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Rio de Janeiro
2019
CIP - Catalogação na Publicação
The thesis explores, from a historical and relational perspective, the state's actions
towards the living territories of the poor in Brazilian and South African cities, particularly
the trajectories of policies of urbanização de favelas in Sao Paulo and in-situ upgrading
in Durban from the mid-1970s to the present. The comparison draws on a connection
established between the two cities: the ‘Mentoring on Upgrading Informal Settlements’,
a technical cooperation agreement established with the support of the United Cities
and Local Governments network between 2011 and 2014. Based on the
‘disassembling connections’ method, this partnership was used as a starting point for
the construction of a transescalar analysis, in which the trajectories of urbanização de
favelas in São Paulo and in-situ upgrading in Durban are understood one to another
and vis-à-vis the construction of a global policy paradigm for cities, shaped over
decades of ‘foreign development aid’. This comparative analysis emphasises the role
played at different scales by local political actors and the dispute for political discourses
and projects, both for the cities and the living territories of the poor. It thus contributes
to the construction of a transnational history of the peripheral urbanisms.
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 11
1.1 Em busca de outros urbanismos na periferia ................................................ 11
1.2 Breve apresentação dos municípios de São Paulo e Durban ....................... 16
1.3 Questões para a investigação comparativa e a conexão Mentoring on
Upgrading Informal Settlements ............................................................................ 26
1.4 Desenho da pesquisa, estrutura da tese e metodologia ............................... 31
1.5 Relevância da pesquisa para o campo do planejamento urbano ................. 35
1.6 Conclusão do capítulo ...................................................................................... 38
1 INTRODUÇÃO
1
As outras duas seriam a clarificação de um interesse teórico em uma questão ou tema; e a própria
realização da análise comparativa. Isto porque como tratado no Capítulo 2, para este autor nem toda
investigação comparativa resultaria em uma análise comparativa.
2
Cf. ANJOS, M.P. O urbanismo nas cidades latino-americanas e a cooperação em gestão urbana entre
Brasil e Colômbia. Revista Logos, Ciencia & Tecnología, 2010; SANTORO, P.F. O desfio de planejar e
produzir expansão urbana com qualidade: a experiência colombiana dos planos parciais em Bogotá,
Colômbia. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, 2011; LOMBARDO, M. A.; VOLPE, L.
L.; VASQUES, A. R. Periferia da Zona Sul da Cidade de São Paulo (Brasil) e de Bogotá (Colômbia).
Mercator, Fortaleza, v. 5, n. 10, 65 - 78, 2008; ZUQUIM, M. L.; MAZO, L. M. S. A democracia na
construção de cidade: participação social na política urbana Brasileira e na Colombiana. In XIII
Seminário da Red IberoAmericana de Investigadores sobre Globalización y Territorio (XIII RII). Salvador
(Brasil): Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), 2014.
13
3
Vale mencionar, contudo, um primeiro contato com essa temática por meio da participação em dois
eventos, respectivamente. A Sessão Coordenada pelo Prof. Carlos Vainer no Encontro da ANPUR
ocorrido em 2005 em Salvador (SC2 -Cidade e política urbana na África do Sul Pós-Apartheid) e o
Colóquio Internacional Desafios Urbanos no Brasil e na África do Sul - Construindo uma Agenda para
a Cooperação em Ensino e Pesquisa, realizado em 2007 no Rio de Janeiro.
14
4
Oficina realizada em 05/12/2011 no auditório da Secretaria Estadual de Habitação.
15
2009). De acordo ainda com essa literatura, a comparação far-se-ia cada vez mais
necessária diante da intensidade das trocas e do comparativismo já praticado entre
governos locais (MCFARLANE; ROBINSON, 2012), isto é, da mobilidade das políticas
(MCCANN, 2008; THEODORE; PECK, 2010) e seus processos de adaptação e
mutação em determinados contextos (MCCANN; WARD, 2012).
A formação da cidade de São Paulo remonta ao século XVI, mas por séculos,
essa cidade, cortada pelos rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí, permaneceria como
um pequeno entreposto comercial no interior de uma economia predominantemente
agrária. O crescimento de São Paulo somente passaria a ser significativo a partir da
segunda metade do século XIX, em consequência da produção cafeeira. O maior
índice de crescimento populacional, 5,58% ao ano, será registrado na década de 1950
e está relacionado à industrialização. A partir da década de 1980 o ritmo de
crescimento populacional desacelera, sendo a taxa entre 2010 e 2019 de apenas
0,55% ao ano6.
5
Dados disponibilizados pelo IBGE (2019) em https://www.ibge.gov.br
6
Dados da Fundação SEADE: São Paulo 465 anos. Janeiro 2019 em https://www.seade.gov.br/wp-
content/uploads/2019/01/Municipio_Sao_Paulo.pdf
7
Dados SEMPLA.
17
Fonte: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook
18
Fonte: Elaboração própria a partir de Brazil Sao Paulo location map.svg, CC BY 2.5,
https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=69575581
19
8
Em parceria com o Centro de Estudos da Metrópole (SEHAB/CEM, 2016)
9
Utilizamos aqui o termo adotado pela Prefeitura de São Paulo. Uma discussão sobre os termos
utilizados para classificar os lugares habitados pelos pobres será apresentada no capítulo 3.
10
Dados obtidos a partir de Statistics South Africa. Cf. http://www.statssa.gov.za
21
Fonte: https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook
22
11
Conversas informais com brancos e zulus indicaram que o termo “Zulu” para a tradição oral desse
povo significa “céu” as pessoas dessa etnia acreditam serem superiores às pessoas de outras. Para
um aprofundamento analítico sobre essa questão cf. LEECH, S.M. Twentieth Century Images of the
“Zulu”: selected representations in Historical and Political Discourse. Dissertação (Mestrado em
História). University of South Africa.
12
Ibid.
13
Cf. Local Government: Municipal Structures Act, 1998 (https://www.gov.za/documents/local-
government-municipal-structures-act)
14
Cf. https://www.gov.za/documents/constitution-republic-south-africa-1996-chapter-12-traditional-
leaders
25
15
De início eram seis, e atualmente são oito os municípios metropolitanos: Buffalo City (East London);
City of Cape Town; Ekurhuleni Metropolitan Municipality (East Rand); City of eThekwini (Durban); City
of Johannesburg; Mangaung Municipality (Bloemfontein); Nelson Mandela Metropolitan Municipality
(Port Elizabeth) e City of Tshwane (Pretoria). Cf. https://www.gov.za/about-government/government-
system/local-government
16
http://www.durban.gov.za/City_Government/mayor_council/Council/Pages/EThekwini_Municipal_Are
a.aspx
17
Dados obtidos a partir de Statistics South Africa. Cf. http://www.statssa.gov.za
26
18
Cf. http://www.durban.gov.za/City_Services/housing/Pages/default.aspx
19
Adaptado de Marx e Charlton (2003) a partir de visitas realizadas em 2015 pela autora.
20
‘The Initiative applies practical experiences from São Paulo housing policies to Durban, as the two
cities have been exposed to accelerated urban growth which has led to informal settlements. It also
offers lessons for African cities aiming to move from a delivery approach to integrated solutions’
Disponível em: https://www.metropolis.org/node/967. Acesso em: 21/11/2013.
27
21
https://www.metropolis.org/node/967. Acesso em: 21/11/2013.
22
UCLG Peer Learning 04 mentoring story: Lilongwe & Johannesburg experience (2008-2012) ,
January 13 http://issuu.com/uclgcglu/docs/jb_lilongwestory?e=5168798/1337741
23
O Ministério é formado por dois departamentos, um dedicado à Governança Cooperativa, isto é,
assuntos federativos, e outro aos Assuntos Tradicionais, isto é, tribais.
24
Em Durban, o cargo de City Manager, ou administrador da cidade, é ocupado por alguém diretamente
apontado pelo Prefeito eleito.
28
A CGLU, por sua vez, foi fundada em 2004, a partir da fusão de antigas
associações como a União Internacional de Autoridades Locais (IULA, fundada em
1913) e a Federação Mundial de Cidades Unidas (FMCU, fundada em 1957) e a
incorporação da rede Metropolis (fundada em 1984 e ainda ativa). Em uma nota feita
a pedido da CGLU, que reúne prefeitos e representantes de cidades
independentemente de seu tamanho, Tim Campbell, ex-consultor do Banco Mundial,
apontou que “ao invés de um fornecedor direto, especializado, a CGLU deveria ser
uma instituição de ensino generalista, uma âncora preocupada com o papel geral da
aprendizagem contínua por cidades e suas associações e organizações afiliadas ”
(CAMPBELL, 2012, p.2). Seguindo essa direção, o programa de aconselhamento
25
eThekwini Municipality 2009. Rationale for a Municipal Institute of Learning – Mile: Enhancing Local
Government Capacity: for practitioners, by practitioners. Draft Discussion Document.
http://www.mile.org.za/QuickLinks/Documents/MILE%20Founding%20Document.pdf
26
Como explicitou o entrevistado 13, diretamente envolvido na criação do MILE.
27
Southern African Development Community criada em 1992 com o propósito de “promover o
crescimento econômico sustentável e equitativo e o desenvolvimento socioeconômico, por meio de
sistemas eficientes e produtivos, maior cooperação e integração, boa governança, paz e segurança
duradouras, para que a região surja como um ator competitivo e efetivo nas relações internacionais e
na economia mundial. Na prática funciona como um bloco econômico, com acordos de livre comércio
e de cooperação nas áreas de saúde, agricultura, infraestrutura, erradicação de pobreza, entre outras.
É atualmente formada pelos seguintes Estados-membros: Angola; Botsuana; Comores; República
Democrática do Congo; Eswatini; Lesoto; Madagáscar; Malawi; Maurício; Moçambique; Namíbia;
Seychelles; África do Sul; República Unida da Tanzânia; Zâmbia e Zimbábue. Cf. https://www.sadc.int/
28
eThekwini Municipality 2009. Vide nota 10.
29
entre cidades foi lançado em 2009, sendo anunciado como um dos resultados mais
bem-sucedidos da cooperação estabelecida entre a CGLU e a Aliança de Cidades
(Cities Alliance).
29
Cf. UCLG and Cities Alliance: Working Together to Support Strategic Urban Planning:
https://www.citiesalliance.org/newsroom/news/cities-alliance-news/uclg-and-cities-alliance-working-
together-support-strategic ; e UCLG Peer Learning 04 mentoring story: Lilongwe & Johannesburg
experience (2008-2012) , January 13
http://issuu.com/uclgcglu/docs/jb_lilongwestory?e=5168798/1337741
30
Fonte: Metropolis
30
Como explicitou o entrevistado 13, responsável pela organização do referido evento e pela
coordenação das atividades em Durban no âmbito do acordo de cooperação com São Paulo.
31
de duas cidades periféricas. Nesse sentido, pode ser considerado como uma das
muitas possibilidades de se colocar em prática proposições recentes no campo dos
estudos urbanos comparativos e de construir uma história transnacional dos
urbanismos da periferia. Além disso, contribuiu para evidenciar possíveis sentidos da
mobilização de ideias e modelos de políticas, através de organizações
intergovernamentais e as diferentes formas pelas quais isso tem ocorrido
historicamente e no tempo presente.
31
http://www.citiesalliance.org/About-slum-upgrading#Why_is_slum_upgrading_important
36
urbanização de favelas são muito complexas32 e, por isso, acabam sendo geralmente
analisadas através de estudos de casos restritos a uma cidade ou à política nacional
de um país. Já as publicações que reúnem um grande número de experiências e
localidades, não se detêm em análises comparativas33.
A presente tese procura contribuir para preencher essa lacuna. A pesquisa aqui
apresentada busca dialogar com estudos que de algum modo analisaram as
imbricações entre as experiências brasileiras de urbanização de favelas, a circulação
de ideias sobre este tema e a atuação das organizações internacionais (ROSSETTO,
1993; WERNA, 1996; DENALDI, 2003; SILVA JUNIOR, 2006; BITTENCOURT, 2018).
Baseando-se em um senso relacional de espaço, argumenta-se que o exame de
interconexões sobre a urbanização de favelas pode ser uma maneira competente de
submeter relacionalmente a esfera global e local de elaboração de políticas ao
escrutínio analítico. O objetivo com esse esforço é duplo: primeiro, explorar o que
McCann e Ward (2010) chamaram de tensão aparente ou o conjunto necessário do
que está "em movimento" e do que está "encravado no lugar"; e segundo, levando
adiante as proposições de Robinson (2016), "pensar com as interconexões e as
diferenças", examinando assim as convergências e diferenciações de políticas de
urbanização de favelas em diferentes instâncias.
32
São projetos que exigem nos governos locais a existência de equipes especializadas (de
engenheiros, arquitetos, urbanistas, assistentes sociais e advogados), demoram muito para serem
executados, marcados por mudanças demográficas e não raros conflitos sociais, envolvem intricadas
questões ambientais e geotécnicas, e são completamente dependentes de outras legislações locais e
nacionais sobre a regulação da terra, construção e meio ambiente.
33
Vale mencionar algumas exceções: Huchzermeyer (2004), Minnery et al. (2013) e Muchadenyika e
Waiswa (2018) são bons exemplos.
37
34
Esses rankings de cidades são informados por outros há muito feitos por corporações privadas para
informar processos decisórios sobre onde, por exemplo, instalar escritórios regionais, fábricas e etc
como mostra a literatura da economia regional, a qual, no entanto, não será analisada nesta tese.
40
35
Citado em CATANI, A.M. As possibilidades analíticas da noção de campo social. Educ. Soc.,
Campinas, v. 32, n. 114, p. 189-202, 2011.
42
36
Alguns elementos metodológicos discutidos são a equivalência funcional entre unidades
comparáveis, o modo como similaridades e diferenças são teorizadas e a definição de causalidade.
43
Com relação aos modelos explicativos, Walton (1981, p.24) indica, em sua
revisão sobre os estudos urbanos comparativos, que o campo poderia ser analisado
de acordo com quatro diferentes abordagens teóricas sobre o urbano: a cidade como
um sistema de mercado, a cidade como mecanismo de integração social, a cidade
como um centro de pluralismo social e, a partir dos anos 1970, a cidade como causa
e consequência do desenvolvimento. A seguir, serão brevemente detalhados os
44
37
As teorias da modernização desenvolvidas neste contexto terão importantes implicações para o
desenvolvimento de políticas voltadas para os países que se intensificam a partir dos anos 1960. Será
então sob influência desta lógica que as primeiras ações de desenvolvimento urbano do Banco Mundial
serão criadas, a partir dos anos 1970. Esse tópico será melhor tratado no capítulo 4.
38
Walton (1981) destaca no interior dessa abordagem o estudo realizado por Goldrich et al. (1970), o
qual compara a integração política de assentamentos urbanos de classe baixa em Santiago e Lima.
45
Esse debate que teve início, nos Estados Unidos, com os estudos de Floyd
Hunter sustentando que a cidade seria permanentemente dominada por um grupo
limitado de atores políticos, e de C. Wright Mills, para quem o poder da elite derivava
da posição social ocupada por seus integrantes em uma sociedade desigual, ganhou
proeminência com a contraposição de Robert Dahl insistindo que o poder político
dependia da capacidade de grupos de interesses plurais, constituídos no interior de
uma economia de mercado e governo democrático, em se fazerem prevalecer na
formação de governos e políticas e, portanto, coalizões estáveis poderiam se dissolver
com o tempo (MARQUES, 2017). Essa abordagem foi responsável por uma grande
produção de estudos comparativos entre cidades (WARD, 2008).
Em primeiro lugar, Goldrich e seus colegas observaram que a integração das comunidades, em ambas
as cidades, variava ao longo do tempo e declinava a medida em que os assentamentos se tornavam
mais permanentes e os seus habitantes se sentiam menos ameaçados pela falta de ou remoção de
serviços. Em segundo lugar, observaram diferenças nacionais: Santiago se tornara mais integrada que
Lima por conta de posições mais favoráveis dos santiaguenhos em relação ao regime politico da época.
Concluem que, ao contrário de muito da teoria à época, a integração comunitária seria um processo
descontínuo e afetado pela severidade das sanções políticas contra a organização.
39
Um exemplo interessante dentro dessa abordagem é o de Leeds e Leeds (1976), que trata das
diferenças contextuais nacionais e urbanas no comportamento político de “invasores” no Brasil, no
Chile e no Peru. O ponto central do estudo é que a natureza da organização política e da estratégia
empregada pelos pobres depende tanto de suas necessidades quanto das estruturas de oportunidade
que lhes são apresentadas pelos sistemas políticos urbanos e nacionais. Esses sistemas variam entre
países em termos de estruturas partidárias e burocráticas, mecanismos institucionais de cooperação
ou cooptação e repressão. Os “invasores”, portanto, organizam-se instrumentalmente de formas
variadas, porém previsíveis, em resposta a esses mecanismos de poder. Acordos clientelistas são por
vezes a única alternativa factível para os pobres, mas o estudo mostra que essas formas de
organização, ainda que organizadas de modo variado, acabaram sendo bem-sucedidas em todos os
países analisados.
46
40
A expressão “Terceiro Mundo” foi criada em 1952 pelo demógrafo francês Alfred Sauvy (em alusão
ao Terceiro Estado da época da Revolução Francesa) e ganhou notoriedade no bojo da Conferência
de Bandung, realizada em 1955 na Indonésia, onde estiveram reunidos 29 líderes de Estados
independentes para discutir solidariedade à África e Ásia, oposição ao colonialismo e às politicas de
guerra fria dos EUA e União Soviética, e buscar formas de cooperação econômica e cultural uns com
os outros (BISSIO, 2015). O Terceiro Mundo reunia um conjunto de nações muito distintas, de limitado
nível de desenvolvimento econômico, e que possuíam em comum o fato de haverem constituído a
periferia colonial ou semicolonial (VISENTINI, 2015). Para Mignolo (2017), a reunião desses países
47
44
Referência à CEPAL, Comissão Econômica para a América Latina foi criada pela Organização das
Nações Unidas em 1948, com sede na cidade de Santiago (Chile).
49
guerra” (GORELIK, 2005, p.117), é enorme. Nos Estados Unidos, em 1974, é iniciado
o Comparative Urban Studies Program na Universidade de Northwestern, em
Chicago, sob o comando de Janet Abu-Lughod, seguindo o então já existente
Comparative Urban Studies and Planning Program, dirigido por John Friedmann na
Universidade da Califórnia. Na Inglaterra, o programa de arquitetura tropical iniciado,
na década de 1950, por Otto Koenigsberger na Architectural Association, em Londres,
é transformado em um curso de planejamento para o desenvolvimento incorporado
pela University College London em 1971, onde foi criado o Development Planning
Unit, que terá no seu corpo docente nomes como John F. C. Turner e Alan Gilbert,
citados em diferentes momentos ao longo desta tese. Como se verá no capítulo 4, a
academia norte-americana e europeia terá um papel bastante ativo na expansão da
“ajuda externa” voltada ao “desenvolvimento urbano” dos países do “Terceiro Mundo”.
45
Ainda sobre a importância de condições causais combinadas nas metodologias comparativas cf.
Ragin, C. Core versus tangential assumptions in comparative research. Studies in Comparative
50
premissa adotada pelos estudiosos que, a partir dos anos 2000, passaram a defender
uma abordagem da cidade como produto de múltiplas relações em diferentes escalas,
como examinado a seguir.
Uma nova abordagem aplicada aos estudos urbanos ganha força no contexto
de uma longa revisão crítica que passa ser feita, a partir dos anos 1980, em diferentes
lugares e idiomas, quanto à ênfase excessiva colocada sobre as forças estruturais do
capitalismo ou da globalização, e às explicações generalizantes dos fenômenos
urbanos. A revisão apresentada a seguir, no entanto, limita-se à literatura mais
diretamente utilizada para a construção do método comparativo utilizado nesta tese.
International Development 40.1, 33-38, 2005; e Ragin, C. How to lure analytical social science out of
the doldrums: some lessons from comparative research. International Sociology 21.5, 633-46, 2006.
46
Outra interessante sistematização sobre os diferentes paradigmas de interpretação das cidades,
menos centrada no uso da comparação, foi organizada por Farret (1985).
51
É no interior desse debate que começa a ser delineada uma cisão nos estudos
urbanos (e por extensão nos estudos urbanos comparativos). Uma cisão entre os
estudos centrados no desenvolvimento econômico mundial como fator explicativo
chave para a análise urbana e aqueles voltados para a análise de aspectos
relacionados à consciência cultural, localidade e diferença, à constituição do sujeito,
a considerações de gênero e etnicidade. Nas palavras de Massey (2013):
Angeles, muito em voga nos anos 1980 e 1990. Mais um caso de "projeção
metodológica" (CONNELL, 2007), no qual dados das cidades na periferia seriam
enquadrados segundo conceitos, debates e estratégias de pesquisa da metrópole,
sem referência ao pensamento social da periferia.
redes para além da extensão física das cidades (MASSEY, 1993; ROBINSON, 2006).
Por fim, a relação estabelecida entre causas e efeito também deveria ser vista como
contingente, evitando-se que leis e teorias fossem construídas a partir de resultados
empíricos de certas cidades. Um entendimento que se aproxima da argumentação de
Pickvance (2001) em torno da causalidade múltipla dos processos.
47
Concepção relacional da produção do espaço (ou espaço/ tempo) que recusa a separação
convencional do espaço e do tempo. Cf. Lefebvre, H. (1991 [1974]) The Production of Space. Malden,
MA: Blackwell.
55
Essa perspectiva centrada nas maneiras pelas quais as cidades habitam umas
às outras, menos por relações topográficas, e mais por processos experimentais e
imaginativos que as aproximam ou distanciam, seria dada à observação de
espacialidades topológicas (ALLEN, 2008). Assim, diferentes formas de poder,
operando através e por toda a configuração do espaço, explicariam como pessoas e
atividades em lugares distantes são aproximadas, por meio da circulação e adaptação
de práticas modelos, por exemplo, e como fenômenos próximos são por vezes
"mantidos à distância".
crítica de Castells (1976) à falta de coesão dos estudos urbanos até a década de 1970
abre espaço para o desenvolvimento do paradigma da economia política, a crítica de
Ward (2008, p. 30), trinta anos depois, aos estudos urbanos comparativos – “um corpo
de trabalho que tem lutado com questões de identidade organizacional, coerência
teórica e integridade metodológica” – busca pavimentar o caminho para a produção
de estudos comparativos “mais imaginativos e justos da diversidade das cidades”,
explicitamente defendendo o engajamento dos geógrafos nesse processo (WARD,
2008, p. 35).
Nesse sentido, este capítulo contribui para explicitar a luta existente entre as
diferentes abordagens do fenômeno urbano e o uso da comparação. Afinal, como
observou Bourdieu (1989, 2002), o campo intelectual é um espaço, relativamente
autônomo, onde os intelectuais lutam, individual ou coletivamente, para impor sua
visão, pelo monopólio da produção cultural legítima, de acordo com sua posição
ocupada no campo, a qual pretendem transformar ou conservar. Sendo o campo dos
estudos urbanos um campo formado por múltiplas disciplinas, há neste uma disputa
entre distintas “categorias de interesse”.
48
O autor se refere a essas hierarquizações entre Norte e Sul como reflexo de uma longa história de
"categorização geográfica global", nascida no interior do colonialismo europeu, e passando pelas
categorizações Primeiro, Segundo e Terceiro Mundo no contexto da Guerra Fria (McFarlane, 2010, p.
728).
57
deve ser utilizada como um aprendizado ético-político por meio de diferentes culturas
teóricas, da incorporação de uma “corrente de traduções”49 e da consideração do
papel de um conjunto de atores institucionais, desde publicações a formas e padrões
de citações, modos de escrita e disseminação que co-constituem as culturas teóricas.
Isso comprovaria que a pesquisa comparativa nunca é neutra, ao contrário, pode ser
reveladora das relações epistêmicas e institucionalizadas de poder entre
comunidades acadêmicas e não acadêmicas pertencentes a diferentes culturas de
produção de conhecimento.
49
McFarlane (2010, p. 733-734) se refere ao conceito de tradução de Bruno Latour, para quem o
conhecimento seria produzido por meio de uma "corrente de traduções" de modo que ao invés de focar
na questão de se o conhecimento se manteve o mesmo ou não, a tradução leva a atenção para as
múltiplas formas e efeitos do conhecimento. O conceito de "tradução", ainda segundo este autor,
também encontraria ecos nos estudos de Edward Said e seu conceito de "travelling theory", segundo
os quais, interpretações equivocadas seriam parte de uma transferência histórica de ideias e teorias de
um lugar para outro.
50
Robinson, J. Cities in a World of Cities: traces of elsewhere in the making of city futures. Vídeo.
Disponível em: https://www.futureofcities.ox.ac.uk/video/ Acesso em: 10/01/2014.
58
51
A autora cita a seguinte passagem da obra A produção do Espaço de Lefebvre, a qual considera-se
relevante de ser aqui reproduzida: “como poderíamos chegar a compreender (...) a gênese do presente,
59
2016).
A opção por explorar uma conexão entre essas cidades foi vista como uma
maneira interessante para a construção da comparação e o entendimento da
urbanização numa escala mais global (WARD, 2010; ROBINSON, 2016, 2018). Parte-
se, portanto, da hipótese de que as conexões têm o potencial de trazer uma variedade
de fenômenos e processos à vista, desde formas socioespaciais e acordos políticos
locais até alianças em outras escalas.
juntamente com as precondições e processos envolvidos, a não ser partindo desse presente,
trabalhando de volta ao passado e, em seguida, refazendo nossos passos? (Lefebvre, 1991 apud
HART, 2016, p. 7, ênfase no original, tradução nossa)
60
remonta aos colonialismos (KING, 1980, 2003, 2004). O estudo desses fluxos durante
e após a era colonial, em diferentes países, e suas formas variadas de “imposição” e
“empréstimo” (WARD, 2000) têm sido há muito tratados tanto pela história urbana
(SUTCLIFFE, 1981; HALL, 1988; NARS E VOLAIT, 2003; HEALEY, 2013; HARRIS E
MOORE, 2013) quanto pela história transnacional (HIETALA, 1987; SAUNIER, 2002;
CLARKE, 2012).
empregada nas análises de políticas e planejamento não apenas retrata, mas também
constrói os problemas em questão” (FISHER e FORESTER, 1993, p. 1). Para os
autores, a “retórica institucionalmente disciplinada da política e do planejamento”
(FISHER e FORESTER, 1993, p. 2) influencia não só a seleção dos problemas a
serem analisados, como também sua própria análise, a definição de ações
institucionais, o acesso e entendimento que o público tem desses problemas, e
merece, portanto, ser investigada.
de uma cidade. Para o autor, não seria a realidade urbana a impor diretamente
inovações lexicais, mas uma tensão nos sistemas classificatórios que atribuem
valores aos espaços da cidade. A existência dessa tensão traria uma nova
necessidade de nomeação dos espaços. É por isso que, para Topalov (2017), o
estudo do processo de nomeação de uma categoria de espaços não deveria se
restringir à etimologia de uma palavra ou um termo, mas incluir a análise das variações
de seu uso com destaque para os atores que o utilizam.
A análise dos registros do próprio Vaux indica slum como sinônimo de quarto,
sendo a palavra também utilizada para classificar alguns atos relacionados a fraudes
52
Sobre diferentes processos de nomeação de classificações urbanas, ver Topalov, C. et al. L’Aventure
des mots de la ville. Paris: R. Laffont (Bouquins), 2010. Este livro é resultado da pesquisa internacional
Les mots de la ville, a qual teve por objetivo documentar as variações de significado, através dos
tempos, espaços e idiomas, das palavras comumente usadas para descrever a cidade e seus
elementos.
53
“1. A room. Obsolete; 2. a. A street, alley, court, etc., situated in a crowded district of a town or city
and inhabited by people of a low class or by the very poor; a number of these streets or courts forming
a thickly populated neighbourhood or district where the houses and the conditions of life are of a squalid
and wretched character”. "slum, n.1." OED Online, Oxford University Press, August 2018,
www.oed.com/view/Entry/182267. Accesso em 27/08/2018.
68
54
AREA SNEAK, or AREA SLUM: the practice of slipping unperceived down the areas of private houses,
and robbing the lower apartments of plate or other articles. LODGING-SLUM: the practice of hiring ready
furnished lodgings, and stripping them of the plate, linen, and other valuables. O completo vocabulário
escrito por Vaux pode ser acessado na página do projeto australiano Gutenberg, criado a partir das
edições impressas de obras de domínio público na Austrália. Disponível em:
http://gutenberg.net.au/ebooks06/0600111.txt. Acesso em: 02/08/2018.
55
Close under the Abbey of Westminster there lie concealed labyrinths of lanes and courts, and alleys
and slums, nests of ignorance, vice, depravity, and crime, as well as of squalor, wretchedness, and
disease; whose atmosphere is typhus, whose ventilation is cholera; in which swarms of huge and almost
countless population, nominally at least, Catholic; haunts of filth, which no sewage committee can reach
– dark corners, which no lighting board can brighten. Passagem citada em The Devils Acre, disponível
em: www.choleraandthethames.co.uk. Acesso em 15/07/2018. Tradução nossa.
69
56
Ambas citadas em Sayers (2017:32) e atribuídas, respectivamente, a Westmacott, The English Spy,
II. 32. The Athenæum from January 18, 1845: “In the thick of the once renowned ‘slums” of St. Giles’s”,
e Dickens, letter of April 3, 1851, in The Letters of Charles Dickens, VI. 345.
57
As primeiras traduções da referida obra para o inglês datam de 1887 em Nova Iorque e 1891 em
Londres.
70
Foi o termo slum, contudo, que apareceu na primeira pesquisa científica sobre
a vida nos cortiços norte-americanos, The Slums of Baltimore, Chicago, New York,
and Philadelphia, publicada em 1894. Nesta pesquisa, slum é definida como “uma
área de becos e ruelas sujas, principalmente quando habitada por uma população
miserável e criminosa” (DAVIS, 2006, p. 33). A palavra slum, portanto, tanto na
Inglaterra quanto nos Estados Unidos, tinha um valor pejorativo de cunho moral e
estigmatizante.
Não tardaria para que novos termos surgissem no bojo de leis autorizativas de
58
Tradução nossa do original em inglês: “a hovel of about ten feet by eight, made somewhat in the form
of an ordinary cow-house, having but a half roof, or roof on one side. It is however inclosed on all sides”
(GOFF ,2016, p. 23).
59
Traduão nossa da citação: “a house materially unfit for human habitation” (DEPAULE e TOPALOV,
1996, p. 9).
71
60
Com o intuito de combater o sensacionalismo com que a pobreza e as slums eram tratadas pela
imprensa à sua época e em reação à natureza insatisfatória dos censos existentes, Charles Booth
coordenou uma investigação sobre a condição dos trabalhadores em Londres, realizada de 1886 a
1903. Publicada sob o título Life and Labour of the People in London, incluía mapas das ruas de
Londres, coloridos segundo os níveis de pobreza e riqueza. Cf. https://booth.lse.ac.uk
72
61
Descendentes dos colonos fazendeiros de origem holandesa e francesa, também denominados
bôeres, que chegaram à região em meados do século XVII.
62
Utilizarei o terno africano para me referir à população nativa. A literatura sul-africana pesquisada e
citada ao longo da tese utiliza os termos Africans, black people e black population para se referir aos
nativos. O termo nativo é amplamente evitado, provavelmente por ter sido adotado mais de uma vez
pelos colonizadores em medidas segregacionistas como o Natives (Urban Areas) Act de 1923. Antes
disso há referências oficiais há uma “native menace” (South Africa, 1921 apud PARNELL, 1988).
73
63
Código Caledon de 1809: sistema de escravidão compulsória pelo qual era obrigatório o
estabelecimento de um contrato de trabalho que previa severas punições para o trabalhador que
resolvesse mudar de emprego. Em 1843 foi estabelecido o Master and Servant Act, que qualificava
como crime a rescisão do contrato de trabalho.
64
Um grupo de bôeres se rebelaram contra o domínio britânico no Cabo nos anos 1830 e partiram para
a criação de novos Estados no interior, onde eles poderiam ser livres da dominação britânica que então
se resumia às colônias do Cabo e Natal. Fundaram o Estado Livre de Orange em 1842 e Transvaal
(terra para além do Rio Vaal) em 1852, o qual autoproclamou-se República Sul-Africana em 1857. Ao
final da Segunda Guerra dos Bôeres, ambos os Estados foram anexados às colônias britânicas.
74
Natives Land Act, segundo o qual aos nativos não era mais permitido a compra de
terras fora das áreas designadas como “reservas” (territórios que foram sub-divididos
segundo grupos étnicos e batizados de homelands65 durante o apartheid). Como
resultado desse ato (reforçado em 1936), a terra agricultável e produtiva, 87% do
território sul-africano, ficava restrita aos brancos e, assim, as áreas “reservadas” aos
africanos, apesar de rurais, eram extremamente densas e muito pobres (WHYTE,
1995).
65
Passaram a ser popularmente conhecidas como bantustões, termo geralmente usado ironicamente
pelos inimigos do regime do apartheid (PEREIRA, 2012: 83).
75
66
Originariamente termo utilizado para se referir às áreas rigidamente controladas e cercadas
destinadas a abrigar homens trabalhadores das minas de diamante e, posteriormente de ouro.
67
Rookery, literalmente, significa ninho de gralhas. Passou a ser utilizado, na Inglaterra do século XIX,
para designar as áreas densamente ocupadas por casas de baixa qualidade no interior das slum areas.
O termo popularizou-se com a obra Oliver Twist, publicada por Charles Dickens em 1838.
68
Apesar da justificativa higienista, tanto na Cidade do Cabo como em Joanesburgo, locations foram
estabelecidas em áreas destinadas ao lançamento de esgotos.
76
Act foi aprovado em 1904, o qual permitia que a autoridade local transferisse os
trabalhadores africanos para locations fora da cidade. Os recursos para a implantação
das locations eram provenientes da produção e venda de cervejas artesanais entre
os próprios africanos, uma vez que essa, a partir do Native Beer Act de 1908, passava
a ser monopólio da autoridade local. Uma combinação que ficou conhecida como
Durban System.
69
Antes da virada do século XX, Joanesburgo já apresentava áreas que poderiam ser consideradas
locations, embora não denominadas como tal, onde viviam africanos e indianos que trabalhavam nas
minas ou no crescente centro industrial da cidade. Quando a peste bubônica se alastrou, em 1904, em
direção a location Coolie (que apesar do nome era majoritariamente ocupada pela população negra),
uma nova localidade, Klipspruit, a 20 km do centro, foi estabelecida para a transferência daquela
população. Após inúmeras reclamações dos patrões brancos a respeito dos prejuízos decorrentes da
distância em que os separava de sua força de trabalho, novas locations surgiram mais próximas à
cidade (BEAVON, 1982, p. 10-11).
70
Sophiatown, Alexandra e algumas partes de Soweto são exemplos de áreas que tiveram origem na
forma desses subúrbios antes do estabelecimento do Natives Land Act.
71
Uma descrição física e socioeconômica detalhada de um slumyard em Joanesburgo pode ser
encontrada em: Hellmann, E. Native Life in a Johannesburg Slum Yard. Africa: Journal of the
International African Institute, Vol. 8, No. 1, Jan. 1935, 34-62.
77
época, como o Public Health Act de 1919, o Housing Act de 1920 e o Slums Act de
193472, serviu para o fortalecimento da segregação racial pré-existente (PARNELL,
1993). Segregação racial que será indubitavelmente estabelecida com a promulgação
pelo governo central do Native (Urban Areas) Act em 1923, o qual dividia a África do
Sul em áreas rurais (non-proclaimed areas) e urbanas (proclaimed areas [of the city]).
Essas medidas definiram controle estrito do movimento de homens africanos entre
essas áreas, ficando cada autoridade local responsável não só pelo fluxo da
população negra como também pela remoção dos “excedentes”, isto é, aqueles
desempregados. Os únicos africanos permitidos a viver na cidade eram os
trabalhadores domésticos.
72
O Public Health Act estendeu o poder de regulação da autoridade local sobre a densidade urbana,
conferindo-lhe o poder de prevenir a superlotação de edifícios, condenar e demolir imóveis insalubres.
O Housing Act, publicado em seguida, disponibilizava recursos aos governos locais para a construção
de casas para os pobres. Contudo, exigia que os empreendimentos fossem racialmente segregados,
separados um do outro por espaços abertos e com vias de acesso diferentes. Finalmente o Slums Act
autorizava a demolição das slums e a remoção forçada da população negra para fora das cidades.
78
Notas do original (em inglês, tradução nossa): os dados de urbanização para 1980, 1985 e 1991 não
foram derivados dos próprios censos, mas são interpolações. Isto porque nesses censos foram
excluídas partes do país correspondentes às antigas homelands do Transkei, Bophuthatswana e Venda
(1980, 1985 e 1991) e também Ciskei (1985 e 1991). Os valores para 2001 são estimativas. Fonte:
Statistics South Africa. Migration and Urbanisation in South Africa. Pretoria: Statistics South Africa,
2006, p.22 (Disponível em: http://www.statssa.gov.za/publications/Report-03-04-02/Report-03-04-
02.pdf Acesso em 28/03/2019)
79
O Group Areas Act, pela primeira vez, estendia a segregação compulsória, pelo
menos potencialmente, aos mestiços, além de centralizar o controle sobre a
segregação racial como um todo, efetivamente reduzindo a autonomia local. Colocava
ainda as bases para o planejamento de longo alcance de alocação de terras em larga
escala, abrindo caminho para a expansão da provisão pública de habitação,
especialmente para os pobres, ainda que de modo estritamente segregado (MABIN,
1992, p. 407). Com o Group Areas Act multiplicam-se, portanto, as townships.
73 o
Ato n 30 de 1950, Population Registration Act: "pessoa branca" designa uma pessoa que na
aparência obviamente o é ou que geralmente é aceita como pessoa branca, mas não inclui uma pessoa
que, embora na aparência seja obviamente uma pessoa branca, seja geralmente aceita como uma
pessoa mestiça ”; "nativo" designa uma pessoa que de fato o é ou que geralmente é aceita como
membro de qualquer raça ou tribo aborígene da África ”; "pessoa mestiça" designa uma pessoa que
não é branca ou "nativa". Disponível em:
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/9/90/Population_Registration_Act_1950.pdf. Acesso
em: 01/08/2018. Tradução nossa.
80
planejadores do Estado optaram então por uma estratégia mais agressiva, baseada
na remoção forçada da população. A fórmula baseada na provisão habitacional em
massa nas townships, de um lado, e na destruição de shack settlements, de outro,
que sustentou a implementação do grande apartheid nas cidades foi viabilizada pelas
altas taxas de crescimento econômico dos anos 1950 e 1960 (MABIN e SMIT, 1997,
p. 206).
Fontes (da esquerda para direita): Martin West Collection, UCT Libraries Digital Collections e Van der
Waal Collection, University of Pretoria, Merensky Library.
74 2
Como ficaram popularmente conhecidas as casas de 40m construídas pelo governo durante o
regime do apartheid feitas de material barato e sem eletricidade até os anos 1980 (BOND, 2012).
82
Act, mais conhecido como “controle de influxo” ou “lei do passe”, foi aprovado e
obrigava que todos os africanos com idade superior a 16 anos em todas as províncias
carregassem seu “passe” o tempo inteiro. O “passe” incluía detalhes do lugar de
origem, histórico dos empregos, pagamentos de taxas e passagens pela polícia.
Em Cato Manor, Durban, por exemplo, o conjunto dessas leis somado aos
anseios dos governantes locais em proteger a população branca resultariam na
remoção forçada não apenas dos negros africanos, mas também dos indianos, e
dentre estes últimos, inclusive aqueles que eram proprietários de suas terras. A
população removida foi reassentada nas townships: Chatsworth, a cerca de 20km de
Cato Manor, foi o destino dos indianos e em KwaMashu e Umlazi, ainda mais
distantes, foram reassentados os negros africanos. Em meados da década de 1960,
a área já estava praticamente vazia e assim permaneceria por cerca de duas décadas
(HINDSON, BYERLEY e MORRIS, 1993; EDWARDS, 1994).
reforçou com o confinamento dos negros nas periferias urbanas (MABIN, 1992).
É também por squatter settlement, assim como shanty town e shack settlement,
que os “moradores de barracos” (do zulu abahlali basemjondolo; do inglês shack
dwellers) se referem aos seus locais de moradia75, frequentemente sujeitos a
remoções forçadas. Umjondolo (imijondolo no plural) é o correspondente no idioma
zulu para shack. Acredita-se que tenha se derivado do rótulo “John Deer” contido em
painéis de madeira provenientes de contêineres utilizados para transportar esses
tratores e que, uma vez descartados, passaram a ser utilizados por trabalhadores
portuários na construção de shacks na década de 1970.
75
Constatação a partir de visitas e conversas como moradores sul-africanos, confirmada em pesquisa
na página eletrônica do movimento Abahlali BaseMjondolo (http://abahlali.org)
87
No fim do século XIX, em duas das principais cidades do país, a capital Rio de
Janeiro e o principal centro econômico São Paulo, os territórios ocupados pelos
pobres e negros também foram alvo de estigmatização. No Rio, onde a população
negra era maior, a violência das transformações urbanas também o foi. Em meados
do século XIX, quando o tráfico de escravos passa a ser proibido no Brasil, cerca de
um terço da população de São Paulo era composta por escravos, enquanto no Rio de
Janeiro, os escravos representavam cerca de metade da população (ROLNIK, 1989).
76
Os dados sobre cor foram sistematizados a partir de
https://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?no=10&op=0&vcodigo=POP106&t=populacao-
presente-residente-cor-raca-dados. Os dados sobre total de imigrantes foram sistematizados a partir
de https://brasil500anos.ibge.gov.br/estatisticas-do-povoamento/imigracao-total-periodos-anuais.html
89
habitantes (Vaz, 1994 apud QUEIROZ FILHO, 2011, p.34). Esse intenso crescimento
demográfico foi, em parte, consequência da abolição da escravidão, que levou um
grande número de escravos negros libertos a migraram das fazendas de café,
localizadas no interior da província fluminense, em direção à cidade (PEARLMAN,
2010; ROLNIK, 1989).
77
Everardo Backheuser, engenheiro civil, foi escolhido em 1905, durante a reforma urbana de Pereira
Passos, para redigir a parte técnico-sanitária do parecer sobre o problema das habitações populares,
encomendado pelo então ministro da Justiça e Negócios Interiores J.J. Seabra (VALLADARES, 2010)
90
78
Confronto entre o Exército Brasileiro e a comunidade de Canudos no interior do estado da Bahia
liderado por Antônio Conselheiro, quem pregava a salvação “milagrosa” dos habitantes desta
comunidade, assolados pela pobreza resultante das secas cíclicas e da concentração de terras na
forma dos latifúndios.
91
estigmatização dos territórios habitados pelos pobres nas cidades, de modo muito
similar àquela conferida às slums e aos slumyards, nas cidades sul-africanas.
reconhecimento jurídico das favelas, importante para que fossem atacadas com ainda
mais eficiência, viria com o código de obras de 1937, o qual proibiu a construção de
novas favelas, assim como o uso de material de construção permanente para a
expansão das comunidades existentes (VALLADARES, 2010; PEARLMAN, 2010). Ao
longo da década seguinte, o debate político-administrativo condenou firmemente as
favelas cariocas, associando-as a uma patologia espacial, mas também social. A
estigmatização dos “favelados” é reforçada pelas assistentes sociais do governo
Vargas, sendo as retaliações a eles dirigidas estendidas a todos os pobres da época
(VALLADARES, 2010).
79
A Fundação Leão XIII foi criada ainda em 1946 pela Arquidiocese do Rio de Janeiro. Entre 1947 e
1954, ela estendeu sua atuação a 34 favelas, implantando em algumas delas serviços básicos como
água, saneamento, luz e redes viárias e mantendo centros sociais em oito das maiores favelas da
cidade na época. Em 1955, a Igreja Católica cria a Cruzada São Sebastião, que, entre 1956 e 1960,
realiza melhorias de serviços básicos em doze favelas, além de construir o conjunto habitacional que
ficaria conhecido como Cruzada, localizado no bairro do Leblon (BURGOS, 1998, p.28 et seq).
80
Os levantamentos oficiais realizados à época pelo IBGE, criado em 1938, restringiam-se às favelas
cariocas. Em 1950, o IBGE incluiu as favelas do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, na contagem
93
o uso de termos como favela e favelado no Rio de Janeiro refletiam enormes tensões.
de população, o que resultou na publicação, em 1953, do documento: “As favelas do Distrito Federal”
(PASTERNAK; D’OTTAVIANO, 2016).
81
Com a mudança do distrito federal para Brasília, o território correspondente ao atual município do
Rio de Janeiro passou a constituir o Estado da Guanabara, que foi extinto em 1975 e fundido ao Estado
do Rio de Janeiro.
82
Movimento criado em 1942 na França foi, segundo depoimento de Lícia Valladares (AMÉRICO e
FREIRE, 2008, p.178) o responsável por transformar a imagem negativa dos cortiços (taudis) naquele
país, mostrando que tinham uma “funcionalidade” que seus moradores eram “pessoas trabalhadoras”
e formavam uma “comunidade”.
94
83
Cf. Valladares, 1978.
95
84
Além do conjunto Vila Kennedy, foram construídos os conjuntos Vila Aliança e Vila Esperança
(CARDOSO, 2007)
85
United States Agency for International Development, criada em novembro de 1961 pelo então
Presidente J. F. Kennedy com o objetivo de centralizar diferentes programas e organizações de “ajuda
externa”, entre eles a Aliança para o Progresso, e dinamizar a promoção do “desenvolvimento social e
econômico”. Cf. https://www.usaid.gov/who-we-are/usaid-history
96
Foi em meio a esse debate, característico da virada dos anos 1960 para os
anos 1970, que as favelas na cidade de São Paulo começaram a crescer. As favelas
existiam em São Paulo desde os anos 1940 (PASTERNAK, 2001), mas eram poucas
e não muito grandes. Até o final dos anos 1970, a principal alternativa habitacional
para os pobres urbanos em São Paulo estava nos loteamentos periféricos.
86
Santos (1980, p.31) critica o uso do termo “autoconstrução”. O autor destaca que apesar das casas
serem construídas com recursos dos próprios moradores, resultavam de diferentes tipos de contratos,
parciais e totais, de mão-de-obra, de diversas qualificações. Ele aponta ainda para a existência de
pequenas empresas que atuavam nesse tipo de loteamentos.
98
Vale destacar aqui, porém, que essa institucionalização trouxe à tona mais um
termo, supostamente também imbuído de neutralidade técnica: assentamentos
precários. O uso dessa denominação se consolida nas décadas seguintes,
principalmente após o lançamento, em 2004, da nova Política Nacional de Habitação,
a qual passou a incluir um componente para a “integração urbana de assentamentos
precários”. Assentamentos precários passaram a englobar as “diversas tipologias
habitacionais” que têm em comum “a precariedade das condições de moradia e sua
origem histórica”, ou seja, todas as situações de inadequação habitacional e de
irregularidade urbanística e fundiária existentes em cortiços, favelas, loteamentos
irregulares de baixa renda e conjuntos habitacionais degradados (MINISTÉRIO DAS
CIDADES, ALIANÇA DE CIDADES, 2009, p. 80).
87
Discussões do Seminário de Habitação e Reforma Urbana (1963) geraram o termo “habitações
subnormais”, que figurou em anteprojeto de lei que resultou no projeto de lei nº 87, de 1963 (BONDUKI
e KOURY, 2010).
88
https://censo2010.ibge.gov.br/materiais/guia-do-censo/glossario.html
100
prática para analisar as diferenças históricas embutidas em termos como favela, slum,
shanty town e informal settlements, entre outros, quando utilizados para nomear e
classificar os territórios habitados pelos pobres em cidades inglesas, norte-
americanas, brasileiras e sul-africanas.
Não por acaso, o uso do termo slum como uma classificação urbana é
contemporâneo à própria origem do termo "urbanismo", o qual, carregado com
concepções europeias sobre desenvolvimento e modernização (SHEPPARD, 2014),
aparece em dicionários de língua inglesa e francesa ao final do século XIX como o
estudo das necessidades físicas das sociedades urbanas, a gestão dos espaços
urbanos, o modo característico de vida dos moradores da cidade e a urbanização.
89
Durante a Exposição Universal de 1889, em Paris, foi organizado o primeiro Congrès international
des habitations à bom marché, onde reformadores de diferentes partes do mundo se reuniram para
discutir preocupações comuns em torno de higiene pública, legislação habitacional, progressos em
esquemas industrializados de habitação, e sociedades privadas de construtores.
90
A Town Planning Conference ocorreu em Londres em 1910 e sucedeu a implementação do então
recém aprovado Housing and Town Planning Act, aprovado em 1909, na Grã-Bretanha.
102
situações de informalidade e/ou ilegalidade. Por outro lado, a análise mostra como
nas cidades brasileiras e sul-africanas o entendimento dessas classificações não se
completa sem um encontro colonial (CONNELL, 2012), capaz de evidenciar uma das
formas pelas quais a lógica colonial de separação entre colonizados e colonizadores
foi perpetuada (QUIJANO, 2000).
91
A autora mostra que, segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (Pnad), em 1999
entre os 10% mais pobres da população brasileira, 68% eram negros (pretos e pardos); sendo que em
2008, essa proporção era de 70,8% (LIMA, 2012: 236).
103
Não à toa, a revogação das “leis do passe” na África do Sul, em 1986, que
implicou na criação de um mesmo documento de identidade para todos os cidadãos,
foi tratada por alguns como uma “opção brasileira” (PEREIRA, 2012, p.123), para dar
a impressão de desmantelamento do apartheid e fôlego ao monopólio branco no
poder. Vale lembrar que, no Brasil, as leis trabalhistas brasileiras regulando a
exploração do trabalho foram introduzidas durante o Estado Novo por Getúlio Vargas
(KOWARICK e BONDUKI, 1994, p. 128), enquanto o direito ao voto permaneceu
restrito à população alfabetizada, isto é, menos da metade da população brasileira92.
92
O Censo Demográfico do IBGE de 1940 indicou uma taxa de analfabetismo de 56,8%
(https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-
noticias/releases/13300-asi-estudo-revela-60-anos-de-transformacoes-sociais-no-pais. Acesso em
03/05/2019.
105
Na virada do século XX, foi criada a Aliança de Cidades, uma iniciativa conjunta
do Banco Mundial e do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos
Humanos (ONU-Habitat). Em torno do slogan “Cidades sem Favelas”, o plano de ação
da Aliança de Cidades definiu suas estratégias para a redução da pobreza mundial
em torno da disseminação e suporte técnico ao desenvolvimento de ações de slum
upgrading, isto é, da provisão de infraestrutura e serviços urbanos às áreas
“densamente povoadas e precárias” e de city development strategies, como foi
denominado o planejamento urbano estratégico.93
93
Cf. Cities Alliance for Cities Without Slums. Action Plan for Moving Slum Upgrading to Scale, 1999,
p. 1. Disponível em: http://web.mit.edu/urbanupgrading/sponsor/ActionPlan.pdf Acesso em:
25/09/2018.
107
Desse modo, após a análise das diferenças históricas que atravessam favelas
em cidades brasileiras e shantytowns em cidades sul-africanas, exploradas no
capítulo 3, e considerando as questões provocadas por essa cooperação, o referencial
teórico e metodologia, apresentados no capítulo 2, o objetivo do presente capítulo é
verificar qual o lugar da criação da Aliança de Cidades e da disseminação do slum
upgrading na longa história de conexões entre cidades e da “ajuda externa”95 para o
“desenvolvimento urbano”.
94
Sobre este tema ver também SCHON e REIN, 1994; HARRIS e VORMS, 2017
95
Foreign aid ou international aid são as expressões utilizadas na literatura de relações internacionais
e documentos oficiais de governos para se referir à transferência internacional de capital, bens ou
serviços de um país ou organização internacional em benefício (sic.) de outro país ou de sua população.
A ajuda pode ser econômica, militar ou humanitária em situações de emergência, como por exemplo,
após desastres naturais. Cf. https://www.britannica.com/topic/foreign-aid
108
Por fim, um terceiro regime poderia ser observado a partir da década de 1980,
conformado no bojo de grandes mudanças na ordem política e econômica mundial.
Esse regime seria marcado pela competição entre cidades tanto em escala global
como regional. Em torno de um discurso de competição, somente na Europa, mais de
quarenta redes de cidades (SAUNIER, 2008, p.17) foram criadas reunindo diferentes
municípios por temáticas, setor de políticas públicas, extensão territorial, etc96.
No âmbito dos acordos bilaterais, o peso e o papel dos Estados Unidos são
cada vez maiores, ainda que muitos países africanos e asiáticos mantivessem uma
relação mais estreita no âmbito da “ajuda externa” com suas ex-metrópoles (WARD,
2010). A crescente influência dos Estados Unidos também se manifesta pela atuação
de grandes instituições filantrópicas – como a Fundação Rockefeller e a Fundação
96
Em 1986 a Conferência de Cidades Europeias, realizada em Roterdã, definiu as cidades como
“motores do desenvolvimento econômico”, marcando o início do movimento das Eurocidades, rede
oficialmente constituída na conferência seguinte, realizada em 1989 em Barcelona (BORJA e
CASTELLS, 1996, p. 153).
110
97
Apesar de não ser o foco deste trabalho, interessantes análises têm sido feitas sobre a atuação
dessas fundações filantrópicas norte-americanas no urbano, mesmo antes do pós-Guerra. Saunier
(2001), por exemplo, analisa a influência da Fundação Rockefeller em instituições como a IULA por
meio do Spelman Fund, criado por esta fundação no início dos anos 1930, para financiar as áreas de
habitação, planejamento urbano e administração municipal. No Brasil, Faria (1995) aponta o papel
fundamental da Fundação Rockefeller nas reformas sanitárias. Já a Fundação Ford, desde a década
de 1950, vem apoiando estudos sobre problemas urbanos (violência, drogas, pobreza, habitação),
políticas públicas e movimentos sociais” (FARIA e COSTA, 2006, p. 172).
98
Original em inglês disponível em: https://www.cbsnews.com/news/harry-truman-inaugural-address-
1949/ Acesso em: 11/04/2018.
111
99
O uso da autoconstrução foi proposto por Koenigsberger na Índia em resposta às condições locais,
incluindo a relativa ausência de uma indústria de construção privada, especialmente para a baixa renda.
Além disso, convergia, de um lado, com a admiração que Koenigsberger tinha pela estratégia de
Gandhi para o empoderamento da população; e, de outro, com certas propostas trazidas pelo
movimento moderno, na Europa e nos EUA, a exemplo da ideia de construção colaborativa sugerida
por Frank Lloyd Wright (LISCOMBE, 2006, p. 159).
100
Até hoje o DPU da UCL é visto como a principal fonte de suporte acadêmico das Nações Unidas,
especialmente ONU-Habitat, como evidenciam as pesquisas e publicações realizadas por este centro
de estudos. Cf. https://www.ucl.ac.uk/bartlett/development/publications
101
Atualmente o Grupo Banco Mundial, além do Bird e da AID, ainda congrega outras três instituições:
Sociedade Financeira Internacional (SFI), a Agência Multilateral de Garantia de Investimentos (Miga) e
o Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (Icsid). Para ser membro do
banco, de acordo com o estatuto do Bird, um país precisa antes se juntar ao Fundo Monetário
113
empréstimos aos países pobres que não preenchiam as condições para acessar os
empréstimos concedidos pelo Bird. De acordo com seu estatuto, os propósitos da
associação são:
Ao longo dos anos 1960, no entanto, o principal foco da “ajuda externa” recaía
sobre as áreas rurais. A experiência com a guerra do Vietnã, a revolução cubana e
outras guerrilhas rurais fazia com que o “desenvolvimento rural” fosse a principal
preocupação. Foi apenas com o fim do conflito no país asiático e as derrotas das
guerrilhas rurais na América Latina que a questão da “pobreza urbana” começou a
ganhar maior destaque na agenda da “ajuda” bilateral e multilateral.
Internacional (FMI). A associação à AID, SFI e Miga está por sua vez condicionada à associação ao
Bird. O Brasil é membro do Bird desde 1946 e da AID desde 1963. Cf. www.worldbank.org/en/about
102
Cf. http://ida.worldbank.org/sites/default/files/IDA-articles-of-agreement.pdf
103
Cf. http://www.un-documents.net/a24r2598.htm Acesso em 17/06/2018.
114
Turner havia se mudado para o Peru no final da década de 1950, por influência
de amigos peruanos, arquitetos, bastante envolvidos na política nacional, que
conhecera na Inglaterra. Seu primeiro trabalho com o governo peruano foi coordenar
a reconstrução de moradias destruídas, por um terremoto em 1958, em Arequipa.
Como a maior parte dos atingidos era muito pobre e o montante de recursos
disponibilizados pelo governo somente permitiria atender uma parte desses, Turner
sugere que um maior número de pessoas poderia ser atendido, com o mesmo
montante de recursos, caso construíssem por conta suas casas (CHAVEZ et al., 2000;
HARRIS, 2003). A autoconstrução, afinal, era uma prática comum para aquela
população recém-saída da zona rural.
104
Peter Alekseyevich Kropotkin, (1842-1921) foi um revolucionário russo e geógrafo, principal teórico
do movimento anarquista, embora tenha alcançado notoriedade em diversos campos, da geografia,
zoologia à sociologia e história. Cf. https://www.britannica.com/biography/Peter-Alekseyevich-
Kropotkin
105
Turner continuou reelaborando suas ideias e recentemente tem se dedicado à reunião e
disponibilização de um conjunto de leis, técnicas e etc. para facilitar o planejamento comunitário e a
autoconstrução. Na entrevista que concedeu a Roberto Chavez, entre outros, alguns de seus projetos
mais recentes são por ele descritos. Cf. http://siteresources.worldbank.org/INTUSU/Resources/turner-
tacit.pdf
115
A partir dos anos 1970, o Banco Mundial passou a ser o maior financiador do
“desenvolvimento urbano” (desenvolvimento e gestão urbana, habitação social,
politica habitacional e gestão administrativa) dos “países em desenvolvimento”, ainda
que apenas uma pequena parcela do seu orçamento geral seja destinada a esse
setor. Financiamento complementado pelos bancos de desenvolvimento regionais e
por acordos bilaterais. Entre os bancos de desenvolvimento regionais, também
criados a partir das regras acordadas em Breton Woods, destacam-se o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID), criado em 1959, o Banco Africano de
Desenvolvimento (Bafd), de 1964, e o Banco Asiático de Desenvolvimento (BAD),
estabelecido em 1966.
106
Como recentemente destacou Richard Stren, “o direcionamento dessas instituições, apesar do seu
tamanho, é dado por indivíduos que, sob constante pressão de doadores para a apresentação de
soluções, ao invés de se debruçarem longamente sobre avaliações, entregam propostas atrás de
propostas” (comentário feito durante o painel Making Southern Urban Policies em 16 de maio de 2018
no âmbito da International Conference on Policy Diffusion, realizada em São Paulo). Essa observação
vai de encontro com a colocação feita por Ramsamy (2006) de que as subsequentes mudanças de
agenda do Banco Mundial não foram puramente resultados de decisões burocráticas internas com base
em avaliações técnicas de projetos, mas são respostas a tendências geopolíticas e intelectuais dentro
e fora do organismo multilateral.
119
“sustentáveis” (COHEN et al. 1983; WORLD BANK 1994). Por isso, a solução
baseada no fomento à autoconstução em lotes próprios, providos de serviços básicos,
parecia a mais adequada. Um tipo de solução que combinava a segurança da posse
com baixos padrões de investimento em infraestrutura e flexibilização de códigos
construtivos. Seguindo o mesmo ponto de vista econômico pragmático, a extensão da
oferta de infraestrutura às “slums” e “squatter settlements” era uma forma de tirar
proveito de um menor deslocamento casa-trabalho-casa, propiciado pela localização
menos periférica desses assentamentos (COHEN, 2015).
Tem início então uma nova fase, na qual os projetos de infraestrutura não
desaparecem, mas são preteridos, ao mesmo tempo em que o investimento no
“desenvolvimento institucional” do setor público adquire protagonismo. Com o objetivo
de que condições (normativas, administrativas e jurídicas) pudessem possibilitar o
122
Babb (2013, p. 278) destaca ainda que países com moedas estáveis e sem
problemas de endividamento, como China, Vietnã, Índia e Coréia do Sul (até a crise
financeira asiática) tiveram pouca exposição às condicionalidades, em contraste com
os países latino-americanos. De acordo com dados compilados por esta autora, no
âmbito do setor urbano, de 1986 até 2010, a Argentina adquiriu recursos com base
em 7 empréstimos do FMI e 19 do Banco Mundial, já o Brasil obteve 3 empréstimos
do FMI e 5 do Banco Mundial.
107
Babb (2013, p. 278) destaca que países com moedas estáveis e sem problemas de endividamento,
como China, Vietnã, Índia e Coréia do Sul (até a crise financeira asiática) tiveram pouca exposição às
condicionalidades. Em contraste, os países latino-americanos foram mais expostos. De acordo com
dados compilados por esta autora, no âmbito do setor urbano, de 1986 até 2010, a Argentina adquiriu
recursos com base em 7 empréstimos do FMI e 19 do Banco Mundial; já o envolvimento do Brasil foi
mais ameno, com 3 empréstimos do FMI e 5 do Banco Mundial.
125
108
Iniciados em meados da década de 1970, essas ações envolviam componentes de diferentes áreas
simultaneamente (habitação, transporte, apoio a negócios, crédito e treinamento, atividades para
geração de renda e creches).
126
assim como no passado as ideias de Turner, foram utilizadas para dar legitimidade a
posições já existentes no Banco Mundial.
Em seus dois livros, “The other path: the invisible revolution in the Third World”
(1989) e “The Mystery of Capital” (2000), De Soto reconheceu a titulação de terras e
de propriedades como motores para uma verdadeira revolução urbana no Terceiro
Mundo, ao possibilitar a entrada de milhões de pessoas pobres no mercado. A ideia
central de De Soto estava baseada na transformação das edificações das favelas,
consideradas um “capital morto”, em ativos que poderiam ser utilizados como garantia
para empréstimos bancários que permitissem aos pobres, por exemplo, abrir
pequenos negócios ou a ampliação e melhoria de suas casas. Essa estratégia, no
entanto, em pouco tempo mostrou sinais de enfraquecimento, uma vez que poucos
bancos comerciais estavam abertos às famílias pobres, dada sua dificuldade de
comprovação de renda, a baixa lucratividade desses empréstimos e certa
desconfiança (GILBERT, 2007, p. 8).
109
Cf. United Nations. A/RES/43/181. 83ª plenária. 20 de dezembro de 1988. Disponível em:
http://www.un.org/documents/ga/res/43/a43r181.htm
127
110
Cf. http://mirror.unhabitat.org/content.asp?typeid=19&catid=374&cid=185
128
Tim Campbell via as “inovações” por ele identificadas na região ao longo dos
anos 1990, relacionadas à participação social, financiamentos comunitários, novos
arranjos federativos, provisão de serviços pelo setor privado e fortalecimento de
capacidades dos governos locais, como impulsionadoras da competitividade tanto no
interior de cada cidade como entre cidades (CAMPBELL et al., 1991). Compreendia a
restauração dos vínculos entre eleitores contribuintes e governos locais, quebrados
por décadas de governos centralizados, como fundamental para a mobilização de
financiamentos com recuperação de custos, desse modo, aumentando a receita dos
municípios e conferindo legitimidade e sustentabilidade aos governos locais. Pois,
como afirmaram os executivos latino-americanos entrevistados: “quando os
contribuintes percebem que estão acessando novos serviços, eles ficam mais
dispostos a pagar” (CAMPBELL, 1997, p. 3, tradução nossa). Não tardou para que as
“inovações” em andamento na América Latina, e alhures, passassem a ser vistas
como instrumentos para acirrar a competição entre cidades, e ao mesmo tempo, a
capacidade de oferta de assistência das agências multilaterais ao redor do mundo.
111
ao protagonismo econômico das cidades e sua promoção por meio do
planejamento estratégico e da cooperação público-privada (BORJA e CASTELLS,
1997).
111
Refere-se aqui ao Capítulo 5 do livro Local & Global (BORJA e CASTELLS, 1997).
112
Este último uma clara influência da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente – RIO
92
130
As crises financeiras ocorridas entre fins dos anos 1990 e início dos anos 2000,
como aquelas ocorridas no México, na Argentina, na Rússia e na Ásia Oriental,
alimentavam ondas de protestos globais contra as instituições financeiras
internacionais. No debate político geral, duras críticas eram dirigidas à atuação
“expansiva”113 do FMI, com seus mecanismos de condicionalidade cruzada e a
aplicação de uma mesma receita para todos os países (STIGLITZ, 2002; BABB,
2013).
Um proeminente crítico dos ajustes estruturais foi Joseph Stiglitz, então vice-
presidente-sênior para políticas de desenvolvimento e economista-chefe do Banco
Mundial, no final da década de 1990, e vencedor do prêmio Nobel de economia em
2001. Stiglitz declarou que a defesa exacerbada do FMI e do Banco Mundial pelo
travamento do investimento público em serviços essenciais, delegando-os aos
mercados, só havia agravado os problemas dos “países em desenvolvimento”. Isso
porque, para o economista, os mercados nesses países, diante da ausência de
informações perfeitas, funcionavam imperfeitamente (STIGLITZ, 2002).
113
BABB (2013) denomina de “mission creep” (em alusão às mudanças graduais dos objetivos de
exércitos em campanha) essa atuação “expansiva” do FMI, que passa a incluir, por exemplo, a
privatização dos serviços de abastecimento de água e de sistemas públicos de previdência e a
imposição de “taxas de usuários” (como as taxas de acesso à educação pública).
131
Esse será o teor da agenda do Banco Mundial para os anos 2000, apresentada
a seguir, enfocada na importância das cidades para “a descentralização política e
114
O primeiro empréstimo do BID para urbanização de “bairros” (neighborhoods upgradings) na AL foi
para o Chile em 1986 no âmbito do Programa Vivienda Progresiva, baseado no modelo de lotes com
infraestrutura e unidades mínimas (BRAKARZ, 2010; MAGALHÃES, 2016). Mas foi a partir da década
de 1990, que o BID aumentou significativamente o número de financiamentos para esse fim. Em 1995
financia o Favela-Bairro que havia sido iniciado no ano anterior pela prefeitura do Rio de Janeiro. É
considerado o primeiro caso de urbanização integrada, isto é, englobando assentamentos inteiros,
componentes de infraestrutura e componentes sociais.
132
115
No original em inglês, livability, competitiveness, bankability, and good governance and
management.
133
É, no entanto, ainda no bojo da construção social dos anos 1970 que se torna
comum a associação entre governança e planejamento estratégico. O planejamento
134
Assim, o que as CDS, cujo protótipo vinha sendo implementado no Vietnã com
o suporte do banco desde 1998, passam a disseminar são as diretrizes do
planejamento estratégico. Só que, como nos lembra Vainer (2000), com pelo menos
uma década de atraso em relação ao início de sua difusão pelos consultores catalães.
Na versão do Banco Mundial a elaboração das CDS tem o objetivo de criar
competitividade entre as cidades e o mercado, cuja liquidez seria dinamizada pela
elevação das receitas municipais, via aumento do pagamento de taxas pelos
contribuintes e a atração de empresas, isto é, a boa governança. Para o alcance desse
objetivo, no entanto, o banco incorpora no modelo das CDS algumas ferramentas
próprias do planejamento tradicional compreensivo e do orçamento participativo, este
116
Para uma descrição menos sucinta e mais aprofundada das origens do planejamento estratégico,
sua transposição para as cidades e sua crítica cf. ARANTES et al., 2000; COMPANS, 2004; NOVAIS,
2010.
135
último uma das “boas práticas” estudadas pelo banco desde o início dos anos 1990,
como mostram os já citados relatórios produzidos por Tim Campbell.
Para colaborar nesse sentido, é que a agenda do banco para os anos 2000
destaca o quarto bloco de atividades ou o grande esforço da instituição em: “extrair e
disseminar lições da experiência com iniciativas de sucesso para aumentar o
conhecimento global e a compreensão do “upgrading” como parte de programas de
fortalecimento comunitário e de combate à pobreza” (KESSIDES, 2000, p. 15,
tradução nossa). A ambição de expandir a capacidade de “assistência técnica” do
Banco Mundial e de torná-lo um “banco do conhecimento” foi uma marca da gestão
de James Wolfensohn (1995-2005) na presidência da instituição. Desde então, o
organismo passou a investir crescentemente em “redes de conhecimento,
comunidades de prática e tecnologia da informação” para um melhor
compartilhamento de conhecimento tanto interna quanto externamente (STONE,
2013, p. 245). Os aportes na criação, gestão e aplicação de conhecimento passam a
ser, portanto, cada vez mais vistos como cruciais na missão do Banco Mundial de
“redução da pobreza”. Ao disseminar conhecimento construído em torno de “melhores
práticas”, ou seja, colocando-se no lugar de um “intermediador” do conhecimento
(Ravallion et al. 2010 apud STONE, 2013, p. 246).
117
Na expressão do Banco Mundial, policy outreach activities. Cf.
http://web.worldbank.org/archive/website01542/WEB/0__CO-17.HTM
118
Lançado em 2000 em substituição ao Instituto de Desenvolvimento Econômico, fundado em 1955.
Enquanto o antigo instituto dedicava-se ao treinamento de funcionários governamentais de alto nível
em Washington, a nova entidade buscou ampliar a abrangência temática e o público-alvo por meio do
ensino a distância, diálogos de políticas e parcerias com instituições locais. Cf.
http://documents.worldbank.org/curated/en/372291468129005130/A-brief-history-of-World-Bank-
Institute-WBI-or-Economic-Development-Institute-EDI
137
119
Conforme definido pelo Estatuto da Aliança de Cidades: ‘O Grupo Consultivo será co-presidido pelo
Vice-Presidente de Desenvolvimento do Setor Privado e Infraestrutura do Banco Mundial, e pelo chefe
executivo da Habitat (...) As decisões do GC são feitas por consenso” (Tradução nossa). Cf.
https://www.citiesalliance.org/charter
120
Cf. https://www.citiesalliance.org/who-we-are/about-cities-alliance/our-members-0
138
membros da Aliança viam o Banco Mundial como uma instituição muito coercitiva.
Além disso, os funcionários disponibilizados pelo banco estavam acostumados a
padrões burocráticos e de rigidez que atrasavam os tramites no âmbito das relações
estabelecidas pela Aliança de Cidades com seus receptores (WORLD BANK, 2008;
COWI, 2011). Em consequência, o secretariado da instituição foi transferido em 2013
para o Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (Unops) em
Bruxelas121.
121
Cf. https://www.citiesalliance.org/newsroom/news/cities-alliance-news/cities-alliance-move-
brussels-track
122
O desenvolvimento desses programas abrangentes e de longo prazo para determinados países,
incluindo a definição da cooperação entre vários parceiros – incluindo cidades, administração nacional,
ONGs, doadores e IFIs –, foi possível graças a uma grande contribuição feita pela Fundação Bill e
Melinda Gates, especificamente para esse propósito. Antes disso, dois países membros (Brasil e
Filipinas) já haviam sido receptores significativos de acordos de parceria num formato um pouco
diferente, criado a partir de 2008, e conhecido como Joint Work Programme (JWP), no qual um
programa de trabalho conjunto entre a Aliança de Cidades e o governo nacional desses países definiu
uma estrutura para os tipos de subsídios que poderiam ser aprovados anteriormente à aprovação
individual desses programas (COWI, 2011, p.13-14).
139
123
De acordo com a presença ou ausência nos projetos de conteúdo relacionado à
“desregulamentação”, “liberalização financeira”, ao “fortalecimento institucional” e às “políticas em favor
dos pobres”, isto é, projetos de infraestrutura na forma de sites and services e slum upgrading.
140
De 1972 a 1982, os dados organizados por Clegg mostram que, além do foco
em projetos de infraestrutura, um número significativo de empréstimos do Banco
Mundial foi destinado ao fortalecimento da capacidade das agências governamentais
locais. Nesse período, mais de 50% dos projetos estiveram relacionados ao
fortalecimento dos sistemas de registro de direitos de propriedade. O nível de atenção
a esses sistemas permaneceu amplamente estável entre 1983 e 1992, enquanto o
número de projetos de infraestrutura caiu consideravelmente nesse período. Entre
1993 e 2002, tanto os empréstimos envolvendo projetos de infraestrutura quanto
fortalecimento institucional continuam diminuindo. Esses empréstimos no período
seguinte, entre 2003 e 2012, apresentaram um aumento pouco significativo se
considerada a ênfase discursiva dada a esses conteúdos a partir dos anos 2000.
Em síntese, o que se observa é que, a partir dos anos 1970, com a entrada do
Banco Mundial na “ajuda externa” voltada à busca de soluções para o problema
habitacional dos países pobres, muito mais modestamente já empreendida pela ONU,
o acesso à terra e à moradia passou a ser enquadrado pelo aumento da produtividade
urbana.
É válido ressaltar, como já feito no capítulo introdutório desta tese, que a opção
de apresentar a análise da configuração da “ajuda externa” para o “desenvolvimento
urbano” e da atuação das agências multilaterais, antes do capítulo a seguir, que
examina as trajetórias da urbanização de favelas em São Paulo e do in-situ upgrading
em Durban, tem o intuito de situar a singularidade dessas trajetórias em meio aos
fluxos e conjunturas político-econômicas globais que as atravessam e ultrapassam.
143
124
Termo utilizado com o mesmo sentido presente em Dagnino (2004, p. 142) para se referir a “um
fenômeno cujas consequências contrariam sua aparência, cujos efeitos não são imediatamente
evidentes e se revelam distintos do que se poderia esperar”.
144
Nessa configuração espacial, uma seca devastadora, no final dos anos 1970,
contribuiu para que um grande número de pessoas fosse buscar condições de
sobrevivência em áreas urbanas (HINDON, BYERLEY E MORRIS, 1993). Estimativas
apotam que se em 1971 havia cerca de 300 mil pessoas habitando barracos
ilegalmente espalhados pela área metropolitana de Durban-Pinetown, em 1981, essa
população já ultrapassava um milhão (HARRISON, 1992). Ao fim dos anos 1980,
cerca de metade da população negra africana de toda a província de Natal vivia em
moradias precárias (Smit, 1997 apud MARX e CHARLTON, 2003).
146
Uma outra pequena parte foram trazidos pelo império britânico como combatentes
para lutarem nas Guerras contra os Bôeres (MAKHATINI, 1994). Além disso, indianos
chegaram à África do Sul como viajantes independentes com passaporte de súdito
britânico. Vale lembrar que Durban era um importante centro comercial e porto para
escoamento, além da produção açucareira, da produção mineradora da região da
Witwatersrand.
Para além das áreas indianas e depois da zona de amortecimento que incluía
algumas terras agrícolas e também alguns dos terrenos mais íngremes em Durban,
estavam as townships destinadas aos africanos: Umlazi ao sul, KwaMashu, Ntuzuma,
KwaDabeka, Clermont e outras ao norte. Essas ficavam a cerca de 25 quilômetros do
centro da cidade, com pouco acesso a outros meios de transporte além de uma única
estrada (MAHARAJ; KHAN e DESAI, 2016).
125
Áreas como, por exemplo, Kennedy Road, próximo ao Umgeni River, e Cato Manor.
148
Fonte: Reprodução a partir de Hindon, Byerley e Morris, 1993, p. 16. Optou-se por manter uma
tradução literal da legenda e pela não tradução de termos como townships e squatter settlements.
5.1.1 O contexto
126
Os Conselhos Administrativos não tinham poderes de formulação de políticas nem autoridade para
fazer regulamentos, dos quais estava encarregado o ministro responsável pelo “governo local negro”.
De 1984 eles foram chamados de Conselhos de Desenvolvimento. No entanto, isso acabou sendo de
curta duração. Eles foram abolidos em 1986, em sintonia com outras políticas reformistas à época
(CAMERON, 1995).
127
Em 16 de junho de 1976 cerca de 15.000 estudantes realizavam uma marcha de protesto para o
Estádio de Orlando contra a introdução Afrikaans como idioma oficial das aulas nas escolas locais,
quando foram interceptados por policiais armados que abriram fogo. A revolta se espalharia para outras
cidades, onde durante os confrontos havia se tornado prática comum a polícia atirar em manifestantes
estudantis. No inquérito sobre os confrontos em Soweto, East Rand e Península do Cabo, a polícia
admitiu ter matado um total de 284 pessoas e ferido outras 2000. A imprensa, incluindo os jornais pró-
governo, no entanto apontava à época que o número real deveria ser três vezes maior (MAFEJE, 1978).
151
128
Consenso do qual também parecia fazer parte, observando-se a natureza de seus acordos e
projetos à época, a Usaid, a Commonwealth Development Corporation do Reino Unido e a Agência de
Cooperação e Desenvolvimento Francesa.
152
Como o próprio P.W. Botha declarou anos mais tarde, em 1984, quando já era
presidente, a “devolução de autoridade aos governos locais dos vários grupos
populacionais” foi um mecanismo constitucional para proteger “os interesses dos
grupos minoritários dentro de uma sociedade heterogênea” (CAMERON, 1995, p.
404). Logo, essa mudança, a exemplo dos Conselhos Administrativos, criados na
década anterior, não alterava o montante de recursos destinados à manutenção das
townships. Pelo contrário, a criação das Autoridades Locais Negras129 sinalizava o
afastamento definitivo do governo no provimento de habitações nas townships, que
passava a ser delegado ao setor privado (BEALL, CRANSHAW e PARNELL, 2002).
129
Para as áreas destinadas aos mestiços e indianos foram criados órgãos consultivos, Management
Committees e Local Affairs Committees (LACs). Neste caso, a intenção era de que tais órgãos
evoluíssem para autoridades locais independentes, ainda que sob forte controle do governo central,
mas além da falta de viabilidade econômica e pessoal treinado, havia também a forte oposição de
indianos e mestiços a essas estruturas do apartheid (CAMERON, 1995).
153
apartheid”, isto é, o fato dos postos de trabalho destinados à população que vivia nas
townships estarem concentrados nas áreas destinadas aos brancos significava que
os tributos pagos pelos empregadores sobre a produção seriam incorporados apenas
à receita orçamentária das “municipalidades brancas”. Mais ainda, restrições impostas
pelo governo do apartheid ao desenvolvimento do comércio nas townships fazia com
que também os salários dos trabalhadores negros fossem gastos nos
estabelecimentos comerciais das “áreas brancas”, cujos impostos pagos seriam
também canalizados para as “municipalidades brancas” (MAYEKISO, 1996, p.211).
Assim, sob o bordão "uma cidade, uma base fiscal" (one city, one tax base!),
associações organizadas para a luta cívica contra o apartheid nas townships
reivindicavam a distribuição equitativa de fundos no interior de um espaço urbano,
funcionalmente integrado, e a criação de uma autoridade metropolitana (MAYEKISO,
1996; BOND, 2012). Os protestos e boicotes que se seguiram evidenciaram a
insustentabilidade do regime do apartheid e foram marcados por ataques físicos aos
conselheiros locais, vistos como legitimadores do regime (MAYEKISO, 1996).
130
O CNA, fundado em 1912 por uma elite de africanos negros bem-educados que reivindicavam
direitos iguais para os setores civilizados da sociedade, havia passado a adotar, por pressão da Liga
da Juventude, fundada em 1940 e mais radical, as táticas de resistência pacífica e de protesto em
massa do Partido Comunista (HUCHZERMEYER, 2004). Até que em 1960, após o massacre de
Shaperville, foi posto na ilegalidade, junto com o Congresso Pan-Africanista e o Partido Comunista.
131
Movimentos que tinham emergido nos guetos norte-americanos, nos anos 1950, cujos princípios de
organização comunitária e estratégias de reinvindicação foram reunidos por Saul Alinsky e publicado,
em 1971, com o título de “Regras para os Radicais” (MAYEKISO, 1996).
155
Entre 1986 e 1992, mais de 3 mil pessoas morreram em meio aos conflitos
violentos que se espalharam por Durban (MARX e CHALTON, 2003). Durante os
confrontos entre os apoiadores da UDF e do Inkatha, as forças de segurança
frequentemente se recusavam a intervir, embora haja registros indicando seu apoio
ativo ao Inkatha (TRUTH & RECONCILIATION COMMISSION, 1998, p. 231)133. Os
132
Entrevistado 8.
133
A partir de 1987, com o estabelecimento da força policial de KwaZulu, a polícia sul-africana
praticamente se retirou do envolvimento imediato nos conflitos em KwaZulu, embora continuasse a
apoiar o Inkatha de formas ocultas, incluindo financiamento clandestino, treinamento de esquadrões de
156
ataque e operações secretas diretas contra a UDF e seus apoiadores (HINDON, BYERLEY E MORRIS,
1993).
134
Segundo descrição feita pelo entrevistado 20.
157
135
No passado, a principal linha de demarcação social dentro das áreas urbanas negras era entre os
migrantes temporários nos hostels e os residentes permanentes nas casas provisionadas pelo governo
nas townships.
159
136
Em 1990 US$ 1,00 correspondia a 2,59 rands (Cf.
https://businesstech.co.za/news/finance/116372/rand-vs-the-dollar-1978-2016/)
137
Dan Smit completou o seu mestrado em planejamento urbano e regional pela Universidade de
Oregon em 1979. Michael Sutcliffe completou o seu doutorado em geografia pela Universidade de Ohio
em 1982.
160
138
Entrevistado 11.
139
Dentre as primeiras áreas de atuação do BESG estão St. Wendolin e Clairwood. A respeito dessa
última, um dos ex-integrantes do BESG observou: “Mostramos que Clairwood poderia ser um lugar de
residência e trabalho (...) ao invés de um ponto de transferência de lixo (...) e que St. Wendolin não
precisava ser removida (...) Em tudo isso, fomos liderados pelas comunidades, como em St. Wendolin,
que tinha à frente um excelente ativista comunitário, Booysie Dlamini, que combinava seu sindicalismo
de chão de fábrica com o ativismo comunitário” (Trecho traduzido de “The Early Voices: An oral
historical biography of the Built Environment Support Group”. Draft Version, 20 pgs, 2014 – documento
cedido por um dos entrevistados).
140
Entrevistado 20. Essa área passou a ser desde então alvo de disputas entre os apoiadores do IFP,
de um lado, e da UDF (CNA após 1990), de outro. No contexto preparatório para as eleições que
sucederam o fim do apartheid, em 1992, essa área seria mais uma vez palco de centenas de
assassinatos, resultantes de disputas pelo eleitorado da região.
161
de Gandhi) e um projeto para provisão de lotes com infraestrutura foi viabilizado por
meio dos mecanismos aprovados no âmbito do Prevention of Illegal Squatting Act,
resultando em cerca de 800 unidades habitacionais141.
141
Entrevistado 20.
142
Entrevistado 20.
143
Afesis-Corplan em East London, Urban Services Group em Porto Elizabeth.
162
144
Informação compartilhada pelos entrevistados 8 e 16.
145
Alfredo Stein trabalhou como consultor da Agência Sueca de Cooperação para o Desenvolvimento
Internacional (Sida) quando esta instituição financiou a criação do Programa de Desenvolvimento Local
(Prodel) na Nicarágua e a Fundación Promota de Vivienda (Fuprovi) na Costa Rica. A Fuprovi foi criada
em 1987 e desde 1988 tem conduzido um programa de construção de unidades habitacionais com
base na ajuda mútua, na qual a associação/entidade formada pelos moradores fica responsável pelo
processo construtivo, sob a assessoria da Fuprovi que oferece assistência social, técnica e
administrativa. O uso de fundos rotativos (originalmente ajuda de doadores da Suécia) permite que o
dinheiro seja reinvestido em novos projetos. Além de consultor da Sida, Stein também atuou no Banco
Mundial, BID, Pnud, ONU-Habitat, GIZ e KfW.
146
Entrevistado 16.
163
governo central.
No final dos anos 1980, contudo, a intensificação dos diálogos do governo com
o CNA, que logo retornaria à legalidade, tornava a atuação dos warlords, em sua
maioria vinculados ao Inkhata, cada vez mais difícil. Além disso, o crescimento
populacional cada vez mais acelerado nos squatter settlements deixava nítida a sua
incapacidade de cumprir com a garantia mínima de condições de sobrevivência,
função pela qual extorquiam a população local. Nesse contexto, muitos warlords foram
assassinados, fugiram ou mesmo passaram para o lado da UDF/CNA.
Em 1995, a maior parte das obras físicas tinha sido realizada e a posse
assegurada para um total de 6.832 lotes. As intervenções físicas incluíram: abertura
e pavimentação de vias carroçáveis e de pedestres, rede de drenagem, pontos de
abastecimento de água (41 no total, o que significava a média de um ponto para casa
170 lotes) e de despejo de lixo (um para cada 205 domicílios). Cada lote foi provido
com um banheiro por fossa ventilada e cada domicílio passou a ser atendido pela rede
elétrica. A quantidade de remoções para a instalação das obras foi mínima, o que
diferenciou Bester’s Camp das intervenções até então realizadas. Desde a fase inicial
da intervenção foram instalados centros comunitários, serviços de saúde e educação.
5.1.3 O abandono
147
Deve-se salientar, contudo, que nem todos os moradores dos squatter setlements eram igualmente
empobrecidos. A limitada produção habitacional pelo governo desde o final da década de 1960 havia
levado uma parte da população negra empregada (e com rendimento considerável) para essas áreas,
a fim de escapar da superlotação das townships (HINDON, BYERLEY E MORRIS, 1993).
165
No trecho citado acima, por exemplo, uma evidência das disputas naquele
período, um dos fundadores do BESG, que também havia trabalhado para a UF,
defende a importância de uma abordagem orientada para o mercado. Indica também,
a partir daquele momento, uma certa convergência entre o trabalho realizado pelas
ONGs e a Urban Foundation. Uma convergência que parecia não se limitar às
166
148
O modelo de financiamento do IDT estava baseado no subsídio de capital para aquisição da
propriedade individual de um lote com infraestrutura nas periferias. Os critérios para recebimento do
subsídio eram: renda mensal abaixo de 1.000 rands (cerca de US$ 380), idade do responsável pelo
domicílio superior a 21 anos e a existência de dependentes familiares. Os beneficiários poderiam ser
subsidiados até o valor máximo de 7.500 rands (aproximadamente US$ 2,9 mil). A solicitação do
subsídio não era feita individualmente, mas em nome da comunidade a ser beneficiada, por autoridades
públicas, empreendedores privados, companhias habitacionais e entidades comunitárias. Um critério-
chave para a alocação do financiamento era a evidência de envolvimento das comunidades
beneficiadas (HUCHZERMEYER, 2004).
149
Entrevistado 15.
150
Esse era o cerne da proposta que, em 1992, havia resultado da Comissão Loor, estabelecida pelo
governo do apartheid para organizar os diferentes subsídios que existiam à época para os diferentes
grupos raciais (de Loor, 1992 apud GILBERT, 2002).
151
Entrevistado 8.
167
Figura 25. Presidente do Banco Mundial, Lewis Preston, recebe o líder do CNA,
Nelson Mandela, em Washington, em dezembro de 1991
152
Além disso, a habitação nos anos de apartheid, apesar de marcada pela segregação, tinha sido
amplamente subsidiada.
168
alcançada por meio de uma aliança com o setor privado (SMIT, 1992).
153
Entrevistado 15.
154
Estimava-se que à época haveria a necessidade de pelo menos 1,3 milhão de novas unidades
habitacionais (ANC, 1994, p. 22)
155
Sob pressão de numerosas entidades comunitárias e ONGs foi aprovado em 1998 o People’s
Housing Process (PHP), o qual passou a financiar um importante número de projetos habitacionais
realizados de forma participativa por ONGs e entidades comunitárias, mas marginais em termos de
escala se comparados à entrega de habitações prontas e subsidiadas. Para mais detalhes sobre o PhP
e sua revisão aprovada em 2008, o Enhanced People’s Housing Process (ePHP), ver: Huchzermeyer
(2004); Charlton e Kihato (2006); Huchzermeyer (2011) e Görgens (2016).
169
156
A Gear enfatizava que o desenvolvimento econômico deveria ser liderado pelo setor privado, com a
privatização de empresas estatais, redução das despesas do governo (especialmente os serviços
sociais), diminuição das regulamentações de controle de câmbio e flexibilização do mercado de
trabalho (Departamento de Finanças, 1996 apud MAHARAJ, KHAN e DESAI, 2016).
170
Nesse contexto, Durban, que já era (e ainda é) uma das cidades que mais
concentra shack settlements, destacou-se devido à manutenção de projetos de in-situ
upgrading, ainda que nenhum programa ou linha de ação específica do governo
nacional estivesse voltado para esse tipo de projeto.
Cato Manor, área que nos anos 1960 concentrava um grande número de
squatter settlements cuja população fora então violentamente removida e reassentada
nas townships, como mencionado no capítulo 3, permaneceu desocupada até os anos
1980, quando passou a receber novas ocupações. Com o avanço das negociações
entre o governo nacional e organizações antiapartheid, Cato Manor foi elencada como
prioridade e, entre 1990 e 1992, foi discutido um plano para reocupação da área, de
cerca de 1.800 hectares e cerca de 21 mil moradores. Em 1993, foi formada a Cato
Manor Development Association, uma agência sem fins lucrativos que, a partir de
1994, passou a ser responsável pela execução do que se tornou o maior projeto
habitacional do país, com recursos provenientes do Reconstruction and Development
Programme (RDP) do governo nacional, da União Europeia e das autoridades local e
provincial (ROBINSON e FOSTER, 1996).
157
Entrevistado 16.
171
Foto da autora.
158
De acordo com o entrevistado 19 apenas Durban teria um programa especificamente voltado para
in-situ upgrading à época.
172
159
A Operação JumpStart foi criada em 1992 para administrar os fundos da Lotérica de Natal
(posteriormente KwaZulu-Natal).
160
Informal Settlements Programme for the North and South Central Local Councils. Essas autoridades
locais eram estruturas provisórias, posteriormente amalgamadas na municipalidade metropolitana de
eThekwini.
173
Charlton e Klug (2016) sugerem que a mudança de foco teria sido o resultado
de uma combinação de fatores: ênfase dos programas nacionais no aumento dos
padrões e tamanho das casas; direcionamento no município para aumentar o total
de unidades entregues; percepção de que existiriam menos organizações e
profissionais com expertise em in-situ upgrading, tanto do setor público quanto do
privado; alto nível de qualidade dos serviços (e tamanho mínimo de lote) exigido pelas
normas de financiamento; certa aversão à presença de barracos na paisagem; e,
finalmente, introdução de um regime de contratos pelo qual a municipalidade teria que
aprovar todos os projetos antes de submetê-los à província para obter financiamento.
161
Os números chegariam a 1,5 milhão de casas até 2003 (GARDNER, 2003, p. 21)
174
162
O subsídio habitacional gradualmente aumentou, em 2003 correspondia a aproximadamente 23 mil
rands ou dois mil dólares (MARX e CHARLTON, 2003). E o tamanho mínimo passou de 32m2 para
40m2 em meados dos anos 2000.
175
163
Entrevistado 16.
176
164
As ações foram motivadas pelo movimento Abahlali baseMjondolo com base no argumento de que
à província cabia legislar sobre o provimento habitacional quando o referido ato apenas tratava de
questões relativas à propriedade da terra, além de propiciar ações de remoção arbitrárias em
desacordo com princípios constitucionais.
165
Entrevistados 16 e 19.
166
A instituição vinha desde 2006 financiando e assistindo tecnicamente o município metropolitano de
Ekurhuleni, no East Rand e próximo a Joanesburgo.
178
167
Cf.
https://www.dpme.gov.za/publications/Outcomes%20Delivery%20Agreements/Outcome%2008%20Hu
man%20Settlement.pdf
168
Entrevistado 18.
169
Em referência aos procedimentos para estabelecimento de townships.
179
170
"Urban LandMark" é a abreviação de "Urban Land Markets Programme". O programa foi criado em
maio de 2006. Com sete anos de financiamento, até março de 2013, foi administrado financeiramente
pela FinMark Trust. A iniciativa está atualmente no Conselho para Pesquisa Científica e Industrial da
África do Sul.
180
Especialistas criticaram o programa por não trazer mudanças com relação aos
parâmetros que convencionalmente determinavam os assentamentos passíveis de
consolidação, e, em consequência, em nada contribuia para fazer valer o princípio
mais importante do Uisp: tratar a remoção como último recurso (HUCHZERMEYER,
2011, p. 175).
171
Entrevistado 18.
172
Idem.
173
Urban Settlements Development Grant (USDG). Além dessa verba, outras já existentes poderiam
ser utilizadas para o mesmo fim. Cf.
http://upgradingsupport.org/uploads/resource_documents/participants-combined/Chapter-6-Interim-
Arrangements-and-Relocations-May-2016.pdf
181
A história dessas políticas no Brasil tem sido um objeto bastante explorado pela
literatura nacional (BUENO, 2000; DENALDI, 2003; CARDOSO, 2007; ANTONUCCI
174
Entrevistados 16 e 19.
183
175
O Censo Demográfico das Favelas do Distrito Federal realizado pelo IBGE em 1950 apontou que
cerca de 170 mil habitantes, ou 7% da população carioca, morava em favelas, no entanto reconhecia-
se que, dadas as limitações do levantamento à época, esse número pudesse chegar ao dobro, isto é,
cerca de 340 mil pessoas (IBGE, 1953). No Recife da década de 1930, estima-se que mais de 60%
dos domicílios estivessem em mocambos, quando foi criada a Liga Social Contra o Mocambo em 1939
(MELO, 1986).
184
5.2.1 O contexto
176
Nas gestões de Jânio Quadros (1986-1988), Paulo Maluf (1993-1996) e Celso Pitta (1997-2000).
185
regime militar em 1964. Criada pela Lei 4.380 e implementada por meio do Banco
Nacional de Habitação (BNH) e do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo
(Serfhau) 177.
177
O BNH substituiu a Fundação da Casa Popular (FCP), primeiro órgão federal, criado em 1946,
dedicado à provisão pública de habitação. Os recursos da FCP deveriam ser provenientes das
Carteiras Prediais dos Institutos de Aposentadorias e Pensões, de Estados e municípios, o que não
aconteceu, resultando numa produção muito baixa, de cerca de 20 mil unidades entre 1946 e 1964
(KOURY, 2019).
186
178
Análises de Azevedo e Andrade (1982) sobre os dados do Censo Domiciliar do IBGE até meados
da década de 1970, mostram que a atuação do BNH não havia contribuído para a queda de domicílios
“rústicos”, classificação que abrangia os domicílios em favelas, por exemplo, e que o percentual de
unidades financiadas para famílias com renda até cinco salários mínimos até 1980 não ultrapassavam
35% do total de unidades financiadas pelo SFH.
187
179
Wagner, B.; McVoy, D.; Edwards, G. Guanabara Housing and Urban Development Program: Report
and Recommendations by AID Housing and Urban Development Team,1965 (LEEDS e LEEDS, 1977).
180
O ideal de urbanização perseguido incluía o reparcelamento com pavimentação, instalação de redes
de água, esgotos, eletricidade e regularização, além de auxílio financeiro para a reconstrução de casas
(por ajuda mútua) com a supervisão dos arquitetos.
181 o
Decreto Federal n 62.654 de 03/05/1968.
188
No final de 1972, Carlos Nelson Ferreira dos Santos, um dos arquitetos que
havia participado do projeto de Brás de Pina foi procurado pela Inter American
Foundation, agência independente criada, em 1969, pelo congresso dos Estados
Unidos para “canalizar a assistência ao desenvolvimento diretamente aos pobres
182
Disponível em: http://rioonwatch.org.br/?p=4676. Acesso em 09/05/2019.
183
Carlos Nelson Ferreira dos Santos, Rogério Aroeira Neves, Sylvia Lavenère-Wanderley, Sueli de
Azevedo e Fernando Casério de Almeida.
189
Vale lembrar que a Usaid havia estado por trás dos grandes conjuntos
habitacionais desenvolvidos na América Latina no âmbito da Aliança para o
Progresso. De qualquer modo, apesar da força das remoções de favelas e da
centralidade da política habitacional comandada pelo BNH, nos anos 1960 e 1970, no
Brasil, o interesse de agências multilaterais, agências de cooperação bilateral e
fundações internacionais interessadas em contribuir para a urbanização das favelas
brasileiras parecia ser cada vez maior.
184
Cf. https://www.iaf.gov/about/
185
Embora a população urbana aumentasse a taxas elevadas desde os anos 1940, foi entre 1960 e
1980 que ocorreu a aceleração do processo de urbanização brasileiro. A taxa de crescimento da
população urbana brasileira –de 4,9% entre 1940 e 1950 e 8,6% entre 1950 e 1960 – chega a 11,2%
190
irregulares, por vezes em torno dos próprios conjuntos produzidos pelo poder público
em periferias distantes. O descontentamento e a organização política dos pobres
urbanos que vinham sendo duramente reprimidos durante os “anos de chumbo” da
ditadura militar começavam a ganhar nova expressão e fôlego na segunda metade
dos anos 1970, durante o período de “distensão” da ditadura militar (MATHIAS, 1995),
com a ascensão à presidência de Ernesto Geisel (1974-1979).
entre 1960 e 1970, década que o Brasil passa a ser predominantemente urbano, e a 11,7% entre 1970
e 1980. A partir dos anos 1980 o ritmo da urbanização passa a diminuir gradualmente (SARAIVA,
2008).
191
1988, p. 3). Somente após nova investida junto ao alto escalão do governo federal186,
num contexto em que sinais de transição do regime militar para a democracia
tornavam-se evidentes, é que o empréstimo no valor de US$ 93 milhões foi acordado,
inicialmente para abranger os programas Planhap, Profilurb e Ficam, além de um
projeto de slum upgrading no Recife187 (WORLD BANK, 1988).
186
Junto ao Ministro do Planejamento, à época João Paulo dos Reis Veloso (WORLD BANK, 1988).
Era ele quem fazia parte do grupo que participava das reuniões semanais com o presidente Geisel. Cf.
http://www.fgv.br/CPDOC/BUSCA/dicionarios/verbete-biografico/joao-paulo-dos-reis-veloso
187
Inicialmente destinado a Jiquiá-Remédios, zona oeste da capital pernambucana, onde à época
viviam mais de 7 mil famílias. Posteriormente os recursos passaram para a urbanização de Brasília-
Teimosa no centro do Recife, e à bacia do Rio Camarajipe em Salvador.
192
A regularilazão da posse da terra nas favelas era uma questão que vinha
mobilizando os movimentos de favelados em diferentes cidades, sobretudo com o
apoio da Igreja Católica. No Rio de Janeiro, a Pastoral das Favelas havia criado, em
1978, o Serviço de Assistência Jurídica, para prestar assessoria às comunidades em
188
Havia circulado entre os moradores a informação de que apenas as áreas da favela ocupadas por
casas de alvenaria seriam urbanizadas, devendo ser a área ocupada por palafitas, onde viviam cerca
de um terço dos moradores, aterrada e transformada em parque. A ameaça de remoção levou os
moradores a formar a Comissão de Defesa das Favelas da Maré (Codefam), a qual após reuniões com
os órgãos federais recebeu a visita do Ministro do Interior Mario Andreazza, a quem se vinculavam o
BNH e o Departamento Nacional de Obras Sociais. Durante a visita o ministro garantiu que nenhum
morador seria transferido da área da Maré, que a todos seriam concedidos títulos de posse e que
escolas e postos médicos seriam instalados.
189
De acordo com o primeiro desses documentos “Diretrizes para o estabelecimento de uma política
de ação para as favelas do município do Rio de Janeiro” de 1979: “A tomada de posição política do
Governo municipal, nunca antes explicitada de forma tão inequívoca, é no sentido de reconhecer
oficialmente o fenômeno, incluindo as favelas entre as áreas que deverão receber sua atenção
prioritária. A remoção somente se processará nos casos em que a própria segurança do morador assim
a exija” (BRUM, 2006, p.104).
194
luta pela posse da terra190. Foi a partir dos encontros da Pastoral, por exemplo, que
havia surgido o projeto de reduzir o prazo da usucapião urbana de 20 para 5 anos
(BRUM, 2006), posteriormente incluído na Constituição de 1988. No Recife, a
regularização fundiária das favelas era uma bandeira de luta desde os anos 1970.
Nessa cidade, os recursos provenientes do Promorar possibilitaram ampliar a escala
de intervenções pontuais e já vinham ocorrendo nas favelas, que à época abrigavam
cerca de metade da população total (MORAES, MIRANDA e SOUZA, 2018). Para
atender a exigência do Promorar de regularização da posse, facilitada pela instituição
da já mencionada Lei Federal de Parcelamento do Solo de 1979, foram criadas 26
Áreas Especiais de Interesse Social (Aeis) em 1980191, no interior das quais muitos
processos de legalização da posse foram construídos de forma participativa
(DENALDI, 2003). Em 1983, essas áreas foram transformadas pela Lei 14.511 de Uso
e Ocupação do solo em Zonas de Especial Interesse Social192.
Dois anos antes, por pressão do movimento “Terras de Ninguém”, que reunia
mais de 50 comunidades, o governo do Estado havia desapropriado uma área de
cerca de 350 hectares, onde moravam cerca de 15 mil famílias, para ser urbanizada
e regularizada pela Cohab-PE, o que aconteceu entre 1987 e 1990 (SOUZA, 2007).
Em 1986, quando se iniciou a gestão de Jarbas Vaconcelos (PMDB), primeiro prefeito
do Recife eleito diretamente após a ditadura militar, foi elaborada a lei que instituiu o
Plano de Regularização das Zonas Especiais de Interesse Social (Prezeis), prevendo
gestão participativa através de comissões de urbanização e legalização (Comul). A
Lei 14.957, resultado de um projeto elaborado por entidades e organizações da
sociedade civil, a partir de amplo processo de discussão, tornou-se referência nacional
nos anos seguintes (SOUZA, 2007).
190
De 1981 até 1986, a Pastoral chegara até mesmo a contar com o apoio financeiro da Fundação
Ford para o desenvolvimento de suas atividades.
191
Decreto Municipal 1.1670/1980.
192
No mesmo ano de 1983, a prefeitura de Belo Horizonte instituiu o Programa Municipal de
Regularização de Favelas (Profavela).
193
O levantamento da prefeitura de São Paulo realizado em 1973 indicou cerca de 70 mil habitantes,
ou 1% da população do município. Já uma nova pesquisa realizada também pela prefeitura em 1987
195
indicou que a população favelada havia alcançado algo como 812 mil habitantes ou 9% da população
do município (SARAIVA e MARQUES, 2005).
194
Nessas ações, por meio do Movimento Universitário de Desfavelamento (MUD), criado em 1961,
estudantes prestavam assistência a moradores de favelas através de convênios com a prefeitura
o
(BUENO, 2000). Em 1965, o MUD organizou em São Paulo o 1 Seminário Nacional de Estudo do
Problema Favela, trazendo diversos intelectuais, representantes de entidades de classe e do governo
para discutir o assunto (SILVA, 2009).
195
Em 1982 eram contabilizadas 63 favelas com 76.268 barracos e aproximadamente 400 mil pessoas
(PMSP/Emurb, 1982 apud SILVA, 2009, p. 207)
196
196
Destaca-se a atuação do Movimento de Defesa dos Favelados, o qual, criado em 1978 em Santo
André, rapidamente foi ampliado e passou a abranger outras favelas da região metropolitana de São
Paulo (SILVA, 1994).
197
Dados oficiais indicam a construção de 4.512 unidades em 6 conjuntos (PMSP/ Emurb, 1982 apud
SILVA, 2009, p. 224)
198
Até 1982, 715 favelas (62.446 domicílios) foram dotadas de energia elétrica e 311 favelas (18.265
domicílios) dotados de ligações de água, sendo 98% de ligações individuais (SILVA, 2009, p. 222).
197
Entre agosto de 1980 e janeiro de 1984, 1060 favelas na cidade de São Paulo, com pouco mais de 83
mil barracos, foram eletrificadas (Sachs, 1999, p.186)
199
O Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal - Fundação Prefeito Faria
Lima (CEPAM) foi uma instituição pública do estado de São Paulo, extinta em 2015, destinada ao
estudo da administração pública municipal e prestação de serviços de capacitação e consultoria técnica
às prefeituras do estado de São Paulo.
200
Entres as razões para essa extinção estão a crise econômica dos anos 1980, que reduzia a captação
líquida do FGTS e fazia cair a receita de juros e amortizações de empréstimos; o altíssimo nível de
inadimplência dos mutuários; e a renegociação das dívidas de estados e municípios (MELO, 1989, p.
51)
198
casos que não preenchiam esses requisitos, obras mínimas visando a minimização
de riscos e saneamento foram realizadas (D’ALESSANDRO, 1999, p. 47).
Paralelamente às intervenções físicas, foi enviado à Câmara um pedido de
desafetação de oito áreas públicas para Concessão de Direito Real de Uso, a título
oneroso, para as famílias. Esse recurso jurídico passava a ser recorrente em
diferentes cidades brasileiras (BUENO, 2000), possivelmente em decorrência do
trabalho realizado pelas pastorais de moradia junto aos moradores de favelas201.
201
No Rio de Janeiro, por exemplo, destaca-se o programa "Cada Família, um Lote" desenvolvido pela
Secretaria Estadual de Trabalho e Habitação durante a gestão do governador Leonel Brizola (1983-
1987).
199
Como se procurou demonstrar até aqui, nos anos 1970 existia forte pressão de
movimentos sociais, assim como de parte da Igreja Católica para a urbanização das
favelas, em diferentes cidades. Essa pressão estendia-se também à academia. Um
grupo de professores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de
São Paulo, por exemplo, estimulava uma aproximação dos estudantes com a
realidade das favelas e periferias202 (ARANTES, 2002). Essa aproximação era
motivada por um debate intelectual mais amplo promovido em torno das teorias do
sistema mundo capitalista, das relações de dependência entre centro e periferia e da
dimensão excludente do crescimento econômico brasileiro. Buscava-se uma reflexão
sobre as características da urbanização brasileira e o papel das políticas urbanas e
habitacionais em transformar cidades marcadas por desigualdades e pobreza
(MARICATO, 1982). Tratava-se ainda de democratizar a técnica e, ao mesmo tempo,
racionalizá-la por meio dos conhecimentos especiais do arquiteto. Informados por
esse debate, e pela experiência já mencionada de Brás de Pina, pelas cooperativas
de habitação uruguaias203 e, de modo mais amplo, até pelos escritos de John F.C.
Turner e do arquiteto egípcio Hassan Fathy, laboratórios de habitação (no âmbito da
universidade), e assessorias técnicas foram criados, fortemente ligados a movimentos
de moradia (LOPES, 2011).
202
Ermínia Maricato, que assumiria a Secretaria de Habitação em 1989, ministrava desde o final dos
anos 1970 (junto com Rodrigo Lefèvre, Siegbert Zanettini e Walter Ono, entre outros) disciplinas que
incluíam visitas à periferia.
203
Organizadas em torno da Federación Uruguaya de Construcción de Viviendas por Ayuda Mutua-
Fucvam.
200
204
Foram removidas as favelas Cidade Jardim, em frente ao Jóquei Clube, e à Avenida Cidade Jardim,
a favela da Avenida Juscelino Kubitschek e a favela Formigueiro, na Vila Maria, antigo reduto eleitoral
de Jânio (BUENO, 2000, p.69)
201
A eleição de Erundina foi iniciada apenas três anos após o fim do BNH e com
parcos recursos para enfrentar o problema habitacional. O propósito da gestão foi,
portanto, mostrar que “uma outra política habitacional era possível” (BONDUKI, 2011,
p.41). Caberia à Habi “pensar os programas alternativos e estabelecer a interlocução
com o movimento de moradia”.
205
A operação “Municipal Micro Drainage Program in Sao Paulo- BR0077” foi aprovada em 17/12/1986
no valor total de 302.180.000 de dólares, sendo 224.680.000 correspondentes à contrapartida do
tomador.
206
Uma lista de todos as operações do BID nesse setor no Brasil pode ser encontrada em
https://www.iadb.org/en/projects-
search?query%5Bcountry%5D=BR&query%5Bsector%5D=DU&query%5Bstatus%5D=&query%5Bqu
ery%5D= Acesso em 18/05/2019.
207
Ermínia Maricato assumiu o cargo de Secretária de Habitação, convidando para Superintendente
de Habitação Popular a Nabil Bonduki, um dos profissionais envolvidos no Laboratório de Habitação
da Faculdade Belas Artes, responsável por iniciar a urbanização da favela Recanto da Alegria, na
gestão de Mário Covas.
202
Ao longo da gestão, e por demanda dos movimentos sociais, uma parte das
ações de urbanização de favelas também passaram a se dar por mutirão, porém a
urbanização de favelas foi apenas marginalmente financiada pelo Funaps, a partir de
1991 por meio do Programa de Urbanização Comunitária – Urbanacom212. Ao final, a
208
Lei 10.257 de 10 de julho de 2001 e Medida provisória 2.220, respectivamente.
209
Uma interessante análise preliminar da imbricação entre intelectuais paulistas, o Partido dos
Trabalhadores e o MNRU pode ser conferida em RUSSO (2017).
210
A urbanização da Favela Recanto da Alegria e o mutirão da Vila Nova Cachoeirinha eram
consideradas duas importantes referências.
211
Foi nessa gestão que o Funaps apresentou o maior percentual de participação no orçamento
municipal. Esse percentual que até então não ultrapassava cerca de 30% passaria a corresponder a
cerca de 50%, em média, do orçamento da Sehab, chegando a 77% em 1992, último ano da gestão
(ROSSETTO, 2003).
212
Com seis favelas e 2.199 domicílios sendo atendidos por este programa.
204
213
O deslizamento de parte da favela Nova República com a morte de 14 pessoas teria sido um fator
importante no sentido de dar mais agilidade ao processo de reorganização administrativa voltadas para
a implementação das ações nas favelas (BUENO, 2000).
214
AS Habis Regionais coordenavam a organização dos Fóruns Regionais de Habitação, onde
participavam os representantes de movimentos de moradia e comunidades de favelas, cortiços e
loteamentos (BUENO, 2000).
215
Alguns dos profissionais de outras cidades que contribuíram com as ações de urbanização e
regularização fundiária de favelas na gestão de Erundina foram: Denise Penna Firme, Eduardo Cesar
Marques e Paulo Saad, do Rio de Janeiro; Evangelina Pinho e José Marinho Nery da Silva Júnior, do
Recife; e Jorge Hereda, de Salvador.
216
A operação “Technical Cooperation Special Program -TC7907168” foi aprovada em 18/12/1980 no
valor total de 980.000 dólares sendo 330.000 correspondentes à contrapartida local.
206
217
Os estudos socioeconômicos deveriam ser realizados pela Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (Uerj), o diagnóstico físico-urbanístico pelo Instituto Municipal de Planejamento (Iplanrio, atual
IPP) e o levantamento jurídico pela própria SMDS.
218
Entre eles estavam Augusto Ivan Pinheiro, então diretor do Fundo Rio, que havia trabalhado na
urbanização de Brás de Pina e estudado no IHS; e Ephim Shluger, quem coordenou as obras de
saneamento na Rocinha e que havia estudado em Harvard.
219
Com a eleição de Brizola (1983-1987) para o governo do estado, a afinidade partidária com o
município teria permitido a ampliação do orçamento do programa (BUENO, 2000). No âmbito do
governo do Estado, foi criado o projeto de Urbanização Integral de Favelas com a meta de transformar
as favelas, respeitando sua estrutura original, em bairros populares integrados ao entorno urbano. As
favelas Pavão, Pavãozinho e Cantagalo foram as primeiras escolhidas para serem urbanizadas. Ainda,
207
no âmbito do governo estadual, foi criado pela Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de
Janeiro - Cedae um programa para o saneamento básico de comunidades de baixa renda (BARBOZA,
2013).
220
Para detalhes do cotidiano do Projeto Mutirão vale a leitura dos depoimentos de Lu Petersen ao
CPDOC em FREIRE; FREIRE-MEDEIROS e CAVALCANTI, 2009.
208
221
A Secretaria de Bem-Estar Social havia ampliado os programas de creches comunitárias e cursos
profissionalizantes em favelas, não atrelados à realização de obras físicas; a secretaria das
administrações regionais passou a executar as obras de contenção de risco (a partir de estudos e
avaliações de risco geotécnico contratados por Habi); as remoções necessárias para obras viárias e
de macrodrenagem, executadas pela Secretaria de Vias Públicas, passaram a ser compatibilizadas
com a produção de novas habitações; e peças de argamassa armada passaram a ser implantadas pela
Emurb nas canalizações de córregos e caixas de ligação na rede de esgotos (BUENO, 2000).
222
Em consequência de negociações prévias entre o Banco Mundial e o governo federal, que havia
solicitado o apoio do Banco Mundial em projetos junto aos governos estaduais para o controle da
poluição dos corpos d’água, em especial aqueles destinados ao abastecimento da população
(FRANÇA, 2009).
209
Não apenas em São Paulo, mas em diferentes cidades brasileiras, como será
explorado a seguir, foi por meio de projetos financiados pelo BID e Banco Mundial
(com importante participação do governo italiano em Belo Horizonte e Salvador) que
a experiência em urbanização de favelas se consolidou. Não obstante o financiamento
de projetos de infraestrutura tivesse passado a um segundo plano na agenda de
organizações multilaterais, como o Banco Mundial, a partir de meados dos anos 1980,
como explorado no capítulo 4. No Brasil, as intervenções em favelas passaram a
integrar progressivamente diferentes setores da administração e a abranger territórios
cada vez maiores, cujas obras beneficiariam não apenas as favelas em si, mas
também o seu entorno.
Com o fim da gestão Erundina, teve início a gestão de Paulo Maluf (1993-1996),
eleito pelo Partido Progressista (PP), partido que teve origem na antiga Aliança
Renovadora Nacional (Arena) de apoio à ditadura militar. Assim, os programas da
gestão anterior, de forte apelo popular, foram imediatamente interrompidos. O Funaps
foi extinto e substituído pelo Fundo Municipal de Habitação.
223
A equipe de coordenação era formada por: Elisabete França, arquiteta, na coordenação geral;
Cleusa Chimelli Mello, assistente social na coordenação do trabalho social; Violêta Saldanha Kubrusly,
arquiteta, na coordenação do sistema de informações geográficas; e Ricardo Sampaio, engenheiro, na
coordenação de obras.
212
224
Depoimento de Lu Petersen (FREIRE; FREIRE-MEDEIROS e CAVALCANTI, 2009, pp. 60, 62, 78)
215
2003). As negociações com o BID começaram em fins de 1994 e no ano seguinte foi
aprovado o empréstimo225.
Uma grande mudança com relação ao movimento que havia sido considerado
como uma “revolução silenciosa” (CAMPBELL, 2003) pelos expertos do Banco
Mundial. E muito diferente das “práticas bem-sucedidas” selecionadas pela delegação
brasileira para a Habitat II, dentre as quais estavam a experiência dos mutirões
autogestionários em São Paulo, do Prezeis em Recife e do Programa Alvorada em
225
A operação “Rio de Janeiro Urban Upgrading Program - BR0182” foi aprovada em 01/11/1995 no
valor total de 300.000.000 de dólares, sendo 180.000.000 correspondentes à contrapartida do tomador.
226
Na década de 1990, com financiamento do BID destacam-se o Favela-Bairro no Rio de Janeiro
(1994-2000); o Nova Baixada na Baixada Fluminense (1999-2007) e o Habitar Brasil-BID criado em
1999 junto ao governo federal. Com financiamento do Banco Mundial destaca-se o Programa Novos
Alagados (1992-2000) em Salvador e o Prosaner (1990-1996) no governo federal.
227
A “participação democrática”, uma das principais bandeiras do Movimento Nacional pela Reforma
Urbana, era vista como a participação da população no orçamento municipal, nos planos locais, no
projeto e na gestão dos recursos para construção de moradias (MARICATO, 1996b).
216
228
Esta metodologia se traduz na elaboração dos Planos Globais Específicos (PGE), instrumentos
previstos no Plano Diretor de Belo Horizonte que, a partir de 1998, passam a ser exigidos para cada
vila que conquista empreendimentos no processo do Orçamento Participativo (MELLO, 2005, p. 6).
229
Urban Services to the Poor Thematic Group.
230
Cf. http://web.mit.edu/urbanupgrading/
231
Dentre os participantes estavam os especialistas do Banco Mundial brasileiros: Jose Brakarz, Ivo
Imparato, Vitor Serra. Além dos agradecimentos às agências financiadoras (GTZ, BID, KfW, Usaid) foi
feito um agradecimento especial à empresa Diagonal, gerenciadora fundada em Pernambuco em 1990
que a partir da gestão de Paulo Maluf em São Paulo ficaria responsável pelo trabalho social nas
urbanizações de favelas.
217
Pode-se considerar, assim, que por meio desse guia era posta em prática a
diretriz de James Wolfensohn de transformar o Banco Mundial em um Banco do
Conhecimento. Na ocasião do seu lançamento, durante o Upgrading Low-Income
Settlements - A Regional Roundtable for Africa, realizado em Joanesburgo em outubro
de 2000, o Programa Guarapiranga foi apresentado em uma sessão dedicada à
apresentação das Global Experiences and General Lessons (FRANÇA, 2009, p. 194).
Esse evento era visto pelo Banco Mundial e a recém-criada Aliança de Cidades como
um primeiro passo para ajudar a (re)estabelecer uma comunidade de profissionais de
slum upgrading na África (BERGEN, 2001).
232
Disponível em http://web.mit.edu/urbanupgrading/upgrading/case-examples/index.html
Acesso em 27/03/2019. Tradução nossa.
218
233
Interactive Planning Workshop for Johannesburg, Greater Johannesburg Metropolitan Council,
September 27-30, 2000.
234
Ao final da implementação do programa em 2000 haviam sido investidos 338 milhões de dólares
(119 milhões provenientes do Banco Mundial e o restante da contrapartida dos executores, isto é, além
da própria Sabesp, a Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo; a Companhia de
Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU); a Eletricidade de São Paulo
S.A (Eletropaulo) e a Prefeitura do Município de São Paulo. Do total de recursos investidos, 113,9
milhões foram para as ações de recuperação urbana que incluíam a urbanização das favelas
(FRANÇA, 2009).
219
No início dos anos 1990, com o suporte financeiro do Banco Mundial, o governo
federal implementou o Projeto de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário
para Comunidades de Baixa Renda – Prosanear I, com caráter de projeto piloto235.
Em seguida, o programa foi continuado pelo governo federal com recursos do FGTS.
A avaliação do governo, no entanto, era de que o desempenho do programa estava
abaixo do esperado e com isso um novo acordo de empréstimo foi buscado junto ao
Banco Mundial. Esse empréstimo centrado na assistência técnica para o
“desenvolvimento institucional” dos municípios, deu origem ao PAT-Prosanear (2000-
2007), cuja proposta inicial era subsidiar tecnicamente os municípios na concepção
de projetos, incorporando as lições aprendidas do Prosanear I e as contribuições de
programas como Favela-Bairro e Guarapiranga, enfatizando a “metodologia
participativa” e o “planejamento integrado – urbanismo, saneamento e trabalho
social”236.
235
No valor de 100 milhões de dólares. Para detalhes ver: BAKALIAN, A.E.; KATAKURA, Y, 1998.
236
Serviço de Informação ao Cidadão – SIC Ministério das Cidades. Disponível em:
http://www.consultaesic.cgu.gov.br/busca/dados/Lists/Pedido/Item/displayifs.aspx?List=0c839f31%2D
47d7%2D4485%2Dab65%2Dab0cee9cf8fe&ID=417376&Web=88cc5f44%2D8cfe%2D4964%2D8ff4%
2D376b5ebb3bef
220
desempenho desse programa havia sido utilizado como justificativa para um acordo
de empréstimo com o BID. O novo formato do programa passava a exigir dos estados
e municípios o levantamento dos “assentamentos subnormais”, a definição de
prioridades de intervenção (Plano Estratégico Municipal para Assentamentos
Informais – Pemas), a elaboração de projetos básicos para as obras físicas e de
diretrizes a regularização fundiária e o trabalho social237.
237
Era exigido que o projeto fosse aprovado por cerca de 80% das famílias cadastradas nas áreas sob
intervenção, e o cumprimento de normas específicas para os reassentamentos necessários devido à
urbanização. O Programa abrangeu 119 municípios no âmbito do Subprograma de Desenvolvimento
Institucional e em 84 destes municípios foram efetivados contratos de obras de urbanização (REGINO,
2017).
238
O Estudo de Avaliação da Experiência Brasileira sobre Urbanização de Favelas e Regularização
Fundiária desenvolvido pelo Ibam avaliou iniciativas de urbanização de favelas em dez cidades
brasileiras: Belém, Belo Horizonte, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, Santo
André, Teresina e Vitória. O estudo destacou que à exceção do Rio de Janeiro, na maioria das outras
cidades o aporte de recursos municipais para o desenvolvimento dessas iniciativas era significativo.
221
Foi nesse contexto que a Prefeitura de São Paulo procurou, logo no primeiro
ano da gestão liderada por Marta Suplicy, o suporte Aliança de Cidades para a
reestruturação da política habitacional. Na proposta enviada, a Prefeitura destacou,
por exemplo, a necessidade de superar a prática de intervenções pontuais e isoladas
na prática da urbanização de favelas:
239
Paulo Teixeira foi coordenador geral da Articulação Nacional do Solo Urbano (Ansur), entre 1987 e
1991, e deputado estadual pelo PT entre 1994 e 1998 e entre 1998 e 2000. Vereador pelo PT em São
Paulo entre 2004 e 2007, foi eleito e reeleito deputado federal pelo mesmo partido desde então.
240
Cf. http://www.labhab.fau.usp.br/pesquisa/concluidas/2003-2/plano-de-acao-habitacional-e-urbana-
para-areas-em-situacao-de-risco-pela-exclusao-socioespacial-e-a-violencia/
223
alterações. O BID então aprovou que parte dos recursos do Programa de Urbanização
e Verticalização de Favelas (Prover) fosse redirecionada para a contratação de
projetos executivos de urbanização integrada para 16 favelas (MAGALHÃES e
VILLAROSA, 2012), algumas das quais haviam recebido melhorias ainda na gestão
de Luiza Erundina. O Programa Guarapiranga teve sua área de abrangência
ampliada, incorporando as favelas e loteamentos no entorno da Represa Billings e
passou a ser denominado Programa Mananciais. A gestão também avançou no
campo da regularização fundiária, com a desafetação de 160 áreas ocupadas por
favelas e emissão de títulos para cerca de 45.000 residentes. Um novo Plano Diretor
foi elaborado, o qual, aprovado em 2002, definiu mais de 900 áreas como Zonas
Especiais de Interesse Social. Em consequência dessas ações, a Sehab recebeu, em
2004, o prêmio internacional Direito à Moradia do Centro pelo Direito à Moradia contra
Despejos241.
241
A ONG internacional Centre on Housing Rights and Evictions (Cohre) foi fundada em 1991 e
encerrou suas atividades em 2014. Durante o período em que esteve ativa foi muito influente junto às
Nações Unidas.
224
242
Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000.
225
Nesse sentido, vale destacar, por exemplo, o importante papel que o ex-
secretário de habitação dessa gestão desempenhou ao seu término. Logo após, o
mesmo se tornou um dos membros do Conselho Consultivo de Política da Aliança de
Cidades e da força-tarefa do Projeto do Milênio das Nações Unidas, dedicada a
melhorar as condições de vida dos moradores de slums (UN Millenium Project, 2005).
Este ainda se tornou o principal articulador da atuação da Aliança de Cidades no
governo federal, após a eleição de Lula (também pelo PT) e a criação do Ministério
das Cidades em 2003.
243
O PT já havia mostrado uma tendência a dedicar especial atenção às relações internacionais. Sob
sua liderança o município de Porto Alegre havia sido o primeiro município a estabelecer uma secretaria
dedicada à captação de recursos e à cooperação internacional em 1994, a qual teve um papel proativo
na disseminação do orçamento participativo. Até então as cidades brasileiras não tinham uma
participação relevante no movimento internacional de cidades e em redes como a IULA e a FMCU
(SALOMÓN, 2011).
226
244
Com recursos na ordem de 1 bilhão de reais anuais provenientes do Orçamento Geral da União a
partir de 2006.
245
O PAC representou a retomada, após cerca de duas décadas de ajuste estrutural, de uma postura
desenvolvimentista pelo governo federal, por meio de um conjunto de investimentos em infraestrutura
(logística, energética e social e urbana,). A primeira fase do PAC (2017-2010), aproveitando-se da
conjuntura econômica internacional favorável, representou um investimento total de 619 bilhões de
reais, sendo cerca de 255 bilhões correspondentes ao eixo infraestrutura urbana e social. Cf.
http://www.pac.gov.br/pub/up/relatorio/6c57986d15d0f160bc09ac0bfd602e74.pdf
246
Para uma análise da implementação do programa sugere-se a leitura de Cardoso e Denaldi (2018).
247
Foram eleitos os prefeitos José Serra (2005-2006) e Gilberto Kassab (2006-2012).
248
Essa cooperação técnica foi realizada entre 2005 e 2008, a pedido da então Superintendente de
Habitação Popular.
227
249
Os projetos da gestão anterior, que privilegiavam o aspecto da regularização fundiária e previam um
grande número de remoções, foram revistos. Para Zuquim (2012) essa diretriz gerou uma cisão no
território das favelas, uma vez que é nítida a diferença entre o tratamento dado às novas áreas de
provisão e o restante do tecido urbano da favela onde a intervenção foi pouco efetiva.
250
Soma dos valores repassados na modalidade urbanização e saneamento integrado, segundo dados
do Ministério das Cidades em dezembro de 2017.
251
7,5% da receita bruta obtida com a exploração dos serviços de abastecimento de água e
esgotamento sanitário no Município de São Paulo.
228
Eventos como esse seriam uma forma comum das agências de financiamento
e as organizações interacionais persuadirem os governos das cidades presentes pela
criação de novas parcerias. De qualquer modo, contribuía enormemente para a
visibilidade internacional da política de urbanização de favelas em curso em São
Paulo. Vale lembrar ainda que foi um ano após a realização desse evento que ocorreu
o evento em Durban, co-organizado pela CGLU e pelo instituto municipal sul-africano,
MILE. Evento, no qual, a presença e apresentação dos técnicos de São Paulo era
aguardada com grande expectativa de estabelecimento de cooperação.
252
O balanço das atividades da Sehab e Cohab entre 2005 e 2009, apresentado em janeiro de 2010
na sede da Prefeitura, indicou no âmbito do Programa de Urbanização de Favelas intervenções em 55
áreas (9 concluídas e 46 em andamento), totalizando investimentos na ordem de 2,4 bilhões de reais
(68% provenientes da Prefeitura e o restante dos governos estadual e federal). No âmbito do Programa
Mananciais, o mesmo balanço indicou intervenções em 94 áreas (14 concluídas e 80 em andamento)
com investimentos equivalentes a 1,1 bilhões de reais (70% da Prefeitura). No âmbito do Programa de
Regularização Fundiária, o balanço indicou a entrega de títulos a 18 mil famílias em 115 áreas.
229
Ainda em 2012, um ano após o início da parceria com Durban, São Paulo
ganhou o prêmio Scroll of Honour, da UN-Habitat destinado a reconhecer as iniciativas
exemplares na área de habitação em todo o mundo.
231
253
Amplamente compreendidas como organizações, regras formais, políticas públicas, regimes
políticos e economias políticas (CAPPOCIA, 2015).
233
viáveis (CAPOCCIA e KELEMEN, 2007). Essas mudanças, por sua vez, gerariam um
legado institucional de longa duração que constrangeria a ocorrência de novas
mudanças. Desse modo, o que o conceito de “dependência de trajetória” implica não
é apenas que a história importa, mas que uma vez adotado certo caminho, sua
reversão esbarrará em arranjos institucionais que podem dificultar a realização de
novas mudanças (LEVI, 1997). O acionamento desse conceito da ciência política, aqui
realizado de maneira experimental, possibilita a interpretação da instauração dos
novos regimes democráticos nos dois países como um segundo momento crítico na
trajetória das políticas habitacionais aqui analisadas comparativamente.
No caso brasileiro, a falência do BNH faria com que políticas nacionais para as
favelas somente voltassem a ser estruturadas nos anos 1990, com a assistência
técnica e empréstimos de agências multilaterais. A ausência de um sistema nacional
permitiu que o governo local estruturasse um programa para a urbanização das
favelas, independentemente de recursos externos e federais, e em diálogo com
experiências similares em outras cidades brasileiras (algumas com financiamento
externo). Em geral, essas experiências foram postas em prática por governos
liderados por partidos de esquerda que cultivavam o ideário da reforma urbana, de
direito à cidade e cidadania para todos. A participação no debate sobre os rumos das
políticas urbanas e habitacionais era vista como um meio de partilha do poder.
No caso sul africano, em contraposição, entre meados dos anos 1980 e 1990
– quando internacionalmente são mobilizadas campanhas para a garantia da posse
de terra e inserção de “assentamentos informais” no mercado associadas a
financiamentos para o “desenvolvimento institucional” – as cidades estão imersas em
234
Com o fim do apartheid, o novo governo democrático optou por uma política
nacional centrada no subsídio total de unidades habitacionais para os mais pobres
produzidas pelo mercado, uma adaptação do modelo chileno desenvolvido com o
apoio de agências multilaterais. Um modelo que do ponto de vista ambiental, urbano
e social representava um retrocesso em relação às pioneiras iniciativas de in-situ
upgrading. As cidades sul-africanas, em consequência acabaram mais dispersas e a
segregação entre os grupos sociais pouco se alterou, com os pobres mantidos em
áreas distantes e deficientes de infraestrutura e serviços urbanos ou em enormes
“assentamentos informais” sem qualquer infraestrutura. A adoção desse modelo,
porém, de positivos efeitos eleitorais, parece ter sido vantajosa para a manutenção do
CNA no poder, permitindo com que este permanecesse inalterado por uma década,
mesmo diante das dificuldades dos cofres públicos em mantê-lo e de pressões
externas pela revisão do subsídio total e adoção de programas alternativos.
A cooperação entre São Paulo e Durban, de um lado, pode ser vista como
resultado do engajamento de diferentes atores políticos brasileiros em promover a
imagem da cidade de São Paulo, através de programas de urbanização de favelas.
Essa promoção, conduzida ao longo de diferentes governos, ora enfatizou um
discurso de participação democrática e direito à cidade, ora de planejamento
254
Não obstante tenha que se ressaltar, no caso de São Paulo e outras cidades brasileiras, a
significativa importância de contratos com financiamento externo, caracterizados pela longa duração,
em garantir a continuidade de certos programas para as favelas entre diferentes gestões. No caso da
África do Sul, esse aspecto parece ser menos relevante, pois os programas municipais são
dependentes dos recursos e normas definidas na esfera federal e provincial. Esse, porém foi um
aspecto pouco explorado.
238
255
Comunicação por e-mail em 16/05/2015.
240
São duzentos e setenta e oito municípios [na África do Sul], nós somos
o único com (...) instituto próprio de ensino e aprendizagem (...) [os
municípios] vêm até nós (...) eles dizem: há algo específico que nos
afeta (...) então chamamos alguém responsável pelo que chamamos
de suporte técnico municipal que vai até o município e pergunta qual
é o seu problema? (…) Mas há também certos aspectos que estamos
dispostos a aprender, por exemplo (…) sistemas de transporte rápido
de ônibus (…) fomos para Curitiba (…) sistemas de transporte
integrados (…) Índia (…) habitação (…) São Paulo. Como MILE, nosso
mandato é levar eThekwini, Durban, para o mundo (...) o que estamos
percebendo agora é que o mundo também está vindo até nós através
da CGLU. (...) E por isso vamos a Moçambique, Namíbia, Malawi,
Tanzânia, Gana, países de língua inglesa (…) Somos apoiados por
241
256
Entrevistado 5 (transcrição e tradução nossa)
242
Durban pode ter “aprendido” muita coisa com a experiência de São Paulo, a
interface com o trabalho social e a qualificação ambiental almeijada com os projetos,
foram algumas das “lições” destacadas pelos entrevistados envolvidos na cooperação
por parte da cidade sul-africana. O quanto esses “aprendizados” provocarão de fato
mudanças na implementação do in-situ upgrading é algo difícil de ser medido no curto
prazo, dadas as complexidades e temporalidades envolvidas nas mudanças das
políticas. Observa-se, porém, que um aspecto importante a ser destacado está
relacionado à expectativa de projeção, tanto internacional quanto nacional, que
acordos desse tipo poderiam trazer à Durban. Afinal o que a experiência brasileira
demonstrava, após décadas de cooperação com agências multilaterais, fundações
filantrópicas e outras organizações internacionais, é que a cidade que aprende torna-
se aquela que ensina.
6 CONCLUSÃO
257
Em crítica à visão generalista presente em Scott e Storper (2015) as cidades devem ser
compreendidas como entidades separadas entre si e definidas segundo a variação empírica em termos
de aglomeração, densidade e proximidade.
246
A análise do caso sul-africano, por sua vez, revelou que não obstante o papel
significativo que iniciativas de in-situ upgrading tiveram em minimizar os violentos
conflitos durante os últimos anos do regime do apartheid, a política habitacional após
247
Além disso, percebeu-se que a partir dos anos 2000, uma vez consolidado o
esvaziamento do caráter político das ações pioneiras de urbanização de favelas e de
in-situ upgrading, passaram a ser privilegiadas as trocas e cooperações diretas entre
governos locais, porém sob a supervisão das agências financiadoras com a
intermediação de instituições como a rede Cidades e Governos Locais Unidos,
compromissada em garantir a aderência dessas trocas, por vezes similares a serviços
de consultoria, ao paradigma global de política para as cidades periféricas, cuja
institucionalização se completou com a criação da Aliança de Cidades. A
compreensão das cooperações entre cidades, contudo não pode ser desvinculada
dos interesses dos atores políticos locais, os quais pareceriam atrair visibilidade
internacional e local não apenas para as cidades que buscam promover como para si
mesmos. Assim, em troca da garantia de novos financiamentos e investimentos,
capazes de aumentar a competitividade das cidades beneficiadas, atores políticos
locais se beneficiariam de maior legitimidade política e profissional.
Deseja-se, assim, que esta tese seja compreendida como uma de muitas
maneiras de se comparar, compreender e clarificar processos mútuos de constituição
248
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