Quando vendeu o primeiro manuscrito, ficou mais surpreso que todo mundo.
Pouco depois, encontrou um editor que o encorajou a continuar escrevendo histórias
de aventura, cuidando de que nenhuma informação verdadeira do Serviço de Inte-
ligência fosse usada.
— Recebi uma carta de Abe hoje — ela declarou numa súbita lembrança. —
Disse que tem uma proposta fantástica para mim. Só preciso produzir dez livros nos
próximos dez anos.
Ela levantou a cabeça.
— Joel, isso é ótimo. Por que não me avisou antes? Ele a beijou ternamente na
testa.
— Esqueci. Havia tantas outras coisas excitantes acontecendo...
Melissa recordou-se de quando voltara do trabalho aquele dia, com Lisa e Tony
competindo para ver quem lhe contava sobre o passeio a cavalo, assim como o pequeno
Christopher lhe puxando para ver a cidade de brinquedo que montara com o pai.

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick
Suspirando, aninhou-se ainda mais nos braços de Joel. Pensando em como
amava aquele homem que lhe ensinara o valor do amor, que a ajudara a manter a
carreira, dividindo com ela as tarefas domésticas e a criação dos filhos, sempre tão
carinhoso e prestativo.
— Eu amo você — ela sussurrou, compreendendo mais uma vez como as palavras
eram limitadas para expressar toda a vastidão dos sentimentos que nutria pelo
marido.
Joel se inclinou sobre ela, como sempre costumava fazer havia tantos anos, e
Melissa pôde sentir que ainda o excitava.
— Você se incomoda de mostrar quanto me ama? — ele perguntou com voz
arrastada, mordiscando-lhe a orelha.
— Será um prazer, senhor — ela respondeu, antes de se beijarem com a paixão
e a emoção da primeira vez.
Fim

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Julia 460 – Sob o Signo da Aventura - Annete Broadrick

Edição 641

Patrícia Ellis
Dallas Shelby jamais imaginaria que ajudar uma amiga pudesse causar tanta
confusão. De repente ela reencontrou Dexter Hudson, e como sempre recebeu apenas
arrogância e frieza. Não era para menos. Rico e influente, esse homem simplesmente
desprezava reles mortais como Dallas. Mas agora Dexter começava a dar sinais de
fraqueza. Uma misteriosa fraude o envolvia, e apenas Dallas poderia ajudá-lo. Ela não
iria perder a chance de lhe dar uma lição. Dexter era muito sedutor... mas não era
dono do mundo!

Edição 642

Joanna Mansell
Alice sempre soube o que queria de sua vida. Por isso, quando conheceu
Dominic Seton, um nobre decadente, proprietário de uma suntuosa mansão, resolveu
que aceitaria o desafio que ele lhe propôs: tirá-lo da beira da falência e recuperar a
valiosa mansão a qualquer preço. Mesmo tendo de suportar o gênio irascível de Dominic
e fugir do fascínio devastador daqueles olhos negros que despertavam nela desejos
inconfessáveis... >

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