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ORIENTAÇÕES ESTRATÉGICAS PARA A DEFINIÇÃO DO EDIFICADO

E SUA ENVOLVENTE PARA PROTEÇÃO CONTRA INCÊNDIOS RURAIS

Conteúdo
Documentação de referência utilizada ............................................................... 3
Enquadramento geral ........................................................................................... 5
Enquadramento no Plano Nacional de Ação do SGIFR (PNA) e respetivas
declinações nos Planos regionais e Sub-regionais de Ação (PRA e PSA) ......... 7
Boas práticas de construção e de manutenção do edificado e envolvente
imediata para a sua proteção contra incêndios rurais .................................... 8
Relevância ............................................................................................................................. 8
Principais processos de Ignição do edificado ........................................................................ 9
Telhado ................................................................................................................................ 11
Paredes ................................................................................................................................ 12
Portas .................................................................................................................................. 12
Janelas ................................................................................................................................. 13
Portadas ou persianas ......................................................................................................... 13
Aberturas e respiradores..................................................................................................... 14
Alpendres, varandas e pérgulas .......................................................................................... 14
Espaço envolvente ao edificado .......................................................................................... 14
Investimentos para melhoria de proteção do edificado ..................................................... 15
Manutenção ........................................................................................................................ 16
Autoproteção ...................................................................................................................... 16
Seguros do edificado contra risco de incêndio rural........................................................... 17

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ORIENTAÇÕES ESTRATÉGICAS PARA A DEFINIÇÃO DO EDIFICADO
E SUA ENVOLVENTE PARA PROTEÇÃO CONTRA INCÊNDIOS RURAIS

Documentação de referência utilizada


Pela sua relevância, para os objetivos pretendidos, procede-se à reprodução de extratos
adaptados dos relatórios seguidamente identificados, conjugados com outras informações
relevantes existentes, para a produção de contributos para o estabelecimento de
regulamentos ou procedimentos de intervenção para a rede secundária de faixas de gestão
de combustíveis e de proteção do edificado, de acordo com as responsabilidades das
entidades no âmbito da legislação em vigor e do Plano Nacional de Ação Sistema de Gestão
Integrada de Fogos Rurais (SGIFR).

Relatórios ForestWISE / Associação para o Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial


(ADAI) que serviram de referência para a emissão das propostas de orientações estratégicas:

a) Planeamento da gestão de combustíveis. Efeito da distância e da frequência das


limpezas na proteção das estruturas e rede viária. Ribeiro L. M., Almeida M., Viegas D.
X., Alves D., Barbosa T. e Modarres M. (2021). ForestWISE (Coordenação) - Projetos AGIF
2021 (P32100231), Vila Real, 160 pp. Centro de Estudos Sobre Incêndios Florestais /
Associação para o Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial / Laboratório
associado de energia, transportes e aeronáutica. Dezembro 2021. AGIF, I.P. – Agência
para a Gestão Integrada de Fogos Rurais, no âmbito da aquisição de serviços de
investigação e desenvolvimento CEXC/09CE-SGPCM/2020.
Objetivos: Produção de documentação que permita apoiar a revisão das disposições
referentes à Rede Secundária de Faixas de Gestão de Combustíveis, em resposta às
questões: 1. Qual a dimensão mínima ou aconselhada das redes secundárias de faixas
de gestão de combustível? 2. Qual a frequência da gestão de combustíveis que deve ser
exigida considerando o tipo de combustível florestal e as condições climatológicas locais?
São apresentadas sugestões de adequação das dimensões das faixas de gestão de
combustíveis da Rede Secundária e da frequência das limpezas associadas, devidamente
fundamentadas na bibliografia técnica e científica mais recente e reconhecida pelos
pares. O critério principal que prevaleceu na análise foi sempre o do comportamento
expectável do fogo nas imediações destas estruturas.
b) Regras para o Edificado e Envolvente nos Territórios Rurais. Almeida M., Ribeiro L.,
Modarres M. e Viegas D. X. (2021). Regras para o Edificado e Envolvente nos
Territórios Rurais. ForestWISE (Coordenação) - Projetos AGIF 2021 (P32100231), Vila
Real, 93 pp. Centro de Estudos Sobre Incêndios Florestais / Associação para o
Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial / Laboratório associado de energia,
transportes e aeronáutica. Dezembro 2021 AGIF, I.P. – Agência para a Gestão
Integrada de Fogos Rurais, no âmbito da aquisição de serviços de investigação e
desenvolvimento CEXC/09CE-SGPCM/2020.

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E SUA ENVOLVENTE PARA PROTEÇÃO CONTRA INCÊNDIOS RURAIS

Objetivos: O objetivo deste trabalho consiste na análise de conhecimento científico que


permita apoiar o desenvolvimento de regulamentos técnicos e outros diplomas legais no
âmbito da segurança contra incêndios na dual casa envolvente. Não se pretende centrar
este estudo nos incêndios florestais ou no comportamento do fogo no interior das
edificações. Este relatório deve ser considerado em complementaridade com o relatório
a). O principal foco refere-se à propagação do fogo rural às construções, desde a sua
envolvente imediata, i.e., o espaço exterior até uma distância inferior a 50m desde o limite
da construção. Os contributos essenciais deste trabalho prendem-se com a resposta às
seguintes questões: 1. De que forma poderão ser minimizados os riscos de propagação
dos fogos rurais aos edifícios a eles expostos? 2. Quais as práticas construtivas que devem
ser seguidas, e com que priorização, com vista à redução da vulnerabilidade dos edifícios?
3. Quais a práticas de gestão de combustíveis na envolvente imediata às construções que
permitem minimizar o seu nível de exposição aos incêndios rurais?

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Enquadramento geral
Os dois relatórios, apesar de se debruçarem sobre intervenções diferenciadas em termos
de incidência no território e de responsabilidades (rede secundária de faixas de gestão de
combustível, e regras para o edificado e envolvente), coincidem no seu conjunto para dar
respostas a necessidades de proteção contra incêndios rurais, orientada para a segurança e
salvaguarda das pessoas, animais e bens em áreas edificadas e nas demais áreas, instalações,
estabelecimentos e infraestruturas abrangidos pela rede secundária (n.º 2, do art.º 4.º, do Decreto-
Lei n.º 82, de 13 de outubro de 2021).

Ao longo dos relatórios referenciados fica clara a interdependência e complementaridade


entre as duas tipologias de intervenção, sendo difícil garantir eficácia na persecução dos
objetivos da rede secundária se, no património construído e sua envolvente imediata, não
forem também garantidas condições adequadas para a sua proteção.

Existe, no entanto, diferenciação regulamentar e, portanto, de procedimentos, relevante


quanto à implicação e implementação das propostas.

O planeamento e regras de implementação da rede secundária de faixas de gestão de


combustíveis, passíveis de aplicação em territórios rurais são perfeitamente definidas nos
artigos 47.º e 49.º, do Decreto-Lei n.º 82/2021, de 13 de outubro, devendo ser
regulamentadas pelo ICNF as normas técnicas relativas à gestão de combustível.

Na envolvente do edificado localizada no interior de áreas edificadas, fora de territórios


rurais (interface de áreas edificadas, a linha poligonal fechada que delimita as áreas edificadas,
separando-as de outros territórios), a gestão de combustível é executada nos termos de
regulamento municipal, de acordo com o n.º 9, do Artigo 49.ª, do Decreto-Lei n.º 82/2021, de
13 de outubro.

Quanto às características do edificado, é definido no art.º 22.º do Decreto-Lei n.º 82/2021, de


13 de outubro, como deveres dos seus proprietários, no âmbito do SGIFR, que estes: a)
Adotam as melhores práticas de autoproteção e redução de ignições, garantindo que o edifício
tem condições para impedir a entrada de material incandescente, não sendo referidas em que
termos deverão ser definidas nem consequências de incumprimento. No entanto, no âmbito
deste normativo, passam a existir condicionantes para as obras de construção, reconstrução
ou ampliação, dentro ou fora das áreas prioritárias de prevenção e segurança (APPS),
relativas à adoção de medidas relativas à resistência do edifício à passagem do fogo e à
contenção de possíveis fontes de ignição no edifício e logradouro:

• Adoção de medidas de proteção relativas à resistência do edifício à passagem do fogo, de


acordo com os requisitos estabelecidos por despacho do presidente da ANEPC e a constar
em ficha de segurança ou projeto de especialidade no âmbito do regime jurídico de
segurança contra incêndio em edifícios, de acordo com a categoria de risco, sujeito a

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parecer obrigatório da entidade competente e à realização de vistoria. Ponto iv), da


alínea b), do Artigo 60º para edificação em APPS. Alínea c), do n.º 1 do art.º 61.º para
edificação em áreas fora das APPS.
• Adoção de medidas relativas à contenção de possíveis fontes de ignição de incêndios no
edifício e respetivo logradouro. Ponto v), da alínea b), do art.º 60.º para edificação em
APPS. Alínea d), do nº 1 do art.º 61.º para edificação em áreas fora das APPS.

Face à diferenciação de regulamentação e de responsabilidade existente em função da


classificação do território em que se inserem as intervenções de gestão de combustíveis na
envolvente do edificado, mas à importância da sua implementação em qualquer das
situações, algumas das propostas de regulamentação constam simultaneamente do
documento relativo à rede secundária e do documento relativo às boas práticas de
construção e de manutenção do edificado e envolvente.

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Enquadramento no Plano Nacional de


Ação do SGIFR (PNA) e respetivas
declinações nos Planos regionais e Sub-
regionais de Ação (PRA e PSA)
• Orientação estratégica: 2 - Cuidar dos Espaços Rurais”
o Objetivo estratégico: 2.3. Aumentar a eficácia da proteção das populações e
do território edificado
▪ Programa: 2.3.1. Apoiar a implementação dos programas de
autoproteção de pessoas e infraestruturas
• Projetos (fichas de projeto):
2.3.1.2 Gestão de combustível nos aglomerados rurais e
envolvente de áreas edificadas
2.3.1.3 Incrementar a resiliência do edificado
2.3.1.4 Programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras”

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Boas práticas de construção e de


manutenção do edificado e envolvente
imediata para a sua proteção contra
incêndios rurais
Frequentemente as estratégias e recursos operacionais para supressão dos incêndios rurais
acabam por se focar maioritariamente na proteção de edifícios isolados ou em aglomerados
populacionais, secundarizando o combate à frente de chamas que se desenrola nos
ambientes mais naturais, ou seja, no espaço florestal. Assim, a gestão dos incêndios deve
prever práticas que diminuam a exposição e vulnerabilidade dos edifícios ao fogo. Este
desígnio pode ser conseguido através de procedimentos de construção adequados e através
de ações de gestão dos combustíveis na sua envolvente.

Relevância
• Regulamento Municipal de gestão de combustíveis na envolvente do edificado em
áreas edificadas, de acordo com o n.º 9., do art.º 49º do Decreto-Lei n.º 82/2021, de
13 de outubro. Nível municipal (PE).
• Deveres dos proprietários de garantia de que o edifício tem condições para impedir
a entrada de material incandescente, de acordo com o art.º 22º do Decreto-Lei n.º
82/2021, de 13 de outubro. Nível nacional e municipal.
• Para obras de construção, reconstrução, ou ampliação de edifícios, dentro das áreas
prioritárias de prevenção e segurança (APPS), ou fora destas, em solo rústico fora de
aglomerados rurais, quando se situem em território florestal ou a menos de 50 m
de territórios florestais,
o Despacho do presidente da ANEPC com os requisitos de proteção relativas à
resistência de edifício à passagem do fogo, de acordo com o ponto iv), da
alínea b), do art.º 60º para edificação em APPS, e da alínea c) do n. º 1., do
art.º 61º para área fora das APPS, do Decreto-Lei n.º 82/2021, de 13 de
outubro. Nível nacional.
o Definição de medidas relativas à contenção de possíveis fontes de ignição de
incêndios no edifício e respetivo logradouro, de acordo com ponto v), da
alínea b), do art.º 60º para edificação em APPS, e da alínea d), do n.º 1 do art.º

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61º para edificação em áreas fora das APPS, do Decreto-Lei n.º 82/2021, de
13 de outubro. Nível nacional e municipal.
• Programas nacionais de proteção de aglomerados populacionais e de sensibilização
para a prevenção de comportamentos de risco, nomeadamente os programas
«Aldeia Segura» e «Pessoas Seguras», ANEPC. Nível nacional e local.

• Programa Condomínio de Aldeia. Nível nacional e local.


• Ações de informação, formação e sensibilização. Níveis nacional, regional, sub-
regional, municipal e local.

Principais processos de Ignição do edificado


• A ignição das construções dá-se maioritariamente pela projeção de partículas
incandescentes. Da análise dos grandes incêndios de 2017 (Pedrogão Grande e 15
de outubro), observou-se que o principal mecanismo de ignição dos edifícios foi
provocado pela deposição de fagulhas, ou partículas incandescentes, provindas do
incêndio.
• Boa parte das ignições das estruturas terá tido origem em fagulhas (61 %), e não pelo
impacto direto do fogo, que foi responsável por cerca de 21 % das ignições no caso
de estudo do Incêndio Rural de Pedrogão Grande de junho de 2017 (IR PG).
• A deposição de fagulhas em partes sensíveis das estruturas ou em acumulações de
combustíveis encostadas a elas ou nos telhados é na realidade o principal método
de ignição de edificações.
• A maioria das casas arde por deposição de partículas incandescentes que
normalmente foram originadas fora do espaço defensável. A projeção de partículas
incandescentes é o fenómeno mais frequente de ignição de estruturas, podendo
ocorrer a dezenas, centenas ou mesmo milhares de metros a partir da frente de um
incêndio, o que reforça a necessidade de garantir a melhor proteção possível ao fogo
das suas componentes e envolventes.
• Na maioria dos casos de estudo apresentados a destruição de casas não está
associada a comportamento extremo do fogo diretamente na Interface urbano
Florestal (IUF), mas antes a fogo de superfície em conjunto com projeções, de curta
a muito longa distância.
• A análise aos impactos dos grandes incêndios ocorridos em Portugal em 2017 indica
que os elementos das casas através dos quais se dão as primeiras ignições são os
telhados e as janelas das casas.
• Mesmo para as edificações que se encontrem no interior dos aglomerados rurais,
nas proximidades de espaços florestais, onde a exposição a incêndios rurais é maior,
as indicações de boas práticas na construção, na manutenção do espaço contíguo à
casa (a faixa perimetral de 1,5 a 2m), e até a boa seleção de espécies de jardim,
devem ser seguidas, de forma a evitar a possibilidade de deflagração por projeção
de partículas, que afeta casas na periferia e no interior dos aglomerados.

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E SUA ENVOLVENTE PARA PROTEÇÃO CONTRA INCÊNDIOS RURAIS

• Várias instalações industriais originam um tipo específico de IUF, onde as


vulnerabilidades são potencialmente maiores e os prejuízos associados às perdas
também. Nestas zonas deve ser promovida a melhoria da proteção das edificações
através de alguns cuidados específicos: incorporação de materiais resistentes ao
fogo; diminuição dos pontos vulneráveis; eliminação de acumulação de materiais
combustíveis no espaço contíguo; instalação de medidas ativas e/ou passivas de
mitigação do risco de incêndio.
• Do total de 1.043 estruturas danificadas no IR PG1, a classe mais afetada foi a de
estruturas de apoio ou anexos, como barracões ou arrumos, representando quase
40% do total. Importante alertar e sensibilizar para a relevância deste tipo de
estruturas este tipo de estruturas, que hipotecam a afetação de meios que poderiam
ser fundamentais para outras situações prioritárias de supressão e, em particular,
de socorro.
• As componentes das edificações que mais as expõem ao perigo de incêndio na IUF,
particularmente afetados pela deposição de partículas incandescentes, são
habitualmente:
o A envolvente - as partículas incandescentes transportadas pelo vento podem
causar novas ignições nos objetos e materiais combustíveis em contacto com
as fachadas;
o O telhado e calhas – são uma parte vulnerável das casas - o telhado das mais
vulneráveis - devido à acumulação de folhas ou outros elementos
combustíveis finos e onde as partículas incandescentes se podem depositar;
o Respiradores e outras aberturas – podem permitir a entrada de partículas
incandescentes, fumo e chamas para o interior da habitação;
o Portas e janelas – os vidros (simples) partem facilmente com o calor e
turbulência típicos dos incêndios, levando ao colapso e permitindo a entrada
de partículas incandescentes, chamas e fumo para dentro, sendo as janelas
(com vidros simples) das partes mais vulneráveis;
o Jardins e sebes – as plantas ornamentais são fontes potenciais de ignição. As
espécies mais inflamáveis são mais propensas a entrar em combustão e a
desenvolver chamas, especialmente se contiverem material seco na parte
aérea;
o Reservatórios de combustíveis (incluindo botijas) – outros riscos induzidos
podem ameaçar o edifício, como a ignição de hidrocarbonetos inflamáveis
ou a explosão de tanques de GPL.
• Com base nas melhores práticas internacionais, e da análise da literatura científica
e técnica, sugere-se a adoção do conceito de zonamento (à semelhança da HIZ- Home
Ignition Zone), para o espaço envolvente das estruturas, com a adoção de 3 zonas,
com dimensões e critérios de gestão variáveis. A primeira pretende criar uma

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A abreviação para IR PG, refere-se ao complexo de incêndios designados de Pedrogão Grande,
ocorridos em 17 de junho de 2017.

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separação física entre vegetação e estrutura, a segunda limitar a progressão do fogo


e a sua intensidade através da gestão total de combustíveis e a terceira aumentar a
probabilidade de as casas resistirem a um incêndio florestal, tal como as anteriores,
e ao mesmo tempo melhorar a segurança e eficácia das forças de combate que
necessitem de as defender.

Ilustração do conceito de Home Ignition Zone, retirado de NFPA (2021a).

• De um modo geral, deve existir uma área contígua à estrutura (normalmente 1,5 a
2m) completamente desprovida de combustível florestal (Zona 1, ou II- Interface
Imediata), seguida de uma zona, usualmente até 10 metros, mas variável em função
do declive (Zona 2, ou IP- Interface Próxima), onde todo o combustível de superfície
deve ser retirado e o arvoredo eliminado ou desbastado. Por último seguir-se-á uma
zona (Zona 3, ou IA - Interface Alargada) em que se deve evitar acumulação
significativa de combustível e assegurar descontinuidade vertical adequada.

Telhado
• O telhado é a componente estrutural onde normalmente se verifica a primeira
ignição das construções, normalmente pelo mecanismo de projeção de partículas
incandescentes.
• O nível de manutenção dos telhados, sobretudo a sua limpeza (eliminação de folhas
e outros detritos) e remoção de telhas partidas, e as práticas construtivas existentes
são os principais fatores que afetam a vulnerabilidade do edifício.

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• Destacam-se como elementos vulneráveis os telhados sem barreira (placa no


telhado, de grande relevância para diminuir a vulnerabilidade do edifício ao fogo).
Os telhados suportados por uma estrutura de madeira e sem isolamento resistente
ao fogo são os componentes mais débeis, pois as pequenas frinchas que existem
entre as telhas ou nos beirais são o suficiente para as partículas incandescentes
entrarem dentro da casa. Nas construções mais modernas, os sótãos são
usualmente construídos em placa de betão, conferindo maior resistência da
estrutura ao fogo.
• Beirais não rematados à estrutura do telhado facilitam a entrada de partículas
incandescentes nos edifícios.
• Telhados em “chapa sandwich”, com interior de poliuretano, nas condições de
temperaturas elevadas, típicas de um incêndio rural, podem fazer com que a camada
esponjosa de poliuretano se comece a degradar, criando uma zona de entrada de
vento, acabando por levantar ou mesmo arrancar a placa sandwich, expondo o
interior da construção à entrada de partículas incandescentes.

Paredes
• A larguíssima maioria das casas localizadas em zonas com propensão para incêndios
rurais tem paredes feitas em material não inflamável, nomeadamente pedra e
alvenaria.
• Paredes com cobertura vegetal como hera, vinha real ou outras plantas, designadas
frequentemente por “paredes verdes” ou “paredes vivas”, aumentam a
vulnerabilidade da casa aos incêndios rurais.
• O caso das paredes compostas por dois tipos de materiais, frequente em unidades
empresariais, mostrou ser relevante na ignição deste tipo de estruturas, pelas
aberturas ou dilatações existentes, que ocorrem frequentemente na transição de
materiais.
• Muitas instalações industriais apresentam paredes em chapa metálica que tem
tendência para dilatar perante condições de alta temperatura, provocando a
abertura de fendas nas zonas de junção das chapas metálicas, criando condições
para a entrada de partículas incandescentes. O efeito da dilatação das vigas e pilares
metálicos deste tipo de construções, pode igualmente criar brechas que aumentam
a vulnerabilidade do edifício à entrada e deposição de partículas incandescentes.

Portas
• A existência de folgas entre portas exteriores e a sua armação, normalmente na
parte inferior, permitem a entrada de partículas incandescentes e, eventualmente, a
ignição do edifício.
• Portas exteriores com vidro simples apresentam uma maior fragilidade perante a
presença de altas temperaturas e ventos fortes, que promovem uma grande

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vibração do vidro, podendo conduzir à sua quebra, permitindo a entrada de


partículas incandescentes e, eventualmente, a ignição do edifício.
• O aspeto do isolamento das portas é muito importante, pois além de impedir a
entrada de fagulhas também pode minimizar a entrada de fumo durante a
passagem do fogo, proporcionando melhores condições de sobrevivência a quem
se encontre dentro das mesmas.

Janelas
• As janelas influenciam decisivamente a vulnerabilidade de um edifício, sobretudo
porque altas temperaturas e ventos fortes, típicos do ambiente de incêndio rural,
podem levar à quebra dos vidros, possibilitando a entrada de partículas
incandescentes dentro da construção.
• As janelas de vidro simples e as persianas de PVC oferecem pouca resistência a
incêndios intensos, embora a sua combinação possa impedir a entrada do fogo em
alguns casos, pelo menos enquanto a sua integridade estrutural não for quebrada.
• O tipo de vidro é determinante para a possibilidade de quebra durante um incêndio
rural. Vidros de espessura inferior a 3 mm, têm maior tendência a quebrar quando
sujeitos aos fluxos de calor típicos dos incêndios rurais.
• Vidros duplos ou com uma espessura igual ou superior a 4 mm podem estalar, mas
dificilmente quebram e permitem a entrada de fagulhas, quando sujeitos às
condições extremas típicas de um incêndio.
• Algumas das intervenções podem apresentar um benefício duplo – por exemplo, a
substituição dos vidros e a eliminação de folgas, nas portas ou nas janelas, beneficia
o edifício não apenas pela maior proteção contra os efeitos dos incêndios rurais,
mas também beneficiam a casa em termos de eficiência energética.

Portadas ou persianas
• As janelas de vidro duplo, complementadas com persianas de alumínio ou portadas
de madeira oferecem maior proteção contra o impacto direto das chamas.
• As portadas raramente ignificam, ou a sua ignição apenas se dá numa fase tardia ou
de intensidade extrema do fogo, na sequência da ignição de outros elementos
construtivos.
• As portadas exteriores são normalmente preferíveis porque protegem não apenas
o interior da casa, mas também a integridade da janela. As persianas são também
elas um bom elemento protetor.

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Aberturas e respiradores
• Todas as aberturas para entrada ou saída de ar (respiradores, chaminés, saídas de
exaustores, etc.) deviam idealmente estar equipadas com redes metálicas de
retenção de partículas, para minimizar a possibilidade de entrada e de saída de
partículas incandescentes.
• De forma a promover o aumento da resistência estrutural das edificações ao fogo
rural, deve ser promovida a colocação de proteções anti fagulha em respiradouros
ou outras aberturas.

Alpendres, varandas e pérgulas


• A existência de alpendres, deques/estrados ou varandas pode criar zonas de
estagnação dos escoamentos atmosféricos onde as partículas incandescentes
tendencialmente se depõem, aumentando a vulnerabilidade do edifício se estes
elementos forem inflamáveis, como no caso das madeiras ou caniços.
• Muitas casas do meio rural apresentam pérgulas de ensombramento de espaços de
lazer junto ao edifício central. Por vezes, verifica-se que a primeira ignição, ou a
ignição sustentada que conduz o fogo ao edifício, tem início nas pérgulas, sobretudo
se forem compostas por espécies vegetais com elevada inflamabilidade.

Espaço envolvente ao edificado


• É possível que a ignição das “estruturas adjacentes”, dos “materiais residuais
depositados na envolvente” ou dos “produtos acabados ou intermédios depositados
na envolvente” tenha ela própria sido provocada por fagulhas, o que pode aumentar
a percentagem global final deste mecanismo de ignição.
• A existência de plantas junto aos edifícios ou mesmo constituindo uma parede ou
telhado verde são muitas vezes altamente perigosas para a integridade do edifício.
• Os combustíveis que se encontram nas imediações das edificações, são fatores que
contribuem para a sua ignição, nomeadamente: barracões de apoio, pilhas de lenha,
ramos, folhas secas, deques de madeira, alpendres, pérgulas, cercas de madeira,
botijas de gás, mobiliário de jardim, derivados de petróleo (plásticos, pneus, etc.).
• É extremamente importante retirar das imediações das casas todos os restos
vegetais resultantes de cortes dos matos, podas e desramas, limpezas de plantas
ornamentais, etc.
• Deve existir uma distância mínima, não inferior a 3m, entre as construções e as
sebes vivas.
• Eliminação física de todo o material inflamável nos primeiros 2m contíguos às
paredes do edificado. A questão do isolamento numa faixa de 2m parece ser
fundamental, pois não só não permite que o fogo entre em contacto direto com os

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elementos estruturais, como também elimina a possibilidade de fagulhas se


depositarem em materiais combustíveis aqui existentes.
• Muitas das espécies mais usadas em sebes apresentam uma grande inflamabilidade
graças à grande quantidade de material morto que têm no seu interior, tal como os
ciprestes (Cupressus sp.), aumentando o perigo para o edifício que muitas vezes está
próximo.
• Para constituição de sebes e instalação de arvores ornamentais na envolvente dos
edifícios devem ser evitadas espécies que acumulem material morto na copa (ex.
ciprestes - Cupressus sp.), devendo ser favorecidas espécies com elevado teor de
humidade nas folhas e/ou folha espessa (ex. Prunus sp., Tilia sp., árvores de folha
caduca em geral, etc.).

Tabela 1. Distâncias, objetivos e tipologias de intervenções na Interface Imediata.

Zona de Edificações Estruturas Objetivo da Tipologia de


Interface Isoladas Poligonais intervenção intervenção
II - Criar separação física
Eliminação completa
Interface entre combustíveis e
<2 < 3,5 de combustíveis
Imediata edificado

Tabela 2. Gestão dos diferentes tipos de combustíveis em função da distância ao edificado.

Zona de
Folhada Herbáceas Arbustivas Arvores
Interface
Eliminação total de resinosas e
II -
folhosas de folha perene de
Interface Eliminação Eliminação Eliminação
espécies florestais (excluindo
Imediata total total total
ornamentais).

Investimentos para melhoria de proteção do edificado


• As componentes estruturais para as quais as intervenções seriam mais vantajosas
em termos de incêndios rurais seriam: o telhado, as janelas, as portas, a capacidade
de autoproteção e a autonomia em termos de água e energia.
• A proteção das aberturas e respiradores é claramente a medida que apresenta a
relação custo/benefício mais vantajosa, ao contrário do que acontece com as portas
que têm um custo mais alto para a diminuição de vulnerabilidade que a intervenção
proporcionaria.
• A sobrevivência (das estruturas) não está garantida quando o espaço defensável é
muito grande, sendo mais importante o espaço mais próximo das casas.

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Manutenção
• A existência de construções abandonadas ou em ruínas, dentro de povoações,
constituem-se como recetores de fagulhas e a sua vulnerabilidade, associada ao
facto de terem por vezes vegetação no seu interior, levou a que começassem a arder
colocando em perigo outras construções em redor.
• Foi analisado (IR PG2017) o caso particular de um empreendimento constituído por
casas de madeira com fins turísticos, onde todas foram destruídas, menos as casas
dos proprietários, de construção idêntica, mas com um grau de manutenção na
própria casa e na envolvente, muito superior, nomeadamente o cuidado tido na
gestão de combustíveis no jardim e na escolha de espécies menos inflamáveis. Este
facto é muito importante na demonstração de que a boa gestão e manutenção de
uma estrutura e do seu espaço envolvente são fatores tanto ou mais importantes na
sobrevivência ao fogo do que os próprios materiais que a constituem.
• A análise (IR PG) da afetação em função estado de conservação estrutural das
edificações, mostrou que: das que se encontravam bem conservadas, cerca de 30 %
teve apenas danos ligeiros, e 36 % ficaram completamente destruídas; nas
moderadamente ou mal conservadas, o dano centrou-se na esmagadora maioria
nas classes de muito danificada e de totalmente destruída.

Autoproteção
• A probabilidade de a casa sobreviver é sempre muito maior quando há gente dentro
ou por perto.
• Verifica-se que frequentemente as pessoas não fecham as portadas ou persianas
durante um incêndio rural, pelo que a sua capacidade de proteção não é utilizada.
• A proteção dos edifícios está muito dependente dos meios de proteção civil, já que
a capacidade de autoproteção é baixa. Os meios de autoproteção, quando existem,
limitam-se frequentemente a mangueiras de jardim, que quase sempre perdem
operacionalidade quando falha o abastecimento público de água ou de energia
elétrica.
• A capacidade de autoproteção está relacionada não apenas com equipamentos e
aptidão física e mental para intervir no incêndio, mas também com a autonomia
relativamente a água e energia, já que a disponibilização pública destes recursos por
vezes falha, sobretudo em situações de grandes incêndios.
• Em termos genéricos refere-se que, salvo em condições específicas em que sejam
usados sistemas de autoproteção com operação sem água e sem energia de suporte
(e.g., telas ignífugas sem sistema de arrefecimento), em situações de risco elevado
deve ser garantida autonomia destes dois recursos – água e energia – uma vez que
durante uma situação de incêndio, o abastecimento público pode não responder às
necessidades.

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ORIENTAÇÕES ESTRATÉGICAS PARA A DEFINIÇÃO DO EDIFICADO
E SUA ENVOLVENTE PARA PROTEÇÃO CONTRA INCÊNDIOS RURAIS

• Deve ser incentivado o uso de sistemas ativos ou passivos de autodefesa em


estruturas ou infraestruturas críticas ou estratégicas, ou de interesse especial, por
exemplo em: torres de telecomunicações; estações ou subestações de distribuição
de energia; polígonos industriais; áreas de serviço das autoestradas e dos itinerários
principais.
• A maioria das vítimas do complexo dos IR de PG tentavam fugir do fogo, a pé ou de
carro. Registaram-se 4 fatalidades dentro de casa (dum total de 66), sendo que todas
essas 4 vítimas tinham pouca independência para poder resistir ao fogo, pelo que
deveriam, se possível, ter sido evacuadas.

Seguros do edificado contra risco de incêndio rural


• As seguradoras, que responderam ao inquérito e que representam cerca de 97% dos
contratos de seguro à habitação em Portugal, indicaram assumir o risco contra
incêndios rurais apenas em condições excecionais, após uma análise casuística.
• Referiram também que apenas poderiam alterar a sua postura de aceitação deste
risco mediante alterações regulamentares e de novos desenvolvimentos na
avaliação do risco, assim como no aparecimento de novas soluções tecnológicas que
fizessem diminuir a probabilidade de danos nos edifícios na sequência dos incêndios
rurais.

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