DADAÍSMO PETISTA: o Brasil lançou-se a um extravagante
exercício de interpretação de texto na semana em que o “traseiro”
tornou-se palavra influente na economia e na política. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou-se na aventura do automatismo verbal. Todo poder ao dadaísmo! Dadaístas de todo o mundo, uni- vos! Assim dizia o manifesto do movimento vanguardista do início do século 20, adversário da lógica: “(...) nada de republicanos, nada de realistas, nada de imperialistas, nada de anarquistas, nada de socialistas, nada de bolcheviques, nada de políticos, nada de proletários, nada de democratas, nada de burgueses, nada de aristocracia, nada de exércitos, nada de polícia, nada de pátrias, enfim, basta de todas essas imbecilidades, não mais nada, não mais nada. NADA,NADA, NADA”. Sacrifique-se a própria política, parecia dizer o presidente. Os juros são altos? Que o brasileiro levante “o traseiro da cadeira” e mude de banco. A política econômica é questionada pela sociedade e pelo Congresso? E daí, se ele é “unha e carne” com o ministro Antonio Palocci (Fazenda) e jura dormir o “sono dos justos” por seu trabalho em prol do Brasil? As pesquisas mostram a atividade desacelerando e o desemprego aumentando? Dadá nelas! “Dadá vem do dicionário. É bestialmente simples. Em francês quer dizer ‘cavalo de pau'. Em alemão: ‘Não me chateies, faz favor, adeus, até a próxima!' Em romeno: ‘Certamente, claro, tem toda a razão, assim é. Sim, senhor, realmente. Já tratamos disso.'” Lula concedeu na sexta-feira sua primeira entrevista coletiva em 850 dias de governo. Falou, falou e falou. Não disse nada, a não ser que não há segredos na sua gestão: o governo é o que foi e será o que é. Dadá! Assim falou...
“Ele [o brasileiro] não levanta o traseiro do banco, ou da
cadeira, para buscar um banco mais barato. Reclama toda noite dos juros pagos e no dia seguinte não faz nada para mudar.” Do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao culpar os consumidores pelos altos juros cobrados pelos bancos. • 25.4.2005 – segunda-feira “Não há povo no mundo que seja mais criativo e trabalhador. [...] Quem paga esses juros é obrigado. Ninguém tem o prazer de gastar uma fortuna no cheque especial.” Do presidente da Fiesp, Paulo Skaf, em resposta a Lula. • 26.4.2005 – terça-feira
“[Lula] é uma máquina de dizer bobagens, um manancial de
lugares comuns, uma fonte inesgotável de metáforas de quarta categoria.” Do vice-presidente da Câmara, José Thomaz Nonô (PFL-AL), sobre a declaração do presidente. • 26.4.2005 – terça-feira
“[A declaração é] um escárnio ao povo brasileiro, pressionado
cada vez mais por juros escorchantes.” Do presidente do PPS, deputado Roberto Freire (PE), e do presidente do PDT, Carlos Luppi (RJ), em nota conjunta em que comentaram a afirmação de Lula. • 26.4.2005 – terça-feira
“O traseiro da indústria está se aproximando da cadeira. Ou
seja, a taxa de crescimento está se acomodando.” De Paulo Francini, diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. • 28.4.2005 – quinta-feira
“Certamente há que se ter critérios técnicos para a definição
da taxa de juros que norteará nossa economia, mas também é inegável que devemos ter maior transparência e efetiva participação do Poder Legislativo nas discussões técnicas que levam à definição desse ou daquele patamar de juros.” Do presidente da Câmara, deputado Severino Cavalcanti (PP-PE), ao comunicar que pretende criar uma comissão para estudar uma forma de retirar do Copom o poder de decidir sozinho a taxa básica de juros da economia. • 27.4.2005 – quarta-feira
“Passou da hora de trocar esta diretoria.”
Do presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Luiz Marinho, em reação à ata do Copom que sinaliza para uma nova alta da Selic em maio. • 28.4.2005 – quinta-feira
“Eu e o Palocci somos unha e carne.”
Do presidente Lula ao afirmar que a atual política de juros altos é a sua política e que não pretende mudá-la. • 29.4.2005