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XXXVIII Olimpíada Cearense de Matemática

Nível 2 - Oitavo e Nono Anos


Problema 1. Antônio e Bruno compraram ingressos para um evento. Ao chegarem em
casa, eles perceberam que os ingressos eram numerados com valores naturais consecutivos.
O número de Antônio é múltiplo de 27 e o número de Bruno é múltiplo de 25. Além
disso, eles viram que os números dos ingressos são os menores naturais que satisfazem
essas propriedades e que o número de Antônio é menor do que o de Bruno. Encontre os
números dos ingressos e justifique sua resposta.

Solução. Como os números são consecutivos, se chamarmos de n o número de Antônio,


então o número de Bruno será n + 1. Temos que n = 27k e n + 1 = 25` onde k e ` são
inteiros positivos. Sendo assim,
25` − 27k = 1.

Isso implica que


27k + 1 2k + 1
`= =k+ .
25 25
Como k e ` são inteiros, temos que (2k + 1)/25 também deve ser inteiro. Sendo assim, o
menor valor possível para k satisfaz 2k + 1 = 25, ou seja, k = 12. Com isso, n = 27 · 12 =
324. Logo o número do ingresso de Antônio é 324 e o do ingresso de Bruno é 325.

Solução Alternativa. O número de Antônio é da forma 27k, onde k é um inteiro posi-


tivo. Logo o número de Bruno é da forma 27k + 1, onde k é inteiro positivo. Além disso,
o número de Bruno é múltiplo de 25, logo temos que achar o menor natural k tal que
27k + 1 é múltiplo de 25. Testando, k = 1, 2, . . ., obtemos os seguintes valores:

(28, 55, 82, 109, 136, 163, 190, 217, 244, 271, 298, 325, . . .)

Observando a lista acima, o menor desses números que é múltiplo de 25 é o número 325
(obtido quando k = 12). Assim, o número de Antônio é 324 e o de Bruno é 325.

Problema 2. Em um tabuleiro 5 × 5, Téo e Dora jogam o seguinte jogo. Téo dispõe de


algumas bombas, cada uma delas ocupando uma peça 1 × 1, e Dora dispõe de um navio,
que ocupa uma peça 4 × 1. Inicialmente, Téo distribui as bombas em algumas casas do
tabuleiro; depois, Dora tenta colocar seu navio em casas não ocupadas por bombas.

(a) Mostre, com um exemplo, que Téo precisa de apenas 6 bombas para garantir que
Dora não consiga colocar seu navio.

(b) Mostre que se Téo dispõe de apenas 5 bombas, então independente de onde as coloque
Dora sempre conseguirá colocar seu navio. Justifique sua resposta.
Solução. (a) Existem várias maneiras de Téo posicionar as 6 bombas e basta exibirmos
uma dessas maneiras, por exemplo, a da figura abaixo.

(b) Veja que é necessário (mas não suficiente) que Téo coloque pelo menos um bomba
em cada um dos seis retângulos 1 × 4 marcados na figura abaixo. Caso contrário,
Dora poderia colocar um navio em uma destas regiões. Mas se Téo possui apenas 5
bombas isso não é possível, pois esses retângulos são internamente disjuntos.

(b) Solução Alternativa Suponha que exista uma maneira de Téo colocar as 5 bombas
de modo a ganhar o jogo. Necessariamente, haverá (pelo menos) uma bomba em cada
coluna e uma bomba em cada linha. Olhe para a última linha: se a bomba encontra-se
na i–ésima casa dessa linha, então necessitamos de duas bombas na coluna i. Como
necessitamos de pelo menos uma bomba em cada uma das demais quatro colunas,
precisaremos de no mínimo de 6 bombas.

Problema 3. Seja ABC um triângulo equilátero com lados de comprimento igual a 3 e


seja D o ponto sobre o lado BC tal que o comprimento do segmento CD vale 1. Sejam
M o ponto médio do segmento AD e Γ o círculo de centro M e tangente ao segmento AC.
Se E é o ponto sobre o segmento AB tal que DE tangencia Γ, calcule o comprimento
de BE. Justifique sua resposta.
Solução. Sejam F e G os pontos de tangência de Γ com AC e DE, respectivamente
(veja a Figura 1 abaixo). Note que 4GM D ≡ 4F M A (pelo caso cateto-hipotenusa de
congruência de triângulos retângulos). Logo, GM
cD = F McA, e segue que G, M e F são
colineares. Como a reta que passa por G e F é perpendicular aos segmentos AC e DE,
concluímos que tais segmentos são paralelos. Então, 4ABC ∼ 4EBD. Como ABC é
equilátero, segue que EBD também é. Logo, BE = BD = 2.

Figure 1: esboço da solução.

Problema 4. Seja n um número natural.

(a) Mostre que 8n − 1 é múltiplo de 7.


8n − 1
(b) Encontre todos os valores de n tais que é um número primo. Justifique sua
7
resposta.

Solução. (a) Quando n = 0 temos que 8n − 1 = 1 − 1 = 0, que é um múltiplo de 7. E


para n = 1 temos 8n − 1 = 8 − 1 = 7 que também é múltiplo de 7. Suponha agora
que n ≥ 2. Para quaisquer reais x, y podemos fatorar a expressão xn − y n como:

xn − y n = (x − y)(xn−1 + xn−2 y + . . . + xy n−2 + y n−1 ).

Fazendo x = 8 e y = 1 temos que:

8n − 1 = (8 − 1)(8n−1 + 8n−2 + . . . + 8 + 1)
= 7 (8n−1 + 8n−2 + . . . + 8 + 1).

Logo, 8n − 1 é um múltiplo de 7.
Solução Alternativa de (a). 8n − 1 é múltiplo de 7 se, e somente se, 8n − 1 = 7k
para algum inteiro não negativo k. Isso equivale a 8n = 7k + 1, o que quer dizer que
basta provar que 8n deixa resto 1 na divisão por 7 para todo natural n.
Vamos primeiramente provar que se a e b são quaisquer dois números naturais que
deixam resto 1 por 7, então ab também deixa resto 1 por 7. Sejam q1 e q2 os quocientes
das divisões, respectivamente, de a e b por 7. Dessa forma, a = (7q1 +1) e b = (7q2 +1).
Então ab = (7q1 +1)·(7q2 +1) = 49q1 q2 +7q1 +7q2 +1 = 7(7q1 q2 +q1 +q2 )+1 = 7t+1,
onde t = 7q1 q2 + q1 + q2 . Logo, ab deixa quociente t e resto 1 por 7.
Aplicando o fato acima repetidamente, podemos observar que ao realizarmos o pro-
duto de quaisquer n números onde cada deles deixa resto 1 por 7, também obtemos
um número que deixa resto 1 por 7. Por fim, veja que 8n nada mais é dos que um
produto de n fatores iguais a 8. Como 8 deixa resto 1 por 7, segue que o mesmo vale
para 8n .

(b) Do item anterior já sabemos que (8n − 1)/7 é um inteiro.


Resta determinar quando ele é primo. Para n = 0, temos que 8n − 1 = 0, que não
é primo. Suponha que n ≥ 1. Veja que 8 = 23 , logo 8n − 1 = 23n − 1 = (2n )3 − 1.
Usando o produto notável x3 − 1 = (x − 1)(x2 + x + 1), com x = 2n , temos que:

8n − 1 = (2n − 1)(22n + 2n + 1).

Como 7 é um divisor de (2n − 1)(22n + 2n + 1) e 7 é primo, segue que 7 divide (2n − 1)


ou 7 divide (22n + 2n + 1).
Caso 1: Suponha que 7 divide (2n − 1). Temos então a fatoração

8n − 1 2n − 1
 
22n + 2n + 1 ,

=
7 7
n
onde 2 7−1 e 22n + 2n + 1 são inteiros. Se ambos forem maiores que 1, temos que
n
(8n − 1)/7 será composto. Assim, para 8 7−1 seja primo é necessário que pelo menos
n
um desses fatores seja igual a um e o outro seja primo. Para que 2 7−1 = 1, devemos
ter n = 3. Verifique que neste caso

8n − 1
= 1 · (22n + 2n + 1) = 26 + 23 + 1 = 64 + 8 + 1 = 73,
7

que realmente é primo. Por outro lado, se (22n + 2n + 1) = 1 então n = 0. Mas já


vimos que n = 0 não é solução.
Caso 2: Suponha agora que 7 divide 22n + 2n + 1. Neste caso temos a fatoração

8n − 1 22n + 2n + 1
 
= (2n − 1) ,
7 7
2n n
onde 2n − 1 e 2 +2 7
+1
são inteiros. Como no caso anterior, um desses números deve
ser igual a 1 e o outro um primo. Se 2n − 1 = 1 temos que n = 0, que não é
2n n +1
solução. E se 2 +2 7
= 1 temos que 22n + 2n + 1 = 7, logo n = 1. Neste caso,
(8n − 1)/7 = 7/7 = 1, que também não é primo.
Concluímos então que a única solução é n = 3.

Problema 5. Considere 5 números reais positivos distintos. Mostre que sempre é possível
escolher dois deles tais que tanto sua soma como o valor absoluto de sua diferença sejam
diferentes dos outros três números.

Solução. Seja S = {x1 , . . . , x5 } um conjunto com cinco reais positivos e assuma que
x1 < x2 < x3 < x4 < x5 . Vamos mostrar que (sempre) é possível escolher dois elementos
de S como no enunciado.
Primeiro examinamos a possibilidade de um dos números escolhidos ser o x5 . Veja que
para qualquer i ∈ {1, 2, 3, 4}, temos que xi + x5 > x5 , logo xi + x5 ∈ / S. E em particular
xi + x5 ∈
/ (S − {xi , x5 }) como pedido. Dessa forma, o par {xi , x5 } só não será uma solução
do problema se x5 − xi = xj para algum j ∈ {1, 2, 3, 4} com j 6= i. Como,

x5 − x4 < x5 − x3 < x5 − x2 < x5 − x1 ,

a única possibilidade para que todos os pares do tipo {xi , x5 }, onde i ∈ {1, 2, 3, 4}, não
sejam solução é se acontecer:

x5 − x1 = x4 , (1)
x5 − x2 = x3 , (2)
x5 − x3 = x2 , (3)
x5 − x4 = x1 . (4)

Assuma então que valem as igualdades acima. Na verdade, as equações (1) e (4) são
equivalente, assim como as equações (2) e (3). Dessa forma, elas podem ser resumidas a:

x1 + x4 = x2 + x3 = x 5 . (5)

Vamos então examinar a possibilidade de {x3 , x4 } ser solução. Usando que x3 > x1 e
a equação (5), temos x3 + x4 > x1 + x4 = x5 , logo x3 + x4 ∈/ S. Assim, esse par só não será
solução se x4 −x3 ∈ {x1 , x2 , x5 }. Mas a equação (5) também implica x4 −x3 = x2 −x1 < x2
(lembre-se que x1 > 0). Logo, o par {x3 , x4 } só não é uma solução se:

x4 − x3 = x1 . (6)
Por outro lado, se isso acontecer, afirmamos que {x2 , x4 } será solução. De forma
análoga à analise acima, temos x2 + x4 > x1 + x4 = x5 , logo x2 + x4 ∈ / S. E novamente
por (5) junto com x1 > 0, temos x4 − x2 = x3 − x1 < x3 . E por (6) temos x4 − x2 >
x4 − x3 = x1 . Logo, x4 − x2 ∈
/ {x1 , x3 , x5 }, como desejado. (Pode acontecer x4 − x2 = x2 ,
mas isso não infringe as restrições do enunciado).

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