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Mais Médicos retorna no governo Lula com recorde de inscritos e

mudança de perfil
Maior formação já realizada pelo programa tem maioria de formados no Paraguai; cubanos são apenas dois

21.nov.2023 às 7h00

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Tatiana Cavalcanti

SÃO PAULO O perfil do Mais Médico mudou. No ano que completou dez anos, o programa federal retornou no governo
Lula com recorde de inscritos, idade média mais elevada e o Paraguai na liderança do ranking de formação dos
profissionais. Os brasileiros também passaram a ser os mais numerosos.

Para ingressar no programa, que atualmente conta com 18,5 mil médicos, os inscritos participam de imersão
presencial e obrigatória, o MAAv (Módulo de Acolhimento e Avaliação de Médicos), e ao final de 30 dias estão sujeitos
a prova para aprovação definitiva.

No edital mais recente, 3.436 médicos iniciaram o curso em 6 de novembro. Essa é a a maior turma já reunida pela
iniciativa, segundo o Ministério da Saúde. Nesse período serão abordadas questões relacionadas à atenção primária,
ética médica e doenças comuns, como diabetes, câncer, tuberculose, pré-natal, além do funcionamento do SUS
(Sistema Único de Saúde).

O médico generalista Ismael Marins, 36 anos, durante curso do Mais Médicos no Jabaquara, zona sul de São Paulo; ele foi enfermeiro antes de
fazer faculdade de medicina no Paraguai - Zanone Fraissat/Folhapress

O grupo é composto por médicos intercambistas, brasileiros ou estrangeiros formados no exterior. As aulas, com
duração total de 160 horas, ocorrem simultaneamente em São Paulo (SP), Salvador (BA) e Belo Horizonte (MG), em
uma parceria dos ministérios da Saúde e Educação com universidades.

"Um ponto importante é a diversificação do perfil dos médicos, incluindo muitos que já tinham experiência em outras
áreas da saúde antes da medicina. A idade média [36 anos], é superior à média de formação médica no Brasil, e muitos
são pessoas maduras, alguns até casados", diz Nésio Fernandes, secretário da Atenção Primária à Saúde, pasta do
ministério.

É o caso do médico generalista Ismael Marins, 36. Ele se graduou primeiro em enfermagem para depois, aos 29 anos,
iniciar o curso de medicina. Casado, pai de uma menina de três anos, e natural de Ourinhos (SP), ele optou por
estudar em Ciudad del Este, no Paraguai.

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Para chegar até ali, conta que seus pais sempre o incentivaram a estudar. O pai era trabalhador rural e a mãe faxineira.
Eles próprios conquistaram novas carreiras com os estudos, ele virou professor e ela técnica de enfermagem.

"Acabei fazendo enfermagem e depois eles me ajudaram a realizar o meu sonho [de ser médico]. Por isso estar no Mais
Médicos fez renascer a esperança de conquistar uma nova carreira", diz ele, que vai trabalhar em Canitar, no interior
de São Paulo.

Para Marins, as aulas proporcionam as ferramentas necessárias para assumir o novo posto com mais segurança.
"Mesmo sendo brasileiro, é essencial aprender sobre o SUS, já que meu treinamento no exterior não incluiu essa
disciplina. Quero seguir atuando no Brasil, vou revalidar o diploma e seguir minha carreira com ética e dedicação."

Os médicos brasileiros e estrangeiros formados no exterior poderão participar do programa por quatro anos sem
precisar revalidar seus diplomas, desde que tenham registro para atuar no país de formação.

O Mais Médicos, de acordo com Fernandes, tem contribuído para a redução das mortalidades infantil e materna
em várias regiões do Brasil, além de aumentar no país o número de consultas médicas em 36%.

Atualmente, o programa está em expansão, diz ele, com o objetivo de preencher 28 mil vagas até o mês que vem e
totalizar 40 mil até o fim da gestão Lula, em 2026.

"O governo tem planos ambiciosos de abrir 20 mil novas equipes de saúde da família em quatro anos para garantir
acesso aos cuidados primários. Ampliando esse número, melhora a proporção de equipe por habitante no Brasil."

Inaugurado por Dilma Rousseff (PT) em 2013, o Mais Médicos passou por mudanças ao longo dos anos, especialmente
durante os governos Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL). A saída dos médicos cubanos em 2018 trouxe
desafios para manter o atendimento à população.

No ano seguinte, para substituir o programa petista, foi criado o Médicos pelo Brasil, que teve dificuldades em sua
implementação e não conseguiu preencher todas as vagas remanescentes do Mais Médicos, segundo o secretário.
Atualmente, a iniciativa conta apenas com dois profissionais vindos de Cuba. Além desses estrangeiros, há três
venezuelanos e um haitiano. Dentre os 3.430 brasileiros, parte deles é naturalizada.

Paraguai, Bolívia, Argentina, Venezuela e Rússia, nessa ordem, são os países com maior número de médicos formados
que atuarão no Mais Médicos. Muitos desses países não possuem sistemas universais de saúde, como o Brasil.

O perfil dos médicos mudou, afirma Fernandes, após avaliação de que com o contingente de profissionais formados no
Brasil, considerando a expansão dos cursos de medicina e o total de brasileiros com registro no exterior, haveria
demanda suficiente de profissionais para ocupar as vagas do programa.

Nicaraguense com cidadania brasileira, o médico generalista Henry Antonio Gómez Rodríguez, 34, se formou em
medicina na Escuela Latinoamericana de Medicina, em Havana, Cuba, em 2013. Ele se mudou para o Brasil em 2017,
mas não conseguiu atuar como médico desde então.

"Trabalhei como educador físico e em empregos temporários para sobreviver. Cada tentativa de participar do Mais
Médicos falhava devido à falta de documentos ou do tempo de permanência no país."

Ele afirmou que finalmente obteve a chance neste ano. "É uma mudança de vida inacreditável. Minha esposa entrou
no Mais Médicos antes de mim e agora trabalhamos juntos em Bagé, no Rio Grande do Sul."

A médica generalista Domênica Resende, 43, escolheu estudar na Universidad Politecnica y Artística del Paraguay, no
país vizinho, por questões financeiras.

"A possibilidade de uma formação mais acessível me levou a essa opção, pois os custos no Brasil são altos", diz ela,
alocada em União da Vitória (PR).

17 Mais Médicos retorna com recorde de inscritos

Domênica Moreira de Rezende, 43, está entre os 3.436 profissionais que fazem imersão em São Paulo antes de atuar no Mais Médicos; ela é

de M MAIS

A turma atual apresenta maior número de mulheres, 51%. Pessoas negras são apenas 7,65% do grupo, enquanto
declarados pardos somam 16,18%

De acordo com o médico de família e comunidade Daniel Puig, 40, docente da UERJ (Universidade do Estado do Rio
de Janeiro) e supervisor do programa, o curso de extensão também aborda situações de violência e ferramentas para
atuação na prática médica.

Há ainda oficinas práticas como a de colocação de DIU (dispositivo intrauterino). "Existem temas centrais que estão
sempre presentes no módulos de acolhimento e outros incluídos ou suprimidos, a depender do cenário nacional. Por
isso, nesta turma foram incluídos temas como Covid-19, febre maculosa e raiva."
O investimento no Mais Médicos aumentou consideravelmente, de acordo com Fernandes, sendo de R$ 1,9 bilhão em
2023. Ele prevê aumento para R$ 4,4 bilhões no próximo ano. A expansão do programa também está relacionada à
formação de médicos de família e comunidade, com o objetivo de ter 100 mil profissionais titulados nessa
especialidade em dez anos.

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