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ATIVIDADE POLICIAL COMO FATOR FOMENTADOR DE PROBLEMAS LIGADOS À

SAÚDE MENTAL.

DADOS

● Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, outro dado que chama a


atenção é o elevado número de SUICÍDIOS entre policiais: foram 104 casos. Assim,
houve mais suicídios que mortes em serviço, o que reflete o elevado nível de
pressão e exposição a que estão submetidos esses profissionais.
● De acordo com dados obtidos via Lei de Acesso à Informação na Secretaria de
Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, entre janeiro de 2014 e junho de
2018 três PMs foram diagnosticados, por dia, com transtornos mentais. Entre janeiro
e agosto de 2018, 2.500 policiais militares foram afastados por transtornos mentais,
mais que o dobro dos afastados em todo o ano de 2014 (836).

ARGUMENTOS

Um dos organizadores do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, Elisandro


Lotin, acrescenta no que se refere às causas desse fenômeno a existência do mito do
policial herói, tido como imune à problema, às condições estressantes da atividade e a
indiferença do Estado. Segundo o especialista: "De um lado, o policial não pede ajuda para
evitar ser visto como o fresco, o mole. Em alguns lugares, quem se afasta para se tratar tem
até perda salarial. Do outro, a maioria dos estados não tem um corpo de psicólogos e
psiquiatras para cuidar dos policiais. Ou tem um puxadinho ou nem tem.
A mística de que o policial é desprovido de fraquezas ou de sentimentos
contribui para a formação de um ambiente discriminatório em relação aos que são
diagnosticados com problemas emocionais e psiquiátricos, o que dificulta o estabelecimento
de um diálogo franco e aberto em nível institucional
Segundo o pesquisador de segurança pública Paes de Souza, o ambiente,
com frequência, é permeado por abusos de autoridade, perseguições, agressões verbais e
falta de confiança. O treinamento exigente – quando não abusivo – desde a entrada na
corporação, prolonga-se em um cotidiano de rigidez hierárquica e intimidação, agravando o
estresse, o medo e a angústia inerentes à profissão.
Além disso, como se sabe, os policiais têm que lidar diariamente com a
violência. Não raro, evidenciam-se situações traumáticas como, por exemplo, a perda de
um amigo, de um companheiro de farda. Retornar para o serviço de imediato, muitas vezes,
o vulnerabiliza emocionalmente, oportunizando o aparecimento de transtornos mentais.
É um ambiente de viés machista e de virilidade, em que não se admite
fraqueza, o que nos remete ao conceito de masculinidade tóxica (ver box abaixo). No meio
policial são comuns frases que exemplificam essa cultura: "nós só admitimos os fortes",
"militar é superior ao tempo", "militar não sente medo".
É comum a existência de policiais que evitam buscar tratamento porque se
recusam a assumir a fraqueza, inerente ao ser humano, ou pelo julgamento por parte dos
colegas, visto ser um meio no qual há ainda muito preconceito com o policial diagnosticado
com problemas emocionais e psiquiátricos.
Os policiais que se afastam por transtornos mentais são, com frequência,
vistos de forma pejorativa pelos colegas, taxados de fracos e vistos com desconfiança pelos
seus superiores por estarem, supostamente, utilizando-se de subterfúgios para não
trabalharem.

Cogitada a palavra do ano pelo dicionário Oxford em 2018 (no final, preferiu-se, apenas,
"tóxica", de caráter mais abrangente), masculinidade tóxica relaciona-se às normas
sociais que levam homens a não falar sobre seus sentimentos, não cuidar da própria
saúde, não demonstrar fragilidade e a tender a resolver conflitos fazendo uso da
violência. Trata-se de uma idealização da masculinidade, na qual prepondera a força,
enquanto a demonstração de emoções representa fraqueza. Alguns segmentos sociais
ainda carregam essa cultura, que é mais forte ainda no meio policial. Frases como o
"homem não chora" refletem a cultura em torno da masculinidade como insuscetível de
fraquezas, que, como nós sabemos, são inerentes ao ser humano (independentemente
do sexo) e, principalmente, os policiais, expostos a todo tipo de violência e estresse.

Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o convívio permanente


com a morte e a violência, as extenuantes jornadas de trabalho, a falta de sono, lazer e
convívio com a família são fatores de risco para os policiais. Estão diretamente relacionados
com o trabalho policial e, portanto, podem levar os profissionais a quadros de adoecimento
físico e mental. No entanto, as organizações policiais individualizam os problemas,
atribuindo ao indivíduo a responsabilidade por seu adoecimento ou violência auto infligida,
como no caso dos suicídios.

Ações do Estado:

Segundo a Lei 13.675/2018, a qual institui o Sistema Único de Segurança


Pública - SUSP: Art. 4º São princípios da Política Nacional de Segurança Pública e Defesa
Social (PNSPDS): [...] II - proteção, valorização e reconhecimento dos profissionais de
segurança pública; Art. 6º São objetivos da PNSPDS: [...] XXI - estimular a criação de
mecanismos de proteção dos agentes públicos que compõem o sistema nacional de
segurança pública e de seus familiares;
Formação de grupo de acompanhamento da saúde mental no âmbito das
corporações, com profissionais, de preferência, externos às instituições policiais. Isso facilita
o diálogo mais aberto, haja vista as barreiras à comunicação dentro das corporações,
mencionadas no item anterior.
Tratamento mais humano no ambiente policial. Isso envolve uma série de
quesitos, mas destaco a importância de mudança de paradigma, de forma que o policial
possa ser visto como um ser humano, com fraquezas que lhe são inerentes, e que merece
ser acolhido nos momentos de dificuldade. É importante que ele seja visto, tanto interna
quanto externamente (pela sociedade) como cidadão, titular de deveres, mas também de
direitos, como o da dignidade humana.
Aumento do efetivo policial como forma de reduzir a jornada de trabalho.
Trabalhar de forma contínua, sob condições extremadas de estresse, prejudica descanso
desses profissionais, afeta sua saúde psicológica e os afasta das próprias famílias e outras
redes de apoio que poderiam auxiliá-los em momentos de crise.
Não há exame psicológico período anual para averiguar a saúde mental dos
policiais que estão na corporação. Não há efetivo de psicólogos ou médicos psiquiatras
para acompanhar e avaliar periodicamente os agentes. Omissão estatal histórica. Deve-se
afastar o policial da arma de fogo quando diagnosticado com transtornos mentais.

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