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Esta é a segunda vez que eu tento escrever este ensaio. A primeira vez eu
pensei que era sobre mim. Desta vez eu sei, eu sinto, é profundamente
sobre "nós", ou algum tipo de "nós" que pode ainda não ter sido formado
Contra o vício
Onde não é este o caso, no entanto, beber café todos os dias pode ser
você perguntar.
encontram nas lojas, puxar ferro, e injetar heroína são todos vícios. Este
nossas vidas não estão, e talvez nunca possam estar, livres deles. É um
império e as categorias que ele nos impõe. Este não é um ensaio neutro.
termo “recuperação”, pois parece apontar para um antigo eu, um “eu não
nunca somos nada mais ou menos diferente do que somos neste momento.
sinto em cada momento. Também não vou usar a palavra “limpo” pelas
1 O termo em inglês é “addiction”, que costuma ser traduzido na literatura científica como “adicção”, mas na
linguagem popular “vício” é mais comum; optei por manter esse termo.
razões óbvias que isto implica que as pessoas que são viciadas são
“sujas”, o que implica ainda mais todo tipo de racismo, classismo e valores
Neste ensaio, vou usar o termo “sóbrio” porque parece ser o menos
drogas. Poder-se-ia argumentar que a maioria das coisas são drogas e que
a maioria de nós não está sóbria, e talvez se esteja certo. Se algo vem à
mente que você pensa que pode ser uma droga e se pergunta se talvez
este ensaio seja sobre esta coisa, provavelmente é sobre esta coisa e a
maioria das outras coisas que as pessoas usam para fugir de seus corpos
ou alterar a percepção que seus corpos têm desta coisa que chamamos de
até usar o termo “amor”. Usarei estes termos com intenção. Não vou
querer dizer com eles algo que seja uma abstração. Este ensaio será um
ato de comunicação. Não será uma apresentação de nada que possa ser
chamado de “fatos”.
idade, usando coisas chamadas drogas e esta outra coisa chamada álcool
que também é uma droga, mas registrada como se fosse algo mais por
óxido nitroso e jogaria a lata pela janela. Minhas drogas de escolha para
ser viciado agora que não sou mais um viciado são o café, várias formas
de crime, e ideias abstratas que não consigo entender bem, mas gosto de
fingir que entendo bem. Se você me perguntar hoje porque usei drogas,
mas agora tem 25 anos e filtra essas experiências através da lente dessa
pessoa de 25 anos.
Quando eu tinha 16 anos bati meu carro em uma árvore porque estava sob
motorista por causa disso. Aos 16 anos, eu disse que nunca usaria "drogas
pesadas". Aos 17 anos, comecei a usar heroína e esta era a droga que eu
e, portanto, estou feliz por poder dizer que me mantive fiel ao meu
e fui suspenso da escola também pelo menos três vezes. Fui preso mais
de três vezes, mas não consegui dizer quantas vezes. Fui uma vez à
sobre isso.
sociedade. Uma coisa que as pessoas gostam de dizer sobre aqueles que
Algumas dessas pessoas usam drogas e outras não. Às vezes, ficar sóbrio
uma fuga deste mundo. Quando eu digo "este mundo", quero dizer o
mundo que foi colocado sobre nós. Não me refiro à Terra, mas a uma certa
dizer algo como "sociedade", mas não quero dizer "sociedade" porque não
podemos romper ou viver nas fendas dele. Um mundo é também algo que
trauma, então é verdade que tratar do vício requer tratar deste mundo e
mundo. Não precisamos de mais médicos para nos dizer que estamos
uma esperança cultural. Ela não nos será dada, ela será construída por
nós.
Outra coisa que as pessoas nos hospitais ou nas salas de aula da faculdade
sobre dependência que me diz que "a ciência moderna diz que a
uma doença e fico mais confuso sobre o que é realmente uma doença. Li a
que o vício é uma doença como a maioria das coisas, mas também é como
perguntar por que o capital poderia querer defini-lo dessa forma. O que
ter uma doença implica sobre aquilo que você tem? Em primeiro lugar,
implica que talvez exista algum tipo de cura ou curso de ação que possa
erradicá-la (ou que talvez um dia possa existir) e que o mais provável é
que essa cura ou curso de ação esteja disponível para compra em algum
aceite a maioria dos planos de saúde (apesar de seu website dizer que
aceita a maioria dos planos de saúde). Também implica que não é culpa da
pessoa que está usando drogas e que está simplesmente doente. Isto me
faz sentir melhor porque a maioria das pessoas se sente mal por aqueles
contra isso, pois ainda não sei o que esta coisa chamada doença realmente
mesmo quando não têm doenças. Sei que nunca escolhi ficar viciado, mas
também reconheço que fiz a maioria das escolhas que fiz enquanto viciado
por minha própria vontade. Por outro lado, também sinto que posso ter
sido possuído por algum tipo de demônio e não posso assumir nenhuma
responsabilidade pelas coisas que fiz quando estava drogado ou roubando
doença que são que todas as pessoas que são viciadas são fracas (eu sou
não ser uma doença e que as pessoas que usam podem ou não ser
egocêntricas, mas também que devemos apoiar amigos que desejam viver
uma vida diferente daquela que estão vivendo agora, e às vezes até
mesmo encorajá-los a viver uma vida diferente daquela que estão vivendo
agora quando vemos a que estão vivendo agora, levando-os a uma morte
busca nobre e seria difícil provar o contrário, mas este é um ensaio sobre
a vida e para aqueles que querem viver uma vida, pois eu não sei como
juntos.
Nós admitimos
Se você já frequentou uma clínica de reabilitação ou um curso de
psicologia ou leu uma revista sobre dependência, você ouvirá muitas coisas
ditas sobre a forma como se deve ficar sóbrio e os passos adequados para
manter essa sobriedade. A maioria destas coisas será declarada como fato
e são fatos na medida em que todas as opiniões são fatos, mas também
há outros fatos que podem não ter sido apresentados a você que devem
ser considerados.
tempo. Em vez disso, gostaria de ressaltar que o que faz programas como
mais.
que não tínhamos poder sobre o álcool - que nossas vidas haviam se
são um problema. Embora esta admissão possa ser uma parte importante
no processo de ficar sóbrio, ela não é a parte mais importante deste
um produto de isolamento. Isto não quer dizer que nunca existem laços
uma forma de viver para o eu. Quando começamos a sentir que não somos
em comum com todos os meus amigos, exceto alguns, era que todos nós
lugares ao longo dos últimos oito anos. Quando comecei a me sentir mais
sentia um certo vínculo ou vida em comum. Eu sabia que não queria beber
ou usar drogas e também sabia que não era como a maioria das pessoas,
então procurei por outras que pareciam não ser como a maioria das
pessoas e que também não queriam beber ou usar drogas. Foi aqui que eu
grupos com os quais se identificar. Eu não era mais um indivíduo que lutava
para permanecer sóbrio, eu era straight edge, e isso significava algo mais
mim mesmo.
ano de NA, apesar de minha desilusão com o programa de NA. Ainda não
2 Referência a uma subcultura punk que rejeita o uso de álcool e outras drogas.
Sobre o propósito
Quando se deixa de usar pela primeira vez as substâncias às quais está
significado e solidão que pode ser descrito com mais precisão como
fazendo não é mais uma parte de si mesmo - e na maioria dos casos esta
foi de fato a parte definidora de você, pois consumiu toda a sua vida.
Embora o desespero não possa ser evitado, o vazio de não ter nenhum
muitos aos seus vícios muito rapidamente. Isto também é o que leva
encontramos religiões, uma vez que são os melhores publicitários. Elas têm
indivíduo dentro dele. Eles podem até mesmo ter muito sucesso em ajudar
pessoas que eram viciadas em certas substâncias a não mais o serem. Eles
contra este mundo. É aqui que a busca individual da alegria se torna uma
aquele em torno do espaço que você habita. Não existe uma percepção
identificamos com algo fora de nós mesmos e, como tal, ainda somos
escravos de nosso próprio ego. Podemos retomar nossos vícios ou
Sobre a alegria
O que buscamos, então, é a reconciliação entre o sentido do nosso
cultos e senti que meu propósito era ajudar outras pessoas que sofriam
com essa coisa chamada vício. Também me alinhei com uma certa
com punks competindo por capital social alegando que era política, e
tem citações à sua volta. Não me lembro de tê-lo escrito. Procuro esta
se há, eu não poderia lhe dizer como encontrá-la. Deixamos esta verdade
esta verdade nos tornamos inseparáveis. No entanto, não paramos por aí.
verdade. Ao fazer isso, encontramos outros com uma verdade comum, uma
exceções à monotonia que nos rodeia. Nós nos tornamos uma força no
mundo. Não somos a única força e não somos a força mais forte, mas
Sobre a neutralidade
Pode-se dizer aqui que uma coletividade e um senso de propósito podem
que eu acharia detestáveis de outra forma. Embora seja duvidoso que este
ensaio chegue a qualquer um que esteja em vias de decidir se a
Como já foi dito, uma certa nova forma de vida é necessária para lidar
enraizamento nos confins do mundo que foi colocado sobre nós. É uma
deste mundo de modo a se tornar realmente contra elas. Não ficar fora
dos papéis que este mundo nos impõe, não faz de nós nada mais do que
possivelmente não. Mas o que você terá feito? Você terá deixado de
pelo qual vale a pena viver. Em vez disso, você receberá uma falsa
sóbrio, mas terá perdido a batalha contra o vício. Você não existe.
absoluto. Além disso, o Império criou este mundo que está cheio de vícios.
vício.
Sobre a vida
Eu procuro na internet por "como se recuperar do vício". O primeiro site
recupera criando uma nova vida onde é mais fácil não usar". Concordo com
que você detesta durante 40 horas por semana não é compatível com
este sentimento. Ser uma pessoa negra neste lugar chamado América não
é compatível com este sentimento. Ser uma mulher neste mundo não é
alegre.
política, mas não se trata de política, mas sim de vida e para aqueles que
expectativas que este mundo nos impõe são muitas vezes demais para
laços entre as criaturas é de partir o coração. Para onde quer que nos
luta contra este mundo e com as formas que ele nos obriga a ter vícios.
identidade que o império quer nos colocar a fim de nos subjugar ainda
para aqueles que lutam contra o vício, não há lugar seguro neste mundo,
assim como não há lugar livre do vício. O que nos une é um compromisso
Uma visão
Uma rede de espaços formada em torno do objetivo de criar um novo
estão lutando contra os vícios. Espaços sóbrios, mas não formados com o
Nosso propósito leva a sério a guerra contra a adicção de uma forma que
coisas que nós fazemos. Deveríamos nos tornar visíveis. Deixar panfletos
fora das clínicas de reabilitação, construir amizades com aqueles que são
construir nossos próprios espaços para pessoas que desejam ficar sóbrias
que não nos levam a sério, à polícia que só quer nos colocar na cadeia, e
amigos e como lidar com questões de saúde mental e criar espaços onde
distribuir seringas limpas para aqueles que não querem estar sóbrios. Nós
à beleza. Ainda somos viciados. Ainda teremos amigos que são viciados.
Ainda teremos amigos que não podemos ajudar apesar de nosso mais
profundo amor por eles e nossos mais profundos desejos de seu bem-
sistemas que empurram tantos para o vício, mas isto não significa que o
vício vá embora. Devemos fazer nosso melhor para ajudar aqueles que
não são a coisa que nos une. O que nos une é a visão do mundo em que
encontrar.