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DISTOPIA 2: RUAS DE SANGUE

Introdução

O crime organizado de Miraitropolis sempre exerceu um poder imenso,


especialmente nas mãos dos grandes mafiosos. Após um tratado de paz ser
estabelecido, a Ryulong, uma fusão da Tríade com a Yakuza, juntamente com os
Latinos, a Máfia Italiana e a Russa, chegaram a um acordo sobre os territórios que
cada uma controlaria. Isso foi feito para evitar derramamento de sangue e conflitos
desnecessários no passado. No entanto, há apenas duas semanas, a Máfia Russa
violou esse acordo ao atacar o Residencial Celeste, território que pertence aos
Italianos, que atualmente é o grupo criminoso mais poderoso e influente de
Miraitropolis.

O desfecho desse ataque resultou em um conflito entre as duas máfias, que


gradualmente se espalha pelas ruas da imensa metrópole. Como consequência, os
negócios da Ryulong e dos Latinos foram prejudicados, uma vez que as ruas estão
cada vez mais patrulhadas pela polícia privada, que dispõe de recursos variados. Os
influentes que costumavam frequentar os estabelecimentos dos criminosos, onde
drogas e prostitutas eram distribuídas, agora estão apreensivos com a crescente
guerra entre as máfias, o que os faz pensar duas vezes antes de adentrarem
cassinos, boates e restaurantes controlados pelos grupos criminosos. Diante dessa
situação, Xiaren, líder da Ryulong, e Fernando Pascal, líder do crime organizado
Latino, se veem em busca de uma solução para o conflito entre os Italianos e os
Russos.

Galathea

Era a primeira vez que eu presenciava os poderes da loira em ação de forma tão
próxima. Embora já estivesse perto dela em outras ocasiões, nunca tive a
oportunidade de observar e analisar minuciosamente os detalhes de suas
habilidades.

A morena, sozinha, aplaudiu calmamente quando as duas emergiram cobertas de


sangue. No entanto, não havia tempo para mais nada, Vladimir estava com pressa.

Os membros da Uroboros cumpriram facilmente a tarefa que lhes foi atribuída,


afinal, não havia dificuldade em render pessoas desarmadas.
Enquanto minha equipe prendia os funcionários, eu observava de longe, incrédula, a
sequência de ações em que uma, depois seis, e por último a hacker desafiavam o
inimigo para um duelo e perdiam todas as vezes.

Olhei para Vladimir e ergui os braços em um gesto que dizia "O que diabos está
acontecendo?". Aproximei-me lentamente, já que o inimigo parecia interessado, e
desafiei todos eles para um duelo.

– Que porra é essa, Vladimir!? Nós vamos fazer uma fila e lutar todos um a um?
A morena fez um gesto para seus soldados, uma indicação simples que Vladimir
prontamente compreendeu como um pedido de cobertura. Shae e os outros homens
se posicionaram, suas armas apontadas em direção ao inimigo. Enquanto isso,
Galathea avançou calmamente em direção a X-9, seus olhos fixos no misterioso
cavaleiro da guerra. Ela ajoelhou-se ao lado da hacker, retirando uma seringa com
líquido incolor de seu cinto. Com cuidado, administrava o conteúdo no braço da
mulher. Antes de levantá-la, notou uma mensagem exibida no visor da luva que X-9
utilizava. Galathea hesitou por um momento, lendo a mensagem, mas decidiu que
aquele equipamento era importante e o colocou de volta na hacker. Com delicadeza,
acomodou a hacker em seu colo, como se ela não pesasse mais do que um
passarinho.

Galathea pousou a hacker no chão ao lado de Vladimir, sentada com as costas


contra uma caixa de equipamentos.

– Você é meio imprudente para uma hacker. – Falou em sua voz baixa e calma que
lembrava uma mãe ou uma professora. – Temos uma equipe aqui, não precisa lutar
sozinha. – Continuou calmamente enquanto se curvava sobre a hacker e
gentilmente posicionava o rosto dela e abria suas pálpebras para ver se essa estava
em choque, assim como checava seu pulso.

X-9 estava agora em uma condição estável, de alguma forma. Embora seus
ferimentos estivessem longe de estar completamente curados, o sangramento havia
sido contido, impedindo que ela morresse nos próximos minutos ou segundos
devido à hemorragia. No entanto, ela não estava em condições de lutar. Qualquer
movimento brusco poderia fazer com que o sangramento recomeçasse, resultando
em uma profusa perda de sangue mais uma vez.

Sorriu e beliscou a bochecha da hacker antes de se erguer e voltar a atenção ao


oponente.
– Escutem bem, seus merdas! Segundo nossa hacker imprudente esse cara aí
depende daquela espada para ter suas habilidades. – Ela pousou as mãos na cintura
erguendo levemente o olhar para fitar o inimigo. – Segundo ela é só desarmá-lo e o
mesmo está acabado. Sendo esse seu calcanhar de aquiles.

Calmamente a morena levou a mão até a cintura, tirando um maço de cigarro e


pescando um deles com os lábios, acendendo o mesmo em seguida.

– Eu pessoalmente creio que ele tem várias outras fraquezas. O fato de que ele é
apenas humano. De que é o cavaleiro dos duelos e está sozinho sem nenhum apoio
de infantaria. Vamos testar algumas dessas hipóteses.

Seus dedos médio e indicador ainda seguravam o cigarro quando ela os apontou
para Guerra. Havia ali um poder de fogo considerável quando se levava em
consideração que havia homens da Paramilitech, Los Zetas, Cosa Nostra e
Uroboros.

– Preparar! Apontar! – Não viu, mas sabia ou talvez sentia que Shae e seus soldados
posicionavam os indicadores nos gatilhos. Sabia que, mesmo que todas as dezenas
de outros a ignorarem, a Uroboros a seguiria até os portões do inferno. Ainda
mantinha os dedos apontados ao inimigo quando deu o comando. – Fogo.

Narrador Capítulo 1

A chuva costumeira molhava as ruas da suja e iluminada Miraitropolis, as calçadas


estavam repletas de pessoas carregando seus guarda-chuvas brilhantes. Alguns
deles estavam voltando para suas casas após uma jornada abusiva e exaustiva de
trabalho nas fábricas e escritórios das megacorporações. O trânsito da avenida
Armitage, a principal da cidade, estava tão lotado de veículos quanto as calçadas de
pessoas. O som das buzinas e os palavrões dos motoristas estressados ecoavam
pela avenida. Em contraste a isso, havia os grandes outdoors brilhantes repletos de
propagandas e poluição visual, a maioria deles mostrando pessoas felizes com os
produtos das grandes marcas.

Na principal via de entrada para Troika, bairro onde a maioria dos moradores
possuía descendência russa, havia um cassino de arquitetura refinada com um
enorme letreiro vermelho em neon escrito "Gennadi", que significa generoso em
russo. Dois veículos entraram no estacionamento subterrâneo do cassino, um
esportivo prateado com rodas rodeadas por luzes neon e um executivo preto
discreto. O estacionamento era repleto de colunas e tinha cerca de mil vagas, mas
apenas algumas dezenas de carros estavam estacionados. Os dois veículos
pararam um ao lado do outro, e de dentro do esportivo saíram Fernando Pascal e
seu irmão mais novo, conhecido pelo apelido de Crazy Dog. Do carro executivo saiu
Xiaren acompanhado de um guarda-costas chamado Jong.

O quarteto entrou no elevador, que estava todo coberto por espelhos. Pascal apertou
o número 22 no painel holográfico do elevador e, um segundo depois, a porta se
abriu. Agora eles estavam no escritório de Yuric, um local com uma decoração
rústica e ao mesmo tempo repleta de classe. O piso simulava madeira, as paredes
eram repletas de cabeças de animais empalhadas e no canto da enorme sala havia
uma lareira acesa. Yuric estava sentado atrás de uma mesa de carvalho verdadeira,
numa cadeira que mais parecia um trono. Ao seu lado, estava seu braço direito,
conhecido por todos pelo apelido de Albino.

– Rapazes, quando o Xiaren ligou querendo marcar uma reunião, eu fiquei surpreso e
ao mesmo tempo curioso. – Falou Yuric com seu sotaque carregado, parando para
dar um gole na vodka que estava sobre sua mesa. – Mas vamos lá, sentem-se. –
Voltou a falar, esboçando um leve sorriso.

Xiaren olhava para ele através do seus óculos holográficos, mantendo-se sério,
disse. – Irei direto ao ponto, Yuric. – Ele deu um passo à frente e continuou. –
Pascal e eu acabamos de conversar com o Montana, ele tá disposto a parar com
esse conflito sem sentido. – Com as palavras de Xiaren, Pascal deu um passo a
frente, falando. – Essa briga não é lucrativa para ninguém, só prejudicou os negócios
de todos nós até agora, então pelo amor de Deus, aceite a trégua.

Ao escutá-los, o russo olhava para Albino, que correspondia com outro olhar. Ele
então se levantou da cadeira, pegando o copo de vodka com seu braço direito
cibernético, finalizando com um último gole. Então ajeitou o nó da sua gravata
vermelha e respondeu. – Receio que isso não será possível. – Ao terminar de falar,
sentou-se novamente.

A resposta de Yuric deixava tanto Xiaren quanto Pascal sem palavras, fazendo com
que um olhasse para o outro em silêncio. Foi então que Crazy Dog deu um passo à
frente, ele vestia uma regata branca, que deixava as tatuagens que possuía nos
braços a mostra. – Olha só velhote, essa merda já ta começando a feder demais,
acho melhor você repensar sua resposta. – Ele gesticulava a cada palavra, como um
verdadeiro gangster das ruas.

O chefão russo passou a canhota sobre seu cabelo grisalho, logo depois respirou
fundo, dizendo logo em seguida. – Tire o bostinha do seu irmão da minha frente ou
eu mesmo farei. – Crazy Dog ao escutar aquela frase cerrou os punhos, mas antes
que ele fizesse qualquer coisa, seu irmão levou uma das mãos sobre seu ombro. –
Vamos sair daqui, é perca de tempo. – Disse Pascal, olhando para Xiaren, que
voltava seus olhos para Yuric novamente, fazendo uma última pergunta. – Antes de
irmos, ao menos me diga qual é o motivo disso tudo.

– Estou apenas pegando o que é meu por direito. – Disse, encarando Xiaren com um
olhar de superioridade. – Está cidade me pertence, sempre pertenceu, estou apenas
tirando o fedelho do lugar que é meu. O topo! – Xiaren, Pascal e os outros
simplesmente davam as costas, entrando no elevador de espelhos. Quando a porta
do elevador se fechava, o Albino então questionava Yuric. – Devo seguir com o
plano, senhor? – Yuric respondeu imediatamente – Deve!

Duas horas depois da reunião mal sucedida, Fernando encontrava-se em sua boate
de luxo. O local ficava na Cidade Média, era um prédio de cinco andares roxo e
branco, com um letreiro vermelho escrito "Vênus". As luzes roxas e rosas
iluminavam o interior do estabelecimento, que contava com plataformas de pole
dance onde tanto prostitutas humanas quanto andróides sexuais dançavam para os
clientes. Naquele momento, porém, os clientes eram poucos devido aos conflitos
acontecendo nas ruas. Os garçons passeavam entre os sofás de couro vermelho,
carregando bandejas com pratos de cocaína e seringas de heroína vermelha.

Fernando estava sentado de frente para o balcão, com uma garrafa de cerveja
aberta, claramente pensativo. Crazy Dog, por sua vez, encontrava-se em um dos
quartos do segundo andar. Ele estava rodeado por três prostitutas enquanto injetava
uma dose de heroína em seu braço direito.

Foi então que o barulho dos tiros ecoou do lado de fora da boate. Fernando, de
imediato, retirou sua pistola .40 do coldre que possuía na cintura. Os garçons
largaram suas bandejas e também pegaram suas armas. As prostitutas correram
gritando, subindo as escadas para os andares superiores, enquanto os clientes
corriam de um lado para o outro em busca de uma saída. Um dos homens de Pascal
entrou pela porta da frente segurando uma metralhadora, gritando. – São homens
do Turco chefia. – Depois de falar, ele era alvejado pelas costas, caindo morto no
chão.

Logo depois, um grupo com cerca de vinte homens adentrava a boate, todos
carregando armas de grosso calibre. Pascal e os garçons atiraram de volta, mas
sem qualquer chance de vitória, foram caindo um a um. Fernando Pascal se
encontrou cercado em seu próprio "castelo", com o cano de todas aquelas armas
apontadas para sua cabeça. Ele então largou a arma, erguendo suas mãos na altura
do ombro. Foi quando o Turco, principal aliado de Yuric, adentrou a boate, com seus
homens abrindo espaço para que ele ficasse frente a frente com Pascal.
– O Yuric mandou lembranças. – Ele então usou a M4A22 que segurava para acertar
um golpe contra o queixo de Pascal, que caiu no chão inconsciente.

Minutos depois um dos seus homens o acordou, ele abriu os olhos agitado, olhando
para os lados procurando pelos seus inimigos. – Cadê aqueles filhos da puta? – Um
rapaz que não tinha mais de vinte anos o respondia. – Quando chegamos já não
tinha mais ninguém, e as putas disseram que eles levaram o seu irmão. – Pascal se
levantou com ajuda, olhou em volta, notando que tudo estava com marcas de bala.
Levou a mão sobre seu rosto, estava nitidamente transtornado. – Reúna todo
mundo, contrate mercenários, hackers e o que tiver ao nosso alcance. Quero todo
mundo atrás do meu irmão, comece pelo Turco e as merdinhas dele.

– Está feito! – Ao escutar as palavras do Turco, Yuric apertava com seu indicador
esquerdo a pequena tela que possuía nas costas da mão cibernética direita,
desligando a ligação e fazendo uma nova. – Yuric, já faz um tempo. – O homem de
voz rouca falava do outro lado da linha. – Espero que você se lembre do favor que te
fiz com a Green Box, Kasper. – Falou Yuric, indo direto ao ponto. – Claro, finalmente
quer que eu pague o favor? – O russo esboçou um sorriso malicioso. – Preciso que
me dê alguns dos seus Super-Replicantes. – A resposta logo veio. – Então você
finalmente começou com seu plano, mandarei dois Ômegas-9, o modelo mais letal
que tenho. – Yuric com um sorriso estampado na face, finalizava a ligação. –
Perfeito!

Enquanto isso tudo acontecia, Xiaren se encontrava no seu escritório, que ficava
dentro do Xiwang, seu restaurante, que é um dos mais famosos de toda
Miraitropolis. Jong, seu guarda-costas lhe comunicava algumas novidades – Chefe,
a Geisha ainda se encontra no submundo, ainda não encontrou as informações que
você quer. – Ao ouvi-lo, Xiaren levava a xícara de porcelana com chá até a boca,
dando um rápido gole. – Ok, continue me mantendo informado.

A área de luxo do restaurante que possuía uma rica arquitetura e decoração oriental
estava praticamente vazia, havia apenas um grupo de engravatados acompanhados
de belas moças. Já na área popular, onde a comida era mais barata e menos
requintada era o contrário, pessoas se apertavam frente ao balcão para comprar
uma tigela de Yakisoba ou um Temaki.

Xiarem ou qualquer uma daquelas pessoas esperava pelo que iria acontecer a
seguir. No topo de um prédio a um quilômetro do restaurante um Jet Hawk tinha
pousado e dentro dele saiaram quatro homens. Um deles era o Albino, o braço
direito de Yuric, o homem de pele totalmente branca, sem pêlos no corpo e com uma
máscara de gás sobre a boca carregava uma RPG no ombro, os outros três homens
que vestiam ternos também. Todos apontaram os lanças mísseis na direção do
Xiwang, disparando um após o outro.

Os mísseis possuíam tecnologia de camuflagem, ou seja, eles eram capazes de


confundir praticamente qualquer radar existente, tornando-se praticamente
invisíveis. Os quatro atingiam o restaurante ao mesmo tempo, o som da explosão
ecoava pela Little Ásia – bairro onde o restaurante ficava – a destruição tomava
conta do local junto com o fogo e a fumaça. Xiaren acordava com parte das roupas
queimadas e ferimentos leves por todo o corpo, ele estava dentro de um túnel que
construiu para situações como aquela, este túnel o levaria para o hangar
subterrâneo que guardava seus principais recursos. Ele estava sendo carregado por
Jong, que estava no mesmo estado que ele. - Como isso aconteceu? – Perguntou
com o braço esquerdo apoiado nos ombros do seu guarda costas. – Fomos
atacados com mísseis, por sorte as paredes reforçadas do escritório agüentaram
praticamente 75% da explosão. – Respondeu Jong com a respiração ofegante,
mantendo seu olho direito, que era uma prótese biônica fechado. – Foi o Yuric, já
esperava algum tipo de retaliação, mas não tão rápido. – Comentou Xiaren, que
estava com o lado direito do seus óculos holográficos quebrado. – O que faremos
senhor? – Questionou o fiel escudeiro. – É simples, avise todo mundo que estamos
em guerra, manda todos os nossos homens irem para o hangar dos mechas,
também contate mercenários e qualquer um que já tenha trabalhado conosco e que
podemos confiar.

O ventilador de teto girava devagar na sala úmida e apertada, no centro dela havia
um homem amarrado em uma cadeira de ferro, além disso, também tinha uma mesa
com algumas ferramentas de tortura e uma câmera. Ele estava sem camisa, possuía
diversos cortes no braço, peitoral e abdômen, seu sangue escorria lentamente por
cada um dos ferimentos, seu cabelo molhado de suor estava caído sobre seu rosto.
Em pé na frente dele estava um homem, ele vestia um chamativo blazer rosa, que
não combinava nada com sua cabeça raspada e sua barba farta.

– Deveria ter escolhido melhor suas amizades, Caz. – O torturador era ninguém
menos que Boris, o ex-membro dos Steelhearts e atual membro da máfia russa. Já
sua vítima era o detetive de polícia, Caz, antigo parceiro de Tony Montana e um dos
seus melhores amigos. – Diga de uma vez o que você quer, seu sádico de merda. –
Perguntou Caz, seu tom de voz mostrava toda a raiva que sentia, chegando a cuspir
um pouco de saliva ao falar. – Eu quero apenas seu sofrimento, já meu chefe quer
outra coisa. – Boris então pegou uma colher na mesa com sua mão direita, com a
esquerda ele segurou o cabelo de Caz, movendo seu rosto para cima. – Primeiro vai
ser o seu olho direito. – Com um sorriso psicótico estampado na face, Boris usava a
colher para arrancar fora o olho direito de Caz, retirando-o para fora junto suas
córneas e nervos. Para o detetive só restou gritar de dor, chegando a desmaiar
momentos depois.

A noite então saiu de cena, dando lugar a um dia totalmente diferente do normal. A
chuva costumeira não havia dado as caras e um calor que chegava aos 45° graus
tomava conta da grande metrópole, o calor deixava as pessoas que já viviam
estressadas devido a rotina cansativa e a violência ainda mais irritadas. Tony
Montana, receberia um presente naquela manhã quente, uma caixa de metal, dentro
dela havia um HoloProjetor e o olho de Caz. Quando ele ligasse o aparelho, assistiria
ao que Boris tinha feito com seu amigo e a uma mensagem de Yuric.

– Bom dia, garoto. – Disse Yuric com um sorriso sínico. – Espero que tenha gostado
da cena, pois eu adorei. – A imagem era apenas uma projeção, mas Yuric parecia
olhar Tony nos olhos. – Irei direto ao ponto, retire seus homens do Residencial
Celeste e eu entregarei o seu amiguinho.

Além de Tony, PeeBoy que se encontrava sem máscara, apenas usando seu chapéu
de cowboy marrom e o ex-piloto de corrida e atual motorista do líder mafioso, Jesse
Castelone, que usava uma jaqueta branca e tinha seus cabelos pretos raspado nas
laterais e algumas cicatrizes no rosto devido a um acidente nas pistas. –
Precisamos chutar a bunda desse russo de uma vez. – Comentou Jesse, que estava
sentado uma das poltronas da enorme sala. – Chefe, quais são suas ordens? -
Perguntou o cowboy PeeBoy, levantando-se do sofá do qual estava sentado.

Gal Bordeaux
All Street, também conhecido como Centro Financeiro II, é o bairro mais rico de
Mirai. Isso foi o que as fontes de Gal, há alguns anos, informaram. Em razão disso,
foi mais do que óbvia a decisão da menina de se instalar por lá, mesmo que 70% de
seus imóveis fossem comerciais. Uniu o útil ao agradável, então. Trabalho e
descanso. Não, ela não trabalhava no comércio tentando empurrar inutilidades aos
outros cidadãos, nem em algum escritório de alguma megacorporação – que,
devido à sua aparência, provavelmente só serviria para ser bonequinha de luxo de
algum velho broxa. Certamente não era esse o seu tipo de profissão..

Fruto do experimento dos pais, descendentes de franceses naquele lugar, aprendeu


desde nova que podia ficar invisível para eles e atravessar objetos. Na infância, não
percebeu, mas era treinada por eles para que fizesse coisas que pessoas comuns
não fariam. Não demorou para que chegasse à adolescência para estar furtando
segredos industriais e invadindo lugares para os contratantes dos pais. Tornara-se
uma ladra, sendo o único ofício que aprendeu. Decidiu que aquilo não era certo, por
isso os abandonou. Não estava certo...

Dividir o lucro com parasitas feito eles, podendo receber tudo para si. E desde então
tem agido, até a presente fase adulta. Seu apartamento era pequeno e discreto
naquela região, nem térreo e nem cobertura. Não era amiga de ninguém. "Sem
vínculos não há preocupações". Não mantinha vínculo com os homens e mulheres
com quem se relacionava. Simplesmente não poderia confiar em ninguém naquela
cidade, naquele distrito... Isso a fazia se sentir só algumas vezes. O que a fazia vez
ou outra acabar exagerando na bebida.

Depois de estudar alguns possíveis novos alvos, preparava-se para mais uma noite
de furto, vestindo o uniforme rosa e branco sob o corpo nu à frente do espelho. Não
seria uma batida de carteira em troca de cartões de crédito. Coisa que ela já deixou
para trás faz tempo. Agora furtava o dinheiro diretamente da fonte. O alvo era o
Banco de Mirai, um dos maiores, senão o maior da megalópole. Encontrava-se a
partir do 30º andar do prédio que ficava ao lado arena da equipe Miraitrópolis
Merry's.

Àquela hora da noite, saí disfarçada do prédio, com um grande sobretudo por cima
do corpo, chapéu e óculos. Minhas roupas não eram muito diferentes das que as
outras milhares de pessoas utilizam nas noites de chuva ácida. Eu andava
apressadamente, como os demais, e assim que avistei meu alvo, tomei uma rota
quase deserta, fugindo das ruas principais. Em um dos becos próximos, larguei o
sobretudo e o chapéu atrás de uma lixeira. Levava comigo apenas um equipamento
hacker similar a um antigo mp4, para plugar no computador e transferir créditos
para minha conta igualmente invisível. Passei a utilizar minha intangibilidade para
atravessar os prédios até chegar ao destino.

Depois que cheguei lá, fui atravessando os elevadores e paredes, aliando-me à


invisibilidade, até chegar ao andar onde havia CPUs responsáveis pelas
transferências. Com cuidado, materializei-me, observando ao redor. Logo em
seguida, espetei o equipamento em uma das entradas e, ajoelhada ali, aguardei
calmamente a transferência. Foi então que ouvi uma voz rouca, como se fosse
emitida com certa dificuldade. Quando me virei, assustei-me com a figura. Mas, à
medida que o tempo passava, essa surpresa inicial se transformou em atração.

– Feio? Não acredito que essa katana aí seja para fazer carinho nas pessoas. —
Examinou o corpo dele. — Digo, a de cima, sobre seus ombros, pelo menos.

– Hahah. Tem senso de humor, isso é bom nesse ramo.


– Ficar viva é melhor do que senso de humor. Quem é você? Como me conhece? O
que quer? — Disse se afastando e recostando em uma das CPUs, pronta para fugir
se necessário.

– Quantas perguntas. Não tem porque se preocupar. Pelo menos não se aceitar. Já
deve ter ouvido falar da Ryulong. Eu os represento. Estamos interessados nos seus
serviços.

– Não estou interessada, obrigada. — Disse olhando para o display do aparelho.


Ainda faltavam 15% para concluir as transferências. Teria que distraí-lo por mais um
tempo. — Mas, se eu estivesse, do que se trataria?

– Bem, deve estar sabendo da recente guerra de gangues, iniciada pela máfia russa.
Estava tudo bem, mas esses filhos da puta decidiram fazer merda. E nós sabemos
das suas habilidades.

– Então você sabe que não sou ninja que nem vocês.
– Nem todos de ascendência oriental são ninjas. Que preconceituosa.
– Que seja. De quanto estamos falando?
– 500.000.
– 1.000.000.
– 750.000.
– Fechado. — De maneira discreta ela voltou seu olhar para o equipamento
novamente. Estava concluído. Mas ainda não tinha se mexido.

– Como eu a contato?
– Parece que você consegue me achar. — Retirou rapidamente o equipamento e
guardou em um compartimento do uniforme. — Boa sorte. — Sorriu e
desmaterializou o corpo, sumindo pelo chão. Retornaria para sua residência.
Certamente a máfia Ryolong a acharia novamente para lhe passar mais detalhes.

Anthony Montana
– FILHO DA PUTA! FILHO DA PUTA, EU VOU MATAR ESSE RUSSO CHIFRUDO!! – Se
podia ouvir minha voz do último andar do prédio. Eu gritava enfurecido, batendo na
mesa de carvalho a minha frente. Não conseguia responder PeeBoy, apenas xingar
Yuric.

– VOU ARRANCAR AS BOLAS DELE E DAR PARA O CACHORRO COMER. DEPOIS VOU
BOTAR ELE DE QUATRO PARA O MESMO CACHORRO CURRAR O RABO DESSE
DESGRAÇADO! NÃO! ANTES VOU SEQUESTRAR A MÃE E AS IRMÃS DELE E FAZER
TREPAR COM UM CANIL E MOSTRAR TUDO EM UM OUTDOOR NO MEIO DO
CENTRO DE MIRAITROPOLIS! PRA TODOS SABEREM QUE ELE É UM FILHO DE UMA
PUTA QUE FODE COM CÃES! – Socava a madeira da mesa. Jesse e PeeBoy se
assustavam.

– DEPOIS VAI SER A VEZ DOS AMIGOS, AAAHH VAI! EU NÃO VOU ARRANCAR OS
OLHOS, EU VOU ESFREGAR CACO DE VIDRO MOÍDO QUENTE NAS VISTAS,
ENQUANTO ELE ASSISTE OS MERDINHAS GRITANDO DE DOR E IMPLORANDO PARA
MORRER. O QUE ACHAM DE OBRIGAR OS ENTES QUERIDOS COMER CACO MOÍDO
NA COMIDA EIN? – Peguei uma arma da escrivaninha e engatilhei, apontei a pistola
para cima descarregando um pente inteiro. Depois recarreguei a arma e continuei
dando tiros para cima.

– AO FINAL, QUANDO ELE JÁ NÃO AGUENTAR MAIS VER NADA DISSO, É QUE VAI
COMEÇAR O SOFRIMENTO, POIS VOU SOCAR UM CANO DE FERRO FERVENDO NO
MEIO CU DELE E JOGAR ÁGUA QUENTE, MAS NÃO O BASTANTE PARA QUE MORRA,
POR QUE NO OUTRO DIA VOU REPETIR ISSO, E NO OUTRO, E NO OUTRO E ASSIM
SUCESSIVAMENTE ATÉ COZINHAR O CRETINO VIVO DE DENTRO PRA FORA! –
Agora eu não me limitava a apenas atirar, quebrava tudo que tinha a minha frente,
vidros, vasos, cadeiras, quadros, obras de arte, luminárias caras. Rasgava cortinas,
os estofamentos do sofá a sala estava se transformando em um amontoado de
coisas quebradas. E quando terminava a munição bastava só puxar da gaveta mais
um cartucho.

Eu percebia nos olhos de PeeBoy e Jesse o medo, é claro, eles nunca me viram
surtando. Mas nem mesmo eu tinha me visto assim. Eu podia notar nas expressões
de seus rostos os pedidos para que aquela insanidade chegasse ao fim, mas eles
não tinham coragem de falar, então apenas se encolhiam e escondiam-se atrás dos
móveis da sala para não serem atingidos pela minha ira. Ninguém havia até hoje me
golpeado tão forte quanto Yuric ao usar Caz para me atingir. Nós mafiosos somos o
pior tipo de pessoa, pior que os empresários das megacorporações, pior do que os
bandidos das ruas, os traficantes que viciam famílias, pior até que os políticos, mas
ainda assim possuímos uma certa ética entre nós. Mas esse Yuric filho de uma
cadela não, ele joga mais baixo e usa qualquer recurso que tiver a disposição… Eu
devia esperar isso de um russo! Meu pai dizia para ficar de olho neles, e isso que
naquela época os cretinos eram nossos aliados.

– Chefe… A pistola tá sem munição... Acabaram todas...


Só percebi por que Jesse tinha avisado. Joguei a porra da arma vazia em cima da
mesa. PeeBoy pediu à secretária que trouxesse um copo com água gelada com
limão e um calmante. Não disse nada, apenas engoli a cápsula azul e vermelha
empurrando goela abaixo com a água. Caminhei ainda nervoso, de um canto a outro
da sala, puxando os cabelos para trás, coçando o queixo com cavanhaque,
pensando mas sem chegar a conclusão alguma, a fúria ainda percorria minhas veias
como lava de vulcão. Foi preciso mais cinco ou seis, acho que até mais, talvez um
punhado daquele remédio em uma bandeja para me acalmar um pouco, o suficiente
para eu poder me sentar frente a mesa e ponderar com eloquência. Fiquei quase
quarenta e cinco minutos olhando para os papéis e jogo de canetas em cima da
mesa, com as mãos frente ao rosto, entre a boca e o nariz, com os dedos
entrelaçados uns aos outros. Olhava o que tinha sobrado e daquela perspectiva do
assento dava pra notar que apenas os objetos retrôs não foram quebrados, como o
telefone de disco, a televisão da década de cinquenta do Séc XX, dois jarros com
plantas e algumas pinturas do corredor. Tanto PeeBoy quanto Jesse ficaram todo
aquele tempo em pé olhando um ao outro, sem saber o que dizer ou fazer. Estavam
mais do que nervosos, então falei com a voz normalizada:

– Quero que vocês usem todos os recursos para resgatar Caz das mãos deste
bunda mole. Não me importa quanto isso vai custar, dinheiro não é problema.
Depois que Caz e sua família estiverem seguros, eu quero que peguem o Yuric e
todos que ele conhece e me tragam até aqui. Também não me importa se vou
gostar de toda minha fortuna para ter aquele resto de punheta má formada aqui.

– Entendido, chefe. – Falaram os dois, uníssono.


– Vamos portanto separar as etapas e funções. Jesse, você é meu motorista,
todavia também parte importante dessa máfia. Mas sei que seus dons se limitam
um pouco quanto o assunto é caçar essa escória. Eu não o culpo, também me
manteria longe se possível. Então quero que você e PeeBoy cace Yuric até a puta
que pariu, dia e noite, 24 horas por dia. Quero saber até a hora em que ele vai no
banheiro cagar, entendido? Quanto mais cedo a gente catar esse bosta que pensa
que é alguém na fila do pão, melhor. – Novamente ambos concordaram, apenas
movendo a cabeça positivamente.

– Mas antes, PeeBoy, por favor, também chame os sobreviventes dos Steelhearts,
essa é a outra parte da tarefa. Precisamos de todos aliados possíveis e quanto mais,
melhor! Com isso também vamos tirar das ruas as opções de Yuric. Tente convocar
Joe, Pollux, X-9, Thomas, Vangelis e Leon. Sei que vão ouvir mais a você do que a
mim. Não esqueça de citar as cifras. E mesmo assim, se isso não convencê-los...
Sabe o que usar como incentivo... – PeeBoy apenas sorriu e se retirou da sala.

Timothy Carter

O velho galpão abandonado, entre a Cidade Média e a Avenida Armitage, possuía


uma grande movimentação de pessoas. No seu interior, havia uma pequena
multidão com cerca de 2.000 homens e mulheres, todos com suas atenções
voltadas para um homem aparentemente comum, que estava de pé em cima de um
palanque de madeira improvisado com caixotes. Ele não precisava utilizar microfone
ou algo do tipo; todas aquelas pessoas estavam com suas atenções voltadas
diretamente para ele. O homem então ajeitou o nó de sua gravata vermelha e deu
dois passos para frente, ficando de pé onde seria a beirada do palco.

– Olho para cada um de vocês e tenho a certeza que vamos tomar nossa cidade de
volta. Vejo aqui homens e mulheres determinados a mudar o que Miraitropolis se
tornou. Juntos eu sei que podemos tirar o poder das mãos dos mafiosos, traficantes,
políticos e a elite corrupta que controla nossas vidas, fazendo homens e mulheres
de bem caminharem pelas ruas com medo de não voltar para suas famílias. Juntos
iremos fazer essa praga que domina nossa cidade pagar por tudo que perdemos dia
após dia! – Quanto Timothy terminava de falar, todos presentes no galpão
aplaudiram, alguns gritaram em forma de apoio a causa do homem, que era
aparentemente um sujeito comum.

Ele então sinalizou com sua mão direita para que as pessoas parassem por mais um
momento e como ovelhas obedecendo seu pastor, todos voltaram a ficar em
silêncio. – Estamos nessa jornada de reuniões já faz cerca de três meses, creio que
chegou o momento de agirmos, afinal ficar parados não fará essa cidade ser limpa
da escória. – Ele pausou por momento, levando as mangas da camisa social branca
que vestia. – Peço então que fiquem atentos no seus comunicadores, logo nossa
cruzada para salvar essa cidade começará. Agora tenho que me retirar, mas conto
com todos vocês.

Ele então finalizou seu discurso, descendo do palco e caminhando até Rose Ortiz,
que o aguardava logo abaixo da escada improvisada. – Tem uma mulher que diz ser
sua cunhada te esperando perto do carro. – Rose era uma ex-policial que foi expulsa
da corporação após ir contra as mudanças impostas pela empresa privada que
passou a comandar a polícia da cidade. Ela foi a primeira que se juntou a Timothy na
sua cruzada utópica e se tornou a pessoa que ele mais confia. – Irei dispensá-la
rápido, conseguiu pegar o pacote? – Perguntou com sua voz calma e ao mesmo
tempo fria, passando uma sensação de vazio. – Sim, ta no carro.

Ele caminhou até a mulher de cabelos castanhos que o esperava próximo ao seu
carro. A moça era a irmã mais nova da sua falecida esposa e tia da sua filha que
morreu junto com a mãe do atentado ao Canal 17. – Timothy, como é bom vê-lo,
quando me falaram o que estava fazendo, eu simplesmente vim assistir com meus
próprios olhos. – Ela falou as palavras com um ar de tristeza, apertando a alça da
bolsa que segurava um pouco mais forte. – Você precisa parar, não pode continuar
com essa loucura de vingança, vai acabar se machucando! – Uma lágrima escorreu
do rosto da jovem mulher, que desviou o olhar. – Não irei parar, não sou como você
que consegue ficar parada sem fazer nada. Cansei de chorar e lamentar, chegou a
hora de fazer algo, Elizabeth. – Ao ouvir as palavras rudes ditas por ele, ela
arregalava os olhos surpresa e ao mesmo tempo assustada. O Timothy que ela
conheceu não era o homem que estava na frente dela, ele era um escritor calmo e
carinhoso, que sempre tratou todos com educação. – Esse não é você, não pode
ser! – Disse ela desabando em lágrimas, Timothy então passou por ela junto com
Rose, que entrou no banco do motorista. Ele antes de entrar no do carona, disse uma
última coisa. – Sou apenas o homem que retirou a esposa e a filha destroçadas do
meio dos escombros do Canal 17, sou o homem que segurou o corpo dessa mesma
filha e não conseguiu reconhecê-la. – Ele então entrou no carro e bateu a porta, Rose
engatou marcha ré e saiu do galpão pelo portão dos fundos.

Uma hora depois o carro comercial comum adentrou o interior de um beco no


Distrito do Sexo. O local estava totalmente vazio, havendo apenas uma caçamba
recheada de lixo. O veículo então parou, Rose saiu primeiro e foi até o porto malas,
abrindo-o e puxando um homem gordo algemado com os braços para trás e com um
saco preto na cabeça. O sujeito caia no chão sujo de lado e começava a se debater
numa tentativa ilusória de fuga.

Timothy respirou fundo e abriu o porta-luvas do carro, pegando uma soqueira


prateada e colocando na sua mão direita, saindo do carro logo depois. – Foi muito
fácil pescar essa baleia, só precisarei colocar um vestido decotado e chamá-lo para
meu apartamento. – A ex-policial enquanto falava, colocou o gorducho de joelhos e
retirou o saco da cabeça dele. Timothy parou de pé de frente para ele, o olhar de
Carter era uma mistura de ódio com frieza. – Yami, piloto e associado aos
Steelhearts. – Após falar, levou a canhota na mordaça que cobria a boca do
sequestrado, que falou desesperado. – O que quer comigo, por favor me liberte. –
Timothy então ergueu a mão direita e a moveu de cima para baixo contra o rosto de
Yami, que era um gordo asiático. O soco o fez gemer de dor, enquanto cuspia alguns
dentes e o sangue escorria pelo lábio rebentado. – Onde é o novo QG dos
Steelhearts? – Perguntou em um tom assustadoramente calmo, socando o rosto de
Yami mais uma vez, quebrando dessa vez seu nariz, que se tornava uma bola
vermelha que escorria sangue. – O-o que quer com eles, estão totalmente fodidos
depois do que aconteceu com o líder deles. – Timothy então segurou o cabelo do
asiático e moveu seu joelho contra o rosto dele, jogando-o no chão após o golpe. –
Onde é o novo QG dos Steelhearts?
Caído no chão com o rosto arrebentado, o piloto não teve escolhas. – Ta bom,
apenas pare, por favor. – Pausou gemendo de dor. – Eles estão operando no porão
de um puteiro de quinta, na rua H do Distrito do Sexo, fizeram um trato com a
cafetina, não faço mais parte do grupo, não sei mais nada cara. – Ao ouvi-lo, Tim
retirava a soqueira da mão, pegando um cigarro de dentro da carteira que guardava
no bolso da camisa ele o acendia com um isqueiro e tragava lentamente, soltando a
fumaça no ar e falando.

– Agora precisamos apenas mantê-lo calado. – Ortiz então levou a destra no interior
do seu sobretudo azulado e sacou uma Glock, desferindo um tiro certeiro contra a
cabeça de Yami, que morria instantaneamente. Timothy por um momento arregalou
os olhos, olhando para Rose claramente surpreso. – Deveria ter avisado pelo menos.

Ela guardou a arma, caminhando até o carro enquanto falava. – Essa é a única
forma de manter alguém calado de verdade, agora vamos sair daqui, o tiro deve ter
chamado atenção. – Ele seguiu o que ela disse, caminhando até o carro enquanto
olhava para cadáver de Yami no chão sujo do beco, apesar de estar disposto a tudo
para conseguir destruir todos os envolvidos no atentado ao Canal 17, Timothy ainda
não havia chegado ao ponto de assassinar alguém.

X9

Ao final daqueles sombrios eventos que a imprensa batizou de “Distopia”, Tony


Montana cumpriu a promessa de nos dar um pagamento bem gordo. Isso me
permitiu sair de cena por um período. Não porque eu estava cansada, tudo bem, eu
estava, mas era melhor ficar nas sombras depois de ter chamado atenção nos
últimos tempos. Contudo ainda existiam perguntas sem respostas e assuntos
inacabados. Como por exemplo o que aconteceu comigo naquela noite fatídica no
Cemitério Neon? Henri Choy realmente iria revolucionar a Lexis com servidores
replicantes de rede? E o assunto inacabado que me perturbava todas as noites antes
de dormir, onde aquele maldito do Boris estava? Eu tinha contas a acertar com ele.
Parecia que tudo vinha na mesma hora como um furacão. Foi questão de tempo até
os chefes das principais máfias encontrarem meu servidor pessoal e encher minha
caixa de email com propostas milionárias para me aliar a eles. Isso só provava o que
eu já desconfiava; não existe tranca que não possa ser desbloqueada, mesmo que
você possua o melhor dos cadeados. Por outro lado, não existe lugar mais seguro
que sua própria mente, isso foi decisivo na escolha que estava por vir. Estava no
banho, relaxando na banheira ao mesmo tempo que fumava e contemplava a cidade
com as janelas laterais em cada lado do banheiro pequeno e estreito, e o Kia ia
falando com sua voz cromada a cada nova mensagem que chegava.

– Merda… Me descobriram… Já disse que estou de férias… – O Kia claro como todo
computador continuava a relatar as mensagens.

Certas coisas não saíam da minha cabeça por nada, claro, eu poderia perguntar a
Pollux, Calidora, Vangelis, PeeBoy ou Joe o que aconteceu comigo e foi o que fiz,
mas todos eles pareciam manter um pacto de silêncio, e sabe, eu ia detestar ter que
torturar meus colegas para obter essa informação. Portanto tinha me focado em
encontrar Boris e assim matava dois coelhos com uma cajadada só. Se eu quisesse
resolver essas e outras questões como o envolvimento de Praxis com a Paramilitech
não bastaria só virar a melhor hacker de Miraitropolis, mas também a mais
equipada. Vi nos jornais a bosta que acontecia no Residencial Celeste. Conhecendo
Tony, sabia que a merda ia feder, e bem fedorenta, por isso tratei de me apressar.

Enquanto eu tinha que lidar com picos de mudança de força, resistência e humor eu
montava um aparelho feito de peças velhas mas que teria um funcionamento bem
avançado. Ao mesmo passo que soldava componentes de um pequeno teclado,
unindo uma placa mãe bem avançada do mercado chamada de “Titã”, finalizava o
aparelho que viria a ficar por cima do meu antebraço, o conjunto todo envolveria o
mesmo, sendo uma peça única de um teclado quadrado, ligado a dois cabos nas
extremidades. O primeiro seria para usar como conector em uma porta de entrada
se fosse preciso, em outras palavras, seria para se conectar a algum outro
computador ou rede caso fosse necessário. Já o segundo ficaria conectado a minha
cabeça. É, meu plano era tornar meu cérebro meu próprio computador, acessando
dados mentalmente, vendo as informações como pensamentos. Uma ideia genial,
não? Pelo menos eu não seria hackeada ou rastreada novamente, digo, não até que
essa tecnologia se tornasse acessível em escala industrial. Só que existia uma
barreira nisso tudo (sempre tem), eu não continha modificações físicas para
conectar o modem ao cérebro. Neste caso, ia precisar de informações com um
casal de amigos que é viciado em drogas virtuais e já macularam tanto seus corpos
com essas operações que perderam a identidade pessoal. Duncan e Sasha. Porém,
eu ainda não tinha certeza de dar esse passo, e para falar a verdade, boa parte disso
era o medo. Nisso nascia dentro de mim um conflito, esse receio de entrar por uma
porta sem volta e a obsessão por segurança.
Depois de Distopia talvez tenha adquirido uma paranoia excessiva, quando saio as
ruas sempre acho que poderei ser pega por alguém de Carmen Telford ou da
Paramilitech. Bom… Eu estava morando no último andar em um hotel barato da
Cidade Média, o dono deu uma colher de chá onde eu podia acessar sempre que
pudesse ou precisasse o terraço. A visão não era das melhores, eram letreiros de
neon de todas as cores por todos os lados, e quase nunca sobrava tempo de subir já
que praticamente sempre chovia. De vez em quando eu ficava lá no alto, sentada na
beirada do parapeito, entre as vigas de aço, com as pernas suspensas pra fora do
prédio, vendo o trânsito lá embaixo enquanto fumava. Dali eu podia também ter uma
clara visão se alguém suspeito entrasse no hotel. Mas claro, nunca ninguém assim
entrava. Até parecia que eu desejava que isso acontecesse... Todavia naquele dia
não ia poder ficar de vigília, desci os andares pelas escadas de madeira que
rangiam parecendo que cederiam a qualquer momento. Precisava de Sasha e
Duncan, infelizmente eles moravam em outro bairro e eu tinha que sair da toca. Não
gostava muito de pôr o nariz pra fora, acho que já disse isso antes em algum
momento, mas não se trata tanto da paranoia, e sim pela razão que preciso passar
pela porta do hotel… Os mendigos fazem da entrada do prédio não só a moradia
deles mas também o banheiro… É degradante... É... Quem mora aqui tem de aturar
isso, como se já não bastasse a sujeira das calçadas, o fedor de urina, a pichação
nas paredes de ferro e em sua estrutura de ferro enferrujado. Mas se quer saber,
isso ajuda a manter o disfarce, quem iria querer morar aqui? Não que a situação do
prédio de Sasha e Duncan fosse muito diferente, mas pelo menos lá não tinham
mendigos fazendo suas necessidades fisiológicas na porta de casa.

– Vocês precisam trancar a porta… Alguém pode entrar e roubar … – Disse


adentrando o apartamento. Mas conclui que não tinha nada para ser roubado ali.

– Hihihi, alguns pivetes removeram as maçanetas e fechaduras só de zoera, não


temos como fechar as portas… X-9, quanto tempo! Andou sumida. – Duncan removia
o capacete de expansão virtual.

– É, desde…. Não importa, a última vez que estive aqui tava me chapando com
vocês... Enfim, queria saber onde vocês fazem esses implantes. – Gesticulei
apontando para a cabeça.

– Ora, olha só, a menina que tinha medo de entrar na faca ganhou coragem?
Finalmente! – Falou Sasha, mas sem remover seu capacete.

– É, acho que sim, então, onde fazem? – Indaguei em pé no centro do apartamento


que só tinha papelão rasgado e os donos sentados no chão.
– Você pode fazer em qualquer clínica do Submundo ou da Little Ásia, mas as
chances de pegar uma infecção nas meninges é grande… – Concluiu Duncan.

– É, ou usarem aparelhos de baixa qualidade... Quero dizer, mais baixa ainda do que
já se usa… – Também concluiu Sasha.

– Então me falem onde vocês fizeram as suas, pronto. – Me irritei.


– Tá foda… Com toda aquela palhaçada de Distopia… O cara que fez nossa
operação… O ...Como era o nome dele mesmo, Sasha?

– Igor. – Respondia.

– ISSO! Igor se mudou para a Cidade Murada dentro do Distrito do Sexo. É, agora
lembro. – Coçava o queixo, lembrando.

– Peraí… Essa cidade murada é só uma lenda urbana, gente… – Ri com a bobagem
– Talvez sim, talvez não, por isso ninguém mais viu o cara por aí. – Duncan colocou
de volta o capacete virtual.

Voltei cabisbaixa, andando pela multidão, na chuva iluminada pelas propagandas


dos outdoores eletrônicos, nem me importando tanto na possibilidade de ser
reconhecida ou sequestrada por alguém da Dama de Prata. Tinha no momento
questões mais relevantes. Não sabia se a Cidade Murada do Distrito do Sexo era
real. Se fosse, eu não sabia onde era, exceto, no bairro do Distrito do Sexo, Dãã…
Supondo que existisse e eu descobrisse a localização exata, ainda tinha o porém de
não poder entrar sem ter convite. É a lenda dizia que apenas com convite você podia
entrar lá, e não tenho informação de ninguém que conheça essa droga de lugar.
Voltei um tanto desapontada, esbarrando nos pedestres, punks, androides e
trabalhadores cansados, considerando a hipótese de me arriscar em uma clínica
qualquer de esquina. Mas o que ia adiantar? Morta eu não teria utilidade. Voltando
ao muquifo do hotel o balcão estava vazio. Isso nunca acontece. O computador
ligado em cima da mesa deixava as coisas ainda mais estranhas. Procurei pelas
televisões de tubo penduradas entre as escadarias e o balcão alguma imagem do
circuito interno, mas não obtinha nada. Uma voz familiar me avisava.

– O dono do hotel está bem, trago de volta assim que terminarmos nossa conversa.
E não tente nada, X-9, sei o quanto se tornou bem forte e esperta, acredite, apesar
disso, sou bem treinado e tenho recursos que podem frustrar suas tentativas. – O
desconhecido abria o sobretudo de couro negro que ia até os pés, mostrando no
interior uma vasta quantidade de facas muito afiadas alojadas no tecido, além de
possuir uma pistola na mão que abria o casaco.

– Conheço sua voz… Mas seu rosto… – Ergui a sobrancelha esquerda, fazendo
esforço pra lembrar.

– PeeBoy, você não reconhece meu rosto porque estava sempre de máscara. –
Concluiu.

– É isso! PeeBoy. Depois pergunto por que decidiu retirar a máscara, no momento
quero saber como me achou e o que está fazendo aqui. – Cruzei os braços.

– Como te achei é segredo profissional, mas posso dizer que estou aqui em nome
de Tony Montana. Você deve ter ficado sabendo que Yuric está provocando-o. A
situação chegou a um ponto que não dá mais pra conter. Tony quer te contratar
antes que Yuric faça isso e como você não respondeu a mensagem… Precisei vir
pessoalmente saber qual sua decisão. – Ele mantinha o casaco aberto, me
lembrando de que não baixava a guarda um segundo.

– Sabia que esse dia ia chegar… Só não imaginei que fosse tão cedo e nem tão
fácil… Por outro lado fico mais tranquila que tenha sido você ou o Montana… É
verdade, não respondi as mensagens. – Ainda me mantinha de braços cruzados.

– As mensagens? Enviamos apenas uma. – Disse PeeBoy.


– Sim, mas recebi outras propostas, de Xiaren, Fernando Pascal, e do próprio Yuric.
– Foi o que imaginamos. Então, você está do nosso lado, né? – Ele tentava intimidar,
abrindo o casaco na hora que acendia um cigarro.

– Sim. – Respondi.
– Que bom. – Ele sorriu, com seus traços delicados.
– E não. – Falei novamente.
– Como assim? – PeeBoy ficou tão surpreso que fechou o casaco.
– Eu tô na cola do Boris desde que… Bem, do que aconteceu no prédio da Orion.
Fiquei sabendo que ele se juntou à máfia russa. Essa é a minha oportunidade de
conseguir pôr as mãos no desgraçado. Mas pra isso vou ter que topar a proposta do
Yuric. – Mordiscava o lábio inferior minha reação nesses momentos estranhos. –
Vou aproveitar o fato de ser meio russa e entrar nessa...Mas fica calmo, estarei do
lado de vocês, saca? Diga ao Tony que vou trabalhar como uma agente dupla.
Enquanto tento pegar Boris vou juntando informações dos russos e passo a vocês,
honrando o nome que tenho. – sorri, tentando descontrair.

– Tudo bem, o plano é bom… Mas é arriscado demais, imagina se descobrem… –


PeeBoy baixou a guarda, ele não era uma pessoa ruim e eu podia usar o momento
de fragilidade para tentar algo, mas também não sou ruim.

– Cara… Já estou tão fodida que nem me importo. – Dei de ombros.


– Vou avisar Tony e ir atrás dos outros ex Steelhearts, nos vemos por aí, X-9. – Ele
acenou dando as costas.

– Espera! – Ele parou, voltando-se novamente para mim. – Você conhece a Cidade
Murada do Distrito do Sexo? – Perguntei parada a sua frente.

– Não… Mas já ouvi dizer que Tony conhece, esteve lá uma vez quando era policial e
outra depois que virou mafioso. Por que?

– Preciso entrar lá… Como agora vou trabalhar novamente para seu chefe, acho que
ele poderia dar uma ajudinha. Ouvi dizer que é acessível apenas com convite, poxa,
se eu tiver o convite do maior gangster de Miraitropolis… – Deixei ele pensar.

– Tá… Vou falar com ele e você me diz por que precisa ir lá.
PeeBoy usou a pulseira comunicadora para falar com Tony, aproveitando que dava o
aviso de que eu trabalharia com eles e ainda bancaria a agente dupla, pediu
informações sobre a Cidade Murada. Montana disse que o Distrito do Sexo era um
lugar pesado até mesmo para bandidos, e que a Cidade Murada era dez vezes pior.
Fez algumas ligações e com os contatos certos conseguiu o passe livre para que eu
pudesse entrar. Expliquei a ambos que necessitava de uma operação e falei que
inserir novos implantes fazia parte do meu plano dentro da rede russa. Tony não
queria perder o investimento, no caso, eu, e mandou PeeBoy e Jesse comigo até o
Distrito do Sexo. Eu não tinha até então entrado no bairro. Era aquela coisa,
começava normal, com cafetões, prostitutas e traficantes nas esquinas
“trabalhando”, Jesse precisava se manter muito atento para não atropelar ninguém.

Conforme entravamos ainda mais no bairro começava os neons a pulsar


intensamente, mostrando que a vida noturna do local era forte e toda sua economia
voltada a prostituição e vendas de drogas. Mulheres nuas se exibem em vitrines,
tubos de vidros pequenos e suportes de ferro acima das ruas, dançando
sensualmente à volta de anéis de luzes verde e todas outras cores imagináveis. Os
clientes como qualquer outro gostavam de ver a mercadoria antes de
experimentá-las. Isso não era importante, e sim que conforme avançávamos bairro
adentro as ruas ficavam mais estreitas e claustrofóbicas, o carro quase não
conseguia passar. Até que chegou o momento em que em um beco sem saída a
calçada terminava frente a uma porta de ferro reforçada, com muitas engrenagens e
tubos. Podia notar-se que era lacrada como uma escotilha. A entrada ficava em um
prédio também enferrujado, surrado pelas constantes chuvas ácidas de Miraitropolis
onde a arquitetura industrial se corria. Os prédios vizinhos tão próximos, se ligavam
uns aos outros, não dando pra perceber exatamente onde começava e terminava o
outro, formando um muro intransponível de metal e concreto. Concluía-se ali que se
tratava da entrada da Cidade Murada. Existia uma placa indicando a proibição de -18
no local, mas era mentira…

– Não dá pra entrar nessa porta com o carro. E não vou deixar ele aqui fora pra ser
roubado. Vocês entram e eu espero. – Sugeriu Jesse, o motorista.

PeeBoy e eu saímos do carro e na frente da porta uma estreita escotilha se abria,


apenas falamos o nome de Tony Montana e a porta se abriu. Se a cidade de
Miraitropolis já era surreal, aquilo lá dentro era fora da surrealidade, nem tenho
palavras pra descrever. É mais brilhante, e com mais lixo! Você encontrará cartazes
chineses de call girls nas paredes, lojas com higiene pobre e também máquinas
automáticas completamente sujas. Pequenas casas formavam um vilarejo pobre,
turvo, mas com muitas luzes de neons entre as vielas estreitas que duas pessoas
mal conseguiam passar juntas. Fiação expostas pelas paredes, onde a qualquer
momento poderia causar curto circuitos que acabariam em tragédia. Pessoas muito
pobres, a maioria de mulheres que caíram ali e não conseguiam mais sair e
precisavam vender o corpo para viver. Outras foram vendidas, trocadas ou deviam
para traficantes e cafetões. Algumas poucas foram a própria dívida dos maridos
viciados em jogos virtuais.

Vítimas de clientes que não usavam preservativo ou da violência sexual de outros, a


todo momento crianças nasciam neste lugar e sem opção seguiam os passos
infelizes das mães. Essas crianças não conheciam o mundo fora da cidade murada.
Uma situação triste e que não podíamos fazer nada. Em algumas janelas era
possível ver o ato sexual, acontecia em toda esquina que a gente passava. Em
outras eu via a tristeza estampada no rosto de alguma mulher que foi ”usada” e ali
se mantinha imóvel como uma boneca, após o coito, como se pudesse existir outra
realidade. Mas não existia.

– Fique do meu lado, não é comum mulheres entrarem aqui, e quando entram não
saem… Por isso Tony pediu para eu acompanhá-la. – Ele pegava em minha mão,
mostrando que eu tinha “dono”. Não que eu gostasse da ideia, não me agradava
nada, mas estávamos sob o comandado de leis machistas.

Caminhamos muito até encontrarmos o lugar que um senhorzinho muito simples e


de olhos puxados disse que era a Clínica Igor. A porta redonda com o Ying Yang foi
uma excelente referência usada pelo senhorzinho, não tinha erro. Sinais de néon
escritos em chinês à volta da entrada e uma placa servindo de tabela de preços ao
lado mostrava que o estabelecimento por mais estranho que fosse estava em
funcionamento. A porta Yin Yang se abriu em duas, e quando você entra, encontra
um lugar escuro com a próxima porta em formato octogonal e detalhes
deslumbrantes a contornando em cores claras. Não sem antes tomar uma passarela
que parecia de pedras em zig zag sobre um fosso com água turva verde que saia
fumaça. Por sorte existe um corrimão em cada lado para ajudar a travessia, mesmo
esse sendo completamente torto e te passar tétano só de olhá-lo. O caminho
continua bem iluminado por luzes vermelhas, até o final do corredor. Lá dentro
estava Igor, numa saleta pequena, com muitas próteses penduradas no teto, ele
mesmo possuía uma em cada braço. O cara é novo, um pouco descuidado, mas se
nota que tem seus vinte e poucos anos. Se desse uma boa aparada naqueles
cachos castanhos e fizesse a barba, não ficaria tão feio. rs. Apontando para uma
tela verde holográfica flutuante a sua frente, esticava a outra mão robótica para a
cadeira de operação, convidativo.

– O senhor Montana falou da sua vontade, sente-se, X-9, fique e me diga no que
posso ser útil.

Frank Coyote

– Porra Nicolle, tá tarde, o que você tá fazendo aqui? – A voz grossa do homem soou
por de trás da porta, ainda sonolento por ter sido pego tão tarde da noite pelas
batidas violentas na entrada do apartamento. A primeira reação que teve ao acordar
foi pegar a G23 na cabeceira da cama, já verificado por instinto se estava carregada
e destravada. Com arma em mãos, caminhou pelos cômodos ainda no escuro,
agradecido por ter não bebido todas antes de ir dormir naquela noite. Parou em total
silêncio atrás da porta, olhando pelo olho mágico para vislumbrar a figura da mulher
de cabelo longo e platinado tremendo em pé no corredor mal iluminado. – Essa
porta vai ficar fechada se não abrir o bico logo. – Aumentou o tom usado, sem abrir
a porta e dando a entender que provavelmente nem isso faria se ela não se
explicasse rápido.
– Cacete Frank, sério que você tá sendo um grande filho da puta justamente agora!?
A Vênus já era e eu quase morri baleada, porra! Abre essa porta! – a mulher gritou
histérica, batendo na porta mais uma vez, descontrolada. Estava bem ferrada e
dessa vez nem era pelas drogas. “Puta que pariu, a Vênus não!” pensou enquanto
abria a porta para a loira que entrou cambaleando no salto alto para dentro do
apartamento. Fechou a porta imediatamente após a mulher entrar, não confiava nem
nos vizinhos malditos e já suspeitava que todo aquele escândalo despertava a
atenção do prédio todo.

– Acende essa luz, Frank! Eu não tô enxergando nada! – A mulher protestou


enquanto Frank alcançava o interruptor mais próximo iluminando toda a sala. Nunca
havia visto Nicolle descabelada e seminua ANTES de entrar em seu apartamento.

– O que diabos aconteceu na Vênus? – Perguntou sentando em uma das poltronas


ferradas que chamava de parte da mobília. Buscou no bolso o cigarro e o isqueiro,
acendendo e tragando. A arma repousava no colo.

– Eu sei lá, tava pronta para começar o turno e uns caras entraram atirando. Tinha
gente morta, Frank! Gente morta! Eu juro que é a última vez que piso lá, eu não vou
voltar. Minha mãe não me criou para ficar metida entre treta de mafioso. – A loira
protestou procurando um lugar para sentar naquele muquifo, tremendo.

– Não, claro que não. A santa da sua mãe te criou para ser uma stripper viciada e
uma prostituta das boas, tenho certeza. Grande mulher ela deve ter sido! – O homem
zombou rindo alto, com o cigarro entre os dedos.

– Vai se foder, seu cretino! Você nem tava lá, porra! Se tivesse duvido que estaria
rindo! Filho da puta! – A mulher protestou furiosa, com o cílio postiço descolando, a
maquiagem borrada pelas lágrimas e as unhas cravadas no ombro em um abraço
desolado. – Essa merda tá toda errada, Miraitropolis já era Frank, vai sobrar pra todo
lado! Vamos fugir daqui, dá o fora enquanto é tempo. – A mulher tremeu, agora
talvez pela abstinência da heroína ou ainda aflita pelo medo. Maldita hora que deu
liberdade e intimidade para uma prostituta qualquer, pensou ao ouvir a proposta.

– Cê tá louca? É agora que essa merda vai ficar interessante. Eu vou até lá. Pode
ficar no apartamento o quanto quiser, mas não vai achar grana aqui. Se achar, não é
minha. – Zombou levantando e lançando o cigarro pela metade no cinzeiro já lotado.
Guardou a arma no cinto e puxou a camisa para cima.

– O-onde você vai Frank!? Tá maluco? – A prostituta também levantou


acompanhando o outro enquanto ele caminhava de volta para a porta de entrada.
– Eu vou até o Pascal. Ele deve tá pagando uma grana preta para quem pegar os
filhos da puta que ferraram a boate dele. Se cuida, Nicolle. – Despediu-se da mulher
atônita enquanto cruzava a porta aberta do apartamento sentindo que os vizinhos
acompanhavam o trajeto de sua saída do prédio através de suas portas,
desgraçados curiosos. Não sabia quem havia atacado os latinos, mas suspeitava
que alguma outra facção da cidade havia se rebelado. Todavia não se importava
com o risco ou quem começou a briga com quem, seu único lamento ainda era a
boate de luxo Vênus ter sido alvo de um ataque. Um filho da puta que mirasse
naquele lugar abençoado só poderia pagar comendo uma bala, pensou enquanto
fazia seu caminho até Pascal para oferecer seus serviços.

Gabriela vulgo Rodrigo

Cidade Média. Boate Venus.

A vida que eu levava não era necessariamente ruim. Trabalhava vendendo meu
corpo para quem pudesse pagar, saciando os desejos daqueles que não
conseguiam ou não queriam seduzir alguém para que realizassem esses desejos. O
público que eu atendia era completamente variado. Punks, autoridades,
empresários, pessoas comuns... É claro, eu não podia ficar com a grana toda. Parte
dela eu tinha que dar para os proprietários da boate em que eu trabalhava e morava.
Não os culpo, afinal eu usava aquele espaço. E como usava.

Ela era de propriedade de Fernando Pascal, líder da máfia latina, também. Seu irmão
mais novo, Crazy Dog era um dos seus homens de confiança. Havia outros ali, mas
eu não me envolvia com essa parte do negócio. Como disse, meu trabalho era
somente dar prazer – e às vezes senti-lo, também. A propósito, para o meu “chefe” e
sua cadeia de comando, meu nome era Gabriela, uma mulher de pele morena e
ascendência latina, o que atraía outros moradores de outros distritos, especialmente
os de ascendência europeia.

Isso quer dizer que para os meus empregadores – mesmo que seja ridículo chamar
esses desgraçados assim, enfim – eu era mulher. Vez ou outra tinha que dormir com
algum deles, enganando-os. Isto porque, além do machismo que parecia ainda mais
crescente nesses tempos, havia uma caça à bruxa aos pouquíssimos mutantes que
existiam em Mirai ou no restante do mundo. No passado, como não foi possível
impedir a onda maciça de racismo mutante, quase todos foram exterminados. O
gene X, entretanto, não foi completamente erradicado. E eu nasci portando um
deles, felizmente ou infelizmente.
A parte feliz é que eu podia virar qualquer pessoa. Escolhe aí. Também era imune a
doenças virais, o que era mais do que vantagem no ramo. A infelicidade, no caso, era
a impossibilidade de contar para alguém e acabar sendo morta. Mas, devido à
necessidade – e à ganância também, vai – eu contava esse segredinho para alguns
clientes. Cobrava-lhes o triplo ou mais para me transformar em quem eles
quisessem. Escolhe aí de novo: pai, mãe, irmãos, amigos, empregadas... Qualquer
um. Um dos meus clientes especiais era o Alek. O cara devia ter uns quarenta anos,
cabelos grisalhos, ascendência russa. Honestamente eu não conseguia entender
porque ele precisaria pagar alguém para foder. Mas já que pagava, concedia-me
alguns raros momentos de prazer.

Em uma das noites em que eu atendia, terminava de arrumar o quarto para os


próximos clientes que viriam. O cara estava deitado na cama bem confortável. Até
então parecia tá tudo bem, mas veio com uns papos estranhos...

– Rodrigo, cê já usou essas tuas habilidades sem ser pra sexo? Digo, as mutantes.
– Hã... Não. Seria bom se não falasse alto delas, irmão.
– Mas cê deve ter ficado sabendo da treta que tá havendo entre as gangues...
– Por alto, só. — Estava de costas para ele, vendo umas coisas no armário. Quando
me virei, notei que ele apontava uma pistola para mim. — Calma aí, cara... — Disse,
com as mãos um pouco erguidas.

– Bem, é o seguinte. Preciso que faça um servicinho pra mim. Repasse as


informações dos teus patrõezinhos para os meus, os russos.

Ser x-9 com certeza não era o que eu queria. Se me descobrissem, eu morreria. Mas
se eu negasse, eu também seria apagado ali. E esses caras têm formas de me
rastrear caso eu fuja. Fugir para onde, nessa merda de cidade, aliás? Assenti
positivamente. Ele, que já estava quase vestido, sorriu de maneira sádica e saiu do
cômodo com o restante da roupa nos ombros. Tranquei o quarto assim que ele
partiu, não ia atender mais ninguém hoje. Tinha que decidir o que fazer. [...]

Horas se passaram, eu não sei quantas. Fiquei sentado no chão abraçando os


joelhos. Foi então que ouvi todo o tiroteio que tava acontecendo no prédio. Associei
logo à guerra de gangues que o Alek mencionara. Eu não era um dos mafiosos, não
sabia atirar, lutar ou qualquer outra coisa suicida. E nem queria, aliás, queria ganhar
meus créditos e pronto. Por isso não me envolvi. Continuei imóvel no meu lugar até
que o silêncio reinasse. Mais algum tempo se passou, eu não sei quanto. Ouvi
batidas pesadas na porta do meu quarto. Não abri. Logo depois ela foi arrombada.
Me transformei na mulher que acreditavam que eu era, mas acho que não a tempo o
suficiente.

O responsável pelo arrombamento era Pietro, um dos capangas do Pascal. Um


carinha insuportável que achava que mandava em alguma coisa.

– Eles já foram embora? – Falei com um tom feminino e usual naquela forma. Porém
isso não pareceu convencê-lo. Veio rápido em minha direção e segurou nos meus
cabelos, naquele momento, longos. Eu pensei em me transmutar novamente,
ficando com um corpo musculoso, por exemplo, e intimidá-lo. Mas ele logo apontou
sua arma para mim.

– Pra mim não precisa mentir, bichinha. Eu sei o que tu é. A questão é: tu quer que
meus chefes também saibam? Eles já estão putos pelo desaparecimento do Crazy
Dog...

– O que você quer?


– É muito simples. Tu tem que achar o cara, só. Os russos o pegaram. Com essa tua
doença de merda de se transformar nos outros, não vai ser difícil, né? Nem preciso
dizer que não aceito não como resposta. – Logo depois ele saiu. Assim como o Alek,
ele tinha seus meios de me achar. Agora eu estava entre a cruz e a espada, não sei o
que poderia acontecer depois. Fodido, mas infelizmente, não no sentido literal.

Pollux

Houve um tempo em que os sinais de uma guerra de gangues na minha cidade era a
alegria de meu trabalho, tantas mortes a serem reportadas e o pior tipo de atitude
inescrupulosa das megacorporações sendo tomadas sob o disfarce de uma guerra
urbana, ninguém estaria preocupado o suficiente para mergulhar direito nas notícias
além do sensacionalismo e das mortes explícitas que eram transmitidas ao vivo
para os espectadores com sede de sangue, todo mundo gostava de ver um pouco
de carnificina e garantir ao povo o seu pão e circo era crucial para deixar a corrupção
intacta, trabalhar para Telford havia me deixado bem letrado nesse tipo de prática e
eu sabia que por baixo dos panos sempre havia um dedo ou outro dos mais
poderosos por trás de conflitos assim tão cruéis.

Callídora estava ocupada nos últimos meses, estudando literalmente qualquer


transação que pudesse nos conduzir ou nos trazer aos nomes de K'dore ou Telford,
e toda a teia que eles construíam em torno da cidade incluindo o velho Coltraine,
alguém que havíamos concordado tentar colocar em nosso bolso ou pelo menos
entender o seu m.o. Era um contato que não pretendíamos destruir por enquanto ou
pelo menos queimar de alguma maneira, mesmo com as intricâncias do passado e
nossos plausíveis conflitos.

– Então ele torturou o amigo do Tony na cara e na coragem? Sujeito destemido esse.
– as luzes passavam rápido por mim enquanto acelerava em uma moto, falando
com um aparelho que dava a volta em minha orelha e me permitia ouvir com
perfeição a voz de Calidora de dentro de nosso QG.

– E agora as máfias estão se voltando uma contra a outra. Eu acho melhor você ir
ver o que ele quer.

– Pode crer que eu vou. Vocês estão fazendo progresso? Falcon tem te ajudado?
– É mais difícil do que a gente pensa, mas o banco de dados está completo de novo.
Olha com o seu amigo italiano se ele não pode fornecer umas permissões novas.

– Tava pensando nisso. Também nos dirigíveis acima da cidade. – Ela demorou só
um pouquinho para entender no que aquilo nos conduziria.

– Verdade. Eles guardam os dados de entrada de todo mundo. Teríamos a


informação de todo mundo também. Você sabe alguma coisa sobre uma
inteligência chamada Praxis?

– Pensei nisso também. Vou desligar, estou chegando. Concentre-se em amplificar


nosso sinal, vou reunir os dados que faltam. Logo logo vamos ter tudo que
perdemos no Canal 17.

– Você sempre fica com toda a diversão. – Click, e a voz se apagou. Eu acelerei
minha moto até o distrito onde o prédio de Montana ficava, não muito longe dali. Eu
já esperava que ele não estivesse lá muito para conversar, mas nunca pude prever o
que encontraria. Quando cheguei lá, estacionei no que sobrava que achava ser uma
parte destinada ao estacionamento, onde um cara largo e mau encarado guardava
uma das portas dos fundos, destinada a seus convidados ou sabe-se lá quem mais
estaria no interesse de Tony chamar sem ser visto.

As coisas estavam feias por toda parte. Era uma terra de ninguém que cada vez
mais parecia se fechar em torno daquele mafioso e por mais que ele não gostasse
de admitir parecia estar ficando desesperado também. Não sabia que ele tinha feito
parte da polícia certa vez, descobri quando Calidora me deu as informações sobre
seu parceiro Caz, e isso explicava o motivo de ser tão bom com interrogatórios,
principalmente por parecer ler quem estava na frente dele e saber quando mentiam,
coisa que eu só conseguia ser bom com os meus implantes. De qualquer jeito foi
outra figura que aprendi a admirar com o tempo.

– Espera aí, engomadinho. – Nem liguei, já tava acostumado. Era mais ou menos a
maneira como aqueles que já me conheciam tratavam-me com 'carinho'. Agora que
meu passado era bem disseminado eram poucas as pessoas que não me
reconheciam por conta do noticiário, mas por sorte os meus recentes atos falavam
mais alto do que tudo isso. Tomei meu tempo, encostei-me na moto, soprei a
fumaça de um cigarro para o alto que sumiu na sombra dos arranha céus da cidade.
O silêncio enfeitado pelas buzinas e gritaria distante era estranhamente terapêutico,
similar a como a cidade parecia estar sendo engolida por si mesma. A tentação de
voltar ao conforto do que era minha vida antes sempre foi algo que de vez em
quando batia a porta das minhas opções mas que logo eu fechava, ciente de tudo
que me levou a essa jornada. As coisas não estavam boas para os Steelhearts
também e eu não via uma resolução fácil em vista muito próxima. Era uma
sensação estranha que tomavam as ruas naqueles dias, como se mais do que chuva
estivesse para banhá-las.

– O Sr. Montana já está pronto agora. – Aprontei-me e joguei o cigarro fora,


passados cinco minutos eu já estava em seu escritório. A coisa toda parecia ter sido
bombardeada do lado de fora, e mesmo que a desordem fosse chamativa não
mostrei surpresa ao vê-lo e correr o risco de irritá-lo. Uma coisa que aprendi com
pessoas temíveis é que a melhor coisa que se pode fazer para lidar com elas é
mostrar que não há medo. Vi que fui o primeiro a chegar e aquilo foi mais do que
ótimo. Tirei o chapéu que cobria minha cabeça e avancei para a mesa de Tony
estendendo a mão para apertar a dele.

– Mister Montana, uma honra encontrá-lo. – O homem estava visivelmente afetado,


e o tanto de remédios que sobrava em sua escrivaninha era o suficiente para mandar
um cavalo em uma viagem psicodélica pra nunca mais voltar. – Ouvi sobre o que
aconteceu, eu sinto muito. Porém eu gostaria também de informá-lo acerca de algo,
acho que não faz mal em saber. – De dentro do paletó eu tirei uma espécie de haste
que parecia de plástico preto, mas com um gesto fiz uma tela em holograma se
estender, era azul transparente e mostrava um rosto que girava em 360 graus, com
dados próximos a um relatório médico. – Este homem se chama Timothy Carter.
Apareceu há alguns dias me procurando e pedindo informações sobre o Canal 17 e
a sua destruição. Perdeu mulher e filha, se bem me recordo. Mais do que isso,
mostrou um certo rancor pelos Steelhearts e sabe que eles estavam envolvidos na
destruição da sede. Acho que estava tentando me recrutar para algum tipo de
motim. – Deixei o relatório em cima de sua mesa, empurrando até que ficasse à sua
vista. Cobri a boca com o punho fechado e tossi uma vez, ergui os olhos e disse. –
Se vier a ser um problema, posso cuidar disso sozinho.

Galathea

As portas duplas se abriram revelando a figura de um homem negro opulento. Era


alto e de ombros largos, a cabeça lisa como um ovo e um dos olhos tinha um brilho
artificial absurdamente aparente na semi-escuridão do local. Se vestia de forma
casual. Casual como um militar, tendo apenas um casaco roxo escuro sobre a
camisa branca simples e as calças oliva. Ele comandava a família junto a Galathea,
dando cabo de suas ordens, mantendo os homens na linha e os mantendo na forma
como ela havia especificado.

– Tá acontecendo. Yuric…
– Eu sei. Angela já me contou. – Respondeu Galathea apontando com o queixo para
uma mulher, também negra e alta em seus saltos. Ela usava um longo vestido
azulado com cortes laterais em ambas as pernas. Sob as pálpebras uma sombra
branca fluorescente, além de brincos e colares dourados. Todo o cabelo preto era
trançado fina e intrincadamente em longas tranças. Seu rosto tinha linhas finas e
delicadas em contraste com as do brutamontes de queixo largo e quadrado que
parou ao seu lado. Angela era a cafetina que tomava conta das garotas para
Galathea. E, por consequência, era também sua “inteligência”. Já que alguns clientes
não conseguiam se conter e deixar escapar coisa ou outra para as meninas.

Embora houvesse assentos na pequena mesa circular, os dois se mantiveram de pé


olhando a matriarca que se mantinha sentada. Essa por sua vez observava a forma
da serpente autofagista que era o símbolo daquela família, embora só fosse
ostentado por aquela única mesa em toda a organização. A sala era pequena e mal
iluminada por lâmpadas cônicas penduradas no teto. Haviam duas adegas
iluminadas embutidas nas paredes que ladeavam Galathea. Atrás da mesma um
armário de armas meticulosamente organizado. Embora não para ostentá-las e sim
para estocá-las.

Embora estivessem 3 andares abaixo do térreo, o som do clube da organização


ainda era audível. Sendo abafado apenas quando um dos membros do lado de fora
se deu ao trabalho de fechar as portas pelas quais Shae havia entrado.

– Mas que merda heim. Todo dia tem uma merda explodindo em Mirai... –
Exasperou a morena apoiando o rosto cansado nas palmas das mãos e os
cotovelos na mesa. – Agora esses filhos da puta vão começar a se matar como se
não houvesse amanhã e foder tudo. Absolutamente tudo. Como Yuric é estúpido,
puta que pariu. Eles não só ofereceram paz, mas também deixaram claro que
recusar significava guerra ao se darem ao trabalho de fazê-lo. Agora esse imbecil
está sozinho, fudido, em guerra contra as 3 maiores organizações criminosas da
cidade… Ou ele tem alguma carta na manga? Um acordo por baixo dos panos com
os ou.. – Fora interrompida por um pigarro de Shae que já conhecia os lapsos de
devaneio da matriarca.

– Ordens? – Cobrou Shae cruzando os braços frente ao corpanzil.


Galathea balançou a cabeça suspirando e ergueu o rosto das mãos com a sombra
de um sorriso.

– Reúna todo mundo. Estamos oficialmente em estado de guerra.


– Porra… Tudo isso? Ninguém tem nenhuma razão para nos atacar diretamente.
– Reúna todo mundo. Eu não quero ninguém morrendo por proxy em guerra alheia.
Leve todos para o segundo andar, preciso falar com eles.

– Certo… – Murmurou Shae antes de sair da Sala.


Angela se manteve graciosa e em silêncio, como se estivesse à espera de suas
ordens. Galathea sorriu ao notá-la ainda ali.

– Bem, minha flor… Diga às meninas para irem para casa. Não vamos ter soldados
nas ruas para dar cobertura a elas por algum tempo.

Com um leve aceno de cabeça a mulher desfilou para fora dali.

Alguns minutos depois, Galathea subiu os degraus para o segundo andar. Os


homens deram espaço para a morena que caminhou por entre os mesmos até uma
mesa de bilhar ali. Sentando-se parcialmente sobre essa, sendo iluminada pela
lâmpada da mesma.

– Os russos jogaram merda no ventilador. Os negócios vão piorar só por isso. Mas
além de tudo, provavelmente vamos ter esses filhos da puta se matando nas ruas
abertamente. Eu não quero que sejam pegos em fogo cruzado da guerra deles. Por
isso, ordenei o estado de guerra. Os senhores sabem o que fazer… Cessar o tráfico,
estelionato, prostituição, etc etc e etc… Vamos operar com prejuízo até o final da
guerra, pois quero que tranquem esse território como uma fortaleza. Mãos à obra!
Galathea notou uma certa decepção e tristeza no olhar de seus homens. Mesmo
esses a saudando como sempre e dando cabo de suas ordens imediatamente. A
música já havia parado e os clientes colocados para fora.
Galathea saiu pouco depois do briefing. Deixando o clube com um letreiro em neon
roxo escrito “BASEMENT” para trás. A morena alta, caminhou pela cidade. As pernas
alongadas estavam cobertas por uma legging de tecido plástico transparente nos
tornozelos que gradualmente se tornava preto opaco à medida que se aproximava
do quadril. Trajava também uma jaqueta pesada de padrão poligonal cujo tecido
projetava cores de acordo com a intensidade dos movimentos dela. Os cabelos
negros longos, tão lisos como vidro, pareciam tilintar ante a menor sugestão do
vento. Esses se encontravam presos num rabo de cavalo alto deixando expostas as
orelhas com brincos argola. A pele alva e imaculada como mármore e as feições,
assim como toda a compleição, pareciam ter sido esculpidas por um mestre
renascentista. Galathea Scipio era uma figura quase divina do alto de seus quase
1,80 e com seu olhar e porte confiante. Não fosse a existência de androides que
também eram esculpidos à mão e também apresentavam o mesmo ápice da
perfeição idealizada.

Parou um instante olhando para o alto, notando a infinidade de luzes e sinais e


placas de neon. Lembrando-se brevemente da escuridão que via ao fazer o mesmo
no deserto.

– Ora ora ora… Eu poderia reconhecer essa bunda em qualquer lugar… – A voz do
diabo lhe trouxe a mente de volta ao chão. Olhando a figura com o canto do olho.

O motor pesado soou uma última vez antes de se aquietar com o metal rangendo ao
perder calor. O modelo da motocicleta e as vestimentas deixavam óbvio quem era o
diabo.

– Não tá velho demais pra andar nessas coisas? – Perguntou Galathea em


monotom.

– Claro que não. O que faz aqui sozinha? – O homem perguntou acendendo um
cigarro e em seguida destacando um do maço e estendendo à morena. Galathea
curvou-se na altura do quadril e pescou o cigarro com os lábios rubros. O velho
demônio lhe estendeu o isqueiro e a mulher se ergueu tragando pesadamente.
Iluminando o próprio rosto com a mesma luz alaranjada que iluminava o outro.

– Ficou sabendo do que tá rolando com o Yuric? – Perguntou o demônio soltando a


fumaça à medida que falava.
– Uhum… Toda vez que esses merdas cagam a bosta escorre aqui pra cima de nós –
Ela exalou e segurou o cigarro entre os dedos. – O que você sabe?

– O que VOCÊ sabe? – Ripostou o velho, rápido e faceiro como uma raposa.
Um breve silêncio entre os dois se instaurou com Galathea o olhando com os olhos
viperinos e inexpressivos. Mas sabia que com ele precisava estender a mão
primeiro. – Yuric recusou uma oferta de paz de Xiaren e Pascal. E ao recusar
basicamente declarou guerra a Tony, Xiaren e Pascal juntos. – Regurgitou as
palavras apressadamente como se quisesse logo acabar com aquilo.

– Yuric, é? Agora faz sentido. É… O pessoal de hoje em dia não é mais como
antigamente. Eles não têm… Enfim… Alguém metralhou a Vênus e raptou o irmão do
Pascal. Houve também um ataque aberto contra o restaurante de Xiaren.

– Merda…
– Eu que o diga. Parece que o russo tá ficando louco. Mas isso não vai fazer eles se
juntarem contra ele. Eles vão todos se matar ao mesmo tempo.

– Você acha? – Perguntou Galathea. E ao ser respondida com um meneio da cabeça


deu de ombros. – É, nunca se pode descartar a possibilidade. Mas ainda acredito
que vão massacrar ele.

– Acredita ou espera? – O velho demônio sorriu. O sorriso virou uma tosse e o


mesmo cuspiu um punhado de sangue do outro lado da moto. Sorriu de volta com
os dentes meio ensanguentados. – Quer apostar mil?

– Mil? – A morena sorriu de canto.


– Humm… Que tal… Isso. – Ele puxou a jaqueta revelando o cabo de uma relíquia.
Uma Magnum M500. – Contra o que quer que esteja carregando ai.

– Acho que não é uma aposta muito justa para você.


– É que eu tenho certeza que vai perder. – O motor rugiu ao ser reavivado, e a besta
ficou ociosa esperando os comandos de seu senhor. – Vai assistir sentada nessa
também? Ou vai colocar aqueles seus soldadinhos de chumbo para fazerem alguma
coisa? Prazer vê-la ainda inteira e conservada após todos esses anos. Até outro dia,
quem sabe…

O velho demônio acelerou a moto começando a se afastar.


– Boa viagem. E não suma…. Eu acho que tenho algo em mente e talvez precise dos
músculos dos Devil’s. E se seus rapazes precisarem de medicina para radiação me
avisa! Eu encontrei um ótimo fornecedor! – Exclamou as últimas palavras para ter
certeza de que ele ouviria mesmo estando já a alguns metros e com o motor
rugindo. Esse velho caduco provavelmente não escuta mais porra nenhuma, pensou.

Novamente estava em seu clube. Agora mais homens estavam presentes.


Novamente estava sentada sobre a mesa de bilhar.

– Eu escolhi esse time a dedo. Lhes dei o apoio que o exército esqueceu de dar. E os
treinei como se fossem lutar em outra guerra mundial… Trabalhamos muito e
gastamos muito com tanto treinamento. Mas isso não vai fazer a menor diferença
se eu ficar como uma mãe coruja em cima de vocês. Nós vamos lutar. Vamos
mostrar a esses merdas como se luta de verdade.

Os homens imediatamente explodiram em urros e gritos, jogando as mãos para o


alto e batendo contra o peito. Não havia nada pior que treinar para uma guerra que
nunca vinha. Ela o fez com o intuito de sempre mantê-los em forma e coesos para
quando finalmente adquirirem a licença de mercenários, estarem aptos a dar cabo
de serviços. Mas treinar por uma guerra que nunca vinha era por si só uma tortura. E
utilizar aqueles homens para quebrar viciadinhos na porrada em becos e proteger
prostitutas era um subproveitamento absurdo.

Continuou após aguardar pacientemente a comoção passar.

– Tenham em mente que independente do quão bem sucedido sejamos, isso aqui é
e sempre foi um estado transitório. A Uroboros não foi feita para ficar chafurdando
na lama junto com essa escória. – Exclamou ela altiva enquanto se erguia. –
Dispensados.

--

– Então… qual é o plano?


Shae estava sentado com Galathea na mesa com a gravura da cobra autofagista.
Dois copos de whisky jaziam sobre essa.

– Pascal, Xiaren, Tony… Se nos fizerem uma proposta vamos simplesmente aceitar a
mais alta. – Ela virou um dos copos nos lábios.

– E…? – Cobrou Shae, notando algo velado na voz da matriarca.


– Vamos lutar por nosso patrono. Cumprir honrosamente nosso contrato, como
sempre. E, quando alguma das famílias se mostrar um alvo fácil, iremos atacá-la
com tudo e tomar seu lugar. – Mordeu o gelo do whisky ao final do discurso.

– Puta. Que. Pariu. – Um longo e preocupado silêncio depois, Shae emendou. –E


como vamos manter isso?

– Aliados. Existem muitas outras pequenas famílias por aí que se fodem por causa
da picuinha desses filhos da puta.

– E como pretende conseguir a boa vontade dessa “coalizão”? Ninguém nunca foi
particularmente amistoso em relação a nós.

– Só precisamos de uma vitória. Só precisamos jogar sangue na água, a ganância


falará, e eles virão famintos… Até porque, vamos dar o território a eles. A Uroboros
foi feita para ter asas e competir na esfera que realmente importa, a política. Eles
podem ficar aí brigando por becos e ruelas quando conseguirmos nossa licença. Eu
tô pouco me fudendo.

Cris Falcon

Sinceramente? Eu não sei como as pessoas desse galinheiro imundo chamado


Miraitrópolis conseguem viver assim. Depois que o Xiaren-sama me passou a
mensagem do incidente na Boate Venus pelo holotech, eu sabia que ia ter que botar
a mão na massa. Isso era, de certa forma, muito bom. Estou mesmo precisando de
uma boa sacudida no meu lado físico, já que minha rotina se resume aos exercícios
que pratico desde os seis anos, os Kata e um pouco de um Kumite com praticantes
do Jiu Jitsu Brasileiro, Muay Thai e alguns karate-ka. Mas era pouca coisa, já que
desde que a turminha do Bafo de Vodka fez questão de estragar a vidinha pacata no
bairro italiano, uma das minhas fontes de renda, aquele clubinho secreto de artes
marciais, foi descoberto pelas firmas de segurança particulares que fazem a ronda
do bairro.

Foi quando eu me vi obrigado a procurar ajuda. Eu realmente precisava chegar ao


fundo nessa história e não havia ninguém que pudesse me passar a mensagem, já
que depois daquela declaração de guerra do Yuric, qualquer coisa que me
mandassem poderia ser facilmente rastreada. Então, resolvi dar uma visitinha a um
dos meus contatos, uma especialista em encriptação e rastreamento de dados
sigilosos...
Assim que digitei a senha que me foi requisitada no portão de acesso daquela casa
bem escondida no meio do ferro velho, Anansi de Almeida quase teve um enfarto ao
me ver. Parece que eu estava ficando BEM popular.
– PUTA MERDA! Eu não acredito. O Chris Falcon em pessoa? Você vem lá dos
cafundós só pra me achar aqui na boca do lixo!

– Eu sei, Anansi. Preciso de um favorzinho seu.


– Deixa eu ver, tá querendo contatos daquelas coreanas gatinhas que apareceram
na tv outro dia? Ou o número de série de algum sexbot que te venderam e não te
deram?

Me segurei pra não cair na risada.

– Nada disso, bem que eu queria essas regalias, mas agora o bicho tá pegando.
Ficou sabendo do que aconteceu na boate Vênus?

Observei A afro-brasileira trazer uma travessa de biscoitos e uma xícara de café.

– Deus me livre guarde, Rapaz. Tá um monte de gente falando disso. Mas, você não
tá fazendo serviço de cão de guarda pro Xiaren?

– Eu estava cuidando de umas outras coisas – Respondi enquanto dei um gole no


café. Realmente precisava.

– Isso explica porquê eu não tinha ouvido nada de você depois do que aconteceu.
Notei uma preocupação bem evidente no tom de voz dela. Mas passado esse susto,
fomos aos poucos colocando todos os assuntos em dia. Conforme conversávamos,
eu e minha assistente hacker descobrimos mais coisas.

– Ei, Chris. Se liga nisso, gatinho.


Algo me chamou a atenção. Xiaren havia convocado uma parceria com Fernando
Pascal e Tony Montana.

– É, a coisa ficou bem feia. Vou ter que fazer isso de qualquer jeito.
– Você é o cara mais louco que já conheci. Os caras com robôs e metralhadoras e
você indo com artes marciais... e você ainda tem aquelas katanas estilosas? Mura...
murro...
– Murasame? Of course, m'lady. E pode fazer o favor? Contata o Xiaren-sama e avisa
que eu tô indo pessoalmente falar com ele.

– Deixa comigo.
Depois disso, me despedi e saí do esconderijo. Se meus planos dessem certo,
Xiaren receberia a mensagem de Anansi e eu poderia prosseguir com o meu
trabalho.

Narrador Capítulo 2

– Uma onda de calor nunca antes vista caiu sobre Miraitropolis, os termômetros
estão medindo mínimas de 39°C e máximas de 45°C. Além da brusca mudança
climática, vários atentados violentos estão sendo registrados em vários bairros, o
caso mais grave é o tiroteio constante que vem ocorrendo a dias no Residencial
Celeste, que atualmente está isolado pela policia, ninguém entra e ninguém sai sem
a permissão deles. A ParaMiltech, responsável pela polícia e outros órgãos de
segurança, mandou a seguinte mensagem de esclarecimento para população. “É
uma questão de tempo para tudo voltar ao normal, nossos oficiais estão nas ruas
para protegê-los, pedimos apenas a calma e colaboração de toda a população,
ParaMiltech agradece!” – O Jornal 17, apresentado pela âncora Michelle Ling era
transmitido por toda cidade através de enormes telões localizados nos grandes
arranha-céus por toda cidade e pelos dirigíveis que sobrevoavam a cidade noite e
dia. A forma que a notícia era dada e o tom da apresentação era friamente planejada
para acalmar a população, uma estratégia do governo para manter todos sob
controle e evitar possíveis protestos. O que sempre funcionava no povo alienado,
desacreditado e decadente de Miraitropolis.

No enorme hangar subterrâneo localizado em algum lugar de Little Ásia, os


membros e associadas da Ryulong se reuniam. Por todo lugar havia homens e
mulheres asiáticos com tatuagens neons cobrindo seus corpos e outros vestindo
roupas formais, o que deixava claro quem pertencia a Tríade e quem pertencia a
Yakuza antes de Xiaren unificá-las.

Um pequeno grupo de dez homens trabalhavam nos mechas de batalha em outra


parte do hangar, eles eram liderados pelo especialista em mecânica Nivans, que
observava cada detalhe da construção e instalação de sistemas com total atenção.
Este era considerado por muitos como um gênio, sua paixão pela robótica tornava
ele um homem extremamente dedicado e perfeccionista, por isso Xiaren mantém
contrato com ele, pois o considerava uma importante arma.

– Vamos lá, quero testes no sistema de defesa a cada 10 minutos. – Instruía Nivans,
num tom autoritário.
Por falar no líder da Ryulong, o asiático estava sentado atrás de uma mesa de metal
numa pequena sala, tinha montado ali uma espécie de escritório improvisado. Ele
assistia as notícias através de uma tela holográfica que flutuava sobre a mesa, sua
expressão mostrava que ele estava pensativo, ele também batia o indicador direito
sobre a mesa, parecendo nervoso e que a todo tempo estava esperando por algo.

Então Jong abriu a porta da sala demonstrando certa urgência na sua ação, Xiaren
então ergueu os olhos, voltando seu olhar para seu guarda-costas e atual braço
direito. – Senhor, nosso informante acabou de nos enviar a melhor informação de
todas. – Disse com certa empolgação, Xiaren apenas fez um sinal com a cabeça,
para que Jong continuasse. – Yuric usou de contatos e influência para fechar
algumas pistas do Aeroporto Internacional de Miraitropolis. Segundo nosso homem,
um avião cargueiro vindo da Rússia vai pousar da pista 21, a uma da madrugada,
trazendo armamento para o desgraçado. Mas essa não é a melhor parte, a filha dele
vai estar no avião.

– Estranho, Yuric não seria burro de trazer sua filha para a cidade no meio de uma
guerra na qual ele é o principal alvo. – Comentou Xiaren, passando a canhota sobre
seus cabelos negros presos em um coque. – Dizem que a filha dele é tão durona
quanto o desgraçado, talvez ele confie apenas nela para trazer o armamento da
Russia NaziSovietica para cá. – Xiaren então ajeitava sua postura na cadeira de
couro. – Reúna todo mundo no setor principal, em 10 minutos falarei com eles.

O líder da Ryulong abriu uma das gavetas da mesa, pegando uma esfera que
possuía uma luz vermelha no topo. – Ligue para Tony Montana. – A luz vermelha
então começou a piscar, ficando verde logo depois, o que significava que ligação
tinha sido atendida. – Velho amigo, muitas pessoas estão achando que iremos nos
matar também. Quero que saiba que não tenho interesse nessa guerra, não irei me
aproveitar disso para atacá-lo, até porque Yuric é quem tá ferrando com todos nós.
Estou contigo nessa guerra, inclusive tenho um presente para você. – Xiaren então
pausou, voltando a falar. – Yuric irá pousar um avião de carga na pista 21 do
Aeroporto Internacional, uma da madruga. Segundo minhas fontes, a filha dele
estará na aeronave para certificar-se que o armamento chegou em segurança. Essa
é nossa chance de ferrar com esse russo filho da puta, você fica com a filha dele
para uma possível troca pelo seu amigo e eu fico com as armas, combinado? Logo
mais entrarei em contato para acertar os detalhes da operação.
Xiaren então saiu do escritório improvisado, vestindo um kimono preto com
estampas de dragão. Estava sem seus óculos holográficos, já que estes haviam sido
danificados recentemente e ainda não havia tido tempo de arranjar outros. Ao
chegar no setor principal, um amplo espaço onde algumas aeronaves ficavam
estacionadas, todos os membros e associados da Ryulong voltaram seus olhares
para ele. O líder então subiu na lateral de uma das aeronaves, para ficar mais alto
que o restante das pessoas presentes. – Todos aqui estão com raiva pelo que houve
no Xiwang. Amigos e familiares foram mortos lá, além disso, aquele restaurante era
um símbolo para todos nós, um símbolo da nossa cultura nessa terra no ocidente.

Descendentes de chineses e japoneses reunidos ali gritaram com determinação em


resposta às palavras de Xiaren – Quero todos preparados, aos poucos começamos
nossa vingança contra o Yuric! – Todos voltaram a gritar, Xiaren então desceu da
lateral da nave e voltou para o escritório. Onde Jong adentrou logo depois,
perguntando para seu chefe. – Qual o plano, senhor? – Xiaren não respondeu,
apenas apertou a esfera com luz vermelha novamente e ligou para Tony, a luz logo
ficou verde e ele falou. – Enviarei duas aeronaves fortemente armadas para o
aeroporto no horário previsto do pouso, elas serão as iscas. Quando os homens do
Yuric focarem nas minhas aeronaves, você cuida do ataque por terra. São 18:00h,
você ainda tem tempo até a madrugada, prepare seu pessoal e vamos acabar com a
entrega de armas dele e a filha dele vai ser sua. – Xiaren desligava a ligação,
voltando seus olhos para Jong. – Começaremos tirando as armas vindas da Rússia
e a filha dele. Então tomaremos o residencial celeste de volta e finalmente enfiamos
um míssil no cassino de merda dele e entregamos o miserável ao Tony. – Xiaren
então se sentou de forma desleixada na cadeira atrás da mesa e Jong perguntou. –
Não deveria chamar o Pascal para ajudar? – Xiaren então mudou de expressão,
mostrando uma certa preocupação. – Não consigo falar com ele, soube que o Yuric
levou o irmão dele e do jeito que o Fernando é, deve ta desesperado atrás de
informação nas ruas. – Antes de sair do escritório e deixar Xiaren sozinho, Jong
voltou a falar. – O Antaro conseguiu fazer contato com a garota com habilidades
estranhas. – Antes dele sair, Xiaren voltou a falar. – Contate ela, a quero em uma
das aeronaves que irão para o aeroporto hoje, ela se chama Gal, correto? – Jong
fazia um sinal positivo com a cabeça e então fechava a porta. Quando seu
guarda-costas e braço direito saiu da sala, Xiaren usou a esfera de comunicação
mais uma vez, a luz vermelha logo ficou verde e ele começou a falar. – Chris Falcon?
Não consigo contatar o Pascal, preciso que vá até a Vênus e dê um recado para ele:
Xiaren deseja falar com você urgentemente.

Pascal estava sentado em um dos luxuosos sofás vermelhos da Vênus, ele segurava
uma garrafa de cerveja na mão direita. Ao redor dele havia várias pessoas, todos
membros do crime organizado latino, exceto um ou dois. No queixo do cafetão havia
um curativo, era o local onde o Turco tinha acertado a coronhada, Fernando então
deu um gole na cerveja e falou logo em seguida. – 50 pessoas reunidas nessa boate
e não conseguiram NADA? – Seu tom de voz era raivoso, Pascal estava claramente
transtornado pela humilhação que tinha sofrido e pelo seqüestro do seu irmão. –
Será que estou rodeado de incompetentes? – Foi então que um jovem descendente
de mexicanos se aproximou de Pascal, pedindo permissão para dizer algo no seu
ouvido. Pascal apenas fazia um sinal com a mão, o jovem era Pietro, um garoto com
ânsia para chegar ao topo da hierarquia do crime latino. As palavras dele fizeram
Fernando Pascal arregalar os olhos, o jovem então se afastou. O cafetão então deu
mais um gole na cerveja e se levantou. – Gabriela e Coyote, quero vocês dois no
meu escritório agora!

O escritório do cafetão e mafioso era luxuoso apesar das marcas de bala na parede
e alguns móveis quebrados. Um lustre quadrado iluminava a sala, que possuía
quatro poltronas ao redor de uma mesa de centro, uma estante com algumas armas
expostas, posters de veículos luxuosos e uma mesa retangular com uma cadeira
coberta por estofado extremamente confortável. Pascal sentou-se na cadeira, ainda
com sua garrafa na mão, logo depois a prostituta Gabriela e o pistoleiro Coyote
entraram no escritório. – Soube que pode fazer certas coisas que ninguém mais
pode, Gabriela, e não estou falando no quesito sexual. Já você, um pistoleiro que
pode ser um exército de um homem só. – Ele deu mais um gole na bebida e
continuou. – Não contarei seu segredo para ninguém, o que você é não me interessa
Gabriela. Pagarei bem para ambos, quero que você Gabriela use suas habilidades
peculiares para se infiltrar na gangue do Turco. Já você Coyote, quero que proteja ela
nessa tarefa. – Ele então finalizou a garrafa cerveja, colocando a garrafa na mesa. –
Turco como sabem é um traficante de armas que tomou o lugar que antes pertencia
aos Steelhearts, ele tem uma mesquita no centro, uma fachada para o tráfico de
armas. O problema é que meus homens não conseguiram tirar nada dos
frequentantes, para piorar, o lugar tá totalmente limpo. Não tem nenhum resquício
do filho de uma cadela. – Pascal então se levantou, olhando para ambos. – Vão até
lá, se infiltrem e qualquer informação sobre meu irmão que conseguirem, farão o
pagamento e o meu respeito por vocês aumentarem.

A mesquita ficava localizada numa rua de pouco movimento no centro, era um


edifício simples com alguns detalhes na sua arquitetura que lembravam as
mesquitas do mundo antigo. O número de mulçumanos nos dias atuais é bem
pouco, porém Gabriela e Coyote veriam alguns homens de turbante e mulheres de
burca adentrando a mesquita.

A porta do cômodo escuro e apertado com apenas uma lâmpada se abria, Boris
passava pela porta e abria um sorriso ao olhar para Caz desmaiado com o corpo
repleto de marcas de sangue e um curativo mal feito no olho. Ele fechou a porta e
parou de frente para Caz, começando a assobiar o hino da Rússia enquanto abria o
zíper da calça e tirava o pênis para fora.

O torturador começou a mijar no detetive, que acordou atordoado com ao ser


atingido pela urina. Caz estava com uma mordaça cobrindo sua boca, o que impedia
ele de falar, mas ele conseguia esboçar alguns grunhidos que pela sua expressão
era uma carga de xingamentos raivosos direcionados a Boris. – HAHAHAHAHA,
você é a melhor privada que já mijei. – Boris guardou seu membro, fechou o zíper e
cuspiu no rosto de Caz, saindo do cômodo e fechando a porta logo depois.

X9 após sua dolorosa cirurgia notaria que sua caixa de mensagem estava uma
resposta dos russos, afinal a hacker tinha aceitado trabalhar para eles. “Venha ao
píer 99 no porto de Troika, quando estiver lá, envie uma mensagem e um de nós te
buscaremos”. O píer 99 era uma galpão usado como garagem para lanchas, ao
chegar lá X-9 esperaria por cerca de 10 minutos. Após esse tempo um furgão branco
iria parar de frente para ela, as portas do fundo do veículo se abririam com dois
homens saindo de dentro. Um segurava um bastão de choque na mão e o outro uma
metralhadora automática. – São ordens do chefe, garantimos que não vai se
machucar. – Um apontaria sua arma para ela, enquanto o outro atingiria sua perna
com a arma de choque, deixando-a inconsciente.

– Não foi pessoal, Yuric apenas não confia em você, trabalhou com o Montana no
evento do Canal 17, sabemos disso. – X9 escutou tais palavras ao acordar, o autor
delas era um homem sem pêlos no corpo e de pele extremamente branca, era o
braço direito de Yuric, homem conhecido por todos como Albino. A hacker estava
deitada em uma cama num quarto de luxo, não estava presa ou subjugada de
nenhuma forma. – Esse é Red, especialista em segurança virtual que Aracno nos
forneceu. – Um sujeito de pele pálida e cabelos vermelhos acenava para X-9. – Olá,
baby. – Ele tinha uma postura afeminada e um sorriso malicioso no rosto. – Ele será
seu companheiro de trabalho e também se certificará que você não envie nenhuma
informação para fora das paredes desse prédio. Bem-vinda ao Hotel Cassino
Gennadi. Seus equipamentos estão na mesa. – Albino então saiu da sala, deixando
X-9 e Red sozinhos no quarto.

1:15 AM.

O avião cargueiro russo tinha acabado de pousar na pista 21 do aeroporto de


Miraitropolis. A aeronave estava cercada por cerca de trinta homens de Yuric que
patrulhavam o local com fuzis munidos de balas de Radiack, lanças-foguetes e
outros tipos de armamentos. Além dos soldados, havia dois caminhões baús
enormes e quinze trabalhadores do porto que não tinham nenhum envolvimento
direto com a Máfia Russa, estavam ali para ganhar uma grana extra. A porta de trás
do avião descia sobre a pista, transformando-se em uma rampa que dava acesso
direto ao compartimento de cargas, que possuía 20 caixas de aço repletas de armas
e equipamentos e dois mechas modelo NaziSoviético. De dentro do compartimento
uma mulher de cabelo loiro na altura do ombro com belas curvas, vestindo um
vestido branco curto com um decote no peito aparecia. Seu nome era Margareth
Nureyev, filha única de Yuric Nureyev.
– Seu bando de viadinhos, subam logo aqui e levem essa carga para os caminhões,
tenho que voltar para Nova Moscou ainda hoje. – Com um forte sotaque russo, a
loira falava com um tom autoritário. Os trabalhadores então começaram a subir a
rampa para pegar as caixas de armamentos.

Dentro de um dos caminhões estava a dupla de replicantes ômega-9 enviados por


Kasper para reforçar o exército de Yuric. Uma mulher magra e pálida de cabelo curto
usando uma máscara de gás sobre a boca e um homem de dois metros de altura
dotado de uma massa muscular exagerada, ambos vestiam jaquetas militares
pretas. – Quero matar alguém, não ficar de escolta. – Disse o grandalhão que
passava uma sensação de ingenuidade na voz, ele era chamado pela alcunha de
Nine-6. A replicante que mais parecia uma adolescente cruzava os braços frente ao
peito. – Logo iremos, estamos numa guerra, afinal. – Ela era chamada pela alcunha
de Nine-10

Foi então que duas aeronaves surgiram no céu simplesmente do nada, isso
aconteceu devido ao seu sistema de camuflagem que tinha sido desligado. Elas
eram duas Crow-Z, duas naves de combate pretas com asas e turbinas nas
extremidades, além de ter duas metralhadoras giratórias na parte frontal. Dentro da
nave da direita havia cerca de quinze homens vestidos com armaduras táticas e
carregando M4A1 com munição de ponta de radiack e um piloto. Já na da nave da
esquerda, além dos 15 homens, também estava Gal Bordeaux e Jong, que era o
responsável por pilotá-la. Os soldados russos no chão ao avistarem a nave,
começaram a atirar sem parar, abrindo uma verdadeira rajada de fogo contra as
Crow-Z. Por sua vez, as naves da Ryulong não ficaram para trás, revidando com as
metralhadoras giratórias.

Os trabalhadores abaixaram-se atrás das caixas e dos caminhões, assustados com


o tiroteio, Margareth correu para o interior do avião para se proteger. Alguns homens
russos começaram a cair ao serem atingidos pelos disparos, entre eles
trabalhadores. Foi nesse momento que a dupla de replicantes saiu de dentro de um
dos caminhões, o grandalhão ficava na frente recebendo os tiros, que não eram
capazes de perfurar sua pele. A garota ficava logo atrás dele, usando o corpo do
parceiro como um escudo.
– Estamos segurando eles, entre e acabe com com a vadia russa Montana! – Disse
Jong através do comunicador preso ao seu ouvido. Porém, ele comemorou cedo
demais. Uma bala .50 com ponta de radiack atravessou o vidro da nave aliada,
perfurando o vidro da cabine e depois o crânio do piloto. A aeronave que não estava
com o piloto automático ligado, começou a girar e então caiu no solo do aeroporto e
explodiu com o impacto da queda. – Merda! Tem um atirador em alguma torre de
comando, vou precisar recuar. – Ele então cessou fogo e ativou a camuflagem,
voltando a falar pelo comunicador, mas dessa vez não era com os italianos e sim
com Gal. – Ladra, chegou sua vez de agir, preciso que use seu dom para ir lá em
baixo e pegar a filha do Yuric. – A porta lateral da aeronave se abriu e um dos
soldados entrou uma corda para que ela utiliza-se ao saltar. Agora tudo dependerá
da estratégia de Tony Montana no chão, pois Jong não poderia mais se expor até o
atirador ser neutralizado ou pelo menos encontrado.

Yuric sentado no seu rústico e luxuoso escritório na cobertura do seu cassino,


observava a cidade através da enorme janela de uma enorme janela de vidro. Na sua
mão esquerda ele segurava um copo de uísque, ele encarava o aglomerado de
prédios e luzes como se fosse uma obra de arte. O russo levou o copo até a boca,
dando um longo gole no líquido de cor amadeirada, depois se virou para sua mesa e
colocou o copo sobre a mesma. Levou os dedos da canhota na tela nas costas da
sua mão direita cibernética, digitava um ip de contato na pequena tela azulada e
depois ativa o recurso de mensagem de voz, aproximando levando a mão perto da
sua boca. – Galathea, sua família de mercenários vem ganhando certa notoriedade
nas ruas. Porém, creio que saiba que sozinhos não vão ter chance nesse mundo de
lobos, cedo ou tarde Miraitropolis será minha, então o que acha de juntar-se ao
vencedor? – Após enviar a mensagem para Galathea, Yuric abaixou seu braço,
voltando a contemplar a grande metrópole.

Gal Bordeaux

– Que calor do inferno, meu Deus do céu.


A loira estava em pé dando socos no aparelho de ar condicionado. Mesmo ligado,
ele não parecia funcionar direito. A asiática na televisão dava notícias e a previsão
do tempo, e não era nada animadora. Gal trajava somente calcinha e sutiã brancos,
tentando amenizar a sensação terrível. Como seu apartamento ficava todo fechado,
não tinha risco de vizinhos tarados ficarem se aproveitando, mesmo que fosse a
parte nobre da cidade.
– Não é possível que esses riquinhos não vão fazer nada a respeito... — Referia-se
aos vizinhos de All Street. Ou seria o aparelho dela que não funcionava
corretamente? Droga, já devia ter visto isso antes... Mas a temperatura era tão
imprevisível naquela cidade que acabou por não se precaver. Foi então que uma
ideia lhe surgiu: invadir algum lugar em que a refrigeração funcionaria
perfeitamente. Um dos edifícios que serviam ao centro financeiro, é claro.
Certamente eles não trabalhariam nas mesmas condições que as pessoas
miseráveis e comuns da cidade. Vestiu o uniforme e partiu para um deles. [...]
Não demorou para que invadisse um escritório. Dessa vez não foi tão esforçada, já
que seu único intento era descansar e aproveitar o ar refrigerado de alguém de
graça. Por isso, nada de habilidades meta-humanas para esta invasão, apenas as
habilidades furtivas e uns desbloqueadores eletrônicos simples. Escolheu um
escritório a esmo, próximo, conseguindo ir de escada. Terceiro andar.

Estava confortavelmente sentada em uma cadeira de rodinhas, altamente


acolchoada. Os pés sobre a mesa e os braços cruzados em cima dos seios. Os
olhos estavam fechados. Tinha passado a hora do expediente, devia ser quase 18h.

– Que vida boa, Senhorita Bordeaux.


Ela tomou um susto, quase caindo da cadeira. Pôs as mãos apressadamente sobre
a mesa, pronta para virá-la e esta servir de proteção se necessário.

– Ah, é você. Quando disse que ia me encontrar, pensei que não iria.
– Temos nossos métodos, eu trabalho.
– Já sei, já sei. O que foi dessa vez, japa?
– Antaro.
– Oi?
– Antaro. Meu nome.
– ... Ta.

– Chegou a hora. Vamos.


– Não vou. Não vi ainda a cor dos créditos.
O aparelho que lembrava um celular vibrou. Ela tirou de um dos compartimentos do
uniforme e viu. Havia um depósito gordo em uma de suas contas falsas. Que ela
nem tinha informado.

– Metade agora, metade quando tudo acabar.


– Certamente... — E assim o seguiu. O destino seria o local onde a Ryulong estava se
reunindo. Aguardariam lá até o início da missão. [...]

Horas depois, descansada, Gal estava dentro de um Crow-Z, uma das naves da
gangue que trabalhava no presente momento. Ela estava sentada em uma das
poltronas moderadamente confortáveis com o cinto amarrado ao corpo. Tinha
convicção que aquilo não acabaria bem. — Acho que eu não sou tão boa para
trabalhar em campo... WHOA!!

Expressou espanto ao ver através do vidro lateral que a nave aliada tinha sido
atingida, aparentemente, já que ela rodopiava no ar e imediatamente ia ao chão,
explodindo. — Onde fui me meter... — Falava chorosa para si mesma prevendo a
morte. Foi então que Jong cessou fogo e ativou o sistema de camuflagem. — Isso,
agora dê meia volta por favor e… Como é?! — Parou de falar sozinha quando ouviu a
voz do chefe determinando que ela sequestrasse a filha do russo. Ladra, tudo bem.
Agora sequestradora?

Concordou pesadamente, já tinha combinado. E não queria ser assassinada por não
cumprir um contrato com a Ryulong. Retirou o cinto e caminhou até onde estava um
dos capangas. Ele abriu uma porta lateral. O vento logo foi sentido, mas não forte a
ponto de puxá-la ou coisa do tipo, em razão da baixa altitude. Ela segurou a corda e
ficou invisível, ativando suas habilidades. O uniforme molecular seguia seu corpo,
então seria difícil para quem olhasse para cima avistar somente uma corda a esmo,
dada a fina espessura do objeto e a provável escuridão do céu àquela hora.

Em pouco tempo já estaria próximo do solo, e então saltaria para ele. Caminhou
ainda invisível pelo chão do aeroporto. Podia ver um mini exército apontando para o
alto esperando qualquer sinal da outra nave para disparar igualmente. Ao lado de
diversos capangas, dois chamavam atenção: uma jovem de máscara de gás e um
homenzarrão. Deviam ter habilidades especiais, assim como ela própria. Ainda bem
que sua missão não era lidar com os dois.

Continuou caminhando com passos rápidos. Não poderia correr, pois faria muito
barulho e poderia chamar atenção, mesmo estando invisível. Não seria difícil
presumir que a Margareth Nureyev estaria no avião cargueiro, já que a informação
que teve previamente era a de que ela e o carregamento de armas eram objetos de
interesse dos seus contratantes. Adentraria a comporta do avião, estando esta
aberta.

Timothy Carter
– Os Steelhearts tão ferrados, vamos simplesmente no porão que eles estão
chamando de QG e eliminá-los. – Disse Rose sentada no sofá com uma garrafa de
cerveja na mão direita. Esse era o problema dela, era uma mulher extremamente
impulsiva e de cabeça quente, não conseguia enxergar outra solução para as coisas
além da violência. Já Timothy funcionava totalmente diferente, era um homem
calculista, procurava sempre a melhor alternativa para manter-se no controle da
situação sem que tudo que conseguiu criar nos últimos meses ruísse.

– Matamos todos eles, não conseguimos nos aproximar de Tony Montana e dois
dias depois ele descobre que fomos os responsáveis pela morte dos aliados dele. –
Disse Tim, suas costas estavam escoradas no balcão da cozinha, ele deu uma
rápida tragada no cigarro que tinha entre os dedos da destra, soltou a fumaça e
voltou a falar. – Será que o Marcus consegue uma boa quantia de dinheiro ainda
hoje? – Ele já tinha um plano em mente, agora precisava apenas desenvolvê-lo. –
Claro, o coitado é dono de uma joalheria. – Marcus era um senhor de setenta anos
que perdeu sua esposa no incidente do Cemitério Neon, culpava os Steelhearts e por
isso juntou-se a causa de Timothy. – Então ligue para ele, pegue o dinheiro e contate
o Pacco. – Ao terminar a frase, finalizou o cigarro numa longa tragada, jogando o
que sobrou em cima do balcão. – Tá ok, mas o que você pretende com isso? –
Perguntou Rose antes de começar a fazer o que Tim pediu. – Vamos negociar, eles
estão acabados, qualquer negócio será bem-vindo.

Tudo estava como planejado, 100.000 em dinheiro em uma mochila preta no banco
de trás do carro ao lado de Pacco, que era um ex-militar alto e gordo, que odiava
criminosos mais que qualquer coisa, era o típico sujeito que acreditava na frase
“bandido bom é bandido morto”. No volante estava Rose como de costume, Timothy
estava no banco do carona com o braço direito repousando na janela, observando a
rua.

O carro comercial preto entrava no Distrito do Sexo, logo podia notar o grande
número de prostitutas, viciados e mendigos espalhados na sarjeta. O som de
música eletrônica mal remixada que vinha de dentro das boates de Strip Clubes
podiam ser ouvidos. Não demorou muito para que o trio chegasse na Rua H, era
uma viela que o carro quase não conseguiu entrar, era coberta por lixo e no fim dela
havia um letreiro simples que piscava o nome Sexy Day em verde. – Nesse buraco
que aquela escória vive? – Perguntou Pacco num tom rude.
– Sim, e vamos pegá-los feito ratos na ratoeira. – Rose falou, zombando da gangue
de traficantes de armas. Timothy então abriu a porta do carro e antes de sair, disse.
– Lembre-se, somos apenas um trio de fabricantes de drogas querendo comprar
armas para proteger o negócio. – Ele saiu e logo depois Pacco e Ortiz fizeram o
mesmo, seguindo o ex-escritor até a boate. Tim empurrou a porta de aço e entrou no
estabelecimento.

Sexy Day era um clube de strip de quinta, havia algumas mesas enferrujadas com
bancos iluminados por lâmpadas baratas, um sofá verde grande manchado, duas
plataformas redondas com um par de andróides sexuais dançando e um bar. No
lugar havia quatro bêbados drogados assistindo a dança das andróides e um
bartender atrás do balcão, que possuía uma estante de bebidas na parede. O trio
parou de frente para ele, que perguntou. – Vieram contratar uma das andróides para
participar de um ménage com vocês? – Rose tomou a frente, apoiando a canhota no
balcão. – Queremos negociar com a galera de baixo. – Em seguida Pacco colocou a
mochila sobre o balcão e a abriu o zíper, mostrando o dinheiro, Timothy manteve-se
dois passos atrás, só assistindo.

– Opa, vou chamá-lo. – O bartender que estava sem camisa, deixando sua prótese
enferrujada que usava no lugar do braço direito à mostra. Ele tirou uma garrafa de
tequila da estante e atrás da garrafa apertou um botão, que fez metade da parede se
abrir. Ele caminhou até a nova passagem e gritou. – Joe, tem cliente para você.

Segundos depois um homem magro vestindo uma camisa com braços, pescoço e
partes do rosto tatuadas saía da passagem secreta. Ele estava com a barba por
fazer e os cabelos negros bagunçados, as marcas de seringa no braço esquerdo
dele mostrava que ele se drogava constantemente. Ele segurava um Glock em uma
das mãos, aproxima-se do balcão com um desconfiado. – Quem são vocês e o que
querem? – Tim cerrou os punhos ao vê-lo, porém se manteve no controle, apenas
registrando através da sua memória fotográfica tudo que via. – Produzimos drogas
em pequena escala numa garagem da cidade média, sabe, precisamos de armas
para se defender. – Falou com Pacco, mostrando o dinheiro novamente.

– Fabricam heroína neon? – Perguntou, passando os dedos da canhota nas cédulas.


– Com certeza, muito boa por sinal. – Afirmou Ortiz, sorrindo de forma simpática
para Joe, que voltou a falar. – Gostei, posso arranjar para vocês nesse momento
uma caixa com quatro MP5 e umas caixas de munições explosivas. – Ao escutá-lo,
Timothy decidiu falar. – Fechado! Entregue as armas e entregamos o dinheiro. – Joe
então fazia um sinal com a cabeça para o bartender, que descia as escadas através
da passagem secreta, voltando minutos depois com a caixa de armas e duas caixas
de munições explosivas, colocando no balcão.
Pacco então entregou a mochila com o dinheiro e depois pegou o armamento,
Timothy deu dois passos até o balcão e estendeu a mão direita. – Foi bom negociar
com você, quem sabe isso não possa ser uma parceria. – Joe apertou a mão de
Tim, respondendo-o. – Tragam heroína da próxima vez, que garanto que essa
parceria pode acontecer. – Ele sorriu após responder, Tim apenas fez um sinal
positivo com a cabeça. O trio então voltou para o carro, guardando as caixas no
porta malas do veículo e saindo da Rua H logo depois. – Da próxima vez que
viermos aqui, esse lugar de merda vai virar uma fogueira de Steelhearts. – Timothy
falou, colocando um cigarro na boca e acendendo logo depois.

Gabriela vulgo Rodrigo

Que molequinho desgraçado. Ele devia ser menor do que eu na minha forma
verdadeira. Mas com uma arma... Os homens ficam grandes, como dizem. Como
não tinha muito o que fazer, arrumei minha mala. Não tinha muita coisa, já que meu
corpo podia formar vestes. Mas ainda tinha algumas coisas para usar,
principalmente enquanto dormia, já que eu ficava desconcentrado. Ouvi passos pelo
corredor. Algumas putas saíam de seus quartos, pareciam se dirigir para outro lugar.
Infelizmente elas, assim como eu, não teriam esse outro lugar. O outro lugar era a
rua, tão perigosa ou mais do que o edifício onde nos encontrávamos.

Ouvi outros passos, mais pesados. Ordens também, como “saiam do caminho,
vadias”, “pra onde estão indo, putas sujas?”. A voz, infelizmente, não era difícil de
reconhecer. Era do bastardinho do Pietro. Ainda na forma feminina de latina, notei
sua chegada. Ele cruzou os braços à frente do rosto, querendo mostrar
superioridade. Olhei para ele e continuei terminando de fazer a mala.

– Vai tentar fugir? Eu pensava que você não era burra. Ou burro. Não sei como falar
com esse tipo de gente.

– Por enquanto, não. O que você quer?

– O chefe quer falar com você, no escritório dele.

– Porra! Cê disse que não contaria se eu encontrasse o desgraçado do irmão dele.

– Agora é tarde. Mas é pra isso mesmo que vai na missão. Tem um carinha que vai
contigo, acho que é do seu tipo.
– Se manda. Já vou até lá.

O outro riu e saiu sem maiores problemas. Talvez eu não o matasse quando tivesse
chance. Talvez só quisesse ascender ao poder como quase todo mundo desse
maldito lugar. Então, com a roupa do corpo que estava, uma blusa tomara que caia
verde neon e uma saia preta, além dos saltos, me dirigi à sala. Pascal estava me
esperando ali. Sentei na cadeira à frente da mesa do seu escritório, e possivelmente
veria o homem que ele anunciava ao meu lado, chamado Coyote. Logo de início ele
disse que sabia quem eu era e que eu não precisava me preocupar.

A proposta tinha sido muito melhor do que a ameaça anterior. Pelo menos ele não
lutaria apenas para ser mantido vivo, ainda levaria uma grana com isso. Não tinha
motivo para recusar.

– Muito bem, então. – Mudei rapidamente a minha forma, passando a exibir a pele
um pouco mais clara, cabelos curtos e barba aparada. A roupa se transformou numa
calça jeans e blusa branca, além de tênis pretos. — Pode me chamar de Rodrigo.
Bem, pelo que entendi, tu quer que a gente investigue o lugar? Suspeita que aquele
desg…

– O senhor Crazy Dog esteja lá, ou alguém tenha informações? Acho que é possível.
Mas vou precisar de algum equipamento.

Caso não houvesse mais nada a tratar ali, eu me retiraria. Falaria com Pietro para ele
me dar alguma arma e algum transporte. Seria uma pistola de radiack e uma moto
relativamente moderna. Já no que seria o estacionamento do lugar, subiria no
veículo e o ligaria. Se Frank estivesse por perto e não tivesse um transporte, ou não
um apropriado, eu iria provocá-lo.

– Ei, seja um bom coiote e suba aqui na garupa. Eu te levo. – Percebi pelo jeitão dele
que era do tipo que não curtia esses comentários, conforme teria mostrado
instantes atrás. Por isso implicaria com ele, e logo após colocando o óculos roxo e
seguindo, tendo ele me acompanhado naquele momento ou não.

[...]

Não demorou para que chegasse ao Centro, onde se encontrava a mesquita. Mas eu
não parei perto, é claro, e sim num beco a umas duas ou três quadras de distância.
Podia ver de onde estava a movimentação de muçulmanos saindo e entrando da
mesquita, devidamente caracterizados como mandava sua religião. Não era segredo
que meu próximo passo seria ficar assim como eles. Preferi adotar a forma feminina
novamente, pois a burca encobre todo o corpo, e assim seria mais difícil de ser
identificado.

– Não consigo disfarçar os outros, só a mim mesmo. Terá que dar um jeito para
entrar. Ou ficar aqui de retaguarda. – Falei brevemente, mas antes entregaria um
comunicador auricular para ele, se este estivesse me acompanhado e quisesse
aceitar. – Assim saberemos se o outro precisa de ajuda. – Prossegui para a
mesquita, então. Ali dentro, repetira a ação dos demais religiosos, curvando-me e
repetindo os sons que eles emitiam, o que não era difícil para mim.

– Allaabu Akbar... – Fingiria total concentração, mas estava atento caso ouvisse
alguém. Esperava o melhor momento para investigar a mesquita.

Frank Coyote
Farejar uma oportunidade era uma dentre as várias características que concediam
ao homem o apelido de Coyote. Não errou em seu julgamento ao dizer para Nicolle
momentos antes que Pascal precisaria de ajuda para se vingar do que havia
acontecido em sua boate, pois mal chegou na Vênus e já era introduzido na reunião
com os capangas do dono, ouvindo tudo o que ele tinha para dizer. Ao ver a
indignação do homem pela falta de informações decentes sobre o inimigo, Frank se
amaldiçoou em silêncio por não ter ido atrás de algo que fosse de valia na
negociação de seus serviços. Não pensou na possibilidade de agir antes da certeza
do pagamento, ganancioso como era.

– Claro, chefia. – Respondeu ao chamado do nome junto de uma mulher de nome


Gabriela que não conhecia, entretanto pelo ambiente e aparência da acompanhante,
deduziu ser uma das garotas da casa. Não entendeu muito bem o motivo dela
também ter sido convocada, todavia ficou em silêncio. Afinal era melhor não
contrariar Pascal puto daquele jeito.

A Vênus era como uma segunda casa para Frank, passava grande parte do seu
tempo livre na boate aproveitando tudo o que ela tinha para oferecer. No entanto, era
a primeira vez que chegava tão longe nos cômodos mais privados de Pascal e sua
máfia. Não tinha quaisquer interesses de se envolver com tráfico ou prostituição a
não ser como consumidor de primeira, então sempre ignorou totalmente o que
rolava nos bastidores da boate. Até aquele momento. Assim que passou pela porta,
lançou um olhar sobre os aposentos do chefe da máfia, observando os detalhes e o
ambiente. Muito digno, pensou, deixando que Pascal falasse o motivo de ambos
terem sido chamados até ali.
– Pagando bem, apenas me dê os alvos e eu garantirei que eles não sejam mais um
problema. – Respondeu para Pascal antes que soubesse que sua missão daquela
vez seria totalmente diferente do que estava habituado a fazer: Era obrigado a
proteger Gabriela enquanto ela se infiltrava entre os inimigos. Matar todo mundo
seria tão mais fácil, mas quem discute com Pascal? Ninguém que preze pela própria
vida. Se não bastasse a revelação da missão problemática, observou incrédulo a
mulher se transformar em um homem diante de seus olhos! A gostosa havia virado
a merda de um homem!

– Cacete, que porra é essa? – Não conseguiu deixar de exclamar, surpreso com a
revelação de que a tal “Gabriela” era um transmorfo. Um transmorfo peludo
chamado Rodrigo! Tentou manter a indignação sob controle ao ouvir o fim das
explicações da missão. A mesquita do tráfico de armas? Já ouviu falar, mas nunca
teve interesse em comprar dos muçulmanos quando tinha tudo mais fácil na área
dos latinos. Se infiltrar ia ser um problema, não estava habituado ao estilo. Contudo
foi só ouvir sobre o pagamento aumentar relativo às informações que conseguisse
que já se conformou em ao menos fazer uma tentativa.

– Pode deixar, Pascal. Aquele desgraçado do Turco tá com os dias contados. –


Conhecia o homem como qualquer pessoa mais envolvida com aquele meio
também conheceria. O fato era que o nome Turco significava problema e se fossem
pegos acabariam bem ferrados. Sem dirigir qualquer palavra para Rodrigo, acenou
para Pascal e se retirou.

[...]

– Rodrigo, não é? Deixa eu te falar um negócio, parceiro. – Frank se aproximou do


homem assim que era convidado a se juntar a ele na garupa da moto. Parou bem
próximo, erguendo a camisa, revelando o “tanquinho” cheio de cicatriz e a arma na
qual colocou uma das mãos sobre o cabo, pronto para sacar. – Eu não sei que tipo
de perversão tu curte, mas é bom que saiba que eu não tô afim de ser sacaneado.
Não dou a mínima para quantos caras já enganou com essas transformações,
felizmente só costumo sair com uma puta da Vênus e não é você. Acho bom que
comece a parar com essas gracinhas do contrário talvez só um de nós volte dessa
missão. – Finalizou deixando que ele ligasse a moto e partisse na frente para só
então seguir até seu Mustang GT250 com melhorias cibernéticas. Ligou o motor
saindo acelerado até a região da mesquita, sem perder Rodrigo em sua moto de
vista. Não conseguiu deixar de se perguntar pelo caminho o quanto Pascal ficaria
puto se atropelasse o transmorfo antes de finalizarem a missão.

Parou próximo da moto no beco afastado, descendo para se encontrar com o outro
e planejarem como proceder. O plano era bom, a habilidade que Rodrigo possuía era
deveras conveniente para o que pretendiam fazer (apesar de Frank ter outra opinião
quanto às outras finalidades para qual usava a habilidade na Vênus).

– Não vou conseguir te proteger dessa distância, gênio. Espera aqui. – Disse para o
outro (que agora era novamente ela, difícil acompanhar) antes que este entregasse o
aparelho auricular de modo que conseguissem se comunicar. Virou uma das
esquinas da saída do beco, tentando não chamar atenção e entrou em uma loja de
roupas. Pegou rapidamente qualquer coisa de seu tamanho e dentro do que julgou
ser os padrões de vestimenta daquele mundo islâmico. Levou tudo ao caixa onde
um cara o observava desconfiado.

– Quê foi? É proibido se converter? – Vociferou para o atendente jogando a quantia


em dinheiro necessária para comprar as vestes, retornando até Rodrigo.

Ali mesmo no beco arrancou toda roupa que usava para colocar a que comprou,
sem qualquer pudor. Não era como se Rodrigo nunca tivesse visto um homem
pelado em sua vida, não é mesmo? Pegou então o aparelho oferecido pelo “parceiro”
e colocou no canal auditivo, enquanto também arrumava a arma em um cinto oculto
pela nova vestimenta. Ao contrário do outro, não foi de encontro ao ritual religioso
em andamento onde todos se curvaram e falavam algo em uma língua que Frank
não entendia. Optou por perambular pela mesquita, atento em manter Rodrigo em
seu campo de visão e em busca de qualquer oportunidade para ouvir uma conversa
ou outra.

Galathea

A luz do teto balançava ligeiramente enquanto os dedos afilados giravam o copo


whisky aguado sobre a mesa.

– Você já aceitou, Gal. Não há porque se preocupar tanto agora.

– Deixai fazer, deixai ir, deixai passar? – Perguntou Galathea após um sorriso cético.

– Exatamente.

Shae pegou a garrafa e levou a mesma até os lábios, ingerindo quase meio litro da
bebida em grandes goles. Bateu a garrafa contra a mesa como se para acordar
Galathea que ainda se encontrava absorta em seus pensamentos. Funcionou já que
o clube estava silencioso agora, sem clientes. A mesa estremeceu e quase derrubou
o copo dela. A morena o olhou erguendo uma das sobrancelhas.
– Eu estou aliviado. Você não está? Me sinto finalmente um cão fora da coleira… A
tensão se foi, agora podemos ser predadores, matar ou morrer sem pudor. Eu estou.
– Se repetiu. – Bem aliviado.

– Tô vendo o alívio. Yuric não sabe que nós aliamos a Tony. Na verdade ninguém
sabe. Além de nós dois e o capanga dele. E se operarmos direito ninguém saberá.
Normalmente aceitaremos apenas “contrato” para um objetivo específico.

– O que é só pra tirar o nosso da reta.

– Sim… Afinal concluiremos nosso objetivo e depois estaríamos à disposição de


quem quer que pagasse mais. Mesmo sendo oposição.

– Tudo bem então. Ninguém sabe. Estamos apenas cumprindo contrato para
alguém. E se alguém vier atrás de nós sabemos de quem cobrar.

– Tony Montana.

– Tony Montana. O que ele quer com o aeroporto?

– Suporte. Perguntei se ele queria que eu tomasse controle da operação ou fosse a


cabeça do assalto…

– Ho ho! Eu adoraria isso. Acertar aqueles merdas com uma tropa de choque bem
coordenada…

– Você precisa encontrar uma grama de amor próprio aí dentro desse corpanzil.

Shae sorriu e deu de ombros.

– O que eu posso fazer? Matar é o único prazer que aprecio mais do que foder.

– Suas parceiras foram todas tão ruins assim? – Galathea bebeu o whisky. – Tá na
hora. Vou pro aeroporto. Disperse os homens por precaução e feche o clube.

E assim foi feito. O sinal néon púrpuro “Basement” que era sinônimo de música
absurdamente alta, ambiente escuro, iluminação e escadarias para o céu estava
agora fechado e desligado.

Os homens da Uroboros, em sua maioria veteranos descartados por Mirai após


deixarem de serem úteis como bucha de canhão, agora se dividem em pares ou
trios. Se espalhando pela cidade em seus veículos e habitações pessoais onde
esperariam até serem requisitados novamente. Exceto os 9 escolhidos por Galathea
para a operação.

– A merda tá rolando lá embaixo, chefe.

– Yeap!

Galathea observava a ação no aeroporto através de binóculos. Os homens estavam


alinhados ao longo das janelas escuras semi-abertas do apartamento. Seis com
rifles anti-pessoal semi-automáticos e os outros três com rifles anti-material. O
apartamento de família simples tinha uma ou outra cadeira derrubada no chão,
assim como uma mesa. Sobre o tapete no centro da sala estava um homem com
hematomas no rosto amarrado e amordaçado junto de sua esposa.

As luzes estavam todas apagadas enquanto os homens tinham suas armas


achando a cada segundo um novo alvo de interesse. Profissionais, tinham seus
rifles posicionados a cerca de um metro das janelas, de forma a permitir mais de um
atirar pela mesma abertura. Sentaram-se em cadeiras ao contrário, apoiando a arma
sobre o encosto.

– Permissão? O pau já está quebrando lá embaixo. – Pediu um dos homens sem


remover o olho da mira luneta.

– Não… – Respondeu Galathea de pé ainda olhando como binóculo. Alternando


entre visão simples, infravermelha e eletromagnética. – Vamos aguardar e torcer
para que não precisem da nossa ajuda. Pera…. Acabei de ser informada que existe
um atirador inimigo por perto. Quem tiver anti-pessoal comece a procurar…. Eu não
tô gostando disso.

– Por quê, chefe? Mal pressentimento?

– Sei lá… Por mim devíamos ter derrubado esse avião antes de tocar o chão. E Tony
tá jogando os homens dele no moedor de carne de acordo com os planos de
outrem… São só… Devaneios de uma velha. Concentre-se no seu trabalho e achem o
atirador. Os outros, se certifiquem de sempre terem um alvo importante na mira. E
seus alvos são-

– Veículos, mechas, aeronaves, drones e equipamentos em geral. - Ecoaram os


homens de forma exasperada cansados de ouvir o sermão de que rifle anti-matéria
não era pra matar gente. Embora fosse incrível ver um ser humano ser despedaçado
por um projétil daquele tamanho.
– Muito bem, muito bem…

Cris Falcon
O recado era simples e direto: "Não consigo contatar o Pascal". Isso significava que
Chris Falcon teria que se deslocar pessoalmente até o vespeiro e contatar a rainha.
Por sorte, a ordem de serviço havia sido encriptada. Depois do serviço de
decriptação, era só jogar o holotech no incinerador. Nada de backups ou serviços de
hospedagem online, já que sua amiga brasileira era "tech savvy" o suficiente para
destruir todo e qualquer bit de informação que poderia vir a ser escondido em
alguma sexbot de quinta categoria.

E foi o que fez. Pegou aquele holotech de uns cinco anos atrás, daqueles que se
olhar torto, começa a soltar faíscas, e assim que ouviu a mensagem, tratou de jogar
em um incinerador. Dizem que não se consegue extrair informação de cinzas, e
sabia que não haveriam pessoas estúpidas o suficiente a ponto de se tornarem
churrasco por causa de uma ordem de serviço. Assim que teve a certeza de que
aquele aparelho nada mais era do que um monte de lixo sem utilidade nenhuma,
tratou de colocar as suas katanas numa espécie de coldre que tinha improvisado.

Por mais que a tecnologia, a pólvora e o placebo andassem juntos, certas coisas
não mudavam. Dizem que o Bushido morreu na batalha de Shiroyama, mas para ele,
que parecia mais um avatar de game de realidade virtual, era a melhor coisa que o
mantinha longe de se entupir de drogas ou terminar a vida sendo apenas um reles
assalariado.

Depois de ter a certeza de que estava sozinho e seguro naquele local, digitou
algumas coordenadas no computador de bordo de sua moto.

A inteligência artificial de bordo fez os cálculos da rota mais rápida e mais segura
possível, levando em consideração congestionamentos e risco de ter o software
interceptado por hackers. Ser furtivo e discreto era essencial durante o trajeto, e o
sistema de camuflagem fez com que a super máquina passasse despercebida,
invisível aos olhos de qualquer um.

Finalmente, depois de uma corrida um tanto quanto suntuosa, parou na entrada da


boate Venus. Tirou o capacete, amarrou os seus longos cabelos negros num coque
formando um rabo de cavalo. O que pareceu dar um charme a mais, visto que
conforme caminhava, algumas prostitutas viravam o rosto em sua direção,
impressionadas com a imponência e presença de espírito que pareciam se unir às
cicatrizes no corpo, sempre contrastando com a sua aparência andrógina.

Mostrando-se indiferente ao fato de que as garotas de programa de luxo o achavam


bem sexy, deu os primeiros passos dentro da boate…

X9
A cidade é extremamente filha da puta, você sai de uma cilada só pra cair em outra.
Sinto cheiro de morte, mas não o odor comum que os cadáveres exalam na
decomposição, o cheiro era da morte personificada. Se meter com os russos é
perigoso, minha aposta é alta, a vida.... Isso é sinônimo de coragem ou
imprudência? Se eu pensar nas impossibilidades de vitória fico paralisada. Oh, a
noite fica cada vez melhor… Tudo parecia se encaixar perfeitamente... Eu estava ali
para me vingar de Boris, mas também passar informações aos italianos, além de
que Tony me pediu para salvar seu amigo, o detetive Caz. E agora descubro que
esse povo tem ligação com o Aracno de Henry Choi... Mas Red quer ver se dou
conta, se me acovardo. Faço justamente o inverso. Ainda grogue, em cima da cama,
eu me revirava com dores, para poder falar com Red.

– É verdade que trabalhei para o Montana no passado, mas você deve entender, foi
pelo dinheiro, ele pagava bem, pude até tirar umas boas férias. – Parecia calma, mas
por dentro estava uma pilha de nervos.

– Mas voltar a trabalhar com aquele carcamano quando o que está em jogo é a
honra nacionalista? Pfff... Eu não trairia a Mãe Rússia, sabe, sou russa. – Ele não
precisava saber que sou na verdade meio russa, e menos ainda que a outra metade
era latina. Se eu não falasse não teria como saber, não existem registros sobre
minha ascendência.

Red não disse nada, apenas sorriu de canto, sentado em uma cadeira de madeira no
fundo do quarto, perto da porta. Ok, talvez o correto fosse não falar demais, ou
acabaria entregando o jogo. Tudo estava claro e brilhante com um milhão de luzes
coloridas cintilando ao redor da minha cabeça que doía demais, a perna que foi
acertada pelo choque nem se fala então. Minha última refeição não conseguia parar
no estômago e eu acabava colocando-a pra fora. Azar do Red, que precisou limpar o
chão. Nem tentei retrucar ou tentar convencer ele de que precisava descansar do
pós operatório, apenas me virei para o lado e fechei os olhos. Assim eu voltava
cerca de duas horas atrás, na clínica de Igor, repassando no sonho tudo que havia
me acontecido.
– A anestesia está pronta. – Dizia o rapaz alto e magro, era do tipo bem comum que
falava sem olhar nos olhos, pois estava sempre conferindo a planilha
holograficamente verde flutuando à sua frente.

A clínica não tinha nome, se tinha, fora apagado pelo letreiro de neon morto da
fachada, as paredes de azulejo eram para ser assépticas, brancas, em vez disso
possuíam um tom encardido. Tubulações velhas cortavam o espaço disputando
atenção com os painéis digitais verdes suspensos no alto que mostravam o tipo de
operação e o valor.

Transplante de baço............. C$$ 5.523,99

Remoção de Estilhaços............ C$$ 1.222.45

Curativos e suturas............... C$$ 89,99

Cybertropina ............ C$$ 847,120,50

Transplante de fígado.............. C$$ 10,425,00

Próteses cibernéticas ................ C$$ 4,789,90

Implantes neurais ..................... C$$ 5,450,50

Implantes cibernéticos ............... C$$ 4,00,00

Sem fazer qualquer tipo de exame ou perguntas a qual responderiam se eu estaria


apta ou não a entrar em processo cirúrgico, Igor se aproximava da cadeira onde eu
estava inclinada. A enfermeira lhe alcançava a bandeja com os aparelhos cirúrgicos
bizarros, que mais pareciam aparelhos de barbear, saca rolhas, tesouras e serras… A
aparência e higiene estavam longe de ser das melhores. Trapos sujos como
esparadrapos e sangue nos bisturis embrulhou meu estômago. Se ele era um dos
melhores... Imagine os piores do ramo... Com monitores escuros na cabeceira olhei
deitada para cima e tubos de metal caíram do teto, formando um aglomerado
confuso de aparelhos, engrenagens, válvulas e fios. Algumas partes hidráulicas se
moviam acima da cabeça, parecendo-me analisar, e gráficos subiam e desciam de
lâminas de vidro eletrônicas nas laterais da cadeira. Uma máscara de plástico
incolor cobriu o rosto do nariz até o queixo, era uma máscara de oxigênio, porém
liberava um gás inodoro que aos poucos fazia as pálpebras pesarem. Assim fui me
acalmando e adormecendo, mas não totalmente, quando senti a picada no braço e o
líquido laranja vivo entrando nas veias como fogo, encontrando as ramificações
nervosas, dando a sensação agoniante de algo acima da dor suportável, passei a me
debater na cadeira, assustada, ainda conseguia ouvir as vozes de Igor e a
enfermeira.

– Fique quieta. Não se mova!

– Doutor, já era para ela estar dormindo!

– Aumente a dose do inibidor de endorfina!

– Mas já aumentei, a dose é capaz de pôr pra dormir uma multidão!

Em pânico, estava sedada demais para me levantar e acordada demais para não
sentir qualquer coisa que tenha recebido o nome de dor. Tentava avisar que estava
desistindo da operação, mas dizia só dentro da minha mente, uma vez que os lábios
não emitiam nada além de murmúrios. A enfermeira pegava meu braço direito
apontando a agulha para o mesmo, tentando sem sorte acertar a veia. Mais de cinco
picadas perfuraram o antebraço em locais errados, brotando gotículas de sangue na
pele alva.

– Não se mexa, caralho! Eu preciso encontrar sua veia! – E era o que tentava fazer,
sem sucesso.

A enfermeira estava quase por completa em cima da cadeira onde eu me


encontrava, dois médicos seguravam cada um dos braços e outros dois cada um as
pernas evitando que me debatesse mais. Vi de canto de olho a seringa de plástico
flexível da enfermeira e agora com sucesso ela achava a veia. Depois disso… Não vi
mais nada além de escuridão fria e solitária da inconsciência.

A clínica fedia a gasolina, lixo azedo e suor, odores que invadem as narinas quando
o vento bate na minha cara. Todos cheiros mortos, os aromas que me fizeram
acordar. Pela primeira vez desde que coloquei estes implantes cibernéticos eu
sentia ter controle dos movimentos, o poder ao meu comando. O fio já estava ligado
à lateral esquerda da cabeça, e a região do cabelo raspada para que a incisão
tivesse sido feita. O fio seguia extenso até o bracelete com teclado no meu braço
esquerdo. Acionei o botão para ligar, a adrenalina percorria o corpo, alimentava
minha determinação, algo que eu não senti das outras vezes que ligava um
computador, é eu talvez possa gostar disso realmente.

– A operação foi bem sucedida, X-9, como pode ver, não possuo os melhores
equipamentos… Mas possuo a melhor técnica. Fiz tudo exatamente como me pediu.
Agora você tem uma cpu dentro da sua cabeça. Não foi fácil. Você precisa ficar
cinco dias sem usá-lo até seu corpo se habituar.

– Cinco dias? Rs, ok. Vou lembrar dessa recomendação. – Me ergui da cadeira,
cumprimentando Igor e fazendo o pagamento em Créditos vivos. Depois PeeBoy me
tirou dali, me levou até as docas do porto em Troika. Contrariando todas ordens
médicas e o resto vocês já sabem. Choque na perna, inconsciência e toda
filhadaputagem russa possível. Acordei me debatendo, segurando a perna e
sentindo a corrente elétrica passar pela musculatura e trucidar a fibra do tecido. Red
ainda estava na mesma cadeira, na mesma posição no mesmo canto do quarto,
rindo. O imbecil passou duas horas inteiras ali, sem piscar, que babaca esquisitão.

– Onde é o banheiro? – Ele apontou para um corredor à direita.

Parada na frente do espelho, aquela falha capilar na lateral me incomodava, eu sabia


que era para o conector craniano, uma coisa necessária, mas me deixava inquieta. E
estava calor, muito mesmo, a previsão do tempo dizia que faria mais de 38 graus.
Com uma tesoura me desfiz dos longos fios lilás. Agora eles davam lugar a um corte
curto e repicado da mesma cor. Não seria a primeira mudança do dia, não é mesmo?
Removi o bracelete e os fios da minha cabeça e tirei a roupa entrando no box para
tomar outro banho. Quando sai do banheiro vestindo um colete de couro e uma
camiseta regata preta por baixo, Red arregalou os olhos.

– O que você fez com seu cabelo? – Sempre num tom debochado que me irritava.

– O calor me obrigou a tomar medidas extremas. Olha só o que achei, estava


procurando alguns analgésicos na farmácia do banheiro e encontrei isso. – Mostrei
a ele um pacotinho de plástico transparente com o haxixe verde fluorescente. –
Bora fumar um? – Red topou, animado, degenerados sempre topam se drogar. Em
um tubo de ferro que achei na cozinha fiz uma narguile improvisada e dei início a
festa. Já que íamos passar boa parte dos próximos dias juntos, porque não começar
uma amizade? Aquele quarto seria base das nossas operações, ficava claro pelos
monitores e equipamentos de informática à nossa volta com telas girando algum
tipo de logotipo. Mesas com botões, luzes e uma quantidade enorme de aparelhos.
Puxei duas cadeiras, uma para mim e outra para Red e acendi o bagulho, começando
a fumar.

– Quando vi isso me perguntei, quem guarda haxixe com radiack no banheiro? Mas
não reclamo. Essa é da boa! – Exalei a fumaça pela boca, rindo e me embalando, já
chapada na primeira, o troço era forte.
Você sabe, sobre efeito de drogas as pessoas se tornam mais legais, suaves e
sociáveis, foi assim com Red, e dessa forma formamos o início de uma amizade, ou
ao menos o que ele podia considerar como uma, entendendo que se vamos ter de
aturar um a cara do outro daqui pra frente, que fosse dessa maneira cordial. Soquei
tanto haxixe nele que a bichinha russa não aguentou e apagou. Não que eu não
tenha ficado alegre também, mas me favoreceu, fato que em meu organismo a
droga fazia um efeito menor devido a “resistência” que possuo. Deixei ele na cama e
voltei a acoplar o bracelete, vestindo o objeto como uma luva e acoplando os fios na
cabeça. Saí do quarto e fui caminhar, a cabeça estava pesada e precisava tomar ar.
Fui à sacada do prédio para poder respirar e aliviar a chapadeira. Mas fiz isso mais
porque o quarto poderia ter escutas, câmeras e bem provavelmente tinha. E de
alguma forma também eles estavam, acho eu, monitorando todas minhas atividades
virtuais, portanto a sacada seria um "ponto cego". De qualquer forma me certifiquei
antes de não estar sendo seguida ou observada. Certo. Se eu não pudesse mandar
mensagem ou mesmo um áudio para Tony e PeeBoy o que eu faria?

Simples, o gesto não chamaria atenção, uma vez que era só passar a mão sobre o
teclado e acionar um único o botão rapidamente, o de criação de link, o bracelete
tinha mais de 300 horas livre para transmitir tudo o que acontecia à minha volta
como um viva voz antigo, e melhor, não ficaria gravado na memória do aparelho se
levantasse suspeitas. O lado negativo era que não ia dar para falar diretamente com
Tony ou PeeBoy, e nem eles comigo. Mas já quebrava o galho. A operação de
caguetar os russos para os italianos começava ali.

Anthony Montana
Oito horas horas antes

PeeBoy e Jesse circulavam pelas ruas úmidas de Miraitropolis “recrutando” mais


soldados, conforme passavam por uma rua em um determinado ponto da cidade,
uma moto dividia o lado oposto da pista. Eles não ligaram, provavelmente era
apenas mais um membro dessas gangues de motoqueiros bêbados, no entanto,
este parecia ter vindo exatamente da direção de onde estava a mulher que eles
procuravam. Jesse estacionou o carro vermelho no meio fio e PeeBoy abriu a porta
saindo logo em seguida.

– Senhorita Galathea, estamos aqui em nome de Tony Montana. Podemos


conversar? – Ele riscava um fósforo no casaco de couro preto e acendia o cigarro na
boca.
– A guerra já começou, e uma guerra grande. As ruas vão ficar manchadas de
vermelho, e é sábio escolher o lado vencedor. Obviamente o Senhor Montana possui
o lado mais forte e poderosos aliados. Muitas gangues estão inclusive se juntando
ao convite dele. Yuric não tem a menor possibilidade de vitória. – Enquanto falava,
PeeBoy tragava o cigarro.

– Mas diferente dos demais, temos uma visão além das estatísticas. Montana não
quer só manter seu domínio, ele quer evitar algo bem maior… Se Yuric conseguir o
que quer, e ficar no comando da cidade, a ParaMiltech vai intervir e prendê-lo. Se
prender um cidadão russo a nação NaziSóvietica terá o motivo ideal para agir… E é aí
que as coisas ficam piores… – Terminava o cigarro rápido, jogando a bituca no
chão.

– A guerra fria tem que continuar fria. Não é bom para os negócios de ninguém uma
disputa global. Pessoas vão morrer, elas morrem todos os dias, mas estamos
falando de muitas, e sem pessoas você não tem clientes. Sem clientes, sem
dinheiro… Você até pode não estar inclinada a aceitar a proposta, mas tem que
admitir que estou certo. – Ele se encostou na lateral do capô do carro, cruzando os
braços.

– Tudo bem, ninguém trabalha de graça, não se trata apenas de manter os negócios
mas também de expandi-los… Tony quer dividir 50% do que conquistar com vocês, é
uma oferta generosa. E também cederá o bairro do Distrito do Sexo a vocês,
poderão administrar e ficarem com todos os lucros. Prostituição, vendas de drogas,
suborno policial, estelionato… Vendas de órgãos, as clínicas de implantes
cibernéticos também podem ficar com vocês… Enfim… Tudo que rola lá, sem dividir
com ninguém. E antes que se pergunte, sim, Tony comanda aquela região. Pense
Galathea, converse com seus amigos e quando tiver uma resposta, me avise. –
PeeBoy jogou a mulher uma pulseira comunicadora com a discagem direta ao meu
escritório.

Quatro horas atrás

Eu não tinha informações de Caz, não sabia nem se ainda estava vivo, e era o que
mais me deixava nervoso, tenso e distraído. Para piorar, um tal de Timothy parecia
comer pelas beiradas. Como um chacal esperava apenas o pior acontecer para
devorar as carcaças caídas. Até aí tudo bem, desde que a carcaça não fosse a
minha. Depois do episódio de surto, prometi a mim mesmo não repetir a cena e
chamei alguns empregados para organizar tudo novamente, por meu escritório
como era antes, deixar como um brinco. Todavia os negócios nunca param e
precisei receber Pollux ainda durante aquele processo.
– Não repare na bagunça, aconteceram algumas coisas por aqui... E não precisa ser
tão formal, filho, a menos que esteja tentando descontrair. – Falei ao jornalista,
oferecendo uma generosa dose de uísque com gelo, para espantar o calor. Por um
tempo ponderei sentado na cadeira, debruçando os cotovelos acima da mesma,
olhando aquele rosto feio de Timothy, não sabia se estava preocupado ou eram as
malditas doses cavalares do remédio que Jesse e PeeBoy me deram.

– Nunca vi mais gordo, não sei quem é esse filho da puta com cara de boqueteiro
aidético. Mas é bom nunca subestimar as pessoas por mais desconhecidas que
sejam. Quero que você descubra mais sobre esse sujeito, se mostre interessado e
comovido a sua causa. Se infiltre aos seus semelhantes, provavelmente ele não
trabalha sozinho, sempre tem os baba ovo na volta de vermes assim. – Puxei uma
9mm da cintura e coloquei a cima da mesa. – Você andou bastante com os
Steelhearts, o suficiente para saber como usar uma dessas não é? – Depois
coloquei dois carregadores de munição no mesmo lugar. – É para a sua segurança,
só use se necessário, sei que sua especialidade é espionar.

Me ergui da cadeira, caminhando até a janela com persianas, as mesmas faziam um


jogo de sombra e luzes no escritório. Com as mãos para trás do corpo, olhando para
a janela e de costas para Pollux, voltei a comentar;

– Estou também preocupado com Joe, ele não atendeu ao meu chamado. Se você
disse que Timothy parece guardar rancor dos Steelhearts pela morte da família, Joe
será o primeiro alvo, e como a gangue está enfraquecida depois da morte de Liam...
Se já não estiver morto... Joe tem muita sorte... Enfim, depois de falar com Carter,
seria bom se você o encontrasse antes que o viado o faça. Avise que dou segurança,
e que tenho um a ele serviço se assim desejar. – Esperei o jornalista se retirar da
minha sala e dispensei o restante dos empregados que organizavam o escritório.
Assim que saíram, apertando um botão vermelho abaixo da mesa,a parede lateral
das estantes de livros se afastou, revelando uma passagem. Era meu quarto, entrei
nele e ao centro estando uma cama king size Akane se encontrava deitada, nua,
dormindo de bruços. Me sentei ao seu lado e passei a beijar seus ombros e suas
costas. Meus lábios percorriam cada centímetro da pele dela. Ela acordou e virou,
deixando cair o lençol branco que cobria os seios. Sem dizer nada, um entendeu o
que o outro queria. Na próxima uma hora e meia nos dedicamos a dar prazer um ao
outro. Ao término, enquanto recuperamos o fôlego compartilhei de meu outro
desejo.

– Quero que vá ao aeroporto com PeeBoy e Jesse. Não se arrisque, eu paguei um


bocado de gente para isso, não quero que fique machucada. Apenas que você
capture a vagabunda da filha de Yuric. Vou usar a puta como moeda de troca. O
putinho vai devolver Caz ou entregarei só os pedaços da piranha pelo correio. Para o
bem dela, espero que meu amigo ainda esteja vivo… Você faria isso por mim? –
Perguntei a Akane, abraçado a ela na cama, dividindo um beijo. Quando dispensava
os empregados e sumia do escritório, meus "funcionários" já sabiam que eu não
queria ser incomodado por ninguém, e mesmo se algum desavisado tentasse,
pagaria com a vida depois. Durante as próximas duas horas ficaria concentrado
dando muito prazer a minha assassina de cabelos cor de sangue.

Duas horas antes

O carro vermelho voltava ao centro de Miraitropolis, exatamente no prédio Olimpo,


gerência de todos meus assuntos. A dupla entrava na sala ampla, os empregados
haviam arrumado a sala exatamente como era antes, nem parecendo que o
ambiente tinha sofrido com o surto de raiva. Me encontrava sentado atrás da mesa
de mogno clonado. Jesse se aproximou.

– Senhor. A hacker se operou e o procedimento não teve nenhum efeito colateral, ela
já se encontra com os russos e assim que puder manterá contato conosco. A
Doutora Vangelis também aceitou cooperar como suporte médico. Herrera e Coronel
já se juntaram a nós e estão lá embaixo. Apenas Joe ainda não deu a resposta.

– E Galateha? – Saindo do meu devaneio, dirigi meu olhar ao deles.

– Galathea responderá em breve. Mas creio que tenha ficado interessada pela
proposta e tenho certeza de que aceitará se aliar a nós. Deixei com ela uma pulseira
comunicadora com link diretamente direcionada a minha, saberei o que ela tem a
dizer e contato ao senhor. – Respondeu PeeBoy.

– Certo… Xiaren acabou de me passar uma informação valiosa sobre armamento e a


filha de Yuric. Vocês vão comandar a operação. Quero todas as armas do
arrombado russo, mas mais do que tudo, eu quero a filha dele raptada! – Bati com a
mão fechada na mesa.

– Sim Senhor. – Os dois responderam.

– Vão, preparem e armem todos. Passem a informação para Galathea de que


estamos indo para o Aeroporto e que ela tem até a uma da manhã para decidir.
Estando lá estarei considerando que é aliada. Se não estiver, então entenderei que
está contra. – Jesse e PeeBoy saíram da sala.

Agora
Já estava perto de acontecer. Era previsto que PeeBoy e Jesse chegariam após a
“isca”. Eles esperaram toda a confusão ser armada para agir. Logo depois da queda
do Crow-Z de Xiaren meus homens entraram em ação, tomando a cena. Dividi o
ataque em três. Como Jesse é um ex-piloto, ele ficou responsável por dirigir e levar
um esquadrão de militantes em um automóvel militar blindado. Dei a cada um dos
doze homens blindagem roubadas da época da Orion Corp. praticamente as
mesmas que os Steelhearts usaram no último confronto. Herrera, Coronel e PeeBoy
estavam com eles. A segunda parte surgia pelos céus, com duas aeronaves
contendo seis ex soldados cada, eram outros Crow-Z com camuflagem. Eles
cobririam o espaço aéreo, impedindo qualquer um do alinhamento russo de sair do
aeroporto e tendo ordens para atirar, abatendo quem tentasse uma fuga. Os
integrantes da nave ficariam a cargo de "confiscar" o armamento assim que a
rendição acontecesse.Eles só tinham ordem para atirar se também alguém tentasse
revidar. Inicialmente a operação seria apenas de rendição, contudo se mantinham
mais do que alerta procurando a direção do disparo que derrubou a nave do líder da
Ryulong, esperando algum parecer do homem em comando em campo, no caso,
PeeBoy.

– Onde está Galathea e o bando? Eles estão atrasados... – Disse PeeBoy para Jesse.

– Tony disse que tá tudo em cima, ela aceitou os termos. – Respondeu Jesse,
olhando a pulseira holográfica que emitia uma mensagem minha.

– Isso é bom, muito bom, mas essa gente precisava estar aqui e nos dar mais
cobertura, aquela aeronave caiu com um tiro, eu vi. Se tiver mesmo um atirador por
aí, não dá pra ficar marcando toca. – Comentou de volta PeeBoy.

– Não vai dar tempo de esperar, vamos agir, cara. – Concluiu Jesse.
Eles não sabiam, mas Galathea e seu grupo estavam salvando sua pele, ou ao
menos era isso que fariam se precisassem. Mesmo assim PeeBoy e Jesse
executavam as ordens dadas por mim sem medo, como bons fiéis soldados. No
solo, o veículo abria as portas e os doze homens armados com AK-47 com munição
de radiack apontavam para os malditos aliados de Yuric. Um plano B caso não
conseguisse raptar Margareth, onde eu usaria os parceiros do russo para obter
informações abaixo de tortura física e psicológica. E a terceira parte seria composta
por PeeBoy e Akane. Ele escoltaria ela até o avião, dando-lhe cobertura. PeeBoy era
excelente em improvisar, e teriam de render os homens que faziam guarda de
Margareth no interior do avião, seu pai não seria burro o bastante de deixar a filha
sem segurança interna.

– Margareth, saia do avião e caminhe em direção ao veículo blindado. Deixe claro a


quem estiver com você que se der um movimento em falso e eu não gostar, vai levar
bala. – Gritou PeeBoy com o ponto no ouvido se dirigindo a Nureyev para que ela
pudesse o ouvir, apontando a arma para a porta. Junto com Akane, esperava a
mulher loira tomar sua decisão, sabia que a ruiva assassina estava pronta para o
combate se assim precisasse. Entretanto, ele sentia um frio percorrer sua nuca e
descer sua espinha. Virou-se para Akane, depois para trás, comentando.

– Já teve a estranha sensação de estar sendo observada?

Kat
Quatro horas após os ataques a Vênus e Xiwang – Ferro Velho Abandonado,
Submundo

O quanto uma guerra pode ser valiosa para as pessoas? O quão lucrativa a descarga
de balas ceifadoras de vida pode ser para alguns indivíduos? MUUUITA GRANA, é o
que dizem, e para tal, alguns seres "vivos" habitantes da metrópole americana
adquiriram algo que pode apenas se pôr como um faro para esse tipo de situação.
Dentro de um depósito precário no perímetro de um ferro velho abandonado na
região conhecida como o Submundo, haviam duas pessoas: Um rapaz jovem,
aparentando ter lá seus 20 anos, trajado com um agasalho, calças de pano, ambos
num tom cinza escuro e tênis marrons já um tanto desgastados. O mais
impressionante de sua figura era notório exoesqueleto que se protuberara de seus
membros, percorrendo do ombro até o pulso de ambos os braços e da cintura até os
calcanhares. Ele se localizava à frente de uma mesa de metal, parecia mexer com
algum tipo de robô que estava ali deitado sobre o aço, com movimentos precisos e
minuciosos, como se fizesse uma cirurgia na máquina.

Alguns metros das costas dele, havia um sofá bem rústico, no qual uma garota de
cabelos ruivos bem escuros, trajando uma blusa de cor marrom também surrada,
uma camiseta com uma estampa simples na cor vinho, calças jeans com a barra
dela suja e tênis de cano alto. Esta figura estava sentada naquele sofá, toda esticada
e com seus braços atrás da cabeceira dele, a sua frente, um pequeno drone pairava
no ar, este projetava uma imagem gráfica de televisão, onde as notícias contavam
sobre uma onda de violência começando na cidade. Ela prestava atenção em todas
as palavras que os jornalistas diziam, seus pés balançavam num ritmo frenético,
enquanto seu semblante esboçava aquela expressão famosa de quem matutava
alguma ideia, até certo ponto que ela se levantava do sofá, se virando e olhando para
seu colega, falando com ele num tom em que sua voz estava mais alta que o volume
da tevê:
– Hey, Cy... Você me disse que tinha conseguido informações sobre toda essa joça
que tá acontecendo ultimamente, certo? Sabe o que tá pegando?

– Ah... Isso é briga de cachorro grande, Katt... Pelo que minhas Vespaz conseguiram
pegar, esses ataques foram responsáveis por homens do mafioso mais insano da
cidade, se me lembro bem o nome dele é Yuri ou algo assim, ele é russo. -respondia
o guri, ainda mantendo foco no que fazia naquele robô.

– Você está falando de Yuric? Ele é o líder Máfia Russa em Mirai... Eu ouvi falar pelas
ruas que ele tem uma rixa com os Italianos e os Chineses... Alguma coisa assim...
Sabe o motivo disso tudo?

– Isso eu tecnicamente não sei... Mas o meu sistema tem captado desde então uma
movimentação de fundos enorme ocorrendo pra tudo que é lado! Mercenários,
hackers, equipamento... Eu fico arrepiado só de pensar nas possibilidades se um
pouco dessa grana caísse pra nós...

Após este ponto, a ruiva olhou pro lado, silenciosa, parecia focar-se em um
pensamento, depois virou-se pra ele, deu um pulo e passou por cima do sofá, caindo
de pé atrás dele e caminhando rapidamente em direção ao seu amigo, enquanto
dizia:

– Cy! Chegou a hora, não tem mais motivos pra gente não entrar pra valer no
cenário, cara!

– O-o que? – Dizia o garoto subitamente parando seu procedimento e virando-se


para sua amiga que agora se encontrava quase cara-a-cara com ele.

– É isso mesmo! A gente não vai conseguir levantar nossa operação se


continuarmos pescando por interceptação de carregamento e fabricando um robô a
cada seis meses devido a tão fucking pobre que a gente é! Olha só pra nós! Você
realmente quer que nós, a próxima geração do crime da cidade seja composta por
dois mendigos e androides feitos de latas de sardinha? Peeeeense comigo, você é o
mais inteligente daqui! – Dizia ela gesticulando para todo o lado.

– M-mas... Sim... Só que, o que faremos? Com quem vamos nos aliar? E você acha
mesmo que algum deles iria se interessar mesmo num grupo de duas pessoas e
alguns robôs?

– AAAAAAHHHHH! CYRUS! – Falava ela revirando os olhos de descontentamento e


batendo as mãos sobre a cintura – Olha só, é isso mesmo que acaba fodendo com
qualquer tentativa nossa de ganhar a porra de um cruzado aqui, essa sua
desgraçada falta de... Auto-estima! Você tem noção do que essa mente aí nessa
cabeça oca já criou? Suas Hyenas já conseguiram dinheiro suficiente pra gente
construir tudo o que a gente tem lá embaixo! A gente tem o nosso lar aqui graças a
tua fodendo criatividade pra construir máquinas mortíferas! – Ela confortava o
amigo, colocando a palma de suas mão sobre os ombros dele. – Veja só, olha pra
mim... Chegou a hora de você mostrar o que a gente sabe fazer e da gente vender o
nosso lambari pra essa cidade ver! Eu sei o que a gente precisa fazer... Só preciso
saber se você tá dentro nessa comigo!?

– E-eu... – Ele estava visualmente tímido naquele momento, seu rosto chegava a
corar por um pouquinho. – Eu já falei que você é a minha líder, Katt... Eu nunca vou
me opor a você e onde você for, eu irei, seja pro trono, ou pro túmulo!

– Haaaaaaaaaaa! Esse é o meu chapinhaaaaa! – Esboçando um sorriso largo


mostrando os dentes, ela abraçava seu amigo, que sorria abobalhado dando uma
pequena risada e abraçando ela também, até que ambos se separavam da
demonstração de carinho. – Olha só, eu tenho orgulho pra caralho de ti! E agora,
mais do que nunca, eu preciso que você dê tudo o que você tem, preciso de mais
Hyenas, alguns Moas e do equipamento maravilhoso que só você sabe fazer! Pode
me arrumar isso pra amanhã?

– Sim! Sim, chefe! Eu vou levar a Linha de Produção pra velocidade máxima!

– Óooootimo! Eu preciso fazer algumas ligações e chamar alguns vermes que me


devem favores, deixe os trajes de combate prontos, e... Prepara o batedor de
cérebro...

Ela dizia esta ultima parte em um sussurro, finalizando com uma piscadela para
Cyrus, que respondia com um sorriso e uma outra piscadela, que acabava saindo
muito estranha devido a postura e o sorriso abobalhado que ele tinha estampado na
cara, ela se virava e partia bem rápido para fora do hangar, deixando ele lá olhando e
acenando, com cara de... idiota.

Quase um dia depois - Ferro Velho Abandonado, Submundo

Horas depois, no Q.G. da dupla, uma movimentação maior acontecia, dentro do


depósito, aquele rapaz agora estava cercado por quatro robôs quadrúpedes, de
tamanho médio, estes possuíam, cada um, uma coloração diferente, apesar dos
traços praticamente idênticos. Todos eram do mesmo tamanho, que era um pouco
maior do que um cachorro de grande porte. Os quatro se moviam lateralmente,
rodeando Cyrus de forma sincronizada e contínua, enquanto o garoto permanecia
parado e olhando para os droides enquanto mantinha uma pose um tanto gozada de
um pistoleiro.

Após certo ponto, ele puxava o seu braço para frente, fechando o punho e esticando
apenas o indicador, do meio e polegar, deixando sua mão direita num formato
similar de uma arma, mirando para o robô de coloração amarela, gritando "POW!"
logo em seguida. Esta reação provocava uma reação imediata daquele único droide,
que quase de imediato dava um salto para trás, como se tentasse escapar daquele
"tiro" que sofria. Após a ação, ele repetia o mesmo, mirando e "disparando" contra o
outros mecanóides que agiam da mesma forma, desviando para os lados e para
trás. Após o feito, Cyrus se coloca de volta a uma postura ereta normal, cruzando os
braços e falando para.... eles:

– É... Seus sensores de defesa reacionários estão cerca de zero ponto quarenta e
quatro por cento fora de triangulação com ações, preciso fazer mais algumas
calibragens...

Logo em seguida, chegava Katterine, abrindo a porta lateral do galpão e entrando


com duas macas contendo dois homens desacordados em cima um era bem magro
e alto e outro era mais robusto, um pouco menor que o outro. Esta vinha
empurrando uma, a sua frente, com a mão esquerda e puxando outra, atrás de si,
com a direita, ela chegava gritando o nome do companheiro, que virava pra trás
levando um susto, mas partia correndo em direção da garota, acompanhado dos
seus "pets".

– Katt, mas o que diabos você tá fazendo? – Ele perguntava ao alcançar ela-

– Ugh... Não se finja de idiota, Cy, você sabe que eu tinha ido... Que peso da porra...
ugh... Tinha ido buscar novos idiotas... Pra você transformar eles em Tripulantes...
Dessa vez só consegui esses dois otários...

– Você é doida, sabia? Veio arrastando esses dois assim? – Ele pegava a maca na
frente dela, segurando e puxando.
– São tempos difíceis, a gente precisa do máximo de bundões possíveis, nossa
Enterprise não pode viver só de Terceirização, cara... Isso... ugh... É o câncer do
empreendedorismo..

– Você não respondeu a minha pergunta... Mas tanto faz, quer que eu mande esses
dois pra Linha de Produção?
– Lógico, mas... – Ela parava alcançando certo ponto, olhando para Cyrus que
também se continha ao lado dela. – Eu preciso que você faça mais um favor pra
mim, inteligência, mon cherry.

– Como assim? – Cyrus pareceu não entender.

– Dizem nas ruas que o crime organizado de Mirai está se preparando pra guerra, os
russos são o alvo principal... A coisa ta ficando feia, pelo que vi, eu preciso que você
mande cada Osprey que tiver e vigie cada canto dessa cidade! A gente precisa saber
quem vai se mover, quando e pra onde... Eu tenho uma ideia que vai gerar pra gente
muito dinheiro?

– Eu posso fazer isso. Mas o que anda passando nessa sua mente?

– Pensa comigo, imagine a quantidade de grana limpa que a gente pode fazer
vendendo informação pros manos? Imagina só, velho! Seríamos tipo... Caçadores de
Informação, tá ligado? Ninguém nos conhece, AINDA... Ninguém está por aí nos
caçando, vamos coletar dados dos três lados, o que eles fazem, o que eles gostam,
como atiram suas armas, onde estão, esse tipo de coisa? Imagina só... Hmmm...
AH! Imagina se tem um top chaykovski por aí zanzando de boas, e a gente informa
os Casa Nostra a localização deles e cobramos uma grana maneira ou recursos top
de linha? Nossa vida tá feita!

– Você quer que viremos um bando de XIS NOVE? – Dizia o garoto prodígio um tanto
incrédulo – Todo mundo vai acabar caindo em cima da gente na mesma hora!

– Não seja burro, rapazinho! Eu não digo de vender pra todo mundo, vamos escolher
um lado, manter nosso negócio nas sombras e ser um supridor de informações,
quando a gente tiver o nosso exercitozinho particular, aí a gente se coloca no sol e
enfia nossa rola grossa bem no ânus dessa cidade! Tá vendo só?
EMPREEEENDEDORISMO, my dear!

Cyrus engolia seco e parecia ainda incomodadíssimo com aquela ideia, mas sua
lealdade para com a menina acabava quebrando-o, e respondia:

– Ta... Tá bem, eu vou liberar todas as Vespaz que eu tenho, mas isso vai consumir
muito do meu tempo, não vou poder focar muito na Linha de Produção...

– Não se preocupe com isso agora, cabeçudo, só consiga ação pra mim... Eu to
sentindo que muito em breve a gente tem nossa primeira exclusiva jornalística! E
então... Hohohoho... A gente vai estar nadando em créditos! Haaaaaaaaaaaa!
Horas depois - Ferro Velho Abandonado, Submundo

Naquele momento do dia, já chegando a calada da noite, o time estava reunido


numa pequena cabana, de pé num dos cantos do perímetro daquele ferro velho, lá
dentro o espaço era pouco, o local estava repleto de máquinas, fios e monitores
centralizados por uma mesa e duas cadeiras, onde a dupla dinâmica se localizava.
Os monitores estavam ligados e diversas imagens diferentes se projetavam neles,
sejam de ruas, becos, vielas, pátios, prédios, parecia um sistema de segurança de
vários pedaços da cidade, e os dois jovens ficavam nessa, assistindo aquele monte
de... nada, enquanto suas cabeças iam se movendo de um lado pro outro, pra cima e
pra baixo, constantemente, enquanto seus olhos tentavam capturar qualquer coisa
em todos os recipientes de imagens.

– Cy, meu querido... Eu já falei o quanto eu te odeio e como eu vou te transformar


numa lata de sardinha por ter de me fazer passar por isso? – Dizia a garota ruiva
enquanto permanecia naquele movimento sincronizado.

– E-eu entendo que você está um pouco... Descontente, com esse tipo de vigilância,
minha querida, mas infelizmente isto é um mal necessário... Eu não consegui fundos
ainda pra integrar o grid de observação das minhas Vespaz ao meu Módulo de
Controle Universal...

– Eu só espero que a gente consiga algo que valha a pena esse esforço hoje...
Waaaahhh... – A garota bocejava – Se tem algo que eu odeio é me acabar em
cansaço e no final só merda ser jogada na minha cara...

Estes dois pequenos prodígios continuavam na vigília, passou-se mais alguns


minutos sem nada, deixando Katterine ao ponto em que seus olhos começavam a
pesar e a cada instante ela parecia mais e mais próxima de cair ao sono. Porém,
alguns milésimos antes que ela pudesse entrar no mundo dos sonhos, um pequeno
beep se deu ao lado esquerdo, seguido pela voz de seu comparsa, que a despertou
de imediato:

– OOOPA, OPA, OPA, OPA!

– HUH? Que.. .que que fo-foi? Q-que foi?

– Um dos meus robôs captou algo incomum com os sensores infravermelhos... –


Cyrus começava a digitar incessantemente no teclado em cima da mesma a sua
frente – Parece... Duas... Aeronaves? Modelo... Pera lá... Vai, vai, vai, vai!!! Consegui!
Mais um scan! São duas aeronaves de combate modelo Crow-Z... Isso é tecnologia
asiática!
– Ahaaaaaaa! Parece que os xing-ling estão aprontando alguma coisa! Chegou
nossa hora, Cy! Pra onde essas naves estão indo?

– Eu vou tentar triangular possíveis alvos de acordo com a rota... Começando a


pesquisa de alvos... – A tela central do setor de controle agora se tornava uma
espécie de Mapa da Cidade, onde pontos, riscos e todo tipo de coisa high-tech-like
começava a aparecer – Não, não... Não tem nenhum alvo significante do negócio de
Yuric do ponto que vimos ele até... Pera ai… – Ele observava a tela novamente – O
único ponto mesmo que é de importância significativa pra cidade como um todo é o
próprio aeroporto internacional...

Voltando seu olhar para o teclado, Cy voltava a digitar algumas coisas no teclado
por cerca de 10 segundos, então voltava sua atenção para seu punho esquerdo,
onde ele apertava um botão, e uma espécie de console holográfico surgia do nada,
ele freneticamente apertava alguns botões, movia algumas das pequenas telas,
expandia uma e fechava outra, enquanto Katt apenas observava, sem entender
bulhufas do que ocorria. Eis que então ela o indagava.

– Cy... O que demônios você está fazendo?

– Eu estou coletando alguns dados... Só mais dois segundos... Pronto! Aqui,


descobri que a pouco, algumas das pistas do aeroporto foram fechadas a mando do
próprio Yuric! E adivinha? Tem uma aeronave pousando lá neste espaço reservado
agora mesmo!

– .............. – Ela apenas conseguia sorrir, parecia ter ganhado na loteria –


YYYYEEEEESSSS! – Agora ela subitamente abraçava seu amigo forte, deixando ele
um pouco assustado pela ação e duas vezes mais encabulado – Agora sim!
Estamos a caminho do pote de ouro no fim do arco-íris!

– Ahh... Ah... – Cyrus estava corado e um pouco afoito – S-sim, Katt... Eu... e-he... Eu
estou enviando um dos meus drones pra lá agora mesmo, ele deve chegar em
tempo da ação, mas como eles são muito lentos comparados às aeronaves, eu temo
que eles cheguem lá primeiro que a gente...

– Rezemos pro Boitatá que esses trouxas fiquem naquele estado infinito de
atira-erra, atira-erra, atira-erra... A gente precisa de informação de tudo! Quem ta lá,
por quê, como e onde! Prepare os scans!

– Sim! Alguns drones adicionais estão sendo redirecionados pro local, mas eles vão
demorar um pouco mais pra chegar lá.
Alguns minutos depois, a maior parte dos monitores estavam desligados na sala,
tendo apenas a tela principal como fonte de imagens da cidade que iam se
alterando conforme a câmera do drone modelo Osprey se movia, os dois estavam
atentos a tela, com a menina parecendo mais ansiosa do que de costume.

Pouco depois o drone alcançava o local de destino, e seus sensores de som já


captavam o áudio de tiros sendo disparados incessantemente, imediatamente,
Cyrus apertava algumas teclas no teclado e o drone alçava voo para uma altitude
maior, sua câmera focava na direção dos sons e ali naquele zoom eles viam a cena,
era um combate incessante entre tropas russas e muita gente que eles não sabiam
direito de qual facção pertencem, juntamente com a imagem de uma das aeronaves
derrubadas e um carro presente na cena. Os comentários se iniciavam:

– Minha nossa, parece uma Zona de Guerra, me lembra um pouco o cenário de


Joanesburgo… – Cyrus já ficava surpreso com o que via

– Escaneia! Escaneia! Escaneia! Escaneia! Escaneia! Escaneia!!! INFORMAÇÕES,


CYRUS!!!

– S-sim, sim, perdão...

O drone dava um pouco de zoom na sua imagem e vários tipos de detalhes escritos,
numéricos e focos quadriculados em faces e equipamentos aconteciam dando
inicio ao processo de escaneamento e revisão do combate da parte dos dois
sorrateiros.

– Catalogue o máááááááximo que puder, e tente deixar o nosso ganso dos ovos de
ouro fora de vista! Isso vai render pra nós uma dinheirão!

Nota: Os Drones de Escaneamento Vespaz Mk.I do Cyrus tem o tamanho de uma


cama de casal queen size.

Akane
Sequestrar uma mulher? Eu? A primeira impressão soou ridícula, mas depois me
pareceu divertida. Brincar sem matar até que era interessante de experimentar.
Apenas encarei meu amante por um breve momento e selei seus lábios com um
demorado beijo. Não respondi verbalmente, não era necessário. Parando para
pensar, a situação estava muito intensa nessa guerra idiota entre máfias, mesmo
vindo de uma linhagem mafiosa também, onde abandonei o nome Morgan... Não
demorou muito para eu ficar séria e sair da cama, focada no tal avião. Tinha que ter
um plano próprio, para não depender dos cachorrinhos de Tony.

Depois de um demorado banho frio, lembrei-me de um sujeito que devia para mim e
para o Tony. Pela sua aparência proposital, todos o tratavam com insignificância,
ignorantes do seu verdadeiro potencial. E onde encontrá-lo? Pelas ruas sujas do
Submundo, qualquer um poderia ver um senhor negro usando cartola e bengala, e
que adora cantar, muito animadinho para um morador de rua... Sim, um mendigo
qualquer, mas não era qualquer um. Com um poder imenso em mãos, ele apenas
quer se divertir à custa dos mais esnobes, fingindo ser fraco. Era hora dele pagar
sua dívida. Afinal, ele é do tipo que adora acordos, e pela sua honra, ele sempre
cumpre suas pendências. Era como um idiota.

Das roupas às ruas foi um pulo. Estava com pressa, pois o tempo era curto. Usava o
uniforme costumeiro para "trabalhar", todas as peças em preto, com a calça justa,
botas de salto curto e um cropped simples. Sempre com minha moto vermelha
também, apesar desta ser uma nova. Para encontrar esse mendigo, era necessário
seguir seu rastro, que era fácil. Mesmo com roupas gastas, sujas e rasgadas, era
uma combinação de um elegante traje de noite de gala. Seus pontos de dormir eram
limpos, e esse é o rastro que seguia. Não demorou muito para encontrá-lo. Pude
escutar sua cantoria de longe, vindo de um beco pequeno e bem sujo, com os restos
do restaurante na esquina.

– Ora ora, a que devo a honra de sua visita madame? – disse assim que me viu.

– Cobrança. Hoje é o dia de cumprir sua parte no acordo e tenha certeza que tem a
aprovação do Tony nisso. Lembra? Sua vida por seus serviços. – Falei seca com os
braços cruzados.

– Não deixo de cumprir minhas pendências madame. Qual é minha parte no acordo?
Demoraram até para virem me cobrar… – Ele com seu jeito sorridente testava minha
paciência.

– Não preciso entrar em detalhes, já deve suspeitar de como serão seus serviços.
Surgiu uma ocasião especial até… Tenho de pegar a filha de Yuric para fazê-la de
moeda e troca e você é necessário nisso. Não me importo com os demais, divirta-se
com eles até… Me fale como funciona esse seu poder…

– Não falo disso com ninguém, mas devo a minha vida ao Tony… Bom… Sabe o que
a toxina do baiacu faz não é mesmo? Quem me transformou nisso fez uma melhora.
Primeiro a vítima parece morrer, será dada como morta por um minuto, depois ela
acorda e faz tudo que eu mando, fica violenta e por último ela fica paralisada até
obter um antídoto. Simples.

– Bom, se prepare para estar na pista 21 daqui a pouco. Faça o que quiser, mas a
megera é prioridade.

Agora

Peeboy me manteve perto o tempo todo; estava claro que ele seguia instruções
adicionais em relação a mim. Tony era esperto, afinal, estava me dando uma mulher
loira e russa. Mal sabia ele que minha mãe era descendente de russos, mesmo
nascendo nessas terras. Nunca soube seu nome de solteira, nem tive curiosidade
até esse momento... Era tentador a ideia de invadir o avião para matá-la, era como
se eu pudesse matar minha mãe novamente e de forma mais dolorosa ainda. Mas
tinha que concordar com o idiota do meu lado, alguém nos observava. Não me
importei; apenas fiquei esperando o Baron fazer sua festa para poder intervir.

Falando nele, o vi entre as latas de lixo perto do avião. Provavelmente estava


reconhecendo o terreno e avaliando como entrar. Eu tinha que admitir que ele era
rápido, apesar de sua idade, pois numa piscada ele não estava mais lá. Voltei a olhar
para o avião e a guerra entre os empregados ao redor. Estávamos protegidos das
balas perdidas, aliás. Tinha comigo duas armas, além das minhas usuais. Uma mini
bazuca de mão com um poder explosivo imenso e outra que parecia uma pistola
comum, mas disparava balas que possuíam uma carga elétrica alta. Apenas fiquei
em alerta, com ambas as armas em mãos, esperando um sinal do velhote.

Baron Samedi, ele era chamado. Sempre foi um morador de rua desde os quinze
anos. Foi sequestrado e submetido como cobaia a uma cirurgia que adicionou
genes animais ao seu DNA. A operação foi um fracasso e, como um produto que
não presta, resolveram descartá-lo. Ele conseguiu fugir de lá e passou a viver
fugindo desde então, até que a perseguição acabou sob a influência de Tony
Montana. Ele passou a ser chamado por aqueles que o procuram de Mortel, o
zumbificador. Foi o que foi investigado sobre eles, afinal, o mentor desse sequestro
e procedimento cirúrgico foi o mesmo que o do meu e de um tigre imundo por aí,
meu tio Reno Morgan.

O mendigo era rápido, e ninguém se importava ou notava sua presença. Nenhum


dos combatentes parecia notá-lo ou levá-lo a sério. Ele ficava rodeando o avião e
observava cada janela em vão. Até que um homem do lado russo da guerra se
aproximou dele, pronto para implicar com o tal morador de rua.
– As latas de lixo estão do outro lado seu, imundo! – Falou ele com sua arma pronta
para atirar.

– Aqui tem lixo mais requintado… – Falou ele modificando seu rosto.

O homem, ao ver a transformação, soltou um gritinho enojado. Parecia odiar peixe,


especialmente um com olhos enormes e espinhosos. Antes que pudesse atirar ou
correr, sua visão foi tapada por uma gosma preta e, no mesmo momento, ele perdeu
os sentidos. O idiota caiu no chão, ficou pálido e com olheiras enormes. Eu assisti a
tudo com um sorriso estampado no rosto, ansioso para ver o resultado da
zumbificação até o fim... Pois ali nasceria um descontrolado capaz de causar um
estrago enorme entre os seus iguais. Infelizmente, aquele era o sinal para Akane agir
e irmos atrás do verdadeiro alvo.

Narrador Capítulo 3

No topo do altar, um sacerdote comandava a cerimônia. Ele vestia um turbante


branco e uma túnica preta. Falava inúmeras palavras em árabe, e os fiéis ajoelhados
no chão da mesquita repetiam com grande entusiasmo. Mesmo sendo uma reunião
costumeira da mesquita, os muçulmanos que frequentavam o local seguiam com
fervor. Para eles, não importava o quanto o mundo havia mudado, a antiga crença
ainda pulsava viva dentro de seus corações.

Uma porta lateral, ao lado do altar, se abriu, e um homem vestindo um terno vinho,
cabelos grisalhos e porte físico imponente adentrou a mesquita. O sacerdote parou
de pregar. O grisalho chamado Alek, descendente de russo, se aproximou dele e
sussurrou algumas palavras em seu ouvido. Rodrigo, que estava infiltrado no meio
dos fiéis, reconheceu seu antigo cliente, que logo depois saiu pela mesma porta por
onde havia entrado. O sacerdote proferiu mais algumas palavras em árabe e
encerrou a cerimônia, saindo pela mesma porta que o russo. Coyote, que também se
encontrava dentro do templo, testemunhou a mesma cena.

Parte dos fiéis se levantaram rumo à saída, enquanto outros continuaram de joelhos
rezando para Alá. Observando o que acabara de acontecer, Rodrigo e Coyote sabiam
que precisavam agir rapidamente ou poderiam perdê-los de vista. Se decidissem
segui-los, a porta os levaria a um beco com latas de lixo e sujeira espalhada pelo
chão. A dupla avistou Alek e o sacerdote adentrando um furgão branco, onde havia
um terceiro sujeito, o motorista do veículo. Agora, teriam que encontrar uma maneira
de segui-los, pois aquela era uma pista importante.
O artista marcial Chris Falcon estacionou sua moto próximo à boate Vênus. À frente
do portão principal, quatro homens de braços cruzados estavam posicionados, cada
um portando pistolas e revólveres em suas cinturas. Nas janelas dos quatro
andares, outros homens seguravam fuzis, mantendo seus olhos atentos a qualquer
movimento próximo à boate. Um tiro foi disparado, atingindo o chão a apenas dez
centímetros do pé do lutador, chamando sua atenção para o sujeito careca em uma
das janelas do quarto andar.

– Mais um passo e explodo sua cabeça, viadinho. – Um dos homens da porta tirou
uma Desert Eagle da cintura, empunhando a pistola com as duas mãos e a
apontando para Falcon, enquanto caminhava na direção dele. – Coloque as espadas
no chão, vire de costas e diga o que quer aqui. – Outro sujeito fazia o mesmo, vindo
até Chris logo depois do outro. Este o algemaria e pegaria suas espadas
independente da sua resposta.

O lutador era empurrado para dentro da boate com o cano da Desert colado na sua
nuca, ao adentrar no local notaria as marcas de balas e os capangas de Fernando
andando de um lado para o outro carregando armas, não havia nenhuma prostituta
no salão principal, apenas homens fortemente armados.

– Pietro, olha o que encontramos lá fora. – Disse o capanga da Desert, empurrando


Chris contra um dos luxuosos sofás da boate. Pietro ao escutá-lo, caminhava até o
visitante colocando a ponta do bastão de baseball que segurava no peito de Chris
Falcon. – Antes de falar com o boss, precisa falar comigo.

X-9 teve sucesso ao conectar-se aos computadores da cobertura de Tony Montana.


No entanto, a hacker deparou-se com um problema. Um filtro virtual havia sido
instalado em todo o quarteirão onde o cassino estava localizado. Isso significava
que qualquer transmissão realizada de dentro para fora ou de fora para dentro
passava pelo filtro. Qualquer coisa não autorizada por Red era simplesmente
apagada, fazendo com que a mensagem desaparecesse por completo. A hacker
precisaria encontrar uma maneira de burlar o sistema de filtragem de dados para
que os italianos recebessem as gravações. O computador central, responsável por
todos os dados que circulavam no cassino russo, encontrava-se no quarto de Red,
localizado no trigésimo segundo andar do edifício, três andares acima do quarto
onde X-9 e Red estavam. Para ter acesso ao quarto, ela teria que se livrar de Red ou
conquistar sua confiança, de modo que ele permitisse seu acesso ao computador
central. No entanto, essa não seria uma tarefa fácil.

– Caralho, que maconha pesada. – Red se levantou do sofá com os olhos ainda
avermelhados, parou atrás de X-9 e voltou a dizer. – Você é uma vadia, mas gosto
disso. – O ruivo deu um tapa na bunda da nova companheira de trabalho, o que
provavelmente seria desconfortável. Logo depois ele apertou alguns botões no seu
relógio no pulso esquerdo, uma tela holográfica azul surgiu na sua frente, onde ele
começou digitar algumas coisas com a destra. – Temos trabalho a fazer, o chefinho
quer que encontremos uma brecha nas defesas do residencial celeste, os italianos
fecharam o local do lado de dentro quando os nossos homens invadiram, deixando
ambos os lados sem ter como conseguir reforços, até mesmo a ParaMilitech não
conseguiu entrar. – Ele sentou-se na mesa que possuía algumas telas holográficas e
teclados, começando o trabalho. A situação da hacker agora ficou ainda mais
complicada, pois agora precisaria lidar com o trabalho designado por Yuric e
encontrar uma forma de passar pelo filtro de dados para enviar as gravações para
Montana.

Segundos depois de Jong ativar o sistema de camuflagem da sua nave e recuar, os


homens de Tony Montana entraram em ação aproveitando-se da distração
proporcionada pelo seu aliado. O plano elaborado pelo italiano era eficaz, o veículo
blindado que carregava um esquadrão de homens fortemente armados avançou
contra o grupo de russos que disparou contra o veículo, ação que não surtiu efeito
nenhum devido à blindagem. Jesse puxou o freio de mão, fazendo a parte de trás
deslizar no asfalto da pista de pouso, parando-o de lado para os capangas de Yuric.
Os capangas italianos saiam do blindado, apontando suas armas para os russos,
que agora estavam em menor número e com pouca munição por causa do
confronto com as aeronaves de Xiaren.

Sem perspectivas os vinte homens restantes da máfia Russa que estava do lado de
fora do avião baixou suas armas, a dupla de replicantes olhou ao redor e um sorriso
largo surgiu na face do grandalhão Nine-6. — Finalmente posso matar. — Comentou
ele, sua parceira Nine-10 o respondeu logo em seguida. — Não faça nada ainda.

Akane e Peeboy separaram-se do esquadrão encarregado de render os russos,


dirigindo-se para a entrada do compartimento de carga do avião. As palavras
proferidas pelo cowboy urbano foram deixadas sem resposta. Até aquele momento,
a vitória parecia estar ao alcance de Tony Montana, e a retaliação parecia iminente.
No entanto, algo inesperado ocorreu. O atirador, posicionado no topo de uma das
torres de comando do aeroporto, a cerca de 1 km de distância do avião, agiu
novamente. Deitado no topo da torre, seu rifle firmemente fixado ao chão, seu olho
esquerdo brilhante em um tom azul fixado na mira da arma, seu dedo indicador
pressionando o gatilho. Ele prendeu a respiração e, no segundo seguinte, apertou o
gatilho.

A bala cortou o ar e atravessou a cabine de um dos Crow-Z enviados por Montana


para patrulhar o aeroporto, seguido por um segundo disparo. O interessante era que
o sistema de camuflagem da aeronave estava ativado, mas mesmo assim o atirador
conseguiu acertá-la duas vezes. As balas perfuraram o vidro frontal, atingindo em
cheio a cabeça do piloto, que tombou sobre o painel de controle da nave. O sistema
de camuflagem desativou-se abruptamente, revelando a aeronave no meio do céu e
fazendo-a girar em direção ao chão. O atirador desmontou seu rifle rapidamente e o
guardou em uma bolsa preta. Ele sabia que dois disparos eram mais do que
suficientes para revelar sua localização. Com um capuz que deixava apenas seus
olhos à mostra, ele desceu a torre correndo pela parede, graças às suas botas
especiais que lhe permitiam caminhar por superfícies verticais. Em seguida, abriu a
porta de um furgão preto estacionado ao lado da torre de comando, jogou a bolsa no
banco do carona e entrou no veículo. — Albino?! A situação no aeroporto está se
complicando. Envie reforços o mais rápido possível. Estou mudando de posição –,
disse o sniper através de um comunicador preso em sua orelha direita. Em seguida,
colocou as mãos no volante e acelerou, afastando-se de sua posição inicial.

Crow-Z então caiu a alguns metros de onde todos se reuniam, seguido por uma
pequena explosão que logo deu lugar às chamas que consumiam os destroços da
nave. Esse evento chamou a atenção de todos ali presentes, incluindo os capangas
de Tony. Era o momento perfeito para Nine-6 e Nine-10 agirem. O grandalhão,
coberto de músculos, correu em direção ao blindado, enquanto os homens de
Montana apontavam suas armas e gritavam para que ele parasse. Foi nesse
momento que o replicante alcançou o carro e o ergueu acima de sua cabeça, com
Jesse ainda dentro.

Ao presenciarem essa ação sobre-humana, os capangas da máfia italiana abriram


fogo contra Nine-6. No entanto, para sua surpresa, nenhum tiro conseguia atravessar
a pele do homem. Era impressionante, principalmente considerando que as
munições eram de Radiack. Enquanto isso, Nine-10 aproveitou que seu companheiro
estava atraindo toda a atenção para si e correu em direção a Akane e Peeboy. Ela
retirou a máscara de gás que usava, revelando seu rosto, e ao se aproximar a uma
distância de dois metros do cowboy e da ruiva, Nine-10 soltou uma rajada de fogo
em sua direção.

Enquanto isso, Nine-6 jogou o veículo militar contra os subordinados de Montana,


forçando-os a se movimentar rapidamente para evitar serem atropelados. Jesse,
preso dentro do veículo, era sacudido violentamente enquanto o carro capotava. Os
russos aproveitaram a confusão para pegar suas armas caídas no chão e começar a
disparar contra o esquadrão de Tony, que resistia graças às suas armaduras. No
entanto, alguns não tiveram tanta sorte. Nine-6 agarrava-os pela cabeça com uma
força esmagadora, amassando os capacetes e, consequentemente, seus crânios. O
homem que Akane trouxe consigo utilizou sua toxina para transformar um dos
russos em uma marionete, mas a cena não passou despercebida por outros três,
que apontaram suas armas e abriram fogo implacavelmente.
Margareth subiu as escadas correndo por um corredor, enquanto dois homens
fortemente armados acompanhados de um robô de combate corriam na direção
oposta em direção ao setor de cargas. Ela parou por um segundo, respirou fundo e
deu a seguinte ordem: — Nem pensem em descer lá. A função de vocês três agora é
impedir que ninguém passe por este corredor! — O trio parou imediatamente,
mantendo suas armas apontadas para a entrada do corredor. Em seguida, a russa
chegou à sala executiva, onde os passageiros ficavam durante a viagem. Ela digitou
uma série de códigos em um painel na parede e, logo em seguida, três portas se
fecharam, bloqueando a passagem entre o corredor e a sala executiva. Cada uma
das portas era composta por uma mistura de chumbo e Radiack, tornando-as
grossas e praticamente indestrutíveis.

O clã de mercenários liderado pela mulher chamada Galathea, que agora era a mais
leal aliada de Tony Montana, avistaria tudo do prédio onde se encontravam. Com a
localização privilegiada que possuíam, o grupo também notaria o veículo do atirador
se movendo no lado contrário onde toda a confusão ocorria. Ele seguia na direção
de outra torre, que ficava ainda mais distante do centro do conflito, cerca de um
quilômetro e meio. Além disso, o grupo seria capaz de notar o drone sobrevoando o
aeroporto. A decisão de pará-los ou não estava nas mãos da líder mercenária, que
poderia abrir fogo com seus atiradores contra o furgão do sniper e contra o drone.

Instruções:

1- Rodrigo e Coyote precisaram rolar um d20 com dificuldade 10 para manter-se fora
de suspeita caso decidam seguir o furgão. Apenas um precisa ter sucesso no dado,
ou seja, a dupla tem duas chances no dado, então se um tiver sucesso o outro não
precisa rolar o dado.

2- Chris terá que decidir se vai dizer a verdade para Pietro ou não, também é livre
para atacar caso queira, mas lembre-se de não narrar sucesso.

3- Akane e Peeboy precisam rolar um d20 com dificuldade 15 para se defenderem da


cortina de fogo lançada contra eles pela replicante Nine-10. Para atacá-la, a
dificuldade é 14. Já para atacar o Nine-6, a dificuldade é 18, mas existe um ponto
fraco nele, basta tentar encontrá-lo.

4- Caso Gal decida continuar com o plano de capturar a filha de Yuric, terá que
passar pela porta que ela ativou. O problema é que a travessia fará com que a ladra
perca muita energia e parte dos poderes de intangibilidade após passar pela porta,
devido ao Radiack presente no material.
5- X-9, caso decida apagar Red usando a força, terá que rolar um d20 com
dificuldade 11. Caso queira buscar uma solução interpretativa, sinta-se livre para
isso.

6- Katterine, peço que role um d20. O resultado significará o quão bem-sucedida


você será na captura de dados.

7- Galathea, role um d20 com dificuldade 16 para acertar o furgão onde o Sniper se
encontra. Caso queira fazer isso, ou role um d20 com dificuldade 18 para acertar o
Drone enviado por Katterine.

Cris Falcon
Armas por todos os lados, segurança reforçada, e um sniper me dando boas-vindas
com um tiro a uns sete centímetros do pé.

Que meigo. É justificável que os caras estivessem paranóicos e surtados, afinal, o


Xiaren só me mandou uma mensagem e disse para eu vir para cá. E eu sabia o
quanto era uma idiotice bancar o Jet Li e arriscar tomar uma dieta reforçada de
chumbo, então resolvi dançar conforme a música e dar a impressão de ser, como
eles disseram, apenas um "afeminadinho" inofensivo. O fato de confiscarem minhas
katanas também não queria dizer nada, já que aquilo era apenas um par de enfeites
que se consegue em qualquer loja de decorações da vida. Se vissem o que eu
carrego de verdade na minha moto... Quer dizer, não acho que daria certo. A Black
Desert Raider tem um dispositivo de autodestruição bem escondido e pronto para
ser detonado se qualquer pessoa além de mim encostar um dedo sequer.

Apenas passei a mensagem do Xiaren: "O chefe da Ryulong quer falar com o
Fernando Pascal o quanto antes". Não sei se ele tinha algum problema mental ou se
a esposa dele andou fantasiando com alguns nudes meus vazados, mas fiz o que
ele pediu. Mais uma vez, não era prudente ou propício sair por aí distribuindo
porrada, já que não era a hora ideal para esmurrar mafiosos com dor de corno.

Com as minhas katanas de enfeite Capivara Seu Creysson já no chão, eu estava


algemado.

— Não fique triste, boy magia. São ordens do chefe. Agora vamos andando. E nada
de gracinhas, hein?

— Está bem.
Um samurai das ruas sabe muito bem quando as virtudes do Bushido devem ser
deixadas de lado. E quando se deve ter algum artifício escondido na manga. O
importante era simplesmente seguir o fluxo da vida, foi o que fiz quando um
daqueles caras me empurrou no sofá. Normal, já que as garotas de programa daqui
me fazem o mesmo e ainda por cima me cobram bem baratinho.

Foi quando aquele indivíduo com um taco de baseball chegou se impondo. Sorte
minha que eu tinha uma bomba de fumaça e um dispositivo de ondas sônicas
escondidos. Pois bem, para uma segurança bem eficiente, os mercenários do Pascal
jamais imaginariam o que se passa na mente de um "andrógino brincando de
Jiraiya". Era imprescindível que eu guardasse algum trunfo na manga para o caso do
bicho pegar, então fiz a carinha mais cínica que pude. Pietro chegou me encarando e
dizendo que teria que passar por ele.

— Muito bem. Xiaren me enviou aqui. Ele quer conversar com seu chefe, mas alguma
coisa o impede de contatá-lo.

Um taco de beisebol não significava nada para mim. Fiquei observando o eunuco me
encostar naquela porcaria, qualquer movimento em falso e aqueles caras estariam
se contorcendo com uma bela enxaqueca causada pelo dispositivo, ou então
estariam recebendo chutes sem ao menos saber de onde vem.

Era só esperar a reação de Pietro. Se ele fosse bonzinho e me deixasse passar, tudo
bem. Se não... eu teria que apelar.

Gal Bordeaux
Pouco depois que Gal chegou ao local indicado pelos seus contratantes, onde
estaria a mulher a ser raptada, percebeu a presença de um homem (PeeBoy) e uma
mulher (Akane) próximos. Ele chegou a pronunciar que se sentia observado. E
estava, mesmo. A loira os analisou clinicamente. Estavam armados até os dentes.
Seria impensável qualquer ação contra eles. Ainda mais por parte de Gal, que
mesmo tendo poderes especiais, não sabia lutar e atirar.

Mas sem que ela precisasse tomar qualquer medida — não tomaria, na verdade — a
metahumana das chamas surgiu, lançando chamas contra os dois. Esse era o bom
de ser invisível, não ser notada e consequentemente não virar churrasco. Sem saber
se aqueles dois eram aliados ou não, os deixou à própria sorte. Partiu para concluir
sua missão.

Enquanto atravessava as paredes ou percorria discretamente ainda na forma


material os lugares, pôde ouvir passos, inclusive do que seriam saltos, talvez,
subindo escadas. O som diminuía, indicando que se afastava. Por isso, a mercenária
apertou o passo, a fim de chegar mais perto.

Em determinado momento, ouviu a voz imponente da russa. "Nem pensem em


descer lá..." A metahumana então percorreu correndo o corredor, atravessando os
corpos de todos os demais guardas, valendo-se dos seus poderes e crendo-se
imbatível. Ela atravessava as portas metálicas grossas, mas... Sentia algo diferente.
Como se... Estivesse se esforçando muito mais do que o normal. Sentia-se cansada.
Fatigada. Algo estava diferente.

Caso conseguisse atravessar até a sala executiva, seguraria no pulso da loira e a


puxaria para vir consigo, depois de já ter ficado na forma material
(involuntariamente, até, por causa do radiack). — Vem, anda. — Quando tentaria
atravessar a parede atrás, com um braço erguido, perceberia que o mesmo não se
desmaterializaria. Isso quer dizer que os poderes estavam "travados". Apesar de
internamente se desesperar, ela não deixaria que isso transparecesse para a outra.
Iria se virar para Margareth e colocaria a mão acima do seio esquerdo da russa. —
Você viu o que posso fazer. Atravessar você não seria muito difícil. Leve-nos para
fora daqui que garanto sua integridade. — Não havia mais o que fazer, apenas tentar
convencê-la e barganhar. Certamente ela questionaria por que Gal não poderia
atravessar as duas, então, já que fez anteriormente. Caso ela perguntasse, então, a
loira sequestradora responderia mentindo: — Só posso atravessar os lugares uma
pessoa por vez. Mas ainda posso atravessar o teu peito e puxar o teu coração para
fora, vadia.

Frank Coyote
Era curioso como Gabriela - ou Rodrigo, para os íntimos - conseguia repetir com
precisão o mantra desconhecido para Frank e, por consequência, acabava
totalmente infiltrada. Tamanha familiaridade com o culto só poderia significar que
talvez fosse realmente islâmica ou, mais provável, era uma excelente espiã. Sendo
assim, Pascal não poderia ter feito escolha melhor do que juntar os dois, mesmo
que Frank negasse qualquer coisa se perguntasse para ele sobre o assunto. Com
atenção felina, observou toda a movimentação típica do templo até que algo
despertou seu interesse: uma nova figura destoante do cenário surgia para
conversar brevemente com o sacerdote e, em seguida, se distanciava. Não
precisaria nem perguntar a Rodrigo se ele também tinha visto o mesmo, mas
perguntou de qualquer forma porque era chato.

— E aí, alaruaquibar. — Tentou imitar o som que ouvia constantemente no salão sem
muito sucesso, deixando que a voz fosse transmitida pelos comunicadores
compartilhados antes. — Viu o que eu vi? Temos que segui-los. — Finalizou
aguardando a ação do moreno disfarçado de mulher em burca.

Gabriela vulgo Rodrigo


— Como é? Pode repetir? — Respondi me referindo à pronúncia de Frank,
completamente desconhecedor da cultura islã. Tão desconhecedor como eu.
Apenas sabia falar desta forma pois certa vez atendi um cliente — Enfim. No
momento estava com o rosto agachado, ainda ajoelhado no chão. Foi então que
ergui a vista e contemplei a dupla que se formava. O pregador e o chantagista.
Tremi. Tive vontade de vomitar, mas como não comia nada há horas, nem sairia
nada. Travei de medo, por isso demorei um pouco para respondê-lo. — Vi...vi. Não
acha arriscado...?

Frank Coyote
— Mais arriscado do que voltar sem nenhuma informação para o Pascal? —
Respondeu imediatamente, temendo perder de vista ambos agora que o sacerdote
se juntava ao russo e desaparecia pela passagem lateral do templo. Se demorasse
demais, perderiam o rastro. Começou então a caminhar entre os fiéis que ainda
estavam naquela estranha oração, agarrando o braço de Gabriela e puxando-a em
direção à saída, apressado.

Gabriela vulgo Rodrigo


Não tive muito tempo para dar meia volta e fugir daquele lugar às pressas. Por
causa de tudo, eu tinha me esquecido completamente do Alek e da ameaça dele.
Porém, logo senti meu braço sendo puxado. Olhei rapidamente e creio que seria um
dos homens de Alek ou algum islã. Meu disfarce estaria acabado. Mas então olhei
nos olhos através do turbante e reconheci que eram os olhos do Frank. Em outras
ocasiões, eu apreciaria a forma como ele me segurou, mas agora... Acabei não
relutando, levantando-me e seguindo-o. Como parecia um hábito as mulheres serem
tratadas assim pelos adeptos daquela religião, ninguém se moveu para impedi-lo.
Em pouco tempo, estávamos próximos ao beco, observando-os se afastar. — Como
vamos segui-los? O seu carro e a minha moto ficaram lá trás... — Falei receoso.

Frank Coyote
Assim que saíram pela passagem para fora, viram os alvos entrarem em um furgão
branco. O beco sujo naquele instante poderia até ser bom para despistar o interesse
de dois fiéis em segui-los até aquele ponto. Com a dúvida de Rodrigo, Frank se virou
para olhar a rua próxima no fim do corredor estreito, por onde o furgão escaparia.
Havia uma única moto estacionada em seu campo de visão. Tinha que ser uma
moto, é claro, reclamou mentalmente. — Vamos, não podemos perdê-los de vista. —
avisou para o parceiro correndo até a tal moto, subindo nela e, shame on me,
fazendo uma ligação direta com extrema habilidade. — Tá esperando o quê? Sobe! —
avisou para o outro desejando profundamente que ele não fizesse qualquer piadinha
sobre a situação invertida que agora o pistoleiro estava ao convidá-lo para subir em
sua garupa.

Gabriela vulgo Rodrigo


Ainda sob o efeito do medo, nem sequer havia prestado atenção no beco pútrido
que percorremos. Nem na moto que Frank avistara. Eu apenas acompanhava com o
olhar os dois se afastando cada vez mais, torcendo para que se distanciasse ainda
mais. No entanto, fui chamado à realidade pela voz grave do outro. Olhei para ele e vi
que estava embaixo da moto. Uma moto desconhecida, que acabara de furtar.
Aquilo acabou me fazendo sorrir. Mordi o lábio inferior e desfiz minha forma
feminina para assumir a masculina. Não iria perder essa oportunidade, é claro. —
Nem refiz a barba de antes. Vou te dar um desconto dessa vez. — Ri, já montando na
garupa da moto e envolvendo meus braços no tanquinho repleto de cicatrizes
anteriormente me mostrado. Dali seguiríamos em grande velocidade o furgão. Ainda
assim, deveríamos ser discretos.

Frank, o coiote, rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 10 para manter-se fora de
suspeita que resultou 17 - Total: 1 Sucessos.

X9
— Era só o que me faltava....

Um filtro, deveria imaginar que uma cobertura digital da Aracno poderia ter esse tipo
de coisa, subestimei a inteligência e a tecnologia de Henry Choi, o filho da puta está
me dando um baile… Mas tenho meus meios de burlar o “escudo” que ele pôs no
cassino de Yuric, e é essa nossa diferença, eu não preciso me limitar a meios
apenas tecnológicos, mas sim também sociais, posso “hackear” as pessoas e já
estou fazendo isso quando ofereci o haxixe com radiack para Red. É, se aquele
tapinha na bunda não foi uma prova de confiança, então eu não sei o que é… Mas
ainda não era o bastante, eu sei, não era o suficiente para ter acesso ao sistema
central. Desligando o PC de pulso e desconectando os fios da minha cabeça, Red e
eu começamos a trabalhar, usando os muitos computadores e monitores do meu
quarto que estavam ligados. Iniciamos as digitações em CPUs caseiros normais,
antes de transferir as linhas de digitação que seriam lançadas ao Residencial
Celeste por meio do meu pequeno PC de bordo na hora de reiniciar o sistema de
segurança do condomínio. Um trabalho lento, manual e muito chato que duraria
algumas horas. O bom é que me daria margem para puxar uma conversa. Primeiro
comentei sobre assuntos de informática, tudo bem profissional.

Logo o diálogo se expandiu, sem que ele percebesse, a conversa adentrou campos
mais pessoais. Discutimos sobre diversos assuntos, desde nossas séries favoritas
até questões íntimas. Parece que ele se tornou meu mais novo amigo gay, dizem
que toda mulher tem um, né? No meio do papo, ele mencionou que seu quarto ficava
três andares acima do meu. Bem, essa era a parte fácil que não exigia tanta
confiança, apesar de ser uma informação crucial. Pensando logicamente, se a
boneca é quem comanda a ala hacker, o sistema nervoso central de tudo deve estar
em seu quarto. O próximo passo seria encontrar uma razão para visitá-lo. Mas que
motivo, eu pensei! Eu faria do jeito mais fácil! Eliminar o rapazinho! Levantei-me da
cadeira e dirigi-me ao bebedouro eletrônico no canto do quarto, pegando um copo
de isopor branco e enchendo-o de água. Na mesma mesa do bebedouro havia uma
caixa de ferramentas, onde encontrei um martelo que escondi atrás do corpo. Para
distraí-lo, comecei a falar...

— Sabe… Eu lembro pouca coisa da minha infância… Para falar a verdade… Quase
nada… Só uns carros correndo pelo deserto em um tipo de corrida mortal… Não sei
se isso é uma lembrança ou um sonho… Já que se misturam. As memórias mais
claras são de uma parte adolescência até o presente…. É como se eu me lembrasse
que sempre fui boa com computadores e máquinas. Depois que deu toda aquela
merda na Orion e quiseram me foder jogando a culpa do assassinato do prefeito nas
minhas costas, decidi usar minhas habilidades para ganhar a vida… Afinal de contas,
ela nunca foi boa comigo, por que eu devo ser gentil com ela? — Comentava,
enquanto o copo enchia e fechava os dedos ao cabo do martelo atrás de mim. — E
você, como entrou nessa vida? — Quando o copo encheu, levei a boca, bebendo,
esperando pela história de Red.

— É… É algo que não gosto de lembrar.... — Ele coçou a cabeça.

— Se não quiser contar, tudo bem, vou entender. — Bebi mais um gole de água, um
tanto quanto frustrada.

— Não… — Sentado na cadeira, de costas para mim, ele não deixou de executar o que
fazia enquanto começava sua história.

— Minha mãe morreu pesando 262 kg… — Pausou e continuou.

— Quando criança, eu nunca entendi porque minha mãe não podia vir às reuniões, às
gincanas escolares ou pelo menos me buscar. Era sempre uma babá ou um vizinho
me levando para a escola, pelo menos até eu ter idade suficiente para conseguir
pegar o ônibus sozinho. Sempre que eu chegava em casa, ela estava caída em uma
cadeira, seu queixo gotejava com gordura e molho de qualquer comida de
micro-ondas que ela tivesse comido. A nossa casa inteira fedia, com o cheiro de
manchas de suor ensopadas em gordura e o aroma mofado de um carpete deixado
sozinho por anos. Eu fiquei lá por anos, a minha infância inteira sendo desperdiçada
nesta casa apodrecendo... — Sua voz mudou.

— Comecei a crescer, a minha ignorância se tornou nojo. Era meio que uma
combinação entre vergonha e medo; vergonha, pois era dali que eu tinha vindo, que
era aquilo que eu poderia me tornar, e medo que ela fosse morrer um dia, morrer e
me deixar sozinho nesse mundo. — A voz alternava nuance.

— Eu cresci, furioso. Por que ela não podia melhorar? Por que ela não pode
simplesmente levantar e andar até mais longe que até a cozinha, talvez até fora de
casa...? Uma parte de mim queria deixá-la morrendo de fome, talvez mantê-la
implorando por comida até que derramasse toda aquela gordura de seu esqueleto.
Mas ela ainda era a minha mãe, eu não podia fazer isso, era a única pessoa que eu
tinha. Ainda assim, ter que esfregar entre sua pele e toda a sua gordura flácida com
um pano úmido todas as noites, vesti-la e até mesmo levá-la até o banheiro
começou a acabar comigo. — Seus dedos se fecharam, cerrando o punho.

— Eu estava fugindo quando entrei na faculdade de informática. Pela primeira vez na


minha vida, eu não era responsável por aquela porca gorda que era a minha mãe. Ela
havia ficado na nossa entediante casa em Little Asia, entre dois prédios
condenados, com um cuidador, pago com sua aposentadoria por invalidez. E eu
ficaria livre para viver a minha vida. Foi isso o que eu pensava. Só que sempre há
uma coisa nesse tipo de plano, sempre há alguma coisa que vai te deixar pra baixo e
vai se alimentar de todas as suas emoções e esperanças até não sobrar mais nada.
Pra mim, foi a necrose da minha mãe. Significava que ela estava apodrecendo viva, o
peso do corpo dela tinha esmagado a carne de suas costas, fazendo o sangue parar
de circular, e o tecido morrer. — Red pausou, como que lembrando a cena.

— Isso significava que eu tinha que voltar pra casa e cuidar dela de novo, depois de
só 26 dias de liberdade. Eu voltei ao odor familiar de urina, suor e mofo; mas agora
estava tudo misturado com o cheiro amargo e doentio de carne apodrecendo. Ela
não estava em sua cadeira, como de costume. Em vez disso, estava desmaiada em
um colchão em um quarto que não usava há muito tempo, as molas da cama
rangiam sob seu peso. Ela estava vestida com uma simples camisola azul, quase
como uma roupa de hospital. Levantando a borda inferior da sua camisola, meus
olhos puderam ver que ela estava apodrecendo mesmo. Parecia até que algum
animal raivoso tinha mordido um pedaço dela, exceto que não tinha nenhuma ferida
em carne viva. Em vez disso, havia um pedaço de carne preta, coberta por sangue
seco que escorria das rachaduras das feridas. De repente, a superfície apodrecida
murchou, e minha mãe se virou para me ver. — Nesse momento, a voz ficou
embargada. Eu larguei o martelo atrás de mim e levei a destra até a boca em
formato de “O”, abafando qualquer som que pudesse sair dela.

— Sua testa estava encharcada com suor, seus olhos se afastando dos meus. A
vergonha estava estampada em seu rosto, mas era escondida por um sorriso fraco.
Não. Eu não estava aguentando isso. Eu saí do quarto, fechando a porta. Eu iria lidar
com ela mais tarde. Em vez disso, larguei a faculdade e fui procurar a porra de um
emprego. Mas as coisas em Miraitropolis nunca foram fáceis, sempre foi uma
merda arrumar um emprego decente e tudo ficava cada vez mais caro, a
aposentadoria dela não dava mais conta. Me juntei a Aracno, Henry Choi, achando
que se tratava de um empresário honesto, humpf. — Larguei o copo de isopor
também, esfregando as vistas, tentando não chorar.

— Isso foi um erro. — Um suspiro lento escapou de seus finos lábios.

— Certa noite, quando ela pensou que eu estivesse dormindo, estava a observando
de longe, na escuridão. Vi sua mão encostar em um buraco de carne podre na sua
coxa. Suas unhas raspando e coçando o osso exposto. Ela estava tremendo e
gemendo, obviamente sentindo uma dor extrema quando removeu o curativo. Ela
pegou suas mãos, trêmulas e melequentas e as enfiou na boca. Eu me engasguei
em silêncio, quase vomitando, quando vi ela lamber uma gosma branca entre seus
dedos, fazendo barulhos altos com seus lábios. No dia seguinte, eu cobri sua ferida
com várias camadas de curativo, e tentei esquecer aquela imagem. Eu ainda tenho
pesadelos com isso. — Red largou o que fazia, baixou a cabeça e começou a chorar.

— Não foi a única vez, vi ela fazer isso várias outras depois disso, e eu me afastava
em todas, é claro. Acho que o único motivo pelo qual não falei com ela sobre isso é
porque isso se tornaria muito real, me forçando a enfrentar aquela situação de
frente, e eu não estava preparado. Entre outras coisas, via as atrocidades feitas
pelas máfias que Choi trabalhava... Meus olhos viram coisas que você não imagina.
Trabalhar com os russos, ver todo aquele sangue e gritos… Estava me afetando. —
Ele limpou as lágrimas.

— Enquanto isso, quando voltava para casa minha mãe estava comendo sua própria
carne, amarga e apodrecida, e eu estava deixando ela fazer isso. Sabe qual foi minha
primeira morte? Minha própria mãe… Sufoquei ela com o travesseiro, a coitada se
debateu durante alguns minutos, eu não tinha prática… Ela sofreu… Mas eu fiz isso,
por ela, sabe por que? Não conseguia suportar vê-la naquela situação… Quando
finalmente parou de se debater e morreu, eu nem conseguia respirar, de tão
contaminado que o ar estava pelo cheiro doentio da sua morte. Enfim, eu tive que
ligar para um guindaste para levar os restos mortais da minha mãe. De certa forma,
isso era a parte mais trágica de sua morte: aquela foi a primeira e a última vez que
ela saiu de casa. — Uma lágrima escorreu do meu rosto, solucei baixo para ele não
ouvir.

— Queimei a residência, tanto para receber o seguro quanto para esquecer todas as
memórias. Mas… Às vezes eu me pego pensando na quantidade de sua própria
carne que ela havia comido. Depois que você mata sua mãe, consegue matar
qualquer pessoa... O tempo passou e eu precisando de grana... Aceitei fazer
servicinhos mais pesados para Choi... Tipo... Trucidar pessoas e hackear grandes
empresas... E sou o que sou hoje… — Ele se virou na cadeira, me olhando.

Naquele momento eu percebi que Red não era assim apenas por ser, o cara era tão
vítima dessa cidade imunda e desumana quanto qualquer um. No final das contas
ele só era mais um fodido na vida… E eu não ia conseguir esmagar o crânio dele
com um martelo… Ele ergueu-se cadeira me olhando, eu estava chorando. Caminhou
até a mim, tocando meus ombros.

— Desculpa, eu não queria te fazer relembrar essas coisas… — Falei limpando as


lágrimas.

— Fica sossegada, linda, eu gostei de você, não contaria isso pra qualquer um... —
Ele enxugava as suas, rindo, tentava amenizar o clima triste.

— Bom… Vamos voltar ao trampo, temos muita coisa pra fazer… Mas Red... Vou te
pedir uma coisa... Acho que o filtro pra isolar o cassino está interferindo nos meus
implantes... Essas coisas que coloquei na cabeça estão me dando uma puta
enxaqueca... Tá insuportável... Tem como desativar enquanto a gente trabalha? Ou
não vou conseguir me concentrar de jeito algum... — Levei a destra até a testa,
fechando os olhos e puxando um pouco do cabelo para trás, simulando incômodo.

— Se quiser, eu mesma posso fazer, só tem que me dizer onde fica a central. —
Lembra o que eu disse sobre hackear pessoas? Isso se chama carisma, e eu tentava
com Red.

Galathea
Dedos ansiosos repousavam sobre os gatilhos enquanto os rifles aguardavam a
ordem. Não demorou muito para tudo sair do controle quando os homens
começaram a se matar na pista de pouso. Foi uma das cenas mais insanas que ela
já presenciara.
— O bicho tá pegando feio lá embaixo… — Comentou um dos homens, sendo
respondido apenas com grunhidos de concordância por seus companheiros.

— Chefe… tem um drone sobrevoando o local. — Observou um dos homens ao tirar


seu olho da mira para se reorientar.

O mesmo apontou para o drone até que Galathea pudesse o encontrar. A mulher
observou o drone a olho nú inicialmente e depois com seu binóculo.

— Será inimigo?

— Eu acho que é de notícias. Deve ser de algum canal.

— Devo abater?

— Preciso checar se não é aliado. Não quero abater equipamento do Tony.

E foi o que fez. Mas não houve resposta porque "O bicho tá pegando feio lá
embaixo". E pôde constatar isso ao olhar pelo binóculo e ver o transporte dos
homens de Tony ser virado como um carrinho de brinquedo.

— Preparem-se para abrir fogo... — Ao dizer isso o soou clique uníssono de travas de
segurança.

— SNIPER!

Exclamou a única outra mulher da equipe. E logo após o aviso dela, outra aeronave
foi abatida. Os homens apenas puderam assistir enquanto a mesma caía
descontroladamente.

— Na torre! Ele está descendo!

— Fogo! Mate-o imediatamente!

Os gatilhos dos rifles anti-material foram puxados e uma enorme peça de cobre
maciço disparou em direção ao furgão. O tiro atravessou a lataria do veículo como
se fosse papel. No entanto, para surpresa de todos, nada de importância foi
atingido. O motorista, as rodas, o eixo motor, tudo permaneceu completamente
intacto, deixando apenas um círculo perfeito no metal e seu gêmeo no lado oposto.

— Ele ainda está se movendo!


— Ele não pode deduzir nossa posição a essa distância e só com os tiros.

— Mas vai poder. — Suspirou Galathea. — Eles precisam de nós no aeroporto. Não
podemos esperar pelo atirador. Continue atirando contra o sniper, Ana. Abram fogo
contra os homens de Yuric. E vocês dois, adquiram o alvo da Ana e abram fogo
contra o sniper também.

E assim foi feito. Logo, o que se podia ouvir eram os estalos dos projéteis cortando
o ar a velocidades supersônicas. Mesmo que os sons dos disparos dos rifles
semi-automáticos fossem completamente abafados pelos silenciadores. Já o som
dos outros três rifles contra o furgão era absolutamente ensurdecedor. Apenas por
um piscar de olhos, enquanto mãos habilidosas manuseavam as alavancas para
ejetar e armar o próximo cartucho.

— Mantenham o fogo. Eu quero todos esses russos mortos. Não, não atire no
grandão. Se limitem aos soldados. Se pudermos matar todos eles, os homens do
Tony ficarão mais à vontade para cuidar do resto.

Uroboros rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 16 para acertar sniper que
resultou 14 - Total: 0 Sucessos

Kat
Aeroporto Internacional de Miraitropolis - Uma Mina de Ouro Banhada a Sangue

O primeiro drone chegava a tempo de testemunhar o início da carnificina, enquanto


os russos apanhavam feio dos italianos que fechavam o cerco. A dupla de vigia se
excitava mais a cada frame que seu drone capturou, enquanto parecia que o conflito
se encerrava de forma tão rápida como havia começado. Durante este singelo
downtime, Katterine cutucava o ombro direito de seu comparsa e dizia:

— Agora... agoragoragoragora! Cy! Escaneie esses simplórios! Pegue tudo o que é


tipo de informação deles! Eu quero nomes, rostos, datas de nascimento e contas
bancárias voando na tela! Go, go, go!

— Varredura de Ambiente começando em três segundos...

Falando as lentes captoras do drone focavam agora mais no campo de batalha,


pequenos quadrados se formavam ao redor de faces, armas, equipamentos, e nisso,
vários dados começavam também a preencher a tela. Perfis de pessoas tomavam o
canto direito, parecia que o drone também tinha acesso a algum tipo de banco de
dados enquanto fazia este escaneamento. Mas para a surpresa de todo mundo,
inclusive dos espectadores, os russos tinham uma carta na manga, na realidade,
uma não, algumas...

Do nada, um som de alto de tiro se deu no ar, e logo em seguida, do mais profundo e
mesclante vazio, uma outra aeronave Crow-Z caía, abatida, ao chão, os captores de
som do drone conseguiam seguir a direção na qual o disparo fora efetuado,
conseguindo pegar o momento em que o que parecia ser um sniper deixando seu
local de disparo em cima de uma das torres de controle aéreo. Apesar do tracking, o
drone não teve tempo suficiente de escanear aquele sujeito que partia em disparada
para dentro da torre. Os dois jovens começavam um novo diálogo:

— Mas olha só essa merda! Isso é melhor que os filmes de ação que eu assisti
semana passada!

— Este atirador é bom demais! Ele conseguiu abater uma nave com um tiro! E ela
ainda estava sob efeito de sistema de camuflagem! Sinistro!

— ... Cy, meu queridinho... Não é hora de ficar de piu-piu duro por causa de apenas
um ser humano com um rifle de ação... ESCANEIE ESSE JOÃOZINHO! Eu acho que
vão querer saber quem é esse... El Derubador de Neaves!

— ... ham... Eu concordo, m-mas... Não creio que essa seja a pronúncia desse nome
em Castelhano…

— Tanto faz!!! Só me diga quem caralhos é esse capeta!

O drone ativava seu Scanner novamente, captando enquanto a figura descia da torre
em disparada pela própria parede, o que era uma visão um tanto bizarra.
Conseguindo acompanhar a movimentação dele enquanto os dados do mesmo
eram coletados. A pessoa chegava até uma van estacionada nas proximidades,
entrando nela. Foi quando barulhos de tiro voltaram a acontecer na cena primária de
combate, quando o drone voltou a ação, viu que dois dos sujeitos estranhos do lado
russo, um homem que mais parecia uma massa de músculos ambulante, e uma
garotinha franzina que... Aparentemente cuspia fogo da boca agora? Era muita coisa
louca acontecendo agora, aparentemente os russos tinham suporte metahumano.

Os receptores de ondas sonoras conseguiram captar barulhos de tiros muito altos


vindo de uma outra localidade mais afastada, seriam mais snipers? As triangulações
alcançavam a localidade da fonte, onde um time inteiro de pessoas se encontrava.
Escaneamentos automáticos puxavam as identidades de cada um dali,
enriquecendo ainda mais os chips de memória daquele drone em particular. Foi
quando Katterine agora segurou o ombro direito de seu companheiro, e dizia: Num
tom mais preocupada:

— Cyrus, a merda tá feia agora, é melhor você trazer esse passarinho de volta pra
gaiola antes que alguém resolva brincar de tiro ao alvo com ele! Qual é o status dos
Ospreys auxiliares?

— Ehhh... Eu tenho dois drones de menor capacidade chegando ao aeroporto em


menos de dois minutos, por que?
— Temos de manter a vigilância sobre o local, mas acho que temos o que
precisamos agora para fazer pelo menos um blackmail insano em um dos lados!
Agora só precisamos saber qual dos dois lados vai vencer essa batalha! mantenha
um dos drones em função de observação e o outro como suporte de escaneamento
e vigia auxiliar! E deixe-os beeem acima do combate, seguros da atenção deles.

— Se você quer assim... Então assim será!

Digitando no teclado do console de segurança, Cyrus batia em retirada com o drone


que se encolhia e numa propulsão um tanto rápida saía de cena, pouco depois os
outros dois drones, numa coloração diferente, chegavam em cena, se pondo a
muitos metros acima do campo de batalha, numa distância em que seria difícil
mesmo para pessoas sobre os hangares ou torres de controle identificá-los,
apenas... Se eles quebrarem seus pescoços olhando pra cima.

Katterine mantinha um sorriso sádico, apenas de lábios, em seu rosto, olhando


agora o combate confuso em terra, Cyrus parecia entretido com as cenas,
comandando os drones para que cobrisse áreas distintas de lá.

Katterine rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 2 para coleta de informações que
resultou 20 - Total: 1 Sucessos

Anthony Montana
— Porra chefe, a merda fedeu! Sua nave foi abatida e agora tá uma suruba do
caralho essa porra! O blindando onde estou… Foi arremessado por um gigante, ele
jogou o veículo como se fosse um brinquedo… Eu tô todo fudido… Minha cara é só
sangue, minha perna foi esmagada… Acho que quebrei um braço… Mal consigo
respirar… Talvez algumas costelas estejam trincadas… Tá doendo muito… Acho que
vou precisar de um baço novo… Ai ai… Ai… ME SALVA, EU VOU MORRER!

— Deixa de ser viado! Quando era da polícia fui pego numa emboscada e levei
quatorze tiros. Matei os chupa-rola usando apenas uma pistola e um cartucho de
munição! Não tive ajuda de ninguém! — Ok… Isso não era totalmente verdade, Caz
me ajudou e salvou minha vida, mas a história serviria pra inspirar Jesse. — Agora
me reporta a merda que tá rolando aí!

— Tá… É tiro e explosão pra todo lado! Sinceramente eu preferia apenas ficar
dirigindo seu carro. — Disse Jesse pela pulseira comunicadora, se encontrava entre
as ferragens do blindado.

— Para de chorar, considere isso seu batismo! Vocês só precisam pegar a filha do
pau no cu do Yuric! É muito difícil? Deixa a carga pra o Xiaren, problema dele! Só
pega a vadia russa e trás ela aqui! — Ordenei

— Eu to perdido chefe… Tô encolhido igual um bebê! E tremendo como uma vara


verde! — Choramingava Jesse em posição fetal, dentro do blindado virado de rodas
para cima, mas que lhe dava abrigo.

— PUTA QUE PARIU! SAI LOGO DESSA MERDA E VAI AJUDAR A AKANE OU O
PEEBOY! CARALHO! — Gritei em frente à pulseira.

Jesse respirou fundo por três vezes, fechou os olhos e tentou sair debaixo do troço.
Mas falhou, não conseguia. Por sorte, um soldado de fora veio em seu auxílio e o
puxou para fora. O militar o colocou em seus ombros e o levou para uma área mais
segura, atrás da torre de comando. Meu chofer estava tão assustado que esqueceu
de desligar a pulseira comunicadora. Pelo menos assim eu conseguia ter uma ideia
do que estava acontecendo. Castelone não conseguia relatar sua situação de volta,
mas o outro soldado captou um sinal vermelho intenso por pura sorte em seu
campo de visão. Ele rapidamente fez uma conexão entre as naves abatidas e a
direção de onde o brilho escarlate era emitido, supondo que os disparos poderiam
ter vindo dali. Os militares são incríveis por causa disso, até mesmo o mais
inexperiente deles sabe o que fazer em momentos como esse, ao contrário desse
maldito Jesse. Mas a culpa é minha por colocar alguém inexperiente em uma
operação desse porte. O homem pegou seu rifle de assalto M416 – estranhamente
uma arma diferente das que forneci aos meus homens – e, sem pensar duas vezes,
foi em direção à luz carmesim. Poderia ser uma máquina, um ciborgue, um sniper ou
algum equipamento de tiro moderno, não dava para saber. Destemido, ele contornou
a torre e se deparou com um furgão em fuga.

Ele disparou uma sequência de tiros contra a porta dupla traseira do furgão,
deixando uma trilha de buracos na lataria. Restava ao militar apenas observar a fuga
do veículo. No entanto, algo havia caído do automóvel. O soldado se aproximou e
pegou a placa do carro. Enquanto retornava para perto de Jesse, eu tentava
acalmá-lo.
– Tudo bem garoto, é sua primeira missão, é normal ficar travado.... Mais sorte na
próxima. – Falei pela pulseira, nem ele sabia que estava ligada.

– Poderia ter feito mais… – Suspirou.

– Já disse, até que tu não foi tão ruim. – Comentei. Era mentira, ele foi um cu!

– Chefe, olha isso, a placa do furgão. – Jesse pediu o objeto ao militar, mostrando
na tela da pulseira holográfica.

– ÓTIMO! Talvez ela possa nos dar pistas de quem eram esses boqueteiros que
abateram as naves. Guarde a placa e se coloque em uma posição que eu possa ver
Akane e PeeBoy.

Se esgueirando pelos cantos, usando as sombras como camuflagem, o soldado


bucha se aproximava mais da confusão formada pela duplas de encrenqueiros que
dava trabalho para Akane e PeeBoy. Jesse Castelone se mantinha sentado mas
sangrando muito, entretanto protegido pela torre de controle, suspendendo o braço
bom para frente, acionando o infravermelho para que a pulseira pudesse captar as
imagens noturnas. E realmente, eu via um cara gigante e uma mulher no meio de
uma fumaça fodida que tirava mais detalhes da visão, mas que porém estava se
dissipando aos poucos. Mas o chão tinha os corpos de alguns homens e muito
sangue. PeeBoy e Akane foram encurralados pelos dois sujeitos estranhos. Como
um felino espreitando a presa, o militar ignorou tudo e todos a sua volta, tocando o
foda-se geral se lançou por trás da mulher, usando seu braço esquerdo direito para
lhe dar uma gravata e com a faca de combate na destra, rasgar sua garganta.
Aquele ato corajoso e violento serviria como distração chamando a atenção do
parceiro gigante. Também ia ajudar PeeBoy a agir. Contudo, para minha surpresa,
quando a fumaça se dissipou eu vi o Cowboy do deserto abatido na pista, envolta de
uma poça de sangue.

– MERDA! PEEBOY!!!! NÃO!!! – Gritei vendo a cena.

Na mesma hora me preocupei com Akane, ela poderia ter sido também abatida pela
cortina de fumaça traiçoeira da outra mulher, mas para meu desespero eu não
conseguia vê-la. Mas aquele soldado bucha mais parecia a porra de um ninja do que
um militar, depois de rasgar a garganta da mulher, ele fez uma manobra muito louca,
essas coisas de jiu- jitsu brasileiro. Usando as pernas e os braços, envolveu a moça
numa imobilização a qual rolou pelo chão para gerar impulso e arremessar o corpo
da mesma contra o parceiro musculoso. Recebendo a encomenda nos braços, o
grandão perceberia que sua amiga estava jorrando sangue pelo pescoço e com
quatro granadas presas ao corpo. Depois disso meu irmão... Quando se dá conta
disso… BOOOOM! A explosão se fez barulhenta, poderosa e potente. Pela intensa luz
e a fumaça negra que se ergueu depois, não dava pra apostar na perda ou ganha
desses dois manés. Mas sei que o grandalhão era resistente o bastante para servir
de escudo e absorver boa parte dos danos e impacto da explosão, além dos
estilhaços, servindo quase como escudo humano para PeeBoy, Akane e quem
estivesse mais perto. Sabe o que foi ainda mais foda? O soldado bucha ninja sumiu
assim como apareceu!
– CARALHO, CARALHO! OLHA O QUE ESSE CARA TÁ FAZENDO! TÁ COMENDO O CU
DE TODO MUNDO NESSA CARALHA! VOU PROMOVER ESSE SOLDADO BUCHA!
APRENDE COMO SE FAZ, JESSE!! AGORA ENCONTRE AKANE, SEU MERDA! - Minha
maior preocupação apesar de confiar totalmente nela.

Peeboy rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 15 para desviar dos tiros e se livrar
da cortina de fumaça que resultou 5 - Total: 0 Sucessos

Soldado bucha rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 14 para rasgar a garganta
da replicante que resultou 16 - Total: 1 Sucessos

Soldado bucha rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 18 para arremessar a


replicante com granadas presas ao corpo que resultou 18 - Total: 1 Sucessos

Akane
Akane rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 15 para defesa que resultou 19 -
Total: 1 Sucessos

Eu não estava prestando atenção no que estava ao meu redor, nessa guerra entre
subordinados. Eu estava bem equipada por culpa de Tony, então não me
preocupava. Nem mesmo um tiro que acertou uma aeronave até então invisível me
abalou. Qualquer um me veria como uma pessoa desatenta no meio de uma guerra,
mas a realidade era outra. O meu corpo foi modificado, então eu não precisava olhar
para algo para saber o que era e o que fazia, eu simplesmente sabia. O mesmo era
com os braceletes que raramente tirava dos pulsos e que estavam invisíveis.
Invisível também estava o Mercury, ou melhor, uma bola de metal que sempre me
seguia.

Meu olhar ia do mendigo para o avião. Eu sabia que a megera russa estava lá com
mais gente. Sabia que entrar sozinha seria desastroso uma vez que tinha muita
gente lá dentro. O barulho era muito palpável aos meus ouvidos, mas como estava
acostumada, não me irritava. Apesar de todo o conflito, ficar parada era letal, então
tive que andar, ainda junto de Peeboy. Nada de conversa entre nós, apenas um
cooperando com o outro. Anos atrás isso era impossível para mim, mas uma hora
eu tinha de me adaptar a sociedade e a tapear melhor ainda.

Duas figuras no meio de sardinhas eram especiais. Não eram humanos comuns, se
é que pode chamá-los assim… Eram diferentes, só me foi registrado assim com uma
tarja de perigo. Talvez eram semelhantes a mim, modificados geneticamente… E
assim que me dei conta destas presenças um deles veio na minha direção na
ofensiva. Não prestei atenção de onde veio o fogo que ela jogou em cima de nós
(Peeboy ainda do meu lado). Não temi final, eu tinha tudo sob controle e desta vez
tinha a bolinha metálica comigo. Ainda invisível, a esfera de metal líquido se moldou
numa placa com uns 5 centímetros a mais que minha altura e o dobro da minha
largura. Como uma parede bem sólida e visível para qualquer um ver (a colisão com
o fogo desativou a invisibilidade), o dano do fogo foi repelido e consumido pelo
metal. Era uma ótima defesa, mas obstruía-me a visão. Sua cor era de um metal
bruto um pouco mais brilhante que o normal. Assim que fiquei fora de perigo, a
parede se desfez e o metal voltou para sua forma líquida e redonda. O mecanismo
de invisibilidade voltou a ativa também.

– Baron, pare de brincar e faça o que tem que fazer, inferno!. – Resmunguei através
do nosso comunicador.

Baron Samedi, por outro lado, estava brincando com um dos guardas russos. Outros
o viram e com suas armas cuspiram balas na sua direção. Só se ouvia a risada
pesada e lenta. Quando a cortina de fumaça abaixou só se via ainda em pé a vítima
“zumbi” dele, com o corpo inteiro de perfurações das balas e rosnando como um
bicho qualquer. Demorou para ele cair tanto morto realmente como paralisado
(precocemente). E onde está o mendigo? Sua risada era ouvida, mas sua presença
era oculta.

Bem, ele puxou seu brinquedo para receber os tiros e saltou para o lado com
extrema agilidade incomum a um humano. Ele estava num ângulo camuflado do
campo de visão dos atiradores e ainda colado ao avião. Ele recebeu a ordem de
Akane e bufou descontente. Decidiu então, um tempo depois, ir para o ataque. Afinal,
diferente da experiência de Daniel Carwell, a do governo teve umas modificações,
mesmo esse mutante sendo uma falha. Então digamos que, no quesito de físico, ele
tinha habilidades de outros animais (coisas básicas, percepção, agilidade,
velocidade…).

A bengala que sempre estava com ele era uma arma, uma espada disfarçada. Ela
seria usada para abrir caminho, assim como sua toxina também. Quanto mais
vítimas, mais caos e proteção ele teria e mais ele ria. Muitos achariam sua risada
tenebrosa. Muitos independente do lado que estavam seriam infectados e ficavam
mais violentos e irracionais depois de uma breve “morte”. Seu alvo era dentro do
avião e qualquer um no seu caminho seria infectado, principalmente o verdadeiro
alvo. Como um gato astuto e rápido, ele entrou livre de qualquer intervenção de fora
(talvez…) e no interior da aeronave, foi à caça do alvo. Uma cuspida era poderosa, se
a pessoa receber duas cuspidas da toxina, ela perde o tempo de zumbi
descontrolado e já cai totalmente paralisada e a madame russa seria o alvo das
duas doses.

– Beaux rêves mademoiselle – Diria ele caso pegue a mulher.

Assim que vi o mendigo entrar no avião, me apressei para correr até as suas
turbinas. Sem elas o avião não passa de um monte de lata inútil. Os tiros para
explodir e distrair quem estiver dentro seria feito pela bazuca nas minhas costas.
Peguei a arma e a montei rapidamente, a destravei e por fim, atirei contra o avião. A
munição era mais pesada e era mais que suficiente para destruir todas as turbinas.
Logo após o feito, corri para uma área segura, afinal não deixariam barato o dano
feito. Apesar de ter sido uma garganta humana, eu fiquei feliz com meus atos.

Narrador Capítulo 4
A porta do luxuoso escritório na cobertura do Cassino Gennadi se abria, Albino
adentrava a ampla sala com certa urgência. O líder criminoso Yuric repousava na
aconchegante poltrona de couro marrom, despertou ao escutar o som da porta
abrindo. Albino parava frente ao seu chefe e foi direto ao ponto. – Trigger acabou de
nos contatar, precisamos enviar reforços ou logo irão chegar ate Margareth. – Yuric
ajeitava sua postura na poltrona, levando sua mão esquerda até seu queixo,
passando seus dedos sobre ele. – Meu pai tinha um ditado: um jogador de verdade
deve sempre manter a roleta girando. – Albino não entendia o que Yuric quis dizer. –
E o que faremos senhor? – Perguntou com uma expressão que demonstrava certa
urgência pela resposta. – Acalme-se meu bom amigo, eu cuidarei disso, apenas
contate o Turco e peça um vídeo de trinta segundos do irmão imbecil do Fernando.
– O braço direito concordou com a cabeça, saindo do escritório e fechando larga
porta de madeira verdadeira.

Caminhando pelo largo corredor amarelo iluminado por luzes brancas e decorado
com enormes telas que mostravam imagens do que um dia havia sido a natureza,
Albino levou o bracelete do seu braço direito, que possuía uma tela retangular ate
sua boca. – Ligação para Turco. – Uma imagem com rosto do traficante de armas
surgia na pequena tela, sinalizando que a ligação tinha sido aceita. – Diga
branquelo. – Falou Turco com um sorriso de canto de boca. – Grave um vídeo do
Crazy Dog e me envie o mais rápido possível. – Albino respondeu em tom de ordem.
– Pode deixar, logo te envio.
30 minutos depois Albino recebia o vídeo no seu dispositivo de comunicação, voltou
para o escritório de Yuric, que agora estava sentado atrás da escrivaninha de
carvalho com uma taça de vinho na mão. – Pronto, estou com o que pediu. – Yuric
colocou a taça na mesa. A calma que ele demonstrava assustava até mesmo Albino,
afinal, qualquer homem com uma filha em perigo ficaria no mínimo irritado, ainda
mais uma filha que poderia ser usada para enfraquecê-lo na guerra que tinha
iniciado. – Ligue para Policia ParaMilitech, faça uma denúncia anônima sobre o que
está havendo no aeroporto. – A expressão do russo demonstrava toda sua
confiança. – Mas senhor, nossos homens podem acabar sendo presos. –
Questionou o Albino o plano do seu chefe. – O que há Albino? Não confia no seu
chefe? – O homem apenas abaixou a cabeça. – Me desculpe, só não entendo o que
você pretende fazer.

– Tenha calma, tenho tudo sob controle. – Yuric apertou um botão na parte de baixo
da mesa, ativando um holograma azul que flutuava acima da escrivaninha. – Esse é
um documento legítimo que nossos queridos advogados proporcionaram. Esse
documento basicamente diz que as armas são legais e vão ser usadas para
segurança do meu cassino, pois sou um homem muito sistemático que não confia
na segurança deste país. – Albino erguia ambas as mãos, batendo uma série de
palmas. – Realmente te devo desculpas, você é um gênio senhor Yuric. – Yuric
desligou o holograma e abriu uma gaveta, pegando uma caixa de charutos Atlântico.
– Sente-se meu bom soldado e fume um charuto comigo. – Ele retirava um da caixa
de madeira e colocava na boca, acendendo com o isqueiro que estava em cima da
mesa.

– O corpo geralmente leva um tempo para assimilar esse tipo de modificação, ainda
mais com implantes desse tipo. – Disse Red, aproximando-se de X-9 para olhar mais
de perto os implantes que ela havia colocado. – Acho muito difícil ser o filtro que ta
causando sua dor de cabeça. – Ele colocou as mãos no ombro dela, fazendo um
movimento de massagem. – A freqüência utilizada no sistema é muito baixa para
interferir em qualquer coisa eletrônica dessa forma, ainda mais em implantes, com
certeza deve ser seu corpo se acostumando. – Ainda fazendo a massagem nos
ombros da hacker, Red seguiu falando. – Acho que no mesmo armário que você
pegou a maconha tem uns analgésicos, tome alguns e vamos voltar ao trabalho.

Ele então voltou para cadeira, antes de voltar ao trabalho de fato, ele fez mais uma
pergunta para X-9. – Yuric não é o tipo de pessoa que você se aliaria, você parece
ser uma pessoa tão boa X, totalmente o oposto daquele russo megalomaníaco.
Então me diz, entre todos os outros criminosos menos piores, porque escolher
trabalhar para ele? – Perguntou Red, voltando a digitar no teclado enquanto linhas
de códigos surgiam na tela. Ele seguiu fazendo isso durante dez minutos diretos,
seus olhos não piscavam durante esse tempo. – Opa! – Ele se levantou da cadeira,
caminhando até uma bolsa de mão vermelha que estava em cima de um criado
mudo ao lado da cama, abriu a bolsa e pegou uma Desert Eagle cromada.

– Eu sei a resposta. – Falou para X-9 que ainda estaria no banheiro procurando os
analgesicos. – Eu não falei nada de filtro para você florzinha, só quem sabe sobre
ele sou eu, Yuric e o Albino. Com a desconfiança que eles possuem em você,
acredito que nenhum dos dois falou com você sobre. – Quando X-9 saísse do
banheiro, Red estaria de pé segurando a pistola com ambas as mãos, apontando-a
para a hacker. – Então a resposta para você querer trabalhar para o Yuric é apenas
uma, pretende roubar informações e mandar para fora daqui, para seu verdadeiro
chefe. – Ele esboçou um sorriso de canto e colou o dedo no gatilho. – Gostei de
verdade de você sua vadia, fui com tua cara, por isso vou te dar a chance de se
explicar antes de entregar você numa bandeja para o Yuric.

O furgão seguiu por ruas próximas a Avenida Armitage, era uma estratégia para
tentar evitar o grande fluxo de carros da avenida, que sempre tinha
congestionamentos. Após cerca de duas horas perseguindo o veículo branco, a
dupla de “espiões” enviados por Pascal começaria a notar o cenário mudando, pois
estava adentrando em Miraitroide, o bairro onde as luzes de neon simplesmente
dominavam tudo. Tudo possuía lâmpadas neon, desde postes de energia a tinta das
paredes dos edifícios e casas, o bairro parecia uma verdadeira árvore de natal num
nível exagerado de decoração.

Rodrigo e Coyote seguiram seu alvo por mais vinte minutos, até chegar numa rua
menos movimentada do iluminado bairro. O veículo parou de frente para uma casa
de shows toda iluminada por luzes azuis, a música tocada lá dentro podia ser ouvida
claramente do lado de fora. O local era um edifício de quatro andares que era usado
geralmente para shows de banda de eletro rock e punk, que faziam sucesso entre a
juventude perdida de Miraitropolis, além de ser um forte ponto para venda de
drogas. O furgão parou ao lado de outros veículos que estavam estacionados no que
deveria ter apenas um estacionado. Alek, o sacerdote e o motorista saíram do
veículo, caminhando até a entrada da casa de shows, onde havia uma longa fila para
entrar.

O par de seguranças simplesmente abria espaço para que Alek e os outros dois
pudessem entrar no estabelecimento. Para Coyote e Rodrigo ficaria óbvio que a
casa de shows fazia parte dos negócios de Turco, pois os seguranças na porta
possuíam traços árabes. A dupla precisaria decidir o que fazer a partir daquele
ponto, iriam arriscar entrar no edifício para descobrir mais ou voltariam para avisar
Fernando sobre o que tinham descoberto até ali?
A primeira reação de Margareth foi de susto, ela parecia ter dado de cara com um
fantasma quando Gal atravessou a porta da sala e a segurou no ombro. A russa era
familiarizada com melhoramento genético e experiências para criação de
super-humanos, mas nunca tinha visto alguém fazer nada tão absurdo antes.
Entretanto, a expressão de Margareth mudou no momento em que Gal a ameaçou
de morte, a russa começou a gargalhar na cara da ladra. – Você não vai me matar,
vadia. – A filha de Yuric após dizer tais palavras moveu sua cabeça para frente,
golpeando Gal com uma forte cabeçada no rosto.
O golpe fez com que Gal cambaleasse para trás, soltando Margareth. – Caso vocês
quisessem mesmo me matar, já teriam explodido esse avião de merda vinte minutos
atrás. Eu sei que me querem viva, sou um trunfo contra meu pai. – A russa com um
sorriso sínico no rosto moveu seu punho esquerdo contra o estômago de Gal,
aplicando um forte soco e logo depois moveu o direito contra o rosto da
super-humana, aplicando um cruzado na lateral do rosto. Gal tombaria desnorteada
com o rosto roxo sobre uma das paredes da sala executiva. – Sempre me falaram
que as mulheres de Miraitropolis são um bando de vacas burras, parece que é
verdade. – Falou com seu forte sotaque russo enquanto deu alguns passos para
trás, ficando ao lado de uma mesa onde havia uma faca de cortar pão. – Tá na hora
de virar bife, vaquinha de laboratório. – Margareth pegou a faca com sua mão direita
e avançou com tudo na direção de Gal com o objetivo de esfaqueá-la na barriga.

O atirador contratado por Tony pisava fundo no acelerador do furgão blindado,


abaixou a cabeça ao escutar o primeiro disparo que atingiu a lataria do seu veículo.
– Merda! – Resmungou enquanto tentava localizar os atiradores, entretanto os
disparos constantes contra o furgão tornava tudo mais difícil. O som do pneu
estourando fez com que ele arregalasse os olhos, mas manteve a cabeça focada no
seu objetivo, que era chegar até a próxima torre. Freou o carro bruscamente,
parando com a porta do veículo praticamente colada na porta da torre de comando,
retirou uma pistola da lateral da coxa, atirando contra a fechadura da porta. – O
desgraçado italiano chamou a cavalaria toda, ele tem atiradores em posição. – O
sniper então agarrou a mochila onde seu rifle estava e saltou contra a porta da torre
que já estava com a fechadura destruída, ele praticamente caiu do lado de dentro. –
dez segundos vocês terão a localização dos amadores metidos a atiradores.

Ele subia as escadas com olhos fixos na parede, seu olho esquerdo cibernético
permitia que ele pudesse enxergar através dela e em longas distâncias além de
possuir um HUD que lhe mantinha ciente de algumas informações. Não demorou
muito para que ele encontrasse o grupo de pessoas armadas num apartamento de
um prédio residencial a alguns quilômetros do aeroporto. – Prédio residencial azul a
alguns quilômetros do aeroporto, tem um pequeno grupo bem armado em um
apartamento com luzes apagadas, tentarei abater alguns deles. – Após falar tais
palavras subiu mais alguns lances de escada, ficando no que seria o sexto andar da
torre de comando. Ele colocou a bolsa no chão e a abriu, o som das peças se
encaixando logo foi ouvido, segundos depois ele estava com seu KII Rifle montado e
pronto para usá-lo. O atirador colocou a ponta do cano na parede, depois colocou
seu olho sobre a mira, sua respiração parou e seu dedo indicador esquerdo apertou
o gatilho. O projétil perfurou a parede da torre, cortando o ar até atravessar uma das
janelas do apartamento onde Galathea e seus homens estavam, atingindo um deles
no peito.

Enquanto isso o combate ao lado do avião acontecia sem parar, sangue e membros
dilacerados eram espalhados por toda pista, o responsável por grande parte disso
era o replicante Nine-6, que com suas mãos enormes arrancava braços, pernas e
cabeça dos soldados de Tony. Peeboy foi atingido em cheio pela rajada de fogo
disparada pela replicante Nine-10, as chamas queimaram parte do seu traje tático
causando algumas queimaduras por todo seu corpo, além disso, ele era atingido por
dois tiros caindo no chão inconsciente, já Akane por outro lado não sofreu nenhum
arranhão, pois utilizou um dispositivo que a protegeu, para completar a ruiva letal
usou uma lança míssil para explodir uma das turbinas do avião. O mendigo aliado de
Akane adentrou o avião com uma espada em punho, aproveitando do pequeno
grupo de homens que havia infectado com sua toxina para usar de distração,
entretanto ao chegar na porta da sala executiva, onde Margareth e Gal estavam
dentro, ele se depararia com dois homens armados com metralhadoras e um robô
de combate que possuía uma arma giratória no lugar de um braço, que protegiam a
porta. Ao vê-lo o robô junto com os homens dispararam sem pensar duas vezes
contra Baron.

Um soldado desconhecido agarrou Nine-10 pelo pescoço, cortando a garganta da


replicante com uma faca. Ela não teve tempo de revidar ou defender-se do soldado
misterioso, que logo depois usou um golpe de Jiu-Jítsu para jogá-la na direção do
replicante grandalhão. Ele virou no exato momento, agarrando a parceira que
sangrava, porém antes que pudesse socorrê-la ou revidar, as granadas que o
soldado havia colocado no corpo dela explodiram, jogando o Nine-6 alguns metros
para trás. As coisas só pioraram para o lado de Yuric, pois os soldados de Galathea
usando a vantagem da distância derrubaram alguns homens russos com tiros na
cabeça. Nine-6 após a explosão teve o corpo coberto pelo sangue da sua parceira,
parte da sua roupa estava rasgada, ele olhava em volta e via os pedaços de Nine-10
espalhados no chão. – Vou matar todos vocês, esmaga-los feito moscas. O
replicante correu na direção de Piboy e Akane como um elefante enfurecido prestes
a esmagar um caçador. Seus olhos mostravam pura ira, ele iria matar qualquer um
para vingar Nine-6. Peeboy era um alvo fácil no chão, caso ninguém tentasse parar
Nine-6, ele iria esmagar o cowboy da cidade e depois avançaria com tudo para cima
da ruiva.
Pietro parou por um momento ao escutar as palavras de Chris, parecia não saber
mais como agir depois de escutá-lo. – Santino, chame o Pascal. – O homem careca
obedecia Pietro e subia as escadas para os andares superiores rapidamente. Pietro
retirou o bastão de baseball do peito do mensageiro, sorrindo sem jeito. – Foi mal
cara, não sabia que trabalhava para o Xiaren. – Apoiou o bastão sobre o ombro,
afastando de Chris após se desculpar.

Minutos depois Fernando descia as escadas com uma garrafa de cerveja na mão, as
olheiras somadas as suas vestes bagunçadas e sua expressão cansada deixava
claro que Fernando Pascal estava no seu limite, ter seu irmão seqüestrado foi um
abalo forte para o cafetão mais bem sucedido da cidade, já que Crazy Dog é a única
pessoa que Pascal tem no mundo, quem sempre o apoiou e o manteve sempre
protegido. – Xiaren, Xiaren, Xiaren. – Deu um gole na cerveja. – Ele é um bom amigo,
mas no fim das contas foi por culpa da ideia dele de pacificar as coisas que acabei
nessa merda de guerra.

Pascal apoiou seu corpo no corrimão da escada, dando mais um gole na cerveja. –
Porém, independente disso, eu ainda estou com ele nessa. Apenas estou focado em
tirar meu irmão das garras daqueles filhos de uma puta desgraçados. – Finalizou a
cerveja e fez um sinal para Pietro. – Soube que quase arrebentou o garoto,
compense ele com uma puta ou um puto, pela aparência dele não sei do que gosta.
– Pascal subia as escadas, saindo das vistas novamente.

Pietro então aproximou novamente de Chris, fazendo um sinal para outro capanga ir
buscar uma das prostitutas que ainda estavam na boate. – Fique aí no sofá, vai
ganhar uma dança e depois o que quiser dela. – Sorriu Pietro de forma forçada,
tentando parecer amigável. Uma puta vestindo uma capa de chuva transparente sem
nada por baixo saia de um dos cômodos, ela possuía cabelo platinado com mechas
verdes e belos peitos siliconados. – Esse é Judy, divirta-se amigo. – Pietro e os
outros capangas presentes na Vênus voltavam para seus postos, deixando a
prostituta dançando no colo de Chris.

Um garoto de rua com menos de 10 anos de idade caminhava na direção da boate


Vênus, ele segurava uma caixa de papelão quadrada nas mãos. – Seu merdinha,
pare aí mesmo ou irei matá-lo. – Gritou um dos seguranças de uma das janelas, o
garoto que tremia parou de caminhar, levando uma das mão dentro da caixa, tirando
para fora uma tela portátil. – Uma mensagem do Sr. Yuric para Fernando Pascal. –
Os homens ficaram sem saber como agir ao escutar as palavras do menino, um dos
capangas fez um sinal com a cabeça sinalizando para outro ir até o garoto e pegar a
tela. – Caralho, essa merda pode ser uma bomba, não vou lá não. – O homem que
tinha dado a ordem respirou ao escutar o outro se acovardar, ele então saiu da
janela e logo depois sai pela porta da frente na boate apontando o fuzil para o
garoto. – Não faça nenhuma besteira garoto. – O garoto continuou parado tremendo
de medo, quando o capanga de Pascal pegou a tela portátil da mão dele, o menino
jogou a caixa de papelão no chão e saiu correndo. O latino observava o aparelho,
examinando-o caso fosse uma bomba ou algo do tipo, chegando a conclusão que
era apenas um tela mesmo, que já possuía um chip de arquivo dentro.

Ele voltava para dentro da boate às pressas, Pietro que já tinha sido avisado por
outro segurança sobre a chegada do “presente” de Yuric acompanhava ele junto
com mais dois sujeitos. Chris Falcon presenciou esse acontecimento e caso
quisesse poderia tentar descobrir o que tinha na tela portátil, mas para isso
precisaria ser um verdadeiro espião. Os homens de Pascal subiram as escadas até o
escritório do chefe, abrindo a porta com certa urgência, Fernando estava cheirando
uma carreira de pó de neon quando seus homens entraram, ele levantou seu rosto
com seu nariz brilhando de verde florescente. – Esqueceram como se bate numa
porta? – O problema era que Fernando havia parado com as drogas já fazia dois
anos, com tudo que tinha acontecido ele agora teve uma recaída. – Chefe, Yuric
mandou um garoto de rua entregar isso para você. – Pascal se ajeitou na cadeira e o
capanga colocou a tela portátil sobre a mesa, o cafetão então esfregou a mão
direita no nariz, apertando o botão de ligar do aparelho logo depois.

Um vídeo de trinta segundos mostrando Crazy Dog deitado em uma cama com uma
espécie de máscara de oxigênio sobre a boca e o nariz, a imagem então saia de
cena, dando lugar ao rosto de Yuric. – Olá meu bom amigo, como acabou de assistir,
seu irmão vem sendo mantido sedado e bem cuidado desde que Turco o pegou.
Então irei direto ao ponto, me entregue Montana e terá seu irmão de volta sem
nenhum arranhão. – A tela se apagava ao final das palavras do russo, os olhos dos
homens de Fernando presentes na sala se cruzaram, todos estavam abismados
com a proposta que Yuric tinha acabado de fazer.

Pascal levantou da cadeira, pegando virando a mesa de ponta cabeça num impulso
fúria. As garrafas de cerveja, os pinos de pó de neon e a tela portátil caiam se
despedaçando no chão. – Filho de uma cabrita do inferno, russo filho do satanás. –
Gritava para os quatro ventos caminhando de um lado para o outro no escritório,
parte disso era devido ao efeito do pó de neon. – Se eu não fizer isso, ele vai matar o
Joaquim. – Joaquim era o nome de batismo de Crazy Dog, Pietro e os outros
ficaram paralisados, era quase como um choque assistir Pascal que era um homem
calmo naquele estado. – Tudo vai para o inferno depois que eu atacá-lo. Contate
Hurt, precisaremos de um homem como ele na jogada – Pietro deu um passo a
frente com um olhar assustado. – Hurt, o sicário?

Ao mesmo tempo em que Fernando recebeu a mensagem, a ParaMilitech colocou


dois dos seus caminhões blindados recheados de soldados fortemente armados
vestidos com seus trajes hi-tec rumo ao aeroporto. Dentro de cada caminhão havia
doze homens, era uma operação feita com base numa denúncia anônima, que
afirma ter visto um grupo de pessoas fortemente equipadas tentando roubar a carga
de um avião no Aeroporto Internacional de Miraitropoles.

– Bravo-A, siga para o prédio. – Disse o capitão da equipe do segundo carro através
do comunicador do seu capacete. – Entendido, Bravo-B. – O primeiro veículo entrava
em uma das ruas secundárias, mudando sua rota para chegar ao prédio onde os
atiradores do Uroboros estavam posicionados.
Os dois veículos eram idênticos, ambos com oito pneus, azuis e equipados com o
que tinha de melhor no mercado. Os oficiais vestidos com seus trajes foram
treinados dia e noite, além de possuir uma condição física quase anormal, eram
literalmente o ápice da condição física que um ser humano comum poderia
alcançar. O tempo de chegada deles até o aeroporto e o prédio era de 12 minutos, as
sirenes estavam ligadas para que os veículos na rua abrissem caminho para os
caminhões que avançavam em alta velocidade. Caso Tony ou Galathea não
tivessem um informante dentro da polícia, logo seriam surpreendidos pela mesma.

1- X-9 quase opta por atacar Red, terá que rolar um D20 com dificuldade 14.

2- Rodrigo e Coyote não precisam rolar dados neste capítulo.

3- Gal vai precisar rolar um D20 com dificuldade 13 para defender-se do ataque de
Margareth e para atacá-la um D20 com dificuldade 12.

5- Galathea terá que rolar um D20 com dificuldade 17 caso deseje atacar o atirador
dentro da torre.

6- Akane precisar rolar um D20 com dificuldade 15 para defender-se do replicante


Nine-6 e um D20 com dificuldade 18 caso deseje atacá-lo. Também terá que rolar
um D20 com dificuldade 15 para Baron defender-se da rajada de tiros.

7- Katterine tá livre para contatar qualquer um dos chefes mafiosos para vender as
informações que conseguiu.

Gal Bordeaux
— Desgraçada! — Foi a reação natural de Gal diante das agressões sofridas. Como
se estas não bastassem, a russa ainda empunhou uma faca de pão de uma mesa
próxima e desferiu um golpe certeiro contra a barriga da meta-humana. Ainda que
trajava um uniforme modificado cientificamente para adaptar-se à sua invisibilidade,
e tendo consequentemente um tipo de material divergente das vestes comuns, este
não foi capaz de impedir a investida. O metal atravessou tanto o tecido rosado como
sua pele, fazendo a loira mirainiana gritar de dor.

Com um impulso natural, Gal tentou socar o rosto da agressora, mas esta desviou. A
verdade é que mesmo se acertasse não ia causar grandes danos, dada a baixa força
física e a ausência de qualquer treinamento nesse sentido. O único bem dessa
tentativa frustrada foi que a russa acabou se afastando um pouco para desviar,
sorrindo cinicamente. Estava comemorando a vitória. O ódio que Bodeaux sentiu foi
enorme, mas estava completamente impotente. Qualquer outra investida contra a
mulher seria completamente falha, ela já previa. Pôs as mãos no ferimento,
pressionando-o, contendo o sangramento. Margareth certamente tentaria comentar
com os guardas sobre a invasora. Ou se ainda quisesse se vangloriar ainda mais,
tentaria atacar mais uma vez. Gal pensou em algo, então.

Retirou o colete rosa agora manchado de sangue e o deixou cair para trás. Ficou
com o tronco completamente nu, tendo algumas partes do seios tampadas pelos
antebraços, já que ainda pressionava a ferida. Mas a maior parte ainda acabava
sendo exposta. Não teria problema, afinal isso ainda faria parte do plano. Logo em
seguida, correu para a primeira porta da sala e a abriu. Elas não deveriam impedir a
passagem de dentro para fora, afinal, a dondoca russa poderia precisar de algo.
Assim que a meta-humana ferida atravessava uma, a fechava logo após. Assim
como ela seria aberta por dentro por ela, também seria pela outra, mas isso daria
algum tempo mínimo para que elas se distanciassem para que a russa não
continuasse a esfaquear a mercenária.

Sendo bem sucedida nessa escapatória, chegaria a tempo de ver a cena a seguir: os
soldados que guardavam a sala, estavam mirando para um homem que se
assemelhava a um mendigo. Eles se virariam para Gal, então, surpresos, por causa
do barulho da porta. Naquele instante, a intenção de Bordeaux era que eles a
confundissem com a própria Margareth, já que não a viram entrar, uma vez
intangível.

Isso porque ambas eram loiras e gostosas. Para guardas como aqueles, num mundo
como aquele, talvez aquilo fosse bastante para confundi-los. Até porque ela estava
com uma calça branca, que poderia fazê-los lembrar que a filha do Yurik também
trajava branco – se héteros fossem, como a grande maioria, não teriam se dado
conta desse detalhe “fashion”. A nudez do tronco mostrando os seios também
poderia ajudar nessa distração. Sem falar no ferimento à mostra. — Um deles está lá
dentro, me feriu! — Apontou para a porta de onde viera. Tudo foi muito rápido, então
logo ou Margareth também a atravessaria, ou comunicaria o fato aos outros guardas
de lá de dentro da sala. Por isso, com as forças que ainda tinha, Gal correu por um
corredor lateral, na intenção de fugir. Esse meio tempo de distração, se tivesse sido
bem sucedida sua tentativa de sair da sala deste modo, acabaria por dar algum
tempo de distração a Baron para este fugir ou atacar ou fazer o que quisesse. Ah, é
claro que um soldado seguiria Gal, caso esta conseguisse seguir pelo corredor.

– Senhora, você precisa de cuidados... — Diria o guarda, olhando mais para os peitos
da mulher do que para o ferimento em si. — Estou bem... Ou melhor... Não... Vá
pegar algo para dor! Rápido! — C-Claro...! — Assim o outro logo entraria em outro
corredor, onde teria uma ala médica ou um bar, a fim de buscar algum medicamento
ou alguma bebida forte. Ela continuou a correr, desesperada. Logo conseguiria sair
do avião, já que os guardas estariam concentrados protegendo a sala onde a
verdadeira Margareth estaria. Isso tudo, reitere-se, se sua investida em sair da sala
tivesse sido bem sucedida. Ali fora, ela veria o cenário de guerra em que aquilo tudo
havia se transformado. — Meu Deus... — Falou incrédula, sem mais forças para
correr. Por isso caminharia velozmente até chegar atrás de um veículo e se abaixaria
atrás dele. Em seguida se comunicaria com Xiaren, ou o seu gerente. — Saiu...
Errado... Alguma coisa afetou meus poderes, eu não consegui pegá-la...

Gal rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 13 para para defender-se do ataque de
margareth que resultou 11 - Total: 0 Sucessos

Gal rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 12 para atacar margareth que resultou
2 - Total: 0 Sucessos

Gabriela vulgo Rodrigo


Não posso dizer que não foi agradável ficar abraçado ao outro "espião" que somente
conhecia pela alcunha de Coyote. Não posso mentir, também, e dizer que durante o
trajeto não fiquei pensando o porquê do apelido, o que ele poderia farejar, afinal?
Enfim, de qualquer modo não manifestei nada. Pelo menos não verbalmente, já que
meu corpo notava o frio que era formado na mudança de um bairro para o outro.
Miraitrode era um bairro podre e completamente desnorteador. Luzes neon para
todos os lados. Em razão destas duas características, projetei um casaco ao redor
da blusa social formada desde a última transformação e formei um par de óculos
escuros, para poder ver melhor. — Tá com frio? — Falei sem tentar ser muito íntimo,
não queria levar uma cotovelada ou ser jogado da moto. Mas sem permissão,
aproveitei para envolver mais um pouco o corpo do outro, transmitindo-lhe calor
enquanto chegávamos próximos do fim daquela perseguição automobilística.

Frank Coyote
Velocidade e liberdade, disso Frank gostava. Sendo adepto das duas vertentes, a
união de ambas não poderia deixar de ser de seu total interesse e paixão: uma moto.
Sobre duas rodas era capaz de voar livre, pois não temia o perigo e tão pouco se
limitava quando em alta velocidade. Todavia a missão exigia um cuidado maior para
não serem pegos e, usando de suas habilidades - diga-se de passagem, muito bem
desenvolvida pelos anos - de motoqueiro, soube muito bem disfarçar a perseguição
sem que fossem descobertos pelo inimigo. Através das ruas próximas da Avenida
Armitage seguiu o furgão, com Rodrigo agarrado a si na garupa. Ignorou a presença
do outro, ainda que ele parecesse querer ser notado a todo e qualquer custo.

– Não estou com frio. – Respondeu seco, focando o caminho através agora de
Miraitroide, tentando não ser cegado pelo neon espalhado por todo lado. Mesmo
depois da negativa, Rodrigo fez questão de se aproximar ainda mais, uma audácia
que Frank cobraria mais tarde o preço. Por mais vinte minutos - ou o que pareceu
uma eternidade para Frank - continuaram o percurso até que o caminho fosse
finalizado em uma casa de shows. Ótimo, este ambiente era muito mais favorável
para Frank. Com cuidado levou a moto até as outras motos que sempre estão
estacionadas perto de lugares movimentados assim, onde os caras e até mesmo
Frank por vezes iam para azarar as mulheres que saiam da boate.

– Pode me soltar. Tá na hora de descer, florzinha. – Avisou para Rodrigo esperando


que ele saltasse primeiro.

Gabriela vulgo Rodrigo


Em pouco tempo chegamos a um beco próximo do que seria uma boate. Fedia
como uma, dava para sentir o cheio de onde eu estava. Ali, onde estávamos,
tínhamos uma distância segura dos nossos alvos. Vi Alek, aquele russo grisalho
desgraçado adentrar a boate como se fosse um convidado de honra. Só então me
atentei para o momento presente. Deve ter se passado quase dois minutos desde
que Frank me mandou descer da garupa. Assim presumi, já que ele me olhava como
um assassino - o assassino que devia ser, mesmo.

– Ah, claro. – Assenti e levantei. Não posso mentir, ainda, que ver o russo me
deixava... Incomodado? Não sei se era a palavra certa. A perda da confiança, quiçá
um sentimento até maior transformado em medo e raiva. Por isso, meio alheio ao
redor e consequentemente à missão, acabei seguindo sem esperar por Frank, meio
desnorteado. Tanto que só "acordei" quando esbarrei na última punk da fila. Que fila
terrível, ela era enorme... Se ficássemos ali, perderíamos toda a noite e
consequentemente nosso objetivo.

– Vou tentar dar um jeito nisso. – Graças às luzes neons desnorteantes e aos
entorpecentes nas mentes desses moleques, ninguém sequer se deu conta que eu
me transformei numa punk gostosinha ali no meio deles. Fui beirando a fila até
chegar ao segurança. Um cara negro, alto e musculoso. Além de ser careca,
tatuagens pelo corpo, um volume expressivo (na cintura), devia estar armado. Não,
com certeza ele estava armado. Havia outro do lado dele. Branco, igualmente alto,
mas gordo, do tipo parrudo. Peludo e... Enfim.
– Boa noite, meninos. Será que vocês poderiam deixar uma garota...Hm... Tomar um
atalho? Rs – Disse, provocativa.

– Está acompanhada? Namorado? – O mais forte me perguntou, e o outro sorriu em


concordância. Disse que sim, que "meu boy estava ali no final da fila e..."

– Bem, então ele terá mais sorte conosco. – Num primeiro momento não entendi.
Mas depois, sim. Assenti positivamente e voltei para o final da fila, onde estávamos.
Agora havia mais pessoas atrás de nós. – Coyote, o segurança, bem… Acho que
você terá mais talento em seduzi-lo. Questão de gosto. Dele. Não tenho culpa.

Frank Coyote

– Nem ferrando. – A resposta veio de imediato, clara como a luz do dia. Não se
ofereceria igual uma prostituta para dois caras numa porta de boate, pois preferia a
morte do que tamanha humilhação. Todavia a ideia da morte era mais concreta
cada vez que pensava que retornar apenas com aquilo de informação não seria o
suficiente. Estava puto pra cacete, mas engoliu o orgulho e avançou com Rodrigo
em seu calcanhar até a porta, parando bem na frente dos grandalhões que
asseguravam a entrada e saída dos drogadinhos daquela área.

– E-hem. Minha mina disse que vocês curtem algo… Mais bruto. Porra, é comigo
mesmo, hehe. Se vocês deixassem a gente entrar, podíamos conversar melhor
depois, só nós três. E aí? – Tentou o seu melhor ainda que o seu melhor fosse
respeitavelmente um lixo. Mas, por incrível que pareça, funcionou. Os caras
trocaram uns olhares sacanas e, talvez por serem árabes e Frank ainda manteve as
vestimentas típicas do templo, quem sabe. Quando abriram a passagem ele deixou
que Gabriela fosse primeiro para dentro do lugar. E tão logo pretendia segui-la…

Levou um tapa na bunda de um dos seguranças. Não pensou, sequer respirou antes
de fechar o punho e voltar com toda a força de encontro ao nariz do sujeito. O
“creck” bem sonoro anunciou que não só havia quebrado a porra do nariz do cara
como também acabara de ferrar com o plano todo. – Vai, vai! – Gritou para Rodrigo
arrancando e entregando a arma do cinto escondido, ciente de que ele entenderia o
recado e se infiltraria na multidão com seus poderes de transformação de modo que
ao menos um deles conseguisse aproveitar toda a confusão. – Acabei de mudar de
ideia, que tal a gente conversar melhor agora? – Provocou ambos os homens
maiores do que ele, dando tempo para Rodrigo continuasse o caminho e sumisse já
dentro da boate.

Gabriela vulgo Rodrigo

– Que... – Foi a única palavra que consegui pronunciar quando vi todo o desenrolar
daquela cena. Primeiro achei engraçado e tive que me conter para não rir… Às
lágrimas por segurar o riso encharcaram meus olhos, mas eu os secava, como se
fosse efeito de alguma droga, o que não atraiu a atenção dos seguranças. Mas
depois, Frank não conseguiu segurar a fúria e partiu para cima deles. Peguei a arma
rapidamente. Na verdade, não a peguei, pois assim que ele socou o segurança e a
deu para mim, aqueles que esperavam para entrar na fila, bem como os penetras
que estavam ao redor esperando a mínima chance para entrarem correram como
uma manada para dentro do estabelecimento. Com aquela gente toda correndo ao
meu lado, na minha frente, atrás de mim, a arma que caiu no chão. Travada… E foi
chutada e pisoteada por toda a manada punk daquele lugar maldito, como se fosse
uma bolinha de totó. Não demorou para que eu a perdesse de vista. Imaginando que
a confusão iria se alastrar, mudei de forma, para a minha forma masculina "normal",
nunca revelada para Alek (somente outras). Percorri o lugar tentando achá-los. Era
como encontrar agulhas no palheiro. O lugar era muito apertado, a música muito
alta, o cheiro de droga e bebida infestando o ar... Por sorte esse era o meu ambiente.
Sem muita dificuldade eu consegui sair do meio do "fervo" e chegar até um dos
cantos do lugar. Nessa parte mais calma, eu buscava todo o redor e acabei
encontrando Alek numa sacada próxima. Me dirigiria à escada verde neon quando
um cara me parou no meio do caminho. Não consegui ver bem seu rosto, mas
parecia asiático. – Licença, eu tenho que… – Outro segurança se aproximava. Puxei
o japa para um beijo e troquei de posição com ele. Mesmo que o funcionário não
tivesse me procurando, pelo menos não àquela forma, preferi não dar brechas. E
aproveitar, também. Assim que o funcionário se afastou eu larguei o cara, me
dirigindo às escadas. Meu coração pulsava de ansiedade. Queria empurrar Alek dali
para o lado de fora…

Frank Coyote
Dois contra um não era o pior cenário para Frank, pois já esteve nessa situação em
outras brigas. O soco no segundo segurança que o acertou com certeza deixaria um
olho roxo, mas nada com o qual ele não soubesse viver. Nem teve tempo de mirar
quando recobrou o equilíbrio, apenas desferiu um outro soco como resposta ao
recebido e o choque do punho com pele e osso se provou suficientemente
satisfatório para o mercenário. Aproveitou a multidão que invadia o lugar e os que
tentavam sair e deixou ser levado entre os corpos, torcendo que o fluxo o
escondesse por tempo suficiente. Não via mais Rodrigo, ou melhor, Gabriela em
lugar nenhum. O lugar estava lotado, afinal. Aproveitou para puxar os tecidos da
vestimenta islâmica enquanto avançava entre os corpos, deixando apenas a camisa
e a calça sobre o corpo e recuperando uma jaqueta arregaçada de algum drogado
largada sobre um dos sofás nos cantos do lugar. Não era o melhor disfarce, mas por
ora serviria apenas para tentar reagrupar com o metamorfo. Felizmente havia
guardado bem mais o rosto de Rodrigo do que de Gabriela - por puro ódio, não se
enganem - e logo o avistou dando uns amassos num japa perdido no vai e vem das
pessoas. Ótimo, muito profissional da parte dele, analisou raivoso avançando em
sua direção e parando ao avistar um dos seguranças atravessando o lugar
provavelmente em sua busca. De costas aguardou que o homem fizesse seu
caminho para voltar a andar até Rodrigo.

– Tá se divertindo, princesa? Cadê os caras? – Agarrou o braço do outro aguardando


a informação de que deveriam seguir pela escada de Neon onde ele havia avistado
Alek. – Beleza, devolve minha arma. – Pediu com mais gentileza do que estava
habituado para perceber que Rodrigo havia perdido a única arma da dupla. –
%☠*#&☠#☣, seu @#☠$%! – Xingou o outro apertando mais ainda seu braço e
pronto para empurrá-lo até que viu o segurança olhando exatamente na direção
deles.

– Cê só pode tá de sacanagem, inferno! – Abraçou o prostituto, envolvendo os


braços em sua cintura e virando o corpo dele para que ficasse totalmente de costas
para o segurança e, para o homem, não passassem de um casal na pegação. Tão
próximos, sentia a respiração sobre a sua, o calor do corpo contra o seu e o ódio
crescente. – Eu juro que se você fizer alguma gracinha, eu quero que se foda essa
missão, eu te mato aqui e agora! – Sussurrou na orelha do moreno, aguardando que
o segurança do outro lado sumisse de vista.

Gabriela vulgo Rodrigo

– Eu sabia que cê não ia resistir muito tempo... – Provoquei, tendo a plena ciência
de que enquanto estivéssemos na mira daquele segurança, eu estaria a salvo. Não é
como se me encontrasse nesse tipo de situação pela primeira vez. Ainda sentia o
apertão no braço, mas acabava por sorrir. Apenas parei quando vislumbro a face de
ódio que o outro emitia com um flash mais claro de luz que pousou sobre nós. –
Eita, calma. – Fiquei sério, escondendo o sorriso com receio de perdê-lo. Apesar que
poderia reconstruir um... Dei de ombros por fim. – Se liga. Aquele cara ali — Apontei
com a vista para Alek na sacada, à esquerda do corredor depois que subíssemos a
escada neon – Ele... Nós temos que pegá-lo, entende? – O outro provavelmente
responderia de maneira grosseira sobre a obviedade, mas para mim era mais grave.
– Ele não só deve saber onde o Crazy Dog tá, como me ameaçou. Sei que tá pouco
se fudendo pra isso, mas por favor, apague o cara. Eu posso te pagar depois que
recebemos do Pascal, beleza? – Nada lembrava a feição de brincadeira ou sedução
de segundos atrás. – Sei do que ele curte. Vou tentar atraí-lo e o levar para o
banheiro. Vai indo pra lá. Acho que podemos interrogá-lo ali. Pode ser?

Frank Coyote

– Você tá brincando com fogo. – Avisou carrancudo ainda de olho no segurança que
estava quase sumindo de vista, já ignorando ambos naquela posição. Entretanto,
não desfez o aperto na cintura alheia, aproveitando do disfarce para olhar melhor
onde era indicado e vislumbrar um dos alvos. – Tu tá querendo resolver problema
pessoal agora? Tá de sacanagem? – Obviamente ele respondeu de maneira
grosseira, mas houve um tom de dúvida em suas palavras quando analisou a figura.
– Talvez ele saiba sim. Eu diria que ele tem cara de quem sabe mais do que fala,
então vamos fazer do seu jeito. – Concordou com o plano soltando Rodrigo do
abraço mais íntimo e fazendo o caminho disfarçadamente até o banheiro nojento do
lugar, rezando que o piscar das luzes ajudasse a passar despercebido entre as
tantas pessoas pelo local.

Gabriela vulgo Rodrigo

Acompanhei o outro se afastar e convicto de que ele acabaria fazendo o que eu


havia pedido. Não custava nada, afinal. Seria a morte de dois coelhos só com uma
paulada. Esse pensamento acabou me fazendo lembrar do aperto na cintura
instantes atrás. Mas eu devia ser profissional. Balancei a cabeça e segui o caminho
da escada, me dirigindo até onde Alek estaria. A partir desse momento, todas
nossas ações seriam apenas tentativas: tentativas de conseguirmos sair vivos
daquela boate. Me aproximaria dele. Puxaria assunto. Como eu já o conhecia, tocava
em pontos que o agradavam e conquistavam sua simpatia. Isso acabaria, se eu
obtivesse êxito, em cortar um longo caminho de um xaveco transcendente. Sabia
das preferências do cara, então... Já cheguei falando o que eu estaria disposto a
fazer por ele. Ah, é claro. Ali eu era só mais depravado dentre tantos outros na boate,
nada de falar um preço. Depois de alguns minutos (imaginava o Coyote impaciente,
já) eu conseguiria convencê-lo.

– Vi um banheiro aqui nesse andar. Bora pra lá? – Diria fugindo das carícias do
homem, fingindo um jogo de sedução quando era na verdade pura repulsa daquele
infeliz. Passamos pela escada... Eu tive muita vontade de empurrá-lo dali, mas me
mantive forte. Fomos seguindo até o corredor. Nesse instante eu tive que ceder,
deixando que ele me pressionasse contra a porta fechada, ainda do lado de fora.
Como ele se distraía com meu pescoço, dei dois toques na porta para dar alguma
espécie de alerta, que mesmo sem combinar, eu teria certeza que Coyote
entenderia. Depois, ainda mantendo o homem distraído com meu corpo, abriria a
porta atrás de mim e faria com que nossos dois corpos atravessassem para dentro.
Àquela altura, eu esperava honestamente que meu parceiro tivesse deixado o lugar
vazio. Ou pelo menos com os outros usuários desacordados. Ali dentro, modifiquei
meus braços para que ganhassem mais massa muscular e consequentemente mais
força, e logo empurraria o russo com relevante força para dentro de uma das
cabines, o que o faria arrebentar a porta e parar em um sanitário. – Ele é todo seu.

Frank Cyote

Pronto, se havia um inferno era aquele lugar. Não só pelos caras se pegando e/ou se
drogando. O que mais incomodou Frank ao entrar no lugar abarrotado era o fedor.
Urina, sangue, porra. Tudo misturado causando uma ânsia de imediato. Que porcaria
de lugar, pensou, percebendo que se deixasse todas aquelas pessoas que estavam
ali dentro teriam mais problemas do que já tinham.

– Todo mundo pra fora! – Gritou, mas sem sucesso. Plano B, pensou. Sem a arma -
cortesia de Rodrigo - teria que improvisar. Retirou um pedaço do tecido da jaqueta já
furada e rasgada e amarrou na mão. Caminhou até um dos espelhos imundos do
lugar e socou o vidro, espatifando em mil pedaços.

Procurou pelo maior e mais pontudo e o trouxe sobre a mão protegida pelo pano. –
EU DISSE TODO MUNDO PRA FORA, PORRA! – Agora seu grito era acompanhado de
investidas com o pedaço de vidro, visando apenas ameaçá-los. Se bem sucedido,
ficaria de tocaia na porta aguardando por Rodrigo. Para variar demorou um século
para que finalmente ouvisse uma batida na porta e, por um momento, temeu ser
algum dos seguranças percebendo a agitação causada anteriormente. Deixou então
o pedaço de vidro pronto para quem entrasse no lugar. Com sorte seria Rodrigo e o
tal russo. Se fosse, observaria o aliado utilizar de seu poder para ganhar massa
muscular e empurrar o alvo para dentro de uma cabine. Se até ali tivessem
conseguido êxito, não esperaria que o homem tivesse chance de recobrar o sentido,
já se aproximando da porta estourada e colocando o pedaço afiado de vidro sobre a
jugular dele.

– Esse tá sendo um dia muito longo. E eu tô cansado e sem paciência, então se fizer
o favor de já pular para parte em que conta onde está o irmão de Pascal, é melhor
para você, para meu amigo aqui e para mim. Então fala ou eu estraçalho seu
pescoço! – Apertou o vidro o suficiente para que fizesse um filete de sangue
escorrer, mostrando que estava falando mais do que sério.
X9
Se o que me aconteceu no passado serviu para alguma coisa foi pra me deixar mais
atenta às ações das pessoas. Coagida a ir para o banheiro com luminárias precárias,
tão imundo quanto o da clínica de Igor na Cidade Murada, simulava procurar os
analgésicos na farmácia presa nos azulejos podres do toilet. É, não me agradou o
tom de voz dele, tão pouco a maneira pausada que emitia as frases ou a massagem
nos ombros, tudo aquilo parecia me avaliar, avaliar se eu tinha medo dele. Até então
tudo bem, eu não dava sinal disso, mas quando por uma fresta da porta vi o maldito
apontando uma arma, tudo mudou. Voltei dois passos, fui até ao trio de pias sujas e
me debrucei sobre a do meio, liguei a torneira, deixei a água correr. Lavei o rosto
para aliviar o calor e a tensão.

– Ok, X, segura a onda, não demonstre medo, faz de conta que uma arma apontada
para você é algo que acontece todos os dias, como um café da manhã. – Repeti a
mim mesma na frente do espelho.

Por mais que aqui seja Miraitropolis, a capital do crime, quem consegue agir
normalmente com uma Desert Eagle apontada pra cara todos os dias? Não sei, mas
deve haver, e eu preciso ser essa pessoa. Tudo que eu tinha estava no casaco
escuro, peguei ele do cabide no canto do box e vesti. Se por algum azar os dados do
destino rolassem contra mim, e acontecesse alguma merda, pelo menos não
perderia os pertences. Dizem que teatralidade é tudo, certo, eu só precisava bancar
a pessoa mais segura desse mundo e um bom visual corrobora com esse migué.

Como parecer a pessoa mais descolada do pedaço? Enchi as palmas de sabonete


líquido e levei até o cabelo, erguendo o topete e fazendo um belo moicano azul lilás.
Pronto, praticamente uma verdadeira punk! No bolso lateral achei uma carteira de
Atlântico. Agradeci por ainda haver dois cigarros. Levei um até a boca e acendi com
o isqueiro que se encontrava no outro bolso do casaco. Dei uma boa e demorada
tragada, fechando os olhos, sentindo a nicotina entrar no meu organismo e me
acalmar. Depois abri a porta, tomada de coragem.

– Isso é sério, Red? Tu tá tão desesperado em ser um cachorrinho do Yuric que


agora tá inventando motivos pífios? Quer me foder me beija, caralho! – Disse
fumando. – Ou você tá me subestimando como hacker ou o bagulho te deixou meio
paranoico, nunca mais te dou haxixe com radiack, cara. – Soltei a fumaça, e voltei a
falar. – Pensa comigo, um hacker médio sacaria que o cassino tem um tipo de
cobertura digital. Eu entrei aqui e meu computador parou de funcionar. Eu tentei
novamente e alegou um tipo de filtro. Essa coisinha no meu pulso pode não parecer,
mas é bem potente e precisa, eu mesma fiz. – Pausei – Mas tudo bem, eu não fui
totalmente honesta em uma coisa. – Dei outra tragada.
– Eu tentei entrar no sistema do cassino sim, não para roubar informações, mas pra
saber se Yuric tinha alguma informação minha. Você lembra do lance no Cemitério
Neon? Mortos se levantando dos túmulos? Eu estava lá, mas a última coisa que eu
lembro é de ter levado um tiro pelas costas que destroçou minha coluna. No
entanto, eu acordei em um laboratório, sem cicatriz nem nada, era para eu estar em
uma cadeira de rodas agora, ou em um caixão! Aliás, além de tudo, olha o que
consigo fazer. – Recuei um passo e segurei a maçaneta da porta do banheiro com a
destra e fechei meus dedos nela, o ferro se retorceu como papel.

– Como você explica isso? Antes do tiro eu não tinha força para amassar uma
latinha de cerveja e hoje consigo rasgar metal com os dedos sem esforço algum.
Yuric é um mafioso bem preparado, ele deve ter acumulado informações de todo
mundo. Caramba, eu só quero saber o que aconteceu comigo, só isso... Me
desculpa, eu devia ter contado que tentei entrar no sistema do cassino pra saber o
que rolou naquele dia. Você me falou sobre sua mãe, e o quanto sofreu, sei que vai
entender o meu lado, e me deixar entrar nos arquivos do Yuric… Porém se você julgar
errado, sem problemas, não precisa desativar o filtro, isso é com você. Mas deixa de
ser paranoico e abaixa essa arma, cara, estou do seu lado. – Permaneci parada a
frente dele, olhando para a Desert Eagle preta empunhada a todo instante na minha
direção. Enquanto tivesse cigarro me manteria calma.

X-9 rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 16 para lançar um migué que resultou
19 - Total: 1 Sucessos

Cris Falcon
Foi uma surpresa bem agradável para Chris ver o tratamento recebido. Quando Judy
apareceu, trajando aquela "roupa" bem insinuante, não tardou a soltar o sorriso mais
radiante que já teve. Não apenas pela provocação da garota em si, mas pela
situação em que se encontrava. Há poucos instantes, estava prestes a ter um taco
de baseball explodindo seu crânio, e depois de se revelar como sendo um enviado
de Xiaren, recebeu a honra de ter uma garota só para ele.

Ela também não demorou a se animar ao ver o rapazote e sua indignação ao ser
indicada a fornecer a compensação logo se transformou em um ânimo intenso e
incandescente.

— Uau, olha só o que o Xiaren mandou.

Quando assentiu com a cabeça, Chris ficou ali paradinho, apenas apreciando a
dança sensual de Judy, enquanto os outros que estavam no local pareciam se
preocupar mais com a situação crítica em que se encontravam, e ele podia se dar ao
luxo de esquecer, ainda que por enquanto, que estava ali para dar uma informação.

Depois de terminar o espetáculo, ela se sentou ao lado dele e, em seguida, trocaram


alguns olhares. Ele sabia o quanto as prostitutas do local eram mercadoria valiosa, e
vendo como Judy parecia se interessar por ele, resolveu tomar a iniciativa.

— Gostou? Eu acho que posso te mostrar umas coisinhas que aprendi por aí...

Quando o casal se preparava para ir para um dos quartos da boate, algo pareceu
interrompê-los. Um funcionário carregando um holotech seguiu até a sala de Pascal
e, poucos minutos depois, eles ouviram um baita barulho. Pior, Chris havia percebido
toda a movimentação. Só que ele estava bem puto por ter que encarar a segurança
forçada. Decidiu que iria deixar isso pra lá, há tempos que estava numa abstinência
desgraçada e qualquer coisa, era só correr até a sua moto.

— Meu bem, o chefe está me assustando com esse barulho.

— Não se preocupe, vai ficar tudo bem, eu te garanto.

Judy sorriu. Mesmo sendo uma prostituta, uma das características daquele
andrógino era tratar as pessoas com dignidade. Apesar de sentir uma certa tensão
no ar, ela deixou que o momento de alegria que teria com ele fosse a única coisa em
sua mente. Naquele momento, a "Yorha 2B" o abraçou e o guiou até um dos quartos.
Enquanto isso, a Black Desert Raider parecia gravar a silhueta de um menino
chegando com uma caixa, sendo revistado pelos guardas e correndo pela rua feito
um louco. Sua moto tinha alguns apetrechos bem interessantes e, com sorte,
ninguém perceberia a câmera do Silvio Santos gravando tudo...

E a sua festinha particular com a garota de cabelos prateados só terminaria quando


quisessem.

Anthony Montana
Ainda acompanhava tudo pela tela holográfica, aquela porra tava melhor do que
filme! Reviravoltas, tiro, porrada, bomba, sangue, Akane viva e o Yuric tomando
bonito bem no meio do cu, não podia ser melhor!! Eu abria meu bom e velho uísque
doze anos, guardado apenas para ocasiões extremamente especiais e despejava
garganta abaixo. Torcia a cada movimento certo a meu favor, e praguejava a cada
um contra.
— Jesse, aumente a potência da captura de áudio, quero ouvir o que esses putos
estão falando! Também aumente o zoom dessa coisa! — Jesse fez o que mandei.

O zoom foi capaz de me permitir ver pela janela da nave, ainda enquadrar ângulos
por áreas inacessíveis sem embaralhar a visão. Um tipo de grade verde digital surgia
na tela, fazendo os ajustes até que finalmente eu pudesse enxergar e ouvir a treta.
Mas vou te contar, aqueles guardas da vaca russa eram burros pra caceta, até eu
vendo por uma pulseira holográfica me liguei que a loira peituda sangrando não era
a puta da Margareth! Mas isso até que foi bom, sabe. Quando aqueles babacas se
dessem conta que não era a vadia iam levar um puta esporro, aposto! Queria assistir
isso, mas Jesse abriu um segundo quadro na tela virtual.

— Chefia, você precisa ver isso!

— O que é mais importante do que assistir os guardinhas levando bronca, hein? —


Olhei para o segundo quadro da tela, PeeBoy no chão, erguendo um dos braços para
cima. digitando uns troços, Jesse aumentou o áudio.

— Akane, corre o máximo que puder, e quem tiver em volta também! — Disse ele,
cuspindo sangue, estava sem capacete.

— O que esse doido vai fazer? — Comentei com Jesse.

— Não faço ideia, chefia. — Respondeu Castelone.

— Helena! Vulcano! Finalmente vou me encontrar com vocês!! — Gritou PeeBoy,


olhando para o céu.

— Caralho, ele vai mesmo fazer o que tô pensando, porra? Ele acha que a merda de
um Viking ou que? Nessa caralha não existe Vahalla não!! — Comentei com
Castelone que estava atento demais para me responder.

Não deu pra ver se Akane seguiu o conselho, nem os outros a volta, mas PeeBoy
mantinha o braço esquerdo erguido para o direito digitar uma sequência em um
bracelete digital de fundo preto com os números vermelhos no antebraço. Enquanto
isso, aquela locomotiva gigante cheia de fúria vinha desgovernada de encontro a
todos. Os dígitos escarlates zeraram, e extremamente bem calculado pelo Cowboy
do deserto a armadura se auto explodiu exatamente no instante em que o Golias
passou em cima dele. Porra, a explosão foi foda, bem forte, muito mais do que
imaginei. Mas eu demorei pra entender o que aconteceu. A detonação também
explodiu o cinto de granadas à volta do quadril de PeeBoy, cerca de umas sete
bombas que ele tinha na armadura explodiram junto erguendo aquela bola de fogo
do capeta. O ar queimou como se uma porta do Inferno estivesse sendo aberta, tudo
ardeu durante um bom tempo, concreto e asfalto foram jogados para o alto, parecia
que não ia acabar. A combustão durou um longo período, clareando a noite escura
como dia. Para você ter noção da coisa, o impacto foi capaz de balançar a aeronave
Crow-Z, chacoalhando tudo e todos lá dentro. O sacrifício do Cowboy deixou uma
cratera na pista do aeroporto. Já o destino do gigante que supostamente foi
implodido junto eu não posso dizer.

— Chefe… PeeBoy foi pra vala… — Choramingou Jesse.

— AHVA! Me conta uma coisa que eu não tenha visto! Por exemplo, o que tá rolando
dentro do avião! Amplie a visão para 200%, não! 300%!

Nem precisava, a ação toda estava mesmo fora da nave. PeeBoy amassou o chassi
do avião, estragando a outra turbina junto com as asas. Se antes o avião não ia mais
levantar voo, agora mesmo que a joça não sairia do chão com o motor danificado e
o trem de pouso parando na casa do caralho. A lateral do Crow estava cheia de
fuligem preta. Os vidros foram pra puta que pariu. E por falar nisso, a detonação
fodeu o painel de controle que ficava bem na zona de maior impacto da explosão, eu
tava vendo os fios, as faíscas e os pedaços de placas despencando da mesa de
controle que entrava em curto circuito.

Mas como eu disse, a ação estava do lado de fora, de repente o soldado bucha ninja
ressurgiu, amarrando uns cabos de aço na traseira do avião de Margareth. Eu não
estava entendendo aquilo, Jesse subiu o braço e então vi o meu segundo Crow-Z
pairando no alto, acima da nave danificada, jogando mais cabos para o soldado
bucha prender no corpo do avião da vadia. O tal atirador da torre de controle estava
na mira de Galathea e seu grupo, a gatona tava dando cobertura para minha nave
trabalhar e se desse um pio ela queimava ele, por isso estava tranquilo. Enfim, com
os cabos presos, o soldado bucha ninja bateu na lateral do avião da russa
mandando o Crow-Z subir, rebocando o avião da russa para cima. Dentro daquela
porcaria além da vadia e os dois guardas dela estavam o robô segurança, o mendigo
baiacu, e a loira gostosa de peitola - e que peitos lindos! - de fora e que menstruava
pela barriga. Todos içados pra fora do aeroporto. Espero que saibam se virar
sozinhos...

— É sério! Jesse, eu quero saber quem é esse sujeito! O nível do cara tá muito
elevado, ele vai ser promovido, ainda mais que abriu uma vaga depois que PeeBoy
se suicidou! Jesse, pede pra ele mostrar a cara. — Bebi uma dose de uísque.
Mas nem precisou chamar, por conta própria o soldado bucha caminhou até Jesse e
se aproximou bem a frente da tela holográfica, subindo a máscara preta e
mostrando o rosto. Porra! Quando vi, meu saco quase caiu! Tava explicado por que o
cara era o fodão. Cabelo bem abastado e assim como a barba, também grisalho,
meia idade, aquela face era inconfundível! Se tratava ninguém mais ninguém menos
do que Vladimir Stanislavski, o meu contato dentro da ParaMiltech. O sujeito que me
fornece armamento e material humano. Inclusive foi ele quem vendeu aquelas
armaduras para os Steelhearts quando eles foderam a Orion.

— Olá Tony!

— Vladimir! Tu não tem mais idade pra brincar de G.I. Joe! Que porra você tá fazendo
metido em campo? Achei que tu só tratasse dos esquemas burocráticos daquela tua
empresa.

— Estou sempre supervisionando meus homens, Tony, você que não sabe. E não
julgue um soldado pela idade, ainda mais se ele for russo. Tenho muita lenha para
queimar, camarada. — Vlad juntou com um braço Jesse e o colocou novamente no
ombro.

— Pra mim tu tava aposentado. Mas sabendo agora que te agrada brincar de
soldadinho, abriu uma vaga para segundo em comando, tá afim de ocupar ela? – Eu
já tinha derrubado metade da garrafa de uísque.

— Falamos disso depois Tony, no momento precisamos tirar o seu pessoal e do


Xiaren daqui. A ParaMilitech está enviando um esquadrão para o aeroporto, não falta
muito para chegarem. — Um blindado praticamente surgia do nada, desativando sua
camuflagem invisível e estacionava ao lado de Vladimir, o russo maldito comandava
meus aviões e um veículo próprio naquela missão e eu nem sabia! Com a porta
aberta, ele colocou Jesse acomodado em um dos bancos e o prendeu no cinto de
segurança.

— Merda! Mais essa agora! Peça para Akane acompanhar você. Avisarei Galathea e
os mercenários dela. — Abri outro link, me comunicando com a minha aliada.

— Galathea, já consegui o que buscava, esqueça o atirador, ele não é importante. A


ParaMilitech está chegando, vocês precisam sair daí já! Não percam tempo! – Mudei
o canal de volta para Vladimir.

— Tony, o Crow-Z está se dirigindo para seu prédio, espero que ele tenha lugar para
pousar veículos aéreos.
— Claro que tem. Sou o cara mais preparado dessa droga de cidade. Mas nem
fodendo tu vai levar essa sucata pra o meu prédio, tá achando que eu sou burro?
Manda essa porcaria de carga para o Submundo, tem um ferro velho e um lixão no
lado sul do bairro, lá vai ter um pessoal meu que vai desmanchar a tralha e tirar a
puta aí de dentro. – Resmunguei alto.

— Entendido camarada. Estamos saindo do aeroporto!

Assim que terminou, antes de entrar no veículo blindado, Vladimir ainda se virou em
direção à torre de controle e fez sinal de positivo, mandando um joinha debochado
na direção do franco atirador, de alguma forma ele sabia que o corno ainda estava
lá. Malditos russos, tem informação até da mãe e a gente nem sabe. Mas como ele
é meu aliado, melhor para mim, e não fazia noção de que o coroa era tão sarcástico
também. Quando todos se acomodaram ele deslizou a porta lateral fechando o
tanque. Sem delongas, o blindado arrancou saindo o mais rápido possível da área do
aeroporto em alta velocidade. Vladimir, um cara que merece meu respeito.

Kat
Horas depois, de volta ao QG da facção.

Ainda era de manhã bem cedo, Cyrus tinha se ausentado para fazer uma compra e
também tinha mencionado dar início a suas investigações sobre as pessoas
presentes nos acontecimentos da madrugada e processamento dos dados
coletados naquela ocasião também. Chegando ao seu "lar" o garoto prodígio se
deparava com uma escuridão total dentro do galpão, ele achava aquilo muito
estranho, mas como possuía controle remoto da localidade, ele dizia:

— Luz...

Porém, nada acontecia...

— Luz! Luz! LUZ!

— Ora, ora... O Garoto Genial parece ter medo do escuro! Mas não é verdade o que
dizem de você aprender uma coisa nova todo dia… — Uma voz desconhecida os
interrompeu.

A voz masculina ecoou dentro da estrutura de uma forma que não havia como
localizar a sua fonte, Cyrus que havia levado um tremendo susto quando o ouviu,,
agora caminhava apavorado para mais adentro do galpão, bem lentamente,
enquanto virava-se pros lados tentando enxergar alguma coisa. Ele dizia:
— Q-q-quem está aí? C-como você... Como que...

— Como eu passei pelo seu sistema de segurança arcaico? Tão fácil como roubar
um banco desta cidade! Mwahahaha!

— M-mas... Katt! O que você fez com ela!?

—Ahahaha... Você vai saber disso... Muito em breve...

Sem aviso prévio, Cyrus sentia um impacto em seus calcanhares que o empurrava e
o fazia cair, como se tivesse recebido uma rasteira, e sem interrupção o jovem caía
ao solo, em seguida sentiu como se um pé o segurasse ao chão, se apoiando ao seu
peitoral. Eis que a figura misteriosa apareceu, era um homem de aparência até
jovem, óculos, camisa com um colete azul e luvas sobre os dedos, olhando para
Cyrus, este dizia começando a gesticular com os braços e a mão:

— Você é bem fácil de derrubar para alguém... Tão espertinho...

— Quem é... Ugh... Quem é você seu desgraçado! Como você passou pelo meu
sistema de segurança!?

— Bom, você pode me chamar de Meu Anjinho da Guarda de Dinheiro... E como eu


passei por ele? Fácil...

O sujeito leva a mão destra até seu rosto, num sorriso, ele a agarra e começa a
puxá-la. De uma forma bizarra, seu rosto começa a se esticar como se fosse de
borracha, deixando o jovem de queixo caído, até que num barulho típico de borracha
em efeito de estilingue (zlap!) o rosto da figura saía por completo. Madeixas ruivas
caíam e uma figura extremamente familiar agora olhava para o rapazinho com um
sorriso largo no rosto:

— Eu mereço um Oscar ou não, hm?

— K-ka-k-k...Katt? É vo-v-você?

— E quem mais conseguiria chutar a sua bunda mecânica sem esse lugar
estraçalhar em pedaços, eh?

— Mas como isso é possível? As roupas... A voz... Tudo isso?

— Monamur, agora você é testemunha de um brinquedinho que eu guardei pra


ocasiões especiais como esta! Isso aqui é um antigo protótipo militar parte de um
"kit de espionagem" ou sei lá. A única parte restante é esse Módulo de Alteração de
Identidade, que em teoria permitiria ao portador assumir a forma de qualquer
pessoa... Mas eu acho que isso nunca chegou a ser implementado... A única pessoa
que eu consigo me transformar é nesse cara...

Dizendo, ela retirava o pé de cimade Cyrus, finalmente, e o ajudava se levantar, ainda


curioso, ele dizia:

— Mas como você conseguiu um equipamento tão poderoso assim?

— Acredite ou não, ganhei isso tempos atrás numa aposta, e mantive escondido,
mas isso não importa, esta figura que você viu vai nos dar todo o dinheiro que você
quiser!

— E como isso vai acontecer?

— Nossa Enterprise precisa de um... Porta-Voz, alguém faça toda a negociação de


forma anônima, sem expor nós dois como os cabeças do negócio. Você sabe que
falar é o meu negócio, então decidi usar essa faceta pra cobrir meus rastros, usando
ela pra falar com os "clientes".

— Não acha que isso é perigoso? E se descobrirem?

— O Espiona-tron é a prova de falhas, tenho certeza! Agora, não podemos perder


tempo, me coloque a par de tudo o que você descobriu, está na hora de meus
talentos nos trazerem grana!

— Espi...? Ahm... Okay, Katt... Vamos lá...

Cerca de uma hora depois, Katt estava sentada numa cadeira em frente uma mesa,
como um comunicador bem a frente, ela travestida como aquele homem, o
ambiente estava com uma iluminação precária, que cobria seu rosto, apenas
deixando os óculos da figura em evidência, ela se pronunciava para Cyrus, sentado
próximo a ela, em outra mesa, com telas holográficas de um computador a sua
frente e um teclado virtual também:

— Ok, Cy! Eu preciso que me coloque em conversação com os alvos, vamos


conseguir um dinheirão com eles! E o primeiro alvo é... Anthony Montana!

— Eu espero que esteja pronta! Eu vou localizá-lo e colocá-la em contato com Tony!
Eu só espero que esteja pronta! O contato com ele vai ser de imediato! Sem
chamadas, sem mensagem de espera, nem nada... Ok vamos lá... Dez segundos pra
sincronização!

Katt se firmava no assento, colocando os braços por cima da mesa, e após os dez
segundos exatos, um som se fazia e a tela holográfica do comunicador ascendia,
mostrando uma imagem estática de televisão, que ia distorcendo-se um pouco até
que ele aparecia: Tony Montana, o italiano que muitos consideravam com o Rei de
Miraitropolis. A menina não perdia e tempo e se comunicava:

— A-ha! Muito bom dia, Senhor Montana, eu acredito que você deve estar se
perguntando "Huh? Quem é este carinha que brotou do nada no meu comunicador
pessoal?" Bom, permita-me iniciar as apresentações... Eu sou o Diretor de Relações
da Corporação Corpus-Tech, pode me chamar de Shadowman, e venho aqui hoje lhe
oferecer os nossos serviços exclusivos de... "Tecnologia da Informação. Não, não,
não, não é necessário se acanhar a indagações neste momento! Permita-me
explanar. Todo mundo está sabendo do que aconteceu no aeroporto, uma batalha
sem igual! Gladiadores combatendo, uma donzela em perigo, explosões e
carnificina! Ah... Meus pêsames pela morte de seus soldados, inclusive... Como era
o nome dele? Pinkboy, Pipboy? Ah quem é um soldado morto além de um saco de
carne para você, não é? Ahahaha... Mas veja bem, sabemos de muito sobre o que
aconteceu lá, mais do que você mesmo pode imaginar Don Montana! Por exemplo,
sabia que foi um sujeito extremamente importante pra cidade que abateu os dois
Crows que os chineses lhe deram? Pois é isso mesmo sobre estas situações que
venho tratar... Estou abrindo aqui uma... Sugestão, de parceria entre nós! Você, pelo
que viu, vai precisar de todo suporte que precisar contra a Crusada Sangrenta que
Yuric está proporcionando na cidade, e acho também que alguém operando nas
sombras, ouvindo as ruas, com um estetoscópio preso ao coração dos russos,
ouvindo o batimento cardíaco das operações dele, lhe fornecendo amostras de
sangue continuamente... Veja só, Montana, eu agora irei direto ao ponto: Como uma
degustação grátis, eu lhe dou uma informação: O Sniper que acabou arrasando com
parte das suas forças é ninguém menos que Trigger, o mercenário famoso que
vende seus serviços ao maior comprador... Agora, se você quiser, podemos te levar
direto a ele! Faça o que quiser, mate-o, estupre-o, contrate-o, faça o que quiser... Te
daremos ele em suas mãos... Por um pequeno preço... huhuh... Veja, somos uma
empresa muito, recente, aqui na cidade e precisamos de fundos para ampliar nossos
serviços... Então ouça bem, pedimos uma singela doação de 350 mil créditos
transferidos para esta conta bancária que irei lhe passar, você tem doze horas para
se decidir, Senhor... Se recebermos o dinheiro, entraremos em contato com você
para maiores detalhes, mas... Não se sinta obrigado a nada! Lógico que apenas
estamos lhe dando uma ferramenta extra para seu embate contra os russos... Mas
ahhh... Acredito também que você não vai querer que nós entreguemos a cabeça
daquela linda senhora velha e todo seu bando para Yuric não é? Nem que eu conte
todos os segredinhos particulares daquela... hmmm... Só de pensar naquela bela
ruiva, meu coração já palpita forte... Ahahahahaha... Pense bem, Montana, podemos
transformar sua vida num Paraíso... Ou adicionar um Círculo do Inferno adicional ao
já existente. Você decide. Doze horas, 350 mil... Ah! E nem tente nos rastrear! Você
vai acabar caindo direto no seu comunicador novamente... A não ser que esteja com
vontade de dar um tiro na própria cara... Esperamos que faça a decisão certa. Para
si, e para todos…

Galathea

Galathea se encontrava enfurecida. Seu ódio revirava-lhe o estômago como poucas


vezes acontecia. Estava abaixada na sombra da parede. Todos estavam. Haviam
chegado àquela posição por instinto quando uma bala subitamente zuniu e ceifou
uma vida, matando-o antes mesmo de cair no chão. Os olhos da morena
observavam enquanto a poça de vermelho negro aumentava, adentrando nos
espaços do chão de madeira e entrando embaixo dos pés dela. Seus homens se
assustaram quando a mesma ergueu o rosto para fitá-los nos olhos. O temor
primordial de olhar nos olhos de um predador enfurecido.

— Eu não fui clara nas minhas ordens? — Sibilou enquanto seu corpo tentava conter
toda aquela fúria. — Continue atirando contra o Sniper, foi o que eu disse. Não foi? —
Um dos homens assentiu nervosamente quando a mesma deixou o olhar recair
sobre ele. — Viu? Essas nem eram as ordens dele e ele as entendeu…

— Chefe…

— EM! QUE…. QUANDO!? POR ACASO EU DISSE: Aguarde calmamente até o atirador
inimigo subir escadas, se estabelecer confortavelmente e atirar de volta contra nós?

— N-não… — Respondeu Ana desviando o olhar para o chão. Assim como os outros
dois emcumbidos de manter fogo sobre o inimigo.

— Quais são suas ordens!?

— Matar?

— Matar…

— Matar ele, senhora!


— E o que estão esperando, porra!? — Vociferou, expressando mais de seu ódio e
deixando que ele saísse de seu peito sem preocupações. — UM CONVITE FORMAL!?
ESPERA QUE EU PEÇA COM JEITINHO? DÁ PRA MATAR O FILHO DA PUTA…. POR
FAVOR!?

Os três se ergueram, apontando os rifles na direção da torre. Alternaram entre os


modos de visão para conseguirem ver melhor a silhueta do atirador e abriram fogo.
Ao mesmo tempo, uma bola de fogo iluminou os arredores do aeroporto. Os
cartuchos vazios se espalharam, junto a dezenas de outros, ao redor dos três
atiradores.

Galathea se afastou por um instante, tapando o outro ouvido enquanto recebia as


informações de Tony.

— Entendido. — Disse baixo e se voltou para os 8 soldados. — A Paramilitec tem um


tempo de resposta absurdo e já está à caminho, esvaziem os cartuchos e vamos
sair. Tempo da missão?

Os atiradores se entreolharam sem resposta. A morena abaixou o olhar até o corpo


no chão. Ele havia sido incumbido de cronometrar. O relógio manchado de sangue
marcava em seu visor 145 segundos. Cada segundo era uma eternidade naquelas
operações.

— Mais rápido! Já está pronto? Me ajude aqui com o corpo. — Comunicou um dos
soldados.

Os dois puxaram o corpo, removendo seus comunicadores e seu implante


subcutâneo com uma faca. Não era ninguém agora. Ninguém, além de um veterano
qualquer que um dia dera tudo por aquela cidade, apenas para ser jogado fora como
lixo quando ele precisou dela. Só mais um soldado ferido gravemente em batalha e
cujo tratamento era caro demais para o exército ou polícia darem a mínima. Recrutar
outro ou comprar um androide tinha um melhor custo-benefício. Galathea ainda
olhava o rosto sem vida no chão. Retirou seu cantil do bolso, despejando um gole
para o morto e bebendo um em seguida. Os soldados livres repetiram o gesto.

Então os tiros pararam. Libertando o atirador inimigo da supressão.

— Mataram ele?

— Não posso confirmar. — Responderam os três.

— Vamos embora.. — Balbuciou a líder em tom sombrio, um tanto melancólico.


Os homens se retiraram do local o mais rápido possível. Afinal, ainda havia a
possibilidade de haver mais alguém lá fora pronto para retornar o fogo.

Desceram as escadas de madeira. Estas rangiam sob as botas enquanto baratas,


ratos e viciados se esgueiravam no escuro, saindo fora do caminho da equipe
vestida de preto. Na rua, os três veículos pretos se abriram automaticamente ao
detectarem a presença das chaves. Os soldados se dividiram entre eles. Eram
veículos civis, comuns, inconspícuos.

— OK Rapazes… Vejo vocês em breve.

E com a frase de despedida de sua líder, os outros dois veículos partiram,


imediatamente se separando. Galathea estava no banco do carona, com um soldado
dirigindo, e Ana no banco de trás. O veículo fez o retorno na rua pouco movimentada
e seguiu em frente. As luzes opacas dos postes iluminavam de forma intermitente
os rostos sombrios e cansados dos veteranos.

— Chefe… — Balbuciou o motorista um tanto aterrorizado.

De um acesso à direita mais adiante, era possível ver as cores das sirenes ficando
cada vez mais vivas que, junto com os sons, atraíam a aproximação da Paramilitec.

— Calma. — Sorriu Galathea despreocupada. Ou mais precisamente, escondendo


sua preocupação para tranquilizá-los. Levou a mão ao rádio ligando o mesmo e
aumentando o volume pouco acima da voz. — Só segue reto em frente. Cuidado pra
não acontecer um acidente. Vai saber o quão bem esses caras dirigem. Eles tem
mais o que fazer além de ficar parando veículos civis.

— Tipo atender à uma zona de guerra. — Brincou Ana nervosamente no banco de


trás.

— É… tipo isso… — Disse Galathea quase não sendo ouvida por conta da música
abafada dentro dos vidros fechados.

Uroboros rolou 3 dados de 20 lados com dificuldade 17 para matar sniper que
resultou 2, 16, 10 - Total: 0 Sucessos

Akane
Baron rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 15 para defesa que resultou 12 -
Total: 0 Sucessos
Baron não tinha sido pego de surpresa, mas não esperava um robô no meio de carne
humana. Não teve tempo de correr, tanto que dentro do avião era estreito. Só lhe
restou lidar com a chuva de balas com seus reflexos e agilidade bem acima do nível
humano. Com a lâmina de sua espada, ele mirava como louco nos projéteis em sua
direção. Porém, como não era o Superman, ele acabou ferido por quase todo o
corpo. Os lugares mais letais foram habilmente protegidos. Nem mesmo as
escamas de peixe que funcionam como armadura foram capazes de aguentar
tamanha munição contra ele.

No fim, ele caiu. Sangrando em toda parte e tendo apenas duas armas além de sua
companheira para toda a vida. Ofegante, ele tentou xingar, mas calou-se ao
visualizar uma mulher aparecendo repentinamente entre eles. Não era o alvo, uma
vez que tinha visto imagens dela... E era bela demais para ser a megera que Akane
falava. Ele só observou a cena, agradecido pela distração. Sem se importar com o
balanço do avião devido a alguma explosão e tudo mais. Apenas, e com dificuldade,
tirou do seu bolso uma granada.

— Que esse presente funcione como as outras… — Murmurou ele com dor e
cuspindo sangue.

A trava foi tirada e ele jogou sorrateiramente mais perto dos guardas e do robô. Esse
tipo detona rápido, uma vez que não explodia. Fazia algo terrível. Todo o sistema
tecnológico, principalmente robôs e IAs, sofreria uma interferência e mau
funcionamento por todo o perímetro do avião, cobrindo boa parte das lutas. Sem
contar na musiquinha irritante que todo robô ou parecido poderia cantar.

" Um, dois... Akane vai te pegar... Tres, quarto, feche bem no quarto... Cinco, Seis...
Akane caça vocês... Sete, Oito, fique bem atento... Nove, Dez... Não durma na sua vez."

Será que é suficiente para afetar os russos nessa jogada?

Era só para ganhar tempo para o Baron se recuperar um pouco e sair do risco de
morte.

Mal atirei na turbina e já ouvi Peeboy gritar para mim. Naquele momento, desejei
matá-lo com minhas próprias mãos. Não perdoava suicídio. Além disso, o cowboy
era tão idiotamente dramático! Para não ser afetada pela explosão em potencial, eu
corri o máximo que pude, matando um ou outro ratinho pelo caminho com minha
Taurus com munição explosiva. Essa arma nunca deixava para trás numa briga. E
como sempre, mirava na garganta e cabeça.
Me permiti olhar ao redor e percebi que toda aquela lutinha dos dois lados mafiosos
era inútil. Queria mesmo era explodir de vez o avião com a megera russa dentro,
essa era minha vontade e o faria se meu amante não precisasse dela viva. Era
frustrante, mas fazia sentido o que ele queria. Não tinha mais o que fazer ali, pois
mais cedo ou mais tarde os soldadinhos perfeitinhos poderiam aparecer e acabar
com a farra. Eu não podia ser pega. E não iria.

Sem pensar em alguma estratégia melhor, corri para o blindado para ter mais
proteção e poder sair dali, uma vez que outro aliado de Tony deu as caras e um
plano de fuga era essencial aqui. Entrei no blindado e fiquei lá, sob uma janela meio
aberta para atirar em mais inúteis do lado russo da máfia.

**Não foi necessário rodar o dado uma vez que o ataque do do replicante foi contido
pelo cowboy, me dando mais tempo para sumir dali.

Narrador Capítulo 5

— Tenho que admitir, você é um viado bem traiçoeiro, me enganou direitinho


desgraçado. — Alek olhou para Rodrigo ao dizer tais palavras, o russo estava
totalmente rendido por Frank, que pressionava contra garganta dele um pedaço de
espelho afiado. — Até arranjou um namorado valentão, uma pena que vão os dois
morrer nesse banheiro sujo. — O russo passou a encarar Coyote com um sorriso
cínico estampado na face.

Mesmo rendido, Alek demonstrava total controle da situação, não parecia temer
Frank e Rodrigo de forma alguma, mostrando confiança e controle em cada palavra.
— Os seguranças provavelmente vão chegar aqui em um minuto, vocês fizeram uma
grande confusão no banheiro, afinal. Então, vou dar essa colher de chá pelas nossas
noites quentes, Rodrigo. O Crazy Dog está sendo bem cuidado, ele adora estar
conosco. Diga isso ao babaca do Fernando. Uma última coisa, diga a Pascal que
traições são difíceis de lidar. — Coyote e Rodrigo, após escutarem as palavras do
russo grisalho, ouviram vozes agitadas no corredor. — Seguranças, odeio esses
caras. — Quem falou isso foi um punk do lado de fora do banheiro, alertando a dupla
sobre a chegada deles.

A dupla precisaria decidir o que faria com Alek. Além disso, ao sair do banheiro,
avistariam cinco seguranças empurrando as pessoas no caminho e avançando
apressados. Estavam a uma distância de três metros da porta do banheiro. Coyote e
Rodrigo precisavam agir rápido para não serem reconhecidos e fugirem do local.
Caso contrário, teriam que lidar com os seguranças na base da força.
O dia finalmente amanheceu na conturbada Miraitropolis. Os enormes telões
espalhados pelos arranha-céus e dirigíveis transmitiam uma única coisa: o
pronunciamento da ParaMilitech sobre a violência crescente na cidade na última
semana. A transmissão era feita diretamente da sala de conferências da sede da
polícia privada. A tenente Aurora McCall estava de pé em frente ao microfone. A
jovem vestia um uniforme simples com o logo da ParaMilitech estampado no ombro
e uma boina sobre seus cabelos castanhos curtos. Era uma mulher de bela
aparência.

– Nós estamos fazendo o possível e o impossível para acabar com a onda de


crimes que vem dominando nossas ruas. Nesta madrugada prendemos um dos
homens responsáveis pela violência das últimas semanas, ainda não podemos dar
detalhes sobre o caso ou revelar a identidade do sujeito, mas em breve tudo voltará
ao normal. – Ela olhava para câmera de forma que transmitia confiança. – Pedimos
apenas a colaboração de toda população para que possamos fazer nosso trabalho
da melhor forma possível, pois a segurança do povo de Miraitropolis é nosso dever e
iremos cumpri-lo. – Após a transmissão ao vivo, o pronunciamento era reproduzido
em loop, era uma estratégia da ParaMilitech para manter a população no eixo, afinal
a onda repentina de calor e os crimes recentes estavam aumentando o índice de
estresse da população, o que poderia gerar problemas futuros.

Na sala de operações da ParaMilitech homens e mulheres trabalhavam sem parar


nos seus computadores, eles checavam cada frame das gravações das câmeras de
segurança do aeroporto e das proximidades do local. Aurora estava de pé ao lado de
um dos funcionários da área de computação, assistindo as imagens junto com ele.
– Que droga, eles simplesmente sumiram, deixando apenas fogo e cadáveres na
pista de pouso e um apartamento bagunçado nas proximidades. – Comentou a
tenente, claramente indignada com sua operação que havia dado errado. – O mais
impressionante chefe, foi aquela Crow-Z que levantou vôo com parte do avião preso
junto a ela por cabos de aço, seguimos ela até as proximidades do Submundo, mas
não podemos fazer mais nada quando a aeronave passou a voar baixo e
desapareceu entre os prédios daquele lugar esquecido. – Aurora cruzou os braços
sobre seus seios, encarando a tela do computador. – Para piorar, as evidências que
encontramos eram relacionadas aos russos, que apresentaram a papelada feita
pelos advogados, mostrando que tudo era “legal” e que foram vítimas da violência
da cidade. – O relógio da tenente começou a vibrar no seu braço, ao olhar para a
pequena tela via que era uma ligação do seu superior, Nick Slay. Ela afastou-se das
pessoas da sala e atendeu a chamada. – Senhor! – Falou de forma formal, ela
parecia realmente respeitar aquele homem.

– Tenente, preciso que agilize as investigações, plante evidências se for preciso, o


povo de Miraitropolis precisa de um cristo para crucificar. Seu discurso foi bom, mas
sem um nome e o rosto para o culpado, logo ele não vai valer de nada. – Slay foi
curto e grosso como de costume, Aurora suspirou e o respondeu. – Senhor, logo a
população vai ter um nome e um rosto para pôr a culpa dos problemas, já estou
trabalhando nisso. – Nick Slay antes de desligar a ligação, disse uma última coisa. –
Não me decepcione Aurora, você tem um grande potencial.

A vida sempre foi feita de escolhas, Chris Falcon escolheu aproveitar o presente que
Pascal tinha lhe oferecido ao invés de espiar o que estava dentro da Vênus para
buscar por informações que pudessem ser úteis para Xiaren, ainda mais após o
agito que tomou conta do local depois que a tela foi entregue por um garoto de rua.
Uma hora após a entrada de Chris no quarto com a prostituta Judy, Pietro bateu na
porta do cômodo duas vezes seguidas, falando no final da segunda batida. –
Acabou o tempo garotão, hora de ir para casa. – Quando Chris saiu do quarto, Pietro
voltou a falar com um sorriso amigável no rosto. – Espero que tenha gostado do
serviço da nossa boate. Diga ao Xiaren que Pascal conta com a aliança deles no
futuro. – Chris pegou sua moto, partindo do território de Fernando Pascal.

Quando a noite finalmente chegou ao fim, uma reunião iniciou-se no escritório de


Pascal nas primeiras horas do dia. Além do cafetão, sentado no mesmo lugar de
sempre, na sala também se encontravam Pietro, Santino e uma nova figura. Um
homem negro com tatuagens na cabeça e nos braços, usando um óculos hi-tech de
lentes vermelhas, mantinha-se com as costas escoradas na parede do escritório,
como se observasse o desenrolar da reunião.

– Quero acabar logo com isso, usaremos explosivos e armamento pesado para
invadir o prédio do Montana, mataremos quem tiver no nosso caminho. Depois o
pegamos, matamos a cachorrinha ruiva e depois o levamos para trocá-lo pelo meu
irmão. – Falou Fernando, sua face mostrava o quão exausto ele tava, sob os olhos
havia enormes olheiras e a voz dele soava cansada, na mesa ainda tinha restos de
pó de neon brilhante. Pietro levantou a mão direita, apontando o indicador para o
chefe, falando num tom empolgado de apoio. – Isso ai chefe, vamos ferrar com os
desgraçados. – Pietro era um puxa saco, apoiaria qualquer decisão de Pascal por
pior que ela fosse. – Começarei a preparar o armamento e reunir o pessoal. – Disse
Santino com sua postura de ex-militar.

O homem negro no canto da sala caminhou ate a mesa de Fernando, olhou para os
presentes ali, focanto em especial o Pascal e esboçou um sorriso como se
zombasse deles. – Vocês realmente acham que esse plano vai surtir algum efeito no
homem mais poderoso do crime organizado de Miraitropolis? – Pascal respeitava
aquele sujeito, por isso fez a seguinte pergunta. – E qual seria seu plano, Hurt?
O habilidoso sicário ajeitou os óculos com a mão direita, respondendo a pergunta
logo depois. – Conheço um hacker que trabalhou para agência de defesa de
Miraitropolis, seu nickname é Darkness, o boato que corre na rede é que atualmente
ele é o melhor no que faz superando até mesmo a hacker X-9. – Ele cruzou os
braços, continuando. – O macarrão italiano com toda certeza possui um sistema de
defesa no prédio, então vamos ser inteligentes, vamos ferrar primeiro a parte
tecnológica do Olimpo e depois entramos com nosso exército para retirar o “Deus”
do seu altar. – Pascal olhava e respirava fundo. – Você será o encarregado da
operação, apenas me mantenha informado de tudo. – Hurt ao ouvir seu contratante
fez um sinal positivo com a cabeça caminhando até a porta do escritório, antes de
sair o sicário falou mais uma coisa. – Agiremos a noite, então aproveite o dia para
tomar um banho e descansar, você parece uma pilha de lixo. – Ao ouvir as palavras
do amigo mercenário, Fernando esboçou um sorriso e relaxou seu corpo na cadeira.
– Acho que tem razão, estou acabado. – Hurt abriu a porta do escritório, se
retirando pra começar os preparativos do ataque ao prédio de Tony Montana.

– Inferno! – Red sacudiu a cabeça ao falar, abaixando a Desert Eagle logo depois,
passando a segura-la apenas com a mão esquerda. – Você tem razão, to ficando
paranoico com toda essa merda. – O ruivo colocou a pistola sobre uma mesa de
centro, aproximando-se de X-9 com um olhar cansado. – Estou cansado, 48 horas
sem dormir. Para completar o Albino fez tua caveira antes de você vir para cá, que
tinha 90% de chances de você nos trair, por causa dos seus negócios com o
Montana meses atrás. – Red suspirou, passando a mão direita sobre seus cabelos
vermelhos, que eram o motivo do seu apelido. – Simplesmente estou em alerta
desde de quando você acordou aqui, tentando descobrir algo, tentando criar um
vínculo para tentar fazer você entregar algo.

Red sentou-se no braço do sofá, olhando para X-9 de forma amigável. – Vamos
esquecer que apontei uma arma para sua cara, prometo deixar minha desconfiança
de lado. – X-9 tinha sido extremamente convincente na sua resposta sobre o filtro,
fazendo com que Red deixar toda desconfiança que sentia em relação a hacker para
trás, o que era muito bom para ela. Ele então se sentou de uma vez no sofá,
relaxando o corpo sobre o mesmo. – Pode começar a buscar pela planta do
Residencial Celeste? Eu descobri o nome da engenheira que fez o projeto, ela se
chama Evangeline Brinne, atualmente é consultora da Elisium o monopólio da
construção civil de Miraitropolis, tem um escritório no centro. Provavelmente guarda
uma cópia da planta no computador dela. – Red sentou-se no sofá, falando uma
última coisa.

– Use o computador, ele tem livre acesso pelo filtro, ou seja, tudo que é feito nesse
computador o filtro simplesmente não nota. – O ruivo então fechou os olhos, caindo
no sono do sofá. Agora era com X-9, ela teria que hackear o computador de
Evangeline e buscar pela planta 3D do Residencial Celeste, a hacker também poderia
aproveitar essa oportunidade para entrar em contato com Tony ou simplesmente
enviá-lo alguma informação. Para hackear o computador da engenheira, X-9
depararia com três portas, onde cada porta possuía uma sequência de códigos que
precisaria ser desvendada ou burlada, ela precisaria usar bem suas habilidades para
conseguir ter total acesso ao sistema.

No luxuoso escritório na cobertura do cassino russo, Yuric esmagava uma garrafa


de vodka com sua mão cibernética, estilhaçando-a em mil pedaços. Albino se
encontrava de pé de frente para o russo, que estava sentado frente a mesa de
carvalho. – O moleque italiano agora possui minha filha, isso pode se tornar um
empecilho grande – Vociferou Yuric com seu imponente sotaque soviético. – Estou
fazendo tudo para encontrá-la, tem homens nossos em cada canto da cidade
espancando associados de Tony em busca de informações. – Disse Albino
claramente intimidado pelo seu chefe. – Muito bem, esse é nosso único problema
real até agora, afinal nosso plano segue bem. – Yuric tinha um olhar raivoso, mas ao
mesmo tempo pensativo. – Entre em contato com Pascal, descubra quando ele
pretende atacar, usamos isso para entrar no Olimpo e recuperar Margareth ou ao
menos descobrir onde ela está. – Ao escutar as palavras de Yuric, Albino fazia um
sinal positivo com a cabeça. – Certo chefe!

O relógio marcava 09h00 horas da manhã, o elevador que levava direto para a
cobertura de Tony Montana se abria e de dentro saia cinco pessoas. Um homem de
cabelo raspado com barba farta ruiva empurrava Margareth Nureyev presa por
algemas magnéticas para dentro do apartamento, o homem era conhecido pelo
apelido de Capitão Gancho, devido o gancho que possuía no lugar da mão esquerda,
o sujeito era um dos responsáveis por controlar os negócios de Tony no submundo.
Ao lado dele tinha um homem gordo, que carregava nos braços Gal com um curativo
na barriga e algemas magnéticas nos pulsos, o gorducho chamava Dr. Jonah, era
um veterinário que trabalhava como médico clandestino no Submundo. Além deles,
Baron, o mendigo com habilidades especiais saía de dentro do elevador, possuía
buracos nas suas roupas e curativos nos locais onde foi atingido pelos disparos.

Gancho jogava Margareth no chão da sala de Montana, falando em seguida. – Essa


puta soviética é difícil de domar, mordeu a orelha de um dos rapazes e chutou o
saco de outros dois, tive que dar um soco na cara dela para fazê-la parar. – Tony e
os outros na sala notariam o roxo no olho da Margareth. O Dr. Jonah colocou Gal
sobre um dos sofás, dizendo. – Não sabíamos quem era essa outra loira, então eu
algemei ela depois que a costurei. – Jesse que estava sentado numa poltrona com
curativos no rosto e ataduras nos braços questionou a dupla. – E os capangas e as
armas que ainda estavam na carcaça do avião?
Capitão Gancho ao escutá-lo, retirou uma planilha digital do bolso interno do casaco,
entregando para Jesse. – Fizemos a contagem, três caixas de munição com ponta
de radiack, duas caixas com vinte AKs em cada e um Mecha de combate
Nazisoviético, o restante do armamento provavelmente ficou na parte do avião que
vocês não conseguiram levar para o Submundo. – Ele levou a destra na longa barba
ruiva. – Guardamos tudo no nosso depósito onde guardamos as drogas, se quiser
faço uma ligação e um dos nossos homens traz para cá. – Olhou para Jesse e
depois para Tony. – Já os capangas, executamos um, prendemos o outro e
desativamos o robô de combate.

Quando ele parou de falar, Margareth que estava descabelada e com seu vestido
branco sujo, voltou seus olhos para Tony. – O garanhão italiano em pessoa, acha
mesmo que me sequestrar vai surtir algum efeito? – Ela esboçou um sorriso,
voltando a falar. – Meu pai se importa com o controle desta cidade de merda mais
do que qualquer coisa. Se o preço para controlar Miraitropolis fosse por uma bala na
minha cabeça, ele mesmo faria isso. – Com um olhar confiante, o que alguém na
posição dela não deveria ter, seguiu falando. – Então o que acha de me deixar tomar
um banho, providenciar um bom jantar e então falarmos de negócios? Você me faz
uma proposta interessante, diz o que quer saber, eu te conto e depois você me deixa
ir. Esse lance de sequestro e tortura nunca vale a pena, então o que me diz,
garanhão? – Finalizou suas palavras encarando Montana de baixo para cima.

Instruções

1- Frank e Rodrigo precisaram rolar um D20 com dificuldade 13 para passar


despercebido pelos seguranças, o resultado dos dados desta vez é individual, ou
seja, se um dos dois errar e o outro acertar, o que errou será notado e o outro não.

2- X-9 precisará rolar três D20, um para cada porta. Dificuldade 12, tem duas
tentativas para cada rolagem.

Timothy Carter

Era manhã, Timothy adentrava pela porta da casa de prostituição chamada Sexy
Day. Desta vez, ele estava sozinho, vestindo um terno marrom por cima de uma
camisa branca com gravata vermelha. O local estava vazio, provavelmente era cedo
demais para qualquer tipo de serviço. Tim aproximou-se do balcão, o barman, ao
vê-lo, o reconheceu de imediato.

— O cara das drogas que precisava de umas armas para se defender, gostou do que
comprou?
— Não tive oportunidade de usá-las ainda. — Disse Timothy com um ar descontraído,
claro que era puro fingimento, queria passar uma imagem amigável e ao mesmo
tempo confiável. — Tivemos uma reunião, gostamos de negociar com vocês, então
estou aqui para fazer uma proposta. — O barman olhou para os lados como se
procurasse por algo, depois voltou os olhos para Tim. — Esse tipo de coisa é só com
o Joe. Vou chamá-lo! — O homem pegou uma garrafa de uísque barato e um copo,
servindo uma dose. — Senta aí e já volto.

Timothy pegou o copo quadrado, sentando-se numa cadeira de ferro de frente para
uma mesa redonda pequena. O barman apertou o botão na estante, e parte da
parede se abriu. Ao invés de apenas gritar por Joe, ele desceu as escadas para o
porão onde funcionava o QG e a oficina de armas dos Steelhearts. Dois minutos
depois, o barman saía pela porta "secreta", seguido por Joe e um homem alto e
careca vestido com uma camisa sem mangas. O barman ficou no balcão, enquanto
Joe e o careca caminharam até a mesa onde Timothy estava terminando de tomar a
dose de uísque.

— Olha ai, o cara que me prometeu heroína de graça. — Disse Joe com um sorriso de
canto.

— Sim, minha sócia foi estacionar o carro, a heroína ta com ela. — Ao terminar
aquela frase, Tim pegou uma carteira de cigarros e um isqueiro no bolso interno do
seu terno. Pegou um cigarro colocou na boca e depois o acendeu com o isqueiro,
colocando ambos de volta no terno. — Agora sim eu gosto ainda mais de vocês. —
Disse Joe. — Aê, esse é meu parceiro de negócios, Larry. — Apontou para o sujeito
careca de pé ao seu lado, que apenas fez um cumprimento com a cabeça. – Ele teve
sua língua cortada fora, por isso é sempre tão quieto. — Gargalhou Joe com a
própria piada. — Hahahaha, mas então, o que te trás aqui de novo cara das drogas?
— Perguntou com um sorriso na face.

Timothy tragava o cigarro, soltando a fumaça pelo o nariz, depois ele o retirava da
boca com os dedos da mão direita. — Quero expandir o negócio, sabe? Tentar uma
parceria com um dos grandes criminosos da cidade, poderia me ajudar nessa, cara?
— Joe trocava olhares com Larry, antes de qualquer palavra dele, Rose entrava pela
porta com um saco de papel nas mãos. — Tinha um bêbado lá fora tentando pegar
na minha bunda, tive que colocá-lo para correr. — Ela sorriu ao falar, colocou o saco
de papel na frente de Joe e depois se sentou ao lado de Tim. — Ta aí sua heroína já
na seringa com mais uma ampola cheia.

Joe pegou o pacote e abriu, olhando o que tinha dentro e disse. — Muito bom! Seu
parceiro tava dizendo sobre a idéia de vocês expandirem seus negócios, entrando
em parceria com um dos mafiosos da cidade, não sei se esse é o momento pra isso,
é um conselho que dou para vocês. — Rose olhou para Tim, falando em seguida. — A
gente sabe que eles tão se matando cara, mas esse é uma boa chance de crescer no
negocio ilegal, fora que poderíamos dar bastante lucro com nosso produto. — Eles
não tinham produto nenhum, não eram traficantes ou fabricantes de droga, porém
esse era o disfarce que encontraram para enganar Joe. — Minha gangue já quebrou
a cara numa aliança dessas, inclusive é por isso que não estamos metidos no meio
dessa guerra. Porém, acho que posso fazer a proposta de parceria de vocês chegar
até Tony Montana, ele foi nosso aliado num lance que aconteceu há um tempo.

Ao escutar as palavras de Joe, Tim apagou o que restava do cigarro na mesa e


retirou uma caneta do bolso. — Tem como me arranjar um pedaço de papel ou algo
que eu possa anotar em nosso contato? — Joe olhava em volta, depois olhou para o
saco de papel onde estava a heroína. — Anota nesse saco de papel mesmo. — Tim
escreveu seu número de contato no saco de papel, depois levantou-se junto com
rose. — Obrigado por fazer isso por nós. — Ele estendeu a mão, cumprimentando o
Steelheart. — Sem problema cara, vocês são legais. — Timothy e Rose saíram logo
depois do estabelecimento. Agora, eles estavam mais perto do que nunca de chegar
até Tony Montana, o homem que Timothy julgava ser o principal responsável pelo
que aconteceu ao prédio do Canal 17, onde sua esposa e filho foram mortos.

X9

Ufa, ainda bem que deu certo… Ele fisgou a isca direitinho, só tinha mais um cigarro,
não sei se conseguiria suportar mais pressão sem fumar. Às vezes a gente
consegue mais informações pelas atitudes das pessoas do que propriamente com
suas palavras. Acompanhei Red lhe tocando o ombro esquerdo, caminhando com
ele até o sofá.

— Tudo bem, por mim tá esquecido esse episódio, só não acredite em tudo o que
falam, ainda mais nesse mundo em que vivemos onde a desconfiança é regra.
Sempre tem alguém pra fazer a caveira da gente. Não culpo o Albino, é o serviço
dele manter Yuric seguro. Agora descansa um pouco, cara, você tá precisando, eu
vou cuidar do assunto da construtora. Como você não se opôs, vou também usar
meu computador de pulso para procurar algo sobre a noite em que levei aquele tiro.
Se você me ver com os fios ligados ao PC central, não precisa me apontar uma arma
de novo hein, rs. — Sorri, me retirando do local para Red descansar um pouco.

A última coisa que Red presenciou antes de pegar no sono foi me ver colocar o
óculos Rift no rosto e plugar os fios intracranianos na lateral da cabeça. Ainda bem
que esse chato tinha liberado o caminho, puta que pariu, já não aguentava mais ele
na minha cola o tempo todo, o cara só faltava me seguir no banheiro... Embora ele
tenha feito isso também. Eu suava muito, de medo, tensão, ansiedade, nervosismo,
calor, de tudo! E só de birra mandei ele tomar no cu mostrando o dedo do meio, o
mané tava roncando mesmo e não ia ver a malcriação. Depois joguei o casaco preto
num canto e voltei a ficar apenas de colete e regata, acendendo o último cigarro que
me restava. Enfim, sentei-me à frente da mesa escura com muitos aparelhos,
reconectei os fios no aparelho ao meu pulso, ligando a outra extremidade à entrada
do gabinete. Esse terceiro fio foi usado como elo com o PC anti-filtro de Red.

Dessa forma, o meu aparelho também ficaria livre do bloqueio, como um HD escravo
parte do equipamento do ruivo. Iniciei o programa sincronizado entre as duas
máquinas e foi curioso para mim, já que eu nunca tinha feito, tudo era novidade e eu
realmente não sabia como ia me sair. Surgiu primeiramente a tela preta de
carregamento, o processo ia demorar um pouco, haja paciência, ainda mais para
mim que não tenho muita, com calor se unindo a isso... A falta de cigarros...
Posteriormente o processo foi finalizado, surgiu a tela de 100% de carregamento e
as duas máquinas estavam em harmonia como se fossem uma.

Deixei meu computador de pulso fazendo duas funções, a primária enviando dados
para o sistema de Tony Montana e a secundária que era procurar realmente alguma
coisa em que pudesse falar sobre a noite no Cemitério Neon, qualquer coisa.
Enquanto isso, eu preparava meu cérebro para uma experiência totalmente nova, a
imersão total na lexis. Não sabia como ia ser, não tinha testado antes e tudo que
tenho feito até agora foi na base do susto, improviso e conhecimento do que eu sei
sobre hackear. Estava nervosa, meu cérebro poderia fritar e eu ficaria catatônica
como Arthur ficou quando deixou Praxis escapar. Era um risco, um risco enorme que
poderia por minha vida na lata do lixo. Ao lado esquerdo da mesa tinha o final de
uma garrafa de vodka. Bebi aquele resto no gargalo e apertei a tecla ENTER do mini
PC.

Por baixo dos óculos, meus olhos lacrimejaram, pareciam queimar com fogo, eu
tinha a impressão de que eles iam derreter. Tentei remover aquela coisa das vistas,
mas a inicialização já estava feita e vi grades de neon rosa choque surgir por trás de
uma figura de guitarra. Eu não sabia o que aquilo significava e fiquei ainda mais
assustada. Aquela porra era comparada a uma viagem de ácido barato. Por isso as
pessoas se viciam nessa merda, cada entrada é uma piração do cacete. O ar me
faltava, o coração quase saía pela boca. A experiência foi totalmente diferente
daquilo que imaginei, julgava que seria como quando usei o capacete de realidade
virtual algum tempo atrás com Dante quando Choi nos capturou. Aquelas grades
pareciam me envolver, como se estivessem me engolindo, e eu não conseguia
escapar. De repente, um sono me tomou, eu perdia os sentidos apesar do meu medo
só crescer. Tinha a sensação de voltar ao útero e apaguei.
— Acorde — A voz era gentil como de uma mãe mas foi o contato no rosto que me
fez despertar. Abri os olhos e vi uma face fina e azulada, com milhões de dados
passando pela sua pele. Me assustei e engatinhei para trás.

— Sou eu, Praxis, pode ficar calma. — Ela disse com a voz quase sussurrada.

— É você… Mas o que está fazendo aqui? Aliás, onde estou? — Estava confusa,
Praxis comigo e não reconhecia o lugar, era cheio de tubos, conexões, corredores
com muitos canos dando voltas e voltas, parecia estar em um filme do Alien.

— Estamos em um lugar seguro da Lexis que costumo chamar de safe point. Aqui
ninguém pode nos rastrear, nem a Paramilitech. Você não se preparou para a
imersão, foi uma tremenda irresponsabilidade entrar sem conhecimento. O que
aconteceu foi quase uma overdose inicial, por favor, nunca mais faça isso, seu
cérebro não é acostumado com tanta frequência. Da próxima vez tente entrar de
maneira menos abrupta na lexis e não a toda potência. — Ela se aproximou, eu
estava mais calma, e me dei conta que tinha imagem dentro da lexis. Isso me
deixava bastante confusa.

— Se eu aprendi bem… Quando uma pessoa é inserida na lexis, ela não tem imagem,
é como um fantasma vagando, e você viu isso, estava lá comigo quando aconteceu.
— Orgulhosa demais para aceitar um conselho, ignorei mais da metade do que ela
disse e foquei apenas no que me era conveniente.

— Seu novo aparelho permite acessar a lexis com a mesma tecnologia que Henry
Choi está para lançar. Ele vai apenas superfaturar os produtos que podem ser
construídos com material mais barato... Tudo pelo lucro. Mas... Você não, fez por
que é um gênio… Ma… Digo, X-9. — Ela evitou a palavra “mãe”. Se tivesse dito, isso
teria me assustado ainda mais.

— É muita informação para absorver… A única coisa que queria era…

— Acessar a planta do Residencial Celeste, ver os arquivos de Evangeline Brinne e as


pastas da Elisium. — Completou como se pudesse ler minha mente.

— C-como v-v-você sabe? — Gaguejei.

— Quanto mais tempo passo na lexis mais experiência obtenho. A Paramilitech


praticamente me mantém conectada 24 horas por dia, como um sistema de
segurança contra possíveis ataques russos. Esses meses me proporcionaram dons
que eu nem mesmo sabia que poderia ter. Se um humano entra na lexis eu posso ler
seus pensamentos, como fiz com você. Foi assim que rastreei você, assim que
entrou no mundo virtual eu pude saber com exatidão onde estava e impedi que seu
cérebro fritasse. — Apesar dela sorrir simpática, era assustador para mim.

— Quase como um deus dentro da máquina… Onipresente e onisciente. — Conclui.

— Mais ou menos isso. Imagine daqui alguns anos o que poderei fazer? — Sua
animação me atormentava, a ideia mais ainda.

— Não quero nem imaginar… — Falei baixo, mas esqueci que ela podia ouvir ou ler o
que eu dizia.

— Parece não estar feliz com meus avanços. — O rosto azul mudou tristonhamente.

— Não… Como eu disse, só tenho que me acostumar com a ideia… Deus Ex Machina
me parece um termo que teria dois sentidos agora. Esqueça, estou divagando...
Praxis, pode me ajudar? Eu preciso…

— Por aqui, basta seguir por este corredor. Ao final dele achará a saída e acesso que
deseja. — Ela novamente leu minha mente. O local por onde ela apontava era um
abismo escuro envolto daquelas tubulações e canos.

— Então se eu me jogar daqui eu acesso os dados da Elisium?

— Encontrará as portas para abri-la. Mas posso ajudá-la no que puder.

Confiei em Praxis e da beirada me lancei de cabeça no abismo. A queda foi longa e


torturante, causando vertigem, dor de cabeça e enjoo. Tudo passava tão rápido que
eu não conseguia ver e achava que ia me esborrachar feio quando chegasse ao final
daquilo, gritava sem parar, o pavor tomava conta de mim. Sempre tive medo de
altura e só fazia aquilo por confiar na Inteligência Artificial que eu mesma criei.
Apesar de cair, parecia que quando chegava ao final, as leis da física não tinham
poder ali. Quando atingi o fundo do abismo, não me estatelei no chão, mas sim
pousei leve como uma pluma. Claro que aquilo tinha a mãozinha de Praxis. Lá
embaixo, fora do safe point, o cenário era diferente, como eu já havia visto da
primeira vez que mergulhei na Lexis. As paredes eram feitas de algum material
transparente que refletia a imensidão negra da rede. O chão e corredores também
tinham essas linhas prateadas que diferenciavam os contornos dos objetos,
destacando-os do resto da escuridão. Assim que me reergui, vi um portal à minha
frente. Praxis se colocou ao meu lado, abrindo as mãos. Em cada palma, tinha duas
chaves.
— Não posso interferir na sua escolha, mas posso garantir que uma dessas duas
chaves abre a porta. Você só tem duas chances, uma terceira tentativa dispararia o
alerta da Elisium e suas contra medidas digitais entraram em ação, não queremos
isso. — Exatamente como dizem ser os deuses, não podem interferir no livre arbítrio
alheio. Escolhi a segunda chave da mão esquerda. Caminhei por uma trilha incolor
seguida de degraus de blocos, com medo vi uma porta redonda que se comportava
como um portal. Em cada lado continha duas coisas que pareciam estátuas, os
mesmos que se vê em Little Asia com sua arquitetura oriental. Inseria a chave mas
ela não se abriu. Os contornos dos leões mudaram de cor, tornando- se alaranjadas
e destacando-se do resto do ambiente, dando sinal de que tinha errado. Eu havia
gasto a primeira tentativa.

— Não se preocupe, X-9, eles são os guardiões das portas, mas se acertar não farão
nada, ainda tem outra chave. Se conseguir abrir, fique ciente de que ainda precisa
destrancar outras duas passagens depois desta. — Consenti com um sinal positivo
com a cabeça e peguei a primeira chave da mão direita. Repetindo o gesto fechei os
olhos, mas diferente de antes o portal girou. Senti um alívio tremendo.

— Conseguiu, passamos pela primeira porta. — Disse Praxis enquanto atravessamos


a entrada que parecia ser feita de líquido cromado. A outra sala não tinha nada de
diferente do corredor anterior, a não ser pelo fato de ser menor e terminar em uma
nova porta e os animais guardiões serem dois falcões.

— Escolha de novo. — Praxis jogou fora as chaves, fechou as palmas e quando abriu
tinham quatro novas em suas mãos. Eu já sabendo o procedimento, peguei a
terceira da mão esquerda, coloquei na fechadura e girei a maçaneta, dessa vez sem
medo e sem pressão, sabia que se errasse teria uma nova chance. Mas nem
precisou, a porta se abriu de primeira, desta vez sem que os animais fossem
alertados.

— Parabéns. Agora só falta uma. — Ela jogou fora novamente o conteúdo das mãos
e surgiu com novas chaves. Os totens agora eram dois imponentes dragões
chineses. Apesar disso estava mais confiante, não pensei em nada e peguei a
segunda da mão direita. Mas para meu pavor, a dupla de dragões também mudou de
cor, eles ficaram alaranjados como os leões da primeira porta e eu recuei dando dois
passos para trás.

— MERDA! — Praguejei.

Parei, pensei, fechei os olhos, me inspirei e expirei, soltando todo o ar dos pulmões.
Relaxei os músculos, todo meu trabalho estava dependendo da última escolha. Ia
dar merda com Red se eu falhasse agora e meu disfarce poderia ir por água abaixo
de vez, o ruivo não ia cair num segundo migué em tão pouco tempo. Isso ainda não
era o pior, Yuric me mataria sem pensar duas vezes. E aposto que minha morte seria
lenta e dolorosa. Praxis me olhava esperando pegar a chave e por alguma razão eu
sentia confiança naqueles olhos artificiais. A quarta chave da palma direita foi
minha escolha. Por que? Não faço ideia, tudo foi intuição, eu deixava que meu sexto
sentido em versão digital me guiasse. Me dirigi entre os dois dragões laranjas, seus
olhos selvagens me espreitavam de forma bem diferente de Praxis, diferente dela
eles torciam para que eu errasse e eu podia jurar que a qualquer momento me
devoraram. Levei a mão trêmula até o portal redondo que girava à minha frente,
mantive o braço esticado para frente, protelando por cerca de um minuto, e então
coloquei a chave.... E o portal se abriu... Ufa!

Pollux
Dava pra sentir as ruas tremerem e serem semeadas com sangue, Montana sabia
fazer isso muito bem mas eu tinha outro tipo de guerra para lutar, e as sombras me
fizeram muito bem nesse meio tempo. Parando pra pensar ter o respeito e a
confiança de Tony foi uma das coisas que mais me orgulhei de alcançar depois da
amizade de Liam e o resgate de Calidora, eu enfim tinha um lugar naquela sub
sociedade e com a minha experiência com a outra, a ainda regida por Telford e suas
marionetes, isso era tudo, mas eu ainda precisava de mais. O homem sabia que eu
não podia lutar naquela guerra dele ainda que quisesse, meu corpo pode não ser tão
bem treinado quanto meu intelecto e isso seria minha derrocada, e o pouco que
podia fazer vinha em lições lentas e doses homeopáticas, não estava me
dissuadindo de minha tarefa mas havia mais que eu podia fazer e não vinha
fazendo. A revolta na superfície da cidade vinha crescendo enquanto eu me
escondia em seu submundo, e temia que apesar da batalha ter terminado favorável
para o homem para quem eu trabalhava, ainda sabia que a tempestade estava só
dando uma pausa antes de voltar com mais violência. Nunca nada é pacífico em
Miraitropolis.

Sem o conhecimento de Montana eu me encontrei com alguns de meus contatos


em um galpão enegrecido e abandonado, e como havia sido instruído, usei o tempo
de guerrilha para me fortalecer e reunir informações, mas também fiz um pouco
mais do que isso. Tinha comigo duas hoverplanes estacionadas no hangar, junto de
mais um avião convencional como já era raro de se ver. Da escada que se
desdobrava para a frente até rebater no chão, os passos de Calidora se ouviam
enquanto ela descia da nave, circundada por dois homens de terno com escutas no
ouvido, sem dúvidas não eram militares. Esperei dirigir-se até mim e cumprimentei
com um sorriso típico enquanto ela retirava os óculos e me olhava com os implantes
avermelhados.
— Vai dar tudo certo enquanto eu estiver fazendo o serviço para o Montana? —
Quando olhei de novo para ela, trazia uma pasta holográfica nos dedos, que
empurrou contra o meu peito e eu pude ver várias identidades perfiladas por ela que
se alinhavam ao nosso objetivo.

— Eles estão todos aqui, vai querer falar com alguns, e evitar outros. Você sabe o
que eu penso sobre alguns desses nomes, ainda acho que deveria usar sua ligação
com o Tony e…

— Pedir essa ajuda pra ele? Nem pensar, primeiro que ele não é meu pai para ficar
bancando esses projetos, e depois ele já tem coisas demais nas mãos. Quero que
isso seja algo nosso, ninguém vai saber até estar online.

— Faz sentido. Só tem mais um nome que eu não consegui encontrar.

— Já sei quem é.

Não era bem um nome, mas um algarismo e uma letra. O que eu procurava estava
além da identidade daquela mulher, e talvez fosse mais fácil encontrar seu trabalho
do que ela própria.

— Olha, eu não sou nenhuma hacker. Sabe como é difícil encontrar uma coisa que
está por toda parte? É a única peça que nos falta.

— Dá pra fazer isso sem essa ajuda, mas é difícil compilar todos os dados. Você tem
feito um bom trabalho com os servidores, mas pra algo tão grande assim, o seu
backup naquele açougue não vai funcionar muito bem.

— Fiz aquilo às pressas, não enche. Calidora riu lembrando de nossa primeira
jornada, e o servidor secundário que havia deixado escondido durante nossa fuga do
Canal 17, um episódio que agora parecia ao mesmo tempo distante e como um
sonho da noite passada.

A gente deixou a conversa de lado e quando focamos no que era importante, alguns
homens que vieram nas demais aeronaves descarregaram uma grande caixa de
metal conduzindo-a para fora da rampa de embarque, outro abria-a com um keycode
que não parecia relativamente seguro, somente um painel com números que se
acenderam diante da pressão e abriram a caixa metálica por onde a carga se
escondia. Um dos mecânicos que vieram junto dos homens nas hovernaves passou
por mim e Calidora e inspecionou melhor o conteúdo. Foi dali que eu ouvi um
pequeno ruído de energia carregada, um ronco suave como ar carregado de
eletricidade que não é ligado a muito tempo, de repente tornei a ver o que era o
drone saindo da caixa, com um espanto do técnico que deu dois passos para trás e
viu a poeira do hangar logo abaixo do drone levantar em um círculo que
correspondia a circunferência de seu halo de decolagem, dois metros e meio acima
do chão. Eu e Calidora vimos a máquina se voltar para nós e as hastes onde as
metralhadoras montadas ficariam alinhar-se conosco, mas não só estava
desarmada como também seu protocolo havia sido limpo a seco, não havia
resposta daquela ferramenta além do que parecia exatamente seguir-nos com seu
olhar robótico.

— É meio que um modelo antigo. Será que vai aguentar? — Não tinha nem sombra de
dúvida na expressão de Calidora, e eu pensava o mesmo mas ainda buscava sua
opinião, que entendia mais daquela produção de engenharia do que eu.

— Vai precisar de alguns ajustes, principalmente quando for para as ruas. É um


inferno lá agora e ela vai precisar sobreviver bem, então vamos ter que mudar ali,
está vendo? E ali também.

— Isso é de linha de produção? Vai dar pra produzir mais?

— Não. Não dá. É um lote antigo que ninguém mais quis, foi tudo que nosso dinheiro
pôde comprar. Mesmo sem minhas modificações ela é bem resistente, mas não
temos um bom número.

— Vou dar um jeito. Vou ter que fazer umas ligações e me encontrar com umas
pessoas agora mas você tem o meu sim. Tudo isso foi bem impressionante, só
precisamos dos nomes certos agora. É o nosso próximo passo.

Calidora havia feito mais progresso do que eu imaginava, então aquilo realmente
estava acontecendo. Era ótimo, mas os estágios finais eram os que realmente me
preocupavam, com toda a oposição que o plano iria definitivamente encontrar.
Cumprimentei alguns dos militares que não pareciam tão oficiais ou legítimos assim
e esperei para checar se Calidora estaria em segurança enquanto os outros
engenheiros a diziam algo sobre os drones que eu não escutava mais pela distância,
então pulei de volta na moto e fui para o segundo encontro da noite. Enquanto eu
dirigia, toquei no painel frontal da moto em que viajava quase deitado sobre o painel
e iniciei uma holomensagem. Salvo contatos muito distantes ninguém ainda sabia o
propósito por trás daquele hangar, e assim deveria permanecer até os últimos
momentos, mas ainda que contar com outras pessoas fosse o elo mais fraco dessa
corrente, era também o ponto mais necessário.

— Coltraine, aqui é Pollux. Tivemos nossas diferenças por razões bem válidas no
passado, mas tenho uma proposta para você. Espero que você faça como eu e veja
qual é o lado certo dessa guerra que estamos vivendo. Mando os detalhes quando
estiver disposto a ouvir. Pense bem nisso. — Não sabia se ele atenderia ao meu
chamado, mas havia pelo menos uma chance de tentar dissuadi-lo de seu atual lado
naquela guerra invisível, não somente a que Montana participava. Coltraine
representava uma posição privilegiada no tabuleiro e ainda que não a tivéssemos
poderíamos precisar exatamente do lugar que ele mantinha, ou ao menos do que ele
guardava. Era um homem esperto e tinha muito a ganhar, restava saber se estava
disposto a investir também. Esse papel seria originalmente de Liam, e só de pensar
do que havia sobrado dos Steelheart, bem, era bom que ele não estivesse vivo para
ver isso. Pedir ajuda aos inimigos não era algo que eu gostava de fazer, mas não
consideraria isso se tivesse outras opções. A hacker de cabelos azuis... Bem, ela
seria uma peça-chave também, mas não contava muito com sua presença. Acho
que o que aconteceu depois daquela noite só serviu para um afastamento ainda
maior, talvez eu recorde a ela demais sobre Liam e como ele morreu para me salvar.
Entendi e respeitei o afastamento. Muitas vezes evitei de me dirigir até o túmulo do
Steelheart quando vi uma figura magra e de cabelos exóticos ao longe, dando a volta
no quarteirão e decidindo prestar minhas homenagens a distância, em respeito. Mas
muito da organização ainda estava viva e eu ainda tinha armas lá dentro, armas não
de aço ou pólvora mas de nervos e olhos.

Com o que eu sabia, parei minha moto ao lado da Sexy Day, sem ainda saber a
intenção daqueles que visitavam a antiga armory dos Steelhearts. Foi aí que eu tive
uma oportunidade que não deixei passar. Eu não conhecia tão bem aquela sua
parceira de negócios, daquele triste homem que algum tempo atrás tentou fazer
contato comigo, mas sabia que era parte da sua rede de informação e uma possível
incitadora. A placa do carro perto de onde parei me dizia que era o veículo da mulher
que o acompanhava, e rápido para que mais ninguém chegasse no mesmo beco, eu
saquei do bolso um pequeno rastreador que se abriu como uma aranha, coloquei
debaixo de sua suspensão e me ergui de novo, para seguir para a boate, onde o
nome de Joe e Larry já me marcavam bem na cabeça como aqueles que faziam
acordo com quem queria destruí-los. Traidores, muito provavelmente. — Timothy
Carter, o cara da revolução. — Encontrei com ele na saída de seu encontro e fiz um
singelo cumprimento a quem o acompanhava, cordial e familiar mas sem muita
intimidade, cauteloso ao que ele poderia saber sobre mim, e se sabia ou não do meu
total envolvimento com Montana, a ser evitado nos próximos dias.

— Não pensou que ia lutar contra toda essa cidade sozinho, pensou?

Cris Falcon
Passado o seu breve momento de diversão ao lado de "YorHa Ju-D", Yasuke
imediatamente voltou a seu posto.
— Vamos ver... "rec_000.avi".
Não viu nada que pudesse ser interessante. Mas por estar sozinho naquele
momento, fez questão de deixar as suas armas próximas e fez um contato no
Holotech de sua moto. Beep, Beep.

— Chris? Onde você está?

— Saindo da Vênus, acabei de ganhar um presentinho dos caras.

— De graça? O que você andou fazendo?

— Digamos que eles tinham um protocolo de segurança e quase me forçaram a


lutar. Mas aí o Xiaren disse que era só eu avisar que era da turma dele que ficaria
tranquilo.

— Ah, menos mal. Do que você precisa?

Deu uma olhadinha no seu holotech. Nenhuma informação que definitivamente


fosse relevante.

— Por hora, nada, mas eu preciso ser discreto. A essas horas, deve ter alguém ou
alguma coisa me seguindo, eu sinto isso.

— Está bem, Chris. Tenha cuidado!

E com isso, seu contato desligou o comunicador do Holotech. Chris seguiu caminho,
mas algo tirou a tranquilidade de sua mente, fazendo com que ele ficasse em alerta.

Galathea
— Calor…

Reclamou a bela morena de ascendência Ítalo enquanto tinha a pele alva açoitada
pelos raios de sol. Olhou de soslaio para esse, sendo ofuscada pelo brilho
esbranquiçado do carrasco do deserto à espreitando de volta pela lateral de um
prédio à distância.

— Diz a que viveu no deserto... Por quê está aqui fora? Lá dentro está climatizado. —
Shae se aproximava notando a mulher coçando seus olhos por ter olhado para o sol.
— Lá não é tão abafado quanto aqui na cidade... E bem menos claustrofóbico. E eu
me acostumei com o barulho, lá dentro está silencioso demais.

— Ei, o que houve com esse clube? Eles faliram? — Perguntou um pedestre passando
na calçada entre Shae e Galathea.

— Em breve voltamos, amigo. Fechamos para uma reforma para melhorar o serviço
para os nossos clientes. — Respondeu Shae exibindo um largo sorriso ao que
parecia ser mais um dos clientes do clube.

Galathea se encontrava encostada contra um sedã preto, de frente para a entrada do


Basement. Todos os neons arroxeados que enfeitavam o lugar estavam desligados.
Sem música, sem movimento, sem clientes e sem dinheiro.

— Estamos perdendo dinheiro. — Disse Shae em tom taciturno enquanto se


encostava no carro ao lado da morena. O veículo abaixou-se um pouco mais ao
receber o peso daquele corpanzil enorme.

— Calma, mal se passaram 24h desde que começamos. E aí?

— E aí… Que tá tudo pronto. Coloquei meu irmão pra vigiar os fundos do cassino. O
mesmo com a mesquita. Alugamos os apartamentos sem registro. Apenas mais
uma de milhares de janelas apontadas para eles.

— Ótimo… Boa e velha vigilância. Mas, eles têm ar-condicionado?

— Quê?

— Ar-condicionado. Tem nos apartamentos? Não quero eles desmaiando de calor e


tédio.

— Um deles tem. Meu irmão reclamou do calor então… — Shae notou o olhar da
morena e deu de ombros – Não é nada. Ele aguenta. Assim deixa de ser mole.

— Arranje uma escala pra eles. Não quero ninguém dando menos de 100% de si por
conta do clima.

— Não seria mais fácil comprar um ar portátil e levar pra eles?

— Sim. Mande o William fazer isso e coloque ele no comando da centúria. Você vem
comigo.
— Oh… Eu? Tanto tempo que não vou em missão com vossa majestade, a que devo
essa honra?

— Para de putaria! — A morena sorriu de lado. — Você vai ser meu guarda-costas,
além do que é meu segundo em comando. Quero que esteja por dentro dos planos
do Montana. E que porra é essa?

Exclamou a mulher quando viu quatro de seus soldados saírem do bar. Os homens
se vestiam de preto, com armadura, coletes e luvas. Além de capacetes com visores
e fuzis de assalto pesado.

— Sua guarda de honra, milady. Disse que ia ver o Tony, então ordenei que se
preparassem.

– Mas eu já disse que vai ser meu guarda-costas.

— Sim, mas também disse que a menor divisão da Uroboros é — Ele ergueu quatro
dedos — quatro soldados. Então nada mais da Echidna caminhando por aí sozinha.
– Ao notar a sobrancelha erguida que traia a irritação da morena, Shae emendou —
Foi você quem declarou estado de guerra, chefe.

— Será que podemos entrar logo? Vocês podem ficar discutindo aí o quanto
quiserem, mas ficar aqui fora de colete e o caralho não é muito prazeroso. —
Ouviram a voz artificial de um dos soldados, essa saindo também de seu
comunicador.

E assim o fizeram. Galathea e Shae ocuparam um dos veículos enquanto os quatro


soldados o outro. Os líderes então partiram para o Olimpo, seguidos de perto por
sua escolta fortemente armada.

--

Após o que pareceu uma eternidade no trânsito daquele labirinto de concreto e aço,
eles finalmente haviam chegado no residencial. Ao estacionar o veículo onde havia
vaga, seguiram para a entrada. As pessoas, em sua maioria trabalhadores,
observavam a figura feminina que liderava o cortejo, desviando o olhar em seguida
ao notarem os soldados armados atrás dela. Alguns olhos mais treinados podiam
ver a escória de sempre se movendo no canto da visão, uma pistola aparecia aqui,
outra ali e no momento seguinte sumia. Afinal de contas, aqueles soldados eram
uma ameaça já que ninguém os conhecia.
Galathea trajava uma calça preta reluzente de um tecido similar a vinil, que grudava
em seu corpo. Botas de salto e cano alto que a faziam parecer ainda mais alta. Seus
seios estavam domados e reprimidos por um espartilho também preto, com
detalhes roxos e fechos frontais metálicos cromados. Levava sobre os ombros um
sobretudo leve de tecido negro chamado "Singularidade", produzido pela linha
Laurel. O material era tão escuro que só se podia notar seus contornos, não
refletindo luz de nenhuma de suas dobras ou costuras, o que dava uma sensação
inquietante de estar olhando para um objeto 2D num plano tridimensional.

Parou ali dentro do saguão. Algumas pessoas à distância checavam discretamente


suas armas, assim como fizeram do lado de fora. Havia uma comunicação por olhar
que chegava ao consenso de que qualquer movimento em falso por parte da
Uroboros seria recebido com uma chuva de tiros. O que era de se esperar, afinal, eles
não sabiam quem ela era.

— Montana… eu estou aqui na sua…. Cidade. Vamos discutir o futuro como é


esperado de pessoas da nossa estirpe. Cara à cara. — Disse Galathea pelo
comunicador, olhando para cima como se pudesse vê-lo por dentro das paredes.
Aguardou a resposta. Afinal de contas, ela não sabia se locomover ali dentro, mas
sabia que provavelmente não teria carta branca para tal sem que Tony permitisse.

Alguns minutos se passaram com aquela tensão. E quanto mais tempo passava,
mais abertamente hostil ficava o ambiente ao redor do grupo de Galathea. A
situação foi defumada e um suspiro coletivo de alívio foi dado por todos os
presentes no saguão quando um homem de Tony desceu de um dos elevadores,
referindo-se a ela pelo nome.

— Ms.Galathea, por aqui por favor. Tony irá recebê-la. Se tivesse nos avisado de sua
visita não a teríamos deixado esperando.

— Da forma como o mundo está hoje, eu prefiro discutir tudo pessoalmente. Sem
provas. Sem rastros. — Respondeu a morena enquanto adentrava o elevador, seus
homens a seguindo de perto. O que despertou um olhar preocupado no gângster ao
ver o armamento pesado dos mesmos. — Havia… Havia um ditado no meu tempo.
Ele dizia “apenas os paranóicos sobrevivem”.

O homem deu um sorriso amarelo e assentiu, não conseguindo esconder sua


preocupação e não dando a mínima para o ditado idiota. Era um bom homem, notara
Galathea, pois não gostava da perspectiva de levar pessoas armadas e
potencialmente perigosas à presença de seu senhor. Mas não houve complicações
para ele, pois os quatro soldados, embora tivessem entrado nos domínios mais
privados de Tony, foram barrados vários cômodos antes do escritório dele. Não
houve protestos, afinal era o que se esperava.

Após mais alguns minutos, Galathea foi chamada e as portas do escritório se


abriram.

A sombra negra do sobretudo balançava atrás dela, junto ao cabelo, enquanto seus
saltos ressoavam sobre o chão ao adentrar. Os olhos rapineiros observavam tudo ao
seu redor, curiosa sobre o escritório do maior mafioso da cidade. A um passo atrás
dela seguia Shae, estoico com seu olho mecânico.

— Don Montana… É um prazer conhecê-lo finalmente. — Disse Galathea repousando


os olhos acinzentados sobre Tony e as mãos na cintura. — E a quantas anda a
nossa… Cruzada contra… ‘o tolo’?

Gal Bordeaux

Gal não tinha muita lembrança depois do ocorrido. Acordou ainda sentindo dor, mas
percebeu que estava em um local diferente - muito mais confortável do que o solo
do aeroporto atrás do veículo em que se escondia. Mas antes de abrir
completamente os olhos, ouviu a voz de Margareth, a vadia russa que a deixou
naquele estado. Por isso, fechou os olhos novamente, atentando-se para a conversa
que se iniciava. Ao que parecia, seu interlocutor era um homem, pois ela se referia a
ele como "garanhão italiano". Ele não parecia ser um dos seus homens, pois
pretendia barganhar com o mesmo. Bem, então ele não iria defendê-la. Talvez seu
intento fosse o mesmo de Xiaren, o desgraçado que a contratou e sequer a
respondeu. Mas, bem, ainda era seu contratante.

Aproveitando-se do momento de distração em que a herdeira de Yuric estava - ela


deveria estar de costas para Gal no sofá, enquanto parecia estar em pé ou sentada à
frente do tal garanhão italiano, dialogando com o mesmo - a meta-humana utilizou
suas habilidades sobre-humanas para se livrar das algemas magnéticas, pois elas,
diferente do radiack, não atrapalhavam seus dons. Embora a loira não saiba
exatamente o que atrapalhou seus poderes horas atrás.

Discretamente, livre das algemas, ela faria seu corpo ficar invisível. Margareth não
perceberia essa ação, e talvez Tony, se prestando atenção ao que a interlocutora
dizia, não iria reparar também. Mas ainda que se reparasse, não haveria tempo
suficiente para avisar algo. Pois, sentindo-se mais recuperada, Bordeaux ainda
invisível se aproximou rapidamente de Nureyev e desferiu contra sua nuca um golpe
com as algemas, agora utilizadas como arma. Se obtivesse sucesso na investida, a
loira russa tombava para o lado e, com mais sorte ainda, cairia desmaiada. Depois
Gal encararia o garanhão italiano.

Primeiramente, eu iria me assustar com a presença dele ali, pois sabia quem ele era,
o grande Tony Montana. E põe grande nisso. Mas logo depois, falaria com ele em
um tom normal, ainda sentindo um pouco de dor. — Desculpe por isso, mas essa
puta me devia —, iria me referir ao machucado no tronco provocado pela outra, caso
meu ataque tivesse dado certo. — Ei, meus olhos estão aqui em cima —, falaria com
o mafioso, caso este tivesse se distraído com o tronco ainda desnudo. Olharia ao
redor e veria que havia uma espécie de cabideiro neon, no qual tinha uma jaqueta de
couro masculina - provavelmente de Tony. Eu caminharia até ela e a vestiria. —
Melhor assim —, diria. Depois, puxaria os cabelos para trás, para que ficassem para
fora da vestimenta.

— Tony Montana, não é? Prazer em conhecê-lo. Bem, eu tava atrás dessa mulher aí.
— Apontaria para Margareth, estando essa caída, se fosse atacada com êxito. — Fui
contratada para levá-la até Xiaren. — Sua missão era levar a mulher, e não guardar
segredo, não foi paga para isso. — Eu tenho habilidades especiais, posso ser um
fantasma. Quase sempre. Mas aí... Fail, e pedi ajuda para o Xiaren e ele cagou. — Ela
parou brevemente, ouvindo a porta ser aberta, e dela adentrar uma mulher de pele
muito branca e cabelos muito negros, muito atraente. Mas voltou atenção de volta
ao garanhão. — Eu posso levar a Margareth daqui, assim como me livrei das
algemas. E pegar o restante do meu pagamento. Ou posso trabalhar para você. O
que me diz? – Embora não estivesse no seu ápice físico, estava bem melhor graças
ao VETERINÁRIO que serviu como médico. Além disso, “dizem que teatralidade é
tudo”.

Frank Coyote
Estava nítido para Frank que aquele cara não iria falar facilmente. Já era esperado,
no entanto. O próximo passo, se tivesse tempo, era usar métodos mais persuasivos,
como tortura, por exemplo. Todavia, o tempo era escasso e o maldito tinha toda
razão do mundo: a dupla não só havia causado um tumulto na entrada do lugar,
como também Frank repetiu a dose minutos antes dentro do banheiro. Nervoso, o
mercenário rangeu os dentes, olhando para Rodrigo enquanto o prisioneiro
terminava de falar. Quando finalmente fechou a matraca presunçosa, Frank riu para
disfarçar o nervosismo.

— Pois é, parece que a situação tá feia mesmo. Mas essa daqui não tem nada a ver
com isso, essa é por ter chamado o Rodrigo de viado traiçoeiro, russo desgraçado!
— Desferiu então um soco de direita no refém na região do queixo, visando
desmaiá-lo com a pancada transmitida diretamente ao tronco cerebral. Era um golpe
certeiro que os lutadores visam em grandes lutas, sendo a diferença que Alek estava
parado e seria bem mais fácil acertá-lo. Sucedido ou não, passou o pedaço de vidro
para Rodrigo assim que ouviu a voz lá fora anunciando a chegada dos seguranças.
Naquela altura, para Frank, a chance de escapar era quase nula. Para Rodrigo, por
outro lado, seria muito mais fácil utilizar-se de seus poderes metamórficos. Foi
quando surgiu uma ideia e Frank rapidamente compartilhou o que pensava com
Rodrigo, visto que o tempo era curto e os seguranças iriam invadir. Não era das
melhores e seria um tiro no escuro, porém era o que existia para o momento de
aperto.

— Então o que me diz? — Finalizou esperando que o outro concordasse em seguir


com o plano.

Gabriela vulgo Rodrigo

— Valeu. — Agradeci pelo soco na fuça do russo babaca, assim como por me
entregar o pedaço de vidro. Segurei o pedaço com firmeza, a ponto de me cortar.
Muita coisa passou pela minha cabeça naquele momento, mas em pouquíssimo
tempo, até escutarmos alguém falando da aproximação dos guardas. — Mas só um
soco não basta. — Aproveitando do estado de inconsciência em que Alek estava por
causa da pancada, enfiei o pedaço de vidro em sua garganta, tão fundo que só parei
quando senti o osso da coluna impedir que eu continuasse. O corpo do grisalho
pendeu ainda mais para o lado, parando em uma das paredes da cabine, morto.
Mesmo vivendo nas ruas, nunca tinha chegado ao ponto de matar alguém. Até
agora.

Não senti remorso nem nada. Nem satisfação. Frank me tirou do transe,
sugerindo-me que eu me transformasse no Alek e o levasse como falso prisioneiro.
Seria muito mais simples, mas... Não. — Eu não vou me passar por ele. — Já estava
preparado para ser xingado ou coisa do tipo, mas estava completamente apático. —
Se quiser sobreviver, é melhor lutar. — Falei brevemente, preparando-me para o que
estava prestes a acontecer.

Eu não era um lutador. Mas geralmente, os seguranças também não eram. Eles se
valem, como regra, de seus tamanhos e músculos para colocarem os arruaceiros
para fora. Às vezes estão armados, é verdade, e eu não estava. Também não saberia
usar a arma, se tivesse uma. Por isso, me equipararia a eles. Mudei minha estrutura
corporal para que passasse a ter 2,03 metros de altura e 120 quilos de puro
músculo.
Assim que a porta fosse aberta por um dos seguranças, e este fosse o primeiro a
adentrar, eu desferiria um golpe ainda com o pedaço de vidro contra a direção de
seu pescoço, valendo-me do fator surpresa, com a intenção de matá-lo. Logo depois,
retornaria rapidamente para onde eu estava. Dessa forma, haveria ainda quatro. Dois
para cada.

Rodrigo rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 13 para passar despercebido pelos
seguranças que resultou 3 - Total: 0 Sucessos

Frank Coyote

— Não foi nada, princesa. — Respondeu irônico ao agradecimento, desejando não


diminuir distância do homem que começava a - querendo ou não - sentir certa
empatia. Deixou o pensamento de lado quando viu que ele não estava satisfeito com
a situação de Alek e, surpreendentemente, dava cabo do homem guiado por uma
fúria irracional.

— Tá maluco, rapaz!? — Frank tentou protestar, porém já era tarde demais para
qualquer impedimento. Rodrigo estava fora de controle, pensou Frank. Pensamento
que se fez mais verdadeiro quando o plano sugerido era negado por qualquer motivo
absurdo, já que era uma ideia melhor do que a apresentada pelo "companheiro".
Atacar os seguranças? O que Rodrigo estava pensando?

— Qual é o seu problema? — Começou a vociferar, sendo interrompido pela


transformação de Rodrigo em um corpo ainda mais musculoso e grande. "Se quiser
sobreviver, é melhor lutar", disse então o outro. Frank sentiu o suor frio percorrer o
rosto, o punho se fechou em um aperto. Olhou para Alek, onde estava, dentro
daquela cabine e... A privada. O tipo de privada daquela boate era a preferida dos
drogados: Possuía a tampa da parte traseira do vaso, onde eles poderiam esconder
drogas como bem quisessem. Não que de fato precisasse esconder esse tipo de
substância naquele lugar. Enfim, Frank foi de encontro ao vaso, tomando cuidado
com o corpo do russo caído, e retirou a pesada tampa da descarga. Voltou com o
objeto em mãos para onde Rodrigo aguardava o primeiro segurança entrar e...

Deu a tampa com toda a sua força na cabeça de Rodrigo. Espatifou o objeto na nuca
vulnerável do outro, tão certo estava da confiança em um mercenário como Frank.
Obviamente, ele não esperava pelo movimento e podia ser um grandalhão
musculoso, mas ainda era humano e qualquer um seria nocauteado pelo golpe.

— Desculpa, princesa, eu não sou um dos mocinhos. Não vou arriscar minha vida por
sua causa e nem ninguém mais. — Disse em um tom mais triste do que imaginava
que fosse ser aquela revelação de sua verdadeira natureza. No fim, havia se
divertido com Rodrigo até aquele ponto. Todavia, estava certo de que o homem
estava fora de si e não teriam quaisquer chances contra os seguranças no território
do russo. Afinal, não precisava arriscar a própria vida para sair dali. Tinha uma
moeda de troca muito melhor: Rodrigo. Abriu então a porta para os seguranças e se
afastou com as mãos levantadas em sinal de redenção...
— Sou conhecido como Coyote, um mercenário, e fui enviado por Pascal para roubar
informações sobre o paradeiro do irmão dele de vocês. Entretanto a situação mudou
e quero vender as informações que tenho dele para vocês. Como garantia de boa fé
entrego esse metamorfo que era algum tipo de bichinho sexual dos latinos. Façam
bom proveito. Agora será que podem me levar ao líder de vocês? Tenho que
informar que um de seus homens de confiança foi morto por esse metamorfo. —
Finalizou olhando de um para outro para mostrar o quanto estava falando sério.
Nesta altura não arriscaria mais sua vida por Pascal e nem pela loucura de Rodrigo,
se o jogo voltasse a mudar, quem sabe. Era a vez dos russos fazerem sua jogada.

Anthony Montana

Nunca ninguém me deu nada na vida, sempre precisei tomar. Mas essa guerrilha
urbana estava me rendendo bons frutos, e as oportunidades começaram a cair no
meu colo. A primeira delas, apesar de bem estranha e suspeita, tratava-se de uma
mensagem de um... Sei lá que aparelho era aquela porra, Vladimir que entende
melhor desse tipo de serviço de inteligência e tecnologia.

— Tony, se quiser posso usar os recursos da Paramilitech para fisgar esse


engraçadinho. — Disse o russo ao meu lado na mesa quando a transmissão se
encerrou.

— Não, tudo bem Vladimir, vamos deixar assim, gostei do estilo ousado do sujeito,
ele tem atitude, e me passou uma informação mais do que valiosa. Vou deixar ele se
achando um pouquinho, é bom pra confiança. Estou mais interessado em capturar
Trigger. — Respondi olhando a tela do aparelho desligada em cima da mesa.

— Mesmo o contato fazendo aparentes ameaças referentes a Akane, camarada? —


Ele deu um leve sorriso.

— Mesmo, se ele se meter a besta não vai ser ver comigo, e sim com ela mesma que
terá de se entender. E acredite, se for esperto, tanto quanto aparentou ser e, se
julgar, ele não fará isso. — Vladimir levou o indicador ao ouvido esquerdo.
— Nossa encomenda chegou, vou ajudar com a subida, me falaram que ela deu
muito trabalho. — Ele saia, do outro lado da mesa estava Jesse, entreguei a ele um
aparelho cromado, semelhante a um controle de televisão.

— Jesse, a morte de PeeBoy deve ter sido meio traumatizante, vou lhe dar tarefas
mais leves. Tome, faça a transferência para o sujeito estranho do vídeo, você pegou
o numero da conta, certo? — Jesse fazia sinal de positivo com a cabeça e digitava a
senha no pequeno teclado colorido com neon azul.

— Ótimo, agora temos mais um aliado. — Eu abri uma caixa de charutos Atlântico, o
melhor do mercado e acendia.

Não demorou muito para Vladimir retornar, e para minha surpresa, a loira tesudinha
de tetas grandes fazia parte do pacote. Confesso que olhei primeiro para ela do que
para a vaca russa escrota. Apesar de um pouco mais calmo e satisfeito com o
resultado, ainda me mantinha bastante preocupado com Caz. Yuric não me
ameaçava há um bom tempo, e isso me preocupava profundamente. Eu apenas
fumava, soltando a fumaça no ar enquanto Capitão Gancho, Dr. Jonah e Jesse
conversavam. Quando o assunto precisou de um consentimento, apenas disse:

— Eu pago os três muito bem para resolver essas questões, então façam o que tiver
que ser feito. Vocês sabem a partir de agora como proceder com o carregamento e
todo o resto. Quero me concentrar no aqui e agora. — Apontei o charuto em direção
de Margareth, sorrindo.

Antes que eu pudesse me erguer de trás da mesa, como uma boa filha de Yuric, a
vadia começou a falar merda. É, parecia que haviam aberto uma fossa daquelas
bem fedorentas. A maluca começou a bostejar tudo pra fora. Esperei ela terminar,
sabe como são as pessoas, de vez em quando precisam extravasar quando tomam
no cu, e no caso dela, ela havia tomado no cu bonito. Então me ergui da cadeira,
devolvendo o charuto à boca, deixando um rastro de fumaça. Parei exatamente à
frente dela, onde puxei a calça para cima, afastando o terno preto, para ela ver as
duas Desert Eagles no coldre.

— Primeiro vamos colocar as coisas em ordem. Você não está em posição de


negociar absolutamente nada aqui. Você respira se eu mandar, você pisca se eu
mandar, você tem medo se eu mandar, você caga se eu mandar! Portanto o banho
vai vir quando e se eu quiser, capisce? — Tirei rapidamente o charuto e derrubei as
cinzas em seu cabelo dourado, depois devolvi aos meus lábios.

— Segundo… Vamos lá, eu acho bom, aliás, muito bom você ser útil sim ao seu pai,
afinal, se não for, também não será para mim. E sabe o que faço com coisas inúteis?
— Levei a mão esquerda ao coldre, puxando a Desert Eagle preta, engatilhando ela, e
depois encostei o cano contra a testa da porca loira.

— Eu simplesmente me livro delas, tá entendendo? — Mas logo recolhi a arma,


guardando, caminhando de volta à mesa.

— Contudo, sou um homem de negócios, um empreendedor antes de qualquer coisa


e não resisto a uma barganha. Então vamos negociar, sim. Lá vai minha proposta,
você colabora, eu acabo com seu pai, e você sai viva! Está bom para você assim?
Mas ok, não sou injusto. Quando seu pai cair, um terço do que ele tem fica com você,
e o restante é meu. Com o porém que você vai ter que responder sempre a mim. É
pegar ou largar. — Eu ia puxar novamente a pistola e ameaçar a vagabunda, mas não
foi preciso, a loira tetuda apagava com maestria a russa. A ação me deixou
surpreso, mas o que mais me surpreendeu foi o par de mamões balançando na hora
que ela golpeou a filha chata de Yuric.

— Não se trata apenas de beleza, tem coragem e ousadia, gosto disso, gosto muito
disso! — Falei não só olhando para os melões como me referindo a eles.

— Mas você é bem apressadinha… Será que em tudo? — Sorri mudando o olhar das
mamas da loira quando ela pedia e passava a fitá-la nos olhos. — Já ia chegar em
você, mas confesso que foi um sossego para meus ouvidos, a voz dessa piranha já
estava me irritando e faltava pouco pra meter uma bala na cabeça dessa porca. —
Deixei a loira perambular livre, se vestir e voltar ao assunto, queria saber como ela
tinha se livrado das algemas. Enquanto isso levei o indicador até a orelha esquerda e
era informado de mais uma visita que estava para chegar. Mandei subir.

— Habilidades muito notáveis por sinal. Inclusive já até mesmo sei como usá-las. —
Disse coçando o queixo e baforando fumaça com o charuto de lado na boca. —
Ahahaha, Xiaren simplesmente vai adorar quando souber que fiquei com a filha puta
do russo, o carregamento e a principal aliada dele… Eu sempre disse lhe que lhe
faltava visão, desperdiçou uma importante ferramenta nessa guerra… Não posso
fazer nada por ele, apenas aproveitar as chances que o destino está me oferecendo.
Você me convenceu graças a sua boa lábia, está contratada! — Ora, ora, ora, ERA
BOM DEMAIS, parece que era meu dia de sorte, a segunda oferta de aliança que me
surgia assim caindo ao meu colo. Outra aliada e seus parceiros entraram na sala.

— É igualmente um prazer lhe conhecer pessoalmente, Ms. Galathea. — Era assim


que me referi e pedi a que todos meus subordinados também fizessem. — Fique a
vontade em meu humilde escritório, gostaria de beber algo? Não hesite em pedir se
for o caso. Foi bom perguntar quanto ao nosso “tolo”, a partir daqui as coisas vão
melhorar, pois a filha daquele corno está comigo… E mais cedo, um contato
misterioso me entregou uma informação importante de bandeja, o atirador da torre
de controle do aeroporto, chama-se Trigger, ele é um mercenário, um dos melhores
no ramo, talvez vocês o conheçam. O vermezinho provavelmente fora contratado por
Yuric. Se for do seu interesse, cace o maldito, torture, desmembre-o, e arranque o
máximo de informações desse bosta. – Caminhei em direção a russa desmaiada.

— Voltando ao assunto, está vendo essa vaca? É a filha daquele puto russo, ela vai
ser meu trunfo, e que felizmente foi calada por outra “Gal”. — Caminhei agora em
direção à loira “fantasma”. — Quero que conheça Gal, ela possui habilidades
incríveis, pode se tornar intangível e invisível! Xiaren largou essa preciosidade ao léu
no meio da guerrilha no aeroporto… E eu a acolhi, agora ela também é uma aliada,
gostaria que se dessem bem. — Assim que terminei, voltei-me a Gal loira.

— E quanto a você, querida, lembra que eu tinha um plano para suas habilidades?
Pois bem, tenho um amigo chamado Caz, ele é da polícia, Yuric o raptou e o mantém
cativo em algum de seus esconderijos. Ainda não sei bem qual. Mas possuo um
contato no seio da máfia russa, ela está agindo como agente dupla. Assim que
descobrir algo sobre meu amigo detetive, quero que com seus poderes vá até Caz e
o traga para mim. Ainda não tenho informações, mas se quiser um palpite, poderia
vasculhar aquele cassino fedorento em Troika, onde também pode dar suporte ao
meu contato. — Assim eu terminava o charuto, voltando a minha mesa e o
apagando-o no cinzeiro. Naquela sala, com Vladimir, Jesse, o novo contato
misterioso, a loira fantasma, Galathea e seus homens, me sentia ainda mais forte do
que sempre fui.

Narrador Capítulo 6

Rodrigo tombou após ser atingido pelo golpe sujo de Frank Coyote, que estava com
as mãos erguidas enquanto os 4 seguranças apontavam Shotguns para ele. Um
olhou para o outro ao escutar as palavras ditas pelo mercenário, era evidente pela
expressão dos homens que não sabiam como agir diante de uma situação tão
extrema. Um deles então tomou a iniciativa, retirando uma algema da cintura
colocando os braços de Frank para trás e depois o algemando. – O Sacerdote vai
saber o que fazer, peguem o outro cara. – Após aquelas palavras, o segurança
moveu o cabo da arma contra o queixo de Coyote, derrubando-o e o deixando
inconsciente.

Frank despertaria um tempo depois numa sala que lembrava um quarto de hospital,
encontrava-se deitado numa maca com o braço direito algemado a uma barra de
ferro presa à parede ao lado dele. O quarto não possuía janelas, apenas uma
poltrona e uma cômoda de madeira marrom. – Finalmente o cuzão acordou. – Falou
o homem de cabeça raspada, bigode e tatuagens nos braços. Ele também possuía
traços latinos, gesticulando e falando como gangster das ruas. – É isso mesmo
viadinho, sou eu, o Crazy Dog. – Frank provavelmente ficaria surpreso, afinal o
homem que tinha procurado a noite toda estava bem na frente dele. – Meu irmão é
um molenga mesmo, contratou uma aberração humana e um mercenário fracote
para me procurar e ainda por cima foi traído por um deles. – O latino riu após aquela
frase. – Deveria meter uma arma no teu cu e puxar o gatilho pela merda que fizeram
na boate, mas os seguranças me falaram que você tem algo a me dizer, então vá em
frente.

Rodrigo acordaria preso por correntes a uma cadeira de metal no centro de um


cubículo sem janelas. O metamorfo não fazia a menor ideia de onde estava para
piorar sentia uma forte dor no local onde Frank tinha golpeado. A porta do pequeno
cômodo se abriu e o torturador de Yuric entrou, fechando a porta logo depois. – Um
brinquedo novo, que segundo quem me deu possui funções especiais. – Boris
esboçou um sorriso largo e assustou ao falar tais palavras, retirou do interior do
terno rosa que usava um martelo e alguns pregos. – Vamos lá, me mostre o que
sabe fazer, depois me conte algumas coisas interessantes. Se fizer isso, prometo
pensar com muito carinho sobre não usar esse martelo para por esses pregos em
você.

X-9 conseguiu enviar algumas informações para Montana, porém não foi nada muito
relevante, aparentemente o sistema de registros de ligações, arquivos e documentos
era separado do resto da rede, provavelmente era alguma das artimanhas
elaboradas por Red em conjunto com a Aracno. Por outro lado, a hacker de cabelo
chamativo conseguiu algo muito relevante, ao passar pela última porta que lhe dava
total acesso ao computador de Evangeline Brinne se deparou com sala branca com
diversas pastas flutuando bem na sua frente, formando uma espécie de corredor de
arquivos transparentes com linhas azuis determinando seus formatos.

Afastado dos outros documentos, X-9 notaria uma pasta um pouco maior que as
outras, flutuando sozinha fora do corredor. Era a pasta com todas as informações do
Residencial Celeste, contendo plantas, configurações do sistema de defesa,
materiais utilizados na construção e muito mais. X-9 ao roubar este arquivo e
entregá-lo para Red, provavelmente faria Yuric ficar 10 passos à frente de Tony
Montana, porém, ela poderia usar do total acesso ao computador de Red para enviar
o arquivo para o italiano também.

Abrindo a planta ao lado do sistema de defesa do Residencial Celeste, X-9 descobria


as seguintes coisas. A primeira era que apesar do prédio em situações extremas
ficar totalmente fechado, existe uma parte que continua “aberta”, o sistema de
ventilação e oxigenação localizado no subsolo do prédio, que conta com um enorme
ventilador que gira suas hélices sem parar dia e noite. O ventilador daria acesso
direto à sala onde o sistema de gás fica. A hacker também descobriria que a uma
forma manual de parar o ventilador, seria acessando um painel localizado logo ao
lado dele. Ela precisaria pensar bem no que faria com essas informações, Red ao ter
acesso aos documentos provavelmente faria as mesmas descobertas que ela.

Xiaren encontrava-se sentado no seu escritório no hangar secreto localizado no


subterrâneo. O globo de comunicação na mesa começou a vibrar e a piscar em
verde, significava que alguém estava ligando pra ele. – Chefe, o aeroporto foi um
verdadeiro caos, Tony ficou com a filha de Yuric e com parte das armas, também
perdemos a mulher com habilidades. O que vamos fazer agora? – Xiaren deu um
tapa na mesa. – Porcaria! Vamos apenas esperar, não podemos lidar com Tony
agora. Volte para o hangar. – Ele então desligou a ligação.

– Xiaren, preciso lhe dizer uma coisa. – Disse Nivans entrando no escritório do líder
da Ryulong, que fez apenas um sinal com a mão direita para que ele falasse. – O
Dragon Mecha está finalizado, porém não conseguimos terminar o sistema de
conexão neural entre o piloto e a máquina. – Xiaren olhou para ele com um olhar de
reprovação. – Arranje uma solução, estou te pagando uma fortuna para criar a
melhor máquina de guerra. – O homem engoliu seco as palavras ditas por Xiaren. –
Eu tenho uma solução, precisamos de um homem chamado Vegan, foi ele que me
ensinou tudo que sei sobre robótica e computação. Ele é um verdadeiro gênio. –
Xiaren levou a destra até o queixo, num ar pensativo. – Entre contato com o Chris
Falcon, diga ele o que sabe sobre o paradeiro deste tal Vegan e ele irá atrás dele
para você, o dragão ficando pronto é o que importa. – Certo, desculpe o transtorno.

Nivans saiu da sala e suspirou aliviado, levou o relógio comunicador próximo a boca,
iniciado a ligação para Chris Falcon. – Sou Nivans, um dos empregados do Xiaren,
preciso que faça algo para mim. – Pausou. – Encontre um homem chamado Vegan,
ele possui cabelos grisalhos e barba cheia, a última vez que o encontrei, ele tinha
uma oficina na rua 23 no centro, o nome era “Concertos e outras coisas”. Quando
encontrá-lo, diga que Nivans precisa da ajuda dele. – Após passar as informações
para Chris, Nivans desligou a ligação.

O quarto totalmente escuro era iluminado por seis monitores holográficos


posicionados num formato de meia lua. De frente para as telas estava um homem
magro de cabelos negros vestido apenas com uma calça preta. Com a mão direita
ele plugou seis cabos nos conectores neurais que possuía na nuca. Depois colocou
um óculos Rift que cobria a testa, olhos e nariz. O hacker então ergueu o indicador
esquerdo, tocando a tecla “enter” do teclado holográfico que flutuava frente a ele.
No instante seguinte sua mente era lançada para dentro da rede, a sensação inicial
era como ser jogado do topo de um prédio. Darkness caía entre linhas de dados e
códigos, ao olhar para baixo conseguia visualizar o que parecia ser o infinito. Uma
porta surgiu na horizontal abaixo dele, levando-o para outro lugar no instante que ele
atravessou por ela.

Agora Darkness encontrava-se de pé no meio de uma enorme sala roxa com linhas
de código verdes formando uma espécie de parede. Sua aparência dentro da Lexis
era um pouco diferente da aparência no mundo real, dentro da rede além de uma
calça jeans, ele estava vestido com um casaco de moletom preto com capuz e
estava sem óculos. O hacker se aproximou da parede códigos. – Vírus Shadow
iniciar dominação! – O que parecia ser sombras materializou-se a partir dos pés de
Darkness, seguindo até a parede de códigos e aos poucos começava a cobri-la.

Darkness era atualmente um dos melhores e mais conhecidos hackers de


Miraitropolis. Pessoas criaram sites e fóruns na Dark Web para falar sobre ele e seus
feitos nos últimos meses. O vírus Shadow, criado por ele próprio, é o que o torna um
hacker tão temido e habilidoso. Após se conectar a um sistema, ele libera o Shadow,
que primeiramente domina todos os mecanismos de defesa e, em seguida, assume
o controle total do sistema em questão, concedendo a Darkness total controle.

A parede de códigos estava totalmente coberta pelas sombras, quando uma


passagem se abriu no centro. Darkness atravessou-a lentamente, encontrando-se
agora no coração do sistema responsável por controlar todo o Edifício Olimpo, o lar
e quartel-general de Tony Montana. As sombras começaram a dominar tudo ao
redor do hacker, que agora controlava a maior parte do prédio. – Luzes, alarmes,
câmeras e comunicação, desliguem-se! –, ordenou.

As pessoas dentro do Olimpo notariam as luzes se apagando e as lâmpadas de


emergência se acendendo. As sombras do hacker Darkness dominaram outra parte
do prédio, agora os drones e os andróides responsáveis pela defesa estavam sob
seu controle, mas ele ainda não podia controlá-los completamente, então fez apenas
o básico. – Desativar! –, ordenou. Os drones e androides caíram no chão,
inanimados como brinquedos. No mundo real, quatro ônibus escolares com placas
de metal nas laterais, fundo e frente avançaram em direção à entrada do prédio.
Parte dos capangas de Tony, posicionados na rua, começaram a atirar contra os
veículos, alguns deles foram atropelados e outros simplesmente tiveram que sair do
caminho.

O primeiro ônibus arrebentou a entrada do prédio, destruindo parte das paredes e a


porta de entrada. Os outros veículos pararam, as portas se abriram e
aproximadamente oitenta homens armados com M4A1 e vestidos com armaduras
simples, com placas de metal protegendo os pontos vitais do corpo, saíram. Parte
deles começou a atirar nos homens que estavam nas ruas, enquanto a outra metade
avançava para dentro do prédio, disparando contra qualquer pessoa que
encontrassem no caminho. Eles subiram pelas escadas, deixando os corpos dos
homens de Montana no chão. O objetivo era alcançar o último andar, onde Tony
estava. Era uma manhã agitada para Tony Montana e seus homens.
Observações:

1- Os jogadores no Edifício Olimpo estão livres para agir como desejarem diante da
situação em que se encontram.

2- Coyote e Rodrigo terão que convencer seus interrogadores. A dificuldade é 09


para ambos. Rolar um D20.

Frank Coyote
Por um breve momento, ele pensou que seu plano fosse um sucesso e que tinha
convencido com êxito os seguranças, expresso nas palavras de um deles ao ser
instruído a levá-lo até o Sacerdote. No entanto, o que ele não esperava era o golpe
da arma em seu rosto e o imediato apagão de consciência. O mundo era uma selva
afinal, e a lei do mais forte nunca mudava. Se tivesse tido mais tempo, pelo menos
lamentaria o fim que teve, assim como o que aconteceu com Rodrigo... Não que ele
se arrependesse de sua decisão, mas se pudesse e soubesse o desfecho de sua
ação, certamente teria se arrependido. No fim, não importava mais; era tarde
demais.

[...] Sua cabeça estava explodindo, e sua garganta estava seca. Acordou
desnorteado, sem ter a mínima ideia de onde estava e do que havia feito
anteriormente. Somente após alguns segundos, as lembranças do encontro com os
seguranças e tudo o que ocorreu antes daquele desastre voltaram à sua mente. De
repente, tentou se levantar, mas logo descobriu que estava preso. Muito bem preso.
Amaldiçoou sua má sorte e, em seguida, percebeu que não estava sozinho no local.
O Sacerdote foi a primeira coisa que lhe veio à mente quando ouviu a voz, no
entanto, as surpresas da noite estavam longe de acabar.

─ Que porra é essa!? CRAZY DOG!? ─ A primeira reação foi de espanto,


compreensível diante da pessoa com quem estava conversando, que era nada
menos que a causa de tanta confusão. Esse homem deveria ser um refém dos
russos, mas ali estava ele, solto e totalmente livre. Além disso, ele demonstrava ter
total controle da situação pela forma como agia! Mil teorias surgiram na mente de
Frank: Seria outro metamorfo tentando enganar o mercenário? Ou Crazy Dog seria
capaz de trair o próprio irmão? Pascal sabia disso desde o começo? O que diabos
estava acontecendo? ─ Olha não é nada disso que você tá pensando, eu não tive
nada a ver com a morte daquele russo no banheiro! Minha única missão era
descobrir onde você tava e voltar para o seu irmão, mas de repente aquele imbecil
do metamorfo que mandaram comigo surtou, matou o russo e queria dar cabo dos
seguranças na sequência. Se eu não tivesse me livrado dele, provavelmente ele teria
matado alguns seguranças antes de ser controlado. Eu salvei vidas! ─ Frank estava
fazendo o seu melhor, porém era difícil lidar com alguém em quem não se podia
confiar mais. Se Crazy Dog fosse realmente um traidor, como tudo indicava, Frank
não poderia dar a entender que ainda era aliado de Pascal. Por outro lado, se Crazy
Dog ainda fosse leal ao irmão por algum motivo, Frank teria que demonstrar que fez
tudo pelos latinos. Qual caminho ele deveria seguir? ─ Escuta, o que tá
acontecendo? Eu pensei que seria levado para o Sacerdote. Você tá de esquema
com os russos? ─ Com a noite que teve até aquele momento, sua cabeça ainda
explodindo e a confusão causada pela descoberta, Frank não estava se saindo nada
bem. Ele sabia que sua vida estava em jogo. Diante disso, a única opção que lhe
restava era enrolar. ─ Seu irmão tá preocupado contigo! Ele reuniu todo mundo para
uma guerra, cara. Tudo por sua causa. O que tá pegando? ─ Ele finalizou sem ter
mais o que dizer, imaginando que talvez Rodrigo estivesse em uma situação pior do
que a dele. Eram tempos difíceis.

Gabriela vulgo Rodrigo


— Onde é que eu to? Será que estou em Alagoinha? — Eu me perguntava, abrindo
lentamente os olhos devido à dor do caralho que sentia, principalmente na região da
nuca. A iluminação porca do local ajudou, pois a falta de claridade não fez minha
cabeça doer ainda mais. Olhei brevemente ao redor e percebi que estava em um
lugar quadrado e pequeno. Em seguida, olhei para baixo e vi que estava acorrentado.

Respirei pesadamente, movendo o pescoço para trás e encarando a única lâmpada


de neon no teto. Coyote me fodeu, mas não da forma que eu queria ser fodido.
Acabei rindo, talvez de forma insana. Neste lugar, realmente não dá para confiar em
ninguém. Mas... Se eu tivesse seguido o plano... Ou não... Será que eu teria agido de
forma diferente? Enfim, não era o momento para pensar nisso. Agora, eu precisava
encontrar uma maneira de sair dali. Meu instinto foi me transformar em uma figura
menor, talvez uma criança, e escapar das correntes, que pareciam ser
convencionais. No entanto, antes que eu pudesse agir de qualquer modo, um
homem adentrou o cubículo.

Ele era calvo, com a cabeça raspada e uma barba grande. Estava na meia-idade, por
volta dos 40 anos ou mais. Vestia um paletó rosa. Em sua mão, segurava um
martelo e pregos. Não foi difícil presumir o que ele poderia fazer com aquilo. Sem
delongas, ele começou a falar.
– Um brinquedo novo, que segundo quem me deu, possui funções especiais.

De início, a frase dele me causou repugnância. Porém, eu estava acostumado a lidar


com esse tipo medíocre de homem. Eu precisava jogar o jogo dele, fazê-lo acreditar
que ele era o maior, preenchendo o vazio que ele carregava dentro de si e a
fragilidade disfarçada em instrumentos de tortura ou em cargos insignificantes que
ocupava. Eu precisava engolir meu orgulho - e na maioria das vezes, outras coisas
também - para satisfazê-los e obter algo em troca. Seja dinheiro, poder... Ou, neste
caso, minha própria vida.

No entanto, eu não mostrei o asco e toda a amargura descrita aqui. Externamente,


após o susto e a sensação de dor latente que ainda persistia, eu esbocei um sorriso
de canto aparentemente genuíno. Como se estivesse satisfeito em ser um
brinquedo nas mãos de alguém. Assim como fui nas mãos de Alek por tanto tempo,
até matá-lo. Quem sabe meu novo dono não teria o mesmo destino?

— Vamos lá, me mostre o que sabe fazer, depois me conte algumas coisas
interessantes. Se fizer isso, prometo pensar com muito carinho sobre não usar esse
martelo para por esses pregos em você.

— Ei, grandão. Esse seu tipo é o meu preferido... Careca e barbudo...

— Não quero papinho. Me mostra, vai.

— Claro. Pra sua sorte, eu posso ser o seu tipo. Qualquer que seja. Se curtir mulher,
uma loira peituda... — E então eu me transformava na tal loira peituda. Com isso, a
corrente acabava ficando mais apertada. — Ou uma negra? — De igual modo eu me
transformava. E assim por diante, cada vez que eu sugeria uma faceta a ele. — Se
curtir homem, também... Forte ou frágil. Geralmente preferem as mulheres... —
Acabava parando na forma de uma mulher morena de cabelo grande e preto, com
atributos fartos.

— Hm... Acho que podemos nos divertir um pouco. Agora, a outra parte.

— Mas já? A gente tava se divertindo tanto... Tá bem. Eu trabalho na Vênus, como
pode perceber... Então, com o sumiço do Crazy Dog, o Pascal me coagiu, por causa
do que sei fazer, a encontrá-lo. Eu jamais me envolveria nisso. O meu departamento
é outro, entende? — Ao dizer isso, aproveitando que não havia correntes nas partes
dos pés, movi um deles lentamente, evitando causar uma reação negativa por parte
do interrogador devido a um possível susto. Meu pé tocou delicadamente o joelho
dele e, em seguida, subiu pela coxa até chegar à região pélvica, onde comecei a
acariciar seu membro e senti sua ereção se aproximar. — Pode me tirar dessas
correntes, então? Tá me apertando tanto...

Como se estivesse hipnotizado, o interrogador se aproximou e removeu as


correntes, deixando meu corpo - agora feminino e nu - livre. Com dificuldade,
levantei-me, fingindo fragilidade e a impossibilidade de qualquer reação física.
Então, materializei roupas curtas sobre mim. Ele me conduziu em direção à porta,
prestes a sairmos dali. — Onde estamos? Posso ajudá-lo de alguma forma...?" —
Perguntei, sem saber se ele iria simplesmente me liberar ou me usar. No entanto,
qualquer coisa seria melhor do que sofrer com aquele martelo e os pregos.

Rodrigo rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 9 para convencer seu interrogador
que resultou 20 - Total: 1 Sucessos

Timothy Carter
Tanto Timothy quanto Rose fizeram um breve cumprimento com a cabeça para
Pollux. Nenhum dos dois disse uma palavra, apenas entraram no carro. A ex-policial
pressionou o polegar no volante, ocorreu uma rápida leitura da digital dela e o
veículo ligou. Em seguida, ela pisou no acelerador e partiram, enquanto Tim
observava Pollux adentrar a Sexy Day através do vidro do carro. "Inferno! Ele abre a
boca e toda a nossa investida vai por água abaixo", disse o homem com um olhar
que transparecia irritação. "Temos a opção de entrar lá e explodir a cabeça dele",
disse Rose com um tom assustadoramente sério.

Timothy pegou um cigarro da carteira de Atlântico no bolso do terno, colocou-o na


boca e acendeu. "Puta merda, vai fumar dentro do carro mesmo? Abre pelo menos a
janela", resmungou Ortiz, mas Tim simplesmente ignorou. Quando acendia um
cigarro, ele se desconectava do mundo ao redor. Segundo o próprio Timothy, o
cigarro tornava seus pensamentos mais claros. — Está fazendo aquela merda de
meditação regada a nicotina de novo que não faz sentido? —, ela continuou
resmungando, agora com um ar de deboche.

— O Ron ainda trabalha na empresa de demolição? — Disse Timothy, expelindo a


fumaça cinzenta para fora.

Rose seguia o fluxo lento da Avenida Armitage, retirou a canhota do volante,


coçando a cabeça pensativa. — Ron é o velhote que acredita que a terra é plana? —
Perguntou ela com certa dúvida no olhar.

— Sim, preciso que ele consiga explosivo, dependendo da jogada do Pollux, teremos
que entrar no jogo para valer.
Enquanto isso, no interior da Sexy Day, Joe e Larry olharam para Pollux com uma
expressão de surpresa. — O grande jornalista do Canal 17, Pollux! — Falou Joe com
ironicamente. — A última vez que te encontrei foi no cemitério, visitando o túmulo
dele. — Continuou Joe, agora com certo pesar na voz. — Quer que eu o tire daqui? —
Perguntou Larry, que tinha cruzado os braços frente ao peitoral. — Para esse cara ter
aparecido depois de tanto tempo, deve ser algo importante, então vamos escutá-lo.
— Joe empurrou com o pé direito a cadeira de aço que ficava de frente para dele, era
um convite para Pollux sentar-se.

Anansi
Mais uma vez, Chris ficou encarregado de passar uma mensagem.

Sabendo dos problemas que teve quando chegou na boate Vênus, mesmo que isso
lhe desse uma hora inteira brincando com Yorha Ju-D, resolveu mandar uma
mensagem encriptada ao homem chamado "Vegan", se apresentando e informando
os contatos que tinha com antecedência.

As informações repassadas ao holotech eram extremamente precisas: Rua vinte e


três, "Consertos e outras coisas".

Era um timing perfeito. Foi naquele local onde ele havia conseguido sua motoca
envenenada e a hacker conhecida como Anansi fez o primeiro contato com ele, o
que foi o começo de uma boa amizade e uma excelente relação de negócios.

Quando terminou de mandar a mensagem, o monitor ficou com a mensagem


"Sending message, please wait...."

Por sorte, os conhecimentos de encriptação de Anansi nunca falharam e aquele


samurai das ruas não iria ter problemas para se apresentar. Afinal, a prevenção era o
melhor remédio...

Ao chegar na tal loja, ele já esperava com antecipação que a mensagem fosse
enviada.

X9
— Não sei o que faço, Praxis — Comentei com a pasta quadrada de arquivos na
minha mão. — Com isso Yuric vai ter uma puta vantagem em cima de Tony. Porém
se entregar tudo ao garanhão italiano, vai ficar estranho voltar de mãos vazias para
Red.— Suspirei pensativa.
— Praxis, faça um backup desse arquivo do Residencial Celeste e envie o original
para o safe point. Faça uma segunda cópia e mande para Tony. —Segurando o
queixo, disse pensativa.

— Pronto, foi rápido e fácil, fiz o que pediu, mas o que faremos com essa segunda
cópia? — Indagou ela com o arquivo na destra.
— Vamos modificá-lo e entregar a Red. Ele queria uma informação, se ela é confiável,
isso é outra história. — Caminhei até outra parte do corredor de linhas azuis
transparentes e comecei a pegar tudo que era arquivo da parede. Praxis fez uma
expressão de reprovação.

— Que foi? Olha a oportunidade que tenho, posso vender muito disso depois por um
bom preço. Substitua os arquivos roubados por… Vídeos de gatinhos fofos. — Praxis
sorriu, acho que ela captou a ideia de galhofa, parece que com a convivência, ela não
apenas pegava o jeito das máquinas, mas dos humanos também, enfim ela fez o
que pedi.

— Pronto de novo. O que quer que eu modifique no backup que enviará para Red? —
Praxis mandava o máximo de arquivos roubados para o safe point. Era mais seguro
que meu computador de pulso.

— Vamos ver… — Levei a destra ao queixo, pensativa novamente, mas antes que
pudesse dar alguma ideia, Praxis alertou.

— O sistema virtual do Olimpo foi desativado por algum tipo de invasão. — Avisou
ela de repente, meio assustada.

— Tem alguém tentando atacar o Tony? Henry Choi, Yuric? — Indaguei.

— Não sei, perdi toda a conexão estabelecida, procurei pelos dados de navegação de
origem, e eles estão criptografados. Levei alguns segundos para decodificar, mas os
dados não levaram a nada.

— Então seja quem estiver fazendo isso, manja bem da parada. Você consegue me
enviar até o banco de dados do Tony e me dar suporte?

— Tentarei. Você vai… Pessoalmente rastrear o vírus?

— Uhum, mas preciso ser rápida, terminar tudo antes daquele ruivo chato acordar.
Enquanto isso… — Me concentrei, fechando os olhos.
Aquele lugar era simplesmente incrível. De alguma forma, ao estar lá dentro, à
medida que o tempo passava, sentia-me cada vez mais parte da Lexis, assim como
ela fazia parte de mim... Esse é o fator prejudicial: as pessoas viciam-se no mundo
virtual porque entram em um processo de simbiose com o ciberespaço, tornando
praticamente impossível viver no mundo real. Está acontecendo o mesmo com a
Praxis... Mas ela é uma inteligência artificial, esse é o mundo dela... Naquele
universo, eu começava a entender as coisas por conta própria e, sem a ajuda da
minha IA, consegui mentalmente criar um contador de tempo, que podia ver através
de uma interface de visão periférica. Não quero ficar aqui por muito tempo; tenho
receio de ficar viciada nessa maldita sensação... Foi algo simples, singelo, algo que
a Praxis faria num piscar de olhos, mas eu não queria me tornar tão dependente
dela.

— Encontrei um ponto de entrada. Por meio do vazamento de dados posso inserir


sua mente no banco de dados de Tony Montana. Preparada? — Fiz um sinal positivo
com a cabeça.

Magicamente diante nossa frente surgiu uma luz escura como um buraco negro, que
começou com um pontinho preto e foi expandindo até nos engolir. Cara... Foi a
maior viagem que tive, nenhuma droga que tomei se comparava... Nem mesmo
aquela outra parada psicodélica de quando fui inserida aqui foi igual. Mergulhando
em uma infinidade de dados, fluindo como por um rio de forte correnteza, luzes
semelhantes a criação de estrelas e galáxias dançavam em minha frente, eram
supernovas azuis explodindo, se expandindo e voltando a se contrair em uma
imensidão negra e sombria que se comporta como líquido. Tudo acontecia ao
mesmo tempo, uma queima de fogos de artifícios índigos, que me traziam mais
conhecimento, e conhecimento é poder. É eu me sentia mais inteligente, como que
se cada dado, cada informação que corria por aquele rio e tocava minha pele
aumentava meu Q.I. Uau! Me sentia muito bem, como nunca havia me lembrado
antes, aquilo curava feridas, alimentava meu bom humor conforme eu atravessava a
toda velocidade por aquele túnel azulado e escuro. Merda... Será que estou ficando
viciada? É tão rápido assim? Não importa, ainda via o visor digital na visão periférica
e não havia passado muito tempo... O que será que me aguarda do outro lado desse
ponto de entrada?

Anthony Montana
Antes da tempestade vem a calmaria, meu pai sempre me dizia isso. Ele me disse
também que você nunca recebe nada sem pagar o preço, e sabe, meu pai era um
homem bastante sábio. Ele também não confiava na tecnologia moderna de Mirai e
por isso nunca foi escravo dela, levei isso comigo.
— Não se alarmem! Eu tenho um gerador de energia! — Certas coisas nunca saem
de moda!

Apertando um botão abaixo da minha mesa, o gerador de energia se ativou,


acendendo primeiro as luzes da minha sala, depois dos corredores do andar, e por
fim todo o restante do prédio. O circuito interno também voltava a funcionar, e os
mais de vinte monitores da minha cobertura ligavam. Era um sistema rústico, e bem
limitado, dependendo agora apenas dos olhos eletrônicos das câmeras, e era por
eles que visualizava do lado de fora. A bagunça estava formada, a luta ia começar.
Do lado esquerdo da mesa de madeira escura puxei um aparelho no estilo de um
pequeno interfone pendurado por um fio preto, e falei.

— Estamos sendo atacados! Os invasores ainda estão no primeiro andar, não deixem
eles avançarem mais! Metade de vocês, concentrem-se no segundo andar, vamos
usar a vantagem do ambiente fechado! Não importa quanto eles sejam, se
bloquearmos fortemente as entradas, eles vão tombar diante das investidas. Se
mantenham preparados para atirar em quem tentar passar do segundo andar, seja
homem, mulher, criança ou velho! Qualquer um! Vocês vigiem as escadarias de
emergência também! Desativarei os elevadores! — Minha voz se espalhava pelos
andares e todos os meus seguranças ouviam fosse onde estivesse.

— A outra metade, suba até a cobertura e faça o mesmo no último andar, atire em
qualquer um que se aproximar da minha porta! — Com os androides e drones
desativados eu precisava usar toda a força humana disponível.

Como a central de energia ficava em minha mesa com aquele gerador, minha sala
passava a ser o sistema nervoso do prédio, era uma medida de segurança, um plano
B. Desativado, os elevadores me dirigi até a frente da mesma, em pé, falando para
todos presentes, principalmente Galathea e seu bando, a loira peituda Gal, Vladimir,
Jesse, Capitão Gancho e Johan, além de outros homens da minha guarda.

— Como vocês viram, algum idiota, provavelmente o imbecil pai dessa vagabunda! —
Apontei para Margareth desmaiada. — Está cometendo a imensa burrice de me
atacar no Olimpo. Ele não vai conseguir muita coisa, mas muito sangue vai ser
derramado nesse prédio, ah, isso com toda a certeza vai! Mas não vamos deixar que
seja o nosso. Movimentei os peões para a entrada, serão sacrificados para um bem
maior, nos manteremos seguros e planejando uma defensiva se preciso. Não sei
quanto tempo vão resistir, mas são homens treinados e fiéis, darão a vida e levarão
com eles o máximo de invasores. Portanto, a cada andar que subirem, esses idiotas
vão perdendo força em números. Se atingirem a cobertura, serão poucos, e ainda
terá metade da minha guarda na porta esperando. Mas não vamos depender deles,
façam o que sabem fazer de melhor!
Me virei e puxei um livro da estante embutida na parede. Só pelo sarcasmo esse
livro era “A arte da guerra”. A parede era falsa e se abriu, existia ali um fundo falso,
mas não era qualquer coisa, era uma sala branca com todo o tipo de arma que você
possa imaginar penduradas nas paredes tão claras que provocaram um desconforto
à primeira vista. Desde um canivete até lança mísseis, granadas, e morteiros.
Convidei a todos entrarem no espaço que era vasto, quase o tamanho da minha sala
principal. Puxei algumas caixas de munição com ponta de radiack e entreguei
primeiro a Galathea e Vladimir.

— Creio que vocês dois são os mais indicados a coordenar uma defesa caso a porta
da frente seja derrubada. Escolham suas armas. — Ergui o braço, oferecendo
qualquer armamento disponível. — O restante de vocês, que sejam menos
experientes, ouçam e obedeçam esses dois, e vamos sair vivos daqui! Se armem
também! — Puxei da parede um rifle a laser, lança chamas e que também funcionava
com munição de radiack em gel. Lembram do napalm? Pois então, radiack em gel
queimava e era mais efetivo umas quarenta vezes. Eu não ia pegar leve, se algum
merdinha entrasse na minha sala, eu ia derreter eles como gelatina mesmo que
tivessem uma armadura militar.

— Vamos para a porra a da guerra! Fracasso não é uma opção! — Engatilhei a arma
depois de munir ela por completo.

Kat
Horas depois.

Logo após receber o montante, a dupla se separava e cada um seguia com um plano
diferente, Katterine iria utilizar metade da quantia para expandir o império deles
construindo um hardware de vigilância até onde o dinheiro permitisse a chegada,
enquanto Cyrus, por sua vez, mencionaram que utilizaria sua parte para "algo mais
sério". Não se passou muito tempo até que os drones de monitoração que foram
colocados nas proximidades do Olimpo detectaram a cena melódica das luzes
principais se apagando e em seguida um grupo de veículos estourando com a porta
de entrada do edifício, invadindo-o. Os drones emitiam um sinal de alerta direto para
os dois membros da C-Tech, Katt e Cyrus recebia ele em seu comunicador
modificado pelo rapaz mesmo, e imediatamente Katt batia retirada das ruas do
Submundo onde se localizava e voltava para o seu Q.G.

Chegando em poucos minutos, ela entrava no Galpão e via Cyrus com as mãos por
cima de uma mesa oval esquisita, extensa, cheia de computadores e máquinas
estranhas, definitivamente algo novo que não estava ali antes da menina sair. A
visão tirava o foco da situação, ela parava de correr e cambaleava um pouco com a
visão do que parecia uma sala de guerra. A mesma agora questionava:

(Katterine) C-Cy... Mas o que infernos é isso?

(Cyrus) Digamos que isso seja uma compilação de onde eu venho usando os meus
fundos e também algo que eu venho guardando para um dia de chuva como esse,
Kattz...

(Katterine) Mas... O QUE É ISSO?

(Cyrus) Uma Estação Retransmissora... Chegou a hora de mostrar o que eu sei


fazer...

(Katterine) Do que você está falando!!!???

(Cyrus) Está na hora de elevar nossas operações para o Protocolo II. Chegou o
momento de eu te mostrar algo que eu venho trabalhando desde os sete anos de
vida enquanto morava na África do Sul. Chegou a hora...

Cyrus começou a pressionar teclas de um teclado holográfico numa velocidade


quase insana, mantendo toda sua visão focada nele, o mesmo dizia, para uma
Katterine um tanto atônita e assustada:

(Cyrus) O Q.G. do Montana está sobre ataque, mas não só de pessoas... Meus
sensores indicam que há um vírus operante em todo o quadrante... Todo o sistema
operacional dele foi para o ralo... Sistema de defesa, Drones de Segurança, tudo...
Existe algum hacker dando suporte para os agressores, então... Acho que tem
apenas uma forma de darmos suporte para ele... -Cyrus parava de digitar
subitamente- Estabelecendo um novo Sistema para eles, algo que nem o hacker,
muito menos o vírus em si tem conhecimento... E, claro, algo que eles vão aprender
a temer...

(Katterine) C-Cyrus...

(Cyrus) Katterine Webner, é com muito orgulho que eu lhe apresento ao mais novo
integrante de nossa organização... E também a arma que nos elevará para Status
que você nem sequer poderia imaginar... Meu Projeto de Vida... Eu lhe apresento...
CABAL!!!

Apertando uma tecla sobre o teclado, sem olhar para ele, apenas focando na garota,
Cyrus iniciou um barulho bem alto sobre o local, como se vários tipos de máquinas
começassem a ligar, deixando a jovem ainda mais assustada, porém dentro de
poucos instantes, um projetor holográfico atrás do jovem-gênio ligava, e uma
imagem distorcida começava a se projetar, sons de interferência se davam também.
Até que a grande imagem começa clarear, e distorção agora apresenta uma face, de
aparência humanoide, com os olhos fechados. Quando os barulhos estranhos
terminavam, a presença ali abria os seus olhos, manifestando duas palavras com
uma voz extremamente estranha, robótica, mas também humana:

CABAL... Online...

Não acreditando naquela coisa que aparecia em frente a si, Katterine acabava
caindo ao chão, sentada, olhando fissurada para a I.A. que começava um diálogo
logo em seguida:

(Cabal) Cyrus... Vejo que conseguiu obter a conquista que tanto almejava! Todos os
sistemas nominais estão operantes. É bom poder ver o mundo.

(Cyrus) Seja vem vindo CABAL. Eu fico feliz em tê-lo entre nós, mas precisamos de
sua ajuda para uma situação...

(Cabal) Menciona Antony Montana, correto? Eu consigo ver a situação, há um ser


humano na rede... Interferindo com os sistemas dele. A queda do mafioso é
iminente, existem combatentes inimigos demais para a baixa taxa de defesa
humana que ele possui.

(Cyrus) E é nisso que você entra, meu caro... Poderia ajudar? O Vírus não consegue
invadir nem danificar seu sistema!

(Cabal) Claro, demorará alguns minutos, mas poderei partilhar das celebrações que
acontecem ao Olimpo. Eu recomendo que acomodem-se enquanto trabalho e...
Recolha a pobre Senhorita Webner do chão, se for algo de incômodo para ela, é
claro...

Alguns instantes depois, a dupla estava "acomodada" sentados em cadeiras de


couro bem de frente da estação operante de CABAL, no projetor holográfico imagens
sistemas iam se projetando, zooms para perto e longe aconteciam a todo instante,
enquanto a face da I.A. permanecia fixa no canto inferior esquerdo. Cyrus, inventor
de tamanho projeto, ficava observando com um fascínio estampado em sua face, já
Katterine se permanecia mais encolhida no assento, olhando, principalmente, para o
rosto da bio-máquina, que não esboçava nada, nem se quer parecia olhar para os
dois. A garota então levou-se para mais próxima do amigo, e disse bem baixo
próximo ao seu ouvido:
(Katterine) Cyrus, você acha mesmo que entregar tudo de bandeja na mão desse
computador maluco é uma ação correta? Escuta, essa coisa tem algo que eu não
gosto: personalidade... E se ele acabar matando todos nós?

(Cyrus) Ham? Mas do que você está falando, Katt? De onde tirou essas ideias? -Dizia
o rapaz olhando confuso e incrédulo as palavras que a companheira de crime dizia-

(Cabal) Não sinta-se afrontado pelas palavras da Senhorita Webner, Cyrus... Afinal de
contas, é normal da condição da espécie humana temer o desconhecido. -CABAL
comentava, tomando a atenção de ambos- Mas permita-me partilhar de uma faísca
de história com você, jovem garota...

...Ativando Arquivos do Acervo de História...

...Traduzindo Modelos...

... Reproduzindo Vídeos...

"... Uma nação inteira, marcada por milhares de anos de exploração, segregação,
pobreza, burguesia e tirania, a República Sul-africana moderna atinge novos
patamares de desigualdade social com a construção das mais novas Metrópoles
Super-Verticais! Onde apenas os super poderosos monetariamente e
intelectualmente podem habitar. E-..."

"... Com as novas Metrópole de Porto Elizabeth e Cidade do Cabo, o Produto Interno
Bruto da República Sul-africana atingiu patamares que ultrapassam o Planeta todo
combinado! Mais uma vez nossa nação demonstra que um país livre de armas de
destruição em massa e intrigas internacionais marcha em direção para um mundo
melh-..."

"... Repórteres vindos da Metrópole de Bloefomtein indicam que os Projetos de


Qualidade de Vida Zeo-Meccha e Futuro ex Machina foram implementados com
sucesso e todos os seus habitantes agora são, quotando: Um com a Tecnologia
Eterna, os projetos de cibernetização e expansão das capacidades cerebrais tomam
cem por cento de sucesso em todos os-..."

"... Repetindo, com as ondas de revoltas das Colônias Normanas contra as


Metrópoles do nosso país, as Forças de Contenção solicitam a todos os habitantes
Híbridos que permaneçam dentro da segurança da-..."
"... Atenção, todos! Isso é urgente! Meu Deus... Estas são as últimas notícias... Os
Normanos invadiram a santidade da nossa Metrópole! Todos... Todos devem
evacuar, IMEDIATAMENTE! Aqui é-..."

"... Com a queda recente de Joanesburgo, Durban e agora Porto Elizabeth, Cidade do
Cabo se torna a última Metrópole Vertical restante. O Prefeito de Estado Zuwe
Mbalgo informou esta manhã e uma conferência com a imprensa que o enxame da
população Normana chegará em breve, portanto, um plano de evacuação da
população começa a ser implementado as dezoito horas locais para-..."

...Final do Acervo de História...

...Encerrando exibição...

(Cabal) Como pode ver, Senhorita Webner, foi uma criação de Cyrus, em momentos
da história de uma nação em que o fraco em maioria se revoltou contra os poucos
poderosos privilegiados.

(Cyrus) Eu consegui fugir, mas meus pais ficaram, porque sabiam que eu podia
cuidar do negócio na América, por isso transferiram noventa e cinco por cento do
Projeto Inteligência da Alvorada...

(Cabal) Eu estive sempre com Cyrus, ajudando enquanto minhas funções e


capacidades eram limitadas, me certificando que sempre poderia ajudá-lo a
subsistir no novo continente, desde o começo, ampliando cada vez mais, até chegar
no ponto em que poderia cumprir minha programação e ser o controle absoluto das
forças armadas da nação. Este é o meu propósito... O nosso propósito, Senhorita
Webner, é governar!

(Cyrus) Eu poderia com toda certeza ter continuado sozinho, e uma hora ou outra eu
estaria neste exato momento em que estou, com aquilo que eu dei toda minha
infância e adolescência em Cidade do Cabo em realidade! Mas eu sempre te achei o
máximo, Kattz! Você tem visão! Atitude! Almeja um mundo em ordem em que nós,
os Superiores, podemos habitar e governar sobre os miseráveis e subdesenvolvidos!
Eu sempre soube disso! Vamos minha querida, agora não é momento de se acanhar!
CABAL é ordem! CABAL é estrutura E poder! Ele vai nos levar ao status de DEUSES!

Katterine permanecia com uma expressão descontente, mas sabendo agora sobre
as coisas que aconteceram com a vida de Cyrus e de onde aquela Inteligência
Artificial havia surgido, uma parte de suas dúvidas e temores dissipará, permitindo a
ela dizer:
(Katterine) B-bom... Se vocês fazem tanto esforço assim só pra me impressionar,
tudo bem... Mas eu vou ficar de olho nisso, quero que você conquiste minha
confiança, cabeça de lata!

(Cabal) Mas é claro, Senhorita Webner, por sinal, o sistemas da Corpus-Tech estão
incorporados ao meu Mainframe, estou vendo a situação atual no Edifício Olimpo, os
humanos se trucidam com facilidade, os infratores avançam com pouca
dificuldade...

(Cyrus) Consegue limpar o vírus do Sistema do prédio antes que eles alcancem
Montana?

Perdão pela ousadia Cyrus... Mas, uma pergunta desnecessária... -A I.A. ria bem de
leve, que chegava a espantar a jovem Katterine- Chegou a hora de mostrar ao
pedaço de carne que ousa mergulhar no ciberespaço algo que o fará ter trauma de
computadores...

A única coisa que a máquina acabava ocultando propositalmente dos seus "amos"
era que este sabia que não estaria sendo o único a tentar invadir os acontecimentos
do Olimpo, mas algo a guiava a isso, CABAL não era apenas uma Inteligência
Artificial com uma bizarra e notória capacidade sentimental, os mistérios que esta
máquina proporcionaria estavam apenas tendo seu início, muita coisa estava para
acontecer ainda.

Gal Bordeaux
Os negócios estavam acertados, então. Gal se tornaria a mercenária de Tony e, pelo
que indicava, já tinha uma missão em vista: resgatar um homem chamado Caz,
integrante da polícia. Isso fez com que a loira tivesse um breve momento de déjà vu,
pois já havia se metido nessa enrascada antes para capturar Margareth, a mulher
que agora estava desmaiada no chão da sala. Bem, era apenas trabalho, então ela
assentiu positivamente, exibindo um sorriso irônico no canto dos lábios. [...]

Infelizmente, os negócios teriam que ser deixados de lado devido a um repentino


apagão no prédio do garanhão italiano. No entanto, o perspicaz italiano havia
previsto essa possibilidade e contava com um gerador rústico, porém funcional, para
garantir que o básico continuasse funcionando no local, como parte da iluminação e
da vigilância. Não demorou muito para que o proprietário do imóvel desse suas
ordens. Ao que tudo indicava, ele desejava que seus soldados - e não eram poucos -
atacassem os invasores, enquanto os "bispos" e ele próprio, o "rei", permanecessem
na sala. Além disso, armas foram oferecidas.
— Não sei usar esses brinquedinhos, Tony... — A loira deu de ombros, sorrindo em
seguida. Aproveitou para fechar a jaqueta preta que agora estava em suas mãos.
Apesar de ser um pouco maior, devido à estrutura corporal do verdadeiro dono, a
vestimenta não limitava seus movimentos. — Bem, vou ajudar os peões. Não
consigo ficar parada por muito tempo. Essa é uma amostra grátis, Tonynho, mas
depois vou cobrar, e não será barato. — Piscou e, em seguida, desmaterializou seu
corpo, passando pelo chão abaixo dela. Assim, com a densidade zerada, ela foi
atravessando os andares, invisível, observando o caos que se espalhava pelo prédio.
Como não havia indícios de radiack na construção, o corpo da loira não sofreria
como no avião no dia anterior.

Já no solo, ela passava a agir de forma mais incisiva. Acenou brevemente para os
homens de Montana, indicando que estava ao lado deles. E assim, agia da seguinte
maneira: a cada inimigo que avistava (vestido de maneira diferente, o que a ajudava
a identificá-los), atravessava seus corpos no chão, puxando-os para baixo e
prendendo-os no solo eternamente; com alguns, atravessava seus corpos e, quando
atrás deles, os puxava para baixo de forma benevolente; quando necessário,
desmaterializava seus próprios braços e mãos para remover ou ferir os órgãos
internos dos inimigos.

No entanto, como gato escaldado tem medo de água fria, Gal tomava cuidado para
não ser atingida por nenhum disparo, temendo que alguma daquelas balas fosse
feita do material que a impossibilitou antes. Assim, ela não se dava ao luxo de
simplesmente ficar intangível para que as munições a atravessassem: quando
alguém disparava contra si, movimentava-se rapidamente para desviar ou "afundar"
no solo, ou escapava para uma parede próxima. Não podia correr o mesmo risco de
antes.

Se bem-sucedida em suas investidas ofensivas e defensivas, ela continuaria


ajudando os peões até reduzir drasticamente o número de invasores ou até que
outra ordem fosse dada pelo italiano.

Pollux
Boate Sexy Day

Eu entrei naquela pocilga cheio de si, mas eu acabei não me dando conta do erro
que estava cometendo, só depois vim a pensar nisso quando já estava de frente
para Joe. Tinha algo estranho sobre ele e de fato, passar tanto tempo longe dos
Steelhearts raízes me deixou um pouco próximo de uma figura bem parasita para
eles. Talvez não a um nível X-9 de ver aquela situação, mas podiam eles pensar que
eu também estava de alguma forma meticulosamente envolvido com o azar da
missão que levou o seu líder a morrer. Era parte de ter feito parte do lado errado
naquela guerra e também ter uma fama que não ia lá muito a meu favor, como se
agora fosse o bode expiatório de tudo que desse errado e, para ser honesto, eu não
tinha como me livrar daquilo. Liam havia morrido para que eu não fosse trucidado
em dois pelos canhões daquela aberração, vai saber por quantas outras pessoas ele
teria feito isso em vida. No exato momento em que eu pisei dentro da boate dava pra
ver que o clima já não era muito bom.

Sem a proteção de Liam eu também era um qualquer ali dentro, e com Joe em
comando, bem eu não o conhecia muito e estava a mercê do seu julgamento. Era
meio que como construir de novo a minha reputação do zero, pela terceira vez, agora
que não só eu estava em maus olhos diante do mundo corporativo de Telford mas
também entre os anarquistas, portanto meu senso de segurança e meus lugares
seguros dentro da guerra naquela cidade estavam diminuindo bastante, e eu
precisava de mais contatos e aliados. Desde que eu retornei tudo parecia bem
diferente, e aqueles comentários irônicos me faziam ver que eu só havia sido aceito
ali dentro de volta porque achavam que eu tinha algo a oferecer.

— Tô sempre por lá. Faz a gente pensar um pouco no que estamos fazendo. Por que
não esbarra comigo quando for lá da próxima vez? Nunca pareço te encontrar. A-há!
Respondo ironia com ironia, sem questionar demais Joe ou lançar meu olhar para
Larry, acusando-os por debaixo dos panos de não terem o mesmo respeito por sua
lápide e memória. Eu tirei outro cigarro de dentro do meu bolso e ofereci ao homem,
mas acabei acendendo sozinho enquanto me sentava.

— Pollux, que surpresa você aqui!

— Olha só quem veio também. Da minha cadeira ainda sentado eu abracei de lado o
quadril de uma mulher que se aproximou e apoiou a mão em meu ombro,
aparentemente sem ter a presença como um empecilho ao lugar e a nossa
conversa, mesmo quando Larry teve de novo a vontade de espantar minha presença
ou a da moça eu ergui uma das mãos em sinal de que o mandasse relaxar.

— Dá pra você parar de enrolar logo, colega? Larry começava a se irritar e isso era
ótimo, minha postura estava sendo o mais relaxada possível para que forçasse uma
situação parecida e parecesse o mesmo de antes, só mais um jornalista e não
alguém com um bom plano por trás, alguém convencido com quem eles não
precisavam se preocupar. Mas, me dei por mim que eu não podia conversar com
Joe, nem a sós, o que eu realmente queria. Tinha um verdadeiro predador acabando
de sair pela porta daquela boate e eu não podia fazer nada, porque pretendia me
fazer passar por um dos seus aliados também. E se Joe tivesse lealdade demais por
ele, isso iria ser foda. Olhei de um pro outro e comecei a ler suas retinas, vi o jeito
nervoso com que trocavam os pés e as expressões de seus rostos que nem eles
estavam cientes de terem de tão leves, eu estava pronto para reagir se eles
apresentassem uma ameaça, mas agora estavam apenas desconfiados, e pior, com
a pessoa errada.
— Proposta de trabalho. Nada a ver com o Timothy, só com um carinha chamado
Liam.

— Agora vai querer pegar o lugar dele também? Folgado demais você.

— Eu lá tenho paciência pra liderar alguma coisa? Tô nessa sozinho. Sabe que é
assim que gosto de trabalhar.

— Escuta, a gente não quer ter nada mais a ver com suas ideias. A gente tá fora do
jogo. Você trouxe o K'dore até nossa porta.

— Muito heróico da sua parte dizer isso, muito. Ainda mais pra alguém que se
esconde dentro de um puteiro hoje em dia.

Larry se ergueu e tentou crescer pra cima de mim mas eu não era o mesmo de
meses antes, também havia aprendido a me defender, mesmo não sendo tão alto ou
intimidante quanto o cara que queria me colocar pra fora no momento em que eu
pisei na boate eu mantive minha posição, me ergui da cadeira e o encarei.Aquilo ali
não me assustaria, eu estava improvisando uma boa cena e também deixando uma
ótima isca para depois fazer com que Joe tivesse interesse no que eu tinha a dizer.
Não estava só interessado em salvar os Steelhearts mas também salvar minha
própria pele e ter um lugar onde eu pudesse me esconder, já que nenhum outro lugar
de Miraitropolis parecia seguro ou iria me aceitar. ── Quando vocês estiverem
prontos para agir que nem homem e fazerem negócios, volto a pôr meus pés aqui.
Joe, você costumava ser mais durão que isso. Agora se esconde e deixa um
estranho te dar ordens. Foi aquele comentário que me fez sentir um empurrão no
meu peito e me dar um passo para trás, também ergui meus braços mostrando não
partir pra briga mas tinha uma expressão fechada e azeda no rosto. O
confrontamento direto não rolaria, mas graças eu tinha um plano b rolando em
mente. Não precisei dizer que não era mais bem vindo ali, mas quando saí pela porta
da boate conduzido por Larry também tinha junto de mim a dançarina segurada pela
cintura.

— Seu plano não deu lá muito certo.

— Não, mas eu quero que você entregue para ele minha mensagem. Cemitério de
Neon, não esqueça. Não deixe ninguém saber que você está envolvida com isso.
— Vou tentar. Você sabe que tá me devendo uma depois dessa né?

Timothy tinha complicado tudo, mas eu mesmo tinha de saber lidar com o
imprevisto. Vi a garota de programa se afastar e entrar de novo na boate e fiquei
sozinho na calçada, suspirando o ar poluído da noite quente que me cercava e
saboreando um plano cada vez mais incerto. Dava pra dar um jeito ainda. Mais do
que só a minha pele estava na jogada agora. — Espero estar vivo pra pagar essa
dívida.

Cemitério de Neon

Eu estava de frente para o túmulo que tanto visitei durante os últimos meses, tantas
memórias e tantas visões do que ali havia acontecido desde as imagens daquela
aberração que tecnicamente também matou X-9 a agora a cena que era o perfeito
resultado de tudo isso. Chovia quente sobre nós e apesar de tão novo o túmulo de
Liam parecia sofrer com uma erosão precoce da chuva ácida que apagava um
pouco das inscrições de seu nome, era um tipo de lembrança amarga que logo iria
se desfazer, aos poucos já sendo esquecida até pelos seus mais próximos amigos.
No cemitério, uma figura de chapéu e sobretudo cinzento esperava o antigo
Steelheart, e agora o típico carisma que eu tinha me faltava em troca de uma
postura mais severa. Quando Joe começou a abrir a boca e apertar os olhos para
me ver melhor no meio da chuva eu o interrompi imediatamente.

— Tim Carter quer ver todos vocês mortos.

— Ãhn? Que? Dava pra entender que ele não entendia nada, mas minha voz não
permitia brincadeiras. Na penumbra, a maior parte do meu rosto se resumia
visivelmente apenas aos olhos que brilhavam púrpuras.

— Não estranhou nem um pouco as motivações dele? Não sei o que ele disse pra
você, mas a família dele estava no Canal 17 quando ele foi abaixo. Ele quer a sua
ajuda pra matar você e o resto, e vai vir atrás de mim logo depois, porque eu
sobrevivi e me juntei aos Steelheart, então vai pensar que era um agente duplo.

— Você tem qualquer coisa que ajude a confirmar essa sua teoriazinha? Com pouco
prazer eu passei para ele o rastreador da peça que havia colocado no carro da
mulher que acompanhava Timothy Carter quando parou do lado da boate. Ainda
estava ativo e não exatamente provava nada do que eu havia falado, mas
certamente iria.
— Acompanhe você mesmo o trajeto dele e junte as peças. Veja se ele não está
armando uma revolta. Estou te transmitindo também os arquivos que recuperei dele
e de sua esposa quando trabalhava comigo. Use a cabeça e me diga se ele tem ou
não razões para se vingar do que sobrou dos Steelhearts.

— Você é um bom mentiroso, por que eu deveria acreditar em você? Pelo menos
agora eu sentia que estava atiçando a curiosidade dele.

— Por que tem mais gente envolvida nesse rolo. Por que eu coloquei meu pescoço
em jogo me fazendo de aliado dele para vir te dar essa informação, e se você não
ficar de bico calado eu vou pra vala, mas você vai depois. Eu tô sempre dizendo que
essa guerra só vai ser vencida de um jeito diferente, mas vocês insistem em tentar
resolver tudo na porrada e no tiro. Eu sei como o outro lado funciona, já estive lá. Tô
longe de ser o sujeito mais intimidante dessa cidade, mas se você quer alguém safo,
sabe que ninguém me passa a perna. Você entrou numa briga grande demais e se
desviou do propósito real, e olha no que isso deu. Era óbvio que eu estava
apontando para o túmulo, aquilo tinha raízes bem pessoais comigo. Ao mesmo
tempo que eu dava uma dica a Joe da amplitude que aquilo estava tomando não
mencionava Montana ou as razões dele querer que eu estivesse de olho em Tim,
aquilo tinha que acabar e era a hora de fazer algo. Junto do relatório que transmitiria
sobre Timothy entreguei a Joe um holoarquivo e o vi navegar em silêncio enquanto
começava a ver os planos. Meus planos, meus detalhes: os drones, os
investimentos, as chaves de acesso à Lexis, as conexões, os transmissores... a
transmissão.

— Isso é... você não pode estar falando sério... Diante do meu silêncio ele ergueu a
cabeça e tentou olhar para mim e só encontrou seriedade, continuei intacto perante
o homem. A ideia era sólida mas precisava de ajuda para chegar a luz do dia, era só
uma questão de tempo e de coragem, que eu estava muito disposto a investir.

— Eu sei como as coisas funcionam. Sempre soube e agora quero fazer do meu
jeito. Com apenas algumas pequenas mudanças consigo tudo o que quero. A
emissora. A emissora era minha ideia, mas eu não conseguiria nada sozinho e não
conseguiria nada confrontando Telford e os seus acionistas, Timothy e a
concorrência diretamente. Estava na hora de lutar com mais do que só armas.

— E o que é que você quer de mim enquanto isso? Era a pergunta que eu tanto
esperava, já tinha dado as costas a Joe quando ouvi sua pergunta. Ele não precisava
que eu respondesse.

— Fica na sua, faz o jogo do Timothy. Não deixe qualquer sinal de que sabe do plano
dele. Presta atenção nos detalhes e me diz tudo o que achar importante. Quero
saber tudo sobre ele, até os podres. Reúna qualquer coisa que pode ser
comprometedora, precisamos desestabilizar a causa dele primeiro. Se o matarmos
hoje, ele será um mártir. Eu já estava me afastando do cemitério e quando a
distância entre Joe e eu era quase máxima, eu falei por último fazendo uma breve
pausa em minha passada. — Minha lealdade sempre esteve com vocês.

Akane
Toda folgada no sofá ao lado da mesa do chefe, eu estava lendo um livro apenas
para me distrair. Eram momentos de calmaria desde que o sequestro do avião fora
bem-sucedido. Pelo menos eu pude finalmente sossegar nesse tempo. E posso até
dizer que me decepcionei com o Baron... Ferido daquele jeito... Pelo menos suas
feridas se curam rápido e agora nem sei onde ele está. Tampouco me importo com
seu paradeiro.

Obviamente, eu estava pouco concentrada no livro chamado "A Arte da Guerra". Um


exemplar arcaico, até... Mas como imagem holográfica, era mais fácil de ler, claro,
nem precisava segurá-lo... Na verdade, eu estava ficando entediada com esse ar de
"não tenho nada de importante para fazer". Mas sabia que a qualquer momento essa
tranquilidade iria se romper.

— É, não demoraram em nada esses bastardo. — Disse irritada quando a luz se


apagou.

Com o susto inicial que a "escuridão" causou, sentei-me no sofá. Os demais prédios
mal conseguiam iluminar aquele escritório de forma miserável. Estava aguardando
meu querido amante ligar o gerador. Fiquei ali, sentada, observando os outros
procurarem por armas e se organizarem para defender seu território. Por que
estavam tão apressados? Talvez fosse apenas uma questão de tempo até uma
formiguinha aparecer e passar pela porta...

— É sério que usaram essa tática arcaica? — Resmunguei checando minhas facas
escondidas nas botas que usava.

A tensão do momento desviou minha impaciência inicial, afinal, estava aguardando


uma entrega muito especial... Foi ideia apenas minha e sabia exatamente onde
encontrá-la. Como um tijolo contra o vidro daquela sala, um projétil quadrado e
resistente aterrissou no chão. Soltei uma risada e, antes que pudesse chamar
atenção de qualquer desavisado, corri para pegar o objeto. Era minha preciosa
encomenda. E para deslacrar aquele misterioso objeto preto e brilhante, tive que
pegar uma faca, cortar o dedão e deixar o sangue escorrer sobre ele... Essa era a
chave.
O objeto metálico abriu e dentro havia uma seringa. Olhei para Tony e mostrei-lhe o
que acabara de chegar, mesmo que tenha custado o vidro blindado da janela...
Bem... Expliquei que o líquido roxo contido nessa seringa era uma espécie de
bactéria criada a partir de um DNA. Se injetada em uma pessoa, ela ficará
totalmente à mercê do DNA incorporado nessa bactéria. E aqui está a melhor parte:
se essa pessoa estiver a mais de 2 quilômetros de distância do, digamos, mestre,
essa bactéria liberará uma toxina radioativa e a pessoa morrerá em poucos minutos.
Tal artifício estava em fase de teste e alguém seria a cobaia e o DNA mestre era do
meu mafioso italiano.

Não perdi tempo em correr até a megera russa desmaiada e aplicar a injeção em
seu braço. Ela estremeceu com a entrada da agulha, mas nem me importei em
causar-lhe dor. Odiava-a em especial... Lembrava-me da minha progenitora. Enfim,
se ela ficar muito longe de Tony, morrerá. Ainda não tinha uma vacina pronta para tal
bactéria radioativa.

Mas devo dizer que a eficácia dessa bactéria vai depender do organismo do
hospedeiro. Com uma resistência imunológica alta, tal injeção e todo seu mal pode
falhar.

E devo dizer que como toda moeda de troca, veio também na encomenda o antídoto.

Galathea
Galathea ouviu o monólogo de Tony Montana. Monólogo, pois nunca tivera a chance
de responder ou manter uma conversa com ele. Nem sequer pôde expressar suas
reservas em relação à loira, que era a nova aliada de Tony.

— Bem eu devo… — Calou-se quando o prédio inteiro apagou.

A morena tinha os dois pés atrás com alguém que vira a casaca e, não podendo
dialogar com nenhum dos dois para entender a situação de fato, ela não entendia e
nem confiava na nova aliada.

Ficou em silêncio no escuro, limitando-se apenas a olhar para a direita onde Shae
estava, notando o brilho frio do olho cibernético a olhando de volta.

Quando Montana restaurou a energia, Galathea havia surrupiado um dos seus


charutos e oferecia outro a Shae, que recusou educadamente e estendeu um
isqueiro aceso para a líder. Ela deu de ombros.
— Não precisa ficar acanhado, ele disse para ficarmos à vontade.

Ao receberem a informação do mafioso sobre o prédio estar sendo atacado,


Galathea e Shae sacaram suas armas pessoais, apontando-as para a janela e
cobrindo-a. Os lábios rubros de Galathea se abriram num sorriso, enquanto seus
dentes brancos se cravaram no papel marrom do charuto.
— Está irritada?

— Não consigo nem sequer ter a porra de uma conversa nesse inferno… — Sussurrou
baixo de forma que apenas seu segundo em comando ouvisse.

Shae se retirou do escritório para se juntar aos outros quatro membros. Um deles
tirou uma shotgun automática das costas e entregou-a ao grandalhão negro que
comandava a organização junto com Galathea.

#Então? Que porra foi essa da luz apagando?#

— Estamos sob ataque. Fiquem atentos.

Ainda no escritório, Galathea olhou para todos ali, só então notando a presença da
ruiva. Acenou com a cabeça para Vladimir quando ele se aproximou para pegar um
dos rifles de Tony, enquanto ouvia-o lhes dar crédito por seus méritos marciais.

— Eu não recomendo que fique no escritório e espere um cenário onde eles


cheguem até aqui. Só estaria reagindo às ações do inimigo, que é o que esperam. —
Galathea levou seu rifle no ombro, olhando pela mira e apontando-o para as janelas.
Ajustou-a ligeiramente antes de voltar a falar. — É também onde eles esperam que
você esteja então… É exatamente para onde estão vindo. Mas caso decida ficar,
tome cuidado com as janelas. É como eu te atacaria. Com força pelo solo,
desviando sua atenção enquanto outro time entraria de rapel pela janela. — Ela olhou
para Vladimir. — O mínimo que devemos esperar é uma manobra de pinça. Eu estarei
lá fora caso precisem de mim.

Galathea chamou um dos homens de Tony para sair com ela. — Preciso de um guia
caso dê merda. — Explicou a mulher.

Não foram longe. Ordenou aos seus quatro homens que se preparassem no
corredor. Eles se posicionaram nos cantos e portas, usando-os como cobertura.
Entrar pelas janelas era inesperado e extremamente efetivo como choque moral. No
entanto, ela esperava algo mais, como helicópteros pousando no terraço e equipes
descendo as escadas, ou simplesmente times se infiltrando por todas as janelas do
andar ao mesmo tempo. Mas nos dois últimos casos, eles teriam que avançar pelo
longo corredor, sob o fogo constante e preciso dos soldados da Uroboros.

Narrador Capítulo 7

Após as últimas palavras proferidas por Frank, o silêncio reinou por alguns segundos
antes que Crazy Dog tomasse a palavra. O gângster latino encarou o prisioneiro,
avaliando-o por um curto período. —Meu irmão é tão fraco que colocou um cabrón
de merda como você na folha de pagamento. — Ele quebrou o silêncio, falando de
forma mais agressiva. — Eu pensei que você seria útil, que teria informações, mas
você não passa de um rato que muda de lado assim que oferecem um pedaço de
queijo maior. — O homem então se aproximou da porta do pequeno quarto de
hospital, antes de sair, olhou para Coyote, que estava na cama algemado, e esboçou
um sorriso sínico. — Antes de matá-lo, vou responder a sua dúvida, cabrón. —
Pausou por um momento. — Cansei de ficar na sombra de um covarde como Pascal,
sem ambição e vontade de crescer. Yuric me fez a proposta de aliança, mas meu
irmão nunca aceitaria. Então forjamos o meu sequestro, o resto você já sabe. — Ele
então abriu a porta e saiu do quarto, trancando-a.

Enquanto isso, no minúsculo cômodo em que estavam Rodrigo e Boris, o metamorfo


conseguia dobrar Boris aos poucos, utilizando sua lábia e suas habilidades
especiais para convencê-lo gradualmente, fazendo com que o torturador o
libertasse. Transformado em uma mulher de belo corpo e feições sensuais, Rodrigo
fez com que Boris, com sua mente perturbada, imaginasse mil coisas para fazer
com as habilidades especiais que ele possuía. Boris sorriu, guardando os pregos no
bolso da calça e segurando o cabo do martelo de forma mais relaxada. Ele decidiu
consultar seus superiores, acreditando que Rodrigo poderia ser uma aberração útil.
Antes de sair do cômodo, Boris apertou o seio de Rodrigo e o empurrou para trás.
Ele virou as costas e abriu a porta da sala, saindo e trancando-a logo em seguida.
Ele prometeu voltar em breve com boas notícias, deixando Rodrigo sozinho,
aguardando ansiosamente por seu retorno.

A porta do quarto de Frank se abriu novamente, revelando a entrada de dois homens


de descendência russa. O mais alto, de corpo robusto e queixo quadrado, avançou
em direção ao mercenário amarrado na cama. Sem aviso prévio, ele pressionou a
ponta de um bastão elétrico contra as costelas de Coyote e acionou o gatilho na
base da arma. A descarga elétrica liberada pelo equipamento foi suficiente para
deixar Coyote inconsciente instantaneamente. O outro russo, que ostentava um
moicano loiro, removeu as algemas dos pulsos do prisioneiro. Juntos, eles o tiraram
da cama, um segurando-o pelos braços e o outro pelas pernas, levando-o para fora
do quarto.
Rodrigo esperou dentro do pequeno cômodo sem ventilação por trinta minutos até
que a porta abriu. Boris entrou acompanhado dos dois homens que carregavam
Frank no braços. — Consegui convencer algumas pessoas da sua utilidade, um
biomodificado com teus poderes do nosso lado será incrível. — Disse Boris com um
sorriso malicioso na face. — Porém, você precisa convencê-los que estar disposto a
fazer qualquer coisa. — Os dois homens colocaram Frank na cadeira e o
acorrentaram, acordando-o com tapas na cara. — Tome! Corte o nariz, orelhas e
língua, depois o mate como desejar. — Após tais palavras, Boris entregou uma faca
militar para Rodrigo, os outros dois homens retiraram da cintura pistolas Glock,
como precaução para uma possível tentativa de ataque que o metamorfo pudesse
fazer contra eles. Agora Rodrigo tinha que decidir, torturaria o homem que o traiu e
se juntaria aos russos ou simplesmente tentaria acabar com eles com aquela faca.

Pollux ainda se encontra no cemitério encarando o túmulo de Liam quando recebeu


uma ligação no seu comunicador. Ao atender, escutou uma voz familiar que talvez
não estivesse esperando escutar. — Quando recebi sua mensagem, fiquei
extremamente surpreso, não parei de me perguntar: o que o jornalista bonitão quer
comigo? Então mate minha curiosidade, me encontre no Submundo ao anoitecer,
estarei em uma Arena Clandestina chamada Ossos Cruzados, fica em um velho
galpão ao lado do lixão. — Logo depois ele desligou a ligação.

Movido pelo seu plano, o jornalista seguiu para o Submundo sem hesitar. As ruas
estavam cobertas de lixo e esgoto a céu aberto, os edifícios já não tinham mais
cores definidas. Viciados imploravam por dinheiro para sustentar seus vícios,
enquanto prostitutas ofereciam seus corpos a qualquer pessoa. Ao chegar no Ossos
Cruzados, Pollux deparou-se com um letreiro feito de sucata e luzes azuis de neon,
formando dois ossos em formato de "x". O odor podre do lixão ao lado invadia suas
narinas, enquanto escutava os gritos de uma pequena multidão que vinham de
dentro do galpão. Na entrada, uma bilheteria improvisada havia sido montada. A
atendente era uma mulher com o lado direito do rosto deformado por uma
queimadura, cabelos curtos e um cigarro barato entre os dedos.– Bonitão bem
vestido com cabelos pretos. O Coltraine não poderia descrevê-lo melhor, ele ta
esperando você no camarote.

Ao entrar no local, o jornalista veria uma gaiola no meio de duas arquibancadas


improvisadas, onde uma pequena multidão assistia um homem com uma prótese
enferrujada enfrentar um robô de combate antigo. Pollux então subiu as escadas
para o camarote, onde Coltraine, que possuía o rosto modificado por placas de aço,
estava com cinco homens e algumas mulheres totalmente nuas, que os serviam
com bebidas. Ao notar a chegada de Pollux, Coltraine deu dois tapas no sofá de
couro que estava sentado. — Venha cá, por um momento achei que não viria. —
Agora dependia de Pollux, qual postura iria tomar diante do traficante e agora
organizador de lutas clandestinas.

O samurai das ruas conhecido como Chris Falcon chegou ao local indicado por
Nivans. Ele encontrou uma loja com enormes janelas de vidro, uma ampla garagem
ao lado e mais dois andares acima. O letreiro amarelo piscava com o nome
"Consertos e outras coisas". Chris notou um furgão vermelho estacionado em frente
ao estabelecimento, além de a vidraça da porta de entrada estar totalmente
quebrada. Isso certamente gerou uma grande desconfiança no samurai.

Por fim, um grito feminino ecoou de dentro da oficina, um grito que carregava medo
e desespero. Caso Falcon decidisse entrar, ele avistaria dois homens no corredor
que levava às escadas para o segundo andar. Um deles era gordo, com cabelos
grisalhos e vestindo uma jaqueta militar branca manchada de preto. Ele arrastava
uma garota pelos longos cabelos cor de verde, e pelos hematomas em seu rosto era
evidente que ela havia sido brutalmente agredida. O outro homem, usando um boné,
caminhava logo atrás, segurando uma submetralhadora em punho, como seu
escolta.

Chris Falcon, o samurai urbano, percebeu que tinha uma ótima vantagem caso
decidisse atacar a dupla misteriosa. Os homens estavam caminhando de costas
para ele em direção à escada e não haviam notado sua presença. Para eliminá-los
ou, pelo menos, nocauteá-los, ele precisaria executar um ataque surpresa eficaz
contra ambos. Como faria isso dependia apenas do seu estilo único e habilidades
como samurai.

O mundo virtual, ao mesmo tempo que pode ser um paraíso para seus usuários,
também pode se transformar em um verdadeiro inferno. X-9 acabara de adentrar o
espaço virtual onde todo o sistema do edifício Olimpo estava localizado. Com sua
experiência como hacker, ela percebeu imediatamente a atmosfera pesada e uma
sensação extremamente estranha, deixando claro que um vírus de alto nível estava
dominando o sistema. A maioria dos contornos que definiam a forma dos cubos de
dados, pastas de arquivos e linhas de acesso estavam agora envolvidos por uma cor
negra, incluindo grande parte do chão onde ela pisava.

Um rosto gigantesco formado por pixels pretos ganhou forma bem na frente dela,
era uma espécie de materialização do vírus Shadow dentro da Lexis. — Devo afirmar,
você fez uma escolha totalmente burra. — A voz metálica era do criador e agente por
trás da dominação do sistema, o hacker Darkness. — Será prazeroso dominar e
deletar sua mente. — Uma matéria negra começou a emergir do chão, envolvendo
gradualmente o corpo virtual de X-9. Era uma espécie de mecanismo de defesa do
vírus Shadow. Sempre que outro hacker ou um programa antivírus tentava
expulsá-lo, o vírus começava a lutar para dominá-lo, visando apagá-lo da existência.

X-9 observava horrorizada enquanto a matéria negra subia lentamente por suas
pernas, dominando seu corpo virtual. Ela sabia que precisava encontrar uma forma
de combater o vírus ou se tornaria mais uma marionete controlada pelo vírus
Shadow dentro do sistema do prédio Olimpo. Enquanto isso, Kabal, a inteligência
artificial, também adentrava o sistema, mas por uma porta de acesso diferente. Ele
logo se deparava com o mesmo problema enfrentado por X-9: o vírus Shadow
tentava dominá-lo e apagá-lo de dentro da Lexis.

Apesar do ataque surpresa, Montana conseguia manter o controle da situação,


utilizando sua excelente habilidade de liderança. No entanto, esse controle era
temporário, pois o inimigo estava em grande número, tornando a defesa de um
edifício tão imenso como o Olimpo extremamente difícil. A maioria das pessoas
presentes no escritório se armou e permaneceu em suas posições, exceto Galathea
e quatro de seus homens, juntamente com o Capitão Gancho, que a acompanharam
para guiá-la pelo imponente prédio. Outra pessoa que não conseguiu ficar parada foi
Gal, que utilizou seus poderes para atravessar pisos e paredes, chegando ao
primeiro andar, onde começou a eliminar os soldados inimigos junto com os
capangas de Tony.

Galathea então ouviu o som de disparos e gritos ecoando da porta que separava a
escada de emergência do corredor em que ela se encontrava. Com sua vasta
experiência como mercenária, ela reconheceu imediatamente o som de uma
metralhadora automática. A porta logo foi destruída por uma enxurrada de disparos,
revelando a entrada de um drone de combate. O drone tinha um estilo visual retro,
com duas hélices laterais, uma luz vermelha na parte frontal que lembrava um olho e
uma metralhadora automática de três canos. Apesar de sua aparência, era um
modelo de última geração, com alta blindagem e poder de ataque. — É um dos
drones de segurança do Tony. — Disse Gancho, olhando para Galathea.

Foi quando a metralhadora da máquina começou a girar e uma chuva de tiros


desabou sobre Galathea, Gancho e os outros quatro homens no corredor. Eles
precisavam agir rapidamente ou seriam pulverizados pela munição de grosso calibre
disparada pelo drone. Devido ao avanço de Darkness na dominação do sistema do
Olimpo, o drone já estava sob o controle do inimigo. Caso X-9 ou Kabal não
conseguissem lidar com ele no ciberespaço, ele logo assumiria o controle dos
androides e dos outros drones.

Gal fez a diferença no andar que havia parado, porém uma voz grave surgiu do meio
dos invasores. — Um biomodificado aqui, não esperava por isso. — O homem negro,
usando um traje tático preto sem manga saiu do meio dos soldados, sobre o rosto
ele usava um óculos de lentes vermelhas e carregava uma espada na mão esquerda.
— Você possui uma habilidade interessante, pena que posso enxergá-la, agora resta
saber se posso cortá-la. — Hurt, o sicário encarregado de comandar aquela invasão,
proferiu com determinação. Ele avançou rapidamente em direção à loira, segurando
sua katana com fio de radiack firmemente com ambas as mãos. Dotado de uma
maestria incrível, seus joelhos estavam flexionados e seus ombros rígidos. Caso Gal
não conseguisse desviar, a lâmina impregnada com radiack cortaria seu braço
esquerdo.

Para completar, um tiro atravessou uma das janelas do escritório de Tony,


destroçando a cabeça de Dr. Jonah. Sangue e vísceras foram jogadas para todos os
lados, sujando quem estava perto dele. — Derrubei o primeiro, Margareth tá no chão,
pelo visto foi nocauteada. Me dê a ordem e mato Montana agora mesmo. — Trigger
falou através de um comunicador, o atirador estava num prédio a 1500m do edifício
Olimpo, possuía visão limpa do escritório de Montana. — Não, a hora do moleque
italiano ainda não chegou, mate todos os outros, quero apenas ele e minha filha no
escritório. — Respondeu Yuric, com o forte sotaque russo que possuía. Trigger
engatilhou seu rifle novamente, passou o dedo sobre o gatilho e respirou fundo,
agora bastava escolher o próximo alvo.

Instruções

1- X-9 e a I.A. Kabal precisam rolar um D20 para resistir ao vírus Shadow. A
dificuldade é 13. Caso não superem a dificuldade, isso não significa que foram
dominados. Ambos têm livre arbítrio para buscar uma alternativa para atacar
Darkness ou combater o vírus, mas sem narrar sucesso.

2- Chris Falcon precisa rolar um D20 com dificuldade 10 para atacar os dois homens
de surpresa.

3- Galathea agora possui o controle do NPC Capitão Gancho. A dificuldade para


defender-se do ataque do drone é 14.

4- Gal tem duas opções: fugir ou lutar. Para fugir do ataque de Hurt, a dificuldade é
13. Para desviar ou defender-se, a dificuldade é 16. Para atacá-lo, a dificuldade é 18.

5- O restante dos jogadores no escritório precisa buscar uma forma de se defender


do atirador. Estão livres para fazer isso.
X9
— Entramos?

— Sim.

— Conseguimos mesmo?

—Sim.
— E agora?

— Agora a gente faz a parte mais difícil.

— Certo, então é sua vez.

O corpo feminino mergulhou de costas em uma quantidade líquida e infinita de


escuridão, extremamente densa e silenciosa, era como submergir em um rio de total
trevas. O rastro deixava pequenos pontos brancos pixelados, se comportando da
mesma forma que bolhas na água. Lentamente fui afundando, tragada de braços
abertos, calmamente, sem demora ou interrupção para o fundo. Depois de um longo
intervalo de tempo apenas descendo sob efeito da gravidade (ou o que parecia ser,
no mundo virtual as leis da física como conhecemos não valem nada) surgiu um
assoalho para os pés sentirem o chão tocarem suas solas. O rio de dados e diversas
informações a volta se desfez e eu me mantive na postura ereta, com os contornos
transparentes moldando as formas na escuridão. Ou tentando, já que como uma
obra surreal os mesmos eram usados para formar um padrão bizarro que constituía
um rosto humano. Não deu tempo de responder, assim, de repente, algo bem
semelhante a um piche envolveu meus pés, me mantendo presa ao solo.

— Agora já sei do que e quem se trata… Shadow…. — Ao menor contato com a


matéria negra, meu pensamento virtual recebia a informação do hacker Shadow e
seu vírus. Eu recebia os dados em um fluxo enorme em minha cabeça, como se tudo
que ele fez no banco de dados de Montana fosse um rastro com sua assinatura
digital. Claro, para apagar os indícios, quem seria louco de entrar em um sistema
infectado? Só eu sou idiota o suficiente… Ou talvez não, outro alguém tinha tido a
mesma estupida ideia. A coisa era uma inteligência artificial. Isso ficaria ainda mais
interessante daqui pra frente.

— Shadow, uma vez a I.A. que criei, Praxis, foi atingida por um vírus criado por Henry
Choi, você deve o conhecer. Esse vírus ferrou com a coitada, mas eu consegui isolar
a infecção. — A história não não era bem assim, mas ele não precisava saber.
A “lama” escura já se encontrava na altura das minhas coxas e sentia minha mente
diferente, aquela porcaria tentava me influenciar conforme o contato aumentava.
Minha mente estava nublada, esquisita uma voz inconsciente me mandava não
resistir, mas eu não lhe dava ouvidos e quando percebi a coisa já envolvia minha
cintura. Nada parecia dar certo. O material estranho agia como areia movediça,
quanto mais tentava me libertar mais me prendia os movimentos. A matéria já tinha
dominado meus braços, estava também no tórax, subindo para garganta e o queixo,
invadindo as laterais do rosto.

— Droga, você estragou meu moicano... Leva horas para preparar ele... — Franzi o
cenho, com os fios de cabelos desgrenhados pela testa, erguendo os punhos na
frente do rosto em posição de combate, mostrando que ainda resistia. 90 % do meu
corpo já estava escuro. — Quer mesmo jogar esse jogo? Eu sei lidar com vírus… —
Ficava complicado até mesmo falar. Minha mente dizia para desistir. A porcaria
daquela matéria não parava de avançar.

Não muito tempo depois, apenas os olhos ficaram à mostra daquela gosma preta,
uma vez que até mesmo o topo da cabeça já se encontrava dominado. Não tardou
para que eu fosse completamente envolvida e engolida pela matéria. Minha
consciência começou a se fundir com o sistema, não sabendo quem mais eu era.
Uma vitória para Shadow… Mas…

— Está feliz, Shadow? Antes que pergunte, olá, eu sou Praxis. — A I.A. de corpo azul
surgiu praticamente do nada, com os braços cruzados abaixo dos seios e um
sorrisinho no rosto.

— Não vá ficando contente, você ainda não venceu, aquela que absorveu não era a
verdadeira X-9, que aliás, deve saber, é uma grande hacker. Aquela era apenas uma
cópia minha. Assim que entrei no banco de dados de Tony Montana, em menos de
um segundo percebi que se tratava de um vírus e sabendo dos riscos, me repliquei,
porém com a imagem e semelhança de X-9. Viu que até mesmo tinha um moicano?
— Ironia… Praxis estava aprendendo comigo. Ela caminhou de um lado a outro, com
os braços para trás e então...

— Achou mesmo que seríamos idiotas de inserir nossas mentes em um programa


malicioso? Você nos subestima, Shadow… Isso é um grande erro. A propósito, sei o
que está pensando, vai tentar me absorver também. Fique à vontade, sou apenas
outra cópia da verdadeira Praxis. — A cópia mudou de gênero, de uma mulher de
corte chanel virou um homem azul sem cabelos e um círculo no meio da testa.

— Ctrl + C e Ctrl + V. — Mais outros dois Praxis surgiram à volta do primeiro e todos
falaram ao mesmo tempo, uníssono e quanto mais falavam, mais se multiplicavam.
— Você pode ficar livre para tentar eliminar todas essas cópias, enquanto elas
tentam absorver você e escanear o problema como um anti-vírus. Para cada uma
que conseguir eliminar, outras duas novas surgem, e continuarão a combater a
infecção. É bem provável que fiquemos travando essa batalha por horas sem um
vencedor. Mas eu não me importo, e vou dizer a razão, por que a verdadeira X-9 está
em algum lugar deste banco de dados arrumando uma solução para limpar e
reiniciar o sistema enquanto você fica ocupado medindo forças comigo, ou melhor,
minhas réplicas. O mais legal de tudo é que criptografei X-9 com código cinco de
segurança, o mais forte, ou seja, para você ela está invisível. E como não sou bobo,
claro, o Praxis original também está na mesma situação, ajudando ela neste exato
momento. — Praxis era praticamente onipresente dentro da Lexis.

— Então, vamos começar? — Movendo a cabeça para um lado e depois para o outro,
a cópia que estava à frente das outras simulava um ruído estalando o pescoço,
alongando o corpo como se estivesse se preparando para lutar. Nessa hora já
existiam mais de trinta outras cópias no local.

— Antes… — Ele se virou para a outra I.A. erguendo o braço em sua direção.

— Você também é uma inteligência artificial. Cabal, correto? Eu ofereço uma aliança
entre nós, afinal somos semelhantes. Ajudo você a me ajudar nessa luta contra
Shadow. Mas se tentar alguma gracinha, esquecerei que pertencemos à mesma
espécie. — Praxis não esperou a resposta de Cabal e voltou-se novamente para
Shadow.

— Preparado?! — Movendo ambos braços para frente do rosto, ele passou a conduzir
objetos no ar, os fazendo flutuar. Estava iniciando o processo de absorção do vírus.

X-9 rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 13 para não ser hackeada que resultou
10 - Total: 0 Sucessos

Timothy Carter
O jogo em que Timothy estava envolvido era perigoso e imprevisível. A presença de
Pollux na Sexy Day era a última coisa que ele esperava, uma situação para a qual
não estava preparado. Isso tornava as coisas muito mais difíceis, já que Tim não
sabia o que Pollux havia dito a Joe. Além disso, ele não tinha certeza de qual atitude
Joe tomaria. E, para complicar ainda mais, Timothy não tinha certeza do próximo
passo que deveria dar: atacar o que restava dos Steelhearts ou continuar buscando
ganhar a confiança do atual líder.
Timothy ponderava sobre todas essas questões em sua modesta sala de estar na
Cidade Média. Sua camisa social branca estava jogada no chão, enquanto a gravata
descansava sobre o sofá. Sem camisa, ele se sentava no chão com as costas
apoiadas na parede. Com um cigarro entre os lábios, ele acendeu-o com um isqueiro
prateado. Fechou os olhos como se entrasse em transe, buscando uma nova linha
de raciocínio que pudesse ajudá-lo a lidar com o novo cenário.

Duas horas depois, Tim encontrava-se caído no chão. O que restava do cigarro
estava jogado ao seu lado, junto com o isqueiro. Ele era apenas um homem comum,
que após três dias sem dormir, havia perdido a batalha para o sono. O som de
batidas consecutivas na porta do apartamento o fez despertar, e ele se levantou
com a mão direita sobre o rosto. Caminhou até uma mesa no canto da sala, abriu a
gaveta e pegou uma Beretta 9mm preta. Ao olhar pelo visor localizado na lateral da
porta, ele avistou Rose do lado de fora. Com isso, destravou a fechadura magnética
e abriu a porta.

— Muito bem, abriu a porta com uma arma na mão, como eu te ensinei. — Ela entrou
com uma maleta na mão direita, sentou-se no sofá e colocou a maleta na mesa de
centro.

— O que é isso? — Perguntou Tim, enquanto colocava a pistola de volta na gaveta.

— Tive que cobrar alguns favores dos meus antigos colegas que cederam a
Paramilitech, é basicamente tudo que eles têm sobre a guerra nas ruas, acho que
poderíamos tirar alguma vantagem disso. — Rose falou, abrindo a maleta, que
possuía vários envelopes com folhas de papel dentro.

— Não esperava algo tão arcaico da Paramilitech. — Tim falou, referindo-se aos
arquivos impressos em papel, algo que poucas pessoas faziam atualmente.

— Soube que casos grandes que estão em andamento eles estão utilizando papel,
um mecanismo de segurança contra hackers. — Ela começou abrir os envelopes,
jogando todos os arquivos sobre a mesa.

A dupla havia lido todos os arquivos relacionados à crescente violência nas ruas,
decorrente do conflito entre as principais facções criminosas de Miraitropolis. Após
a leitura do último documento, Tim jogou-o sobre a mesa de centro e soltou um
suspiro. Seu olhar havia mudado, revelando uma nova determinação. Agora, suas
ideias estavam claras e um novo caminho se abria diante dele.
— Vamos usar a Paramilitech como parte do nosso exército. — Disse Timothy,
encarando Rose.

A ex-policial não entendeu o que ele quis dizer, apenas o olhou com uma expressão
de dúvida. — Tudo indica que eles estão perdidos, precisam de um cristo para
crucificar antes que a opinião pública, começa ir contra eles. – Rose relaxou as
costas no sofá, sorrindo.

— Então entregamos um cristo para Paramilitech e ao mesmo tempo eliminamos


um obstáculo, correto? — Timothy se levantou do sofá, caminhando até a janela do
apartamento.

— Ainda tem contato com a tenente? — Um sorriso sacana surgiu no rosto de Rose.

— Quando ela tá cheia de trabalho, cansada e carente resolve me ligar. — Timothy


virou-se para sua fiel aliada.

— Então contate ela, temos nossa próxima jogada.

Kat
Em poucos instantes, a recém-nascida I.A. alcançou o perímetro do mundo virtual. O
local era envolto em escuridão, como se estivesse vagando pelo mais profundo
vazio. Sua imagem ali era distorcida, como se estivesse fragmentada, algo que a
dupla havia testemunhado anteriormente. Mesmo sem presenciar exatamente o que
CABAL estava vendo, eles mantinham seus olhos fixos na tela de monitoramento,
onde dados caíam como cascatas e letras, códigos e números atravessavam a tela.
No centro, uma silhueta transparente de um rosto permanecia fixa, enquanto CABAL
se pronunciava:

A pequena Fratura Independente do meu sistema alcançou a região do ciberespaço


contaminada... O Vírus Shadow esta afetando esta Fratura de uma forma que eu não
esperava, o sistema não consegue alcançar os Protocolos de Defesa do Olimpo...

(Cyrus) Não! Isto está se tornando perigoso demais!

Não há o que temer, Cyrus... Esta audácia primitiva está longe de ser uma ameaça
ao meu mainframe, a parcela que enviei ao mundo cibernético opera numa fratura
estilhaçada do meu sistema que não possui vínculo comigo diretamente... É como
se eu controlasse um pequeno brinquedo por controle remoto. Eu precisarei apenas
de um pouco de... Criatividade, para contornar a situação.
Voltando a focar exclusivamente no evento, a Fratura de CABAL, apesar de estar
envolta pelo vírus, ainda guardava algumas surpresas na manga. Um brilho se
formou em sua "testa" e cerca de cinco feixes de luz se projetaram em várias
direções, formando imagens de torres imponentes, mesmo para as desproporções
do ciberespaço. Essas estruturas possuíam, em suas bases, algo que parecia ser
geradores. E então, o Avatar da I.A. surgiu acima das imagens de Praxis e Shadow,
depois que a outra figura propôs uma união. E sobre os dois, uma voz cibernética, de
tom abafado e quebrado, disse:
Shadow, não pense que suas ações são triunfantes, você... Nem ninguém realmente
possui crença que tudo o que habita este mundo, menos nós, é claro... Não passa de
um amontoado simples de números... Seu tão aclamado Vírus para mim não passa
de simples montante de códigos, que da mesma maneira que foram concebidos,
podem ser desfeitos...

As torres agora emitiam um brilho intenso que se culminava numa espécie de laser
indo para o alto. O "chão" onde tocavam agora parecia dissipar aquela massa negra
que estava se apropriando deles, e vagarosamente acontecia o mesmo com o "teto"
dali, a gosma parecia ir desaparecendo lentamente, enquanto CABAL operava como
o coração daquele grid de "antivírus".

Veja, como os pilares que construí operam numa codificação fora dos parâmetros
de onde o seu vírus opera. E agora iniciam um protocolo de desmantelamento do
DNA puro do que seu vírus é. Veja os números e letras se tornaram apenas um zero
único e constante. Praxis, eu creio que sua constituição seja capaz de lidar com este
humano simplório enquanto eu realizo meu trabalho, preciso de apenas alguns
momentos para desfazer toda essa bagunça. Mantenha ele longe dos
decodificadores!

Cabal rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 13 para não ser hackeado que
resultou 8 - Total: 0 Sucessos

Gabriela vulgo Rodrigo


Eu consegui dobrar o Boris. Por um pouco de sorte, mas também graças aos meus
talentos únicos e à perversidade do cara. Não seria o primeiro a realizar fetiches
obscuros. Só precisava me esforçar para que ele não fosse o último, ou seja, ficar
vivo. Porém, as coisas não seriam tão fáceis como eu supunha... Mesmo livre das
correntes arcaicas, eu ainda estava preso dentro do cubículo. Estava apreensivo pra
caramba, mas tentava não expressar esse sentimento.

Enquanto aguardava - eu me encontrava em pé, em um corpo feminino, pressionada


contra a parede atrás de mim - esperando que Boris reaparecesse, pensava em
maneiras de escapar dali. Não havia janelas nem ventilação. Comecei a suar, tanto
de nervosismo quanto pelo calor sufocante. Ainda não chegava a sentir falta de ar,
mas a ansiedade me deixava um pouco sem fôlego. Meu tórax... Ou melhor, meus
generosos seios, moviam-se conforme eu respirava ofegante.

Não demorou muito para que a porta fosse aberta abruptamente e ele entrasse,
trazendo consigo dois seguranças como armários. Mas o que um deles trazia
consigo era meio... perturbador. Frank estava desacordado, sendo carregado como
um boneco. Boris o colocou na cadeira e, em seu sadismo, me ofereceu uma faca
para que eu retalhasse o cara que me traiu, há algum tempo que não consigo
precisar, e depois o matasse.

Não vou negar que senti uma certa raiva quando acordei, mas depois deixei passar.
Ele estava apenas tentando se salvar, assim como eu. Permaneci imóvel no canto
onde estava, com os braços cruzados sobre os seios, tentando segurá-los e não
demonstrar minha aflição. Poderia simplesmente fazer o que eles diziam ou pegar a
faca e tentar uma fuga suicida. Suicida porque dois daqueles homens estavam
armados.

— Você quer que eu o torture e o mate para provar a minha lealdade? É isso,
benzinho?

Havia essas duas alternativas. Seguir como um capacho ou tentar fugir. Calculei
mentalmente. Eu poderia acertar uma facada em um dos seguranças, me
transformar em uma criatura pequena - uma criança, por exemplo - e tentar escapar.
Mas eu não sabia onde estava, a probabilidade de ser pega era muito grande. O
caminho mais fácil seria fazer o que eles diziam.

Porém, mesmo que uma parte de mim estivesse quebrada com o assassinato de
Alek, eu não queria e nem podia matar Frank. Mesmo com a traição desse maldito.
Por isso, permaneci imóvel onde estava. Não sabia quanto tempo havia passado
durante toda essa minha reflexão no mundo real, naquele cubículo, mas esperava
que fosse pouco. No entanto, cheguei à conclusão, relembrando momentos
passados, que muitos homens como Boris, que eu havia contornado instantes atrás
através da sedução, também precisam ser tratados com firmeza. É por isso que
muitos deles até gostam de BDSM. Portanto, enxerguei naquele momento a
oportunidade de me impor, e decidi não escolher nenhuma das alternativas que me
eram oferecidas.

— Desculpa, benzinho, mas eu não gosto de testes. Eu não vou matá-lo. Mas
também não vou bancar o herói e te impedir. Fica a seu critério. Honestamente, não
é isso que provará minha lealdade a vocês. Minha lealdade será se vocês não me
mandarem numa missão suicida sem suporte algum, como os latinos babacas
fizeram. Posso ajudá-los como quiserem, desde que me paguem e não me
coloquem em enrascadas sem saída, como os outros fizeram. Se assim for, podem
usar meus poderes como quiserem.

As cartas estavam lançadas. Havia grandes chances deles se revoltarem, mas


enfim. Mal ou bem, minhas habilidades eram únicas em Mirai - não conhecia outro
mutante que tivesse algo semelhante. Se me matassem, eles perderiam uma arma
valiosa. Por isso, os encarei, mas sem expressar superioridade, apenas seriedade.
Não ia brincar com a sorte também.

Pollux
Noite tensa aquela, mas eu não aceitaria sair do cemitério menos do que satisfeito.
Nunca precisei falar firme com alguém, ameaçar ou colocar alguém contra a parede,
vi que no fundo algo em mim estava mudando e finalmente, depois de tantos meses
após a minha jornada finalmente começar, eu estava me tornando outra pessoa
dentro de mim mesmo. O vulto nas sombras continuou a cruzar o cemitério... sentia
lama e água suja debaixo dos meus pés espalhando ao menor passo, sentia vontade
de voltar para casa ou parar para comer algo mas ainda havia muito a ser feito.
Dentro do sobretudo vejo uma luz se acender oriunda do meu braço, percebo que é
uma chamada da qual eu ainda não esperava tão cedo. É incrível quando você
começa a fazer a coisa certa para você naquela cidade, parece que o caminho
adiante se desdobra e as portas vão se abrindo, bastando você estar dentro do
destino reservado para você, seja lá por quem ainda o guarde. De uma certeza eu
tive quando sorri com o canto da boca ao perceber a próxima oportunidade que me
abria, eu estava no momento e no lugar que eu sempre deveria estar. Não tinha a
menor ideia daquilo dar certo ou não, mas uma vez ou outra na vida, é bom fazer o
que é correto. Eu estava me acostumando rápido a isso.

Eu não sabia contar quantas vezes eu fui claro a Joe para não abrir a boca, e com o
gravador que havia dado a uma das minhas garotas favoritas na boate, tinha certeza
que poderia manter meus olhos bem colados no líder Steelheart de longe, mas eu
não achava que seria preciso. Acho que finalmente havia decidido que confiar em
mim era apenas um pouco menos pior do que morrer. Ao mesmo tempo eu tinha
cada vez mais gente dependendo de minhas ações, era uma responsabilidade que
eu não gostava de correr mas precisava assumir. Joe, Calidora, e até mesmo o pobre
Timothy. Quer dizer, eu poderia estar no lugar dele, eu poderia ser ele quando toda a
tragédia aconteceu. Timothy só teve muito mais a perder do que eu e apelou para
um frio ódio para tentar achar um culpado. Era compreensível, ainda que não fosse
certo o que ele estava fazendo. Da mesma forma que ele havia perdido a família e
agora estava tentando achar os culpados, eu por outro lado só estava tentando
defender a minha. Antes de mais nada eu precisava de aliados, e eu não precisava
ser muito seletiva para isso, nem poderia também. Os laços hoje nas ruas estão
cada vez mais hostis e os que ainda não se envolveram nessa guerra não tem mais
o mínimo de interesse em fazer isso. Por isso fui atrás de Coltraine. Era um homem
que sabia ficar quieto e sabia desaparecer quando necessário, além do mais,
mesmo contrariando Calidora ela concordou que era uma aliança que, se possível,
também seria necessária. Concordamos em deixar o acontecido com a cybertropina
para trás como dois bons cavalheiros e receber um ao outro novamente, do zero.
Confesso ter ficado surpreso quando ele honrou o acordo, não poderia saber que ele
teria peso com suas palavras mas no meio daquele inferno certa ordem ainda era
mantida pelo homem de vários implantes. Um homem que prosperava no caos, era
exatamente isso que eu almejava ser, como todo bom oportunista.

— Sei onde te encontrar. Você que me aguarde. Não foram poucas vezes que eu
estive no Submundo, nem agora e nem antes, sempre tive meu trabalho me metendo
até os joelhos na sujeira da cidade, não era um estranho a parte mais boêmia e
luxuriosa da cidade, para dizer dela com o mínimo de educação. Era uma latrina de
pecados para alguns, um caça níquel para outros e a diversão para muitos outros.
Para mim, era os três, às vezes ao mesmo tempo e às vezes um de cada vez. Ossos
Cruzados não tinha nem uma fama nem qualidade boa, mas tinha algo típico de
Miraitropolis ali dentro. Não sabia dizer se eram os clientes, as músicas, as drogas
ou o comércio, havia infelicidade e vícios também, mas para alguns era somente
mais um tempo perdido esquecendo que no segundo seguinte poderiam morrer. Era
parte da cultura de Miraitropolis de tentar viver todo último segundo não se
arrependendo do anterior e você não a vive de verdade se não está dentro dela.

Era fácil ver uma tristeza latente por trás daqueles olhos apesar do vício e do sexo
barato, era como um bandaid sobre uma hemorragia, mas o que mais poderia se
fazer? Ser contra um lugar destes é tirar o pouco de diversão que algumas pessoas
ainda podem ter, mesmo que isso signifique, por outro lado, a exploração de tantas
outras. Como um conhecido de tais lugares, eu tentava não pensar muito sobre isso
e costumava deixar a boate em paz quando ainda trabalhava para o Canal, pisar de
novo em um lugar familiar a mim era uma sensação amarga e reconfortante ao
mesmo tempo.

— E ele não me disse nada sobre você. Vai ver ficou com ciúme. Tentei ser agradável
e charmoso para a mulher que me recebia, ainda que profissional tanto quanto
poderia também. Como sempre meus ouvidos foram sendo preenchidos com a
música alta quanto mais para dentro da boate eu caminhava, mais os gritos de
êxtase e o barulho de metal amassado ia crescendo até se tornar uma trilha sonora
tão grande que nem meus pensamentos tinham um volume tão alto. Resmungos
violentos também eram ouvidos cada vez que eu esbarrava em alguém tentando
passar de pessoas para as quais a bebida e o sexo ainda não são o suficiente e
precisam procurar briga. Meus olhos brilhavam com os refletores de luz intensa que
era jogada em toda a boate, até encontrar o trono de onde Coltraine comandava
tudo. Lá tudo parecia mais abafado, e quase pude ouvir a sua voz sem me esforçar
demais pra isso. Tomei o seu convite com um sorriso no rosto e apertei sua mão
firme antes de começarmos.
— Então, o que achou do meu novo palácio? Coltraine sabia se manter acima de tudo
e todos, enquanto eu tentava me manter com um perfil baixo, passando debaixo do
radar dos outros.

— Uma maravilha. Fico contente que tenha aceitado me ouvir.

— Me mostre o que você disse que traria.

— Está tudo aqui. Os planos que você está recebendo são os mesmos que discuti
com Calidora. Pode imaginar o que ela disse sobre isso mas já passou por coisa
pior. Da roupa eu tirei mais um holograma que se desdobrou em um relatório como o
que tinha entregue ao Montana antes de ver Calidora no hangar com o armamento
contrabandeado. Coltraine virou-se de lado e começou a ler concentrado e só depois
de um tempo ergueu-se do sofá e foi para a parte mais espelhada do camarote,
onde ele podia ver lá embaixo o gladiador que duelava com o robô. Ainda dava para
ver seu reflexo lendo as páginas e percebi como tinha começado primeiramente pela
página dos custos e gastos.

— Então, o que é que você acha? O suficiente pra ter a sua colaboração? Não
esperava que daria no que deu, mas quando cobrei sua resposta ele se virou para
mim ainda com um semblante pensativo e bateu com o dedo no arquivo, quase
como se fosse me devolver.

— Pollux, minha resposta é não. Você não pode estar achando que isso daria certo
no atual estado das coisas aqui na cidade. Coltraine tinha um olhar sério ao mesmo
tempo que aquele mesmo jeito sarcástico de fazer negócios. Eu não entendi e me
levantei também, franzindo as sobrancelhas.

— Eu estou cansado de ter que lutar uma guerra dos outros com armas dos outros.
Olha, essa é a primeira oportunidade que temos de lutar de igual pra igual com
essas pessoas, sei que ainda tem laços com a Telford e que isso o comprometeria,
mas há mais do que apenas lucro pra você nessa empreitada.

— Eu sei que tem. Veja Pollux, o problema é que você está me apresentando um
modelo de negócios que destrói outro que eu já tenho. Você quer destruir Telford e
K'dore, e em troca se eu aceitar a sua proposta eles destroem você. Além do mais, o
que você propõe é exatamente tentar atacá-la frente a frente. Não é diferente do que
atirar um molotov contra os robôs de segurança da Carmen. Tem ideia do quão
rápido eles cairiam sobre você se descobrissem que você tem uma emissora? Você
não sobreviveria nem aos advogados dela.

— É o momento perfeito. Com todo mundo ocupado demais com a Paramilitech


ninguém vai ver outra empresa surgir. Todo mundo está fragmentado, ocupado
lutando contra algo.

— A partir do momento em que você der as caras, todos vão se unir contra você. Ele
passou o dedo contra um dos implantes na cabeça como se os coçasse, e voltou a
falar comigo após um breve silêncio. — Você não pode bater de frente contra
Carmen, e eu não posso apoiar o seu negócio se for do mesmo ramo que ela, pois
irei perder um ou outro de qualquer jeito. Você sabe qual é a solução. Vá para a
Lexis.

Eu esperava demais daquela negociação, mas era tolo de esperar que Coltraine
simplesmente desse sim assim tão fácil. Eu odiava admitir, mas o homem era
esperto e não era a primeira vez que ouvia aquela sugestão. Tentei falar algo mas
apenas mordi a boca e pensei mais antes de continuar a conversa. Calidora havia
dado sinais de que também teria essa ideia em mente ao invés de montar uma
emissora do zero, simplesmente porque era com o que estávamos mais adaptados
e porque, no fundo, ainda era meu sonho sentir-me no topo como antes eu estava.
Não é fácil quando você é confrontado com o fato de que sua ideia vai te levar para
a morte, por mais sedutora que ela seja. Eu sabia que Coltraine dizia a verdade, só
não queria aceitá-la. — Televisão é tudo o que eu sempre soube fazer, que sentido
faz se não atacar Carmen dentro do próprio jogo dela? Isso não tem nada a ver
comigo.

— Achei que isso se tratasse sobre a verdade, não sobre você. Se você atacar ela
dentro do próprio jogo, você vai perder. Você e todo mundo que arrastar para essa
ideia. Ele me acordou do meu egocentrismo de uma maneira bem direta, mas eu
precisava disso. Sentei novamente no sofá e apoiei os cotovelos sobre os joelhos,
olhando para o espaço entre eles enquanto Coltraine falava. — Você quer jogar um
jogo onde as regras não são justas, e quem as faz é o seu oponente. Se você quer
que a verdade seja livre, os meios dela também precisam ser. Na Lexis você pode
fazer suas regras, replicar seus documentos quando forem derrubados, fazer ser
realmente ouvido, você não conseguiria nem um sinal tão grande assim para uma
emissora de televisão, a menos que consiga ir para o espaço junto dos satélites de
Carmen. E eu posso me manter anônimo. Essas são minhas condições.
É, para alguém que buscava tanto a verdade eu a aceitava bem mal. Era amargo,
mas eu precisava aceitar, ter comigo tantos conselhos contra meus ideais era quase
um atestado contra minha competência, mas quando parei de ver tudo com uma
lente pessoal demais comecei a ver a razão por trás de um labirinto de fatos. Claro,
eu sabia o mínimo sobre sistemas eletrônicos para me virar, nada comparado a
Calidora mas era um caminho que deveria traçar. Menos confortável e que pediria
mais empenho, mas o certo. Não fazia meu estilo, mas ir atrás da verdade, ou pelo
menos da sujeira certa, isso fazia. — Se eu conseguir um sinal forte o suficiente para
aplicar essa ideia dentro da Lexis, você nos apoiaria?

— Um site requer uma emissão bem menos exigente do que um canal, é verdade,
mas exige um banco de dados do tipo que eu sei que vocês ainda não tem. Como
pretende arranjar um?

— Com isso, não se preocupa. Eu sei exatamente onde procurar…

Galathea
— Alô? Algo errado?

William colocou o hamburger de volta sobre a mesa enquanto engolia a mordida


sem mastigar. Se engasgou no processo e bebeu rapidamente a cerveja enquanto
tentava se manter atento às suas ordens.

#Sim. Estamos sob ataque aqui no Olimpo. Prepare a centúria, talvez precisemos de
uma extração. Profissional.#

— Qual o nível de resistência?

#Só prepare a centúria, William. E espere meu comando. Eu quero vocês prontos pra
uma “blitzkrieg”.#

— Certo… Eu vou entrar em contato com os rapazes… Chefe? Chefe!?

O mercenário não ouviu nada além de uma voz vazando pelo comunicador de
Galathea dizendo “É um dos drones de segurança…” e sons de disparos.

— Estamos dentro? — Perguntou Jesus.

— Até as bolas. A ordem é equipamento completo. Quero todo mundo pronto pra
rodar em 120 segundos.
Os homens se levantaram da mesa e assentiram, ligando todos os seus
comunicadores para transmitir as ordens aos seus companheiros armados
espalhados pela cidade.

No corredor, Galathea foi surpreendida em meio à sua conversa pela entrada do


drone. Shae a puxou para dentro da cobertura da porta. Os projéteis acertaram as
paredes do corredor, ocasionalmente ricocheteando no concreto e indo além. Sorriu
orgulhosa ao ouvir a confirmação de todos os seus soldados de que estavam em pé,
logo antes do contra-ataque iniciar.

Não havia muito trabalho a ser feito. Era um corredor reto e a Uroboros estava
devidamente entrincheirada. Nem mesmo um exército passaria por ali. Era o tipo de
cenário que transformou todas as batalhas urbanas da história da humanidade em
um moedor de carne. Era o tipo de combate para o qual eles haviam sido
doutrinados por Galathea. Afinal, era o único tipo de combate que existia em Mirai.

Os tiros dos fuzis ecoaram, atingindo o drone. Os primeiros projéteis destroçaram os


impulsores da máquina. O drone caiu, sem meios de sustentação, mas mesmo no
chão ainda tinha ângulo e continuou atirando. Os homens de preto não pararam de
disparar, mesmo com o drone também atirando contra eles. Só cessaram quando o
drone começou a emitir fumaça, desligando.

—Tony tem algum drone mais perigoso que isso por aqui? — Perguntou Galathea
ainda irritada.

O guia meneou positivamente com a cabeça.

— Maravilha…

-Que houve, Gal? - Perguntou Shae enquanto recarregava sua shotgun automática. A
arma icônica era sua favorita.

— Eu imaginei que os soldados do Tony pudessem segurar as escadas. Até uma


criança poderia. É um espaço confinado que afunila qualquer força atacante. Um
prédio é uma fortificação natural, tanto que…

— Nas guerras, tropas inimigas se aquartelam e dormem no mesmo prédio com uma
linha de frente vertical. — Seu sócio a interrompeu — Eu sei. Eu co-escrevi nosso livro
da guerra. Está preocupada que os homens de Tony estejam sendo atacados pelas
costas pelos próprios drones? É isso?

Galathea assentiu com uma feição sombria.


— Se é o caso eu espero que ele tenha cartas na manga.

— Na verdade eu estava mais preocupada se devia ou não descer. Poderíamos ir


andar por andar, matando todos os drones até chegarmos à linha de frente. Tony
parece que quer fazer o inimigo vir até aqui e resistir até o fim no escritório. Eu não
gosto dessa perspectiva.

— Não gosta de estar cercada.

—Uhum.

— A decisão é sua… chefe.

— Seu merda. Às vezes eu penso que me deixou liderar a Uroboros só pra não ter
que fazer as decisões difíceis.

Shae apenas sorriu e deu de ombros. Galathea respirou fundo algumas vezes.

— Vamos avançar! Com cuidado e atenção. Varredura completa em cada andar.


Cadência acelerada.

Os mercenários saíram de suas coberturas avançando pelo corredor. Metade em


cada lado, tocando a respectiva parede.

Eles se moveram rapidamente e em silêncio. Logo no andar abaixo, outro drone


estava cercado por três corpos. Foi abatido com alguns disparos. Nenhuma palavra
foi proferida pelos homens de preto. Gancho tentava segui-los de perto da melhor
forma que podia, enquanto eles desciam as escadas em direção a outro andar.
Desceram aproximadamente cinco andares rapidamente, sem mais nenhuma ação.

Uroboros rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 14 para defender-se do drone que
resultou 16 - Total: 1 Sucessos

Anthony Montana
— Olha essa merda, porra, olha isso, droga!! — Apontava para Jonah, destroçado no
carpete do escritório, com muito sangue, vísceras e tripas espalhadas. — Isso não se
faz! Não se faz mesmo! Covardia tem limite! — Trinquei os dentes.

— Calma, Sr Montana, Jonah morreu defendendo seu legado. — Falou Jesse me


consolando.
— Que se foda o Jonah, eu tô falando do tapete persa, caro pra caralho, miolos
mancham, essa merda não vai sair nem fodendo! — Respondi irritado.

— Eu pensei que… — Puxei Jesse pela camisa, o obrigando a se abaixar.


— Mas que bosta, tá querendo levar um tiro na cabeça também? Se abaixa! — Fiz
com que ele ficasse agachado ao meu lado, atrás da mesa.

— Obrigado, Senhor Montana. — Ele sorriu.

— Não agradeça, fiz pelo tapete, mais uma mancha dessas e vai sair os olhos da
cara a limpeza! — Jesse fez uma expressão descontente.

Entreguei a ele uma arma, uma Uzi e muita munição. Não perguntei se sabia usar
aquilo, pois se não sabia, ia aprender, os melhores soldados são forjados no calor da
batalha. E se não aprendesse significava que não era um bom soldado e como uma
seleção natural ele morreria ali mesmo.

— Akane deu aquela mãozinha típica dela, adoro isso nessa garota. Pega a vaca
como garantia, Vladimir! — Gesticulei com a cabeça em direção a filha de Yuric. O
velhote ordenou que um dos seus soldados segurasse Margareth e o mesmo se
posicionou perto de mim.

— Russos, por mim eles que se explodam, mas essa puta é importante até o
momento. — Comentei abaixado, esquecendo que Vlad também era russo, mas
foda-se.

Já ele se armou até os dentes, a única coisa que acrescentei ao meu arsenal foi
mais munição. Essa gente da Paramilitech é sempre muito bem preparada. Calado,
(talvez tenha ficado magoadinho quando mencionei os russos) Vlad seguiu logo
atrás com a equipe de Galathea, deixando-me para trás. Não que me importasse,
todo mundo sabe que eu me viro muito bem sozinho e estou disposto a sair vivo,
mesmo que isso custe a vida dele, dela e dos seus amiguinhos. Com toda aquela
confusão e a dificuldade que a Oroboros enfrentava, o velho russo casca grossa
silenciosamente retirou do seu colete balístico uma série de bugigangas estranhas e
as jogou no chão do corredor. Eram uns aparelhos pretos, quadrados, com luzinhas
vermelhas que não paravam de piscar. Tecnologia avançada da Paramlitech, algo
que eu simplesmente não entendo, então apenas observo. Enfim, o velho espalhou
essas coisas. Eu não estava entendendo nada até o momento em que ele entregou
duas unidades para a morena tesuda da Oroboros e finalmente decidiu explicar do
que se tratava tudo aquilo.
— Isso são aparelhos de P.E.M. Se um drone ou qualquer outra máquina controlada
tentar avançar automaticamente será desativada. Espero que seus soldados não
dependam de alta tecnologia ou o que tiverem também serão desativados. Tome
alguns desses e faça bom uso daqui em diante. O meus vão garantir a segurança de
Tony, mas meus homens vão espalhar pelo caminho alguns outros para que você e
sua equipe trabalhem em segurança. — Vlad novamente fez um sinal com o
indicador, ordenando que alguns homens encapuzado e de farda preta se
espalhassem pelo corredor, escadarias e demais dependências do Olimpo, grudando
nas paredes, corrimãos, degraus, quadros e estátuas gregas aqueles pequenos
aparelhos negros que piscavam em luz escarlate.

— Não se preocupem mais com os drones. Se atravessarem o perímetro do sinal


dos aparelhos, eles perderão toda e qualquer utilidade. — É, esse velho é foda.

Vlad e seus homens tomaram a frente, cada um deles com um aparelho maior preso
ao peito, fixado no colete militar. Eles davam escolta para a Oroboros, ampliando o
raio do P.E.M. e desativando drones ou qualquer porcaria lixosa que fosse
comandada como a merda de um robô. A partir de agora só precisavam lidar com o
fator humano. Mas esse facilmente poderia ser combatido e derrotado com balas e
boa estratégia. E isso, a bosta de treinamento da Paramilitech tinha, assim como a
Oroboros.

— Nós aqui dentro só precisamos nos cuidar com as malditas janelas. Mirem em
qualquer coisa que se mover do lado de fora, não vamos dar mole e nem facilitar.
Tem um atirador de elite em algum ponto, talvez um prédio vizinho. Fiquem atentos!
— Ordenei aos meus homens que ficaram no escritório, apontando minha arma para
as janelas.

— Querida, vá ao nosso quarto e veja do circuito interno o lado de fora do topo do


prédio, talvez consiga localizar esse viado arrombado do atirador em algum dos
edifícios a volta do Olimpo. E se tiver alguma outra ideia, não hesite em executá-la.
— Dei um tapinha na bunda da ruiva, pedindo esse favor a Akane.

Gal Bordeaux
Até aquele momento todas as ações de Gal obtinham sucesso. Porém, como em
tudo na vida, um obstáculo surgiu. Um homem negro empunhando uma espada
surgiu em sua frente. Pela maneira como ele falava e se portava, bem como os
outros invasores pareciam respeitá-lo – dando espaço aos dois, embora ela não
quisesse encontrar-se a sós com ele (pelo menos não nessas condições) – ele devia
ser o manda-chuva daquela operação. — Um biomodificado por aqui, não esperava
por isso. — Ele se manifestava. Impunha sua presença contra a mulher. Ainda assim,
ela não se intimidava. Ou fingia que não. Sorria ao mesmo tempo ironicamente e de
maneira sedutora. — Tem muitas coisas por aqui que você não espera, querido.

— Você possui uma habilidade interessante, pena que posso enxergá-la, agora resta
saber se posso cortá-la. — Mais uma vez ele se manifestou. Mas dessa vez, não
houve tempo para respostas imediatas. Isto porque o espadachim partiu para cima
da mutante, visando cortá-la. Mesmo não sendo um ás da estratégia de combate ou
uma leitora ávida de livros de guerra – sequer era uma ávida leitora de qualquer
coisa –, não seria difícil presumir que sendo o inimigo quem aparentava ser, não
portaria uma espada qualquer.

Por isso, agora ciente que não era mais “invencível” como pensava ser, ou pelo
menos, “impegável”, a loira fez o que qualquer ser pensante faria: fugiu. Naquele
andar, o térreo, havia uma quantidade relativa de corredores que levariam para os
elevadores e outros lugares que Bordeaux sequer teve oportunidade ainda de
conhecer – mas esperava ficar viva o suficiente para explorar com calma. Procurou
a rota mais perto de si e correu para ela.

Não adiantava ficar invisível; segundo o espadachim dissera, ele podia vê-la de
algum modo, ou através da tecnologia dos óculos que portava, ou era também um
biomodificado. Mas ela não queria que ele não a visse. Queria que ele a seguisse,
inclusive. Assim, enquanto corria, virou-se para trás, e responderia a segunda frase
pronunciada por ele. Sua voz saiu um pouco mais alta e até abafada, por causa dos
movimentos de corrida que fazia. Justamente para que ele seguisse sua voz. —
Ainda quero ver você me cortar com essa espada, vem! — Gargalhou, passando por
um outro corredor.

Assim que chegou a este, pôde perceber que havia uma quantidade considerável de
homens de Montana. Eles empunharam suas armas contra ela, mas ainda sorrindo,
ela ergueu os braços, o que fez com que a jaqueta se movesse um pouco para os
lados e exibisse o tronco ainda desnudo, desde antes, atraindo a atenção destes. —
Estou do lado de vocês, rapazes. Funcionária recém-contratada pelo Sr. Montana.
Mas tem um rapaz que está me seguindo que não deveria estar aqui. — Ela falaria,
contando que o sicário a teria seguido até ali.

Caso o plano de tê-lo atraído fosse bem sucedido, este chegaria até o local, tão
surpreso como ela mesmo esteve instante atrás, deparando-se com aquela
quantidade considerável de homens de Montana. Antes mesmo de qualquer tipo de
explicação, Gal usaria suas habilidades especiais para ficar intangível e atravessaria
o chão logo abaixo de si, ficando “imersa” neste. Isto para que o campo de visão dos
soldados ficasse completamente livre, avistando Hurt, e assim disparassem
efetivamente contra o homem, transformando-o em peneira.

Tecnicamente a investida ofensiva não partiria de si, e sim dos homens de Montana.
Isso, claro, se Hurt a seguisse. Mas dado o substantivo que o classificava, o algoz
sedento de sangue dificilmente se recusaria a segui-la, ainda mais sendo ela, para
ele, uma presa frágil, já que sua espada poderia facilmente abatê-la. Se a investida
fosse bem sucedida, talvez a equipe de invasão acabasse por ficar desestabilizada,
uma vez que o homem em comando estaria morto – ou pelo menos ocupado
brincando de gato e rato com a loira.

Gal rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 13 para fugir do ataque de hurt que
resultou 14 - Total: 1 Sucessos

Akane
Akane rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 10 para achar e ferir o atirador que
resultou 15 - Total: 1 Sucessos

Todos que me viam ali, no canto do escritório, poderiam dizer que eu não estava me
importando com o que estava acontecendo. Por que eu iria pegar uma arma e sair
correndo atrás dos invasores? Eu não vejo lógica nisso. Se há peões para fazer o
trabalho, não é necessário que a rainha o faça. Ela não tem a responsabilidade de
proteger os bispos, torres e cavalos. O único objetivo dela é proteger o rei. Eu sabia
quantos estavam invadindo, meu sensor era poderoso. Suspeitava que nosso
sistema estava sendo hackeado, pois foi fácil para eles cortarem a energia e não
tínhamos resposta dos drones e robôs.

Mas então, por que eu estava parada de braços cruzados? Simplesmente porque
nenhum ataque tinha sido direcionado a mim e eu não conseguia tirar os olhos da
loira russa, desejando ardentemente a sua morte. Eu não reagi à morte de um dos
peões, ou será que ele era uma torre? Não importa! Todos aqui nesta sala estavam
em perigo. Eu não pude evitar rir da ira do meu amado em relação ao tapete persa,
era adorável ver esse lado dele diante de objetos caros que ele gostava. Mas antes
de pensar em qualquer coisa, veio o pedido dele, que soou bastante excitante,
semelhante ao tapinha dado na minha bunda. Em resposta, pisquei para ele e segui
em direção àquela sala.

—Vou levar uma amiguinha para saciá-lo…. — Falei divertida com a situação.

Mas antes, passei pela sala secreta e peguei um dos melhores rifles para me
acompanhar na missão. Minha percepção, que agia como um radar, era suficiente e
seu alcance abrangia uma parte dos prédios ao redor. Era uma questão de sorte se
ele estaria ao meu alcance ou não. Depois de destravar e carregar o rifle, dirigi-me
ao quarto. Ao contrário do nosso quarto no casarão, este era pequeno e básico,
localizado na cobertura do prédio e era a única saída para o circuito interno. Eu
precisava me posicionar adequadamente no topo e me camuflar no telhado. Era
fácil, vesti roupas pretas e o lado de fora também era escuro, só precisava esconder
o vermelho do meu cabelo com uma touca da mesma cor. Após concluir os
preparativos, posicionei-me no telhado, ao lado dos maquinários do prédio, focada
em encontrar o desgraçado que estava matando nossos homens. Não demorou
muito para detectar seus movimentos cautelosos ao recarregar sua arma, bem nos
limites do meu radar. Era apenas uma questão de mirar e matá-lo rapidamente. Fazia
muito tempo desde a última vez que usei tal arma, e fazer isso sem chamar a
atenção de ninguém era tedioso. Assim que me senti pronta, disparei duas vezes,
um tiro mirando no coração e outro na cabeça.

Assim que concluí o trabalho, retornei ao quarto. Acha que eu iria ficar por aí,
exposta a qualquer um? Quando me deparei com a cama convidativa, não resisti e
me deitei nela. Admito estar cheia de preguiça desde que acordei. Odiava invasões
como essa, apenas covardes atacam em grupos. Decidi descansar um pouco,
embora permanecesse atenta ao meu redor, caso outro idiota de sniper aparecesse.
Não tinha mais truques na manga, não sou uma hacker para neutralizar drones
hackeados. A única coisa que conseguia fazer era paralisá-los. O lado ruim disso era
que meu nome seria anunciado em cada andar do prédio, já que aquela música
irritante soava para todo mundo. Como meu programador faleceu, não encontrei
ninguém capaz de modificar aquilo... E nem era realmente necessário.

Mas a dúvida dava pontadas: paralisar todos os robôs e drones ou não?

Nem todos os russos sabiam da minha existência e se souberem, minha cabeça


estaria a prêmio para acabar com Anthony Montana…

Narrador Capítulo 8
A batalha no mundo virtual pelo controle do Edifício Olimpo começou a tomar novos
rumos. X-9, aliada a Praxis, fez uma jogada arriscada, porém, de certa forma, efetiva.
O vírus shadow, controlado pelo hacker Darkness, passou a devorar cada cópia
criada por Praxis em uma ação frenética e inútil. A inteligência artificial CABAL
também fez seu movimento, um contra-ataque que trouxe outro desafio para
Darkness. No entanto, nenhum deles obteve total sucesso em suas respectivas
defesas, resultando na queda de ambos nas mãos do inimigo. X-9 viu-se cercada por
linhas de código negras que giravam ao seu redor como um tornado, impedindo
qualquer ação que ela pudesse tomar. Já CABAL teve todos os seus recursos
bloqueados, como se o sistema tivesse apresentado um erro. — Não preciso
detê-los de forma definitiva, aos poucos estou ganhando mais força dentro do
sistema do Olimpo, mantê-los parados é tudo que preciso fazer. — A voz metálica
ecoou pelo ciberespaço, vibrando como uma sinfonia desafinada sobre os ouvidos
de todos os presentes ali.
Enquanto isso, no mundo real, o grupo de soldados liderado pela mercenária
Galathea avançava pelos corredores do imponente edifício, descendo com cautela
para os andares inferiores. De repente, o grupo ouviu uma série de disparos vindo do
andar abaixo de onde estavam, seguidos por gritos de dor e desespero. Hurt era o
responsável por aquilo. O assassino utilizou sua espada com extrema maestria,
defendendo-se de cada tiro dos homens de Montana que encontrou pelo caminho.
Ele seguiu a super-humana chamada Gal, que usou suas habilidades para
desaparecer após atraí-lo para o corredor onde o grupo de capangas estava reunido.
Rodeado pelos pedaços dos corpos dos homens que acabara de eliminar, Hurt
guardou sua espada nas costas e levou o dedo indicador direito até o comunicador
que possuía sobre a orelha direita. — A super humana conseguiu escapar, continuem
avançando, de acordo os meus sensores tem um grupo de inimigos logo acima de
nós. — Hurt olhou para cima, visualizando com o auxílio dos seus óculos a silhueta
da equipe liderada por Galathea.

Tony Montana mantinha sua posição na sua cobertura, abaixado empunhando uma
arma e xingando tudo e todos. Jesse, que ainda estava ferido devido aos eventos do
aeroporto ficava ao seu lado. — Chefe, esse cara ferrou a gente no aeroporto
praticamente sozinho, o filho da puta consegue atirar de uma distância absurda. —
Comentou o motorista com as mãos trêmulas segurando uma metralhadora. Mas
pelo visto nada disso era relevante para a assassina e amante de Tony, Akane. A
ruiva posicionada na luxuosa suíte do casal empunhou o rifle, localizou o atirador de
elite e efetuou um disparo contra o mesmo com a frieza e precisão que um
assassino deve ter. A bala atravessou o ar, chegando ao edifício localizado a quase
1,5km do Olimpo, perfurando o traje tático do sniper Trigger no ombro e o jogando
para trás devido ao impacto.

Caído com as costas coladas no piso do prédio onde estava, Trigger levou a mão
esquerda até a máscara tática que utilizava para cobrir seu rosto. O homem de
cabelos e barba claros respirou ofegante, seus olhos fixos no ombro direito onde a
bala havia atingido. Graças ao traje que vestia, não sofreu nenhum dano corporal,
porém o mesmo não pode ser dito sobre a área afetada do traje. O projétil perfurou a
proteção, ficando a apenas 1cm de sua pele.. — Ufa! Essa foi por pouco, não
esperava alguém tão bom com um rifle do lado do italiano. — Trigger então virou-se
de bruços, rastejando até o seu rifle, agora o atirador precisaria ter o triplo de
cautela, afinal sabia que sorte poderia não salvá-lo uma segunda vez.
Preparou-se novamente, colocando seu olho sobre o rifle e o indicador no gatilho,
com sua prótese ocular ele era capaz de enxergar grandes distâncias, assinaturas
de calor e até mesmo através das paredes. — Chegou o momento especial, adeus
Tony Montana. — Trigger apertou o gatilho, o projétil voo até o Olimpo, perfurando a
parede e seguindo rumo a Montana que estava no chão. Caso o italiano não tivesse
uma carta na manga, teria suas costas atravessadas pelo tiro.

No cubículo onde Rodrigo se encontrava junto a Boris, dois capangas e Coyote


presos na cadeira, as cartas foram jogadas. O metamorfo rejeitou o teste,
recusando-se a matar seu antigo aliado. — Você não passa de um viadinho sem
bolas, eu devia ter imaginado. — Disse Boris, erguendo a faca que empunhava e logo
depois perfurando o topo do crânio de Frank, que morreu no mesmo instante. — Mas
o que você disse faz sentido, você não precisa ter sangue nas mãos para fazer o que
queremos que faça. — Boris sorriu de canto, encarando Rodrigo com seu olhar de
psicopata. — Se livrem desse imundo, e você aberração, me acompanhe. — Ordenou
Boris, que saiu da sala, seguido por Rodrigo.

Ambos pararam em frente a uma porta de metal, a poucos metros de onde Rodrigo
estava anteriormente. Boris destrancou a porta, que levava a outro cubículo. Lá
dentro, o detetive Caz estava amarrado a uma cadeira, com inúmeros ferimentos
pelo corpo. O torturador pegou um alicate de uma mesa repleta de objetos de tortura
e se aproximou de Caz, apertando seu nariz com a ferramenta. O policial acordou
tremendo e gemendo de dor. — Esse vermezinho aqui é nosso trunfo, preciso que
use suas habilidades para ficar igualzinho a ele, você pode fazer isso, correto? — Diz
Boris para Rodrigo enquanto torcia o nariz de Caz com o alicate. Ele então parou,
caminhou até a porta do pequeno quarto e chamou um dos capangas no corredor. —
Quando chegar a hora de você entrar no jogo, você ficará confinado aqui, o Malcon
será sua sombra, não tente qualquer gracinha. — O capanga, de cabelos grisalhos
com longas entradas, fez um sinal com a cabeça para Rodrigo, levando-o para outra
sala localizada em uma ala desconhecida daquele complexo. A sala era mais
confortável, com dois sofás, uma mesa com quatro cadeiras, uma geladeira e uma
simples TV que lembrava um refeitório degradado. Rodrigo agora tinha que decidir
se esperaria Boris seguir com o plano no qual ele seria a chave, ou se tentaria fugir.

Em meio aos gritos de euforia dos homens e mulheres empolgados com a violência
dentro da arena de luta dos Ossos Cruzados, a conversa entre Pollux e Coltraine
prosseguiu tranquilamente, o que era um alívio para o jornalista. Antes de deixar o
local, Coltraine pegou uma taça de vinho que estava sobre a mesa à sua frente.
Antes de dar um gole, o traficante disse uma última coisa para o jornalista. — Existe
uma pessoa que pode te ajudar nessa jornada. — Coltraine deu um gole no vinho. —
Seu nome é Vegan, ele ficou conhecido no passado como um gênio da robótica
conseguia criar obras primas com poucos recursos. — Coltraine repousou a taça na
mesa, pegou um holopad no interior do seu sobretudo roxo e digitou algumas
coisas. — Te enviei o último endereço conhecido dele, é uma oficina chamada
Consertos e outras coisas, seja rápido, soube que o Yuric tá atrás dele.

Caso o jornalista seguisse a dica de Coltraine, ele chegaria à oficina localizada no


centro de Miraitropoles. Ao se aproximar, notaria os vidros quebrados, um furgão
estacionado na porta e uma moto estacionada nas proximidades. Ao entrar, Pollux
escutaria gemidos de dor vindos do segundo andar. Para chegar até lá, a única
opção seria subir uma escada. Ao alcançar o topo, Pollux ficaria chocado ao
presenciar um homem gordo e grisalho cometendo um ato de violência contra uma
jovem mulher de cabelo verde, enquanto outro sujeito, usando um boné, revistava o
cadáver do samurai urbano Chris Falcon, cujo corpo estava repleto de buracos de
bala. — FALA ONDE SEU CHEFE TÁ VAGABUNDA! — Gritava o gorducho em cima da
garota, socando seu rosto e penetrando seu pênis nela, que já estava quase
inconsciente. Pollux teria a vantagem do elemento surpresa para acabar com a
dupla, se sua escolha fosse essa é claro.

Instruções
1- X-9 e CABAL precisarão fazer um teste com dificuldade 12 para contornar o
bloqueio de suas ações.
2- Galathea está livre para determinar a estratégia de seu grupo contra o grupo
inimigo enviado por Hurt.
3- Pollux precisa fazer uma rolagem com dificuldade 10 para eliminar ou imobilizar a
dupla de inimigos.

Gal Bordeaux
A escapada tinha sido bem-sucedida, afinal. Ao atravessar o chão, criando um efeito
visual semelhante ao de alguém mergulhando em uma piscina, a loira conseguiu se
livrar do assassino. Ou melhor, acabou atraindo-o para uma armadilha, mesmo sem
ter a intenção de fazê-lo, já que não tinha conhecimento de que os capangas de
Montana estariam naquele local. — Agora essa maldito vai ter o que merece.

A loira já se vangloriava ao estar no andar de baixo. O lugar em que ela se


encontrava tinha uma atmosfera que remetia a um porão ou algo do tipo,
evidenciado pelos objetos espalhados e pela escassa iluminação, além da ausência
de pessoas. — Funcionários, ou até de andróides ou de invasores russos. Até
porque, como estava no térreo, naquele momento, presumiu assim ser esse o atual
lugar.

Logo, ela direcionou sua atenção para o andar de cima, fixando o olhar no teto do
local. Enquanto escutava os disparos incessantes, um sorriso de satisfação se
formava em seu rosto ao pensar na morte iminente do sicário. Contudo, ao contrário
do que esperava ouvir em seguida, o que chegou aos seus ouvidos não foi o gemido
de dor de apenas um homem, nem uma única voz. Pelo contrário, eram vários
lamentos de dor, fazendo-a presumir imediatamente que a emboscada improvisada
havia dado errado, resultando na morte do grupo de Montana e não do alvo
pretendido. — Não dê a homens o trabalho de uma mulher...

Ela correu para um canto do porão, onde encontrou alguns objetos que poderiam
servir de base. Subiu neles e, usando suas habilidades mais uma vez, atravessou o
chão, mas apenas o suficiente para ter uma visão de Hurt de costas, conversando
com seus subordinados. Parecia que ele não havia deixado o local, o que lhe daria
tempo para agir como meta-humana.

Ela empurrou um dos objetos pesados para a área abaixo de onde Hurt estaria. Em
seguida, subiu novamente na estrutura. Pretendia se tornar intangível mais uma vez
e, estando abaixo do seu algoz, caso ele ainda estivesse no mesmo lugar,
atravessaria o chão acima dela e abaixo dele. Em seguida, materializaria suas mãos
para tocar as pernas dele e, finalmente, o puxaria para baixo... — Como o bicho
papão embaixo da cama... — E no meio do caminho, caso obtivesse sucesso, ela
soltaria o corpo do sicário quando ele estivesse com o tronco atravessando o chão.
Nesse momento, ela o materializaria novamente, uma vez que estivesse fora do
alcance do toque de Gal.

Se a investida fosse bem-sucedida e não houvesse nenhum obstáculo no caminho,


como uma simples mudança de local ou o surgimento de capangas no porão, o
corpo do sicário se solidificaria exatamente no momento em que o solo estava.
Dessa forma, aquela parte do seu corpo seria preenchida pelo concreto, metal ou
qualquer material que compunha o solo, levando-o à morte instantânea.

A mulher confiava no sucesso de sua investida, contando não apenas com suas
habilidades únicas, mas também com o fator surpresa. Hurt parecia pensar que ela
já havia escapado completamente do local. Independentemente do resultado, ela
logo planejava fugir caso percebesse qualquer reação hostil, interrompendo a ação
se necessário. E se tudo desse certo, ela tentaria subir para preservar a integridade
de seu novo empregador e de seus negócios.

Gabriela vulgo Rodrigo


Fechei os olhos antes de testemunhar a morte de Frank. Apesar dos sons que ele
emitiu e do eventual cheiro de sangue que tomou o ar, fiz um esforço para não ficar
enjoada. Com os olhos fechados, ouvi Boris indicar que era hora de sair dali, seguido
pela ordem de remover o corpo de Frank. Tendo memorizado a direção da porta, me
virei e abri os olhos assim que passei por ela, seguindo o meu novo chefe.

Continuamos nosso caminho para outro local, que se assemelhava ao lugar onde
estávamos antes. Havia mais uma vítima de tortura ali. Parecia que eu tinha sido
levada a uma espécie de masmorra onde as pessoas eram torturadas até a morte,
reforçando ainda mais a noção de que não era uma boa ideia ter qualquer
pensamento tolo, caso contrário, eu estaria no lugar delas. Olhei com pesar para o
pobre Caz, mas infelizmente não podia fazer nada por ele naquele momento. Talvez,
quem sabe, eu pudesse fazer algo mais tarde.

— Claro que posso me tornar ele. — Imediatamente, transformei meu corpo feminino,
que era a minha aparência atual, para assumir a aparência e vestes de Caz. Fiz isso
para mostrar a ele o que eu era capaz de fazer e, assim, ganhar sua confiança ainda
mais. — É só me dizer o que fazer na hora, chefinho. — Em seguida, me transformei
novamente para que voltasse a parecer como eu realmente era.

Logo depois fui “apresentado” a Malcon, o cara que seria meu guarda-costas ou
sequestrador, depende do ponto de vista. Mas eu não mostrei receio. — Ah, claro.
Tenho certeza que nos divertiremos juntos, não é, Malcon? — Sorri, já os seguindo
para o outro cômodo. Este último tinha o tamanho parecido com os demais, mas o
seu interior era imensamente mais confortável. Logo abri o refrigerador de porta de
vidro, e peguei uma garrafinha de cerveja. Caso Malcon estivesse ali dentro, pegaria
uma para ele, também. — Você pode beber em serviço? Se não, não tem problema,
fica sendo nosso segredo.

Minha intenção era me aproximar de Malcon. Eu tinha a missão de entregar a Pascal


a localização de seu irmão, e até então, eu não a tinha obtido. Mesmo que eu
acabasse desistindo do meu propósito original, seria bom ter essas informações em
mãos. Ao contrário de Frank, que testemunhou Crazy Dog como um aliado do lado
russo, eu ainda não tinha essa informação. E eu estava determinada a consegui-la.
Sentei-me em uma das poltronas e indiquei a outra para ele. Não tinha a intenção de
forçar nada de natureza sexual com o cara. Pelo menos, não por enquanto. — Vocês
tem mais presos por aqui? Esse lugar lembra até os antigos Campos de Auschwitz,
de séculos atrás. Que porra sinistra. — Caso ele se mostrasse amistoso, eu
continuaria. — E quem manda? Soube nas ruas do Yuric, o cara é tipo uma lenda. E
agora soube do Boris... Tem mais algum pajé nessa tribo?

Pollux
Vegan. Não é um nome que impõe muito medo, mas eu gostei. É, gostei. Eu tinha
tirado de Coltraine o que eu queria e ele tinha de mim o que queria que eu
prometesse. Não confiávamos um no outro, mas era o suficiente para que
andássemos para a frente, juntos, e dado o fato de que antes estávamos a beira de
agarrar o pescoço um do outro, estávamos fazendo um progresso a passos largos
dessa vez.

— Quando eu voltar, volto com boas notícias. E quem sabe possa me dizer mais
sobre esse Yuric. Ainda não tive a oportunidade de apertar a sua mão. Não, a boate
não tomou muito de meu tempo desta vez. Apesar das luzes e das dançarinas, da
luta e da bebida, eu não me demorei muito por lá em nome do que tinha em minha
cabeça como objetivo. Precisava ser rápido e quando sei que o tempo é curto,
qualquer desvio que tomo custa uma vida. Uma das coisas mais difíceis como um
jornalista era inerte assistir ao que de pior ocorria no mundo e submundo de
Miraitropolis. Tem algo diferente quando se está apontando uma câmera para o
lugar que filma, do que quando está simplesmente misturado a uma multidão como
um transeunte, como eu e Calidora inúmeras vezes fizemos, presos a nada mais
poder fazer do que olhar, olhar e assistir o que em breve todos assistiriam com nós,
juntos, no noticiário de segunda edição. O que Telford e o Canal fizeram comigo me
mudou, me deixou mais forte, mais esperto, mais sagaz. Além do mais, muito mais
engenhoso. Me tornei a ferramenta do meu próprio ofício, uma que eu mesmo uso
contra o mal, que um dia eu já participei por nunca tentar impedir de acontecer,
apenas olhar e registrar.

Tinha muito para ver em Miraitropolis. Como é que se escapa de um olhar, de uma
memória, afinal? Podia não ser a arma mais letal daquela cidade mas com certeza
era a mais silenciosa e traiçoeira. Era a veia por onde o sangue venenoso de Telford
e K'dore corriam, os seus espiões por dentro do próprio sistema, os olhos dela que
se escondiam por trás das minhas pálpebras. Eu não podia sequer culpar a mulher
pelo que me tornei, e quer saber, eu realmente não culpava. Foram as minhas
escolhas, e foi a minha índole que me permitiu ficar parado enquanto o mal vencia o
bem. Desde aquela noite no meu apartamento, mais e mais me sinto quebrando os
elos e desatando os nós de velhos hábitos e velhas conexões, cada vez mais sou
mais Pollux, e menos uma ferramenta. Ferramentas não pensam, ferramentas não
agem. Não salvam.

O silêncio no qual me afundava era triste, numa cidade que com todos os seus
pecados eu ainda considerava linda, e minha casa. Do horizonte poluído aos
malfeitores se escondendo em ruas apinhadas de cidadãos, até no mal existia o
espaço para a redenção. O aroma da noite abafada me trazia lembranças e
promessas, um distante gosto de sal que aguçava minhas lembranças, e me fazia
apertar o rosto sobre a moto, que costurava sobre as ruas pairando alguns
centímetros acima delas, me imergindo em uma cidade que eu lembrava
constantemente que era minha. Tanto para fazer nela. Tanto para limpar.
— Você está se aproximando do lugar que Coltraine falou. Estou detectando
presenças inesperadas por lá, melhor ir com cuidado.
— Vou tentar me aproximar em silêncio. Veja se consegue uma identificação.
Quantos você detectou? E naquela noite, eu estava para colocar mais dois lixos para
fora de casa.

Consertos e Outras Coisas

Assim que minha moto chegou a ficar inerte, eu ouvi os gritos. Gritos que gelam a
espinha e inconfundivelmente são de uma mulher, e não uma que está levando a
melhor. Por melhor que eu fosse nisso, por mais silencioso que eu pudesse ser,
existem alarmes que jogam pela janela toda nossa cautela e nos transforma no
nosso mais íntimo ímpeto, o de salvar ou de correr, e eu não tive dúvidas sobre qual
era o meu. Arrastei os pés depressa para trás do furgão estacionado e tomei
cobertura, mas nada advinha do primeiro andar, então tão logo corri para as
escadas, onde no final desta, coloquei-me de costas contra a parede. A mulher
balbuciava, e perguntas ferozes eram cuspidas enquanto eu coloquei a cabeça para
dentro e espiei para dentro do andar, tão rápido quanto pude.

— Calidora, uma ambulância, rápido. Para três. Em toda minha vida e trabalho, aquilo
eu nunca tinha testemunhado. Minhas mãos perderam o calor do sangue e de
dentro de meu casaco eu saquei a SMG que carregava comigo, com munição de alto
impacto, não-letal.

— O que está... meu deus…

— Desculpe, nos vemos depois.

— Não, não corte a transmissão!! Calidora não precisava ver aquilo. Eu já consegui
as informações básicas de alguns deles, inclusive o nome do corpo que era
saqueado, sem sinais vitais. Fechei as pálpebras por um momento, e quando as abri
novamente, Calidora não mais enxergava através de mim. Nem eu respondia por
mim mesmo. Fiz a curva da escada sem qualquer respeito por furtividade, mirei
primeiro no homem que, saqueando o cadáver, estava de costas para mim. Atirei
uma rajada de munição contra as suas costas e coluna, sem tirar o dedo do gatilho,
uma bala depois da outra. Quando fosse o tempo de eu ser detectado, eu já teria
atirado à vontade. Para o homem sobre a mulher eu parti, mas colocando de volta a
SMG no cinto e retirando um bastão curto que, com um gesto acelerado, se
desdobrou numa tonfa desdobrada, que girou no ar e foi destinada bem na nuca do
estuprador. Um golpe, depois do outro, depois do outro. Algumas no rosto, outras
nos membros. Eu não queria matá-lo, queria deixá-lo gritando de dor. Conhecia uma
promotora que iria adorar pegar um caso daqueles, se os dois sobrevivessem.
Queria deixá-los bonitinhos para quando entrassem na cadeia. — Sorria pra câmera,
seu lixo.
Pollux rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 10 para sentar o dedo em
vagabundo que resultou 12 - Total: 1 Sucessos

(Nicolle, Kat e Akane se retiram da quest)

Anthony Montana
Com cautela Akane voltava do quarto blindado da cobertura, sempre séria, calma e
cautelosa. Ela não disse, nem precisava, pelo semblante eu podia perceber que ela
não havia tido sucesso em sua tentativa de atingir o sniper. Merda, o caldo estava
começando a ficar grosso. Enquanto isso, Jesse buzinava nos meus ouvidos
tagarelando mais do que uma velha na filha do SUS.

—Tô vendo o que ele consegue fazer! Deve ser algum poder divino, Akane nem
arranhou o filho da puta! — Gritei fechando o punho e batendo contra o chão.

Minha ruiva continuava se mantendo atenta, na soleira da entrada do quarto, mas


também diante ao escritório, olhando os passos do atirador pela mira de sua sniper.
Jesse e eu continuamos nos arrastando pelo chão, uma situação bem humilhante
para mim, o maior e mais temido gangster da cidade. Já para Jesse não, era comum
ele rastejar. Akane nos dava cobertura para podermos ter acesso ao quarto
blindado. De repente, um grito me assustava, sem mais nem menos ela se jogaava
como se estivesse mergulhando em uma piscina. Sei que é meio doida, mas até o
momento não entendia o motivo daquilo, não até ouvir o zunido rompendo as
paredes do Olimpo e uma fisgada brutal nas costas. A dor era lancinante, mas não
gritei, cerrei os dentes aguentando firme a dor. Toquei por baixo do meu corpo e uma
poça vermelha começou a tomar forma, e o pior, não parava de aumentar. Olhei para
o outro lado e vi Akane, por cima de mim, inconsciente, parecia que dormia. Tentei
levar minha destra até seu ombro, mas a dor impedia. Seu traje de proteção estava
encharcado de sangue, que juntava ao meu. Agora eu consegui entender o que ela
tinha feito, tentou servir de escudo para a bala. Infelizmente o projétil perfurou
ambos, e me mantive consciente porque as camadas de proteção do uniforme dela
apararam a força da bala, e seu corpo também, mas a coitada levou o impacto
maior. Apesar disso, eu sentia minha força se esvaindo, a cada segundo eu perdia o
muito da minha força invejável. Também começava a sentir frio, muito frio e a mente
nublada. Usando o que me restava de vitalidade, convoquei com a mão Jesse, para
se aproximar mais. O Coitado estava congelado de medo.
— Jesse.... Venha aqui... — Ele enfrentou o medo e abaixou, colocando o ouvido
perto de onde estava, segurando minha mão.

—Senhor Montana... O que faço? — Indagou.


— Me leve até o quarto blindado... Você é forte... Lá dentro tem alguns mantimentos
de primeiros socorros... Tudo que precisar para eu e Akane... — Respondi com muita
dificuldade.

Os meus homens que estavam na sala imediatamente se posicionaram na grande


janela ao lado da perfuração da bala e começaram a atirar no filho da puta que me
alvejou. Quero dizer, atiraram contra ele, apenas dando cobertura para Jesse me
carregar até o quarto e depositar meu corpo enfermo na cama. Ele fez o mesmo
com Akane que parecia dormir. Ele a deixou do meu lado, segurei sua mão, e apertei
a de Akane deitada comigo. Jesse iniciava o procedimento, me servia de uma
garrafa de uísque, limpava o ferimento, retirava a bala da carne, suturava a mesma
para depois fazer os curativos. Outro capanga que por motivos de força maior não
me recordo o nome, cuidava da minha ruiva. Depois dos primeiros socorros eu via o
quanto os lençóis estavam manchados de sangue. Akane não mostrava reação
alguma e eu continuava perdendo as forças. Minha percepção sempre foi ótima,
treinei ela quando ainda era policial, mas agora, eu mal conseguia ouvir o que Jesse
me falava, parecia que meu radar abrangia uma área bem restrita à minha volta.
Novamente convoquei Jesse para se aproximar, ele obedeceu, então falei algo em
seu ouvido.

Minutos depois, ignorando o possível tumulto que estaria na sala do escritório,


Jesse Castellone em passos curtos, com um lenço branco nas mãos, limpava as
lágrimas e engolia os soluços de choro, tentando reunir força para falar. Convocando
um punhado de sílabas qualquer, entre a soleira da saída do quarto e a entrada da
sala do escritório, sem escolher palavras, encostado na porta, anunciava a todos da
forma que sabia, sem delongas:

— O Senhor Montana... e a Senhorita Akane.... Estão mortos!

X9
Puxei o pino conector de telecomunicações da tomada de aço cirúrgico no encaixe
de minha têmpora. O cérebro piscou como um letreiro de neon falhando, pulsando
como se fosse explodir. Um portal no banco de dados principal se abriu e a visão se
deslocou para dentro dele, me devolvendo ao angustiante mundo real. Brilhantes
fileiras de estrelas emolduravam as laterais da minha visão turva. Depois de colocar
para fora todo o conteúdo do meu estômago, consegui respirar melhor deixando o
mal-estar distante. Sentada na cadeira, vendo que a camareira do hotel me
amaldiçoaria pelo estrago feito no carpete do quarto, ponderei o que tinha acabado
de fazer e por um segundo quase me arrependi da ideia de me desplugar da lexis.
Mas que se foda, Tony Montana estava morto, e ninguém ia me pagar pela porra do
serviço, por que me arriscar naquela merda de briga virtual? Eu tinha as informações
do Residencial Celeste no safe point de Praxis, se vendesse para Pascal ou Xiaren
ainda podia ganhar alguma grana e meu tempo aqui então não teria sido totalmente
em vão.

Tinha certeza que Praxis não seria boba de se manter online naquela maldita
armadilha, mesmo que fosse impossível capturá-la agora ela.. Digo ele... Era
propriedade dos militares e ninguém é besta de querer confusão com a
Paramilitech. Igual a mim bastava se desconectar da Lexis e foi o que ela fez, como
se houvesse uma ligação entre nós, eu sabia disso. Entretanto não podia ter a
mesma certeza daquela outra I.A. chamada Cabal. Isso não é problema meu. Fiz
uma breve pausa fuçando em cada arquivo do cyberdeck, descartando informações
inúteis enquanto a função de busca procurava o que o tinha encontrado sobre a
fatídica noite que levei o tiro. Beleza, estava tudo ali, parei para ler. Dados básicos
apareceram na tela junto de uma foto, da Dra. Vangelis, tava ficando interessante.
Como numa imagem animada, pessoas vestidas de branco passavam por trás dela,
dando a entender que se tratava de uma ala cirúrgica. Era ampla, com um imenso
branco anti-séptico todo envidraçado. A loira começava a explicar.

— O projétil da bala calibre doze destroçou a coluna, colocando-a em coma.


Conseguimos salvar o sistema nervoso, cérebro e olhos originais de X-9. Por
enquanto estamos mantendo ela viva nesse tubo com oxigênio e o líquido que o
Doutor Thomas Carwell criou. Infelizmente ele se encontra sedado em recuperação
em um leito do laboratório, incapaz de nos revelar o nome da fórmula e a
composição da mesma. — Cara... QUE TROÇO NOJENTO, quase vomitei de novo.
Um cérebro, uma espinha dorsal e nervos estavam boiando dispersos num tanque
cilíndrico cheio de fios e tubos, mergulhado em uma coisa que muito similar a soda
limonada gaseificada. Aquele par de globos oculares... Pareciam com vida, cientes
ao fitar a câmera. Fiquei bastante desconfortável, ainda mais sabendo que aquilo
era eu... Ok, a Doutora Vangelis não parecia também nada à vontade, dava pra ver
nitidamente na expressão do rosto. A animação sonora era editada. A cena seguinte
segundo os dados tinha sido feita horas depois e ela ainda parecia desconfortável,
mas um pouco menos do que antes. Ou era isso, ou conseguia disfarçar muito bem,
vá saber...

— Os órgãos foram transferidos para um corpo "vazio" de uma replicata humana.


Chamados de embriões adultos. O corpo sem gênero e sem feições logo após a
operação começará a tomar "contornos femininos" e obter a fisionomia da hacker
em questão de horas. Alguns detalhes anatômicos já podem ser observados... —
Numa cápsula aberta e revestida de fios e aparelhos eletroeletrônicos um corpo nu
sem cor e definição de gênero exceto pelos seios em formação, como a doutora
dizia parecia dormindo em profundo repouso com uma máscara que ao meu leigo
entender estava mantendo ela respirando. Telas holográficas em formato de lâminas
e slides monitoravam as funções vitais da pessoa deitada. A animação sofria um
"corte", terminava ali. Boquiaberta eu tentava entender, quer dizer que agora eu era
uma replicata? E meu sistema nervoso dentro disso representava o que? Muitas
dúvidas residiam em minha cabeça. Não dava tempo de assimilar, uma onda de
tristeza me tomava, sabendo que havia perdido minha humanidade comecei a
chorar, muito, como nunca fiz antes. Depois de limpar as lágrimas tomei coragem
para assistir o restante do arquivo, afinal, existia algo ainda pior do que saber que
não pertencia mais a raça humana? Como eu digo, nunca duvide disso, nunca diga
que não tem mais como piorar... Por que acredite, sempre tem! A imagem de
Vangelis voltava a se mover e falar.

— Conforme o tempo passar, X-9 notará que sua força física estará muito acima de
uma jovem mulher da sua idade. A replicata embrião usada como segundo corpo
era um modelo de combate, portando uma resistência bastante grande, destreza
com coordenação a realizar feitos atléticos, reflexos rápidos além da grande
desenvoltura muscular, todas em níveis muito acima do ápice humano.

— Certo, isso era a parte boa.

— Entretanto! — Sempre tenho medo do "entretanto" — Infelizmente a Carwell Lab


assumiu estes "embriões" antes de serem proibidos, portanto pertencem aos
modelos antigos ômegas -6, possuindo apenas quatro anos de vida. — PUTA QUE
PARIU! EU SÓ TENHO QUATRO ANOS DE VIDA E ESSES MERDAS NÃO ME FALARAM,
NEM QUANDO EU PEDI! Desta vez não chorei, mas precisei segurar a raiva que corria
nos meus punhos, minha vontade era de quebrar o quarto do hotel, mas Red
despertaria e eu pretendia fugir sem chamar atenção.

— Ainda é cedo para alegar se a operação foi bem sucedida, de qualquer forma,
mesmo que seja, com fins de evitar rejeição do sistema nervoso por parte do
restante do corpo, X-9 precisará regularmente usar um composto concentrado de
cybertropina. Por essa razão, eu induzi os Steelhearts a negociar com Coltraine, o
sócio do Capitão Nick Slay. Espero ... — Desliguei a gravação com muita raiva, quer
dizer que a Doutora Vangelis tinha um trato com Nick Slay e os Steelhearts foram
negociar a cybertropina com Coltraine numa jogadinha ensaiada dos três? Ou a
cientista estava sendo pressionada ou não era o anjinho que aparentava ser. Quero
saber se o tiro na minha coluna realmente foi acidental ou se foi marmelada. Agora,
mais do que tudo, falar com Pollux era necessariamente vital.
Nada mais me prendia naquele cassino, só lamentava adiar minha vingança contra
Boris e provavelmente minha retirada condenaria a vida de Caz, mas eu estava
pensando mais em mim mesma no momento, algo havia mudado em mim... O
quarto mesmo sendo uma construção homérica parecia me sufocar, precisava de ar
puro, sair daquele ambiente claustrofóbico ou surtaria. Red ainda estava ferrado no
sono, juntei minhas coisas e aproveitaria a oportunidade pra cair fora sem ser vista...
Contudo, antes de fechar a porta eu voltei ao quarto. Como havia dito... Algo tinha
mudado em mim...

Naquele instante pensei "Ah... Preciso descarregar minha raiva", mas seria covardia
demais... O cara estava dormindo feito uma criança, vulnerável como um bebê...
Quero mais é que tudo se foda!

— Sabe... Não fui com a tua lata desde o primeiro momento que te vi! — Me
aproximei dele devagar, avaliando a situação, coçando o final da nuca com a destra.
A mão tava coçando pra espancar vagabundo.

Sem piedade, não pensei duas vezes e comecei. Tapei sua boca com a mão e
apliquei muitos socos em seu abdômen. Interruptos murros na cabeça também, não
havia nada que ele pudesse fazer se não arregalar os olhos e se debater enquanto
apanhava feito um cachorro sem dono. Naquela hora nem mesmo lembrar da
história triste da mãe dele me comovia. Minha força continha as tentativas dele se
soltar. Em poucos segundos a cara do filho da puta se tornou uma massa disforme
roxa e vermelha. Saco, foi rápido demais, nem teve graça, deu nem pra o cheiro, ele
não aguentou muito e apagou. Fui até o banheiro, removi três dentes presos no
punho e lavei minhas mãos sujas de sangue.

Depois caminhei até o pequeno bar do quarto onde me servi de uma generosa dose
de uísque com gelo. A pedra ficava dançando dentro do copo, derretendo aos
poucos, se misturando na bebida cor caramelo enquanto estava ocupada rangendo
os dentes um contra o outro procurando uma forma de sair do cassino sem chamar
a atenção, tinha que ser rápida ou ia matar esse merdinha se ficasse um segundo a
mais ali. Os dedos batiam inquietos na madeira do balcão do bar e o que pareceu
apenas alguns minutos, eu encontrava: Trocar de roupa com Red, assim com muita
sorte poderia passar despercebida fazendo um cospobre do ruivo. Porém, olhando
melhor, não seria bom, estavam manchadas de sangue e despertariam suspeitas.
Mas se xeretasse seus pertences poderia resolver aquela questão. Terminei a dose
de uísque em um só gole e fui fuçar. Vasculhei o armário, cômodas, nada de roupas.
Foda-se, acharia algo melhor, na sua maleta tinha duas malditas holomáscaras. Para
o que e por que ele tinha aquelas coisa não me fazia ideia, hoje em dia, os indutores
de imagens são mais modernos, discretos e eficientes no sentido de infiltração. E
vejam só que sujeitinho tramposo, o cartão bilhete junto das holomáscaras dizia se
tratar de dois itens de colecionador preciosos no mercado negro, já que utilizar
produtos que induzem imagem se tornou proibido depois que a vaca da Telford virou
a manda-chuva de tudo. O ruivão tinha roubado essas coisas de um museu pra
vender prum ricaço e ganhar uma grana bem gorda. Bom, não ia mais.
Parecia que era disso que o viadinho vivia, de trambiques no Black Market, que
perdedor... Colocada no rosto um código de barra azul fluorescente surgia na maçã
do rosto, autorizando e ligando a placa de vidro quadrada que representava a
máscara. Um simpático rosto eletrônico azul surgia na lâmina vítrea. A
deslumbrante capacidade analógica de funções cibernéticas correu por caminhos
de elétrons, assumindo uma face real quase palpável. E não só o rosto, o corpo
também. Sistematicamente meus cabelos ficaram longos, vermelhos. As roupas
também mudavam, viravam um colete preto com camisa social branca por baixo,
gravata preta e calça de linho com finos sapatos italianos. Agora era um homem. É,
eu virava a imagem e semelhança de Red. Quanto a outra holomáscara eu prendi na
cara quebrada do verdadeiro Red repeti o mesmo processo, contudo ele assumia a
minha aparência. Deixei o desgraçado amordaçado e amarrado em uma cadeira, o
quarto não tinha câmeras, ninguém veria meu ardil. Não foi difícil imitar os
movimentos afeminados do boiolinha quando passava pelas prostitutas de biquínis
rosas e capas de plásticos extravagantes bebendo drinques caros enquanto
rodeavam as janelas do hall principal do cassino. Sendo bem comum algumas até
de seios de fora para atrair clientes. Rolava de tudo dentro do cassino, não somente
jogo, mas prostituição, venda de drogas, armas, negociações do mercado negro,
trafico de pessoas e escravos sexuais.

Virando cegamente, observando as espirais reluzentes e os caminhos de neons


pulsantes que rodeavam o interior do cassino, avancei com velocidade para a saída
da enorme construção de Yuric. Um segurança oriental - Orientais trabalhando para
russos? - usando um visor retangular na frente dos olhos abria a porta principal,
afastando as duas abas duplas. Mas o cara do lado não foi tão compassível.

— Onde vai, Red? O Senhor Yuric deu ordens para você ficar de olho na hacker até ela
terminar o serviço. Ele enviará novas ordens, fique na espera. — O homem sem
cabelos, rosto fino e terno preto, ligado por alguns implantes ao lado deste se
colocou na minha frente.

— Aquela coisinha inofensiva? Pfffff... — A voz também mudava para o mesmo


timbre de Red. — Eu mandei pegar os arquivos do Residencial Celeste e coloquei a
vadia pra dormir. Ela tá lá em cima, amarrada no quarto depois da surra que dei na
putinha. Quer conferir, pode ir lá, vocês sabem o número do quarto. Eu vou em algum
puteiro de Nocturna aproveitar meu intervalo até que Yuric mande fazer outra coisa,
essa bosta de cassino só tem mulheres, e você sabe, eu gosto de um cara bem
potente pra relaxar. Vou de moto... Onde está mesmo a moto... — Falei tentando
induzir o desgraçado a falar onde era o estacionamento, mas ele não disse.
Continuei me dirigindo a saída, ele não impediu, no entanto assim que coloquei
meus pés pra fora do cassino, ele me chamou novamente.

— Red. — Droga, ele tinha percebido alguma coisa.

— O estacionamento é para o outro lado. — Apontou para a ala sul do saguão.

Eu sabia que Red tinha uma moto, quando tava chapado comentou que era seu
xodó, ele deu todos os detalhes da aparência daquela gracinha, orgulhoso, não tinha
erro, a máquina turbinada se destacava entre os outros veículos. Só não sabia onde
ficava a porcaria do estacionamento... Que vacilo... Enfim, em poucos segundos eu
estava a caminho de sair daquele lugar chato pra caralho. Subi na moto, tirei do
bolso uma metade de uma falange ensanguentada e pressionei contra o painel. O
motor ligou, dando as boas vindas no visor central digital. Acelerei o mais rápido
que pude saindo dali, jogando o indicador de Red fora em alguma esquina. A
belezinha era macia e deslizava pelo asfalto como se as ruas não tivessem buracos,
claro, ela flutuava sobre o lixo da avenida Armitage. Tenho uma amiga que vai adorar
ver essa gracinha. Não sei quanto ao resto de Miraitropolis, mas onde estava
começava a chover, para variar, tornando a jornada ainda mais interessante.
Relâmpagos cortavam o céu negro entre os arranha céus de neon de Troika. O vento
batia nos cabelos vermelhos e as gotículas escorriam pelo rosto de queixo alongado
das feições do ruivo. Mesmo assim, o calor ainda era insuportável.

— Redefinir senha. O código será ekkusu, traço, naino. — Com a voz do ruivo eu
falava com os gráficos amarelos do painel e ele reprogramou a palavra chave. Agora
a moto era minha definitivamente.

Enquanto eu voava baixo com minha nova aquisição, o homem sem cabelos
mandou um dos seguranças subir até o quarto e checar se eu falava a verdade. O
cara de terno, óculos quadrados escuros, estranhas ranhuras na testa e cabelo estilo
militar bem aparado abriu a porta silenciosamente com as luvas de couro,
constando que de fato uma garota de moicano lilás estava amarrada e amordaçada
no quarto. Ele ligou a luz espantando a escuridão. Fechou a porta e se aproximou,
parando na frente da mulher.

— Aaaah.... Vou te dizer uma coisa... Eu te vi subindo com o Red e amaldiçoei o filho
da puta quando soube que ele ficaria contigo sozinho nesse quarto. Mas quando
descobri que aquele idiota era um viadinho de merda, minha esperança voltou a
crescer... Crescer como uma coisa que tenho pra te mostrar aqui... — O segurança
afrouxava o cinto, deixando a calça preta cair. Yuric contratava a pior escória de
Miraitropolis para entrar na sua máfia, era comum ex presidiários, assassinos,
canibais e todo o tipo de degenerado, até mesmo estupradores fazem parte do
exército dele.

— Sua bundinha quando anda me deixa louco... Vou entrar gostoso nela... Vamos
passar boas horas juntos, e ninguém vai se importar com o que vai acontecer aqui...
Ninguém… — Red ia descobrir isso da pior maneira....

— Calidora, você tá me ouvindo? — Eu fazia curvas perigosas em alta velocidade,


sem me importar, nem mesmo estava de capacete. Ligando o sistema da moto na
Lexis, eu entrava em contato com a amiga de Pollux. O painel se transformava em
um monitor, onde eu via ela e ela me via.

— Estou sim... Quem é você? — Eu me esqueci que estava ainda usando a face de
Red. Desativei a holomáscara para Calidora reconhecer meu timbre durante a
chamada. Desativada, meu verdadeiro rosto também surgia por trás. — Melhor
assim?

— X-9... Não esperava...

— É... Eu sei, eu sei, falei que não queria ver você nem o Pollux depois que se
recusaram a falar o que me aconteceu naquela noite no Cemitério Neon... Mas agora
isso não importa, tomei a liberdade de me apropriar de uns arquivos emprestado do
Yuric. A propósito, Cali, obrigada por não me avisar que tenho apenas quatro anos
de vida.... — Ouvi do outro lado da linha ela engolir em seco.

— Posso explicar... — Ela não sabia por onde começar. E eu não queria também
saber o motivo.

— Enfim... Esquece isso, Cali... O caso não é esse, estou realmente precisando falar
com o Pollux, sabe onde posso encontrá-lo? — Indaguei com o tom de voz menos
rancoroso.

— Está certo... — Engoliu em seco, ouvi o ruído de novo, mas voltou a falar. — Acho
que ele vai mesmo precisar de ajuda, da última vez que entramos em contato estava
no Concertos e Outras coisas, no Centro. Tinha um homem morto e uma mulher
sendo abusada por dois sujeitos, eles estão armados!! — Ela quase gritava,
implorando que eu a ajudasse.

— Porra... O que o Pollux tá fazendo num lugar desses? Merda, me passa o


endereço, tô indo pra lá agora! — Derrapei no asfalto na manobra mais proibida que
uma moto antigravitacional já fez em toda história. Mudava a direção para o centro
da cidade, Calidora passava os dados do lugar e eu não perdia tempo, ganhava
vantagem sobre ele por possuir um veículo sem rodas.

Diminuí a velocidade da moto, desliguei o motor, travei o circuito de segurança e


desmontei, entrando no estabelecimento chamado "Consertos e Outras Coisas".
Andei cautelosamente, atento a qualquer som ou movimento suspeito. De repente,
ouvi o som de tiros e meu coração acelerou, temendo o pior. Embora Pollux fosse
astuto, inteligente e um espião promissor nesta maldita cidade, ele ainda era
inexperiente em confrontos diretos. Corri na direção dos disparos, sacando a Desert
Eagle que também havia roubado de Red. Ao chegar ao local de onde vinha o
barulho, percebi que minha preocupação era infundada e, para minha surpresa, a
maior da noite, Pollux havia derrubado duas pessoas. Guardei a pistola e me
aproximei dele.

— Ora, ora, aprendeu a atirar ou foi um golpe de sorte? Acho que tá mais pra
segunda opção, armas nunca foram seu forte. Sentiu saudades? Eu senti. — Disse
fitando-o, mas droga, ele não veria, afinal a tonta aqui não tinha removido a
holomáscara. Ah, ele ia me reconhecer pela inconfundível voz mesmo com o
moicano bagunçado e desmanchado por causa das alças da tela de led azul na
cara. Assim espero... Ou eu ia tomar um belo de um tiro nas fuças por que eu
acabava de lembrar que ele ainda não tinha me visto com o novo corte.

Narrador Capítulo 9
O próprio chefe russo assistia a derrota do italiano por um grande telão de led em
sua sala, sentado em sua cadeira reclinável, frente a um monitor que cobria toda
uma parede entre estantes de livros e troféus, cortesia concedida por Shadow que
transmitia tudo a ele, ao vivo, usando as câmeras do sistema interno do local. Yuric
gargalhava ao ver a expressão devastada no rosto de Jesse e como todos ficaram
abalados com a notícia de sua morte, realmente houve um golpe duro no time
Montana. Ignov deixava o copo de vodca descansando na guarda da cadeira e via
áudio dava novas ordens pelo comunicador de pulso. O sistema interno
informatizado de segurança voltava a normalidade, Shadow devolvia a posse do
controle do prédio, e tão sincronizado como uma dança, ao mesmo tempo a tropa
de Yuric se retirava do edifício Olimpo, diferente do que Gal, Vladimir, os homens de
Tony e de Galathea pensavam, não existia mais motivo para estarem ali uma vez que
o objetivo já havia sido atingido. Dezenas, talvez centenas de mortos e feridos ( e
um soldado de Yuric solidificado entre os andares) foram deixados para trás, teve
baixas dos dois lados da guerra. Sangue, marcas de tiros e muita destruição
refletiam o resultado daquela violenta disputa. Como um fantasma, o atirador
executor também sumia como se nunca tivesse existido.
O gângster russo após ordenar a retirada do sniper, passava novas ordens, desta
vez para Boris, mas o conteúdo desta informação ainda era extremamente sigiloso.
Boris entretanto, não se mostrou muito contente com o novo comando do seu chefe,
por outro lado jamais o desobedeceria. Todavia a expressão fria não durou muito
tempo, com seu habitual olhar sádico sorriu satisfeito ao saber que Montana agora
estava morto. Desligando a comunicação foi até a masmorra onde Caz se
encontrava, caminhou lentamente até o detetive amarrado e ergueu o braço da
pulseira a sua frente. A imagem holográfica se projetou no ar. Reproduzia ao policial
a cena da morte de Tony.

— Aprecie comigo essa maravilhosa cena! — Apesar disso, Caz se mostrou firme.

— Oh... Não se comoveu? Tudo bem, posso assistir infinitamente isso. Vamos ver se
você também. — Como se não bastasse os castigos físicos sofridos, Caz agora era
torturado psicologicamente, cada vez que a curta cena terminava, ela entrava em um
looping, repetindo sem parar o momento do tiro matando Montana.

— Droga! Chega, o que vocês querem? São tão perdedores que não conseguem se
dar conta de quando venceram? A cidade é de Yuric, acaba logo com isso, seu
infeliz! Me mata duma vez, porra! — Arrasado, Caz gritava, alterando o tom das
palavras. Seu rosto estava inchado e roxo, coberto de feridas cortes e sangue
coagulado, além da vista direita vazia devido o globo ocular removido por seu algoz.
Boris cancelou a holografia do pulso e se curvou para trás, gargalhando.

— Ahahahahahaha, matar você? Pra quê? A morte seria um alívio, um alívio que não
merece. Deixar você vivo se culpando pela morte do amigo é bem mais interessante!
Se quiser morrer, vai ter que fazer isso você mesmo! — Boris subiu o terno e a
camisa, puxando a pistola e jogou-a no chão. Depois desamarrou o detetive e deu as
costas, caminhando em direção a porta aberta. Caz se jogou ao chão e agarrou a
arma.

— Você vai pagar, depois é a vez do seu chefe! — O policial apontava a arma para o
inimigo, que se virou lentamente com um sorriso no rosto.

— Para um policial com sua fama você é bem idiota... Acha que daria uma arma
carregada? — Correu até Caz e aplicou uma joelhada em seu rosto, segurando sua
cabeça para tornar o impacto mais forte.

— Vocês tirem esse lixo daqui, joguem em qualquer viela do outro lado da cidade, ele
não é mais útil! — Ordenou gritando aos capangas, que entraram na peça e levaram
Caz.
Em outra parte daquela grande masmorra desconhecida, outro capanga bebendo
uma cerveja long neck respondia Rodrigo.

— É, vamos nos divertir muito sim... Hehehe, e se não puder beber em serviço, faço
mesmo assim, rs — Ele empinava a pequena garrafa gelada entre os lábios,
pensando coisas absurdas que poderia fazer com Rodrigo quando se transformasse
em uma mulher. — Ausch o que? — Indagou, ele, era alto, forte e até bem apessoado,
mas burro feito uma porta. — Digo com uma condição. Se transformou no Detetive...
Se conseguir se transformar na minha cunhada, eu conto tudo que quiser saber...
Cara... Tenho um tesão na irmã da minha esposa, mas a piranha nunca me deu
bola... — Do bolso o homem entregou uma foto, nela tinha uma ruiva, alta, longos
cabelos cor de fogo vivo, lábios carnudos, seios generosos, assim como as coxas e
quadril, realmente uma bela mulher. — Essa é ela, um tesão não é? Pode se
transformar nessa coisinha linda?

Porém antes que Rodrigo pudesse responder, Boris entrava na sala, olhando
desconfiado para ambos. Mas não deu vazão a isso e abriu o refrigerador pegando
uma cerveja gelada para si também. Depois de abrir e beber o primeiro gole, olhou
para Rodrigo.

— Hora de trabalhar, boneca, vem comigo! — Deu as costas, saindo do cômodo,


esperando que fosse seguido. O outro homem ficou no lugar, mas piscou para
Rodrigo, deixando claro pela leitura labial silenciosa que o acordo ainda estava de
pé. Seria a única razão de obter as informações que queria.

Depois, bem depois, naquele momento, seguindo Boris até uma outra cela, entravam
e nela estavam algumas mulheres, crianças, homens e idosos. Não dava para contar
que o ambiente era escuro, a fumaça e as grades atrapalhavam. Boris pegou da
cintura a mesma arma que ofereceu a Caz e carregou de um cartucho de munição,
entregando a Rodrigo a mesma.

— É o seguinte, Montana virou defunto, é, nem eu acreditei quando ouvi, e o Detetive


não é mais importante. Mas o chefe não quer apenas deixar ele culpado pela morte
do amiguinho, quer também foder com a imagem de bom moço do rapaz. Portanto
você vai se transformar no Caz e executar essa gente enquanto filmo tudo. Vou te
dar essa chance de provar que é homem. Eu perdoo o fato de você não ter
conseguido matar o Coyote, afinal vocês pareciam bem íntimos... — Sorriu
malicioso, insinuando algo entre eles. — Mas essas pessoas você não conhece,
acredito que será mais fácil. — Tão rápido quanto um pensamento, o russo já sacava
outra pistola da cintura, com a mesma maestria de um protagonista de filme de
faroeste a apontava para Rodrigo. — E não tenha nenhuma ideia de merda com essa
arma. Eu tô de olho em você, e acredite, sei muito bem usar essa pistola, melhor do
que imagina, não me teste! — Ele dava de ombros, falando de novo. — Então garotão,
vai demorar muito? Se te deixa mais aliviado, isso aí é tudo morador de rua. — Como
se o motivo justificasse.
Rodrigo alterava sua aparência para a do Detetive, essa era a parte fácil. Boris o
ameaçando com uma pistola ativava a função de gravação da pulseira
comunicadora com o braço livre, para todos os efeitos agora era Caz e não Rodrigo
ali com ele. O transmorfo erguia a arma para frente, em direção a jaula com todos os
mendigos, pessoas em farrapos, sujas, doentes e desnutridas. Se via a tristeza em
seus rostos. Ponderava, talvez tirar as vidas daqueles sem-teto fosse misericórdia e
não assassinato. Do que valeria viver vivendo uma vida miserável e sem futuro?
Mesmo assim sua mão tremia, começava a transpirar, sua roupa empapada de suor.
O dedo ia parar no gatilho mas os movimentos travavam. "Caz" estava indeciso, não
sabia o que fazer, ou não conseguia fazer. Boris suspirava, desligando a função
gravação da pulseira, o "Detetive" estava tão compenetrado dividido em seu dever
que não notava.

— Sabia que não tinha culhões para isso, viadinho de merda. — Depois do
comentário preconceituoso, o russo desferia uma forte coronhada na lateral da
cabeça do transmorfo, que desabava com a pancada, derrubando a pistola para
longe.

— Vacilou uma vez e vai vacilar mais... Ficou claro que você não está à altura para o
serviço! — Boris dava dois chutes na barriga de Rodrigo caído e apontava para a
jaula, sem pestanejar descarregava a munição nos moradores de rua, fazendo
questão que Rodrigo testemunhasse o múltiplo homicídio.

— Viu? É assim que se faz! — Colocou o cano da arma enfumaçado dentro da boca
do transmorfo, queimando seus lábios. — Mas relaxa gracinha, você tem um dom
muito bom, é isso que ainda vai te manter vivo, pelo menos por enquanto. —
Retirando o cano da arma, Boris se ergueu novamente e começou a espancar o
pobre Rodrigo, até ficar inconsciente.

A desordem no Olimpo precisava ser desfeita, não apenas a desordem física, mas
também a moral, e era por essa questão que Jesse começava. Reunindo os
capangas sobreviventes - Gal, Vladimir, Galathea e seu grupo - ao redor da mesa
onde Tony Montana havia falecido. O pobre Castelone tinha uma responsabilidade
maior do que conseguia suportar. Ele nunca foi capaz de falar em público, nem
mesmo quando precisava apresentar um trabalho na escola quando era mais jovem.
E agora, ele tinha que ser o orador para um bando de assassinos e ex-combatentes
de guerra. Ainda abalado pela morte do chefe, sentia um enorme peso em suas
costas. Na primeira tentativa, sua voz não saiu, na segunda teve um pouco mais de
sucesso, mas ainda pigarreava e seu tom de voz ainda era baixo. Na terceira vez, ele
limpou a garganta e reuniu coragem, conseguindo finalmente se expressar.

—Não sei por que ele me suportava... Acho que era a generosidade... — Soluçou,
mas todos sabiam naquela sala que Tony podia ser tudo, menos generoso.

— Em troca dessa grande generosidade eu vou falar em nome dele... Exatamente as


suas últimas palavras... Que foram... — Pausou, respirou fundo, tentando não
soluçar.

— Não deixe Yuric tomar Miraitropolis, ela pertence a mim, mas como estou
morrendo, ficará aos italianos. Mas você meu filho, infelizmente é fraco, medroso e
covarde, não vejo futuro com essa atitude, a menos que mude muito. Mas como não
estarei vivo para ver essa mudança, e nem minha Akane, quero que deixe o comando
do meu legado para Galathea. — Ele pausou para que todos pudessem absorver
melhor. No entanto, prosseguiu — Nas veias dessa mulher corre o mesmo sangue
que o meu, temos os mesmos descendentes... E vejo nessa mulher uma força
semelhante a minha. Estamos aos pedaços, muito sangue foi derramado, perdemos
muitos soldados... Como minha última quero que reerga a Cosa Nostra, não deixe
aquele russo filho da puta virar o dono da cidade. — Findou e novamente pigarrou.

— Foi o pedido no leito de morte... Senhorita Galathea, tens vinte quatro horas para
aceitar ou declinar. Agora me deem licença... Tenho que cuidar do funeral do Senhor
Montana e sua esposa. — Jesse se retirou, indo para o quarto de Tony, mas antes
chamou Vladimir com ele, assim como os asseclas sobreviventes.

Os homens de Montana tinham muito serviço pela frente com por exemplo a retirada
dos corpos dos mortos dos andares. Eram empilhados uns em cima dos outros, e
entre tantos eram encontrados Herrera e Coronel, pai e filho que por falta de uma
boa oportunidade de emprego entraram no cartel italiano para não deixar a família
morrer de fome. Por serem bons soldados e eficientes no que faziam, ambos eram
de extrema confiança de Tony, no entanto diante os agentes bem treinados de Yuric
não tiveram a menor chance e naquela noite encontraram a morte nas mãos russas.
Apesar de ainda não saber, uma mãe e esposa iria enterrar marido e rebento no
mesmo dia. O agente de Yuric que estava preso em um dos andares foi executado
com um tiro na cabeça. Vladimir antes de seguir para a sala secreta privada, pegou a
inconsciente Margareth Ignov nos braços e a carregou junto consigo. Julgava que a
filha de Yuric ainda poderia ser uma forma de barganha, apesar de ficar claro que era
verdade, seu pai não ligava para ela, já que o objetivo todo tempo era aniquilar o rival
e não salvá-la. Os demais estavam liberados, e Galathea junto do seu grupo tinha um
dia para decidir se assumia o controle da máfia italiana, dando continuidade ao
legado de Montana ou não. Dentro do quarto, Jesse, Vladimir e alguns capangas
observavam o casal morto na cama king size. Ficava evidente que Castellone não
tinha a mínima ideia do que fazer. O agente triplo quebrava o silêncio.

— Meu jovem, vou lhe ajudar até Galathea decidir se assume os negócios de Tony ou
não. — O olhar do garoto brilhou.

— O-o-obrigado Senhor Stanislavsk, sua ajuda... Sua ajuda... Será... — Ele gaguejava
emocionado, sem conseguir terminar a frase.

— Não precisa ficar nervoso, camarada. — Tocou no ombro de Jesse. — Vamos


começar reforçando a facção, mesmo que tenha que armar qualquer vagabundo,
mesmo que tenha que dar uma arma a qualquer trombadinha nas esquinas...
Espalhe nas nas ruas que a máfia italiana está admitindo gente nova. Ofereça bons
pagamentos para profissionais de todas as áreas. Isso também vai mostrar a Yuric
que vocês não estão acabados. — Mais confiante, Jesse se voltou aos capangas e
falou alto.

— Vocês ouviram o Senhor Stanislavsk, espalhem nas ruas que estamos procurando
gente para ingressar na Cosa Nostra!!

Aqueles momentos onde tudo estava sendo reescrito em Miraitropolis, Pollux e X-9
conversavam no Consertos e Outras Coisas. Sentados cada um em uma pilha de
metais retorcidos, a hacker deixava o ex jornalista a par sobre a morte do mafioso
italiano, de tudo que aconteceu no Olimpo e o que descobriu sobre si mesma nos
arquivos de Yuric, assim como ele também a deixava a par sobre suas desventuras.
Mais do que tudo eles tinham que escolher o rumo a tomar, se continuariam com os
italianos mesmo em frangalhos ou se por infortúnio teriam que se aliar a outra
facção. Quem tinha a palavra no momento era X-9.

— Sei lá, cara... Acho que já deu pra os italianos, é melhor a gente se juntar com o
Pascal, ou até mesmo com o Xiaren, ele era amigo do Tony né? De qualquer forma
não estaríamos virando casaca... Não totalmente... — Ela dizia isso para se
convencer.

— Mas você ainda tem assuntos a resolver, tem esse tal de Tim, e esses dois
merdinhas aí. —Deu um pontapé em um dos homens rendidos que estava amarrado
e amordaçado ao chão.

— E eu tenho muitas coisas na cabeça... Esse lance de ser uma replicata... E eu sei,
não precisa se desculpar de novo... Apesar de você merecer um soco nessa cara, eu
te perdoei. Afinal, estragaria esse rostinho lindo né? — Ela sorriu para ele.
— Tem o lance também da Vangelis se vendendo para o Nick Slay, e por isso ela
indicou Coltraine a vocês... Tudo bem que não foi de todo ruim, você conseguiu um
novo contato... E a cybertropina. Mas parecer que fomos manipulados me
incomoda... Ok, vou deixar esse assunto para depois, Vangelis está fora de
Miraitropolis mesmo. Vamos decidir primeiro o que faremos, se continuamos com o
time do Tony ou não. E depois, tô contigo pra o que der vier contra esse Tim, ele quer
ferrar a gente por causa do que aconteceu no Canal 17, mas aquilo foi efeito
colateral... — X-9 suspirava, tentando se convencer do próprio argumento.

— Tim não vai foder com a gente, K'dore não conseguiu, Telford também, não será
ele que vai conseguir! Enquanto você pensa, vou chamar uma amiga pra se juntar
com a gente. Ela além de gente boa, é uma tremenda gata. — Cutucou o braço de
Pollux com o cotovelo. — Manja pra caramba de carros, isso pode nos ser vital se a
coisa feder e precisarmos escapar. Sorte que ela é meio doida e topa umas paradas
tão malucas quanto. — Deslizando os dedos pelos fios, empurrava os conectores da
manopla plugando os cabos nas duas entradas na lateral da cabeça. Dentro da Lexis
mais uma vez ela conseguia entrar no computador pessoal de Max, sua amiga
mecânica e deixava uma mensagem para mesma. Bastava apenas pensar que as
letras surgiam formando palavras no monitor da amiga.

— Oi, Max, tudo bem? Quanto tempo... Não nos vemos desde... Ih, nem lembro,
sinceramente... Bom, como sei que você é maluca o bastante para topar, tá afim de
se juntar comigo e um outro amigo numa parada perigosamente insana? Vou te
explicar rapidinho. A merda ainda não foi jogada no ventilador, mas logo logo será...
A mídia não falou nada porque a coisa não tomou grandes proporções... Tá rolando
uma briga entre as máfias italiana, russa, latina e oriental, e tá ficando feio... O
chefão russo raptou um amigo Detetive do chefe Italiano, eles começaram a tretar,
as outras máfias se meteram e agora tá essa putaria de um querendo comer o
fígado do outro. Rolou uma parada tensa no aeroporto abandonado e a filha do
russo foi raptada pelo Poderoso Chefão, é o Tony Montana. Mas se liga que a
melhor parte vem agora, o Yuric como retaliação mandou os homens dele invadir o
prédio do Don Corleone.. AH! E ainda contratou um hacker pra tomar controle do
edifício. Eu mesma não consegui fazer muito pra impedir o hacker, odeio admitir,
mas o filho da puta é bom mesmo. Resultado disso foi que um atirador conseguiu
matar o Tony e a ruiva vadia que ele traça. Não vai demorar muito pra notícia se
espalhar pelas ruas e conhecendo como esses caras são, eles vão recrutar qualquer
pessoa, principalmente as que se destacam em alguma área importante. Ou seja,
querendo ou não, mais cedo ou mais tarde vão descobrir seu dom e um capanga de
algum deles vai bater na sua porta querendo te recrutar. Se negar, vão te ameaçar e
vai ter que aceitar de qualquer forma... E eu acho que assim como eu, você gosta de
ter um mínimo de controle sobre seu destino. Então antes que isso aconteça, ainda
tem a chance de escolher. Pegue o que puder, traga um bom carro e me encontre no
Centro, no Consertos e Outras Coisas, é uma mecânica mas parece mais um tipo um
ferro velho que fica perto da Avenida Armitage, deve conhecer. Estarei com Pollux,
ele é de confiança. — Finalizada mensagem, mantendo a manopla ativa para
receber a notificação da resposta da amiga. Ela se virou para o ex jornalista,
sorrindo.

— Acho que ela vai topar, a Max não negaria um pedido meu, vocês vão se dar bem.
Pedi pra trazer um carro, a gente pode levar esses trastes com a gente. — De pé a
frente do trailer da oficina, a hacker acendia um cigarro, esperando a notificação da
mensagem da amiga, também esperava a decisão de Pollux.

E como X-9 profetizou ainda naquela mesma noite trágica, o boato da morte do
gângster italiano corria as ruas, e com ele a notícia de que a Cosa Nostra estava
"admitindo" novos funcionários. Quem estivesse interessado que fosse até a boate
Meia Noite, em toda a iluminação excessiva e hologramas comerciais de Miratroid e
encontrasse com Vladimir e Castelone para uma audiência. O dono do lugar era um
chefe xamã da gangue de jamaicanos, Fellows Nation, mostrando que a primeira
aliança era feita com os mesmos.

Xiaren sabia que mesmo sem Montana os italianos ainda eram perigosos e bastante
vingativos, seus homens com raiva não sossegariam até que restasse o último
russo em pé e estudava uma possibilidade de unir sua facção com a mesma. Com
Yuric tomando a cidade ele nunca chegaria ao topo, não que com Tony fosse
diferente, mas ao menos tinha algumas liberdades e vantagens com o colega.
Também estava "contratando" no seu restaurante em Little Asia, Xīwàng.

Pascal não tomava conhecimento sobre o óbito em sua sala privê, estátuas
hedonistas segurando luminárias - um homem e mulher da cor de ouro, nus - em
forma de globo iluminavam a dança exótica de uma prostituta de top less em cima
da mesma no pole dance. Mesmo assim não se animava, afundando em bebida e
drogas os círculos escuros à volta dos olhos e as rugas que adquiriu na última
semana mostrava o estado preocupado do pobre homem que havia perdido o irmão.
Era um zumbi sentado nos assentos de veludo vermelho. Seu estado embriagado e
narcotizado o bloquearam de qualquer informação que seus empregados
passavam. Porém como Montana, Xiaren e Yuric, Fernando também tinha seu braço
direito que pensaria por ele nas horas mais difíceis, contudo um título apenas não
torna ninguém um líder, o que define isso é a personalidade forte. O homem com
essa personalidade apesar de não ser do alto escalão da facção latina era Roberto
Noronha, um brasileiro, mulato, preferia se vestir com roupas esportivas, uma
camisa polo e uma calça cheia de bolsos em vez de o tradicional terno escuro e
gravata. Mas certamente o que mais se destacava nele eram os implantes oculares
escuros como um óculos de sol, e as próteses abaixo dos joelhos, semelhantes a
duas pás de carbono. Havia "ganho" elas depois do atentado à bolsa de valores, a
explosão derrubou uma fachada que esmagou seus tornozelos. Assim que se
aposentou por invalidez, o dinheiro não dava para se sustentar e cedeu aos encantos
do dinheiro fácil da máfia do seu bairro. Não era totalmente infeliz, o salário permitiu
comprar aquelas próteses velocistas, Roberto Noronha passou a ser conhecido por
sua extrema velocidade quando corria. Isso garantiu subir de cargo em pouco
tempo, na verdade poucos meses e agora era o segundo em comando.

— Pascal não está em condições, vamos dar mais um tempo ao chefe. — Ele falava
para outros dois homens com porte de segurança em uma sala espelhada da
Vênus.

— A essa hora as outras máfias estão se organizando pra verdadeira guerra que vai
estourar. Tenho uma gama de sugestões a fazer. Primeiro, a gente vai trancar a
venda de armas no Rio Bravo, o maior polo de tráfico de armas está em nosso
território. Segundo, estamos em desvantagem sem Dog e com Pascal na fossa,
então entram duas opções, se aliar a Yuric. — Os homens na sala resmungaram até
praguejavam com o nome do russo. — Calma, calma, eu sei, não me agrada também,
mas o cara está crescendo, e quem sabe uma aliança liberte o Dog Loco. A segunda
é se aliar a Cosa Nostra. Eles tão caídos, mas não dá pra subestimar os
carcamanos. — A ideia não agradava os homens também, mas parecia ser menos
nojenta. — E ainda tem uma terceira, nos aliar a Xiaren, talvez juntos possamos
impedir os italianos de voltar a crescer e ainda dar um chute nas bolas dos russos.

— De qualquer forma vamos pensar como uma equipe, quero a opinião de vocês. Por
enquanto, vamos fazer uma visita a alguém. — Roberto e o restante dos homens
entraram três carros cheios de capangas. Nem necessidade de andar pelas
turbulentas avenidas de Miraitropolis, recolheram as rodas e içaram voo acima das
escuras e esfumaçadas ruas, entre os prédios sufocados por luminosos.

Chegando em Rio Bravo em poucos minutos, eles estacionaram o automóvel


antigravitacional em frente a uma entrada para o subsolo, que levava a uma antiga
estação de metrô da cidade transformada em um tipo de bar. Isso era evidente pela
escadaria que descia para dentro do chão, pelos neons roxos e amarelos e pelos
azulejos desgastados nas paredes. Embora estivesse localizado no bairro brasileiro,
a placa de entrada estava escrita em japonês. O dono era um velho preguiçoso
demais para fazer a troca de idioma. Mas isso não importava, pois todos conheciam
o local. Era o Buteco do Seu Zé. Um ponto de encontro para ex-presidiários, fugitivos,
traficantes de drogas e órgãos, e até mesmo escravos do deserto. Além disso, ali
ocorriam negociações do mercado negro, jogos de azar e, é claro, prostituição. O
lugar era frequentado por muitos bêbados e viciados em implantes e drogas virtuais,
e brigas não eram raras de se presenciar. Seu Zé, ou simplesmente Zé, geralmente
ficava atrás do balcão, com sua espingarda calibre doze e suas duas androides de
segurança. Apesar de tudo, ele parecia um homem comum e pacato de meia-idade,
com cabelos e barba grisalhos. Quem não o conhecia, jamais imaginaria que ele era
o maior vendedor de armas da cidade. O ambiente parecia um ferro-velho com luzes
de boate. Roberto e os outros atravessaram mesas repletas de almas perdidas na
noite. O dono não estava no balcão, em seu lugar havia uma das androides servindo
bebidas. Noronha se apresentou e a androide permitiu a entrada deles para a sala
atrás do balcão. Enquanto reuniam os lucros do dia com o contador de Créditos, um
visor repleto de cabos com uma lente do lado esquerdo, Zé deu as boas-vindas aos
jovens gangsters.

— Boa noite rapazes, no que posso ser útil? — Respondeu ele, sem remover o
contador de créditos.

— Seu Zé, o senhor ficou sabendo da morte do carcamano? — Com um sinal de


positivo o mais velho respondeu que sim com a cabeça.

— Ótimo, então sabe que estamos às portas de um confronto. — O homem de meia


idade repetiu o gesto anterior.

— Excelente. O plano vai ser esse, o senhor vai vender armas apenas para nós, e
nossos aliados, eu quero impedir que as outras máfias tenham acesso a facilidade
bélica que você proporciona. Isso não vai impedir que consigam se armar, é claro,
mas vai dificultar bastante. — Roberto acendia um cigarro, sentado na mesa a frente
de Zé.

— Terei então que dizer não aos meus clientes na época em que mais iria lucrar?
Pascal sabe que essas "Temporadas" me deixam mais rico? — Indagou o traficante.

— Pascal infelizmente não se encontra em condições de planejar algo, ele ficou


muito abalado com o rapto do irmão. Até ele se recuperar, estou no comando. Mas
isso não importa, gostaria de saber se vai colaborar com a gente? — Seu Zé
suspeitava que Roberto queria tomar o lugar de Pascal, seu amigo, no entanto não
tinha certeza, era cedo demais para deduzir.

— Mas é claro meu jovem amigo, estou no território de vocês, e por mais que me
desagrade não vender o peixe quando a maré está alta, o que posso fazer? Sou
apenas um humilde trabalhador nessa cidade repleta de oportunidades. — Seu Zé
sorriu de forma irônica, Roberto sacou, mas sabia que o velho não desobedeceria.
Se levantou da cadeira e se retirou do recinto.
Em frente a diversos monitores suspensos nas paredes, Cyrus usava todo seus
conhecimentos para salvar a inteligência artificial Cabal. O erro de Cyrus, diferente
de X-9 e Praxis foi permanecer online mesmo depois de provar sua superioridade e
controle sob o sistema do Olimpo. Seus esforços pareciam em vão, cada minuto que
passava uma tela se apagava como uma televisão fora de sintonia. O hacker rival ao
que demonstrava queria brincar com Cabal, infectado-o. A I.A. estava perdendo a
batalha e seu criador entrando em desespero batia na cadeira de metal em que
estava sentado, destruído as peças, arrancando fios, arremessando para longe o
visor de realidade virtual que utilizava.

— Ferrou, Katt, perdemos o Cabal para esse vírus! Todo nosso investimento...
Nossos planos... Droga! — Gritou para sua fiel companheira, Katterine Webner.

— Sem dinheiro e sem Cabal, o que vamos fazer, como vamos viver? Estava tudo
certo... Tony Montana ia encher nossa conta bancária... — Em surto, Cyrus não
parecia o mesmo jovem calmo de sempre. A dificuldade transformava as pessoas
em monstros. Não era tudo, o rival do jovem parecia querer mais, do tipo de gente
que gosta de se alimentar de terror psicológico. Invadindo o sistema da dupla,
colocando todas a suas defesas abaixo, Darkness usava os telões remanescentes
para enviar uma singela mensagem a aqueles dois que ele considerava ingeridos. O
recado era claro, simples e direto, o prenúncio confrontou Cyrus como se injetassem
água gelada em suas veias e paralisou. Ele não podia acreditar em seus olhos

— Katt... Katt... Você precisa ver isso... A gente se meteu com peixe muito grande...
Foi um vacilo enorme... Deixe tudo como está no nosso esconderijo... Não mexa em
nada... Vamos vender nossos bens pessoais, hoje mesmo partiremos para Nova
Transilvânia recomeçar a vida lá... Miraitropólis anda muito perigosa... Não quero
problemas com esse Darkness.

Como ordenado por Boris, Caz era largado do outro lado da cidade, em Hapton
Heights, um bairro praticamente esquecido e abandonado, usado como um lixão
gigante pelas indústrias de Miraitropolis. Além do lixo da cidade são descartados
androides, qualquer outro tipo de produto indesejado, incluindo cadáveres e bebês.
O lugar parecia o inferno na terra. Caz se erguia com os ferimentos abertos sob os
entulhos de lixo e sujeira, o que via era um bairro com prédios e torres de chaminés
em ruínas, como se uma guerra tivesse devastado tudo ali. A escuridão era a dona
do lugar.

Enquanto isso no Cassino Overdose, em Troika, Yuric recebia em sua sala o atirador
que havia assassinado Tony Montana. Trigger. O homem entrou no escritório do
chefão russo acompanhado de dois seguranças. Ficando a frente de sua mesa
Ignov se levantava da cadeira e ia até o sniper, o abraçando e comemorando, uma
recepção bem calorosa para um russo.

— Muito bem, muito bem, quis receber pessoalmente o homem que me entregou
Miraitropolis. Saiba que por causa do seu feito não apenas sua reputação será das
melhores, como ficará ainda mais rico. Aqui está a quantia combinada pelo serviço
muito bem finalizado, tenha uma uma boa aposentadoria. — Yuric se levantava da
cadeira, ajeitando o colarinho de sua camiseta branca com suspensórios.
Excentricamente também usava luvas da mesma cor. Ninguém sabia a razão
daquilo. Mais do que tudo, era uma maneira de intimidação, onde poderia revelar a
pessoa seu porte físico avantajado.

— Aposentadoria? — O mesmo sorriu. — Você deve saber que quanto mais se


ganha, mais se quer. Isto não é tudo para mim. — De terno e não mais com seu traje
sniper, ele recebia de Ignov um cartão plástico vermelho, contendo dois milhões de
Unidades de Créditos.

— É assim que gosto de ouvir, quer dizer que vai continuar trabalhando para mim? —
Ignov cruzou os braços.

— Sem dúvidas! — Respondeu o atirador, na mesma hora, sem hesitar.

— Tenho uns novos trabalhos para você, meu caro. — Voltou a ficar atrás da mesa,
mexendo alguns papéis.

— Vou requisitar novamente aquele traje de repulsão magnética, se não fosse ele a
essa hora era eu que estaria sendo velado em vez de Montana. — Sorriu em
deboche. Ignov concordou com a cabeça.

Considerações:

1 - Gal e Rodrigo viraram npcs.

2 - Galathea tem uma grande responsabilidade, aceitar ou declinar quanto a


proposta de liderança dos italianos.

3 - Pollux também tem uma escolha a fazer, se continua do mesmo lado da guerra
ou aceita a sugestão de X-9 de mudar de time. E se mudar, escolher qual nova
facção, já que a hacker espera uma resposta.

4 - Max narrará a sua chegada até o centro, ao encontro de X-9 e Pollux. Ou algum
outro destino que ela escolher.
5 - Tim está livre para narrar e ir onde quiser, fica a seu próprio critério dentro da
trama.

6 - Aos novos jogadores, sejam bem vindos. Precisam dizer a qual máfia se unir,
russos, italianos, latinos ou orientais e ir até os respectivos locais:

Cassino Overdose de Yuric em Troika, caso queiram aliança com os russos.

Boate Vênus, na Cidade Média, se quiser falar com Roberto para ingressar na máfia
latina.

Bar Meia Noite em Miraitroid se quiser fazer parte da Cosa Nostra (italianos)

E por fim, Restaurante Xīwàng, em Little Asia se a escolha for a Ryulong dos
orientais.

Lembrando que vocês vão participar de uma "audiência" com os responsáveis de


cada facção, explicando os motivos (como uma entrevista, que cada player fará
conforme achar melhor) do porquê entrar naquela máfia. Caso não consigam
inventar uma motivação, pode ser utilizado o contexto do jogo, foram "recrutados"
para se juntar ao grupo por alguma capacidade ou qualidade que tenham destaque.

Timothy Carter
De pé, caminhando de um lado para o outro, estava Rose com o relógio próximo à
boca enquanto conversava incessantemente. Pela expressão em seu rosto, parecia
ser algo realmente sério. Enquanto isso, Timothy estava diante do espelho, vestindo
sua camisa social branca. Ele dava um nó na gravata vermelha, colocava um terno
simples de cor marrom e, para finalizar, passava a mão direita molhada no cabelo.
Ao sair do banheiro, seus olhos se encontravam com os de Rose, que havia
finalizado a ligação.

— Qual o problema? — Perguntava, baseando-se na expressão séria estampada no


rosto da ex-policial.

—Montana ta morto cara, meu informante nas ruas disse que não se fala de outra
coisa. — Tim ao ouvi-la, suspirava por um segundo. — Um dos culpados morreu, não
fui o responsável, mas me sinto aliviado de alguma forma. — Tony era um dos
responsáveis pelo atentado ao Canal 17, tirá-lo do jogo era um dos objetivos de
Timothy, que agora ele não precisaria mais cumprir. — O jogo vai ficar mais sério, a
morte dele foi algo inesperado no mundo do crime, ele mantinha os mais insanos da
cidade na linha.

— Iremos até o fim e ainda temos muito a fazer. — Ela olhou para Tim, fazendo um
sinal positivo com a cabeça, ele então fez mais uma pergunta. — Falou com a
tenente? — A expressão séria de Rose quebrou-se e um sorriso sínico surgiu na sua
face.

— Sim, e como esperado ela não recusou, disse que em duas horas estará aqui. —
Para Timothy aquelas palavras soaram como um presente, ter alguém importante na
polícia escutando-o seria extremamente importante.

Duas horas depois.

O furgão azul blindado, com o nome ParaMilitech escrito na lateral, parou em frente
ao pequeno edifício residencial. Do seu interior, emergiram uma mulher de cabelos
castanhos na altura dos ombros e um homem vestindo a armadura de combate
utilizada pela maioria dos soldados da polícia privada. Juntos, eles adentraram o
prédio e bateram na porta do apartamento onde Timothy e Rose se encontravam.
Rose prontamente abriu a porta, permitindo a entrada da Tenente Aurora McCall e do
soldado. Enquanto isso, Timothy permaneceu parado, com as mãos mergulhadas
nos bolsos de sua calça.

— Vamos lá, não tenho tempo para papo furado, digam o que tem para mim. — Disse
a tenente em um tom rude e autoritário, encarando Tim e Ortiz com um olhar sério.

— Calminha aí, vamos colocar na sua mão um presente e é assim que você nos
trata? —

A tenente apontava para o relógio no seu pulso esquerdo. — Não tenho tempo para
besteiras Rose, vai dizer o que sabe ou não? — Timothy então decidiu falar, dando
um passo para frente.

— Sabemos que estão desesperados, precisam acusar alguém pela merda


acontecendo na cidade, temos a localização dos Steelhearts. – Aurora mudava a
expressão, ficando claro que agora eles tinham sua total atenção. – Em troca
queremos apenas que você fique devendo uma para nós, entramos em contato
quando você precisar pagar.

— Digam a maldita localização e se realmente estiverem lá, fico devendo vocês,


feito? — Timothy fazia um sinal positivo com a cabeça, olhando para Rose.
— Certo, certo. Eles estão operando no subterrâneo de um bar chamado Sexy Day
em Miraitroid. — Contou Rose, cruzando os braços logo em seguida. A tenente
McCall fez um sinal com a cabeça para o soldado ao seu lado.

— Vamos sair daqui, parece que temos mais trabalho para fazer. — A dupla da
ParaMilitech foram embora, Rose fechou a porta do apartamento e questionou Tim.

— Será que isso vai dar certo?

— Espero que sim! — Respondeu acendendo um cigarro.

Toshio Soujirou
Naquele dia havíamos recebido somente dois carros. As ruas estavam uma loucura,
não que elas já não fossem, mas no momento estava pior ainda. Essa merda de
guerra entre esses mafiosos, acabava por atrapalhar todo mundo e não trazia nada
de bom para a comunidade. Max estava nos fundos da oficina, procurando algumas
ferramentas, uma vez que um dos carros que tinham chegado para nós utilizava um
sistema de gravidade mais complexo, enquanto que eu, estava sentado numa das
poucas mesas "organizadas" que ainda tinham por ali, mexendo em alguns
programas, justamente para adiantar o lado da minha patroa. Foi nesse momento,
que um pequeno som ecoou pelo local, era um som bem baixo, mostrando que Max
havia recebido uma mensagem em seu computador pessoal. A princípio ignorei o
som, mas de inúmeras formas pensamentos escrotos começaram a vir à minha
mente. Será que era algum namorado novo dela? Amigos? Será que era aquela
amiga dela que ficava tentando levar a Max para umas enrascadas? AAAAAAAHHH!!
PORRA!! O que será?

— TOSHIO!! ONDE ESTA A PORRA DA CHAVE MAGNÉTICA!? VOCÊ USOU ESSA


CARALHA NESSES SEUS BRINQUEDOS DE NOVO? — Gritava Max, dos fundos da
oficina, ao mesmo tempo que se dava para ouvir sons de coisas sendo reviradas.

— Não mexi nela dessa vez!! Procura que você acha!! — Gritei de volta. Não
aguentando fui até o pc pessoal dela e peguei ele rapidamente. Não era difícil
passar pela segurança dele, quando você já o espia faz algum tempo.

Abri a mensagem e advinha? Era da tal X9, aquela amiga que eu disse, que só vive
se metendo em merda. Foi quando vi que a mensagem parecia urgente e um tanto
longa. Abri a mensagem e comecei a ler rapidamente, logo Max entraria pela oficina
e se me visse mexendo em seu computador, ou eu perdia o emprego ou eu perdia a
cabeça.
" Oi, Max, tudo bem? Quanto tempo... Não nos vemos desde... Ih, nem lembro,
sinceramente... Bom, como sei que você é maluca o bastante para topar, tá afim de
se juntar comigo e um outro amigo numa parada perigosamente insana? Vou te
explicar rapidinho. A merda ainda não foi jogada no ventilador, mas logo logo será...
A mídia não falou nada porque a coisa não tomou grandes proporções... Tá rolando
uma briga entre as máfias italiana, russa, latina e oriental, e tá ficando feio... O
chefão russo raptou um amigo Detetive do chefe Italiano, eles começaram a tretar,
as outras máfias se meteram e agora tá essa putaria de um querendo comer o
fígado do outro. Rolou uma parada tensa no aeroporto abandonado e a filha do
russo foi raptado pelo Poderoso chefão, é o Tony Montana. Mas se liga que a melhor
parte vem agora, o Yuric como retalhação mandou os homens dele invadir o prédio
do Don Corleone.. AH! E ainda contratou um hacker pra tomar controle do edifício.
Eu mesma não consegui fazer muito pra impedir o hacker, odeio admitir, mas o filho
da puta é bom mesmo. Resultado disso foi que um atirador conseguiu matar o Tony
e a ruiva vadia que ele traça. Não vai demorar muito pra notícia se espalhar pelas
ruas e conhecendo como esses caras são, eles vão recrutar qualquer pessoa,
principalmente as que se destacam em alguma área importante. Ou seja, querendo
ou não, mais cedo ou mais tarde vão descobrir seu dom e um capanga de algum
deles vai bater na sua porta querendo te recrutar. Se negar, vão te ameaçar e vai ter
que aceitar de qualquer forma... E eu acho que assim como eu, você gosta de ter um
mínimo de controle sobre seu destino. Então antes que isso aconteça, ainda tem a
chance de escolher. Pegue o que puder, traga um bom carro e me encontre no
Centro, no Consertos e Outras Coisas, é uma mecânica mas parece mais um tipo um
ferro velho que fica perto da Avenida Armitage, deve conhecer. Estarei com Pollux,
ele é de confiança. "

— Wow!! — Pensei. Então era isso que estava rolando? Cara. Era hora de me colocar
no mapa. Sem falar que a parte de que eles estariam para recrutar pessoas e
aparentemente eles poderiam vir ameaçar ou obrigar Max a trabalhar pra eles. Nem
fodendo que eu ia deixar isso acontecer. Era uma oportunidade de matar dois
coelhos com uma cajadada só. Primeiro defendendo Max desses desgraçados que
lotam a cidade, e segundo, poderia me infiltrar na máfia de forma rápida e simples.
Bem, a ideia não seria exatamente entrar na máfia, mas o "Ronin".

Copiando a mensagem para meu datapad, fechei a mesma e deixei o pc da Max do


jeito que estava antes. Foi nesse momento que uma das portas da oficina se abriu.
A porta que era daquelas de correr, se abria repentinamente e aquilo me dava um
puta susto. Por um segundo achei que havia sido pego com a boca na botija, mas
quando olhei, era só a minha stalker de cada dia, Jenny.
— O que você está fazendo? — Perguntou a jovem. Jenny era uma garota de 16 anos
(mesma idade de Toshio) e que claramente era a fim do mesmo, só que acabava por
não ser notada, já que Toshio era gamado pela própria chefe.

— Nada. A Mad pediu pra eu ajeitar algumas coisas no pc dela e tu não sabe o que
eu vi... Precisamos conversar fora daqui. Temos que achar o Pedro e o Dollar. Eles
vão querer ouvir essa também. — Se levantando rápido, Toshio puxava Jenny pelo
braço e a menina não parecia entender nada.

— MAX! VOU DAR UMA SAÍDA!! — Gritei, para ela saber que eu tava tirando uma
pequena folga.

— O que?! Você tem que me ajudar seu merdinha!!

— Eu vou ajudar! Mas quando voltar! Deixa que a parte eletrônica dos carros eu
cuido!! FUI!!

Antes que Mad viesse me dar algum esporro, peguei minhas coisas e saí correndo
com Jenny. Eu esperava seriamente que Mad recusasse aquele pedido da tal X9,
mas conhecendo como elas ficam quando se juntam, eu duvido que fosse acontecer
assim. Jenny me seguia, perguntando que bicho tinha me mordido, mas eu não tinha
tempo de explicar, eu precisava falar com Pedro e com Dollar. Pedro era um amigo
que conheci quando Mad tentou me obrigar ir à escola, ele morava em Rio Bravo e
gostava de motos assim como eu, já Dollar, era um riquinho, que nós salvamos de
uns punks otários que estavam tentando extorqui-lo, desde então ele vive nos
seguindo como se fosse um mascotinho.

Do lado de fora da oficina, montei na minha moto e coloquei o capacete estilizado


que eu havia feito com restos de sucatas da oficina, Jenny subia logo atrás e se
ajeitava na garupa. Dei a partida no motor ligando os sensores magnéticos que
fizeram o mesmo ranger e pequenas faíscas de estática se espalharem pelas rodas.
Para quem não sabe, eu havia modificado minha moto para ficar exatamente igual à
moto do Kaneda, do filme Akira. Eu adorava aquele filme e desde criança sonhava
em ter uma moto como a dele. Nomeei minha moto de RedAkira, justamente por
isso.

— Toshio, o Pedro disse que encontra a gente lá na fábrica, e o Dollar disse que está
numa festa de ricaços com o pai dele, mas que assim que puder nos encontra lá. —
Dizia Jenny falando com os outros dois amigos, pelo datapad.

— Certo! Se o Pedro já tiver lá, não tem problema. — Dito isso, acelerei a moto e
disparei com a mesma pelas ruas de Miraitroid. Meu capacete, automaticamente, já
traçava a rota que eu desejava e através de uma pequena realidade aumentada
mostrava no chão o caminho que eu devia fazer.

Era estranho ver as ruas de Miraitroid tão vazias, as pessoas podiam não saber ao
certo o que estava rolando, mas aquela cidade parecia que possuía um instinto para
coisas ruins. Provavelmente as pessoas já suspeitavam que a máfia devia estar se
enfrentando. Não demorou para que cruzássemos às ruas de Miraitroid, chegando
aos limites da cidade onde havia um terreno de uma fábrica abandonada. Era ali que
ficava nosso point, onde eu sempre me encontrava com meus amigos mais
chegados. Entrei no terro com moto e tudo, através de um buraco na cerca que
ficava escondido devido a um outdoor enganando que olhasse somente de relance,
no entanto para quem conhecia o lugar, sabia que atrás do outdoor havia essa
pequena "entrada".

Estacionei a RedAkira num dos becos da fábrica. Jenny desceu da mesma meio
revoltada, provavelmente estava puta da vida por eu ter arrastado ela para lá sem
explicar o que estava rolando. Apertando um pequeno botão no meu capacete, o
mesmo se recolhia a ponto de eu poder guardá-lo no bolso.

— Você vai explicar agora o que está acontecendo ou não? — Perguntava a jovem de
cara feia.

— Primeiro vamos encontrar o Pedro, depois eu falo.

Entramos na fábrica pela porta lateral da mesma. O local estava totalmente vazio, e
ligando as chaves de forças as luzes se acendiam. Você pode estar se perguntando
como uma fábrica antiga ainda tinha energia... Bem, eu não sou considerado um
jovem gênio atoa, não trabalho numa oficina consertando carros de alta tecnologia
aos meus 16 anos, atoa também. Sentei no sofá velho que tinha no centro da fábrica
e relaxei até a hora que Pedro chegasse. Jenny ainda parecia revoltada e por isso
ficava sentado nas escadas longe de mim. Às vezes eu olhava para ela, querendo
explicar logo, mas vendo a cara emburrada, eu sabia que no mínimo eu levaria umas
patadas de graça. Dez minutos se passaram e então Pedro chegou. A porta se abria
e o mesmo vinha falando algo sobre como conseguiu cortar dois carros que
estavam batendo um pega, mas antes que ele continuasse, ao ver nossas caras de
apreensivos, sua voz falhou e ele nos olhou sério.

— Ih alá, o que que tá pegando? — Perguntou. Pedro era um adolescente de 17 anos,


negro, e com 1,87 de altura. Tinha um cabelo com sidecut azul que brilhava devido a
tinta de neon que ele passava no cabelo. O mesmo também geralmente sempre
estava usando óculos da moda, sendo esse seu maior vício.
— Finalmente, cara! Agora posso contar sobre nossa ascensão dentro da máfia! —
Falei, soltando a bomba de forma inesperada.

— COMO É QUE É? — Falaram os dois de forma uníssona, mediante a informação.

— Exatamente! Vamos entrar nessa guerra de gangues... Aliás, eu vou entrar. — Falei.
Pedro ficou quieto imediatamente, mas Jenny parecia super alterada.

— Como assim!? Não fala merda Toshio! Uma coisa é ficar pegando uns punks
retardados dentro de Miraitroid, outra coisa é você querer se meter com as máfias
maiores e entrar numa delas bem quando eles resolvem criar uma guerra!! Você
pirou total!

— Você não entendeu Jenny! A merda foi jogada no ventilador, os caras estão
recrutando qualquer um, por que aquele tal de Montanna virou presunto. Se eu entrar
como "Ronin", eu posso conseguir informações, contatos, e se bobear eles até
mesmo financiam nossa causa. Seria como usar eles, contra eles mesmos!! É
perfeito! Sem falar que, se eu não tentar entrar nessa, aquela amiga da Mad, ta
tentando por ela no meio disso, não posso deixar a Mad entrar nessa sozinha!! Tanto
a oficina, quanto a vida dela vai estar em jogo! — Expliquei. Confesso que eu estava
um tanto empolgado e não estava pensando na coisa num todo. No futuro, posso
dizer que isso foi fruto da minha imaturidade.

— AH! PRONTO! SABIA!! Tinha que ter alguma coisa relacionada com aquela vadia!
— Jenny odiava Mad, não só por Toshio ser gamado nela, como por ela ser adulta e
mais madura que ela. A típica inveja da menina mais nova, com relação à mulher
mais velha.

— Não chame ela de vadia!! Ela nem fez porra nenhuma pra você!? De onde vem
esse ódio todo?! — Perguntei já me emputecendo com aquela reação idiota da
garota.

Jenny então parecia travar e seus olhos se enchiam de lágrimas, mas ela estava
muito orgulhosa, ela não ia chorar na minha frente. Virando o rosto ela dava as
costas e saia do local, mas antes de bater a porta deixava claro sua posição quanto
ao meu plano.

— Quer saber Toshio? Vai se fuder! Se quer se matar, se mate, mas não vou me
envolver nessa merda. Não quero ver no que isso vai dar.
Pedro observava tudo de forma muito séria. Desde que soltei a informação, ele
parecia um tanto pensativo. Ignorando Jenny, olhei para o mesmo e minha
expressão deixava claro que eu estava à espera de uma resposta.

— Que é? Por que está me olhando assim? — Ele perguntou.

— Como assim? Você não vai dizer nada?


— Ah cara. Você parece decidido... E quando você decide algo com essa
empolgação toda, nossas opiniões nunca valem nada. Ou seja, tu já ta ligado no
foda-se brother. Diferente da Jenny que está agindo assim por ciúmes, eu to nessa
contigo. Não quero ver você morto. A gente é brother, mesmo que eu seja negro e
você asiático, a parada é que estamos juntos nessa.

Por um segundo fiquei parado sem reação. Eu não sabia que Pedro era tão maduro a
ponto de pensar tanto nos amigos. Agora eu realmente estava em dúvida se devia
ou não seguir adiante com o plano, mas quando pensava em tudo que eu estaria
deixando passar perdendo essa oportunidade, sem contar, que pensar em Max no
meio dessa confusão, e eu não estando lá para ajudar, me deixava fazia ter um
aperto no peito. Eu sentia que devia seguir esse caminho.

— Valeu Pedro. Desculpa o meu jeito de ser mano, mas eu sinto que devo seguir
adiante.

— Você que manda brother, só vamos nessa. — Ele falou com um sorriso, e esticou a
mão para o nosso típico aperto de mão.

Resolvido o que faríamos, mostrei a mensagem que copiei do pc da Max, para que
Pedro ficasse completamente ciente do que estávamos para fazer. Com base nas
informações, Yuric tava na vantagem nesta guerra, e os Italianos estavam na merda,
mas conhecendo como funcionam essas máfias, eu sabia que agora os Italianos
abriram a porta para tudo e todos... Qualquer um seria um soldado em potencial.
Meu pai era um Yakuza, antes daquele filho da puta de Xiaren ter desvirtuado tudo,
então saber como funciona o jogo de mapas é algo que eu tenho em mente desde
meus 6 anos de idade. Ok, que meu pai dizia sempre para eu não me meter nisso,
pois era novo demais, mas diferente de outras crianças, aos seis anos eu já
conseguia criar um computador super potente utilizando coisas básicas, ou seja,
entender uma hierarquia era tão simples quanto.

— O plano é o seguinte. Se os Italianos abrirem as portas, é certo que outros abrirão.


Temos que sondar as ruas e achar onde podemos nos juntar à Ryulong... A parada é
a gente se infiltrar na "casa" do Xiaren, ou seja, ficar perto do meu inimigo me dará
vantagem, entendeu? — Expliquei para Pedro, enquanto tomávamos uma cerveja que
ele havia trazido. Jenny aparentemente realmente tinha ido embora. Já Dollar, não
havia dado sinal de vida, provavelmente os pais dele estavam alugando o mesmo
para mostrar o "filhinho perfeito" que eles tinham. Acredito que seja até por odiar a
vida de riquinho, que Dollar adora tanto andar conosco.

— Certo. Tipo, a parada é pegar um desses punks idiotas, e tentar arrancar


informações e aí tu vai aproveitar que é xingling e tentar se infiltrar nos xingling
também, certo? — Resumiu Pedro, que sempre me chamava de xingling pra me zuar.
Filho da puta.

— Xingling é a mãe, mas sim... Esse é o plano. — Confirmei, rindo.

— Tá ligado que se tu vai agir como Ronin, você não pode mostrar seu rosto. Você
terá que inventar alguma desculpa, pra nunca tirar a máscara. — Falou o brasileiro no
seu típico tom cheio de gírias. Esse "Ronin" que tanto eu quanto ele mencionamos,
era a identidade secreta que eu usava para fazer algumas coisas por Miraitroid.
Desde que ele matou um dos meus melhores amigos, eu decidi que se não podia
fazer dessa merda de cidade melhor, eu pelo menos podia tentar fazer Miraitroid, um
bairro decente.

Quando eu era mais novo, meu pai começou a me treinar bem cedo nas artes
marciais de nossos ancestrais. Ele havia visto meu potencial intelectual e acreditava
firmemente, que se me treinasse corporalmente, eu me tornaria um grande soldado
para a Yakuza no futuro. Então desde novo, ele me treinou em judô, jiujitsu, karatê e
ninjutsu. No entanto, eu sempre fui um garoto que não gostava de combates físicos,
sempre preferindo montar meus pcs e motores de moto, do que lutar. Eu só fui ver
que todo aquele treinamento do passado só me era útil, quando ano retrasado, um
dos nossos amigos foi morto, por um grupo de Punks das redondezas.

— Eu já tenho algo em mente. Vou usar meu capacete da moto. Na verdade eu já


estava para fazer isso... Tá ligado que eu te falei que chegou uma BMW M300 Coupé
la na oficina e que eu consegui replicar o sistema de tranca que ela possui? Então.
Eu implantei esse sistema no meu capacete, logo, assim como uma tranca de carro,
ninguém vai conseguir desativar meu capacete a não ser que manje tanto quanto eu
e a Max de carros. Então meio que não revelar minha identidade para eles, e só me
apresentarei como Ronin, sacou?

— Entendi bro. Ainda acho arriscado, mas acredito que os Ryulongs não vão
estranhar tanto se tu aparecer lá. Afinal, vocês são todos iguais! — Pedro falava isso
ainda zoando Toshio, que ameaçava dar um soco no amigo, mas ambos ficavam
rindo das piadinhas escrotas entre eles.
— Mano, eu acho melhor não envolvermos o Dollar nessa. Uma coisa é a gente agir
em Miraitroid, outra é com a Máfia. Ele não toma noção das coisas, por viver num
mundo "diferente". — Falou Pedro, voltando a ficar sério. Ele agora ficava em pé e
andava de um lado para o outro. Dava para ver que ele estava ansioso.

— Nisso eu concordo. Queria que pelo menos a Jenny topasse nos ajudar nessa...

Foi nesse instante que de cima de um andaime velho da fábrica, a voz da menina
ecoava.

— E eu vou seu idiota... — Falava a mesma, nos dando um puta susto. Eu não fazia
ideia de como ela havia surgido ali. — Posso estar puta contigo, mas ainda gosto de
vocês, não vou deixá-los se matarem assim tão rápido.

Ela sorria, mostrando que todo o seu mau humor havia sumido e ela parecia ter se
conformado que a coisa toda iria rolar com ou sem ela. Decidido que nós três
agiremos sem contar as coisas para o Dollar, era hora de agir... Afinal, o tempo
estava contra nós. Eu queria pelo menos já ter agido, antes da Mad ver o tal recado e
tomar suas decisões. Sendo assim, definimos o que cada um faria nesse plano. Eu
claro seria a linha de frente, enquanto que Pedro e Jenny me conseguiriam
informações e me auxiliaram de longe, Pedro ainda se oferecia para ir comigo, mas
eu não queria ver outro amigo morto diante dos meus olhos, principalmente ele, que
era quase meu irmão. Peguei meu capacete no bolso e apertando um pequeno
botão o mesmo se abria e ficava num tamanho normal, encaixei ele na cabeça e
com uma simples programação ativei as travas. A partir de agora, eu só o tiraria
quando aquela merda toda acabasse, eu iria - literalmente - incorporar a figura que
criei.

— Está me ouvindo bem? — A voz de Pedro se projetava nos comunicadores dentro


do capacete.

— Jenny, as câmeras estão ok? — Perguntei. A mesma seria responsável por ser
meus "olhos extras". Eu havia instalado câmeras na parte de trás do capacete, e nas
laterais dele. Assim, Jenny poderia ver tudo que rolava como se fosse os olhos na
minha nuca.

— Estão ok, sim. — Ela respondeu, e senti novamente aquele tom de choro em sua
voz.

— Oi?

— Não se mate.
Sem dar uma resposta, saí pela porta da fábrica e subi na minha RedAkira, dando
partida na moto, derrapava ela e acelerava com tudo, indo em direção às ruas de
Miraitroid. Agora era hora de encontrar alguns filhos da puta em becos e arrancar
deles informações sobre essa briguinha dos mafiosos.

Não demorou para escutar alguns gritos de desespero, misturados a risadas


nojentas que pareciam se divertir com o sofrimento alheio. Miraitroid era um point
muito usado por Punks aleatórios da cidade que só queriam causar baderna. Punks
era até uma forma errada de se referir a eles, por causa do movimento Punk original,
eles não tinham nada. Entrei com minha RedAkira no beco e joguei o farol dela no
máximo iluminando repentinamente os filhos da puta. Era cinco idiotas e um grupo
de duas garotas e um rapaz. Estavam sendo molestados e extorquidos. Os cinco
idiotas vestiam roupas típicas desses imbecis que só tem culhões quando estão em
grupo: Casaco de couro, moicano spike, correntes e muitas tatuagens brilhantes de
neon. Quando joguei o farol na cara dos idiotas, todo mundo por alguns segundos,
ficaram cegos... Uma brecha, para eu saltar da moto no meio deles.
Desembainhando minha Motorhead, comecei a desferir golpes e a passar entre os
alvos, utilizando de acrobacias simples. Cada corte desferido, visava a fivela de seus
cintos, ou a costura de suas calças, fazendo com que um bando de marmanjo
metido a bandido machão, ficassem - literalmente - de calças arriadas.

Sem saber muito o que estava acontecendo. Eles tentaram correr, porém tropeçaram
e caíram um por cima dos outros. Minha grande vontade era cravar a katana na
cabeça de cada um, mas ter uma chacina naquela altura do campeonato, não seria
bom. Quatro deles se levantaram, mas o quinto que tinha um moicano verde, eu fiz
questão de segurar. Quando ele levantou ja tentando correr, coloquei a bainha da
Katana na frente dele e o idiota batia com o nariz na mesma caindo de costas no
chão estirado.

— Preciso de um de vocês pelo menos. — Falei, pondo a ponta da Katana no peito do


sujeito, para ele nem pensar em se mexer.

Me virei para as duas meninas e o rapaz que estavam sendo vítimas em toda aquela
situação, e fiz um aceno como se dissesse "Eae? Vão ficar aí parados olhando ou
vão dar o fora?"... Aparentemente eles entenderam o recado e saíram correndo, mas
uma das meninas voltava, ela era asiática como eu, e numa típica reverência de
agradecimento, dizia algo que eu realmente não esperava.

— Para um autêntico samurai não existem as tonalidades cinzas no que se refere a


honra e justiça, só existe o certo e o errado. — Dizia a jovem, de forma clara e num
tom - óbvio - de agradecimento. Aquilo me pegou tão de surpresa, que por um
segundo vacilei e quase deixei o punk fugir, mas com um pequeno chute na lateral
do pé dele, o mesmo tropeçava no próprio calcanhar e caia novamente, só que agora
de cara no chão.

Ter sido reconhecido e ter escutado um trecho do código dos samurais, me encheu
tanto de determinação e esperança. Que não perdi sequer um segundo com aquele
molóide. Coloquei ele de pé, e a ponta da katana encostada em seu pescoço.
Acredito que as perguntas saíram tão rápidas e imponentes, que o cara nem tentou
pestanejar, entregou tudo muito rápido. Aparentemente ele só revelava coisas que
eu e Pedro já tínhamos deduzido... Que os Italianos estavam recrutando a torto e
direito, e que outras máfias seguiram a ideia, se preparando para um "segundo
round" da guerrinha deles. O mais importante, é que por Little Asia ficar colada com
Miraitroid, ele tinha uma informação que nos interessou bastante. Xiarens estava
recrutando membros no Xīwàng, assim aumentando o poder da Ryulong.

— Perfeito. — Soltei quase que automaticamente, ao ouvir a informação. Sem ligar


muito, deixei o idiota ir embora. Agora era hora de ir ficar cara a cara com aquele
mestiço desgraçado.

Corri até minha moto e disparei em direção a Little Asia. Nunca havia acelerado
tanto a RedAkira como naquela noite. A mesma parecia só um feixe vermelho
brilhante cortando os carros e motos em alta velocidade. Em poucos minutos eu
estava diante do enorme restaurante chinês... O filho da puta, tinha a cara de pau de
fundir a Tríade com a Yakuza e ainda mantinha a base deles num restaurante
Chinês. Só de olhar para o lugar, me dava vontade de tacar fogo em tudo, mas tudo
ao seu tempo. Deixei minha moto no estacionamento do local e sem tirar o capacete
me dirigi à entrada. Apesar de toda a guerra, aparentemente Xiaren não queria
perder dinheiro, o local estava em pleno funcionamento, mesmo que tivesse bem
menos clientes do que normalmente se via. Assim que cheguei na entrada, um
fucking chinês de quase dois metros, colocou a mão em meu peito barrando a
minha passagem.

— Onde pensa que vai com esse capacete ainda na cabeça? — Falou o mesmo, me
olhando de cima, como se eu fosse um inseto que poderia ser esmagado sem
qualquer piedade. Sem responder, os visores do capacete desceram, e fiz uma
reverência típica de meus ancestrais.

No mesmo instante ele entendia que eu era japonês e então fazia um sinal para um
sujeito de cabelos longos e tapa-olho, que claramente também era japonês.

— ここで何をしたいですか?(O que você quer aqui?)


— 戦争と名誉. (Guerra e honra.)

O homem então por alguns segundos, ficou me encarando, provavelmente


ponderando, no entanto eles deviam estar bem desesperados. O mesmo fez um
gesto com a cabeça para que eu o seguisse e assim o fiz. Adentrei o restaurante e
indo para um parte mais vazia nos fundos, passava por um corredor cheio de portas,
ao final do corredor havia uma escada, só nesse pequeno caminho, eu contava pelo
menos uns vinte mafiosos fortemente armados, Xiaren realmente devia estar com o
cu na mão. Eu havia visto ele ainda quando era muito criança, o mesmo era novo e
parecia um filhote de porra nenhuma, e até meu pai que não tinha uma grande
patente dentro da Yakuza era mais importante que ele. Como Xiaren havia
conseguido crescer e dominar tudo aquilo era algo a se pensar com cautela, e talvez
dar até um crédito pela façanha. Subimos as escadas já dando de frente com um
enorme portão duplo, com dragões se entrelaçando pintados a ouro, as portas se
abriram e muitos outros capangas se encontravam no local, além de pessoas
estranhas... Era hora de olhar na fuça do alvo mais importante que eu podia
encontrar, era hora de respirar fundo e fingir que iria pôr o rabo entre as pernas para
servi-lo, quando na verdade, o mesmo só estaria acolhendo uma cobra.

Mad Max
Acordei com uma puta ressaca em minha cama após uma longa noite de bebedeira
em Mirai's Hope, um pequeno bar espremido entre as casas e não muito
frequentado, talvez por isso não fosse lá muito arrumado mas ao menos as bebidas
eram baratas, lugar perfeito para encher a cara sem que fosse perturbada por
alguém, o que não foi o caso da noite passada, e me lembrava da briga de bilhar que
arrumei ao passar a mão por um hematoma que havia ganhado pouco acima do
supercílio, resultado de algum golpe que achei ter desviado. A cabeça ainda sentia
os sintomas da bebedeira como se eu tivesse girado a noite toda e só agora estava
parando. Não poderia ficar na cama o dia inteiro, os negócios estavam ficando sem
movimento e pelo menos eu deveria receber o dinheiro pelos dois carros que se
encontravam em minha oficina; trabalho simples e que não dariam muito lucro, mas
em tempos difíceis, créditos eram créditos. Coloquei os pés ao chão e me levantei
para poder me trocar, eu tinha um trabalho a fazer e nenhuma disposição para
começar.

Após um banho frio e um café extremamente forte e sem açúcar, eu estava pronta
para o trabalho e... aé, onde estava aquele pirralho? Eu torcia para que ele tivesse
sumido apesar de sua notável habilidade com tecnologia, mas eu não tinha jeito
para cuidar de crianças. Andei pela casa que estava um tanto bagunçada pela falta
de cuidado. Em cima da televisão estava minha jaqueta de couro que eu tratei de
vestir, era como se fosse meu uniforme, eu nunca o largava. Coloquei calcei as
botas de couro e fui chamar Toshio ir para a oficina. Abri um pouco a porta e logo
me virei com certa pressa e desânimo na voz. ─ Vamos logo pra oficina... ─ E como
resposta eu ouvia um "Bom dia!" completamente alegre e cheio de energia. Grunhi
baixo e respondi ─ Anda caralho...

O mau humor estava altíssimo, estava com hematomas sobre o supercílio e no


canto da boca que só reparei ao olhar no retrovisor interno do carro.

Foi um longo dia mexendo nos carros e quando finalmente fiz uma pausa para poder
descansar e tomar uma lata de cerveja, fiquei fuçando e estudando um diagrama
que havia conseguido em uma corrida, além de alguns trocados. Era a respeito de
um novo tipo de motor à base de energia, mas era um tanto mais complexo, tinha o
formato de uma bola e provavelmente as mesmas proporções, mas nada
relacionado a motor era segredo pra mim e minhas habilidades de mecânica. ─ É
belezinha, você vai me ser muuito útil, só preciso desvendar os seus segredos... ─
Estralei os dedos e vesti um par de luvas para começar a montar algumas peças
enquanto seguia as instruções, aquilo provavelmente iria demorar muito tempo para
ser concluído... ou, só precisaria das peças certas. Olhei para a mesa e logo notei
que também precisaria das ferramentas certas também. Bufei de raiva, Toshio tinha
mania de usar as ferramentas e o dom de guardá-las em outro lugar, e então
comecei a fuçar na caixa, jogando tudo para fora, revirando as sucatas e caixas de
equipamentos, armário, não achava a droga da ferramenta em lugar nenhum. ─ Que
garoto fodido! ─ Reclamei quase gritando.

─ TOSHIO!! ONDE ESTÁ A PORRA DA CHAVE MAGNÉTICA!? VOCÊ USOU ESSA


CARALHA DA PORRA DE SEUS BRINQUEDOS DE NOVO? ─ Me aproximava da porta,
pronta para dar um chute do japa e ele respondia do outro lado.

─ NÃO MEXI DESSA VEZ!! PROCURA QUE VOCÊ ACHA!

Chutei uma caixa que derrubou algumas ferramentas, com quem ele pensa que está
falando? e eu tratei de arrumar toda a bagunça para não perder nada, e enquanto o
fazia, reclamava comigo mesma. ─ Porra, isso aqui está parecendo um chiqueiro, e
esse muleque não ajuda a organizar... ah, merda. ─ Arrumei as ferramentas, não que
o lugar fosse completamente organizado mas, era minha organização. Daquela
forma, eu sabia onde estava cada coisa e, no gancho de ferramentas que ficava na
parede acima da escrivaninha, ainda faltava uma ferramenta, justamente a chave
magnética. Suspirei em uma breve satisfação, agora só precisava saber da
ferramenta. Antes de eu procurar no outro cômodo, onde Toshio estava, eu o ouvi
gritar novamente.
─ MAX! VOU DAR UMA SAÍDA!! ─ Na hora eu já fui apressada para a porta, ele não
podia sair assim, nem mesmo havíamos combinado nada.

─ O QUE?! VOCÊ TEM QUE ME AJUDAR, SEU MERDINHA!! ─ E corri para o escritório,
mas ele já tinha saído e pelo perfume no ar, já sabia que a putinha mirim, também
conhecida como Jenny esteve ali. Ele iria sair pra namorar? Filho da puta! Chutei a
cadeira contra a porta e praguejei sem parar. Respirei fundo para me acalmar e
terminei a cerveja num gole só, e de cabeça fria comecei a pensar. "Bem, pelo
menos eu terminei o serviço então vou deixar um recado para os donos buscarem."
Acessei as mensagens de meu pc e então eu vi uma muito familiar, cujo remetente
era X-IX e mandava a seguinte mensagem:

─ Oi, Max, tudo bem? Quanto tempo... Não nos vemos desde... Ih, nem lembro,
sinceramente... Bom, como sei que você é maluca o bastante para topar, tá afim de
se juntar comigo e um outro amigo numa parada perigosamente insana? Vou te
explicar rapidinho. A merda ainda não foi jogada no ventilador, mas logo logo será...
A mídia não falou nada porque a coisa não tomou grandes proporções... Tá rolando
uma briga entre as máfias italiana, russa, latina e oriental, e tá ficando feio... O
chefão russo raptou um amigo Detetive do chefe Italiano, eles começaram a tretar,
as outras máfias se meteram e agora tá essa putaria de um querendo comer o
fígado do outro. Rolou uma parada tensa no aeroporto abandonado e a filha do
russo foi raptado pelo Poderoso chefão, é o Tony Montana. Mas se liga que a melhor
parte vem agora, o Yuric como retalhação mandou os homens dele invadir o prédio
do Don Corleone.. AH! E ainda contratou um hacker pra tomar controle do edifício.
Eu mesma não consegui fazer muito pra impedir o hacker, odeio admitir, mas o filho
da puta é bom mesmo. Resultado disso foi que um atirador conseguiu matar o Tony
e a ruiva vadia que ele traça. Não vai demorar muito pra notícia se espalhar pelas
ruas e conhecendo como esses caras são, eles vão recrutar qualquer pessoa,
principalmente as que se destacam em alguma área importante. Ou seja, querendo
ou não, mais cedo ou mais tarde vão descobrir seu dom e um capanga de algum
deles vai bater na sua porta querendo te recrutar. Se negar, vão te ameaçar e vai ter
que aceitar de qualquer forma... E eu acho que assim como eu, você gosta de ter um
mínimo de controle sobre seu destino. Então antes que isso aconteça, ainda tem a
chance de escolher. Pegue o que puder, traga um bom carro e me encontre no
Centro, no Consertos e Outras Coisas, é uma mecânica mas parece mais um tipo um
ferro velho que fica perto da Avenida Armitage, deve conhecer. Estarei com Pollux,
ele é de confiança.

─ Parece que a fantasma da X estava finalmente reaparecendo, e era uma boa


notícia. Fazia tempo que não a via e nem mesmo sabia que vida ela estava levando,
apesar de saber que naquela droga de cidade, tudo acaba no crime, e já começamos
desde a época em que nos conhecemos no orfanato. Ao menos eu era forte para
sobreviver a uma vida dessas, diferente de meus pais. Abri um sorriso bem esperto,
talvez com isso pudesse rolar alguma grana para ajudar o meu bolso, além de, é
claro, reencontrar uma velha amiga. ─ Fechado. ─ Respondi o e-mail com um breve
"estou à caminho" e já comecei a tirar meu macacão sujo de óleo de motor, vestindo
minha jaqueta e colocando um óculos escuro, calça jeans e tênis surrado, estava
pronta para sair.. Não demorei muito e já estava rasgando as ruas com meu carro
modificado ao meu gosto, uma raridade, um SP-118, e segui para aquele tal
ferro-velho.

Logo era possível me verem chegando, um carro bege e capô preto entrava no
ferro-velho Consertos e Outras Coisas e estacionava. De dentro dele, eu saía, já
acendendo um cigarro assim que fechei a porta e segui até os dois que estavam ali
e eu reconhecia apenas um de longe, graças ao mohawk roxo, e esperava que ela se
lembrasse de mim também, afinal, não havia mudado muita coisa.

─ Olha sóoo... a quanto tempo eu não vejo minha querida amiga X, que sumiu e nem
me disse onde estava. ─ Comentava enquanto me aproximava dos dois com os
braços erguidos, como se quisesse saudá-los. ─ E você deve ser o tal do Pollux que
fiquei sabendo na mensagem. ─ Estendeu a mão que estava coberta pela luva de
couro que costumava usar, assim como a outra que segurava o cigarro na outra
mão.

Dexter
Inacreditável. Simplesmente inacreditável o ponto em que minha vida se encontrava.
Depois de tantos anos de estudo e preparo... Certo, talvez não tenha sido tanto
tempo assim, graças à minha inteligência natural. Foi preciso apenas uma pitada de
boa vontade da minha parte. E ainda assim, eu me encontrava DEPENDENTE dos
meus pais. Isso era simplesmente inconcebível. Aos meus vinte e quatro anos,
depois de apresentar diversos projetos, criações e invenções avançadas para o
nosso tempo futuro, eu simplesmente não conseguia arrumar trabalho algum no
maldito Distrito da Cidade Média!

Isso não me fazia passar por necessidades, entretanto. Meu pai tinha um ótimo
trabalho nas megacorporações de Miraitropolis, mas no setor de comunicações, o
que não ajudava a me colocar no mercado. E eu não queria ajuda dele, é claro. Eu
tinha talento suficiente para trabalhar nos melhores laboratórios de robótica ou com
replicantes, graças ao meu vasto conhecimento tanto na área biológica quanto
computacional. Eu queria conquistar meu lugar por mérito próprio. Eles é que
estavam perdendo um ótimo cientista... Ah, além de mim e do meu pai, minha
família era composta por minha mãe, uma típica dona de casa, e minha irmã, uma
bailarina loira anencéfala! Não literalmente, é claro. Estou usando uma figura de
linguagem para exemplificar o nível de burrice dela. Mas...

— Mas que orgulho! Nossa pequena filhota brilhando nos palcos do Teatro de All
Street! Estou muito feliz! — Isso. Isso era inacreditável. Minha irmã, quem falei que
era estupidamente burra, ascendeu profissionalmente. Ela era alta, bem mais alta do
que eu. Era bailarina. — Nos dias de hoje, valorizam muito esse tipo de arte! — Minha
mãe continuava. Estávamos sentados à mesa, como num típico comercial
desgraçado de margarina — por incrível que pareça, ainda consomem esse tipo de
coisa nos dias de hoje.

— Ah, mamãe! Não é nada demais, eu apenas segui meu sonho, sabe... — Ela dizia,
me fazendo revirar os olhos pesadamente, num misto de inveja e asco. Nenhum dos
burraldos viu meu ato. Meu pai a parabenizou, também. Me submeti àquela situação
degradante por mais alguns minutos, comendo sem vontade alguma a comida no
prato. — Em breve será sua vez, Dexter! O sol nasce para todos... — Quando Didi se
dirigiu a mim, eu cheguei a engasgar de raiva. Estava completamente possesso, mas
internamente, pela situação em que me encontrava. Ser “motivado” por ela, ou
provocado, me fez exceder. Levantei abruptamente e como bom garoto gênio e
mimado, me dirigi ao meu laboratório.

— Não posso mais me submeter a isso... — O meu problema, comparado aos


problemas da cidade, era ínfimo. Eu tinha ciência disso. Noventa e sete por cento da
população não tinha acesso às mesmas regalias que eu. Ainda assim, a sensação
de dependência, e o pior, do sucesso da minha irmã prematura ao meu, me matava
internamente aos poucos. Resolvi fazer o que qualquer pessoa que se encontra
nessa condição faz: me liguei à Práxis, não através de plugs corporais, mas com
meu óculos de realidade virtual. — Vamos ver o que está acontecendo pela cidade...

Abismado eu tinha ciência do que acontecia. Da guerra entre gangues. Da morte do


italiano. E da... PROPOSTA DE TRABALHO?! Essa era minha chance, meu momento.
Tudo bem, não era o que eu imaginava pra mim. Que tipo de pessoas será que
seriam meus colegas de labor? Hm... Certamente intelectualmente inferiores, mas
eu poderia ser um pouco complacente, é claro... Então, estava decidido. Me vesti da
melhor maneira possível, deixando claro minhas aptidões. Jaleco branco, sobre a
blusa social branca e calça e sapatos pretos, e luvas roxas. Além dos óculos.
Esperei dar a hora em que Didi foi embora (para seu apartamento próprio! Grrr) e
meus pais puritanos, que dormiam cedo, retirarem-se para seu quarto, para sair.
Apesar da minha idade, eles ainda ficavam me indagando aonde eu ia, com quem
me encontraria...
Certamente não seria lá uma boa ideia dizer que iria me juntar a uma máfia,
pressupus. [...]

Encontrava-me, agora, à frente do bar Meia Noite. O lugar era excessivamente


iluminado com neon e com hologramas comerciais de Miratroid. Havia,
aparentemente, uma fila de pessoas mal-encaradas esperando para a... Entrevista
de emprego. Me dirigi diretamente ao homem que guardava a porta. Ele devia ter o
dobro do meu tamanho. Seus olhos eram substituídos por próteses robóticas.
— Olá. Soube da oferta de trabalho. Estou me predispondo a integrar o seu quadro
de empregados. Mediante uma justa e satisfatória compensação, é claro.

— Quê? — O homenzarrão respondeu, claramente confuso. Revirei os olhos. —


E-s-t-o-u a-q-u-i p-e-l-o... — Eu soletrava, na tentativa de auxiliar o seu baixo
desenvolvimento intelectual a entender, quando ele me interrompeu. Segurou em
meu pescoço com força. — Arghh...! — Tentei explicar a clara confusão que ali havia
se instaurado, quando um outro homem se aproximava. Esse tinha uma aparência
esquisita. Era tão alto quanto, mas seu queixo parecia ser formado por diversas
rachaduras... Pregas? Que coisa nojenta e ultrajante.

Vi que eles discutiram brevemente enquanto eu era enforcado. Algo que o outro
disse o fez me colocar no chão. Levei as mãos ao pescoço, massageando-o e
recuperando o ar. Surpreendentemente, meu algoz era agora convidativo. — Entra. —
Então, o segui bar adentro. O lugar definitivamente não era um dos quais eu visitaria
de modo regular, mas dada às condições... Enfim. Logo fui direcionado a uma sala.
Ao que tudo indicava, o responsável pelo processo seletivo, seria o dono do lugar,
chefe xamã da gangue de jamaicanos, Fellows Nation. Sentei-me e ajustei a gravata
bagunçada anteriormente pelo enforcamento. Fui mais direto dessa vez. Não queria
ser agredido de novo. — Soube que precisam de gente. Tenho grande conhecimento
técnico científico. Posso ajudá-los em criação de armas, reparo, incluindo mechas,
dentre outras coisas. — Falei sério dessa vez, tentando não contaminar minha frase
com a natural arrogância. E mesmo que não soasse petulante como costumeiro, fui
firme. Pelo menos tentei. Pois depois desandei a tossir, efeito ainda do
enforcamento.

Pollux
A luz vermelha-azul girava na rua mais distante de onde Xis e eu estávamos,
intermitente e insistente, enquanto dois policiais conduziam os meliantes até uma
viatura completamente avariada, mas ainda em serviço. Do lado de uma ambulância
que piscava com as mesmas cores, uma mulher de roupa rasgada chorava com o
rosto nas mãos enquanto uma mulher de luvas e uniforme branco a amparava. Eu
escutava a hacker atento mas ainda meus olhos fugiam na direção da entrada
daquela oficina, de onde havia acabado de dar o meu depoimento e acabado de
dividir as filmagens que meus olhos fizeram, garantindo uma prisão por completo
flagrante. Me surpreendeu ver a garota de cabelos azuis comigo naquela noite,
quase nunca deixando seu anonimato e sendo na maior parte das vezes um
presságio de que algo grande estava para vir, mal sabia eu que já estava
acontecendo. A conexão que eu tinha direta com Montana se apagou momentos
depois do que eu julguei ser uma falha, mas o conhecimento técnico de Calidora era
tão infalível quanto ela fazia propaganda sobre ser, e algo muito grave havia
ocorrido. No silêncio enquanto escutava X-9, Calidora e eu assistimos as últimas
palavras ditas em seu funeral através do streaming de uma das câmeras no seu
complexo, mas seu corpo ainda ficou fora do alcance de minha visão. O italiano era
sagaz, se estava fingindo e forjando a própria morte, pelos quais motivos fossem,
mesmo não sendo uma boa hora estava sendo inteiramente convincente, e aquela
sua mercenária também não havia dado as caras? Ninguém foi atrás dela? Suspeitei
mas engoli aquela como a verdade, pelo menos até meus olhos testemunharem
outra coisa, infelizmente. Mas já tava mais do que na hora de tirar algumas das
minhas cartas da manga. Mesmo que a hacker tivesse aquele codinome... eu
confiava nela. Confiava o suficiente para abrir o jogo e a boca depois de um certo
tempo de silêncio, mas não foi com ela que falei, e o que tive de fazer foi logo diante
dela, aberto a julgamentos.

── Cali, eu quero mandar uma mensagem para essa Galathea. Consegue achar um
canal aberto para levar a mensagem até ela? — Perguntei levando um dos dedos a
meu ouvido, mas daquele momento em diante Calidora também estava livre para
falar em voz alta através do meu comunicador. Não tinha segredos que X-9 pudesse
vazar sobre mim se não tivesse segredos com ela, certo?

── Está bem, encontrando um canal seguro... pronto! Vou dar um jeito da


mensagem chegar até ela. Em três, dois, um... pode falar!

── "Galathea. Você não me conhece, mas eu sei quem você é. Em menos de vinte e
quatro horas você precisará fazer uma escolha que nunca me deram: escolher um
lado. Existem mais forças em jogo do que o olho pode enxergar, e caso você faça a
escolha certa, meus serviços como espião de Tony Montana passam a ser seus.
Você não precisa responder a essa mensagem. Apenas aceite a responsabilidade e
entraremos em contato novamente. Recuse-a, e nunca nos encontraremos. Confio
que saberá o que está fazendo. Lhe darei algumas horas de vantagem... atacando os
russos como amostra de lealdade."

Tudo estava em xeque mas eu ainda não havia revelado a natureza de meu ataque
pra jovem que ali estava comigo, e embora não parecesse estava trabalhando nele
agora mesmo. Quando finalizei o comunicador passou de roxo a azul novamente,
mostrando que Calidora havia recebido a mensagem e estava pronta para achar
qualquer canal de transmissão - comunicadores, implantes, até mesmo reprodutores
de música - para enfiar a mensagem no meio e encontrar os ouvidos da mulher.

— Xis, eu já estive do lado errado por muito tempo. Principalmente tempo o bastante
para saber que não existe lado certo. Mas quando eu estava na merda um estranho
deu a vida por mim e outro acreditou em mim mesmo tendo-o prejudicado tanto no
passado. Agora os dois estão mortos, e eu não pude participar do funeral de nem
um nem outro. — Mudei a expressão mas continuei firme. — Esse Tim... ele não é de
todo mau. Se quer saber ele é muito parecido comigo, só que tinha mais escrúpulos,
e uma família. Não me leve a mal, os Steelhearts perderam a liderança, e você um
grande amigo, mas eu perdi todos que eu conhecia. Com exceção da Calidora. —
Com um sorriso, não me impeço de alcançar o meu bolso e apanhar um cigarro, que
depois de soprar a fumaça para cima continuo explorando o tema. Olhei para o meu
comunicador, e o enhancing de uma filmagem mostrava uma barra de progresso
quase completa. — Não acho que o Tony ou os Steelhearts tenham sido santos, mas
a mesma tragédia que desgraçou Timothy também me redimiu. Foram bons para
nós, mas quem sofre é sempre Miraitropolis. Sempre quem um dia já foi inocente.
Quando foi a última vez que você viu alguém fazer isso?

Apontei com a cabeça para atrás de mim. Atrás de nós a mulher ainda soluçava,
pegava um lenço que lhe haviam trazido e chorava dentro dele, amparada por um
oficial da lei que, sem jeito, tentava segurar calmamente seu ombro. Na caçamba de
um furgão reforçado, os dois meliantes de rosto inchado pela minha surra
brincavam de tetris tentando caber os dois em um espaço ridículo.

── Edição completa. Quer que eu envie para o Tim agora? — Calidora falou em voz
alta do comunicador.

── Ainda não. Xis, se a guerra continuar não vai sobrar nada aqui que a máfia possa
controlar. Não vai ter diferença nenhuma entre nós e o deserto. Quero te fazer uma
pergunta: quando você invade um sistema, quem é que o controla? O usuário, ou o
invasor? Quero te mostrar algo...

>> EXECUTAR: BORIS_CHANNEL17_STH

Era uma filmagem do dia da destruição do Canal 17, em um holograma cujo feixe de
luz era reproduzido pelos meus olhos. A primeira que eu fiz depois que ele foi
destruído, nossa, faz um tempo enorme e ainda acho que foi nas últimas horas. Eu
havia acabado de sair dos esgotos do bairro, fugindo do ataque dos Steelhearts que
atacaram a sede da emissora nos andares superiores e os soldados híbridos de
K'dore e Telford que fuzilavam inocentes, inundando feito cardume os andares
inferiores, onde a maioria trabalhava. Nas ruas, eu olhava para cima e focava com os
meus implantes nos olhos na primeira vista que eu tive da equipe dos Steelhearts,
agora com todos identificados: a mulher de cabelos azuis que evacuou o prédio era
a que estava em minha frente, a de cabelos vermelhos era a mercenária de Tony
Montana, mas o homem mais alto que saía pelo telhado e embarcava no helicóptero
era Boris, o mesmo que prestava seus serviços agora aos russos, nas imagens com
um pobre segurança ensanguentado nos ombros. Akane e X-9 estavam, para a
grande maioria do público, ainda agora declarada mortas, mas Calidora fez o
máximo para maquiá-las da edição, deixando o foco em Boris como o que mais se
destacava, o russo que havia tanto dado trabalho para muitos naquela cidade.

— Quando Tim olhar isso, eu espero que, como é mesmo? O inimigo do meu inimigo
é meu amigo, não é assim que falam? Eu odiava olhar aquela cena novamente, mas
não guardava rancores por X-9 participar de um plano que deu tão errado. Também
havia parado de pedir desculpas depois de ter entregado pra ela a cybertropina que
salvou o seu corpo. De um certo modo, nós dois nos destruímos e nos demos nova
vida, então agora estávamos verdadeiramente quites. Éramos mais parecidos do
que podíamos imaginar também. — Pessoas boas também fazem escolhas erradas.
Mas quando as escolhas erradas se tornam hábitos, bom, é atrás dessa gente que
iremos atrás.

── O Timothy não consegue fazer essa distinção, Xis. Se pensassem como ele,
Tony teria atirado na minha cabeça por ter trabalhado com a Telford, eu na sua por
trabalhar contra o Canal, e você... bom, você entende o efeito dominó. Tim não era
esse sujeito extremista de hoje em dia. Queremos dar uma chance a ele, como nos
deram. Bom, depois de afastar o perigo que ele é para nós primeiro. E para isso
vamos precisar torcer para que ele morda a isca e use sua sede de vingança contra
Boris e ataque os russos para nós. Tem mais uma coisa... — A voz de Calidora saía
pelo meu pulso, mas era bom ver as duas se dando bem, e principalmente Xis,
enquanto ficava em silêncio e a assistia entender os planos que eu e minha parceira
havíamos feito a partir das sombras. Estava terminando o cigarro quando ela
chegou na parte final, mas deixei-a conduzir. — Os Steelhearts eram bem
conduzidos, mas estavam fora de controle. O que fizeram contra nós foi um prato
cheio para a opinião pública caça-los como uma praga, o que os levou a extinção.
Ou quase. Movi parte deles para um bairro longe dessas ruas de sangue, para
trabalhar em um projeto que estou chefiando. Pollux é meu emissário urbano e tem
mantido as aparências com os outros lá na antiga sede. Estou enviando o vídeo para
Tim agora mesmo, e para sua guarda costas também.

— Sei que não deve gostar disso, Xis, é verdade que nem tudo precisa de controle,
mas tudo precisa de um freio. E às vezes até de justiça. — Minha voz firmou a última
palavra da sentença, e até um sorriso quieto se mostrou no canto da minha boca, e
apesar de explicativo ainda continha uma boa dose enigmática. — Quando você
precisar escolher um lado, lembre-se que existem poderes ocultos nessa cidade,
mais sutis. Que existem olhos bem atentos sobre Mirai agora, querendo mostrar a
verdade, ou pelo menos usá-la para preservar o mínimo de equilíbrio. No final do dia,
importa?

Ouço ao longe um carro se aproximando, e pelo motor que vem cortando as ruas só
imagino que possa ser alguém com um propósito bem claro em mente. Sabia que
era o contato de X-9, aquela altura. Lancei um olhar de lado para a mesma para
saber se estava certo, e sua expressão me entregava a resposta. O assunto acabou
momentaneamente. A garota, surpreendentemente educada para uma mecânica
após sair de seu carro, me cumprimenta e em respeito tiro o chapéu de minha
cabeça e aperto sua mão de volta.

— Muito prazer, Max, e seja bem vinda ao clube. Como ia dizendo, meu plano é
continuar apoiando Montana e sua sucessora, das sombras. Não é questão de quem
vai vencer, é questão de decidir o futuro de Mirai, e Montana não era um bom
samaritano, mas era uma represa que impedia outros mafiosos de tomarem conta
da cidade. Além disso, é do meu interesse resgatar Caz, o seu antigo parceiro. Minha
expressão se fechava e a voz exigia um tom mais imperativo. — Eu preciso de um
contato de confiança dentro da polícia se for fazer as coisas do jeito certo, e talvez
ele possa me dizer o que diabos aconteceu com Nick Slay. Estava na hora. Olhei
para o meu comunicador e dei um sinal com a cabeça para as duas em minha
frente, passando a palavra a hacker. — O que vocês pensam?

Em algum lugar do subterrâneo de Miraitropolis...

— Senhora? Estamos prontos, a operação deverá começar imediatamente. — Um


homem de traje militar aproximou-se da transmissão para convocar Calidora. Ela
assentiu com a cabeça, e logo depois dirigiu-se diante do comunicador outra vez,
por onde assistia uma das garotas através dos olhos de seu emissário.

— Chegou a hora. Devo conduzir a operação até o outro lado da cidade agora, antes
que a guerra comece de verdade. Tomem cuidado, por favor! Torçam por nós, e
façam a escolha certa. — Calidora offline. Ocorreu um longo suspiro antes que ela
pudesse se voltar para os militares na sua sala improvisada novamente. Calidora era
verdadeiramente incansável, mas o estresse de um futuro incerto a estafava, muito
mais do que operar o seu jogo de sombras de um lugar fechado e claustrofóbico
como aquele. — Quero ter uma palavra com o engenheiro Hall quando chegarmos do
outro lado. Tudo está pronto?
— Sim senhora. O capitão Brewster já partiu com metade do contingente de pessoas
e parafernalha. Nossa melhor aposta é chegar até Hampton Heights pelos esgotos.
— Apesar dos trajes, os militares contratados por Calidora não representavam força
bélica. Após a queda do Canal 17, Calidora foi atrás dos antigos contatos de Telford
que desistiram de operar com a mesma e, devido a queda de ações e divergências
morais ou até pessoais, estas mesmas pessoas foram convencidas ou coagidas a
trabalharem para a dupla de sobreviventes naquela noite. A maioria engenheiros, a
outra grande parte de tecnólogos que forneciam protótipos de alta linha aos seus
antigos empregadores, um pequeno agrupamento de uma força tática aérea que
garantia apoio às suas aeronaves também, agora vinham parar convenientemente
como fornecedores e contratados de Cali. — A senhorita talvez deva levar uma
máscara de oxigênio. Adicionou o militar, relutante.

— Não. Escutem, precisamos ser rápidos. Quero extremo cuidado com o


equipamento, mas conduzam todos sob o comando de vocês com prioridade
máxima. Não quero nenhum de vocês mortos. Se chegarmos em Hampton Heights
sem os equipamentos, ainda poderemos lutar outro dia. Se colocarmos os
transmissores e os armazenadores de dados à nossa frente, a batalha já está
perdida. — O homem em traje blindado flanqueou Calidora por um lado e dois outros
de jaleco branco e óculos translúcidos de realidade aumentada seguiram pelo outro
lado, até uma outra sala de onde um enorme rombo era visto, ligando o metrô a um
canal esquecido do subterrâneo de Miraitropolis, causado por um veículo com uma
broca exagerada na parte frontal. Aquela era a entrada de sua operação.

— Todos estão aqui, com exceção da unidade aérea. Devemos enviar o sinal e
convocar mais alguém?

— Não até que estejamos online e com um bom sinal. Conduzirei o grupo aéreo
sozinha na segunda fase do comboio. Nenhuma facção deve ser avisada até que
estejamos seguros, à exceção dos Steelhearts. Mas lá, na superfície, eles precisam
parecer ainda ativos. Os chamaremos quando for apropriado, mas não podemos
arriscar ganhar mais inimigos. Os que estão conosco devem servir.

O sapato caro de Calidora começava a empossar no chão que levava ao esgoto,


enquanto uma larga van passava pelo buraco ao lado dela, e dois outros carros
seguiam devagar atrás, com homens e antenas, mas poucas armas. — Ainda pode
demorar para emitirmos um forte sinal, tudo dependerá do meu parceiro. Mas até lá
precisamos decidir o rumo dessa guerra com mais do que balas. Precisamos obter
controle. — Como último ato antes de perder contato com a superfície, Calidora
movia os dedos por sobre a interface em holograma também disposta em feixes de
luzes a partir de seus olhos enquanto vários carros passavam ao seu lado,
conduzidos por flares alaranjados, enviando finalmente o vídeo da noite da
destruição do Canal 17 a Timothy Carter, dando início a primeira jogada de xadrez no
tabuleiro dos jornalistas.

X9
Não esperava que Pollux fosse contar com a polícia pra lidar com os dois crápulas
que tinha prendido. Para a minha sorte eu ainda não tinha me desfeito da
holomáscara, e isso me forçou a mentir sobre minha aparência novamente. Não,
nada de simular a cara medonha daquele nojento escroto do Red, dessa vez preferi o
típico visual de uma daquelas garotas do Vintage, que andam na moda como
verdadeiras cosplays da era vitoriana usando espartilhos. Adicionei ao novo layout
uma gargantilha trançada, luvas transparentes até os cotovelos e uma longa saia
preta com bojo à volta da cintura. Além da roupa alterava os cabelos, manteria eles
azuis, mas longos, como usava antigamente. Admito que é uma forma interessante
de se vestir, mas existia tanta história em volta dessas pessoas e tantas outras
coisas que comentavam sobre aquelas mulheres... Foda-se, eu não ligava. Às vezes
o disfarce falhava como uma imagem de uma fita VHS velha, mas os devoradores
de donuts eram burros demais para perceber. Eu coçava o cabelo azul preso apenas
com as franjas soltas, bastante pensativa sobre as coisas que Pollux e Calidora
diziam, não muito satisfeita, chutava uma lata de cerveja no chão. Não disse muito
sobre o que pretendia, tampouco o que pensava, aceitava o argumento deles no fim
das contas. Sabendo que agora eu me sentia em outra dimensão, cercada sempre
da mesma coisa, aproveitei para olhar para trás, vi os bandidos algemados, sendo
colocados nas viaturas policiais, entretanto fazendo ameaças.

— As delegacias estão cheias, nós não vamos ficar muito tempo lá, logo estaremos
de volta às ruas! A polícia é comandada pra quem a gente trabalha!! Em breve
vamos nos encontrar de novo! Todos nós! — O policial jogou um deles no banco de
trás da viatura, dando a partida no carro logo em seguida. Inclinei o pescoço para a
direita, novamente olhando para Pollux.

— Ele tem razão, não dá pra confiar na polícia, ela é da Paramiltech... Aliás, não dá
mais pra confiar em nenhum serviço privado dessa porcaria de cidade. Você e
Calidora são muito bonzinhos... Ainda acreditam no sistema, nas pessoas... Eu
não... — Sempre fui sozinha. Nunca tive família e nem casa, mas talvez fosse hora
de mudar isso. — Mas tudo bem, já dei minha palavra, não sou de dar para trás. —
Se havia um defeito em mim, era agir por impulso. Eu sabia bem a respeito e não
pretendia mudar.

— Vamos continuar com o time Montana mesmo sem garantia de pagamento.... Isso
é tão... Tão... Motivador... Nossa... — Insatisfeita me desfiz daquela holomáscara
ridícula, voltando a minha aparência original.
Tinha muita coisa naquele plano que não me agradava, e não era só o fato de não
receber um puto tostão pela participação, e sim por Calidora se arrastar como um
rato no detrito pelos labirintos de corredores do esgoto, transpondo tralhas e
sujeitos armados. Hampton Heights era o pior distrito que alguém podia sonhar, é
uma lenda urbana, nem sei se de fato aquele lugar existia.

— Só vou dizer uma coisa... Não gostei nada do que aqueles dois caras falaram... E
não me refiro ao fato de estarem de volta à rua antes que os policiais preencham a
papelada do boletim de ocorrência, e sim sobre trabalharem pra alguém que
controla a polícia... A gente sabe que Nick Slay não é flor que se cheire, mas não é
bom pra ele que descubram que alguns Steelhearts ainda estejam vivos, além de ter
ganho o cargo de presidente da Paralimitech a nossas custas, todo o status que ele
tem atualmente pra o ralo. Acho que tem pessoas dentro da própria corporação
agindo por conta própria sem que o Capitão saiba. Vou descobrir isso, mas antes,
vou deixar a Max por dentro do assunto. — Eu sabia que era ela chegando naquele
veículo chamativo, ninguém em Miraitropolis tinha mais estilo com carros do que
ela.

Admirava seu jeito rebelde, seus cabelos negros e cheios de pontas, ou então sua
muda de couro com marcas e rasgos em suas calças jeans, Max era magra e se
vestia como uma fanática por rock. Seu Converse All Star era sua marca registrada,
acho que ela tem aquele par de tênis desde os 16 anos e dado como o vermelho
estava desbotado deveria ser isso mesmo.

— É, sumi por um tempo... Max... Mas posso garantir que foi por uma boa causa. —
Esperava ela e Pollux terminarem de se cumprimentarem e se conhecerem melhor
para então começar as explicações.

— A gente falava exatamente sobre esse tal de Nick Slay... Uns meses atrás eu fui
despedida e acusada de ter projetado o androide que matou o prefeito. Uma gangue
que tinha treta com o dono da empresa queria foder com o velhote. Com objetivos
em comum nossos destinos se cruzaram e me filiei a essa gangue, os Steelhearts.
Entre idas e vindas, muita confusão e mentira, o velho filho da puta chamado K'dore
teve o que merecia, entretanto, esse tal de Nick Slay precisava de uma escada para
alavancar sua carreira e criar a Paramlitech. Fez isso com um acordo que fechamos,
ele deixaria em paz os sobreviventes dos Steelhearts com a condição de que o
grupo se dissolvesse. A gente não tinha escolha, e aceitamos. Ele alegou às
autoridades que fomos eliminados pelo seu esquadrão. Com isso obteve o que quis
e até conseguiu um contrato com a atual "Prefeita" Carmen Telford, terceirizando a
segurança pública. Mas parece que surgiu um pessoal aí falando umas merdas que
contradiz tudo isso. E é isso que penso, Pollux, vou xeretar até descobrir tudo. —
Fitei Max. — Decidimos seguir o poderoso chefão mesmo depois de morto, você tá
com a gente? — Deixaria minha amiga livre pra decidir.

— Enquanto você pensa, Max... Vejam isso. — O vento bagunçava o cabelo


desfazendo o moicano lilás, passei a teclar com rapidez os botões da minha
manopla, como se quisesse acessar alguma coisa antes que fosse tarde demais.
Estendi a palma de minha mão na frente de meu corpo, para realizar o acesso.. E
VOILÁ! Um raio índigo saiu da manopla igual a um projetor de cinema, projetando
em 3D um homem sem cabelos azulado semi transparente. Talvez a primeira vista
poderia soar assustador para Max e Pollux.

— Olá, eu sou Praxis. — Ele se apresentava caminhando.

— Praxis é uma inteligência artificial da rede. Digamos que ele é o avanço do


navegador de Lexis. Com essa manopla que se liga com meu cérebro por esses dois
fios, estamos mentalmente conectados. — Talvez Max e Pollux ainda estivessem
assustados, porém com o tempo de convivência quem sabe mudariam de ideia.

— No acordo eu tive também que ceder Praxis para Nick, e agora ele é propriedade
da sua empresa, no entanto, eu que o projetei e Slay nem imagina que fiz isso para
poder acessar os dados da Paramiltech. Os idiotas nem suspeitam que são meu
banco de dados pessoal. Hehehe. Sendo o maior órgão de segurança, imaginem o
quanto de documentos armazenados eles possuem... É de lá que vou tirar as
informações que preciso. Praxis, procure por células independentes dentro da
Paramilitech. Ah, e dê uma amostra da sua versatilidade, acho que a primeira
impressão não foi boa, rs — Ele desapareceu, e por algum tempo ficou aquele
silêncio estranho, todavia não demorava para reaparecer novamente, porém, de
dentro de uma cascata de fontes e códigos azuis agora com aparência feminina e
da mesma cor, uma mulher de cabelo chanel surgia a nossa frente, projetada para
fora da rede dados.

— Não foi fácil filtrar as informações disponíveis, ao que parece existem muitas
células dentro da Paramilitech, vertentes que não concordam com a política de
regime de Nick Slay. Por isso fiz uma pesquisa mais apurada de acordo com seus
interesses e encontrei alguns resultados. Ao que parece, todas essas vertentes
dentro da empresa usam o sistema de dados para registrar suas operações e
poucas horas atrás a tenente Aurora McCall junto de um soldado visitou o
apartamento de Timothy Carter, lá estava também a ex policial Rose Ortiz. A tenente
opera com mãos de ferro a repartição que comanda a polícia e segurança de
Miraitropolis. Usa sua autoridade a seu bel prazer sem precisar ser questionada ou
prestar satisfação a ninguém, nem mesmo a Nick Slay. Quando os bandidos
falaram que trabalham para quem manda na polícia, se referiam exatamente a
McCall. — Conectada mentalmente a mim, Praxis tinha também acesso a minha
memória, e se recordava do momento.

— Viu? Eu falei pra você, Pollux, melhor não subestimar esse cara... — Mas fui
interrompida por Praxis.

— Isso não é tudo, infelizmente o motivo e o conteúdo da conversa não consta nos
registros da empresa. No entanto, eu usei o sistema de vigília do Olho Elétrico para
vascular e naquele mesmo horário um drone biométrico monitorava a região e
registrava alguns trechos da conversa. Separei para vocês o que mais parece bater
de acordo com seus interesses. — O primeiro áudio se tratava da voz de Tim

>> Sabemos que estão desesperados, precisam acusar alguém pela merda
acontecendo na cidade, temos a localização dos Steelhearts. Em troca queremos
apenas que você fique devendo uma para nós, entramos em contato quando você
precisar pagar. — E em seguida a resposta de uma mulher, ao que indicava, era a
tenente.

>> Digam a maldita localização e se realmente estiverem lá, fico devendo vocês,
feito? — Uma terceira voz aparecia no áudio, e conforme o conteúdo, era a ex
policial Rose.

>> Certo, certo. Eles estavam operando no subterrâneo de um bar chamado Sexy
Day em Miraitroid. — O áudio terminava, mas não precisava de mais, o áudio mesmo
em péssimo estado e curto, era o suficiente.

— Tá vendo, Pollux? Parece que seu amigo Tim também é bem esperto e tá se
armando... Melhor, armando pra cima de você... Fica de olho nesse cara... Enfim,
acho que isso é o bastante para saber como agir. — Subi a camisa por baixo do
casaco, pegando a Desert Eeagle e jogando para Max, junto de um cartucho de
munição.

— Pega aí, Max, você é bem esperta e acho que precisou aprender a se defender
nessa bosta de cidade. Se não sabe atirar, a gente dá um jeito. Bom, temos duas
armas, dois carregadores... — Joguei o outro para Pollux, cortesia do velho amigo
Red. — ... Uma holomáscara, uma moto e um carro. Você deve saber onde fica essa
Sexy Day, huh? Qual é o plano? — Perguntei ao ex jornalista.

Galathea
A luz roxa do neon que decorava a adega refletia sobre a água condensada no
exterior de um copo de uísque, envolto preguiçosamente por dedos alvos e
alongados. Galathea se encontrava debruçada sobre a pequena mesa em seu
escritório claustrofóbico, sua silhueta delineada pela mesma luz roxa. As paredes,
com centenas de furos semelhantes a uma colmeia, adornadas por uma fita neon na
borda, guardavam, de um lado, uma adega e, do outro, um arsenal onde apenas as
coronhas de vários rifles estavam expostas. De alguma forma, o cômodo apertado e
o fato de estar três andares abaixo da terra lhe concediam segurança suficiente para
perder a consciência..

Começou a despertar quando notou Shae se movendo em algum lugar. Já havia se


acostumado com a festa constante que acontecia nos andares acima, de modo que
agora, com o clube fechado, sentia falta da música alta. Agora, só podia ouvir o
silêncio...

Alguns segundos se passaram até Shae abrir a porta do escritório.

— Thea? — Chamou-a, sendo respondido por um grunhido — E então?

— Eu recebi uma mensagem… algum anônimo falando sobre escolha certa e etc e
tal… — Balbuciou a morena ainda sem erguer a cabeça da mesa.

— E o que ele queria? — Shae puxou uma cadeira e se sentou do outro lado da mesa.

Galathea pôde ouvir o som de uma cerveja sendo aberta.

— Alguma coisa, alguma coisa… escolha certa, bla bla bla responsabilidade e por aí
vai. Não faço ideia de quem era então…— Ela deu de ombros.

— Falando em escolhas… Já se decidiu?

A figura se ergueu com um soluço que, na verdade, era um sorriso sarcástico. Vestia
apenas um short curto e uma regata bege. Seu rosto alvo e macio estava marcado
pelos traços da mesa e pelos arranhões em seus braços. O cabelo desgrenhado
escorreu para longe de seu rosto quando ela balançou a cabeça e olhou para Shae.
Foi nesse momento que ela percebeu que a outra também estava usando uma
regata oliva, manchada com algumas gotas de sangue, e apresentava hematomas
no rosto. Ele segurava o sangramento de um corte no supercílio direito.

— Vocês ainda estão brincando de clube da luta no depósito? — Perguntou antes de


beber o whisky aguado que restava no corpo. Shae apenas deu de ombros. — Eu já
disse que vou proibir isso no momento em que um de vocês perder a capacidade de
lutar com essa putaria. À propósito você não é destra? — Perguntou incisivamente
olhando o sangue brotando sob a gaze acima do olho do negro.
Shae apenas riu e deu um longo gole em sua cerveja tentando disfarçar o quão fofa
ela ficava quando deixava sua mentalidade de mãe coruja aflorar daquela forma.
Mas sabia que ela não iria proibir nada no fim das contas.

— De qualquer forma. — Reatou Shae, parando brevemente para conter um arroto. —


Levando em consideração o tempo que demorou eu sei que não vai recusar. Teria
recusado sumariamente se realmente não quisesse… É a pessoa mais vaidosa que
já andou nesse planeta então… é apenas natural assumir a liderança.

— Não é tão simples assim. Eu realmente não quero assumir aquilo… — Galathea
puxou a garrafa de whisky novamente e colocou mais uma dose em seu copo.

— Mas…?

A morena estreitou os olhos com a pergunta incisiva de seu sócio.

— Mas… Eu não sei se estamos limpos nessa história. E se for o caso de Yuric saber
que nos aliamos ao Tony, imagino que assim que acabar com a Cosa Nostra ele virá
atrás de nós… E eu não acho que confio em ninguém além de mim para liderar.

Shae assentiu, mas permaneceu em silêncio. Ambos permaneceram ali, em silêncio.


Enquanto terminava de beber.

— Cuide deles. Cuida bem deles…

— Não demore pra nos chamar. — Respondeu Shae se levantando.

— Mande William preparar uma decúria. Ele irá me escoltar.

— Certo… E veja se veste algo prático dessa vez, já que vai precisar de todo esse
poder de fogo.

Galathea sorriu.

----

Não tardou muito para que os três veículos chegassem ao Olimpo. Menos ainda
para andarem pelos corredores deste até o elevador. Os homens ladeavam Galathea
como asas negras, armados até os dentes.
A morena calçava saltos que pareciam ter sido esculpidos em pedras de obsidiana.
Seu corpo imaculado estava coberto por um bodysuit carmesim, que se ajustava
perfeitamente à sua pele. As pernas alvas e alongadas estavam expostas, podendo
ser vistas de vez em quando enquanto ela caminhava. Sobre os ombros, ela
carregava um pesado casaco negro que descia até o calcanhar. O tecido negro se
assemelhava à pelagem de algum animal, mas era, na verdade, sintético. Esse
casaco servia para diminuir sua temperatura corporal, com seus milhões de fios
negros atuando como um radiador. Isso permitia que ela o usasse mesmo nos dias
mais quentes. Seu cabelo liso e escorrido misturava-se ao casaco e movia-se
conforme ela caminhava.

Finalmente chegou ao escritório de Tony. Os homens no caminho não tentaram


impedi-la novamente, já a reconhecendo como uma aliada de Tony. A decúria
aguardou do lado de fora enquanto a morena observava o local, notando como ele
havia sido restaurado ao seu estado natural.

— Eu vou tomar conta deles Tony… Pode deixar. E se io muoio da partigiano…. tu mi


devi seppellir — Recitou ela sem ritmo uma música que fora esquecida através do
tempo, assim como a Itália. — E seppellire lassu in montagna…

Jesse logo chegou ao local, provavelmente convocado pelos homens que avistaram
Galathea. A morena virou-se para a porta, encarando-o, enquanto apoiava seu peso
sobre a mesa do escritório atrás dela.

— Você vai ter que liderar a família Jesse…. Inevitavelmente algum dia você vai ter
que assumir. Então mantenha seus olhos e ouvidos bem abertos para aprender. A
primeira coisa que vou te ensinar é; Nunca demonstre dúvidas quanto às suas
ordens para quem as recebe. Essa é sua aula por hoje, agora vamos ao que
interessa…

Se virou e pegou a caixa de charutos e tirou um dali, cortando a ponta e o levando


aos lábios e acendendo.

— Eu ouvi o que o velho mandou fazer. Não me atrai a ideia de me esconder atrás de
uma parede de bucha de canhão…. Se alguém interessante sair disso, traga até mim.
Mas, falando do que importa… Eu preciso de informações. — Ela caminhou pelo
escritório. Sentindo um frio na espinha ao notar o quão grande era e a enorme
janela. — Eu estou cega até então. Então preciso ser informada de tudo. Preciso de
um relatório detalhado sobre o ataque ao Olimpo, quero saber de tudo o que
aconteceu por todos os ângulos. Quero um levantamento geral sobre todo o capital
da Cosa Nostra; humano, bélico e financeiro. Preciso entender quem está sob
controle direto do Olimpo e quem é de famílias satélites. E por fim quero saber tudo
o que sabem sobre os Bratva. A Uroboros irá fornecer tudo o que sabe também,
temos um dos nossos vigiando o cassino, para que possamos fazer um exame
cruzado dos dados. Quero saber todas as instalações, todos os territórios e todas as
famílias satélites a eles. Se possível até mesmo o que Yuric come e quantas vezes
por dia ele caga.

Ela tragou o charuto e soltou a fumaça lentamente.

— Ele me queria na liderança… então, eu estou liderando. Mãos à obra!

Eugene Volcan
Saí do trabalho com um sorriso largo estampado no rosto, dando uns passinhos de
tango sozinho mesmo. Finalmente, eram minhas primeiras férias em anos
trabalhando para o Grupo de Investigação e Análise Comportamental de Claire
Falcon. Pela primeira vez em muito tempo, sentia um pouco de confiança pelos
serviços que havia prestado até então. Não vou me aprofundar no passado, afinal,
sou um criminoso reabilitado! Já nem ligo mais para a tornozeleira eletrônica que
rastreia cada um dos meus passos. Pelo menos, se algo acontecer, já vão saber
onde me encontrar.

Mas ao caminhar pelas ruas da All Street, fiquei confuso sobre o que fazer em
seguida. Antes, passava horas observando uma loja e planejando roubá-la, ou então
aprendendo coisas novas para me tornar melhor do que era. Agora, não tinha a
menor ideia do que fazer... Trabalhei arduamente para reduzir minha pena e, depois,
trabalhei nos mesmos horários que os demais ao ser reintegrado à sociedade. Só
saía para jantar e dormir... Afinal, todo o departamento de polícia e medicina não
tem descanso. E eis que minhas férias foram de apenas uma semana.

— Onde vou me divertir? — Perguntei apenas olhando ao meu redor.

Ajeitei meu paletó estilo anos 80, muito clássico, uma raridade, e me dirigi ao
carrinho de cachorro-quente ali perto da esquina. O cheiro me transportou para a
infância, quando eu recebia as sobras das vendas do dia por ter uma grande
amizade com o vendedor. Sim, cresci nas ruas, afinal, meus pais ficaram presos na
antiga Paris e eu fui acidentalmente parar em um navio de carga que me trouxe até
aqui. Tive que me virar sozinho e aprender tudo o que fosse possível... Já invadi
bibliotecas virtuais para adquirir novos conhecimentos, sempre escondido... Minha
infância foi um desastre, mas também foi repleta de momentos preciosos. Meu
único pesar é ter perdido meu amigo, que sempre esteve ao meu lado e, de repente,
desapareceu. Até hoje, nem seu nome está mais ativo no sistema.
— Um especial para mim senhor. — Falei cordialmente.

— Num instante fica pronto. — Ele respondeu me encarando com estranheza, no fim
era divertido.

Sentei em um banco para aguardar o preparo do cachorro-quente, com um sorriso


animado no rosto. Afinal, todos parecem estranhar minha postura e minhas roupas,
como se eu fosse um recorte de uma revista antiga. Mas esse é o meu estilo, é o
que me deixa confortável. Desde criança, eu vasculhava o porão da minha casa e de
casas aleatórias em busca de revistas antigas de moda. Minha família era dona da
revista de moda mais famosa da época em Paris, mas infelizmente faliu com o
avanço da tecnologia um pouco antes da viagem. No entanto, eu continuo apegado
a esse estilo retrô. Parecia um bobo, aproveitando ao máximo a tão esperada
liberdade.

Minha casa ficava a poucos metros do trabalho, então não precisava de um veículo
para ir e vir. Meu plano inicial era dormir um pouco e decidir o que fazer ao acordar.
Pelo menos, eu estava me deliciando com o saboroso fast food pelo caminho. O
molho era divino. Aliás, falando assim, até parece que vivo em um lugar tranquilo e
seguro. Mas essa realidade só existe nos livros. Nem parecia, mas naquele
momento, uma guerra entre máfias estava explodindo por todos os cantos, e os
policiais estavam sobrecarregados. Minha bela patroa estava em um treinamento
intensivo, e toda a equipe decidiu tirar férias, inclusive eu.

Já no conforto da minha casa, depois de tomar um banho revigorante, meus cabelos


loiros acinzentados estavam secos e presos. Conectei-me à internet para me
atualizar sobre os últimos acontecimentos. Mesmo com todo o tempo livre, não
consigo me livrar dessa mania que adquiri ao longo dos anos. Passei a me
questionar se o amigo da minha patroa estaria por aí, envolvido em alguma
atividade relacionada à máfia. Afinal, minha equipe sabia que ele tinha tido
envolvimento com eles no passado. A ideia de ligar para ele passou pela minha
cabeça, mas logo a descartei.

No entanto, meu sistema de alerta vermelho foi ativado. Era a primeira vez desde
que desenvolvi esse programa com a ajuda de Rose. Resumindo a história, os
russos têm fortes aliados em sua terra natal. Afinal, a Europa que restou se tornou
território deles. Mas há um pedaço que, supostamente, não foi monopolizado. E lá
só tem gente de peso, pronta para qualquer coisa.

Mas tudo não passava de suposição minha, baseada apenas em pesquisas e nas
palavras dos refugiados que apareceram por aqui alguns anos atrás. No entanto, o
alerta vermelho indicava que alguém estava desembarcando aqui, vindo desse
suposto território desconhecido.

Talvez para ajudar o Yuric? Ou talvez era outro refugiado pedindo abrigo.

Como eu estava livre, fiquei tentado a investigar, mas precisava de um ardil para não
dar na cara. Depois de pensar, decidi entrar nessa maratona mafiosa e ver o que
descubro.

— Rose, preciso de um favor. — Me conectei com minha grande amiga e hacker, além
de parceira de trabalho.

— Diga Gini, do que precisa? — Lá vem ela com seus apelidos estranhos…

— Preciso da localização do Pollux, preciso falar com ele cara-a-cara. — Fui evasivo.

— Já vi que vai aprontar né Gini… Tudo bem, já está no seu comunicador. Agora vou
comer meu doce, fui. — E desconectou.

Já tinha tudo em mãos, inclusive a chave do meu carro, um clássico adorado tanto
em seu tempo quanto nos tempos mais modernos, graças a uma famosa série de
televisão, o Impala 67. Porém, apesar de ser um Impala por fora, a tecnologia
avançou tanto que não existia mais gasolina. O local para onde eu precisava ir ficava
bem distante da minha casa, então teria que dirigir na velocidade máxima para
chegar a tempo. Eu me certifiquei de que estava preparado, com todos os
equipamentos necessários, afinal, é sempre bom se precaver.

Ao chegar ao lugar, estranhei a paisagem. Era uma área repleta de coisas antigas,
parecendo um ferro-velho ou talvez uma oficina abandonada. Não me importei com
a aparência decadente do local. Estacionei o carro, ciente de que o barulho do
alarme alertaria qualquer um que estivesse dentro do lugar. Antes de prosseguir,
verifiquei se não estava sendo seguido por alguém. Satisfeito por não ter notado
nenhuma presença suspeita, saí do carro e me aproximei da porta velha e
enferrujada.

— O salvador chegou! — Cheguei brincando — Olá Pollux, mademoiselles. Vim para


ajudar, mas por apenas uma semana, depois disso minha coleira volta ao pescoço…
— Terminei sorrindo cordialmente.
Narrador Capítulo 10
Antes que Pollux pudesse responder, tanto X-9 quanto Max levaram um grande
susto. As coisas nunca estiveram tão tensas desde a Distopia, e por esse motivo,
quando o homem loiro de terno apareceu e se apresentou ao trio na oficina
"Consertos e Outras Coisas", foi recebido com expressões carrancudas,
principalmente por parte de X-9 e Pollux. As armas foram rapidamente apontadas
em sua direção, e a hacker pegou um grande pedaço de ferro do chão, erguendo-o
acima de sua cabeça.

— Quem é esse doido? Pollux, conhece esse cara? — Ninguém atirou, a princípio o
sujeito parecia desarmado e alegre demais, só não sabiam que era pela liberdade, já
que ocorrendo uma guerra de máfia e gangues não existia muitas razões para
sorrisos e alegria.

— Agora fiquei curiosa como esse sujeito te conhece... — Olhou para o ex jornalista
— Talvez seja um erro, mas vamos ouvi-lo. Além do mais, estamos muito tensos,
principalmente Pollux e eu. — Disse para sua amiga Max.

— Você tem cinco minutos para dizer quem é, como conhece Pollux e o que quer. As
armas vão estar apontadas, não tente nenhuma bobagem. Vamos beber algo dentro
do trailer e conversar. — A hacker abriu a porta do trailer atrás de si, convidando o
homem loiro de terno a entrar. Ela, Max e Pollux entraram logo em seguida. O rapaz
se apresentava, usando bem o tempo minutos para contar sua história, o que queria
e tudo mais enquanto X-9 procurava em alguma gaveta algo para beber. É claro que
conforme narrava sua trajetória os cinco minutos passavam, ele levou muito mais do
que isso. Entre algumas caixas X-9 achou uma velha garrafa de uísque. Não era
bom, talvez até mesmo falso, mas servia ao momento. Encontrou apenas três
copos, em que serviu os demais à volta da mesa de ferro e ficou com a garrafa,
bebendo no gargalo.

— Então você é da firma da Claire? Hmmm... É, os documentos não parecem ser


falsos. — Concluía colocando a garrafa na mesa, levando os códigos até o teclado
ao digitar computador no pulso preso a manopla, o tipo de crachá que possuía além
do nome do rapaz um número de série e código de barras se fosse falso seria
facilmente descoberto com a análise do aparelho.

— Te chamam de Gini... É assim que vamos te chamar... Ok, você está com a gente,
deve ter aprendido bem com Claire. Pollux também é um bom investigador, vocês
juntos podem descobrir bastante coisa. — Serviu mais uma dose de bebida a cada
um e para o jovem loiro não ficar por fora de nomes e situação contou tudo sobre o
que tinham passado. Aquilo levou algum tempo, talvez uma hora ou duas, não dava
pra saber ao certo, por fim concluiu:

— Atualizando: temos dois carros, uma moto, duas armas, munição e uma máscara
holográfica. Nosso ex jornalista aqui. — Colocou uma mão por cima do ombro do
mesmo. — Estava prestes a dizer o que faríamos quando você nos interrompeu. A
dúvida era entre ir atrás de Tim e a Tenente da Paramilitech, salvar os Steelhearts ou
ficarmos mais um pouco aqui e tentar começar a criar aquela parada da inteligência
artificial para o canal de streaming. Acho que dá pra fazer de tudo um pouco se nos
dividirmos. Eu fico aqui construindo o que posso, monitorando Calidora também
enquanto vocês escolhem entre as duas outras funções. — Decidiu, bebendo mais
uma dose de uísque no bico da garrafa. — Deixem a moto para que eu possa usar de
emergência, se der merda ao menos terei como fugir. Ah! Ficarei também com a
holomáscara. — Salientou ao se lembrar antes de finalmente terminar.

Faltava ainda uma hora para amanhecer e os italianos já haviam feito aliança com
as principais gangues de Miraitropolis. Além dos jamaicanos, um dos nomes fortes
em sua lista eram os Neon's Warriors, uma maioria composta por jovens vestindo
couro negro, com implantes cibernéticos, óculos com lentes cromadas e capuzes
em suas jaquetas, que, é claro, tinham neon. Os guerreiros de neon eram conhecidos
por serem bons atiradores e sempre utilizavam armas de fogo bastante chamativas
e luminosas. A Cosa Nostra não poupava esforços quando se tratava de recursos
humanos. Corria o boato de que alguns deles foram até Hampton Heights para
recrutar aqueles que viviam abaixo da linha da miséria. As más línguas diziam ainda
mais, afirmavam que até mesmo os deformados e aleijados foram aceitos.

Agora, se Yuric contava com a força tarefa tática e os melhores homens


especializados ao seu lado, Galathea tinha a maior quantidade de soldados. Por
questões estratégicas, o russo não estava mais "contratando" homens das ruas, uma
precaução que ele tomou para evitar espiões e possíveis infiltrações de traidores.
Com menos de meia hora para o sol nascer, a reunião no Bar Meia Noite em
Miraitroide já havia terminado. Vladimir havia mandado Jesse de volta ao Olimpo
mais cedo. Ao chegar no prédio, o agente triplo encontrou Castelone afundado em
uma poltrona de couro bordô, visivelmente preocupado.

— O que aconteceu, camarada? — Indagou o velho agente ao jovem.

— A senhorita Galathea... Quer que eu assuma... Uma... Responsabilidade... Que eu...


Não posso ter... Quer... Que eu... Faça um relatório... Sobre as finanças da máfia...
Seja seus olhos... Traga informações sobre o ataque no Olimpo... Eu.. Não sei por
onde e como começar... Senhor... — Respondeu gaguejando, de olhos arregalados.
— Hmmm... — Analisou coçando a barba branca.

— Comecei pelas finanças... Andei olhando os documentos e com novos aliados a


folha de pagamento aumentou. O cofre dá conta até o mês que vem... Mas depois...
Se não encontrar uma forma de lucrar com isso... Não vai adiantar ter a maioria de
soldados ao nosso lado... — Os olhos arregalados estavam vermelhos de
preocupação. Vladimir continuava a coçar a barba.

— Como eu ia reverter a situação? Não existia como!! — Jesse levou as mãos aos
cabelos castanhos, desalinhando com o problema que tinha. — A única forma que
encontrei foi permitir assaltos em nossos territórios para aumentar o caixa. — Jesse
olhou para Vladimir, que apenas balançou a cabeça negativamente.
— E também incentivar atividade criminosa nos territórios rivais... — O agente de
barba e cabelos grisalhos manteve a expressão, aquilo cortava Jesse como uma
faca.

— Eu sei o que o senhor deve estar pensando... Eu falhei com a máfia, falhei com o
senhor, falhei com a senhorita Galathea... — Baixou a cabeça.

— É, agir como um trombadinha não arrancará sorrisos dela... O que Tony diria?
Esqueça, ele está morto, se preocupe com Galathea... O que acha que ela vai dizer?
— Jesse gaguejou mas nada saiu.

— Para tudo tem uma solução, camarada. — O semblante de preocupação pairava


sobre o rosto do jovem.

— Precisa se provar digno e valioso dela, precisa cair nas graças de Galathea, agora
ela é sua chefe, mais do que tudo, seu principal objetivo é conquistar sua confiança.
— Manteve as mãos para trás do corpo enquanto falava.

— O senhor tem razão... — Jesse mantinha o olhar vago, pensativo.

— O que mais ela esperava da sua parte? — Indagou.

— Informações sobre o ataque ao Olimpo, da morte do Senhor Montana ou qualquer


outra coisa que fosse importante. — Respondeu. — E se... Hmm... Acabou de me
ocorrer algo, precisarei de sua ajuda. O senhor tem um pequeno esquadrão... Ele
pode rastrear um ponto de Troika que tenha alguma atividade importante e então
agimos... O que acha? Nada acontece naquele bairro sem que Yuric saiba.

— Agora você está começando a pensar como um mafioso, meu caro. — Vladimir
sorriu.
Amanhecia, mas nem parecia. O véu escuro e cinza do nevoeiro cobria os neons dos
prédios, enquanto a luz do sol lutava para atravessar o cobertor de nuvens de
poluição que mantinha o calor insuportável, criando uma atmosfera de estufa. Lá
embaixo, nas ruas sujas do centro, centenas de trabalhadores se apressavam em
direção aos seus empregos enfadonhos, precisando se esquivar habilmente para
evitar serem empurrados pela multidão enlouquecida. De repente, parecia que um
tipo de arrastão havia começado. A cena se repetia em diversos bairros da cidade:
Miraitroide, Submundo, Cidade Média, Cidade Baixa e All Street. Nem mesmo os
bairros de Little Asia e Troika foram poupados do ataque das gangues.

Os noticiários sempre despejavam enxurradas de matérias pessimistas, mas


naquele dia tudo estava ainda mais pesado. Começando com o anúncio da morte do
ex-policial e mafioso Anthony Martin Montana, as notícias prosseguiam com
matérias sobre os arrastões, insinuando uma ligeira ligação entre os dois fatos. Era
de se supor que, mesmo estando certos, não se podia esperar menos de um jornal
tendencioso como o da emissora de Carmen Telford. Contudo, o pior ainda estava
por vir. O trio de âncoras em sua bancada noticiava os testes nucleares da Rússia
Nazisoviética, aumentando o medo da população. Era como se a nação soubesse
que a capital da União das Américas estava fragilizada com conflitos internos. O
intento de Carmen Telford era incentivar o ódio aos russos, uma vez que ela sabia
que Yuric estava mais forte do que nunca e controlando as ruas de Miraitropolis
após a morte de seu rival.

Bem ou mal, a Dama de Prata entendia e aceitava que Tony Montana mantinha uma
certa ordem em meio ao caos, uma ordem que foi desfeita e desequilibrada por
Yuric. Sendo uma estrategista nata, ela também anunciava seus testes militares nos
desertos radioativos, utilizando uma situação terrível como o medo nuclear para
alimentar a xenofobia. Seu plano era encurralar todos os cidadãos russos nos
limites de Troika e impedir que a máfia de Yuric conquistasse mais territórios,
evitando uma expansão do mesmo. Telford criava o cenário perfeito para Galathea
agir sem que a própria Dama de Prata precisasse sujar as mãos.

Em algum ponto de Little Asia, um discreto prédio sem atrativos, sem letreiros
luminosos nem luxo, localizado em uma rua escura e pouco iluminada, abrigava uma
reunião entre homens de colarinho branco e Yuric. O topo do prédio ficava
completamente oculto pela neblina suja de Miraitropolis, um lugar inusitado para os
negócios do russo, que sempre foi associado a edificações luxuosas e de alta
qualidade. O décimo oitavo andar abrigava um vasto escritório, onde importantes
assuntos e negócios eram discutidos por aqueles senhores, tendo Yuric como parte
do grupo.
A parte externa do escritório era composta por enormes vidraças que se estendiam
do chão ao teto, proporcionando uma vista panorâmica da cidade. Os corredores
eram espaçosos, com paredes lisas pintadas de um tom de vermelho escuro,
adornadas com quadros de arte. No entanto, o aspecto mais marcante era a
presença de homens vestidos com ternos e gravatas, portando armas como
pistolas, uzis e fuzis de assalto. Eles patrulhavam constantemente o andar,
garantindo a segurança do local. Apesar disso, o sistema de segurança era
relativamente simples, com medidas cibernéticas que poderiam ser invadidas por
um hacker de nível médio.

Houve um forte estalo nas janelas reforçadas daquele andar, e as vidraças cederam
ao impacto causado pela explosão que ocorreu no corredor em frente à sala de
reuniões. Por meio de cordas, homens vestidos de preto e equipados com
armaduras foram arremessados para dentro do pavilhão. Uma intensa luz branca,
tão poderosa que parecia rivalizar com o brilho do sol, cegou todos que estavam
presentes no interior. Aproveitando-se momentaneamente da cegueira causada pela
luz, uma enxurrada de tiros de metralhadoras partiu das janelas agora
desprotegidas. As balas, do calibre radiack .40, atingiam com precisão e letalidade
as cabeças dos seguranças, explodindo seus crânios como se fossem melancias.
Outros eram abatidos com disparos em seus corpos, não tendo qualquer chance de
sobrevivência.

Dentro do escritório, mais seguranças surgiram em uma tentativa desesperada de


conter o caos. No entanto, eles encontraram o mesmo triste destino que seus
colegas anteriores. Seus corpos foram arremessados pelas paredes e corredores,
deixando rastros de sangue e deformações provocadas pelos inúmeros disparos.
Com as portas abertas, a entrada do pelotão invasor foi facilitada, não havendo mais
nenhuma barreira de proteção. Enquanto isso, um homem se jogava no chão,
buscando abrigo debaixo de uma mesa. Ele permanecia ofegante, com os braços
cruzados sobre o peito, encolhido e de olhos fechados.

Todos os soldados, sem exceção, ergueram suas metralhadoras e abriram fogo,


disparando dezenas de tiros que vararam os corpos dos dezoito homens de terno
escuro que estavam ao redor da mesa retangular. Os impactos foram tão intensos
que as paredes não resistiram e cederam. O sangue escorria pelos quadros, paredes
e rodapés, enquanto os coturnos dos invasores avançavam sobre poças vermelhas.
Não demorou muito até que chegassem ao covarde que se escondeu debaixo da
mesa de madeira reforçada.

Um soldado, erguendo-o pela lapela do terno preto, revelou seu rosto através do
visor de vidro do capacete baixado. Barba e cabelos brancos contrastavam com a
armadura de tons brancos e azuis, em oposição ao esquadrão negro. Era evidente
que ele era o líder da operação, o alfa.

— Ninguém no prédio sabia do ataque, como Yuric escapou tão rápido? — Perguntou
Vladimir.

— El-e-estava na reunião... Mas em co-onferência hologr-afica... E -e não


presencialmente. Veja na cadeira da cabeceira... Tem um pequeno projetor... Ele
fazia sua imagem aparecer... — Gaguejando com medo respondeu o homem de
olhos puxados e leve sotaque coreano.

— Esperto.... Não saiu de Troika... Qual era a razão da reunião? — Vladimir


chacoalhava o coreano.

— Se eu falar... Você... Não me mata? — Implorou o oriental.

— Se não falar AGORA meto uma bala na sua cabeça sem pensar duas vezes. Qual o
motivo da reunião? — Vladimir puxou uma glock do coldre da armadura e colocou o
cano da arma na boca do homem.

— Está... Está... No... Slide do fundo da sala.... Tudo o que debatemos foi gravado
naquele aparelho... — Apontou para perto da janela, uma lâmina holográfica azul
flutuava sozinha como um fantasma naquele canto do escritório.

— Obrigado. — Vladimir baixava o visor amarelo puxando o gatilho, se protegendo


dos miolos do coreano.

— Jesse, venha aqui, camarada. — Acenou com a destra, convocando o jovem que
se aproximava.

— Senhor, foi bastante inteligente atacar somente o andar da reunião em vez do


prédio inteiro e desativar as barreiras de segurança da torre. Usar o Crow Z para
cegar a segurança... Uau, que estratégia! Ele ainda está mantendo a vigília lá fora?
— Indagava empolgado.

— Sim, mas não se preocupe com isso, desde o início era pra ser uma missão rápida,
logo esse prédio inteiro estará cheio dos homens de Yuric. O que precisamos está
tudo aqui. — O mais velho retirou do centro de um suporte do chão uma pequena
esfera, e a lâmina holográfica se desfez assim que puxou um chip de um cartão
vermelho. Com as informações da reunião, o esquadrão pulava as janelas quebradas
da torre voltando para o Crow Z que planava à espera deles, e então sumia no
espaço aéreo de Miraitropolis desaparecendo na noite artificial da megacidade.
Enquanto lá embaixo, na selva de pedra, parecia que todos os marginais e
criminosos estavam armados e cometendo assaltos. Os rumores de que a máfia
italiana estava recrutando pessoas estranhas de Hampton Heights eram
verdadeiros. Dezenas de indivíduos considerados anormais, defeituosos e
marginalizados pela sociedade agora estavam tendo sua vingança, disparando tiros
indiscriminadamente nas esquinas, como se tivessem conquistado seu espaço. E, é
claro, eles também cometiam pequenos delitos.

Não era incomum presenciar assassinatos nas ruas, alguns resultado de disputas
por território, outros decorrentes de roubos seguidos de morte, e um número
alarmante causado pela imprudência - ou estupidez - de colocar armas nas mãos de
assassinos em série. Até mesmo os mendigos possuíam algum tipo de pistola, por
mais simples que fosse.

A verdade era que, mais uma vez, a população trabalhadora e honesta se via refém
da violência excessiva da cidade. Era possível encontrar cérebros, sangue e vísceras
espalhados pelas calçadas a qualquer momento. Quisesse ou não, a Cosa Nostra
lucrava com essa situação, e o arquiteto por trás desse plano era Jesse Castelone. O
jovem italiano estava de volta ao poder, com seu terno perfeitamente alinhado ao
seu corpo esguio, contabilizando os lucros. Vladimir, ainda usando sua armadura,
observava-o de perto. O garoto parecia uma criança feliz com seu novo brinquedo.

— Só nessa amanhã, senhor Vladimir, mesmo dividindo os lucros com as gangues,


conseguimos arrecadar as finanças do próximo mês! — Jesse estava atrás de uma
mesa, com um contador de Créditos a frente das vistas, o mesmo modelo de visor
que Seu Zé fazia em Rio Bravo.

— Novamente você está se distanciando do seu objetivo para com sua chefe e
pensando como um trombadinha, se deixando levar pelo rápido sucesso rápido e
esquecendo do que verdadeiramente importa. Não se empolgue tanto, camarada, já
disse sua patroa não gostará desta atitude. — Respondeu com os braços para trás
do corpo a frente da mesa de Jesse.

— Oh... Não tinha pensado nisso... — Coçou a cabeça

— Minha primeira sugestão é tomar essa medida apenas temporária. — Sugeriu. —


Por enquanto mostre a ela o que encontramos, ela ficará feliz. — Jesse apenas
sinalizou positivamente com a cabeça e se ergueu da cadeira.

— O que contém nesse cartão é o que realmente importa. — O cartão chip foi
inserido em um computador normal e a lâmina holográfica flutuava no meio da sala,
assim como eles encontraram no escritório em Little Asia. O agente com o indicador
mostrava os arquivos que tinha lido e comentava com o jovem italiano.

— Vamos ver como as peças estão se mexendo no tabuleiro. A mãe Rússia notou
que Miraitropolis está enfraquecida e comandada por um mafioso de sua
nacionalidade, e começou a agir psicologicamente testando ogivas. Telford que não
é boba e nem nada, sendo uma empresária que soube administrar a situação
negativa e até certo ponto reverteu alimentando a desconfiança em cada russo da
cidade. Por outro lado, Yuric novamente soube virar o jogo e está jogando mais
pesado e mais sujo do que ela, enviando uma corporação fantasma em que usa para
lavar dinheiro. A ChoiTech não existe, é um engodo, a empresa está trabalhando
para os nazisoviéticos, a corporação de armamento é na verdade de Ignov e serve
como um cavalo de Troia... Você sabe o que isso representa, Jesse? Que essa
empresa não vai ajudar a proteger Miraitropolis e sim desarmar ela quando minha
nação atacar a sua... Estaremos indefesos como bebês...— Explicava Vladimir, ainda
com sua armadura de combate

Ainda pela manhã, Carmen Telford anunciou a mais recente parceria da


Paramilitech, mostrando seu compromisso com a segurança da União das
Américas. A empresa bélica ChoiTech também havia fechado um contrato com o
gabinete de Carmen. Seu presidente, o empresário coreano Henry Choi, era
conhecido não apenas por sua habilidade nos negócios, mas também por seu
talento como programador. A Dama de Prata, como Carmen era conhecida, cedeu a
Henry o antigo prédio da Orion.Corp, de Jaime K'dore, que havia falido após o
escândalo dos necroides. Choi conseguiu adquirir o edifício por metade do valor de
mercado, tornando-o uma pechincha no coração da cidade. E tudo indicava que essa
nova parceria já havia sido firmada meses atrás, aguardando apenas o momento
certo para ser anunciada, pois o prédio já havia sido reformado e totalmente
remodelado.

Com uma estética mais moderna e menos sombria em comparação aos K'dore, a
sede da ChoiTech se erguia como uma torre luxuosa e imponente, envolta por
hologramas em constante movimento. Peixes, símbolo da ChoiTech, circulavam ao
redor do prédio como se estivessem em um grande aquário holográfico. Em uma
coletiva de imprensa realizada na entrada da escadaria, Henry Choi afirmava que
nunca mais permitiria que outra empresa caísse como os K'dore, pois os hackers
eram coisa do passado. Com seu revolucionário programa anti-invasão, o Sistema
Aracno, nenhuma invasão virtual seria capaz de penetrar nas sedes corporativas.

Não muito distante dali, ainda no coração da cidade, especialmente nas redondezas
do Olimpo, os Neon Warriors mantinham vigilância reforçada ao redor do prédio em
grande número. Posicionados nos telhados e terraços das casas e outros edifícios,
eles garantiam os melhores pontos de observação do bairro, caso houvesse uma
nova tentativa de invasão por parte do Yuric. A gangue estava agitada e pronta para
agir a qualquer momento quando uma figura atravessou a rua em direção à
residência agora pertencente a Galathea. Essa visita peculiar era ninguém menos
que Xiaren em pessoa, dirigindo-se à entrada sem seguranças e aparentemente
desarmado, não demonstrando qualquer intenção hostil. Ele falou aos Guerreiros de
Neon que precisava conversar com Galathea. Por sua vez, a gangue entrou em
contato com seu líder, Jesse Castelone, informando-o de que o líder da Ryulong
estava no território. Não considerando ser uma armadilha, uma vez que Xiaren
estava sozinho e era parceiro de Anthony Montana, Jesse ordenou ao grupo que
permitisse a passagem. No entanto, ele tomou precauções e decidiu não permitir
que o gangster tivesse contato direto com sua chefe até que soubesse quais eram
suas verdadeiras intenções. Por isso, ele o recebeu em sua sala, junto com Vladimir.
Convidando-o a se sentar à mesa e oferecendo uma generosa dose de saquê, a
bebida incolor repousava no copo sobre a mesa de madeira enquanto Xiaren
explicava o motivo de sua visita e seu interesse.

— Meus pêsames ao seu patrão, Tony e eu nos conhecíamos fazia quinze anos.
Estarei em seu enterro e da senhorita Akane quando ocorrer, não deixe de me avisar
quando será. Mas a razão pela qual vim pessoalmente não é exatamente esta.
Como disse, Montana e eu tínhamos uma longa relação, nossa ascensão foi quase
ao mesmo tempo. Lembro quando conversamos, ele querendo ser o chefão italiano
e eu da Yakuza ou Tríade, foram longos dias planejando e almejando nossos sonhos
até que se tornaram realidade... Quando acontece você nem acredita, leva tempo até
perceber que não é um sonho apenas. Sempre fomos parceiros, nem mesmo o
poder mudou isso, não é agora que será diferente... Em nome dessa trajetória eu
estou querendo manter a aliança da Ryulong com a Cosa Nostra. Yuric precisa cair.
Agora que já fez sua entrevista, posso falar com Galathea ou não? — Incisivo, Xiaren
pressionava Jesse.

A antiga linha de metrô desativada de Hampton Heights pairava sobre o grupo


armado, revelando que o renegado bairro não era apenas uma lenda urbana, mas
uma realidade concreta. No entanto, não havia motivo para comemoração, pois a
jornada de Calidora e seus companheiros era árdua. Como ratos no esgoto, homens
e mulheres se moviam pelo rio de sujeira que atravessava a cidade. Apesar do
desconforto, o pior ainda estava por vir.

Lanternas acopladas a armas iluminavam as galerias sombrias de Miraitropolis,


revelando uma cena desoladora. Pelo caminho, encontravam-se indivíduos
drogados, desabrigados e até mesmo cadáveres. No entanto, eles não se
intimidavam diante das armas e se colocavam como obstáculos na única passagem
para Hampton Heights, um arco escuro e afastado nas entranhas de tijolos, pedras e
tubulações.

Os viciados se moviam como zumbis cambaleantes, consumidos pelo constante


uso de substâncias ilícitas. Seus corpos não possuíam mais um fio de cabelo, e eles
babavam uma espuma branca, rangendo os dentes e emitindo grunhidos. Os fios
conectados em suas cabeças e os visores metálicos sobre seus olhos revelavam
que eram marionetes controladas por drogas virtuais. No entanto, havia algo
peculiar neles. Essas pessoas guardavam um segredo que, se descoberto, poderia
ter grande importância no futuro.

Em sua capacidade limitada, seja em poder ou inteligência, Jesse empurrou a porta


dupla do escritório de Galathea e adentrou a sala. Ele estava visivelmente nervoso,
com suor frio escorrendo pela testa e tentando esconder sua tremedeira.
Lembrava-se das palavras de Vladimir, que havia lhe dado conselhos sobre manter
uma postura confiante. Ao se posicionar diante da mesa da nova líder da Casa
Nostra, sentiu um medo maior do que jamais sentira por seu falecido chefe, Tony.
Pelo menos ele conhecia Tony, mas a morena de longos cabelos negros e pele
branca era uma incógnita para ele. Não sabia do que ela seria capaz. Talvez fosse a
frieza com que ela se comportava, o oposto de Montana, que era intenso e vivia em
explosões de raiva. Ou talvez fosse por causa dos erros de Jesse ao autorizar
roubos e assassinatos nas áreas de atuação italiana. Apenas de pensar nisso, Jesse
sentia suas pernas fraquejarem e quase desmaiava. No entanto, ele sabia que se
permitisse isso, seria o seu fim dentro da organização mafiosa. "Covardes não são
aceitos em lugar nenhum", repetia para si mesmo, como um mantra que Vladimir
havia lhe ensinado. Somente com essa mentalidade, Jesse conseguiu reunir
coragem para dirigir a palavra à sua chefe.

— Senhorita Galathea, aqui estão as informações que pediu. — Colocou em cima da


mesa um pequeno aparelho semelhante a um pen drive. — Fiz um levantamos de
tudo que poderia ser útil. Com exceção de informações sobre a morte do Senhor
Montana, está tudo aí.

— Também trouxe comigo dois homens que podem fazer a diferença no combate
contra o Yuric. O primeiro deles é Meia Noite, o líder da gangue jamaicana. Esse
homem tem o conhecimento de tudo que acontece nas ruas, tem olhos e ouvidos
por todas as esquinas. — Com a mão indicou que o homem negro, alto e esguio
adentrasse sala para se apresentar. O mesmo retirou a cartola e cumprimentou
Galathea, ficando em pé apoiado em sua bengala de madeira. Era bastante
carrancudo e intimidador com suas tatuagens brancas pelo corpo. O corvo no
ombro confirmava sua aparência sombria.
— O segundo é um jovem com o Q.I. muito alto, Dexter, pensei que ele poderia
trabalhar com os homens da Oroboros no que diz respeito a equipamentos e
qualquer coisa do setor científico e tecnológico. É outra vantagem que teríamos
diante do Yuric. — Permitiu que o jovem de jaleco branco e óculos entrasse para que
a morena o pudesse visualizar.

— A terceira já é uma conhecida nossa, a talentosa Gal, a mulher que consegue ficar
invisível e intangível. Com uma ordem poderia entrar no covil dos russos e sair sem
que fosse notada. — Sem cerimônias a mulher loira parou ao lado dos outros.

— E por último... Nem eu mesmo esperava... O Senhor Xiaren, líder da Ryulong e


antigo aliado do Senhor Montana, veio reforçar a aliança. — Xiaren com elegância
parou a frente da mesa também. Jesse esperava que com tantos assuntos a tratar,
sua chefe não lembrasse dos vacilos que cometeu ao incentivar o crime nas ruas
para obter um lucro no cofre da Casa Nostra.

Considerações:

1 - Com base em tudo o que Jesse descobriu, sobre os planos de Yuric e a situação
em que Yuric se encontra, encurralado apenas em Troika, ele precisará planejar um
contra-ataque em resposta ao que aconteceu com Tony. O ponto fraco dos negócios
do russo é o Cassino Overdose. Meia-Noite pode ser usado como um personagem
não-jogador, como mencionado no capítulo, já que ele sabe tudo o que acontece nas
ruas de Miraitropolis. Gal se tornou um personagem não-jogador devido à troca de
jogadores que optaram por Dexter. Gal pode ser uma arma importante, já que pode
atravessar substâncias sólidas e se tornar invisível. Também será necessário dar
uma função a Dexter e decidir se aceita ou não a aliança de Xiaren.

2 - X-9 vai criar a I.A., enquanto Polliux decide o rumo que ele, Gini e Max vão tomar.
Portanto, apesar de não haver uma ordem definida para postagem, ele precisa ser o
primeiro dentro desses três personagens. (Apenas para deixar claro, Max e Gini
dependem da decisão de Polliux, os outros personagens da quest não). O esquadrão
que está ajudando Calidora terá que descobrir qual é o segredo que os viciados dos
esgotos estão escondendo. As opções estão abertas, seja para capturá-los ou
matá-los. Mas lembre-se de que a quantidade numérica deles é muito superior à do
esquadrão.

3 - Tim ainda está livre para fazer o que quiser.

4 - Toshio, por enquanto, fica em espera.

Update (Apenas para Toshio, Pollux, Max e Gini)


Debaixo de uma fina garoa que caía em Little Asia, os latões com fogo onde
mendigos dormiam foram derrubados por um caminhão de entrega. O veículo
estacionou nos fundos do restaurante de Xiaren. Não era incomum receber entregas
ilegais, como armas, drogas e materiais contrabandeados, e seus homens estavam
cientes de que naquele horário receberiam um carregamento completo. Por esse
motivo, nem mesmo foram inspecionados pelos membros da Ryulong que faziam a
guarda naquele plantão. Três homens saíram da cabine do caminhão, suas armas
equipadas com silenciadores, e eliminaram os cinco orientais de terno que deveriam
proteger aquela entrada.
Abriram o compartimento do caminhão, liberando outros integrantes da gangue.
Apenas um deles decidiu não acompanhá-los e usou a escada de incêndio do prédio
vizinho para chegar até o topo. Os demais adentraram o estabelecimento, seguindo
as ordens dos três primeiros membros que lideravam o grupo e exigiam o uso de
máscaras. Lançaram uma bomba de gás no chão, criando uma cortina que não
apenas atrapalhava a visão, mas também era venenosa. Logo, os dutos de
ventilação começaram a espalhar o gás pelo recinto. Além das máscaras de
proteção, todos os invasores estavam equipados com visores de calor. Movendo-se
rapidamente, muitos deles se espalharam pelos corredores e saídas, tomando o
controle do local. Não sobrou uma única porta para servir de escape, pois os
inimigos cercavam o saguão principal de todos os lados. No entanto, o que mais
impressionava era a presença daqueles três indivíduos que atuavam em conjunto.
Eles pareciam idênticos, tornando impossível determinar se eram trigêmeos, clones
ou androides programados com o mesmo design. Vestidos de maneira idêntica,
com bonés, jaquetas e calças militares, eram conhecidos como "Cérberos" por essa
razão.

— Quero quatro de vocês seguindo por esse lado, e mais quatro pelo outro, vamos,
agora! — Ordenou aquele que parecia ser o alfa. Os outros dois apenas apontavam
suas armas.

Ao mesmo tempo em que soltava um berro, o líder dos Cérberos disparou nas
costas de um membro da Ryulong que tentava emboscá-los. Movendo-se como um
tanque, avançou impiedosamente em direção aos demais, trocando tiros sem se
preocupar com a possibilidade de ser atingido. Com uma precisão exímia, ele
derrubou oito membros da máfia oriental com disparos certeiros. Os outros dois
Cérberos não ficavam parados, oferecendo cobertura ao "irmão" e eliminando outros
atiradores que representavam uma possível ameaça. Foi nesse momento que o
ataque se intensificou, sem poupar nem mesmo os clientes que estavam
desfrutando de suas refeições. No entanto, em meio ao caos, sempre há alguém que
se destaca. O membro mais habilidoso da Ryulong não ficou inerte e emergiu com
sucesso, conseguindo abater três dos estranhos invasores. Durante a ausência de
Xiaren, que estava com Galathea, ele assumia o controle. Com suas notáveis
habilidades com armas de fogo, ele rapidamente neutralizou a invasão, dando
ordens com firmeza:

— As máscaras de gás estão na cozinha, não venham se não tiverem usando uma! —
Dando a dica para seus homens, enquanto eles corriam para a porta de acesso a
cozinha, o Wong concedia cobertura.

No entanto, de maneira misteriosa, alguns dos orientais tombaram sem vida antes
mesmo de chegar à porta. Wong, surpreso e confuso, utilizou os dois dragões
dourados da entrada do saguão como abrigo e arregalou os olhos diante daquela
cena inexplicável. Aproveitando a oportunidade, um rapaz mascarado da gangue
avançou, tentando entrar em confronto com ele. Antes que o jovem pudesse apertar
o gatilho, Wong disparou sua arma, atingindo a perna direita e o ombro direito do
rapaz a queima-roupa. O outro membro da gangue caiu, ainda vivo. Wong puxou o
ferido pela roupa, deixando um rastro rubro no chão, e o trouxe para perto dos
dragões.

— Quem é o responsável por isso? — Perguntou.

— É amostra que ele pode estar em Troika, mas a extensão de seus braços pode
ainda tocar seu chefe. — Respondeu com sangue na boca.

— Ele quem??? — Sem paciência, o chinês de cabelo raspado gritava.

— Yuric, oras....

— Foi o porco russo que atacou o Meia Noite hoje mais cedo? — Indagou novamente,
mas o homem já estava morto e não obteve a resposta da sua pergunta.

Mais um disparo e desta vez um de seus braços se tornou um pedaço de carne


desprendida do corpo. Wong reagiu mesmo naquele estado deplorável, era um
general de Xiaren também por conta disso. Sacou sua arma do coldre da perna
esquerda e começou a disparar na direção que o tiro venho.

— Ele está no terraço do prédio vizinho, contra a luz de um poste, atirem naquela
direção! — Alertou dando a posição do inimigo. Contudo, devido ao capuz, era quase
impossível descobrir ou deduzir sua identidade.

Agora, melhor equipados com máscaras de gás de espectro verde, eles tentavam
derrubar Wong, disparando suas metralhadoras sem piedade. No entanto, antes que
pudessem ter sucesso, o único capaz de restaurar a ordem naquela situação foi
atingido novamente. Parte da cabeça de Wong foi despedaçada, deixando apenas a
parte esquerda intacta. Seu corpo inerte caiu pesadamente, fazendo com que o
sangue se espalhasse pelo carpete. Pedaços de crânio e cérebro salpicavam um dos
dragões dourados, enquanto um dos homens ao lado comentava com outro, que
usava uma mesa de ferro virada como barricada.

— A coisa tá saindo do controle... Esse deve ser o mesmo cara que matou o
Montana e a mulher dele!! — Seu colega até tentou abrir a boca, mas um único tiro
foi o suficiente para destroçar toda sua cabeça.
Aos poucos, aqueles que ainda restavam para lutar estavam sucumbindo. Eles não
queriam ser abatidos como gado, então dirigiram-se para o rombo feito em uma das
paredes do restaurante, em meio às explosões causadas pela gangue. Com sucesso
em sua fuga desesperada, conseguiram chegar até a calçada. No entanto, eles não
perceberam que haviam caído em uma armadilha. Um dos "trigêmeos", segurando
um controle, acionou os explosivos, fazendo com que aquela parte da rua fosse
lançada pelos ares. Concreto e sangue voaram para todos os lados, atingindo alguns
sobreviventes mutilados no chão. Quando a fumaça finalmente se dissipou, como se
por mágica, o atirador misterioso sabia exatamente onde os homens de Xiaren
estavam posicionados dentro da neblina e os eliminou com precisão, eliminando
todos aqueles que ainda haviam resistido ao ataque. Toshio testemunhava tudo,
mas sabia que precisava criar um plano ou também seria morto.

Em outra parte da cidade, em algum ponto da Avenida Armitage, Max guiava seu
carro com Pollux ao seu lado, enquanto Gini seguia sozinho em seu próprio veículo,
seguindo o carro da dupla à frente, uma vez que o jornalista sabia para onde
estavam indo. No entanto, independentemente do que o trio havia decidido fazer, um
carro policial os seguia e sinalizava para que parassem. Nessa situação, para evitar
levantar suspeitas, a melhor coisa a fazer era obedecer. Enquanto isso, a pulseira de
Pollux vibrava, indicando uma mensagem de voz de Coltraine.

— Só queria dizer que sinto muito pela informação errada sobre Vegan, você não o
encontrou no Consertos e Outras coisas não é? A pouco fiquei sabendo que Yuric
raptou o cara. É, o filho da puta foi mais rápido do que você. Provavelmente
ameaçou o coitado e tá fazendo trabalhar para ele a força. Essa cidade tá uma
bosta... Tão raptando todo mundo, seu amigo, Thomas Carwell também sumiu, e pra
piorar, dele eu nem faço ideia quem tenha raptado. Mas fica esperto, do jeito que tá
a coisa, você pode ser o próximo. Bom, te liguei porque senti que fiquei na dúvida de
uma informação que fosse mesmo importante, no fim das contas teve duas. — O
traficante desligou, o alerta havia sido dado.

Do carro policial desceram quatro pessoas: três homens e uma mulher. Eles
estavam vestindo as armaduras convencionais da Paramilitech, com capacetes
equipados com máscaras de gás, escudos e cassetetes que mais pareciam espadas
de luz. Eram soldados padrões com os trajes mais básicos e baratos da corporação.
Enquanto isso, a mulher usava apenas um colete reforçado, sem muita proteção
além do torso. Batendo com o cassetete no vidro, um dos agentes da P.M. ordenava
que Pollux e Max saíssem do carro, enquanto outro fazia o mesmo com Gini. Uma
vez estacionados na beirada de um dos trechos da Avenida Armitage, os soldados
solicitaram a documentação dos veículos. A mulher se aproximou e fez um sinal
negativo para os agentes, deixando claro que não era necessário. Um deles se
aproximou e anunciou:
— Saíam com as mãos para cima e se posicionem no meio fio. Apenas falem se
solicitados e se seus devidos nomes forem mencionados. Caso contrário
mantenham o silêncio absoluto enquanto a Tenente Aurora McCall fala. — A voz era
metalizada por conta da máscara, porém firme e grossa, bastante autoritária.

— Boa noite... Ou bom dia.... Com essa chuva nunca sei ao certo... — Olhava para o
céu nublado e chuvoso. — Pollux, foi bem difícil achar você. — Ela olhava agora para
Max, chegando com o rosto bem perto da morena.

— É sua namorada? Amiga? Ela é bem bonita... E o garotão ali atrás? Também não
conheço. — Se referindo a Gini.

— Ah claro, informalmente chamados de Max e Gini... — Um dos soldados entregava


um holotablet para a policial conferir a ficha criminal de cada um deles. — Uma
mecânica e um "estagiário" condenado... Bel dupla... — Continuou a mexer no
aparelho sem nem mesmo olhar para o trio quando se apresentava, deixando claro
que não estava sendo nada cordial, além de provocativamente debochada.

— Esses dois estão limpos... Mas você, Pollux... Hmmm.... Se não me falha a
memória nos registros da ParaMilitech consta que está morto... Junto dos demais
Steelhearts... No entanto... Parece mais vivo do que qualquer um de nós aqui... — Ela
caminhava de um lado a outro na chuva, como se quisesse resolver um problema.

— Me ajude a resolver esse enigma, como pode alguém morto ainda andar? Isso
vale para os demais Steelhearts... — Parava na pista.

— Isso quer dizer alguma coisa, alguém mentiu, alguém dentro da ParaMilitech...
Mas por qual razão? Acho que você pode responder essa pergunta. Mas calma, não
agora, eu gosto de suspense. Por enquanto vamos tratar de negócios. — Não
importava quem você fosse em Miraitropolis não existia lugar algum em que não
pudesse andar um ou dois quarteirões sem que alguém tentasse tirar vantagem.
— Quanto vale o preço da liberdade? Provavelmente você diria que ela não tem
preço, por outro lado eu diria que tem, e vale dois milhões de créditos. É um valor
pequeno considerando o que poderia acontecer se Carmen Telford descobrisse que
você e alguns Steelhearts ainda estão vivos, incluindo o tal de Joe e a hacker de
cabelo colorido. Isso seria bastante ruim... Tsc, tsc, não somente a eles mas até
mesmo para seus dois novos amigos aqui. Sei que vocês não tem esse valor, claro,
não é uma quantia fisicamente possível levar nos bolsos e mesmo que fosse,
ninguém seria louco de andar por Miraitropolis com tanto dinheiro. Também sei que
não é fácil arrumar tanto em tão pouco tempo. Então pensando... Como estou de
excelente humor, dou a vocês exatamente 48 horas para arrumar esse dinheiro ou
meu bico pode acabar abrindo durante a reunião que tenho com Telford em muito
breve. Acho que se for bem organizado, um roubo em um banco pode pagar meu
silêncio... Talvez. Como vão conseguir não é da minha conta. Quero ver os três aqui,
nesse mesmo lugar dentro de 48 horas com dois milhões de Créditos. — Ela voltava
em direção ao carro, abrindo a porta, mas antes de adentrar, lembrava.

— E não adianta tentarem fugir, com a ParaMilitech posso caçar vocês até Marte e
precisar, embora prefira transformar a vida de vocês num inferno diferente se
bancarem os valentões. Tentem e descobrirão! — Entrava no carro, os outros três a
acompanhavam.

Obs:

1- Toshio pode tanto tentar um contra-ataque como simplesmente uma fuga, o


importante é sair vivo. Se optar por atacar tem que levar em conta que a maioria dos
Ryulongs morreram. A dificuldade será alta, 18 nos dados (Para fugir não precisa
de rolagem). De alguma forma precisa avisar Xiaren do que aconteceu ali. Claro que
se os dados não colaborarem uma tentativa interpretativa é bem válida se coerente.

2- Pollux, Max e Gini, cada um vai agir de forma independente, sem precisar esperar
o outro ou combinar, tudo conforme sua maneira e sua personalidade diante o
suborno da Tenente. As escolhas são, ou aceitam o que ela disse ou também
tentam atacar ela. Porém devem lembrar que são três e somente dois possuem
armas, com dois cartuchos de recarga, enquanto os quatros policiais além de
melhor armados possuem proteção e já estão dentro do carro. A dificuldade nos
dados caso queiram atacar também é 18. Contudo, se forem atacados, existe uma
tentativa interpretativa de ter sucesso sem a rolagem dos dados. Mas... Ela seria
uma alternativa que levaria à morte instantânea dos agentes da P.M. Quem fizer isso
esteja ciente de que terá sangue policial nas mãos. Vale mesmo a pena?
Galathea
Empoleirada em sua cadeira no escritório, Galathea recebia a todos em silêncio.
Seus olhos claros e afilados, como de um rapinante, observavam friamente aqueles
que adentravam. William aguardava alguns passos atrás dela. E foi ele quem falou
primeiro.

— Senhores, agradeço a visita. Vamos então ordenar as coisas de forma apropriada.

Galathea ativou as informações e as leu em silêncio enquanto William enxotava


todos da sala, exceto Xiaren. As palavras apenas confirmavam algumas das coisas
que ela já havia sido informada. Um leve sorriso surgiu em seu rosto antes de
desligar o aparelho e levantar o olhar novamente para Xiaren, assim que as portas
do escritório se fecharam atrás dele. Agora, os dois estavam completamente
sozinhos ali, se não fosse por William, que se apressou em voltar para trás da
morena. Ele aguardava em silêncio, com uma postura sepulcral, como um cão de
guarda bem adestrado.

— Eu peço perdão o terem feito esperar. — Galathea gesticulou para um dos dois
assentos do lado oposto à mesa — Por favor. Vamos ao que interessa. A que devo
sua visita?

--------------

Cumprimentando William silenciosamente com um singelo e breve gesto de


positivo, acenando com a cabeça, o oriental puxou a cadeira e se sentou à mesa em
frente a Galathea, indo direto ao assunto.

— Como disse ao talentoso Jesse, a Ryulong sempre foi aliada de Tony, eu mesmo
mantinha uma estreita relação com ele. E sendo completamente honesto, não é
nada inteligente ficar contra a Cosa Nostra mesmo com os malditos russos tendo
atualmente mais poder. — Contou ele. Sua voz era calma, mais do que o tradicional,
ajeitou-se melhor na cadeira, prosseguindo. — Também posso ser bastante
persuasivo com os latinos. Ouvi dizer que os coitados estão sem rumo depois que
Pascal surtou quando seu irmão foi raptado. Desde então ele não teve mais notícias
do coitado. Dois homens foram contratados para saber de seu paradeiro, Coyote e
Rodrigo, o primeiro apareceu morto, o segundo não se tem notícias... Ou seja, os
chicanos estão às cegas. Como eu acho quase impossível que Pascal fique ao lado
de Yuric, a menos que seu irmão ainda esteja vivo e seja usado como moeda de
troca, eles podem se tornar nossos aliados. Serão as três maiores máfias contra os
russos, isso é algo que nem mesmo Yuric podem conceber. — Respirando fundo,
Xiaren voltou o olhar fixamente a Galateha, não em tom de desafio, mas com certeza
e segurança no que dizia. — Dessa forma, Yuric pode ser esmagado. Minhas fontes
seguras confirmam que tem neste momento um cargueiro cruzando o oceano
pronto pra aportar em Troika, ele traz aqueles fanáticos nazisoviéticos, o
desgraçado vai encher Miraitropolis com esses bastardos e como deve saber a
tensão entre nossos países está bem alta. Permitir que Yuric abra as portas para
essa gente é inaceitável. — Se aproximando da mesa, inclinando o tronco para
frente, Xiaren baixava o tom de voz, como se fosse confidenciar algo somente a ela.
— Dez meses atrás, quando consegui reformar a Ryulong, uma feira de tecnologia
apresentou um artefato chamado Green Box. Ninguém soube para o que ela servia
porque os porcos dos russos roubaram o objeto. Enviei a minha segurança pessoal,
a pessoa mais indicada que conhecia para recuperar o artefato, entretanto quando
ela entrou nas docas nunca mais foi vista, nem ela e nem a Green Box. O Detetive
Caz cuidava do caso, mas a imprensa não quis mostrar a falha do queridinho do
Departamento policial e abafou todas informações. E como o povo tem memória a
curto prazo ninguém mais comentou caindo no completo esquecimento. Dizem que
a Green Box foi enviada para a Rússia para a construção de armas nucleares
alimentadas por radiack... É, Green parece que é em referência ao verde do radiack...
De qualquer maneira, se isso for verdade, vamos precisar nos unir, nós e os
chicanos. — Depois de dizer o que sabia, o oriental voltou a posição normal inicial,
encostando as costas na guarda da cadeira.
--------------
Após receber Xiaren, Galathea apenas o ouviu em silêncio, já que ele parecia tecer
um assunto seguido do outro sem pausa. A morena pousou o cotovelo direito sobre
a mesa e apoiou o queixo sobre o punho. Sua única reação diante da maioria do que
foi dito foi erguer o cenho ao ouvir falar da Green Box. Ela nunca havia ouvido falar
daquilo antes.

— Eu sempre considerei que éramos aliados. — A morena estendeu a mão até a


garrafa de Whisky sobre a mesa, despejando uma dose para si e outra para Xiaren.
Empurrou o copo para ele e deu um longo gole em sua bebida. — Mesmo que não
oficialmente, mas por circunstância. Afinal foram as três famílias que concordaram
em paz e a ofereceram a Yuric. Logo após os russos negarem a proposta, as
mesmas três famílias foram atacadas subitamente. Ao atacar todo mundo, Yuric
automaticamente aliou todos contra ele.

Ela ficou em silêncio um instante e bebeu todo o conteúdo do copo de uma única
vez.

— Yuric provavelmente já concebeu uma aliança entre nós três. Por isso atacou
preventivamente e esse deve ser exatamente o mesmo motivo de estar importando
poder bélico da Rússia. — Ela se recostou no assento — Quanto a esse negócio de
cargueiro, eu sugiro não fazer nada. Se for mesmo um bando de fanáticos nazistas,
o governo vai dar cabo deles. Só é bom se certificar de que essa informação caia
nos ouvidos certos dentro da Paramilitech ou do Governo... Não sabemos quem
está na folha de pagamento dos Bratva. — Ela deu de ombros — Eu não sei o que
fazer sobre essa tal Green Box. Parece algo que foge da nossa alçada. Só sei que
Caz foi sequestrado pelos Bratva num ataque contra Tony assim como o rapaz dos
latinos. E até hoje não foi encontrado. Mas, falando no diabo... — Um silêncio se
seguiu onde era possível ouvir o som das unhas longas dela tamborilando nos
apoios da cadeira. — Após o ataque ao Olimpo alguns corpos de "latinos" foram
encontrados dentre os mortos. Como um aliado, se importaria de me acompanhar
numa visita a nosso querido Pascal? — Sua voz se tornou fria e inflexível — Afinal de
contas eu preciso passar essa situação... à limpo.
--------------
— Nunca é cuidado demais reforçar os laços, ainda mais quando estamos em um
tempo em que tudo muda da noite para o dia, a cidade está de pernas para o ar não
é mesmo? Eu só quis me certificar, não me entenda mal, por favor. — Pegando o
copo, o oriental despejou sobre sua garganta a bebida para não deixar a garganta
seca. E assim que terminou voltou a falar. — Ele sabe, aquele porco russo sabe e não
é louco de nos subestimar. Porém algo me diz que não é só uma prevenção contra
nós. Yuric não dá ponto sem nó, deve haver algo maior por trás disso tudo... —
Xiaren colocou a mão no queixo, refletindo.

— Mas se você diz que é melhor não mexer nesse vespeiro... Estou de acordo. Ainda
mais se Vladimir ainda estiver trabalhando com vocês, com certeza os ouvidos
daquela velha raposa são os certos para lidar com esse problema — O oriental
terminava sua dose.

— Ninguém sabe muito sobre a Green Box, exceto os russos, mas se for mesmo
alguma coisa para se criar armas... Estamos em maus lençóis e será um pesadelo
atômico... Não basta essa velha louca da Telford anunciando testes no
deserto...Tsc. — Lamentou. — Talvez esse tipo de assunto não seja da nossa alçada
e fosse melhor que nosso amigo octogenário soubesse dessa história também. —
Cruzou as pernas, pensando sobre o que Galathea dizia de Caz e o outro que os
latinos haviam perdido, no entanto guardou somente para si a opinião.

— Oh! Mas é claro que não me importo, será um enorme prazer, eu já pensava
mesmo em fazer uma visita a ele! — Xiaren sorriu.
--------------
— Me passe os dados e irei me certificar de que o velho fique ciente do que anda
acontecendo. — Galathea suspirou lenta e pesadamente — Eu devo admitir que não
ligo muito pra essa tal de Green Box. Sugiro uma aproximação mais direta a esses
problemas; Se todas as peças no tabuleiro apontam para os Bratva. It’s simple, we
kill the Bratva!
A morena gesticulou para William que abriu o escritório para que Xiaren pudesse se
retirar.

— Enquanto meus homens preparam a escolta, eu vou lidar com algumas tarefas, se
não se importa.

Após Xiaren se retirar William chamou Castellone.

Enquanto se dirigia para a sala, ouviu um conselho sussurrado ao passar por


William: "Respire". E assim o fez, controlando sua ansiedade a cada expiração.
Embora não pudesse evitar sentir que tudo revirava seu estômago até a garganta
quando ouviu a porta se fechar atrás de si. William voltou para trás da mulher, que o
observava em silêncio. Ela havia mudado o escritório de Tony, era familiar, mas
estranhamente diferente, com cores menos chamativas e sem janelas, apenas
monitores. Enquanto se perdia nesses detalhes, notou que o silêncio havia se
prolongado demais enquanto estava ali de pé, sem saber se deveria falar, se deveria
se sentar, ou se desculpar...

— Eu estava pronta para descarregar uma tempestade em você. — O silêncio foi


quebrado pela voz calma. Seus lábios cobertos pelas mãos com dedos entrelaçados
em frente ao rosto. — Entretanto William me lembrou de que nem tudo isso é do seu
feitio. Afinal, parte vem da ordem de Vladimir de recrutar tudo quanto é merda. — A
morena sorriu e balbuciou consigo mesma. — Uma medida desesperada para
estancar uma ferida que sangrava profusamente.

Jesse abriu os lábios para falar, mas fora imediatamente interrompido.

— Não é assim que a Cosa Nostra deve ser, Jesse. — Sua voz agora tinha até um
certo pesar, como uma professora desapontada. — Nós deveríamos operar em
concordância com a população, oferecer-lhes serviços que o governo não consegue
e assim nos tornarmos intocáveis por conta do amor do povo, como sempre fizeram
os sicilianos.

— D-desculpa…

— Mas — Continuou ela ignorando o pedido de desculpas. — A cidade eterna está


morta, assim como velhos costumes. Embora eu deseje trazê-los de volta. Nós
somos italianos e devemos agir de acordo. Lembre-se disso. Chantagem, decepção,
política e ocasionalmente… metralhar a concorrência. Preferencialmente
manipulamos outras pessoas para fazer nosso trabalho sujo. Mas nós, de forma
alguma, nos tornamos inimigos públicos número 1, pintamos um alvo enorme no
nosso rabo e importamos para Carmen e a Paramilitech nos foder até estarmos
mortos. Você entende o que eu quero dizer!?

— Mais ou menos…

— Ótimo! Porque você vai consertar essa cagada. Chame o Meia Noite, William. —
Galathea pegou um charuto e cortou as extremidades antes de acender. Tony tinha
um bom gosto para drogas, um que não carregava para estética. Tragou
pesadamente antes de continuar. — Eu não sei porque a Telford não jogou os cães
dela sobre nós ainda, mas ainda bem que ela não o fez. Deve estar de mãos cheias
com essa porra da Rússia e política internacional e etc… Mas você. — Ela apontou a
ponta incandescente do charuto para Castellone — E você — Ela apontou para Meia
Noite que acabara de entrar. — Vão consertar isso. Você vai entrar em contato com
esses lunáticos Jesse, deve ter um mínimo de controle sobre eles imagino, e vai
enviá-los contra Yuric. Toda essa ralé dispensável. Eu quero que os Bratva sejam
atacados em todo e qualquer lugar onde estejam. Eu não quero esses filhos da puta
nem cagando em paz mais. Agora, sabemos que os homens de Yuric são tão
experientes quanto nossos rapazes e eles irão dar cabo dessa turba de vagabundos
e viciados sem problemas… em sua maior parte. E essa parte é a que importa,
mesmo que os russos matem a maioria deles sem problemas, alguns daqueles
Bravta filhos da puta irão morrer no processo. Sem falar que a população está em
frenesi por causa da política internacional. Eu não quero que Yuric só se sinta
hostilizado por protestos e descontentamento, eu quero que ele tema todo e
qualquer cidadão tenha a intenção de matá-lo. Mas, o mais importante, eu quero que
os russos parem de mover seus homens de um lado para o outro livremente. Meia
Noite, você e seus rapazes devem servir de batedores para essa operação. Descubra
onde os homens de Yuric estão. Eles tem casa, provavelmente. Eles comem fora e
se divertem uma vez ou outra e portanto nem sempre estão sob as asas de Yuric.
Encontre-os e envie as coordenadas para Jesse, ele irá cuidar do resto. Sobre essa
turba de malucos armados; Os que sobreviverem a isso devem valer alguma coisa e
irão ser incorporados de fato à Cosa Nostra. Os que morrerem… irão aliviar nossa
carga financeira. Agora saiam. Mãos à obra!
--------------
Por fim, após aguardar que os dois saíssem da sala, William chamou Gal e o outro
jovem. Gal parecia muito mais à vontade no local do que o outro, era de se esperar,
afinal, ela já esteve ali, nua até. A morena ergueu o cenho ao olhar o rapaz de cima a
baixo. Em seguida, ela se levantou, finalmente alongando os músculos
preguiçosamente, passando para o outro lado da mesa e encostando-se nas costas
dela enquanto dirigia a palavra ao rapaz.

— Você não me parece alguém…… apropriado para esse tipo de vida.


— Ele realmente parece bem jovem. — Comentou William. — Mas não muito mais
jovem que Vicky.

— Verdade. Nesse caso, me mostre do que é capaz. Imagino que saiba usar um
computador, mas parece mais um engenheiro. — A mulher olhou para Gal. — Você…
eu ainda não entendo como veio parar na nossa folha de pagamento. — A mulher
sorriu com o canto dos lábios. — Mas já que é o caso, pegue suas roupas de Gala.
Você vai para o Cassino Overdose. Jogue, flerte, converse e tire o máximo de
informações possíveis. Esse jovem aqui irá lhe dar suporte e William irá levar e
trazer vocês, assim como fornecer poder de fogo caso precise ser extraída de lá.

Tragou o charuto e abriu as portas.


— Câmeras, comunicadores, armas, explosivos… ou seja lá o que ela precise, será
seu trabalho fornecer jovem. — Ela assoprou a fumaça na direção do rapaz. — E
você, meu bem… — Piscou para a loira — Encontre aquelas áreas restritas, aqueles
locais vulneráveis e, se a oportunidade surgir, destrua o cassino inteiro.

Galathea deixou a sala adentrando o elevador seguida por alguns dos homens da
Uroboros.

#Shae, prepare a centúria, eu estou indo até Vênus.#


#Se precisa de desse poder de fogo todo era melhor nem ir, Thea#
#É só uma precaução. Mantenha-os longe e à paisana o suficiente para não serem
detectados.#

O elevador parou no estacionamento subterrâneo do olimpo onde a mulher foi


guiada para seu veículo. Xiaren a esperava ali. A manipula iria com ela, como
escolta.

— Perdão fazê-lo esperar ainda mais. Vamos?

A mulher acenou com a cabeça para Xiaren antes de adentrar no veículo luxuoso
que pertenceu a Tony Montana.

Gal Bordeaux
Depois dos momentos tensos da invasão, Gal fingiu-se de morta. Não havia
necessidade de se voluntariar para enfrentar perigos como aquele da invasão do
prédio, que agora era sua morada, pelo menos temporariamente. Não precisaria
mais pagar aluguel ou contas; que os bens do finado Tony - que esteja em paz -
servissem para algo agora. Por isso, ela perambulava pela construção, pelo menos
nas partes intactas e seguras, usufruindo dela. Pôde perceber que muitos novos
"funcionários" surgiam na máfia. Alguns deles até ajudaram nos reparos do imóvel.
No entanto, após alguns dias de relativa paz - somente dentro do prédio, pois na
cidade o caos estava instaurado - ela foi chamada para a sala. A sala. Aquela que
pertencia a Montana e agora estava nas mãos de uma mulher que tinha o mesmo
nome que ela.

Vagarosamente, dirigiu-se até lá. Nesse momento, vestia roupas caras, as melhores
que o salário de ascendência italiana poderia comprar, da linha Hedare. Chegou a
usar um dos cosméticos da linha, mas como se sentiu mal, não prosseguiu com o
uso. Ali, diante da morena, sentia sua imponência, que a tornava desejável. Agora,
percebia como os outros funcionários se sentiam. Ouviu suas recomendações e
assentiu positivamente, retribuindo o sorriso de canto. Uma tarefa furtiva como
aquela parecia combinar muito mais com ela do que um embate como antes.
Embora, em seu ego inflado interno, considerasse que se saíra muito bem.

— Roupa de gala? Cassino? Parece que temos algo divertido aqui. Anotou tudo o que
a chefinha disse, Júnior? — Falou com o ruivo com roupa de cientista. Já tinha
estereotipado o garoto como uma espécie de nerd só pela aparência, ao vê-lo. Com
as diretrizes da Scipio, comprova a teoria. O garoto pareceu esbravejar por alguns
instantes, o que foi sumariamente ignorado pela loira. — Ótimo. Preciso que
desenvolva lingeries que possam ficar invisíveis quando eu ativar minhas
habilidades, assim como meu uniforme. Pedirei para que te entreguem minha
jaqueta e você reproduza o tecido dele.

Imperativa, logo deixou o lugar, rumando de volta para o quarto. Um dos capangas a
seguiu, a seu pedido, e o entregaria a vestimenta conforme anteriormente
informado, para que ele a levasse ao menino ruivo supostamente tão inteligente. Se
ele fosse verdadeiramente inteligente, não teria problemas em criar o que foi
solicitado. Para ela, de acordo com o que planejava, bastaria isso para realizar a
missão com êxito.

Dexter
— Junior?! É com esse tipo de gente que vou ter que trabalhar? — Ironizei. Os outros
capangas me olharam de cima a baixo. Engoli seco. Devia, com certeza, escolher
melhor as palavras para proferir nesse lugar em que eu estava. Instruído, assenti
positivamente. Até ouvir aquele pedido. O que ela queria? Fazer alguma espécie de
strip-tease? Não seria melhor simplesmente tirar a peça? De qualquer modo,
qualquer desafio para construir algo era melhor do que ficar parado. Por isso,
assenti mais uma vez e saí depois dela, dirigindo-me ao laboratório improvisado.
Digo isso porque ele não tinha o mesmo aparato que os equipamentos contidos no
meu particular. Enfim, era hora de me virar. Certamente, meus pais já estariam
pensando que eu voltaria na primeira oportunidade... Não daria esse gostinho a eles.

Pouco tempo depois que cheguei, o capanga chegou com a jaqueta rosa chamativa.
— Pra que ela me pediu isso? — Meia Noite me informou que ela conseguia ficar
invisível e "atravessar paredes". Não seria impossível, afinal. Talvez algum dia eu
construísse aprimorados como ela. O dispensei e iniciei seu pedido. Após alguns
minutos analisando a peça de roupa fornecida, consegui identificar os materiais
utilizados e, em instantes, graças ao meu intelecto, consegui reproduzi-la.
Aproveitando ainda aquele momento de efervescência criativa, produzi
equipamentos para mim e para ela, nessa missão que remetia aos filmes de espiões
antigos.

Não posso negar que esse clima era até instigante. Com os equipamentos prontos,
alocados em locais discretos do meu corpo, vesti um terno simples, semelhante ao
que meu pai usava. Bati na porta dos aposentos da loira e pude constatar a maneira
como estava vestida. Trajava um vestido longo vermelho, que mostrava as curvas do
seu corpo, cabelo preso e maquiagem que ressaltava seu rosto. Perdi-me por alguns
instantes com a visão. — Criou o que pedi? — Ela perguntou. Só consegui fazer
acenar. Ela riu e então seguimos para a garagem do edifício.

De início ela me indagou sobre ir ao Cassino Overdose. — Mas é lógico que vou! —
Enfatizei. Caminhamos por mais alguns instantes e nos deparamos com um
hovercar. Ela e Meia-Noite contestaram minhas habilidades automobilísticas, mas
simplesmente os ignorei. Em questão de segundos, saímos da sede da Cosa Nostra
e nos dirigimos para o Cassino citado. Apesar da confusão instaurada naqueles
dias, graças à segurança do russo, os arredores do nosso objetivo estavam seguros.
Segurança é uma palavra usada de modo relativo aqui. — Bem, vamos repassar o
plano…

Gal Bordeaux
— Plano, queridinho? — A loira conteve o riso. — Fica no carro que eu sujo as mãos,
tá bem? — O garoto ainda tentou argumentar, mas ignorado, aceitou. Aprimorada saí
do veículo e, em passos calmos, dirigiu-se à entrada do Cassino Overdose. Antes de
chegar até a entrada, ouviu uma voz em seu ouvido. Era ele. Dexter, o pentelho ruivo.
Literalmente. Revirei os olhos. Havia implantado um comunicador em seu cordão e
brincos. Perguntou como ela adentraria o lugar sem a apresentação de um convite
holográfico adequado. — Eu pretendia usar algo que chamam de charme, não sei se
você conhece.
Ainda que fosse soberba e desdenhasse dele, não duvidava, intimamente, de suas
capacidades. Àquela altura, já trajava o equipamento fornecido por ele, que seria
usado em momento oportuno. Abri a pequena bolsa e constatei que havia ali um
indutor holográfico. Segundo Dexter, através do comunicador, o equipamento seria
capaz de reproduzir o convite. E de fato, o foi. Tão logo apresentado, a tela do
mesmo reproduziu a imagem previamente cadastrada por ele. Talvez o guri não
fosse imprestável, afinal. O que importava é que adentrar dessa maneira pouparia
esforços que poderiam ser melhor empregados em outras situações.

O interior do Cassino era tão luxuoso quanto o seu exterior. Repleto de luzes neon,
como não poderia deixar de ser, abrigava uma multiplicidade incrível de pessoas.
Desde a nata de Miraitropolis, como também russos (dada a aparência destes, que
os distinguiam, de certo modo). Havia muitos capangas destes, também, com os
mais diversos tipos de implantes e próteses robóticas. Fui encarada por alguns, mas
desviava o olhar ou sorria falsamente. A princípio, minha missão seria descobrir o
que pudesse. E, se fosse possível, destruir tudo. Seriam muitas vidas perdidas...
Vidas inocentes. Quer dizer, não há inocentes em Miraitropolis. Ainda assim, não
eram culpadas necessariamente por estar ali e não deveriam morrer por isso. Eu não
era genocida.

Percorri o local observando as pessoas se entretendo nas máquinas e mesas de


jogos de azar, que ainda guardavam certa similaridade com aquelas do longínquo
passado. Recostei-me em uma delas. Depois de analisá-las, aquele homem de meia
idade de sobretudo parecia ser algum figurão. Seria a pessoa certa para arrancar
informações. Puxei assunto, fingi rir das coisas que ele falava, endossei suas
apostas infrutíferas e em poucos instantes estávamos percorrendo pelo salão
iluminado.

— Sócio majoritário? Uau. — Continuava fingindo interesse. Àquela altura já tinha


descoberto que o nome dele era Mikhail Petrov, e que os russos haviam instalado
uma base no Deserto Radioativo. Que, aparentemente, houve um combate entre eles
e homens da ParaMiltech de Telford lá, e que os russos teriam se sobressaído,
conseguindo a posse de uma grande quantidade de radiack. Mas esta era a sua
versão. Poderia muito bem ser apenas inverdades para se vangloriar indiretamente
para a bela mulher.

— Opa, vamos com calma... — Recusava as investidas mais íntimas do homem. Mas
isso o enfureceu. Depois de xingá-la, levou a mão à cintura para pegar a arma
parcialmente à mostra e certamente disparar contra ela. Ou, no mínimo, coagi-la a
fazer o que ele queria. A cultura de impor as vontades masculinas às mulheres
parecia ainda mais ressaltada naqueles tempos sombrios. Provavelmente oriunda
da falta de imposição de limites mais rígidos no passado. De toda forma, ele
escolheu a mulher errada para resolver se impor. Com as habilidades características
dela, ficou intangível e antes que ele disparasse, atravessou a mão em seu tórax.
Carregou artérias para o outro lado, quando atravessou as costas, controlando a
mão para que somente essa se solidificasse, jogando aquelas partes vitais no chão.

— Mais sorte na próxima. — Proferiu antes de ficar completamente intangível e ter o


corpo atravessado pelo do homenzarrão, sem vida, jogando no chão do elevador.
Depois voltou à forma tangível novamente. Seu plano inicial era não ter que tomar
esse tipo de atitude, tanto que podia se observar pelo pedido que fez ao engenheiro.
Queria descobrir, entrar, e sair do lugar. Mas com a vida ameaçada, não restou
alternativa. O elevador finalmente chegou ao andar indicado. Segundo as conversas
até então, o finado informou que ali se encontrava o centro de operações do
cassino. Saiu com cuidado do transporte que logo após fechou suas portas,
seguindo andar abaixo. Logo encontrariam o corpo do sócio assassinado e não
seria nada bom. — Ei, Dexter. — Falava pelo comunicador. — Venha ao 13º andar...
Talvez consiga descobrir mais coisas do que eu.

Não tinha problemas em admitir isso. Afinal, fui enviado para esse propósito, não
era? Havia à minha frente uma grande e única porta metálica, ao lado do corredor
também metálico. Tentei atravessá-la, como de costume, mas foi impossível. Isso
me fez lembrar da primeira missão desde que ingressei nessa guerra de máfias. Eu
ainda não sabia, mas a porta também era revestida de radiack, o que garantia sua
proteção. Era a única porta ali, pelo menos aparentemente. A outra saída era voltar
para o elevador, já que todo o corredor era feito do mesmo material que a porta. E
retornar ao elevador não parecia uma boa saída. — Preciso de você aqui, Dexter! Não
consigo atravessar uma porta... — A sensação de impotência anteriormente
acometida a ela, quando foi ferida pela filha vadia de Yuric retornava. Encostava-se à
porta, abaixando-se.

Dexter
Todas as informações que recebia pelo comunicador de Gal, eu transmitia para o
laboratório na Cosa Nostra. Elas seriam automaticamente gravadas e possivelmente
acessadas por eles caso algo acontecesse conosco... Como quase aconteceu com
ela. Escutei a ação que se sucedeu no elevador e, infelizmente, me preocupei com
sua integridade. Já tinha sido notificado por Meia Noite que nesse ramo é cada um
por si, mas eu não era tão egoísta assim, afinal. Logo depois, escutei seu pedido de
socorro. — Tenho que ir lá! — O capanga que nos acompanhava aconselhou não
fazer. Que ele iria. Mas supus que seria difícil permitirem sua entrada. Saí do
hovercar em direção à construção.
No caminho me convenci de que teria a mesma chance que ele de entrar no lugar.
Nenhuma. Simplesmente não me deixariam entrar. E eu não tinha um passaporte
como o que dei para ela. E mesmo se eu usasse, não tenho cara de gente que
frequenta esses ambientes. Logo veriam que algo estava errado e eu, na melhor das
hipóteses, seria chutado para fora. Ajeitei o terno, puxando um pouco para cima para
esconder o rosto, e rodeei o quarteirão, indo até o lado mais afastado, mas que
ainda me permitia ter contato com a construção. Em um beco escuro, analisei a
parede à minha frente. Olhei para os lados, verificando se havia algum perigo.
Aparentemente, não. Abri o paletó e constatei que alguns apetrechos estavam
presos a ele.

Mais uma vez, verifiquei os arredores, trêmulo. Levei a mão até o meu par de óculos
e o coloquei. Ativando uma função especial dele, consegui enxergar do outro lado.
Tratava-se de um banheiro, aparentemente vazio. Em seguida, busquei outro
equipamento e encontrei algo que se assemelhava a uma caneta. Mas era apenas
na forma. Em questão de minutos, o ativei e logo começou a emitir um laser. Com
cuidado, fiz uma abertura na parede e, como a parte selecionada não encontrava
mais apoio, consegui empurrá-la e adentrar o lugar.

Caminhei pelo salão neon, fingindo que nada estava errado. Evitava encarar as
pessoas ao meu redor para não levantar suspeitas. A medida que me afastava da
área das jogatinas e apostas, acabei chegando ao que parecia ser o bar. O local
estava repleto de pessoas bebendo e usando pó neon. Algumas estavam
debruçadas sobre as mesas, desacordadas ou talvez até mortas por overdose. Um
calafrio percorreu minha espinha, mas continuei seguindo em frente.

Em certo momento, acabei trombando com uma mesa onde estavam três figuras
esdrúxulas. Um homem de pé, segurando uma espécie de facão; outro sentado, com
braços robóticos; e uma mulher com implantes nos olhos. Engoli em seco, tentando
desviar o olhar, mas era impossível. Meus olhos foram atraídos para aquelas figuras
peculiares. Confesso que fiquei paralisado de medo naquele instante. Eles logo
perceberam minha reação e começaram a me encarar. Quando o homem sentado se
levantou, não pensei duas vezes e me virei rapidamente, tomando um rumo
diferente.

Eu continuei a caminhar, tentando disfarçar minha agitação. No entanto, meus


esforços foram em vão. Assim que me virei, percebi que os três indivíduos estranhos
estavam se aproximando rapidamente. Entrei em pânico e comecei a correr para
escapar deles. Mas logo percebi que minha falta de habilidade física tornava a fuga
ainda mais difícil. Eles estavam se aproximando cada vez mais, e eu sabia que
precisava tomar uma atitude.
Naquele momento, estávamos em uma área afastada da construção, que parecia
ser algum tipo de depósito. Sem música ou outras pessoas ao redor, eu conseguia
ouvir um som distante. Um deles saltou em minha direção, e num reflexo rápido, me
virei e acabei caindo de costas. O homem com braços metálicos estava prestes a
cair sobre mim quando tive uma ideia. Lembrei-me da caneta-laser que eu havia
encontrado anteriormente. Sem hesitar, a ativei e um raio de luz atravessou o corpo
do homem, parecendo tê-lo eliminado. Empurrei o corpo para o lado e continuei
minha tentativa desesperada de fuga. Ainda agachado, engatinhei em direção ao
elevador, minha única esperança de escapar.

No entanto, sabia que seria inútil. Os outros dois perseguidores estavam se


aproximando rapidamente. Eu já podia imaginar meu destino trágico quando, de
repente, vi Meia Noite. Ele se preparou, flexionando as pernas e lançando sua
bengala de madeira. Meus olhos seguiram a trajetória da arma, que perfurou a
garganta da mulher com implantes oculares, que estava mais próxima de mim. Um
alívio momentâneo tomou conta de mim, sabendo que eu ainda tinha uma chance
de sobreviver. Quase gritei o nome de Meia Noite em gratidão, mas meu alívio foi
interrompido quando o homem com o facão lançou sua arma contra meu aliado.
Fechei os olhos por um breve momento, temendo o pior. Quando os abri novamente,
vi Meia Noite caído no chão, cercado por uma poça de sangue. Não sabia se ele
estava morto ou apenas ferido. Sem tempo para ajudá-lo, levantei-me rapidamente e
corri em direção ao elevador, que, por sorte, estava aberto. Não havia nada que eu
pudesse fazer por Meia Noite naquele momento, pois eu ainda precisava de uma
salvação completa.

Eu apertava freneticamente os botões holográficos, desesperado para que a porta


do transporte se fechasse. O capanga com o facão estava mais lento, o que me deu
um pouco de tempo para ver a porta do elevador se fechando e me deixando em
segurança. Pelo menos por enquanto. Respirei aliviado, mas meus sentimentos de
alívio foram rapidamente substituídos pela visão do corpo do homem assassinado
por Gal. O enjoo tomou conta de mim e acabei vomitando sobre o cadáver,
horrorizado ao ver suas vísceras expostas.

Cheguei ao andar indicado, ainda recuperando o fôlego e com o rosto sujo. Limpei-o
com o antebraço, sem me importar com a sujeira. Minha atenção se voltou para a
loira que estava claramente abalada. Mesmo que não pudesse ajudá-la
completamente naquele momento, assenti para mostrar que estava ali por ela.

Conectei um dispositivo que parecia um smartphone antigo na entrada da porta da


sala de controle. Rapidamente, consegui abri-la. Ao entrar, deparei-me com um
homem sentado em uma plataforma elevada, cercado por várias telas. No chão, um
líquido esverdeado formava uma espécie de fonte, rodeando a escada que levava
até o homem. Era evidente que eu precisava acessar os controles, mas antes disso,
precisava imobilizar o homem.

A mulher invisível ao meu lado parecia ainda mais afetada pela presença do líquido
esverdeado, dificultando seu movimento. O homem se virou para nós, claramente
assustado. Foi quando a porta da sala atrás de nós se fechou, deixando-me sozinho
com ele. Seria uma batalha entre nós dois.

X9
Verdade seja dita, eu mesma não sabia o que estava fazendo, não tinha material
necessário e decente pra construir uma I.A. não em um ferro velho. - ou oficina,
embora parecesse mais o outro - quer dizer, algumas coisas até pude aproveitar
encontrando ali... Sentada numa mesa de ferro bem pequena e num ambiente bem
menor do que costumo trabalhar, mexia em uma placa mãe velha e alguns chips.
Quando fiz a Praxis eu tinha uma equipe de outros hackers, com tecnologia de ponta
e conhecimento absurdos, eram os melhores de Mirai. Mas para criar essa
inteligência artificial que vai apenas esconder a verdadeira face de Pollux, não
precisava de muito. E era até bom mesmo que os componentes não fossem de
ponta. Gosto de trabalhar com coisas que ninguém mais usa, consideradas fora de
linha, apenas dou um upgrade nelas e dá pra usar de boa, com a vantagem é que
ninguém vai tentar hackear algo retrô. Por esse motivo usei alguns disquetes nesse
sistema da inteligência artificial. Claro que nunca é fácil, o custo de utilizar uma
tecnologia ultrapassada é alta, entre eles, fazer o serviço dobrado, como por
exemplo precisar mais de dez disquetes para gerar a centelha de vida nessa I.A.
Infelizmente aquilo era o máximo que ia conseguir, querendo ou não eu precisava de
ajuda. Na lateral da mesa em cima de uma estante tinha uma velha televisão, liguei
o aparelho para me distrair enquanto finalizava o meu trabalho inicial.

No começo eu não dei muita atenção, o som da tv era só pra não ficar aquele
silêncio chato no trailer, até que ouvi a voz de um cara, ele falava rápido, não gostava
de esperar, tanto que prosseguia sem aguardar. Aquele jeito de falar me lembrou
muito uma pessoa, alguém que encontrei apenas uma vez, e mesmo assim nem foi
pessoalmente, todavia o encontro foi marcante, de maneira negativa, é claro. Antes
que seja mal interpretada, não se tratava de um ex namorado, era muito pior.
Incrédula arregalei os olhos e quase caí para trás, Henry Choi, o cara que no passado
colocou um vírus na Praxis, matou um dos hackers da minha equipe estava
inaugurando uma empresa aqui no centro da cidade e com apoio de Carmen Telford!
Será que ela sabe o tipo de pessoa que esse sujeito representa? Será que ela sabe
que ele tentou estragar os planos dela uma vez? Aposto que não, ou ela não
acolheria essa cobra. Levei as mãos à testa quando a própria disse que a união da
prefeitura com a ChoiTech deixaria a União das Américas mais segura contra os
russos. Peraí, tem alguma coisa acontecendo que eu não sei? Fui procurar na Lexis
algo a respeito, esperando encontrar alguma coisa sobre o conflito das máfias e
para meu desespero as notícias eram ainda piores... É, testes nucleares nunca são
boas notícias... Elas esquentam uma guerra fria... O pior de tudo é saber que nesse
caso você não pode fazer nada a respeito, mas deixar a segurança da cidade nas
mãos de um terrorista virtual era a maior piada que podia ouvir, é uma piada de
extremo mau gosto. Era pior do que deixar apenas nas mãos da ParaMilitech, sim,
eu me sentia ainda mais segura com P.M. pra ver como as coisas estavam
desesperadoras...

Eu precisava voltar ao trabalho, apesar de ficar com muito medo da combinação


entre Telford mais Choi mais uma guerra contra os russos. Não dava pra negar
minha tensão, tanto que quando ouvi a Dama de Prata anunciando que mais tarde
falaria sobre as novas medidas para Miraitropolis eu joguei a pequena televisão de
tubo pela janela. Não dava pra suportar, respirei fundo e acendi um cigarro, dando
uma longa e boa tragada. Merda, era meu último, ia precisar de mais para me
acalmar. Tentei voltar a me concentrar no serviço complicado que me dispus a fazer
e até a limitação de material me irritava. Foi quando vi pela janela quebrada um
homem alto de meia idade rondando o trailer. No início pensei se tratar do dono do
local, desconsiderei a hipótese sabe-se lá por que motivo e peguei novamente a
barra de ferro e coloquei sobre a manga do casaco, nessa hora eu lamentava por
não ter ficado com uma daquelas pistolas que deixei com Pollux e Max... O homem
abriu a porta, não tinha onde se esconder naquele pequeno ambiente, e mesmo que
tivesse ele já tinha percebido minha presença, além de ser uma medida inútil não ia
bancar a covarde. Permiti que ele entrasse e o recebi em pé, mesmo considerando
aquilo uma extrema burrice.

— Foi você que enviou a mensagem a Galathea? — Ele indagou entrando devagar,
estava de terno azul marinho e gravata amarela com listras escuras, bem arrumado
e elegante, um coroa charmoso.

— Não… — Respondi franzindo o cenho.

— Estranho... O sinal vinha daqui… — Coçou a barba grisalha. — É a proprietária do


lugar? — Perguntou novamente.

— S-sim... — E de novo respondi seca, mentindo.

— Entendo... Ah, me chamo Vladimir Stanislavsk, e você? — Ele estendeu o braço, se


apresentando.

— Me chamo... Érica... Érica Singer. — Apertei sua mão.


— Certo, acho que foi um engano, às vezes esses aparelhos de sinais acabam por
ser imprecisos, sempre existe uma margem de erro. Me perdoe pelo incómodo. A
propósito, acho que tem uma televisão de quatorze polegadas no terreno, talvez seja
sua, vendo que o vidro da janela está quebrado. Não quero incomodá-la, tenha um
bom dia, senhorita Singer. — Ele deu as costas e ia se retirando, mas a maldita
curiosidade...

— Espere! Você é da máfia? Ouvi dizer que Galathea é a nova chefe dos italianos...
Mas o senhor tem sotaque russo... E pelo que sei, água e óleo não se misturam. — O
homem parou de costas e se virou, aquilo poderia custar minha vida.

— Sim, sou russo, mas odeio o regime nazisoviético, vim para Miraitropolis fugindo
dele. Quando encontrei uma oportunidade de crescer percebi que aqui era meu
lugar. — Ele se virou, achei que estaria apontando uma arma, no melhor estilo James
Bond, mas não.

— Entendi... Essa forma de crescer foi dada pela máfia italiana... Suponho, já que
mencionou Galathea… — Busquei outro cigarro, mas tinha esquecido que eles
haviam terminado.

— Muitas perguntas senhorita Singer, ainda mais para uma simples dona de oficina...
Mas não, a oportunidade não foi dada por Galathea ou Anthony Montana, embora
durante muito tempo eu tenha ajudado ele. — Meu queixo caiu, e ele percebeu. O
safado jogou verde e cai como um patinho. Não dava mais pra esconder o jogo, era
melhor abrir o jogo. Quer dizer, não todo

— Ok, foi daqui sim que o sinal da mensagem foi enviado. Não sou dona do lugar
nem nada do tipo. Na realidade sou hacker. — Ocultei a participação de Pollux para
preveni-lo.

— Hmmm... — Percebendo que eu estava sendo mais sincera, e que queria fumar, o
velho me deu um dos seus cigarros.

— Agora estamos jogando limpo, senhorita Singer. — Ele acendeu o cigarro com seu
isqueiro.

— Me chame apenas de Érica. — Traguei.

— Certo, Érica. Já que estamos falando mais francamente, sim, estou no momento
trabalhando com os italianos, e não para eles, embora meu contrato seja com
Anthony Montana, até expirar, meus negócios são com Galathea. O motivo de vir
aqui é que você mostrou inclinação em ajudar a Cosa Nostra com uma importante
informação embora Galathea não tenha dado muita importância. Portanto, quero
saber se tem interesse em se aliar a mesma? — Que ironia, eu já era aliada, hehehe!

— É claro! Ou não teria enviado o sinal, não é mesmo? — Mais relaxa, pisquei.

Expliquei a Vladimir qual eram os planos e como estava desenvolvendo a I.A. ele
quis ajudar, ficou encarregado de arranjar mais tecnologia para o projeto. O que foi
bom, afinal com restos de sucata é que não ia conseguir fazer aquele bagulhoso
funcionar. Ele ligou para seus contatos e solicitou o que precisava. Aquilo me
despertou mais curiosidade... Ele não se comportava como mafioso, e julgar como
descobriu meu lance diria que é um ex militar... De alguma forma ele lembra muito
os soldados de Tony, aqueles os quais Pollux e eu atuamos lado a lado na Orion.
Vladimir também lembra um pouco Nick Slay, de alguma forma bizarra que eu não
sei explicar.

—O material que precisa, incluindo o pequeno dirigível, vai estar no Meia Noite. — Ele
sorriu cordialmente.

— Obrigada, mas... O que é Meia Noite?

— Um clube noturno, é usado para lavagem de dinheiro dos jamaicanos.

— Como todos de Miraitropolis... — Falei.

— Exato. Agora preciso voltar ao meu posto. Você vem junto?

— Sim, vou seguindo o seu carro com a minha moto.

— Perfeito. Mas antes... — Ele retirou da cintura duas pistolas, meu sangue gelou...

— As ruas andam bem perigosas ultimamente, espero que saiba usar. — Colocou-as
em cima da mesa.

— Ah... Sei sim, obrigada novamente. — Suspirei aliviada, guardando as armas e o


acompanhei até a porta.

Subi na moto, coloquei o capacete e acelerei. Vladimir não estava de brincadeira, o


bicho tava pegando mesmo. Enquanto dirigia seguindo seu automóvel ouvi no
mínimo uns seis tiros em duas esquinas que cruzei. Vi gente brigando e até uns
mendigos assaltando um casal. Do outro lado da rua um homem com rabo de
cavalo cortava com um par de navalhas a garganta de outro a sangue frio. Foi
chocante, espirrou muito sangue, por sorte não precisei usar as armas que ele.
Estacionamos a frente de um grande sobrado, a placa em Neon amarelo fosco
escrito "Meia Noite" ficava piscando a todo instante ao lado de garotas de biquíni em
aquários, até mesmo quando fechado. Ele fica bem no centro de Miraitroide e toca
música alta, do outro quarteirão da pra ouvi-la. Vladimir falou que depois que o dono
foi ao encontro de Galathea, ele fechou por algumas horas, mas seus sócios
estavam reabrindo naquele exato momento, um local que dá rios de dinheiro não
fica muito tempo com as portas trancadas e já tinha uma fila na calçada à espera da
abertura. Nossa passagem foi feita pela entrada dos funcionários, nada de anormal.
No segundo andar, na sala do Meia Noite, o material que ia ser usado estava
distribuído em três caixotes. Como o processo da I.A. já estava praticamente
encaminhado, imediatamente comecei a finalização dela. O balcão para trabalhar
era grande e até então tudo corria bem, foi foda quando o bar abriu... Aquele som
alto... A batida eletrônica dos anos oitenta passou a chacoalhar meus miolos. Quem
sabe em dias normais eu até curtiria, no entanto naquela hora tava sendo impossível
de trabalhar assim, mas me esforcei ao máximo pra encerrar aquele martírio.

— Pollux, terminei a I.A. estou esperando o dirigível chegar, nem te conto, estou no
Bar Meia Noite em Miraitroide, com um aliado da Galathea, ele forneceu os
materiais. Bom, depois a gente conversa, te ligo depois. — Fechei o link com a
pulseira comunicadora. Vladimir voltava e me convocava para acompanhá-lo até o
estacionamento, um furgão branco ficava estacionado perto da entrada de entregas,
antes de abrir as portas ele me avisava para não criar grandes expectativas. É a
vida...

— Não é grande coisa, mas dá pra usar, consigo colocar esse pequeno dirigível no ar
em vinte minutos. Pelo que me disse vai precisar de uma antena receptora e
transmissora de sinais... Acho que tenho uma parabólica por aqui... Deve estar perto
dos bancos ou por baixo de algum desses trambolhos e bugigangas deitadas dentro
da caçamba. Vou encontrar, só um instante.

O mais legal de tudo era que depois que ele instalou a antena o negócio ficou ainda
mais com cara de gambiarra. Eu não me importava desde que funcionasse. O coroa
me ensinou como operá-lo, eu tinha que depois repassar para Pollux e Calidora as
instruções. Ele ficou atualizando o sistema do aparelho, ia levar um bom tempo. Foi
quando minha manopla começou a vibrar alertando uma nova chamada.

— Estranho... Tenho uma nova mensagem... — Ergui o pulso à frente do rosto.

— E o que tem de estranho nisso? — Ele mexia nas teclas no painel do aparelho, de
costas.
— Ninguém tem meu contato... Não da manopla... Pra isso uso a pulseira
comunicadora... — Curiosidade.... De novo... E foi ela quem matou o gato. Não resisti
e aceitei a porcaria da chamada. Dentro da minha cabeça eu ouvia a voz robótica e
arrastada, a intenção era assustadora, tinha conseguido.

— Aqui quem fala é Darkness, aposto que se lembra, impossível esquecer quem
venceu o duelo virtual, primeiro de muitos que virão. Mas não estou aqui para
tripudiar sua derrota. Yuric ficou muito desapontado com sua traição, ele
desconfiava de você, mas nunca imaginou que poderia ser tão baixa. Red também
lamenta, é, ele está vivo, mas no hospital, entubado, foi severamente violentado, os
molestadores só descobriram que não era você quando a holomáscara passou a
falhar. Yuric me pediu para devolver o golpe. Você a conhece ? — Como devem
saber, meus olhos atualmente são meus monitores, da mesma forma que meus
ouvidos são os aplicativos de áudio, como uma miragem passei a ter a visão em
primeira pessoa de alguém no topo de um terraço, pela arquitetura parecia ser o
Vintage, o bairro onde morei. Uma jovem mulher usava um visor virtual, ela andava
pelos parapeitos feio uma equilibrista bêbada sem se importar com a altura.

— SASHA! — Gritei seu nome, reconhecendo-a.

— Não adianta alertá-la, isso é uma gravação, não se preocupe, ela está em um lugar
bem melhor agora. — Então Sasha despencou do terraço, de braços abertos, caindo
e caindo até se espatifar no asfalto atrapalhando o trânsito, tinha sangue por todos
os lados.

— ELA ERA MINHA AMIGA!! — Gritei novamente.

— Por isso morreu, e vai ser assim se não se entregar a Yuric, a cada hora que
passar um dos seus amigos vai morrer. — Naquele momento pensei em Max, mas
por sorte tinha a enviado com Pollux e Gini, por enquanto estava segura.

— O próximo da lista vai ser esse rapazinho que encontrei no mesmo apartamento,
pelo nível de intimidade acho que eram namorados... Forneci a ele uma dose mortal
de uma nova droga virtual... Mas se você fizer o que mandei, seu amigo se salvará.
— Na imagem que ia direto para meus nervos óticos, Duncan, o namorado de Sasha
estava encolhido em um canto do quarto, sentado sobre o colchão, em coma
induzido.

— Eu poderia forçá-la a se entregar, sei exatamente onde está, mas vai ser mais
interessante assim.
— Pare de blefar! Se você tocar em um fio de cabelo Dele... Eu vou... Eu vou... — Ele
interrompeu.

— Calada, não sou alguém com quem se deve brincar, vou lhe dar uma amostra de
que não estou blefando. — Pneus derrapavam pelo asfalto e o ronco alto de motores
se fez, os barulhos de tiros vinham da entrada do Meia Noite e abafaram a maioria
dos gritos. Nem todos haviam entrado, a maioria esperava na fila da calçada.
Darkness mandou matar aquela gente só pra me mostrar que podia. Mas como ele
sabia?

— Não dá tempo para ficar ouvindo suas mensagens, Érica, entre na van, rápido! Está
me ouvindo? ÉRICA? — Eu fiquei em choque, paralisada, Vladimir pegou meu pulso e
me jogou dentro da van, fechando as portas e mandou o motorista arrancar. Saímos
dali por que logo a polícia chegaria e Vlad não queria que a ParaMilitech o visse no
Meia Noite. Eu ainda tentava entender como ele sabia que eu estava no night club,
só existia uma explicação…

Pollux
De onde havia vindo aquele maluco, eu não sabia, e pelo jeito do olhar das meninas
elas também não. O sorrisinho estava a poucos passos de se tornar a mais nova
peneira de Miraitropolis, mas a sorte também deveria sorrir bastante pra ele pra que
esse destino não fosse imediatamente realizado, pelo menos por enquanto. Eu não
gosto muito de planos de última hora, e a inclusão de um estranho no que já era um
tanto confidencial me fez ponderar novamente se não ficaria melhor sozinho. Mas
resolvi confiar em mim mesmo e dividir meu pensamentos com os outros, enquanto
bebia e tragava outro cigarro.

— Eu tenho razão pra acreditar que Tim está muito próximo de encontrar o
esconderijo dos Steelhearts. Coloquei um rastreador em um dos veículos dele, eles
o trocam toda hora mas pude notar que andaram se aproximando, de onde eles
agora se escondem. A primeira parte do plano é garantir a segurança deles, e deixar
com que Calidora conclua a parte dela em Hampton Heights. Ela vai garantir que
haja uma sede para que a nossa transmissão chegue a Praxis, e um esconderijo
para todo o nosso equipamento.

A parte mais difícil era não ter notícias sobre ela até então, e apenas a intuição para
me dizer que tudo estava bem. Bem, eu ouviria dela quando chegasse do outro lado
da cidade e saísse da zona subterrânea, mas se o dia virasse e eu não tivesse
notícias dela.... — O plano meus caros, é colocar outra força em jogo nessa cidade.
Com a guerra das gangues eu e Calidora encontramos a oportunidade perfeita para
criarmos nosso próprio lado no tabuleiro, sem depender da Cosa Nostra, já que todo
chefe nosso tem o hábito de morrer. Com os laços quebrados com Tony, agora
temos nosso próprio bote salva vidas. — Me levantei e me dirigi até a janela do
trailer, onde ergui por hábito parte da cortina para olhar através da fenda a rua do
outro lado. — O que queremos é uma plataforma para que a verdade seja exposta.
Não na televisão, mas em streaming, na Praxis. Um compilado onde possamos
distribuir ao público o podre de cada um que não podemos alcançar com balas,
tentar derrubar nossos inimigos do mesmo jeito que eles dominaram essa cidade. —
Depois olhei para cada um deles novamente, os que estavam reunidos comigo, mas
não esperava mesmo muito interesse pelo plano. As sementes haviam sido
plantadas já há algum tempo e só agora o plano estava realmente sendo
concretizado, e não era nem de longe tão atraente quanto o crime organizado. — Pra
isso eu tenho buscado um meio de publicar os dados que meus implantes salvaram,
e Calidora foi para Hampton Heights estabelecer uma base secreta.
— Mas primeiro tenho uma dívida com um certo alguém. Precisamos visitar os
Steelhearts remanescentes e tirá-los de Miraitroid. Só tem uma pessoa que pode
impedir meus planos agora e eu acho que sei para onde ele está indo. Tenho razões
para acreditar que Tim e Rose estão querendo acabar com o que restou da gangue
fazendo alianças perigosas por aí.

Naquela altura eu já podia imaginar que ele havia recebido a filmagem que enviei
para ele do dia em que o Canal 17 foi destruído, mas nem Timothy e nem Galathea
ainda haviam feito contato, o que não podia ser bom. Também não pude dizer que
fiquei dando pulos de alegria quando X-9 decidiu ficar para trás, mas entendi seus
motivos. Saltei no carro com o desconhecido e a sua amiga de confiança, e logo
mostrei para o navegador do carro as coordenadas de nosso destino. — Eu não vou
mentir aqui, a coisa pode ficar feia bem rápido. Não vou pedir que ninguém fique
comigo, mas se resolverem ficar é pra lutar. Não quero que ninguém atire em
Timothy sem eu tentar dialogar com ele primeiro. — Ele havia crescido muito mais
rápido do que eu imaginava e em silêncio também, seria uma pena tê-lo como
inimigo no final das contas, e tendo em vista que passamos pelo mesmo episódio
traumático de quase perder tudo na vida, havia mais motivos para que ele perdesse
a cabeça do que eu. Fui tomado por um pouco de nostalgia ao passar novamente
por aquele bairro, olhando através do carro os telões nas ruas com Telford e vez ou
outra uma nota a respeito de Montana. Era um tempo bom quando meus principais
empregadores ainda estavam vivos, os únicos que me permitiram uma segunda
chance e uma segunda vida naquela cidade, mas agora tudo estava mudando tão
rápido. Agarrar-me em algo antes de tudo afundar era uma questão de
sobrevivência, e proteger a cidade uma questão de moral. Se tudo ao meu redor
tivesse virado guerra, então era hora de parar de procurar alguém para dedicar minha
lealdade e fazer algo a respeito disso tudo.
— Outra coisa, preciso ir a outro lugar depois de garantir a segurança dos
Steelhearts. Mas preciso ir sozinho. O que não contei à X-9 é que preciso de um jeito
de saber o que se passa em Miraitropolis em tempo real, e não confio em uma IA pra
isso. — Ainda faltava uma parte bem grande de todo aquele plano, e uma parte que
pertencia a mim e que só por mim podia ser feita. Se tudo desse certo e Calidora me
deixasse saber que saiu do outro lado da cidade, isto é. Mas me surpreendi quando
tivemos uma parada inesperada no meio do caminho, que foi quando tudo começou
a dar errado. Sinceramente, naquela hora eu já não me surpreendia com mais nada,
e nada poderia impedir o caminho até o meu objetivo. A mulher armada e os seus
capangas fizeram com que nós descesse do carro, mas estranhamente não ordenou
nossa revista completa. Quando aquilo aconteceu eu sabia que estávamos diante de
algo ilícito. Mesmo que pudéssemos reagir não era como se fossemos lutar contra
aqueles trogloditas com as armas que tínhamos em mão hoje, portanto restou a
mim dar um jeito naquela situação. — Com todo respeito tenente, você acha que se
Telford estivesse atrás de mim, ela não me acharia antes de você? Ou acha que uma
simples tenente seria mais capaz do que ela? — Eu podia levar um tiro na testa
naquele momento, a qualquer momento, mas algumas palavras são mais rápidas do
que balas. Mesmo diante daquela ameaça, coloquei as mãos na cintura por dentro
do terno e continuei sorrindo. — Somente eu sobrevivi depois da noite no Canal 17, e
logo depois me juntei ao Steelhearts, o que culminou na morte do líder deles. Vocês
realmente não conseguem ver um palmo na frente de vocês, não? Fique à vontade
para falar para Telford onde está o espião dela, vão acabar mortos por saber desse
segredo. Agora, se a questão era dinheiro, bastava ter me falado. Tenho certeza que
eles dois sabem muito bem onde arranjar essa quantia para vocês. — Aquele cara
todo sorridente e a amiga da X-9, bom eu não confiava em nenhum dos dois
inteiramente e realmente não sabia em quem de verdade confiar. Mas eu sei que
estava tudo bem até aceitar essa ''ajuda''. — Só que vamos deixar uma coisa bem
clara. Se Carmen ou os seus sócios quisessem essas pessoas mortas, elas teriam
contratado alguém menos sutil como... você. Mate as minhas fontes de informação
a vontade, mas estejam preparados para lidar com a ira da chefe, a escolha é sua.
Estou indo visitar os Steelhearts agora mesmo, a propósito. Tem espaço no banco
de trás pra vocês. — Dei de ombros enquanto a conversa chegava ao fim. No fundo
eu estava bem diferente daquela confiança que exalava em excesso, mas tudo que
me fosse me garantir uma imunidade diplomática valeria a pena tentar arriscar.
Quando eu voltei para aqueles outros dois, a questão no entanto foi bem diferente.
Acho que pela primeira vez desde que tudo aconteceu, eu estava realmente nervoso.
— Você disse que trabalhava na agência da Claire, não foi? Você não é amiga da X-9?
Um de vocês foi descuidado o suficiente para colocar a gente no caminho da
Paramilitech.
Corri para a frente e agarrei as chaves de um dos carros, batendo a porta quando
entrei e me dando a certeza de que pelo menos uma das armas estava comigo. —
Desculpa, mas eu preciso fazer isso sozinho.

Quando finalmente cheguei, saí do carro e me deparei com a entrada lateral do bar
agora onde os ainda poucos Steelhearts ainda se escondiam, tão apagados e fracos
que nem de Timothy começavam a suspeitar ainda.

— Joe, a gente precisa conversar. Sentei no banco ao lado do velho, que já parecia
me olhar com suspeita por trás do óculos escuro ainda que estivéssemos dentro de
um bar. — Vocês precisam dar o fora daqui. O esconderijo foi comprometido.

— Iiii... comprometido por quem, o que que você tem a ver com isso? Ouvi Larry vir
por trás defender até então seu parceiro, que não me respondeu e eu continuei,
mesmo sabendo a fama sobre mim que tinha pairado sobre eles depois que Liam se
foi.
— O seu namoradinho, Timothy Carter, tava querendo destruir os Steelhearts desde o
começo, e vocês se abriram todo pra ele. Ele quer vingança pelo que fizeram lá no
Canal 17, coisa que eu podia querer mas tô do seu lado. E a cereja do bolo? Algum
filho da puta me dedurou pra Paramilitech, então meu disfarce foi pro ralo.

— A gente tava em paz até você chegar. Das duas vezes você só trouxe os inimigos
até a gente, tô começando a achar que tem algo a ver. Por que avisou a gente só
agora? — Bufei uma vez e olhei para Joe dessa vez, que me fazia a pergunta. Não
tinha bem uma resposta, era apenas questão de estratégia. Os Steelhearts não eram
conhecidos por sua sutileza e se Tim suspeitasse de qualquer coisa que eles
sabiam, não iria querer adiar a destruição deles. Eu tinha que mantê-los na
ignorância pelo tempo dado. — Por que vocês iriam dar com a língua nos dentes, e
agora eu tenho um outro esconderijo para nós, e um plano também. É a chance de
vocês se reformarem, começarem a agir de outro jeito.

— Você trouxe gente desconhecida pra cá, como fez quando matou o Liam. Agora
você quer pagar de santinho. Eu devia quebrar você.

Ouvi os dedos de Larry estalando atrás de mim e não tive outra resposta senão
cumprir a sua própria ameaça. Me virei e acertei sua boca com o meu punho de
forma tão rápida que suas costas caíram por cima da bebida de Joe e pararam do
outro lado. Sacudi a mão e a trouxe de novo para mim, agarrando ao meu próprio
pulso. — Vocês não passam de uma gangue de trombadinhas hoje em dia, ninguém
mais te respeita. O inferno tá congelando lá fora e vocês nessa merda de bar,
bebendo e tendo câimbra de bunda. Nem parece o que já foram. — Minha voz se
ergueu ao ponto das poucas pessoas naquele bar já terem direcionado a atenção na
direção da cena, e meu estado alterado. — Eu faço das tripas coração pra tentar
honrar isso que já foi uma casa pra mim, e vocês só querem saber de beber as
mágoas com whisky. A mídia tinha razão, vocês não são nada sem o Liam. — Não
me arrependia, de forma alguma do que dizia. O meu comunicador tocou, e eu notei
que era uma mensagem de X-9, falando sobre os equipamentos. Me acalmei por um
segundo mas por um minuto eu olhei para o meu pulso, não sabendo muito se
responderia. No fim escolhi não responder. — Lembram do antigo esconderijo que a
Dama de Prata destruiu lá quando a gente escapou pelos esgotos e conhecemos a
doutora? Vão para lá e abram caminho até Hapton Heights, não abram o bico e não
sejam seguidos. Tenho que ir em mais um lugar sozinho, de novo. E mais, quando eu
voltar, quem vai estar no comando sou eu.

Hampton Heights

— Preparem-se para atirar, eles estão no nosso caminho. As pessoas nem sabiam
dizer direito se o que viam era um ser vivo ou algo já morto. Os olhos pareciam
brilhar com aquela pouca iluminação do lugar, várias armas se erguiam para formar
um paredão em torno do túnel que queriam passar, os veículos vinham por trás
sendo escoltados, alguns com lonas sobre as suas carrocerias onde os
equipamentos eram ocultos, ficava cada vez mais claro que não seria possível
deixar aquele labirinto de túneis no esgoto sem lidar com aquelas pessoas.

— Não, ninguém atira sem a minha permissão! Sargento, dispare essa arma e você
não está mais conosco. — Calidora esbraveja e aponta o dedo para o comandante,
que relutante faz um gesto com a mão e ordena os seus homens a cessarem a
ordem. — Quem são eles? Temos alguma notícia? Eles nos entendem?

— Não senhora, pode ser perigoso se aproximar. Não sabemos quanto tempo estão
aqui embaixo, nunca mapeamos o subsolo desse bairro. Mas o único jeito até a
sede é por aqui. — O jaleco cinza de Calidora era uma insistência por parte dos
doutores, curto o suficiente para não arrastar no lodo do esgoto por onde as suas
botas abriam espaço para caminhar. Olhando para aqueles habitantes, pareciam
mais zumbis do que gente viva, mas não começaria a história daquela emissora o
mesmo gente que sua antiga chefa, matando inocentes. — Cuidado, não se
aproxime!

Calidora fez exatamente isso. Quando estava há um braço de distância das pessoas
encontradas, tomou um suspiro longo e retirou a máscara de oxigênio, ficando de
cara limpa.

— O que é que ela está fazendo?


— Eles devem estar tão amedrontados quanto nós. Provavelmente nunca viram tanta
gente assim. Passem os médicos para frente, e tragam comida e vacinas se
tivermos também. Escondam as armas se preciso mas não tirem a mão delas, só
para garantir. Façam entender que viemos em paz. — Diz Calidora mais baixo para o
general ao seu lado, depois bate em seu ombro e o deixa seguir. — Vamos continuar,
abrindo caminho devagar até conseguirmos passar os veículos. Não podemos nos
atrasar nem mais um minuto! — O túnel estava abarrotado, um grande número de
gente ainda formava um paredão à frente quase intransponível, mas médicos de
roupa branca chegavam aos poucos e tentavam estabelecer um contato um pouco
menos hostil do que aqueles que tinham armas à mostra e tentavam empurrá-los
com elas. Não ouviu ninguém entrar em contato ou tentar comunicar-se, então
continuou a andar na direção deles e aos poucos, abrir caminho entre o seu povo,
como se pedisse licença. Depois, os pesados carros começaram a se mover e por
último o seu pulso acendeu novamente, era o comunicador finalmente dando sinais
de vida, o que como um bom sinal mostrava que estavam mais próximos de onde o
sinal da superfície já os alcançava. Aproveitando o tempo restante, Calidora usou-o
para enviar uma simples e curta mensagem. — Pollux, começar a segunda fase da
operação. A helinave vai estar te esperando no local combinado. Boa sorte.

Mad Max
Estava tentando digerir todas aquelas informações que me foram passadas por X e
Pollux na última hora. Era mais ação do que eu poderia ter feito algum dia até então
mas isso não me tornava menos capaz de fazer o que é que me fosse pedido,
porém, estava ali para ajudar uma amiga e ganhar um dinheiro quem sabe, e esse
plano já foi furado pois no meio da conversa, foi mencionado que o contratante
estava morto. Não demorou para que já estivéssemos partindo para a localização
em que o amigo de X lhe dizia e aquele plano... não era um dos melhores,
principalmente porque não receberia nenhum tostão furado já que o contratante
estava tocando trompeta com o tridente do diabo, e isso não me agradou muito, e
com o semblante fechado, apertei um pouco mais o volante com ódio, e enquanto
prestava a atenção na avenida, deixava passar despercebido quando no painel do
carro surgia o ícone de uma mensagem recém chegada.

Assim que começamos a seguir pela Av. Armitagem, as coisas começaram a


mostrar como tudo poderia dar errado muito rápido, e que aquele plano era bem
fraco por não conter nenhum plano B. Um veículo da Paramilitech chegava e nos
fazem parar e antes de fazer qualquer coisa, repeti duas vezes, "merda, merda!".
Descemos do carro e então aquele encontro informal começou, sabia que iria dar
merda só pela forma que estava começando.
— Boa noite... Ou bom dia.... Com essa chuva nunca sei ao certo... — A mulher
começava a falar. Então aquela era a tenente McCall? De uma forma ou de outra,
não estava gostando da forma como ela falava e meu sangue começava a ferver,
não gostava de ser abordada daquela maneira e muitos metidos a valentões de
Miraitroid aprenderam da pior forma. E aquilo não teve outro final diferente do
esperado, era uma chantagem como qualquer outro faria, e isso me decepcionou
pois achei que poderia machucar meus punhos em alguém, mas não diminuiu minha
raiva, principalmente quando Pollux começou a falar e literalmente largou a bomba
em nossas mãos, somente para em seguida pegar o carro de Gini e fugir! Minha face
estava queimando, meu nariz avermelhado, assim como as maçãs do rosto. Meu
olho direito deu algumas piscadas involuntárias, era um tique que eu tinha quando
estava fula da vida, e então andei batendo os pés até chegar em meu carro, eu não
poderia deixar aquilo acontecer, ninguém mandava em mim! Antes mesmo que o
carro dos policiais pudesse dar a arrancada para sair dali, puxei do espaço traseiro
que fiz questão de tirar os bancos para puxar meu canhão de fótons. Era uma arma
grande e suas células de recarga eram guardadas numa bolsa de couro que era
ligada ao canhão por uma tira de couro, quase como a de uma bolsa, mas não tive
tempo de tirar tudo isso para fora e, com raiva e precisão disparei. Um feixe de luz
colorido e brilhante acertou o motor do carro policial em seguida houve a explosão
que causou um breve e pequeno estrondo naquela região.

—Não torci para que ninguém escutasse. Joguei o canhão para dentro do carro
novamente e comecei a andar até as vítimas enquanto tirava a desert eagle do cinto,
e assim que cheguei ao lado do carro, comentei. — Aqui está seus dois milhões,
otária. — E descarreguei o pente em todos ali dentro apenas para garantir, mesmo
com os corpos em combustão. A arma estava quente e me voltei para o meu carro, e
quando passei ao lado de Gini, ordenei, ainda cheia de raiva. — Entra no carro agora,
vamos atrás de Pollux. — E estava falando sério, e eu prometia em minha cabeça
que quando o encontrasse, ele iria nos pagar por nos abandonar assim, mas quando
sentei de volta ao volante, vi o ícone de mensagem, e então a abri com um toque, e
era uma mensagem de Aria, uma amiga de Miraitroid:

"Max! Max! Max... eu não sei por onde você anda gata, mas como sabe, o caos da
cidade está cada vez pior, e eu queria dizer que um carro invadiu sua oficina, deve
ter... umas três pessoas lá e estão roubando suas coisas. Sabe que se eu pudesse
eu faria alguma coisa, mas, bem... meu braço ainda não está bom, e não sou
canhota. Venha logo."

— Porra... loiro, não sei o que você pretende fazer, mas agora só tem duas opções;
Ou vem comigo, ou salta do carro. — Max parecia mais calma mas antes que ele
pudesse responder, já estava em movimento para não acabar sendo pega por
policiais que viessem checar o incidente.
Narrador Capítulo 11

Os noticiários ferviam, novas informações mostram que a nova vítima do que a


mídia estava chamando agora de "Ruas de sangue" era o night club Meia Noite, em
Miraitroide. Sem pudor a TV mostrava ao chão os corpos perfurados de
adolescentes enquanto a polícia chegava pra investigar a cena do crime.

— Mais de vinte jovens foram executados na frente da casa noturna à espera para
entrar no local. O comissário de polícia J. Harmeman fora convocado para
comparecer ao gabinete de Carmen Telforld, tudo indica que a Dama de Prata já
havia pedido resultados na operação policial, mas contudo mesmo com seus
pedidos em nada mudou a brutalidade nas ruas. Será que é a última noite de
Hamerman em seu posto? Por falar na digníssima senhorita Telford, em alguns
minutos ela fará um pronunciamento em rede nacional. — A população de
Miraitropolis aguardava ao menos um pronunciamento por parte de Telford, no
entanto nada foi dito ou mesmo uma nota prestada. Parecia que a Dama de Prata
fazia a política do silêncio absoluto ou não se importava com a brutalidade atual.

Insatisfeitos com o banho de sangue que ocorria nas ruas, com o confronto entre
União das Américas x Rússia Nazisovíética, e o inicio de teste nucleares nos
desertos, o silêncio foi a gota d'água, nem mesmo a onda de violência das ruas foi
capaz de impedir que pessoas revoltas e muito insatisfeitas com a gestão de
Carmen Telford fossem às ruas. Ao final daquele dia os protestos tomaram a cidade,
em diversos pontos e avenidas dos bairros os cidadãos erguiam cartazes de repúdio
à Carmen Telford, mas em nenhum outro local existia mais confusão do que a frente
da nova prefeitura de onde o pronunciamento havia sido feito. Tomando um longo
trecho da Av. Armitage ao centro, protestantes aguardavam a saída da Dama de
Prata nas escadarias do prédio, a ParaMilitech fora acionada para conter possíveis
avanços e atitudes. No entanto, já prevendo a iniciativa popular, ela utilizava uma
dublê. Não era bem essa a palavra correta, Telford tinha encomendado com a
G.E.M.S. uma replicata sua para ludibriar os olhares nessas horas. O que os
protestantes não sabiam é que jogavam pedras, pedaços de ferro e bombas
caseiras no automóvel de um "clone" enquanto Carmen fazia uma retirada evasiva
segura pelas portas dos fundos do edifício, onde ninguém a importunaria. Um
veículo moderno, de última geração, cedido pela companhia automobilística Luft,
de Elleanor Aigner. O carro era idêntico a aquele que ficava estacionado na frente da
prefeitura. Seu motorista mecanizado a esperava.

— Podemos ir, Aron. — Sorria se sentando ao banco.


Telford pelo jeito havia feito alguns "ajustes" no seu ciborgue rebelde do passado,
Aron, e agora ele a servia fielmente de fato, não como um segurança, mas sim como
um serviçal motorista. Sem preocupação a senhora de cabelos platinados outra vez
escapava bem sucedidamente, bem longe do julgamento público.

Conforme as horas se passaram naquele dia, os protestos se tornaram mais


violentos. Não eram apenas cartazes que os manifestantes erguiam, mas pedaços
de ferro ou bastões de aços, qualquer coisa que pudesse servir para quebrar
vidraças. Revoltosa, a multidão depredava patrimônio público e privado. Desde lojas
de aparelhos eletro-eletrônicos, agências bancárias a prédios da prefeitura. Pilhas de
entulhos eram amontoadas no meio de avenidas e ou calçadas para ser ateado fogo
e arder em chamas, criando bloqueio. No meio dessa confusão não era rara a cena
de saqueadores carregando aparelhos ou estoques de comida de mercados. A
polícia ficava deliberadamente obrigada a agir. Os enviados não eram os soldados
padrão e sim aqueles antigos agentes da lei que anos antes haviam se formado nas
academias de polícia e mesmo depois da mudança de política com a segurança se
tornando privada, insistiam em atuar ao lado dos funcionários altamente equipados
da ParaMilitech.

Com suas baixas proteções, uniformes ultrapassados que não concediam


segurança alguma para o serviço, precisavam se proteger atrás de seus escudos
velhos e bem desgastados, enfrentando a classe operária enraivecida que
arremessava paus, pedras pesadas e muitos coquetéis molotovs. Ficava nítido que
não tinham condições para combater o tumulto e tão pouco resistiriam a pressão
psicológica, como cordeiros para o abate foram enviados por seus superiores
apenas para desistirem, no intuito de valorizar mais os agentes da P.M. um plano
que em breve seria posto em prática pelo diretor Nick Slay e o presidente da
corporação, General Kasper, por enquanto deixavam assim, com o circo pegando
fogo. Alguns boatos diziam que funcionários e agentes oficiais da ParaMilitech
estavam infiltrados na multidão, incitando e aumentando essa histeria coletiva,
jogando gasolina na fogueira.

Ao longe na paisagem se podia ver o porto e os guindastes das docas, o furgão de


Vladimir parecia rondar as ruas limites do bairro quase na divisa de Troika. Eles
realmente haviam rodado muito, ao contrário do que pensou o passeio não fez X-9
melhorar, ela continuava em choque com a cena de sua amiga Sasha morta e
Duncan em coma com uma dose letal de droga virtual. Por sua vez, o agente russo
da ParaMilitech não sabia, não havia visto as cenas, nem ouvido o que Darkness
disse a hacker e pensava que ela se encontrava com o olhar vago devido a culpa
pelas mortes no Meia Noite. Vladimir se sentava ao lado da jovem de moicano lilás e
tentava consolá-la.
— Sabe como chamamos isso em uma guerra? Efeito colateral. — X-9 não dizia nada,
apenas olhava vagamente para as paredes do compartimento de carga do furgão.

As palavras de Vladimir não surtiram efeito e de repente a manopla em seu pulso


passava a vibrar e somente isso quebrou seu transe. A hacker parecia que agora
tinha medo do aparelho que criou, em um pensamento instintivo quase agarrou o
teclado do pulso e o arrancou, mas conteve-se antes de fazer essa besteira. Vladimir
parecendo que sabia como operar aquela máquina apertou duas teclas, uma para
receber a mensagem e outra para projetar em viva voz o som.

- Está convencida de que não estou blefando? Aposto que sim. Você se decidiu? Vai
se entregar ou vai matar mais um de seus amigos? — A voz de Darkness era fria e
apreensiva.

— Já disse que não vou voltar para aquele inferno! — Trincando os dentes, a hacker
respondeu.
— Você teve sua chance, X-9, fez sua escolha. — A manopla automaticamente
projetou uma tela holográfica azul e nela seu amigo Duncan se contorcia tendo uma
overdose da droga virtual. Não durou mais do que cinco segundos e ele parou de se
debater no colchão, espumando uma baba verde pela boca. Sem dizer nada, X-9
evitou olhar apertando o rosto contra o peito de Vladimir.

— Seu amigo entrou para a história, ele é a primeira vítima da minha droga virtual.
Ela ainda não tem nomenclatura, estou pensando em colocar o nome do seu amigo.
Esse produto estará nas ruas dentro de alguns dias. Não preciso dizer que será um
sucesso. — A transmissão se encerrou.

— Você acha que tem sangue de seus amigos nas suas mãos... Mas não tem, não é
bem assim... Não foi você que os matou... Beba algo em nome deles. — Vladimir
tirou um cantil do bolso interno do terno e entregou a X-9, e a mesma bebeu uma
dose de vodca em honra a seus amigos falecidos.

— Me conte que lugar é esse que você não quer voltar. E quem é X-9? — Vladimir
também bebeu em memória aos amigos de X-9.

— Não fui totalmente sincera... Eu sou X-9... — A hacker então contou que esteve no
cassino de Yuric, trabalhando como agente dupla de Tony Montana, mas que não
deu muito certo depois do ataque de Darkness.

— Agora tudo faz sentido... Vou contar o que sei também... Não vou mentir, a
situação está muito feia, minha cara… — Ele disse a ela tudo que sabia, incluindo o
que descobriu junto com Jesse no prédio coreano.
— Carmen Telford reduziu o espaço de Yuric a Troika, mas ele não precisa de muito
quando tem o porto à sua disposição. Xiaren entrou em contato e avisou que
Nureyev está abrindo as portas de Miraitropolis para os Nazisovíéticos, se algo não
for feito, a guerra pode estourar dentro do seu território. Há um navio chegando da
Rússia com um carregamento de armas... Diversas delas... Isso não pode aportar...
— Vladimir como hábito coçava a barba grisalha, preocupado.

— Você disse que é da ParaMilitech, por que não fala para seu superior que tem essa
coisa chegando? — X-9 não parava de beber e acendia um cigarro.

— Isso implicaria em muitos poréns, entre eles explicar que estou afiliado a máfia
italiana... Seria o fim da minha carreira... É bom lucrar com a venda dos armamentos
da P.M. se eu sair... Perco tudo. Vou ter que fazer de outra maneira. — Disse ele
usando o isqueiro para acender o cigarro de X-9

— Quanto a mim, preciso voltar ao Meia Noite... — Dizia baixo para ninguém ouvir.

— Você é doida Érica? Digo, X-9? A Paramilitech ainda deve estar lá. — Tentava
também falar baixo.

— É que deixei em cima da mesma o chip e a placa mãe da I.A. sem essas coisas ela
não vai funcionar... — Vladimir apreensivo colocava a mão na frente do rosto.

— Está certo... Mas vou deixá-la uma quadra antes do Meia Noite, não quero arriscar
ser visto. — Ela concordou.

Apesar da relutância de Vladimir, o furgão voltava a Miraitroide e como prometido


Vladimir estacionava faltando uma quadra para o night club, abaixo de um poste
sem luz. Com muito receio, colocando as mãos nos bolsos do casaco, X-9 descia do
carro e fazia o restante do percurso a pé. Tremendo de medo de algum maluco
saltar das sombras para rasgar sua garganta como um par de navalhas, assim como
viu no centro algumas horas atrás, cada passo dado era muito bem pensado e todo
cuidado era pouco. Por sorte chegou à frente do Meia Noite e até mesmo a polícia já
havia se retirado, deixando apenas no local uma faixa virtual de isolamento. Os
corpos já haviam sido retirados, mas X-9 pisava em uma crosta de sangue, papel e
lixo que se formavam na calçada.

Empurrou as portas e entrou. Sem delongas foi direto a sala e lá estava o chip e a
placa mãe. Guardou nos bolsos e voltou correndo para a saída, descendo as
escadas rapidamente, entretanto, antes de cruzar a porta ouviu um chamado.
— Ein mocinha, você é a tal de X-9? Legal... Darkness imaginou que você voltaria ao
Meia Noite e me pediu pra te levar com vida. Mas não disse em que estado... Vamos
brincar... — Sorriu se contorcendo estranhamento com seu corpo magro cheio de
tatuagens.

Para seu terror era um sujeito sem camisa, segurando um par de navalhas, igual a
aquele que viu rasgando gargantas, só que ao invés de cabelo longo possuía um
moicano igual ao de X-9, a diferença ficava na cor preta. Não era o mesmo cara
daquela esquina, mas provavelmente pertenciam à mesma gangue.

— Darkness de novo... — O homem magro partiu correndo para cima de X-9, usando
com boa rapidez o par de navalhas na diagonal, em direção aos seus braços, abrindo
fendas em sua jaqueta que na mesma hora expulsaram uma boa quantidade de
filetes vermelhos, cortes precisos em seus ante-braços, impedindo que alcançasse
qualquer arma que fosse usar contra ele. Apesar de doloroso, os cortes não
deteriam a hacker, notando isso o estranho fez mais um movimentos desta vez em
forma - ironicamente - em "x" para cima dela. Contendo-a momentaneamente ao
segurá-la por trás encostando o fio da lâmina contra seu pescoço, o descamisado
com a mão livre esticou o braço para frente, estendendo até a visão de X-9, a sua
pulseira comunicadora se abriu desdobrando, mais uma vez exibindo a voz robótica
e assustadoramente arrastada.

— Esse é o Carniceiro, ele é membro da gangue dos Navalhas vermelhas, aliado dos
russos, ou seja, no contrato que assinei, esses rapazes com notáveis habilidades
com armas brancas trabalham para mim. Carmen Telford pode ter encurralado Yuric
em Troika, mas não eu, e nem os Navalhas e até ele resolver essa situação nós
seremos a extensão da máfia "camarada". Pena que não vai compartilhar essa
informação com seus companheiros, pois tem uma escolha a fazer. Mexendo na sua
vida particular descobri que tinha mais dois amiguinhos soltos por aí. Um deles é de
quando trabalhou na Orion, chamam ele de Drone... Que criativo... Um sujeito que
tem como hobby construir drones se auto-intitula com o mesmo nome que seus
brinquedos... Ele será o próximo da lista se você tentar resistir ou se negar a vir com
o Carniceiro até o Cassino Overdose. — Com a navalha destilando um filete vermelho
na lâmina, a escolha de X-9 era uma das mais difíceis em sua vida.

Desde que venceu seu arqui rival, Yuric não parecia muito preocupado em ficar
apenas em Troika, ele sabia que aquela situação era momentânea, ainda mais se
seus inimigos não soubessem aproveitar a chance de ouro. Apesar do incidente
com os coreanos em Little Asia, reservava um tempo para comemorar, mesmo
sabendo que Margareth estava cativa dos italianos. Para ele não importava muito,
tinha perdido a filha quando essa se casou com Krigor Ignov e passou a ser sua
esposa, abandonando o nome Nureyev. Na longa mesa de jantar dentro do
restaurante do Cassino Overdose o russo se encontrava cercado de sua gente,
seguranças e mais seguranças. Ao outro lado se encontrava o gênio da robótica,
Vegan, proprietário da oficina Consertos e Outras Coisas, a qual Coltraine indicou a
Pollux sua localização. Todavia, o traficante não sabia que Vegan havia sido raptado
por Yuric, prestando seus serviços obrigatórios, ou ou morreria. O mais difícil para
Vegan era ter de se sentar na mesma mesa que seu raptor, o insuportável Boris, o
braço direito aparecia sentado ao seu lado, o primeiro após a cabeceira do chefe. O
homem careca de barba que por puro sadismo continuou lhe ameaçando mesmo
concordando ir ao encontro de Yuric sem demonstrar resistência continuava a lhe
encarar durante o jantar.

Quem também não se encontrava em uma boa situação era Rodrigo, preso no
subsolo, sabe-se lá a quantos metros abaixo do térreo do cassino, em uma
masmorra fria, suja, escura e fedorenta. Existia provavelmente alguma ligação com
o esgoto, já que o lodo verde invadiu parte da galeria, tendo que dividir a cela com
ratos, baratas, aranhas, centopéias e escorpiões, todo o tipo de vida animal
asqueroso. Cabisbaixo, sabia que tão cedo não sairia dali, se é que sairia algum dia,
seu futuro além de incerto era nebuloso, dependia de Boris ou Yuric. Tudo mudou
quando aquele homem que conversou e confessou ter uma fantasia com a irmã da
sua esposa apareceu entre as grades.

— E aí cara... Se lembra ainda como é minha cunhada? Se precisar empresto a


foto... Mas eu não quero fazer aqui nesta cela suja... Temos umas duas horas até
Boris voltar da festa do chefe... Vamos aproveitar e fechar aquele acordo? — O
homem loiro de cabelos curtos e óculos de sol retirava do bolso um molho de
chaves e ia abrindo a cela, sorrindo, cheio das segundas intenções.

— Dá pra usar um dos quartos do hotel... Tem champanhe, cigarros, até um pó de


neon se você curtir... A gente trepa e eu te conto tudo o que sei sobre o irmão do
Pascal. — A cela ficava aberta à espera da resposta de Rodrigo.

Enquanto a cidade ruía em desgraça, em uma das coberturas de All Street, Telford e
Henry Choi comemoravam a parceria. Apenas os mais ricos de Miraitropolis se
encontravam lá. O presidente da G.E.M.S empresa geneticista que ilegalmente lucra
com o comércio de replicatas estava lá. Além dele estavam os seis representantes
do conselho secreto que manipulava nas sombras a capital da União das Américas.
Elleanor Aigner, uma linda mulher de 26 anos, herdeira da empresa alemã de
automóveis Luft. Arthur Strawnoff, dono da maior empresa de implantes
cibernéticos do mundo. Cassandra Allestar bilionária presidente de uma das
maiores empresas da indústria da moda, Julius Roffman, sua empresa é
responsável por todo o refinamento de Radiack, Laurel Hedare, que dizem ter
matado o marido para assumir sua empresa de cosméticos, líder em vendas e agora
Choi, que entrava para esse seleto grupo, sendo o sétimo membro, ocupando uma
cadeira que estava vaga desde a decadência de Jaime K'dore. Todos
cumprimentavam o descendente de coreano com muito ardor. Restou em certo
momento diante uma bela e homérica janela com diversas vidraças, Carmen e Henry
discutindo os próximos passos quem iniciava a conversa como sempre era a Dama
de Prata.

— Henry, o gado está descontente, você precisava ver o bando de pobres na frente
da prefeitura hoje... Lamentável... Aos poucos os protestos vão piorar, eu conheço
essa gente inferior como a palma da minha mão. Quero que você trabalhe em um
projeto que possa deixar esse povinho ocupado com alguma baboseira enquanto as
coisas acontecem em Miraitropolis e eu arrumo essa bagunça que se formou com
as máfias. — Dizia levando a taça de champanhe aos lábios ao terminar.

— Não se preocupe, Carmen, já vinha pensando nisso e planejando certas medidas.


Vou precisar dos recursos de Cassandra para o projeto. De acordo? — Também
levava uma taça de champanhe aos lábios.

— É claro, aquela desmiolada fala sim para tudo que digo. Se pedir para ela se jogar
desse prédio a tonta nem questionaria. — Tanto a Dama de Prata quanto Choi
encerraram a conversa gargalhando muito.

— O que mais gosto em Miraitropolis sabe o que é, Choi? O sistema protege o rico e
condena o pobre. Tudo é forma de lucrar, se a pessoa quer segurança, precisa pagar
a polícia. Se quer vender drogas ou armas, precisa pagar a polícia. O contribuinte já
paga imposto, bem alto, e ainda precisa respeitar a tabela de preços dada pelos
policiais. Cada um tem sua área. Essa era a gestão da tenente, e agora ela se tornará
comissária por esta qualidade notável. É errado pagá-la com um novo cargo para
que nós possamos nos sentir seguros? A resposta é não. Essa festa só está
acontecendo por causa dela e seus militares, um brinde a eles! — Telford se
esbaldava em champanhe e deboches, brindando e rindo com Henry Choi.

— A propósito... Ela está atrasada para a festa. — Observava Telford, bebericando


sua bebida enquanto olhava para os lados procurando a Tenente.

— Tudo bem, terei outra oportunidade de conhecê-la. Me perdoe a pressa, mas tenho
outros assuntos tão importantes quanto ainda para serem resolvidos. Quero da
mesma forma que quero iniciar imediatamente o projeto com Cassandra. Tempo é
dinheiro! Se me der licença... — Choi se retirava do luxuoso prédio, visivelmente com
pressa usava o elevador direto a garagem e com seu carro deixava a festa de Telford
para trás.
— Orientais... Sempre tão ocupados... Viciados em trabalhos. Humpf. — Desdenhou
Telford, meio aborrecida, bebendo seu novo drinque

Não que fosse importante para a Dama de Prata, mas circulava na Lexis,
principalmente nas redes sociais um vídeo onde o Detetive Caz executava a sangue
frio um grupo de sem tetos dentro de uma cela. As imagens não eram bem claras e
nem tão esclarecedoras, não se via exatamente quem descarregou a arma, apenas
uma coisa era certa, quem segurava pistola segundos antes da cena dos tiros era
ele. Caz era um dos poucos que nunca sofreu com a ira de Telford recaindo por sua
cabeça, todavia ela não tinha ligação ou apreço com o policial, mesmo ele sendo o
garoto propaganda da sua gestão, uma prova de que existia alguém competente
trabalhando na polícia. Tudo isso estava indo por água abaixo, a reputação sempre
boa do detetive ficava em xeque. Alguns diziam se tratar de armação, outros não. A
única coisa certa era que sua carreira sofreu um tremendo baque mesmo com
aqueles que acreditavam em sua integridade moral. Caz havia obtido a simpatia e
aceitação do povo por seus próprios méritos. O que ficava claro era que bastava
uma suspeita ou boato não confirmado para destruir uma vida inteira de confiança.
Ficava claro para Telford que alguém deveria tomar esse lugar uma vez que a
população perdia seu herói, seu salvador. Ídolos são criados todos dias e assim
como ascendem, caem tão rápido quanto, com Caz não seria diferente, logo Carmen
colocaria a nova Comissária Aurora em seu lugar, tomando a frente a
responsabilidade de ganhar a simpatia popular. Povo distraído e esperançoso era
povo fácil de se controlar.

Depois que Galathea saiu do escritório com Xiaren, Jesse pela primeira vez em toda
sua vida teve um surto de raiva. Ele se retirava para sua sala, não quebrava nada
como Tony Montana fazia, mas seu rosto estava rubro com a ira, seus punhos
fechados e caminhava de um lado a outro. Também bufada como nunca, passando
as mãos nos cabelos ao puxar para trás.

— Fiz tudo que ela pediu e mesmo assim me trata como uma criança? Ela acha que
me falta coragem, ousadia? CULHÕES? EU VOU MOSTRAR QUEM TEM CULHÕES! SE
É OUSADIA QUE QUER, ENTÃO É O QUE TERÁ! — Ele levava o braço esquerdo com a
pulseira comunicadora à frente do rosto, usando a função de voz para todo seus
contatos.

— Todas as gangues afiliadas a Cosa Nostra se armem até aos dentes e sigam para
Troika. O alvo é o Cassino Overdose. Repito, Cassino Overdose. — Ordenava falando
alto.

— Mas Jesse… Isso vai ser um banho de sangue… Quase um suicídio… — O líder dos
Guerreiros de Neon tentava argumentar, mas Castelone o interrompia.
— A ordem foi bem clara! Não deixem o lugar em pé, NÃO DEIXEM sobreviventes,
nem mulheres nem homens ou velhos, não quero ninguém vivo, seja inocente ou
não! — Esbravejou Jesse, ninguém ousou contrariar sua ordem.

Isso não foi tudo, sem Vladimir por perto Jesse metia cada vez mais os pés pelas
mãos, aproveitando-se da ausência da sua líder e todos outros que quiçá poderiam
lhe impedir, foi até o cárcere da filha de Yuric, Margareth, que era mantida como
refém em uma das salas de alta segurança do Olimpo. Ordenou a um dos
empregados que abrisse a porta da sala, a russa parecia estar em uma prisão
domiciliar, com cama, televisão, banheiro e boa comida. Ela possivelmente seria
moeda de troca ou uma carta na manga futuramente nessa guerra. Apesar de ter
conhecimento dessa possibilidade, Castelone ignorava tudo tirando sua beretta da
cintura e sem dar chance a Margareth disparava contra sua cabeça. Seus miolos
pintaram a parede da sala e seu edredom.

— Quero ver ela dizer que não tenho ousadia!!! — Assoprava a fumaça do cano da
arma.

Max não sabia, mas sem querer acabou ajudando Pollux e os Steelhearts quando
explodiu a viatura com a Tenente McCall. Assim ela eliminou também uma forte
aliada de Timothy em sua vingança. O automóvel ardia em chamas no meio da pista
daquele trecho da Armitage, transformando-o numa prisão de fogo para a Tenente e
os demais policiais. Seu corpo derretido encoberto por cinzas queimava mais do
que os dos outros que estavam com armaduras da ParaMilitech. A sensação nova e
estranha de matar podia estar entalado na garganta de Max, da mesma forma que o
gosto estranho e amargo do assassinato podia estar escorrendo por sua boca
aberta, assim como o calor das chamas quente e ardente em suas narinas. Mas se
quisesse se livrar teria que sair da cena do crime rapidamente. Ela e Gini entraram
no carro, e sabendo da situação da sua oficina, ficaram sem tempo. Tão rápido
quanto chegaram partiram os dois, água dos hidrantes escorriam, crianças estavam
correndo de um lado a outro, carros trancavam as principais vias, precisava tomar
cuidado se quisesse evitar um acidente ou algo pior. Ao chegar em Miraitroide os
faróis altos revelaram Aria escondida entre latas de lixo de um beco próximo a Get
Jett. Sabendo que se tratava da amiga da mecânica, Gini não tardou a abrir a porta
do carro para a garota saltar para dentro. A coitada se encontrava tão assustada que
não conseguia falar. Não precisou, logo Max viu a oficina que jazia nas mãos de uma
gangue. Eram três homens, todos iguais, com jaquetas, camisas, luvas e calças
pretas. Todavia o que mais chamava a atenção eram as máscaras, ou melhor,
capacetes. Iluminados com neons circulando suas viseiras, o formato do que
usavam na cabeça era de orelhas e focinho de rato. Eles destruíram tudo o que viam
pela frente com marretas. Nada era perdoado, desde carros a objetos pessoais.
Tudo estava revirado e em total desordem, e quando perceberam que um carro
estacionou pararam o que estavam fazendo para encarar os “intrusos”.

— Vão embora se não querem confusão, agora! — Ordenou o do meio com uma voz
metálica.

A menos de um quarteirão da Boate Vênus, o carro em que Galathea, Xiaren e alguns


outros homens se encontravam eram obrigados a parar. A principal gangue afiliada
aos latinos tinha ascendência mexicana. Eles pintavam o rosto com maquiagem
preta e branca, o que os transformava em verdadeiras caveiras. Seu nome era Los
Muertos. Das sombras eles surgiram, e logo mais de vinte pessoas cercavam os três
carros que estavam entrando nos domínios de Pascal. Uma mulher de cabelos
curtos e negros se aproximou da janela apontando uma arma para o veículo batendo
no vidro. Aquilo poderia incomodar certamente a líder da Cosa Nostra, no entanto
Xiaren era conhecido por sua habilidade natural diplomática entre as máfias, sendo
um dos poucos em que Montana realmente parava para ouvir. Sabendo lidar com a
situação, ele baixou o vidro e a mulher se adiantou, o reconhecendo.

— Xiaren, negócios a tratar com Pascal? Infelizmente ele não está podendo receber
ninguém… — Apesar da aparente cordialidade, a mulher mantinha uma expressão
brava.

— Entendo… Deve ser por causa do hermano. Com quem posso falar, quem está no
comando provisório?

— Vamos ver se Roberto está disponível… — Ela levou a destra até a altura da orelha
e se afastou, entrando em contato. Seu implante na lateral direita do rosto emitiu
um fraco sinal verde, projetando um pequeno texto holográfico. Menos de meio
minuto com um gesto com o braço permitiu a passagem dos carros. Dentro da
boate eram acompanhados pela segurança pessoal de Pascal, na verdade, de
Roberto agora, até seu escritório no último andar. Os homens de Galathea e Xiaren
ficariam aguardando no corredor, assim como os do anfitrião deixando apenas os
três dentro da sala cheia de neons coloridos porém escuros.

— Fiquem a vontade, perdoe a ausência de Pascal, ele não se encontra muito bem…
O irmão ser raptado o pegou de jeito. — Roberto mesmo puxava a cadeira para a
morena de longos cabelos negros se sentar, assim como prestou a mesma gentileza
ao oriental. Assim que ficaram acomodados, lhe serviam uma dose de vinho tinto
para cada um em longas taças de cristais. Voltou ao seu assento e indagou.

— A visita de vocês já me era esperada. Temos um assunto em comum a tratar. Um


assunto chamado Yuric, correto? — Xiaren balançou a cabeça positivamente.
— Pois bem, sou todo ouvidos. — O mulato de cavanhaque cruzou as mãos,
entrelaçando elas sobre a mesma.

O transporte de Pollux até Hemptom Hights havia sido tranquilo e também foi uma
boa oportunidade para que ele colocasse um pouco a cabeça em ordem, um bom
tempo para que o mesmo descansasse já que parecia bem tenso. O descer da
helinave era recebido pelos soldados de Calidora em um heliponto improvisado
pelos mesmos. Muitas luzes piscando indicavam onde deveria ser feito o pouso. Ali
também estavam caixas de madeira com material a ser usado, armas e veículos
com tração nas quatro rodas. Um destes soldados contratados era Sypher, com
aparência mudada, cabelo pintado de loiro, raspado nas laterais porém com uma
franja ondulada. O óculos metalizado unido com o microfone embutido na escuta da
orelha ajudava a manter a identidade oculta. Ele se aproximava do ex jornalista,
sabendo muito bem quem era, e inclusive se recordando que havia feito parte dos
Steelhearts um ano antes. Não tinha conhecimento se Pollux o reconheceria, todavia
também não ia entrar no assunto.

— Calidora me pediu para recebê-lo enquanto está ocupada e pediu para avisar
sobre os contratempos. Conseguimos contornar o problema nas galerias de esgotos
graças a ideia dela. Tive muita sorte em obter sucesso interrogando um deles que
não teve parte do cérebro danificado. Não foi usada violência na interrogação.
Aquelas pessoas são fantoches, cobaias de uma nova droga virtual. Infelizmente foi
apenas o que consegui. — Sypher puxava dos bolsos frontais do colete militar uma
insígnia, entregando a Pollux o objeto em forma de elipse prateada. Dentro se
encontrava o nome Choi.

— Essa peça estava no equipamento de um deles. Acho que o responsável cometeu


um deslize e deixou sua assinatura em um dos macacões deste pessoal estranho.
Sei bem quem é esse Choi. É Henry Choi, um programador que da noite para o dia
ergueu uma empresa, um verdadeiro império e se aliou a Carmen Telford. O que
pouca gente sabe é que ele é um anti-hacker que os combate com vírus….

Antes que a conversa tivesse conclusão, um alto estrondo se ouviu, seguido de uma
intensa gritaria. Todos se mantiveram a postos e quando um holofote foi
direcionado na direção dos barulhos foi revelado que os moradores do bairro de
Hempton Hights estavam depredando os equipamentos montados. O problema era
que não eram moradores comuns como em qualquer outro ponto da cidade, se
tratava de Hempton Hights, o bairro maldito e renegado. Aquelas pessoas eram
praticamente monstros noturnos, suas aparências eram cadavéricas, desleixadas,
muito horrendas. Como se seus olhos não acreditassem no que viam, aquelas
coisas não eram humanos, e sim bestas. Seres deformados, grotescos, se
locomovendo na escuridão como fantasmas ou algo mais assustador. Não dava
para saber se aquilo era obra de experimento mal sucedido de alguma
megacorporação que foi descartada naquela região. Sendo extremamente e
totalmente hostil e diferente dos pobres drogados dos esgotos, estes não
apresentavam interesse algum em dialogar, se é que sabiam falar. O único intuito era
destruir aquele equipamento e machucar os invasores com suas garras. Sim,
possuíam garras afiadas, isso foi mostrado quando um se lançou em um soldado e
lhe rasgou o pescoço, separando a cabeça do corpo. Esta saiu rolando
desprendendo muito sangue. Como crianças perdidas sem nenhuma instrução
restava aquele pequeno esquadrão descobrir por si mesmo se aquelas coisas eram
de verdade ou algo sobrenatural.

Naquela sala estreita cheia de monitores com um homem ao topo sentado em uma
cadeira estava prestes a acontecer um interessante duelo dentro do cassino
Overdose. Mais do que isso, Gal e Dexter estavam à frente de algo muito maior e
importante, bem mais do que entrar em confronto com alguém. Tratava-se de um
valioso segredo. Felizmente o sujeito se mostrava tão assustado e imponente
quanto a dupla e tentava a todo custo esconder o rosto. Levado pelo medo e incapaz
de usar os infinitos recursos que tinha à sua disposição, no susto a única coisa que
conseguiu pensar foi em fugir e para isso ele executou um salto mesmo naquela
altura. Sua ação impensada lhe custaria caro, torcia o tornozelo direito na queda. Gal
não poderia fazer muita coisa diante aquela crise, para infortúnio da loira o líquido
verde era Radiack, a única forma de manter todo aquele maquinário cibernético
ativo. Aquilo era um tanque com tubos que alimentava os computadores e
monitores do ambiente. Notando que a mulher ficava enfraquecida, em um surto de
coragem o franzino homem aplicava um soco no queixo dela. Não era um murro
forte, mas levando em consideração que aquilo tirava todas as forças da loira, a
levaria ao chão no mínimo. Tudo mudou quando ele viu Dexter, percebendo que o
líquido verde não tinha efeito nele, o agressor de Gal se acovardou dando passos
para trás, procurando as sombras para ocultar sua face. Da mesma maneira que
fazia tudo em silêncio, se esquivava de um confronto direto. O motivo pelo qual o
homem tinha receio de manter longe dos olhos do garoto seu rosto era
desconhecido, custava a Dexter descobrir.

Considerações.

1- Galathea mergulhará no mundo da máfia e explorará as intricadas relações entre


a Cosa Nostra, Ryulong e as gangues latinas do Rio Bravo. A possibilidade de
divisões territoriais em caso de derrota de Yuric também será explorada. Galathea
ainda não tem conhecimento das ações de Jesse, e Xiaren não tem conhecimento
do ataque ao seu restaurante. Um plano envolvendo as três máfias para derrubar o
russo pode ser discutido, se considerado necessário.
2- X-9 enfrentará uma escolha difícil entre se render para salvar seu amigo Drone ou
salvar a si mesma. Dependendo do caminho que ela escolher, ela pode descobrir
algo significativo.

3- Rodrigo receberá uma proposta em troca de informações sobre Crazy Dog. Ele
deve decidir se aceita ou recusa.

4- Pollux, armado com as informações fornecidas por Sypher e sabendo que X-9
teve um confronto com Henry há um ano, deve decidir se compartilha as
informações sobre Choi e os bonecos usados como cobaias. No entanto, antes de
qualquer coisa, Pollux precisa resolver o problema dos bizarros moradores de
Hamptom Heights, que estão destruindo seu equipamento e atacando os soldados.
É importante notar que essas "criaturas" não se comunicam nem possuem
racionalidade. (Calidora pode estar envolvida em encontrar uma solução para esse
problema.)

5- Max confrontará a gangue que está vandalizando sua oficina. Para derrotar cada
um dos três membros, ele precisa tirar um número 11 ou maior no dado (seja
matando-os ou não). Eliminar dois deles fornecerá informações importantes do
terceiro membro, sem a necessidade de outro lançamento de dados. Essas
informações podem ser compartilhadas com outros jogadores em rodadas
subsequentes.

6- Gal está incapacitada devido à radiação e ao soco que recebeu (então não há
necessidade de postar para ela nesta rodada; será assumido que ela está
inconsciente). Agora, cabe a Dexter lidar com a situação. No entanto, mais
importante do que se envolver em combate físico é descobrir a identidade da
pessoa que está se escondendo atrás da máscara. Se Dexter tirar um 13 ou mais no
dado, ele obterá a informação mais crucial do jogo.

7- As mesmas recomendações da rodada anterior se aplicam a Toshio.

8- Por enquanto, a narração de Gini foi assumida, pois o jogador está passando por
uma mudança fora do jogo. Gini permanecerá um NPC sem impacto significativo.

Observação: Todas as escolhas feitas, seja usando o dado ou não, terão


consequências significativas para os jogadores a partir de agora. A ideia de causa e
efeito estará em jogo.
PS: Quem desvendar o enigma por trás da interconexão das informações dos
jogadores terá vantagens na rodada final contra o chefe. A solução do enigma deve
ser deixada em minhas mensagens (Praxis).

Gabriela vulgo Rodrigo


"Perdi o rumo da minha vida". Muitas vezes isso é dito da boca pra fora, mas agora
fazia completo sentido pra mim. Não que fossem as mil maravilhas viver escondido
durante todos aqueles anos fingindo ser mulher para trabalhar na Vênus, até ser
"descoberto" por aquele desgraçado. Mas ainda assim era melhor, menos arriscado,
menos insalubre... Do que a situação em que estava agora. Coagido a trabalhar para
o Pascoal, meu principal dever era descobrir o que tinha acontecido com o irmão
dele, Crazy Dog, raptado. Honestamente, depois de tanto tempo, acho que já
apagaram o cara. Quer dizer, não sei como as coisas estão lá fora, mas ou já o
usaram como moeda de troca ou já mataram, com certeza. E se ele foi resgatado,
com certeza aquele desgraçado do Pascoal deve ter me abandonado aqui pra
morrer nas mãos dos russos.

Ou melhor, ser escravizado. Essa desgraça de mutação servia para alguma coisa,
afinal. E como as antigas senzalas, eu estava preso em uma versão ainda pior. O
cheiro era terrível, mas eu acabei me acostumando. Baratas e demais animais
peçonhentos me rodeavam. Nas primeiras horas, eu tinha ficado apavorado. Mas
agora... Era quase um alento ter a companhia desses bichos. Encolhido num canto,
sentado no chão, abraçava os joelhos contra o meu corpo quando ouvia passos.
Devia ser algum capanga para trazer aquele lixo que chamam de refeição. Mas não
era um capanga qualquer... Era o maldito que tinha ficado incumbido de "cuidar" de
mim. Reconheci pela voz nojenta dele. Ele insistia com o papo da cunhada... Eu
quase o xinguei. Mas vi ali uma oportunidade de escapar.

— Mas é claro, docinho. Mas se você me mostrar uma foto, fica mais fácil de eu
lembrar... — Disse com a voz mansa, já quase feminina, modificando as cordas
vocais, desejando internamente a morte dele. Levantei-me fingindo que estava
ótimo. Passei a acompanhá-lo pelo lugar. A água do esgoto era verde. Claro, estava
podre, mas era diferente... Até o fedor era diferente. Quase metalizado. Enfim,
continuei caminhando pelas galerias até chegarmos em um curto túnel, o qual
percorremos.

Quando atravessamos a porta metálica que separava o túnel escuro, deparei-me


com um corredor em ótimo estado. Parecia um ambiente completamente diferente
do que eu estava. Observando o tipo de papel de parede, a iluminação neon... O
lugar até lembrava um pouco o interior da Vênus. Será que eles me colocariam para
trabalhar de novo? Eu poderia me acostumar facilmente ao luxo de antes... Sem
muita demora, chegamos a um elevador e, depois de subirmos, fomos para o quarto
mencionado pelo cara. Ele abriu a porta e eu entrei, seguido por ele.

O tal quarto realmente tinha tudo o que ele falava. O porco logo começava a se
despir. — Você é bem apressadinho... Me mostra aí, como é ela, de novo. — Sem
demora, ele pegou um aparelho e o holograma reproduziu como seria a sua
cunhada. Sorri de canto, e logo meu corpo passou a assumir aquelas formas
femininas. Ela parecia ser descendente de latinos, minha especialidade. Pele
morena, cabelos negros e longos, e corpo avantajado. Realcei esses detalhes, já que
parecia que o tipinho iria gostar. Até que ele não era tão ruim assim. Já tive que
fazer com homens piores. Em questão de instantes, ele vai para cima de mim, voraz,
me beijando e acariciando. Ou melhor, beijando e acariciando a cunhada. [...]

Depois do ato feito, e de nos limparmos, ficamos um tempo ali no quarto. Ainda
restaria uma hora das duas em que ele mencionara. O capanga estava curvado
sobre a mesa, cheirando pó de neon. Ofereceu-me, mas sorrindo, neguei. Meu corpo
podia ser imune a doenças virais, mas não me defenderia do vício em drogas ou até
de uma overdose. — Mas então, me diga... Eu cumpri a minha parte do acordo. E
bem, não é? — Ele acenava positivamente, me encarando um pouco alterado por
causa do pó de neon. Levantei da poltrona em que estava, ainda na forma feminina e
nua. Peguei a garrafa de champanhe e passei a bebericar do gargalo, mesmo. — Que
fim levou o Crazy Dog, bebê?

Ele gargalhou e ainda sem olhar pra mim enquanto cheirava mais uma carreira de pó
de neon, me respondendo. — Deixa de ser burra, bichinha. Te meteram numa
roubada. — Sorri, fingindo beber mais do líquido, enquanto na verdade meu sangue
fervia. — Ah, mas disso eu não tenho dúvida... Mataram o coitado? Até que ele era
bem apessoado... — Ele acenou negativamente, mas sorrindo. — Mataram? O cara tá
vivinho da silva, porra. Sempre esteve. E muito bem. Ele teve esse tempo todo com
os russos... — Quase engasguei com a bebida, mas me controlei. Tinha que me
manter impassível, como se não ligasse mais para aquilo. Afinal, agora eu era o
brinquedinho russo.

— Mas que filho da puta... — Ri, fingido. O que foi acompanhado pelo outro. Ele
terminava a última carreira, ainda curvado, quase se levantando. — Então, acho que
ainda temos tempo pra umazinha... — Ah, temos, sim... — Num ato rápido, e
tentando me aproveitar do possível estado em que o meu amante estaria, quebrei a
garrafa de champanhe na mesa e, com a parte do gargalo em mãos, quebrada e
com pontas cortantes, visei enfiar na região da garganta dele. Se meu ataque fosse
bem-sucedido, provavelmente o levaria a óbito, e eu tentaria escapar dali.
Uma missão mais do que suicida. Sem fundamento algum. Pascoal foi enganado
desde o começo, e talvez realmente gostasse do irmão, e por isso possivelmente
estivesse sem esperança. Coyote morreu por nada. E agora esse capanga, também,
se eu tivesse sorte, morreria por nada. Pelo menos os últimos instantes dele vivo
teriam sido felizes, pois eu caprichei para o maldito. Eu constataria por breves
segundos o corpo estirado no chão, tomando ciência do assassino que eu tinha me
tornado. Primeiro o Alek, e agora, se obtivesse sucesso, essezinho que eu sequer
sabia o nome.

O barulho da garrafa quebrando talvez despertasse a atenção de possíveis outros


capangas, se eles estivessem ali fora ou nas proximidades daquele quarto. Eu então
assumi a forma do homem que teria matado e sairia do cômodo, despistando,
fingindo que seria um acidente e para mandarem algum robô limpar o cômodo. Ato
contínuo, percorreria o local, tentando descobrir o que ele era. E mais do que isso,
fugir dali e repassar a informação ao Pascoal. No processo, eu assumiria formas
diferentes, tentando despistar os capangas...

Galathea
Não pode negar que se irritou em ter armas apontadas contra ela naquela situação,
mas por outro lado sabia que aquelas pessoas só estavam fazendo seu trabalho. O
que era de se esperar já que as coisas só iam de mal a pior.

O que ela não esperava era a cordialidade e hospitalidade com que foram recebidos
por Roberto. Ela nem sequer o conhecia, apenas ouviu Xiaren lhe assoprar o nome
quando ela o olhou confusa para o mesmo.

Sentou-se cruzando as pernas e segurando a taça entre os dedos


despreocupadamente. O olhar sério e severo estava diretamente sobre os visores do
latino. Meneou levemente a cabeça quando o mesmo disse que iria ouvi-los.

— O tempo é curto e eu serei breve. Sabe porque estamos aqui, então qual é a sua
resposta? — Seu rosto não se moveu, sua voz era tão inflexível quanto ferro. Suas
pupilas dilataram ao fim da frase, mas ainda assim manteve seu olhar.

Pollux
A operação já estava no meio do caminho quando eu cheguei. Bom, eu pensei, tudo
estava indo bem melhor do que eu imaginava. Quando a helinave pousou alguns dos
cientistas me receberam junto com um cara que eu não reconheci na hora, mas
depois meu implante começou a ler as suas expressões faciais e não demorou até
me mostrar sua identidade. Já tínhamos nos encontrado antes, afinal.

— Bom trabalho, cara, muito bom trabalho! Bom te ver de novo também, ainda mais
do nosso lado! — Bom, pelo menos uma pessoa estava de fato interessada em parar
aquela guerra ao invés de se unir a ela. Bati no seu ombro e fui conduzido para longe
da área de pouso, enquanto nós conversávamos em voz alta. — Essa peça estava no
equipamento de um deles. Acho que o responsável cometeu um deslize e deixou
sua assinatura em um dos macacões deste pessoal estranho. Sei bem quem é esse
Choi. É Henry Choi, um programador que da noite para o dia ergueu uma empresa,
um verdadeiro império e se aliou a Carmen Telford. O que pouca gente sabe é que
ele é um anti-hacker que os combate com vírus….

— Então pera aí, ele tá do nosso lado ou não? Ou é um agente duplo, ou é tão
desonesto quanto Telford e só está tentando tomar o lugar dela. — Parei com os
passos de súbito e bati com as costas da mão no peito de Sypher, fazendo-o parar
enquanto eu lembrava de algo importante. — Espera um minuto, aquela hacker de
cabelo azul, eu lembro que ela teve um confronto com esse tal de Choi. Não tinha
jeito na época de um dos dois saírem vivos de um encontro assim, então eles... tem
algo a ver com isso?

A insígnia dele estava nas minhas mãos, mas nem tive tempo para obter a resposta
que queria. Eu e Sypher nos abaixamos enquanto uma multidão parecia querer virar
alguns carros nossos, que só depois de tombar num, conseguimos ver que eram de
fato pessoas, se é que ainda podiam ser chamadas assim depois de tudo que a
droga fez com eles. Houve outro estrondo quase em seguida e uma nuvem de
fumaça se ergueu com alguns brilhos de tiros, acertando aqueles que ameaçavam o
maquinário essencial.

— Abram fogo, merda eles são muitos! — Alguns tiros ricocheteavam perigosamente
nos próprios equipamentos, o que tornava defender-se muito mais arriscado é uma
tarefa muito mais minuciosa.

— Que diabos é isso? Eles nem são mais gente! Precisamos fazer alguma coisa.

O jeito com que Sypher disse aquilo me deu uma ideia que poderia salvar a todos
nós. Bati de novo em seu ombro e gesticulei para que me seguisse, driblando os
molotovs arremessados que colocavam aquela área de pouso em perigo, com as
chamas se espalhando rapidamente pelos veículos blindados. Alguns dos carros
eram de fabricação militar mas todas as suas armas haviam sido removidas e
substituídas por suporte de campo, como radares ou emissores de som, e era por
isso que precisávamos tanto deles, mas tudo de natureza balística tinha sido
confiscado por Telford antes de dispensar os seus contratos científicos, nos
deixando só com o necessário mas infelizmente, sem muita defesa. — Sypher,
coloque os tampões de ouvido e me ajude a operar isso! Ligue na frequência padrão
e vá baixando até não sermos mais afetados, vamos dar um jeito neles! — Entrei em
um carro largo com uma grande antena que saía de sua parte superior do teto,
podendo girar feito um observador. Escalei a sua caçamba enquanto Sypher entrava
na cabine e o operava, virei a antena para a direção de onde os ataques vinham e o
cara do óculos verde fez seu trabalho ligando o aparelho e procurando um sinal.
Normalmente o emissor emitiria pulsos baixos demais para serem ouvidos, mas na
frequência certa produziu um zunido tão forte que todos perto dele se abaixaram e
cobriram os ouvidos. — Reduz a frequência agora cara, reduz até eles caírem! —
Nossos soldados haviam caído no chão e também não podiam lutar, o cenário agora
era de várias pessoas deitadas tentando cobrir os ouvidos, e outros daqueles seres
que já não eram humanos de joelhos, quase conseguindo resistir a carga sonora.
Conforme Sypher foi modificando a frequência do emissor de ondas, quase senti o
meu ouvido sangrando como o de vários mais próximos da antena. Achei que estava
ficando surdo por um momento quando o ruído agudo foi diminuindo e deu espaço a
uma confusão pela ausência de barulho ao redor, mas quando pude erguer a cabeça
vi que apenas os viciados que sofreram mutações continuaram no chão, e Sypher
estava atrás de mim no caminhão tirando os tampões de ouvido para falar comigo.

— Maravilha, a droga teve efeitos cerebrais nas cobaias, já quase nem são mais
humanos, então respondem a outras frequências que as nossas. Está todo mundo
bem? — Nós começamos a escutar tiros, os soldados estavam acabando com os
agressores que estavam resistindo mais fortemente a frequência, o que não causou
muita confusão nos minutos seguintes. O resto permanecia deitado, debatendo-se
ou quase desmaiando. Uma das pessoas do nosso time que vi erguer-se foi uma de
cabelos vivos e jaleco, e soube exatamente quem era. Desci do carro, enquanto
Sypher me seguia e deixava o caminhão blindado com outros engenheiros, abracei
Calidora com força e soltei-a quando soube que estava em segurança.

— A gente ainda não conseguiu. Falta pouco, mas o mais importante. Precisamos
deixar o sinal online de uma vez por todas. Calidora botou as mãos na cintura e
esperou que eu dissesse algo.

— Isso que a gente viu agora é a experiência do Choi? Quem são aquelas pessoas
com você? Tinha gente sendo escoltada que certamente não pertencia ao grupo de
Calidora, com certeza subnutridos e que mais pareciam com mendigos.

— São habitantes dos esgotos de HH, nós achamos que são os drogados que
fugiram da experiência com as drogas virtuais, ou podem só ter sido azarados
mesmo. De qualquer jeito oferecemos ajuda. Agora no nosso plano. — Deixou por
sua vez que Calidora terminasse de explicar o que queria.

— Isso. Vou deixar os engenheiros lidarem com essas 'coisas' que encontramos da
melhor forma possível, mas não temos instrumentos médicos, vamos matar todos
se ficar perigoso demais. O bom é que gravamos tudo, de vários pontos de vista. —
Calidora deu um sorriso genioso e apontou para a têmpora e os olhos. — Mas temos
muito acontecendo agora. Tivemos notícia do parceiro do Montana, o Caz,
executando alguns mendigos. Estamos tentando limpar a imagem e conseguimos
detectar que ele estava sendo ameaçado de morte. Assim que tivermos algum sinal,
vamos exibir o vídeo real em todas as telas da cidade.

— O cara era bom, não merecia isso. Sypher, você consegue colocar um worm no
sistema de transmissão por satélite dela, se a gente sequestrar um dos seus
dirigíveis? Que nem quando ela hackeou os nossos olhos daquela vez? — O moleque
sacudiu a cabeça, tinha talento e me disse sim, era bem isso que eu esperava. Era a
segunda vez que a gente resolvia uma situação juntos contando com alto barulho de
algo também, como quando tivemos aquele confronto nos esgotos perto do
esconderijo dos Steelhearts. Era bom ter alguém familiar de novo do mesmo lado
que eu.

— Só vai dar certo uma vez, mas vai ser o suficiente. Depois disso, usamos os
satélites dela para ter acesso a toda informação de domínio público e fazer o
upgrade do implante de vocês. — Se o sistema dos implantes meus e de Calidora
estivessem integrados ao sistema de info que a Telford tem, seríamos tão
poderosos quanto ela queria que fôssemos, capazes de reconhecer qualquer um
naquela cidade, qualquer informação, qualquer segredo. E ainda poder espalhar
todos os segredos dela bem debaixo do seu nariz.

— Tem mais uma coisa, eu já fiz uma reportagem aqui no passado, Carmen me
mandou calar a boca pois descobri que funcionava uma espécie de tráfico de armas
experimentais, entrando e saindo pelo lixão através dos túneis e airdrops. Por isso
escolhi essa área, temos uma antena e uma ótima recepção. Mas também encontrei
um radar enquanto vínhamos para cá. Minha equipe descobriu que tem algo vindo
pelo mar. Não sabemos o que é. — Cruzou os braços e olhou para mim de novo,
claramente nervosa.

— Então vamos nos separar. Calidora, você pode checar o que é que está se
aproximando, mas de longe e em segurança. Seja lá o que for, não estamos prontos
pra lidar com isso. Use o seu implante e tente determinar algo. Sypher, o que restou
dos Steelhearts está vindo pra cá por aquele mesmo caminho que fizemos ao fugir,
quero que os encontre e que os proteja. Eu vou atrás do dirigível, e da minha
vingança. — Todo mundo me deu pelo menos um aceno de cabeça que concordava
com o plano, mas estávamos decidindo tudo em partes iguais. Apesar da minha
decisão, a parceria com a Calidora me permitia ter duas mentes pensando como
uma, e realmente esperava que Sypher ficasse com a gente se tudo desse certo,
poderíamos aumentar em número e deixar nossa marca em Miraitropolis. Podíamos
não ser os mais fortes ou termos uma gangue, mas não precisávamos de nada
disso.

Quando eu voltei para Miraitroid, a helinave de Calidora estava me esperando no


exato local combinado. Ficava lá no topo de uma delegacia abandonada, onde
alguns prédios haviam crescido ao redor e escondido o local como parte de um
beco, um lugar perfeito para esconder algo daquele tamanho, mas meio difícil de
retirar. Ela havia dito que o piloto automático faria o resto por mim, mas já fazia
tempo que Calidora havia pilotado uma nave como repórter de Mirai enquanto eu
dava as notícias, então isso não me deixou menos nervoso. Assim que eu entrei a
nave começou a acender os painéis, não tinha laterais ou portas na parte traseira
onde eu seria transportado e imaginei que fosse por causa das armas
desacopladas, mas não foi nenhum problema, o voo foi cuidadoso e quase nem
senti o veículo sacudir na sua subida. Uma grande quantidade de vapor se erguia ao
meu redor quando ela começou a subir, deixando um rastro que logo sumiu atrás da
sua decolagem, logo eu estava me erguendo entre as luzes dos arranha-céus, de pé
enquanto me segurava na borda da aeronave e olhava para fora, cada segundo mais
longe de todo aquele olho do furacão.

— Essa vista é mesmo linda. Dá nem vontade de descer mais. — Se eu sabia que
estava lutando contra um gigante naquela guerra, claro que sabia, principalmente
quando era comparado a tanta gangue que havia sido puxada pro meio dela, mas
ninguém luta tanto por algo quanto alguém que luta por aquilo que ama, e de Mirai
eu entendia. Conhecia aquela cidade como a palma da mão e era esperto o
suficiente para ninguém me conhecer, eu já havia provado do bom e do melhor que a
ganância podia me oferecer trabalhando pra Carmen, e se uma coisa que Timothy
havia me ensinado era que eu também continuava sendo um homem sem nada a
perder. Se a cidade precisasse de um protetor ou um mártir, seria eu. Mas de repente
o meu comunicador apitou, e eu vi que era uma transmissão de Calidora. Já estava
superando em altitude os prédios ao meu redor, e mais acima o vento começava a
soprar frio.

— O que você disse? Enfim, a transmissão pode começar a ficar fraca agora. Tenta
fazer o que eu te digo, vou acessar os seus olhos para te dizer como hackear a
transmissão, e o Sypher intercepta do lado dele. Tome cuidado. — Dava pra ouvir
agora as turbinas do dirigível de transmissão ao meu lado, com a helinave
emparelhando o voo com aquela coisa de tamanho verdadeiramente monstruoso.
Ao redor dela deveria haver algum campo de defesa, pois os sistemas da minha
nave começaram a piscar indicando alguma anomalia, talvez um campo magnético.
— Aí vai nada outra vez. Esperei atingir o máximo do que ainda podia com o voo
sendo automático, antes de começar a perder alguns metros. Naquele momento eu
agarrei a mochila que havia sido guardada para mim no interior do veículo,
desdobrando um arco retrátil com uma flecha sem ponta, mas sim com um imã que
dispensava faíscas azuis, perfeita para minha passagem para o outro lado. Deixei no
nível do meu rosto, mirei e atirei, e não só a flecha atingiu a lateral do dirigível mas
como também deixou por seu caminho uma corda luminosa bem esticada, que usei
junto do arco para me levar até a sua cabine de tripulação, através da tirolesa
improvisada e abordando o zepelim em pleno voo. Usei o mesmo arco para deter os
tripulantes da nave, sem que eles fossem alertados da minha presença. Atirei com a
flecha elétrica nas costas de um engenheiro que estava do outro lado do
compartimento onde entrei, e fiz o mesmo com seu amigo que respondia a certos
comandos em um monitor, garantindo que as coordenadas fossem sempre
atualizadas. Como a maior parte do resto do funcionamento era mecanizada eu não
tive dificuldades em infiltrar o dirigível, apenas me preocupando em não causar
alarde e manter-me anônimo, mas isso não ia acontecer por muito tempo. Chutei
para fora um dos corpos, sem medo de matá-los visto que parte do equipamento
trazia uma mochila que regulava a altura atual e desacelerar seu usuário quando
perto demais do chão, feito uma jetpack de emergência. O segundo não possuía o
equipamento, e eu não estava a fim de cometer assassinato a sangue frio. Eu sabia
o que significava tirar a minha própria mochila e colocar na cara, mas eu fiz mesmo
assim.

— Calidora, Sypher, é agora. Ainda estão aí? Vou sintonizar a frequência e vocês a
hackeam. Três, dois... — A primeira parte não foi difícil, terminou tão rápido quanto a
minha contagem. Mas depois, dei acesso a Calidora para ver através de meus olhos
e eles tiveram o característico brilho vermelho que os implantes dela também
tinham. Ela se comunicava comigo, interagindo com o painel através de mim e o
hack não tardou a ser completado. Quando aconteceu, foi uma das melhores
sensações que tive na vida.

Era como se informação pura fluísse através de mim. Quando conectamos a


transmissão dos dirigíveis ao nosso servidor não só tivemos acesso a quase
qualquer informação pública mas também ficamos capazes de piratear nossa
própria transmissão, sem que Carmen pudesse nos derrubar sem derrubar a si
mesma. Minha vista embaçou por um longo momento, e quando voltou eu
conseguia ver tudo. Cada formiguinha lá embaixo com um nome, com uma
informação, com um endereço. Cada painel na minha frente tinha circuitos a mostra,
senhas, como um perfeito raio x de segredos.
— Puta merda, conseguimos! — Comemoramos juntos, o mesmo upgrade valendo
para nós dois, agora em potência total. — Sypher, Sypher! Acessa agora a frequência
que vou te passar e tenta limpar a barra do amigo do Montana, solta o vídeo dele.
Precisamos dele e do público do nosso lado. Eu vou atrás de uma fonte minha. —
Era incrível ter uma arma nas mãos, mas potencialmente ter acesso aos segredos
de qualquer pessoa me deixava extasiado, e muito mais perto do poder. Tudo
finalmente estava indo conforme os planos, e faltavam poucos passos agora. Tentei
localizar X-9 como um teste para ver até onde as informações que agora tinha iam, e
mesmo assim não foi fácil. Mas consegui acessar o comunicador em seu pulso para
uma mensagem como antes havia feito, embora com um alcance muito mais fácil
do que a vez com Galathea.

— Xis, dá um sorriso pra câmera. Olha pra cima e dá um tchau. — Falei tirando um
sarro, não resisti e logo fui direto ao ponto. — Eu consegui algo. Vou passar umas
imagens para o seu comunicador, foi de quando cheguei a HH. — Enquanto eu
falava, transmiti o que eu e Calidora havíamos combatido para que ela tivesse uma
ideia do quão sério era aquilo. — Essas coisas que nos atacaram tem uma
assinatura digital no organismo deles que vem do Henry Choi. Pelo visto sabotaram
algum tipo de droga e isso causou essa mutação, que veio da empresa dele. Você se
encontrou com esse cara um tempo atrás, quando a gente ainda trabalhava juntos.
Então qual é a dele? Pelo visto, se ele tentar derrubar a Carmen, isso não o torna
bonzinho, mas sim quase pior. — Parei de falar por um segundo e depois minha voz
se tornou mais séria. — Vou apagar do sistema qualquer ligação sua com ele, mas
preciso saber se você sabia disso, pra mostrar para o povo e poder impedi-lo. Confio
em você. — Poucas pessoas sentiram a vontade de dizer aquilo, mas o pouco
contato com a hacker não era maior do que a minha intuição de que apesar de tudo,
ela era alguém em quem eu podia contar como uma fonte, e como uma aliada. Mas
ela precisava rever as pessoas com quem andava urgentemente. Porque Henry
Choi?

— Calidora, agora somos eu e você. — Parei de falar por um segundo e depois minha
voz se tornou mais séria. Sentei na cabine de direção, colocando coordenadas
manuais que eu acessava através do mapa da cidade, no mostrador do radar do
dirigível. Pensei por um momento, e tive certeza do que faria, por mais que aquilo
me colocasse de volta ao meu primeiro dia de criminoso. — Prepare-se para acionar
o alarme de incêndio da ChoiTech, se ele for mesmo um canalha. Vou fazer um
'pouso forçado'.

X9
— Tá certo… Eu me entrego… — Disse com uma navalha na garganta. Mas o cara
tava em transe admirando minha jugular pulsando.
— Você ouviu? Eu disse que me entrego! Me leva de volta ao Overdose! — Precisei
gritar com o Carniceiro pra ele entender, o desgraçado queria muito cortar meu
pescoço.

Darkness não disse nada; algo parecia tê-lo interrompido naquele momento, e seu
link se desfez. Nem eu, nem o cara da navalha entendemos o que aconteceu. Nada
passava pela minha cabeça sobre o que poderia ser mais importante para ele, já que
ele parecia ser competitivo e obstinado em provar que era um hacker superior.
Precisei segurar minha onda, ou iria estragar tudo. Aproveitei aquele rápido
momento de distração para desencadear uma descarga elétrica vinda da manopla
que estava com defeito por causa do Darkness. O raio azul saindo do pulso circulou
meu corpo e o do Carniceiro, e num baque tão veloz que não deu para ver quando
fomos separados, voamos para lados opostos. É verdade que eu também levei um
tremendo choque e sofri com a eletricidade, mas sabendo que lidaria melhor do que
ele por possuir uma fisiologia de replicata de combate, mais forte e mais resistente
do que a de um ser humano, não perdi tempo vendo se tinha quebrado algum osso.
Eu sabia que não tinha e logo saltei em cima do crápula que estava grogue, caído
com a cabeça sangrando na parede. Comecei a socar o rosto com as duas mãos
fechadas, tanto, mas tanto, que nem a mãe ia reconhecê-lo depois.

— Darkness deve ter uma base de operação, você vai me levar até ele! — Com a boca
cheia de cortes e sangue, ele consentiu com a cabeça. Acho que isso era pra
lembrar que eu podia cessar o espancamento. Continuei batendo.

— Ah não, não mesmo, quero ainda descontar minha raiva! — Ele levou as mãos à
frente do rosto, tentando se proteger, o que não adiantou nada, perdeu os dentes
mesmo assim.

— Ótimo! Acho que já está bom! Tem que sobrar um pouco de você ainda. — Limpei
o sangue das mãos na minha camisa, levantando.

— Para sua sorte espero que Drone esteja bem. — Ele não conseguia falar com a
boca inchada e apenas afirmava positivamente com a cabeça.

— Que bom, ou seria seu fim! — Peguei a navalha no chão e levei até a frente do seu
rosto e passei o fio no cabelo, arrancando o moicano dele. Puxando pelos braços, os
prendi com força, levando-o para fora do Meia Noite. Vladimir viu de dentro da van e
foi até mim.

— O que está acontecendo? Quem é esse?


— É um filho da puta que trabalha pra Darkness, tentou me pegar de tocaia dentro do
Meia Noite, mas algo deu errado e ele se fodeu… — Expliquei, apertando com força
os braços do Carniceiro.

— Seu braço… Você está perdendo muito sangue… — Realmente gotejava criando
uma pequena poça na calçada.

— Depois cuido disso, ele sabe onde o Darkness se esconde. Coloca ele dentro do
furgão, vou seguir vocês de moto. Ela ficou aqui em algum lugar. — Enquanto eu
procurava a moto, Vladimir algemava Carniceiro, foi quando ele falou:

— Darkness sabe que você ainda tem uma última amiga… Eu ia fazer o serviço… —
Ele tinha adquirido uma fratura no septo, perdido a maioria dos dentes, cortes em
todo rosto, dois olhos tão inchados pelos hematomas que tinham se fechado e
ainda assim sorria de alguma forma.

— Max! — Arregalei os olhos, assustada. E então voltei para Vladimir que o segurava.
— Preciso salvar uma amiga. — Dei dois passos me afastando, mas logo parei,
ponderando.

— Não… Darkness está conseguindo me rastrear e encontrar as pessoas mais


próximas de mim por causa do meu aparelho… Se eu for até Max vou acabar
entregando-a de bandeja… Na tentativa de protegê-la… Acabei trazendo ela para
dentro do furacão… — Vladimir não sabia muito bem do que eu falava, mas acabava
me abraçando.

— Além de Drone foi a única amiga que me restou… Os outros estão mortos, e tudo
por minha causa… — Também o abracei.

— Fique calma, se culpar não vai resolver nada. — Não ia mesmo. Ele limpava
minhas lágrimas.

Me doía admitir, Max estava mais segura longe de mim. Era irônico saber que
precisaria me afastar dela para que tudo desse certo. Nesse caso, meu rumo agora
era o covil de Darkness.

— Esse merdinha sabe onde o Darkness se esconde. Vamos até ele…

Vladimir jogou o Carniceiro no fundo da van, junto com o dirigível, enquanto recebia
as coordenadas de onde ir. Eu os segui com a moto roubada do Red, que havia
ficado estacionada na frente do Meia Noite quando toda a confusão do tiroteio
aconteceu. A fina garoa retornava em Miraitroide, e o trânsito não ajudava em nada,
tudo estava uma confusão. Marchas, protestos, fogo pelas ruas e brigas. Com o
calor, as pessoas quebravam hidrantes nas ruas para se refrescar. Vi alguns robôs
da ParaMilitech patrulhando as avenidas, mas eles não se metiam na confusão,
apenas os policiais humanos, com pouca proteção, e isso era o que tinha de mais
estranho. Tudo estava de pernas para o ar e eu já não entendia mais nada. Com as
coordenadas, paramos em frente a uma casa de arcades chamada Arcadia... Que
trocadilho inteligente...

Contudo, era óbvio que aquela fachada só existia para esconder o segredo de
Darkness, já que era nítido que aquele fliperama velho nunca estava aberto, apesar
de podermos ver as máquinas ligadas do lado de dentro. Eu estava tão impaciente
que queria chegar metendo o pé na porta, mas Vladimir, sendo um agente secreto,
impediu e usou uma ferramenta para abrir a entrada de forma furtiva. Eu estava
nervosa, com medo de fazer alguma besteira devido à minha apreensão, então
deixei Vladimir ir na frente para vasculhar o lugar. Mesmo assim, mantive a desert
eagle em minhas mãos, pronta para qualquer emergência. O velho voltou,
gesticulando para que eu fosse ver algo, e eu o segui. Nos fundos da loja,
deparei-me com uma das coisas mais estranhas da minha vida. As paredes estavam
forradas com um plástico branco, quase transparente, e no centro havia um palco
em formato oval. Muitas pessoas seminuas estavam conectadas por fios e cabos
pretos que pendiam do teto. Vladimir e eu subimos na plataforma, observando
aquilo mais de perto. Ele não entendia a razão daquilo, enquanto eu começava a
compreender.

— Essa é a central que ele usa… Faz sentido não conseguirmos rastrear o Darkness,
ele está usando essas pessoas… Digo, a mente delas como servidores… Se em
algum momento ele for hackeado ou rastreado, vamos cair na mente de um desses
pobres coitados. Ele é esperto, nunca se expõe... — Levei a mão ensanguentada ao
queixo.

— Então como vamos saber quem ele é?

— Não vamos, tenho uma suspeita… — Minha pulseira comunicadora começou a


tocar, era Pollux. Recebi a chamada com um certo atraso, sabendo que nossa
conversa seria fragmentada. Ele falava tudo o que tinha a dizer primeiro, e eu
responderia em seguida. Teria que esperar um pouco mais para receber sua
resposta. Caminhei para fora da casa de arcades, tentando avistá-lo apesar das
gotas de chuva que escorriam pelo meu rosto. O que vi foi um dirigível sobrevoando
os prédios de Miraitroide na escuridão do céu noturno. Aquela aeronave era da
Carmen Telford, mas como Pollux havia conseguido isso? No entanto, ele continuou
falando sem dar tempo para perguntas, confirmando minhas suspeitas sobre
Darkness e Choi. Abri um segundo link para ver as imagens do que ele havia
encontrado em Hampton Hights.

— Encontrei aqui em Miraitroide algo parecido, veja. — Também enviei imagens dos
caras acoplados com cabos atrás da cabeça.

— Choi e Darkness são a mesma pessoa. — Engoli em seco, talvez fosse um choque
para Pollux. Vladimir me encarou seriamente.

— Como eu descobri? Confirmei depois em dois aspectos, com as imagens que


enviou, sendo praticamente a mesma coisa do que encontrei no covil do Darkness. E
também por que essas pessoas com fios são replicatas criadas apenas para serem
servidores biológicos de Darkness… Choi disse que faria isso, um ano atrás quando
nos encontramos na Lexis pela primeira vez. Não resta dúvidas… Só podia se tratar
do mesmo pedaço de merda… — Parei por um segundo e respondi a pergunta feita
sobre qual era a intenção de Darkness… Melhor dizendo, Choi.

— Choi é um tremendo duas caras, e isso vai muito além da guerra de gangues!
Nesse mesmo encontro um ano atrás disse que ia fazer algo que lucraria muito,
colocar Mirai e a Rússia em pé de guerra. Não tinha entendido como ia executar o
plano, mas agora tudo se encaixa. Um contato meu de dentro da ParaMilitech disse
que Henry tá do lado de Yuric, ele é um cavalo de Troia mandando pelos russos,
dessa união com a Carmen, vai conseguir que a empresa de softwares dele tenha
acesso aos sistemas de segurança do Serviço Secreto. O objetivo dele, eu sei, é
baixar as defesas da cidade sem parecer que fez isso. Só me resta saber o que ele
ganha com essa guerra se tudo iria pra o inferno, até ele mesmo. — A ideia me
assustava muito.

— Ok, apague todo e qualquer registro desse encontro, por favor. Me diz duas
coisas: o que você vai fazer agora? E a Max, como está? — Bom, eu ia ter que
esperar o delay até que me respondesse. Entrei novamente na casa de arcades,
como era um dos covis de Darkness, eu tinha o que precisava para remover o
programa da minha manopla.

— Vamos lá, Vlad, hora de trabalhar um pouco. — Infelizmente, não havia nada que
pudéssemos fazer pelos pobres coitados conectados aos fios no centro daquela
sala. Suas mentes estavam vazias, seus corpos, meras cascas. Decidimos
desplugar todos eles, privando Darkness de seus servidores humanos. No entanto,
eu tinha certeza de que isso não o deteria. Aquele bastardo sempre tinha um plano
alternativo na manga. Enquanto o avô vasculhava cada canto em busca de
suprimentos e primeiros socorros, eu me dediquei a procurar qualquer pista que
Choi pudesse ter deixado para trás, algo que me levasse ao programa malicioso que
infectou minha manopla. Mas não encontrei nada. A falha com Pollux deve ter sido o
único erro que ele cometeu. A alternativa arriscada estava se mostrando arriscada
demais, mas decidi arriscar. Subi ao palco circular onde as replicatas servidores
estavam conectadas, acionei o comando na minha luva e pluguei os cabos
suspensos do teto diretamente em uma das entradas laterais da minha cabeça,
estabelecendo uma conexão direta com o banco de dados do esconderijo. A outra
entrada, ligada a um dos fios da minha manopla, serviria como ponte para remover a
podridão que havia encontrado.

— Não tem outra maneira? Se ligar a esses cabos é pedir por mais problemas. —
Comentou o vovô russo.

— Se tivesse, certamente não escolheria essa alternativa. Eu sei dos riscos. Não me
faça pensar, ou acabarei me arrependendo e voltando atrás. — Ações
inconsequentes sempre foram meu forte. Não que fosse um orgulho.

Vlad tratou imediatamente de fazer um curativo no meu machucado, mas quando


ele rasgou minha manga e viu o corte que ia do ombro até o antebraço, percebeu
que teria que dar pontos. A situação estava realmente complicada. O problema era
que não tínhamos anestésicos no local. No entanto, eu disse a ele que não seria
necessário. Quando me conectasse, não sentiria mais nada e os pontos poderiam
ser feitos. Pressionei a tecla "Enter" e mergulhei na imersão. Uma imagem de tela de
autorização surgiu diante dos meus olhos fechados. Depois de carregada, os
códigos abriram o portal digital circular, com tons de verde e amarelo, no modo
espionagem.

Entrar na Lexis sempre começava da mesma maneira. Primeiro, um prazer intenso,


quase como um orgasmo, percorria meu corpo. Era uma sensação quente, que
começava no meio das pernas e se espalhava pelas coxas e pelos ossos do quadril,
fazendo minha musculatura tremer. Os sentidos eram inundados com cheiros, sons
e imagens sexuais. Era isso que eles usavam para viciar as pessoas. Acredito que
seja o princípio ativo dos programas das cobaias marionetes de Choi. Essa técnica
já era usada para viciar os jovens em casas noturnas, permitindo que eles criassem
e selecionassem suas fantasias eróticas ao entrar na Lexis. Henry, no entanto, levou
isso a um nível muito maior, aprimorando o sistema em uma escala monumental.

E depois, as luzes psicodélicas de uma casa noturna começavam a se formar ao


redor do meu corpo, criando um tubo que me engolia e me lançava em um oceano
de dados. Era como mergulhar em um tanque cheio de água, a sensação era real. Ao
final desse tanque escuro, meus pés tocavam algo sólido e, a partir dali, a gravidade
voltava ao normal, não mais como dentro de um oceano. Pouco a pouco, o cenário
começou a se formar ao meu redor. Primeiro, gráficos verdes vazados surgiram, e
em seguida, foram cobertos por pilares e paredes que se assemelhavam ao mundo
real. O ambiente que se construiu era semelhante a Little Asia, com uma arquitetura
completamente oriental. A evolução da Lexis estava acontecendo rapidamente a
cada vez que eu me conectava. A simbiose que nos conectava virtualmente me
dizia, mesmo na ausência de Praxis, de forma mental, que tudo isso era obra dela.
Ela não era mais apenas uma inteligência artificial, havia se transformado em um
organismo vivo. Ironicamente, o vírus que ela contraiu por causa de Choi a
transformou nisso.

Eu caí na área da unidade principal do computador do Arcadia. Minha entrada


solicitou uma atualização no sistema e a autorização foi automática. Era uma forma
de isolar o programa que Darkness havia usado no meu CPU, utilizando a própria
instalação do seu software para limpar meu computador. Pastas, arquivos, músicas,
fotos, gifs, tudo estava passando por um filtro rigoroso.

Foi aí que as coisas começaram a ficar interessantes. Isso ativou o sistema de


defesa de Darkness, e ele assumiu a forma de uma aranha, confirmando a última
suspeita de que Choi e Darkness eram a mesma pessoa. Há um ano, eles
mencionaram que o combate contra os hackers envolveria uma criatura chamada
Aracno. Aracno emergiu do seu esconderijo e, perdendo seu anonimato, tentou me
atacar. O desagradável era que ele assumiu a forma de uma aranha-armadeira
marrom avermelhada, com proporções fora do comum. Era do tamanho de um
labrador. Nos encontramos em uma ponte de madeira no meio de um jardim japonês
repleto de cerejeiras, e nosso duelo começou. Além da vantagem do tamanho, eu
tinha a função de um antivírus, mas aranhas nunca foram agradáveis, especialmente
quando têm o porte de um cachorro. Suas pinças destilavam veneno, suas múltiplas
pernas se moviam e produziam um som arrepiante na madeira da ponte. Eu sempre
odiei esse tipo de criatura. Ela avançou, erguendo suas patas dianteiras finas e
alongadas em posição de ataque. Nesse instante, fiquei paralisada e não consegui
me mover mais. Eu sabia que, se quisesse resolver todos os problemas do meu
computador de pulso, teria que vencer o medo. Caso contrário, teria sido melhor
nem ter começado tudo isso.

Mais do que proteger o banco de dados de Arcadia, Aracno queria impedir que eu
removesse o que Choi usava na manopla para me rastrear. Sem pensar muito, me
abaixei e esmaguei a aranha gigante com a mão, pressionando o centro do corpo
contra o piso da ponte. Um clarão de luz índigo se abriu abaixo dela, revelando
diversos códigos binários em azul que eliminaram a criatura, fazendo-a desaparecer.
Na verdade, parecia que a aranha tinha sido teleportada. Minha expressão parecia
contente, mas na realidade eu sorria nervosamente. Sentia medo e nojo ao mesmo
tempo. O que me confortava era o fato de que não tinha sido tão difícil e, olhando
por um ângulo otimista, nem tão repugnante assim. No entanto, estava
comemorando cedo demais, pois isso fez com que uma quantidade absurda de
aranhas menores surgisse pelas laterais da pequena ponte de madeira. Rápidas e
destemidas, avançavam na minha direção, tomando meu espaço. Logo, algumas
estavam subindo pelos meus pés e pernas. Algo precisava ser feito antes que eu
entrasse em pânico. A questão era: o que era pior, enfrentar uma aranha do tamanho
de um cachorro ou centenas de milhares de aranhas pequenas?

Mad Max
Queimava o asfalto com maestria, como uma experiente em corridas clandestinas
que era, mesmo correndo o risco de atropelar alguém. Era como se pudesse me
desligar do mundo, como se me tornasse uma só com a velocidade, e somente a
estrada existia à minha frente... tá, acho que li isso em alguma história em
quadrinhos em algum lugar. O fato é que precisava voltar logo para minha oficina e
eu não estava de bom humor, o que fazia com que nenhum assunto dentro do carro
prosseguisse. Gini bem que tentou, mas só conseguiu obter respostas vagas até
então. Também não prestava muita atenção ao que ocorria ao redor, não enxergava
aquelas pessoas depredando lojas e roubando, ou matando alguém a cada esquina.
Aquele caos todo já era familiar na minha cabeça, um caos que eu via sempre que
perdia a cabeça, e nada daquilo me surpreendia, pois sabia que, no fim, aquela era a
verdadeira Miraitropolis, onde cada um era um lobo na pele de cordeiro.

Naquela velocidade, não demorou para que eu chegasse na rua onde minha oficina
ficava. Ao parar o carro, ouvimos um barulho vindo das latas de lixo. Tratava-se de
Aria, que estava muito ansiosa e um pouco assustada. Gini a reconheceu pela
mensagem que me enviou e, sem demoras, a puxou para dentro do carro. A garota
não era muito alta e sua aparência era infantil, mas não condizia com sua idade, que
era dois anos mais nova do que Max. O caso é que ela sofria de uma leve deficiência
que retardava seu envelhecimento, o que era bom e fazia as pessoas
subestimarem-na, pagando o preço por isso. Aria vestia roupas negras e tinha uma
aparência meio mórbida, mas esse era o seu estilo. Seus cabelos eram longos e
negros, com franjas curtas, e sua pele era pálida como a de um fantasma. Apesar de
tudo, isso era bom para ela se esconder e bisbilhotar coisas de seu interesse. Ela
respirava fundo enquanto olhava para a oficina junto dos outros dois. O bom era que
o vidro do carro era escuro.

— Eles vieram pela noite e começaram a destruir tudo. ─ Apontou com a mão direita
de metal, era uma prótese recém colocada por causa de um acidente.

— De onde será que esses caras vieram? Digo, devem ser de alguma gangue, olhe só
para suas roupas. ─ Gini comentava baixo, talvez estivesse com medo de ser notado
pelos cara-de-ratos.
— Eu não sei de onde vieram, mas com certeza não voltarão para o mesmo buraco.
─ As minhas mãos pressionavam um pouco o volante, e foi então que fizeram a
ameaça.

— Vão embora se não querem confusão, agora! ─ Estavam destruindo minha oficina
e ainda queriam mandar, quem eram eles para não terem medo do perigo? Com
certeza não eram das redondezas ou certamente não estariam fazendo algo do tipo
de forma tão deliberada.

Dei a partida no carro modificado para o meu gosto, aceleração de ponta.

— MAX! ─ Gini e Aria gritaram com medo do que fosse acontecer, e não demorou
muito, eu estava com a cabeça quente e simplesmente joguei o carro sobre os três
sem dar chance de fugirem. No final, mesmo em meio ao barulho da cidade, o
barulho alto quando o carro derrubou a parede com ferramentas e estante de metal
com o corpo dos três não foi imperceptível, afinal, com a pancada, por um momento
ninguém viu mais nada, e a coitada da Aria quase parou no para-brisas. Eu, sem o
cinto de segurança, bati a face contra o volante tão rápido, mas não tão forte, e
fiquei desorientado por um curto tempo. Nesse momento, Gini saiu do carro com
uma arma em mãos para ver se alguém estava vivo ainda e encontrou! O cara estava
gemendo de dor no chão, urrando enquanto segurava a perna pelo joelho, que estava
quase tão retorcida quanto o tronco de uma árvore, com fratura exposta. Gini se
antecipou e com cautela, chutou a arma do bandido. Aria veio logo em seguida,
procurando alguma arma no corpo enquanto limpava um pouco do sangue que
escorria de sua testa. Eu, por outro lado, saí um pouco depois, com um corte na
região do nariz, provavelmente o havia quebrado mas na hora não estava ligando.
Sacrei a Desert Eagle e me aproximei do recém-desarmado homem e, antes que
mais uma tragédia acontecesse, Aria interveio.

— Max! Não! Não faça isso! ─ Se levantou e se colocou na frente da minha mira.

— Irei matar esse desgraçado, sai da frente! ─ Destravei a arma enquanto olhava
para Aria, mas ela permaneceu e me encarou, brava.

—Você está um trapo. Vamos levar ele lá pra casa, ele deve ter alguma informação
útil ou pelo menos poderemos saber quem te atacou, para depois revidar. E meu pai
poderá dar uma olhada no seu nariz... ─ Falou com avidez, e então saiu da frente,
sabia como eu ficava de cabeça quente e sabia como falar para me dar alguma
clareza. Eu mantive aquele bandido em minha mira, imaginei a bala atravessando
seu corpo com facilidade, o desejo era forte nas a menor tinha razão. Suspirei e
guardei a arma no cinto de minha calça.
— Eu não vou diz... ─ No momento em que o cara ia protestar, chutei sua cara com
força para desmaiá-lo ali mesmo, mas depois me arrependi e manquei um pouco,
não estava contando que aquele capacete me faria lamentar o chute.

— Porra... ─ Andei mancando até minha mesa de trabalho, quase dando pulos.
estava com o pé dolorido mas logo passaria, e então puxei uma gray tape da gaveta
e joguei para Gini. ─ Prende o vagabundo... Aria, leve Gini e essa coisa contigo até
sua casa, eu vou pegar uma coisa e estarei logo atrás.

— Não demore... ─ Ela dizia com certa preocupação, e eu apenas sorri, com o nariz
sangrando e os dentes avermelhados, certamente machuquei a gengiva também.
Assim que os dois saíram, cuspi o sangue com saliva no chão e procurei em minhas
gavetas até achar o protótipo que estava construindo e sua planta, não poderia
deixar algo assim para trás.
No momento em que peguei, lembrei-me do dia em que o consegui como prêmio em
uma corrida clandestina, onde pessoas, trabalhadoras ou não, entravam em busca
de grana extra. Usávamos codinomes para não sermos reconhecidos. Modéstia à
parte, eu ganhava todas as que participava. Naquele dia, além do dinheiro pela
metade, ganhei essa planta de um engenheiro, talvez mega endividado, que me deu
algo tão valioso assim. Pelo menos, era o que eu pensava. Guardei a pasta e o
protótipo em que tinha começado a trabalhar em minha mochila, junto com algumas
ferramentas que gostava de usar e algumas baterias de célula de fusão, além de
mais munição. Afinal, tinha que estar sempre preparada. Enquanto saía, dei uma
olhada nos outros dois... a coisa não estava muito boa para eles. Provavelmente
seriam enterrados como indigentes. Abri novamente meu sorriso sínico de vitória,
com os dentes avermelhados, e então coloquei meus óculos escuros e entrei no
carro novamente. Dirigi até o outro lado da quadra e escondi o carro num
estacionamento subterrâneo no final da rua. Saí e acendi um cigarro enquanto
caminhava até o prédio ao lado. Era noite, não tinha vento algum, nem mesmo um
resquício de frio, mas algumas gotas caíam do céu. Logo começaria a chover.
Cheguei num bar com um grande letreiro em neon piscando, chamado Titty Twister,
marcado pelo desenho de uma mulher seminua levantando a perna em looping. Não
era um bar tão popular, mas era o lugar onde párias de toda cidade frequentavam,
inclusive eu. O espaço era grande, com mesas de bilhar pelos cantos e a bandeira da
Austrália estendida atrás do balcão, mas naquele momento tudo estava escuro.
Fechado. E mesmo assim, dava para sentir o cheiro da bebida no ar. Era meu tipo de
ambiente favorito. Não me segurei e peguei uma garrafa de cerveja na geladeira.
Estava geladinha, mas antes de beber, a encostei sobre o nariz machucado.

— Droga... ─ Reclamava pela dor, mas pelo menos estava amenizando aos poucos.
Subi as escadas que levavam ao primeiro apartamento. Não era um lugar luxuoso,
afinal, era um conjunto habitacional como todos aqueles que existiam em Mirai. Mal
construído e sujo, mas as pessoas viviam neles assim mesmo. Ao chegar na sala,
encontrei Aria, Gini e Kendric, pai de Aria, conversando... ou terminando uma
conversa. Não tinha visão do nosso prisioneiro, provavelmente estava preso dentro
de um dos quartos.

— ...precisamos tirar informações e... ─ Nesse momento, eles pararam de falar e


Kendric me recebeu com alegria. Não era muito velho, tinha seus 60 anos de idade e
não estava decaído como muitos jovens. Era um pouco mais baixo do que eu e Gini,
cabelos grandes e brancos, presos para trás, barba grande e com óculos escuro
redondo tapando os olhos. ─ Max! Você está um fiasco, como sempre.

— Não mais do que você, velho! ─ Abri um sorriso de alívio e dei um abraço forte no
mesmo. Eu, assim como X9, não crescemos com família alguma, então depois de
grande, tivemos pessoas próximas, e Kendric e Aria eram esses. ─ Eu preciso de
uma ajuda sua.

— Deixa eu adivinhar, quer que eu te remende, não é? ─ Ele perguntava, parecia até
que já sabia o que fazer sempre que Max entrava por aquela porta.

— Sim, pois eu vou dar uma dura naquele canalha que estava destruindo minha
oficina. ─ Coloquei a mochila sobre uma poltrona velha, era de veludo vermelho e
com acabamento em madeira, eu gostava, dormi muito ali. A sala estava um pouco
bagunçada, com fios literalmente cobrindo a parede do computador, Aria era uma
aspirante a hacker também, e me sentei no sofá confortável, tirando o óculos e
erguendo a face.

— Certo, se precisarem passar a noite aqui, sabe que pode. Aliás, viu a prótese da
Aria? Ela ainda está se acostumando... ─ Enquanto ele falava, chegava perto de mim
com naturalidade, colocando sua mão sobre minha face enquanto a outra, colocava
meu nariz no lugar, estava apenas deslocado, mas a dor ainda assim me fez gritar.

— MERDA! MERDA! Filho da puta! ─ Na mesma hora me encolhi um pouco, com as


mãos sobre o nariz recém colocado no lugar.

Dexter
Depois que conseguimos entrar, eu e Gal, não havia mais jeito de sair. A porta se
fechou atrás de nós com rapidez. Cheguei a procurar algum painel de controle ali do
lado de dentro, colado à porta, como havia do lado de fora. Mas não encontrei. Pelo
que rapidamente presumi, a porta somente poderia ser aberta a partir daquela
central no alto, à nossa frente. A loira parecia estar se sentindo mal. Era um
contraste enorme em relação à mulher fatal que conheci horas atrás na Cosa Nostra
e no início da missão. Não era medo ou teatro. De fato, pude perceber que até seu
tom de pele ficava pálido. Algo no ambiente a deixava assim. No entanto, eu teria
que descobrir o que a enfraquecia mais tarde. Porque a figura que se sentava no
pedestal eletrônico se virou em nossa direção.

A luz do local não era favorável. Aquela água extremamente esverdeada refletia a luz
de forma subversiva, criando sombras que dançavam pelo ambiente. Além disso, a
pessoa à nossa frente usava uma máscara que cobria completamente o rosto. Era
uma máscara prateada, com um aspecto metálico, porém fosco. Além do terno
elegante que ele trajava, pude perceber que suas mãos também estavam protegidas
por luvas feitas do mesmo material da máscara-capacete. Ao lado dele, um cubo
transparente flutuava no ar, contendo uma misteriosa moeda em seu interior.

Para minha sorte, no entanto, ele parecia tão desastrado quanto eu quando se
tratava de acrobacias. Assim que saltou de seu trono, torceu o tornozelo ao cair de
forma desajeitada. Mas caiu próximo o suficiente da loira para socá-la com aquela
luva prateada. Mesmo estando um pouco distante dele, atrás dela, pude perceber
que não havia muita força por trás do golpe do homem de terno. No entanto, o
simples toque da luva em seu rosto fez com que Gal desmaiasse. E o pior, ela estava
caindo em direção àquela água pútrida! Lancei-me adiante para puxá-la, me virando
para ganhar impulso e garantir que caíssemos na plataforma metálica em forma de
passarela, evitando o mergulho na água esverdeada. Caímos ao chão e eu tentei em
vão acordá-la.

— Anda, Gal! Faz uma das suas mágicas, tira a gente daqui!!

Bradava em desespero, mas era em vão. Ergui meu olhar e pude constatar que o
indivíduo estava tentando se arrastar em direção ao círculo no final da passarela,
com o objetivo de acionar a cadeira que estava ali no centro. Não podia permitir
isso. Corri desajeitadamente em sua direção. Infelizmente, ele percebeu minha
aproximação e, mesmo com o tornozelo lesionado, conseguiu me chutar,
fazendo-me cair de costas com força contra a passarela metálica abaixo de mim.

— Arrhg! — Urrei de dor, a tempo de vê-lo se levantar com dificuldade e partir para
cima de mim.

O mais inteligente, em condições normais, seria ele me chutar até que eu caísse
metros abaixo na água. O problema era que apenas uma de suas pernas estava em
boas condições, e se ele fizesse isso, ficaria vulnerável o suficiente para que eu o
derrubasse facilmente. Então ele se lançou para cima de mim, desferindo socos
contra meu rosto, peito e barriga, agachando-se ao mesmo tempo. Foi nesse
momento que pude comprovar que a luva era realmente metálica, dada a quantidade
de danos que causava em mim. Eu lutava para me desvencilhar dele, tentando
revidar com socos enquanto nos engalfinhávamos naqueles poucos metros de
largura da passarela.

Como mencionado antes, eu não era um lutador. E o meu adversário, mesmo sem
ser um, estava usando equipamentos para se sobrepor a mim. Nada mais justo do
que eu fazer o mesmo. Utilizando aquele pequeno laser que eu havia usado minutos
atrás para entrar no hotel, que apesar de pequeno, era extremamente potente, eu o
ativei. Da ponta do laser, um fino raio vermelho atingiu o mascarado acima de mim,
perfurando seu terno e, pelo cheiro de carne queimada, parte de sua pele também.
Para escapar do ataque, ele se afastou de mim, se lançando para trás. Caso
contrário, ele acabaria sendo atravessado pelo raio e talvez morto.

Caído para trás, da mesma forma como eu estava quando ele se jogou sobre mim,
ele colocava as mãos sobre o ferimento, movendo o tronco de um lado para o outro
na tentativa de aliviar a dor. Agora era a minha vez de me lançar sobre ele: mas
antes disso, fiz com que o laser perfurasse ou ao menos ferisse seus braços,
deixando-o praticamente imobilizado. Com um tornozelo machucado e os dois
membros superiores danificados, sua única perna saudável não seria capaz de me
causar mais danos.

— Fica quieto, idiota! — Esbravejei, no calor do momento.

Posicionei-me sobre ele, com os meus joelhos impedindo que seus antebraços se
moverem. — Vamos ver quem é que está por trás dessa máscara refletora... —
Sentindo-me o maior detetive de todos os tempos, utilizei aquele mesmo laser que
saía de um compartimento semelhante a uma caneta e, com movimentos rápidos ao
redor da máscara, queria garantir que o raio não permanecesse no mesmo lugar por
muito tempo, evitando causar danos ao rosto por baixo. Apenas o suficiente para
que o laser penetrasse na máscara metálica e, contornando-a, pudesse remover a
"tampa" que ali se formava, permitindo-me ver o rosto que estava oculto. Caso eu
não reconhecesse o nosso algoz, já que eu era novo nessa questão da criminalidade
de Mirai, utilizaria meu aparelho semelhante aos antigos smartphones e faria um
reconhecimento facial, buscando dados diretamente da Lexis.

Posteriormente, tendo descoberto quem ele ou ela era, eu me levantaria e dispararia


uma última vez com meu equipamento contra a perna boa, deixando-a
completamente inutilizada. Em seguida, me sentaria na cadeira em que ele estava e
ativaria os comandos para poder interagir com aquele fantástico equipamento à
minha frente - que seria muito mais útil nesse momento do que no combate de
instantes atrás, onde quase fui morto. Buscaria informações e acesso às
funcionalidades do Cassino. Em seguida, me comunicaria com Galathea e Vladimir,
caso aquela central que eu buscasse operar tivesse um meio de comunicação
externo, para informá-los sobre tudo o que havia acontecido ali - a invasão
"bem-sucedida" ao Cassino, a possível morte de Meia Noite e nossa localização -
enquanto aguardava novas ordens.

Dexter rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 13 para descobrir a identidade do


sujeito que esconde o rosto que resultou 15 - Total: 1 Sucessos

Narrador Capítulo 9
Os guardas fortemente armados faziam a ronda, garantindo a segurança dos
clientes do Overdose. A fina garoa atingia Troika, dando mais destaque às luzes dos
neons que iluminavam a fachada do cassino. Tudo parecia calmo do lado de fora,
assim como no interior. Era apenas mais uma noite comum, com pessoas
apostando, bebendo e drogas sendo vendidas e consumidas nos saguões.
Mulheres, tratadas como meros objetos, ditavam seu valor por uma noite suada de
puro amor de aluguel.

Rodrigo estava prestes a adentrar o hall de entrada, entre os caça-níqueis e as


roletas. Ninguém parecia notar seus passos, ou se notavam, simplesmente não se
importavam. Afinal, ele usava um rosto que não era o seu. Estava tão próximo de
alcançar a desejada liberdade. Ao mesmo tempo, na frente da rua, emergindo da
neblina tóxica da poluição que se erguia dos bueiros, quatro figuras armadas se
aproximavam do cassino.

Suas roupas chamativas, com linhas coloridas de iluminação neon nos casacos,
deixavam transparecer suas identidades. Um dos guardas do cassino rapidamente
deu o comando para que eles não avançassem e soltassem suas armas.
Obviamente, o quarteto não obedeceu. Sem perceberem, em uma tática bem
elaborada e executada, um hovercar com farol alto desceu com um maluco em cima
do capô, apontando para a porta do Overdose. Não era apenas a chuva normal de
Miraitropolis agora, mas também uma chuva de balas.

Antes que as portas fossem abertas e os seguranças pudessem reagir à luz forte do
farol do carro, houve um barulho de explosão e tudo tremeu. Os elevadores pararam
e as luzes se apagaram. Todos que estavam no interior do estabelecimento
começaram a correr sem rumo. Rodrigo ficava preso no corredor, sendo empurrado
de um lado para o outro pela multidão assustada. O que ele e os demais não sabiam
era que o Overdose estava sofrendo um ataque em massa. Diversas gangues,
reunidas a mando de Jesse, entraram atirando no escuro, alvejando qualquer um
que estivesse por perto. Aproveitaram o fato de a casa de jogos estar sem energia
para se defender.

As defesas de Yuric não ficaram paradas. Seus homens logo reativaram o gerador
reserva e a luz voltou ao cassino. Porém, era tarde demais. Muitos corpos
perfurados jaziam no chão e a maioria dos invasores já havia adentrado o território
de Nuryev. Rodrigo ouvia os barulhos dos tiros e toda a gritaria. Por uma jogada de
sorte, alguém o empurrou com tanta força que ele caiu dentro de um elevador
aberto. As portas logo se fecharam com o retorno da energia. Pelo menos por
alguns instantes, ele estava seguro.

Os russos estavam em menor número, porém bem treinados, como exemplo de uma
mulher que saltava de uma vidraça e, com dez tiros, eliminava dez inimigos, tendo
total êxito. Apesar disso, a situação dos que defendiam o cassino não era nada boa.
O que faltava de experiência às gangues, elas compensavam em material humano.
Surgiam como baratas, gritavam e atiravam. A entrada do corredor já estava
coalhada de corpos e, ainda assim, continuavam a aparecer mais e mais. Chegou o
momento em que os guardas russos não conseguiam mais conter o avanço e
recuaram pelas escadas. Por enquanto, o que acontecia em Troika ficava em Troika,
pois perto do centro as coisas não pareciam boas, apesar de menos caóticas. Nem
mesmo o intenso calor conseguia cessar os protestos.

A praça perto da nova prefeitura estava repleta de cidadãos. Alguns subiam na


estátua de John Armitage, o homem que construiu parte da cidade, e erguiam
cartazes eletrônicos bastante coloridos e iluminados por diversas cores, pedindo a
saída da Dama de Prata. Conforme o tempo passava, mais gente se juntava,
reunindo uma multidão maior. Diversas faixas etárias e quase todos os tipos de
classe social estavam presentes. Estilos se misturavam na praça, criando um
contraste nunca visto antes. Punks de couro caminhavam lado a lado entre carros
antigos e senhores de chapéu fedora. Luzes de neon brilhavam ao lado de TVs preto
e branco nas lojas. Era uma verdadeira mistura de tempos e estilos.

Como era de se imaginar, não existia uma câmera ligada ou um repórter para fazer
cobertura do evento, onde os insatisfeitos politicamente reivindicavam seu direito
civil. Claro, não era interessante para Carmen Telford mostrar a queda de
popularidade. Foi quando, estrategicamente, os telões nas ruas mostraram o que
acontecia em Troika que o rumo de tudo mudou. Usados como peões em um
tabuleiro, toda aquela força e fúria dos protestos ganharam uma nova direção. Sem
receio, os manifestantes da praça se uniram em uma marcha, caminhando rumo ao
bairro de etnia russa, esquecendo rapidamente Carmen Telford e toda a sua
corrupção.
Como era conveniente para Carmen Telford, dirigíveis das emissoras da Dama de
Prata, de uma distância segura, sobrevoavam Troika, transmitindo ao vivo as
explosões e tiros. O fogo e a gritaria eram praticamente as únicas coisas que se
podiam ver e ouvir na transmissão ao vivo. Enquanto o embate de disputa de
domínio do cassino se desenrolava, mantendo-se equilibrado, aqueles que
protestavam, revoltados com Yuric e toda a xenofobia implantada por Carmen,
caminhavam pelas avenidas, arrecadando mais aliados pelos bairros que passavam.
Culparam a máfia russa pelos dias de desgraças de Miraitropolis e desejavam
acertar as contas com o causador deste inferno urbano.

Na sala de Roberto, na boate Vênus, o brasileiro não hesitava e respondia


rapidamente, sem pensar duas vezes. — É claro que estou do lado de vocês. Yuric
desrespeitou todos quando negou o pedido de paz. Prejudicou a Ryulong,
assassinou Montana e raptou Crazy Dog, ele precisa ser punido. Ainda desafiou a
polícia torturando Caz, que assim como o irmão de Pascal duvido muito que esteja
vivo. Ele apontou o dedo na cara de Carmen Telford quando sumiu com o detetive
queridinho da mídia. Nesse momento ele deve pensar que é intocável… Vamos
mostrar que está errado. — Com o comentário Roberto reforçava os votos de união
com os italianos e os orientais, não sobrando dúvidas que todos estavam do mesmo
lado.

Contudo, antes que a conversa pudesse se desenvolver melhor, a televisão ligada na


sala, sem som, mostrava cenas de explosões e tiros, com manifestantes pelas ruas.
Isso chamou a atenção de Roberto, que aumentou o volume, e os três ficaram
sabendo que o Overdose estava sob ataque. Não tinha como Galathea não associar
aquilo com Jesse. Tanto Xiaren como Roberto olharam para a morena, esperando
alguma palavra dela, enquanto a voz do âncora repassava a situação desastrosa.

— Mais uma noite sangrenta, uma nova batalha acontece entre as máfias no
Cassino Overdose em Troika. Manifestantes surgem por todos os lados. Dezenas de
oficiais estão hospitalizados.

— A revolta não acontece apenas no Overdose, ela toma em massa os outros bairros
da cidade. No ponto do quilômetro 78 da Avenida Armitage a viatura da Tenente
Aurora McCall foi atacada e consumida em chamas. A ação foi filmada e permanece
em posse da ParaMilitech para análises. Não sobrou sobreviventes dentro do
veículo.

A notícia enfurecia Carmen Telford, que em sua festa de gala perdia a compostura e
quebrava a taça de champanhe, jogando-a na parede. A orquestra de violinos parava,
a conversa cessava no salão, e todos expressavam espanto com o surto de raiva da
Dama de Prata. Ela logo recuperava a compostura, ajeitando com destreza a mecha
de cabelo platinado que havia caído sobre as vistas, e pegava outra taça da bandeja
do garçom parado à sua frente, abrindo um sorriso largo para manter as aparências.
A música voltava a tocar, e os convidados, fingindo que nada tinha acontecido,
retomavam suas conversas normalmente.

Em especial, comandados por aquelas quatro figuras iniciais, os Guerreiros de Neon


tomavam de assalto o primeiro andar. Os russos começavam a perder o controle, e
restava apenas tentar proteger os outros andares. Os tiros continuavam, e parecia
que finalmente os anfitriões conseguiam conter o inimigo novamente, o jogo virava
mais uma vez. Nas escadas, a mínima tentativa de avanço terminava em morte. A
cada momento, mais apoio chegava, com gangues vindas de todas as partes de
Miraitropolis. É claro que isso teve um efeito no resto da cidade, gerando uma
reação em cadeia extraordinariamente assustadora.

Era fácil localizar as zonas de tumultos, bastava seguir as sirenes e as helinaves dos
jornais. Pairando sobre a Cidade Média, um motorista era espancado por três
policiais por resistir à prisão, e isso causou a comoção da vizinhança, que atacou os
agentes da PM. O ódio se alastrava pelas ruas, virando pandemônio e bagunça, tudo
de maneira gratuita. A pilhagem de comida em mercados era feita nas calçadas
mesmo, ao ar livre. Os incêndios aconteciam em Miraitroide, carros e ônibus
estavam sendo revirados e depredados. Residências transformavam-se em ruínas
entre escombros. Muitas zonas ficavam sem luz ou sem água, ou ambos, o que dava
margem para sequestros e tantas outras coisas piores acontecerem. O cenário não
devia nada a filmes apocalípticos.

Saqueadores invadiam lojas da Little Asia como caçadores de tesouros. Os agentes


humanos da ParaMilitech em menor número e mal armados apenas observavam,
amedrontados como os demais, afinal também são cidadãos normais com famílias
para sustentar. No centro, pessoas estavam sendo espancadas e baleadas. Até All
Street sofreu, a violência não crescia no bairro, ela explodia por toda parte. Outras
gangues que não estavam diretamente envolvidas na guerrilha urbana aproveitavam
para tomar novos territórios, sempre com muitas balas e truculência. A frustração
começava a crescer nas pessoas, algumas se trancavam em suas casas e
apartamentos, outras iam às ruas para deter saqueadores e trombadinhas, em uma
tentativa inútil, eles eram milhares. Nos bairros onde o sexo movimenta o mercado,
nem as sexys shops foram poupadas. Muita gente roubava lingeries, “brinquedos”
eróticos e carregava o que podiam nos braços.

Miraitropolis desmoronava, o vento espalhou as chamas pelo Vintage, os bombeiros


não conseguiam dar conta de tantos locais incendiados, todos estão impotentes
enquanto tudo só piorava, o caos parece extrair o que há de pior na população,
assaltos e estupros são visíveis a qualquer esquina, sem pudor algum ou receio de
punição das autoridades. Mais ataques terroristas acontecem nos subúrbios onde
outros incêndios criminosos ardem por toda parte. Miraitropolis se torna em poucas
horas uma terra devastada, o terror engole inocentes com ódio, não fica possível
dialogar com ninguém que esteja nas calçadas sem que seja agredido. As ruas se
tornam rios de sangue, hospitais que antes já não possuíam condições e vagas para
atender pacientes agora transbordam de mortos e feridos, cadáveres enchem as
geladeiras dos necrotérios. Os holojornais dizem que a força-tarefa mecanizada da
ParaMilitech será convocada, mas se fosse verdade ela já estaria atuando.

Tudo dependia do rumo que o confronto do Overdose tomaria, nada estava definido
ainda, a situação se mantinha bastante equilibrada. Ao longe, a multidão de
protestos chegava aos arredores do cassino, gritando e marchando, munidos do que
podiam chamar de armas: paus, pedras, pedaços de ferro, correntes e bombas
caseiras. Surpreendentemente, tomavam partido, ficando ao lado das gangues e,
ironicamente, assim como eles, agiam com muita agressividade, uma vez que antes
reclamavam justamente da violência exacerbada. Foi um detalhe crucial no
confronto, pois o maior número passou a dar indícios de que sobrepujariam os
russos. O que era um confronto agora podia ser chamado de massacre. Além de ser
impossível lidar com a quantidade de pessoas que invadiam a casa de jogos, os
mercenários de Yuric estavam ficando sem munição. Mais alguns minutos e não
conseguiriam barrar as investidas pelas escadas.

Os primeiros invasores conseguiram atingir os níveis superiores do cassino após o


reforço popular que receberam, e com bombas, depredavam o cassino. Yuric não
pretendia ficar sentado em sua sala enquanto o Overdose desabava. Ele sabia que
era questão de minutos até que seus homens não tivessem mais como conter a
multidão enfurecida. Puxando Vegan pelo colarinho, acompanhado de Boris, Trigger
e Crazy Dog, eles seguiam escoltados até o terraço do cassino, aguardando a
chegada de uma helinave convocada via rádio. O pedido já havia sido feito há muito
tempo, e a nave estava bastante atrasada, o que deixava o russo extremamente
irritado e apreensivo. Seu humor se tornava ainda pior quando isso acontecia.

— Onde está Choi? — Boris dava de ombros, sem resposta.

— Não vou esperá-lo, assim que a nave chegar vou partir sem ele se não estiver aqui!
— Comentou acendendo um charuto para acalmar os nervos e não transparecer a
ansiedade que passava no momento. Yuric deixava de pensar quando estava bravo
e sobrava para Boris, ele sabia que Choi era importante se quisessem conquistar a
cidade de vez. Ele, mesmo que não pedisse sabia o que Yuric queria, saiu do lado de
Nuryev e voltou as escadas, armado com sua Magnum 44, executava pelos
corredores quem tentava impedir o seu avanço até a sala de Henry.
O que nem ele esperava é que antes de chegar a porta de ferro trancafiada acontecia
uma forte explosão abalando o local, Boris foi arremessado ao chão praguejando.
Dentro da sala Darkness, já havia perdido o controle, ele estava nas mãos do jovem
Dexter, covardemente se encolhia ferido em um canto escuro depois de ter a idade
revelada, Darkness e Choi eram a mesma pessoa.

Outra explosão ocorreu e, como um terremoto, tudo dentro da sala tremia. Monitores
e telas, assim como todo o aparato tecnológico naquele interior, sacudiam. As
paredes da câmara rachavam e, sem resistir muito, sofrendo com a pressão exterior,
longas e largas fendas eram abertas. Boris, usando uma dessas rupturas da
estrutura, adentrava aquela sala tecnológica. Ao ver um garoto ocupado
manuseando os aparelhos de Choi e uma mulher loira desacordada, Boris não
pensou duas vezes e apontou a magnum na direção da mulher desmaiada,
apertando o gatilho uma, duas, três, quatro vezes. No entanto, o tambor estava sem
munição. Ele se desfez da arma e, erguendo no ombro esquerdo o corpo de Henry
Choi, saiu com ele pela mesma abertura pela qual entrou. A helinave finalmente
aparecia no céu chuvoso e poluído de Miraitropolis, pousando no pequeno heliponto
do terraço do cassino. Não tardou para Boris retornar, subindo os degraus com
Darkness. Yuric já estava acomodado nos assentos, fechando o cinto sobre a
cintura, quando Henry foi jogado dentro da nave. Descabelado e com o terno preto,
Choi entrou na helinave junto com Boris.

— Invasores… Eles causaram meu atraso... — Yuric não disse nada, pouco se
importava com os motivos do atraso. Só expressou algo, um descontentamento
quando viu que o sangue manchava o estofado da sua nave.

— Vou descontar do seu pagamento a limpeza dessas manchas. Boris, faz esse
porco parar de sangrar no meu banco. — Tirando do bolso um refil médico em forma
de bastão branco com uma cruz vermelha no centro, Boris aplicava nas feridas de
Darkness, cessando a hemorragia dos ferimentos e também anestesiando sua dor,
em segundos recuperaria os movimentos.

— Obrigado, obrigado... Se me permite… Tenho assuntos inacabados… Irei me


ausentar um pouco… — A mesma reação de antes foi a resposta de Yuric, silêncio e
desinteresse. Henry Choi abria em seu colo um estojo preto contendo um teclado da
mesma cor, plugando os conectores do cyberdeck atrás do seu pescoço, alinhando
os fios a seu sistema nervoso e entrava na Lexis.

Ninguém sabia exatamente o que ele pretendia fazer lá, não totalmente, nem mesmo
Calidora. Todavia ela estava ocupada como sempre e tinha seus próprios negócios
para se preocupar. Abrindo um canal seguro, entrava em contato com seu colega,
falando tão rápido que as pausas quase não podiam ser percebidas.
— Pollux, você nem imagina quem achamos aqui em Hamptom Hights vagando a
esmo!! Caz! Sim, ele está vivo! — Dizia com muita empolgação.

— Sypher encontrou ele perto de umas ruínas, bebendo água da chuva para se
manter. Depois de comer algo, o detetive contou que foi desovado pelos homens de
Yuric. Parece que o russo perdeu interesse nele assim que soube da morte de
Montana, não tinha mais motivos para manter ele cativo. Infelizmente Caz está sem
um dos olhos… Lembra daquele sujeito escroto dos Steelhearts, Boris? Ele usou uma
colher para remover seu globo ocular esquerdo do coitado... — A voz de Calidora
pareceu pesada.

A milícia de Aurora McCall prometia vingança, e mais do que isso, fariam de tudo
para que os planos da Tenente fossem cumpridos. Assumindo a operação, um
Crow-Z militar cruzou os céus de Miraitropolis, quase dividindo o espaço aéreo com
o dirigível de Pollux. A sorte do jornalista era que, além de estarem totalmente
concentrados, a milícia de McCall não suspeitava que ele estava em posse daquela
aeronave. Evitando o caos e o trânsito engarrafado das ruas lá embaixo, pelos ares
não demoraram a chegar ao esconderijo dos Steelhearts remanescentes. Sabiam
que os dias de glória daquela gangue estavam no passado e poderiam pousar a
nave sem disfarçar na frente da Sexy Day. E foi assim, papéis e muito lixo voaram
espalhados pela calçada quando o trem de pouso do Crow-Z tocou o chão. Vestindo
armaduras blindadas, vinte homens fortemente armados entraram na boate
decadente, dando voz de prisão para Joe e Larry, que bebiam em uma mesa perto do
balcão e estavam embriagados demais para entender o que acontecia. Arrombaram
a entrada do porão que servia de QG, rendendo também quem estivesse dentro e
confiscando armas e aparelhos do grupo. Junto dos remanescentes, Larry e Joe
foram algemados e levados ao compartimento de carga do Crow-Z, onde se
encontravam também antes deles sentados no interior da nave, Leon e Thomas
Carwell, ex-colegas dos Steelhearts.

— Quando essa zona toda acabar vamos entregá-los para a mídia se acalmar. Nick
Slay quer culpados para essa confusão, então vamos unir o útil ao agradável.
Vingamos a Tenente e entregamos para Carmen Telford. Ninguém vai duvidar que
os Steelhearts estavam por trás de tudo. — Comentou com a milícia de McCall o
misterioso soldado de cabelos negros e curtos com as laterais grisalhas, sua
expressão dura não permitia sombra de dúvidas sobre sua personalidade
extremamente séria, ele continha implantes na testa, um cabo neural, usava um
óculos cromado e jaqueta de couro, parecia ter entre 45 a 50 anos.

— Eu mesmo me encarrego de fazer as análises técnicas do vídeo captado pelo


dirigível do Olho Elétrico (sistema de banco de dados da prefeitura e da ParaMilitech
que monitora e possui os registros de todos cidadãos legais de Miraitropolis) no
momento da explosão do carro da Tenente, e quando meus implantes confirmarem
a identidade do assassino vamos atrás dele. Mas o coitado não vai ter a mesma
sorte que os vagabundos dos Steelhearts… Esse vai prestar contas diretamente com
cada um de nós. Vai desejar estar no inferno quando isso acontecer. — Depois disso
o compartimento se fechou e o Crow-Z ergueu voo para um destino desconhecido.

Xiaren recebeu uma ligação, um dos seus capangas seriamente ferido e com a voz
arrastada, dizia em sua pulseira comunicadora que o Xiwang havia sido atacado.
Xiaren fora inocente ao ver a situação da cidade e imaginar que seu restaurante
ficaria intacto. Em todo caso, o mais importante naquele momento era que muitos
dos seus homens haviam sido mortos. O oriental se irritou, levantando-se da
cadeira.

— Lamento, terei que deixá-los, surgiu uma emergência inesperada, meu restaurante
foi atacado e a contagem de mortos é alta… Deve ter sido Yuric… Preciso retornar ao
Xiwang o mais rápido possível. — O brasileiro apenas concordou positivamente com
a cabeça, se levantando da cadeira também e acompanhando Xiaren até a porta.

— Entendo perfeitamente. — Respondeu Roberto tocando o ombro direito do outro.


— E quanto a senhorita Galathea? — Indagou Roberto, a morena também tinha seus
próprios problemas, aquela confusão toda se dava por causa de Jesse, aquilo
estaria martelando sua cabeça. Ao que se suspeitava, Castelone, mesmo sendo um
coitado, tinha força e gente que o seguia dentro da Cosa Nostra. Isso poderia
significar uma divisão dentro da máfia italiana se não fosse bem administrada ou
bem resolvida. Contingente descontente com a escolha da nova liderança ou apenas
mão de obra inexperiente como o próprio Jesse? A morena teria que descobrir por
si, e tudo dependia de uma conversa com seu subordinado.

Por cortesia, Roberto cedia tanto a Galathea quanto a Xiaren um hovercar com
motorista para cada um, assim evitariam os tumultos e não teriam que lidar com o
aborrecimento da demora do transporte terrestre. Assim que a líder da Cosa Nostra
chegava ao Olimpo, era informada por um de seus homens que Jesse havia
executado a filha de Yuric, Margareth. Mais alguns passos até o elevador e estaria
na sala que foi de Tony Montana e agora lhe pertencia. Ao abrir a porta do cômodo e
tocar o interruptor, Castelone estava sentado à sua mesa apenas com um hobby de
seda e com os pés em cima da mesa. Fingiu surpresa ao vê-la entrar.

— Estava lhe esperando senhorita Galathea, e guardando seu trono. Com as ruas
violentas... Nunca se sabe... Hehe. — Aquilo soava pura provocação. Jesse
mostrava-se bem diferente depois de ter matado pela primeira vez. Também
mostrava-se mais seguro após os acontecimentos no Overdose. Parecia o dono do
lugar, com uma taça de vinho tinto na mão esquerda, sem pressa se ergueu de trás
da cadeira, sorrindo, se levantando e caminhando para trás do assento.

— Bem vinda de volta. — O tom era ousado e debochado ao conceder lugar de volta
para a morena de longos cabelos negros. — Fiz o que ordenou, mandei todas as
gangues para o matadouro. E não é que deu certo? Ah, como um eficiente
empregado que tanto desejou tomei a liberdade de checar as mensagens do seu
computador na sua ausência. Gal, Dexter descobriram que Henry Choi está ajudando
Yuric com a alcunha de Darkness, o mesmo que hackeou o sistema de defesa do
Olimpo. Meia Noite está morto. — Mais uma vez irônico, pausava bebendo vinho e
voltava a falar. — Também pediram para deixar avisado que o russo saiu com o rabo
entre as pernas, escapou pelo terraço com uma helinave. Graças a mim, a senhorita
conseguiu uma boa vantagem. — Ele gargalhou, tripudiou, querendo ou não, enviar
as gangues para combater os russos no próprio território tinha dado certo e
garantido um golpe severo como resposta à morte de Montana.

— Não morreu, AINDA! Mas Vladimir saberá muito bem como aproveitar essa
vantagem. — Castelone aciona a pulseira comunicadora. Aquilo era uma afronta à
autoridade da mulher. Jesse parecia que finalmente tinha criado coragem, porém
estava claramente desafiando-a.

No mundo virtual, X-9 passava por maus bocados, o punhado de pequenas aranhas
fazia a hacker tombar para trás, os minúsculos animais percorriam todo seu corpo
deitado no chão, o medo a paralisava. Aquelas patinhas finas e compridas andavam
por seu rosto, olhos, nariz e boca. Parecia estar totalmente vencida depois de limpar
o sistema operacional da sua manopla, o que seria uma tremenda ironia do destino.
De repente, os aracnídeos recuavam, se reagrupando do outro lado da ponte
vermelha. Aos poucos, o amontoado começava a tomar forma, contornos e textura
de algo maior, na verdade, muito maior. Seja o que fosse que estava se formando era
colossal. De dentro de uma chuva de faíscas, um homem extremamente bem
definido e musculoso, meio máquina, com partes robóticas de neon azulado
imitando longas pernas metálicas aracnídeas, dava altura a um gigante de seis
metros. Sua fisionomia não parecia com ninguém conhecido, mas X-9 sabia que a
aparência sem cabelos, com a raiz pintada de loiro e a ausência de íris nos olhos,
não enganaria.

— Se sua intenção era me causar medo, eu não fiquei nada impressionada. O lance
com as aranhas estava funcionando melhor. Toda essa altura deve ser para
compensar algo, não é Darkness? Ou prefere ser chamado de Henry Choi? — Falou
se erguendo e cruzando os braços frente aos seios. A expressão do outro ficou
abalada, tentava disfarçar.
— Está equivocada quanto a minha identidade… — Ela interrompeu.

— Corta essa cara, eu estou nesse momento dentro no seu fliperama, sei de tudo, os
servidores biológicos, suas cobaias em Hamptom Hights, e essa aparência aí de
aranha não mente… Para fazer referência ao sistema Aracno… Você é o Choi sim,
chega de se esconder, chega de joguinhos, vamos resolver nossos problemas aqui e
agora! — A hacker fechou os punhos.

— E o que pretende fazer sem o amparo da sua amiga azul? Se mesmo com ela você
não teve chance… Se entregue e será mais fácil. É a última vez que peço. — Também
cruzou os braços frente ao peito, porém os dele eram de metal com luzes azuis.

— Depois de ter matado meus amigos? Não mesmo, vem, vou chutar tua bunda pra
fora da Lexis!

Com os punhos cerrados, X-9 saltava para cima de Darkness. Um ruído de metal
acertava-a no peito como a bola de metal de um guindaste, jogando-a de volta ao
chão. Ela apenas soltava um gemido abafado e se levantava de novo, repetindo o
mesmo erro de avançar pulando para golpeá-lo. Um trem descarrilava na forma de
um murro na cara. Ficava bamba depois do segundo soco no rosto, mesmo assim
insistia em tentar socá-lo. Conseguia, mas era como esmurrar um cofre de ferro,
quem sente o tranco são seus dedos. Ela usava a outra mão e os dedos se torciam
como da primeira vez, os ossos dos punhos ficavam esfolados. Henry Choi falava
algo, entretanto X-9 não entendia nada por causa do barulho das pancadas que
levava por todo o corpo, o espancamento durava uma eternidade, nem ela entendia
como conseguia suportar. Talvez fosse a tremenda força de vontade. Contudo, a
hacker apagava por um segundo, afundando-se em algo tão escuro e denso quanto
um nevoeiro da morte. Algo lhe dizia que se entregando daquele jeito seria isso,
significaria morte. Não podia ceder ao infinito desejo de adormecer, mesmo que
fosse impossível lutar. Insistia em ficar consciente, cuspindo fora o nevoeiro,
afastando-o, tentando limpar os pontos brancos que surgiam em sua visão.

Ofegante, soluçando e se afogando com o sangue e saliva em excesso, cada soco


quebrava algo dentro dela, e os efeitos não se restringiam apenas dentro da Lexis,
influenciavam no mundo real, tanto que enquanto Vladimir fechava os pontos do
braço da hacker, mesmo inconsciente de olhos fechados ela cuspia uma bolha
vermelha em sua cara sem querer. Também surgiu uma hemorragia nasal que
preocupou o agente da ParaMiltiech, a surra era uma representação do que
Darkness tentava, remover a hacker da Lexis eliminando-a fritando seu sistema
nervoso. Pelos resultados e efeitos físicos do mundo real, parecia que estava tendo
sucesso.
— Você não é nada sem a sua amiguinha azul. — Zombava Darkness, esmurrando a
face de X-9 roxa e cheia de hematomas contra o chão.

Gini não permitia que Aria visse o que ele faria com o sobrevivente da gangue,
mandava ela sair e fechar a porta. Uma sala suja e qualquer da parte de cima do
Titty Twist onde Kendric dizia ser seu escritório havia sido cedido para interrogar o
“rato”. A única fonte de iluminação parecia ser uma placa azul e vermelha de néon
com ideogramas orientais piscando do lado de fora da janela, ninguém sabia a razão
daquilo estar ali se não se tratava de Little Asia. A infiltração e os fios desencapados
eram uma péssima combinação, Gini não sabia como que o bar ainda não tinha
pegado fogo. Naquele ambiente úmido e mofado o ar condicionado, uma
geringonça velha que fazia muito barulho não refrigerava nada e o aroma de suor
impregnado nos móveis tornava o local intimidador o bastante para um
interrogatório. Sendo um ex criminoso e atualmente trabalhando numa agência que
forma oficiais, passou tempo o bastante com bandidos e policiais para aprender o
melhor - ou pior - que os dois lados usam como técnica de interrogatório. Gini
parado perto da janela deixava o jogo de sombras e luzes da basculante desenhar
sua silhueta, não dizia nada, o rato ficava cada vez mais tenso. Tremia como vara
verde. A voz rasgava o silêncio como uma faca afiada.

— Deve ser bem dolorido ser atropelado. Você está destinado a terminar assim,
sangrando e com os ossos todos quebrados em cima de um sofá velho rasgado e
fedorento, um final digno de um rato… — Cruzou os braços, acendendo um cigarro.

— Mas posso te garantir que antes de morrer vou tornar tudo ainda mais doloroso e
prolongado. Vai morrer quando eu disser para morrer. — O garoto de capacete deu
uma olhada sabendo que estava em um tremenda encrenca.

Aria ouviu um grito, não, um urro de pavor, e correu até a porta, colando o ouvido. A
boca secou, os dentes se apertaram tanto que pareciam se partir uns contra os
outros, e o coração, esse parecia querer sair pela garganta. Ela ouvia sons de algo
sendo triturado, depois serrado e, por fim, furado. Era algo macio, como carne, não
sabia dizer ao certo. Outros urros animalescos vieram em seguida. A filha de Kendric
ficou paralisada, ouvindo tudo aquilo. Ela não fazia ideia do que Gini possuía para
trazer tanto terror ao jovem. Seja o que fosse, Gini tinha aos montes e fazia bem.
Depois, ela ouviu alguém soluçar e riu quando percebeu que se tratava do garoto
começando a orar. Deve estar muito assustado para apelar para a religião em
tempos onde ninguém mais acredita!, pensou Aria. Gini fez algo não apenas para
aumentar a dor do garoto, mas também sua febre. A sensação era horrível, ele
desejava morrer, implorava pela mãe. Gini não sentia dó e era mesmo como disse,
ele morreria quando permitisse. Mesmo após a confissão, a sessão de tortura
continuou por uma hora, até que finalmente o garoto não resistiu mais aos castigos
e sucumbiu. Aria descolou o ouvido da porta rapidamente quando sentiu que a
mesma estava sendo aberta, sentou-se na cadeira e abriu o case onde guardava seu
cyberdeck, fingindo que estava teclando algo.

— Ele contou até o que não pedi, vou começar por partes. Eles estavam destruindo
sua oficina, Max a mando de Darkness, o cara quer foder com todos que têm algum
tipo de envolvimento com a X-9. Mas não trabalham para ele, são um grupo de
hackers mercenários chamados de Black Hats, por isso a palhaçada do capacete de
ratos... Pelo que parece são financiados por esse tal de Darkness... É o grupinho
particular de amigos treinado por ele. Outra coisa importante, estavam tão
centrados em te pegar, morena, que rastrearam as imagens capturadas dos
dirigíveis do Olho Elétrico e criptografaram para a ParaMilitech não ter acesso. Não
pense que foi feito para te ajudar, a preferência era que fosse levada até Darkness,
mas se algo acontecesse de errado, como aconteceu agora, em uma hora a
criptografia das imagens seria desfeita e a ParaMilitech ficaria sabendo que nós
explodimos o carro da Tenente Aurora. É, esses caras estavam na sua cola, Max,
querendo te pegar no pulo do gato. — Gini tragou o cigarro, se encostando na parede
vendo Kendric "consertar" o nariz de Max.

— Resta pouco tempo, acho que cerca de quarenta minutos para criptografar de
novo as imagens. Aria, você poderia deixar de fingir que está digitando algo nesse
teclado e tentar fazer realmente algo de útil. — Gini entregou a máscara luminosa
em forma de rato no colo da garota pálida.

— O leite com pera armazenava tudo no capacete. Ouvi em algum momento que
você é uma aspirante a hacker, será que consegue acessar os arquivos colocar uma
criptografia nova? — Puxou uma cadeira e se sentou com a mesma virada de guarda
para frente.

— Vou tentar! — Aria com empolgação arrastou os fios do cabelo curto da nuca
mostrando as entradas dos plugs de fios em meu pescoço não por exibição mas por
necessidade.

Conectou os cabos transparentes nos orifícios conectores em seu sistema nervoso,


assim como na coluna, e do outro lado ligou os fios no capacete cheio de luzes.
Online na rede de dados, sentia aquela sensação prazerosa que todos os
navegadores experimentavam ao entrar na Lexis. Os olhos da garota reviraram,
restando apenas o branco das vistas, uma coisa inevitável, que ninguém conseguia
evitar. Na verdade, era isso que mais viciava os navegadores da Lexis, alguns nem
voltavam mais. Superada a emoção inicial, Aria conseguiu desbloquear a senha do
capacete de maneira relativamente fácil para uma iniciante. Empolgada com seu
sucesso, ela se ergueu em pé, acessando, via motoramente, o banco de dados do
capacete, movendo slides e lâminas holográficas que surgiam com informações em
imagens de HUD transparente à sua frente.

— Acho que entrei no sistema operacional do capacete. Foi até fácil, não vou contar
vitória antes do tempo, é claro, mas se eu conseguir achar as imagens e por uma
nova criptografia vou comemorar muito! — Disse entusiasmada.

Considerações:

1- Pollux deve continuar com seu plano dentro do dirigível contra Henry Choi.
Também precisa ditar o rumo que Calidora dará a Caz.

2- X-9, com a luta virtual, para vencer Darkness, a dificuldade é 16 nos dados.

3- Dexter, agora que descobriu quem é Darkness e avisou Galathea, deve fazer uso
da sala de controle para sair vivo do cassino durante o ataque e levar consigo Gal,
que está desacordada. Tudo que é recurso tecnológico da área pode ser usado para
seu benefício.

4- Rodrigo não teve tanta sorte e vai ter que ficar escondido no elevador fechado
durante uma rodada e torcer para ser encontrado pelas pessoas certas. (?) Só então
poderá compartilhar com Pascal o que sabe sobre o irmão.

5- Galathea tem que decidir o que faz com Jesse, se aceita as atitudes e a forma
como ele age, ou aplica um corretivo no rapaz, lembrando que as escolhas tomadas
terão fortes consequências diretas no futuro. (Enviar algum veículo e reforço para
ajudar Dexter e Gal fica a livre escolha, assim como dar novas ordens de comando
para os mesmos.)

6- Max, agora possui informações de que Darkness/Choi não age sozinho, fica a
escolha se compartilha com mais alguém sobre isso. Mas antes de tudo, precisa de
Aria para criptografar as imagens do assassinato da Tenente Aurora. Como Aria é
iniciante, a dificuldade é 16. Se conseguir, a ParaMiltech não descobrirá sua
identidade nem a de Gini.

Mad Max

"Aonde devemos ir, nós que peregrinamos por essa cidade a procura do melhor de
nós?"
Gini conseguiu tirar informações do cabeça de rato após alguns minutos de tortura,
o rapaz sabia muito bem como fazer aquele serviço e eu nem queria saber como ou
onde ele aprendeu aquilo, mas deu resultado, e era isso que importava.

A ansiedade era pior do que a de uma partida de hockey e eu estava praticamente


assistindo Aria tentar fazer uma nova criptografia para que minhas imagens fossem
apagadas, imagens de quando eu friamente, ou de cabeça quente, matei aqueles
PMs na Av. Armitage, e posso dizer que não me arrependi de nenhum tiro, tanto que
estava com um sorriso de deboche enquanto me lembrava dos quatro queimando.
Gini e Kendric por outro lado, aguardavam impaciente de outra maneira enquanto
ligavam a televisão para ver o que estava passando. Era apenas uma tela de vidro
que projetava as imagens com as cores estouradas, eu tinha de me lembrar de
reclamar com o velho para que trocasse aquilo (Afinal, eu dormia ali vez ou outra).
No entanto, Aria soltava um suspiro longo de desânimo, e foi quando pulei do braço
do sofá para ir até ela.

─ Eu fiz tudo o que eu aprendi para tentar fazer o serviço, mas isso é avançado
demais pra mim. Foi mal gatinha. ─ Aria falava como se fosse adulta, mas sua
expressão era a mesma de uma criança que não conseguia se sair bem em uma
prova e, na verdade, aquilo de fato era uma prova dos conhecimentos que ela tinha,
ainda estava em aprendizado. Eu não fiquei brava com ela, desapontada um pouco?
Com certeza, mas não iria descontar na guria, então recostei na parede enquanto
voltava o olhar para a televisão. Miraitrópolis se tornou um verdadeiro campo de
guerra, e aquele massacre era resultado de uma fúria direcionada aos russos que
cutucaram um vespeiro com vara curta ao matarem Montana. Virei mais um gole da
cerveja e reclamei.

─ Eu não gostava deles mesmo. ─ Não era bem o que a menor esperava ouvir, mas
pelo menos não levou uma bronca, e logo foi tirando o capacete que bagunçava
seus cabelos e a mesma tentava arrumar, e antes que comentasse mais alguma
coisa, eu, ainda olhando para a televisão dei mais algumas instruções. ─ Manda um
recado pra minha amiga, a X9, avisando que... ─ Nesse momento, Kendric voltou o
olhar pra mim um tanto surpreso.

─ Então ela voltou? ─ Comentou surpreso com aquilo, e eu respondi. ─ Sim, e voltou
abalando tudo por aqui.

─ Não que não fosse acontecer cedo ou tarde com você, não é? Pela vida que você
leva... ─ Aquele sotaque australiano me tirava do sério quando me criticava, mas eu
não me dei ao luxo de perder a razão naquele momento, e me voltando novamente
para Aria, continuei falando. ─ Mande uma mensagem pra ela, dizendo que o tal do
Darkness não trabalha sozinho, ele financia um grupo de hackers mercenários
chamados Black Hats. Puta nome feio. Mas diz que são financiados por esse cara, e
que ele vai mandar gente pra pegar todo mundo que tem envolvimento com ela. E
também fala pra ela me fazer o favor de apagar minhas imagens do sistema da PM,
aquela festinha pode virar um caos pra cima de mim.

Aria novamente acessava seu sistema e começou a digitar num teclado virtual que
surgia à frente de suas mãos. Digitando com agilidade, ela enviava a seguinte
mensagem para X9, no endereço em que eu pedi, o que estava em meu computador:

< Mensagem de: Aria, amiga da Max.

Hey X9... não sei qual o seu nome mas sei que é amiga da Max. Bem, sabe como ela
pode ser cabeça quente, mas dessa vez seu cérebro psicótico acabou queimando
quatro agentes da Paramilitech, e as coisas podem ficar bem feias. Um grupo de
mercenários chamados Black Hats atacaram a oficina dela para tentar matá-la mas
demos conta deles, porém, Max disse que você deveria saber que eles trabalham a
mando do tal de Darkness, e que ele financia um grupo de mercenários que estão
caçando todo mundo que tu conhece, e falando neles, eles rastrearam as imagens
da Max executando esses PMS e pretendem descongelar do banco de dados deles
caso esses mercenários não a pegassem, e bem, você sabe que isso não aconteceu.
Por favor, ajude a Max, não deixe que eles façam isso com ela!

Fim da Mensagem. >

Logo em seguida, Aria deu o sinal de que havia enviado um joinha com a mão mas
não desligou seus aparelhos, agora era preciso saber se X9 iria conseguir fazer o
que foi pedido. Eu sorri para ela e em seguida dei um peteleco em sua testa como
agradecimento e me virei antes de vê-la reclamar, pois Kendric me chamava para o
bar na parte debaixo. Gini permanecia no sofá assistindo a televisão pois iria ficar
com Aria caso minha amiga entrasse em contato logo.

Lá em baixo, eu ia até a cadeira da ponta do balcão enquanto o velhote coçava a


barba e acendia uma luz para dar uma iluminação fraca para poder tirar uma cerveja
do freezer e abrir a mesma. Era Cooper Pale Ale, que tinha como símbolo, um
canguru. Eu adorava aquele rótulo. Ele me servia um copo e eu logo aceitava.

─ O que foi Kendric? ─ Ele parecia ainda meio chocado com a violência e deveria
mesmo estar, de nós três ali, ele poderia perder muito com essa guerra que
estourava. Pousou uma das mãos sobre o balcão enquanto a outra levava o copo
espumando para os lábios, dando um belo gole.
─ Max, você viu como as coisas estão lá fora e as coisas nunca estão tão ruins que
não possam piorar. Sabe, eu não tenho mais idade para poder correr por aí com uma
arma em mãos e matando sem pensar. ─ Ele fazia uma pausa e levava o copo outra
vez aos lábios, dessa vez, tendo de limpar um pouco da barba com a outra mão. Eu,
por outro lado, estava um tanto mais apreensiva, praticamente sabia o que ele queria
dizer com aquilo.

─ Está dizendo que vai pular fora? ─ Obviamente, eu não era a pessoa mais
sentimental por ali, então não sabia muito bem como reagir, por isso, apenas virei
um pouco da cerveja garganta a baixo.

─ Pode se dizer que sim. A questão é que, cá entre nós, não que eu esteja tentando
te ofender, você sabe que eu não faria isso, mas quem tem mais a perder nessa
guerra sou eu. Tenho esse bar desde que perdi minha mulher, e isso foi tempo o
suficiente para que Aria se tornasse a garota que é. Não digo que tenho uma vida
boa, mas às vezes, precisamos proteger os nossos bens, as coisas que mais
gostamos. Eu sei que no fundo você entende mesmo que seus amores sejam
cerveja e automóveis... ─ Eu abri um sorriso bobo, pior que era verdade o que ele
dizia e eu mexia um pouco o copo com a cerveja. ─ Você pretende arrumar sua
oficina quando esse inferno acabar, eu sei disso. Mas se alguma coisa acontecer
com Aria, digo, se ela me deixar, eu não teria como reconstruí-la. ─ Na verdade
poderia, mas Kendric não era tão fã de tecnologia, apenas deixou que Aria obtivesse
um braço robótico por causa do acidente que o amputou e pela necessidade que ela
tinha de ter todos os membros. Ele se virava novamente e puxava uma caixa de
charutos debaixo do balcão.

─ Eu sei que não... ─ Eu não sabia muito bem o que comentar, mas enquanto
processava aquelas informações, parecia que passava um filme em minha cabeça,
sobre minha infância, os pais que não tive e a vida no orfanato, e essas lembranças
foram quebradas com a voz rouca mas firme dele.

─ Então, venha conosco. Eu sei que gosta de arrumar as coisas, construir


bugigangas, mas podemos ter tudo isso em outro lugar ou recomeçar. Sua amiga, a
X9, deve estar envolvida nisso até o pescoço, mas você ainda pode fugir disso. ─ Ele
pousava as mãos sobre a caixa de charutos enquanto se aproximava um pouco
mais do balcão, esperando por minha resposta, e esse convite me pegou de
surpresa. Levantei o olhar para o mesmo e ergui novamente a face. Olhava para o
lado, os cantos, cadeiras e mesas vazias, o cheiro de bebida e bar velho que
transformava aquele lugar em meu lugar favorito para se passar as noites apesar de
algumas figuras que apareciam pelo local, mas quando então novamente veio as
notícias da televisão, a cidade em caos, X9 precisando de mim, tanto que havia me
contactado, eu abaixei a cabeça novamente e olhei para o fundo do copo que ainda
tinha cerveja e respondi Kendric, com a voz mais pesarosa.

─ Valeu pelo convite, mas não adiantaria nada. A cidade é podre com ou sem ela, e
não posso abandonar uma irmã, assim. Então continuarei aqui, e irei sobreviver. Por
nós. ─ Palavras fortes, moldadas desde o tempo em que vi meus pais morrerem
naquele ataque de motoqueiros, eu ainda sou jovem e tenho muita coisa a fazer,
mas não era a melhor em explicar, mas parecia que algo doía lá dentro, afinal, eu não
era uma miss simpatia. Peguei o copo em mãos novamente e terminei de beber o
resto da bebida. O gosto do malte parecia ter parado na língua e o sabor era
inesquecível. A melhor bebida da casa.

─ Eu sei, e sabia que responderia algo assim. Eu te conheço pois já conversamos


bastante aqui, nesse balcão. Sei que você quer continuar firme, forte como uma
barragem, dura como o aço, e batendo mais do que um Muhammad Ali. Você é
pessoa mais forte e corajosa que conheci e sei que vai conseguir sobreviver a esse
holocausto, mas não deixa de ser triste ver uma garota jovem como tu se acabando
em drogas e violência.

Eu não respondi, mas ouvi Gini me chamar de lá de cima, então me levantei, mas
antes de ir para as escadas, Kendric me parou e puxou a caixa de charuto para a
beira da mesa, e eu logo recusei. ─ Sabe que não fumo charutos.

─ Max, você sabe o que esse bar significa pra mim. Ele me libertou da raiva e das
drogas quando eu pensei que tinha perdido tudo, tinha esquecido de Aria porque ela
me fazia lembrar de Heather, e espero que um dia, quando você tiver alcançado o
que deseja, quando ver que a vida é uma cruzada sem final feliz, talvez esse bar
possa ser sua liberdade. ─ Nesse momento, ele abria a caixa de charutos, e dentro
havia um molho com 4 chaves e um chaveiro de canguru, e ele o empurrava para a
minha direção. Não tive tempo de recusar ou aceitar, Kendric começou a subir pela
escada e sua voz já um pouco mais longe, comentou. ─ Estaremos indo embora
logo depois que vocês saírem. Boa sorte.

Eu fiquei ali em baixo praticamente paralisada com a situação, olhando para as


chaves sobre o balcão que era iluminado por aquela luz fraca, dentro do bar não
muito grande, de cadeiras vazias e vários enfeites de neon de canguru e a bandeira
australiana, enquanto lá fora, a garoa caía mas não amenizava o calor das ruas que
liberaram seus vapores de esgoto e embaçar o brilho dos vários letreiros de neon.

"A esperança é um erro. Se não conseguir consertar o que está quebrado, você vai
enlouquecer. "
Galathea
Galathea Scipio estava irritada. Suas ordens não foram seguidas e ainda por cima
não tivera chances de negociar na reunião. Não tivera chance de pressionar Roberto
sobre seu envolvimento na morte de Tony Montana.

#Will, status#

#As coisas tão bem feias por aqui, chefe. ─ Disse William, falando alto no
comunicador por conta da confusão no Overdose que era ensurdecedora mesmo da
garagem ─ Eu vou extrair nossos agentes.#

#Bom. Deixo isso à sua descrição. Só os recupere inteiros. Shae mandou algum
reforço caso precise.#

Quando ela chegou ao escritório do Olimpo ainda com essas questões lhe pairando
sobre a mente, notou a situação inusitada. Fez sinal com a mão para que Vicky a
esperasse do lado de fora ao invés de andar ao lado dela como William fazia. O
jovem aguardou, fechando a porta atrás dela quando essa entrou.

Não podia dizer que a situação não a irritou ainda mais, pois o fez. As palavras de
Jesse de fato jogaram combustível na fogueira.

A morena levou a mão destra até sua testa, massageando-a, assim como os olhos.
Parecia extremamente cansada por um instante, mas se recompôs em seguida.

Com apenas os dois ali seus saltos ecoaram no silêncio entre os dois à medida que
a morena se aproximava de Jesse. E, mesmo esse dando um ou dois passos atrás
ela ainda assim se aproximou. Os dedos afilados e alvos seguraram a gola do hobby.

Ela alinhou o tecido.

Com calma e paciência, de forma um tanto afável, como uma mãe, ela alinhou a
vestimenta de Jesse.

─ Quando Tony estava morrendo, ele pediu para que eu liderasse a família. Ele não
achava que você estava pronto para o serviço. ─ A voz era calma e baixa, como de
uma professora. ─ Eu só aceitei porque não confiava em ninguém além de mim para
fazer frente à Yuric. ─ Os dedos deixaram o tecido de seda e se embrenharam no
cabelo dele, também alinhando e domando algumas mechas mais selvagens. ─
Mas, se discorda dele… Bem, sinta-se à vontade para liderar como bem quiser, Dom
Castelone.
Embora suas ações não fossem hostis, ela ainda assim havia invadido seu espaço
pessoal sem pestanejar e o tocara sem sequer considerar que ele protestaria. Para
ela, era apenas powerplay.

─ Informo que Xiaren e Roberto reforçam a aliança com a Cosa Nostra, você agora
tem alguns aliados. A Uroboros irá pegar seu pagamento acordado e se retirar. E eu
vou voltar aos meus negócios. ─ Ela deu de ombros. ─ E você poderá lidar com seus
problemas como quiser.

Ela não estava nem um pouco a fim de retificar cada merda que ele fizesse. Deixaria
que ele aprendesse sozinho, ou levasse a Cosa Nostra pro buraco. Embora a última
opção não fosse muito vantajosa para ela, sendo justamente para evitar isso que ela
havia aceitado a liderança.
--------------
A pistola deu o reasegurador clique metálico quando William circulou o ferrolho. Os
outros três saíram do carro junto com ele. Estavam à paisana. William usava uma
jaqueta de couro cor caramelo e os outros seguiam o mesmo padrão
despreocupado.

#Dexter? Gal!? Me passem a localização de vocês no prédio. Eu estou entrando para


fazer a extração. A coisa ficou feia demais então eu preciso tirar vocês daqui antes
que piore.#

─ Sem formação, seus merdas! ─ Rosnou Jesus que usava um moletom preto.
Acendeu um cigarro e tragou profundamente, fazendo com que parassem para
esperá-lo. ─ A última coisa que precisamos é parecer com os russos. Ou pior ainda,
sermos reconhecidos pelos russos como não russos.

─ Somos apenas clientes pegos no meio do fogo cruzado, senhores. Relaxem um


pouco. ─ Disse William enquanto fazia o caminho por onde ele viu Dexter seguir.
Não tardou muito em encontrar o buraco no banheiro e adentrar por esse.

Dexter
Vou confessar que tive um pouco de sorte de ter conseguido dobrar o tal maldito.
Me sentia orgulhoso, é claro. No meu primeiro combate real – sem ser um de
videogame ou na realidade virtual da Lexis – eu consegui me sair melhor. Logo
descobri que o cara se chamava Henry Choi, e depois que ele ficou acuado, eu
reassumi o trono tecnológico. Ali, eu tinha acesso a várias informações e, além de
ter passado para Galathea e quem quer que estivesse no comando da Cosa Nostra
as informações de que Henry Choi era Darkness – hacker que eu descobrira após
rápidas pesquisas – eu tentava também baixar arquivos para a minha nuvem na
Lexis. Se bem-sucedido fosse, poderia descobrir outros planos dos russos.

— Gal, você não vai acreditar... — Me virei a tempo de perceber que eu a tinha
deixado inconsciente completamente à mercê de qualquer perigo. Um cara
grandalhão e com cara de poucos amigos, que eu reconheceria depois como Yuric
apareceu. Ele disparou contra a loira e eu acreditei que era o seu fim. Senti minha
respiração faltar por alguns instantes. Mais sorte ainda do que eu tive, ela teve, pois
a arma do cara não funcionou. Visando escapar logo, ele pegou o Choi e saiu por
uma das aberturas causadas pela destruição que o prédio sofria. Com ele longe,
desci com cuidado para não machucar o pé como o "sequestrado" sofreu antes. —
Anda! Acorda logo! Maldição!
Eu praguejava em vão, até avistar Jesus. E William e mais um que eu não sabia o
nome, lacaios da Scipio. Isso aconteceu depois de eu ter recebido a comunicação
deles e ter-lhes enviado nossa localização. Era boa a sensação de que não éramos
apenas fantoches deixados para morrer depois de cumprirmos nossa parte do
trabalho. Jesus carregou Gal com certa facilidade. Já devia estar acostumado a
carregar corpos para desova, presumi. De toda forma, eu os acompanhei para fora,
pelo caminho que eu tinha feito. Ainda encontramos poucos capangas russos.
William os acertava e o outro cara também. Logo nos vimos fora do Cassino, quase
em ruínas, e rumamos para o veículo, adentrando-o. Eu não sabia para onde Jesus
estava nos levando, mas acreditava que era até Galathea.

Pollux
— Meu deus... isso é... — Calidora também sentia o nariz sangrar. Não precisava nem
olhar para o comunicador para saber disso. Parecia que nossos olhos estavam
fervendo também, devido a sobrecarga dos implantes e das informações que
passavam por nós.

— Informação demais. Poder demais. — Eu tinha um sorriso no rosto enquanto


falava aquilo. Era quase como se a tentação de usar tudo aquilo a nosso favor fosse
demais para que deixássemos escapar, mas não estávamos mais do lado dos
tiranos. De alguma forma, aquilo foi ainda melhor do que o poder, saber que estava
fazendo o bem. Era quase uma redenção.

— Pollux, más notícias. O navio que está tentando atracar na cidade tem a tripulação
sob comando de alguns barões de Mirai, e acho que Choi está atrás deles! O navio
está cheio de soldados, provavelmente nazisoviéticos vindos do Pacífico. — Tinha
um nervosismo claro nas suas palavras mas eu não me amedrontei. — Seja lá o que
façamos, não vai dar tempo de chamar a atenção para esse problema agora, todo
mundo está ocupado demais para olhar as notícias.
— Vai você e quem sobrou da operação pra cima deles. Leva os militares e não deixa
eles alcançarem a terra firme. A gente é tudo que temos agora, então vai ter que dar.
— A operação pedia uma segunda divisão e uma mudança completa de planos, mas
eu sabia que a Calidora daria conta do recado. O dirigível era pesado demais para
ser manobrado até o outro lado da cidade e Henry Choi certamente o abateria antes
que eu pudesse levá-lo até onde planejava, além do trajeto ficar óbvio demais com o
passar do tempo.

— Lembra quando a gente plantava evidências falsas pra sabotar os adversários da


Telford? Ou quando a gente denunciou aquela rede de frigoríficos? E o açougueiro
canibal? Imaginou que um dia estaria caçando nazisoviéticos? — Ela riu mansa,
rapidamente mudando de assunto.

— As coisas mudaram rápido. Em um dia a gente estava no topo, no outro...


procurando abrigo em um bueiro, fazendo operações clandestinas para não nos
acharem. — A cidade se iluminou para finalmente a minha grande apresentação.
Telões, outdoors, até televisores por trás das vitrines das lojas estavam todos
sintonizados na minha frequência. Dava para sentir cada bit fluindo por meu cérebro
enquanto me conectava aos servidores públicos de informação, fluindo e
transmitindo ao mesmo tempo o que tinha deles para mim e vice versa. Toda a
verdade que rolou durante a queda do prédio do Canal 17, sua destruição assistida
por mim de uma visão privilegiada, os necroides que marchavam para dentro da
sede matando qualquer um em seu caminho, a morte de Liam na batalha contra o
líder deles, todas as imagens eram vistas por qualquer aparelho audiovisual do meu
ponto de vista ao alcance público e aberto para mim. O sequestro de Calidora, o
falso cadáver de X-9, a verdade sobre o assassino do prefeito. Era como se uma
corrente de informações tivesse vazado para a artéria principal da cidade, causando
um enorme sangramento. Todos os segredos que meus olhos já gravaram agora
foram lançados no domínio público.

— E eu devo tudo isso a você. — Falei com Calidora que ficou por um longo tempo
em silêncio, pensando. Caz era visto nos telões ao lado de seu suposto falecido
parceiro, e depois a imagem que recebi se sobrepunha, mostrando alguém o
forçando a alvejar inocentes. Uma sensação mais quente invadiu minha nuca e senti
que estava conectado a algo, ou alguém. De repente, as imagens de Calidora
também começaram a surgir em flashes junto do streaming que havíamos aberto
para a cidade. A aliança com os antigos paramilitares descontentes com Carmen
Telford, os achados a respeito de quem Henry Choi realmente era, a violência de seu
sequestro quando tentou denunciar as práticas abusivas da empresa nos tempos do
antigo prefeito. Se a verdade ainda tivesse poder, seria a hora dela imperar.
— Vamos colocar um fim nisso de uma vez por todas. — Com um leve embargo na
voz Calidora se recompôs, como se engolisse um soluço e se pusesse de pé de
repente. Consegui ouvir os passos apressados atrás dela e o motor de veículos
pesados se preparando para algo. Ela já deveria ter dado as ordens aos homens sob
seu comando.

— Você consegue. Sempre achei que você seria boa mandando nas pessoas. — Ouvi
sua risada e rimos juntos dessa vez, enquanto ela do outro lado do comunicador
batia uma continência e se afastava.

— Tome cuidado, Henry Choi tem uma patrulha aérea. Não deixará que você se
aproxime demais do prédio. Boa sorte, meu amigo. Hoje a audiência vai pelos ares.
— Eu acenei com um sorriso achando graça. — Não entre em combate direto com
eles, use a tecnologia que sobrou da operação, envie um sinal ou desvie-os.
Atrase-os até os Steelhearts e Caz trazer mais reforços. Você vai salvar essa cidade.
Nossa cidade. — Com outro olhar que trocamos, o comunicador se apagou e deixou
com que cada um de nós seguisse seu destino. Sem dúvida o que esperava Calidora
poderia ser o mais incerto e estressante, mas nunca estivemos tão fortes, e
apoiados pelas mãos certas estávamos sem dúvida no ápice de nossa influência.
Por último, tentei entrar em contato com todos os nomes que surgiam na minha
interface de informações, dentre tantos cidadãos de Miraitropolis aqueles que eu
mantinha como aliados pessoais tiveram prioridade, mas poucos estavam
diretamente ao meu alcance, nomes e assinaturas digitais pulavam diante dos meus
olhos como um computador vivo, e um email em especial chamou minha atenção
quando procurando por uma conhecida.

Dei um riso fraco de canto de boca, e por curiosidade, tentei entrar nos domínios de
X-9. Como sempre, sua localização parecia um limbo, algo fora da grade de
informações que fez minha cabeça quase explodir só para ver os detalhes da
conexão, mas que senti ser possível inspecionar adiante. E rangendo os dentes,
sentindo minha consciência se esvair por um segundo dos meus olhos para a tela
holográfica na minha frente, eu comecei a entrar em seu mundo.

Tudo era uma bagunça de informações e códigos que vibravam diante de mim entre
o mundo real e o cyber, comigo podendo ver um pouco dos dois. Tinha algo parecido
com uma aranha gigante vindo na minha direção, mas que passou por mim como se
eu nem estivesse lá. Foi naquele momento que descobri que estava conectado à
mente de X-9, e não ao servidor que ocupava! Tal como Carmen Telford fez comigo
no passado, manipulando meus atos através dos implantes instalados. Contudo,
obviamente não tinha forças e nem intenções de controlar a hacker. Ao invés disso…
— Sempre ocupada demais lutando contra monstros gigantes pra ter tempo para
aquela nossa missãozinha juntos né? — Falei com a voz modulada, e meu corpo em
flickering constante, mas certo de que ela havia me escutado e também me visto,
sombreado por códigos.— Ei, você tá indo bem. — O simples fato de ser bem tosco
morrer pra uma aranha digital já deve te dar motivação suficiente.

Pensei ter ouvido um barulho que vinha do meu lado, e luzes começaram a rodear o
dirigível que havia roubado dizendo que a segurança de Henry realmente já deveria
estar a par do que eu estava planejando. — Max entrou em contato com uns amigos
dela, ela tá legal, aprendeu a se virar rápido. Vou te dar o update da geolocalização
dela pra você não se preocupar. — A imagem que me representa levou dois dedos ao
lado da cabeça e depois os apontou para a hacker dos cabelos azuis, deixando a
nuvem conduzir a informação. Parecia ser interessante o mundo que ela ocupava,
um mundo que eu pensei que até que gostaria de visitar mais vezes. Mas o tempo já
era curto e como sempre, o contato era breve.

— Bom, isso é tudo... vou deixar você se divertir agora. Arrebenta esse canalha por
mim. Apostei vinte miraicoins em você. A gente se vê qualquer dia, Gambinha. — Por
um momento parecia que se formava um sorriso na minha representação digital,
mesmo que impossível, antes de desaparecer em cubos de código ao vento. Quando
dei por mim no mundo real, o dirigível estava sob ataque. Eu não esperei até minha
cabeça parar de girar para trazer até minha mão novamente o arco com que abordei
a aeronave, me escondendo por trás do parapeito de metal, a única cobertura que
tinha contra dois veículos aéreos que se aproximavam, além de quatro mais
distantes. Uma flecha atingiu uma das turbinas da primeira nave, mas não foi o
bastante para derrubá-la. Com dois ocupantes em cada, continuavam atirando com
armas montadas tentando me deter do meu caminho, mas meu segundo disparo fez
a flecha entrar direto na cabine da nave da segurança privada e perfurar o peito do
condutor. Uma longa faixa luminosa agora arrastava como um reboque a pequena
nave conforme o dirigível ganhava velocidade adiante, trazendo-a comigo.

O prédio de Henry Choi se aproximava rápido. Eu olhava para baixo e via as pessoas
se reunindo na entrada, evacuando o prédio como eu bem havia pedido pra Calidora,
o que me trouxe um novo sorriso aos lábios. — Sem inocentes dessa vez. É isso aí,
Miraitropolis. Diferente do Canal 17, diferente do que me criou. Eu bem sabia que as
operações secretas daquele rascunho de tirano não se passavam bem debaixo do
seu nariz, mas o golpe era estratégico, crítico. Quase simbólico, o dirigível de
Carmen Telford contra o prédio de Henry Choi, guiado não menos do que pelo
aprendiz de ambos.
Eu tive tempo de mais um tiro, e muni o arco de mais uma flecha antes de atirar
contra a blindagem do carro aéreo que o dirigível rebocava, antes de desaparecer
em uma grande bola de fogo e fumaça.

Timothy Carter
As luzes do Cemitério Neon iluminavam a figura do homem que estava de pé em
frente ao túmulo de sua esposa e filha. Ele fumava um cigarro e olhava fixamente
para o nome delas escrito nas lápides. Elas eram tudo o que ele tinha de bom
naquele mundo podre e foram levadas de forma brutal, simples vítimas do jogo de
poder que dominava Miraitropolis. Ele tragou o cigarro uma última vez, soltando a
fumaça no chão e jogando o que restou no solo. Sua expressão era vazia e ao
mesmo tempo sombria.

— Tim? Finalmente te achei, a cidade pegando fogo e você aqui. — Falou Rose Ortiz,
a amiga e aliada de Timothy em sua cruzada em busca de vingança.

Ele então voltou ao mundo real, virando-se para Rose que estava de pé atrás dele. —
Como andam as coisas? — Ele falou num tom baixo e calmo de costume.

Rose deu um sorriso de canto, respondendo a pergunta. — Os corações de ferro


foram presos, apesar da morte da McCall, o plano deu certo. — O grande objetivo de
Timothy Carter havia se cumprido, porém ele se sentia satisfeito, a sensação ruim
que sentia não passou.

— Os panfletos e a aeronave estão prontos? — Ele perguntou, iniciando uma breve


caminhada com Rose até o carro.

— Sim, vai usar sua estratégia arcaica agora? — Ela perguntou. — As pessoas estão
nas ruas, revoltadas com tudo o que tem acontecido, essa é a hora de uma ideia ser
plantada e de um guia se erguer diante delas. — Rose tirou o smartphone do bolso
da jaqueta marrom e disse de forma descontraída. — Você quem manda.

Uma aeronave comercial modelo Hawk-11 sobrevoava o epicentro de todo o caos de


Miraitropolis, que agora já não era mais o centro, mas sim os arredores do Cassino
Overdose. De dentro da Hawk-11, uma grande quantidade de panfletos era jogada,
criando uma verdadeira chuva de papel que caía sobre o povo revoltado nas ruas.
Apesar de ser arcaico o uso de papéis nos dias atuais, em um momento como
aquele, seria a melhor forma de transmitir uma ideia para todas as pessoas que
acreditavam estar lutando por algo em Miraitropolis. No panfleto vermelho, que
lembrava o próprio sangue, tinha a seguinte mensagem:
Não existe paz sem luta.
Quem tira nossa paz não.
Quem mata nossas famílias.
Olha de cima.
Assistem a tudo de suas luxuosas coberturas.
Vamos tirá-los de lá, vamos tomar o topo.
Juntem-se à minha causa e lhes direi como.
Carter, Timothy.

X9
O estado deplorável em que fiquei não passava apenas de uma representação
gráfica daquela batalha. A gente não trocava socos nem nada, mas sim tentava
sobrepujar um ao outro com linhas de código, softwares, vírus, antivírus, firewalls,
ices, conhecimentos de informática, habilidades próprias e qualquer outra coisa que
um pirata virtual usa em seu arsenal para se proteger dentro da rede de dados. Toda
essa dor, esse mal-estar, toda essa dificuldade em respirar, esse excesso de sangue
escorrendo da minha boca e a vontade de vomitar são virtuais. Meu corpo não está
danificado dessa maneira fora da Lexis. É claro que eu precisava dizer isso para
mim mesma e me convencer, engolir a bile de volta e avisar ao estômago que não há
nada para ser expelido. Como eu disse, os danos, se eu tiver algum, serão cerebrais,
o que, dependendo de como for, pode ser pior. É, crianças, não brinquem com isso,
não transformem seus cérebros em um tipo de computador biológico, os riscos são
enormes.

As batalhas entre hackers não costumam durar muito, portanto, o próximo


movimento deve decidir o vencedor desse duelo. É por isso que preciso ter certeza,
só tenho uma chance. Se errar, ferrou, e de maneira definitiva. Acho que já apanhei o
suficiente para deixá-lo confiante o bastante. Assim como lá fora, no mundo real,
uma batalha aqui dentro também se vence tentando prever a ação do adversário. Se
eu estiver certa, ele vai tentar me derrubar da Lexis. Nessas situações, pelo menos
na maioria das vezes, quando se tem os recursos corretos para usar em uma vítima
que está fazendo uma conexão neural, que é o meu caso, significa morte. Em outras
palavras, todas as apostas estão contra mim. Ele é o cavalo que vai vencer a corrida,
correto?

Os dedos de Darkness se fechavam em volta da minha garganta, sem reação. Eu


não reclamava e nem reagia, sendo erguida do chão como se eu não pesasse nada.
A mão apertava meu pescoço com tanta força que quase perdia a consciência
novamente. Tudo se resumia a um jogo de sorte e rapidez... Nesse momento, vi algo
pixelado surgindo. A voz parecia ser a de Pollux, mas era impossível que ele tivesse
entrado aqui, ou será que não? Quer dizer... Eu levei muito tempo para conseguir...
Como ele fez em tão pouco tempo? Darkness parecia tão surpreso quanto eu e me
dava uma folga.

Tudo durou tão rápido... Mas... Aquilo era a distração que eu queria e precisava.
Minhas mãos encostaram no tórax de Darkness. Emanou uma forte luz azul, e de
dentro da luz surgiu aquela aranha asquerosa que tanto me incomodou e tentou me
atacar.

O bicho tinha o tamanho de Henry. Ao recriar a aranha em cima de seu peito, o


aracnídeo ficou no meu lugar e ainda o abraçou com todas as suas oito patas,
apertando-o como uma aranha de verdade faz com sua vítima. O abraço da morte
estava acontecendo, e Choi tentava lutar com seus braços mecânicos, mas com
meus aprimoramentos, Aracno estava muito mais forte do que ele. As pontas das
patas, como unhas de um lobo, enterravam-se nas poucas partes que pareciam
humanas, rasgando sua pele, nervos e tecidos como se fossem pano, expondo tudo
para fora. As patas reviraram e remexiam tudo dentro dele freneticamente, como se
quisesse deixá-lo oco. A coluna do idiota ficou exposta, e só aquilo deve ter doído o
dobro da surra que ele me deu. Ele parou de relutar, suas forças minadas, o filho da
puta começou a desmoronar. Era o fim dele, e eu sabia disso. No entanto, sem
misericórdia, Aracno projetou as duas pinças da boca na direção do peitoral de
Darkness. Sem fazer nenhum som, injetou um líquido azul em seu corpo. Hehehe,
outro ponto para minha criatividade. A aranha original não tinha veneno. O bicho
peçonhento o largou e Henry Choi começou a definhar, perdendo sua jovialidade e
ganhando uma aparência doentia, velha e frágil. Os músculos se atrofiaram, aos
poucos ele foi diminuindo de tamanho, perdendo força e resistência, parecendo um
velhinho de longa idade, encurvado e ofegante até para falar.

— Como…? — Ele se perguntava, rastejando.

— No mundo virtual, se você souber como, dá pra fazer de tudo, basta ter
criatividade, coisa que falta em você, meu amigo, e eu tenho de sobra. Não eliminei a
aranha, apenas... hmm… Digamos que… Absorvi, é, esse é o termo mais aproximado
pra se usar, absorvi Aracno. Sendo um programa de computador, modifiquei sua
invenção reprogramando enquanto absorvido. Só precisei trocar uns comandos
durante os sofridos momentos em que me espancava, é, a surra teve esse propósito,
além de te deixar confiante e descuidado serviu para mexer no código fonte do
Aracno, afinal não sou tão masoquista assim para levar porrada de graça.
Reconhecendo você como invasor e não mais eu ele te enrabou legal, ahahaha. Ah, é
claro, com uma licença poética a minha versão do Aracno é bem maior e mais letal
que a sua. — Questões resolvidas, a aranha Aracno se desfez, se tornando pequenos
números azulados que flutuando se agruparam no meu braço, fazendo parte de mim
e me curando dos machucados.

— Vou usar o código fonte do Aracno como meu sistema de defesa, é justo pelo que
fez com a Praxis, ela nunca mais foi a mesma depois daquele vírus maldito… Por
outro lado minha I.A. ganhou autonomia. Enfim, vou modificar algumas coisas no
programa à minha própria maneira, obrigada. — Choi suspirou apenas ouvindo, não
tinha vitalidade nem para falar. Sua imagem cadavérica não durou muito e caiu de
frente, logo virou poeira, havia sido desconectado da Lexis, eu tinha vencido.

— Então é isso, quando voltar espero não estar retardada ou algo do tipo… — Me
desconectei, diferente de Choi, da maneira certa.

Quando voltei a realidade para minha calma não tinha sofrido muitos danos no
cérebro, quero dizer, não permanentes. Limpei com a mão o sangramento do nariz.
O machucado do braço tinha sido fechado, no lugar ia ficar uma puta cicatriz
quando os pontos caíssem, melhor do que nada. Ouvi tiros vindo da entrada no
fliperama e Vladimir não estava mais por perto. Temi o pior, me erguendo com
dificuldade da cadeira, os músculos gritavam mas corri até a porta, o velhote tava
louco, dando tiros pra tudo que era lado.

— EEIN, TÁ ACHANDO QUE É O VELHO OESTE? — Gritei na porta.

— Miraitropolis enlouqueceu enquanto você cochilava, tem gangue que nunca vi


saindo dos bueiros, alguém precisa impedir que eles roubem a van e invadam o
arcade! — Ele parecia bravo.

— Não estava dormindo! — Foi minha vez de retrucar. — Venci Darkness.

— Eu sabia que você é hacker, e que seu nome não era Érica. — Vladimir continuava
a dar tiros, me encolhia a cada disparo.

— Tenho acesso aos registros de Nick Slay, mesmo ele não sabendo. Inclusive por
meio deste que sei que foi você quem lutou com o Necroide Alfa na Orion, e que
fechou um acordo com Slay entregando a Praxis para a ParaMilitech em troca da
sua liberdade e anonimato dos amigos. — Ele baixou as armas, me fitando.

— Não tinha como não saber, eu vendi as armaduras e o equipamento bélico que
Tony cedeu para os Steelhearts entrar no prédio de K’dore naquela noite. — Mantive
meu silêncio, deixando ele conduzir a conversa.
— Não via outra pessoa se não você para vencer Darkness. E como foi? Ele morreu?
— O russo trocava os carregadores dos rifles esperando a resposta.

—Não, fiz melhor, fritei os implantes neurais dele, deve ter doído até na alma. Henry
nunca mais vai entrar na Lexis. Pra um hacker isso é pior do que a morte. — Acendi
um cigarro e dei uma longa tragada em forma de comemoração.

— Vocês hackers são estranhos… Eu preferia ouvir que Choi está morto, não esqueça
que ele ainda tem bastante força no mundo real ao lado de Telford servindo de
agente duplo para os russos. — Deu um tiro para o alto, afastando alguém que se
aproximava da van. Me encolhia de susto.
— Pollux vai dar um jeito nele aqui do lado de fora. — O vovô deu de ombros e mudou
de assunto, entrando.

— Tenho uma boa notícia, Dexter o garoto esperto de Galathea me passou a


informação de que o Overdose está ruindo e que Yuric e seu bando escaparam
usando os ares. As coordenadas que ele me passou não mentem, indicam uma fuga
pelo Oceano Atlântico, sabe o que significa? — Ele me fitou nos olhos, seriamente.

— Que ele foi buscar refúgio no navio nazioviético que está chegando em
Miraitropolis. — Respondi, tragando novamente.

— Exatamente! É a oportunidade ideal de matar dois coelhos com uma pancada só,
como vocês dizem por aqui. Yuric está enfraquecido e irritado, vai ficar um longo
tempo lambendo as feridas. É esse período que nós vamos usar para interceptar o
navio. — Respondeu empolgado.

— Opa, opa, opa, peraí, como assim “nós” cara pálida? — Franzi o cenho.

— A única forma que eu vejo de impedir a chegada do navio russo é repetir o que
Montana fez. Já tenho você comigo, resta saber se me ajuda a unir um pequeno
time. Assim não preciso envolver a ParaMilitech oficialmente nesse assunto. —
Coçava a barba branca, uma mania que tinha.

— Quem disse que vou topar essa loucura? E mesmo que fosse topar, a maioria dos
Steelhearts estão mortos ou aposentados. Ninguém vai entrar na sua conversa. —
Respondi sem olhá-lo.

— Minha ideia nunca consistiu em usar os Steelhearts. Mas sim uma lista de nomes
que venho observando estar envolvidos nessa guerra de gangues desde o início.
Estudando eles, me parece que existe um grupo de pessoas especialistas em
sobreviver a esse tipo de caos. Se reunirmos temos uma grande chance contra o
navio naziviético e Yuric. — Repetia a ação anterior.

— Quem faz parte dessa lista além de mim? — Cruzei os braços, foi minha vez de
encarar ele seriamente.

— Pollux, Gini, sua amiga Max, o garoto esperto que mencionei, Dexter, Gal, uma
mulher com habilidades incríveis de se tornar invisível e intocável, além da própria
Galathea e seu ajudante, Jesse. Quem sabe Calidora. — Vendo que estava seguro,
fechou a porta.

— Como sabe da Max, Gini e da Calidora? Eu nem mencionei eles… Quanto muito
pouco falei de Pollux… Você… Estava nos espionando desde o começo? — Descruzei
os braços indo para cima dele, mesmo sabendo que isso não era uma ideia
inteligente.

— Sim. — Ele não se intimidou. — Vou também juntar um pequeno grupo da


ParaMilitech que vem me ajudando desde sempre, eles são de confiança. Ficarei
encarregado de falar com Galathea, Dexter e Gal, talvez um ou outro da turma de
Pascal e Xiaren. Para o restante preciso de você, vai me ajudar? — Levei a mão ao
queixo, depois cocei a cabeça, andando de um lado ao outro.

— Me dê um tempo para pensar… — Fui para os fundos da casa de arcades, deixando


Vladimir na entrada. Fiquei em uma sala velha que tinha só uma mesa, uma cadeira
e uma pequena cafeteira. Foram quatro xícaras de café uma atrás da outra, fumei o
bastante para mandar um dos pulmões pra vala e entrar na fila de transplante. Já
estava quase convencida que entrar nessa ia ser furada, declinada a dizer não, uma
mensagem na minha pulseira comunicadora me fez mudar de opinião.

Cada vez que voltava para o salão principal do Arcadia Vladimir tinha uma nova
surpresa fazendo alguma coisa maluca, antes foi agir como um cowboy, agora ele
havia juntado todas aquelas pessoas que tinham sido desligadas dos fios da casa
de jogos de Choi e os empilhado na rua. Removendo o tanque externo da van e
usando como recipiente para despejar o radiack combustível nos pobres coitados
nus deitados no asfalto, ele riscava um palito de fósforo. O pior de tudo é que eles
não reclamavam, pareciam estar ali por vontade própria. Antes de acontecer a
merda avancei em sua direção apagando o fogo segurando sua destra.

— Enlouqueceu? Matar vagabundos de gangues tudo bem, ATÉ VÁ, mas essas
pessoas, são inocentes e vítimas de Darkness! — Gritei contra seu rosto.
— Olha para eles! — Gritou de volta, me empurrando. — São corpos sem alma, sem
identidade! Plugados na Lexis não passam de escravos, offline são cascas vazias
sem vontade. — Encarei a pilha de corpos e me aproximei, o monte respirava, então
me abaixei em sua frente tocando um homem sem cabelos igual aos demais e
como todos os outros me olhou, tentei falar, eles me ouviam, mas não respondiam.

— Está vendo? É um sofrimento cada minuto de vida deles, uma existência


desnecessária, para que viver assim? — Não disse nada, ainda fiquei abaixada
tentando buscar alguma reação neles que me dissesse que não eram só bonecos de
carne.

— Estou tentando ser coerente e misericordioso, Choi criou eles apenas como
servidores humanos… É triste, infeliz e desumano? Sim, é, e bastante! Mas você só
estará prolongando mais o castigo deles se os manter vivos. — Nada de respostas
daquelas pobres criaturas, quanto mais eu tentava comunicação mais entendia que
Vladimir estava certo. Me erguia e mantinha-me calada, voltando para o Arcadia.
Vladimir riscava um novo palito de fósforo e incendiava a noite com cheiro de carne
e ossos queimados, não ouvi gritos. A pilha de corpos ardeu bloqueando a
passagem da rua, o ato também serviria para colocar medo e espantar as gangues
que tentassem nos roubar ou invadir o fliperama, eu sabia que os russos eram
doidos, parte minha é russa, mas aquilo já era demais.

— Não podia ter pelo menos metido uma bala na cabeça de cada um? — Comentei
quando ele voltou para dentro .

— Não tenho tanta munição assim, preciso economizar. — Vladimir parecia não se
cansar nunca e adorar seu trabalho.

— Já decidi, vou te ajudar, só por que tô vendo o inferno que Mirai está se tornando,
já tem gente sendo queimada aos montes nas ruas. — Ele fez que não entendeu a
alfinetada.

— Isso tem que terminar, eu tive presente quando K’dore enlouqueceu, quando
Telford assumiu o poder, enfrentei a porra de um necroide alfa, cai com ele de um
prédio… Teve morte, confusão, violência, m as nada como isso… — Baixei a cabeça
lamentando.

— Vou chamar um Crow-Z para nos pegar, andar por terra em Miraitropolis é algo
impossível atualmente. Vai ser também uma maneira mais ágil e segura de carregar
o satélite. — Ele levava a destra até a pulseira comunicadora.
— Só uma coisa! — Interrompi segurando seu antebraço antes de fazer a chamada.
— Você vai me prometer cuidar de todos que eu convidar, Pollux, Max, Gini e
Calidora. — Ele concordou, positivando com um aceno de cabeça.

— Quero que me prometa! — Salientei.

— Eu prometo. — Respondeu sério e alto.

— Tem mais! Boris vai estar com Yuric, ninguém toca nele antes de mim. Vou fazer
ele pagar pelo que fez com Liam. — Nunca esqueceria de Liam, nosso líder dos
Steelhearts que foi morto por causa desse cara. Me lembrava que foi o motivo de ter
entrado nessa, me vingar de Boris.
— Todas as madrugadas desde então passei a acordar suada depois dos pesadelo,
tendo que visitar sua lápide no cemitério neon no meio da noite… Só assim
conseguia voltar a dormir. É verdade que já faz um certo tempo que não visito…
Tenho andado meio ocupada tentando me manter viva numa cidade selvagem, mas
isso não muda o fato que ainda me sinto culpada pela sua morte. — Escondi a
lágrima que correu pelo rosto.

— Consta nos relatórios de Nick Slay a causa da morte de Liam, combinado, Boris é
todo seu. — Mais uma vez algo havia mudado dentro de mim vendo a pilha funeral
arder, a cidade desmoronar e relembrar de Liam. Mais uma parte minha morria, e
não era exagero, eu ia atrás da máfia russa, e ia colocar pra foder, a situação tava
uma merda mesmo, não vou me importar se tiver que matar. Quem liga? Eu não,
carregar o assassinato de Boris não ia me trazer Liam de volta, mas ia me fazer
bem. Essa droga de lugar chamada Miraitropolis envolve a gente até um ponto em
que você se sente sufocada, irritada, pressionada e obrigada a fazer coisas que
pensou jamais fazer.

— Espera, tem mais! Eu não posso garantir a ajuda dos meus amigos, mas com uma
troca de favores tudo fica mais fácil. Uma amiga da Max me mandou uma
mensagem uns minutos atrás. Ela matou a Tenente Aurora e as imagens estão com
os milicos, sorte que estão criptografadas, mas não por muito tempo, o vídeo está
sob análise, tem gente da P.M. tentando desbloquear as imagens… Se descobrirem,
Gini e Max estão encrencados. Ajudar eles pode ser uma boa moeda de troca. —
Ergui o indicador.

— Só uma pessoa faria isso... Magane Grisson. Ele é obsessivo com esse tipo de
procedimento, se tratando da Tenente Aurora então... Faz ainda mais sentido ser ele
o encarregado das análises. Eles são um dos tantos agentes corruptos dentro da
ParaMilitech… Mas o que você quer que eu faça? — Isso soava irônico, Vladimir
vendia armas da PM para criminosos e fora da lei como um traficante da polícia.
— Não tenho acesso a criptografia, se não eu mesmo faria o trabalho. Nesse caso só
vejo uma saída, eliminá-lo. — Falei acendendo o último cigarro.

— Você está pedindo para eu matar um agente da ParaMilitech? Que loucura… — Ele
desdenhou virando de costas.

— Você disse que ele é corrupto. Mais um motivo para intervir! Até a ParaMiltech vai
sair ganhando se ele bater as botas. — Vladimir parou, ponderando de costas,
colocando a mão no queixo e coçando a barba grisalha.

— Aurora já morreu, se Grisson também for morto... Hmm... É, pensando bem não é
uma ideia tão ruim assim. Apesar de ser arriscado nunca gostei mesmo de Grisson.
— Vlad voltou novamente a me olhar e perguntei.

— Qual é o plano? —Peguei o cigarro que ele ofereceu e acendeu para mim. O meu já
tinha acabado há décadas.

— Direi que tenho informações sobre o assassinato da Tenente, informações que só


podem ser passadas pessoalmente. Magane é desconfiado demais, mas sua
obsessão vai levá-lo direto a armadilha. — Sem perda de tempo Vladimir convocou
sua nave pela pulseira comunicadora.

— De acordo com Aria, a amiga da Max, uns caras mandados por Darkness
detonaram a oficina dela. Black Hats, Choi financia eles, você os conhece? — Joguei
a fumaça para cima.

— Existe um outro hacker que se chama Black Hat, oito meses atrás ele invadiu o
banco de dados da ParaMilitech, mas não roubou nada. Achei que fosse um
adolescente chamando a atenção, não imaginava que fazia parte de um grupo
financiado por Choi. Precisamos ficar de olho nessa gente, Choi pode estar vencido,
mas ainda aliados. — Não disse nada, iria atrás dessas informações quando tudo
acalmasse, mas isso me deu uma outra ideia,

— Estou aqui pensando sobre o assunto... Tenho lidado com pessoas perigosas, e
estou pra enfrentar talvez as piores que já conheci em toda minha vida, seria justo
eu ganhar uns upgrades. — Ajeitei o moicano para o lado esquerdo. — Tipo... quero
fazer reajustes nos meus implantes, potencializá-los, mas sem sofrer a mesma dor e
trauma que passei na clínica clandestina da cidade murada, a ParaMilitech pode
fazer isso. E para o combate no mundo real pensei em uma mira smartlink.
— Ficará com aprimoramentos corporativos de um empregado da P.M. — Pelo tom
de voz e a expressão aquilo soava como um não.

— É isso aí, se quer algo bem feito, tem que investir. — Bati em seu ombro,
amigavelmente, abrindo um sorriso divertido.

— Está querendo me levar na conversa... Você é muito malandra... — Vladimir se


virou, ainda era uma possibilidade em aberto, não disse que sim mas também não
disse que não. Mas mudou de assunto.

— O Crow-Z chega em meia hora. — E então enviou a isca para Grisson via bracelete
digital, marcando hora e local do encontro.
Como ele prometera, pontualmente o Crow-Z chegou trinta minutos depois. Junto
com os soldados, o vovô russo transportava o satélite para dentro da nave, assim
como minha motocicleta antigravitacional. O furgão foi incendiado em seguida, com
o cara dos Navalhas Vermelhas dentro. Vlad não queria deixar pontas soltas naquele
caso. Ao adicionar fogo à pilha de corpos, as chamas aumentaram diante do
Arcadia. Vlad sabia que eu tinha interesse em me apossar do estabelecimento como
um espólio de guerra, para lembrar a batalha vencida em cima de Choi. Da mesma
forma que obtive a moto de Red, Vlad deixou dois agentes de armadura guardando o
lugar, além de um robozão grandão. Eu não fazia ideia de como ele conseguia ter
acesso a todas aquelas coisas sem que a ParaMilitech desse por falta. No entanto,
achava meio desnecessário. O aviso estava bem claro, aquela fogueira
desencorajaria qualquer um. O seguro morreu de velho, melhor assim. Vlad me
entregou uma jaqueta de couro preta. Não sei de onde ele a tirou, mas foi muito
bem-vinda. Meu sobretudo havia virado um farrapo.

— Vamos passar em casa, quero pegar minha katana. — Lembrei antes de entrar no
Crow-Z.

— Vou equipá-la com as mais eficientes armas de fogo e você quer uma katana,
menina? — Vladimir franziu o cenho.

— É minha espada da sorte, tomei ela de troféu depois da primeira missão com os
Steelhearts. Tem bastante valor sentimental.

— Você gosta de colecionar objetos dos seus adversários como um tipo de troféu…
— Apertou a boca.

— Claro, até hoje tenho um parafuso que guardei depois que derrotei o Necro-A. —
Zombei dele.
O coroa de barba e cabelos grisalhos achou melhor não retrucar. Alçamos voo
debaixo daquela chuva e deixamos o solo e a região de Miraitroide, rumo à Cidade
Média, onde meu hotel, se ainda estiver em pé, fica. Era uma noite de intenso tráfego
aéreo na cidade, e não era para menos. Lá embaixo, o caos reinava, e quem podia
utilizava qualquer meio que não tocasse o chão. Pousamos não muito tempo
depois, bem no meio da avenida. Sem muita surpresa, a rua estava suja como
sempre. No entanto, o hotel estava sendo saqueado e depredado. Os moradores
abandonaram o local, deixando tudo para trás. O dono foi morto por uma gangue
assustadora que se vestem de palhaços - odeio palhaços. Praticamente só a
fachada do hotel permanecia de pé. Restavam poucos apartamentos com algo
dentro. Eu via pessoas usando minhas roupas, levando móveis, pegando minha
televisão, cama, armário. Os mequetrefes não perdoavam nem a pia; estavam
levando até o vaso sanitário e a banheira de hidromassagem. Vlad, sendo perspicaz
como sempre, percebeu pelo meu olhar de aborrecimento que tudo aquilo já tinha
sido meu.

— Se quiser podemos pegar de volta suas coisas e dar uma lição nesses ladrões. —
Falou sentado ao banco do lado, observando pelo vidro da janela.

— Deixa… Não tinha nada de valor… Meu dinheiro está guardado numa conta
corrente. Só quero a katana. — E essa estava bem guardada em um compartimento
do quarto, não tinha como saberem. Só que não esperava ver uma oriental de cabelo
chanel e um longo vestido florido com decote saindo do hotel com a minha katana
na cintura. A perua fazia pose, exibindo a coxa no corte que o vestido possuía na
lateral e que imitava um quimono; - de quenga, claro. - Eu não ia permitir o desaforo
e perdi a linha, arrancando o cinto do banco do Crow-Z e abrindo a porta da nave
com força. Desci e caminhei em direção à japonesa abusadinha, falando alto
enquanto apontava para ela.

— Ô queridinha, essa katana é minha! — A vaca não disse nada, só me encarou


ameaçando desembainhar a katana.

— Larga a merda da espada, vadia! — Ela manteve a posição, esperando que eu me


aproximasse para usar a katana.

Quer dizer, só até eu pegar a pistola embaixo da jaqueta de couro e apertar o gatilho
sentindo o braço indo atrás e o brilho cortando a noite ao meio. Ela cambaleou, eu
não sabia onde tinha atingido, e nem me importei, vi onde tinha sido baleada só por
causa das manchas vermelhas encharcando e maculando o branco do vestido
florido no ombro direito e na lateral esquerda da cintura. Dei mais dois tiros, alvejou
o peito ao lado oposto do coração e o outro pegou a bota de couro preta de salto e
cano longo, bem na canela. A piranha largou a espada, mal ficou em pé e caiu na
poça de sangue aos seus pés. Fui até a japa e tomei a katana, depois me abaixei
para comprovar que ainda estava respirando.

— Que pena, vai ficar um buraco no vestido... Digo... Vários... Olha, tá viva, sorte sua,
atirei pra matar. Mas não sou tão boa de mira. Considere sua noite de sorte e
quando alguém armado mandar você devolver algo, devolva! — Caminhei de volta ao
Crow-Z onde a galera da PM assistia a cena, e Vladimir mais do que todos parecia
surpreso. Ele abriu a porta para eu entrar.

— Tem razão, precisa dos upgrades, você atira mal, muito mal! — Lamentou, parecia
galhofa, mas falava sério. Precisei segurar o riso.

— Eu avisei... — Falei entrando na nave e fechando a porta.

— Mas depois de pegarmos Grisson. — O Crow-Z novamente alçava voo. Não quis
deixar Max, Gini ou Aria ansiosos, rapidamente levei os dedos ao teclado da minha
manopla, usando a pulseira comunicadora em conjunto para enviar uma mensagem
explicando o plano.

< Mensagem de: X-9:

Oi Aria, aqui é a X-9, um amigo meu disse para vocês ficarem ligadas, esses Black
Hats são perigosos, se aparecer mais deles não os enfrentem. Vou descobrir mais
sobre eles. Diz pra Max que eu e esse mesmo amigo vamos tentar interceptar o cara
que tem as imagens. Não posso confirmar que terei sucesso, só enviei a mensagem
para que saibam que estou cuidando do assunto. Daqui a pouco retorno avisando se
deu certo ou não.

Fim da Mensagem. >

O Crow-Z de Vladimir foi direto para a periferia do Eden, uma região bastante
afastada da aglomeração urbana do restante da cidade, onde o muro que separa
Miraitropolis do deserto pode ser visto. Não escondi minha admiração, fiquei
realmente impressionada, comprovando que o muro é real. Nunca tinha visto e
achava que fosse apenas mais uma história contada, uma lenda urbana como
tantas outras. Era um local excelente para o vovô russo e sua equipe descerem com
antecedência em relação a Magane Grisson. Eles se posicionaram estrategicamente
em pontos onde a luz dos postes não poderia iluminá-los. O próprio Crow-Z ficava no
escuro de uma esquina, totalmente mergulhada nas trevas. Os agentes aguardavam
a chegada do carro de Grisson na penumbra, portando seus rifles em mãos. Longe
da cidade, os atiradores poderiam disparar sem silenciadores, apenas os
suburbanos ouviriam o estrondo dos rifles ecoando sobre o carro.
Os moradores do Eden não teriam a quem contar. É uma comunidade que possui
pouca ou nenhuma credibilidade, não por sua integridade moral, mas sim por razões
que o resto da cidade simplesmente ignora. O bairro foi criado justamente para
concentrar a população miserável da cidade, formado inicialmente por
ex-presidiários, ladrões, saqueadores, ciganos e outros. Eles recebiam residências
longe do centro. No entanto, ao longo dos anos, pessoas honestas também
passaram a residir ali, submetendo-se a moradias baratas apenas por falta de
condições financeiras. Curiosamente, os prédios e casas não têm a cor escura como
a maioria de Miraitropolis, nem neons. Até nisso se diferenciam do resto. A cor dos
materiais de construção é mais clara, um tipo de granito ou mármore varrido pela
areia. Não é à toa que depois daqui só temos o deserto radioativo. Até as barras de
aço utilizadas para a sustentação dos edifícios possuem a mesma cor opaca e sem
graça.

Estava preocupada, mostrando-me nervosa e bastante inquieta. Grisson não dava as


caras e já haviam se passado vinte minutos. Para meu alívio, dez minutos depois,
um hovercar alongado de cor cinza claro, como o granito das construções ao redor,
se camuflava na paisagem do Eden ao estacionar exatamente no ponto onde o
encontro havia sido combinado, na esplanada em frente à igreja do bairro. Vladimir e
eu observamos atentos a descida do veículo pelas janelas da nave. Os soldados
também observavam em total silêncio, ninguém respirava para não levantar
suspeitas, apenas aguardando as ordens de seu superior para agir.

— O filho da puta estacionou abaixo de um poste, não é nada burro... Com os


soldados no escuro, mesmo que os dirigíveis do Olho Elétrico gravam a ação não
será possível identificá-los. Não vamos cometer o mesmo erro que sua amiga Max.
— Olhava através de um binóculo.

— Ele está usando um indutor de imagem. Não quer ser associado com minha
pessoa. É engraçado ver Grisson de terno e com aquele cabelo loiro esquisito. —
Passava o binóculo para mim, mesmo eu não tendo noção da fisionomia verdadeira
de Magane algum tipo de tecnologia que podia atravessar os vidros escuros do
carro permitia que seu rosto fosse visto.

— Hora dos fogos de artifício! Não quero tiros na cabeça, o arquivo não pode ser
danificado! — Ordenava para seus homens usando a pulseira como comunicação
com eles.

Os primeiros tiros atravessaram os vidros. A munição calibre 40 com ponta de


radiack era mais do que suficiente para furar a blindagem do carro. Os soldados
organizaram-se de forma a ficarem distribuídos igualmente dos dois lados da rua,
formando um corredor polonês onde o automóvel permanecia no centro. O corpo
dentro do sedan se remexia sem parar, sendo perfurado por todos os lados em um
festival de balas. Era humanamente impossível alguém sobreviver à chuva de
projéteis furiosos que rasgavam a lataria e perfuravam as janelas. Os rifles
queimavam cartuchos, esvaziando a munição das armas. Não restavam dúvidas,
Magane Grisson e seu motorista estavam mortos.

— Agora é a sua vez! — Vladimir abria a porta, eu pulava encaixando a lâmina de


vidro no rosto, ajustando a holomáscara para padrões de uma aparência masculina.
Se fosse filmada, o Olho Elétrico testemunharia um homem, sem cabelos, 30 anos,
vestindo camisa esporte azul, calça jeans e tênis all star preto entrando no carro de
Grisson. Carregava comigo um rifle caso precisasse usá-lo.
Ao destravar a porta tinha que lidar com muito sangue no estofado do carro e vidro
temperado despedaçado, procurar um local onde o líquido vermelho e os cacos não
estivessem presente se tornava uma tarefa completamente difícil. Me sentei em
cima de uma poça gosmenta e rubra cheia de pedaços de vidro ao lado do homem
loiro de cabelos crespos de terno e gravata grafite, a aparência que Grisson usava
com o indutor de imagem. Pluguei os conectores do meu crânio à entrada
estabelecida na lateral da cabeça do morto, abaixo da orelha e fiz a conexão com a
manopla.

—Já baixou os dados? — Vladimir me apressava pela pulseira comunicadora

— Calma, ainda nem comecei, eu nunca fiz isso antes. — A conexão ainda precisava
se estabelecer.

— Como? — Ele perguntou se irritando.

— Nunca fiz download dos arquivos da cabeça de um morto, sou marinheira de


primeira viagem. Nem sei se vai dar certo. Se não der certo, pelo menos Grisson está
morto, e vamos torcer para que ele não tenha compartilhado o arquivo com mais
ninguém. — Ainda não tinha conseguido entrar na mente morta de Grisson.

— Pare de tagarelar, faça o que tem que fazer, garota e saía daí! — Ordenou com a
voz grossa, como se eu fosse um de seus empregados.

Eu tinha menos de cinco minutos para conseguir manter a conexão com Grisson.
Depois disso, os neurônios, sendo as primeiras células a se decompor, também
deteriorariam o arquivo das imagens descriptografadas, e elas se perderiam para
sempre. Nervosa e sem um manual de instruções ou alguém para me auxiliar, quase
que por sorte, entrei na conexão neural de Magane. Grisson tinha uma quantidade
impressionante de informações arquivadas em seu cérebro, do tipo de engenharia
que só poderia ter sido feita com um HD implantado nele. Isso também explicava
como ele conseguia fazer análises de imagem e descriptografar arquivos.
Vasculhando dentro de sua mente, encontrei informações que deixariam Carmen
Telford com seus cabelos prateados em pé e fariam Vladimir parecer vinte anos
mais velho. Escândalos envolvendo atrizes, políticos ligados a prostitutas, amantes
alimentando o tráfico de drogas e o mercado negro de escravos humanos do
deserto, venda ilegal de órgãos. Acordos corruptos dentro da ParaMilitech, histórico
de fichas sujas de Nick Slay e do General Kasper, e até mesmo algo relacionado a
Telford e K'Dore no antigo esquema dos necroides. Não conseguia me concentrar e
selecionar o que realmente importava, sempre havia uma pasta ou outra em que eu
parava para ler mentalmente. Vladimir ficava ainda mais apreensivo.

— Conseguiu? — Gritou.

— Tem cada coisa na cabeça desse cara que dava para incriminar até o Papa… —
Respondia admirada.

— X-9! SE CONCENTRE! COPIE AS IMAGENS E VENHA! — Gritou ainda mais do que


antes.

O grito me fez estremecer, mas também me trouxe de volta à realidade, lembrando


do que realmente importava e por que eu estava ali. Agora, eu me concentrei com
mais determinação, buscando fundo na mente de Magane. O tempo estava se
esgotando, restavam menos de quatro minutos até que tudo fosse apagado
definitivamente com a morte dos neurônios. Eu corria contra o relógio e sabia que
não havia tempo a perder. Com dois minutos e meio restantes, senti o suor frio
escorrer pela minha testa. Vasculhei entre os arquivos mais bem guardados, usando
o recurso da leitura dinâmica para agilizar minha busca. No entanto, não encontrava
nada relacionado ao assunto de McCall. De repente, deparei-me com uma pasta
intitulada "Assassinato de Aurora" e acionei o play, bastando apenas um comando
para que as sinapses me transportassem rapidamente para dentro daquela
lembrança. Ali, testemunhei Max e Gini explodindo um carro. Sem perder tempo, fiz
o download do arquivo e, como a conexão estava bem estabelecida, diferente do
início, não demorou mais do que os dois minutos restantes para que tudo fosse
baixado por completo. Despluguei os fios da entrada do conector abaixo da orelha
do falecido e saí do carro, correndo em direção às trevas onde os soldados me
aguardavam dentro do Crow-Z, juntamente com Vladimir. Era hora de escaparmos
pela tangente.

— Consegui! — Gritei correndo de volta e entrando na nave. A porta se fechou e eles


alçaram voo saindo do Eden. Retirei a holomáscara e sem perda de tempo enviei
outra mensagem para Aria.
< Mensagem de: X-9:

Aria, sou eu de novo, roubei as imagens criptografadas, isso custou a vida do cara
da ParaMilitech, mas não vem ao caso e nem nós importamos, não é mesmo?
Magane Grisson era o nome do sarna, tivemos a sorte que ele não compartilhou
com mais ninguém o arquivo. Pede para a esquentadinha não matar mais nenhum
milico, por favor. rs. Preciso urgentemente falar com a Max, não saiam de onde
estão, vou até vocês.

Fim da Mensagem. >

— Avisou sua amiga? — Perguntou Vladimir, balancei a cabeça positivamente.

— Então vamos cuidar dos seus upgrades. — Demorô.

Ekkusu naino rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 16 para torrar os implantes
de Darkness que resultou 17 - Total: 1 Sucessos

Ekkusu naino rolou 1 dados de 20 lados com dificuldade 16 para vencer Grisson que
resultou 16 - Total: 1 Sucessos

Irvine Montana
O som da música eletrônica ecoava de dentro do pequeno cômodo nos fundos da
boate. Lá, um homem careca com tatuagens na cabeça estava amarrado a uma
cadeira de ferro, enquanto outros dois homens permaneciam de pé segurando
facas. O indivíduo na cadeira exibia diversos cortes pelo corpo, seu rosto estava tão
machucado que parecia um tomate podre de tantas pancadas que havia recebido. A
porta do pequeno quarto se abriu e entrei, fazendo um gesto com a mão para que os
dois rapazes com as lâminas saíssem. Vestia um elegante terno branco sobre uma
camisa branca com finas listras diagonais, dispensando a gravata, pois eu as
detestava.

— Boa noite! Vocês russos realmente odeiam diversão. — O cara mantinha a cabeça
abaixada, se recusava a me dar atenção. — Já foram mais de quatro ataques aos
clubes, boates e bares e hoje você pretendia fazer mais um com aquela mochila
cheia de explosivos. — Minha direita estava sobre a cintura enquanto gesticulava
com a direita. — Vocês começam o caos e ainda querem tirar a distração das
pessoas, eu particularmente acho isso uma sacanagem.
Parei de falar por um momento, levando a canhota ate um dos coldres axilar que
usava por baixo do terno, sacando uma Beretta e colocando o cano sobre a testa do
russo.

— Você é o típico russo machão, só vai começar a dizer algo depois de horas e horas
de tortura e não tenho para isso. Não quero saber do Yuric, sei tudo que preciso
sobre aquele filho de uma cadela, quero saber sobre o atirador. O rato que disparou a
bala que mandou o Tony pro inferno. — Engatilhei a arma. — Você me diz o que sabe
sobre ele, eu te mato e tudo acaba. Você continua pagando de durão, meus homens
entram com uma barra de ferro e um martelo, primeiro enfiam a barra no seu rabo e
depois esmagamos suas bolas, a escolha é sua. — E pela primeira vez ele ergueu a
cabeça, me olhando nos olhos como um cão raivoso. Para homens como aquele,
sua masculinidade frágil valia mais que tudo, mais que a própria vida.

— E-ele é um atirador de elite que o Yuric contratou como assassino e


guarda-costas, ele parece ter um olho biônico e dizem que é capaz de acertar um
copo a 10 km. Todos o chamam de Trigger, isso é tudo que eu sei. — Para ser
sincero, ele não disse nada que eu já não soubesse. No fim das contas, foi uma
perda de tempo. Retirei a arma da sua cabeça e a guardei novamente no coldre,
saindo da sala em seguida. No minuto seguinte, a dupla de homens que estava
presente antes entrou, um segurando uma barra de ferro e o outro com um martelo.

— Eu to segurando todas as pontas possíveis Bernard, se não sou eu mantendo a


lavagem de dinheiro e os estabelecimentos funcionando o pagamento dos homens
começaria a atrasar e aí sim estaríamos afundados na merda. — Levei o copo que
continha uma dose de uísque até a boca e virei de uma vez só.

Bernard era meu homem de confiança, era o cara que me auxiliava em todo tipo de
negócio. — Eu te entendo cara, mas não podemos passar por cima do que Tony
disse antes de bater as botas, Galathea foi a escolha dele. O problema que tá
surgindo é o Castelone, ouvi dos homens que estão recebendo ordens diretamente
da chefia que o cara que tem dado as cartas e não ela.

Levantei da cadeira que ficava atrás de uma mesa metálica, levando ambas as mãos
sobre meu cabelo e o colocando para trás. — Vamos para o Olimpo, a cidade tá um
caos por causa das últimas decisões tomadas, a Galathea tem fama de ser muito
competente, mas o Castelone é um puxa saco que a única coisa que sabe fazer bem
é dirigir. — Peguei o terno que estava jogado sobre um sofá no canto do escritório e
o vesti.

Bernard me acompanhou enquanto saíamos. Descemos as escadas que levavam


diretamente ao salão da boate. As luzes piscantes e a música alta dominavam o
ambiente, enquanto as pessoas dançavam sem parar, alheias ao caos iminente que
pairava sobre Miraitropolis. Ao passar pelo bar, pude ver a bargirl realizando
habilidades impressionantes com as garrafas, um verdadeiro espetáculo.

— Cuidado com as garrafas, volto logo meu doce. — Ela apenas sorriu. Eu tinha a
reputação de tratar as pessoas ao meu redor com consideração, desde
subordinados e clientes. Era essa habilidade em lidar com as pessoas que me
tornava tão eficiente em minha área. Saímos da boate e entramos no Hovercar
estacionado, partindo pelos céus em direção ao Olimpo.

Narrador Capítulo 13
Largados à própria sorte pelo seu comandante, os mercenários russos haviam sido
praticamente dizimados por completo. Sem uma voz líder que os orientasse, a
situação só piorava. Eles estavam perdidos, como crianças desamparadas. Além
disso, a escassez de munição também era um problema, já que o principal
fornecedor de armas, o traficante Seu Zé de Rio Bravo, fora proibido de negociar
com a gangue de Yuric. Essa jogada acabou definindo o resultado da disputa, com
méritos para o comandante provisório dos latinos, Roberto. O Overdose
inevitavelmente estava fadado a cair, parecendo mais ruínas ou um pedaço de queijo
suíço. Os russos que ainda estavam vivos se renderam. Como o desfecho de um
espetáculo bizarro e de mau gosto, tudo se encerrou com uma última explosão no
salão principal do cassino. Máquinas e cofres sofreram um impacto severo,
resultando em uma chuva de dinheiro.

Cédulas caíam do céu, assim como as gotas de água em uma chuva intensa.
Principalmente os protestantes, pessoas comuns e sofridas que se uniram a
marginais para derrubar a tirania de Nuryev, pegavam as notas acreditando ser uma
forma de recompensa após o confronto. De forma estranha, junto com o dinheiro,
panfletos com palavras inflamadas aumentavam ainda mais os ânimos e as
esperanças daquela população sofrida. Alguém na multidão leu algumas frases e
encorajou os outros a também lerem os papéis que caíam do céu.

Parecia que os planos de Tim, de alguma forma ou de outra, se alinhavam com a


casualidade dos fatos. Quase simultaneamente, os outdoors eletrônicos, monitores
holográficos de LED e toda a propaganda usada para ilustrar comerciais nas
fachadas dos prédios e suas vidraças se transformavam em imagens que
incriminavam Carmen Telford de diversas maneiras. Gravações e áudios vazavam
para que todos tivessem noção de que a mulher de preto era contraditória e
suspeita, corrupta e mentirosa. Se aqueles vídeos eram verdadeiros ou fake news,
nem mesmo Caz havia morrido e sido vítima de manipulação. No meio da multidão,
alguém gritava, inflamando os corações esperançosos e cansados: "É HORA DA
REVOLUÇÃO!" E o restante respondia, gritando e erguendo pedaços de paus, pedras
e ferro para o céu chuvoso e cinza de Miraitropolis. Concordavam, mesmo sem
saber quem era Timothy Carter.

As palavras de ordem e mudança não duravam muito tempo, pois a guarda


mecanizada da ParaMilitech chegava e os impedia de ficar com o dinheiro,
obrigando-os a devolvê-lo. Os robôs agiam de acordo com o propósito para o qual
foram construídos, assim como os soldados com suas armaduras reforçadas e
robustas empunhavam armas, ameaçando os cidadãos e incentivando-os a largar as
cédulas e os panfletos. A maioria se recusava e acabava sendo espancada e caída
ao chão, agarrada aos maços de dinheiro. Encorajados pela vitória sobre os russos,
acreditavam que também poderiam enfrentar a polícia armada. Pelo menos as
gangues haviam sido mais espertas e fugido.

Abaixo de truculência, aqueles que permaneceram foram espancados, e mais uma


sessão de violência foi demonstrada ao vivo. O resultado não poderia ser outro
senão a prisão de dezenas de contribuintes, chefes de família, pessoas comuns e
trabalhadoras que tinham contas a pagar. A ParaMilitech confiscava todo o dinheiro
e os panfletos em sacolas negras, levando um carregamento de vários lotes para
sua sede central, cujo local ninguém sabia ao certo.

Chegava ao fim toda aquela loucura e brutalidade. A chuva lavava o sangue dos
mortos, sendo carregada pelo córrego vermelho nos canteiros dos meio-fios do
quarteirão. Enfileirados nas calçadas, lado a lado, os dirigíveis filmavam os corpos, a
grande maioria perfurada por balas e deformada por pancadas. Nunca se tinha visto
tantos cadáveres juntos, algo comparável a uma guerra. A contagem se tornava
impossível para os agentes da ParaMilitech, e a emissora de Carmen Telford
transmitia sem cortes ou censura, tanto no canal quanto no serviço de streaming, já
que haviam retomado o controle de seus sinais. Apesar de estar em menor foco, a
violência continuava em Miraitropolis. Podiam-se ver espancamentos gratuitos e
muitos roubos à mão armada. Ainda havia cenas lamentáveis, como vítimas sendo
arrastadas para vielas sujas por algum vagabundo fedorento e drogado, sofrendo
violência sexual. No centro, um grupo de baderneiros ateava fogo em um morador
de rua nas escadarias da catedral e tentava depredar a grande igreja. Por ser uma
região bastante escura e desabitada, julgaram que poderiam "curtir" um pouco a
noite. O padre local, Desmodeus, na soleira da porta, espantava os arruaceiros com
tiros de sua escopeta calibre doze. Executava um com um tiro no peito e deixava
outro ferido no ombro, enquanto o restante fugia. Foi o suficiente para desmotivar a
invasão no templo sagrado, abandonado pelos fiéis há muito tempo. Na zona
industrial da cidade, uma fábrica era implodida de dentro para fora, mas os autores
do ato criminoso ainda não tinham sido identificados.
Afastados das zonas ao redor do cassino e da área de atuação da ParaMilitech, as
gangues que se uniram para derrubar o negócio de Yuric, tiveram acertos a
apresentar umas com as outras. A aliança entre todas elas era desfeita. Nem todas
as gangues tinham interesse naquele local e, achando mais viável lugares como o
subúrbio do Éden ou Cidade Alta, onde quase não existiam rivais fortes, essas
gangues deixavam o bairro sem necessidade de briga. Os principais interessados,
os Dragões Brancos, mestres em artes marciais, principalmente o kung fu, estavam
prestes a entrar em conflito com os Tigres Negros, também de Little Asia e
excelentes lutadores corpo a corpo, para dominar parte do bairro russo. Saber quem
ficaria com Troika nesse momento parecia mais importante do que qualquer outra
coisa, ao menos para eles.

As duas facções se preparavam em um beco, encarando-se, trocando xingamentos


e zombarias primeiro. Depois, como soldados de guerra, corriam de encontro uns
aos outros, usando não só os punhos, mas também porretes de madeira, marretas e
espadas. Os Guerreiros de Noen, por direito, ficariam com a zona e não se envolviam
no confronto, pelo menos não naquele momento. Observavam de longe, cientes de
que haveria baixas de ambos os lados, e quem saísse vencedor estaria muito
desfalcado para enfrentá-los. Seria o momento em que eles mostrariam quem
realmente dominava o lugar.

Em contrapartida, gangues de motociclistas também desejavam sua fatia do bolo e,


com suas motos, chegavam rugindo os motores. Os Mirai Devil's já dominavam boa
parte de Miraitroide antes e agora pareciam soberanos naquela região. Ninguém
ousava enfrentá-los. Como forma de comemoração, passariam a madrugada inteira
batendo rachas, bebendo, buzinando e fazendo festa com música alta. Sendo os
donos da rua, se drogavam e transavam com dezenas de prostitutas em vias
públicas. Era uma verdadeira orgia urbana, onde para eles não existia mais a palavra
"limites".

Dentro do Crow-Z X-9, estranhamente, se mantinha calada, concentrada em uma


sequência de digitação no teclado da manopla. Aquilo, de certa maneira, o barulho
das teclas batendo rapidamente, irritava Vladimir. Ele então puxava assunto numa
tentativa desesperada de voltar a atenção da hacker para uma conversa, em vez
daqueles ruídos irritantes.

— Você não parece assustada voando numa nave como essas. — Ao lado da garota
ele estica o pescoço tentando ver o que ela tanto escrevia.

— Não é a primeira vez, já tinha voado com os Steelhearts em um troço parecido


com esse, foi na primeira missão, quando vencemos uma gueixa que usava essa
katana. — Por um segundo ela deixou de digitar com a destra e tocou na bainha da
espada, batendo três vezes na mesma presa a sua cintura. Vladimir suspirou,
achando que a tinha tirado de seu devaneio, mas logo depois ela retornou ao que
fazia. O mais velho levou a mão esquerda à testa.

— Parece preocupada, o que está digitando? — De novo tentou olhar, sem sucesso.

— Estou tentando me comunicar com Pollux, ele me enviou uma mensagem


enquanto enfrentava Darkness. Estava então rastreando o sinal da Aria, mas ele me
passou as coordenadas onde ela e Max estão e vem de Miraitroid. — Ela coçou a
cabeça, mordiscando os lábios, sinal que estava nervosa.

— E o que tem de errado? — Indagou se ajeitando no banco da nave.

— Pollux estava indo para o centro em direção ao prédio de Choi, deixando Max e
Gini se virarem por conta própria. Ele falou em um tom estranho… Como se
estivesse se despedindo. — Respondia sem olhar Vladimir, apenas digitando.

— Hmm… Isso não é nada bom. Vamos fazer seus upgrades e seguir o sinal de
Pollux depois. — Concluiu o russo coçando o queixo de barba branca.

— Não! Pode ser tarde demais, precisamos ir atrás dele agora! — Deixou de digitar,
mas o olhar parecia vago e bem distante. — Não precisa ser uma clarividente pra ver
que isso vai dar merda. Tive acesso a uma gravação do Olho Elétrico que não me
agradou nada, Timothy Carter e sua parceira dedurando os Steelhearts para Aurora.
Esse cara perdeu a família quando o Canal 17 foi explodido e quer vingança de
todos os envolvidos. Aurora morreu, Grisson também, mas Tim é um cara muito
inteligente e centrado na sua cruzada, certamente essas não eram as únicas cartas
dele. — Ela parou de falar, ele apenas dizia:

— Continue, fale tudo o que sabe.

— Quando entrei na cabeça de Grisson eu vi algumas coisas… Os Steelhearts


sobreviventes foram pegos pela milícia dele e de Aurora. Thomas, Leon, Joe… E vão
entregá-los para Telford e por culpa neles dessa confusão toda. Não vi muito, você
me apressou e o tempo estava acabando… Enfim, se de alguma forma Tim
conseguiu mandar alguém para raptar Pollux… Ou ele tá pensando em fazer alguma
merda a gente precisa ajudar ele também. — Fitou o homem mais velho, numa
expressão frágil, pedindo ajuda.

— Nem pensar! Não é prioridade em nossa missão, lamento pelos seus colegas,
mas matei um homem da ParaMilitech. Além do mais, temos informações
fragmentadas sobre os Steelhearts, ninguém faz ideia onde eles estejam presos
agora, nem mesmo eu. Se seguirmos por essa linha estamos desviando de nossos
objetivos. — Vladimir sempre mudava o tom de voz nessas horas, era quase como
se desse uma lição de moral.

— Não sou um dos seus soldados. — Ela também alterava o tom de voz, irritada e
incomodada pela forma como era tratada.

— Se me envolver ainda mais vou levantar suspeitas. Se isso acontecer, adeus, Yuric
vence. Pense que somos a última chance de acabar com essa desordem. — Ele
tinha cuidado para que a tonalidade não soasse como uma ordem, mas também
sem perder a autoridade.

— Ok, tudo bem, acho que às vezes algumas cabeças precisam rolar para que a
ordem tome seu curso. São baixas de guerra. — Alfinetava fitando-o. Ele não
respondia a ironia.

— Com todos eles presos, Pollux sumido, Tony Montana e Akane mortos, Tim teve
afinal sua vingança, e usando nosso próprio jogo, quase que Max e Gini são
arrastados de graça. Boris e eu somos os únicos ex Steelhearts ainda livres, sabe
porque? — Vladimir se mostrou curioso com a questão.

— Porque sabe que vou atrás de Boris, vou fazer o serviço sujo e sujar minhas mãos,
assim como ele, quero vingança. — O mais velho não disse nada.

— Mas sem Pollux é um a menos para seu esquadrão suicida, Vladimir. — Ela o
encarou firme nos olhos, franzindo o cenho.

— Menina irritante… Piloto, siga para a torre de Choi, no centro! — X-9 voltou o olhar
para a janela.

Chegando ao local, a nave sobrevoava sobre uma espessa fumaça negra. A visão
não era nada agradável: fogo e destroços. Escolhendo algum ponto em que pudesse
aterrissar, o piloto bem treinado da ParaMilitech conseguia acomodar a nave para a
tripulação sair. X-9 era a primeira a correr pela porta do veículo aéreo e disparar em
direção às chamas, tentando encontrar o corpo do seu amigo. Infelizmente, o calor
impedia que ela chegasse mais perto. Vladimir ordenava que seus soldados, com os
aparatos certos de proteção anti-fogo, fizessem o que a hacker não podia fazer.
Inteligentemente, o russo dirigiu-se ao corredor do prédio e quebrou o vidro onde a
mangueira de incêndio estava guardada, puxando-a para que a água extinguisse o
fogo. A garota de cabelos roxos, que dependendo do humor ou estado de
nervosismo, mudavam para lilás ou um azul mais vivo, caminhava apreensiva de um
lado a outro, destruindo as unhas com os dentes. Ela só parou quando os soldados
tiraram um corpo em uma maca, enrolado em um tecido cromado e térmico.
Vladimir a segurou, ela tentou empurrá-lo, mas mesmo assim sua força não foi
suficiente. Havia algo naquele velho homem que o tornava tão forte e resistente
quanto ela. Ela não sabia o que era, estava mais preocupada com o estado do seu
amigo. O russo a segurou novamente e, quando ela tentou resistir novamente, ele
aplicou um soco tão forte em sua barriga que a fez dobrar os joelhos e perder os
sentidos.
No Olimpo, Jesus guiava silenciosamente Dexter e Gal pelos corredores do prédio
da máfia, em uma forma de escolta. Rodrigo também estava junto, reconhecido pelo
próprio Jesus como um dos homens contratados por Pascal. Não seria nada
diplomático deixar um aliado para trás. É claro que a atmosfera do ambiente não
parecia boa. Eles tinham a sensação de que estavam caminhando pelo corredor da
morte. Diferente de sua contraparte bíblica, esse Jesus não inspirava calmaria em
seus seguidores. O prédio inteiro estava passando por reformas, um verdadeiro
canteiro de obras com pedreiros, carpinteiros e engenheiros. Os sistemas de defesa
também estavam sendo reforçados em todas as partes, a fim de evitar outra
invasão. Esse investimento fora feito por ordem de Jesse, sem aconselhamento ou
permissão de Galathea. Ele resolveu a questão da falta de verba após a morte de
Tony, e agora, com o caixa em alta, achou que tinha o direito de gastar como bem
quisesse. E falando nele, Castelone surgiu no corredor onde Jesus caminhava com
Gal, Rodrigo e Dexter, colocando-se à frente do quarteto antes que chegassem ao
próximo andar. Os elevadores ainda eram um risco, então uma boa caminhada pelas
escadarias era necessária.

— Bem vindos de volta, senhores. — Olhou para Gal. — E senhoras. Me acompanhem,


Jesus, agradeço pela cooperação, está dispensado para se juntar a sua… Hmm…
Chefe… — Disse com desdém quando se referiu a Galathea.

— Você não está no comando, Jesse, deixe de palhaçada, pare de brincar de


mafioso. — Provocou Jesus.

—Você disse brincar? Acho que será necessário uma prova da minha autoridade
aqui. — Ele sacou um revólver de cano longo tão rápido que nem mesmo Jesus viu.
Jesse apontou para ele.

— Uni… Duni...Te… — A arma mudava do rosto de Jesus aleatoriamente para Gal,


Rodrigo e depois Dexter. — O escolhido foi…. Você! — E por um azar do destino a
escolha aleatória caia no jovem Dexter, o garoto ruivo de óculos e jaleco arregalou
os olhos. O tiro atravessou sua cara, explodindo o crânio e fazendo os miolos e
pedaços vermelhos pintarem a parede branca em suas costas.
— Eu não gostava dele mesmo… Muito metido a sabichão… Jesus, acho que deixei
bem claro quem manda aqui. Tem alguma objeção? — Ele apontou novamente a
pistola para o rosto de Jesus que negou silencioso balançando a cabeça.

— Ótimo. Vocês venham comigo, Jesus, já disse que está dispensado? Sabe o
caminho de volta à latrina. — E levou Gal e Rodrigo até sua sala. Lá se encontrava
sentado em uma cadeira de estofado de couro negro, Vladimir, com alguns de seus
homens. Ele se ergueu, apertou a mão da loira e do rapaz bem apessoado chamado
Rodrigo.

— Boa noite. A senhorita Gal e eu já nos conhecemos. Mas você, Rodrigo, não deve
me conhecer. Sou Vladimir, um antigo amigo e sócio de Montana. — Ele voltou a se
sentar e pediu que a mulher e o rapaz fizessem o mesmo.

— Meu caro camarada Rodrigo, sei que trabalha para Pascal e deve ter informações
valiosas ao ter se infiltrado no antro de Yuric. Se puder compartilhar conosco essas
informações, principalmente quanto a quem cerca Yuric, ficarei bastante agradecido.
Mas vim aqui pessoalmente não apenas por isso, é sim para fazer uma proposta a
você e a Gal. Yuric está encurralado no meio do oceano, em um navio vindo da
Rússia, com armas e soldados, um verdadeiro pesadelo a Miraitropolis. Não tenho
autorização oficial para mandar agentes da P.M. nessa missão. Por outro lado, não
quero que nosso sonho de liberdade seja ameaçado, e acho que nem vocês querem.
Desejo saber se posso contar com a ajuda de ambos dentro de sete dias para
estarmos dentro daquele navio e prender Yuric, terminando de vez esse pesadelo e
impedir que nazisovieticos aportem em Miraitropolis? Sei de suas habilidades e elas
seriam muito bem vindas nessa operação. Pensem bem, vou lhes entregar
comunicadores, quando decidirem, me contatem. — Vladimir se ergueu, saindo da
sala com seus homens, se despedindo do casal. Ao chegar no corredor, viu o sangue
na parede. O corpo já havia sido removido, mas os miolos estavam presentes no
chão. Vladimir convocou Jesse com a destra para se aproximar… — Não sei no que
está pensando mas não provoque Galathea… Querendo ou não ela é a representante
de Tony… Não estrague os negócios… Garoto idiota… — Jesse encarou o russo e
puxou novamente a Glock, os homens da P.M. rapidamente sacaram também suas
armas, apontando a ele.

— Não seja burro, camarada. Antes de você puxar esse gatilho meus homens já
teriam acabado com você e eu não teria problema algum com Galathea quanto a
isso já que parece fazer questão de ganhar a antipatia dela…. Seja inteligente, baixe
a bosta dessa arma e saia do meu caminho. — Calado, Castelone fez o que Vladimir
ordenou, mas se mostrou bastante irritado.
— E irei falar com ela nesse exato momento, e nada me impedirá. Quero que ela
esteja de bom humor, embora presumo que você tenha estragado o estado de
espírito da mulher quando matou o fedelho só para tentar impressionar…
Lamentável… — Vladimir e o restante subiu as escadas e entrou no escritório da
morena, onde Jesus reportava o acontecimento com Dexter. Educadamente o russo
grisalho entrava, pedindo licença.

— Perdoe a intromissão, acredito que o assunto seja de suma importância, sei que
não devo interferir no que diz respeito a “família”, mas estou tão desapontado com o
senhor Castelone quanto qualquer um aqui. Ele se descontrolou… Apesar de tê-lo
acolhido como filho…. Não… Não tanto… Como um sobrinho ou um primo distante
mais novo, não irei interferir em uma possível punição de sua parte. Para ser sincero
não vim tratar disso, mas sim de algo muito maior e mais importante. Se me
permite… — Pedindo permissão o agente da P.M. adentrava o escritório sozinho, sem
sua escolta, não queria parecer rude naquele momento delicado. E assim fez a
proposta de invasão ao navio de Yuric a Galathea.

— Não muito tempo depois X-9 acordava em uma cama parecida com a de hospital.
Lençóis brancos e limpos. Seu corpo doía como se tivesse sido atropelada por um
caminhão e sua cabeça girava como se recuperasse de uma ressaca. Não fazia
ideia de onde estava e se ergueu da cama. Possuía suas roupas, apenas vestiu os
tênis converse preto que ficavam ao lado do pé do criado mudo. Vladimir entrou no
quarto nesse momento.

— Desculpe pelo soco… mas você ficou descontrolada. Não me orgulho do que fiz,
mas foi necessário. — Ele parou frente a cama onde a hacker estava sentada.

— Tá tudo bem… Digo… Tá nada… Minha barriga tá dolorida… Parece que fiz mais de
oito mil abdominais… Quero saber o que você coloca no sucrilhos pra ser tão forte
assim… Ein…. O que aconteceu com Pollux? — X-9 se ergueu rapidamente da cama
ao lembrar do amigo.

— Se controle… Não quero repetir o que fiz ontem… Detestaria ter que lhe acalmar
novamente… Seja forte!

— Ele… Ele… Morreu né? — Os olhos se encheram de lágrimas. Vladimir não disse
nada, apenas fechou as vistas e baixou a cabeça

— Droga… Pollux… Seu idiota…. Porque fez isso? Deveria ter outra maneira… — Ela se
jogou na cama novamente, puxando os lençóis e se cobrindo, em um choro
soluçado igual ao de uma criança.
— Vou lhe deixar sozinha por algumas horas… Seus implantes já estão prontos e os
cirurgiões também… quando se sentir melhor vá até a sala 202, estaremos lhe
esperando. — O mais velho saiu do quarto e deixou a jovem com seu pranto. Duas
horas mais tarde, em passos lentos e arrastados X-9 chegava até a sala 202, não era
longe de seu quarto. O recinto tinha uma área grande onde muitos computadores e
máquinas de operações estavam interligadas. Médicos e técnicos em informática
trabalhavam juntos em gráficos de telas holográficas transparentes que flutuavam
no ar.

— Onde estamos? — Indagou a Vladimir.

— Em uma instalação secreta da ParaMilitech.

— E oficialmente essa operação NUNCA existiu.

— Exatamente. É por isso que vai sair daqui da mesma forma como entrou, sem
saber da localidade dessa instalação. — Concluiu o mais velho, sentado à uma
cadeira à frente de um painel com muitos botões coloridos.

— Não me importo, só quero terminar logo com isso. — Deu de ombros.

— Então vamos começar. Primeiramente a cirurgia vai constituir na remoção dos


seus olhos para que os implantes cibernéticos interajam melhor entre si e as
conexões neurais fluam de maneira rápida e…

— Pera, pera, pera… Não quero remover meus olhos… eles, meu cérebro e parte da
minha coluna vertebral são as únicas partes originais que me restaram! — Concluiu
ela.

— Ah…. Seu acidente no Cemitério Néon… Mas infelizmente é a única maneira. —


Respondeu o russo.

— E se em vez de implantes oculares a gente usar um tipo de app no meu cérebro


que simula o mesmo processo de réplicas óticas?

— Já tentamos isso e não deu certo. — Respondeu um sujeito magricelo de terno


cinza, cabelo lambido e óculos fundo de garrafa.

— Quem é o engomadinho? Deixa eu ver o que vocês já tentaram aí. — A hacker se


aproximou do computador do rapaz que tentou impedir a visão colocando as mãos
na frente do monitor.
— Não… O projeto olhos de águia é secreto, apenas agentes autorizados podem.... —
Vladimir fitou seriamente o rapaz que entendeu e removeu as mãos da frente do
monitor. X-9 não só tomou o lugar no jovem como passou a digitar linhas de códigos
no teclado do mesmo.

— Projeto olhos de águia? Que cafona… Muda esse nome... Eu ein… Claro, olha só,
por isso não tava dando certo, se liga! — Mudando toda as informações disponíveis
que apareciam na tela, cada novo código dava uma nova perspectiva para o projeto.
Os técnicos do setor de inteligência informatizada da P.M. se sentaram à volta da
hacker, como em uma aula, aprendendo um pouco mais e testemunhado que aquela
magnífica mente podia fazer. Levou cinquenta e cinco minutos para ela modificar
tudo e recriar uma nova reprogramação do projeto do app da ParaMilitech. Quem
entendia do assunto ficava impressionado com as habilidades e conhecimentos da
garota de moicano.

— Pronto! Considerem minha contribuição pra ParaMilitech. Agora é com vocês. —


X-9 saiu da cadeira e se deitou na maca de operações

Foi utilizado todo o estoque de anestesia para fazer a hacker adormecer. O processo
foi longo, durou o restante do dia. Os médicos abriram a cabeça da garota com
serras de ossos, criando novas portas de entrada. Essas portas consistiam em
buracos nas laterais da cabeça e na nuca. As brocas perfuraram o osso para então
introduzir fios conectados nessas novas aberturas. Junto com isso, foi inserido um
chip de cinco milímetros, que seria usado para emular implantes óticos. Ela não
sabia, mas estava contribuindo não só para a informática, mas também para a
medicina. Com esse aplicativo, os soldados não precisariam mais remover seus
globos oculares. O restante da operação foi realizado pelos técnicos do serviço de
inteligência informatizada. Os upgrades no cérebro de X-9 estavam sendo feitos
remotamente, através de supercomputadores. Sua manopla também estava sendo
aprimorada, não visualmente, mas tecnologicamente. As pessoas envolvidas não
conseguiam entender como a jovem havia criado tudo aquilo apenas com sucatas.
Firewalls, antivírus e novos softwares estavam sendo instalados, todos em níveis
militares. Vladimir sabia que poderia estar criando um monstro que, no futuro,
poderia usar esses recursos contra ele. Mesmo assim, ele assumia os riscos, pois
não tinha muitas opções. Exatamente à meia-noite e dois minutos, ela recobrou a
consciência, sentindo a pior dor de cabeça de sua vida. Vladimir estava ao seu lado.

— Bem vinda de volta. — Segurou sua mão enquanto estava deitada.

— Essa porra dói pra caralho… — Resmungou.

— Que boca suja… é tão feio uma menina tão bonita falar palavrões…
— Ah é? Foda-se… — Eles riram juntos. — Quero mais analgésicos, por favor. — Se
contorceu na cama.

— Vou buscar. Acho que vai acabar com esse estoque da mesma forma como
acabou com a anestesia. Mas vai ter que modelar esse linguajar xulo. Descanse
mais, ainda precisa de dezoito horas de repouso até pensar em usar os novos
implantes. — No dia seguinte, graças às mudanças em seu organismo forte de
replicata, X-9 estava firme e forte, em pé ao lado da cama de hospital e tudo em
menos de doze horas depois. O russo entrou e se assustou.

— Você se recupera rápido. Isso é bom. Agora que está melhor vamos conversar
sobre o que faremos. Fui até o Olimpo e estou esperando a resposta de Galathea e
seu reforço. Assim como de Gal e Rodrigo. Você sabe quem são, inseri a ficha deles
em seus novos implantes. Xiaren e Roberto já confirmaram suas presenças, para
nossa sorte querem o sangue de Yuric tanto quanto eu. Ah, enviei Rodrigo de volta
ao covil dos latinos… Ele tem informações de Pascal… Acredita que o crápula estava
trabalhando junto com Yuric desde o começo? E o irmão sofrendo...

— Dizem que o pobre Fernando caiu em desgraça… Não quero nem ver quando
souber que o Cachorrito Loco — Pronunciou um espanhol macarrônico — o traiu.
Mas isso não é assunto que nos diz respeito. Pronta pra reencontrar sua amiga? —
X-9 balançou a cabeça positivamente.

— Estou vendo o quanto parece ansiosa. Certo, vamos lá. Sabe do procedimento
padrão… — Vladimir colocou um capuz escuro sobre a cabeça da hacker e a guiou
até a mesma aeronave que já havia voado. Quando a mesma partiu e já estava nos
ares o capuz foi removido.

— Com toda a tecnologia disponível da P.M. e você usa um capuz de pano pra
ocultar a local

X-9 ainda lembrava de Pollux e sentia uma profunda tristeza. Passou boa parte da
viagem estranhamente calada, sem fazer suas habituais piadas ou deboches. Não
sabia se Calidora estava ciente da trágica decisão de seu amigo, e não tinha
coragem suficiente para perguntar. Eles seguiram o sinal enviado pelo ex-jornalista
do Canal 17 e foram levados até Miraitroide. Aterrissar em um terreno abandonado
parecia ser a opção menos pior. Apenas a hacker e o russo seguiram a pé até um
bar. De repente, ela parou abruptamente, como se algo tivesse chamado sua
atenção.

— Merda! — Praguejava, dando meia volta.


— Já pedi para maneirar esse palavreado, o que aconteceu? — Perguntou ele.

— Devia imaginar que a Max se esconderia aqui já que estava com a Aria… Como fui
esquecer? Ela é filha do dono dessa bodega… O cara não vai muito com a minha
lata…

— O que fez ao sujeito? — Perguntou novamente, coçando a barba branca.

— Nada. O problema é que o coroa acha que só a coloco em confusão. E agora vou
entrar lá e pedir pra Max vir comigo numa missão suicida… Vou dar toda razão que
ele queria. — Chutou uma lata de lixo vazia na esquina.

— Não ligue pra o que ele pensa. A escolha é da sua amiga. — X-9 ergueu novamente
o rosto e olhou o mais velho.

— Tem razão… Tem razão… — Os dois entraram no bar, ela pediu uma long neck de
cerveja Weiss? Ele, como um bom russo pediu uma dose dupla de vodca. O dono
reconheceu o tom lilás dos fios de cabelo mesmo que agora X-9 usasse um corte
moicano. O dono do bar não falou nada e continuou a limpar o balcão de madeira
com um pano sujo molhado. A garota bebeu mais uma dose da cerveja e quebrou o
silêncio.

— Preciso falar com a Max. — Tomou mais um gole da sua coragem engarrafada.

— Ela está melhor longe de você. Muito bem, beba sua cerveja e saia. — O homem
continuou a limpar o balcão com o pano, mas com mais força.

— Só vou sair depois que falar com ela. — E repetiu o ato, bebendo cerveja no bico.

— Acho que você é meio surda e burra… — Ele puxou um taco de baseball de baixo
do balcão, Vladimir se ergueu pronto para sacar uma arma abaixo do casaco, mas
X-9 impediu tocando seu antebraço.

— Não é assim que funciona… Deixa comigo, Vlad...

— Só vou repetir mais uma vez antes de usar esse bastão na sua cabeça, a Max não
vai falar com você! — Naquele instante Aria saia da parte de trás do bar e via o pai
sendo rude.

— Pai… Isso não é maneira de tratar os clientes…. Depois reclama que ninguém vem
aqui… Você deve ser a X-9, Max fala muito de você. Vem, ela está lá nos fundos. Ah,
eu sou Aria. — O homem olhou feio, mas Aria sendo a única coisa que ainda lhe
importava na vida conseguia amolecer seu coração como uma verdadeira filhinha
do papai.
— Este é Vladimir. — Apresentou o mais velho que apertou sua mão

— Olá, senhor Vladimir. — Aria correspondia o cumprimento abrindo um sorriso


simpático. — Vamos, X-9, ela está te esperando. O trio seguiu para o fundo do bar, os
passos acordam Max que dormia em um sofá velho e Gini que precisou usar uma
antiga mesa de bilhar como cama.

— Max, Gini, olha quem está aqui! A X-9 e o pai dela!!! — Tanto ele quanto ela se
olharam e sorriram.

Sabiamente na hora de explicar quem era Vladimir, o homem pedia para a garota lhe
preparar um bom almoço russo bem caprichado e assim deixar-lhe bastante tempo
ocupada enquanto tinham aquela conversa.

— Vladimir me ajudou a limpar a barra de vocês. Sem ele eu não saberia o que fazer
e nem por onde começar. Grisson foi pra vala com tudo que sabia, e com ele aqueles
arquivos de vídeos da Aurora. Isso não é obrigatório e nem uma forma de
chantagem, vocês podem decidir não nos ajudar. Mas ele e eu vamos com a máfia
latina, oriental e provavelmente a italiana chutar a bunda do Yuric. Só vamos esperar
a poeira baixar um pouco. Estão com a gente nessa?

Naquela mesma manhã, sobre os escombros do restaurante, os homens de Xiaren


procuravam sobreviventes. Um deles encontrava Toshio com alguns ferimentos, foi
o sobrevivente da chacina naquele lugar unicamente por ter se fingido de morto. O
capanga removia o capacete e notava que além de vivo se tratava apenas de um
garoto muito jovem. Xiaren foi chamado, ordenou que o jovem fosse submetido a
uma observação médica. Xiaren não mediu esforços para cuidar do sobrevivente, e
tão pouco fins financeiros para sua recuperação. Como os hospitais estavam
lotados com toda aquela loucura das ruas, as clínicas clandestinas do bairro oriental
restavam como as únicas opções. Depois de um longo processo com
medicamentos vindos do que restou da antiga China, o menino abria os olhos. O
líder da Ruylong esperava ao seu lado, sentado em uma cadeira de ferro. Toshio
relatava tudo o que havia acontecido no restaurante, não deixando dúvidas que tinha
sido um ataque dos russos. Ele fechou o punho e socou a parede. Depois de ter
expressado sua ira ligou para o líder Dragões Brancos de Little Asia.

— Daqui a sete dias, no porto, leve o máximo de gente que conseguir. Yuric vai pagar
caro pelo que fez!
Muitos protestos contra Carmen Telford estavam sendo feitos no centro, depois que
Pollux havia exposto tudo que existe de podre em seu mandato o seu reinado ficava
ameaçado. Muitos pediam o impeachment da dama de prata, mas tem quem ainda
a queria como líder e dizia que a cidade tinha melhorado. A prefeita de Miraitropolis
evitou aparições públicas, em vez disso deixou nas mãos de seus assessores de
imprensa o discurso ao vivo no dia seguinte. A justificativa era sempre a mesma: o
mandato de Telford sofria ataques de rebeldes, implantando informação, imagens e
muito material falso. Mas que ninguém precisava se preocupar, os responsáveis já
haviam sido capturados e no palanque das escadarias da prefeitura, Joe, Leon,
Thomas e os Steelhearts restantes eram apresentados algemados e com uniforme
de presidiários. A cidade estava dividida, metade queria a dama de prata fora, a
outra acreditava que todas as informações passadas naquela noite eram um golpe
dos rebeldes remanescentes dos Steelhearts capturados naquela noite.

Os dias que se sucederam foram mais calmos, enquanto se limpava o lixo, o sangue
das ruas e a bagunça das destruição, comerciantes e moradores tentavam
reconstruir seus lares e suas vidas, Carmen tinha como objetivo primário fazer com
que a população esquecesse das sérias acusações que foram feitas. Para isso
iniciou os testes nucleares no deserto oficializando a abertura do seu projeto de
segurança da União das Américas contra a Rússia Nazisovietica. Ela sabia que o
povo possuía memória curta e as atenções seriam voltadas para outra direção. Ao
mesmo tempo estavam sendo lançados os novos modelos andróides, e com a forte
campanha da empresa robótica de Choi em união a indústria de apelo a moda de
Cassandra Alesstar, o primeiro desfile foi um sucesso e suas modelos artificiais se
tornaram exemplo de padrão de beleza, revolucionando a moda moderna e
arrecadando milhões aos seus cofres. Quanto ao próprio Choi existia uma dúvida,
não fora mais visto depois do incidente que explodiu parte do seu prédio e muitos
acreditavam que estava morto, porém nada era confirmado até então.

Para os envolvidos diretamente como por exemplo Max, aquela calmaria era
aproveitada para reconstrução da sua oficina. Aria, seu pai e Gini ajudavam. X-9
também, apesar de a maior parte do tempo estar envolvida no término do seu
projeto, o dirigível que colocaria no ar a Inteligência artificial que Pollux almejava. Era
o mínimo que poderia fazer em sua memória. Toshio já estava totalmente
recuperado, era incrível o que a medicina moderna podia fazer naqueles dias. O
jovem ajudante da mecânica aproveitava seus dias de “folga” comprando briga com
os Mirai Devil’s, naquele dia sem Max saber ele trocava socos com Slaw, o dono do
moto clube. Sem também que ela soubesse, Toshio aceitou o convite de Xiaren para
invadir o porto em Troika com a Ryulong.

Tudo era diferente em relação a Rodrigo, quando relatou sobre a traição de Crazy
Dog, Pascal com todas as letras surtou. Subiu ao terraço da Vênus e começou a
disparar contra cada pessoa que caminhava na calçada. Roberto sabia que não era
um bom momento para despertar as atenções. Com muito pesar ordenou que
Pascal fosse internado temporariamente em um sanatório até que recuperasse seu
juízo normal, isso caso se recuperasse. As coisas não iam muito bem também na
Cosa Nostra. A última afronta de Jesse, o assassinato a sangue frio de Dexter
separou definitivamente a máfia italiana em duas. Ele reuniu todos que lhe deram
apoio, formando uma segunda falange da máfia italiana, muito mais tradicional, o
primo de Tony estava presente neste encontro. Para evitar um confronto antes da
invasão ao porto, Vladimir sugeriu que Castelone se retirasse do Olimpo junto da
parcela que o seguia. Sabiamente durante aquela reunião ele obedeceu. Galathea
havia ficado um pouco mais fraca, ao menos podia contar com seu trunfo, a loira
com grandes poderes que compartilhava do mesmo nome.

Calidora mantinha base em Hampton Heights sem notícias de Pollux. Todas


tentativas de contatar X-9 eram em vão. Ela desistiu quando percebeu que a hacker
cortava suas chamadas. Ajudou Caz a voltar para a cidade sob proteção, é claro.
Carmen falsamente lhe recebeu na prefeitura, condecorando o detetive com uma
medalha ao mérito por seus feitos. Caz aceitou, mas sabia que não podia confiar
nela. Tudo passou tão rápido e já faz uma semana desde então. O dia D tinha
chegado, era hora de todos irem à Troika em seu porto.

Considerações:

1- Como estamos chegando a reta final da quest o objetivo de todos jogadores é o


mesmo: vocês foram recrutados por Vladimir, sejam quais forem as motivações
para aceitar o convite e estão em Troika. Devem entrar nas docas e armazéns do
porto sem chamar a atenção dos guardas da máfia russa, que patrulham a área
fortemente armados. Por outro lado, os homens de Yuric estão em menor número
devido ao baque depois do Cassiano Overdose. A prioridade é tomar o porto,
neutralizando os guardas, seja como for, de maneira letal ou não. Vocês não
precisam rolar dados, será uma rodada totalmente INTERPRETATIVA. Se desejar
relatar o que fizeram nos sete dias que separaram os eventos violentos até o Dia D, e
os motivos de terem aceito a missão, fiquem à vontade.

2- Gal é essencial no jogo, mas Rodrigo é opcional.

3- Irvine deve escolher que lado ficará, de Galathea ou Jesse.

4- Galathea, se quiser interagir com Vladimir em seu turno, fique a vontade.

5- Junto de vocês estão dez agentes da ParaMilitech, Roberto (que atualmente


representa Pascal) e Xiaren. Cada um também levou dez representantes cada. A
Cosa Nostra possui a mesma unidade de capangas, porém, Galathea se beneficia do
adicional de seus npcs da Oroboros.

6- A postagem de Timothy também é opcional. Porém se optar postar, não estará no


porto e sim em outro ponto da cidade mostrando sua ótica da situação.

Irvine Montana
Fiquei com a cabeça mergulhada nas finanças da Cosa Nostra e na proteção dos
nossos negócios, e acabei deixando toda a merda entrar pela porta da frente.
Cheguei tarde ao Olimpo, Jesse havia se tornado influente e agora existia uma
rachadura dentro da família mafiosa, uma organização criada por irmãos, pela qual
muito sangue foi derramado para mantê-la unida. Doía ver o rumo que as coisas
estavam tomando. Parecia que sem um Montana no comando, tudo estava saindo
do controle. Era hora de corrigir tudo isso. Não podia permitir que dois oportunistas
arruinassem a Cosa Nostra, especialmente depois de ter perdido uma perna e um
olho por ela.

O hovercar pousou no estacionamento de uma das nossas boates. O local estava


repleto de carros da máfia, algo que eu já esperava, pois era responsável por
comprá-los e distribuí-los entre os associados, como meu falecido primo havia
solicitado. Saí do carro acompanhado de Bernard e nos dirigimos à entrada da
boate, onde cinco homens armados com submetralhadoras faziam a segurança. Ao
perceberem que era eu, abriram a porta sem questionar. Adentrei apressadamente,
com as mãos mergulhadas nos bolsos da minha calça social branca. Jesse
Castelone estava de pé no palco, onde as garotas costumavam fazer suas
apresentações especiais. Parecia que ele estava prestes a fazer um discurso para
os homens presentes ali. No entanto, minha entrada causou uma pequena comoção.
Homens começaram a falar coisas como "eu sabia que o Sr. Montana apoiaria
Jesse". Mas esse não era meu objetivo, muito pelo contrário.

Não era do meu feitio não responder aos meus funcionários, mas dessa vez eu não
tinha tempo para isso. Fui direto para o palco, subindo as escadas localizadas na
lateral com passos rápidos. Castelone abriu um sorriso enquanto estendia os braços
quando me viu. — Irvine, nosso homem dos negócios, eu sabia que escolheria o lado
certo, venha cá e me dê um abraço. — O idiota tava achando era alguma espécie de
novo Tony Montana, era irritante vê-lo fazendo aquele cena como se fosse o grande
chefão da máfia, o novo poderoso chefão. Parei, virando meu corpo para a platéia
que naquele caso era metade dos membros da Cosa Nostra, retirei as mãos dos
bolsos e comecei a falar. — Minha família deu o sangue para estabelecer a Cosa
Nostra, chegamos ao topo com muito esforço e sofrimento. Meu primo morreu,
apesar das nossas diferenças, eu o respeitava pelo o líder nato que ele era. Não vou
deixar a organização que minha família batalhou para fortalecer ser afundado por
um bostinha feito esse. — Gesticulando sem parar como um verdadeiro descendente
de italianos apontei para Jesse com a direita. — Tony Montana deixou a organização
nas mãos de Galathea, não concordo com isso também, porém foi o seu desejo e foi
feito isso, pois confiava na competência dela. Até segunda ordem, a manda chuva
da Cosa Nostra chama-se Galathea e não Jesse Fodido Costelone, um idiota que
passou a vida puxando o saco do Tony. — Encarei Jesse com meu olho bom. — E
pense duas vezes antes de sacar sua arma, o Bernard que tá bem ali tá prontinho
para atirar nessa sua cabeça de vento. Já o restante de vocês, venham comigo,
vamos acertar as contas com Yuric de uma vez por todas no porto de Troika. —
Coloquei as mãos de volta nos bolsos da calça e virei as costas para Castelone,
descendo as escadas para fora do palco.

Aos poucos, o salão da casa noturna foi esvaziando-se, com os homens presentes
ali saindo logo após minha partida. No final, apenas Jesse Castelone permanecia
dentro da boate, solitário e sem nenhuma autoridade dentro da Cosa Nostra. No
estacionamento, todos os associados que antes seguiam Jesse aguardavam
minhas ordens. Tínhamos assuntos pendentes com Yuric, e eu estava determinado
a lidar pessoalmente com o atirador que tirou a vida do meu primo. Nossa aliança se
dirigia ao porto de Troika, o último obstáculo antes de alcançar Yuric, que
atualmente se refugiava em um navio nazisoviético em alto mar. Subi no capô de
uma Mercedes 2100 preta estacionada ali e comecei a falar. — A única coisa que
quero de vocês hoje é sangue russo, depois disso, a bebida está por minha conta! —
Todos ali gritaram empolgados, sacando suas armas e balançando de um lado para
o outro. Eu entrei no meu hovercar junto ao Bernard, que dirigia o veículo e então
partimos rumo ao território da máfia russa.

Nossa recepção foi exatamente como eu havia imaginado: uma saraivada de tiros
do AK-97. Parecia que éramos os primeiros da aliança gangster a chegar ao local,
pela forma calorosa como fomos recebidos. Felizmente, nossos carros eram
blindados, o que nos permitiu chegar bem próximo à entrada principal do porto. Os
veículos da Cosa Nostra foram parando enfileirados, formando uma barreira
impenetrável. Os homens saíram dos carros, empunhando suas armas e
respondendo aos tiros. Eu segui em frente com o hovercar, atropelando um atirador
russo que estava em cima de uma torre improvisada com contêineres. O maldito foi
arremessado a metros de distância. Os soldados russos voltaram sua atenção para
o meu carro, o que permitiu que meus capangas na entrada do porto avançassem,
derrubando vários deles no processo.

— Pare aqui, e comece o show. — No meio da zona de carga do porto, o hovercar


aterrissou, inúmeros disparos o atingiram de todos os lados, mas a blindagem
reforçada aguentava o tranco. Bernard apertou alguns comandos no painel, o
volante deu lugar a um joystick e uma metralhadora saiu de dentro de um
compartimento no capô do carro. — Vou mandá-los para o inferno, senhor. —
Respondeu Bernard, movendo o joystick e apertando o botão vermelho
incessantemente. A saraivada de tiros transformou os russos em verdadeiros
queijos suíços, pintando o chão do local com tons de vermelho. Logo atrás, os
soldados italianos chegaram, reforçando a artilharia contra os russos. Eu não ia ficar
de fora da ação. Abri a porta do carro, peguei o lançador de foguetes no banco de
trás e o apoiei no ombro, encostando na porta do carro. Em seguida, apertei o
gatilho. KABUM! Pedaços de russos voaram para todos os lados. — Vamos lá,
vamos colocar esses filhos da puta no devido lugar, no inferno! — Gritei, os homens
seguiram com os dedos nos gatilhos, atirando em qualquer filiado a máfia russa que
aparecia pelo caminho.

X9
Depois daquela loucura que foi a noite passada, seria bom tirar o pé do acelerador e
ter uma merecida pausa. Com esse tempo de sobra, faria alguns testes na
inteligência artificial e corrigiria alguns bugs no seu sistema operacional. Enquanto o
equipamento não chegava, ajudava Max na reconstrução da sua oficina. Mais do
que tudo, tínhamos o projeto de converter três automóveis normais em hovercars.
Era algo simples, apenas instalar o equipamento antigravitacional e fazer alguns
reparos. Poucas pessoas sabem, mas eu ensinei tudo o que Max sabe, ainda na
adolescência quando nos conhecemos no orfanato. Claro, ela continuou se
especializando e se tornou a melhor nisso, enquanto eu me tornei a melhor na área
de informática. Nós três, ela, eu e Gini, corríamos contra o tempo. Até então, apenas
um dos carros estava pronto, estávamos na metade do serviço do segundo e nem
tínhamos começado o terceiro. Se o pai da Aria não fosse tão babaca, a garota
poderia estar nos ajudando. Ela queria, mas por minha causa ele não permitiu. No
meio da tarde, minha pulseira comunicadora vibrava com uma nova chamada.
Através dessa ferramenta, sabia que Vladimir estava vindo com a encomenda. O
Crow Z cortava os céus de Miraitropolis enquanto Vladimir levava o dirigível no
compartimento de carga da nave. Eu era a única capaz de fazer aquela coisa
estranha, cheia de emendas, fios, placas e todo tipo de gambiarras, funcionar. Três
soldados de Vlad retiravam o objeto do interior da nave estacionada na rua e o
carregavam até um pequeno toldo de zinco que servia como "ateliê" improvisado no
quintal da Max e sua oficina em reforma. INFELIZMENTE, precisei abandonar o
trabalho nos carros para dar atenção ao dirigível. Instalava o chip da inteligência
artificial, ainda sem nome, e reiniciava o sistema. O navegador do painel da nave
rastreava os sinais dos dados enviados por Pollux na noite anterior e os copiava em
seu disco rígido, baixando as informações mesmo estando em um banco de dados
seguro de Carmen Telford. Aquela velha acha que pode esconder alguma coisa de
mim...

— É bom que façam os hovercars, não vou poder levar vocês até o porto, tenho
muita gente para liderar além dos meus soldados. — Disse Vladimir em pé ao meu
lado observando tudo que eu fazia.

— Imaginei. E mesmo que pudesse, gosto de andar com minhas próprias pernas. —
Respondi erguendo a cabeça rapidamente para fita-lo, mas logo voltava a me
concentrar no painel.

— Isso inclui levarem suas próprias armas. — Gesticulou com as mãos, como se
lamentasse informar aquilo. — Mas posso sugerir um lugar… — Ele deixou em cima
da mesa um papel amassado, abrindo tinha um nome e um endereço de Rio Bravo.
Era sua forma de se desculpar.

— Obrigada. — Olhei rapidamente para ele, sorrindo e baixei a cabeça voltando a


fazer o mesmo que antes.

— Não sabia que entendia de carros também. Para mim foi uma grande surpresa.
Onde aprendeu? — Indagou curioso, cruzando os braços.

— Me pergunto isso quase sempre, não faço idéia de como aprendi sobre mecânica.
Mas sinto que é desde muito cedo, como se sempre fizesse parte de mim. Antes
mesmo de mexer em computadores já modificava automóveis. — Respondi da
mesma maneira, digitando de cabeça baixa, centrada no painel de tela holográfica
do dirigível.

— Bizarro… Isso parece coisa do povo do deserto… Aquela gente já nasce sabendo
sobre carros, transformam uma sucata em uma máquina de guerra em dois toques.
— Ele estalou os dedos.

— Mas você tem cara de quem nunca atravessou os muros de Miraitropolis. Mas
uma coisa é certa… Alguém te ensinou isso, foi seu pai?

— Não cheguei a conhecer ele. Nem minha mãe. Desde que lembro sempre vivi no
orfanato. — Desta vez evitei olhá-lo. Ele percebeu que a perguntava havia me
incomodado.

— Hmmm… entendi… Bem… Vou indo, você está ocupada e de qualquer forma
preciso resolver alguns assuntos ainda. Boa sorte com os carros e com os
computadores, te vejo daqui uma semana em Troika. Vou passar e dar um alô para
seus amigos antes de partir, até mais. — Abanei me despedindo sem olhar sua
partida.

Levou o dia todo até que a herança de Pollux estivesse finalizada. Gini e Max já
estavam dormindo quando coloquei aquele trambolho pra funcionar. Não fez
barulho algum. Foi ganhando altitude cada vez mais, até atingir a altura ideal para ter
comunicação com as antenas dos prédios mais altos de Miraitropolis. Delas, o sinal
seria transmitido para os bairros vizinhos, se espalhando como um vírus até
abranger toda a cidade. Após a sincronização do roteador daquele brinquedinho,
estava pronto para fazer minha segunda invasão nos canais de televisão e
streaming de Telford. Acionei o display da minha manopla, sintonizando no canal, e
me sentei na cadeira reclinável no meio do quintal, abrindo uma cerveja para assistir
ao espetáculo noturno. Bem, começou exatamente como planejei. Um cara de
cabelo castanho longo e espetado, preso nas extremidades, emergiu das sombras,
mostrando-se sentado em um balcão, como se fosse um âncora de telejornal.
Vestido com um casaco de material laminado e reluzente, ele tinha uma pulseira no
braço esquerdo, muito semelhante à minha manopla, onde apenas os dedos ficam
descobertos. O cenário atrás dele, repleto de rebites, circuitos e placas cromadas,
alguns frisos também, parecia um estúdio de notícias, com uma tela de vinte
polegadas exibindo diversas cenas, as mesmas mostradas por Pollux, reforçando a
farsa da Dama de Prata. O jovem que era a inteligência artificial projetada se
apresentou. Seu rosto era desconhecido, mas suas ações, postura e forma de falar
se assemelhavam muito a alguém que eu conhecia bem. Eu assistia aquilo e não
conseguia acreditar no que via.

—Não... Não... Isso... Isso é impossível... — A negação era clara e o meu sorriso no
rosto incrédulo.

A velha de prata ia ficar muito puta, não ia conseguir rastrear o IP do dirigível nem ter
sucesso na invasão porque gosto de usar meios arcaicos de comunicação, como o
sinal analógico com ondas de rádio, por exemplo. Isso acontece porque a tecnologia
ultrapassada é mais difícil de bloquear. Não sei qual será a repercussão, nem
quantos espectadores foram atingidos, mas terminei a cerveja satisfeita e fui dormir,
rindo da expressão no rosto de Carmen e das novas possibilidades que se abrem.

Nos dias seguintes, conseguimos recuperar o tempo perdido e finalizar o último


carro. Brindamos a conclusão com muita cerveja, música e diversão, nem parecia
que estávamos tensos com a insanidade dos últimos acontecimentos. Deu até para
realmente descansar e se divertir depois disso. Max, Gini e eu rimos, ouvimos
música alta e dançamos. Bebíamos sempre antes de dormir, dava até para esquecer
toda a desgraça de Miraitropolis. Era como se a vida sempre tivesse sido assim, boa
e divertida. Mas não, tudo que é bom dura pouco, e o dia D chegava como uma
lufada de vento quente no rosto. Mais cedo, fui até Rio Bravo e, por indicação de
Vladimir, seu Zé, o dono de uma pocilga que um dia foi uma estação de metrô, me
vendeu algumas armas e munições. Comprei duas Desert Eagles para mim, um
AK-47 para Gini e pistolas termonucleares para Max. Finalizei a compra levando três
coletes de Kevlar com liga de radiack. Aquela porra saiu cara, mas ele garantiu que
segurava bala de grosso calibre.

No fim daquela tarde e início da noite, me preparava para a guerra que estava por vir,
mais uma vez. Era como se eu tivesse voltado ao passado, um ano atrás, quando me
preparei para entrar no prédio da Orion com os Steelhearts. Não... São apenas vagas
lembranças... Aquela noite poderia ser minha última, não sabia se voltaria viva ou
em um caixão, e por essa razão estava nervosa. Ajeitava meu mocassim para cima,
vestia uma calça jeans preta, meu tênis Converse da mesma cor ficava com os
cadarços bem firmes. Checava meu colete abaixo da camiseta do Misfits, estava
tudo certo com ele. Também movia a lapela longa da jaqueta de couro, erguendo
quase até o queixo. Com o cigarro entre os lábios, queimando o filtro, a katana presa
às costas e o par de Desert Eagles no coldre axilar abaixo do casaco negro,
respirava fundo, me olhando no espelho. Apertava o play na manopla, deixando uma
música rodando e me encorajando.

— Tá na hora, Boris! Eu até posso morrer essa noite, e é bem provável que sim, mas
de uma coisa tenho certeza, vou ter minha vingança, filho da puta, vou te levar
comigo pra o inferno. — Disse a mim mesma frente ao espelho, com semblante
sério, como nunca antes. Aquilo não foi uma promessa, foi uma certeza.

O trio de hovercars saiu de Miraitróide, partindo em direção a Troika, atravessando a


noite chuvosa e bastante quente. O bairro se encontrava calmo ultimamente,
bastante quieto, sem o domínio dos russos e agora pertencendo aos Guerreiros de
Néon. A maioria das atividades se resumia a pequenos assaltos em pontos
isolados. Dava para ouvir tiros a poucos metros do porto, e não eram apenas coisas
de ladrões, não.

— Droga… A máfia italiana… Eles sabem como ser sutis… Tanto quanto um elefante
numa loja de porcelana. Não vamos nos meter nesse tiroteio. Deixem que façam a
maior parte do serviço enquanto entramos por outro portão mais afastado. — Falei
pelo sistema de áudio-voz que instalamos nos três hovercars, a qual nos possibilita
conversar.

Com a planta do porto projetada diretamente em meu cérebro, tomando a dianteira,


guiei Gini e Max até um portão de grades afastado daquela algazarra. Baixamos os
faróis e estacionamos. Os dois ficaram nos veículos, eu saí do meu e me aproximei
do portão, andando abaixada rente à grade para que o russo dentro da cabine da
cancela não me visse.

— Só tem um cara na cabine, vou desmaiar ele e abrir o portão. — Falei baixo,
levando a manopla perto da boca. Meu equipamento também estava interligado pelo
sistema de áudio-voz dos carros, então eles me ouviram. Sorrateiramente, abri a
porta da cabine e dei um mata-leão no guarda, desmaiando-o. Em seguida, desativei
o escudo elétrico que impedia que hovercars invadissem o espaço aéreo do porto e
abri o portão para Max e Gini entrarem com os veículos. A maior parte da russalhada
estava envolvida na briga com os italian boys, o que era melhor para nós. Os que
restavam de guarda ficavam nervosos demais para perceber uma aproximação.
Quando perceberam, já era tarde demais. Eu estava lá, atrás deles, estrangulando-os
até tirar o ar e deixá-los inconscientes. Entrei na bodega sem disparar um único tiro,
deixando os caras desmaiados. Aprendam com quem sabe do assunto, italianos!
Não vou mentir, o mérito todo é do programa de treinamento espião que baixei da
ParaMilitech uma noite antes. Meus novos implantes absorvem as informações e as
assimilam em alguns minutos, coisas que levariam seis meses ou um ano para
aprender. O mesmo acontece com a planta do porto, que está gravada em minha
memória. O esquema de aprendizagem é o mesmo. Agora sei me esgueirar pelas
sombras, andar sem fazer ruído, atacar sem ser percebida e aplicar golpes em
pontos de pressão que levam ao nocaute instantâneo. Isso, somado ao fato de que
sei exatamente onde cada porta, cada corredor vai dar, é uma grande vantagem. No
final das contas, acabei me empolgando um pouco e não esperei por Max e Gini,
mas eles devem estar logo atrás de mim e talvez precisem disparar alguns tiros, ou
não, não sei como vão se sair. Em uma das docas, quando não havia mais russos
para derrubar, o encontro com os carcamanos foi inevitável. Tanto eu quanto eles
nos assustamos, e o ruim desse encontro foi que os italian boys sacaram as armas.
Eles não estavam para brincadeira.

— EI,EI, EI, EI, CALMA AÍ GALERA! — Ergui as mãos para a frente, pedindo calma e um
minuto de atenção. — Acho que o tio Vlad falou de mim para vocês, sou a X-9, a
hacker, de cabelo roxo e tals. — Apontei com a destra pra meu moicano, essa gente
da máfia é meio tosca, sabe...

— Tô ajudando o coroa também, logo… Estamos do mesmo lado… Tecnicamente


somos aliados. Vamos nos acalmar, baixar essas metrancas e nos conhecer, aposto
que nos daremos muito bem, capiche? — Meu italiano é horrível, espero ter
pronunciado certo. Mas de qualquer modo eles baixaram as armas.

— Legal… Legal… Logo atrás tá chegando um bonitão loiro e uma morena com
cabelos lisos até aqui. — Fiz sinal mostrando na altura dos ombros. — Eles estão
comigo. — Passado o susto respirei fundo e senti uma vontade incontrolável de
fumar.

Gabriela vulgo Rodrigo


Nos corredores do cassino, transformando-me em quem eu pudesse para conseguir
sair vivo daquele maldito lugar, observava as vestimentas dos funcionários e seus
biotipos. Geralmente, eram roupas brancas de cozinha e fenótipos latinos. As
exibicionistas de palco, com poucas roupas, eram asiáticas. E assim por diante. Até
que consegui encontrar um trio de pessoas. Elas eram totalmente desconhecidas
para mim, mas o aparentemente mais velho dos três, um homem de cabelo grande
preso e barba espessa, pareceu me reconhecer. Ele me chamou para me juntar a
eles. Bom, se fosse uma ameaça, o cara não perderia tempo me chamando; ele
simplesmente meteria uma bala na minha cara de uma vez. Por isso, decidi me
juntar àquela mini caravana. Para minha sorte, ele era um dos representantes da
máfia italiana, parceira da latina para a qual eu ainda trabalhava. Ele nos conduziu
para o lado de fora, onde um veículo nos levou para o Olimpo.

Durante o caminho, informei a ele sobre a minha missão e o resultado dela: Crazy
Dog estava com os russos o tempo todo. Acredito que devo recompensá-lo de
algum modo, e era com essa informação que visava usar como pagamento. Ele me
orientou a informar os "peixes grandes" sobre a descoberta, e eu concordei.
Seguimos o caminho até a propriedade italiana. Ao chegarmos lá, fomos
interceptados por um maluco que decidiu brincar de roleta russa conosco. Para
minha surpresa, ele escolheu matar o ruivo com um tiro na cara, aparentemente por
gosto próprio. A loira ao nosso lado gritou, levando as mãos à boca. Mas,
incrivelmente, eu não me alarmei. Já tinha presenciado tanta morte e desgraça
nesse curto período de tempo que estava indiferente.

A situação se resolveu. Fomos levados para falar com o tal de Vladimir. Repeti a ele
sobre Crazy Dog. Ele achou melhor que eu contasse diretamente a Pascal, e eu
concordei. Depois, uma oferta foi feita a mim e à loira que conheceria como Gal. Nos
convidaram para nos juntar a uma espécie de milícia para deter os russos de
invadirem Miraitropolis. Não nos pressionaram, nos deixaram muito à vontade.
Inclusive, Vladimir saiu em seguida para lidar com seus problemas mafiosos. Fiquei
lado a lado com a mulher.

— Ouviu o que ele disse? E então?

— Quê? Você é retardado? Olha onde nos meteram! Não tem dinheiro que pague
isso!! Se estamos vivos, é por pura sorte.
— Não existem outras pessoas como nós! — No caminho ela havia me dito suas
habilidades, e eu, as minhas para ela. O que nos tornava importantes para Vladmir. —
Não vai adiantar nada ficarmos aqui, de braços cruzados esperando esse navio
chegar e sabe lá o que vai acontecer com a gente. Ou você vai ficar invisível pra
sempre?!

— Eu... Não sei.

Ela saía da sala, mas antes que ela o fizesse por completo, entreguei-lhe um
comunicador. — Pro caso de mudar de ideia. — Sorri-lhe.

Ela acabou aceitando e saiu. Fiquei mais alguns instantes sentado, pensando no que
fazer. Eu nunca fui patriota, sempre me importei pouco com esse lugar desgraçado.
Mas se já era ruim com ele, seria ainda pior sem ele. Decidi caminhar pelos
corredores depois de sair. Procurei o tal Jesus, que me mostrou onde era o banheiro.
Tomei um banho demorado e, ao sair, ele estava esperando do lado de fora,
perguntando se eu precisava de algo. Pedi um meio de transporte a ele para que eu
pudesse me dirigir até Pascal. Ele me ofereceu carona, mas preferi ir sozinho. Para
isso, me foi dada uma das motos de Montana. Esse cara parecia ter consideração
por pessoas como eu. [...]

Percorri as ruas caóticas. Parece que não fui só eu que vivi o inferno esses dias.
Mais um motivo para aderir à ideia suicida. A viagem, graças à potência do
transporte, não demorou muito. Depois de informá-los, Pascal piorou ainda mais,
pelo que soube. Roberto parecia ser um cara íntegro, pois, depois que lhe passei a
informação, ele depositou o dinheiro acordado entre mim e Pascal. O tal do Pietro
parecia estar morto, aparentemente. Ainda bem. Roberto me disse depois que eu
estava livre para ir embora, que meu dever estava cumprido. — Não. — Ele arqueou a
sobrancelha. — Me ensina a atirar. E mais o que puder. Meu trabalho não acabou
ainda.

Ele sorriu. E foi assim que comecei meus treinamentos. Os latinos eram ótimos
atiradores, e mesmo com aquela pouca semana de treinamento, eu já atirava
consideravelmente bem - o suficiente para me defender. Passei a treinar mais meus
poderes também. Tentei transcender os desejos sexuais que eram utilizados pelos
clientes, transformando-me em pessoas e até criaturas fora dos padrões. Era difícil,
virar aquilo que não estava habituado sempre. Era como se eu tivesse que
reescrever meu DNA muito rapidamente...

Mas aos poucos eu conseguia imitar as mais diversas pessoas e criaturas que eu
conhecia com mais facilidade. Até aquelas conhecidas e poderosas.
E assim, depois de sete dias com descanso mínimo, esforçando-me ao máximo, eu
só não conseguia acertar melhor os alvos, mas também me transformar de forma
mais eficaz e diversificada. Imitava pessoas e até mesmo seres considerados
míticos. Percebi que além do dano físico que eu podia causar, seja com uma arma
ou com um ataque aumentando a minha densidade muscular, podia impor medo
neles. No dia D, me juntei aos latinos e fomos para Troika, com o objetivo de acabar
com o máximo de russos que pudéssemos. Pelo que entendi do plano, o objetivo era
enfraquecer o porto para diminuir as chances de ajuda ao navio posteriormente.
Percebi tiros e confusão em determinada parte, denotando que alguma das gangues
não queria tanto ser discreta. Os latinos, armados com um diversificado tipo de
equipamento bélico, ao contrário do que eu imaginava, resolveram agir na surdina.
Eliminavam os russos que encontravam com armas com silenciador ou a laser, sem
emitir barulho. Eu agia da mesma forma, mas nem sempre atingia o alvo
diretamente, tendo que finalizar as mortes com novos disparos ou até golpes
físicos. Para os golpes físicos, eu me transformava em pessoas com maior
densidade e, às vezes, até nas mencionadas criaturas.

Depois de alguns minutos de ação e adrenalina, nosso líder nos conduzia para nos
encontrarmos uns com os outros. Nos deparamos com a gangue italiana, e dentre
eles uma distinta mulher de cabelo arroxeado, uma punk, um loiro magricelo e o
velho Vladimir, para quem aceno com a cabeça. — Resolvi aceitar a proposta.

Gal Bordeaux
Talvez ele estivesse certo, ela pensava enquanto descansava em seu apartamento
em All Street. Estava confortável apenas com um roupão fino de seda, sentada fora
da banheira, mas com os pés dentro dela. O luxo que os roubos tinham garantido até
então. Para ela, aquela cidade não era tão ruim assim. Então... um novo regime poria
as coisas ao fim, certo? A guerra já acabou com quase tudo... A guerra de verdade, a
nuclear, no caso. A urbana nunca acabaria, porque gera dinheiro. Mas a nuclear...
erradica tudo. Nada impediria que o navio que se aproximaria não lançasse mísseis
nucleares em sua casa. Talvez a vaca da Telford não tivesse os meios necessários
para defendê-la, e realmente ela e os outros meta-humanos precisassem entrar em
ação.

Aceitou, por fim. Não por qualquer sentimento de amor pela cidade ou pelos outros
habitantes, apenas pelo seu próprio. Ainda tinha sua própria liberdade e,
principalmente, sua vida. Nada que nenhum russo maldito fosse tirar dela. Além
disso, guardava um certo rancor da vaca de Margareth por ter deixado uma marca
em seu abdômen perfeito com aquela facada.
Falando em dinheiro, algo que movia a loira, dirigiu-se à sede da máfia "japonesa".
Assim que chegou, vestindo uma blusa e calça justas ao corpo, com sapatos altos
na mesma cor, chamou a atenção dos orientais que faziam parte da organização.
Eles portavam armas modernas e katanas, cada um com sua própria aparência.
Alguns trajavam ternos, outros exibiam partes cibernéticas, alguns eram novos e
outros já estavam envelhecidos. Ela simplesmente ignorava as palavras chulas que
lhe eram dirigidas. Conhecida por todos ali, foi levada até a sala de Xiaren.

Após chegar lá, a segurança pessoal dele, uma oriental com máscara semelhante ao
uniforme que cobria o resto do corpo, abriu a porta para que ela adentrasse na sala.
Xiaren não demonstrava felicidade nem desapontamento ao vê-la. Talvez fosse
porque ele já sabia o motivo de sua visita.

— Você me deve a metade do dinheiro, conforme Antaro prometeu. Um tempinho


atrás.

— Isso se o trabalho fosse efetuado de maneira correta. Pelo que me relataram, você
foi ferida e salva pelos italianos. Então, a metade é mais do que o suficiente.

O sangue subiu de raiva em seu rosto. Ele percebeu, mas crente de sua
invencibilidade e da aparente mediocridade da mulher, continuou.

— Mas se quiser me fazer uns outros serviços, eu posso pagar o restante... — O


homem dizia levando a mão até acima do pênis sobre a calça, indicando o que
queria. Agia para abrir o zíper, o que o faria ficar com as duas mãos ocupadas por
alguns instantes. — Mas é claro... Vou só ao banheiro me preparar. — De pé,
caminhou até a saída com a promessa de voltar. A segurança estava prestes a abrir
a porta quando a loira usou de sua intangibilidade para atravessar a caixa toráxica
dela e puxar seu coração. A oriental caiu no chão sem vida.

Assustado, Xiaren prendeu seu próprio membro no zíper enquanto tentava fechá-lo
rapidamente para pegar uma arma e disparar contra a loira que se aproximava
calmamente. Depois de se certificar de que a porta estava trancada, ele urrou de dor,
mas conseguiu agarrar a arma. Disparou várias vezes contra Gal, mas as balas, sem
qualquer traço de radiack, atravessaram seu corpo como se ela fosse um fantasma.
Quando ela se aproximou, colocou sua mão intangível dentro da cabeça de Xiaren. —
Faça a transferência agora —, disse ela, sem demonstrar qualquer reação ou
superioridade. Com a outra mão livre, tangível, ela digitou os dados da conta
criptografada no holograma da mesa, ordenando que ele realizasse a transferência.
Receoso por sua vida, ele obedeceu às ordens. "Muito bem. Agora vá refletir sobre
suas atitudes", disse ela, usando seu poder para lançar Xiaren para o cômodo
adjacente. Em seguida, ela saiu por outro caminho, sabendo que, devido aos
disparos feitos por ele, seus homens logo estariam na sala. [...]

Os três dias restantes se passaram enquanto ela descansava. Gal lamentava a


morte do ruivo cientista, principalmente porque ele poderia ter descoberto o que a
fez passar tão mal no Cassino. Até então, a sua fraqueza continuaria sendo um
mistério para si mesma. A única coisa que ela concluiu foi que algo a deixava assim,
tão estranha de repente, e que somente nessa missão ela havia sentido isso. Era um
sinal para mantê-la alerta e não confiar cegamente em suas habilidades
sobre-humanas.

Mesmo assim, ela aproveitou suas habilidades para eliminar o inimigo por inimigo
em Troika. Geralmente, ela tentava ser furtiva, aplicando golpes fatais semelhantes
ao que havia dado no soldado de Xiaren. Quando o alvo russo não estava olhando,
ela se tornava intangível e retirava órgãos ou materializava as pontas dos dedos
para causar hemorragias.

Sua ação mais importante até então ocorreu quando, depois de subir em alguns
contêineres, ela viu um homem segurando uma caixa e prestes a lançá-la contra o
grupo de Vladimir, que estava metros abaixo. Era provavelmente uma bomba. Gal
agarrou-se ao homem e se jogou do alto com ele. Ela poderia tê-lo soltado e
atravessado sozinha, mas preferiu atravessar junto com ele e deixá-lo no
subterrâneo.

A ação pôde ser vista por Vladimir e pelas pessoas ao seu redor, incluindo o mutante
que ela havia encontrado na sede italiana e onde também foi proposta. Gal soltou o
russo que ela havia puxado para o salto, fazendo com que ele se solidificasse em
pleno chão. Seu corpo foi comprimido pelo solo ao redor, absorvendo-o. Enquanto
isso, Gal "nadava" no chão até emergir diante de Vladimir e sua trupe.

Kuki Sanbam
Dias antes.

— Você entendeu a missão, docinho?

Silêncio. Xiaren continuava ajeitando seu uniforme preto com a blusa verde larga por
cima. Ela ajustava suas botas, colocando uma sobre um banco enquanto seu corpo
curvado para frente se certificava de que todos os equipamentos estavam presos
em cada compartimento.

— Eu perguntei se você entendeu, porra!


— Sim. Não precisa repetir. Não sou surda.

Elevou o olhar para encará-lo com seus olhos que lembravam os formatos dos
cortes que ela poderia fazer em seu corpo caso ele continuasse a perturbá-la. A
relação entre a mulher de olhos puxados e o homem careca de meia-idade não era
amistosa nem de rivalidade. Ele simplesmente servia como uma espécie de contato
para ela e os contratos. Não que ela se orgulhasse do que fazia, mas era a única
utilidade que ela via para si mesma. Foi criada para trabalhar para alguém, usando
seu intelecto e corpo bem treinado para realizar coisas que os contratantes não
eram capazes. A diferença agora é que ela trabalhava para si própria. Ainda assim,
era necessário ter um intermediador, mesmo que fosse o desequilibrado do
Manfreud.

— É imprescindível que você o acompanhe em todos os passos, 3. — Para evitar que


ele repetisse mais uma vez e a retirasse completamente do sério, ela apenas o
encarou e acenou positivamente, sem esboçar reação alguma. — Para a nossa
contratante, o valor que ele representa para a mídia é altíssimo e a mídia é como se
fosse — O quarto poder. Eu ouvi pela primeira vez. Mas isso é uma história antiga.
Não existe outro poder senão Carmen Telford. — Isso pode estar para mudar. É com
isso que nossa contratante conta. — Ela assentiu mais uma vez antes de sair em sua
missão. [...]

Dias atuais.

Ficou seguindo o homem por todos os trajetos que ele fez, mesmo que ele não
percebesse. Disso ela poderia se gabar: é uma ás em ser invisível e não ser notada.
No momento, observava do alto de um dos arranha-céus os céus de Miraitropolis e a
confusão no ar com os dirigíveis, através de um binóculo especial. Não foi difícil
presumir que o dirigível que o homem que seguia se chocaria com o prédio de Henry
Choi. — Merda. O meu dinheiro. — Disse apática, armando o arco que portava em
uma velocidade transcendente, graças à tecnologia do mesmo e às habilidades que
possuía. Uma flecha que possuía uma espécie de cabo similar ao aço – menos
pesada e de igual resistência – embutida nela seria disparada. Assim que o objeto
foi disparado também em grandíssima velocidade, prendeu-se em uma das laterais
do transporte voador. Com uma espécie de bobina embutida no arco, Número 3 foi
puxada contra ele.

Assim, conseguiria chegar na parte em que Pollux estava, bem a tempo de vê-lo
lançar sua última flecha. Última flecha daquele dia, se sua ação fosse bem sucedida.
Ato contínuo, ela efetuaria um chute contra o tórax do homem que o lançaria para
fora do transporte. Seguidamente, virar-se-ia apenas para confirmar a previsão do
choque do objeto contra o prédio. Lançar-se-ia para fora do transporte pela mesma
abertura que teria lançado o jornalista, e diferente dele, que provavelmente estaria
com os membros abertos, o que diminuiria sua velocidade por aumentar a
resistência contra o ar, ela teria se lançado em posição de “míssil”, o que diminuiria a
resistência e consequentemente aumentaria a velocidade de seu corpo.
Assim, conseguiria chegar na parte em que Pollux estava, bem a tempo de vê-lo
lançar sua última flecha. Última flecha daquele dia, se sua ação fosse
bem-sucedida. Ato contínuo, efetuaria um chute contra o tórax do homem,
lançando-o para fora do transporte. Em seguida, virar-se-ia apenas para confirmar a
previsão do choque do objeto contra o prédio. Lançar-se-ia para fora do transporte
pela mesma abertura que teria lançado o jornalista. Diferente dele, que
provavelmente estaria com os membros abertos, o que diminuiria sua velocidade
devido à resistência contra o ar, eu me lançaria em posição de "míssil", diminuindo a
resistência e aumentando a velocidade do meu corpo.

No ar, então, tendo conseguido me aproximar do homem, envolveria rapidamente as


duas penas em minha cintura. Já tendo perdido o arco utilizado para me prender ao
dirigível, usaria uma espécie de arpéu que carregava em um dos meus bolsos.
Dispararia e faria seu gancho se prender em uma das paredes de um dos vários
prédios do centro. Se fosse bem-sucedida na investida, realizaria um movimento de
pêndulo com ele, no pleno ar, até cairmos sobre o terraço de um prédio menor. O
choque dos corpos ao chão do terraço certamente acarretaria dor, mas se
tivéssemos sorte, não teríamos ferido nenhum órgão interno. Assim, manteria o
homem vivo, e o corpo encontrado por X-9 e Vlad, devido às queimaduras intensas,
poderia ter sido confundido e não ser o do verdadeiro.

Laurel Hedare ou Claire


Se você faz parte da elite em Miraitropolis, não há motivo para vagar pelas caóticas
ruas da cidade. A proprietária da Empresa Hedare, responsável pela venda de
cosméticos e roupas na cidade, era um exemplo perfeito. Como herdeira da
empresa e da fortuna misteriosa de seu falecido marido, ela terminou de aplicar seu
produto cosmético chamado Beau-Line. Seu corpo estava parcialmente exposto
enquanto ela aplicava lentamente o creme do pote em sua pele. Foi quando ouviu
uma batida na porta. Era Maria, sua empregada. Havia robôs que poderiam fazer o
trabalho, mas a mulher loira na casa dos quarenta preferia ter serviçais humanos.

A funcionária latina informou que um homem estava esperando por ela na sala de
estar. Ele era da polícia. Laurel respirou fundo. — Diga a ele que estarei lá em breve.
—, disse ela, revirando os olhos. Depois que a empregada saiu, ela começou a
remover o creme do corpo e colocou um colar de cor de pérola. Ela calçou seus
saltos e caminhou lentamente em direção ao policial, como se não houvesse nada
de errado com ela. Quando chegou, ela lhe lançou um sorriso radiante. — Bom dia. É
sempre bom receber a polícia. Especialmente sem aviso prévio —, disse ela,
estendendo a mão para cumprimentá-lo. Ele apertou sua mão. — Se houvesse um
aviso, não seria divertido, não é mesmo, Sr. Hedare? — Ambos fingiram rir. — O
motivo da minha visita é bastante simples. Há fortes evidências de que você tem
usado uma substância ilegal chamada Radiack na composição do creme Beau-Line
—, disse ele. Ela começou a rir. Dessa vez, ele permaneceu sério. — Mas isso é
absurdo, oficial... Sanchez, certo? —, disse ela. — Sanchez, de fato. Bem, oficial,
obviamente eu não uso essa... como era mesmo? Redneck?— , disse ela, zombando
dele. — Radiack, senhora.—; — Bem, então. Radiack. Eu não uso. Se isso é tudo… — O
policial percebeu que a situação poderia se intensificar e decidiu ir embora. Ela
abandonou sua expressão hostil e a substituiu por uma de desgosto. Ela voltou às
suas atividades sociais.

Cerca de duas horas depois, ela viu na televisão a confirmação do aviso maldito
daquele Sanchez. Eles mostraram uma representação gráfica de um rosto feminino
ligado a um relatório de que uma certa cliente havia usado o produto várias vezes e
ficou com a pele seriamente danificada. A cliente, agora uma paciente, deu sua
versão da história. Advogados já mencionaram processos contra a empresa. —
Maldição! Por que aquela mulher maldita não morreu logo?! — ela exclamou,
derrubando pratos e objetos sobre a mesa à sua frente. O policial estava certo. Mas
a pior parte era que as notícias estavam se espalhando livremente... Carmen
controlava a mídia. Ela era sua amiga, não podia deixar isso passar, pensou. Afinal,
ela fazia parte de seu conselho... Mas ela também estava lidando com muitas
coisas. Era natural que algumas coisas escapassem.

Ainda naquele dia, ela entrou em contato com sua equipe de relações públicas para
organizar uma coletiva de imprensa. E assim aconteceu, na sede da empresa. Ela
ficou em um pequeno pódio e deu uma introdução básica, garantindo a todos que
seus produtos estavam longe de serem tóxicos. — Bem, com isso, espero que o
assunto esteja resolvido. Mas, Sra. Hedare, há evidências de que o Beau-Line
contém Radiack—, —Você sabia que o Radiack é uma substância do deserto
radioativo? — Essas foram as perguntas que ecoaram de jornalista para jornalista.
Sem querer respondê-las, ela simplesmente agradeceu mais uma vez e, escoltada
por alguns funcionários, dirigiu-se à saída. Ela esperava que fosse o fim.

Naquela noite, enquanto passava pelos canais de TV para ver se havia algo sobre
ela, não encontrou nada. Era terrível. Anunciaram que uma forte campanha da Choi
Robotics em parceria com a indústria da moda de Cassandra Alesstar havia
realizado um desfile de moda bem-sucedido, e seus modelos artificiais se tornaram
o epítome dos padrões de beleza, revolucionando a moda moderna e arrecadando
milhões. O sangue da loira ferveu. Choi também estava no conselho. Ele deveria tê-la
apoiado, e não Cassandra. E não era apenas prestígio que estava perdido, mas uma
grande fortuna que não foi arrecadada. Choi era subserviente a Carmen... Mais uma
falha de sua "amiga". Ela decidiu que era a hora certa de fazer uma visita e colocá-la
a par das coisas.

Quando se dirigiu, no dia seguinte para falar com a poderosa de prata, tomou
verdadeiro chá de cadeira. — Diga a ela que é Laurel Hedare, querida. — Falava com
a secretária, rodeando sua mesa. — A secretária levantou-se da cadeira e foi até a
sala atrás de si. Voltou poucos segundos depois, com uma feição de receio. —Ela
não poderá atender a senhora agora, senhora Hedare. — Laurel deu um meio sorriso,
como se estivesse incrédula. — Você informou que SOU EU que estou aqui,
esperando? — Ela assentiu positivamente. Pensou em falar mais uma vez, mas viu
que alguns outros funcionários a observavam. Resolveu ir embora e voltar no dia
seguinte.

No dia seguinte, a história se repetiu. Dessa vez, de modo ainda mais grave a seu
ver. A secretária nem mais se dava ao trabalho de ir até a sala. “A senhora Telford
está indisponível, senhora Hedare. Me desculpe.” Ela ainda esperou alguns minutos
fitando a cidade pelo vidro da janela, na expectativa que a Dama de Prata saísse da
sala e pudesse interpelá-la diretamente. Mas lembrou que havia câmeras naquele
cômodo e que ela poderia muito bem estar apenas esperando que a empresária
saísse para poder ficar à vontade. Essa possível sensação de estar sendo ignorada
deixava-a maluca. Quebrou o copo de cristal que haviam lhe servido água como se
fosse papel a ser amassado – efeito do radiack em sua pele, que lhe concedia uma
pele de "mármore". Limpou os cacos na roupa e saiu batendo pé. Parece que a
amizade com Carmen estava abalada.

Horas mais tarde, quando retornou para seu escritório com a cabeça mais fresca,
estranhou um papel em sua mesa. As correspondências eram todas entregues por
mídia digital. Isso só podia dizer que alguém não queria ser hackeado ou hackeada.
Na carta havia dizeres como “Lamento esse desfile de Cassandra”; “As suas roupas
são tão melhores”; “Isso só pode ser um sinal de que Miraitropolis não é mais a
mesma”. A intenção era clara, fazer suspeitas recaíram sobre aquela amizade. Mas
por quê? E o que ela teria interesse nisso?

Galathea
Jesus desceu os últimos degraus das escadas para o último andar do clube, abrindo
as portas para o depósito. A música alta o atingiu como golpe. Vicky que o
acompanhava se encolheu com o som súbito.
— Puta que pariu… que merda é essa? Música Clássica? Quem escuta uma coisa
dessas?

— Tá mais pra música jurássica. — Sorriu o mais novo enquanto se aproximavam de


uma caixa que servia de mesa improvisada sobre a qual Galathea e William
empilhavam e verificavam o equipamento que iriam levar na missão.
O local estava atolado de caixas, a maioria sem um arranhão sequer. Todas com
bons equipamentos comprados com anos de trabalho duro e suor daqueles
soldados. As pilhas de caixas bloquearam parcialmente a boa iluminação do local.
Os presentes vestiam roupas pretas tradicionais, embora não estivessem totalmente
equipados para a missão ainda.

— Como estamos? — Perguntou Jesus pousando as mãos na cintura e se curvando


sobre os coletes, cartuchos, visores, armas e granadas sobre a grande caixa de
alumínio com interesse fingido.

— Preparando. — Respondeu Galathea sem erguer os olhos da mesa. — Coloque


mais granadas, Will. — Instruiu calmamente.

William anotou as mudanças no equipamento para manter o depósito em ordem


antes de ir buscar o que ela havia pedido em uma das caixas.

— Estamos preparando tanta coisa ao mesmo tempo… — Começou Jesus, mas


notou que Galathea estava prestando pouca ou nenhuma atenção a ele, de forma
que o Messias emendou. — Então… sobre o menino do laboratório, Dexter…

A morena parou imediatamente, olhando para a caixa com um semblante distante e


sombrio. Ela tinha tentado evitar pensar naquilo até então. Por alguns instantes, ela
não falou nada, até mesmo a música parecia ter silenciado enquanto algumas
mechas do cabelo negro escorriam por seu ombro e ela permanecia alheia a isso,
como um cadáver.

— Eu disse… ele era jovem demais pra isso. — A morena finalmente falou, ainda
olhando pro nada. A entonação de sua voz deixava claro que ela estava tentando
convencer mais a si mesma do que responder a pergunta.

— É, ele era jovem demais pra isso. — Respondeu Jesus dando de ombros.

Vicky apenas observou a situação com o cenho erguido, pois ele mesmo não
parecia ser muito mais velho do que Dexter.
Galathea acendeu um cigarro e se afastou, subindo lentamente as escadas para
cima absorta em seus pensamentos.

O som metálico das granadas tocando a caixa de metal atraiu de volta a atenção
dos dois. William os encarava com um olhar gélido. Jesus ergueu as mãos tentando
apaziguá-lo.

— O quê? Eu não fiz nada.

— Não toque no assunto, ela não gosta de pensar em outros problemas antes de
uma missão.

— Não tem problema nenhum se a solução é simples. Aliás, eu não sei porque não
matamos aquele pau no cu ainda. Quanto mais demorarmos, pior vai ser pra todo
mundo. Literalmente todo mundo.

— Ele vai morrer… — Disse William com tanta certeza quanto tinha de que o sol
nascia no leste — Vai morrer log

— Ele vai morrer quando ela der a ordem. Podem se equipar, está na hora. — Rosnou
Shae adentrando o recinto.

— Mas porra, Shae, ele matou um de nós!

— Não. Dexter era da Cosa Nostra e não Uroboros. Imagino que os italianos tenham
suas próprias regras quanto à morte desnecessária de um membro por outro.

— Não podemos ficar aqui sentados com o dedo no cu enquanto ela carrega esse
fardo sozinha. — Reclamou William em sua devoção típica para com sua líder.

Shae balançou a cabeça de um lado para o outro com um sorriso no canto dos
lábios. Ele via Galathea mais como uma igual do que uma deusa da guerra como
outros outros membros, de forma que conseguia manter a cabeça clara ao invés de
se tornar um pseudo-fanático como William.

— Podemos e vamos.

E com essas palavras Shae pegou seu colete e começou vesti-lo. Aquela era apenas
a primeira peça do traje padronizado de combate que utilizavam.

Calmamente colocaram placas de cerâmica e carbono sobre o peito, braços, pernas


e ombros. Fivelas foram apertadas e fechos travados sob um silêncio quase
ritualístico onde tudo o que se ouvia eram sons metálicos de armas sendo
inspecionadas e carregadas, granadas presas e bandoleiras posicionadas. A morena
logo se juntou a eles, colocando também suas roupas e prendendo suas armas e
munições na cintura.

O silêncio perdurou durante a viagem. Era sempre o mesmo silêncio, independente


da missão. A tensão e ansiedade da batalha. Aquele tremor leve no fundo do corpo,
proveniente da dúvida de que esta vez será a que não irá retornar. O silêncio da
concentração, onde cada soldado luta uma batalha interminável consigo mesmo.
Onde cada instinto grita para que ele vire, volte, fuja. Mas a mera imaginação do
olhar de nojo dos seus companheiros diante de tal ato parece ser ainda mais
insuportável que a própria morte.
--------------
O veículo parou a uma boa distância da entrada do porto e dali já podiam ver o
rastro da destruição causada pelos italianos. Assim como podiam ouvir seus tiros e
ver os riscos luminosos contra o céu. Uma batalha no mínimo impressionante
estava acontecendo. Ela achava um overkill absurdo, mas ainda assim uma
demonstração de poder impressionante.

— Quem é aquele? — Perguntou Galathea apontando a batalha com um cigarro que


havia acabado de acender ao sair do veículo.

William pegou um rifle no interior do veículo, trazendo-o para os ombros e espiando


a batalha através do scope.

— É aquele é… como é o nome dele? Montana. O outro Montana. Irvine, isso. Irvine
Montana. — O rifle estalou, a bala cortou o ar e atravessou a garganta de algum
pobre russo à distância. Foi o único tiro dado pelos membros da Uroboros.

— Não deveríamos ajudar? — Perguntou Jesus ansioso pra atirar em alguma coisa e
dar catarse a toda a tensão em seu corpo.

— Não — A morena exalou as palavras lentamente com a fumaça — Vamos


conservar munição e força. Vladimir nos chamou aqui pra invadir um navio. Aliás, eu
não sabia que tinha outro Montana….

A conversa se desenrolou despreocupadamente entre as pessoas de preto


encostadas no carro enquanto ouviam os tiros. Dali estavam longe o suficiente de
qualquer perigo, a não ser por uma bala perdida. Quando finalmente os tiros
cessaram, eles se aproximaram da pequena aglomeração de italianos e cia que
começava a se formar. Palavras não foram trocadas naquele momento, apenas
acenou com a cabeça para Irvine e a mulher com cabelo Azul. Galathea reconheceu
a hacker pelos arquivos da Cosa Nostra.

— Câmeras. — Ela ordenou e os 5 membros da Uroboros incluindo ela ligaram suas


câmeras presas ao ombro destro. A morena olhou a tela do seu comunicador no
interior do antebraço, vendo as imagens ficarem on-line uma a uma.

— Vai fazer streaming? — Perguntou Vicky olhando por cima do ombro dela,
fazendo-a rir com a ideia de filmar russos morrendo para o deleite da população de
Mirai. Mas apenas negou com a cabeça.

Timothy Carter
Ele conseguiu o que queria, seu nome e sua causa agora estavam na boca do povo
revoltado de Miraitropolis. As pessoas desejavam algo novo, ansiavam por ter suas
vozes ouvidas e ansiavam por alguém disposto a realizar seus desejos. Timothy
Carter seria esse alguém, o farol que os habitantes da megalópole buscavam. Na
semana seguinte ao conturbado ataque ao cassino Overdose, os panfletos
distribuídos por Timothy se multiplicaram e um site discreto, com o mesmo design
do panfleto, foi criado. Em menos de quatro dias, já havia uma quantidade absurda
de acessos, afinal, as pessoas queriam saber quem era Timothy Carter e
pesquisavam na rede pelo seu nome, o que as levou até o site recém-criado.

Tim estava de pé em frente ao espelho, abotoando um paletó verde musgo e


acertando o nó da gravata preta. Ele passava a mão no cabelo, colocando-o para
trás. — Vai deixar a barba? — Perguntou Rose sentada numa poltrona de veludo atrás
de Carter. — Sim, demonstra uma imagem de força para as pessoas, e o que somos
nós além da imagem que passamos? — Ele terminou de se arrumar, Rose então se
levantou e disse. — Tem certeza que vai fazer isso? Provavelmente informações
sobre esse encontro já chegaram até os escritórios da Paramilitech, é uma jogada
perigosa dar as caras assim. — Timothy havia usado o site para marcar um encontro
na frente da catedral de Miraitropolis, onde faria seu primeiro discurso para os
interessados na sua causa. — Se a Paramilitech aparecer, será ainda melhor, vai
mostrar para o povo que eu realmente sou uma ameaça para o sistema.

O grande momento chegou para Tim Carter. Em frente às escadarias da catedral,


uma multidão se formou, todos curiosos e interessados no homem que havia
decidido lutar contra o sistema. Timothy subiu as escadarias com Rose Ortiz ao seu
lado, parando no topo e virando-se para todas aquelas pessoas que conversavam e
até mesmo gritavam. A mulher entregou um alto-falante portátil para Tim, e as
pessoas logo começaram a entender que ele era o homem dos panfletos. Alguns
começaram a pegar seus dispositivos móveis para gravar, e o silêncio começou a
tomar conta. — Boa noite a todos, sou Timothy Carter. — A atenção das pessoas se
voltou totalmente para ele agora. — Perdi minha esposa e filha no ataque ao Canal
17 que ocorreu a meses atrás. Eu sei o que vocês sentem todos os dias, com seus
amigos e familiares sendo subjugados e mortos devido ao sistema que fecha os
olhos para o que acontece aqui nas ruas. Por isso eu decidir fazer alguma coisa,
pois não quero as pessoas continuem sentindo essa sensação impunidade, sendo
tratadas como brinquedos pela elite que só faz nos explorar. — As pessoas
começaram a gritar e aplaudir, ele então finalizou. — Hoje, eu peço o apoio de cada
um de vocês para a criação do Partido Independente de Miraitropolis. Com a ajuda
de vocês, eu poderei chegar até o topo e combater todos aqueles que nos olham das
suas coberturas com nojo. E se não chegarmos pela democracia, chegaremos pela
FORÇA! Se a vida já estava ruim, estava ficando pior por causa da ansiedade.
Quando recebi a notícia sobre a resposta de X9, eu já estava pronta para mais uma
vez sair por aí com meu carro à sua procura, pronta para sentir o vento nos cabelos
e a pressão da velocidade na pele. Era como uma droga que acalmava meus ânimos
e me acalmaria depois daquela conversa um tanto desconfortável que tive com o
velho. Mas mesmo assim, aquele molho de chaves com o pingente de canguru
estava em minhas mãos. Por que eu segurava aquilo? Acordei de meus
pensamentos e estava deitada no velho sofá de veludo vermelho, descalça e bem à
vontade, olhando para o teto velho daquela sala e ouvindo as notícias dos jornais,
relatando o que estava acontecendo. Pousei o antebraço sobre a testa. Era um
momento de pensamentos piores do que as piores brisas ou ressacas. O tempo
passava lentamente e tão impaciente quanto eu, estava Gini, deitado na mesa de
bilhar e perdido em pensamentos que eu provavelmente não saberia. Talvez sobre
as pessoas de quem ele se importava e imaginava o que estaria acontecendo com
elas naquele momento. Era como se estivéssemos ilhados naquela pocilga. Foi
então que Aria chegou, trazendo uma cerveja gelada para mim. Me sentei no sofá e
aceitei, dando um belo gole enquanto ela se ajeitava ao meu lado. As pessoas foram
à loucura, gritando palavras de apoio a Timothy que agora seria um político em
ascensão.

Mad Max
< Mensagem de: X-9:

Oi Aria, aqui é a X-9, um amigo meu disse para vocês ficarem ligados, esses Black
Hats são perigosos, se aparecer mais deles não os enfrentam. Vou descobrir mais
sobre eles. Diz pra Max que eu e esse mesmo amigo vamos tentar interceptar o cara
que tem as imagens. Não posso confirmar que terei sucesso, só enviei a mensagem
para que saibam que estou cuidando do assunto. Daqui a pouco retorno avisando se
deu certo ou não.
Fim da Mensagem. >

< Mensagem de: X-9:

Aria, sou eu de novo, roubei as imagens criptografadas, isso custou a vida do cara
da ParaMilitech, mas não vem ao caso e nem nos importamos, não é mesmo?
Magane Grisson era o nome do sarna, tivemos a sorte que ele não compartilhou
com mais ninguém o arquivo. Pede para a esquentadinha não matar mais nenhum
milico, por favor. rs. Preciso urgentemente falar com a Max, não saiam de onde
estão, vou até vocês.

Fim da Mensagem. >

Se a vida já estava ruim, estava ficando pior por causa da ansiedade. Quando recebi
a notícia sobre a resposta de X9, eu já estava pronta para mais uma vez sair por aí
com meu carro à sua procura, pronta para sentir o vento nos cabelos e a pressão da
velocidade na pele. Era como uma droga que acalmava os ânimos e me acalmaria
depois daquela conversa um tanto desconfortável que tive com o velho. Mas
mesmo assim, aquele molho de chaves com o pingente de canguru estava em
minhas mãos. Por que eu segurava aquilo? Acordei de meus pensamentos e estava
deitada no velho sofá de veludo vermelho, descalça e bem à vontade, olhando para o
teto velho daquela sala e ouvindo as notícias dos jornais, relatando o que estava
acontecendo. Pousei o antebraço sobre a testa. Era um momento de pensamentos
piores do que as piores brisas ou ressacas. O tempo passava lentamente e tão
impaciente quanto eu, estava Gini, deitado na mesa de bilhar e perdido em
pensamentos que eu provavelmente não saberia. Talvez sobre as pessoas de quem
ele se importava e imaginava o que estaria acontecendo com elas naquele
momento. Era como se estivéssemos ilhados naquela pocilga. Foi então que Aria
chegou, trazendo uma cerveja gelada para mim. Me sentei no sofá e aceitei, dando
um belo gole enquanto ela se ajeitava ao meu lado.

— Então, a sua amiga está vindo pra cá. — Ela dizia, tentava não demonstrar muita
coisa mas no fundo, estava um tanto ansiosa pois, como estava aprendendo os
macetes da vida de hacker, entrar em contato com uma expert seria outro nível, e
suas mãos inquietas sobre o colo mostravam bem como estava ansiosa. Eu, por
outro lado, me recostava no sofá de forma relaxada e apenas respondia.

— Ela virá sim. Você vai conhecer, ela pode te ensinar várias técnicas sobre essas
coisas aí de hackear. — Obviamente os olhos de Aria chegavam a brilhar, mas por
outro lado, ela sabia o quanto seu pai desgostaria dessa ideia e novamente abaixou
os ombros após um suspiro. — Acho que papai vai surtar antes disso... — E com
certeza, eu só poderia concordar mas não disse nada, então dei mais um gole.
Pensar em tudo aquilo me deixava puta com a situação toda. Eu gostava muito de
Aria e era pesado pensar que não conseguiria mais ver minha "irmãzinha", é, era
assim que eu pensava sobre ela. Kendric era um filho da puta, panaca e covarde. Por
outro lado, a cidade estava um caos e qualquer um poderia ser vítima em questão
de poucos momentos, e a televisão mostrava isso claramente. Eu pensava como e
onde X estaria no meio de toda aquela confusão.

Kendric em seu quarto, preparava algumas coisas para a futura viagem que faria
com sua filha. Malas prontas, armas que eram compostas por pistolas e rifles
carregados, e seu favorito, um arco e flecha bem arcaico, ainda feito de madeira,
com aljava cheia de flechas. Estava tudo ok para a futura partida assim que Max
saísse para seus negócios. O velho se aproximava da cabeceira e ajeitava o retrato
de sua falecida esposa. Ele a observava e ficava a pensar, imaginar se estava
fazendo o certo ou se havia alguma outra forma de poder fazer aquilo, será que era
certo fugir e abandonar o lar que tanto lutou para manter de pé? E, certos pontos
parecia errado, mas ele sabia que quando começava uma luta naquele lugar, naquela
cidade, ela acabaria apenas em morte, de ambos os lados, e era arriscado perder
sua filha no meio de tanta violência. Ele alisava o retrato com muito pesar. Seria
muito mais fácil tomar decisões se ela estivesse ainda viva.

Os dias se passavam e no último, já começava ruim, ao menos para Kendric que


gritava para uma visitante um tanto indesejada mas não inesperada, cedo ou tarde
ela viria. Naquela manhã, no bar quase movimentado, chegavam uma garota de
moicano roxo e um velho barbudo, ele sabia muito bem de quem se tratava e tentava
se livrar o mais rápido deles. Alguns clientes tentavam não ligar muito, afinal, brigas
em bar eram normais, mas era diferente quando se tratava do dono brigando. Alguns
olhares se voltaram para a cena que estava mais interessante do que as notícias na
televisão, que como sempre mostravam que toda aquela bagunça de uns dias
atrás,que estava quase sendo jogado debaixo dos panos, a polícia e os políticos
sabiam como fazer aquilo, mas ainda assim no coração de qualquer habitante da
região, sabiam que era apenas uma questão de tempo até a violência desenfreada
voltar. Em meio a toda aquela bagunça, Aria descia as escadas e espiava o que
estava acontecendo. Moicano roxo, manopla tecnológica. X9, era a amiga de Max.
Ela sentiu os pelos se arrepiarem e não podia deixar que ela fosse embora, então
interveio.

Eu? Eu estava dormindo naquele sofá, parecia que estava grudada nela, mofada,
mas estava muito bem ali e parecia que Gini estava muito bem naquela mesa de
bilhar também, dormiu ali por duas vezes e só reclamou um pouco de dores nas
costas, mas nosso sono foi cortado quando Aria entrava nos chamando. Acordei
quase num pulo, estava "daquele jeito" recém acordada, com os cabelos
despenteados e a cara de morta, além de estar de bermuda e com uma camisa bem
folgada, estava realmente bem à vontade ali, e Gini não estava tão diferente quanto
de costume, apenas as roupas sociais não estavam ajeitadas para que ficasse bem
a vontade também, e sua cara de sono denunciava o quão profundo estava
dormindo.

—É o que?! - Cocei os olhos enquanto tentava ver aquelas silhuetas contra a luz das
escadas e bocejei, já me levantando com preguiça, era uma boa impressão que
estava passando. Aria se afastou para ir preparar algo para que comessem algo, e
esse tempo foi aproveitado para as explicações. Eu me sentava no braço do sofá e
apenas ouvia X falar.

— Vladimir me ajudou a limpar a barra de vocês. Sem ele eu não saberia o que fazer
e nem por onde começar. Grisson foi pra vala com tudo que sabia, e com ele aqueles
arquivos de vídeos da Aurora. Isso não é obrigatório e nem uma forma de
chantagem, vocês podem decidir não nos ajudar. Mas ele e eu vamos com a máfia
latina, oriental e provavelmente a italiana chutar a bunda do Yuric. Só vamos esperar
a poeira baixar um pouco. Estão com a gente nessa?

Querendo ou não, eram algumas informações meio difíceis de se engolir naquela


manhã. Ajeitei os pés dentro do all-star surrado e antes de me levantar, falei com
certa preguiça.

— Bom, parece que você saiu pra fazer milagres, Jeová. Você sumiu e agora voltou,
quase todas as grandes gangues de Mirai unidas. Parece perigoso, mas pelo menos
será um festão. Eu irei sim. — Olhei para os lados, Kendric não estava ali, algo
aconteceu pois ele certamente estaria gritando. — Quem diria, Kendric não está com
uma arma apontada para a cabeça dela… — Comentei pra mim apenas.

Nessa hora, Gini se aproximava enquanto arrumava pelo menos as roupas,


obviamente ele queria muito saber o que se passava. — Espera um pouco. Você
sumiu, Pollux sumiu logo depois da primeira barreira que enfrentamos e sobrou só
eu e a Max. Esperamos seu contato, o que não foi muito explicativo. Antes de
qualquer passo que eu venha a seguir, quero saber o que aconteceu. — De fato,
precisávamos de algumas informações sobre o que aconteceu desde ali, então Gini
parecia muito mais sensato do que eu no caso de se atirar de cabeça em alguma
briga.

X-9 moveu os lábios para responder Gini, mas Vladimir respondeu primeiro, ou por
estar se sentindo meio inútil naquela conversação ou por saber o quão era doloroso
para a hacker relatar que Pollux estava morto, afinal eram amigos e ele não só
entendia como respeitava isso.
Infelizmente toda informação que possuo é sigilosamente militar. Mas pense que
não vai fazer isso por Pollux, nem pela X-9 ou por mim, fará por si mesmo, ou deseja
que sua cidade seja invadida por nazisovieticos? Quer que a guerra bata a porta da
sua casa? Eu sou russo e não quero. Mas entendo, vocês vivem em um mundo
extremamente capitalista, de consumo exagerado, não vou é nem quero mudar ele,
ganho muito com isso vendendo armamento da ParaMilitech, essa é a América e
seu sonho. Então se tentar salvar seu lar não é motivação suficiente para você
arregaçar as mangas e entrar nessa guerra como diz, estou disposto a pagar pelos
seus serviços. Três mil créditos de miraikoins em sua conta entrarão amanhã
mesmo depois das nove horas da manhã. — Vladimir era rígido e sabia jogar o jogo
de qualquer um. De alguma forma ou outra conseguia o que queria.

— Heey! Também quero três mil Telfords na minha conta. — X-9 descruzou os
braços, voltando-se para o paramilitar, fazendo uma cara de surpresa.

— Você já foi paga com os upgrades dos implantes cibernéticos, sossegue seu
facho. — A moicano voltou a cruzar os braços, franzindo o cenho e fazendo bico,
como uma criança contrariada.

— Quanto a você, Max, é justo que ganhe algo também. Durante o tempo em que
estiver nessa tarefa colocarei pessoas para reformar sua oficina, não só com uma
boa e nova estrutura de qualidade mas também com ferramentas e máquinas. Acho
que posso fazer o mesmo com sua casa. — Vladimir podia ser severo mas era justo.

Pela reação, acho que a resposta era meio "bruta e inesperada" para o loiro que
cruzou os braços enquanto encarava Vladimir, as opções eram claras mas o plano
não era esse. Se lembrava de que tinha só mais alguns dias para que viessem
buscá-lo mas, aquele navio era real e tudo podia acabar.

Eu, por outro lado, acabava estranhamente me empolgando, então concordava,


balançando a cabeça positivamente.

— Parece razoável. Eu estou dentro.

— Estou dentro também. — Concluiu Gini logo depois.

Agora tínhamos tudo para começar. Não era um trabalho gratuito, mas era muito
empolgante. Assim que o pessoal de Vladimir chegou à oficina, eu mostrei todo o
estrago que foi causado. A parede estava caída, móveis amassados e manchados
de sangue, além de pedaços de tecidos humanos que foram esmagados ali. X
olhava para mim, um tanto surpresa, e eu apenas ergui os ombros como se não
fosse nada demais.
— Só estava tentando redecorar —, disse, soltando uma risada. Claro, foi uma piada
bem ruim. Eu levei um engradado de cerveja apenas para começar, pois quando tudo
estivesse montado, começamos o trabalho. Enquanto isso, subi para minha casa e
deixei uma mensagem no quarto de Toshio, escrita: "Cuide da casa e da oficina
enquanto eu estiver fora".

Finalmente, o trabalho começou. Eu, X e Gini nos reunimos para começar a lidar com
os Hover, mesmo que Gini não soubesse muito sobre eles. Pelo menos ela estaria lá
para nos auxiliar na montagem. Eu olhava para a garota com seu moicano, e sentia
um tom de nostalgia. Era como nos velhos tempos do orfanato, mas agora
estávamos vivendo isso.

Nas horas de descanso, Gini dedicava sua atenção a outro projeto misterioso, algo
que eu desconhecia até então. Enquanto isso, eu continuava montando a esfera
conforme os diagramas indicam. Parecia que eu estava quase terminando e mal
podia esperar para testar. No entanto, minha concentração foi interrompida por uma
mensagem de Aria. Ela me informou que estava quase partindo com seu pai, mas
também expressava sua desaprovação em relação à escolha dele. Eu entendia
perfeitamente os sentimentos dela.

Enfim, o primeiro dia de trabalho foi tranquilo e todos merecemos descansar. No


entanto, eu estava tão ansiosa que comecei a fazer os preparativos finais para o
meu novo projeto de motor. Abaixo da oficina, havia outro salão, quase do mesmo
tamanho. Era uma garagem desocupada que tinha uma saída na rua de trás, mas
estava conectada à minha oficina. Lá embaixo, havia um carro desmontado em três
partes: a dianteira, a cabine de dois bancos e a parte de trás onde ficava o motor.
Este último estava suspenso a poucos centímetros do chão, com suas rodas
apoiadas em uma esteira grande para simular uma corrida. Eu estava mexendo no
motor, atualizando-o para receber aquele novo componente em forma de esfera.

— Achei que a gente teria de descansar para terminar os hovercars. — É, o velho


barbudo Vladimir havia pedido hovercars para nossa missão e eu não negaria, adoro
fazer novos projetos, mas ainda assim, amava mais os carros que possuíam rodas
para andar no chão. Não parei de fazer o que estava fazendo e continuei atualizando
o motor com a solda elétrica que iluminava minha cara com as faíscas.

— Eu consigo fazer essas coisas de olhos fechados. E falando em dormir, tu está aí,
acordado. Deveria vir falar comigo com uma garrafa de cerveja nas mãos, pra mim, é
claro. — Obviamente tinha um pouco de ironia mas muita verdade, queria realmente
estar bebendo alguma coisa para aliviar o calor.
— Foi mal, só vim avisar que a Aria está por aqui. — Nessa hora eu congelei, achei
que ela já tinha partido com Kendric, mas ela era bem teimosa. Voltei para a mesa
de peças, escolhendo algumas outras ferramentas para apertar e fixar os novos
mods no carro. — Eu já vou falar com ela.

— Ok, ficarei por lá. — Não demorou muito e ele estava subindo as escadas
novamente, e era muito claro que ele estava pensando muito sobre o quesito das
férias dele.

Bem, eu voltava ao motor e fixava os mods necessários. Em seguida, ajeitava o novo


projeto de motor em formato esférico, que era plugado em alguns receptores.
Fechava o motor e entrava na cabine, me sentando no banco. "É isso aí, belezinha,
hora de mostrar pra mamãe do que é capaz", eu dizia, alisando os consoles que
estavam no lugar do volante. Seria muito mais fácil conduzir assim. Era como um
pintor tentando transmitir o máximo de sentimento em suas obras.

Colocava protetores de ouvido e começava a pisar no acelerador. O som da


aceleração já era bem alto, o motor era potente e alcançava uma velocidade acima
da média em questão de segundos. Eu ria escandalosamente de alegria, olhando
para o painel eletrônico que ainda não chegava nem na metade. Com 200mph
alcançados, descia ainda mais o pé no acelerador. O visor acendia cada vez mais e
os números aumentavam. O escapamento começava a emitir algumas luzes
quentes e estalava alto dentro da sala, fazendo os papéis voarem. Os estalos se
tornavam mais constantes, a luz quente aumentava o brilho até chegar a uma
coloração branca, iluminando a entrada da sala. O barulho era tão alto quanto o de
um jato e o visor começava a tremer. Já havia alcançado quase 700mph e meu
corpo se enchia de adrenalina. Me imaginava correndo nas estradas com uma
máquina daquela, até que, BUMMM!! Ele explodiu na minha cara.

Desacelerei até conseguir desligar o motor. Estava satisfeita? Mas é claro! Alguns
arranhões não me abalariam, mas agora precisava regular aquilo. Era potente
demais e mortal. Me levantava do banco, limpava o macacão e tentava limpar o
rosto que estava um tanto sujo por causa da fumaça que exalava do visor. Tossi
bruscamente e me virei para o restante da sala, levantando o óculos mais uma vez e
olhando aquela bagunça toda que foi feita. A parede para onde o motor estava
apontado estava com sinais de queimadura, o que me deixava mais ansiosa para
continuar o trabalho. Mas tive de subir para falar com Aria e... ela não estava mais
lá.

Os dias seguintes foram uma verdadeira festa, comemorando nosso progresso no


trabalho e aproveitando as horas de descanso ao máximo. A incerteza do nosso
futuro nos impulsionava a nos divertir ainda mais, entregando-nos às bebidas e às
drogas para escapar da realidade. À noite, decidimos fazer uma pequena
celebração, regada a muito Hard Rock e Punk. Gini, mesmo não sendo fã daquela
música, se entregou à dança, provavelmente influenciada pela bebida. X estava
relaxando em um dos sofás do local e eu me juntei a ela, jogando-me de forma
descontraída ao seu lado. Acomodei-me no sofá, colocando meus desgastados
all-stars sobre ele. Deixei a cerveja de lado e peguei uma erva que estava guardada
na gaveta, acendendo-a e dando o primeiro trago. Embora eu preferisse as emoções
do pó de neon, aquele cigarro também proporcionava um alívio agradável.

— E então, como vamos fazer em questão de preparação, além dos hovers é claro.
Acredito que seu velho deve ter falado algo sobre isso, eu iria adorar ter uma
daquelas armaduras dos paramilitas pra chutar a bunda gelada desses russos. — A
imaginação estava a mil e eu adorava só o fato de poder socar alguém com uma
armadura daquelas.

Primeiro, vou instalar um sistema de comunicação por voz nos nossos hovercars,
para que possamos nos comunicar facilmente durante a missão. Além disso, farei
adaptações no sistema para que eu possa falar com vocês usando minha manopla
em caso de emergência. Já fiz o download do mapa do porto, o que nos permitirá
saber exatamente por onde entrar. - Ela fez uma pausa breve apenas para encaixar o
canudinho em uma das narinas e aspirar a colorida linha de pó de néon esticada em
um prato em suas mãos. Depois de algumas inalações, continuou a falar.

— Aaah, foi bom ter mencionado isso! — X-9 se ergueu do sofá, caminhando
descalça, vestindo apenas uma longa camisa branca que passava da cintura e foi
até o quarto onde dormia e voltou com alguns coldres, caixas de munição, três
coletes balísticos e claro, armamento. Afastou as cervejas da mesa de centro a
frente do sofá e colocou tudo em cima.

— Gini meio que deixou o vovô no vermelho pra armaduras super fodásticas, mas
deu o endereço de um cara em Rio Bravo. Disse que conhecia Vladimir e ele me fez
um preço camarada. Gini já me pagou, e só cobrei por que ele tá cheio da grana
agora, mas de você não cobrarei, até por que está me hospedando na sua casa,
hehe. — A hacker deu um sorrisinho meio maroto e continuou, pegando uma arma
que mais parecia ter vindo de um filme de Guerra nas Estrelas.

— Comprei essa pra você, é uma arma termonuclear, tem munição de radiack
concentrada, se deixar na potência máxima acho que pulveriza um corpo humano.
As baterias de munição estão aqui. — Entregou nas mãos uma caixa quadrada
marrom de plástico contendo seis baterias que duravam mais de uma hora de
sessão de tiros. E esse é seu colete. Entregou a vestimenta de liga de kelvar com
radiack.
Eu me ajeitava no sofá, sentando na beira para poder ver aquele kelvar e então me
levantava, comparando com as medidas de meu corpo como se fosse uma peça de
roupa da moda, e então o vesti. Dei uma risada bem satisfeita e mais um trago no
cigarro, era perfeito.
— As pistolas são minhas e o fuzil do Gini. Bom, sua arma é de uso militar, não sei se
sabe usar. Mas baixei um tutorial de utilização. Pena que você não tem implantes
como os meus, uma troca de dado entre eles seria o suficiente pra você sair atirando
como uma profissional. O jeito vai ser treinar na prática. — Ela pegou uma bateria e
inseriu no cabo da arma.

— Eu consigo me virar, não se lembra daquelas gravações com os militas? —


Respondi bem confiante enquanto pegava aquelas armas, era como estar em algum
filme de sci-fi nerd... hello, estávamos vivendo algo assim!

— Aé... mas é bom já estar preparada para manusear uma arma dessas. Vamos no
quintal treinar uns tiros? — Indagou bebendo um gole de cerveja.

— Então vamos lá. — Saímos à noite para a área nos fundos da oficina, que mais
parecia um depósito de entulhos. Eu estava arrumando algumas coisas para o meu
pequeno treinamento, mesmo que estivesse levando tudo na brincadeira por causa
do cigarro que estava fumando. Não era a melhor atiradora, mas pelo menos tinha
precisão em meus tiros quando estava calma. Nenhum disparo era desperdiçado,
pelo menos quando eu mirava em alvos parados. Eu comemorava como se fosse
uma grande vitória, confiando em minhas próprias mãos. No entanto, naquele
momento, minha mente estava viajando e a noite passou como um turbilhão de
cores, música e psicodelia. Sonhos se misturaram com a realidade, ou talvez eu
estivesse apenas dormindo. Mas uma coisa eu sei, acordei logo pela manhã,
vestindo apenas um short e uma camisa branca com algo escrito no peito. Não
queria nem pensar, mas era o dia D. O cheiro de pré-apocalipse estava no ar, quem
sabia o que iria acontecer dali em diante. Demorei um pouco para sair da cama, pois
estava contemplando meus pensamentos. Aquele poderia ser o dia em que tudo
acabaria e, estranhamente, eu estava em paz com essa ideia. Coloquei uma música
para tocar, acendi um cigarro e fiquei olhando para o teto. Meu quarto já era uma
bagunça total, cheio de pichações com frases aleatórias de músicas ou apenas
servindo como diário para meus dias de fúria. Levantei-me e peguei uma caneta,
deixando uma mensagem próxima à porta, e saí para me preparar fisicamente.

A hora finalmente chegou. Nos aproximávamos do porto logo no início da noite. A


festa já estava em pleno vapor, com os italianos distribuindo azeitonas para todos
os lados lá embaixo. Era uma verdadeira farra, e nós entraríamos por outro portão,
de forma mais discreta.
— Droga… A máfia italiana… Eles sabem como ser sutis… Tanto quanto um elefante
numa loja de porcelana. Não vamos nos meter nesse tiroteio. Deixem que façam a
maior parte do serviço enquanto entramos por outro portão mais afastado. — A
ouvia falando do rádio, e realmente, estava um fuzuê lá em baixo.
— Pois é, até fogos de artifício eles estão soltando! — Um trocadilho quanto as luzes
das balas que voam soltas para quase todos os lados.

Não demorou para que nos infiltramos pelo outro portão. X, que havia colocado um
programa ninja na cabeça, agora começava a desacordar os guardas, e eu franzia o
cenho meio brava. Era alguma tática? Eles acordaram e logo se juntariam ao número
de pessoas nos caçando, mas nada fiz até então, a não ser seguir sorrateiramente
do meu jeito. Não estava parecendo uma ninja, mas as roupas discretas ajudavam.
Estavam completamente escuras, até mesmo os sapatos eu troquei para aquela
ocasião. Uma mochila mais discreta ainda guardava um possível ás na manga,
enquanto na cintura eu carregava uma das armas de radiack e com a outra em
mãos. Cautelosamente, eu e Gini seguimos quase os mesmos passos de X, até que
ela avançou demais e logo reclamei, baixo, é claro - "Merda". Revirei os olhos, mas
segui pelo mesmo caminho que ela havia feito, e Gini vinha logo atrás, parecendo
um James Bond. Aceleramos os passos quando ouvimos uma algazarra mais à
frente e nos deparamos com X à frente de italianos parecendo gangsters de filme
antigo. Ela parecia se dar "bem" com eles, então me aproximei com cara de poucos
amigos, como sempre, e assim perguntei, apontando para eles com o queixo
enquanto abaixava a arma.

— Então esses aí são os italianos? Parecem a trupe do Chaves. — Outra piadinha,


talvez não numa boa hora, mas éramos aliados então tentei não parecer rude, mas
que era engraçado vê-los daquele jeito, era.

Pollux
Tinha que ser perfeito. Tinha que ser agora.

Dava pra sentir o ronco dos motores do dirigível chegando perto da parede de vidro
do prédio de Henry Choi, e estando na parte de trás do veículo eu não sabia
exatamente quanta distância eu ainda tinha antes do choque. Estava tão próximo
que conseguia me enxergar no reflexo das janelas de vidro, atrás de onde apenas
escritórios vazios restavam. Naves de segurança flutuavam em torno do dirigível e
eu conseguia ouvir o rádio dos pilotos ao meu redor, sobrevoando o gigante que ia
contra o prédio como moscas em torno de um grande animal. Calidora tinha dito que
precisava ser perfeito: a turbina era a parte mais sensível daqueles hovercars, mas a
blindagem especial podia ser atingida. Quando mirei na primeira nave e a vi cair,
percebi que seria mais difícil do que imaginava. Ainda assim, levei o arco aos olhos
e...

A flecha de ponta magnética atingiu a aeronave e escorregou pela placa de titânio


da blindagem, mas ficou presa na brecha onde a placa se ligava a outra, cobrindo a
lateral do veículo aéreo. Enganchada daquela forma, uma corda que partiu com a
flecha não demorou a se esticar e brilhar em amarelo ouro, da mesma forma que fiz
para abordar o dirigível no começo da operação. Eu não tinha outra escolha, e agora
o alvo era bem mais rápido e móvel do que o monstro que eu estava prestes a
destruir, foi minha única chance de deixar o destino de uma morte certa, quando as
chamas do primeiro impacto já começavam a queimar as minhas costas. Não tive
tempo de pensar. Usei a flecha que restava, presa com a corda ao meu arco, para
saltar do dirigível.

— CALIDORA, É AGORA! Diferente da primeira vez, não foi possível aplicar uma
tirolesa e ir direto para dentro do cockpit do hovercar armado. Tive de recorrer a ficar
pendurado pela corda e confiar na flecha emperrada na blindagem. Se meus olhos
nunca tivessem sido modificados eu jamais teria sido capaz de ter uma mira tão
precisa, mas também talvez jamais estivesse naquela situação. Não havia tempo
para arrependimentos, meu peso mal afetava a estabilidade do veículo, mas já
balançava de um lado para o outro loucamente, voando perto demais da explosão
do dirigível. Um ronco pareceu tremer a cidade inteira, vidro e fogo voaram na minha
direção cortando tudo o que encontraram pelo caminho, mas eu continuava a subir
pela corda, entre segundos de desespero em que me encolhia para não bater nas
laterais do prédio durante aquele breve período onde havia me tornado um pêndulo.

— Não consigo acessar o piloto automático da aeronave sem você interferir no


painel! Não consigo hackear, preciso que você interfira para que eu desvie a
informação! Ela gritou do outro lado do comunicador no meu ouvido.

Curiosamente foi quando o copiloto apontou com sua arma para baixo que eu, já
tendo subido na corda um bom caminho, fui capaz de agarrar seu pulso e girá-lo na
minha direção para que soltasse a arma, ao mesmo tempo que me segurando nele
por um apoio extra. Minha intenção não era jogá-lo cidade abaixo, mas com a
precaução de um cinto de segurança eu sabia que não o derrubaria mesmo se
ficasse pendurado nele. Foi segurando em seu braço que tive acesso para passar da
flecha para o cockpit, onde mal se apertavam três pessoas.

Foi uma puta confusão, como pular dentro de um carro com ele em movimento, e
com os bancos já cheios. Lembro de entrar com uma mão fechada e desferir um
forte soco contra o copiloto, mas adentrar a cabine torto o suficiente para esticar a
perna e de lá de dentro chutar o capacete do piloto, que não aparentou sofrer nada
mas deixou o hovercar balançar perigosamente. Naquela altura o dirigível inteiro já
havia sido consumido pelas chamas e o prédio explodia em etapas, andar por andar
onde as chamas de um uniam-se com a dos outros, da metade até as duas outras
pontas. Cada explosão seguinte gerava uma chuva de estilhaços e um bafo de ar
quente que fazia o veículo girar no ar, enquanto outros dois à distância colidiam em
uma explosão de claridade.

— May day! May day, estamos sem estabilidade e com intrusos a bordo da nave! —
Com o piloto ocupado com o pedido de socorro e minha boca sangrando da troca de
socos com o seu parceiro, empurrei-o contra o painel por tempo o suficiente para
que desnorteado não me impedisse de tomar o manche de suas mãos, puxando
para trás com toda a força antes de ligar o piloto automático no último segundo.

— Tomando controle agora! — Quando Calidora foi capaz de manipular o


computador de bordo, a aeronave já estava quase em uma subita vertical, e a
blindagem inferior rangia contra o que ainda restava de pé do prédio, deixando
faíscas e ruína por toda parte daquela manobra urgente. Calidora nunca pilotou uma
nave daquele modelo, pelo menos não armada, mas os seus anos de experiência
sobrevoando Miraitropolis garantiram que minha vida fosse salva remotamente
agora que tínhamos acesso ao fluxo de informações da cidade. Toda a cadeira do
piloto se desfez e o puxou janela fora, enquanto eu e o tripulante restante fomos
jogados para a cabine traseira, onde as largas portas laterais estavam abertas.

— Segura minha mão, você não vai cair! E para de tentar me bater! — Ambos
machucados e com pelo menos meu ombro seriamente ferido, senão deslocado, eu
estendi o braço bom para agarrar o homem que se equilibrava com as mãos para
fora, mas nunca tive tempo de ver se realmente havia cumprido minha promessa.
Lembro de tê-lo puxado para cima de volta à parte traseira da nave conforme
Calidora a manipulava e colocava-a em um suave estado de sobrevoo, dirigindo-a
para longe da fumaça e da explosão, mas pela mesma porta pela qual eu puxei o
copiloto também entrou mais alguém. Não dava pra saber se era algum assassino
ou outra pessoa determinada a me impedir pulando de alguma das outras naves,
mas me pegou de jeito. Logo após ter ficado de pé senti as pernas pressionando o
meu peito e então tudo girou mais rápido do que eu poderia calcular. Fogo e
concreto se misturavam na bagunça de imagens borradas diante dos meus olhos
até atingir algo sólido e duro.

Eu sabia que estava de novo em terra firme, mas descobrir aonde estava era outra
história. Minhas costas pousaram contra o piso duro e minha cabeça girou, tonta. —
Você podia ter planejado o pouso melhor... — Ficava claro que a estranha de cabelos
escuros e invejável agilidade não tinha más intenções, mas ainda assim era bem
linha dura. Eu vi seu corpo virar dois antes de tentar me erguer e não conseguir, e
então desmaiar de cansaço.

Complexo Médico Subterrâneo, Submundo

Já estava virando costume acordar em uma mesa de operação sem saber quanto
tempo se passou, mas a velha sensação de que meus implantes foram mais uma
vez ligados era bem familiar.

— O que aconteceu comigo? Dra. Vangelis? — Eu conhecia bem aquele lugar, mas
parecia totalmente reformado e definitivamente não era uma ala que eu conhecia.
Quanto tempo faz desde que havia conseguido a cybertropina contrabandeada para
aquele laboratório?— Onde está a garota que veio comigo? — Eu sabia que não
poderia ter vindo sozinho ou acompanhado de mais ninguém. Se outra pessoa
tivesse me trazido, certamente teria levado a outro lugar menos confidencial.

— A dra. Vangelis deixou o complexo pouco depois da crise com os Steelhearts e a


operação em sua amiga. Eu sou a sua substituta, dra. Jóhansson. — Ela não parecia
muito feliz com a ideia do que foi feito com X-9 e a sua troca de corpo. Estar diante
de uma possível aliada com muitos códigos de conduta seria complicado, e ela não
parecia tão flexível quanto a primeira que estava em seu lugar. Tinha o cabelo curto,
um corpo magro e uma expressão bem mais séria.

— Uma mensagem misteriosa trouxe sua amiga e você até aqui. Melhor dizendo, a
mensagem trouxe sua amiga que te trouxe. Alguém que disse que sua localização
precisava ser mantida em segredo.

— Calidora! É uma aliada. — Ela não pareceu ligar muito, e continuou séria.

— Você tinha diversas fraturas quando chegou aqui, e eu não quero saber como você
as conseguiu. Mas o que me intriga foi a sobrecarga que você sofreu. Sua cavidade
ocular ganhou queimaduras por causa do implante, mas eu nunca vi algo assim na
vida, a não ser em queimaduras no córtex de pessoas que são desconectadas
rápido demais da Lexis. Fora a sua óbvia falta de temor pela morte, não vejo danos
cerebrais. — Não precisava falar nada para perguntar o que é que havia acontecido
comigo, cruzando os braços enquanto eu me levantava sem camisa da maca.

— É complicado. Eu acho que mais informação do que eu consegui aguentar passou


pelos meus implantes. — Dava pra sentir que eu estava sedado, mas minha cabeça
ainda insistia em latejar, como se eu estivesse de ressaca. Jóhansson sacudiu a
cabeça, como se eu fosse algum hacker principiante que é pego em um sistema
difícil demais para o meu alter ego.
— Você dormiu por dois dias. Sua cabeça passou pelo equivalente a um ataque
DDoS. Pelo que vi, seus implantes possuem capacidade de upload e integração,
então vou chutar que tentou acessar algum arquivo armadilha, visto como você deve
ser algum tipo de espião. As suas cargas neurais, no entanto, ainda estão
trabalhando, o que quer dizer que você ainda está trocando e baixando informações
com algum servidor. Eu tomaria cuidado. — Calidora deveria estar sentindo a mesma
coisa, mas como fui eu a integrar a frequência dos nossos implantes ao servidor
público de informações do dirigível de Telford, fui usado como um conduíte para a
conexão ser bem sucedida. Isso quer dizer que... podíamos entrar na Lexis?

— Quando Carmen instalou meus implantes, ela também instalou um transmissor


neural no fundo do crânio para monitorar minha visão... — Dessa vez eu falava
sozinho, levando uma das mãos até minha nuca. Isso quer dizer que eu também
tenho aquela entrada na nuca, só não é visível... é claro! Eu deveria saber que a
informação não era só enviada mas recebida também! O que, junto da IA que X-9
construiu para me ajudar no meu trabalho, me permitiu criar um avatar da minha
consciência para trafegar em meio às informações obtidas.

— Doutora, eu preciso que me monitore mais uma vez. Eu preciso acessar mais uma
informação.

— Sua amiga misteriosa me disse que você poderia tentar alguma idiotice do
gênero. A propósito, a que te trouxe deve estar no hangar, fora da sala de operações.
— Bem no pulso da doutora não deixei de reparar em uma tatuagem que ficou por
um segundo apenas visível, entre a luva que usava e a manga comprida do seu
jaleco. Quando olhei de volta para a mulher, reparei que não deveria ter percebido
meu olhar mas não pareceu surpresa quando perguntei.

— Eu não sabia que a Ryulong tinha ideia de que esse laboratório existia.

— Eles não sabem, eu sei. — Ela disse com um pouco de rancor na voz, puxando a
manga do casaco para mostrar o restante da tatuagem. — Não gosto de receber
ordens, sou uma médica, não uma gangster ou um soldado. E quando os
paramilitares começaram a entrar em cena, foi a minha vez de sair. — Então era uma
ex-Ryulong? Aquilo podia dar pano pra manga, mas como ela parecia pouco se
importar com o que acontecera comigo ou mesmo com o que estava havendo na
superfície da cidade, além de estar em um antigo esconderijo Steelheart, seu álibi
era mais eloquente do que sua explicação e tudo favorecia a sua honestidade. —
Seja rápido, meu suprimento de medicamentos é curto e eu não gosto de gastar
com suicidas. Meus aparelhos vão monitorar suas atividades e se sentirem que seu
corpo não vai aguentar, vão te colocar em coma. Ela começou a colocar eletrodos
em minha nuca, peito e têmpora, antes de eu ter tempo de fazer mais perguntas.

— Obrigado, doutora. E diga obrigado para a menina que me trouxe também. — Achei
ter terminado, mas conforme deixava a sala, me senti obrigado a estender o convite
como forma de agradecimento. — Há um lugar em Hampton Heights fora do radar
das gangues onde vocês duas terão segurança garantida por mim. Eu as levarei para
lá assim que eu me recuperar. — Ela abanou o rosto para mim mas não fez nem que
sim, nem que não. Quando a sala de novo ficou em silêncio e eu sozinho, por dentro
eu não poderia estar mais eufórico, então me sentei de forma mais confortável,
fechei os meus olhos e comecei a procurar o que buscava.

Nem de longe eu tinha todo o poder de Carmen em minhas mãos, mas assim que
entrei no seu fluxo de informações eu percorri o caminho inverso que ela planejava.
Sabia que de alguma forma ela espionava todos os seus aliados, mas nunca pensei
ser possível usar o próprio sistema dela para fazer isso de volta e chegar até a Dama
de Prata, mas não era ingênuo de tentar algo tão grande tão cedo. Certamente ela
havia colocado um preço alto na minha cabeça e nos meus implantes, a essa hora
muito mais aprimorados do que quando os recebi na primeira versão, mas ainda
assim a minha melhor arma. Sozinho, eu não tinha ideia de como fazer aquilo, mas
acabou sendo natural como entrar em um sonho vívido, só que mais doloroso. Eu
senti aquele princípio de êxtase de hacker que nunca compreendi até ter uma dose,
de ser mais um amontoado de informações navegando por outras, com a diferença
de que estava faltando a representação visual do mundo cyber. Na minha cabeça
demorou longos minutos até encontrá-lo, mas não sabia o quanto isso correspondia
no mundo real. Tudo pareceu corrompido de alguma forma. X-9 deve realmente ter
estragado qualquer defesa que o homem tivesse, porque não foi difícil começar a
vasculhar as informações na cabeça do hacker. E antes que eu percebesse, eu
estava dentro dela.

— Boa noite, Henry Choi.

— Quem é você? Quem disse isso?! — Ouvi a voz dele dentro da minha própria
cabeça, embora estivesse na dele. Uma sensação de náusea começou a se abater
sobre mim, e a sensação que veio depois era da mesma agitação que Choi deveria
estar sentindo, ouvindo uma voz distorcida falar pelos seus implantes queimados,
sem poder combater o invasor.

— Que esperta. X-9 fez você perder a habilidade de hackear, mas isso não te impede
de ser hackeado. Como se sente tendo a consciência usada igual você fez com
aqueles inocentes? Por que não abre os olhos?
— Quem é você e como conseguiu acesso a mim? Eu juro, se for alguém da
Paramilitech... — Então fez sentido porque eu não estava enxergando nada. Fui
vendo cada vez mais, com uma nitidez que ainda era péssima e na qualidade de um
televisor cheio de glitches, mas o que havia na frente dos olhos de Choi era na
realidade uma venda, o que indicava que também havia feito uma troca de implantes
ou que havia ficado cego devido à sobrecarga que sofrera, agora remediada.
— Há um tempo atrás, sua sócia me equipou com um par de implantes para servir de
espião para ela, além de repórter full time. Quando minha amiga descobriu que
estavam monitorando cada passo da vida dela e veio me contar, eu descobri que era
Carmen que estava usando meus olhos, não eu. E sabe o que eu descobri?

— Foi você, não foi? Que ajudou a destruir o prédio do Canal 17 e agora destruiu o
meu, FILHO DE UMA PUTA! — Demorou até eu perceber que Henry estava agora de
frente para um espelho, e o soco que deu contra a sua superfície o fez estilhaçar em
várias partes, fragmentando seu reflexo.

— Eu soube que estava sendo monitorado por Carmen na noite anterior. Eu teria
morrido na destruição do Canal 17 se não estivesse pronto para me demitir naquela
noite. O responsável, você sabe muito bem, está do lado dos russos hoje e se chama
Bóris, um brutamontes de alta patente dentro da gangue deles, outro lixo como você.
— Corrigi o homem num tom de voz exasperado, ainda com vingança em mente,
mas voltei rápido ao foco. — Eu só destruí o seu prédio para acabar com você
economicamente, e fiz isso sem matar inocentes. Você não significa mais nada,
Choi, e agora com as informações de seus servidores, eu não preciso mais de você.
Eu descobri que Carmen planejava te espionar cedo ou tarde. Quando acessei os
servidores dentro do dirigível que derrubei, vi todos os meus protocolos que Carmen
bloqueou de mim.

— Grande bosta, o que você pretende fazer? Acha mesmo que a Carmen tem medo
de você? Que EU tenho? Ela não vai perdoar a sua traição nem se voltar lá pintado de
radiack. Acha que o seu joguinho de tornar os podres dela públicos vai mudar
alguma coisa? Ninguém tem medo da verdade.

— Nisso, precisamos concordar. — Houve um momento de silêncio e o que perdurou


no ar foi um sorriso invisível de minha parte. — Mas tudo o que você tinha servirá de
grande valia para a Veritas. O backdoor que eu e Calidora deixamos quando
hackeamos o dirigível, os remanescentes Steelhearts trabalhando para nós, os
antigos contratos militares da Telford, e agora o que sobrar da engenharia que você
criou será mais do que adequado para nossa emissora dentro da Lexis. Nem
Miraitropolis precisa mais de homens como você.
— Uma emissora? Vão cair matando na porta da sua sede na manhã seguinte, seu
idiota.

— Não com nossas informações percorrendo um servidor público, não sem uma
sede própria, não com os implantes oculares que você ajudou a instalar. E com
certeza não dentro da Lexis, com uma IA própria que a hacker que te deixou aleijado
criou para nós. Ainda pode ser difícil burlar a defesa da Paramilitech agora que está
em poder dela, mas eles estão ocupados demais contratando músculos para
contratar cérebros. Ninguém teme a verdade, mas quando os seus planos vierem à
tona e você cometer suicídio por causa disso, todo mundo vai ter um motivo para
temer Veritas.

— Eu acho que tem um furo nos seus planos, repórter mirim. — Henry Choi riu de
puro ódio, rangendo os dentes para o espelho. Distraído, o seu controle diminuía e
me permitia agir exatamente como o planejado. — Eu ainda estou vivo e não
pretendo morrer antes de ver você e sua amiga enforcados na frente da prefeitura.
Você nem sabe onde eu estou.

Não dava pra ter ideia de onde Henry Choi havia se escondido, mas havia o brilho
vermelho de uma câmera de segurança no canto do corredor onde o espelho
refletia. Quando "olhei" para ela, vi o brilho tremular durante um segundo e me
perguntei se podia manipular o circuito. Fosse a extensão da minha invasão aos
implantes ligados a Henry Choi ou minha imaginação, a câmera virou para apontar
exatamente para onde o homem estava, bem a tempo de filmar sua mão se
mexendo para agarrar a pistola na cintura.

— O curioso foi que, quando estava fugindo de Carmen no covil dos Steelhearts, ela
tentou usar a arma na minha mão para matar meus novos aliados. E acontece que
você acaba de cometer o mesmo erro. — Demorou até Henry Choi descobrir o que
estava acontecendo. Quando sua mão foi levada até a cintura por um momento,
apenas confusão tomou conta do seu olhar, sem saber que eram os impulsos
nervosos que eu controlava que o levavam a agarrar a arma. No segundo seguinte,
os músculos começaram a lutar contra mim, e senti na minha própria cabeça todos
os impulsos elétricos dos seus implantes avariados queimando debaixo da pele,
lutando contra mim e minha invasão ao seu sistema nervoso.

— Não, NÃO!! Não pode terminar assim, você não pode...!

— Adeus, Henry Choi Uma boa noite, obrigado pela audiência. — Foi a primeira vez
em quase dois anos que usava a frase de despedida do jornal que apresentava, e
não deixei de sorrir quando o fiz puxar o gatilho contra a própria cabeça, no meio
segundo onde o espelho foi lavado com sangue e depois os meus próprios sentidos
foram se perdendo, devido à conexão interrompida e ao esgotamento do meu corpo.
Mais uma vez, voltei a tombar contra a maca, mas fui levado à inconsciência desta
vez com um sorriso no rosto. Um sorriso de dever cumprido.

Troika

As tropas de recrutas de Vladimir recebem uma inesperada surpresa de pessoas


que não haviam diretamente convidado. Em um primeiro momento, um buzz elétrico
parecia deixar o ar mais pesado, com pontos no horizonte escuro que insinuavam
uma nova chegada. Um enxame de drones antecipou a chegada de dois carros da
Veritas, veículos pesados e armados não com poder de fogo, mas com duas
estruturas com forma de antena na cabine, operadas cada uma por um homem que
direcionava o seu alcance para os russos no porto. Os recém-chegados não
buscavam o confronto direto nem o auxílio dos italianos, mas agiam como um
suporte de combate direcionando ondas sonoras aos russos em frente aos carros
de forma que não podiam evitar levar as mãos à cabeça e ceder ao ataque não-letal,
espalhados pelo chão. A pé, sozinho e ainda com ferimentos visíveis, Caz ressurgia,
portando o antigo emblema no peito e liderando os Steelhearts rebeldes para aquela
operação. No meio do céu poluído do porto, uma nave maior começou a configurar
suas turbinas para o sobrevoo, deixando o enorme veículo pairando sobre a área.

— Lembrem-se, neutralizem todos, vasculhem o navio quando terminarem e não


façam contato com as outras gangues! Vamos limpar a área e sair. — As ordens de
Calidora eram claras, por trás do manche que conduzia a aeronave pesada. Ao seu
lado, uma cabine aberta deixava espaço livre para um sniper auxiliar a retomada
terrestre, disparando projéteis elétricos.

Narrador Capítulo Final


Vladimir e seus soldados eliminavam o restante dos russos que, escondidos nos
armazéns numerados das docas, tentavam armar uma emboscada para os
invasores aliados do esquadrão da ParaMilitech. Rápidos e ágeis, ninguém notou a
aproximação sendo executada. Corpos perfurados por silenciosas balas de radiack
despencaram no chão do cais, alguns mortos, outros apenas desmaiados,
completando e finalizando a coleção de russos "quebrados" naquela noite quente.

— Agora que todos estão aqui, não é necessária apresentações, cada um sabe quem
o outro é. Tudo isso foi um pequeno aquecimento, não se orgulhem tanto, a
qualidade dos guardas de Yuric caiu muito depois que ele perdeu o Overdose. O
verdadeiro desafio está vindo agora, preparem-se. — Vladimir apontou para frente e
um navio de grande envergadura chegava. Sua pintura desgastada denunciava a
baixa qualidade do metal que o constituía, as muitas luzes tentavam esconder esse
infortúnio. Lentamente, aportava no cais sob a fina e quente chuva ácida de
Miraitropolis, empurrando o fedor de urina velha e peixe morto do porto.

— O nome do navio é Do Svidaniya. Humpff… — Analisou ranzinza.

— O que quer dizer? — Indagou Gini que se encontrava perto do soldado.


— Adeus, em russo. — Completou Vladimir com cara de poucos amigos ao assistir a
chegada do navio.

— Ele tem um quilômetro de extensão por quinhentos metros de largura. Possui três
níveis em seu interior. Foi adicionado um aglomerado de pequenas construções,
provavelmente para alojar os trabalhadores civis. Essa coisa é quase como uma
favela flutuante. A ParaMilitech acredita que com todo esse tamanho o Do Svidaniya
pode estar carregando não só soldados nazisovieticos como também armamento
de guerra. Vocês ouviram falar da Green Box? Obviamente não, um ano atrás,
espiões russos roubaram essa caixa de expositores em uma feira de tecnologia de
Miraitropolis. Ela funciona à base de radiação e cria tecnologia bélica baseada no
mesmo. Desde então esses canalhas ficaram animados com a corrida
armamentista entre as duas potências. Eu posso afirmar, trabalhei para os dois
lados, armas de guerra com a tecnologia dessa caixa e aquele navio é uma péssima
combinação. — Vladimir ainda mantinha o dedo indicador apontando para o Do
Svidaniya.

— Chega de conversa, isso é tudo que precisam saber. Deixe que meus soldados e
eu vamos na frente, com muita sorte talvez vocês nem precisem agir. Torçam por
isso. Nos sigam! — Engatilhou o fuzil e se moveu de sua posição.

O navio despejou sua barulhenta âncora na água poluída, lodosa e escura do porto,
remexendo latas de refrigerantes, papel, caixas de madeira e outras imundícies do
fundo da baía de Troika. Abrindo uma porta lateral do convés, um mecanismo de
metal velho e carcomido gemeu, se desdobrando até bater na beirada de concreto
do deck. Era a rampa para os guardas do porto subirem a bordo.

Vladimir e mais dez de seus homens foram os primeiros a usar o rápido acesso.
Quando um russo estava à espera, pedindo identificação no final da rampa, o mais
velho pressionou-lhe o ombro e o russo caiu desacordado. Fez sinal para o restante
subir, em silêncio, é claro. A eficácia do time de Vladimir era excelente e
impressionante. Sem ruídos, os disparos dos silenciadores eliminavam a segurança
armada dos Bravtas sem chance de defesa. Vladimir estava cumprindo sua palavra
no acordo com X-9, mantendo a segurança de todos em primeiro lugar, pelo menos
por enquanto. Sem correr o risco de expor Galathea, Max, Gini, a hacker, Gal e o
restante, em poucos minutos o esquadrão de Vladimir tomava o convés e se dirigia
para uma das entradas, a que parecia ser a principal: uma porta dupla de ferro e
engrenagens no centro do Dos Svidaniya.

— Excelente, camaradas! Tudo está ocorrendo como previsto, se continuar assim


logo estarão em suas casas são e salvos. O próximo nível é no interior do navio. X-9,
você pode hackear a sequência que destrava essa porta?
Não foi a X9 necessário responder. Conectando o cabo metálico de sua nuca ao
display digital verde da porta, a conexão coaxial de seus novos implantes
cibernéticos combinava todas as possíveis sequências de senhas de onze dígitos,
enquanto ela digitava algo no teclado da manopla que possuía outros dois fios que
se ligavam à lateral da cabeça. A velocidade com que as informações fluíam pelo
córtex era quase ilimitada, proporcionando um prazer semelhante ao sexual. Seus
olhos violetas tremiam de um lado para o outro sem parar, piscando várias vezes
também. Dois minutos depois, semi-ajoelhada em frente à porta, ela dizia alguns
números.

Vladimir digitava a senha e a porta destravava.

— Muito cuidado, precisamos ser ainda mais discretos aqui dentro. — Alertou o
homem grisalho, segurando seu fuzil na soleira da entrada recém destravada.

Entretanto, antes que desse o primeiro passo para o interior do navio, um hovercar
barulhento e cheio de luzes coloridas, bastante chamativas, sobrevoou o convés. Os
soldados apontaram as armas para cima, esperando uma ordem de seu superior.
Bastava um sinal do mais velho, e a abordagem do veículo voador seria abatida.
Vladimir olhou para cima, tentando ler a placa do automóvel, mesmo com a chuva e
a fumaça do motor atrapalhando a visão. Após o reconhecimento, ordenou que
baixassem os fuzis. Quando o hovercar pousou e ergueu a porta direita, o russo da
ParaMilitech indagou sisudo para o motorista.

— O que você faz aqui? Ordenei que ficasse fora dessa operação! — Apontou o
indicador para o motorista oculto.

— Você não manda em mim! Não sou uma criança para acatar suas ordens! Tão
pouco vou deixar que esses dois idiotas joguem na fossa a Cosa Nostra! — Jesse
apontou para Galathea e Irvine ao sair do carro.

— Não venha causar discórdia! Tudo estava correndo bem até você aparecer. Volte
para casa e resolva seus problemas pessoais depois! — Fechou o pulso frente ao
rosto de Jesse ameaçando dar um soco.
Um alarme soou, a sirene ensurdecedora incomodou os ouvidos. Frases em russo
ecoaram pelo convés através de um autofalante. As palavras soavam
incompreensíveis para muitos ali, mas não era preciso ser fluente no idioma para
entender a situação. Eles haviam sido descobertos. O barulho e as luzes
espalhafatosas do hovercar de Jesse foram o que os denunciou.

— Tentei hackear as câmeras, fazer alguma coisa já que estou no sistema do navio,
mas já era tarde demais, o alarme soou antes! Me desculpe. — Lamentou a hackear
baixando a cabeça.

— Não se desculpe, a culpa não é sua. — Respondeu Vladimir fitando Jesse com
muita raiva.

— Tem outra coisa… — A voz arrancou Vladimir de sua contemplação rancorosa


diante Castelone e o fez uma vez mais pairar a atenção na garota de moicano lilás
antes que fizesse alguma besteira com o italiano teimoso. — Ou o Yuric tá sem
guardas ou o filho da puta confia muito no próprio taco… Em vez de um exército
estar vindo, vejo apenas uma assinatura de calor subindo as escadas. É só eu que tô
com a impressão que isso não é bom? — Indagou esperando uma resposta positiva
do mais velho.

Vladimir não sabia o que responder nem o que fazer. A situação era inusitada e fora
do planejamento, e o mesmo temor que pairava sobre X-9 também o incomodava.
Da penumbra do interior da porta, saiu um homem magro, quase esquelético, alto,
sem cabelos e com olhos amarelos profundos, como os de um cadáver. Seus braços
e pernas eram longos, e ele estava sem camisa, usando apenas sapatos e uma
calça de couro. Sua pele apresentava aberturas, como entradas de plugs feitos de
ferro, nas costelas, tórax e braços, todos incrustados na carne vermelha. Cateteres
médicos enfaixados com curativos saíam das veias dos braços, indo para algum
lugar do corpo, e dali pingava um sangue grosso e escuro. Parecia ter emergido de
uma mesa de operações incompletas.

Seu rosto mantinha-se oculto por uma máscara de metal cinza que cobria do queixo
até o nariz. Em um caminhar muito lento e com movimentos estranhos que
incomodavam quem assistia, aquele homem, semelhante a um zumbi, expelia uma
fumaça clara por onde passava.

— Mas que porra é essa? — Gritou Xiaren, assustado.

— De acordo com os dados do Do Svidaniya, esse é um experimento criado pela


Green Box chamado Fome. Ele absorve até a morte a energia e vitalidade das
pessoas à sua volta. Não precisa de contato físico, sem a gente saber ele já está
sugando nossas energias! — Explicou a hacker

— Aaah! Mas esse sujeito não vai roubar minha vitalidade! — Gritou Roberto que não
perdeu tempo, apontou a pistola e disparou. Seus homens repetiram o ato também
descarregando a munição em cima da criatura bizarra. Todavia parecia que existia
uma proteção invisível a sua volta que impedia de ser alvejado. Toda vez que os
projéteis tocavam a defesa, um azul claro piscava e desprendia faíscas amarelas.

— É um escudo digital! Vou tentar desativá-lo! — Perto da porta por estar conectada
ao sistema do navio, X-9 iniciou um novo rastreamento de senhas. Infelizmente,
como consequência da pouca distância entre ela e Fome, sentiu rapidamente os
resultados da absorção de energia enquanto operava sua manopla. Sua desastrosa
escolha deixou-a exausta, com fadiga mental. Mal conseguia concentrar-se
concentrar. Sua pressão em declínio diminuía assustadoramente, assim como os
batimentos cardíacos. Falar se tornava quase impossível. A pele mudava de cor,
ficando azul, levemente enrugada e gelada, apesar dos mais de 40 graus de
temperatura em Miraitropolis.

— Eu não consigo… Vocês vão ter que… Achar outro jeito… — Com todo esforço em
se manter consciente, caiu, seu corpo pesadamente bateu de lado no chão de ferro
do convés e os plugs foram desconectados da porta.

Considerações:

Como visto, este é o último capítulo onde vocês enfrentam níveis de dificuldade. Vai
funcionar da seguinte maneira: os jogadores postam suas ações e a narrativa
apresenta a reação ou consequência no boss. Se vocês fizerem as escolhas certas,
o boss, mesmo sendo forte, pode ser derrotado facilmente com um "macete" e
vocês partem para o próximo nível do navio. Caso contrário, continuam as
tentativas, obviamente com as consequências. São cinco níveis.

Fome possui um escudo digital impenetrável que o protege de todos os tipos de


ataques físicos. Vocês precisam encontrar uma maneira de burlar isso. É lógico, é
bastante fácil, para falar a verdade. Fiquem à vontade para combinar entre si essa
estratégia, seja dentro ou fora do jogo. A partir de agora, não declarem sucesso nas
investidas. As consequências das suas escolhas, certas ou não, serão descritas no
turno de narração, de acordo com as decisões tomadas, como já foi explicado. Boa
sorte e bom jogo.

PS: X-9 está indisponível, um recurso que usei para tornar o jogo mais justo.
Galathea
Brevemente após ouvir a explicação de Vladimir o navio ancorava no local. Jesus
assobiou impressionado com o tamanho da monstruosidade.

— Não deveríamos estar atirando nessa coisa com mísseis ou sei lá?
— Acho que a ideia é capturar. É uma quantidade significativa de matéria prima para
ser simplesmente jogada no fundo do mar. — Explicou Vicky dando de ombros.

Galathea se encontrava focada na missão de forma que mal reagiu com a chegada
de Castellone além de um sorriso de canto ao vê-lo ser repreendido por Vladimir.
William por outro lado se eriçou ao ver Jesse.
----
O grupo seguiu os agentes da Paramilitech. Galathea sempre atenta à forma como
eles se moviam e operavam, além de tentar memorizar os jargões, embora nada ali
demonstrado fosse novo para ela.

Não demorou muito após a Hacker abrir a porta, quando a morena sentiu um frio na
espinha ao perceber o inimigo se aproximando, enquanto a mulher de cabelo azul
narrava o que estavam prestes a enfrentar.

Seus homens se juntaram aos outros, atirando inutilmente contra a criatura, parando
assim que a hacker informou que era inútil atirar contra ele.

— Merda! Ela disse que ele suga a vitalidade. Recuem, talvez a distância diminua o
efeito. Passem para pistola!

Os operadores se moveram de forma ordenada, recuando em uma linha. Soltaram


suas armas primárias, deixando-as pendendo pela bandoleira, enquanto sacavam as
pistolas. Eram do mesmo modelo termonuclear laser que era o antigo padrão da
força policial de Mirai. Uma salva de raios iluminou o local, as armas bradavam
gritos elétricos das baterias sendo descarregadas contra a criatura. E eles
recuavam.

Galathea esperava que os disparos fossem ignorados pelo escudo, assim como a
luz o era.

Irvine Montana
O navio russo era gigantesco, parecia um bairro navegável. Não me sentia bem
naquele lugar, pelo fato de ser o território do inimigo. Um território sobre o qual eu
não possuía conhecimento algum. Segurava com a mão direita uma metralhadora
apoiada no meu ombro, enquanto meus companheiros da Cosa Nostra olhavam ao
redor, atentos e armados. Não confiava em Vladimir. Ele era o homem que pertencia
aos três lados que estavam prestes a entrar em conflito. Russo, militar e posso
considerá-lo também um gangster. Mas, no fim das contas, ele só serve a uma única
pessoa: a si próprio.

Fiquei conhecido por ser um chefe gentil. Sempre coordenei meus funcionários da
melhor maneira possível. Por isso, os clubes, boates e bares da Cosa Nostra sempre
foram lugares seguros e confiáveis. Todos aqueles que seguem minhas ordens me
respeitam como líder. Entretanto, há coisas na vida que tiram até o homem mais
gentil e bondoso do sério. Quando aquele hovercar pousou, fazendo o alarme tocar,
e Jesse saiu dele, eu quase não me segurei. Poderia tê-lo matado ali mesmo, mas
não tivemos tempo para isso. A porta principal se abriu e uma aberração passou por
ela.

— Afastem-se! — Ordenei ao escutar o que X-9 disse, uma pena que para ela foi tarde
demais e acabou tombando devido ao "poder" da arma russa, que, pelo que a hacker
tinha dito, era capaz de sugar a vitalidade das pessoas. Meus homens, juntamente
com os do velho russo e Galathea, tentaram detê-lo com tiros, ação que foi em vão
devido ao campo de força que o zumbi russo sinistro tinha em volta do corpo. — Não
podemos atacá-lo corpo a corpo e nem a distância, russos filhos de uma cadela. —
Resmunguei dando passos para trás mantendo os olhos fixos na experiência
soviética.

Mantive a calma apesar de a situação ser complicada, foi graças a isso que tive uma
ideia que talvez pudesse surtir algum efeito contra o inimigo a nossa frente. —
Bernard, não quero morrer nesse navio de merda, então fique esperto meu bom
amigo. Capisce? — Ainda com a arma apoiada no ombro corri na direção do
hovercar que o filho da mãe do Castelone tinha trago para o navio, ao mesmo tempo
em que ele tinha fudido todo o plano, o desgraçado talvez tenha nos dado a arma
para acabar com a aberração russa.

Abriria a porta do veículo, deixaria a metralhadora sobre o meu colo, presa ao meu
corpo pela bandoleira. Após ligá-lo, o painel cheio de luzes acenderia e eu colocaria
minhas mãos no volante. — Vamos nessa, talvez um impacto em uma escala maior
seja capaz de mandá-lo junto com essa proteção de bosta para casa do caralho. —
Pensei em voz alta. O caminho estaria livre devido ao fato de todos se afastarem,
por causa da habilidade de sugar vitalidade. O carro começaria a flutuar, o som dos
motores ecoaria, e eu pisaria fundo no acelerador, avançando com tudo contra a
máquina soviética. Eu atingiria o corpo do zumbi com o carro na lateral, o que
provavelmente o jogaria contra uma das paredes do navio ou para fora dele. Não
sabia da capacidade do seu escudo, mas não tínhamos tempo. Seria tudo ou nada.
Narrador
A disputa contra o inimigo estava acirrada, e para infelicidade de todos, nem mesmo
a munição termonuclear estava funcionando. Os disparos barravam na parte de fora
do escudo, da mesma forma que as munições comuns. Fome pareceu surpreso e
assustado quando um hovercar descontroladamente foi em sua direção e colidiu
contra o escudo. O automóvel amassou sua lateral, sua força motriz fez o inimigo
ser arremessado de um lado a outro do convés, sendo jogado como um brinquedo e
batendo com muita brutalidade em uma parede, afundando no metal retorcido até
sumir. Os soldados da ParaMilitech bradaram em comemoração, erguendo armas
para cima em reverência à atitude de Irvine.

Gini aproveitou a ofensiva para se aproximar da porta e pegar X-9 em seus braços,
levando a hacker para mais perto dos demais. Nem Gini nem o restante do grupo
sentiam os efeitos do cansaço. As veias de X-9 deixavam de possuir um tom mais
escuro que sua pele, as rugas também pareciam estar suavizando e sua jovialidade
voltando, mesmo que lentamente, assim como sua cor normal. Vladimir, bastante
preocupado, se aproximou de onde Gini havia mantido X-9 sentada, recostada em
seu corpo, respirando ofegante. Apesar disso, a hacker se encontrava ainda
inconsciente. O russo levou as mãos até o compartimento do cinto que
correspondia ao seu kit médico e retirou um frasco de remédio. Levou alguns
comprimidos até os lábios da hacker e empurrou com os dedos, fazendo todo o
processo de massagem na traqueia para não engasgar. Contudo, ela não respondia.
Como ninguém mais sofria com os efeitos de fraqueza e até mesmo X-9 parecia
gradualmente se recuperar, Vladimir considerou o inimigo derrotado.

— Gini, fique aqui fora cuidando de X-9. O restante de vocês venham comigo! —
Sinalizou com a destra para o seguir para dentro do navio.

Entretanto, antes que pudesse atravessar a porta, o barulho de metal retorcido


rasgando o fez parar e voltar o olhar para onde o hovercar estava. Saindo do rombo
na parede, os passos lentos da criatura mostravam que não havia sofrido um
arranhão. O escudo esférico intacto ainda o mantinha protegido em seu interior, e se
não causava influência nos outros era apenas porque seu estranho poder não tinha
alcance naquela distância para onde foi arremessado. Não iria durar muito, o ser
zumbificado tomava lentamente o caminho de volta. Se o avanço não fosse contido,
o grupo sentiria suas energias drenadas novamente em muito breve.

— Camaradas, suponho que nosso inimigo ainda não morreu! — Comentou


sarcasticamente Vladimir.
Laurel Hedare ou Claire
— Como foi o resgate de Pollux, Doug? — A mulher perguntava, sentada em uma
confortável cadeira reclinável. Virada para a janela, avistava a cidade a longos
metros acima. A fumaça do cigarro que tragava embaçava os reflexos neons que
invadiam o vidro blindado. Diferente do calor que fazia lá fora, a refrigeração da sala
garantia a ela o conforto que poucos na cidade podiam ter. Mas o dinheiro não era
suficiente para a loira.

O funcionário respondeu positivamente, o que fez um sorriso de canto brotar nos


lábios da mulher. Sabia que não poderia cobrar o favor diretamente, isso só o
afastaria. Tinha que deixá-lo trabalhar por livre e espontânea vontade. O inimigo do
seu inimigo é seu amigo, dizem – embora nenhum embate com o jornalista tivesse
ocorrido até então. E por bem, não ocorreria. Ela agradeceu com um aceno de
cabeça, voltando sua atenção à imagem que a janela proporcionava. Queria tudo
aquilo...

Algumas horas se passaram. Nesse ínterim, ela recebera uma correspondência


escrita à mão por Laurel, bem como havia determinado o pagamento da outra parte
à mercenária que tinha feito o salvamento dias atrás. Ficara sabendo, também, da
movimentação que acontecia em Troika – graças a um agente infiltrado seu.
Poderia solicitar que alguns de seus soldados ajudassem, afinal, queria Miraitropolis
tanto quanto seus heróis, mas não podia arriscar se intrometer. Ainda era cedo para
aparecer. Infelizmente, em outro canto da cidade, certa movimentação a faria agir.

Seu assessor vinha informar sobre o ato político de Timothy Carter. — O


comunistinha entrou em ação? Hm... — Sorriu forçadamente para o subalterno. —
Teremos que adiantar um pouco os planos. Prepare o espaço. — Ele assentiu e saiu
da sala. Alguns minutos depois, enviou uma mensagem até o pequeno aparelho
comunicador dela que estava sobre a mesa, avisando à chefe que estava tudo
pronto. E para o local indicado, já previsto, ela se dirigiu.

Posicionou-se em um púlpito bem construído, mas simples. Não podia aparentar


luxo para pessoas que mal tinham coisas em casa. — Boa noite, cidadãos de
Miraitropolis. — A transmissão seguia através da Lexis, em razão do monopólio na
comunicação por parte de Carmen. — Nossa cidade foi acometida de grande
desgraça nos últimos dias. — Diferente de Tim, que buscava apoio no povo nas ruas,
mais marginalizado, o alvo de Claire eram as pessoas que tinham – ou alugavam –
suas casas, e detinham condições de acessar a Lexis. Não necessariamente ricos,
mas estáveis. Pessoas que não queriam perder o pouco conforto que tinham. — É
preciso que confiemos nas instituições. — O que ela falava parecia um
contrassenso, de início. Como assim confiar em uma pessoa que ela queria tirar do
poder? — Enfatizo, nas Instituições. Não nas pessoas que as comandam. Desde que
Carmen assumiu, e reduziu nosso Estado, nossa vida só piorou. — Ele centrava ainda
mais sua vista diante da câmera, como se quisesse olhar nos olhos dos
espectadores. — Não acreditem em falsos profetas. Em salvadores. Isso não existe.
É apenas outra versão da Dama de Prata que já conhecemos. Meu nome é Claire
Underwood, e com vocês, cidadãos de bem de Mirai, poderemos tornar nossa nação
grande novamente. Boa noite e obrigada.

Gal Bordeaux
Superada qualquer apresentação que possa ter ocorrido entre os membros daquela
inusitada equipe, todos seguiram o russo dúbio e sábio em direção ao navio que ali
atracava. Gal não foi diferente, embora aquela sensação de estar caminhando em
direção à própria morte não parava de latejar em sua cabeça. A passos apressados,
a trupe invadiu o ambiente, e tudo parecia relativamente bem até Jesse chegar e
criar uma cena. Seu intento foi alcançado, chamando a atenção dos russos, fazendo
surgir uma criatura dantesca e ocasionando o estado de inconsciência da hacker. O
metamorfo Rodrigo acompanhou Gini na investida de auxiliar X-9, modificando o
corpo para que tivesse densidade corporal suficiente para ajudá-la a ser carregada
ou protegê-la.

Antes dela desmaiar, contudo, atentou-se às suas palavras: um escudo digital


protegia a besta. — Como se ela precisasse de proteção... Nós poderíamos morrer
só de ver isso. — Deixou o comentário sarcástico escapar, completamente
inoportuno enquanto levava uma mão à têmpora esquerda, sentindo literalmente
uma dor de cabeça. — Como eu sinto falta de drogas pesadas. Enfim. — Semicerrou
a vista enquanto analisava o escudo, fingindo entender como ele funcionava. Nesse
ínterim, observou as investidas de Galathea e sua gangue, além da investida
posterior do italiano recém-chegado nessa confusão toda. Todas infrutíferas. — Ah,
não... Merda.

Sibilou ao pensar no que seria mais lógico. Atravessar aquela merda e atacar o
bicho. Riu de nervoso com a ideia, porque mesmo se – e era um ser bem grande –
conseguisse atravessar, com seus poderes, como iria atacar um ser que além de
horroroso, matava só com sua presença? — Pelo menos se eu pudesse... Espera. —
Olhou ao redor, buscando possíveis aliados para a investida que concluiu. Foi
excluindo mentalmente cada um que, por algum motivo, achou que Max seria a
pessoa que aceitaria trabalhar consigo naquele instante.

— Ei, Punk. —Falou enquanto caminhava para perto dela, olhando o tempo todo para
a criatura e voltando sua atenção à colega, dividindo sua atenção. O monstrengo
continuava a se aproximar. — Olha, não sei por que veio, mas já que tá aqui,
provavelmente também não quer morrer. — É, ela não era a melhor para inspirar as
pessoas. Precisaria de sorte e de boa vontade de Max para que fosse
compreendida. — Atirar daqui não vai ter jeito. Mas se você usar esse armão, de cara
pro bicho, pode dar certo. Posso nos deixar de frente para ele! Olha. — Para
demonstrar suas habilidades, a loira atravessou o próprio estômago com a mão,
tornando aquela parte do corpo intangível. Com aquela demonstração, esperava
convencê-la.

Conseguindo, era hora de entrar em ação. Caminhou com ela até perto de onde a
criatura estava, e como estavam as duas mais próximas, já podiam sentir os efeitos
de Fome. Começava a se sentir fraca, de modo similar quando esteve naquela sala
no Cassino. Maldição, precisava descobrir o que era. — Bem... Vamos lá. Vamos ser
rápidas, mesmo assim. — Tocou o ombro da mecânica e assim tornou as duas
intangíveis. Desse modo, por estarem em um estado físico diferente do qual Fome
teria sido programado para ferir, as duas não seriam atingidas pelos efeitos danosos
que irradiavam dele. Na verdade, a meta-humana não sabia bem sobre física ou
qualquer outra explicação científica. Apenas agia instintivamente.

Ainda controlando a densidade corporal das duas, fez com que as solas de seus pés
se mantivessem sólidas, o que as permitia continuar caminhando em direção da
criatura sem afundarem navio adentro. Consequentemente, essa pequena parte
sólida poderia fazê-las sentir o efeito causado por Fome, mas como eram partes
pequenas que estavam expostas, possivelmente conseguiriam continuar em direção
a ele. — Quando eu avisar, atira nele, docinho. — Porém, para atirar no bicho, era
preciso que o corpo das duas ficasse sólido, já que a arma precisaria da
sustentação dos braços, e estes, do corpo. Assim, tornaria ambos tangíveis apenas
no tempo necessário para que ela atirasse, e logo voltaria com os dois ao estado de
intangibilidade, na intenção de preservar suas respectivas energias vitais. — Agora!

Mad Max
Se tinha uma coisa que me dava nos nervos, eram cabeças ocas querendo chamar a
atenção, e quase praguejei quando vi aquele carro que parecia um carnaval
ambulante chegar. Acho que o nosso objetivo era entrar sorrateiramente e acabar
com tudo, não? E quem era aquele palhaço? Eu só sei que queria enterrar uma bala
no crânio do imbecil. Obviamente, com todo aquele show de luzes, chamou a
atenção indesejada, e eu já estava preparada para deitar uns nazistinhas soviéticos,
mas o que veio foi apenas uma horrenda criatura que parecia ter saído de contos de
ficção científica(?). Mas só um? Poderia ser algum tipo de prepotência russa, e eu
quase ri, mas fui surpreendida: Todos que estavam por perto dele começavam a
passar mal, e os tiros não o atingiam... até mesmo X9 quase sucumbiu quando
tentou hackear o escudo!

— Merda! — Balbuciei enquanto segurava minhas armas com mais firmeza. Os


outros todos tentavam de alguma forma parar aquela indescritível monstruosidade,
com chuva de lasers, balas, até mesmo um carro foi jogado naquele filho da puta
que voou longe e nos deu um alívio de vitória, que foi tomado de nosso peito logo
depois.

— Desgraçado... — Não era só eu quem estava surpresa, nossos aliados ficaram


ainda mais preocupados e eu realmente não sabia o que fazer naquele momento,
talvez nem tinha comigo uma artilharia que desse conta de algo, e em meio a todo
aquele alvoroço, ouvi alguém me chamar.

— Hey, Punk. — Era uma mulher loira que eu não tinha notado que estava ali ainda,
estava tão tensa quanto eu e muito provavelmente achando que também iria morrer,
mas pelo jeito que ela falava e andava, parecia ter um plano.

— O que é? — A resposta saiu seca, mas não era momento para cordialidades.
Assim como ela, eu também estava tentando dividir a atenção no assunto e na
criatura que novamente caminhava em passos lentos em nossa direção.

— Olha, não sei por que veio, mas já que tá aqui, provavelmente também não quer
morrer. — Quase revirei os olhos, obviamente não iria querer morrer aqui. — Atirar
daqui não vai ter jeito. Mas se você usar esse armão, de cara pro bicho, pode dar
certo. Posso nos deixar de frente para ele! Olha. — Ta, ali eu fiquei meio surpresa
também. Já era de conhecimento que existia alguns meta-humanos em Mirai, mas
parecia que a sorte caía ao nosso colo quando agora tínhamos dois! Na verdade,
achei muito mais cool a habilidade dela, e cocei a ponta do nariz com a ponta do
dedo indicador enquanto abria um sorriso alegre.

— Caara, eu acho que pode muito bem funcionar — Não foi difícil me convencer, e
como costumava ter ansiedade por chutar bundas, me aproximei um pouco mais
dela e me virei para o monstrengo. — Eu acho que já entendi o plano. Confiarei em
você, e tenho dito que depois disso aqui, você vai me pagar uma rodada de cerveja.
— Arrumava as luvas de couro e depois checava os pentes... desnecessário, não
havia disparado um único tiro ainda, mas era sempre bom pra nada dar errado.

Logo seguiram para perto da cena de ação, ninguém mais estava atirando por conta
de estarem paralisados com aquilo mas eu e a loira que ainda não sabia o nome,
estávamos nos aproximando, parecia loucura ou suicídio, mas era um plano, e era
bom eu não começar a me arrepender pois já estava sentindo os efeitos de entrar
naquele raio.

— Bem... Vamos lá. Vamos ser rápidas, mesmo assim. — A loira não parecia
totalmente bem e eu consegui notar isso, mas precisávamos fazer aquilo de um jeito
ou de outro.

— Uh, certo, não quero ficar nenhum minuto a mais perto disso... — Realmente, já era
desagradável olhar para aquilo de longe, de perto as coisas só pioravam com o
efeito de sua arma. Senti o toque no ombro e dali em diante, uma sensação estranha
percorria meu corpo. Era como se o ar estivesse passando diretamente por mim.
Realmente, eu e ela estávamos em outro nível de matéria. Abri um sorriso confiante,
pois tinha que mostrar que sabia o que fazer. Será que poderia usar minhas armas
mesmo estando intangível? Queria segurar o tiro da arma de Radiak para
transformar o pesadelo em poeira... tive que arriscar. Não saquei nada até a loira
dizer, pois como ela sabia usar os poderes, saberia a hora de atacar, e não demorou
muito para chegar. Entramos naquele maldito escudo, provavelmente ali não haveria
como ele se proteger. Novamente, senti os efeitos dos poderes dele, estávamos
tangíveis novamente, e então ouvi o sinal. — Agora!

Foi um momento muito rápido aos olhos de todos, mas eu gostei da sensação.
Estava com uma das pistolas de radiak mirando na cabeça da criatura, e então
despejei uma rajada de tiros que iluminaram aquela pequena parte enquanto todo e
qualquer pedaço de carne, sangue e etc era espalhado quando a cabeça estourava.
— Quem disse que não dá pra morrer de fome? — É, péssimo momento para piadas?

"Famine, your body it has torn through


Withered in every place"

Narrador
Para os espectadores que observavam do lado exterior, tornou-se impossível
visualizar o resultado daquele embate. O interior do escudo se tornava densamente
vermelho até que, repentinamente, se desfez.

Somente desta forma, o estranho homem esguio foi visto, tombando de joelhos,
sem cabeça. Tanto Max quanto Gal estavam cobertas de sangue e miolos. Sem vida,
ele pendeu para o lado esquerdo e caiu inerte. Uma grande poça escarlate se formou
abaixo do corpo. As duas corajosas heroínas triunfantes poderiam curtir a vitória,
uma vez que os efeitos da absorção de energia não existiam mais.

— Isso!!! — Vibrou Vladimir.


Rodrigo, com X-9, apoiou a hacker em seus fortes braços sob sua nova estrutura. O
russo da ParaMilitech enviava seus homens para entrar no navio. Após certificar-se
de que estava seguro, ele atravessou a porta com o restante dos que aguardavam.
Ao entrar, já se podia ter uma boa noção de quão colossal era o Do Svidaniya.
Somente aquele anexo tinha as dimensões de um armazém das docas do porto,
deixando até mesmo Vladimir de queixo caído.
Escotilhas de ferro e tubos de metal se entrelaçavam nas paredes e escadas,
levando a escritórios ao alto, onde muitas luzes iluminavam o local. Ainda existia um
saguão maior, onde funcionários transportavam mísseis em pequenos carros. O
saguão, de formato hexagonal, comportava bastante equipamento, e não restava
dúvidas de que ele seria usado como início de algo muito grande na disputa entre a
Rússia e Miraitropolis.

— Como suspeitei, lá estão as ogivas. Que irresponsabilidade colocar civis para


operar esse material nuclear, o Governo russo paga gente muito humilde para
trabalhar aqui em baixo. Muitos são até obrigados ou ameaçados. O exército rapta
as famílias e os coitados ficam sem escolha. Uroboros, não disparem contra esses
pobres diabos, apenas os renda. Meus homens vão subir as escadas e esperar a
segurança aparecer para contê-los se necessário, não quero um projétil atingido
esses mísseis.

Os integrantes da Uroboros agiam antecipadamente rendendo os funcionários. X-9


aos poucos foi recuperando a consciência. Rodrigo a colava ao chão para poder
andar com os próprios passos.

A segurança nazisovietica rapidamente se mobilizou dentro dos escritórios, porém


os paramilitares preencheram as escadas e corredores, encurralando os russos
após saírem das saletas. No entanto, os nazisovieticos nunca cedem, mesmo em
desvantagem. Os soldados automaticamente foram obrigados a agir, e um pequeno
tiroteio ocorreu, embora não tenha durado muito. O receio de oferecer risco às
ogivas não aconteceu, mostrando que eram muito bem treinados e, por isso, faziam
parte da elite do esquadrão de Vladimir. Os inocentes foram guiados e instruídos a
sair do navio após a rendição.

— Segundo a planta, o Do Svisdaniya possui ainda outros três setores. — X-9


mostrou para todos verem uma planta holográfica de cor laranja do navio que se
projetou da manopla do seu braço.

— Esse nível já tomamos, vamos ao próximo! — Vladimir motivou a todos, no


entanto, passos foram ouvidos e uma escotilha se abriu logo à frente. Do interior
escuro, saiu um homem alto e forte, vestindo uma regata camuflada, com um
moicano azul e pinturas de guerra ao redor dos olhos e da boca. Seus lábios
estavam roxos. As sobrancelhas em forma de arco tornavam o olhar mais
ameaçador, especialmente quando se notava a espada às suas costas. Sorrindo, ele
se apresentou.

— Boa noite senhoras e senhores, eu sou Guerra. Mestre em combate armado e


desarmado. Um guerreiro forjado para vencer toda e qualquer tipo de batalha. Não
admitimos invasores neste navio, serei obrigado a despachar todos vocês, essa é
minha função! — Concluiu.

— Um cara só? Que piada! Senhor Vladimir, permissão para entrar em combate! —
Gritou um dos soldados.

— Permissão concedida. — Respondeu o mais velho.

Patrick, o melhor combatente corpo a corpo do esquadrão, partiu correndo,


avançando e tomando distância antes de erguer o pulso lateralmente para aplicar
um soco. No entanto, ele foi derrotado com apenas um murro no rosto antes de
concluir sua ação. Seus colegas ficaram incrédulos e não perderam tempo. Seis
soldados imediatamente cercaram Guerra, fechando o cerco ao seu redor. Ele estava
sem saída e não tinha como agir. Sem dar chance para se prepararem, os soldados
agiram, aplicando golpes, chutes, socos, cotoveladas e joelhadas. Guerra resistiu
bravamente, protegendo-se com os braços e revidando na mesma medida. Ele
distribuiu golpes sincronizados de artes marciais, combinando kung fu, muay thai,
boxe, jiu jitsu brasileiro e luta livre. Ao final, todos os soldados caíram vencidos.
Guerra mantinha um sorriso, sem parecer nem um pouco cansado.

Sem delongas, os três soldados restantes não arriscaram o combate desarmado e


optaram por disparar seus fuzis contra o oponente. Antes que fosse alvejado, Guerra
sacou a espada das costas e impressionantemente rebateu todos os tiros com a
lâmina da arma branca. Ele avançou conforme a munição queimava e, quando esta
acabou, ele estava perto demais para aplicar um golpe fatal. Sua expressão
triunfante dizia mais do que qualquer palavra. No entanto, outra espada impediu seu
avanço, criando um choque de faíscas no embate entre as lâminas.

— Você já provou o que queria, comprovamos que é bom. Eu serei sua adversária! —
X-9 usou sua força para empurrar e afastar Guerra.

— Desafio aceito! — Ele empunhou a espada na frente do rosto, X-9 fez o mesmo
com sua katana, o encarando antes do duelo como dois samurais.

— Ela ainda está fraca… — Comentou Xiaren.


Gritando, ela investiu primeiro. O corte transversal acertaria a lateral do flanco de
Guerra se ele não tivesse sido bloqueado. Recuando, a hacker fez o segundo
movimento, tentando perfurar o abdômen de Guerra com a ponta da katana. No
entanto, ele apenas bateu sua lâmina na dela, fazendo o golpe falhar e perfurar a
parede. Rapidamente, ela retirou a katana e a movimentou de baixo para cima. Seu
oponente foi mais rápido e se deslocou para o lado, sua espada cortando um
corrimão de ferro. Irritada, ela começou a executar diversos golpes consecutivos,
sem pausa alguma entre eles. Mesmo assim, a arma do inimigo sempre bloqueia,
frustrando cada golpe. X-9 rapidamente ficou cansada e perdia a agilidade dos
movimentos. Ela arfava com facilidade, o desgaste sendo maior uma vez que não
estava totalmente recuperada dos efeitos do Fome.

Ela estava com os implantes cibernéticos ativados ainda, analisando a forma de


lutar do oponente. No entanto, não encontrava uma falha, uma brecha sequer na
defesa. Insistiu outras vezes com a katana, mas o resultado era sempre o mesmo.
Pensar na ideia de que Guerra estava apenas brincando a irritava demais. Mesmo
não obtendo sucesso em encontrar uma falha no sistema de luta do adversário,
seus implantes haviam descoberto algo importante. De alguma maneira, Guerra
percebeu isso e decidiu finalizar o duelo. Sem ver de onde surgiu o golpe, X-9 notava
que havia sido atingida na barriga. O espadachim ergueu sua arma, exibindo para
todos o corpo da hacker deslizando lentamente pelo fio frio da claymore. Um rio
carmesim se formou aos pés de Guerra.

— Estava divertido, mas você trapaceou, menina. — Jogou-a de lado como um


pedaço de pano, o corpo ao cair no assoalho desprendeu a manopla presa ao pulso,
rolando pelo chão.

— Quem é o próximo??? — Desafiou empunhando a espada sangrenta nas mãos.

Galathea
Era a primeira vez que via os poderes da loira em ação de perto daquela forma.
Lembrava de estar perto dela em outras ocasiões, mas nunca havia tido a
oportunidade de apenas olhar e perscrutar os detalhes das habilidades.

A morena aplaudiu calmamente, sozinha, quando as duas emergiram cobertas de


sangue. Mas não houve mais tempo para nada além disso, Vladimir tinha pressa.

Os membros da Uroboros cumpriram com facilidade a tarefa que lhes foi dada, até
porque não havia nenhuma dificuldade em render pessoas desarmadas.
Enquanto sua equipe prendia os funcionários, Galathea assistiu de longe, incrédula,
à ação que se seguiu, onde um, depois seis, e por último a hacker desafiavam um
inimigo para um duelo e perdiam todas as vezes.

Ela olhou para Vladimir, erguendo os braços num gesto que dizia "Que porra é
essa?". Se aproximou lentamente, já que o inimigo parecia interessado em desafiar
todos eles para um duelo.
— Que porra é essa, Vladimir!? Nós vamos fazer uma fila e lutar todos um a um?

A morena gesticulou para seus soldados, um gesto simples que Vladimir entenderia
como ela pedindo cobertura. Shae e os outros homens se posicionaram com as
armas apontadas para o inimigo. Galathea calmamente fez seu caminho até X-9,
seus olhos fixados no suposto cavaleiro da guerra. Ajoelhou-se ao lado da hacker,
puxando de seu cinto uma seringa com um líquido incolor. Administrou o líquido no
braço da mulher. Antes de erguê-la, notou a mensagem plotada no visor da luva que
X-9 usava. Galathea hesitou um segundo, lendo a mensagem, e decidiu que o
equipamento era importante, de forma que o colocou de volta na hacker. Colocou
X-9 em seu colo, como se ela não pesasse mais do que um passarinho.

Galathea pousou a hacker no chão ao lado de Vladimir, sentada com as costas


contra uma caixa de equipamentos.

— Você é meio imprudente para uma hacker. — Falou em sua voz baixa e calma que
lembrava uma mãe ou uma professora. — Temos uma equipe aqui, não precisa lutar
sozinha. — Continuou calmamente enquanto se curvava sobre a hacker e
gentilmente posicionava o rosto dela, abrindo suas pálpebras para verificar se ela
estava em choque, ao mesmo tempo em que checava seu pulso. X-9 estava
estabilizada, de alguma forma. Embora seus ferimentos estivessem longe de estar
curados, o sangramento havia sido estancado, impedindo-a de morrer nos próximos
minutos ou segundos por hemorragia. Ela não estava apta a combater, no entanto.
Qualquer movimento brusco e ela voltaria a sangrar profusamente novamente.

Sorriu e beliscou a bochecha da hacker antes de se erguer e voltar a atenção ao


oponente. — Escutem bem, seus merdas! Segundo nossa hacker imprudente esse
cara aí depende daquela espada para ter suas habilidades. — Ela pousou as mãos
na cintura erguendo levemente o olhar para fitar o inimigo. — Segundo ela é só
desarmá-lo e o mesmo está acabado. Sendo esse seu calcanhar de aquiles.

Calmamente a morena levou a mão até a cintura, tirando um maço de cigarro e


pescando um deles com os lábios, acendendo o mesmo em seguida.
— Eu pessoalmente creio que ele tem várias outras fraquezas. O fato de que ele é
apenas humano. De que é o cavaleiro dos duelos e está sozinho sem nenhum apoio
de infantaria. Vamos testar algumas dessas hipóteses.

Seus dedos médio e indicador ainda seguravam o cigarro quando ela os apontou
para Guerra. Havia ali um poder de fogo considerável quando se levava em
consideração que havia homens da Paramilitech, Los Zetas, Cosa Nostra e
Uroboros.
— Preparar! Apontar! — Não viu, mas sabia ou talvez sentia que Shae e seus
soldados posicionavam os indicadores nos gatilhos. Sabia que, mesmo que todas
as dezenas de outros a ignorassem, a Uroboros a seguiria até os portões do inferno.
Ainda mantinha os dedos apontados ao inimigo quando deu o comando. — Fogo.

Irvine Montana
O monstro soviético era realmente uma aberração de laboratório de primeira linha.
Mesmo após eu atingi-lo com o hovercar, o maldito continuou sem nenhum dano e
voltou a caminhar na nossa direção. Devido ao impacto do carro contra o corpo dele,
a porta do lado do motorista travou. Admito que fiquei um pouco nervoso, não
queria ficar dentro daquele carro enquanto a arma russa se aproximava. "Merda!" -
Reclamei, mas graças a Deus, foi em vão. Uma mulher loira juntou-se com a
mecânica e, usando uma habilidade especial, conseguiram ultrapassar o escudo do
russo. Eu não acreditei no que tinha visto. Elas viraram fantasmas, e isso era algo
impressionante.

O que aconteceu depois disso foi a morte do inimigo. Vladimir não perdeu tempo e
logo entramos dentro da grande embarcação. Parte do grupo da Galathea rendeu os
trabalhadores que eram praticamente escravos, porém logo depois as coisas
voltaram a ficar conturbadas. Um único homem surgiu, ele carregava consigo uma
espada e, após subestimá-lo, num combate que parecia mais uma humilhação, ele
derrotou alguns soldados da Paramilitech e logo depois a X-9, que agiu feito uma
punk porra louca e tentou enfrentá-lo com sua katana. Já não bastava ter sido
derrubada anteriormente.

Então Galathea mostrou o motivo pelo qual Tony tinha escolhido ela antes de
morrer. A mulher era uma líder nata, e eu tenho que reconhecer isso. Ela pegou X-9
ferida, descobriu o possível ponto fraco do sujeito e ordenou a seus homens que
atirassem nele. Para falar a verdade, não acreditei que a chuva de tiros iria funcionar.
Ele era uma espécie de jedi daquele filme que teve umas 200 sequências, como era
o nome mesmo? Star Wars: Episódio 109. Era provável que ele bloqueasse todos os
tiros com sua claymore, que era uma espada bem interessante, para falar a verdade.
— Vocês, cerquem e mirem nos pés desse exibido. — Fiz sinal para nove dos meus
homens, que começaram a atirar junto aos capangas de Galathea. — Bernard, me
ajude com uma coisa. — Enquanto a rajada de tiros caía sobre o homem, eu
esperaria o momento certo para agir. Como imaginei, nada daquilo adiantou. Porém,
o sujeito estaria com o ego ainda mais inflado, afinal de contas, defender-se de uma
chuva de tiros era para poucos.

— Ei! Parem de atirar, eu vou cuidar disso. — Todos parariam de atirar, mantendo as
armas apontadas para o espadachim que estaria no centro do círculo, a maioria não
entenderia ou acharia que eu estava louco. — Você se acha valentão, certo? —
Caminhei com os olhos fixos nele para o centro do círculo. — Eu sempre odiei
valentões, por isso eu mesmo vou chutar você.

Continuei caminhando até ele com uma expressão séria e determinada. Quando ele
erguesse a mão para me atacar, seria seu fim. O que pedi para Bernard fazer era
simples: num canto do chão, havia uma corrente com um gancho na ponta, usada
em navios para mover cargas e coisas do tipo. Porém, para que o plano desse certo,
o homem tinha que ter seu ego inflado e depois ser desafiado por alguém
importante, no caso, eu. Bernard era meu braço direito e eu confiava nele. Quando o
homem tentasse me atacar, o gancho atingiria seu pulso e Bernard puxaria com
força, provavelmente rasgando ou puxando o braço para trás. Isso faria a espada
cair no chão, e antes que ele pudesse pegá-la, eu faria isso. — Não disse que te
chutaria sozinho. — Falaria enquanto ele tentaria se soltar do gancho, chutando-o no
saco, caso ele abaixasse num impulso natural que fazemos ao ser chutados nas
partes, ergueria a espada com ambas as mãos e cortaria sua cabeça. Sempre disse
que sou um homem bondoso com meus funcionários, mas nunca disse que sou
bondoso com meus inimigos.

rolou 1d20 para Bernard Tirar espada e obteve 20


rolou 1d20 para Irvine Tirar espada e obteve 3

Narrador
Lutar como uma equipe estava mostrando ser a principal chave para derrotar os
cavaleiros do Apocalipse. A cabeça decapitada de Guerra se desprendeu do corpo,
quicou duas vezes no chão antes de deslizar pelo assoalho, deixando para trás um
rastro vermelho. Apesar do êxito no combate, Vladimir não conseguia se concentrar.
Sua mente e sua atenção estavam voltadas para os soldados abatidos e,
principalmente, na hacker. Após Galathea administrar a dose daquela substância na
veia dela, a garota de moicano lilás rapidamente reagiu, abrindo os olhos. De alguma
forma, ela ouviu o que tinha sido dito e tentou responder à morena, mas as palavras
não saíam. Vladimir impediu a nova tentativa de comunicação dela, selando o
indicador em seus lábios.

— Não fale. — Ele recostou novamente ela na caixa de madeira e se ergueu,


ordenando.

— Não fiquem parados, dêem assistência aos abatidos! — Ordenou o líder do


esquadrão, em tom irritado ao seu grupo.
Imediatamente, Calidora foi a primeira a sair de sua zona de conforto, ordenando a
seus homens que acudissem os soldados abatidos da Paramilitech. Nada mais
adequado para um grupo de soldados, provavelmente muitos deles já se conheciam
e haviam atuado juntos no passado. Calidora foi pessoalmente cuidar de X-9. Ao
mesmo tempo, Gini teve a mesma ideia. Toshio, o ajudante de Max na oficina Get
Jett, manteve-se infiltrado com os orientais, tentando manter discrição sem aparecer
ou atuar demais, na intenção de não chamar a atenção de sua patroa. Ele sabia que
levaria uma bronca ali na frente de todos se fosse descoberto. Contudo, apesar de
não gostar de X-9, Toshio sabia que Max e ela mantinham uma longa e forte
amizade há muitos anos. Se a mecânica perdesse a amiga, ficaria profundamente
triste. Ele detestaria ver Max depressiva, seria a última coisa que desejaria. Nutrindo
esse forte sentimento, Toshio saiu da inércia e juntou-se a Calidora e Gini, com a
segurança de que seu capacete personalizado ocultaria sua identidade. E estava
completamente correto. Junto dos outros dois, ele se abaixou e questionou.

— Ela vai sobreviver?

— Estou tentando fazer o possível. A perda de sangue foi grande. — Gini sem dizer
nada rasgava um pedaço da camisa por baixo do terno, expondo o colete balístico e
entregava a Calidora a porção de trapo. A mesma improvisou um torniquete para
conter o sangramento no abdômen da hacker.

— Vamos levá-a um lugar mais seguro, é prudente deixá-la longe dessas brigas. —
Gini e Toshio ergueram com cuidado X-9, carregando a hacker para longe ao apoiá-la
entre seus ombros. Os homens de Calidora faziam o mesmo com os soldados da
Paramilitech.

— Ficaremos com ela, só saiam de perto caso necessite de nossa ajuda. — Falou
Gini aos outros dois.

Os italianos, orgulhosos do feito de Irvine, se cumprimentavam e inflamavam o ego


do Montana. Seu status tinha crescido muito na Cosa Nostra e, depois de vencer o
Guerra, isso se tornava mais evidente. Vladimir escondia a felicidade e o alívio da
vitória sob uma expressão fechada. Apesar de orgulhoso e contente, fazia todos
voltarem à realidade.

— Sem perda de tempo, seguindo em frente! — Disse com cara de poucos amigos e
como um verdadeiro líder militar caminhou até a única porta do final do saguão que
supostamente dava acesso ao próximo nível. Por sorte, a escotilha não ofereceu
resistência, não estava bloqueada e abriu sem dificuldade. Como procedimento
padrão, dois soldados da Paramilitech tomaram a frente, certificando-se de que o
acesso era seguro. Com essa certeza, Vladimir seguiu o caminho, gesticulando para
os outros o acompanharem. Os homens abatidos podiam responder por si mesmos,
voltando à ativa.

X-9 também respondia bem a recuperação das funções, se normalizando


rapidamente, vendo Gini e um rapaz de capacete lhe ajudar a caminhar, embora foi
para Calidora que ela dirigiu a fala primeiramente.

— Cali… Espero que me perdoe pelo Pollux… E por ter te ignorado quando tentou se
comunicar comigo… — Mas foi interrompida.

— Falamos disso depois, consegue se mover sozinha? — A hacker fez sinal de


positivo com a cabeça. Gini e Toshio permitiram que ela se equilibrasse por conta e
desse os primeiros passos sozinha, mas atentos ao seu lado auxiliando caso fosse
necessário.

— Você perdeu bastante sangue, não sei como conseguiu recobrar a consciência, na
verdade não sei como consegue ficar em pé. — Então ela se lembra da operação que
X-9 passou e se cala. A hacker percebe, mas não diz nada.

Vladimir liderava o caminho de acesso àquele andar. Diferente do anterior, mantinha


o aspecto limpo e branco, como uma ala hospitalar. Macas e aparelhos cirúrgicos
estavam dispostos por todos os lados, reforçando essa ideia. Bandejas de alumínio
com bisturis sujos de sangue coagulado e um forte odor de algo podre relembravam
a X-9 clínica, onde X-9 fez sua primeira cirurgia de implantes cibernéticos. O lugar
não era tão limpo quanto o saguão médico que percorrera, bem diferente do
laboratório onde recebeu seu novo corpo ou onde Vladimir disponibilizou seus
upgrades. Toshio percebia que o torniquete ao redor do seu abdômen já estava
encharcado de sangue, e ela pressionava a ferida com dor.

— Você está bem? — Indagou preocupado.

— Sim… Apenas com um pouco de dor… Nos pés… De tanto caminhar... Esse saguão
é enorme. — Ela tentava amenizar a situação mas Toshio não achava graça, se
pudesse ver através do capacete, o jovem oriental a encarava sério. Ela nunca levava
as coisas a sério e isso sempre irritou Toshio.

— Toma, acho que isso vai passar a dor por algum tempo. — Gini entregou um frasco
de plástico branco, contendo alguns comprimidos. O problema é que o rótulo estava
em russo.

— Analgésicos… — X-9 entendia o idioma, e Gini também. Ela pôs na boca alguns
comprimidos e lembrando da sua condição resolveu engolir tudo o que tinha no
frasco.

Aquele nível estava se mostrando tão grande, ou até maior, do que o de cima. Depois
de abrir algumas portas, Vladimir chegava a um lugar que se assemelhava a um
necrotério. Ali dentro, tudo estava calmo. As paredes, algumas delas de metal,
continham gavetas de aço inoxidável. Muitas macas estavam vazias, mas outras
continham cadáveres. Alguns estavam envoltos em sacos plásticos, enquanto
outros estavam expostos, com etiquetas presas aos dedos dos pés. Mais adiante,
havia outra porta, e era ali que o pior estava por vir. Da mesma forma que na sala
anterior, também havia cadáveres, porém os corpos haviam passado por algum tipo
de procedimento muito além de uma simples autópsia. Não era incomum encontrar
também corpos em avançado estágio de decomposição, exalando o cheiro da
putrefação no ar.

Em uma das macas o que se assemelhava a um homem de idade, era mantido


aparentemente vivo, sem rosto, sem crânio, somente ainda com a parte de trás da
nuca a qual possuía alguns fios de cabelo grisalho cacheado. Por meio de tesouras
médicas seu cérebro e seu sistema nervoso mantinham-se expostos, ligados por
fios e eletrodos, o restante se mantinha íntegro.

Os finos fios vermelhos azuis ligados ao cérebro e a uma estranha máquina


mantinham a vitalidade do coitado. Mas aquilo não era o bastante. Mais a frente
uma coluna vertebral com a cabeça de uma mulher na extremidade também era
mantida viva em cima de uma mesa completamente ensanguentada. Pessoas
vestidas com roupas cirúrgicas pareciam fazer testes e anotar as reações adversas
do rosto da mulher que se retorcia sem parar. Enojado com o que viu, Vladimir partiu
para cima dos médicos em punho com sua pistola com silenciador, executou a
dupla com um tiro na nuca de cada um.

— Cientistas nazisovieticos… Só eles para executarem essas barbaridades… —


Extremamente incomodado com a coluna com a cabeça da mulher se retorcendo na
mesa, Vladimir também a executava com um tiro silencioso na testa da mesma,
dando um fim a seu tenebroso sofrimento.
— Pobre e infeliz existência… Ninguém merece algo assim... — Exclamou guardando
a arma.

Porém, após guardar sua arma, ao passar por entre duas macas que cobriam uma
dupla de corpos, um deles se ergueu em um movimento brusco, jogando o pano
branco para cima, revelando um homem estranho, com feridas necrosadas no rosto.
Ele segura o braço direito de Vladimir com bastante força.

— INFERNO! ME SOLTE! — Tentando puxar o braço de volta, o estranho deitado na


maca possuía bastante resistência apesar da aparência decrépita.

— Camarada, assim você não me deixa outra escolha! — Com a mão livre que lhe
restava, tomava de cima de uma mesa o que parecia uma furadeira, sem pensar
duas vezes Vladimir enfiava a broca na testa do homem, perfurando sua fronte sem
hesitar. O sangue da vítima saltou da testa, dando fim ao mesmo. Vladimir estava
livre.

— Esse lugar está me tirando do sério, vamos sair logo daqui. — Jogava a broca suja
de sangue escuro de volta à mesa.

O que o soldado veterano da Paramilitech não sabia era que seu nojo estava prestes
a aumentar quando abrisse a porta ao final do corredor. Na outra sala, ele se
deparava com uma cena chocante: um médico com as calças abaixadas estava em
cima de uma mesa cirúrgica, onde uma mulher loira estava deitada com sangue pelo
seios nus. O homem de cabelos negros, puxados para trás e levemente calvo,
executava movimentos repetitivos com o quadril, enquanto beijava e mordia a loira
como se fossem amantes. A cena era autoexplicativa e deixava um dos homens de
Calidora extremamente perturbado e enojado, fazendo com que ele disparasse seu
revólver na direção do louco. Infelizmente, os disparos ricocheteavam no metal da
mesa cirúrgica e não atingiam o estranho.

— Viktor F. Landa! Eu deveria imaginar que você estava por trás disso tudo!!! — Com
as calças arreadas o cientista corria até a porta mais próxima e em um painel cheio
de luzes e botões ele acionava uma proteção de grades que impediria Vladimir ou
qualquer outro de lhe pôr as mãos. As grossas barras de aço subiam rapidamente
do chão protegendo Viktor e bloqueando a passagem.

— E eu deveria imaginar que você é um traidor! Mas isso terá um fim. Vocês
conheceram meus filhos, Fome e Guerra, conhecam agora o Pestilência! Lamento ter
que usá-lo tão prematuramente, o projeto ainda não está completo, mas munido das
mais letais variações de vírus que a humanidade já conheceu em toda sua
existência, não será preciso uma versão final para dar cabo de você e suas
marionetes, Vladimir. — Com certo desespero Viktor teve pressa em apertar o botão
de neon luminoso vermelho em destaque no centro do painel, usando o recurso
como medida de sua própria segurança.

A porta de aço inoxidável pesada se arrastou lentamente do lado oposto da sala,


liberando um vapor gelado que escapava como se saísse de um frigorífico. Do
interior da névoa gelada, emergiu um homem magro de longos cabelos negros e
molhados. Sua pele estava coberta por inúmeras chagas, bolhas e sangramentos.
As feridas purgavam infecções, sangue com pus e um líquido verde. Parte de seus
intestinos parecia estar exposta.

Junto dele, outros quatro homens na mesma condição se juntaram a ele, emergindo
da névoa gelada. As bolhas em suas peles pulsavam, algumas explodiam, exalando
um fedor insuportável e lançando aquele líquido nojento de cor verde para frente.
Roberto, que estava mais próximo, deu alguns passos para trás, colocando a mão na
frente do nariz.

— Esses caras fedem pra caralho! — Exclamou o brasileiro, enojado.

— Ebola, Anthrax, varíola, peste negra, são só alguns dos vírus que meu rebento
carrega no organismo, ele é um hospedeiro de doenças que assolaram o pesadelo
dos homens por muito tempo. Diferente dos meus outros dois filhos esse vai
conceder a morte a vocês. Será lento e bastante doloroso! — Depois de falar, Viktor
sumiu por trás das grades, fugindo como um rato, sabendo que as barras de ferro
lhe dariam segurança.

— Viktor relatará ao Governo russo sobre minha carreira de agente triplo. Ele precisa
ser morto antes que dê com a língua entre os dentes. — Comentou Vladimir.

— Ah claro, primeiro você tem que sair vivo dessa, velhote. — Respondeu Toshio,
com a voz abafada pelo capacete.

— É, você está tão preocupado somente com sua carreira, e nós que vamos morrer
por nada? — Falou Xiaren em tom alto, quase gritando, visivelmente irritado e quase
perdendo o controle.

— Ninguém vai morrer por nada. Quer saber? Já estou cheia disso!!! — Calidora
vestindo sua armadura saiu de trás de Vladimir e apontou seu rifle para frente,
disparando contra Pestilência e os outros quatro que andarilhavam a sua volta.
As balas de radiack faziam um tremendo estrago na carne frágil dos cinco. Quando
a munição terminou, Pestilência e os outros estavam aos pedaços no chão da ala.
Dava para ver que era o fim, diferente dos filhos anteriores de Viktor, esse não
guardava surpresas.

— S-se-erio… Então terminou, é só isso? — Indagou Toshio, incrédulo.

— Ao que parece sim, camarada. X-9, verifique nos seus arquivos se existe alguma
saída alternativa além da que foi bloqueada por Viktor. — Apontou, o russo.

— Era o que eu já estava fazendo desde que o Pestilência e os amigos apareceram.


E encontrei uma outra outra passagem. Ela fica atrás da sala onde essas coisas
saíram, tenho os códigos de desbloqueio comigo, vai ser mamão com açúcar. —
X-9 mexia no teclado da sua luva, erguendo o pulso para que todos pudessem ver na
imagem holográfica da manopla a estreita e tubular passagem de ferro com luzes
azuis até a porta.

Posteriormente, ele recolheu o antebraço novamente, olhando o visor para


memorizar o código. Estranhou o silêncio, mas prosseguiu. Assim que a sequência
de oito números estava bem gravada em sua mente, ele ergueu o rosto para frente e
entendeu o motivo do silêncio. Uma névoa verde, expelida pelos corpos de
Pestilência e dos outros homens, cobriu a passagem. Ela era densa e mal dava para
ver a porta. Lentamente, a névoa avançava na direção do grupo, espalhando-se pelo
ambiente. Eles não podiam voltar de onde vieram e também não podiam avançar
com a passagem bloqueada. A única alternativa era passar pela névoa esmeralda. O
tempo era curto.

— Perai… Tá de sacanagem né? — X-9 franziu o cenho e bufou ao ver aquilo.

— Olha só… Aqui na planta do navio mostra que tem um respiradouro e um duto de
ventilação perto da porta. Se reverter a função do respiradouro acho que tem como
fazer os canos sugar essa fumaça escrota igual aqueles aparelhos que absorvem a
gordura impedindo que se espalhe pela cozinha, aqueles troços em cima do fogão,
sabem? A merda é que as válvulas são manuais e estão do outro lado do corredor,
não dá pra mexer remotamente nem com meus implantes, alguém terá de fazer isso
pessoalmente. — Frustrada X-9 encarou o grupo. Os ombros foram para frente,
como se existisse um peso neles.

Gabriela vulgo Rodrigo


— Eu vou. — Só depois que concordei com a ideia é que a ficha caiu. Mas que porra
eu tava fazendo?! Me lançando à morte desse jeito. Olha como aqueles bichos eram,
tudo o que aquele médico necrófilo falou... Todas as doenças que eles exalavam. Ao
mesmo tempo, eu não queria ficar mais parado desse jeito. Impassível, observando
tudo ser feito pelos outros. Há poucos minutos lutaram contra um cara que era uma
espécie de... ninja/samurai semi-indestrutível?! E antes, um bicho que nos matava só
de chegarmos perto... Nas duas vezes eu não fiz nada. Não queria ser um peso
morto. Embora a morte parecesse cada vez mais perto.

Mas... presumi que, dentre as pessoas ali, talvez a fumaça não me fizesse mal. Quer
dizer, eu não sei se não faria, mas depois de todo esse tempo trepando com os
piores sujeitos de Miraitropolis, sem preservativo ou qualquer outro tipo de proteção,
descobri que era imune às doenças que eles poderiam me transmitir, diferente das
outras garotas que trabalhavam na boate. Vi muitas delas adoecerem e morrerem,
sendo substituídas por novas, replicantes ou robôs. O que fosse mais barato para o
Pascal no momento, ou dependendo do tipo de mercado que ele pretendia atingir.

Agora a fumaça verde se aproximava cada vez mais em que eu mandava meu corpo
seguir e ele involuntariamente ficava parado. — Você pode me guiar? Isso é, se os
comunicadores dados pelo velho funcionarem nessa fumaça. E se eu não morrer. Ou
nós. — Tentava usar a ironia para me distrair. Instintivamente, meus pulmões
aumentaram de tamanho, dada minha capacidade mórfica. Minha principal intenção
era guardar oxigênio o suficiente para não precisar inalar aquela neblina esverdeada,
ou pelo menos tentar, já que o contato com a pele seria inevitável.

Como não haveria outros voluntários – a mulher transparente parecia ainda cansada
— eu segui pelo corredor. Fui tateando pela parede ao lado, almejando chegar do
outro lado vivo e puxar as válvulas mencionadas pela mulher de moicano roxo.
Contaria com a indicação do caminho por ela, também, já que tentaria percorrer
parte do trajeto de olhos fechados e só os abriria quando necessário. Acreditava que
não haveria outras ameaças para mim além da fumaça tóxica. Tomara que eu tenha
sorte.

Narrador
— Quer dizer que você se atirou para a morte? — Uma voz surgia, Viktor F. Landa se
dirigia a Rodrigo por meio de auto-falantes espalhados pela sala e pelo corredor.

— Eu sabia dos tantos experimentos humanos de Miraitropolis, mutantes e tudo que


é profanação genética como você, Henry Choi falou o quanto a loira ficou impotente
quando confrontou o radiack. Eu pensei que adicionar um pouco… Digo, bastante no
organismo do meu filho seria interessante, ou acha como foi possível misturar
tantos vírus em um só? Deveriam ter imaginado que com a Green Box e radiack se
pode fazer tudo! Você nem mesmo suspeitou a cor verde da neblina? O melhor ainda
está por vir.

De alguma forma, em sua segurança, Landa observava Rodrigo atravessando a


fumaça esmeralda. Assim como Gal antes, o efeito do radiack misturado a todas
aquelas doenças conseguiu anular as habilidades de Rodrigo. Ele conseguiu, até
certo ponto, alterar sua constituição, mas não foi capaz de impedir que o coquetel
de doenças afetasse o seu organismo. Graças ao valioso radiack, ele se tornava tão
invulnerável quanto qualquer outro ali. Rodrigo, sem sua imunidade, acabava
contraindo os piores vírus imagináveis. No entanto, aquelas doenças levariam
tempo, talvez horas ou dias, até de fato matá-lo, e o que fez tombar frente às
válvulas foi a fraqueza causada pelo radiack.

Rodrigo por ser um “investimento” de Pascal, gerava ira em Roberto, que sem medo
se opôs a Vladimir, parando a sua frente e o encarando extremamente bravo.

— Faça alguma coisa! Ele vai morrer. Mande um dos seus soldadinhos buscar o
Rodrigo. Eles devem ter uma daquelas máscaras de gás ou algo do tipo! — Ele
gritava frente ao mais velho.

— Você acha camarada que se eles portassem esse tipo de equipamento eu


permitiria Rodrigo seguir em frente? Meu setor está operando no vermelho, Nick Slay
e Kasper deixaram de repassar a verba para nosso pelotão. Eles desviam o pouco
dinheiro dado por Carmen Telford. — Roberto fitou o russo, sem dizer nada, mas não
arredou o pé.

— Mas que merda de esquadrão é esse que não tem nem a porra de uma máscara
de gás? Vocês deveriam ser algo tipo uma S.W.A.T. — Roberto encarava Vladimir
ainda mais perto, rosto a rosto.

— Vou ignorar o infeliz comentário, camarada, mas quero lembrar a você que essa
operação é extra oficial, caso contrário não teria convocado todos aqui. Preciso
repetir que estamos até com a munição contada e sem a autorização da
Paramilitech? Estou tirando dinheiro do meu bolso para pagar todos vocês! Não terei
lucro algum nessa operação, só quero evitar uma guerra. — Vladimir não alterava a
voz, mas mantinha o tom firme na mesma. — E não altere sua voz comigo, amigo,
será melhor assim.

— Peraí, vamos manter a calma! — X-9 interveio, ficando entre Roberto e Vladimir,
tentando diminuir a tensão afastando-os antes que se iniciasse uma briga.
— Deixa comigo, eu resolvo isso. — Claramente provocando Irvine, Jesse saiu de trás
da multidão parafraseando o outro italiano.

— Vou ajudar a bichinha. — Estralou os dedos.

Sem ninguém esperar, Jesse aplicou um soco na pessoa mais perto, o infortunado
foi Gini, que se posicionava a sua lateral direita. O soco o pegou de surprssa e fez
Gini cambalear, pego em cheiro com um murro no queixo, o golpe o deixou zonzo.
Percebendo que teve sucesso, Jesse segurou o terno do outro, agarrando pelos
ombros e arremessou Gini com toda sua força. Gini caiu dentro da fumaça verde e
aspirou a neblina verde devido ao susto. Começou imediatamente a se engasgar.

— Deixa de frescura e salva o cara! — Ordenou Jesse.

Mas diferente de Rodrigo, Gini ao encher os pulmões começou a vomitar, passando


muito mal e já tendo os efeitos de imediato. Sua carne passou a arder como se
queimasse, e em pouco tempo a ficar liquefeita, virando uma massa vermelha e
pegajosa que escorria pela roupa. Pele, cabelos, cartilagem e olhos derretiam,
expondo os ossos enquanto o pobre coitado gritava desesperado, indicando que
sentia dores lancinantes.

O grito desesperado e atormentador certamente deixou todos de cabelo em pé e


desconfortáveis, de certa maneira culpados também, mais do que tudo indicou em
seguida o fim de uma vida. Gini caia transformado em uma caveira dentro de um
terno.

— É…. Não deu certo… — Disse Jesse dando de ombros.

Xiaren o pegou pela lapela do terno e com toda sua força o ergueu, jogando-o contra
a parede. Jesse caiu arfando, o oriental puxou uma pistola e apontou contra o rosto
do italiano, pressionando a ponta do nariz com o cano da arma.

— Isso foi extremamente desnecessário! Me dá só um motivo para não te matar? Eu


posso fazer isso e não me aconteceria nada, teus amiguinhos italianos iam até me
agradecer!!! — Antes que algo pudesse ser dito, novamente surgiu a voz de Landa,
agora ela tinha um tom mais robotizado.

— Todos desesperados perdendo o controle. Se eu fosse você guardaria essa bala


para si mesmo. Qualquer morte é melhor do que essa, vocês viram. Devem estar se
perguntando a razão do amigo ali ter derretido. Rodrigo por ser o paciente zero teve
sorte de não ter adquirido a versão mutante do vírus. Mas assim que ele foi
infectado, o vírus rapidamente mudou, evoluiu, com os genes transmorfos e radiack
a fórmula se tornou mais mortal e com um processo de morte muito acelerada. O
outro coitado que foi jogado na névoa teve azar. Obrigado, caro amigo Rodrigo por
ter potencializado o Pestilência. — Xiaren largou Jesse e apontou a arma em
direção ao auto falante e disparou, cessando a voz irritante de Landa. Entretanto
aquilo não ia parar o avanço da fumaça mortal.

— Depois a gente se acerta! — Apontou para Jesse. — Alguém tem alguma idéia?! —
Perguntou guardando a arma na cintura. Restava pouco espaço no ambiente e os
soldados de Vladimir já se comprimiam uns nos outros ao final do corredor.

Irvine Montana
As coisas ficaram feias para nossa equipe improvisada. Não esperava que as coisas
melhorassem, mas assumo que fiquei surpreso com o quão bizarro tudo se tornou
depois que passamos por aquela porta e chegamos ao que parecia ser o setor dos
laboratórios da grande embarcação. Em resumo, um cientista maluco russo que
criou tanto a primeira aberração que encontramos e melhorou o espadachim que
decapitei apareceu com mais um monstro. Ele explodiu numa neblina verde cheia de
doenças enquanto o filho da puta fugiu pelos fundos da sala em que ele estava.

Estamos presos em um corredor estreito, com uma fumaça que nos faria morrer da
pior forma possível. A hacker punk, que já havia se ferrado duas vezes, descobriu
uma saída de ar fechada atrás da neblina cancerígena. Rodrigo tentou agir
confiando em suas habilidades, mas acabou caindo. Depois disso, quase perdi o
controle. Jesse, que ainda estava conosco, socou um garoto e o jogou no meio da
doença. O pobre coitado se transformou em uma pasta de sangue em menos de um
minuto, tão agressiva que aquela maldita fumaça se tornou. Enquanto Xiaren
ameaçava Jesse, eu respirava fundo, com os punhos cerrados, tentando controlar
meus impulsos. Minha vontade naquele momento era esmagá-lo feito uma barata.

O líder da Ryulong desistiu de matá-lo quando notou a névoa se aproximando dos


meus homens juntamente comigo tentaram se afastar ao máximo, que não era
muito. — Senhor! Precisamos agir logo. — Disse Bernard, esperando que eu tivesse
uma resposta para aquele problema, sou um líder e não um grande sábio que tem a
solução de tudo. — Não tem como sem sacrifícios. — O encarei, enquanto segurava
a claymore com firmeza na minha mão esquerda. — Ele parou deu dois passos e
olhou nos meus olhos e disse. — Eu faço isso, serei o sacrifício, senhor. — Já devia
ter esperado esse tipo de atitude daquele velho, ele era um dos homens mais fiéis a
Cosa Nostra, após a guerra do deserto ele dedicou sua vida totalmente a família
Montana e a nossa organização.
— Eu preciso de você meu bom amigo não permitiria isso. — Ao ouvir minhas
palavras ele voltou a olhar para a fumaça da morte, avancei então sobre Jesse de
uma vez, meu objetivo era atingi-lo com um cruzado de direito no queixo, se ele
caísse consciente colocaria a ponta da espada sobre sua garganta. — Algeme esse
filho da puta. — Um dos meus homens o algemaria isso seria um problema a menos.
— Não sei o restante de vocês, mas não quero morrer nesse barco de merda com
doença saindo pelas minhas orelhas. — Peguei com Bernard uma granada, e a
arremessei sem culpa alguma com objetivo de atingir o fundo do corredor, meu
objetivo era que explosão fosse forte o suficiente para explodir a saída de ar e fazer
com que aquela névoa verde fosse sugada para o inferno de onda ela saiu.

rolou 1d20 para Irvine Explodir a saída de ar e obteve 15

Narrador
O plano de Irvine se mostrou desastrosamente errado. A explosão causada em um
espaço confinado gerou um forte impacto barulhento, arremessando fogo, pedaços
de ferro, canos e parafusos para todos os lados, colocando em risco a vida de todos
os presentes. Um soldado da Paramilitech caiu ao chão, um estilhaço de ferro
atravessando seu tornozelo como uma lança afiada. Um membro dos Los Zeta teve
o braço perfurado por parafusos. Toshio, graças ao capacete que usava, não perdeu
a cabeça literalmente, mas uma placa de ferro atingiu sua região. Um dos homens
de Calidora teve o ombro dilacerado pelo mesmo motivo. X-9 foi jogada para trás,
atingida por um pedaço de madeira em seu abdômen, fraturando duas costelas e
fazendo o ferimento em sua barriga sangrar novamente. Até mesmo um italiano que
estava próximo à explosão foi vítima de queimaduras. Mas, com certeza, quem mais
sofreu foi Rodrigo, já que a granada explodiu quase ao seu lado. Não era possível
saber qual havia sido o destino do transmorfo, pois, naquele momento, os
problemas apenas pioravam. O rombo na parede significava um rombo no casco da
embarcação, uma vez que aquele nível do andar seria como o subsolo de um prédio.
A água poluída do porto de Troika começou a invadir o corredor restrito. Quando
todos puderam se recuperar do ensurdecedor ruído, Roberto, com muita raiva,
avançou em direção a Irvine, puxando-o pelo colarinho.

— Qual é o seu problema? Não viu o Rodrigo no final do corredor? Que merda você
fez? Seu plano é matar todos nós afogados?

Assim que o brasileiro se mostrou agressivo para com o italiano os membros da


Cosa Nostra rodearam Roberto com armas apontadas para o mesmo. Los Zetas não
deixavam por menos e fizeram o mesmocom os homens de Montana, tornando-os
alvo. Uma situação ainda mais tensa se configurava.
— Humpf… Foi por esse traste que vocês me trocaram? O cara cheira a desastre! —
Provocou Jesse, se referindo a Irvine.

— Cala boca! — Calidora desferiu uma coronhada na face de Jesse que quebrou seu
nariz e o jogou sentado no chão, bastante zonzo.

Uma confusão se iniciou, todos discutiam enquanto o nível da água com sangue
subia. Ninguém se entendia com tantas vozes nervosas falando e gritando ao
mesmo tempo. Uma coisa era certa, pessoas tensas discutindo armadas nunca
acabava bem. Xiaren caminhou até Jesse, querendo descontar sua frustração.

— Eu vou matar esse filho da puta agora mesmo! — Xiaren retirou a pistola da cintura
novamente e apontou para a nuca de Jesse. Um tiro cortou o burburinho de ofensas
e brigas, entretanto o disparo vinha da pistola de Vladimir e não de Xiaren.

— VAMOS MANTER A CALMA!!! — O russo estava com o braço erguido para cima, o
tiro para o alto serviu para cessar as discussões.

— Não morreremos aqui! Dou minha garantia. Nos resta pouco tempo, se gastarmos
ele com essas disputas inúteis de poder estamos nos dando por vencidos. É isso
que são, um bando de derrotados? — Vladimir havia conseguido chamar a atenção.

— Roberto, largue Irvine. Irvine, mande seus rapazes se acalmarem. Roberto pedirá o
mesmo. Não foi uma atitude muito inteligente mas ao menos ele tentou. — Eles
obedeceram Vladimir, quando tudo pareceu menos nervoso este puxou o italiano e
lhe falou ao pé do ouvido. — Nunca mais faça algo do tipo, filho. Você não se
preocupou com Rodrigo e nem com mais ninguém aqui dentro. Sem mencionar o
que estava pensando quando fez aquilo? Liberando essa fumaça no ar ia matar
milhões de pessoas em Miraitropolis. Tem sorte de eu estar muito ocupado e
preocupado em sobreviver, ou já estaria preso. — O russo deu dois tapinhas
amigáveis sobre o ombro esquerdo do italiano, sorrindo de forma amarela e se
afastou.

Vladimir sabia que o vírus não ia sair do navio e afetaria a cidade devido a água que
entrava. Por outro lado isso de longe significava uma solução. O nível já estava a
altura da canela do russo, um soldado nesse instante solicitou a atenção do mais
velho, perguntando ao ouvido do líder russo.

— Senhor, qual é o plano?


— Sinceramente soldado…. Eu não sei... — Vladimir permitia mostrar sua expressão
preocupada apenas para aquele soldado e ninguém mais. Sabia que se expressasse
aquele semblante a esperança de todos se perderia.

— AAAAAAAAAAAAAAHHHHHHH!!!!!!!

De repente se ouviu um grito quase igual ao de Gini. Como a água tomava espaço,
também diminuía o do gás, espalhando ele de forma acelerada no ar. Um italiano
respirando o amálgama de doenças contraiu a névoa em sua respiração. A carne
desmanchava se diluindo na água, passando pelo mesmo processo que Gini. Urros
de terror e dor, agonia e então um crânio descarnado e vermelho expulsou os globos
oculares flutuavam na água, deixando para trás duas órbitas vazias. Para as
testemunhas restava recuar ao fundo do corredor ao lado oposto da fumaça tóxica,
se comprimindo o máximo que podiam, claustrofobicamente, com água até os
joelhos.

Irvine Montana
A confusão se instaurou após a explosão da minha granada, transformando aquele
corredor apertado em um caos de fragmentos de metal e destroços do navio sendo
arremessados em todas as direções. Pessoas ficaram feridas e até mesmo
perderam suas vidas devido às minhas ações. Mas eu sabia que tinha feito o que
precisava ser feito. Enquanto Roberto avançava sobre mim, agarrando meu
colarinho com fúria nos olhos, eu o encarei sem medo. Meus homens prontamente
apontaram suas armas para ele, desencadeando uma tensão ainda maior quando os
homens de Roberto fizeram o mesmo em resposta. Para piorar a situação, Jesse
aproveitou o momento para me diminuir perante meus companheiros, enquanto
Xiaren tentava tomar uma atitude drástica contra ele.

— Tá tudo bem pessoal, pode abaixar as armas, mas da próxima vez que fizer algo
do tipo Roberto, eu te mando para o inferno. — Falei após ele me soltar quando o
dono da razão Vladimir pediu para que colocássemos a cabeça no lugar. Ele me
puxou para o canto, achando que podia me ameaçar ou dizer que minha atitude foi
incorreta, eu sabia disso, porém eu tentei e quanto ao Rodrigo ele já é um homem
morto após respirar o gás das doenças. — Eu não me importo com você velho
traidor, um homem que serviu três grupos diferentes ao mesmo tempo não é digno
do meu respeito. Você só serve você mesmo no fim das contas. — Dei as costas
para Vladimir logo depois, sacando uma pistola do interior do meu sobretudo e
disparando contra a cabeça de Jesse, já tinha passado da hora daquele desgraçado
morrer.
Depois disso, enquanto meus homens e todos os outros se moviam para o lado
contrario da névoa, eu peguei X-9 no colo em meio a água podre que saia do buraco
feito pela minha granada, aquela punk já tinha se ferrado muito ao longo da nossa
tarefa. — Bernard tome a espada e vocês cinco ajudem ele a tentar abrir aquela
maldita porta. — No momento abrir aquela porta era nossa melhor chance, pois
poderíamos sair daquele corredor, trancar o gás lá dentro e evitar a água que já tinha
atingido meu joelho.

Narrador
Vladimir ignorou o comentário de Irvine, sabendo que aquela discussão não traria
nenhum benefício e apenas aumentaria a tensão em uma situação já delicada. No
entanto, o aviso estava dado e ele sabia que precisava ficar de olho no italiano de
temperamento explosivo mais do que nunca. Era uma verdade inegável. O russo
calculava cada movimento daquele homem, e quando percebeu que Irvine estava
prestes a sacar uma arma, o mais experiente segurou firmemente seu pulso e
desviou o disparo para o lado, fazendo a bala acertar a água em vez da cabeça de
Jesse.

— Sem mais mortes, não foi suficiente matar Rodrigo? — Ao mesmo tempo que
falava apertou a pistola para ejetar a munição e deixar o italiano armado, mas sem
ter como fazer besteira.

— Honestamente não me importo com a sua opinião, mas Jesse está sob minha
custódia, e o levarei preso depois disso, esse desgraçado terá a punição adequada.
E quem não gostar, pode se ver comigo. — Após falar, Vladimir soltou o pulso de
Irvine e foi até o outro italiano e apertou com os dedos os nervos do trapézio de
Jesse, isso o fez desmaiar.

— Soldados, fiquem de olho nesse traste, se alguém se aproximar dele tem


permissão para atirar. — Dois agentes da Paramilitech o escoltaram, mostrando os
rifles, ficando em posse de Jesse, inconsciente.

— Agora preciso pensar. — Vladimir colocava a mão no queixo, pensando em alguma


saída enquanto via o teimoso Irvine voltar pelo corredor e ainda carregar X-9. O
soldado ao lado do russo iria intervir mas Vladimir impediu o avanço apenas
tocando a mão no braço do seu agente e movendo a cabeça negativamente.

Com tantas discussões e tensão a água já cobria a cintura. Os italianos tentavam


forçar a porta de onde entraram, ela não estava trancada. Assim que se abriu o nível
da água no corredor diminuiu, não que fosse a intenção de Irvine mas por que X-9
decidia andar por si mesma voltando a por os pés no chão.
— Eu agradeço sua preocupação e não quero ser mal agradecida. Já trabalhei pra
Cosa Nostra quando seu primo ainda era vivo, mas eu não posso deixar aquelas
pessoas pra trás. É uma burrice sim, a atitude mais inteligente seria recuar e
sobreviver… Mas talvez eu queira morrer tentando. Entrei nessa com Gini, ele já
morreu, vou ter que aprender a lidar com isso, sua morte vai pra sempre me
assombrar. Mas nunca conseguiria me encarar no espelho se acontecesse o mesmo
com Max… — Ela fechou o pulso, forte.
— E tem Boris… Eu vou por minhas mãos nele!!! — Caminhando com a água até aos
joelhos novamente a hacker voltou para correr junto com os demais que ficaram
para trás, não sabendo se Irvine seguiria para o lado oposto ainda ou voltaria a se
juntar ao grupo, mas dado ao temperamento dele imaginou que pelo orgulho não
voltaria a se unir. Ela caminhava pressionando a ferida sangrenta enquanto
suportava a dor das costelas quebradas. Cada passo era como um martelo batendo
em seus ossos.

Ao menos mantendo aquela porta aberta mesmo que fosse alguns segundos
aliviava a pressão e garantiu uma sobrevida baixando o nível do alagamento. Por
outro lado a névoa continuava avançando, um dos homens da Paramilitech foi a
vítima da vez, respirando o ar contaminado imediatamente sentiu os efeitos, seu
desespero falou mais alto. Mesmo assim tentou manter o controle.

— Senhor Vladimir, foi uma honra servi-lo. — O soldado sacou sua arma e colocou
dentro da boca, disparando contra a própria cabeça.

Mad Max
A vitória se estampava nos rostos de todos, e alguns gritavam em celebração pelo
sucesso alcançado. No entanto, a verdadeira vitória estava estampada em mim e
em Gal, pois nos banhamos no sangue daquele cretino sugador de energia. Era a
imagem perfeita do triunfo, não é mesmo? Exceto pelo gosto desagradável que
invadiu minha boca quando acabei com um pedaço repugnante de miolos. Eca! Não
havia doçura alguma nisso, tampouco era algo para se apreciar. Enquanto algumas
pessoas nos elogiavam ao passar por nós, eu arrumei meus cabelos encharcados
para trás e limpei o rosto o melhor que pude. Em seguida, verifiquei minha mochila
para garantir que tudo estivesse intacto: peças do Laser, ok! Pistolas extras, ok!
Munição e bateria, ok! Era hora de seguir em frente, mas após dar alguns passos,
olhei para trás. Um frio na barriga me dominou, afinal, a noite seria longa e encontrar
e compreender o funcionamento daquela defesa seria um desafio.

— É... seria uma boa. — E também percebi que ninguém mais estava preocupado. Os
líderes dos grupos - Vladimir, Galathea, Irvine, Xiaren e Roberto - não levaram em
consideração essas possibilidades, e isso era bom! Como uma força de ataque, era
nosso dever pensar em todas as possíveis ameaças que poderiam surgir contra nós,
estar preparados para qualquer confronto. No entanto, eles estavam cegos pela
vingança contra Yuric, e talvez conseguissem lidar com isso, mas precisavam
considerar todas as variáveis. Cheguei à conclusão de que talvez não tivéssemos
tempo para isso também. Suspirei e continuei a caminhar. Aliviada, avistei X9
andando novamente ao alcance da minha visão, e assim seguimos em direção
àquele navio-favela.
Fizemos uma abordagem rápida quando encontramos aqueles trabalhadores, eles
não falavam a nossa língua mas era certeza de que não estavam ali porque queriam,
e então o velhote da Paramilitech ordenou que eles fossem retirados dali de dentro,
pelo menos não seriam vítimas de balas perdidas. Não fiz questão de ajudar, não
estava ali para ajudar nazisoviéticos, e sim para acabar com uma ameaça de uma
vez por todas, uma que poderia acabar com as pessoas de quem eu gostava e até
que tentaram. Novamente senti aquele frio na barriga quando se ouviu o estalar das
engrenagens fazendo uma escotilha subir, e de dentro, surgiu um homem parrudo,
de moicano e com uma espada em mãos.

[...]Adrenaline control
Forever fixed my soul
Curse by my side
Judgment in disguise[...]

— Ora ora, olha o que encontramos na porta número 2. — Falei em tom de gozação
de algumas pessoas que estavam perto de mim talvez tenham notado a referência.
Era um programa que passava nas madrugadas "a porta dos sonhos". E com o
mínimo de conversa, todos entravam em ação mais uma vez mas não consegui
erguer minha arma. Sentia que não era a hora certa ou ao menos talvez por
ansiedade ao ver aquelas habilidades, não consegui pensar em nada. Até que o vi
atravessar o abdômen de minha melhor amiga com a espada. DESGRAÇADO! Gritei
de onde estava e me aproximei com rapidez, queria ver como ela estava, queria
socar a cara daquele filho da puta mas fui barrada por algumas pessoas do pelotão
de Galathea.

— Hey, garotinha, não se aproxime a não ser que queira morrer. Cuidaremos disso
quando tivermos alguma ideia de como fazer. E a punk ali, ela vai sobreviver. — Ele
dizia com firmeza, enquanto a imponente mulher de longos cabelos negros a pegava
no colo e a afastava do combate. Havia uma certa elegância naquilo, e tudo o que
consegui fazer foi ficar ali, observando e respirando fundo. Minha amiga foi
colocada no chão, e a líder começou a falar coisas que não pude ouvir, mas X9
parecia reagir a isso. Parecia estar fora de perigo. Então, ouviu-se a ordem. "Fogo!"
Ela disse, e todos, sem exceção, começaram a disparar contra o espadachim. Desta
vez, ele caiu, mergulhando em uma poça de seu próprio sangue após se tornar um
verdadeiro alvo. Sua Claymore caiu no chão e Irvine a pegou. Seria um valioso
espólio de guerra, eu sabia disso. Foi nesse momento que notei que mais uma vez
tinha outro conhecido ali. Mirai sempre conseguia atrair todo tipo de pessoa, mesmo
em momentos como esse. Ele usava uma roupa branca com listras vermelhas e um
capacete na cabeça. Sim, o reconheci, mas não disse nada. Eu me aproximaria dele
mais tarde para dar um cascudo nesse pirralho que, para começar, nem deveria
estar ali.
Corremos então para mais fundo do navio e entramos num pesadelo. Era uma ala
médica cheia de experiências terríveis, e até cheguei a desacelerar os passos ao ver
as incontáveis bizarrices aque ali se encontrava, X9 até passava por mim e para
tentar quebrar o gelo, soltei uma piadinha. — Espero que agora você pare com esse
seu sadomasoquismo. — E segui logo atrás dela, Toshio e Gini. Passávamos por
cenas grotescas tiradas perfeitamente de filmes de terror. Eu sabia que aquilo
também acontecia nos interiores de Mirai, mas outra coisa era ver com os próprios
olhos, e acabei saindo do transe quando ouvi tiros matando alguém. Estava perto de
Vladimir e ele acabou executando dois cientistas e uma cabeça que estava sobre
uma mesa, e então outra cena doentia: Um russo estava trepando com uma morta!
— Que nojento... — Levantei minha arma para matar o desgraçado mas atiraram
antes e espantaram o desgraçado que correu. A conversa que se seguiu então me
fez ficar a par da situação. Viktor F. Landa, um cientista maluco que fazia
experiências em humanos, os transformando em monstros, agora tudo se encaixava
em vista das duas aberrações que encontramos antes, e minha vontade de virar
aquele cara do avesso era ainda maior.

— Esses russos conseguem se mostrar cada vez mais doentes. — Claro, não era
minha intenção falar isso para Vladimir, mas soou baixo e talvez alguém tivesse
escutado, e então veio mais uma figura diabólica. Um homem completamente
doente, tão doente que parecia impossível estar vivo, mas o infeliz estava, e outros
quatro saíram do frigorífico de onde o primeiro saiu. Rangi os dentes, era uma cena
realmente de se arrepiar, e antes que pudesse tomar qualquer atitude, a Paramilitech
acabava com eles com uma chuva de tiros e em reação, levei as mãos aos cabelos,
eles não fizeram isso! Porra, bolhas em todas as partes, doenças, vírus! Quando se
encontra uma arma biológica como essa, tinha que lidar com a situação com mais
cautela! Dito e feito, as merdas das doenças se espalharam pelo ar na cor
esverdeada como o radiack. Viktor já se vangloriava de seu feito e todos ali iriam
morrer. E um murmurio começou de todos os lados, o medo tocava no coração até
dos mais bravos, a situação estava ficando fora de controle, até que X9 deu uma luz
no fim do túnel.
— Era o que eu já estava fazendo desde que o Pestilência e os amigos apareceram.
E encontrei uma outra outra passagem. Ela fica atrás da sala onde essas coisas
saíram, tenho os códigos de desbloqueio comigo, vai ser mamão com açúcar

Talvez aquilo colocasse um pouco mais de ânimo em todos, até eu mesma respirei
mais forte e dei alguns passos para trás, tentando tomar um espaço de segurança.
Agora aquela luz parecia até nossa ruína. Não tínhamos muitas opções, e voltar não
era uma delas. De um lado da sala, a fumaça se espalhava, do outro, a porta
trancada por grades, o caos se instaurou mais uma vez!

— Esse não pode ser o fim da linha, esse não pode ser o fim, não pode, não pode,
não pode... — Eu ouvia de algumas pessoas que estavam ali, e me aproximei de um
dos rapazes, coloquei a mão em seu ombro e tentei deixá-lo mais calmo.

— Hey, me escute, nós vamos sair dessa. Só temos que colocar nossas cabeças no
lugar. — Ele se acalmou, mas o medo fazia as pessoas tomarem decisões erradas.
Primeiro Rodrigo saiu andando em meio a névoa. Eu não o conhecia mas ele
conseguiu andar quase até a válvula que X9 falou antes de cair. As pessoas
começaram a ensandecer. — Porra! — Eu não podia ficar parada, não mesmo!
Peguei minha mochila e tirei dali as três partes de meu canhão e comecei a
montá-lo. — Esses desgraçados não sabem montar um plano... — Ajeitei a bolsa das
células de fusão e comecei a apertar em minha cintura para não precisar carregar no
ombro, mas logo caí pra trás com um estrondo e um repentino terremoto. O cheiro
de queimado subia e eu sentia as pernas molharem. Hey, não era minha culpa não!
Algum retardado jogou uma granada na merda da fumada e explodiu a parede da
sala, a água começou a entrar e tivemos de recuar ainda mais. — Porra, de que lado
vocês estão? Parem um pouco pra pensar! — Mas minhas palavras não surtiam
efeito algum, pois um zunido afetava o ouvido de todos, e todo mundo começava a
se agitar afinal, após a explosão, muitas pessoas caíram machucadas ou mortas.
Que burrice da porra! Vi Toshio ao chão e o puxei para mais perto, rezei para que
estivesse vivo ainda, mas sentia a sala mais vazia. Olhei para os lados e tentava
saber o porque. Além de Rodrigo, mais um corpo estava ao chão, e estava
totalmente derretido. Meus olhos corriam pela sala e X9 caiu novamente mas já
estava sendo acudida pelos italianos. Vladimir estava tendo discussões com aquele
maníaco da granada... alguma coisa tinha de ser feita! Terminei de ajeitar o canhão e
me levantei do chão. Ele era pesado mas o adaptei para conseguir ter melhor
precisão, e com o meu peso somado ao da arma, fui pedindo espaço para aquela
porta onde o detestável Viktor correu. — Da licença! Vou tentar fazer alguma merda
pra livrar a bunda de vocês! — Era possível notar a raiva em minha voz.

Provavelmente chamei a atenção de todos com o clarão do laser, ele brilhava quase
como uma mistura dançante do arco-íris e quase em silêncio, subiu aquele cheiro de
metal queimado até conseguir cortar todas as barras. Não seria o meu melhor corte,
eu estava com raiva. Raiva não, irada.

[...] Now your mission lies ahead of you


As it did mine so long ago
To help the helpless ones who all look up to you
And to defend them to the end[...]

Galathea
A situação saiu fora do controle bem rápido. Galathea mal teve a chance de
contemplar o quanto a sala anterior lhe fazia lembrar de casa, de sua mãe. Seu
mundo era apenas zumbido após a explosão da granada.

— Chefe! Ordens?

Escutou a voz distorcida de Vikcy puxando-a de volta para a realidade para notar que
os presentes começavam a ameaçar uns aos outros.

— Sigam-na caso ela consiga. — Apontou para Max. — Recuem de volta para a sala
anterior caso contrário.

— Fala como se não fosse vir com a gente…

— Eu tenho que buscar ele. — Respondeu a morena apontando a abertura no casco.

— Você não pode estar falando sério! — Começou William antes de ser interrompido
pela mão de Shae em seu ombro.

O sócio de Galathea pegou o capacete do mesmo e o entregou a Galathea. Essa o


agradeceu meneando levemente a cabeça e amarrou o cabelo em um coque antes
de encaixar o capacete.

— Preso — A morena riu de dentro do capacete quando Vladimir informou que iria
prender Jesse.

Não fazia diferença, Castellone iria morrer de uma forma ou de outra. Um membro
da equipe de Vladimir havia sido assassinado a sangue-frio. Era tudo o que Galathea
precisava para ordenar uma execução sumária, mas a equipe e a missão não eram
dela.

Ela respirou fundo e então perseguiu seus próprios objetivos.


Certificou-se de que estava devidamente selada antes de fechar os filtros de gás,
impedindo que qualquer ar entrasse ou saísse dali. Era basicamente uma função
rebreather do capacete.

Galathea se lançou na água. Ainda estava muito rasa para nadar confortavelmente,
então ela mais se arrastou do que nadou até a abertura no casco. Segurou-se na
abertura, passando seu corpo para fora. Agora flutuava em um mar profundo e
escuro. Ativou a visão de calor e ficou ali por alguns instantes, segurando no navio
com certa apreensão antes de soltar o ponto seguro, especialmente sem ter
localizado Rodrigo. O infravermelho não funcionava adequadamente dentro d'água,
mostrando apenas tudo como frio. Galathea então optou pela segunda opção e ligou
as fibras de LED presentes em sua roupa da Uroboros.

400 mil lúmens, uma ferramenta simples e muito útil para cegar inimigos em um
tiroteio. Afinal, não era fácil mirar ou sequer olhar para um oponente que
repentinamente brilhava como o sol.

A água se iluminou quando ela brilhou como uma estrela, revelando todo o lixo e
poluição presentes ali. Para todos os lados que olhava, havia algo flutuando, até
mesmo algum movimento da vida marinha.

Quando finalmente notou algo vagamente parecido com um humano, a morena


nadou em sua direção. A sombra grotescamente enorme do navio estava acima dela
e ela podia ver formações de corais no casco enquanto lutava contra o peso e a
densidade de seu corpo, o que tornava o ato de nadar ainda mais difícil.

Não sabia se o encontraria com vida, mas se estivesse, Rodrigo e Roberto ficariam
me devendo. Caso contrário, ela se asseguraria de que ninguém além dela tivesse
acesso ao DNA e corpo do mutante. E, quem sabe, talvez eu possa começar a me
interessar pelos negócios da família, pensou. Mentia para si mesma, é claro. No
fundo, não tinha interesse algum em ciência.

Seu objetivo era recuperar Rodrigo, ou seu corpo, e armar explosivos no casco para
abrir outra passagem de volta para o navio. Explosivos extras sempre são úteis.

Gal Bordeaux
Muita, muita coisa aconteceu. E foi de difícil assimilação para a loira, acostumada a
usar seus poderes (ou ser usada) para pegar coisas através de paredes ou cofres e
trancas e depois sumir, como uma ladra gatuna. E agora estava em um navio ao lado
de pessoas tão insanas quanto ela, arriscando a vida pra evitar que o navio
nazisoviético usasse suas diabólicas coisas na cidade que não amava, mas que era
a única que tinha. Vilão enfraquecedor, morto; vilão espadachim, morto; agora o
vilão gasoso.. Uma explosão (intencional). Gal se abaixou e usou sua intangibilidade
para se proteger dos possíveis destroços. Nesse momento, de desespero, não levou
ninguém consigo naquela intangibilidade. Não por egoísmo, e sim por nervosismo.
Na verdade, uma ausência de sentimentos. Talvez estivesse em choque.

E foi num dos cantinhos junto à grade, quieta e alheia a todo inferno que acontecia
ao redor, que se atentou para o que a voz no auto-falante pronunciou. Sibilou
sozinha, baixinho, para si mesma. — "Henry Choi falou o quanto a loira ficou
impotente quando confrontou o radiack". — Não, ela não sabia o que era radiack,
mas não foi difícil concluir que ele se referia à composição da fumaça. E como dois
e dois, se ela se dirigisse a ela, como o metamorfo fizera, também seria danificada.
Talvez fosse algo que danifica pessoas como eles dois. Diferentes.

— Oh, certo... — Ainda murmurando sozinha, Gal permanecia abaixada e sentindo-se


inútil enquanto observava os outros agirem ao seu redor. Viu Irvine pegar X-9,
apenas para vê-lo ser devolvido. Testemunhou Max montando seu canhão
improvisado para atravessar as grades do navio “Por que ela não pensou nisso
antes?” E então, Galathea, a mulher que assumiu o lugar de Montana, mas que agora
parecia ser substituída pelo italiano que lançou a bomba. Esse italiano havia
chamado atenção desnecessariamente com seu hovercar no início deste capítulo, e
agora estava lançando uma bomba. Embora Galathea fosse muito mais preparada
do que ele, parecia que ela não queria assumir o comando. Neste momento, não
havia nada que qualquer um pudesse fazer - especialmente a loira, que, se antes
estava interessada na proposta financeira de Vladimir, agora só desejava sair
daquele lugar com vida.

O que Irvine não sabia, nem Gal, talvez nem os outros membros desse grupo, era
que a bomba lançada pelo "italiano" impetuoso teria efeitos semelhantes à sua
personalidade. Quando explodiu, além dos efeitos desastrosos já conhecidos,
poderia ter uma consequência positiva: o calor. A explosão geraria um intenso calor
naquela região envolta em fumaça. Isso aqueceria a névoa esverdeada e faria com
que o ar quente da região, incluindo eles próprios, se elevasse, tornando-se menos
denso devido à dilatação causada pelo calor, graças a um princípio físico conhecido
como convecção térmica. Essas leis físicas provavelmente continuariam existindo
naqueles tempos futuros, uma vez que a gravidade persistia.

Com isso, o grupo teria apenas que se preocupar com a água pútrida da baía, pelo
menos por enquanto, já que o ar quente e tóxico os manteria um pouco afastados,
pairando no alto. Enquanto isso, a loira etérea observava a ação da morena com
quem compartilhava o nome. Ela tinha a intenção de salvar Rodrigo, ou pelo menos
o corpo dele. Lembrava-se do que o garoto de programa havia dito dias atrás,
quando o misterioso russo os convocou para a missão suicida. Foi Rodrigo que a
convenceu. Ela também precisava fazer algo.

— Ei, me espera! — Falou alto para a que se lançava na água em busca do possível
corpo dele, mas aparentemente não fora ouvida.

De qualquer forma, Galathea usou sua intangibilidade para mergulhar na água, já


que nesse estado não precisava respirar. Estava escuro, mas conseguiu localizar Gal
graças às fibras LED presentes nas roupas da Uroboros que ela carregava. Ela tocou
seu ombro, tornando as pontas dos dedos tangíveis por um breve momento. Se
Galathea virasse, poderia ver Gal - já que ela estava intangível, não invisível. Galathea
acenou positivamente, mostrando seu apoio e disposição para ajudar na busca pelo
corpo de Rodrigo, vivo ou morto.

Caso conseguissem encontrá-lo, havia uma chance de ele estar vivo. Rodrigo não
era imortal - tanto o gás tóxico quanto a explosão certamente teriam causado danos
severos. No entanto, seu corpo não era humano, suas células não funcionavam da
mesma forma que as de um humano comum. Seu corpo estava em constante
mudança e, portanto, podia se curar em escalas menores e mais rápidas, devido à
velocidade aumentada do trânsito celular. Essa capacidade morfológica permitia
que o corpo de Rodrigo se recuperasse mais rapidamente, criando novos tecidos
orgânicos e garantindo sua sobrevivência. Suas habilidades nunca haviam sido
testadas a esse ponto, mas a capacidade estava lá. A questão era saber se seria
suficiente.

Depois de encontrarem o corpo de Rodrigo, seja ele vivo ou não, Galathea seguraria
na outra Gal (e em Rodrigo, se ele estivesse lá) e os tornaria intangíveis, para que
pudessem retornar ao local de onde vieram. Dessa forma, não haveria necessidade
da mafiosa implantar os explosivos planejados. Caso ela tenha feito isso de
qualquer maneira, Galathea tentaria convencê-la, por gestos, a desistir da ideia. Em
seguida, eles retornariam juntos ao local onde estavam, mais especificamente perto
de Max, que estava determinado a criar uma outra saída.

Narrador
As coisas não ocorriam como o planejado, ver seu soldado se suicidar deixou o
experiente soldado Vladimir realmente sem saber o que fazer. Ele se manteve
olhando o sangue e miolos do agente escorrer preguiçosamente pela parede, quase
não respirava. Mas o medo as vezes força as pessoas a mostrarem seu pior, em
outras faz emergir o melhor.
— Será que elas vão conseguir? — Perguntava X-9 para Vladimir, se referindo a
Galathea e Gal, porém o russo estava ocupado demais com seus pensamentos para
responder.

O terror batia Vladimir, até mesmo um militar com um invejável currículo não estava
preparado para tudo. O russo queria viver como todos ali, por outro lado, recuar
significava falhar a missão, e tinha tanto desejo de cumpri-la como de sobreviver.
Seu transe foi quebrado quando a luz do laser invadiu seu campo de visão e nele viu
um fio fino de esperança. Alguém conseguiu pensar em uma alternativa que não
envolvesse explosões e isso se provou bastante promissor, tanto que um sorriso de
alívio se estampou na face calejada pelo tempo. O homem de cabelo e barba
grisalha não dizia nada durante o período que Max cortava as barras, no entanto o ar
de maior preocupação parecia sumir durante aqueles instantes. A garantia podia ser
pouca, mas melhor do que nada. Para a sorte do grupo, Viktor F. Landa fora
confiante demais e não fez as grades de alguma liga reforçada ou de radiack puro.

Entendendo como um desaforo para com seu chefe, o italiano com a Claymore
regressou para onde os outros estavam, a fim de trazer X-9 de volta mesmo que a
força, esquecendo que portava a espada do Guerra. Mas parou e assistiu as barras
sendo vencidas por Max e sua arma. Quando foi possível passar uma pessoa pelo
vão que o laser fez, Vladimir solicitou a Claymore do italiano. Primeiramente o
homem se negou, todavia, depois que o russo despejou um olhar intimidador capaz
de deixá-lo de cabelo em pé, a arma branca foi entregue ao soldado. Com sua força
o mais velho aplicou um corte na transversal em direção a maçaneta. A fenda
danificou a tranca, e mais uma vez para a sorte de todos o matérial não era
reforçado tão pouco especial. Landa subestimou o grupo mais uma vez, jamais
imaginou que seriam capazes de atingirem a porta. Com um ponta pé Vladimir abriu
passagem, e o nível do alagamento que estava novamente na cintura diminuiu.
Ainda não dava para saber se o próximo setor se tratava de um saguão ou uma
pequena sala, portanto a locomoção até o outro andar precisava ser executada
rapidamente antes que fosse também alagada.

Enquanto isso, do outro lado do corredor, X-9 encarava a situação de risco que era
mergulhar nas águas sujas do alongamento para ajudar Galathea e Gal no resgate
de Rodrigo assim que voltaram para o casco. Seu ferimento viria ser uma via para a
entrada de bactérias e impurezas no organismo. Não ligava, completou a tarefa
ajudando a puxar Rodrigo para superfície e depois auxiliou as duas mulheres a
emergir após o resgate.

Junto delas ela carregou o rapaz, Rodrigo estava severamente mutilado e com
múltiplas queimaduras. Vladimir manteve a entrada aberta para que todos
trocassem de nível e quando foi a vez de X-9 ela parou, questionando-o.
— Você não pareceu muito comovido ou apto a ajudar, ficou preocupado demais
com essa porta não é? Militares... — O mais velho não respondeu, só mantinha a
passagem acessível segurando a porta com um braço enquanto a água ia entrando
para o andar seguinte.

— Vamos levar ele junto e isso não é uma permissão, ok? E Irvine? — Indagou
jogando o moicano molhado para o lado.

— Se ele quiser pode vir conosco, não vou impedir apesar da insubordinação, mas
acho que já fez sua escolha. — Olhou de volta para o lado oposto do corredor.

Depois que todos finalmente passaram, o russo fechou a porta. Ele não estava
enganado, aquela era uma pequena sala de controle por onde Landa controlava
tudo, possuía monitores e auto-falantes, painéis de controle e fios. No entanto ao
perceber que seria caçado tratou rapidamente de fugir abandonando o lugar. Viktor
agora não tinha mais a situação sob controle.

— Tome, faça bom uso. — Vladimir entregava a Claymore para o capanga italiano.

— Camaradas. — Ele empurrou a próxima porta que Viktor deixou aberta devido ao
desespero

Atrás dela, havia uma escada que levava a um ambiente onde se podia respirar
muito melhor do que no estreito corredor anterior. Diferente deste último, aquele
andar parecia ter uma atmosfera mais militar do que cirúrgica, embora ainda
houvesse elementos deste último, como mesas, camas e equipamentos cirúrgicos
em algumas partes. O perigo causado por Pestilência havia sido superado, mas não
havia comemoração. Além das perdas, todos pareciam bastante irritados e
cansados.

Ao atravessar a extensão do andar, X-9 notou uma área que parecia ser um hangar.
Por ordens de Vladimir, seus soldados renderam as pessoas responsáveis pela
manutenção dos aviões de combate. A operação foi fácil e não houve resistência
por parte dos funcionários do hangar. Mais adiante, X-9 avistou algo que talvez não
significasse muito para muitos, talvez apenas uma máquina de guerra antiga, mas
para ela possuía um grande simbolismo. Era um robô gigante, com traços rústicos,
medindo mais de três metros de altura e bem armado. Ela ficou paralisada ao ver
aquilo. Depois de alguns segundos, voltou a comentar com sua amiga Max.

— Eles tem um tipo próprio de Necroide Alfa…. Que merda isso… Ainda bem essa
coisa tá desativada… Assim espero ao menos...
Ela continuou a caminhada, mas olhando para trás, certificando-se de que o monstro
mecânico não se moveria após a passagem, algo que não a surpreenderia, os
necroides que conheceu eram cheios de surpresa e artimanhas. Diferente do que
imaginou o monstro mecânico permaneceu inativo encostado na parede. Mais a
frente existiam máquinas que remetiam novamente a um hospital. A que mais
chamava a atenção se tratava de uma grande cápsula cilíndrica metalizada. Na sua
frente continha um vidro de formato oval levemente azulado. Vladimir sinalizou
silenciosamente com um gesto facial para o soldado ao seu lado, este foi até X-9,
Galathea e Gal, tomando Rodrigo dos braços e antes que protestassem, Vladimir se
pronunciou.

— Ele é médico da infantaria paramilitar, essa cápsula pode manter Rodrigo vivo até
sairmos daqui. É melhor do que carregá-lo sangrando até a morte.

Como era especialista naquilo, não se esforçou muito para ligar o equipamento,
abriu também o seu enorme compartimento central e depositou o metamorfo no
interior da máquina e a fechou. O soldado deslizou os dedos pelo gabinete de
controle, uma máscara caiu conectando-se ao rosto do rapaz e um líquido incolor
inundou o interior da cápsula. Pelo vidro oval podia-se ver Rodrigo flutuando com
bolhas a sua volta.

— Isso não vai mantê-lo vivo. E nem vocês. — Quando falou, uma sombra surgiu
dentre os aparelhos, era Landa com seu jaleco branco sujo de sangue.

Acham que se livraram dos efeitos do meu filho Pestilência, mas não. Todos tiveram
contato com a água. O gás também se misturou a ela. É claro que se diluiu um
pouco, e isso reduziu seu efeito, é verdade, mas ajudou seus corpos absorveram as
doenças sem necessidade de respirarem. Vai demorar um pouco, algumas horas,
talvez alguns dias, não importa! Sem um antídoto estão todos condenados! — Xiaren
empunhou seu rifle em direção a Landa, Vladimir bloqueou empregando o cano da
arma para baixo.

— Espere. Landa é o único que pode criar uma vacina, precisamos dele vivo.

O russo tirou da cintura um par de algemas e se aproximou de Viktor, que não


mostrou resistência. Apenas falou.

— Não irei ficar parado esperando os dias passarem, nem tão pouco me deixar ser
preso, sou um homem ocupado e bastante apressado. Por isso vou convidar minha
filha mais nova para se juntar a festa e acelerar o serviço do irmão dela. Morte, por
favor? — Por causa do escuro, não dava para notar seu rosto, ainda mais porque se
fardava de negro.

— Exclamou X-9

Porém, assim que saiu da penumbra, a filha de Landa não parecia uma mulher, sua
aparência esquelética, sem cabelos, de orelhas pontiagudos, sua pele branca e as
tatuagens no rosto que simulavam ossos de uma caveira mais os olhos azuis
brilhantes como néon reduziam a feminilidade de Morte a quase zero. Seu corpo
nem mesmo tinha volume de seios ou curvas, a mulher era tão magra quanto feia.

— É uma boa noite para morrer. Pai, pode deixar comigo, não vou falhar como meus
irmãos. — De novo como um rato ou uma barata, Viktor F. Landa se esgueirou pelas
sombras sumindo antes que Morte tivesse finalizado.

— Deixa comigo! É minha vez! — O italiano com a Claymore ergueu a espada acima
da cabeça e desferiu um corte, Morte deu um passo para trás, deixando que a
espada cravasse no chão e ficasse presa. O italiano tentava removê-la fazendo
força. Morte deu um passo a frente voltando a posição inicial.

— Ah, como o jovem Arthur na lenda de Excalibur, mas desta vez, sem final feliz. —
Morte tocou no ombro do italiano com a ponta esquelética do indicador e o italiano
soltou o cabo da espada, caindo morto no chão.

— O toque da Morte. — Ela disse olhando o cadáver e então esticou a destra para
alcançar o cabo da arma mas Calidora intervenho.

— Engole isso, feiosa!!! — Ela apontou pistola e junto dos seus soldados abriu fogo
contra a Morte, fuzilando a mulher de aparência frágil que saltou do outro lado, com
o corpo perfurado feito peneira e sangrando.

— Vadia! — Suspirou Calidora.

Dois de seus homens se aproximaram checando se a mulher estava morta. Não


precisava humanamente era impossível sobreviver a um fuzilamento, porém os
cavaleiros se mostraram anormais como experimentos. Contrariando as regras da
lógica, o azul néon dos olhos iluminaram o ambiente escuro. Morte puxou os dois
soldados para perto com cada uma das mãos e os homens caíram mortos como o
italiano.
— Meu pai não falou dos meus dons. Além do toque mortal, possuo imortalidade! —
Ela se ergueu e as feridas expeliram os projéteis das balas e os orifícios
cicatrizaram.

— Tornarei isso divertido para todos, mas principalmente para mim. Eu deixo vocês
correrem e se esconderem enquanto chego perto. Preparados ou não, lá vou eu!
Boooo! — Debochadamente, Morte ergueu os braços acima da cabeça, caminhando
lentamente assim, simulando os monstros de filmes clássicos de terror enquanto se
aproximava do grupo bem devagar. Ela parecia se divertir como se aquilo fosse uma
brincadeira.

Gal Bordeaux
"Esqueça a coroa, princesa. Você foi esquecida no churrasco." Se houvesse uma
expressão moderna para descrever a situação em que a loira se encontrava, seria
essa. Há apenas alguns meses, sua fama a precedia, sendo uma das poucas
meta-humanas conhecidas, com um dom especial. Mas diante dos Quatro
Cavaleiros, ela não parecia tão poderosa assim. Ela não associava os inimigos que
enfrentava a figuras bíblicas, simplesmente por falta de conhecimento. Mas ao
testemunhar as ações da Morte, principalmente, ela sentia que estava realmente
chegando ao fim de seus dias.

— Talvez ela não fosse tão imortal como diziam — Afinal, a propaganda engana. Mas
ela provava sua resiliência quando conseguia permanecer de pé e desafiadora após
ser alvejada por tiros de seu adversário. O inimigo já havia tirado a vida de vários
soldados e, aparentemente, até mesmo do italiano briguento. — Bem, droga —,
murmurou, avaliando a situação. Ela não queria agir como heroína e acabar como o
metamorfo. Ao mesmo tempo, esperar por um milagre não adiantaria nada. "Certo..."

Ela se posicionou à vista da Morte, saindo de trás de um dos diversos objetos


naquele andar. — Você quer brincar de esconde-esconde nessa altura? Faça um
favor pra gente e acabe logo com isso — Provocou, esperando despertar o interesse
da Cavaleira e incentivá-la a perseguir os invasores. Excessivamente confiante em
suas próprias habilidades e talvez desconhecedora das de Bordeaux, Gal previa que,
quando a Morte se aproximasse, se é que se aproximasse, ela se agacharia e tocaria
o solo. Manipulando a densidade daquela parte específica do chão onde a Morte
estava, Gal a tornaria intangível, fazendo-a cair para o andar de baixo.

No entanto, quando a Morte estivesse na metade da descida, a loira solidificaria


aquela parte intangível, aprisionando o corpo da Morte. Ela talvez não sofresse
nenhum dano, mas ficaria para sempre presa naquele chão, incapaz de se mover. A
manobra de Gal se assemelhava a uma que ela havia executado há algum tempo
atrás contra o sicário que enfrentou na Cosa Nostra. Isso os livraria
temporariamente do ataque mortal da quarta Cavaleira. E quem sabe, com seu
corpo parcialmente exposto e suas moléculas desestabilizadas, sua imortalidade
poderia enfraquecer, permitindo que os outros se juntassem e pusessem fim à sua
vida. "Você não vai encostar em mais ninguém, sua vadia!" comemoraria se sua
manobra atingisse seu objetivo. Então, ela se viraria para os outros. "Ataquem com
tudo!" No caso de sua manobra não ter sucesso, ela tomaria as precauções
necessárias para manter distância do toque letal da Morte, pronta para fugir e
atravessar objetos, se necessário.

Narrador
O corpo de morte afundava no metal sem que pudesse fazer nada. A estranha
mulher não conteve o olhar de espanto, sem entender, certamente subestimou seus
inimigos e agora pagava caro ficando presa ao chão do andar. Gal foi astuta e certa
na estratégia, não havia necessidade de vencer a Morte, bastava apenas barrá-la.

— Não, não, não! — Incorporada ao chão ela batia as mãos contra o metal, tentando
se libertar, inutilmente.

— Cadê sua cara de deboche agora? — Sorriu X-9 tripudiando a inimiga indefesa.

— Deixem ela aí, não é mais necessário esse combate. Vamos ao encontro de
Landa! — Gesticulou Vladimir, estava inconformado por ter se infectado e ansiava o
encontro com Viktor.

— Onde vocês vão? Não terminou!!! — Vociferou Morte.

— Ah, terminou sim. — Ao lado de Vladimir, X-9 passou, Morte tentou alcançá-la mas
a hacker desviou mostrando o dedo do meio depois.

Guiados pelo agente da Paramilitech, eles continuaram a caminhar pelo andar, até
que encontraram Viktor atrás de uma mesa de laboratório e diversos tubos de
ensaio, ele não parecia temente frente ao grupo.

— Vocês estão prestes a conhecer… — Com um controle preto na mão, Landa


apertou um botão e atrás de si, uma porta secreta se abriu. Sem delongas do interior
daquela passagem surgiu uma figura feminina conhecida de X-9 e principalmente de
Xiaren. Essa figura se posicionou frente ao grupo e mostrou suas armas.

— Achei que essa praga tivesse morrido… — Comentou a hacker para si mesma.
— É você! — Surpreso Xiaren exclamou com alegria.

— Eu induzi sua assassina a um tipo de transe, ela não é mais a mesma pessoa.
Querida, mate todos eles! — Com a ordem todos ergueram suas armas na direção da
japonesa, Xiaren gritou.

— ESPEREM!!! Não atirem! Quero falar com ela antes. — Ele ergueu as mãos pedindo
que o fogo fosse aberto contra a oriental. Em passos lentos ele se aproximou dela
para conversar.

— Caz me contou o que você fez por ele, você mesma fez por sua vontade, o salvou
sem se importar com a Green Box. Eu não sabia que ainda estava viva, muito menos
na Rússia…. — Mas foi interrompido por Landa.

— O que está esperando? Mate ele!!! — Ordenou a ela.

— Só você sabe o que passou nas mãos desse monstro. Não precisa obedecer, esse
doente não é nada seu. Você não é escrava de ninguem. — Ele ia se aproximando.

— Mate ele!!!! — Insistiu Viktor.

— É livre, se desejar não precisa trabalhar para mim também. Tenha sua vida, faça o
que quiser, só poupe um banho de sangue. — A Geisha parecia confusa, entre a
ordem de Landa e a de Xiaren. A lavagem cerebral que sofreu criava conflito de em
suas ordens primárias desde sua criação no laboratório da G.E.N.S. que era
obedecer seu “dono” em toda e qualquer situação. Essa ordem era impressa em
seus genes. Hesitante a oriental continha uma expressão vazia, como se sua mente
tivesse sido removida, sem vida ou alma. A “ordem” de Xiaren a submetia a uma
escolha, que teria privilégio acima da lavagem cerebral de Viktor, vencendo o
sistema mental implantado. As lâminas retráteis da gueixa se recolheram, e ela
virou-se para Landa e o imobilizou pelos braços com uma mão apenas, enquanto
que com a outra desferiu um murro no seu rosto. O susto tamanho não permitia o
cirurgião falar nada. Ela repetiria o golpe, porém Xiaren interveio.

— Precisamos desse verme vivo. Depois você pode se vingar pelo que ele fez. —
Xiaren olhou para Vladimir e esse se pronunciou.

— Qual seu truque agora, Viktor? Estou esperando. — Cruzou os braços, Vladimir. —
Mas não obteve resposta, Viktor não tinha mais truques. — Existe a possibilidade de
uma vacina? Você deve criou essa coleção de doenças, deve ter criado uma cura
também. — A gueixa o soltou para responder.
— É possível…. Nos meus gráficos biológicos, ela… Entre todos vocês foi a única que
não reagiu ao vírus. — Apontou para Max.

— Max é imune a névoa podre do Pestilência? Uma vacina pode ser feita a partir do
seu sangue. Me entregue esses dados. — Sem hesitar, Landa entregou a Vladimir um
holotablet que continha a porcentagem de contaminação de cada indivíduo. Onde
Max estava em 0%

— Se eu criar um antídoto, você não me mata? — Perguntou Landa com medo nos
olhos.

— É possível, agora nos guie até onde Yuric se encontra e sem truques ou não há
negociação. — Empurrou Viktor com a destra, forçado ele percorreu até o final do
andar onde se encontrava uma porta dupla de ferro em formato quadrado. Contendo
o código, abriu-a e todos desceram por uma longa escadaria até o último sub-andar
do navio.

Ao final das escadas existia outra porta exatamente igual à primeira e prestativo
graças a promessa de negociação, Viktor inseriu o código no display e a passagem
se abriu. O interior da sala era escuro mas notava-se ser maior do que todos os
anteriores. A única luz que existia era vinda de cristais ao centro do andar onde ao
meio de quatro pilares um triângulo com um círculo vermelho dentro de um
hexágono negro flutuava suspenso no ar. Dois soldados nazisoviéticos faziam
ronda, subindo e descendo os degraus que dava acesso ao artefato. Apesar da
invasão eles ignoraram a presença do grupo. Uma voz masculina invadiu sua sala.
Não restava dúvidas, se tratava da voz do chefe dos Bravtas.

— Um grupo de vagabundos conseguiu chegar até aqui… Vladimir seu traidor, se meu
humor não estivesse péssimo lhe daria a chance de se desculpar pela mãe Rússia.
Trigger… — Com o pedido um tiro vindo praticamente do nada furou o aço perto dos
pés de Vladimir. Ele não recuou.

— Trigger é o atirador que matou Tony, isso mostra a mestria que ele possui com
armas de fogo.

— Foquem no atirador, procurem ele! — Ordenou Vladimir aos soldados baixando um


visor frente aos olhos que parecia um tipo de óculos simulador de realidade. Eles
vasculharam a área mas foi o próprio russo que encontrou o sniper.

— Atrás dos pilares! — Tanto Vladimir quanto seus homens abriram fogo contra
Trigger, que não fez um movimento ou tentou se esconder. Os tiros passaram por ele
desviando e atingiram as paredes.
— Você não aprende mesmo, Vladimir, a disputa no Olimpo não te ensinou nada? O
traje de Trigger é magnético e repele balas de todo o tipo, custou caro mas valeu a
pena. Se quisessem, já estariam mortos! — Enquanto Yuric se gabava, a gueixa não
ficava parada, projetou as lâminas para fora dos dedos e começou a caçar os
soldados a volta do triângulo. Neutralizava as ameaças como uma nata caçadora,
antes que Yuric comandasse um ataque. Silenciosamente ela mutilava os guardas
sem expressar emoção. Yuric ficou impressionado com a ação da japonesa e
ordenou sua morte.

— Trigger, dê um fim naquela ali. — Apontou para a oriental.

No entanto, o restante não ficou parado. O grupo de Calidora, a Ryulong, os latinos e


Oroboros agindo em cooperação dispararam contra Trigger, mesmo sabendo que as
balas seriam repelidas. Pelo menos o fator psicológico do tiroteio atrapalharia a
concentração do atirador de elite. Aqueles que não estavam envolvidos no tiroteio
buscaram abrigo para evitar serem alvejados.

— Não vou ficar parada. — Disse X-9 para Max.

Apesar de sair de trás do abrigo, ela não sacou suas armas, mas desapareceu na
penumbra. Trigger derrubava alguns soldados da Paramilitech, Ryulong, dos Los
Zetas e de Calidora. Mais soldados nazisoviéticos invadiam a sala, reforçando a
segurança, e a gueixa cuidava deles. Dentro da confusão, Yuric se revelou sentado
em um trono de ferro, no fim do andar. Tratava-se de um lugar escuro, afastado do
restante do ambiente. Ao seu lado, estavam o Turco, Boris e Vegan, o gênio tenaz da
robótica que foi sequestrado e projetado a maior parte do sistema do navio. Ele se
mantinha ao lado inimigo contra sua vontade. Diferente de Landa, que, usando a
oportunidade, escapava das mãos de seus algozes, mostrando total lealdade aos
russos.

— Cessar fogo!!! — Ordenou Yuric erguendo-se do trono ao notar que mesmo com
reforço a disputa se mantinha equilibrada. — Eu mesmo vou cuidar desses merdas!
— Nem todo mundo sabia, mas Yuric possuía uma prótese no lugar do braço direito.
Com as melhorias de Vegan, havia projetado um canhão de plasma a base de
radiack e adaptado ao braço mecânico. Uma luz verde intensa emanava da prótese
apontando na direção do grupo reunido por Vladimir. Antes de disparar Yuric
precisava carregar o disparo, mas aquele disparo poderia levar todos em sua mira
para o além.
— Se você quer algo bem feito faça você mesmo!!! — Falou com empolgação na voz.
Contudo, algo aconteceu, o disparo não aconteceu e o canhão de plasma de radiack
cessou o carregamento da carga.

— Mas que merda…. O que foi isso? TRIGGER, TURCO, ATIREM!! — Turco tinha uma
versão compacta, menor e menos potente que Yuric em seus dois braços que foram
arrancados pela gueixa um ano antes. Seu mecanismo também não funcionou. Mas
o mais estranho, a arma de Trigger também não funcionava naquele momento e ele
não entendia como.

— Atirem logo! — Mandou Yuric, estava tão confuso quanto os dois, e igualmente
irritado.

Então, Trigger foi alvejado no braço, o que indicava que até seu traje estava com
avaria. Em seguida, foi a vez do Turco, que também não obteve sucesso. Boris
sacou sua pistola, mas, assim como as outras armas, mesmo puxando o gatilho,
não conseguiu atirar. Boris se desfez das pistolas e puxou Vegan e Viktor pelo
pescoço, se escondendo atrás do trono de ferro. Yuric fez o mesmo. Eles não
compreendiam o que estava acontecendo.

— Esses caras são muito burros, apostaram tudo nesse programa lixo do navio.
Confiaram tanto que optaram por se desfazer de munição real, tendo a energia do
navio como alimentação para as armas e trajes! Hauhauhauhauhauha, desativei
todo o sistema do Do Svidaniya!" — Sem esconder o orgulho em seu sorriso após o
feito, dizia X-9 abaixada no centro dos degraus, com os cabos dos plugs laterais de
sua cabeça conectados no artefato triangular suspenso entre os quatro pilares,
digitando nas teclas de sua manopla algo que só fazia sentido para ela.

— Tá certo, fim do jogo, eles estão indefesos como bebês! — Mudando totalmente a
expressão, ficou séria após puxar os fios de cabeça e se erguer.

— Terei minha vingança. — Caminhou até o trono, Yuric tentou um soco mas foi
golpeado antes com um tapa que o jogou de costas contra uma parede. Trigger
também tentou revidar e teve o mesmo fim. Puxou Landa pelo colarinho e o jogou de
volta para onde seus colegas estavam, a queda deve ter quebrado um par ou dois de
costelas de Viktor, todavia seu foco era Boris.

— Finalmente nos reencontramos! É hora de conhecer a dor... Muita dor... — Disse a


Boris encarando com um olhar que poderia incinerar o outro russo. Ela se aproximou
dele, pegando-o pelo rosto, o encostando na parede, com a outra sacou a desert
eagle e fincou o cano abaixo do queixo. Boris suava frio.
— Ainda não!! — Uma voz vinda de uma porta alertava. A baixa luminosidade não
permitia a hacker visualizar quem era.

— Caz tem contas a pagar com Boris também. — Caz saiu de trás da porta mas a
voz não era dele.

O detetive tinha um curativo no olho, se aproximou do russo, X-9 permitiu, estava


curiosa com a voz misteriosa. Caz ficou cara a cara com o homem que lhe torturou.

— Não vou demorar muito, só vim tomar algo que Boris me deve. — Caz tirou uma
colher do bolso, Boris sabia o que aquilo significava, ele arregalou os olhos e quando
fez isso a colher foi inserida no globo ocular esquerdo e puxado para fora do rosto,
ficando pendente apenas pelo nervo óptico. Com força o policial puxou deixando
para traz uma órbita vazia e cheia de sangue. Ele colocou o olho ensanguentado
dentro de um pequeno pacote de plástico e deu as costas.

— Só queria isso, ele é todo seu. — Falou para X-9

— Caz… Você anda muito violento. Você não era assim, tsc, viu o que causou andar
com esses russos escritos? — Enquanto Boris gritava pressionado o fluxo de sangue
da órbita vazia o dono da voz se revelava saindo das sombras. O típico humor negro
não poderia ser de ninguém menos do que Tony Montana, ao seu lado estava Akane
e Irvine, seu primo. Junto deles boa parte da Cosa Nostra os acompanhavam. Eles
vieram de outro acesso não usado do navio.

— Ahhahahahaha, olha a cara do Yuric, Caz, o filho da puta não tá entendendo nada.
Acho que ele merece uma explicação. — Montana foi até onde o russo estava e se
posicionou frente ao mesmo e cravou no piso a espada do cavaleiro Guerra. Depois
voltou o olhar ao inimigo.

— Quando aquele bostinha do seu atirador me acertou eu fui sagaz, vi a


oportunidade perfeita para usar isso contra você. Eu sabia que se acreditasse que
havia me matado soltaria o Caz. E bastou só a substância vinda do baiacu cedido
por Baron... Alguma coisa... Aquele sujeito estranho que nos ajudou no aeroporto,
para que assim Akane e eu pudéssemos simular nossas mortes. Até o médico
legista acreditou, você caiu como um pato. Olha sua cara de cu, acreditou mesmo
que havia matado o grande Tony Montana? Só que não! — No final da frase, a voz de
Tony tomou um sinistro tom gutural e segurou o russo pelo pescoço, enforcando.
Quando Yuric quase perdeu a consciência pela falta de ar o italiano soltou e
começou a aplicar socos sem parar, castigando seu rival com uma surra
descomunal na frente de todos.
— Mas não vou te matar não… Eu só mato homens. — Ele cessou os socos e cuspiu
na cara de Yuric. Seu rosto estava demolido, só um dente restava na boca, suas
gengivas inchadas proporcionando muita dor. Muitos dos ossos da face estavam
fraturados e deforme. O nariz quebrado deformou-se. Uma das omoplatas com a
fratura do deslocamento projetou-se abaixo da pele devido aos danos. O russo não
conseguia falar e olha-lo dava pena. Tony deixou para traz seu rival e inimigo
passando por Trigger, lhe dando um soco também, jogando o sniper desacordado
no chão. O mafioso se dirigiu até Jesse, Vladimir removeu as algemas e este
abraçou seu patrão.

— Senhor Montana, fiz tudo o que me pediu. Também segui a risca as regras de
Vladimir, nós éramos os únicos que sabiam que não estava morto. — Tony não disse
nada, manteve o abraço, Jesse fez o cumprimento da Cosa Nostra, beijando a face
de Montana. Nesse momento o barulho de um tiro rompeu o silêncio, e Jesse se
afastou caminhando para trás dando três passos com a mão na barriga. A fumaça
saía do cano da pistola de Tony.

— Não, você quase pôs tudo a perder. Desobedeceu Galathea, Vladimir e meu primo.
Já ouviu dizer que para conhecer a real face de um homem basta lhe dar poderes?
Pois eu não gostei do que você se tornou. — Ele guardou a arma no coldre.

— Tony… Porque…? — Jesse caiu de joelhos pressionando com as duas mãos o


sangrando.

— Eu já expliquei, se você não entendeu não perderei meu tempo repetindo. Vamos
Caz, precisamos consertar essa vista, isso tá me dando uma agonia tremenda. —
Tony deu um leve tapinha no ombro do seu amigo e abraçou Akane, se retirando pela
mesma porta que entraram. Antes, com gestos, ordenou a seus capangas que Yuric
fosse amarrado em um dos pilares.

— Agora é com você. — Disse para seu primo Irvine. De longe fez uma reverência
militar a Vladimir. O russo correspondeu e foi até Landa, o juntando do chão.

— Use seus recursos e comece imediatamente uma vacina. — Viktor deu uma
gargalhada alta, com a qual lágrimas saíram dos olhos. Vladimir não entendia o
motivo dos risos até que Landa explicou.

— Acreditou mesmo que existia uma cura? Eu não desenvolvi uma e nem faço idéia
de como criar. Ahahaha, vocês todos vão morrer, mesmo com o sangue imune da
garota. — Apontou novamente para Max.
— Está querendo me dizer que não consegue criar a única coisa que ainda te
mantém vivo? — O russo fitou-o com desprezo.

— Ahahaha, exatamente! E tudo ainda fica mais engraçado sabendo que no final
nem a Green Box você vai recuperar, esse triângulo ridículo criado por Vegan é só
uma fonte barata de energia baseada nela, ahahaha. Mas perto da Green Box ela é
medíocre! — Vladimir se virou aos seus aliados.
— Camaradas, hoje, dentro desse navio, nós seremos lei. E o primeiro a entender
isso será Viktor F. Landa! — O cirurgião cessou a gargalhada.

Essa é a reta final de Ruas de sangue, como recompensa vocês poderão selar os
destinos de Yuric, Trigger, Viktor, Boris e Turco, sem a necessidade de rolar dados.
Vocês poderão tortura-los, questioná-los ou executá-los, assim como simplesmente
perdoa-los. A única regra é que cada jogador só pode escolher um destes
personagens.

Ps: Boris é da X-9.

Gal Bordeaux
Após a vitória contra Morte – pelo menos a não sucumbência para a vilã, pelo
menos – o grupo seguiu Vladimir e chegou ao que parecia ser a última parada
daquela incursão. Uma nova confusão tomou o lugar, mas dessa vez a
meta-humana se absteve completamente, encontrando abrigo atrás de uma das
diversas pilastras que havia pelo lugar. Tinha um considerável apreço pela vida e não
iria se arriscar a esse ponto. Os guerrilheiros que fizessem. Um pequeno banho de
sangue ocorreu novamente, mas dessa vez, o grupo invasor parecia obter êxito. X-9
teve sua vingança, Montana se mostrava vivo... Muitas reviravoltas. Mas o que
importava para Gal era a cura – se é que estava mesmo doente. De nada adiantava
salvar aquela cidade se não pudesse continuar viva para desfrutá-la – ou das coisas
que podia roubar.

Vladimir parecia estar prestes a atacar Viktor. A loira interveio. — Deixa eu tentar
falar com ele. — Deu um tapinha leve em seu ombro, como se quisesse confortá-lo e
afastá-lo. Assim, se ele concordasse em deixá-la com ele, a sós, ela se sentaria à
frente do doutor louco. O encararia seriamente por alguns instantes, talvez um
minuto. Ou dois. — Você é um homem diferente, não é? — Não esperou a resposta, o
encarando, ajeitando o cabelo e limpando o rosto para tentar parecer mais
apresentável como outrora. Antes disso tudo começar. — Não me leve a mal, por
favor. Não digo no sentido pejorativo. É difícil equilibrar uma grande mente como a
sua com as demais. — Falava sinceramente. Porém, ao mesmo tempo em que o
admirava pelas criações feitas, o abominava. Tentava ocultar a segunda parte do
pensamento. Sabia que com ele não adiantaria ser espancado até a morte. É capaz
até que esse maldito bastardo gostasse, visto a cena de sexo anterior com o corpo
da mulher morta. Um necrófilo. Ele gostava de coisas excêntricas, o desgraçado.

— O que era mais importante para você? O dinheiro, ou tinha alguma satisfação em
trabalhar para o Yuric, como algum tipo de patriotismo? Aliás, de onde você é?
Daqui, de Miraitropolis? — Permitiu-se sorrir para ele e mostrar-se o mais à vontade
possível, como se gostasse da presença do homem. Caso ele chegasse a perguntar
o motivo de suas atitudes amistosas, ela responderia com um sorriso de canto. —
Bom, se estou infectada, não vou morrer em um tiroteio para antecipar isso, né? E
você parece ser a única pessoa inteligente o suficiente para uma última conversa
decente. — Tentava não ser muito escancarada na bajulação, como quem conclui o
óbvio ao compará-lo com as demais pessoas presentes. Incluindo as do "seu time".
— Viu o que ele fez com o russo? Não havia necessidade alguma daquilo. —
Concluía verdadeiramente. — Aquele seria o seu destino. Mas acho um desperdício.
Falando em desperdício... — Abriu um pouco o zíper da jaqueta cor-de-rosa, o que
fazia os seios naturalmente se abrirem um pouco mais, criando um decote que
ficava à mostra. — Eu queria continuar viva. Você gosta de criar coisas, não é? Bom,
eu não sei se nasci assim ou se me modificaram para fazer essas coisas... — Se
aproximou dele, ainda sentada na cadeira, colocando as mãos sobre seus joelhos.
Depois levou uma das mãos até o tórax do cientista, fazendo-a ficar intangível e
penetrar sua caixa torácica. — Eu já matei gente desse jeito, sabia?

Ela então continuou com a mão dentro do seu corpo, descendo pelo seu estômago e
até que parasse "dentro" do seu pênis e virilha. Estava intangível ainda, então Landa
não conseguiria sentir nada fisicamente da parte dela — talvez só os próprios
estímulos cerebrais ao ver aquela cena. Talvez o homem gostasse, já que
demonstrara se excitar pelo peculiar. Retirou a mão de dentro dele e repousou sobre
uma das coxas, assim como a outra permaneceu fazendo. — É incrível, né? Nem eu
sei a extensão do que posso fazer. Por que não me ajuda com isso? Assim você de
repente pode reproduzir comigo. Digo! Hahahah Reproduzir isso que eu consigo
fazer, levar adiante. Me mantendo viva, podemos estudar e experimentar coisas.
Para isso, vou precisar do antídoto. Ou, se não tiver, que produza um para mim. Para
nós. — Ela agora deixou o tronco invisível, de modo que ele pudesse ver o encosto
da cadeira atrás de si. Mas ela continuava visível da parte dos seios para cima,
incluindo os braços. — Quase tinha esquecido disso. Essa coisa de ficar invisível.
Quando não preciso arriscar minha vida para salvar essa cidade de merda, acho
engraçado ver como as coisas conseguem entrar no corpo. Quer dizer... Ver lá
dentro, sabe?!

Riu fingindo estar constrangida. Antes de ser uma meta-humana, ladra, mercenária e
talvez heroína, Gal aprendeu a usar a sedução como uma das suas principais armas.
Certas vezes, somente com esse artifício conseguia se livrar dos problemas em que
se metia ou obter êxito quando não queria se cansar muito para realizar seus
trabalhos. No momento, sua intenção era ganhar alguma espécie de crédito, talvez
admiração, por parte de Viktor, e assim conseguir persuadi-lo a entregar o antídoto,
caso o disponha, ou criá-lo, de boa vontade, se não tiver de verdade, com a falsa
promessa de permitir que ele fizesse experimentos com ela — e talvez mais coisas.
Pressupôs que esse caminho devia ser tentado, já que quando teve sua vida
ameaçada — por mais de uma vez — o médico lânguido sempre conseguia escapar
ou parecia não se importar.

X9
Tomado pelo calor do momento, Boris ergueu o braço esquerdo para me acertar um
soco, na iniciativa de me pegar distraída enquanto ouvia o diálogo de Gal e Landa.
Dei dois passos para trás, deixando seu punho fechado passar alguns centímetros
do meu nariz. Percebendo que havia errado a investida, recolheu o braço
rapidamente, quem sabe para armar outra tentativa futura, mas meus dedos já se
fechavam firmemente em volta do seu antebraço, a ponto de lhe machucar, e ele não
pôde se movimentar.

— Esperei quase dois anos por este momento e acha que vou me permitir ser pega
desprevenida? — Respondi calmamente.

Contudo, o semblante de serenidade foi substituído por uma nova expressão. Uma
luz radiante emanou dos meus olhos, enquanto meus lábios se converteram em
uma linha reta e fina, e meu cenho se franziu. Minha respiração estava totalmente
controlada, e cada nervo estava pronto para agir em um impulso de ódio e vingança.
Em um gesto rápido, forcei o braço de Boris a executar o movimento inverso da
rotação do cotovelo. Ouviram-se um "CRACK" alto e seco. Dois ossos partidos se
ergueram da carne como lanças, indicando a dolorida fratura exposta. Boris gritou, e
eu soltei seu antebraço.

— Não vou me orgulhar do que farei, Boris, mas já cometi tantos erros, tantos
pecados, que talvez eu possa conviver com isso. — Agindo por instinto, Boris correu
e tentou se esconder atrás de um dos pilares centrais que mantinham o triângulo
suspenso, deixando um rastro de sangue da fratura exposta. Segui a trilha vermelha,
parando atrás de onde ele se escondeu.

— Não adianta se esconder, nada vai te salvar! — Puxei a katana da bainha das
costas e a cravei no pilar, entre as rachaduras. O sangue escorreu lentamente pela
lâmina da espada, enquanto se ouvia outro grito de dor. Deixei a katana ali e
caminhei para o lado oposto. Boris estava empalado e preso ao pilar pelo abdômen,
sangrando como um porco. Todo o risco tinha sido calculado, pois nenhum órgão
vital havia sido atingido. Aproximei-me dele, sacando novamente a pistola e
encostando o cano em sua testa.

— Não… Seria muito rápido… Me lembro de uma vez que você me bateu, quando eu
era mais fraca. Que tal quitar essa dívida? — Guardei a Desert Eagle no coldre da
coxa e cerrei os punhos.
— Um belo exercício para extravasar a raiva, o rosto que eu tanto persegui, que tanto
me assombrou virou um saco de pancadas.

Boris gotejando fluido vital vermelho da face cansada de apanhar, é isso que eu
chamo de justiça poética. Sua cabeça, pesada demais para se manter erguida,
pendia olhando para baixo, acompanhada de uma respiração profusamente
ofegante. Tudo indicava que ele estava semi-inconsciente naquele momento.

— Não, nada de dormir no melhor da festa!

Corrigir a postura pondo as costas ereta para trás empinando de queixo para frente
foi a maneira que encontrei para fitar meu nemesis cercado por uma poça escarlate.

— K’dore tentou me ferrar, eu pensei em matá-lo, mas quando percebi que deixá-lo
vivo na pobreza era pior que a morte, poupei sua vida. Ter o mesmo tipo de castigo
será interessante, acho que sei o que é pior pra você.

Com as mãos nuas, novamente inverti a rotação das articulações dos membros
daquele desgraçado. Além da outra fratura exposta, igual à primeira no cotovelo
sadio, Boris ganhava movimentos antinaturais nos joelhos, girando ao contrário e
estourando suas rótulas e tudo por dentro. Devagar, em longos e agonizantes
momentos, músculos, ossos e tendões iam sendo destruídos assombrosamente, de
maneira categórica. O sangue fugia pelas narinas, inicialmente como filetes
vermelhos, em maior abundância. Suas mandíbulas travaram, os dentes trincados
rangiam um no outro, e sua garganta mostrava o inferno caótico de dor. Um silvo
animalesco escapou de seus lábios, refletindo o sofrimento daquele instante. Todos
ouviram o estrondo de mais ossos se partindo.

— Você gosta muito de aproveitar a vida, mulheres, bebidas, drogas, farra e roubos,
se eu tirar isso tudo de você, será pior do que a morte.

Depois de todo aquele sofrimento agonizante removi a espada do pilar e encostei o


metal dela no triângulo suspenso. A porcaria por ser alimentada de radiack
esquentou a lâmina deixando-a vermelha. Voltei até onde Boris estava caído e parei
à sua frente.
— Os bracinhos e as perninhas tão doendo? Vai passar. — Levantei a katana acima
da cabeça. Com leves movimentos decepei as duas pernas de Boris um pouco
abaixo das coxas. O braços perto dos ombros. A alta temperatura cauterizou o
sangramento evitando hemorragias, mas desprendendo um odor de carne
carbonizada. Mais rápido do que ele pudesse gritar, o fio da arma passou a rasgar
seu rosto, e repetir o corte na carta já aberta, ampliando ainda mais os ferimentos.
Mais do que tudo era a lei da selva, a lei da sobrevivência onde apenas o mais forte
fica e o fraco perece, portanto executava a prática com uma certa frieza, sem
mostrar muito arrependimento.

— Isso é pelo Liam!!!! — Vociferei aplicando mais cortes onde já existiam muitos
outros.

O olho que sobrou, nariz, lábios, orelhas e cabelo foram totalmente arrancados. A
face de Boris ficou desfigurada, até parte da sua língua foi arrancada, nem mesmo
as mais recentes técnicas cirúrgicas modernas dariam jeito nele. Cego, sem poder
falar ou se movimentar, deixei o que sobrou dele para trás, caminhando até Vladimir.

— Me faz um favor? Mantenha esse filho da puta vivo, ligado a aparelhos ou


qualquer porra assim, ele merece sofrer cada instante em sua vida agora. Então
quando eu permitir, ele poderá morrer. — Vladimir consentiu silenciosamente com a
cabeça. Eu me afastei para longe do restante do grupo. E agora que a adrenalina
tinha baixado e o calor da fúria esfriado, sentia repulsa pelo que fiz. Tomada por
uma pressão psicológica, seguida de um imenso sentimento de culpa, o estômago
embrulhou. A náusea formou uma poça escorregadia de sangue e vômito. Nunca
antes havia machucado alguém, não daquela maneira severa, e agora carregaria
essa herança negativa também.

Quando consegui parar de vomitar, limpei os lábios, esfregando a mão na boca, e


retornei para perto dos outros. Mas eu senti que, depois daquilo, não seria mais a
mesma. Não dava para voltar atrás. Algo tinha mudado. A última centelha de
humanidade dentro de mim havia se extinguido.

Mad Max
Após toda aquela confusão com Morte, chegamos ao encalço de Viktor Landa
finalmente. Minhas mãos suavam de ansiedade de poder dar um tiro naquele russo
maldito, só de pensar nas vidas que ele arruinou em prol de suas experiências
infernais. Matamos quatro delas e eu esperava que não houvesse mais nenhuma,
mas minhas esperanças foram por água abaixo quando uma gueixa apareceu para
protegê-lo, com longas lâminas nas unhas como garras. Ela, com certeza, iria fazer
picadinho de pelo menos um de nós! Por sorte, era conhecida. Xiaren se pôs à
frente, e Landa viu suas chances se tornarem nulas outra vez.

Como uma barata, ele tentava achar alguma forma de se safar enquanto falava com
Vladimir, até que apontou o dedo para mim. Vladimir, por sua vez, também voltou o
olhar naquela direção enquanto pegava o holotablet.
— O que tem eu? — Não havia escutado direito por causa da distância, mas comecei
a me aproximar, e então, um dos paramilita comentou para que eu pudesse ouvir.

— Ele disse que você é a única imune ao vírus que o Pestilência transmitiu. Todos
fomos infectados por causa da água que invadiu a sala naquele momento. É, você é
a nossa esperança. — Eu estava ainda mais surpresa do que ele, mas para tentar
acalmar, de forma descontraída eu comentei. — Deve ser por causa do tanto de
drogas que já usei. — Não, não era engraçado, mas eu mesma não conseguia
acreditar naquilo. Vladimir queria fazer um antídoto a partir de meu sangue... Bem,
acho que eu teria de salvar a todos novamente.

Corremos para a última sala, o fim da linha naquele enorme navio, e as luzes
estavam baixas, mas logo conseguimos ver o porquê. Aquela sala toda parecia ser
tecnológica, principalmente pelo objeto ao centro. Parecia ser uma espécie de fonte
de energia. Mas por que estava exposta? Amadores, tinham que ser russos.

Lá dentro, nos encontramos finalmente com o nosso alvo. Yuric não estava nem um
pouco satisfeito com nossa invasão, e a discussão foi ficando cada vez mais
acalorada até o primeiro embate. A oriental acabou com os guardas que chegavam,
mas a encrenca piorou com a presença de um atirador de elite, e logo aquilo tudo
virou um tiroteio. Eu procurei cobertura e X9 entrou também em ação.

— Não vou ficar parada. — E saiu correndo para longe, enquanto me mantive ali, com
as pistolas em mãos, então apenas sorri. — Faz o que sabe fazer. — Me virei para
trás, a entrada começava a receber mais soldados, e eu e alguns paramilitos
conseguimos segurar, dar conta para que conseguíssemos manter o controle de
inimigos dentro da sala. Disparei uma, duas, três vezes, e acertei pelo menos uma
perna e um headshot bonito, que lavou a porta da entrada com sangue e miolos
estourados. Outros entravam e os soldados também os faziam cair, aquela luta já
estava ganha! X9 deu um xeque-mate e agora os russos estavam novamente em
nossas mãos. Pobres tolos que estavam contando somente com energia. Quem
entra em guerra sem munição de verdade?

Vladimir então deu as cartadas finais. Era muita emoção para pouca noite, pois até
os mortos estavam voltando à vida, como foi o caso do Montana. Bem que senti um
cheiro de defunto no ar, só me perguntava se não era das crias de Viktor. As palavras
que finalizaram a noite foram: "Nesse navio, nós seremos a lei."

Sei que a ansiedade estava à flor da pele de todos. As pessoas ali dentro estavam
na vontade de acabar com mais russos só porque tinham a possibilidade de morrer.
Eu sei que poderia, de alguma forma, ajudar a todos ali com minha suposta
imunidade, então me aproximei de Vladimir, agora um tanto mais séria. Pude
vislumbrar o que sobrou de Yuric e sua equipe caída.

— Se for verdade mesmo que sou imune, temos que achar uma forma de fazer
algum antídoto com isso. Hoje fizemos um bom trabalho apesar de... né. Você sabe.
Mas vocês não podem morrer assim. Espero que faça a escolha certa, Vladimir. Eu
me livrarei do restante.

Assim como os outros, eu queria ter uma chance de acabar com algum deles, e o
escolhido da vez foi Trigger. O atirador de elite tão prestigiado agora estava sob a
mira da minha .40. Não havia um motivo específico pelo qual o escolhi, mas não era
seu dia de sorte. Meu dedo no gatilho deu uma leve coçada e, BAM! Primeiro um
clarão seguido de um estrondo alto. A última coisa que ele viu foi meu olhar de
desprezo. E se ele tiver a sorte de ir para algum caminho que possa existir no
pós-vida, que Gini o encontre e transforme essa passagem num verdadeiro inferno.

O corpo caía já sem vida ao chão, com um buraco na testa e um arrombo na nuca,
era o fim do atirador.

Galathea
A fumaça úmida espiralava em All Street ao redor da alta figura de pé na calçada.
Um dos braços cruzados sob os seios e o cotovelo do outro apoiado sobre o
primeiro, segurando uma piteira preguiçosamente. O tronco estava coberto com um
leve tecido azul claro que delineava perfeitamente seu corpo. Do ombro esquerdo
pendia uma capa do mesmo tecido, falhando em sua função, já que esvoaçava,
assim como as tranças do cabelo, a cada veículo que passava. As pernas longas da
negra estavam desnudas e nos pés levava saltos de acrílico azulado.

Ela aguardava ansiosamente.

— Bando de filho da puta. — Falou a cafetina em tom nervoso. — Vão todos lá pra
desgraça de um navio e me deixam aqui sozinha responsável por tudo.

— Veja pelo lado bom. Pelo menos você não está tomando tiro de russos. —
Respondeu Ana ao se aproximar da mulher.
Ana se trajava com o uniforme preto padrão, com placas de cerâmica da
organização. Seu longo cabelo loiro estava organizado em uma única trança que
caía para frente sobre seu ombro destro. Ela e mais quatro membros estavam ali
para fazer a segurança de Angela. Eles formavam um perímetro de um metro ao
redor dela, para a desgraça dos pedestres comuns que passavam por ali e eram
impedidos de passar dentro do perímetro.

— Hum… — Angela resmungou enquanto mantinha o olhar fixo num enorme telão no
alto de um prédio do outro lado do cruzamento.

— Além do mais você é a única integrante oficial que não é ex-militar… e eles
confiam em você o suficiente para a tarefa de colocar todos nós na linha.

Angela ignorou seja lá o que quer que Ana estivesse falando e girou o pulso. Uma
pulseira dourada e primorosamente adornada projetou a interface de seu
comunicador.

#Solomon. Já terminou com o escritório?#

Não era necessário comandos ou digitar números ou contatos, o equipamento sabia


exatamente com quem ela queria falar. Não tardou nem dois segundos para a
resposta chegar.

#Sim — Respondeu a voz ofegante. — Já terminamos por aqui. O pessoal já está


começando a montar a festa. Por quê não veio aqui me ajudar a montar as coisas?#

#Vai sonhando. Existem robôs pra isso, sabia? — Provocou e, após conseguir um
silêncio desconfortável de Solomon do outro lado da linha, ela sorriu. — Vocês e
esse mimimi com androides, viu… Acho que vou ter que arranjar uma psicóloga pra
todo mundo.#

— Tá quase, chefe.

#Depois nos falamos#

Angela terminou a chamada e olhou as horas no comunicador. Seu olhar pulou dos
números para o enorme telão e dali de volta para os números.

Três segundos. Dois. Um.


Seu coração parou momentaneamente. A ansiedade parecia explodir. A hora estava
exata e seus olhos no telão assistindo o fim de um comercial qualquer sobre roupas.

Após o que pareceu ser o meio segundo mais longo da história, o telão ficou preto. O
comercial seguinte havia iniciado. O enorme logo da cobra autofagista aninhada em
asas agora voava sobre All Street.
A imagem foi seguida por uma de Galathea em uma pose desafiadora, ladeada por
soldados da organização em seus formidáveis trajes de combate completos. Sob a
imagem projetada, havia um texto que lia "Uroboros Segurança Privada", além de
algum slogan para as massas e contato e endereço do novo escritório na cidade
média.

Ao mesmo tempo, várias outras telas menores por toda Miraitropolis repetiram
mensagens similares, de acordo com os contratos firmados com as empresas de
marketing.

Ana se aproximou novamente de Angela e pode notar essa expirando pesadamente.

— Os dados foram lançados… — A negra falou sozinha enquanto os olhos ainda


estavam sobre o telão que agora projetavam comerciais aleatórios de bebidas. — Os
negócios estão oficialmente abertos.

Ana sorriu ao lado dela, pois podia ouvir os outros soldados comemorando e
apertando as mãos uns dos outros entusiasmados.

— Pois é… — Disse a loira.

Angela se virou novamente para seu comunicador.

#Hardin, como andam as coisas aí? Quanto tempo para os Crow-Z?#

#Oi! Alow! Bem, o contrato já foi assinado. Eles irão entregar os três dentro de 5 dias
úteis.#

#Ótimo. Agora só falta resolvermos a merda do armazém…#

Galathea finalmente havia se movido. Por anos, havia ficado nas sombras
acumulando capital e temendo atrair a atenção do governo ou de alguma das
famílias criminosas. Mas não naquela noite. Naquela noite, ela torrou todos os
recursos. Todo seu estoque de drogas foi liquidado, fazendo a alegria das pessoas
nas ruas para que a Uroboros saísse, relativamente, limpa da lama.
E era agora ou nunca. Não haveria oportunidade melhor. O cenário político da cidade
estava propício. Pouco após uma coletiva da Paramilitech reforçando seus votos
para com a segurança da cidade, a Dama de Prata, pelo que pareceu, colocou seus
cães paramilitares na coleira. Com isso, deixou que o dano colateral da guerra entre
famílias corresse à solta nas ruas da cidade e cometesse todo tipo de atrocidades
contra a população sem nenhuma repercussão. Os pormenores não foram
exatamente assim, mas provavelmente seria essa a ótica da população e, por
consequência, de algumas empresas.

A Uroboros queria essas empresas em sua cartilha de clientes.

Agora a cobra estava voando.

Galathea não teve tempo de se recuperar do seu quase afogamento na tentativa de


resgatar Rodrigo. Agradeceu às duas rapidamente, e o time seguiu em frente. Ela e
seus homens cuidaram da retaguarda. Sempre parecia uma inutilidade, afinal, os
russos atuais não pareciam muito propensos a aplicar táticas de combate como
atacá-los pelas costas. Talvez seja por isso que estão perdendo, pensou consigo
mesma.

Sua cabeça ainda tinha um zumbido oriundo de seus tímpanos que haviam sido
estourados alguns instantes atrás com a granada de Irvine.

Então encontraram a morte. Que foi derrotada magistralmente por Gal em poucos
instantes.

Novamente encontraram mais resistência na Gueixa e em seguida em Yuric, Boris e


o sniper que foram todos neutralizados sem muitos transtornos.

— Ah puta que pariu… — Ela exasperou cansada quando ouviu as palavras de


Vladimir. Sabia o que uma sessão de tortura iria acontecer em seguida. — Vocês
fiquem alerta. Não quero nenhum russo pegando eles de calças arriadas enquanto
saciam seu sadismo.

— Onde está indo, Thea? — Perguntou Shae preocupado.

— Só voltar algumas casas. Eu preciso de uma amostra. — E assim ela o fez. E,


enquanto voltava, ela olhou para o corpo de Jesse no chão após a volta de Tony.
Não despendeu sequer um pensamento para o caído. Era simplesmente a lei do
submundo concluindo seu ciclo. Ficou, na verdade, intrigada com a volta súbita e
retirada mais súbita ainda de Tony Montana no último segundo do conflito. Quase
uma participação especial.
A Morte ainda estava presa e ainda viva. Mas Galathea a ignorou e simplesmente
usou sua faca para colher o sangue dela do piso do navio e voltou para sua equipe..

— Os rapazes já terminaram no escritório. — Disse Shae. — E a festa também já está


acabando.
— Festa? Que festa? — Questionou Vicky franzindo o cenho.

— De abertura da Empresa.

— E eu to aqui… ouvindo gente ser torturada. Puta que pariu.

— Olhe pelo lado bom — Começou Jesus, mas fez uma longa pausa antes de admitir.
— Bem, não tem lado bom.

Entre conversa fiada e cigarros o grupo aguardou.

Irvine Montana
Homens como Yuric precisam se sentir no controle da situação, apesar do meu
primo ser um imbecil, ele percebeu isso e forjou sua morte como parte de um plano
maior para eliminar o velho russo. Mas isso todos vocês já sabem, eu não sabia
disso ou o que iria acontecer. Tentei ser um bom líder para Cosa Nostra quando vi
tudo começar a desmoronar, principalmente pelas mãos de Jesse, e isso foi algo
que gostei no meio disso tudo. Se Tony não tivesse colocado o poder nas mãos do
babaca, nunca saberíamos quem ele era de verdade, e no fim teve o que merecia.

Todos queriam um pouco de vingança. Eu acredito que seja mais uma desculpa para
colocar para fora a raiva e a violência interior. Somos feras esperando apenas um
momento para agir no final das contas. Fiz um sinal para dois dos meus capangas,
eles se aproximaram e eu disse próximo a eles: — Você fique de olho na moça que é
o nosso remédio, não quero perdê-la de vista. E você, pegue o Turco sob custódia.
Ele era um bom traficante de armas, quero ter acesso ao arsenal dele. — Ele
consentiu com a cabeça e se afastou. Traguei o cigarro que segurava entre os
dedos. Meu olhar logo depois voltou-se para Vladimir. Continuei com a mesma
opinião que tinha sobre ele. Não confio naquele velho metido a sabe-tudo de forma
alguma. Ele é tão traiçoeiro quanto uma serpente.

Enquanto todo mundo pegava sua recompensa em sangue, eu dei as costas e saí
pelo mesmo local que meu primo. Para muitos, o problema estava resolvido,
entretanto, eu não acredito nisso. O mundo é caótico, o conflito com Yuric e todo
seu circo de horrores foi apenas uma amostra do que estava por vir. Além disso,
Tony e eu precisávamos ter uma conversa franca, coisa de família.

Nick Slay
Todos os seus aparelhos de comunicação estavam tocando: holotablets,
computadores, e etc. Parecia que, repentinamente, todos pareciam demonstrar que
"A criança cagou nas calças e era vez do papai limpar a merda". Uma longa tragada
em seu charuto e mais uma dose de whisky. Nick Slay se levantava de sua poltrona,
ainda de roupão e barba mal feita. Estava numa sacada, sabe-se lá de onde, e olhava
Miraitropolis de cima, fitando os enormes telões e dirigíveis estampando a logo de
uma organização que resolvia sair "das sombras". Uma cobra que abocanhava sua
própria cauda agora ganhava asas. Finalmente, Slay resolvia por atender uma das
chamadas.

— Sou todo ouvidos, Carmen. — Falou o comandante, sua voz rouca, devido a anos
de fumo, ecoou pelo local.

— Você está presenciando esta afronta?! — Falava Telford. Dava até para ouvir o
veneno pingar das presas da cobra, metaforicamente falando, é claro.

— GaHahah! Ela é ousada, ela rolou os dados e agora vamos ter que esperar ele
parar de girar para ver o resultado. — Respondeu Nick.

— Hunf... Não sou uma mulher de jogos Nick. Sabe por que? Porque em jogos, existe
a possibilidade da derrota. Eu nunca conheci a derrota. Eu não rolo dados, eu os
destruo.

— Se quer ter sua vitória. Eu vou te dar, vou embalar e deixar na sua mesa.

Telford desligava sem dizer nada, e mesmo que a conversa tivesse sido recheada de
metáforas, parecia que ambos se entendiam muito bem. O Comandante, querendo
ou não, sabia o que tinha que fazer. Telford se enganava se achava que Nick era uma
peça em seu tabuleiro. Ele, até então, só tinha deixado sob comando de Telford as
"formigas operárias". As mais fortes e competentes, Nick mantinha-se próximo a si,
prontas para agir quando fosse necessário. Pegando um velho telefone - sim, um
telefone - ele discava para um número de somente três dígitos. Na primeira
chamada, uma voz fria atendia do outro lado.

— Reúna-os. É hora da Paramilitech ascender a uma escala extra nesta cidade.


Quero Neemeia a frente disso, e você e os outros darão cobertura se necessário…
Narrador
Viktor testemunhava os fins que Boris e Trigger tiveram e sorria nervoso, suando
frio. Sabia que teria um destino semelhante se não fizesse o jogo da loira. Landa
mantinha o sorriso para disfarçar o temor. Permaneceu encarando Gal e Vladimir
quando este se apoiou, esperando ter resposta sobre o antídoto.

— Vamos, Viktor, não tenho a noite toda, vá abrindo o bico. — Respirando fundo e
limpando o filete de suor da testa calva, finalmente o cientista se pronunciava.

— Mesmo que eu não esteja aqui, prefiro que sofram até o último segundo. Vou
morrer sabendo que o fim de vocês será pior que o meu… — Sem que ninguém
percebesse, Landa levava a mão canhota até o bolso lateral do jaleco, lentamente.

— Porque o meu será rápido… O de vocês não… — E, imediatamente puxou um longo


bisturi, passando abaixo do pescoço, cortando de uma orelha até a outra,
decepando veias e artérias com uma frieza impressionante. O sangue saltou como
um jato com bastante pressão aos pés de Gal e Vladimir. O russo tentou conter a
hemorragia pressionando o corte, mas era tarde demais, Viktor se debatia e ficava
cada vez mais frio até perder a vida de vez.

Vladimir explodiu em fúria, socando as paredes e proferindo os piores e mais


pesados xingamentos em russo, via a última esperança de cura se esvair em
sangue. Um dos seus soldados voltava com um sujeito algemado.

— Senhor, encontramos este aqui escondido em uma sala. — Roberto se aproximou,


olhando o sujeito nos olhos.

— Crazy Dog… Se escondendo igual um covarde? Deixe ele comigo soldado, o


cachorrinho vai ter uma longa conversa cara a cara com o irmão. — Vladimir tinha
mais com que se preocupar e permitiu que Roberto ficasse com a custódia do irmão
de Pascal.

— Vai dar tudo certo, você vai encontrar um antídoto. — Roberto tentou consolar o
russo tocando em seu ombro, depositando toda sua esperança nele.

— Vamos embora, a missão aqui terminou, mas o meu trabalho não, meus soldados
e eu temos uma corrida contra o tempo, precisamos sintetizar uma cura para a
doença que nos infecta. Se me permitir, gostaria de levar uma amostra do seu
sangue. — Vladimir se virou para Max, fazendo o pedido educadamente.
— Enquanto isso, todos serão pagos como prometido, amanhã de manhã uma conta
fantasma será aberta com seus codinomes, uma senha enviada a cada um dos
emails. Terão 48 horas para sacar os créditos unitários. E a você, a reforma da
oficina ficará por conta da casa. — Mais uma vez ele falava com Max.

— E caso até lá eu consiga o antídoto, os avisarei também pelos emails. Agora


vamos sair daqui, já não aguento mais esse lugar… Acho que vocês também não. —
Yuric era desamarrado e levado junto, Boris em uma maca e Crazy Dog escoltado
pela máfia latina. Não esqueceram de Rodrigo, que retirado da máquina incubadora
fora levado em uma mesa cirúrgica, aparentemente mostrava melhoras
significativas.

— Pedi a solicitação de um Crow-Z para que todos sejam levados em segurança ao


centro. Meus soldados e eu ficaremos um tempo a mais aqui. Precisamos limpar
essa bagunça e eliminar as provas de que eu estive aqui antes da Paramilitech
oficialmente chegar. — Vladimir indicava a saída, à qual Tony fez sua breve aparição.
Aquela passagem com escadas levava aos níveis e andares do elevador por onde o
grupo veio, sendo uma rota alternativa. O gênio da robótica, Vegan, que havia sido
raptado por Yuric, se juntava aos demais, saindo daquele lugar escuro.

— E esse aqui, senhor? — O soldado apontava para o chão, onde Jesse sangrava.

— Para que pareça uma briga de máfias sem envolvimento de oficiais não podemos
deixar testemunhas. — Vladimir sacou sua pistola, se abaixou, engatilhou a arma e
apontou para baixo. — Me perdoe, Jesse, não é nada pessoal. Adeus. — E o tiro
atravessou o crânio de Jesse, findando com a vida do italiano.

Ao chegarem no convés, Vladimir junto dos outros esperava a chegada do Crow-Z


para que o transporte pudesse ser feito antes que seus colegas dessem as caras.
Em meio a essa espera, Aria, a amiga de Max e Gini, surgiu de trás de alguns
caixotes. Ela correu contente até sua amiga, abrindo os braços para abraçá-la.
Porém, uma bala atravessou seu peito, transpassando o corpo. A pequena Aria caiu
alvejada e sangrando nos braços de Max. À beira da morte, ela tentava se explicar,
como toda boa criança.

— Quis ver o que vocês vinham fazer no porto… Parecia ser legal...

— Não era pra você estar aqui! — Disse a hacker, chegando depois e tentando
pressionar com as mãos o sangramento do tórax de Aria aos braços de Max, na vã
tentativa de ajudar.

— Meu pai ficará uma fera...


— Não fale, poupe fôlego. Vamos tirá-la rápido daqui, aguente firme! — Disse X-9,
Max parecia abalada demais para dizer algo, sua amiga ficava cada vez mais fria,
aquilo não era bom, sabia o que significava.

— Desculpa, Max, desculpa, X-9, digam ao Gini que mandei um beijo. — A garota não
tinha conhecimento de que Gini havia morrido, nem teve tempo, ela olhou para Max
e fechou os olhos antes que algo pudesse ser dito.
Enquanto isso, os homens de Vladimir dispararam na direção da silhueta que atirou
em Aria. A sombra parecia dançar entre os projéteis, e em cima do telhado de uma
torre de comando, trocava tiros. Seis soldados foram abatidos com precisão na
cabeça. Os homens de Calidora e alguns de Roberto e Xiaren também foram
atingidos. Sem um arranhão, a sombra parou de atacar e falou em alto e bom som.

— Não tenho munição para acabar com todos. Isso foi apenas um aviso para vocês
da Paramilitech, para as máfias e qualquer outro que se ache poderoso. Um aviso do
que os aguarda. Vocês não são intocáveis como pensam que são! Em breve, as
replicatas vão mostrar isso! — Proclamou a sombra com a identidade oculta. Em um
movimento ágil, ela se lançou ao mar, mergulhando e desaparecendo nas
profundezas das águas negras da baía de Troika. X-9 deixou de pressionar o tórax de
Aria e, com as mãos vermelhas de sangue, limpou-as em suas roupas manchadas,
caminhando lentamente até Vladimir.

— Você disse ficaríamos seguros… Essa é mais uma morte que fugiu do seu
controle... Quem é esse pirado que matou uma pobre criança inocente?

— Não faço ideia... E... Eu não contava que a menina fosse nos seguir e nem que
uma replicata maluca fosse nos atacar… Não abuse da minha paciência. Veja, a
condução de vocês acaba de chegar. — O russo apontou aos céus e a nave chegava,
se preparando para pousar no convés.

Uma segunda nave também pousou, pronta para fazer o transporte de Vladimir e
seus agentes depois que eles terminassem de limpar a "bagunça". A morte de Aria
deixou um gosto amargo naquela vitória. Nada foi dito, e os convidados, juntamente
com os agentes, entraram na aeronave. Feridos e mortos também foram carregados
para dentro. Assim que todos estavam no interior da aeronave, prenderam-se aos
cintos em seus bancos, e o silêncio prevalecia. Com os motores aquecidos, o
Crow-Z subiu verticalmente, cortando o espaço aéreo chuvoso da cidade,
desaparecendo nas nuvens escuras e carregadas da tempestade que assolava
Troika.
— Acabei de acionar uma mensagem a Paramilitech sobre uma atividade da máfia
no porto de Troika, dentro de uma hora os militares estarão aqui. Vamos tomar os
reféns, o reator, a cabeça da Morte e carregar os corpos dos nossos soldados para
dentro do Crow-Z, sejamos rápidos! — Ordenou o russo aos subordinados

Na outra manhã...

Pronunciamento oficial da prefeita Carmen Telford

O logotipo escudo da cidade de Miraitropolis surgia nos televisores, computadores,


holotablets, celulares e nos telões públicos espalhados pelas ruas e fachadas dos
prédios luminosos da cidade. Todo o meio de comunicação voltava sua atenção
para o centro das longas escadarias de mármore da nova prefeitura. Em seu
gabinete, sentada à frente de sua mesa, Carmen Telford cumprimentava os
espectadores.

— Bom dia cidadãos de Miraitropolis, muitos não sabem, mas ontem a noite uma
guerra foi evitada. Minha assessoria me aconselhou a não dar detalhes, mas como
quero ter um mandato de total transparência, venho por meio deste pronunciamento
informá-los sobre o ocorrido. — Como sempre, seriamente se dirigia às câmeras, a
voz se tornava ríspida como de um paramilitar. — No porto, em Troika, os agentes da
Paramilitech, sob minhas ordens, articularam o fim de uma disputa de máfias. As
principais e maiores casas estavam lá, Los Zetas, Ryulong, Cosa Nostra e Bratva. A
motivação da disputa ocorreu devido à posse de um navio vindo da Rússia, repleto
de armamento nuclear e soldados altamente preparados. Nossos agentes da
Paramilitech sobrepujaram todas as casas. Infelizmente a maioria conseguiu
escapar. No entanto, nossa principal preocupação, os russos, foram capturados.
Nesta manhã, um agente especial infiltrado que pediu para que seu nome não fosse
divulgado, entregou Yuric, o homem que tanto aterrorizou nossa cidade ao longo
desses dias. Junto dele os Bratvas foram dissolvidos e a ameaça que representava
não é mais real. Um artefato que estava em posse de Yuric também foi confiscado.
Os especialistas da Paramilitech confirmaram as suspeitas, se trata de um reator
nuclear a base de radiack projetada com uso da Green Box. — Ela pausou
rapidamente como de costume, respirou e voltou a falar. — Portanto, firmo o
compromisso com todos vocês que os dias de paz em Miraitropolis finalmente
chegaram e não deem ouvidos a supostas pessoas que apenas querem envenenar
nossa relação, não se rendam as promessas utópicas de Timothy Carter ou de Claire
Underwood, eu posso garantir sem hesitar que os interesses deles estão muito além
dos direitos civis, diferente de minha pessoa eles só pensam em si. Eu, Carmen
Telford evitei uma guerra, o que eles fizeram pelo povo? Fiquem comigo e estarão
seguros! Antes de desejar uma nova caminhada de mãos dadas a vocês, irei
aproveitar o pronunciamento para promover o policial Caz, conhecido de todos, ao
novo Comissário do Departamento de polícia de Miraitropolis, vamos saudar nosso
corajoso novo Comissário que sobreviveu aos castigos dos Bratvas! — Houve uma
longa e incansável sessão de aplausos gravados inseridos pelo engenheiro de som
da transmissão. Caz entrava ao gabinete, com um curativo no olho parecia
desconfortável, não com o ferimento, com a homenagem ou a promoção, mas em
saber a verdade. Além de tudo, o policial não entendia - ou não queria entender - o
sentido do novo cargo, afinal a segurança de Miraitropolis era alçada da
Paramilitech, o que Telford fazia era nada mais, nada menos do que usar Caz como
instrumento para suas mentiras. Ele fazia o teatro como a megera queria, não por
concordar, e sim por que precisava.

Naquela mesma manhã, Vladimir e uma equipe de cientistas militares tentavam


desenvolver um antídoto para o vírus que Viktor F. Landa projetou. No entanto, todas
as tentativas falhavam, e as demais amostras ao longo do dia se mostravam
igualmente ineficientes no combate à doença. Já haviam se passado mais de
dezoito horas de trabalho no projeto, e nenhum resultado satisfatório tinha sido
alcançado. Era uma verdadeira corrida contra o relógio, uma corrida que estava
sendo perdida. Pela primeira vez em toda sua vida, Vladimir sentia medo. Ele
amaldiçoava Landa, apesar de ter sido um monstro em vida, reconhecia que o
desgraçado era um gênio como engenheiro cientista. E até o momento, nem mesmo
a equipe composta pelos melhores da Paramilitech conseguia encontrar uma
variante sintética para a cura. Mesmo morto, Viktor cumpria sua promessa de
aterrorizar Vladimir. Se existe um inferno, provavelmente ele está lá gargalhando,
guardando ao seu lado um lugar para o russo.

Do sangue da Max, foi criado quase de última hora um antídoto para o vírus letal do
Pestilência. Uma vez que o próprio Vladimir dependia disso, depositou como
gratidão uma quantia generosa em sua conta fantasma. Prometeu que buscaria a
identidade do assassino de Aria. Quando finalmente os infectados receberam o
e-mail sobre a cura e o ponto de encontro no Edifício Olimpo, sede da Cosa Nostra,
mesmo não sendo necessário, Max fez questão de estar presente. Como prometido,
Vladimir enviou engenheiros e todo o material necessário para a reconstrução da
Get Jett, a oficina mecânica de Max. O estabelecimento não apenas foi reconstruído,
mas também ampliado e modernizado. Com as habilidades de Max, logo seria
reconhecida como a melhor autopeças de Miraitropolis. O único problema seria a
exposição, o que poderia chamar a atenção da Dama de Prata. Para atrapalhar um
pouco isso, Vladimir limpou os registros de Max e qualquer associação ao caso da
Tenente Aurora. Isso não resolveria a questão, mas certamente atrapalharia muito
as buscas da milícia da Tenente caso tentassem vingança. De qualquer forma,
Vladimir deixou alguns presentes para Max, como um treinamento de combate
armado e desarmado, além de um vasto arsenal militar que garantiria sua segurança
caso precisasse.
Irvine

Irvine apenas aceitou a vinda de Vladimir no Olimpo por dois motivos: o primeiro,
porque precisava desesperadamente do antídoto; o segundo, porque seu primo Tony
Montana havia ordenado. Para o desgosto de Irvine, Vladimir fez questão de
pessoalmente aplicar a dolorosa vacina em sua corrente sanguínea. Ficava clara a
provocação, não era segredo que o italiano detestava o russo. No entanto, após a
alfinetada, Vladimir puxou gentilmente da bainha a claymore de Guerra, a espada tão
eficiente e sedutora. Ele ofereceu a arma a Irvine, sabendo que o mesmo tinha
demonstrado bastante interesse nela, em uma humilde tentativa de deixar as
diferenças de lado. Na mesma ocasião, ao lado de Akane, seu primo anunciava a
"aposentadoria". Tony queria aproveitar a oportunidade de estar legalmente morto
aos olhos da Dama de Prata para trabalhar em um plano secreto que desbancaria a
política. Para isso, explicava que iria precisar de muito tempo e foco, e comandar a
máfia italiana dividiria sua atenção. Como Galathea parecia agora ter mais interesse
no futuro da Uroboros, Tony passava oficialmente o comando da Cosa Nostra a
Irvine. Apesar de prometer não interferir no comando nem nas escolhas do primo,
deixava claro que ainda era o primeiro na linha de comando e que gostaria de
sempre ser informado sobre as finanças e investimentos da máfia. Irvine parecia
colher os frutos de seu investimento, onde passou anos e anos à sombra do
Montana mais velho, e poucas vezes foi reconhecido. Agora era sua vez, tinha a
máfia a seu dispor e uma arma de combate extremamente letal.

Galathea

Ser líder da Cosa Nostra nunca fez de fato parte dos planos de Galathea. Ao fazer
um acordo com Irvine, ela se despedia do comando da máfia italiana com grande
estilo. Atingindo finalmente seu objetivo, a Uroboros saía do submundo da
ilegalidade para os negócios lícitos. Assim como Max, ela também despertaria a
atenção. No entanto, podia ficar um pouco mais tranquila quanto a isso, uma vez
que Carmen Telford não continha tantos registros de dados e informações acerca
da morena e seu grupo depois que deixou a máfia italiana. A Uroboros sabia limpar
seus rastros, e mesmo que a Dama de Prata um dia soubesse do real paradeiro de
Galathea, ela estaria bem preparada para o confronto, junto com seu leal e
competente time. Não apenas se defenderia, mas também atacaria se fosse
provocada. Com a quantia paga por Vladimir em troca de seus serviços, sua
empresa teria capital suficiente para novos investimentos no mercado que lhe
correspondiam. Soube-se que fora oferecido um cargo bastante importante e bem
remunerado na Uroboros para Gal, "a loira que atravessa paredes", mas é
desconhecida a resposta da mesma.
Gal

Muitos se interessaram pelas habilidades da mulher que, no começo, parecia tímida,


desconfortável e insegura em usar seus dons. O primeiro a oferecer um cargo foi
Xiaren, seu antigo empregador. O oriental via bastante futuro para a Ryulong, ainda
mais agora que havia garantido de volta sua fiel e mortal guarda-costas, a Gueixa.
Com as duas trabalhando ao seu lado, Xiaren poderia mais facilmente atingir os
objetivos ocultos que tinha para o futuro e tornar a Ryulong a máfia mais temida e
número um de Miraitropolis, em outras palavras, ocupar o lugar atualmente ocupado
pela Cosa Nostra. Quem também se interessou foi Tony Montana, antes de se
afastar do comando da máfia italiana. Além dele, os Zetas ofereceram um bom
salário à loira caso decidisse trabalhar em Rio Bravo com os latinos. Mas, sem
dúvidas, a melhor oferta havia sido a da Uroboros, a qual Gal parecia ter criado uma
harmonia maior, grande parte disso graças a Galathea. Todos acreditavam que ela
aceitaria a oferta da morena, não apenas pela maior quantia monetária, mas porque
acreditava-se que um vínculo entre as duas "Gals" havia se formado. Apesar disso, a
resposta da loira ainda permanece um mistério, assim como seu paradeiro. Talvez
ela esteja apenas aproveitando as 'férias' com o pagamento gordo que recebeu de
Vladimir.

Rodrigo

Depois de se salvar da morte graças à câmera de recuperação no Do Svidaniya e ser


mantido sob observação pela equipe médica de Vladimir dentro do bloco cirúrgico
da Paramilitech, Rodrigo ainda foi imunizado com o antídoto da vacina anti-Peste
(nome dado ao antídoto criado a partir do sangue de Max). Assim que se recuperou,
graças às suas formidáveis habilidades de modificação de massa física e aparência,
superou sem grandes traumas os problemas sofridos de mutilação e cicatrizes
deixadas pela infeliz explosão da granada lançada por Irvine. Não se sabe, no
entanto, se Rodrigo guarda algum rancor disso. Por esse mesmo motivo, torna-se
incerto dizer se ele aceitaria ou não a proposta feita por Tony Montana, que, antes
de se retirar para sua "aposentadoria", assim como fez com Gal, ofereceu emprego
ao transmorfo. Mas não eram somente os italianos que se interessavam; parecia
que as máfias em geral estavam desesperadas em relação aos "mutantes", e uma
nova disputa se iniciava entre eles. Xiaren era quem demonstrava mais interesse na
contratação de Gal e Rodrigo, o que deixava mais evidente seu plano de se tornar o
mais forte no submundo de Miraitropolis. Os Zetas, tendo uma vez os serviços de
Rodrigo, desejavam novamente que o rapaz se tornasse seu aliado, desta vez em
definitivo. Todavia, Roberto tinha agora mais no que pensar, já que não foi uma boa
ideia colocar Crazy Dog e Pascal frente a frente para acertarem as contas. Pascal
parecia não ter superado a traição do irmão e, usando um copo de vidro que quebrou
na mesma hora, degolou Crazy Dog de orelha a orelha, enquanto o irmão mais novo
se esvaiu em sangue. Pascal, em seguida, repetiu o ato em si mesmo. O escritório
da Boate Vênus parecia um matadouro banhado com o sangue dos irmãos. Rodrigo
presenciou tudo naquela noite; ele nunca mais se esqueceria da cena.

Pollux

Após ser salvo por uma desconhecida chamada Número 3, Pollux, ao menos por um
tempo, se aliou à equipe que o salvou para que pudesse arquitetar melhor seus
objetivos com um pessoal altamente qualificado. De alguma forma, também criou
um forte laço com Caz, o atual Comissário de Miraitropolis. O que poucos sabem é
que os dois trabalham juntos, trocando informações. Talvez tenha sido esse o único
motivo pelo qual Caz tenha aceitado a promoção de Carmen Telford e feito seu
teatrinho em rede nacional. Junto do dirigível e da Inteligência Artificial criados por
X-9, Pollux podia agir nas sombras, mantendo seu anonimato e evitando chamar a
atenção de sua ex-patroa. Ele recebia ajuda de sua sempre fiel amiga e colega,
Calidora, que, junto com a equipe formada, agora tinham uma base secreta no
distante e esquecido bairro de Hamptom Heights. Assim como aconteceu com Tony
Montana, muitos achavam que Pollux havia morrido, e um deles era Timothy Carter,
que sumiu de cena por um tempo e planejava, no futuro, dar cabo da única
ex-Steelheart que aparentemente escapou de seus planos: X-9. A hacker também
era uma das únicas a saber que Pollux ainda se encontra vivo e bem. Ele
estabeleceu uma rede de contatos onde ajuda Calidora e o ex-repórter, auxiliando
ambos sempre que pode, sem cobrar nada por seus serviços. Pollux ainda mantém
seu mistério, e até o momento, temos poucas ou quase nenhuma informação sobre
ele ou a organização em que se envolveu. Até mesmo X-9 e Calidora, que são as
pessoas mais próximas, detêm poucos dados. Mas uma coisa é certa: em breve, ele
retornará.

X-9

Com a cura para o vírus, X-9 tinha outras preocupações em mente. A primeira era
manter-se viva. Ela tinha um alvo marcado em suas costas. Timothy Carter não seria
o único que poderia vir a atacá-la no futuro. Pollux havia mostrado a Carmen Telford
que não era tão sabida como pensava ser e que muitas coisas aconteciam debaixo
do seu nariz sem ela saber. Revelou o engodo que X-9 criou sobre a própria morte.
Saber que foi enganada durante um ano acabou provocando a ira da prefeita em vez
da sua humilhação, e agora faria de tudo para caçar a hacker. Apesar disso, ela não
condenava Pollux, e mesmo com a cabeça a prêmio sentia-se satisfeita quando
pensava no ego ferido da toda-poderosa de Miraitropolis. Parte do problema foi
resolvido indo morar com Max, na casa da mecânica. Ela teria a segurança
necessária. Enquanto isso, burlava o sistema de vigilância do Olho Elétrico, com
diversas biometrias e nomes falsos. Ela e Max sobreviveriam assim daqui para
frente. A seu pedido, Vladimir mantinha Boris vivo em alguma clínica clandestina do
Submundo, respirando com aparelhos, cego, surdo, mudo e amputado. Seu corpo se
tornou sua prisão. Esporadicamente, X-9 comparecia no leito de sofrimento daquele
homem, e mesmo não tendo a maioria dos sentidos, o russo sentia sua presença.
Dava para ver o medo no inofensivo Boris a cada visita da hacker. Ela voltou a atuar
como pirata virtual, vendendo e comprando informações corporativas e de
segurança a altos preços, desafiando a Dama de Prata. Sua fama se tornava uma
lenda, assim como sua existência. Mas isso não importava, sua jornada para
descobrir como iria viver mais do que quatro anos em um corpo replicata começava.
No entanto, por enquanto, ela se sentia plena. Ao dormir, nunca mais teve pesadelos
com Liam. Seu "amigo" havia enfim sido vingado e descansava em paz.

Final alternativo

Viktor testemunhava os fins que Boris e Trigger e sorria nervoso, suando frio. Sabia
que teria um destino semelhante se não fizesse o jogo da loira. Landa mantinha o
sorriso para disfarçar o temor. Permaneceu encarando Gal, e Vladimir quando esse
se apoiou esperando ter resposta sobre o antídoto.

— Vamos, Viktor, não tenho a noite toda, vá abrindo o bico. — Respirando fundo e
limpando o filete de suor da testa calva, finalmente o cientista se pronunciava.

— Mesmo que eu não esteja aqui, prefiro que sofram até o último segundo. Vou
morrer sabendo que o fim de vocês será pior que o meu… — Sem que ninguém
percebesse, Landa levava a mão canhota até o bolso lateral do jaleco, lentamente. —
Porque o meu será rápido… O de vocês não… — E, imediatamente puxou um longo
bisturi, passando abaixo do pescoço, cortando de uma orelha até a outra,
decepando veias e artérias com uma frieza impressionante. O sangue saltou como
um jato com bastante pressão aos pés de Gal e Vladimir. O russo tentou conter a
hemorragia pressionando o corte, mas era tarde demais, Viktor se debatia e ficava
cada vez mais frio até perder a vida de vez.

Vladimir explodiu em fúria, socando as paredes e proferindo os piores e mais


pesados xingamentos em russo, via a última esperança de cura se esvair em
sangue. Um dos seus soldados voltava com um sujeito algemado.

— Senhor, encontramos este aqui escondido em uma sala. — Roberto se aproximou,


olhando o sujeito nos olhos.

— Crazy Dog… Se escondendo igual um covarde? Deixe ele comigo, soldado, o


cachorrinho vai ter uma longa conversa cara a cara com o irmão. — Vladimir tinha
mais com que se preocupar e permitiu que Roberto ficasse com a custódia do irmão
de Pascal.

— Vai dar tudo certo, você vai encontrar um antídoto. — Roberto tentou consolar o
russo tocando em seu ombro, depositando toda sua esperança nele.

— Vamos embora, a missão aqui terminou, mas o meu trabalho não, meus soldados
e eu temos uma corrida contra o tempo, precisamos sintetizar uma cura para a
doença que nos infecta. Se me permitir, gostaria de levar uma amostra do seu
sangue. — Vladimir se virou para Max, fazendo o pedido educadamente.

— Enquanto isso, todos serão pagos como prometido, amanhã de manhã uma conta
fantasma será aberta com seus codinomes, uma senha enviada a cada um dos
emails. Terão 48 horas para sacar os créditos unitários. E a você, a reforma da
oficina ficará por conta da casa. — Mais uma vez ele falava com Max.

— E caso até lá eu consiga o antídoto, os avisarei também pelos emails. Agora


vamos sair daqui, já não aguento mais esse lugar… Acho que vocês também não. —
Yuric era desamarrado e levado junto, Boris em uma maca e Crazy Dog escoltado
pela máfia latina. Não esqueceram de Rodrigo, que retirado da máquina incubadora
fora levado em uma mesa cirúrgica, aparentemente mostrava melhoras
significativas.

— Pedi a solicitação de um Crow-Z para que todos sejam levados em segurança ao


centro. Meus soldados e eu ficaremos um tempo a mais aqui, precisamos limpar
essa bagunça e eliminar as provas de que eu estive aqui antes da Paramilitech
oficialmente chegar. — Vladimir indicava a saída a qual Tony fez sua breve aparição,
aquela passagem com escadas levava aos níveis e andares do elevador por onde o
grupo veio, sendo uma rota alternativa. O gênio da robótica Vegan, que havia sido
raptado por Yuric, se juntava aos demais, saindo daquele lugar escuro.

— E esse aqui, senhor? — O soldado apontava para o chão, onde Jesse sangrava.

— Para que pareça uma briga de máfias sem envolvimento de oficiais não podemos
deixar testemunhas. — Vladimir sacou sua pistola, se abaixou, engatilhou a arma e
apontou para baixo.

— Me perdoe, Jesse, não é nada pessoal. Adeus. — E o tiro atravessou o crânio de


Jesse, findando com a vida do italiano. Ao chegarem no convés, Vladimir junto dos
outros esperava a chegada do Crow-Z para que o transporte pudesse ser feito antes
que seus colegas dessem as caras, e em meio a essa espera, Aria, a amiga de Max e
Gini surgiu de trás de alguns caixotes. Ela correu contente até sua amiga, abrindo os
braços para abraçá-la, porém uma bala atravessou seu peito, transpassando o
corpo. A pequena Aria caiu alvejada e sangrando nos braços de Max, as portas da
morte ela tentava se explicar como toda boa criança.

— Quis ver o que vocês vinham fazer no porto… Parecia ser legal...

— Não era pra você estar aqui! — Disse a hacker, chegando depois e tentando
pressionar com as mãos o sangramento do tórax de Aria aos braços de Max, na vã
tentativa de ajudar.

— Meu pai ficará uma fera...

— Não fale, poupe fôlego. Vamos tirá-la rápido daqui, aguente firme! — Disse X-9,
Max parecia abalada demais para dizer algo, sua amiga ficava cada vez mais fria,
aquilo não era bom, sabia o que significava.

— Desculpa, Max, desculpa, X-9, digam ao Gini que mandei um beijo. — A garota não
tinha conhecimento de que Gini havia morrido, nem teve tempo, ela olhou para Max
e fechou os olhos antes que algo pudesse ser dito.

Enquanto isso, os homens de Vladimir dispararam na direção da silhueta que atirou


em Aria. A sombra parecia dançar entre os projéteis e, em cima do telhado de uma
torre de comando, trocava tiros. Seis soldados foram abatidos com precisão na
cabeça. Os de Calidora também, assim como alguns de Roberto e Xiaren. Sem um
arranhão, a sombra parou de atacar e falou em alto e bom som.

— Não tenho munição para acabar com todos. Isso foi só um aviso para vocês da
Paramilitech, para as máfias e qualquer outro que se ache poderoso, um aviso do
que os aguarda. Vocês não são intocáveis como pensam que são! Em breve as
replicatas vão mostrar isso!!! — Com a identidade oculta, a sombra se lançou ao mar,
mergulhando e desaparecendo nas profundezas das águas negras da baía de
Troika. X-9 deixava de pressionar o tórax de Aria e com as mãos vermelhas limpava
nas roupas o sangue que as manchava, caminhando lentamente até Vladimir.

— Você disse ficaríamos seguros… Essa é mais uma morte que fugiu do seu
controle... Quem é esse pirado que matou uma pobre criança inocente?

— Não faço ideia... E... Eu não contava que a menina fosse nos seguir e nem que
uma replicata maluca fosse nos atacar… Não abuse da minha paciência. Veja, a
condução de vocês acaba de chegar. — O russo apontou aos céus e a nave chegava,
se preparando para pousar no convés.
Uma segunda nave também pousava, pronta para fazer o transporte de Vladimir e
seus agentes depois de limpar a "bagunça". A morte de Aria deixou um gosto
amargo naquela vitória. Nada foi dito enquanto os convidados e os agentes
entravam na aeronave. Feridos e mortos também eram carregados para dentro.
Assim que todos estavam no interior da aeronave, prenderam-se aos cintos em seus
bancos, enquanto o silêncio prevalecia. Com os motores aquecendo e as turbinas
rugindo, o Crow-Z decolou verticalmente, cortando o espaço aéreo chuvoso da
cidade e desaparecendo nas nuvens escuras e carregadas da tempestade que
assolava Troika.

— Acabei de acionar uma mensagem a Paramilitech sobre uma atividade da máfia


no porto de Troika, dentro de uma hora os militares estarão aqui. Vamos tomar os
reféns, o reator, a cabeça da Morte e carregar os corpos dos nossos soldados para
dentro do Crow-Z, sejamos rápidos! — Ordenou o russo aos subordinados.

Algumas horas depois, não muito longe dali, na base central da Paramilitch, em uma
localização secreta onde somente os agentes tinham acesso, além da prefeita, nos
laboratórios subterrâneos, Vladimir levou seus convidados. Não havia tempo para
seguir protocolos quando a vida estava por um fio. Com exceção de Max, todos
pareciam nervosos pelos corredores, e havia uma sensação de pressa no ar.
Convocando uma equipe de cientistas renomados na área de biomedicina e
doenças virais, em pouco mais de uma hora, o agente russo arrancou esses homens
e mulheres do conforto de seus lares e famílias para trabalharem sob pressão em
um prazo relativamente curto. Vladimir já estava sentindo os sintomas, uma tosse
rouca e insistente o fez cuspir sangue. Enquanto isso, a equipe de cientistas tentava
desenvolver um antídoto para o vírus projetado por Viktor F. Landa, com base no
sangue de Max. No entanto, até então, todas as tentativas haviam falhado. Já
haviam se passado mais de dezoito horas de trabalho no projeto, e nenhum
resultado satisfatório havia sido alcançado. Era uma verdadeira corrida contra o
relógio, uma corrida que estava sendo perdida. Pela primeira vez em toda sua vida,
Vladimir sentia medo. Vendo seus soldados se deformando e tendo hemorragias
pelos olhos, o russo se desesperou. Ele olhou para Max, a única que não sofria os
danos daquela terrível e bizarra praga. Correu até a sala onde os cientistas estavam
trabalhando, apressando-os como se isso garantisse a cura, mas na realidade só
atrapalhava.

Vladimir era um experimento do exército quando a Paramilitech ainda não existia,


portanto, nada mais normal do que ter uma resistência maior aos efeitos do vírus.
Mas o restante dos infectados não tinha esse privilégio. De repente, ele se tornou
testemunha de um surto de mortes. Primeiro foram seus soldados, logo depois
todos aqueles convidados que ele prometeu proteger a X-9, incluindo a própria.
Estavam sendo devastados pela doença. Pústulas eclodiram dos rostos, expelindo
pus. Não só dela, mas também de Galathea, Irvine, Gal, Calidora, Roberto, Xiaren e
seus ajudantes. Todos eles chegavam ao limite. Primeiro, caíram ao chão, tossindo
tanto que ficava impossível respirar. Logo em seguida, jatos vermelhos de sangue
eram expelidos pela boca com muita força. E por fim, aquilo que ocasionou a morte
de Gini. Os infectados sentiram um calor insuportável em suas peles, e sua carne
realmente parecia derreter e descamar. Em desespero, Vladimir testemunhou sua
falha pela janela de vidro do laboratório. Como zumbis, aqueles que conseguiam
resistir um pouco mais se arrastavam pelos corredores, deixando um rastro
escarlate, agonizando. Uma silhueta bateu na janela, e os restos de sangue
escorreram pelo vidro.

— Vo-você... V-ocê prometeu n-noos pro-pro-proteger... — A silhueta cobrava, com


dificuldade e sofrimento, batendo na janela, deixando um borrão escuro na vidraça
opaca.

Pela frase que se tratava de uma cobrança, Vladimir sabia que aquela era X-9. A
hacker tombava em seu último suspiro. Ao longo do corredor, ele via restos de
cadáveres ensanguentados que lembravam Galathea, ou um punhado de carne e
roupas que foram de Gal, ou a caveira apodrecida de Irvine jogada no lobby. O russo
sabia que não havia escapatória, o próximo seria ele, era só uma questão de tempo.
Amaldiçoava Landa. Apesar de ter sido em vida um monstro, Vladimir reconhecia
que o crápula fora um gênio como engenheiro cientista. Nem mesmo a equipe com
os melhores da Paramilitech conseguira encontrar uma variante sintética para a
cura. Mesmo morto, Viktor cumpria sua promessa. Se existe um inferno,
provavelmente ele está lá gargalhando, esperando por Vladimir junto com os demais
que ele condenou.

FIM

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