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do CEE Fiocruz
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Os principais fatores que atuam diretamente na perda da biodiversidade são o uso não
sustentável ou alterações da terra e do mar, a superexploração da natureza, as mudanças
climáticas a poluição e a invasão/introdução de espécies exóticas invasoras.
O principal resultado do Segmento de Alto Nível da primeira parte da COP15, foi a adoção
da Declaração de Kunming5, em 13 de outubro, firmada por mais de uma centena de
países. A Declaração foi intitulada Civilização ecológica: Construindo um futuro
compartilhado para toda a vida na Terra.
DE SAÚDE ÚNICA
O texto recorda e se situa no contexto da Década de Ação das Nações Unidas para o
Desenvolvimento Sustentável, da Década das Nações Unidas para Restauração de
Ecossistemas e da Década das Nações Unidas para Ciência do Oceano, assim como, da
Declaração de Cancún sobre a Integração da Conservação e Uso Sustentável da
Biodiversidade para o Bem-Estar, da Declaração de Sharm el Sheikh sobre o Investimento
na Biodiversidade para as Pessoas e o Planeta, e da Cúpula das Nações Unidas sobre
Biodiversidade de setembro de 2020, cujo tema, recordemos, foi Ação Urgente sobre
Biodiversidade para o Desenvolvimento Sustentável.
Apesar de ser um documento político inicial e ainda sem metas claras, a Declaração de
Kunming incorpora o saber científico e alerta para a necessidade de ações integradas em
todos os setores, dentre eles a saúde, encorajando a adoção de abordagens de Saúde
Única.
Preâmbulo da Declaração
Reconhece também que “os principais fatores diretos da perda de biodiversidade são as
mudanças no uso da terra/mar, a superexploração, as mudanças climáticas, a poluição e as
espécies exóticas invasoras”, mas não faz qualquer menção ao que consideramos a causa
das causas, ou seja, o modelo de desenvolvimento e de produção e consumo que marcam a
etapa atual do capitalismo global.
Observa que é necessária “a combinação de medidas que visem deter e reverter a perda de
biodiversidade”, o que incluiria mudanças no uso da terra e do mar, conservação e
restauração de ecossistemas, mitigação das mudanças climáticas, redução da poluição,
controle de espécies exóticas invasoras e prevenção da exploração ambiental excessiva,
bem como ações para transformar os sistemas econômico-financeiros e garantir a produção
e o consumo sustentáveis e reduzir o desperdício; afirma que nenhuma dessas medidas
isoladamente, nem em combinações parciais, é suficiente, e que a eficácia de cada medida
é potencializada pela outra.
A nosso ver, esse parágrafo preambular é paradoxalmente avançado pelo conjunto de
ideias, mas problemático pelo uso de vocábulos ambíguos ou que expressam ações
insuficientes, como é o caso mitigação, excessiva, redução etc. Esses termos deverão ser
transformados em métricas-alvo para que haja avanços significativos. Por enquanto, a única
métrica existente nesta Declaração é que os países devem preservar 30% das suas terras e
oceanos até 2030, uma meta conhecida como ’30 por 30 ‘, que foi reconhecida pela sessão
da COP15 de Kunming.
Compromissos
Como se pode observar, uma agenda ampla e ambiciosa, que repete alguns mantras já
ecoados no último decênio, mas que são muito importantes de serem reafirmados no
contexto atual de aprofundamento da perda de biodiversidade em todo o planeta. No
entanto, os comprometimentos não se refletiram em metas específicas para conter
extinções em massa de espécies. O próprio ministro do Meio Ambiente da China, Huang
Runqiu, país que preside a COP15, disse aos delegados da conferência que “a declaração é
um documento de vontade política, não um acordo internacional vinculante”.
Reações globais
A reação à Declaração foi positiva na maior parte dos países e grupos de países do mundo.
Inúmeras agências das Nações Unidas manifestaram-se com propostas de adesões desde
suas particulares áreas de atuação. A Presidência do Conselho da União Europeia saudou
positivamente a Declaração de Kunming, logo após sua divulgação. O G7 já havia
manifestado posição favorável à maioria das aspirações e compromissos da COP15, nos
itens 42 e 43 do seu Carbis Bay G7 Summit Communiqué6, mas não se manifestou
especificamente sobre a Declaração. O G20 vai se reunir neste final de outubro e espera-se
uma manifestação de apoio à Declaração. Os Estados Unidos da América, que até hoje não
ratificou a CDB, manteve seu estridente silêncio habitual.
A World Wide Fund for Nature (WWF) saudou a combinação de medidas presentes na
Declaração, que inclui tanto ações de conservação, como ações para abordar a produção e o
consumo insustentáveis, pois ambos são imprescindíveis para assegurar um mundo
favorável à natureza nesta década. Por outro lado, ressaltou que há um extenso caminho
para uma abordagem governamental implementada por todas as partes da CDB, mas a
participação de ministros de economia e finanças, agricultura, desenvolvimento e meio
ambiente demonstra que os governos estão começando a reconhecer que a biodiversidade
deve ser tema prioritário em todas as áreas.
De acordo com a Agência Reuters, a Declaração de Kunming pede uma “ação urgente e
integrada”, que reflita as considerações sobre a biodiversidade em todos os setores da
economia global. Mas questões cruciais como o financiamento da conservação em países
mais pobres e o compromisso com cadeias de abastecimento mais amigáveis com a
biodiversidade foram deixadas para serem discutidas na segunda etapa da COP15, em abril
de 2022.
Para o Greenpeace7, o texto não contém os avanços suficientes e esperados na maioria dos
temas polêmicos, apesar dos tímidos intentos. O comunicado da ONG acrescenta que,
embora sejam importantes metas ambiciosas, como proteger pelo menos 30% das áreas
terrestres e marinhas até 2030, são imprescindíveis compromissos governamentais
concretos com estratégias de implementação e meios reais para atingi-las. Ademais, as
metas devem reconhecer os direitos dos povos indígenas e das comunidades locais, e seu
papel fundamental na preservação da natureza e da biodiversidade.
ESPERANÇA
Com a perda de espécies atingindo seu ritmo mais rápido em 10 milhões de anos, o avanço
das mudanças climáticas e a previsão de novas epidemias, a declaração de Kunming traz
uma nova esperança. A Declaração pode ter parecido apressada, mas as negociações sobre
propostas mais concretas ocorrerão em 2022, culminando na segunda parte da COP15 em
abril-maio. Espera-se que o debate suscitado pela Declaração de Kunming ecoe nos
próximos fóruns globais a que se destina, como o High-Level Political Forum do Ecosoc 2022
sobre a Agenda 2030, e a própria Assembleia Geral das Nações Unidas de 2022. A
sociedade civil global e nacional tem papel fundamental na cobrança de que as promessas
virem, finalmente, ações concretas na proteção e restauração da biodiversidade. O planeta
não pode mais esperar!
1 Goldfarb, B. Edge of Existence: As climate change and habitat loss push wildlife to the
brink, the time to protect biodiversity is now. The Nature Conservancy August 27,
2021 https://www.nature.org/en-us/magazine/magazine-articles/protect-biodiversity-now/
2 Keesing F et a.l Impacts of biodiversity on the emergence and transmission of infectious
diseases. Nature 468.7324: 647-652,
2010. https://www.nature.com/articles/nature09575.pdf
3 Buss PM; Magalhães DP. As estreitas relações entre a pandemia e a biodiversidade. Centro
de Estudos Estratégicos blog [Internet], 18 jan. 2021. Acesso: https://www.cee.fiocruz.br/?
q=As-estreitas-relacoes-entre-a-pandemia-e-a-biodiversidade
5
Ver: https://www.cbd.int/doc/c/df35/4b94/5e86e1ee09bc8c7d4b35aaf0/kunmingdeclaration
-en.pdf
6 Ver: https://www.consilium.europa.eu/media/50361/carbis-bay-g7-summit-
communique.pdf , itens 42 e 43, pg.17
7 Ver: https://www.greenpeace.org/international/press-release/49923/kunming-
declaration-announced-at-un-convention-on-biological-diversity-greenpeace-response/