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Natal/RN
2023
PATRICIA RILLIANE GOMES DA SILVA
Natal/RN
2023
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -
CCHLA
BANCA EXAMINADORA
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Ao professor Orivaldo pela parceria do conhecimento nesses quatro anos sob sua
orientação.
Ao querido professor Homero, que leu cuidadosamente esta tese e, apesar das
discordâncias teóricas, esteve disponível para ajudar.
Aos professores que aceitaram o convite para compor a banca de defesa desta tese.
Às professoras Josimey Costa da Silva e Eloísa Klein pelas contribuições valiosas
na qualificação.
Aos funcionários do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais (PPGCS)
pelo apoio e atenção.
Aos amigos e co-orientadores, Cristina, Jadson, Rebekka, Maria Rita, Germano e
Ana Paula, pelas conversas descontraídas sobre a vida acadêmica, acompanhadas
de comida e risos (ou choros).
Ao meu companheiro, Bruno, que esteve do meu lado nessa jornada.
À dona Santa e seu Didil, meus pais, minha inspiração para os estudos.
À tia Carol, por me lembrar que estudar é resistência.
À minha avó, dona Maria, por acreditar em mim e ter orgulho (exagerado) de tudo
que faço.
À Capes, pelo financiamento desta pesquisa.
RESUMO
INTRODUÇÃO 12
1. CAPÍTULO 1 – UM MUNDO REAL PARA SITUAR O DIGITAL 33
2. CAPÍTULO 2 – A TRAJETÓRIA OCULTA DO MEME 68
3. CAPÍTULO 3 – POSSESSÃO 94
4. CAPÍTULO 4 – VIBRAÇÃO DAS FORMAS ARGUMENTATIVAS 116
CONSIDERAÇÕES MEDIADAS 137
REFERÊNCIAS 143
12
INTRODUÇÃO
O OBJETO
O mistério que cerca o limiar entre “se tornar” (ou não) um Meme1 na internet
é o mesmo que cerca a escolha sociológica entre, por exemplo, Émile Durkheim e
Gabriel Tarde em uma tese de doutorado como esta. Ambas as escolhas,
inevitavelmente, perpassam pela inconstância e descontinuidade de associações
infinitesimais, imprevisíveis e imensuráveis, livres demais para se pretender delimitar
um fenômeno social a partir delas. Todavia, é justamente essa inconstância e
descontinuidade que garante a continuidade tanto do Meme quanto de uma
perspectiva sociológica, não porque são a mesma coisa, mas porque compõem o
mesmo modo de existência: o social2. Este atravessa o seguimento das conexões
heterogêneas, porquanto, para existir, precisa ser retraçado por meio de mudanças
sutis na conexão de recursos não sociais (LATOUR, 2012b). Sob tal enfoque, o
Meme é apresentado como um modo específico de fazer essa travessia, cuja
importância reside na manutenção dos grupos.
O cerne da questão, portanto, consiste no fato de que o social não está
pronto. Para trazê-lo à vida, Latour (2019) oferece um caminho, a Teoria Ator-Rede,
cheio de sinalizações, a fim de que o pesquisador não se perca e mantenha-se bem
situado. Esse caminho é iniciado com uma analogia entre o social e a logística das
Redes, baseada no fato de que não se pode dispensar a articulação dispendiosa
que garante a existência da sociedade, a qual nunca está pronta, dada e plena, está
sempre se fazendo e refazendo. Mas, onde e quando o Meme se situa nesse
processo? Primeiro, vamos focar na logística mencionada (esquematizada na figura
1), depois, vamos compreender como ela pode ser útil para perceber a consistência
processual do que a perspectiva sociológica herdeira de Gabriel Tarde define como
social. O aspecto crucial a ser sublinhado inicialmente, é que o termo Rede remete
1
A expressão Meme é usada no singular por esta tese, porque, como se espera deixar claro até o
término da leitura do segundo capítulo, ele é definido por meio da importância de sua Técnica na
articulação entre o mundo e o pensamento.
2
Bruno Latour (2012b) chega a afirmar que o social não existe. Mas, ele trabalha com a noção de
ser-enquanto-outro (LATOUR, 2019), segundo a qual, para existir é preciso, necessariamente, passar
por outros, e isso vale para todos os existentes, inclusive o social. Dessa forma, a afirmação de que o
social não existe é uma provocação relativa ao fato de que sem mediações, sem a associação entre
coisas não sociais em si, o social não pode existir.
13
Dito de outra forma, Rede é tanto aquilo que desloca quanto aquilo que faz
deslocar, o que corresponde a dois modos de ser uma Rede, o oleoduto e o
petróleo, o encanamento e a água, por exemplo. Ademais, importa ainda notar que a
Rede homogênea depende da Rede híbrida para acontecer e continuar existindo.
Dito isto, podemos retomar a analogia supramencionada, a Teoria Ator-Rede parte
dessa logística com a finalidade de oferecer ao pensamento um caminho capaz de
explicar a fabricação da realidade, resultante do cruzamento de dois tipos de Redes
ou conectores principais, articulados para garantir as condições materiais e artificiais
das existências. As Redes híbridas fazem referência ao mundo das coisas, à
prática, ao fato que guarnece a travessia do social e, quando bem consolidado e
articulado pode ser chamado de instituições; porém, estas mesmas instituições
permitem a travessia de muitas Redes homogêneas ao mesmo tempo, as quais são
feitas de discurso, exatamente onde o Meme está situado.
Situar o Meme no nível das Redes homogêneas significa afirmar que
esta tese tem como objeto um regime de enunciação, um tipo particular de
continente agregado no ato de falar, ou melhor, postar. Contudo, homogênea é
14
apenas a continuidade de seu efeito que, aliás, nunca está sozinho, está sempre
articulado com outros regimes de palavras no esforço de fazer e refazer grupos. É
esse efeito que Latour (2019) propõe mapear, enquanto serviços ou valores caros às
sociedades ocidentais, e, assim, construir uma antropologia dos modernos. Diante
do objetivo de explicar as condições artificiais dos modos de existência, quer dizer,
dos mediadores da realidade, o autor faz um relatório com o mapeamento de 15
valores inerentes aos modos de existência, os quais são sempre mencionados com
a letra inicial maiúscula, a fim de sinalizar para o leitor que se trata de um modo de
existência de um regime de enunciação: a Reprodução, a Metamorfose, o Hábito, a
Técnica, a Ficção, a Referência, a Política, o Direito, a Religião, o Apego, a
Organização, a Moral, a Rede, a Preposição e o Duplo Clique, todos emaranhados
no discurso3. Além dos que faltam ser identificados a convite do próprio autor para
dar continuidade à pesquisa de uma vida inteira, a construção de uma antropologia
dos modernos.
Dessa forma, esta pesquisa é um aceite para este convite, uma vez que
apresenta um novo regime de enunciação. Importa ressaltar que se trata de uma
dimensão elementar do discurso, a qual foi estudada isoladamente, logo, antecede a
formação de qualquer instituição, sujeito ou grupo, porque o Meme, bem como os
demais regimes de enunciação, é um mecanismo de manutenção de grupos.
Contudo, o Meme só pode ser (ou estar sendo) uma ação específica no discurso se,
e somente se, houver articulação entre smartphones,wi-fi, cabos, carregadores de
energia, registros e outros elementos imensuráveis; igualmente, esta tese de
doutorado, para existir, necessita da articulação de carregadores, energia elétrica, o
computado pelo qual estou digitando, livros e etc., tendo em vista que, “não há como
parar nessa ladeira que leva ao infinitesimal, que devém, fato certamente
inesperado, a chave de todo o universo” (TARDE, 2003, p. 24).
Em outras palavras, Meme e tese4 são feitos do mesmo material (discurso),
mas, compreendem a ações diferentes na instauração da realidade, isto supõe a
descontinuidade e imprevisibilidade dos elementos que se associam, assim como a
homogeneidade do ser que perpassa por essa descontinuidade e imprevisibilidade
3
Na verdade, não apenas no discurso, em outros modos de existência não discursivos também, mas,
isso não é abordado por esta tese, cujo foco é mapear um regime de palavra para acrescentar à lista
feita por Latour (2019).
4
Uma tese está intimamente relacionada ao regime de enunciação da Referência ou da ciência, ao
falar cientificamente.
15
A HIPÓTESE
5
O termo mônada é apropriado por Tarde por meio da influência do filósofo alemão Gottfried Wilhelm
Leibniz e remete às dimensões elementares da natureza. Toda existência é singularmente composta
por uma pluralidade de mônadas, as quais não são idênticas, são as aberturas para a diversidade
que compõem o mundo. Nas palavras de Tiago Seixas Themudo (2002, p. 50), “cada mônada tem
sua pequena zona de expressão clara e distinta, seu pequeno território de consciência, sua pequena
clausura, sua pequena propriedade. A grande diferença entre a monadologia de Leibniz e a
neomonadologia de Tarde é que a condição de clausura em Tarde não é definitiva. Suas mônadas
têm portas e janelas, estabelecem conexões, se apropriam de outras mônadas, e não apenas
combinam pontos de vista. E é desse jogo de conexões e capturas que o corpo individuado se
produz, que um campo de percepções claras e distintas se produz, que um sujeito se produz. Sujeito
sempre instável, provisório e mutante”.
6
Tarde (2003) se refere à tendência das ciências modernas de pulverizar o universo, negando a
continuidade material na medida em que aponta o átomo, a célula, o indivíduo, multiplicando os
seres.
16
Para campo da comunicação, o termo “Meme” parece ter sido uma dessas
iniciativas perspicazes, criado por Richard Dawkins (2007) na década de 1970,
segundo o qual, o gene, quer dizer, uma forma não rígida e absoluta, uma unidade
de conveniência que compreende a um cromossomo de extensão suficiente para
constituir uma unidade de cópia hábil para a seleção natural, é similar a uma
segunda base de evolução cultural: o Meme.
Segundo o biólogo (2007), Meme é uma unidade de sentido, também de
extensão variável, pois depende do potencial de abstração e replicação de cérebro
em cérebro. Porém, como “o real não é uma série inteiramente previsível de
acontecimentos, ordenados, mas um desdobramento processual de fluxos em
constante remanejamento, de formas e fronteiras constantemente desfiguradas”
(THEMUDO, 2002, p. 22), o termo começou a ser adaptado ao conjunto de ideias de
um mundo em emergência: o digital. Este conjunto de ideias, assim como qualquer
outro fabricado pelos humanos, “não expressam um estado natural; elas precisam
ser inventadas. E tais invenções não se materializam da noite para o dia, mas
adquirem uma consistência processual, cuja duração pode ser expressa em anos e
até mesmo séculos” (THEMUDO, 2002, p. 23). Na internet, o termo começou a ser
usado na década de 1990, momento no qual o mundo digital era um espaço novo e,
pouco a pouco, os internautas começaram a associar Meme a piadas, trocadilhos
entre outras formas de virais (CHAGAS, 2020).
7
O Meme é uma ação discursiva, e é justamente seu efeito que deixa pistas para descrever tal ação.
8
Smartphones, cabos, canetas, mesas, wi-fi, imagens, vídeos, um gato, um papel.
18
fios e canais que deixam espaços vazios9, em torno de seus segmentos para muitos
outros domínios se intersectar. É impossível apontar os limites destes domínios,
mas, de uma determinada forma, a partir do seu efeito discursivo na materialidade
das coisas, podem ser delimitados. De maneira introdutória, pode-se afirmar que o
cruzamento dessas duas Redes corresponde às condições materiais e artificiais da
existência, pois, “a linguagem é bem articulada, como o mundo do qual ela é
carregada” (LATOUR, 2019, p. 126).
Portanto, as Redes híbridas e as Redes homogêneas são dois fenômenos
diferentes, apesar de ambos serem chamados de Rede. Contudo, são
complementares, já que a composição de uma série descontínua de elementos
heterogêneos faz circular de forma contínua, valores ou serviços. Aspecto que fez a
hipótese desta tese vibrar sob a desconfiança de que o Meme é, precisamente, um
desses valores desenvolvidos pelos modernos frente às circunstâncias instauradas
no mundo digital. Em outras palavras, esta pesquisa de doutorado partiu da
hipótese de que o Meme seria mais desses valores ou serviços, ainda não
mapeados, que seria um regime de enunciação, uma Rede do tipo homogênea,
agregada no esforço humano de criar e manter seus grupos, no esforço de
conversar. Dito isto, já se pode prever que o Meme, tal como o é apresentado aqui,
longe de ser uma postagem, uma imagem, uma piada, um trocadilho ou o remix
disso, embora faça parte de tudo isso, é um continente do discurso, da fala, da
conversa, importante na fabricação da realidade.
Agora, retomemos a comparação entre Meme e tese, citado inicialmente: se
são iguais do ponto de vista das Redes híbridas; do ponto de vista das Redes
homogêneas, um e outra produzem seus respectivos valores, são peculiares. Ou
seja, partir das Redes híbridas, inevitavelmente, leva às associações livres, cheias
de surpresas e de descontinuidades, a um tipo de emaranhado impossível de
realizar alguma classificação sem se deparar com muitas exceções. Em função
disso, nesse nível da realidade, todos os acontecimentos são iguais. Enquanto as
Redes homogêneas, por sua vez, apresentam associações limitadas, delineiam-se
discursivamente, e suas particularidades são bem definidas por meio de uma
tonalidade própria. No nível das Redes homogêneas, os fenômenos ou ações que
9
As metáforas latourianas focam na percepção maior dos espaços vazios do que nos cheios: qual é o
espaço que o efeito do Meme preenche na instauração da realidade? Quando e onde esse efeito se
agrega na instauração da realidade dos humanos?
19
caracterizam o social podem se insinuar a seu modo e definir-se, mas, isso acontece
em uma dimensão elementar, pois,
se for correto, com diz Tarde, que “a diferença vai diferindo”, deve
haver vários modos de ser que garantam sua subsistência por meio
de uma amostra distinta de alteridade; e que só pode encontrar
criando oportunidades de instaurações diferentes para cada um, a
fim de aprender a falar com eles em sua língua (LATOUR, 2019, p.
139).
A TESE
10
Uma definição ostensiva do social aponta para algo dado, pronto, que permanece lá (LATOUR,
2012b).
11
Enquanto objeto de uma definição performática, o social desaparece quando deixa de ser
representado; e, para não desaparecer, é necessário que outros atores entrem em cena (LATOUR,
2012b).
12
Como a analogia entre o social e as Redes enfatiza a existência dos grupos sociais nunca é dada,
plena e pronta, requer um trabalho de subsistência.
13
Latour (2012b) diferencia mediadores de intermediários: estes últimos transportam significado ou
força sem transformá-los, ou seja, se definimos o que entra, o que sai também já está definido,
contado como uma unidade. Enquanto os mediadores transformam, traduzem, distorcem, modificam
os significados ou os elementos que transportam, neste caso, o que entrar não define o que sai, logo,
suas especificidades precisam ser levadas em conta todas às vezes, pode ser contado como um, por
nenhum, ou por uma infinidade. É, portanto, as constantes incertezas sobre a natureza íntima das
entidades se são mediadoras ou intermediárias, que segue a pesquisa.
21
14
Essa Rede híbrida, na verdade, garante a travessia de serviços e valores agregados no ato de falar.
E o Meme é apenas um desses serviços e valores a ser localizado.
22
impeachment. O primeiro para se referir aos Memes cujas imagens não eram
registros do momento da votação (neste momento eu tomava Meme e postagens
engraçadas como sinônimos), mas que eram usadas, mesmo assim, para falar
sobre o assunto impeachment; o segundo para se referir aos Memes que usavam
registros do momento da votação (videos, frases, imagens), mas que não falavam
necessariamente sobre o impeachment (SILVA, 2019). Porém, com isso, ainda só
era possível descrever a articulação da Rede híbrida que resultava na postagem, a
questão é que o comprometimento do Meme não é com as crenças e desejos do
grupo criador da postagem, muito menos com um padrão de postagem em si, estas
são coisas que podem se associar de muitas formas diferentes e mudam a
performance. Em resumo, esta tese afirma que o Meme é o seguinte efeito técnico
da fala ou do discurso: a flexibilização de scripts por meio da resolução
antecipada dos conflitos.
Em uma conclusão inicial da dissertação, fundamentada nas três principais
categorias desenvolvidas por Tarde (2011), a imitação, a oposição e a adaptação, o
Meme foi assinalado como “uma imitação peculiar; detentores de potencialidades
inventivas; capazes de estabelecer alianças, cuja lógica parece desafiar a razão”
(SILVA, 2019, p. 20). Agora, o esforço consiste em mostrar que essa imitação
peculiar é capaz de extrair uma alteração na instauração da realidade; que suas
potencialidades inventivas apresentam uma tonalidade discursiva que lhe diferencia
de outros tipos de potencialidades inventivas; e se caracteriza por uma trajetória
específica (em uma dimensão elementar do discurso) no processo de reagregar o
social e; por fim, o esforço consiste em defender que o Meme só parece desafiar a
razão porque, de maneira geral, privilegia-se os critérios de alguns regimes de fala
em detrimento dos critérios dos outros regimes de fala. Isso implica dizer que a ação
do Meme possui uma racionalidade sim, bem como critérios tão sofisticados quanto
os da ciência, o da Religião, o da arte e etc.
Certamente, em comparação aos modos discursivos de existência da ciência,
da Religião e da Política, bem estabelecidos em decorrência do tempo com uma
correspondência direta entre um domínio, uma instituição e um contraste discursivo
alinhados, cuja tecnicidade e centralidade são mais evidentes e apreendidas; o
Meme pode parecer pouco importante, sem seriedade, longe de merecer tal
definição. Mas, talvez seu valor na fabricação e manutenção dos grupos comece a
se insinuar se imaginar como seriam as plataformas digitais sem a Técnica do
23
Meme. Sem ela, o ambiente digital estaria despovoado, não seria possível criar e
fazer acontecer. Além disso, cada regime de enunciação se articula no sentido de
preencher um hiato no social, qual é o hiato mediado pelo Meme no esforço de fazer
e refazer os grupos?
Sua mediação até pode ser subestimada por ser tão bem ocultada, sutil e,
necessariamente, disfarçada. No entanto, seu efeito é tão perfeitamente sentido que
provoca um intenso debate acadêmico (e não acadêmico) acerca da sua importância
e de sua ontologia. Tão atuante na instauração da realidade quanto confuso em
suas delimitações, o Meme tem mobilizado um esforço classificatório, desde a
definição clássica de Richard Dawkins (2007) até as perspectivas mais atreladas à
criação de conteúdos e compartilhamento em plataformas digitais. Em tais
perspectivas, há uma preocupação generalizada para estabelecer categorias, bem
como, longevidade, fecundidade e fidelidade de cópia (DAWKINS, 2007); humor,
intertextualidade e justaposição anômala (KNOBEL, LANKSHEAR, 2007); ou
conteúdo, forma e postura (SHIFMAN, 2013).
Em Dawkins (2007), o conceito de Meme visa demonstrar que a evolução
cultural acontece de maneira análoga a evolução biológica, ou seja, por meio de um
agente mínimo que pode ser classificado pelos três aspectos supracitados: a
longevidade concerne à duração no tempo; a fecundidade corresponde a
continuidade por meio de cópias em sucessivos cérebros; e a fidelidade diz respeito
ao nível de semelhança das cópias. Enquanto Michele Knobel e Colin Lankshear
(2007), com uma perspectiva diretamente ligada ao mundo digital, apontam três
padrões que contribuem para a fecundidade do Meme: o humor, variando do
peculiar e inusitado ao excêntrico, ao bizarro, às paródias e/ou; uma rica
intertextualidade, fazendo referências cruzadas e irônicas a diferentes eventos,
ícones e fenômenos da cultura popular e/ou; justaposições anómalas,
principalmente de imagens.
Por sua vez, Limor Shifman (2013) propõe pensar o conceito de Meme não
como ideias isoladas ou fórmulas que se espalham com facilidade, mas, sim, como
um grupo de itens de conteúdo criados com consciência mútua e que apresentam
características em comum. Com base no conceito original de Richard Dawkins
(2007), segundo o qual Meme é uma unidade de imitação, a autora propõe isolar
três dimensões: o conteúdo, referente às ideias e as ideologias veiculadas; a forma,
referente a encarnação física da mensagem percebida pelos sentidos; e a postura,
24
A METODOLOGIA
16
A ação do Meme, bem como as ações dos demais regimes de enunciação, se considerada
isoladamente, constituem apenas descontinuidades do ponto de vista do grupo. Para mediar a
continuidade de um grupo ou situação, os regimes de enunciação precisam se articular uns com os
outros.
27
? ? ? ? ?
Fonte: adaptado de Latour (2019, p. 392-393)
[HAB] HÁBITO Hesitações e Cursos de ação Prestar atenção/ Véu sobre as Obter essências.
ajustes. interruptos. perder a atenção. preposições
Grupo 2: quase-objetos
[FIC] FICÇÃO Vibração material/ Triplo desengate: Fazer manter, Envios, Multiplicar os
forma. tempo, espaço, fazer crer/ figurações, mundos.
actante. fracassar, perder. formas, obras.
28
[REF] Distanciamento e Pavimentação Informar/ perder Constantes por Ter acesso aos
dessemelhanças das inscrições. as informações. informações. distantes.
REFERÊNCIA
das formas.
Grupo 3: Quase-sujeitos
[DRO] Dispersão dos Vinculação dos Ligar/ romper os Seres portadores Garantir a
casos e das casos e das planos da de segurança. continuidade das
DIREITO
ações. ações pelos enunciação. ações e dos
meios. atores.
[MOR] Inquietude sobre Exploração dos Retomar os O “reino dos fins”. Calcular o
os fins. vínculos meios/ cálculos/ impossível ótimo.
MORAL
fim. suspender os
escrúpulos.
[DC] DUPLO Horror dos hiatos. Translação sem Falar literalmente/ Reino indiscutível Manter o mesmo
tradução. falar por figuras e da razão. apesar do outro.
CLIQUE
tropos.
e informação, por que retomar ao nível elementar dessas Redes? Quer dizer, “por
qual virtude o absurdo daria ao espírito humano a chave do mundo?”, como
questiona Tarde (2003) ao se referir a crescente importância do infinitesimal
decorrente do acréscimo de conhecimento, uma vez que o conhecimento seria um
simples acúmulo de contradições. A resposta, prossegue ele, talvez seja porque
embora não se considere a perspectiva monadológica, ela não deixa de figurar,
como um memorial, como especificações de nosso ativo intelectual.
Para esta tese, esse memorial no ativo intelectual precisou ser acessado com
urgência por um pensamento em crise diante da necessidade de formar grupos a
partir de indivíduos distantes fisicamente, comumente chamados de relações on-line,
nas quais,
(Bruno Latour)
20
Publicado pela primeira vez em 1896.
34
Com cuidados infinitos, elas foram descidas uma após outra, caixote
depois de caixote, às entranhas da terra. Esse resgate do mobiliário
humano se faz em ordem: toda a quintessência das antigas grandes
bibliotecas de Paris, de Berlim e de Londres, reunidas em Babilônia,
e depois abrigadas no deserto com todo o resto, e mesmo de todos
os antigos museus, de todas as antigas exposições da indústria e da
arte, está condensada ali, com incrementos consideráveis.
Manuscritos, livros, bronzes, quadros: quanto esforço, quanta
dificuldade, apesar da ajuda das forças intraterrestres, para embalar,
transportar e instalar tudo isso! Tudo isso deve, no entanto, ser inútil
para aqueles que se entregam a esse trabalho. Eles não o ignoram,
sabem-se condenados, provavelmente pelos restos de seus dias, a
uma vida dura e material, para qual sua existência de artistas, de
filósofos e de letrados não os preparara. Mas – pela primeira vez – a
ideia do dever a cumprir entrou nesses corações, a beleza do
sacrifício subjugou esses diletantes. Devotam-se ao desconhecido,
ao que ainda não é, à posteridade para a qual se orientam todos os
votos de suas almas eletrizantes, como todos os átomos do ferro
tendem para o polo (TARDE, 2014, p. 480-496).
36
21
O termo homo digitalis remete aos indivíduos imersos na comunicação digital, no trabalho imaterial,
ou seja, nas relações mediadas por plataformas digitais.
38
ações discursivas para existir, mas, as peripécias dessas mesmas ações constituem
um entrave para situar a realidade fabricada pelos homo digitalis.
Ao propor a construção de uma antropologia dos modernos, Bruno Latour
(2002) explica que todas as criações chamadas de sociais desses povos sugerem a
plenitude ou completude de algo pronto, simplesmente dado, que, teoricamente,
explicaria os aspectos residuais das relações entre os indivíduos. Mas, este autor
orienta pensar sobre o social seguindo, rigorosamente, o caminho inverso. Dessa
maneira, partimos da compreensão de que, longe de estar a disposição por meio de
um simples toque em uma tela, o mundo digital é constituído por cada aspecto
residual que se agrega em seu favor, e isso não é uma tarefa fácil, haja vista que ela
requer a habilidosa articulação entre Redes (conectores), afinal, “um vazamento em
um oleoduto obriga o operador a fechar as válvulas, um deslocamento de três
metros na área de um wi-fi e adeus, a conexão se perde” (LATOUR, 2019, p. 38).
Em suma, sem o abrigo de um mundo real, não há como uma situação, um
grupo ou um fenômeno qualquer se sustentar, acontecer. A Teoria Ator-Rede realça
a necessária fabricação desse abrigo destacando que há mais de um tipo de Rede
seguindo a precedente, acontecendo, dando continuidade, superpondo-se. O termo
Rede (que logo será abandonado e substituído por conector ou associação) remete
tanto a heterogeneidade dos dispositivos materiais22 (smartphones, cabos, fiação)
quanto a travessia de serviços ou valores23 (discursos), esta última possibilitada
impreterivelmente pela primeira. Correspondem a dois tipos diferentes de
conectores, os quais são articulados no estabelecimento das condições materiais e
artificiais da realidade. Da fabricação à realidade o trabalho é intenso, e o Meme é
um desses serviços ou valores, é um conector capaz de produzir um efeito
específico na qualidade das relações dos grupos constituídos no mundo digital.
É precisamente sobre esse efeito que esta tese versa do início ao fim. E para
isso, é preciso fragmentar o discurso até chegar ao que se pode chamar de falar
memeticamente, porque, como ficará mais claro no decorrer da leitura, trata-se de
uma atividade que se agrega a outras atividades discursivas movidas pelos desejos
e crenças dos grupos. Logo, é possível inverter tal percurso, ou seja, partir dessa
ação elementar (a do Meme) até a realidade do mundo digital e vice-versa. A
22
Chamada de Rede Híbrida em uma linguagem mais técnica da Teoria Ator-Rede (LATOUR, 2019).
23
Chamada de Rede Homogênea em uma linguagem mais técnica da Teoria Ator-Rede (LATOUR,
2019).
39
24
Essa característica antropológica dos modernos é operacionalizada pela noção de crenças,
resume-se na compreensão de que os outros povos crêem e não são literais, já os modernos sabem,
são objetivos (LATOUR, 2002).
40
relação de Redes tão bem articuladas quanto quase indistinguível entre sujeito e
objeto, ignora-se, sobretudo, que “se não existe mediação, não existe acesso”
(LATOUR, 2019, p. 74). Por meio dessa ruptura, os modernos encontraram um meio
para purificar a teoria sobre a produção da realidade, dos vestígios da prática que
produziu tal realidade, mesmo esta última estando a todo vapor, cuidando do
fazer-fazer necessário à manutenção de todas as atividades humanas (LATOUR,
2022).
É como se a realidade na qual os modernos vivem dependesse
desesperadamente da sua condição plena, pronta, dada, não feita. E, dessa ruptura
grosseira entre sujeito e objeto, resultasse um mundo interior (subjetividade)
constituído por sonhos, ilusões e fantasias, teoricamente, existentes apenas em
nossas cabeças; totalmente desconexo do mundo exterior, constituído pelos objetos
prontos, sob o pretexto de que, uma vez elaborados no laboratório, parecerem poder
existir sem a nossa presença, compondo o mundo real, contínuo, sem lacunas, sem
vazio, sem humano. Na versão teórica dos modernos, graças à representação, o
sujeito da interioridade projeta sobre a "realidade exterior" seus próprios códigos,
mas, estes códigos seriam fornecidos prontos, de fora pelas estruturas da língua, do
inconsciente, do cérebro, da sociedade (LATOUR, 2002).
O que sustenta a versão dos modernos sobre a realidade que os cerca é
denominado de fetiche por Latour (2002), diz respeito a um operador do pensamento
que explica o porquê de eles acreditarem, enquanto povo, serem os únicos sem
crenças ou ilusões. Todavia, na prática, não há nem objeto encantado nem objeto
causa (não fabricado), ou melhor, os indivíduos são necessariamente superados por
aquilo que fazem, seja, usando os exemplos do autor, criar uma divindade, modificar
os genes ou redefinir as leis da economia. Toda atividade humana exige um trabalho
intenso que permite a verdade tanto dos fatos quanto do espírito, mediadas,
respectivamente, por Redes híbridas, que colocam o mundo das coisas em
movimento; e pelas Redes homogêneas que, por sua vez, colocam os modos de
discursos em ação.
Com a finalidade de realçar justamente a articulação desse movimento e
dessa ação25, Bruno Latour (2002) sugere outro operador para o pensamento, a
25
As Redes híbridas garantindo a travessia das Redes homogêneas, ou seja, dos valores
desenvolvidos pelos modernos.
41
saber, o fe(i)tiche26. Este é fundamental para mapear a ação do Meme, bem como
para mapear a ação das demais ações discursivas. Entretanto, é ainda importante
salientar que os modernos não fabricam sua realidade pelo caminho mais difícil
(ocultando os rastros deixados pela prática desse processo) gratuitamente, isso
reflete na principal característica desse povo: puderam mobilizar forças
extraordinárias sem que elas lhes fossem ameaçadoras, essas forças mediam uma
ampliação planetária das Redes. O delicado disso consiste no fato de que a ruptura
entre sujeito e objeto estabelece um mundo independente da prática, ou melhor, a
teoria da ação pode se desdobrar sem ter que prestar contas instantaneamente ao
mundo da prática. Por conseguinte, é imprescindível o remendo indefinido para
restaurar os pedaços e espaços, como operação de salvamento (LATOUR, 2002).
O Meme é uma das ações de manutenção da realidade, cujo efeito nas
relações entre os indivíduos é crucial para reagregar o social nas circunstâncias
instauradas no mundo digital. Ele corresponde a uma ação restauradora ou, se
preferir, a um discurso restaurador, sua dimensão prática é ocultada e ofuscada pelo
fetiche, mas, ainda assim, seu remendo específico é sentido, percebido, porque ele
preenche algum espaço da quebra entre teoria e prática (entre fato e fetiche) mesmo
que esteja confuso em meio a heterogeneidade dos elementos que se associam em
seu favor. Constantemente, os fetiches são destruídos e reconstruídos, remetem na
prática27 o que a teoria28 só pode apreender sob a dupla forma de quebra e de
restauração. Em síntese, os modernos criam, meticulosa e astuciosamente,
linguagens fe(i)tiches capazes de fabricar “um estar sendo” qualquer (uma situação,
um acontecimento) que passam da fabricação à ação, tais como divindades, feitos,
obras e etc., que os ajudam na instauração das condições artificiais de existências,
de restaurações e curas (LATOUR, 2002). E o Meme é uma dessas linguagens
fe(i)tiches, um discurso restaurador.
26
A palavra fe(i)tiche propõe a criação de uma Antropologia simétrica, a proposta é tornar os
modernos comparáveis aos “outros” das culturas ditas primitivas, torná-los comparáveis àqueles que
são vistos como criadores de ilusões. Tanto o termo fato quanto o termo fetiche têm a mesma
etimologia, ligada ao verbo fazer, assim, fe(i)tiche é uma junção de ambos, cujo objetivo é evidenciar
que todas as atividades humanas apresentam o mesmo passe, quer dizer, correspondem justamente
ao cruzamento da Rede híbrida com a Rede Homogênea.
27
Associação híbrida no mundo das coisas materiais.
28
Multiverso discursivo.
42
30
Tarde (2005) define a multidão como um feixe de contágios psíquicos, porém, diferentemente do
público, ela é produzida essencialmente por meio do contato físico. Isto é, para a multidão, a
aproximação dos corpos é indispensável.
31
Lembrando que os valores discursivos são as Redes homogêneas, mantenha o seu caminho bem
sinalizado, porque é no nível dessas Redes que esta tese se atém. É no modo de existência das
Redes homogêneas, como é explanado mais à frente, que a ação do Meme está situada.
44
1.4 O HIATO
Uma vez que a Rede híbrida esteja com a manutenção em dia, importa
pensar a articulação dos mecanismos responsáveis por manter o grupo vivo
lembrando que o essencial consiste em mais do que dizer a mensagem, consiste no
como dizer a mensagem. É precisamente no efeito do como se diz que reside a
trajetória da ação discursiva e que se deve avaliar a qualidade da conexão. Note-se
que, entender a verdade de cada condição ontológica não corresponde tão somente
a uma perspectiva relativista, trata-se, principalmente, de falar de cada modo em sua
língua e conforme seu princípio de veridicção, “Este é o mínimo que podemos pedir
a um investigador” (LATOUR, 2019, p. 125). A linguagem é bem articulada, bem
como o mundo do qual é carregada, logo,
continuidade das Redes. Assim, o pensamento “crítico” sempre procura apontar por
trás das instituições do verdadeiro, do belo, do bem, do todo, à multiplicidade de
manipulações duvidosas, de traduções, de metáforas, ou melhor, de transformações
que invalidam seu valor; como se existisse uma substância que permanece sem
transformação, já dada e por isso mesmo verdadeira e pura.
Na medida em que se comprometeu com a impossível tarefa de esconder
seus fetiches (as mediações), a linguagem dos modernos assumiu a missão de
ocultar os vestígios da prática, operando uma sutura entre a teoria e a prática. Por
causa disso, eles vivem sempre nas ruínas, “aquelas que acabaram de derrubar,
aquelas que erigiram no lugar do que derrubaram e que outros, pelas mesmas
razões, estão se preparando para derrubar” (LATOUR, 2019, p. 43-44). No mundo
digital (e sim, real), o fe(i)tiche primordial consta em garantir os vínculos para a
formação de grupos entre indivíduos corporalmente separados, em função disso, as
vítimas da escassez do tempo desenvolvem Técnicas a fim de medir a temperatura
dos interesses apaixonados, ou melhor, medir a coesão dos espíritos que não se
vêem necessariamente, não vibram olhando no olho.
Os interesses apaixonados garantem os veículos de qualquer grupo, em
qualquer mundo construído para ser habitado por humanos. Todavia, nas
circunstâncias do digital, descobrir que se gosta das mesmas coisas, que se admira
o mesmo líder, que se concorda com as mesmas ideias requer atualizar os valores,
os modos de se alterar, os fe(i)tiches, em suma, o falar. Essa distância física dos
indivíduos que impede de transmitir o magnetismo, a penetração do olhar
diretamente, impede de se contagiar pela aproximação física, delimita o hiato que
autoriza preencher a primeira célula do caderno de encargo do Meme:
Não saber a ? ? ? ?
temperatura dos
interesses
apaixonados.
Fonte: autoria própria
46
32
Se um grande número de indivíduos está possuído pelo mesmo sentimento, estes indivíduos estão
na iminência de constituir um grupo. Para tanto, é necessária a ação de outros regimes de
enunciação, especialmente o da Política, conforme é esclarecido no capítulo 4.
33
O objeto compreende a uma situação, fenômeno ou grupo social resultado das ações discursivas.
34
Talvez seja mais adequado ao invés de “seres” pensar em um “estar sendo”, afinal, corresponde a
uma trajetória, conforme é aprofundado no próximo capítulo.
47
35
Lembrando que esta tese versa sobre um “estar sendo” em uma dimensão elementar (o Meme), ele
só começa a ganhar forma social ao se somar a outros modos de “estar sendo” discursivamente.
48
diversidade dos valores, que, como já deve ter ficado claro, acontece no nível da
linguagem. Assim, ainda se mantendo na analogia a partir da obra de Saraceno,
dado que se estar muito bem sustentado pelas conexões de âncoras distantes, é a
vez das ações restauradoras alinhavar “nós” locais. Pontuar essa lógica interessa a
essa tese porque é exatamente onde o Meme é situado: no sistema de valores das
sociedades ocidentais. Esses valores se apresentam como domínios, e, embora
sejam distintos, são ligados entre si. Latour (2019) mapeou a existência de 15, cuja
ação conjunta está ilustrada na figura 3.
modo de existência dessas Redes discursivas, em explicar por qual motivo o Meme
é uma delas. Mas, espera-se que tenha ficado claro o imprescindível trabalho para
guarnecer os fenômenos sociais e garantir a realidade dos mesmos.
Dito isso, o primeiro aspecto a ser destacado sobre a pluralidade ontológica
dos discursos36 é que os modernos, coisa que desassossega Latour (2019), não
conseguem falar sem esmagar, atropelar e amalgamar vários modos de existência.
O segundo aspecto importante é que os modos de existência correspondem à
modus operandi, jamais à substância, ou seja, todas as ações apontadas na figura 3
(assim como as que ainda não foram identificadas e mapeadas pela antropologia
dos modernos) se cruzam ininterruptamente, de sorte que, a Preposição é a ação
restauradora que sempre está sinalizando esses cruzamentos. De maneira mais
simples, é como se a Preposição direcionasse as setinhas azuis ilustradas na
imagem da figura 3, e, desse modo, de alguma forma indicasse qual modo de
existência deveria ser respeitado (ver os encargos da Preposição no quadro 2). A
Preposição concerne, como efeito, a uma tomada de posição no sentido gramatical,
que antecede a proposição e determina o modo pelo qual se deve acessar ou
compreender o que será dito. Concerne, portanto:
37
A realidade social humana.
38
Em As leis sociais, Gabriel Tarde (2011) versa sobre as condições elementares do social.
39
Nunca é demais lembrar, trata-se de uma ação de subsistência, não de substância.
52
O Meme não pode ser, portanto, apenas “um termo popular para descrever a
rápida aceitação e propagação de uma ideia particular apresentada como um texto,
imagem, linguagem, ‘movimento’, ou alguma outra unidade de ‘coisas’ culturais”,
conforme definem Knobel e Lankshear (2007, p. 202), porque sua ação não serve
especialmente a uma ideia, pelo contrário, a ideia pode sem danos a condição do
falar memeticamente, ser traída. É à coesão do grupo que o Meme serve
veemente40. Em suma, uma ideia ou opinião acompanha a trajetória do Meme de
maneira muito frágil para servir como base de sua definição. Essa trajetória reflete
menos uma harmonia de pensamento do que um sentido condicionado pela ação
restauradora que impera no que é proferido.
Considerando todos esses aspectos a respeito da detecção de um hiato e de
seus seres fe(i)tiches, ainda falta designar a chave de acesso, isto é, a Preposição
que permite aos modernos identificar a tonalidade ou o contraste do falar
memeticamente em uma conversação. Em concordância com Tarde (2005),
conversar abrange o ápice da atenção espontânea que os indivíduos se prestam
mutuamente e se interpenetram, mais do que em qualquer outra relação social.
Trata-se de uma ação tão irresistível quanto inconsciente. Na conversação, explica o
autor, um público é unificado e vivificado pelo livro, e, sobretudo, pelo jornal que o
serve com uma pauta, um assunto.
No momento da escrita de Gabriel Tarde (2005), a aproximação física ainda
era muito significativa nas relações sociais, ainda não existia a urgência de uma
nova ação restauradora, não existia um hiato propriamente dito. No contágio por
aproximação física, explica o autor, os interlocutores agem uns sobre os outros,
essencialmente, pelo timbre de voz, pelo olhar, pela fisionomia, pelos passes
magnéticos dos gestos e não apenas pela linguagem. Sobre tais aspectos, é
fundamental ressaltar que não podem ser dispensados porque são muito
importantes, então, no mundo digital, eles foram adaptados à nova forma de
conversação: à publicação. Em função disso, as chaves de acesso que permitem
conversar por meio das tonalidades diferentes, ou melhor, que permitem respeitar os
modos de existência discursivos, transformam-se em registros imagéticos, capazes
de transcender o timbre da voz, o olhar, a fisionomia, os passes magnéticos dos
gestos, de maneira agitadora, dado que, do ponto de vista dos regimes de
enunciação, o como se diz é mais importante do que o que se diz.
40
Conforme esclarecido no capítulo 2, focado na trajetória do Meme.
53
41
Latour (2019) compara essa aventura do curso da ação a um passe, expressão que pode ser
pensada a partir do seu uso no futebol, refere-se a quando uma entidade qualquer passa por outra
por intermédio de um passo, um salto, um limiar no curso habitual das coisas, introduzindo uma forma
de descontinuidade, ou seja, introduzindo a circulação de outros valores.
42
Cada Regime de enunciação tem a sua.
43
FIC, POL, REL, DRO correspondem, respectivamente, à Ficção, Política, Religião e Direito. Latour
(2019) usa estas notações para se referir resumidamente aos modos de existência.
54
44
REP, TEC, FIC, MET correspondem, respectivamente, à Reprodução, Técnica, Ficção e
Metamorfose.
45
O capítulo 3 é dedicado à exemplificação desse resultado do cruzamento entre os seres da Ficção
e os seres do Apego, por meio da personagem Nazaré Tedesco.
55
se arriscar a dar conta da árdua tarefa de fabricar o real, o qual consiste em não
saber a temperatura dos interesses apaixonados (retomar o quadro 3), pois,
empreender e fazer interessar crenças e desejos (condição de felicidade dos seres
do Apego) no mundo digital requisita a adaptação do contágio à distância física e à
tragédia da falta de tempo. Então, se, como afirma Latour (2019), o interesse
apaixonado é um mediador por excelência que sobrevém entre duas entidades que
não sabiam, antes desse interesse surgir, que estavam vinculadas uma à outra; o
Meme é uma espécie de mensageiro do mundo digital, enviado para avisar: “temos
interesses em comum, estamos vinculados!".
A mensagem, no entanto, não conta mais com o timbre da voz, com a
penetração do olhar, com os passes magnéticos dos gestos; e as adaptações de tais
aspectos estão intimamente relacionadas à escolha do registro (imagem, frase,
áudio, vídeo) oportuno, afinal, como já foi apontado, o Meme acontece muito menos
quando alguém se identifica com as crenças e desejos veiculados em uma
postagem qualquer na qual se falou memeticamente, do que quando conseguiu
convidar, mediar uma sensação de pertencimento, em suma, avisar que “você é o
destinatário dessa mensagem, porque temos interesses em comum. Avise aos
demais!". A sutileza que camufla essa ação consiste no fato de que, quando a
mensagem chega ao destinatário, a ação específica do Meme cessa, transforma-se
em uma imagem congelada. Isso significa dizer que não se trata de “o que é o
Meme”, mas, sim, de “quando é o Meme”.
O Meme está sendo quando um lapso de negatividade ou um parar
interrompe o fluxo da positividade do mundo digital, e este lapso é oportuno em meio
ao que Han (2017) chama de tirania da visibilidade, porque reduz o que se pretende
falar a uma dimensão vazia de sentido, a partir da qual se podem criar novos
sentidos; e o Meme continua sendo enquanto a fala vai garantindo a certeza do
vínculo. Ao começar a circular como postagens criadas com a intenção de servir a
opinião de um grupo ou a um pensamento particular, o registro é congelado pelo
repost, pelo postar inúmeras vezes, pelo ecoar em várias plataformas digitais. Para
ser breve, uma vez que a continuidade do achado expressivo consiste na sua
capacidade de trair qualquer ideia-sugestão proferida, não é o Meme que serve ao
grupo, são os grupos que servem aos deuses fe(i)tiches (do Meme e de outros
regimes de enunciação), como uma espécie de culto para, assim, manterem-se
vivos.
58
49
Esse achado expressivo é retomado de maneira mais explicativa no capítulo 3.
59
apressadas resumem sua ação aos assuntos pouco relevantes que, eventualmente,
determinada postagem esteja mediando, como, a título de exemplo, pode-se
observar na figura 7.
Fonte: 9GAG
O termo LOLítica diz respeito, explica Tay (2020), a combinação entre Meme
e humor político. Mas, sob a compreensão desta tese, esta autora se refere, na
verdade, ao falar memeticamente (modo pelo qual se fala) sobre política (assunto
sobre o qual se fala); e o trecho citado culmina nas imensuráveis controvérsias
intrínsecas à heterogeneidade dos sistemas técnicos, o que inviabiliza uma
descrição acerca das especificidades do Meme, pois, “quanto mais se estudam os
dispositivos técnicos, mais se consideram todos os seus elementos e menos é a
possibilidade de uniformizar-los em um todo coerente” (LATOUR, 2019, p. 179). O
fragmento de Tay (2020) versa, portanto, sobre a heterogeneidade dos materiais
disponíveis para guarnecer o modo de existência do Meme (e, vale pontuar, de
guarnecer outros modos de existência discursivos simultaneamente), e sobre a
necessidade de se acrescentar várias coisas para que a Técnica50 dessa ação
comece a acontecer.
Em outras palavras, Tay (2020) aborda a Técnica do ponto de vista das
Redes híbridas que garantem a travessia das Redes homogêneas, inclusive o
Meme. A Técnica que interessa para apreender a especificidade do Meme reside em
sua trajetória, na continuidade ou homogeneidade do seu efeito, por isso, não existe
Memes (no plural) existe uma Técnica do Meme, a qual está presente sempre que
se consegue entregar sua mensagem (já mencionada) aparentemente inofensiva.
50
Lembre-se que a ação restauradora sempre é realizada em conjunto com outras ações, outros
passes que se articulam. Latour (2019) descreve a Técnica não como um meio para atingir
determinados fins, mas, como um modo de existência. Dessa forma, ela possui, também, um caderno
de encargo: um hiato, uma trajetória, uma condição de felicidade, seres a instaurar e uma alteração
na realidade, conforme pode ser observado no quadro 2..
62
Isso justifica o fato de essa pesquisa não analisar recortes de postagens, haja vista
que estas apenas materializam de alguma forma, o que pode ser materializado
infinitesimalmente de outras formas para obter o mesmo efeito (o aumento da
quantidade social). Uma vez que o objetivo desta tese é mapear a condição
ontológica do Meme, consoante a sua condição de Rede51, os rastros da sua
Técnica devem ser buscado,
O mesmo pode ser dito sobre a habilidade de produzir postagens nas quais
se fala memeticamente. Dominar essa Técnica oferece vantagens na formação de
grupos no mundo digital, onde não se tem tempo para maiores explicações, então, é
preciso simplificar as informações e, por algum caminho, organizar o pensamento
segundo os parâmetros dados pelas novas condições sociotécnica, da mesma forma
que os sobreviventes da tragédia de Fragmentos de uma história futura também
precisaram reinventar as suas tecnologias para manutenção e instauração de
grupos. No caso do mundo digital, o desenvolvimento de tais habilidades está
relacionado aos vários aplicativos usados na produção registros como obra prima
para manipulação, edição e postagem, mas, “todos os turbilhões e desordeiros das
transformações técnicas podem ser esquecidos através do objeto técnico, da função
que ele deve se contentar em cumprir fielmente” (LATOUR, 2019, p. 183).
Assim, a Técnica não corresponde aos meios para atingir determinado fim, na
compreensão de Latour (2019, p. 184-185), “se existe uma coisa que o materialismo
nunca soube celebrar é a multiplicidade dos materiais, essa alteração indefinida dos
poderes ocultos que dá astúcia àqueles que explorarão”. Por isso, ainda é preciso
aludir a astúcia inerente a ação do Meme, usada não necessariamente para
51
Não é que a Rede híbrida seja desconsiderada, mas, se ela está bem equipada e com a
manutenção em dia, as Redes homogêneas podem assumir suas próprias articulações, assumir outro
modo de existir.
63
52
Mesmo correndo o risco de essa afirmação ser repetitiva, esses modos de se alterar relativo à
comunicação encontram-se no âmbito das Redes homogêneas.
64
pelo caminho, como pistas. Marcondes Filho (2018, p. 9) descrever esses rastros,
embora não esteja falando sobre os modos de existência dos regimes de
enunciação, da seguinte forma:
53
Ver novamente a figura 7, na qual, tem-se uma postagem usando um achado expressivo popular no
Brasil, mas sendo usado com legenda em inglês.
54
Um ser mental e social é encontrado em qualquer grupo ou agregado.
55
Para a Teoria Ator-Rede, trajetória, ser e sentido são sinônimos.
66
57
Inerentes às Redes híbridas.
58
Na qual Latour (2019) aponta onde se devem procurar os erros de sentido, e a incerteza é
constante.
59
O fundamental é perceber, por exemplo, o fato de não ser coerente tomar a decisão de um tribunal
como verdadeira, justa ou íntima, porque se comete um erro de sentido ao passo em que se pede
algo que não pode ser dado e que nem mesmo foi prometido. O advogado pode procurar os erros de
direito que impedem o processo judicialmente, (os encontram ao longo do caminho) em um sentido,
cuja chave é específica. Ao usar outra chave de interpretação, comete-se um erro de categoria
(LATOUR, 2019). O mesmo vale para o Meme, afirma esta tese.
68
(Bruno Latour)
60
Realidade desfrutada por gerações futuras, uma delas vivida pelo narrador da história, que se
lembrava de Milcíades como um herói que salvou a humanidade.
61
Lembrando, público é um tipo de grupo social, no qual a interação, a coesão psíquica, o contágio,
acontecem à distância física.
62
A internet já foi destinada à pouca interação, como explica Luciana Zenha (2018), a web 1.0,
estágio inicial da World Wide Web (www), era limitada a oferecer informações, os usuários só podiam
ver as páginas Web, não podiam contribuir para o conteúdo produzido.
63
A partir da Web 2.0 a interação pôde se tornar algo possível por meio de plataformas digitais como
o YouTube e Blogs, por exemplo (ZENHA, 2018).
69
64
Cruzamento dos seres da Ficção (envios, figurações, formas, obras) com os seres do Apego
(interesses apaixonados) ilustrado na figura 4.
65
As crises e recuperações compreendem o hiato da Metamorfose.
71
Isto não significa que não haja uma cavidade do sujeito, mas esta
sempre deve ser cavada por um trabalho de mina, desobstruída,
escorada, equipada, instituída, mantida. Para evitar que seja
inundada, deve ser sempre chamada com grandes custos por
máquinas cada vez mais gigantescas. O psiquismo dos Modernos se
parece com uma cidade subterrânea, uma infraestrutura material,
uma esfera pressurizada artificialmente (LATOUR, 2019, p. 161).
O “Meme da loira confusa”, como costuma ser chamado por aqueles que não
conhecem a personagem, é estrelado por Nazaré Tedesco, vilã principal da novela
Senhora do destino (2004), produzida e exibida originalmente pela TV Globo, uma
rede de televisão comercial brasileira, aberta. A interpretação dessa personagem foi
feita pela atriz Renata Sorrah, e se inicia, mais ou menos, no meio da trama para o
fim, momento em que ela converte o caráter dramático e comovente de uma mãe à
procura da sua filha roubada em deboche e ironia. Inicialmente interpretada pela
atriz Adriana Esteves (Juventude da personagem), Nazaré, após uma briga com o
amante que se recusava casar-se com ela porque já era casado, encontra Maria do
Carmo, uma retirante nordestina perdida no meio de uma repressão policial contra
estudantes que protestavam contra o ato institucional n-5 da ditadura militar,
promulgado em 1968 no Brasil.
Com cinco filhos e um deles machucado, a mãe aceita a ajuda de Nazaré,
que, passando-se por enfermeira, promete cuidar das crianças enquanto o filho mais
74
O amante, José Carlos, não sabia da sua verdadeira profissão, para ele, ela
fingia ser enfermeira, e, dessa forma, conseguiu o sobrenome que desejava. Mais
de vinte anos depois, Nazaré, já interpretada por Renata Sorrah, estreia sua
aparição na novela empurrando o marido da escada (figura 12), em razão dele ter
visto na televisão uma foto da sequestradora de Lindalva (nome dado por Maria do
Carmo a sua filha) que havia sido feita por um jornalista nas ruas do Rio de Janeiro
no meio do tumulto entre policiais e estudantes em 1968. José Carlos entra em
choque ao ver aquela mulher vestida de enfermeira, grávida (barriga falsa) e com
uma criança nos braços. Para se livrar desse problema, ela o empurra da escada e,
muito mal, ele infarta antes de denunciá-la.
figura 13). Esse aspecto não é aprofundado aqui porque seria focar na trajetória dos
seres da Metamorfose (influências, divindades, psiquismos), que, embora seja
importante para a trajetória do Meme, é esta última, em específico, que interessa
mapear.
A partir da cena da figura 12, a novela inicia uma nova fase, o destino
finalmente cruza o caminho de Isabel (filha roubada) e Maria do Carmo. O impasse
decorrente disso, consiste no fato de que, apesar de descobrir que foi sequestrada,
Isabel ama e defende a mulher que a criou. Todavia, o que esse roteiro tem a ver
com o falar memeticamente? Diretamente, nada. A Nazaré ficou conhecida entre
internautas estadunidenses e de outros países em 2016, quando pessoas de vários
países, que nem mesmo sabiam que ela é brasileira, conduziram uma conversação
no Twitter acerca de sua imagem (um achado expressivo com seu rosto
aparentemente confuso). Embora já fosse popular no Brasil, o achado expressivo
da Nazaré viralizou por meio de uma discussão sobre política, na qual, perfis
estadunidenses usaram a imagem dela para conversar, ou melhor, falar
memeticamente, sobre o debate entre Donald Trump e Hillary Clinton (candidatos à
77
até agora”. Há dois aspectos a serem ressaltados nisso, primeiro, a falta de uma
identidade não comprometeu a condição de achado expressivo, provavelmente
tenha sido até um fator importante para dimensão da repercussão; segundo, e não
menos importante, a figura 14 exemplifica o fato de que falar memeticamente não
significa o mesmo que falar sobre Meme e vice-versa, embora uma coisa não
impeça a outra. Essa compreensão é fundamental para trilhar essa tese, que se
propõe a falar sobre Meme, mas não memeticamente.
66
E isso é válido tanto para o computador pelo qual estas palavras estão sendo digitadas, quanto
para o Meme, por exemplo.
79
67
É preciso acompanhar o conhecimento com suas Redes de Referência, oferecendo os meios para
ir tão longe quando quisermos, porém, é imprescindível arcar com o preço da instalação e expansão
dessas Redes. Esse pluralismo ontológico nos liberta do preconceito de olhar para outras sociedades
achando que elas confundiram a matéria com a dimensão simbólica. Ao invés de ir buscar na cultura,
na linguagem ou nas representações; mas, é o fio da experiência que deve ser seguido, e não
ficarmos presos no dualismo do sujeito/objeto.
80
seres da Ficção com os seres do Apego (ver figura 4), mas, agora, a questão
pertinente para dar continuidade a esta cadeia de Referência construída por esta
tese é: qualquer achado expressivo serve? Alguns são mais ideais que outros para
falar memeticamente? Um achado expressivo emerge, necessariamente, de um
alinhamento entre crenças e desejos com um insight. Para Tarde (2003),
crenças e desejos são forças da alma e apresentam um caráter quantitativamente
variável, iniciando na menor propensão a crer e a desejar até o ápice da certeza e
da paixão. Sob tal enfoque, esta tese ousa afirmar que esse alinhamento é, de
maneira geral, o esforço da ação do Meme, ao passo em que mira na construção de
uma afirmação e certeza, em uma convicção.
Há uma contradição oculta, explica Tarde (2003), quando se pretende, por um
lado, que um organismo é um mecanismo formado em virtude de leis puramente
mecânicas, e, por outro lado, que todos os fenômenos da vida mental, inclusive a
crença e o desejo, são apenas resultados da organização.
que várias partes do cérebro discordem para iniciar um conflito interno. O instigante
disso, é que tal conflito não é exatamente o problema, porque no caminho oferecido
pelo humor é preciso introduzir um conflito emocional. Mas, delicadamente, se por
um lado, tiver pouco conflito sobre o fato de a piada ser apropriada ou não, a piada
falha; por outro, se há provocação em excesso, não há conflito porque a
inadequação é clara desde o início. Em suma, a produção de jocosidade consiste na
adequação, conforme ressalta o neurocientista citado. Observe que a edição na
figura 16 com a frase “ki dia é hoje” oferece uma leve satisfação, ao apenas
solucionar o motivo da sensação transmitida pelo achado expressivo.
O humor corresponde a como lidamos com mensagens complexas e
contraditórias, ele auxilia na resolução de sentimentos confusos e conecta os
indivíduos com outros em situações de estresse; e o riso advém na medida em que
se percebe os detalhes (WEEMS, 2016). Esta tese compreende isso como o grande
estimulante do mundo digital, mediado pela possibilidade Técnica de manipular os
detalhes. A figura 17 exemplifica isso com a edição mais usada da Math lady.
em seu caráter contemplativo, mas, sim, pela sua dimensão política frente aos meios
de reprodutibilidade técnica cada vez mais avançados. Weems (2016) enfatiza que
interpretar o mundo é um acontecimento criativo, porque os humanos são criaturas
geradoras de hipóteses, ou melhor, estão sempre adivinhando o que é preciso fazer
ou dizer. Essas hipóteses, não raramente, estão erradas e isso não é absolutamente
ruim, pelo contrário, porque detectar os erros é a forma por meio da qual o cérebro
transforma conflito em recompensa.
A recompensa vem na forma de neurotransmissores indutores de prazer (a
dopamina, por exemplo) liberados quando o conflito é resolvido a partir de um
processo que Weems (2016) divide em três estágios importantes para o pensamento
de modo geral: a construção, o ajustamento e a resolução. A construção remete ao
quanto os indivíduos são ativos no processamento do ambiente em que vivem, e
que “quando solucionamos problemas, nós não apenas buscamos em nossa
memória possíveis soluções. Em vez disso, deixamos nosso cérebro trabalhar,
gerando muitas respostas possíveis, algumas delas úteis [...] e outras não [...]”
(WEEMS, 2016, p. 775). O ajustamento, por sua vez, está relacionado com o que o
cérebro faz com as expectativas da construção, pois, somente se atentando para as
consequências dos erros é possível entender por quais motivos esses erros levam
tantas vezes ao humor, e como eles podem levar a novas interpretações.
68
Weems (2016, p. 775) explica que “O cérebro é uma fera complexa. Há regiões separadas para a
visão, a audição e a linguagem, além de várias para orientar nossos movimentos. Há regiões que se
ativam quando usamos matemática complexa, outras que armazenam novas memórias e outras que
nos ajudam a reconhecer rostos. A única coisa mais surpreendente do que a especialização do
cérebro é que ele faz tanta coisa que a evolução nunca poderia tê-lo preparado totalmente para fazer.
Assim, não deveria ser surpresa que, quando o cérebro começa a pensar em coisas, ele toma alguns
caminhos errados”.
87
cada uma, o Meme pode realizar a sua trajetória específica e oferecer uma via a ser
imitada. Talvez esteja cansativo, mas, a trajetória objeto desta tese só ganha sentido
sociológico quando está em associação com outros discursos, assim, antes de
apontá-la, faltam algumas considerações. Imitar, reproduzir uma opinião remete ao
“ser” de um grupo social, ou seja, situado nas Redes homogêneas, esse “ser” é
constituído por um agregado de discursos. Ademais, cabe salientar que todos os
modos de existência discursivos mencionados partem de uma instituição moral, visto
que para cada um é destacado uma condição particular de felicidade e de
infelicidade, quer dizer, não param em nenhum momento de “moralizar”.
Note que para fechar a cadeia de trajetórias supracitada, o Meme precisa
oferecer uma via a ser imitada, sua condição de felicidade. O que interessa aqui,
vem antes dessa condição de felicidade ser atingida, porque corresponde a um feito,
não pode ser tomado como pronto, o que interessa (a trajetória) é o acontecendo
desse feito. Portanto, “em vez de opor o ‘ser do dever ser’, deve-se contar, antes,
por quantos seres convém passar e quantas alterações é preciso aprender a se
dobrar para continuar a existir” (LATOUR, 2019, p. 365). Corresponde ao “dever
supremo” de explorar por quais outros seres são necessários passar para subsistir
(a articulação) que define a existência.
ter ideia do quanto estamos perto de uma solução até tê-la. Dado que, ser afastado
das falsas suposições provoca prazer, a surpresa consiste em um valor tão
importante para o humor quanto para o insight, assim, quanto maiores são as
expectativas de uma interpretação, mais se torna permissível ser pego em
desequilíbrio pela virada real de uma piada.
Entretanto, a surpresa não é suficiente em uma piada, é preciso, ainda,
oferecer uma mudança de perspectiva, afinal, ela é uma maneira de manipular
muitos scripts. Quanto maior a oposição dos scripts, mais engraçada a piada,
porque se rir do imperativo de ter que integrar objetivos ou ideias incompatíveis, que
levam à confusão, à dúvida e à vergonha. Efetivamente, construir, ajustar e resolver
interpretações conflituosas é crucial em todos os aspectos do pensamento, mas, a
piada se especializa na rapidez desse processo e o humor entra na medida em que
convida a, simultaneamente, realizar os três estágios (a construção, o ajustamento e
a resolução). Logo, o humor é uma das formas de se lidar com a confusão, e, sem
confusão, não se poderia rir (WEEMS, 2019). Neste aspecto, importa perceber que o
Meme precisa, além de mandar a mensagem oculta para pessoas fisicamente
distantes, “resolver” os conflitos sociais do mundo digital. Como lidar com os
sentimentos incongruentes que movem as ações nesse ambiente? Organizando-se
com humor. Explico.
Uma vez que o falar memeticamente consegue atingir sua condição de
felicidade, ou melhor, consegue oferecer uma via para ser imitada, é seguido pela
produção de scripts. Estes, na descrição de Latour (2019), são histórias capazes de
impor a seguinte torção: obrigar àqueles que as contam, os falantes, a ocupar duas
posições ao mesmo tempo, ligeiramente defasadas. A primeira posição reside acima
dos relatos, como se estivessem livres para escrevê-las a qualquer momento; e, em
seguida, abaixo dos relatos, como se não fossem livres para modificá-los. O script é
avaliado de acordo com sua capacidade de definir fins, contornos e, em sentido
amplo, prazos, e dominar essa capacidade é a condição de felicidade que Latour
(2019) reputa à Organização. Para uma visão mais geral, observe a figura 18.
90
Paradoxalmente, os scripts têm duração pelo que não dura, mas é em razão
dos quadros advirem do interior dos próprios scripts que eles conseguem enquadrar.
Tais quadros obtêm o efeito de continuidade, de estabilidade, de essência, de
inércia, apesar de não existir nenhuma substância por trás, nenhum mundo no qual
se apoiar os dispositivos. Os scripts, portanto, oferecem a possibilidade, a força de
retomadas, de reenvios, de retificações, de queixas e de obediências, de fazer durar
algo que, enfim, possuirá bordas, fronteiras, programações, limites e etc., ou melhor,
consegue-se algo que parece com o que se esperava, mas sem nunca o conseguir
de fato (LATOUR, 2019). A trajetória do Meme tem a oportunidade de acontecer e
cruzar a produção e seguimento dos scripts (Organização) em razão de um aspecto
que lhe é favorável versado por Weems (2016): os humanos são especializados em
ambiguidades. Esta é a última pista que levará à trajetória do Meme.
Mais do que reconhecer uma ambiguidade, importa explorá-la. Neste aspecto,
sobressai-se a relevância do pensamento flexível para a interpretação de
significados sutis e para as suposições minimamente aceitáveis acerca de possíveis
interpretações, enfim, para a criatividade. Ao contrário dos computadores, os
humanos são bons contadores de piadas porque são pensadores desorganizados,
ou seja, são capazes de deixar suas mentes discutir e flutuar até que uma solução
as surpreenda. De acordo com essa visão, o modo como se procura uma solução
conta mais do que ter mais tempo para achar uma solução, afinal, todo tempo do
mundo não ajuda se não souber como procurar. Diferentemente do caso do
91
segundo ele, pelo menos sete significados diferentes. Basta ler em voz alta para si
mesmo e enfatizar uma palavra diferente em cada leitura, tudo que seria necessário
é uma inflexão em determinado ponto, uma mudança de tonalidade ali, e a interação
pode ser completamente alterada. Embora nem mencione os regimes de
enunciação, o neurocientista está falando sobre o que Latour (2019), com fascínio,
aponta como trajetória, como o fazer-fazer que antecede o resultado, pronto,
aparente dado, pleno.
No caso da ação específica do Meme articulada em benefício do grupo, a
trajetória consiste na flexibilização dos scripts por resolução antecipada dos
conflitos, para, penosamente, entregar a sua mensagem. Esta é a trajetória que,
em uma segunda instância (a das Redes homogêneas), é identificada quando se diz
“isso é um Meme”. Portanto, o Meme não é uma piada, não é a Nazaré Tedesco,
não é o achado expressivo, não é a postagem, não é a opinião: é a ação, a
trajetória que já pode preencher o seu lugar no quadro de encargos.
Não saber a Flexibilizar os Oferecer uma via Curtidas, reposts, Dar quantidade
temperatura dos scripts por para ser imitada, emojis, social, contagiar.
interesses resolução oferecer um comentários
apaixonados. antecipada dos pensamento em favoráveis.
conflitos. comum/Opor-se,
conflitar.
Fonte: autoria própria
fazer a opinião se movimentar, para salvar o social no mundo digital e garantir que o
contágio, aparentemente, não tenha sido feito, trabalhado, pareça não sugerido,
apenas uma identificação vinda do espírito dos indivíduos, da interioridade,
chama-se: falar memeticamente.
94
3. CAPÍTULO 3 – POSSESSÃO
(Bruno Latour)
em lidar com os conflitos éticos oferecendo uma resolução hábil (e cínica), por isso,
o seu humor mordaz se sobressai quando tentam descrevê-la. A surpresa contida
em frases do tipo “como a Nazaré virou Meme?”, “quando isso aconteceu?” parte do
fato de que o intenso trabalho para fabricar esse acontecimento foi ocultado70. Mas,
para compreender a eficácia desse deslocador de ação, o “Meme da Nazaré”, é
fundamental ressaltar que ela não é simplesmente produtos da interioridade dos
indivíduos, não pode estar presa a um mundo simbólico, pelo contrário, ela foi
fabricada e passou à autonomia, que dizer, bem como todas as criações discursivas,
superou ligeiramente os falantes. A transcendência desse fenômeno reside na
passagem71 da prática à ação72 de um número ilimitado de atores.
Se foi passado clareza sobre a perspectiva que dá base a este trabalho, já
está claro que o mundo das coisas e o pensamento são articulados de forma
trabalhosa e sofisticada. Contudo, pontua Latour (2019), mais surpreendente do que
a maneira como os modernos tratam seus fe(i)tiches, é o pouco espaço que
concedem àquilo que lhes são peculiares: a arte (Ficção) e a Técnica. Justamente
duas trajetórias destacadas neste capítulo no acontecimento chamado “virar Meme”.
Diante de toda essa complexidade que envolve a fabricação artificial da realidade, a
cada ocasião, o que se deve aprender a nomear são as transcendências, pois,
remetem a
73
O foco desta tese é a ação de uma Rede homogênea, não se pretende aprofundar quanto os
demais tipos de Rede, mas, é relevante pontuar que, ao que parece, a Rede híbrida guarnece a
passagem das Redes homogêneas, assim como as Redes homogêneas guarnecem a passagem das
Redes de psicogênese.
99
Nazaré ameaça jogar a criança no rio caso se aproximem dela, então, Isabel
tenta conversar e pede sua filha de volta, prometendo não permitir que a façam mal
101
se a criança for devolvida. Diante dessa e de tantas outras maldades seria comum
pensar que não tem como ficar do lado da sequestradora de bebês; porém, se está,
também, diante de uma especialista na flexibilização de scripts e resolução
antecipada de conflitos, dessa forma, ela surpreende por meio do mecanismo rígido
peculiar a sua existência, a sua fisionomia, e diz: “é o fim da linha”, ignorando o fato
de que acabou de sequestrar um bebê, prossegue sua fala: “eles não vão deixar que
essa raposa linda, felpuda, saia sã e salva daqui. Eu te amo, eu te amo mais que
minha própria vida. Isabel, você é o ar que eu respiro, eu vou te dar uma prova
agora do meu amor por você”. A prova do amor por Isabel é devolver o neném e,
sorrindo, jogar-se na ponte.
cachimbo não teria persistido sem passar por elas (LATOUR, 2019,
p. 126).
O autor reitera que o signo não é o sentido, mas, sim, uma das variedades do
sentido advindas da Ficção. Apesar de ser tentador relacionar os signos entre si
como se constituíssem um mundo à parte, um sistema ou uma estrutura, eles são
como organizadores virtuais que fazem todos os existentes vibrarem na direção de
uma forma que se sucederá a precedente. Devem-se reintroduzir, então, os
invisíveis para expulsar as representações. Dizer que os seres da Ficção povoam o
mundo significa que eles vêm a nós e se impõem, porém, com a peculiaridade de
74
Latour (2019) descreve essa condição ontológica de ser-enquanto-outro. Diferentemente deste, o
ser-enquanto-ser busca se firmar em uma substância que assegure sua continuidade e abandone a
experiência de existir para focar no que é sólido e seguro. Por sua vez, o ser-enquanto-outro exige
ser instaurado, não possui garantia acerca de sua origem, situação ou operador, além disso, pagam
sua continuidade com descontinuidade, isto é, as etapas n-1 e n+1 do trajeto de existência.
75
Mas, como já é de se esperar de Latour (2019), é preciso ainda problematizar a noção de signo,
afinal, se todos passam por outros para existir, conforme ele defende, a definição segundo a qual
signo é aquilo que ocupa o lugar do outro, precisaria englobar todos os seres. Isso implica dizer que a
palavra “signo” não pode ser colocada como o oposto da palavra coisa: fim de mais um dualismo.
Para enfatizar esse posicionamento, o autor escolheu a expressão modo de existência, desenvolvida
originalmente pelo filósofo Étienne Souriau.
107
76
Usando a auto apresentação do #MUSEUdeMEMES: “um projeto desenvolvido sob a
coordenação-geral do professor doutor Viktor Chagas, e que envolve pesquisadores e estudantes do
Laboratório de Pesquisa em Comunicação, Culturas Políticas e Economia da Colaboração (coLAB),
vinculado à Universidade Federal Fluminense, o #MUSEU tem a expectativa de apresentar ao grande
público um conjunto de pesquisas sobre o tema, valendo-se de sua verve como ação de extensão
universitária e simultaneamente como projeto de divulgação científica. Como escritório-modelo ou
agência-escola, o #MUSEU organiza oficinas e seminários acadêmicos, desenvolve projetos de
inovação tecnológica, e, acima de tudo, suscita problematizações indispensáveis” (VIKTOR CHAGAS,
109
seguinte afirmação: “No museu de belas artes dos memes de internet, quase não há
artistas consagrados, já que muitos memes são criações anônimas e coletivas”.
Contudo, sob a perspectiva dos seres da Ficção,
2015, NP).
110
De maneira geral, o Meme é uma das formas de se alterar, de ser outro, que
se soma a tantas outras formas de se alterar e, desse jeito, pode continuar a ser o
mesmo. Consoante a Bergson (2020), a linguagem só produz efeitos risíveis porque
é obra humana, modelada sob as formas do espírito, por isso, é possível sentir que
algo da vida humana vive nela. Seria a forma de vida prática dos regimes de
enunciação da qual fala Latour (2019)? Ainda para Bergson (2020), se a vida da
linguagem fosse completa e perfeita, incapaz de se dividir em organismos
independentes, ela escaparia ao cômico. Sob tal enfoque, é plausível concluir que o
cômico no mundo digital se sobressai pelo ápice da asfixia das formas de vida
prática do discurso, reivindicando o reconhecimento dos serviços e valores
prestados pela linguagem à fabricação da realidade. Em síntese, se o despertar de
uma ilusão resulta no riso, sorrir no mundo digital é predominantemente o efeito de
não poder fugir das contradições, do esforço surreal de ter que corrigir a realidade.
Nesse mundo, é muito mais difícil garantir a ilusão de que a realidade está pronta,
dada, plena e esconder os fe(i)tiches.
Esse riso é canalizado pela centralidade que o Meme assumiu cuja
consequência mais fascinante consiste na evidenciação da importância do
infinitesimal para os acontecimentos. Tal façanha decorre do fato de que o Meme
exige do pensamento que ele acesse as ideias a partir de um memorial precedente
acumulado, o mais sintético possível (tem-se pouco tempo, assim, quando mais
comprimida a mensagem, mais eficiente na entrega ao destinatário correto), porém,
quanto mais sintético e acumulado for este memorial, mais próximo do absurdo e da
ausência de sentido. Por esse caminho, as contradições se multiplicam de maneira
extraordinária e lidar com elas é o único caminho. Então, se a intenção é reagregar o
social, é necessário se especializar em resolver conflitos (e rápido), sendo os
achados expressivos, uma das chaves de acesso.
melhor, ela fala e faz falar. Os modernos, tanto quanto aqueles que chamam de
ingênuos porque fabricam e reconhecem a existência de suas entidades, fazem o
mesmo, a diferença reside na insistência em separar o que construíram do que,
teoricamente, veio de outro lugar: da dimensão simbólica, do mundo da imaginação.
Insistem que não precisa sustentar tudo isso, pois simplesmente estaria lá, dado,
pronto, feito. Mas, a questão cara a Latour (2002) é: quem está enganado a respeito
da origem da força? Como se pode fabricar ídolos a partir das próprias fantasias e,
mesmo assim, imputar essa força ao que foi fabricado?
Frente à eficácia do ídolo, não adianta dizer que não é nada, porque já
começou a agir e a deslocar a ação, isto é, o fe(i)tiche é capaz de inverter a origem
da força. Aquilo que não é capaz de fazer nada sem a ação dos indivíduos já fez e
se inseriu na disputa incomensurável acerca da origem da ação. Em termos
precisos, a Nazaré Tedesco não está na imaginação do homo digitalis, ou em uma
identificação do seu espírito, ela está circulando, ela existe. Sendo assim, o Meme
não é moderno, uma vez que compreende ao movimento do social, faz parte do
esforço de reagregar o social, do esforço de mediação entre o mundo das coisas e o
mundo das palavras, entre o objeto e o sujeito, entre a exterioridade do indivíduo e a
interioridade do indivíduo, entre a matéria e o espírito, entre a prática que sustenta a
realidade e a teoria sobre a constituição da realidade. Aliás, o Meme faz a mediação
de mais um binarismo criado pelos modernos: ele (não sozinho, é claro) faz a
mediação entre as interações nas quais o contágio acontece por aproximação física,
a chamada vida offline; e as interações nas quais o contágio acontece à distância,
chamada de vida online.
E mais, para garantir o delineamento da opinião ou do que importa ser
imitado, o Meme é capaz de subjugar os demais regimes de enunciação: enviando
os seres da Ficção para torcer a realidade e, deste jeito, multiplicar os mundos. Isso
implica dizer que, ao encontrar resistência de outras opiniões (sobre Política ou
sobre Religião especialmente) é possível, neste mundo, cultuar os seres do Meme
para “resolver” as contradições, com a finalidade de garantir uma aparente
continuidade, ignorando, muitas vezes completamente, o estado das coisas
inerentes às Redes híbridas em prol das sensações, do sentimento entorpecido
pelas crenças e desejos.
Por fim, a especialização de tais contradições na trajetória do Meme cria a
ponte para um cruzamento poderoso com outro regime de enunciação tão
115
sofisticado e mal falado quanto o que constitui o objeto desta pesquisa: a Política.
Esse cruzamento é versado no próximo capítulo, não mais focando em evidenciar o
Meme como um regime de enunciação, mas, sim, tratando-o como tal em
associação com a Política.
116
(Gabriel Tarde)
77
Em síntese, os capítulos precedentes afirmam que os interesses apaixonados podem ser medidos
pelos seres do Meme, as curtidas, os comentários favoráveis, os reposts, e, objetivamente sentidos
no crescimento ou alargamento do grupo, no aumento da quantidade social do grupo. Neste capítulo,
importa saber por meio de qual articulação os interesses apaixonados podem ser delimitados e
desenhar ou descrever grupos.
78
Ou seria ao contrário, os seres do Meme se apropriam dos seres da Política?
118
79
Retomar tal esforço no capítulo 2, o qual versa sobre a trajetória do Meme.
120
Mapeado por Latour (2004), um dos meios mais delicados de fazer os grupos
existirem é denominado de falar politicamente. Trata-se de cercar, apreender,
assenhorear os grupos, de reproduzi-los pelo exercício sempre recomeçado, pelo
laço, pelo envolvimento, pela curva da sua ação. Todo agregado social, seja qual for,
precisa de um trabalho de (re)apreensão que exige uma palavra curva, hábil na
121
trajetória de traçar e retraçar, provisoriamente, seu invólucro. Logo, não existe grupo
sem reagrupamento, sem uma palavra mobilizadora, ou melhor, na ausência desta
enunciação, não há agregado social pensável, visível e unificável.
Isso implica dizer que limitar a fala política à forma oficial de vida pública é o
mesmo que impedir a existência de qualquer outro agregado, considerando-se que,
ao fazer isso, somente o Estado e a nação poderiam existir. Limitaria-se, assim, a
enunciação à esfera política, sem oferecer meios aos demais grupos para se
manterem existentes. Para tornar visualmente compreensível, Latour (2004)
apresenta um esquema acerca da trajetória desse regime de enunciação: o círculo
político.
80
O “um” compreende o grupo constituído temporariamente por todos que foram alinhados pelo
círculo político.
123
devem transformar a ordem recebida, não apenas repeti-la. Isso significa dizer que o
círculo somente se fecha, se houver uma dupla traição, caso contrário, se existir
fidelidade, transparência exata de informação, o círculo jamais será completado,
porque é um equívoco tomar a palavra política verídica no sentido da informação
(LATOUR, 2004).
O paradoxo da fala política reside, então, na impossibilidade de autonomia
sem esta dupla traição. Neste aspecto, torna-se compreensível o repúdio causado
nas pessoas razoáveis diante do fazer Política, por mais valiosa que a liberdade
seja, ela requer um percurso defeituoso. O sentimento depreciativo dirigido à Política
vem justamente do fato de a autonomia e a liberdade encobrir o trabalho da
composição, da traição, da Metamorfose, “a autonomia como resultado esconde a
horrível cozinha da heteronomia” (LATOUR, 2004, p. 23). Mas, questiona o autor, e
se recusassem, na prática, esse trabalho desprezível e em vez da palavra curva,
somente usasse a palavra reta, a transparência, a retidão e a imediatez? E se fosse
decidido exigir dos políticos que “falassem verdadeiro”, repetissem fielmente o que
dizem os seus mandantes? A resposta é categórica: não existiriam grupos. A
“multidão” não teria como deixar de ser “multidão”, não se faria mais do que repetir
fielmente diante dos critérios da informação, mas, falsamente diante dos critérios da
Política.
Em primeiro lugar, partindo do falar memeticamente, a multidão está sendo
sugestionada a todo o momento, por tendências e contratendências, oferecendo vias
(opiniões) a serem imitadas, e, ao conseguir enviar a sua mensagem (e constituir um
pensamento em comum), então, o círculo político pode iniciar. Tome nota de que o
Meme apenas garante as condições para resolver os conflitos inerentes à “multidão”,
quer dizer, ao público, mas, essa resolução não pode se sustentar por muito tempo,
por isso; em segundo lugar, a “multidão precisa ser retomada incansavelmente,
afinal, a mensagem é pontual, “pensamos igual sobre isto ou sobre aquilo”, porém,
com o intenso fluxo de scripts, talvez não “pensemos igual sobre quilo outro”. Falar
politicamente, portanto, visa delinear, mesmo que de maneira um tanto
desconfortável, um grupo, mantendo nele o máximo de indivíduos possível. E,
quanto mais indivíduos se almejam, maior será o desafio de flexibilizar os scripts por
resolução antecipada dos conflitos.
Como o movimento precisa ser ininterrupto, sob pena de reduzir o grupo, a
fala política se articula com a fala memética na medida em que precisa engendrar
124
novos scripts81. Afinal, o círculo só pode ser retomado, ao passo em que ganha
quantidade social. No mundo digital, há uma maneira peculiar de medir a quantidade
social, como já foi dito, os seres do Meme (curtidas, reposts, comentários positivos)
tentam mensurar os números exteriores das duas quantidades interiores (crenças e
desejos). Assim, é o conjunto dessas forças interiores que delimitam grupos e
figuras de lideranças, ou seja, estes passam a serem reconhecidos por suas pautas
que se repetem, por meio de certo grau de coesão psíquica. Ademais, o cruzamento
do Meme com a Política (obviamente salvaguardando os efeitos de outros regimes
enunciativos) culmina na definição de grupo de Gabriel Tarde (2000): uma profunda
assimilação mental, a espíritos suficientemente semelhantes para compor um
agregado.
81
Aqui, entra outro regime de enunciação na associação discursiva, a Organização, mas, infelizmente
não é explorado, dado que o objetivo desta tese é mapear a ação do Meme especialmente.
82
O conteúdo das palavras diz respeito ao modo de existência da Referência, ao regime discursivo da
ciência.
125
83
Versados no capítulo 1.
128
Ou seja, a verdadeira ilusão é acreditar que existe acesso sem mediação, que
um acontecimento social, um grupo ou uma situação pode existir sem um trabalho
intenso de articulação entre Redes. O “estar sendo” um líder, um grupo aceito e
com certa coesão psíquica, correspondem a rituais que possuem Técnicas
capazes de permitir a articulação entre o mundo e o pensamento. O aspecto
fundamental disso reside no fato de que recorrer a essas Técnicas, dadas as
eventuais adaptações, é imprescindível para fabricar qualquer mundo, seja o
subterrâneo idealizado por Tarde (2014), seja o digital, em experimentação pela
sociedade atual.
84
O aspecto delicado aqui consiste na compreensão generalizada, de acordo com a qual os políticos
mentem justamente para envolver. Porém, é fundamental lembrar que, no âmbito das Redes
homogêneas, o verdadeiro e o falso são categorias que não tem nada a ver com a definição
epistemológica. Tem a ver com os critérios de felicidade e infelicidade de cada modo discursivo. No
caso do Meme, mentir significa não conseguir oferecer uma via a ser imitada, no caso da Política,
mentir significa não conseguir ampliar ou manter o grupo. Portanto, não é de se espantar que se
possa proferir uma mentira no sentido da definição epistemológica (dizer uma coisa que não condiz
com as etapas n e n+1, o que precede e o que sucede um acontecimento a partir do modo de
existência da Referência), mas, mesmo assim, dizer a verdade em um tipo de segunda instância, uma
vez que ofereceu uma via a ser imitada e conseguiu alargar o grupo. Por isso, é importante sempre
se situar a respeito de qual Rede estamos.
133
85
Rouvroy e berns (2018) compreendem governabilidade algorítmica como certo tipo de racionalidade
(a)normativa e (a)política, baseada na coleta, agregação e análise automatizada de dados em
quantidade massiva, para modelizar, antecipar e afetar, por antecipação, os comportamentos
possíveis.
86
A elaboração de perfis nas plataformas digitais acontece por meio da mineração de dados, o
datamining, processo dividido em três momentos por Rouvroy e berns (2018): o primeiro momento é o
da coleta e conservação automatizada de uma quantidade massiva de dados não classificados, o
bigdata, facilmente constituído porque os indivíduos compartilham esses dados nas plataformas
digitais benevolentemente; o segundo momento corresponde ao tratamento automatizado dos dados,
de modo a fazer surgir correlações sutis entre eles; por fim, o terceiro momento é o uso dos saberes
produzidos no segundo momento para fins de antecipação dos comportamentos individuais,
associados a perfis.
134
ação capaz de influenciar à distância, além disso, não se tem muito tempo. Logo, o
desafio não é apenas trazer questões relevantes para a pauta das conversações no
mundo digital, mas, sobretudo, ou antes, aprender a conversar sem esmagar os
modos de existência dos regimes de enunciação.
Dito isso, esta tese termina com uma questão a ser investigada em outra
oportunidade: é possível uma diplomacia discursiva no mundo digital?
137
CONSIDERAÇÕES MEDIADAS
feito e não se sabe como aconteceu e de onde exatamente partiu, mas, está pronto,
dado, pleno, muitos podem sentir a realidade do fenômeno. Podem, também, deixar
de sentir: basta interromper a conversação, interromper o movimento que alimenta o
estado social. Portanto, para manter ou inovar um estado social, é preciso aprender
a conversar, e o Meme, embora não possa estar ausente, compreende apenas uma
parte desse ato, uma unidade de sentido sem sentido se estiver isolada. Parece
intuitivo esse termo ter sido escolhido para remeter a algo que não se sabe
exatamente se é a imagem, se é a postagem, se é a piada, se é a ideia, contudo,
pode-se sentir seu efeito com muita clareza: “é um Meme!”. Mas, é preciso se
identificar com o Meme, certo? Errado. O Meme não aciona uma identidade, ele
provoca uma alteração; ele não apenas sugestiona um repost, uma curtida ou um
comentário elogioso ao conteúdo materializado em uma postagem qualquer pelo
simples fato de satisfazer uma dada opinião. Neste caso, é o modo discursivo da
Reprodução que impera, quer dizer, a Reprodução da mesma opinião, pois, o
contágio já aconteceu e a ação do Meme não está sendo mais a principal.
De maneira específica, os seres do Meme medem a temperatura dos
interesses apaixonados flexibilizando scripts por meio da resolução antecipada de
conflitos, mediando, assim, o contágio. Sobre a resolução antecipada de conflito, a
Técnica do Meme capilariza o humor enquanto recurso para lidar com os conflitos e
contradições inevitáveis decorrentes da ampliação das Redes. O humor é
fundamental porque a flexibilização dos scripts requer maleabilidade ou até certa
“distração” em relação aos conflitos e contradições das crenças e desejos. Ademais,
experimentar a liberdade prometida pelo mundo digital consiste em uma maneira de
andar na corda bamba que equilibra o caráter sério e o caráter cômico da vida,
respectivamente, o sentimento de que tem controle da vida e o sentimento de que
não tem controle nenhum da vida. Dessa forma, com seu valor específico para a
criação e manutenção de grupos, o Meme se soma/associa aos demais regimes de
enunciação mapeados por Latour (2019).
A associação mais proeminente, em razão da urgência temporal para criar e
manter grupos no mundo digital é entre a fala do Meme e a fala Política, em outras
palavras, falar memeticamente e falar politicamente são as ações que aceleram
extraordinariamente o fluxo dos acontecimentos no mundo digital. Juntas, garantem
que a existência do grupo e a imitação irrefletida sejam um pouco mais estendidas,
na medida em que as conversas conseguem acontecer regularmente e atingir suas
139
possa imitar, opor-se e se adaptar diante das condições hostis ao social: muitos
reflexos, pouco tempo e distância física. O Meme é uma tecnologia discursiva que,
bem como as outras tecnologias discursivas, combina elementos a fim de se adaptar
às novas circunstâncias. Note-se que não é uma tecnologia que parte do nada, ela
remonta a experiência do contágio por contato físico, mas, não se confunde com o
contágio das relações face a face nem com outros regimes de enunciação, porque
possui um hiato próprio. Sua trajetória é cercada pelo conflito, não tem como fugir,
dessa maneira, precisa aprender a lidar com ele para atingir a condição de felicidade
de oferecer uma via de imitação. Falar memeticamente é, em resumo, um desafio:
“vamos conseguir ficar juntos nesse mundo?”.
Entretanto, talvez a questão seja outra: por qual motivo os modernos desejam
tanto mudar para um mundo tão hostil? Por que o mundo digital é tão atraente? O
que ele promete? Afinal, a tragédia da extinção do tempo e da aproximação física é
consequência de viver nesse mundo, ou seja, diferentemente dos indivíduos de
Fragmentos de uma história futura, os modernos não estão fugindo da tragédia, seu
conflito é não saber se estão felizes no mundo digital: estão cansados pelo esforço
de parecerem felizes; cansados pelo esforço de ter que dar conta da multiplicação
em um nível sem precedentes das contradições e para sanar esse cansaço cultuam
a deuses fe(i)tiches muito exigentes, cujos retornos não são duradouros, suplicam
curtidas, emojis fofos, elogios, reposts. À vista disso, o pensamento parece um
exercício em crise. Contudo, embora os modernos estejam fragmentados demais e
experimentando caminhos para reagregar o social, inventar uma nova tecnologia
discursiva como o Meme não sinaliza dessubjetivação ou privação da subjetividade,
pelo contrário, significa resistência subjetiva, produz um tipo de pensamento que
interessa a nossa época.
“Produzir Memes” é tido como uma atividade atualmente importante para a
manipulação política, por exemplo, porém, a espontaneidade é um dos aspectos
fundamentais para o Meme. O que de fato se produz nas propagandas de política
eleitoral são postagens que adaptam ideias aos achados expressivos, munindo-se,
assim, de um potencial para viralizar, e, eventualmente, falar memeticamente, dado
que o Meme precede a verbalização da ideia. Ao atribuir à linguagem uma ideia,
tem-se uma adaptação, o nível abstrato do Meme se objetiva em uma via a ser
imitada, reproduzida. Produzir achados expressivos é outra coisa, se os políticos
profissionais pudessem produzi-los assim com tanta facilidade, bem como a Nazaré
141
Tedesco produz, seriam verdadeiros artistas, mas apenas usam recursos de edição
para adaptar uma opinião específica.
Nazaré Tedesco, entre outras influências, divindades e psiquismos, é
invocada no mundo digital justamente para garantir as transformações e emoções
dos indivíduos, por meio das quais o processo de subjetivação pode acontecer. No
caso dela, as sensações podem ser figuradas, principalmente, pela sua fisionomia
capaz de acessar o cômico, não porque tal fisionomia é cômica em si, mas porque
oferece um acervo precioso de achados expressivos, capazes de surpreender o
mecanismo rígido na continuidade viva das coisas humanas e, a partir dessa
surpresa, poderem rir da ilusão de achar que tem o controle da vida. O mecanismo
rígido capturado no curso da vida é descrito por Henri Bergson (2020) como uma
distração da vida, um intruso na continuidade da vida, e percebê-lo é como perceber
a distração, e isso é útil para a trajetória do Meme.
A trajetória do Meme pode ser percebida como uma trajetória do pensamento,
de maneira que, agregar e desagregar a realidade são uma questão de agregar e
desagregar o pensamento. O Meme é feito do que Bruno Latour (2012b) chama de
social: um dos muitos elementos de ligação que circulam por estreitos canais, ou
melhor, não se trata de uma cola capaz de fixar tudo, mas, sim, daquilo que outros
tipos de conectores misturam, um tipo de conexão não em si mesma social; um
movimento peculiar de reassociação e reagregação. Portanto, os regimes de
enunciação, especialmente o Meme, não são os culpados pelos desafios
sociológicos do mundo digital, são, efetivamente, tentativas de resistir às condições
hostis ao social, de salvar o social. A verdadeira urgência é a de aprender a
conversar e o Meme apenas reitera: jamais fomos modernos, fabricamos a realidade
cultuando deuses fe(i)tiches.
Por fim, a importância do Meme consiste em preencher o vazio ou o hiato
aberto pela distância física entre os indivíduos como condição dada pelas
circunstâncias sociotécnicas do mundo digital, uma vez que trabalha na resolução
dos conflitos e contradições inerentes às relações sociais diante da ampliação
extraordinária das Redes, das associações, das conexões, dos agregados sociais.
E, como efeito, o Meme resulta na flexibilização dos scripts, garantindo mais um
pouco (o trabalho deve ser incessante) a existência de um grupo, um acontecimento
social. Sem tal ação, o mundo digital não poderia ser povoado, não poderia existir,
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não poderia ser real. Como mediar de outra maneira esse modo de existência (o do
social) tão delicado, sem a ação do Meme no mundo digital?
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REFERÊNCIAS
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