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Copyright © 2022 Pitangus Editorial

Copyright© 2022 Beena Khan

Titulo original: Kiss of Venon


Direção Editorial: Simone Freire
Capa Original: Ms. betty
Design de Capa: L.A. Designer Editorial
Tradução: D. Dias
Revisão de Tradução: Vânia Nunes
Revisão Final: AB Serviços Editoriais
Diagramação: Cris Spezzaferro

Esta obra segue as regras do Novo Acordo Ortográfico.


Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com nomes, datas e
acontecimentos reais é mera coincidência.
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS
Nenhuma parte dessa obra poderá ser reproduzida em qualquer meio ou
forma - impresso, digital, áudio, visual - sem a expressa autorização da autora
e editora sob penas civis e criminais.
A violação autoral é crime, previsto na lei nº 9.610/98, com aplicação legal
pelo artigo 184 do código penal.

www.pitanguseditorial.com.br
São Paulo, Brasil
Sumário
Playlist
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Epílogo
A Lock of Death –Livro 2
Posfácio
Nota do Autor

Este é um livro de romance dark, e sua leitura pode causar


gatilhos a leitores mais sensíveis. Para se conectar com o cenário
de Nova York, a sede do diretor do FBI foi mudada na história.
Apresenta personagens de caráter duvidoso e é vagamente
baseado em um conto de fadas combinado com a imaginação do
autor.
Às mulheres que caíram, mas se levantam
novamente para mostrar que ainda usam suas coroas.
Playlist

Desert Rose – Sting


You Are The Reason – Calum Scott
One Last Time – Arjun
Heat Waves – Glass Animals
Ocean Eyes – Billie Eilish
Live Like Legends – Ruelle
Bird Set Free – Sia
Wait For You – Elliot Yamin
Roses – Ghostly Kisses
Protect You – Danielle Hollobaugh
Dark Side – Bishop Briggs
Breathe – Fleurie
Fire Meets Fate – Ruelle
Antihero – Aviva
Bem-vindo ao submundo de Nova York.
Vagamente baseado no conto de fadas A Bela Adormecida.
ALEXANDER

ERA UMA VEZ UM SONHO…


Um Tirano da Malevolência vivia para dobrar o mundo à sua
vontade.
Alexander puxou o longo blazer preto contra o peito. Sua camisa
era tão justa, que se encaixava em seu corpo como uma segunda
pele. Ajeitando seus punhos roxos, ele olhou para as ambulâncias
alinhadas do lado de fora. Um segundo depois, os paramédicos
levaram os pacientes. Ainda bem que, em meio a toda aquela
comoção, ele conseguiu se misturar facilmente. Atravessando as
portas de vidro, a corrente de vento gelado do ar-condicionado o
atingiu em cheio. Dois de seus homens andavam na frente dele, e
um andava atrás.
Ele olhou em seu entorno. Estavam em um dos hospitais mais
antigos que ele já havia visitado, e ele não tinha o hábito de ir a
muitos. Porém, hoje era uma ocasião especial. O chão era de
ardósia cinza, brilhante como se tivesse sido pintado recentemente.
A luz artificial era muito forte e machucava seus olhos. Ele olhou
para as fotografias penduradas na parede cor de magnólia que,
como em uma linha do tempo, passavam de imagens em preto e
branco para coloridas. Ele sentiu quando um arrepio percorreu sua
espinha enquanto ele olhava para o corredor interminável e curvo.
Hospitais eram tão deprimentes, mórbidos e horríveis, e ele já
queria sair correndo dali.
Mas ele era um homem com uma missão, esperando
impacientemente ao lado de seu irmão, Dimitri, enquanto seus
homens recebiam dois passes de visitantes. Seus homens
mostraram suas identificações na recepção, enquanto suas armas
permaneciam escondidas embaixo de suas roupas pretas e
brancas. Apenas dois visitantes por vez podiam entrar no quarto do
paciente, mas Alexander não se importou com esse detalhe. Ele
tinha coisas para fazer, e tinha que fazê-las rápido.
Entrando no elevador, subiram até terceiro andar, onde outra
recepcionista os cumprimentou, verificando seus crachás para poder
permitir a entrada. Menos pessoas vagavam ao redor, e a tensão
nos ombros de Alexander desapareceu.
Ele acenou com a cabeça para Dimitri e ordenou:
— Faça sua coisa.
Seu irmão apenas olhou fixamente para frente enquanto
caminhava até a jovem recepcionista de cabelos pretos e uniforme,
e se plantou firmemente à frente de sua mesa cinza. Seus olhos se
arregalaram quando ela notou a aparência de Dimitri.
Cabelo preto. Maçãs do rosto esculpidas. Pele clara.
Bons genes russos.
— Oh... Olá — ela falou em uma voz ofegante.
Alexander viu o nome Nancy em seu crachá.
— Eu sou Dima — a voz profunda e baixa de seu irmão falou,
rolando as vogais no apelido. Um de seus homens ao lado dele,
Adrik, acenou para ela enquanto entregava-lhe os passes.
Ela pegou, mas seus olhos continuaram grudados em Dimitri.
— Eu sou Nancy — ela respondeu com uma sugestão de sorriso.
Ela olhou para seus passes antes de devolvê-los a Adrik.
— Eu nunca vi você aqui antes — ela disse para Dimitri.
— Primeira vez aqui — Dimitri respondeu. Ele casualmente
encostou os antebraços na mesa dela e perguntou: — São duas da
tarde. Você não deveria estar na hora do almoço?
Ela deu um sorriso nervoso.
— Eu mal tenho tempo para respirar por aqui — ela admitiu. —
Geralmente só consigo comer quando saio do trabalho.
— É um turno de oito horas?
— É hora do rush, e eu não posso sair do meu posto.
Dimitri apoiou os cotovelos na mesa, inclinando-se para mais
perto. A garota parecia ter parado de respirar.
— O que você gosta de comer?
— Hum... Eu pego qualquer coisa nas máquinas lá fora.
— Tudo bem. Vou trazer algo para você em uma hora.
As sobrancelhas de Alexander se ergueram enquanto ele
escutava a conversa.
A garota arregalou os olhos castanhos, parecendo assustada, e
protestou:
— Oh... — Suas bochechas rosadas pareciam queimar, ficando
em um tom vermelho brilhante — Isso é muito gentil... Mas você não
precisa. — Ela deu de ombros sem jeito.
— Vou trazer.
Dimitri disse isso como uma afirmação, e não como uma
pergunta.
O coração da coitadinha vai se partir quando o almoço não
chegar.
Alexander não se importava com ela. Ela poderia morrer de fome.
Aproveitando a distração, ele e um de seus homens passaram. Em
um impulso, os ombros largos de Dimitri os bloquearam do campo
de visão da jovem. Com seu corpo minúsculo sentado, Dimitri era
um gigante comparado a ela, e Nancy estava muito encantada por
ele para prestar atenção em qualquer outra coisa. Eles não tinham
passes extras, e tudo o que eles tinham que fazer era entrar e sair.
Quando já estavam em segurança, longe da recepcionista, Dimitri e
Adrik se juntaram a eles. Alexander olhou para frente, e seus olhos
sombrios se iluminaram quando se depararam com o quarto 310A.
Os homens à sua frente espiaram para dentro e murmuraram:
— Retaguarda livre.
Bom. Eles não precisavam de testemunhas.
Alexander os ultrapassou e, segurando firmemente a maçaneta
prateada, abriu a porta e entrou. Seus olhos afiados pousaram
automaticamente no homem de roupa azul na cama.
Yuri Sidorov virou os olhos em direção à porta.
Alexander entrou no pequeno quarto, lentamente, como um
predador cercando sua presa. Ele estava feliz por Yuri ser o único
paciente no quarto. Seus homens o seguiram, e a porta se fechou.
Ele parou a alguns metros de distância e olhou para Yuri, que
estava conectado à máquina intravenosa:
— Pakhan — Yuri ofegou. — V-você aqui?
— E você também.
— Eu... Eu tenho uma condição médica, você já sabe, Pakhan. E-
eu venho aqui uma vez por semana para tratamentos — Yuri
gaguejou.
Alexander não respondeu, e os olhos de Yuri se apertaram para,
logo em seguida, se abrirem novamente. Desta vez eles estavam
vermelhos e injetados de sangue, as lágrimas neles se formando.
— Não esperava que você trabalhasse com o FBI — ele falou
finalmente, com desapontamento aparecendo em sua voz, que era
clara e dominadora, não deixando espaço para perguntas ou
qualquer tipo de defesa.
Yuri respirou fundo e olhou para o chão. Seus dedos brincavam
com os lençóis brancos.
— E-eu queria deixar a Bratva — Yuri gaguejou. — Tenho uma
família.
Os lábios de Alexander se contraíram quando ele se sentou na
beirada da cama, que chiou com o peso extra. Yuri tentou recuar.
— Tudo o que você tinha que fazer era me pedir. Você não acha
que eu deixaria você ir embora?
Yuri olhou para o chão.
— Fiz um juramento. Era impossível.
— Talvez, mas posso transformar o impossível em possível.
Yuri olhou para cima, surpreso:
— Posso ir então?
Os olhos de Yuri se encheram de alegria, mas Alexander não
sentiu nenhum remorso pelo que ele diria a seguir.
— Você não deveria ter ido à polícia. Você estava dando
informações privilegiadas aos meus inimigos. Você trabalhou contra
mim. Se você tivesse se aproximado de mim, talvez eu pudesse ter
deixado você ir — respondeu ele. — Mas você é um traidor. Um
rato.
Seus olhos sombrios brilharam para Yuri.
— O que você acha que acontece com os traidores?
O homem na frente dele, seu antigo Vor, seu soldado russo,
engoliu em seco.
— Pakhan... Eu... Eu sinto muito. Eu só…. — Yuri gaguejou.
— Quanto você disse a eles? — Alexander ferveu.
— N... Não muito — o homem guinchou — Apenas sobre o tráfico
de drogas.
Ele queria rir. Isso era mais do que suficiente para entregá-lo à
morte.
— Se estivéssemos lá fora, eu teria levado você para a masmorra
— Alexander falou. — Mas, por enquanto, isso é bom o suficiente —
ele terminou, levantando-se. Puxou sua arma do lado de seu colete
e apontou para Yuri.
Os olhos de Yuri se arregalaram de terror e ele gaguejou
protestos:
— Não... Pakhan... P-por favor, tenho uma família.
Alexander inclinou a cabeça.
— Talvez você devesse ter pensado nela antes de me trair.
— Por favor, não machuque minha família!
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Como você se sente sobre elas... — Ele sorriu — trabalhando
como minhas mulas?
— Não. Não! Pakhan, minha filha tem apenas dez anos.
Alexander nem piscou.
Yuri começou a protestar novamente, mas foi interrompido.
— Sua esposa será uma das minhas mulas. E será vendida,
eventualmente.
— Não! Eu... Me desculpe, Pakhan! Eu só queria deixar essa
vida.
— A única saída dessa vida é a morte.
Sem abaixar sua arma, ele acenou para Dimitri. Seu irmão se
aproximou de Yuri, lançando-se sobre ele. Yuri abriu a boca para
gritar, mas Dimitri tirou um pano cheio de clorofórmio do bolso da
calça e o enfiou em sua boca, abafando seus gritos. Normalmente,
Alexander teria matado um traidor, mas eles estavam em um
hospital, e balas eram uma jogada arriscada.
Yuri se debateu contra Dimitri, chutando seus membros através
dos lençóis. Com um ar de satisfação, Alexander observou os olhos
castanhos de Yuri ficarem vermelhos, até que eles se fecharam
lentamente, deixando-o inconsciente.
— Dê-me — Alexander ordenou a Adrik, guardando sua arma.
Adrik tirou uma seringa de dentro de um dos bolsos de sua
camisa e a entregou a ele. Agarrando o lençol em sua mão,
Alexander virou o braço flácido e pálido de Yuri, expondo o interior
da pele e as grossas veias azuis. Atirar com balas era fácil, mas
fazia muita bagunça. Deixava sangue, DNA e suspeita. Suas armas
não eram registradas, mas uma morte acidental funcionaria melhor.
Inclinando-se para frente, ele olhou para a grande veia à espreita
sob a pele pálida de Yuri. Ela havia sido perfurada e conectada ao
tubo central intravenoso. Ele tirou a ponta do tubo e encaixou a
seringa vazia nela, pressionando-a. Yuri não acordou. Quando
terminou, enganchou o tubo de volta na veia.
Ele deu um passo para trás e Dimitri soltou Yuri.
Lentamente, uma bolha de gás encheria o coração de Yuri. Yuri
morreria com seu próprio oxigênio, sua própria respiração. Embolia
gasosa. As mesmas respirações que Yuri dava enquanto o delatava.
Ele o alimentou, confiou nele e fez dele seu soldado, apenas para
ser traído no final. Lentamente, os vasos ficariam menores a partir
do local da punção e do fluxo. O fluxo de sangue seria bloqueado...
E então... Descanse no inferno.
Yuri ainda estava inconsciente, mas seu peito subia e descia
rapidamente. Alexander e seus homens esperaram em silêncio,
ainda levaria algum tempo. Depois de dez minutos, os membros
fracos de Yuri pararam de sacudir. A máquina vital mostrou uma
linha. Apitou, pronta para alertar quem estava por perto. Satisfeito,
ele se virou para sair, mas a porta se abriu.
Ele congelou, e seus olhos se voltaram para o som.
Seus homens se levantaram, alertas, e apontaram a arma na
direção da porta, prontos para atacar.
— Você não trancou a porta? — Alexander cerrou os dentes para
Adrik.
O rosto do soldado ficou vermelho.
— Pensei ter trancado.
— Lembre-me de chutar seu traseiro mais tarde — Dimitri
repreendeu.
Segurando um suspiro desapontado, Alexander se esforçou para
não revirar os olhos. Ele não estava com disposição para matar
nenhum dos funcionários do hospital. Era perceptível demais. Com
três de seus homens apontando a arma para a porta, ele puxou a
sua e a ergueu, pronto para atirar. Seu batimento cardíaco trovejou
enquanto ele esperava, mas seu pulso permaneceu calmo, exigindo
foco. Quando a porta se abriu totalmente, seus olhos caíram para a
criatura que estava diante dele.
Uma menininha de um metro de altura.
Uma garota de olhos castanhos, lábios carnudos e pele morena.
Ela não podia ter mais de quatro anos.
A tensão nos ombros de Alexander afrouxou, e ele fez um
movimento com um dedo para que seus homens abaixassem suas
armas. Ele olhou para o traidor morto. Yuri parecia estar dormindo, e
esperava que a garotinha não pudesse dizer. A última coisa que ele
queria era uma criança de quatro anos traumatizada e gritando. Os
olhos da criança se arregalaram e se encheram de diversão.
— Ah, você tem uma arma? — ela perguntou.
Os olhos de Alexander se estreitaram.
— Ixu é legal. Minha mãe também tem uma.
Ela tinha uma pronúncia fofa quando falava, tipo Piu-Piu. Sua voz
era suave e aguda. Ele ainda não entendia o que queria dizer. A
criança de cabelos castanhos parecia estar estudando-o como ele a
estudava.
— Voxê é da políxia como minha mãe? Voxê também prende
criminoxos grandes e maus? — ela perguntou. Seus olhos grandes,
castanhos e amendoados tinham um ar de travessura.
Alexander baixou a guarda e guardou sua arma. Seus homens
seguiram o exemplo. Ele percebeu que ela não conseguia
pronunciar o “S” no meio das palavras. Agora não era hora de dizer
à criança que ele era o grande criminoso. Ele se perguntou onde a
mãe dela estava.
Ele não estava muito preocupado com a criança identificá-lo. As
crianças esquecem detalhes facilmente.
A criança olhou para o monitor.
— Que barulho é exe?
Ele acenou para Adrik para desconectar a máquina. A porta ainda
estava aberta, mas ninguém mais espreitava do lado de fora. Eles
iriam fechá-la de volta assim que saíssem. Eventualmente, alguém
da enfermagem faria a checagem durante a ronda.
— Nada — ele respondeu facilmente.
— Ele tá dormindo? — a criança perguntou, olhando para Yuri.
Seu lábio se contraiu.
— Sim. Quem é você, detskoye solnyshko?
A criança franziu o cenho.
— O que ixu quer dijer?
Sua pronúncia ficou mais forte.
— Bebê sol — respondeu Alexander.
A criança sorriu.
— Quantos anos você tem? — ele perguntou. — E onde está sua
mãe? Você não deveria estar perambulando sem um adulto.
A menina acenou quatro dedinhos no ar.
Alexander olhou, divertido. Então ele tinha imaginado certo.
— Voxê trabalha com minha mãe?
Mais uma vez, a criança não estava respondendo a ele. Em vez
disso, ela deu pequenos passos à frente e agarrou a mão dele,
puxando-o, forçando-o a dar dois passos. Seus soldados ficaram
tensos perto dele. Ele estendeu a mão, e eles pararam.
— Vamox dar um oi para a mamãe! Vou dijer que voxê é um
polixial como ela — a criança disse.
Alexander parou imediatamente.
— Não acho que seja uma boa ideia a mamãe conhecer um
estranho — ele repreendeu.
E também, porque a mãe provavelmente presumiria que ele
estava tentando sequestrar sua filha. A criança não podia descrevê-
lo com precisão, mas, sem dúvidas, a mãe poderia. Se ela fosse
uma policial, ela com certeza saberia quem diabos ele era.
A criança de olhos castanhos apenas piscou, o marrom neles
escurecendo.
— Vamox! Vamox lá — ela disse teimosamente, puxando-o e
forçando-o a se mover.
Ele olhou de volta para seus homens.
— Encontro vocês lá fora.
Eles apenas assentiram. Seu irmão Dimitri ainda permaneceu,
olhando para ele com uma expressão imperturbável. Afastando-se
lentamente, seu irmão inexpressivo conectou a máquina novamente,
e Alexander fechou a porta. Ele tentou puxar a mão de volta, mas a
criança apenas a segurou com as duas mãos. Esta era uma
situação complicada. Como se desvencilhar de uma criança
pegajosa?
Passando uma mão por sua imaculada barba negra, ele ponderou
em pensamento. Ele não tinha experiência com crianças e sempre
ficava longe delas. Elas eram muito exigentes, curiosas, e sempre
que os filhos dos soldados vinham até ele em casamentos, ele
sempre se afastava. Crianças menores de seis anos eram irritantes.
As mais velhas eram mais disciplinadas. Ele odiava especialmente
quando os pequenos o cutucavam.
— Onde estamos indo? — ele perguntou finalmente.
Seu olhar caiu para suas mãos entrelaçadas. Ele se elevava
sobre ela por quase um metro, e ela ia apenas até suas coxas.
— Quarto da mamãe — ela respondeu.
Alexander franziu o cenho. Ela é uma paciente aqui?
Ele levantou o braço para correr os dedos pelo cabelo grosso e
preto, mas então se lembrou que estava arrumado e preso atrás das
orelhas. Abaixando a mão, notou os olhares sensuais das
enfermeiras por quem passou. Ele sorriu.
Escondendo um sorriso, elas viraram seus rostos corados em
direção ao chão, e ele seguiu em frente. A criança ainda estava
dedicada à missão de encontrar sua mamãe. Se a mãe o
reconhecesse, somando dois e dois, ele provavelmente acabaria
matando-a.
— Chegamos — anunciou a criança quando chegaram à sala no
meio do corredor e entraram. — Minha avó tá falando com o
médico, max mamãe tá aqui.
Os olhos de Alexander esquadrinharam a figura na cama.
Uma jovem estava deitada com os olhos fechados.
Inconsciente ou dormindo?
Ele não sabia dizer.
A criança largou sua mão, mas ele não se virou para sair. Ele
deveria sair. Era uma péssima ideia ficar por muito tempo. Em
breve, os médicos encontrariam o corpo de Yuri. Ele desejou que
seus pés se movessem, mas eles permaneceram colados ao chão,
mantendo-o completamente à sua mercê. Curiosamente, ele olhou
para a mulher, preso como em um transe.
O rosto dela estava limpo e sem maquiagem. Seu cabelo
castanho-claro e liso se derramava ao redor dela como uma
auréola. Maçãs do rosto altas emolduravam seu rosto delicado.
Agora, ele conseguia dizer de onde sua filha herdara a beleza. A
mãe tinha o mesmo tom de pele da filha e os lábios carnudos.
Depois de um momento, ele percebeu para quem estava olhando.
Era como olhar para um fantasma.
Ela era a esposa do ex-diretor do FBI.
Caralho. Ele precisava se mover agora antes que ela acordasse.
Alexander deu um passo atrás, pronto para sair, mas a garotinha
agarrou sua mão novamente.
Suspirando silenciosamente, ele conteve o desejo de fulminar a
criança com o olhar. Em vez disso, apenas olhou para ela e tentou
controlar o aborrecimento que se agitava nele.
— Mamãe, dá um oi para meu novo amigo — disse a criança,
aparentemente alheia ao fato de sua mãe estar inconsciente. — O
nome dele é... — ela parou e seus grandes olhos encontraram os
dele, talvez percebendo que ela nunca perguntou o seu nome.
Ele não podia revelar seu nome verdadeiro, então deu seu
apelido. Apenas aqueles próximos a ele o chamavam assim:
— Zander — ele murmurou. — Qual é o seu nome?
A garotinha sorriu:
— Noura — ela respondeu e se virou para sua mãe adormecida.
— Mamãe, este é o Jander! — Noura declarou antes de olhar para
ele novamente: — Jander, esta é a mamãe.
Ele escondeu um sorriso com a pronúncia errada do nome. Noura
também não conseguia pronunciar o “Z”. Ele olhou para a bela
mulher adormecida novamente antes de olhar para Noura.
— O que aconteceu com ela? — ele perguntou.
A garotinha franziu o cenho.
— Minha avó dixe que foi um axidente. Mamãe tá dormindo há um
tempo.
Alexander arqueou uma sobrancelha.
— Dormindo? — Ela apenas assentiu. — Por quanto tempo?
A garotinha acenou três dedos no ar.
— Três dias? — ele perguntou.
Noura balançou a cabeça.
— Três meses?
— Não. — Os olhos de Noura não tinham brilho agora.
Três anos. Coma. Ela está em coma, ele percebeu depois de um
momento.
— O que aconteceu com ela?
— Vovó dixe que foi um axidente de carro.
Ela devia ter um ano quando sua mãe entrou em coma. Ele olhou
friamente para a mulher inconsciente. Alexander se virou para sair,
mas seu olhar caiu sobre um livro de histórias deitado na cadeira
próxima.
Uma princesa dormindo.
— Que história é essa? — ele perguntou a Noura.
Ela soltou a mão dele, suas perninhas marcharam em direção à
cadeira e ela pegou o livro. Noura mostrou a capa, ainda sorrindo, e
isso fez com que ele concluísse que ela era uma criança feliz.
— Parece com sua mãe — ele comentou.
A criança riu.
— Minha mãe também é uma prinxeja.
Ele não queria desapontar a menina, então escolheu ficar quieto.
— Sabe, nexe conto de fadax, tem um prínxipe que beija a
prinxeja adormexida e ela acorda — Noura falou novamente, e seus
olhos arregalados caíram sobre sua mãe. — Talvez voxê também
devexe beijar ela.
Beijar? Ela quer dizer beijar?
Ele a ouviu direito?
— Ela pode acordar! — exclamou Noura.
— Já fiquei muito tempo aqui. Eu deveria ir embora.
Suas pernas se viraram e ele começou a caminhar em direção à
porta. As perninhas de Noura imediatamente correram na frente
dele, bloqueando sua saída. Ela esticou os braços e as pernas, em
uma postura que significava que estava falando sério. Ele olhou,
divertido e cheio de curiosidade sobre essa menina. A verdade é
que estava começando a gostar do pequeno anão irritante.
— Beija ela — ela exigiu. — Ela pode acordar.
— E se ela me transformar em um sapo?
Noura apenas piscou, confusa.
OK, deixa para lá. A criança obviamente não conhecia aquele
conto de fadas.
— P-Por favor, Jander! — Noura juntou as mãos à sua frente.
Ele tinha que admitir: a garota era adorável.
Ele passou a mão pelo rosto e olhou para a viúva adormecida. Ela
era deslumbrante, e ele não se importaria nem um pouco em beijá-
la. Mas ela era a porra da esposa de um policial, e ele não se
aproximaria dela. Alexander voltou seu olhar para Noura e balançou
a cabeça.
— Por que você não pede ao seu pai? — ele deixou escapar.
Ele esqueceu por um segundo que o diretor anterior do FBI
estava morto. O pai de Noura estava morto. Segurando a
respiração, ele esperou a reação de Noura. E ele conseguiu uma.
Seus enormes olhos se encheram de lágrimas, ameaçando escorrer
pelo rosto.
Ai, Jesus. Caralho.
— Tudo bem — ele estremeceu. — Eu vou fazer isso. Não chore.
As palavras saíram em um tom de comando, mais do que ele
gostaria.
Os olhos de Noura brilharam instantaneamente, e ela enxugou as
lágrimas, que logo foram substituídas por um sorriso radiante. Na
verdade, as lágrimas desapareceram como se nunca tivessem
estado lá, e Alexander encarou-a por alguns segundos, imaginando
onde as crianças aprendiam esse tipo de comportamento desonesto
e manipulador. Era como se elas soubessem que chorar chamaria a
atenção de qualquer um. Merda de crianças dramáticas. Lançando-
lhe um olhar de malícia, ele pressionou a ponte de seu nariz, mas a
criança apenas deu uma risadinha. Sua cara de vilão não funcionou
com ela. Quem a criou fez um trabalho terrível em não ensiná-la a
não falar com estranhos.
— Prometa-me que não vai contar a ninguém que me viu — ele
ordenou.
Os olhos de Noura se arregalaram.
— Ah... Por quê?
— Faça um acordo comigo — Alexander respondeu, evitando sua
pergunta. — E você não pode contar a ninguém que tem um amigo
chamado Zander.
A criança riu.
— Voxê é meu amigo?
Ah... porra...
Ele tinha acabado de dar esperança a uma criança órfã. Uma
pontada de culpa encheu seu coração. Era irônico que ele não se
sentisse culpado pela morte de Yuri, mas essa criança, com sua voz
fofa e sua natureza alegre, estava fazendo com que ele sentisse
coisas que normalmente não sentia.
Crianças. Olhos grandes e rostos pequenos. Elas eram pequenos
demônios. Mágicas como pequenos feiticeiros. Podiam derreter os
idiotas mais endurecidos e de coração de pedra com seus sorrisos e
inocência, e ele não tinha interesse em se transformar em uma poça
de sentimentos logo hoje. Se o fizesse, poderia culpar a oxitocina
liberada em seu corpo. Agora ele conseguia entender por que as
pessoas que viam uma criança fofa diziam que queriam mordê-la.
— Promete, Noura — ele exigiu, contundente, deixando de lado o
jeito calmo que normalmente carregava.
Ele apoiou as mãos nas coxas e se elevou sobre a garotinha.
Normalmente, essa postura deixaria os outros com medo, mas
Noura apenas riu. Ele se perguntou de que planeta ela era e tentou
de forma mais firme, mas, novamente, ela apenas sorriu.
— Voxê deveria xer um ator — disse Noura animadamente.
Apertando a ponte do nariz novamente, ele se virou e caminhou
em direção à viúva adormecida. Ele já queria acabar com isso.
Alexander sabia que estava preso em uma situação complicada, e
isso era algo raro.
Como lutar contra uma criança sem recorrer à violência?
Ele fez uma pausa, ficando a apenas alguns centímetros de
distância da mulher.
De perto, ela era ainda mais atraente. Nenhuma maquiagem em
seu belo rosto, e seu cabelo parecia saudável e brilhante. Ela era
radiante. As enfermeiras deviam estar cuidando bem dela.
Alexander se abaixou, e seu antebraço descansou no travesseiro
macio acima da cabeça da mulher adormecida, e ele aproximou-se
dela. Sentiu o cheiro de seu perfume natural e delicado. Uma
fragrância floral na qual não queria pensar. Seus olhos o atraíram
novamente. Longos e grossos cílios pretos emolduravam seus olhos
fechados. Sem pensar, ele estendeu um dedo para traçá-los.
Ele conseguia ver cada sarda, cada poro. Seus olhos se
encheram com a beleza do rosto da mulher e deslizaram para seu
pescoço longo e nu. A pulsação contra sua garganta se moveu, e
ele ergueu os olhos.
Alexander olhou por trás do ombro, encarando Noura, uma
criança animada e que já havia dado sua bênção. Ele iria para casa
e pularia de cabeça em sua piscina, para esquecer toda essa
bagunça, pois a última coisa que queria era beijar uma mulher meio
morta depois de matar alguém.
Alexander se inclinou, preenchendo o espaço entre eles, e
pressionou seus lábios contra os dela.
Apenas um beijinho. Um beijo, quase casto.
Nada mais, nada menos.
Ela tinha lábios quentes e macios. Alexander deixou que seus
lábios permanecessem nos dela por alguns segundos, até que um
movimento súbito surgiu sob ele. Os olhos dela se abriram, e seus
lábios cheios se moveram contra os dele. Alexander se afastou e
olhou para as pálpebras trêmulas da mulher.
Ainda em estado grogue, a viúva adormecida despertou.
GHISLAINE

MINHA VISÃO ESTAVA turva, e minhas pálpebras, apesar de


ainda estarem pesadas, se abriram lentamente.
Respirei fundo quando a dormência do sono desapareceu dos
meus membros, mas nenhum ar saiu, e eu engasguei por causa da
minha língua seca. Uma luz branca ofuscante me atingiu, vinda de
todos os ângulos, invadindo minha visão com uma luminosidade não
natural. Eu não precisava de um espelho para saber que meus
olhos, com suas pálpebras pesadas, estavam afundados.
Pisco rapidamente, e sinto a visão retornando.
Um par de olhos escuros e um sorriso sinistro e malicioso me
encaravam.
Eu empurrei minha cabeça para trás em meu travesseiro.
Quem é você?
Ele não era familiar, e minha mente nebulosa não o reconheceu.
Exalei, e meu hálito quente pousou em seus lábios. Seu olhar
escureceu e fixou-se novamente em meus lábios entreabertos antes
de encontrar meus olhos. O cabelo do estranho tinha mechas
negras que pareciam ser muito sedosas e macias. Elas estavam
presas e estilizadas atrás de suas orelhas. Um contraste escuro
contra sua pele pálida e seus olhos, que eram muito escuros.
Eu nunca tinha visto olhos pretos como os dele. Pareciam duas
piscinas cheias de abismo e vazio. Eu podia ver meu reflexo neles,
olhando de volta para mim. Uma barba preta aparada cobria suas
maçãs do rosto proeminentes. Nem mesmo o blazer preto justo
conseguia esconder os músculos que se retesavam por baixo da
roupa, que se agarrava à sua pele como uma armadura.
Ele estava envolto na escuridão. Sem cor.
Os olhos. O cabelo. Seu senso de estilo.
Seu braço descansava acima da minha cabeça, e ele ainda
estava sorrindo. Era um sorriso perigoso e hostil, como se não
estivesse fazendo nada de bom, e arrepios percorreram minha
espinha.
O misterioso estranho exalava confiança e havia uma aura sobre
ele. Poder. Ele exalava a poder e riqueza. Eu queria gritar com ele,
mas estava muito atordoada.
Ele ainda não tinha se afastado de mim. Estava tão perto, que
meu olhar se fixou em seus lábios. Eu estreitei os olhos e, como em
um flash, a lembrança deles roçando contra os meus cruzou a
minha mente.
Ele me beijou.
Talvez eu tivesse imaginado isso, mas não conseguia esquecer a
sensação. Foi um beijo casto. Um pequeno beijo. Não poderia ter
sido mais do que alguns segundos... Bem, eu não tinha certeza
porque não sabia há quanto tempo estava dormindo. Achei que
estava sonhando e que talvez ainda estivesse presa nesse sonho.
Isso não poderia ser real. Certo?
Sem chance. Quem acordava com um beijo?
Era uma loucura. Impossível.
Eu estava perdendo a cabeça.
Fechei os olhos, desejando acordar, e me forcei a continuar
respirando, a ficar calma. Eu não sabia onde estava ou quem era
esse homem. Passos se afastaram de mim até desaparecerem.
Apenas o fluxo do meu sangue passou pelos meus ouvidos, e minha
respiração se intensificou. Quando abri os olhos novamente, depois
de algumas batidas, o homem tinha ido embora.
Pisquei, assustada novamente. Onde ele havia ido?
Olhei ao redor, analisando o ambiente desconhecido. As paredes
brancas brilhantes eram hostis. Esfreguei os olhos com as costas
das mãos e estremeci quando percebi que tinha usado de muita
força. Meu olhar foi para os intravenosos em meus braços.
Hospital. Eu estava em um hospital.
Meu corpo dolorido se mexeu — membros que doíam como se
não se mexessem há anos. Um gemido arranhou minha garganta
seca, e eu esfreguei minha testa latejante. A luz artificial acima da
minha cabeça não estava ajudando em nada. Um tecido áspero se
esfregou contra a minha pele, e olhei para a roupa branca e azul
que eu usava. Franzindo a testa, cerrei os punhos para dentro e
para fora, tentando retomar a sensação de usá-los.
Passos rangeram nas proximidades, e eu fiz uma pausa.
Era aquele homem de novo? Ele havia retornado?
Meus olhos ainda embaçados se ergueram, esperando por ele
novamente, mas meu olhar se desviou para uma criança pequena
pairando nas proximidades. Seus grandes olhos castanhos
assustados olharam para os meus olhos castanhos, tão
semelhantes. Seus lábios carnudos se assemelhavam aos meus.
Agora, quem era essa criança? Fui recebida por rostos de pessoas
que não reconheci. Ela se parecia comigo, mas eu não conseguia
identificá-la.
— Mamãe! — a criança gritou.
Meu coração martelou no meu peito, e minhas costas se
pressionaram contra o travesseiro macio novamente.
Não, é impossível.
Um momento depois, minha visão ficou escura.
Acho que desmaiei.
Os gritos da criança ainda ecoavam em meus ouvidos.
Mamãe! Mamãe! Mamãe...
Ainda perdida em pensamentos, caí em um sono sem sonhos.
Acordei mais tarde com uma imagem de olhos escuros ainda
gravados em minha mente. Aquele homem ainda me assombrava
quando eu dormia. Eu não tinha ideia de quanto tempo havia
passado. Ergui os olhos cansados e quatro pessoas me
cumprimentaram.
Um médico estava lá no lugar do outro.
O crachá dizia: Dr. Garcia.
O Dr. Garcia era um homem de meia-idade, moreno, bronzeado,
alto e com ombros largos. Um jaleco branco emoldurava seus
ombros. Ele usava um uniforme azul e trazia um estetoscópio
pendurado em seu pescoço. Depois de um momento me estudando,
ele deu um sorriso gentil. Era diferente do sorriso do estranho
anterior e não me colocou em alerta máximo. Seu sorriso era calmo,
reconfortante, e aquietou meu coração louco. O mesmo coração que
estava retumbando no meu corpo como um ioiô.
Eu não conseguia ver os rostos atrás do médico, mas podia ver o
contorno de uma mulher. Três mulheres, na verdade. Três.
Por que isso soava tão familiar?
Abri a boca para falar novamente.
Finalmente, encontrei as palavras:
— Por que estou aqui?
Minha voz saiu muito presa. Minha língua estava grossa e eu a
sentia pesada na boca. Isso me deixou ansiosa, as palavras soavam
estranhas na minha língua como se eu não falasse há dias. Ainda
atordoada e entorpecida do meu sono, olhei para os intravenosos na
minha pele, lembrando que ainda estava no hospital. Minha mente
estava lenta e nebulosa.
— Sou o Dr. Garcia. Seu médico. Você está no Hospital Geral de
Nova York e está segura. — Ele deu outro de seus sorrisos gentis.
— Você pode dizer seu nome para mim?
Ele havia ignorado completamente minha pergunta. Por que
estava me perguntando isso? Olhei para ele sem expressão.
— Preciso saber o quanto você se lembra — disse ele.
Oh. Pisquei algumas vezes, tentando me lembrar de uma
resposta:
— Ghislaine... — respondi depois de um momento. — Meu nome
é Ghislaine Khalil.
O médico assentiu, satisfeito.
— Quantos anos você tem?
Ele estava me testando.
— Vinte e três — respondi.
Ele apenas acenou com a cabeça, mas, desta vez, ele perdeu o
sorriso.
— Você sabe em que ano estamos?
Minha testa se enruga.
— 2019.
— Qual é a última memória que você tem?
Fechei os olhos com força, tentando me lembrar, mas fiquei em
branco.
— Minha mente está confusa — admiti, abrindo os olhos.
O médico ficou em silêncio, enquanto me estudava como se eu
fosse um experimento científico. Alguns momentos se passaram e
ele permaneceu mudo. Um lampejo de aborrecimento surgiu em
mim quando percebi que o médico estava demorando. Olhei para o
Dr. Garcia com ódio nos olhos, e logo ele não parecia mais tão
gentil.
— O que está acontecendo? — exigi saber. — Você não pode
esconder coisas de mim. Meu marido é o diretor do FBI e eu sou
uma agente. O que diabos está acontecendo? — Minha voz ficou
mais pesada e rouca.
O Dr. Garcia franziu a testa e abriu a boca para falar, mas a
mulher atrás dele finalmente se fez visível. Lágrimas enchiam seus
olhos arregalados e sombrios. Ela olhou para mim, e estava
fungando. Eu a reconheci.
— Aaama — sussurrei, sem fôlego. Minha tia paterna.
Uma a uma, as duas mulheres atrás dela se tornaram visíveis.
Minhas três tias, Sabrina, Inês e Sarah, estavam diante de mim.
As mulheres, minhas guardiãs que me criaram. Elas olhavam uma
para a outra. Para mim. Olhos castanhos, altas e lindas. O sorriso
que estava se formando em meus lábios congelou quando observei
suas aparências. Rugas cercavam minha tia mais nova, Inês. Elas
não estavam lá da última vez que a vi.
Minha tia do meio, Sarah, tinha cabelos duas vezes mais
compridos, até a cintura. A última vez que a vi, estava com um corte
na altura dos ombros.
Engoli em seco, mas a saliva havia secado na minha língua. Não
havia mais nada em mim para engolir. Um arrepio percorreu minha
espinha. Eu realmente esperava que tia Sarah estivesse usando
aplique, mas, então, olhei para minha tia Inês. As rugas não podiam
ser fingidas.
Elas vieram com a idade com o passar do tempo.
Quanto tempo se passou?
— Mamãe! — uma voz gritou novamente.
Eu empurrei meu corpo para cima, e minha cabeça olhou
bruscamente para a direita, para a criança de olhos castanhos. Seu
sorriso brilhante me cumprimentou novamente. Não a tinha notado
até agora. Ela devia ter ficado quieta o tempo todo. A tontura me
atingiu com o movimento repentino. Gemi e toquei minha testa.
Mãos macias tocaram meu rosto e murmuraram:
— Descanse, meu bem.
Não precisei olhar para saber que era minha tia Sabrina.
Apenas balancei a cabeça e deitei de volta no meu travesseiro.
— Mamãe, voxê acordou! — a criança gritou novamente.
Fechei os olhos com força, querendo calar a voz dela.
Ela tinha problema na fala.
Um flash de memória deslizou em minha mente.
Mamãe.
Uma pequena voz falou comigo.
Voxê é minha prinxeja adormexida, mamãe. Uma prinxeja da vida
real.
Eu me lembrei da voz dela agora. Achei que só existia em meus
sonhos... Mas era real. Ela era real. Eu não sabia quanto tempo ela
tinha falado comigo durante tudo isso, e há quanto tempo eu estava
dormindo, mas eu sabia que ela estava lá.
— Quem é essa criança? — perguntei, fechando meus olhos.
Ninguém respondeu, e meu coração se partiu.
— Por que ela está me chamando de mamãe?
Novamente, nenhuma resposta.
Eu tinha uma filha.
Eu me lembrei... Mas minha filhinha tinha apenas um ano de
idade.
Minha pequena Noura.
Ela ainda não conseguia andar com as pernas bambas e
gordinhas. Ainda estava engatinhando. Os médicos disseram que
ela poderia ter um desenvolvimento tardio, já que ela era minha
primeira filha. Agora, esta garotinha estava pulando para cima e
para baixo, como se estivesse pronta para correr uma maratona. Ela
já estava falando. Minha filhinha só falava arrulhos.
Eu queria negar a verdade, mas não podia fugir dela para sempre.
Passei a mão pelo meu rosto e agarrei meus cabelos castanhos,
querendo arrancá-los. Uma lágrima escorreu dos meus olhos
fechados e rolou pelo meu rosto.
— Em que ano estamos? — perguntei, finalmente, fungando. Abri
meus olhos, derrotada, e olhei para cima com olhos vermelhos.
— 2022 — respondeu o Dr. Garcia.
Meu coração se despedaçou e a dormência me encheu.
— Você tem vinte e seis.
Três anos se passaram.
Três longos anos.
E eu não tinha nenhuma lembrança real deles.
Apenas as lembranças de Noura falando comigo o tempo todo.
— Você estava em coma profundo — Dr. Garcia continuou. — Eu
não esperava que você acordasse tão cedo, honestamente — ele
admitiu em voz baixa. — Com pacientes em coma, nunca podemos
dizer. Um dia, há um movimento da mão, e, no dia seguinte,
desaparece.
Eu estava em um sono tão profundo, que não podia ser quebrado.
Até que... um par de lábios roçou os meus.
Meus olhos se arregalaram.
— Havia um homem no meu quarto. Onde ele está? — Olhei para
fora pela porta aberta, mas não havia ninguém à vista. Olhei para
trás, para um surpreso Dr. Garcia.
— Um homem? — ele coçou a cabeça antes de acrescentar: —
Você não teve nenhum visitante masculino hoje.
Fiz uma careta, descontente com a resposta.
— Eu me lembro dele! — reclamei. — Ele... Ele…
Minhas bochechas ficaram rosadas.
Me beijou. Meus pensamentos pararam, e eu não consegui
terminar minha frase. Parecia inacreditável aos ouvidos e bastante
embaraçoso também. Eu não queria adicionar psicótico e delirante
ao meu diagnóstico.
Um coma quebrado com um único beijo mortal.
Eu quase quis rir. Talvez tivesse imaginado tudo, uma vez que
ninguém viu o homem sair. Olhei para a criança agitada... Minha
filha. Engoli em seco quando a olhei novamente. Ela não parecia
familiar. Não reconheci essa linda garotinha.
Lembrei-me de que Noura tinha cabelo castanho-claro e curto, e
agora estava na altura dos ombros. Minha filhinha era menor, e essa
Noura mais velha tinha quase um metro de altura. Ela estava
andando e falando.
Eu tinha perdido tanta coisa. Eu não estava lá quando ela falou
sua primeira palavra de verdade. Qual tinha sido sua primeira
palavra? Queria saber tudo. Estava faminta por qualquer tipo de
informação. Lágrimas queimaram em meus olhos.
— Não chore, meu bem — tia Sarah se inclinou e sussurrou
contra o meu cabelo.
Funguei ainda mais forte e esfreguei minha mão no meu nariz.
Estava ficando mais difícil me segurar. Exalei, tentando manter
minha respiração calma, mas as lágrimas ainda derramavam, de
qualquer maneira. Forçando-me a respirar fundo, olhei para o Dr.
Garcia com uma visão turva. Choraria mais tarde, mas, agora,
precisava de respostas.
Limpando minha garganta, falei:
— Você disse que eu não tive nenhum visitante masculino hoje.
Por que meu marido não me visitou?
Não conseguia ver bem o médico, mas notei seu suspiro agudo.
Ele devia ter soltado sem querer. Eu não poderia saber? Por quê?
Enxuguei os olhos com a roupa de hospital feia e áspera e olhei de
forma questionadora para o médico.
— Onde ele está? — perguntei. — Ele está trabalhando hoje? Ele
sempre foi tão ocupado e dedicado ao seu trabalho — Um leve
sorriso se formou em meus lábios —, ele deve saber que eu estou
acordada. — Meus olhos brilharam, e a tensão em meus ombros
desapareceu.
O silêncio apenas me cumprimentou em troca. Olhei para minhas
tias, atordoada e confusa, procurando respostas. Quando abri a
boca para falar, o Dr. Garcia falou antes de mim:
— Qual é a última lembrança que você tem de seu marido?
Suspirei, frustrada com as perguntas irritantes que ele estava
jogando no meu colo. Eu não podia nem ficar chateada com ele,
pois o médico estava apenas fazendo seu trabalho. Enfiei minhas
longas mechas castanhas atrás das orelhas e respirei com
dificuldade.
— Acabamos de sair do escritório corporativo, meu marido e eu
íamos fazer o trabalho de campo. Estávamos dirigindo. E então…
Franzi minhas sobrancelhas quando minha mente ficou em
branco.
Não conseguia me lembrar de mais nada. Havia uma lacuna entre
minha memória, e eu não sabia o porquê.
Um choro encheu o ar, e meus olhos se voltaram para minha tia
Inês. Sua pele morena estava manchada e vermelha. O que estava
acontecendo?
O Dr. Garcia tinha uma expressão lamentável no rosto, mas seus
olhos eram gentis enquanto falava:
— Acredito que você tem amnésia seletiva. Há uma parte sua que
não se lembra daquela noite.
Olhei cautelosamente a minha volta, e, antes que eu pudesse
fazer qualquer outra pergunta, a criança passou pelo médico e por
minhas tias, ficando bem na minha frente. Ainda era difícil vê-la
como minha filha.
— Voxê é muito bonita, mamãe — ela sussurrou, inclinando-se
para frente, e descansou a mão no meu joelho. — A vovó xempre
falava comigo de voxê.
Soltei um suspiro doloroso e encarei a criança sorridente. Eu fiz
uma careta para o jeito que ela falou. Seu S era pronunciado como
um X. Olhei para minhas tias.
— Há quanto tempo ela fala assim? — sussurrei.
A criança ainda sorriu, sem perceber o que eu estava insinuando.
Tia Sarah descansou a mão no meu ombro:
— Desde que ela aprendeu a falar — ela respondeu.
Respirei fundo. Era fofo agora, mas trocar letras poderia levar ao
bullying mais tarde na vida. Mordi meu lábio inferior. Minha mão
trêmula estendeu-se desajeitadamente e pousou em seu cabelo.
Acabei acariciando-a como a um cachorro.
— Ela tem um defeito na fala. O pediatra de Noura mencionou
que, às vezes, ela coloca a língua nos lugares errados da boca. Isso
faz com que distorça palavras e sílabas. Ela fica com a língua presa.
Ela tem feito terapia da fala nos últimos dois meses... Embora ela
odeie ir lá.
Balancei a cabeça, tentando entender. Era muita informação de
uma vez. Pisquei para conter as lágrimas. A garotinha ainda era
linda para mim, com ou sem língua presa.
— Você é incrível — sussurrei, inclinando-me e segurando suas
bochechas pequenas e macias em minhas mãos úmidas. Ainda me
lembrava dela como ontem, exceto que agora eu estava segurando
uma versão muito mais velha dela. Três longos anos se passaram,
mas, para mim, foi como apenas um dia. — Não posso acreditar que
eu fiz você.
Os olhos de Noura brilharam, e seus braços finos e
desengonçados envolveram meu pescoço, me puxando para mais
perto. Congelei, pega de surpresa. Estava tentando falar com ela,
mas não sabia se estava pronta para abraçá-la ainda. Movi meus
membros frios, mas não consegui envolvê-la. Sua voz era familiar.
Eu a ouvia no meu estado de coma... Mas o corpo dela era um total
desconhecido ao meu toque. Ela era maior do que eu estava
acostumada.
Alguns momentos depois, a criança baixou os braços e deu um
passo para trás, parecendo alheia ao fato de que eu não a
abraçava. Obriguei-me a desviar o olhar dela e encarei o Dr. Garcia.
— Meu marido... — só falei duas palavras.
Ele me encarou severamente, mas meu eu teimoso não estava
aceitando.
— Meu marido... — repeti enfática. — Onde ele está?
Dr. Garcia suspirou e passou a mão pelo cabelo grosso.
— Prefiro não dizer nada que possa servir como gatilho. Que tal
levarmos um dia de cada vez? — Sua voz doce e gentil estava me
enojando.
Então, uma voz falou:
— Papai tá no xéu, mamãe.
GHISLAINE

O TEMPO PAROU, e ninguém falou mais uma palavra sequer.


Tia Ines engasgou com a respiração.
Dr. Garcia suspirou e olhou para mim, como se estivesse se
desculpando.
Neste momento, percebi: eu nunca deveria ter acordado. Um
coma para o resto da minha vida não soava tão mal assim.
Virei os olhos na direção de Noura.
Seus olhos castanhos me encaravam, cheios de tristeza, e seus
lábios estavam torcidos em uma careta.
— Ixu é o que a avó me dixe.
Minha respiração ficou pesada, e eu sufoquei meus soluços
enquanto enfiava os dedos no cabelo, puxando meu couro
cabeludo. Doeu, mas eu precisava que doesse.
— Vamos, querida — tia Ines sussurrou.
Nem me incomodei em olhar diretamente para ela, mas, com o
canto do olho, pude vê-la pegando Noura pela mão e tirando-a do
quarto. Foi melhor assim. Uma criança nunca deveria ser obrigada a
presenciar o colapso nervoso de sua mãe.
Era como se alguém tivesse enfiado a mão no fundo do meu peito
e arrancado meu coração, torcendo e rasgando minhas entranhas.
Eu queria negar a verdade. Lembrei-me dele. O sorriso dele. Sua
risada... Ainda ecoava em meus ouvidos. Éramos jovens e
apaixonados.
Era tudo uma mentira. Eles estavam me enchendo com suas
malditas mentiras.
O que Noura sabia? Ela era apenas uma criança.
Não é verdade. Não é verdade, repeti como um mantra.
Acordei apenas para ter o amor da minha vida arrancado de mim,
e ver uma criança na minha frente, não um bebê. Além de descobrir
que três anos da minha vida haviam sido perdidos.
— Sinto muito — tia Sarah sussurrou. — Foi o acidente de carro.
— Ela se inclinou para me envolver em um abraço.
Deveria tê-la abraçado de volta, mas não queria seu toque. A
pessoa que eu queria não estava mais por perto. Eu nunca sentiria
seus braços em volta de mim novamente. Empurrei minha tia para
longe.
Ela chorou com o movimento. Não me incomodei em olhar para
cima, mesmo quando percebi que ela colidiu com o monitor
cardíaco. Não havia lugar para pena ou culpa em meu coração
enquanto as lágrimas inundavam meu rosto como uma cachoeira.
Havia cinco estágios do luto, e acabei de atingir meu primeiro.
As ondas de arrependimento me atingiram como as ondas longas
e lentas em uma praia rasa. Cada onda era gelada e provocava
arrepios direto na minha espinha. A culpa me comeu viva por eu
ainda estar aqui, e ele, não. Não sabia por que o destino havia
brincado com nossas vidas assim, tão perigosamente. Não sabia
por que eu não estava morta com ele.
Mas era tarde demais.
Meu marido estava morto.
Meu casamento havia terminado.
O ‘até que a morte nos separe’ veio cedo demais.

Dois dias depois, tive alta.


Durante esses dois dias em que fiquei no hospital, não pronunciei
uma palavra sequer.
Tia Ines havia trazido algumas roupas da minha casa. Olhei para
a blusa verde em minhas mãos e para a calça jeans apertada. Ela
também me trouxe roupas de baixo brancas de algodão. Eu não
tinha um espelho de corpo inteiro no quarto do hospital, então não
podia olhar meu corpo. Às vezes, quando as enfermeiras me
ajudavam a entrar no banheiro, meu corpo doía. Agora, elas me
deixaram em paz, pois eu assegurei a elas e à minha família que eu
estava bem.
Mas estava? Pelo menos, era bom fingir.
Desamarrei minha bata de hospital, tirei-a do meu corpo e a
joguei de lado na cama. Só fiquei de calcinha preta. Olhei para baixo
e estudei meu corpo esbelto. Meus braços e pernas estavam mais
magros. Eu costumava ter pernas atléticas, que tonificava com
corrida e kickboxing. Agora, elas só pareciam magras. Os músculos
do abdômen, que eu tinha me esforçado tanto para conquistar, se
foram. Agora, meu estômago estava achatado.
Eu me perguntava o que eles me davam além de glicose na veia.
Afinal, o que um paciente em coma comia?
Enfiavam um tubo de alimentação na minha garganta? Fiz uma
careta e meus olhos foram até meus seios cheios e arredondados.
Eles pareciam iguais. Continuei investigando meu corpo. Levantei
uma perna e não notei nenhum pelo no corpo. Eu arqueei uma
sobrancelha e, pela primeira vez em dois dias, um pequeno sorriso
se formou em meus lábios.
Não conhecia as regras dos hospitais, se eles depilavam ou não
os pacientes. Eu duvidava. Deve ter sido minha tia Ines. Ela era
esteticista e provavelmente me depilava para que eu não ficasse
toda cabeluda. Uma risadinha desconfortável saiu da minha boca
com a imagem da minha tia depilando minha genitália também.
Gemi e bati a palma da mão na minha testa. Isso foi embaraçoso.
Mas, pensando bem, ela me criou e me viu correndo nua desde
criança. Acho que não era tão ruim. Estendi a mão para a linha do
biquíni e rocei meus dedos contra a pele nua. Não me depilava há
dois dias e não senti nenhum pelo crescendo. Ela deve ter usado
cera. Apalpei minhas nádegas suavemente. Eu não me importava
de ter um pouco de cabelo lá, mas, claramente, minha tia me
depilou como um bebê recém-nascido. Provavelmente cresceria um
pouco.
Meu sorriso se tornou mais amplo.
Eu era como um bebê recém-nascido.
Este era o meu renascimento.
Uma segunda chance na vida.
Estendendo a mão em direção ao meu rosto, toquei minhas
sobrancelhas. Mais cedo, eu as verificara no pequeno espelho de
rosto no banheiro. Ela deve ter feito isso também. Olhei para os
meus longos fios castanhos. Agarrando a ponta do meu cabelo,
percebi que estava aparado. Um sorriso agradecido se formou em
meus lábios por minha família não ter desistido de mim. Por ainda
cuidarem de mim. Eram as pequenas coisas que contavam. Minhas
unhas estavam cortadas. Eu sempre odiei unhas compridas. Elas
sempre quebravam durante o trabalho.
Eu tinha certeza de que não parecia uma pessoa que acabou de
sair do coma. Eu parecia... normal. Sentia-me limpa, mas esperava
parecer uma mulher das cavernas que acabou de sair do
esconderijo. Uma pequena parte de mim estava feliz por eu não
parecer. Eu nem tinha certeza de como as pessoas em coma
deveriam se parecer. Além das enfermeiras, quem cuidava dos que
não tinham a mesma sorte que eu?
Eu ainda tinha minhas tias, minhas guardiãs. Elas me criaram
desde que eu era criança. Quando era mais nova, morava no
Marrocos, e me disseram que eu adoecia com frequência. Meus
pais idosos acharam que uma atmosfera diferente seria melhor para
mim. Eles eram extremamente supersticiosos e fizeram de minhas
tias paternas minhas guardiãs legais. Mau olhado era algo muito
real na minha cultura.
Eles acreditavam que eu havia sido amaldiçoada pelo mau-olhado
por causa da inveja de alguém. Meus pais abriram mão da custódia,
e eu me mudei para os Estados Unidos. Alguns anos depois, eles
morreram de velhice. Eles me tiveram em uma idade avançada, e
eu era sua única filha. Não sentia falta dos meus pais biológicos,
porque não me lembrava deles.
Suspirando, tirei minha calcinha e a substituí por uma nova, e
também coloquei meu sutiã novo. Completamente vestida, meus
dedos beliscaram a blusa, que ficou um pouco folgada em mim. Eu
ainda não estava pronta para enfrentar o mundo, mas tinha que
tentar. Durante esses dois dias, não quis visitas, e as que vieram,
além das minhas tias, me recusei a vê-las. Não tinha nenhuma outra
família nos Estados Unidos e quase nenhum amigo. Deve ter sido
alguém do trabalho.
Levantei meus ombros caídos e mantive minha cabeça erguida
enquanto saía do quarto. Jurei que todas as enfermeiras e médicos
ficaram em silêncio quando fechei a porta atrás de mim. Tentei ser
discreta, mas todos os olhos da equipe estavam em mim. Eu
provavelmente era uma pessoa milagrosa para eles. Engoli
profundamente e apertei minha mandíbula, observando meu rosto
endurecido, eles desviaram o olhar.
Alguns segundos depois, minhas tias e Noura me
cumprimentaram.
— Hora de ir para casa — disse tia Ines, estendendo balões e
uma caixa de chocolates para mim. Dei um sorriso fraco e os peguei
dela. Adorava chocolates, e meu estômago roncava. O médico
havia me avisado para comer pouco mas eu não podia consumir
grandes refeições porque meu estômago ainda não estava
acostumado com comida de verdade.
— Vamos para a minha casa? — Perguntei.
Minhas tias trocaram um olhar. Tia Sabrina respondeu:
— Claro, querida, se você quiser. Achei que seria melhor se você
ficasse em nossa casa.
Antes que eu pudesse responder, Noura se agarrou aos meus
joelhos, estendendo os braços para que eu a pegasse. Olhei para
ela com desconforto e acariciei sua cabeça. Ela franziu a testa e
olhou para tia Sabrina com lábios trêmulos. Eu estremeci com a dor
dela e escondi meu rosto em chamas. O calor tomou conta do meu
corpo, me deixando com a sensação de estar prestes a pegar fogo.
Felizmente, tia Sabrina teve pena da criança e a pegou nos braços.
Noura continuou a olhar para mim com os olhos tristes, o brilho
neles desaparecendo a cada segundo.
Doeu meu coração. Queria dizer a ela que não era ela, era eu.
Esperava que minhas tias tivessem conversado com ela sobre isso,
que eu iria precisar de espaço, mas, pelo jeito que ela se agarrou às
minhas pernas, duvidava que alguém tivesse falado com ela.
Gostaria de poder olhar para Noura da perspectiva dela, mas não
sabia se estava pronta para ser mãe de uma criança de quatro
anos. Quando tudo aconteceu, eu estava amamentando e ela tinha
apenas um ano. Eu ainda me sentia do mesmo jeito, e, para mim,
ela envelheceu da noite para o dia, e eu honestamente não fazia
ideia de qual seria o meu próximo passo.
Percebi que tia Sabrina ainda estava falando enquanto descíamos
o corredor.
— É só que você será atingida por uma onda de lembranças
quando for para sua casa. Talvez uma pequena pausa seja melhor.
Eu apenas balancei minha cabeça.
— Quero morar na minha casa.
— Onde moramos não é a sua casa também? — Tia Sarah
perguntou, sua voz dando a impressão de estar ofendida.
Um suspiro frustrado deixou meus lábios. Eu não estava
melhorando as coisas para ninguém ao meu redor. Eu tinha certeza
de que estava dando vibrações de princesa do gelo para qualquer
um que ousasse estar perto.
— É... — balbuciei — Mas eu só quero estar perto de... — Minha
voz sumiu, e eu me segurei antes que meus olhos se enchessem de
lágrimas novamente. Dele. Eu queria estar perto dele. Suas fotos. A
casa que montamos juntos. As memórias que construímos.
Tia Sabrina deu um olhar de entendimento e assentiu.
— Tudo bem, se é isso que você quer. É só que a mudança
repentina pode ser demais para Noura — acrescentou.
Pisquei lentamente, não a entendendo.
— O tribunal nos deu a custódia temporária de Noura até você
acordar. Todos os anos, vamos ao tribunal. O tribunal revisa tudo e
acrescenta mais seis meses. A custódia de Noura conosco ainda
está em vigor por três meses até que seja devolvida a você. Ela está
morando conosco o tempo todo.
Oh. Isso fazia sentido.
— Eu não tentaria roubá-la de vocês — respondi, me forçando a
sorrir. — Vocês são as guardiãs dela também... Assim como foram
minhas. Posso entender seu apego.
Tia Sabrina retrucou:
— Ah, você sabe que eu não quis dizer isso. Claro, você pode tê-
la de volta, como deveria. Você é a mãe dela. Todos os dias, sempre
falamos de você. Todos os dias, visitamos você. Nunca deixamos
ela te esquecer.
Meus olhos lacrimejantes encontraram os dela, e eu assenti, sem
palavras.
Nunca poderia esquecer o que elas fizeram por mim.
Se fosse outra pessoa, elas teriam puxado o plugue há muito
tempo e tomado minha filha como delas.
— É só isso, vai ser um novo ambiente, uma nova casa para
Noura — tia Sarah entrou na conversa.
Fiquei olhando por alguns segundos antes de uma ideia explodir
na minha cabeça.
— Por que vocês três não vêm morar comigo por algumas
semanas?
— Mesmo? — Tia Ines exclamou excitada ao nos depararmos
com o Dr. Garcia. — Você não se importa?
— Claro que não — respondi.
Eu não era um monstro que tiraria Noura delas.
O Dr. Garcia me entregou os papéis de alta e me deu algumas
instruções. Devo ter perdido o foco, porque não prestei atenção a
nada que saiu de sua boca.
Olhos desajeitados de estranhos estavam em mim novamente.
Acenei para ele educadamente, embora quisesse me livrar dele e
deste lugar. Este hospital foi minha casa por três anos, mas como
algo poderia ser um lar se você nem conseguia se lembrar? Nunca
pertenci aqui. Não era para ficar aqui para sempre.
— Ghislaine — disse ele, tirando-me dos meus pensamentos.
Olhei para ele, e ele segurava um arquivo preto na frente. — Este é
o resumo do seu caso e do seu falecido marido na noite do
acidente.
Meus ouvidos despertaram e eu escutei.
— Já que você não se lembra daquela noite, não quero dizer
nada traumatizante para servir como gatilho. Suas tias me pediram
para fazer o mesmo. — Fiz uma careta e olhei para meus parentes,
que estavam olhando para qualquer lugar, menos para mim. —
Porém, você é adulta, então estou dando este arquivo para você. Se
você quiser, pode lê-lo em seu próprio tempo. — Então seu rosto fez
uma careta. — Se você tiver alguma dúvida, pode vir falar comigo a
qualquer momento. Meu cartão também está anexado a esse
arquivo. Eu recomendaria esperar até você ter sua memória
completa de volta. Sua situação é altamente sensível.
Mordi a parte interna da bochecha e balancei a cabeça
lentamente. Satisfeito, ele entregou o arquivo, deixando-me segurar
um pedaço da minha vida.
O que diziam as anotações?
Curiosa, eu queria espiá-las, mas, agora, queria esquecer tudo o
que havia acontecido. Eu queria descansar. Meu sono profundo
havia sido interrompido, e eu estava pensando em dormir
novamente. Estávamos prestes a virar em direção à saída, mas
meus ouvidos se alinharam com a conversa da televisão.
Olhei para a tela plana plantada atrás da parede da recepcionista.
Eu peguei o nome Yuri Sidorov e morto. Continuei avançando. Parei
novamente quando ouvi A máfia russa e Solntsevskaya Bratva.
Agora, isso era familiar.
Em alerta, uma tensão pareceu tomar conta dos meus ombros.
Meus olhos estavam presos na tela da TV.
— A polícia ainda está investigando a morte de Yuri Sidorov. Se
foi natural ou se houve ato criminoso, descobriremos — disse o
repórter da TV.
Eu estava ouvindo, acompanhando as atualizações, quando
Noura falou ao meu lado.
— Conhexo exe homem, vovó Xabrina.
Eu nunca tinha me virado tão rapidamente. Virei a cabeça muito
rápido, e a pressão me atingiu. Pisquei lentamente, tentando
recuperar o controle da minha oscilação. Soltei uma respiração
profunda.
— Você está bem? — perguntou tia Inês.
Concentrei-me apenas em Noura, que ainda estava nos braços de
tia Sabrina.
— O que você quer dizer? Você o conhece?
Como essa criança conhece um mafioso russo?
Ela sorriu.
— Ele estava dormindo no quarto.
Dormindo ou... morto?
Raios de choque correram pela minha espinha. Eu sabia que a
definição dela de dormir era diferente da minha. Ela acreditava que
um coma era considerado dormir, mas as notícias não
mencionavam nenhum coma para o mafioso Yuri Sidorov.
— O que você estava fazendo vagando por aí? — Tia Sabrina a
repreendeu. Noura deu uma risadinha e escondeu a boca atrás das
mãos. Eu não pude deixar de sorrir. Ela era uma criança alegre.
Lembrava meu marido. Tinha seu sorriso e risada. Sempre fui quieta
e mais reservada.
— Extava entediada — ela murmurou. — Extava andando.
— O que você viu? — perguntei, cuidadosamente alerta.
— Oh, Jan... — ela fez uma pausa, e seus lindos olhos se
arregalaram. — Nada! Não vi nada.
Ela apertou os lábios carnudos em desafio.
Eu a encarei um pouco mais, ela sabia de alguma coisa e, por
algum motivo, ela estava escondendo. O que ela ia dizer? Jan? Eu
não sabia se isso era uma pessoa ou uma coisa. Não acendeu
nenhuma luz. Eu provavelmente faria mais algumas perguntas mais
tarde e poderia ter que relatar isso para a equipe do FBI, mas queria
saber o quanto ela sabia. Eu me perguntei se eles me deixariam
voltar ao trabalho. Esperava que deixassem. Não sabia o que mais
poderia fazer em casa. O FBI era o único lugar em que trabalhei em
toda a minha vida.
Percebendo que Noura não daria mais informações, saímos do
hospital e nos dirigimos para o estacionamento, mas a luz inundou
todos os espaços, e o sol escaldante banhou meu rosto. Gemi alto.
O sol estava tão brilhante, que meus olhos sensíveis arderam,
lacrimejando sem que eu percebesse. Levando a mão à testa, tentei
proteger meus olhos da claridade e pensei que gostaria de ter
óculos de sol comigo, mas acho que ninguém pensou nisso.
Os raios dourados explodiram em um arco-íris de cores vibrantes
no céu. Gostaria de ter saído ao entardecer ou à noite. Minha mente
estaria nublada com tons de cinza, e eu não sentiria a luz do sol.
Meus olhos tentaram se ajustar à luz, mas ela os queimou. Não via
a luz natural, o brilho do sol, há anos.
Abaixei minha mão um pouco e fui saudada por ainda mais luzes
ofuscantes e câmeras piscando. Repórteres me cercaram,
bloqueando nosso caminho.
Droga. Havia uma celebridade por perto?
— Agente Ghislaine Khalil! Como é acordar depois de três anos?
Acho que isso respondia minha pergunta anterior. Tive sorte de
nunca ter trabalhado como agente disfarçada. Caso contrário, meu
disfarce teria sido descoberto. Exalei e cobri meus olhos novamente.
— Bela adormecida! — outro repórter gritou.
Eu resmunguei.
— Por que há tantos repórteres? — eu reclamei com tia Sabrina.
— As pessoas acordam do coma com frequência.
— Eu não faço ideia. Eles não estavam aqui de manhã. — Tia
Sabrina cobriu o rosto de Noura com o lenço enrolado no pescoço.
— Deve ser por causa do acidente... — sua voz sumiu antes de
acrescentar: — Nosso genro era um homem de alto nível. Todos o
conheciam como o diretor do FBI, e você era sua esposa, que
sobreviveu depois de vencer um coma.
Suspirei e continuei a proteger meus olhos.
— Afastem-se — ordenou tia Inês. Ela tirou um mini guarda-chuva
da bolsa e apontou na direção deles. Escondi um sorriso e tentei
não revirar os olhos. Era tão o estilo dela, mas agora não era o
melhor momento para dizer a ela que o guarda-chuva seria
declarado como uma ‘arma’ no jornal amanhã.
— Srta. Ghislaine! — disse outro repórter.
Estremeci. Eu fui Senhora, no passado.
Estávamos encurraladas pela multidão, um enxame de repórteres,
e acho que alguém me empurrou para o lado. As luzes ofuscantes
eram demais para mim, e meus olhos lacrimejaram. Eu esperava
que eles não pudessem ver as lágrimas. Eu já podia imaginar as
manchetes amanhã.
Viúva do diretor do FBI tem colapso no dia em que sai do hospital.
Seria algo de grandes proporções. Abri a boca para falar, para
pedir que nos deixassem passar, mas, então, a segurança do
hospital veio correndo em nossa direção.
— Estas são dependências do hospital. Afastem-se delas —
ordenou um oficial. Eu teria dado um sorriso educado, mas colei
meu rosto no chão. — Vamos chamar a polícia para reforço.
Afastem-se.
Risos histéricos queriam explodir de mim. Eles esqueceram quem
eu era? Bem... Eu ainda não fui reintegrada.
Relutantemente, a multidão recuou e nos permitiu passagem.
Tia Inês passou na minha frente e me guiou até o Camry preto no
estacionamento. Assim que me sentei no banco de trás do carro, Tia
Sarah sentou-se na frente e Tia Sabrina entrou, acomodando Noura
em uma cadeirinha ao meu lado, cobrindo o rosto dela. Assim que
Tia Inês trancou as portas do veículo, me senti esmagada entre
elas. Os repórteres estavam nos perseguindo novamente, e eu
escondi meu rosto deles mais uma vez. Não queria que eles
capturassem nenhuma reação minha.
Tia Inês baixou a janela do motorista e gritou:
— Afastem-se do meu carro, seus idiotas. Não serei responsável
por atropelá-los, ibn el kalb. ‘Filhos da puta’. Não se meta comigo.
Sou do Marrocos.
Deus. Eu a amo. Ela sempre foi minha favorita.
Eu deveria tê-la lembrado de não xingar na frente de Noura. O
riso histérico que estava engarrafado dentro da minha alma chegou
à superfície. Meus ombros trêmulos chacoalharam. Para o mundo
exterior, podia parecer que eu estava chorando, mas minha risada
gargalhou pelo carro.
Até Noura se juntou a mim por baixo do pano, seu corpinho
tremendo. Eu podia imaginar as manchetes atualizadas.
Viúva do diretor do FBI perde a sanidade e ri.
Alguns repórteres me chamaram de “Viúva Adormecida!”.
Tia Inês fechou a janela, bloqueando os sons. Ela pressionou o pé
contra o acelerador e buzinou algumas vezes. Então,
provavelmente, sem pensar duas vezes, saiu dirigindo. Por sorte, os
repórteres haviam se afastado. Olhei pelo espelho retrovisor para as
figuras desaparecendo. Esperava nunca mais vê-los.

— Viemos uma vez por semana, nos revezando para limpar o


lugar — disse tia Inês atrás de mim enquanto entrávamos juntas em
minha casa.
Minhas pernas trêmulas já estavam prontas para desabar sobre
mim. Coloquei uma das mãos na parede para me firmar, ainda
segurando o arquivo e os papéis de saída na outra. Atrás de mim,
tia Sabrina esfregou minhas costas. A tensão em meus ombros foi
embora, deixando apenas a tranquilidade. Ela sempre soube como
acalmar a tensão. Havia dado uma chave reserva às minhas tias no
passado. Levantei meus olhos para analisar a minha casa
aconchegante. Ela era tradicional, com pisos de madeira e cheiro
almiscarado e amadeirado. Era familiar e parecia um lar de verdade.
Como em um transe, meu olhar percorreu as paredes em tom de
bege que estavam vazias. Fiz uma pausa. As fotografias do meu
marido haviam sumido.
— Tiramos algumas fotos… Você sempre pode colocá-las de
volta. Só não queríamos chocar você quando voltasse para casa
depois de muito tempo — sussurrou tia Inês.
Um nó se formou na minha garganta. Balancei a cabeça,
apreciando o gesto, e me sentindo muito perdida para usar palavras.
Tia Sarah beijou a minha têmpora, e eu descansei minha cabeça
contra seu rosto por alguns segundos, saboreando o momento,
antes de me afastar.
— Obrigada — minha voz saiu baixa, engasgada.
Merda. Gostaria de não ter engasgado.
— Vou fazer um almoço leve para você. Abasteci a casa hoje —
tia Sabrina sussurrou enquanto passava por mim. — Por que você
não fica à vontade, uyoon ghazaal? — ‘Olhos de gazela’.
Não perdi a ironia de ficar à vontade em minha própria casa.
Coloquei a pasta que estava na minha mão na mesa. Estava
prestes a me sentar quando um barulho me alertou.
Algo estava piando.
Era reconhecível. Familiar.
Meus olhos alertas foram na direção da voz, e um sorriso se
formou em meu rosto. Movendo-me em direção a ela, olhei para
meus dois pássaros pretos em uma gaiola dourada que pendia do
teto.
— Nós cuidamos deles — disse tia Inês por trás. — Depois vamos
colocá-los do lado de fora, onde é melhor para eles.
Meu marido me deu de presente quatro anos atrás, no ano de
nascimento de Noura. Eles eram especiais, porque não era
permitido em alguns estados dos EUA, mas meu marido era o
diretor e tinha suas conexões.
Os melros europeus, Turdus Merula, cantavam.
Uma voz suave e melodiosa encheu o ar, como uma
apresentação de balé.
— Ei — murmurei.
Eles pararam de cantar quando me aproximei. Não tinha certeza
se eles se lembravam de mim. Ainda eram lindos, com anéis em
volta dos olhos amarelos brilhantes. Eram um par. Uma fêmea e um
macho. A fêmea era marrom escura e tinha sua própria beleza.
Quando me aproximei deles, eles gritaram.
Fiz uma pausa e meu sorriso desmanchou.
Eles se esqueceram de mim.
Não se ouvia mais a bela melodia no ar. Um som estridente, que
machucou em meus tímpanos, a substituiu. Estremeci e dei um
passo para trás. Imediatamente, eles ficaram quietos. Os pássaros
me estudaram também, e procuraram respostas através dos meus
olhos, como se estivessem se perguntando se eu era um amigo ou
um inimigo. Talvez minha mente tenha pregado peças, mas eu
jurava que um deles estreitou os olhos para mim. Eles não pareciam
mais suaves ou melodiosos. Agora, pareciam corvos frios e
barulhentos com seus gritos de alarme.
As asas negras do macho me assustaram. A pena lustrosa
ficando mais brilhante a cada segundo. Balancei minha cabeça,
tentando clarear meus pensamentos nebulosos. Meus próprios
pássaros estavam me assombrando. Quase pulei quando eles
gritaram novamente.
— Talvez eles só queiram ficar do lado de fora — tia Sarah tentou
me assegurar chegando por trás de mim. Eu odiava ouvir o tom de
pena em sua voz. — Eles são pássaros selvagens e anseiam por
liberdade. Vou colocar a gaiola deles do lado de fora.
Ela entrou na minha frente, e me incomodou o fato de que eles
não escolheram gritar com ela como fizeram comigo. A cantoria
encheu o ar novamente, e eu olhei para eles com saudade no meu
rosto. Nada mais era o mesmo. Esses pássaros também não eram
familiares.
Eu era uma estranha em minha própria casa.
Sem saber mais o que fazer, com o coração pesado, sentei-me no
sofá dourado. Meu traseiro afundou na plenitude fofa do assento.
Um suspiro ofegante saiu da minha boca, e olhei para a figura
desbotada de tia Sarah, enquanto ela se afastava com meus
pássaros.
Perdida em meus pensamentos, devo ter cochilado no sofá,
porque acordei mais tarde com o cheiro de lentilha.
Tia Sabrina tinha feito harira para nós.
Esfreguei os olhos, ainda nublados pelo sono, e fui ao banheiro
para me refrescar. Acendi a luz e meu olhar foi atraído pelo reflexo
no espelho. Eu havia emagrecido. Era meio óbvio pelas minhas
roupas mais folgadas.
As maçãs do meu rosto estavam mais proeminentes do que
antes, e minha pele morena estava opaca e amarelada. Faltava-lhe
o dourado profundo que já teve. Meus olhos pousaram sobre as três
cicatrizes marrons desbotadas. Virei a cabeça e olhei para elas.
Estavam perto da borda do meu couro cabeludo. Provavelmente a
um centímetro dele.
Meus dedos trêmulos se estenderam, trilhando as cicatrizes
irregulares que iam para o meio do meu couro cabeludo. Cicatrizes
profundas e escondidas debaixo do meu cabelo grosso e comprido.
Cicatrizes que ninguém podia ver, mas que só eu podia sentir. Um
lembrete permanente na minha pele que já havia sido imaculada.
Olhei-as com curiosidade, pois não estavam lá antes. Deviam ser do
acidente. Os médicos mencionaram que eu bati a cabeça e quebrei
gravemente os ossos.
Suspirei inquieta, e a tensão voltou ao meu corpo. Estendi a mão
e esfreguei a parte de trás do meu pescoço. Agarrando a borda da
pia, respirei fundo duas vezes. Abri a torneira e joguei água limpa e
gelada no rosto. Esperava que isso empurrasse minhas entranhas,
como fez com minha aparência externa. Esfregando uma toalha
limpa no meu rosto, saí rápido do banheiro.
Todas estavam sentadas à mesa de jantar, esperando por mim.
Tia Sarah estava rindo e mostrando seu telefone, quando olhei para
a mesa de carvalho branco, onde eu costumava a me sentar. Meu
coração queria sair do peito enquanto eu olhava para a cabeceira da
mesa. Meu marido sentou lá uma vez. E agora ela estava vazia.
Não encontrando outro lugar para sentar, já que todos os
assentos estavam ocupados, sentei-me ali.
Eu era a chefe da minha casa agora.
— Ines, você está no Tik Tok — tia Sarah entrou na conversa.
Eu franzi minhas sobrancelhas.
— Tique o quê?
Tia Sarah sorriu na minha direção e me mostrou o vídeo de tia
Ines gritando para o repórter:
— Vou te atropelar.
Meus olhos brilharam, e eu olhei para tia Ines, que estava
revirando os olhos.
— É um novo aplicativo que saiu, onde as pessoas fazem vídeos
e têm música de fundo gravada sobre ele. Aparentemente, todo
mundo é viciado nisso — tia Ines disse, então ela olhou para tia
Sarah — Como essa aí.
Sorri com suas brincadeiras e tia Sabrina me entregou a harira.
Olhei para a sopa marrom-alaranjada de lentilha, tomate e grão de
bico. Estava fresca e quente. Era bom comer minha comida
tradicional, mas eu estava secretamente desejando junk food,
especialmente hambúrgueres de frango não saudáveis. Franzindo o
cenho, eu me perguntei quantas semanas mais teria que esperar
para meu estômago se ajustar.
Olhei para Noura do outro lado da mesa. Ela também estava
tomando sua pequena sopa em sua cadeira rosa. Meus olhos se
encheram de lágrimas novamente ao vê-la segurando sua pequena
colher. Droga.
Os pedaços do meu coração se partiram ao vê-la comer pela
primeira vez. Eu nunca tive a chance de ensiná-la. Balançando a
cabeça, tentei afastar esses pensamentos, mas eles continuaram
vindo com força total. Depois que terminei de comer e lamber os
dedos, tia Sabrina me entregou um chá de menta.
— Beba isso — ordenou.
Assenti e peguei o copo de suas mãos. Eu queria dizer “não”, mas
não consegui, pois seus olhos castanhos se encheram de
admiração enquanto ela olhava para mim. Tomei goles lentos do
shai. Os marroquinos ainda eram viciados em chá. Algumas coisas
nunca mudavam.
— Noura vai dormir com vocês? — perguntei a minhas tias em
voz baixa.
Elas pararam de comer e se viraram para olhar para mim.
Trocaram um olhar, mas não responderam à pergunta.
— Ela tem seu quarto aqui — acrescentei. — Tínhamos um berço
para ela... — Limpei a garganta. Ela tinha superado o berço. —
Também tínhamos uma pequena cama roxa para ela. — Eu não
perdi a minha escolha do pronome. Sempre fomos nós. Meu marido
e eu.
Tia Sabrina assentiu.
— Claro. Vou cuidar disso por enquanto. Quer descansar e tirar
uma soneca? Vou te acordar para o jantar.
Fiquei grata pela oferta.
Dei um pequeno sorriso para Noura e, antes de subir, peguei
minha papelada do hospital. O medo encheu meu coração enquanto
eu olhava para a escada. Era bem escura e escondida, e eu não
conseguia ver o que estava por trás dela. Sabia o que fazer — era a
minha casa, afinal de contas —, mas, ainda assim, um arrepio
percorreu minha espinha com o pensamento de andar sozinha. O
desconhecido me perturbava.
Olhei para minhas tias, que estavam comendo novamente.
Quase quis convidá-las para me acompanharem, mas parecia
muito estúpido, muito infantil. Eu era uma mulher adulta e temia que
me julgassem um incômodo. Elas já tinham feito tanto por mim.
Prendendo as mechas do meu cabelo, meus passos vacilaram por
alguns segundos.
Com passos hesitantes, forcei-me a subir e fui em direção ao meu
quarto. Imediatamente, acionei o interruptor do corredor, e uma
fraca luz amarela encheu o teto. Faltavam fotografias nas paredes.
Em vez disso, pregos embutidos nelas me cumprimentaram. A única
evidência de que algo esteve pendurado nas paredes de cor bege.
Meus olhos se voltaram para o cômodo à minha frente.
Meu quarto.
A porta de mogno estava fechada como se esperasse minha
condenação. Parecia crescer, como se estivesse me provocando e
me ameaçando.
Entrar ou não entrar…
Arrisquei e sussurrei uma oração. O chão rangia sob mim a cada
passo. Fiz uma pausa, querendo me virar. Eu não deveria ter que
temer minha casa. Tentei relaxar meus nervos, mas esta casa,
outrora aconchegante, se transformou em um lugar assombrado em
um único minuto. Esfreguei meu pescoço dolorido novamente, um
mau hábito que estava adquirindo, e olhei com frustração.
Vá em frente, querida.
Uma voz profunda e nervosa sussurrou atrás de mim.
Virei-me, mas não havia ninguém à vista. Segurei minha boca
com as duas mãos, assustada com aquela voz.
Meu marido. Eu conhecia aquela voz.
Ansiava por ouvi-lo novamente.
Minha imaginação selvagem estava me esgotando. Expirando
lentamente, me movi com passos hesitantes em direção à porta.
A cada passo, o chão rangia novamente.
É apenas a madeira, tentei me tranquilizar. E estou no segundo
andar. Estou bem. Estou bem.
Não funcionou, e acabei correndo em direção à porta do meu
quarto como se um fantasma invisível estivesse me perseguindo. O
rangido tornou-se ainda mais ensurdecedor. Assim que cheguei à
porta, imediatamente acionei o interruptor e bati a porta atrás de
mim. Fechando meus olhos, me inclinei contra ela. Isso foi muito
mais difícil do que eu pensava. A transpiração desceu pela minha
nuca, encharcando minha blusa verde. Eu precisava de um banho
novamente. Abri os olhos lentamente e olhei para o quarto.
Mais uma vez, as fotografias haviam desaparecido. Os lençóis,
que antes eram cinzas, foram substituídos por outros de cor
dourada. Com passos hesitantes, caminhei em direção à minha
cama. Levantei minha mão e rocei o tecido macio. Estava fresco e
limpo. Meus olhos foram para os travesseiros onde uma vez eu
dormi. Onde ele uma vez dormiu.
As cores estavam todas erradas. Era para ser prata. A
inquietação encheu minha mente, e me perguntei o que aconteceu
com os lençóis e fronhas originais. Esperava que minhas tias não os
tivessem descartado. Eu perguntaria a elas mais tarde.
Olhei para o arquivo preto na minha mão.
O registro, a memória daquela noite no acidente.
Ler ou não ler?
Não queria reviver aquele incidente novamente.
Se eu tivesse esquecido, talvez fosse o melhor a fazer. Antes que
eu pudesse mudar de ideia, empurrei o arquivo preto e os papéis de
saída na mesa de cabeceira perto de mim.
Sufocando um grunhido frustrado, fui em direção ao meu armário
para escolher uma nova muda de roupas. Tomaria um banho quente
e dormiria. Um bom banho sempre me embalava facilmente em
direção ao sono. Esperava que suas roupas tivessem sumido
também... Mas elas ainda estavam lá. Pelo menos algumas. Meu
armário parecia limpo, mas alguns pares de camisas de botão,
camisetas e boxers permaneceram guardados. As roupas dele.
Eu não aguentei mais, e palavrões saíram da minha boca. Peguei
uma de suas camisas brancas e macias, agarrei-me a ela
desesperadamente e levei ao meu nariz para lembrar o seu cheiro.
Amadeirado.
Ele sempre cheirava a amadeirado, mas esta camisa cheirava a
sabão. Minhas tias devem ter lavado as roupas recentemente.
Não era o cheiro dele.
Minha fúria se transformou em um soluço. Minha agonia e
angústia se derramaram de minha alma, e minhas lágrimas
encharcaram a camisa, manchando-a com minha dor. Eu me forcei
a fechar a porta do armário e fui para o banheiro. Largando a
camisa no corrimão do box, me despi e entrei no chuveiro. Abri a
torneira de água quente, mas a água gelada me cumprimentou.
Merda.
Dei um passo para trás, meus pés quase escorregando. Encostei-
me na parede de azulejos brancos e frios enquanto esperava a água
esquentar, olhando fixamente para o teto.
Depois de alguns momentos, me virei para a água e a deixei
escorrer pela minha pele aquecida. As gotas de água saltaram da
minha testa antes de desaparecer. Fiquei assim por vários minutos
antes de finalmente me lavar. Fechei os olhos e me virei para que a
água pudesse escorrer pelas minhas costas.
Um hálito mentolado atingiu meu rosto.
Meus olhos se abriram e um rosto familiar e lindo sorriu para mim.
— Driss — falei sem fôlego.
Ele sorria.
Inclinei-me para frente rapidamente e agarrei seu rosto perto do
meu.
Meu coração se iluminou ao vê-lo. Seu sorriso se foi enquanto ele
olhava para baixo com aqueles olhos intensos. Suas sobrancelhas
grossas e pretas se estreitaram enquanto ele me observava. Ele
ainda era tão bonito quanto um ser divino. Inclinei-me e toquei seus
lábios avidamente com os meus. Fechei os olhos, saboreando a
sensação dele em meus braços novamente. A água morna caía
sobre nós. Seus braços se apertaram ao meu redor, e suas mãos
brincaram com minha cintura. Eu o agarrei como se pudesse mantê-
lo para sempre comigo.
Como se o destino fosse arrebatá-lo de mim novamente.
Minhas mãos estavam por toda a sua pele dourada. Antes de
mergulhar os dedos em seus cabelos molhados, enrosquei-os nos
pelos do seu peito. Sua barba rouçou minha pele rudemente
enquanto sua boca se movia sobre a minha com avidez. Lutei contra
sua boca com a minha, empurrando-o com mais força e forçando-o
a recuar até que suas costas nuas batessem contra a parede. Seus
lábios se afastaram do meu rosto, e um protesto saiu da minha
boca.
Eu estava prestes a puxá-lo de volta, mas senti seus lábios no
meu pescoço, lambendo e sugando. Um gemido escapou da minha
boca quando seus dentes roçaram meu pulso.
Sua boca desceu para meus seios, lambendo e chupando com
força. Meus mamilos endureceram em seus lábios. Seus braços
musculosos me levantaram pela cintura, e eu envolvi minhas pernas
ao redor dele. Eu ainda estava gemendo e, um momento depois, ele
empurrou seu pau para dentro de mim, descansando
profundamente como se aquele lugar fosse sempre dele. Ficamos
assim por alguns momentos, minutos, possivelmente horas. Eu não
fazia ideia. Encarei seus preciosos olhos o tempo todo enquanto ele
me possuía.
Ele era meu... E eu era dele.
Para todo o sempre.
Não tinha esquecido meus votos e meu casamento.
Desmoronei sobre ele, meu orgasmo escorrendo pelas minhas
pernas. Eu sorri, com minha mente confusa e meu coração contente
e encantado. Estava segura em seus braços. Ele era minha
segurança.
Estava ligada a ele.
Quando finalmente abri os olhos, ele havia desaparecido.
Eu me virei, procurando-o, mas ele não estava lá. Meus pés
estavam plantados no chão molhado. Estendi a mão para a parte
interna das minhas coxas. O fluido pegajoso ainda estava lá. Gemi e
passei a mão pelos meus cabelos molhados, emaranhados. Minhas
pernas ficaram moles, eu desabei no chão, respirando rápido e com
dificuldade.
Eu o imaginei.
Excelente. Agora estava tendo alucinações.
Alucinei fazendo sexo com meu marido morto.
E tive um orgasmo.
Tinha ouvido sua voz mais cedo, tenho certeza disso.
Teria que colocar isso na minha lista de verificação quando
entrasse em contato com o Dr. Garcia amanhã para a medicação
prescrita para parar essa loucura.
Não era real.
Nada mais era real.
Fiz um voto de amor eterno, mas o amor foi corrompido.
Em seu lugar, agora havia uma mancha na minha alma.
GHISLAINE

PASSADO
Vinte anos de idade.

Visitei a academia do FBI hoje.


É exatamente tudo o que eu havia sonhado.
A excitação borbulhou em meu coração enquanto meus olhos
arregalados observavam as paredes cinzentas e os homens
vestidos com roupas do FBI. Meu sorriso diminuiu com a falta de
representação das mulheres neste campo de trabalho. Virei-me,
ansiosa para explorar mais, mas parei quando meu olhar foi atraído
até um homem parado a vários metros de distância, contra a
parede.
Ele estava olhando diretamente para mim.
Era alto, muito mais alto do que o meu um metro e sessenta. Ele
provavelmente tinha mais de um metro e noventa. Ele era
encorpado, usava uma camisa de botão azul-marinho justa. Seu
blazer estava esticado sobre seus músculos definidos, e não se via
nenhuma ruga em seu paletó. Sua pele era bronzeada, quase
dourada. Seu cabelo castanho escuro era picotado e seus olhos
eram quentes e pareciam iluminados pelo sol. As cores de um pôr
do sol desvanecendo-se.
Seu lábio elevou-se, percebendo que eu estava obviamente
olhando para ele. Rapidamente desviei o olhar, e, quando voltei
minha atenção para ele, ainda estava me encarando.
Engoli em seco profundamente quando ele se endireitou e
caminhou em minha direção. Olhei por cima do ombro para ver se
alguém estava atrás de mim.
Quando voltei a olhar para ele, seus lábios se abriram em um
pequeno sorriso. Não era um sorriso como eu já tinha visto em
homens antes, que emitia vibrações perigosas e misteriosas.
Seu sorriso era diferente.
Era um sorriso genuíno e doce.
Era seguro. Ele se sentia... seguro.
— Sou Driss Khalil — disse o homem de olhos castanhos assim
que me alcançou. Sua voz era profunda, masculina e rouca.
Inclinei minha cabeça, encontrando seus olhos intensos, que
estavam olhando de forma penetrante para mim. Engoli em seco e
fiquei imóvel como uma estátua, sem palavras. Não era todo dia que
o diretor do FBI me cumprimentava.
— Eu sei — sussurrei, então senti minhas bochechas ficarem
rosadas.
Merda. Calma, Ghislaine. Muita calma.
Claro, eu sabia sobre ele.
Seria estúpido não saber quem seria seu chefe um dia. Bem, isso
se eu fosse escolhida. Eu também sabia que ele era dez anos mais
velho que eu. Ele obviamente deveria me contratar, porque eu já
tinha feito muita pesquisa sobre ele como uma maldita stalker.
Estava obcecada por seus casos. Sempre admirei o trabalho dele e
não conseguia acreditar que ele estava falando comigo. Ele devia
ser um homem ocupado.
Seus lábios cheios se contraíram novamente, ampliando seu
sorriso. Deus... Gostaria que ele parasse de sorrir para mim assim.
A estranheza me encheu, e eu estava perdendo a cabeça. Esperava
que ele não notasse minhas bochechas escarlates.
— E seu nome? — ele perguntou quando eu não respondi.
— Ghislaine — respirei, olhando para a arma presa ao seu cinto
antes de olhar para cima novamente.
— Oh. Marroquina? — ele perguntou, levantando as
sobrancelhas.
Meus lábios se esticaram, formando um sorriso. Seus olhos se
fixaram em meus lábios, e parei de sorrir. Talvez fosse meu batom
vermelho.
— Sim — respondi.
— Eu também.
Eu já sabia que ele também era.
Dei um sorriso fraco e nervoso.
— Eu nunca vi você aqui antes. Você está treinando?
— Não — respondi. — Vim visitar.
— Ah, uma visitante? — ele questionou, divertido. — Você quer
trabalhar no FBI? — Ele estava olhando para mim com uma lente
totalmente nova agora.
— Sim — respondi com orgulho.
— O que faz você pensar que não vai chorar no primeiro dia?
Perdi meu sorriso imediatamente. Não esperava que ele dissesse
isso. Meu coração martelava no meu peito, e minha boca se abriu.
O que aconteceu com o lema de receber os visitantes com o
coração aberto?
Driss Khalil apenas continuou a olhar para mim, sem se preocupar
em se desculpar. Eu estava muito perplexa, e, pela segunda vez
hoje, ele me deixou sem fôlego.
— Isso não é um ‘mostre e fale’. Lidamos com a vida e a morte, e
você — ele continuou, analisando minhas feições, seus olhos
ficando sombrios — está usando muitas joias que chamam a
atenção. O primeiro tilintar da sua pulseira alertará um criminoso de
que alguém está por perto. E suas unhas são muito longas. Elas vão
quebrar na luta.
Escondi meus braços atrás das costas como uma aluna tonta,
sendo repreendida pelo professor mais velho e gostoso. Seu lábio
se curvou em um sorriso.
Ele sorriu para mim! Seu sorriso doce se foi.
— Seu batom é brilhante, mais brilhante que o sol. — Meu
coração encolheu e morreu neste momento — É muito chamativo.
Isso não é uma festa, é um trabalho perigoso. Você quer minha
aprovação, mas não está pronta para isso.
Pisquei rapidamente, tentando entender. Por que ele estava
sendo tão cruel? Fiz uma careta, ainda pensando em como
contradizê-lo.
— Cuidado aí — ele sussurrou enquanto se movia para passar
por mim. Prendi a respiração o tempo todo, e meus ombros se
ergueram como um soldado pronto para uma batalha. Merda. Fui
tão estúpida. Nem estava trabalhando para ele e já estava tentando
agradá-lo. Ele tinha acabado de me insultar. Ele percebeu, e seus
olhos de sol pareciam estar rindo de mim. Um aroma amadeirado
flutuou em direção ao meu nariz. Odiava o quão atraente e viril ele
cheirava. — Seus cílios podem cair se você piscar demais.
Oh, meu Deus... Meu queixo estava pronto para bater no chão.
Idiota arrogante.
Virei minha cabeça em direção a ele, inclinando-a e lançando
adagas para ele.
— Eles são reais — rosnei. Excelente. Eu só falei para defender
meus malditos cílios. Alguém atire em mim.
Nós nos encaramos, um desafiando o outro a desviar o olhar
primeiro. Inferno, não havia nenhuma maneira de ser eu a ceder. Eu
não era mais uma admiradora fascinada pelas estrelas. Ele poderia
apodrecer no inferno. Seus olhos traçaram minhas feições mais uma
vez. Estávamos ombro a ombro, e eu esperava que ele não tivesse
me notado.
Eu o julguei errado.
Ele não era nada doce.
Não sabia que ele era tão idiota.
Foda-se ele agora.
Ele era exatamente como aqueles homens misteriosos, e era
brutal como o inferno. Ele se inclinou mais perto, elevando-se acima
de mim, até que estava a apenas alguns centímetros do meu rosto.
— Então mal posso esperar para descobrir — sua voz ficou
profunda quando ele murmurou.
Ele disse isso e... foi embora, deixando-me uma bagunça
desgrenhada. Vim aqui em busca de apoio, e esse homem, esse
louco, me dispensou como se eu fosse um lixo.
Minha mandíbula endureceu. Rangendo os dentes, me forcei a
seguir em frente, saindo da sala sem olhar para trás. Embora
estivesse ansiosa para encará-lo mais uma vez, eu apenas olhei
para frente.
Eu mostraria a ele quão dedicada eu era.
Quão pronta podia estar.
Desafio aceito.
GHISLAINE

PRESENTE
Uma semana depois

Driss Khalil
1985 - 2019
Amado Filho, Marido e Pai

Olhei para a gravura e passei suavemente meus dedos sobre ela.


Coloquei as rosas vermelhas na lápide.
— Sinto sua falta — sussurrei.
Eu nunca receberia uma resposta de volta.
— É tão solitário sem você — admiti. — Gostaria de poder
rebobinar os últimos três anos. — Funguei, enxugando os olhos, e
sorri rapidamente. — Sabe, eu odiei sua coragem no dia em que
você me conheceu… Sknti klbi bla matshawrni. Você se instalou no
meu coração sem permissão. — Uma pequena risadinha escapou
dos meus lábios. — Estou presa — sussurrei —, não sei o que fazer
aqui. Tudo é... caótico. O tempo passou para todos, mas ainda
estou vivendo no passado. Queria que você estivesse aqui. Você
não merecia ir tão cedo. Você era tão jovem... — minha voz sumiu,
e minha respiração ficou irregular. — Nós éramos tão jovens. Não é
justo que você tenha entrado na minha vida, e Deus acabou tirando
você de mim. De nós. De Noura. Gostaria que você ainda estivesse
aqui, ao meu lado.
A melancolia suavemente me afastou de tudo o que me trazia
alegria. Era uma capa que eu não podia simplesmente deixar cair no
chão. Foi a razão pela qual eu não consegui encontrar nenhuma
superfície ou sol novamente. Deitei minha cabeça na lápide,
sentindo-me unida com ele novamente. Desejei que ele se
levantasse de novo, mas ele não o fez. Minhas lágrimas cobriram a
terra lamacenta. Eu não sabia como acalmar meu coração louco.
Meus uivos de infelicidade pioravam a cada respiração que eu dava.
— Por favor, volte para mim — eu implorei baixinho.
Tijolo por tijolo, as paredes ao meu redor caíram, desmoronando,
me afogando. Nós. A enxurrada de amor me afogou. Lágrimas
salgadas brotaram dos meus olhos como um poço quebrado e
escorreram pelo meu rosto. Meu queixo tremia, e meu peito arfava
como o de uma criança angustiada. Pisquei meus cílios pesados, e
minhas lágrimas molharam meu vestido. Os únicos sons ao meu
redor eram meus próprios gritos e meu batimento cardíaco irregular.
Eu faria qualquer coisa para trazê-lo de volta.
Chore agora, querida, e nunca mais chore por mim.
Essa mesma voz profunda sussurrou.
Meus olhos se abriram, e eu me virei, procurando por ele
novamente, mas não havia nada.
Driss não estava aqui comigo.
Ele estava a sete palmos abaixo.

Meus passos pisaram desajeitadamente na sede do FBI.


Todos olharam para mim enquanto eu passava. Eu lancei um
olhar gelado na direção deles, e eles desviaram o olhar. Nenhuma
pessoa me cumprimentou ou se preocupou em dizer olá. Eu nunca
fui benquista aqui, de qualquer maneira, por causa do meu
relacionamento com Driss.
Fiz uma pausa, olhando para o escritório ao lado dos diretores do
FBI.
Era meu escritório.
Meu nome não estava mais nele.
Agora, tinha um nome que não reconheci. Meus ombros se
curvaram em derrota enquanto eu piscava para conter as lágrimas.
Era estranho que eu tivesse sido apagada da memória das
pessoas, mas este escritório ainda estava fresco em minha mente,
claro como o dia. Driss me deu meu próprio escritório. Eu era sua
esposa, e, sim, ele me favorecia. A maioria dos agentes tinha uma
mesa, mas ele me deu algo maior.
Driss era o diretor, então quebrava as regras para mim.
Normalmente, eu não poderia trabalhar com ele, porque ele era meu
marido, mas ele ameaçou sair, deixando seu supervisor sem outra
escolha a não ser me aceitar, e o resto era história. Foi uma má
jogada da parte dele. O privilégio que eu tinha sobre os outros
despertou ódio e inveja entre meus pares. Ainda me lembrava de ter
sido invejada por meses, e muitos agentes me evitaram como uma
praga.
Olhei para o escritório ao lado.
O novo diretor do FBI.
O nome de Driss não estava mais gravado na porta. Partiu meu
coração que outra pessoa tivesse assumido seu legado.
Limpando minha garganta e mente, ajeitei minha jaqueta jeans,
minha camisa branca de botão e o jeans preto. Eu estava prestes a
ir para a porta, mas um homem se fez visível das sombras.
Um sorriso se formou em meus lábios pela primeira vez em uma
semana.
Reconheci a pele profunda e dourada e os olhos quentes e cor de
mel.
Miran Demir sorriu... ou tentou.
Ele era o diretor da DEA, a sigla em inglês para Gestão de
Repressão às Drogas.
O Chefe.
— Ei, Gil — ele falou. — Sentimos sua falta.
Meus olhos lacrimejaram com sua voz profunda e o tom
calmamente poético do Oriente Médio. Seu corpo alto se moveu em
minha direção antes que ele estendesse a mão para me abraçar.
Ele ainda parecia o mesmo, se não maior e mais musculoso.
Quando nossas jurisdições se sobrepunham no passado, Miran
frequentemente trabalhava com Driss. Frequentávamos os mesmos
círculos, e ele tinha uma profunda amizade com meu falecido
marido. Miran também era árabe e se relacionava bem conosco.
Sua mão acariciou minhas costas, e eu funguei contra seu ombro,
me permitindo chorar.
Era apenas Miran. Ele era seguro, assim como Driss.
— Você está bem agora — disse ele contra o meu cabelo.
Eu provavelmente manchei sua camisa branca. Depois de um
momento, eu me afastei de seu conforto, dando um passo para trás,
olhando para suas roupas formais como uma distração. Miran nunca
usava terno, dispensando o código de vestimenta. Um verdadeiro
rebelde por natureza. Ele usava camisas abotoadas e calças pretas,
mas nunca o paletó e a gravata. Acho que odiava ternos. Era óbvio.
Suas mãos soltaram meu cabelo, e seus olhos cheios de tristeza
encontraram os meus.
— Como vai?
Ninguém nunca me fez essa pergunta recentemente, e isso me
quebrou tudo de novo.
— Tentando — eu admiti.
Esperava não parecer muito patética para ele.
Vi a aliança de casamento em seu dedo anelar. Meus olhos se
estreitaram no diamante brilhante que havia antes de olhar para
minha mão sem anel. A ironia não me incomodou. Agora que
estávamos nos encontrando novamente, eu fiquei viúva, e ele se
casou.
Eu também perdi o casamento dele.
— Parabéns — sussurrei, olhando para sua mão novamente,
encontrando seus olhos lentamente. Quis dizer isso com meu
coração.
Ele deu um sorriso fraco, e sua covinha apareceu.
— Shukran. — Obrigado. — Foi quase um ano atrás. — Quando
eu não respondi, ele acrescentou: — Nenhuma quantidade de
condolências seria suficiente para eu dizer a você agora. Eu
realmente sinto muito por tudo, Gil.
Eu apenas balancei a cabeça, aceitando seu pedido de desculpas
genuíno.
— Eu queria ver você quando voltasse para o escritório — ele
continuou. — Aguente firme e mantenha contato comigo, ok?
— Claro — sussurrei.
— Tenho que ir para o trabalho de campo, mas eu vou vê-la
novamente em breve. — Ele avançou para passar por mim e
apertou meu ombro.
— Oh, você não quer dizer oi para o diretor?
Miran piscou como se eu tivesse perdido a cabeça.
— Não. Não é a mesma coisa — admitiu. Entendi. Não era mais
Driss. — Se cuida, Gil — ele murmurou e passou por mim.
Eu exalei lentamente, sorrindo novamente ao entender que pelo
menos alguém estava feliz em me ver. Eu ainda tinha pessoas que
se importavam comigo. Minhas tias. Miran. E até a pequena Noura.
Limpei as lágrimas do meu rosto e fiquei do lado de fora da porta
por alguns segundos. Não podia entrar com uma cara manchada e
bagunçada. Tirei um espelho da minha bolsa e passei pó sob meus
olhos de guaxinim. Uma vez apresentável, bati à porta duas vezes e
esperei.
— Entre — uma voz grossa disse de dentro.
Expirando lentamente, girei a maçaneta com dedos trêmulos e
entrei no escritório familiar. Fechei a porta. Olhei para os arredores.
Paredes brancas com estantes. Vi algumas medalhas também.
Erguendo a cabeça, olhei para o atual diretor do FBI.
Cyrus Drakos.
Ele era meu parceiro de trabalho antes.
Agora, ele era o chefe do FBI.
Liguei para ele antes de ir, pedindo o encontro, e ele concordou.
Ele se virou para olhar para mim. Parecia mais velho, não mais o
homem de trinta e três anos que eu lembrava. Os homens
envelhecem como um bom vinho. Seu cabelo preto encaracolado
bagunçado em torno de sua cabeça e seus olhos azuis brilharam
quando ele percebeu que era eu. Ele era alto, quase um metro e
oitenta, e usava um terno azul-marinho justo.
A mesma cor que Driss sempre usava.
Por que ele não podia ter vestido preto como todo mundo? Por
que a cor de Driss? A ira ameaçou me queimar, consumindo tudo
em sua destruição. Eu me forcei a me acalmar.
— Ghislaine. Bem-vinda ao lar — falou Cyrus.
Dei um sorriso hesitante. Eu não estava muito sorridente esses
dias.
— Olá, Drakos — falei educadamente, usando seu sobrenome
para reconhecê-lo.
— Sente-se — ele acenou com a cabeça, apontando para a
cadeira em frente a ele. Sentei-me em silêncio, mas ele ainda
estava de pé, encostado na janela, olhando para mim. Evitei seu
olhar e olhei para frente em vez disso. Fiquei feliz por ele não ter me
abraçado. Não podia abraçá-lo. Olhei para cima e esperei que ele
dissesse alguma coisa, qualquer coisa, mas ele apenas inclinou a
cabeça e continuou olhando para mim.
Minhas bochechas aqueceram sob seus intensos olhos azuis.
Por fim, ele falou:
— Você parece a mesma.
Minhas bochechas queimaram, e eu queria alcançar a parte de
trás do meu pescoço e esfregar o nó que havia se formado lá. Deus,
eu precisava marcar uma consulta de massagem. Gostaria que ele
se sentasse.
— Você parece mais velho — ofereci, levantando minhas
sobrancelhas.
Ele riu, e finalmente se sentou na minha frente. No mesmo lugar
onde eu havia feito sexo às escondidas com meu marido inúmeras
vezes. Mas não achei que fosse a mesma cadeira. Eles devem ter
renovado quando Cyrus mudou de posição. Inclinando-se para trás,
ele me observou com seu olhar perscrutador. O suor pinicava minha
pele quente, e estava pronto para queimar minhas roupas. Agora,
eu não queria que ele se sentasse assim também. Era como se ele
estivesse propositalmente tentando me fazer sentir desconfortável.
Depois de um momento, ele disse:
— Meus sinceros sentimentos por Driss Khalil. — A voz dele não
parecia nada sincera.
Ele estava feliz por estar sentado na cadeira do meu falecido
marido? Eu balancei a cabeça, aceitando suas condolências
independentemente.
— Parabéns por sua promoção.
Acho que eu poderia fingir formalidades também.
Ele ficou em silêncio por alguns segundos antes de falar
novamente:
— É um milagre ver você de novo — ele admitiu. — Eu estava
mesmo esperando você acordar.
Ele esperou. Para quê, exatamente?
Ele foi meu parceiro de trabalho no passado, sim, mas nunca
estivemos perto de ser amigos. Ele me acusou de ganhar favores de
Driss. Eu era privilegiada, mas isso não significa que não trabalhava
duro. Fui aceita na academia do FBI sem a referência de Driss.
Limpei a garganta e falei:
— Eu estava me perguntando quando seria reintegrada
novamente, se possível.
Ele ergueu as sobrancelhas.
— Oh, você quer pular para o trabalho já? Achei que poderia
querer mais descanso.
Fiz uma careta, balançando minha mão no ar.
— Acredite em mim, descansei o suficiente nos últimos três anos.
Seus lábios se curvaram em um sorriso.
— Você teria que passar pelos mesmos requisitos novamente.
Avaliações de informática, escrita, física e mental. Podemos pular a
entrevista estrutural.
Mental? Merda.
— É necessário mental?
Ele inclinou a cabeça, me observando.
— Faz parte dos requisitos. Há algo que eu deveria saber?
Eu apenas balancei minha cabeça descontroladamente.
— Não, claro que não. Não estou louca. — Então, como se fosse
uma deixa, ri como uma lunática.
O sorriso de Cyrus se alargou, claramente gostando do meu
desconforto.
Ele deve realmente amar aquela cadeira. Eu esperava que
desmoronasse sob ele. Talvez devesse dizer-lhe que não havia uma
parte nesta grande sala em que eu não tivesse fodido meu marido.
A cadeira. A mesa. A parede. Contra as janelas. O chão. Deixamos
nossas marcas em todos os lugares. Eu me repreendi com meus
pensamentos selvagens. Não era culpa dele que Driss estivesse
morto.
— Vou agendar você para a próxima semana então, Ghislaine.
Ele ronronou meu nome, e meu coração se encheu de ansiedade
e disparou. Suor frio pinicava meus dedos, e esfreguei minhas mãos
úmidas. Raramente usávamos nossos primeiros nomes por aqui e
todos se chamavam pelos sobrenomes.
Cyrus não era Driss. Ele não era seguro.
— Se você passar, terá que trabalhar em uma mesa normal.
Ele deu de ombros e realmente parecia apologético desta vez.
— Isso não é um problema — respondi.
Contanto que estivesse fazendo algo e aplicando minhas
habilidades à força, eu ficaria grata.
— Perfeito. Estou ansioso para vê-la novamente, Ghislaine.
Meu coração se apertou. Por que ele não estava usando meu
sobrenome?
— Khalil — corrigi. — Eu ainda sou Khalil.
Os olhos de Cyrus se estreitaram e ele desmanchou o sorriso.
Acho que atingi um nervo.
Ghislaine: 1 x Cyrus: 0
— Claro, Ghislaine.
Olhei para ele, surpresa que ele ainda escolheu dizer meu
primeiro nome.
Nós dois estávamos quites agora.
Seus olhos azuis escureceram, e eu não via mais meu parceiro de
trabalho. Ele nunca tinha falado comigo assim antes. Sorrindo
novamente, seu olhar me provocava a desafiá-lo. Eu não podia
fazer isso, porque ele era o diretor. Isso fazia dele meu chefe. Isso
lhe dava o direito de me chamar do que quisesse, até mesmo algo
estúpido como frango empanado, e ninguém piscaria de surpresa.
Era assim que funcionava, e eu odiava que ele estivesse tirando
vantagem disso.
Fiquei de pé, sem deixar de notar a forma como seu olhar se
deteve em minhas curvas. Fechei os olhos com força antes de abri-
los novamente. Ele nunca teria ousado fazer isso antes. Eu me
despedi dele, mas seu olhar ardente ainda me queimava enquanto
eu me afastava. Eu estava muito feliz por bater a porta atrás de
mim.
Uma semana se passou e eu completei minhas avaliações. Eu
fingi com a psiquiatra e menti sobre a maior parte. De jeito nenhum
eu ia dizer a ela que eu tinha alucinado sobre meu marido uma vez
e ouvi a voz dele. O Dr. Garcia havia prescrito um medicamento
para me ajudar com isso e, infelizmente, tive que declarar isso na
minha avaliação mental. A psiquiatra me deu reintegração
temporária. Ela disse que eu teria que ser reavaliada para ver meu
progresso a cada dois meses.
Por pouco não atirei nela, mas me segurei.
Puxei minha jaqueta de couro preta para mais perto de mim. Era
verão lá fora, mas eu usava uma roupa grossa. Eu queria me cobrir
com camadas extras de roupas. Gostaria de poder me esconder e
desaparecer nas sombras para sempre. Nunca usava ternos ou
roupas formais como todo mundo. E Driss nunca tinha me
repreendido por me vestir de maneira informal. Mais uma vez,
privilégio de esposa.
Soltei um suspiro profundo e prendi meu cabelo comprido atrás
das orelhas. Limpando a garganta, bati na porta de Cyrus.
Começa a segunda rodada.
Assim que ouvi sua voz, entrei na sala, mas, desta vez, não a
fechei. Deixei bem aberta para todos verem e ouvirem. Cyrus já
estava sentado quando entrei.
Mais uma vez, ele usava azul-marinho, e isso mexeu com os
nervos. Preto era a cor dos agentes da agência. Azul-marinho não
era sua cor, e ele sempre usava preto quando trabalhávamos como
parceiros. Ele olhou para cima, e seus lábios se ergueram em um
sorriso presunçoso.
— Parabéns por sua reintegração.
Eu me perguntei se ele esperava que eu falhasse.
— Obrigada — respondi, sentando em frente a ele.
Nossos olhos se chocaram, azul contra castanho, e eu me
mantive firme, encontrando seu olhar forte.
— Por que você não está de uniforme? — ele perguntou depois
de um momento.
Pisquei, pega de surpresa. Era uma coisa tão Driss de se dizer.
— Isto é o que eu sempre visto para trabalhar.
Cyrus recostou-se e apoiou os braços nos braços da cadeira. Sua
postura ecoava controle, e meu conjunto de nervos estava pronto
para fritar a qualquer momento.
Ele balançou a cabeça lentamente.
— Não, você costumava usar isso.
Não o entendi.
— Você vai usar o código de vestimenta como todo mundo.
Minhas sobrancelhas se curvaram antes de eu assentir
lentamente.
Não havia mais privilégios especiais de esposa, eu acho.
Ele deu outro de seus sorrisos arrogantes, e eu queria esculpir
seu rosto com uma faca. Eu cravaria minha lâmina tão
profundamente em seu rosto, começando em sua testa, e arrancaria
sua pele.
Esse pensamento frio me deixou congelada.
Que diabos? Nunca pensei em alguém com tanta malícia e ódio.
Não estava me sentindo eu mesma.
— Tenho certeza de que quando Driss era o diretor, ele permitia
que você fizesse certas coisas do seu jeito.
Cerrei e abri meus punhos sob a mesa. Fiquei feliz por ele não
poder vê-los, porque eu estava pronta para esmurrar seu rosto. Mais
uma vez, esse pensamento me horrorizou. Agarrei minhas mãos,
com medo de quebrar a mesa.
— Mas… — Ele arqueou uma sobrancelha — isso não vai
acontecer sob meu comando. Você trabalhará como todo mundo e
se vestirá como todo mundo. Sem favores.
Eu apenas assenti porque... O que mais eu poderia dizer?
Eu não perderia meu emprego por causa do código de
vestimenta.
— Use uma saia amanhã.
O comando em sua voz gélida me empurrou.
Lembro-me de quando conheci Driss pela primeira vez, ele
também chamou atenção para a minha aparência... Mas ele não me
ordenou que fizesse nada. Ele não tinha mostrado autoridade sobre
mim. Ele me avaliou e me julgou. Cyrus queria me governar como
um ditador. Eu me inclinei para trás em minha cadeira, com medo de
ter ouvido mal. Minhas mãos tremiam, e eu queria sair desta sala.
— Saia? Muitas das agentes femininas usam calças.
Seus olhos azuis brilharam, cheios de algo que eu não reconheci.
O que ele estava planejando? Me tornar mais infeliz do que eu já
era?
— Você vai usar uma saia amanhã, Ghislaine — ele repetiu o
comando. Ele poderia muito bem ter dito que eu deveria vir nua
também. Abri a boca para protestar, mas ele falou por cima de mim.
Fechei minha boca em vez disso. — A menos que você prefira que
eu te mande para casa hoje e retorne de saia. Você pode tornar isso
oficialmente conhecido do público ou fazê-lo em particular amanhã.
É a sua escolha. Não sei quais métodos você pode ter usado antes
para chegar ao topo, mas não funcionará mais.
Gostaria de ter minha arma agora para que eu pudesse puxar o
gatilho e atirar todas as balas em seu peito. Meu coração se encheu
de prazer, imaginando o sangue escorrendo dele. Seria preto como
sua alma sombria. Provavelmente seria frio como sua maldita alma.
Eu não gostava quando as pessoas olhavam para mim com pena...
Mas isso, isso estava em um nível totalmente novo. Ele estava
basicamente insinuando que eu havia seduzido e dormido com Driss
para garantir minha posição.
Que eu fodi meu caminho até o topo.
Ele estava loucamente delirante?
Em primeiro lugar, quem diabos seduzia um diretor para se tornar
um agente, dentre todas as coisas? Ser um agente em um campo
perigoso, fervilhando de sangue e violência, exigia coragem, força e
determinação. E, em segundo lugar, se eu quisesse seduzir alguém
para meu ganho, eu teria seduzido um maldito bilionário. Meu pulso
saltou para minha garganta, e eu lancei meus olhos para qualquer
lugar, menos para ele. Esperava que ele não pudesse ler nada no
meu rosto.
Calma, Ghislaine.
Queria dizer a ele que não era uma escolha, que ele estava
usando de manipulação para me controlar. Mas ele era meu chefe.
Eu poderia registrar uma queixa de assédio contra ele, mas para
onde isso iria? Eu provavelmente seria transferida ou demitida, mas
ele ainda estaria aqui. Ele era um diretor respeitado, e eu era
apenas uma... agente. Trabalhava sob seu comando. Ele queria que
eu jogasse de acordo com suas regras. Talvez eu pudesse obedecer
a algumas e tentar contornar outras. Se possível.
Limpei a garganta e estupidamente disse:
— Eu não tenho nenhuma saia.
Não era mentira. Eu usava exclusivamente jeans.
Seu sorriso altivo voltou.
— Então, sugiro que você faça algumas compras, Ghislaine.
— Certo — confirmei. — Vou me retirar agora.
Eu me levantei e o encarei nos olhos.
Não pude resistir a acrescentar:
— Khalil. Eu sou Ghislaine Khalil. A esposa de Driss Khalil.
Espero que você nunca esqueça que ele teve que morrer para você
ter seu cargo.
Você nunca foi digno, terminei baixinho.
Ele mudou a expressão rapidamente. Antes que ele pudesse me
chamar de novo, me virei e saí da sala, batendo a porta com toda a
minha força. Eu provavelmente não deveria ter dito isso.
Todos ao meu redor olhavam, mas eu não dava mais a mínima.
Eles provavelmente ouviram a conversa, de qualquer maneira, e eu
seria o tema quente para fofocas no almoço.
Esperava que a porta quebrasse e desmoronasse, danificando o
lindo escritório que nunca pertenceu a ele. Que ele só recebeu
porque o dono anterior não estava mais por perto.
Não me chocou a falta de sentimento de culpa no meu coração.
Já não me repreendia por ter pensamentos sombrios. O ódio se
agitou no fundo do meu coração, querendo punir a todos.
Eu estava certa, de toda forma.
Na hora do almoço, sussurros ao meu redor comentavam sobre a
forma rude com que eu havia falado com o diretor do FBI. Nenhuma
pessoa veio em minha defesa pelo que Cyrus me disse. Olhei infeliz
para a tela do meu computador, tentando não deixar os sussurros
me afetarem.
Mas eles rugiram.
A viúva louca perdeu a cabeça.
Quem ela pensa que é para usar seu privilégio novamente?
Você acha que o coma danificou sua mente?
Ela nunca falou assim antes.
Agora ela não é nada.
Bom, ela pode trabalhar duro pela primeira vez, como o resto de
nós.
Ela é apenas uma boazuda.
Não sei o que Sr. Khalil viu nela.
Ele está em um lugar melhor sem ela.
Cruel. Cruel. Cruel.
Eu sabia que os outros agentes não gostavam de mim, mas não
sabia que era tão ruim assim. Ninguém fofocava sobre mim no
passado. Se alguém ousasse, Driss sempre vinha em meu socorro
e os calava, mas ele não podia mais ser meu salvador, meu protetor.
Eu só tinha a mim mesma, e me obriguei a carregar sua força.
— Quero você no meu escritório. Agora — uma voz veio atrás de
mim, empurrando-me dos meus pensamentos.
Quero você. Essas palavras ecoaram em minha mente.
Sentei-me ereta, alerta, virando-me em minha cadeira preta, e
encontrei os olhos frios e azuis de Cyrus. Eles não estavam mais
cheios de malícia, mas uma estranha frieza espreitava sob eles.
Levantei-me ao comando, e seus passos pesados se afastaram de
mim. Silenciosamente segui atrás, mantendo minha cabeça e
ombros erguidos. Tentei mascarar minhas inseguranças, mas estava
com medo de tê-lo irritado com minhas declarações anteriores.
Talvez ele fosse me demitir. Talvez eu tenha estragado tudo.
Cyrus não estava sentado quando entrei em sua sala. Ele bateu a
porta e a trancou, fazendo meus ombros tensos pularem. Sentei-me
e cruzei as pernas para parar o tremor. Por que a porta estava
trancada? Seu corpo alto e ameaçador veio em minha direção antes
que ele se jogasse em seu assento.
Esperei que ele dissesse as palavras que acabariam com minha
carreira. Você está demitida. Uma mancha no meu currículo, e eu
teria dificuldade em encontrar um emprego neste campo
novamente. No meu mundo, uma vez demitida da força policial,
você perdeu o respeito aos olhos de todos. Ninguém mais te
consideraria como um deles. Seu trabalho, sua reputação, seu
legado... Tudo estaria desaparecido.
Em vez disso, ele perguntou:
— Você se lembra do caso em que você e Driss estavam
trabalhando antes do acidente?
Oh. Não esperava isso de jeito nenhum. Franzi minhas
sobrancelhas, pensando muito. Minha mente estava confusa
novamente enquanto tentava pesquisá-lo, navegando nele
lentamente. Eu não tinha pensado no meu último caso. Depois de
alguns segundos, eu respondi:
— Sim.
Lembrei-me.
— Este é o arquivo do caso com notas atualizadas.
Ele jogou um arquivo preto sobre a mesa.
Meus olhos caíram sobre as palavras na capa.

CONFIDENCIAL

Meus ombros relaxaram, e a tensão no meu corpo desapareceu.


Baixei a guarda, só um pouco, e me recostei na cadeira. Fazia
sentido agora ele ter trancado a porta.
Ninguém mais poderia ouvir esta conversa.
Eu ainda estava pensando quando Cyrus falou novamente.
— Você e Driss estavam trabalhando em uma operação com
Miran Demir. Tem também as notas anteriores suas e de Driss.
Ainda não temos muitas evidências sobre a máfia russa, mas o líder
deles é um homem difícil, mas esperamos pegá-lo. Um dos
mafiosos russos, Adrian Sokolov, foi preso, mas ele não está
disposto a apontar os culpados.
Eu o encarei, surpresa. Esta era uma informação nova.
— O chefe Demir não está mais trabalhando neste caso. Ele foi
retirado.
Eu fiz uma careta, e, antes que eu pudesse perguntar qualquer
coisa, ele respondeu minha pergunta não dita.
— É um conflito de interesses — acrescentou, acenando com a
mão, me dispensando. Minha carranca se aprofundou, mas Cyrus
continuou assim mesmo: — Quero que você volte a trabalhar neste
caso.
Abri as páginas, pegando os nomes Dimitri Nikolaev e Adrian
Sokolov. Olhei para a primeira página corajosamente afirmando:

Principal suspeito: Alexander Nikolaev


Posição e Organização do Crime da Máfia: Pakhan
(Chefe) da Solntsevskaya Bratva.
País de origem e idade: Estados Unidos da América;
29
Sob investigação por: Tráfico de pessoas, tráfico de
drogas, mulas de drogas, lavagem de dinheiro e
assassinatos em massa.

Meu olhar caiu sobre a fotografia colorida ao lado do nome.


Eu soltei uma respiração irregular e sufocada. Eu não podia
acreditar que eu não tinha me atinado nisso no começo. Talvez
fosse o meu estado de espírito horrível.
Eu reconheci aqueles olhos negros.
Aquelas mechas escuras que eram parecidas com penas de
corvos.
Essa pele pálida.
Aquele sorriso sinistro.
O tirano da cidade de Nova York.
Lembrei-me de ver esse homem quando acordei.
Esperava ver meu marido, mas foi ele.
O Pakhan estava no quarto do hospital comigo.
O homem que eu tinha visto quando acordei depois de três anos.
Alexander Nikolaev me marcou com um beijo.
ALEXANDER

Sete meses depois

ALEXANDER OLHOU PARA os homens sentados ao seu redor


na sala de conferências. Ele havia realizado uma reunião em seu
escritório corporativo.
Encontrando os olhos azuis de seu pai, Daniel Nikolaev, e de seu
avô, Alexei Nikolaev, ele os encarou.
Seu pai havia renunciado há quase seis anos, colocando-o, seu
filho primogênito, no comando. Alexander voltou sua atenção para
os outros membros da Irmandade Bratva.
Ele olhou para seu irmão Dimitri à sua frente.
Ele era o segundo em comando e Obshchak. Ele vigiava os
Brigadeiros. Cuidava do lado de segurança da Bratva para garantir a
lealdade e trabalhava como um de seus espiões. Se alguma coisa
acontecesse com Alexander, ele governaria em seguida.
Movendo os olhos pela fileira, seus olhos caíram sobre Kirill
Volkov, seu Brigadeiro em seus trinta e poucos anos. Um capitão
encarregado que às vezes dava ordens aos soldados, também
treinava seus assassinos. Levantando a cabeça, ele olhou para a
mulher diretamente atrás de Kirill que não estava sentada.
As mulheres não podiam sentar-se à mesa. Ela era a jovem
esposa de Kirill. Ele a conheceu quando ela tinha treze anos, antes
de contratá-la no mercado negro.
Mas Alexander não conhecia sua história completa. Seus frios
olhos azuis encontraram os dele antes que ela inclinasse a cabeça
para o chão. Um de seus olhos tinha uma íris maior e mais preta do
que o outro, como se tivesse sido danificado no passado. Ele tinha
ouvido rumores de que ela não podia ver bem de um olho. Seu
cabelo estava preso em um rabo de cavalo, preto e elegante. Ela
era magra, alta e gostosa. Se ela não fosse a esposa de Kirill, talvez
ele gostasse de vê-la nua.
Anastásia Volkova.
Todos a chamavam de Fantasma.
Kirill disse que ela era a assassina mais mortal que eles tinham, e
Alexander a tinha visto em ação antes. Anastásia era letal e rápida
como um raio. Ela derrubou três de seus próprios homens em uma
batalha de combate prático antes. Normalmente, ele não permitia
mulheres na Irmandade. Era uma máfia exclusivamente masculina
por esse motivo específico, mas ela havia sido iniciada antes de
Alexander assumir a liderança. Ele confiava em Kirill o suficiente
para mantê-la por perto.
Desviando o olhar, ele olhou para os outros três membros
principais da Bratva sentados, antes de seu olhar se concentrar no
chefe da máfia irlandesa, Cian Doyle, que havia solicitado uma
reunião.
— Então, Cian... — Alexander começou, encontrando seus olhos
— O que você queria discutir?
Cian endireitou-se e apertou suas mãos na mesa de vidro.
— Tenho uma proposta.
Alexander esperou.
— Uma aliança de casamento.
Alexander tentou não revirar os olhos e voltou sua expressão
entediada para o homem.
— Minha filha já é maior de idade. Ela fez dezoito anos — Cian
continuou. — Ela é linda e nobre. Uma aliança matrimonial conosco
fortaleceria a unidade entre russos e irlandeses.
Alexander virou-se para seu pai, Daniel, que estava muito
ocupado, mandando mensagens em seu telefone. Seu pai estava
tentando esconder um sorriso. Talvez ele estivesse falando com a
mãe de Alexander.
— O que você acha, Pai? — Alexander consultou.
A cabeça de seu pai se ergueu e ele riu:
— Você é quem tem que se casar, não eu.
Os homens ao redor deles juntaram-se ao riso, mas Alexander
permaneceu quieto e inclinou sua cabeça em direção a Cian.
— Vou pensar sobre isso.
A mandíbula de Cian tensionou depois que ele assentiu com a
cabeça.
— Certo. Claro.
Ele tirou os olhos do rosto de Alexander.
Ele estava esperando um sim imediatamente?
Alexander tentou não zombar internamente.
Pouco depois que o chefe da máfia irlandesa saiu, os homens
continuaram sua conversa sobre negócios futuros. Uma hora
depois, Alexander saiu do prédio com seu irmão, Dimitri.
Eles foram para o carro com quatro bykis, os guarda-costas de
Alexander.
— Ouvi dizer que os policiais têm poucas evidências sobre nós a
respeito do caso de Yuri — disse Dimitri. — Parece um caso aberto
e fechado. — Antes que ele pudesse responder, Dimitri perguntou:
— E aquela garotinha que nos viu?
Alexander parou quando chegaram ao Porsche prata fosco.
— Faz meses. Se a criança tivesse dito alguma coisa, não
estaríamos andando por aí.
Dimitri ainda parecia cético, parecia querer contradizê-lo. Seus
olhos azuis — que eram bastante ferozes e elétricos — ousavam
perfurar qualquer um. Seu irmão raramente sorria. Ele o viu sorrir
quando eram crianças, mas agora as expressões de Dimitri eram
limitadas. Seu irmão exibia brilho e dúvida. Não era de admirar que
as pessoas o chamassem de Fúria às vezes. Seus olhos eram
diferentes um do outro. Dimitri herdou os olhos de seu avô, Alexie
Nikolaev. Eles ainda pareciam semelhantes, e podia-se dizer que
eram parentes, embora não tão próximos como irmãos.
— Ninguém machuca a criança, Dima — Alexander murmurou.
Seu irmão assentiu.
— Certo. Não estou planejando. Mas ela é uma testemunha.
— Uma testemunha não confiável — Alexander corrigiu. — Ela
prometeu que não vai dizer uma palavra.
Os olhos de seu irmão se estreitaram em descrença, e ele cruzou
os braços musculosos e cheios de tatuagens sob a camiseta preta.
Agora, seus corpos pareciam diferentes também. Considerando que
ele era mais musculoso, Dimitri muitas vezes parecia um grande titã
que poderia matar alguém apenas pisando com seus pés enormes.
Quando as pessoas os encontravam pela primeira vez e não
sabiam quem eram, muitas vezes confundiam os irmãos. Eles
sempre presumiam que Dimitri era mais velho, mesmo sendo três
anos mais novo. O rosto de Dimitri era bem barbeado e ele tinha
cabelos mais curtos. Era mais cheio na parte de cima e mais curto
nas laterais, enquanto Alexander sempre mantinha a barba aparada
e o cabelo comprido.
— E você aceitou a palavra de uma criança? — seu irmão
questionou.
Ele encolheu os ombros.
— Você ficaria surpreso com o quão boas as crianças são em
guardar segredos.
Dimitri apenas zombou:
— Você não tem experiência com elas.
Alexander sorriu.
— Não, mas elas parecem gostar de mim — respondeu ele,
lembrando-se dos sorrisos da pequena Noura. — O que aconteceu
com a recepcionista Nancy? — ele brincou, propositalmente
incitando seu irmão de coração de pedra.
Dimitri estreitou suas sobrancelhas grossas e pretas.
— Nada além do fato de que eu entreguei a comida.
O sorriso de Alexander se alargou. Ele iria gostar muito disso.
Seus olhos escuros se iluminaram com malícia.
— Entregou? — ele questionou. — Você está falando sério?
Dimitri apenas piscou.
— É o que eu faço. Lembra, irmão?
Ele estava certo. Dimitri frequentemente entregava as mulas que
eles mantinham. O lábio de Alexander se contraiu, e ele segurou
uma risada. Dimitri continuou a olhar impassível. Alexander
encontrou seus olhos. Uma coisa que ele gostava em Dimitri era
que ele não conseguia sentir emoções. Um sociopata e um mafioso
da Bratva formavam uma combinação perigosa.
— Aquela garota provavelmente pensou em você por semanas.
Você fez o dia dela, está planejando vê-la novamente? — Alexander
perguntou.
— Não — Dimitri respondeu brevemente. — Não é o meu tipo.
— Então por que você conseguiu a comida para ela?
Os olhos azuis de seu irmão colidiram com seus escuros.
— Promessa é dívida. Vamos para casa agora. É exaustivo falar
com você às vezes, e eu odeio falar — Dimitri murmurou, mudando
de assunto.
Um dos bykis de Alexander segurou a porta para ele entrar em
seu Porsche. Dimitri deslizou no banco de trás, ansioso para correr
para casa, e Alexander estava prestes a seguir atrás, mas uma voz
chiou a suas costas:
— Jander!
Ele fez uma pausa e olhou por cima do ombro.
Ele podia reconhecer aquele jeito fofo de falar a quilômetros de
distância.
Seus lábios se curvaram quando notou a pequena Noura parada
ali novamente. Ela era como um sol brilhante. Tão pequena e
angelical. Ela usava um vestido roxo brilhante, de tiras, que
alcançava os joelhos. Seus pezinhos estavam em meias e sapatos
roxos combinando. Seu cabelo castanho macio estava em um rabo
de cavalo. Ela tirou a franja da frente dos olhos, mas eles só
pousaram no mesmo lugar. Seus olhos castanhos brilhantes
estavam cheios de travessura enquanto ela olhava para ele.
Alexander se afastou da porta e deu alguns passos na calçada.
— Detskoye solnyshko — ele murmurou. Bebê Sol. — Olá,
pequena criatura.
— Oi, Jander! O que voxê tá fazendo aqui? — ela falou,
apertando a boneca contra o peito.
Ele ficou surpreso que ela ainda se lembrasse de seu nome.
— Trabalhando — ele respondeu finalmente, não revelando nada.
— Xério? — Seus olhos atônitos pareciam que iam explodir das
órbitas oculares. — Onde tão ox bandidox? — Seu pequeno corpo
girou como uma bailarina, com seus olhos selvagens inspecionando
os arredores, procurando por eles.
Ele escondeu um sorriso com a ironia de que o bandido estava na
frente dela.
— Eles estão se escondendo — ele sussurrou, arregalando os
olhos apenas para assustá-la.
Sua boca formou uma expressão em ‘O’ quando ela voltou sua
atenção para ele.
— Legal. Quero que eles xejam prejos.
Ele arqueou uma sobrancelha e inclinou a cabeça para a
garotinha.
— Sabe, você não deveria estar vagando sozinha — ele
repreendeu. Esta era a segunda vez que ela aparecia à sua vista. A
primeira foi no hospital. — Coisas ruins acontecem com garotinhas.
A boca de Noura abriu.
— O cara mau vai me machucar?
Ninguém se deu ao trabalho de ensiná-la a não falar com
estranhos? Mas, novamente, se tivessem, as crianças raramente
ouviriam, de qualquer maneira. Elas eram teimosas pra caralho. Ele
tentou uma tática diferente, já que não tinha ideia sobre paternidade:
— É perigoso. Não saia da vista de sua mãe, Noura. Onde ela
está, afinal?
Antes que ela pudesse responder, uma voz falou atrás deles:
— Noura. Com quem você está falando?
Uma voz suave, ofegante e gentil agraciou seus ouvidos.
Erguendo o olhar da pequena criatura, ele inclinou o corpo para a
esquerda e olhou para a voz feminina desconhecida.
Seu olhar pousou em sua mãe. Certamente não uma voz
adequada a uma figura de autoridade.
Nos encontramos novamente.
A mulher misteriosa estava ainda mais sexy do que da última vez
que a viu. Agora que ela estava de pé, ela alcançava os ombros
dele. Sua pele estava dourada. Provavelmente voltou à sua cor
original. A última vez que ele a viu, foi vários meses atrás, e ela
estava mais pálida, quase parecendo um vampiro.
O sol ficava bem nela. Seus longos cabelos castanho-claros
estavam soltos e chegavam até o meio do peito. Essa cor era uma
fraqueza para ele. Tão diferente de seus cabelos pretos. Pareciam
macios como seda, e ele ansiava por passar os dedos pelos fios
exuberantes.
Ele se perguntou como ela ficaria quando ele agarrasse seu
cabelo, ela estando debaixo dele. Ele enrijeceu em suas calças e
moveu seu blazer longo e ajustado para cobrir o meio de suas
coxas. Não havia necessidade de traumatizar a criança, porém...
seus lábios se voltaram para cima em um sorriso quando os olhos
da mulher seguiram o pequeno movimento. Ele não se importava
em chocá-la.
Seus lábios se separaram em surpresa, e sua pele dourada
corou. Sua expressão era tão doce. Suave e inocente. Ela percebeu
e desviou os olhos rapidamente antes de encontrar seu olhar
novamente.
Sem vergonha, ele continuou estudando-a, gostando do rubor
cobrindo sua pele. A luz do sol acentuava o ninho dourado em seu
cabelo. Ela era como a própria luz do sol também. Deslizando os
olhos para baixo, notou que ela usava um blazer preto, uma camisa
branca de botão e uma saia preta. Roupas de trabalho. Muito
diferente da bata de hospital em que ele a viu. Seu olhar caiu em
seus membros longos e nus. Suas pernas longas e sensuais eram
suaves e tonificadas.
Ele nunca poderia esquecer aqueles olhos grandes, castanhos e
amendoados, com aqueles cílios grossos e escuros. Eram grandes
e luminosos. Fascinantes, mas trágicos. Uísque no gelo.
Eles não tinham o brilho em comparação com os olhos
expressivos de Noura. Seus olhos eram da mesma cor, mas os de
sua mãe não tinham brilho. Os olhos comoventes dessa mulher
eram inquietantemente profundos, penetrantes e friamente
indagadores. Seus olhos contavam um milhão de histórias, um
milhão de segredos como o mar escondido.
E eles estavam tristes como o inferno. Tristes pra caralho.
— Você... é você — ela sussurrou.
Ela virou o nariz bonitinho no ar.
Ele permaneceu em silêncio e continuou a sorrir.
Em um pequeno sussurro, ela acusou com seus lindos lábios:
— Ladrão de beijos.
GHISLAINE

A PESSOA MAIS perigosa da cidade de Nova York estava


sorrindo para mim.
O Pakhan da Bratva.
Um assassino a sangue frio.
Um vilão insano.
Um assassino russo implacável.
Malicioso. Sem coração. Monstruoso.
Minha mandíbula se contraiu e meus olhos se voltaram para
Noura, que estava perto dele. Alcançando-a, eu rapidamente a
puxei para longe dele, para perto das minhas pernas.
Seu sorriso se aprofundou.
Aquele não era um sorriso doce e genuíno. Era um daqueles
sorrisos misteriosos, mas perigosos. Este homem era uma má
notícia.
Ele cruzou as mãos atrás do corpo enquanto ainda me examinava
abertamente. Eu queria arrancar seus olhos e jogar pôquer com
eles. Meus olhos se arregalaram ao perceber isso. Nunca tive esses
pensamentos sombrios. Olhei em seus olhos, que eram de uma
linda cor escura. Eu ia colocar a culpa de tudo neste tirano. Ele era
um selvagem reencarnado. Todo vil e mau.
Eu tinha sido beijada pela própria morte.
Obviamente, isso afetaria minha sanidade.
Ele ainda não tinha falado, e eu fiz uma careta, me perguntando
por que ele estava falando com Noura. Se ele estivesse planejando
sequestrar minha filha, eu o algemaria tão rápido, que ele nem teria
tempo de piscar. Eu o observei um pouco mais.
Ele parecia mais alto. Mesmo com a distância entre nós, seu
corpo esguio pairava sobre mim. Ele vestia suas roupas justas
novamente, as cores preto e branco o encobrindo.
— Pensei que você poderia não ter lembrado — Alexander
Nikolaev falou, finalmente, com seus olhos brilhando. Uma voz
suave como uma melodia profunda e forte que me acariciava.
Meu olhar se fixou em sua boca carnuda.
Claro, me lembrei daqueles lábios rosados.
Infelizmente, ele era bonito. Tudo bem, admito. Ele era.
Extremamente bonito, mas era um selvagem. Sempre tão horrível
quando destruía os outros. Pálido, assustador e alto como um
vampiro. Ele era como uma criatura rara, violenta e mítica. Mais mito
do que realidade. Tudo o que ele precisava eram asas.
Ele parecia completamente diferente de mim. Era como a noite, e
eu era o dia. Dois paralelos. Repreendendo-me por meus
pensamentos, fechei os olhos de vergonha e brinquei com o cabelo
de Noura, usando-o como uma distração. Quando olhei para cima
novamente, ele parecia estar se divertindo. O sorriso nunca
diminuiu.
Sem saber mais o que fazer, cobri as orelhas pequenas de Noura
com as mãos e encarei o criminoso. Seu olhar escuro seguiu o
movimento, e seus olhos maliciosos se iluminaram novamente.
— Você não pode sair beijando as pessoas — falei. Isso soou
muito tímido, então limpei a garganta e perguntei: — Por que você
fez isso?
Ele soltou as mãos atrás e passou uma das mãos tatuadas pela
barba aparada. Parecia zombar de mim. Olhei a pele escura cheia
de tentáculos. Meus olhos se estreitaram naquele ponto antes de
olhar para cima.
Mas tentáculos de quê?
— Sua filha... — disse ele, abaixando o queixo para Noura, que
continuava a sorrir para ele com carinho. De jeito nenhum minha
filha seria amiga de um criminoso. Ainda cobria suas orelhinhas
para que ela não pudesse ouvir nossa conversa inapropriada. Ela
tentou se esquivar, mas segurei firme. Depois de alguns momentos,
ela parou de lutar e chupou o polegar. Eu provavelmente parecia
uma mulher louca agora, e não dava a mínima. — Ela exigiu que eu
te beijasse.
Pisquei, perplexa e pega de surpresa. O quê?
Fiz uma careta, e, antes que pudesse fazer qualquer outra
pergunta, ele falou novamente:
— Ela acreditava que eu poderia te acordar do coma.
Franzi minhas sobrancelhas. Que tipo de feitiçaria era essa?
Seus olhos serenos brilharam, e sua voz ficou tão baixa, como se
ele estivesse compartilhando um segredo comigo, ao falar:
— Minha magia funcionou, não?
Ele parecia muito orgulhoso de si mesmo, e eu tinha certeza de
que, a qualquer segundo, seu peito estaria estufando. Poderia
imaginar as últimas manchetes se a mídia soubesse o que
aconteceu naquele dia.

Viúva do diretor do FBI acorda com um beijo de um chefe da


máfia russa brutal.

Foi apenas uma coincidência louca. Ele me beijou quando eu


decidi acordar... Certo?
Ele não era nenhum príncipe encantado.
Meu príncipe encantado já estava morto.
— Talvez você não esteja ciente de quem eu sou — comecei a
falar, tentando acalmar a ira queimando em meu peito. Eu ia
explodir um dia. Apertei e soltei a pressão nos meus dentes, mas o
ranger se tornou insuportável, então parei. — Trabalho para a
polícia. Sou a agente do FBI Ghislaine Khalil. Você não pode sair
tocando as pessoas. É... inapropriado — terminei.
Ele ergueu as sobrancelhas de brincadeira.
— É mesmo? — ele murmurou em sua voz lírica.
Ele se aproximou, e segurei minha respiração. Estava muito perto,
invadindo propositalmente meu espaço pessoal. Graças a Deus, eu
tinha Noura como um sanduíche entre nós. Olhei para baixo para ter
certeza de que ela ainda não podia ouvir nossa conversa. Até agora,
tudo bem. Ela estava brincando com sua bonequinha.
Satisfeita, olhei para o Pakhan.
Seus olhos profundos se arregalaram dramaticamente e ele
continuou sussurrando:
— Porque me lembro de você me beijando de volta.
Meu pulso batia em meus ouvidos enquanto meu coração
acelerava. Meu queixo quase caiu, pronto para bater no cimento.
Deus, ele era tão frustrante. Por que tive que encontrá-lo hoje? Eu
estava apenas tentando aproveitar um dia com minha filha no
parque.
Apertei minha mandíbula e cerrei os dentes.
— Não sabia o que estava fazendo — protestei. — Parecia um
verme assustador em meus lábios.
Agora, isso era uma mentira. Não parecia nada disso. Lembrei-me
da suavidade de sua boca. Ele sorriu de novo, nunca sorrindo
completamente. Queria imobilizar sua boca com fita adesiva.
— Certo — ele murmurou com uma pitada de sarcasmo. Ele não
parecia ofendido por eu o chamar de verme.
— Olha você... Pakhan — eu cuspi essa palavra como se fosse
venenosa. Era plena luz do dia e ele não podia me machucar. Além
disso, minha arma estava presa na cintura, por baixo do blazer. Ele
ergueu as sobrancelhas. — Fique longe da minha filha.
Ele olhou para Noura novamente.
— Bem, ela é quem sempre me encontra. — Antes que eu
pudesse desmenti-lo, ele desafiou: — Pergunte a ela você mesma.
Nunca me aproximei dela.
Não precisava perguntar nada a ela. Ela era uma criança, não
sabia de nada. Olhei para ele e falei claramente:
— Que esta seja a última vez que ela fala com você. Se ela
realmente conhecesse sua verdadeira identidade, ignoraria sua
existência com muita força.
Ele desmanchou o sorriso, e eu me sentia muito presunçosa. Sua
mandíbula se moveu, e meus olhos foram para seu queixo
proeminente e angular, onde podia contar cada pequeno tique. Ele
repreendeu baixinho:
— Droga, Olhos Tristes... Quem te machucou?
Eu odiava como sua voz soava tão baixa e suave, como se ele
soubesse todos os meus pequenos segredos sujos. Que eu era uma
causa perdida esses dias. Perdi toda a presunção que estava
sentindo apenas um momento atrás. Tentei não mostrar uma reação
a ele, mas ele me deu um olhar acolhedor. Frustrada, meus lábios
se esticaram em uma linha fina e sombria.
Quem diabos ele estava chamando de Olhos Tristes, afinal?
— Fique longe de mim — avisei, querendo apontar um dedo em
sua direção. — E, principalmente, da minha filha. Vou emitir uma
ordem de restrição contra você se não o fizer.
— Não é crime falar com você — ele rebateu.
Dei um sorriso de lábios apertados antes de falar novamente:
— Estou ciente sobre você, Pakhan, e todas as suas atividades
perigosas e ilegais. Não preciso que você a corrompa.
Seus olhos enevoados se enrugaram novamente.
— E se eu corromper você em vez disso?
Seus olhos nunca abandonaram meu rosto. Seu olhar era
perturbador, mas convincente.
Arrepiante, mas magnético.
Minha respiração ficou rasa enquanto seu olhar percorria cada
centímetro do meu corpo. Meu batimento cardíaco vacilou, e desejei
que calasse a boca.
— Isso nunca vai acontecer — declarei.
Ele se aproximou ainda mais, e seu cheiro de couro misturado
com loção pós-barba me inundou. Gostaria que ele não fosse tão
viril. Apenas mais alguns passos e ele poderia me beijar novamente.
Apertei meus lábios no caso de ele tentar de novo, mas eu
provavelmente parecia uma idiota, então parei.
— Sério, Olhos Tristes? — ele murmurou, arqueando uma
sobrancelha. — Você está falando comigo há mais de dez minutos
em vez de fugir. Eu diria que tentei você... — sua voz assustadora
caiu tão baixo, eu respirei fundo — Só um pouco.
Balancei minha cabeça em descrença.
— Prefiro comer terra.
Ele olhou para mim e continuou:
— Há uma parte de você que está intrigada... Porque — ele sorriu
novamente — você prende a respiração o tempo todo que estou
perto.
Merda. Ele notou isso?
Meu coração martelava contra meu peito, e meu pulso acelerou.
Eu queria fugir, mas meus pés ficaram grudados no chão, à sua
mercê como uma prisioneira.
Ele provavelmente era como Cyrus.
Pior, na verdade.
Pelo menos Cyrus não era um assassino em massa.
Ambos eram vis, imprudentes e impiedosos, de qualquer maneira.
Separei meus lábios trêmulos para protestar:
— Pakhan... — mas minha voz saiu muito ofegante, e eu nunca
terminei minha frase.
— Alexander.
Eu odiava como meu coração batia mais forte a cada segundo
que passava. Odiava como seus olhos selvagens escureceram
quando ele olhou para mim. Odiava a forma como o tom baixo de
sua voz se aprofundava.
Perigo, minha voz interior sussurrou. Corra.
O canto de seus lábios se ergueu, e minhas bochechas
aqueceram.
— Para você, eu sou Alexander.
Ele deu alguns passos para trás, ainda olhando para mim. Sua
figura alta se virou, indo em direção à porta aberta do carro. Seus
homens a fecharam em sequência. Alguns momentos depois, eles
foram embora, deixando-me ali, ainda olhando para ele.
GHISLAINE

PASSADO
Vinte anos de idade.

Voltei à academia do FBI um mês depois.


Não sabia por que ainda me importei em voltar depois daquele
encontro com Driss Khalil. Esperava encontrá-lo novamente.
Aparentemente, eu não tinha aprendido a lição da primeira vez.
O seminário havia terminado e todos estavam fazendo uma pausa
para comer alguns petiscos. Curiosamente, meus olhos vagaram ao
redor, procurando por aquele rosto dourado familiar. Não o tinha
visto antes. Ele não estava aqui hoje?
A decepção se instalou em meu coração. Tomei um gole do suco
de laranja que servi para mim na lanchonete. O cabelo na parte de
trás da minha nuca se arrepiou quando um olhar ardente queimou
minha blusa branca. Me acalmei e lentamente me virei, encontrando
seus olhos intensos.
Ele ainda estava lindo, como da última vez que eu o tinha visto.
Alto, moreno e bonito.
Posso parecer um pouco tola, mas ele era isso tudo.
Ele parecia mais bronzeado, mais moreno do que da última vez
que o vi.
Meu coração disparou, mas escondi aquele sorriso que queria se
curvar em meus lábios. Ele se moveu em minha direção, vindo do
outro lado da sala, com sua caminhada letal, confiante e forte. Todo
o ar deixou meus pulmões quando pisquei, preparando o que eu
tinha a dizer a ele. Mostraria a ele quão dedicada eu seria à causa e
quão duro eu trabalharia.
Apenas alguns metros de distância agora.
Ele ficou na minha frente.
— Você veio de novo... Ghislaine.
Meu olhar surpreso encontrou o dele. Ele se lembrou do meu
nome.
Sua voz ainda estava nervosa e forte. Controlada e confiante. O
tipo que pertencia a uma figura de autoridade.
Um líder. Um governante. Um rei.
— Voltei — respondi. Felizmente, minha voz não estava coaxante
como a de um sapo. — Você não pode destruir meus sonhos —
ousei dizer.
Ele ergueu a sobrancelha intrigado.
— Você não pode me atropelar — continuei. — Só porque sou
feminina e gosto de coisas femininas, não significa que não seja
forte.
Seus olhos pareciam estar rindo.
— Nunca disse que você era fraca. — Antes que eu pudesse
contra-atacar, seu olhar intenso e ousado retornou e percorreu meu
rosto e meu corpo. — Você está diferente hoje. — Esperei que ele
terminasse sua avaliação. — Sem batom vermelho. Em vez disso, a
cor é nude e combina. Sem joias também.
Uma pequena parte em mim rugiu de alegria por ele ter notado.
— Sua maquiagem é sutil, seu estilo se mistura à multidão agora
— ele continuou, seu olhar caiu para minhas mãos, para minhas
unhas cortadas. Ele me encarou novamente. — Você se veste
casualmente. Camisa de botão e calça preta. — Um sorriso queria
se formar em meus lábios com seu elogio. — No entanto, todos os
homens nesta sala ainda estão olhando para você.
Não queria sorrir agora.
Olhei ao redor da sala e percebi o que ele queria dizer. Minha
pele corou e ficou quente sob seus olhares. Eu estava muito focada
em Driss Khalil para notar qualquer outra pessoa.
— Você nunca pode ser casual — ele murmurou.
Meu coração afundou no peito, e olhei para o chão, a decepção
enchendo meu corpo por ter falhado novamente. Um suspiro deixou
meus lábios, e fiquei profundamente amuada. Queria impressioná-
lo, tanto quanto queria que ele me levasse a sério como candidata.
Este era o meu recomeço.
Um novo começo.
Derrotada, eu estava prestes a me virar e sair, mas ele falou
novamente:
— Você foi a primeira coisa que notei quando entrei nesta sala.
Assustada, levantei meus olhos e encontrei seus olhos fortes.
Eu estava deslumbrada novamente. Passei a língua por meus
lábios secos, e seus olhos seguiram aquele movimento. Minha
garganta ficou seca, ressecada, mas não ousei beber meu suco de
laranja.
— Você se destaca apenas por ser você.
Quando não respondi, ele ergueu as sobrancelhas e virou o
corpo.
Disse antes de perder a coragem:
— Isso significa que passei? — disse, animada, e eu gostaria de
ter falado com mais confiança.
Driss Khalil fez uma pausa e voltou a me encarar.
Na deixa, meus ombros se endireitaram e mantive minha cabeça
erguida.
Merda. Eu era como uma estudante ansiosa completa.
— Você nunca falhou na primeira vez — ele respondeu.
Mordi o lábio em confusão.
— Mas, Sr. Khalil, você disse... — minha voz sumiu.
Ele me ofereceu um sorriso, um sorriso genuíno, perdendo o
sarcasmo por trás dele. Ele levantou a mão e estendeu para mim.
— Você pode me chamar de Driss em vez disso. É um prazer
conhecê-la oficialmente, Ghislaine.
Meus olhos brilharam e eu sorri, estendendo a mão para apertar
sua mão grande e quente.
— Driss — sussurrei, saboreando seu nome na minha língua.
Gostei. E gostei dele ainda mais.
GHISLAINE

PRESENTE

Nos últimos sete meses, eu estava usando uma máscara.


Acordar.
Banho.
Cozinhar.
Comer.
Deixar Noura na creche.
Trabalhar.
Ser perseguida por Cyrus.
Ir para casa.
Comer.
Dormir.
Repetir.
A rotina era confortável, e eu estava grata por ainda ter algo a ver
com a minha vida. Isso me dava foco. Eu não podia interagir muito
com Noura por causa dos meus horários de trabalho. Tive que
praticamente implorar a Cyrus por um dia de folga para levar Noura
ao parque da última vez. Ele não me dava dias de folga. Isso era
ilegal, já que ele não podia me fazer trabalhar tanto.
Minhas tias moravam comigo agora. Eu tinha perguntado se elas
poderiam se mudar para morar comigo permanentemente. Não tinha
mais ninguém além de Noura. Elas concordaram alegremente e
cuidavam dela quando eu saía para o trabalho. Ainda perdida em
meus pensamentos, caminhei um quarteirão até a sede. Cheguei
tarde hoje, pois havia feito um check-up com o Dr. Garcia.
Era uma da tarde.
Fiz uma pausa, meu corpo sentindo um predador por perto.
Olhei ao redor das ruas movimentadas de Nova York. Alguns
homens estavam me olhando, mas eu não sabia se era aquele
olhar.
O tipo de olhar que deixava um arrepio incontrolável na espinha,
como se você estivesse sendo observada. Como um caçador
ganhando de uma gazela.
Estreitei meus olhos nos táxis amarelos, meus ouvidos atentos
aos caminhões buzinando. Meus olhos buscavam
descontroladamente na movimentada hora do rush, mas esse
sentimento nunca foi embora. Ele rastejou por todo o meu corpo, e
eu queria arranhar minha pele viva, rasgando-a até sangrar. Passei
a mão pelo meu cabelo, e minha mão caiu frouxamente ao meu
lado.
Virando-me, fui para dentro da sede. A recepcionista me
cumprimentou. Eu me perguntei se era porque ela realmente se
importava ou porque eu era sua superior. Sorri educadamente e
segui em frente. Como sempre, cabeças e olhares se voltaram para
mim quando cheguei à minha mesa. Eu estava acostumada com
isso agora, mas eles ainda eram irritantes.
Ocupei-me com o trabalho, estudando meu caso atual.
Algumas horas se passaram e recebi uma ligação no meu pager.
Cyrus.
Gemi internamente. Ele provavelmente queria que eu fosse ao
seu escritório novamente para que ele pudesse grelhar minha bunda
um pouco mais. Sugando uma respiração lamentável, eu respondi:
— Khalil.
Eu nunca deixei de lembrá-lo de quem eu era.
— Escritório. Agora.
Ele desligou.
Apenas duas palavras que me deixaram uma bagunça.
Estava tentando manter minha cabeça acima das águas esses
dias, mas eu estava me afogando... todos os dias. Suspirando
inquieta, levantei-me e alisei as rugas da minha saia preta. Odiava
usá-la, e tinha certeza de que os olhos de Cyrus estavam sempre
colados na minha bunda quando eu saía da sala dele. Tentei limpar
minha mente e fui em direção ao seu escritório como uma
caminhada envergonhada.
Cabeças se viraram em minha direção, mas ninguém me ofereceu
um sorriso.
Também não tinha amigos aqui.
Driss tinha sido meu único amigo.
Era meio patético.
Limpando meus pensamentos, bati à porta dele. Quando ouvi sua
voz, entrei.
— Feche a porta — ele ordenou sem olhar para cima, folheando
os arquivos.
Talvez ele quisesse falar comigo sobre o caso de Alexander
Nikolaev. Ainda estávamos investigando. Quando o fiz, sentei-me
em frente a ele. Seus olhos hostis se ergueram e encontraram meu
olhar questionador.
Ele raramente saía do escritório a não ser para reuniões. Driss
estava sempre em campo caçando, prendendo e interrogando
criminosos. Muitas vezes, ele me levava consigo. Miran trabalhava
principalmente no campo também. Eles não apenas enviavam seus
agentes para o campo sozinhos para morrer enquanto trabalhavam
confortavelmente no escritório. Eles estavam lá para sua equipe a
cada passo do caminho. Cyrus, no entanto, estava grudado em sua
cadeira como se alguém fosse arrancá-la.
— O que você vai fazer depois do trabalho? — ele perguntou
casualmente.
Inclinei a cabeça, confusa.
— Casa, como sempre.
Eu não tinha vida social.
— Quando seu turno acabar, vamos comer alguma coisa.
Ele estava me convidando para sair?
Não... Meu maxilar apertou. Isso soou terrivelmente como uma
ordem.
Observei ele e seu terno azul-marinho. Se eu tivesse uma tesoura
agora, faria uma centena de linhas em ziguezague nele. A cada dia,
meus pensamentos pioravam. Sempre fui uma mulher boa e
piedosa. Nunca pensei errado sobre ninguém antes... Até agora.
— Minha filha está esperando por mim — eu rebati.
Não o incomodou em nada.
— Ela pode esperar um pouco mais.
Como ele ousa? Quem era ele para tomar decisões sobre minha
filha?
Eu queria me inclinar sobre a mesa e dar um tapa em sua cara.
Fiz uma pausa. Meu sangue gelou e minhas mãos tremeram. Minha
reação era por causa desses medicamentos que ainda estava
tomando? Ainda estava tomando antipsicóticos. Meus pensamentos
eram mais paranoicos. Podia ser um efeito colateral. Não queria
acreditar que isso era quem eu era agora.
— Não — respondi severamente. — Ela não consegue dormir
sem mim.
A mentira escapou. Noura podia dormir bem sem mim. Alguns
dias, quando eu estava atrasada, trabalhando até as nove, minhas
tias já a tinham colocado na cama.
— Vamos, Ghislaine — retrucou Cyrus. — Você trabalhou a tarde
toda. — Quando eu não respondi, ele exigiu: — Você não está com
fome? Porque estou morrendo de fome.
Suas pupilas dilataram enquanto ele me examinava abertamente.
A cor dos olhos dele era linda, mas olhos tão bonitos não mereciam
ser esculpidos em um selvagem. Engoli o nó se formando na minha
garganta.
Minhas mãos tremiam tanto, que eu tive que sentar nelas para
parar os tremores. Ele estava flertando, mas não parecia inocente.
Ele queria mais, e eu não podia dar mais. Não queria fazer isso com
ele. Definitivamente, não ele. Esta era uma situação complicada
agora, e eu não conseguia ver uma saída. Ele era meu chefe, e
suas táticas me deixaram confusa, já que ele tinha a vantagem.
— Te vejo mais tarde — ele continuou, sem se preocupar em
esperar pela minha resposta, me dispensando. Abri a boca para
falar, mas seu telefone tocou, interrompendo-me. Ele acenou com a
mão para mim novamente, como se eu fosse como seu cachorro,
um animal de estimação que ele estava enxotando.
Levantei-me e, novamente, pude sentir seus olhos colados na
parte inferior das minhas costas. Saia idiota. Apenas destacava
minha bunda, se estendendo pelas minhas curvas. Gostaria que
meu cabelo fosse mais comprido, pelo menos, para que eu pudesse
cobri-la da vista dele, mas não era. Na saída, tentei não cair das
minhas pernas trêmulas. Meus saltos não ajudaram em nada.
Fechei a porta e suspirei de alívio.
Ainda precisava pensar em uma maneira de recusar. Não iria sair
para jantar com ele. Não tinha interesse em dar-lhe esperanças e
ser sua amante. Eu me encolhi e sentei na minha cadeira, olhando
para a minha mesa. Ignorando os olhares e sussurros ao meu redor,
mantive minha cabeça baixa e me concentrei em trabalhar.
O nome Alexander Nikolaev veio à minha mente.
Lembrei-me do nosso último encontro há duas semanas.
Ele era tão estranho e misterioso.
O que ele queria de mim?
Sem noção do que fazer, cocei minha cabeça e caí de volta na
minha cadeira como espaguete. Talvez ele flerte com muitas
mulheres.
Amanhã, eu encontraria Adrian Sokolov na prisão.
Esperançosamente, eu poderia fechar o caso em breve. Eu tinha
pouca informação sobre Alexander. Eu me perguntei se deveria
entrar em contato com Miran para obter ajuda, mas não queria
incomodá-lo. Ouvi dizer que sua esposa estava grávida e ele havia
tirado uma folga do trabalho para ela.
Pensei em vigiar Alexander, mas ele era muito esperto.
Inteligente. Avançado. Era difícil atingir o Alfa. Eu precisava ir atrás
do Ômega, que era Adrian.
Tirei meu blazer e o pendurei em minha cadeira.
O relógio marcava seis da tarde enquanto eu olhava para os
ponteiros me sentindo tensa.
Em menos de duas horas, Cyrus se aproximaria de mim
novamente. Gemendo internamente, bati na testa, me sentindo
derrotada. Parei quando peguei os olhares assustadores em mim
novamente. Meu lábio se curvou em um rosnado, e meus vizinhos
rapidamente desviaram o olhar.
Idiotas.
Eles não tinham nada melhor para fazer na vida do que deixar a
viúva infeliz? Eu poderia solicitar uma transferência no futuro depois
de terminar o caso de Alexander. Deveria.
Tinha deixado pendente por muito tempo. Antes de mais nada,
terminaria o caso de Alexander, então uma transferência poderia
acontecer.
O tempo passou, mas eu não conseguia me concentrar em
minhas anotações. Olhava para o relógio mortal a cada cinco
minutos. Cada segundo era como uma eternidade. Fechei os olhos.
Gostaria que Driss estivesse aqui.
Ele saberia o que fazer. Eu estava presa e não queria ser
demitida por minha rejeição. O desespero encheu meu coração. A
desolação ameaçava me arruinar. Devo ter ficado sentada o tempo
todo, olhando fixamente para a tela do computador e não fazendo
absolutamente nada.
Era uma loucura.
Loucura.
Olhei a hora novamente.
20 horas.
Todos ao meu redor se levantaram, e aproveitei a oportunidade
para sair correndo daqui. Mandaria uma mensagem para Cyrus e
diria que tinha uma emergência. Saí, desliguei a tela do computador
e coloquei meu arquivo na minha bolsa de couro preta.
Em movimentos apressados, peguei meu blazer. Sem me
preocupar em vesti-lo, saí do meu cubículo de trabalho e, com
passos apressados, avancei, a última a sair da multidão. Exalei e
sorri quando estava prestes a chegar à saída.
— Onde você está indo? — uma voz profunda repreendeu por
trás.
Não. Parei, perdendo meu sorriso.
Congelei, com minha mente exigindo que eu continuasse me
movendo e correndo para fora daqui, mas meus membros se
congelaram. Paralisada. Meu corpo parou ao ser pega, com medo
de ser demitida e perder meu sustento. A voz familiar tornou-se
visível, e Cyrus apareceu ao meu lado.
Seus olhos ameaçavam os meus, e me forcei a não me encolher.
Mantive minha cabeça erguida quando encontrei seus olhos. Ele
não poderia ter poder sobre mim se eu não desse a ele.
— Temos um jantar. Pensei termos discutido isso.
Discutido? Ele praticamente me ordenou. Minha mandíbula ficou
tensa e eu menti:
— Minha tia me ligou. Noura está perguntando por mim.
— Noura é muito pegajosa para uma criança de quatro anos —
Cyrus rebateu, erguendo as sobrancelhas.
Ninguém falava assim da minha filha.
A angústia encheu meu coração. Sem pensar, peguei a arma
presa no coldre da minha saia. Nunca tinha matado alguém a
sangue frio antes, mas, neste momento, eu queria. A escuridão que
permanecia em minha alma estava se aproximando da superfície,
querendo destruir qualquer coisa em seu caminho. Seus olhos
seguiram aquele movimento com um sorriso. Odiava seu sorriso
maldito. Congelei quando meus dedos roçaram o objeto de metal
frio.
— Você não tem filhos, então é claro que você não saberia quão
crucial suas mães são para eles — murmurei.
— Pais também, certo? — seu lábio se curvou em um sorriso de
escárnio feio, e ele zombou maliciosamente: — Mas, obviamente,
ela não tem um.
Não sabia o quão mais possível era um coração partido se
estilhaçar, mas ele explodiu novamente. Foi esmagado novamente.
Sua crueldade diante de mim, rasgando minhas entranhas e
depois torcendo-as até que nada restasse. Meu coração e minha
alma estavam mortos. Meu corpo era apenas uma casca externa do
que foi deixado para trás. Eu só tinha minha mente sobrando... Mas,
ultimamente, até isso estava ficando louco. Minha sanidade era a
única coisa que me restava. Lágrimas encheram meus olhos, e meu
lábio inferior tremeu. Meus ombros caíram, perdendo a fachada de
bravura que eu tinha. Não podia acreditar que ele acabou de dizer
isso. Ele acabou de insultar descaradamente a mim e minha família.
— Jantar primeiro — Cyrus ordenou, então saiu na minha frente,
esperando que eu o seguisse. — A menos que você prefira o papel
rosa na sua mesa?
Uma lágrima rolou pelo meu rosto aquecido.
Demitida.
Ele me demitiria se eu não seguisse com seus planos selvagens.
Meu coração e minha mente ficaram dormentes, rasgados mais uma
vez. Eu o segui, olhando para o chão, perdida e atordoada,
desejando estar em qualquer lugar, menos aqui.
Driss, onde você está?
Nenhuma resposta veio.
O vento frio bateu no meu rosto quando saí do quartel-general,
secando as lágrimas salgadas que grudavam em meus cílios. Nunca
cheguei a limpá-las. Um lembrete permanente do meu destino. Olhei
fixamente para a frente, para a figura de Cyrus em azul-marinho.
Ele se virou e falou comigo, mas eu não estava mais prestando
atenção nele. Sua boca se moveu, mas não consegui ouvir nada
saindo de seus lábios. Meu corpo estava presente, mas minha
mente estava em outro lugar. O zunido do sangue em minhas veias
me percorreu e meu coração disparou descontroladamente.
Ele ainda olhava, provavelmente esperando por uma resposta, e
eu acenei para o que quer que ele tivesse dito.
Se ele tivesse apenas me mandado abrir as pernas para me
foder, eu estaria no inferno.
Por sorte, não foi isso.
Acabou que ele perguntou que tipo de cozinha eu queria. Havia
um restaurante indiano a três quarteirões da sede. Era perto, então
fomos andando. Meus saltos batiam contra o cimento, meu cabelo
voou para trás quando o vento o varreu. Concentrei-me em um
passo de cada vez, sem ouvir Cyrus falando. Uma nuvem escura
pairava sobre minha cabeça, e meu corpo pesava. Estava muito
ocupada me concentrando em andar, porque estava prestes a cair
no chão.
Chegamos a um beco escondido, e o tráfego diminuiu nessa área.
Nenhum carro em movimento estava à vista. Não conseguia ver
ninguém ao nosso redor, e o sol tinha se posto trinta minutos atrás,
nos deixando no escuro. Apenas as lâmpadas da rua
permaneceram acesas. Não estávamos mais na estrada principal da
cidade.
Sem aviso, uma mão forte e grande me puxou contra a parede.
Larguei minha bolsa de couro e meu blazer no chão.
Assustada, olhei para cima como um cervo perplexo, de boca
aberta, e encontrei os olhos escuros de Cyrus.
— Você é a porra de uma muda que não pode responder quando
eu falo com você? — ele perguntou.
O tempo parou e meus membros ficaram congelados no chão. Ele
estava gritando, mas suas palavras estavam longe demais para
meus ouvidos, como se ele estivesse a uma milha de distância.
Seus olhos estavam sobre os meus. Partículas de cuspe voaram no
meu rosto, enquanto ele gritava. Sua pele ficou vermelha, e eu só
podia olhar para as veias prontas para explodir de sua testa a
qualquer segundo. Fechei os olhos para não me cegar
temporariamente, mas não virei o rosto. Fiquei ali, ainda como um
fantasma da noite.
Suas palavras não me machucaram mais. Eu não estava aqui.
Fiquei quieta, só para irritá-lo um pouco mais.
Seu peito pressionou contra o meu, pairando sobre mim, me
empurrando ainda mais contra a parede de tijolos. Olhei em volta
para ver se havia pessoas circulando, alguém que pudesse me
ajudar, mas não havia ninguém. Ele escolheu o local perfeito para
me atingir.
Virei-me para encará-lo com as pálpebras pesadas. Queria dormir
e nunca mais acordar. Gostaria de nunca ter acordado. Um coma
me manteve longe da realidade brutal. Isso permitiu que meu
cérebro se curasse. Isso me impediu de desmoronar... Mas agora,
era tarde demais.
Minha vida já havia terminado em uma tragédia.
Gostaria de ser mais forte e lutar, mas meus braços e pernas não
tinham mais força. Meus membros pesados eram inúteis.
Desorientada, insisti em levantar o braço e socá-lo no rosto, mas
pesava como aço e concreto. O peso era impossível de levantar.
Queria pegar minha arma e me defender, mas fiquei imóvel como
uma tábua, apenas inspirando e expirando. Como um organismo
apenas inalando e exalando. Meu corpo tinha desligado. Agora, só
restava carne e ossos de mim. A qualquer minuto agora, minha
carne teria desaparecido também.
— Você sempre pensou que era melhor do que eu, hein, sua
putinha? — ele perdeu a cabeça. Sua voz soava ainda mais
profunda, monstruosa, mas ainda tão distante. — Agora, você vai
aprender a porra do seu lugar. Khalil sempre desfilava com você.
Sempre me irritava quanta clemência ele te deu. Deve ser uma
boceta de ouro. Você é bonita, sabe, mas não passa de uma vadia
metida.
Seu hálito quente pousou no meu rosto, e eu desviei. O tempo
tinha diminuído, e eu queria que a noite já tivesse acabado. Minha
mente estava me embalando para dormir, e pensei que ia desmaiar
em breve.
Estava desmaiando, percebi.
Meu corpo não estava reagindo do jeito que eu queria. Não
prestava atenção aos sinais mentais. Ele desconectou. Minha mente
estava desligando lentamente para me proteger do inevitável.
A qualquer segundo, tudo estaria acabado.
Cyrus se inclinou para trás e me deu um soco no queixo.
Esse golpe me fez jogar minha cabeça para trás, me fazendo ver
estrelas. Um gemido saiu da minha boca, e meu rosto doeu. Ele
estendeu a mão áspera novamente e puxou minha blusa branca,
rasgando-a no meio.
— Vou colocar você no seu lugar para que nunca passe por cima
de mim.
Nunca passei por cima dele. Eu era apenas a esposa de Driss.
Ele ia me matar por causa disso? Os botões brancos estavam
espalhados no chão, brilhando no escuro como diamantes. Não
precisei olhar para baixo para saber que meu sutiã branco estava
visível. Fechei os olhos, perdendo a batalha para mantê-los abertos.
Você nunca precisou de mim para protegê-la.
Uma voz calma familiar sussurrou.
Não ouvia isso há meses, depois que comecei a tomar minha
medicação. Meus olhos se abriram lentamente.
Nunca disse que você não era forte.
Lágrimas inundaram meus olhos.
Você é forte. Por isso, fiz de você minha esposa.
Lágrimas rolaram pelo meu rosto.
Você já derrotou um estado de coma. Agora, porra, acorde.
Minha cabeça virou na direção de Cyrus, e pisquei rapidamente,
tentando lembrar onde estava. Minha mente enviou sinais para
minha mão novamente. Meus dedos trêmulos se abriram e
apertaram, lentamente recuperando a sensibilidade. Meus membros
eram como concreto. Levou segundos, talvez minutos, para levantar
minha mão. Não tinha certeza. Gritei quando suas unhas afiadas
arranharam meu pescoço. Sangue quente escorria dele, manchando
meu sutiã branco. Levei um tapa novamente, e meu queixo dolorido
queimou. Achei que ele ia me matar.
Inalando, estendi um braço e dei um soco sólido em sua
mandíbula estúpida. Cyrus caiu para trás, tropeçando alguns
passos, segurando o queixo machucado. Olhei para minha blusa
rasgada e tentei puxá-la de volta com meus dedos trêmulos, mas foi
inútil. Levantei meus olhos para ele novamente, encontrando seu
olhar gelado e cheio de ódio.
— Como você se atreve a me bater? — ele gritou. — Sou seu
maldito chefe! Vou demitir sua bunda e arruinar sua vida. Maldita
psicopata.
Não deixei de notar a ironia de ser chamada de psicopata.
Foi ele quem me atacou.
Cyrus atacou, me dando um tapa no rosto novamente. A palma de
sua mão pesada queimou contra minha bochecha ardente. Meu
corpo ainda estava se recuperando, ainda estava frágil. Não sabia
se poderia lutar contra ele e vencer. Tentaria, mas provavelmente
perderia minha vida no final. Noura, pensei. Eu tinha Noura. Tinha
que lutar para viver por ela.
Ele estendeu a mão para trás, agarrou meu cabelo e o puxou para
cima. A água salgada atingiu meus olhos, borrando minha visão.
Estendi a mão livre para empurrá-lo, mas precisava de mais tempo.
Meu corpo ainda tremia enquanto lutava para me defender.
Um momento depois, seu peso corporal foi tirado de mim. Engoli
em seco, estendendo a mão pela parede para me segurar para não
cair. Meu corpo cedeu e caiu no chão de cimento duro, enquanto eu
buscava por ar rápido. Puxei meus joelhos para o meu peito,
sentindo-me pequena como uma criança.
Meus ouvidos se atentaram aos palavrões vindo à minha direita.
— Filho da puta.
Esse era Cyrus.
Mais alguns palavrões.
Ouvi outra voz profunda.
Quem era aquele?
Parecia familiar, mas não conseguia colocá-lo em lugar nenhum.
Levantei meus olhos pesados e olhei para a minha esquerda.
Cyrus me encarou, e o homem que estava lutando com ele estava
de costas para mim.
Roupa preta. Blazer preto e calça preta. Roupas formais.
Muito familiar.
Franzi minhas sobrancelhas, mas minha mente ainda estava em
branco. Um latejar sondou minha testa, e esfreguei minha mão
contra ela, desejando que ficasse dormente também. Meu corpo
doía como se tivesse sido atingido por um milhão de agulhas. Os
sentimentos em meu corpo voltaram lentamente. Socos e chutes
estavam sendo lançados ao fundo, mas não prestei atenção neles.
Estava muito perdida. Só me vi nessa noite turva, escura e
estrelada.
— Que porra você está fazendo aqui? — Cyrus gritou ao fundo.
— Você vai entrar no meu território e me impedir de tocá-la?
Tocar? Experimente agredir.
Talvez ele estivesse tomando algum tipo de remédio, como eu,
porque ele estava claramente delirando.
— Vou mandar prendê-lo — declarou Cyrus. — Você teve um
pedaço dela? É por isso que você está lutando?
Fechei os olhos, desejando poder fechar os ouvidos também.
Mais socos e chutes vieram.
Meu defensor não falava. Eu me perguntei por que não.
Talvez ele fosse mudo...
— Essa cadela está amaldiçoada como uma maldita praga —
Cyrus continuou a gritar entre respirações pesadas. — Sabia que
ela toma antipsicóticos? — Tive que listar isso na minha avaliação
mental, à qual ele tinha acesso. — Ela é mentalmente instável e
fodida. Driss Khalil cometeu o pior erro ao trazê-la para minha
jurisdição.
Eu me enrolei ainda mais em uma bola. Funguei contra meus
joelhos, descansando minha mandíbula dolorida contra eles.
— Não, o pior erro que ele cometeu foi deixar você viver.
Era uma voz suave e familiar que eu já tinha ouvido antes, mas,
agora, ela perdeu seu talento, revelando a brutalidade crua por trás
dela.
Meus ouvidos se animaram com os sons do desbloqueio da
segurança de uma arma. Olhei imediatamente para a minha direita,
e o homem alto e magro de blazer estava segurando uma arma na
direção de Cyrus. Estreitei meus olhos ardentes enquanto os
observava.
Cyrus foi espancado completamente. Ele estava com os olhos
inchados, o nariz quebrado e o lábio partido. O sangue escorria de
sua boca, pousando em seu terno limpo, que agora estava
amassado. Seu cabelo encaracolado estava desgrenhado e
despenteado. Ele não se parecia mais com o polido diretor do FBI,
como ele gostava de se exibir.
Se eu estivesse de bom humor, teria rido.
Inspirando e expirando, meu treinamento começou, e minha mão
disparou para a parte de trás do meu coldre, desenganchando
minha arma e apontando-a para o homem de blazer.
A arma de Cyrus ainda estava presa ao cinto.
Aquele homem misterioso ia matar um oficial federal.
Era uma ofensa punível.
Eu estava fazendo o que fui treinada para fazer.
Servir e proteger.
Meu lema.
Destravei a trava de segurança.
— Seu marido morto deve estar tão feliz sem ela. Ele deve estar
rindo alegremente em seu túmulo, onde ele pertence! — gritou
Cyrus.
Não sei quais métodos você pode ter usado antes para chegar ao
topo, mas não funcionará mais.
Pai também, certo? Mas ela não tem um.
Aprenda a porra do seu lugar.
Maldita psicopata.
Essa cadela é amaldiçoada como uma maldita praga.
Mudei minha mira para a esquerda e puxei o gatilho.
GHISLAINE

10

ATIREI
Não uma vez.
Não duas.
Não três.
Mas seis vezes.
Disparei todas as minhas balas em seu peito.
E continuei pressionando o gatilho mesmo quando a arma estava
vazia.
O som clicando de novo e de novo.
Aqueles olhos azuis colidiram com os meus, boquiabertos,
quando o choque invadiu seu rosto confuso. Não senti nenhuma
presunção em meu coração, mas estava contente que meu rosto
seria a última coisa de que ele se lembraria. Eu segurando uma
arma apontada para ele.
Seu corpo caiu no chão. O sangue escureceu contra o tecido de
sua roupa, manchando o azul-marinho permanentemente. Seu terno
não era mais bonito. Meu chefe Cyrus respirou fundo e seu corpo
parou de se mover. Ele ficou flácido, de olhos fechados e imóvel no
chão. Não pude deixar de pensar que agora ele ficará em coma
para sempre. Eu ainda estava olhando para seu corpo morto,
quando o homem misterioso de blazer preto lentamente se virou e
me encarou, revelando-se por completo.
Tirando meus olhos de Cyrus, encarei olhos escuros que eram
frios e duros como aço. Não podia dizer o que ele estava sentindo.
Descrença? Ele compôs bem suas expressões. Seus olhos se
estreitaram antes de olhar para minha arma. Seu corpo se virou
completamente, vindo em minha direção, e, por instinto, apontei
para ele.
Ele não parou os passos, muito menos abrandou.
Eu tinha usado todas as minhas balas. Todas as minhas seis
balas.
E ele sabia.
Eu não tinha minha Glock 9M comigo. Aquela metralhadora
carregava dezesseis balas, a que usava para trabalho de campo,
mas eu estava no escritório hoje. Estava sempre de plantão.
Meus dedos tremiam, e minhas pálpebras tremiam para o homem
que apareceu na minha frente. Eu ainda estava no chão, ainda com
os joelhos pressionados contra o peito, ainda apontando uma arma
para ele.
Ele achava que era o próximo, que poderia me machucar
também?
Era a vez dele agora? Ele começaria a me bater?
Meu lábio inferior tremeu, mas meus olhos não lacrimejaram
novamente. Eles eram como uma lixa agora. Eu não tinha mais
lágrimas para chorar, e a dormência estava voltando. Encostei-me
na parede, percebendo que não havia outro lugar para ir.
Estava enjaulada contra os tijolos. Eu não tinha balas
sobressalentes. Eu só carregava sobressalentes quando estava
trabalhando em campo.
Hoje foi apenas mais um dia no escritório. Também não trouxe
meu canivete, porque usava saltos estúpidos hoje. Talvez pudesse
usar o cano da minha arma. Virei meus olhos para o chão,
procurando por possíveis pedras que eu pudesse jogar nele, mas
estava limpo. Meus botões estavam espalhados ao meu redor, mas
esses eram inúteis.
Balancei minha cabeça descontroladamente, com protestos
querendo sair da minha boca, mas minha língua estava muito
pesada. O homem se agachou ao meu lado, e meus ombros se
ergueram em tensão. Não importava que ele estivesse ajoelhado
diante de mim. Estendi meus braços cansados, e meus membros
doeram quando me inclinei para frente e enfiei o cano da arma em
seu peito. Exalando, empurrei mais fundo em seu peito, não me
importando se eu o machucasse.
Encontrei os olhos escuros do Pakhan.
Era Alexander Nikolaev o tempo todo.
— Abaixe sua arma, Olhos Tristes — ele murmurou.
Apenas balancei minha cabeça, meu cabelo voando com o vento.
Ele estendeu a mão e, em um movimento rápido, arrancou a arma
das minhas mãos. Deixou cair ao meu lado, e eu olhei para ele com
os lábios ressecados.
— Minha — murmurei baixinho.
Alexander inclinou a cabeça enquanto passava a mão pela barba
imaculada, me estudando. Seu olhar se fixou em meu queixo
machucado e seus olhos se estreitaram. Sua beleza sombria se
misturava com a noite escura. Seus olhos eram como duas vastas
massas de escuridão. No entanto, sua pele era tão pálida e
luminosa, que ele brilhava no escuro.
Ele sangrava. Deve ter sido a luta que deixou aqueles cortes
acima das sobrancelhas e bochecha. Mas não eram muito terríveis.
Eu ainda tinha meus joelhos dobrados contra mim. Seu olhar foi
do meu rosto até minha camisa rasgada. Ele não podia ver muito,
porque meus braços estavam no caminho, mas ele podia ver as
protuberâncias dos meus seios.
Engoli em seco e, com dedos trêmulos, estendi a mão para cobri-
los de sua vista. Baixei a cabeça de vergonha e funguei. Suas mãos
grandes alcançaram-me desta vez, e eu as afastei. Isso não o
impediu, e ele alcançou a barra da minha camisa, puxando-a para
fora da minha saia.
Eu vacilei. Seria a vez dele também.
Meu coração batia forte no meu peito. Meus membros doloridos
empurraram contra ele, mas ele se aproximou ainda mais. Sua mão
fria estendeu-se e segurou meu queixo, me forçando a ficar parada.
Assustada, meus olhos pesados encontraram seu olhar duro.
Seus olhos se suavizaram, perdendo o nervosismo.
— Confie em mim — ele sussurrou.
Sua voz era rouca e sedutora enquanto falava.
Um chefe da máfia do submundo estava me pedindo isso.
Um gângster notório.
Um assassino a sangue frio que vendia mulheres para viver.
Um criminoso que era o caso número um do FBI.
Ele se inclinou em minha direção, chegando cada vez mais perto,
até ficar a apenas alguns centímetros de distância. Sua cabeça
pairava acima de mim, seus longos dedos nunca soltando meu
rosto. Ficamos assim por alguns segundos. Depois de um momento,
eu não sabia mais o que fazer além de assentir.
Seus dedos deixaram minha mandíbula, e minha pele aquecida
perdeu a frieza da dele. Soltei meus joelhos, e suas mãos puxaram
minha camisa rasgada sobre minha cabeça. O ar frio da noite
atingiu minha pele nua. Olhei para o meu sutiã branco. Sangue
cobria as bordas externas. Os arranhões de Cyrus estavam em
mim, mas não acho que fossem tão ruins. A dor havia diminuído.
Eu ainda estava olhando para o meu peito quando Alexander se
inclinou para frente e tirou meu cabelo do caminho. Assustada, eu
olhei para ele, atordoada. Ele alcançou atrás de suas calças e tirou
um pequeno lenço quadrado. Seus olhos encontraram os meus
novamente. Não havia luxúria em seu olhar, ou talvez ele fosse
apenas bom em escondê-la. Eu não sabia dizer. Ele colocou o lenço
no meu pescoço.
— Para o sangue — ele disse suavemente.
Assenti lentamente, a compreensão surgindo em mim. Estendi a
mão e coloquei minha mão ali, cobrindo a dele. O toque era suave.
Seus olhos colidiram com os meus novamente, antes que ele tirasse
a mão.
Sem aviso, ele tirou o blazer.
Fascinada, mergulhei em seus movimentos. Ele era um enigma
misterioso. Um homem que eu tinha visto duas vezes e com quem
só falei uma vez antes. Sua camisa de botão saiu em seguida.
Olhei, perplexa, para ele se despindo. Talvez ele tivesse perdido a
cabeça como eu também. Uma risadinha histérica queria deixar
meus lábios. Ele se esticou em um pequeno sorriso, mas congelou
quando meus olhos caíram em seu peito nu pela primeira vez. Tão
pálido e assustador. Uma tez diferente da minha profunda e
dourada.
Tatuagens cobriam seu corpo, marcando seu peito e braços. Ele
tinha uma na mão também, mas eu não conseguia ver bem. Elas
estavam por toda pele dele. Eu nunca tinha visto algo assim antes,
apenas em fotos. Meu marido nunca fez nenhuma tatuagem. Eu
conhecia outros agentes que gostavam de manter os prisioneiros
nus e os puniam durante os interrogatórios. Eles provavelmente
viram tatuagens todas as vezes. Eu era uma agente, mas meus
métodos eram diferentes em comparação com os outros. Sabia que
Miran gostava de torturá-los. Era um fato bem conhecido em nossas
jurisdições.
Eu só falava com criminosos.
Apenas interrogatório verbal.
Eu só via seus braços, rosto e tatuagens no pescoço.
Nunca o peito e as pernas.
Não acreditava em tortura e assassinato de pessoas. Mas, então,
olhei para o corpo de Cyrus Drakos.
Pelo menos eu acreditei nisso uma vez.
Concentrei-me em Alexander novamente. Eu não conseguia ver
sua arte no escuro, mas o contraste nítido se destacava em sua
pele clara. Ele era esguio, forte e musculoso. Inclinando-se para
frente, ele puxou sua camisa por sobre minha cabeça. Movi minha
mão do meu pescoço, e meus membros se moveram e empurrei
meus braços no tecido quente. Ele puxou a camisa sobre o meu
estômago, cobrindo-me.
Algo desconhecido agitou em meu coração que ele tinha dado um
de seus pertences para mim. Suas mãos puxaram meu cabelo de
dentro da camisa, e agora eles estavam soltos e livres atrás de mim.
Meus braços envolveram o tecido de cetim, e eu me abracei. Era
muito longo e muito grande, praticamente me afogando nele. Eu
inalei o cheiro calmante dele. Escuridão e couro. Cheirava como ele.
Apertei o lenço contra meu pescoço novamente. O tecido branco
tinha manchas de sangue.
— Você parece uma myshka com minhas roupas — ele
murmurou.
Meus olhos curiosos se voltaram em sua direção, sem entender o
idioma russo.
Ele estendeu a mão e sacudiu meu nariz.
— Ratinho.
Estendi a mão e toquei o local em que seu dedo estava.
— Vem.
Isso foi tudo que ele disse. Ele colocou o blazer de volta em seu
corpo, embora o tenha deixado desabotoado. Ainda podia ver seus
peitorais duros.
Um suspiro ofegante deixou minha garganta, e me inclinei contra
a parede para me levantar. Minhas pernas vacilaram e caí de volta.
Franzindo o cenho, tentei ficar de pé novamente, mas meus
membros ainda pareciam bolo de carne, completamente sem
energia. Fiquei no chão e olhei pateticamente para os meus pés.
— Pegue sua bolsa e roupas — disse Alexander, entregando-me
meus itens. Agarrei-os com força contra o meu corpo.
Ele pegou seu celular e escreveu algo nele antes de guardá-lo
novamente. Sem aviso, ele passou as mãos por baixo das minhas
pernas e me pegou no colo, como se eu fosse sua noiva prometida.
Atordoada, observei cada movimento seu como um falcão. Ele me
carregou sem esforço, como se eu não tivesse peso. Pressionei um
braço contra seu peito, meus dedos roçando seu peito nu, e o outro
braço ainda agarrado ao meu pescoço, segurando o lenço. Levantei
meus olhos nervosamente, e ele olhou diretamente para mim com
aqueles olhos profundos.
Meu coração parou. Parei de respirar, e seu lábio se contraiu.
Acho que ele já sabia disso.
Minha pele corou, cada centímetro em mim ficando quente. Seus
olhos escuros suavizaram, o brilho neles retornando. Seus olhos
pareciam as próprias estrelas escuras. Pisquei, olhando para ele
com fascinação, como se ele fosse um experimento científico. Não
sabia por que ele estava fazendo isso. Não sabia por que ele não
deixou Cyrus me agredir.
Eu não o entendia, muito menos o conhecia.
Ele era o inimigo público.
Inimigo da lei, o que o tornava meu inimigo.
Um perigo vivo, ambulante e falante para a humanidade.
E, ainda assim, me senti livre em seus braços.
— Para onde estamos indo? — eu murmurei finalmente.
— Casa.
Ele estava me dando respostas de uma palavra.
Meus olhos caíram, por cima do ombro de Alexander, para o
cadáver de Cyrus.
— Temos que chamar a polícia. — Eu quase quis rir. Eu era a
maldita polícia. — Eu... atirei em um homem.
Alexander apenas me ignorou e continuou andando pela rua,
deixando o corpo de Cyrus para trás. Olhei para ele e protestei:
— Não podemos deixá-lo aqui. Preciso falar com a polícia. —
Tentei me contorcer um pouco, mas era inútil contra esse tirano. —
Alexander... — assobiei.
Seus olhos caíram sobre mim novamente.
— Ele está morto... Preciso me entregar — murmurei.
Não gostava da ideia, mas era a coisa certa a fazer.
Depois de um tempo, ele respondeu:
— Não.
Pisquei algumas vezes, sem entender.
— Você vai simplesmente deixar o corpo dele lá? As pessoas vão
encontrá-lo — argumentei.
— Meus homens virão — ele apenas respondeu. — Eles estão
por perto.
Olhei para ele, perplexa e me perguntando sobre suas intenções
pela segunda vez. Fiquei em silêncio, pensando no que mais podia
fazer para fazê-lo mudar de ideia. Ele não ia simplesmente me jogar
no chão, e meu corpo precisava de mais tempo para despertar
completamente antes que eu pudesse usá-lo corretamente.
Ficamos assim por alguns minutos, ele andando e me carregando
em silêncio. Não havia ninguém andando por este beco. Estava
vazio. Eu me perguntei: era por isso que Cyrus tinha me trazido
aqui? Fiquei feliz por ter um silenciador na minha arma. Ninguém
dentro dos apartamentos pôde ouvir os tiros.
Seu corpo estava quente contra mim, e eu o encarei o tempo
todo. Ele não me deu atenção e olhou para frente.
Alguns momentos depois, luzes fracas se aproximaram na direção
oposta.
Dois carros pretos.
Um se moveu em direção ao cadáver de Cyrus, e eu olhei para
trás enquanto três homens saíam do carro todos de preto, usando
máscaras e luvas pretas. Eu ainda podia vê-los do final do
quarteirão.
Eles pegaram o corpo de Cyrus e o jogaram no porta-malas. Uma
limpeza. Eles estavam limpando minha bagunça. Eu olhei enquanto
eles borrifavam algo no chão ensanguentado, antes de puxar baldes
de água do carro. Onde diabos eles conseguiram isso e tão rápido?
Esses homens faziam trabalhos profissionais melhores em limpezas
do que em filmes. Nunca tinha visto isso ao vivo, e meus olhos
gananciosos absorveram tudo. Criminosos. Criminosos treinados.
Fiz uma careta para mim mesma.
Agora, eu também era uma criminosa.
Desviando o olhar da cena do crime, olhei para o carro preto para
o qual Alexander estava indo. Uma percepção surpreendente me
atingiu, e eu falei.
— Você é um cúmplice agora. Você é parte do meu crime.
Os olhos escuros de Alexander se voltaram para mim novamente.
— Parceiros — ele sussurrou, seus lábios se contraindo
novamente.
Isso tocou meu coração partido. Desviei o olhar rapidamente e me
concentrei na minha bolsa de couro.
— Você não teve nada a ver com isso — minha voz vacilou. —
Ainda posso me entregar. Eu posso explicar o que aconteceu...
que... ele... ele... — minha voz sumiu.
— Não foi legítima defesa, Olhos Tristes — Alexander sussurrou,
reconhecendo a verdade que eu estava com muito medo de admitir.
Meus olhos saltaram para ele.
— Ele não tinha a arma dele.
Meu lábio inferior tremeu, e a água pinicou meus olhos.
— Eu poderia tê-lo matado facilmente. — Sua mandíbula
tiquetaqueou. — Ele mereceu... E eu não vou deixar você cair por
isso.
Este era o mesmo homem que continuou a escravidão moderna.
Uma das principais razões pelas quais o FBI o estava
investigando.
Eu não sabia o que pensar sobre ele. Era muito contraditório.
Perplexa demais para dizer qualquer coisa, chegamos ao carro dele.
Ele me colocou dentro e entrou, fechando a porta. Sem saber
mais o que fazer, sentei-me ali no banco de couro, ainda confusa e
perdida, não mais me segurando. O sangue havia parado. Eu não
sabia o que fazer com o lenço, até que ele o pegou de mim e o
jogou no chão.
Um momento depois, o motorista acelerou. Estava escuro demais
para ver quem estava dirigindo. Levantando meus olhos, encontrei
os de Alexander.
Eu não estava mais em seus braços, e isso inquietou meus ossos.
Olhei para o chão, pensando no que mais dizer. Antes que eu
pudesse, ele alcançou minha cintura novamente e me puxou sobre
sua coxa, mas não fiquei totalmente em seu colo. Minha cabeça
descansou em seu peito, de lado, e eu apertei minhas mãos, me
sentindo um pouco contente agora. Tentei ignorar seus músculos
definidos contra os quais me encostei. Mas seu calor ajudava. Olhei
para aqueles olhos assombrosos dele. Ele não desviou o olhar de
mim.
— Você sabe onde eu moro? — perguntei finalmente.
— Sim.
Novamente, com essas respostas monossilábicas.
Olhei para ele com desconfiança, exigindo respostas com os
olhos.
— Você me seguiu? — eu acusei, minha mandíbula ainda doía
enquanto eu falava.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Sim — ele repetiu, descaradamente.
Meus lábios se separaram, e eu fiquei intrigada. Bem, sabia onde
ele morava também. Seu endereço estava praticamente escrito no
arquivo. Falando do arquivo, olhei para a bolsa de couro no banco,
onde ela estava segura. Desviei o olhar e o encarei.
Por que ele sabia onde eu morava? Eu era apenas mais uma
agente.
— Isso é assustador como o inferno — murmurei.
Seu lábio se contraiu.
— Você veio de carro para o trabalho?
Balancei minha cabeça.
— Não, peguei o trem. — O trânsito de Manhattan era horrível e
raramente havia estacionamento por perto.
Ele apenas assentiu.
Minhas mãos roçaram meu cinto, e percebi que não tinha minha
arma comigo. Todo o ar deixou meus pulmões.
— Minha arma? — perguntei, olhando para cima.
Ainda estava na cena do crime.
Ele se inclinou um pouco, me empurrou com ele e puxou minha
arma de trás de suas costas, presa na sua calça. Suspirei de alívio.
Ele deve ter pegado do chão quando eu não estava olhando.
Agradecida, peguei-a de suas mãos e a prendi de volta ao meu
cinto. Eu ainda estava pensando quando falei novamente:
— As balas são marcadas com números de série. Elas podem ser
rastreadas até mim. — Fui um idiota por falar quando sabia que o
motorista provavelmente estava ouvindo nossa conversa. Talvez ele
já soubesse. Mais um cúmplice do meu crime.
Eu ainda não sabia quem dirigia.
— Não é tarde demais — continuei. — Eu ainda posso me
entregar... Estou... errada... Eu... Eu... — minha voz sumiu, e me
inclinei para me afastar dele. — Vire o carro.
Ninguém atendeu meu pedido.
Alexander apenas passou o braço em volta da minha cintura, me
impedindo de sair.
Pisquei para ele.
— Eu lhe dei uma ordem como oficial do Federal Bureau of
Investigation.
Por fim, ele olhou para mim com aqueles olhos brilhantes e
inclinou-se em minha direção. Minha cabeça afundou em seu peito
e, seguindo meus instintos, tentei me afastar. Quanto mais perto ele
chegava, mais eu afundava.
Sua respiração estava em meus lábios enquanto ele falava:
— Você acha que você pode me assustar, Passarinho?
Com uma voz tão baixa, ele me tirou o fôlego novamente.
Meu coração acelerou com o apelido. Esse apelido me lembrou
os pássaros que eu tinha em casa. Mastigando a parte interna da
bochecha, percebi que ele deve ter me seguido até em casa... Eu
deveria estar com mais medo, mas estava muito focada no cadáver
que deixamos para trás.
Olhei para o meu parceiro no crime, para o meu cúmplice.
Um Bonnie e Clyde modernos.
Eu estava tendo pensamentos histéricos novamente, e desejei
que eles calassem a boca.
— Você tem que me ouvir — protestei, minha respiração
pousando em seus lábios. Apenas alguns centímetros entre nós. —
Preciso me entregar à polícia. É a coisa certa a fazer. A coisa moral
a fazer — continuei, brincando com meus dedos. Eu não sabia se
estava tentando convencer a ele ou a mim mesma. — Não posso
tirar uma vida e me safar. Não podemos fugir de um crime. Essa não
é a minha causa. — Talvez a sua. Eu não disse isso em voz alta. —
A lei vai entender… Temos um sistema de justiça. — Eu me encolhi.
— Ok… Um sistema de justiça falido às vezes, mas os tribunais vão
entender… Talvez não, mas desde que eu tente… Você não pode
fazer o diretor do FBI desaparecer tão facilmente. Ele é um homem
de alto nível. Isso voltará para você. Você vai ter problemas por
minha causa.
Eu não queria que isso acontecesse com ele.
Ele era um criminoso, sim, mas era injusto que ele fosse punido
pelo meu crime.
— Pare — ele rosnou.
Eu imediatamente obedeci.
— Ele machucou você — Alexander ferveu, seus olhos brilhando.
Sua respiração saiu rápida e forte, e sua voz se aprofundou. —
Aquele filho da puta se atreveu a tocar em você com as mãos sujas.
Ele bateu em você. — Seus olhos vagaram no meu maxilar, que
provavelmente estava ostentando uma cor vermelha — Mesmo
quando ele não estava te tocando, ele estava te machucando. Você
reagiu. Você surtou. Isso acontece.
Eu nunca o tinha ouvido falar tão cruelmente antes.
Era estranho... E eu queria que ele me defendesse novamente.
Quando não falei, ele me lembrou:
— Pense em Noura. Pense na sua família. O que elas vão fazer
se você apodrecer na cadeia? Elas acabaram de te trazer de volta.
— Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele acrescentou: —
Se você não o tivesse matado, eu o teria feito, de qualquer maneira.
E não colocaria seis malditas balas nele, eu teria colocado doze.
Meus lábios se separaram enquanto eu olhava para o tirano
acima de mim.
— Doze? — repeti em um sussurro.
Sua mandíbula tensionou na escuridão.
— Eu carrego duas armas.
Desta vez, meu lábio superior se curvou. Eu queria rir. Um oficial
da lei, um homem da lei, me agrediu e eu o matei, mas esse tirano,
chefe da máfia e criminoso, me defendeu.
Mesmo se eu dissesse a verdade, duvidava que alguém ficasse
do meu lado. Era inacreditável.
Tentei controlar a risada, mas ela escapou mesmo assim. Minha
risada saiu pelo ar, a tensão deixando meu corpo. Minha mandíbula
doía, porém, e eu parei de rir.
Ele perdeu o nervosismo em seus olhos e olhou para mim
incrédulo.
— Você está rindo? — ele questionou.
Isso só me fez rir de novo, desta vez mais forte. Eu ainda não
tinha chorado completamente. Mas o riso era melhor agora. Ajudava
a diminuir a dor. Eu tinha perdido oficialmente.
— Não ouvi esse som antes — ele murmurou.
Meu sorriso congelou, e meus olhos encontraram os dele. Meu
coração acelerou do jeito que ele estava olhando para mim. Virei
meu rosto para longe, porque ele estava muito perto. Seu cheiro de
couro estava em mim novamente. Eu estava coberta por isso. Sua
camisa grudada na minha pele. Eu estava no carro dele. Tudo
girava em torno dele.
— Quando chegaremos à minha casa? — perguntei calmamente.
— Minha casa.
Eu me virei para encontrar seu olhar novamente, sem perder sua
nitidez. O brilho neles se foi tão logo apareceu. Ele se afastou de
mim e olhou para frente.
— Por que vamos para lá? — perguntei com hesitação.
Seus olhos caíram antes de olhar para frente novamente.
— Porque tenho a sensação de que você entrará em pânico e
revelará a verdade para sua família.
Perplexa, eu pisquei. Ele estava meio certo. Isso parecia algo que
eu faria.
— Sua casa em Old Westbury? — perguntei, engolindo em seco.
Ele teria muitas pessoas por lá.
— Não — ele respondeu. — Tenho uma cobertura na cidade.
Estamos quase lá. — Seus olhos caíram para o meu rosto. — Você
pode partir amanhã quando estiver calma. Você está falando como
uma tagarela e também está rindo. Está lidando de forma diferente,
e não é normal.
Eu queria rir novamente.
Ele estava questionando meu comportamento anormal?
Ele era um psicopata sádico.
Interrompi o olhar e brinquei com meus dedos. Ainda não tinha
me incomodado em tirar minha cabeça de seu colo. Fiz uma pausa.
Ainda estava no colo dele. Claramente, eu tinha ficado muito
confortável. Eu me movi para mudar, mas seu braço desceu na
minha testa, me empurrando de volta para seu colo. Soltando um
gemido frustrado, eu queria rugir para ele. Alexander apenas olhou
para mim, divertido.
— Eu deveria deixar minha família saber então.
Ele arqueou uma sobrancelha e virou o rosto em direção à minha
bolsa, suas mãos estendendo-se para abri-la. Percebendo que o
arquivo CONFIDENCIAL estava lá, fiz uma pausa, mas acabei
caindo de volta em seu colo. Meus membros ainda estavam fracos e
doloridos.
Ele fez uma pausa, olhando para o meu comportamento louco.
— Vou pegar meu telefone — respirei.
Ele deu de ombros e entregou minha bolsa para mim. Coloquei
sobre a barriga e procurei pelo meu telefone. Encontrei e estava
prestes a discar o número da tia Sabrina quando a voz profunda de
Alexander me interrompeu:
— O que você está fazendo?
Olhei para cima e disse o óbvio:
— Ligando para minha tia Sabrina.
Ele pegou o telefone de mim. Depois de alguns momentos, ele
devolveu. Olhei para a mensagem que ele enviou.
Fiquei presa no trabalho. Vou terminar e irei
amanhã.
Estreitei meus olhos para o texto antes de olhar para Alexander.
— Você não conhece minhas tias — protestei. — Uma mensagem
não é bom o suficiente para elas. Elas vão me perseguir e me ligar
dez vezes se eu não ligar quando estiver atrasada. Não importa se
você tem trinta anos, elas ainda te tratam como um bebê.
Como se fosse uma deixa, o telefone começou a tocar.
Assustada, deixei cair no meu rosto já dolorido. Gemendo, peguei
o telefone ainda tocando. Olhei para Alexander, e ele estava
sorrindo. Eu estava prestes a pressionar o botão verde na tela, mas
fui interrompida novamente.
— Essa é uma ideia terrível — ele zombou. — Elas são sua
família. As pessoas ficam fracas quando se trata delas. Ela
reconhecerá seu pânico.
Tentei não revirar os olhos.
— Eu sou do FBI. Dou conta disso.
Eu menti. Não poderia lidar com merda agora.
Limpando minha garganta, atendi a chamada e a pressionei no
meu ouvido.
— Aaama — falei ao telefone.
— Por que você está trabalhando até tão tarde? — a voz de tia
Sabrina veio.
— Tenho que terminar o arquivamento de notas — menti.
Os olhos de Alexander estavam grudados no meu rosto.
— Você pode fazer isso amanhã. Venha para casa, querida.
Sua voz atingiu meu coração.
Engoli em seco.
— Logo. Eu irei amanhã.
— Por que você está falando tão baixo? — ela exigiu.
Limpei a garganta e lágrimas pinicaram meus olhos.
— É apenas uma conexão telefônica ruim — tentei explicar.
— Tem certeza de que esse é o único motivo?
Eu congelei, e meu lábio tremeu.
— S... Sim — minha voz vacilou.
— Tudo bem — ela respondeu finalmente. — Você já comeu,
habibiti? — Querida. — Você quase não come nada. Parece um
galho hoje em dia. Um espantalho. Um dia, você pode simplesmente
desaparecer no ar. Puf.
Preocupações depositadas em seus insultos.
Além disso, algo comum na minha casa. Minha respiração
engatou, e isso me fez sorrir. Olhei na direção de Alexander, que
estava ouvindo a conversa como um perseguidor intrometido. Fiz
uma careta, achando seu barulho rude, mas ele apenas sorriu
sarcasticamente.
— Eu... Eu vou... Em breve — prometi ao telefone.
— Ok. Eu te amo, venha logo para casa.
Fechei os olhos com força e soltei um suspiro raso. Um nó se
formou na minha garganta.
— Ana Bahibek. — Amo Você. — Diga a Noura que a mamãe
disse boa noite — eu engasguei.
Um choro saiu da minha boca, e uma mão grande apertou meus
lábios, abafando meu soluço. Meus olhos se abriram e encontraram
os olhos escuros de Alexander. Ele não estava mais sorrindo e
pegou meu telefone. A chamada terminou antes que minha tia
pudesse ouvir qualquer coisa.
— Eu não disse que isso era uma má ideia? — Alexander ferveu.
Eu chorei ainda mais.
Seu rosto estava perto novamente na escuridão, com a mão ainda
pressionada contra minha boca. Eu podia sentir o leve sabor
salgado de sua pele áspera. Suas sobrancelhas franzidas, seus
olhos estavam mais duros e nervosos. Minha respiração saiu mais
forte e mais rápida. Minha boca se moveu contra sua mão, minha
visão turva a cada segundo. Estava ficando mais difícil respirar, e
meus gritos se transformaram em soluços.
— Ah... Caralho... — ele sussurrou. Ele olhou para fora da janela.
— E estamos em casa.
ALEXANDER

11

CARALHO...
Ela estava chorando.
O tipo de choro que era agonizante para os ouvidos.
O tipo de choro que te matava.
Caralho em dobro.
Alexander havia ordenado que ela não falasse na porra do
telefone, e ela ainda o fez, de qualquer maneira.
Malditas fêmeas.
Você diz a elas algo para fazer para o bem delas, e elas fazem o
oposto. Sua mão ainda apertada contra sua boca. Ele não tinha
imaginado fazer isso de primeira.
Aquelas lágrimas em seus malditos olhos tristes não pertenciam a
esse lugar. Uma dor excruciante estava nelas. Aquele filho da puta
do Cyrus Drakos teve coragem de tocá-la. Seus homens o levaram
para o armazém vazio. Seu corpo estaria lá amanhã até que ele
decidisse o que fazer com ele. Ele ordenou especificamente que
eles não jogassem seu corpo em qualquer lugar. Ele queria trazer
aquele policial corrupto de volta à vida, apenas para lhe dar uma
segunda morte. Olhando para o motorista, ele encarou Dimitri,
escondido nas sombras.
— Dê-me alguns minutos, e nós vamos.
Ele não podia entrar no hotel com uma mulher chorando.
Dimitri não respondeu e saiu do carro, deixando o estacionamento
pago com manobrista. Alexander tomou isso como um sim. Seu
irmão pegaria uma carona com seus outros homens e voltaria para
casa.
Agora, ele estava sozinho com Ghislaine.
Olhando de volta para ela, seu rosto ficou vermelho e sua linda
pele ficou manchada. Kohl borrou os olhos dela, dando lhe uma
aparência de guaxinim. O rímel se misturou com suas lágrimas,
deixando seus olhos castanhos avermelhados e injetados.
Segurando um suspiro, ele retirou a mão que cobria a boca de
Ghislaine, e seu soluço rasgou o ar. Olhou para os dedos trêmulos
dela antes de colocar a mão sobre eles e pressioná-los. Com a mão
livre, empurrou o cabelo dela para trás, acariciando sua testa de um
lado ao outro. Não havia como parar o choro agora. Ela tinha que
parar antes de ficar mais agitada.
Eles ficaram assim por alguns minutos, e ele não sabia quanto
tempo se passou. Ele se acalmou enquanto observava seu rosto
aflito. Seus olhos selvagens. Aquelas bochechas rosadas
misturadas com o resíduo cinza de sua maquiagem derretida. Sua
mandíbula roxa.
Um belo desastre.
Ele ainda olhava para baixo, mas os olhos dela eram como um
andarilho, perdido e angustiado, como se não pudesse navegar no
escuro. Alguns momentos depois, seus soluços diminuíram. Seu
choro parou, mas pequenos gemidos ainda deixavam seus lábios
rosados. Ele não tinha lenços de papel para limpar o rosto dela.
Usou seu único lenço.
— Sente-se — ele ordenou.
Aqueles olhos castanhos dispararam e seus lábios se separaram.
Ela piscou lentamente, o tipo de inocência que recém-nascidos
piscavam quando pressentiam um estranho e estavam curiosos.
Seus olhos ainda lacrimejavam, mas pelo menos ela parou de
chorar.
Um segundo depois, ela levantou a cabeça do colo dele e, com
movimentos vacilantes, ela se sentou no banco de couro. Bom. Ela
poderia se mover sozinha. Ele não se importava de carregá-la para
o hotel, mas isso chamaria muita atenção, e agora, eles precisavam
manter a cabeça baixa e se misturar. Ele segurou as mãos dela, e o
calor e a suavidade delas ainda queimavam em sua palma. Ele
olhou por alguns segundos, sua língua correndo pelos dentes,
esperando que ela limpasse o rosto. Mas ela ficou parada como
uma estátua, como se estivesse permanentemente congelada no
tempo.
— Limpe seu rosto.
Ghislaine piscou novamente antes de suas mãos alcançarem seu
rosto. Ela estava obedecendo suas ordens. Ela esfregou a parte de
trás dos dedos no rosto, marcando a pele imaculada com kohl.
Agora, suas mãos estavam cobertas de maquiagem também. Ela
continuou, alcançando seu rosto sem rumo, e ele simplesmente
olhou, estudando cada pequeno movimento confuso,
descoordenado e perdido dela.
— Use minha camisa.
Ele fez uma pausa na ordem, e a compreensão pareceu surgir em
seus olhos, como por que ela não tinha pensado na ideia. Ele
inclinou a cabeça enquanto ela usava a camisa de cetim branca
limpa que ela vestia.
O tecido já foi limpo e sem rugas. Agora, estava manchado com
ela. Sua feminilidade suave e elegante estava coberta por ele,
substituindo sua masculinidade. A bainha da camisa grande
terminava no meio das coxas, e ela ainda usava a saia preta por
baixo. Levantando o olhar para o rosto dela, ele arrastou os olhos
sobre o decote. Os dois primeiros botões estavam abertos,
destacando sua pele morena, e suas curvas redondas eram visíveis
novamente. Ele não estava duro antes, mas agora ele estava tão
duro, que seria uma luta andar com a porra do tesão.
Uma vez que ela terminou de limpar, ela olhou para cima, seus
grandes olhos amendoados procurando por ele. Uma curiosidade
espreitava em seu corpo. Uma fome por aprovação em seus olhos.
Uma dor profunda e inquietante percorreu seu corpo. Era algo que
ela estava fazendo apenas uma vez ou ela sempre foi assim?
Ele gostava quando as mulheres se submetiam a ele. Quando ele
as fodia. Quando ele as dominava. Controlava. Isso, por outro lado...
era estranho.
Ele não podia acreditar que esta era a mesma mulher que
assumiu o controle e atirou seis balas em um homem.
Ele não a salvou.
Ela se salvou.
Ele assentiu, e a satisfação encheu os olhos dela.
Um suspiro ofegante deixou seus lábios enquanto ela pegava a
sua bolsa. Ela apertou aquela bolsa de couro preto contra o peito
como se fosse fundamental para sua vida. Isso atraiu seus olhos
para o movimento. O que havia de tão importante nisso? Desviando
o olhar, ele abriu a porta e saiu. Deu um passo para trás e Ghislaine
o seguiu.
Seus passos se moveram em direção à entrada.
Eles caminharam lado a lado, talvez um passo atrás, mas ela
ficou perto dele, perto de seu corpo, demorando-se ao lado dele,
como se ele pudesse abandoná-la a qualquer segundo. Seus olhos
estavam grudados no chão enquanto ela fazia movimentos tímidos.
Suas pernas ainda vacilaram naqueles saltos da porra batendo
contra o chão, mas ela podia se mover.
Ela não parecia nada com uma agente do FBI agora.
Não parecia mais uma mãe forte.
Ele só via um ser humano perdido.
— Mantenha sua cabeça baixa — ele murmurou. — E não faça
contato visual com ninguém.
Sem lhe dar um olhar, ele continuou andando. Juntos, eles
entraram no saguão dourado e vermelho do hotel, e ele não perdeu
os olhares curiosos lançados em seu caminho.
Ele não se preocupou em abotoar o blazer, que balançava
enquanto ele avançava. No elevador, ele apertou o botão SUBIR e
cruzou os braços sobre o peito enquanto esperava. Um bipe o
alertou e a porta se abriu.
Algumas pessoas saíram antes de ele entrar. Um casal apareceu
atrás dele, e ele apenas olhou para eles com seus olhos escuros,
desafiando-os a entrar no elevador.
— Pakhan — o homem sussurrou.
O rosto do estranho ficou vermelho antes que ele se afastasse
com a mulher. Alexander sabia que era um homem reconhecível.
O noticiário da manhã muitas vezes exibia sua fotografia como
suspeito de outro assassinato, e depois, estava nas capas de
revistas de seus últimos encontros. Seu disfarce para o mundo era
que ele possuía sua própria linha de negócios de carros, NIKO.
Ele apertou o botão do elevador para o último andar, o
quadragésimo, e tirou o cartão-chave do bolso. Apenas ele, Dimitri e
membros selecionados da equipe do hotel tinham acesso.
Ghislaine se inclinou para mais perto, e seus dedos se agarraram
à bainha do blazer dele. Ele olhou para baixo quando eles
descansaram em sua pele. Ele segurou um suspiro. Agora, seu
toque não estava ajudando seu corpo aquecido. Como se
percebesse que ela estava segurando seu peito nu, seus dedos
pequenos e finos se afastaram e caíram em sua boca trêmula. Suas
suaves bochechas rosadas ficaram vermelhas como cerejas. A cor
era proeminente em seu tom de pele. Seu lábio se contraiu para a
pequena criatura. Ela não era baixa, exatamente, de estatura média,
mas ele ainda se elevava sobre ela por alguns bons centímetros.
Tomado em seu nervosismo, ele agarrou seus dedos
escorregadios de sua boca e os colocou de volta em seu peito.
Os olhos de Ghislaine se voltaram para ele, como uma pequena
myshka surpresa, e o encararam com a boca aberta. Os dedos dela
estavam molhados com a saliva, roçando a pele seca dele, e isso o
tentou a colocá-los na boca, para ver qual era o sabor. Que gosto
ela tinha. Seu cheiro era limpo, como a terra orvalhada. Mãe sol.
Ela parecia o sol, mas, ao invés disso, ela era o luar. Seu lábio
superior se contraiu novamente, e os olhos dela seguiram aquele
movimento, franzindo a testa com a visão.
— Você está sorrindo — ela murmurou por fim.
Ele sorriu.
— Não estou.
Uma carranca substituiu entre suas sobrancelhas.
— Você comeu? — ele perguntou.
Ele ouviu sua conversa telefônica com sua tia.
Ela balançou a cabeça.
Primeiro de tudo, um banho quente seria bom para ela, então, ela
iria comer.
O elevador apitou e eles chegaram ao seu andar.
— Oh — Ghislaine murmurou baixinho.
Ele inclinou o rosto, verificando seu olhar curioso enquanto ela
observava a mansão. Sim, esse andar inteiro era sua cobertura.
Ele deu um passo à frente, e o elevador se fechou. Pegando seu
telefone, ele pediu serviço de quarto enquanto a olhava. Passos
pequenos e tímidos se moveram ao redor de seu lugar. Se alguém
lhe tivesse dito sete meses atrás que ele teria um agente do FBI em
sua casa, ele os teria abatido. Ele não tinha mais certeza do que
pensar.
Ela observou o piso de mármore feito sob medida sob seus saltos.
Seus olhos se ergueram e pousaram nos lustres dourados
luminosos que pendiam do teto. Grandes sofás brancos com
puxadores de ouro puro os cercavam. Fotografias de trabalhos
abstratos em preto e branco emolduravam as paredes. Assim que
ela terminou de olhar, seus olhos os encararam.
— Chuveiro.
Ela respondia a seus comandos únicos.
Sua pequena cabeça balançou para cima e para baixo antes de ir
em direção a ele. Ele se virou e foi em direção ao banheiro de seu
quarto. Olhando para trás, ele notou que ela olhou para sua cama
branca giratória coberta com lençóis de cetim sem rugas. Ela parou
na porta, e aqueles grandes olhos castanhos líquidos encontraram
os dele, perturbando suas entranhas.
Marrom era uma cor simples.
Subestimado. Eloquente. Amável.
Como os carvalhos em sua casa ancestral.
Como o outono que vinha todos os anos.
Nutrindo. Caloroso. Lindo.
Ela era o outono que vinha todos os anos, deixando o inverno
para trás em seu rastro.
— Você já confiou em mim para chegar tão longe — ele falou.
Ela estendeu a mão e colocou uma mecha atrás da orelha.
Depois de expirar, ela avançou. Em movimentos rápidos, ele se
moveu em direção ao banheiro. Dirigindo-se ao box do chuveiro, ele
abriu as torneiras quentes e frias e tamborilou os dedos até que a
água ficasse levemente morna. Seus passos se moveram atrás
dele. Ele olhou por cima do ombro. Ela ainda segurava o blazer e a
bolsa com ela.
Ele se virou para sair, mas ela estava no meio da porta, parada e
não entrando. Ele caminhou até ela, e seus olhos permaneceram
em seu rosto o tempo todo. Ela levantou o queixo, inclinando a
cabeça para trás, absorvendo-o.
— Vou colocar roupas novas na cama. Você pode colocar seu
blazer e bolsa do lado de fora — ele sugeriu.
Seu lábio inferior tremeu.
— Quero minhas coisas comigo.
Arqueando uma sobrancelha, seu olhar captou como ela agarrou
a alça de sua bolsa. Levantando os olhos novamente, ele apenas
assentiu. Ele deu um passo à frente, mas ela não saiu do caminho.
Outro passo mais perto, e parecia que ela parou de respirar
novamente. Seu lábio superior se curvou, satisfeito. Era bom saber
que ele a deixava sem fôlego.
— Você está bloqueando minha saída — disse Alexander quando
ela não saiu do caminho. — A menos que você queira que eu pule
no chuveiro também. — Diga sim, ele ordenou silenciosamente. Em
vez disso, ela se contorceu, movendo-se para a direita, e ele sorriu
pela sua pressa.
Pelo menos isso a fez se afastar.
Ele fechou a porta e passou a mão pelo cabelo que um dia esteve
arrumado. Agora ele estava bagunçado, desgrenhado, e seu cabelo
comprido caía sobre os olhos. Estremecendo, ele estendeu a mão
para tocar o corte acima de sua sobrancelha. O sangue secou,
deixando-o duro. Ele tirou uma camiseta branca e fina de seu
armário e uma cueca preta e as deixou na cama para ela. Suas
calças de moletom não caberiam nela, e uma parte doente dele
queria ver suas pernas ‘lindas de matar’ novamente.
Tirando uma calça de moletom preta para si mesmo, ele foi para o
banheiro extra nas dependências da sala de estar. Depois de tirar os
sapatos de couro, as meias e se despir por completo, entrou no
chuveiro e abriu a torneira fria, e imediatamente, a água gelada o
encharcou. Ele piscou e respirou com dificuldade. A água grudava
em seus cílios enquanto pensava na viúva.
A viúva negra.
Ele passou a mão pelo cabelo grosso e descansou um antebraço
na frente dele, contra a parede. Ele se lembrou daquele olhar
quando ela explodiu as balas.
Selvagem. Feral. Sombrio.
Como uma borboleta fora de seu casulo.
Como uma leoa solta de sua jaula.
Não mais tão triste.
Não mais uma maldita policial moralista.
Mas alguém capaz de um assassinato, como ele.
Isso se repetia em sua mente como uma música no rádio.
Olhando para baixo, ele notou que seu membro havia se
alongado. Ele se perguntou o que mais seria necessário para tirá-la
de sua concha.
Uma vez, ela foi suave e quieta... Mas, agora, ele não tinha tanta
certeza. O que mais se escondia naqueles olhos enigmáticos dela?
Alcançando abaixo, ele enrolou os dedos em sua masculinidade
grossa e fez movimentos para cima e para baixo. Observando as
veias no comprimento de seu pênis, sua mente se desviou para
Ghislaine.
Hoje não era um dia para ser um homem melhor.
Mas, de qualquer forma, agora, ele não dava a mínima.
Ele estava apenas alguns momentos de explodir.
Gemendo, ele aumentou a velocidade, fechando os olhos, e
lembrou-se daquele olhar insano dela. Estava fodendo tudo. A
camisa dela estava rasgada, mas ele deu uma boa olhada antes de
desviar os olhos. A forma como o sangue escorria por seus seios
cheios, cobertos por seu sutiã branco. Mesmo o tecido modesto não
conseguia esconder sua exuberância. A maneira como ela se sentia
em seus braços quando ele a pegou. Suave e delicada como a
chuva, mas como um relâmpago quando aceso. Algumas faíscas
provocaram uma tempestade. Ela era a tempestade da década,
ameaçando inundar qualquer coisa em seu caminho.
Ele se lembrou de seus sorrisos e risadas no carro. Apenas para
seus olhos e ouvidos. Ele a tinha visto, vulnerável, mas resiliente.
Agora, ela não sairia de sua mente, e ele nunca a deixaria ir.
Alexander bombeou mais forte, e imagens vívidas de seus lábios
rosados e carnudos tocaram em sua mente. A maneira como ela
olhava para ele pedindo aprovação, instruções, qualquer coisa.
Porra, ela seria tão submissa sob seu comando em sua cama.
Um líquido espesso e um grunhido saíram dele, salpicando as
paredes.
Ele exalou e descansou a testa contra a parede. Dando-se um
momento, ele fechou os olhos antes de terminar a limpeza. Odiava
quando seu cabelo estava bagunçado, então, ele rapidamente
esfregou uma toalha no cabelo e escovou atrás das orelhas para
mantê-los no lugar de sempre.
Saindo do banheiro, vestindo sua confortável calça de moletom,
seus olhos se desviaram para a comida na área de jantar. O serviço
de quarto devia ter aparecido. Seus pés descalços deslizaram pelo
chão, indo até a geladeira da cozinha para pegar um pacote de gelo.
Então, ele se moveu em direção ao assento principal. Fez uma
pausa quando passos vieram atrás dele. Virando o corpo para a
direita, seus olhos colidiram com os de Ghislaine.
Ela estava com o rosto nu, sua maquiagem completamente
desaparecida. Seu cabelo castanho tinha escurecido, e os fios
molhados grudavam na fina camisa branca. A camiseta dele. Ele a
encontrou poucas vezes, e ela já estava vestindo as roupas dele.
Um privilégio que ele não concedia a nenhuma outra mulher em sua
vida. A camisa com decote em V era longa e folgada nela, chegando
ao meio das coxas. Seus olhos foram até suas pernas nuas e lisas.
A cueca escondida sob a camisa grande. Deslizando o olhar para
cima, seus olhos congelaram quando pousaram em seu peito.
Porra. Posso ver seus seios.
Ela não estava mais usando sutiã.
Bem, ele se lembrava que estava manchado de sangue. Seus
olhos foram diretamente para o pescoço dela. Ela ainda estava
sangrando? Nenhum sangue grudado na camiseta. Devia ter
parado. Seus olhos foram atraídos por seus seios bem
arredondados. Cheios e firmes. Sem o sutiã, eles estavam
ligeiramente mais baixos. Ainda impecáveis. Os mamilos se
projetavam como pequenas pedrinhas duras, e ele queria colocá-los
em sua boca e fazê-la se contorcer embaixo dele, implorando por
mais. Ele endureceu novamente. Parte de seu cabelo caía na frente
de sua camisa, molhando a área, e ele podia ver as sombras
escuras de sua pele nua. Sua mandíbula ficou tensa e ele engoliu
em seco, levantando o olhar.
Ela estava olhando diretamente para ele, olhando abertamente
para seu peito nu, para as tatuagens pretas e azul-marinho em sua
pele. Suas bochechas recém-rosadas do chuveiro eram agora de
um vermelho escarlate fumegante. Seu queixo estava escurecendo,
ficando roxo. Não parecia quebrado, apenas machucado.
A fúria se agitou em sua alma quanto mais ele olhava para ela.
Forçando-se a voltar sua atenção para o rosto dela, ele encontrou
seus olhos novamente. Ela cruzou as pernas trêmulas na frente dela
e mordeu o lábio inferior exuberante.
Tomando um segundo para organizar seus pensamentos, ele
falou:
— Pegue o gelo e ponha no maxilar.
Ele entregou a ela, seus dedos roçando um no outro. Raios de
eletricidade disparavam cada vez que se tocavam. Seus olhos
seguiram o movimento antes de acrescentar:
— A comida está aqui.
Ele se virou e foi em direção à sua cadeira.
Uma vez sentado, ele olhou para ela. Ghislaine o seguiu, mas não
se sentou. Ela olhou para os assentos ao redor, provavelmente
confusa com as múltiplas opções.
— Sente-se do meu lado.
…Ou no meu colo.
Sua cabeça virou em sua direção, e seus olhos brilharam. Dando
um passo à frente, ela se sentou na cadeira ao lado dele.
Porra, ela era muito obediente, e ele gostava muito disso.
Ele culpava sua submissão ao seu trauma.
Ligando-se a um homem do Submundo que a estava
perseguindo.
Não era assim que ele imaginava que sua noite terminaria.
Olhando para o banquete, ele estendeu a mão e despejou arroz
em seu prato. Olhando de lado para ela, ele esperou para ver se ela
o seguia.
Ela pegou alguns pedaços de carne assada, purê de batatas e
pão para si mesma. Satisfeito, ele terminou de empilhar comida em
seu prato, e eles comeram em silêncio. Os únicos sons na
atmosfera eram deles mastigando, bebendo e seus garfos batendo
no prato. Ele a observava de vez em quando.
Seus lábios se moviam enquanto ela mastigava. O movimento de
sua garganta enquanto ela engolia. Ela lambendo o canto do lábio
para limpar o molho. Sua mão pressionando o gelo contra sua
mandíbula. Uma vez que ele terminou de comer, ele olhou para o
prato dela.
Ela estava perto de terminar também.
Alcançando a garrafa de vidro, ele a trouxe para perto dele e se
serviu de uma bebida. Ghislaine olhou curiosamente para o tom
caramelo do líquido saindo da garrafa. Ela parou com o gelo na
bochecha. Ele serviu-lhe uma bebida também e colocou-a na frente
dela.
— Beba isso.
Desta vez, ela não obedeceu e olhou para ele com olhos
cautelosos.
— O que é isso? — saiu de sua linda boquinha.
— Veneno — ele respondeu com um sorriso. Ela fez uma careta.
— É tequila.
Franzindo a testa, ela respondeu:
— Eu não bebo.
— Você teve uma... noite difícil. Pegue.
Ela torceu o nariz.
— Por que você está me dando ordens?
— Por que você está me ouvindo? — ele respondeu, inclinando a
cabeça.
Abrindo os lábios, seus olhos frenéticos olhavam para a comida
na frente dela. Seu sorriso se alargou.
Peguei você.
— Qual o sabor disso? — ela respirou depois de um momento.
Seus olhos se iluminaram e ele murmurou:
— Prove você mesma.
Depois de um segundo, seus olhos encontraram os dele mais
uma vez.
— Você está tentando me embebedar?
Sim.
— Vai ajudá-la a relaxar — ele respondeu em vez disso.
— Acho que você está tentando me embebedar.
Um sorriso se formou em seus lábios novamente.
— Talvez — ele sussurrou.
— Por quê? — ela exigiu, sua carranca se aprofundando.
Assim, poderei saber todos os seus segredos.
Ele apenas deu de ombros em resposta.
— Faça o que você achar melhor.
Ele pegou sua bebida e pressionou o copo de borda fria em seus
lábios. Agradou suas entranhas quando seus olhos curiosos
seguiram o movimento.
Inclinando o copo, ele engoliu o líquido áspero e terroso. Era
levemente doce. Ele fechou os olhos e bebeu a bebida rapidamente.
Então, se serviu de outra.
Ghislaine apenas observava seu consumo. Tomou um gole, que
esvaziou em seu estômago também. Seus membros afrouxaram, e
a tensão em seus ombros foi embora. Sentindo-se mais leve, serviu-
se de outra bebida, mas bebeu lentamente.
Não era ele que ia ficar bêbado esta noite.
Ainda bebendo sua bebida, ele sorriu, satisfeito contra o copo
quando ela pegou seu copo e cheirou. Fazendo uma careta, ela
tomou um gole e quase cuspiu.
— É horrível! — ela desabafou.
Ele parou de beber e abaixou o copo.
Seus olhos estavam lacrimejantes enquanto ele observava sua
beleza dourada.
A água do chuveiro ainda escorria de seu cabelo, pousando em
seus seios, que pareciam muito macios em sua camisa. Todo o
sangue correu para sua virilha. Ele tomou outro gole e falou:
— É, no começo… Depois você se acostuma com o sabor.
Ela fez beicinho, e seus lábios ficaram mais cheios. Ele queria
beliscá-los. Ela tomou um gole de sua bebida novamente. Seus
olhos se fecharam, uma lágrima deixando seu rosto, provavelmente
pela queimadura em suas papilas gustativas. Ele quase quis
parabenizá-la quando ela terminou a bebida.
— Isso é nojento — ela falou, um pouco embriagada quando ela
se virou para olhar para ele, olhos vidrados e lábios cheios cobertos
de tequila. — Coloca mais.
Ele queria rir, mas deu a ela mais uma.
Logo, ela havia consumido mais doses do que ele. Dois copos
abaixo, e ela estava agora no terceiro. Ele a deixou beber até a
metade antes de se inclinar e arrancá-lo de suas mãos.
— Ei! — ela balbuciou, estendendo a mão para a bebida, mas ele
a segurou no comprimento do braço.
— Você teve o suficiente. Mais, e você vai vomitar. Não tenho
interesse em limpar isso e, além disso, é sua primeira vez. — Ele
colocou a bebida perto dele, onde ela não podia alcançar.
— Você é tão mandão — ela argumentou com olhos selvagens.
Ele gostava dessa selvageria neles.
A loucura. A imprudência.
Era viciante. Ela era viciante de se olhar.
Ele ergueu uma sobrancelha sutil.
— Sou um chefe da máfia. O que você esperava? — ele
respondeu com uma pitada de sarcasmo.
Sua boca caiu aberta.
— Você acabou de confessar ser Pakhan!
Seus olhos brilhantes a encararam com diversão.
— Você está bêbada. Eu nunca disse isso — brincou.
Ela se levantou e quase caiu de volta. Ele disparou para frente de
seu assento, agarrando seus braços antes que ela causasse
qualquer caos.
— Não estou bêbada — ela protestou, seus olhos ferozes
brilhando.
Ela perdeu toda a ferocidade quando pareceu perceber o quão
perto o rosto dele estava dela. Alarmada, seu olhar sombrio
desmoronou, e ela olhou para o peito dele. Ele soltou seus braços,
mas ela não deu um passo para trás, apenas olhou fascinada para
suas tatuagens. Seus dedos longos e finos se ergueram e pairaram
acima de seu juramento.
Não tenho corpo, nem alma, nem nome. Eu sou Bratva.
— Você é Bratva — ela murmurou baixinho. — Como isso não é
evidência suficiente para prendê-lo? — Quando sua voz saiu tão
baixa, seu insulto diminuiu.
— Qualquer um pode ter tatuagens do juramento — ele
respondeu, divertindo-se com a criatura feminina. — Os fanáticos
têm isso o tempo todo.
— Não tenho nenhuma tatuagem — ela falou sem fôlego e olhou
para cima para encontrar seus olhos.
Agora, ele queria verificar sua maciez sedosa apenas para ter
certeza de que ela não era tatuada. Seus olhos caíram para os
lábios dela. Eles formavam o arco de cupido perfeito.
— Hora de você dormir.
Ela torceu o nariz empinado novamente.
— Tão mandão — ela protestou. — Chefão.
Seus olhos brilharam com sua própria piada, e ela riu como uma
criança. Ela era uma tagarela mais uma vez. Ele culparia a tequila
por isso agora. Isso a estava tirando de sua concha.
Antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, ela se virou e
deslizou pela casa dele como se fosse dela, como se pertencesse a
ela. Seus olhos caíram para sua bunda redonda antes de fazer
buracos em sua camisa. O que ele já queria tirar.
Sua ereção estava piorando, e outro banho frio não resolveria.
Silenciosamente, ele a seguiu.
Às vezes, ela cambaleava, mas se segurava antes de cair.
Batendo a porta aberta, ela bateu contra a parede.
Agora, ela pensa que é supermulher.
Ele observou seus movimentos tontos. Permanecendo na entrada
da porta, seus olhos seguiram Ghislaine enquanto sua bunda
atrevida se jogava na cama. Cama dele. Ele se inclinou contra a
porta e cruzou os braços sobre o peito.
Ghislaine olhou em sua direção, e seus olhos se deslocaram até
seus braços musculosos e definidos. Suas bochechas ficaram
rosadas. Quando ela olhou para cima novamente, a curiosidade
encheu seus olhos:
— O que você estava fazendo lá no meio da noite?
Observando você.
— Eu estava no bairro.
Ele a estava observando no quartel-general. Recebeu um
telefonema relacionado ao trabalho e, quando terminou de atender,
sentiu falta dela quando ela saiu do prédio com o diretor. Ele não
sabia em que direção ela tinha ido, então vagou por becos e
quarteirões, procurando por ela. Quando a encontrou, era um pouco
tarde demais. Ele nunca deveria tê-la perdido de vista.
Depois de algumas batidas, ela soluçou e disse:
— O-obrigada.
Alexander descruzou os braços e enfiou as mãos nos bolsos do
moletom. Moveu-se em direção a ela até que pairou na beirada da
cama.
— Eu deveria ter mais medo de v-você — ela murmurou,
soluçando novamente. — A lei me avisou sobre você.
Seus olhos curiosos a observaram.
— Por que você não está com medo?
Intrigada, ela encontrou seus olhos novamente.
— Não sei — admitiu. — Eu mal te conheço. Você ainda é um
estranho... Este é apenas o nosso segundo encontro.
— Terceiro — ele corrigiu.
Um pequeno sorriso apareceu em seus lábios exuberantes.
Lentamente, o sorriso desapareceu tão logo surgiu.
— Por que você me ajudou?
Ty moya. Você é minha.
— Você nem me conhece — ela murmurou.
Mas conheço.
— Quando isso começou? — ele perguntou depois de um
momento.
Confusa, suas sobrancelhas franziram em resposta.
— Já que ele atacou você — ele esclareceu.
Seu lábio inferior tremeu novamente, e seus olhos se encheram
de água. Fungando, ela olhou para a cama.
— Ele nunca gostou de mim desde que éramos parceiros na força
— ela admitiu entre soluços. — Mas ele nunca me deu tanto
trabalho, porque meu marido era o diretor naquela época.
Ela deu um sorriso amargo.
— Todo mundo odiava o privilégio que eu tinha… Desde que
voltei ao trabalho, todos me odeiam. Me intimidavam. Disseram
coisas terríveis sobre mim. Cyrus era o pior atormentador. Ele fez de
sua m-missão me deixar infeliz desde o primeiro dia.
Ele ficou em silêncio enquanto ouvia.
— E-Ele me disse para usar saias em vez de calça — sua voz
caiu. — Eu odiava usar saias… Não posso trabalhar no campo com
elas. São mais difíceis de correr ou perseguir alguém. Para lutar.
Elas não são... e-eu. Ele queria me mudar.
Ela olhou para cima com uma expressão esmaecida, a luz extinta
em seus olhos mais uma vez.
— E-ele sempre me chamava de Ghislaine e nunca pelo meu
sobrenome no trabalho. Mesmo que eu o corrigisse muitas vezes,
ele sempre me pegava. Ficou pior, então, ele começou a me
chantagear dizendo que se eu não saísse para jantar hoje, ele iria
me demitir.
— Por que você nunca reclamou dele? — Alexander questionou.
Seus lábios formaram um sorriso de partir o coração.
— Quem acreditaria-a em uma agente sobre o diretor, um homem
respeitado e de alto perfil em vez de em uma mulher que está
usando — ela estremeceu e continuou — antipsicóticos?
Lembrou-se de que Cyrus havia dito isso.
— Por que você está tomando isso?
Ela parou de falar. Ele se perguntou qual era a história ali.
— Você acha que eu sou louca? — ela desabafou. — Não sou l-
louca.
Seu lábio se contraiu.
— Sim, mas não o tipo de loucura que você está pensando.
Ela fez uma careta, seu rosto deprimido.
— Eu sou estranha como v-você? — ela perguntou com os olhos
arregalados e apontando um dedo para ele.
Ele sorriu.
— Você ainda não viu nada.
Ela torceu o nariz. Ele gostava de suas pequenas expressões
faciais. Era melhor do que olhar para seus malditos olhos tristes. Ela
estava piscando lentamente como se suas pálpebras estivessem
pesando.
— Acho que estou bêbada — ela balbuciou, seus soluços
desapareceram agora. Ela olhou para sua camisa. — Esta camisa é
enorme…. bem enorme, enorme. — Ela pegou o decote e olhou
para os seios. — Você tem o dobro do meu tamanho. Muito... muito
grande.
Clássica bêbada. A diversão encheu seus olhos, ela verificando
seus seios enquanto falava sobre ele. Ele a pegou olhando as linhas
vermelhas em sua pele lisa.
— Você precisa de pomada para o pescoço?
Depois de um momento, ela respondeu:
— Nããão.
Agora, sua voz estava ficando chorosa. Ela parou de checar a si
mesma e olhou para ele, seus olhos brilhando. Ela caiu
dramaticamente na cama, seus olhos piscando para o teto. Depois
de um momento, ela falou novamente:
— Estou feliz que... ele está morto — ela admitiu, sussurrando
como se estivesse compartilhando um pequeno segredo sujo. —
Todos os dias… morria um pouco por causa dele. Ele não pode
mais me machucar.
Depois de um instante, ela fechou os olhos, e pequenas
respirações deixaram sua boca. Percebendo que ela estava
desmaiada, foi como um déjà vu novamente. Ele se aproximou,
olhando para seu rosto angelical.
As aparências enganavam, no entanto.
Ela mostrou a ele sua escuridão, do tipo que deixa as boas
garotas ruins, e ele ansiava por vê-la novamente.
Ela respirou, feliz em seu sono. Todas as suas preocupações
tinham desaparecido, e ela parecia em paz.
Agora, ele estava bem acima dela. Ele esperou que ela se
mexesse novamente, mas ela estava nocauteada. Seus olhos se
demoraram sobre as três marcas longas e rosadas que iam de seu
pescoço até os ombros. Ele cerrou os dentes, estreitando os olhos.
Estendendo a mão, ele manteve seu toque leve como uma pena
enquanto ele seguia aquelas pequenas marcas que não pertenciam
à pele dela. Olhando para ela para ver se acordaria, ele percebeu
que não. Seus olhos se fixaram em suas pálpebras fechadas, e ele
estendeu a mão e sacudiu o resíduo de uma lágrima deixada para
trás antes de levar a ponta do dedo à boca e saboreá-la.
Doce e amargo. Assim como ela.
Afastando-se, olhou para seu quarto, até que seu olhar caiu na
bolsa de couro preta sobre a mesa. Estreitando os olhos, seus
passos avançaram. Ele olhou por cima do ombro, mas ela não se
mexeu. Satisfeito, voltou seu foco para a bolsa dela.
Ela estava muito apegada a isso.
O que havia de tão especial?
Pegando a bolsa, ele abriu o zíper. Olhou para os pertences —
carteira, batom, perfume, smartphone, absorventes e as chaves
dela. Ele cavou mais fundo e encontrou luvas de látex e algemas.
Ele sorriu que ela curtisse certas safadezas.
Isso deve ser divertido.
Mas então, ele se lembrou que ela era uma agente, e ela
carregava algemas consigo.
Deixa para lá.
Colocando-os de volta na bolsa, seu olhar caiu em uma pasta
estranha. Curioso, ele a puxou.
CONFIDENCIAL

As palavras gritaram.
Ele abriu o arquivo preto, e sua fotografia olhou para ele. Sua
mandíbula se apertou, e ele olhou para Ghislaine adormecida.
Voltando seu olhar para o arquivo, ele o folheou, anotando e
memorizando os detalhes e as evidências sutis que eles tinham
sobre ele. Não era muito. Principalmente só especulação.
Responsável Principal: Ghislaine Khalil
Então, era ela quem o investigava.
Bom saber.
Olhando para ela, ele devolveu o arquivo em sua bolsa e fechou-
a, colocando-a na mesma posição em que o encontrou.
Virando as costas para ela, ele apagou as luzes e fechou a porta.
Alexander olhou para a mensagem anterior que recebeu de Dimitr
Ele ainda está respirando.
Cyrus Drakos ainda estava vivo.
Ela havia atirado no filho da puta, mas ele ainda vivia.
Ele era um filho da puta sortudo.
Alexander mandou uma mensagem.
Mande-o ao médico.
A resposta de Dimitri veio quase imediatamente.
Você está bêbado?
Ele bufou uma risada.
Em vez de responder, ordenou:
Prepare a pirâmide.
GHISLAINE

12

MEUS OLHOS SE abriram para encarar uma dor de cabeça


assassina.
Analisei os meus arredores. Estava em um quarto verde e
dourado. Não era o meu quarto, as minhas paredes eram bege.
Sentei-me rapidamente. A dor que martelava em minha mente
rodopiante piorou. Minha cabeça parecia inflar como um balão à
medida que a pressão aumentava. Havia uma nuvem escura
pairando sobre minha cabeça, e ela não parecia ter nenhuma
intenção de clarear.
Estou com uma ressaca clássica e terrível.
Formidável. Esfreguei as mãos contra a cabeça, que parecia
prestes a se partir ao meio.
Estendi os braços e bocejei, piscando como uma coruja. Minha
boca estava seca, coberta de saliva desidratada. A tequila estava
maravilhosa e deliciosa ontem. O gosto era inebriante, mas, agora,
eu me sentia enjoada. Chega de beber para mim.
Meus lábios racharam quando eu os lambi. Pensei em tirar uma
folga do trabalho hoje. Nunca tive uma ressaca antes. Sentei-me
ereta e olhei para minha bolsa sobre a mesa. Tinha que mandar
uma mensagem para Cyrus e pedir um dia de folga.
Bocejando novamente, eu me mexi, mas então congelei.
Cyrus estava morto.
Eu o matei.
Não. Eu o assassinei.
Descargas elétricas correram através do meu corpo, e exalei com
força.
As memórias da noite passada me atingiram. O ataque. O tiroteio.
A limpeza. Foi uma bagunça.
Eu me odiava por perder o controle. Eu não poderia tirar um dia
de folga hoje... Cyrus também faltaria ao trabalho. Eu engoli em
seco. Tudo por minha causa. Ele estava morto por minha causa.
Se tirasse um dia de folga, ficariam desconfiados.
Talvez pudesse ir e fazer algum trabalho de campo para variar.
Esfregando minha testa latejante, gemi quando me levantei da
cama. Era por isso que eu nunca deveria beber novamente. Meus
olhos aterrissaram na minha camiseta branca. Bem... Não minha.
Dele.
De Alexander Nikolaev.
Estava no covil do Tirano.
Cheirei a gola da camisa. Ainda cheirava mais a homem, como
ele, do que a mim. Levantei meu olhar, me perguntando onde ele
dormiu na noite passada, já que ele me deu seu quarto. Olhei para a
porta antes de ir na direção do banheiro. Perguntei-me que verdade
eu tinha deixado escapar para ele na noite passada. A tequila era
como veneno, afinal. Esperava que nada muito pessoal. Eu não
conseguia me lembrar de nada depois do jantar.
Peguei minha saia no caminho para o banheiro.
Eu esperava que ele não se importasse que eu usasse seu
chuveiro novamente. Eu já era um incômodo para ele. Tomaria
banho rapidamente e sairia logo daqui. Esticando meus membros
doloridos, me despi e tomei um banho quente. Fiquei ali por alguns
minutos, deixando a água me atingir e molhar minha pele.
Estendendo a mão, coloquei uma mecha de cabelo molhado atrás
da orelha e cobri meu rosto com as mãos.
Eu matei uma pessoa.
Era uma assassina a sangue frio.
Meu lábio tremeu, e o mordi para parar de chorar.
Alexander ia atirar em Cyrus.
Por que eu fui estúpida o suficiente para atirar nele eu mesma?
Lembrei-me de suas provocações. As coisas dolorosas que ele
me disse. Elas tocaram repetidamente em minha mente. Ele me
acionou, mas isso não tornava minhas ações menos erradas.
O que eu fiz foi errado.
Era tarde demais para me entregar?
Pense em Noura, a voz de Alexander ecoou em minha mente.
Respirando fundo, terminei de me lavar e me vestir. Coloquei
minha calcinha e levantei minha saia, afivelei o cinto e enganchei no
coldre a minha arma vazia. A mesma que tirou uma vida ontem à
noite. Eu já havia matado pessoas — criminosos — em outras
ocasiões, mas essa situação era diferente.
Eu estava diferente agora.
Minha camisa tinha rasgado, então vesti a que Alexander tinha
me emprestado na noite passada. Esperava que ele não se
importasse que eu estivesse pegando emprestado de novo. Enfiei-a
na saia e vesti meu blazer, abotoando-o. Felizmente, isso escondia
a camisa.
Olhei no espelho do banheiro, meu olhar pousando em meu
queixo. O hematoma feio estava de um roxo brilhante, um grande
contraste contra a minha pele. Meus olhos lacrimejaram com a
visão. Mas doía menos. Precisava esconder isso com maquiagem.
Felizmente, tinha base e pó na minha bolsa para retocar. Gostaria
de ter uma escova de dentes comigo. O sabor da bebida ainda
estava na minha boca. Meu olhar foi até o enxaguante bucal na
prateleira. Isso funcionaria por enquanto. Peguei e rapidamente
lavei minha boca. Um arrepio me percorreu. Eu estava na cova de
um criminoso, e estava usando seus pertences.
Onde ele estava, afinal?
Saí, procurando meus sapatos. Quando os encontrei, coloquei-os
rapidamente. Correndo os dedos pelo meu cabelo, me olhei no
espelho. Mechas molhadas e escuras emolduravam meu rosto
afundado. Parei por alguns minutos para analisar meus olhos
cansados e o vermelho inconfundível neles. Precisaria de colírio
mais tarde.
Aproximei-me do espelho. Eu tinha envelhecido durante a noite.
Todos os dias, eu evoluía para outra pessoa. Irreconhecível. As
pessoas dizem que conforme você envelhece, se torna uma pessoa
melhor, mas eu não sabia que tipo de pessoa estava me tornando. A
escuridão me cercava, e eu não conseguia ver a saída. Ia me
consumindo aos poucos, e eu temia que um dia não sobrasse nada
de mim.
Peguei minha bolsa e olhei para dentro dela.
O arquivo ainda estava lá, o que me fez suspirar de alívio.
Peguei meu pó compacto e uma pequena base para viagem.
Cobri meu maxilar com camadas de maquiagem para esconder as
marcas, tentando não estremecer. Quando terminei, coloquei minha
camisa rasgada e o sutiã na bolsa e saí do quarto.
Com passos hesitantes, olhei em volta, mas ninguém me
cumprimentou. O Pakhan não estava à vista.
Então deixei o lugar para trás.

Uma hora depois, eu já tinha comido uma rosca com café.


Liguei para o trabalho e a secretária de Cyrus atendeu. Avisei que
estava tirando meio dia de folga e estava indo para a Prisão de
Viker para ver Adrian Sokolov. Ela mencionou que Cyrus não
estava, e eu não a questionei sobre o motivo.
Uma corrida de táxi depois, e estava na prisão.
Estava esperando na sala de interrogatório quando um guarda da
prisão trouxe Adrian Sokolov para a sala. O guarda algemou os pés
dele no chão, e as mãos, na mesa entre nós.
Estudei o homem. Era meu primeiro encontro com ele.
Seu cabelo ruivo escuro estava penteado atrás das orelhas, e
seus olhos verdes encontraram os meus. Ele usava o uniforme
laranja padrão. Apertei o gravador na minicâmera que carregava.
— Sou a agente do FBI Ghislaine Khalil.
Sua boca não deu qualquer resposta.
— Você pode dizer seu nome? — eu perguntei.
Seus olhos pareciam entediados enquanto me encaravam. Eu
não estava intimidada por ele. O FBI não era lugar para pessoas
que têm medo de enfrentar criminosos. Você precisava ser
destemida.
— Adrian Sokolov — ele respondeu em sua voz profunda.
Eu continuei com o interrogatório
— Qual é a sua posição na Bratva?
Ele ergueu as sobrancelhas.
— Não sei do que você está falando.
Suas respostas não me derrotaram. Ele já havia recebido uma
sentença de três anos por lavagem de dinheiro e havia sido acusado
de um crime. Provavelmente, não era nada para ele. Li no arquivo
que ele tinha uma conta no exterior com milhões de dólares não
contabilizados. Não conseguíamos conectar isso ao tráfico humano
e de drogas, e precisávamos de mais evidências para unir o caso.
Eu o encarei nos olhos.
— Qual é o seu relacionamento com Alexander Nikolaev?
Era estranho que eu pudesse manter uma cara séria enquanto
falava sobre o homem em cuja cama eu dormi na noite passada.
Literalmente dormi até mais tarde. Ele me ajudou, sim, e apreciei
isso, mas não conseguia fechar os olhos para o meu trabalho, meu
dever e minha causa.
Uma voz irritante continuou sussurrando que eu o estava traindo,
mas eu segurei a vontade de fazer uma careta. Eu não estava. Não
significamos nada um para o outro. Dois estranhos que acabaram
de se conhecer em um momento terrível.
Concentrei-me no rosto de Adrian, mas ele não falou nada.
Coloquei minhas mãos sobre a mesa e as apertei.
— É verdade que ele incriminou você para levar a culpa? —
Também li as anotações de Miran no arquivo, mas ele considerou
isso como especulação.
A mandíbula de Adrian ficou tensa, e eu escondi um sorriso.
Então era verdade?
O monstro permaneceu quieto e não confirmou. Eu não tinha
certeza da razão pela qual ele estava levando a culpa. Ver a
resiliência em seus olhos me fez perceber que ele não delataria, não
importava quem o traísse. Um lampejo de admiração me percorreu
antes de desaparecer.
— Olha... — comecei — Você não tem que assumir a culpa por
ele. Se você trabalhar comigo, posso ajudá-lo a recorrer novamente
do seu caso.
— Você é aquela mulher que acordou do coma, certo?
Eu mantive minha expressão impassível.
Aparentemente, ele ignorou tudo o que eu tinha acabado de dizer,
e até os presos na prisão sabiam sobre mim.
Mas eu sabia o que ele estava fazendo. Ele estava tentando me
distrair, me provocando a mencionar algo sobre mim. Larguei meu
belo ato profissional.
— Olha... — eu disse com uma pontada — Você já vai apodrecer
na cadeia. Você não está ajudando a si mesmo se não cooperar
conosco. E se uma dessas mulas que você tem fosse sua filha?
Sua mandíbula ficou tensa e ele cerrou os dentes. Meus olhos se
iluminaram. Colocar a família no meio sempre ajudava. Ainda assim,
ele não disse nada, mas, obviamente, eu havia perturbado seu
humor.
— Onde estão as meninas? — perguntei finalmente. — As mulas
que fornecem as drogas — e acrescentei baixinho: — e o sexo?
Quando ele não respondeu, bati minha mão na mesa.
— Responda — eu ordenei.
Ele estava em alerta, seus ombros tensos, seus olhos colidindo
com os meus.
Nunca perdia a paciência durante um interrogatório. Eu era
reservada, calma e serena. Nunca perdia a cabeça.
— Ele jogou sua bunda na cadeia — não pude resistir, mas
acrescentei: — Ainda assim, você quer ajudar seu Pakhan e fazer
seu trabalho sujo? Ele está lá fora relaxando, fazendo Deus sabe o
quê, enquanto você está nesta gaiola dourada.
A fúria substituiu a tensão nos olhos de Adrian, e suas mãos se
moveram como se ele quisesse me estrangular. Ele não podia.
Estava amarrado.
— Estou surpresa que vocês, homens, não vendam as mulheres
da sua família.
Cale-se. Cale-se. Você vai morrer, minha voz interior avisou. Ele
pode dar um golpe em você.
Ignorei aquela voz e a empurrei para trás da minha mente.
Eu não dava mais a mínima.
— Cuidado — Adrian rangeu os dentes.
Lancei-lhe um olhar altivo.
— Ou o quê? — desafiei.
Quando ele não falou, continuei dizendo:
— Vá em frente, me diga.
Esperei sua ameaça. Eu ainda estava com minha minicâmera.
Seus olhos voaram para ela. Eu poderia dizer que ele queria me
quebrar ao meio. A ira ecoou de seu corpo, me atingindo com força
total. Seu rosto ficou vermelho, destacando suas sardas antes de
murmurar:
— Ninguém pode me obrigar a fazer nada. Eu morreria pela
minha causa. Foi minha escolha.
Atordoada, pensei na sua resposta. Então Alexander não o
incriminou, e ele assumiu a culpa de bom grado?
Não sabia por que eu estava incitando-o, embora, mesmo que ele
escorregasse e me ameaçasse, ainda não poderia ligá-lo a
Alexander. Ele não mencionou o nome de seu líder. Os olhos de
Adrian brilharam novamente antes que ele desviasse o olhar,
exalando.
Acho que já tive o suficiente hoje.
Eu teria que voltar novamente.
Não tendo conseguido nada hoje além de irritar um mafioso
perigoso, fui para casa. Só queria dormir o dia todo. Minha ressaca
havia diminuído, mas a dor de cabeça ainda estava lá, lembrando-
me permanentemente de nunca mais tocar em bebida.
Uma hora depois, cheguei em casa. Destranquei a porta e entrei,
esperando evitar minhas tias. Meus olhos procuraram ao redor, mas
eu não vi ninguém... Ainda. Tirei meus saltos e subi as escadas na
ponta dos pés. Eu queria evitar todos os rostos agora.
Corri para cima e liguei o interruptor, e as luzes fracas acima de
mim se acenderam. Recuperando o fôlego, olhei para o corredor
que ainda me assustava e me assombrava até hoje. Uma
inquietação sempre me preenchia, uma que eu nunca havia sentido
antes do acidente de carro. A cada passo que eu dava, o chão
rangia abaixo de mim.
Alguém acreditaria em mim quando eu dissesse que às vezes
corria para o meu quarto? Quando cheguei à minha porta, eu a bati
atrás de mim, meu corpo caindo contra o batente da porta, mas a
escuridão ainda me seguia. Passei a mão pelo rosto e liguei o
interruptor.
A luz encheu o quarto e, em movimentos frenéticos apressados,
tirei meu blazer e a saia irritante. Eu enrolei a saia em uma bola e a
joguei na lata de lixo, onde ela pertencia. Pelo menos eu não
precisava mais usar aquilo. Esfregando a mão contra minha testa
aquecida, tirei minha camisa e calcinha e as deixei cair no chão. O
ar frio cumprimentou meu corpo escaldante, e eu precisava
desesperadamente de um banho novamente. Meus olhos foram até
a janela perto de mim.
Minhas cortinas estavam abertas, como as tinha deixado ontem
de manhã. Meu corpo corou, e eu esperava que ninguém me
pegasse de topless. Suspirando, me afastei da janela, peguei meu
pijama de algodão e corri para o banheiro.
Quando terminei de tomar banho e pentear o cabelo, desci as
escadas para cumprimentar minha família. Forcei um sorriso no
rosto.
Eu estava no quarto degrau quando uma voz na minha frente
gritou:
— Mamãe!
Noura. Meus olhos cansados pousaram em seu corpo minúsculo
parado na parte inferior da escada. Desci.
— Oi — falei desajeitada.
Limpei minha garganta. Ela se agarrou à minha perna, fazendo
meu coração apertar. Desajeitadamente, me abaixei e esfreguei seu
cabelo macio. Eu não a peguei. A maioria das mães, se não todas,
pegaria seus filhos e os seguraria depois de um dia de trabalho.
Fiquei imóvel como uma estátua.
— Xenti xua falta ontem, mamãe — continuou Noura, apertando
minha perna com tanta força, que meus músculos se esforçaram
para respirar. Seus olhos brilhantes olharam para cima, e eu dei um
pequeno e tímido sorriso.
Uma dor encheu meu coração, querendo pegá-la e segurá-la
perto de mim. Em vez disso, eu me desvencilhei de seus braços e
dei um passo para trás. Limpando a garganta novamente, perguntei:
— Onde estão as avós?
— Bem aqui — disse uma voz aguda.
Olhei para cima e encarei tia Inês.
Eu estava prestes a cumprimentá-la, mas a primeira coisa que
saiu de sua boca foi:
— O que aconteceu com seus olhos?
Merda. Eles ainda estavam injetados de sangue. Esqueci-me dos
colírios. Baixei os olhos, olhando para o chão.
— Não consegui dormir no escritório — menti. Não senti nenhuma
culpa. De forma alguma. Porque eu estava mentindo desde o
primeiro dia.
Estou bem.
— Ah... — respondeu tia Inês. — Você comeu alguma coisa? —
Agora, ela estava obcecada com meus hábitos alimentares como tia
Sabrina.
— Sim — respondi. — Tomei café da manhã.
— É noite agora. Vou trazer algo para você.
Sem esperar minha resposta, ela foi para a cozinha. Esfregando a
parte de trás do meu pescoço — o nó estava lá de novo —, fui em
direção ao sofá e me joguei nele.
Noura seguiu atrás de mim, deslizando pelo chão de madeira. Ela
estava na minha frente agora.
Sorri pela primeira vez hoje.
— O que você fez o dia todo ontem?
Estendi a mão e coloquei uma mecha atrás de sua orelha.
Ela sorriu, seu branco perolado brilhando.
— Brinquei com minha boneca. — É claro.
Ela avançou e subiu no meu colo. Atordoada, olhei para ela como
se ela tivesse duas cabeças.
— Mamãe... — ela sussurrou, enrolando-se como uma bola e
descansando a cabeça no meu peito — Não me deixe de novo.
Minha visão turvou, e eu pisquei, lutando para conter as lágrimas.
Não sabia se ela estava falando de ontem ou daqueles três anos,
eu não pude estar lá para ela. Meus braços chegaram até ela, mas
pararam, sem saber como abraçá-la. Coloquei-os de volta no sofá e
respirei seu perfume suave e floral. Eu a encarei, com um sorriso
brincando em meus lábios. Era estranho. Ela facilmente se envolveu
em torno de mim.
No entanto, aqui estava eu... ainda lutando.
Ainda se afogando.
Morrendo por dentro.
— Eu não vou — prometi baixinho.
ALEXANDER

13

GHISLAINE JÁ HAVIA PARTIDO quando Alexander voltou para a


cobertura.
Ele a encontrou vazia, embora o cheiro dela ainda permanecesse
no lugar. Sua feminilidade ainda estava presente.
Ele tinha o telefone dela, mas Alexander não fez a ligação. Ela
não havia dado o número a ele, mas ele ainda tinha seus homens
para obter todas as informações que pudessem sobre ela. Notou
que uma de suas camisas estavam faltando. Lembrando a filmagem
da câmera da cobertura, seus lábios se curvaram em um sorriso.
Ela tinha fugido de sua casa como um ratinho.
Alexander deixou sua cobertura e foi para Old Westbury.
Uma remessa estava sendo enviada hoje. Seus ouvidos seguiram
os gritos das mulheres dentro dos cinco contêineres de caminhão,
separados com uma abertura de metal. Ele as ouvira tantas vezes,
que se tornara imune a elas. Dando uma volta, certificou-se de que
todas as garotas fossem contabilizadas.
Vinte meninas.
Uma vez verificada a última garota, confirmou com Dimitri para
entregá-las.
Foi em direção ao seu armazém e, assim que entrou, olhou ao
redor, admirando o armazém de granito cinza escuro que ele
mantinha, vazio de qualquer mobília e cor. Ele gostava assim.
Mortal. Horrível. Incolor.
Seus olhos se ergueram para Cyrus Drakos.
O Diretor respirava lentamente.
Inspira, expira.
Continuava vivo.
Ghislaine Khalil não era uma assassina, afinal.
Talvez essa fosse a maneira de o universo lhe dizer que estava
em seu destino destruir esse homem.
A porra de uma segunda chance.
O Diretor estava sem camisa e usava apenas calça. Seu peito
ferido estava enrolado em bandagens brancas. Com os membros
amarrados pela corda presa com um cinto, ele foi suspenso no ar.
Assim que o homem acordou, Alexander ordenou que seus
homens o amarrassem. O Diretor ergueu os olhos caídos enquanto
eles lutavam para permanecer abertos.
O rosto de Cyrus, espancado, estava preto e azul. Contusões
roxas, resultados da luta da noite passada, estavam espalhadas por
sua pele pálida. A cor estava mais proeminente e mais forte do que
ontem. Seu nariz estava quebrado e torto agora, e seus lábios
estavam inchados.
— Por que você não o deixou para morrer, irmão? — uma voz
baixa disse por trás.
Os passos de Dimitri se aproximaram dele.
Alexander olhou para ele de lado.
— Ele merece uma segunda morte.
Dimitri ficou em silêncio por um momento antes de perguntar:
— Por que você ajudou aquela agente? Você mencionou que ela
está nos investigando. Não devemos nada a ela — sua voz estava
misturada com desaprovação.
— Você não viu o que eu vi ontem à noite — respondeu
Alexander, olhando para frente, para o corpo de Cyrus, que pairava
no ar. Então, inclinou a cabeça para os olhos azuis imperturbáveis
de Dimitri. Ele sorriu. — Além disso, a filha dela gosta de mim.
Ele ainda se lembrava da Bebê sol.
Voltando sua atenção para Cyrus, ele se concentrou.
— O que você está fazendo? — o homem resmungou com os
lábios secos. Sua voz era apenas um murmúrio. — Eu sou o
Diretor... — ele murmurou — Você não pode... fazer isso.
Alexander cruzou os braços sobre o blazer, com um sorriso de
escárnio cruel brincando em seus lábios.
— Nunca imaginei você como um agente federal corrupto.
Não que fossem todos ruins.
Ele sabia que Miran Demir não era nenhum trapaceiro.
Nem Ghislaine Khalil.
— Eu... eu... não fiz nada.
Mesmo quando perto da morte, ele ainda negava a verdade.
— Deixe-me refrescar sua memória... — Alexander piscou seus
olhos — Você agrediu uma de suas agentes ontem à noite. Você
bateu nela.
O Diretor ficou em silêncio e baixou os olhos. Seu peito subia e
descia em movimentos lentos e rítmicos, respirando
superficialmente. Depois de um momento, ele questionou:
— Por que me consertar... por que me curar... só para fazer isso?
— Ele acenou para as cordas.
Agora, essa era uma excelente pergunta.
Alexander havia sido pego desprevenido na noite anterior, quando
Dimitri mencionou que o diretor ainda estava vivo. Então, ele
aproveitou o momento e a oportunidade para seu proveito. Ordenou
que Dimitri chamasse um dos médicos da Bratva e o limpasse. Se
não tivesse feito isso, o Diretor teria morrido na noite passada.
Ele estava dando seu último suspiro. Agora, o Diretor estava livre
de balas e com curativos. Seu corpo ainda estava se curando, e ele
provavelmente morreria de novo se alguém não o soltasse das
cordas logo.
Alexander descruzou os braços e os deixou cair para os lados.
— Porque quero ver você sofrer de novo. — Quando o Diretor não
respondeu, ele continuou: — Não consegui matar você.
Ghislaine tinha tomado sua caça, arrebatando-a bem debaixo de
seu nariz. Isso o deixou atordoado e quase chocado. Ele não
esperava isso dela. Foi muito ousado. Agora, a necessidade de
caçar e ferir o homem preenchia seu corpo. A necessidade de punir
e cumprir uma matança inacabada.
E agora, voilà, ele tinha uma segunda chance novamente.
— Você vai morrer de novo — ele sorriu maliciosamente. — Muito
lenta e dolorosamente desta vez, e eu vou assistir a cada segundo e
apreciar.
O Diretor piscou, provavelmente muito cansado e inquieto.
— Onde está... Ghislaine?
Alexander desmanchou o sorriso.
— Não diga o nome dela — ele rosnou.
Os olhos azuis de Cyrus se estreitaram antes de se arregalarem
de surpresa.
— Sabe — começou Alexander —, não me escondo atrás da lei
para fazer meu trabalho sujo. Sou quem sou. Eu vivo isso. Eu o
possuo, enquanto você — ele zombou do homem que piscava — é
uma vergonha para o seu dever. Um predador escondido atrás de
um distintivo.
A cabeça de Cyrus pendeu em derrota.
— Hora de encarar sua morte.
Os olhos do Diretor pousaram no banco alto alguns metros abaixo
dele. Um dispositivo de metal com uma pirâmide no topo, e ele
estava suspenso no ar acima dela. Alexander levantou a mão e
seus homens baixaram o Diretor. Os olhos vesgos do homem
ficaram assustados, cheios de descrença, quando ele encontrou os
olhos de Alexander novamente.
— O que... Você não pode fazer isso — Cyrus gaguejou. — Você
está falando sério... Me matando agora porque você não conseguiu
antes? — ele tentou gritar com uma voz rouca.
Essa era uma razão.
Alexander não respondeu, e seus olhos se iluminaram ao ver
Cyrus sendo baixado para a ponta afiada do assento em forma de
pirâmide. Suas pernas estavam abertas, bem separadas pelas
cordas.
Por um momento, ele se perguntou se deveria dizer a seus
homens que puxassem as cordas para que os membros do Diretor
fossem arrancados de seus encaixes legítimos. Então, ele balançou
a sua cabeça. Era uma morte rápida, e Cyrus Drakos merecia o pior.
— Você não pode se safar disso — Cyrus rugiu, com sua voz
embargada e seu rosto ficando vermelho. — Sou o Diretor do FBI.
Seus protestos caíram em ouvidos surdos.
— Aqui, você não é nada. — O lábio de Alexander se curvou em
irritação.
— Por favor, mostre um pouco de m-misericórdia! — o homem
implorou, cuspindo protestos.
Agora, ele estava tentando uma tática diferente.
Os olhos ferozes de Alexander encontraram os olhos azuis
enlouquecidos do homem.
— Nunca mostro misericórdia.
O Diretor estava abaixado, e o topo pontudo tocava o meio de
suas pernas.
Estou feliz que ele esteja morto.
Com a pressão descendente causada pelo próprio corpo de
Cyrus, a pirâmide rasgou sua carne, rompendo sua pele. O sangue
escorria de sua bunda, cobrindo sua calça azul-marinho. O Diretor
gritou como um porco estripado antes de rugir com sua voz rouca.
Ninguém lá fora podia ouvi-lo. Eles estavam a quilômetros de
distância da civilização. Completamente isolados do mundo externo.
Este era o submundo de Alexander.
Sua casa. Sua teia. Seu universo.
Ele decidia quem saía vivo ou morto daqui.
A pirâmide empalou totalmente o ânus de Cyrus quando seu
corpo afundou ainda mais.
Berço de Judas.
Os gritos guturais e ásperos estavam ficando lúgubres a cada
segundo. Soavam como uma melodia para os ouvidos de Alexander.
Música para seus ouvidos. A adrenalina correu por seu corpo, e seu
pulso acelerou com a visão do sangue. O Diretor gritou e tentou
torcer as pernas, mas isso só o empurrava com mais força contra a
pirâmide.
Quanto mais o Diretor resistia, mais satisfação enchia a mente de
Alexander. Ele observava o tempo todo, sem tirar os olhos do
homem, memorizando cada detalhe, mapeando-o em sua mente.
Uma imagem que ele jamais esqueceria.
Todos os dias, eu morria um pouco por causa dele.
— Puxe-o para cima — ordenou Alexander — e faça de novo.
Os homens obedeceram e levantaram o corpo dilacerado de
Cyrus.
Respirações rasas deixaram a boca do Diretor, e seu peito arfava
para cima e para baixo enquanto ele se debatia contra as cordas. A
transpiração penetrou em suas bandagens brancas, molhando-as. O
sangue escorria por baixo dos curativos. Os pontos deviam ter
rasgado. Seu cabelo estava uma bagunça despenteada e
desgrenhada.
Sua secreção era clara através de suas calças. Um cheiro
pungente de amônia encheu as narinas de Alexander, e ele estreitou
os olhos. O mijo escorreu pela calça do Diretor, escurecendo suas
roupas. Pequenos soluços horrorizados deixaram sua boca quando
o líquido se misturou com seu sangue frio, tornando-se um. Agora,
sangue metálico borrifava a pirâmide de cor dourada. O fluido
vermelho escuro escorria pela calça de Cyrus, cobrindo o chão de
cimento cinza.
Um banho de sangue.
— Novamente.
Ele não pode mais me machucar.
Agora, Cyrus Drakos nunca poderia.
— Novamente.
GHISLAINE

14

PASSADO
Seis anos atrás, vinte anos de idade.

Hoje era meu primeiro encontro com Driss Khalil.


Coloquei um vestido de veludo rosa de um ombro só na altura da
panturrilha. Satisfeita comigo mesma no espelho, terminei de aplicar
os retoques finais de maquiagem quando a campainha tocou. Eu
sorri e quase tropecei nos saltos correndo. Exalei e abri a porta.
Driss estava ali, alto e bonito. Desta vez, ele não usava um terno
azul-marinho. Sua camisa verde-oliva estava abotoada e tinha as
mangas enroladas, e ele usava calça preta formal. Um relógio Rolex
estava em seu pulso. Chocou-me vê-lo em qualquer cor além do
azul.
Coloquei uma mecha de cabelo atrás da orelha.
— Oi.
Seus olhos castanhos caíram sobre mim, trilhando minha roupa
antes de seu lábio se curvar. Acho que ele gostou.
— Olá — sua voz acariciou meus ouvidos, enviando arrepios na
minha espinha. Seus olhos voltaram para o meu rosto antes de
focar em meus lábios. Parei de sorrir. Aquele pequeno gesto fez
meu coração disparar.
Mas, então, ele perguntou:
— Você não está usando lábios vermelhos hoje?
Levantei minhas sobrancelhas.
— Achei que você não gostasse.
Ele suspirou.
— Você acha demais. Eu nunca disse isso.
Fiz uma careta, lembrando-me da nossa primeira conversa.
Ele disse que meu batom era muito brilhante, mas não que ele
odiasse.
— Gosto dessa cor em você — ele murmurou. — Não é
apropriado para trabalhar em campo. Há pessoal e profissional, só
isso.
— Oh, sim? — Eu desafiei, balançando minhas sobrancelhas. —
Serei sua agente quando você for o diretor. Que bela maneira de
misturar as coisas.
Seus lábios se curvaram em um sorriso, e ele riu antes de olhar
para meus braços.
— Onde estão suas joias e penduricalhos? Gostei muito delas.
Escondi um sorriso.
— Seus pulsos parecem vazios — ele comentou.
Eu ri.
— Você pode envolver seus dedos ao redor deles em vez disso.
Deve deixar uma marca. — Quis dizer isso como uma piada, mas o
riso na minha voz nunca saiu da minha garganta quando peguei sua
expressão intensa.
Ele parecia querer me engolir. Devorar.
— Eu... eu... — Tropecei nas minhas palavras. — Piada de mau
gosto — respirei. Olhei para baixo imediatamente, meu rosto
queimando em tom vermelho escarlate, e o vestido rosa que eu
usava não estava ajudando.
— Não me tente — ele avisou. Meus olhos dispararam,
encontrando os dele. — Porque eu poderia aceitar.
GHISLAINE

15

EU NÃO VI Alexander por duas semanas.


E Cyrus Drakos estava oficialmente desaparecido.
Muitas vezes eu olhava para seu escritório.
Estava vazio, e as luzes sempre permaneciam apagadas dentro.
Todos os agentes foram ordenados a continuar trabalhando em
seus respectivos casos. Agora que o chefe do FBI se foi, não
tínhamos ninguém a quem reportar. O Diretor sempre se reportava
ao Procurador-Geral dos Estados Unidos. Todos os agentes aqui,
todos os cinquenta de nós, não podiam se reportar a uma única
pessoa ocupada. Seria caótico. Eles nomearam um chefe
temporário.
Os agentes federais que investigavam o caso me fizeram
perguntas quando verificaram as imagens de segurança das
câmeras no escritório. Eles nos viram juntos.
Eu disse a eles que fomos os últimos a sair, e foi isso. Eu não
contei a eles que ele me forçou a ir jantar com ele.
Nós nunca chegamos ao jantar, de qualquer maneira. Que
propósito isso teria feito? Disse a eles que tinha ido para casa
depois. Felizmente, eles não averiguaram a história e questionaram
minhas tias. Menti para elas que estava trabalhando até tarde no
escritório naquela noite.
Não disse a ninguém a verdade. Nem mesmo à minha família.
Carregava um segredo terrível dentro da minha alma, um fardo no
meu coração. Um segredo atado com sangue e engano. Estava
enganando todos ao meu redor. Estava com medo de que o carma
pudesse me morder na bunda.
E aconteceu quando ela apareceu.
Meus olhos caíram sobre uma mulher que vinha pelo corredor.
Cachos curtos emolduravam seu rosto, e ela tinha uma pele morena
clara. Seus olhos esmeralda, grandes, lindos e cheios de lágrimas.
Esposa de Cyrus Drakos.
Sierra Drakos.
Eu me levantei do meu assento e fui em sua direção. Não tinha
certeza se poderia fingir condolências, mas não podia simplesmente
ficar ali sentada. Eu a encontrei no passado duas vezes, desde que
Cyrus e eu éramos parceiros no trabalho. Dei a ela um fraco sorriso
hesitante.
Ela devolveu antes de enxugar o rosto.
— Olá, Ghislaine. É bom te ver.
Eu conseguia sentir a agonia em sua voz vacilante. Meus olhos
cansados observaram seus olhos inchados e aqueles círculos
escuros sob eles. Suas bochechas estavam manchadas e rosadas.
Seu nariz escorrendo e fungando.
Tudo parecia muito familiar para mim.
— Você também — respondi. E eu falava a sério.
A culpa corroeu meu coração, por esta mulher, por sua dor.
Entendia o que era perder um marido.
Meu pulso disparou por ser eu a responsável por sua dor. Passei
a língua pelos lábios nervosamente e perguntei:
— Como você está?
Seus olhos cheios de lágrimas encontraram os meus novamente.
— Não tão bem — ela sussurrou.
Ele não te merecia.
Queria dizer a ela. Queria dizer a ela cada coisa que ele tinha
feito. Que eu tinha feito. Gostaria de poder dizer a ela que eu
poderia voltar atrás, mas isso seria uma mentira. Não me arrependi
nem um pouco da morte de Cyrus, e isso não assustava minha
alma.
Estendi a mão e, em vez disso, a coloquei em seu ombro.
— Sinto muito — minha voz falhou.
Ela olhou para cima, surpresa, e eu limpei minha garganta caso
ela suspeitasse. Eu realmente estava com pena dela. Não era culpa
dela que o marido fosse enganador. Por que ele me mandou jantar
com ele quando ele já tinha uma esposa carinhosa?
— Tudo vai ficar bem — assegurei com mentiras.
Eu era como uma sanguessuga venenosa e desejava poder
impedir que a sujeira saísse da minha boca. Odiava dar falsas
esperanças a ela, mas não sabia mais o que fazer.
— Só espero que eles o encontrem logo — ela continuou. — Não
recebi ameaças ou chamadas de resgate. É como — sua voz
vacilou — se ele desaparecesse.
Engoli em seco, porque era verdade.
Eu deveria temer que a polícia pudesse descobrir seu corpo um
dia. Uma pessoa normal e sã o faria, mas eu não era nem um pouco
sã. Eu estava à beira da insanidade, flutuando em uma fenda. Se eu
fosse a pessoa a lidar com as consequências de seu corpo, estaria
em pânico. Mas não estava. Tinha um cúmplice. Mesmo que a lei
pudesse ligar a morte a mim, eles não poderiam provar porque não
tinham corpo nem arma.
Essa arma ainda estava segura no meu cinto.
O pânico deles descobrindo seu corpo estava ausente no meu
coração. Eu não sabia o que aconteceu com seu cadáver, mas, no
fundo do meu coração, sabia que ninguém jamais o encontraria.
Porque a pessoa que se livrou dele era o homem mais perigoso
de Nova York.
Confie em mim.
Ele disse isso para mim. E confiei. Pelo menos nisso.
Os principais oficiais que investigavam o caso ficarão inquietos
um dia, cansados e frustrados antes de declarar o caso um beco
sem saída e encerrá-lo. Três anos. Em três anos, Nova York
declararia Cyrus morto, mas meu coração me dizia que a polícia
desistiria antes disso. Outros estados seguiam um tempo de direito
comum de sete anos, mas Nova York, não.
Cyrus Drakos seria dado como morto.
Mais um caso encerrado.
— Esta é a pior coisa que poderia ter acontecido de todas as
coisas — Sierra falou, seus olhos lacrimejantes encontrando os
meus, descansando a mão em seu estômago.
Uma memória passou pela minha cabeça antes de desaparecer.
Estou grávida, Driss.
Minhas pernas quase cederam e tentei mascarar o horror em meu
rosto. Meu coração afundou.
Era como se ela tivesse pisado nele e o deixado sangrar. Minha
testa latejou com a súbita invasão daquela memória. Não reconheci.
Afastei meus pensamentos.
— Estou grávida de três meses — disse ela, levantando a cabeça
e dando um pequeno sorriso.
Eu era a destruidora de sua felicidade.
Tinha impiedosamente destruído sua família sem poupar outro
pensamento.
Grávida. Matei o marido de uma mulher grávida.
Apertei meus lábios juntos. Ela olhou para baixo novamente,
alheia a mim. Engoli o nó se formando na minha garganta.
— Parabéns.
Isso era tudo que eu poderia dizer. Nada mais. Nada menos.
Ela deu outro sorriso antes de se virar e sair.
Assim que ela desapareceu de vista, corri para o banheiro
feminino com a mão na boca.
Engasgando, bati a porta, feliz que ninguém mais estava lá
dentro. Com ânsia de vômito, corri para o banheiro e esvaziei meu
café da manhã. Agarrei o assento do vaso sanitário, respirando com
dificuldade em arquejos, minhas pernas caindo no chão.
Você matou alguém, minha consciência me chamou.
Isso não era eu.
Você destruiu uma família.
Não, eu não era capaz de arruinar uma casa.
Você deixou o filho dela órfão.
Essa não era eu naquela noite.
Agora, ela é exatamente como você é. Uma viúva.
Eu não queria que ela fosse como eu.
Você é uma Viúva Negra.
Merda. Merda. Merda.
Tive ânsia novamente, mas nada saiu.
Meu estômago estava seco e vazio. Lágrimas caíram dos meus
olhos, e eu lutei para conseguir respirar. Minha boca ficou seca, o
gosto ácido ainda na minha língua. Encostei-me na porta da cabine
e descansei os cotovelos nos joelhos. Minhas mãos cravaram no
meu cabelo, puxando com força o couro cabeludo. Levantei de novo
e de novo. O oxigênio não era suficiente. Lágrimas amargas
deixaram meus olhos antes que eu as enxugasse. Forcei-me a ficar
de pé, percebendo que alguém poderia entrar a qualquer minuto.
Dei a descarga e fui até a pia.
Olhei para meus olhos castanhos vazios no espelho.
Uma louca.
Liguei a água e salpiquei meu rosto algumas vezes. Lavei minha
boca, mas nenhuma quantidade de água conseguia tirar o sabor
pungente. Queria aquele gosto nojento fora. Estava descarrilando
lentamente, e a um segundo de desmoronar novamente. Provei
minha língua de novo, e fiz uma careta. Desesperada para me
limpar, olhei para o sabonete. Antes que pudesse me questionar,
coloquei minha mão sob a barra de sabão. Segurando na minha
mão, deixei a água encher minha mão e a enfiei na boca,
gargarejando a mistura.
Não me reconhecia mais ou o que eu estava fazendo.
Só queria estar limpa de novo, não apenas do vômito, mas do
sangue em minhas mãos. E as vidas inocentes manchadas por mim.
O sabonete quase me fez vomitar de novo, mas me contive. Cuspi
na pia e lavei minha boca com água de novo e de novo. Suspirando,
sequei meu rosto com o papel e saí do banheiro. Olhei ao meu
redor, me perguntando se alguém tinha notado. Não. Todo mundo
estava ocupado trabalhando para me dar atenção.
Mantendo minha cabeça baixa, voltei ao meu lugar.

Eram dez da noite quando saí do escritório e fui para casa. Muito
mais tarde do que eu costumava sair.
Saí da entrada e deixei a porta se fechar atrás de mim. Comecei a
caminhar até a estação de trem. Menos pessoas estavam ao meu
redor, e mantive minha cabeça baixa enquanto descia o quarteirão,
me misturando com as sombras da escuridão.
Não pude deixar de olhar de vez em quando por cima do ombro
como se alguém estivesse me seguindo. Eu me perguntei se era
ele. Ele admitiu me perseguir... Mas por que ele me seguiria?
Abracei-me, tremendo.
Era setembro agora.
O outono estava aqui.
O vento ganhou velocidade enquanto me movia mais rápido. A
sensação assustadora nunca ia embora. Caminhei ao longo do
quarteirão antes de ter que atravessar o beco escondido ao longo
do caminho para a estação de trem. Arranha-céus haviam
desaparecido, substituídos por prédios de apartamentos. Tentei
ouvir os passos, mas não havia ninguém andando atrás de mim.
Estava sozinha nesta rua. Os cabelos da minha nuca se eriçavam
toda vez que ouvia um farfalhar atrás de mim. Um arrepio percorreu
minha espinha.
Parando, eu me virei.
— Revele-se — eu ordenei a quem estava à espreita nas
sombras. Soei como uma idiota, mas esperei por ele.
Meus olhos procuraram, buscando por qualquer sinal de uma
pessoa, mas havia apenas o vento soprando em meus tímpanos.
Estava prestes a me virar quando meus olhos se viraram para a
esquina do prédio. Uma sombra escura à espreita descansava ali,
então essa pessoa se adiantou.
Meus olhos colidiram com Alexander Nikolaev.
Cansada demais para questioná-lo, mantive contato visual
enquanto ele caminhava em minha direção. Suas roupas eram
escuras como as sombras ao seu redor. Mas sua camisa era
branca. As duas cores seguras às quais ele se agarrava. Seus
blazers eram sempre mais ajustados e aconchegados em seu corpo
em comparação com um paletó normal. Os punhos deles eram
roxos ou bordô. Eu os havia notado todas as vezes. Roupas justas
que mostravam cada centímetro de seu corpo magro e duro. Um
sopro frio de medo invadiu meu corpo. Varrendo meu olhar sobre ele
mais uma vez, encontrei aqueles olhos profundos.
— Por que você está me seguindo? — perguntei finalmente.
Ele enfiou as mãos nos bolsos da calça e deu de ombros, como
um menino.
— Estou de olho em você.
Meu coração disparou com sua voz suave. Não ouvia isso há
duas semanas. Franzindo o cenho, perguntei:
— Me perseguindo?
Seus olhos negros se iluminaram com malícia, lembrando aquele
olhar familiar que tinha visto antes. Ele não respondeu minha
pergunta. Certificando-me de que não havia mais ninguém ao nosso
redor, perguntei em um sussurro abafado:
— O que você fez com... o corpo dele?
— Livrei-me dele. — ele respondeu brevemente.
Franzindo as sobrancelhas, perguntei:
— Onde?
A diversão encheu seus olhos novamente.
— Ninguém nunca vai encontrá-lo. — Acreditei nele, mas a
hesitação encheu meu coração. — Não que haja muito para
encontrar dele, de qualquer maneira.
Meus olhos brilharam.
— O-o quê? — Gaguejei.
Ele disfarçou um sorriso.
— Eu estou brincando.
Queria fazer mais perguntas a ele. Duvidava que ele estivesse
brincando. Mordi o interior da minha bochecha, esperando por mais
informações, esclarecimentos, qualquer coisa, mas ele permaneceu
quieto.
Agora, nós dois estávamos sem palavras.
Dois estranhos presos no mesmo barco.
Dois cúmplices de assassinato.
Parceiros. Foi assim que ele nos chamou.
Nós nos encaramos por alguns momentos, desafiando o outro a
desviar o olhar. Seu olhar aquecido me inquietou desde o primeiro
dia. Ele olhou com uma curiosidade feroz, como se eu fosse o
centro de sua atenção. O seu mundo. Isso sacudiu minhas
entranhas, e meu coração bateu contra minha caixa torácica. Fui
primeiro a desviar o olhar.
Por fim, eu disse:
— Vá para casa, Alexander.
Eu me virei e me afastei dele, passando pelos grandes prédios de
apartamentos com parques embutidos perto de nós. Depois de
alguns segundos, olhei para trás e ele ainda estava no mesmo lugar.
Ele não se moveu.
Fiz uma pausa e não pude deixar de rir
— Você está grudado no chão?
Ele apenas continuou olhando para mim, e eu balancei minha
cabeça.
— Por que você não vai para casa? — exigi. — Nenhuma lista de
mortes hoje? — Congelei. Não podia acreditar no que tinha acabado
de escorregar.
Com os olhos arregalados, olhei enquanto seu corpo se movia em
minha direção. Seu passo era confiante, seguro e letal. Mais uma
vez, eu estava prendendo a respiração. Metade de seu corpo na
escuridão e metade na luz.
Ele estava na minha frente agora, apenas alguns metros de
distância. A diversão encheu seus olhos.
— Cuidado aí — ele cantarolou. — Sei o seu pequeno segredo.
Todo o ar saiu dos meus pulmões com a ameaça. Uma sensação
fria se arrastou por mim. Medo. Lágrimas pinicaram meus olhos, e
eu me afastei dele imediatamente. Olhei para ele incrédula, a dor
clara em meu rosto.
Ele percebeu e ergueu as sobrancelhas.
— Não me olhe assim.
Abri a boca para gritar com ele, mas nada saiu.
— Você está me ameaçando? — Engasguei em vez disso.
Seus olhos escuros nunca deixaram meu rosto.
— Você é uma garota inteligente. Deveria saber.
Idiota. O que havia de errado com ele?
Balancei minha cabeça antes de apontar um dedo em sua
direção.
— Nunca me ameace — rosnei.
Seus olhos escuros brilharam.
— Ou o quê? — ele desafiou, se aproximando e invadindo
propositalmente meu espaço pessoal.
Quando eu não respondi, ele provocou:
— Você vai me prender? Mas não serei eu o algemado.
Meus ombros tensos relaxaram, inspirei e expirei. Olhei para o
chão, para qualquer lugar, menos para ele. Com as pernas bambas,
voltei novamente em passos rápidos e pequenos, meus passos
correndo para os jardins da frente do apartamento. Eu precisava me
afastar dele.
Ele era muito traiçoeiro e imprudente. Era o Pakhan, um
criminoso, e eu estava sozinha com ele no meio da noite.
Era como Cyrus de novo.
Tenebroso. Ameaçador. Vil.
— Vá embora! — protestei por cima do ombro, meus passos indo
na direção errada.
Ele simplesmente me seguiu como um predador, me observando.
Vibrações arrepiantes vieram dele, e não gostei nada.
— Por que você está fugindo de mim, Passarinho? — ele
sussurrou. Quando não respondi, ele acrescentou: — Você pode se
defender, lutar e atirar.
Fiz uma pausa.
Certo. Eu era uma completa idiota.
Virei meu corpo para ele.
— O que você quer? — respirei.
Ele não respondeu e apenas passou a mão pela barba.
— Por que você está aqui?
Erguendo as sobrancelhas, ele disse zombeteiramente:
— Como eu disse, para ficar de olho em você.
Revirei os olhos.
— Eu não sou uma criança.
Seus familiares olhos brilhantes voltaram, e eles varreram da
cabeça aos pés sobre o meu corpo, demorando-se sobre meus
seios e quadris. Arrepios elétricos percorreram minha espinha,
arrepiando tudo entre minhas pernas. Meu batimento cardíaco
errático martelava enquanto ele me observava o tempo todo. Queria
esconder meu corpo de seu olhar, mas minhas mãos estavam moles
ao meu lado. Uma parte de mim gostava de seu lado voyeur.
— Posso ver isso — ele murmurou.
Meu coração martelava no meu peito, e minha garganta secou.
Relâmpagos explodiram em minha alma e chiaram em minhas
veias. Ele não estava planejando ir a lugar nenhum. Eu não queria
saber o que ele estava pensando agora. Limpei a garganta e mudei
de assunto.
— A esposa dele esteve aqui hoje.
Eu acalmei. Merda, por que diabos eu diria isso a ele?
Os olhos de Alexander ficaram surpresos.
— Oh? — ele só disse isso.
Agarrei minhas mãos, brincando com meus dedos. Ele era o único
que sabia a verdade. Não podia compartilhar com mais ninguém. Eu
não encontrei seus olhos.
— Ela está grávida — murmurei baixinho. Uma risada amarga
deixou meus lábios. — Ela está grávida do filho dele.
Meus olhos incrédulos encontraram os de Alexander novamente,
mas sua expressão não mudou. Este homem ainda estava calmo,
sereno e seguro de si. Como ele fazia isso? Como ele poderia ficar
ali enquanto meu eu retorcido era uma bagunça se desenrolando?
Queria me mascarar como ele.
Gostaria de poder parar de me sentir da mesma maneira que ele.
— Como você desliga isso? — perguntei finalmente.
Ele apenas piscou, provavelmente querendo que eu esclarecesse.
— Sentimento — sussurrei. Meus olhos brilharam. — Como você
desliga o sentimento? Como me tornar como você? — perguntei
com um tom de urgência na voz.
Seus olhos se estreitaram, como se ele estivesse pensando
muito.
— Você quer ser como eu? — ele disse, sua voz como seda.
Com uma respiração trêmula, eu balancei a cabeça ferozmente.
— Sim. Você é um psicopata. — Eu me encolhi com a forma
como tinha dito isso. Não queria ser uma psicopata como ele, mas
queria parar de sentir. Queria parar de me sentir culpada o tempo
todo.
Seus olhos estavam risonhos novamente.
— Como você sabe que eu não sinto?
Dei de ombros, exausta.
— Sente? — zombei.
Ele permaneceu mudo novamente. Odiava quando ele ficava
assim, como se estivesse me desligando propositalmente.
Frustrada, olhei para ele, inspirando e expirando até perder a
cabeça.
— Ela está grávida! — exclamei, lágrimas enchendo meus olhos.
— E eu falei com ela hoje. Tive a coragem de olhá-la nos olhos e
dizer-lhe que tudo ficaria bem. Eu menti.
Alexander ficou quieto o tempo todo, e seus olhos se estreitaram
nas bordas.
— Menti para ela, na cara dela. Que tipo de pessoa eu sou? Você
deveria ter me deixado levar a culpa por isso! — acusei, apontando
um dedo em sua direção.
Ele estreitou os olhos, o rosto tenso e os olhos aquecidos.
— Você não deveria ter acobertado o meu crime. Mereço ir para a
cadeia. Eu mereço... mereço... — minha voz sumiu, e eu solucei. —
Destruí uma família! — gritei, um soluço ameaçando sair da minha
boca. Lágrimas escorriam pelo meu rosto. — Ela nunca saberá o
que aconteceu com seu marido. Nunca terá paz em seu coração,
porque eu roubei! Todos os dias, ela se perguntará se hoje é o dia
em que ouvirá falar de seu marido. Ela acha que ele está
desaparecido! — exclamei. — Você tem alguma ideia de como isso
é terrível para uma família com um membro desaparecido? —
acusei, então eu ri amargamente. — Claro que não, Sr. Pakhan —
cuspi.
Eu tinha perdido a cabeça e estava gritando.
— Você arruína famílias o tempo todo, não é? — rosnei.
Minha visão ficou turva e eu não conseguia mais distinguir suas
feições. Gostaria de poder ver sua expressão. Para ver a dor em
seus olhos como eu estava sofrendo. Não era justo como ele
conseguia se desapegar de tudo. Por que ele não estava reagindo
como eu estava?
— Você faz as pessoas desaparecerem o tempo todo! — acusei.
Eu não sabia quando isso se tornou mais sobre ele e menos
sobre mim. Não me reconheci mais.
— Você é um assassino sem consciência. Você mata pessoas
sem piscar um olho. Você não dá a mínima se elas têm uma família
ou não — protestei. Minha voz estava rouca, e eu não a reconheci.
Parecia uma criança perdida e chorando. — Desde que você esteja
feliz, certo? Você é tão egoísta! — rugi.
Deus. Eu estava louca, mas minha boca se recusava a parar.
— E-eu nunca deveria ter acordado do coma! Todo mundo teria
sido muito mais feliz se eu não tivesse feito isso. Isso não teria
acontecido então. É tão triste... — acrescentei, ainda chorando.
Lágrimas inundaram meus olhos, e estendi a mão
apressadamente para enxugá-las.
— Você não tem ideia de como é ruim mentir para todo mundo e
ser solidária. Você provavelmente nunca sentiu simpatia por
ninguém em sua vida... Como posso simpatizar com o homem que
me machucou? Droga. Gostaria de nunca mais voltar a trabalhar.
Minha voz ficou rouca, e eu ainda estava gritando, mas não fazia
mais sentido. Limpei meus olhos, clareando minha visão, e olhei
para a figura perigosa de Alexander. Não notei quando ele chegou
tão perto de mim.
— Vou me entregar à polícia — declarei.
Seus olhos brilharam e sua mandíbula travou, mas eu não lhe dei
a chance de dizer nada.
— E você não pode fazer nada sobre isso! O que você vai fazer?
Grampear minha boca? — Então, eu zombei de horror: — Ou talvez
costurar? Você gosta de tortura, não é?
Oh, Deus... Alguém precisava me calar.
Agora, eu estava apenas divagando, mas não conseguia parar.
— Você é um tirano! — declarei: — Psicopata! E um perseguidor.
Você me persegue, seu homem assustador e terrível!
Gostava mais de mim quando estava quieta.
Não poderia nem culpar a tequila por isso.
— Eu vou... me render — minha voz sumiu, e meus dedos
trêmulos cavaram na minha bolsa para pegar meu telefone. — Eu
vou ligar... — murmurei, pressionando o botão número nove.
Ele derrubou meu telefone das minhas mãos, que caiu no chão
antes que eu pudesse discar os outros dois. Assustada, olhei para o
meu telefone quebrado, a tela quebrada. Inclinei-me para pegá-lo.
— Chamar a polícia — murmurei histericamente como se essa
fosse minha última missão.
Sua mão firme agarrou meu braço, me puxando para cima.
— Não! — protestei. — Estou fazendo a coisa certa! — disse,
tentando pegar meu telefone novamente. Talvez ainda estivesse
funcionando. Afastei suas mãos descontroladamente enquanto
tentava dar uma estocada. As lágrimas ainda rolaram pelo meu
rosto.
— Cala a boca — o rosnado baixo de Alexander veio. Sua voz
suave.
Por que ele estava sendo um idiota tão pomposo? Tentei me livrar
dele, mas ele era muito forte. Meus olhos ainda estavam no meu
telefone, como se fosse um prêmio de ouro.
— Por que você encobriu meu crime? — exigi.
Eu lhe dei uma cotovelada no estômago. Com um grunhido, seu
aperto afrouxou, e eu corri para o meu telefone, mas ele me agarrou
novamente. Lágrimas escorriam dos meus olhos, e eu me virei para
encará-lo. Eu o empurrei com meus membros trêmulos. Ele se
moveu. Um pouco. Mais determinada, estendi a mão para empurrá-
lo novamente. Sua mão grande e suave desceu na minha garganta,
envolvendo os dedos ao redor dela.
— Para — sua voz profunda retumbou.
Meu olhar lacrimejante encontrou o dele, e fiquei encarando seus
olhos negros selvagens. Com a mandíbula tensa, ele olhou para
mim, seus olhos ardentes. A chama neles se espalhando por mim
como um incêndio. Suas pequenas respirações duras e rápidas
pousaram no meu rosto.
Dei um chute na perna dele. Ele fez uma careta, mas, então, se
inclinou para mais perto, seus longos dedos apertando meu
pescoço. Minha cabeça inclinou, lágrimas ainda caindo dos meus
olhos. Estendi a mão para empurrá-lo novamente, mas ele os
empurrou com a outra mão.
Ele se aproximou, me empurrando para trás, e eu o deixei,
minhas pernas andando para trás. Ele olhava nos meus olhos o
tempo todo. Ele avançou e eu recuei. Um passo à frente. Um passo
para trás. Seu aperto nunca deixou minha garganta, segurando-a
permanentemente como se ele fosse uma parte do meu corpo,
minhas articulações.
Um sussurro rouco deixou meus lábios molhados.
— O filho dele será como minha Noura... Órfão de pai.
Não podia acreditar que acabei de dizer isso.
Meu peito arfou novamente, e um soluço saiu de mim.
Sua mão imediatamente deixou minha garganta e apertou com
força minha boca, pressionando contra ela. Eu me movi para trás e
bati em uma parede de tijolos. Os apartamentos.
— Você está piorando as coisas para si mesma.
Desobedeci novamente e chorei. Minhas lágrimas corriam
livremente pelo meu rosto, manchando sua mão. Balancei minha
cabeça como uma lunática. Eu nunca me senti assim antes, como
uma tempestade furiosa.
Condenada. Desesperada. Privada.
— Ghislaine — ele ferveu. — Pare.
Foi a primeira vez que ele falou meu nome.
Sua voz estava tão rouca enquanto falava como as ondas baixas
na praia à noite. Gritei, sua mão sufocando meus gritos todas as
vezes. Seus olhos negros se concentraram em mim, e ele tirou a
mão e a substituiu por seus lábios.
Me acalmei.
Pega de surpresa, eu pisquei.
Seus olhos encararam os meus arregalados.
Sua boca estava tocando a minha.
Alexander Nikolaev estava me beijando.
Na mesma velocidade em que seus lábios pousaram nos meus,
ele se afastou uns centímetros, seu rosto ainda pairando sobre mim.
Agora de boca aberta, meus olhos se fixaram em seus lábios. Eles
eram macios. Encontrei seu olhar novamente.
Seus olhos escuros e quentes pareciam querer me devorar. Isso
me queimou como brasas, e um arrepio me percorreu. Minha pele
corou sob seu olhar perscrutador. Pequenos gemidos ofegantes
deixaram minha boca. Eu não estava mais soluçando.
Confie em mim.
Não sabia quem deu o primeiro passo, ele ou eu. Não achei que
isso importasse, mas nossos lábios estavam um no outro
novamente. Fechei os olhos com o impacto e um suspiro satisfeito
deixou meus lábios.
Ele era um completo estranho.
Mal sabia sobre ele, só o que estava no arquivo, mas eu o estava
beijando.
Eu o estava beijando como se não houvesse amanhã.
A única coisa que tínhamos em comum era Cyrus.
Eu realmente precisava saber alguma coisa sobre ele além do
fato de que estávamos ligados?
Presa pelo assassinato. Dor. Trauma.
Tudo o que eu conseguia pensar agora era como sua boca se
sentia contra a minha, áspera e pesada. Meus lábios se moveram
contra os dele, não lutando mais contra ele. Os pelos de sua barba,
esfregando contra a minha pele. Ele mordeu meu lábio inferior com
força, e eu choraminguei contra ele.
Sua mão agarrou minha cintura, e ele chupou meu lábio desta
vez. Gemi contra sua boca, minha respiração caindo sobre ele. Sua
outra mão agarrou a parte de trás da minha nuca, me puxando para
ele. Não conversamos mais. Nós não precisávamos. Não tínhamos
mais nada a dizer. Ele estava me beijando uma, duas vezes, e eu
perdi a conta de quantas vezes seus lábios tocaram os meus. Seu
cheiro como homem, suor limpo e couro. O cheiro se infiltrou
profundamente em minha pele.
Eu não cheirava mais a mim mesma. Eu era como ele.
Seus beijos se tornaram mais duros, e eu estava cheia de uma
necessidade urgente que não sentia há muito tempo. Minha
respiração ficou presa no meu peito. Sensações rastejaram sobre
mim, e meu corpo formigou sob ele. Cruzei minhas pernas juntas
para parar a dor entre elas.
Sua boca estava em todos os lugares — na cavidade da minha
têmpora, minha bochecha, meu pescoço e minhas clavículas, antes
de rastejar de volta à minha boca. Sua presença consumiu a minha,
até que eu me dissolvi em uma névoa.
Sua mão afundou ainda mais nos meus cabelos, e eu arqueei
minhas costas contra a parede, de encontro a ele, com meus seios
colidindo em seu peito quente e duro. Eu estava muito mais alta do
que com a tequila. Seu gosto era tudo.
Agarrei seu blazer em meus punhos, minha boca se movendo
ferozmente contra a dele, puxando-o mais forte contra mim. Ele
gemeu, o som baixo e retumbante em sua garganta que eu podia
sentir no fundo do meu estômago. Apenas para os meus ouvidos. O
mundo borrou ao meu redor.
Uma onda de impotência me encheu quando me rendi a ele. Não
estava mais afundando, não mais me afogando, a maré deixando
meu corpo mole. Estava na costa intensa.
Sua língua exigiu entrada em minha boca, sondando-a aberta,
enviando tremores selvagens pelo meu corpo. Um rosnado baixo
soou do fundo de seu peito. Balancei enquanto corria minhas mãos
pelo cabelo dele, não me importando que eu estivesse bagunçando
tudo. Não sabia por quanto tempo ficamos assim. Cada centímetro
do meu corpo se dissolveu contra ele quando ele me beijou.
Apenas beijando. Somente beijando. Não foi como o primeiro
beijo que ele me deu no hospital. Isso era muito mais. Não sabia
que um beijo poderia ser tão caótico.
Não era apenas um beijo.
Era um beijo venenoso.
Um beijo cheio de veneno.
Um beijo que não tinha final feliz.
Só tragédia.
Meus olhos se abriram, e eu o empurrei de volta.
Ele não esperava isso. Afastou-se alguns metros de mim, mas se
conteve para não cair. Seus olhos escuros e vidrados caíram sobre
mim. Sua boca ainda estava rosada e molhada.
O que eu estava fazendo?
Nunca havia tocado em outro homem além do meu marido.
Ele sempre foi meu primeiro.
O primeiro homem por quem me apaixonei. O primeiro homem
com quem dormi. O primeiro homem com quem me casei. O
primeiro homem com quem tive um filho.
Estendendo a mão trêmula, toquei meus lábios inchados, ásperos
e completamente beijados. O veneno de Alexander se espalhou
pelo meu sangue e o ressentimento doeu no meu peito.
Gostaria de poder voltar os últimos dez minutos. Respirando com
dificuldade, fechei os olhos e olhei para o chão. O vento soprava ao
nosso redor no meio da noite. No meio do nada. Meus lábios
tremeram, e eu os mordi para impedi-los de tremer. Isso nunca mais
poderia acontecer. Nunca.
Encontrei seus olhos intensos novamente.
— Passarinho... — Alexander respirou, com a voz áspera e
estranha do nosso beijo.
Olhei para seus lábios antes de encontrar seus olhos, que
estavam com as pálpebras pesadas, embriagados. Ele parecia o
luar e tinha me provado como se eu fosse sua obsessão mais
profunda.
Fechei meus olhos. Minha alma doeu ao som de sua voz. Como
poderia eu mal conhecê-lo, e essas palavras por si só serem
suficientes para me quebrar?
Abri os olhos e balancei a cabeça.
Ele nunca se moveu do lugar onde estava e apenas olhou para
mim, perplexo, assim como eu. Sua máscara se fora. A fachada fria
desapareceu de sua expressão. Ele passou a mão pelo rosto antes
de descansar em seus lábios. Seus intensos olhos negros estavam
no meu rosto novamente.
Atormentada, fugi dele com minhas pernas bambas sem olhar
para trás. Meu corpo tremia o tempo todo na escuridão da noite.
Seus passos não vieram atrás de mim.
Uma parte de mim desejou que ele tivesse me perseguido.
ALEXANDER

16

DOIS DIAS SE passaram desde que Alexander beijou Ghislaine


Khalil.
Ou ela o beijou.
Mesma merda.
Ele ainda se lembrava da suavidade de sua boca carnuda e
rosada. A maneira como ela gemeu em sua boca. A maneira como
ela fechou os olhos quando ele a beijou. Ou como as mãos dela se
enroscaram nas roupas dele, puxando-o para mais perto. Ele
também se lembrava do gosto dela. Ele não tinha ideia de por que
ela tinha gosto de sabão.
Ignorando esse pensamento, não importou para ele naquela hora,
e não importava para ele agora. Um sentimento obscuro, possessivo
e egoísta o invadiu desde que ela cruzou seu caminho. Ele queria
que ela precisasse dele, o desejasse, da mesma forma que ele a
desejava. Uma vez que ele a tivesse, ninguém mais ia tocá-la.
Um desejo veio a ele quando ela estava histérica e ele precisava
calá-la, então ele a beijou.
Ele se afastou para o caso de ela sacar a arma e atirar na cabeça
dele.
Não confiava nada nela.
Aquela garota era como uma bomba-relógio.
Um movimento errado e poderia detoná-la.
Mas isso o fez franzir a testa.
Ele gostava dela selvagem. Indomável. Caótica.
Mas agora... Ela estava incontrolável. Sua dor, sua vergonha, sua
culpa: tudo a estava comendo viva.
Ela o beijou de volta como se o quisesse, precisasse dele
também.
Então, ela o empurrou para longe como se ele fosse uma praga.
Aquilo o pegou desprevenido, interrompendo-o abruptamente. Ele
estava apenas indo com o fluxo. Quase quis agarrá-la e beijá-la
novamente, mas ela tinha aquele olhar enlouquecido. O mesmo
olhar que ela tinha quando atirou em Cyrus Drakos.
Ela realmente não o matou.
Ele o matou em vez disso.
Ela atirou no Diretor, sim, tentou ‘assassiná-lo’, mas ele
sobreviveu. Drakos estava morrendo quando Alexander o puxou de
volta da morte, consertando-o, antes de matá-lo por si mesmo.
Alexander ordenou a seus homens que puxassem Drakos para cima
e para baixo na pirâmide repetidas vezes.
Dez vezes.
O Diretor ainda estava acordado na quinta, mas, depois, perdeu a
consciência. Toda vez que a pirâmide o empalava, ele acordava
novamente. Então desmaiava. E acordava. Na décima vez,
Alexander ordenou a seus homens que puxassem Drakos tão alto
no ar, suspendendo-o ali e, em seguida, jogando-o rapidamente
sobre ela de uma só vez. A pirâmide de metal havia perfurado todo
o seu corpo, tornando-se uma parte permanente de sua carne e
ossos.
O corpo de Cyrus Drakos foi rasgado ao meio.
Ele ordenou que a cabeça de Cyrus fosse cortada. Ninguém
poderia identificá-lo então. Seu corpo foi queimado, e apenas os
ossos ficaram para trás.
Então, ele teve esses mesmos ossos entregues em uma de suas
fazendas no estado de Indiana por um de seus homens. Seus leões
de estimação haviam digerido com segurança aqueles ossos — ele
tinha uma licença especial para eles — não deixaram nenhum
vestígio ou evidência de Cyrus Drakos para trás.
O mundo jamais encontraria seu corpo, e ninguém jamais
prenderia Ghislaine. Nem um único fio de cabelo de sua linda
cabeça seria prejudicado. Enquanto ele vivesse, ninguém poderia
machucá-la.
Alexander estava em sua limusine preta quando a porta do
passageiro se abriu e um homem robusto deslizou para o banco de
couro. Olhos de mel o encontraram.
Miran Demir.
— Por que estou aqui, Pakhan? — Miran perguntou com uma
provocação.
Ele ainda parecia magoado depois de sua hostilidade no passado.
Os olhos de Alexander brilharam.
— Olá para você também, primo.
Ele havia solicitado uma reunião, embora não tivesse mencionado
sobre o motivo.
Miran revirou os olhos.
— Diga logo. Não tenho todo o tempo do mundo. — Seus olhos
olhavam para fora da janela, provavelmente se perguntando se
alguém poderia vê-lo.
— Claro — ele falou lentamente. — Você é um homem ocupado.
O telefone de Miran tocou.
Ele o tirou do bolso, mas não respondeu.
— Quem é?
Os olhos de Miran encontraram os dele.
— Vlad.
A mandíbula de Alexander apertou.
— Vocês dois estão próximos agora.
Miran deu de ombros.
— Mantemos contato às vezes. — Seus olhos brilharam e
respondeu: — Pelo menos, ele não é um mentiroso.
Obviamente, Miran ainda estava chateado. Em vez de contra-
atacar, com uma mente fria, ele cuspiu as palavras:
— Queria falar com você sobre Ghislaine.
Os olhos de Miran franziram em confusão.
— O que tem ela? — Antes que ele pudesse responder, Miran
exigiu: — E como diabos você a conhece?
— Ela atirou em Cyrus Drakos.
Miran parecia perplexo, como se tivesse perdido todo o ar de seus
pulmões. Alexander nunca o tinha visto assim.
— Bem... — ele continuou, ignorando o olhar questionador de
Miran. — Ela atirou nele, e pensamos que ele estivesse morto.
Inferno, ele deveria estar morto, mas ele não estava. Então, eu o
matei.
— Que porra é essa? — Miran exclamou, seus olhos confusos
para caralho. — Por que ela atiraria nele, e por que você estava
perto dela? — Quando Alexander não respondeu, Miran se inclinou,
apoiando os cotovelos nas coxas, e o queixo na mão. Ele respirou
fundo antes de engasgar severamente: — Comece desde o início.
E Alexander começou:
— Cyrus Drakos a estava atacando — ele ferveu, sua mandíbula
tensa. Os olhos de Miran escureceram, mas ele não interrompeu. —
Eu estava passando — ele mentiu. — Eu o tirei de cima dela antes
que ele pudesse fazer qualquer outra coisa. Lutamos. — Ele sorriu.
— Chutei a bunda do precioso diretor do FBI. Afinal, ele nunca foi
capaz de comandar o FBI. — Miran não devolveu o sorriso e apenas
piscou. — Estava prestes a atirar nele, mas uma bala o atingiu
primeiro. — Alexander deu de ombros. — Ghislaine atirou nele. Seis
vezes.
E estou orgulhoso pra caralho.
Miran estava tão quieto, embora Alexander pudesse sentir a ira
vindo de seu corpo aquecido. Depois de um momento, ele
perguntou:
— Foi legítima defesa?
Alexander não respondeu.
— Ela achou que ele ia te matar, por isso ela atirou nele? — Miran
continuou perguntando.
Alexander balançou a cabeça.
— Ele não tinha uma arma. Mas minha arma estava fora.
Miran suspirou profundamente e tirou as mãos do queixo. Ele
passou a mão pelo cabelo preto e se inclinou contra o assento,
pensando muito.
Alexander podia entender muito bem.
Era uma situação confusa.
— Ela poderia mentir e alegar legítima defesa — disse Miran.
Alexander arqueou uma sobrancelha.
Miran continuou:
— Mas as seis balas são questionáveis.
Depois de um momento, seus olhos encontraram os de
Alexander, e ele cruzou os braços fortes sobre o peito. Os mesmos
que provavelmente espancam prisioneiros todos os dias. Ele mudou
de assunto e perguntou:
— Por que você a ajudou?
Alexander manteve sua expressão neutra e deu de ombros.
Porque ela me pertence.
— Estava apenas sendo um bom cidadão.
Seu sorriso se alargou.
Miran revirou os olhos.
— Acho difícil acreditar que você salvaria uma mulher aleatória.
Alexander estreitou os olhos.
— Então, você acha que nem todo mundo está no seu nível,
hein?
Miran era conhecido por participar de missões de resgate sem
autorização que às vezes o colocavam em apuros. Mas isso nunca
o deteve. Ele arriscaria sua vida, seu trabalho, sua causa por um
estranho. Alexander sentia um lampejo de admiração por ele.
Ele não conhecia aquele sentimento de ser altruísta.
Era estranho para ele.
— Por que ela atirou nele quando ele não estava mais a
atacando? Por que não quando ele realmente estava? Ela é uma
agente. Ela é fisicamente treinada com armas — Miran questionou,
balançando a cabeça. — Não faz o menor sentido.
Alexander descansou o braço sobre o assento, lembrando-se
daquela noite fria.
— Por que só é aceitável matar em legítima defesa, mas não
depois do que o homem fez com ela?
A mandíbula de Miran apertou.
— Quando eu a vi... — Alexander continuou — Havia algo...
estranho nela. — Suas sobrancelhas se franziram. — Seus
movimentos eram... muito lentos. — Uma imagem vívida deslizou
em sua mente das mãos trêmulas de Ghislaine. — Não sei há
quanto tempo isso estava acontecendo. Ele estava batendo nela. —
Seu pulso acelerou, lembrando sua mandíbula machucada.
O rosto de Miran se transformou em uma careta, e ele olhou para
o chão.
Alexander continuou:
— Acho que ela estava em choque. Quando eu o tirei de cima
dela, ele estava falando merda sobre ela. Ela ainda estava por
perto. Quando ela ouviu, ela... explodiu.
Ele se lembrou do dedo dela pressionando o gatilho de novo e de
novo, mesmo quando ficou sem balas. Cinco vezes. Ela havia
pressionado o gatilho mais cinco vezes antes de perceber que
estava sem balas. Ele nunca poderia esquecer aquele som de
clique, aquele desespero em seus dedinhos.
— Ela atirou seis balas naquele idiota, e ele não morreu? — Miran
questionou em descrença, olhando para cima com os olhos
arregalados. — Isso não faz sentido.
A diversão encheu Alexander e ele sorriu.
Qualquer dessas coisas faz? Eu a beijei e ela acordou do coma.
Ela atirou para matar, mas aquele homem sobreviveu. Então, eu o
matei. Não.
Nada fazia sentido.
— Ela não acertou o coração dele. Acho que ela mirou
loucamente — Alexander sugeriu. — Duro filho da puta. Ele viveu,
mas estava morrendo. Então, eu o matei. Tarefa concluída.
Miran ergueu uma sobrancelha.
— Você basicamente admitiu para mim que matou o diretor do
FBI, Cyrus Drakos. O mesmo diretor que a polícia procura há
semanas. Ele é a prioridade número um.
Alexander acenou com a outra mão no ar.
— Eles estão perdendo tempo. Não vão encontrá-lo.
Miran exalou e juntou as mãos no colo.
— E por que você me contou isso? Você esqueceu o que eu faço
para viver?
Essa era uma excelente pergunta.
— Porque posso dizer que você se importa com Ghislaine Khalil.
E eu vejo com quem ela fala.
Ele tinha visto Miran entrar no quartel-general do FBI uma vez. Foi
no mesmo dia em que Ghislaine voltou ao trabalho.
Miran suspirou e desviou o olhar.
Isso confirmou suas suspeitas.
— E também sei que você, de todas as pessoas, saberia o que
fazer. Você ajuda as mulheres. — Ele deu um sorriso provocante. —
Você é meio mole para um chefe. Pelo menos, para as mulheres.
Os olhos de Miran dispararam antes que ele soltasse um suspiro.
Sua mandíbula estava tensa, e ele esfregou a testa.
— Isso se chama ser humano, você deveria tentar — Miran
rebateu. Antes que Alexander pudesse responder, ele continuou: —
Agora, você me fez parte de seu crime. Exatamente o que eu
precisava — ele suspirou. — O que você espera que eu faça, afinal?
Devo prendê-lo, em vez dela? Você o matou depois de tudo.
Alexander deu de ombros.
— Você pode até me prender, mas não pode provar nada no
tribunal. Sua palavra não é suficiente. Alguém realmente vai
acreditar que eu confessei a você? Vou apenas negar. Não há
ninguém. Sem armas.
Miran apenas piscou e permaneceu quieto.
— Acho que ela é como você — Alexander continuou. — Ou
poderia ser.
Miran ergueu uma sobrancelha.
Alexander deu um sorriso provocante.
— Você tortura criminosos, não? Talvez ela também esteja nessa
merda sádica. Não sei se ela está muito interessada em matar não-
criminosos.
Miran zombou.
— Duvido muito. Ela não é nada como eu… — então ele
acrescentou: — Ou você.
Mas quero que ela seja como eu.
Os lábios de Alexander se contraíram.
Miran continuou:
— Para constar, você precisa ficar longe dela. Quão conveniente
é que você estava passando e magicamente a salvou?
Era óbvio pelo tom de Miran que ele encontrou alguma merda
superficial na história. Alexander deixou cair o braço do assento e se
inclinou para frente, apoiando as mãos nos joelhos.
— Ela não tem amigos. Ninguém com quem conversar — ele
murmurou.
— Sou amigo dela — Miran protestou.
Alexander revirou os olhos.
— Ela precisa de uma saída para canalizar sua dor. Você acha
que talvez possa ajudá-la?
Só vou deixá-la mais louca.
Miran franziu a testa, mas pareceu pensar muito.
Depois de alguns momentos de silêncio, Alexander perguntou:
— Você vai prendê-la?
Miran exalou antes de passar uma longa mão pelo rosto.
— Não — ele respondeu finalmente.
Alexander silenciosamente suspirou de alívio.
— E quanto a mim? — ele brincou, seus olhos travessos caindo
em Miran.
Miran olhou com malícia em seus olhos e disparou as palavras:
— Que se foda — antes de sair do veículo e fechar a porta.
GHISLAINE

17

DUAS SEMANAS SE passaram desde que eu beijei Alexander


Nikolaev.
Mantinha minha cabeça baixa sempre que eu caminhava para a
estação de trem.
Sabia que ele estava à espreita nas sombras sempre que eu saía
do trabalho. Não o chamei, e ele nunca se fez visível. Era uma coisa
não dita entre nós, e ele me via ir embora. Ele se tornou como um
terceiro olho. Seus olhos não pareciam mais assustadores. Mas
deveriam. Ele admitiu me perseguir.
O homem que me beijou, meu perseguidor.
Ele ainda era perigoso, e também era o mesmo homem que me
defendia, que me deixava ficar em sua casa. Não sabia o que teria
feito se ele não estivesse lá.
Um colapso mental parecia mais com isso.
O vento sussurrava e rugia sempre que eu saía. O mesmo vento
que estava ao redor dele também.
Acariciava sua pele como acariciava a minha?
Despenteava o cabelo dele como despenteava o meu?
Eu deveria esquecê-lo.
Ele era apenas um estranho. Deveria parar de pensar nele.
Mas nós tínhamos uma ligação, e não havia como eu negar isso.
Na manhã seguinte, fui para a prisão de Viker.
Levantei minha cabeça e encontrei os olhos de Miran.
Ele me deu um pequeno sorriso.
Ele me ligou hoje, dizendo que queria falar comigo. Eu gostava de
Miran, mas queria ficar sozinha esses dias e não podia negar a
ordem do chefe da DEA. Eu o encontrei no corredor vazio.
— Venha comigo — ele murmurou.
Assenti, me perguntando sobre o que ele queria falar comigo.
Seus olhos quentes estavam vagando como se ele estivesse
procurando por alguém. Ele falou em um sussurro, sem mover os
lábios — um feito impressionante que eu nunca poderia fazer. Ele
era mais treinado do que eu. Era chefe há mais tempo do que eu
era agente.
— Eu sei o que aconteceu com Cyrus.
Fiz uma pausa e quase caí. Olhei para o chão, com muito medo
de ver o julgamento em sua voz.
Ele estava me prendendo? Como diabos ele sabia?
— Não me pergunte como. Eu só sei.
Minha respiração engatou e uma sensação paralisante em meus
pés me atingiu, colando meus pés no chão. Minha vida acabou.
Minhas mãos começaram a tremer, o tremor piorando a cada dia, e
eu as apertei para detê-las.
Noura, sua mãe vai ser presa.
— E eu entendo.
Não esperava isso.
Levantei meus olhos lacrimejantes e encontrei os de Miran.
Não havia julgamento ali. Apenas bondade e compaixão me
saudaram.
— Eu entendo — ele repetiu em uma voz tão baixa, sua voz
retumbante misturada com simpatia.
Suas mãos se estenderam e me puxaram para um abraço.
Segurei um soluço e descansei minha cabeça contra o tecido macio
de sua camisa branca. Sua mão acariciou meu cabelo suavemente
enquanto eu chorava baixinho em seu peito. Esperava que ele não
se importasse que eu estivesse manchando sua camisa. Ele não
mencionou isso e continuou a me abraçar. Quando meus olhos
ficaram sem lágrimas, eu me afastei. Meu coração voltou ao seu
ritmo constante. Ele deixou cair os braços, e eu me afastei dele.
Eu não sabia como ele sabia, mas permaneci calada.
— Vou fazer um interrogatório hoje — ele falou, desta vez
movendo os lábios — e quero que você esteja presente.
Franzi minhas sobrancelhas, não entendendo nada.
Para quê? Eu não precisava de treinamento.
Ele se virou sem esperar pela minha resposta.
Perplexa, eu o segui para dentro da sala. Ele fechou a porta. A
sala cinzenta e de granito era enorme, e havia uma grande mesa no
centro. Mas meus olhos caíram sobre o homem de uniforme laranja.
Seus pés estavam algemados e presos ao chão, e suas mãos
estavam algemadas à mesa. Dei um passo para trás, assustada,
não porque ele estava algemado, mas porque um capuz preto
cobria seu rosto.
Olhei para Miran com hesitação.
— Então ele não pode ver seu rosto.
Levantei minhas sobrancelhas em questão, ainda não
entendendo.
Miran olhou para o homem.
— Este é um traficante de drogas, e ele será julgado em breve —
começou ele. — Supostamente, ele fornecia a um grande número
de pessoas. — Meus ouvidos se animaram, ainda atordoados, mas
ouvindo. — Uma grande quantidade de metanfetamina,
supostamente duzentas mil, para um grande número de pessoas.
Seis dessas pessoas estão mortas agora.
Meus olhos saltaram na direção do preso.
— Eu não vendo drogas — protestou o detento. — Não sei do que
você está falando.
Miran continuou mesmo assim:
— Temos provas contra ele, nós o pegamos vendendo.
Rastreamos essas mortes, e isso nos levou de volta a ele. — Ele
acenou com a cabeça na direção do preso. — Eles tiveram uma
overdose em uma festa e morreram. Seis deles eram adolescentes.
Adolescentes menores de idade. Eles tinham dezessete.
Meu coração caiu. Pobres crianças.
Meu olhar encontrou os olhos de Miran que não eram mais
calorosos, mas sua voz era neutra. Era o diretor da DEA diante de
mim.
— Você acha que ele merece viver?
Dei um passo para trás, chocada com a pergunta. Lambi meus
lábios secos, tentando pensar em uma resposta, mas incapaz de
encontrar uma.
O que Miran estava fazendo? Não estava entendendo nada.
— Eles engasgaram com o vômito — acrescentou Miran.
Meus olhos escureceram, e eu olhei para o preso novamente.
Desta vez, meu coração se agitou. Meus punhos se fecharam e se
abriram.
— Seis crianças perdidas para as drogas. Seis jovens vidas. Você
acha que as crianças deveriam ter sido mais responsáveis?
Meus olhos voaram para Miran, mas não falei.
Ele olhou para o preso e disse:
— Ou vamos culpá-lo em vez disso? — Não havia hostilidade na
voz de Miran enquanto falava.
Meus olhos seguiram seu olhar, queimando buracos na camisa
laranja do preso.
— Eles deveriam ter sido mais cuidadosos, mais responsáveis —
Miran respondeu sua própria pergunta sem julgamento. Sua voz era
tão malditamente clara. — Eles também eram jovens demais. Pode
haver muitas razões pelas quais eles estavam cheirando
metanfetamina. Pressão dos colegas, pressão da escola, ou tentar
se encaixar e ser legal. Suas mortes foram acidentais. Talvez eles
tenham julgado mal a quantidade.
Eu estava tão quieta agora, pronta para esmurrar o preso no
rosto.
Miran continuou a me fazer perguntas, embora eu não tivesse
falado nada.
— Você acha que esse homem se aproveitou das crianças,
explorando suas vulnerabilidades para seu próprio lucro e ganho?
Engoli em seco e encontrei os olhos de Miran novamente. Não
sabia como ele conseguia ficar tão calmo, quando eu estava pronta
para rasgar este prisioneiro vivo. Era como se Miran tivesse
desligado algo nele. Como ele fazia isso? Como Alexander fazia
isso? Eles podiam se controlar, e aqui estava eu... queimando viva.
— Ou você acha que esse homem não é responsável pelas
escolhas que aquelas crianças fizeram? Que ele estava vendendo
como sempre faz? As crianças podiam pensar por si mesmas, ver o
certo do errado. Todo mundo sabe que o uso de metanfetamina é
ilegal nos Estados Unidos, a menos que seja farmacêutico, mas eles
fizeram isso, de qualquer maneira. Não era como se eles tivessem
treze anos. Eles estavam perto da idade adulta. Quase dezoito em
breve. — Miran se aproximou de mim. — O que você acha?
Percebi que ele estava me contando uma história.
Um incidente que aconteceu.
E estava me dando os dois lados dessa perspectiva.
E me pedindo para escolher.
Por quê?
Olhei para o prisioneiro novamente.
— As crianças não devem ser responsabilizadas e pagaram o
preço por suas más escolhas — eu disse com uma voz vacilante.
Limpei minha garganta. — Elas já sofreram por suas
consequências. Elas morreram. Agora — apontei para o preso —,
este homem sabia o que estava fazendo, mas, ainda assim,
escolheu vender a droga para as crianças. Os adolescentes, ele
provavelmente sabia que eles ficariam viciados nisso e voltariam
para mais.
Virei-me para olhar a expressão neutra de Miran.
— Você acha que ele vai confessar?
Eu zombei:
— Se não, eu vou fazê-lo.
A expressão neutra de Miran se desmanchou e foi substituída por
curiosidade.
— E como você quer continuar?
Meus olhos ardentes se moveram para aquele prisioneiro. Meu
coração ainda ardia por aquelas crianças. A dor que seus pais
deviam estar sentindo agora... Perder seus filhos.
As pessoas sempre zombando deles, dizendo que seus filhos
eram drogados. Este homem tinha arruinado tantas famílias. Não
eram apenas seis adolescentes. Eram pais também, irmãos
também, e avós também.
Um bairro inteiro.
— Você quer questioná-lo? — Miran perguntou quando eu não
respondi. — Até agora, ele continua negando tudo.
Olhei para ele e balancei a cabeça.
Miran deu um pequeno sorriso.
— Fervura?
Assenti.
Isso seria um bom começo.
Olhei para o espelho unidirecional perto da porta. Eu sabia o que
eram. Só as pessoas de fora podiam ver o interior. Era como a
polícia às vezes estudava suspeitos e criminosos na sala de
interrogatório. Observando o comportamento.
— Não se preocupe — disse Miran. Olhei para ele, pego no ato.
— Ninguém entra ou fica à espreita quando estou aqui.
— Eu não fiz nada! — o prisioneiro protestou novamente. — Não
é minha culpa que as crianças não sejam responsáveis. Culpe a
porra dos pais deles, não eu!
Meu rosto virou em sua direção, meu corpo queimando com ira,
pronto para explodir a qualquer segundo. Sem pensar, e como se
meus membros tivessem vontade própria, eles se moveram,
avançando em direção ao prisioneiro amarrado.
— Espere — Miran chamou atrás de mim.
Não parei até chegar ao prisioneiro. Minhas mãos se lançaram em
seu pescoço, prontas para quebrá-lo. Um rosnado baixo e
animalesco saiu da minha garganta, um som que não reconheci, um
som que não pude acreditar que veio de mim. O prisioneiro
protestou, mas eu o ignorei. Estava prestes a torcer sua cabeça
quando meu corpo foi empurrado por trás e jogado no chão.
Meus membros bateram no chão duro com o impacto, e um
desconforto irrompeu das minhas articulações doloridas. Eu gemi.
Minha mão se agarrou ao meu joelho ferido. Talvez estivesse
sangrando. Meus olhos cansados olharam para cima e notei Miran
no chão comigo. Suas mãos estavam no chão, mas ele se sentou
ereto. Não estava mais sorrindo para mim. Sua respiração estava
pesada. Seus olhos estavam horrorizados enquanto ele olhava
incrédulo, como se eu fosse uma pessoa completamente diferente.
Eu o havia deixado em estado de choque.
Essa não é uma visão que você vê no chefe Miran Demir, o diretor
da DEA, todos os dias.
— O que há de errado com você? — Miran falou finalmente.
Engraçado. Eu me fazia essa pergunta todos os dias.
ALEXANDER

18

ALEXANDER OLHOU PARA o Ford prata antes de se sentar no


banco do passageiro. Seu olhar se dirigiu para Miran, que estava
olhando para frente. A mandíbula de Miran estava firme, quando ele
descansou um cotovelo para fora da janela. Sua mão passou pela
barba.
— Então, o que aconteceu hoje? Você a ajudou?
Um silêncio mortal encheu o carro. Alexander bateu os dedos
impacientemente no joelho. Ele esperou que o outro falasse, mas
Miran permaneceu mudo. A mandíbula do chefe apertava a cada
segundo que passava.
Por fim, ele falou:
— Ela está muito sinistra — sua voz profunda misturada com
preocupação.
Alexander esperou que ele continuasse.
— Eu a trouxe para uma sala de interrogatório. Havia um
traficante lá dentro, sendo responsabilizado pela morte de seis
adolescentes. Ela quase quebrou o pescoço dele.
Alexander ergueu as sobrancelhas.
Caralho. Isso era impressionante.
— Eu tenho limites. Receio que ela possa não ter... nenhum.
Ah, sem limites? Alexander escondeu um sorriso.
— O que você pediu para ela fazer?
Finalmente, Miran virou-se para olhá-lo.
— Fervura.
— Você precisa de um novo método, a propósito. Você o usa há
anos. — Todo líder do crime conhecia o método de Miran. Sempre
que iam para a cadeia por uma detenção de drogas, eram fervidos.
Sempre. E quando eles saíam, geralmente porque não havia provas
sobre eles, eles espalhavam a notícia. Alguns aliados até
competiam para ver quem recebeu mais fervuras.
Alexander nunca havia sido preso antes, então ele foi poupado
desse método ‘adorável’.
Miran apenas piscou.
— Sou um homem simples e mantenho um método simples que
funciona. Não preciso me entregar a mais e me tornar alguém como
você.
Mais uma vez, ele estava provocando-o.
Miran tirou a mão da barba e começou a tamborilar no volante.
— Eu parei a tempo — ele continuou em voz baixa. — Havia um
olhar selvagem em seus olhos. Algo que nunca tinha visto nela
antes. Foi... assombroso.
Alexander tinha visto isso naquela noite, quando ela puxou o
gatilho também.
— Isso significaria um criminoso a menos para você, se ela o
tivesse matado.
Miran balançou a cabeça.
— Eu faço merda, mas trabalho com a lei também. E não estava
pronto para algemá-la se ela o tivesse matado.
O silêncio caiu sobre eles novamente. Por alguns segundos, os
únicos sons que vinham eram de suas respirações. Alexander olhou
para frente, passando a mão pelo rosto.
— Era apenas fervura — Miran exclamou, perdendo a cabeça e
batendo no volante.
Surpreso, Alexander virou-se para olhar.
— Agora, você, meu primo — Miran se virou e olhou com malícia
—, você é um filho da puta que me levou muito mais fundo nesta
merda. Isso é tudo culpa sua — acusou. — Achei que poderia
ajudá-la a canalizar sua raiva em outra coisa. Para dar a ela o
controle na punição de criminosos. Não acreditei quando você disse
que ela é como eu, mas eu a testei, e quer saber? Ela não falhou,
porra. Ultrapassou minhas expectativas e assumiu o controle de si
mesma. Com que tipo de pessoa ela se parece? Porque, com
certeza, não se parece comigo. — Ele bateu a mão no volante
algumas vezes, buzinando antes de afundar no banco.
Alexander achou que era melhor pensar antes de falar. Depois de
um momento, ele abriu a boca, mas Miran estendeu a mão e o
acertou bem na mandíbula.
Assustado, sua cabeça foi jogada para trás. Um rosnado tenso
saiu da boca de Alexander, e ele deu um soco na cabeça de Miran
em troca.
— Dermo — merda — toque em mim de novo e eu vou cortar seu
pau multicultural! — ele avisou.
Agora, eles rugiam e estavam na garganta um do outro.
— Seu russo com cara de bostinha! — Miran rosnou. Ele bateu
em Alexander novamente.
— Você também é russo! — Alexander contra-atacou.
Os tensos olhos cor de mel de Miran encontraram os dele antes
que ele suspirasse e o soltasse. Ainda olhando para ele com
cautela, a mandíbula machucada de Alexander apertou. Os olhos de
Miran suavizaram quando ele olhou para a marca. Isso lembrou
Alexander de quando eles brigavam quando crianças, e Miran,
sendo o primo mais velho, se sentiria culpado por bater nele.
— Use isto. Vai ajudar com o inchaço — disse Miran, entregando-
lhe a garrafa gelada perto de sua carteira.
Obrigado.
— Idiota. — Alexander apertou-o em sua bochecha. Eles ficaram
em silêncio por um minuto. Ele passou a garrafa de volta para
Miran.
— Você precisa mais do que eu.
Miran virou-se para ele e abriu um sorriso.
— Poshel ty. — Foda-se.
Ainda assim, ele pegou a garrafa e a pressionou na cabeça.
— Ela é capaz de matar — Miran suspirou. — Expliquei o caso
para ela e ela concordou em ferver. Então, aquele prisioneiro disse
alguma coisa. Um comentário. Isso a irritou. Era como se algo nela
tivesse assumido o controle e ela... surtou tudo de novo.
As sobrancelhas de Alexander franziram, a compreensão
surgindo nele. Cyrus tinha falado algo para ela também.
— Ela quase matou aquele homem bem na minha frente. — Miran
balançou a cabeça, sua voz estava cética. — Eu a mandei para
casa depois disso. Disse-lhe para tirar um dia de folga do trabalho.
Eu deveria ajudá-la, mas, agora, eu fiz isso ficar pior. Obrigado por
colocar isso na minha consciência — ele disse secamente, olhando-
o nos olhos. — Você precisa ficar longe dela — ele comandou. —
Falo sério. Você é a pior pessoa para estar por perto dela agora.
Alexander ficou quieto por um segundo e respondeu:
— Eu cuido disso. — Sei exatamente o que fazer.
Miran deu um olhar severo.
— Espero que você saiba o que está fazendo, Alexander. — Ele
tentou não franzir a testa, porque Miran não o chamava de Zander
como fazia no passado. — Se os impulsos dela saírem do controle,
teremos uma serial killer em nossas mãos.

GHISLAINE

Uma semana depois

Eu não conseguia esquecer o olhar de Miran.


A decepção e a desaprovação neles haviam doído. Eu me
perguntei o que Driss teria pensado se ele estivesse aqui. Não sabia
o que havia me vencido no interrogatório. Ainda me recusava a
acreditar que esse é o tipo de pessoa que eu era. Isso nunca fui eu.
Não podia ser... Certo?
Quando saí do escritório, uma brisa fresca passou por mim.
Ventou mais forte no mês passado. Folhas caíram ao meu redor
agora que o outono estava aqui. Ele soprava suavemente uma brisa
ao meu redor enquanto eu me aconchegava na minha jaqueta jeans
preta. Voltei a usá-la.
O vento frio atingiu minhas bochechas. Às vezes, era silencioso, e
às vezes, retumbava. O ar estava gelado enquanto eu caminhava
silenciosamente pelas ruas vazias. Estava quase chegando à minha
casa nos subúrbios.
Atrás de mim, veio um par de luzes piscando.
Continuei andando, mas olhei para ele.
Uma limusine preta desconhecida.
Continuei andando, mas a velocidade do carro diminuiu quando
parou na minha frente. Olhei para a porta, me perguntando quem
diabos estava lá dentro. O motorista saiu, todo vestido de preto.
Não sabia quem ele era. Ele abriu a porta dos fundos e olhou para
mim. Esperei que a pessoa dentro da limusine saísse. Tentei espiar
lá dentro, mas não consegui ver ninguém.
O motorista continuou olhando para mim.
— Pakhan a requisita — ele disse finalmente.
Me acalmei.
O cabelo na parte de trás da minha nuca se levantou. Engoli em
seco. Alexander esteve aqui? Meu coração saltou para minha
garganta. Olhei para dentro do carro novamente, mas as sombras
apenas me cumprimentaram.
Ir ou não ir?
Uma parte em mim queria vê-lo novamente, mas eu sabia que
não. Aquele beijo foi um erro. Nunca deveria ter acontecido.
Nossos mundos eram muito diferentes. Proibido.
Eu era uma agente, e ele era um criminoso. Ele estava do lado
errado dos trilhos, e eu ia ficar no meu.
Encontrei os olhos do motorista novamente e simplesmente me
virei sem responder. Era melhor não falar nada. Eu me movi, mas
meus ouvidos detectaram passos pesados atrás de mim. Virei-me e
meu olhar foi até o motorista, que estava me alcançando. Eu dei um
tapa na mão dele. Mais uma vez, ele atacou, mas eu dei um soco na
cara dele. Ele gemeu e se afastou com a mão no rosto. Dando um
passo para trás rapidamente, soltei meu revólver. Puxando-o para
fora do meu coldre, eu apontei para seu rosto.
— Afaste-se — avisei baixinho.
O russo fez uma pausa e estreitou os olhos. Dando-me um olhar
frustrado, ele se virou para sair.
Eu o olhei cautelosamente enquanto ele voltava para a limusine.
Satisfeita, virei-me e guardei a arma de volta. Alguns momentos
depois, passos se moveram atrás de mim novamente.
— Pensei que tinha dito para você voltar... — minha mão
alcançou minha arma quando me virei.
Eu congelei, minha mão deixando minha arma.
O abismo escuro me cumprimentou em vez disso.
Seus olhos eram lindos e tão deslumbrantes, que eu queria me
perder neles. Ele era lindo como a noite. Ele veio como um rei da
noite, e me atraiu para ele como uma viciada. Um misterioso enigma
que estava determinado a me atormentar. Meu rosto ficou vermelho
com meus pensamentos repentinos.
Esperei que ele falasse em vez disso.
Os olhos de Alexander encontraram os meus.
— Você está me evitando.
Minha garganta secou. Eu não tinha ouvido sua voz em duas
longas semanas. Não me incomodei em responder e, em vez disso,
me virei. Quanto mais eu estava perto dele, mais eu não conseguia
ver direito. Com ele, eu subiria apenas para, no final, cair. Quanto
maior a adrenalina, mais profunda a queda. Esperava que ele
entendesse a dica e fosse embora. Seus passos se moveram em
minha direção novamente, parando na minha frente agora, e
impedindo meu caminho. Eu acho que não.
Meus olhos escurecidos encontraram os dele novamente, mas eu
ainda não disse nada.
Olhei para sua bochecha direita amarelada. Quem tinha batido
nele? Tentei evitá-lo, mas ele bloqueou meu caminho. Segurando
um suspiro novamente, tentei passar por ele, mas seu corpo em
roupas pretas veio no meu caminho novamente.
Meus olhos se arregalaram.
— Mova-se — sussurrei.
Não tinha energia para discutir agora.
Só queria ir para casa depois de um longo dia de trabalho, comer
e possivelmente dormir um pouco.
— Você está com olheiras — ele observou.
Eu interrompi o olhar e desviei-o, achando as árvores mais
fascinantes do que seu rosto agora. Às vezes, eu acordava no meio
da noite, encharcada de suor, e levava muito tempo para voltar a
dormir, o que acabava me deixando com uma aparência cansada.
Quando estava com vontade, cobria minhas olheiras com
maquiagem. Outras vezes, não fazia nada. Fiquei de boca fechada
e não respondi.
— Fale comigo, Ghislaine.
Gii-lane.
Meu coração pulou com a maneira como ele disse meu nome, as
vogais nele retumbando enquanto ele falava. Ele realmente disse
certo. A maioria das pessoas não conseguia.
Meus olhos se ergueram em sua voz de comando. Seus olhos
estavam aquecidos, e sua mandíbula estava tensa. Ele estava
chateado, e eu não queria lidar com isso ou com ele. Tentei passar
por ele novamente, mas um grunhido baixo e animalesco deixou
seus lábios. Acho que ele teve o suficiente de mim. Eu poderia
facilmente pegar minha arma novamente e apontá-la para ele, como
fiz com o motorista, mas uma pequena parte de mim não queria.
Ele pegou meu braço e me puxou para ele. Assustada, minhas
mãos pousaram em seu peito duro como pedra. Ele ainda olhava
para mim, e eu gostaria que ele removesse aquele olhar tenso de
seu rosto. Iniciou o perigo. Eu gostava quando ele sorria para mim
em vez disso. Seus sorrisos irritantes estavam crescendo em mim.
Eu gostei do jeito que seus olhos escuros se suavizaram e brilharam
também.
— Somos parceiros agora, gostemos ou não — disparou. Meu
coração retumbou, e minha pulsação trovejou por sermos parceiros.
— Somos cúmplices de merda. Agora, entre no maldito carro.
Sem esperar pela minha resposta, ele se afastou, mas não antes
de agarrar meu braço. Tentei puxá-lo de volta, mas ele apenas
olhou.
— Não me faça jogar você por cima do meu ombro.
— Psicopata — murmurei, então tentei golpear suas mãos para
longe. Sabia que poderia facilmente sacar minha arma e atirar nele
ou chutar suas pernas, mas não queria machucá-lo. Não tinha
certeza do porquê. — Você não pode deixar de ser um idiota por
dois segundos?
— Pare com isso, Pássaro — ele ordenou em uma voz tão baixa.
Estendi a mão para golpeá-lo mais uma vez, mas ele evitou meu
golpe. Franzindo a testa, pensei comigo mesmo: por que ele não
estava mais me chamando de Passarinho?
Ele soltou o aperto da minha mão. Seus olhos estavam cheios de
raiva. A ira fervente vinda de seu corpo fez meu coração bater forte.
Nunca o tinha visto tão chateado. Este era quem ele realmente era.
Um Pakhan violento, imprevisível e insanamente poderoso. Ele
era assustadoramente intenso. Ele alcançou minha cintura,
provavelmente para me jogar por cima do ombro. Ele levantou meus
quadris bem alto, e... eu envolvi minhas pernas ao redor dele,
agarrando seus quadris.
Alexander fez uma pausa, claramente não esperando por isso.
Suas mãos agarraram minha cintura.
— Você é mau — murmurei, envolvendo meus braços em seu
pescoço e olhando para ele. — Tão mau.
Seus olhos se tornaram enormes, e a familiaridade neles voltou. A
ira neles havia desaparecido agora que eu estava tão perto dele,
moldando nossos corpos juntos. Não sabia por que eu tinha me
enrolado nele como uma cobra.
Talvez eu não quisesse que ele ficasse chateado comigo. Eu
deveria me afastar, mas seus olhos só me atraíram mais fundo.
Queria sair dele, ir para o chão, mas ele estava perto de mim. Isso
me lembrou de quando nos beijamos. Ficamos assim, sem dizer
uma única palavra. Talvez com medo de que, se o fizéssemos,
nunca mais tivéssemos esse momento. Meus olhos foram atraídos
para sua boca, a mesma que tinha me provado antes de encontrar
seus olhos ardentes novamente.
Era uma cor rara, e muitas pessoas acreditavam que não existia.
Bem, eles não testemunharam o que eu fiz. Aqueles olhos escuros
dele eram luminosos, uma cor aveludada que brilhava no escuro,
como se um bilhão de estrelas tivesse explodido neles. Às vezes,
eles brilhavam. Suavizavam. Endureciam. Às vezes, eles eram
maus.
Seus olhos eram tão bonitos quanto a noite.
Eles me lembravam da escuridão dentro de mim.
Que eu não estava sozinha.
Que ele estava aqui comigo.
— Leve-me para o seu carro — sussurrei, minha respiração
pousando em seus lábios. Eu ainda não sabia sobre o que ele
queria falar, mas, olhando para sua boca, eu não iria esperar para
descobrir.
Alexander engoliu em seco, sua garganta balançando com o
movimento. Ele se virou e seus braços agarraram minha cintura,
nunca tirando os olhos de mim. Ele passeava pela noite, como uma
pantera à espreita e esperando o momento de atacar.
Quando ele chegou ao carro, a porta ainda estava aberta, e ele
me abaixou no banco de couro, mas eu nunca parei de montar nele.
Ele fez uma pausa e olhou para minhas pernas enredadas. Olhando
para cima novamente, sua mão empurrou meu peito para baixo no
assento com minhas costas retas, me fazendo cair. Aterrissando em
meus cotovelos, fiz uma careta. Minhas mãos o alcançaram como
se eu estivesse perdida sem ele.
— A porta. Preciso fechar a porta — sua voz saiu rouca.
Oh. Seu motorista estava dentro da limusine, percebi. Olhei para
a frente, mas havia uma divisória e não consegui vê-lo. Uma vez
que Alexander fechou a porta, puxei seu braço e o arrastei para mim
novamente. Seus olhos encontraram os meus quando ele abaixou
seu peso em mim. Ele estava em cima, seu peso corporal
descansando em mim. Não todo. Acho que ele estava se
esforçando para não me esmagar. Ninguém falava agora. Nunca
senti esse tipo de fogo antes. Nós apenas nos beijamos antes, e
isso destruiu meu mundo. Não podia imaginar o que aconteceria se
levássemos as coisas um passo adiante.
Minhas mãos agarraram sua camisa, puxando-o para mais perto,
até que sua boca estava pairando sobre a minha. Sua respiração
me fez cócegas, e minha boca se abriu e inalou seu ar inebriante e
seu perfume fascinante. Dentro e fora. Nós compartilhamos a
respiração um do outro.
Meu batimento cardíaco irregular estava de volta. Eu tinha
esquecido que ele queria falar comigo agora. Seu olhar penetrante
se fixou em meus lábios antes de encontrar meus olhos nebulosos
novamente. Havia muita tensão no ar, em nosso impasse. Muito
fogo. Um inferno. Isso me sufocou com o caos de tudo que eu não
conseguia ver através da névoa espessa. A luxúria e o desejo
giraram, enfureceram e se misturaram ao nosso redor. Desviei o
olhar antes de encontrar seus olhos novamente.
Mas devemos parar. Essa foi uma péssima ideia... de novo. Abri
minha boca para falar, e seus olhos se estreitaram, como se
pressentissem o que eu ia dizer, então sua boca caiu sobre mim.
Deveria ter feito a coisa certa e o afastado, mas eu não tinha mais
moral. A moralidade me deixou há muito tempo. Sangue encharcou
minhas mãos assim como ele.
Era tão errado ser ruim pelo menos uma vez?
O que ser bom me deu, afinal? Eu não via mais o certo do errado.
Eu só via ele.
Retribuí seu beijo em vez disso.
Era como saboreá-lo novamente. Não conseguia parar de beijá-lo.
Não conseguia parar de deslizar minhas mãos por todo o seu corpo.
Estendi a mão e tirei seu blazer, meus lábios nunca deixando os
dele. O blazer caiu no assento, agora esquecido.
Meus braços agarraram seu pescoço, e ele empurrou sua boca
com mais força contra a minha, como se não conseguisse o
suficiente de mim. Apenas beijá-lo era o suficiente para me deixar
selvagem... Imagine se estivéssemos nus e ele estivesse dentro de
mim, me reivindicando para si.
Seria destrutível.
Seu beijo era tão intenso, que me tocava em todos os lugares.
Esse pensamento fez minha carne formigar e meu núcleo entre
minhas pernas tremeu. Um gemido saiu da minha boca. Envolvi
meus membros ao redor de sua cintura, me esfregando contra ele, e
querendo mais atrito. Ele gemeu em minha boca e chupou meu
lábio inferior com tanta força antes de liberá-lo com um estalo.
Aquele som dele vibrou contra meus lábios, e o latejar entre
minhas pernas se intensificou. Seu cheiro de couro estava em cima
de mim, e eu o respirei. Inspirei-o. Sua barba se esfregava contra
minha pele toda vez que ele tomava minha boca. Ele a possuía
todas as vezes, com sua língua lambendo e sondando minha boca
possessivamente.
Arrepios de eletricidade correram selvagens pela minha pele.
Flutuei nas correntes eletrizantes entre nós. Essa fome insaciável e
muito mais. Isso me deixou com medo. Minutos se passaram como
horas, e eu desmanchei como geleia debaixo dele, feliz e perdida.
Ele me apoiou e tirou minha jaqueta jeans, deixando-a cair no
chão da limusine. Suspirei em sua boca. Estávamos sentados
agora. Suas mãos trilharam sob minha camisa de botão, roçando a
pele ali. Seus dedos longos, como os de um músico, me tocavam
como um instrumento. Provocando e me tentando com cada toque,
deixando um rastro de fogo atrás dele. Um gemido devastador saiu
da minha boca quando ele esfregou sua protuberância grossa
contra mim.
— Você está duro — murmurei contra seus lábios.
Ele se afastou uma polegada, seus olhos cheios de um brilho
perverso.
— Você não quer saber o quanto.
Meu coração traiçoeiro acelerou mais rápido, e ele estava me
beijando novamente. Suas mãos rastejaram para dentro da minha
camisa, descansando no meu sutiã, na borda externa antes de
deslizar as mãos dentro deles, brincando com a minha pele.
— Alexander — sussurrei.
Seus dedos roçaram meus mamilos duros, e um gemido gutural
saiu da minha boca. Eles doíam para serem tocados agora.
Uma voz irritante na parte de trás da minha cabeça me lembrou
novamente que eu deveria parar com isso. Que ele era o Pakhan.
Um criminoso implacável. Um cavaleiro quebrado. Não deveria
permitir que outro homem me tocasse. Dei esse direito apenas ao
meu falecido marido.
Eu me afastei um pouco e murmurei contra seus lábios macios:
— Devemos parar. Isto é tão errado. Péssima ideia.
— Parece tão fodidamente certo — ele respondeu antes de me
puxar para ele novamente. Eu gritei, e ele engoliu o som com os
lábios novamente. Odiava como meu coração, uma vez partido,
acelerava novamente. Como ele batia contra o meu peito,
martelando por dentro.
Afastei-me do beijo, respirando com dificuldade.
— Alexander — sussurrei.
Virei meu corpo, e suas mãos deslizaram para fora da minha
camisa. Mas apenas para estender a mão e agarrar meu queixo.
Não o suficiente para machucar, mas o suficiente para mostrar que
ele não tinha terminado comigo. Olhei em seus olhos. Eles só me
mandavam ficar quieta.
Minha, eles gritaram.
Suas mãos se estenderam entre minhas pernas, soltando minha
arma e colocando-a de lado. Eu simplesmente o encarei. Ele
desabotoou e puxou meu jeans preto pelas minhas coxas e o deixou
descansar em meus pés. Meus lábios se separaram quando o ar frio
do ar-condicionado do carro atingiu minha pele aquecida. Eu ainda
usava minha camisa, mas minha calcinha preta estava em exibição.
Tentei fechar minhas pernas, mas suas mãos as separaram, de
qualquer maneira.
Então, ele fez algo que eu não esperava.
Ele se levantou do assento e se agachou diante de mim no chão.
Atordoada demais para falar, meus olhos nebulosos apenas
observaram enquanto o Pakhan se ajoelhava diante de mim.
Seus olhos negros levantaram para os meus.
— De costas contra o assento — ele ordenou, ainda entre as
minhas pernas.
Pisquei e fiz o que ele ordenou.
Esta era uma ideia terrível. Por que diabos eu estava sempre o
ouvindo, afinal? Abri a boca para falar novamente.
— Talvez devêssemos reconsiderar?
Parecia que eu estava falando sobre uma proposta de trabalho.
Seu olhar intenso encontrou o meu, queimando-me no lugar com
um único olhar, me controlando. Tirando minhas botas e meu jeans
completamente, ele me encarou vorazmente. Seus olhos se
encheram de minhas pernas douradas como se ele me apreciasse.
Percebi que o agradava. Em todos os lugares que seus olhos
olhavam, um rubor carregava. Meus mamilos formigavam debaixo
do meu sutiã, esforçando-se para ficarem livres contra o tecido. Em
um movimento rápido, minha calcinha também caiu.
— Zander — sussurrei, estendendo a mão para agarrar seu
cabelo preto polido.
Odiava estragar tudo, mas talvez um puxão no cabelo o fizesse
entender. Eu o puxei, e seus olhos de noite tempestuosa se
voltaram para mim. Eles ficaram tão escuros, que pude ver seu lado
enegrecido. Isso não era uma boa ideia. Suas mãos se moveram
sob minha bunda, trazendo minha carne quente e rosada para mais
perto de sua boca. Perdi o fôlego e meus dedos agarraram o
assento.
— Dentre todas as pessoas, estou com uma agente... Sua beleza
me irrita — disse ele asperamente. Meu coração disparou. Depois
de um momento, ele murmurou: — Você quer esquecer?
Ele inclinou a cabeça e olhou para cima, e eu não tive resposta.
— Posso fazer você esquecer... tudo. Até você mesma. A única
coisa que você reconhecerá é minha boca.
Não havia sorriso em seu rosto, nem seus olhos brilhavam. Ele
estava falando sério, e isso enviou arrepios de emoção na minha
espinha.
Segundos tensos se passaram entre nós até que percebi que não
havia respondido.
— Por favor... — sussurrei sem fôlego.
— Por favor, o quê? — ele exigiu, sua respiração soprando em
minha carne inflamada e brilhante. Eu estava exposta a ele, à sua
mercê. O tubarão mais perigoso de todos. Eu pulsava, e já queria
sua boca em mim.
Por favor, não pare. Nunca pare.
Em vez disso, o que saiu da minha boca foi:
— Você já deu dois beijos. — Idiota. Eu queria cobrir meu rosto
com minhas mãos.
Seus olhos tempestuosos escureceram antes de cair em meus
lábios.
— Provei aqueles lábios — Meu coração estava prestes a
explodir, então seu olhar caiu para o rosado entre minhas pernas —,
mas eu nunca provei esses lindos lábios de baixo.
Sua boca quente lambeu minha carne aquecida.
Meu coração explodiu.
— Você já está tão molhada, Passarinho — ele murmurou.
Alexander Nikolaev estava me comendo viva.
Eu nunca poderia esquecer quem ele era. Um inimigo.
Isso era tão errado, restritivo e inapropriado.
Mas, novamente, eu já era famosa no trabalho por me misturar
com o proibido.
Primeiro, o diretor do FBI.
E agora... o Pakhan.
Minha cabeça voou para trás enquanto ele chupava cada dobra
rosada, dolorosamente lento antes de sua língua entrar em mim. Ele
lambeu e chupou meu clitóris com tanta força, que me deixou sem
fôlego. Meu corpo ficou hiper consciente de cada centímetro de sua
língua mágica. Ele enviou um tremor violento através de mim.
Parecia estranho, mas maravilhosamente certo.
Sensações começaram a invadir o meu corpo, a intensidade de
sua boca me sufocando. Meu pulso vibrava contra meu ouvido. Uma
névoa irracional me encheu, deixando apenas desespero e
insanidade para trás.
Inclinei-me para agarrar seu ombro e empurrei sua cabeça para
mais perto de mim. Ele se banqueteou comigo, como um homem
necessitado, enquanto se alimentava de mim. Sua língua mágica
fazia coisas que eu não sentia há anos. Literalmente. Eu estava
pingando em sua boca, e ele lambeu com uma varredura quente de
sua língua. Ruídos lamentáveis deixaram meus lábios, e eu
esperava que seu motorista não me ouvisse. Separei minhas pernas
mais para que ele pudesse ter mais acesso, e seu elogio vibrou
contra o meu núcleo.
— Boa menina.
Eu respirei, tremendo. Senti como se tivesse feito algo de bom em
seus olhos. Meu corpo tremeu enquanto ele me lambia em todos os
lugares que podia alcançar. Com cada onda de fogo, meus olhos
reviravam na minha cabeça, deixando-me vazia e cheia ao mesmo
tempo.
Ele se afastou e sussurrou, sua respiração me esfriando e
queimando minha carne.
— Você é minha boa menina?
Sim. Fechei a boca para o caso de me envergonhar e comecei a
cantar em vez disso. Por que eu gostava tanto de seus apelidos
para mim?
— Você nunca me disse sobre o que queria falar comigo hoje —
sussurrei através da minha respiração áspera, mudando de assunto.
Não tinha ideia de por que eu tinha dito isso. Isso devia ser a última
coisa em minha mente. Isso deveria ser sobre eu esquecer.
Alexander riu.
Um rico som retumbante ecoou no carro. Essa foi a primeira vez
que eu o ouvi rir, e ele estava entre minhas pernas. Quão romântico.
Concentrei-me em sua risada suave e baixa. Era bom para os
ouvidos.
Ele se afastou.
— O que está acontecendo com você ultimamente?
Fiz uma careta e abri minha boca para responder, mas ele me
lambeu novamente. Sufocando em uma respiração, envolvi minhas
longas pernas ao redor de seu pescoço. Suas mãos soltaram minha
bunda, e seus dedos subiram, rastejando pela minha camisa até
chegarem ao meu sutiã. Ele continuou a me lamber enquanto suas
mãos puxavam os bojos do sutiã para cima, deixando-os descansar
acima dos meus seios.
Suas mãos ásperas pousaram na minha pele nua, amassando e
torturando, ignorando os pequenos protestos que saíam da minha
boca. Ele beliscou meus mamilos sensíveis, brincando com eles. Ele
os esticou enquanto ainda trabalhava sua boca no meu clitóris
dolorido. As protuberâncias endureceram instantaneamente ao seu
toque. Droga, ele estava ajoelhado, mas ainda tinha poder sobre
mim.
Eu queria sua boca neles. Sua boca em todos os lugares.
Ponderei sobre sua pergunta depois de um segundo.
— Eu quase matei alguém... de novo — admiti em um sussurro.
Ele nunca parou, como se já soubesse disso. Ele sabia?
— Não gosto dessa escuridão — murmurei, olhando para o teto.
— Não consigo ver uma saída.
— Gosto disso — ele murmurou contra a parte interna das minhas
coxas. Olhei para o criminoso. — Adoro pra caralho. Sua destruição
é linda. — Sua língua lambeu-me novamente e eu choraminguei.
Seus dedos continuaram esticando meus mamilos.
— O que estou fazendo aqui com você? — sussurrei.
Alexander olhou para cima com um brilho nos olhos e sorriu. Sua
boca ainda estava molhada.
— Não sei. O que você está fazendo aqui comigo, Ghislaine?
Odiava quando ele sorria. Isso o humanizava. Por que ele não
podia ser um psicopata frio e taciturno como o resto deles? Gostaria
que ele parasse de usar meu nome também.
Sem esperar por uma resposta, ele continuou me lambendo.
Esta não era eu. Isso estava errado em tantos níveis. Não queria
aproveitar isso, mas descaradamente o fiz.
— Sinto falta do meu marido. Penso em Driss todos os dias —
falei. Eu estava falando sobre meu falecido marido enquanto outro
homem estava entre minhas pernas, me comendo.
Ele fez uma pausa.
Merda, só piorou. Esperava não tê-lo insultado, e mantive minha
boca fechada agora. Eu me senti meio mal. Ele era um criminoso,
sim, mas também tinha coração. Um coração de pedra, mas um
coração.
— Continue falando comigo — Alexander murmurou.
Acho que ele não se importava de ser usado.
Ele enfiou a língua tão fundo dentro de mim que eu gritei. Eu
sabia que estava demorando para me liberar. Eu não tive um
orgasmo nos três anos de coma, e, desde que tive alucinações no
banheiro, nunca mais me toquei.
Um pequeno gemido saiu da minha boca e continuei:
— Eu nem consegui me despedir dele. É tão solitário no trabalho,
estar lá e não ver o rosto dele. — Os dentes de Alexander roçaram
meu clitóris e eu gritei. — Nossa vida estava apenas começando.
Ele trabalhou tanto para chegar aonde estava, e agora está... morto.
Sua mordida se intensificou, e eu esfreguei meu monte contra seu
rosto, com respirações roucas deixando minha boca. Senti a
adrenalina bombear em minhas veias. Eu podia me sentir pronta
para explodir em breve.
Ele fervia profundamente no meu núcleo, subindo mais rápido,
querendo ser solto. O perigo e a emoção me instigaram. Isso só me
deixou mais quente e molhada. Minhas mãos alcançaram seu
cabelo, puxando seu couro cabeludo com tanta força que ele gemeu
debaixo de mim.
— Por que eu consegui viver... e ele não?
O dedo de Alexander sacudiu meu clitóris, e ele me lambeu de
cima a baixo. Através dos meus gemidos, continuei falando:
— Ouço a voz dele às vezes. Sinto que minha alma morreu com
ele. Minha sanidade se foi agora que ele se foi.
Alexander deu um tapa em meu sexo, meu clitóris, e eu me
estilhacei em mil pedaços diante dele, liberando em sua boca.
Ele ainda me lambeu, me limpando. Ainda respirando com
dificuldade, meus ombros caíram contra o assento. A energia em
mim foi perdida. A luta em mim desapareceu. Poderia finalmente
relaxar. Minha cabeça estava mais leve, e meu coração, cheio de
conteúdo. Fechei os olhos brevemente.
Gozei com tanta força, que estava nas nuvens. Meu corpo flutuou
no ar, e um sorriso brincou em meus lábios. Não conseguia nem
lembrar meu próprio nome.
Lentamente, abri meus olhos.
A escuridão me cumprimentou.
A realidade me atingiu.
Ele olhou para cima, ajoelhado no chão, e lentamente lambeu os
lábios, como se estivesse saboreando o meu gosto. Os mesmos
lábios molhados que tinham minha excitação brilhando neles.
Minhas bochechas queimaram quando olhei para sua boca. Ele
ainda tinha aquele olhar em seu rosto, que dizia que eu quero foder
você e muito mais. Ele abriu um sorriso arrogante. Seus olhos
tinham um brilho neles, como se ele me tivesse na palma de sua
mão. Como se ele tivesse triunfado sobre mim. Ele não estava
errado.
Alexander me fez esquecer tudo.
Mesmo que fosse temporário.
ALEXANDER

19

ALEXANDER OLHOU PARA o deserto diante deles.


Eles estavam na floresta assombrada à noite. O sol havia caído
há muito tempo e a escuridão pairava sobre eles. O céu estrelado
era de veludo e brilhava ao luar, embora os ventos sussurrando
cobrissem a vista.
Ele se virou para a direita e encontrou os olhos de Ghislaine.
Com as sobrancelhas franzidas, inclinando-se em direção ao nariz
afilado, ela perguntou:
— O que estamos fazendo aqui?
Ele não disse a ela por que eles estavam aqui, apenas que ele
precisava que ela fosse com ele. Ele deixou os faróis acesos
enquanto fazia sinal para que ela o seguisse, e saiu do carro para o
deserto, onde ela poderia correr livre.
O tempo gelado estava ainda mais frio, e ele puxou seu blazer
preto mais junto do seu corpo. A floresta escura era um lugar
perigoso. Irreal e assustador, de fantasmas noturnos e criaturas
selvagens. A noite cinzenta e sombria caiu sobre eles enquanto
estavam juntos. Era um lugar assustador para a maioria, mas um
tempo para ganhar vida para ele. Para eles. Ele olhou para ela
novamente. Ela usava uma jaqueta de couro, uma blusa verde por
baixo e uma calça jeans preta.
Ele ainda se lembrava do gosto doce dela alguns dias atrás. Ele
deu a ela o que ela precisava. Um orgasmo. Não apenas um alívio
físico, um bem-aventurado interno que a ajudaria a dormir melhor à
noite. A primeira coisa que ele notou quando olhou para ela foram
seus grandes olhos outonais. As olheiras escuras grudavam em sua
pele, deixando seu vazio para trás. Depois daquela noite, ele
ordenou que ela voltasse para casa sem exigir uma retribuição. Ela
parecia melhor agora. Aquela noite não era sobre ele. Era tudo para
ela.
Embora ele quisesse fazê-lo de novo e de novo.
Seu gosto estava grudado em sua língua até agora.
Ela estava olhando para a floresta com cautela, como se um
animal perigoso pudesse saltar e matá-la. Ele segurou um sorriso
presunçoso. O maior predador ao redor dela era ele.
— Você está secretamente planejando me matar? — ela exigiu,
encontrando seus olhos. Ela estreitou o olhar. Ela era uma gazela
tão inocente e bonita antes, e agora, olhe para ela... indomável.
Uma agente moralista estava na floresta, no meio do nada com ele.
Um chefe da máfia.
Ele sorriu.
— Sim.
Ela zombou e olhou para ele incrédula. Cruzou os braços sobre o
peito. Seus olhos seguiram aquele pequeno movimento, de modo
que ele podia ver os seios dela aparecerem através da jaqueta
jeans desabotoada. A necessidade o encheu, queria tirá-la e fodê-la
contra seu carro sem pensar. Forte e rápido. De novo e de novo.
Como se sentisse seus pensamentos sujos, ela deu um sorriso de
lábios apertados.
— Você é tão metido a homem — ela murmurou baixinho, sua voz
atada com desaprovação.
Seu sorriso se alargou, seus olhos enrugando.
— O que mais eu deveria ser, Passarinho? — ele zombou
maliciosamente.
Ela revirou os olhos e respirou fundo o ar.
Ele teve um desejo de alcançar e apertar.
— Às vezes, não consigo decidir se quero te matar ou... — sua
voz sumiu, e ela desviou o olhar, seu rosto em chamas escarlate
sob os faróis.
Ele ergueu as sobrancelhas de brincadeira.
— Ou? — ele instigou.
— Beijar você — ela sussurrou.
Sua pequena e suave voz era tão baixa, que ele teve que se
esforçar para ouvi-la. Ela não o encarou, e seu rosto queimou sob
seu olhar perscrutador.
— Mesmo? — ele questionou. Então, com uma voz rouca, ele
perguntou: — O que está impedindo você?
Ghislaine olhou para cima, seus olhos como um cervo preso nos
faróis. Ela mordeu seus lindos lábios rosados nervosamente, antes
de seus olhos dispararem para os lábios dele.
Satisfeito, ele percebeu: ela queria beijá-lo, depois de tudo. Sua
garganta se contorceu, seu olhar caiu de seu rosto e percorreu seu
corpo. Ele queria envolver sua mão em sua garganta e golpeá-la
com tanta força, que ela esqueceria seu próprio nome e cantaria
apenas o dele. Deus, ele queria fodê-la sem sentido. Tocá-la.
Prendê-la a ele e arruiná-la para qualquer outra pessoa.
O sangue correu por suas veias, e ele exalou. A tensão sexual
entre eles o deixava tonto às vezes. Era uma dança mortal da qual
eles participavam.
Ele se inclinou para ela, e ela fez o mesmo em sua direção.
A hesitação espreitava em seus olhos, e ela lambeu o alto do
lábio superior, convidando os lábios novamente.
Atrás deles, folhas farfalharam no chão, pneus pesados
esmagando-os. Ela se afastou e olhou por trás de seu ombro.
O momento se estilhaçou.
Seus olhos acompanharam o movimento.
O jipe estacionou, e Adrik, Dimitri e dois de seus outros soldados
saíram. Eles trouxeram três homens gritando com capuzes pretos.
Seus homens ordenaram que se ajoelhassem.
— Toropitsa — Dimitri exigiu. Rápido.
Quando não o fizeram, os homens os empurraram para a frente.
Seus homens tiraram os capuzes. Agora, seus pés estavam
amarrados com cordas, suas mãos, já amarradas, e suas bocas,
com fita adesiva.
— O que está acontecendo? — Ghislaine perguntou, o medo
tremendo em sua voz evidente.
Ele não precisava olhar para ela para saber que seu corpo estava
cheio de tensão novamente.
— Diga aos homens para virem depois de uma hora para limpar
— Alexander ordenou quando Dimitri passou por ele para retornar
ao carro.
Dimitri arqueou uma sobrancelha antes de olhar para Ghislaine.
Ele observou a expressão de seu irmão para ver se ele a verificaria,
mas sua expressão era estoica como sempre. Dimitri voltou sua
atenção para Alexander.
— O que é isto? Um encontro para brincar?
Alexander escondeu um sorriso e deu de ombros.
— Algo parecido.
Os olhos de Dimitri se estreitaram antes de assentir.
— Tudo bem, Pakhan. Não vou questionar você. Se é assim que
você quer matar seu tempo, fique à vontade. Agora, se você me dá
licença, tenho algumas entregas para fazer, irmão.
— Você tem uma nova entrega. Uma nova missão. Número nove.
Dimitri assentiu, virou-se e saiu com os homens no jipe. Os pneus
chiaram enquanto se moviam. Agora, eles estavam sozinhos. Nem
uma única pessoa estava ao redor deles enquanto eles estavam na
floresta de trepadeiras e árvores.
— O que você está fazendo? — Ghislaine exigiu.
Alexander olhou para ela.
— Dando a você o controle.
Seus lábios se separaram e ela abaixou a cabeça, desviando o
olhar dele. Afastou-se do carro e dirigiu-se aos três homens
amarrados à sua esquerda.
— Você realmente vai matar esses três homens na minha frente?
— ela falou por trás.
Ele fez uma pausa e olhou por cima do ombro. Ignorando sua
pergunta, ele disse:
— Estes são três homens de uma máfia italiana rival. — Os
homens que tentaram me assassinar. — A Família Berlusconi fode
crianças.
Ghislaine caminhou até ele com movimentos hesitantes.
Um homem tentou protestar através da fita, mas seu som estava
abafado.
— Todos os anos, eles são responsáveis por inúmeras capturas
de crianças. Eles mantêm as crianças em masmorras escondidas,
onde esses homens vêm… e se revezam. — Ele observou sua
expressão horrorizada. Prestando atenção em tudo, com excitação
enchendo suas veias quando o desgosto dela tomou conta. — A
idade mais jovem que eles começam é oito. Não importa se é
menino ou menina. — Ele a encarou nos olhos e ordenou: —
Destrua-os.
Sua boca parecia pronta para cair no chão. Ela recuou
imediatamente, seus olhos disparando para os três homens
amarrados. Ela os encarou por alguns instantes.
Ele observava a reação dela o tempo todo.
Tantos sentimentos passaram por seus olhos. Negação, confusão,
malícia e, finalmente... fúria. Seus olhos se voltaram para ele, e
seus lábios se separaram como se ela quisesse dizer algo, mas
seus olhos voltaram para os homens amarrados.
Alexander movia-se lentamente, como um predador. Seus olhos
se estreitaram quando ele passou por ela. Sem dizer uma palavra,
ele voltou para seu carro e se inclinou contra ele. Cruzando os
braços sobre o peito, esperou pelo próximo movimento dela.
Os olhos arregalados de Ghislaine dispararam em direção a ele
antes que ela enfrentasse os homens amarrados. Sua mão
descansava na arma presa à cintura, mas não a levantava.
Os protestos saíam de suas bocas novamente, mas os sons eram
abafados.
— As crianças do sexo feminino são esterilizadas para que não
engravidem — acrescentou.
Sua cabeça voou em sua direção, seu cabelo castanho-claro
voando com o vento. Sua arma puxada para fora do coldre em sua
cintura.
Finalmente.
Ele olhou para o monstro que havia sido criado. Um monstro que
ele criou. Ele nunca conheceu uma mulher tão implacável. Ela
usava crueldade lindamente. Ela era a calmaria antes da
tempestade.
Ele sorria agora, não mais sorrindo para ela segurando a arma
para aqueles homens, pronta para estourar seus miolos. Seus olhos
eram intensos e selvagens quando ela se virou para olhá-los.
Aquele mesmo olhar maníaco que ele ansiava nela estava de volta.
Seus olhos eram da cor de um maldito pesadelo. Um pesadelo
assassino. Satisfeito, ele olhou para ela em deleite. Ele mal podia
esperar que ela os matasse. Uma onda de adrenalina percorreu seu
corpo e enrijeceu sua calça, imaginando o sangue que logo cobriria
o chão da floresta.
Seus olhos se fixaram nas mãos de Ghislaine. Suas mãos
trêmulas. Ele nunca tinha visto isso antes. Seu corpo estremecia
enquanto suas mãos trêmulas seguravam sua arma. Na vez que ela
atirou em Cyrus, ele estava longe dela. Ele nunca a viu disparar a
primeira bala, porque ele estava de costas. Agora, ele podia ver
tudo. Havia uma determinação em seus olhos para matar, mas...
suas mãos estavam em conflito. Acionando e revertendo o gatilho.
Ele parou de sorrir, não mais satisfeito.
Não mais encostado na porta, suas costas se endireitaram.
Alcançando sua pistola atrás de sua cintura, ele liberou a trava.
O lábio inferior de Ghislaine tremeu.
Mais um movimento e ela apertaria o gatilho.
Alexander ergueu a arma e apontou para a esquerda.
Ele disparou três balas fatais no cérebro desses três homens.
Seus olhos se arregalaram, seus corpos relaxando, e eles caíram
de cara no chão. Havia grandes pedras na frente deles, e suas
cabeças bateram no impacto, respingando plasma. O sangue
escorria de suas feridas, manchando o chão seco e deixando um
vermelho profundo e escuro.
Assustada, Ghislaine cambaleou para trás, antes que seus olhos
enlouquecidos girassem ao redor para pousar nele. Seus olhos
chocados e avermelhados encontraram os dele. Eles caíram em sua
pistola antes de encontrar seus olhos novamente. Ela abaixou a
arma frouxamente para os lados, a luta para manter o controle se
foi.
— Por que... v-você os matou? — ela gaguejou. — Pensei que
você queria que eu fizesse isso...
Travando o gatilho, ele colocou a arma atrás de sua cintura.
Voltou sua atenção para ela e não disse nada.
Ela balançou a cabeça em descrença antes de lançar os olhos
para os cadáveres. O sangue vermelho escuro estava chegando
mais perto, inundando o chão com vermelho, como um banho de
sangue. Era para ser uma matança limpa se as pedras não
estivessem no caminho. Isso ia ser uma bagunça para limpar na
floresta escura.
— Por que você fez isso? — ela estalou.
Ele não disse nada.
Ela empurrou sua arma em sua direção.
— Responda — ela rangeu.
— Melhor abaixar sua arma primeiro — ele sugeriu.
Ela suspirou e deixou cair a arma ao seu lado.
Talvez agora não fosse o melhor momento para dizer isso,
quando ela ainda estava segurando uma arma.
— E guardá-la.
Ele não tinha interesse em morrer hoje.
Ela franziu a testa antes de prendê-la de volta à sua cintura.
Satisfeito, ele olhou para ela. Mas ela sempre poderia retirá-la.
— Você não matou Cyrus Drakos — Alexander disse,
encontrando seus olhos. Sua carranca se aprofundou, com
confusão invadindo seus lindos olhos grandes. — Você atirou nele,
mas ele sobreviveu.
Seus lábios se separaram, e ela deu um passo para trás, com
suas mãos alcançando seu cabelo. Sua cabeça balançou de um
lado para o outro. Sua boca caiu aberta, e ela parecia um peixe
escancarado.
— Ele está vivo? — ela engasgou. — E você não me contou?
— Ele não está vivo — continuou ele. — Ele estava respirando
pela última vez naquela noite. Teria morrido eventualmente... se eu
não o tivesse trazido de volta à vida.
Ela colocou as mãos na cintura.
— O quê? Você acha que é Deus então?
— Pode ser. Dou vida às coisas... Até você — ele sussurrou.
Suas bochechas ficaram rosadas e ela desviou os olhos. Ela
cruzou os braços sobre o peito antes de encontrar seu olhar
novamente.
— Não entendo. — Ela suspirou, claramente frustrada.
— Consegui atendimento médico a tempo, porque queria matá-lo
eu mesmo. — E matá-lo por ferir você. — E eu o fiz. Ele está morto,
Ghislaine.
Ela sufocou uma risada amarga. Ele arqueou uma sobrancelha
sutil, perguntando-se se ela enlouqueceria para sempre. Ela o
atacou. O corpo dela colidiu com o dele, empurrando-o ainda mais
para dentro da porta do carro. Sua mão caiu contra a janela do
carro.
— O que há de errado com você? — ela rugiu. — Todo esse
tempo, você me deixou pensar que eu o matei! Por que você não
me contou antes?
Ela se inclinou para socá-lo no rosto, mas ele agarrou seu punho
e torceu sua mão atrás da cintura. Seu corpo quente estava
pressionado firmemente contra seu peito.
— Você vai perder a mão se me bater de novo — ele assegurou
baixinho, com seu corpo e mente tensos. A brincadeira nele se foi.
Ela virou a cabeça para trás em sua direção, antes de empurrar
seu peso contra ele com toda a força e fazê-lo bater na porta do
carro novamente.
Ele a soltou e a empurrou para longe dele. Ela tropeçou alguns
metros antes de se virar e olhar para ele. Ele fez uma pausa. Aquele
olhar assassino estava em seus olhos novamente.
O mesmo que atirou em Cyrus Drakos.
O mesmo que Miran tinha visto na prisão.
O mesmo que ele tinha visto esta noite para esses homens.
E agora, era para ele.
Nenhuma piedade estava por trás de seu olhar.
Os olhos dela já não riam com ele e brilhavam. Agora, eles foram
substituídos por um fogo que ameaçava consumir ambos com sua
ira.
— Então, isso foi apenas um jogo maldito para você? — ela
sussurrou com voz rouca, sua respiração saindo áspera. — Por
quê? — ela gritou: — Por que você não me contou antes! — A dor
brilhou em seus olhos. — Eu desabafei com você. Te disse coisas
sobre mim... Oh, meu Deus, chorei com você, e você estava
escondendo a verdade de mim. Ei kalb! Hamar! — Seus olhos
atormentados encontraram os dele.
Ele não tinha ideia do que ela acabou de dizer no final. Deviam
ser palavrões em árabe. Algo se agitou dentro de sua alma, e ele
odiava o jeito que ela estava olhando para ele agora.
— Eu te falei sobre a esposa de Cyrus. Te disse no carro que não
gosto dessa escuridão! Por que não me contou antes, Alexander?
— ela cuspiu o nome dele como se fosse venenoso. — Por que me
fazer sentir toda essa culpa, essa ira, essa raiva?
Ele passou a mão longamente pelo rosto. Tensionando sua
mandíbula, agora, ele estava preso em um dilema. Ela estava certa,
e ele deveria ter dito a ela antes. Encontrando seus olhos
depravados, ele falou:
— Porque é a primeira vez que você sente outra coisa... além de
tristeza.
Ela parecia perplexa. Tão perplexa, que seus olhos caíram no
chão. Ele queria puxá-la para ele, mas ela poderia atirar nele no
segundo em que chegasse perto, então ele ficou onde estava.
A menina selvagem também era uma menina louca.
— Você estava livre — ele continuou em voz baixa. — Você saiu
da sua concha. Sentiu outras coisas. Raiva. Controle. Poder. — Ela
colou os olhos no chão, mas parecia estar ouvindo. — Quando eu te
encontrei pela segunda vez, seus olhos estavam tão tristes... —
continuou ele, lembrando daquele dia no parque. — Isso... — Ele
fez uma pausa, procurando a palavra correta antes de decidir —
era... estranho, e eu precisava que você sentisse outra coisa. Você
atirou naquele homem na minha frente tão destemidamente. De
novo e de novo. Parei de te chamar de Olhos Tristes semanas atrás.
Seus olhos se ergueram para ele. A fúria neles desapareceu.
Agora, eles pareciam sem esperança.
— Havia uma escuridão em você, e você precisava controlá-la...
antes que ela controlasse você. Hoje, vi outra coisa. — Ele olhou
para as mãos flácidas que não tremiam mais. — Você estava em
conflito. Eu não deixei ir tão longe. Eu parei você. Agora, você não
tem as mortes desses homens em sua consciência.
Ele olhou para os três cadáveres a poucos metros deles. O
sangue chegava até onde Ghislaine estava, escorrendo sob suas
botas pretas. Ele deu um passo em direção a ela e parou,
esperando que ela sacasse sua arma e atirasse nele.
Um passo mais perto agora.
— Por que você acha que te chamo de Passarinho?
Ela apenas piscou e falou em voz baixa:
— Porque você me persegue e sabe que tenho pássaros em
minha casa.
Ele estava a apenas alguns passos dela.
Ele escondeu um sorriso. Sim, sabia, mas não era esse o motivo.
— Um pássaro voa livre no céu, e, para mim, você é isso.
Ela parecia ter parado de respirar.
— Ubitsa — ele murmurou.
Ela franziu a testa.
— O que é isso?
— Assassina. — Seus olhos brilharam com dor. — Você não é
uma assassina, Ghislaine.
Ela suspirou.
— Eu te odeio. — Seus olhos escurecidos brilharam como um
fogo aceso. — Te odeio tanto. Tanto, tanto. — Agora, ela estava
divagando. Ela se moveu em direção a ele. — Te odeio — sua voz
estava mais nervosa. — Quem você pensa que é? — ela apontou
um dedo em sua direção, cada palavra atingindo-o como uma
adaga, e isso fez seu sangue se agitar — Para me tirar da minha
concha? Quem é você para decidir isso, seu doente? — Agora, ela
estava junto a seu rosto. Seus olhos castanhos ardentes caíram
para os lábios dele antes de disparar para cima, desafiando os seus,
escuros.
Estreitando os olhos aquecidos, ele a agarrou pela garganta e a
puxou para ele.
— Quem sou eu? — ele rosnou com adrenalina correndo em suas
veias. — Eu sou o homem que está lá, ao seu lado, desde o
primeiro dia. — Ela protestou novamente, e seus olhos mortais
olharam para baixo. Ela se calou. — Eu sou o homem com quem
você compartilha sua dor. Eu sou sua pessoa. Só eu. Você derrama
sua alma fodida para mim. Você gosta da doença em mim. Você
anseia por isso. Você é atraída por isso — os olhos dela se
arregalaram —, porque você pode ser um pouco distorcida, como eu
também.
Seus olhos se estreitaram antes de continuar
— Posso decidir o que diabos eu quiser. Você sabe por quê? —
Ela não falou nada. Ele apertou os lados de seu pescoço. Ela soltou
um pequeno suspiro de sua linda boquinha e suas pupilas dilataram.
— Porque você é minha. Você foi minha antes mesmo de falar
comigo.
Ele soltou seu aperto de sua garganta, e ela respirou. Pena que
durou pouco, porque ele agarrou a jaqueta dela e a arrancou.
Assustada, ela olhou maravilhada. Ele puxou a bainha de sua
camisa e levantou sobre sua cabeça. Ela se moveu sob suas mãos,
seu comando, e sem dizer uma única palavra.
Apenas pequenos gemidos saíram de sua boca. Ele soltou a arma
de sua cintura e deixou-a cair para o lado. Virando-a como uma
bonequinha, suas mãos desabotoaram sua calça jeans e,
agachando-se, puxou-a para baixo.
Atordoada, ela agarrou seus ombros para se apoiar. Suas botas
saíram em seguida. Ele teve que ter cuidado para ver onde ela
pisava. Havia muitas pedras pequenas e galhos no chão. Então, seu
jeans saiu completamente. Ele os colocou na rocha vazia perto
deles, e não perto dos cadáveres. Olhando-a do chão, seu olhar
encontrou o dela, nebuloso. Ele deu uma longa lambida em seu
joelho interno. Pequenos arrepios surgiram em sua pele. Sua
pequena boca se abriu e ela alargou as pernas, sua postura para
ele.
A necessidade enrolou e apertou seu corpo para tomar o que ela
estava oferecendo. Isso só o endureceu como uma rocha. Um
gemido baixo deixou sua garganta. Ele ficou de pé, com mais de
1,90m de altura, e olhou para ela. Suas respirações curtas saíam
em baforadas no ar frio. Suas bochechas estavam rosadas, e seus
movimentos, nervosos. Seu longo cabelo castanho estava
despenteado pelo vento. Sua pele dourada brilhava no escuro. A
única luz que vinha era do feixe dos faróis. Ela só usava uma cor
dourada de sutiã e calcinha. A cor de sua pele.
Seus seios cheios subiam e desciam, e os olhos dele caíram em
algumas pequenas sardas entre eles. Seu estômago estava tenso, e
suas longas pernas eram macias e suaves. Ele a puxou pelo braço,
e seu peito arfante bateu contra o dele. Seu lábio inferior tremeu,
como se ele fosse o lobo mau, e ela era a gazela inocente. Ele iria
devorá-la esta noite.
Ela desviou o olhar dele, e seus olhos caíram sobre os cadáveres
a poucos metros deles. Fazendo uma careta, ela se virou para olhá-
lo, provavelmente para abrir a boca e repreendê-lo novamente. Ele
não deu a ela uma chance, e colidiu sua boca na dela.
Seus olhos se arregalaram nos dele antes que eles hesitassem e
se fechassem. Ele não fechou os olhos e a observou o tempo todo,
como o predador que era. Como o maldito perseguidor que era. Ele
não gostava de seus olhos em nenhum lugar, apenas nela. Seus
braços esguios e longos se estenderam para envolvê-la, mas ele os
prendeu atrás da cintura, fazendo-a arquear o peito contra o dele.
Ela gemeu em sua boca, e ele adorou. Ele era dono de sua boca
e adorava chupar, lamber e morder seus lábios. Ele a consumiu com
seus beijos e engoliu seus gemidos. Ele queria devastá-la desde
que colocou os olhos nela. O corpo dela se moveu contra ele, e
suas mãos se torceram em seu aperto. Ele mordeu seu lábio com
força, até que provou seu sangue doce, e isso inundou sua língua.
Ela se contorceu contra ele, sussurrando em sua boca, e seus
olhos se abriram.
Olhando para as sombras de seus olhos, ele se inclinou e lambeu
sua boca sangrenta, limpando o sangue, e beijou sua dor,
saboreando o gosto de seu poder sobre ela.
Ela era uma obra de arte. Uma obra-prima que ele queria
emoldurar na parede. Seus olhos deixaram os dela por um segundo,
antes de dispararem para o chão.
O sangue dos rivais mortos estava chegando mais perto de seus
pés. Ele não queria aquele sangue sujo nela. Alexander só gostava
do sangue dela. Ele soltou suas mãos e a levantou pelos quadris,
até que ela ficasse de pé. Ele havia levantado outras mulheres mais
pesadas, e ela era mais leve em comparação a todas. Assustada,
ela se afastou e lambeu os lábios. Seu olhar questionador encontrou
o dele.
— Confie em mim.
Ela provavelmente não deveria.
Ele já quebrou a confiança dela, e provavelmente faria isso de
novo no futuro. Mas ela agarrou a camisa dele em suas mãos,
puxando-o para mais perto.
Isso era tudo o que ele precisava dizer para tê-la se curvando à
sua vontade.
Ela comia avidamente da palma de sua mão toda porra da vez.
Inclinando-se, ele arrastou beijos sobre sua mandíbula até a
clavícula, e ela suspirou contra seu toque. Sua boca ainda escorria
sangue para seu queixo, e sua língua molhada lambeu novamente.
Suas mãos alcançaram atrás de sua cabeça e na parte de trás de
seu cabelo. Ele a arrastou para baixo até que ela desnudou seu
pescoço longo e esbelto para ele. Ele deu pequenos beijos leves
contra sua pele delicada, e ela derreteu sob ele. Seu leve aroma de
terra o cobriu.
Sem aviso, seus dentes apertaram o lado de seu pescoço macio.
Ela gemeu e agarrou suas costas. Ele brincou e cortou a pele,
marcando-a com cada mordida.
Alcançando atrás com a mão livre, desabotoou o sutiã, deixando-
o cair na mesma pedra limpa com o resto de suas roupas.
A sola de seus sapatos estava coberta de sangue agora. Ele se
afastou de seu pescoço e olhou para ela. Seus seios eram redondos
e enchiam suas mãos. Suas aréolas, uma cor marrom clara. Suas
mãos serpentearam de suas costas para seu estômago, antes de
chegar para cima e segurar seus seios.
Ghislaine soltou um gemido e seus olhos colidiram com os dele.
Ela deveria estar com medo dele, mas deu um pequeno sorriso e
seus olhos brilharam. Caralho. Por que ela tinha que sorrir assim?
Ela estava apenas incitando-o a ser o idiota que ele era.
Um monstro.
Ainda segurando seu olhar, seus dedos frios esfregaram contra
sua carne aquecida, seus mamilos eretos. Eles endureceram e
ganharam vida diante dele. Seu sorriso diminuiu e seus olhos
enevoados brilharam e se encheram de desejo. Ele os puxou,
esticando-os o máximo que podiam, provocando-a. Sua boca
soltava pequenos gemidos toda vez. Ela colocou os braços em volta
do pescoço dele, e suas respirações pesadas pousaram em seus
lábios.
Ele amassou seus seios juntos antes de abaixar a boca neles,
provando-os pela primeira vez. A única parte que ele ainda não
tinha provado. Assim que engoliu o mamilo ereto, Ghislaine gritou.
Ele deu, a cada um, uma lenta e profunda sucção, antes de roçar os
dentes sobre eles. O calor irrompeu dentro dele, e seu eixo se
alongou, esfregando contra sua calça. Seus gemidos eram
descontrolados, e ela cravou as unhas em seu couro cabeludo.
Ele devorou sua carne, amassando-a, avermelhando-a,
marcando-a. Ele esfregou o cabelo áspero do queixo em seu
mamilo, e enrugou debaixo dele, deixando-o vermelho brilhante e
duro como uma rocha. Ghislaine estremeceu, com suas pequenas
respirações saindo em baforadas. Ele fez o mesmo com o outro
mamilo negligenciado, sugando-o até que ela estava uma bagunça,
choramingando diante dele.
Ele se afastou por um segundo e tirou o blazer. Seus olhos se
aqueceram e a encararam ferozmente. Seus olhos estavam tão
fodidamente brilhantes agora. Agora, ela fez mais do que apenas
viver, ela ganhou vida. Sua camisa saiu em seguida. Seus olhos
caíram para seu peito claro e arrastou seus dedinhos — que ele
queria mordiscar — em seu peito. Eles passaram pelos pequenos
cachos pretos antes de traçar suas tatuagens. Ela parecia fascinada
e absorta em apenas olhar e explorar sua pele. Ele precisava de
mais.
Ele puxou para baixo sua calcinha dourada, levantando-a antes
de jogá-la na rocha também. Um sussurro ofegante deixou sua
boca, e sua mão segurou seu sexo, seu montículo macio, que
estava brilhando e encharcando contra sua pele. Quanto mais fundo
ele alcançava seus pequenos cachos macios, mais quente e úmida
ficava sua pele. Satisfeito, ele ergueu dois dedos para seus lábios
rosados e inchados, completamente beijados, e sufocou seus sucos
em sua boca.
Ghislaine piscou, curiosa, e suas bochechas esquentaram. Depois
de um momento, sua língua saiu e lambeu sua doce excitação.
Gemendo contra ela, ele a puxou pelos quadris, até que ela estava
escarranchada contra sua cintura. Sua excitação escorregadia ia
contra seu estômago. Ele os abaixou no chão.
Seus olhos dispararam para cima, e um sussurro saiu de sua
boca.
— Tem sangue.
— Não dou a mínima — sua voz saiu áspera.
Ela parecia querer protestar de novo, mas manteve a boca
fechada desta vez. Bom. Ela estava em cima dele agora.
O sangue nunca a tocou, em vez disso, tocou as costas nuas dele
e manchou sua calça. Seus olhos brilharam em aprovação. Ele era
um fodido assassino, mas ela não era.
Talvez o destino não quisesse que ela fosse uma.
Arrastando seu corpo nu, ele a preencheu. A fome se agitou em
seu corpo, em seus seios pendurados sobre seu rosto, e ela
brilhava no escuro. Ele a empurrou para baixo, de joelhos, para que
seu cinto pudesse sair. Desabotoou a calça, abaixando a cueca
boxer e liberando sua ereção furiosa. Ela o encarou com olhos de
corça, mordendo os lábios.
Ele puxou sua bunda em cima dele, abaixando sua boceta em seu
pau. A satisfação encheu sua alma quando ela afundou
completamente nua. Sem barreiras entre eles.
Sua boca gemeu antes de deixar exalações irregulares.
— Isso dói — ela gemeu.
Seus olhos nebulosos colidiram com os olhos acusadores dela,
como se ela o estivesse culpando. Ele abriu um sorriso presunçoso.
— Obrigado pelo elogio. — Ela mostrou sua pequena língua. —
Você não faz isso há quase quatro anos. Seu corpo vai se
acostumar — ele murmurou.
Ela torceu o narizinho no ar.
— Você está falando como se eu tivesse esquecido como é.
Suas mãos descansaram em seus quadris.
— Esqueceu o quê? — ele perguntou com um sorriso malicioso.
Suas bochechas queimaram, e ela corou sob o luar. Ele se
espalhou de suas bochechas para seus seios.
— Sexo — ela disse como se fosse uma palavra ruim.
Isso só o fez sorrir ainda mais.
— Seu corpo anseia por isso.
Seus olhos brilhantes brilharam.
— Por que diabos você está sorrindo?
Ele arqueou uma sobrancelha e seu sorriso diminuiu.
— Você tem sorte, você é linda. — Linda pra caralho. — E é
minha. Não machuco aqueles que são meus. Caso contrário, você
já estaria morta por me desrespeitar.
Seu corpo se acalmou e suas bochechas aqueceram. Ela olhou
para qualquer lugar, menos para ele, e ele sorriu.
— Preciso de um momento para respirar enquanto você está
dentro de mim.
Aaah. Porra. Ele lhe deu dez segundos. Isso era tudo que ele
podia dar. O sangue correu para sua virilha, e seu pênis se contraiu,
exigindo se mover.
— Você não tem ideia do quanto eu queria foder você esse tempo
todo, Passarinho.
Ele enfiou nela em um único e rápido impulso.
Um grito gutural saiu de sua boca, e ele a moveu contra ele, para
cima e para baixo. Ela deslizou sobre sua masculinidade quando
começou a montá-lo, esfregando seu calor úmido e sedoso para
cima e para baixo em seu comprimento. Seu membro engrossou
dentro dela, empurrando mais forte. Seus seios balançavam e
pulavam com cada impulso. Porra, ele precisava dela.
Seus olhos encontraram os dele novamente.
— Ainda odeio você por mentir para mim — ela sussurrou.
Ele deu um sorriso maroto.
Suas mãos agarraram seus seios. Foda-me. Seus lábios se
separaram com a visão enquanto ela se movia sobre ele,
segurando-se e gemendo.
— Eu ainda deveria te matar — ela sussurrou.
— Oh, deveria? — ele desafiou com um sorriso. — Faça isso.
Ele empurrou mais fundo nela, fazendo-a saltar.
Franzindo o cenho, ela estreitou os olhos antes de seu olhar
disparar ao redor. Curioso, seu olhar seguiu o dela. E antes que ele
percebesse, ela pegou o objeto preto caído e segurou o revólver na
testa dele.
Ele fez uma pausa. Tão fodidamente imóvel agora. Seus olhos
encontraram os dela.
A bruxinha sorrateira tinha um sorriso no rosto e estava em êxtase
com isso. Ela também continuou a montá-lo. Era a coisa mais
gostosa que ele já viu. Ele pensou o mesmo quando ela atirou seis
balas em um homem. Isso foi ousado, mas olhe para ela agora. Ela
veio de muito longe. Seu pássaro era imparável.
— Se você se mexer, vou estourar seus miolos.
Ele quase sufocou uma risada.
Quem era essa garota corajosa?
Mas, oh, ele não duvidou e não fez nenhum movimento.
— Se eu não me mexer — ele questionou depois de um momento
—, como vou te foder? — E só para provar seu ponto, ele levantou
os quadris e empurrou nela com força.
Ela gritou e abaixou-se em seu corpo, com o peito macio roçando
contra seu peito duro e liso. A arma nunca deixou sua têmpora. Sua
respiração quente caiu em seus lábios, e ele a penetrou novamente.
Um gemido gutural saiu de sua boca. Ele continuou batendo nela,
embora ela tivesse uma arma.
— Mas eu deveria te matar — ela sussurrou entre gemidos. —
Você é um criminoso, afinal. Estaria fazendo um favor ao mundo…
Mas, desde que você entrou na minha vida, sinto que me
transformei… E não posso negar isso.
Ele se acalmou, encontrando seus olhos.
— Você está certo, você sabe. — Ela continuou a se mover contra
seu pênis, possuindo-o. — Eu estava protegida antes, como um
pássaro em uma gaiola dourada... E agora — seus olhos se
arregalaram de prazer. — Agora, estou voando para o céu. Eu me
sinto imparável. Você tem essa sensação às vezes?
Ele apenas piscou. Ela esqueceu quem ele era?
Ela baixou a arma para o chão.
Alexander estendeu a mão imediatamente e a jogou longe deles.
Caiu a alguns metros de distância. Ele fez uma nota mental para si
mesmo para pegá-la mais tarde. Quando ele a pegou olhando para
ele, repreendeu:
— Não confio em você com armas.
Ela riu.
Pela primeira vez, sua gargalhada espalhou-se no ar, como um
pássaro canoro. Uma melodia sexy que ele não tinha ouvido antes.
Ele se perguntou se ela alguma vez riu. Seus seios subiam e
desciam, e sua boca abriu um sorriso tentador. O tempo pareceu
congelar enquanto ele apenas olhava em seus brilhantes olhos
vidrados. Ela era mais do que a luz do sol ou o luar. Era o maldito
universo.
Eles estavam fodendo perto de três cadáveres, sangue estava
manchando-o, e estavam no meio da floresta gelada à noite, e ele
não dava a mínima. Tudo o que conseguia pensar sobre ela era sua
risada. O vento assobiou e girou ao redor deles. As folhas caíam
das árvores acima, cobrindo-os no frio.
O outono estava sobre ele.
Ela sempre tinha sido o outono para ele.
Seus olhos atordoados se afastaram dele, e ela olhou para o
chão. Curioso, enquanto ainda bombeava nela, seus olhos seguiram
o movimento. Alcançando as duas mãos no chão encharcado de
sangue, ela as colocou lá antes de levantar as mãos revestidas de
vermelho e arrastá-las pelo pescoço e seios. Ele respirou fundo, e
ela lhe deu um sorriso malicioso.
— Você está coberto com isso — ela sussurrou. — Você não é
um herói… Mas eu também não sou uma heroína. Cansei de fingir.
Ele quase gozou ao ouvi-la.
Suas palavras eram pesadas, como uma promessa sombria
carregando o peso de um juramento. Ele teve o suficiente dela
montando nele, então ele a jogou no chão sangrento, não se
importando mais.
As folhas esmagaram abaixo dela quando suas costas nuas
aterrissaram. Ela parou de sorrir. Ele sorriu e seu pulso ficou louco,
querendo absorver sua aura. Ele puxou a calça e cueca boxer até
os tornozelos agora, e abaixou-se para ela novamente. Inclinando a
ponta de seu pênis em seu núcleo, ele não aliviou neste momento.
Ele era implacável, e repetidamente mergulhou dentro de sua
umidade, quase como se fosse dividi-la ao meio.
— Minha garota selvagem — ele murmurou. — Apertada pra
caralho. Você é tão linda.
Sua voz estava profunda com desejo.
Ghislaine gritou e envolveu suas pernas nele, puxando-o para
mais perto. Seu corpo se aqueceu e se moldou contra o dele.
Sua boca caiu em um suspiro feliz, e ele a pegou, sua língua
reivindicando e deslizando sem piedade. Não mais segurando. Sua
boca era firme e agressiva contra a dela, até que ela não era nada
além de chamas e calor diante dele. A barba dele raspou suas
bochechas, deixando-as machucadas e vermelhas.
— Zander — um gemido gutural deixou seus lábios macios.
Ele gostou desse apelido vindo da sua boca.
Sua pélvis afundou na dela, e ele enfiou nela novamente. Seus
fodidos músculos tensos o apertando, afundando cada vez mais,
cobrindo-o com ela. Ela se moveu contra ele e estendeu os braços
para envolver seu pescoço. Mas ele puxou os braços
desengonçados de seu pescoço e, com a velocidade da luz, os
prendeu contra o chão da floresta. Seus olhos lacrimejantes
encontraram os dele, e seus lábios se separaram. Seu corpo inteiro
tremeu debaixo dele.
Pele contra pele. Peito contra peito.
Ele girou seu eixo, levantando e balançando dentro dela.
Bombeando dentro dela de novo e de novo, sua astúcia tomava
conta dele. Cada vez que ele empurrava nela, olhava em seus
olhos. Eles se dilataram com seus golpes duros e perversos.
Piscavam para ele com tanta necessidade, rodopiando nas suas
sombras marrons. Ele se inclinou e mordeu seu pescoço, deixando
mordidas quentes e molhadas.
— Pevchaya ptitsa.
As palavras russas eram um sussurro contra sua pele.
— O que isso significa? — Ghislaine murmurou.
Alexander empurrou mais fundo nela.
— Pássaro Cantor.
Ele olhou para cima, ao mesmo tempo que sua respiração
engatou, e seus lábios formaram um sorriso. Ele se inclinou e
lambeu seu lábio inferior, tirando aquele sorriso do rosto dela. Não
conseguia pensar direito quando ela sorria. Seus olhos se voltaram
para ele como um vasto oceano, carregado de segredos, puxando-o
para baixo com ela. Seu rosto era tudo quando ela se desfez diante
dele, quebrando.
Ele puxou e soltou no chão.
Ela fechou os olhos, quase como se estivesse dormindo, em um
estado de sonho, como se estivesse em coma novamente. Ele não
ficaria surpreso se a tivesse fodido em coma.
Ela falou em uma voz baixa e rouca:
— O que você está fazendo comigo?
Claramente, ela não estava falando sobre eles fodendo.
Ele achava que ela era uma bola de fogo quando estava no
controle e empoderada... Mas isso estava em outro nível. Ela estava
solta e livre, com os olhos ainda fechados e um sorriso feliz
brincando em seus lábios. Ela estava em suas veias, ardente e leve,
como se fosse feita para ele.
E esse pensamento era o suficiente para destruir seu mundo.
GHISLAINE

20

A NOITE PASSADA foi um erro.


E eu estava preparada para dizer isso a Alexander.
Consegui um telefone substituto e rastreei seu número de
telefone. Tive acesso ao seu arquivo e dados pessoais. Não senti
vergonha de invadir sua privacidade, porque ele já havia invadido a
minha, de qualquer maneira. Tinha ligado para ele mais cedo,
querendo falar com ele.
Liguei de um telefone pré-pago para o caso de o FBI estar me
rastreando. Ele me disse para ir à sua cobertura. A equipe me
deixaria subir com um cartão-chave, e eu tirei um dia de folga do
trabalho hoje. Finalmente me permitiram folgas nos fins de semana.
Alguém poderia acreditar nisso?
Agora, aqui estava eu no elevador, meu coração martelando cada
vez que os números dos andares mudavam. O medo enchia meu
coração. Que diabos eu estava pensando, estando perto dele o
tempo todo? Ele era meu maldito caso, para não mencionar que era
um notório gângster.
Um suspiro saiu da minha boca. Mas não poderia esquecer a
noite passada.
Fodendo como animais selvagens no meio de uma floresta.
Nunca tinha feito isso antes.
Nunca tinha experimentado a liberdade assim antes.
O que era outra razão pela qual isso precisava parar.
Era uma tentação perigosa, e eu não poderia cair nesse caminho
corrupto. Não queria ficar presa em sua armadilha, em que eu não
veria mais uma saída. Ele mesmo me mataria se soubesse que eu o
estava investigando. Meus pensamentos pararam quando a porta do
elevador apitou e abriu.
A primeira coisa que meus olhos notaram foi ele.
Ele estava lá no meio de sua luxuosa cobertura.
Saí do elevador, que se fechou atrás de mim imediatamente.
Ele era devastadoramente lindo.
Sua beleza era eterna e surreal às vezes. Divina. Odiava como
seus olhos me espreitavam. Ou como seus lábios estavam puxados
naquele sorriso malicioso e familiar. Sua brincadeira, sua proteção,
sua crueldade cresceram em mim.
Não via mais um Pakhan.
Via Alexander.
Aqueles olhos dele olhavam para minha roupa, para o decote
cavado e meus ombros nus. Meu batimento cardíaco acelerou
quando ele lambeu os lábios e me estudou.
— Olá — ele cantarolou, avançando como um predador letal.
Seus olhos rastejaram sobre mim, e tentei me manter firme, embora
ele me intimidasse como o inferno.
Quase queria correr de volta para o elevador e sair.
— O que te traz de volta tão cedo? — ele perguntou em um
sussurro, espreitando ao meu redor como se eu fosse sua próxima
refeição, na qual ele iria afundar seus dentes. Prendi minha
respiração automaticamente.
Ele separou meu cabelo liso para o lado, expondo meu pescoço.
Estava atrás de mim agora.
— Sentiu saudades?
Não respondi.
Seus lábios roçaram um ponto sensível no meu ombro que fez
cócegas na minha pele. Fechei os olhos por um segundo, inclinando
a cabeça para trás, permitindo-me ceder por um instante. Seu braço
serpenteou possessivamente em volta da minha cintura, puxando-a
contra seu peito duro. Sua ereção estava evidente mais uma vez.
Abri meus olhos. Isso estava ficando fora de controle. Tirei sua
mão da minha cintura e dei um passo para longe dele, criando
distância entre nós. Meu corpo estava frio agora que estava longe
de seu calor.
Virei-me para encará-lo novamente, evitando seus olhos, porque
eu era uma covarde.
— Não posso mais te ver.
Fechei os olhos rapidamente antes de olhar para o chão.
Um silêncio mortal me cumprimentou, e eu estava com medo de
ver sua reação.
— Não acho que devemos fazer isso nunca mais — continuei,
com a inquietação se instalando em minha alma. — Sou um agente
e você é um... — Mordi a língua e, em vez de dizer criminoso,
acabei dizendo: — Pakhan. — Isso parecia menos ofensivo. —
Nossos mundos são muito diferentes. A noite passada foi um erro.
— Uma memória vívida passou em minha mente, dele entre minhas
pernas em seu carro. — Não deveria ter deixado chegar tão longe.
Foi errado. — Ainda não encontrei seus olhos.
— Não. — Uma única palavra letal veio como resposta.
Meus olhos saltaram, encontrando seus olhos enfurecidos. A
tensão estava saindo de seu corpo, me atingindo com força total.
Franzindo as sobrancelhas, repeti:
— Não? — Quando ele não respondeu, eu limpei minha garganta.
— Eu me expressei claramente. Isso não vai acontecer nunca mais.
Segurei seu olhar, e ele brilhava diante de mim, escurecendo,
mas eu me segurei. Eu me retirei para o elevador para me afastar
de sua presença intimidadora antes que ele me prendesse
novamente.
Assim que eu estava passando, sua mão se estendeu e agarrou
meu pulso, me parando em seu caminho. O medo atingiu meus
ossos, e eu engoli em seco. Ele iria me machucar?
Não encontrei seus olhos e olhei para o chão novamente.
— Eu disse não.
Sua voz era tão clara e forte enquanto falava, embora a fúria
ainda estivesse vindo de seu corpo.
Mastiguei minha bochecha internamente. Isso não estava indo tão
bem quanto eu planejei. O que eu estava pensando? Que eu diria a
ele para se foder e ele concordaria alegremente?
Suspirei silenciosamente em minha mente, e puxei minha mão
dele, mas ele apenas segurou. Meus olhos se ergueram,
encontrando os dele.
Quase recuei do abismo olhando para mim. O perigo escorria
deles.
— Alexander — resmunguei finalmente.
— Você não pode me deixar. Não vou permitir.
Olhei para ele, atordoada. Meu coração afundou, e eu esperava
que ele estivesse brincando. Mas, a julgar pela expressão severa
em seu rosto, ele parecia muito sério.
Balancei minha cabeça, mas ele continuou falando.
— Você pertence a mim — ele rangeu.
Meu coração disparou.
— Não vou deixar você fora da minha vista — ele balançou a
cabeça lentamente, a promessa gravada profundamente em sua voz
— Toquei você. Agora ninguém mais fará isso. Você se entregou a
mim, livremente. Agora, você é minha para foder. Cada parte de
você é minha.
Raios de eletricidade passaram por mim, pela possessividade em
seu tom de comando, pela necessidade em sua voz. No que eu
tinha me metido? Antes que pudesse dizer qualquer coisa, ele
puxou minha mão para frente, e minhas costas pousaram em seu
peito. Eu me movi, mas ele passou os braços firmes em volta da
minha cintura, prendendo meus braços contra os meus lados.
Segurei um suspiro, e odiava como meu corpo cedia contra ele
como se o reconhecesse.
Ele não recuaria tão facilmente.
— Não posso mais te ver, Alexander — sussurrei, minha voz
falhando. Gostaria de poder ser mais forte.
— É mesmo? — ele respirou contra o meu pescoço, seu outro
dedo brincando com uma mecha do meu cabelo. — Então, por que
você se vestiu assim? — Sua outra mão caiu e brincou com a
bainha do meu vestido rosa pastel na altura do joelho. — Para dizer
adeus a mim de todas as coisas?
Eu estava perplexa, minha garganta balançando enquanto eu
engolia em seco. Não tinha argumentos para usar um vestido justo
rosa pastel que deixava meus ombros e seios à mostra. Agarrava-se
a cada curva minha, e estava secretamente satisfeita por ele ter
notado. Abandonei minha jaqueta jeans normal e jeans preto, e
escolhi este vestido em vez disso.
— Você sabe quão linda fica com isso? — sua voz foi como uma
carícia adorável contra minha pele, sua boca se movendo sobre
meus ombros nus, deixando arrepios para trás. — Quão perfeita
você fica nele? Quão perfeita você é?
Fiquei muda, embora suas palavras me gelassem até os ossos.
— Você queria que eu te visse nisso — ele provocou, com sua
mão serpenteando e apertando meus seios. Tinha certeza de que
ele podia sentir meus mamilos intumescidos. Não estava usando
sutiã porque não combinava com o vestido. Minha respiração saía
em pequenas baforadas, lembrando-me da noite passada.
— Você vem aqui vestida como a princesa mais bonita viva e
depois exige que eu a deixe em paz? — Ele riu amargamente, e
meu pulso disparou. — Acho que não.
Ele estava tornando isso muito mais difícil. Uma dor lancinante
estava em minha alma, e doía deixá-lo. Eu não estava entendendo
nada.
Meu lábio inferior estremeceu, e eu tentei sair de seus braços,
mas ele apenas me virou. Colei meu rosto em seu peito, recusando-
me a encontrar seus olhos, com medo do que poderia encontrar
neles.
— Você não está mais fugindo de mim — ele declarou, me
levantando pelos quadris e me segurando no ar. Não poderia montar
nele desta vez, pois estava de vestido, e eu queria. Suas mãos
estavam pressionadas contra minha bunda agora, e ele se virou.
Meus olhos escurecidos encontraram os dele.
— Me solta — sussurrei, minha respiração pousando em seus
lábios.
— Não.
Mais uma vez, com suas respostas de uma única palavra.
Ele começou a andar. Vi seu quarto. O mesmo em que dormi uma
vez. Meu corpo ficou rígido, e eu engoli em seco.
— Alexander — sussurrei impotente.
Meus instintos de treinamento estavam me dizendo para socar,
chutar e esbofeteá-lo, mas, quando ele me olhava assim, como se
me quisesse, como se me desejasse, todo o poder saía de minhas
mãos e ia para as dele. Jamais conseguiria me forçar a machucá-lo.
Mate-o ou beije-o. Nunca poderia decidir.
Ele me carregou para seu quarto e me jogou no colchão. Agarrei
os lençóis macios quando aterrissei e me sentei ereta. Olhei para
cima, encontrando seus olhos, e meu coração estava pronto para
explodir. Eles estavam mais frios, como se eu o tivesse
desapontado, e meus dedos estavam coçando para tocá-lo.
Seus olhos percorreram meu corpo novamente, traçando meus
ombros nus e o decote profundo. Minha pele corou, e eu queria que
ele desviasse o olhar. Isso me dava medo, mas, ao mesmo tempo,
incitava coisas em mim que eu não queria mais sentir.
Disseram que todas as histórias de amor tinham finais felizes...
Mas minha história de amor já havia terminado. Acabou no dia em
que meu marido morreu.
Isso nunca poderia ser uma história de amor.
Éramos muito voláteis, impulsivos e imprevisíveis quando juntos.
Ele inflamava minha alma e o mal em mim explodia.
Nós nunca poderíamos ser um conto de fadas.
Era uma ilusão.
Uma bela ilusão.
Estávamos condenados desde o início.
Coloquei meus fios caídos atrás das orelhas e foquei em seus
olhos.
— Preciso sair.
Seus olhos escuros ficaram mais duros, e seu lábio se curvou,
não em um sorriso, mas em um escárnio cruel. Quase não o
reconheci. Foi-se o Alexander de quem eu gostava e, em vez disso,
um Pakhan me cumprimentou.
— Se você sair desta cobertura agora... — Ele ferveu. — Eu
contarei ao mundo inteiro o que você fez. Vou contar tudo a eles —
prometeu.
Minha boca caiu aberta, pronta para bater no chão, e eu agarrei
os lençóis com força. Ele estava brincando de novo?
Mas, olhando para seu rosto letal, sabia que ele estava falando
sério. Eu estava com medo. Pensando por um segundo, tinha
entendido errado, e queria que ele repetisse. Eu o julguei errado.
Ele não era meu defensor.
— Você matou Cyrus! — apontei.
Ele encontrou meus olhos com malícia.
— Mas você atirou nele primeiro.
Eu balancei minha cabeça em descrença.
— Nós dois vamos para a porra da prisão, o que você acha? —
Ele ergueu as sobrancelhas. — Final feliz do caralho.
Meu pulso disparou. Ele tinha enlouquecido.
— Não tenho medo de ir para a cadeia. Você acha que não posso
administrar meu império lá de dentro? — disse.
Olhei para ele, horrorizada, imaginando quem havia substituído o
homem da noite passada por isso. A inquietação se instalou em
minha alma. Este era quem ele realmente era. Ele zombou com um
sorriso cruel. Eu não gostava quando ele sorria assim. Ele parecia
tão frio.
— Não se preocupe. Não vou dizer a eles que você fodeu com o
principal suspeito do seu caso.
Meu coração, que estava martelando, caiu do meu peito. Minhas
entranhas nervosas se contorceram, e eu me perguntei como diabos
ele sabia disso. Se ele contasse a alguém, seria o maior escândalo
no meu local de trabalho. Estar com ele me tornava um escândalo.
Sem esperar por uma resposta, Alexander se virou e fechou a
porta com um estrondo que perfurou meus tímpanos. Ele tremia
com a hostilidade. Ondas de choque percorreram meu corpo como
um fio aceso com o que ele declarou.
Ele sabia o tempo todo.
Oh, meu Deus... Ele sabia que eu o investigava.
Foi por isso que ele se aproximou de mim? Para ver o quanto eu
sabia? Ele nunca tinha falado do caso antes.
Esfreguei a nuca com os dedos. Suspirei, imaginando como eu
poderia convencê-lo. Com hesitação, levantei-me e fui em direção à
porta, para ver se podia falar com ele novamente.
Ainda suspirando, alcancei a porta para abri-la.
Não se mexeu.
Tentei novamente, mas não se moveu. Estava emperrada? Tentei
sacudir a maçaneta, mas ela ainda não abriu. Puxei-o mais algumas
vezes, mas se recusou a abrir.
Uma percepção surpreendente me atingiu.
Alexander me trancou.
Não queria acreditar nisso a princípio, mas, quando tentei girar a
maçaneta várias vezes, não girava. Bati na porta algumas vezes,
mas ele não voltou.
Ele a havia trancado por fora?
Exalando, tentei manter a calma, mas meu batimento cardíaco
estava frenético, e mordi o interior da minha bochecha enquanto
tentava pensar racionalmente.
Eu estava em uma cobertura com um homem perigoso.
Um homem que eu tinha julgado mal.
Um homem com quem eu tinha dormido.
Um homem que me queria.
Ele nunca me deixaria sair. Nunca.
Bati na porta novamente.
— Alexander, abra a porta.
Apenas o silêncio me cumprimentou.
Minhas batidas caíram em ouvidos vazios.
Ele ainda estava por perto?
O tempo passou, vários minutos se passaram, enquanto eu
andava de um lado para o outro. Empurrando meu cabelo atrás das
orelhas, fiz uma careta, meus olhos encarando a porta. Lidaria com
sua bunda mal-humorada mais tarde, mas, primeiro, eu precisava
sair daqui. No passado, podia ter sido indefesa, mas não estava
mais indefesa.
Estava mais forte agora.
Eu sou a porra da Ghislaine Khalil.
Ainda estava com meu telefone e me perguntei se deveria pedir
ajuda. Não. Eu era uma agente da força policial, não precisava de
ajuda. Eles me fariam um milhão de perguntas sobre por que eu
estava aqui. Se tivesse que perder para um último recurso, ligaria
para Miran.
Ele me ajudaria e não questionaria por que eu estava aqui. Ele
manteria meu pequeno segredo sujo. Uma parte de mim ainda não
queria que ele soubesse. Estava com medo de seu julgamento.
Olhei para os meus saltos.
No momento em que eu tentasse arrombar a porta, meus saltos
quebrariam. Eu gostaria de ter usado botas para poder chutar a
porta. Chutei no passado, mas isso foi com a ajuda de outros
oficiais. Eu era forte, mas não tinha força sobrenatural. Tentei, de
qualquer maneira. Bati meu ombro contra a porta, meus olhos se
estreitando nela. Não se mexeu.
Bati meu ombro nela, de novo e de novo, desafiando-o a abrir,
mas ela não se mexeu. Suspirei e soltei um ofego quando uma dor
atingiu meu ombro machucado e dolorido. Ficou vermelho.
Pense, Ghislaine. Pense. Você é uma policial.
Olhei ao redor do quarto, imaginando o que eu poderia usar para
arrombar a porta. Meus olhos caíram no armário de Alexander.
Ainda olhando para a porta, corri em direção a ela. Abri a porta
branca e um enorme closet apareceu diante de mim. Entrei no
armário luxuoso. Eu poderia literalmente caminhar aqui. Roupas.
Tantas roupas penduradas ao meu redor. Tudo preto e branco. Suas
cores seguras. Olhei para os móveis dourados lá dentro e os
candelabros que desciam do teto. Ele tinha um maldito sofá aqui
também. Balançando a cabeça, olhei para as roupas.
Meus olhos foram atraídos para os cabides.
Evitando os mais grossos, procurei cabides de arame finos e
pretos. Os que continham roupas mais leves. Eu os encontrei.
Tirando a camisa branca de cetim, joguei-a no chão, mas não antes
de pisar nela com os saltos.
Idiota.
Larguei o cabide no chão de ladrilhos brancos e usei o salto para
deixar o gancho reto e pontudo. Levou tempo. Segundos
provavelmente se transformaram em minutos. Satisfeita, corri para
fora da sala e em direção à porta novamente. Tentei girar mais uma
vez, esperando por um segundo que Alexander tivesse mudado de
ideia.
Ainda estava trancada.
A decepção se instalou em meu coração e meus olhos brilharam.
Olhei para o pequeno buraco dourado abaixo da maçaneta e inseri o
fio pontudo. Tive que balançar em torno dele também. Meus ouvidos
se animaram com um barulho de clique. Ah. Em movimentos
apressados, girei a maçaneta e, finalmente, ela se abriu. Puxei com
tanta força que ela bateu contra a parede.
A poucos metros de distância, Alexander estava casualmente
enviando mensagens de texto em seu telefone. Ele parecia
completamente imperturbável enquanto eu era uma bagunça
desgrenhada. Seus olhos caíram em mim quando ele me notou de
pé atrás da porta. Então, ele sorriu e ergueu as sobrancelhas em
avaliação.
Ele fodidamente sorriu.
— Você conseguiu, Passarinho.
Com o sangue correndo em minhas veias, joguei o arame em
Alexander, mas ele se esquivou, dando um passo para o lado à sua
direita.
Carrancudo, ele se virou para mim. Tirei meu sapato e joguei nele.
Maldito sequestrador.
Mais uma vez, ele se esquivou, mas não antes de se aproximar.
Acabei de tirar meu outro sapato e estava prestes a jogá-lo também,
mas ele o arrancou da minha mão e o jogou para o lado.
Lívida, meus olhos selvagens encontraram os dele.
Ele não estava mais sorrindo, mas parecia calmo.
Como ele podia estar tão incrivelmente calmo?
Estendi meus braços, esperando estrangulá-lo até a morte. Minha
pulsação atingiu minha garganta, e meus olhos se estreitaram nele,
determinados a acabar com sua vida. Meus olhos brilharam, o
sangue tentando ferver fora de mim. Agarrei seu pescoço com as
duas mãos e o puxei para mim. Tudo que eu precisava fazer era
torcer...
Ele empurrou meus braços para o lado e os puxou firmemente
para os meus lados, empurrando meu peito contra o dele. Um
grunhido frustrado deixou meus lábios, e eu o encarei nos olhos,
desafiando-o.
— Adoro essa porra de olhar em seus olhos.
Seus olhos negros estão cheios de travessuras e muito mais.
— Como se você quisesse lutar, até me matar.
E assim, o fogo em mim se extinguiu.
Meu coração rachou e meus olhos lacrimejaram, provavelmente
perdendo aquele olhar pelo qual ele estava obcecado. Ele só
gostava de mim quando eu era um inferno. Quando era como ele.
Um monstro. Um tirano.
A luta em mim diminuiu, e caí contra ele. Ele não se importava
comigo. Ele era tão psicótico quanto todos pensavam, e eu era um
novo peão em seu jogo. Desviei o olhar dele, mas não antes de uma
lágrima rolar pelo meu rosto.
Ele não soltou meus braços, mesmo que eu tentasse me livrar
dele. Ele se inclinou e lambeu meu rosto, enxugando aquela lágrima
que caiu de mim. Não olhei para ele. Meu coração rachou, e eu
estava tão decepcionada.
Ele era um criminoso implacável, um homem que infringia a lei.
Por que eu esperava que ele fosse diferente? Porque ele me
defendeu, me confortou e liberou um lado indomável de mim?
Apertei meus lábios e evitei seu olhar. Ele não merecia mais meus
olhos nele.
Eu o odeio. Eu o odeio. Eu o odeio. Eu...
— Você está chateada.
Meus pensamentos foram interrompidos.
Fechei os olhos com sua voz rica, e outra lágrima escorreu pelos
meus olhos. Eu odiava como sua voz soava calmante.
Odiava como ele ainda me afetava, o quanto o desejava.
Quando ele se tornou tão importante para mim?
— Você abriu a porta, Ghislaine — a maneira como ele falou meu
nome ainda me fazia arrepiar a espinha —, não teria te obrigado a
fazer algo que eu sabia que você não era capaz.
Minha mente voltou ao incidente de ontem. O conflito, a batalha
que encontrei comigo mesma para matar ou não aqueles três
homens. Lutei e Alexander os matou em vez disso. Ainda assim, as
lágrimas rolaram pelo meu rosto novamente, nunca parando. Não
importava o que ele dissesse. Ele estilhaçou meu coração partido e,
em vez de moldá-lo, ele o estilhaçou, me despedaçando.
Ele se inclinou para mais perto e começou a deixar beijos leves
no meu ombro machucado e em chamas.
— Você poderia ter chamado o FBI ou 911 para reforço. Você
tinha seu telefone com você... — Tentei mover meu ombro dele,
odiando como meu corpo ainda amava seu toque. Ele continuou
beijando minha dor de qualquer maneira. — Mas você não fez isso.
Eu ainda estava de olhos fechados.
— Olha para mim.
Não.
Mantive meu rosto à direita, no chão.
— Ghislaine.
Me deixa.
— Fala comigo.
Sua voz de comando saiu severa, odiava quando ele falava
assim. Isso me fazia derramar meus segredos traiçoeiros para ele
todas as vezes. Ele não merecia mais meus segredos.
Minha dor era minha dor.
Ele soltou um dos meus braços.
Eu me movi contra ele, mas ele sozinho torceu meus braços atrás
da minha cintura. Poderia facilmente chutá-lo nas bolas ou no
joelho. Por que era tão difícil para mim machucá-lo todas as vezes,
mas ele podia me machucar tão facilmente? Tóxico. Ele era tão
venenoso, que eu virei massa de modelar em suas mãos.
Alcançando uma mão em direção ao meu queixo, ele virou meu
rosto e me forçou a olhar em seus olhos. Deixei-o olhar desta vez,
para a minha desolação e angústia que ele causou. Os olhos de
Alexander se estreitaram, observando meus olhos esmaecidos,
cheios de lágrimas.
— Você me trancou — acusei.
Minha voz saiu tão baixa, ainda em dúvida.
Meus olhos se encheram de lágrimas novamente e tentei virar o
rosto, mas ele segurou meu queixo com firmeza.
— Você se livrou. Você está livre — ele respondeu finalmente.
A palavra livre se instalou em meu coração. Meu lábio inferior
tremeu, e seus olhos caíram para ele antes de encontrar meus olhos
cheios de dor.
— Como estão meus olhos agora? — ousei perguntar.
Seu olhar permaneceu sobre eles, e eles nunca se moveram.
— Sou Olhos Tristes novamente.
Minha voz falhou antes que meu rosto se enchesse de lágrimas
novamente.
Não chore. Não chore. Repeti esse mantra em minha mente, mas
era tarde demais. Elas quebraram como uma barragem no meu
rosto, ainda em agonia pelo que ele tinha feito comigo.
— Você tirou minha liberdade — acusei. — E, então, você me fez
lutar por isso. — Se meu queixo não estivesse em seu alcance, eu
teria balançado a cabeça. Eu não podia mais vê-lo, minha visão era
turva. Queria queimar todo esse lugar até o chão.
— Ghislaine — ele sussurrou, seu hálito quente batendo em
minhas bochechas molhadas. Sua voz era tão suave e meiga ao
ouvido, mas eu não conseguia esquecer a torrente corrupta e
desonesta que estava lá.
— Sou apenas um jogo para você — sussurrei. — Você só quer
que eu seja louca como você. — funguei. — Eu me pergunto se
Miran soube por você. — Eu balancei minha cabeça. — Você está
sempre me testando… Como se quisesse que eu fizesse parte da
sua vida sombria. Você é egoísta... — exalei. — Tão malditamente
egoísta. Você não se importa com ninguém além de si mesmo e o
que você quer. É cruel o suficiente para me trancar aqui. Não
importa se foi por menos de trinta minutos. Você tirou minha
liberdade, sabendo o quanto isso significa para mim. Você tirou a
mesma coisa que queria que eu fosse. Livre. Você... me prendeu —
minha voz falhou — de novo.
Quando ele não respondeu, tentei vê-lo através das lágrimas, mas
minha visão sombria estava distorcida.
— Por que eu? — exigi baixinho. — Por que você me escolheu?
— protestei em meio às lágrimas. — Você poderia ter qualquer uma.
Há muitas mulheres à sua disposição para suas necessidades.
Ele permaneceu mudo.
— Por que se envolver com uma mãe solteira viúva?
Sua boca permaneceu permanentemente fechada, e percebi que
ele não me responderia. Acho que não era digno de suas palavras.
Doía e esfaqueava minha alma repetidamente.
Continuei:
— Se eu fosse outra pessoa, poderia estar com uma escuta em
mim, gravando nossas conversas. Você é meu caso — ainda não
sabia como ele sabia —, mas ainda não fiz nada sobre isso. Não te
observo e não te sigo. Em vez disso, deixei meu dever... por você.
Esperei que ele falasse, mas nada veio no meu caminho.
— Minha tristeza incomoda você — terminei. — Você quer ver a
selvageria em vez disso. Você não pode ter a escuridão em mim se
minha dor é algo que não quer. Você não pode ter um sem o outro.
Minha dor desencadeia minha sanidade. Elas vêm do mesmo lugar.
Se você não pode aceitar minhas raízes, então você nunca vai me
aceitar…
Esperei que ele me prendesse novamente.
O silêncio me cumprimentou em vez disso.
Não olhei mais para ele e descansei meus olhos cansados em
sua camisa. Seu aperto em meus membros afrouxou, e ele deixou
cair o dedo do meu queixo. Não encontrei seus olhos, e ele não se
afastou de mim. Um estremecimento atormentado queria percorrer
meu corpo.
Queria que ele me confortasse, me abraçasse, se desculpasse
pelo que tinha feito, que afastasse a dor com um beijo, mas ele não
fez tal coisa. O que eu esperava dele? Um relacionamento?
Balancei minha cabeça em silêncio, desapontada comigo mesma.
Nós nunca poderíamos ser algo real.
Contos de fadas existiam apenas em livros de histórias.
E ele não era nenhum príncipe encantado.
Estava mais para um vilão.
Dei um passo para trás, sem encontrar seus olhos.
Peguei meu sapato do chão e agarrei meu outro na sala de estar
quando saí do cômodo. Eu os apertei contra o meu peito com força,
segurando-os perto. Queria olhar para ele mais uma vez, porque
estava com medo de que esta fosse a última vez que eu o veria.
Meus olhos se encheram de água novamente, e me forcei a
continuar andando, mantendo meus ombros erguidos, e não
querendo mostrar o quanto eu estava pirando por dentro. Eu não
sabia se ele ainda estava me observando, mas não me virei, com
medo de correr para seus braços.
Ele não era meu paraíso ou meu porto seguro.
Era o oposto disso.
Um tirano de seu submundo e nada mais.
Não pertencia aqui com ele.
Ainda não olhei para ele quando as portas do elevador se
abriram.
De costas para ele, as portas se fecharam, e finalmente
engasguei com um grito.
Éramos duas linhas paralelas que nunca poderiam se encontrar.
Ele era a lua, e eu era o sol.
Ele era um criminoso.
E eu era uma policial.
GHISLAINE

21

LARGUEI O CASO de Alexander Nikolaev duas semanas depois.


Tinha feito pouco progresso nele. Tentei no começo, mas não deu
em nada. Não sabia como continuar investigando um homem com
quem dormi. Era um conflito de interesses.
Meus superiores não me questionaram quando entreguei o caso.
Talvez eles já soubessem do meu histórico de saúde mental e
acreditassem que eu não era estável o suficiente para lidar com o
caso. Parei de tomar antipsicóticos há alguns dias e queria culpar
minha mente enlouquecida pelos medicamentos em vez disso. Eu
não tinha mais alucinações, e também não ouvia a voz de Driss.
Também pedi uma mudança na minha agenda, então, em vez de
sair às oito da noite, passei a sair às cinco e chegava em casa às
seis.
Ainda seguia o mesmo caminho para casa todas as noites e me
perguntava se ele ainda estava rondando nas sombras. Não podia
mais sentir seus olhos em mim. Isso me deixava entorpecida. Eu era
uma idiota por querer que meu perseguidor ainda estivesse por
perto. Perseguidores e assassinos eram o pior pesadelo de todos,
mas, para mim... ele era mais do que isso. Talvez porque ele entrou
na minha vida do nada e me defendeu.
Se soubesse que ele era meu perseguidor antes daquele
incidente, então, talvez não me sentisse assim. Eu não sabia
quando ele se tornou mais. Ainda não conseguia especificar o que
exatamente havia entre nós. Era mais do que apenas desejo e muito
maior do que necessidade. Ele nunca mais entrou em contato
comigo. Uma pequena parte em mim desejava que ele o fizesse.
Talvez ele tivesse seguido adiante com outra pessoa. Alguém digno
de seu tempo. Ele nem me respondeu da última vez em que falei a
minha verdade. Doeu profundamente no meu coração.
Eram por volta das seis horas quando voltei para casa do
trabalho.
Noura estava colorindo e me pediu para ajudar em seu livro de
histórias. Dei um sorriso manso e prometi a ela que, depois de
comer, eu faria. Assim que troquei de roupa e comi, me acomodei
na sala, ajudando-a.
— Mamãe... — disse Noura depois de um momento.
Meus olhos se chocaram com os castanhos dela, tão parecidos
com os meus.
Ela me deu seu sorriso perolado.
— Voxê parexe canxada, mamãe. Voxê tá bem?
Meu mundo desmoronou e meu corpo ficou rígido. Como o resto
do mundo não viu isso, mas minha filha de quatro anos viu? Dei um
sorriso fraco e esperei que alcançasse meus olhos.
— Sim — menti. — Estou bem.
Ela ainda olhava com olhos curiosos, como as crianças faziam
quando sabiam que um adulto estava mentindo para elas.
Depois de alguns segundos, ela fez beicinho e voltou à sua
atividade. Um suspiro ofegante de alívio saiu da minha boca por ela
não ter continuado a perguntar. Tinha medo de responder a uma
criança.
— Como era o papai?
Meu corpo se acalmou. Olhei para ela, mas ela continuou
colorindo, sem perceber o efeito que sua pergunta teve em mim.
Uma lágrima saiu do meu olho antes que pudesse enxugá-la. Olhei
para minha filha, pensando antes de falar. Estendi a mão e enxuguei
a lágrima.
Ela era linda, preciosa e minha.
A franja castanha-clara cobria sua testa pequena, e ela usava um
vestido azul tiffany de tiras. Esperava que ela nunca superasse
aqueles vestidinhos. Suas bochechas redondas e rosadas estavam
abaixadas, e eu queria mordê-la. Meus olhos contaram as sardas
que ela tinha em sua pele. Quatro na bochecha direita e cinco na
bochecha esquerda. Ela tinha uma no lábio também. Era adorável.
Era impecável. Crianças...
— Driss era maravilhoso e atencioso — disse em voz baixa.
Limpei minha voz e acrescentei: — Ele foi um ótimo pai.
Mesmo por apenas um ano de sua vida.
Não foi apenas um ano. Ele estava lá durante a gravidez também,
a cada passo do caminho, segurando minha mão e me guiando.
Os grandes olhos de Noura encontraram os meus novamente.
— Não me lembro dele.
Amuada, ela continuou colorindo.
Meu coração foi para ela.
— Todos os garotos da minha claxi têm papai.
Ela continuou colorindo, mas sua carranca se aprofundou.
— Você me tem — disse suavemente. — Você tem avós. Nós
também somos seus pais. Isso não é legal? Ter dois em tantas
pessoas?
Ela olhou para cima e seus lindos olhos brilharam.
— Xim — ela respondeu com entusiasmo. — Mamãe, o que
acontexeu com aquele homem com quem voxê converxou no
parque?
Parei de sorrir. Ela ainda se lembrava de Alexander.
Ela continuou a sorrir.
— Ele é xeu amigo também?
Também? Por favor, não me diga que ela o considera seu amigo.
Antes que eu pudesse responder, a campainha tocou.
Eu me perguntei quem era tão tarde da noite.
Olhei para o relógio, eram quase oito horas. Além da hora de
dormir de Noura também. Antes que eu pudesse me levantar, tia
Ines saiu da cozinha e acenou com a mão para que eu continuasse
sentada. Com hesitação, observei com um olho enquanto ela abria a
porta. Com o outro, olhei para Noura, que estava colorindo com
seus dedinhos novamente.
Um suspiro encheu o ar, e eu rapidamente busquei meu revólver.
Não encontrei na minha cintura. Olhei para baixo, percebendo que
estava no meu quarto, guardado em segurança.
Não mantinha uma arma no corpo em casa, principalmente por
causa de Noura. Levantei-me e olhei para minha tia de boca aberta.
Com quem ela estava falando? Tentei espiar pela porta, mas não
consegui ver ninguém. Levantei-me do meu assento, avançando
novamente, até que o rosto se tornou visível para mim. Eu parei de
me mover.
Alexander.
Seu olhar escuro caiu sobre mim, trilhando minha camisola de
cetim rosa, me consumindo com seus olhos antes que eles caíssem
no meu rosto novamente. Eles eram mais ousados e difíceis. Meus
mamilos intumesceram contra o meu tecido, e eu queria gritar com
eles. Uma rajada de vento do lado de fora entrou pela porta e minha
pele estremeceu.
Sem vergonha, seu olhar feroz continuou a rastejar sobre mim, e
suas pupilas dilataram. Queria me esconder dele, mas me segurei.
Esta era a minha casa. Ele não podia me intimidar nisso.
Mas o que ele estava fazendo aqui no meio da noite?
Abri minha boca para questioná-lo, mas um corpo minúsculo
passou por mim e se moveu em direção a Alexander.
Tentei agarrar Noura, mas sua bunda sorrateira era muito rápida,
e ela escorregou sob minhas mãos.
— Jander! — ela sussurrou.
Por que ela o estava chamando assim?
— O que você viu? — Eu perguntei a ela, cuidadosamente alerta.
— Oh, Jan... — ela fez uma pausa, e seus olhos se arregalaram.
— Nada! não vi nada.
Voltando à realidade, meus olhos focaram nela. Ela viu Alexander
com aquele homem, Yuri?
Engoli em seco, minha garganta balançando. Foi ele quem o
matou? Com meu maxilar cerrado, eu me movi em direção a ele. Tia
Ines se plantou no meu caminho, provavelmente tentando protegê-lo
de mim.
— Você está indecente — ela sussurrou para mim, olhando para
minha camisola rosa transparente. Mal chegava às minhas coxas.
Isso foi doce, mas tentei não revirar os olhos. Este homem já tinha
me visto nua, mas com certeza não iria dizer isso a ela.
— Vou ficar bem — assegurei. Esperava.
Passei por ela para confrontá-lo. Seus olhos não estavam mais
em mim, mas na minha Noura, que se agarrava à sua perna,
pulando para cima e para baixo, olhando para ele como se ele fosse
seu melhor amigo.
Queria me dar um tapa na cara com o que eu estava vendo.
Tal mãe, tal filha.
Uma risada histérica queria deixar meus lábios.
Fiz um movimento para pegá-la de volta, mas então... Alexander
se abaixou e a pegou em seus braços. Fiz uma pausa. Meu coração
afundou e meus olhos brilharam. Era algo que Driss faria também,
mas ele era seu pai. Alexander não era. Meus pés congelaram, me
mantendo cativa enquanto eu observava a visão diante de mim.
Estou grávida, Driss.
A memória tomou conta da minha mente novamente, e eu voltei à
realidade. Por que diabos essa memória continuava voltando?
Confusa, pisquei e afastei meus pensamentos. Olhei para cima e
me lembrei de onde estava novamente.
Minha filha estava nos braços de um notório gângster.
Agora, essa não era uma visão que via todos os dias.
Eu me belisquei para ver se não estava em algum tipo de
pesadelo. Não estava. Balancei minha cabeça, tentando me
concentrar no que estava acontecendo. Fiquei de boca aberta
enquanto Noura falava com ele.
— Oi, Jander! Eu xenti xua falta — ela gritou.
O que diabos há de errado com ela?
Encontrei os olhos da minha tia, que apenas me encarava,
horrorizada. Sabia que ela reconhecia Alexander. Era difícil não
reconhecer quando o Pakhan, o líder da máfia russa, estava na sua
frente.
— Você quer que eu pegue sua arma? — ela sussurrou para mim
em uma voz silenciosa.
Alexander olhou para ela. Ele devia ter ouvido. Minha tia se
acalmou, suas bochechas ficaram vermelhas, e ela desviou o olhar.
Olhei para Noura novamente.
— Vá pegar minha arma e minhas algemas — murmurei de volta.
Não sabia o que ele estava planejando.
Tia Ines passou por mim e correu para pegar minhas coisas.
Alexander não se incomodou em impedi-la e, em vez disso, falou
com minha filhinha.
— Oi, Bebê Sol.
Quem era ele para falar com ela?
Deus... Sua voz. Eu queria calá-lo.
E o Bebê Sol?
Meu maxilar se contraiu, e estendi a mão para Noura.
Ela apenas riu e enfiou a cabeça na curva do pescoço de
Alexander. Se ele fosse outra pessoa, eu teria achado adorável,
mas ele era um monstro.
Ele veio aqui para me matar... e Noura?
Gostaria que minha tia se apressasse com minha arma. Não
podia atacá-lo com meus punhos, já que ele estava segurando
Noura. Olhei para trás e encontrei os olhos das minhas outras duas
tias. Elas tinham a mesma expressão de horror que tia Ines tinha.
Felizmente, tia Ines voltou com minha arma, algemas e a chave
das algemas. Peguei os objetos de metal dela, segurando a arma
em uma mão, e as algemas e a chave na outra. Se ele tentasse
alguma coisa contra minha família, eu o mataria ou o algemaria,
dependendo do que viesse primeiro.
Alexander não me poupou nenhum olhar.
— Voxê veio me ver? — Noura perguntou a ele.
Seus olhos cheios de malícia encontraram os meus em vez disso.
— Sim. É claro.
Dei um olhar irritado e bati meu pé descalço impaciente.
— Voxê vem me ver de novo também?
Ele sorriu para minha filha.
— Qualquer coisa por você, Bebê Sol.
Apertei meus lábios para que eles parassem de tremer.
Por que ele estava fazendo isso? Ela não tinha pai, e eu não
podia permitir que ela se apegasse a ninguém, muito menos a ele.
Virei-me para olhar para Noura novamente e limpei a garganta.
— É hora de você dormir. Venha aqui.
Estendi meus braços para ela novamente. Ela gritou e se agarrou
a Alexander como se ele fosse seu bote salva-vidas. Malditas
crianças. Um pensamento passou pela minha mente. Achei que
poderia funcionar.
— Noura... — disse severamente. Alexander e minha filha
olharam para mim. — Ele come crianças vivas — disse, arregalando
meus olhos para assustá-la.
Alexander ergueu as sobrancelhas enquanto me avaliava.
— Não... — ele respondeu, sua voz cheia de diversão. — Apenas
adultos.
Ele me deu outro olhar desconfiado.
Segurei meu queixo antes que ele caísse novamente. Minha pele
corou lembrando que ele me comeu uma vez. Cruzei minhas pernas
trêmulas, com medo de cair de cara na frente de seus pés. Não
queria ver os rostos das minhas tias. Esperava que elas não
tivessem ouvido, mas eu sabia que todas ouviram.
Noura apenas deu uma risadinha, alheia a ele. Felizmente,
minhas tias não sabiam de nada, assim como minha filha. Tentei
não me irritar por ela estar me desdenhando pelo psicopata.
Alexander notou, e seus olhos risonhos brilharam.
Ele deve estar gostando disso agora.
Dei-lhe um sorriso de lábios apertados. Desgraçado.
— Goxtaria que voxê me vigitaxe maix — disse Noura, olhando
para Alexander. — Axo voxê muito legal. Meu pai também era
polixial.
Meu coração caiu por ela.
O sorriso de Alexander diminuiu quando ele olhou para ela.
— É? Acho que você é a garota mais legal do mundo.
Os olhos de Noura brilharam, e isso apertou meu coração morto.
— Não apenas a mais legal — ele continuou, sua voz baixando.
— Também a mais bonita... — Ele encontrou meus olhos, e minha
respiração ficou presa na minha garganta — Assim como sua mãe.
A admiração encheu seus olhos, e ele se recusou a desviar o
olhar.
Se eu não o odiasse tanto agora, eu teria desmaiado.
Mas, felizmente, eu estava pensando direito.
Noura sorriu, e seus olhos brilharam para ele como se ele
estivesse enlouquecendo o Papai Noel.
— Você sabe o que Noura significa? — ele questionou, virando-se
para olhar para minha filha.
Ela perdeu o sorriso, franzindo a testa, mastigou o dedo mindinho
e balançou a cabeça.
Alexander sorriu.
— Posso ver onde você conseguiu isso também — disse ele,
olhando para o dedo em sua boca antes de olhar para mim e sorrir.
Oh, Deus... Meu rosto ficou vermelho, e eu bati meu pé impaciente.
Lembrei-me de chupar meus dedos na primeira noite em que fui
para sua cobertura no elevador.
Ele se virou para olhá-la novamente.
— Significa luz... — então, acrescentou suavemente — Bebê Sol.
Como diabos ele sabia disso? Eu não deveria estar surpresa. O
homem havia feito uma investigação melhor sobre mim do que eu
jamais havia feito sobre ele. Tentei não ser insultada.
Noura sorriu, mas depois de um momento, diminuiu.
— Na excola, todax crianxas dijem que meu pai tá morto.
Meu coração disparou e meus olhos brilharam. Por que ela estava
dizendo isso a ele? Ela não tinha mencionado isso para mim.
— Mesmo? Quais são os nomes delas? — ele demandou.
Prendi a respiração, sabendo que ele iria matá-las.
Noura abriu a boca, mas eu falei em vez disso:
— É o bastante.
A severidade na minha voz chamou sua atenção.
Noura olhou novamente para Alexander.
— Mamãe dixe que ela é meu pai agora.
Os olhos de Alexander brilharam.
— Ela é.
Noura fez beicinho então.
— Às vejes, eu tinha um papai — meu coração rachou e
transbordou — Depois da escola, os papais pegam xeus filhos. Fico
olhando todas as vejes... Mas meu pai não vem.
Meu pobre bebê.
Meus olhos ficaram brilhantes, e respirei fundo. O tremor em meu
coração trovejou. A dor aumentou, e tive que morder meus lábios.
Gostaria que ela tivesse me contado primeiro.
Mas, novamente, eu não compartilhei nada sobre mim
recentemente, com ninguém além de Alexander. Às vezes, era mais
fácil falar com um estranho do que com sua própria família... E eu
não sabia a razão.
— Você quer que eu vá buscá-la depois da escola?
Perplexa, eu só conseguia olhar para eles. O que ele estava
fazendo?
Noura, alheia à verdadeira natureza dele, balançava sua cabeça
para cima e para baixo em concordância. Eu podia sentir minhas
tias olhando para mim, mas não prestei atenção nelas.
Limpando minha garganta, eu falei:
— Noura, ele não vai te buscar na escola. Desça agora mesmo.
Caso contrário, você não terá tempo de TV.
Ela ficou deprimida, claramente não gostando que eu a estivesse
interrompendo. Ela se virou para olhar para Alexander.
— Ok. Mamãe tá chateada, eu acho.
Fechei os olhos. Ela não tinha a menor ideia.
— Eu vou — ela murmurou baixinho.
Um suspiro de alívio deixou minha boca quando Alexander a
abaixou no chão. Encarei-o com todo o veneno que pude reunir em
meus olhos antes de baixar o olhar para Noura, minha pequena
criatura corada e diabólica.
Ela se encolheu um pouco, e suavizei minha expressão. Ela se
moveu para frente e agarrou minha perna nua agora com seus
bracinhos finos. Ela era tão delicada, frágil e pequena. Meus olhos
caíram em seu laço de cabelo roxo combinando. Combinava com o
vestido dela.
Não poderia ficar chateada com ela por muito tempo. Sua aura
brilhava tão intensamente, não é de se admirar que Alexander a
chamasse de ‘Bebê Sol’.
— Não fique brava, mamãe. Eu te amo.
A água encheu meus olhos novamente antes que eu piscasse
para longe. Ela puxou meu braço para baixo, sem se importar que
eu estivesse carregando uma arma e algemas nas mãos. Ela era
filha de uma policial, e minhas tias a treinaram para não temer uma
arma na minha ausência.
Depois de um momento, eu me agachei para ela. Encontrei seus
olhos castanhos inocentes como um anjo. Aqueles que eu tinha
medo de encontrar todos os dias por receio de que ela percebesse
que eu era uma impostora, e não sua mãe. Mesmo agora que eu
estava aqui, minhas tias cuidavam melhor dela do que eu. Estava
sempre trabalhando e, mesmo estando em casa, não sabia ser mãe
para ela.
Tirando-me dos meus pensamentos, Noura passou seus
bracinhos ao meu redor, me puxando para um abraço de urso. Seu
doce perfume floral me inundou. Eu acalmei e minhas mãos
levantaram no ar para abraçá-la. Elas congelaram alguns
centímetros com o impacto.
Engoli em seco, e me forcei a segurá-la em meus braços pela
primeira vez. Segurando a respiração engasgada, tentei tanto
diminuir a distância entre nós, mas não consegui diminuir a
distância. Desapontada, eu me xinguei quando ela se afastou e me
deu um beijo gentil na minha bochecha.
— Boa noite, mamãe.
Ela pulou para minhas duas tias atrás de mim.
Com as pernas bambas, me levantei e me virei para olhar para
Alexander. Seu sorriso havia desaparecido, e eu não conseguia ler
bem sua expressão. Tudo o que ele fez foi olhar para mim. Foi um
gesto simples, mas o suficiente para fazer meu sangue ferver. Eu o
mataria esta noite e iria para a cadeia. Malditas consequências.
Virei-me para olhar para tia Ines:
— Já volto — sussurrei com força.
Ela olhou para mim como se quisesse protestar, mas meu olhar a
queimava no lugar. Ela congelou. Acho que eu tinha aquele olhar
em meus olhos novamente. Ela assentiu antes de dizer:
— Tenha cuidado.
Eu me virei para olhar para Alexander:
— Lá fora — ordenei desta vez.
Ele arqueou uma sobrancelha e voltou para a minha varanda.
Coloquei meus chinelos e o segui, trancando a porta. Ainda olhando
para ele, pulei para ele, agarrando-o com a mesma mão que
segurava as algemas.
— Sério? — Soquei a palavra como veneno em um sussurro para
o caso de minhas tias poderem me ouvir. Não ficaria surpresa se
elas estivessem escutando. — Você veio à minha casa? — Agarrei
o interior de seu colarinho e o puxei para mim.
Ele ainda não disse uma única palavra e apenas observou.
— Que diabos está de errado com você?
Levantei minha arma e apontei para sua têmpora, e avancei,
empurrando-o para a minha varanda até que a cerca branca o
impediu de se mover mais. Eu pressionei a arma com mais força em
sua cabeça, esperando que deixasse um amassado nele. Brilhei
internamente. Isso seria uma vergonha para seu rosto bonito.
— Como você ousa segurar minha filha e fingir ser um bom
homem? — eu zombei, coma ira agitando em cada respiração,
formando nuvens. — Você não é o pai dela.
Seu olhar se estreitou e, como uma pantera, ele arrancou a arma
da minha mão, me desarmando. Surpresa, tentei agarrá-la
novamente, mas ele deixou cair minha arma na varanda do sofá. Ele
ignorou meus protestos e agarrou minha mão, me puxando pelos
degraus da varanda em direção ao meu quintal.
Minha pele estremeceu no clima severo. Eu não tinha nem uma
jaqueta. Esperava que ninguém pudesse nos ver. Tive sorte que a
névoa branca nos ocultava dos espectadores. Era outono — a
época mais nebulosa do ano — e folhas mortas esmagavam sob
nossos pés. Então, eu queria rir dramaticamente quando percebi
que também deixei cair a chave das algemas ao longo do caminho.
— Engraçado — ele murmurou baixinho. — Você não deu a
mínima por eu não ser um bom homem quando me deixou tocá-la
todas as vezes. — Seus olhos ferozes brilharam, e eu desviei o
olhar, apressadamente.
— Me larga, Alexander! — sibilei, batendo em sua mão.
Meu treinamento entrou em operação, mas, desta vez, não me
contive e chutei o joelho dele. Ele grunhiu levemente e caiu no meio
do caminho, antes que ele se recuperasse e se levantasse
novamente. Seus olhos voltaram para mim, e tentei não me
encolher sob seu olhar intenso. Seus olhos estavam tão escuros,
como se não tivessem piedade de mim. Ele estava a um segundo
de me matar.
Engoli o nó na minha garganta. Ele poderia me matar do lado de
fora da minha casa enevoada, e as pessoas que passavam nem nos
veriam. Era estranho. Trabalhei com criminosos perigosos, e eles
me lançavam olhares de ódio o tempo todo. Mas este homem... me
afetava com um único olhar mortal.
Olhei para trás e percebi que minha varanda havia desaparecido
na neblina. Voltei meu olhar para ele.
— Você não pode me manter como refém — fervi. — Não sou sua
prisioneira.
— Sério? — ele desafiou.
Nunca soltando minha mão, ele foi em direção ao meu quintal.
Inclinou a cabeça e me empurrou contra a parede da casa no meio
da minha garagem.
— Você não é minha prisioneira?
Aquele brilho em seus olhos estava de volta.
O que ele estava planejando fazer?
Eu não tinha minha arma. Acho que uma batalha de combate
serviria. Fiquei em posição, pronta para lutar e chutar sua bunda.
Não iria cair sem lutar. Ele levantou uma sobrancelha e fez um
movimento para pegar minha mão. Tentei pegá-lo de volta, mas ele
agarrou minhas algemas.
Atordoada, fiz uma carranca, e minha postura de luta diminuiu.
Curiosa, observei. Seus olhos selvagens se ergueram e ele se
inclinou. Recuei por reflexo, até que ele apareceu na minha frente.
Seus olhos atordoados caíram para os meus lábios antes de
encontrarem meus olhos novamente.
— Isto é por apontar uma arma para mim.
Empurrando minhas duas mãos acima da minha cabeça, ele... me
algemou na grade da janela. Parei de me mover, me perguntando o
que diabos acabou de acontecer?
— Isso é por me chutar.
Encontrei seus olhos negros e sem expressão.
Ele estava respirando mais entrecortado, e seus olhos caíram
para meus lábios novamente. Eu queria me cobrir. Estava vestindo
apenas uma camisola. Estava tão frio aqui fora. O vento cortava
minha pele nua e meus mamilos ficaram eretos sob o tecido.
Estúpido frio.
— E se eu te deixar aqui no frio a noite toda? — ele desafiou.
— Alexander. — Odiava aquele apelo na minha voz.
Estava com medo dele agora, do que ele era capaz.
O homem que conheci estava longe. O homem cujos olhos
brilhavam e cujos lábios sempre sorriam. Agora, um assassino
implacável estava diante de mim.
Soltei uma respiração pesada. Meu coração parecia tão cheio e
vazio ao mesmo tempo. Tentei mover minhas mãos contra as
algemas de aço, mas elas eram duras como rochas. As únicas duas
maneiras que eu poderia sair eram com uma chave, e a outra seria
eu deslocando meu ombro. Meus ombros caíram, e mesmo assim
não o encarei, com medo do que poderia encontrar.
— Nunca pensei que poderia te odiar mais... até agora.
Minha voz falhou novamente.
Nunca deveria ter me permitido ficar sozinha com ele.
— Você disse que não machuca aqueles que você chama de
seus.
Seu corpo se moveu em minha direção, e prendi a respiração
desta vez. Suas mãos descansaram na parede atrás de mim antes
de pairar acima de mim. Odiava que seu cheiro de couro atraente
me afetasse ainda mais agora. Com seu corpo tão perto de novo,
era difícil se concentrar em qualquer coisa além dele. Gostaria que
ele não tivesse uma presença tão forte.
— Você me deixou.
Sua voz soou acusadora aos meus ouvidos, e me virei para ele.
Seus olhos se estreitaram enquanto olhavam para mim.
— Ninguém me deixa, porra.
— Acho que há uma primeira vez para tudo.
Provavelmente não deveria ter dito isso. Minha boca esperta não
me ajudaria nessa situação.
— Por que estou algemada no meio da noite? — perguntei
finalmente. Meus olhos escurecidos encararam os dele. — Você vai
me matar? Larguei seu caso — murmurei — Não porque tenho
medo de você... Bem, tenho — admiti com desconforto — Mas não
foi por isso que larguei. Achei que nunca mais te veria.
— Queria falar com você.
Não pude evitar quando uma risada amarga saiu da minha boca.
Sua mandíbula apertou novamente, e parei de rir. Ele se inclinou e
pressionou sua testa contra a minha. Gostaria que ele se afastasse.
Não conseguia pensar direito. Seu cheiro familiar estava em mim
novamente.
— Você tem uma maneira muito legal de mostrar isso — disse
secamente.
Ele respirou fundo pelo nariz.
— Vim para falar com você, e você me botou para fora.
Eu me afastei e arqueei uma sobrancelha.
— Obviamente, esta é a casa da minha família. Você veio sem
avisar.
Ele soltou um suspiro e balançou a cabeça.
— O que você quer de mim? — Odiava o quão baixa minha voz
saía. Olhei para o chão, derrotada.
— Sua dor. Sua escuridão. Tudo.
Meus olhos saltaram para ele e meu lábio inferior tremeu.
— Não vou fugir da sua dor — ele murmurou. — E vou parar de te
chamar de Olhos Tristes.
Meu coração voltou à vida.
— Você me algemou.
— Você estava lutando comigo... E não queria bater em você.
Oh. Assustada, encontrei seus olhos novamente.
— Foi um meio de conter você.
Suspirei e minha respiração pousou em sua boca. Seus olhos
seguiram aquele movimento, e ele lambeu os lábios. Balançando a
cabeça, concentrei-me e respondi:
— Se você quer que eu te ouça, não é assim que funciona.
— É assim que eu trabalho — ele respondeu brevemente. — Se
você prometer não me atacar, eu solto você.
Ele estava mentindo? Levantei minhas sobrancelhas e balancei a
cabeça lentamente.
— Deixei cair a chave ao longo do caminho.
Eu me perguntei se ele realmente faria isso. Ele se afastou de
mim, seu corpo quente se distanciando de mim antes de se mover
em direção à varanda e desaparecer na névoa espessa.
O ar frio me atingiu novamente. Estava mais gelado e escuro
enquanto a névoa me cercava. Ruídos não naturais da noite
perturbaram meus ouvidos, e eu esperava que ele voltasse logo.
Minhas tias não saíram.
Aquilo era uma coisa boa. Felizmente, elas concluíram que eu
estava longe de casa, e não algemada contra uma grade.
Medo me encheu quando segundos se transformaram em
minutos. Ele devia estar procurando no ar branco e enevoado.
Alguns momentos depois, Alexander voltou.
Dei um suspiro de alívio. Ele se aproximou, e encontrei seus olhos
soturnos. Seus olhos procuraram os meus. Eu não sabia para quê.
Meus ouvidos se animaram com o som de clique. Estava sem
algemas. Ele se afastou de mim e colocou as algemas e a chave no
parapeito da janela acima de mim.
Puxando meus braços para baixo, verifiquei meus pulsos.
Estavam rosados, mas não machucados. Olhei para cima e
encontrei seus olhos novamente.
Nós dois ficamos em silêncio enquanto olhávamos um para o
outro.
Suspirei e cruzei minhas mãos na minha frente.
— Sobre o que você queria falar?
Ele engoliu em seco, sua garganta subindo e descendo, como se
estivesse tentando formar as palavras, mas não sabia como.
Curiosa, eu o estudei. Ele passou a mão pelo rosto e andou de
um lado para o outro, xingando em russo baixinho. Não tinha ideia
do que ele estava dizendo. Por um momento, tentei olhar para a
situação da perspectiva dele. Este era um homem que não estava
acostumado a ouvir não.
E eu disse não a ele.
Percebendo que ele não iria me responder, falei em vez disso:
— Por que você me trancou no seu quarto?
Ele fez uma pausa nos passos e se virou para olhar para mim.
— Não queria que você me deixasse.
Sua voz parecia tão perdida como a de um menino.
Meu coração acelerou.
— Não é assim que você diz a uma pessoa que quer que ela fique
— argumentei. Ele desviou o olhar de mim. — Você usa palavras.
Ele olhou para mim, e seus olhos brilharam novamente. Eles não
pareciam mais bonitos. Mesmo assim, fiquei onde estava.
— Usei minhas malditas palavras. Eu te disse — ele protestou.
Balancei minha cabeça.
— Você se ouve? Tudo o que você disse foi que eu não posso
deixar você. Você tirou minha escolha.
Seus olhos tempestuosos voltaram.
— Nós fodemos. — Fiz uma careta para o quão vulgar ele soou.
— Nós transamos uma vez, e você queria desaparecer? Você não
foi a porra do caso de uma noite para mim.
Engoli em seco, suas palavras me atingindo como balas.
— Então — ousei perguntar —, o que eu sou para você,
Alexander?
Ele ficou quieto, suas palavras obviamente o abandonaram.
Era estranho que sempre que o questionava, ele se fechava para
mim, como se quisesse parar de sentir também.
Olhei para o homem na minha frente, o criminoso que uma vez eu
tinha decidido destruir. Nunca soube que ele era um furacão que
poderia me arruinar também.
— Você não pode me trancar de novo — sussurrei. — Se fizer
isso, você nunca vai me ver novamente. — Minha respiração saiu
muito rouca. — Você não pode fazer isso comigo. Pode chamar a
polícia, contar tudo o que eu fiz, mas não pode... me trancar se
tivermos um desentendimento. Não é assim que as coisas
funcionam.
Seus olhos ferozes se moveram para mim.
— Então me ensina — ele rosnou, e minha respiração engatou. —
Caralho, me ensina.
Ele soltou um grunhido frustrado e virou as costas para mim.
Mesmo estando a poucos metros de distância, a ira saiu de seu
corpo.
Eu não deveria estar surpresa. Ele era o Pakhan.
Um homem que liderou um exército de soldados, governando-os,
tentou fazer o mesmo comigo. Governar. Cyrus tentou me dominar
também, mas isso parecia... diferente. Cyrus sabia melhor, certo e
errado. Talvez Alexander tenha sido ensinado de forma diferente.
Seu modo de vida mafioso era diferente do meu. Isso não
melhorou seu comportamento, mas me deu uma melhor
compreensão dele e de sua vida.
— P-prometa-me que você não vai me enjaular nunca mais?
Minha voz saiu em um sussurro.
O vento ganhou velocidade, e envolvi meus braços em volta de
mim. O tremor voltou a minha fala.
Ele ainda não se virou, mas concordou.
— Sim.
Franzindo o cenho, olhei para a parte de trás de seu blazer preto.
— Você tem que p-prometer — disse entre os dentes.
Parecia que eu estava pedindo uma promessa de dedo mindinho.
Tive medo de que ele não dissesse as palavras.
— Eu prometo.
Pela primeira vez em semanas, meus lábios se ergueram em um
sorriso.
Ele não era como Cyrus. Ele ouvia.
— E você se desculpa? — não pude deixar de perguntar.
— Não force — sua voz saiu severa.
Passos de bebê.
Ele estava aprendendo a se desculpar, apenas de uma maneira
diferente.
Era meio fofo.
Meu sorriso se alargou, transformando-se em um riso. Minhas
bochechas se esticaram tanto, que meu maxilar doeu. Estava
sorrindo no meio da noite fria como uma lunática, olhando
desesperadamente para um homem de costas para mim. Agora, era
a hora de voltar para casa. Estava congelando, de todo modo.
Sentindo-me tímida, estendi meus braços e os pressionei contra a
parede. Talvez isso o fizesse olhar para mim.
— Alexander — balbuciei.
Ele suspirou.
— E agora? — ele exigiu, virando-se. — Já disse... — Ele fez uma
pausa no que eu estava oferecendo.
Sentia falta dele, e eu o queria, mas nos meus termos.
Seus lábios se separaram antes que ele me visse. Aqueles olhos
viajaram dos meus braços nus sobre a minha cabeça para a minha
camisola rosa e frágil. Ele gostou dessa cor em mim da última vez.
Eu não pude deixar de me agarrar nessas últimas duas semanas.
Eu o peguei me checando de cima a baixo.
— Sabe... — Alexander falou lentamente em uma voz baixa e
rouca, chegando perto de mim no escuro. Ele enfiou as mãos nos
bolsos da calça. — Tive um longo dia de trabalho.
Eu ri com sua definição de trabalho, mas parei quando percebi o
quão sério ele estava.
— Sem mencionar que tive que conter um pássaro selvagem.
Eu sorri muito.
Seus olhos aquecidos pousaram em mim, e meu sorriso diminuiu.
— Seja uma boa menina e tire essa camisola.
Eu engasguei com uma respiração.
Minha boca ficou aberta antes de fechá-la ao seu comando. Todo
o calor correu para o meu núcleo inflamado.
Oh. Pensei que ele que iria tirar.
E por que eu gostava tanto de ser chamada de boa menina?
Aturdida, meus olhos selvagens bateram nos dele. Ele ainda
olhava para mim, nunca afastando o olhar. Sempre que me olhava,
era como se eu existisse apenas para seus olhos.
— Se você não fizer isso, vou rasgá-la. Daí, você pode explicar
isso para suas tias — ele disse com malícia em seus olhos.
Meu pulso saltou para minha garganta. Estava quase tentada a
dizer a ele para rasgá-la. Depois de um momento, limpei a garganta
e gritei:
— Minhas tias provavelmente estão preocupadas comigo. —
Normalmente, elas não estariam, já que era meu trabalho, mas
viram o Pakhan, a própria morte, na minha porta, então é claro que
ficariam com medo. — Tem que ser uma... rapidinha.
Seus lábios se contraíram.
— Coisinha exigente, não?
Minhas bochechas aqueceram, e estendi a mão para puxar a
bainha da minha camisola sobre minha cabeça antes de deixá-la
cair no chão.
O ar gelado cortou minha pele. Eu não podia acreditar que estava
fazendo isso do lado de fora novamente. Por que não podíamos
transar como pessoas normais em uma cama, em uma casa? Em
algum lugar seguro?
Ainda tremendo por entre os dentes, me perguntei se era tarde
demais para perguntar a ele se poderíamos fazer isso em seu carro.
Mas meus olhos encontraram seu olhar ardente.
Então, novamente, não era mais normal, e ele com certeza
também não era. Não me sentia segura quando estava perto dele.
Minha segurança estava comprometida. Quando ele estava perto de
mim, uma emoção perigosa enchia meu coração. Eu era invencível.
Algo era tentador e livre em ser íntimo ao ar livre e não ser
confinado.
Meus mamilos intumesceram no ar frio. Estava planejando dormir
depois, mas fui tão rudemente interrompida por esse Tirano. Quase
quis me cobrir, mas meus braços pendiam frouxamente ao meu
lado.
Seu olhar ardente pousou na minha clavícula antes de descer
pelos meus seios pesados e depois descansar na parte interna das
minhas coxas. Cruzei as pernas, esperando que ele parasse de
olhar. Ele percebeu isso e deu um de seus sorrisos marotos. Ele era
tão bonito. Queria que ele sorrisse para mim novamente. Gostava
desse lado dele. Devolvi um sorriso fraco, mas parei quando ele se
moveu em minha direção em alguns movimentos rápidos.
Ele só me deu um segundo antes de sua boca estar em cima de
mim. Gemi contra seu gosto familiar. Senti falta dele. Todo ele. Meus
dentes pararam de bater, e seu calor me atingiu. Ele capturou meus
lábios contra os dele, suas mãos cavando em meu cabelo.
Seus lábios eram ásperos e necessitados. Crus e dolorosos.
Uma dor que era tão boa...
Ele arrastou seus lábios dos meus e foi pelo meu pescoço, me
lambendo. Sua mão deixou meu cabelo, e, agora, ambas
seguravam meus seios, amassando e apertando.
Empurrando-me ainda mais contra a parede de tijolos, sua boca
pousou em meus mamilos intumescidos. Seus dentes rasparam
sobre eles, despertando sensações em meu corpo. Meu núcleo
latejava, e eu queria mais.
Minhas mãos cavaram em seu cabelo antes de cair em seu
blazer. Ele estava vestindo muitas roupas, e eu gemi. Estava
prestes a tirar seu blazer, mas ele afastou minhas mãos carentes e
urgentes. Ferida pela ação, olhei para cima.
— Não há tempo — ele murmurou contra a minha carne antes de
soprar uma respiração fria no meu mamilo aquecido. Ele se
enrugou, e ele o observou fascinado antes de engoli-lo com a boca
novamente.
Sorri com o fato de que ele estava ouvindo meu pedido rapidinho.
Seus olhos encontraram os meus com a boca ainda no meu peito,
sugando. Minha respiração ficou presa no meu peito. Ele os agarrou
com tanta força, que eu tinha certeza de que os hematomas
remanescentes estariam lá amanhã. Era difícil respirar quando seu
olhar caiu sobre mim. Mas ele nunca explicou o que eu significava
para ele.
Se eu não era um caso de uma noite, o que eu era?
— Amo seus peitos — ele murmurou, se afastando, o comentário
fez meu coração explodir — e sua bunda redonda.
Ele estendeu a mão e bateu uma mão atrás de mim, pousando
bem na minha bunda.
Assustada, olhei para ele. Nunca na minha vida um homem me
deu palmada antes. A palma de sua mão bateu contra ela
novamente, e a umidade se acumulou na minha calcinha.
— O que você está fazendo? — chiei como um rato.
Ele deu um sorriso tímido.
— Disciplinando você.
Minhas bochechas queimaram e murmurei:
— Mas eu sou a autoridade.
Inclinando-se, ele olhou nos meus olhos e me desafiou:
— Eu também sou.
Sua mão desceu na minha outra nádega, e eu gritei com o
impacto. A picada deixou um rastro nebuloso em minha mente, e
agarrei seu colarinho em meu aperto. Respirei com dificuldade pelo
nariz.
Meu corpo ansiava por ele e seu toque. Sua mão acalmou o tapa,
acariciando-o.
— Qual é o meu crime? — ousei perguntar.
Seus olhos ficaram turvos.
— Me deixar.
Sua mão bateu contra minha carne novamente, e um pequeno
gemido deixou minha boca. Ele perdeu o sorriso, e seu olhar foi
para os meus lábios.
— Você gosta disso?
Foi atencioso da parte dele perguntar. Ele era tudo que eu
precisava. Podia sentir arrepios em erupção na minha pele, e minha
carne aqueceu. A dor dos golpes ainda estava fresca, mas queria
que ele fizesse isso de novo. Teimosa demais para admitir, fiquei em
silêncio.
Sem aviso, sua mão brutal encontrou minha carne novamente.
Caralho. Minha bunda estava pegando fogo. Arqueei minhas
costas, meus seios roçando o tecido de seu blazer. Sua mão se
afastou da minha carne ardente e aquecida e deslizou para dentro
da minha calcinha. Um gemido involuntário deixou meus lábios.
Espiei, e ele parecia estar se divertindo.
— Você está molhando minha mão — ele soava divertido.
Não encontrei seus olhos, muito assustada para dizer qualquer
outra coisa. Sua mão estava me provocando agora, e apertei
minhas pernas para prendê-lo ali. Olhei para cima e dei um sorriso
maroto.
Ele arqueou uma sobrancelha antes de estender a outra mão e
puxar minhas pernas com força. Eu ofegava, e seus três dedos
estavam presos dentro de mim, me jogando impiedosamente, como
se eu fosse seu brinquedo de foda favorito.
Tentei me mover contra sua mão, querendo mais fricção, mas
seus dedos brutais enrolaram ao redor da minha carne aquecida,
segurando meu monte e cavando mais fundo.
Um suspiro desesperado e estranho deixou meus lábios. Como
estava molhada, seus dedos entraram facilmente, mas queimou,
incendiando minha pele. Por um segundo, um tremor me percorreu,
para que ele pudesse me levantar assim.
Prendendo a respiração, olhei para baixo. Puxando seu cinto e
desabotoando-o, puxei sua calça e cueca boxer para baixo antes de
tomar seu eixo na minha mão. Ele estava duro e grosso em meus
dedos, e a ponta dele estava roxa. Fascinante. Meus olhos não viam
um há três anos. Embora eu ainda me lembrasse do passado como
se fosse ontem. Na floresta, não consegui prestar muita atenção.
Ele soltou um grunhido, mas eu ainda estava estudando seu pau.
Por um segundo, queria apertá-lo como ele me apertava com os
dedos. Matá-lo como ele estava me matando. Estendi a mão e
agarrei seu pau com uma mão, e a outra esgueirei para apertar suas
bolas um pouco forte, mas não o suficiente para esmagá-las. Ele fez
uma pausa, e xingamentos russos deixaram sua boca sexy.
— Você não quer que a boa menina seja má hoje? — desafiei
com um sorriso torcido. Não reconheci a sujeira saindo da minha
boca. Não era mais a velha Ghislaine. Essa nova vida foi meu
renascimento quando morri e ressuscitei das cinzas.
As pupilas de Alexander dilataram, e ele retaliou, soltando seu
aperto e puxando minha calcinha encharcada até meus tornozelos.
Meu domínio sobre ele caiu. Agarrando minha garganta — minha
excitação ainda escorregadia na ponta dos dedos —, ele me
empurrou contra a parede e enfiou o seu pau dentro de mim,
reivindicando-me.
Abri minha boca para ofegar, gritar, qualquer coisa, mas sua boca
colidiu com a minha, abafando meus sons e engolindo meus
gemidos. Não consegui nem fechar os olhos dessa vez. Ele me
olhava cada vez que enfiava em mim. Cada impulso mais forte e
mais profundo do que antes.
Atordoada, mordi meus lábios, enquanto ele me batia cruelmente.
Agarrei a parede para me apoiar, esperando não cair. Meu núcleo
se apertou ao redor dele, puxando-o mais fundo em mim antes que
eu desmoronasse. Levou apenas alguns segundos. Isso não
impediu Alexander, e ele não desistiu. Ele me virou com o rosto
contra a parede e entrou em mim novamente, desta vez por trás.
Como estava úmida, ele entrou facilmente.
— Zander — respirei, olhando de volta.
Sua respiração rouca caiu na minha nuca.
— Adoro como seus lábios se movem quando você diz meu nome
— ele sussurrou, grunhindo contra mim.
Seu braço serpenteou ao redor, envolvendo-se contra meus seios,
cavando em minha pele e me segurando possessivamente. Estava
sendo atropelada por um homem perigoso. E gostava disso.
Adorava.
Seus dentes roçaram meu pescoço antes de se fecharem sobre
ele. Gritei com o impacto. Sua outra mão alcançou abaixo e
esfregou os dedos contra meu clitóris aumentado. Ele continuou
bombeando em mim, seu corpo deslizando contra o meu. Ele se
encaixava em mim tão perfeitamente, e isso me deixava com medo.
Ele poderia ver isso? Ele sabia?
Pequenos gemidos deixaram minha boca quando ele me tomou
contra a parede no meu quintal. Ele estava me deixando louca, as
sensações crescendo em mim, e eu gozei tudo de novo.
Ainda não o deteve.
— Alexander, é uma rapidinha — minha voz desesperada aos
meus ouvidos.
Ele esfregou meu clitóris sensível novamente, e eu virei minha
cabeça um pouco para implorar para ele com meus olhos. A voz em
mim se foi agora. Seus olhos monstruosos caíram sobre mim antes
de sua boca encontrar a minha novamente. Ele chupou meu lábio
inferior enquanto empurrava em mim de novo e de novo.
— Porra, quero algemar você de novo — ele sussurrou
asperamente.
Gritei com outro impulso:
— Faça isso.
Seus olhos voaram para mim, e ele fez uma pausa, com seu
comprimento total ainda dentro de mim, o tempo todo. Seu corpo
estava tão imóvel, e eu queria que ele se movesse novamente.
— Você disse... — sua voz sumiu, seus olhos se estreitaram.
— Isso é diferente — sussurrei. — Eu vou deixar.
Seu pau se contraiu dentro de mim. Acho que aprovou também.
Não precisava ser perguntado duas vezes. Ele puxou e me virou,
de frente para ele. Olhou para o parapeito da janela acima da minha
cabeça. Encontrando as algemas, levantou meus braços fracos
antes de algemá-los contra a grade.
— Tanto para uma rapidinha... — ofeguei.
Ele sorriu e olhou para a janela.
— Sorte as cortinas estarem fechadas. Caso contrário, suas tias
teriam um show. — Antes que pudesse responder, ele enfiou em
mim novamente. Gritei, e seu olhar penetrante encontrou o meu o
tempo todo em que seu corpo deslizou em mim. — Você está
exatamente onde eu quero você, Passarinho. À porra da minha
mercê.
Nossos olhos se encontraram, e o ar estalou com a tensão. Toda
vez que eu movia minhas mãos, minhas algemas batiam contra a
grade da janela. Parei de me mover quando ele mergulhou e
colocou um mamilo dolorido em sua boca, e sua outra mão brincou
com meu clitóris novamente enquanto enfiava brutalmente desta
vez. Tentei fechar minhas pernas ao redor dele, mas ele apenas as
manteve separadas.
— Não me faça amarrar suas pernas também — ele avisou contra
a minha pele. Um rubor percorreu meu corpo. Não me importaria se
ele o fizesse.
Sua boca se moveu em cima de mim antes de encontrar meus
lábios de novo, as estocadas se tornando cruéis e duras. Mordi
meus lábios, esperando abafar os gemidos que queriam explodir de
mim. Minhas pernas trêmulas quase cederam na minha frente, mas
as algemas me seguravam. Um momento depois, eu gozei, meu
peito arfando para cima e para baixo com cada respiração que dava.
Finalmente, ele puxou e soltou também.
Um pensamento confuso encheu minha mente.
Ele nunca usou camisinha... E eu nunca pedi para ele.
Isso era impulsivo. Um deslize e causaria um desastre. Confiei
nele todas as vezes. Comigo. Meu corpo.
Eu era uma tola, mas dei a ele o controle de mim.
Caí contra a parede, quase indo ao chão, mas suas mãos me
pegaram. Inquieta, descansei minha testa suada contra a dele, e
seus lábios roçaram o lado do meu pescoço, deixando um beijo para
trás.
Eu sorri.
— Acho que você sentiu minha falta... Muito.
Alexander não respondeu, mas riu, e sua respiração me fez
cócegas. Ele não concordou, mas compartilhou sua risada comigo.
E isso foi bom o suficiente.
ALEXANDER

22

ALEXANDER NÃO SABIA o que estava fazendo, mas tinha


dormido com Ghislaine novamente nas últimas três semanas. E ele
continuou a fazê-lo um pouco mais. Eles finalmente se mudaram
para o quarto dele pela primeira vez.
Ela nunca esteve na mansão dele em Old Westbury, e a cobertura
era mais segura. Aqui, ninguém poderia alcançá-lo. Eles estavam
escondidos dos olhos gananciosos do mundo, de seus inimigos.
E ela era seu pequeno segredo proibido.
Vestindo apenas sua calça de moletom preta, ele saiu à varanda,
onde ela estava vestindo uma de suas camisas de cetim. Ele
gostava delas mais nela do que em si mesmo. Ela nunca passava a
noite por causa de Noura.
Toda vez que ela o visitava, invadia seu armário, vestindo suas
camisas caras como se pertencessem a ela. Ele a deixava fazer o
que queria com suas roupas todas as vezes.
Uma vez que ela se trocava e ia para casa, ele inalava o perfume
floral persistente que ela deixava em suas roupas. Era
reconfortante, e ele estava obcecado. Ela era sua obsessão mais
profunda.
Seus olhos deslizaram por suas pernas nuas e suas pequenas
unhas rosadas. Ele olhou, contente. Era sua cor favorita nela.
Feminina. Isso complementava sua tez. Ele abriu a boca para falar,
mas, como se o sentisse, ela se virou e deu um sorriso.
As palavras o abandonaram e ele apenas respirou, perdendo o
sorriso.
Juntando-se a ela na sacada, ele apoiou os cotovelos no
parapeito de vidro e olhou para baixo. A cidade de Nova York estava
diante deles.
À medida que a noite caía, cada arranha-céu de vidro diante dele
iluminava uma janela de cada vez. Através da profundidade da
noite, feixes de luz acendiam a cidade. Os pequenos carros abaixo
dele passavam zunindo. Ele olhou para Ghislaine, que observava as
ruas abaixo.
Um sorriso tímido brincou em seu rosto, e o vento soprou os
cachos sedosos dela de volta. Os mesmos que ele gostaria de usar
quando ela estivesse debaixo dele.
— Sinto que estou no topo do mundo — disse ela suavemente.
Seus olhos caíram sobre a pequena verruga perto de seus lábios,
e ele estreitou o olhar. Ele nunca tinha visto aquela pequena
imperfeição antes. Esplêndido. Ainda a observando, seu olhar
seguiu aquele brilho nos olhos dela. Às vezes, ele apenas olhava
para ela. Seus olhos se enchiam de um brilho quando se
iluminaram. E suas sobrancelhas subiam quando ela olhava para
ele interrogativamente, ou quando ela franzia as mesmas
sobrancelhas, franzindo a testa, na maioria das vezes para ele. Ele
notava tudo e não conseguia parar de observá-la.
Ela era fascinante.
Um trabalho de arte.
Um raio de sol se você retirar suas camadas externas.
— Prefiro estar em cima de você — ele rebateu.
Ela o pegou olhando, e seus olhos de pôr do sol encontraram os
dele. Suas bochechas ficaram rosadas. Às vezes, ele recuperava o
fôlego, segurando-o da mesma forma que ela segurava o dela. O
que ela estava fazendo com ele? Era uma sensação desconhecida,
e ele não gostava.
— Você está olhando — ela acusou.
Seus lábios puxaram para cima em um sorriso.
— Eu tenho olhos.
Ela fez isso de novo, franzindo as sobrancelhas. Mordeu o lábio
inferior e ele quis substituir os dentes dela pelos dele. Sua mão se
estendeu, timidamente colocou uma mecha atrás da orelha e
desviou o olhar.
— Além disso, essa vista é mais impressionante, você não acha?
— ele perguntou maliciosamente.
Ela sorriu antes de olhar para o chão.
— Por que você voltou a me seguir como fazia antes?
Seus olhos encontraram os dele novamente.
— Quem disse que eu parei?
Seus olhos se arregalaram e seus lábios se separaram.
Ela enfiou um dedo no peito dele.
— Repugnante.
— Sabe — ele falou lentamente —, é irônico que, quando a força
policial persegue meu pessoal, eles chamam de vigilância, e quando
eu o faço, é chamado de perseguição. — Ele mexeu as
sobrancelhas, esperando por uma resposta.
— Isso é diferente! — Ghislaine argumentou.
— É? — ele questionou. — Só porque você tem um distintivo, não
há problema em observar as pessoas? — Sua boca se fechou. —
Não estou fazendo a mesma coisa que seu pessoal faz? De olho no
caso? — ele brincou.
Ele quis dizer isso como uma piada, mas suas bochechas ficaram
vermelhas de mortificação, e ela desviou o olhar e abaixou a
cabeça.
— Abandonei o seu caso — ela murmurou.
Alexander escondeu um sorriso, estendeu a mão e acariciou um
dedo em sua bochecha. Ele gostava de poder fazê-la estremecer
com um único toque.
— Como você sabia? — ela se perguntou, virando-se para olhar
para ele. Ele deixou cair o dedo. Esperava que ela descobrisse. A
compreensão pareceu surgir nela, e seus olhos piscaram
rapidamente. Seus cílios castanhos escuros eram tão longos como
as asas de uma borboleta. — Você leu meu arquivo de caso! — ela
acusou.
Ele não pôde deixar de sorrir.
Seus olhos caíram para os lábios dele antes de encontrar seus
olhos novamente.
— E você está muito satisfeito com isso — ela bufou.
— Você estava presa à sua bolsa como se fosse seu bote salva-
vidas. Fiquei curioso — admitiu.
Ela arqueou uma sobrancelha.
— Foi quando você começou a me observar mais para ver o que
eu sabia? — Antes que ele pudesse responder, ela acrescentou: —
Sempre senti que alguém estava me observando antes desse
incidente. — Seus olhos se estreitaram nele.
Ela não precisava saber que sua loucura com ela começou há
muito tempo. Desde o dia no hospital. Ele a beijou naquele dia e
saiu com uma obsessão.
Ele a observou todos os dias desde então, nos últimos nove
meses. Quando ele não estava fazendo seus negócios e reuniões,
ele estava na sede dela ou do lado de fora de seu quintal.
Ela nunca poderia saber que ele sabia que ela dormia com uma
luz noturna, e deixava as cortinas abertas. Ele tinha visto tudo uma
noite quando ela se despiu, invadindo sua privacidade.
A noite no carro ou a noite na floresta não foram as primeiras
vezes que ele a viu nua. Ele via tudo, muito antes de eles
começarem a se comunicar, e ele imprimia na memória.
A plenitude de seus seios. Os pequenos cachos entre suas longas
pernas. Permanecendo nas sombras, ele a observou como um
voyeurista, memorizando seu rosto e corpo.
Ele deu de ombros como um menino, e inocentemente
respondeu:
— Não sei do que você está falando.
Mas ele sabia, e ela nunca poderia descobrir. Se o fizesse, ela
correria para as colinas, sabendo o quão profunda sua loucura por
ela corria em suas veias. Que ele a estava observando desde o dia
em que ela recebeu alta do hospital. Uma sensação incômoda o
estava deixando inquieto, lembrando-o de que ele estava sendo
desonesto, mesmo que ele pedisse a ela para confiar nele. Ele era
egoísta e cruel o suficiente para mantê-la no escuro. Ela estava
ligada a ele, e ele nunca a deixaria ir. Ele a queria só para ele.
Ela o olhou com curiosidade, como se tentasse descobrir se ele
estava mentindo ou não, mas ficou quieta e não insistiu.
— Você ficava desconfortável por eu estar seguindo você?
Eu ainda estou.
— No começo — ela começou —, eu estava com medo e isso me
assustava, mas… — sua voz sumiu.
Curioso, ele perguntou:
— Mas?
Ela deu um sorriso tímido. Ele gostava de sua timidez também.
Era diferente da loucura nela.
— Mas então percebi que era você, e nós nos aproximamos... —
Suas bochechas ficaram rosadas e seus olhos brilharam. — Deixei
de me incomodar.
Ele a agarrou pela cintura e a puxou para ele, pressionando seu
peito nu contra suas costas.
— Você deveria ter muito medo de mim — ele ronronou,
inclinando-se e descansando o queixo na curva do pescoço dela.
Ela se contorceu contra ele como uma gatinha e riu como uma
adolescente. Animado, ele esfregou o cabelo do queixo na pele nua
e macia de seu pescoço.
— Isso faz cócegas — ela murmurou.
Ele fez um pouco mais. Ela tentou se soltar, mas ele a pressionou
contra o vidro, prendendo-a, pressionando as mãos nos lados
opostos da grade.
Inalando seu cheiro de terra, ele perguntou:
— Isso faz você ter medo do que eu faço para viver?
Ela parou de resistir em seus braços. Ele pensou que ela estava
se afastando novamente, mas relaxou quando as costas dela
caíram contra seu corpo.
— Você é perigoso — ela acusou. Então, depois de um segundo,
perguntou: — Por que você comete crimes?
Ele não respondeu.
— Qual a sua história?
Mais uma vez, ele permaneceu mudo.
— Zander — ela respirou.
Caralho. Ela precisava parar de dizer o nome dele assim, porque
seu pau se agitava, ganhando vida, e ele queria tomá-la direto
contra a varanda. Ela já estava dolorida. Ele já tinha transado com
ela duas vezes hoje. Sua bunda esfregou contra sua masculinidade
através do tecido, e ele segurou um gemido.
— Não tenho uma história — ele respondeu, sua respiração
pousando em seu pescoço, ainda segurando-a. — Não procure
maneiras de me humanizar buscando tragédia em mim, Passarinho.
Sou quem sou não por causa de um passado trágico. Este é o meu
modo de vida.
Ela suspirou.
— Mas, ainda assim, por que… Por que escolher essa vida de
violência?
Ele a olhou cautelosamente, de lado. Ela deixou o caso dele, ou
assim ela disse, mas ela ainda poderia estar usando um rastreador.
Afinal, ela era uma agente. Escolhendo cuidadosamente suas
palavras, ele respondeu:
— A vida da qual você fala, ninguém a escolhe, ela escolhe você.
Quando ela não respondeu, ele continuou:
— É um dever, passado por gerações. A maioria das pessoas
segue os passos de seus pais, e eu segui os meus.
Ele parou por um segundo antes de continuar:
— Fui criado por bons pais, Daniel Nikolaev e Natasha Nikolaeva.
— Ela congelou com a menção de sua família notória. — Uma
família monstruosa dá à luz filhos monstruosos. Meu pai nunca me
bateu ou abusou da minha mãe. Meu irmão mais novo, Dimitri, e eu
tivemos uma boa educação. Criado nos melhores internatos, fiz
academia de equitação, comi as melhores refeições, dormi em seda
e vivi no luxo, vivi uma vida privilegiada sem tragédia até… — Seus
lábios se curvaram novamente e, sem remorso, ele disse: — Se
você está procurando maneiras de me fazer sentir pelos outros, não
vai funcionar.
Ele sabia que ela estava tentando virar a cabeça para olhar para
ele, mas manteve o queixo enterrado na curva de seu pescoço.
— Porque eu nunca senti o tipo de dor que as pessoas normais
sentem.
Até que eu vi sua dor, ele terminou em silêncio. Eu senti então...
Ghislaine estava quieta como um rato.
— Você não quer deixar essa vida? — ela questionou.
— Não — ele respondeu sem perder o ritmo. — Você não pode
deixar essa vida. Tenho pessoas para proteger, minha família não se
limita apenas ao sangue. Há aqueles que me servem, que são leais
a mim. Não sou covarde e não dou as costas ao meu povo. A
Organização Bratva está em alta. Está mais rica. Você sabe o que
acontece se alguém tentar sair da Bratva?
Ghislaine parou de respirar.
— Dyshat — ele ordenou — Respira.
Ela obedeceu.
— Você morre.
Ela endureceu em seus braços.
— Uma vez que você entra, você está por toda a vida. Você sabe
demais e, se quiser sair, você é um fardo, mesmo se for o próprio
Pakhan — ele falou com cuidado, para não revelar sua posição na
Irmandade.
Ghislaine ficou em silêncio contra seu peito, e ele esperou que ela
dissesse alguma coisa.
— Quantos anos tinha o Pakhan quando entrou?
Ele sorriu com o fato de que ela o pegou e falou da mesma
maneira.
— Ele foi iniciado aos quinze anos.
Ela assobiou um suspiro.
— Isso é triste! Ele era apenas uma criança.
Alexander esfregou o queixo contra seu pescoço novamente e ela
se contorceu. Ele deu um beijo suave em sua veia pulsante,
querendo afundar os dentes nela.
— Um menino de quinze anos criado na Irmandade Bratva viu
demais para ser chamado de criança. Você perde sua inocência em
uma idade jovem. As jovens princesas da máfia estão protegidas,
mas os meninos... — sua voz sumiu. Uma memória vívida brilhou
dele de pé em uma poça de sangue. Exalando, ele continuou: —
Eles são treinados para serem assassinos. Ninguém protege os
meninos... Eles aprendem a se proteger. Quando ele tinha cinco
anos, testemunhou sua primeira morte por seu pai.
Ghislaine respirou fundo.
— Seu pai arrancou um olho de um homem e jogou com ele —
um sorriso divertido encheu seu rosto — Ao longo dos anos, ele se
tornou imune a isso. Ficava excitado. — Seus olhos se iluminaram.
— O sangue, o sangue derramado, a mesma coisa que as pessoas
chamam de ‘perturbado e violento’, ele chamava de liderança e
proteção. Ele adorou tudo isso. É quem ele nasceu para ser.
Ghislaine ficou em silêncio mais uma vez, e mal se movia. Ele se
perguntou se ela iria deixá-lo novamente. Franzindo a testa,
perguntou se deveria ter falado.
— Eu não sou seu príncipe encantado, zolotaya moya — De
Ouro. — E não sou seu cavaleiro quebrado em armadura brilhante
também.
— Isso não é verdade — ela protestou. Ele gostou de ouvir isso.
— Seu nome, Alexander, significa Defensor, sabe? Você me ajudou
naquela noite. Quem disse que você não é um cavaleiro?
Seus lábios formaram um sorriso. Apenas escapou desta vez
antes que ele pudesse detê-lo. Ele estava sorrindo muito perto dela,
coisas que ele havia descartado como ridículas antes.
Em vez disso, ele mudou de assunto.
— O que significa seu nome, Ghislaine? — perguntou,
saboreando o nome dela em sua língua. Era único, étnico e
adorável como ela. Ele já sabia a resposta. Suas habilidades de
pesquisa eram excelentes. Talvez o FBI devesse recrutá-lo.
— É marroquino, para Gazela — ela respondeu suavemente.
— Conte-me sua história agora.
Ela suspirou contra ele antes de se virar em seus braços e
descansar a testa contra a dele. Suas respirações fracas e suaves
caíram em seu rosto, e ele a respirou.
— Você já conhece minha história.
— Fale algo que não sei.
— Fui criada por minhas tias cristãs e meus pais faleceram
quando eu era jovem. — Eu sei. — Então, conheci Driss.
— Fale-me sobre o seu marido.
Escapou antes que ele pudesse pensar sobre isso.
Ela se afastou um pouco e olhou, estupefata.
— Você não fica com ciúmes quando eu falo sobre ele?
Fico. Isso me queima vivo.
— Disse que não fugiria da sua dor — ele respondeu em vez
disso. — Ele era uma parte do seu passado. — Sua mandíbula
apertou. — E quero saber tudo sobre você. Suas falhas, suas
fraquezas, tudo.
Seus olhos brilhantes encontraram os dele.
— Eu tinha apenas vinte anos quando o conheci — ela
respondeu, olhando para o chão da varanda. — Ele era o diretor do
FBI. — Um pequeno sorriso saiu de seus lábios, e ela olhou para
cima.
Ele reprimiu a fúria que corria em suas veias por ela sorrindo para
um homem morto. Caralho, ela é minha agora. Engolindo sua ira,
ele esperou que ela continuasse.
Ela torceu o narizinho.
— Eu o odiava no começo, mas depois ele cresceu no meu
conceito. Começamos a namorar e nos casamos em menos de um
ano. Parecia... o destino. Isso já aconteceu com você? Você
conhecer alguém do nada, e parecer que é para ser?
Ele passou a língua pelos dentes e não falou.
— Tive Noura, e então... — ela engoliu em seco, e sua garganta
esbelta balançou. — Tivemos um acidente de carro.
Estreitando os olhos, ele perguntou:
— O que aconteceu naquele dia?
Seu rosto enrugou como se ela estivesse lutando para pensar.
— Não me lembro — ela exalou. — Tudo está em branco na
minha cabeça. O médico disse que tenho amnésia seletiva. Talvez
minha mente queira me proteger do trauma. Eles disseram que
poderia voltar para mim um dia, mas, até agora, não voltou. — Ela
parou de falar, e ele queria que ela voltasse para ele.
— Diga-me uma coisa... — ele começou, com as sobrancelhas
franzidas, e ela esperou que ele continuasse — Quando Noura te
abraçou naquela noite... Por que você não a abraçou de volta?
Ela congelou como se ele tivesse captado a verdade.
Ah. Então eu estava certo.
Ela suspirou e tentou se afastar, mas ele agarrou sua cintura,
mantendo-a no lugar. Ele se lembrou das mãos congeladas de
Ghislaine.
— Fale comigo. Eu não julgo — ele insistiu, inclinando-se e
esfregando o nariz contra o dela. Bem, ele deveria ser a última
pessoa a julgar alguém, de qualquer maneira.
— É difícil — confessou. Seus olhos de outono escureceram, e
ela exalou lentamente, desviando o olhar. — Amo Noura. Eu quero...
— Estreitando os olhos, ele esperou que ela terminasse. — Mas e-
ela é muito mais velha do que quero que ela seja — sua voz falhou
—, quero abraçá-la — seus olhos desesperados encontraram os
dele — mas ela não se encaixa mais em meus braços como se não
fosse… mais minha filha. Não estava aqui para criá-la. Ela se sente
mais filha das minhas tias do que minha. Às vezes, sinto que estou
presa no passado.
— Por que suas tias a criaram, e não a família de seu marido? —
Ele sabia essa resposta também, mas queria ouvir os detalhes de
sua vida de sua boquinha.
— A família de Driss não mora nos Estados Unidos. Eles estão
em Marrocos. Minhas tias são meus únicos parentes vivos. O
tribunal reverteu a custódia para mim… Mas não me sinto como a
mãe dela.
Depois de um tempo, ele respondeu:
— Vai levar tempo, mas ela ama você mais do que suas tias.
Quando ela te vê, seu mundo inteiro está em seus olhos. Quando a
conheci pela primeira vez — seus lábios se esticaram em um sorriso
divertido —, tudo o que ela conseguia falar era sobre sua mãe.
Uma lágrima rolou pelo rosto de Ghislaine, e ele se inclinou e a
lambeu. Ela fez uma careta e estendeu a mão para enxugar a
bochecha molhada.
— Lambedor de rosto — ela gritou antes de rir.
Ele era ladrão de beijos antes. Poderia também adicionar o novo
apelido à lista.
— Você gosta disso — ele cantarolou. — E você adora quando
sou um lambedor de bocetas também.
A pele dela ficou vermelha como um tomate, e isso só o
estimulou. Seus olhos caíram de seus olhos assustados para sua
boca sorridente, então de volta para seus olhos. Os mesmos que
brilhavam agora.
— Seus olhos não estão mais tristes.
Ghislaine abriu a boquinha, provavelmente para repreendê-lo para
não chamá-la mais assim, mas ele continuou, olhando
profundamente para eles.
— Não estou chamando você assim, apenas observando. Eles
têm aquele brilho que você pode ter perdido uma vez. — Ela fechou
os olhos, provavelmente querendo calar suas palavras. — Olha para
mim — ele comandou, alcançando atrás de sua nuca e inclinando
sua cabeça para cima. Isso a forçou a abrir os olhos. Quando ela o
fez, ele afrouxou o aperto em seu couro cabeludo e o apoiou na
parte de trás de seu cabelo. Ele olhou fixamente em seus olhos
castanhos. — Antes, eles eram quase sem alma. Agora, eles têm
alma.
— Para... — Ela ferveu — Não fale.
Passarinho jogou punhais nos olhos dela, e ele apenas continuou
a olhar.
— Eles ficam mais calmos. — Seus olhos estavam em chamas
agora, e isso só o estimulou. — Eles mudam quando você sorri para
mim. Quando você ri comigo — ele sussurrou. — Eles sentem
agora.
— Você está pensando demais — ela protestou, tentando
descartar seus comentários. — E... nós somos... — sua voz sumiu.
— Nós somos o quê, Passarinho? — ele perguntou em uma voz
tão baixa.
Transa? Foda? Ficante?
Ela calmamente disse:
— Você nunca me disse o que eu sou para você.
Ele não respondeu a ela antes e não respondeu a ela agora.
— Você está com medo — ele se inclinou e sussurrou contra seus
lábios. Ela ficou permanentemente imóvel em seus braços. — Você
tem medo do que eu te faço sentir. Isso não é luxúria. Isso não é
mais foda — ele admitiu, e sua própria revelação o surpreendeu. Ele
ficou fixo nos olhos dela o tempo todo em que falou. — Nós
cruzamos os limites desses desejos… E você sabe disso.
Ghislaine ficou em silêncio em seus braços, mas, então, ela falou:
— Por que eu, Alexander? — ela sussurrou, derrotada. — Você
nunca respondeu minha pergunta. Por que se envolver com uma
mulher com bagagem como a minha?
A resposta estava na ponta da língua, mas ele a segurou e
engoliu com o resto de suas emoções, empurrando-as de volta para
dentro. Ele soltou seu aperto do seu couro cabeludo e a envolveu
mais perto dele.
Ghislaine suspirou e sua cabeça caiu em seu peito nu. Seus
dedos finos se curvaram e descansaram nele antes que ela
fechasse os olhos. Alexander olhou para cima, ainda segurando-a, e
fitou o céu estrelado da noite.
GHISLAINE

23

— VOCÊ ESTÁ PRESO por posse ilegal de ópio. Você tem o


direito de ficar em silêncio... — eu li os direitos do drogado antes de
algemá-lo e levá-lo para o meu carro.
Estava fazendo trabalho de campo hoje.
Agora que Cyrus não estava mais por perto, não estava mais
presa ao escritório corporativo. Alisei meu jeans preto, sorrindo
agora que estava confortável. Não havia mais saias. Fui até a
delegacia local para entregar o drogado.
Depois de explicar os detalhes aos policiais na delegacia, saí.
Meu celular vibrou, o peguei no bolso de trás e olhei para a tela.
Franzindo as sobrancelhas, me perguntei por que a pré-escola de
Noura estava me ligando.
— Alô — respondi. — Ghislaine Khalil falando.
— Oi, Sra. Khalil — uma voz feminina soou na outra linha. —
Como você está hoje? Sou a professora de Noura, Sra. Hernandez.
— Estou bem, como você está? — perguntei educadamente.
— Estou ótima. Obrigada por perguntar.
Destranquei meu carro e sentei no banco do motorista.
— Algo aconteceu? — Meu pulso disparou. — Noura está bem?
— Ah, não é nada disso. Noura está perfeitamente segura —
depois de uma pausa, ela continuou: — A aula terminou, e,
normalmente, a avó de Noura, Sabrina, vem buscá-la, mas há um
homem aqui. — Um homem? Antes que eu pudesse fazer qualquer
pergunta, ela continuou: — Ele mencionou o nome dele, mas não
está listado no formulário de liberação. Queria confirmar com você
se podemos deixá-la ir com ele? A avó de Noura ainda não está
aqui.
Tamborilei meus dedos no meu volante.
— Qual o nome dele?
— Ele mencionou que seu nome é Alexander.
Ahh... Que diabos ele estava fazendo lá?
Suspirando, minha mente se encheu de um milhão de perguntas
antes de falar ao telefone.
— Estarei aí em dez minutos.
Coloquei meu carro em movimento. Mordendo o lábio, fui em
direção à escola de Noura. Não era muito longe, já que não estava
trabalhando na cidade hoje. Pensei em ligar para ele, mas queria
estrangulá-lo pessoalmente. A viagem foi silenciosa, enquanto meus
pensamentos dispersos tentavam se concentrar. Ele ainda não tinha
rotulado oficialmente o que éramos, e estávamos dormindo juntos
por um mês e meio agora. Às vezes, os rótulos eram ruins, mas, em
relacionamentos íntimos, eram necessários. Eu precisava definir o
que éramos.
Era sua amante?
Sua namorada?
Sua acompanhante?
Quase gargalhei com o último pensamento. Ele nunca esclareceu
que era monogâmico comigo, e nunca perguntei a ele. Vou colocar
na minha lista mental para perguntar.
Quando cheguei à pré-escola de um andar, não havia
estacionamento ao meu redor. Era um pequeno prédio de tijolos, e
não tão cheio. Deixei o pisca ligado e deixei meu distintivo perto do
para-brisa, caso um policial tentasse me multar. Levando minhas
chaves comigo, entrei no local.
Na recepção, vi um blazer preto familiar. Os punhos eram de um
roxo profundo. Gostava de seu traje formal. Ele se apegava às cores
neutras, mas gostava de roxo e bordô. Eu não pude deixar de sorrir.
Inclinei-me e alisei meu cabelo para trás. Deveria ter verificado
como eu estava antes de sair do carro.
Meu batom estava desbotado agora? Eu tinha batom nos dentes?
Mortificada, esperava que não. Era uma mulher crescida, mas,
agora, eu era como uma adolescente idiota tentando apaziguar sua
paixão.
O que havia de errado com as mulheres quando estavam
apaixonadas?
Assustada, parei em minha caminhada.
Que diabos acabei de pensar? Antes de parar para me
repreender e contemplar o pensamento, notei Alexander inclinado
sobre a mesa da recepcionista.
Ela estava rindo de algo que ele disse. Perdi meu sorriso, e a fúria
correu por minhas veias. A dor passou pela minha alma.
Ele estava flertando com outras mulheres?
Meu! Queria gritar.
Ele nunca disse que éramos exclusivos, mas doía mesmo assim.
Alexander se virou.
A campainha da porta deve tê-lo alertado.
Seus olhos negros encontraram os meus antes de seguirem
minha roupa habitual, antes de descansarem no meu rosto
novamente. Ele deu um de seus sorrisos familiares. Não um sorriso
pequeno, mas um completo desta vez. Quando sorria, sua beleza
mortalmente gelada tornava-se divina.
Sua aparência russa se destacava. Seus olhos brilharam, e ele se
moveu em minha direção, embora a recepcionista ainda estivesse
falando com ele. Foi meio rude da parte dele, mas meu coração se
encheu de esperança de que ela não era a pessoa que ele
realmente queria.
Era eu. Seu olhar dizia tudo.
Iria questioná-lo sobre o flerte mais tarde, mas eu era sua única
atenção agora. Peguei o rosto irritado da recepcionista de cabelos
castanhos quando ela me recebeu. Bufando, ela desviou o olhar e
começou a digitar asperamente em sua mesa. Enquanto digitava,
cada toque no teclado soava mais forte que o outro. Ela não parecia
tão feliz, e eu não queria me sentir tão presunçosa sobre isso, mas
senti.
Ele era meu.
E eu era... dele.
— Passarinho — ele murmurou.
Meu coração acelerou novamente. Eu o encontrei ontem, mas já
sentia falta dele. Desejei que as borboletas no meu estômago
parassem de vibrar. Elas não pertenciam lá.
Limpei a garganta e recuperei a compostura.
— O que você está fazendo aqui? — questionei.
— Jander! — uma voz gritou por trás.
Bem na hora, Noura saiu correndo da porta atrás da recepcionista
e agarrou a perna de Alexander. Tentei não ficar chateada por ela
ter ido até ele em vez de mim.
— Bem, olá para você também — murmurei baixinho.
Alexander olhou para cima, e seu lábio se contraiu, obviamente
pegando meu tom machucado. Resisti ao desejo de enfiar minha
maldita língua nele. Ele era tão malditamente arrogante.
— Bebê Sol — disse ele, abaixando-se e pegando-a.
Ela riu e começou a falar com ele. Ela usava um de seus lindos
vestidos. Eu adorava vesti-la de manhã. Ela era uma boneca. Minha
boneca.
Inclinei a cabeça e olhei para eles.
Não prestei atenção na conversa. Era tão fácil para ele segurá-la,
e então havia eu... Isso só me lembrou do meu fracasso e que eu
era uma mãe terrível.
Desde que acordei do coma, apenas abracei minha filha no
hospital, sem jeito. Eu me perguntava se ela já havia notado. Ele era
perfeito com ela e a fazia feliz.
As crianças eram assim. Dê-lhes um sorriso ou uma conversa do
jeito delas, e se apegavam muito rápido e com muita força. De certa
forma, as mulheres também eram assim.
Acho que nunca superamos a infância.
Meu coração doía, porque não sabia se Alexander estava
planejando ficar por aqui. Não sabia se duraríamos.
E se ela se acostumasse com a presença dele e ele
desaparecesse? Ele nunca deixou claro, embora tenha mencionado
que era mais do que apenas transa, mas quanto... mais?
Afastando meus pensamentos, concentrei-me neles.
— Prometi a você que viria buscá-la na escola — disse Alexander,
sorrindo para minha filha.
Gostaria de poder desviar o olhar da quantidade de afeto na
minha frente. Queria que isso parasse. Queria dizer a ele para ir
embora, que ele não era o pai dela, e nem discutimos nosso
relacionamento — qualquer que seja — ou o dele com Noura. Mas
então olhei para minha filha. Seus lindos olhos castanhos estavam
iluminados, e ela estava rindo. Estava alegre, e eu odiaria tirar esse
momento dela... Então cedi e mantive minha boca fechada.
— Obrigada — disse Noura, com os olhos brilhando, brilhantes
como o sol. Inclinando-se, ela beijou Alexander na bochecha.
Assustado, ele se virou para olhar para mim.
Agora, essa era uma expressão que não se via todos os dias
nesse líder russo. Tentei esconder um sorriso, mas ele se soltou no
meu rosto. Perguntei-me se aquele era seu primeiro beijo de uma
criança? Ele era bom com crianças, ou talvez fosse bom apenas
com a minha. Ele parecia mais do tipo que achava as crianças um
incômodo.
— Eu não xinto mais ixu — respondeu Noura alegremente.
Meus olhos voaram para ela, e eu parei de sorrir.
Olhos tristes. Minha filha também era Olhos Tristes.
Por que ela nunca me contou?
Mas, novamente, estava sempre trabalhando. Nunca tinha tempo
para ela... ou achava tempo para ela. Sabia que às vezes tentava
evitá-la como se ela fosse uma praga.
Atrás de mim, a porta soou, e olhei para trás.
Tia Sabrina ficou parada ali como um cervo apanhado pelos faróis
enquanto observava a visão. Seu rosto ficou vermelho quando notou
o Pakhan, e seus olhos se concentraram em Noura, que estava em
seus braços.
De boca aberta, ela olhou antes de encontrar meus olhos. Apenas
pisquei e tentei não revelar nada.
— Vovó! — Noura gritou quando a notou.
Alexander a colocou no chão, e ela foi correndo até tia Sabrina,
envolvendo-a em um abraço. Eu ainda estava ofendida por não ter
recebido um abraço dela.
— Precisamos conversar — disse tia Sabrina, atirando laser
através de seus olhos para mim. Conseguimos. Eu não sabia
quando, mas em breve…
A última vez que Alexander apareceu na minha porta, evitei suas
perguntas e apenas disse que estava trabalhando em um caso.
Menti. Abandonei o caso de Alexander há muito tempo.
Apenas assenti antes que ela pegasse a mãozinha de Noura e a
levasse embora. Minha filha olhou para trás e acenou para mim,
então seu olhar foi para Alexander, demorando-se nele. Era tão
esperançoso que doeu.
Agora, apenas uma princesa estava ali com seu cavaleiro.
Seu lábio se curvou novamente, e ele se moveu em minha
direção quando encontrei seus olhos. Ele parou quando passou por
mim, olhando fixamente. Gostaria que ele não me fodesse tão
facilmente.
Meu batimento cardíaco disparava toda vez, e eu queria pular
nele, mas estávamos em um lugar público. Quase quis rir. Isso
nunca nos parou antes. Ele saiu pela porta, e, aproveitando a deixa
para segui-lo, eu saí. Ele ficou lá, esperando por mim.
Fiquei ao seu lado, olhando para frente.
— Você não deveria fazer isso — disse finalmente.
— Fazer o quê? — ele questionou.
Seu olhar queimou no lado do meu rosto, mas eu não me virei
para olhar para ele. Segurando um suspiro, apertei minhas mãos
quentes na minha frente e soltei um suspiro no ar gelado. Iria nevar
em breve. O outono foi embora.
— Dar esperança a Noura — disse suavemente.
Alexander ficou quieto. Muito quieto. Seu corpo estava tenso, e
ele se endireitou. Depois de um tempo, ele respondeu:
— Eu estava apenas cumprindo minha promessa a ela.
Virei minha cabeça para ele, finalmente encontrando seus olhos.
Aqueles abismos negros olhavam diretamente para mim.
Às vezes, esquecia o que estava dizendo quando ele
simplesmente olhava para mim. Seu olhar era onisciente e
poderoso. Com um único olhar, ele me manteve cativa.
— Ela não tem pai — falei claramente. — Se você estiver muito
perto dela, ela vai pensar em você como um.
Sem esperar por sua resposta, fui em direção ao meu carro para
retornar ao meu trabalho de campo. Eu só dei três passos antes de
uma mão forte puxar meu braço, me trazendo para trás.
Meu ombro pousou em seu peito, mas não olhei para cima. Minha
respiração estava presa na minha garganta, e eu não queria que ele
visse meus olhos, que revelariam algo para ele. Inalei seu cheiro
familiar. O que gostava.
— E o que há de tão errado se ela pensar em mim como seu pai?
Pisquei, com medo de tê-lo ouvido mal.
Orei a Deus para que estivesse alucinando novamente.
Não queria acreditar nele, e esperava que ele estivesse
brincando.
Pelo tom em sua voz, ele parecia muito sério.
Lentamente, meus olhos se ergueram e encontraram os dele.
Um desafio me encontrou.
Parei o olhar e fitei o chão.
— Ela não é outro desafio que você pode vencer — disse,
balançando a cabeça. — Ela é uma garotinha que perdeu o pai...
Você precisa ficar longe dela.
Um rosnado baixo saiu dele, e eu mordi minha bochecha
internamente, me perguntando se eu havia provocado o Alfa.
Noura era minha filha. Não dele.
Ele se inclinou para perto, até que seus lábios macios roçaram
minha bochecha. Fechei os olhos com o impacto.
— Você esqueceu que você é minha? — Ainda não abri os olhos.
— Isso significa que tudo sobre você é meu também. O que é seu, é
meu.
Ele parecia possessivo como o inferno, mas havia algo mais em
sua voz.
Proteção.
Abri os olhos e olhei para ele.
Ele estava tão perto, eu podia ver os pequenos poros em sua pele
pálida.
Não queria pensar muito sobre isso, então mudei de assunto:
— Por que você estava flertando com a recepcionista?
O ciúme escapou da minha voz. Seus olhos se encheram de
prazer, e eu tentei não revirar os olhos.
— Não estava — ele corrigiu. — Ela estava flertando comigo.
Arqueei uma sobrancelha.
— Existe alguma diferença?
Alexander se inclinou e esfregou seu nariz contra o meu. Eu não
podia deixar de adorar quando ele fazia isso todas as vezes.
Adorar? O que eu estava pensando de novo?
— Por que você está brigando comigo, hein, Ghislaine? — ele
sussurrou, sua respiração caindo em meus lábios. Meu corpo
sempre formigava quando ele falava meu nome. — Eu não a quero.
Meus olhos são apenas para... você — ele admitiu.
Meus olhos esperançosos brilharam.
— Não durmo com outras mulheres desde que te beijei.
Eu brinquei:
— A primeira vez ou a segunda?
Ele sorriu descaradamente, e eu queria me inclinar e morder seu
lábio.
— A segunda — ele admitiu.
Meu coração disparou no céu.
— Por quê? — sussurrei, fechando meus olhos.
Ele se inclinou e deu um beijo suave no meu queixo.
— Porque ninguém mais se compara.
Eu ainda não abri meus olhos, porque meu coração, uma vez
morto, estava muito cheio agora. Acordado. Não sabia quando havia
renascido, mas não parava de bater. Corria para ele. Eu desejei que
ele admitisse isso, mas, quando fazia, gostaria de não ouvi-lo.
Reconhecer tornava tudo tão real.
Meus olhos ainda estavam fechados quando seus passos se
afastaram de mim. Alguns momentos depois, abri meus olhos e
Alexander se foi. Ele me deixou uma bagunça e desapareceu.
GHISLAINE

24

UMA SEMANA HAVIA se passado desde que Alexander visitara


Noura na escola.
Desde que ele revelou o quão sério ele estava a meu respeito.
Era meu dia de folga e eu tinha aparecido em sua cobertura.
Vestindo uma de suas camisas, saí do quarto para beber água.
Olhei por cima do ombro, dando uma espiada. Alexander estava
enviando mensagens de texto em seu telefone, sem camisa e com
calça de moletom preta. Gostei que ele tirou sua roupa formal. Olhei
para as tatuagens pretas e azul-marinho em sua pele clara,
vislumbrando uma adaga e um homem a cavalo.
Um cavaleiro.
Um Defensor.
Eu sorri.
Elas não doeram? Eram tão ousadas. A tinta escura ia dos
ombros até o pulso. Ele tinha uma tatuagem-manga em um de seus
braços. Sob aquele olhar de cavalheiro que ele carregava com
blazers e calças formais, ele era todo fogo e cinzas.
Quando terminei de beber, sorri e fui na ponta dos pés para o
quarto. Talvez eu o pegasse desprevenido e o assustasse. Isso
seria divertido, esgueirar-se e persegui-lo pelo menos uma vez.
Cobri minha boca antes que uma risadinha saísse. Parei na parede
e olhei pela porta. Ele estava sentado em sua cama de costas para
mim, falando ao telefone. Podia ver seu reflexo no contorno da
janela da sacada. Sua cabeça estava baixa, então ele não me viu à
espreita atrás. Sorri, e estava prestes a me aproximar dele, mas
então ele falou com uma voz clara:
— Mate-os.
Fiz uma pausa...

Olhei para meu marido, Driss.


Estávamos vigiando novamente no carro, escondidos nas
sombras da noite. Durante o trabalho de campo, observamos nosso
caso entrando e saindo, procurando qualquer tipo de pista. Era no
meio da noite, quase duas da manhã.
Um tiro foi disparado dentro do armazém.
— Alguém atirou — ele confirmou em sua voz profunda.
Mais tiros no armazém.
Os homens de guarda do lado de fora deixaram seus postos e
correram para dentro.
— Fique no carro, Ghislaine — ele avisou, antes de abrir a porta
do carro. — Vou checar.
Desobedeci e saí.
Ele estreitou os olhos.
— Te dei uma ordem.
Mordendo o lábio, eu disse, depois de um segundo:
— Eu não vou deixar você ir sozinho.
— Eu lhe dei um comando como seu chefe, o diretor de
investigação do Federal Bureau. — Sua voz tinha um tom agora, o
que significava que ele estava chateado.
Enruguei meu nariz.
— Eu sou sua esposa em primeiro lugar, senhor. Estamos juntos
nessa, lembra? — eu disse, balançando as sobrancelhas de
brincadeira.
Driss deu um olhar letal, e eu queria me encolher diante dele. Ao
mesmo tempo, me perguntava: para quem ele achava que estava
dando aquele olhar?
— Deus sabe o que eu estava pensando, arrumando uma esposa
no FBI — disse ele baixinho.
— Não vou deixar você sozinho. Vamos investigar juntos, ok?
Ele parecia querer discordar.
— Tudo bem — disse ele em tom aborrecido. — Lembre-me de
falar com suas tias novamente sobre por que sua sobrinha é tão
teimosa. — Um sorriso brincou em seus lábios, afeição saindo
deles.
— Você me ama — protestei, pegando minha Glock 9M.
— Infelizmente — ele brincou, dando um de seus sorrisos
vitoriosos.
Fiquei lado a lado com ele.
— Você não acha que devemos chamar reforços? — questionei.
— Preciso investigar e confirmar o que exatamente aconteceu
antes de fazer isso — respondeu ele. — Não sei quem disparou e
por quê. — Ele olhou para mim. — Se não for nada, nossa operação
estará estragada, eles saberão que estamos atrás deles e mudarão
o local do armazém. A menos que seja necessário, não atire e não
deixe que eles te vejam.
Ele se moveu e puxou sua arma.
A porta do armazém estava aberta e entramos. Andando vários
metros e usando paredes para nos esconder, a visão quase me
deixou perplexa.
Mulheres. Muitas e muitas mulheres estavam empacotando
saquinhos com pó branco. Cocaína. Essas eram as mulas?
Procurei, estreitando meus olhos na fonte do disparo. Meus olhos
caíram sobre duas mulheres com tiros na barriga, deitadas em uma
poça de sangue no chão.
O que elas fizeram para merecer tal destino?
A fúria se agitou dentro de mim, e meu lábio se curvou em
desgosto.
— Isso é o que acontece com as vadias que não ouvem — disse
um dos homens. Eu me encolhi involuntariamente, e meus olhos
caíram sobre ele. Ele vestia uma camisa preta e calça jeans preta.
Não o reconheci. Vinte outros soldados russos o cercavam.
Eles mataram duas mulheres, e isso era evidência suficiente para
levá-los. Além disso, havia uma grande quantidade de drogas ilegais
na nossa frente. Olhei para Driss, e ele me encarou duramente
antes de voltar sua atenção para os homens. Precisávamos
derrubar o comércio de sexo e drogas. Depois de um segundo, ele
olhou para mim e apontou para a porta.
Olhando para eles, eu me virei.
Driss e eu demos cinco passos até que meu pé pisou em uma
haste de metal no chão. O barulho vibrou através de mim, e eu
congelei. Olhei para Driss, que sequer olhou para os homens.
— Corre — ele comandou baixinho.
Acabamos de dar mais cinco passos quando uma bala passou por
nós.
Eles nos ouviram.
— Quem diabos era aquele? — uma voz gritou.
Segurando a respiração, usamos as paredes para nos esconder.
— Eles têm armas! Policiais! — uma voz gritou.
Driss e eu corremos para a entrada, e ele atirou de volta contra os
homens, derrubando dois. Havia muitos atrás de nós.
Um mafioso já estava gritando ao telefone:
— Temos um problema. Duas testemunhas. É Driss Khalil e sua
esposa.
Insultada, queria dar um tapa na cabeça desse homem. Eu
também tinha um nome.
Com quem ele estava falando, afinal?
— Espera! Não consigo te ouvir, chefe. Há muito barulho ao redor.
Estou colocando você no viva-voz.
Um momento depois, alguém falou:
— Mate-os.
Uma voz profunda, suave e masculina.
— Torne seus rostos irreconhecíveis.
Aquela voz.
Era tão fria e determinada, que enviou arrepios na minha espinha.
Olhei para trás e derrubei o homem mais próximo perto de mim.
Olhei para Driss enquanto corríamos. Eu não queria meus olhos
longe dele. Quando chegamos lá fora, corremos em direção ao
nosso SUV. Driss ligou o motor e pisou fundo no acelerador. Seu
cinto de segurança veio em seguida. Fiquei sem fôlego e ofegante.
Driss ligou a sirene imediatamente. Olhei para trás e vi quatro SUVs
nos seguindo.
Testemunhamos um crime, e havia apenas dois de nós. Não
importava quem éramos, eles não nos deixavam fora de vista. Com
a adrenalina correndo em minhas veias, abri a janela do carro, e o
vento cortou minha pele. Mirei e atirei nos pneus do carro atrás de
mim.
Ele parou bruscamente antes de arremessar para a esquerda e
bater na calçada. Soltando um suspiro, apontei para outro carro
atrás de nós, mas uma bala passou por mim novamente. Eu me
esquivei e deslizei de volta para dentro. Olhei no espelho retrovisor,
e as três grandes vans restantes que estavam dirigindo a uma
velocidade infinita uma ao lado da outra atiraram em nosso carro à
prova de balas. Não consegui uma visão clara dos homens.
— Chame reforços — Driss ordenou, olhando no espelho
retrovisor.
Peguei meu celular, e outra bala passou.
Liguei para a sede do FBI, mas ninguém atendeu. Notei a hora.
Duas e meia. Todo mundo estava em casa agora, e não no
escritório corporativo.
— Deixe-me ligar para Cyrus — murmurei baixinho.
Tocou algumas vezes.
Novamente, nenhuma resposta.
Por que diabos ninguém estava atendendo?
Mais balas chiaram atrás de nós, e agora estavam se
aproximando. Pulei quando uma bala atingiu a parte de trás do
porta-malas antes de disparar mais baixo. Um sentimento de
afundamento se instalou em meu coração de que eles estavam
mirando nos pneus.
— Nenhuma resposta — me virei freneticamente para Driss, que
continuou dirigindo. — Deixe-me ligar para Miran ou 911.
— Não. Levará muito tempo para eles virem agora — Driss
ordenou, olhando no espelho retrovisor. — Mire fora da janela e
atire nesses filhos da puta. Precisamos nos distanciar deles.
Olhando para ele, me virei para a janela, achei uma chance e
atirei novamente no carro, atingindo o para-brisa. Atirei novamente
no banco do motorista, o sangue espirrou para dentro e caiu no
para-brisa.
Morto, eu esperava. O carro no meio saiu dos trilhos da estrada e
foi arremessado para os lados, capotando. Ele também bloqueou o
carro à sua direita. Esse também caiu e tombou.
Nada mal. Três fora. Falta apenas mais um.
O carro mudou para o meio da estrada agora.
Satisfeita, sorri, percebendo que poderíamos conseguir.
Tínhamos munição extra e nosso carro era à prova de balas.
Contanto que dirigíssemos rápido, poderíamos escapar e pedir
reforços quando estivéssemos em um local seguro. Meu sorriso
congelou quando meus ouvidos se animaram com as buzinas
soando lá fora. Voltei para dentro e olhei para frente, e meus olhos
caíram no bloqueio branco e vermelho a dez metros de nós.
Era um sinal vermelho de pare, e Driss estava com a sirene
ligada. Podíamos facilmente atravessar o sinal vermelho e os carros
parariam. Não importava, porque não era um carro, mas um trem.
Uma travessia ferroviária.
Não poderia parar mesmo se nós os avisássemos. Estava indo
rápido demais. Éramos os únicos carros no meio da noite. Nenhum
outro estava por perto.
Olhei para trás no SUV. Estava a menos de seis metros de nós.
Espiei pela janela novamente e tentei mirar, mas agora eles
estavam constantemente atirando balas em nós. Voltei para dentro
com um suspiro, mas os tiros não pararam. Precisava de uma
abertura para atirar neles, mas estávamos ficando sem tempo.
— Não consigo parar no semáforo — disse Driss, olhando para o
espelho retrovisor. — Eles estão bem atrás de nós. — Ele olhou
para o trem indo direto para o cruzamento. — Vou fazer uma
inversão de marcha e jogá-los fora dos trilhos. Levanta o vidro da
sua janela. Seus tiros não funcionam em nosso carro.
Assenti e fiz como ele ordenou.
Essa era a melhor ideia, em vez de pular na frente de um trem.
Olhei para trás de nós.
Restavam apenas dez metros.
Driss virou o volante, e eu olhei no espelho retrovisor. O SUV
atrás de nós ganhou velocidade e nos alcançou. Ele atingiu a parte
de trás, jogando-nos de cabeça no caminho do trem que chegava.
Gritei, mas não ouvi nada de Driss. Antes que eu pudesse olhar
para ele, o trem bateu na lateral.
Lado de Driss. O lado esquerdo, do motorista do carro.
Sufoquei um grito, e os olhos torturados de Driss encontraram os
meus antes que o trem se chocasse contra nós novamente e nos
arrastasse com ele. Sua boca explodiu em sangue, que derramou
em seu colete à prova de balas. Também era resistente a facadas,
mas não era uma facada de punhal.
Olhei, com repulsa, para um pedaço da porta que havia penetrado
em seu estômago. A força bruta disso tinha sido forte demais para
sua jaqueta.
Sangue. Tanto sangue.
Ele gemeu, desviando sua atenção para a frente, e apertou o
acelerador, talvez esperando que ainda pudéssemos escapar.
Estávamos presos, e as lágrimas rolaram pelo meu rosto. Estendi
a mão para segurar sua mão, mas o carro capotou. Meu grito ficou
preso na garganta quando minha cabeça e meu estômago bateram
no teto.
Grunhi antes de estender a mão para tocar a parte de trás da
minha cabeça. Uma percepção surpreendente me atingiu de que eu
não estava usando cinto de segurança, pois estava atirando pela
janela. Com minha mente girando em círculos, olhei para minha
mão coberta de sangue.
Um desconforto irrompeu no meu estômago, e gemi novamente.
Com uma visão sombria, me virei para olhar Driss.
Ele estava pendurado de cabeça para baixo?
Vi apenas vermelho através dos meus olhos. Onde ele estava?
— Driss... — Tossi sangue.
— Estou bem aqui — sua voz atormentada chegou até mim.
Ele deve ter capotado também. Quanto mais machucado ele
estava agora? Com minha visão turva, estendi a mão cegamente
para agarrá-lo. Uma mão grande e quente agarrou a minha e o
conteúdo encheu meu coração. O trem ainda estava arrastando
nosso carro antes de parar, mas eu temia que fosse tarde demais.
Eu não conseguia mais ver como Driss estava.
— D-Driss... — sussurrei.
— Eu estou aqui, meu bem.
Tossi sangue novamente. Tudo era um borrão. Fechei os olhos e
apertei a mão quente do meu marido com mais força.
— E-eu queria te dizer uma coisa... Não sei se terei a chance de
te dizer — engasguei. O sangue escorreu pela minha testa e caiu no
teto. Eu me enrolei em uma bola, meus membros e estômago
doendo. — Recebi os resultados do médico hoje... Estou grávida,
Driss. Vamos ter outro filho.
Minha visão estava ficando preta.
— Estou tão feliz em ouvir isso.
Um sorriso feliz se formou na minha boca sangrenta.
— Te amo — ele murmurou.
Minha visão se desvaneceu, mas me lembrei de suas últimas
palavras.
— Te amo desde o dia em que te vi...

Voltando à realidade, meu cérebro travou por um momento.


Minha testa latejava. Cada parte de mim parou enquanto meus
pensamentos me alcançavam. Queria negar a memória. Não podia
ser verdade. Não. Não. Não.
Era apenas minha mente fodida pregando peças em mim...
Certo?
Segurei a parede para me firmar enquanto me perdia em minhas
sombras. Lágrimas encheram meus olhos, e eu bati a mão em meus
lábios para abafar o choro. Mas era tarde demais. Um grito
traiçoeiro deixou meus lábios.
Alexander olhou para cima de seu telefone, encontrando meus
olhos no reflexo noturno da varanda.
Aqueles olhos de luar.
Devastadoramente lindos.
E lindamente fortes.
Ele olhava por cima do ombro.
Minha visão ficou turva e dei um passo para trás, balançando a
cabeça como uma lunática. Meu cabelo voando. A onda de choque
foi forte o suficiente para que eu tivesse que sufocá-la. Engoli,
queimou minha garganta entupida. Ele se levantou lentamente, mas
eu já estava recuando e correndo em direção ao elevador,
apertando o botão DESCER. A adrenalina corria pelo meu sangue,
querendo escapar.
Espiei por cima do ombro e Alexander estava na porta, com um
olhar perplexo. Quando a porta do elevador se abriu, pulei para
dentro. Ele se moveu em minha direção, correndo, seus olhos
procurando os meus. Ele ainda estava a alguns metros de mim.
Balancei minha cabeça descontroladamente, minha visão era uma
névoa vermelha agora.
— Seu assassino.
Minha alma rachou.
Ainda não queria que fosse verdade.
Ele fez uma pausa, seu corpo estava parado, como congelado no
tempo.
A dor passou por seus olhos.
Sua compostura quebrou, permitindo-me um vislumbre do homem
escondido nele pela primeira vez.
— Lembrei-me de tudo do acidente.
Meus olhos acusadores encontraram os dele.
A compreensão surgiu em seu rosto, e ele parecia um animal
ferido. Era verdade então, não importava o quanto eu quisesse
negar.
Apertei o botão do lobby repetidamente.
Os olhos de Alexander brilharam quando a porta do elevador
começou a se fechar. Ele correu em minha direção tão rápido, que
sua velocidade relâmpago me assustou. Eu me encolhi contra a
parede do elevador, vacilando. Não tinha minha arma ou meu
canivete comigo. Deixei no quarto.
Poderia me defender e lutaria se fosse preciso... Mas a angústia
substituiu meu coração. Não podia lutar bem.
Provavelmente perderia.
Meus olhos se encheram d’água, escorrendo livremente pelo meu
rosto.
— Foi você, Alexander.
A última coisa que vi foi sua mão quando a porta do elevador se
fechou em seu rosto.
Mate-os.
Essa era a voz dele.
A voz de Alexander Nikolaev.
O Tirano do Submundo.
Era o caso dele que meu marido e eu estávamos investigando.
Caí contra a parede do elevador enquanto descia. Escorregando
ao chão, minhas lágrimas mancharam a camisa com minha dor.
Quebrei tudo de novo.
Meu coração, que estava se consertando, se partiu... de novo.
Sangrava por toda parte, me engolindo e me sugando até secar.
Cicatrizes invisíveis que me feriram, reabriram. As que ninguém via.
Deixou minha alma crua como se não houvesse mais carne, apenas
ossos.
Ele estava certo o tempo todo.
Ele não era nenhum príncipe encantado.
Ele era um criminoso de sangue frio.
A tragédia nunca poderia tocá-lo.
Porque ele era a causa da minha.
Meu coração se partiu novamente, mas hoje minha alma também
se despedaçou.
Ele tinha destruído minha vida.
E não podia nem destruí-lo.
GHISLAINE

25

SAÍ CORRENDO DO elevador como uma louca.


Apenas vestindo sua camisa e minha calcinha, deixei minha
bolsa, arma e distintivo na cobertura. Não me importava mais.
Quando meus pés tocaram o chão do saguão, percebi que também
não tinha sapatos. Escondi meu rosto das pessoas que me
olhavam.
Alguns sussurraram enquanto eu passava correndo. Alguns
sussurros se tornaram rosnados. Eles estavam fofocando sobre
mim. Tudo de novo. Eles pensavam em mim como uma prostituta?
Eu não ficaria surpresa se o fizessem. Só usava uma camisa de
manga comprida. Minhas pernas estavam nuas, meu cabelo
desgrenhado, e eu parecia completamente fodida.
Sem saber se ele estava se aproximando de mim ou não, corri o
mais rápido que pude sem olhar para trás. Precisava sair dessa
maldita cidade. Eu pertencia ao maldito subúrbio, e não a um
arranha-céu chique. Era bom demais para ser verdade.
Eu deveria ter sido mais esperta. Minha visão ficou turva e
esbarrei nas pessoas. Esfregando os olhos com a mão, saí do
prédio. Meus pés quentes atingiram o chão de cimento duro, frio e
úmido da cidade de Nova York.
Estava nevando.
Não era mais outono.
O inverno estava aqui.
Olhei para as nuvens cinza-azuladas que pairavam sobre o céu.
O ar gelado cortou minha pele, e envolvi o corpo com os braços,
tentando me aquecer. Não havia muito que pudesse fazer pelos
meus pés. Os flocos pousaram na minha pele, derretendo.
Chamei um táxi.
Felizmente, alguém teve pena de mim e parou. Eu não era uma
mendiga sem-teto, embora parecesse uma agora. Só pagaria
quando chegasse em casa.
Felizmente, um táxi parou do outro lado da rua. O tráfego da
cidade ainda estava intenso, e corri para ele. Alguns carros pisaram
nos freios para evitar me atingir. Outros apenas buzinaram e alguns
motoristas me chamaram de ‘vadia estúpida’, mas os ignorei.
Rapidamente, abri a porta do táxi com os dedos congelados e dei ao
motorista a direção para minha casa. Batendo a porta, suspirei de
alívio. Um soluço ameaçou sair de mim, mas engoli. Eu me enrolei
como uma bola, e o motorista continuou me olhando pelo espelho
retrovisor.
— Você está bem, senhorita? — o homem de meia-idade
perguntou. Seus olhos caíram sobre minhas roupas pobres antes
que ele encontrasse meus olhos novamente. — Você está ferida?
Pelo menos ele perguntou o meu lado da história. Eu quase quis
rir. Alguém me destruiu, mas não do jeito que ele estava pensando.
Apenas balancei minha cabeça e funguei, esperando que ele
parasse de falar comigo. Ele parou, e eu fiquei feliz.
Olhei para minhas mãos trêmulas, cobertas de kohl e rímel. Em
seguida, me atrevi a olhar para fora da janela do carro, e vi quando
a porta do hotel se abriu.
Alexander.
Com a mandíbula tensa, seus olhos procuravam freneticamente
as ruas... Por mim, mas ele não podia me ver. Abaixei a cabeça
quando o táxi passou por ele, me escondendo de sua vista. Dei uma
última olhada nele. Alexander estava apenas de calça de moletom.
Suas tatuagens se destacavam em sua pele pálida, em contraste
com os nova-iorquinos em seus elegantes casacos de lã. Mas ele
usava chinelos. E então lá estava eu. Olhei para meus próprios pés
dormentes. Lágrimas escorriam pelo meu rosto, mas segurei meus
soluços. Choraria quando chegasse em casa.
Agora, eu só precisava ficar quieta.
Estive perseguindo uma ilusão o tempo todo.
Uma fantasia.
Havia negligenciado meus deveres de trabalho e até mesmo meu
papel de mãe por ele.
Cobri minha boca, abafando um grito que queria arrancar de mim.
Descansando minha cabeça contra o assento de couro quente, eu
me enrolei em uma bola, contando os segundos, finalmente estaria
em casa. A viagem foi longa e tranquila.
Fiquei olhando pela janela o tempo todo, piscando. A bile subiu
pela minha garganta, e a engoli. As lágrimas secaram no meu rosto,
e eu não tinha estendido a mão para enxugá-las também. Dias de
inverno, de tempestade e gelo haviam chegado.
A neve branca e pura caía mais pesada, me afogando com ela. A
nevasca lá fora era um branco total. Estava congelando, embora o
motorista tivesse aumentado a temperatura.
Como o gelo lá fora, meu coração estava congelado.
Sentei-me com os joelhos dobrados contra o peito, de frente para
a janela, como se fosse apenas uma criança perdida. Não pensei
mais nele. Parei de pensar e me concentrei na neve lá fora. Era
linda quando caía, mas feia quando alguém pisava nela.
Estendendo a mão para limpar o nariz, fechei os olhos brevemente,
esperando poder me acalmar para dormir. Mas o sono também
nunca veio.
Quando cheguei em casa, pedi ao motorista que esperasse, e eu
traria dinheiro para ele. Engolindo a respiração gelada, saí para a
nevasca como um zumbi irracional e de pés descalços.
Pensei que perder meu marido era a pior coisa que poderia ter
acontecido comigo, mas agora isso... Estava dormindo com o
assassino dele. Eu me forcei a continuar respirando e me movendo.
Apenas me concentrando em coisas pequenas, e não em coisas
maiores. Gostaria de ter comprado sapatos, mas não estava com
minha carteira. Tudo o que sabia era que eu tinha que voltar para
casa. Estava melhor na segurança e proteção de minha casa. A
liberdade tinha um preço alto.
Fui muito imprudente. Eu tinha estado tão alto nas nuvens com
ele... E agora, tinha caído forte e rápido. Ainda estava em espiral
sem como parar. Não havia fim para essa loucura.
Estremecendo toda vez que meus pés congelados pousavam na
neve, eu olhava para o manto branco diante de mim. Se estivesse
de melhor humor, teria odiado manchar a neve com meus passos. O
vento uivava ao meu redor e varria meu cabelo atrás do meu rosto.
Pequenos flocos caíram no meu cabelo uma vez seco, molhando-o.
O frio atravessou meu rosto, atingindo-o como pedras.
Enxugando o rosto, me perguntei como explicaria minha
aparência para minhas tias.
Quando entrei na minha varanda com meu corpo gelado igual a
um picolé, toquei a campainha duas vezes com meus dedos
trêmulos e gelados. Eles estavam ficando dormentes. Olhei para
trás para ver se estava sendo seguida, mas não vi ninguém. Meus
ouvidos se animaram quando a porta se abriu, e o ar quente e os
aromas da comida picante da minha tia me saudaram. Dei um
suspiro de alívio.
— Que diabos aconteceu com você? — Tia Sabrina gritou.
Eu me encolhi e desviei o olhar, olhando para o chão,
envergonhada demais para encontrar seus olhos.
— Gil... — sua voz doce sumiu antes de agarrar meus braços
rígidos e me puxar para dentro da casa e fechar a porta. Meus pés
cobertos de gelo pousaram no tapete quente e macio abaixo de
mim. Era reconfortante, mas não podia consertar minha alma. Podia
sentir cada centímetro de seu olhar ardente em meu corpo. — Você
foi... a-atacada, minha filha? — Odiava como sua voz tremia.
Uma lágrima rolou pelo meu rosto.
Meu coração e minha alma foram violados.
Minha confiança.
Balancei minha cabeça, mas não encontrei seus olhos.
— Oh... — ela suspirou de alívio — Isso é uma camisa de
homem? — Quando eu não respondi, ela perguntou com sua voz
cheia de suspeita: — Com quem você estava? — Não havia
julgamento em sua voz, apenas preocupação. Gostaria que ela
gritasse comigo em vez disso.
Por fim, olhei para cima.
Seu rosto bonito e preocupado deu uma olhada em meus olhos
avermelhados e ela respirou fundo. Seus olhos se estreitaram em
mim, sem dizer uma palavra, mas simplesmente olhando.
Atrás de mim, passos se moveram em nossa direção. Sabia que
eram minhas outras duas tias. Os olhos de tia Sabrina caíram sobre
as marcas de mordida no meu pescoço, e ela franziu a testa, seus
olhos me acusando. Normalmente, quando voltava do encontro com
Alexander, cobria os chupões com maquiagem. Estendi a mão
trêmula e a passei pelo meu cabelo molhado e liso. A tristeza
encheu seus olhos.
— Por favor... Não me diga que é aquele homem que vi perto de
você duas vezes. — Abaixei minha cabeça de vergonha, e um
suspiro deixou sua boca novamente. Nunca tive essa conversa com
ela, afinal. Na escola de Noura, ela foi embora antes que eu
pudesse, e evitei a conversa quando voltei para casa. — Pensei que
o P-Pakhan estava te ameaçando no começo... Quando ele
apareceu em nossa casa, mas então eu o vi com Noura. Ele já
esteve perto dela antes? Ela parece conhecê-lo.
Não respondi e pisquei para conter as lágrimas.
— O que você está fazendo, Ghislaine?
Por fim, o julgamento e a decepção encheram sua voz.
Cansada, levantei a cabeça e disse:
— O t-táxi está lá fora. A corrida foi cinquenta e dois dólares. Eu
n-não tenho minha carteira. — Odiava quão patética eu soava. —
Você pode pagar?
Sem esperar resposta, me virei, ignorando os olhares curiosos
que tia Sarah e tia Ines me deram. Cada passo que dava era um
punhal nas minhas solas frias. Estremecendo, fui em direção às
escadas, pronta para mergulhar em meus lençóis quentes.
Mas uma voz doce e melódica gritou:
— Mamãe!
Gostaria de ter tido um momento de silêncio antes de encontrá-la.
Fungando, me virei, encontrando Noura. Dei um sorriso fraco e
tímido, e esperei que alcançasse meus olhos.
Ela usava um pequeno vestido branco, e seu cabelo sedoso
estava solto ao redor dela, em vez de seu rabo de cavalo habitual.
Meu pequeno anjo.
Noura ficou ali, olhando para mim como se eu fosse seu mundo
inteiro.
Não suas avós, mas eu.
A excitação enchia seus olhos sempre quando voltava para casa.
Queria estender a mão para abraçá-la e pedir desculpas por ser
uma mãe podre. Ela olhou para mim com malícia em seus olhos.
Isso me lembrou dele.
— Voxê xe molhou na neve, mamãe?
Sua adorável pequena língua me fez sorrir. Realmente tinha a
filha mais fofa. Funguei e limpei meu nariz frio com as costas da
minha mão.
— Sim — limpei minha garganta entupida. — Vou tomar banho —
e chorar — e prometo descer rapidinho. Ok?
Ela sorriu e assentiu antes de sair correndo.
Eu me virei com um suspiro e subi as escadas. Cada passo era
como correr uma maratona. Olhei para meus pés cheios de bolhas,
azulados pelo frio arrepiante. O sangue deles evaporou, e as
manchas apareciam neles.
Eu merecia.
Merecia por negligenciar minha família e trabalho e escolher um
homem como ele.
Não foi sua culpa, minha voz interior veio.
Mas era.
Você não sabia.
Tudo foi minha culpa.
Não foi sua culpa ter acordado três anos depois.
Não respondi.
Não foi sua culpa que você tentou procurar uma fuga do caos em
sua vida.
Continuei muda.
Percebi que havia chegado ao último degrau. Os rangidos sob
meus passos não me incomodaram hoje. Indo em direção ao meu
quarto, acendi a luz. Meus olhos foram atraídos para meu armário, e
corri, abrindo a gaveta com dedos dormentes. Olhei para o arquivo
preto na minha frente.
O mesmo que o Dr. Garcia me dera.
O mesmo que nunca tinha visto.
Gostaria de ter olhado no mesmo dia em que recebi alta. Se
tivesse, talvez tivesse lembrado de tudo mais cedo. As coisas não
teriam chegado tão longe e ficado tão sombrias.
O destino tinha me ferrado regiamente.
Com uma respiração fria, abri o arquivo e li. Achei as palavras no
meu resumo de acidente e colisão com o trem e aborto e amnésia.
Li o arquivo de Driss também. Meus olhos pairaram sobre as
palavras ferimentos internos graves e hemorragia.
Em nenhum lugar foi mencionado que outro carro nos atingiu.
Talvez eles tivessem presumido que o acidente de trem tinha feito
isso. Ninguém sabia o que aconteceu naquela noite além de Driss e
eu... e Alexander e seus homens. Todo mundo tinha concluído que
fora um acidente.
Caso encerrado.
Mas foi um atropelamento e fuga.
Eles nos atacaram e nos deixaram para morrer.
Sem saber mais o que fazer, simplesmente me sentei na cama.
Entorpecida e vazia.
As lágrimas não caíram mais.
Minhas entranhas estavam congeladas.
O certo era tomar um banho quente, cuidar dos pés feridos,
descer e explicar tudo para minhas tias. Mas não conseguia me
mexer.
Meus pés ficaram presos ao chão, me mantendo cativa. Queria
dormir e nunca mais acordar. Um coma. Gostaria de ter ficado em
coma para sempre.
Qual era o sentido de acordar?
Desta vez, a voz dentro da minha mente ficou quieta.
Talvez ela ficou sem esperança e fechou também.
Inclinei-me para frente, apoiando os cotovelos nos joelhos e
colocando o queixo nas mãos. Cinco minutos. Eu me daria cinco
minutos, depois me iria me recompor.
Por Noura. Por minha família.
Esses cinco minutos nunca chegaram.
Ouvi gritos do primeiro andar.
Olhei para a minha porta.
Imediatamente, soube quem tinha chegado.
Cambaleei enquanto me levantava, minhas pernas vacilaram. Não
conseguia sentir meus pés de jeito nenhum. Era como se
estivessem dormindo. Um coma novamente. Com movimentos
hesitantes, fui em direção ao meu armário.
Tive que acabar arrastando meus pés atrás de mim. Perdi o
equilíbrio por duas vezes. Abri a porta do armário e olhei para cima.
Meus olhos foram direto para onde a caixa estava escondida. A
mesma caixa em que guardava uma arma sobressalente. Estendi os
braços trêmulos e a puxei para baixo. Peguei minha Glock, olhando
para a máquina de matar preta na minha mão. Estava mais pesada,
quase forçando meu braço para baixo. Eu a carreguei com munição.
Segurei a arma ao meu lado e olhei sem expressão para a porta.
Movendo-me em direção à minha janela, eu estava no centro do
meu quarto.
Esperando.
Não choraria por ele.
Minhas lágrimas eram apenas minhas. Minha dor era apenas
minha.
Ele não merecia mais vê-las.
Passos pesados e apressados subiram as escadas.
Congelei, colada ao chão enquanto levantava meus olhos.
Encontrei aqueles olhos negros no final do corredor.
Desta vez, não me perdi neles.
Talvez ele estivesse aqui para me matar, agora que eu sabia a
verdade.
Alexander se moveu em minha direção até ficar na minha frente.
Apontei minha arma para ele.
Ele não estava mais sem camisa, usava um longo casaco de lã
preto. Pelo menos era inteligente, ao contrário de mim, que corri
descalça na neve como uma louca. Seu cabelo preto tinha manchas
de flocos de gelo neles, e ele usava botas agora.
Em sua mão esquerda, ele segurava minha bolsa, e me forcei a
não chorar ao perceber que ele a trouxe de volta para mim. Ignorei
sua tática. Seu olhar foi do meu rosto, notando meus olhos
avermelhados, até a arma que estava apontada para ele. Ele olhou
para meus pés azuis, que ainda me congelavam.
Não disse uma única palavra enquanto segurava minha arma,
usando minhas mãos trêmulas. Claramente, uma mão não era
suficiente.
Ele encontrou meus olhos novamente.
As primeiras palavras que saíram de sua boca linda e astuta
foram:
— Deixe-me explicar.
Eu sequer pisquei. Nada mesmo.
Eu o encarei por alguns segundos.
Toda vez que ele tinha falado antes, meu coração costumava
pular. Ele rugia. Agora, estava em silêncio.
Alexander se moveu em minha direção, mas inclinei a arma em
um aviso, enviando uma mensagem óbvia.
Aproxime-se mais e eu puxarei o gatilho.
Ninguém me culparia se eu fizesse isso.
Ele era um gângster notório.
Um intruso em minha casa.
Não teria que encobrir nada hoje.
Ele fez uma pausa e sua mandíbula ficou tensa. Cerrando os
dentes, ele parou perto da porta e não entrou no meu quarto.
Mensagem entendida, acho.
— Você saiu correndo de lá antes de me deixar dizer qualquer
coisa — ele continuou, sua voz ainda profunda e grave, mas não me
afetou como antes. Seus olhos escureceram quando ele olhou para
mim.
Minha respiração sempre falhava quando ele olhava para mim,
mas agora eu não sentia absolutamente nada. Ele não significava
nada para mim.
— Não te conhecia naquela época. Conheço você agora... — ele
engoliu em seco. — Eu não me importava com você naquela época.
Não deixei de notar o tom em sua voz. Eu me importo com você
agora.
Antes, apenas ouvi-lo me faria derreter, mas, hoje, sua voz
enganosamente linda não conseguia mais apagar a dor e a mágoa.
Eram as folhas caídas sob a geada.
Meu coração não batia mais por ele. Não rugia como
anteriormente. Meus ossos tremiam com a dor que ninguém jamais
poderia entender. Apenas um silêncio antinatural dentro de mim me
cumprimentou... Como se eu não tivesse mais alma. Apenas meu
corpo. Um cadáver vivo.
O inverno estava lá fora, e agora estava na minha alma.
Eu não era mais o outono.
Eu era o inverno.
As lágrimas atrás dos meus olhos se recusavam a cair. Tinha
perdido toda a minha energia, e eu queria um banho com água
escaldante, para limpá-lo do meu corpo. Seus hematomas sexuais
ainda permaneciam na minha carne. Eu ainda cheirava como ele.
Ainda usava sua maldita camisa. Foi uma luta para ficar de pé, não
apenas por causa do tormento em minha alma, mas também porque
meu corpo estava lutando para respirar. Minhas pálpebras pesadas
estavam se fechando lentamente.
Esperava não estar hipotérmica.
Eu ainda tinha meus pobres pés que precisavam de descanso.
Minha garganta secou, e engoli, empurrando aquele nó dolorido
para baixo. Eu me recusava a deixá-lo subir.
Não via mais Alexander.
Tudo o que via era o homem que destruiu minha vida.
A causa da minha devastação, minha queda, minha destruição.
Um verdadeiro Pakhan.
— Não olhe para mim assim — ele murmurou, me empurrando
para fora dos meus pensamentos. Balançando a cabeça, ele
continuou: — Você está me olhando de forma diferente... E não
gosto disso.
Meus dedos tremiam, e eu os estabilizei, envolvendo minhas
mãos mais apertadas ao redor da arma. Obriguei-me a olhar nos
olhos dele e, finalmente, falei:
— Você disse ‘confie em mim’. Isso era uma mentira então?
Minha voz era clara, mas era baixa e monótona.
Era como se ele tivesse roubado minha voz de mim. Eu fui uma
tola. Uma maldita tola, e ele zombou de mim.
Seus olhos escureceram antes que ele se recompusesse. A
máscara vacilou por um segundo, mas eu consegui enxergar. Sua
dor escorregou antes que ele a mascarasse novamente. Ele estava
se esforçando para não sentir, tentando se esconder atrás da
máscara, mas eu podia vê-la caindo.
Todo esse tempo, rezei e desejei que ele me deixasse ver o
verdadeiro eu dele, e agora que tinha visto, não me importava.
Ansiava por seu coração, alcançando através da escuridão, através
das sombras para ele, mas apenas para receber a traição no final.
— Foi real?
Eu me forcei a continuar respirando e mantive minha voz clara.
— Nós? Alguma coisa do que tínhamos era... real?
Não sabia quando nos tornamos um nós.
Quando ele não respondeu, provoquei:
— Ou fomos apenas algumas fodas?
Seus olhos brilharam, e ele cerrou os dentes.
— Foi mais do que apenas algumas.
Se meu coração estivesse vivo, teria disparado, mas se desfez
em pedaços.
— Você mentiu para mim.
Não foi uma acusação. Foi uma confirmação.
Sua garganta balançou.
— Omiti a verdade.
Balancei minha cabeça, porque era a mesma coisa.
— Não quero ver você nunca mais — respondi, olhando
fixamente. Esperava que ele se lembrasse da minha expressão pelo
resto da vida. A devastação no meu rosto por causa... dele. — Vá
embora, ou vou colocar uma bala na sua cabeça.
Ele olhou para a minha arma antes de olhar para o meu rosto.
— Sua filha está lá embaixo.
Ele estava me desafiando?
— Você esqueceu quem eu sou? — perguntei com um toque de
sarcasmo. — Estou pronta — ameacei.
Pronta para matá-lo, terminei silenciosamente sob minha
respiração.
Ele abriu a boca para provavelmente protestar, mas eu não tinha
terminado de falar. Ele estava na porra da minha casa, e eu era a
rainha deste reino. Ninguém poderia falar acima de mim aqui.
Não queria ouvir mais mentiras.
Eu o encarei nos olhos.
— Fique longe de mim. Caso contrário, eu vou atirar todas as
minhas balas em seu cérebro e vou para a cadeia pelo seu
assassinato. — Dei um sorriso amargo. — E desta vez você não
pode encobrir meu crime… Porque você estará morto. Saia e nunca
mais apareça na minha frente.
Gostaria que aquele olhar selvagem e assassino que eu recebia
às vezes voltasse e eu pudesse atirar nele bem no meio de seus
olhos, mas eu não senti nenhuma ira hoje. Soltei mais um golpe.
Ele tinha me quebrado.
— Grávida. Eu estava grávida quando você ordenou que nos
matasse.
Não senti dor quando terminei de falar.
Seu corpo ficou rígido, suas mãos ficaram imóveis ao seu lado, e
seus olhos atormentados brilharam em descrença antes que a culpa
os preenchesse. Odiava a ele e seus olhos agora. Eles não
significavam nada para mim. Engolindo em seco, seu pomo de Adão
balançou e seus punhos se fecharam e se abriram ao lado do corpo.
Eu me perguntei por um segundo o que ele faria.
Ele atiraria em mim?
Ele estava se preparando para esmurrar meu rosto?
Ele me mataria por ter me lembrado da verdade sobre ele?
Eu ainda era uma testemunha de seus crimes daquela noite, e
ainda podia testemunhar à polícia. Esperei, procurando por alguma
pista de que ele pudesse sacar uma arma e apontá-la para mim. Ele
se moveu em minha direção, e minhas mãos apertaram minha
Glock, e eu nem pisquei.
Apertei o gatilho.
Bam.
Ele fez uma pausa, e seu corpo sacudiu até a metade antes que
ele parasse. Um grunhido rouco saiu de sua boca antes que seus
olhos estreitos fossem para o sangue metálico escorrendo de seu
braço. Meus olhos brilharam. Realmente atirei nele e não me
arrependi.
Atirei em Alexander.
E eu faria isso de novo.
Ele criou esse monstro em mim, pagaria o preço por isso também.
Meu criador merecia toda a minha ira.
Automaticamente, sua mão foi para o braço, sangrando, antes de
seus olhos em chamas dispararem para mim como se ele não
pudesse acreditar que ousei atirar nele. Acho que ele não me
conhecia tão bem. Ele não parecia mais bonito. Sua mandíbula
apertou, e ele soltou uma respiração irregular.
Inclinei minha cabeça para ele, minha respiração saía lenta e
constante. Meus olhos pousaram em seu braço ferido, que ainda
segurava minha bolsa. Percebi que ele estava apenas colocando-a
sobre a mesa próxima.
Meu coração não acelerou mais. As borboletas no meu estômago
se foram. A culpa não aparecia mais na minha alma, da mesma
forma que ele ordenou o ataque à minha família sem nenhum
remorso.
Eu ainda olhava para minha bolsa quando seu braço ileso sacudiu
em movimento, e ele puxou um revólver de suas costas e apontou
para mim. Meus olhos se arregalaram, sabendo que eu poderia
morrer hoje.
Pressionando meus lábios, encontrei seu olhar hostil.
Vou levá-lo comigo então.
Agora, nós dois apontávamos nossas armas um para o outro. Seu
rosto pálido corou avermelhado, seus dentes rangendo quando ele
inclinou a cabeça para mim. A respiração irregular saía por sua
boca. Sua raiva desafiava a minha. Meu batimento cardíaco
acelerou, e meu pulso disparou.
Uma centena de ideias deviam estar passando por sua mente
sobre como ele poderia me matar. Ele também nunca me contou
como matou Cyrus. Foi tão horrível que ele não poderia me dizer?
Esperei que ele apertasse o gatilho, para acabar com isso, para
acabar comigo, para acabar conosco.
Seus olhos negros escureceram.
— Se você morrer, eu morro também.
Pisquei ao perceber o que ele havia falado. Antes que eu pudesse
dizer qualquer coisa, ele largou a arma e se virou, se afastando de
mim, e me deu as costas.
Ele me deixou viver.
Talvez porque não havia como um de nós sobreviver sem matar o
outro hoje. Soltei um suspiro de alívio, mas não abaixei minha arma.
Ainda apontei para as costas dele. Atiraria nele pelas costas como
se ele tivesse me esfaqueado também.
Sua presença se afastou, agarrando seu braço, deixando gotas
de sangue no chão rangendo. Eu o machuquei.
Seus passos desapareceram no corredor, descendo a escada, me
deixando. Ainda não confiava nem um pouco nele, então o segui
silenciosamente. Talvez ele mantivesse minha Noura e tias como
reféns. Talvez as matasse.
Desci a escada com a intenção de segui-lo, mas então a porta da
frente se fechou.
Fiz uma pausa.
Alexander se foi.
ALEXANDER

26

UMA FERVURA IMPOSSÍVEL se formou na alma de Alexander.


A raiva se agitou em seu peito, crescendo como correntes de
águas profundas. Suas mãos rígidas se fechavam e se abriam ao
lado do corpo. O fogo nele queimava, ardendo suas entranhas
depois que deixou Ghislaine em uma maldita bagunça. Seus olhos
castanhos brilhavam diante dele. Ela exalou ódio por ele. Ele não
ficaria surpreso se ela decidisse matá-lo, afinal. Ela atirou nele, de
qualquer maneira.
Seus olhos desolados.
Vazios. Não mais tristes para caralho. Mas vazios para caralho.
A dormência que ele causou.
Em vez de ir para casa, ele foi para sua masmorra.
A mesma masmorra em que mantinha seus prisioneiros, traidores,
e os rivais que ele havia capturado. Essas grossas paredes de
pedra cinza não podiam conter uma oração nem um espírito.
Nenhuma luz externa poderia entrar aqui. Sem janelas. Ninguém
sabia dizer se era dia ou anoitecer aqui. A contenção isolante aqui
era serena, e quem entrava nunca saía vivo. Não era mais brilhante
do que uma penumbra do crepúsculo. Dentro das celas, havia um
balde para cagar e um colchão amarelado e encaroçado.
Ele mudou de comportamento, voltando a ser o homem frio e
indiferente que era em seu universo. Era sufocar silenciosamente ou
saborear os gritos dos prisioneiros.
Escolheu o último.
Quando entrou no calabouço de granito amarelo artificialmente
iluminado, seus Vors curvaram suas cabeças.
— Pakhan.
Ele não os cumprimentou de volta e continuou andando. Sem se
preocupar em desabotoar o casaco de lã, rasgou os botões e deixou
que caísse no chão.
Seu braço esquerdo ferido ainda queimava com a bala impressa
nele. Grunhindo, ele não se importou. Cuidaria disso mais tarde.
Parando na primeira cela, grossas barras de metal o saudaram.
Colocando-se em modo de luta, suas mãos geladas sacaram sua
arma. Ele ainda usava bem o braço direito.
— Abra a cela — ele ordenou a um de seus homens, vigiando.
Sua voz severa não deixou espaço para perguntas.
O guarda destrancou a cela e Alexander invadiu o interior. Mijo,
suor e fedor frio penetraram em suas narinas. Seu olhar caiu sobre
um homem de pé contra a parede. Um de seus muitos rivais.
Alexander ergueu sua arma, mirando entre suas pernas, e atirou
em seu pau. Dois segundos depois, o sangue entrou em erupção,
escorrendo pelas calças do homem. O homem uivou, suportando o
peso de sua ira. Ele atirou no homem no peito, no estômago e
depois no coração. O combustível nele se transformou em brasas
ardentes e pretas, desencadeando o inferno nele.
Apertando o gatilho novamente, ele atirou no coração do homem
morto de novo, como ele tinha disparado balas invisíveis no coração
de Ghislaine. Todas as seis balas dele terminaram, a pólvora
deixando cinzas frias em seu rastro. Ele colocou a arma atrás da
cintura e puxou sua segunda arma.
Saindo da cela, ele ordenou novamente:
— Abra a próxima.
O guarda obedeceu e abriu a porta.
Outro rival cumprimentou Alexander.
A lista de alvos sobre ele era incontável.
Seus inimigos eram infinitos.
Alexander ergueu sua arma e, sem aviso, atirou no homem em
cada um de seus olhos, deixando-o permanentemente cego e
morto.
Da mesma forma que ele surpreendeu Ghislaine.
O corpo desabou e bateu no chão de cimento com um baque. O
tornado perverso dentro dele rejeitou e saiu para brincar. Ele chiava
em suas veias, formigando sua espinha.
Os olhos de Alexander se arregalaram no escuro, inalando a
visão do sangue metálico e amargo que aquecia seu corpo frio e
tenso. O sangue o lembrou de como o coração de Ghislaine estava
sangrando.
Ele o fez sangrar.
E esmagou as faíscas de fogo que ele viu nela.
Exalando, a corrida das mortes o atingiu, e sua mente ficou tonta.
Ele passou para a próxima cela e, um por um, ordenou que seus
homens abrissem as celas.
Atirando no próximo rival entre seus pés, ele deixou o homem
aleijado como se tivesse varrido o mundo de Ghislaine sob seus
pés. O homem gritou, e o que Alexander ouviu o animou. Por que
ela não gritou com ele como esses filhos da puta? Em vez disso, ela
olhou fixamente em seus olhos, como se não o reconhecesse. Seus
olhos castanhos perderam a mesma obscuridade, o mesmo brilho, a
mesma luz que ele viu retornar.
Quando ele correu para a casa dela, não encontrou Ghislaine.
Ele encontrou a Viúva Negra novamente.
Ela o chamou de assassino, e um assassino ele seria.
Ele liberaria o demônio nele hoje, aquele que manteve escondido
dela. Agora, o sangue escorria pelo chão empoeirado, indo em
direção às botas pretas de Alexander e encharcando suas solas.
Esticando os nós em seu ombro, ele apertou o gatilho novamente e
atirou no homem bem na boca, querendo que ele se calasse.
Não era o grito que ele preferia ouvir. O homem se acalmou, e as
entranhas retorcidas de Alexander ficaram satisfeitas. O corpo
desmoronou e, em seu lugar, havia um homem com um buraco no
rosto. Ele colocou a arma em sua cintura, pois havia ficado sem
balas também. Ordenou ao guarda que abrisse a próxima cela,
querendo fazer isso a noite toda com sua interminável lista de
inimigos.
Estalando os dedos doloridos, ele foi direto para o homem na
cama, escondido e assustado com a raiva que ele deve ter ouvido
de seu falecido vizinho. Agarrando-o pela nuca, Alexander jogou o
homem no chão. O homem atordoado grunhiu quando seus
membros bateram no chão sujo e se virou para olhar para
Alexander.
Alexander o agarrou pelo couro cabeludo e o ergueu. Um líquido
se moveu sob suas mãos, e ele percebeu que estava tirando
sangue. Bom. O homem gritou protestos e apontou um soco em seu
rosto, mas ele bloqueou, logo antes de acertar o homem na
mandíbula.
A cabeça do homem voou para trás. Quando ele olhou para o
rosto de Alexander, soltou um rugido e o chutou na barriga.
Alexander soltou um grunhido suave antes de bater o cotovelo no
nariz do homem. Uma sensação crocante irrompeu no impacto, e
sangue jorrou do rosto do homem.
Antes que ele pudesse reagir, Alexander deu um soco em seu
crânio, sentindo seu cérebro se mover por baixo. Da mesma forma
que Ghislaine bateu com a cabeça, o que a deixou inconsciente por
três malditos anos.
O homem caiu no chão, imóvel e sem respirar.
Com a adrenalina correndo em suas veias, esticou os dedos e
saiu.
Ele repetiu a mesma ordem com voz áspera:
— Abra.
Encontrando os olhos do guarda por um segundo, puro terror
retornou ao olhar. Os olhos negros de Alexander se enfureceram e o
guarda desviou o olhar. Rapidamente, a próxima cela foi aberta.
Vozes tagarelavam e dominavam ao redor dele, o resto dos
prisioneiros se movendo em direção às celas douradas e
encarando-o. Ele os ignorou e olhou para frente. Antes de entrar na
próxima cela, murmurou para o guarda:
— Traga-me minha ferramenta.
Ele repetiu o padrão, usando os punhos e chutes para desferir
golpes. Seu braço ferido doía de angústia quanto mais ele o usava.
Ele rasgou ainda mais em seus tendões. Bom. Ele precisava de dor
agora.
O sangue respingou em suas roupas pretas e cobriu suas mãos
inquietas. Ele precisava mantê-las em movimento, continuar
matando, agarrando-se aos últimos fios de sanidade que se
agarravam a ele. Uma risada amarga queria deixar sua garganta.
Descarrilado, ele estendeu a mão para limpar o fio de suor de seu
rosto, manchando de sangue todo o rosto como a porra de uma
pintura de guerra.
Desta vez, ele bateu o cotovelo na espinha do homem,
quebrando-a, deixando-o paralisado. Da mesma forma que
Ghislaine olhou para ele no elevador, grudada em um ponto, e seus
pezinhos descalços congelados no chão. Os mesmos pezinhos
azul-gelo preciosos que ele viu congelando.
Quando saiu da cela e foi para a próxima, seu guarda estava lá,
esperando com sua ferramenta. Seus olhos alegres caíram sobre a
motosserra preta.
Ela sempre o chamou de psicopata, mas nunca soube a verdade
em sua extensão. Puxando sua camisa coberta de sangue, ele a
deixou cair no chão. Não havia necessidade de prender o item solto
na ferramenta.
— Quantos prisioneiros sobraram? — Alexander rangeu
asperamente.
O guarda ergueu os olhos assustados e olhou para frente.
— Dez.
Alexander piscou.
— Coloque-os todos em uma cela.
Seu guarda assentiu, sacou sua arma e foi para a próxima cela.
Três outros guardas escoltaram o resto dos prisioneiros, um por um,
empurrando-os em uma cela sob a mira de uma arma.
Alexander olhou para a motosserra em suas mãos, uma fome se
agitando enquanto ele ofegava. O suor escorria pela nuca e grudava
no peito nu, as tatuagens brilhando sob a luz artificial no meio do
corredor da prisão. Ignorando os gritos e protestos ao seu redor, ele
fechou os olhos e lambeu o sangue em seus lábios lentamente,
saboreando o gosto.
Seus olhos se abriram quando um guarda disse:
— Está feito, chefe.
Sem reconhecê-lo, Alexander mudou-se para a próxima cela
destrancada, com a porta aberta. Os dez homens lá dentro
recuaram quando notaram a arma em sua mão. Ele entrou na cela,
plantou os pés com firmeza e puxou a motosserra, ligando-a. Um
olhar assassino surgiu em seus olhos enquanto ele sorria para os
homens assustados. Aproximando-se deles, agarrando a
motosserra com firmeza em suas mãos.
— Quem é o próximo? — zombou baixinho.
Todos os homens se entreolharam, assustados e horrorizados. O
medo em seus malditos olhos era ouro puro. Ele inclinou a cabeça e
olhou para o homem mais próximo a ele. Indo em direção a ele,
seus olhos brilharam em antecipação. O homem tentou rastejar
contra a parede, procurando uma fuga, mas foi encurralado.
Alexander saltou sobre ele, a motosserra cortou seu estômago. O
homem gritou, uivando como o resto das mortes.
Um corpo bateu em Alexander, e a motosserra cavou mais fundo
no homem que ele estava matando. Esquecendo o homem, ele
girou como um relâmpago com a máquina de matar, rugindo
enquanto cortava as mãos dos dois homens que claramente se
arriscaram a empurrá-lo e atacá-lo. As partes desmembradas do
corpo caíram no chão, deixando um rastro de. O sangue chiou e
espirrou no ar, cobrindo Alexander mais uma vez, intoxicando-o em
sua loucura. Os homens sem membros caíram no chão, seus
corpos caindo antes que eles parassem de se mover.
Mortos, presumiu.
Ele olhou para os sete homens restantes, desafiando-os com uma
sobrancelha arqueada.
— Quem se atreve a me bater de novo?
Ninguém fez um movimento em direção a ele agora.
Talvez eles estivessem procurando outra oportunidade.
Aos seus olhos, nenhum desses homens era humano. Apenas
rivais e traidores. Um meio para o fim. Ele se lançou para o homem
mais próximo a ele, levantou a motosserra no ar e cortou sua
cabeça, e o homem caiu no chão.
Com um olhar ameaçador, ele passou pelos homens. Às vezes,
um por um, às vezes, dois de cada vez. Outro homem tentou atacá-
lo novamente, mas ele ergueu a motosserra, acertando-o bem no
pescoço largo. A cabeça foi cortada e rolou no chão de cimento. A
adrenalina encheu sua cabeça, e as pontas dos dedos formigavam
ao matar. Rugindo, Alexander chutou a cabeça com a bota, e ela se
chocou contra a parede. O plasma, a matéria cerebral e o sangue
respingaram nos homens próximos. Gritos roucos e de angústia
encheram o ar enquanto ele destruía cada homem restante.
De pé no centro, ele olhou para o círculo, para o massacre de
suas próprias mãos. Plasma, cadáveres e sangue cobriam as
paredes e o chão.
Todos mortos.
Quinze mortes no total.
Fechando os olhos, ele desligou a motosserra e a deixou cair.
Nenhum som o saudou, apenas sua respiração fraca. A fadiga o
atingiu, a corrida das mortes, deixando sua mente cheia, e ele caiu
de joelhos. Suas mãos pousaram no chão de granito empoeirado
enquanto ele respirava.
Olhos castanhos brilharam em sua mente, nunca deixando sua
memória.
A desesperança neles. A depravação. A traição.
Ele tinha matado a alma dela.
Agora, todos seriam sem alma também.
Até ele.
Ninguém jamais respiraria pacificamente enquanto ela sufocasse.
Agora, todos esses malditos homens estavam sem vida.
Assim como a Ghislaine sem vida que ele deixou para trás.
Destruirei o mundo por existir sem ela.
GHISLAINE

27

TIREI UMA LICENÇA de duas semanas do FBI.


Liguei para Miran para perguntar se ele estava trabalhando no
escritório. Ele estava. Eu o avisei que estava entrando na sede da
DEA.
Ainda estava nevando lá fora quando entrei no prédio. A nevasca
havia parado há uma semana, mas a neve ainda ia e vinha às
vezes. Olhei para os carros do lado de fora das portas de vidro que
estavam cobertas de flocos de gelo.
Bonito, mas bom demais para ser verdade.
Bonito, mas não por muito tempo.
Todas as coisas bonitas acabavam.
Aprendi isso da pior maneira.
Passei a mão pelo meu casaco de lã branca. Pela primeira vez,
escolhi ver algo que não fosse na cor preta. Talvez porque não
estivesse com vontade de me parecer com a rainha da morte.
Peguei o elevador até o escritório de Miran. Não cruzando o olhar
com ninguém, bati do lado de fora de sua porta enquanto espiava
pelo espelho de vidro transparente.
Ele parou de digitar em seu teclado de mesa e encontrou meus
olhos. Acenou com a cabeça, peguei minha deixa e entrei em sua
sala simples e grande. Vazia de cores e decorações extravagantes.
Duas prateleiras de livros de Direito me receberam.
Dei uma olhada rápida na fotografia de uma jovem em sua mesa.
Devia ser sua esposa. Ela tinha cicatrizes no lado direito do rosto.
Isso me fez parar, mas, mesmo assim, ela era bonita.
Sentei-me em frente a ele e encontrei seus olhos.
Ele deu um sorriso tímido, ou uma tentativa. Aquele homem
nunca sorria, mesmo com aquela covinha dele. Mas seus olhos
castanhos quentes eram gentis. Gostaria de poder retribuir seu
sorriso, mas não tinha energia. Mal tinha energia para levantar de
manhã e fazer o café da manhã para todos.
— Olá, Ghislaine — ele falou em seu leve sotaque do Oriente
Médio. — Como vai?
Morta por dentro, queria dizer, mas respondi:
— Estou bem. — Quebrada. A mesma resposta ensaiada que dei
a todos desde que acordei do coma. Depois de um momento,
continuei: — Vou deixar o FBI.
Os olhos de Miran encontraram os meus antes de suas
sobrancelhas grossas e pretas se franzirem.
— Por quê?
Olhei para o meu colo, incapaz de encará-lo.
Desisti do meu dever, agora não podia mostrar meu rosto no
trabalho.
— Não parece mais o mesmo — admiti sem revelar muito.
— Mas você trabalhou tanto, Ghislaine — ele protestou em uma
voz tão baixa. — Não entendo… — sua voz sumiu. Quando não
respondi, ele perguntou: — É por causa do que aconteceu na
prisão?
Levantei meus olhos e encontrei seu olhar questionador.
De certa forma, ele estava certo.
— Não sou mais a mesma pessoa.
Estava dando respostas audíveis sem dizer nada a ele.
Confuso, ele me deu uma olhada. Nenhum julgamento estava em
seu rosto, mas admiração.
— O que está acontecendo? — perguntou sem rodeios, indo
direto ao ponto.
Fiquei muda novamente e desviei o olhar.
— É por causa de... Alexander?
Meus olhos voaram para cima e suas sobrancelhas franzidas se
ergueram no ar. Realização surgiu em seu rosto.
— Aah... — respirou — Então é isso.
Meu rosto corou, mas eu o olhei nos olhos.
— Vim aqui porque acreditei que eu poderia encontrar um amigo
— admiti baixinho.
Ele descansou os cotovelos na mesa e me encarou nos olhos.
— Ele te machucou? — Sua mandíbula apertou enquanto seus
olhos procuravam os meus. — Ele é um homem perigoso e capaz
de ferir os outros. — Seus olhos brilharam, e eu senti uma vingança
pessoal, mas não consegui identificar. — E mentir — Miran zombou.
Minhas sobrancelhas se ergueram em surpresa. Mentir?
Agora, isso era algo que tínhamos em comum.
Miran notou meu olhar questionador e respondeu:
— Bem, ele é meu primo e mentiu na minha cara que não fazia
escravidão sexual. — Ah, eu não sabia que eles eram parentes. Ele
franziu a testa: — Então, novamente, ele é um criminoso e não
admitiria a um chefe da DEA o que ele faz para viver. — Quando eu
não respondi, ele perguntou casualmente: — O que aconteceu entre
vocês?
Ele me destruiu.
— Alguma coisa com que eu deva me preocupar?
Ele me fez viúva.
— Ghislaine?
Ele deixou minha Noura órfã.
Afastando-me dos meus pensamentos, concentrei-me nele.
Lembrando por que vim aqui, respondi:
— Desde que voltei ao FBI, não parece mais o mesmo. Antes de
ter Driss — um sorriso triste brincou em meus lábios —, ansiava por
trabalhar porque ele estava muito perto de mim. Agora, ele não está
lá, e o mesmo lugar... me assombra.
Miran entendeu minha resposta antes de dizer:
— Você sempre pode se transferir para um distrito diferente. Você
não precisa trabalhar em um lugar onde há uma lembrança
permanente do seu passado.
Tão estoico e sábio.
Não é à toa que ele era o chefe. Gostava que ele fosse capaz de
raciocinar.
— Driss amava a força mais do que eu — admiti. — Não é justo
que ele não esteja mais por perto para fazer parte disso, mas eu,
sim… não quero mais.
O silêncio me cumprimentou.
Depois de um momento, Miran falou:
— Então, o que você quer?
Alexander. Eu me odiava por ainda querê-lo.
Nas últimas semanas, ele não tinha me procurado novamente.
Enquanto eu estava feliz com isso, uma pequena parte em mim, que
eu havia enterrado, se perguntava: por que não o enterrei?
Por que eu ainda estava viva?
Por que ele ainda não me matou, mesmo sabendo a verdade?
E por que eu não... o entreguei ainda?
Essas perguntas sempre rondavam minha mente, e as respostas
que eu não queria enfrentar.
— Paz — respondi por fim. — Um momento de paz.
— Você poderia tirar férias? — Miran ofereceu.
— Eu decidi. Só queria que você soubesse.
Compartilhar algo.
Franzindo a testa, Miran olhou para mim:
— O que você vai fazer agora?
— Estava pensando em deixar a cidade — acrescentei baixinho.
O país, na verdade.
Miran sibilou:
— Você está planejando fugir? Diga-me a verdade, Ghislaine. O
que Alexander fez? Sei que algo está acontecendo entre vocês dois.
Fechei os olhos e rezei para que ele parasse de me perguntar.
Driss era um de seus amigos mais próximos. Se confessar, eu me
perguntava se ele entregaria Alexander.
Podia imaginar as manchetes agora. Elas ficam mais saborosas a
cada vez.
Chefe da máfia russa causou o ‘acidente’ do diretor do FBI e de
sua viúva.
Relutantemente, abri meus olhos e encontrei seus olhos
dourados.
— Quero esquecer tudo — respondi. — Ele. — Esperei por uma
resposta, mas nenhuma veio. — Quero uma lousa limpa e seguir em
frente com minha vida. — Se puder.
Miran suspirou e roçou a barba.
— Tudo bem — disse ele finalmente. — Se você quiser conversar,
estou sempre aqui.
Assenti, apreciando o gesto.
— Quando você está pensando em sair? — ele perguntou.
— Vai levar tempo para vender minha casa e móveis — respondi
depois de um momento. — Espero que o mais rápido possível.
Ele deu um sorriso fraco.
— Você vai fazer falta.
Meus olhos brilharam e eu assenti.
— Você também vai.
Depois de um momento, eu me levantei. Miran seguiu o exemplo
e deu a volta para me dar um abraço de despedida. Passei meus
braços ao redor dele, descansando minha cabeça em seus ombros.
— Vou descobrir o que Alexander fez, Ghislaine — ele prometeu
contra o meu cabelo. Meu corpo se acalmou. — Driss era meu
amigo. Se Alexander te machucou, não vou deixá-lo escapar disso.
Não encontrei seus olhos quando me afastei dele.
Desejando-lhe bem, eu me afastei, mesmo que pudesse sentir
seus olhos quentes queimando nas minhas costas o tempo todo.

Depois de deixar o escritório de Miran, voltei à sede do FBI e dei


meu aviso prévio de duas semanas. Não surpreendeu ninguém.
Eles provavelmente estavam esperando isso o tempo todo de uma
maluca. Apenas uma desvairada para eles. Por mais que
trabalhasse, eles não me apreciavam. Nunca pertenci aqui. Nem me
importei se eles fizessem uma festa de comemoração depois que
saísse. O FBI deixou de ser minha casa no dia em que voltei e a
placa de identificação do escritório do meu marido foi substituída.
A polícia ainda investigava o caso de Cyrus, mas saíram de mãos
vazias. Alexander algum dia revelaria a verdade?
Lembrei-me de sua ameaça alta e clara da cobertura.
Se você sair desta cobertura agora, vou contar ao mundo inteiro o
que você fez. Eu lhes direi tudo.
Ele poderia dizer a eles o que quisesse agora.
Não tinha medo.
Eu fiz uma última coisa.
Algo que eu deveria ter feito há muito tempo.
Não podia fazer isso na sede, então, parei na biblioteca local.
Digitei duas linhas no computador. Gostaria de poder escrever em
vez disso, mas não queria que ele fosse rastreado até mim.
Quando imprimi, usei as luvas de látex que sempre carregava. As
mesmas que usava quando encontrava evidências em uma cena.
Dobrei o papel em um envelope que peguei da bibliotecária e o
coloquei na minha bolsa. Não me incomodei em salvar o documento
do Word e fechei-o. Peguei um táxi da cidade.
Enquanto usava meu chapéu branco na cabeça, pedi ao motorista
que me deixasse a três quarteirões de distância antes de entrar no
bairro suburbano. Caminhei na rua escura, limpa da neve. Não
podia deixar pegadas para trás. A tempestade havia diminuído, mas
a neve continuava.
Olhei para a moderna casa branca surgindo na minha frente
enquanto me escondia atrás de uma grande van preta. A barra
estava limpa. Ninguém estava à espreita lá fora. Felizmente, ainda
estava nevando. Nenhuma pessoa sã estaria do lado de fora,
exceto... eu.
Mas, novamente, eu havia perdido minha sanidade e moralidade
há muito tempo.
Mas ainda tinha uma última coisa moral a fazer.
Com passos cautelosos e meus olhos alertas, puxei o cachecol de
lã para cima, escondendo minhas feições e apenas revelando meus
olhos.
Apenas no caso de alguém me ver. Exalando um suspiro quando
cheguei à varanda da frente, minha mão permaneceu na
campainha, querendo pressioná-la e entrar.
Balançando a cabeça, abri minha bolsa e coloquei um novo par
de luvas pretas de látex. Tirei a carta do envelope e a coloquei
dentro da caixa de correio antes de fechá-la. Enfiei o envelope de
volta na minha bolsa. Eu não queria deixá-lo para trás apenas no
caso de meu fio de cabelo estar nele. A bolsa de uma mulher era
como um vasto oceano, era possível encontrar qualquer coisa nela.
Enquanto me afastava, desfiz as pegadas, e fiz isso a cada
quinze passos que dei. Ninguém poderia me rastrear.
Quando terminei, minha mão estava dormente e gelada. Os flocos
de neve derreteram contra minha mão, transformando-se em
mingau. Caminhei pelas ruas vazias e limpas da noite, descendo
dois quarteirões antes de tirar as luvas e jogá-las no lixo mais
próximo. Até amanhã de manhã, teria ido também. Enfiando as
mãos nos bolsos de lã, o calor penetrou na minha pele.
Mais dois quarteirões adiante, entrei na rua principal, onde os
carros passaram correndo por mim. Chamei um táxi e fui para casa,
para minha família.
Lembrei-me das palavras que escrevi para Sierra Drakos.
As que eu desejava dizer a ela.
Eu não contei a ela o que seu marido tinha feito comigo.
Ela iria se perguntar sobre isso a vida inteira se eu o fizesse. Não
era mais sobre mim, nem sobre eu ser uma vítima aos olhos dela.
Era sobre ela e seu filho ainda não nascido.
Deixei-a com uma falsa esperança de que seu marido tivesse
morrido como mártir.
Eu lhe dei misericórdia, algo que ninguém nunca havia me
mostrado.
De uma viúva para outra.
De um sobrevivente para outro.
Ela finalmente teria paz em seu coração e terminaria sua busca.
Desejei-lhe adeus.

Seu marido está morto.


Sinto muito.
GHISLAINE

28

SEMANAS APÓS SEMANAS se passaram.


Demorou para vender minha casa, talvez porque ainda fosse
inverno. Naquela época, era mais difícil se mudar e os compradores
eram poucos. Agora, eu estava sentada na sala com minhas três
tias.
Noura estava na terapia da fala.
Por quatro semanas, minha família não me pressionou, e elas
esperaram que eu falasse. Sentei-me em um sofá e minhas tias
sentaram-se no outro à minha frente. Cruzei as pernas e brinquei
com o tecido de lã macio do meu suéter branco.
Encontrei cada par de olhos castanhos, tão parecidos com os
meus.
Meus dedos tremeram quando me lembrei de respirar. Os
pássaros no canto da sala cantavam novamente. Eles estavam de
volta para dentro. Pelo menos, eles não me olhavam
ameaçadoramente.
— Conheço Alexander há algum tempo — disse, olhando-as nos
olhos. Os lábios de tia Sabrina formaram um sorriso de lábios
apertados, mas ela não pressionou por mais informações. Tia Sarah
fez uma careta, e tia Ines olhou curiosa.
Nunca poderia contar a elas sobre o beijo no hospital. Parecia
inacreditável, e eu não tinha interesse em explicar como o destino
funcionava.
— Eu estava trabalhando no caso dele, pesquisando — continuei.
— Comecei a trabalhar no caso há quase quatro anos com Driss. —
Minha respiração ficou presa no meu peito quando me lembrei do
meu falecido marido. — Fui atacada uma noite.
Minhas tias ofegaram e suas vozes falaram, dominando umas
sobre as outras, pedindo mais informações.
— Alexander estava lá para me ajudar a tempo.
Eu não contei a elas, eu me ajudei também.
Eu atirei no culpado.
Olhei para tia Sabrina com os olhos sombrios.
— Foi naquela noite que você me ligou, e eu disse que voltaria
para casa pela manhã — sussurrei. Seu rosto suavizou. — Depois
daquela noite, nós nos unimos, e eu o encontrei de novo e de
novo… Até que se transformou em algo sobre o qual eu tinha pouco
controle. Tentei acabar com isso — meus olhos imploraram para
elas —, mas ele apareceu na minha porta — eu disse com um leve
sorriso, lembrando aquela noite insana e aquele homem persistente.
— Ele está ameaçando você, minha filha? — Tia Sabrina fervia.
Ele não tinha me ameaçado recentemente.
— Não — admiti. — Depois daquela noite, eu o encontrei
novamente. Não pude deixar de sentir... — minha voz sumiu. —
Achei que estávamos indo para algum lugar. Que era... — Eu me
atrapalhei — Não sabia o que éramos, mas estávamos juntos —
terminei. Abaixei minha cabeça e olhei para o chão. — Lembrei a
noite do acidente.
Um choro encheu o ar, e eu apertei meus olhos fechados.
— Lembrei que Driss e eu estávamos vigiando tarde da noite.
Noura esteve com vocês a noite toda. Fomos checar algo, e os
mafiosos russos nos pegaram. Era o caso de Alexander. — Suspirei.
— Ele ordenou que fôssemos mortos.
Abri meus olhos lentamente, mas não encontrei seus olhos.
Era tudo, muito de uma vez.
Ninguém falou mais, e eu estava com medo de suas reações.
Eu era uma mulher adulta com uma filha, mas ainda temia as
reações de minhas tias. Eu acho que, não importava quantos anos
você tinha, você sempre se importava com o que sua família
pensava sobre você.
— Eu me odeio — sussurrei, meus olhos brilhando. — Odeio ter
deixado o homem que matou meu marido — E tentou me matar
também — me tocar. — Continuei: — Nenhum número de banhos e
esfregões poderia me deixar limpa novamente. — Meus ouvidos se
animaram quando um barulho de movimento me alertou. Alguém se
levantou, mas eu olhei para o chão como uma criança pronta para
seu castigo.
— Sinto muito — minha voz falhou. — Sinto muito por desapontar
vocês e Noura.
E Driss. Eu sinto muito por ele. Por estar com seu assassino e
pisar naquele pedaço de metal que nos denunciou.
Um peso afundou no meu lado oposto.
— Ele mentiu para você — tia Sabrina resmungou, inclinando-se
e embalando minha cabeça na dobra de seu braço. Um soluço saiu
da minha boca. Um que estava segurando nas últimas semanas
enquanto me agarrava desesperadamente a ela. — Ele traiu sua
confiança.
As palavras de Alexander sussurraram em minha mente.
Omiti a verdade.
Meu lábio inferior tremeu, e uma das minhas outras tias esfregou
pequenos círculos nas minhas costas.
— Como você poderia saber que ele foi o único a causar... seu
trauma? — perguntou tia Ines. — Não foi sua culpa, querida.
Um choro saiu dos meus lábios enquanto meu peito subia e
descia. Minha visão ficou turva e fechei os olhos. Chorei
imprudentemente, sem me conter desta vez. Lágrimas de angústia
rolaram pelo meu rosto. Meu coração sangrando derramou de meus
olhos desolados, manchando minha família com minhas feridas.
Não tinha mais medo de que alguém ouvisse meus gritos em casa.
Era para todos verem agora. Não precisava mais fingir ser forte.
Não estava mais entorpecido.
Eu sentia.
— E-eu sabia que ele era um criminoso — murmurei depois de
recuperar o fôlego — Ainda assim, estava com ele. Sou uma
desgraça para minha causa, meu trabalho, meu dever. Eu não
mereço fazer parte da força. Eu saí.
Ninguém mais falava.
Não tinha dito a eles que eu deixaria meu emprego.
— Se D-Driss estivesse vivo, ele me odiaria — resmunguei, meus
lábios tremendo enquanto eu falava. — Ele odiaria que eu tivesse
me contaminado com um criminoso.
Tia Sarah suspirou.
— Não, ele não odiaria — ela me assegurou. — Claro, você
poderia ter talvez... escolhido alguém melhor para estar. — Um fraco
sorriso se formou em meus lábios, mas eu não encontrei seus olhos.
Tia Sabrina ainda estava me abraçando como um bebê. — Mas
você se uniu quando ele te ajudou. Está bem. Ele estava lá quando
você poderia se sentir sozinha.
— V-Você acha que ele estava comigo só para ver se eu me
lembrava? — Eu me atrevi a perguntar, abrindo meus olhos. Meus
soluços haviam parado. Eu não sabia por que ainda estava
tentando. — P-Por que ele não me matou? Eu disse a ele que não
me lembrava da noite do acidente. — Um familiar par de olhos
negros e um sorriso travesso surgiram em minha mente. Eu não o
tinha visto em um longo mês, nem ele me procurou.
Ele ainda pensava em mim?
Ele se importava mesmo?
Gostaria de poder apagá-lo da minha mente completamente.
Ninguém me respondeu.
Eu me afastei de tia Sabrina e endireitei minhas costas.
Alcançando minhas mãos, enxuguei meus olhos com as costas dos
meus dedos. Um suspiro ofegante deixou meus lábios agora que o
fardo havia sumido do meu peito.
— Você vai prendê-lo? — perguntou tia Ines.
Congelei. Eu deveria. Era a coisa certa a se fazer.
— Ele é um assassino — acrescentou tia Sarah.
— E-eu... — minha voz estava cheia de conflito.
Alguém esfregou meu ombro e funguei.
— Deixe-a em paz — tia Sabrina repreendeu suas irmãs mais
novas. — Vamos viver um dia de cada vez.
Encontrei seus olhos e dei um sorriso agradecido e tímido. Ela
deu um sorriso conhecedor e se inclinou para dar um beijo na minha
testa, como ela costumava fazer quando eu era criança. Duas das
minhas tias agarraram minhas mãos e as apertaram. Encontrei cada
um de seus olhos.
Elas não eram apenas minhas tias, nem eram apenas minhas
guardiãs. Elas eram minhas mães. Todas elas. As pessoas tinham
uma mãe ao crescer ou nenhuma, e eu era tão abençoada com três.
Ainda as tinha em minha vida, e elas aceitavam a mim e meus
defeitos. Fui criada em uma casa de mulheres fortes.
Se meu pai estivesse vivo, o que ele faria?
Um sorriso fraco se formou em meus lábios. Não me lembrava
dele, mas imaginava a única coisa sã que um pai protetor faria.
Pegar um rifle e marchar até a casa do culpado por quebrar o
coração de sua filha e por arruinar sua vida.
Podia ver Driss fazendo isso por Noura. Meu sorriso diminuiu. Se
ele estivesse vivo, ele teria feito isso.
— Quero sair daqui — revelei. Encontrei seus olhos novamente.
— Quero que todas vocês e Noura venham comigo. Um novo
começo. E-eu... só quero esquecer.
Elas trocaram olhares uma com a outra antes de encontrar meus
olhos esperançosos novamente. Soltaram minhas mãos agora, e eu
senti falta de seu calor e cuidado.
— É sábio fugir? — Tia Sarah perguntou baixinho.
Fechei meus olhos. Foi a mesma coisa que Miran tinha me
perguntado.
Eu me perdi em um homem como nunca tinha me perdido antes.
Com Driss, estava protegida.
Com Alexander, canalizava minha escuridão.
— Eu deveria ter me mudado quando descobri que Driss estava
morto — disse, outra lágrima escorrendo pelos meus olhos. — Se
tivesse, nada disso teria acontecido.
Estendi a mão e limpei meus olhos novamente.
Tia Sarah desapareceu da sala e, alguns momentos depois,
voltou com um guardanapo molhado e me entregou. Sorri com o
gesto e peguei dela com dedos trêmulos. Estendendo a mão,
enxuguei os olhos, esperando consertar minha aparência
manchada. Não sabia como estava, mas, felizmente, eu não tinha
nenhuma maquiagem, então, pelo menos não precisava me
preocupar com isso.
A umidade fria do guardanapo se instalou na minha pele
aquecida, esfriando minhas entranhas junto com ela. Com um
suspiro, terminei de me limpar. Antes que pudesse me levantar e
jogá-lo fora, tia Sarah arrancou o guardanapo das minhas mãos e foi
até a cozinha para descartá-lo.
— Vamos com você, onde você quiser.
Meus olhos voaram para tia Sabrina.
— Você tem razão. — Ela deu um sorriso triste. — Este local tem
muitas lembranças ruins. Uma boa mudança de cenário seria boa.
— A casa vai levar tempo para vender — respondi logo depois.
Ela inclinou a cabeça e colocou mechas atrás de minha orelha.
— Então, vamos nos mudar assim que vender.
Sorri carinhosamente para ela.
— Terei que fazer o jantar em breve — tia Sabrina disse.
— Posso ajudar — ofereci, levantando do meu assento.
Ela me dispensou com a mão.
— Não, você prepara o café da manhã para nós. Podemos cuidar
do resto das tarefas. — Ela ficou em silêncio antes de acrescentar:
— Além disso, você nos deixou ficar em sua casa, e aprecio isso.
Você nos pediu para ir embora com você, em vez de apenas levar
Noura e partir. Estou tão grata por isso.
Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ela esfregou meu
cabelo e foi embora. Tia Ines a seguiu, provavelmente para ajudá-la.
Presumi que tia Sarah nunca voltaria da cozinha. Um leve sorriso se
esticou em meus lábios enquanto eu me sentava e pensava no que
tinha acabado de acontecer. Minha felicidade durou pouco, porque a
campainha tocou.
— Eu atendo — gritei para minhas tias e fui para a porta.
Enxugando a última lágrima perdida em meu rosto, destranquei a
porta e a abri.
Não estava preparada para ver Alexander Nikolaev na minha
porta.
Bati a porta bem na cara dele, mas seu braço disparou pela
entrada com um rápido reflexo de relâmpago e a impediu de fechar.
Ele a abriu com força. Forcei um nó na garganta quando encontrei
seus olhos.
Apenas duas poças escuras e vazias de escuridão.
Tipo o meu agora.
Não o via há tanto tempo.
Um desejo encheu minha alma quando seu olhar profundo colidiu
com o meu novamente. Ele ainda parecia o mesmo, vestindo um
blazer preto com punhos cor de vinho, uma camisa branca de botão
e calças pretas. A barba estava aparada, mas o cabelo estava mais
comprido, ainda liso, mas passando da nuca, como se não tivesse
sido cortado recentemente.
Eu me perguntei o que ele estava fazendo na minha porta. Eu já
tinha fechado minhas portas para ele. Se ele tentasse alguma coisa,
usaria meus punhos e pernas.
Eu não disse nada enquanto o observava.
Meus olhos foram para o braço esquerdo dele, em que eu atirei
uma vez. Não estava engessado. Olhei de volta para seu rosto.
Seus olhos analisaram meu rosto, percorreram minha roupa, antes
de olharem de volta para o meu rosto. Esperei que ele falasse
primeiro. Se ele estava aqui para me ameaçar, é melhor ele fazer
isso rápido e sair. Sua boca se abriu e meus olhos caíram em seus
lábios, os mesmos que devastaram cada parte do meu corpo.
Mantive contato visual e me recusei a fugir dele.
— Ghislaine — disse ele em sua voz sedosa.
Eu me forcei a continuar respirando e mantive minha compostura,
embora meu corpo formigasse. Ele não podia mais me prender em
sua armadilha, em sua teia mortal.
— Quem é? — uma voz chamou atrás de mim.
Sem nem olhar, sabia que era tia Ines.
— O que diabos você está fazendo aqui? — ela gritou. Gostaria
que ela não o fizesse. Foi doce e protetor como o inferno, mas temi
sua retaliação. — Saia da nossa propriedade!
Olhei por cima do ombro e dei um pequeno sorriso.
— Vou cuidar disso — assegurei a ela.
Ela me deu um olhar de desconfiança e descrença.
— Vou pegar minha faca! — ela protestou e saiu correndo.
Essa não era a coisa mais sábia a dizer a um homem como
Alexander. Eu me perguntei se ele atiraria nela. Virei as costas para
minha tia e cobri sua figura desbotada com a minha, escondendo-a
de sua vista. Ele teria que passar por mim para chegar até ela, mas
ele nem sequer lhe deu um olhar enquanto seus olhos me
observavam.
Seus olhos se arrastaram para o meu pescoço, onde ele pegou
um brilho dourado de carne antes de engolir em seco. Seu olhar
percorreu meu corpo, demorando-se em minhas curvas. Eu usava
um suéter de lã branca e uma legging preta. Olhando para cima, ele
encontrou meus olhos novamente.
— Passarinho — ele disse.
Meu coração não acelerou dessa vez.
Provavelmente porque ele o matou.
Eu olhei friamente.
— Alexander.
Com certeza, não iria perguntar a ele por que ele estava aqui.
Ouvi passos e olhei para trás novamente.
Todas as minhas três tias estavam lá, segurando suas facas de
cozinha. Era uma visão que nunca poderia esquecer. Tia Sabrina
também segurava um tomate na mão. Acho que ela esqueceu de
colocá-lo de volta... Aquela era a arma dela? Não pude evitar
quando meu lábio superior se contraiu em um sorriso. Eu quase quis
rir delas.
— Cinco minutos — Alexander falou novamente.
Voltei minha atenção para ele.
Seus olhos procuraram os meus.
— Só preciso de cinco minutos.
Eu o olhei com olhos mortos.
— Você é indigno do meu tempo.
Seus olhos brilharam e sua mandíbula apertou.
— Vou embora — ele prometeu. — Depois que eu tiver cinco
minutos com você.
Arqueei uma sobrancelha, desafiando-o.
— E se eu não der?
Ele exalou uma respiração profunda no ar gelado, e saiu em
pequenas baforadas nubladas.
— Não teste meu controle, porque não tenho nenhum — ele
ameaçou.
Alcancei a porta para fechá-la em seu rosto novamente.
Um grunhido baixo saiu de seus lábios, e ele estendeu a mão, me
agarrando pelo braço, me puxando para a varanda.
Colidi com seu peito. Antes que pudesse protestar, ele fechou a
porta na cara das minhas tias. Algo bateu contra ela.
Alguém jogou um tomate?
Alexander apoiou todo o seu peso contra a porta, me prendendo
contra ela, ignorando os gritos e protestos vindos de dentro.
Elas não podiam mais abrir a porta. Nossa porta abria para fora,
em vez de para dentro da casa.
Respirei quando meus olhos vidrados encontraram os dele. Seus
olhos escureceram quando ele me olhou novamente. Estava tão
perto dele de novo. Era difícil respirar quando eu estava perto dele.
Sua presença ainda consumia cada fibra do meu ser.
Atrás de mim, a porta se moveu antes de Alexander bater os
braços nela novamente, mantendo-a fechada enquanto cerrava os
dentes.
Minha respiração ficou presa no meu peito quando encontrei seus
olhos cheios de angústia, minha cabeça entre seus braços.
— Cinco minutos — ele exigiu. — E diga às suas tias para assistir.
Assenti depois de um momento.
Ele ainda não se afastou, e suas mãos continuaram a descansar
nos lados opostos da minha cabeça, ainda segurando a porta. Ele
abriu a boca e sua respiração tocou meus lábios. Eu o inalei. Era tão
parecido com a noite em seu carro. Disse a ele que ouviria.
Agora, por que ele não estava recuando? Talvez ele nunca tivesse
a chance de estar tão perto de mim novamente. Talvez ele ainda
estivesse enrolando, ou eu estava tentando satisfazer meu coração
partido? Seus olhos se moveram dos meus olhos antes de cair para
os meus lábios.
— Você tem cinco minutos — sussurrei.
Ele se aproximou, e eu estava com medo de que ele pudesse me
beijar.
E eu poderia deixá-lo.
Um passo mais perto e seus lábios estariam em mim.
Minhas tias ainda gritavam atrás de mim, e uma delas chorou.
Meu coração se condoeu por elas, e meus olhos lacrimejaram com
seu tormento. Eu não conseguia nem virar a cabeça para olhar para
a porta. Ele me pressionava contra ela sem ter para onde me mover,
como um pássaro canoro engaiolado. Ele me tinha sob seu controle
novamente, e eu me odiava por não querer me afastar dele.
— Alexander — disse, procurando através de seus olhos,
implorando sem dizer nada. — Elas têm medo de você.
Sua mandíbula apertou, e sua testa fria descansou contra a minha
aquecida. Eu parei de respirar. A sensação era tão familiar.
— Acham que eu vou te machucar?
Sua voz, um sussurro contra meus lábios.
Meus olhos brilharam e eu exalei.
— Mas você já machucou, não?
O tique em sua mandíbula desapareceu e seus braços caíram da
porta. Seu calor desapareceu, deixando-me fria.
— Coloque seus sapatos e volte para fora.
Olhei para os meus pés. Eu nem estava usando sapatos. Pelo
menos tínhamos uma varanda. A neve não podia entrar aqui. Ainda
assim, estava congelante, e meus pés estavam ficando gelados.
Baixando meus olhos, virei meu rosto para a porta e limpei minha
garganta.
— Está tudo bem — tentei assegurá-las. — Estou bem. Vou abrir
a porta. Não me ataquem pensando que é... ele.
Imediatamente, os ruídos internos pararam.
Soltando um suspiro, abri a porta e espiei para dentro.
O delineador de tia Sabrina escorria pelo rosto e tia Ines parecia
morta de medo. Tia Sarah estava a um segundo de desmaiar. Elas
ainda seguravam suas facas. Olhei para o tapete na frente da porta,
manchado com um tomate vermelho brilhante.
Então, estava certa, afinal.
— Vou falar com ele e ele vai embora.
Elas me olharam como se eu tivesse enlouquecido. Talvez eu
tivesse. Mas sabia que ele não iria embora até que eu falasse com
ele.
— Cinco minutos — prometi. — São apenas cinco minutos.
Desviei o olhar e entrei, enfiando os pés nos chinelos. Melhor do
que estar descalça. Elas pareciam hesitantes em me deixar sair.
— Em cinco minutos, se eu não abrir a porta, chamem a polícia.
Eu não era mais do FBI. Eu era alguém que havia falhado no meu
dever e, em vez de enfrentá-lo, desisti. Eu ainda tinha minhas armas
licenciadas para proteção, mas elas estavam lá em cima.
Elas assentiram antes de tia Ines avisar:
— Tenha cuidado.
Eu me virei para a porta. Saindo, a fechei. Inclinei-me contra ela e
encontrei o olhar de Alexander. Ele não tinha se movido daquele
lugar. Sua beleza violenta se destacava na pura neve branca que
nos cercava. Ele apenas me encarou. Ele pediu cinco minutos
apenas para olhar para mim? Ele não disse uma palavra, e o tempo
estava passando. A fúria entrou em minhas veias enquanto eu
olhava. Estava a um segundo de gritar minha na cabeça.
— Por que você está aqui, Pakhan? — perguntei finalmente.
Meu tom saiu mais como uma provocação do que eu queria.
Nenhuma resposta veio dele.
Ele não iria falar, mas eu, com certeza, iria agora.
— Você se aproximou de mim quando sabia tudo sobre mim.
Você estava me perseguindo o tempo todo... desde o hospital. —
Pensei que ele estivesse me seguindo porque gostava de mim, mas
agora eu sabia melhor. — Você sabia tudo sobre mim, que você era
responsável, mas você se colocou propositalmente na minha vida.
Você se aproveitou. — Balancei minha cabeça, o desgosto piscando
em meus olhos.
Seus olhos se estreitaram com a acusação.
— Não poderia ficar longe — ele admitiu, e minha respiração
engatou. — Eu tentei, mas... — sua voz sumiu.
— Então, você teve uma foda por pena com a viúva? — rosnei, e
eu tinha certeza de que meus lábios estavam se curvando em um
sorriso de escárnio feio.
Seus olhos brilharam e ele se aproximou de mim.
Ele adorava minha selvageria, minha escuridão, mas não quando
era claramente dirigida a ele.
— Não foi uma foda por pena.
Não tinha resposta para isso, então mudei de tópico.
— Quando você estava planejando me contar?
Pelo menos, ele teve a decência de desviar o olhar.
Eu zombei:
— Você nem estava planejando me contar.
Seus olhos ferozes brilharam.
— Você acha que eu diria que matei seu marido? — Ele balançou
a cabeça como se a ideia fosse bizarra. — Se fosse um acidente,
teria admitido… Mas não foi. Eu o matei intencionalmente e tentei
matar você também.
A franqueza de sua voz profunda me chocou, deixando-me
perplexa e de boca aberta. Como ele pode ser tão cruel? Gostaria
de ter meu telefone comigo para que eu pudesse pelo menos gravar
sua confissão. Mas ele era inteligente. Ele me pegou em minha casa
e sabia que não tinha nenhum rastreador ou gravação de câmera
em mim.
— Gostaria de nunca ter conhecido você — eu disse, balançando
minha cabeça descontroladamente.
Ele engoliu em seco, deixando o peso das minhas palavras atingi-
lo.
— Você é o pior erro da minha vida. Pessoas como você não
podem amar alguém. Você nunca vai entender o que é ser um
marido. Você nunca vai entender o que é ser pai. Você só sabe ser
um criminoso. Isso é tudo que você é. — Apontei um dedo em sua
direção, e meus olhos brilhavam ao mesmo tempo. — Você não
conhece um amor altruísta. Você é egoísta até o âmago. — Sua
pele pálida ficou vermelha, e ele parecia querer me sufocar. — O
que você acha que poderia ganhar entrando na minha vida? —
perguntei. — Você estava me espionando? Para ver o quanto eu
sabia?
Uma pequena parte de mim esperava ser provada errada.
— Ou você pensou que poderia substituir meu marido... com
você? — Fiz uma careta de repulsa. — Você não é nem metade da
pessoa que ele era. Você o tirou de mim. Você tirou um marido de
uma esposa... Um pai de uma criança... Um filho de seus pais... Um
irmão de seus irmãos. Pela primeira vez, sua consciência não
tremeu quando você... tentou nos matar sem piedade? — Meus
olhos se encheram d’água, e uma lágrima escorreu. Seus olhos se
estreitaram. Limpei rapidamente. — Você destruiu uma família. Você
destruiu tudo. Você é um animal imundo!
Seus olhos se estreitaram, e ele se aproximou até que um pé
ficou entre nós.
— Eu não era imundo um mês atrás — ele espetou.
Meu pulso disparou e eu engoli em seco.
Ele continuou, sua voz caindo tão baixa:
— Você adorou quando minha boca e minha língua devastaram a
porra de sua boceta rosa. — Olhei para o chão, em qualquer lugar,
menos para ele. — Você gozou tão forte todas as vezes. Eu fiz você
esquecer seu próprio nome. Eu não era sujo quando te beijei.
Quando estava fodendo você. — Meus olhos se arregalaram. —
Quando possuí você. — Seus olhos ameaçadores se encheram de
um brilho perverso, enviando arrepios pela minha espinha. — Você
me deixou fazer todas as vezes. — Seus lábios se curvaram em um
sorriso torcido e escuro, e ele acrescentou: — Sem a porra da
camisinha.
Meus olhos se arregalaram, e meu corpo ficou escarlate. Por que
ele tinha que trazer isso à tona? Esfreguei a nuca.
— Você sabia o que eu faço para viver. Você conhecia minha
causa. Você sabia quem eu era — ele rebateu. — Você poderia ter
ido embora também. — Minha pele ficou vermelha com sua verdade
letal, e a vergonha encheu minha alma. — Onde você achou que ia
dar, hein? Onde você pensou que iria daqui a alguns meses? Um
ano?
Perdi o fôlego.
— Eu confiei em você — minha voz falhou. — Todas as vezes que
você me disse para confiar em você, coloquei tudo de mim em suas
mãos.
É por isso que eu permaneci.
Olhei para cima, e o fogo em seus olhos se foi.
Ele parecia querer protestar, mas eu não terminei de falar.
— Você é um verdadeiro Pakhan, afinal — murumei baixinho. —
Você mente e é enganador. Você é egoísta... — Lágrimas encheram
meus olhos. — Você arruinou uma família, nada fica no seu
caminho. Você está pronto para matar qualquer um.
— Eu matei para me proteger, meu povo, minha Irmandade —
Alexander protestou.
Meus lábios se transformaram em um sorriso de escárnio.
— Foda-se sua Irmandade. Você é um monstro de coração de
pedra.
Sua postura ficou rígida, e seus lindos olhos negros se tornaram
ameaçadores. Eles não eram mais atraentes. Agora, eles pareciam
que iriam trazer o inferno para cima de mim. Eu respirei fundo.
Antes que pudesse falar novamente, seus longos dedos envolveram
meu pescoço. Meu corpo se acalmou e ficou rígido.
— Fale essa besteira de novo, e eu vou te mostrar que tipo de
monstro escondido eu sou exatamente — sua voz retumbou com a
ameaça.
Meu pulso disparou, e meu batimento cardíaco irregular
aumentou.
Desafio aceito.
— Foda-se sua Irmandade — repeti com os dentes cerrados. —
Foda-se. Vai embora. — Agora eu não conseguia parar de xingar.
Talvez eu tivesse um desejo de morte hoje.
Esperei que ele me matasse. Contei na minha cabeça. Levaria
apenas um estalo para ele torcer meu pescoço. Seus olhos
desolados se transformaram em aço. Ele apertou meu pescoço, seu
aperto como uma tocha de fogo, marcando minha pele.
Uma respiração ofegante e sufocada deixou meus lábios, e meus
olhos se arregalaram quando ele pressionou o meio do meu
pescoço, cortando meu ar. Sua cabeça inclinou quando ele apertou
a mandíbula. Era como provar a morte novamente. Estendi a mão e
o acertei no queixo.
Grunhindo, ele soltou seu aperto.
Pressionei minha mão no meu pescoço latejante.
— Você está disposto a... me machucar mesmo agora — acusei
através de pequenas respirações, meus olhos piscando com dúvida
de que ele realmente cumpriu sua ameaça.
Por que esperaria diferente? Eu balancei minha cabeça
descontroladamente, e meus olhos piscaram para conter as
lágrimas. Minha alma se partiu e se quebrou em pedaços.
— Você está desrespeitando minha causa — ele assobiou. — E
avisei você também. Se você fosse outra pessoa, eu já teria
quebrado seu pescoço.
Seus olhos intensos caíram para o meu pescoço. Ele deu um
passo em minha direção, mas eu só dei um passo para trás. Ele ia
me sufocar de novo? Minhas mãos trêmulas levantaram e
envolveram meu pescoço. Meus olhos se encheram d’água, e engoli
em seco. Seus olhos escurecidos encontraram os meus, mas seus
passos não pararam. Estendendo a mão, ele empurrou meus braços
para o lado. Tentei esconder meu pescoço dele novamente, mas ele
agarrou minhas mãos com força atrás de mim sozinho.
Uma respiração terrível deixou meus lábios, e fechei meus olhos,
esperando que ele me matasse. Contei os segundos na minha
cabeça. A qualquer segundo agora, e sua mão pousaria na minha
pele novamente.
Meu corpo tremeu quando seus dedos roçaram meu pescoço. Em
vez de apertar, eles traçaram a dor que ele causou com toques
suaves como penas. Uma lágrima rolou pelo meu rosto, e seus
lábios plantaram no meu pescoço, acalmando a pulsação. Seu
cabelo macio roçou minha bochecha, e inclinei minha cabeça
enquanto ele dava pequenos beijos.
— Você pode dizer o que quiser sobre mim, mas nunca sobre a
minha causa... Não gosto de te machucar — sussurrou, sua voz
rouca e misturada com algo ilegível. Ele era muito complexo, e eu
não conseguia entendê-lo. — É como machucar... a mim mesmo.
Meu coração caiu do meu peito, com medo de ter ouvido mal. Eu
quase queria que ele repetisse isso. Mordi o lábio para parar o
tremor. Se apenas beijos e palavras doces pudessem consertar
tudo. Exalando, virei meu rosto para longe dele, torcendo meu
corpo. Ele fez uma pausa. Seu aperto em minhas mãos afrouxou,
mas ele não me soltou. Soltei seu aperto e me afastei.
Limpei a garganta e disse:
— Você não vai chegar perto de mim ou da minha filha
novamente. Não vou perder outro filho por sua causa.
Os olhos feridos de Alexander pousaram no meu rosto.
— Passarinho — ele murmurou, estendendo a mão para mim
novamente.
— Nunca apareça na minha frente novamente — sussurrei. — Eu
te odeio.
Sua mão parou, e seus olhos surpresos se voltaram para o meu
rosto, como se eu tivesse lhe dado um tapa. Eles pareciam mais
sombrios, sem a malícia e o brilho que normalmente estavam neles.
Ele desviou o olhar de mim, olhando para o manto branco de neve.
— Como faço para acertar as coisas? — Eu nunca tinha ouvido
sua voz soar tão baixa antes. — Como faço para reconquistar você?
Meu coração traiçoeiro trovejou e quis que ele calasse a boca.
— Não há nada que você possa fazer — declarei, embora meu
coração tremesse. — Seus cinco minutos acabaram.
Os olhos de Alexander olharam para mim novamente. Ele apenas
me encarou, seus olhos memorizando minhas feições como se
nunca mais fosse me ver. Seus passos se afastaram, e ele virou as
costas para mim. Ele desceu os degraus, afastando-se da varanda,
de mim e da minha vida. Tive que cruzar as pernas para não impedi-
lo de sair.
Minha cabeça tombou para frente enquanto eu olhava para o
chão.
Uma pergunta estava na ponta da minha língua.
— Por que você não tentou me matar de novo depois que acordei
do coma? — Minha voz estava tão baixa, como se eu nem tivesse
falado nada.
Fechei os olhos, com medo de sua resposta.
— Noura — Alexander sussurrou. — Conheci Noura e não
consegui matar a mãe dela.
Meus olhos cheios de lágrimas voaram para cima, mas ele não
estava olhando para mim enquanto falava. Suas costas ainda
estavam viradas, e eu desejava ver seu rosto.
— Então, quando conheci a mãe dela, não pude deixá-la ir. Se
você morrer, morro também — ele disse em uma voz tão baixa.
Suas palavras sugaram a voz para fora de mim.
Percebi que ele não tinha me matado quando eu atirei nele
naquele dia, não porque ele estava com medo da morte.
Ele me poupou porque não queria... me perder.
Alexander foi embora, me deixando sem fôlego.
ALEXANDER

29

Duas semanas depois

OS OUVIDOS DE Alexander sintonizaram nos gritos diários das


mulheres que ele ouvira tantas vezes. Aqueles aos quais era imune.
Um carregamento de dois caminhões cheios de contêineres estava
sendo enviado hoje. Ele estava dando uma volta, certificando-se de
contabilizar todas as garotas.
— Há alguma notícia de Dimitri? — ele perguntou a Adrik.
Seu irmão não respondia desde o carregamento atual. Fazia
semanas e ele não havia retornado. Lembrou-se da última vez que
falara com ele.

— O que você está fazendo? — Alexander perguntou


suavemente. — Você deveria atender seu telefone quando eu ligar.
Dimitri ficou em silêncio por um segundo antes de falar:
— Fui grampeado.
— Onde está Nove?
Dimitri ficou em silêncio novamente.
— Adeus, irmão.
Então, Dimitri desligou.
Confuso, Alexander tentou falar com ele novamente, mas o
telefone estava desligado.

— Não — respondeu Adrik. — Ele está fora do radar.


Alexander alcançou o contêiner do meio e estava prestes a
marcar a mercadoria quando uma voz protestou:
— Vou morrer aqui!
Ele ignorou.
— Por favor! — uma voz feminina implorou.
Virando as costas para ela, ele a ignorou, indo embora. Elas eram
apenas vozes para ele. Mercadoria. Não humanos.
— Não consigo respirar aqui!
Ele fez uma pausa.
Olhando por cima do ombro, caminhou em direção à voz feminina.
Se a mercadoria não pudesse respirar, ela morreria na longa viagem
de cinco horas. Talvez tenha sido um estratagema para ganhar
algum tempo. Ainda assim, ele tinha que verificar.
Curioso, parou na frente do contêiner. Seus olhos encontraram
um par de olhos verdes marejados. Eles estavam com as bordas
vermelhas, e lágrimas brotavam neles. Ele nunca mantinha contato
visual com a mercadoria. Se alguém o fizesse, entrava em conflito e
não podia mais fazer o trabalho bem. Seus olhos baixaram,
estreitando os olhos nas mãos da mulher entrelaçadas na frente de
sua barriga. Seu vestido branco solto a cobria, o tecido envolvendo
seu pequeno corpo. Mas ele ainda podia ver tudo. Sua barriga
grande.
Uma barriga muito grávida.
Sua respiração ficou presa em seu peito, atordoado com a visão.
Grávida. Eu estava grávida quando você tentou nos matar.
Afastando seus pensamentos, ele se concentrou no corpo da
mulher. Ela parecia grávida de pelo menos sete meses.
Ele nunca tinha vendido uma mulher grávida antes.
— Adrik — ele fervia baixinho. Seu soldado veio correndo até ele.
— Quem diabos fez esse pedido? Porque, com certeza, não fui eu.
— Ele apenas comandava, e seus homens faziam as ordens.
Quando Adrik não respondeu, seus olhos assassinos se voltaram
para encará-lo. Dois outros soldados se alinharam ao lado de Adrik.
Eles olharam para qualquer lugar, menos para ele, ainda sem lhe
dar uma resposta.
— Não vendo fêmeas grávidas.
Um grunhido baixo saiu de sua boca enquanto falava, e ele
desejou ter sua motosserra apenas para matar seus homens agora.
Uma arma não era suficiente.
— D-Deve ter sido um erro — Adrik protestou.
Alexander lançou-lhe um olhar, e o Vor olhou silenciosamente
para o chão.
— Ela não deveria fazer parte da mercadoria. O comprador não
está esperando uma mulher grávida — ele ferveu. — Quem diabos
vai fazer o parto do bebê dela lá? — Ele duvidava que o comprador
a deixasse ficar com o bebê, em primeiro lugar.
Passando a mão pelo rosto, ele falou:
— Ela não pertence aqui. Levem-na para casa.
Adrik olhou para cima, atordoado. Então, ele olhou para a fêmea
que havia parado de chorar. Alexander encontrou seus olhos
curiosos. Ela estava ouvindo a conversa deles.
— Pakhan, ela viu nossos rostos — protestou Adrik. — Ela é um
problema.
Arqueando uma sobrancelha, ele se virou e foi até a garota. Ele
não sabia o nome dela. Seus nomes não importavam em seus
negócios. Ela seria apenas um número.
A mulher grávida se afastou das barras de metal do contêiner,
dando um passo para trás, tremendo de pavor. A transpiração
deixou seu cabelo loiro emaranhado e suas mechas molhadas
grudadas na testa suada. Seu vestido estava úmido também. Ele
não ficaria surpreso se ela se mijasse agora que ele estava tão
próximo dela.
— Você sabe quem eu sou?
Sua voz não era suave enquanto falava, mas severa.
Depois de um segundo, ela abaixou a cabeça.
— Meu nome é Alexander Nikolaev — continuou ele, de qualquer
maneira. Ela apertou a mão sobre a boca ofegante. — Lembre-se
sempre desse nome. Você pode voltar para casa. Meus homens
levarão você e seu bebê para um lugar seguro.
Ela olhou para ele como se fosse bom demais para ser verdade.
— Ninguém vai te machucar. Você tem minha palavra. — Essas
palavras não soaram bem saindo de sua boca enganosa, porque ele
disse repetidamente “confie em mim” para Ghislaine, apenas para
quebrar seu coração no final. — Nunca fale sobre este incidente
novamente — ele advertiu, os cantos de seus olhos se estreitando.
— Você não mencionará meus homens ou minha Organização para
uma única alma. Se você revelar qualquer tipo de informação, não
posso mais garantir sua segurança.
Sua boca caiu aberta antes que ela a fechasse.
— Você entende? — ele perguntou baixinho.
Ela assentiu obedientemente.
Satisfeito, ele desviou o olhar e se virou para Adrik:
— Devolva o número vinte.
Ele se virou para ir embora e continuar contando o resto da
mercadoria.
Alguns passos abaixo, uma voz falou atrás dele:
— Olivia.
Ele fez uma pausa.
— Olivia Hamilton — a voz feminina disse.
Seus ombros ficaram tensos, e ele olhou para trás.
A mulher encontrou seus olhos novamente, ainda com medo, mas
ousada agora.
— Meu nome é Olivia Hamilton.
Sua mandíbula se apertou, e ele desejou que ela não tivesse
falado o nome dela. Ele não gostava de conhecê-las. Quando seus
olhos brilharam, ela se encolheu e virou as costas para ele.
Cerrando os dentes, ele se virou e continuou andando. Não mais
com vontade de contar, ordenou que um de seus soldados
terminasse antes de deixar a área.
Agora, ele nunca esqueceria que uma vez quase vendeu uma
mulher chamada Olivia.
Eram nove e meia da noite quando ele parou na casa de
Ghislaine.
O sol havia se posto e não havia nuvens no ar. Apenas o céu
escuro e melancólico sobre sua cabeça. Estava escuro como breu,
e o inverno ainda estava por perto. Ele não tocou a campainha
desta vez, já que ela não o deixaria entrar, de qualquer maneira.
A última vez que ele a convenceu por cinco minutos, ele não foi
capaz de dizer nada a ela. Quando ela esteve tão perto dele
novamente, isso o deixou perplexo. Ela ainda era linda. Aquelas
olheiras voltaram e grudaram em sua pele como sacos de corvo.
Seus olhos, uma vez brilhantes, estavam mais escuros, como se ele
tivesse sugado a luz deles.
Apertando os dentes, ele parou no quintal dela, olhando para seu
quarto. Suas cortinas ainda estavam abertas. Surpreendeu-o que
ela não as fechasse, sabendo que ele a observava.
Talvez ela presumisse que ele não a observava mais? Mas ela
estava errada. Ele observava. Todas as noites, ele vinha. Ela nunca
olhou para fora da janela, ou talvez estivesse com medo do que ela
poderia encontrar lá fora à espreita no escuro.
Às vezes, ele a via pairando perto da janela, olhando para o teto
com olhos vazios. Ele não gostava nada disso.
Ele a tinha visto se despindo e se vestindo também. Isso sempre
aquecia seu corpo gelado, e ele queria subir na casa dela, bater
contra a mesma janela e fodê-la até que ela o aceitasse de volta.
Ele a observava sempre, fosse ele ou seus homens rastreando-a
quando estava ocupado. Nunca a tinha visto com outro homem.
Miran não contava, porque era fiel demais para trapacear. As pontas
dos dedos dele formigavam, querendo esmagar o próximo homem
que ousasse tocá-la nos seios. E se um dia ela começasse a
namorar outra pessoa? Ela o odiava. Certo. Mas ninguém mais
estava colocando a mão nela. Ele a arruinou no final.
Suas luzes estavam acesas e seu corpo se movia.
Ela estava fazendo sua rotina habitual e carregava sua camisola
nas mãos. Era sua parte favorita. Ele enfiou as mãos frias nos
bolsos da calça, esperando que elas esquentassem. Tinha parado
de nevar, mas a neve ainda estava no chão. O ar era como gelo,
sugando seu oxigênio e o sangue seco. Vestindo seu casaco de lã
preto, ele inclinou a cabeça enquanto olhava para ela.
Ela desceu a bainha de sua blusa rosa e puxou-a sobre os
ombros. A cor que ele era obcecado nela. Ele queria estar no quarto
dela e tirar a blusa em vez disso, mas perdeu esse privilégio. Como
aquela blusa ousava tocá-la quando a única coisa que ele podia
fazer era olhar?
Ela era dele, caralho.
Ele ficou duro como pedra em sua calça. Seus olhos se
aqueceram quando seus seios exuberantes, que estavam
modestamente cobertos com um sutiã de algodão branco, encheram
sua visão. Os mesmos que ele provou com a boca e amassou com
as mãos inúmeras vezes. Sua pele dourada e limpa estava
intocada. As marcas de mordida que uma vez ele deixou,
desapareceram.
Apertando os dentes, ele queria invadir sua casa e possuí-la
novamente. Seria tão fácil invadir, sequestrá-la e levá-la para sua
casa antiga em Old Westbury, onde ela pertencia por direito com
ele. Seria tão fácil ligá-la a ele. Ela o odiaria no começo, choraria
até, mas, então, ela não teria escolha a não ser aceitá-lo.
Você me trancou.
Não seria a Ghislaine que ele queria.
Você tirou de mim a mesma coisa que você queria que eu fosse.
Livre.
Apenas uma casca do que ela costumava ser.
Você me enjaulou novamente.
Não. Ele não a sequestraria. Em vez disso, esperaria.
Esperaria que ela voltasse para ele.
Ele fez uma promessa para ela.
Seus olhos permaneciam nela o tempo todo. Ela abaixou a calça
jeans. Seus peitos brincando de esconde-esconde com ele, e jogou
a roupa na cama. Estava prestes a tirar o sutiã, mas, então, ela fez
uma pausa. Sua cabeça se moveu para a direita antes de seus
olhos se erguerem e olharem para a janela.
E diretamente para ele.
Seus olhos não mostraram sinais de surpresa e choque. Eles
estavam desolados quando encontraram seu olhar faminto. Ele
sabia o que estava por vir agora que ela o pegou.
Opção um: ela sairia correndo de casa com sua arma como a
corajosa que era. Opção dois: ela fecharia as persianas e cortinas
em seu rosto. Talvez ambos.
Sem se mover, ele ficou parado, e seus olhos perfuraram os dela.
Ela estava lá em cima, no alto da segurança de sua casa, e ele
estava lá embaixo, no chão. Tão perto, mas longe dela. Ela se
moveu em direção às cortinas, e ele engoliu em seco. Ela ia excluí-
lo, como vinha fazendo há quase dois meses. Sua alma se agitou,
querendo protestar, mas ele ficou quieto.
Ela estava perto da janela, encontrando seus olhos.
Ghislaine deu um passo para trás, seus braços finos alcançando
suas costas, e desabotoou o sutiã. Ela deixou cair no chão. Bem...
Essa era uma terceira opção que ele não esperava. Ela não tirou os
olhos dele o tempo todo. Ficou lá, apenas em sua calcinha branca,
exposta para os olhos dele. Ele queria alcançar e traçar seus dedos
sobre ela novamente, mas estava do lado de fora, e ela estava
dentro. Suas mãos se ergueram e seguraram seus seios pesados.
Porra. O que ela estava fazendo?
Atordoado, ele olhou vorazmente para sua luz e sua escuridão.
Seus olhos pareciam o desafiar, como se ela estivesse dizendo:
você não pode mais me ter. Ele cerrou os dentes antes de apertar
os lábios. Ela arqueou uma sobrancelha antes de dar um sorriso
amargo.
Mensagem recebida então.
Ainda assim, ele não se mexeu e assistiu ao show que ela deu
para ele. Ele quase estendeu a mão por baixo de sua calça para
agarrar seu pau grosso, que estava pronto para explodir, mas ele se
forçou a fazer uma pausa. Não. Ela estava fazendo isso de
propósito, para atormentá-lo, para puni-lo. Isso era tudo para ela, e
não para ele. Ele gostava quando ela estava empoderada e no
controle, mas não quando tinha poder absoluto sobre ele. Ele não
conseguia pensar direito então. Ele era o maldito Pakhan, e não um
maldito Romeu. Claramente, ela estava se divertindo um pouco
demais, seu rosto em chamas impiedosamente enquanto ele estava
do lado de fora de sua janela à sua mercê.
Certo. Ela poderia fazer isso. Mesmo que fosse tão doloroso
observá-la. Com a mandíbula tensa, ele cruzou os braços sobre o
peito e olhou diretamente nos olhos dela.
Jogue o seu jogo, Monstrinha.
Ela estreitou os olhos antes de se abaixar e tirar a calcinha. Se
ele não estava a um segundo de explodir antes, agora, essa
necessidade estava... matando-o.
Ele olhou para seu corpo brilhante e exuberante, seus dedos
formigando para traçar cada centímetro de sua pele novamente. Ela
estava deixando-o olhar, mas ele não podia tocá-la. Um tormento
que ele nunca desejaria para seus piores inimigos. Isso era
excruciante, mas ele disse a si mesmo para aceitar. Ele a teria de
qualquer maneira que ela se entregasse a ele.
Seus olhos pousaram nos seios redondos antes de se concentrar
em suas coxas. Sua boca encheu d’água, e ele mordeu o lábio.
Ainda segurando seu olhar, suas bochechas rosadas queimaram,
mas seus dedinhos se moveram em direção à sua linda boceta. Ele
moveu as pernas enquanto olhava para ela. Seus dedos
bombeavam para dentro e para fora enquanto ela se tocava e o
fazia assistir. Isso era pura agonia, mas ele estava congelado no
chão, e seus olhos fixos nela como um transe. Ele queria pegar
aqueles mesmos dedos e sugá-los até secar.
Sua pequena boca doce se abriu antes que ela mordesse o lábio.
Puxando os dedos mais fundo em seu calor, ela segurou a mesa ao
lado dela. Sua boca se abriu novamente, e ele imaginou seus
pequenos gemidos e grunhidos. Ele não podia ouvi-la, porque a
janela estava fechada, e ele odiava. Ela o estava fazendo assistir,
mas ele não conseguia ouvir aqueles sons preciosos e prazerosos
saindo de sua boquinha.
Ela estava tão malditamente molhada, sua excitação escorregadia
contra seus dedos. Sua cabeça levantou, e seus olhos se moveram
para longe dele, expondo seu pescoço longo e esbelto, no qual ele
queria afundar os dentes. Porra, se ele estivesse na frente dela, ele
a faria engasgar com seu pau tão forte, chorar lindas lágrimas.
Ela era deslumbrante e feliz assim. Apenas para seus olhos. Ela
se tocava em sua ausência? Ele não sabia. Talvez tenha se tocado
na cama, mas ele não podia vê-la quando ela estava deitada. Sua
ereção se alongou em sua calça, gritando por uma liberação, e ele
se mexeu novamente. Por que diabos ele estava se submetendo a
isso de novo?
Um momento depois, sua boca se abriu, e ele desejou que ela
pudesse olhar para ele novamente. Deixá-lo vê-la gozar.
Mas ela não encontrou seus olhos novamente, como se tentasse
propositalmente não deixá-lo vê-los. O tempo passou, e sua boca se
abriu e sua mão agarrou a mesa mais próxima com força. Com as
pernas bambas, ela se contorceu para ficar de pé.
Ela gozou, e não o deixou ver seus olhos.
A fúria se agitou em suas veias, marcando suas entranhas
enquanto sua mandíbula apertava. Ela abriu os olhos, e seu olhar
atordoado encontrou o dele. Ele queria gritar, mas ela apenas sorriu.
Caralho, ela sorriu, do mesmo jeito que ele sempre fazia com ela.
Ele lambeu os lábios, perguntando-se se já deveria sequestrá-la.
Então, ela virou as costas nuas para ele e saiu.
Ela não mais apareceu em sua visão.
A ira saiu de seu corpo, ameaçando queimar todos ao seu redor.
Ele fez a única coisa que não deveria. Com as pernas trêmulas,
pegou uma pequena pedra próxima e a jogou contra a janela dela.
Volta.
Faminto, seus olhos a procuraram. Quando ela não voltou, ele
jogou outra pedra. Talvez ela tivesse ido buscar sua arma? Ele
perdeu a cabeça, de qualquer maneira, atirando pedras na janela de
uma mulher. Ele estava prestes a pegar outra pedra, mas Ghislaine
voltou, vestindo uma camisola. A mesma maldita camisola rosa com
que ele a viu antes. Agora, isso era pura tortura.
Ela cruzou os braços sobre o peito, olhando para ele. Sua
mandíbula ficou tensa, desafiando-a a atirar nele. Ela foi até a janela
e, finalmente, abriu o trinco antes de levantá-la. Ela descansou os
braços na janela antes de encará-lo. Sua pele, ainda brilhante e
úmida de sua liberação. O ar ventoso soprou suas mechas sedosas
para trás e seus dentes batiam no frio.
— Que porra foi essa? — Alexander exigiu.
Ghislaine apenas enfiou o nariz no ar.
— Por que você não me deixou vê-la gozar?
Suas bochechas queimaram antes que ela finalmente falasse.
— Você viu meu corpo. Isso foi bom o suficiente.
Ele odiava aquele tom provocador dela.
Ele exalou, sua ereção finalmente diminuindo, embora agora ele
estivesse preso com fodidas bolas azuis.
— Eu... — ele respirou com dificuldade pelo nariz. — Não vi seus
olhos.
Não é a mesma coisa.
Ela desviou o olhar dele, não deixando que ele visse seu rosto.
— Vá embora, Alexander — ela disse em voz baixa.
Ele teve que se esforçar para ouvi-la. Então, ele a encarou.
— Você não disse isso nos últimos vinte minutos desde que eu
estava aqui.
Seus olhos voaram para ele e seu lábio inferior tremeu, suas
sobrancelhas enrugando. Porra, ela ia começar a chorar de novo?
Sua alma morreu um pouco por dentro.
— Não chore — ele sussurrou, olhando para o chão agora. Ela
fungou, e ele olhou para ela novamente. Ela ainda não encontrou
seus olhos. — Retiro o que disse. Tá bom. Não me mostre seus
olhos — ele disse com uma carranca — Só não chora… — sua voz
sumiu.
Ela limpou o nariz, mas ficou olhando para o chão.
— Por que você continua me observando? — ela sussurrou.
Seus ombros ficaram tensos e ele engoliu em seco, pensando
muito consigo mesmo.
— Por que você continua deixando?
Seus olhos castanhos dispararam, arregalados como uma gazela.
Passando a mão pelo rosto, lentamente, uma percepção ocorreu-
lhe. Ela se despia todas as noites em seu quarto... e não em seu
banheiro.
— Você já sabe que eu observo você — ele falou, observando
sua expressão. Sua garganta balançou, mas ela ainda segurou seus
olhos. — Por que você não fecha as cortinas então?
A vergonha encheu seus olhos e ela desviou o olhar.
Peguei você. Seu lábio superior se contraiu.
Ela sabia que ele ainda a estava observando o tempo todo.
— Você não quer que eu pare.
Não era uma pergunta, mas uma afirmação.
O lábio inferior de Ghislaine tremeu antes que ela os apertasse
em desafio, recusando-se a olhar para ele.
Ele se acalmou, satisfeito com a realização. Ele concluiu que ela
pensou que ele tinha parado, mas ele nunca pensou que ela
pudesse fazer isso de propósito.
— Ghislaine... — ele sussurrou, sua ereção forçando contra sua
calça. Os olhos dela voaram para os dele. — Você gosta quando eu
vejo você como um maldito voyeur? Você gosta de se despir para
mim todas as noites, me dando um show tentador e me levando ao
limite?
Suas bochechas esquentaram e ela se moveu para se virar.
De novo, não.
— Você nunca me respondeu da última vez que nos encontramos.
Ela fez uma pausa.
— O que é preciso para você ser minha de novo?
Seus olhos dispararam para ele, e ela balançou a cabeça.
Um sentimento de desânimo e desesperança caiu em sua alma
carbonizada.
— Não há como eu consertar isso? — ele questionou.
Seu lábio se curvou em um sorriso amargo.
— Não há como voltar atrás do que você fez — ela acusou. Seus
olhos escurecidos encontraram os dele. — Você não pode consertar
nada. Você não pode nos consertar. — Um suspiro deixou seus
lábios quando ele encontrou seu olhar ferido. A mesma dor que ele
causou. — Você não pode esperar entrar dançando na minha vida e
pensar que eu nunca descobriria a verdade... Por que você entrou
na minha vida, afinal?
— Eu não... Pelo menos, não no começo — ele admitiu. — Noura
me pegou do lado de fora e me arrastou para ver sua mamãe-
princesa — seu lábio se contraiu, lembrando-se da memória. —
Quando você acordou, não consegui esquecer seus olhos. Eles me
assombravam — ele continuou, baixando a voz e falando as
palavras que ele queria dizer da última vez que a viu. Seus olhos
olhavam para frente agora. — Achei que você me reconheceria
como o homem que ordenou o golpe. Mas você não reconheceu.
Nos meses seguintes, não vi você, mas você também não me
prendeu. Fiquei curioso e reencontrei Noura. — Seus olhos se
ergueram e seus lábios se curvaram em um leve sorriso. — Sempre
foi Noura. Ela nos uniu.
A garganta de Ghislaine se contorceu, e uma lágrima escorreu por
seu rosto.
Ele queria limpá-la... ou lambê-la, mas estava longe demais.
Exalando, ele continuou:
— Quando te encontrei novamente, você não falou sobre o
acidente. Achei que talvez fosse porque Noura estava por perto...
Mas percebi que você não se lembrava. Fiz algumas pesquisas —
ele admitiu — e descobri que você teve amnésia sobre o acidente.
Você não conseguia se lembrar.
Ghislaine não disse uma palavra, e seus olhos se encheram de
lágrimas. Ele não sabia qual olhar era pior para ela, quando seus
olhos estavam vazios ou quando estavam cheios de lágrimas.
Matou sua ereção.
— Não cheguei perto de você para ver o que você lembrava. Não
fiz isso porque eu era o seu caso. Fiz porque... — sua voz sumiu
sem terminar.
Por fim, ele fez a única pergunta na ponta da língua.
— O que preciso fazer para acertar?
Ghislaine enxugou as lágrimas com as costas da mão.
Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, ele acrescentou:
— E não me diga para sair da sua vida, porque eu não vou
desistir de você.
Assustada, suas sobrancelhas franziram, e ela o encarou longa e
duramente. Ela falou com sua voz suave:
— O que você acha que é a coisa certa a fazer, Alexander? — Ele
segurou seu olhar, não querendo desviar do dela. — Eu acho que
você sabe — ela declarou e deu um sorriso amargo. — Mas você
não quer fazer a coisa certa... Porque você pensa como um Pakhan,
e não como um homem.
Com isso, ela deu um passo para trás e abaixou a janela.
Fechou as cortinas também.
Um movimento simples que torceu sua alma e enfiou uma adaga
por ela. Ela finalmente o estava excluindo para sempre.
ALEXANDER

30

ERAM 17h55 QUANDO Alexander entrou no grande prédio de


granito. Seus olhos traçaram a área da recepcionista e os azulejos
creme sob seus pés. Os transeuntes olharam para ele antes de
desviarem seus rostos. Muitos o reconheceram e correram,
esperando não colidir com ele. Ignorando-os, seus olhos se
concentraram no elevador, e ele pressionou o botão SUBIR. Quando
o elevador chegou, estava vazio. Entrando nele, apertou o botão
para o quinto andar.
Batendo o pé, seus ouvidos se animaram quando a campainha do
elevador tocou. Ele se abriu, e ele olhou para a porta de vidro a
poucos metros de distância. Puxando a maçaneta da porta, estava
satisfeito que ainda estava destrancada. Escritórios enormes o
receberam quando entrou. Pequenas estações de trabalho em todos
os lugares.
Seus olhos vasculharam de volta, procurando o escritório central.
Ele nunca esteve aqui antes, então levou alguns momentos para
localizá-lo. Seus olhos vasculharam dentro de uma sala, e seus pés
viraram naquela direção, seus olhos cheios de reconhecimento.
Seu olhar caiu sobre a pessoa que veio ver.
Uma figura alta e encorpada familiar, vestindo roupas formais.
Claro, sem terno e gravata.
Ele olhou para a placa de identificação na porta.
Diretor da DEA Miran Demir.
Como se sentisse seus movimentos, o chefe Miran ergueu os
olhos de arquivar sua papelada. Era sua hora de sair, e Alexander
tinha escolhido o momento perfeito para pegá-lo. Não havia
ninguém ao redor deles, e a sede estava vazia.
Miran arqueou uma sobrancelha antes de acenar para ele entrar.
Mesmo que Miran não tivesse assentido, ele teria entrado de
qualquer maneira. Olhos castanhos endurecidos o encontraram.
Alexander não estremeceu sob seu olhar e o encarou bem nos
olhos.
— O que te traz aqui? — perguntou Miran.
Ele adivinhou que eram formalidades agora.
A relação de sangue deles era para sempre.
Alexander sentou-se em frente a Miran.
Miran apenas piscou friamente e se inclinou em sua cadeira de
couro preto.
— Minha esposa está me esperando — disse ele depois de um
momento. — Recomendo ir direto ao ponto.
Alexander inclinou a cabeça:
— Ghislaine Khalil.
Duas semanas se passaram desde que ele a viu.
Duas semanas desde que ela lhe deu um ultimato.
Miran arqueou uma sobrancelha, mas seus ombros ficaram
tensos.
— O que tem ela? — Quando Alexander não respondeu, Miran
exigiu. — Você a machucou? — Eu quebrei ela. — Ela não é seu
novo brinquedo, primo — Miran advertiu. — Deixe-a em paz.
— Eu matei Driss Khalil.
Ele confessou a única coisa que poderia arruiná-lo.
Miran parecia perplexo, pego de surpresa antes que seus ombros
caíssem contra o assento. Antes que pudesse questionar qualquer
coisa, Alexander acrescentou:
— E eu tentei matar Ghislaine Khalil também.
Miran estava quieto, mas seus punhos se fecharam e se abriram
em cima da mesa. Ele parecia querer sufocar Alexander até a
morte.
— O acidente de que todos falam... — Alexander disse com voz
rouca — Não foi um acidente. Meus homens pegaram os agentes
espionando uma de minhas transações, e eu ordenei que eles
fossem mortos... Eles eram pontas soltas, e fiz o que todo Pakhan
faria. Destruí-los. — Miran cerrou os dentes, mas ainda não falou. —
Meus homens colidiram com o carro deles, jogando-os contra um
trem.
Miran bateu o pé com impaciência e sua mandíbula ficou tensa.
— O marido dela morreu por minha causa. Ela perdeu a memória
por minha causa — ele revelou toda a verdade agora.
— Por que você está me dizendo isso, Alexander? — gritou
Miran.
Os olhos escuros de Alexander permaneceram nele o tempo todo:
— Porque eu quero que você me prenda.
GHISLAINE

31

— MAMÃE — Noura gritou enquanto se sentava no meu colo.


Nas últimas semanas, eu estava em casa, não tinha nada além de
tempo em minhas mãos. Minhas mãos permaneceram rígidas ao
meu lado, em vez de envolver Noura.
Eu deveria ganhar o prêmio de mãe do ano.
Olhei para minha filhinha. Ela não conseguia dormir, então veio se
aconchegar comigo. Não com suas avós, mas comigo. Ela usava
pijamas amarelos e azuis de girassóis, e seu cabelo estava em seu
rabo de cavalo solto que eu tanto amava.
Bebê Sol.
A memória trouxe um leve sorriso ao meu rosto antes de removê-
lo completamente. O apelido combinava com ela. Essa garotinha
era linda demais, e seria uma luta manter os meninos longe dela
quando fosse mais velha. Por um segundo, não queria que ela
crescesse e ficasse assim para sempre.
Mas lembrei-me: o tempo nunca para ninguém. Ela herdou sua
tez dourada de mim. Seu cabelo castanho-claro — muito mais claro
que o meu — quase parecia dourado sob o sol.
Alexander ainda vinha todas as noites e ficava do lado de fora da
minha janela. Eu sabia, porque tinha espiado pelas cortinas. Olhei
para minha janela. Ele estava lá fora agora?
Não saberia, porque as persianas e cortinas pendiam sobre a
janela, me escondendo da vista dele. Meus dedos coçaram para
abrir as cortinas e espiar, mas eu quis ser forte.
Estava exausta, mas eu tinha que ser forte. Fechei as mãos em
punhos para parar a coceira, mas ela continuava.
Concentrei-me em Noura novamente.
Ela se parecia exatamente comigo, exceto que era uma criança
mais feliz, enquanto eu só usava uma carranca no rosto esses dias.
Ela não era uma criança selvagem e nunca teve acessos de raiva.
Eu me perguntei se ela tivesse vivido uma vida normal como as
outras crianças, daria as coisas como garantidas? Ela já havia
sofrido tanto quando criança. Sua inocência ainda estava lá, mas ela
era madura para sua idade.
Muito amadurecida.
Agora, eu queria saber se isso era normal.
— Mamãe — sussurrou Noura contra meu peito.
Olhei em seus lindos e grandes olhos castanhos. Não pude deixar
de estender a mão e colocar aquela franja dela para trás, para que
eu pudesse ver seu lindo rostinho de cupcake. Ela sorriu
docemente, e isso me derreteu na hora.
— Tô tão felij que voxê tá de volta, mamãe — ela colocou os
braços mais apertados contra a minha cintura. — Vijitei voxê todos
os dias no hospital, para voxê acordar.
Meus olhos brilharam. Por que ela tinha que dizer coisas tão
incríveis? Sempre me deixava uma bagunça desgrenhada. Piscando
para conter as lágrimas, minha mão trêmula descansou em sua
testa, escovando sua franja macia e sedosa para trás. Ela suspirou
feliz contra mim, e seus olhos se fecharam. Meu primeiro toque nela
em meses.
A culpa aguda encheu meu coração. Ela era apenas uma criança
pequena que perdeu os pais com um ano de idade. Agora que um
deles havia retornado à sua vida, sua felicidade havia voltado.
— Estou tão feliz que você é minha filha — finalmente reconheci.
Os olhos de Noura se abriram e brilharam. Ela se aconchegou
contra mim, descansando sua pequena cabeça contra o meu peito.
Ficamos assim por algum tempo. Eu não a estava segurando, mas
era um começo. Estava mais perto dela do que antes. Não
conseguia abraçá-la, mas meus dedos agarraram seus cachos. Um
sorriso fraco apareceu em meus lábios. Talvez houvesse esperança
para nós, afinal.
Suspirei quando me inclinei e inalei seu cabelo. Ela cheirava
como mágica, um perfume floral limpo. Noura riu debaixo de mim e
espiou através de seus longos cílios.
— Voxê tá me tocando, mamãe? — ela perguntou com um sorriso
altivo.
Meus lábios se transformaram em um sorriso.
— Sim.
Ela torceu o nariz.
Algo que ela também herdou de mim. Ela estava em terapia
fonoaudiológica há quase um ano, mas não vi melhora. Talvez
demorasse mais alguns anos.
— Como está a terapia da fala?
Ela fez beicinho.
— Eu odeio ixu.
Arqueando uma sobrancelha, perguntei:
— Por quê?
— O que há de tão ruim no jeito que eu falo?
Fazia sentido agora. Talvez ela não estivesse tentando usar a
terapia que eles estavam ensinando a ela.
— Nada está errado. — Só tenho medo do seu futuro. — Você é
perfeita do jeito que é.
Suspirando de contentamento, Noura se aconchegou em mim.
Não demorou muito para ela adormecer no meu colo. Estava
passando meus dedos pelo cabelo dela quando meus próprios olhos
me embalaram para dormir.
Fechei os olhos brevemente para descansar. Poderia ter uma boa
noite de sono hoje, esperava que as bolsas de corvo sob meus
olhos desaparecessem. Eu não sabia quanto tempo havia se
passado antes que meu celular vibrasse. Soltando um gemido
suave, meus olhos se abriram e a luz do meu quarto me
cumprimentou.
Protegendo meus olhos, olhei para o meu telefone vibrando antes
de olhar para a minha Noura nocauteada novamente. Ela parecia
feliz enquanto dormia com os lábios entreabertos. Tive sorte que o
telefone não estava com som. Caso contrário, ela teria acordado.
Não tinha ideia de quem estava me chamando.
Não era como se eu tivesse uma vida social.
Por um segundo, me perguntei se era Alexander.
Meu coração voltou à vida. Ele não tinha meu número...
Suspirando, me inclinei sobre a mesinha de cabeceira e olhei para o
identificador de chamadas.
Intrigada, atendi o telefone:
— Olá, Miran.
O silêncio me cumprimentou da outra linha, e eu pensei que ele
tinha discado a ligação acidentalmente. Olhei para a tela do meu
telefone novamente, e ainda estava conectado a ele. Um suspiro o
deixou antes que ele falasse.
— Ghislaine, há alguma maneira de você vir ao meu escritório?
Escritório? Olhei para a hora. Eram nove e meia da noite.
— É tão tarde — murmurei. — Qual o problema?
Eu não tinha a menor ideia de por que ele estava me ligando à
noite e o que era tão importante que não podia esperar até amanhã.
Ele suspirou novamente.
— Não ligaria se não fosse necessário. Preciso falar com você. —
Antes que pudesse questioná-lo, ele insistiu: — Pessoalmente.
Fiz uma careta.
— Há algo errado?
Eu me perguntei se o caso de Cyrus tinha levado a polícia até
mim? Eu estava sendo chamada para ser presa? Mas eles
apareceriam na minha casa e não me ligariam. Parecia bobo, então
descartei a ideia.
Cuidadosamente, afastei Noura do meu colo e a coloquei
gentilmente na minha cama. Mesmo pegajosa em seu sono, seus
bracinhos se estenderam para mim, agarrando o decote da minha
camisola. Escondendo um sorriso, peguei seus dedinhos e os
coloquei embaixo. Levantei o edredom e coloquei sobre minha filha.
Mudando de posição, levantei o telefone ao meu ouvido.
Miran estava falando novamente.
— Preciso falar com você sobre Zander.
Um momento depois me ocorreu que ele estava falando sobre
Alexander.
— É urgente, Ghislaine — insistiu Miran, perdendo a frieza que
carregava em sua voz poética. — Preciso te ver agora.
Sua voz não deixou espaço para perguntas.
— Tudo bem — concordei, estupefata. — Vou encontrá-lo entre
trinta a quarenta minutos.
— Estou ansioso por isso.
E com isso, ele desligou o telefone.
Segurei meu telefone na minha mão, meus dedos ficando
brancos. Do que ele estava falando, afinal? E Alexander? Perguntas
encheram minha cabeça, para as quais eu não tinha respostas.
Olhei para a forma adormecida de Noura e suspirei inquieta.
Tinha acabado de ter um momento com minha filha e já estava
sendo puxada para longe. Rapidamente, me despi, colocando meu
jeans preto e um suéter azul-petróleo. Escovando meu cabelo
estático, puxei meu casaco de lã branca sobre meu corpo e coloquei
botas de neve combinando. Não estava mais nevando, então não
precisava do meu chapéu e luvas.
Peguei minha bolsa e coloquei meu telefone e arma dentro. Era
mais um hábito carregar minha arma. Minha carteira e chaves já
estavam dentro da bolsa. Dando uma olhada ansiosa para minha
Noura adormecida, me virei com relutância.
Apaguei as luzes e espiei para fora do meu quarto. A essa altura,
todas deviam estar dormindo. Felizmente, poderia fugir e voltar sem
ser descoberta. Fechei a porta do meu quarto. Com sorte, Noura
ainda estaria dormindo quando voltasse. Odiaria que ela acordasse
no meio da noite e não me encontrasse perto dela.
Andei na ponta dos pés no corredor, ainda odiando como o piso
rangia debaixo de mim. Estúpida casa assustadora. Mal podia
esperar para conseguir um comprador em breve e sair desta casa
mal-assombrada. Esta casa nunca mais foi a mesma desde que
voltei.
Quando desci as escadas, meus olhos caíram sobre meus
pássaros. Eles arrulharam para mim enquanto eu passava. Estava
feliz que eles não gritavam mais comigo. Talvez eles me
considerassem um deles agora.
Minha vida estava voltando aos poucos. Pedi um serviço de táxi, e
ele disse que chegaria aqui em menos de cinco minutos. Olhando
para trás de mim mais uma vez, fui em direção à minha porta e a
tranquei. Desci a varanda, em direção ao jardim da frente.
Bati o pé, ainda olhando para trás com medo de que alguém
tivesse me visto saindo de fininho. Sempre podia dizer a elas que
estava apenas me encontrando com Miran, mas parecia suspeito
que fosse no meio da noite. Era melhor que ainda estivessem
dormindo quando voltasse.
Mordendo o lábio, olhei para a rua enquanto um carro preto vinha
em minha direção. Chequei a placa com o carro que supostamente
estava me pegando. Satisfeita de que estava correta, levantei os
olhos do meu telefone e fui em direção ao carro.
Assim que me sentei, fomos para a cidade.
Mas meu corpo formigava inquieto embora. Miran tinha sido tão
reservado ao telefone, não revelando nada. Bati os dedos nos
joelhos, olhando para a hora de vez em quando. Ele estava se
movendo tão devagar, provavelmente porque eu estava olhando
para ele com muita frequência. Vasculhei meu telefone, procurando
uma distração, e comecei a jogar jogos aleatórios nele para passar
o tempo.
O carro se moveu e parou completamente perto do meio-fio. Eu
estava tão focada no meu jogo que nem percebi que tínhamos
chegado à sede da DEA.
Agradecendo ao motorista, saí com as pernas bambas.
Soltei um suspiro frustrado e a tensão voltou ao meu corpo. Só
queria voltar para casa e dormir ao lado de Noura novamente. O ar
estava pesado, enquanto o vento girava ao meu redor.
Mantendo minha cabeça baixa, entrei no escritório. Eu fui até o
elevador. Quando a porta abriu, nem uma única alma me
cumprimentou. A palavra DEA estava gravada na parede.
Todo o andar era de propriedade do departamento. O quartel-
general estava envolto em escuridão, e todos tinham voltado para
casa para passar a noite. Aconchegada em meu casaco de lã,
entrei, encontrando a porta principal de vidro destrancada.
Por que Miran estava trabalhando até tão tarde?
Perguntas encheram meu corpo enquanto eu mastigava minha
bochecha internamente. Descendo o corredor, meus olhos se
iluminaram quando caíram em seu escritório.
Miran olhou para cima, e eu dei um sorriso tímido. Ele não
devolveu, porém, e meu sorriso diminuiu. Estava prestes a abrir a
porta, mas meu olhar caiu em outro homem na sala.
Um homem muito familiar, de costas para mim.
Ele estava vestido todo de preto, e eu notei borgonha em torno de
seus punhos. Fiz uma pausa. O que estava acontecendo?
Eu me perguntei se deveria fugir agora, mas Miran estava lá
dentro também. Ele insistiu para que eu entrasse, e, agora que eu
estava aqui, não fazia sentido sair com perguntas sem resposta.
Meus ombros doíam, e eu esfreguei a nuca enquanto girava a
maçaneta e entrava.
Com passos hesitantes, entrei, deixando a porta atrás de mim
fechar. Tinha acabado de dar alguns passos quando o homem de
preto virou o rosto para mim. Eu sabia quem era o tempo todo.
Poderia reconhecê-lo a uma milha de distância.
Respirei fundo quando meus olhos caíram sobre Alexander.
Soltando um suspiro, olhei para Miran antes de olhar para os
olhos escurecidos de Alexander. Assustada demais para dizer
qualquer coisa, voltei minha atenção para Miran para obter mais
informações. O Chefe apenas se recostou na cadeira, como se o
cansaço o tivesse atingido.
Então, ele falou:
— Ghislaine, você sabe por que Alexander está aqui?
Não tive resposta.
— Você se lembra do seu... acidente? — perguntou Miran.
Meus olhos voaram para Alexander, que me observou o tempo
todo antes de seus olhos caírem em Miran novamente.
Olhei para Miran novamente, e ele me olhou como se soubesse
de tudo.
— Então, você se lembra do que aconteceu?
Aturdida, apenas assenti.
Miran passou a mão pela barba preta aparada.
— Pakhan aqui — ele disse, erguendo as sobrancelhas na
direção de Alexander — confessou que ele é o responsável por
aquele acidente.
Engoli a bile que subiu na minha garganta antes de olhar para
Alexander. Ele tinha feito o quê?
Atônita, eu apenas olhei de boca aberta em descrença.
— Não só isso, mas ele também me pediu para prendê-lo.
Fechei a boca e olhei para Miran.
Miran passou uma longa mão pelo rosto. Nunca o tinha visto
assim antes. Normalmente, ele era sempre estoico. Sempre tão
calmo, seguro e autoritário. Agora, ele parecia estar lutando para
entender tudo.
Eu não podia culpá-lo.
Era um desastre.
— Estou surpreso — continuou Miran, e ele fez uma careta. —
Chocado, na verdade. Alexander é a razão de... tudo. O que me
choca ainda mais — agora Miran estava fervendo —, é por que
diabos ele está confessando quando nunca confessou nada em sua
vida antes? — Ele lançou um olhar de desaprovação para
Alexander. Seus olhos se ergueram para encontrar os meus. — E
eu acredito que tem tudo a ver com você.
Desviei o olhar e cruzei meus dedos trêmulos.
— Ouça, Ghislaine.
A voz de Miran saiu mais suave e calma.
— Sei que algo está acontecendo entre vocês. — Ele ia me julgar
por me envolver com um chefe da máfia? — Francamente, não
estou chocado com isso como deveria estar.
Meu olhar surpreso encontrou o dele.
— Você não é a primeira agente que ficou... envolvida — ele
sufocou a palavra como se fosse uma maldição — no próprio caso.
Balançando a cabeça e zombando baixinho, olhou para
Alexander, e ele ficou quieto. Miran se inclinou para frente de sua
cadeira e tamborilou as pontas dos dedos contra a mesa de vidro.
Seus aquecidos olhos castanhos brilharam e escureceram para
Alexander. Apertando os dentes, ele atirou lasers nele.
— Eu deveria te prender pelo que você fez com Driss — ele
murmurou, então olhou para mim antes de voltar sua atenção para
Alexander. — Pelo que você fez com Ghislaine.
Água encheu meus olhos. Eu ainda não tinha dito uma única
palavra e olhei para Miran. Evitei o olhar de Alexander a todo custo,
embora pudesse senti-lo queimando em mim de vez em quando.
As pontas dos dedos de Miran bateram mais rápido na mesa de
vidro, e pensei que ele poderia quebrá-la a qualquer segundo. Ele
exalou antes de bater a mão na mesa.
— Por que diabos você continua me envolvendo em sua
bagunça? — ele rugiu, perdendo a calma.
Eu pulei, com medo de que sua fúria fosse direcionada a mim,
mas sua ira estava focada apenas em Alexander. Nunca o tinha
ouvido falar tão cruelmente antes. Agora, este era o chefe da DEA
que eu estava vendo, e não meu amigo Miran.
— Tenho uma porra de uma família agora. Por que você continua
me dizendo merda e me colocando em conflito de interesses?
Olhei para Alexander.
Alexander apenas deu de ombros como um menino,
imperturbável pela ira de Miran. Ele deu um sorriso, um sorriso tão
familiar, e meu coração quase caiu.
— Não é óbvio? — Alexander perguntou: — Irmão?
Miran estava quieto agora, e seus dedos pararam de se mover.
— Você é minha família… Além disso, você é o policial moralista.
Não sei quem entenderia mais do que você — admitiu Alexander.
Miran se recostou em seu assento e exalou longamente.
Obviamente, ele devia estar exausto pelo nosso dilema. Meu
coração se enterneceu por ele, e eu gostaria de poder dizer algo
para confortá-lo.
— Ghislaine.
Minhas costas se endireitaram ao comando em sua voz
autoritária. Você pode tirar o policial da força, mas não a força do
policial.
Os olhos cor de mel de Miran caíram sobre mim.
— O que você quer que eu faça com ele?
Meus olhos estavam prontos para saltar das órbitas oculares.
— Devo prendê-lo?
Miran me encarou nos olhos o tempo todo, e tentei não me
encolher sob seu olhar intimidador. Havia dois homens de sangue
quente nesta sala. Ambos eram perigosos em suas posições, e eu
era o cordeiro prestes a ser abatido.
Abri a boca para falar, mas nada saiu. As palavras me
abandonaram, e eu estava com medo de olhar para Alexander,
então mantive meu olhar focado no Chefe.
— O certo a fazer é prendê-lo. Ele está se entregando —
acrescentou Miran. Meu lábio inferior tremeu, e minha alma se
debateu dentro de mim. — É por isso que você veio ao meu
escritório naquele dia, para se despedir? — Miran gritou. Estremeci
com seu tom, mas então ele o suavizou, — Por causa de
Alexander?
Eu apenas assenti, atordoada demais para dizer qualquer coisa.
— Despedir?
Minha cabeça virou na direção de Alexander.
Seus olhos escuros e confusos encontraram os meus antes de
olhar para Miran.
— O que você está falando? — ele questionou Miran.
Miran soltou um suspiro áspero antes de responder:
— Ela está partindo de Nova York.
Ninguém falou mais, e um silêncio antinatural e desconfortável
encheu o ar. Meus pés quase cederam nas minhas pernas trêmulas.
Havia um assento ao lado de Alexander, mas não me atrevi a
sentar. Alexander estava tão quieto, e eu colei meus olhos no chão.
Ele não sabia que eu estava me mudando e o deixando para trás,
porque eu nunca disse a ele.
Uma voz leve do Oriente Médio falou novamente.
— Ghislaine.
Meus olhos saltaram para Miran se levantando.
Engoli em seco e dei um passo para trás de seu corpo gigante e
intimidador. Miran esperou que eu dissesse alguma coisa, seus
olhos procurando e caçando os meus. Depois de alguns momentos,
sua mandíbula se moveu e sua mão abriu uma gaveta. Segui seus
movimentos, e minha respiração ficou presa no meu peito com o
que ele segurava em suas mãos.
Um par de algemas de prata.
Não. Meu pensamento repentino me aterrorizou, e respirei com
dificuldade. Meu peito subia e descia, lutando para pegar ar.
Ele se afastou de sua mesa e, depois de um momento, Alexander
se levantou também, ficando em sua altura máxima. Olhei de um
homem para o outro, indecisa e em conflito. Engoli o nó na garganta
e meus membros inferiores tremeram. Mordi os lábios para parar de
tremer, mas não adiantou.
— Já que você não quer responder — Miran disse severamente,
me olhando nos olhos. — Vou prender esse criminoso.
Seus passos se moveram em direção a Alexander, e eu
automaticamente saí do caminho, como se meus pés tivessem
vontade própria. Ele estava na frente de Alexander agora,
segurando as algemas que selariam permanentemente seu destino.
Miran olhou para mim mais uma vez.
— Ele é um criminoso aos seus olhos, Ghislaine?
Meus olhos lacrimejaram, e antes que eu pudesse parar as
lágrimas de cair, elas caíram como uma represa quebrada, de
qualquer maneira. Minha visão ficou turva, e eu não conseguia olhar
para os homens na minha frente. Funguei e foquei meus olhos na
mesa de vidro diante de mim. No fundo, as algemas estalaram, e eu
sabia que Miran as havia aberto.
— Vire-se — Miran ordenou a Alexander.
Um soluço se atreveu a ameaçar meus lábios, e eu estendi a mão
e fechei minha boca. Não conseguia respirar, porra.
Por que estava reagindo assim?
Estendi a mão e enxuguei as lágrimas dos meus olhos, mas elas
continuavam caindo incontrolavelmente. Fiquei arrasada quando
descobri a verdade... Mas isso, eu nem queria imaginar esse
destino. Mordi meu dedo, esperando que eu parasse de chorar.
— Alexander Nikolaev — Miran continuou —, você está preso
pelo assassinato do ex-diretor do FBI, Driss Khalil, e pela tentativa
de assassinato da ex-agente do FBI, Ghislaine Khalil. Você tem o
direito de permanecer em silêncio…
Minha mente se distraiu enquanto Miran continuava a ler os
direitos de Alexander. Meu coração rachou novamente, e eu fechei
meus olhos, incapaz de testemunhar. Um clique me chamou de
volta.
Não tive que olhar para cima para saber que ele algemou
Alexander. Gostaria de nunca ter vindo aqui, depois de tudo. Estava
muito mais feliz com Noura em casa. Esta era a coisa certa a fazer.
A prisão de Alexander. Ele era culpado, um criminoso, o homem
que arruinou minha vida, que roubou minha felicidade e paz. Meu
pulso disparou e meu coração atormentado rugiu que ele estava
sendo tirado de mim novamente.
— Mantenha sua cabeça baixa e siga em frente — Miran
continuou falando com Alexander.
Balancei minha cabeça em silêncio.
Passos avançaram, e eu queria pisar no chão e parar o destino.
Eu não podia controlar minha vida antes.
O destino tinha me controlado naquela época. Isso me prendeu
uma vez, mas eu poderia controlar o destino agora.
— Pare.
Os passos pararam.
Com os olhos marejados, olhei para Miran e Alexander. Alexander
estava com as mãos atrás dele, algemado, enquanto olhava para
mim. Aqueles olhos negros não tinham brilho enquanto ele estava
ali.
Miran estreitou os olhos, esperando por mim.
Pisquei para conter as lágrimas.
Sinto muito, Driss.
— Solte-o.
Eu era tão egoísta. Tão malditamente egoísta, e odiava cada fibra
do meu ser. Estendi a mão e limpei sob os olhos, tentando limpar a
bagunça.
Os olhos de Miran não continham nenhuma decepção. Em vez
disso, ele deu um olhar conhecedor que dizia claramente: demorou
bastante.
Ele usou a chave para soltar Alexander e, com um suspiro, ele se
virou e foi para seu armário. Ele pegou seu casaco preto do cabide
e o colocou em seu corpo, cobrindo-se.
— A decisão é sua, Ghislaine — disse ele por fim. — Quando
você estiver pronta, sempre estarei aqui para ajudá-la. Apenas
lembre-se disso, ok? — Sua voz era tão gentil enquanto falava,
removendo o chefe estoico que ele era alguns momentos atrás.
Eu funguei e apenas respondi:
— O-obrigada.
— Eu preciso trancar — disse ele depois de um momento. —
Minha esposa está me esperando. — Ele olhou para a hora
melancolicamente antes de seus olhos brilharem para Alexander
novamente.
Assenti novamente e me afastei dele. Meus passos trêmulos
deixaram seu escritório. Ouvi os homens conversando novamente,
mas não prestei atenção. Com meu coração pesado e minha alma
quebrada, fui para o elevador. Não ouvi passos atrás de mim e, pela
primeira vez, fiquei feliz por Alexander não estar me seguindo. Saí
do prédio e as lágrimas pararam de cair.
Eu havia impedido a prisão de Alexander.
Uma traição à alma de Driss.
Esperava que ele me perdoasse.
Não podia ver Alexander preso. Se eu quisesse prendê-lo, já o
teria feito há muito tempo. Não acreditava que ele realmente iria
continuar com isso. Lembrei-me das minhas últimas palavras para
ele quando ele me observou naquela noite. Ele descobriu a coisa
certa a fazer e conseguiu.
Mas ainda não tinha certeza de como me sentir sobre isso.
Eu inalei o ar frio de Nova York.
O ar assobiou e cortou minhas bochechas aquecidas, o gelo
queimando contra minha pele ardente. Desci um quarteirão e estava
prestes a tirar o telefone da bolsa para chamar um táxi, quando uma
voz me parou:
— Passarinho.
Fiz uma pausa, minhas mãos caindo do meu telefone.
Meu corpo formigava com a voz suave e familiar. Exalando, fiquei
sem resposta e continuei me movendo. Seus passos seguiram atrás
de mim.
— Fale comigo.
Fechei meus olhos.
Não poderia cair em sua armadilha novamente.
Talvez devesse começar a correr e torcer para despistá-lo.
Parecia uma ideia fantástica. Minha bolha estourou quando uma
mão estendeu e agarrou meu braço, me puxando para uma parada.
Meus joelhos quase cederam na minha frente. Sabia que era ele.
Não olhei, com medo do que poderia encontrar lá, e ainda mais com
medo do que ele encontraria em meus próprios olhos. Mantendo
minha cabeça baixa, olhei para o chão lamacento.
Alexander se fez visível, seu cheiro familiar de couro vagando
sobre mim novamente. Ele estava tão perto de mim. Sua respiração
caiu na minha bochecha, e me forcei a continuar respirando.
— Você disse a ele para me deixar ir.
Virei o rosto para a esquerda, esperando evitá-lo. Pretensão era
melhor. Melhor ser ignorante do que tolo.
— Por quê? — ele perguntou, sua voz ainda suave como mel.
Fiquei muda.
— Você ainda está chateada — disse ele, sua voz atada com
decepção. — Fiz a coisa certa, não foi? — A hesitação em sua voz
me fez chorar de novo.
Prendi a respiração, esperando que o soluço que ameaçava
minha garganta escorregasse e passasse. Quando isso aconteceu,
soltei uma respiração longa e rouca.
— Responda, Ghislaine — ele exigiu, ainda me agarrando.
Deveria estender a mão e puxar a mão dele de mim, mas meus
membros ficaram congelados ao meu lado. — Por que você disse a
ele para me soltar? — Alexander murmurou.
Ele se inclinou para frente até que seu peito roçou nas minhas
costas. Sua outra mão estendeu para separar o cabelo do meu
pescoço, revelando minha pele nua para ele. Deixei escapar um
leve suspiro quando seus lábios macios roçaram a lateral do meu
pescoço. Fechei os olhos brevemente, saboreando a proximidade
dele antes de abri-los novamente.
— Por que você estava chorando?
Ele estava me fazendo perguntas, perguntas que me deixavam
com medo.
Ele deixou beijos leves na minha pele novamente, e eu inclinei
meu pescoço, permitindo-lhe mais espaço. Meu pulso vibrou quando
seus dentes roçaram minha pele suavemente. As pessoas
passavam por nós, mas eu não lhes dava atenção.
Ninguém mais importava quando ele entrava na minha visão, no
meu foco. Tudo ficava em segundo plano, inclusive eu.
— Por que você está saindo de Nova York?
Meus olhos brilharam novamente, e gostaria que ele fosse
embora.
— Por que você está me... deixando?
Meu coração rachou tudo de novo.
Em sua última pergunta, minhas costas se endireitaram e
relutantemente, eu me afastei dele. Meu pescoço ainda queimava
de seus beijos. Sua mão caiu do meu pescoço, e continuei andando
me afastando dele ainda mais.
Ele rosnou atrás de mim e agarrou minha mão, me forçando a
parar novamente. Sua mão me puxou, e ele me empurrou de volta
contra um dos carros estacionados. Um gemido assustado deixou
meus lábios.
A multidão noturna nesta área havia diminuído, mas alguns
espectadores ainda olhavam enquanto passavam. Encontrei seus
olhos, minhas bochechas queimando por eu ser um espetáculo aos
olhos deles. Alexander não se importava, e ele estendeu a mão e
virou meu queixo em sua direção, me forçando a encontrar seus
olhos.
— Para de me ignorar — ele exigiu, sua respiração pousando em
meus lábios. — Fiz o que pude para me acertar por você. — Meu
coração trovejou. — Por que não é bom o suficiente para você? O
que mais eu preciso fazer para me provar aos seus olhos?
Engoli em seco, suas palavras me atingindo como raios de
eletricidade. Seus olhos se estreitaram e ele agarrou a parte de trás
da minha cabeça com a outra mão, inclinando meu rosto para o
dele.
— Por que você está fugindo?
Agora, ele era a terceira pessoa a dizer isso.
— Não vá embora.
Sua voz continha um apelo que eu nunca tinha ouvido antes. Era
este o seu novo estratagema? Balancei minha cabeça
silenciosamente. Não. Ele não podia sentir a dor dos outros. Ele já
havia dito isso para mim antes.
Ele não era um príncipe encantado, nem um cavaleiro quebrado.
Ele era o vilão da minha história.
Não poderia seguir as trilhas erradas novamente. Fiz isso antes e
olha onde isso me levou? Me afoguei nele, me perdi completamente
e não podia fazer isso de novo. Tinha que pensar em Noura.
Precisava me concentrar nela.
Seus dedos no meu cabelo apertaram.
— Caralho, me responda.
Meus olhos escurecidos encontraram os dele, no olhar
ameaçador em seus olhos.
Ele se rendeu como um verdadeiro homem teria feito.
Mas agora... o Pakhan me cumprimentava novamente.
Era um lado dele que nunca foi embora.
Ele sempre seria um criminoso perigoso.
— Você está me machucando — choraminguei.
Suas sobrancelhas franziram, e seus dedos no meu cabelo
afrouxaram.
— E o que você está fazendo comigo? — ele murmurou. — O que
você está fazendo comigo, Ghislaine?
Era a mesma pergunta que eu tinha feito a ele uma vez. Meu
corpo formigava com a dor em sua voz. Exalei antes de piscar.
— Você não pode puxar meu cabelo assim quando está chateado.
Ele mostrou uma expressão de lábios apertados antes de assentir
com a cabeça.
— Mais alguma coisa, alteza? — ele provocou.
Franzindo a testa, eu olhei para ele.
— Use suas palavras, lembra?
Seus olhos caíram em meus lábios antes que ele olhasse para
meus olhos novamente, suspirando.
— Tenho usado minhas palavras nos últimos dez minutos, e você
está me ignorando — sua voz estava rouca enquanto ele falava. —
Por quanto tempo mais você vai me punir? Eu me entreguei... Por
que você interrompeu a prisão? — ele exigiu.
Eu não tinha uma resposta, então, fiquei em silêncio.
Ele soltou um grunhido frustrado como se estivesse procurando a
maneira mais fácil de me matar e se safar. Talvez ele tivesse o
suficiente de mim.
— Seria muito mais fácil se eu pudesse trazer você para minha
casa sob a mira de uma arma. Você sabia que, se eu fosse outro
líder, já teria sequestrado você por me negar? Além disso, tenho
mulheres sequestradas o tempo todo para ganhar a vida.
Meus olhos voaram para cima, e minhas costas se endireitaram
contra o carro. Percebi sua declaração. Ele estava falando sobre
suas mulas de drogas e o comércio do sexo.
Ele deu um olhar conhecedor.
— Tenho um exército de soldados esperando meu comando. Se
eu disser ‘pulem’, eles vão perguntar: ‘quão alto?’ — Engoli em
seco, tentando limpar minha garganta entupida. — E, então, há...
você — ele espetou, seu olhar estrelado me queimando. — Estive
tentando falar com você, para reconquistá-la, e você me dá a porra
do gelo. — Seus olhos fitavam incrédulos.
Engoli em seco e me encolhi sob seu olhar intenso.
— Você me rejeitou uma e outra vez, e aceitei porque sou um
homem e não porque sou o Pakhan. Se realmente quisesse ser o
Pakhan, já teria sequestrado você e, eventualmente, você teria se
submetido a mim de joelhos como todo mundo faz, querendo ou
não.
Minhas sobrancelhas franziram, e meus olhos brilharam.
Por que ele estava sendo tão cruel?
Ele notou meus olhos lacrimejantes e suavizou seu tom.
— Mas não fiz. Porra, não fiz. Você tem ideia de como é difícil
para mim ficar longe de você? — Minha respiração engatou. —
Você nem fala comigo, muito menos me deixa te beijar e te tocar.
Minhas bochechas esquentaram, mas meus olhos ficaram
grudados em seu rosto.
— Está tudo bem? — uma voz profunda veio atrás de nós. —
Senhorita, precisa de ajuda?
Assustada, desviei o olhar de Alexander e olhei para o homem
que havia falado. Alexander se virou e rosnou para ele. Sem olhar, o
homem fugiu. Olhei para a figura desaparecendo e Alexander voltou
sua atenção para mim.
— Você me disse uma vez, tirei sua escolha de você quando
tranquei você. Não quero fazer isso de novo — declarou ele, seus
olhos em chamas. — Não quero tirar sua escolha até que você seja
uma marionete que apenas me obedece. Nunca tomei uma mulher
para mim. Sim, vendo mulheres — ele revelou —, vendo. Eu não as
invado, nem deixo meus homens tocá-las. É negócio…. Mas quero
você, de boa vontade. — Meu pulso saltou para minha garganta. —
Você me odeia, tudo bem... Mas fale comigo, Ghislaine — sua voz
caiu tão baixa — Caralho, fale comigo. Não me ignore assim. Grite
comigo, pragueje, mas não me dê seu silêncio. Não gosto quando
você fica quieta.
Funguei.
— Estou tão brava com você — admiti em um sussurro.
Seus olhos perderam todo o fogo, e ele se inclinou para frente,
seus lábios quase roçando os meus.
— O que mais? — ele murmurou. — Apenas continue falando
comigo.
— Estou tão chateada — acusei, meus olhos esmaecidos atirando
punhais nos dele. — Você me traiu — minha voz falhou.
Ele ficou em silêncio agora.
— Você escondeu a verdade de mim.
Seus olhos ficaram em mim o tempo todo, sem dizer uma única
palavra. Ele lambeu os lábios antes de engolir, sua garganta
balançando.
Meu lábio inferior tremeu.
— Você brincou comigo.
— Nunca — ele jurou, balançando a cabeça —, eu nunca fiz isso.
Fiquei em silêncio agora, pensando muito e muito novamente.
— Continue falando. Deixe-me ouvir sua voz.
Aquele apelo em sua voz retornou. Por que ele não podia
simplesmente me deixar em paz?
— Não pude ver minha filha crescer…Eu perdi... — continuei: —
Perdi três anos da minha vida que nunca mais poderei voltar. Perdi
tudo. Não ouvi minha Noura falar pela primeira vez. Não a vi
correndo pela primeira vez. Não a vi comendo pela primeira vez.
Não consegui segurar a mão dela e levá-la para a pré-escola pela
primeira vez. Não estava lá para consolá-la chorando em seu
primeiro dia longe de... mim.
Funguei e estendi a mão para limpar meu nariz.
— Ela foi criada por outra pessoa quando deveria ter sido criada
por mim. Você não apenas tirou um pai de uma criança... Você tirou
uma mãe também. Você me tirou dela — acusei, olhando-o nos
olhos. — Qual foi a culpa dela em tudo isso? — exigi. — Ela tinha
apenas um ano de idade na época. O que ela tem a ver com alguma
coisa?
Quando ele não respondeu, continuei:
— Nem consegui me despedir do meu marido. Ele morreu
sozinho, sem mim ao seu lado — minha voz engasgou, mas eu me
forcei a falar. — Ele era o amor da minha vida. Não consegui...
enterrá-lo. Não consegui colocar flores em seu túmulo pela primeira
vez. Perdi todas as minhas primeiras vezes. Você as roubou de
mim. — Minha visão ficou turva e estava ficando mais difícil vê-lo. —
Te disse meus sentimentos. Te contei tudo. Minhas fraquezas.
Minhas vulnerabilidades. Compartilhei minha vida com você. Minha
Noura... Eu te dei honestidade... E você só me deu mentiras —
minha voz falhou — Você foi a razão da minha queda... Te odeio
tanto pelo que você fez — sussurrei. — Você não tem ideia do
quanto.
Eu olhei para ele. Seus olhos escuros desviaram o olhar antes de
caírem em meus lábios trêmulos. Seu rosto se aproximou,
preenchendo a distância entre nós. Seus lábios macios roçaram
meu queixo suavemente. Sua mão se escondeu atrás da minha
nuca e inclinou minha cabeça para ele antes de seus dentes
escovarem minha pele. Estremeci debaixo dele e virei meu rosto
para ele, evitando seu toque.
— Você tirou tudo de mim — admiti. — Quero sair de Nova York e
nunca mais voltar. Não há mais nada para mim aqui. Esta cidade é
como um mau presságio. Tudo foi destruído. Não posso me perder
de novo.
Ele ficou em silêncio enquanto absorvia minhas palavras.
— O que é preciso para você ficar? — ele perguntou finalmente.
Seria muito mais fácil se ele pudesse exigir ameaças na minha
cara. Teria um tempo melhor para odiá-lo, mas quando ele me
perguntou... eu não conseguia pensar direito.
— E-eu quero ser deixada sozinha — admiti — preciso que você
me deixe ir, por favor. — Odiava o apelo em minha voz.
O silêncio me cumprimentou novamente, e eu olhei para ele,
encontrando seus olhos escuros. Sua garganta apertou e ele
assentiu. Lambendo os lábios, ele se afastou de mim. Seu calor me
deixando.
Engoli o soluço ousando subir. Queria estender a mão e puxá-lo
de volta, mas apertei minhas mãos com medo de que eu pudesse
fazer isso. Ele se distanciou, e doeu como o inferno, embora eu
tenha pedido a ele. Era a coisa certa a fazer... Mas não me fez sentir
melhor.
Alexander enfiou as mãos em seu casaco de lã.
— Tudo bem — ele murmurou. Meus olhos ficaram em dúvida. —
Vou ficar longe de você. Vou deixá-la em paz, mas não se afaste de
mim. Fique, Passarinho.
Fechei os olhos com força, incapaz de olhar para ele.
— Não vou entrar em contato com você novamente. Farei o que
você quiser, mas não deixe a cidade.
Abri os olhos e me levantei, não mais encostada no carro.
Observei o homem à minha frente.
— Por que você não quer que eu vá embora, Alexander?
Minha voz saiu muito baixa.
Por favor, admita a verdade para mim pelo menos uma vez.
Meu coração ansiava pelas coisas que eu queria que ele
dissesse.
Sem dizer uma palavra, ele se afastou de mim e foi embora. Meus
olhos focaram em sua figura persistente que se misturou com a
multidão antes que ele desaparecesse.
GHISLAINE

32

OS FLOCOS DE gelo que uma vez caíram, pararam.


O inverno se foi e, em troca, uma brisa quente cumprimentava
meu rosto toda vez que olhava pela janela. Hoje foi um dia sem
gelo. Uma promessa de dias quentes de verão pela frente. Levantei
a janela do meu quarto e inalei a brisa fresca e suave. Choveu esta
manhã, e os verdes abaixo de mim ainda estavam molhados. A
chuva havia encharcado o solo marrom, e flores silvestres cresciam
diante de mim. Era primavera.
Afinal, havia luz sob a escuridão.
Os raios do sol atingiram minha pele quente, tocando-a como
beijinhos. Todas as noites, eu olhava para fora da minha janela,
meus olhos perdidos procurando por ele, mas ele nunca mais
apareceu. Pedi a ele para me deixar ir, e ele o fez. Tinha
desaparecido da minha vida.
Mês após mês se passou, mas ele não havia retornado.
Ele se rendeu, mas ainda não foi o suficiente.
Uma parte de mim ainda não estava satisfeita com o que eu havia
perdido, com o que minha Noura havia perdido.
Fiquei em Nova York.
Chega de fugir.
Ele manteve sua palavra dessa vez e ficou longe de mim. Não
entrou em contato comigo pelo menos uma vez nos últimos quatro
meses.
Sacudindo meus pensamentos, desci com minhas ferramentas de
jardinagem e, no caminho para a porta, esbarrei em minha parceira.
Meu pequeno sol me cumprimentou. Não podia deixar de chamá-la
assim agora. O rosto de Noura ficou radiante quando pegou as
ferramentas, e ela correu para calçar suas pequenas sandálias.
Observei seus pequenos movimentos fofos. Ela usava um pequeno
vestido verde hoje, que destacava seus olhos.
— Tô pronta, mamãe! — gritou, pulando para cima e para baixo.
Eu adorava quando ela me chamava de mamãe.
Dei um sorriso e coloquei minhas sandálias antes de abrir a porta
do quintal e correr para fora. Segurei a porta para ela, e ela passou
voando por mim como um pássaro em uma missão. Esse
pensamento me assustou. Não querendo me perder no passado,
fechei a porta. À minha frente, meus pássaros estavam ativos e
cantavam alegremente, com suas belas melodias levadas pelo
vento. Dei um passo à frente, descendo as escadas para o pátio.
Passarinho.
Uma voz profunda sussurrou em minha mente.
Às vezes, isso ecoava na minha cabeça.
Já não ouvia a voz do meu marido.
Agora, era apenas a voz dele.
A única voz que não pertencia à minha cabeça.
Pensei em doar meus pássaros de estimação, mas eu os amava
e não podia me separar deles. Esses pássaros selvagens fariam
parte da minha vida agora. Olhei para o manto de nuvens acima da
minha cabeça. Então, olhei para Noura enquanto ela se dirigia para
o jardim que estávamos plantando. Ela se agachou no chão
marrom, inalando as flores. Aquelas flores eram douradas como o
sol, seus caules ainda brilhando da chuva matinal. Primeiro, elas
vieram sozinha ou em par, agora todas as trinta balançaram
alegremente e dançaram com a brisa da primavera.
Girassóis. Plantamos girassóis.
A vida selvagem nunca poderia deixar minha mente agora.
O sol, esses pássaros e essas flores estavam ao meu redor,
embora desaparecessem da minha vida sem deixar vestígios.
Aproximei-me de Noura e me agachei ao lado dela.
Estávamos plantando mais algumas sementes hoje.
Gostava de passar tempo com minha filha, sem fugir mais dela.
No entanto... nunca a segurei até agora. Em vez disso, dei passos
de bebê em direção a ela. Estava tentando me aproximar, construir
nosso relacionamento tenso.
Ela me aceitou de braços abertos, e, agora, era a minha vez. Dei
um sorriso fraco para Noura, e ela pegou as sementes das minhas
mãos com avidez, antes de plantá-las. Eu a ensinei e ela aprendia
rápido. Quando terminamos, minha testa brilhava de suor, e o solo
lamacento manchava suas mãozinhas.
Noura ergueu os olhos e deu uma risadinha, passando a mão
molhada na testa. Devolvi o sorriso, meus olhos enrugando para ela.
Agora, ela parecia uma bagunça.
Estendi um dedo sujo e belisquei seu nariz.
Ao mesmo tempo, ela espirrou.
Epa. Antes que pudesse dizer qualquer coisa, suas mãos
selvagens e enlameadas vieram em minha direção, manchando
meu rosto. Assustada, apenas engasguei. Acho que ela esqueceu
que minha boca estava aberta e suas mãos manchadas deslizaram
para dentro. Enojada, minhas papilas gustativas provaram o solo
terroso e eu cuspi no chão molhado. A risada de Noura soou alta ao
fundo, e me virei para encará-la.
Quando ela se tornou tão travessa?
— Voxê tá muito engraxada, mamãe!
Olhando para ela com desaprovação, não pude evitar quando
meu rosto se esticou em um sorriso. Seus ombros tremeram quando
ela riu, e foi o som mais bonito que já ouvi. Eu estalei a língua
baixinho, e levantei a mão e manchei suas bochechas com sujeira.
Esperava que ela não tivesse uma alergia depois.
Gritando, ela pegou a terra próxima e jogou no meu cabelo. Não
esperava isso. Estendi a mão para agarrar sua bunda, mas ela riu e
passou as mãos molhadas por todo o meu rosto, cobrindo-me com a
maciez marrom. Deixei que ela se divertisse um pouco, embora às
vezes tentasse sujar seu rosto levemente.
Foi meio difícil não fazer isso. Noura gritou e me agarrou. Meus
olhos se arregalaram e minhas costas pousaram no chão molhado.
Bem, lá se foram minhas roupas limpas. Não me importei. Noura
agarrou-se ao meu pescoço, ainda rindo antes de deixar beijos no
meu ombro nu. A parte limpa de mim. Sorri tanto que meu maxilar
doeu.
Ela era tão ridícula.
— Te amo, mamãe.
Ahh... Droga, ela era dona do meu coração. Ela sabia disso?
Finalmente, ela se afastou e voltou a plantar mais algumas flores,
como se os últimos dez minutos e a luta na lama nunca tivessem
acontecido. Olhei para minha filha travessa, observando se ela me
atacaria com terra novamente, mas ela cantarolou baixinho e
continuou a jardinagem.
Ela me pegou olhando e ergueu as sobrancelhas.
— Voxê parece... uma merda.
Merda? Perdi o equilíbrio de joelhos e minha bunda caiu no chão.
Mais uma vez, ela me deixou estupefata. Eu a encarei do chão
antes de me sentar.
Era esta a minha angélica Noura?
— Quem te ensinou essa palavra? — Com certeza, não fui eu e
minhas tias. Não xingamos perto dela. Pelo menos, tia Ines não
xingava em inglês. Às vezes, em árabe.
Ela deu de ombros.
— Uma crianxa da minha turma dixe. Ele ouviu ixu de xeu pai.
Apertei meus lábios e olhei para ela com força. Depois de um
momento, relaxei meu rosto e disse:
— Você não pode usar essa palavra, Noura. Não é legal para os
bebês dizerem.
Suas sobrancelhas franziram antes de fazer beicinho.
— Eu não xou um bebê!
Certo. Ela não era mais, e não pude deixar de sorrir.
— Prometa-me, Noura, você não vai usá-la novamente — exigi,
perdendo meu sorriso. — Quando você fizer dezoito anos, você
pode.
Ela riu antes de assentir obedientemente.
Bom. Agora, isso resolve.
Ela continuou a jardinagem, não fazendo mais comentários rudes.
Também não me falou dele. Ela tinha sentido algo? Esperei que ela
me questionasse sobre isso, mas ela não o mencionou, e nem eu.
No silêncio pacífico, continuamos a jardinagem enquanto o sol
brilhava sobre nós e os pássaros cantavam no ar.
Voltamos a ser uma família.
E não deixaria ninguém nos separar.
GHISLAINE

33

A NOITE JÁ tinha chegado quando minhas tias saíram de casa.


Mais tarde, naquela semana, elas tinham um evento para o qual
iriam. Uma reunião na casa de uma amiga delas. Elas me
convidaram para ir junto também, mas, sendo a pessoa antissocial
que eu era, educadamente recusei.
Odiava as pessoas. Acho que era óbvio o suficiente.
Não era à toa que eu não tinha amigos.
Por sorte, elas não insistiram e me deixaram em paz.
Noura estava lá em cima, tirando uma soneca, enquanto eu
estava sentada na sala, zapeando a televisão. Suspirei porque não
consegui encontrar nada interessante para ver.
Alguns momentos depois, a campainha tocou.
Levantando-me do sofá, me perguntei se minhas tias haviam
retornado tão cedo. Elas só tinham saído por uma hora e não
deveriam chegar em casa antes das dez da noite. Em vez de olhar
pelo olho mágico, abri a porta. Meu olhar caiu em seus sapatos de
couro preto antes que eles levantassem e encontrassem seus olhos.
O que ele estava fazendo aqui?
Meu corpo parou enquanto olhava para Alexander na minha porta.
Meu olhar faminto o envolveu novamente, e ele pareceu fazer o
mesmo comigo. Meus dedos ansiosos coçavam para puxá-lo para
perto e me abraçar novamente. Não tinha estado perto dele em
quatro longos meses.
Ele parecia ainda mais bonito do que antes, ou talvez fossem
meus olhos ansiosos que sentiam falta dele. Meu olhar pousou em
sua mandíbula proeminente e angular antes de cair em sua
garganta que balançava. Observei seus olhos vidrados, e meu
coração parou, com medo de que, se ele falasse, poderia quebrar
tudo de novo.
Gostaria de ter me vestido melhor, se soubesse que ele viria.
Talvez pudesse ter usado rosa, a cor que ele gostava em mim. Mas,
novamente, por que esperaria vê-lo novamente?
Ele sempre chegava sem avisar e sem ser convidado, de
qualquer maneira. Em vez disso, usava um pijama de algodão cinza
claro. Eles eram ajustados e apertados, no entanto, e delineavam
minhas curvas.
Seu olhar voraz se moveu do meu corpo antes que ele falasse.
— Você não tem mais olheiras.
Droga... Foi a primeira coisa que ele me disse?
Teria sido melhor se ele me ameaçasse ou exigisse que eu
voltasse com ele. Poderia facilmente odiá-lo então, mas sua
preocupação me matou. Encheu minha alma de esperança
novamente. Odiava que ele notasse meus olhos todas as vezes, e
meu coração batia com sua voz sedutora. Isso me assombrava
sempre. Era o meu segundo favorito depois da risada de Noura.
— Você está melhor do que antes, Ghislaine.
Não ‘Passarinho’? Eu queria questionar, mas mordi minha língua,
segurando o que eu queria dizer.
— Você disse que ficaria longe.
Ele deu de ombros antes de exalar.
— Só queria ver como você estava.
Gostaria que ele já me esfaqueasse no peito e cortasse meu
coração. A dor familiar da minha garganta voltou novamente, e
mordi meu lábio trêmulo.
Quando não respondi, ele perguntou:
— Como você está?
Arrastei meus olhos para longe dos dele e olhei para seus
sapatos em vez disso. Eles pareciam fascinantes o suficiente.
— Você não deveria ter vindo aqui — disse suavemente. — É
melhor se você for embora.
Não queria que ele fizesse isso, mas eu já tinha acabado com
isso. Nós.
Não houve retorno do que havíamos passado. Eu me movi para
fechar a porta, mas seu braço estendeu a mão e me impediu de
fechá-la. Fiz uma pausa. Foi como um déjà vu.
Ele a empurrou para o lado e atirou-a contra a parede.
Pisquei antes de meus olhos pousarem nos dele. Eles não
estavam chateados, mas... esmaecidos. Não tinham a mesma
travessura como antes. Em vez disso, vi um homem que era como
eu. Que havia perdido o brilho assim como eu.
— Tem alguém em casa? — ele perguntou depois de um
momento.
Minha garganta balançou com os tons sensuais em sua voz. Eu
deveria mentir e dizer a ele que todos estavam em casa, mas, em
vez disso, o que saiu da minha boca estúpida foi:
— Noura está dormindo.
Ele inclinou a cabeça, seus olhos de meia-noite nunca deixando
meu rosto.
— E suas tias?
Não deveria dizer a ele. Ele tomaria isso como um convite para
entrar. Se lhe dissesse que minhas tias estavam em casa, ele iria
embora. No fundo do meu coração, sabia que ele iria. Nas duas
últimas vezes, ele nunca entrou na minha casa quando elas
estavam em casa... Mas, hoje, eu estava sozinha. Não tinha minha
família ao meu redor, e ele veio para mim como um leão pronto para
atacar. Deveria mentir. Essa era a coisa certa a fazer. Eu pisquei,
com minha garganta balançando enquanto eu falava.
— Elas não estão em casa.
Ele entrou e fechou a porta, trancando-a.
Mordi minha bochecha interna e me afastei dele, minhas costas
batendo na parede atrás de mim.
— Alexander — implorei, minha voz doía de desejo. Seu olhar
faminto estava em mim novamente como um predador, e eu era sua
presa. — Você disse que ficaria longe — acusei baixinho.
Seu lábio se contraiu, e aquele sorriso familiar retornou.
— Bem... Sou um mentiroso, e todos sabemos disso, não? — ele
perguntou, seus olhos me desafiando a discordar.
Ele estava certo. Isso era verdade, e eu não podia negar.
Lambi meus lábios, e seus olhos seguiram aquele movimento.
Eles escureceram quando seus olhos bateram nos meus.
— N-Noura está dormindo — gaguejei, repetindo minha
declaração anterior enquanto tentava afundar mais fundo na parede,
mas não tinha para onde ir enquanto ele pairava na minha frente.
Seus olhos escurecidos se iluminaram com malícia, e o brilho em
seus olhos voltou. Meu coração pulou uma batida.
— Então, teremos muito cuidado para não fazer barulho,
Passarinho.
Ele se aproximou enquanto olhava para mim. Ele sugou o ar dos
meus pulmões agora que estava na minha frente. Por que ele não
se afastou? Tentei tanto seguir em frente com a minha vida... E
agora, aqui estava ele, parado diante de mim, e eu estava de volta à
estaca zero. Uma pergunta queimou na ponta da minha língua, e eu
falei com os nervos desordenados.
— Por que você está aqui?
Seus braços prenderam-me contra a parede. Seu cheiro estava
em mim novamente. Sentindo-me pequena, olhei para sua camisa
branca de botão para uma distração. Parecia macia, e eu queria
tocá-la.
— Por que você acha que estou aqui?
Suas palavras eram como uma carícia na minha pele, e fechei os
olhos.
— V-Você não pode estar aqui — gaguejei. Idiota. Limpando a
garganta, continuei: — Fui bem clara da última vez.
— Pensei em tentar fazer você mudar de ideia mais uma vez. —
Meus olhos se abriram. — Eu te dei o espaço que você queria, mas,
já disse isso antes, nunca desistiria de você — sua voz baixou
roucamente.
Meu coração alegrou por dentro.
Estúpido coração traidor.
Ele abaixou o rosto, e sua boca familiar roçou minha bochecha.
Virei o rosto e tentei permanecer forte, embora minhas pernas
estivessem como gelatina. Mais um segundo e eu cairia.
— Não te perdoei — sussurrei.
Ele deixou beijinhos no meu queixo, e eu estremeci. Acho que ele
gostou muito daquele lugar. Um pequeno gemido saiu da minha
boca, e eu fechei meus malditos lábios.
Boca estúpida traidora também.
— Você pode ficar com raiva de mim o quanto quiser —
respondeu Alexander — Você pode me odiar, mas isso não muda o
fato de que... seu coração bate por mim. — Odiava que ele
estivesse certo. Com uma mão frágil, eu o empurrei, e ele caiu para
trás, ainda olhando para mim. — Ghislaine, o que é preciso para
você voltar?
Ele sempre me perguntava isso. Nunca parava.
— Isso não está em discussão.
Ele estendeu a mão para me tocar, mas eu levantei minha mão.
Ele fez uma pausa.
— Não gosto mais do seu toque.
Isso era uma merda de mentira.
Por que eu disse isso?
Mas não estava com vontade de ser manipulada por seu pau.
A ira saiu de seu corpo, e acho que só o irritei.
— Então, de quem você gosta do toque? — Seu lábio se curvou
em uma carranca. — Do seu marido?
Cruzei os braços sobre o peito e, apenas para ofendê-lo e
machucá-lo, respondi:
— Sim.
Os olhos de Alexander escureceram.
Sua próxima resposta me pegou desprevenida.
— Então finja que eu sou ele.
Olhei para ele, de olhos arregalados, e descruzei os braços.
Agora, eles pendiam frouxamente ao meu lado.
Ele passou a mão pela barba.
— Se ficar mais fácil para você, finja que sou ele... e deixe-me
tocar em você.
Franzi minhas sobrancelhas.
— Você tem um suprimento ilimitado de garotas à sua disposição.
Por que não está com elas? — Eu ainda estava chateada com ele,
mas também não queria que ele tocasse em ninguém. Isso só iria
me quebrar de novo.
— Isso não é necessário. Quero isso. Quero você.
— Não — respondi teimosamente, mas eu odiava como meu
estômago fervilhava de borboletas. Odiava borboletas agora.
Estômago estúpido traidor também.
— Ty edinstvennaya zenshina, kotoruyu ya hochu. Você é a única
mulher que eu quero. Você pode fingir que eu sou outra pessoa —
ele rosnou, me puxando pela cintura e em direção a ele. Tentei
afastá-lo, mas ele só segurou com mais força. — Tem sido difícil
sem você. Eu esperei... que você... voltasse, mas você não voltou
— sua voz baixou. — Não sabia mais o que fazer além de esperar...
Mas agora estou aqui porque precisava vê-la novamente.
Ele esperou por mim. Eu gostaria que ele parasse de falar.
— Você me pergunta o tempo todo, por que eu? — Seus olhos se
fixaram em mim enquanto ele falava. — Você me perguntou por que
eu não queria que você fosse embora. Primeiro, responda minhas
perguntas. Como é que fui eu que arruinei sua vida, que quase te
matei, e fui eu que te acordei de novo? Como você explica tudo
isso? Como você pode lutar contra o destino? Não planejei nada
disso.
Perplexa, eu estava quase sem noção como ele é.
— Você para de respirar quando eu chego tão perto de você,
Ghislaine — ele sussurrou contra meus lábios, ainda segurando
minha cintura. — Você perde o fôlego. Eu te faço feliz. Fiz uma
vez… Você sente por mim. Você me quer. Você me deseja. Por que
você está negando?
Não lhe respondi e, em vez disso, olhei para o peito dele, na
esperança de calá-lo. Esperançosamente, ele iria entender a dica e
sair.
— Uma vez, você pertenceu a outro homem. Você não pertence
mais. Não estou pedindo para você esquecê-lo. — Meus olhos se
fecharam. — Não estou pedindo para você substituí-lo por mim.
Estou pedindo meu próprio lugar, onde posso fazer parte de você.
Engasguei com a minha respiração. Ele estava dizendo todas
aquelas coisas que eu desejava ouvir... Mas eu estava com medo
de que fosse tarde demais.
— Não me afaste… Você entrou na minha vida, e, sim, eu sabia
quem você era. Após a morte de seu marido, meus homens
disseram que você entrou em coma. Eu nunca fui atrás de você
então.
Sua respiração dura atingiu o lado do meu rosto enquanto ele
falava, e eu escutei. Ouvi tudo o que ele tinha a dizer.
— Quando Noura me disse para te beijar no hospital, era para ser
apenas um beijo. Nada mais... Mas você abriu seus lindos olhos e
olhou para mim. Não conseguia esquecer aqueles olhos. — Meu
coração acelerou. — Eu te observei desde que você saiu do
hospital. Você não tem ideia de quão profunda é minha obsessão
por você, mas eu nunca tentei tomar você para mim. — Meus olhos
brilharam. — Em vez disso, fiquei nas sombras… e nunca me tornei
visível. Você nunca deveria saber. Não planejei me envolver com
você… — ele confessou —, mas alguém te machucou. Então, me
tornei visível pra caralho, e você se tornou parte da minha vida.
Minha garganta engolia enquanto tudo doía, e meus olhos ficaram
atônitos.
— E foi tudo real. — Minha respiração engatou. — Foi real como
a porra do real pode ser — sua voz era uma promessa sombria. —
Você era tão quieta. Tão reservada. Tão fodidamente triste. Fui
atraído por você, não porque queria protegê-la, e não porque queria
ajudá-la, mas porque queria fazê-la viva novamente. Para sentir de
novo.
Mordi o lábio porque o tremor piorou.
— Vi uma faísca em você naquela noite quando você atirou
naquele filho da puta. Você viveu de novo — ele continuou. — Você
teve essa dor, essa raiva, e isso se transformou em algo maior do
que eu jamais imaginei. Sim, foi por minha causa. Sou responsável
por sua mágoa, sua dor e sua perda.
Minha respiração ficou presa no meu peito.
Soou terrivelmente como um pedido de desculpas.
— Você chorou naquela noite quando aquele homem te
machucou. Foi o som mais cru que já ouvi.
Lembrei-me daquela noite. Olhei para cima e ele se encolheu.
— Essa foi a primeira vez que senti a dor de alguém… Eu queria
fazer da sua dor parte da minha. Você me faz sentir, caralho. — Sua
voz ficou rouca, e eu fechei os olhos, sem palavras. — Você chorou
de novo quando descobriu que aquela mulher estava grávida. Sua
culpa foi por minha causa. Eu causei tudo isso. Fiz com que você se
tornasse você. Com Driss, você sentiu proteção e segurança.
Comigo, você se sente poderosa e livre. E não negue isso.
Não, porque era verdade.
— Você é minha, Ghislaine. Minha gazela. Desde o dia em que
você olhou para mim pela primeira vez, você se tornou minha. Não
quero deixar você ir — sua voz ficou tão baixa. — O que mais
preciso fazer para que você olhe para mim como se eu fosse seu
tudo de novo?
Fiquei muda em vez disso. Talvez isso fosse melhor. Não
encontrei seus olhos. Sabia que eles estavam atormentados como
sua voz.
— Toda vez que você olhava para mim, eu caía tão forte.
Meus olhos voaram para ele.
A angústia, a dor, a agonia estava em seus lindos olhos.
— Caí cada vez mais fundo. Nunca foi sobre foder você. Não
queria foder você e tirar você do meu sistema. Queria que você
ficasse permanentemente lá. — Ele deu um sorriso fraco. —
Naquela noite quando nos beijamos... Quando nos beijamos de
verdade, eu estava condenado. Bastou apenas um beijo.
Eu queria estender a mão e segurá-lo em meus braços
novamente.
— Não se afaste de mim. Sei que eu mereço isso. Gostaria de
poder dizer que não queria matar Driss. — Sufoquei uma respiração
irregular. — Gostaria de me arrepender disso, mas não me
arrependo. É egoísta. Eu sei. Sou egoísta. Nunca afirmei ser algo
maior. — Seus lábios formaram um sorriso triste. — Fiz o que
qualquer líder faz por sua causa. Protegi meu povo. Eu os escolhi.
Vocês dois viram meus homens em ação e tomei uma decisão.
Ele suspirou.
— Não me arrependo da morte de Driss Khalil… Porque, sem
isso, você nunca teria vindo para a minha vida. Eu nunca teria
conhecido você se isso nunca tivesse acontecido. Não me
arrependo de matá-lo, mas lamento o caos que causei a você e sua
família. Você não merecia isso. Você compartilhou seus segredos
comigo, e eu os mantive em segurança. Eu os segurei perto de mim.
Não consigo respirar quando você não está aqui — ele balançou a
cabeça — Esses meses. Não são apenas quatro longos meses que
você esteve longe de mim. Foram dois meses antes disso também...
Seis meses longe de você foram como uma porra de morte.
Ele estava dizendo tanto, e eu queria calá-lo. Era tarde demais.
Achei que ele tinha acabado de falar, mas não.
— Quando olho para você... vejo uma mulher tão forte e
destemida depois de tudo que passou. Vejo uma mulher, uma mãe
que está tentando viver, sobreviver. Você não está quebrada. Você
nunca esteve quebrada para mim. Apenas escondida sob sua
concha. Como não querer isso? Como posso deixar outro homem
ter isso... Ter você? Quero que você só respire por mim, como eu só
respiro por você — sua voz cheia de possessividade.
Meu coração disparou, querendo cair a qualquer segundo. Ele
deu um de seus sorrisos, e seus lindos olhos brilharam como os
meus. Eles eram tão bonitos quando eram mais suaves.
— O que você precisa que eu faça? Quanto mais tenho que
rastejar? Ficar de joelhos por você? — ele desafiou. — Nunca me
curvei para ninguém além de pessoas com quem me importo. Vou
fazer isso por você. Vou fazer isso, porra, se for preciso. Diga-me e
farei isso.
Por fim, olhei para ele e fiz as duas perguntas que eu queria uma
resposta.
— Você pode trazer Driss de volta? Você pode trazer o pai de
Noura de volta?
O rosto de Alexander desmoronou antes que ele exalasse. Ele
ainda segurava minha cintura o tempo todo, e nem uma vez ele me
soltou. Talvez ele tenha pensado que eu fugiria dele.
— Tirei tudo de você. Sei que tirei. E lamento as perdas que lhe
causei.
Atordoada, aceitei seu pedido de desculpas.
— Não posso trazê-lo de volta, mas posso te devolver tudo. Tudo
o que você perdeu. Tudo que Noura perdeu. Um marido — minha
respiração engatou, — Um pai. Deixe-me ser o único para você,
porque você é a única para mim. Vou te dar o mundo — ele exalou
rudemente. — Qualquer coisa que você nomear. Você merece. Vale
a pena esperar. Você não está mais sozinha. É você e eu. Somos
nós.
Seus olhos procuraram os meus, lacrimejantes. Antes que eu
pudesse dizer alguma coisa, seus lábios caíram sobre mim. Ele
agarrou a parte de trás da minha cabeça e me segurou no lugar,
afastando-se da parede e em direção à minha sala de estar. Não
sabia quando acabei no tapete, mas estava lá, e ele estava acima
de mim.
— Alexander — respirei —, eu n-não posso.
Engoli em seco em sua boca quando sua excitação dura esfregou
contra mim. Sua língua sondou minha boca brutalmente, exigindo
entrada. Mordi seu lábio inferior, minha boca se enchendo com o
gosto dele e o sangue que eu extraíra.
Ele gemeu, o som vibrando contra meus lábios. Ele apenas
pressionou seus lábios mais firmes contra mim. Um pequeno
gemido saiu da minha boca, e foi engolido por ele.
— Então, finja que sou ele. Se essa é a única maneira que você
vai olhar para mim de novo, vou aceitar.
Seus lábios deixaram minha boca, sua voz rouca contra meu
pescoço, deixando beijos leves contra meu corpo. Ele estava em
cima de mim, sua boca vagando, vagando, tomando, e nunca
parando.
Eu era horrível. Terrível. Uma esposa terrível. Uma mãe terrível.
Um ser humano de merda. Deveria parar com isso, mas não queria.
— Noura pode acordar — sussurrei.
Agarrei sua boca e pressionei meus lábios contra os dele.
Alexander retribuiu o beijo com um suspiro satisfeito antes de se
afastar, e seus olhos intensos caíram sobre mim. Ele consumiu
meus lábios novamente, como se fosse dono da minha boca. Suas
mãos frias deslizaram sob minha camisa, roçando meu umbigo
antes de subir para meus seios, os mesmos sem sutiã. Ele
cantarolou em aprovação quando seus dedos ásperos encontraram
meus mamilos. Eles intumesceram como balas sob seu toque. Eu
queria sua boca neles.
Ele puxou minha camisa de algodão sobre minha cabeça, e seu
olhar ganancioso rastejou sobre mim. Seus olhos caíram em meus
seios, e eu estendi minhas mãos para me cobrir de seu olhar
predatório. Ele apenas os separou e me levou para dentro. Eles
pareciam mais pesados sob ele, e minha pele explodiu em arrepios.
Respirei fundo. Ele olhou para mim como se eu fosse incrível.
— Você é a coisa mais linda do mundo. — Isso confirmou seu
olhar. Sua voz baixou e suas pupilas dilataram. — Se eu estivesse
lá naquela noite, e se eu tivesse visto você, não acho que eu
poderia ter... matado você — ele confessou. — Teria deixado você ir
embora.
Dois segundos depois, ele se lançou em mim, me empurrando
contra o tapete. Sua boca molhada chupou meus mamilos. Eles
formigavam sob sua língua perversa enquanto ele os provocava.
Pequenos gemidos deixaram minha boca. Seus dentes roçaram
uma protuberância, esticando-a, puxando-a o mais longe que podia
antes que seus dentes o apertassem cruelmente. Eu estava com
medo de que ele tirasse sangue. Eu abri minha boca para gritar, e
ele olhou para cima. Sua mão estendeu a mão e apertou minha
boca, abafando meus gritos. Lágrimas encheram meus olhos com a
dor no meu mamilo. Ele acalmou a mordida soprando nela, sua
respiração fria contra minha carne aquecida.
— Você não pode gritar— ele murmurou contra a minha pele
antes de seus olhos olharem para cima.
Noura. Balancei a cabeça lentamente sob sua mão.
Esperançosamente, ela acordou muito mais tarde e não pegou
sua mãe e seu melhor amigo perdidos no ato.
Sua boca se moveu para o meu outro mamilo, e ele o mordeu
grosseiramente também. Arqueei minhas costas contra ele,
arranhando suas costas quando outro grito me deixou. Tarde
demais. Não conseguia controlar minha voz.
Sua mão ainda pressionada contra minha boca. Lágrimas
borraram meus olhos. Ele acalmou o formigamento com outra
respiração fria. Olhei para os meus seios. As protuberâncias
castanhas claras tinham escurecido, como um roxo raivoso, e
pareciam perto de sangrar. A mão de Alexander deixou meu rosto.
Ele tirou o blazer, e sua camisa veio em seguida.
Meus olhos gananciosos observaram suas tatuagens e seu corpo
magro e musculoso. Estendi a mão e meus dedos traçaram a tinta
sobre ele, me familiarizando com eles novamente. Suas mãos
descansavam nos lados opostos da minha cabeça, pairando acima
de mim enquanto ele me observava, divertido com meus pequenos
cuidados.
— Você tem ideia do quanto senti sua falta? — Ele inclinou a
cabeça para baixo e esfregou o nariz contra o meu.
O resto da minha roupa saiu em seguida, e eu estava nua debaixo
dele. Suas mãos se estenderam e amassaram meus seios
doloridos.
— Quero foder isso — disse ele rispidamente.
Meus olhos atordoados se voltaram para os dele, e ele deu um
sorriso malicioso.
— Você já os torturou — acusei.
Seu sorriso se alargou e seus olhos escuros brilharam.
— Mas não o suficiente.
Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele puxou o resto de
suas roupas. Sua masculinidade ereta me cumprimentou. Os
joelhos de Alexander estavam no chão do carpete enquanto ele
pairava acima do meu estômago. Engoli em seco enquanto ele
estava lá como o cavaleiro mais sombrio. Ele tocou seu pau grosso
contra meus mamilos doloridos, e um por um esfregou contra eles.
Estremeci, e meus olhos encontraram os dele.
Afastando-se, ele deslizou seu pau no meu estômago antes de
descansar entre meus seios. Minhas pernas tremiam, e a umidade
se acumulou em meu núcleo. Suas mãos encontraram meus seios e
ele os moveu para cima e para baixo entre seu pau. Isso era tão
sujo e erótico, e eu adorei. Pequenos gemidos deixaram minha boca
enquanto ele bombeava contra mim com um aperto firme.
Olhei para cima e encontrei seus olhos carentes. Meus lábios se
separaram, e eu arqueei minhas costas do chão, levantando e me
oferecendo a ele. Ele me observou o tempo todo com um brilho em
seus olhos profundos.
Uma vez voyeurista, sempre voyeurista.
— Você é uma garota tão boa me tomando assim — ele avaliou.
Lambi meus lábios com sua aprovação, meus olhos vidrados
colidindo com os dele. Olhei para baixo e olhei para o pau dolorido
que se aproximava do meu rosto. Ele era longo e liso. Perguntei-me
qual era seu gosto. Eu queria agradá-lo também. Abaixei minha
cabeça e lambi a cabeça protuberante. Não foi ruim. Masculino e
almiscarado.
Alexander parou em movimento, e um gemido silencioso deixou
seus lábios.
— Não me importaria de acordar com seus lábios em volta do
meu pau. — Suas palavras brutais enviam arrepios na minha
espinha. Ele deveria ter entrado na minha vida com uma etiqueta de
advertência.
Mordendo minha bochecha nervosamente, coloquei a língua para
fora e o lambi como um experimento. Tinha feito isso no passado,
mas não com ele. Ele era duro e grosso.
Desta vez, eu o tomei na minha boca. Ele se abaixou perto do
meu rosto, pressionando a mão contra o tapete e empurrando mais
fundo na minha boca. Quando ele atingiu minha garganta, tive
reflexo. Tinha acabado de engasgar com ele. Meus olhos
lacrimejaram, e ele se afastou. Ele arqueou uma sobrancelha.
— Ninguém nunca vai tocar em você além de mim. — Meus olhos
se ergueram. Ele se esfregou contra meus lábios molhados, e eu
provei seu pré-sêmen. — Nenhum outro homem jamais saberá
como seus lábios se parecem com porra entre eles — ele prometeu,
e seus olhos ficaram mais vítreos. Minhas bochechas queimaram.
— Nenhum outro homem jamais saberá como seus olhos parecem
assustados com o quão profundo você pode levar um pau. Se um
homem tentar chegar perto de você e se você deixar, vou mutilar
seu corpo e matá-lo na sua frente, e vou foder você em carne viva
em seu sangue até você gritar.
Eu não duvidava que ele faria isso. Ele já havia me tocado em um
banho de sangue uma vez. Com a mão, ele pressionou minhas
bochechas, me fazendo formar um ‘O’ com a boca. Respirando
fundo, me inclinei para frente, querendo-o novamente. Eu o chupei,
tomando cuidado para não usar nenhum dente, e ele bombeou em
minha boca.
Ele respirou acima de mim, e um zumbido de aprovação saiu de
sua boca. Uma onda de satisfação me encheu quando meus olhos
enevoados encontraram os dele escurecidos.
— Se você continuar fazendo isso, vou gozar na sua boca — ele
avisou com uma pontada em sua voz. — E vou fazer você engolir.
Engoli em seco, me encolhendo com a ameaça sexy antes de me
afastar dele, seu pau deslizando pelos meus lábios molhados.
Nunca tinha engolido antes.
Ele sorriu antes de retirar sua masculinidade e foi mais baixo,
longe do meu estômago e seios, e se posicionou entre minhas
coxas. Eu me levantei em meus cotovelos e olhei para meus seios
doloridos. Eles ainda brilhavam de sua sucção cruel. Ele deixou
hematomas neles, e eu sabia que eles iriam doer amanhã. Olhei
para cima e fiz uma careta.
Percebendo-os, ele comentou:
— Gosto das minhas marcas em você.
Claro que gosta.
Ele esfregou sua protuberância contra a minha umidade, girando
ao redor. Envolvi minhas pernas ao redor dele, tentando puxá-lo
para mais perto.
Ele sorriu para mim, murchando como um gato no cio embaixo
dele. Soltei um gemido, e então ele se esmagou dentro de mim em
um movimento rápido. Isso me tirou o fôlego, e eu desabei no
tapete. Não conseguia nem gritar.
— Sua loucura chama a minha escuridão — disse ele com
exalações irregulares. Enfiando. — Você sente isso entre nós? —
Enfiando. — Você foi feita para mim. — Enfiando. — Para correr
selvagem e indomável ao meu lado.
Ele enfiou selvagemente em mim novamente, e um gemido
deixou meus lábios. Aparentemente, foi com muita força, porque sua
mão apertou minha boca novamente. Ele se inclinou e girou os
quadris, seu corpo moendo e trabalhando com o meu. Eu me movi
embaixo dele, no ritmo, combinando com seus movimentos. As
sensações em mim subiram cada vez mais alto, atingindo meu pico.
Ele grunhiu acima de mim, e seus olhos encontraram os meus,
lacrimejantes.
Suas estocadas eram poderosas, e empurravam meu corpo toda
vez, meus seios se movendo com elas. Minhas mãos se
estenderam e acabei arranhando-o no pescoço, minhas unhas
tirando sangue. Ele estremeceu, e seus olhos brilharam antes de
enfiar em mim novamente, me desafiando. Seus movimentos
estavam ficando mais ásperos e mais difíceis, enquanto ele me
invadia de novo e de novo, e eu o deixava todas as vezes porque
estava faminta por esse homem.
Meu corpo zumbia com eletricidade, vibrando enquanto envolvia
meu núcleo e pulsava pelos meus membros. Estava finalmente no
topo.
Meus músculos se contraíram, e gozei com tanta força, que meu
corpo parecia que estava caindo de um penhasco. O êxtase me
encheu enquanto uma corrente elétrica percorria meu corpo. Gritei
contra a mão dele, e eu me despedacei violentamente debaixo dele.
Meu corpo estremeceu tanto que mordi sua mão.
Mas isso não o deteve enquanto estava deitada embaixo dele,
atordoada enquanto uma lágrima saía do meu olho. Ele continuou a
se mover. Uma sensação quente de naufrágio tomou conta da
minha alma quando eu a soltei. Eu era um vulcão em forma
humana. Toda a tensão que eu tinha antes desapareceu e voou pela
porta.
Alexander tirou a mão da minha boca, e meus olhos caíram sobre
as marcas de dentes vermelhos que deixei para trás. Ele enfiou em
mim novamente, respirando com dificuldade.
— Você é tão linda quando se solta — ele sussurrou.
Enfiando.
— Você não tem ideia do quanto você me arruinou.
Enfiando.
Agora somos dois.
— Você é minha.
Enfiando.
— Cada parte fodida de você pertence a mim.
Enfiando.
Seus lábios desceram nos meus, dando um beijo contundente.
— Seus lábios são meus.
Enfiando.
Seus lábios caíram em minhas protuberâncias sensíveis e
doloridas, sua boca e dentes lambendo-os novamente, fazendo-os
doer.
— Seus peitos são meus.
Enfiando.
Sua mão estendeu a mão e tocou meu clitóris escorregadio,
enviando um arrepio pela minha espinha.
— Sua boceta é minha.
Enfiando.
Exalei e minha respiração pousou em seu rosto.
— Suas respirações são minhas.
Enfiando.
Meus olhos se arregalaram, desejando não poder ouvi-lo. Era
melhor quando ele estava apenas falando sujo, mas agora era muito
mais.
Sua boca deixou um beijo à esquerda do meu esterno.
— Seu coração é meu.
Enfiando.
Fechei os olhos, esperando poder calá-lo.
Seus lábios pressionaram contra as minhas pálpebras.
— Seus olhos são meus.
Enfiando.
Abri meus olhos, e ele sorriu sombriamente.
— Sua maldita alma é minha.
Enfiando.
Meus olhos ficaram mais vidrados, e sua voz ficou mais áspera.
— Ty moy navsegda. És minha para sempre.
Enfiando.
— Cada parte em mim pertence a você também.
Enfiando.
— Estou arrebatado pra caralho por você.
Enfiando.
— Eu te amo.
Enfiando.
Meu corpo se acalmou, e eu pensei que tinha ouvido errado.
Procurei seus olhos, querendo que ele esclarecesse. Seus olhos
nebulosos encontraram os meus e seus lábios formaram um lindo
sorriso.
— Estou perdidamente apaixonado por você.
Enfiando.
Arqueei abaixo dele, outra liberação crescendo em mim. Ele se
inclinou e seus lábios se moveram contra os meus, me beijando
mais uma vez. Afastando-se um pouco, seus olhos negros travados
nos meus.
— E você também me ama.
Enfiando.
Gritei e desmoronei debaixo dele, mas, desta vez, ele não abafou
meu som devastador. Em vez disso, ele escutou, seus lábios se
contraindo antes de sussurrar:
— Meu pássaro canoro.
Alexander puxou, e ele gozou em todo o meu estômago. Não me
importei, porque era isso ou meu tapete. Não seria capaz de
explicar as manchas para minhas tias, de qualquer maneira.
Respirando superficialmente, meu corpo parecia que estava
flutuando, e eu perdi toda a força de vontade em meus membros.
Não podia senti-los mais, e estava me perguntando como eu iria me
levantar.
Seus lábios se moveram contra o meu pescoço, me beijando
antes de se afastar de mim. Ele puxou sua cueca boxer e calça
enquanto eu ainda estava deitada no chão, ainda perdida com
minha mente fora deste mundo.
Olhando para mim, ele sorriu.
— Precisa de uma mão?
Pisquei e me ergui nos cotovelos, evitando sua ajuda. Arrastei
meu corpo dolorido contra o sofá antes de olhar para minha barriga
cheia de gozo e seios machucados. Levantando-me, descansei
meus ombros caídos contra as pernas do sofá. Não havia uma parte
de mim que não fosse marcada por ele. Em vez de encontrar seus
olhos, eu olhei para o chão, puxando meus joelhos para cima.
— Reconheço esse olhar — a voz de Alexander veio.
Dormi com o assassino do meu marido, mas, dessa vez,
conscientemente.
Imagine se Driss estivesse me observando do céu agora…
Foi traição da pior maneira possível.
A culpa afundou em minha alma, provocando-me de minha
traição.
Pode não ter sido minha culpa no passado, mas desta vez...
Nenhum número de explicações que eu pudesse me dar seria
suficiente.
Meu lábio inferior tremeu, e o arrependimento encheu meu
coração.
Por que eu fiz isso?
Mordi meu dedo para evitar um soluço ameaçador.
— E-eu não pensei no meu marido nem uma vez — engasguei
em voz baixa. A vergonha encheu minha alma. — Não imaginei que
fosse ele. Só vi... você.
Eu não sabia por que estava admitindo isso para Alexander, mas
queria que ele me provocasse sobre isso. Para me punir pelo meu
egoísmo.
Esperei que seu comentário de repreensão viesse, mas não veio.
Olhei para a parede à minha frente. Enxuguei as lágrimas que
rolaram pelo meu rosto. Olhando para Alexander, ele ainda estava lá
sem camisa alguns metros acima de mim. Lágrimas escorriam pelo
meu rosto, e balancei minha cabeça como uma lunática. Seus olhos
suavizaram, e ele se moveu em minha direção, mas virei meu corpo.
Ele fez uma pausa.
— Eu não posso — sussurrei, finalmente, olhando para ele. —
Você ainda é o assassino do meu marido.
Seu rosto caiu.
Minha alma se abriu novamente.
— Eu não acho que posso perdoá-lo... Não posso passar por isso.
— Balancei minha cabeça novamente. — Não posso mentir para
minha Noura quando ela for mais velha, dizer que seu pai morreu
em um acidente. — Minha alma ardia. — Como poderia viver
comigo mesma agora que estou com o assassino do pai da minha
filha? Não é só sobre mim... É sobre minha garotinha também.
Alexander engoliu em seco, e seus olhos queimaram em mim.
— É isso então? — ele perguntou suavemente.
Sua voz era baixa, e eu fechei meus olhos.
Por que ele teve que voltar, e por que me aproximei dele
novamente?
— Eu gostaria... — admiti — Gostaria de poder te perdoar. Quero
te perdoar — minha voz falhou. Eu queria. Eu realmente queria.
Ansiava por perdoá-lo. — Mas e-eu não posso… Não posso mais
ser egoísta. Minha Noura. Não posso fazer isso com ela. Não posso
substituir o pai dela.
Alexander passou a mão pelo rosto, e seus olhos atormentados
encontraram os meus.
— Por que ela não pode ter dois pais?
Por favor, pare de falar.
Não respondi. Em vez disso, o que saiu da minha boca foi:
— Isso é um adeus para sempre, Alexander.
Seus olhos intensos caíram sobre mim novamente, e, desta vez,
eles estavam assustadores e desolados. Seus olhos estavam tão
fodidamente vazios agora, e eu fiz isso com ele. Queria estender a
mão e suavizar sua dor.
Depois de um momento, ele assentiu, antes de pegar sua camisa
e blazer. Ele se levantou e olhou para mim mais uma vez.
Uma última vez.
— Para sempre.
Sua promessa me assombrou profundamente.
Ele virou as costas para mim e saiu pela minha porta.
Desta vez, sabia que ele nunca viria atrás de mim novamente.
Porque eu o destruí.
Olhei para a porta, atordoada, antes de me virar para a parede
novamente. As lágrimas no meu rosto haviam secado.
Ele havia me confessado tudo.
Todas as coisas que eu desejava ouvir.
Mas não foi o suficiente.
Entregar-se não foi suficiente.
Pedir desculpas não foi suficiente.
Confessar não foi suficiente.
Nenhuma quantidade de rastejar jamais seria suficiente.
Não poderia substituir o que eu tinha perdido.
O que Noura havia perdido.
Quebrei seu coração como se ele tivesse partido o meu.
ALEXANDER

34

A ESCURIDÃO CUMPRIMENTOU Alexander enquanto ele se


sentava na enorme cadeira preta de veludo de seu quarto.
As cortinas estavam fechadas, bloqueando a entrada de qualquer
luz do sol, e ele apagou as luzes. Suas pontas dos dedos
tamborilaram contra o braço enquanto olhava para o nada. Ele fazia
isso com frequência nas últimas semanas, enquanto seus
pensamentos entravam e saíam.
Pegando o copo de tequila, bebeu em três goles. Sua garganta
queimou quando engoliu. Pegando a garrafa, ele se serviu de outra
bebida. Esta era sua rotina diária agora. De manhã à noite, se
engaiolava no quarto, bebendo.
Ele simplesmente parou de sair. Parou suas reuniões. Agora,
dava ordens de seu quarto.
Pensava em Ghislaine com frequência e se perguntava se ela
também pensava nele. Ele prometeu a ela que a deixaria em paz
para sempre, e manteve essa promessa. Isso não significava que
ele deixaria de esperar que ela voltasse para ele.
Uma batida saudou seu quarto, interrompendo seus
pensamentos.
Seus olhos caíram sobre a figura na porta, sua mamochka,
Natasha Nikolaeva.
A beleza de sua mãe era de tirar o fôlego, a mesma aparência
que ele herdou. Ela tinha longos cachos pretos descendo pela
cintura e olhos ainda mais negros, com pele de marfim de
porcelana. Também era alta e esbelta. Sua mãe o cumprimentou
com um sorriso, mas ele não o retribuiu. Em vez disso, ele voltou
para sua tequila e bebeu.
Pelo menos, ficaria com ele para sempre.
— Zander... — a voz suave de sua mãe veio. — Por que você se
trancou no seu quarto? — Sua voz estava cheia de curiosidade, e
não de decepção.
Ele desejou que ela o atacasse em vez disso e lhe dissesse para
se recompor como o fodido homem adulto que ele era.
Por que as mães eram tão gentis? Um sorriso se formou em seus
lábios quando ele se lembrou de Ghislaine com Noura também.
Ele adivinhou, elas eram todas assim.
— Estou bebendo — Alexander afirmou o óbvio.
— Claro, eu posso ver — ela respondeu sem perder o ritmo. —
Mas por quê? Você não bebe tanto. Todo mundo tem questionado
seu paradeiro.
Alexander tomou um gole diretamente da garrafa agora.
— Todo mundo pode ir se foder.
Normalmente, ele evitava xingar na frente de sua mãe, mas não
se importava. Sua mãe se aproximou, mas ela não falou mais. Ela
foi a única que se preocupou em ficar por ali. Seu avô Alexie e seu
pai Daniel o deixaram sozinho depois de perceber que ele era
teimoso pra caralho.
Um sorriso amargo se formou nos lábios de Alexander.
— Ela está sofrendo também — sussurrou. — Agora, nós dois
estamos infelizes.
— Quem? — sua mãe perguntou. — Quem é essa ela? — A
curiosidade encheu sua voz novamente antes que ela suspirasse. —
Você nunca fala comigo sobre as mulheres com quem sai.
— Mulher... — corrigiu. — É apenas uma... Pelo menos foi.
— Bem, o que aconteceu? — perguntou sua mãe.
— Eu fodi tudo — respondeu, tomando um gole da garrafa e
enxugando a boca molhada com as costas da mão. Seus olhos
vidrados se acalmaram e suas costas descansaram contra o
assento.
Sua mãe ficou em silêncio agora.
— Como você faz alguém te perdoar? — ele perguntou.
— Não consigo ver alguém ficar bravo com você por tanto tempo
— sua mãe brincou, e ele podia dizer pela voz dela que ela estava
sorrindo. Depois de um breve momento, ela acrescentou: — Você
pode começar se desculpando.
Ele exalou e tomou outro gole da garrafa.
— Eu tentei isso, mas não funcionou.
Sua mãe ficou quieta novamente. Talvez ele a tenha chocado. Ele
olhou em sua direção, e ele estava certo. Sua boca estava baixa
enquanto ela olhava para ele incrédula.
— Você se desculpou com alguém… E uma mulher, entre tanta
gente?
Sua mão estava em seu peito como se estivesse a um segundo
de ter um ataque cardíaco.
Ele não pôde deixar de piscar os olhos.
— Mas você nunca se desculpou com ninguém — sua mãe
protestou. Então, ela murmurou baixinho: — Querido Deus, ela deve
ser muito especial.
Ela é.
— O nome dela é Ghislaine — revelou, saboreando aquele nome
na língua. Um leve sorriso se formou em seus lábios. — Ela... me
ensinou — ele confessou em uma voz baixa e rouca. — Ela me
ensinou a fazer isso. — Sua mãe ficou quieta enquanto ouvia.
Talvez ela ainda estivesse em choque. — Ela me ensinou a usar
minhas palavras.
— Você mudou, Alexander. — Ela soltou um leve suspiro. —
Quando você vai trazê-la? — Ele olhou para ela novamente. A
excitação estava explodindo fora dela. — Quero conhecer essa
garota mágica!
Alexander virou-se para encarar sua garrafa novamente.
— Ela não quer nada comigo — ele continuou, e tomou outro gole
de sua bebida. Seus sentidos ficavam embotados a cada gole.
Esperançosamente, isso o colocaria em coma. Então, ele saberia
exatamente o que Ghislaine sentiu naqueles três malditos anos. —
Ela tem uma filhinha — ele sorriu. — Noura.
— Oh. Você está tendo um caso com uma mulher casada?
Ele balançou sua cabeça.
— Uma viúva. Ela é viúva.
Sua mãe ficou em silêncio antes de falar novamente.
— Sabe, Zander, existem nobres princesas da máfia que são
solteiras, cujas alianças podem fortalecer melhor a Bratva. — Ele
ouviu enquanto tomava outro gole. — Seu pai estava falando sobre
uma aliança com a máfia irlandesa para fortalecer nossa unidade. —
Ele ainda não respondeu enquanto olhava fixamente para a parede.
— E ela seria uma... virgem, e não uma viúva.
Desta vez, seu lábio se curvou. Seus olhos brilharam para sua
mãe, e ela se encolheu, percebendo o fogo em seus olhos. Ela
estremeceu.
— Eu... Eu só estava dizendo... — sua voz sumiu, desviando o
olhar agora. — Uma mulher viúva vem com muita... dor. Você está
pronto para isso? Você não quer alguém com uma ficha limpa?
Ele sorriu. Tinha visto aquela dor de perto.
— Não preciso de uma princesa da máfia quando estou
apaixonado por uma rainha — murmurou. Uma princesa mimada
não saberia o que fazer com um pau, de qualquer maneira, e ele
ficaria sem paciência tentando ensiná-la. Mas ele não iria admitir
isso em voz alta para sua mãe. — Eu a escolheria entre mil virgens
sempre. Não preciso de um corpo puro, porque ela tem a alma mais
pura que eu já vi.
Ela me tocou. Agora, não posso ser de outra pessoa.
A presença de sua mãe ainda permanecia no quarto.
— Ela deve ter te impressionado muito — sua mãe falou
novamente, a afeição clara em sua voz. — Espero que ela caia em
si. Eu só quero que você seja feliz.
Ele apenas assentiu antes que ela se aproximasse e descansasse
a mão em seu ombro. Depois de alguns momentos, ela se virou e
saiu do quarto, fechando. Ele voltou a beber já que não tinha nada
melhor para fazer do que matar o tempo.
Ainda bebendo, alguém bateu à porta novamente.
Irritado que sua mãe havia retornado, ele olhou bruscamente para
a porta quando ela se abriu.
Não era sua mãe.
Eram três de seus Vors, e um deles era Adrik.
Adrik entrou na sala com hesitação.
Alexander ergueu a sobrancelha, esperando que ele falasse.
— Pakhan? — Adrik perguntou, baixando a cabeça — Quando
enviaremos o próximo carregamento das meninas? As ordens estão
pendentes.
Alexander ficou parado, sem responder.
— Pakhan? — veio a voz de Adrik depois de alguns momentos.
Medo e hesitação amarraram sua voz.
— Cancele — Alexander murmurou.
Um silêncio mortal o saudou.
— Devolva as meninas — acrescentou.
Quando Adrik não respondeu, Alexander virou a cabeça. Adrik
ficou ali com a boca aberta.
— C-Chefe... — Adrik gaguejou. — O pedido está pago. Dez
meninas. Dez milhões pela heroína que as mulas do sexo vão
exportar.
— Não dou a mínima. Te dei uma ordem.
Adrik deixou o rosto cair no chão.
— Compense e devolva todas as garotas — disse ele, escolhendo
suas palavras com cuidado. — Diga a todos os nossos clientes que
estamos oficialmente fora desse negócio. — Seu lábio se contraiu e
seus olhos fecharam.
— Sim, claro, Pakhan. Desculpa. — Em vez de sair, o soldado
ainda permaneceu no quarto. — Se eu puder... Posso dizer uma
coisa? — perguntou Adrik.
Alexander suspirou e beliscou a ponte de seu nariz inquieto.
— O que é? — ele assobiou.
— Foi uma ordem de War. Ele não vai ficar feliz com isso.
Alexander acenou com a mão no ar com desdém.
— Não me importo. Agora me deixe em paz.
Adrik assentiu brevemente antes de se virar e fechar a porta.

Uma semana depois

Alexander finalmente saiu de seu quarto.


Mas não era para ir a nenhuma reunião ou conduzir qualquer
negócio.
Ele parou no cemitério e enfiou as mãos nos bolsos da calça.
Inclinando a cabeça, observou o nome na lápide:
Driss Khalil

— Provavelmente não deveria ter vindo aqui — Alexander


começou, com sua voz clara e suave. Ele não havia tocado na
tequila hoje, pois queria ficar sóbrio sobre o que tinha a dizer, mas
suas pálpebras ainda pesavam como cimento. — Não visito os
túmulos das pessoas que matei.
Nenhuma resposta o recebeu como ele esperava.
Levantando as pálpebras pesadas, olhou para a lápide.
— Estou em um túmulo, conversando com uma pessoa morta.
Ele olhou por cima do ombro para sua limusine estacionada do
lado de fora do cemitério. Três de seus bykis estavam lá, esperando
por ele. Voltando sua atenção para o túmulo, ele se concentrou
novamente:
— Você acha que ela deseja que eu esteja morto também? Isso
seria justiça aos seus olhos, Driss? — perguntou.
A brisa da primavera soprou ao redor dele, carregando os
sussurros de sua voz junto com ela. Ele olhou para o cemitério
maciço, olhando ao redor.
Já era noite quando parou. Menos cheio nesta hora do dia.
— Responda-me, Driss — rosnou.
Ele franziu a testa, percebendo a estranheza de sua ordem.
— Dormi com sua esposa — ele continuou. — Mas nunca tentei
seduzi-la. Eu a observei... porque não conseguia ficar longe dela.
Quando olho para ela, vejo meu mundo inteiro. Quando vejo sua
filha Noura... — seu lábio se contraiu — Vejo uma garotinha que
poderia ser minha também. Elas precisam de sua família inteira
novamente. Deixe-me estar lá para elas.
Mais uma vez, o silêncio o cumprimentou.
De qualquer maneira, ele não entendia por que estava aqui.
— Por que você não faz aquela coisa de sussurrar que você faz?
— ele exigiu grosseiramente. — Ela costumava dizer que às vezes
ouve sua voz. Diga a ela para me escolher. — Olhando para a
sepultura de cimento cinza, ele engoliu em seco. — Sim. Te matei.
Sim, sabia que sua esposa também era testemunha. Mas não sabia
que ela estava grávida — sua voz falhou. — Nunca teria… — sua
voz sumiu.
Ele pensou por um momento antes de falar novamente.
— Bem, eu provavelmente teria te matado, de qualquer maneira,
mas a teria deixado ir se soubesse — ele confessou.
Seus olhos se estreitaram no túmulo.
— Você está morto — afirmou sem rodeios. — Enterrado a sete
palmos, onde eu o coloquei, mas ainda estou competindo com você.
— Seu lábio se curvou em um sorriso de escárnio ameaçador. —
Não sei que diabos estou fazendo aqui, de toda forma. Isso é
loucura.
Loucura absoluta.
— Eu não vim aqui para me desculpar com você. Vim aqui... —
sua linha de pensamento sumiu. — Vim aqui para admitir as coisas
que tirei de você também — ele admitiu finalmente.
Ele se perguntou se Driss sairia do túmulo e o sufocaria até a
morte? Mas esse pensamento era muito ridículo, então deu de
ombros.
— Uma família — ele sussurrou. — Gostaria de poder dizer que
quero devolvê-las a você, mas sou um idiota egoísta e não posso
devolvê-las a você. Não quero.
Ele enfiou as mãos nos bolsos da calça.
— Não sei onde você está agora, talvez no céu. As pessoas
dizem que você foi um bom homem, talvez até melhor do que eu...
Mas saiba que, mesmo quando esta vida terminar, ainda não vou
parar de lutar por Ghislaine, mesmo que tenha que arrancá-la no
céu de você e arrastá-la para baixo, para o inferno comigo.
Simplesmente ótimo.
Ele desafiou um morto e ainda nem estava bêbado.
Talvez ele devesse sair. Isso parecia sábio.
— Você a teve, mas agora a alma dela ressoa por mim.
Ainda olhando para o túmulo, ele se virou lentamente, dando as
costas para seu inimigo morto. Sem olhar para trás, saiu do
cemitério.
GHISLAINE

35

EU ESTAVA NO jardim, regando os girassóis em flor.


As pétalas amarelas eram como a juba de um leão e eram de tirar
o fôlego. Esperava que sua beleza não desaparecesse, mas sabia
que, quando o outono chegasse, elas morreriam. Quando terminei
de regar, meus olhos caíram sobre um girassol que havia se
quebrado do caule e caído morto no chão.
Eu peguei.
O que aconteceu com este gira...
Meu pensamento sumiu quando uma porta batendo me alertou.
Intrigada, olhei para trás.
A porta do meu quintal ainda estava fechada. Foram minhas tias?
Elas voltaram para casa? Franzindo a testa, me levantei do chão e
fui em direção à porta. Quando cheguei lá, meus pássaros cantaram
tão alto, que acho que estourou meus tímpanos. Olhei para eles,
mas eles não se calaram.
O que estava errado com eles?
Entrei na minha casa e tranquei a porta.
Noura ainda estava dormindo em seu quarto, então me movi
silenciosamente para dentro da casa rangente. Vendo que os gritos
do pássaro foram suficientes para perfurar meus tímpanos, me
perguntei se ela havia acordado e estava vagando. Com meu rosto
em uma carranca, subi as escadas para o quarto dela, do outro lado
do corredor do meu. Olhei para a porta marrom aberta.
— Noura? — chamei.
Nenhum som me cumprimentou.
Ela estava no banheiro?
Queria checar o quarto dela primeiro. As tábuas do assoalho se
movendo enquanto eu caminhava. Deus... Eu gostaria que parasse
de ranger toda vez. Deveria ter saído desta casa quando tive a
chance. Minha carranca se aprofundou e entrei no quarto de Noura.
Seu edredom estava no chão.
Como diabos ela o jogou para baixo?
Era muito pesado para ela. Atordoada, olhei para os lençóis. Não
havia Noura ali. Virando-me, fui em direção ao banheiro. Estava
vazio também.
— Noura? — chamei mais uma vez.
Apenas meu pulso acelerado e batimentos cardíacos erráticos me
cumprimentaram.
— Meu bem, onde você está?
Verifiquei meu quarto no caso de ela ter ido me procurar lá. Minha
filha também não estava lá. Verifiquei meu banheiro. Estava vazio.
Dei uma olhada dentro dos quartos restantes das tias também. Mais
uma vez, vazio.
Onde ela havia desaparecido?
Esperava que ela não estivesse brincando de esconde-esconde.
Segurando um suspiro, voltei para o quarto dela, procurando
algum tipo de pista de para onde ela poderia ter fugido. Ela não era
do tipo que brincava quando acordava. Olhei para os lençóis vazios
e me aproximei deles. Meu olhar pousou em um papel branco na
cabeceira da mesa. Intrigada, fiquei parada.
Não estava ali antes. Estava prestes a pegar o papel, mas meu
telefone vibrou. Alcançando atrás do bolso do meu jeans, puxei para
fora.
CHAMADA DESCONHECIDA.
Arqueando uma sobrancelha, me perguntei se deveria deixar cair
na caixa postal. Mas pensando melhor, suspirei e respondi.
— Alô? — Ainda procurando pelo quarto.
— Ghislaine.
Aquela voz... era assombrosa.
A voz do homem era rica e ressoou como um trovão.
Não reconheci de jeito nenhum.
Esfreguei a parte de trás da minha cabeça.
Quem diabos estava no telefone, e onde minha filha sorrateira
estava escondida? Eu me movi em direção ao armário de seu
quarto. Abri e nada além de roupas me cumprimentou.
— Estou com Noura.
Congelei. Minhas pernas quase cederam sob mim. Agarrei a
parede para continuar de pé. Um arrepio percorreu minha espinha
com a ameaça na voz taciturna. Ele parecia mais velho do que eu.
Engoli em seco profundamente, esperando que isso fosse uma
maldita piada. Ele estava me enganando?
— Por que você não é uma querida e entrega aquele bilhete que
meus homens deixaram para o Pakhan? — o homem falou
novamente.
Meus olhos voaram para o papel branco ao lado da cama.
Noura…
Noura se foi.
— Ele saberá onde me encontrar. Diga a ele para vir sozinho.
Caso contrário, Noura... — Ele riu sombriamente, sua risada
enviando parafusos para meus ossos. Agarrei o telefone com mais
força, meus olhos ainda grudados no bilhete.
— Você é uma agente inteligente. Você não vai fazer nada
estúpido, certo, reinita? — ele repreendeu baixinho.
A chamada terminou.
O tremor nas minhas pernas piorou, e minhas pernas gelatinosas
cederam debaixo de mim. Desabei no chão, ofegante.
Inspire. Expire.
Minha mente girou em torno de mim, e um ruído histérico saiu da
minha boca, recusando-me a acreditar nele. Era como se a terra
tivesse se despedaçado sob meus pés. Agarrei a estrutura da cama,
minhas pernas tremendo enquanto eu tentava ficar de pé. Meus
olhos chocados se moveram em direção ao bilhete, lendo-o, mas
sem entender o significado. Segurei-o entre meus dedos.
Minha bunda afundou na cama da minha filha.
Noura está desaparecida.
Um grito saiu da minha boca.
Noura foi sequestrada.
Soquei minha mão contra a cabeceira de madeira.
Não, não, não.
Queria estar em negação.
Caralho. Meus olhos lacrimejaram quando trouxe minha mão
machucada de volta para mim. A pele rasgada em meus dedos
estava escarlate. Fungando, eu tentei segurar. Quando aqueles
homens invadiram e se esgueiraram para dentro da casa? Nem ouvi
Noura gritar. Se ao menos eu estivesse dentro...
O homem me disse para ligar para Alexander. Mas por que ele
levou minha filha? O que Alexander tinha a ver com isso?
Com perguntas não respondidas, peguei meu telefone para ligar
para ele, mas então parei. Não tinha o número dele, e ele nunca me
deu. Estava listado no arquivo do caso no escritório do FBI.
Outro grito saiu da minha boca.
Miran, minha voz interior veio: Pergunte a Miran.
Eu me levantei e meus dedos trêmulos procuraram no meu
telefone pelo número de Miran. Meu coração explodiu de alegria
quando o encontrei, e eu estava prestes a discar quando uma voz
ecoando interrompeu meus pensamentos.
Você não vai fazer nada estúpido, certo?
Meus dedos pararam.
Autoridades. Ele indiretamente me ordenou que não ligasse para
as autoridades. Deixei escapar um grito sufocado e o pavor tomou
conta da minha alma.
Roendo as unhas, em vez disso, enviei uma mensagem para
Miran.
Eu:
Pode me dar o número de Alexander?
A mensagem de Miran veio depois de alguns segundos.
Cada segundo passou em agonia.
Miran:
Por quê? Você vai se encontrar com aquele
doente?
Eu quase quis sorrir. Eu queria que fosse isso. Qualquer coisa
menos minha pequena Noura sendo sequestrada.
Eu:
ME PASSA.
Ele mandou uma mensagem para o número.
Suspirei de alívio.
Um momento depois, recebi outra resposta.
Miran:
Está tudo bem?
Eu:
Sim.
Menti.
Discando o número que ele deu, esperei ansiosamente que
Alexander atendesse. Tocou algumas vezes antes de cair na caixa
postal. Liguei novamente, e não houve resposta. Onde diabos ele
estava? Queria jogar meu telefone contra a parede. Em vez disso,
enviei-lhe algumas mensagens de texto para retornar minhas
ligações. Não recebi nenhuma resposta.
Ficando de pé, corri para o meu quarto e troquei de roupa. Vesti
uma fina camisa preta de manga comprida e um novo par de jeans
pretos escuros. Não tinha mais minha Glock e revólver. O FBI as
havia levado quando eu me demiti, mas eles me deixaram manter
uma arma normal para minha segurança. Vasculhando meu armário,
encontrei uma pequena bolsa com presilha que poderia enrolar na
cintura. Coloquei minhas chaves e deixei cair a nota que foi deixada
para trás. Também coloquei muita munição na bolsa. Não sabia no
que estava me metendo, então era melhor estar pronta.
Mandei uma mensagem para tia Sabrina rapidamente:
Levei Noura ao parque. Volto esta noite.
Estava mentindo de novo, mas não havia necessidade de
preocupá-las. Correndo escada abaixo, meus dedos tremeram
quando tranquei a porta da frente. Tateando, deixei cair minhas
chaves no chão antes de pegá-las. Não tive tempo nem paciência
para esperar um táxi, então, corri para o meu jipe preto.
Liguei o motor, e meus membros formigaram quando coloquei o
carro em movimento. Cobertura. Precisava chegar à cobertura de
Alexander na cidade. Tentei ligar para o celular dele, mas cheguei à
caixa postal novamente. Tentei enviar uma mensagem novamente,
mas ele também não respondia às minhas mensagens.
Ele estava me ignorando?
Minha garganta secou, e eu mantive meu foco na direção. Ainda
tinha o cartão-chave para sua cobertura. Esperava que ele estivesse
lá. O trânsito estava movimentado como sempre, e gostaria de ter
minha sirene para poder passar por todos, mas com o coração
pesado, percebi que não podia.
Buzinei apressadamente para os carros se moverem mais rápido,
e ficava irritada a cada respiração. Olhei para a hora, e ela se movia
dolorosamente devagar. Lágrimas encheram meus olhos, e apertei
meus lábios, esperando que não caíssem. Não podia chorar agora.
Precisava ser forte pela minha filha.
Minutos se passaram até que mais de meia hora depois, cheguei
à cobertura de Alexander. Não consegui encontrar nenhum
estacionamento, então estacionei em fila dupla. Folheei meu painel,
procurando meus antigos cartões de visita do FBI. Encontrei uma e
coloquei perto do para-brisa. Ninguém precisava saber que eu não
era mais um agente. Não podia deixar que rebocassem meu carro.
Saindo correndo do meu carro, passei por pessoas que gritaram
comigo em resposta. Ignorando-os, meus passos continuaram se
movendo como se eu estivesse correndo uma maratona. Minhas
respirações saíam fortes e cheias enquanto eu praticamente me
lançava em direção ao elevador. Empurrando mais pessoas para
fora do caminho, meus dedos pressionaram o botão SUBIR, de
novo e de novo, meus pés praticamente pulando para cima e para
baixo.
Quando apitou, subi e apertei o andar Alexander. Com as mãos
trêmulas, peguei o cartão-chave e o examinei antes que o elevador
subisse. A inquietação encheu meu coração, e empurrei a bile que
estava subindo na minha garganta de volta.
Olhando para os números dos andares mudando, meu coração se
encheu de expectativa de que iríamos pegar minha pequena Noura.
O elevador finalmente apitou e eu invadi a cobertura gritando:
— Alexander!
Apenas o silêncio pairava no ar.
Procurei um quarto após o outro, mas ele não estava por perto.
Peguei meu celular e disquei ansiosamente o número dele. Mais
uma vez, foi para o correio de voz. Cerrando os dentes, puxei meu
cabelo, puxando-o com força. Soltei um grito exausto antes de
fungar.
Ele estava conduzindo seus negócios agora?
Outra ideia surgiu em minha mente.
Westbury. Old Westbury.
Sua mansão. Ele pode estar lá.
Não tinha outra escolha a não ser ir procurá-lo lá também.
Dando as costas, saí da cobertura e fui em direção ao seu castelo
dourado.

Ao me aproximar da casa de Alexander, observei o enorme


castelo branco com portões vermelhos dourados. Espiei através das
barras de metal dourado e, dentro do pátio, havia estátuas de
cavalos e enormes passarelas. Parei na entrada fechada, buzinando
o carro de novo e de novo. Sete de seus homens guardavam o
portão. Todos com roupas pretas. Olhei ao redor e mais homens
cercaram o perímetro do castelo, aumentando em número. Dois
gigantes se aproximaram de mim. Abaixei minha janela.
— Eu preciso ver Alexander! — Gritei.
Os homens trocaram olhares entre si.
— Diga seu nome e empresa.
Revirei os olhos.
— Sou Ghislaine. Isso é tudo que você precisa dizer a ele! — Eles
apenas olharam impassíveis. — Ele vai chutar suas bundas por me
fazer esperar — ameacei.
Mas não estava muito certa sobre isso.
Quando eles não responderam, perguntei esperançosamente:
— Ele está em casa?
— O chefe não mencionou nada sobre visitantes.
— Você precisa me deixar entrar, agora!
Gritei a plenos pulmões.
Um homem deu um passo para trás e discou um número em seu
celular. Ele estava ligando para Alexander? Ele falou audivelmente,
e era difícil ouvir o que ele estava dizendo. O homem desligou.
— As pessoas na casa disseram que o Chefe está descansando.
Ele está adormecido.
Apenas pisquei. No meio do dia?
— Acorde-o — insisti.
Eles me encararam como se eu tivesse enlouquecido. Talvez eu
tivesse.
— Deixe-me falar com ele! — protestei. — Por favor! — minha voz
falhou.
Uma parte de mim desejava ter trazido Miran comigo. Esses
homens provavelmente me deixariam entrar se eu tivesse.
Os homens trocaram outro olhar entre si.
— É melhor você sair e voltar outra hora.
Cerrei os dentes e rosnei:
— Se você não me deixar entrar, vou derrubar esses portões. —
Os homens ficaram no lugar. — Alguém levou minha filha! —
Protestei: — Tenho uma mensagem para Alexander. Eles me
disseram para dar a ele.
Minhas mãos deixaram meu volante e foram em direção a minha
bolsa.
Instantaneamente, os homens sacaram suas armas de trás da
cintura e as ergueram.
— Mãos onde eu possa vê-las.
— É apenas uma nota, seus idiotas! — gritei. — Você atira em
mim, e Alexander vai te queimar vivo. — Também não tinha certeza
disso.
Um homem cerrou os dentes e perguntou:
— Como você está usando o primeiro nome do Chefe? Apenas
sua família pode chamá-lo assim.
Não tinha interesse em explicar minha história pessoal para um
estranho, mas minha pele formigava, lembrando que ele me disse
para chamá-lo de Alexander em vez de Pakhan. Eu era sua família
também?
Vasculhei minha bolsa, tirando a nota antes de acenar em seus
rostos estúpidos e estoicos. Não me importava que eles estivessem
prontos para atirar em mim.
— Olha! — Apontei para a nota.
Um homem pegou o bilhete e toda a cor desapareceu de seu
rosto como se tivesse visto um maldito fantasma. O que essa nota
significava mesmo?
— Vou deixar você entrar — disse ele, retornando minha nota.
Dando um sorriso agradecido, peguei-a de volta. Ele tirou um
controle do bolso e apertou um botão. Os portões dourados se
abriram e eu entrei na casa ancestral de Alexander pela primeira
vez. Meus olhos caíram sobre a enorme estufa, jardim e os cães
correndo ao redor. Havia também um grande carvalho entre toda a
vegetação. Estacionei meu carro e saí, meus pés correndo pela
casa de mármore. O homem destrancou a grande porta branca e eu
entrei. Meus membros congelaram no local.
A mansão era luxuosa e enorme, e a quantidade de riqueza à
minha frente era surpreendente. Eu provavelmente me perderia.
Móveis dourados e brancos cobriam a área. Grandes candelabros
dourados pendiam acima. Meu olhar caiu sobre as grandes
fotografias na parede. Alguns dos membros da família de Alexander,
e alguns dele. Minha respiração engatou, e eu me forcei a me virar.
Uma voz feminina suave entrou na sala.
— O que está acontecendo aqui?
— Ela diz que está aqui para ver Pakhan, senhora.
Meus olhos caíram sobre uma mulher que era como uma cara de
Alexander. Era sua mãe, Natasha Nikolaeva.
Já tinha visto a fotografia dela no FBI.
Os mesmos olhos escuros me saudaram. Ela era bonita.
Assombrosa mesmo. Seu longo cabelo preto cascateava atrás dela
enquanto ela caminhava em minha direção. Como Alexander, sua
bela beleza brilhava em contraste com seus olhos e cabelos
escuros. Ela era majestosa e elegante, seu corpo envolto em um
longo vestido azul com um decote cavado. Seus olhos curiosos
pousaram em mim antes de seus lábios se curvarem em um sorriso
gentil.
— Ghislaine — ela sussurrou.
Ela sabia meu nome?
— Preciso ver Alexander.
Seus lábios se arregalaram em um sorriso antes de seus olhos
escuros brilharem. Ela parecia um pouco feliz demais em me ver, e
isso estava me deixando desconfortável.
— Vou levá-la até ele — ela assegurou ao guarda.
O guarda assentiu antes de voltar para dentro.
Natasha Nikolaeva me olhava agora.
— Por que você não me segue? — ela perguntou, gesticulando
para eu ir com ela.
Caminhei até ela enquanto olhava furtivamente para ela de vez
em quando. Estava conhecendo a mãe de Alexander pela primeira
vez. Gostaria que fosse em circunstâncias melhores, mas então me
lembrei, não importava, de qualquer maneira.
— Ele não está em seu melhor estado — ela admitiu calmamente.
Meus olhos curiosamente piscaram em sua direção.
Ela deu um sorriso triste, mas falou muito pouco. Eu a segui
enquanto subíamos a grande escadaria escarlate e dourada sem
fim. Olhando ao meu redor, notei que não havia guarda-costas
dentro do castelo. Ela parou diante de uma porta cor de mogno e
disse:
— Ele está lá.
Sem ouvir minha resposta, ela se virou para sair.
Olhei para sua figura alta e desbotada antes de abrir a maçaneta
dourada e espiar dentro da escuridão completa. O ar-condicionado
frio me cumprimentou quando entrei e fechei a porta. Meus passos
hesitantes caíram no tapete macio abaixo. Andando alguns metros,
uma figura sem camisa deitou de bruços na cama.
Dormindo.
Lambi meus lábios e me movi em direção a ele.
— Alexander.
Minha respiração ficou presa no meu peito, e eu limpei minha
garganta.
Ele não se mexeu e respirou superficialmente sob as cobertas,
seu peito subindo e descendo. Meus dedos trêmulos alcançaram
seu ombro antes de fazer uma pausa.
— Alexander — tentei novamente.
Estava ficando sem tempo, e eu precisava acordá-lo.
Ele grunhiu levemente e se mexeu.
— Deixe-me em paz, mamochka. — Confusa, fiquei ali atordoada.
Sua voz fria e arrastada veio novamente: — Passe-me minha
tequila.
Perplexa, pisquei. Ele estava bebendo?
Funguei e peguei o gosto amargo e doce que pairava no ar.
Suspirando, apertei a ponte do meu nariz.
— Alexander — sussurrei, alcançando seu ombro e balançando-o
suavemente para frente e para trás.
— Você não soa como mamochka.
Seu corpo mudou, e sua cabeça levantou e olhou para trás de seu
ombro. Agora que meus olhos se ajustaram, eu podia focar nele.
Seus olhos estreitos brilharam no escuro antes de seu lábio se
curvar em um sorriso familiar que eu adorava.
— Acho que ainda estou sonhando — ele sussurrou antes de
deixar cair a cabeça de volta na cama. Desta vez, ele não desviou o
olhar de mim. — Um sonho lindo.
Minha pele corou.
A julgar por sua voz, ele estava fora de si.
Baixa e rouca.
Silenciosa e arrastada.
— Estou surpreso que você esteja vestindo roupas no meu sonho.
Ele deu um olhar conhecedor, e um arrepio percorreu meu corpo.
— Preciso falar com você — comecei.
Antes que pudesse continuar, sua mão disparou e me puxou para
ele. Ele se mexeu, abrindo espaço para mim. Eu gritei e aterrissei
nos lençóis sedosos da cama com as costas contra a cama. Ele me
cobriu com seu corpo aquecido, aconchegando-se contra mim. Um
suspiro carregado saiu de sua boca e atingiu meu rosto.
Sim, ele estava muito bêbado.
— Alexander. — Tentei sair de debaixo dele.
Seu rosto se ergueu e pairou acima de mim, seu abismo escuro
encontrando o meu. Seu cabelo estava despenteado e bagunçado,
e caiu em seus olhos. Grunhindo para mim, seus olhos caíram na
minha bolsa antes que ele a soltasse da minha cintura e a jogasse
no chão.
— Odeio barreiras entre nós — sua voz era como seda contra a
minha pele, envolvendo-se em torno de mim mais uma vez. Meu
coração quase desistiu. A bolsa não era a única barreira entre nós.
Em conflito, meus braços se estenderam e envolveram seu
pescoço.
— Alexander — tentei novamente —, preciso falar com você.
— Shhh... — ele sussurrou, levantando a cabeça e olhando para
mim. — Este é o meu sonho, e você fica quieta nele. — Abri minha
boca para protestar, mas seus olhos caíram para minha camisa
preta. — E por que você ainda está vestindo roupas na minha
cama?
Sugando as palavras de mim, ele alcançou a bainha da minha
camisa e puxou-a acima da minha cabeça. Respirando com
dificuldade, olhei em seus olhos antes de seu olhar baixar para o
meu sutiã preto.
Agora, isso estava ficando fora de controle. Ele olhou para cima
novamente e roçou seus lábios contra os meus. Senti o gosto
amargo da tequila. Suas mãos roçaram a borda do sutiã antes de
colocá-los, segurando meus seios.
Um pequeno gemido deixou meus lábios, e sua boca se inclinou
sobre a minha, engolindo-a. Até gostei do gosto de tequila dele. Ele
capturou meu lábio superior entre os dele, me beijando. Minha boca
se moveu contra ele também. Ele puxou meus mamilos
intumescidos através do tecido antes de estender a mão para a
parte de trás do meu sutiã, soltando-o.
Meus seios ficaram livres, e ele tirou meu sutiã de lado. Com
meus lábios separados, olhei para cima novamente, me afastando.
Meu corpo corou quando seu olhar faminto caiu sobre mim
novamente. Suas mãos se moveram sobre mim, me amassando.
— Penso em v-você todos os dias.
Meu coração disparou por ele, e estendi a mão e escovei seus
cachos atrás da cabeça, para que eu pudesse ver toda a sua
beleza. Com um suspiro, sentei-me ereta, empurrando-o para trás
em sua bunda. Eu o encarei nos olhos.
— Alexander — disse com a voz rouca — Noura. Minha Noura se
foi.
Intrigado, ele inclinou a cabeça.
— Se foi? — ele repetiu.
Ele estendeu as mãos para envolver minha cintura nua e me
puxar para mais perto. Aterrissei em seu colo, e fiquei feliz por ele
ainda usar sua cueca boxer, mas sua ereção pressionada contra
mim. Pelo menos ele não estava nu. A minha pele lisa e nua roçou
seu peito musculoso. Meus mamilos formigavam e doíam quando
esfregavam contra seu cabelo.
Seus olhos se estreitaram.
— O-O que você quer dizer?
— Ajude-me a encontrá-la — eu disse com os olhos arregalados.
— Ela está em perigo!
Ele apenas piscou.
Ele não estava reagindo como eu queria, não refletindo sobre a
ameaça. Quanto ele já tinha bebido? Estendi a mão e segurei seu
rosto aquecido entre minhas mãos.
— Saia desse estado. — Acariciei sua barba com a ponta dos
dedos.
Muito fora de si, seus olhos caídos estavam fechando novamente.
— Chuveiro — exigi —, vamos te dar um banho, então você pode
pensar direito.
Eu me movi de seu colo, ficando de pé, mas sua mão disparou
para me agarrar novamente, me puxando de volta para ele. Ele se
inclinou e descansou o rosto contra minha barriga nua. Sorrindo
sombriamente, toquei seu cabelo e ordenei:
— Tome banho agora.
Ele levantou a cabeça e apenas piscou.
— Você me deixou — ele balbuciou.
Meu pulso disparou e eu o ajudei a se levantar. Ele cambaleou e
estava bêbado como o inferno, então, como ele iria me ajudar?
A decepção caiu sobre meus ossos. Cada segundo passado era
outro segundo longe de Noura. Exalando, olhei ao redor em seu
quarto para um banheiro adjacente. Meus olhos caíram em uma
porta branca e se dirigiram para ela.
Ele apoiou seu peso em mim, e eu quase perdi o equilíbrio.
Arrastando-o para o banheiro, abri a porta e meus dedos tocaram a
parede para o interruptor de luz. Satisfeita, meus olhos caíram sobre
ele, e eu liguei.
A luz artificial brilhante encheu a sala, e Alexander grunhiu em
meus braços, protegendo seus olhos avermelhados dela. Fechei a
porta do banheiro atrás de mim e o ajudei a ficar contra a porta. Eu
me virei e quase deixei meu queixo cair no chão antes de fechar
minha boca novamente. Ele era rico como o inferno. Eu tinha
esquecido que ele tinha bilhões. Um pequeno sorriso tímido brincou
em meus lábios. Mas eu tinha visto o homem por trás do dinheiro.
Ladrilhos de mármore dourado estavam sob meus pés, e o quarto
estava pintado de escarlate e preto. Mastiguei o interior do meu
lábio, sentindo-me simples. Suspirando, fui em direção ao box do
chuveiro, e liguei a água gelada. Isso funcionaria. A água quente
apenas o faria dormir. Eu me virei para ele, e seus olhos estavam
focados no teto. Quando eles me pegaram olhando, seu olhar
encontrou o meu.
Olhos vermelhos.
— Há quanto tempo você bebe?
Seus olhos se moveram do meu rosto para os meus seios,
demorando-se lá. Eu ainda estava sem camisa. Cobrindo-me de sua
visão com a minha mão, seus olhos escuros caíram no meu rosto
novamente.
— Desde... — ele balbuciou — Adeus para sempre...
Uma parte da minha alma secou.
Eu me movi em direção a ele, e seus olhos ficaram em mim o
tempo todo. Ele estendeu um dedo e enrolou uma mecha marrom
clara do meu cabelo em seu dedo, enrolando e desenrolando como
se isso o fascinasse. Eu puxei meu cabelo para longe, e meus
dedos trêmulos foram em direção a sua cueca boxer preta. Elas
precisavam sair para o banho dele.
Ele me deixou despi-lo, e eu evitei olhar para ele abaixo da
cintura. Guiando-o para o box do chuveiro, eu o empurrei
suavemente para dentro. A água gelada atingiu sua pele, e ele se
encolheu.
Então, ele parou de se mover. Ficou lá, debaixo do chuveiro,
olhando para o chão. Era como se ele nem estivesse presente.
— Zander — engasguei.
Seus olhos vazios se ergueram para os meus.
Olhos tristes. Por que eles estavam Olhos Tristes hoje?
Forcei o nó na minha garganta de volta para baixo.
Eu causei isso.
Não vi um Pakhan na minha frente.
Nem via Alexander agora.
Tudo o que via era um homem quebrado.
— Ainda estou sonhando? Nunca quero que esse sonho acabe.
Eu o magoei.
Sufocando uma respiração, meu peito arfava. Apertei meus lábios
trêmulos e o encarei. Forçando-me a desviar o olhar dele, eu falei.
— Xampoo e sabonete. Então podemos sair.
Movi-me em direção aos sabonetes e shampoos para entregá-los
a ele, mas seu braço molhado escapou e sua mão agarrou meus
quadris nus. Então, ele me puxou em direção a ele.
Meus lábios se separaram e eu protestei
— E-Espere.
Não poderia molhar meu jeans, mas ele não prestou atenção em
mim. Com um suspiro, eu rapidamente tirei meus sapatos e roupas
restantes.
Em um único puxão, eu estava compartilhando o espaço do
chuveiro com ele. Meu corpo colidiu contra o dele, e o chuveiro
gelado acima me encharcou. Droga.
Meus dentes bateram instantaneamente, rangendo juntos.
Agarrei-me à sua cintura para me equilibrar. Suas mãos se
estenderam e colocaram meus cachos molhados atrás das minhas
orelhas. Meu barulho parou. Meu olhar levantou e colidiu com o
dele. Lambendo seus lábios molhados, seu dedo arrastou o
contorno dos meus lábios.
— Você parece muito r-real — ele sussurrou com voz grossa.
Queria dizer a ele que era, mas ele estava muito ocupado
explorando meus lábios. Sua outra mão traçou a parte de trás da
minha coluna, descendo. Eu arqueei meu peito contra ele. Toda vez
que eu precisava, meus mamilos roçavam contra ele e eu gemia.
Controle-se, Ghislaine, me repreendi, pense direito.
Seus lábios frios se inclinaram para me beijar. Foi diferente do
primeiro beijo que ele me deu. Aquele era suave e casto. O segundo
beijo que ele me deu foi sobre necessidade quando ele provou
minha culpa, minha amargura, meu veneno.
Ele... estava me deixando provar tudo. Sua dor, sua culpa e seu
veneno. Eu o envenenei. O beijo queimou em uma loucura
gananciosa quando ele me puxou para mais perto, e gemi contra
ele. Uma loucura sem esperança, como se ele parasse de me beijar,
quebraria o sonho.
Era profundo, áspero e desgastante. Molhado e selvagem.
Acho que adorei o sabor da tequila agora. O calor rastejou para
baixo no meu estômago, e minha pele ardeu em chamas. Uma
chama pulsava entre minhas pernas. A realidade se desvaneceu até
que eu só o tinha.
Seu cheiro, seu calor, seu coração.
Eu me afastei e respirei superficialmente. Virando-me — mesmo
que seu aperto nunca tenha me deixado —, peguei o xampu com
dedos trêmulos e esguichei um pouco em seu cabelo. Tinha uma
tarefa para focar. Seu corpo alto pairava sobre mim. Larguei o
xampu e passei meus dedos por seu cabelo molhado suavemente.
Ele fechou os olhos debaixo de mim, e um suspiro forte deixou
seus lábios. O chuveiro derramou em seu cabelo, e eu o limpei.
Seus olhos se abriram e me observaram. Eles gritaram: preciso de
você para mim e muito. Isso me deixou com coceira e sem fôlego.
O sabonete veio em seguida. Corri-o pelo peito e pelos braços e
tentei colocá-lo nas pernas também, mas ele não me deixou me
mexer.
Suspirando, eu coloquei a mão atrás de suas costas e tracei o
sabonete. Esperançosamente, isso ajudaria. Uma vez que ele
estava limpo, eu me afastei para ajudá-lo, mas suas mãos nunca me
deixaram. Seu olhar assombroso me penetrava todas as vezes, e
minha pele queimava contra a dele. Lambendo os lábios, ele
inclinou a cabeça para mim. Ele não parecia ter terminado comigo
tão facilmente. Arrastando suas grandes mãos para cima, elas
capturaram meus seios.
— Zander — insisti, — Nós precisamos ir agora. Noura precisa de
ajuda!
Minhas palavras ainda não penetraram nele, e eu queria
estrangulá-lo. Quanto tempo levaria para a bebedeira passar e ele
pudesse se desintoxicar? Horas. Eu não podia permitir isso agora.
Estava prestes a brigar novamente, mas ele me levantou, pegou
meus seios, e sua boca deslizou sobre eles, lambendo a água.
Assustada demais para dizer qualquer coisa, ele os chupou um por
um, meus mamilos intumescidos desaparecendo em sua boca
quente. Ele era todo dentes e garras. Ele os manteve cativos, e
minhas mãos agarraram seus ombros. Separei meus lábios
enquanto sua boca percorria toda a minha pele. Um gemido deixou
meus lábios, e ele olhou para mim.
— P-Passarinho — sussurrou contra a minha pele.
— Zander — protestei, me afastando, mas seus dentes roçaram
meus mamilos em um aviso.
Entendi a mensagem claramente.
Afaste-se ou sangre.
Ele se inclinou para mais perto, sua excitação dura como uma
rocha pressionada contra meu estômago. Cedi por um momento, e
fechei meus olhos sob ele antes de abri-los novamente. Sua boca
deixou meu peito, e ele olhou para mim.
— Você está r-realmente aqui? — A dúvida encheu sua voz antes
que ele balançasse a cabeça. — Isso é impossível. Você me odeia.
— Não odeio você — sussurrei.
E eu não odiava. Eu odiava o que ele tinha feito no passado, mas
não ele.
Nunca Alexander.
Seus olhos esperançosos espiaram nos meus, e aquela pequena
faísca que ele havia perdido voltou neles. O preto neles brilhando e
escurecendo. Sua mão se estendeu e separou minhas pernas até
que ele estava se esfregando contra meu clitóris. Respirei fundo.
— Alexander — repreendi —, precisamos ir.
Eu me virei, mas seu braço disparou e me aprisionou de volta no
lugar. Pisquei meus olhos em desaprovação.
— Neste sonho, nunca vou deixar você ir. Faço o que diabos eu
quiser com você — ele disse, sua voz arrastada misturada com
possessividade.
Seu olhar intenso encontrou o meu. Agarrando as bochechas da
minha bunda, ele me puxou para mais perto, alinhando-se com o
meu núcleo aquecido.
Sua protuberância dura esfregou contra mim. Meu corpo tremeu,
e um pico de calor percorreu minhas veias. Meu batimento cardíaco
dançou agora que eles estavam vivos. Nossas respirações se
misturaram, e seus lábios roçaram os meus. Desta vez tão
suavemente.
Queria dizer a ele novamente que tínhamos que sair, mas não
consegui mais impedi-lo. Ele estava tão perdido, e eu não queria
destruir esse momento para ele. Para nós.
Uma respiração afiada deixou meus lábios quando ele bateu em
mim, embainhando-se dentro de mim.
Meus músculos tensos se apertaram e o agarraram. Sua mão
deixou minha bunda, enrolando-se em volta da minha garganta. Ele
enfiou em mim novamente, cada vez perversamente. Um gemido
abafado saiu da minha boca. Eu estava tão cheia dele, e ele estava
tão dentro de mim, que eu podia senti-lo perto do meu estômago.
Completa novamente.
Porém, doía, e meus lábios doloridos ainda formigavam de seu
beijo brutal anterior. Eu os lambi, e seu olhar escureceu. Ele
continuou isso por alguns momentos em um ritmo constante. Meus
braços envolveram sua cintura, e seus quadris encontraram os
meus.
— Quando isso acabar, você vai embora de novo? — ele
perguntou em uma voz tão baixa. — Toda vez que você sai... minha
alma se sente incompleta. Ela se desconecta quando você se vai.
Meus olhos voaram para ele, e eu queria confortá-lo.
A pressão quente se acumulou dentro de mim, e eu desmoronei
diante dele, e ele me firmou segurando a mão na minha cintura.
Esperei ele terminar também.
Ele deu um sorriso malicioso.
— E-eu tenho uma ideia — sussurrou, ainda enterrado dentro de
mim. Intrigado, eu apenas encarei. — Se você tiver meu filho...
Então, você não pode me deixar.
Todo o ar em meus pulmões deixou meu corpo, e eu me arrastei
para trás, mas ele só me segurou no lugar pela minha garganta em
um estrangulamento permanente. Ele nunca me deixaria ir. Talvez
ele tenha pensado que eu iria correr. Suguei o ar, e esperava que
ele estivesse brincando. Ele balançou a cabeça, e eu tremi sob seu
olhar feroz. Percebi o quão perigosa e imprudente essa situação
era.
Agora, ele estava intimidando com sua presença pesada, e seu
brilho queimou em minha pele.
— O-o que você acha, Ghislaine? — ele provocou com um sorriso
cruel — Eu deveria?
Eu não sabia se isso era uma ameaça ou uma promessa.
Ele se sentia tão desamparado que pensou que era a única
solução?
— Zander. — Ele ainda bombeava em mim. — Isso vai te ajudar?
Seus olhos escuros encontraram os meus.
— Diga-me para entrar em você.
Meu pulso disparou, e eu mordi meu lábio.
Se dissesse a ele, e ele o fizesse, poderíamos finalmente ficar
juntos. Estaríamos unidos. Não poderia escapar dele então... E eu
não queria. Estava presa ao meu passado, mas queria estar presa a
ele também. Ele era meu futuro. Eu desejava ser dele até todo o
sempre.
— Faça isso — sussurrei. — Eu deixo.
O desespero saiu da minha voz.
Agora, eu era como ele.
— Sou uma causa perdida sem você também — admiti.
Ele me puxou para mais perto, até que não houvesse espaço
entre nós, o movimento cutucando-o mais fundo em mim. Eu gemi.
Éramos uma alma e um corpo. Ele inclinou minha cabeça, me
forçando a encontrar seus olhos. Arqueei minhas costas, moldando
em direção a ele.
— Eu n-nunca uso camisinha com você. — Ele ainda se movia
contra mim. — Você é a primeira mulher com quem transei sem
camisinha.
Encarei, encontrando seus olhos selvagens e tempestuosos.
— Você é o único homem com quem eu fiz sexo além do meu
marido.
Seus olhos se arregalaram, ainda empurrando em mim.
— Mas eu nunca poderia fazer isso com você. — Soltei um
pequeno gemido, e seus olhos se estreitaram. — Assim não. Você
terá meu bebê um dia, mas não hoje. — ele grunhiu e saiu de mim,
o fluido espesso salpicando minhas pernas.
Uma pequena parte de mim ficou desapontada.
— Acorde — insisti, cedendo contra seu corpo. — Isso não é um
sonho. Estou aqui. Estou bem aqui — suavizei minha voz e procurei
em seus olhos pelo homem que uma vez reconheci.
Confuso, seus olhos atordoados encontraram os meus.
Com respirações superficiais, sua testa caiu na minha.
— Você não é um sonho — ele repetiu. — Você está realmente
aqui.
Ele se afastou de mim, soltando seu aperto da minha garganta.
Virando-me para o chuveiro, suas marcas saindo de mim. Eu me
virei e segurei seu rosto em minhas mãos.
— Escute-me. Preciso que você me ajude a encontrar Noura.
Ele apenas piscou.
— Noura, Alexander — repeti. — Noura. Noura.
Ele parecia imperturbável.
— Bebê Sol — sussurrei.
Suas sobrancelhas franziram antes que a compreensão surgisse
em seu rosto. Franzindo a testa, ele perguntou:
— O que tem Noura?
— Ela se foi! Alguém a levou — disse com a voz rouca, e meu
coração sangrou novamente. — Eles roubaram meu bebê.
Alexander se afastou de mim e passou uma longa mão pelo rosto.
— E-eu não entendo.
Saí do chuveiro e entreguei a ele uma toalha branca grande e
fofa. Ele a pegou de mim, usando-o para enxugar o cabelo antes de
enrolá-la na cintura. Peguei uma das toalhas menores e a usei para
me secar antes de vestir minha calcinha e jeans. Minhas meias e
sapatos vieram em seguida. Minha camisa e sutiã ainda estavam do
lado de fora. Abrindo a porta do banheiro, corri para caçar o resto
das minhas roupas. Eu as coloquei.
Os passos de Alexander seguiram atrás de mim. Ele estava
andando sozinho agora. Bom. Aquilo era um bom sinal. Seus olhos
caíram sobre mim com dúvida.
— Como alguém poderia roubar Noura? — ele exigiu, esfregando
a testa. Ele acusou: — Onde você estava?
Meus olhos se encheram de água, e seus olhos severos
suavizaram.
— Eu estava no quintal, no meu jardim — disse em voz baixa. —
Noura estava cochilando dentro de casa e minhas tias não estavam
em casa. Sempre tento observá-la quando estamos do lado de fora
depois da última vez que ela se afastou... Mas estávamos em casa.
Eu pensei... Eu pensei... — lágrimas caíram dos meus olhos,
agarrando-se aos meus cílios — que estávamos seguras.
Quando ele não respondeu, continuei:
— Alguém invadiu. Quando voltei para dentro, ela não estava
mais na cama. Dez minutos depois, recebi uma ligação
desconhecida de um número privado.
Eu me virei e peguei minha bolsa do chão. Abri o zíper e tirei o
papel com dedos trêmulos. Voltei-me para Alexander.
— Ele me disse para lhe dar este bilhete.
Meu coração se encheu de esperança enquanto eu olhava para
ele.
Alexander arrancou o bilhete da minha mão e o leu.

Isso é Guerra1.

1. Um trocadilho com o nome do personagem antagonista, War.


ALEXANDER

36

WAR HAVIA SEQUESTRADO NOURA.


E ele declarou guerra a Alexander.
Os olhos sombrios de Alexander fitaram o armazém cor de vinho.
Eles estacionaram a mais de sessenta metros de distância, longe
dos espectadores e da câmera. Era o lugar de War. Seu olhar caiu
sobre Ghislaine, Miran e Dimitri no Porsche. Seu irmão havia
retornado recentemente de sua missão. Sentou-se com Ghislaine no
banco de trás.
— Vocês todos entenderam o plano?
Miran olhou para ele duramente do banco do passageiro da
frente.
— Eles vão atirar em você — Miran repreendeu. — Não é uma
boa ideia.
— Eu concordo — a voz áspera de Dimitri veio do banco do
motorista. — Deixe-me ir com você, irmão.
— Vou sozinho — Alexander ferveu. — Ninguém me segue.
— Vou com você — Ghislaine gritou ao lado dele.
Ele olhou para seus olhos avermelhados e seus cabelos
molhados, ainda grudados em sua camisa e pele. Por um momento,
se perguntou se a tinha imaginado no chuveiro. Mas não, ele se
lembrava claro como o dia, e ele a tinha tomado como um bastardo
egoísta.
— Não.
Ela fez uma careta em vez disso. Ele estava caminhando para
sua possível morte e não queria que ela fosse prejudicada.
— Estou falando sério — disse Alexander. — Eles só querem que
eu vá. Se algum de vocês me seguir, eles vão... — seus olhos
caíram sobre Ghislaine — machucar Noura.
Ela respirou fundo.
— Por que eles a levaram... e não a mim?
Respirando com dificuldade, ele esfregou a testa latejante.
Algumas horas se passaram desde sua última bebida, e ele estava
lentamente voltando a si, embora seu cérebro ainda parecesse frito,
e ele ansiava desesperadamente por dormir. Pelo menos, ele parou
de ver as coisas rodando.
— Bem... Sou um alvo mais difícil de sequestrar, obviamente.
Estou perto de muitas pessoas. Agora... Você — ele encontrou seus
olhos lacrimejantes e confusos — fica principalmente sozinha, mas
você costumava ser uma agente, então talvez eles tenham
escolhido a pequena Noura. Ela é um alvo mais fácil.
Ela parecia perplexa, e ele queria acalmá-la.
— Como eles sabiam sobre mim e você?
Sua alma se agitou. Pensando muito, ele respondeu:
— Eles são a máfia. Eles ficam sabendo de tudo. — Ele não
deixou de notar a expressão preocupada em seu rostinho. — Vou
trazer sua filha de volta, ok? — Ele queria adicionar confiança nela,
mas sempre fodia tudo no final, de qualquer maneira.
Ela assentiu brevemente, e ele se virou e abriu a maçaneta da
porta.
— Zander — Ghislaine chamou atrás dele.
Caralho. Ela exercia tanto poder sobre ele com uma única
palavra, especialmente quando o chamava assim.
Ele olhou por cima do ombro.
— Volte para mim.
A súplica em sua voz preocupada apertou sua alma morta. Ele
não sabia o que ela queria dizer com isso, mas, se saísse vivo, ele
exigiria que ela lhe contasse. Seus olhos pareciam querer dizer
muito mais, mas ela parecia com medo.
Ele deu um breve aceno de cabeça e se dirigiu para o grande
armazém. Afrouxando os punhos bordô de sua camisa branca de
botão, ele os rolou sobre os antebraços, expondo a tinta envolta em
sua pele. Ele não estava usando seu blazer preto. Não havia
necessidade de sujá-lo hoje.
Passou a mão pelo cabelo molhado e desgrenhado. Estava
bagunçado, e ele não gostava disso. Empurrando os ombros para
trás, concentrou-se e foi em direção à entrada, onde dez homens
estavam explorando a área.
Eles ficaram tensos quando ele se aproximou, trocando olhares
um com o outro. Estendeu as mãos em rendição, esperando que
eles se aproximassem dele. Um homem se aproximou com
hesitação. Ele encarou o homem com firmeza. O homem desviou o
olhar rapidamente, encolhendo-se sob os olhos assassinos de
Alexander. Ele foi apalpado, embora pudesse sentir a tensão vindo
do homem. Quando se afastou, segurava duas das armas que
Alexander carregava. Ele se abaixou, verificando os sapatos de
Alexander, e tirou os dois canivetes finos.
— Limpo — gritou para os homens na parte de trás.
Alexander deixou cair os braços ao lado.
Um homem deu um passo atrás dele e ordenou:
— Mova-se. Olhos para a frente, e não tente nada.
Alexander fez como foi instruído. Seus olhos observaram as
grandes paredes de granito preto enquanto andava em linha reta.
Caixas marrons e barris estavam ao seu redor. Contando o número
de homens, ele procurou War. Ele não estava aqui. Havia muitos
homens. Talvez cinquenta ou mais.
Sua Organização Bratva foi informada, e ele deu a ordem a eles
que, se ele não saísse com a criança em uma hora, eles deveriam
entrar com o exército. Ele passou pelo corredor interminável antes
de ser ordenado a entrar em uma sala.
Estudando os homens, ele se virou para encará-los.
— Onde está Noura? — perguntou. — Estou aqui para que você
possa deixá-la ir.
Um homem de cabelos castanhos com uma expressão estoica
encontrou seus olhos.
— De acordo com as ordens de War, não podemos deixar a
criança ir ainda.
Alexander cerrou os dentes e o amaldiçoou baixinho.
Arqueando uma sobrancelha, perguntou:
— E onde está War?
— El Capo decidirá quando quer vir.
— E o que eu deveria estar fazendo enquanto isso?
Sete soldados entraram na sala, cercando-o em um círculo.
Nenhum deles segurava seus rifles em suas mãos, e eles
cumprimentaram Alexander com expressões duras. Ele quase quis
revirar os olhos. Eles iriam atacá-lo primeiro. Que clássico.
Estendendo a mão, ele passou a mão pela barba imaculada,
olhando cada homem como um predador caçando sua próxima
refeição. Ele ergueu as mãos em posição de luta, pronto para
enfrentá-los.
— Você luta contra nós e a criança morre — disse um homem.
Alexander congelou, e seus olhos sombrios voaram para o
homem que havia falado.
— Como eu sei que ela está viva? — ele demandou.
O homem sorriu, e Alexander queria torcer a porra do pescoço.
— Você não tem escolha, a não ser aceitar nossa palavra.
Sua ira se acendeu e ele cerrou os dentes.
— Se eu descobrir que você me traiu, não será bom para você ou
seu Capo — zombou. — Quero ouvir a voz da criança.
Os soldados trocaram um olhar antes que um deles pegasse um
telefone e discasse um número.
— Coloque a voz da criança.
Alexander prendeu a respiração, e seu coração quase explodiu
quando uma voz familiar veio.
— Mamãe! Tô com medo.
Ele reconheceu facilmente aquela voz.
Soltando as mãos para o lado, apertou os músculos do corpo com
força. Imediatamente, um soco saudou sua mandíbula. Sua cabeça
voou para trás, sua mandíbula queimando de dor, mas ele apenas
olhou para eles novamente. Alguém atrás deu um golpe em seu
ombro. Outro golpe saudou a parte de trás de sua cabeça, e ele
estremeceu. Esse doeu pra caralho. Ele piscou, mas seus olhos
viram estrelas. Focalizando seu olhar nos homens novamente, eles
o chutaram nas costas, fazendo-o cair de joelhos. Sua respiração
saiu mais áspera, e cada instinto nele estava lhe dizendo para lutar.
Um flash de olhos grandes e brilhantes e um pequeno vestido
encheram sua mente.
Se ele quisesse vê-la viva, não se defenderia.
Os golpes pioraram um após o outro. Um golpe colidiu com sua
mandíbula novamente, provocando uma erupção de sangue de sua
boca. Ele cuspiu um bocado no chão antes de estender a mão e
limpar a boca sangrenta. O sangue escorria de seus lábios antes de
pousar em sua camisa branca. Bem, pelo menos parecia Borgonha.
Uma de suas cores favoritas. Ele escondeu um sorriso para que os
homens não vissem. Não há necessidade de incentivá-los ainda
mais.
Mais socos e chutes aterrissaram em cada parte de seu corpo.
Um homem pisou em seu pau dentro de suas calças, e ele cerrou os
dentes, mas um rugido angustiado escapou. Ele rosnou:
— Pelo amor de Deus, deixe meu pau em paz. Eu quero filhos
algum dia.
Quando eles não ouviram, ele virou as costas para eles. Seus
membros cansados estavam no chão agora, e seu estômago
recuou, tentando se levantar. Uma pesada haste de metal aterrissou
com força em sua omoplata, e ele estremeceu. Tentou ficar de
joelhos, mas eles atingiram uma haste em suas costas. Ele tinha
certeza de que era preto e azul por baixo de suas roupas. Seus
músculos gritaram e sua mente ficou mais confusa.
Ele não queria perder a consciência e tentou manter os olhos
abertos. Eles continuaram atacando suas pernas, e ele não achava
que conseguiria se levantar tão cedo. Grunhiu sob os golpes.
Pisaram em suas mãos e as esmagaram. Rangendo os dentes, ele
olhou ameaçadoramente para os homens que pisaram em seus
dedos.
Com a boca sangrenta, ele deu um sorriso cruel.
— Seu Capo precisa de sete soldados para atacar um homem? —
ele desafiou com uma voz nervosa, perdendo a frieza neles. —
Onde diabos War está se escondendo?
Um bastão em suas costas foi a resposta.
Ele descansou a cabeça no chão e respirações rápidas deixaram
seus lábios. Algum filho da puta puxou seu cabelo, e ele grunhiu
com a dor repentina e explosiva em seu couro cabeludo em
chamas.
Por um momento, ele se perguntou se foi isso que Ghislaine
sentiu quando ele puxou o cabelo dela naquele dia em que se
rendeu. Ele nunca teve seu cabelo puxado com tanta força, e seu
couro cabeludo queimou, ele nunca conheceu a agonia e a
humilhação disso. Mentalmente, ele se lembrou de não fazer isso
com sua preciosa cabecinha novamente. Embora, sem a roupa, ele
a arrancasse. Um pequeno sorriso puxou seus lábios, lembrando
seu tempo juntos. Ele provavelmente nunca mais a veria. Seu
sorriso diminuiu.
Dois homens se colocaram em sua frente, e ele ergueu os olhos
escurecidos. Agarrando seus braços, eles o arrastaram para frente.
Era como se seus membros estivessem sendo separados. Ele abriu
e fechou os olhos, descansando-os brevemente, mas os solavancos
em suas articulações doloridas o acordaram novamente. Talvez
devesse ter bebido um pouco mais antes de vir. Entorpecer-se
parecia ideal. Exalando respirações superficiais, ele tentou se
concentrar com uma visão turva.
Eles o puxaram para cima, e suas pernas trêmulas quase
cederam sob ele. Uma delas estava quebrada. Eles separaram seus
braços, e seus olhos tentaram focar, mas não conseguindo ver. Sua
visão continuou entrando e saindo. O latejar em sua testa voltou.
Os homens amarraram seus braços com cordas apertadas, cada
um deles indo na direção oposta, esticados. Ele olhou e tentou
puxar seus braços para se libertar, mas uma dor o encheu. Cerrou
os dentes e agarrou a corda perto de suas mãos amarradas e tentou
puxá-la em sua direção para se libertar.
Ele olhou enquanto a corda cortava seus pulsos pálidos. Sangue
vermelho escuro escorria deles e caía no chão duro. A queimadura
penetrou em sua pele, intensificando-se cada vez que ele se movia
contra as cordas. E a corda grossa poderia cortar suas mãos.
Soltando um suspiro frustrado, ele parou. Suas pernas quase
cederam debaixo dele, mas ele se conteve. Levantando a perna
quebrada do chão, tentou não deixá-la tocar. Ficar em uma perna
também não parecia fascinante.
— Quanto mais? — Alexander exigiu. — Onde está War?
Sua cabeça se virou para os passos pesados que vinham em sua
direção. Levantando os olhos, ele olhou para os sapatos de couro
bronzeado que o encontraram.
Uma voz profunda e masculina o cumprimentou:
— Olá, amigo.
Alexander olhou nos olhos impiedosos.
War.
GHISLAINE

37

FIXEI MEUS OLHOS no armazém, olhando e procurando para ver


se Alexander e Noura sairiam logo. Até agora nada. Olhei para a
hora no carro.
Mais de trinta minutos se passaram.
— Por que eles estão demorando tanto? — Meu coração
disparou. — Acho que ele está com problemas. — Estendi a mão
para abrir a maçaneta da porta, mas a fechadura foi fechada.
Surpresa, olhei para o irmão mais novo de Alexander, Dimitri.
Eu o tinha visto uma vez na floresta antes. Lembrei-me daquele
olhar em seus olhos, vazio de qualquer emoção. Se Alexander era
magro, este homem era encorpado com músculos grossos. Ele era
ainda maior que Miran. O irmão mais novo poderia facilmente ser
um segurança de clube. Não ficaria surpreso se ele pudesse jogar
alguém de lado com um movimento rápido. Ele tinha cabelos curtos,
e seus olhos eram diferentes em comparação com os de Alexander.
Dimitri tinha olhos azuis, e eles eram bem gelados e sem emoção.
Meu estômago se contorceu, e algo me disse que esse homem
nunca sorriu um dia em sua vida, o que diz muito, porque eu achava
que Miran era pior. Este irmão era mais como um maldito sociopata.
Ele se encaixa no perfil para isso.
— A Bratva deve chegar em vinte minutos. Esperamos —
ordenou ele. Sua voz baixa e grossa era tão áspera, que retumbou
quando ele falou. Não era nada como o de Alexander.
— Pode ser tarde demais então! — protestei.
Meus olhos horrorizados olharam para Miran passando a mão
pela barba.
— Ela tem razão — disse ele, olhando para o armazém. — Ele
está lá há muito tempo. — Ele já estava com seu equipamento à
prova de balas e roupas pretas. — Vou entrar.
— Seu idiota de merda — Dimitri repreendeu. — Esperamos pelo
exército. É o que a Bratva faz. Nós esperamos.
Miran se virou na direção de seu primo mais novo e deu um
sorriso torto.
— Não sou Bratva — declarou ele, então destrancou a porta e a
escancarou.
— Também vou! — protestei.
Miran olhou por cima do ombro.
— Você não está com colete à prova de balas.
— Não me importo — disse teimosamente.
Abri minha porta e saí para o sol escaldante. Protegi meus olhos
do brilho, e os raios do sol queimaram minha pele. Bem, pelo menos
tinha tomado banho antes de vir. Um pequeno sorriso brincou em
meus lábios, lembrando a memória fresca que eu compartilhei com
Alexander. Miran saiu do carro, e, um momento depois, Dimitri saiu
também. Ele olhou para nós e balançou a cabeça, como se
fôssemos crianças bobas e desobedientes. Mafioso sem emoção...
— Você vai ser morto — protestou Dimitri. — Parem de tentar ser
malditos heróis.
Olhei para ele, e seu olhar nervoso lutou contra o meu. Tentei me
manter firme e me recusei a ser intimidada por esse bruto gigante.
— Você pode vir, primo, ou ficar aqui — disse Miran, olhando para
o armazém enquanto tomava sua posição e segurava sua Glock
com as duas mãos.
Dimitri piscou e bateu a porta.
Um momento depois, ele puxou sua arma também.
Escondi um sorriso enquanto caminhávamos em direção ao
armazém, usando as árvores para nos esconder. Pressionando
meus lábios, debati quem era o idiota que tinha levado minha filha.
Eu queria matá-lo primeiro.
— Vou pegar os homens aqui — ordenou Miran. — Você e Dima
vão para dentro.
Dima? Intrigada, percebi depois de um momento que ele estava
falando sobre Dimitri. Olhei para o gigante novamente. Ele poderia
facilmente pisar em mim, e eu provavelmente iria sangrar. Desviei o
olhar de seu tamanho e me concentrei no armazém.
— Todos vocês têm munição extra, certo? — perguntou Miran.
— Sim, Senhor.
Apertei minha boca fechada na frase que escapou. As mesmas
palavras que usei para o chefe do FBI e agora para o chefe. Bem,
era meu falecido marido antes, mas, quando as pessoas nos
cercavam, eu o chamava assim. Miran não prestou atenção em
mim, porém, me poupando do constrangimento.
Usando as árvores, ele apontou para os três homens mais
próximos da porta. Foi uma jogada inteligente. Esses seriam os
primeiros a correr para dentro e alertar os outros. Muitos teriam
como alvo os mais próximos deles. Os outros procuraram antes de
disparar balas aleatórias ao redor, incapazes de nos ver.
Rapidamente, nos mudamos.
— DEA, larguem suas armas! — ordenou Miran. Eles não o
fizeram, então Miran atirou em um homem após o outro, e Dimitri e
eu entramos no armazém. Dimitri correu na minha frente, atirando
no olho de um homem, e eu me encolhi com o sangue escorrendo.
O buraco em seu rosto era uma visão que eu nunca esqueceria. Ele
mereceu, de qualquer maneira. Sequestradores de crianças. Eu
rosnei para os muitos homens que surgiram à frente, mirando em
seus peitos. Apertei o gatilho e atirei em dois homens na minha
frente.
Meus ouvidos se animaram com os gritos de Dimitri. Não sabia
onde ele estava, mas não conseguia olhar para trás. Usando as
paredes para me esconder, atirei bala após bala nos homens. Seus
corpos caíram no chão. Havia muitos, mas eu não desistiria.
Encontraria Alexander e Noura.
Ficando sem balas, abri minha bolsa enrolada na cintura e tirei
mais munição, recarregando minha arma. Gostaria de ter um
maldito rifle em vez disso. Espiei da parede e uma bala passou
chiando por mim. Amaldiçoando baixinho, esperei um momento
antes de me virar para encará-los novamente e atirar em seu peito.
Meus olhos olharam para Dimitri, que estava atirando também.
Ruídos de tiros. Muitos ruídos.
Onde estavam Alexander e Noura? Não podia vê-los. Limpando o
suor que escorria da minha testa, disparei mais balas.
Recarrego.
Bang.
Recarrego.
Bang.
Era um ciclo sem fim, e adrenalina bombeava em minhas veias.
Era eu, ou esses homens estavam aumentando em número? Era
como se mais e mais deles saíssem de lugares escondidos. Eu me
escondi e olhei para as portas, que poderiam me dar algumas pistas
sutis. Não conseguia mais ver Dimitri, mas vi Miran. Ele havia
entrado e estava atirando. Presumi que os homens lá fora foram
atingidos.
Suspirando de alívio, meus olhos caíram em uma porta próxima, a
pelo menos seis metros de distância. Apontei para os homens perto
daquela área e atirei neles um por um. A multidão naquela área era
menor, e me concentrei nela, movendo-me naquela direção. Balas
vieram, e me abaixei, agachada atrás de um barril. Olhei para cima
e apontei a arma para as duas figuras iminentes na porta. Disparei
uma vez, mas depois fiquei sem munição. Suspirando, abri minha
bolsa novamente, remexi nela, mas estava sem balas.
Droga.
Passando a mão pelo meu rosto, puxei a adaga escondida no
meu sapato. Eles ainda atiraram em minha direção. Usando os
barris como uma barricada, rastejei na direção deles. Eles não
podiam me ver. Olhando para eles, deslizei como uma serpente
pronta para atacar.
Eles foderam com a mãe errada.
Agarrando minha adaga em direção a eles, pulei e investi contra
eles. Assassinato estava em minha mente. Cortei a garganta de um
homem sem remorso. Seu sangue amargo espirrou sobre mim
como uma cachoeira quando atingi uma artéria. Caiu em minhas
roupas e cabelos, me encharcando. O sangue já não me repelia.
Minhas entranhas retorcidas ficaram satisfeitas. Gorgolejando e
segurando seu pescoço ensanguentado, ele caiu no chão. Surpreso,
o outro homem olhou para o corpo antes de olhar para mim.
Rosnando, chutei sua mão, derrubando sua arma. Ele ainda
pressionou o gatilho, mas a bala colidiu com o teto. Enfiei minha
adaga em sua bochecha, empurrando-o com toda a minha força. Ele
gritou, e puxei a lâmina para fora antes de atingi-lo no meio de sua
testa, declarando-o com morte cerebral em minha mente. Ele caiu
no chão também.
A Viúva Negra estava aqui para ficar agora.
Sem olhar para trás, puxei minha adaga de sua testa sangrando e
peguei uma arma. Tiros ainda dispararam atrás de mim. Corri em
direção à porta que estava a poucos metros de mim.
Dois homens vieram correndo em minha direção e atirei no peito
deles um por um, e seus corpos caíram. Entrei na sala, meus olhos
procurando por Alexander e Noura. Meus olhos pegaram um corpo
pálido e sangrando, mas outro homem se lançou para mim por trás.
Virei para trás e cortei minha adaga em seu rosto. Gritando, o
homem segurou seu rosto cortado e caiu de joelhos. Meu
treinamento anterior de kickboxing começou, e torci minha perna
atrás do pescoço dele e a bati. O barulho foi satisfatório para os
meus nervos.
Meu sangue corria pelas veias, com a necessidade de caçar,
matar e destruir esses homens que sequestraram minha pobre filha.
Outro atacou-me por trás, e rapidamente me virei e o chutei no
maxilar. Ele caiu para trás com um grunhido, e atirei fatalmente na
cabeça dele. Outro homem me atacou. Eu me virei e dei um chute
alto em sua bochecha, sua mandíbula rangendo sob minhas botas.
Quebrei dois dentes e eles caíram no chão sujo. Atirei nele também.
Um homem levantou sua arma para atirar em mim, e eu joguei
minha adaga nele, acertando-o bem em sua garganta dourada. Ele
largou a arma e apertou a garganta. Seus olhos rolaram em sua
cabeça, e ele estava morto também. Estava ficando sem balas.
— Ghislaine, cuidado — gritou uma voz rouca.
Alexander. Estava prestes a atirar de novo, mas um chute veio,
acertando minha mão, e eu larguei a arma. Um homem me
desarmou. Gemendo e agora sem armas, me virei para o homem
com os punhos, mas ele deu um soco na minha cabeça e eu caí no
chão. Aquele homem poderia me acertar. Quem quer que fosse, ele
agora estava pairando sobre mim. Respirando com dificuldade,
estrelas brilharam na minha frente e um fio de sangue caiu da minha
testa. Um gemido saiu da minha boca, e estendi a mão para tocá-lo.
Grunhindo, parei e deixei cair minha mão. Virei meu corpo e olhei
para os sapatos de couro bronzeado na minha frente.
Com os olhos atordoados, segui o jeans azul escuro rasgado
antes de pousar na camisa formal azul-celeste. Uma tatuagem
espreitava de seu colarinho desabotoado. Ele usava uma jaqueta de
couro marrom justa. Era alto e musculoso. Tinta preta cobria suas
mãos grandes e cheias de veias castanho-claros.
Anéis cobriam sua pele. Meus olhos rastejaram para cima,
observando seu piercing na orelha. Um pequeno aro de ouro pendia
de sua orelha. Seu cabelo castanho escuro curto e grosso era mais
pesado no topo e mais curto nas laterais. Um cavanhaque cobria
seu queixo, e uma cicatriz marrom descia por seu pescoço,
desaparecendo em seu peito como se alguém tivesse passado uma
lâmina por sua pele. Ele tinha outra cicatriz perto do olho. Eu
estremeci, quando olhei em seu rosto, que não continha nenhum
sorriso.
Eu encontrei seus olhos perigosos.
Um azul e um marrom.
Nunca tinha visto olhos raros como aqueles antes.
Eles eram diferentes dos negros de Alexander.
Grossas sobrancelhas castanhas emolduradas sobre eles.
Soube quem ele era instantaneamente.
War. Essa nota fazia sentido agora.
No começo, não entendia o que isso significava, mas agora
entendi.
O senhor do crime de drogas do Cartel de Dallas estava diante de
mim.
O líder colombiano.
Todos na força estavam cientes dele. Engolindo em seco, lembrei
que ele também gostava de decapitar pessoas e enviar suas
cabeças como lembranças. Ele ainda andava livre, porque não
havia provas contra ele. War inclinou a cabeça quando seus
homens me prenderam. Ele estreitou os olhos enquanto me
observava. Não parou de olhar para mim.
— Você lutou bem.
Essa era a mesma voz áspera e rica que ouvi no telefone.
Ele olhou para os cadáveres de seus homens e um sorriso
presunçoso e torcido se formou em seu rosto.
— É uma pena que eles tenham sido derrotados por uma mulher.
Mereceram suas mortes.
Um tremor percorreu meu corpo. Ele não dava a mínima para
seus próprios homens. Que tipo de homem ele era então? Antes
que eu pudesse responder, uma voz falou:
— Mamãe!
Noura. Meus olhos saltaram atrás de War para olhar para ela. Ela
estava com os olhos vendados. Procurei por algum hematoma em
seu corpinho, mas não tinha visto nenhum. Um suspiro de alívio
deixou meus lábios. Por um segundo, fiquei feliz por ela não poder
ver nada. Havia corpos ao nosso redor, e eu estava com medo de
que ela pudesse me ver como um monstro.
— Quatro de vocês ficam do lado de fora e vigiem. Não deixe
ninguém entrar e tranquem a porta — a voz de War explodiu. — E
tirem esses corpos daqui.
Seus homens fizeram como ele ordenou. A porta se fechou,
embora os tiros ainda fossem disparados do lado de fora. Miran e
Dimitri foram emboscados? Esperava que eles não tivessem ficado
sem munição como eu. Talvez pudessem chegar a tempo e
arrombar a porta.
Desviei o olhar dele, procurando minha arma. Eu podia sentir um
olhar ardente em mim, e olhei para cima, War estava me
observando novamente. Seus olhos seguiram minha visão antes
que ele avançasse, pegando minha arma e travando a trava de
segurança. Seus dedos longos e escuros acariciando a arma antes
de colocá-la na cadeira próxima.
Os olhos incompatíveis de War se ergueram de mim e se
moveram para seus homens. Olhos tão bonitos não pertenciam a
um homem tão cruel.
— Coloque-a na minha frente.
Dei um soco nos homens que tentaram me segurar, mas um deles
me deu um soco no rosto e eu estremeci.
Um rosnado baixo veio do fundo:
— Não toque nela.
Olhei para trás e meus olhos pousaram em Alexander.
Uma corda o amarrava, e sua camisa branca estava encharcada
de sangue. Um barulho assustado saiu da minha boca. Seus olhos
escuros e angustiados caíram sobre mim. Eles tiveram problemas
para se concentrar e ele piscou muito. Sua cabeça sangrava,
sangue escorrendo até o pescoço. Meu coração doeu por ele, e eu
queria traçar suas feridas com meus dedos e lábios. Três homens
apontaram suas armas para ele. Eu me movi em direção a ele,
querendo ajudá-lo, mas uma mão agarrou meu cabelo por trás e me
arrastou de volta. Um grito saiu da minha boca e meus olhos se
encheram de lágrimas.
Alexander soltou maldições ao fundo, e Noura estava chorando:
— Mamãe!
O homem que me agarrou, soltou o aperto do meu cabelo e me
jogou contra o chão, contra os pés de War, como se eu fosse um
maldito cachorro. Cerrando os dentes, olhei para o homem e chutei
os pés dele, fazendo-o perder o equilíbrio. Estúpido pedaço de
merda. Ele caiu no chão. Antes que eu pudesse apreciá-lo, um
corpo sólido se moveu atrás de mim e serpenteou uma mão quente
em volta do meu pescoço, inclinando-o para cima.
Encontrei os olhos de War novamente.
Em sua outra mão, ele agarrou uma lâmina limpa e brilhante e a
trouxe para o meu pescoço.
Ele ia me matar.
— Deixe-a ir, War! — Alexander protestou. — Ela não tem nada a
ver com isso!
Minha visão ficou turva e o ouvi dizer a seus homens:
— Tire a venda da criança e traga-a aqui também.
Minha alma se debateu e eu me virei para acertá-lo, mas seu
braço firme agarrou meu pescoço, tornando impossível para mim
sair de seu estrangulamento. Depois de um momento, parei de me
mexer quando notei Noura em seu pequeno vestido verde.
A venda foi tirada, e seus olhos assustados encontraram os meus.
Ela correu em minha direção, mas um homem bloqueou seu
caminho. Intimidada, ela recuou. Suas bochechas rosadas estavam
manchadas, talvez de tanto chorar. Queria estender a mão e colocá-
la em meus braços, mas não consegui.
Ela fungou, e seus olhos caíram sobre Alexander. Seu sorriso se
iluminou, mas seus olhos caíram sobre o sangue. Sua boca formou
uma forma de ‘O’ antes de ela fazer uma careta. Eu me encolhi. Ela
não deveria nos ver assim. Eu bati no braço de War novamente,
mas ele não me soltou.
— Calma aí — ele murmurou atrás de mim.
Parei por um segundo, procurando uma abertura.
— Alexander — War falou.
Ele soltou meu pescoço, tornando mais fácil para mim respirar,
mas agora a lâmina estava sobre mim. Um movimento errado, e ele
cortaria minha garganta e os faria assistir.
— Você não cumpriu minha ordem — War continuou.
Ordem? Que ordem?
Olhei para Alexander em busca de respostas, mas ele apenas
olhou para War.
— Você pode ter seus milhões de volta — Alexander resmungou.
War riu, e a risada zombeteira áspera encheu o ar.
— Não era sobre o dinheiro. Fiz um pedido e esperava que você o
cumprisse. Quando você não o fez, isso afetou meus negócios. Tive
uma perda.
Tentei arduamente não revirar os olhos.
Seu negócio compreendia cocaína e heroína.
— Essas garotas devem significar algo para você vir buscá-las,
especialmente para uma criança que não é sua — War continuou.
— Voxê é um homem mau! — uma voz pequena e minúscula
saiu.
Todas as cabeças caíram na direção de Noura, e um sorriso de
partir o coração se formou em meus lábios.
— Jander é legal — ela guinchou, seu queixo trêmulo erguido
para War em desafio.
Rezei para que ela calasse a boca.
Agora não era o momento ideal para falar mal de um senhor do
crime.
— E o que temos aqui? — War perguntou. Presumi que ele
estivesse olhando para minha filha. — Você realmente é filha de sua
mãe. Você tem o mesmo fogo.
Isso era elogio em sua voz? No passado, as pessoas sempre
elogiavam Driss e nunca tinham olhado para o meu trabalho. A força
nunca havia notado o que eu podia fazer, mas o criminoso atrás de
mim, sim. Que adorável. Não.
— Voxê é um dos caras maus! — Noura acusou novamente.
Meu coração apertou, mas ordenei:
— Noura, fique quieta.
Ela ainda podia falar, e não pude deixar de me sentir orgulhosa.
Esperava que War não tirasse sarro de seu ceceio. Se fizesse, eu
iria derrubar sua bunda mesmo se ele cortasse minha garganta.
Noura o encarou.
— Jander e minha mãe vão te prender!
Um silêncio letal caiu no ar, e eu queria torcer minha cabeça e ver
a expressão de War:
— Me prender?
Ops. Agora aquele não era o momento perfeito para dizer a Noura
que Alexander também era um criminoso.
— Xim, ele é um policial como a mamãe!
Eu me encolhi e ordenei:
— Noura, fique de boca fechada.
A risada zombeteira de War encheu o ar.
— Ah, foi isso que ele te disse? — War perguntou. Meu coração
caiu. — Ele é mais parecido comigo do que com sua mãe.
Noura ficou em silêncio e olhou para Alexander em busca de
confirmação. Alexander soltou um suspiro irregular, mas ele não
disse nada para ela. Em vez disso, seus olhos ardentes focaram em
War.
— Você está se divertindo com isso, não? Deixe-as irem. Estou
aqui agora. O que mais você quer? — ele exigiu.
War o ignorou e inclinou meu rosto com a mão, me forçando a
encontrar seus olhos. Ele ainda estava intimidando de cabeça para
baixo. Uma sobrancelha grossa se ergueu no ar e ele perguntou:
— Diga-me, reinita, o que você faria para salvar a vida de seu
amante?
Falei o primeiro pensamento que me veio à mente.
— Qualquer coisa — respondi. — Não o machuque.
Eu odiei aquele apelo em minha voz, e meus olhos brilharam.
O lábio de War se curvou, mas ele não sorriu.
— Qualquer coisa? — ele zombou com uma faísca perversa em
seus olhos.
— Pare com isso, War! — Alexander gritou novamente.
Minha garganta travou com o tormento em sua voz.
Sabia o que War estava perguntando. Ainda assim, esperava que,
de alguma forma, fosse diferente. Eu me perguntei quanto tempo
levará para Miran e Dimitri arrombarem a porta.
Eles estavam mesmo vivos? Os tiros do lado de fora haviam
diminuído, mas ainda havia tiros. Eles ficaram para trás atirando nos
homens, e eu escorreguei ainda mais para dentro. Talvez pudesse
protelar War e nos dar mais tempo. Se não fizesse o que ele queria,
ele poderia matar Alexander e Noura. Tive que agir rapidamente. Eu
lambi meus lábios.
— Cubra os olhos, Noura.
Eu não queria que ela testemunhasse minha queda.
— Ghislaine! Não! — a voz de Alexander rugiu ao fundo. Meu
coração se apertou com sua voz atormentada.
Minhas mãos chegaram abaixo da bainha da minha camisa para
levantá-la sobre a minha cabeça. Eu tinha acabado de descobrir
meu estômago quando a lâmina que War segurava pressionou mais
forte contra minha pele. Fiz uma pausa e deixei cair minha camisa.
Confusa, encontrei seus olhos novamente. Ele me encarou por
um segundo com seus olhos incompatíveis antes de levantá-los
para Alexander.
— Deixe minha mãe em paz! — Noura protestou.
Minha cabeça caiu para frente e meus olhos cansados caíram
sobre Noura, que estava segurando uma arma.
A mesma arma que uma vez estava na cadeira a poucos metros
dela. Ninguém deve tê-la visto tentando pegá-la. Ela sempre foi
sorrateira assim. Seus olhos estavam focados em nós.
Ela apontou para a War.
Olhei, horrorizada, que minha garotinha estava segurando uma
arma em suas pequenas mãos. Algo que não era para estar ali. Sua
inocência manchada com um toque de violência.
Seus dedinhos minúsculos tremeram.
Minha garganta se fechou como pedra. Perdi minha voz como se
ela tivesse roubado as palavras de mim. Não ousei olhar para o
homem violento que segurava uma lâmina no meu pescoço. Queria
gritar para Noura largar a arma, correr, porque eles poderiam matá-
la. Lágrimas rolaram pelo meu rosto enquanto eu tentava transmitir
a mensagem aos meus olhos. Inalei uma respiração afiada através
da minha garganta apertada.
— I-Isso não é um brinquedo, meu bem — eu implorei finalmente.
— Abaixe a arma.
Os homens de War se aproximaram dela, mas pararam. Eles
olharam para War novamente e recuaram. Eu não sabia o que se
passava entre eles. Os olhos de Noura se encheram de água e ela
os fechou, a água escorrendo de seus preciosos olhos castanhos.
Ela puxou o gatilho.
Nada disparou.
Ela puxou de novo, mas nada disparou. Virando-se para olhar
para mim, ela olhou impotente com os lábios trêmulos.
— A segurança está ligada — uma voz rica e áspera falou.
War. Os olhos da minha filha se estreitaram, confusos.
— Xeguranxa?
Ela não tinha ideia do que ele estava falando. Balancei minha
cabeça descontroladamente, ainda com medo de falar. Não diria à
minha filha como atirar com uma arma. Não era seu dever me
proteger. Se eu dissesse a ela, no segundo em que contasse, eles a
colocariam no chão.
Os sapatos de couro de War se afastaram de mim e foram em
direção a ela. Pulei em sua perna, minha voz gritando:
— Não!
— War! Não! — Os protestos de Alexander vieram.
War apenas me ignorou e caminhou em direção à minha filha, me
arrastando. Eu estava prestes a protestar novamente, mas então ele
se inclinou, encontrando seus olhos assustados.
— Você me lembra alguém que conheço — ele sussurrou. — Isso
não parece certo em suas mãos. Me dê.
Sua voz não deixou espaço para perguntas.
Noura franziu a testa e virou o narizinho para ele.
Quando ela não ouviu seu comando, ele pegou a arma de suas
mãos e a colocou atrás da cintura. Afastei-me de seus pés, e ele
arrastou meu braço no chão com ele. A lâmina de prata ainda
estava em sua mão grande, ainda brilhando na escuridão.
— DEA! Abram a porra da porta! — uma voz veio de fora.
Miran. Meu coração se encheu de esperança, e olhei para a porta.
Houve gritos do lado de fora, e mais tiros vieram.
— Hora de dizer adeus — War disse, olhando para a porta.
Meu mundo desabou. Esperei que os dois homens entrassem,
mas não abriu. O tiroteio lá fora continuou. Não sabia se eles iriam
rebentar a tempo.
Virei-me para encarar Noura.
— Vire-se, meu bem — resmunguei — Fecha os olhos e cubra os
ouvidos, Noura. — Minha hora de morrer é aqui. — E conte em voz
alta até cem. Eu te amo, ok? — Engasguei.
Noura parecia querer vir e me abraçar, mas seus olhos caíram na
lâmina brilhante na mão de War. Sua pequena garganta balançou
quando ela engoliu em seco antes de assentir, concordando com o
meu comando, e se virando de costas para mim.
Olhei para Alexander.
Meus olhos lacrimejantes caíram em seus pulsos sangrentos, e
queria beijar suas contusões e a dor. Ele deixou seu orgulho e
dignidade de lado por mim, lutando uma guerra por mim. Para
Noura.
Isso não o tornava fraco. Altruísta.
Ele foi altruísta para nós. Todos podiam matar, fosse homicídio,
homicídio culposo ou legítima defesa, mas nem todos podiam...
sacrificar. Ele não tinha feito isso apenas hoje também. Ele fez isso
quando se rendeu à DEA também. Sua respiração saiu superficial, e
sua pele clara ficou mais pálida. Ele estava respirando seu último
suspiro? Ele havia perdido muito sangue. Um pequeno gemido
ofegante deixou meus lábios quando seu olhar escuro colidiu com o
meu.
Tentei dizer a ele através dos meus olhos: está tudo bem.
Uma vez, ele foi um criminoso que tirou tudo de mim.
Um criminoso que me ajudou naquela noite quando fui agredida.
Um criminoso que viu minha escuridão e não fugiu dela.
Um criminoso que se entregou à polícia por seus crimes.
Um criminoso que rastejou aos meus pés.
Um criminoso que saiu em missão para trazer minha filha de
volta.
Ele não era mais apenas um criminoso.
Ele foi o homem que nunca parou de lutar por nós.
Antes, ele nunca me disse a verdade.
Medo. Talvez ele estivesse com medo de me perder.
Meus lábios formaram um sorriso e seus olhos negros
escureceram.
— Eu te amo.
Um sussurro apenas para seus ouvidos.
Estou tão loucamente apaixonada por você.
Ele parecia ter parado de respirar. Isso me fez querer sorrir ainda
mais. Hoje, eu o deixei sem fôlego.
— Perdoo você.
Minha pequena Noura cobriu os ouvidos e contou até cem, com a
língua presa enfatizando cada número. Olhei para ela uma última
vez. Eu nunca iria vê-la crescer.
Meu olhar selvagem encontrou os olhos de Alexander novamente.
Ele é o homem que amo.
O homem que realmente perdoei com todo o meu coração.
A mão de War pousou na minha cabeça e puxou meu cabelo
grosseiramente para trás, expondo minha garganta para ele.
Estremeci com a queimadura em meu couro cabeludo, e lágrimas
corriam pelo meu rosto. Mordi o lábio para que Noura não ouvisse.
Desejei que Alexander me ouvisse como Noura fez. Meu coração se
encheu de conteúdo, o sangue em minhas veias correndo,
separando todos ao meu redor até que eu só consegui ouvir minha
respiração constante e meu pulso acelerado. Minha vida já havia
passado diante de mim.
Tinha visto minha morte e renascimento.
Não tinha mais medo.
Uma lâmina se conectou com a pele da minha garganta,
afundando a ponta mais fundo. Sangue escorria pela minha pele na
abertura. Desta vez, fiz uma careta e fechei os olhos.
De longe, a voz rouca de Alexander veio gritando e xingando:
— Porra, não, não, não!
A agonia e o tormento eram claros, embora parecesse que ele
estava a quilômetros de distância de mim.
— Me mate em vez disso! Poupe-a!
Uma voz que aprendi a amar.
Uma voz que eu lembrava todas as noites quando dormia.
Uma voz que me deu esperança quando pensei que tinha perdido
tudo. Porém, nunca perdi... ele me ajudou a recuperar tudo de volta.
Esperei que a lâmina fosse arrastada pelo meu pescoço. Contei
os segundos, preparado para morrer hoje. Uma vez, eu era uma
agente. Estava preparada para morrer em batalha. Morreria como
mártir hoje.
Esperava que Noura parasse de chorar.
A tontura me atingiu, e meu corpo estava pronto para desligar
mais uma vez, mas meus ouvidos ainda ouviam seus pequenos
gemidos suaves que me abriam todas as vezes.
Lá fora, a porta foi chutada e batida.
O tiroteio lá fora havia parado.
— Considere isso uma lição aprendida, Pakhan.
Levei alguns segundos para perceber que era a voz de War.
A lâmina saiu da minha garganta, e meus olhos se abriram. Com
hesitação, olhei para o traficante do cartel que estava pronto para
tirar minha vida. O homem que sequestrou minha filha e machucou
meu Alexander.
Seu olhar de pedra não estava em mim, mas em Alexander.
War desviou o olhar dele e fez um gesto com a mão para seus
homens antes de se virar e sair pela porta dos fundos.
Os passos do líder colombiano se afastaram.
Estava com muito medo de me mexer, com medo de que ele
pudesse voltar, com medo de que ele estivesse tentando nos
enganar. Os quinze homens restantes do Cartel nos deixaram.
Pisquei rapidamente, ainda sem acreditar que isso não era real.
Que ainda era um jogo.
O que acabou de acontecer?
A porta dos fundos clicou e, nesse momento, a porta da frente se
abriu. Miran e Dimitri entraram, cheios de soldados russos. Mais de
vinte soldados encheram a sala, e muitos ficaram do lado de fora.
— Mamãe! — Noura gritou.
Ela se moveu em minha direção e passou os braços em volta do
meu corpo. Eu estava viva. Eu ainda respirava e Noura estava em
meus braços. Seu corpo minúsculo agarrou-se desesperadamente a
mim, e lágrimas encheram meus olhos. Levantei minhas mãos e...
as envolvi em volta da minha filha.
Eu quase a perdi. Envolvi meus braços mais apertados ao redor
dela, agarrando-me a ela com medo de que alguém pudesse
arrancá-la de mim. Respirei seu perfume antes de sufocar beijinhos
por todo o seu rostinho. Ela sorriu e me deixou beijá-la. Enrolei-me
em volta dela novamente, fungando, ainda com medo de que esse
momento não fosse real.
Meus olhos lacrimejantes se ergueram, e o olhar vidrado de
Alexander encontrou o meu.
Ele é o escolhido.
Uma voz nervosa familiar sussurrou em minha mente.
Driss.
Olhei em volta antes de me segurar.
Ele visitou meu túmulo.
Quê? Meus membros congelaram, ainda o ouvindo.
Ele disse que iria levá-la para longe de mim no céu e arrastá-la
para o inferno com ele quando esta vida terminar.
Eu sorri. Isso era algo que Alexander diria.
Que pena para ele, não posso morrer uma segunda morte aqui.
Meu sorriso congelou e meu coração disparou.
Vejo você do outro lado.
Um suspiro de conteúdo saiu da minha boca. A voz de Driss era
real o tempo todo? Eu nunca soube que Alexander visitou o túmulo
de Driss. Não poderia imaginar isso. Não sabia mais o que pensar.
Mordendo meu lábio, olhei enquanto os homens de Alexander
ajudavam a desamarrá-lo.
Vozes encheram o ar.
— Pakhan — muitos deles sussurraram.
— Onde está War? — Dimitri exigiu.
— Ele saiu pela porta dos fundos — respondeu Alexander.
Imediatamente, Dimitri se virou para a porta dos fundos, correndo
em direção a ela. Meu olhar seguiu seus olhos. Ele girou a
maçaneta, mas estava trancada por fora.
Dimitri enfiou seus ombros largos nela, empurrando-o para frente
algumas vezes até que ela abriu e desapareceu. Meus olhos caíram
sobre Miran, agachado diante de mim.
— Você está bem? — ele perguntou, pegando meu cabelo
encharcado de sangue. — Fiquei sem munição, mas a Bratva
chegou na hora.
Eu apenas assenti.
Miran se afastou de mim e foi em direção a Alexander. A mão de
Miran se estendeu e tocou os pulsos sangrentos de Alexander. Ele
deu um pequeno sorriso, e Miran apenas balançou a cabeça em
resposta. Isso me fez sorrir. Eles eram tão diferentes um do outro,
mas, ao mesmo tempo, parecidos.
Alexander me pegou olhando, e seus olhos estrelados queimaram
nos meus agora que eu estava em seu foco. Agora, ele estava no
chão com seus homens pairando sobre ele.
Dimitri havia retornado sem War.
Imaginei que ele tivesse escapado.
— War nos deixou ir. Ele já se foi — disse Alexander.
— Vou encontrá-lo para você, irmão — Dimitri jurou.
Alexander apenas olhou nos meus olhos.
— Vamos para casa por enquanto.
Os homens se levantaram um por um e saíram pela porta. Dei um
beijo fraco em Noura e me levantei na direção de Alexander no
chão. Ela me seguiu silenciosamente. Meus olhos caíram em seus
ferimentos brutais, querendo alcançá-los e tocá-los. De perto, ele
parecia ainda pior. Sua boca estava machucada e seus hematomas
haviam piorado. Sangue cobria seu cabelo grosso e preto. Eu me
agachei abaixo dele e estendi a mão, tocando sua testa.
— Você é real? — ele murmurou.
Seus brilhantes olhos negros estavam cheios de malícia
novamente.
Com cuidado para não pisar nele, me inclinei para frente e segurei
seu queixo suavemente em minhas mãos, meus dedos roçando os
pelos de sua barba. Ele parou de sorrir e me olhou com saudade.
— Você não está tão bonito agora — eu sussurrei.
Seu lábio se contraiu, mas, então, ele estremeceu, fazendo sair
mais sangue do corte. Meu coração se abriu, e eu limpei sua boca
sangrenta.
— Eu deveria ter te perdoado antes.
Seus olhos negros permaneceram grudados no meu rosto.
— Está na hora de você fazer isso.
Estava prestes a dizer algo, mas ele gemeu.
— Minha cabeça está me matando.
Sugando uma respiração afiada, sentei-me no chão sujo ao lado
dele. Com dedos trêmulos, levantei sua cabeça e a coloquei no meu
colo.
— É um doce de sua parte me dar seu colo — disse ele,
levantando uma sobrancelha de brincadeira — ou sua boca. — Este
homem quase foi espancado até a morte, mas ele ainda queria
flertar. Ri e dei um beijo suave em seus lábios machucados antes de
me afastar. — Não estava falando sobre isso, mas também serve —
acrescentou. Ele sorriu, mas acabou estremecendo quando o corte
em sua boca sangrou novamente.
— Você se machucou por minha causa. — Minhas lágrimas
caíram em sua bochecha. Ele ergueu um dedo quebrado e as tirou
do meu rosto. — Obrigada por sempre estar lá para mim. E Noura.
Você arriscou sua vida e veio atrás de mim... Não é a primeira vez
que faz isso — sussurrei, lembrando-me da noite com Cyrus.
Seus olhos suavizaram.
— Você é a primeira pessoa em quem penso quando acordo —
engasguei — Você é a última pessoa em quem penso quando
durmo. Eu fugi de você todas as vezes e você me perseguiu. Não
importa o quanto lutei com você, te afastei, você nunca desistiu de
nós — minha voz falhou. — Senti sua falta todos os dias. Até senti
falta de ver você do lado de fora da minha janela todas as noites.
O sorriso tímido que eu gostava tanto apareceu em seu rosto.
— Você me fez ganhar vida — confessei — Qalbi. Você é meu
coração. — Sua respiração engatou, e eu não pude deixar de sorrir.
— Toda vez que você tirou algo de mim, me deu algo também. Você
entrou na minha vida e devolveu o presente mais importante. —
Esfreguei meu nariz contra o dele. — Uma família. Apenas me
dando você.
Sua garganta balançou quando ele engoliu.
— Estou tão apaixonada por você — minha voz falhou —, não
consigo imaginar minha vida sem você. Tem sido tão difícil... ficar
sem você. Sou viciada em você, sua aura, seus sorrisos, sua voz,
sua presença. Você estava certo. Minha alma é para você agora.
Antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa, deixei beijinhos
em seu rosto, marcando-o mais uma vez como meu.
— Sinto muito que você tenha sofrido.
Eu não estava falando apenas sobre hoje.
Beijei sua bochecha.
— Sinto muito que você tenha sofrido por minha causa.
Beijei sua outra bochecha.
— Me desculpe por atirado em você antes.
Beijei sua testa.
— Sinto muito por te afastar de mim.
Beijei seu nariz.
— Sinto muito por te machucado.
Beijei seu queixo.
— Desculpe por não ter dito que te amo antes.
E, então, minha boca desceu sobre sua boca ferida.
Eu pressionei meus lábios contra os dele. Eu não queria
machucá-lo. Não me importava que Noura estivesse nos
observando. Eu só precisava segurá-lo perto de mim novamente.
Sua mão se estendeu, serpenteando pelo meu cabelo antes de
esmagar meus lábios com mais força contra os dele.
Ele soltou um gemido, de dor ou prazer, eu não tinha ideia. Ele
lambeu meu lábio inferior. Eu estava tentando ser cuidadosa, mas
ele não se importou, e apenas moveu seus lábios rudemente contra
os meus, engolindo os meus, cobrindo minha boca com seu sangue.
O mundo desapareceu quando ele me beijou.
Ele foi a metade que me fez inteira.
— Você é minha — declarou Alexander, afastando-se brevemente
antes de olhar para mim e depois para uma sorridente Noura que
estava atrás de nós. — Ela é minha também.
Meu coração disparou no céu, e outra lágrima rolou. Estávamos
cobertos de sangue e lágrimas.
— Moi devochki. Minhas meninas. Você não tem ideia do quão
louco eu sou por você, e eu vou despedaçar qualquer um que te
machuque. Sacrificarei o mundo por você, até eu mesmo.
Meu coração disparou, e sua boca roçou a minha.
— Você é minha Viúva Negra — ele continuou, seus olhos
levantando em um sorriso malicioso. — Sabia que eles me chamam
de Aranha? — ele perguntou, revelando a tatuagem em sua mão
que eu tinha imaginado, mas nunca totalmente visto. Uma longa
tatuagem preta com duas marcas triangulares vermelhas unidas,
formando uma ampulheta avermelhada. — Este é o símbolo da
Bratva... Como não deveríamos ser?
Surpresa, pisquei, e Alexander continuou me beijando antes de se
afastar. O sorriso provocante que eu tanto amava encheu seu rosto.
— Por que você não ficou no carro como eu pedi?
— Estava com medo de que... q-que — engasguei com a minha
respiração — eles matassem você e Noura. Não podia
simplesmente sentar e não saber o que estava acontecendo. Achei
que nunca mais veria você.
Seus olhos brilharam.
— Então, você veio correndo?
— Sim — respondi sem hesitar. — Cortei a garganta de um
homem e esfaqueei outro na bochecha antes de esfaquear seu
cérebro também.
Ele assobiou baixo.
— Isso soa muito como... tortura.
— Não me arrependo — admiti. — E faria de novo.
Seu lábio se contraiu.
— Adorei como você entrou pela porta e cortou aquele homem no
rosto com uma lâmina.
Sua voz estava cheia de admiração como se estivesse orgulhoso
de mim.
Meus olhos brilharam para ele.
— Quem disse que só os homens podem ser salvadores, hein? —
sussurrei contra seu rosto.
O pássaro em mim não estava mais engaiolado.
Ele voou.
— Minha escuridão para a sua — prometi.
Meus olhos brilharam para ele.
— Governe ao meu lado.
Meus olhos encontraram seus olhos atormentados.
Era uma vida de escuridão, sangue, morte e perigo. Sempre teria
que vigiar minhas costas, assim como as de Noura. Sempre
seríamos um alvo, já que Alexander tinha tantos inimigos.
A batalha com War poderia continuar. A rivalidade poderia nunca
acabar, e eu viveria com medo pelo resto da minha vida que ele
pudesse dar seu último suspiro. Mas não conseguiria me ver sem.
Ele era meu mundo, tanto quanto Noura.
Faria qualquer coisa por ele.
Não era mais uma santa.
Era uma pecadora, assim como ele.
— Junte-se a mim.
— Se você tivesse que escolher entre a Irmandade Bratva ou eu...
— perguntei — Quem escolheria?
Ele engoliu em seco.
— Fiz um juramento à minha causa quando fui iniciado, e jurei
novamente quando me tornei Pakhan. A Bratva sempre veio em
primeiro. Meu dever, minha causa, meu povo... Mas agora... —
meus olhos se encheram de esperança — Você é minha primeira
escolha. Você também é meu povo. Eu mataria, torturaria e
queimaria se eles machucassem você e Noura, mesmo que fosse
meu próprio povo. Se alguém apontar o dedo para você, eu corto.
Se eles falarem mal de você, corto a língua deles. Nunca mais
quero passar pela dor de te perder. Foi como... — sua voz baixou —
me perder. Senti-me um viúvo, aquele sem funeral. Foi a sensação
mais solitária do mundo.
Meu coração disparou. Estendi a mão e passei em sua boca
sangrenta. Ele alcançou minha garganta e colocou beijos de penas
em meus lábios. Meu corpo zumbiu em aprovação. Depois de um
momento, eu me afastei.
— Eu sei que você não é um santo — então, eu sorri. — Mas eu
também não sou. Você é louco às vezes, mas ainda é o homem que
eu amo. Eu sabia quem você era desde o começo... Mas isso não
me impediu de te amar. Porque eu vi você.
Meus olhos brilharam, e minha garganta fechou.
— Você era o único com quem eu podia falar sobre minha dor.
Você viu minha dor e a desafiou em vez disso. Você notou tudo em
mim, minhas falhas, minha escuridão e minhas imperfeições. — Dei
um largo sorriso. — Você não fugiu de mim e, em vez disso, correu
comigo. Nunca desistiu de mim. Você pode ser terrível, mas é bom
para mim — olhei para trás e encontrei os olhos brilhantes de Noura
— e minha filha.
Os olhos de Alexander dispararam, brilhando ferozmente.
— Você não precisava — eu sussurrei. — Você não precisava vir
buscar Noura, mas veio. Você aceitou Noura e eu, e nos colocou
antes de você. Não quero perder você, e vou ter você de qualquer
maneira que eu puder mantê-lo. Minhas mãos não estão mais
limpas também — admiti. — Também sou uma assassina. Ficarei ao
seu lado. Acho que também sou óbvia, porque estou apaixonada
por um criminoso. Agora, nós dois somos.
Seus lindos olhos negros brilhavam como a noite.
Inclinei-me e sussurrei contra seus lábios.
— Digo sim. Governarei com você.
Eu era a Viúva Adormecida, e ele era meu Malévolo.
— Horoshaya devochka.
— O que isso significa? — murmurei.
Ele piscou.
— Boa menina.
O rubor se espalhou pela minha pele e minhas bochechas
esquentaram. Fechei meus olhos para ele para sempre.
— Você é meu amante — então, eu torci meu nariz — e meu
perseguidor. Você é a razão pela qual meu coração ganhou vida
novamente. Ya mahjat alqalb.
Alexander levantou um polegar e roçou meu lábio inferior.
— O que isso significa agora?
— Sangue do meu coração.
GHISLAINE

Epílogo

Alguns meses depois

ERA UMA VEZ UM SONHO…


Um estranho estava diante de mim enquanto eu dormia.
Eu o senti antes mesmo de vê-lo.
Provei seus lábios antes mesmo de saber quem ele era.
Um único toque e ele quebrou meu coma.
Minhas pálpebras pesadas se levantaram e encontraram seus
olhos.
Fiquei enredada em sua armadilha e não queria deixar sua teia.
Tornou-se meu mundo. Ele era meu mundo.

Meu coração batia forte enquanto estava do lado de fora da porta


branca.
Tia Sabrina ficou do meu lado esquerdo, e tia Sarah e tia Ines
ficaram do meu lado direito. Meus nervos tremeram, e me
ameaçavam de tropeçar de cara no chão.
— Preparada? — Tia Ines me perguntou.
Dei-lhe um sorriso doce.
As portas da igreja se abriram e entramos. O rastro do meu
vestido rosa e dourado deslizava no chão atrás de mim. Não usava
branco. Alexander era obcecado por rosa em mim. Minha pele
orvalhada estava sutilmente adornada com contorno kajal nos olhos
suaves e claros. Meu cabelo estava em um coque, e meu véu se
arrastava atrás de mim.
Todos os olhos caíram sobre mim quando entramos.
Vi Miran no meio da multidão, e ele deu um sorriso tímido. Fiquei
feliz por ele estar aqui para fazer parte da vida de Alexander
novamente. Uma bela senhora ruiva estava ao lado dele. Meus
olhos brilharam para ele, segurando seu precioso bebê recém-
nascido.
Kivanc Demir.
Concentrei-me no corredor enquanto caminhava. Não sabia que
esse dia seria possível novamente.
Olhei para cima por um momento e me perguntei se Driss estava
me observando. Eu rezei para que ele estivesse feliz por mim.
Escolhi um homem que arriscou a vida por mim e minha filha.
Decidimos que contaríamos a verdade a Noura quando ela
ficasse mais velha. Ela merecia saber. Eu estava com medo da
reação dela. Pode ser como a minha, mas esperava que ela o
aceitasse como eu aceitei.
Borboletas invadiram meu estômago quando meus olhos caíram
sobre uma figura em um terno preto com mangas roxas.
Certa vez, ele era o vilão da minha história.
Agora, ia ser meu marido.
Os olhos escuros de Alexander se voltaram na minha direção, e
ele parecia ter parado de respirar. Mordi o lábio para me impedir de
sorrir. Seus olhos percorreram meu decote antes de traçar minhas
curvas persistentes. Quando sua atenção voltou para o meu rosto,
um brilho estava em seu olhar. Estreitei meus olhos, e seu lábio
virou em um sorriso.
Homem tolo. Eu estava tão apaixonada por ele.
Não sabia que era possível amar de novo... Mas amava.
Zin Dyali. Meu belo homem.
Ele ficou lá no altar, esperando que me juntasse a ele, sua beleza
russa se destacando. Sua mandíbula esculpida, emoldurada com
sua barba imaculada e aparada. Seu cabelo brilhante de meia-noite
estava penteado e polido atrás das orelhas, tocando sua nuca. Sua
beleza era divina. De tirar o fôlego.
Minhas tias aceitaram Alexander depois que disse a elas que ele
me ajudou a localizar Noura. Elas só queriam minha felicidade. Eu
as convidei para morar conosco na casa de Alexander, mas elas
recusaram educadamente. Acho que ainda tinham medo dele.
Noura viria morar comigo, e minhas tias não se importaram.
Minha vida tinha acabado uma vez.
Mas eu tinha criado um novo começo.
Cheguei mais perto, e minhas tias me entregaram a ele para
sempre. Eu não era um presente para ele. Em vez disso, era sobre
eu me unir a outra pessoa além das minhas guardiãs.
Sua mão quente e forte agarrou a minha, e seus olhos se
demoraram no meu rosto antes de olhar para o ministro. O ministro
começou a recitar as escrituras e iniciou a cerimônia, mas meus
olhos só se fixaram em Alexander.
Vi Noura no meio da multidão em seu pequeno vestido cremoso
rodado com um sorriso no rostinho. Ela era a florista. Em vez de
correr para mim, ela automaticamente foi até Alexander, agarrando-
se a sua perna. Isso me fez sorrir desta vez. Toda vez que ele
estava perto dela, eu ficava no banco de trás, e não me importava
com isso.
Ela era o nosso pequeno Cupido que nos uniu.
— Papai! — sua vozinha veio.
Morria cada vez que ela dizia isso.
O ministro limpou a garganta, nos dando uma dica de que agora
era hora dos votos.
Alexander e eu nos encaramos.
— Tenho meus próprios votos que gostaria de dizer hoje.
Intrigada, olhei para ele. Ele não tinha me dito isso.
Ele piscou maliciosamente, e eu fiz beicinho em vez disso.
Inclinando-se para mais perto, ele sussurrou em meu ouvido:
— Coloque esses lábios exuberantes para mim novamente, e eu
vou fazer algumas coisas profanas com você esta noite.
Olhei para o fascinante chão de madeira agora.
— Ghislaine... — ele falou em sua voz tentadora.
Meus olhos se ergueram para encontrar os dele, percebendo que
ele havia se afastado.
— Você não é mais uma viúva... E hoje, vou fazer de você minha
esposa no dia do nosso casamento.
Seus olhos estavam cheios de necessidade enquanto olhavam
nos meus. Ele nem tinha começado ainda, e meus olhos já estavam
se enchendo de água.
— Você é minha primeira e única — continuou sua declaração. —
Eu posso não ter sido seu primeiro, mas você é a primeira mulher a
se estabelecer em meu coração, minha alma, meu próprio ser. —
Seu lábio se contraiu. — Você é a única mulher que já ouviu essas
palavras. Você é a única mulher destinada a ser minha esposa. Nós
não nos encontramos nas melhores circunstâncias, mas eu ainda
vou escolher você. Vou pegar você toda de novo. Ty moya sud’ba.
Você é meu destino.
Estendi a mão e enxuguei minhas lágrimas. Meu batimento
cardíaco disparou, e não conseguia me concentrar em mais
ninguém além dele.
— Você me ensinou a falar. — Seus lábios se curvaram em um
pequeno sorriso, e um brilho encheu seus olhos negros. — Você me
ensinou a sentir a dor dos outros. Nunca vou fugir das sombras ao
seu redor. — Nunca desviei o olhar da profundidade de seus olhos.
— Prometo que se chegar a hora, a morte chegará a mim antes de
chegar a você. Lutaria uma guerra por você. — Eu sorri. — Juro que
sempre serei fiel a você. Eu prometo que nunca — ele balançou a
cabeça — lhe darei uma razão para duvidar de mim novamente.
Juro que nunca trairei sua confiança.
Mordi meu lábio inferior trêmulo.
— Você sempre pode confiar em mim com sua felicidade, seus
segredos e sua vida. Em troca, prometo a você: tudo de mim é
dedicado a você — ele olhou para a pequena criatura que ainda
estava agarrada a sua perna — e nossa filha, Noura.
Ele olhou para mim.
Minha respiração me abandonou mais uma vez.
— Hoje, em vez de dizer sim, digo irei fazer — prometeu
Alexander. — Darei a você para sempre porque você me deu a si
mesma, livremente. Ya tvoy. Eu sou seu, krasivaya.
Ele adorava me chamar de bonita.
Eu sorri para o homem que estava na minha frente.
Lembrei-me daquele primeiro beijo que nos uniu.
Um beijo cheio de veneno nunca foi tão doce.
Agora, hoje, enquanto eu falava meus votos para Alexander e me
unia a ele, nossos corações sincronizavam juntos.
Antes que o ministro pudesse dizer “pode beijar a noiva”, seus
lábios famintos já estavam em mim.
Tivemos beijos diferentes ao longo do nosso tempo juntos, mas
agora compartilhamos nosso primeiro beijo de casamento. Uma
declaração oficial de que eu era dele para sempre. Eu sorri no beijo,
mas então ele mordeu meu lábio inferior e eu parei de sorrir.
Seu fogo desafiando o meu.
Todo conto de fadas tinha um final feliz.
Mas, uma vez, o meu terminou em uma tragédia.
Minha história terminou antes que pudesse começar.
Tudo desmoronou, deixando meu mundo despedaçado.
Ainda assim, eu vivi.
Eu tornei a viver.
Eu era a Viúva Adormecida.
Tornei-me a Viúva Negra.
E, hoje, era uma mulher casada.
Tinha morrido mil mortes e voltava cada vez mais forte. Era a
fênix que renascia através de suas cinzas.
Eu me apaixonei por dois homens.
Tão vastamente diferentes um do outro.
Uma vez, estava protegida e segura com um homem que amava.
E agora, voava no céu com o homem com quem estava hoje.
Suas penas negras nas minhas.
Minhas sombras nas dele.
Era seu passarinho.
Governava ao seu lado.
Seu submundo se tornou minha casa.
Não éramos um conto de fadas.
Nosso amor era proibido.
Só saiu na escuridão da noite.
Alexander não era meu príncipe encantado.
Nem era um cavaleiro quebrado…
Era meu cavaleiro mais sombrio.
O destruidor da minha vida.
E ele também era o reparador.
O defensor.
Era o veneno.
E era o antídoto.

A Lock of Death –Livro 2

Uma releitura do conto de fadas Dark Rapunzel.


Eu sou a Número Nove, sirvo ao prazer daqueles que batem à
minha porta.
Era uma vez...
Eu estava trancada em um arranha-céu em Nova York com outras
oito meninas.
Um dia, a Irmandade Bratva vem me buscar.
Dimitri Nikolaev.
Sociopata. Bárbaro. Desumano.
Imagine minha surpresa quando ele disse:
— Você será entregue.
Posfácio

Espero que tenham gostado de ler este romance. Se você gostou,


sinta-se à vontade para deixar um comentário no Goodreads,
Amazon e Bookbub, mesmo que sejam apenas duas palavras.
Adoraria ler seus pensamentos. A série continua em dois livros
independentes.
Esta é a minha nova série da Viúva Negra de personagens de
moral totalmente questionáveis, femininas e masculinas. Hora de
dizer adeus à história angustiante de Alexander e Ghislaine. Essa
história de amor é uma das minhas favoritas com a continuação da
releitura. Este é o meu livro mais grosso até hoje. Em vez de fazer
uma duologia, decidi juntar tudo em um grande livro.
O livro de Dimitri é o próximo. Seu livro se passa simultaneamente
com o de Alexander. Ambas as histórias ocorrem no mesmo período
de tempo, e não após o término de uma. Foi mencionado que ele
estava em uma missão. O próximo livro continua com isso.
Em todos os meus livros, gosto de destacar e explorar
tópicos sensíveis, mas importantes. Cerca de 14.500 a 17.500
pessoas são traficadas para os Estados Unidos a cada ano.
P.S Você tem interesse no livro de Noura, da terceira geração das
crianças? Acho ela adorável, mas sou tendenciosa.
Sinta-se à vontade para me mencionar em seus comentários ou
me enviar seus pensamentos no Instagram/Twitter @beenaxkhan ou
no meu e-mail beenaxkhan@gmail.com
Meu coração explode de alegria lendo suas mensagens.
Até a próxima, leitores.
Beena Khan

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