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Resenha

FREITAS, C. S. de; ALCÂNTARA, L. P. de; BARROS, S. Desigualdades (online) como obstáculo à


democracia digital: o caso do portal e-Cidadania. Liinc em Revista, [S. l.], v. 18, n. 2, p. e6031, 2022. DOI:
10.18617/liinc.v18i2.6031. Disponível em: https://revista.ibict.br/liinc/article/view/6031. Acesso em: 25 nov.
2023.

O tema principal do artigo é o capital digital e as consequências causadas pelo seu acúmulo. Ele tem por
objetivo estabelecer uma relação direta entre os indivíduos que possuem um grande capital digital e a
influência que eles possuem no meio digital, o que por sua vez causa implicações em questões políticas e
econômicas que abrangem muito mais que a área do mundo virtual. Para isso, ele faz uma análise dos 10
perfis que receberam mais votos nas suas propostas legislativas dentro do portal e-Cidadania, utilizando-se
do método prosopográfico para estabelecer uma investigação de características dos indivíduos ou grupos em
questão. Como resultado, o artigo concluiu que os 10 indivíduos ou grupos analisados possuem um nível
elevado de aprendizagem do capital digital, fortalecendo a ideia de que há sim essa relação de poder.

Como evidenciado no artigo, o conceito de capital digital torna-se relevante com a difusão das chamadas
TICs (tecnologias de informação e comunicação) e conforme crises com a democracia representativa surge, a
necessidade popular por mais representatividade na esfera pública torna a internet um espaço de organização
política na busca por mais direitos. Tal cenário evidencia a relação entre a vulnerabilidade social e a
disponibilidade de informação, onde a sociedade deixa de ser uma sociedade da informação para se converter
em uma sociedade da economia da informação. Entretanto, a falta das habilidades necessárias para lidar com
esta sociedade digital gera desigualdade, de forma que a habilidade é construída (ou ainda obtida) a depender
de fatores como escolaridade, renda e acesso a cultura. Diferentes tipos de indivíduos então teriam diferentes
níveis de acesso à democracia digital.

Dessa maneira, para a compreensão do tema, é necessário compreender adequadamente certos temas, dentre
eles podemos citar a democracia digital, definida como “conjunto de recursos, ferramentas, projetos,
experimentos, experiências e iniciativas em que se usam tecnologias para produzir mais democracia e
melhores democracias” e que para mesmo, podem atuar de diversas formas: 1) Remediar a crise democrática
2) Estimular a crise democrática 3) Constatar a própria irrelevância, por causar mudanças cosméticas ao
invés de mudanças fundamentais.

Também podemos citar o termo capital tecnológico-informacional ou capital digital, defendido por alguns
autores, que sugere, na sociedade moderna, o acesso e a habilidade de usar a tecnologias digitais se tornaram
uma forma de capital (que para o mesmo, é qualquer tipo de poder que surge em determinada relação social)
que pode ser usada para ganhar vantagem/hierarquia na sociedade.

Além disso, pode-se categorizar as habilidades digitais em alguns níveis básicos. Primeiro, as habilidades
operacionais, que se referem à capacidade de operar dispositivos digitais. Segundo, as habilidades formais,
que se relacionam com a capacidade de navegar e buscar informações online. Terceiro, as habilidades
informacionais e estratégicas, que se referem à capacidade de avaliar e usar informações digitais para atingir
metas específicas. Por último, as habilidades de comunicação digital, que envolvem a capacidade de
participar e se comunicar em ambientes digitais. Dessa forma, o nível de capital digital de um indivíduo pode
ser amplamente determinado por essas habilidades, que são gradativamente adquiridas conforme o indivíduo
se socializa e integra na sociedade.

Ou seja, aqueles que possuem um alto nível de capital digital podem exercer maior influência em
comparação com aqueles com baixo capital digital. Relevante principalmente no contexto da democracia
digital, onde o acesso e a habilidade de usar a tecnologia digital podem afetar significativamente a
capacidade de um indivíduo de participar e influenciar processos sociais.

Assim sendo, o objeto de pesquisa estudado, o portal do e-Cidadania, possui três ferramentas utilizadas para
cumprir seu propósito de transparência pública:

1. Ideia Legislativa: recurso para sugerir mudanças na legislação, propor novas leis ou apoiar propostas
de outros usuários;
2. Evento Iterativo: permite a participação remota dos eventos públicos como sabatinas e audiências;
3. Consulta Pública: permite ao usuário opinar livremente sobre projetos de lei, emendas à constituição,
entre outros.

A Ideia Legislativa é o recurso específico estudado pelo referido artigo, pois segundo o mesmo este
possibilita expandir o processo de construção de instrumentos normativos a população, antes restrito aos
senadores. Apesar disto, é necessário acesso a internet para utilizar a ferramenta, algo que não se mantém
homogêneo para a população, esta ausência de capital digital é um marcador das desigualdades, perceptível
por exemplo por cidadãos que deixam de receber benefícios sociais pela falta de acesso ao capital digital.
Este é, entretanto, apenas um dos filtros presentes na ferramenta do e-Cidadania, outros citados foram
também a capacidade cognitiva, limitada pelos números restritos de acesso à educação, e o filtro moderador
da própria plataforma

O método utilizado para traçar o perfil dos agentes de maior sucesso foi o método prosopográfico, que
consiste em determinar o campo de estudo identificar as características comuns e questões uniformes dos
personagens envolvidos, chamado também de biografia coletiva. No contexto analisado pelos autores, as
informações dos proponentes de ideias para o e-Cidadania são divididos em quatro categorias:

1. Nome;
2. Estado;
3. Profissão;
4. Dados educacionais.

Para identificar as habilidades digitais por parte dos agentes foram observados: Habilidades de manuseio e
Habilidades de criatividade, com os dados sendo observados de novembro de 2019 até março de 2020, como
já dito a hipótese que norteia a pesquisa é a de que o poder de influência é definido pelo capital digital,
portanto as informações coletadas tiveram por objetivo mapear o capital digital dos proponentes de acordo
com os critérios já citados acima.

Por fim, o referido artigo buscou por meio de um estudo averiguar como a influência do capital digital se
comporta, se utilizando principalmente da participação de usuários no portal e-Cidadania. Com uma
metodologia voltada para a análise prosopográfica, foi observado que indivíduos que possuem alto índice de
apoio a suas ideias possuíam um grau de escolaridade e capital digital alto, classificados no nível 3 na escala
de aprendizagem do capital digital, dos quais representam a maioria dos agentes destacados no estudo, apesar
de que esse não era o único ponto decisivo. Além disso, por meio desse capital digital, esses mesmos agentes
conseguem navegar entre pessoas a fim de sugerir propostas das quais são amplamente discutidas e encontrar
os melhores meios para gerar estratégias de apoio e assim ampliar suas influências e gerar um público de
apoio para tais abordagens.

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