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NEIO CAMPOS

MUDANÇA NO PADRÃO DE DISTRIBUIÇÃO SOCIAL A


PARTIR DA LOCALIZAÇÃO RESIDENCIAL

Brasília: década 90

Tese apresentada ao Curso de Doutorado do Programa de


Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de
Doutor em Planejamento Urbano e Regional.

Orientador: Prof. Dr. Pedro Abramo


Doutor em Economia / Ècole des
Hautes Etudes en Sciences Sociales

Rio de Janeiro
2003
C198m Campos, Neio.
Mudança no padrão de distribuição social a partir da
localização residencial : Brasília, década 90 / Neio
Campos. – 2003.
196 f. : il. ; 30 cm.

Orientador: Pedro Abramo.


Tese (doutorado) – Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e
Regional, 2003.
Bibliografia: f. 177-186.

1. Localização residencial. 2. Economia urbana.


3. Brasília (DF). I. Abramo, Pedro. II. Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Pesquisa e
Planejamento Urbano e Regional. III. Título.

CDD: 330.91732
NEIO CAMPOS

MUDANÇA NO PADRÃO DE DISTRIBUIÇÃO SOCIAL A


PARTIR DA LOCALIZAÇÃO RESIDENCIAL

Brasília: década 90

Tese submetida ao corpo docente do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e


Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do grau de Doutor em Planejamento Urbano e Regional.

Aprovado em:

Prof. Dr. Pedro Abramo – Orientador


Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional - UFRJ

Prof. Dr. João Rovatti

Profª Drª Norma Gonçalves Lacerda

________________________________
Profª Drª Ana Clara Torres Ribeiro

________________________________
Prof. Dr. Ricardo Libanez Farret

________________________________
Dr. José Agostinho Anachoreta Leal
AGRADECIMENTOS

O trabalho de elaboração de uma tese envolve um esforço coletivo, difícil


de ser percebido quando da socialização do mesmo, seja em termos da
responsabilidade final pelas idéias, análises e conclusões registradas no texto
final, como na própria defesa da tese, feita perante uma banca examinadora pelo
autor do trabalho.
No entanto, o trabalho metodicamente organizado que é perseguido em
uma tese, é a expressão de um conjunto de idéias, as quais, de formas distintas,
são compartilhadas por diversas pessoas em diferentes posições sociais,
contextos e momentos.
Os agradecimentos iniciais as pessoas que auxiliaram a conclusão desse
trabalho são dirigidos ao meu amigo e orientador Prof. Dr. Pedro Abramo. A ordem
referida acima tem um significado concreto fundamental, por que se não tratasse
de um amigo, a oferecer o seu ombro fraterno acima de qualquer circunstância,
com apoio e generosidade tamanha que impediram à difícil decisão de desistência
da tarefa de conclusão do doutoramento, ajudando a superar os dramas pessoais
intercorrentes a essa admirável aventura que é a vida humana. Especificamente,
no que se relaciona ao papel de orientador, o Prof Dr. Pedro Abramo de muito
tempo se apresenta como uma referência importante à perspectiva teórico-
metodológica adotada nas pesquisas já realizadas, oferecendo importantes
contribuições de um economista não-ortodoxo à visão de um geógrafo que busca
entender processos sociais por meio da teoria espacial crítica. Estendo esses
agradecimentos à Andréa Cunha e Luciana Fernandes, amigas e colegas do
Observatório Imobiliário e de Políticas do Solo, coordenado por Prof. Pedro,
espaço privilegiado para reflexão da temática desenvolvida na tese.
Agradeço ao corpo docente do Instituto de Pesquisa e Planejamento
Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro pela oportunidade
da formação e aprofundamento da compreensão do espaço urbano e regional, por
meio de diversos seminários, debates e discussões. Gostaria de destacar o
privilégio especial e altamente compensador de ter a Profª Ana Clara Torres
Ribeiro como professora durante dois semestres, nos seminários preparatórios do
Projeto de Tese. Seu desempenho rigoroso, ao mesmo tempo amável,
sedimentou uma admiração iniciada ainda como recém mestre em Planejamento
Urbano, em 1988, nas discussões e mobilizações acerca da Reforma Urbana,
mas, principalmente, condicionou a minha atividade docente para o ensino de
Metodologia da Pesquisa na graduação do curso de Geografia da Universidade de
Brasília, onde, os textos com orientação dos passos metodológicos necessários à
construção do conhecimento científico me servem de bússola. Estendo esses
agradecimentos aos colegas do Programa de Doutorado do IPPUR assim como
aos seus funcionários.
Em Brasília, tenho tido a oportunidade de conviver profissionalmente com
diversas pessoas e situações, tanto com colegas da Universidade de Brasília
(UnB) como da Empresa de Consultoria Tecnologia e Consultoria Brasileira
(TCBR). Em todas essas oportunidades sobressai a busca da troca de
experiências que permite a aquisição de novos conhecimentos, mas,
principalmente, o estreitamento de laços de amizade e afeto, fundamentais para
propiciar uma convivência prazerosa.
O suporte financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior – CAPES, por meio do Programa Institucional de Capacitação
Docente e Técnica deu a base material para enfrentar os custos incorridos durante
todo o desenvolvimento do Programa. Importante, também, agradecer, na pessoa
do Prof. Dr. Martim Smolka, Senior Fellow e Diretor do Programa sobre América
Latina e Caribe do Lincoln Institute of Land Policy, a concessão da Bolsa
Dissertation Felowship, em junho de 2000.
Alguns profissionais contribuíram mais diretamente no desenvolvimento
desse trabalho, seja por meio da aplicação dos questionários da pesquisa de
campo, destacando-se as alunas do Curso de Graduação do Departamento de
Geografia, Maria Rita Fonseca e Mariana Miranda, como na revisão do texto,
realizada pela Arquiteta Luciana Pessoa. A formatação e ilustração foi elaborada
por Nanci Andrade e maior parte dos mapas foram elaborados no Laboratório de
Informações Espaciais do Departamento de Geografia da UnB, pelo competente
trabalho da colega Potira Hermuche. Agradeço, também a permissão para uso de
alguns gráficos e mapas confeccionados pela equipe coordenada pelo Dr. Heber
Ramos, diretor da TCBR. .
Gilberto Gil afirma que a Bahia lhe deu régua e compasso. Compartilho
desse sentimento com ele, acrescentando a bússola representada pela formação
dada por meus pais, José Campos e Helena Flora de Oliveira Campos, a
convivência com a minha companheira Albaneide e os filhos, Geane, Ciro e
Helena, os quais no cotidiano dividiram todos os momentos vivenciados durante a
elaboração dessa tese, agradecendo a compreensão e a compaixão que sempre
tiveram pelas minhas falhas e ausências.
RESUMO

A mudança no padrão sócio-espacial de Brasília como uma das expressões


do processo de estruturação intra-urbana é o objeto deste trabalho. Compreender
como se processa a decisão das escolhas de localização, tanto em relação à
produção como o consumo de formas-conteúdo (edifícios, condomínios, bairros,
lotes, equipamentos e infra-estruturas urbanas) em seus movimentos concretos de
valorização/desvalorização espacial, constitui o seu objetivo geral. Essa decisão é
tomada em uma trama de relações complexas na qual o espaço não é apenas
uma condição geral para que as escolhas se materializem, mas uma dimensão
constitutiva dessas decisões, suscitando, no caso concreto em análise, a questão
principal do estudo: como se processa a coordenação espacial dos eventos de
transformação do espaço intra-urbano de Brasília, cada vez mais dinâmicos,
complexos e contingentes, marcados por tomada de decisões locacionais
estratégicas e interdependentes? A abordagem teórico-metodológica relaciona os
sinais emitidos por convenções urbanas, enquanto mecanismo de coordenação
espacial, ao conceito de forma-conteúdo, ou seja, a materialização localizada da
dinâmica social que não é explicada pela sociedade sozinha, mas pelo que essa
forma-conteúdo representa enquanto permanência e transformação da
ordem/desordem espacial. O principal resultado alcançado é a aplicação de uma
abordagem heterodoxa de economia e geografia urbana ao campo dos estudos
intra-urbanos, tomando como exemplo empírico à configuração sócio-espacial de
Brasília. Constatou-se que a dinâmica sócio-espacial de Brasília tem nas
sinalizações emitidas pelos agentes que produzem e se apropriam do espaço, o
aspecto constitutivo mais forte, trazendo para o centro da análise a categoria
espaço enquanto híbrido de sistemas de ações e de objeto.
ABSTRACT

The change in the social and spatial Brasilia pattern, as like one of
expressions of the intra-urban process, is the object this thesis. To understand how
works the location decision-making choice, by the side of production as consuming
shape-contents (buildings, neighborhoods, lots, equipments and infra-structure
urban), in their concrete movements of valorization/desvalorization of the space,
it’s the general objective. This decision is adopted in a trama of complex
relationship where the space is not just a general condition to support the
locational choice, but it’s one of the constitutive dimensions of these decisions,
arising, in concrete analysis case, the main problem of the study: how works the
spatial coordination of events around the Brasilia’s intra-urban space
transformation? This transformation is taken in context of dynamic, complex and
contingents, signalized by strategic and interdependent locational choice. The
theoretical and methodological approach relates the urban convention signals
while mechanism of spatial coordination, to concept of contents-shape, on the
other words, to the located materialization of social dynamic that is not explicated
by self society, but by this shape-contents represents while o permanency and
transformation of spatial ordem/desordem. The main results this work is the
application of a heterodox approach in the fields of intra-urban studies both
economics and geography subjects, taken as example Brasilia and it’s social and
spatial configuration.
Lista de Ilustrações
Tabelas
Tabela nº 1 - Crescimento da População Urbana do Distrito Federal....................36
Tabela nº 2 - Distrito Federal – Favelas (1982) ......................................................39
Tabela nº 3 - Entorno do Distrito Federal – Evolução da População Total dos
Municípios do Aglomerado de Brasília (1970 – 1996)............................................42
Tabela nº 4 – dados empíricos nos 3 momentos....................................................79
Tabela nº 5 - População Economicamente Ativa (PEA) e População
Ocupada (PO) - 1996 e 2000................................................................................106
Tabela nº 6 - Ocupações Principais em 1997 (Em
%)..............................................116
Tabela nº 7 - Indicador de Educação - 1996 e 2000............................................111
Tabela nº 8 - Renda Domiciliar Mensal Per Capita - 1996 e 2000.......................113
Tabela nº 9 - Grau de Concentração de Renda no Distrito Federal - 1997 e 2000
..............................................................................................................................118
Tabela nº 10 - Índice Médio de Desenvolvimento do Distrito Federal - 1996 e 2000
..............................................................................................................................121
Tabela nº 11 – Determinantes da troca de residência por classe de renda e
condição de ocupação do imóvel anterior............................................................122
Tabela nº 12 – Trajetórias urbanas entre localidades..........................................125
Tabela n° 13 - Déficit Habitacional por Faixa de Renda.......................................165
Tabela nº 14 - População Urbana e Número de Lotes Residenciais Licitados
no Distrito Federal -1989 – 1998..........................................................................166

Figuras
Figura nº 1 - As semelhanças e diferenças entre Ricardo e Marx.........................68
Figura nº 2 - As semelhanças e diferenças entre Ricardo e Marx..........................69
Figura nº 3 - Escassez dos bens não produzidos e suas condições de troca........71
Figura nº 4 - Modelo de Análise Decisória”.............................................................90
Figura n° 5 - Localização residencial do migrante de baixa renda em seu processo
de integração na cidade..........................................................................................92
Figura n° 6 – O caminho da convenção urbana...................................................142

Quadros
Quadro nº 1 - “MODELO DE TURNER” .................................................................93
Quadro n° 2 - Desenho institucional dos primeiros anos do BNH........................162

Gráficos

Gráfico n° 1 – Índice de Gini – RA’s do DF – 1997 e 2000...................................118


Gráfico n° 2– População do Distrito Federal (Mil hab. 2000) x Distância de Brasília
(Km)......................................................................................................................126
Gráfico n° 3 – População do Entorno (Mil hab. – 2000) x Distância de Brasília (Km)
..............................................................................................................................127
Gráfico nº 4 – População Acumulada (%) DF e Entorno x Distância de Brasília
(Km)......................................................................................................................128
Gráfico n° 5 – Modos de Viagens X Renda..........................................................129
Mapas

Mapa n° 1 – Localização dos Ribeirões do Torto e Gama.....................................28


Mapa n° 2 – Distrito F e entorno.............................................................................41
Mapa n° 3 – Regiões Administrativas do DF..........................................................44
Mapa n° 4 - Distrito Federal – dinâmica territorial..................................................48
Mapa n° 5 - Ocupação Territorial – projeção futura (PDOT)..................................98
Mapa n° 6 - Ocupação Territorial – 1950-1960).....................................................99
Mapa n° 7 - Ocupação Territorial – década de 1970...........................................100
Mapa n° 8 - Ocupação Territorial – década de 1980...........................................101
Mapa n° 9 - Ocupação Territorial – década de 1990...........................................102
Mapa n° 10 - Variação da Ocupação Territorial entre as décadas de 1960 e 1990
..............................................................................................................................103
Mapa n° 11 - Postos de Trabalho........................................................................108
Mapa n° 12 - Matrículas escolares (mil)..............................................................112
Mapa n° 13 - Renda Domiciliar............................................................................115
1

SUMÁRIO

Apresentação 12

Introdução 14

Capítulo I - A Concepção Urbanística de Brasília 20


Introdução 20
Principais Matrizes Conceituais 22
Breves Incursões Contextuais Acerca da Construção 26
Configuração Espacial de Brasília 30

Capítulo II - Espaço, Localização e Posição Social 50


Introdução 50
Principais contornos do debate sobre Espaço 53
Localização, Valorização do Espaço e Posição Social 63
Localização e Dinâmica Espacial de Brasília 75

Capítulo III - Mobilidade Sócio-espacial em Brasília 82


Introdução 83
Motivações e Preferências nos Deslocamentos Intra-urbanos 96
Fatores de Atração e Expulsão 96
Dimensão dos Deslocamentos Intra-Urbanos 124

Capítulo IV - Convenção Urbana, Formas-Conteúdo e Coordenação da


Dinâmica Espacial de Brasília
Introdução 130
Convenções Urbanas na Perspectiva Heteredoxa de Economia Urbana e a
Dinâmica Espacial da Cidade 133
Formas-Conteúdo Articulando a Espacialidade Intra-Urbana 146
Brasília e a Coordenação da Dinâmica Espacial 165

Conclusões 171

Referências 167

Anexos 187
12

APRESENTAÇÃO

Este trabalho expressa os momentos pessoais difíceis enfrentados pelo


pesquisador no decorrer do doutoramento, associado à própria complexidade da
tarefa de trabalhar com um objeto de natureza interdisciplinar, o espaço urbano,
constituinte da própria realidade existencial do pesquisador/morador.
Apesar do marco lógico do trabalho fincar suas bases na formação de
geógrafo, o desenvolvimento da argumentação projeta-se em outras áreas do
conhecimento tais como a economia urbana, a sociologia urbana ou ainda a
história urbana na tarefa de analisar a mudança no padrão de distribuição social
de Brasília a partir da localização.
A tese ora apresentada reflete uma jornada já trilhada na temática da
estruturação intra-urbana, iniciada na metade dos anos 80, com a participação na
pesquisa associada, coordenada pelos pesquisadores e professores da
Universidade de Brasília, Aldo Paviani e Ricardo Farret, denominado “Mobilidade
Residencial Intra-Urbana no Distrito Federal” (1986). Nesta pesquisa, o aspecto
analítico ressaltado foi às motivações do morador no processo de deslocamento
no espaço interno da cidade.
Em seguida, a dissertação de mestrado defendida em 1988 no Instituto de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, versava sobre a produção
da segregação residencial em Brasília, compreendendo-a como um dos signos do
processo de estruturação intra-urbana em um contexto de desigualdade sócio-
espacial.
Continuando os esforços para a compreensão do processo, no início dos
anos 90, no âmbito de um Projeto Integrado com o Instituto de Pesquisa e Pós-
Graduação em Planejamento Urbano e Regional/IPPUR, foi desenvolvida uma
pesquisa sobre a dinâmica imobiliária e a estruturação intra-urbana de Brasília,
adotando o mesmo procedimento metodológico e base de informações da
pesquisa pioneira coordenada por Martim Smolka para a cidade do Rio de Janeiro
(Smolka, 1995).
13

Essa pesquisa proporcionou a formação de um banco de dados contendo


as informações sobre as transações imobiliárias compreendendo uma série
temporal significativa de 30 anos, além de ter permitido aos pesquisadores
envolvidos participarem da Rede de Pesquisa Dinâmica Imobiliária e Estruturação
Intra-Urbana, de âmbito nacional, a qual fomentou como principais atividades da
rede, a realização de dois seminários de pesquisa de caráter internacional, onde
foram discutidos os aspectos teórico-metodológicos implicados pela temática.
A culminância desse envolvimento canalizou-se para a realização desse
programa de doutoramento em Planejamento Urbano e Regional no IPPUR, sob a
orientação do Prof. Pedro Abramo, encetando além da reflexão aprofundada
acerca do campo geral, a oportunidade de envolvimento nas atividades
coordenadas pelo referido pesquisador, ressaltando-se a participação em dois
seminários internacionais organizados no decorrer desse período.
Face ao envolvimento com a linha de pesquisa, referida anteriormente, o
Lincoln Institute of Land Policy concedeu no ano de 2000 uma Bolsa (Dissertation
Fellowship) para auxílio no desenvolvimento da pesquisa, assim como, por
recomendação do Prof. Martim Smolka, recebeu um convite para participação e
apresentação no Lincoln Institute of Land Policy de um curso sobre o
Funcionamento do Mercado de Terras Urbanas, ocorrido em novembro de 2001,
em Cambridge, MA, Estados Unidos.
Cabe mencionar, também, o programa desenvolvido no ano de 2001, no
âmbito do European Regional and Development Planning PhD Module, pela
Université du Lille, por indicação do Prof. Abramo, o qual proporcionou um
intercâmbio profícuo de experiências e visões acerca do planejamento urbano e
regional da Europa.
14

INTRODUÇÃO

“Pouco a pouco, baseada no Plano Piloto de

Lúcio Costa, Brasília aparecia como um oásis

naquela terra vazia e abandonada. As ruas, as

praças, os palácios, etc. Era arquitetura a

enriquecer o horizonte raso e sem fim do

planalto. A cidade que o otimismo de JK

permitiu realizar em tão curto prazo: ‘Não

quero’, dizia ele, ‘uma cidade qualquer, feia e

provinciana, mas uma cidade moderna, que

possa exprimir o futuro e grandeza do nosso

país”.

Oscar Niemayer

Correio Braziliense, 21/04/2001

Analisar Brasília com foco nas mudanças sócio-espaciais encetadas pela


localização residencial remete-nos à discussão da utopia urbana que impulsionou
o gesto de criação, no sentido que, sua realização, implicaria no desenrolar do
processo de formação espacial, a concretização de uma sociedade nova,
fundamentada em novas regras de convívio e de estruturação social.
15

Muito antes do Iluminismo, imagens utópicas do que a cidade poderia ser


povoavam, principalmente, as mentes de arquitetos e urbanistas, no pressuposto
que um bom desenho promoveria o surgimento de uma nova sociedade.

Em verdade, as utopias urbanas vêm desde a tradição da antiguidade


grega, mesclando idealizações de cidade e sociedade. Na República de Platão,
um dos interlocutores de Sócrates narra uma “lenda fenícia”, segundo a qual uma
sociedade utópica era gerada nas entranhas da Terra. Do mesmo modo que esta
gerara metais nobres, como o ouro, a prata, o cobre, ela teria gerado também os
filósofos, os guerreiros, os artesãos e os camponeses, cada um com sua função e
cada um com seu lugar na polis. Enquanto aos filósofos, dotados de razão e
senso de justiça, caberia governar a sociedade utópica, os guerreiros a
defenderiam contra seus inimigos externos, enquanto os artesãos e camponeses
trabalhariam para sua manutenção. A função de cada casta/estamento é
necessária e imprescindível para garantir a sobrevivência e defesa do todo.
Contudo, não deve haver “mesclas” dos metais. Cada um deverá permanecer em
sua pureza original, ou seja, em seu lugar, cumprindo a sua função. (Freitag,
2002).

Thomas Morus, no período renascentista, utiliza o mesmo recurso de


pensar um “lugar nenhum” para idealizar uma nova sociedade. Em seu livro
Utopia, ele descreve a organização social de uma ilha que não figurava em
nenhum mapa da época, povoada por uma sociedade ideal, distribuída por 54
núcleos urbanos, todos iguais. Nessa ilha a propriedade privada tinha sido abolida,
sendo que seus moradores habitavam as casas que de 10 em 10 anos eram
distribuídas à população por sorteio e sua ocupação era gratuita. Todos os
inquilinos tinham que trabalhar pelo menos seis horas por dia, sendo que o
trabalho era organizado de forma racional com uma divisão funcional de tarefas. O
sexo e o casamento eram regulamentados.

As idéias de Thomas Morus influenciaram urbanistas como Campanella e


socialistas utópicos tais como Robert Owen e Charles Fourier, os quais,
16

desenvolveram modelos de cidades e sociedades utópicas, como por exemplo, a


“Cidade do Sol”, a “Nova Atlântida”, a “New Harmony”, e o “Falanstério”.

Em certa medida, a idéia-força que materializou Brasília remete a essa


mesma tradição, ou seja, pensar modelos de cidades que instaurassem uma nova
sociedade, conforme pode ser inferido da referência feita por Oscar Niemayer à
determinação do Presidente JK em construir uma cidade moderna que
expressasse a grandiosidade da nação.

A modernidade e a urbanização decorrente do processo de industrialização


trouxeram uma concepção material e funcional mais adequada a essa visão. O
urbanista, portador de uma racionalidade reguladora de uma ordem espacial,
expressa no plano, seria o maestro de todo esse processo. Em acordo com a
seguinte afirmativa de Abramo: “de forma esquemática, podemos dizer que a
prática arquitetural do ‘projeto’ colonizou o espaço urbano e que o exercício
generalizado da ‘perspectiva’ tornou-se o ‘projeto’ de cidade. Em uma palavra, o
plano transformou-se no mecanismo produtor da ordem urbana”. (Abramo; 2001:
10)

A partir da análise da concepção racionalista de Brasília, cidade paradigma


da tradição modernista, do seu processo de formação e de sua atual configuração
espacial, essa pesquisa busca estabelecer diálogo entre o conceito de convenção
urbana proposta por Abramo (1998) e a noção de forma-conteúdo proposta por
Santos (1978). Estes dois termos conceituais ao se articularem permitem uma
leitura da dinâmica sócio-espacial da cidade em uma perspectiva diversa de
análises urbanas clássicas tais como a vertente de economia urbana neoclássica,
da ecologia urbana e da marxista.

Esta perspectiva direciona a análise no sentido de contemplar além dos


processos concretos das transformações espaciais, materializadas na
configuração geográfica das diversas localidades que constituem esse espaço
urbano, o seu aspecto simbólico, sinalizador de convenções urbanas, que
17

condicionam a dinâmica espacial e, ao mesmo tempo, é condicionada por essas


transformações, conferindo-lhe, dessa maneira, uma legibilidade ao processo1.

Portanto, o tema da tese é a mudança no padrão sócio-espacial de Brasília


como uma das expressões do processo mais geral de estruturação intra-urbana.
Almeja-se compreender como se processa a decisão das escolhas de localização,
tanto no nível da produção como no consumo de objetos espaciais (edifícios,
condomínios, bairros, lotes, equipamentos coletivos e infra-estruturas urbanas).
Essas escolhas são processadas na trama de relações complexas que envolvem
o espaço urbano e no jogo de decisões cruzadas e interdependentes acionadas
por convenções urbanas.

Esse processo enceta transformações no uso do solo urbano, expressas


por meio do padrão de expansão urbana, da intensificação de sua ocupação
(reparcelamento/verticalização) e da distribuição espacial dos segmentos
populacionais, as quais, por sua vez, configuram certas regularidades e permitem
a leitura da dinâmica espacial.

A estrutura interna da cidade é definida por meio da localização relativa dos


elementos espaciais2, posicionados numa rede de relações entre suas partes
constitutivas, configurando um determinado padrão de uso e de ocupação do solo;
e pelas relações complementares que as decisões interdependentes de
localização tomadas pelos homens, firmas e instituições provocam nas
transformações das áreas residenciais, industriais, comerciais e de serviços.
Ambos aspectos, em sua dinâmica, geram atributos espaciais, tais como: o centro,
as centralidades, as periferias, a segregação espacial.

Na perspectiva teórico-metodológica adotada para análise do processo de


mudança do padrão sócio-espacial, destacam-se como elementos que
materializam/objetivam os movimentos da estrutura intra-urbana, os estoques

1
Certamente uma legibilidade contingente e multifacetada, signo da complexidade urbana do
presente.
2
Segundo Milton Santos (1985: 6) os elementos do espaço seriam os homens, as firmas, as
instituições, as infra-estruturas e o denominado meio ecológico.
18

imobiliários, as motivações e escolhas locacionais no tecido urbano e os padrões


de ocupação das áreas da cidade, concretizados nos diversificados usos do solo
urbano. Todos estes elementos pressupõem, por sua vez, diferenciadas
densidades técnicas, informacionais e simbólicas nos espaços constitutivos da
estrutura interna da cidade.

Por se tratar de relações estruturais, não basta apenas captar as


transformações destes elementos de forma isolada, pois o que dá especificidade a
este recorte analítico é o caráter relacional de seus elementos, animado numa
dialética sócio-espacial entre as condições de valorização/desvalorização do
espaço e de deslocamento do homem.

Segundo Santos (1996: 36), “o valor de um dado elemento do espaço, seja


ele objeto técnico mais concreto ou mais performante, é dado pelo conjunto da
sociedade, e se exprime através da realidade do espaço em que se encaixou.”
Portanto, as duas condições referidas, estabelecem, necessariamente, conexões
entre pontos no espaço, ou seja, produzem localizações que, por sua vez, não
podem prescindir da terra enquanto um fator constitutivo de sua materialidade,
seja como suporte das atividades, seja como capital.

O espaço aqui considerado é, primordialmente, o espaço geográfico, pois


além de incluir os sistemas de ação do homem, inclui a materialidade dos
sistemas de objetos, os quais, por sua vez, de acordo com Santos (op. cit.)
formam as configurações territoriais, onde a ação dos sujeitos, ação racional ou
não, vem instalar-se para criar um espaço. Portanto, o espaço concreto, onde
permeiam os espaços, econômicos, políticos, filosóficos, antropológicos e naturais
que lhes dão sentido, vida e valor.

Esta tese é organizada em quatro capítulos. O primeiro capítulo aborda a


concepção urbanística de Brasília, desde a apresentação resumida das principais
matrizes conceituais que condicionaram a formulação do Plano Piloto, passando
por breves incursões contextuais acerca do período de construção da cidade até à
caracterização do seu processo de formação sócio-espacial.
19

O segundo capítulo inicia-se com uma discussão sobre o espaço, categoria


de análise transversal aos diversos níveis analíticos propostos, buscando
apresentar de forma sintética as principais formulações teóricas acerca de sua
compreensão. Em seguida busca-se relacionar a questão da localização e a
posição social como um elemento central na manifestação das escolhas
residenciais, valendo-se dos aportes oferecidos pela teoria social crítica,
principalmente o estudo coordenado por Bourdieu (1997) acerca das condições de
produção das formas contemporâneas de miséria social. O capítulo é encerrado
com a articulação de uma discussão sobre localização e dinâmica imobiliária,
considerando as principais características da mercadoria habitação.

No terceiro capítulo, discute-se a mobilidade sócio-espacial de Brasília,


tendo por base os resultados da pesquisa de campo feita nas principais
localidades, inquirindo sobre as motivações e preferências nos deslocamentos
intra-urbanos, a dimensão desses deslocamentos e os fatores de atração e
expulsão dos mesmos.

O quarto capítulo trata da noção de convenção urbana como mecanismo de


coordenação espacial e de sua relação com as formas-contéudo constituintes da
estrutura urbana. Inicia com as diversas acepções do conceito para, em seguida,
apresentar os principais elementos da forma como a perspectiva heterodoxa de
economia urbana proposta por Abramo (1998) explica a dinâmica espacial da
cidade. Na última parte trata de identificar no espaço urbano de Brasília os
processos de homogeneização e diferenciação espacial decorrentes da atuação
dos capitais imobiliários.
20

CAPÍTULO I - CONCEPÇÃO URBANÍSTICA DE BRASÍLIA

Brasília “é retrato vivo da primeira grande cidade

brasileira da era científica-técnica, prova

concreta de como, no espaço humano, se

encontram enfeixadas vontades diversas

hierarquizadas segundo os tempos e diferentes

em escala, índole e alcance”

Milton Santos (Prefácio de Brasília Ideologia e

Realidade/Espaço Urbano em Questão. In:

PAVIANI, A (org.); 1985: 10)

INTRODUÇÃO

O estudo da mobilidade sócio-espacial de Brasília não prescinde de um


entendimento mais geral do processo de formação da cidade, assim como o
contexto imbricado em todos os momentos de sua dinâmica espacial.

Duas dimensões são identificadas nesse contexto. A primeira implica em


pensar a prática de planejamento urbano enquanto uma série de normas e
racionalizações acerca da produção e apropriação social do espaço do conjunto
constituído pela “aglomeração urbana” de Brasília.
21

A segunda dimensão, apoiando-se na indagação de Brasilmar Nunes, vai


no sentido de verificar “de que maneira transformar esta concepção3 em referência
simbólica de um povo, de uma cultura”. (Nunes; 1997: 14)

Nesse sentido, é muito comum na prática cotidiana de Brasília proceder-se


o questionamento se gostam ou não de viver na cidade. Questionamento
intimamente relacionado à ambivalência desse espaço marcado pelo forte caráter
simbólico de Capital Federal, portanto, objeto de notícias rotineiras daqueles que
dele se apropriam para o exercício do poder, em escala federal, ou a ele acorrem
para fortuitos expedientes de ordem política e/ou burocrática; sendo ao mesmo
tempo em que é aglomeração urbana, produto de uma urbanização desigual e
excludente, marcada por forte dualidade interna: Plano Piloto versus periferias
imediata e externa4. É, dessa maneira, espaço vivido para seus residentes e,
principalmente, cidade natal para geração de brasilienses que, paulatinamente,
concorrem para diminuir àquela sensação de uma comunidade de forasteiros,
habitando um lugar que não os pertence.

Este capítulo pretende dialogar com essas múltiplas dimensões na


formação desse espaço singular, iniciando-se com a discussão das premissas
conceituais que embasaram a sua concepção de cidade modernista, idealizada a
partir de um plano racional compreensivo. Avança no sentido de uma breve
contextualização política da decisão irrevogável e determinada do Presidente
Juscelino Kubitscheck de construí-la no período de seu governo, concluindo com
uma caracterização de sua configuração espacial no sentido de revelar os
contornos dinâmicos dessa complexidade ordem/desordem, expressa nos
movimentos da cidade atual.

3
A possibilidade de realização no concreto, uma concepção ideal de espaço urbano como é a
experiência singular de Brasília.
4
É denominada neste trabalho periferia imediata as 19 (dezenove) localidades que conformam as
Regiões Administrativas do Distrito Federal, conforme o Mapa nº 03. Enquanto, periferia externa
faz referência ao conjunto urbano estruturado no entorno do quadrilátero do Distrito Federal,
ilustrado no Mapa nº 01
22

PRINCIPAIS MATRIZES CONCEITUAIS

A concepção de Brasília, por sua origem, tem ligações com as teorias do


urbanismo ortodoxo que, segundo Jacobs (2000:16), mostram-se hoje em dia,
como parte do folclore e, por isto mesmo, muito mais nocivas, porque são
encaradas como naturais. A preocupação em construir uma cidade funcionalmente
racional para a vida econômica e social dos seus moradores, estimulou o debate
em torno de como a cidade poderia ser, refletindo diferentes atitudes com relação
à natureza da urbanidade e da própria relação homem/natureza.

Nesse debate a primeira matriz a considerar é representada pela


concepção de Ebenezer Howard, autor da obra clássica em Urbanismo,
denominada Garden Cities Tomorrow. Neste livro, (apud Jacobs, 2000) o autor
propôs no final do século XIX, um plano para conter o crescimento de Londres e
também repovoar a zona rural, onde as vilas estavam em decadência, construindo
um novo tipo de cidade, a Cidade-Jardim5.

A meta de Howard era criar cidadezinhas auto-suficientes, rodeadas por um


cinturão agrícola, onde a indústria, as escolas, as moradias e as áreas verdes
ficariam em território pré-determinados; no centro ficariam os estabelecimentos
comerciais, esportivos e culturais, partilhados por todos os moradores.

O tecido urbano e o cinturão verde que as contornariam deveria ser


permanentemente gerido pela administração pública sob a qual a cidade tivesse
nascido, de modo a evitar a especulação ou mudanças supostamente descabidas
no uso da terra, e também afastar a tentação de aumentar sua densidade. A
população máxima não deveria ultrapassar 30 mil habitantes.

Na verdade, de acordo Nathan Glazer, citado por Jacobs, a cidade-jardim


foi “concebida como uma alternativa à cidade e como uma solução para os
problemas urbanos; esse foi, e ainda é, o alicerce de seu imenso poder como
conceito de planejamento urbano”. (Jacobs; op.cit.: 17)
5
A concepção de cidade jardins seria a contraposição da vida em apartamentos de alta densidade
da Ville Radieuse proposta por Corbusier,.
23

Para Jacobs (id. Ibidem.), Howard trouxe à baila idéias efetivas para a
destruição das cidades: ele compreendeu que a melhor maneira de lidar com as
funções da cidade era selecionar e separar do todo os usos simples e dar a cada
um deles uma independência relativa.

Ela focalizou a oferta de moradias adequadas como a questão prioritária, à


qual todas as outras se subordinavam; o comércio deveria fazer o fornecimento
rotineiro e padronizado de mercadorias e atender a um mercado restrito.

Concebia, também, o planejamento urbano como uma série de ações


estáticas; em cada caso, o plano deveria prever tudo o que fosse necessário e,
depois de posto em prática, deveria ser protegido contra quaisquer alterações,
ainda que mínimas.

Por fim, desprezou, particularmente, a complexa e multifacetada vida


cultural da metrópole.

Ainda de acordo com a afirmativa de Jacobs (id.ididem.), seguidores das


idéias de Howard e Geddes6, tais como Lewis Mumford, Clarence Stein, Henry
Wright e Catherine Bauer, embora não tivessem obtido aceitação expressa de
seus planos, conseguiram incutir e popularizar no urbanismo ortodoxo, idéias
como: a rua é um lugar ruim para os seres humanos; as casas devem estar
afastadas dela e voltadas para dentro, para uma área verde cercada; a unidade
básica do traçado urbano não é a rua, mas a quadra, mais particularmente,a
superquadra; o comércio deve ser separado das residências e das áreas verdes.

Acrescenta também, que esses urbanistas fundamentados nas premissas


de Howard, insistiam que, uma comunidade planejada deve ser ilhada como uma
unidade auto-suficiente, deve resistir às mudanças futuras e todos os detalhes

6
Biólogo e filósofo escocês que via a idéia de Cidade-Jardim como um ponto de partida para um
modelo muito mais grandioso e abrangente de planejamento regional, onde a estas poderiam ser
atribuídas, racionalmente, amplos territórios, imbricando-se com recursos naturais, em equilíbrio
com agricultura e os bosques, formando um todo lógico e esparso.
24

significativos devem ser controlados pelos planejadores desde o início e mantidos


dessa maneira.

Seguindo essa mesma linha de raciocínio com relação à preponderância do


plano urbano na constituição da cidade, tem-se o trabalho de Le Corbusier, citado
por Jacobs (op.cit.) que, nos anos 20, planejou uma cidade imaginária
denominada Ville Radieuse, composta de arranha-céus dentro de um parque.

Nessa cidade, a massa de população seria alojada a uma taxa de 296


habitantes por mil metros quadrados, uma densidade urbana bastante alta, mas,
em virtude das construções altas, 95 por cento do solo permaneceria livre. Os
arranha-céus ocupariam apenas 5 por cento do solo.

Para Jacobs, Le Corbusier planejava não só um ambiente físico; projetava


também uma utopia social, acrescentando: “os planejadores da Cidade-Jardim e
um séqüito cada vez maior de reformadores habitacionais, estudantes e arquitetos
popularizavam sem descanso os conceitos de superquadra, bairro projetado,
plano imutável, e gramados, gramados, gramados, além do mais, estavam
conseguindo firmar esses aspectos como símbolos de um urbanismo humano,
socialmente responsável, funcional e magnânimo.” (Jacobs; id.ibidem: 22)

Segundo P. Hall (1995), Brasília como uma cidade inteiramente nova,


representa uma das melhores aplicações da concepção racionalista da cidade
“corbusiana”, idealizada num plano urbano e construída, geometricamente, em
terreno limpo.

A análise de sua estruturação não pode prescindir do entendimento do que


representou a concepção de cidade para Le Corbusier, principalmente, sua plena
de confiança “na virtude do planejamento centralizado, que iria abranger não
apenas a edificação urbana, mas cada um dos aspectos da vida de seus
habitantes” (op.cit.: 247).
25

Tal pressuposto, em grande medida, servira de inspiração para elaboração


do Plano de Lúcio Costa para Brasília, vencedor do Concurso Público para
Construção da Capital Federal.
26

BREVES INCURSÕES CONTEXTUAIS ACERCA DA CONSTRUÇÃO

Antes de passar à análise da proposta vencedora, é importante ressaltar


aspectos históricos relacionados à decisão de construção da Capital do Brasil no
Governo Juscelino Kubitschek.

Brasília representou, pelo menos no discurso governamental da época, a


meta-síntese do Plano de Governo, no qual sobressaia como principais objetivos:
a interiorização do País, o desenvolvimento industrial ancorado na indústria
automobilística, um novo ciclo econômico baseado no processo de substituição de
importações. Até então, a estrutura econômica brasileira era de base
eminentemente agro-exportadora, em descompasso com a aceleração do
processo de urbanização brasileira e a necessidade de mudanças demandadas
pela nova estrutura sócio-espacial em formação.

De acordo com Farret (1985), pode-se reconhecer que, até a construção de


Brasília em 1960, dois estágios de desenvolvimento capitalista ocorreram no
Brasil, com as suas correspondentes políticas públicas que ocasionaram
repercussão na dimensão urbano territorial brasileira. O primeiro, de 1900 a 1930,
marcado pelo denominado Estágio do Modelo Primário de Exportação. O outro
estágio, denominado Modelo de Acumulação Industrial, compreendendo de 1930
a 1964.

O Plano de Metas 1956-1961, ambicioso plano governamental ancorado


nos maciços investimentos públicos e privados nas áreas de infra-estrutura,
indústrias básicas e de bens de consumo duráveis, além da denominada meta-
síntese, construção da nova Capital, produziu reconhecido impacto sócio-
espaciais no Brasil, principalmente no que se refere ao agravamento do
desequilíbrio espacial, em razão da concentração de vultosos investimentos na
região Sudeste.
27

No entanto, em acordo com a afirmação de Holanda, a lógica que explica a


formação sócio-espacial de Brasília não reside exclusivamente no desdobramento
dos processos econômicos e sim, “em dois tipos de separação: uma, entre o
estado e a sociedade civil, materializada, no nível espacial, num pedaço
especializado de território servindo uma função superestrutural fortemente
segregada; a outra, entre a cidade-capital e qualquer região historicamente
consolidada no Brasil, realizada pela construção de Brasília num planalto então
praticamente deserto, marcando a relação radicalmente trans-espacial entre a
capital e o país como um todo”. (Holanda; 1998: 303)

A idéia de construção da Capital Federal no interior do país não era nova,


remontado à época do Império. A definição da área para a construção da futura
capital iniciou-se em 1892, com os trabalhos desenvolvidos pela denominada
Missão Cruls, constituída com a função de definir e demarcar as terras que seriam
posteriormente incorporadas a um novo Distrito Federal. Em 1948, um novo
trabalho precursor do concurso para construção da capital, conhecido como
Relatório Belcher, foi selecionada dentro do perímetro delimitado pela Missão
Cruls, alguns sítios mais adequados à construção de uma cidade, tendo sido
escolhido o Sítio Castanho.
28
Mapa n° 1 – Localização dos Ribeirões do Torto e Gama

Localização dos Ribeirões do Torto e do Gama

Mapa de localização no DF
175000
8270000

Rib
ei r
ã od
oT
or
to

Limite do Distrito Federal

Legenda:

Rios
Lagos e lagoas
a
am
oG

N d
o
i rã
e

2 0 2 km
4 Kilometers
Rib

8235000
190000
29

O primeiro passo tomado pelo Presidente Juscelino Kubitschek para a


efetivação do compromisso de campanha de construir Brasília dentro do período
de seu governo (1956-1960), foi à constituição da Comissão de Planejamento da
Construção e da Mudança da Capital Federal, em janeiro de 1956.

Esta Comissão, presidida por Ernesto Silva, providenciou a demarcação do


território do Distrito Federal, e trabalhou na elaboração do Edital do Concurso para
o Plano da Cidade, contando com a colaboração dos arquitetos Oscar Niemayer,
Raul Pena Firme e Roberto Lacombe. (Tamanini, 1994: 125-6).

O Edital de concurso, lançado em 20 de setembro de 1956 com o título


Concurso Nacional do Plano Piloto da Nova Capital do Brasil, deu início, de fato, à
concepção da cidade de Brasília.

Foram apresentados ao Júri do Concurso, composto pelo Presidente da


Companhia Urbanizadora da Nova Capital Federal (NOVACAP)7, engenheiro
Israel Pinheiro, do representante do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), arq.
Paulo Antunes Ribeiro, pelo Diretor de Departamento de Urbanismo da
NOVACAP, arq. Oscar Niemayer, representante dos Estados Unidos, arq. Stamo
Papadaki, da França, André Sive e da Grã-Bretanha, Sir William Holford, vinte seis
projetos concorrentes. (Carpintero, 1998).

Após esta breve incursão histórica acerca da concretização da decisão de


construir Brasília, retorna-se para os aspectos urbanísticos do plano escolhido
pelo júri como o vencedor do concurso para a construção da Nova Capital.

7
Empresa criada em 19 de setembro de 1956, por meio da Lei Federal nº 2.874.
30

CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DE BRASÍLIA

O plano vencedor, sob a denominação de Plano Piloto de Brasília, foi


aquele elaborado pelo urbanista Lúcio Costa que, no dizer da Comissão Julgadora
do Concurso, “o plano é claro, direto e fundamentalmente simples, além de ser o
único para uma capital administrativa do país”. (Arquitetura e Engenharia, Revista.
1957; 44:13)

Para Lúcio Costa, a cidade “(...) deve ser concebida não apenas como
URBS, mas como CIVITAS, possuidora de atributos inerentes a uma capital. E,
para tanto, a condição primeira é achar-se o urbanista imbuído de certa dignidade
e nobreza de intenção, porquanto dessa atitude fundamental decorrem a
ordenação e o senso de conveniência e medida capazes de conferir ao conjunto
projetado o desejável caráter monumental. (...) Cidade planejada para o trabalho
ordenado e eficiente, mas ao mesmo tempo cidade viva e aprazível, própria ao
devaneio e à especulação intelectual, capaz de tornar-se com o tempo, além de
centro de governo e administração, num foco de cultura dos mais lúcidos e
sensíveis do país.” (COSTA, Relatório, Preâmbulo. Citado em Carpintero, 1998:
118)

Descrita na maioria das vezes pela forma de um avião, a planta da cidade é


constituída por dois divisores que se cruzam em forma de eixos. O eixo
monumental, marcado pelos principais edifícios públicos e repartições
administrativas, possuem pistas de tráfego afastadas por extensos gramados,
enquanto o eixo rodoviário, arqueado para adaptar-se à topografia do sítio, tem ao
seu redor as habitações e áreas complementares, segundo Carpintero (op.cit.),
organizadas em esquemas evoluídos da Cidade-Jardim, como observado
anteriormente, configurando as denominadas superquadras.
31
32
33

Seguindo, resumidamente, a análise feita por Carpintero (id. Ibidem),


acerca dos principais pontos teóricos contidos no Plano Piloto de Brasília,
destaca-se, primeiramente, o esquema de cidade-linear, proposto por Arturo Soria
y Mata em 1882, sobre o qual se baseia toda a estrutura física de Brasília. Os dois
eixos estruturantes, tanto o Eixo Monumental como o Eixo Sul-Norte,
desempenham funções próprias, fundamentadas nos princípios da Carta de
Atenas. O primeiro, desempenhando a função de trabalhar e cultivar o corpo e o
espírito, reunindo os centros cívico e administrativo, o setor cultural, o centro de
diversões e o centro esportivo, enquanto o segundo, transversal ao Eixo
Monumental, realizando as funções relacionadas à habitação e seus serviços
complementares.

O segundo elemento teórico contido no Plano de Lúcio Costa é a


concepção de cidade-jardim e a unidade de vizinhança. A proporção de espaços
verdes, abertos e de baixa densidade de ocupação conferem a paisagem urbana
34

da cidade uma feição de parque muito próxima do modelo proposto por Ebenezer
Howard, em 1898. A idéia de unidade de vizinhança é apropriada da concepção
desenvolvida por Clarence Stein como derivada da idéia de cidade-jardim, no
início da década de 20, tendo sido utilizada por Lúcio Costa para estruturar maior
parte da função residencial no Plano Piloto.

Plano Piloto
Foto aérea – Marcos Rebouças
35

A concepção de racionalidade funcional na organização dos diversos


subsistemas que compõem a cidade, dotando-a de uma setorização funcional
explícita, é uma das idéias mais difundidas do plano de Lúcio Costa, embora
Carpintero (id. Ibidem) ressalte a não utilização dessa idéia de forma mecânica,
pois o urbanista previra no seu Relatório, no setor dos bancos tal como no dos
escritórios, a existência de três blocos altos e quatro de menor altura, ligados entre
si por extensa ala térrea com sobreloja de modo a permitir intercomunicação
coberta e amplo espaço para instalação de agências bancárias, agências de
empresas, cafés, restaurantes, etc.

Por último, o privilégio ao automóvel individual, coincidindo com a ênfase


dada pelo Presidente Juscelino Kubitscheck no já referido Plano de Metas, ao
desenvolvimento da indústria automobilística.

Alguns momentos marcantes podem ser identificados no processo de


formação do espaço urbano de Brasília, envolvendo desde o momento de sua
criação até sua atual configuração sócio-espacial.

De acordo com o Estudo “Instrumentos de Planejamento e Gestão Urbana:


Brasília e Rio de Janeiro”, podem ser delimitados os seguintes períodos (IPEA,
2001: 45):

9 “primeiro período (1956 -1973) – esse período foi marcado pela mudança
da Capital, implantação do Plano Piloto e criação das cidades-satélites, ou
seja, pelo delineamento do modelo polinuclear de ocupação;

9 segundo período (1974 -1987) – período de organização territorial,


surgimento de um vetor de crescimento no sentido sudoeste e alimentação
do polinucleamento, formação do aglomerado urbano com a expansão dos
loteamentos limítrofes ao Distrito Federal; e

9 terceiro período (1988 – meados de 1997) – período de consolidação dos


vetores de crescimento urbano anteriores, surgimento dos eixos de
conurbação e da cidade ilegal.”
36

A cidade estrutura-se, no primeiro período, como um projeto de Estado,


sendo este o principal agente articulador da organização espacial,
desempenhando as funções de planejador, promotor, construtor e financiador do
processo de produção espacial.

Junto as grandes obras, apareceu uma constelação de acampamentos dos


trabalhadores que vieram participar da construção e as denominadas “invasões”,
ou seja, espaços de moradia dos excluídos dos alojamentos construídos pelas
empreiteiras, destinados ao pessoal empregado na construção da cidade.

O ritmo de construção civil era frenético, assim como o crescimento


demográfico impulsionado pela forte imigração. Em 1959, quando o IBGE
procedeu as primeiras contagens de população, o Distrito Federal contava com
64.314 habitantes. Ao fim do primeiro qüinqüênio de sua inauguração, o
contingente populacional alcançava 213.511 habitantes, registrando-se
sucessivamente até o presente momento, taxas de crescimento populacional
positivas, conforme a Tabela nº 1 .

Tabela nº 1 - Crescimento da População Urbana do Distrito Federal

ANO POPULAÇÃO

1960 88.334

1965 213.511

1970 516.082

1975 766.701

1980 1.139.031

1985 1.239.994

1990 1.429.549

1995 1.625.334

2000 1.877.562

Fonte: Anuário Estatístico da CODEPLAN/GDF, 2000.


37

No final desse primeiro período as marcantes desigualdades sócio-


espaciais entre o centro urbano (Plano Piloto) e as demais localidades estavam
cristalizadas, podendo-se destacar entre as características mais importantes do
período:

9 “ocupação polinuclear do território, associada à ação fortemente


centralizadora do Estado, voltando-se as ações prioritariamente para a
implantação e a construção do Plano Piloto, com grandes investimentos
estatais;

9 antecipação por, pelo menos, 20 anos daquilo que estava sendo previsto
pelas intenções governamentais em relação às cidades-satélites,
consolidando uma periferia composta, principalmente, de operários da
construção civil e migrantes;

9 segregação espacial desencadeada pelo planos e ações governamentais,


com base nas questões ambientais (localização das bacias, anel sanitário)
e na preservação do plano urbanístico. O recurso hídrico passou a ser
definidor da ocupação espacial;

9 desapropriação – fator fundamental para a consolidação da Capital, mas


não para a localização específica das cidades-satélites; e

9 isolamento e desconsideração das estruturas urbanas existentes (Planaltina


e Brazlândia)”. (op.cit.: 47)

No segundo período, o aprofundamento das desigualdades sócio-espaciais


foi contínuo, observando-se a expansão e adensamento dos núcleos já existentes,
contudo em níveis muito aquém da demanda habitacional crescente.

A diminuição do ritmo das obras de construção civil em relação ao primeiro


período caracterizado teve graves conseqüências sociais para a cidade em
formação, provocando forte queda na oferta de empregos, ao passo que se
38

observava o contínuo crescimento de sua população urbana, decorrente não só da


elevada imigração como pela sua alta taxa de crescimento vegetativo.

A conjugação desses dois fatores implicou na forte pressão por acesso à


moradia, inaugurando desde já os conflitos gerados em torno da questão
habitacional em Brasília, sendo importante destacar, a permanência não prevista
no plano original, da denominada “Cidade Livre”, assentamento pioneiro mantido
pela luta dos moradores excluídos do acesso à moradia nos apartamentos
funcionais ou nos acampamentos das grandes obras.

Contrariando o plano urbanístico original, a criação de assentamentos


urbanos distantes da área central, as denominadas “Cidades Satélites”, aconteceu
desde o primeiro momento da construção de Brasília, diferente do que estava
disposto no próprio Edital do concurso, o qual exigia o projeto para uma cidade
que comportasse a população de até 600 mil habitantes no ano 2000, prevendo,
então, a partir deste limite de ocupação, a criação das “Cidades-Satélites”.

Apesar da intensa mobilização efetuada pelo Governo Federal para atrair a


força de trabalho necessária à construção de Brasília, a mesma atenção não foi
dada com relação às condições de vida da grande maioria destes trabalhadores e
sua inserção no espaço da cidade após o término de sua construção. Ficou logo
bastante clara a intenção de se construir o Plano-Piloto (Área Central) para abrigar
os funcionários públicos mais graduados, as elites profissionais, corpo diplomático,
e logo depois, com a criação de duas áreas contíguas ao Lago Paranoá (Lago Sul
e Lago Norte), os loteamentos destinados à construção de residências unifamiliar
para as classes de alta renda. Aos demais funcionários públicos e população em
geral, restaram a moradia nas “Cidades-Satélites”, inicialmente, meras “cidades-
dormitório”, com padrão urbanístico bastante inferior em relação à Área Central e
que tiveram suas origens, na maioria das vezes, na forte pressão exercida pela
carência de moradia e a deliberada política do governo local de remover as
“favelas” localizadas na Área Central para fora dos seus limites.
39

A propriedade pública da terra para expansão urbana foi pensada,


inicialmente, com a intenção de permitir ao Estado obter recursos que custeasse a
própria urbanização do Distrito Federal, com a valorização das glebas rurais
transformadas em loteamentos urbanos. Primeiro essa atividade imobiliária
pública foi exercida pela Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil
(NOVACAP), desde a inauguração da cidade até a criação da empresa pública
especialmente voltada para a gestão do patrimônio fundiário urbano e o
desenvolvimento de atividades imobiliária, denominada Companhia Imobiliária de
Brasília (TERRACAP), em 1973.

No início da década de 80, o grande problema urbano que se apresentava


era a formação de favelas e ocupações irregulares dos denominados fundos de
lotes8, levando o Governo do Distrito Federal a instituir programas específicos
para estudo de políticas públicas visando ao atendimento habitacional da
população de baixa renda. Em 1982, foi instituído o Grupo Executivo para
Assentamento de Favelas e Invasões (GEPAFI), vinculado à Secretaria de
Serviços Sociais que, em levantamento cadastral feito nesse mesmo ano,
constatou a existência de cerca de 70 mil habitantes vivendo nesses espaços de
deteriorada condições geográficas. (Ver Tabela Nº 2 )

Tabela Nº 2 - Distrito Federal – Favelas (1982)

Região Administrativa Nº de Invasões Nº de Barracos Nº de Pessoas

Brasília 37 5.373 37.611

Gama 04 356 2.492

Taguatinga 10 2.943 20.601

8
Os lotes eram subdivididos em pequenos cômodos, com entradas independentes e utilização de
precárias instalações sanitária de uso comum.
40

Sobradinho 02 472 3.304

Planaltina 17 892 6.244

Total 70 10.036 70252

Fonte: GEPAFI/Governo do Distrito Federal

Nas áreas limítrofes ao quadrilátero do Distrito Federal, registrou-se o início


do processo de criação de loteamentos urbanos voltados para absorção das
camadas populacionais de menor rendas, não atendidas pelo mercado imobiliário,
altamente seletivo e restritivo de Brasília.

O município de Luziânia, situado na porção sul do Distrito Federal, é o


exemplo mais característico do início do processo de “periurbanização”, onde lotes
sem infra-estrutura urbana instalada abrigavam população pobre oriundas do
Distrito Federal, que usavam esses espaços como verdadeiras “cidades-
dormitórios”, pois as oportunidades de emprego e renda continuavam
concentradas no centro do aglomerado urbano, conforme Tabela Nº 03.
41

Mapa n° 2 – Distrito Federal e entorno


42

Tabela Nº 3 - Entorno do Distrito Federal – Evolução da População Total dos


Municípios do Aglomerado de Brasília (1970 – 1996)

Município 1970 1980 1991 1996

Luziânia 32.803 80.089 205.427 104.840

Planaltina de Goiás 8.972 16.207 40.189 58.219

Padre Bernardo 3.383 11.811 16.208 17.875

Água Fria de Goiás -(a) -(a) 3.976(a) 3.913

Valparaíso -(b) -(b) -(b) 75.434

Novo Gama -(b) -(b) -(b) 60.458

Cidade Ocidental -(b) -(b) -(b) 33.159

Águas Lindas -(c) -(c) -(c) 61.481

S. A do Descoberto -(b) 12.725 34.378 45.670

Total 50.158 120.823 300.178 461.049

Fontes: CODEPLAN (Indicadores Conjunturais) e IBGE (Contagem Populacional


de 1996)
Notas: (a) Incluído em Planaltina de Goiás.
(b) Incluído em Luziânia.
(c) Incluído em Santo Antônio do Descoberto
43

Em resumo, o segundo período é marcado por:

9 “mudança no tratamento das invasões, com a atuação do GEPAFI;

9 proliferação de planos de ordenamento do território;

9 estabelecimento do vetor de crescimento no eixo sudoeste do território do


Distrito Federal, a partir do PEOT;

9 crescimento acelerado dos loteamentos limítrofes ao Distrito Federal,


principalmente em direção a Luziânia, Santo Antônio do Descoberto e
Planaltina de Goiás;

9 formação do aglomerado urbano de Brasília, pela integração dos subúrbios-


dormitório localizados no entorno imediato do Distrito Federal; e

9 manutenção das questões ambientais como suporte à ocupação de novas


áreas, o que ocasionou segregação espacial”. (op.cit.: 52)

No último período identificado, de 1988 - meados de 1997, a autonomia


política do Distrito Federal conferida pela Nova Constituição, inseriu importantes
instrumentos de gestão do espaço urbano de Brasília, com destaque para a
exigência da aprovação de plano diretor de desenvolvimento urbano.

O processo de urbanização do Distrito Federal bem como do seu entorno


avoluma-se, ancorado em duas estratégias de gestão territorial:

A primeira, destinada à classe média alta e ao atendimento das demandas


do capital imobiliário, concretiza-se, principalmente, com a criação do Setor
Sudoeste, uma das áreas de expansão urbana, proposta por Lúcio Costa no
âmbito do estudo denominado “Brasília Revisitada”, realizado em 1985, por
solicitação do Governo do Distrito Federal.
44

Mapa n° 3 – Regiões Administrativas – RA’s - Distrito Federal

DE GO BRIEL
IAIS
205

SAO GA
205

URUAC
201

U
205

205
205
251 345

505 110

010 405
103
131

170 1 07
113
080 111
130

205

020

180

511 405
330
100

105
110

220 121

030
130

PLANALTINA 405

001 230
127
445 020
150 215

001
420 SOBRADINHO 010 345

415 230 230


133
130
230

527 330
137

425 VALE DO
129 AMANHECER 105
141
430
133
440
BR AZ LANDIA PED RA
FUND AM ENTA L
249 145
250
143
105

003
257
541

440
435 VAR JAO 479
130
330

151
435

005
445 007
547
263
MAN SOES 159
DO LAG O
240 080
LAGO NORTE

EIXO
561 001 355

009 479

RO
450

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RA - II Gama RA - V Sobradinho RA - VIII Núcleo Bandeirante

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RA - III Taguatinga RA - VI Planaltina RA - IX Ceilândia

RA - X Guará

RA - XI Cruzeiro RA - XIV São Sebastião RA - XVII Riacho Fundo

RA - XII Samambaia RA - XV Recanto das Emas RA - XVIII Lago Norte

RA - XIII Santa Maria RA - XVI Lago Sul RA - XIX Candangolândia


45

A segunda estratégia, caracterizada pela criação de novos assentamentos


urbanos, destinados ao reassentamento de população de baixa renda moradora
das favelas e cortiços das áreas urbanas já consolidadas.

Essa nova política urbana, adotada em 1988 pelo Governo do Distrito


Federal, instituiu o Programa de Assentamento para a População de Baixa Renda,
consistindo na criação e doação de lotes semi-urbanizados à população que era
moradora nos lotes subdivididos em cômodos de fundo de quintal e ocupantes de
lotes irregulares nos diversos pontos do Distrito Federal, resultando em uma
expansão urbana horizontal na maioria das cidades-satélites existentes, bem
como na criação de novos assentamentos urbanos tais como, Santa Maria, Riacho
Fundo e Recanto das Emas.

De acordo com o levantamento efetuado pelo Instituto de Planejamento do


Distrito Federal (IPDF), em 1996 este programa de assentamento promoveu a
distribuição de um total de 109.128 lotes, a seguir discriminados:

9 “fixação de acampamento e invasões: Vila Planalto – 986 lotes; Vila DVO


– 347 lotes; Areal – 1.129 lotes; Vila Paranoá – 6.774 lotes; Agrovila São
Sebastião – 7.000 lotes; Vila Varjão – 634 lotes;

9 ocupação de espaços vazios e expansão de setores em núcleos urbanos


existentes: Candangolândia (complementação) – 3.017 lotes; Expansão
das QNM 34,38, 40 e 42 de Taguatinga – 1.056 lotes; Bairro Veredas de
Brazlândia – 1.545 lotes; expansão da QNP 22 e 24 de Ceilândia; QNO de
Ceilândia – 2.113 lotes; Samambaia (complementação) – 28.967 lotes;
expansão oeste de Sobradinho – 3.290 lotes; Setor Oeste do Gama – 366
lotes; QE 42, 44 e 46 do Guará – 1.070 lotes;

9 criação de novos núcleos urbanos: Santa Maria – 18.090 lotes; Recanto


das Emas – 15.619 lotes; Riacho Fundo – 8.007 lotes. Todos se situavam
na mancha de expansão urbana definida pelo PEOT (Plano Estratégico de
Ordenamento Territorial).”
46

O acréscimo de mancha urbana decorrente desta política de doação de


lotes semi-urbanizados, a criação de novas áreas urbanas para classe média
(como por exemplo, com a implantação efetiva da cidade de Águas Claras prevista
desde o PEOT) e a acelerada expansão da ocupação urbana em direção a
Luziânia, Santo Antônio do Descoberto e Planaltina de Goiás, engendraram um
novo padrão urbano no território em análise.

Em uma posição autônoma às estratégias territoriais formuladas pelo poder


público, observa-se nesse período, a proliferação dos loteamentos privados
clandestinos, os denominados “condomínios horizontais”, destinados ao
atendimento da demanda reprimida de novas habitações para a classe média e
alta.

Essa situação confere uma certa peculiaridade ao mercado imobiliário de


Brasília, porque a classe média passa também a recorrer aos métodos de
ocupação irregular das faixas de renda mais baixa para resolver o acesso à
moradia.

A origem do problema de loteamentos irregulares/clandestinos em Brasília


está relacionada aos trabalhos de desapropriação não concluída na ocasião do
estabelecimento do regime de propriedade pública das terras do Distrito Federal,
ocasionando uma pluralidade de regimes jurídicos tais como: terras não
discriminadas, terras públicas adquiridas em comum e não submetidas a um
processo legal de divisão e térreas públicas arrendadas para o uso rural.

A situação de ilegalidade na ocupação de extensas áreas de uso não


urbano se intensificou e o número de parcelamentos irregulares/clandestinos
cresceu de 130 para 529 loteamentos cadastrados em 1994, espalhando uma
mancha urbana descontinua com extensão aproximada do dobro da área
urbanizada do Plano Piloto de Brasília.

Segundo o diagnóstico sobre a situação fundiária dos loteamentos


irregulares/clandestinos no Distrito Federal, realizado pela Companhia Imobiliária
47

de Brasília (TERRACAP) em 2003, apenas 150 condomínios, divididos em 19


setores habitacionais, são considerados passíveis de regularização, em um
universo estimado por associações de moradores em aproximadamente 500
parcelamentos.

Esse novo eixo de crescimento urbano, constituído pelo fenômeno dos


condomínios irregulares de classe média, tem contribuído para alterar o padrão
urbano de Brasília, configurando uma outra dinâmica territorial.
48

Mapa n° 4 - Distrito Federal – dinâmica territorial


49

Em resumo, o terceiro período pode ser caracterizado por:

9 “aumento expressivo da mancha urbana;

9 formação do aglomerado urbano com a articulação de municípios goianos


à dinâmica urbana de Brasília;

9 novo delineamento da mancha urbana no Distrito Federal com


modificações no padrão polinucleado de ocupação;

9 conurbação entre Plano Piloto e Taguatinga, estruturada pela linha do


Metrô e pela criação da cidade de Águas Claras;

9 consolidação dos vetores de expansão urbana, associada a um processo


de conurbação;

9 proliferação de loteamentos clandestinos, causando sérios impactos no


território fora dos vetores propostos;

9 aparecimento de uma nova forma urbana constituída pela cidade ilegal e


pelo parcelamento privado da terra;

9 alteração do Poder local, com a participação da iniciativa privada no


parcelamento da terra no Distrito Federal;

9 aumento do papel do Poder Legislativo nas decisões do Poder Público


local; e

9 transformação dos processos de gestão, com utilização de instrumentos


mais democráticos de participação da sociedade, por meio dos conselhos
locais de planejamento, do orçamento participativo e de parcerias entre
governo e iniciativa privada”. (op.cit.;: 56-58)
50

CAPÍTULO II - ESPAÇO, LOCALIZAÇÃO E POSIÇÃO SOCIAL

“... as cidades, como os sonhos, são

construídas por desejos e medos, ainda

que o fio condutor de seu discurso seja

secreto, que suas regras sejam obscuras,

as suas perspectivas enganosas, e que

todas as coisas escondam outra coisa ...”

(Calvino, Ítalo. “As Cidades Invisíveis”,

CIA. das Letras, 1990)

INTRODUÇÃO

Ao contrário da tradição modernista de encarar a cidade sob a perspectiva


da razão funcionalista, o ponto de partida assumido nesse trabalho focaliza a
forma urbana e sua estruturação interna como produto e produção de movimentos
de força sociais.

Como um fenômeno de largo alcance, possui linguagem própria, na qual se


difundem significações generalizadas que permitem inferir uma dada legibilidade
no seu processo de estruturação.

Nesse sentido, apesar de não desconhecer as armadilhas que são postas


ao entendimento dessa realidade multifacetada, complexa e dissimuladora que é a
cidade contemporânea, importante persistir no esforço de seu entendimento.

A categoria espaço destaca-se em alguns campos disciplinares das


ciências sociais como a economia, política, antropologia e sociologia; em áreas de
conhecimento como arquitetura, urbanismo, lingüística/literatura, e, também, em
campos interdisciplinares como planejamento urbano, planejamento regional,
gestão ambiental, gestão do território e desenvolvimento sustentável. Nos distintos
51

campos a categoria vem acompanhada de adjetivações tais como, espaço urbano,


espaço político, espaço social, espaço mental entre outras, traduzindo diferentes
conotações à categoria, o que representa, no dizer de Douglas Santos, “mais um
problema que uma solução o uso da categoria, já que, em si e para si, ela parece
não resguardar qualquer tipo de conceito mais perene, que nos permita usa-la
com tranqüilidade e com um mínimo de certeza de sermos entendidos.” (Douglas
Santos, 2002: 16-17).

Apesar desse destaque em áreas de conhecimento tão abrangentes,


excetuando-se a ciência geográfica e a física, onde a noção de espaço ultrapassa
os limites da identificação do objeto e coloca-se como uma espécie de identidade
epistêmica, na expressão de Corrêa (1995), pouca reflexão tem sido realizada
acerca do debate teórico fundamental sobre a posição e condição do espaço
perante a Totalidade Social, estando-se muito mais preocupado em descreve-la
do que conceitua-la.

Na Geografia, a reflexão acerca do conceito espaço tem variado desde uma


visão empiricista, onde o conceito confunde-se com o de paisagem, dominante,
por exemplo, na perspectiva positivista da Geografia Clássica/Tradicional, à
concepção negligente do marxismo ortodoxo, posicionando-o apenas como
“palco” das relações sociais. Em alguns momentos, chega-se mesmo a alça-la ao
plano epistemológico, considerando a proposição de uma “Espaciologia” como
designação de uma “ciência do espaço”, feita quase simultaneamente por Henri
Lefebvre (1981) e Milton Santos (1978), onde a referida categoria constituiria uma
instância autônoma conjuntamente às demais instâncias da Totalidade Social.

Nessa pesquisa busca-se discutir esse conceito de espaço a partir da


noção de forma-conteúdo de Santos (1978) articulada à noção de convenção
urbana, proposta por Abramo (1998), designando-os como termos conceituais
fundamentais para o entendimento da dinâmica sócio-espacial da cidade.

A apropriação combinada desses conceitos permite proceder a uma leitura


da dinâmica sócio-espacial impulsionada pelos deslocamentos das famílias
52

residentes na cidade em uma perspectiva que toma em consideração além das


relações estruturais de produção, circulação e consumo do espaço urbano,
imbricadas na atividade imobiliária, os sistemas de valores simbólicos/culturais
expressos nas transformações das formas-conteúdo criadas nesse processo.

Em outras palavras, as transformações sócio-espaciais, seja os


movimentos de difusão/homogeneização das inovações espaciais ou de
valorização/desvalorização das diversas localidades componentes de uma dada
estrutura urbana, são apreendidas sob uma ótica que leva em consideração os
fatores contingentes e singulares da ordem/desordem urbana.

É relevante, em face da abordagem teórica metodológica adotada, apontar


os principais elementos desse debate, atendo-se, principalmente, à reflexão sobre
a definição do espaço enquanto Instância Social, desfrutando de relativa
autonomia perante as demais instâncias da Totalidade Social e como um misto de
sistemas de ação e de objeto, segundo as proposições desenvolvidas por Milton
Santos (1978, 1979, 1985, 1988 e 1997).
53

PRINCIPAIS CONTORNOS DO DEBATE SOBRE ESPAÇO

Enquanto uma das categorias fundamentais na Geografia, juntamente com


os conceitos-chave de paisagem, região, lugar e território, o espaço ganhou
centralidade a partir da década de 1950, no bojo da denominada “revolução
teorética-quantitativa”, que introduziu significativas modificações na Geografia
(Christofoletti, 1976 e Santos, 1978). Para esta corrente de pensamento, o espaço
é considerado por meio da planície isotrópica derivada de uma visão racionalista,
hipotética-dedutiva, e de sua representação matricial. O espaço é relativo, sendo a
sua legibilidade expressa nas relações entre os objetos para vencer a fricção
imposta pela distância17.

O surgimento da Geografia Crítica na década de 70, fundada no


materialismo histórico e na dialética, teve nos debates, acima referido, um dos
temas básicos. A crítica central desta abordagem geográfica buscava romper, de
um lado, com a geografia tradicional considerando o ocultamento do espaço
proporcionado por esta corrente ao privilegiar os conceitos de paisagem e região
e, de outro, com a noção asséptica de espaço relacional da geografia teorética-
quantitativa, calcada nos pressupostos do positivismo lógico, tais como: planície
isotrópica, racionalidade econômica, competição perfeita e a-historicidade dos
fenômenos sociais. Dentre os autores principais nesta perspectiva crítica pode-se
destacar os trabalhos de David Harvey, Edward Soja, Neil Smith e Milton Santos.

Um aspecto adjacente, mas nem por isto menos importante face as


interessantes implicações para a teorização do espaço, proporcionada pela
Geografia Crítica, foi o rompimento do isolamento da Geografia com relação às
outras ciências sociais, fruto do entendimento basilar da categoria espaço como
um conceito ontologicamente social.

17
Importante salientar que é a partir desta visão de espaço relativo que se define as rendas
diferenciais, conceito fundamental na explicação do processo de estruturação do uso do solo
urbano sob a perspectiva da economia urbana neoclássica.
54

Dentre autores não-geógrafos cabe destacar as propostas de teorização


espacial de Henri Lefébvre, Manuel Castells, Allain Lipietz e Mark Gottdiener,
desenvolvidas sob diferentes ângulos da perspectiva marxista.

O espaço aparece, efetivamente, nesta perspectiva de análise, a partir da


obra de Henri Lefébvre, Espacio y Política, onde o autor assevera que o espaço
“desempenha um papel ou uma função decisiva na estruturação de uma
totalidade, de uma lógica, de um sistema” (LEFÉBVRE, 1976, p. 25). Para
Lefébvre, o espaço entendido como espaço social vivido, em estreita correlação
com a prática social não deve ser visto como espaço absoluto, nem como um
produto da sociedade, “ponto de reunião dos objetos produzidos, o conjunto das
coisas que ocupam e de seus subconjuntos, efetuado, objetivado, portanto
funcional” (op. cit., p.30). O espaço para Lefébvre é o lócus da reprodução das
relações sociais de produção.

Segundo Soja (1993), numa reação à centralidade exagerada dada à teoria


do espaço de Lefébvre na constituição e desenvolvimento da sociedade capitalista
moderna, surge os trabalhos de David Harvey (A Justiça Social e a Cidade, 1973)
e de Manuel Castells (A Questão Urbana, 1983) os quais, embora reconhecendo a
contribuição de Lefébvre, expressa em sua maneira de lidar com a organização do
espaço como produto material, com a relação entre as estruturas sociais e
espaciais do urbanismo e com o conteúdo ideológico do espaço socialmente
criado, não concedem às estruturas das relações espaciais pesos tão incisivo e
determinante.

Castells (1978) apresentou o espaço como um produto material que emerge


dialeticamente da interação entre cultura e a natureza. Assim, o espaço não seria
simplesmente um reflexo da estrutura social, mas a expressão concreta de uma
combinação de instâncias, uma combinação de elementos e interações sociais,
cujas leis são especificações gerais das leis gerais da Sociedade, negando-lhe,
desta maneira, leis próprias.
55

A teoria do espaço, portanto, consiste em uma especificação de uma teoria


geral da organização social, no intuito de explicar as características da forma
social particular, o espaço, e de sua articulação com outras forças e processos
num dado momento histórico.

A contribuição de Allain Lipietz (1980), inscreve-se na mesma tradição


estruturalista de Castells, contudo, o autor avança a concepção ao argumentar
que, a estruturação do espaço se realiza a partir da espacialização da divisão
social do trabalho, propondo o conceito de Divisão Econômico-Social do Espaço
(DESE). Para Lipietz, o espaço é a forma material das relações sócio-econômicas
que estruturam as formações sociais. O espaço como reflexo das relações sociais,
restringe também o desenvolvimento dessas relações, pois a sociedade recria seu
espaço sobre a base do espaço estabelecido no passado.

Lipietz (op. cit.) propõe como mecanismo regulador da reprodução da


DESE, ao longo do tempo, a teoria da imposição de um tributo fundiário urbano,
onde um tipo de tributo fundiário dominante se constituiria no mecanismo de
mercado regulador dessa reprodutibilidade, ou seja, os regimes concorrencial e
monopolista de regulação da DESE.

O trabalho do sociólogo Mark Gottdiener (1997), inscrito também no esforço


de teorização do espaço sob a angulação marxista, assevera que o espaço integra
e está intimamente envolvido nas relações sociais de produção, pois é parte das
forças de produção, elemento fundamental para o processo capitalista.

Porém, buscando estruturar por um lado, uma objeção básica às limitações


da economia política no tocante à análise do espaço na superação, segundo o
autor, do funcionalismo endêmico dessa corrente de pensamento e, por outro, a
insuficiência do Realismo em fornecer teoria específica para orientar o trabalho de
apreensão concreta do espaço preconizado por esta corrente de pensamento,
propõe um retorno ao conceito marxista da fórmula da trindade, isto é, o espaço
enquanto terra é introduzida na equação entre capital e trabalho (op. cit.; p.162)
56

Voltando às contribuições de autores no campo da Geografia, é importante


destacar como ponto de partida para a discussão da posição e condição do
espaço perante a dinâmica social, a obra de David Harvey (1975, 1982), não só
pelo conteúdo expressivo em termos de teoria espacial como também pelo
percurso político-filosófico e seu rebatimento direto nas abordagens teórico-
metodológicas desenvolvidas pelo autor.

Grosso modo, Harvey entende que as dimensões internas e externas do


espaço são inter-relacionadas e estão ligadas com o processo de acumulação do
capital. As transformações nas forças produtivas, aumentando a escala de
produção e a concentração e centralização do capital se processam paralelamente
à aglomeração urbana numa expansão do espaço capitalista internacional.

Para este autor, as crises de superacumulação são inerentes ao processo


de desenvolvimento capitalista, visto que o capital produz mais que a oportunidade
de uso, crises resolvidas através dos violentos episódios de destruição de valor,
requisitando, via de regra, a intervenção do Estado por meio da competição entre
nações visando à exportação dos efeitos dessa desvalorização, instaurando uma
espécie de neocolonialismo. As desvalorizações de capital são sistematizadas no
contínuo processo de reestruturação do espaço por meio da competição inter-
regional (Harvey, 1982).

Dessa maneira, Harvey (1990: 376) propõe o termo “desenvolvimento


geográfico desigual do capitalismo”, conseqüência em última instância, do fato de
que o capitalismo se desenvolve sobre um espaço geográfico extremamente
diversificado quanto à disponibilidade e distribuição de recursos naturais, força de
trabalho, fatores localizados e diferencialmente combinados no transcorrer da
história que, por sua vez, condicionam arranjos espaciais variados.
57

Em uma crítica velada ao que ele denomina a reificação (a coisificação) da


cidade18, Harvey (1196) revela onde situa o foco de sua análise espacial, ao
afirmar que, em uma sociedade de classes tal como a capitalista, as práticas
espaciais interligadas, oriunda da interação de diferentes atores com objetivos e
agendas bastante diversas, adquire um conteúdo de classe definido, embora isto
não implique em dizer que todas as práticas espaciais devam ser interpretadas
como tais. Acrescenta, então que, sob o capitalismo, é a ampla gama de práticas
de classe relacionadas à circulação do capital, à reprodução da força de trabalho e
das relações de classe e à necessidade de controlar a força de trabalho que
permanece hegemônica.

Para superar o perigo da aludida reificação ao tratar da relação entre


processo e objeto comum às análises espaciais, Harvey sem desconhecer as
dificuldades da tarefa, destaca como importante ter em mente os seguintes
pontos:

i) “o conjunto de processos sociais que se dão no espaço produz inúmeros


artefatos - uma forma construída, espaços produzidos e sistemas de
recursos de qualidades específicas, organizadas em uma configuração
espacial distinta;

ii) a ação social subseqüente tem que levar em conta tais artefatos na medida
em que tantos processos sociais (tal como deslocamento casa – trabalho)
se tornam fisicamente interligados;

iii) Esses processos espaciais também configuram certos arranjos


institucionais, formas legais, sistemas políticos e administrativos,
hierarquias de poder e similares;

iv) Estes também dão à “cidade” qualidade objetuais que podem dominar as
práticas diárias e conduzir a uma cadeia de ações subseqüentes; e,

18
Crítica a impressão de que a “cidade” pode ser um agente ativo, afirmando que essa não passa
de mera “coisa”. Ver artigo “Do gerenciamento ao empresariamento: a transformação da
administração urbana no capitalismo tardio. In: Espaço & Debates, Ano XVI, 1996,
58

v) Finalmente, a consciência dos habitantes urbanos é afetada pelo conjunto


de experiências do qual derivam percepções, leituras simbólicas e
aspirações.” (Harvey; op.cit.: 51)

Nesse ponto da discussão imprescindível mencionar a obra de Milton


Santos (de alguma maneira inspirada em Lefébvre) e seu esforço epistemológico
de construir uma teoria do espaço, principalmente naquilo que avança em termos
do esclarecimento das contínuas tensões entre forma e processo, entre função e
estrutura, entre sujeito e objeto, entre atividade e coisa, igualmente levantadas
por Harvey, mas de caráter mais limitado, dado o enquadramento de sua
teorização do espaço em uma abordagem de caráter mais essencialista como a
marxista onde a explicação essencial dos processos espaciais encontra-se
derivada.

Segundo Richard Peet (1998), a perspectiva de Milton Santos é uma


espécie de estruturalismo dialético-existencial que integra tempo e dinâmica na
estruturação do espaço. Para Santos, “os modos de produção se concretizam
sobre bases territoriais historicamente determinadas (...) as formas espaciais
constituem uma linguagem dos modos de produção”. (Santos; 1977: 5)

Para chegar à definição do espaço como “um conjunto indissociável,


solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não
considerados isoladamente, mas como um quadro único no qual a história se dá”,
Milton Santos percorreu uma longa trajetória reflexiva acerca do próprio conceito,
em um esforço interpretativo da ontologia espacial no sentido de identificar a
natureza do espaço assim como encontrar as categorias de estudo que permitem
corretamente analisa-lo. (Santos; 1997: 51).

Inicialmente, Milton Santos define o espaço geográfico como sendo a


natureza modificada pelo homem através do seu trabalho, entendendo-o como
59

categoria histórica, onde “é a própria significação dos objetos, do seu conteúdo e


das relações entre eles que muda com a história.” (Santos; 1978: 121)

Sendo assim, o autor nesta primeira reflexão, propõe que o espaço deve
ser considerado como um conjunto de relações realizadas através das funções e
de forma que se apresentam como testemunho de uma história escrita por
processos do passado e do presente.

Portanto, é um fato social no sentido com o qual K. Kosik, citado por Milton
Santos, define os fenômenos sociais: um fato histórico, na medida em que
reconhecemos como um elemento de um conjunto e realiza assim um dupla
função que lhe assegura, efetivamente a condição de fato histórico: de um lado,
ele se define como conjunto; ele é simultaneamente produtor e produto;
determinado; um revelador que permite ser decifrado por aqueles mesmos a quem
revela; e, ao mesmo tempo, em que adquire uma significação autêntica, atribui um
sentido a outras coisas. É um fato social, um fator social e uma instância social.
(K. Kosik; 1967: 61)

Entre as categorias internas de análise, o autor destaca a paisagem, a


configuração territorial, a divisão territorial do trabalho, o espaço produzido ou
produtivo, as rugosidades e as formas-conteúdo.

Neste esforço, é imprescindível levar em consideração a dimensão escalar


do espaço, isto é, os recortes espaciais no tratamento da região, da localidade, do
lugar, assim como a constituição de redes, sinergias e trocas, tanto materiais
como simbólicas.

Algum dos processos básico, alerta o referido autor, situa-se,


originariamente, externos ao espaço, no entanto, fundamentais para o estudo
dinâmico das categorias internas do espaço. Assim, propõe considerar junto às
categorias internas “a técnica, a ação, os objetos, a norma e os eventos, a
universalidade e a particularidade, a totalidade e totalização, a temporalização e a
60

temporalidade, a idealização e a objetivação, os símbolos e a ideologia.” (op.cit.:


19).

O espaço em sua própria existência é uma forma-conteúdo, isto é, uma


forma que só tem existência empírica e filosófica se considerada em conjunto com
o seu conteúdo e um conteúdo, que só pode existir, com a forma que o abrigou.

Segundo Milton Santos as “formas-conteúdo” seriam a concretização de


estruturas espaciais num dado momento e objeto de uma dinâmica
transformadora de seu conteúdo. Ou seja, “através do espaço, a história se torna,
ela própria, estrutura, estruturada em formas. E tais formas, como formas-
conteúdo, influenciam o curso da história (...)”, que apesar de não disporem de
uma autonomia de comportamento, possuem autonomia de existência
(op.cit.:152).

Ainda para esse autor, “pode-se dizer que a forma, em sua qualidade de
forma-conteúdo, está sendo permanentemente alterada e que o conteúdo ganha
uma nova dimensão ao encaixar-se na forma. A ação, que é inerente à função, é
condizente com a forma que contém: assim, os processos ganham inteira
significação quando corporificados (grifos no original)”. (Santos; 1985: 2)

Neste sentido, acrescenta Santos, a localização “como expressão da


objetivação do imenso movimento do mundo apreendido em um ponto geográfico”
sugere leituras da relação entre estrutura, em termos de direcionamento do
processo de transformação espacial da cidade e produção de distintos padrões
nos períodos particulares de sua evolução; e agência, em termos da ação e
estratégias desenvolvidas e adotadas por agentes individuais, tais como, o
político, o planejador, o loteador, o incorporador, o consumidor, o construtor e o
proprietário de terra. (id.ibidem.: 3)

A noção de intencionalidade é importante para entender a definição de


espaço proposta por Milton Santos, na qual ação e objetos se confundem por meio
61

do movimento permanente de dissolução e de recriação do sentido, constituindo-


se no traço central da dinâmica espacial.

A categoria totalidade é fundamental para o entendimento da sucessão


interminável das formas-conteúdo, uma vez que Milton Santos a considera como
existindo no seio de um processo permanente de totalização que é, ao mesmo
tempo, um processo de unificação e fragmentação e individuação, permitindo,
associar o aparecimento, transformação e renovação dos lugares aos movimentos
da sociedade.

O que movimenta esta dinâmica, acrescenta o autor, é a categoria divisão


do trabalho, encarregada a cada cisão da totalidade de transportar aos lugares um
novo conteúdo, um novo significado e um novo sentido. O evento, enquanto
portador de um acontecer histórico, constitui o vetor da realização e transformação
do espaço.

Dessa maneira, em uma análise que foca a categoria espaço, necessário


levar em consideração sua formação, sua estrutura, seus processos e funções,
suas transformações e significado de seus momentos constitutivos na consciência
e ação humana.

O conceito de estrutura urbana sob o ponto de vista geográfico, não pode


se limitar ao aspecto funcional, pois além de abrigar os diferentes usos que
configuram a cidade, o conceito denota aliança entre forma e desenvolvimento de
práticas sociais que, em última análise, estabelece a localização de atividades.
Estas por sua vez, configuram juntamente com seus demais elementos
construtivos, a imagem das localidades, impregnada de caráter e singularidade.

O espaço, portanto é uma forma durável, que não se desfaz paralelamente


à mudança de processos; ao contrário, alguns processos se adaptam às formas
preexistentes enquanto que outros criam novas formas para se inserir dentro
delas.
62

“Os lugares possuem, como qualquer fenômeno real, capacidade de


transmitir mensagens que serão interpretadas como revelação de certos sinais
codificados.” (Kholsdorf, 1999: 26). A configuração dos lugares pode oferecer
informações relativas a uma série de aspectos de uma dada estrutura urbana,
correspondente a aspirações posicionadas de forma distinta em cada um desses
aspectos.

A forma-conteúdo, como meio de apreensão do significado dos lugares,


portanto de legibilidade da estrutura intra-urbana, responde a expectativas sociais,
tanto as de ordem geral como as de caráter específico.

No primeiro caso, corresponde, necessariamente, pela definição da


formação sócio-espacial que a contém, devendo o seu estudo estar inserido na
definição da lei de movimento entre categorias analíticas, onde se inclui o espaço
que, assim, é compreensível por essa dinâmica, da mesma maneira que sua
forma.

No segundo caso, corresponde aos anseios individuais expressos nas


preferências e escolhas espacialmente localizadas, assim como nos diferentes
modos de apropriação do espaço urbano.

Os lugares apresentam-se no que se denomina espaço urbano concreto, ou


seja uma totalidade complexa formada por atividades, formas, significados e
práticas sociais19.

Em geografia, a forma espacial é a expressão do lugar, que encarna um


valor real, assim como as pessoas que o habitam e trabalham. Nesta formulação,
a dimensão espacial contém os diversos níveis da realidade, tanto o social como o
físico/ ambiental.

19
O conceito de lugar é desse modo apresentado como porção discreta do espaço total.
63

LOCALIZAÇÃO, VALORIZAÇÃO DO ESPAÇO E POSIÇÃO SOCIAL

Face ao delineamento teórico dado à categoria espaço na secção


precedente, considera-se importante para a compreensão da dinâmica sócio-
espacial da cidade, refletir acerca do ato de localizar-se em dada estrutura interna
da cidade e as implicações de tal fato, objetivamente e subjetivamente, em termos
de valorização do espaço e posição social.

Segundo Bourdieu “o espaço social se retraduz no espaço físico, mas


sempre de maneira mais ou menos confusa: o poder sobre o espaço que a posse
do capital proporciona, sob suas diferentes espécies, se manifesta no espaço
físico apropriado sob a forma de uma certa relação entre a estrutura espacial da
distribuição dos agentes e a estrutura espacial da distribuição dos bens ou dos
serviços, privados ou públicos”. (Bourdieu; 1997: 160)

Sendo assim, a posição de um sujeito no espaço social se exprime no lugar


(no sentido de sítio físico em que está situado) e pela posição relativa que suas
localizações temporárias e permanentes ocupam perante a localização de outros
sujeitos.

A posição social da família, nos termos definidos por Bourdieu, pode ser
expressa por diferentes formas de capital: “capital social”, isto é, prestígio social,
como indicado, por exemplo, pelo nome de família bem conhecido; “capital
cultural”, isto é, educação ou gostos; ou “capital econômico”, isto é, recursos
materiais, usualmente expressos nos padrões de consumo.(Bourdieu; op.cit.)

É comum raciocinar em termos de localização intra-urbana das pessoas e


atividades em termos estritamente econômicos, uma vez que a tradição dos
estudos urbanos clássicos confere, quase exclusivamente a essa dimensão, o
poder explicativo do processo.
64

No entanto, é preciso atentar, em concordância com Bordieu, que os


agentes sociais “são constituídos como tais em e pela relação com um espaço
social (ou melhor, com campos) e também as coisas na medida em que elas são
apropriadas pelos agentes, portanto constituídas como propriedades situadas num
lugar do espaço social que se pode caracterizar por sua posição relativa pela
relação com os outros lugares (acima, abaixo, entre, etc.) e pela distância que o
separa deles”. (Bordieu, op.cit: 160)

Na definição da relação entre espaço social e espaço físico acrescenta este


autor, “como o espaço físico é definido pela exterioridade mútua das partes, o
espaço social é definido pela exclusão mútua (ou a distinção) das posições que o
constituem, isto é, como estrutura de justaposição de posições sociais” (id.ibidem:
160).

Nesta noção de justaposições sociais está implícita a idéia de hierarquias e


distâncias sociais, as quais, muitas vezes, encontram-se dissimuladas pelo efeito
de naturalização que a permanência das realidades sociais no mundo natural
enceta. Sendo assim, por conseqüência e própria constituição, todo o espaço é
hierarquizado.

Coerente com a noção de rugosidades espaciais (Santos, 1985), para


Bourdieu uma parte da inércia das estruturas do espaço social resulta do fato de
elas estão inscritas no espaço físico e que não poderia ser modificadas senão ao
preço de um trabalho de transplantação, de uma mudança das coisas e de um
desenraizamento ou de uma deportação de pessoas, as quais suporiam
transformações sociais extremamente difíceis e custosas.

As diferentes configurações espaciais que caracterizam a estrutura intra-


urbana compõem, utilizando os termos de Bourdieu (op.cit.), os diferentes campos
ou, se prefere, os diferentes espaços sociais fisicamente objetivados, reificado20,
que tendem a se sobrepor, ao menos grosseiramente: disto resulta concentrações
20
O conceito de reificação aqui empregado da forma usada por Georg Lukás e Karl Marx, ou seja
como se o espaço em si fosse algo concreto e real, além de nossa capacidade de controle. (Allan
G. Johnson; Dicionário de Sociología, 1997).
65

dos bens mais raros e de seus proprietários em certos lugares do espaço físico
que se opõem assim, em todos os aspectos, aos lugares que agrupam
principalmente e por vezes exclusivamente os mais carentes.

Crucial nesse sentido é o aspecto relativo dessas posições, ou seja, todas


posições elevadas em seus campos respectivos e que não podem ser
compreendidos no que eles têm de mais específico a não ser que o coloquemos
em relação às posições situadas no mesmo campo, em posições inferiores, mas
em outras regiões do espaço físico.

Isto significa dizer que a distribuição espacial das diferentes famílias pelos
distintos espaços componentes de uma dada estrutura urbana é processada por
meio de sinalizações entrecruzadas, transcendentes ao comportamento
racionalista, tanto em termos por um lado, da maximização da função utilidade
proposta como critério de decisão de escolha locacional (economia urbana
neoclássica) como pelo critério dos gradientes dos diferentes tipos de rendas
fundiária urbana no condicionamento da produção imobiliária e,
conseqüentemente, o papel determinante da oferta no processo alocativo de solo
urbano (abordagem marxista21).

Na perspectiva de análise adotada nesta pesquisa e ainda em concordância


com os enunciados de Bourdieu, consente-se que “as surdas injunções e os
chamados silenciosos à ordem das estruturas do espaço físico apropriado são
uma das mediações através das quais as estruturas sociais se convertem
progressivamente em estruturas mentais e em sistemas de preferências. Mais
precisamente, a incorporação insensível das estruturas de ordem social realiza-se,
sem dúvida, para uma parte importante, através da experiência prolongada e
indefinidamente repetida das distâncias espaciais nas quais se afirmam as
distâncias sociais, e também, mais concretamente, através dos deslocamentos e
dos movimentos do corpo que essas estruturas sociais convertidas em estruturas
espaciais e assim naturalizadas organizam e qualificam socialmente como

21
Esta abordagem é bem representada no campo dos estudos urbanos pelos trabalhos de
Topalov, 1979; Lipietz, 1974; Harvey, 1982 e Ball, 1983.
66

ascensão ou declínio, entrada ou saída, aproximação ou distanciamento em


relação a um lugar central valorizado”. (op.cit.: 160)

A posição de um sujeito no espaço social se exprime no lugar do espaço


físico em que está situado e pela posição relativa que suas localizações
temporárias e permanentes ocupam em relação à localização de outros sujeitos.

Acrescenta por fim Bourdieu, a posição social “se exprime também no lugar
que ocupa (no direito) no espaço através de suas propriedades (casas,
apartamentos ou salas, terras para cultivar, para explora ou para construir, etc.)
que são mais ou menos embaraçosos ou, como se diz às vezes, ‘space
consumming’ (o consumo mais ou menos ostentatório do espaço é uma das
formas por excelência de ostentação do poder)”. (id. ibidem.: 161)

O endereço residencial e profissional, dessa maneira, serve de referência


para expressar o nível social de determinado agente, implicando na maioria das
vezes na expressão simbólica do status social que esse agente deseja exprimir.
Morar em um determinado lugar compreende um conjunto de significados que
transcendem ao atendimento da necessidade de abrigo.

Uma vez que na cidade moderna o espaço público tem sido cada vez mais
restrito como local de interação de distintas classes, pois, paulatinamente, as
pessoas são direcionadas a interagir com aqueles que compartilham semelhante
nível de renda, educação e cultura, em espaços privativos tais como “shoppings”,
clubes e academias, é conferido, portanto, a esses espaços uma importância
muito maior do que as épocas precedentes.

Tendo sido criado tais espaços físicos, por se constituir em um fixo


composto de uma inércia-dinâmica (Milton Santos, 1988), sua modificação
resultará em um processo difícil e custoso, residindo aí parte da inércia das
estruturas do espaço social que são transformadas a custo de um trabalho de
transplantação.
67

Como o espaço geográfico é fisicamente objetivado por meio de uma


localização, é na relação entre a distribuição dos agentes e a distribuição dos bens
no espaço que se define o valor das diferentes localidades do espaço social
objetivado.

Tal entendimento se distancia das análises clássicas da estruturação intra-


urbana lastreada na Teoria do Valor, tanto a de corte marxista centrada no
conceito de valor-trabalho, como a neoclássica com foco no valor utilidade.

Com efeito, de justificar a adoção de uma abordagem para a mobilidade


sócio-espacial no espaço intra-urbano por um ângulo multidisciplinar e distinto das
análises clássicas referenciadas, propiciando oportunidade para a captação de
processos contingentes e dinâmicos de ordem/desordem espacial22, procede-se
uma rápida revisão crítica dessas análises, como exemplificação do debate geral
entre as explicações de caráter essencialista própria das análises clássicas em
relação às análises contextuais, referidas por Barnes (1996).

O ponto de partida das abordagens clássicas é a teoria do valor.

A teoria do valor, strictu sensu, é simplesmente uma teoria de determinação


de preços, no entanto, para Myrdal sua utilização tem ocupado uma posição muito
mais significativa nas Ciências Sociais, como “o ponto de partida para todas as
análises econômicas realizadas sob a superfície terrestre”. (Myrdal; 1969: 15)

A corrente marxista se insere nas abordagens de economia política que


emergiram na primeira parte do Século XIX, impulsionada inicialmente por
economistas dos séculos dezoito e dezenove e, em particular, com os escritos de
David Ricardo.

22
Cada vez mais a percepção da complexidade dos fenômenos implicados pela dinâmica sócio-
espacial da cidade na atualidade, tanto em termos de dimensão como de velocidade, impulsiona a
adoção de procedimentos analíticos que considerem a vigência de uma ordem contingente e
multifacetada na constituição dos mesmos, superando a visão clássica das disfunções urbanas,
dos conflitos estruturais ou mesmo de caos urbano.
68

De acordo com a breve caracterização feita por Shepard & Barnes (1990), o
esquema central tanto para Ricardo como para Marx estava fundamentado
primeiramente, no conceito de valor, isto é, o aspecto fundamental na
determinação dos preços relativos; segundo, nos circuitos de produção e
reprodução; e terceiro, na distribuição de renda entre as classes sociais.

As semelhanças e diferenças entre Ricardo e Marx são esquematicamente


apresentadas nas figuras abaixo:

Figura n° 1 - As semelhanças e diferenças entre Ricardo e Marx

Fonte:
69

Figura n° 2 - As semelhanças e diferenças entre Ricardo e Marx

Fonte:

Embora, segundo a argumentação de Sheppard & Barnes (op. cit.), os


trabalhos de Ricardo tenham focalizado sobre os bens de produção, uma de suas
maiores contribuições para o debate político no século dezenove esteve
relacionado à construção de um argumento sobre os proprietários fundiários.
Ricardo, em particular, argumentou que na esfera da distribuição os proprietários
fundiários representam um obstáculo para a reprodução dos bens de produção e,
por sua vez, para a criação de valor. Tal argumento é ilustrado pela figura nº1 .

Marx, anos depois, deslocou a esfera do conflito delineada por Ricardo, isto
é, não se tratava mais do antagonismo entre os proprietários fundiários e
capitalistas, mas entre capitalistas e trabalhadores.
70

Do ponto de vista marxista, os preços das mercadorias são determinados


pelo tempo de trabalho socialmente necessário empregado para produzir um bem
usando a técnica de produção média de um dado momento histórico, conforme
ilustra a figura nº 2 . Especificamente, para Marx, combinar capital e trabalho
permite a produção ocorrer, resultando em um dado nível de produto. Parte do
produto realizado vai para os capitalistas na forma de lucro (mais-valia) e então é
reinvestido, permitindo a reprodução do capital constante. O remanescente vai
para os trabalhadores na forma de salários, permitindo a reprodução social do
trabalhador.

A abordagem neoclássica que emergiu no final do século XIX distinguiu-se


de forma cabal das abordagens de economia política. De acordo com Shepardes
& Barnes (op.cit.) a teoria de valor neoclássica não inicia com a análise dos bens
produzidos e suas condições de produção e reprodução como a faz a economia
política, mas com a escassez dos bens não produzidos e suas condições de troca
(Conforme ilustrado na figura nº 3 ), sendo que os valores de troca são derivados
dos desejos primitivos de consumidores individuais e da escassez dos recursos
naturais23.

23
No capítulo III, é mais bem detalhada a noção de valor utilidade por meio da revisão das
principais abordagens de economia urbana neoclássica.
71

Figura nº 3 - Escassez dos bens não produzidos e suas condições de troca

Fonte:

Em particular, o modelo de equilíbrio geral da abordagem neoclássica


presume a existência de um conjunto de indivíduos racionais que são beneficiados
com uma dada alocação desses recursos naturais escassos. Estes indivíduos
isolados manifestam suas preferências, ou seja, conhecem o que gostam e
desgostam e podem julgar sua satisfação a partir de uma dada escolha. O
problema econômico é então encontrar os preços (de equilíbrio) que trazem, por
meio das trocas, uma alocação ótima daqueles recursos escassos. Em resumo, o
problema econômico é de escolha racional.
72

Para Maurice Dobb na concepção marxista, o fundamento do valor trabalho


tem sua definição fora da esfera da economia, uma vez que sendo concebido
como o gasto de uma dada quantidade de energia humana, sua base está
assentada “nos fatos psicológicos, (...) no gasto de cérebro, nervos, músculos e
órgãos dos sentidos.” (Dobb; 1940: 13).

Ademais, Marx caracterizou o conceito de valor como uma lei da natureza,


ou seja, uma lei que, todas as sociedades humanas são capazes de transformar a
natureza para o atendimento de seus propósitos somente por meio do trabalho. A
noção de valor-trabalho constituiu-se, assim, na primeira formulação explícita da
categoria valor. Neste sentido, o tempo de trabalho é o custo último da produção
que explica a medida imanente do produto, para qualquer sociedade.

Embora as formas de valor na qual o tempo de trabalho é expresso variem


historicamente, o tempo gasto no processo de trabalho permanece como o fator
essencial perpassando diferentes períodos e lugares, portanto oferecendo pouca
explicação do processo sob uma ótica que dê ênfase à dimensão espacial.

Sob a ótica da economia neoclássica, o conceito essencial na definição do


valor das coisas é o de utilidade. Segundo Dobb utilidade é o elemento que
constitui uma definição implícita da forma geral e do caráter da área denominada
por economia”. Embora utilidade seja simbolicamente representada por meio da
função de preferência e tomada sobre valores singulares, é muito difícil obter-se
uma definição precisa do termo. (Dobb; op.cit.: 19..)

Utilizando a mesma analogia dos físicos no emprego da técnica de


maximização da restrição de energia para revelar o caminho mínimo percorrido
por qualquer movimento de partícula de energia, os economistas neoclássicos,
segundo Mirowisky (1984), usaram a mesma técnica matemática para descobrir
as ações mais eficientes (racional) demandas por consumidores e produtores no
sentido de maximização da utilidade e dos lucros, respectivamente.
73

A despeito dos vários sentidos atribuídos ao termo utilidade24, o seu


significado está assentado em um nível subjetivo e individual do gosto dos
consumidores, portanto, da mesma maneira da crítica levantada ao conceito de
valor-trabalho, repousa em um nível de análise exterior à economia propriamente
dita. Como Maurice Dobb afirma que “a significância da ‘constante’ [uitlidade] é
alguma qualidade em qualquer caso particular que pode ser reconhecida
independentemente de qualquer outra variável no sistema (...) e sendo assim, em
um importante sentido, situa-se como um fator externo em que a situação total é
dependente”. (citado por Barnes; op.cit.: 64)

Na Geografia o relacionamento entre teoria do valor-trabalho e forma


geográfica tem impulsionado variadas abordagens, dentre as quais Barnes
(id.ibidem) destaca David Harvey pelo que representa de importância,
profundidade e originalidade no tratamento dessa categoria como condição
fundamental para a formação e transformação do espaço geográfico. O autor
destacado parte do princípio que o desenvolvimento histórico do capitalismo
impõe a universalização progressiva do valor como forma de trabalho abstrato.

David Harvey é aqui considerado em sua fase de ortodoxia marxista (1982,


1985, 1986). Como proposição geral assevera que a produção social do espaço e
do tempo é muito mais relações internas do que condições externas da dinâmica
da acumulação do capital.

A produção e a estruturação do espaço não acontece de forma homogênea,


pois as diferentes parcelas do espaço são incorporadas ao processo geral de
produção e de circulação do capital a partir de condições histórico-geográficas
distintas, configurando vetores de forças antagônicos, tanto no sentido da
dispersão geográfica como da sua concentração.

Segundo Harvey (1999) se a mais-valia tivesse de ser produzida e realizada


dentro de uma região ‘fechada’, então a tecnologia de produção, as estruturas de

24
Em razão da dificuldade de sua definição, um conjunto de sinônimos lhe é atribuída: desejo,
satisfação, prazer, bem-estar, entre outros.
74

distribuição, os modos e as formas de consumo, o valor, as quantidades e


qualidades da força de trabalho, assim como toda a infra-estrutura física e social
necessária deveria ser perfeitamente consistente com cada um desses aspectos
no interior daquela região. A cada modificação no processo de trabalho deveria
corresponder a mudança na distribuição, consumo, infra-estrutura, etc.

No entanto o processo de desenvolvimento capitalista é totalmente


incompatível com essa hipótese, pois a tentação para o capitalista levar a sua
produção onde a realização do lucro seja maior e mais rápida é inerente ao
próprio modo de produção, resultando dessa maneira, um movimento antagônico
de equalização e diferenciação espacial, denominado por Harvey (op.cit.) de
desenvolvimento geográfico desigual.

Nessa perspectiva, então, o processo social deve ser explicado em última


instância, no âmbito da discussão sobre o valor e trabalho, categorias
fundamentais da materialidade social. Assim, a relação sociedade-espaço é,
desde logo, uma relação valor-espaço, pois substantivada pelo trabalho humano.
75

LOCALIZAÇÃO E DINÂMICA ESPACIAL EM BRASÍLIA

O endereço tem peso na definição do lugar social do indivíduo. Morar no


Lago Sul, Lago Norte, Plano Piloto, áreas nobres de Brasília; morar Taguatinga,
Guará, Sobradinho, Gama, localidades distantes do centro (Plano Piloto), porém
situadas em escala intermediária em termos de status social e econômico; morar
em Paranoá, Recanto das Emas, Samambaia, Planaltina, Brazlândia, periferia
imediata; e, por fim, Águas Lindas, Santo Antônio do Descoberto, Novo Gama,
Planaltina do Goiás (Brasilinha), periferia mais distante, engendram sociabilidades,
oportunidades e apropriações espaciais distintas entre seus moradores.

Em qualquer lugar do mundo o endereço denota variadas distinções, e


Brasília (Plano Piloto), mesmo sendo uma cidade criada o um propósito de
favorecer encontros de pessoas de variadas posições sociais, tem demonstrado
desde o início de sua história, a ocorrência de preconceito do brasiliense em
relação ao endereço.

Se no início da cidade, se manifestava no microcosmo de uma


superquadra, com manifestações de apreço ou desapreço por pessoas que
moravam em apartamentos maiores em relação aos apartamentos menores,
chegava ao nível de relativo desprezo daqueles que moravam nas “superquadras”
100, 200 e 300, em relação às 400, com seus prédios sem elevador; passando
pela formação das cidades-satélites que, com recorrência, foram sendo formadas
como produto de pressão social das classes de renda menos favorecidas, mas
que com o desenrolar do processo de desenvolvimento desse espaço geográfico
foram se consolidando como cidades de classe média, com um padrão de vida
mais próximo do Plano Piloto; para culminar hoje com a maior carga de
preconceito com relação aos assentamentos urbanos recentes, providos de forma
incipiente de padrão urbanístico qualificado.
76

Tomando por base as observações extraídas da pesquisa qualitativa

realizada pela WHO – Pesquisa e Informações de Mercado, realizada em março

de 2000, por solicitação do Correio Braziliense com 50 pessoas, distribuídas em

cinco grupos de amostragem, divididas por sexo, idade, classe social e endereço,

constata-se que:

9 a discriminação vem de uma minoria pois é justamente cerca de 15%


da população que mora no centro de Brasília (Plano Piloto, Lago Sul,
Lago Norte, Cruzeiro) é que tratam o restante da população como
fizessem parte da mesma população;

9 os moradores do centro de Brasília responsabilizam as comunidades


das outras cidades pela violência e pela pressão social vivenciada
hoje em dia;

9 a discriminação é mais intensa entre os moradores do Plano Piloto


com os das outras regiões do DF, no entanto ela parte também de
quem vive nas cidades com melhor infra-estrutura e mais perto do
centro para os vizinhos da periferia; e,

9 os moradores da Aglomeração Urbana de Brasília35, independente


de onde residem ao serem perguntado, quando perguntados fora
daqui onde moram, referem sempre como resposta que residem em
Brasília, denotando o orgulho de morar na capital do país.

Relacionando os aspectos de como os residentes das distintas


localidades referenciam entre si o local de moradia à análise da dinâmica
espacial intra-urbana, percebe-se a existência de fatores que condicionam,
tanto a localização como a mobilidade residencial, transcendentes às

35
Criada por meio de Lei Complementar Nº 94, em 19/02/1998, com o objetivo de estabelecer um
mecanismo institucional que permitisse o Poder Público tratar de forma mais adequada os
problemas regionais.
77

explicações clássicas baseadas no trade off entre acessibilidade e espaço


(abordagens de economia urbana neoclássica) e teoria da renda fundiária
urbana (abordagens marxistas). A existência de uma externalidade de
localização residencial, como afirma Abramo (1998), pode abrigar outras
lógicas tais como, por exemplo, a representação de status social e econômico
que determinado endereço no interior da cidade denota.

Nessa perspectiva as localizações e os correspondentes preços


implicados pela mesma são condicionados pelo comportamento estratégico
dos agentes intervenientes na dinâmica espacial e os fatores de externalidade
que, ao interferir nas preferências das famílias, provocam toda uma teia de
decisões cruzadas nas escolhas de localização.

Em um ambiente de incerteza próprio da complexidade urbana, as


famílias são obrigadas a antecipar ações em relação aos outros, tomando
decisões localização na estrutura interna da cidade que julgam a melhor,
sobrepondo essas decisões às suas preferências locacionais, encetando um
movimento de “desnaturalização” do espaço econômico.

Nesse sentido a noção de convenção urbana é fundamental para o


entendimento da coordenação da dinâmica espacial em uma perspectiva
heterodoxa.

De acordo com a definição de Abramo, a convenção urbana, entendida


como “uma crença referente ao tipo de família que, supostamente, vai se
instalar numa determinada localização (externalidade de vizinhança), conforme
as inovações espaciais (diferenciações do bem-moradia) propostas por
capitalistas”. (Abramo; 2001:164)

Como uma crença, uma dada convenção urbana é contingente, pois a


cada momento novos significados, imagens, referências são emitidas a
respeito de uma determinada localidade. Os próprios incorporadores
imobiliários, pela definição dada por Smolka (1886), agentes transformadores
78

do uso do solo e das características dos estoques do construído urbano, como


afirma Abramo (op.cit.) “terão todo o interesse em partilhar em outro lugar, uma
nova concepção que assegure a coordenação espacial de outra operação de
transformação da estrutura espacial urbana”. É por isso que, conclui, “os
empreendedores tentarão sempre propor novas convenções urbanas, por meio
(indireto) das inovações espaciais”. (Abramo; op.cit.: 8)

Este movimento constante de transformação espacial, no nível interno


da própria localidade, permitirá a identificação de diferenciados momentos na
evolução da mesma, possibilitando estabelecer o que Abramo (op.cit.)
denomina de “ciclo de vida” da localidade.

Sendo assim, no plano da estrutura agregada da dinâmica espacial, as


inovações espaciais podem se deslocar no espaço produzindo as transições
regulares no interior do ciclo de vida das localidades.

Os períodos de transição correspondem ao momento no qual uma nova


convenção urbana serve de mecanismo de coordenação das decisões de
produção dos estoques imobiliários. No entanto, a representação da sucessão
de convenções urbanas, no transcurso do tempo, poderá também representar
a “vida” da localização, por meio das mudanças que elas trazem nas
características de seu estoque imobiliário. Assim, a curva evolutiva dos
estoques reais serve para descrever o “ciclo de vida” das localidades.
79

Tabela Nº 04 - Lotes Residenciais Licitados pela TERRACAP

Localidade 1989 1994 1998

VL(1) VA(2) Nº VL(1) VA(2) Nº VL(1) VA(2) Nº


Un Un Un

Ceilândia 15.400 16.478 44 - - - - - -

Gama 78.397 126.120 195 47.423 61.968 82 - - -

Guará - - 16.055 16.132 24 24.800 57.300 38

Plano Piloto 96.391 162.241 145 17.956 20.048 26 - - -

Taguatinga 82.151 144.062 141 72.861 92.598 118 215.350 248.076 331
Fonte: banco de dados da Pesquisa com base nas informações dos Editais de Licitação
(1) Valor médio de lançamento
(2) Valor médio alcançado
(3) (–) nenhum lote lançado no ano

Segundo Abramo (1998), a convenção urbana permite um duplo


processo de coordenação: de um lado, uma articulação espacial das ofertas e
de outro, uma coordenação das ações em torno de um padrão de configuração
do estoque e de suas características.

Em termos de oferta, o monopólio estatal das terras para expansão


urbana constitui-se em uma característica singular do mercado imobiliário de
Brasília, não obstante poder ser verificada a ocorrência de ocupações
irregulares de terras ao longo de todo o processo de formação desse espaço
urbano.

Em relação ao segundo processo de coordenação o padrão fortemente


segmentado do mercado imobiliário de Brasília condiciona a quantidade de e
as estratégias de atuação das incorporadoras imobiliárias nos quatro
submercados imobiliários identificados na cidade.
80

O resultado agregado das inovações espaciais, isto é, as entradas e


saídas provenientes, ao nível da ordem urbana global, tanto a ação dos
empreendedores urbanos com a sua estratégia de antecipação do “mark-up”
urbano que eles poderiam impor a uma determinada área; quanto a
depreciação “fictícia”36 do padrão espacial de uma dada localidade, permite
alterar as externalidades de vizinhança daquela localidade específica,
repercutindo conjunto da configuração urbana de uma cidade.

Dessa maneira, em concordância com Abramo (op.cit.), a inovação


espacial é uma estratégia fundamental para a desestabilização da ordem
espacial urbana vigente, revelando a simbiose entre ordem e desordem
espacial, pois, de um lado, ela provoca o movimento de mudança em direção
às novas ordens residenciais (a dinâmica) e, de outro, ela tem a capacidade de
desordenar as externalidades (retorno da incerteza urbana) e de bloquear a
coordenação necessária a sua recomposição.

A dinâmica espacial, então, pode ser definida como o processo de


configuração incessante de ordem/desordem espacial impulsionada pelo
conjunto de inovações espaciais (considerado como o vetor da diferenciação
do espaço) e suas imitações por meio das difusões (considerado como o vetor
de homogeneização do espaço).

Essas inovações espaciais não acontecem de forma sincrônica entre as


diversas localidades. Por conseqüência, as transformações nas características
dos estoques imobiliários conjugadas à demanda compostas por “tipos” de
famílias que se distinguem segundo os seus níveis de renda, atividade
ocupacional e composição etária, engendra uma espécie de mosaico de
externalidades de vizinhança, proporcionando no agregado da estrutura intra-
urbana a configuração de padrões espaciais.

36
Depreciação fictícia no sentido que é provocada o deslocamento de uma família para uma outra
localização gerando um acesso a outra família de renda inferior, em razão das mudanças no
padrão do imóvel em si como das características urbanística da localidade em que está inserido.
81

Em resumo, a dinâmica espacial sob a coordenação das convenções


urbanas, constitui-se em movimentos de valorização/desvalorização dessas
convenções, resultantes de decisões de localização interdependentes e
estratégicas entre os diversos agentes participantes da formação do espaço
intra-urbano.
82

CAPÍTULO III - MOBILIDADE SÓCIO-ESPACIAL EM BRASÍLIA

O homem está na cidade


como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

mas variados são os modos


como uma coisa está em outra coisa:
o homem, por exemplo, não está na cidade
como uma árvore está
em qualquer outra
nem como uma árvore
está em qualquer de suas folhas
(mesmo rolando longe dela)
o homem não está na cidade
como uma árvore está num livro
quando um vento ali a folheia

a cidade está no homem


mas não da mesma maneira
que um pássaro está numa árvore
não da mesma maneira que um pássaro
(a imagem dele)
está / va na água
e nem da mesma maneira
que o susto do pássaro
está no pássaro que eu escrevo

a cidade está no homem


quase como uma árvore voa
no pássaro que a deixa

cada coisa está em outra


de sua própria maneira
e de maneira distinta
de como está em si mesma

a cidade não está no homem


do mesmo modo que em suas
quitandas praças e ruas

Poema Sujo
FERREIRA GULLAR
Buenos Aires
Maio/outubro,1975
83

INTRODUÇÃO

Os estudos sobre a mobilidade social têm sido produzidos principalmente


como domínio da Sociologia.

De acordo com a definição de Allan Johnson “mobilidade social é o


movimento ascendente ou descendente em sociedades estratificadas. Pode ser
intergerações (comparando indivíduos com seus pais) ou intragerações
(comparando posições ao longo de tempo de vida de indivíduos).” (Johnson; 1997:
150)

Nessa pesquisa é focalizada a posição das famílias residentes no espaço


urbano de Brasília37, buscando identificar sua trajetória de deslocamentos a partir
da decisão de migrar relacionando ao seu status social em termos de renda, grau
de instrução educacional e prestígio ocupacional.

Uma das questões cruciais implicadas nos estudos de mobilidade está


relacionada a saber com exatidão o que está sendo medido. Confusão entre
mobilidade absoluta e relativa é o centro da confusão acerca do entendimento se
determinadas sociedades realmente revelam movimentos de ascendência ou
descendência social.

Para Birdsall e Graham (1999), mobilidade absoluta é definida como o


movimento de indivíduos através de um limite de renda fixado, estabelecido
tomando por base um ano para toda população, enquanto mobilidade relativa é
definida como mobilidade individual relativa em relação aos outros, normalmente
situados em uma mesma faixa etária, a qual refletirá a influência de fatores tais
como educação, herança e sorte.

37
Importante lembrar que espaço urbano de Brasília é aqui considerado na acepção do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ou seja, o Plano Piloto mais o tecido urbano das
demais Regiões Administrativas que compõem o Distrito Federal.
84

Pela definição dada à mobilidade absoluta, um grande número de pessoas


terá trocado de status apesar de sua posição relativa dentro de uma distribuição
permanecer a mesma, em razão de fatores tais como a ocorrência de crescimento
econômico e a tendência natural das rendas aumentarem à medida do
amadurecimento profissional do indivíduo.

Os estudos da mudança de localidade dos moradores no espaço intra-


urbano estão inseridos em um campo de pesquisa mais abrangente relativo à
temática das migrações, seja as de caráter nacional ou internacional.

Estas pesquisas, em sua grande maioria, estão assentadas em dados


empíricos acerca dos fatores de atração e de expulsão das áreas de origem e
destino dos migrantes, o ritmo e modalidades desses deslocamentos, sua
abrangência e, por conseqüência, enseja análises acerca dos processos sociais
de integração ou segregação, tanto do ponto de vista do migrante como da
comunidade que o acolhe; dos processos de ascensão (ou vice-versa) das
respectivas posições sociais, dos impactos positivos ou não na dinâmica
econômica e urbana dos espaços geográficos, suporte e condição/condicionada
de materialização do processo.

O processo desencadeia ritmos, direções e intensidades de deslocamentos


de diferentes contingentes populacionais, dando ensejo à aplicação na explicação
do mesmo alguns dos fundamentos teóricos acerca da estruturação interna das
cidades (Paviani, Farret e Campos, 1990).

Para o seu entendimento é necessário considerar a relação fundamental


com a dinâmica social que este processo espacial enceta, uma vez que a
mobilidade residencial pode ser definida como as mudanças de endereço das
pessoas no âmbito do mesmo espaço urbano, repercutindo transformações na
85

estrutura, função, forma e significado de uma fração específica daquele espaço,


ou seja, de determinado lugar38.

Tais movimentos produzem impacto na dinâmica espacial da cidade, e


mais precisamente, na sua dinâmica imobiliária, uma vez que seu movimento é
impulsionado pelas decisões, desejos e possibilidades de produtores e
consumidores de espaço na configuração do bem imobiliário.

Portanto, a mobilidade residencial pode ser


analisada como um fenômeno da dinâmica
imobiliária, uma vez que as necessidades,
preferências e capacidades das famílias têm
como conseqüência uma dada localização e,
estas por sua vez ao se concretizarem, encetam
um conjunto de alterações espaciais, sociais,
econômicas, culturais, entre outras, revelando o
caráter complexo e mutante do processo.

38
Segundo Armando Corrêa da Silva (1978), não existe o lugar fora do espaço. Sendo assim, a
explicação do processo está imbricada necessariamente com o entendimento da categoria
espacial designadora do lugar.
86

MOTIVAÇÕES E PREFERÊNCIAS NOS DESLOCAMENTOS INTRA-URBANOS

O processo de estruturação intra-urbana é dinâmico e multifacetado,


pressupondo alterações espaço-temporais no que diz respeito ao padrão de
expansão urbana, na intensificação da ocupação urbana e na distribuição dos
diferentes segmentos populacionais residentes na cidade.

A configuração de espaços distintos no contexto de uma cidade marcada


por forte segregação residencial como Brasília, refletem de alguma forma a
posição das famílias residentes na sociedade, impulsionando deslocamentos no
interior da cidade no sentido de ajustar essa nova posição à determinada
localização na cidade.

As decisões locacionais podem ser identificadas através dos movimentos


do mercado, representadas pelas transações imobiliárias que envolvem uma
parcela significativa do estoque total de imóveis (terrenos, casas, apartamentos,
lojas e salas comerciais) existentes na cidade a cada momento, bem como os
imóveis novos. (Farret, Campos & Castilho, 1995).

As trocas de endereço residencial a partir das áreas ou zonas em que os


imóveis são menos valorizados para outras mais valorizadas (ou vice-versa)
podem ser tomadas, de acordo com Smolka (1992a), ceteris paribus, como
indicadores da mobilidade social ascendente ou descendente.

De acordo com Abramo (1988), “a dinâmica imobiliária, através do


deslocamento das atividades do setor, nos ajuda a compreender as mudanças na
estrutura intra-urbana”. Os capitais incorporadores, por meio de sua ação de
transformação do solo urbano e coordenadação demais etapas relacionadas à
realização do bem imobiliário39, possuem a capacidade de auferir lucro no próprio

39
O Capital Incorpora atua como um maestro da “orquestra” imobiliária pois é sob sua coordenação que
acontece a aquisição do terreno, a aprovação do projeto, a operação de empréstimo, o agenciamento
imobiliário para permitir as vendas antecipadas do bem imobiliário, a contratação da firma construtora e a
finalização do empreendimento quando da entrega de todas unidades imobiliárias.
87

processo de transformação do espaço urbano, seja por meio da inserção de novas


glebas ao tecido urbano existente ou pela mudança nos atributos espaciais da
mancha urbana consolidada.

Por meio deste entendimento, o movimento do capital imobiliário é


restringido pelos estoques imobiliários existentes, no dizer de Milton Santos
(1978), pelas rugosidades espaciais40, assim como pelas projeções acerca da
configuração, funcionamento e “status” daquela localidade receptora do
empreendimento no futuro.

Sendo assim, para Abramo e Faria (2000: 3) “o capital imobiliário utiliza


estratégias de ação, tais como atuação de forma concentrada, delimitando áreas
de valorização, e a inovação/diferenciação do produto-habitação. Essa inovação
não se refere apenas aos atributos do imóvel em si, como altera o padrão de
ocupação de toda uma área, valorizando-a em relação às outras áreas da cidade.”

Dois tipos de motivações básicas são considerados importantes por


Abramo (1988), via investimentos imobiliários, capazes de deslocar a demanda e
influenciá-la em suas decisões locacionais. A primeira relaciona-se ao acesso aos
serviços de habitação; a segunda, pelo fato da habitação representar, também,
um ativo41 que no futuro poderá se valorizar, viabilizando, assim a mudança da
família.

No âmbito das teorias mais diretamente relacionadas com a mobilidade


residencial a questão das motivações que levam as pessoas empreenderem
mudanças de residência na cidade tem um papel fundamental.

Levando em consideração à realidade sócio-


espacial americana, em um trabalho
considerado clássico, Simmons desenvolveu um
quadro de referência teórica para temática, a
partir da formulação de três questões básicas:

40
Milton Santos define as rugosidades como “o espaço construído, o tempo histórico que se
transformou em paisagem, incorporado ao espaço.” (1978: 138)
41
A habitação é, também, com todas as suas características físicas inerentes, um valor de uso na
sua condição primordial de abrigo do homem.
88

Quem muda?; Por Que mudam?; e Para onde


mudam? (Simmons: 1968).

Estas perguntas permitem relacionar três variáveis correspondentes, ou


seja, quem muda refere-se às características demográficas (idade, estado civil,
sexo) do migrante, expressas sinteticamente na noção de ciclo de vida. Por que
mudam, refere-se as características econômicas tais como nível de renda e de
educação, tipo de ocupação, entre outras. Por último, a terceira indagação, para
onde muda, relaciona-se ao lugar que será ocupado pelo migrante na estrutura
urbana, evidenciando muitas vezes fenômenos sociais, tais como integração ou
segregação; status social; discriminação racial, entre outros.

Com base na realidade americana, Simmons destaca que a faixa etária dos
25 aos 34 anos é a mais propensa a empreender mudanças na cidade
(op.cit.:625). Em pesquisa sobre a Mobilidade Residencial na Cidade do Rio de
Janeiro, Smolka (1994), utilizando informações oriundas das Guias de Imposto de
Transmissão Inter-Vivos (ITBI), identificou a faixa etária entre 35-44 anos como a
de maior número de adquirentes de imóveis (por correspondência, mais propensa
a mudar), portanto, em uma faixa superior à considerada por Simmons.

O ritmo de crescimento de determinada cidade associado ao seu tamanho


condiciona a dimensão dos deslocamentos intra-urbano, isto é, em cidades
grandes a complexidade de sua estrutura favorece o surgimento de oportunidades
e apelos para mudanças, observando-se índice maior de mobilidade intra-ubano
diretamente proporcional ao seu tamanho e ritmo de crescimento.

Para Wolpert (1965), no entendimento da mobilidade da população é


imprescindível compreender os aspectos comportamentais da decisão de mudar,
propondo o conceito de “place utility” (utilidade do lugar), ou seja, o grau de
satisfação ou insatisfação do indivíduo com relação a uma determinada localidade,
englobando as características físicas e imateriais do sítio e de seu entorno.
89

Este conceito vai direcionar o fluxo do migrante para uma determinada


localização no espaço interno da cidade, em um processo de ajustamento a uma
moradia e localidade que atendam aos anseios e necessidades que ensejaram os
deslocamentos. É óbvio que o fator mobilidade social expresso, principalmente, no
nível de renda do migrante é preponderante nas razões da mudança.

O “modelo de análise decisória”, proposto por Chapin (1977) e seus


colaboradores, caminha na mesma direção quando se refere à conduta humana e
sua dinâmica produzindo decisões de localização, no intuito de satisfazer as suas
aspirações sociais.

Em síntese, o esquema teórico proposto pelo referido autor confere aos


indivíduos e/ou agentes que operam no espaço urbano um ciclo de conduta que
percorre quatro fases:

1. Fase 1, experimentação das necessidades e desejos;

2. Fase 2, a definição dos objetivos e metas;

3. Fase 3, planejamento de diretrizes alternativas de ação; e,

4. Por último, a tomada de decisão e conseqüente atuação.

A expressão gráfica do “Modelo de Análise Decisória”, como mostra a

Figura nº 4, permite depreender o papel desempenhado pelo sistema de valores

ao impulsionar os indivíduos ou agentes a percorrerem as fase identificadas como

o ciclo de comportamento humano ao mesmo tempo que é influenciado pela

configuração urbana do lugar objeto da decisão locacional, denotando uma lógica

de fator condicionado/condicionante à dimensão espacial.


90

Figura nº4

Fonte:

O sistema de valores, acima referido, tem


conotações diferenciadas em relação às práticas
residenciais específicas de cada grupo social,
sendo importante, então, ressaltar a existência
de uma certa regularidade das decisões de
mudança dos diferentes segmentos do mercado
imobiliário de acordo com a renda ao qual o
grupo pertence.

Assim, para os grupos de alta renda, o principal fator que impulsiona a


mobilidade residencial intra-urbana é a busca de uma maior qualidade de vida em
áreas aprazíveis, muitas vezes distantes dos centros urbanos, menos densas,
91

detentoras de características físicas e sociais típicas de seu alto padrão de


consumo.

No outro extremo, a mobilidade residencial das classes de baixa renda


pode ser impulsionada por meio de duas estratégias:

A primeira, relacionada à ocupação dos núcleos centrais, onde, na maioria


das vezes, os imóveis residenciais encontram-se em franco estágio de
decadência, ensejando um processo de “encortiçamento” dessas residências.

A segunda por meio da ocupação periférica das franjas urbanas, muitas


vezes via o processo de autoconstrução em loteamentos irregulares ou
clandestinos.

A mobilidade residencial, como bem sintetizado por Faria(2000: 24) “varia


em função das classes sociais, de suas aspirações, de suas estratégias, e das
conotações residenciais embutidas nas procuras residenciais.”

Segundo o modelo de itinerário intra-urbano dos migrantes de baixa renda


proposto por Conway (1980), três prioridades básicas são consideradas pelo
migrante:

Primeira, a acessibilidade, significando valorizar a localização próxima ao


local de trabalho, reduzindo desta maneira os custos de transporte;

Segundo, a segurança da titulação, conferindo ao título de propriedade do


imóvel a garantia da estabilidade e consolidação de sua posição social no
ambiente urbano; e,

Terceiro, as amenidades sociais, relacionado à localizar-se próximo à


amigos e parentes, para a manutenção dos laços de solidariedade como
estratégia de reprodução familiar.

Nesta linha de raciocínio é importante ressaltar


os trabalhos de Turner (1968, 1978),
especificamente sua proposição de um modelo
92

explicativo para a localização residencial do


migrante de baixa renda em seu processo de
integração na cidade, identificando vários
estágios (econômico, social e espacial)
percorridos pelo migrante na cidade, conforme a
figura abaixo:

Figura n° 5 - Localização residencial do migrante de baixa renda em seu processo de


integração na cidade
93

Observa-se neste quadro que o autor atribui uma certa simetria entre os
grupos de renda média e muito baixa no que diz respeito às variáveis
acesso/localização e moderno padrão de amenidade. No primeiro grupo (renda
média) o autor atribui baixa prioridade à variável acesso/localização, enquanto
atribui prioridade muito alta à variável amenidade, sendo que no último grupo
(renda muito baixa), as prioridades atribuídas às mesmas variáveis são invertidas,
vis a vis.

Em Farret (1982), tem-se a transposição do


gráfico acima referido para um quadro sintético
do “Modelo de Integração Social do Migrante de
Turner”.
Quadro nº 01 - “MODELO DE TURNER”

NÍVEL DE POSIÇÃO NO PRIORIDADES LOCALIZAÇÃO TIPOLOGIA


ADAPTAÇÃO MERCADO DE RESIDENCIAIS
TRABALHO

MIGRANTE Informal Acesso/localiza “Centro” Cortiço/sub-


ção locação

± ADAPTADO Formal não Segurança/pro Loteamentos Auto-


especializado priedade periféricos construção/
irregulares/clan barracos
destinos

ADAPATADO Formal Qualidade Bairros Alvenaria


especializado ambiental/ consolidados
“Standards”

Fonte: Farret (1982)


94

Apesar do modelo de Turner possuir várias aproximações com os modelos


neoclássicos de decisão locacional, seu ponto de partida difere das vertentes
centradas na primazia das decisões individuais do consumidor, enfatizando o
papel de agente e instituições envolvidos no mercado de terra e de habitação,
objetivando detectar a natureza do conflito e a competição estabelecida entre
esses diferentes agentes.

Implícita nesse modelo, a idéia de ascensão social uma vez que o migrante
ocupa diferenciadas posições na cidade, correlacionando suas prioridades
residenciais ao status econômico alcançado, expresso na suas posições no
mercado de trabalho.

Assim, as decisões de deslocamento residencial no espaço interno da


cidade, são tomadas em resposta a determinadas condições individuais, tipo ciclo
de vida familiar e mobilidade social, associadas às condições estruturais tais como
relação renda/emprego e como bem acrescentado por Abramo e Faria (op.cit.:
431) e disponibilidade de crédito imobiliário, os quais por sua vez, determinam a
direção do fluxo, “que em última instância é determinado pelo grau de
satisfação/insatisfação com o lugar de origem, no que diz respeito às alterações
urbanas ligadas ao processo de valorização/desvalorização do estoque, que incide
também na estrutura social de vizinhança.

A decisão para onde mudar, a última questão destacada por Simmons


(op.cit.) relacionada com as motivações do migrante, vai estar influenciada, desta
maneira, pelas condições de oferta e demanda do mercado imobiliário em geral, e
especificamente, do mercado habitacional.

A este respeito, Abramo (1998) infere que o capital imobiliário para realizar
seus ganhos utiliza diferenciadas estratégias de ação que, por sua vez, se
traduzem em externalidades, que são incorporadas ao valor dos imóveis, definindo
assim, acesso diferenciado das famílias com diferentes rendimentos. Assim,
completa o autor, a estratégia de inovação para atrair demanda, se traduz na
oferta do bem habitação com todos os seus atributos intrínsecos (características
95

físicas), e extrínsecos (“acessibilidades que a localização da moradia permite


usufruir”).

Outro aspecto a ser considerado com respeito à destinação do migrante no


espaço intra-urbano se relaciona à tendência observada em muitos estudos de
que a maior parte dos movimentos se constituírem em fluxos de curta distância. A
tendência da escolha de destinos próximos tem duas explicações possíveis: uma
é a manutenção da familiaridade espacial, constituindo-se a mudança em uma
tentativa de ajustamento da habitação e sua localização. A outra é a manutenção
do acesso à cidade como um todo.

No entanto, quando o movimento é mais longo, de acordo com a hipótese


formulada por Abramo e Faria “pode se tratar de uma reacomodação do mercado,
melhor explicando, ricos/pobres saindo de áreas desvalorizadas/valorizadas, indo
para áreas compatíveis com seu status sócio-econômico. E neste aspecto,
contrariando os modelos de migração dos geógrafos comportamentalistas, que
reduzem as decisões de localização dos indivíduos/famílias à simples erros de
avaliação da vizinhança/área, afetando sua percepção quanto às características
sociais do ambiente, entra o importante papel da dinâmica imobiliária na
estruturação do espaço, via investimentos capazes de deslocar a demanda, e
influenciá-la em suas decisões.” (Abramo e Faria: (op.cit.: 433)
96

FATORES DE ATRAÇÃO E EXPULSÃO

Segundo Pickvance (1974), os fatores demográficos, socioeconômicos e


ambientais/culturais estão entre os principais determinantes da mobilidade intra-
urbana.

Os demográficos estão associados às mudanças de fases do ciclo de vida


das famílias e que poderiam ser estilizadas, de acordo com Smolka, “na
seqüência: independência (financeira ?) de filho(a) adulto(a) – constituição de
nova família/aluguel ou aquisição de nova moradia – filhos, e com eles a
necessidade de imóvel de maior tamanho ou local com melhor acesso à escola,
área de lazer, segurança, etc., e assim por diante.” (Smolka, 1992 – Revista
Brasileira de Estudos Populacionais, Campinas 9(2).)

Os socioeconômicos estão associados


essencialmente a mudanças de emprego que
afetam a conveniência dos deslocamentos
pendulares entre o local de residência e o de
trabalho. Melhorias salariais ou de posição na
hierarquia funcional também podem ensejar
reavaliações do endereço residencial.

Os fatores ambientais e culturais estão associados a eventual inadequação


da vizinhança, resultante, por exemplo, da degradação física do ambiente
imediato, de alterações urbanísticas, do aumento da violência, dos riscos
ecológicos, da poluição, entre outros.

Antes proceder a análise dos dados encontrados na aplicação da pesquisa


em uma amostra com os adquirentes de imóveis no Distrito Federal, é apresentar
algumas características da evolução do crescimento populacional, principais tipos
de ocupação, distribuição de renda e grau de instrução, fatores socioeconômicos
que provocam significativas alterações na estrutura familiar e no ciclo de vida dos
indivíduos e, por conseqüência, influenciam na decisão de mudar.
97

A premissa de que a população do Distrito Federal não poderia ultrapassar


a 500 mil habitantes no ano 2000, sob pena de comprometer a qualidade de vida
de seus moradores, há muito teve que ser abandonada, em face ao intenso
processo de urbanização que se instalou, conforme mapas a seguir.
98
99

Mapa 6 - Ocupação Territorial 1950 - 1960

Década de 50

Década de 60
100

Mapa 7 - Ocupação Territorial - Década de 1970

Década de 50 e 60
Década de 70
101

Mapa 8 - Ocupação Territorial - Década de 1980

Década de 50, 60, 70


Década de 80
102

Mapa 9 - Ocupação Territorial - Década de 1990

Década de 50, 60, 70 e 80


Década de 90
103

Mapa 10 - Variação da Ocupação Territorial Entre Décadas de 1960 e 1990

Década de 60

Década de 90
104

Em 1957, 15.404 pessoas moravam em Planaltina, Brazlândia e fazendas


próximas. Foram os primeiros habitantes do atual Distrito Federal. Com o início
das obras de construção de Brasília, deflagrou-se um processo migratório
caracterizado por contingentes populacionais que se diferenciaram quanto à
origem e à função desempenhada na nova cidade. O auge desse processo
verificou-se nas décadas de 1960 e 1970, mas ainda hoje permanece ativo, em
decorrência de um quadro de transferência das populações rurais e dos pequenos
centros urbanos para as grandes cidades, o que ocorre em todo o País.

Segundo a Companhia de Desenvolvimento do Planalto Central, no período


mais intenso da construção de Brasília, nas décadas de 1960/70 e 1970/80, as
correntes migratórias constituíam o principal fator formador da população do
Distrito Federal, com um número de 358.014 e 488.546 migrantes,
respectivamente.

Em 1960, ano de sua fundação, Brasília já contava com 150 mil habitantes,
entre funcionários públicos, instalados no Plano Piloto (parte central), e
candangos, assim denominados originalmente os operários migrantes que
trabalharam na construção da capital e moravam nas cidades-satélites que pouco
a pouco se foram formando em ao redor do Plano Piloto.

A população aumenta rapidamente à medida que a estrutura político-


burocrática se instala em Brasília. Por causa da necessidade estratégica da rápida
ocupação da região, a elite do serviço público vê-se atraída por salários superiores
aos da média brasileira. Ao mesmo tempo, dezenas de milhares de migrantes
passam a residir nas cidades-satélites. Em trinta anos, o Distrito Federal alcança
1,7 milhão de habitantes, apresentando uma das mais altas taxas de crescimento
demográfico do País. Em 1988, com a nova Constituição, ganha plena autonomia
e passa a eleger diretamente seu governador e deputados.

Segundo o IBGE, “a População Economicamente Ativa (PEA) corresponde


ao conjunto das pessoas com idade igual ou superior a 10 anos, ocupadas e
desocupadas no período de referência de sete dias” anterior à pesquisa realizada.
105

A população ocupada (PO), “compreende as pessoas que tinham trabalho na


semana anterior à da entrevista, ou seja, os indivíduos que tinham um patrão,
exploravam seu próprio negócio ou trabalhavam sem remuneração com membros
da família”.

A Tabela 5 apresenta esses dois indicadores. Em 1996, a relação


PEA/População Total foi menor nas RAs mais pobres, a exemplo de Brazlândia,
Paranoá e Planaltina. Em 2000, essas três RAs melhoraram de posicionamento,
enquanto que, em todas as demais, ocorreu redução, a mais expressiva delas na
RA do Guará. Em termos médios, houve diminuição nesse indicador entre 1996 e
2000.

Na relação PO/PEA, constata-se que Paranoá e Planaltina continuam no


grupo com menor índice, juntamente com Santa Maria, São Sebastião e
Candangolândia. Entretanto, em todo do DF esse indicador mostrou crescimento
entre 1996 e 2000, destacando-se, nesse particular, exatamente as RAs que, em
1996, ocupavam as piores posições.
106

Tabela nº 5 - População Economicamente Ativa (PEA) e População Ocupada (PO) - 1996 e 2000
PEA/População Pessoas
PO/PEA - Em %
Regiões Total - Em % Ocupadas ∆% Anual
(1996/2000)
Administrativas 1996 2000 1996 2000 1996 2000

Brasília 0,72 0,54 0,67 0,90 98.499 96.561 -0,5%


Brazlândia 0,43 0,55 0,68 0,79 13.893 23.094 13,5%
Candangolândia 0,82 0,58 0,53 0,82 6.032 7.413 5,3%
Ceilândia 0,66 0,50 0,58 0,81 129.777 138.769 1,7%
Cruzeiro 0,93 0,48 0,67 0,91 35.031 27.675 -5,7%
Gama 0,65 0,51 0,62 0,82 49.386 54.267 2,4%
Guará 0,81 0,47 0,66 0,86 54.826 47.015 -3,8%
Lago Norte 0,77 0,61 0,79 0,89 15.874 15.846 0,0%
Lago Sul 0,69 0,52 0,71 0,92 14.171 13.594 -1,0%
Núcleo Bandeirante 0,67 0,63 0,69 0,90 14.521 20.688 9,3%
Paranoá 0,54 0,64 0,50 0,76 12.752 26.847 20,5%
Planaltina 0,57 0,61 0,53 0,77 35.632 69.728 18,3%
Recanto das Emas 0,79 0,59 0,56 0,76 23.034 41.836 16,1%
Riacho Fundo 0,75 0,54 0,70 0,82 11.088 18.516 13,7%
Samambaia 0,60 0,51 0,57 0,79 53.531 65.814 5,3%
Santa Maria 0,66 0,48 0,52 0,77 30.330 36.361 4,6%
São Sebastião 0,93 0,69 0,54 0,83 22.285 37.241 13,7%
Sobradinho 0,74 0,54 0,62 0,83 46.640 57.676 5,5%
Taguatinga 0,70 0,55 0,62 0,86 97.101 115.300 4,4%
Média do DF 0,68 0,53 0,61 0,83 764.404 914.239 4,6%
Fonte dos dados primários: Anuário Estatístico do DF - 2000

Combinando-se esses indicadores com a população total, é possível


chegar-se à população ocupada, de 914.239 pessoas em 2000, representando
crescimento anual de 4,6% entre 1996 e 2000.

A Tabela 6 apresenta as atividades profissionais desempenhadas pela


população do Distrito Federal, em 1997, por Regiões Administrativas. Foram
computadas aquelas que, somadas, atingem percentuais próximos a 90%. A
ocupação principal está assinalada em verde; a segunda em amarelo e a terceira
em azul.

Fazendo-se, inicialmente, uma análise por Região Administrativa, constata-


se que a administração federal, administração no Governo do Distrito Federal, o
comércio e outros serviços figuram como as três primeiras atividades profissionais
107

na maioria dos casos. Excetuam-se dessa situação predominante Sobradinho,


Paranoá e São Sebastião, nas quais os serviços domésticos constituem
importantes atividades; Riacho Fundo e Candangolândia, em que o mesmo ocorre
com os serviços autônomos. O Lago Sul é a única Região Administrativa em que
as profissões liberais comparecem entre as três atividades mais importantes.

Sob o ponto de vista das profissões, verifica-se que a construção civil se


apresenta como fonte importante de ocupação no Paranoá e em São Sebastião,
enquanto que a indústria de transformação e os transportes apenas mostram certa
expressão em Brazlândia, o mesmo ocorrendo com os serviços em
estabelecimentos bancários (Brasília) e em estabelecimentos de ensino particular
(Lago Sul).

A prestação de serviços autônomos é atividade importante em Planaltina,


Ceilândia, Samambaia, Recanto das Emas, Riacho Fundo e Candangolândia,
embora apenas nestas duas últimas figure entre as três primeiras em ordem de
importância. De modo geral, os dados revelam a vocação do Distrito Federal como
complexo urbano em que o nível de emprego associa-se de forma indiscutível ao
setor público (governos Federal e Distrital), comércio e serviços. O mapa n° 11 a
seguir, ilustra o papel da RA 1, Brasília, como concentradora das oportunidades
de emprego.
108

Mapa 11 - Postos de Trabalho

IEL
OIAIS
G ABR
205
205

DE G
SAO
URU
201

334

AC
U
205

205
205
251 345

505
110

010 405
103
131

170 107
113
080 130 111

205

020

180

511
330
17 405

100

105
110

220 121

27 030
130

PLANALTINA 405

001 230
127
445 020
150 215

001
420 SOBRADINHO 010
345

415 230 230


130 133

230

527 330

8
137

425 VALE DO
129
AMANHECER 105
141
430
133
440
BRA ZLA NDIA PEDRA
FU ND AMEN TA L
249 145
250
143
105

003
257

6
541

440
435 V ARJ AO 479
130
330

151
4 35

005
44 5 007
547
263

MA NS OES 159
DO L AGO
240 080
LAGO NORTE
19

EIX O
561 001 355

009 479

RO
4 50

52 66 4

DO
AGUAS LINDAS ASA N O RTE

80

VIA
SAA 015 250

RIO
561

NO RTE
180
097 RCG PARANOA
ES TA CAO MA NSOES
RO DO FERRO VIA RIA DO L AGO
BRASILIA 173
EI XO
MO NU
CRUZEIRO MENT
AL VIL A
095
STRC PLAN ALTO
070
087
TAGUATINGA SIA SETO R
SUDO ES TE
GUA RA I AS ASUL LAGO SUL 310

180
L
SU
CEILANDIA RIO
V IÁ
085 MA NSOES DO
PARK WA Y RO
O
EI X
GUA RA II 025
255

457

AGUAS CLARAS
079
051

LA G
O SU
L
URB ANA S
MA NSOES
DOMBO SCO
27 120

CIDAD E ECLÉTICA 3 035

7
190
460
047
AERO PORTO
321

SAMAMBAIA 120

20
180 075
401

RIACHO FUNDO
MA NS OES
PARK WA Y 9 Manso es
Park Way
045
135

5
060

8
465

135
SAO SEBASTIAO
RECANTO
003

DAS EMAS
331

280

337

001
251
180 SMPW
251
341

Sto . AN TON IO 065


DO D ESC OB ERTO 055
140
135

190
040

480 251
475
001

060

25 361

7
467

290
483 050

GAMA
371
379
180

NIA
ZIA
383

LU
STA. MARIA 135
B.H./S.P.

290 495

295

DV O
PARQUE S.
CIDAD E
NO VO B ERN ARDO
CÉU AZU L JA RDIM
GAM A

PEDREGAL VALPARA ÍZO

PARQUE
ES TREL A D'ALVA

LA GO A ZUL CIDAD E
O CIDENTAL

PARQUE M ARAJÓ

LU ZIÂNIA

Postos de Trabalho ( mil )


109

Tabela n º 6 - Ocupações Principais em 1997 (Em %)


Estabele-
Ind. de Adminis- Admis- Estabele- Serviço Serviço Outros
Regiões Constru- Comér- Trans- Profissão cimento
Transfor- tração tração cimento Autôno- Domé- Servi- SOMA
Administrativas ção Civil cio porte Liberal Ensino
mação Federal GDF Bancário mo stico ços
Particular

Brasília 41,27 13,85 8,01 6,18 4,12 5,50 11,19 90,1


Gama 2,98 5,28 5,62 29,49 20,93 3,46 6,45 3,95 15,91 94,1
Taguatinga 3,32 11,56 21,78 23,51 2,77 3,00 9,84 3,11 11,75 90,6
Brazlândia 4,65 8,39 4,86 24,72 14,88 6,79 6,14 5,89 17,84 94,2
Sobradinho 5,56 4,69 10,86 24,36 21,98 8,57 11,10 6,79 93,9
Planaltina 16,85 25,78 12,39 12,42 3,98 14,64 86,1
Paranoá 16,42 4,30 3,67 26,49 19,96 19,76 90,6
Núcleo
Bandeirante 2,21 3,32 14,06 14,77 25,27 4,10 4,33 2,87 5,47 4,09 15,22 95,7
Ceilândia 5,26 3,73 7,90 16,39 20,25 5,27 14,43 6,06 15,65 94,9
Guará 3,64 25,81 20,50 14,26 4,40 8,83 12,85 90,3
Cruzeiro 34,18 19,27 11,26 5,21 3,87 2,90 3,72 10,44 90,9
Samambaia 6,65 2,91 4,82 19,18 15,41 5,49 12,16 9,56 20,76 96,9
Santa Maria 8,24 5,22 12,99 18,52 4,94 9,38 9,24 29,08 97,6
São Sebastião 11,01 5,49 6,28 28,07 4,06 8,81 12,94 16,39 93,1
Recanto das Emas 6,63 2,36 5,09 19,36 22,30 5,89 13,47 7,85 14,87 97,8
Lago Sul 8,32 2,54 25,52 8,69 13,63 3,78 13,48 5,06 7,74 88,8
Riacho Fundo 2,08 5,66 23,41 27,97 4,49 12,67 3,15 12,52 92,0
Lago Norte 46,12 7,17 10,60 5,21 5,73 5,54 10,28 90,7
Candangolândia 3,63 14,58 21,29 18,23 2,27 3,24 18,93 2,49 11,39 96,1
Fonte dos dados primários: Anuário Estatístico do DF - 2000
Legenda das Cores
Verde: Ocupação Principal
Amarelo: Segunda Ocupação
Azul: Terceira Ocupação

O parâmetro tradicional para se avaliar o desenvolvimento educacional é a


taxa de analfabetismo. Entretanto, para se dispor de uma visão mais apropriada
desse aspecto no DF, construiu-se um indicador que resulta da divisão do número
médio real de anos de estudo em relação ao ideal. A média ideal foi calculada
tomando-se a população total das RAs por faixa etária e multiplicando-se o
número de habitantes pelo número de anos de estudo adequado às diferentes
faixas de idade, ou seja, 1 ano (pessoas de 0 a 4 anos), 4 anos (5 a 9); 9 (10 a
14); 14 (15 a 19); 16 (20 a 24) e 17 anos para pessoas com idade superior a 24
anos.

A média relativa ao número real de anos de estudo foi obtida multiplicando-


se a população, por faixa etária, pelo número efetivo de anos de estudo constante
110

do Guia de Informações Sócio-econômicas, Turísticas e Culturais do Distrito


Federal – 1999 e da Pesquisa Domiciliar-Transporte – 2000, ambos da
CODEPLAN. Dividindo-se a média real (ou efetiva) pela média ideal, chega-se ao
indicador relativo ao grau de educação dos habitantes das 19 Regiões
Administrativas do DF.

Esse indicador, apresentado na Tabela 7, mostra que o nível educacional


médio do Distrito Federal cresceu 5,2% de 1996 a 2000, cabendo destacar os
bons resultados alcançados nas Regiões Administrativas de Candangolândia,
Gama, Núcleo Bandeirante, Riacho Fundo e São Sebastião, com crescimento
variando entre 10 e 26%. As reduções mais expressivas ocorreram em Planaltina,
Recanto das Emas, Lago Norte e Paranoá.
111

Tabela nº 7 - Indicador de Educação - 1996 e 2000


Média de Anos de Média de Anos de
REAL/IDEAL
Estudo IDEAL Estudo REAL ∆%
Regiões 1996/2000
1996 2000 1996 2000 1996 2000
Administrativas
Brasília 13,0 14,6 9,9 11,3 0,76 0,77 1,6%
Brazlândia 13,7 12,7 6,0 5,8 0,44 0,45 4,5%
Candangolândia 12,5 13,6 6,7 8,2 0,54 0,60 12,6%
Ceilândia 12,7 13,3 5,7 6,4 0,45 0,48 6,9%
Cruzeiro 10,1 14,1 7,0 10,6 0,69 0,75 8,4%
Gama 13,6 13,4 5,8 7,2 0,42 0,53 25,9%
Guará 10,9 13,9 7,3 9,1 0,67 0,66 -1,4%
Lago Norte 13,1 14,8 10,7 11,4 0,82 0,77 -6,2%
Lago Sul 13,9 15,3 11,3 12,8 0,81 0,84 3,1%
Núcleo Bandeirante 13,2 13,8 7,5 9,2 0,57 0,67 16,9%
Paranoá 13,7 12,6 5,8 5,2 0,43 0,41 -2,7%
Planaltina 13,2 12,7 6,0 5,3 0,45 0,42 -8,5%
Recanto das Emas 8,5 12,1 4,0 5,4 0,48 0,45 -5,6%
Riacho Fundo 7,0 12,7 3,4 6,7 0,48 0,53 10,4%
Samambaia 12,0 12,6 5,2 5,7 0,43 0,45 4,8%
Santa Maria 10,8 12,5 4,9 5,7 0,46 0,45 -0,7%
São Sebastião 10,3 12,3 3,9 5,7 0,38 0,46 21,3%
Sobradinho 10,9 13,3 6,1 7,3 0,56 0,55 -1,1%
Taguatinga 12,6 13,8 7,3 8,4 0,58 0,61 5,2%
Média do DF 12,1 13,4 6,5 7,6 0,54 0,57 5,2%
Fonte dos dados primários: CODEPLAN: Guia de Informações Sócio-econômicas, Turísticas e Culturais do
Distrito Federal - 1999 e Pesquisa Domiciliar - Transporte - 2000.

Também na localização de estabelecimentos de ensino, a RA I, Brasília,


destaca-se, conforme o mapa nº 12 o demonstra, a seguir:
112

Mapa 12 - Matrículas Escolares ( mil )

DE GO RIEL
IA IS
GAB
205
205

SAO
URU
201

161

A CU
205

205
205
251 345

505
110

010 405
103
131

32
170 107
113
080 130 111

205

020

180

511
330

32 405

110
105
100

220 121

030
130

PLANALTINA 405

001 230
127
445 020
150 215

001
420 SOBRADINHO 010 345

415 230 230


133
130
230

13
527 330
137

VALE DO
102
425

129
AMANHECER 105
141
430
133
440
BRA ZLA NDIA PEDRA
FUND AMEN TA L
249 145

107
250
143
105

003
257
541

440
435 VARJ AO

2
479
130
330

151
4 35

005
44 5
007
547
263
MA NSOES 159
DO LAG O
240 080
LAGO NORTE
13

EIXO
561 001 355

14 009 479

RO
DO
4 50
AGUAS LINDAS ASA N ORTE

VIA
250
SAA 015

RIO
561

NO RTE
180
097 RCG PARANOA
ESTA CAO MA NSOES
RO DO FERRO VIA RIA

30
DO L AG O

EIXO
BRASILIA 173

MO NU
CRUZEIRO MENTA
L VIL A

070

TAGUATINGA
095

087
STRC

SIA SETO R
SUDO ESTE
PLAN ALTO

8
GUA RA I ASASUL LAGO SUL 310

180
L
SU
CEILANDIA RIO
V IÁ
085 MA NSOES
PARK WA Y DO
RO
O

45 255

457 079
G UA RA II
EIX
025

SU L
051

LA GO
AGUAS CLARAS MA NSOES
URBANA S
120
DO MBO SCO

CIDAD E ECLÉTICA 3 035

321
190
460

8 047 AERO PORTO

180 SAMAMBAIA 075

12 401
120

23 RIACHO FUNDO 135

060
MA NSOES
PARK WA Y 9 Ma nso es
Park Wa y
045

465

135
SAO SEBASTIAO
RECANTO
003

DAS EMAS 331

280

337

001
251
180 SMPW
251
341

Sto . AN TON IO
DO D ESC OBERTO 45 065
055
140
135

190
040

475
480

29 001
251

060
467

361

290
483 050

GAMA
371
379
180

NIA
ZIA
383

LU
STA. MARIA 135
B.H./S.P.

290 495

295

DVO
P ARQUE S.
CIDAD E
NOVO BERN ARDO
CÉU AZU L JA RDIM
G AM A

PEDREG AL VALPARA ÍZ O

PARQUE
ESTREL A D' ALVA

LA GO A ZUL CIDAD E
O CIDENTAL

PARQ UE M ARAJ Ó

LUZIÂNIA
113

Neste item são analisados os principais aspectos relacionados à renda e


sua distribuição no DF, bem como sua posição relativa no contexto nacional.

A tabela 8 apresenta a renda domiciliar média em 1996 e 2000, em valores


correntes e preços reais de 2000, considerando-se que, segundo o Índice Geral de
Preços-Disponibilidade Interna (IGP-DI), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a
taxa inflacionária no período considerado foi de 57,47%.

Verifica-se que as RAs dos Lagos Sul e Norte e Brasília – esta seguida de
perto pelo Cruzeiro – encabeçam a lista das áreas de maior renda mensal
domiciliar média. No ano 2000, as últimas posições foram ocupadas pelo Recanto
das Emas, Paranoá, Santa Maria, Samambaia, Brazlândia, Planaltina e Ceilândia.

Tabela nº 8 - Renda Domiciliar Mensal Per Capita - 1996 e 2000


Em R$ Correntes Em R$ de 2000
Regiões Administrativas ∆% 1996/2000
1996 2000 1996 2000
Brasília 968,89 1.140,09 1.525,71 1.140,09 -25,3%
Brazlândia 169,40 182,27 266,75 182,27 -31,7%
Candangolândia 301,31 371,54 474,47 371,54 -21,7%
Ceilândia 197,21 216,18 310,55 216,18 -30,4%
Cruzeiro 669,87 1.053,74 1.054,84 1.053,74 -0,1%
Gama 245,20 292,29 386,12 292,29 -24,3%
Guará 569,76 567,83 897,20 567,83 -36,7%
Lago Norte 1.415,54 1.370,60 2.229,05 1.370,60 -38,5%
Lago Sul 1.903,07 2.007,04 2.996,76 2.007,04 -33,0%
Núcleo Bandeirante 520,68 834,97 819,91 834,97 1,8%
Paranoá 119,48 152,47 188,15 152,47 -19,0%
Planaltina 163,02 194,03 256,71 194,03 -24,4%
Recanto das Emas 123,83 140,31 195,00 140,31 -28,0%
Riacho Fundo 249,80 268,37 393,36 268,37 -31,8%
Samambaia 200,30 169,41 315,41 169,41 -46,3%
Santa Maria 122,20 167,03 192,43 167,03 -13,2%
São Sebastião 143,27 281,00 225,61 281,00 24,6%
Sobradinho 302,03 376,92 475,61 376,92 -20,7%
Taguatinga 428,68 489,36 675,04 489,36 -27,5%
Média do DF 463,87 540,81 730,46 540,81 -26,0%
Fontes dos dados primários: CODEPLAN: Pesquisa Domiciliar - Transporte -
2000 e Anuário Estatístico do DF - 2000
114

De outra parte, os dados mostram que, na média real, ocorreu queda de


26% no citado indicador, entre 1996 e 2000. As maiores reduções atingiram as
RAs de Samambaia, Lago Norte, Guará e Lago Sul, envolvendo, portanto, áreas
de faixas variadas de renda, o que não permite identificar padrão de
comportamento definido, nesse particular, em Regiões Administrativas ricas e
pobres.

No mapa n° 13 a seguir, confirma-se a concentração espacial da renda


domiciliar no DF.
115

Mapa 13 - Renda Domiciliar

1370 2007 376

IEL
194

OIAIS
G ABR
205
205

DE G
SAO
URU
201

AC U
205

205
205
251 345

505
110

405

1140
010 103
131

170 107
113
080 130 111

205

020

1053
180

405

182
511
330
100

105
110

220 121

030
130

PLANALTINA 405

001 230
127
445 020

567
150 215

001
420 SOBRADINHO 010
345

415 230 230


130 133

230

527 330
137

425 VALE DO
129
AMANHECER 105
141
430

489
133
440
BRA ZLA NDIA PEDRA
FU NDAMEN TA L
249 145
250
143
105

003
257
541

216
435 V ARJAO
440

152 330
130
479

835
151
43 5

005
445 007
547
263

MA NSOES 159
DO LAGO

268
240 080
LAGO NORTE

EIX O
561 001 355

009 479

R OD
450

AGUAS LINDAS ASA N ORTE

OV
SAA

281
015 250

IA RIO
561

NO RTE
180
097 RCG PARANOA
ESTA CAO MA NSOES
RODOFERROVIA RIA DO LAGO

EIX O
BRASILIA 173

MONU
CRUZEIRO ME NT
AL VILA
095
S TRC PLAN ALTO
070

169 TAGUATINGA
087

GUA RA I
S IA S ETOR
S UDOESTE
ASASUL LAGO SUL 310

180

L
SU
CEILANDIA RIO
V IÁ
085 MA NS OES DO
PARK WA Y RO
EI XO
GUA RA II 025
255

457 079

371 L
051

O SU
LA G

140 AGUAS CLARAS URB ANA S


MA NS OES
DOMBOSCO
035
120

CIDAD E ECLÉTICA
AEROPO RTO
190
460
321 047

180 SAMAMBAIA 075


120
4 01

RIACHO FUNDO 135

MA NS OES Ma nso es 045


PARK WA Y Park Way
060

465

135
SAO SEBASTIAO
RECANTO
003

DAS EMAS 331

292
280

337

001
251
180 S MPW
251
341

Sto . AN TON IO 065


DO DESC OB ERTO 055
140
135

190
040

480 251

167
475
001

060
467

361

290
483 050

GAMA
371
379
180

NIA
LUZIA
383

STA. MARIA 135


B.H./S.P.

290 495

295

DVO
PARQUE S.
CIDAD E
NOVO B ERN ARDO
CÉU AZU L JA RDIM
GAM A

PEDREGAL VALPARA ÍZO

PARQUE
ESTRELA D'ALV A

LA GO A ZUL CIDADE
OCIDENTAL

PARQUE M ARAJÓ

Renda domiciliar mensal per capita - 2000


LU ZIÂNIA
116

Pelos dados das Contas Regionais do IBGE, relativos ao ano 2000,


constata-se que o DF detém a maior renda per capita do País, com R$ 14.405,00,
mais que o dobro da média nacional (R$ 6.473,00). O Produto Interno Bruto (PIB)
do Distrito Federal (R$ 29.587 milhões) supera o de todos os Estados das regiões
Norte, Centro-Oeste e Nordeste, excetuando-se o Estado da Bahia (R$ 48.197
milhões), não obstante ser muito próximo ao de Pernambuco (R$ 29.127 milhões).

Fazendo-se uma análise por Região Administrativa, pode-se chegar a


algumas conclusões que atestam a importância e o potencial econômico de
algumas delas, mesmo consideradas isoladamente. De fato, multiplicando-se a
renda familiar média mensal pela população e considerando-se o período de 12
meses, chega-se a um valor de R$ 10.867 milhões, o que representa 36,73% do
verdadeiro PIB.

Isso significa que, para se chegar ao PIB é preciso multiplicar o resultado


encontrado pelo coeficiente de 2,72 (=1÷0,3673). Aplicando-se esse coeficiente
sobre a renda familiar média anual por RA, conclui-se que o PIB estimado para as
RAs de Ceilândia (R$ 2.430 milhões), Cruzeiro (R$ 2.199 milhões), Guará (R$
2.141 milhões), Lago Sul (R$ 1.845 milhões) e Sobradinho (R$ 1.586 milhões)
supera ou se aproxima do PIB dos Estados do Acre (R$ 1.703 milhões), Roraima
(R$ 1.117 milhões), Amapá (R$ 1.968 milhões) e Tocantins (R$ 2.450 milhões).

Seguindo-se nessa análise, constata-se que o PIB da Região Administrativa


de Brasília (R$ 7.391 milhões), em 2000, suplanta o de todos os Estados da
Região Norte, exceto Amazonas e Pará, assim como dos Estados do Piauí (R$
5.330 milhões), Alagoas (R$ 7.023 milhões) e Sergipe (5.921 milhões). O PIB
estimado para Taguatinga, de R$ 3.894 milhões no mesmo ano, também supera o
dos Estados da Região Norte, exceto Amazonas, Pará e Rondônia.

A distribuição de renda é usualmente medida pelo Índice de Gini (ou


coeficiente de Gini), que varia entre zero e a unidade. O valor zero representa
igualdade perfeita na distribuição de renda (todos os indivíduos ou grupos
117

possuem a mesma renda), enquanto a unidade indica desigualdade perfeita (toda


a renda concentra-se em apenas um indivíduo ou grupo).

No Anuário Estatístico do Distrito Federal – 2000, há dados referentes ao


Índice de Gini para o ano de 1997. Com base em dados publicados pela
Companhia do Desenvolvimento do Planalto Central (CODEPLAN), foram feitas
estimativas desse Índice para 2000, de modo a se poder analisar a evolução da
distribuição de renda entre 1997 e 2000, nas 19 RAs do Distrito Federal.

Esses dados constam da Tabela 9 e são representados no Gráfico nº 1,


podendo-se verificar que, no período considerado, ocorreu melhoria no grau de
distribuição de renda em algumas RAs do DF (Candangolândia, Ceilândia,
Cruzeiro, Lago Sul, Recanto das Emas) e aumento da concentração nas demais,
especialmente em São Sebastião, onde ocorreu crescimento de 52,19%.

Na média, houve aumento de 5,21% no grau de concentração da renda no


DF, mas não se constata padrão homogêneo no comportamento da distribuição de
renda, nos anos considerados, entre regiões com diferentes níveis de renda
familiar per capita, tendo em vista que ocorreram variações em sentido contrário
nos Lagos Sul e Norte (RAs mais ricas) e no Recanto das Emas e Paranoá, as
mais pobres.

Aspecto importante a ser sublinhado é a relação inversa entre grau de


concentração de renda e renda per capita. Calculando-se o coeficiente de
correlação (que varia de – 1 a + 1) entre o Índice de Gini e a renda média
domiciliar por habitante (1996 a 2000), chega-se ao valor de – 0,54. Isso indica
que, quanto mais rica a RA, menor o Índice de Gini, ou seja, mais bem distribuída
é a renda. Ao contrário, quanto mais pobre a RA, mais concentrada é sua
distribuição de renda.
118

Tabela nº 9 - Grau de Concentração de Renda no Distrito Federal - 1997 e 2000


Índice de Gini
∆% 1997/2000
Regiões Administrativas 1997 2000
Brasília 0,3996 0,3943 -1,32%
Brazlândia 0,5024 0,5253 4,55%
Candangolândia 0,4708 0,4404 -6,45%
Ceilândia 0,4525 0,4143 -8,45%
Cruzeiro 0,4450 0,4078 -8,36%
Gama 0,4761 0,4708 -1,11%
Guará 0,4470 0,5062 13,25%
Lago Norte 0,3935 0,4571 16,17%
Lago Sul 0,3907 0,3541 -9,37%
Núcleo Bandeirante 0,5121 0,5314 3,77%
Paranoá 0,5360 0,5924 10,52%
Planaltina 0,5097 0,5167 1,36%
Recanto das Emas 0,4333 0,4015 -7,35%
Riacho Fundo 0,4659 0,5209 11,81%
Samambaia 0,4966 0,4937 -0,59%
Santa Maria 0,4326 0,4868 12,53%
São Sebastião 0,4316 0,6569 52,19%
Sobradinho 0,5127 0,5426 5,83%
Taguatinga 0,4919 0,5454 10,87%
Médias 0,4632 0,4873 5,21%
Fontes: Anuário Estatístico do Distrito Federal - 2000 e Codeplan (2000)

Gráfico nº 1– Índice de Gini – RA’s do DF – 1997 e 2000

1997
B r a s ília
M é d ia s 0 ,8 B r a z lâ n d ia 2000
0 ,7
T a g u a t in g a C a n d a n g o lâ n d ia
0 ,6

S o b r a d in h o 0 ,5 C e ilâ n d ia
0 ,4
0 ,3
S ã o S e b a s t iã o C r u z e ir o
0 ,2
0 ,1
S a n t a M a r ia 0 ,0 G am a

S a m a m b a ia G u ará

R ia c h o F u n d o L ag o N orte

R ec an to d as E m as L ag o S u l

N ú c le o B a n d e ir a n t e
P la n a lt in a
P ar an o á
119

Para se dispor de uma visão mais geral sobre as características


socioeconômicas das RAs do DF, a Tabela 10 apresenta um indicador que se
poderia chamar de índice médio de desenvolvimento, construído a partir dos
índices de educação, renda per capita e grau de concentração da renda (Gini).
Esse indicador visa suprir a falta do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH),
que não se encontra disponível para as RAs de forma individualizada.

O índice de educação foi obtido da Tabela 7. Quanto maior esse indicador,


melhor o nível educacional da RA e vice-versa. O índice de renda per capita foi
construído tomando-se por base a maior renda domiciliar média, de R$ 2.996,76
(Tabela 8), verificada em 1996 no Lago Sul, à qual foi atribuído o índice unitário.
Os demais foram calculados de forma proporcional. A renda per capita do Gama,
em 2000, por exemplo, representava apenas 10% da renda média dos habitantes
do Lago Sul em 1996, calculada a preços de 2000.

Como o índice de Gini (G) mede o grau de concentração da renda, o valor


(1 – G) representa o grau de igualdade em sua distribuição. Assim, enquanto G
indica o lado negativo da distribuição de renda, (1 – G), ao reverso, mostra a
“virtude” do processo distributivo, podendo, portanto, ser combinado diretamente
com os demais indicadores, pois todos expressam condições socioeconômicas
desejáveis.

A média aritmética dos três indicadores fornece uma visão geral do grau
relativo de desenvolvimento das RAs do Distrito Federal, conforme consta na
Tabela 9. Está implícita, nesse cálculo, a atribuição do mesmo peso relativo às
três dimensões que integram o índice médio, ou seja, à renda per capita, à
educação e à distribuição de renda, procedimento semelhante ao empregado no
cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) – assunto
desenvolvido mais adiante.

Constata-se que o índice de desenvolvimento médio sofreu ligeiro declínio,


em 2000, relativamente a 1996, da ordem de 4,5%. As quedas mais acentuadas
ocorreram nas Regiões Administrativas do Guará, Lagos Norte e Sul, são
120

Sebastião e Paranoá. Nos três primeiros casos, o fator preponderante responsável


pela redução, foi a renda per capita, enquanto que o aumento no grau de
concentração da renda foi o principal fator explicativo no caso de São Sebastião.

A mesma Tabela 10 também mostra a redução do índice médio de


desenvolvimento em outras RAs. Em apenas cinco delas houve crescimento
desse indicador: Candangolândia, Ceilândia, Cruzeiro, Gama e Núcleo
Bandeirante. Em todos esses casos, especialmente nos dois últimos, a melhoria
dos níveis educacionais foi o principal fator explicativo do aumento verificado.

O Gráfico 2, mostrado na pág. 133 proporciona visão geral do índice de


desenvolvimento médio das 19 RAs do DF, mostrando que, exceto nos casos
antes ressaltados, de redução ou crescimento desse indicador, não ocorreram, no
conjunto, alterações significativas no período analisado.
121

Tabela nº 10 - Índice Médio de Desenvolvimento do Distrito Federal - 1996 e 2000


Regiões Índice de Gini (G) (1 - G) Índice de Educação Índice de Renda Médias ∆%
Administrativas 1996/2000
1996 2000 1996 2000 1996 2000 1996 2000 1996 2000
Brasília 0,3996 0,3943 0,60 0,61 0,76 0,77 0,51 0,38 0,62 0,59 -5,9%
Brazlândia 0,5024 0,5253 0,50 0,47 0,44 0,45 0,09 0,06 0,34 0,33 -3,1%
Candangolândia 0,4708 0,4404 0,53 0,56 0,54 0,60 0,16 0,12 0,41 0,43 5,2%
Ceilândia 0,4525 0,4143 0,55 0,59 0,45 0,48 0,10 0,07 0,37 0,38 3,4%
Cruzeiro 0,4450 0,4078 0,56 0,59 0,69 0,75 0,35 0,35 0,53 0,57 5,9%
Gama 0,4761 0,4708 0,52 0,53 0,42 0,53 0,13 0,10 0,36 0,39 7,8%
Guará 0,4470 0,5062 0,55 0,49 0,67 0,66 0,30 0,19 0,51 0,45 -11,7%
Lago Norte 0,3935 0,4571 0,61 0,54 0,82 0,77 0,74 0,46 0,72 0,59 -18,5%
Lago Sul 0,3907 0,3541 0,61 0,65 0,81 0,84 1,00 0,67 0,81 0,72 -11,1%
N. Bandeirante 0,5121 0,5314 0,49 0,47 0,57 0,67 0,27 0,28 0,44 0,47 6,2%
Paranoá 0,5360 0,5924 0,46 0,41 0,43 0,41 0,06 0,05 0,32 0,29 -8,4%
Planaltina 0,5097 0,5167 0,49 0,48 0,45 0,42 0,09 0,06 0,34 0,32 -6,4%
Rec. das Emas 0,4333 0,4015 0,57 0,60 0,48 0,45 0,07 0,05 0,37 0,36 -1,2%
Riacho Fundo 0,4659 0,5209 0,53 0,48 0,48 0,53 0,13 0,09 0,38 0,37 -4,1%
Samambaia 0,4966 0,4937 0,50 0,51 0,43 0,45 0,11 0,06 0,35 0,34 -2,4%
Santa Maria 0,4326 0,4868 0,57 0,51 0,46 0,45 0,06 0,06 0,36 0,34 -6,1%
São Sebastião 0,4316 0,6569 0,57 0,34 0,38 0,46 0,08 0,09 0,34 0,30 -12,2%
Sobradinho 0,5127 0,5426 0,49 0,46 0,56 0,55 0,16 0,13 0,40 0,38 -5,7%
Taguatinga 0,4919 0,5454 0,51 0,45 0,58 0,61 0,23 0,16 0,44 0,41 -6,5%
Média do DF 0,4632 0,4873 0,54 0,51 0,54 0,57 0,24 0,18 0,44 0,42 -4,5%
Fontes: Tabelas 1.14, 1.1.5 e 1.1.6, aplicada a metodologia de cálculo descrita no texto

Como anteriormente fora referido, os fatores ambientais e culturais estão


associados a eventual inadequação da vizinhança, resultante, por exemplo, da
degradação física do ambiente imediato, de alterações urbanísticas, do aumento
da violência, dos riscos ecológicos, da poluição, entre outros.

Estes fatores merecem destaque nesta pesquisa em razão do enfoque


teórico metodológico adotado, ou seja, relacionar o processo de mobilidade sócio-
espacial à dinâmica imobiliária representada pelos movimentos de compra e
venda de imóveis e principalmente, pelos deslocamentos provocados/induzidos
pelos agentes imobiliários no próprio processo de realização da atividade.

Por uma das características inerentes da atividade imobiliária de ponta, ou


seja, concertada pelo Capital Incorporador, é importante considerar os fatores
decorrentes “mark-up urbano”, ou seja, a introdução de “novas formas de morar”
122

promovida pelo marketing imobiliário, conferindo às famílias de classe de renda


mais altas (demanda mais solvável), constituir-se no alvo prioritário de difusão das
inovações urbanas engendradas por empreendedores schumpeterianos (Abramo,
1988).

Levando em consideração que as motivações pelas quais as pessoas


mudam de residência no espaço urbano envolve fatores variados, resumidamente
arrolados acima, foram destacadas no questionário aplicado42, razões
relacionadas diretamente às condições do bairro e às condições do imóvel,
propriamente dito, correlacionando-os às classes de renda e condições de
ocupação dos adquirentes.

Tabela nº 11
DETERMINANTES DA TROCA DE RESIDÊNCIA
POR CLASSE DE RENDA E CONDIÇÃO DE
OCUPAÇÃO DO IMÓVEL ANTERIOR

Motivos Classe de Renda Condição de Ocupação Total


até 2 SM 2 -10 SM > 10 SM Próprio Alugado Outros*
Melhoria Salarial 0 1 12 9 0 4 -
Casamento 1 0 5 5 1 2 -
Separação 0 1 4 3 0 2 -
Nascimento de filhos 1 1 3 4 0 2 -
Receb. de Herança ou doação 1 6 6 8 3 2 -
Insatisfação c/ o local 0 4 5 7 1 1 -
Insatisfação c/ o imóvel 0 5 8 7 3 1 -
Aquisição de casa própria 5 12 19 12 12 11 -
Total 8 30 62 55 20 25 100
Fonte: Entrevistas no Balcão do ITBI/GDF, Set/2002
* Moravam c/ familiares, funcional, cedido, etc.

42
Ver no capítulo Anexo I os detalhes sobre as questões metodológicas envolvidas na aplicação
dos 100 questionários, durante o mês de setembro de 2002. Na aplicação dos questionários
contou-se com o auxílio de duas alunas bolsistas, estudantes do Curso de Geografia da
Universidade de Brasília (Mariana Miranda e Maria Rita Fonseca.)
123

Em relação à motivação principal para a troca de residência, a aquisição de


casa própria, independente da classe de renda e da condição do imóvel ocupado,
foi a principal razão de mudança, representando, aproximadamente, um terço do
total dos deslocamentos intra-urbanos em Brasília.

Este resultado vai ao encontro aos resultados alcançados em estudos


dessa natureza realizados por Faria (1998) para o Rio de Janeiro e por Ribeiro
Filho (1999) para a cidade de Manaus. Em ambos estudos, a aquisição da casa
própria representou de forma destacada a principal motivação para os
deslocamentos intra-urbanos.
124

DIMENSÃO DOS DESLOCAMENTOS INTRA-URBANOS

Os deslocamentos de pessoas estabelecem um conjunto de interações


espaciais e estas, por sua vez, devem ser vistas como parte integrante da
existência (e reprodução) e do processo de transformação social. (Roberto Lobato
Corrêa, 1997).

No que se refere à existência e reprodução social as interações espaciais


refletem as diferenças de lugares face às necessidades historicamente
identificadas. No que concerne às transformações, as interações espaciais
caracterizam-se, preponderantemente, por uma assimetria, por relações que
tendem a favorecer um lugar em detrimento de outro, ampliando as diferenças já
existentes.

A dimensão dos deslocamentos, tanto em termos de volume como de


distância, correspondem, em certa medida, às distinções que são estabelecidas e
ampliadas por esses processos de transformação na configuração geográfica dos
lugares.

Com respeito à destinação do migrante no espaço intra-urbano se em


muitos estudos observa-se uma tendência de que a maior parte dos movimentos
se constituírem em fluxos de curta distância.

Analisando-se a matriz de deslocamentos entre as principais localidades do


Distrito Federal, consta-se por meio da ordenação do endereço de origem do
migrante e o endereço da nova residência, que a principal concentração dos fluxos
é intralocalidade, expressos na diagonal principal da Tabela 12.
125

Tabela 12. Trajetórias Urbanas entre Localidades


Número Absoluto (Amostra de 100 entevistados)

Localidade A B C D E F G H TOTAL
A - Plano Piloto* 29 1 1 2 2 1 2 0 38
B - Sobradinho 6 7 0 0 0 0 0 0 13
C - Ceilândia 0 0 10 1 0 0 0 0 11
D - Taguatinga 2 2 2 8 1 0 0 0 15
E - Gama 2 0 1 1 7 0 1 0 12
F - Ceilândia 0 0 0 0 0 10 0 0 10
G - Guará 4 0 0 0 0 0 1 1 6
H - Fora do DF 2 0 2 4 1 0 0 0 9
TOTAL 45 10 16 16 11 11 4 1 114
Fonte: Entrevistas no Balcão do ITBI/GDF, Set/2002
* Plano Piloto compreende Asas Sul e Norte, Lagos Sul e Norte,
Cruzeiro, Setores Ocotogonal e Sudoeste

O Plano Piloto além de concentrar o maior número de deslocamentos


intralocalidade, distribui população para todas as outras localidades do Distrito
Federal, caracterizando-se como a localidade que mais “expulsou” moradores. Em
direção oposta, Taguatinga, é a localidade que mais atraiu moradores de outras
localidades, destacando-se aqueles atraídos de localidades fora do Distrito
Federal.

A tendência da escolha de destinos próximos tem duas explicações


possíveis: uma é a manutenção da familiaridade espacial, constituindo-se a
mudança em uma tentativa de ajustamento da habitação e sua localização. A
outra é a manutenção do acesso à cidade como um todo.

No entanto, quando o movimento é mais longo, de acordo com a hipótese


formulada por Abramo e Faria “pode se tratar de uma reacomodação do mercado,
melhor explicando, ricos/pobres saindo de áreas desvalorizadas/valorizadas, indo
para áreas compatíveis com seu status sócio-econômico. E neste aspecto,
contrariando os modelos de migração dos geógrafos comportamentalistas, que
reduzem as decisões de localização dos indivíduos/famílias à simples erros de
avaliação da vizinhança/área, afetando sua percepção quanto às características
126

sociais do ambiente, entra o importante papel da dinâmica imobiliária na


estruturação do espaço, via investimentos capazes de deslocar a demanda, e
influenciá-la em suas decisões.” (Abramo e Faria: (op.cit.: 433)

No sentido de melhor caracterizar a dimensão dos deslocamentos


observados nos fluxos de origem e destino estabelecido pelos moradores de
Brasília é importante mostrar a distribuição da população do Distrito Federal por
distâncias em relação ao Plano Piloto. Nesse particular, cabe chamar atenção
para o fato de que, na faixa entre 25 e 35 km concentram-se 1,25 milhão de
habitantes (61% da população do DF).

Gráfico 2– População do Distrito Federal (Mil hab. 2000) x Distância de Plano Piloto (Km)

6 0 4 0 0

372 344 350


3 5 0

5 0
Distâncias
52
População 3 0 0

4 0

42 2 5 0

186 39
3 0
35 2 0 0

33
30 147
20
115
1 5 0

2 0 25
15
1 0 0

64
52 53
1 0
99
71
11
5 0

0
6 0

1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 0 1 1

Em complemento, quando se considera o Entorno do DF, constata-se, no

Gráfico 3, a seguir, que 81% de sua população (cerca de 661 mil habitantes)

concentram-se num raio entre 25 e 80 km de Brasília, nas oito cidades mais


127

populosas dessa região: Luziânia, Águas Lindas, Valparaízo, Formosa, Novo

Gama, Planaltina, Santo Antônio do Descoberto e Cidade Ocidental.

Gráfico 3 – População do Entorno (Mil hab. – 2000) x Distância de Brasília (Km)


3 5 0 1 6 0

323
3 00
141 1 4 0

1 2 0

2 5 0

Distâncias
106 1 00

95 População
195
2 00

74 79 169
8 0

1 5 0
74
138 141 6 0

124 125
52 116 119 120
1 00

100 104
40 81 83 4 0

34
5 0

43 46 50 57 58
22 21
40 20 2 0

15
24 10 11 7
0
4 3 3 4 3 0

1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 0 1 1 1 2 1 3 1 4 1 5 1 6 1 7 1 8 1 9 2 0 2 1

Por fim, analisando-se de forma global as distâncias em que a população

(em percentuais acumulados) se localiza em relação á área central de Brasília, o

Gráfico 4, a seguir, mostra que 97% da população do Distrito Federal e Entorno

reside num raio de até 58 km do centro da capital federal.

O mesmo gráfico permite verificar que, a partir de 25 km do centro de

Brasília, o percentual acumulado da população começa a superar, em termos

proporcionais, a distância em relação à Capital. Assim, na faixa entre 25 e 58

km concentram-se 84% da população do Distrito Federal e Entorno.


128

Gráfico 4 – População Acumulada (%) DF e Entorno x Distância de Brasília (Km)

94% 100%
9 0 1 0 0 ,0 %

8 0
86% 97% 9 0 ,0 %

80%
Distâncias 72% 88% 81 8 0 ,0 %

82%
7 0

% Acumulado (População) 78% 7 0 ,0 %

6 0

70%
66%
6 0 ,0 %

57 58
52%
5 0

50 52
5 0 ,0 %

4 0

38% 46
42 43 4 0 ,0 %

24 31% 39 40
35
3 0

20 33 3 0 ,0 %

15 30
11 25
2 0

2 0 ,0 %

6
1 0

1 0 ,0 %

16%
12%
9%
3% 7%
0 0 ,0 %

Por fim, o Gráfico 5 mostra que também no Distrito Federal o modo de

deslocamento é fortemente influenciado pela renda das pessoas. Aos níveis de

renda mais baixos estão associadas as viagens a pé e por transporte coletivo;

aos níveis mais elevados, predominantemente o automóvel.


129

Gráfico 5 - Modos de viagem x renda

90,00
% de Viagens da Classe de

80,00

70,00

60,00
Renda

50,00

40,00

30,00

20,00

10,00

0,00

0 ---I 1 1 ---I 2 2 ---I 3 3 ---I 4 4 ---I 6 6 ---I 9 9 ---I 12 12 ---I 20 20 ---I 30 >30
SM SM SM SM SM SM SM SM SM SM
Classe de Renda Domiciliar (SM)

Ônibus Auto/Utilitário e Táxi

Lotação A Pé
130

CAPÍTULO IV - CONVENÇÃO URBANA, FORMAS-CONTEÚDO E


COORDENAÇÃO DA DINÂMICA ESPACIAL DE BRASÍLIA

“A verdadeira revolução que surgiu com a teoria de

Einstein [...] foi o abandono da idéia de que o

sistema de coordenadas do espaço-tempo possui

significado objetivo como uma entidade física

isolada. Em vez dessa idéia a teoria da relatividade

implica o fato de que as coordenadas de espaço e

tempo são apenas os elementos de uma linguagem

utilizada de um observador para descrever seu meio

ambiente.” Mendel Sachs, físico relativista citado

em Fritjof Capra (O Tao da Física 1993, 9ª edição)

INTRODUÇÃO
A estrutura espacial da cidade atual configura um sistema complexo, não
completamente aleatório, uma vez que tendem a apresentar determinados
padrões, configurando-se muito mais à semelhança de sistemas não-lineares25 do
que como sistemas funcionais, como é comumente entendido na tradição do
Planejamento Urbano.

Um paralelo ao debate travado no campo da Física Teórica entre a


concepção Clássica (newtoniana) e Moderna (einsteniana) relacionada à
necessária associação entre os conceitos de tempo e espaço, ajuda a entender os
processos dinâmicos implicados na estruturação interna da cidade em uma
perspectiva que almeje proceder a uma leitura alternativa às vertentes clássicas

25
Sistema não-linear que é atribuído à Física Quântica em contraposição a Visão Newtoniana do
desenrolar dos eventos.
131

de estruturação urbana50 e aproxime tal abordagem à teorização espacial crítica


de Milton Santos articulada com o conceito de convenções urbana proposto por
Abramo, considerando-a como coordenadora da dinâmica sócio-espacial.

A dinâmica imobiliária impulsionada por processos de


valorização/desvalorização do espaço e pela necessidade de contínua inovação e
alteração do produto imobiliário têm no funcionamento do mercado imobiliário,
refletido nas decisões de realização do produto e na efetiva transação dos
mesmos, uma de suas expressões fenomênicas.

No entanto, o funcionamento desse mercado apresenta singularidades que


o diferenciam de outros mercados, introduzindo, principalmente, a problemática do
comportamento não parametrizado dos agentes econômicos no que diz respeito
ao processo das escolhas de localização na cidade. Ou seja, em concordância
com Abramo (2001), em um ambiente de incertezas quanto às intenções
econômicas dos agentes entre si, a explicação da ordenação espacial baseada na
hipótese de um “indivíduo míope” que se deixaria guiar por uma racionalidade
paramétrica é limitada. Sendo assim, o autor propõe uma leitura heterodoxa da
concorrência espacial, em que escolha de localização, ocorre em um contexto de
incerteza radical.

O lugar da crença nesse processo complexo e aberto de tomada de decisão


sobressai-se como mecanismo de coordenação espacial, as denominadas
convenções urbanas (Abramo, op. cit), que condicionam a dinâmica espacial de
uma “ordem” urbana provisória, contingente e multifacetada.

Este capítulo procura discutir e organizar o tratamento dado ao conceito de


convenção urbana enquanto mecanismo de coordenação espacial. Ele começa
identificado os vários conceitos de convenção no seio da Economia a partir da
tradição keynesiana para, em seguida, discutir a aplicação do conceito no
processo estruturação intra-urbana.

50
Refere-se principalmente as abordagens da Economia Urbana Neoclássica, a Escola de Chicago
e a tradição marxista.
132

Este capítulo faz, também, uma caracterização do mercado imobiliário,

envolvendo desde a identificação das especificidades da mercadoria habitação em

geral, suas implicações na formulação de políticas públicas até chegar à

especificidade desse espaço geográfico.

Por fim, tenta-se identificar e desenvolver uma relação entre este conceito e

teoria espacial crítica de Milton Santos, principalmente a noção de formas-

conteúdo que confere materialidade à dimensão espacial (1978; 1995). Este

movimento reflexivo é crucial para os propósitos de empreender uma leitura da

estruturação intra-urbana tendo como foco analítico à dinâmica do mercado

imobiliário e as suas sinalizações em termos de afirmação, mudança e

reafirmação das convenções urbanas.


133

CONVENÇÕES URBANAS NA PERSPECTIVA HETEREDOXA DE ECONOMIA


URBANA E A DINÂMICA ESPACIAL DA CIDADE

Diversas definições de convenções coexistem na teoria econômica


contemporânea, expressando um grande interesse despertado pelo conceito51, no
entanto, algumas dessas definições são interpretações dadas ao significado de
convenção atribuído a Keynes, embora, no dizer de Dequech (1999), Keynes não
defina o conceito de forma explícita.

Algumas definições mais explícitas do conceito de convenção são


sumarizadas, em seguida:

Darity & Horn (1993: 28-31) interpretando Keynes, compreende convenção


como uma “regra do polegar” e afirma que “existem vários tipos de regra do
polegar”. A projeção da situação existente e a crença na opinião do outros poderia
ser exemplos das regras do polegar.

Também inspirado em Keynes, outra conceituação, colocada por Possas


(1990: 11-12), identifica a convenção primariamente como a conformidade com a
opinião média. A projeção do presente e do passado recente no futuro é
considerada como uma – talvez a mais importante – das possíveis opiniões
convencionais. A projeção da situação existente poderia ser, então, um padrão
específico de expectativa que as pessoas podem adotar.

Na definição de Dequech (op.cit.), convenção é, antes de tudo, uma regra


coletiva do polegar, ou, mais precisamente, um padrão prescrito de
comportamento (pensamento) socialmente compartilhado. Esta definição difere da
definição de Possas, no sentido que a opinião média pode ser resultado de vários
tipos individuais de comportamento, enquanto a idéia de uma regra coletiva do
polegar ou padrão de comportamento sugere que muitas pessoas podem seguir

51
A respeito desse grande interesse, ver, por exemplo, o número especial da Revue Économique
nº 2, 1989.
134

uma regra similar ou padronizada. As duas definições são quase equivalentes


quando a dispersão em torno da opinião média é muito baixa. Então, o padrão
específico de expectativas que representa a opinião média seria um fundamento à
regra específica do polegar que é seguida. Como uma regra socialmente
compartilhada e padrão de comportamento regular, uma convenção nesta
definição é similar ao que o autor citado chama uma instituição ou um tipo de
instituição. Na definição dele, uma convenção tem duas outras características:

a) ela é seguida no mínimo em parte porque outras pessoas a seguem; e

b) ela tem algum grau de arbitrariedade.

Para Lewis (1969: 58), uma convenção é também um padrão coletivo de


comportamento, mas sua definição é mais restritiva do que a de Dequech, por
requerer que todo mundo concorde com a convenção quando existe uma
expectativa que outros terão a mesma concordância.

Robert Salais (1991) propõe a definição que uma convenção é um conjunto


de elementos que, a todo instante, para os participantes da convenção, caminham
juntos e sobre os quais, por conseqüência, eles partilham um comum acordo. Mas
esse comum acordo não procede de uma escrita prévia em que cada detalhe seria
explicitado e que refletiria, de ambas as partes, uma racionalidade e uma
intencionalidade idêntica e consciente de si mesma.

Assim, uma convenção é um sistema de expectativas recíprocas sobre as


competências e os comportamentos dos agentes envolvidos na mesma. Os
comportamentos esperados não precisam ser concebidos antecipadamente e
depois coordenados para serem obtidos, residindo neste aspecto a diferença
básica entre convenção e contrato.

A definição da “regra do polegar” proposta por Darity & Horn (1993) aplica,
como em Simon, para um procedimento individual no qual não está
necessariamente associado com um padrão coletivo de ação, embora a atenção
para a opinião dos outros é vista como uma entre as várias possíveis regras do
135

polegar individual. As definições de convenção como aquiescência com a opinião


média e como uma regra do polegar coletiva são mais próximas da forma comum
de ver uma convenção como alguma coisa compartilhada com outros.

Nesse sentido, há uma aproximação à definição do conceito de convenção


urbana colocado por Abramo (2001: 164), ou seja, “ele é uma crença referente ao
tipo de família que, supostamente, vai se instalar numa determinada localização
(externalidade de vizinhança), conforme as inovações espaciais (diferenciações do
bem-moradia) propostas por capitalistas”.

O conceito de convenção urbana sob uma perspectiva heterodoxa de


economia urbana permite compreender a justaposição das diferentes paisagens,
usos da terra e significados vistos em um primeiro momento de sua apreensão,
como um espaço fragmentado.

A atuação dos diversos agente modeladores do espaço urbano, tanto no


que se refere à sua produção, circulação e consumo originam os fragmentos que
compõem o grande mosaico urbano que caracteriza a cidade moderna. No
entanto, essa fragmentação não se realiza de uma vez para sempre, apesar da
forte inércia das formas espaciais fixadas pelo homem. Ao contrário, está sempre
refeita nos movimentos do espaço e do tempo.

O espaço e o tempo são considerados como elementos inseparavelmente


vinculados da linguagem que um dado observador utiliza em sua descrição dos
eventos, no caso específico, dos fenômenos de transformação da organização
espacial intra-urbana que, a cada momento, apresenta movimento tanto no
sentido de difusão como de homogeneização de novos aspectos relacionados ao
seu respectivo padrão espacial.

Captar os sentidos desses movimentos direciona os esforços para a


compreensão da dinâmica espacial sob uma perspectiva heterodoxa do mercado
de localização residencial, conforme proposto por Abramo (1998; 2000), pois à
medida que os movimentos do sistema se ampliam, este pode chegar a
136

determinadas condições nas quais a evolução futura pode tomar vários caminhos
diferentes dentro do seu padrão de organização.

Dessa forma, mesmo em sistemas complexos e “caóticos52” como a


estrutura interna da cidade, a antecipação de futuros é possível dentro dos
espaços de imponderabilidade, pelo menos no que diz respeito às características
qualitativas gerais do comportamento do sistema (exceto os valores precisos e
suas variáveis num determinado instante; Capra, 1993)

No entanto, essa antecipação de futuros que é característica na dinâmica


de funcionamento do mercado imobiliário, à semelhança, por exemplo, da
argumentação utilizada por Becker53 com relação à decisão de localização
residencial como um meio de investimento familiar, remete ao problema crucial da
incerteza urbana.
Em acordo com a argumentação de Wack, a incerteza constitui uma
característica do mundo real, principalmente nos sistemas complexos, e não um
“... desvio ocasional e temporário de algo razoavelmente previsível” (Wack, 1998:.
363).
Apesar de carregado de incertezas, o comportamento de qualquer objeto
tende a expressar determinados padrões logicamente interpretados e analisados,
que decorrem das circunstâncias históricas e da lógica de funcionamento e
interação.
A partir de uma visão abrangente e conceitualmente rigorosa dos
fundamentos basilares da Abordagem Neoclássica da Economia Urbana, Abramo
(1995; 1997; 1998; e 2001) propõe uma perspectiva alternativa ao que ele
denominou de “síntese espacial neoclássica ou ortodoxa”.

52
No campo dos estudos urbanos pode-se constatar uma expressiva corrente que trata a
complexidade do espaço urbano em uma visão catastrófica, relacionando os problemas oriundos
da dimensão urbana uma visão determinística da dinâmica espacial. Para uma discussão mais
detalhada, ver artigo Campos, Iuakami e Pinedo (1986).
53
No âmbito da denominada Nova Economia Urbana Neoclássica, Becker é um dos autores
referido por Abramo (1998) na discussão teórica acerca das teorias sobre a representação do
espaço.
137

É importante sublinhar as principais contribuições teóricas da abordagem


de Economia Urbana Neoclássica, por se tratar de uma vertente de pensamento
fundamental para a maioria dos estudos sobre o processo de estruturação intra-
urbana, tanto pela posição hegemônica assumida por tal corrente nos principais
centros acadêmicos do mundo como pelo número de publicações científicas e
aplicações de suas interpretações no campo das políticas públicas. Esta revisão
breve é feita tomando por referência básica Abramo (2001 a).

O modelo de Alonso (1964) é, sem dúvida, a contribuição mais importante


dessa abordagem. Seu ponto de partida é a retomada da herança teórica de Von
Thunen, com o modelo de distribuição espacial das atividades econômicas a partir
da noção de um mercado central. Tal teoria aplicada ao discurso neoclássico
compreende a distribuição geográfica dos agentes no espaço como o resultado
agregado de um conjunto de decisões estritamente individuais, onde o objetivo
único seria o de maximizar uma função utilidade (no casa das famílias) ou de lucro
(no caso das firmas e dos agricultores).

Para proceder a escolha das localizações residenciais possíveis de uma


família, o primeiro passo seria o de estabelecer um conjunto de combinações
entre a dimensão espacial, traduzida pela distância entre o lugar da moradia e o
local de trabalho (t); pela quantidade de espaço consumido (q); e, por todos os
outros bens agrupados em uma cesta de bens compostos (z). Por sua vez, estes
resultariam combinações alocativas dos indivíduos, produzindo, dessa maneira,
níveis de satisfações agrupadas sobre uma curva, denominada pelo autor, “curva
de indiferença”. A função utilidade que representa as escolhas possíveis pode ser
descrita da seguinte forma:

U = U (z,q,t)

Em razão de existir embutida nessa idéia um custo de deslocamento entre


o local de moradia e o local de trabalho que, por definição, é o centro da cidade
(CDB), a acessibilidade ao centro será um atributo da localização desejada pelos
indivíduos.
138

Como a maximização das utilidades sofre restrição em razão dos recursos


disponíveis do consumidor, o segundo passo na teoria da escolha residencial
consistirá na introdução de um limitador de renda no universo de possibilidades de
consumo. A teoria parte do pressuposto que os indivíduos tomam as suas
decisões de forma autônoma e independe, buscando maximizar suas funções
objetivas, assim, as limitações orçamentárias atuam como um parâmetro exógeno
e as escolhas, por sua vez, são decididas segundo uma racionalidade
paramétrica54.

A racionalidade paramétrica articula-se com a representação naturalizante


do espaço (distância ao CDB na tradição von thuniana), consistindo, portanto, na
tradução econômica da distância ao centro (custo de deslocamento), que, por sua
vez, seria calculado em função da distância percorrida, da tecnologia dos
transportes e de outras variáveis externas ao processo de equilíbrio espacial
preconizado por Alonso.

Assim, a renda de oferta seria a tradução do montante máximo que o


indivíduo é capaz de pagar para consumir um espaço determinado em uma dada
localização. Essa capacidade de dispêndio dos indivíduos é representada, à
semelhança da curva de indiferença, por uma curva de rendas de oferta, capaz de
reunir todas as rendas propostas em função da distância ao centro da cidade.

O segundo modelo fundador da denominada Abordagem de Economia


Urbana Neoclássica é o modelo proposto por Muth (1969), ancorado numa visão
que se baseia nos termos tradicionais de um equilíbrio parcial de mercado.

De acordo com Abramo (2001: 51), “Muth formulou o problema diretamente

em termos de programa de maximização da utilidade de um consumidor que se

54
Racionalidade paramétirica definida como um comportamento distinto de uma racionalidade
estratégica na qual os indivíduos buscam maximizar suas decisões individuais quanto a escolha de
localização de uma forma autônoma, interessando-se apenas na satisfação de seus próprios
desejos e nas limitações que lhe impõem seus recursos iniciais e o mercado em termos de curvas
de renda. Para uma discussão mais detalhada, ver Abramo (2001).
139

acha submetido a uma restrição orçamentária, evitando utilizar a noção de oferta

de renda (aluguel) para obter um ponto de localização optimal.”

Para Muth, a função de renda do mercado estando decrescente em relação


à distância, o consumidor terá a sua localização de equilíbrio precisamente no
ponto, onde, qualquer que seja o seu movimento (em direção ao centro da cidade
ou ao contrário, à periferia) ele não será capaz de produzir uma variação no
rendimento real. Esta seria o que a tradição das análises urbana neoclássica
denominou de “condição de Muth”, que pode ser expressa segundo a
representação de Fujita (1989: 25) da seguinte maneira:

K’(t*)= R’(t*)Q(t*,u*) onde, K’(t*)

É igual à economia (poupança) marginal realizada sobre a despesa de


moradia expressa por:

R’(t*) Q(t*,u*).

Por conseqüência, a condição de Muth admite concluir que, se o custo de


transporte marginal for superior à poupança marginal, a família terá interesse em
se aproximar de centro para aumentar seu rendimento real, enquanto que, ao
contrário, quando o custo de transporte marginal é inferior à poupança marginal,
significa que a família poderá aumentar seu rendimento com a decisão de morar
mais para a periferia, visto que a economia em termos de aluguel será, dessa
maneira, superior ao aumento dos custos de deslocamento.

O ponto de equilíbrio em termo de localização das famílias é alcançado,


segundo esta interpretação, quando se alcança uma equação entre a economia
marginal nas despesas de aluguel e o custo de deslocamento marginal, pois neste
ponto, o indivíduo não tem mais interesse de se deslocar na estrutura interna da
cidade, pois qualquer que seja a sua direção, o mesmo não poderá aumentar seu
nível de satisfação. Sendo assim, a condição de equilíbrio espacial da família no
discurso neoclássico seria aquela que maximiza a utilidade dos indivíduos.
140

Segundo Abramo (op.cit.: 55), sem olvidar as diferenças de procedimento


conceitual, “as conclusões de Alonso e Muth sobre o equilíbrio de localização
individual remetem à passagem do indivíduo (ação) ao agregado-coletivo (ordem),
isto é, das decisões individuais de localização ao ordenamento do uso do solo e,
portanto, a estruturação da cidade.”

O modelo de Wingo (1961), ao aprofundar os efeitos do sistema de


transportes no processo de localização dos agentes e ao acrescentar a dimensão
densidade residencial à configuração do processo de equilíbrio espacial das
famílias, constitui-se outra tradição nos estudos de estruturação intra-urbana sob a
perspectiva de economia urbana neoclássica.

O autor introduziu a noção de renda de situação, entendida como


mecanismo de mercado que permite estabelecer o critério de uniformidade do
poder de compra do salário, aproximando, dessa maneira, às formulações de
Alonso e Muth, no que concerne ao processo de tomada de decisão de
localização dos indivíduos, ao construir uma representação do espaço a partir do
critério de indiferença espacial.

Porém, o modelo de Wingo apresenta uma diferença bastante significativa


em relação aos outros “modelos fundadores” da síntese neoclássica, no que se
refere a seu ponto de partida para a análise da escolha de localização residencial,
pois de acordo com Abramo (op.cit.: 90), “na formulação de Wingo, mais que a
função de utilidade dos consumidores, são, principalmente, a determinação do
salário e a localização residencial dos trabalhadores que constituem o ponto de
partida da análise espacial urbana.”

Em resumo, segundo Abramo (1998: 13), o raciocínio neoclássico repousa


em dois pilares: “a representação do espaço subjacente à formulação das
escolhas de localização que permite, por uma parte, fazer dessas escolhas um
trade off entre acessibilidade e espaço; por outra parte, a hipótese da
racionalidade econômica paramétrica que transforma os indivíduos em autômatos
guiados pelos cálculos de maximização de suas restrições”.
141

Um conjunto de críticas tem sido levantada à abordagem de economia


urbana neoclássica, principalmente, no que diz respeito aos limites de seus
fundamentos axiomáticos, grosso modo aqui resumidas em duas críticas
principais. A primeira representada pelo princípio de equilíbrio geral fundamentado
na liberdade de escolha de localização de indivíduos autônomos e independentes
que buscam maximizar suas escolhas locacionais sob a restrição orçamentária
individual, descartando a interdependência das decisões de localização entre os
agentes econômicos.

A segunda relaciona-se ao debate da dimensão tempo no qual os agentes


econômicos tomariam suas decisões de investir ou comprar desconhecendo as
relações intertemporais implicadas com essas decisões, ou seja, os mesmos
seriam míopes com relação à antecipação dos processos de alteração da
estrutura interna da cidade.

É justamente pela introdução da noção de tempo nas escolhas de


localização dos agentes econômicos que Abramo (1998) inicia à formulação de
uma abordagem alternativa à leitura do mercado de localização residencial,
apresentada pela síntese ortodoxa neoclássica.

Nesta perspectiva, as localizações e os preços imobiliários não serão mais


considerados como sendo o resultado do encontro de indivíduos autônomos e
independentes. Muito pelo contrário, o comportamento estratégico dos agentes
econômicos e os fatores de externalidade vão condicionar as manifestações de
preferências das famílias e, por sua vez, o fato dessas escolhas de localização
serem interdependentes implicará na consideração dos fenômenos de
antecipação do tomador de decisão, ou seja, do capital imobiliário.

Segundo Abramo (op.cit.), esse processo de antecipação de decisões em


um ambiente de incerteza urbana, permite um movimento de “desnaturalização”
do processo de localização urbana, pois será o jogo de sinais e ações cruzadas
dos consumidores e produtores do espaço urbano, as denominadas convenções
142

urbanas, que estarão no centro da coordenação de todo esse processo,


esquematicamente representado, a seguir(Abramo; 1998: 116).

Figura nº 6 - O caminho da convenção urbana

Convenção
Urbana

Ação

Empresários Imobiliários
Consumidores

Produção Inovação
Oportunismo Típico

C
Escolha de Localização a
m
i
n
h
o
Motivações
Valorização Ruptura da
(mark-up urbano) Convenção
Residência Especulação

Graus de Surpresa Potencial Efeito de Efeito de


Estoque Valorização

Desistência Surpresa
Absorvida

Contágio da Desistência Confirmação da Crença

Enfraquecimento da Convenção
Retorno Incerteza Urbana
143

Abramo (op. cit.) assevera que convenção urbana é uma antecipação


(crença) não apenas acerca das localizações, mas também dos estoques
residenciais que lhes caracterizam, e sua realização efetiva acontecerá em
decorrência de uma temporalidade histórica que exige a permanência da crença
durante o tempo necessário à construção dos bens imobiliários, os quais, por sua
vez, permitem a externalidade de vizinhança se concretizar ou não.

Tanto do ponto de vista do consumidor quanto do empresário pode-se


identificar um conjunto de ações seqüenciais a confirmar ou rejeitar no decorrer do
tempo a convenção estabelecida em determinada localização, podendo-se
mencionar, então, a noção de um caminho para compreender a continuidade ou
rejeição das convenções urbanas.

Os incorporadores imobiliários, pela própria definição como agente da ação


transformadora do uso do solo e das características dos estoques imobiliários,
terão todo interesse em criar, em localidades diferenciadas, novas concepções de
apropriação espacial, no sentido de antecipar e assegurar frente aos demais
empreendedores, a coordenação espacial na transformação da estrutura espacial
urbana.

Esse movimento incessante de transformação espacial, no nível interno da


própria localidade, de acordo com Abramo (1995), permitirá conhecer o “ciclo de
vida” da localização, enquanto no plano da estrutura agregada da estrutura
espacial, as inovações espaciais podem se deslocar no espaço, produzindo as
transições regulares no interior desse ciclo de vida.

A convenção urbana permite, dessa forma, um duplo processo de


coordenação. De um lado, uma articulação das ofertas e de outro, uma
coordenação das ações em torno de um padrão de configuração do estoque e de
suas características.

Ao nível da ordem urbana global, o resultado agregado das inovações


espaciais, isto é, as entradas e saídas provenientes, tanto da ação dos
144

empreendedores urbanos na suas estratégias de antecipação do mark-up urbano


que eles poderiam impor a uma determinada área, quanto à depreciação “fictícia”,
isto é, deslocamento provocado pela saída de uma família para outra localização,
gerando acesso a outra família de renda inferior, permitindo modificar a
externalidade de vizinhança.

A proposição de uma nova convenção urbana visando mudar as


características dos bens residenciais e a externalidade de vizinhança de uma certa
localização poderá repercutir no conjunto da configuração urbana de uma
determinada cidade.

Sendo assim, pode-se estabelecer uma relação entre as mudanças ao nível


local e as modificações que essas mudanças incitam na configuração das
externalidades de vizinhança da estrutura intra-urbana geral, ressaltando-se o
papel determinante das inovações espaciais enquanto estratégia de
desestabilização da ordem urbana antecedente.

Na qualidade de componente do mercado imobiliário, a inovação espacial


revela, em acordo com Abramo (op.cit.), a simbiose existente entre a lógica de
ordem e desordem espacial urbana: de um lado, ela provoca o movimento de
mudança em direção às novas ordens residenciais (a dinâmica), e de outro, ela
tem a capacidade de desordenar as externalidades existentes (retorno da
incerteza urbana) e de bloquear a coordenação necessária a sua recomposição,
logo engendrar uma desordem espacial.

É justamente este conjunto de inovações espaciais (considerado como o


vetor da diferenciação do espaço) e suas imitações na forma de processos de
difusão (considerado como o vetor de homogeneização do espaço), que
constituem a dinâmica espacial.

A dinâmica espacial definida dessa maneira seria portadora de vários


processos de difusão das inovações. Cada um desses processos, ainda segundo
Abramo (id.ibidem.), teria uma “inovação datada” em tempos diferenciados, mas
145

continuando a transformar as características dos estoques imobiliários.


Acrescentando o fato que a demanda é composta por “tipos” de famílias que se
distinguem segundo os seus níveis de renda, pode-se supor que a dinâmica de
inovação impulsionada pelos empreendedores imobiliários focalizará,
primordialmente, as famílias de renda mais alta, por apresentarem uma demanda
mais solvável.

Assim, os diferentes processos de difusão das inovações datadas ao se


articularem com o processo de configuração das externalidades de vizinhança,
conformará uma estrutura espacial não apenas como um mosaico dessas
externalidades, mas, também, um mosaico de características espaciais
estabelecidas segundo o mesmo critério.

Alcança-se, dessa forma, uma leitura da dinâmica espacial intra-urbana


bastante distinta da tradição ortodoxa de economia urbana neoclássica, onde o
espaço é considerado uma variável exógena (natural) vis-à-vis às escolhas que
fazem os agentes do mercado de localização. Sob uma perspectiva alternativa,
como apresentada, a configuração espacial intra-urbana é compreendida por meio
dos movimentos de valorização/desvaloriazação coordenada por convenções
urbanas, ou seja, é o resultado da interdependência de decisões de localização
estratégicas e cruzadas dos agentes envolvidos.
146

FORMAS-CONTEÚDO ARTICULANDO A ESPACIALIDADE INTRA-URBANA

O espaço urbano é simultaneamente fragmentado e articulado, e esta


fragmentação articulada é a expressão espacial de processos sociais no dizer de
Corrêa (1997).

Em acordo com Milton Santos, compreende-se que “o espaço se impõe


através das condições que ele oferece para a produção, para a circulação, para a
residência, para a comunicação, para o exercício da política, para o exercício das
crenças, para o lazer e como condição de ‘viver bem’...”. (Santos; 1997: 45)

Sendo assim, a instância espacial é articulada, necessariamente, numa


combinação localizada, a uma estrutura demográfica, de produção, de consumo,
de renda, de classes, assim como é condição e resultado do sistema de valores
simbólicos, ideológicos e culturais de determinada realidade social.

A combinação localizada dessas estruturas remete à reflexão acerca do


conceito de estrutura, onde no dizer de Wanderley G. dos Santos significa
“relações recorrentes entre suas partes constitutivas, as quais, entretanto, nem
são efeitos emergentes de comportamentos interdependentes translúcidos ao
sujeito, nem são surpresas procriadas pela objetividade complexa, e associadas
por construção contingente do sujeito de conhecimento”. (Wanderley G. dos
Santos; 1990: 86).

Mais diretamente relacionado à compreensão da cidade sob a ótica


espacial, Santos (1988, 1995) sugere que é na relação dialética existente entre
estrutura, processo, função e forma, se extrai a possibilidade de uma análise dos
fenômenos espaciais em sua totalidade. Portanto, a forma corresponde a um
objeto ou um arranjo ordenado de objetos; a função é a atividade elementar de
que a forma espacial se reveste; a estrutura nada mais é que a inter-relação das
diversas partes que compõe a totalidade social; e, como parte inerente aos
elementos acima, o processo é a ação contínua que se desenvolve rumo a um
resultado qualquer.
147

Como alerta o referido autor, “não se pode analisar o espaço através de um


só desses conceitos, ou mesmo de uma combinação de dois deles. Se
examinarmos apenas a forma e a estrutura, eliminando a função, perderemos a
história da totalidade espacial, simplesmente porque a função não se repete duas
vezes. Separando a estrutura e função, o passado e o presente são suprimidos,
com o que a idéia de transformação nos escapa e as instituições se tornam
capazes de projetar-se no futuro. Examinar forma e função sem a estrutura, deixa-
nos a braços com uma sociedade inteiramente estática, destituída de qualquer
impulso dominante. Como a estrutura dita a função seria absurdo tentar uma
análise sem esse elemento”. (Santos;1985: 56)

A organização espacial é complexa, pois existem funções decorrentes de


processos sociais que são mais suscetíveis de engendrar formas novas e
modernas; outras, não são capazes de inovar, utilizando por isto, as formas
espaciais preexistentes, mediante uma readaptação. Além do mais, as inovações
têm distintos tempos de aceitação, algumas vezes passando por maior número de
distorções a fim de se integrarem; em outras, elas se opõem de modo relativo às
formas existentes, de maneira que estas não se acham de todo integradas ao
novo.

Conforme alerta Santos (1978), as formas mais duráveis chegam mesmo a


limitar e a dirigir determinadas transformações no presente, denominando de
rugosidades espaciais (grifo nosso) estas restrições impostas à possibilidade de
ampla transformação espacial oriundas das decisões e escolhas que os agentes
pretendem imprimir no processo de estruturação intra-urbana.

M. Godelier sugere que, “todo sistema e toda estrutura devem ser


abordados como realidades ‘mistas’ e contraditórias de objetos e de relações que
não podem existir separadamente”. (Godelier; 1966:.254-255)

Assim, cada edifício, bairro, loteamento, está sempre mudando de valor


relativo dentro de cada área onde se situam, mudanças que não são homogêneas
para todos e cuja explicação transcende cada um desses objetos e só pode ser
148

encontrada na totalidade das relações que comandam a Sociedade em geral, e a


estruturação do espaço da cidade, no particular.

Como afirma M. Santos, “a cada evento, a forma se recria. Assim, a forma-


conteúdo não pode ser considerada, apenas, como forma, nem, apenas, como
conteúdo. Ela significa que o evento, para se realizar, encaixa-se na forma
disponível mais adequada a que se realizem as funções de que é portador. Por
outro lado, desde o momento em que o evento se dá, a forma, o objeto que o
acolhe ganha uma outra significação, provinda desse encontro. Em termos de
significação e de realidade, um não pode ser entendido sem o outro, e, de fato, um
não existe sem o outro. (...) A idéia de forma-conteúdo une o processo e o
resultado, a função e forma, o passado e futuro, o objeto e o sujeito, o natural e o
social”. (Santos; 1997: 82-83)

As formas-conteúdo destacadas nesta pesquisa são os produtos


imobiliários propriamente dito e o processo de sua inserção no espaço da cidade,
isto é, a estruturação do centro, dos sub-centros, dos bairros residenciais, áreas
industriais e das áreas funcionais estudadas no emaranhado de relações
interdependentes que lhes dão sentido.

Os eventos no espaço da cidade tornam-se cada vez mais contingentes


fazendo-se necessário considerar um instrumento analítico que permita a
apreensão dessa coordenação espacial na realização das formas-conteúdo, acima
referida.

O local institucional onde se processa a maioria dos movimentos desta


fragmentação articulada do espaço urbano da cidade sob a lógica capitalista é o
mercado.

O mercado é um tema que transcende a ciência econômica, pois no mundo


contemporâneo ele assume uma abrangência e centralidade que lhe é adjudicado
uma fundamental importância na formação e explicação dos fenômenos sociais.
149

Para Hodgson “o mercado é como um conjunto de instituições sociais no


qual um grande número de trocas de produtos de um tipo específico toma lugar e
até certo ponto são facilitadas e estruturadas por aquelas instituições.” (Hodgson,
1988: 174)

Nesta definição a noção de troca está relacionada ao conceito de uma


instituição normativa e envolve tanto a troca dos direitos de propriedade como as
transferências de bens ou serviços.

Assim, as trocas envolvem concordância contratual e troca de direitos de


propriedade, o mercado consistindo, por sua vez, em um dos mecanismos que
estrutura, organiza e institucionaliza essas atividades.

A função da instituição mercado não é somente a transmissão de


informação relativa aos preços ou quantidades de um produto específico, mas,
também, de influenciar as ações e disposições de outros agentes que estão
compartilhando essa mesma instituição. Esse processo se dá, principalmente,
pela forma que o mercado estrutura o processo de cognição dos agentes
envolvidos, tendo a possibilidade de afetar suas preferências e crenças.

Ao contrário da visão da ortodoxia econômica, na qual o mercado


representa o locus onde ocorre a manifestação das livres escolhas individuais,
aceita-se o princípio que o mercado nunca pode ser inteiramente livre no sentido
clássico da palavra, uma vez que por meio de suas convenções, rotinas e regras,
a escolha individual é, em alguma medida, constrangida pelos tipos específicos de
comportamento de seus agentes.

Associada a essa questão emerge o problema de como os preços são


determinados e como preço de equilíbrio e quantidades são alcançados em uma
perspectiva eminentemente teórica.

A perspectiva adotada distancia-se do modelo neoclássico como, por


exemplo, foi expresso por Leon Walras (1929), quando desenvolveu a
denominada “ficção do leiloeiro” chamando um conjunto de preços, e ajustando-os
150

à medida das respostas para as diferenças entre oferta e demanda, até que o
mercado lucre e o equilíbrio seja alcançado.

É amplamente aceita a idéia que decisões para comprar ou vender uma


dada mercadoria por um preço depende em parte dos preços esperados no futuro.
Mas os preços futuros podem flutuar, assim as expectativas assumem a forma de
uma norma ou limites de preços possíveis, face sua prevalência em algum período
futuro.

No entanto, há enormes dificuldades para o estabelecimento de alguma


expectativa normativa em relação aos preços, a qual, nem as sofisticadas técnicas
estatísticas de análises resolvem, dado o número enorme de variáveis na
determinação dos mesmos de uma maneira confiável.

Na ausência dessas normas, as decisões de mercados estão sempre


envoltas no risco ou na incerteza, embora no seu funcionamento prevaleça algum
mecanismo normativo tanto na mente e como na prática dos agentes envolvidos.
Para George Shackle (1972: 227) os preços que se mantém em um nível
particular, por algum tempo, adquire algum poder de sanção e autoridade,
funcionando dessa forma como convenções.

Na teoria neoclássica o único preço normativo é o preço de equilíbrio ex


post, o qual é formado após um extenso processo de ajustamento e sinalização no
mercado, constituindo-se muito mais em um processo lógico do que histórico. Ao
contrário, na perspectiva adotada por Hogdson (op.cit.), embora o preço normativo
possa ser afetado pelos preços cotidianos, ele existe ex ante, incrustado nas
instituições e expectativas de indivíduos, portanto sustentados sobre os preços
correntes praticados no tempo histórico.

Sendo assim, é crucial o papel desempenhado pelas informações no


sentido de configurar as convenções, normas e instituições que fazem funcionar
essa instituição, distanciando-se da visão neoclássica do mercado como o locus
da perfeita competição.
151

O ponto de partida nessa perspectiva é a distinção estabelecida por Frank


Knight’s entre risco e incerteza, resumida nos seus principais pontos por John
Maynardes Keynes (1937). Para este autor, somos obrigados a agir em um mundo
de incertezas e muitos desses atos estão baseados na experiência passada e nas
convenções estabelecidas.

Um agente individual não é plenamente consciente das intenções de


investimento dos outros agentes, assim o incentivo para investir depende em parte
do conhecimento de uma oferta competitiva limitada de outras firmas, ou o
estabelecimento de uma crença que os outros não possuem a informação
relacionada à oportunidade que é acessível ao investidor.

Segundo Rogdson (op.cit.), a noção de preço normativo ajuda a entender


como a economia de mercado opera em um mundo onde os agentes têm
conhecimento limitado. Conseqüentemente, a rigidez (parcial) dos preços não
poderia ser tratada como uma hipótese restritiva a ser imposta em um modelo
generalizante. Rigidez não é caso especial e o mercado funciona coerentemente
por causa dessas imperfeições, e não a despeito das mesmas como estão
presumidos nas principais teorias econômicas.

Tais argumentos remetem à consideração de um caminho alternativo para o


problema de tomada de decisão em um mercado de informação imperfeita como o
caminho proposto pela teoria dos jogos.

Andrew Schotter em seu trabalho pioneiro, aplicou a teoria dos jogos para
estudar as instituições econômicas e normas, argumentando que, “os jogos que
são repetidamente jogados, os jogadores desenvolvem certos acordos
55
socialmente aceitos para as “regras de polegar” , normas, convenções e
instituições que passam a suceder gerações de jogadores.” (Schotter, 1981: 12).

55
Ver o capítulo sobre convenções para obter o significado dessa regra no âmbito da conceituação
das convenções.
152

Jogo é definido como o conflito onde o ponto de partida não é o desacordo,


mas, ao contrário, um acordo, isto é, o acordo entre os oponentes para lutar por
objetivos incompatíveis dentro de certas regras.

Sendo assim, instituições e rotinas são necessárias para oferecer


informações vitais, particularmente, sobre as estratégias futuras dos outros
agentes.

Antes de passar a análise do mercado imobiliário de Brasília, é importante


tecer alguns comentários a respeito da especificidade da mercadoria habitação, a
lógica de funcionamento desse mercado e as implicações dessas na formulação
de políticas habitacionais.

A mercadoria habitação possui especificidades em relação aos outros bens


econômicos que fazem a dinâmica de funcionamento desse mercado possua
distinções em relação à maioria das outras mercadorias. Dentre outras
características podem ser destacadas:

i) o estoque de habitações é marcadamente heterogêneo;

ii) habitação é um bem fixo no espaço, pois na maioria dos casos é


impraticável mover as habitações de uma localidade para outra;

iii) habitação é um bem de alto valor, pois para a aquisição de uma moradia
um chefe de família típico tem que recorrer a grandes financiamentos;

iv) habitação é um bem durável; e,

v) os custos de mudança de uma habitação para outra são relativamente


altos.

A primeira característica, a habitação como um bem heterogêneo, significa


atribuir a cada unidade habitacional um preço diferente, dependente de
características locacionais/espaciais e de construção. No dizer de Santos & Cruz
(2000), trata-se de um mercado completamente produto-diferenciado, ou seja,
153

cada imóvel em si difere no tamanho, na disposição dos cômodos que o


compõem, no repertório construtivo utilizado (por exemplo, tipo de piso, de
armários, de janelas, durabilidade da fundação, do telhado, etc.) e na qualidade e
eficiência dos equipamentos instalados (equipamento de cozinha, sistema de
calefação, ar condicionado, encanamento, eletricidade, etc).

Em razão da indissociabilidade entre habitação e localização, esse bem é


tratado como um bem composto por um conjunto de outros bens56, cujos preços,
implicitamente, contribuem para a formação do preço de mercado de cada
unidade habitacional, o que na literatura econômica é definido como preços
hedônicos (Rosen, 1974).

Com relação à segunda característica, a habitação como um bem fixo no


espaço, significa que o consumidor ao escolher uma habitação implica, também,
em escolher uma vizinhança, e uma escolha de acesso a uma variedade de
serviços e facilidades, constituindo-se, assim, a posição residencial em um
componente do pacote imobiliário.

Dentre os atributos de uma localidade podem ser destacadas:

i) a acessibilidade, ou seja, os locais diferem quanto ao acesso ao


trabalho, aos pontos de diversão, à provisão de serviços tais como escola,
creches, entre outros;

ii) a qualidade ambiental, ou seja, os locais diferem em níveis de qualidade


do ar e de ruído, de paisagem;

iii) a provisão de serviços públicos tais como policiamento, telefonia, postos


de saúde; e,

56
Associada às características próprias de cada habitação, tem-se sua localização, o número de cômodos,
amenidades da vizinhança (parques, vista para o mar, orla de lago, etc.), entre outras.
154

iv) as características exteriores de vizinhança, ou seja os efeitos de


vizinhança produzidos pela modificação da aparência das moradias uma
determinada localidade

Do ponto de vista do produtor de habitação, implica considerar um conjunto


de condicionantes que transcendem o processo de produção em si da mercadoria,
tais como a implantação de infra-estrutura pelo setor público que permita a efetiva
realização do bem habitacional, o padrão médio de investimento realizado, entre
outros.

A terceira característica, habitação como um bem caro, implica na


dependência de políticas de financiamento, a qual, por sua vez, está condicionada
pelo contexto macroeconômico no que diz respeito entre outros aspectos, a uma
política de juros, ao controle fiscal, à curva inflacionaria, etc. Para o consumidor, a
habitação geralmente constitui uma fração substantiva do orçamento doméstico,
implicando financiamentos de longo prazo.

As duas últimas especificidades do bem habitação têm importantes


conseqüências na estruturação da cidade e são características essenciais para o
entendimento do funcionamento do mercado habitacional. O fato habitação ser um
bem durável e possuir um alto custo de transação confere um papel importante
aos estoques imobiliários, ou seja, a produção de novas moradias representa
apenas uma pequena fração do estoque imobiliário total em um dado período,
conseqüentemente, produzem impacto na configuração espacial se considerado
um tempo mais longo, sendo importante considerar no entendimento dessa
dinâmica a questão das transformações e permanências espaciais.

É considerável, portanto, para o funcionamento do mercado imobiliário o


papel desempenhado pela quantidade de imóveis usados a cada ano, sendo
considerada a regra geral de que em um ano as construções novas representem 2
a 3 por cento do estoque de imóvel total (O’Sullivan, 1993)
155

Como uma das características essenciais do mercado de imóveis usados


tem-se as interações entre os diferentes sub-mercados de imóvel e o processo
através do qual uma moradia passa de um uso para outro, ou seja, o modelo de
filtragem do mercado de imóveis, conforme proposto por O’Sullivan.

Os atributos, acima considerados, definem características especiais ao


mercado habitacional. A complexidade e fixação da mercadoria habitação fazem
com que o custo de transação seja muito alto neste mercado, implicando em
custos monetários propriamente ditos e custos relacionados à localização
específica do imóvel, que podem ser denominados de custos de localização.

Em geral, no mercado habitacional os consumidores têm que avaliar


pessoalmente as alternativas de aquisição e comprometem uma considerável
soma de dinheiro se quiser mudar o padrão de consumo escolhido. Os custos
monetários incluem uma substantiva perda de tempo e dinheiro na procura por um
imóvel, além de envolver os custos que gerados pela mobilidade residencial e pela
conclusão da transação. Os custos de localização devem ser avaliados em termos
da perda das relações de vizinhança, do acesso às amenidades do lugar e aos
equipamentos coletivos, relações que tem variações condicionadas pelo tempo de
residência em uma determinada localização particular.

Outro aspecto relacionado à heterogeneidade da habitação diz respeito ao


fato que o mercado habitacional em uma cidade é composto por alguns sub-
mercados. Para Rothenberg, Galster, Butler & Pitkin (1991: 2), “é possível assumir
que o mercado habitacional pode ser funcionalmente segmentado em uma
estrutura ordenada de submercados graduados de acordo com o nível de
qualidade. O nível de qualidade refere-se a um grau hierárquico de
substitubilidade segundo os demandantes e ofertantes agregados”. Assim, o
mercado de imóveis é segmentado com relação ao tamanho, à posição, e à
qualidade. Por exemplo, algumas famílias desejam escolher um imóvel pequeno,
com maior acessibilidade aos serviços e amenidades urbanas do que outras que
preferem um imóvel grande, em uma localização mais isolada em termos de
agitação urbana. Em outros casos, alguma famílias procuram imóveis com
156

repertório construtivo moderno, dotado de todas facilidades tecnológicas,


enquanto outras preferem um imóvel mais clássico devido à valorização do estilo
representado por tal imóvel. Ou seja, pode-se falar da existência de um sub-
mercado para imóveis grandes e outro para imóveis pequenos; da existência de
um sub-mercado para imóveis “hightech” e outro para imóveis clássicos e assim
por diante.

A segmentação do mercado habitacional em sub-mercados não implica, no


entanto, negligenciar o fato que os mesmo estão relacionados uma vez que os
consumidores possuem certa flexibilidade em suas escolhas de moradia, ou seja,
em outras palavras, os sub-mercados diferem no grau de substitubilidade um do
outro, impulsionando a propagação de uma escolha por todo o mercado.

As habitações dos diferentes submercados são substitutas imperfeitas, uma


vez que as famílias movem-se entre os submercados em respostas às mudanças
nos preços relativos de tipos diferentes de imóveis. Por exemplo, o preço relativo
de um apartamento de quatro quartos aumenta, impulsionando alguns potenciais
consumidores deste tipo de imóvel deslocarem-se para o sub-mercado de
apartamento de três quartos.

Outro aspecto importante a considerar no entendimento do funcionamento


do mercado habitacional é proceder a uma clara distinção entre habitação como
um bem de consumo durável e a habitação como um ativo para seus proprietários,
no sentido que permite aos mesmos que usufrua um fluxo de rendimentos
associados aos serviços prestados pela mesma.

Feita esta breve caracterização do funcionamento do mercado habitacional,


importante pontuar os desdobramentos identificados na pesquisa sobre o bem
habitacional no Brasil, tomando por referência básica a excelente síntese
fornecida por Azevedo & Ribeiro (1996).

Os autores identificam cinco grandes eixos temáticos nas últimas décadas,


iniciando pelos estudos de caráter macroeconômicos relacionados ao emprego
157

urbano, destacando autores como Carlos Ernesto Ferreira (1976) e Dorothéa


Werneck (1978).

A seguir, os referidos autores ressaltam um segundo eixo temático ligado


aos aspectos técnicos-materiais do setor construtivo, seja na perspectiva da
organização industrial, identificando como exemplo o trabalho de Paulo Bruna
(1976), seja no estudo do processo de trabalho, ressaltando a contribuição
seminal de Sergio Ferro (1976) acerca das relações sociais travadas no canteiro
de obras, tema posteriormente tratado por Nilton Vargas (1979), por meio da
explicação das particularidades pré-tayloristas da construção via análise integrada
das suas dimensões técnicas e econômicas.

O terceiro eixo temático reuniu trabalhos que analisavam a construção


popular, sua organização interna e a articulação desta prática com o denominado
padrão periférico de crescimento urbano, resultado das formas pelas quais o
trabalho é mobilizado pelo capital, identificado como os desbravadores deste viés
analítico, os trabalhos de Ermínia Maricato (1979), Nabil Bonduki e Raquel Rolniki
(1979).

O quarto eixo reunido em torno de uma abordagem de política habitacional,


foi identificado por Azevedo & Ribeiro (op.cit.) como o de maior profusão de
pesquisas, tendo como iniciadores Berenice Guimarães (1974), Sérgio de
Azevedo (1975), Luis Aureliano G. de Andrade (1976), Gabriel Bolaffi (1975) e
Lícia Valladares (1976) que, além da continuidade da produção de trabalhos na
temática nas décadas seguinte, tiveram a parceria de um expressivo número de
outros autores que refletiram sobre a temática, sendo destacado o trabalho de
Marcus A. Mello (1988).

O último grupo identificado relaciona-se aos trabalhos sobre a análise da


produção capitalista da moradia, produzidos a partir do final da década de 70,
referindo-se especificamente aos ensaios teóricos acerca das particularidades do
capital de incorporação (Ribeiro, 1979, 1981 e Azevedo, 1982) e da relação entre
preços da terra e uso do solo (Cunha e Smolka, 1980). É citada, também, a
158

análise explicativa da prática dos incorporadores nos textos de Rodrigo Lefevre


(1979) e Roberto S. Almeida (1981).

Importante acrescentar ao quadro sintético, acima referido, o esforço de


pesquisa conjunta encetado pela Rede Integrada de Pesquisa sobre a Dinâmica
Intra-Urbana das Cidades Brasileiras, iniciada ainda na década de 80 por Martim
Smolka, no IPPUR, e seus desdobramentos nas reflexões teóricas de Pedro
Abramo (1995, 2000, 2001) e no estabelecimento de linha de pesquisa acerca do
funcionamento dos mercados informais de terra e suas conseqüências na análise
de programas habitacionais voltados para este setor.

Correlacionada às especificidades da mercadoria habitação, bem como as


diferentes maneiras de proceder sua análise, importante destacar, também,
algumas particularidades das políticas habitacionais.

Uma vez que habitação é uma necessidade e ocupa uma grande fração no
orçamento doméstico, a política habitacional tem a capacidade de afetar todos os
cidadãos, significando, portanto, que a distribuição de habitação é uma importante
questão tanto para os agentes produtores como os consumidores dessa
mercadoria, além de importante questão política para governos, em todas as
esferas.

A política habitacional está relacionada muito proximamente aos outros


objetivos importantes de política econômica e social, como por exemplo,
estabilização macroeconômica, bem-estar e inclusão social, saúde pública, uso
apropriado do solo, desenvolvimento econômico, entre outros.

Pelo fato da habitação responder por parcela significativa da atividade do


setor construtivo e por ser este setor um grande demandante de mão-de-obra
operária, recursos financeiros aplicados no setor habitacional, tende a responder
por significativa parcela da geração de empregos.
159

A política habitacional, dessa maneira, deve estar coerente com estas


outras esferas de decisão, estando sua eficiência em grande medida relacionada
às ações coordenadas dessa política com as outras políticas públicas.

No Brasil, a adoção de uma política habitacional abrangente, inclusive com


a existência de um sistema de crédito regulado pelo Estado, se deu a partir de
1964, quando foi criado o Sistema Financeiro de Habitação (SFH) que, no dizer de
Hamilton Santos (1999: Políticas Federais de Habitação no Brasil: 1964/1998),
consistiu no mais pretensioso programa governamental para o setor habitacional,
o qual financiou mais de seis milhões de novas habitações em seus mais de trinta
anos de existência.

Antes deste período, as intervenções do governo na área habitacional


foram tímidas e não sistemáticas, dotadas na maioria das vezes de um caráter
eminentemente assistencialista.

Segundo Kampel e Valle (IBMEC, 1974: 13), “o sistema [vigente antes de


64] de concessão de empréstimos a valores nominais fixos distorcia o mercado
em três aspectos: primeiro premiava os mutuários, os quais pagavam suas
amortizações em cruzeiros desvalorizados; segundo, afastava a poupança
voluntária desse mercado, tendo em vista as taxas reais de juros fortemente
negativas; terceiro, minguava a capacidade de aplicação das poucas instituições
existentes.”

A resposta dada pelo Governo Federal a esse problema foi a criação do


SFH, um mecanismo de captação de poupança de longo prazo para investimentos
habitacionais, cuja idéia central era que a aplicação de um mecanismo de
correção monetária sobre os saldos devedores e as prestações dos
financiamentos habitacionais viabilizaria tais investimentos, mesmo em uma
conjuntura cronicamente inflacionária.

O órgão operador do SFH era o Banco Nacional de Habitação (BNH),


responsável pelo gerenciamento do FGTS, pela normatização e fiscalização da
160

aplicação dos recursos das cadernetas de poupança e pela definição das


condições de financiamento das moradias para os consumidores finais.

Ademais, o BNH tinha a responsabilidade de garantir a liquidez do sistema


diante de dificuldades conjunturais, derivadas, por exemplo, de eventuais
problemas com a captação das poupanças voluntárias no curto prazo ou de
elevações temporárias dos índices de inadimplência dos mutuários.

Em verdade, segundo descreve Abdalla (1996: 12), “o BNH atuava como


agente garantidor, seja das cadernetas, seja das letras imobiliárias às quais
aplicava a sua chancela. Além disso, supria linhas de crédito [dado que era o
órgão gestor do FGTS] e era o órgão regulador, em uma mistura de papéis
semelhantes à do Banco Central.”

O BNH era composto de dois subsistemas, segundo as suas principais


fontes de recursos.

O primeiro caso, o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE),


os recursos das cadernetas de poupança e dos demais títulos imobiliários eram
captados pelas associações de poupança e empréstimo, os denominados agentes
financeiros do SFH, e serviam para financiar investimentos habitacionais
propostos por empreendedores ou construtores.

Aprovado o financiamento, o empreendedor responsabilizava-se pela venda


das unidades habitacionais construídas aos consumidores finais, (a maior parte
deles de classes de renda alta e média) e os consumidores, por sua vez,
responsabilizavam-se pelo pagamento do empréstimo às instituições financeiras,
no papel de mutuários.

O empreendedor, desta maneira, era apenas um intermediário do processo,


visto que após a venda do imóvel ele repassava sua dívida as instituições
financeiras para os mutuários.
161

O segundo caso, o FGTS, que tinha sua arrecadação integralmente gerida


pelo BNH. Esta arrecadação era destinada prioritariamente à construção de casas
de interesse social, os disseminados conjuntos populares e cooperativas.
Posteriormente, esses recursos foram também para os setores de
desenvolvimento urbano e saneamento.

Importante ressaltar o papel desempenhado pelas Companhias de


Habitação (COHAB) na construção dessas unidades habitacionais. Essas
companhias eram empresas mistas sob o controle acionário dos governos
estaduais ou municipais que associavam a execução de programas setoriais de
construção de habitações às atividades financeiras relacionadas à
comercialização dessas unidades imobiliárias.

O BNH, durante certo tempo, foi de fato o definidor da política urbana no


Brasil, pois não se limitava apenas à esfera financeira, além de exercer papel
preponderante na promoção da indústria da construção civil e, por conseqüência,
do nível de atividade e emprego do Brasil.

Hamilton Santos (op.cit.: 14) resume de forma precisa o desenho


institucional dos primeiros anos do BNH, a seguir transcrito:
162

Quadro n° 2 - Desenho institucional dos primeiros anos do BNH

Fonte:
163

Duas formas principais de intervenção governamental podem ser


destacadas no tocante a disponibilização de recursos para o financiamento do
setor:

i) de modo direto, ou seja, por meio da utilização de fundos públicos; e/ou


indiretamente, por meio da legislação incidente sobre o mercado financeiro; e,

ii) atuando na provisão de moradias destinadas às camadas menos


favorecidas da população57.

Apesar do elevado déficit habitacional brasileiro não particularizar a


carência de moradia somente nas camadas de mais baixa renda, segundo a
antiga Secretaria de Políticas Urbanas do Governo Federal (SEPURB, 1996), 85%
dessa carência se concentra nas famílias de renda inferior a cinco salários-
mínimos mensais. Ademais, uma grande parcela do estoque de moradias do país
não conta com infra-estrutura adequada.58

O caráter profundamente perverso aludido por Azevedo & Ribeiro (1996) ao


desempenho do Sistema Financeiro de Habitação no Brasil é observado, quando
pelos dados desagregados do setor mostram que de 4,5 milhões de unidades
financiadas no período compreendido entre 1964 e 1968, por exemplo, somente
33,3% foi destinado aos setores populares, sendo que os beneficiados por
programas alternativos (entre 1 e 3 salários mínimos), apenas 5,9% foram
contemplados.

Além disso, acrescentam (op.cit.: 13), “a política habitacional teve, na


prática, um caráter ‘redistributivo às avessas”, pois baseou-se num sistema

57
De modo distinto do primeiro aspecto, acima mencionado, na segunda forma, a ação do
governo procura substituir o funcionamento do mercado, uma vez que atua em um segmento que
não é atendido pelo mesmo.

58
A Fundação João Pinheiro divulgou em 1995, o déficit habitacional brasileiro na ordem de 5
milhões de novas habitações. Este trabalho pioneiro no sentido de tratar de forma aprofundada os
dilemas e desafios para cálculo do déficit em escala nacional fora encomendado pelo Governo
Federal e teve no ano de 2000 a publicação de sua atualização.
164

financeiro abastecido de capitais sub-remunerados, oriundos de pequenos


poupadores (cadernetas de poupança) e de recursos dos assalariados (Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço – FGTS).”
165

BRASÍLIA E A COORDENAÇÃO DA DINÂMICA ESPACIAL

Retomando a análise específica do mercado imobiliário de Brasília pode-se

identificar como ponto de partida três características principais: pouca oferta,

escassez de terrenos e regras urbanísticas rígidas para a construção. A

combinação dessas três características tem provocado um déficit habitacional

de 109.895 moradias, sendo relevante assinalar o percentual elevado de

famílias na faixa de renda de 5 a 10 salários mínimos que não possuem

habitação própria (11,4%), enquanto nesta mesma faixa de renda para o Brasil,

segundo os cálculos da Fundação João Pinheiro (2000), esse percentual é de

5,4%.

Tabela n° 13 - Déficit Habitacional por Faixa de Renda

Faixas de Renda Distrito Federal Brasil

Até 3 salários mínimos 74,4 83,2

De 3 a 5 salários mínimos 8,9 8,4

De 5 a 10 salários mínimos 11,4 5,4

Mais de 10 salários mínimos 5,0 2,0

Fonte: Fundação João Pinheiro/Minas Gerais.

A escassez de terrenos para construir pode ser constatada procedendo ao


cruzamento do crescimento da população urbana com a oferta de lotes
residenciais, licitados entre os anos de 1989 a 1998, conforme tabela n° 14.
166

Tabela Nº 14 - População Urbana e Número de Lotes Residenciais Licitados no Distrito Federal


1989 - 1998

Ano População Urbana Lotes Residenciais

DF Plano Piloto DF Plano Piloto

1989 1.436.727 273.335 356 156

1990 1.475.781 267.757 98 46

1991 1.515.889 269.264 221 76

1992 1.565.362 270.776 388 138

1993 1579.450 208.503 430 33

1994 1.582.257 206.452 269 06

1995 1.625.334 204.428 218 04

1996 1.692.253 202.426 94 20

1997 1.749.209 201.419 202 12

1998 1.812.399 200.414 90 0


Fontes: CODEPLAN – Anuário Estatístico 2000;
Banco de Dados Licitações Públicas da TERRACAP em Anexo.

A tabela permite constatar o baixo número de lotes residenciais ofertados


nas licitações públicas realizadas pela TERRACAP, em relação ao aumento da
população urbana no mesmo período. Além disso, as incorporadoras e
construtoras atuantes no mercado imobiliário de Brasília concentram seus
negócios no Plano Piloto, no sentido que é nessa localidade onde o capital
imobiliário aufere preços acima da expectativa dada a escassez de oferta de
apartamentos.

Paradoxalmente, 53.810 imóveis em Brasília encontram-se vazios à espera


de moradores, denotando dessa forma a incompatibilidade da renda das famílias
com suas necessidades habitacionais. Acrescente-se a esta característica o fato
que persiste no Plano Piloto 69 projeções não construídas, sendo que
167

pertencentes à Universidade de Brasília tem 40 áreas desocupadas ainda não


lançadas no mercado.

Esse descompasso provoca, alem da elevação do valor, a redução da


concorrência imobiliária, o que contribui para aumentar ainda mais os preços dos
imóveis prontos. Essa situação propicia a formação de oligopólios dominados pelo
Capital Incorporador, pois passa a ser determinante nas relações de produção não
mais o preço da terra42 e sim, a relação entre capital investido e retorno esperado,
mais especificamente, seu lucro composto, que tem no ganho fundiário, o principal
componente. (Abramo, 1989)

O alto custo para adquirir um terreno da TERRACAP tem afugentado


muitas empresas, restando hoje segundo declaração do ex-presidente do
Sindicato da Indústria da Construção Civil do DF, Márcio Machado, apenas seis
empresas com condições de comprar terrenos e empreender no Plano Piloto e
Setor Sudoeste. O preço médio de uma projeção43 no Plano Piloto ou Setor
Sudoeste está estimado em R$ 8 milhões, resultado da lei da oferta e da procura,
acionada por meio das licitações de terrenos, onde leva o terreno a empresa que
oferecer o valor mais alto.

A escassez de áreas para a realização de empreendimentos imobiliários


nas localidades de maior atratividade do ponto de vista do capital imobiliário, com
pouca oferta de terrenos urbanos pela TERRACAP tem provocado situações de
conflito entre os citados agentes, principalmente no que diz respeito a enorme
pressão para o lançamento das projeções previstas para o novo setor residencial
de Brasília, denominado Setor Noroeste, localizado no Plano Piloto, enquanto se
recusam a investir em Águas Claras, cidade projetada em 1991 como nova opção
de moradia para a classe média.

42
De acordo com Smolka (1989), o custo de construção, ao longo do período pós-64, vem
paulatinamente, perdendo a importância na composição dos preços de imóveis empreendidos sob
o comando do Capital Incorporador.
43
Pela concepção urbanística de Brasília, o que se adquire ao comprar um terreno é sua projeção
uma vez que os prédios são erguidos sobre “pilots” para permitir a passagem das pessoas ao nível
do solo.
168

Na época de criação, a TERRACAP deu prioridade à venda de terrenos


para as cooperativas habitacionais, sendo as mesmas receberam condições mais
favoráveis do governo para pagar os terrenos, resultando a oferta de
apartamentos a preços mais baixos, fato que não interessa ao capital imobiliário.

Águas Claras, na atualidade, tem cerca de 15 mil habitantes apesar ter sido
criada para abrigar 160 mil habitantes; possui 80 edifícios construídos, 100 em
construção e mais 45 projeções para aprovação. A TERRACAP ainda possui um
estoque de 150 terrenos para vender na região.

O Setor Noroeste, a área objeto de maior pressão das maiores empresas

do setor imobiliário, está planejada para atender a classe média, foi aprovada por

Lúcio Costa no estudo denominado “Brasília Revisitada”, no meados da década de

80. Inicialmente abrangia uma área de 300 hectares, sendo que o projeto atual

prevê ocupar uma área de 825 hectares, com a previsão de 100 mil habitantes.

Em razão do mercado imobiliário de Brasília apresentar-se fortemente


segmentado em termos de diferenciações da qualidade de seus produtos,
confirmando o que Rothenberg & et.al. (1991), denomina de “housing-quality
submarket”, pode-se identificar a existência de quatro submercados imobiliários
(Farret, R. e Campos, N.; 1997), configurados no decorrer do processo de
estruturação intra-urbana da cidade, a partir do processo de oferta e formas de
transação.

O primeiro submercado é o de lotes, monopolista e estatal, existentes nas


mãos de poucas agências, destacando-se os lotes da Companhia Imobiliária de
Brasília (TERRACAP), os da Universidade de Brasília (UnB) e os lotes do Banco
do Brasil. Trata-se de transações primárias, em que esses lotes são colocados no
mercado, em geral, sob a forma de leilão público, com poucas exceções para
atuação da UnB que atua, na maioria das vezes, em parceria com as
incorporadoras imobiliárias.
169

O segundo submercado é constituído por lotes e imóveis do tipo


secundário, caracterizado por uma estrutura fortemente oligopolizada, com
processo de comercialização idêntico a qualquer cidade onde inexiste o
instrumento do monopólio estatal de terras urbanas. A diferença em relação ao
mercado imobiliário de Brasília relaciona-se aos estoques governamentais de
imóveis que, podendo ser ofertados a preços descolados (para baixo) do mercado,
tem a capacidade de inflexionar o comportamento geral dos preços nesse
mercado.

O terceiro submercado refere-se aos imóveis funcionais que, até 1991,


somavam cerca de 100.000 unidades, em Brasília. Esse submercado interage
com os anteriores de duas maneiras: primeiro, excluindo do mercado habitacional
privado uma parcela significativa de potenciais compradores, muito dos quais com
elevado padrão de renda; segundo, por gerar um excedente monetário para
significativa parcela da população, decorrente do baixo preço dos aluguéis pagos,
em alguns casos simbólicos, proporcionando a esses segmentos referidos,
canalizarem seus investimentos para outros tipos de bens imobiliários, tais como:
sítios, residências de passeio, salas comerciais, entre outros.

Finalmente, o quarto submercado, diz respeito aos imóveis de


assentamentos semi-urbanizados, como são denominados e produzidos pelo
Governo do Distrito Federal nos marcos de sua política habitacional e,
repassados, com subsídios, por meio do instrumento de cessão de uso, à
população de baixa renda. Nesse submercado, as transações imobiliárias ocorrem
por meio dos denominados “contratos de gaveta” que, embora difíceis de
mensurar o volume representado, influenciam a dinâmica imobiliária do conjunto
da cidade.

Em razão da distribuição gratuita e pouco criteriosa dos lotes nesses


assentamentos, o mercado paralelo de compra e venda de lotes, por meio dos
“contratos de gaveta” de unidades imobiliárias sem escrituração, impulsiona a
atuação de lideranças comunitárias e dos próprios moradores no sentido de
realizarem ganhos imobiliários nada desprezíveis, mantendo em estado elevado a
170

demanda por novas áreas ou criação de novos assentamentos urbanos no espaço


geográfico do Distrito Federal.

Considerando que a dinâmica espacial revela duplos movimentos de


homogeneização e de diferenciação, constata-se que nesses assentamentos, que
a demanda de tipos de famílias segundo os seus rendimentos tem um
escalonamento ascendente em relação às inovações datadas. Isto é, no primeiro
momento de ocupação dos lotes semi-urbanizados nos assentamentos urbanos
criados terão predominância de ocupação as famílias de renda mais baixa, as
quais, a medida que realizam transações imobiliárias dão acesso àquela
localidade, família com estratos de renda mais elevadas e por conseqüência, com
padrão de consumo do bem habitacional em particular e do conjunto de serviços
oferecidos pela localidade mais sofisticado, impulsionando, dessa forma, o
estabelecimento de novas externalidades de vizinhança. Sendo assim, quanto
maior for o nível de renda das famílias que se localizam nesses assentamentos,
mais acelerado será o processo do estabelecimento das inovações espaicais.
171

CONCLUSÕES

Braxília

dedico este canteiro

de obras, este

jardim-operário, aos

esquecidos de Deus

que construíram

esta cidade de

brasília e que, um

dia, construirão

comigo, em sonho

e sem dor, a cidade de Braxília

(Nicolas Behr, do livro Poesília:

poesia pau-brasília, LGE Editora, 2002)

No ideário modernista, o plano urbanístico tem a capacidade de produzir a


cidade, redefinindo o papel do produtor de materialidade a partir de uma
racionalidade funcionalista.

Entender a mudança no padrão sócio-espacial de Brasília como uma das


expressões do processo mais geral de estruturação intra-urbana, em uma visão de
espaço urbano: (i) simultaneamente fragmentado/articulado, reflexo/condicionante
social, expressão do cotidiano e também do futuro; (ii) envolvido em mitos,
crenças, valores, utopias e conflitos, em parte projetados nos objetos geográficos
(formas-conteúdo tais como, as ruas, os edifícios, os condomínios, bairros, os
172

monumentos, etc.) transcendentes à aludida razão funcionalista que inspirou a


concepção dessa cidade são as motivações principais do estudo ora apresentado.

A apreensão de como se processa a decisão das escolhas de localização


em Brasília, sob a trama de relações complexas que envolvem sua concepção,
formação e transformação, no jogo de decisões cruzadas e interdependentes,
coordenadas por convenções urbanas e articuladas as formas-conteúdo que lhes
conferem materialidade, é a perspectiva teórico-metodológica adotada.

As sinalizações, os sentimentos, os ruídos, os valores que os homens


conferem às formas-conteúdo engendram laços de afeição ou desgosto à
determinada localidade, conferem posição social atribuindo-lhes status,
vivenciadas e valoradas das formas mais distintas pelas pessoas.

Várias cidades coabitam o espaço ocupado por Brasília. Do traço original


de Lúcio Costa, definido por ele próprio como o gesto singelo de dois eixos que se
cruzam em formato de cruz, à metrópole de hoje, complexa, contraditória, onde o
cotidiano laborado em uma incessante obra coletiva cria, acrescenta, transforma
novas formas-conteúdo.

O projeto modernista pensado por Lúcio Costa para o Plano Piloto de


Brasília se baseou em quatro escalas, a bucólica, a residencial, a monumental e a
gregária, que ao longo da formação desse espaço urbano ganharam distinta
materialidade.

Apesar de Brasília (Plano Piloto) possuir em média 100 m² de área verde


por habitante, quase dez vezes mais que o recomendado pela Organização
Mundial da Saúde (OMS), a escala bucólica se concretizou com marcantes
distinções entre as diversas localidades componentes dessa estrutura urbana. O
acesso ao Lago Paranoá, a existência de parques, árvores que poderiam
confirmar Brasília como uma cidade-parque é uma realidade para os moradores,
por exemplo, do Lago Sul, do Lago Norte, da Asa Sul, da Asa Norte, do Setor
173

Sudoeste, do Setor Octogonal, não se pode dizer o mesmo para os moradores de


Samambaia, Santa Maria, Recanto das Emas, Paranoá.

As superquadras, com os prédios com pilotis, comércio local, escolas


parques, formadoras das unidades de vizinhança compõem a escala residencial
proposta por Lúcio Costa. Esta tipologia não foi repetida nas cidades-satélites
criadas para abrigar os trabalhadores desde a época da construção, culminando
com a formação de assentamentos urbanos periféricos, constituídos, inicialmente,
de arruamentos sem pavimentação, nos quais, os postes de rede elétrica e os
chafarizes dos poços artesianos constituem as únicas infra-estruturas urbanas
previamente instaladas.

A escala monumental, apesar de incompleta, ganha materialidade na


denominada Esplanada dos Ministérios, justificando a sua localização concentrada
por ter sido idealizada para ser a expressão simbólica do Poder Republicano.

Por fim a escala gregária é tema de controvérsia recorrente quando o


assunto é Brasília. O ponto de encontro representado pelo cruzamento dos eixos
Rodoviário e Monumental, pensado para ser o local de convergência da cidade, no
qual uma plataforma destinada a pedestres uniria as partes norte e sul dos setores
Bancário, Comercial, Autarquia, Hoteleiro e de Diversões, nunca concretizou esta
intenção, pois a construção dos referidos setores foi feita em níveis diferente,
priorizando a circulação de automóveis, limitando a centralidade pensada
originalmente.

A alteração de uma representação do espaço significa alterações de


posições relativas daqueles que dele se apropriam. Assim, a estrutura urbana
além de abrigar os diferentes usos e ocupação do espaço urbano é expressão,
também, da aliança entre a forma espacial e o desenvolvimento das práticas
sociais que confere significado a localização das atividades.
174

Sendo assim, forma espacial é forma-conteúdo, pois o espaço é uma forma


durável, conforme referido anteriormente, que não se modifica sincronicamente
com os processos que lhe conferem dinamicidade.

A noção de forma-conteúdo associada à coordenação da dinâmica espacial


pelas convenções urbanas é uma das maneiras de apreender o significados dos
lugares, não apenas no que eles denotam como localização, porque, sendo assim,
seria, em certa medida, uma naturalização da forma-conteúdo, mas,
principalmente, no que eles denotam como complexidade, constituída por
sistemas de ações e sistemas de objetos, híbrido de sistemas que define o espaço
geográfico.

Os preços imobiliários são sinalizações importantes das rugosidades


espaciais, no sentido que permite uma valoração diferenciada das localidades.
Essas valorizações diferenciadas reconstituem um território a partir de mosaicos,
pois é nesta dimensão que o espaço é realizado historicamente na produção dos
eventos que no dizer de Santos (1986) possibilita unir o mundo ao lugar.

O território, tomado como uma forma-conteúdo, é considerado como algo


que está em processo, pois é o continente da vida social, em todas as escalas
(global, nacional, regional, local), por conseguinte, ele tem que ser visto, ainda de
acordo com Santos “como um campo de forças, como o lugar do exercício, de
dialética e contradições entre o vertical e o horizontal, entre o Estado e o mercado,
entre o uso econômico e o uso social dos recursos”. (Santos; op.cit.: 19).

A paisagem é o lugar onde a memória se inscreve como oposição a um


tempo recortado em presente, passado, futuro, segundo esquemas espaciais.

De acordo com Moreira (1993), paisagem é memória materializada como


corpo geográfico, daí visível, da história humana; é uma fala do mundo com o
homem por meio da linguagem simbólica, própria a todo inconsciente coletivo. É o
próprio mundo dos significados-significantes exposto como fenomenologia do
arranjo das localizações.
175

A cidade como paisagem natural e construída é lugar de múltiplas


territorialidades organizadas a partir das exigências do estado, do mercado ou da
luta social. A paisagem é uma herança de diferentes momentos, a formar diversas
camadas por acréscimos ou substituições (rugosidades espaciais), que tem idades
diferentes.

O lugar é um conjunto de objetos que tem autonomia de existência pelas


coisas que o configuram, mas que não tem autonomia de significação, pois todos
os dias novas funções se impõem e se exercem.

O espaço é o misto de paisagem e vida social que lhe dá sentido,


significação e existência. Em acordo com a trilogia proposta por Henri Lefebvre
(1974), o espaço é visto neste trabalho como espaço concebido, espaço vivido e
espaço percebido, mas, também, espaço dos significados-significantes

No sentido de analisar as diversas dimensões da categoria espaço,


conjuntamente as demais subcategorias que dão significado geográfico, utiliza-se
a noção de convenções urbanas, conceito que operacionaliza essas diversas
dimensões em uma perspectiva imanente à dinâmica espacial representada pela
configuração sócio-espacial da cidade.

A crença estabelecida em dado momento a impulsionar decisões, emitir


sinais e promover escolhas dos agentes sociais implicados na estruturação do
espaço de uma cidade, neste caso específico, Brasília, permite uma leitura,
sempre provisória e contingente, da ordem/desordem encetada pela dinâmica
espacial.

Segundo Thomas Khun, toda ciência se funda a partir de um modo de


conceituação capaz de criar unanimidade, ou seja, um paradigma. Nesta direção,
um novo paradigma sugerido por Bachelard, em 1934, e retomado nas últimas
décadas por Edgar Morin, onde busca-se apreender o real complexo, em oposição
ao paradigma clássico, que partia da premissa de que a complexidade do real era
apenas sua aparência e que fenômenos “aparentemente complexos” poderiam ser
176

reduzidos às suas partes simples. Para aqueles autores, enfrentar a complexidade


do real significa confrontar-se com os paradoxos ordem/desordem, da parte/todo,
do particular/geral, do um/múltiplo.

Neste trabalho, a todo o momento, sobressai a motivação em busca de uma


leitura da cidade enquanto forma-conteúdo complexa, em que os paradoxos,
acima referidos, muitos além de circunstanciais, constituam a existência e a
transformação do fenômeno.

A consciência das limitações nas análises empíricas está presente, pois


não é corriqueiro transcender as análises onde se demarcavam espaços de
significados distintos, armados por localizações fixas ou intercambiantes que,
apesar das modificações, mantinham nítidas distinções de significados.

Hoje, em face da fluidez instantânea da paisagem, engendrando a


fluidificação dos espaços, diminui cada vez mais as distinções entre a
espacialidade topológica, percebida, vivida e produzida, em relação a
espacialidade simbólica, pois os sinais emitidos por significados de diferentes
escalas difunde-se e confunde-se em um contexto em que o fantástico e o real se
interpenetram para formar uma mesma espacialidade.
177

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ANEXO 1– ASPECTOS METODOLÓGICOS DA BASE EMPÍRICA

No intuito de compreender como se processa a decisão da escolha de


localização na trama de relações complexas que envolvem a estruturação
intraurbana de Brasília, movimentadas pelo jogo de decisões estratégicas e
interdependentes de diversos agentes formadores do espaço urbano, coordenado
pelas convenções urbanas, foram desenvolvidos os seguintes passos
metodológicos.

O primeiro passo envolveu a aplicação de 100 questionários com os


adquirentes de imóveis em Brasília, no momento em que o mesmo dirigia-se ao
balcão da Receita do Distrito Federal para o registro da transação imobiliária.

A cobrança do Imposto sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis –


ITBI, instituído pela Lei nº 11, de 29/12/1988, regulamentada pelo decreto 16.114,
de 02/12/1994 é feita pela Subsecretaria da Receita, órgão vinculado à Secretaria
de Estado de Fazenda e Planejamento do Governo do Distrito Federal. A base de
cálculo do imposto é feita sobre o maior valor, declarado ou de pauta, incidindo
uma alíquota de 2% sobre este valor nas transmissões não onerosas e 1% nas
transmissões onerosas.

Na determinação do tamanho da amostra, adotou-se a fórmula para o


cálculo do tamanho mínimo da amostra, segundo Barbetta (2002: 60). Um primeiro
cálculo do tamanho da amostra pode ser feito mesmo sem conhecer o tamanho da
população, através da seguinte expressão:

1
no=
E 02

Onde:

no = uma primeira aproximação para o tamanho da amostra; e,


188

E0 = o erro amostral tolerável.

De acordo com Barbetta (op.cit.), pode-se estimar uma proporção no caso


de elementos componentes de uma população com grande heterogeneidade erros
amostrais que não ultrapassem 4%, obtendo-se um nível de confiança aproximado
de 95%. Face à heterogeneidade das pessoas adquirentes de imóveis em uma
cidade com a população de Brasília, adotou-se com erro amostral tolerável (E0)
0,04.

Assim, uma primeira aproximação:

1
no= = 625
(0,04)2

Como procedimento preliminar para a determinação do número de


elementos da amostra (N), foi realizado o levantamento da média mensal de guias
liberadas em todos os postos de arrecadação da Subsecretaria da Receita, órgão
da Secretaria de Estado de Fazenda e Planejamento do GDF. Assim, o número
médio de guias liberadas é de 119 guias, segundo informações da Célula de
Gestão dos Tributos Diretos da referida Receita.

Considerando 119 guias como o tamanho N da população, corrigiu-se o


cálculo anterior, por:

N. n0
n=
N + n0

Onde:
189

N = tamanho (número de elementos) da população;

no = uma primeira aproximação para o tamanho da amostra;

n = tamanho (número de elementos) da amostra; e,

E0 = o erro amostral tolerável.

Em função do número médio de guias liberadas (tamanho N da população),


o tamanho da amostra é de:
(119)*(625) 74375
n= = = 99,96 famílias
119 + 625 744

Dessa maneira, chegou-se a uma amostra de 100 entrevistas com


adquirentes de imóveis, tendo sido aplicado, no mês de setembro de 2002, um
questionário contendo 40 perguntas, segundo os campos descritos a seguir44:

1 – características sócio-demográficas dos adquirentes, envolvendo idade,


gênero, estado civil, cor, grau de instrução, ocupação profissional, faixa de renda,
renda familiar e número de pessoas que contribuem para renda familiar;

2 – aspectos relacionados à decisão de mudar, abrangendo a finalidade do


imóvel adquirido, as pessoas envolvidas na decisão de compra, principais
características de uso do imóvel anterior, posicionamento em relação à vizinhança
e os fatores que contribuíram para sair do imóvel, tanto em relação à localidade
como em relação ao próprio imóvel;

3 – aspectos relacionados ao imóvel adquirido, tais como principais


características de uso do imóvel anterior, posicionamento em relação à vizinhança

44
Ver o modelo de questionário nos anexos.
190

futura, posicionamento em relação à sua própria renda frente à futura vizinhança,


os atores intervenientes da compra, o tipo de recursos utilizados e o valor do
imóvel adquirido; posicionamento quanto aos fatores que contribuíram para a
escolha do imóvel tanto em relação à localidade como ao próprio imóvel;

4 – um campo sobre a trajetória residencial do adquirente no Distrito


Federal; e,

5 – questões relacionadas ao deslocamento casa – trabalho do adquirente,


englobando informações sobre a localidade do seu trabalho, os meios de
transportes utilizados, modalidade de transportes e tempo de deslocamento tanto
da moradia atual como da moradia futura.

O tamanho da amostra para aplicação dos questionários baseou-se no


número médio mensal de registros do Imposto de Transmissão de Bens
Imobiliários (ITBI), nos 04 maiores postos de arrecadação da Secretaria de
Fazenda e Planejamento do Governo do Distrito Federal, da ordem de 202
registros. Excetuando os meses de janeiro e dezembro, nos quais, são
observadas diminuições expressivas do número médio de registros das
transações imobiliárias em Brasília, optou-se por proceder a aplicação dos
questionários no decorrer de um único mês, em setembro de 2003. Face à
inexistência de casos registrados em algumas localidades da área de abrangência
da pesquisa, foram feitas algumas agregações espaciais para efeito de análise.

O segundo aspecto, dado às peculiaridades do mercado imobiliário de


Brasília, especialmente, a existência do monopólio estatal exercido pelo Governo
do Distrito Federal no lançamento de novas áreas para expansão urbana, via a
Companhia Imobiliária de Brasília (TERRACAP), implicou na análise das
transações que envolvem o mercado de imóveis novos, coletando-se informações
sobre os lançamentos dos lotes destinados aos diversos usos no quadrilátero do
Distrito Federal, efetuados pela Empresa, por meio da realização de leilões
públicos.
191

Nesse sentido, foi constituído um banco de dados, englobando todos


lançamentos efetuados pela TERRACAP entre os anos de 1988 a 1998, contendo
os seguintes campos:

Campo 1 – Ano de lançamento

Campo 2 – Número do Edital e data de lançamento

Campo 3 – Tipo de Adquirente (Pessoa Física ou Pessoa Jurídica)

Campo 4 – Localização do imóvel, contendo o endereçamento completo

Campo 5 – Tipo de Destinação, contendo os diversos usos

Campo 6 – Área do Lote (em m²)

Campo 7 – Área de Construção (em m²), denotando o índice de construção


adotado para a área

Campo 8 – Informação sobre o Valor de Lançamento (em R$)

Campo 9 – Informação sobre o Valor Alcançado (em R$)

Campo 10 – Número de lances ofertados para cada imóvel

Campo 11 – Diferença percentual entre o valor mínimo e valor alcançado do


lote.

O universo espacial do estudo é o Distrito Federal e os seus centros urbanos.

Brasília, seguindo a acepção empregada pelo IBGE, é constituída pelos centros

urbanos do Plano Piloto e das demais Regiões Administrativas, aqui

denominadas de localidades. Essas localidades foram consideradas nesta

pesquisa como equivalentes aos bairros das cidades "convencionais".


192

Com vistas à caracterização das principais empresas que atuam no


mercado imobiliário, foram realizadas entrevistas não estruturada45 com os
dirigentes dessas empresas, classificadas segundo o número de
empreendimentos realizados.

A entrevista não estruturada visou, por meio da conversação guiada, obter

informações acerca das estratégias de atuação do Capital Incorporador,

principalmente ao que concerne ao tempo de atuação no mercado, ao volume e

características do produto comumente lançado, a localização, o valor de

lançamento e o esquema de financiamento utilizado. Assim, por meio dessas

entrevistas com os dirigentes do Sindicato da Indústria da Construção Civil

(SINCUSCON-DF), identificou-se três categorias de empresas imobiliárias,

segundo o número de realizações.

Como empresas de grande porte em atuação no mercado imobiliário tem-se


a CONBRAL, PAULO OCTÁVIO, VIA, LIDER, ENCOL, OK46; as empresas média
são a ANTARES, HC CONSTRUTORA, SILCO ENGENHARIA, EMPLAVI,
VAGON, VILELA CARVALHO, REAL ENGENHARIA E LUNER; e as empresas de
pequeno porte são a SOLTEC, IP, MGONÇALVES, DINÂMICA, COL, MULTICOM,
e INTERMEDIUM.

45
É um tipo de entrevista que no lugar de responder à pergunta por meio de diversas alternativas
pré-formuladas, visa obter do entrevistado o que ele considera os aspectos mais relevantes de
determinado problema. Dessa maneira, a entrevista estruturada procura saber que, como e por
que o fenômeno ocorre, em lugar de determinar sua freqüência. (Richardson & colaboradores;
1999; 3ª edição).
46
A ENCOL E OK não encontram-se atuando no mercado imobiliário de Brasília e o Grupo Osório
Adriano iniciou sua atuação, lançado prédios residenciais de alto luxo na cidade de Taguatinga,
dentro da moderna concepção de condomínio residencial com serviços de apart hotel.
193

Anexo 2 - PESQUISA DINÂMICA IMOBILIÁRIA E ESTRUTURAÇÃO


INTRA-URBANA
QUESTIONÁRIO SEM FINS LUCRATIVOS
USO EXCLUSIVAMENTE CIENTÍFICO

No. _____________ Data ___/____/_____


Entrevistador: ________________________

ADQUIRENTES DE IMÓVEIS

1. Idade do adquirente: _______anos

2. Gênero do adquirente: ( 1 ) Feminino ( 2 ) Masculino

3. Estado Civil: ( 1 ) Casado ( 2 ) Solteiro ( 3 ) Separado ( 4 ) Viúvo (5)


Outros __________

4. Cor: ( 1 ) Branca ( 2 ) Preta ( 3 ) Amarela ( 4 ) Parda ( 5 ) Indígena

5. Faixa de Renda do Adquirente: ( 1 ) Até 1 s.m. ( 2 ) 1 a 3 s.m. ( 3 ) 3 a 5 s.m.


( 4 ) 5 a 10 s.m.
( 5 ) + 10 s.m.

6. Renda Familiar: ( 1 ) Até 2 s.m. ( 2 ) 2 a 5 s.m. ( 3 ) 5 a 10 s.m. ( 4 ) 10 a 15 s.m.


( 5 ) + 15 s.m.

7. Número de pessoas que contribuem para a renda familiar:

8. Grau de Instrução: ( 1 ) Nenhum ( 2 ) Alfabetizado ( 3 ) 1o grau ( 4 ) 2o grau (5


) 3o grau
( 6 ) Mestrado / Doutorado

9. Ocupação Profissional:
a ) Profissão:
b ) ( 1 ) empregado ( 2 ) autônomo ( 3 ) empregador ( 4 ) não remunerado
( 5 ) aposentado
c ) ( 1 ) Funcionário público ( 2 ) indúst. constr. civil ( 3 ) outra atividade indúst.
( 4 ) comércio
( 5 ) agricultura ( 6 ) serviço superior ( 7 ) serviço inferior ( 8 ) Outros

10. Finalidade do imóvel adquirido:


( 1 ) Moradia Própria ( 2 ) Comprou para terceiros (filhos, parentes, etc...)
( 3 ) Alugar ( 4 ) Investimento ( 5 ) Outros _______________________
194

11. A decisão de compra do imóvel foi: ( 1 ) Individual ( 2 ) Familiar ( 3 ) Cônjuge

12. Já reside no imóvel que você está comprando ? ( 1 ) Sim ( 2 ) Não

13. Imóvel Anterior:


A) Localidade ____________________
B) Tipo: ( 1 ) casa ( 2 ) apto ( 3 ) outro ____________________
C) No . de dormitórios ____________
D) No . de moradores _____________

14. O tipo de vizinhança era diferente de você na localidade em que você morava ? ( 1 )
Sim ( 2 ) Não
Porque ?

15. Saiu do imóvel por causa localização ou do imóvel em si ?

16. Quais os fatores que levaram a sair do imóvel e a comprar o imóvel novo ?
A) ______________
B) ______________
C) ______________

17. Escolha entre as opções abaixo o porquê de você ter saído do imóvel anterior e
enumere de 1(maior) a 3(menor) os motivos mais importantes:

Em relação ao bairro:
distância trabalho distância escola violência
distância parentes status barulho
distância comércio transporte conflito com vizinhos
distância lazer proximidade favelas problema c/ infra-estrutura (falta
água,
iluminação pública,
saneamento, alagamento)

Em relação ao imóvel:
tamanho do imóvel falta de garagem falta de elevador
falta de varanda preço do condomínio IPTU

18. Imóvel adquirido:


A) Localidade
B) Tipo: ( 1 ) casa ( 2 ) apto ( 3 ) outro ____________________
C) No. de dormitórios
D) No. de moradores

19. O tipo de vizinhança para onde você vai é diferente de você ? ( 1 ) Sim (2
) Não
Porque ?

20. O Imóvel adquirido é: ( 1 ) Novo ( 2 ) Usado


195

21. Você considera sua renda: ( 1 ) menor ( 2 ) maior ( 3 ) igual a sua


vizinhança anterior

22. Você acha que vai para um bairro cuja vizinhança tem renda: (1 ) menor ( 2 ) maior
( 3 ) igual a sua

23. A compra foi intermediada por: ( 1 ) corretor ( 2 ) advogado ( 3 ) proprietário do


imóvel ( 4 ) outros

24. Tipos de recursos utilizados na aquisição do imóvel:


( 1 ) Poupança ( 2 ) Financiam. Banco ( 3 ) Direto incorporador ( 4 ) Familiares ( 5 )
FGTS
( 6 ) Outros

25.O Imóvel em que residia era: ( 1 ) próprio ( 2 ) alugado ( 3 ) cedido ( 4 ) de


familiares
( 5 ) outros

26. Vendeu imóvel de sua propriedade para adquirir este? ( 1 ) sim ( 2 ) não

27. Qual o valor do imóvel adquirido? (R$/US$) ______________________

28. Trajetória residencial no Distrito Federal: (Aonde está morando? / Onde morou antes?
– Até 5 mudanças)
A – alugado C- cedido P – próprio O –outros

Ano Localidade Ocupação Condição De Ocupação


Profissional Do Imóvel
Residência Trabalho

* Se a localidade for fora do Distrito Federal, colocar o município / Estado

29. Assinale os fatores mais importantes que estariam associados à aquisição do imóvel:
( ) melhoria salarial nos últimos 2 anos
( ) casamento
( ) separação
( ) nascimento de filhos
( ) recebimento de herança ou doação familiar
( ) insatisfação com o local de residência anterior
( ) insatisfação com as características do imóvel anterior
( ) aquisição de casa própria
196

30. Dentre os seguintes termos associados à troca de residência na cidade, sublinhe 3


que você considera estarem associados à sua decisão pelo imóvel adquirido; e numere
de 1 (maior) a 3 (menor) os mais importantes:

Em relação à localidade: (1 a 3)
já morou no bairro transporte símbolo status
oportunidade de negócio
proximidade trabalho praia qualidade do bairro valorização
proximidade parentes/filhos verde vizinhos
proximidade comércio associação moradores
proximidade escola melhor vista da cidade
proximidade lazer

Em relação ao imóvel: (1 a 3)
conforto imóvel conforto condomínio amigos
tamanho do imóvel propriedade garagem
valor do imóvel segurança elevador
preço condomínio IPTU mais barato varanda

31. Quantos imóveis visitou antes de decidir pelo adquirido?

1–5 5 – 10 10 – 20 Mais de 20
Em Geral
Na Localidade

32. Quantos meses procurou o imóvel novo ?

33. Informação sobre o imóvel foi adquirida :


( 1 ) jornal ( 2 ) TV ( 3 ) panfleto ( 4 ) amigos/parentes ( 5 ) corretor ( 6 ) outros
_____________

34. Qual a localidade do seu trabalho? ___________________

35. Qual(is) o(s) meio(s) de transporte utilizado: ( 1 ) carro/moto ( 2 ) ônibus (3)


trem ( 4 ) metrô
( 5 ) outros

36. Quantos de cada transporte? 1___________ 2____________

37. Qual o tempo médio de deslocamento para o local de trabalho de sua moradia atual?
____________

38. Qual o tempo médio de deslocamento para o local de trabalho de sua moradia futura?
___________

39. Quanto tempo até o ponto do ônibus atual ?

40. Quanto tempo até o ponto do ônibus futuro ?

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