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INSTITUTOS FEDERAIS: EDUCAÇÃO, GESTÃO E ATUAÇÃO

Reitoria do IFNMG
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Catalográfica Elaborada pela Bibliotecária Elciax Cristina de Sousa
- CRB/6 2065

I59i Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais


2018 Institutos federais: educação, gestão e atuação / André Luis Rabelo
Cardoso; Iza Manuella Aires Cotrim Guimarães; Edson Antunes Quaresma
Júnior (organizadores). – Montes Claros, MG: IFNMG, 2018.
118 p.: il.

v. 1
ISBN: 978-85-67611-27-3
Inclui referências

1. Prática de ensino. 2. Educação Profissional. 3. Rede Federal de


Educação Profissional e Tecnológica. I. Cardoso, André Luis Rabelo, org. II.
Guimarães, Iza Manuella Aires Cotrim, org. III. Quaresma Júnior, Edson
Antunes, org. IV. Título.

CDD: 371.3
Editora IFNMG
Montes Claros-MG/2018
Colaboração:

Roberta Silva Santos


Revisão

Karina Carvalho de Almeida


Projeto Gráfico/Diagramação/Capa
Reitor do IFNMG
Prof. José Ricardo Martins da Silva
Diretor-Executivo
André Luís Rabelo Cardoso
Pró-Reitor de Administração
Prof. Edmilson Tadeu Cassani
Pró-Reitor de Ensino
Prof. Ricardo Magalhães Dias Cardozo
Pró-Reitora de Extensão
Profª. Maria Araci Magalhães
Pró-Reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação
Prof. Rogério Mendes Murta
Pró-Reitor de Desenvolvimento Institucional
Prof. Alisson Magalhães Castro
Diretor de Gestão de Pessoas
Prof. Rafael Farias Gonçalves
Diretora de Assuntos Estudantis e Comunitários
Profª. Ana Alves Neta
Diretor do Centro de Referência em Formação e Educação a Distância
Prof. Antônio Carlos Soares Martins
Diretor-Geral Campus Almenara
Prof. Joan Brálio Mendes Pereira Lima
Diretor-Geral Campus Araçuaí
Prof. Aécio Oliveira de Miranda
Diretor-Geral Campus Arinos
Prof. Elias Rodrigues de Oliveira Filho
Diretor-Geral do Campus Diamantina
Prof. Júnio Jáber
Diretor-Geral Campus Januária
Prof. Cláudio Roberto Ferreira Mont’Alvão
Diretor-Geral Campus Montes Claros
Prof. Renato Afonso Cota Silva
Diretora-Geral Campus Pirapora
Profª. Joaquina Aparecida Nobre da Silva
Diretor-Geral Campus Salinas
Prof. Wagner Patrício de Sousa Júnior
Diretor-Geral Campus Teófilo Otoni
Prof. Renildo Ismael Félix da Costa
Diretor do Campus Avançado Janaúba
Prof. Fernando Barreto Rodrigues
Diretor do Campus Avançado Porteirinha
Prof. Pedro Paulo Pereira Brito
André Luis Rabelo Cardoso
Administrador. Doutorando em Política Pública pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestre em Gestão Pública pela
Universidade de Brasília. Especialista em Contabilidade pela Faculdade Integrada de Jacarepagua. Graduação em Administração pela
Universidade Estadual de Montes Claros. Atualmente é Diretor Executivo e Reitor Substituto do IFNMG. Tem experiência na área
de Licitações, Compras Governamentais, Orçamento Público, Execução Orçamentária, dentre outros. Possui pesquisas nas áreas de
Política e Administração Pública, com temas ligados a: Administração Pública, Capacidade Estatal, Estado e Sociedade, Democracia,
Qualidade do Gasto Público, Burocracia, Reforma Gerencial, Implementação de Políticas Públicas.

Edson Antunes Quaresma Júnior


Administrador. Doutorado em Administração pela UFMG, com Programa de Doutorado Sanduíche na Universidade de Leicester-
Inglaterra com fomento da CAPES. Mestre em Educação Cultura e Organizações Sociais pela FUNEDI/UEMG, especialista em
Docência do Ensino Superior pela Faculdade Santo Agostinho, com graduação em Administração pela Universidade Estadual de
Montes Claros. Atua como docente desde 2009, desde os níveis de ensino médio\técnico, até a graduação e pós-graduação lato e stricto
sensu. Atualmente é professor EBTT com dedicação exclusiva no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de
Minas Gerais e Presidente da Fundação de Apoio ao IFNMG-FADETEC. Parecerista de revistas nacionais e internacionais, é membro
de comissões para avaliação de credenciamento e recredenciamento de cursos e instituições de ensino. Atualmente se interessa pela
discussão sobre tecnologias e a criação de instituições voltadas para o ensino não formal, análise do discurso e crítica organizacional.

Iza Manuella Aires Cotrim Guimarães


Professora do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG), na área de Didática e Fundamentos da Educação. Doutoranda em
Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em Saúde Pública com ênfase na Gestão do Trabalho e da Educação
na Saúde pela Escola Nacional de Saúde Pública/Fiocruz. Possui formação pedagógica pelas Universidades de Ciências Aplicadas
de Tampere (HAMK) e Hämeenlinna (HAMK), ambas na Finlândia, por meio dos Programas “Teachers for the Future” e “Finnish
Training the Trainers (FiTT)”. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Educação Profissional, atuando principalmente
nos seguintes temas: currículo integrado, evasão escolar, ferramentas digitais e metodologias ativas.

Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Lista de Avaliadores Ad Hoc

Adálcio Carvalho de Araújo UEMG

Admilson Eustáquio Prates IFNMG

Adriana Leal Abreu Uergs

Alcino Franco de Moura Júnior Unimontes e FIPMoc

Alexandre Fonseca D’Andrea IFPB

Alexandre Nascimento de Almeida UnB

Lista de Avaliadores Ad Hoc


Ana Clara Gonçalves Alves de Meira IFNMG

Ana Paula Paes de Paula UFMG

André Geraldo da Costa Coelho IFNMG

Antônio Carlos Soares Martins IFNMG

Azenaide Abreu Soares Vieira IFMS

Bruna Mendes Oliveira IFPA

Carla Regiani Conde Universidade de Santo Amaro (Unisa)

Edna Guiomar Salgado Oliveira IFNMG

Edna Ribeiro de Freitas IFNMG

Elisangela Almeida Barbosa IFMT

Fábia Magali Santos Vieira Unimontes

Felipe Fróes Couto Unimontes

Flávia Sueli Fabiani Marcatto UNIFEI-MG

Fredy Coelho Rodrigues IFSULDEMINAS

Gilmer Jacinto Peres CEFET-MG

Giuliana de Sá Ferreira Barros IFNMG Salinas

Helder Luiz Palmieri Caldas IFNMG

Hellen Vivian Moreira dos Anjos IFNMG

Ione dos Santos Velame IFG

Izabelly Dutra Fernandes UEPB/Secretaria Estado de Educação Paraíba

Jamylle Rebouças Ouverney King IFPB

Volume 1
Jeremias Pereira da Silva Arraes UnB

Joelma de Fátima Mendes Bandeira IFNMG

José Júlio Cesar do Nascimento Araujo IFAC

June Marize Castro Silva Unimontes

Kleber Carvalho dos Santos IFNMG

Lucas Casagrande UFRGS

Luciana Xavier Magalhães UnB

Maria Aparecida Colares Mendes IFNMG

Marize Lyra Silva Passos IFES

Nathalia Helena Alem IFBA

Nilva Schroeder IFSC

Nivea Alves de Almeida UFMG

Renata Veloso Santos Policarpo IFMG

Roberto Comini Frota IFNMG

Rui Martins da Rocha IFNMG

Sandro José Conde IFSP

Sheylla Chediak IFRO

Shirley Mirone Martins Guimarães IFNMG

Simone Martins UFV

Suzana Alves Escobar IFNMG

Thiago Linhares Brant Reis Centro Universitário UniBH

Wilney Fernando Silva IFNMG

Zaira Bomfante dos Santos UFES

Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Apresentação
Caro leitor,

Este livro que chega a suas mãos é uma coletânea que reúne 17 artigos, voltados, primordialmente,
para as áreas de educação e gestão dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Trata-se de
um trabalho organizado por servidores de nosso IFNMG, em comemoração aos 10 anos da Rede Federal
de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, completados em dezembro do corrente ano.
Por meio deste, o leitor poderá ter acesso a um pouco do que tem sido a história do IFNMG, de
seus campi, servidores, cursos, alunos… e de outros Institutos Federais, cujas experiências são relatadas
em alguns dos artigos selecionados para o livro em questão. Enfim, terá, nesta obra, a oportunidade de
compreender um pouco das ações educacionais, socioeconômicas e culturais realizadas, não somente por
este Instituto como também pela Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica como um todo.
Ações que levam esperança e desenvolvimento a todas as comunidades atendidas pelos IFs, de forma
digna e ética.
Nosso desejo é que este livro sirva como fonte de pesquisa, para estudantes de dentro e fora do
Instituto, e de conhecimento, para a comunidade em geral e demais instituições que se interessarem por
temas relacionados à trajetória dos Institutos Federais.
Expresso aqui nossos sinceros agradecimentos aos autores dos artigos aqui publicados, por doarem
seu tempo e compartilharem seus saberes, em prol da visibilidade do trabalho realizado pelos Institutos
Federais perante a sociedade. Aos demais que também contribuíram para que este livro fosse publicado,
direcionamos também o nosso reconhecimento.
Que esta obra seja o marco inicial, o motivador para mais publicações que venham colaborar
na divulgação do avanço, cada vez maior e melhor, deste representante da Rede Federal de Educação.
Recebam minha gratidão e tenham todos uma boa leitura!

José Ricardo Martins da Silva


Reitor do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais

Volume 1
Esta é uma publicação comemorativa. Foi elaborada em razão dos 10 anos dos Institutos
Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, inaugurados em 2008. Um livro que congrega diversas
das características dessa rede pública de ensino e as apresenta em seu próprio processo de confecção.
Esse trabalho é uma iniciativa do Grupo de Pesquisa “Estado, Organizações e Desenvolvimento”
(GPEOD) do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG). Trata-se de um grupo multidisciplinar, que
tem como desafio pesquisar e promover a articulação entre ações de gestão nos Institutos Federais e atividades
de ensino, pesquisa e extensão.
A elaboração deste livro se deu por meio de Chamada Pública (Edital IFNMG nº 121, de 12 de abril de
2018), que teve como finalidade selecionar capítulos de produção acadêmico-científica, resultantes de pesquisas,
estudos teóricos e relatos de experiências sobre os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.
Nesse contexto, a definição de uma Chamada Pública como instrumento de divulgação e seleção se deu
por dois motivos: primeiro, por considerar os princípios de impessoalidade e transparência (todos os artigos
foram submetidos a uma avaliação cega por no mínimo três avaliadores Ad Hoc, pertencentes ao quadro dos
Institutos Federais e Universidades de todas as regiões do país); segundo, por possibilitar a submissão de
trabalhos por docentes e técnicos administrativos de diversas instituições, contribuindo, assim, para fortalecer a
Rede Federal de Educação, Ciência e Tecnologia.
Aliás, essa é uma característica que parece se ressaltar cada dia mais na Rede, que é exatamente sua
capacidade de atuar com capilaridade e abertura para a inclusão e integração regional. E isto, o leitor poderá
observar claramente neste livro, pois recebemos contribuições de todas as regiões, e não apenas dos Institutos
Federais (IF’s).
Infelizmente não foi possível publicar todos os artigos, já que o número de submissões (para imensa
satisfação da Comissão Organizadora, cabe registrar) foi bem superior à capacidade prevista. O edital previa
a publicação de aproximadamente 12 artigos, mas, considerando que 17 dos artigos obtiveram nota superior à
média de todos os artigos submetidos, a Comissão definiu pela organização do livro em dois volumes, segundo
os eixos temáticos previstos no edital, a saber:

Eixo 1: A gestão do espaço educacional nos Institutos Federais: desafios e oportunidades.


Eixo 2: Educação e práticas de ensino no contexto dos Institutos Federais: experiências significativas e/ou
inovadoras.
Eixo 3: A integração entre as práticas de ensino, pesquisa, extensão e gestão nos Institutos Federais.

Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Assim, este volume apresenta os artigos selecionados para o Eixo “Educação e práticas de ensino
no contexto dos Institutos Federais: experiências significativas e/ou inovadoras”. Esses artigos apresentam
experiências e resultados de pesquisas referentes aos seguintes temas, previstos na chamada pública:
Experiências curriculares inovadoras (construção e/ou implementação); Experiências
significativas no processo de ensino-aprendizagem: metodologias ativas e/ou ferramentas
digitais e/ou atividades colaborativas; Prática docente e aprendizagem centrada no estudante;
Educação à Distância nos Institutos Federais; Experiências, possibilidades e obstáculos para
a inclusão nos Institutos Federais; Evasão escolar na Educação Profissional e Tecnológica;
Experiências significativas para a formação de professores na Educação Profissional e Tecnológica.
Os artigos foram organizados segundo as temáticas enfocadas por cada um, partindo da formação
de professores em geral, muito bem representada pela experiência do Programa Institucional de Bolsa de
Iniciação à Docência (Pibid), passando pela articulação entre formação de professores, educação profissional
e construção da identidade docente. Em seguida, apresentamos os artigos relacionados diretamente às
experiências significativas com metodologias diferenciadas, ativas e centradas nos estudantes.
Importante ressaltar que, ainda que alguns artigos tenham seu enfoque numa área específica (como
estatística ou enfermagem, por exemplo), as estratégias neles relatadas podem ser aproveitadas em outras
áreas de ensino, com as devidas adequações, claro, justamente pelo seu caráter inovador e pela aproximação
com a realidade dos estudantes.
Assim, no que se refere à formação de professores em geral, temos o artigo “O papel do Pibid
para a permanência e êxito dos acadêmicos das licenciaturas no IFNMG – Salinas”. Esse estudo
evidencia a importância do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid) para o
fortalecimento das Licenciaturas, especialmente no que se refere ao combate à evasão, construção
da identidade docente e à vivência de experiências significativas para a formação de professores.
O artigo “O Ensino Médio integrado e as Licenciaturas nos Institutos Federais de Educação, Ciência
e Tecnologia” discute a articulação entre Ensino Médio integrado e a formação de professores, por meio de
pesquisa realizada com coordenadores e docentes de cursos de Licenciatura em Ciências Biológicas de três
Institutos Federais do estado de Minas Gerais. Trata-se de um trabalho de grande relevância, considerando
que a oferta do Ensino Médio integrado e dos cursos de licenciaturas compreende um significativo
percentual das vagas ofertadas pelos Institutos Federais (Lei nº 11.892/2008) e que, dentre os achados da
pesquisa, verificou-se que metade dos docentes entrevistados não possuem entendimento do Ensino Médio
integrado, apesar de algumas iniciativas de articulação verificadas.
A Licenciatura em Ciências Biológicas também foi objeto de estudo do trabalho “Exterioridades
da formação docente em Ciências Biológicas: um estudo com egressos do IFNMG – Campus Januária”.
Nesse estudo, egressos do curso manifestaram sobre suas expectativas, frustrações, vivências e desafios
relacionados ao curso de Licenciatura propriamente dito e à trajetória profissional em construção.
Importante ressaltar que, apesar desses dois últimos estudos terem se realizado em torno da
Licenciatura em Ciências Biológicas, seus resultados e discussão abrangem a formação docente como um
todo, evidenciando elementos importantes para a reflexão sobre as licenciaturas nos Institutos Federais.
Numa discussão articulada entre formação docente e metodologias ativas, o artigo “Elementos da
Educação do século XXI explorados em cursos de formação de professores” apresenta a experiência de
dois Institutos Federais em direção ao movimento “Educação para o Século XXI”. Os autores chamam
atenção para a necessidade de um reposicionamento do professor no processo de ensino-aprendizagem,
atuando, principalmente, como colaborador ativo e agente de mudança. Projetos, problemas e ferramentas
digitais são alguns dos elementos que configuram essa nova dinâmica.
Nessa mesma direção, o artigo intitulado “O Role-play como estratégia de ensino para a
Enfermagem” apresenta a experiência de um Instituto Federal com o desenvolvimento de uma estratégia
de ensino diferenciada, dinâmica e centrada nos estudantes no Curso Técnico em Enfermagem da
instituição. A articulação entre teoria e prática e aproximação com situações reais do mundo do trabalho
são características verificadas nessa estratégia.

Volume 1
Já o artigo “Uso de desenhos táteis para aumentar o acesso de deficientes visuais à informações
esportivas” apresenta uma experiência exitosa de educação inclusiva, demonstrando a importância da utilização
de metodologias inovadoras e abrangentes, que possam garantir mais que o acesso à instituição, mas também a
qualidade do processo de ensino-aprendizagem para todos os estudantes que ingressam nos Institutos Federais.
Por fim, o artigo “Projetos de ensino como recurso à aprendizagem estatística: um enfoque no
desenvolvimento do pensamento estatístico” possibilita o conhecimento de uma abordagem diferenciada para
o ensino de estatística, mais contextualizada e envolvente. Os estudantes têm uma participação mais ativa por
meio dessa estratégia, que além de focada na resolução de problemas, apresenta um caráter interdisciplinar.

Desejamos a todos, uma ótima leitura!

12 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


O PAPEL DO PIBID PARA PERMANÊNCIA E ÊXITO DOS ACADÊMICOS DAS LICENCIATURAS DO
IFNMG – SALINAS.......................................................................................................................... 15

O ENSINO MÉDIO INTEGRADO E AS LICENCIATURAS EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS NOS INSTITUTOS


FEDERAIS MINEIROS...................................................................................................................... 33
EXTERIORIDADES DA FORMAÇÃO DOCENTE EM CIÊNCIAS BIÓLOGICAS: UM ESTUDO COM OS
49
PRIMEIROS EGRESSOS DO IFNMG - CAMPUS JANUÁRIA.................................................................
ELEMENTOS DA EDUCAÇÃO DO SÉCULO XXI EXPLORADOS EM CURSOS DE FORMAÇÃO DE
66
PROFESSORES................................................................................................................................
O ROLE-PLAY COMO ESTRATÉGIA DE ENSINO PARA A ENFERMAGEM.............................................. 78
USO DE DESENHOS TÁTEIS PARA AUMENTAR O ACESSO DE DEFICIENTES VISUAIS A INFORMAÇÕES
ESPORTIVAS.................................................................................................................................... 88

PROJETOS DE ENSINO COMO RECURSO À APRENDIZAGEM ESTATÍSTICA: UM ENFOQUE NO


DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO ESTATÍSTICO....................................................................
103

Volume 1
14 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação
O PAPEL DO PIBID PARA PERMANÊNCIA E ÊXITO DOS
ACADÊMICOS DAS LICENCIATURAS DO IFNMG – SALINAS

Edna Guiomar Salgado Oliveira 1


Giuliana de Sá Ferreira Barros 2
Lílian Gleisia Alves dos Santos 3

Resumo: Com a iniciativa de contribuir para a formação docente, foi proposto, em 2007, no Brasil, o
Programa Institucional de Iniciação à Docência (PIBID). O PIBID é uma iniciativa para o aperfeiçoamento
e a valorização da formação de professores para a educação básica. O Programa concede bolsas a
acadêmicos de licenciatura, participantes de projetos de iniciação à docência desenvolvidos por Instituições

. Giuliana de Sá Ferreira Barros . Lílian Gleisia Alves dos Santos


de Educação Superior (IES), em parceria com escolas de educação básica da rede pública de ensino. Os
projetos devem promover a inserção dos estudantes dos cursos de licenciatura no contexto das escolas
públicas desde o início da sua formação acadêmica, para que desenvolvam atividades didático-pedagógicas
sob orientação de um docente da licenciatura e de um professor da escola. Nesse contexto, a pesquisa
pretendeu conhecer a relevância do PIBID na definição da identidade docente dos bolsistas dos cursos
de Licenciatura (Matemática, Química, Ciências Biológicas e Física) do IFNMG - Campus Salinas, bem
como compreender o papel das bolsas do Programa na permanência do acadêmico no curso. Trata-se de
uma pesquisa com abordagem qualitativa, do tipo exploratório, que utilizou o questionário online para
coleta de dados com 117 acadêmicos. Os resultados mostraram que os bolsistas pretendem seguir carreira
docente; que as bolsas contribuem para permanência no curso e que o Programa tem dado resultados
exitosos.

Palavras-chave: PIBID; Formação Inicial de professores; política pública.

Edna Guiomar Salgado Oliveira

1
Professora de Didática e Fundamentos da Educação do IFNMG Campus Salinas. Doutora em Educação/ Formação de Professores
Email: edna.oliveira@ifnmg.edu.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/8549987367452713
2
Professora de Didática e Fundamentos da Educação do IFNMG Campus Salinas. Doutoranda em Educação/ Inclusão Social
Email:giuliana.sa@ifnmg.edu.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6239296315251066
3
Professora de Didática e Fundamentos da Educação do IFNMG Campus Salinas. Mestre em Educação/ Currículo e Prática Docente
Email: lilian.santos@ifnmg.edu.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/3691039570938526

Volume 1 15
THE ROLE OF PIBID FOR PERSISTENCE AND SUCCESS FOR
ACADEMICS OF THE LICENSEES OF IFNMG - SALINAS

Abstract: Intending to contribute to teachers training it was proposed in Brazil, in 2007, the Institucional
Scholarship Program of Teacher Training/ Programa Institucional de Iniciação à Docência (PIBID). The PIBID
is a public policy with an initiative to improvement and valorization of teachers training to basic education.
The program grants scholarships to the students of Teaching Courses who engage in projects developed by
Institutions of Higher Education (IHE) in partnership with public schools of basic education. The projects must
promote the inclusion of the teaching courses’ students in the public schools since the beginning of their majors
so that they can develop pedagogical activities under orientation of the teaching course’s professor and the
public school teacher. In this context, the research intended to understanding the relevance of PIBID in defining
the identity of the scholarship holders in the following Teaching Courses (Mathematics, Chemistry, Biology
and Physics) at IFNMG- Salinas campus. It also sought to comprehend the role of the Program’s scholarships
for the students to keep on their studies. It is a qualitative exploratory research that used an online questionnaire
for data collection, 117 students were surveyed. The results have shown that the scholarship holders intend to
pursue a teaching career; the scholarships contribute for the students keep on their studies and the Program has
given successful results.

Key words: PIBID; Initial Teacher Training; Public Policy.

16 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


INTRODUÇÃO

O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID – é um Programa de incentivo


e valorização do magistério e de aprimoramento do processo de formação de docentes para a educação
básica, vinculado à Diretoria de Educação Básica Presencial – DEB –, da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior – CAPES. Proposto em 2007, teve sua regulamentação mais detalhada pelo
Decreto n. 7219/2010 (BRASIL, 2010).
Um dos objetivos do Programa Institucional de Iniciação à Docência (PIBID) é a elevação da
qualidade das ações acadêmicas voltadas à formação inicial de professores nos cursos de licenciatura das
instituições públicas de educação superior, assim como a inserção dos licenciandos no cotidiano de escolas
da rede pública de educação, o que promove a integração entre educação superior e educação básica.
O Programa visa também a proporcionar aos futuros professores participação em experiências
metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter inovadoras e interdisciplinares que busquem a
superação de problemas identificados no processo de ensino-aprendizagem.
A intenção do Programa é unir as secretarias estaduais e municipais de educação e as universidades

. Giuliana de Sá Ferreira Barros . Lílian Gleisia Alves dos Santos


públicas em favor da melhoria do ensino nas escolas públicas em que o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (IDEB) esteja abaixo da média nacional. Entre as propostas do PIBID, está o incentivo
à carreira do magistério nas áreas da educação básica com maior carência de professores com formação
específica: Ciência e Matemática, de 6º a 9º do ensino fundamental, e Física, Química, Biologia e
Matemática para o ensino médio (BRASIL, 2010).
O PIBID oferece bolsas para que alunos de licenciatura exerçam atividades pedagógicas em escolas
públicas de educação básica, contribuindo para a integração entre teoria e prática, para a aproximação
entre universidades e escolas e para a melhoria de qualidade da educação brasileira. Para assegurar os
resultados educacionais, os bolsistas são orientados por coordenadores de área – docentes das licenciaturas
– e por supervisores - docentes das escolas públicas – que exercem suas atividades na escola atendida e que
também recebem bolsas para acompanharem o desenvolvimento dos bolsistas na escola.
O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais – IFNMG – é a
Instituição Federal de Ensino Médio, Técnico e Superior que está presente em toda região Norte de Minas
Gerais, expandindo-se até o Vale do Jequitinhonha, Mucuri e Noroeste de Minas. Em 2010, o IFNMG

Edna Guiomar Salgado Oliveira


implantou cursos de licenciatura no Campus Salinas, para suprir a demanda de professores na região
nas respectivas áreas de conhecimento – Química, Física, Ciências Biológicas e Matemática –, pois a
instituição pública de ensino superior mais próxima da região a oferecer cursos de licenciatura situava-se
a aproximadamente 200 quilômetros do município de Salinas.
Desta forma, o IFNMG fortaleceu o resgate da identidade cultural da região e a busca pelo seu
desenvolvimento pleno no seio da comunidade local e regional, preparando recursos humanos para o
desempenho das profissões exigidas pela sociedade e necessárias para um contexto que é permeado por
contínuas e profundas transformações (IFNMG/ Salinas, 2010, p. 8).
O IFNMG participa do PIBID desde 2011, com quatro cursos de licenciatura –Química, Ciências
Biológicas, Física e Matemática –, no Campus Salinas/MG, com nove subprojetos vinculados aos referidos
cursos. Os subprojetos são núcleos de estudo e trabalho organizados por componente curricular vinculado
à educação básica. No caso em questão, o IFNMG/ Campus Salinas possuía : dois subprojetos vinculado
à matemática, dois vinculados à física, dois vinculados à química e três subprojetos vinculados à biologia.
Nesse contexto, o PIBID aparece como forte aliado para a qualidade do ensino básico nas regiões do Norte
e dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, uma vez que nossos acadêmicos são oriundos dessas regiões.
O mapa abaixo aponta as cidades das quais são provenientes os acadêmicos que participam do
PIBID no IFNMG/ Campus Salinas, em 2017. Essas cidades incluem-se nas regiões com indicadores
sociais e educacionais que estão aquém da média nacional.

Volume 1 17
Figura I: Origem dos bolsistas na região Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha

Fonte: elaborado pelas autoras

Quanto ao perfil dos alunos dos cursos de licenciatura, vê-se que os acadêmicos são, na maioria, da
cidade de Salinas, e os demais moram próximo ao IFNMG/ Campus Salinas, em cidades vizinhas.
Esta pesquisa teve como objetivo compreender as contribuições do PIBID na definição da identidade
docente dos bolsistas dos cursos de Licenciatura (Matemática, Química, Ciências Biológicas e Física) do
IFNMG – Campus Salinas, bem como compreender o papel das bolsas do Programa para permanência e êxito
do acadêmico no curso.

O PIBID E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES

A falta de conexão entre a formação nas Universidades e o campo da prática é apontada por Zeichner
(2010) como um problema eterno na formação para a docência. O distanciamento entre os espaços de formação
e de trabalho deve constituir fator de grande preocupação entre os responsáveis pela formação dos professores,
pois a escola é o espaço estruturante da atividade docente. Tardif (2011) aponta que os saberes profissionais
dos professores são situados, ou seja, são construídos e ganham sentido em função dos contextos de trabalho
nos quais são exercidos. Ainda questiona o modelo universitário de formação profissional ao discutir o papel
das faculdades de educação na formação dos futuros professores, observando que os cursos são geralmente
idealizados segundo um modelo apenas “aplicacionista” (TARDIF, 2011, p. 270).
Saviani (2009), Manrique (2008) apontam que um dos principais problemas dos cursos de licenciatura é
trabalhar conhecimentos específicos e pedagógicos de forma desarticulada, descontextualizada e sem significado
para os licenciados, o que os impede de compreender a importância desses conhecimentos para o trabalho como
professor. Outro autor que faz crítica a esse modelo de formação é Arroyo (2007), afirmando que as propostas
curriculares, diretrizes e normas tomam como referência modelos idealizados de docência, desconsideram a
prática concreta dos professores e suas condições de trabalho. Assim, “[...] pensar a formação numa abordagem
que vá além da acadêmica, envolvendo o desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional da profissão
docente”, faz-se urgente (NUNES, 2001, p.28).
Dessa forma, compreender a constituição do ser professor é compreender sua identidade, que perpassa
diversos fatores que vão desde a sua socialização primária, enquanto aluno da escola, seguindo para a formação

18 institutos feDeRais: eDucação, Gestão e atuação


inicial em cursos de licenciatura, até tornar-se professor de fato, ficando em formação permanente. Pimenta
(2002, p.59) afirma que “a identidade não é um dado imutável, nem externo, que se possa adquirir como
uma vestimenta. É um processo de construção do sujeito historicamente situado”.
Especificamente sobre a identidade profissional dos professores, Garcia, Hypólito e Vieira (2005,
p. 54-55) compreendem como:

[…] uma construção social marcada por múltiplos fatores que interagem entre si, resultando numa
série de representações que os docentes fazem de si mesmos e de suas funções, estabelecendo,
consciente ou inconscientemente, negociações das quais certamente fazem parte de suas histó-
rias de vida, suas condições concretas de trabalho, o imaginário recorrente acerca dessa profissão.

Assim, discutir a identidade docente e correlacionar ao PIBID é fundamental para compreender as


contribuições que o Programa tem trazido para este aspecto na perspectiva do próprio acadêmico bolsista.
O PIBID, contudo, não é simplesmente um programa de bolsas. É uma proposta de incentivo e valorização
do magistério e de aprimoramento do processo de formação de docentes para a educação básica. “De fato,
nesse período ainda curto de sua existência, o PIBID já vem sendo reconhecido como uma política pública

. Giuliana de Sá Ferreira Barros . Lílian Gleisia Alves dos Santos


de alto impacto na qualidade da formação de professores” (GATTI, ANDRÉ, GIMENES, FERRAGUT,
2014, p.5).
Atrelada a essa discussão, verifica-se a necessidade de se pensar a licenciatura e seus potenciais
problemas, em especial, o esvaziamento dos cursos, dado o desprestígio social e salarial da carreira no
magistério, negligenciada historicamente. Nesse sentido, Diniz (2006) faz uma comparação quanto ao
número de candidatos por vaga nos cursos de licenciaturas e enfatiza que é consideravelmente menor que
os outros cursos oferecidos, ressaltando ser uma graduação menos procurada por aqueles que se debruçam
em estudos para passar no vestibular. “Essa diminuição na relação candidato/vaga no vestibular pode
significar um alerta em relação à falta de atrativos que as licenciaturas oferecem” (DINIZ, 2006, p. 84). Se
o ingresso já se mostra como um problema, sem atrativos, as taxas de evasão também são grandes.
Outra questão levantada é o distanciamento da Universidade com as escolas da educação básica.
Não raro, há acusações dos dois lados, uma que critica a prática dos professores, e a outra que nega a
teoria repassada pela universidade. O que se estabelece é um grande ruído, vozes silenciadas e pesquisas

Edna Guiomar Salgado Oliveira


encasteladas sob a égide da intelectualidade. Uma das propostas do PIBID é diminuir tais ruídos na
licenciatura. O professor se utiliza de experiências vivenciadas enquanto aluno dos bancos escolares,
podendo ressignificar as mesmas nas instituições de formação (TARDIF; RAYMOND, 2000). Assim, o
PIBID pode ser considerado um programa de ressignificação das licenciaturas.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa com abordagem qualitativa, do tipo exploratório, que utilizou questionário
online para coleta de dados. Os sujeitos da pesquisa foram 117 acadêmicos bolsistas do PIBID dos cursos
de licenciatura (Química, Física, Matemática, Ciências Biológicas) do Instituto Federal do Norte de Minas
Gerais – IFNMG/ Campus Salinas, no primeiro semestre de 2017. Retornaram 80 questionários, que foram
analisados à luz do referencial teórico. Os licenciandos bolsistas foram denominados ao longo do texto
como Pibidianos e foram nomeados como: P1, P2 e assim sucessivamente.
Optou-se, dado o volume de respostas abertas, por proceder em aglutinar as respostas por
semelhanças e criar categorias, o que permitiu abarcar um volume de respostas representativas do ponto
de vista das narrativas dos bolsistas. Verificou-se muita convergência nas respostas dos acadêmicos
participantes, conforme se observará nas análises a seguir expostas.

Volume 1 19
RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os “Pibidianos” são do curso de Licenciatura em Química, Física, Matemática e Ciências Biológicas.


Participaram da pesquisa 80 acadêmicos dos respectivos cursos, sendo que 74% são do sexo feminino, e 26%,
do masculino. Como outras pesquisas e dados nacionais apontam, a docência se faz, na sua grande maioria, por
contingente feminino. O Censo da educação básica aponta que as professoras representam 80,1%, e 19, 9% são
homens (INEP, 2009).
Quanto à idade dos acadêmicos, 90% estão entre 19 a 24 anos, o que assinala para uma clientela bem
jovem na licenciatura no campus do IFNMG/Salinas, mostrando que ingressaram no curso assim que concluíram
o Ensino Médio.
Com relação à renda familiar dos acadêmicos Pibidianos, 92% recebem entre um a dois salários mínimos,
e 8%, de dois a três salários. É notável que o fator socioeconômico influencie na escolha do curso, além de
assegurar a escolha do período noturno, o que favorece aos estudantes conjugarem trabalho e estudo.
Diniz (2006) expõe que o ingresso dos acadêmicos, nos cursos de licenciaturas, é recorrente devido a
influências relacionadas à situação socioeconômica e cultural dos candidatos. Assim,

A posse de capital escolar e cultural garante oportunidades diferenciais de ingresso no ensino superior ou
em diferentes cursos na Universidade, o que se relaciona com a origem social e que tem efeito de acumu-
lar continuamente esse tipo de capital simbólico. Por exemplo, isso pode elucidar a grande demanda e o
sucesso no vestibular de filhos de famílias de mais alta renda em cursos de prestigio maior, como medi-
cina e direito. Pode também elucidar o acesso a determinados cursos por candidatos de origem social em
frações de classe com menor posse de capital econômico e maior posse de capital cultural e, finalmente,
esclarecer o ingresso de alunos com menor posse de capital econômico e cultural nos cursos de menor
prestigio (DINIZ, 2006, p. 80, grifos do autor).

Os cursos de licenciaturas são notadamente considerados, em pesquisas, cursos de menor prestígio.


Esse fato pode estar associado às condições socioeconômicas e culturais vivenciadas pelos vestibulandos que
disputam uma vaga nessa modalidade de ensino. Por funcionar geralmente no período noturno, segundo Diniz
(2006), as pessoas que mais procuram pelas licenciaturas são aquelas que, por razões diversas, precisam trabalhar
durante o dia, não tiveram oportunidade de estudar em sua juventude, bem como almejam exercer uma atividade
com melhor remuneração à que atualmente recebem.
Essa pesquisa vai ao encontro do estudo de Viana (2016) sobre a licenciatura de Matemática no IFNMG,
que também destaca as condições econômicas dos discentes que, em sua maioria, não têm independência
financeira, “pois 55,4% são dependentes dos pais, e 8,6% necessitam de ajuda das bolsas e assistência estudantis
oferecidas pela instituição, sendo mencionado o Programa de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID)” (VIANA,
p.27, 2016).
Como afirmam Mota (2006) e Diniz (2006), a licenciatura é um curso em que a maioria do alunado é
dependente economicamente. Sendo assim, denota-se essa modalidade como um curso procurado por quem
possui poucas condições financeiras.
Desse modo, como enfatiza Diniz (2006), a renda familiar influencia na escolha do curso superior que o
vestibulando almeja, sobretudo é possível ver a interface entre relação econômica e capital cultural, considerando
que 80% dos acadêmicos são os primeiros da família a possuir o curso superior; 19% possuem irmãos com
ensino superior, apenas um acadêmico tem a mãe com ensino superior, e nenhum deles possui pai com ensino
superior. Como na pesquisa de Diniz (2006), os pais dos acadêmicos também possuem uma trajetória escolar
pouco privilegiada, sendo mais de 60% dos pais dos entrevistados pessoas que não conseguiram completar o
ensino fundamental, o que leva a crer que isso também tenha influenciado na escolha do acadêmico pelo curso
de licenciatura.
Perguntado aos Pibidianos o que os trouxe ao curso de licenciatura, 26% responderam que por falta de
opção e que gostariam de fazer outro curso; 33%, para continuar estudando, e 41%, porque se identificavam com

20 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


o curso. Observa-se que somando os resultados – falta de opção e continuar estudando – chegamos a 57%,
o que supera os 41% que vieram para o curso porque se identificam com a licenciatura.
Convergente a essa ideia, Mota (2006), em sua pesquisa, enfatiza que a falta de atrativos nos cursos
de licenciaturas está relacionada às baixas perspectivas remuneratórias e status social que os vestibulandos
têm em relação à profissão docente. Afirma ainda que o mercado de trabalho está sempre se modificando.
Sendo assim, as perspectivas profissionais dos acadêmicos podem ser consideravelmente variáveis.
Foram analisadas as respostas dos Pibidianos com relação ao nível de importância do PIBID para a
permanência no curso de licenciatura.

Gráfico I - Nível de importância do PIBID para permanência no curso

. Giuliana de Sá Ferreira Barros . Lílian Gleisia Alves dos Santos


Fonte: Elaboradas pelas autoras

Edna Guiomar Salgado Oliveira


Vê-se que a bolsa do PIBID de quatrocentos reais (R$400,00) tem alta importância na permanência
do acadêmico no curso de Licenciatura. Assim, é possível aqui entrelaçar os dados entre a renda familiar,
escolha do curso e posição geográfica do IFNMG Campus Salinas. Dificilmente os acadêmicos fariam
o curso superior se não encontrassem, via Instituto, a oportunidade em cursar o ensino superior, dado as
condições materiais dos mesmos e da região Norte de Minas, considerada uma das mais pobres do país.
No que se refere ao número de licenciados que concluem os cursos, Gatti (2010) enfatiza que,
“comparado aos cursos considerados de maior ‘prestígio’ na sociedade, é consideravelmente baixo o número
de formandos entre os ingressos nas licenciaturas, “que se situava na taxa média de 24%, conforme dados
do INEP/MEC (2006)” (GATTI, 2010, p. 07). Diante do exposto e tendo em vista dados da Instituição,
pode-se inferir que a taxa de evasão dos cursos em licenciatura do IFNMG/ Campus Salinas ainda é
acentuada, em especial nos cursos de Química, Física e Matemática, mas, pode-se afirmar que poderia ser
ainda maior se não houvesse as bolsas do PIBID que, de forma significativa, têm assegurado a permanência
dos acadêmicos nos cursos.
Também foi perguntado aos Pibidianos em que ou como aplicam o valor da bolsa. O gráfico abaixo
apresenta cinco pontos:

Volume 1 21
Gráfico II: A aplicação dos recursos da bolsa do PIBID por categoria

Fonte: elaborado pelas autoras

Com relação à importância, aplicação e destinação dos recursos da bolsa do PIBID, faremos
alguns destaques das narrativas: “Só tem me motivado a continuar no curso”; “ofereceu a permanência no curso,
pela falta de condições financeiras. Além, de auxiliar na decisão profissional”; “facilita a escrita/submissão de
trabalhos para ir em eventos” e

O programa é essencial para minha formação, pois além de apresentar as realidades da profissão docente,
possibilita um auxílio financeiro, de modo que eu tenho a disponibilidade maior de estudar e dedicar ao
meu curso, sem necessitar trabalhar. (P11)

Além de ser pouca a carga horária nos proporcionando mais tempo para estudar, o dinheiro vem a calhar
muito bem pra tirarmos xerox e vir pra escola, o Pibid nos ajuda a saber verdadeiramente se queremos ser
professores, nos aproximando da nossa futura realidade. ( P23,P56,P69)

Primeiramente, o PIBID foi o que desde os primeiros semestres do curso tem me assegurado condições
em carácter de permanência, pois, através deste, eu consigo me “ajeitar” e dividir, com familiares e cole-
gas, despesas como aluguel, alimentação, higienização, transporte etc. Além disso, o PIBID me dá condi-
ções em termos materiais para a permanência no curso também me habilita postura ética/moral para lidar
com senso crítico numa visão holística e transformadora perante o novo contexto educacional marcado
pelas inúmeras reformas.( P45, P68,P45, P8, P32)

Vê-se pelas narrativas dos pibidianos que a bolsa se torna suporte financeiro, permitindo a permanência deles no
curso. Importante observar que, quando esse suporte é citado, vem acenando algo a mais, há sempre um complemento
como: “mais tempo pra estudar e me dedicar a meu curso”, “ajuda a saber se verdadeiramente se queremos ser
professores”, “tem motivado a continuar no curso”, me habilita ética e moralmente para lidar com senso crítico”.
A próxima questão respondida pelos “Pibidianos” se referia à importância do PIBID para formação da identidade
docente. O gráfico a seguir assinala que 95% dos acadêmicos consideram o Programa como muito importante nessa
construção.

22 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Gráfico III - Nível de importância do PIBID na construção da identidade docente

. Giuliana de Sá Ferreira Barros . Lílian Gleisia Alves dos Santos


Fonte: elaborado pelas autoras

As justificativas trouxeram muitas nuances, das quais destacamos três categorias:

a) Ajudou na identificação com o curso

Entrei no curso com a ideia de que não queria exercer a docência, mas, ao conseguir o PIBID,
a visão que eu tinha de sala de aula mudou totalmente. ( P9, P18, P66, P52)

Edna Guiomar Salgado Oliveira


Antes do PIBID, eu tinha certeza absoluta de que eu não queria fazer licenciatura, a princípio
estava ali por estar. Mas o PIBID foi uma alegria, estou aprendendo mais com as observações
nas salas de aula. Enfim, agora estou passando a gostar mais do curso e a me dedicar mais
também. (P27)

Pois as experiências durante as observações das aulas apontam as dificuldades que irei enfren-
tar caso eu escolha esta profissão: PROFESSOR.(P59)

Eu me descobri quando comecei o PIBID. Apesar de gostar de Biologia, no início do curso não
me via como futura professora. Ao entrar para o PIBID, me apaixonei pela licenciatura.(P.7)

A intenção não é ser professor, porém, o PIBID está mexendo nessa decisão.(P17)

Me ajuda a decidir se desejo mesmo atuar na área da educação ou em outras áreas. Antes de
ingressar no PIBID, não tinha tanta vontade de exercer a profissão. (P31)

O PIBID me fez ter a certeza de que quero seguir a carreira da docência.(P.80)

Volume 1 23
Muitos depoimentos mostram que o PIBID tem um grande papel como reforçador da escolha para ser
professor e para incentivar estudantes a escolher a licenciatura. A oportunidade de entender e viver a escola faz
com que eles se voltem para a docência e atribuam valor à atividade de ensino na educação básica.

b) Conhecer o cotidiano do professor, dificuldades, a ealidade da escola e da sala de aula:

Porque conhecendo o PIBID me ajuda a conhecer um pouco mais do cotidiano de um professor, bem
como os pontos relevantes da carreira. A realidade da escola, saberemos se queremos ou não seguir car-
reira.(P10)

Pois com o PIBID eu posso ter contato direto com o ambiente escolar, compreender na prática como um
professor se comporta em sala de aula e os melhores métodos para facilitar a aprendizagem dos alunos.
Tendo essa visão posso perceber se ser professor é realmente o que quero fazer após a finalização da
graduação.(P33)

Porque estará vivenciando a vida do professor na sala de aula com os alunos.(P14)

Porque através do PIBID temos a experiência do que é ser um professor na prática, e isso é muito impor-
tante. (P43)

O PIBID proporciona a vivência com a realidade do professor, além de contribuir de maneira direta para
o contato com o meio escolar fora da posição de aluno.(P51)

Sim, pois consegui vivenciar melhor a vida do professor, sua real responsabilidade e o prazer em ensinar.
(P3)

Através do PIBID, tenho contato direto com a sala de aula e com a realidade vivenciada pelo professor.
(P29)

Pois, através do PIBID, posso conhecer, de fato, como será o meu futuro local de trabalho, assim como as
situações que o permeiam. (P1)

O Programa me coloca no ambiente escolar junto com professores, alunos e instâncias da administração e,
por vezes, dá-me a oportunidade de avaliar cada um desses aspectos, no sentido de perceber as diferenças
de anseios meu e minhas turmas.(P28)

No PIBID que é possível perceber se eu realmente quero atuar na área de educação, visto que dentro da
sala de aula podemos ter uma visão melhor do que é ser um professor, principalmente nas monitorias no
qual temos contato direto com os alunos. (P36)

É a partir do Programa que o acadêmico entende, realmente, o que é estar em uma sala de aula como pes-
soa de autoridade e que será o mediador de ensino-aprendizagem. Nesse momento percebe-se, a respon-
sabilidade imposta ao professor e toda desvalorização do profissional. Entretanto, é com essa experiência

24 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


que o acadêmico pode se apaixonar por essa tarefa de contribuir com a formação de outra pessoa.
Isso é maravilhoso.(P44)

Alguns atributos, como o compromisso com a profissão e a obrigação moral com os alunos, podem
ir emergindo a partir das experiências com o PIBID, quando o estudante começa a se ver como um professor
e passa a assumir um compromisso com a formação das crianças e adolescentes que, por um momento,
passam pelas suas mãos.
Quanto maior for o espaço entre educador e educando, tanto mais possibilidades de aprendizagem
se abrem na escola. “Afinal o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente lido, interpretado,
escrito e reescrito” (FREIRE, 2013, p.109). Compreende-se que é de fundamental importância que a escola
repense sua prática pedagógica, tendo a justiça social, a ética e direitos humanos como eixos norteadores.
Para tanto, o professor deve refletir sobre o fazer pedagógico, preparar as melhores condições
a fim de promover a aprendizagem, explorar diferentes práticas de ensino, contextualizar o que estiver
ensinando, utilizar tecnologias, estabelecendo-se assim o que Freire (2013) define como estreita relação
com a realidade conhecida pelos educandos, vivenciada por eles, despertando sua consciência crítica e

. Giuliana de Sá Ferreira Barros . Lílian Gleisia Alves dos Santos


reflexiva, tornando-os agentes de sua formação.

c) Vivenciando a prática docente considerando:

Porque a experiência do PIBID me faz refletir de como será quando eu for um professor e a relação
que devo ter com os alunos na prática.( P8)

O PIBID contribui muito com as vivências da prática docente e da relação com os conteúdos da
faculdade.( P.76)

O Programa me auxilia cada vez mais a consolidar a vontade de ser professora, uma vez que possi-
bilita que eu possa ver na prática as vantagens e desvantagens dessa profissão.(P.63)

Edna Guiomar Salgado Oliveira


Vemos na real como é a vida do professor de escola pública, as reais dificuldades enfrentadas pelo
professor na prática.(P.19)

Toda a prática realizada e experiência vivida dentro da sala de aula, mesmo antes da conclusão do
meu curso, só reforça a certeza que tenho da docência! Toda experiência vivida é base para meu
futuro como docente.(P.71)

Porque através do PIBID, ganhamos experiências com os professores regentes e também, tendo o
contato direto com a escola e consequentemente com os alunos. Nos prepara melhor para a docên-
cia.(P6)

Antecede o contato com a sala de aula, de forma a adquirir experiências e didáticas, podendo ver na
prática o que dá e o que não dá certo dentro da sala de aula.(P.76)

As narrativas dos Pibidianos parecem indicar certa relação entre as necessidades objetivas do
cotidiano escolar, vivenciado por meio do desenvolvimento do projeto e os estudos de algumas disciplinas
na universidade, sejam elas da didática ou específicas. O Programa abre espaço para o afastamento de
reducionismos, tanto teóricos como práticos.

Volume 1 25
Ao refletir sobre a importância da dimensão prática na carreira do professor, Altet (2001) explica que:

[…] o saber da prática é construído na ação, com finalidade de ser eficaz; ele é contextualizado, encarna-
do e finalizado, transformando-se em um saber adaptado à situação. Essa adaptação do saber é construída
a partir da experiência vivida com a ajuda de percepções e interpretações dada as situações anteriormente
vividas (ALTET, 2001, p. 31)

Sendo assim, os saberes se constituem como algo plural que foi construído no âmbito
sociocultural da profissão, podendo apresentar modificações com o passar do tempo, incluindo informações,
crenças, habilidades e aptidões relacionadas a uma determinada profissão. Dessa forma, a identidade que cada
professor constrói baseia-se em um equilíbrio único entre as características pessoais e os percursos profissionais
construídos ao longo da história de vida.
Os depoimentos denotam a importância do PIBID como um programa que dá visibilidade às licenciaturas
e chama a atenção para a especificidade desse curso, agregando valor a ele e a seus graduandos. Há momentos
em que se tem a impressão de que a universidade “descobre” que tem curso de licenciatura e passa a reconhecer
sua importância (GATTI, ANDRÉ, GIMENES et al, 2014).
A última questão da pesquisa perguntou aos Pibidianos como eles veem a docência depois de sua
participação no PIBID. Dado o número de informações, foram criadas categorias que aglutinassem as narrativas.
As categorias dizem respeito: a) trabalho docente como desafiador e difícil; b) compreensão da profissão docente
para além da sala de aula; c) a docência como construção de uma prática positiva e esperançosa; d) ensinar e
aprender como condição para a profissão.
Muitos dos bolsistas expressam uma visão ampla sobre o papel do Programa, embora alguns outros
mostrem uma visão bem específica.

a) Trabalho docente como desafiado e difícil:

Vejo a docência como uma profissão transformadora, apesar das dificuldades e desafios encontrados por
diversos motivos.(P64)

Uma profissão desafiadora, porém, extremamente importante. Pois todos os profissionais passam por um
professor.(P52)

Vejo com um desafio, pois através do PIBID pude ver a realidade vivida nas escolas públicas e será um
grande desafio para mim. (P10)

Profissão desafiadora e que necessita de reflexão todos os dias. Ser professor não é fácil. (P5)

A docência consiste em estar preparado para um grande desafio a cada dia, onde o professor tem que ser
um ótimo articulador dos meios a que lhe é disponível para proporcionar uma efetiva aprendizagem dos
alunos, apesar das diversas dificuldades que possam impedir a difusão do conhecimento e a significativa
aprendizagem.(P18)

Vejo com um olhar de docente que sabe o que irá encontrar quanto entrar no mercado de trabalho, pois
o Pibid proporcionou uma visão de clientela na qual terei que lidar. Os obstáculos que irei enfrentar e as
pedras que serão colocadas no meu caminho.(P23)

26 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Vejo com um desafio, pois através do PIBID pude ver a realidade vivida nas escolas públicas e será
um grande desafio para mim.(P19)

Um meio amplo, que requer compromisso e muita dedicação dos docentes, ensinar é uma tarefa
muito trabalhosa, porém é prazerosa e extremamente gratificante(P37)

A docência, muitas vezes compreendida pura ou simplesmente como o ato de ensinar, tem em si
uma face muito mais complexa, pois, para se ensinar, antes é preciso aprender a ensinar, o que não é tão
fácil como parece. Diante disso, o que ocorre é o fato de o professor possuir suas crenças e ideologias
a respeito do trabalho docente e do ato de ensinar, e que ao chegar ao local de trabalho acaba por entrar
em contraste com a cultura escolar daquele lugar, com o que pensam os colegas e com o que os alunos
esperam.
Assim, conviver neste espaço como Pibidiano possibilita compreender este espaço “difícil e
desafiador” como um dos percursos itinerários da docência de forma segura e refletida.

. Giuliana de Sá Ferreira Barros . Lílian Gleisia Alves dos Santos


b) Compreensão da profissão docente para além da sala de aula

Uma das profissões mais importantes, mas mal remunerada. (P78)

Com muita responsabilidade, que não é fácil ser professor, que o governo sempre joga a culpa no
professor, que é preciso coragem para seguir.(P61)

Vejo a docência como um desafio que devemos enfrentar diariamente em sala de aula e mesmo
assim lutar por uma educação de qualidade. (P67)

Sem dúvidas, tenho outro olhar acerca da profissão e suas adversidades.(P48)

Edna Guiomar Salgado Oliveira


Como uma tarefa árdua, desvalorizada e ao mesmo tempo indispensável para a humanidade. Entre-
tanto, mesmo com tantos desafios é algo gratificante para mim. (P56)

Um professor entrando no mercado de trabalho já sabendo o que vai enfrentar. Acredito que vou me
tornar um professor mais consciente da realidade.(P24)

A docência não é nada fácil, vejo um grande número de alunos que não sabem ler e grande maioria
de alunos não quer nada, e ainda a escola não tem todo o suporte que deveria ter para uma boa
docência.(P12)

Os bolsistas Pibidianos vão demarcando e dando sentido as suas narrativas quando assinalam as
dificuldades do professor para a instância das políticas educacionais, da falta de valorização do trabalho
docente, da precarização do trabalho docente. Problemas no contexto educacional sempre existiram e
sempre vão existir.
Não é de hoje que a luta por melhoria salarial, por aquisição de materiais e equipamentos didáticos/
pedagógicos, enfim, por melhores condições de trabalho, tem sido pauta de reivindicações da categoria
docente. As condições precárias de trabalho impactam, negativamente, o desenvolvimento do processo
educativo, tendo em vista que os alunos também são atingidos por tais condições de trabalho. Partindo do

Volume 1 27
pressuposto de que a prática docente está imbrincada “tanto nas vivências de sua prática pedagógica, como nas
vivências políticas dentro e fora da escola, do seu engajamento político social” (CORRÊA, 2000, p.96), deve
ser concebida como um processo de aprendizado constante.
As narrativas dos bolsistas apontam para melhor compreensão das relações humanas, que são próprias
do trabalho docente (TARDIF; LESSARD, 2005), tendo a possibilidade de buscar mudanças para aperfeiçoar a
sua prática.

c) A docência como construção de uma prática positiva e esperançosa:

Que nós futuros professores podemos fazer a diferença e melhorar a educação no país. Eu me sinto prepa-
rada para assumir uma sala de aula coisa que sem o Pidid seria diferente. Que a bolsa alcance ainda mais
estudantes pelo Brasil.

Que realmente não é fácil ser professor, que a nossa esperança tem que estar acima de qualquer obstáculo,
mas que é possível sim fazer a diferença e nos tornar diferente enquanto professores

Muito produtiva, me imagino uma professora que ministra aulas com excelência, pois o Pibid me permite
vivenciar o mundo dos alunos.

É o que eu quero trabalhar depois de minha formação e dar o melhor de mim.

Não é nada fácil, mas minhas experiências só me fizeram querer fazer algo para melhorar a educação.

O caminho que realmente deveria ter escolhido, o caminho pelo qual levarei pessoas comigo, um espaço
que dou o meu melhor.

Com olhos não de julgamento e sim de compreensão, pois consigo enxergar os pontos positivos e negati-
vos que teremos de enfrentar na nossa futura profissão.

Uma visão muito melhor da docência, antes não enxergava sua importância, agora vejo o quão importante
ela é.

Pode-se perceber que os bolsistas apontam os desafios da docência, mas têm esperança de construir
e ser colaborador de uma educação e da escola como espaço de se “fazer a diferença”, e trazem um olhar de
esperança. Para Freire (2013), a esperança faz parte da natureza humana e está intimamente ligada à alegria e,
essa, por sua vez, se faz necessária à atividade educativa. Assim, a “esperança de que professor e alunos, juntos,
podemos aprender, ensinar, inquietar-nos, produzir e juntos igualmente resistir aos obstáculos à nossa alegria”
(FREIRE, 2013, p.80). Para o autor, mudar é difícil, mas é possível.
Seguindo essa linha de pensamento, Guarnieri (2005) enfatiza que parte dos conhecimentos relacionados
à profissão docente só se inicia e se aprende no decorrer da vida profissional, ou seja, é no exercício da profissão
que se constrói e se consolida o processo de tornar-se professor. Dessa forma, o acadêmico pode possuir o mais
vasto conhecimento relacionado à docência, porém, esse conhecimento por si só não o torna professor. É na
prática que esse conhecimento será efetivado e muitas vezes reconstruído. É na prática que o acadêmico passa
da fase discente para a fase docente.

28 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


d) Ensinar e aprender como condição para a profissão docente

Vejo que são necessários novos métodos e novos professores com novas ideias e disposição para
chamar atenção dos alunos para as aulas, para ensinar e aprender.( P1)

E uma profissão difícil no sentido de responsabilidade para que os alunos saiam com o conteúdo
aprendido, levando para sua vida acadêmica.(P13)

Uma profissão de suma importância, realizado e contente ao ensinar um aluno.(P16)

Que, sempre, podemos melhorar. Sempre podemos fazer mais, ou ao menos, tentar. Que devemos
estar dispostos a mudar nossa didática, para que o processo de ensino-aprendizagem também mude.
(P22)

. Giuliana de Sá Ferreira Barros . Lílian Gleisia Alves dos Santos


Como uma forma de contribuição para a educação, tanto em relação ao aluno como para o profes-
sor. Ambos aprendem e trocam informação.(P30)

Tenho a visão de dedicar mais no curso para obter uma boa formação e, portanto, futuramente,
poder repassar o que aprendi em sala de aula.(P57)

Depois que entrei no PIBID, vejo de uma forma totalmente diferente a docência. Antes pensava
que quanto mais conhecimento [específico] tivesse seria melhor, mas agora vejo que o grande desa-
fio na escola que atuo é a indisciplina dos alunos e a didática da Faculdade me dá base para poder
lidar com essa situação, por isso depois que entrei no Programa passei a ver o sentido das matérias
pedagógicas no curso.(P77)

Edna Guiomar Salgado Oliveira


Pode-se perceber em vários fragmentos, ao longo da pesquisa, mudança de postura do estudante
bolsista em relação às reflexões nas aulas de didática no que se refere aos conhecimentos e saberes
pedagógicos, reafirmando a importância das mesmas e percebendo a relação simbiótica entre os componentes
específicos e pedagógicos do curso.
Também se nota a preocupação em não minimizar a importância da formação teórica e o
reconhecimento que, com o contato com a escola e suas práticas, há mais possibilidade de reafirmar teorias
ou questioná-las.
O professor, então, aprende no exercício de sua profissão, que o chão da sala de aula é um terreno
de aprendizagem múltipla e, exigirá dele a práxis pedagógica, sem dicotomizar a prática e teoria, pois
não se constrói um educador na unilateralidade desses saberes, mas sim a “medida que o professor vai
efetivando a articulação entre o conhecimento teórico-acadêmico, o contexto escolar e a prática docente”
(GUARNIERI, 2005, p.13).
Corrobora com a ideia Freire (2013), quando traz à baila questões da formação como a
responsabilidade ética, política e profissional do professor como processos permanentes. Formação que
se alicerça na análise crítica de sua prática. Nesse sentido, é necessário pensar no ensinar e aprender como
tema fundante da identidade docente.
Sob essa ótica, o que se pode perceber é que ao tornar-se professor e construir sua profissionalidade,
vários elementos poderão influenciar nesse processo, e alguns deles são a história de formação acadêmica e
os conhecimentos ali adquiridos, bem como a comunidade escolar à qual o docente - ou futuro docente - se
insere e passa a fazer parte (MOURA, p.2003).

Volume 1 29
De forma geral, os Pidianos do IFNMG/ Campus Salinas apontaram os principais aspectos para a construção
da identidade docente em suas múltiplas possibilidades, sobretudo a prática educativa como experiência que discute
a prática, não a prática pela prática, mas a prática refletida e pensada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verificamos que o PIBID do IFNMG/ Campus Salinas criou espaços fecundos dentro dos cursos de
licenciatura, contribuindo com a construção da identidade dos futuros docentes. A identidade emerge como uma
característica que vai dando sustentação para a ação do exercício docente. Uma questão é “pensar escola”, outra é
“fazer escola”. O PIBID possibilita esta construção tríade, entrelaçada, intimamente imbrincada (Universidade x
Escola x Reflexão sobre a prática).
É necessário entender que a construção da identidade docente é algo permanente, que se serve de cultura
pessoal, que provém de sua história de vida e de sua cultura escolar anterior; também se apoia em certos conhecimentos
disciplinares adquiridos na universidade, assim como em certos conhecimentos didáticos e pedagógicos oriundos
de sua formação profissional.
Ressaltamos ainda que o Programa tem atingido seus objetivos quanto a importância crescente de políticas
de indução de valor e mudanças em posturas formativas de docentes para a educação básica no âmbito do IFNMG.
Além disso, as ações do PIBID estão proporcionando uma formação inicial de maior qualidade.
Os bolsistas também disseram que a participação no Programa ajudou a confirmar a escolha profissional,
motiva-os a seguir carreira como professor e a construir uma visão da profissão e uma identidade profissional.
A participação no Programa com bolsa contribui para a permanência dos estudantes nas licenciaturas, para
a redução da evasão e para atrair novos estudantes e, quiçá, diminuindo a possiblidade do tão prolatado apagão
docente que já se configura nas pesquisas educacionais.

REFERÊNCIAS

ALTET, M. As competências do professor profissional: entre conhecimentos, esquemas de ação e adaptação,


saber analisar. In: PAQUAY, Léopold et al. (Orgs.). Formando professores profissionai : Quais estratégias?
Quais competências? Porto Alegre: Artmed, 2001. p. 23-35.

ARROYO, M. G. Condição docente, trabalho e formação. In: SOUZA, J. V. A. (Org.). Formação de professores para a
educação básica: dez anos da LDB. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.

BRASIL. Programa Institucional de Bolsas de iniciação à docência. MEC: 2010. Disponível em < http://portal.
mec.gov.br/pibid> acesso em abril 2017

BRASIL. Decreto n. 7.219 de 25/06/2010. Dispõe sobre o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência e dá
outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7219.htm >.
Acesso em: jun. 2013.

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32 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


O ENSINO MÉDIO INTEGRADO E AS LICENCIATURAS EM CIÊNCIAS
BIOLÓGICAS NOS INSTITUTOS FEDERAIS MINEIROS

Bruna Mendes Oliveira1


Edson Antunes Quaresma Júnior2

Resumo: Este estudo apresenta resultados de pesquisa relativos às entrevistas com coordenadores e
professores de três cursos de licenciatura em ciências biológicas de Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia (IFs) de Minas Gerais. São apresentados os dados e análises referentes à categoria de
estudo articulação entre o ensino médio integrado (EMI) e os cursos de licenciatura dessas instituições. A
proposição dessa investigação levou em consideração a expansão da Rede Federal de Educação Profissional,

Bruna Mendes Oliveira . Edson Antunes Quaresma Júnior


Científica e Tecnológica (RFEPCT), especialmente a criação dos Institutos Federais no final de 2008. Nesse
contexto, destaca-se a ampliação da oferta de cursos técnicos de nível médio, ofertados prioritariamente na
forma integrada ao ensino médio, e a obrigação legal que os IFs têm em ofertar 20% das vagas para cursos
de licenciatura e programas especiais de formação de professores para a educação básica e a educação
profissional. Os resultados apontaram que menos da metade dos professores entrevistados possuem um
entendimento do ensino médio integrado, mas que existem, no interior dos três cursos investigados,
iniciativas de articulação entre a licenciatura e o EMI. Dessa forma, confirma-se a hipótese de que os
Institutos Federais se revelam como um lócus diferenciado para a formação de professores no país, onde é
possível promover um diálogo promissor entre licenciaturas e ensino médio integrado, promovendo uma
formação de professores que esteja em consonância com as demandas próprias da rede federal, como é o
caso do professor do EMI.

PALAVRAS-CHAVE: Articulação; Licenciaturas; Ensino médio integrado; Institutos Federais.

1
Técnica em Assuntos Educacionais no IFPA. Mestra em Educação Tecnológica pelo CEFET-MG.
E-mail: bruna_ifnmg@outlook.com
Lattes:: http://lattes.cnpq.br/8601109569262887
2
Professor do IFNMG. Doutor em Administração pela UFMG. Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais pela
FUNEDI.
E-mail: edson. antunes@ifnmg.edu.br.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/1176141467543002

Volume 1 33
INTEGRATED HIGH SCHOOL AND AN UNDERGRADUATE IN FEDERAL
INSTITUTES SCIENCE AND TECHNOLOGY

ABSTRACT
This study presents research results related to interviews with coordinators and professors of three teaching
education programs in biological sciences of Federal Institutes of Education, Science and Technology of Minas
Gerais. The articulation between vocational education integrated to academic high school and undergraduate of
these institutions is considered a category of study, and the data and analyses related are presented. The proposal of
this research considered the Federal Network of Professional, Scientific and Technological Education expansion,
especiallrams. The results showed that less than half of the interviewed teachers understand the integration
with high school properly, however it was pointed out that there are within the three courses investigated,
initiatives of articulation between the undergraduate and the integrated high school. Thus, the hypothesis that
Federal Institutes present themselves as a differentiated locus for teacher training in the country is confirmed.
At Federal Institutes is possible to promote a promising dialogue between undergraduate and integrated high
school education, promoting teacher training that is in line with demands of the federal network, as can be seen
at the integrated high school teacher.

KEYWORDS: Articulation; Teaching education programs; Integrated high school; Federal Institutes.

34 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


INTRODUÇÃO

Este artigo apresenta resultados de pesquisa relativos às entrevistas com coordenadores e


professores dos cursos de Licenciatura em Ciências Biológicas dos Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia (IFs) de Minas Gerais1. São apresentados os dados e análises referentes à categoria
de estudo articulação entre o ensino médio integrado e os cursos de licenciatura dessas instituições.
O objetivo da referida pesquisa foi compreender se os Institutos Federais mineiros em seus cursos
de Licenciatura em Ciências Biológicas estão formando o professor para atuar no ensino médio integrado,
na perspectiva da formação humana integral. Nesse sentido, identificar iniciativas e práticas de articulação
entre o ensino médio integrado (EMI) e as licenciaturas, e ainda, a compreensão dos coordenadores de
curso e professores formadores sobre esse tipo de ensino, torna-se parte indispensável para o atingimento
do objetivo acima descrito.
A proposição dessa investigação levou em consideração a expansão da Rede Federal de Educação
Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT), especialmente a criação dos Institutos Federais no final
de 2008. Nesse contexto, destaca-se a ampliação da oferta de cursos técnicos de nível médio, ofertados
prioritariamente na forma integrada ao ensino médio acadêmico, e a obrigação legal que os IFs têm em

Bruna Mendes Oliveira . Edson Antunes Quaresma Júnior


ofertar 20% das vagas para cursos de licenciatura e programas especiais de formação de professores para
a educação básica e a educação profissional (BRASIL, 2008).
Cabe ainda mencionar que em relação à oferta de cursos de formação de professores, a publicação
do Ministério da Educação / Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (MEC/SETEC) intitulada
Contribuições para o processo de construção dos cursos de licenciatura dos Institutos Federais de
Educação, Ciência e Tecnologia aponta que essas licenciaturas devem procurar conectar a formação de
professores para a educação profissional e para a educação básica, bem como, contemplar conhecimentos
sobre trabalho e educação em suas propostas curriculares (MEC, s/d).
Dessa forma, acredita-se que essas instituições se revelam como um lócus diferenciado para a
formação de professores no país. Isso decorre do fato dos IFs serem instituições especializadas na educação
profissional e tecnológica (EPT), ofertando educação básica e educação superior, nas quais um mesmo
docente pode lecionar (OLIVEIRA; OLIVEIRA, 2016). Além disso, tem-se a perspectiva de propostas
e projetos de licenciatura que visem à formação de professores que atendam às suas próprias demandas,
como é o caso do ensino médio integrado.
A parte da pesquisa objeto deste artigo, de natureza predominantemente qualitativa, envolveu
realização de entrevistas semiestruturadas – numa perspectiva etnográfica – com coordenadores e professores
de três cursos de Licenciaturas em Ciências Biológicas de Institutos Federais distintos que compõe a rede
federal em Minas Gerais. Após o processo de coleta dos dados, as entrevistas foram transcritas e seus
conteúdos analisados à luz do significado de ensino médio integrado aqui defendido e que foi tomado
como referencial conceitual de análise.
Para tanto, as falas dos entrevistados foram interpretadas, agrupadas e tabuladas objetivando assim
obter uma maior organização e clareza na transmissão da informação.
Foram entrevistados um total de dezesseis sujeitos nos três IFs participantes dessa fase, sendo dois
coordenadores, uma vice coordenadora e treze professores. Por questões éticas, as instituições envolvidas
neste estudo receberam as seguintes denominações: IF1, IF2, IF3 e os entrevistados receberam nomes
fictícios.
As entrevistas buscaram verificar os conhecimentos desses sujeitos sobre o ensino médio integrado
e a formação do professor para esse tipo de ensino, envolvendo a perspectiva dos coordenadores e
professores entrevistados sobre a relação entre a licenciatura e o ensino médio integrado.

3
Os resultados apresentados compõem parte dos que foram alcançados quando da realização de pesquisa no mestrado em Educação Tecnológica, no Centro
Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG), sobre as Licenciaturas em Ciências Biológicas dos IFs mineiros e o ensino médio integrado.
Dissertação que também foi publicada em formato de livro. Cf. Oliveira (2016) e Oliveira (2017).

Volume 1 35
Ao se trabalhar com a categoria articulação entre o ensino médio integrado e as licenciaturas, objetivou-
se identificar se existe articulação, na perspectiva de que essas experiências podem significar indícios de uma
preparação para a docência na educação profissional. Nesse intuito, perguntou-se aos entrevistados como eles
compreendem o ensino médio integrado, se eles vislumbram a possibilidade da articulação mencionada e o que
julgam fundamental na formação dos professores em geral e para professores que atuam no EMI.
O texto que se segue para melhor compreensão do estudo abordado, está organizado em cinco partes:
num primeiro momento expõem-se discussões sobre o ensino médio integrado e as especificidades da docência
nesse tipo de ensino. Na segunda parte, apresentam-se os resultados e análises acerca da concepção de ensino
médio integrado dos sujeitos entrevistados. Na terceira parte, aborda-se a articulação entre as licenciaturas e o
ensino médio integrado, propriamente dita. Num quarto momento, demonstra-se a percepção dos entrevistados
sobre o que é essencial na formação de professores em geral e na formação do professor do EMI. Por fim, são
feitas as considerações finais que buscam apontar perspectivas para os cursos de licenciaturas dos Institutos
Federais que contemplem a formação docente para atuar no ensino médio integrado.

ENSINO MÉDIO INTEGRADO E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR PARA ESSE TIPO DE ENSINO

Concebendo-se um projeto de educação que tem por objetivo a formação humana integral consoante aos
interesses e necessidades dos jovens e adultos das classes populares e que não atenda aos interesses imediatos
do capital, tem-se como possibilidade, considerando especificamente o ensino médio como última etapa da
educação básica, o ensino médio integrado à educação profissional. Nesse sentido, segundo Moura (2014) atuar
profissionalmente na perspectiva da formação humana integral diante da contradição entre capital e trabalho,
na perspectiva dos interesses da classe trabalhadora requer do professor conhecimentos acerca dos princípios
que norteiam a proposta do EMI, além de compreender-se, num processo de tomada de consciência, como
pertencente à essa mesma classe.
O ensino médio integrado surge de forma a contrapor-se à dualidade educacional que tem raízes na
divisão do trabalho própria e necessária ao advento e consolidação do sistema capitalista. Nesse sentido, segundo
Machado (1989, p.21):

[...] a divisão do trabalho do período manufatureiro traz consigo, portanto, a divisão entre mão e cérebro,
entre o pensar e o fazer. Assim, não só o trabalho se divide, mas ao separar, cinde o próprio homem.

Essa reflexão traz à tona a dualidade entre trabalho intelectual e trabalho manual e entre ensino
propedêutico para a elite e educação profissional para as classes trabalhadoras. Contrapondo a isso, a proposta
do ensino médio integrado tem como pilares fundamentais e/ou princípios norteadores: a educação politécnica
e a escola unitária; o trabalho como princípio educativo; a formação omnilateral ou formação humana integral;
e o trabalho, a ciência e a cultura como categorias de integração curricular.
Segundo Gramsci, a concepção de escola unitária do trabalho está relacionada ao ideal de uma “escola
única inicial de cultura geral, humanista, formativa, que equilibre equanimente o desenvolvimento da capacidade
de trabalhar manualmente [...] com o desenvolvimento de capacidades de trabalho intelectual” (GRAMSCI,
1975, p.1531 apud NOSELLA, 2010, p. 210).
Na proposta de Gramsci, a escola única se reveste de um novo humanismo com características de um
ensino desinteressado, no sentido de não ter finalidades práticas muito imediatas (NOSELLA, 2010). Em síntese,
pode-se dizer que a escola de Gramsci postula a união entre instrução e trabalho e a perspectiva do homem
completo (MACHADO, 1989).
Compreende-se que a educação politécnica se relaciona ao trabalho como princípio educativo geral,
uma vez que este é tomado ontologicamente como realização imanente ao indivíduo, ou seja, na forma pela
qual o homem produz sua própria existência em sua relação com a natureza. A educação politécnica também
considera o trabalho historicamente, associado a um modo de produção e suas práticas econômicas (RAMOS,
2007?).

36 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Para Frigotto (2014, p.74) o trabalho constituiu-se em um princípio educativo socializador
fundamental. Segundo esse autor, é necessário que se socialize e internalize o fato de que o trabalho é
comum a todos os seres humanos, ou seja, todos os seres humanos precisam alimentar-se, proteger-se e
produzirem seus meios de vida e isso se dá pelo trabalho. Desse fato decorre que a exploração do trabalho
de outros não é natural. Isso constitui em uma forma de trabalho explorado e alienado relacionada às
diferentes práticas econômicas e aos modos de produção e que vem marcando historicamente o trabalho
humano.
Nesse contexto, segundo Saviani (2003), a politecnia contrapõe-se à concepção capitalista burguesa
de fragmentação do trabalho e envolve a articulação entre trabalho intelectual e trabalho manual, implicando
uma formação que, a partir do próprio trabalho social, desenvolva a compreensão das bases da organização
do trabalho na nossa sociedade e que, portanto, permite que se compreenda o seu funcionamento. Portanto,
o ideário da educação politécnica busca romper com a dualidade educacional entre ensino propedêutico e
ensino técnico, relacionada ao princípio da formação humana integral com o objetivo de desenvolver todas
as potencialidades humanas (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2012).
Nesse sentido, de acordo com Ramos (2007?), a formação humana integral ou formação

Bruna Mendes Oliveira . Edson Antunes Quaresma Júnior


omnilateral tem como base a integração de todas as dimensões da vida no processo formativo. Nesse
sentido, trabalho, cultura e ciência são eixos fundamentais de integração entre ensino médio e técnico.
De acordo com a autora supracitada, o sentido dessas dimensões dentro da perspectiva de integração pode
ser elucidado da forma que se segue:

O trabalho compreendido como realização humana inerente ao ser (sentido ontológico) e como
prática econômica (sentido histórico associado ao respectivo modo de produção); a ciência compre-
endida como os conhecimentos produzidos pela humanidade que possibilita o contraditório avanço
produtivo; e a cultura, que corresponde aos valores éticos e estéticos que orientam as normas de
conduta de uma sociedade (RAMOS, 2007?, p.3, grifos nossos).

Dessa forma, percebe-se que a superação da dualidade entre formação geral e profissional é um dos
objetivos de um projeto de ensino médio que não seja compromissado com a divisão social existente entre
trabalho intelectual e manual, que tenha como fundamento a pessoa humana e não o mercado de trabalho.
O ensino médio integrado sugere, dessa maneira, uma formação completa e não uma formação consonante
à ideologia presente no modo de produção capitalista atual.
Sendo assim, o ensino médio, como a última fase da educação básica, deve ser concebido e
organizado de modo a possibilitar que o educando crie as condições necessárias para desenvolver-se
intelectual e moralmente, sendo capaz de, através da autonomia conquistada, tomar suas próprias decisões,
inclusive escolher a carreira que quer seguir, se de caráter científico ou de caráter prático-produtivo, sem
nenhuma imposição (GRAMSCI, 1991 apud RAMOS, 2014, p.210).
Isso posto, o conceito de integração deve ser considerado como um dos pilares da formação de
professores para o EMI. Em outras palavras, é necessário estender a concepção de ensino médio integrado
para o nível da educação superior (OLIVEIRA; BURNIER, 2013), envolvendo a formação de professores
das disciplinas técnicas e das disciplinas acadêmicas do ensino médio.
Cabe mencionar também as características atitudinais desses profissionais. É necessária uma
“atitude humana transformadora” por parte desses sujeitos, ou seja, uma “postura docente que transcenda
ao simples exercício do cotidiano escolar” (ARAÚJO; RODRIGUES; SILVA, 2014, p.169). É necessário
que a formação docente tenha incorporada, em si, ações que visem construir e efetivar um projeto de
formação integral do sujeito, de forma a romper com o modelo determinado pelo modo de produção
capitalista contemporâneo.
Importa também analisar que, para o professor atuante nessa modalidade de ensino, conhecê-la
torna-se um requisito. Assim, trata-se de levar até o docente, o conhecimento sobre a educação profissional
e suas especificidades. Para Machado (2008, p. 18), o perfil docente para atuar na EP engloba as “dimensões

Volume 1 37
próprias do planejamento, organização, gestão e avaliação desta modalidade educacional nas suas íntimas
relações com as esferas da educação básica e superior”.
Visando as características ora mencionadas, que dão suporte ao projeto de ensino médio integrado, bem
como, à proposta de formação politécnica do sujeito, é necessário ao professor da EP “ser capaz de permitir
que seus alunos compreendam, de forma reflexiva e crítica, os mundos do trabalho, dos objetos e dos sistemas
tecnológicos dentro dos quais estes evoluem” (MACHADO, 2008, p.18). Portanto, demanda-se do professor
outra atitude e outra formação: orientada pela responsabilidade social, reflexiva e crítica (MOURA, 2007, 2008).
Nesse sentido, Machado (2008, p.17) acredita que o professor que atua no ensino integrado:

[...] deve saber integrar os conhecimentos científicos, tecnológicos, sociais e humanísticos, que compõem
o núcleo comum de conhecimentos gerais e universais, e os conhecimentos e habilidades relativas às
atividades técnicas de trabalho e de produção relativas ao curso técnico em questão.

Dessa forma, não basta ao professor de biologia ou de outras disciplinas propedêuticas, que sejam atuantes
ou em formação dentro dessa proposta, ter pleno domínio da sua área de conhecimento. Torna-se fundamental
também, conhecer sobre as demais áreas dos cursos técnicos em que atuam, para ser capaz de promover um
diálogo entre estas e assim romper com a fragmentação curricular ainda presente nos cursos técnicos integrados
ao ensino médio.

CONCEPÇÃO DE ENSINO MÉDIO INTEGRADO PARA COORDENADORES E PROFESSORES

Inicialmente, é necessário informar que entre os sujeitos entrevistados seis atuam no ensino médio
integrado, seis já ministraram aulas nesse tipo de ensino e quatro nunca atuaram nele.
O entendimento sobre o ensino médio integrado dividiu-se entre concepções que se distanciam do que é
proposto para o projeto de EMI, tal como discutido neste texto, e compreensões que se aproximam de tal projeto
e que indicam um entendimento que vai além da justaposição entre disciplinas científicas e técnicas. Nesse
sentido, as respostas foram agrupadas pela proximidade dos sentidos das falas dos professores com a ideia de
simultaneidade, de interdisciplinaridade e de formação global, assim como mostrado na Tabela 1.

A ideia de simultaneidade expressa pelos entrevistados está relacionada à noção de “soma” e demonstra a
ideia de que o ensino médio integrado é um curso com única matrícula e em uma mesma instituição, ou seja, eles
se articulam, tal como viabiliza o Decreto n. 5.154/2004 (BRASIL, 2004), mas com currículos fragmentados
para o ensino médio e para o ensino técnico. Essa é uma concepção que se distancia do projeto de EMI, conforme
demonstram as falas a seguir.

38 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


É uma ótima proposta [...] no médio integrado ele tem a oportunidade de estar estudando como em
todas as escolas de ensino médio, mas também já aprendendo uma profissão (Isabel).

Eu entendo que é um curso que ao mesmo tempo fornece os conteúdos da educação básica e tam-
bém uma matriz profissionalizante (Augusto).

No ensino médio integrado os alunos trabalham com as disciplinas que são do ensino médio, disci-
plinas do conteúdo propedêutico, aqueles que vão ser utilizados no exame do ENEM, nos exames
vestibulares. Além disso, trabalham com as disciplinas específicas do ensino técnico. Assim, eles
têm de manhã as aulas do ensino médio normalmente, o conteúdo básico, e à tarde, normalmente
eles têm as aulas do ensino técnico (Elias).

É integrado porque é voltado para alguma área, algum curso técnico que já tem algumas disciplinas

Bruna Mendes Oliveira . Edson Antunes Quaresma Júnior


voltadas para o aluno sair dali com uma titulação como técnico mesmo, por isso recebe esse nome
(Cristina).

Considera-se que o conceito expresso nessas respostas representa uma concepção utilitarista do
ensino médio integrado e tem relação com a forma com que este ocorre no interior das instituições em
que esses sujeitos atuam, pois, a partir do relato dos professores depreende-se que não há diálogo entre as
disciplinas técnicas e científicas. Tal fato, segundo eles, leva a uma carga horária intensa e consequentemente
os alunos têm dificuldades, conforme pode-se conferir a seguir.

[...] os alunos vinham daquele ensino tradicional, de só meio expediente, quando chegam ao Insti-
tuto, o aluno de 1º ano sente um baque. Ele vê que terá que estudar o dia inteiro, é prova, é semana
de prova. São duas, três provas, às vezes a semana toda. É essa a rotina do integrado (Tadeu).

Ele passa a ter 18, 19 disciplinas que não é fácil para ele lidar com tranquilidade com tudo isso. In-
clusive, na primeira série do ensino médio integrado vemos muita evasão, muita dificuldade desse
adolescente em conseguir internalizar essa rotina (Roberta).

Tenho ressalvas ao modelo do ensino médio integrado porque colocamos uma carga horária que é
igual, por exemplo, ao ensino médio que não tenha o ensino profissionalizante integrado. Mas essa
pessoa que não está fazendo o integrado, ele estuda de manhã e a tarde tem contra turno livre para
estudar, para descansar e os nossos alunos não têm isso. Acho que eles têm um currículo muito
carregado (Laís).

É uma exigência muito grande de disciplinas, de carga horária e de cobranças, de atividades para
alunos que estão vindo de um outro sistema. Ele cai num sistema de cobrança muito elevado e
alguns têm muita dificuldade de lidar com esse tipo de cobrança (André).

Acho que eles têm um acúmulo de conteúdos hoje, um número exacerbado de disciplinas, que
muitas vezes penso que não tem um trabalho interdisciplinar. Essa é a sensação. Eu estou falando
da vivência aqui. Pode até estar no projeto, na discussão, mas que não realiza um trabalho interdis-
ciplinar de um modo que você possa conjugar as disciplinas do propedêutico e do técnico (Márcia).

Volume 1 39
O professor Cláudio também denuncia essa realidade, mas demostra um entendimento do projeto de
ensino médio integrado que vai ao encontro do que se busca, ou seja, a efetivação de um currículo integrado,
apesar da sua fala relacionar o ensino integrado apenas à questão da interdisciplinaridade.

Acredito que tem duas vertentes. Você tem o ensino médio integrado que eu acho que é o que, pelo menos
por onde passei, é o que funciona, mas não é o que é pensado. O que funciona é simplesmente ter o curso
técnico junto com o curso médio de educação básica, simplesmente no mesmo local e dentro do próprio
curso. E o que se busca, mas não o que se tem, a gente pensa é em integrar mesmo dentro de uma inter-
disciplinaridade, de uma ajuda mútua entre as disciplinas. Mas o que eu vejo ocorrer não é isso (Cláudio).

Outros professores também demonstram um entendimento do ensino médio integrado para além da
justaposição das disciplinas acadêmicas e técnicas, tal como demonstra as falas a seguir.

Para mim, integrado não seria só nesse diploma dele. Seria, por exemplo, eu dou aula de biologia, então
técnico em agroindústria, será que preciso seguir as matrizes, o que pede para biologia, para agroindústria
sendo que na parte técnica ele tem disciplinas de microbiologia, disciplinas que eles verão muito melhor
na parte técnica. Então, sentamos e organizamos ou então “eu não vou fazer isso, a gente pode fazer uma
atividade integrada” ou se ele tem que ver isso no primeiro ano na agroindústria, teria que ver isso também
na biologia: fazer uma atividade só valendo para as duas disciplinas. Para mim isso seria integrado e não
é feito assim (Raquel).

É articulação, é integração de disciplinas, é interdisciplinaridade? Sim, mas eu entendo como um


movimento muito maior. Eu entendo mesmo como um movimento em que se enxerga a educação de um
jeito diferente, que enxerga a educação do jeito que ela tem que ser em todas as suas nuances (Anastácia).

O aluno está se formando de forma global. Certo? Então, assim, ele tem que entender que o que ele está
aprendendo em português vai servir para ele lá no técnico, vai se usar na química, vai se usar na física e
o contrário também (Renata).

Foram seis professores que explicitaram um maior entendimento do ensino médio integrado. Considera-
se que essas falas expressam uma noção de formação global, pois se diferencia das outras ideias expressas
pelos entrevistados – simultaneidade e interdisciplinaridade. No entanto, apesar dessas falas apontarem para a
integração das disciplinas, estas não assinalam um entendimento no sentido da formação humana integral ou
formação omnilateral e da noção de integração a partir das dimensões do trabalho, ciência e cultura, tal como
discutido neste texto.
Além disso, é importante mencionar que as compreensões relacionadas à ideia de simultaneidade
demosntradas por nove professores demonstram o desconhecimento que eles têm dessa modalidade de ensino,
um dos requisitos observados como necessários à atuação docente na EP por Machado (2008).

ARTICULAÇÃO ENTRE O ENSINO MÉDIO INTEGRADO E AS LICENCIATURAS

A articulação entre o ensino médio integrado e a licenciatura não foi mencionada nos projetos político-
pedagógicos de curso das licenciaturas investigadas1. No entanto, pode-se constatar que, vários professores,
principalmente aqueles que possuem uma compreensão de integração, possuem e/ou vislumbram iniciativas no
sentido de aproveitar a oferta do ensino médio integrado nos IFs a favor da formação do professor. Manifestações
nesse sentido foram percebidas nos três cursos que participaram da fase de entrevistas dessa pesquisa, de acordo
com a tabela abaixo:
1
A análise dos projetos político-pedagógicos de curso e matrizes curriculares constituiu-se na primeira fase da pesquisa, mas que não está sendo abordada neste texto.

40 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Constatou-se que a principal forma de articulação que vem ocorrendo é através do estágio
supervisionado. Essa experiência ocorre nos três cursos e mostra-se ainda mais proveitosa quando o

Bruna Mendes Oliveira . Edson Antunes Quaresma Júnior


professor de estágio da licenciatura é também professor no ensino médio integrado. Nesse sentido, algumas
das respostas obtidas foram as que se seguem.

Inclusive, acredito que as turmas do integrado constituem o nosso laboratório vivo, eu diria. Por-
que, assim, se tenho uma licenciatura, um curso de licenciatura, na mesma instituição, para a pre-
paração e formação de professores para atuarem, dentre outros campos, obviamente, no ensino
médio, no ensino integrado ou em outras instâncias do ensino básico. Ter dentro dessa mesma
instituição o laboratório vivo que são as turmas de ensino médio integrado é maravilhoso! [...]

Dar para contar com isso. Inclusive as pesquisas, inclusive o próprio estágio, muita coisa pode estar
realizando dentro dessas turmas do integrado. Fazendo uma ponte entre o que o Instituto oferece na
formação de professores e como esses mesmos professores que atuam na formação dos professores
também atuam lá no integrado (Roberta).

[...] observamos que tem um movimento em que os alunos querem estagiar aqui na escola. Então,
os professores que atendem esses alunos no estágio são os professores deles lá no curso de licencia-
tura. Então, esse diálogo é muito frequente (Anastácia).

Eu tenho achado possível, sim. Inclusive, acaba que alguns dos alunos do superior acabam fazendo
estágio comigo no médio. Eles trazem coisas que surgem das discussões, dos projetos propostos
na disciplina do superior eles têm a possibilidade de aplicar nas minhas turmas do médio (Raquel).

Temos trabalhado. Já houve situações também que os alunos elaboraram um trabalho e apresenta-
ram para o ensino médio em sala. Mas a maioria dessas atividades que tenho feito são essas, de pe-
gar as disciplinas, trazer do estágio supervisionado para as aulas aqui. Há atividades, sim. (Neide).

Os alunos de licenciatura já atuam. Temos o estágio que eles fazem e utilizam muito os alunos do
ensino médio. O estágio no ensino técnico integrado, quer dizer, eles trabalham com esses alunos.
Pela questão também de facilidade aqui, de logística, temos a escola aqui do lado, o técnico. Então,
fica fácil para esses alunos também atuarem. Assim, boa parte deles já tem um grupo em que já
atua (Elias).

Volume 1 41
As outras formas de articulação mencionadas pelos entrevistados são mostradas nos relatos a seguir.

Acho que isso é uma possibilidade muito boa que temos aqui que a maioria das instituições de ensino
não tem, que é fornecer o ensino médio na mesma instituição que oferece o ensino superior. Inclusive,
algumas turmas quando ministro a parte de evolução, direciono uma atividade que os alunos têm que ir
no ensino médio e fazer um plano de curso e atuar realmente, ministrar aulas. E boa parte dos estágios
supervisionados eu sei que são realizados aqui no ensino médio (Augusto).

Uma licenciatura dentro do Instituto Federal pode formar um profissional, acho que existe a possibilidade
de formar um profissional com essa visão integrada desde que ele tenha a oportunidade de viver a inte-
gração através do estágio, através das bolsas Pibid. Uma coisa que a gente tem visto aqui que acho bom é
que nos eventos científicos conseguimos colocar o aluno da graduação orientando os meninos do médio
integrado. Eles decidem, as alunas me procuram dizendo que querem fazer o trabalho. Eu não orientei,
entreguei para alunos meus do Pibid e eles orientaram. Eu só dava um... “ah é isso, é isso”. E agora de
novo, um outro evento, vai ter alunos do superior. E não vemos isso só em biologia. Os alunos da licen-
ciatura em química também orientam os meninos do médio (Raquel)

No Instituto existem várias coisas que acontecem em que há essa integração. Por exemplo, existe a FECIB
que é a Feira Científica de Barbacena, na qual um professor que leciona na graduação e no médio e você
coloca um co-orientador, que é da graduação. Então, esse aluno vai co-orientar os alunos do ensino médio
naquele trabalho. Então, acho isso perfeito: a atuação como docente e a ligação com o médio (Cristina).

O professor Augusto menciona que proporciona aos seus alunos das licenciaturas oportunidade de
atuarem no ensino médio integrado. No entanto, não se percebe um trabalho voltado para as especificidades do
ensino integrado. Já os relatos das professoras Raquel e Cristina, mostram essa articulação também no âmbito
da pesquisa, extensão e orientação.
Outra posição é a da professora Vilma que diz acreditar que é possível fazer essa articulação e, apesar
de ainda não ter desenvolvido atividades nesse sentido, mostra-se receptiva à ideia. Ela afirma ainda que outros
professores também teriam abertura para trabalhar com essa articulação, demonstrando que há uma predisposição
dentro da instituição nesse sentido. No entanto, segundo ela, é uma proposta que ainda precisa ser amadurecida
pelos sujeitos que estão envolvidos no curso.

Eu acho totalmente possível. Inclusive até pensei isso por ter trabalhado com o conteúdo de biologia
celular. Atualmente tenho uma turma de primeiro ano e a matriz curricular no primeiro ano aborda essa
questão da biologia celular. Já pensei em desenvolver algum trabalho para envolver os alunos no ensino
também [...]. Isso contribui demais. E os professores, de modo geral, são muito abertos nesse sentido.
Acho que pode faltar às vezes um pouco de articulação. Quem está no comando, na coordenação ou al-
guma coisa do tipo, talvez pudesse incentivar mais, não só da área específica, mas de todas as áreas. Não
só no caso da biologia, mas em outros cursos que temos aqui também. Acredito que os alunos têm só a
ganhar também (Vilma).

As constatações permitem verificar o interesse em promover a formação do professor do ensino médio


integrado, por grande parte dos docentes atuantes nas licenciaturas. Todavia, os relatos também deixam
compreender a necessidade de amadurecimento, estudo e transposição, via projetos político-pedagógicos e
currículos dessa proposição para os referidos cursos. Além disso, evidencia-se que esse é um diferencial dos IFs
como lócus de formação de professores, facilitando a formação de professores para o ensino médio integrado.

42 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM GERAL E PARA O ENSINO MÉDIO INTEGRADO

Neste tópico serão apresentados o que os próprios docentes formadores julgam fundamental na
formação dos professores em geral e para o ensino médio integrado (Tabela 3). As respostas contemplam
conhecimentos e atitudes que são necessários à atuação docente e os resultados obtidos mostraram que
para vários dos entrevistados as mesmas coisas são fundamentais para os professores em geral e para o
professor do EMI.

Bruna Mendes Oliveira . Edson Antunes Quaresma Júnior


A categoria conhecimentos pedagógicos foi a que apareceu mais vezes nas falas dos entrevistados,
sendo ressaltados conhecimentos de didática e psicologia da educação, dimensão prática do ensino e
conhecimentos sobre avaliação, como mostram os depoimentos a seguir. Salienta-se que o domínio do
conhecimento pedagógico é uma das competências vistas como necessárias ao docente na Resolução CNE/
CP n. 01/2002 (BRASIL, 2002).

Você precisa ter a base mesmo de uma pedagogia que facilita muito seu trabalho, ao preparar uma
aula, você articular dentro da sala, os materiais que vão ser utilizados (Isabel).

Eu acho que tem que ter disciplinas que englobem esse sentido, a questão pedagógica mesmo, de
como atuar, como conduzir essas situações, isso é imprescindível. Acho que uma coisa está bem
agregada à outra, o conhecimento básico e a questão pedagógica. Com cuidado a mais aí com a
questão da psicologia da aprendizagem, do desenvolvimento porque acho que temos que respeitar
a época, a fase da criança e do adolescente (Vilma).

Eu acho que ele tem que ter uma base de psicologia para compreender, por exemplo, a adolescência,
como que os meninos desenvolvem certo tipo de raciocínio (Laís).

Volume 1 43
Eu acho que é muito importante essa parte prática, o estágio. Acredito que isso é fundamental (Neide).

Ele tem que ter noção do que é avaliação, porque isso depende dela para o aluno, infelizmente, hoje nota
para passar de ano. Então, ele tem que saber avaliar (Cristina).

Sobre os conhecimentos específicos os professores disseram que o domínio dos conteúdos da área de
conhecimento que será objeto de ensino é algo básico na formação e atuação docente:

A primeira coisa é ter o conhecimento da área consolidado. Isso aí é fato para você tomar a frente de
qualquer área do conhecimento (Vilma).

A formação docente tem alguns pilares básicos. O primeiro deles é ter domínio do seu conteúdo. Dessa
maneira não dá para permitir que os alunos saiam com a base do conteúdo que eles vão ministrar: o con-
teúdo de biologia, de química, de educação física, precário (Márcia).

Primeiro, o conhecimento, ele tem que ter o conhecimento do que ele está falando (Elias).

A posição explicitada nessas falas demonstra a importância do conhecimento teórico da área específica.
Entretanto, deixa implícito que outros conhecimentos são necessários à atuação docente. Nesse sentido, aparece
nas falas dos professores questões relacionadas à pesquisa, atualização e desenvolvimento profissional, formação
política, conhecimentos gerais, motivação e amor pelo que se faz.

Buscar sempre pesquisar. Acho que isso é importante na formação do professor. Que ele pesquise sobre a
sua prática e também o que tem sido mais utilizado atualmente, que ele se atualize também (Elias).

Eu acho que tem muita coisa que eu considero fundamental para a formação de professores. Filosofica-
mente, penso que tem que ter amor e isso é importante para qualquer segmento em que ele for trabalhar.
Eu acho que tem que ter conhecimento teórico, isso também é importante para os dois. Considero neces-
sário ter uma formação política também para trabalhar [...]. Professor tem que saber um pouco de tudo,
tem que entender de política, de história, de geografia, antes de saber do conteúdo. E depois, sim, procurar
o conteúdo. E eu vejo que essas necessidades são comuns para os dois tipos de ensino, ensino médio e
médio integrado ao técnico (Augusto).

É muito importante ter no currículo de um professor, o saber se posicionar, ser crítico, saber o momento
de você pegar uma situação que está em evidência, um assunto comentado, introduzir aquilo na sala. O
professor não é só a pessoa que passa o conteúdo em sala de aula. Ele é referência. E referência intelectual
e cultural para o seu aluno [...]. Então tem que dominar o assunto, tem que ser uma pessoa séria, tem que
fazer esse gancho e isso tudo vem da preparação, da formação dele [...]. É você primeiro saber o quê
que você vai fazer e você saber se posicionar perante à turma. O resto acho que vem com a experiência
(Tadeu).

O papel social do professor, a formação no ensino, a sua própria formação é antes de mais nada se formar
para um ser que tenha um olhar crítico, que se posiciona de forma politizada nas questões que está propon-
do a ensinar. Por isso é muito importante que os cursos de licenciatura preparem o professor para um nível
de criticidade social, para que ele seja uma pessoa participativa, para que ele contribua para a construção
social de qualidade e não apenas seja um mero transmissor de informações que o livro didático traz ou que
a própria literatura apresenta, que ainda acontece muito a reprodução do livro didático. Falta ainda esse

44 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


professor crítico, que seja teoricamente fundamentado para se posicionar em sala de aula e ajudar
os seus alunos a tomar decisões, a mudança de atitude, a participação social, a refletir sobre aquilo,
aquele conteúdo que está se propondo em relação ao que isso vai trazer como melhoria de vida para
ele [...]. E é claro que toda essa qualificação de um professor da licenciatura, ele deve também ter o
mesmo olhar para atender o ensino médio integrado, sim. Porque em momento algum um professor
que apesar de ser professor de um curso de ensino médio integrado ou não, tem que atuar com esse
perfil transformador aí (Roberta).

Acredita-se que os aspectos de ordem atitudinal apontados pelos professores possuem um caráter
ainda mais importante na formação e no trabalho docente no ensino médio integrado. O EMI exige uma
atuação que vá ao encontro da perspectiva da transformação social (MOURA, 2014) e exige dos sujeitos
uma atitude humana transformadora (ARAÚJO; RODRIGUES; SILVA, 2014) que envolve, certamente,
uma postura crítica e reflexiva, engajamento político-social e trabalho coletivo. Nessa direção, alguns
professores apontaram algumas dessas características como fundamentais ao professor do EMI.

Ele tem que interdisciplinar com a propedêutica, com a profissional e ele tem que entender que

Bruna Mendes Oliveira . Edson Antunes Quaresma Júnior


ele não está sozinho. Então, isso, para mim, considero como primordial. Porque se ele tem esse
entendimento, aliás, não é só entendimento, chamo de entendimento e sensibilidade. Ele tem que
ser sensível a esse contexto em que ele está inserido e trabalhar com os colegas, buscar essa relação
com todas as áreas (Anástacia).

Então, acho que ele tem que ter essa abordagem mais contextualizada e aí eu vejo uma diferença do
professor do ensino médio e do ensino médio profissionalizante. O ensino médio profissionalizante,
por conta dessa carga horária muito grande que os meninos têm, precisam ter um diálogo com os
professores da área específica para tentar enxugar, como “oh, isso a gente não vai dar aqui porque
vocês já vão ver no outro período” ou “isso eu vou dar porque vai servir de base para o que você
vai ver no outro período”. Eu acho que essa é uma diferença, de você ser um professor que tem um
diálogo maior com as áreas técnicas (Laís).

Eu acho que na formação do professor tanto a base pedagógica quanto a base conteudista não po-
dem faltar. Ouvimos muitas vezes em alguns cursos de licenciatura pessoas que deixam o conteúdo
um pouco de lado pensando até um pouco o ensino médio. Talvez deixa de fazer algum aprofun-
damento, o que considero um erro. Dentro dessas duas bases para o ensino integral, para o ensino
médio integrado principalmente nos Institutos, teria que ter alguma forma de se trabalhar essa
integração. E eu não vejo na maioria das formações em licenciatura (Claúdio).

No entanto, o professor André confirma o que foi percebido na análise das propostas curriculares:
não há no currículo um trabalho diferenciado que vise à formação do professor do ensino médio integrado
no PPC do curso do IF2, onde atua o docente. Segundo ele:

O objetivo geral das disciplinas pedagógicas é que o aluno saia do curso de biologia sabendo que
ele tem que aplicar isso, que tem que tentar enxergar diferentes realidades, diferentes contextos e
trabalhar esses diferentes contextos. Mas especificamente nessa questão do atendimento ao médio
integrado acho que não tem uma visão muito específica sobre isso. Acho que falta (André).

Dessa forma, as entrevistas reiteram que não existe nas licenciaturas em geral um trabalho específico
que tente aproximar os licenciandos às questões do mundo do trabalho e da relação entre suas disciplinas e
as disciplinas técnicas, tal como coloca Moura (2014). Aliado a isso, muitos professores não julgaram que

Volume 1 45
existam especificidades na formação do professor do ensino médio integrado. Entretanto, não se pode deixar de
mencionar que várias características citadas se referem aos dois tipos de ensino, regular e integrado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo central da pesquisa foi compreender se os Institutos Federais mineiros em seus cursos de
Licenciatura em Ciências Biológicas estão formando o professor para atuar no ensino médio integrado, na
perspectiva da formação humana integral. Para cumprir esse objetivo, fez parte desta investigação a realização
de entrevistas com coordenadores e professores de três desses cursos.
As análises empreendidas apontaram que menos da metade dos professores entrevistados possuem um
entendimento do ensino médio integrado que pelo menos se aproxime da concepção de formação humana
integral. O conceito expresso nas respostas de parte dos entrevistados representa uma concepção utilitarista do
ensino médio integrado e tem relação com a forma com que este ocorre no interior das instituições em que esses
sujeitos atuam: currículos fragmentados em que não há diálogo entre as disciplinas. Em decorrência disso, tem-
se uma carga horária intensa, o que acarreta uma série de dificuldades aos alunos.
Em contrapartida, vários professores, principalmente aqueles que possuem uma compreensão de
integração, possuem e/ou vislumbram iniciativas no sentido de aproveitar a oferta do ensino médio integrado
nos IFs a favor da formação do professor. Além disso, alguns professores também sinalizaram que há abertura
por parte de outros profissionais em trabalhar com essa articulação, demonstrando que há uma predisposição
dentro da instituição nesse sentido.
Em consonância a isso, foi possível perceber que existem, no interior dos três cursos investigados,
iniciativas de articulação entre a licenciatura e o ensino médio integrado. Na maioria das vezes elas ocorrem por
meio do estágio; entretanto, os professores mostram-se receptivos a outras formas de articulação.
Além disso, foi possível constatar que a maioria dos professores não considera especificidades na
formação do professor do EMI e apontam características que seriam necessárias para o professor que atua no
ensino médio integrado ou não à educação profissional.
É possível afirmar ainda que há um movimento por parte dos professores atuantes nas licenciaturas em
promover a formação do professor do ensino médio integrado, mas isso ainda não está expresso nos projetos
político-pedagógicos e currículos dos cursos de Licenciatura em Ciências Biológicas dos Institutos Federais
mineiros. Portanto, é algo que ainda precisa ser estudado, amadurecido e sistematizado no interior da rede
federal como um todo e, então, transposto para os cursos de licenciatura ofertados pela mesma.
Dessa forma, confirma-se a hipótese de que os Institutos Federais se revelam como um lócus diferenciado
para a formação de professores no país, onde é possível promover um diálogo promissor entre licenciaturas e
ensino médio integrado, promovendo uma formação de professores que esteja em consonância com as demandas
próprias da rede federal, como é o caso do professor do EMI.

REFERÊNCIAS

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46 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


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MACHADO, L. R. S. Politecnia, escola unitária e trabalho. São Paulo: Cortez/ Autores Associados,
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48 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


EXTERIORIDADES DA FORMAÇÃO DOCENTE EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: UM
ESTUDO COM OS PRIMEIROS EGRESSOS DO IFNMG - CAMPUS JANUÁRIA

Evanylson Lopes de Araújo 1


1
Joelma de Fátima Mendes Bandeira 2
Cláudio Wilson dos Santos Pereira 3

Resumo: Considerando que os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia se encarregam


de ministrar cursos de licenciatura na área das Ciências da Natureza para atender as demandas sociais
locais com ênfase na garantia da qualidade da Educação Básica, objetivou-se com este trabalho, analisar
a graduação em Ciências Biológicas ofertada pelo IFNMG - Campus Januária a partir da perspectiva dos
seus primeiros egressos. Para tanto, procedeu-se com uma breve investigação bibliográfica/documental

Bruna Mendes Oliveira . Edson Antunes Quaresma Júnior


sobre a formação docente em Ciências Biológicas no território nacional e, posteriormente, realizou-se uma
pesquisa de caráter descritivo, em que o link de acesso a um questionário do tipo autoaplicado, elaborado
através de uma Ferramenta Web 2.0 (Google Forms), foi enviado, por e-mail privativo, aos egressos.
Ao todo foram contatados 13 egressos e, destes, 12 responderam ao questionário proposto. Desse modo,
observou-se que os sujeitos pesquisados, em sua maioria, estão parcialmente satisfeitos com a própria
formação docente, visto que idealizavam a formação do biólogo em detrimento da formação do professor
de Ciências/Biologia. Entretanto, notou-se que a graduação tem grande importância para estes licenciados,
que, agora, ambicionam a realização pessoal de suas metas profissionais visando concretizar seus projetos
de vida.

Palavras-chave: Ciências da Natureza; Graduados; Instituto Federal; Licenciatura.

1
Licenciado em Ciências Biológicas | IFNMG - Campus Januária
e-mail: evanylsonlopes@yahoo.com.br
Curriculum Lattes: http://lattes.cnpq.br/7229685149412666
2
Pedagoga e Mestra em Educação e Sociedade
Professora de Didática/Fundamentos da Educação | IFNMG - Campus Januária
e-mail: joelma.mendes@ifnmg.edu.br
Curriculum Lattes: http://lattes.cnpq.br/4583531853631104
3
Pedagogo e Mestre em Educação Científica e Formação de Professores
Professor de Didática/Fundamentos da Educação | IFNMG - Campus Januária
e-mail: claudio.pereira@ifnmg.edu.br
Curriculum Lattes: http://lattes.cnpq.br/6886618478421094

Volume 1 49
TEACHER’S TRAINING IN BIOLOGICAL SCIENCES: A
STUDY WITH THE FIRSTS IFNMG GRADUATES’ STUDENTS (CAMPUS JANUÁRIA)

Abstract: Since Federal Institutes of Education, Science and Technology are responsible to conduct bachelor
level courses in the field of Natural Sciences to meet the local social demands and guarantee highly qualified
Basic Education, this study aimed to analyze the Biological Science Graduation course offered by IFNMG
- Campus Januária, according the first graduates students perspective. In order to do so, a brief literature/
documental research was carried out to understand teacher’s education in Biological Sciences in a national
territory, then a descriptive research was conveyed through a self-applied questionnaire made out of Web Tools
2.0 (Google Forms) and available through a link sent to the graduates in their private e-mail addresses. From 13
graduate contacted,12 answered the questionnaire.Thus, it was observed that the subjects studied were partially
satisfied with their own teacher’s education course, considering that they conceived the Biologist qualification
in detriment of the the Science/Biology Teacher. However, it was noticed that the teacher’s course was essential
for these graduates, that now, aim to achieve their professional goals in order to apply their life projects.

Keywords: Natural Sciences; Graduates; Federal Institute; Graduation.

50 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


INTRODUÇÃO

Desde a sua origem, as graduações em Ciências Biológicas sofrem constantes modificações para se
adequarem às transformações socioambientais brasileiras e, com vistas à formação de perfis profissionais
distintos, contribuem para o progresso do ensino e da pesquisa nacional nesta área do conhecimento
(CONSELHO FEDERAL DE BIOLOGIA, 2010; ROSA, 2014).
No entanto, é evidente que a Educação Básica ainda carece de profissionais licenciados para
atuarem no ensino de Ciências e/ou Biologia em todas as regiões do Brasil (SOUSA; BERALDO, 2009;
ARAÚJO; VIANNA, 2011; ROCHA, 2013; LIMA, 2014).
Em prol da demanda deste nível escolar por profissionais habilitados e qualificados à docência, a
Lei Nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia
– conhecidos nacionalmente apenas como Institutos Federais (IFs) –, consagrando-os como um novo locus
de formação docente no país, especialmente, nas áreas de Ciências da Natureza e Matemática (BRASIL,
2008; SOUSA; BERALDO, 2009; LIMA, 2014).
Ressalta-se, entretanto, que os IFs possuem um legado de experiências tradicionalmente voltadas

Evanylson Lopes de Araújo . Joelma de Fátima MendesBandeira . Cláudio Wilson dos Santos Pereira
para a educação profissional e tecnológica, haja vista que foram estruturados a partir da integração e/ou
transformação de Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs), Escolas Técnicas Federais (ETFs)
e Escolas Agrotécnicas Federais (EAFs) (SOUSA; BERALDO, 2009; GOMES, 2013; LIMA, 2014).
Portanto, a caracterização dos IFs como Instituições de Ensino Superior (IESs) está arraigada aos setores
técnico-industrial e agropecuário da educação profissional brasileira (SOUSA; BERALDO, 2009; LIMA,
2014).
Neste contexto, Sousa e Beraldo (2009), Gomes (2013) e Lima (2014) enfatizam que ministrar
cursos de licenciatura é uma tarefa recente e desafiadora para tais instituições, uma vez que estas passam a
“[...] necessitar de um domínio teórico e metodológico do campo das Ciências Humanas.” (GOMES, 2013,
p. 95) em objeção à lógica neoliberal historicamente presente na Rede Federal de Educação Profissional,
Científica e Tecnológica.
A partir da leitura desta realidade, o presente trabalho apresenta as seguintes questões que nortearam
a problemática do tema investigado: Quais são as convicções dos egressos do curso de Ciências Biológicas
sobre a própria formação docente no âmbito da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e
Tecnológica? Ademais, a habilitação de licenciado possibilitou a concretização de seus diferentes projetos
de vida?
Destarte, este trabalho tem como objetivo geral analisar a formação docente obtida no curso de
Ciências Biológicas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais
(IFNMG) - Campus Januária a partir da perspectiva dos seus primeiros egressos, visando conhecer aspectos
subjetivos dos entes pesquisados em relação ao referido curso superior; para tal finalidade os seguintes
objetivos específicos foram idealizados: identificar pormenores outrora vivenciados pelos egressos em
suas trajetórias acadêmicas na instituição; e averiguar as oportunidades porventura proporcionadas após a
conclusão da graduação.
Faz-se necessário esclarecer que a concepção deste estudo emanou do desejo pessoal dos
pesquisadores em contribuírem com as posturas crítico-reflexivas a respeito dos cursos de licenciatura
ofertados pela Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, haja vista que estudos
com egressos de Ciências Biológicas – e outras áreas correlatas às Ciências da Natureza – sobre aspectos
da própria formação docente ainda são incipientes no meio acadêmico.
Portanto, salienta-se que esta pesquisa é de grande relevância para a Educação Nacional,
especialmente, no que diz respeito à formação docente em Ciências Biológicas no âmbito dos IFs. Os
subsídios desta investigação poderão nortear discussões produtivas no âmago da sociedade brasileira acerca
das especificidades dos cursos superiores destinados à formação de professores e, quiçá, proporcionar uma
reflexão sociopolítica sobre os caminhos a serem trilhados para valorizar e resgatar o status da profissão
docente no país de modo a assegurar a qualidade da Educação Básica ofertada às atuais e futuras gerações.

Volume 1 51
METODOLOGIA

Consoante aos objetivos propostos, o presente trabalho buscou realçar o percurso metodológico através
de uma abordagem quantiqualitativa, mesclando elementos mensuráveis e não mensuráveis que, de acordo com
Silveira e Córdova (2009, p. 32-33), “[...] tende a enfatizar o raciocínio dedutivo [...]” à medida que atenta para
a “[...] compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais.”.
A pesquisa de campo desenvolvida, iniciou-se com uma breve investigação bibliográfica/documental
sobre a formação docente em Ciências Biológicas no território nacional, especialmente, no âmbito da Rede
Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica. Posteriormente, foi realizada uma pesquisa de caráter
descritivo utilizando-se de um questionário autoaplicado para a coleta dos dados, focalizando a percepção dos
egressos do curso de Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária como objeto de estudo (GIL, 2008;
SILVEIRA; CÓRDOVA, 2009).
Gil (2008) e Santos (2017) justificam que a utilização do questionário possibilita o anonimato dos
respondentes, assegurando, assim, a idoneidade das informações prestadas.
Não obstante, com o uso do questionário “há menos riscos de distorções, pela não influência do
pesquisador” (SANTOS, 2017, p. 04), configurando-o como um recurso de investigação padronizado (SILVA;
MENEZES, 2001; GIL, 2002, 2008).
O questionário foi elaborado através de uma Ferramenta Web 2.0 (Google Forms), compreendendo
questões abertas e fechadas, de acordo com “[...] a natureza da informação desejada [...]” (GIL, 2008, p. 126)
pertinente à formação docente em Ciências Biológicas e demais especificidades subjetivas.
Mediante lista de endereços eletrônicos disponibilizada, previamente, pela Coordenação do Curso de
Ciências Biológicas e Secretaria de Registros Acadêmicos do IFNMG - Campus Januária, o link para acesso ao
questionário foi enviado, por e-mail privativo, individualmente, à um universo de treze (13) egressos.
Antes da aplicação definitiva do questionário, foi realizado um pré-teste que permitiu a observação da
necessidade de adequação das questões, uma vez que “o pré-teste de um instrumento de coleta de dados tem por
objetivo assegurar-lhe validade e precisão.” (GIL, 2008, p. 134).
O questionário permaneceu ativo, registrando as respostas dos egressos, durante um prazo máximo de, apro-
ximadamente, sete (07) meses (período compreendido entre os meses de julho de 2015 a janeiro de 2016), sendo
monitorado semanalmente. Após este período, o questionário foi desativado e procedeu-se à análise dos dados.
Ao todo foram contatados treze (13) egressos do curso de Ciências Biológicas do IFNMG - Campus
Januária e, destes, apenas um (01) não respondeu ao questionário proposto. Contudo, foi necessário, por
inúmeras vezes, contatá-los por outros meios de comunicação (ligações telefônicas e mensagens via redes
sociais), motivando-os à participarem efetivamente, no intuito de angariar uma amostra expressiva.
Faz-se indispensável esclarecer que o limitado quantitativo de egressos outrora contatados, representa,
proporcionalmente, os únicos acadêmicos que obtiveram a habilitação de ‘Licenciado(a) em Ciências Biológicas’
na referida IES até 2015, compondo, assim, a amostra precípua desta investigação.
Ademais, ressalta-se que a praticidade do questionário em meio eletrônico (Google Forms) proporcionou
uma eficiente obtenção de dados quantiqualitativos. Por conseguinte, os dados quantitativos foram descritos
e interpretados de acordo com os métodos analíticos recomendados por Gil (2008) e a análise dos dados
qualitativos baseou-se na Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2002), observando-se as diferentes fases
e polos cronológicos: a pré-análise, a exploração do material, o tratamento dos resultados, a inferência e a
interpretação.
O delineamento do perfil dos sujeitos e do recorte temporal da pesquisa caracterizou a delimitação do
fenômeno. Quanto aos procedimentos, o tratamento e a saturação dos dados da investigação possibilitaram a
definição das características do objeto apresentado pelos sujeitos, validando, assim, as informações do trabalho.

52 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


RESULTADOS E DISCUSSÃO

Aspectos biológicos e socioculturais

Identidade sexual

A amostra representativa desta investigação foi composta por doze (12) egressos do curso de
Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária, dos quais 25% são do sexo masculino e 75% são do
sexo feminino:

Gráfico 1: Identidade sexual dos egressos do curso de Ciências Biológicas

evanylson loPes De aRaújo . joelma De fátima menDesBanDeiRa . cláuDio Wilson Dos santos PeReiRa
Fonte: Dados da pesquisa

Teixeira et al. (2014) evidenciam que, na área das Ciências Biológicas, o gradativo aumento de
profissionais do sexo feminino no mercado de trabalho, independentemente do grau universitário, é uma
tendência contemporânea. Contudo, o exercício da docência, inerente à habilitação de licenciado, ainda
está socialmente atrelado aos padrões culturais atribuídos ao gênero feminino (GATTI, 2010; GATTI et al.,
2010; CANAAN; NOGUEIRA, 2015).
Destarte, estudos realizados por Castro (2010) e Bastos et al. (2013) com concluintes e egressos dos
cursos de Ciências Biológicas de IESs públicas, também revelaram uma maior representatividade feminina
de licenciados em contraste à diminuta representatividade masculina. Entretanto, Castro (2010) adverte
que, por se tratar de um curso superior vinculado à formação docente de uma área específica das Ciências
da Natureza, há uma variabilidade na distribuição de licenciados no mercado de trabalho, por sexo, de
acordo com a disciplina a ser ministrada nas diferentes modalidades de ensino da Educação Básica, visto
que estes profissionais estão aptos a lecionarem tanto nos anos finais do Ensino Fundamental quanto no
Ensino Médio.

Aspectos acadêmicos e profissionais

Integralização do curso de Ciências Biológicas

Outro dado relevante que foi apurado nesta investigação, diz respeito ao ano em que o egresso
concluiu o curso de graduação:

volume 1 53
Gráfico 2 - Ano de conclusão do curso de Ciências Biológicas

Fonte: Dados da pesquisa

Observou-se que 17% dos egressos integralizaram o curso de Ciências Biológicas no ano de 2014, em
contraposição, 83% o integralizaram no ano seguinte, 2015.
Estes percentuais já eram previstos, uma vez que o referido curso foi implementado no IFNMG - Cam-
pus Januária no segundo semestre de 2010 (com a oferta de 40 vagas anuais) e seu período mínimo e máximo de
integralização é equivalente a quatro (04) e seis (06) anos letivos, respectivamente (INSTITUTO FEDERAL DE
EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO NORTE DE MINAS GERAIS, 2010, 2013; BRASIL, 2017).
Sendo assim, é coerente inferir que os egressos das primeiras turmas tenham concluído o curso em con-
formidade aos prazos estipulados pelos dispositivos legais da IES.
No entanto, estes percentuais também sugerem que, de um presumível universo composto por 40 ingres-
santes, a integralização do curso dentro do prazo mínimo proposto pela IES configura-se como um desafio a ser
suplantado.

Expectativas e frustrações intrínsecas ao curso de Ciências Biológicas

No que concerne às expectativas e frustrações dos egressos sobre o curso de Ciências Biológicas, notou-
-se uma idealização à formação do profissional biólogo em detrimento à formação do profissional docente, tanto
em aspectos de estrutura curricular quanto em aspectos de preparação para o mercado de trabalho e formação
continuada:

O curso me surpreendeu pela excelente qualidade dos profissionais docentes e grade curricular. Ficou
aquém no que se refere à aulas práticas e viagens técnicas. Percebi também que os cursos de licenciatura
não são contemplados com bolsas de IC devido ao preconceito sobre licenciandos não serem pesquisado-
res, e isso não condiz (sic). (Egresso A, 2015).4

1
[...] não poder assinar ART ( Anotação de relatório técnico ) devido a carga horaria do meu curso (núcleo
especifico e instrumental ) que me dá essa competência diante do CRBio (Conselho regional de biologia)
não ser suficiente (sic). (Egresso D, 2015).4

O curso foi o que esperava, os conteúdos, as aulas praticas e teoricas (sic). Mas o que seria melhor mais
aulas especificas do curso para que o acadêmico esteja preparado para dar aula e fazer uma pos graduação
(sic). (Egresso G, 2015).4

4 Dados da pesquisa

54 institutos feDeRais: eDucação, Gestão e atuação


A frustração foi a falta de ter mais matérias especificas do curso como botânica e aulas praticas de
laboratório (sic). (Egresso H, 2015).5

Expectativa: aprender mais em aulas práticas. Frustações: poucas aulas em laboratório, muita ma-
téria pedagógica [...]. (Egresso I, 2015).5

Esperava maior possibilidades de pesquisa na área de ciências, tinha em mente planos de pesquisas
que infelizmente não foi possível realizar [...]. (Egresso L, 2014).5

Ademais, a inserção imediata no mercado de trabalho também é apontada pelos egressos como uma
expectativa outrora frustrada, seja por falta de oportunidades viáveis, seja por já estarem atuando em outras
áreas profissionais no setor público:

A frustração é formar e não ter emprego. (Egresso E, 2015).5

Evanylson Lopes de Araújo . Joelma de Fátima MendesBandeira . Cláudio Wilson dos Santos Pereira
No momento a única frustração é que ainda não posso atuar na área por motivo de estar em período
probatório em outro trabalho o qual não abrirei mão (sic). (Egresso F, 2015).5

[...] minha frustração é que por ser concursada e em período probatório na área da saúde ainda não
estou atuando como professor (sic). (Egresso J, 2015). 51

Neste contexto, Diniz-Pereira (2000) apud Castelo Branco, Bontempo e Saraiva (2016) enfatiza
que há nas IESs uma supervalorização do bacharelado em detrimento à licenciatura, especialmente, nos
cursos em que as duas modalidades coexistem.
É oportuno esclarecer, que a Lei Nº 6.684, de 03 de setembro de 1979, no inciso I de seu artigo 1º,
regulamenta e autoriza o exercício da profissão de biólogo à portadores de diploma “devidamente registra-
do, de bacharel ou licenciado em curso de História Natural, ou de Ciências Biológicas, em todos as suas
especialidades ou de licenciado em Ciências, com habilitação em Biologia, expedido por instituição bra-
sileira oficialmente reconhecida” (BRASIL, 1979). Assim, esta normativa contribui para que os egressos
almejem atuar, futuramente, em áreas divergentes à docência (ROCHA, 2013).
Apesar disso, o Conselho Federal de Biologia (CFBio) (2010) – órgão responsável pela fiscalização
do exercício profissional do biólogo em território nacional –, alerta que, na época da promulgação da Lei
Nº 6.684/79, todos os licenciados em História Natural também eram bacharéis em virtude do obsoleto mo-
delo de formação docente “3 + 1”. Ademais, as modalidades de Bacharelado e Licenciatura dos cursos de
Ciências Biológicas e/ou História Natural possuíam as mesmas estruturas curriculares, em especial, no que
diz respeito a carga horária dos componentes curriculares da área biológica, de modo que tal dispositivo
legal proporcionou tratamento isonômico às habilitações de bacharel e licenciado, considerando-as aptas
ao exercício profissional de biólogo.

5
Dados da pesquisa

Volume 1 55
Em suma, a formação do biólogo e do docente em Ciências/Biologia começou a ser direcionada para
atividades específicas através das Diretrizes Curriculares para os Cursos de Ciências Biológicas (Parecer CNE/
CES Nº 1.301/2001 e Resolução CNE/CES Nº 7/2002), e a carga horária dos componentes curriculares da área
biológica foi readequada em conformidade aos perfis destes profissionais, sendo o licenciado privado do regis-
tro profissional de biólogo nos Conselhos Regionais de Biologia (CRBios) a menos que complemente, através
de formação continuada, a carga horária mínima dos componentes curriculares da área biológica exigida pelo
CFBio (CONSELHO FEDERAL DE BIOLOGIA, 2010, 2012).
Sobre esta dualidade de perfis, dados obtidos por Araújo et al. (2007), Castro (2010) e Malacarne, Castro e Bär
(2015) em estudos análogos sobre a identidade profissional de concluintes dos cursos de Ciências Biológicas, demonstra-
ram que são altos os índices de repúdio dos licenciandos pela carreira docente na Educação Básica em virtude da possibi-
lidade de atuação como pesquisadores da área biológica, circunstância esta que motiva a “[...] formação de profissionais
insatisfeitos e de menor competência na docência no nível básico.” (VASCONCELOS; LIMA, 2010, p. 330).

Dificuldades e desafios inerentes à trajetória acadêmica

A fim de traçar algumas peculiaridades intrínsecas ao percurso acadêmico no IFNMG - Campus Januária, esta
investigação também evidenciou dificuldades e desafios vivenciados pelos egressos durante o período de integralização do
curso de Ciências Biológicas, a saber:

• Adversidades pessoais de ordem familiar;


• Problemas financeiros recorrentes;
• Dedicação mútua ao trabalho e à graduação;
• Transtornos e dificuldades de aprendizagem decorrentes da defasagem escolar na Educação Básica;
• Carência de infraestrutura institucional;
• Impasses na realização de atividades de pesquisa e extensão;
• Cumprimento das atividades do Estágio Curricular Supervisionado;

Tais proposições são comprovadas através dos seguintes relatos:

Tive muitas dificuldades com o tempo para estudar, trabalhava mais de 40hs semanais, passei por problemas, sou
mãe de família, sou responsável pela minha casa, minha mãe diagnosticada com câncer de estomago e eu quem
estava a frente de tudo (sic). (Egresso J, 2015). 61

Manutenção na cidade da faculdade. (Egresso B, 2015).6

Falta de recursos financeiros. (Egresso K, 2015).6

Dificuldades: consolidar o trabalho e a faculdade. Desafio: concluí-la. (Egresso I, 2015).6

A maior dificuldade foi a disciplina de matemática, depois foi conciliar o serviço com os estudos. (Egresso H, 2015).6

A maior dificuldade enfrentada por me (sic), foi a falta de conhecimento básico que deveria ter sido adquirido no
ensino fundamental e médio, especialmente no que diz respeito matemática e português. (Egresso L, 2014).6
6
Dados da pesquisa

56 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


A minha maior dificuldade foi concentrar nas aulas de conteúdo pedagógico, para conseguir atin-
gir o objetivo de conseguir adquirir conhecimento e aprovação nas disciplinas (sic). (Egresso D,
2015).7

Falta de laboratórios. (Egresso C, 2014).71

Falta de laboratórios específicos. Por ser da primeira turma, tudo era um teste. (Egresso E, 2015).7

O curso tem um quadro de professores reduzido, então, poucos estão disponíveis para o desenvol-
vimento de projetos (extensão e pesquisa). (Egresso A, 2015).7

Os estagios foi um desafio (sic), pois é o nosso local de trabalho, onde podemos observar como
é na prática uma sala de aula, e perceber a dificuldade como é ser um professor na rede pública.

Evanylson Lopes de Araújo . Joelma de Fátima MendesBandeira . Cláudio Wilson dos Santos Pereira
(Egresso G, 2015).7

No contexto da realidade subjetiva de cada um dos egressos, observou-se a predominância de as-


pectos socioeconômicos e educacionais como fatores agravantes à trajetória acadêmica.
No que diz respeito a estas evidências, Gatti et al. (2010) explicam que, nos últimos anos, o perfil
socioeconômico dos jovens que optam pelos cursos de licenciatura no Brasil mudou drasticamente e as
IESs, de modo gradativo, são compelidas a se readequarem à realidade destes jovens, visando suprir espe-
cificidades educacionais e, quiçá, socioculturais.

Apreciação do curso de Ciências Biológicas

Intrínseco aos princípios norteadores da formação docente brasileira, observou-se que 100%
dos egressos afirmaram que o curso de Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária contribuiu,
positivamente, para a transformação social da ação docente dos mesmos.
Estes percentuais revelam, subjetivamente, a consciência crítica dos egressos, outrora proporcionada
por situações de ensino/aprendizagem vivenciadas no decorrer do período de integralização do curso,
frente à realidade desafiadora da docência na Educação Básica.
Posto isto, Gatti (2013, p.53) elucida que o futuro docente deverá estar “[...] preparado para
exercer uma prática educativa contextualizada, atenta às especificidades do momento, à cultura local e ao
alunado diverso em sua trajetória de vida e expectativas escolares.”, portanto, é apropriado deduzir que,
na amplitude da formação docente em Ciências Biológicas, o IFNMG - Campus Januária logrou êxito
quanto ao desenvolvimento do pensamento crítico e reflexivo de seus acadêmicos sobre a importância da
educação na transformação da realidade social contemporânea.
Destarte, esta investigação também evidenciou a avaliação positiva dos egressos aos aspectos gerais
do curso de Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária (matriz curricular, recursos humanos,
infraestrutura e políticas assistenciais), conforme revela o gráfico seguinte:

7
Dados da pesquisa

Volume 1 57
Gráfico 3 - Avaliação do curso de Ciências Biológicas em uma escala de zero a dez

Fonte: Dados da pesquisa

Considerando como parâmetro de referência uma escala de zero a dez (0 a 10), 58% dos egressos
atribuíram os conceitos 8 - 9 (Ótimo), 34% atribuíram os conceitos 6 - 7 (Bom) e apenas 8% atribuíram o
conceito 10 (excelente).
Tais resultados sugerem que os problemas em torno da docência na Educação Básica não procedem,
exclusivamente, dos cursos de licenciatura. Todavia, Gatti (2013) adverte que os cursos superiores vinculados
à formação docente de uma área específica, necessitam de inovações constantes nas estruturas formativas e nos
currículos em prol da função social da Educação Básica.
Com a finalidade de complementar esta informação, os egressos foram solicitados a indicarem índices
de satisfação acerca da formação docente em Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária, sendo os
resultados expressos através do gráfico abaixo:

Gráfico 4 - Satisfação dos egressos quanto a formação docente em Ciências Biológicas

Fonte: Dados da pesquisa

58 institutos feDeRais: eDucação, Gestão e atuação


Apesar da avaliação positiva atribuída anteriormente aos aspectos gerais do curso, observou-se
que 50% dos egressos estão parcialmente satisfeitos com a formação docente em Ciências Biológicas, em
contraposição, 42% estão plenamente satisfeitos e apenas 8% manifestaram-se insatisfeitos.
Faz-se necessário esclarecer que tais dados não elucidaram quais fatores colaboraram para os altos
índices de descontentamento dos egressos, contudo, em decorrência dos relatos aqui apresentados, verifi-
cou-se que a idealização à formação do profissional biólogo configura-se como um dos possíveis fatores
determinantes para este inconveniente.

Oportunidades subsequentes proporcionadas pelo curso de Ciências Biológicas

Acerca das oportunidades subsequentes proporcionadas pelo curso de Ciências Biológicas do


IFNMG - Campus Januária, verificou-se que, apesar das adversidades que possivelmente influenciam o
grau de satisfação com a formação docente, os egressos se sentem preparados para a vida em sociedade e
ambicionam a realização pessoal de suas metas profissionais.
Tais deduções são comprovadas através dos seguintes relatos:

Evanylson Lopes de Araújo . Joelma de Fátima MendesBandeira . Cláudio Wilson dos Santos Pereira
Melhorou os meus conhecimentos, realizei meu sonho de fazer biologia mes-
mos sem condições financeiras e sem abandonar nada (sic). (Egresso J, 2015).8

[...]
1
me ensinou a ser uma pessoa mais crítica, me fez ser
mais corajosa para enfrentar os desafios. (Egresso F, 2015).8

O curso de ciências biológicas me proporcionou uma visão de mundo mais amplo, alem de me for-
mar como docente, na qual eu estou tendo a possibilidade de contribuir para a formação de outras
pessoas de minha comunidade (sic). (Egresso L, 2014).8

O curso proporcionou uma oportunidade de trabalhar na área da docência (sic). (Egresso K, 2015).8

[...] estou desempregada. As possibilidades de pegar aula só surgiu em locais de difícil acesso (sic).
(Egresso E, 2015).8

[...] possibilidades de fazer concurso que necessita de curso superior. (Egresso H, 2015).8

[...] realização de diversos concursos públicos. (Egresso C, 2014).8

A possibilidade de uma formação continuada (Pós-graduação) a qual estou participando de alguns


processos seletivos. A consultoria ambiental [...]. (Egresso D, 2015).8

No que se refere à atuação dos egressos na docência da Educação Básica em meio a este cenário de
oportunidades diversificadas, esta investigação revelou que somente 25% deles atuam como docentes, em
oposição, 75% não desempenham nenhuma atividade diretamente ligada ao magistério:

8
Dados da pesquisa

Volume 1 59
Gráfico 5 - Atuação dos egressos do curso de Ciências Biológicas na docência da Educação Básica

Fonte: Dados da pesquisa

Diante destes resultados e dos relatos aqui descritos, faz-se necessário esclarecer que uma gama de
fatores contribuiu para que os egressos do curso de Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária não
ingressassem de imediato na docência, dentre os quais:

• Recente diplomação;
• Falta de oportunidades viáveis no mercado de trabalho;
• Desvalorização da docência na Educação Básica;
• Dedicação à concursos públicos/processos seletivos;
• Atuação em outras áreas profissionais no setor público que propiciam estabilidade financeira.

Ademais, notou-se, sobretudo através do relato do Egresso E (2015) elencado acima, que a demanda
local por profissionais da Educação Básica concentra-se em prováveis áreas rurais, isto é, espaços físicos de
difícil acesso para muitos graduados que, apesar das oportunidades profissionais, não possuem condições
de deslocamento para ingressarem imediatamente no mundo do trabalho o que, porventura, contribui para a
vacância de cargos no magistério deste nível escolar.
Contudo, estudos realizados por Rocha (2013) e por Magalhães e Fialho (2014) também evidenciaram
reduzidos índices de licenciados em Ciências Biológicas engajados no magistério da Educação Básica,
evidenciando, assim, a baixa atratividade da carreira docente em Ciências/Biologia.
Outro ponto de destaque que foi investigado, concerne à possibilidade de desistência da carreira docente
em face às adversidades da profissão no contexto atual da sociedade capitalista. Neste quesito, notou-se que
75% dos egressos do curso de Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária manifestaram-se favoráveis
a abandonarem a carreira docente, mesmo que ocasionalmente. Em contraposição, apenas 25% não cogitaram
esta possibilidade:

60 institutos feDeRais: eDucação, Gestão e atuação


Gráfico 6 - Possibilidade de desistência da carreira docente

Fonte: Dados da pesquisa

evanylson loPes De aRaújo . joelma De fátima menDesBanDeiRa . cláuDio Wilson Dos santos PeReiRa
Segundo Gatti et al. (2010), a baixa atratividade da carreira docente no Brasil é consequência das
políticas públicas ineficientes que não priorizam a valorização do magistério e o desenvolvimento pro-
fissional dos docentes, tanto em aspectos de remuneração quanto em aspectos de condições de trabalho e
resgate da imagem social.
Todavia, faz-se necessário advertir que a desvalorização histórica da docência no Brasil e a con-
sequente precariedade das condições de trabalho, impulsionam ainda mais o distanciamento dos jovens
licenciados do magistério na Educação Básica em busca do status quo da profissão de biólogo no mercado
de trabalho (VASCONCELOS; LIMA, 2010; ROCHA, 2013).
No que diz respeito ao zelo pela formação continuada em meio a esta conjuntura de incertezas
acerca da carreira docente na Educação Básica, esta investigação denotou que 92% dos egressos do curso
de Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária não estão inseridos em programas de pós-graduação,
em contraposição, apenas 8% cursaram ou estão cursando uma pós-graduação lato sensu:

Gráfico 7 - Inserção dos egressos do curso de Ciências Biológicas em programas de pós-graduação

Fonte: Dados da pesquisa

Ventura (2015), após analisar a trajetória profissional dos egressos do curso de Ciências Biológicas
de uma IES pública, constatou que o exercício da docência instiga os licenciados a ingressarem em progra-
mas de pós-graduação.
Nesta perspectiva, Aranha e Souza (2013, p. 83) elucidam que “A formação continuada deve, pois,
ser entendida como desenvolvimento profissional, uma possibilidade de proporcionar novas reflexões so-
bre a ação e novos meios para desenvolver e aprimorar o trabalho pedagógico.”.

volume 1 61
Posto isto, percebe-se que as possíveis motivações dos licenciados pela pós-graduação estão atreladas à
prévia identificação do sujeito com o perfil profissional docente que almeja desempenhar no meio social e com
as implicações de seu trabalho na transformação da realidade de outrem. Portanto, conclui-se que a desvalo-
rização da docência na Educação Básica é o principal fator que desestimula os egressos do curso de Ciências
Biológicas do IFNMG - Campus Januária a ingressarem no magistério e, consequentemente, em programas de
pós-graduação.
No entanto, estudos recentes sobre a atratividade da carreira docente em Ciências Biológicas realizados
por Castelo Branco, Bontempo e Saraiva (2016), revelaram que os recém-egressos de cursos de licenciatura que
optam por seguir carreira na docência da Educação Básica, buscam, em um primeiro momento, ingressar em
programas de pós-graduação stricto sensu e, após obter a titulação de mestre e/ou doutor, pleitear uma vaga de
Professor do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (EBTT) nos IFs, negligenciando, assim, o magistério nos
sistemas municipais e estaduais de ensino em face do plano de carreira favorável e das melhores condições de
trabalho da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica.
Neste contexto, faz-se indispensável elucidar que dados obtidos por Araújo et al. (2007), Castro (2010),
Bastos et al. (2013) e Rocha (2013) revelaram que são altos os índices de concluintes e egressos dos cursos de
Licenciatura em Ciências Biológicas desinteressados nos programas de pós-graduação na área da Educação e/
ou Ensino de Ciências/Biologia, visto que eles intencionam ingressar em programas de pós-graduação na área
biológica propriamente dita, aspirando a obtenção futura do registro profissional de biólogo em conformidade
às exigências do CFBio quanto ao cumprimento da Lei Nº 6.684/79.
Não obstante, muitos licenciados, após obterem uma titulação acadêmica a nível de pós-graduação stric-
to sensu, visam a atuação no magistério do Ensino Superior em função do plano de carreira diferenciado e da
possibilidade de desenvolvimento e/ou orientação de pesquisas aplicadas na área biológica (CASTRO, 2010;
VENTURA, 2015).
Em suma, observa-se que este panorama atual tende a agravar ainda mais o déficit brasileiro de licencia-
dos em Ciências Biológicas engajados na Educação Básica, sobretudo nos sistemas de ensino público municipal
e estadual. Logo, são urgentes as políticas públicas de valorização do magistério que visem resgatar o status
profissional do docente deste nível escolar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho analisou o curso de Ciências Biológicas do IFNMG - Campus Januária a partir da perspec-
tiva dos seus primeiros egressos, originando, finalmente, respostas específicas aos questionamentos investiga-
dos.
Diante dos objetivos norteados pela problemática deste trabalho, constatou-se que o percurso acadêmico
dos egressos no IFNMG - Campus Januária foi caracterizado por dificuldades subjetivas de ordem socioeco-
nômica/educacional e por inúmeras expectativas intrínsecas à formação docente em Ciências Biológicas, espe-
cialmente, no que concerne à priorização dos componentes curriculares específicos desta área do conhecimento.
Sendo assim, infere-se que, provavelmente, a opção pela modalidade de licenciatura configurou-se como uma
via alternativa de acesso à Educação Superior, haja vista a idealização da formação do biólogo em detrimento
da formação do professor que foi evidenciada nos relatos aqui descritos.
Neste contexto, observa-se que os egressos, em sua maioria, estão parcialmente satisfeitos com a for-
mação docente ofertada pelo IFNMG - Campus Januária. Contudo, os elevados índices de avaliações positivas
atribuídas por eles aos aspectos gerais do curso de Ciências Biológicas e a unanimidade de que este contribuiu
para a transformação social da ação docente dos mesmos, permitem inferir que a graduação tem grande impor-
tância para estes licenciados, que, agora, ambicionam a realização pessoal de suas metas profissionais de modo
a concretizar seus projetos de vida outrora concebidos.

62 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


A despeito disso, verifica-se que a entrada imediata no mercado de trabalho também é apontada
pelos egressos como uma expectativa então frustrada. Não obstante, nota-se que, dentre vários fatores
preponderantes, a desvalorização da docência na Educação Básica inibe a inserção de um expressivo quan-
titativo destes egressos no magistério e, consequentemente, em programas de pós-graduação.
A partir da leitura desta realidade, conclui-se que o curso de Ciências Biológicas do IFNMG - Cam-
pus Januária forma profissionais aptos ao exercício da docência na Educação Básica em atendimento as
necessidades do setor educacional brasileiro, porém a formação docente por si só não supre efetivamente
a demanda nacional de professores deste nível escolar.
Portanto, faz-se necessário a implementação de políticas públicas de valorização do magistério que
objetivem resgatar o status profissional do docente da Educação Básica, de modo a proporcionar condições
de ingresso e permanência dos licenciados na carreira docente.
Posto isto, recomenda-se que estudos futuros sejam realizados visando evidenciar o destino ocupa-
cional destes egressos, bem como os temores e desafios vivenciados por eles no início da trajetória profis-
sional.

Evanylson Lopes de Araújo . Joelma de Fátima MendesBandeira . Cláudio Wilson dos Santos Pereira
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Volume 1 65
ELEMENTOS DA EDUCAÇÃO DO SÉCULO XXI EXPLORADOS
EM CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Jamylle Rebouças Ouverney-King 1


1
Sandro José Conde2

Resumo: Os cursos de licenciatura do século XXI encontram-se em processo de adequação às novas necessidades
discentes e as do mundo do trabalho. Apontamos neste capítulo como o ensino híbrido pode ser utilizado como
ferramenta de conscientização dinâmica para o “pré-professor”, por meio de relatos de experiência com 64
alunos de dois cursos de Licenciatura em Biologia em diferentes instituições (IFPB e IFSP) em que ferramentas
digitais como o Google Forms, o Padlet, e o Moodle foram usados para aproximar os participantes do novo
formato que o fazer docente vem se moldando. A partir de atividades centradas nos estudantes, criando espaços
de compartilhamento coletivos de informação digital, aliados à discussões em sala de aula, os participantes
praticaram e se apropriaram de elementos da Educação do Século XXI, conscientizando-se da importância
desse conceito para sua inserção no mundo do trabalho e nas interações sociais modernas. As reflexões discentes
que cercam o futuro da prática docente referendam a necessidade de uma remodelação curricular, mas acima
de tudo, de uma lógica que reposiciona identitariamente o professor e transforma-o em colaborador ativo do
conhecimento, não apenas aquele que alimenta o aluno diariamente com o conhecimento mas ressignificando o
professor do Século XXI como agente de mudança.

Palavras-chave: Licenciatura em Biologia; Educação do Século XXI; Ensino Híbrido; Ambientes Colaborativos
Virtuais; Atividade Centrada no Estudante.

1
Professora do IFPB- Campus de Cabedelo. Doutorado em Curso de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa Catarina
(2014). Mestrado em Lingüística pela Universidade Federal da Paraíba (2009). Formação complementar na TAMK - University of Applied Sciences (Finlândia) - Tea-
chers for the Future e na HAMK - Hame University of Applied Sciences - FiTT - Finnish Teacher Trainer Diploma Programme.
E-mail: jamylle@ifpb.edu.br
Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4270047Z0
2
Professor do IFSP - Campus São Roque. Doutorado-Direto e Pós-Doutorado em Ciências da Saúde. Formação complementar na TAMK - University of Applied
Sciences (Finlândia) - Teachers for the Future e na HAMK - Hame University of Applied Sciences - FiTT - Finnish Teacher Trainer Diploma Programme.
E-mail : sandroconde@ifsp.edu.br
Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4744556D3

66 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


21ST CENTURY EDUCATION ELEMENTS TAPPED INTO
TEACHER TRAINING UNDERGRADUATION COURSES

Abstract: Graduation courses in the 21st Century are undergoing a reshaping process according to learners’
and the labor world’s needs. We hereby identify how blended learning can be used as a dynamic tool to
raise awareness for the “pre-teacher”/trainee-teacher through testimonials of 64 Undergraduation students
from two Biology Courses in different institutions (IFPB and IFSP) in which digital tools, e.g. Google
Forms, Padlet and Moodle, were used to bring participants closer to the new path that the teaching practice
has been taking. Student-centred tasks, sharing information through digital environments, along with
classroom discussions, led learners to practice and develop their ownership of 21st Century Education
Elements, becoming aware of the relevance of such concept for their insertion in the labor world and social
modern interactions within such environment. Undergraduates’ reflections which surround the future of

Jamylle Rebouças Ouverney-King . Sandro José Conde


teaching practice endorse the need for a curricular reshaping action, but above all, they emphasize a logic
that repositions the teacher’s identity by transforming him/her in an active knowledge collaborator and not
only the one that “spoonfeeds” their learner with knowledge, the 21st Century Teacher is resignified as a
change agent.

Keywords: Biology Degree; 21st Century Education; Blended Learning; Virtual Collaborative
Environments; Student-centred Activity.

Volume 1 67
INTRODUÇÃO

As experiências tecidas aqui advêm do inquietamento de professores que lecionam em cursos de


Licenciaturas em Biologia e que participaram de uma formação profissional na Finlândia no ano de 2016 e,
desde então, vêm remodelando suas práticas docentes e ações em meio aos múltiplos ambientes de ensino e
aprendizagem de que fazem parte.
Inicialmente, faz-se necessário contextualizar como a Finlândia relaciona-se ao modelo de Educação
no Século XXI. Amparada em um processo educacional que se cerca de elementos como colaboratividade,
cooperatividade, ensino centrado no aluno, desenvolvimento de habilidades sociais e competências, articulação
com o mercado de trabalho, autonomia e equidade, a Finlândia obtém destaque global e torna-se um país de
referência na reestruturação de modelos educacionais e currículos. Desta forma, tal referência chega ao Brasil
por intermédio de cursos de formação e capacitação que intercambiam professores em um fluxo contínuo de
trocas multiculturais e multi-sensoriais e desencadeiam práticas docentes atualizadas e adaptadas às demandas
do Século XXI. Cotrim-Guimarães e Ouverney-King (2017) apontam que a Finlândia dispõe de processos
educativos que contribuem significativamente para a produção docente e dicente ao desenvolver habilidades
sociais, autonomia, cooperação e equidade.
Observa-se que, no resultado do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) no ano de 2015,
para o ranking de Ciências, o Brasil ficou na posição de número 59, de um total de 65 países. Muito embora o
objetivo final do sistema educacional finlandês não seja alcançar posições de destaque em rankings, a Finlândia,
um dos países que praticam mais efetivamente as modalidades de ensino propostas e aplicadas na pesquisa
descrita neste trabalho, apresenta-se como um excelente modelo a ser seguido, visto que alcançou na mesma
pesquisa a posição de número cinco em Ciências, sendo a melhor colocação dentre os países europeus (OECD,
2015).
Poucos são os ambientes de aprendizagem em que os alunos experimentam um ensino que os prepara
para a vida, não somente pessoal, mas também profissional. Outrossim, o tradicional método de ensino, que
“alimenta” diariamente os alunos com o conhecimento, tem seu espaço consolidado e reforçado por práticas
como aulas centradas no professor (ANASTASIOU, 2001). Além disso, temos professores com altas cargas
horárias de trabalho, ou múltiplas jornadas de trabalho – trabalhando muitas vezes em escolas nos três turnos
em diferentes modalidesde de ensino (a exemplo do ensino fundamental, médio, técnico ou superior), escolas
desprovidas de infraestrutura mínima, alunos desmotivados, e uma infinidade de outras características cercam o
ambiente de ensino e aprendizagem na atualidade (GASPARINI et. al., 2005).
Como contornar tais obstáculos e recuperar um ambiente sadio e de formação significativa para a vida?
Um outro questionamento atrelado a esse seria: como formar profissionais que possam contornar tais obstáculos
e ainda multiplicar o fazer docente com vistas a “contagiar” os profissionais ao seu redor?
Inicialmente, apresentamos os materiais e métodos que sustentam o recolhimento dos dados que aqui são
utilizados para análise e reflexão, em seguida trazemos à baila os referenciais teóricos que vem acompanhados
da análise das atividades aplicadas e, por fim, expomos algumas perspectivas acerca dos elementos da educação
do Século XXI e como eles auxiliam a moldar o perfil do docente na atualidade através das práticas executadas.
E, desta forma, buscamos responder ao questionamentos anteriores aqui elencados e sugerir propostas de
abordagem para uma educação colaborativa, reflexiva e centrada no protagonismo estudantil.

MATERIAIS E MÉTODOS

Os cursos de Licenciatura aparecem como um dos ambientes propícios para a solução de tais
questionamentos abordados na introdução desse capítulo (Como contornar obstáculos com altas cargas horárias,
múltiplas jornadas de trabalho e ainda recuperar um ambiente sadio e de formação significativa para a vida?
Como formar profissionais que possam contornar tais obstáculos e ainda multiplicar esse fazer docente com vistas
a “contagiar” os profissionais ao seu redor?). Contudo, um ensino tradicionalista, engessado por metodologias
centradas no professor como detentor do conhecimento, técnicas ultrapassadas de ensino e numerosas aulas
expositivas pode comprometer a formação docente na contemporaneidade (ANASTASIOU, 2001).

68 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Pensando em tal realidade e munidos de estratégias renovadas, interdisciplinares, concentradas no
desenvolvimento das quatro principais competências centrais para um ensino dinâmico no Século XXI –
criatividade, comunicação, colaboração e pensamento criativo (MCGUIRE, 2018) – e que, por conseguinte,
estão atreladas à geração de ideias inovadoras, de solução de problemas, de proposição de projetos e, acima de
tudo, vislumbrando uma aprendizagem mais humanizada, os autores vêm experimentando práticas docentes
híbridas (que se valem de encontros presenciais e também de ferramentas digitais de aprendizagem) com turmas
de Licenciatura em Biologia desde 2017. É importante destacar que os cursos de licenciatura são ambientes de
formação e que optamos, no caso desta pesquisa, por chamar de “pré-professores”, os alunos destes cursos, já
que todos os participantes identificaram seu desejo de se tornarem docentes.
Um total de 36 alunos participou da disciplina Instrumentação no Ensino de Ciências do curso de
Licenciatura em Ciências Biológicas do IFSP - Campus São Roque. A disciplina tem por objetivo oferecer
subsídios e discutir sobre a prática docente no nível fundamental - anos finais (sexto ao nono ano). Caminhando
pelo viés da reflexividade sobre o futuro da prática docente, 25 alunos já cursaram ou estão cursando a disciplina
de Prática de Ensino em Biologia III, do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas do IFPB - Campus
Cabedelo.

Jamylle Rebouças Ouverney-King . Sandro José Conde


Ao todo, já são mais de 60 discentes participantes de práticas inovadoras no campo do ensino e
aprendizagem em disciplinas como Instrumentação para o Ensino de Ciências e Prática de Ensino em Biologia.
O sustentáculo informacional que corrobora essa pesquisa advém de questionários realizados por meio
da ferramenta Google Forms, em que os discentes responderam sobre suas experiências e usos de ferramentas
tecnológicas em meio pedagógico, gamificação, vantagens e riscos de tal utilização; do uso de ambientes virtuais
de aprendizagem como o Moodle, para a realização de atividades seguindo o modelo de sala de aula invertida;
da construção de mapas mentais em ferramentas colaborativas para organização de ideias e compartilhamento
de propostas. Apresentamos aqui a descrição de quatro dessas práticas.
Destarte, os registros inseridos pelos participantes em tais plataformas são aqui compilados e analisados
à luz de teorias a exemplo de “alinhamento construtivo”, “ensino por competências”, dentre outros referenciais
teóricos relevantes para o desenho de um perfil docente e para a reformulação de um panorama educacional
que traga em seu cerne as características do Século XXI, como o pensamento crítico, a comunicação, a
colaboratividade e a criatividade nos ambientes de ensino e aprendizagem.

RESULTADOS E DISCUSSÃO: A SALA DE AULA PEDE UMA REFORMULAÇÃO

A partir de uma proposta colaborativa e de construção coletiva do conhecimento, os alunos do


IFSP trabalharam com temas como “Ensino por Competências” (BARNET et al., 2010) e “Alinhamento
Construtivo” (BIGGS, 1999; BIGGS & TANG, 2011). Esses temas foram abordados utilizando a ferramenta
digital “Padlet” que permite compartilhar, por meio de quadros informativos, ideias e informações gerais,
de leitura coletiva e construção colaborativa. Esses quadros também possibilitam a utilização de imagens,
links e vídeos, transformando a ferramenta em multimodal (já que lança mão de múltiplos modos de
compartilhamento de informação pois é visual - com imagens estáticas e com movimentos - e com recursos
de áudio), facilitando ainda mais a interação e abordagem inclusiva.
Para trabalhar o “Ensino por Competências” os alunos foram orientados a compartilhar três quadros em
um mural virtual utilizando a ferramenta digital Padlet: um primeiro quadro sobre o significado de Ensino por
Competência, onde os alunos pesquisaram autores e apresentaram sua pesquisa sobre essa forma de abordar
a aprendizagem (Primeira coluna da Figura 1); um segundo quadro questionando-os se atualmente os alunos
vivenciam um Ensino por Competência (Segunda coluna da Figura 1); e um terceiro quadro onde sugerem uma
atividade para explorar um Ensino por Competência com alunos do Ensino Fundamental - anos finais (Terceira
coluna da Figura 1).

Volume 1 69
Figura 1: Mural na plataforma Padlet com as respostas, em colunas rolantes, dos alunos na disciplina de Instrumentação no Ensino de
Ciências sobre o conceito de Ensino por Competência. Na primeira coluna os alunos apontavam um referencial teórico sobre Ensino por
Competência; na segunda coluna apresentaram suas opiniões sobre essa forma de ensino no nível Fundamental II; na terceira coluna suge-
riram uma atividade para a aplicação dessa forma de ensino.

É interessante observar que após a pesquisa sobre o Ensino por Competência, e em suas reflexões no
quadro do meio, os alunos revelam diversos fatores, a exemplo de infraestrutura, do ensino conteudista, da
formação profissional, dentre outros elementos, que não permitiram a eles vivenciar essa experiência. Aqui,
já na reflexão, observamos o desejo de mudança no discurso discente e a sinalização do desenvolvimento de
competências para a prática docente, tal como pode ser observado no trabalho de Feitosa et al. (2018).
Outra experiência de sucesso ocorreu com a atividade nomeada de “Alinhamento Construtivo”, em que
os alunos foram orientados a compartilhar quatro quadros: um primeiro quadro escolhendo uma habilidade
informada na Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017); um segundo quadro onde localizaram, dentro
da taxonomia de Bloom (BLOOM et al., 1983), a ordem da ação desempenhada pela habilidade escolhida;
um terceiro quadro onde sugerem uma atividade para o estudante atingir essa habilidade; um quarto quadro
onde sugerem uma avaliação, forma do estudante demonstrar ao professor que atingiu a habilidade escolhida
(Figura 2).

70 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Jamylle Rebouças Ouverney-King . Sandro José Conde
Figura 2: Mural na plataforma Padlet com as publicações, em quadros conectados por setas, dos alunos na disciplina de Instru-
mentação no Ensino de Ciências sobre a organização de habilidades para o componente curricular “Ciências” da BNCC baseada no
conceito de Alinhamento Construtivo de John Biggs (BIGGS, 1999; BIGGS & TANG, 2011).

Todas as tarefas, além de permitirem a construção coletiva de conhecimentos ao compartilharem


materiais na plataforma Padlet, abrangeram uma grande quantidade de atividades e habilidades inerentes à
prática docente que, associadas à discussão em sala de aula, criaram uma base de dados com atividades e
suporte teórico para as práticas dos futuros professores, que se valeram de sua experiência em estágios nas
escolas da região para aprimorar o conteúdo compartilhado e refletir sobre a prática pedagógica dentro das
diretrizes orientadas pela atual Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017).
Além disso, as tarefas desenvolvidas pelos alunos de graduação já são indicativos do desenvolvimento
de competências docentes contidas no modelo educacional do Século XXI, a exemplo da colaboratividade
– já que atividades sugeridas se aplicam a diferentes modalidades de apropriação do conhecimento, como
as individuais e as em grupo –, interdisciplinaridade – pois unem múltiplas áreas do conhecimento na
busca de solução de questões complexas –, além de sinalizarem a possibilidade de exercícios aplicados, o
que se encaixaria em um conceito amplamente utilizado no modelo finlandês de ensino que é o de “hands
on”, i.e., ‘meter a mão na massa’ e, assim, aprender fazendo (learn by doing).
Bransford et al. (2005) asseveram que a formação do profissional docente é a pedra fundamental
no estabelecimento de atitudes e percepções sobre sua prática futura. Nesse sentido, entendemos que
os conhecimentos que são perpassados e construídos colaborativamente durante o período da formação
docente serão determinantes na condução do perfil profissional, não importando a faixa etária. Sobre essa
características apresentamos que os alunos do IFPB são em sua maioria jovens, como ilustra o gráfico da
turma que está no período 2018-1 (Figura 3).

Volume 1 71
Gráfico 1: Faixa etária dos alunos na disciplina de Prática de Ensino em Biologia III do curso de Licenciatura em Ciências
Biológicas do IFPB - Campus Cabedelo no período 2018-1.

A faixa etária aparece como elemento de destaque nesta pesquisa visto que são “pré-professores”
advindos de um ambiente de ensino e aprendizagem com ênfase em uma abordagem centrada no professor.
Todavia, todos os participantes da pesquisa e da prática já sinalizaram desejo de se tornarem docentes, daí a
utilização da nomenclatura “pré-professores” e, portanto, estão buscando estratégias alternativas para fomentar
um ambiente remodelado para a Educação no Século XXI com vistas ao protagonismo estudantil.
Amparado por duas competências contidas na Educação do Século XXI, a comunicação e a
colaboratividade, perguntamos, utilizando a ferramenta Google Forms, a um grupo de alunos sobre a utilização
de redes sociais enquanto ambientes virtuais de aprendizagem e obtivemos as respostas observadas na Figura 4.

Figura 3: Respostas sobre a utilização de redes sociais enquanto ambientes virtuais de aprendizagem, por meio do “Google
Forms”, de um grupo de alunos na disciplina de Prática de Ensino em Biologia III. Em virtude do recorte, algumas respostas
não aparecem em sua totalidade, mas foram as seguintes: acredito que sim em formato de aula; podem, acho que dependem
do aluno; sim, sim aliás um ótimo mecanismo; sim como meios indiretos; sim, desde que dê para ficar online em sala; sim, lá
temos contato com os alunos e professores; sim, as redes sociais são muito eficientes.

72 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Não obstante, a assertividade na seleção da rede social como opção de ferramenta didático-
pedagógica e sua vantagem na comunicabilidade com os atores do processo de ensino e aprendizagem
e obtenção de resultados tão positivos quanto aqueles que seriam obtidos em momentos presenciais,
vem acompanhada de uma pletora de ressalvas que abrangem a forma como o recurso será aplicado, a
possibilidade de desvio na função da atividade em decorrência de outros interesses que a rede social pode
despertar, e em especial a forma como a atividade é orientada, já que deve apresentar objetivos claros e
possibilidades de resultados passíveis de alcance.
A sinergia entre a formação docente e a subsequente – e efetiva – prática docente que irá tomar conta
da vida do egresso de um curso de licenciatura não está contida apenas na instrução bibliográfica, ou nas
ferramentas - analógicas ou digitais - de que se apropriam, ou ainda nas experiências com apresentações
em eventos acadêmicos, congressos e sua prática docente por meio do estágio, mas em uma adaptação do
conhecimento que adquire e sua posterior aplicação ao ambiente de ensino e aprendizagem. Os participantes
da pesquisa mostraram-se comprometidos em se apropriar do conhecimento e da estratégia das redes
sociais enquanto ferramenta de ensino e aprendizagem, sem utilizá-la como elemento de distração e até
elencando potenciais soluções para situações em que seus futuros alunos pudessem se desvirtuar, a exemplo

Jamylle Rebouças Ouverney-King . Sandro José Conde


de monitoramento do uso em sala de aula e também com alunos monitores das redes, mantendo o foco
daquele canal de comunicação midiático.
Outras características como a formação de Comunidades Profissionais de Aprendizagem (DUFOUR
et al., 2005) também são relevantes, já que permitem a colaboratividade, a troca de experiências e a otimização
da prática docente. Para Dufour (et al., 2005, p. 31), uma Comunidade Profissional de Aprendizagem pode
ser descrita como “qualquer combinação possível de indivíduos com interesse em educação” e, seguindo
esse fio condutor, podemos adicionar a essa lista de indivíduos todos aqueles agentes que participam dos
ambientes de ensino e aprendizagem, desde o diretor da escola, passando pelos professores, coordenadores,
pedagogos, psicólogos, porteiros e, em especial, os alunos, pois - embora muitas vezes não estejam cientes
- estes são os mais interessados no processo de ensino e aprendizagem. Aqui, contudo nos concentramos
na figura dos “pré-professores”, esses alunos que em breve inverterão o processo e se tornarão professores
e hoje promovem atividades colaborativas entre si por intermédio de redes sociais como o Instagram (em
que eles podem compartilhar socialmente suas experiências, práticas e ainda sugerir dicas de abordagens
para outros alunos do curso e também seguidores da conta da rede social)31.
Outrossim, desejamos a formação de sujeitos que promovam a construção do conhecimento em
conjunto, mas queremos, igualmente, sujeitos autônomos que construam a independência e o protagonismo
estudantil. Seguindo esse fio condutor, perguntamos, também utilizando o Google Forms, aos alunos o que
seria “educar para a autonomia” e algumas respostas4 se destacam:

“Educar para a autonomia me remete que você está educando alguém para que ela seja autônoma
nas suas decisões e opiniões, no caso que a pessoa não espere ser mandada fazer algo, mas que
ela faça de livre e espontânea vontade e detenha esse desejo em si. As tecnologias surgem como um
vetor para isso, para a favilicotacao [sic] do acesso à informação permite isso.” (Participante 1)

“Estimular o senso crítico nos alunos e fazer com que se crie uma individualização de conhecimen-
to a partir do exercício feito a partir da coletividade.” (Participante 2)

3
Alguns desses compartilhamentos podem ser visualizados em: https://www.instagram.com/cabioifpb/.
4
Os participantes responderam ao questionário utilizando, muitas vezes, smartphones, então algumas das respostas poderão apresentar distorções gráficas,
ausência de ortografia, dentre outras digressões linguísticas, porém, com o objetivo de manter os relatos fidedignos utilizamo-nos as versões originais retiradas
da tabela do Excell gerada pelo Google Forms e quando tais digressões são identificadas apresentamos a expressão “sic”.

Volume 1 73
“Tornar o aluno mais independente. As tecnologias facilitam nas elaborações de trabalhos em geral, na
comunicação, nas EAD, etc.” (Participante 3)

“Educar para autonomia, seria preparar pessoas para que elas tenham a capacidade de buscar o co-
nhecimento. A tecnologia e suas ferramentas são estrumentos que otiminizam a capacidade de busca de
informação e possibilitam a elaboracao deatividades [sic].” (Participante 4)

Com base nos excertos acima destacados percebemos o desenho de um perfil de docência que destaca as
múltiplas estratégias aplicadas à confecção de processos de construção do conhecimento apoiados em tecnologias
digitais e instrumentos tecnológicos variados que irão fomentar um processo de ensino e aprendizagem mais
independente, afinal, é notório o conhecimento de que os alunos já estão em sala de aula munidos de dispositivos
móveis com múltiplas funções e que não hesitam em utilizá-los, quer sejam requisitados pelos professores
ou não. Nesse sentido, fazer uso desse tipo de tecnologia aproxima os atores em níveis instrucionais, sociais
e comunicativos (duas competências aqui já destacadas como essenciais para a educação no Século XXI), e
Barthes (apud DUFOUR et al, 2005) advoga que um ambiente comprometido a uma aprendizagem para a vida
toda irá gerar alunos que aprendem para a vida toda e não apenas para executar testes e provas.
Destacamos, nas palavras de Pasin (2017), que a utilização do ensino híbrido, ou blended learning
como é conhecido em inglês, é uma tendência metodológica contemporânea que promove um “aprendizado
envolvente e eficiente”, pois “socializa o conhecimento”. Além disso, é uma metodologia que funciona tanto
de forma síncrona – em sala de aula – quanto assíncrona – no ambiente de ensino virtual –, o que permite a
flexibilidade da aprendizagem. Entendemos a flexibilidade aqui de diversas maneiras: pensando nos alunos que
preferem revisar conteúdos em casa – refletindo sobre as múltiplas inteligências (GARDNER, 2008) e modos
de aprendizagem, nos alunos que por algum motivo não podem comparecer a aula e assim podem ter acesso ao
conteúdo e interagir com os colegas a distância, dentre outras possibilidades.
Atrelado ao hibridismo que a tecnologia permite acessar, podemos inserir nesse contexto a metodologia
da sala de aula invertida, também conhecida como flipped classroom - já que o modelo de sala de aula em que
o professor ministra o conteúdo é invertido para a estratégia em que o aluno irá se apropriar do conteúdo em
casa, usando quaisquer artifícios que desejar, sejam livros ou fontes online, gerenciar a sua apropriação do
conhecimento e compartilhá-lo com os pares de forma presencial - e associar as duas metodologias na promoção
de uma aprendizagem significativa e autônoma. Leite (2017) afirma que a sala de aula invertida otimiza o
tempo da aula, uma vez que os alunos vem preparados para o ambiente presencial e utilizam o tempo da aula
para solver dúvidas e concentrarem-se em assuntos que despertam interesse, tornando o aproveitamento mais
positivo.
Seguindo o modelo de ensino híbrido em associação com a sala de aula invertida, dez alunos de Prática
de Ensino em Biologia IV, do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas do IFPB - Campus Cabedelo,
acessam o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) denominado Moodle Presencial para compartilharem
algumas tarefas. Dentre elas, o destaque é dado para a proposição seguinte: os alunos deveriam selecionar um
breve artigo acadêmico que trouxesse em seu cerne práticas de ensino interdisciplinares associadas à Biologia;
deveriam então postar no AVA o artigo e elaborar duas perguntas que iriam provocar a reflexão nos colegas
que, por conseguinte, leriam os artigo e responderiam às perguntas. A atividade foi realizada por nove entre dez
participantes da disciplina, e duas semanas após a finalização, foi realizado um momento de reflexão presencial
em que os alunos deveriam compartilhar o aprendizado e a validade de tal atividade para a sala de aula.

74 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Figura 4: Atividade no moodle da disciplina de Prática de Ensino em Biologia III.

Jamylle Rebouças Ouverney-King . Sandro José Conde


Figura 5: Atividade no moodle da disciplina de Prática de Ensino em Biologia III, aqui observamos a interatividade dos alu-
nos na proposição de questionamentos, respondendo aos colegas e ainda sugerindo outras leituras.

Durante a sessão de feedback, os participantes apontaram que acharam a atividade positiva já que
puderam ler e refletir sobre tema com artigos que não eram muito extensos, a leitura e a resposta aos
questionamentos feitos poderia ser realizada em qualquer momento que possuíam disponibilidade física e
de tempo, não sendo obrigatoriamente o espaço da sala de aula necessário, alguns informaram que faziam
a leitura durante o trajeto no ônibus usando dispositivos móveis, nos fóruns eles também parabenizaram os
pares pelos questionamentos propositivos e que, de fato, promoviam a reflexão sobre a prática da sala de
aula e destacaram que esse tipo de atividade surge como alternativa extremamente profícua para casos em
que os alunos estão impossibilitados de se deslocarem para os ambientes físicos de sala de aula, embora
estejam em condições de participar das atividades.
Outra experiência de sucesso foi a utilização da ferramenta Playposit, que traz a possibilidade de
inserção de um vídeo do Youtube e elaboração de questões – que podem ser reflexivas, de múltipla escolha
e abertas – sobre esse vídeo e que são sincronizadas e permitem ao usuário assistir ao vídeo e responder às
questões que são apresentadas. Desta forma, a aprendizagem híbrida e associada à sala de aula invertida
aparece como solução inclusiva e aproxima os atores do processo de ensino e aprendizagem não deixando
lacunas na colaboratividade nem na apropriação do conhecimento.

Volume 1 75
Destacamos ainda que a participação ativa e a colaboração por meio da troca de conhecimentos,
experiências, proposição de reflexão, leituras, de forma híbrida, quer seja lançando mão de AVA, ferramentas
digitais como Padlet, ou redes sociais como o Whats App fomentam a construção, desde a graduação, de
uma cultura de colaboratividade que uma Comunidade Profissional de Aprendizagem (DUFOUR et al, 2005)
necessita, visto que o resultado maior a ser alcançado pelos atores do processo de ensino e aprendizagem é a
apropriação do conhecimento de modo significativo pelo aluno.

À GUISA DE CONCLUSÃO

Assim, a partir de atividades centradas nos estudantes, metodologias ativas, criação de espaços de
compartilhamento coletivo de informação por meio digital, aliados a discussões em sala de aula, os “pré-
professores” praticaram e se apropriaram de elementos da Educação do Século XXI, conscientizando-se da
importância desse conceito para a inserção deles em suas práticas docentes, e de seus futuros alunos, no mundo
do trabalho e nas interações sociais modernas. As reflexões discentes que cercam o futuro da prática docente
referendam a necessidade de uma remodelação curricular, mas acima de tudo, de uma lógica que reposiciona
identitariamente o professor e transforma-o em colaborador ativo do conhecimento e não apenas aquele que
“alimenta” o aluno diariamente com o conhecimento. Desta forma, o professor do Século XXI é ressignificado
como agente de mudança. Com base em práticas como as aqui relatadas, pensamos e praticamos processos de
ensino e aprendizagem ubíquos e compartilhados, adaptados às necessidades e demandas globais mas ao mesmo
tempo regionais e locais, considerando idiossincrasias e todo o arcabouço que molda o indivíduo.

REFERÊNCIAS

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Volume 1 77
O ROLE-PLAY COMO ESTRATÉGIA DE
ENSINO PARA A ENFERMAGEM

Leticia Oliveira de Melo1


Roberta Carozo Torres2
Roseanne de Sousa Nobre 3

Resumo: O role-play é uma estratégia de ensino, traduzida como simulação de uma situação de trabalho que
permite aos alunos praticar a comunicação em diferentes contextos e papéis sociais e consolidar o aprendizado
teórico-prático. Objetivo: relatar a experiência da prática do role-play no processo de ensino-aprendizagem dos
alunos do Curso Técnico de Enfermagem do Instituto Federal de Alagoas. Metodologia: O público alvo foram
os estudantes do módulo I do curso técnico de enfermagem do IFAL, e iniciou em abril de 2018 seguindo as eta-
pas de: levantamento bibliográfico e identificação dos conhecimentos e habilidades que constituíram os casos;
leitura e discussão dos casos pelo corpo docente; apresentação da proposta à turma; criação do cenário e distri-
buição dos papeis entre os alunos; aplicação da simulação, discussão e avaliação da aprendizagem. Resultados:
Percebeu-se melhoria do processo de ensino-aprendizagem do conteúdo de enfermagem através da participação
ativa do aluno, aproximação de situações encontradas no mundo do trabalho por meio da simulação de casos
(situações-problema) e estímulo a percepção crítica do aluno através de debates e discussões. Conclusão: Esta
estratégia de ensino possibilitou aos docentes e discentes visualizarem de maneira dinâmica as concepções so-
bre o trabalho em equipe e a articulação entre teoria e prática.

Palavras-chave: Educação em enfermagem; Ensino fundamental e médio; Tecnologia educacional.

1
Professora do Instituto Federal de Alagoas - Campus Benedito Bentes. Enfermeira, mestre em Enfermagem pela Universidade Federal de Alagoas.
Membro do grupo de pesquisa em Enfermagem e Saúde - CNPQ/ IFAL.
Contato: leticia.melo@ifal.edu.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/0447231671658376
2
Professora do curso técnico de enfermagem do Instituto Federal de Alagoas - Campus Benedito Bentes. Enfermeira, mestre em Enfermagem pela
Universidade Federal de Sergipe. Líder do grupo de pesquisa em Enfermagem e Saúde - CNPQ/ IFAL.
Contato: roberta.torres@ifal.edu.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/9403750351171985
3
Professora do curso técnico de enfermagem do Instituto Federal de Alagoas -Campus Benedito Bentes. Enfermeira, mestre em Ciências e Saúde
pela Universidade Federal do Piauí. Membro do grupo de pesquisa em Enfermagem e Saúde - CNPQ/ IFAL. Membro do grupo de pesquisa em Saúde
Coletiva - CNPQ/ UFPI.
Contato: roseanne.nobre@ifal.edu.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/7652707228250878

78 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


ROLE-PLAY AS A TEACHING STRATEGY FOR NURSING

Abstract: Role-play is a teaching strategy translated as a simulation of a work situation that allows studen-
ts to practice communication in different social contexts and roles and to consolidate theoretical-practical
learning. Objective: to report the experience of the role-play practice in the teaching-learning process of
students of the Nursing Technical Course of the Federal Institute of Alagoas. Methodology: The target
audience was the students of module I of the nursing technical course of IFAL, it began in April 2018,
following the steps: bibliographical survey and identification of the knowledge and skills that constituted
the cases; reading and discussion of cases by faculty; presentation of the proposal to the class; scenario
creation and distribution of roles among students; application of simulation, discussion and evaluation of
learning. Results: It was noticed the improvement of the teaching-learning process of nursing content
through active participation of the student, approximation of situations found in the work world through

Letícia Oliveira de Melo . Roberta Carozo Torres . Roseanne de Sousa Nobre


case simulation (problem situations) and stimulation of the critical perception of the student through deba-
tes and discussions. Conclusion: This teaching strategy enabled teachers and students to view in a dyna-
mic way the conceptions about teamwork and the articulation between theory and practice.

Keywords: Nursing education; Elementary and high school; Educational technology.

Volume 1 79
INTRODUÇÃO

Na conjuntura atual, de acelerado processo de modernização científica e tecnológica, são necessárias


modificações e/ou inovações no processo de formação profissional. Nesse contexto, no âmbito da formação na
área da saúde, deve-se priorizar a formação crítica e reflexiva, comprometida com as necessidades de saúde da
população.
Dessa forma, um dos desafios para a educação na saúde consiste em adotar posturas pedagógicas que
considerem o princípio da integralidade no preparo desses profissionais. Por conseguinte, os professores da
área de Enfermagem têm buscado propor métodos de ensino com vistas a despertar o interesse e desenvolver a
aprendizagem significativa dos discentes (CARVALHO et al., 2016).
No tocante ao ofício da Enfermagem, salienta-se o quão crucial é a formação contextualizada, com
qualidade, considerando as habilidades e competências específicas para contemplar a complexidade que envolve
a própria natureza de seu trabalho – o cuidado humano – que exige um olhar sensível e crítico, a fim de garantir
uma assistência de qualidade (FROTA et al., 2013).
Todavia, mesmo diante dessa constatação ainda é evidenciado o predomínio de práticas pedagógicas
tradicionais, rígidas e mecânicas, que por vezes considera o estudante um ser vazio, que necessita ser preenchido
por conteúdos, negando-lhe a oportunidade de estabelecer relação com o ambiente no qual está inserido e por
isso encontra dificuldade no desenvolvimento do senso crítico e analítico (PETERSEN et. al, 2013).
Neste sentido, estimular e aplicar estratégias de ensino que aproximem os estudantes de situações
encontradas na prática se torna fundamental para que possam tornar-se mais críticos e reflexivos contribuindo
para a resolução de problemas do cotidiano prático (SILVA, CUNHA, FIGUEIREDO, 2015).
Dentro desse contexto se insere o role-play, uma estratégia de ensino que oferece maior realismo às
situações apresentadas em sala e se aproxima dos desafios presentes no mundo do trabalho. O role-play se
caracteriza pela simulação de um caso previamente preparado, que dá significado aos conteúdos ensinados e
proporciona ao estudante a aproximação com a realidade do trabalho em saúde (COGO, et.al, 2016).
Consiste em um método que favorece aos discentes a vivência metafórica de situações-problema
correspondentes aos principais cenários de atuação profissional. Parte-se do pressuposto de que tal vivência
pode favorecer o desenvolvimento da autonomia e do pensamento crítico-reflexivo do aluno diante de sua
formação, tendo como foco a participação ativa do mesmo no processo de aprendizagem (SOARES, et al.,
2015).
Vale ressaltar que para exercer a docência na área da saúde é imprescindível que os docentes conheçam as
tendências pedagógicas e filosóficas que permeiam o ensino nesse campo, a partir da utilização de metodologias
inerentes às novas concepções em educação, capazes de superar a tendência tradicional culturalmente enraizada.
A iniciativa de realizar este projeto de ensino surgiu da vivência das próprias docentes a partir das
experiências em sala de aula que mostraram a necessidade de integrar teoria e prática. Este projeto teve como
objetivo promover a aprendizagem contextualizada fazendo a integração entre os conteúdos das disciplinas e
casos construídos relacionados à prática profissional.
Desta forma, objetivou-se neste artigo relatar a experiência de aplicação do role-play com os alunos do
Curso Técnico em Enfermagem do Instituto Federal de Alagoas (IFAL).

METODOLOGIA

Trata-se de um relato de experiência dos resultados parciais do Projeto “O Role-play como estratégia de
ensino para a enfermagem” que teve início em abril de 2018, e encontra-se em andamento. O público alvo foram
os estudantes do módulo I do Curso Técnico em Enfermagem do IFAL, selecionados a partir dos seguintes
critérios de inclusão: estar matriculado no 1º semestre do Curso Técnico em Enfermagem do IFAL, cursando
a disciplina Fundamentos de Enfermagem I e ter disponibilidade de horário para participar do momento da
simulação. Foram excluídos os alunos faltosos, bem como os matriculados no Módulo II que já participaram do
projeto. O projeto foi desenvolvido de acordo com as seguintes etapas:

80 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


1ª etapa: foi norteada pelo levantamento bibliográfico e identificação dos conhecimentos e habilida-
des que constituiriam os casos para posterior simulação. Durante esta etapa, como também nas posteriores,
foram realizadas reuniões de orientação com os alunos envolvidos.
2ª etapa: foi desenvolvida a construção textual de cada caso com a colaboração dos professores e
alunos (bolsista e voluntário) do projeto. Na sequência, os casos foram lidos e discutidos pelo corpo docen-
te responsável pela disciplina Fundamentos de Enfermagem I para promover a identificação dos estudantes
com a situação-problema descrita na situação-problema. Os casos foram construídos de forma a apresentar
circunstâncias de cuidado que estimulassem a busca por conhecimento teórico (Fundamentos de Enferma-
gem, Ética, Biossegurança, dentre outros) articulado ao contexto prático. Além disso, os casos construídos
envolveram situações recorrentes dos campos de prática, relacionados à realidade local.
3ª etapa: após o preparo dos casos clínicos, a proposta foi apresentada à turma do Curso Técnico em
Enfermagem (módulo I) e aos professores das disciplinas para início do role-play e construção da agenda

Letícia Oliveira de Melo . Roberta Carozo Torres . Roseanne de Sousa Nobre


de aplicação destes.
4ª etapa: na sequência, o role-play foi planejado com a criação de um cenário no laboratório de en-
fermagem, sendo os papéis da simulação distribuídos entre os alunos. Estes estavam diante de prescrições
médicas e de enfermagem, que simulavam dúvidas e tomadas de decisão em diálogos produzidos no pre-
paro e realização de cuidados. O cenário foi preparado no laboratório de enfermagem pelos professores do
projeto juntamente com o aluno bolsista e voluntário, considerando a área física e os materiais disponíveis.
5ª etapa: aqui ocorreu a aplicação do role-play através da simulação/dramatização focada na singu-
laridade de cada caso. Os estudantes simularam/ dramatizaram o caso selecionado e os que não participa-
ram da encenação assistiram, e posteriormente participaram do debate, opinando e discutindo a respeito
das atitudes e decisões realizadas pelos atores (alunos) de acordo com cada situação. Após a simulação,
o docente responsável orientou a discussão, recapitulou os objetivos e descreveu sua percepção sobre a
atividade.
6ª etapa: a avaliação da aprendizagem dos alunos ocorreu de forma contínua durante todo o processo
a partir da observação dos momentos de simulação e aplicação de questionários com perguntas objetivas e
subjetivas para avaliar a satisfação e aprendizagem de acordo com os casos simulados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O Curso Técnico Subsequente em Enfermagem do IFAL foi implantado em fevereiro de 2018, e en-
contra-se com duas turmas, compostas por 20 alunos cada. Dentro do Projeto Político Pedagógico do cur-
so, a disciplina Fundamentos de Enfermagem I é o componente curricular no qual são ensinadas as técnicas
da assistência de enfermagem, dentre elas a verificação de sinais vitais e a administração de medicamentos.
A verificação de sinais vitais e a administração de medicamentos são práticas corriqueiras à equipe
de enfermagem, sendo na maioria das vezes executada pelos técnicos e auxiliares, e em casos especiais
pelo enfermeiro, conforme orientações da prática profissional regulamentadas pelo Conselho Federal de
Enfermagem (COFEN).

Volume 1 81
Foi realizada a simulação da prática de verificação de sinais vitais e administração de medicamentos
das vias oral (VO), subcutânea (SC) e intramuscular (IM) a partir de dois casos previamente elaborados que
buscaram integrar os conteúdos estudados nas diversas disciplinas do primeiro semestre do curso (Anatomia,
Biossegurança, Fundamentos de Enfermagem e Farmacologia).
Participaram da simulação quatro docentes do curso, dentre elas a coordenadora do projeto, e as demais
responsáveis pela disciplina de Fundamentos de Enfermagem I. Fizeram-se presentes 25 discentes, que foram
inicialmente divididos em dois grupos, subdivididos em trios e quartetos e distribuídos em três estações de
prática.
Cada docente comandou uma estação, distribuindo os personagens entre os discentes do grupo. Após
a leitura do caso, os participantes executaram os seus papéis de acordo com a descrição de cada personagem
na ficha individual. O discente que executou o papel do técnico de enfermagem teve acesso a um modelo de
prontuário no qual constavam as informações do paciente (dados clínicos e sociais), bem como prescrição
médica e formulário para registro do procedimento.
No primeiro momento os alunos experienciaram a prática a partir do conhecimento teórico adquirido nas
aulas expositivas e estudos extraclasse. Após a simulação, ocorreu o debate e discussão a respeito das decisões
tomadas em cada caso com a participação dos alunos quanto às percepções, dúvidas e sugestões. Os pontos
mais relevantes por eles levantados foram a falta de habilidade técnica e a pouca interação do profissional com
o paciente e familiar.
De acordo com Morán (2015), na implementação das metodologias ativas, o professor enquanto mediador
deve acompanhar e analisar os resultados e possíveis lacunas durante a aplicação da atividade. Devido ao fato
de esta ter sido a primeira execução desta metodologia, em alguns momentos foi necessária a interferência das
docentes para esclarecer dúvidas quanto a execução da mesma.
No que diz respeito a avaliação do role-play como metodologia ativa de ensino, a maioria dos alunos disseram
estar muito satisfeitos, conforme mostra a tabela 1.

Tabela 1 – Score de satisfação dos alunos quanto ao uso do role-play como método de ensino na
enfermagem. Maceió, Al, 2018 (n=25).
Variáveis N %
1. Muito satisfeito 19 76
2. Satisfeito 6 24
3. Insatisfeito - -
4. Muito insatisfeito - -

Nenhum discente avaliou o método como insatisfatório, o que demonstra que o role-play é uma estratégia
adequada para o ensino na Enfermagem, para o público em que foi empregado, por aproximar o aluno da
realidade que encontrará na prática, conforme constatado pelo relato a seguir:

Os casos simulados são uma forma de inserir o aluno na realidade do ambien-


te hospitalar (...) tornando-se, portanto, um importante instrumento na busca da dimi-
nuição de possíveis erros, uma vez que aguça o senso autocrítico do estudante. (A3)

A utilização de métodos lúdicos, como jogos e simulações, no processo de ensino-aprendizagem desa-


fia o aluno a aplicar o conhecimento teórico e desenvolver as habilidades. Portanto o jogo emerge como uma
oportunidade para consolidar e resgatar os conhecimentos adquiridos até então, além de estimular o pensamento
crítico e a tomada de decisão, habilidades essenciais para o profissional de enfermagem.

82 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Ajuda na percepção e avaliação dos conhecimentos adquiridos até aqui, aumentou o desejo pela
busca do aperfeiçoamento. (A14)

Além do desenvolvimento dessas habilidades técnicas, os desafios bem planejados contribuem


ainda para aprimorar as competências emocionais, pessoais e de interação, o que para a enfermagem
facilita a prática de uma assistência humanizada (MORÁN, 2015; XAVIER et al., 2014).
Os discentes acreditam que o método é uma importante ferramenta para uma qualificação
diferenciada, no qual o lúdico lhes eximiu do peso da seriedade da sala de aula, o que facilitou o aprendizado,
e por isso deve ser difundido.

Este método é um degrau a mais para uma boa qualificação das turmas. Inclusive, merece ser apre-
sentado para outras escolas técnicas e até mesmo para os cursos de nível superior. (A7)

A revisão integrativa feita por Neves da Nova Fernandes e Ângelo (2018) evidenciou que os jogos
e as simulações tem sido bastante utilizados no ensino da enfermagem, mais especificamente no nível
superior, por promover a autoaprendizagem. Não foram encontrados estudos a respeito da utilização do

Letícia Oliveira de Melo . Roberta Carozo Torres . Roseanne de Sousa Nobre


role-play no ensino técnico em enfermagem, o que endossa a relevância desse projeto.
O role-play permite ao aluno a percepção de si, do outro e do ambiente que lhe espera no cotidiano
profissional, estimulando-o a implicar-se com o princípio fundamental da enfermagem enquanto ciência –
o cuidado ao ser humano.

CONCLUSÃO

O role-play, enquanto estratégia de ensino e aprendizagem, mostrou-se como um método efetivo,


visto que possibilitou aos docentes e discentes visualizarem de maneira dinâmica as concepções sobre o
trabalho em equipe e a articulação entre teoria e prática.
A partir da simulação foram evidenciadas lacunas no conhecimento dos alunos quanto a execução
das técnicas de verificação de sinais vitais e administração de medicamentos, levando-os a refletir a res-
peito da importância destas, dos saberes e habilidades necessários para execução, além de questões éticas.
A implicação dos alunos com o cuidado centrado no ser humano reafirma a relevância deste método de
ensino. O projeto segue em andamento, sendo estes resultados parciais. Sugere-se que mesmo com a
avaliação positiva dos alunos a estratégia seja aplicada novamente com vistas a elucidar a sua eficácia em
outras turmas com o objetivo de comparação dos resultados.

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SILVA, O.S.; RAMOS, R.L.; CUNHA, K.C.S.; FIGUEIREDO, N.M.A. Habilidades e destreza manual: tratan-
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SOARES, A.N.; GAZZINELLI, M.F.; SOUZA, V.; ARAÚJO, L.H.L. Role Playing Game (RPG) como estra-
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SOARES, A.N.; GAZZINELLI, M.F.; SOUZA, V.; ARAÚJO, L.H.L. Role Playing Game (RPG) na graduação
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XAVIER, L.N. et al. Analisando as metodologias ativas na formação dos profissionais de saúde: uma revisão
integrativa. Sanare, v.13, n.1, 76-83, 2014.

84 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


ANEXO A

CASO CLÍNICO PARA ROLE-PLAY


ADMINISTRAÇÃO DE MEDICAMENTOS E VERIFICAÇÃO DE SINAIS VITAIS

DADOS DE IDENTIFICAÇÃO: paciente do sexo masculino, autônomo, casado, 39 anos, natural e pro-
cedente de Maceió/AL.

QUEIXA PRINCIPAL: dores abdominais.

HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL: Sr. Luiz certo dia acordou queixando-se de dor na região do abdômen.
Etilista crônico, procurou o PS com queixa de epigastralgia intensa. Aferidos sinais vitais: taquicárdico

Letícia Oliveira de Melo . Roberta Carozo Torres . Roseanne de Sousa Nobre


(110bpm), taquidispneico (26 ipm), hipotenso (PA= 90X60mmHg), febril (38ºC), saturação de O2 93%. Ao
exame físico: ictérico, abdome ascítico, emagrecido, pele fria e pegajosa.

Foi avaliado pelo médico plantonista, que realizou a prescrição médica e solicitou exames laboratoriais e
de imagem. Foi encaminhado à sala de medicação.

HISTÓRIA MÉDICA PREGRESSA: hipertensão arterial e etilismo.

HISTÓRIA FAMILIAR:

• Pai: faleceu aos 57 anos devido a cirrose hepática;


• Mãe: faleceu aos 78 anos, sem comorbidades;
• Possui dois irmãos (1 diabético);
• Possui uma filha saudável.

EXAME FÍSICO: Bom estado geral aparente, lúcido, orientado, mucosas normocoradas. Peso: 70kg; Al-
tura: 1,70m; Temperatura: 36.6°C; FR: 26ipm; FC: 110bpm; PA: 90x60mmHg. Bulhas normofonéticas;
ausculta pulmonar normal; fígado palpável sob o rebordo costal; sem edema; pulsos periféricos palpáveis.

EXAMES COMPLEMENTARES: glicose: 412mg/dl; creatinina: 1,1mg/dl; colesterol total: 194; coles-
terol HDL: 38mg/dl; triglicerídios: 70mg/dl; ácido úrico: 7,0mg/dl; hemoglobina: 15,9mg/dl; leucócitos:
5.400; TSH: 1,36; PSA total: 0,38; TGO 22,4 U/I; tempo de protrombina: RNI 0,9. Anexo radiografia de
tórax anormal.

Volume 1 85
ANEXO B
FICHAS DOS PERSONAGENS

Nome: L.T.M
Idade: 39 anos.
Naturalidade/Procedência: Maceió/AL.
Estado civil: Casado.
Sexo: Masculino.
Profissão: Autônomo.
Filho(s): 1.

Nesse dia, Luiz acordou como de costume às 5:30h, desempenhou sua rotina normal e por volta das 6:15h
começou a se sentir mal, com fortes dores abdominais e não quis tomar o café da manhã. Entretanto, por
volta das 6:30h sua esposa entra em seu quarto e o encontra pálido e reclamando de dores. Preocupada,
leva-o ao PS. Após ser examinado, ele é medicado e mantido em observação para a realização de alguns
exames.

Nome: S.S.P.S

Idade: 31 anos.
Naturalidade/Procedência: Maceió/AL.
Estado Civil: Casada.
Sexo: Feminino.
Profissão: Cabeleireira.
Esposa de Sr. Luiz, acordou cedo para preparar o café da manhã, foi até seu quarto, onde o encontrou se
sentindo mal. Preocupada, levou-o até o PS. Está extremamente aflita e nervosa, pois o seu esposo não é
de adoecer, e além disso precisa abrir o salão.

Nome: J.C.J

Idade: 28 anos.
Naturalidade/Procedência: Maceió/AL
Estado Civil: Solteira.
Sexo: Feminino.
Profissão: Técnica de Enfermagem.
Filho(s): 2.

Antes de chegar ao plantão discutiu com sua mãe após esta queixar-se de que ela trabalha muito, está
sempre cansada e não cuida dos filhos. Além disso, não teve uma boa noite de sono pois sua filha estava
com febre. Chegou ao hospital atrasada, às 7h50min, e às pressas foi iniciar sua rotina hospitalar.

86 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


ANEXO C
PRESCRIÇÃO MÉDICA

1. Jejum até segunda ordem


2. Passar sonda nasogástrica aberta
3. Instalar cateter nasal de oxigênio 3l/min
4. SG 5% 1000ml + NaCl 20% 20ml em 24h
5. Metoclopramida 10mg, IV, 8/8h
6. Ranitidina 1g, IV, agora

Letícia Oliveira de Melo . Roberta Carozo Torres . Roseanne de Sousa Nobre


7. Omeprazol 20mg, VO, agora
8. Dipirona 1 amp IM, agora
9. Glicose 50% 40ml, IV, se dextro < 70mg/dl
10. Insulina regular humana 8UI SC agora
11. Dextro 6/6h
12. Verificar Sinais Vitais (SSVV) 6/6h

13. Encaminhar para realização de exames solicitados

Volume 1 87
USO DE DESENHOS TÁTEIS PARA AUMENTAR O ACESSO DE DEFICIENTES
VISUAIS A INFORMAÇÕES ESPORTIVAS

João Elias Vidueira Ferreira1


Maria do Perpétuo Socorro Sarmento Pereira2
Deriks Karlay Dias Costa3

Resumo: As representações visuais esportivas são pouco acessíveis aos deficientes visuais, que não podem
enxergar as imagens mostradas em livros, televisões, computadores e até nas quadras de esportes. Este trabalho
tem como objetivo realizar um estudo sobre desenhos táteis de quadras esportivas (tênis, voleibol, futebol de
salão, futebol de campo, handebol, basquetebol e golbol) para deficientes visuais. Os desenhos das quadras
esportivas foram criados no computador e impressos sobre papel microcapsulado. Depois os desenhos foram
submetidos ao calor utilizando uma máquina fusora térmica. Os desenhos táteis foram avaliados por um grupo
de deficientes visuais. O ensino de Educação Física se torna mais inclusivo quando emprega desenhos em relevo
com informações em Braille e descrição verbal auxiliando os deficientes visuais na exploração dos ambientes
de práticas esportivas.

Palavras-chave: Desenhos táteis; Quadras esportivas; Deficiência visual.

1
Servidor do Instituto Federal do Pará- campus Tucuruí. Pós-doutorado em Ensino de Química pela The University of Queensland, Austrália, dou-
torado e mestrado em Química pela UFPA.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/8018691254585785
Contato: joao.elias@yahoo.com.br
2
Servidor do Instituto Federal do Pará, campus Tucuruí. Mestrado em Ciências da Educação pela Universidad Internacional Tres Fronteras, Paraguai.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/9940055346582613
3
Servidor do Instituto Federal do Pará, campus Tucuruí.Mestrando em Computação Aplicada pela UFPA.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/6715128767869399

88 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


THE USE OF TACTILE GRAPHICS TO ENHANCE THE ACCESS
OF BLIND AND VISUALLY IMPAIRED PEOPLE TO INFORMATION ON SPORTS

ABSTRACT: Visual representations in sports are little accessible to blind and visually-impaired people,
whom cannot see the graphics presented in books, televisions, computers and even in courts. This work
aims to study tactile graphics of courts (tennis, volleyball, indoor soccer, soccer, handball, basketball, and
goalball) for blind and visually-impaired people. The drawings were created using computation and printed
onto microcapsule paper. Then they were heated using a heat machine. The drawings were evaluated by
a group of people with vision impairment. Physical Education is more inclusive when there is embossed
design with Braille text and verbal description. It helps blind and visually-impaired people to explore
places where sports are practiced.

João Elias Vidueira Ferreira . Maria do Perpétuo Socorro Sarmento . Deriks Karlay Dias Costa
Key-words: Tactile graphics; Courts; Vision impairment.

Volume 1 89
INTRODUÇÃO

A cultura esportiva está bastante presente nas nossas vidas. Desde crianças somos convidados a participar
das mais variadas modalidades esportivas, tanto para fins de lazer, de qualidade de vida ou até mesmo como uma
profissão. Os benefícios trazidos aos deficientes visuais por terem um maior conhecimento acerca do mundo
dos esportes está no fato de se ter uma maior compreensão da própria realidade, do mundo em que vivemos.
O esporte possui uma ação que ativa a imaginação humana, facilita a socialização, proporciona lazer e, dessa
maneira, contribui para o processo de inclusão.
O mundo dos esportes possui uma linguagem própria para mostrar seus ambientes de práticas. As
representações existentes, por exemplo, em um campo de futebol ou em uma quadra de basquetebol, dão
sustentação à lógica de funcionamento de determinada modalidade esportiva. Assim, tem-se, no caso de um
campo de futebol, o meio de campo, a grande área, a pequena área, o escanteio etc. No basquetebol, a disposição
dos elementos espaciais é outra: garrafão, linha de três pontos, semicírculo de lance livre, etc. Por conseguinte,
nota-se que muito daquilo aprendido sobre esportes é baseado no aspecto visual da localização desses elementos.
Entretanto, acreditamos que, lamentavelmente, os deficientes visuais estão em desvantagem no que
diz respeito ao acesso às informações do mundo dos esportes, particularmente quando estas são apresentadas
de modo visual. Eles não podem enxergar as inúmeras imagens disponíveis em livros, apostilas, televisões,
computadores ou até mesmo estampadas em roupas. O acesso ao conhecimento por parte dos deficientes visuais
exige fundamentalmente a utilização dos sentidos da audição e do tato, pois a visão encontra-se parcialmente ou
totalmente comprometida.
Este trabalho objetiva realizar um estudo sobre o uso de maquetes táteis de quadras esportivas (tênis,
voleibol, futebol de salão, futebol de campo, handebol, basquetebol e golbol) com deficientes visuais. Sua
relevância está no fato de que a literatura ainda é insuficiente de conhecimentos acerca do emprego de
tecnologias assistivas no ensino da educação física escolar, em especial na adaptação de representações visuais
aos deficientes visuais.
Os materiais em relevo tátil são recursos indispensáveis para pessoas com deficiência severa na visão.
Além de um importante recurso didático, os materiais em relevo tátil são instrumentos que oferecem novas
vivências e experiências à pessoa com deficiência visual e contribuem para que o processo de inclusão social
realmente aconteça. Ocorre que sem a visão os outros sentidos passam a receber a informação de forma
intermitente, fugidia e fragmentária (DE SÁ; DE CAMPOS; SILVA, 2007).
O artigo 59 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) estabelece que: “os
sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: I – currículos, métodos, técnicas,
recursos educativos e organização específicos para atender às suas necessidades”. O estatuto do IFPA (Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará, 2009) ressalta em seu inciso IV do artigo 3° do capítulo II, o
qual trata “Dos Princípios, Das Finalidades, Das Características e Dos Objetivos do IFPA”, que a instituição tem
“Compromisso com a formação humana integral e emancipatória, com a produção e difusão de conhecimentos
científicos tecnológicos, com alcance à inclusão de indígenas, quilombolas e pessoas com deficiências e
necessidades educacionais especiais”. Também o inciso III do artigo 5° desse mesmo capítulo, afirma que o
IFPA tem como objetivo “realizar pesquisas aplicadas, estimulando o desenvolvimento de soluções técnicas e
tecnológicas, estendendo seus benefícios à comunidade”.
Segundo Lemos (2018), a educação física escolar tem a colaborar com o aprimoramento do educando
como pessoa humana, como cidadão e não, apenas, com a preparação física de pessoas. De Carvalho (2012)
defende que a escola inclusiva vai muito além de oferecer estrutura física facilitando o acesso, e/ou a criação
infinita de leis que garantem direitos, que na maioria das vezes se esbarram na falta de preparo profissional e
falta de investimentos em materiais didáticos e, pior ainda, na falta de uma cultura inclusiva na sociedade.
A educação física, parte integrante do contexto escolar, na opinião de De Carvalho (2012), é uma
disciplina que, além de benefícios educacionais, é área fértil para o trabalho de sociabilização e superação.
Assim, é desafiada a proporcionar conteúdos e atividades que possibilitem a participação de todos, para, de fato,
construir uma escola de todos, respeitando o ritmo, limites e possibilidades de cada um: igualdade de direitos.
Este estudo também pode proporcionar novas possibilidades para a prática pedagógica concreta na educação

90 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


física escolar, possibilitando a ampliação de suas estratégias e metodologias no processo de ensino-
aprendizagem do aluno deficiente visual, concretizando o processo inclusivo. Este processo,

[...] tange questões como o acesso, a permanência e, principalmente as metodologias adaptadas para
assegurar a participação desses alunos nas aulas, sobretudo nas de educação física, uma vez que
a perda ou a falta de visão não os impedem de participar ativa e efetivamente das aulas, seja qual
for a modalidade de ensino [...] Portanto, a universalização e a democratização das oportunidades
devem ser debatidas e pensadas de modo real, de acordo com a realidade situacional, sem atos pro-
tecionistas ou paternalistas, buscando o respeito pelas diferenças [...] oferecer conjunturas ideais de
igualdade. (FREITAS; SALES; MOREIRA, 2016, p.101)

Finalmente, o IFPA, campus Tucuruí, tem realizado diversos trabalhos de ensino, pesquisa e extensão
no âmbito do uso de tecnologias assistivas para levar informação aos deficientes visuais e contribuir na
melhoria do processo de ensino-aprendizagem dos mesmos. Espera-se que este trabalho seja um valioso
instrumento para aumentar o acesso de deficientes visuais à cultura esportiva por meio do uso de maquetes
táteis das quadras esportivas.

João Elias Vidueira Ferreira . Maria do Perpétuo Socorro Sarmento . Deriks Karlay Dias Costa
OBJETIVO
OBJETIVO GERAL

Aumentar o acesso de deficientes visuais ao conhecimento esportivo utilizando maquetes táteis de


quadras esportivas.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

• Verificar qual o grau de conhecimento dos deficientes visuais sobre as quadras esportivas.
• Investigar possíveis diferenças na percepção tátil de maquetes de quadras esportivas e diferen-
tes perfis de deficientes visuais.
• Verificar se entre os deficientes visuais há um maior estímulo aos esportes quando tem acesso
às maquetes táteis de quadras esportivas.

MATERIAIS E MÉTODOS

A metodologia empregada na coleta de dados dessa pesquisa foi fundamentalmente qualitativa,


baseada em entrevistas, questionários e observação direta envolvendo os entrevistados, nas quais foi
privilegiado o emprego de maquetes táteis de quadras esportivas acessíveis às pessoas com deficiência
visual. Inicialmente, como estratégia de ação, foi proposta a formação de um grupo de estudo/trabalho
com os membros desenvolvedores da pesquisa. Esse grupo foi composto por três servidores do IFPA,
campus Tucuruí: um docente, com experiência no ensino e na produção de materiais educativos adaptados
aos deficientes visuais; uma técnica em assuntos educacionais, que é graduada em Educação Física e
possui experiência profissional na área; e um técnico audiovisual, que tem experiência no desenvolvimento
de novas tecnologias. O grupo se reuniu periodicamente para o planejamento da pesquisa, produção e
avaliação das maquetes esportivas adaptadas com os deficientes visuais.
Posteriormente, foi feito um levantamento na literatura acerca dos diferentes métodos de adaptação
de materiais pedagógicos para deficientes visuais, principalmente buscando identificar seus pontos positivos
e negativos. Outro aspecto dessa pesquisa foi verificar, por meio de entrevista e questionário com questões

Volume 1 91
abertas e fechadas, o nível de conhecimento dos professores de Educação Física sobre formas de apresentar
representações visuais aos seus alunos com falta de percepção visual.
Em uma etapa seguinte, foram criados desenhos de áreas de prática de diversos esportes no computador
usando o software livre Inkscape®. Na confecção dos desenhos, foram usadas texturas bem diferenciadas
para enfatizar partes distintas da quadra (linhas e áreas), objetivando facilitar a exploração tátil por parte dos
deficientes visuais. Cada desenho de quadra foi impresso em papel microcapsulado (swell paper) tamanho A3,
marca Zy-tex2®, e teve inscrições visuais (para pessoas videntes, que enxergam) e em Braille (para pessoas que
só lêem o Braille). A fonte de letra em Braille usada foi a Duxbury Swell Braille tamanho 24. Primeiramente, o
desenho foi impresso no papel microcapsulado em uma impressora a laser e depois o papel foi submetido por
alguns segundos ao aquecimento em uma máquina fusora térmica (heating machine), marca Teca Fuser®. Com
o aquecimento, apenas as partes em preto no papel ficaram em relevo em uma altura uniforme.
Esse método de criação de imagens táteis é reportado na literatura como sendo um dos mais usados
no mundo (THOMPSON; CHRONICLE, 2006; BRAILLE AUTHORITY OF NORTH AMERICA, 2010;
POWER; JURGENSEN, 2010).
Os objetos esportivos táteis produzidos seguiram as orientações do manual americano BANA (2010), o
qual traz orientações acerca de como melhor fazer desenhos em relevo com legenda em Braile. Esses desenhos
em relevo foram avaliados por um grupo de três deficientes visuais formado por ex-alunos do IFPA, campus
Tucuruí. Esse grupo foi composto por pessoas com diferentes idades, tipos e graus de comprometimento da
visão, idade de chegada da deficiência visual, níveis de escolaridade, habilidades com a leitura em Braille e
com imagens em relevo e aptidões por esportes. Essa diversidade dos participantes teve como intenção fornecer
respostas variadas que pudessem enriquecer as discussões da pesquisa.
Cada participante foi comunicado pessoalmente sobre os propósitos da pesquisa. Nenhum deles recebeu
qualquer pagamento em dinheiro, porém eles foram devidamente esclarecidos sobre a relevância que esse
trabalho ostenta no sentido de contribuir para melhorias no ensino da Educação Física escolar às pessoas com
comprometimento da visão. Após o consentimento de participação, os deficientes visuais participaram de duas
entrevistas (antes e depois) da exploração tátil das maquetes em uma sala do IFPA, campus Tucuruí, em horário
que foi melhor conveniente para cada um. A identidade dos mesmos foi preservada, sendo de conhecimento
apenas dos entrevistadores. Os participantes foram identificados nesse texto com códigos P1, P2 e P3.
Durante o teste com as maquetes esportivas táteis, o pesquisador e o entrevistado sentaram
confortavelmente à frente de uma mesa, dispostos um de frente para o outro. As instruções e demais formas de
comunicação foram fornecidas através de uma combinação de instrução verbal e apresentação de materiais táteis
(desenhos e escritos em Braille). Os entrevistados foram motivados a se sentirem à vontade e falarem livremente
sobre suas opiniões, principalmente sobre a descrição das maquetes táteis. As entrevistas foram gravadas em
imagens e em áudio para facilitar o processo de análise dos resultados. Não houve restrição de tempo durante a
entrevista. Os deficientes visuais preencheram um questionário com questões abertas e fechadas para avaliar o
nível de conhecimento sobre as quadras esportivas antes e depois da apresentação das maquetes táteis, as quais
foram apresentadas a eles seguindo uma ordem aleatória.
No decorrer da exploração das maquetes com as mãos, os entrevistados puderam girar livremente as
maquetes. O pesquisador somente interviu com comentários de motivação/orientação, mas sem fornecer dicas
sobre o objeto que estava sendo explorado. Foram reportados os comentários mais interessantes dos entrevistados,
seus gestos e suas estratégias de exploração dos desenhos. Todos os comentários dos entrevistados que não se
ajustaram às características do desenho foram desconsiderados.
Finalmente, foram analisadas as informações geradas durante as entrevistas, o preenchimento dos
questionários e a exploração tátil das maquetes, que formaram a base para as discussões dos resultados dessa
pesquisa.

92 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os alunos com deficiência visual que avaliaram as maquetes táteis das quadras esportivas acharam
muito boa a experiência. Segundo eles, essas maquetes são de fácil manuseio e explicativas, pois trazem
em Braille informações acerca dessas quadras esportivas. De acordo com Padilha et al (2017), uma
característica chave sobre imagens em relevo para deficientes visuais é justamente a facilidade com que
essas imagens possam ser exploradas pelos dedos das mãos.
Os participantes realmente se sentiram curiosos para fazerem os testes das maquetes e, quando
estes aconteceram, não esconderam a satisfação por terem, pela primeira vez em suas vidas, explorado com
as mãos o desenho de áreas de práticas esportivas, algumas das quais apenas ouviam falar, sem ter uma
noção mais clara de como eram esses espaços de lazer. Eles acabam apresentando uma curiosidade natural
pelo uso dessas novas tecnologias.
Os participantes mostraram perfis variados com relação ao gênero, idade, tipo e período da vida da
chegada da deficiência na visão, assim como habilidade na leitura do Braille e de imagens táteis. A tabela 1
resume o perfil de cada um dos entrevistados. Apenas um deles era do sexo feminino. A faixa etária variou

João Elias Vidueira Ferreira . Maria do Perpétuo Socorro Sarmento . Deriks Karlay Dias Costa
de 25 a 41 anos.
Quanto à escolaridade, P1 estava cursando a graduação em engenharia sanitária e ambiental em
uma universidade pública. P2 tinha finalizado o ensino médio havia dois anos e estava sem estudar. P3
estava cursando a graduação em serviço social em uma universidade particular. Apenas P1 e P3 tiveram
efetivamente aulas de Educação Física no próprio Instituto Federal, porém todos tiveram aulas de Educação
Física nas outras escolas onde estudaram.
Dois participantes apresentavam cegueira e um deles era caracterizado como tendo baixa visão.
Nenhum deles já nasceu com comprometimento grave da visão. Todavia, um deles foi progressivamente
perdendo a percepção de luz durante a infância enquanto para os outros dois foi na adolescência que essa
perda evoluiu.
O nível de leitura em Braille era muito bom para os participantes P1 e P2. Já o P3 tinha um domínio
considerado regular. De fato, P3 teve pouco contato com o código Braille, pois a chegada da cegueira
aconteceu enquanto cursava o ensino médio e em sua escola não havia nenhum suporte de equipamento
e nem pessoas capacitadas para a produção de material adaptado para deficientes visuais. Curiosamente,
essa participante concluiu a educação básica com um conhecimento mínimo do Braille, apesar de ser cega!
Então, supõe-se que nas várias disciplinas escolares essa aluna deva ter sido meramente aprovada...

Volume 1 93
Figura 1. Desenho tátil da quadra de basquetebol

94 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


João Elias Vidueira Ferreira . Maria do Perpétuo Socorro Sarmento . Deriks Karlay Dias Costa
Figura 2. Desenho tátil do campo de futebol

As figuras 1 e 2 mostram, respectivamente, o desenho de uma quadra tátil de basquetebol e de um


campo de futebol. Já a figura 3 mostra um dos entrevistados explorando esses desenhos em relevo com
legenda em Braille.

Volume 1 95
Figura 3. Deficiente visual avaliando o desenho tátil de uma quadra esportiva

Você se sentia incluído nas aulas de Educação Física?

A primeira pergunta tinha como objetivo sondar se os entrevistados se sentiam incluídos nas aulas
de Educação Física escolar. Suas respostas ajudariam a avaliar se de fato tem-se trabalhado na prática a tão
defendida inclusão na educação.

Participava e ajudava no dia-a-dia... agilidade, noção espacial [...]. Faltava equipamentos adaptados:
bola com guizo e demarcações na quadra. (Participante P1).

Passei a praticar Educação Física no fundamental II, mas não era junto com os demais colegas. Era
sempre caminhada, a escola não tinha espaço adequado. No IFPA passei a participar efetivamente [...].
No fundamental II eu não era incluído porque não tinha quadra. No ensino médio eu era incluído porque
tinha espaço adequado. (Participante P2).

Não participava das aulas no ensino fundamental. No médio, participei pouco [...]. Eu não era incluída
no fundamental I e II. No médio, participava apenas do atletismo. (Participante P3).

O participante P1 reconhece em sua fala a relevância da Educação Física em sua vida, quando cita que
ela ajudava no seu dia-a-dia, particularmente se referindo à orientação e mobilidade. No entanto, P1 também
reconhece uma triste realidade vivida no nosso país: a falta de estrutura de apoio aos deficientes visuais nas
aulas de Educação Física. Essa falta de estrutura que tem como consequência direta a pouca participação dos
deficientes visuais em atividades dessa disciplina também é destacada por P2 e P3.
A inclusão é um elemento importante a ser trabalhado no ambiente escolar. Na Educação Física, na
maioria das vezes, os alunos que precisam ser incluídos acabam sendo excluídos das atividades pelo fato de não
conseguirem realizá-las ou pelo uso de metodologias de ensino que não reconhecem as diferenças dos alunos
(WERMANN; NEUENFELDT, 2015). A Educação Física é importante para todos os estudantes incluindo
aqueles com deficiência visual. Embora o planejamento seja necessário, é importante incluir os estudantes em
programa de Educação Física considerando ser isso um componente exigido do currículo padrão (WILLINGS,
2018).

96 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Como eram as aulas de Educação Física na escola?

Este segundo questionamento acabou sendo parcialmente respondido já na primeira pergunta, pois,
considerando a falta de materiais adaptados e também a falta de um melhor preparo por parte de alguns
profissionais de Educação Física, havia pouca participação nas atividades de Educação Física. No entanto,
esta segunda pergunta pontuou ações que eram desenvolvidas (quando eram desenvolvidas!) nas aulas.

Durante o ensino médio, nas aulas, tinha o colega ajudando. No basquete, eu ficava embaixo
do garrafão. No vôlei, eu sacava [...]. Os professores não eram capacitados para trabalhar com
deficientes visuais, mas foram buscando maneiras de me incluir e modificar as modalidades. (Par-
ticipante P1).

No ensino médio, no voleibol eu sacava. No basquete eu ficava próximo da cesta. (Participante P2).

João Elias Vidueira Ferreira . Maria do Perpétuo Socorro Sarmento . Deriks Karlay Dias Costa
Não participava. (Participante P3).

O participante P1 toca numa das variáveis relacionadas à problemática da prática esportiva escolar
na perspectiva da inclusão: falta um melhor preparo dos próprios profissionais de Educação Física para
o atendimento ao aluno com necessidades específicas. É interessante comentar que, embora P1 tenha
dito que os professores no ensino médio foram buscando maneiras de incluí-lo, esse participante revelou,
depois, que quando cursava a 5ª série do ensino fundamental, ele ficava apenas sentado na beira da quadra
durante as aulas de educação Física. No final, recebia a presença sem ter efetivamente participado de
qualquer atividade física. Naquela ocasião, esse aluno questionou como ele foi aprovado em Educação
Física se não participava das aulas. Então a direção daquela escola trocou o professor da turma do aluno
deficiente visual.
Os professores de Educação Física precisam compreender que o destaque dado ao aluno com
deficiência sempre deve ser as suas possibilidades e capacidades e não as suas limitações (FREITAS;
SALES; MOREIRA, 2016). No que diz respeito à atitude do professor que deixava o aluno na beira da
quadra, Willings (2018) defende o apoio à inclusão dos estudantes deficientes visuais em atividades de
grupo. Conforme a autora, deve-se ter certeza de que os estudantes jogam, brincam e conversam com seus
colegas de turma ao invés de se sentarem sozinhos pelos cantos.

Qual desenho tátil de quadra de esporte foi o mais fácil e o mais difícil de entender?

Mais fácil

Campo de futebol, porque assisto muito jogos de futebol. (Participante P1).

Futebol de campo. Eu jogava na minha infância. (Participante P2).

Golbol e tênis de quadra [...]. Tem poucas texturas e informações. (Participante P3).

Volume 1 97
Mais difícil

Tênis, porque não conhecia. (Participante P1).

Tênis, porque não vivenciei esse esporte e é diferente as demarcações de todos os outros esportes. (Par-
ticipante P2).

Voleibol. O desenho cobre toda a área em alto relevo. (Participante P3).

O que mudou na sua percepção sobre cada uma das quadras esportivas?

Golbol

Foi evidenciada a área de defesa e a área neutra. (Participante P2).

Passei a identificar a zona neutra. (Participante P3).

Tênis de quadra

Não conhecia. Conheci agora. Sabia apenas da rede central. (Participante P1).

Eu não conhecia as demarcações da quadra. (Participante P2).

Sei onde é o saque. (Participante P3).

Voleibol

As zonas de ataque e defesa. As ações dos jogadores nesta zona. (Participante P2).

Sei as zonas de ataque e defesa. (Participante P3).

Futsal

Agora sei onde fica a linha do pênalti. O tiro livre, pensava que era a marca do pênalti. (Participante P2).

Handebol

Pensava que o handebol era igual à quadra de futsal. (Participante P1).

98 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Não conhecia a quadra de handebol. (Participante P2).

Conheci tudo. (Participante P3).

Basquetebol

Compreendi melhor as marcações, valor das pontuações em relação à área de arremesso. Pensava
que o garrafão era uma única área. Entendi o posicionamento dos jogadores no lance livre. (Par-
ticipante P1).

Passei a conhecer a linha de lance livre, linha dos três pontos e garrafão. (Participante P2).

João Elias Vidueira Ferreira . Maria do Perpétuo Socorro Sarmento . Deriks Karlay Dias Costa
Percebe-se pelos depoimentos que houve aprendizagem em decorrência do uso dos desenhos táteis.
Isso se revela quando os entrevistados demonstram agora ter um melhor conhecimento acerca das quadras
de práticas de esporte. Por exemplo, o entrevistado P1 pensava que a quadra de handebol era igual à de
futsal. Já P2 nem sequer conhecia a quadra de handebol. P3 é mais abrangente com respeito ao aprendizado
com as quadras esportivas táteis ao dizer que, no caso do handebol, “conheci tudo”.

Como você avalia o uso de quadras esportivas táteis na Educação Física escolar?

É muito bom para as pessoas estarem conhecendo as quadras e suas formas [...]. Antes de ir para
a prática da Educação Física na escola, conhece os espaços da quadra através da quadra tátil.
(Participante P2).

Ajuda ao deficiente visual ter oportunidade de saber áreas e dimensões da quadra esportiva. Tendo
maior noção espacial durante a prática. (Participante P3).

As respostas dos participantes P2 e P3 se complementam e são justamente um dos principais


objetivos do uso de desenhos táteis com quem tem problema de visão. Esses desenhos podem dar uma
melhor orientação espacial do formato dessas áreas de práticas esportivas. É sabido que mapas táteis
ajudam bastante no processo de orientação e mobilidade. Antes de o aluno percorrer uma quadra para ter
uma noção de seus espaços, é valioso que o mesmo explore com as mãos um desenho dessa quadra. Com
isso o deficiente visual pode já mentalizar o formato da quadra e seus principais elementos.
Freitas, Sales e Moreira (2016) defendem uma Educação Física inclusiva e adaptada como
alternativa à mudança desse cenário excludente que a Educação Física vem vivendo nas escolas. Para eles,
isso consiste na adequação da gama de conteúdos presentes em qualquer programa de atividade física, de
modo a contemplar todos os alunos, independentemente de suas necessidades específicas.

Considerações acerca da produção das quadras esportivas táteis

Algumas conclusões puderam ser tiradas com relação à criação das maquetes táteis das quadras
esportivas, as quais são aqui listadas:

• O ditado popular “quanto menos melhor” é uma boa recomendação. Deve existir um meio termo entre
o máximo de informações a serem transmitidas e o mínimo para o bom entendimento do desenho tátil.

Volume 1 99
Os autores chamam de “poluição tátil” o excesso de elementos em relevo presentes em um desenho (linhas,
pontos, símbolos, texturas, legendas ou qualquer outra informação que esteja distribuída sobre o desenho).
A presença de muitos desses elementos exige maior habilidade cognitiva do deficiente visual. As legendas
em Braille não podem ser extensas.
• Percebeu-se que o papel microcapsulado tamanho A3 comportou bem o desenho das quadras juntamente
com as legendas em Braille. Caso sejam necessárias mais informações, pode-se fazer à parte um texto em
Braille ou até mesmo mostrar partes específicas de uma determinada quadra de esporte.
• A disposição das legendas na parte superior do desenho das quadras mostrou-se apropriada.

• Para uma melhor percepção tátil, sugere-se utilizar linhas bem distintas quanto ao contraste (formato e es-
pessura).

O recobrimento de partes extensas do desenho fica melhor com texturas. Todavia, as texturas de áreas
vizinhas precisam ser bem distintas. Por exemplo, na quadra de voleibol, a zona de ataque apresentou textura
contendo pequenos quadrados enquanto a zona de defesa mostrou linhas finas paralelas.
O espaçamento entre elementos inseridos no interior de texturas, tal como entre o ponto central e a textura do
círculo central do meio do campo de futebol, precisa obedecer a um mínimo de 3 mm. De modo semelhante,
acontece entre a linha delimitadora do garrafão e o semicírculo de lance livre no basquetebol. Isso tornou mais
perceptível a identificação desses elementos.
Pequenas distorções no desenho são permitidas, por isso as formas existentes e as distâncias entre elas
não precisam ser rigorosamente as mesmas do seu análogo visível. Assim a marca do escanteio sofreu um
pequeno aumento proposital para poder ser melhor identificada pelos dedos.
Nos desenhos criados, além da presença de texto em Braile, havia texto em tinta (próprio para quem enxerga).
Isso facilitou a interação com os deficientes visuais, pois dois dos entrevistadores não tinham conhecimentos do
código Braille. Nascimento, Hoffman e Marcolino (2016) esclarecem que o texto em Braille é acompanhado do
texto em tinta para o caso de o leitor com deficiência visual, se tiver dúvidas em relação ao que estiver escrito,
poder pedir ajuda a alguém alfabetizado.
Os identificadores para áreas com textura eram retangulares e tinham dimensões de 2,5 cm de comprimento
por 1,2 cm de altura. Todavia, constatou-se que seria melhor aumentar um pouco essas dimensões, para facilitar
a leitura tátil, principalmente em virtude de dois dos entrevistados não terem grande experiência na leitura de
desenhos táteis.
É fundamental dizer que somente apresentar um desenho em relevo para um deficiente visual explorar
com as mãos não basta. Ele pode ainda precisar de algumas informações repassadas oralmente para melhor
compressão do desenho. O processo ensino-aprendizagem deve ser interativo, embora os alunos devam ter
alguma autonomia.
Ainda hoje, infelizmente, o sistema de ensino tradicional pouco tem se mostrado eficiente com relação
à inclusão da pessoa que não enxerga. Em uma pesquisa realizada por Souza e Soares (2018) sobre o curso de
Educação Física da Universidade do Estado do Pará, não foram identificados grupos de pesquisa na área de
Educação Física adaptada em nenhum dos campi investigados, bem como nenhum dos professores entrevistados
coordena ou nem mesmo participa de grupos de pesquisa ligado à inclusão. Neste sentido, as autoras defendem
a necessidade urgente de articulação entre ensino, pesquisa e extensão.
É preciso ter em mente que os estudantes com deficiência visual têm características especiais próprias,
por conseguinte são necessárias estratégias específicas que possam favorecer- lhes o acesso ao conhecimento.
Para Padilha et al (2017), a ampliação do acesso às tecnologias assistivas poderá causar uma grande revolução
no meio educacional, considerando a inclusão dos alunos deficientes visuais.

100 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


CONCLUSÃO

Os deficientes visuais entrevistados demonstraram ter pouco conhecimento relacionado às quadras


esportivas. Havia inclusive uma certa confusão quando essas quadras eram comparadas. Das maquetes
táteis, a quadra de tênis, foi aquela com que menos tinham familiaridade com o formato e disposição das
áreas, sendo inclusive a mais difícil de ser reconhecida, na opinião de dois deficientes visuais.
Houve uma pequena diferença entre os participantes no que diz respeito à habilidade de leitura
tátil das quadras esportivas em relevo com legendas em Braille. Isso era plenamente previsível, pois eles
apresentavam diferentes perfis de deficientes visuais com relação à idade, habilidade de leitura do Braille
e experiência visual, pois todos em algum momento de suas vidas já enxergaram.
Percebeu-se que após explorarem os desenhos táteis das quadras esportivas, eles passaram
a entender melhor esses espaços, tanto o formato como a função de cada área específica das quadras.
Consequentemente, eles também passam a compreender mais sobre as diferentes modalidades de esporte.
Finalmente, a Educação Física escolar passa a ser mais inclusiva, quando emprega desenhos em
relevo com informações em Braille, auxiliando os deficientes visuais na exploração dos ambientes de

João Elias Vidueira Ferreira . Maria do Perpétuo Socorro Sarmento . Deriks Karlay Dias Costa
práticas esportivas.

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102 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


PROJETOS DE ENSINO COMO RECURSO À APRENDIZAGEM ESTATÍSTICA:
UM ENFOQUE NO DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO ESTATÍSTICO

Mario de Souza Santana1


1
Resumo: O presente artigo tem como propósito apresentar um produto educacional voltado para o ensino
e aprendizagem da Estatística em disciplinas introdutórias nos cursos superiores. Tal produto tem sua
origem em experiências didáticas realizadas nos cursos de Administração e de Gestão Ambiental, em um
Instituto Federal de Educação Técnica e Tecnológica, no período de 2013 a 2017. No primeiro semestre
letivo de 2016 realizamos intervenção com a finalidade intencional de um estudo mais sistemático
acerca dessas experiências. Concluímos que os levantamentos por amostragem se apresentam como uma
possibilidade efetiva para o desenvolvimento de uma proposta didática que visa ao desenvolvimento do

Mario de Souza Santana


pensamento estatístico e que tem como fundamento a aprendizagem por meio do uso de investigações
reais no ambiente da sala de aula. Por fim, exemplificamos as ideias defendidas apresentando algumas das
atividades desenvolvidas por estudantes dos cursos citados.

Palavras-chave: Pensamento estatístico; Letramento estatístico; Ciclo investigativo.

1
Professor no IFNMG/Campus Araçuaí. Mestrado em Educação Matemática.
E-mail: mario.santana@ifnmg.edu.br ou mariomatica@bol.com.br
Lattes: http://lattes.cnpq.br/5052290132613539

Volume 1 103
TEACHING PROJECTS AS A RESOURCE TO STATISTICAL LEARNING:
AN APPROACH TO THE DEVELOPMENT OF STATISTICAL THINKING

Abstract: The purpose of this article is to present an educational product focused on the teaching and learning
of Statistics in introductory undergraduation course. This product has its origins in didactic experiences carried
out in the Administration and Environmental Management courses, in a Federal Institute of Technical and
Technological Education, from 2013 to 2017. In the first semester of 2016, we conducted an intervention with
the purpose of a more systematic study about these experiences. We conclude that the sample surveys are
presented as an effective possibility for the development of a didactic proposal that aims for the development
of a statistical thinking and that is based on learning through the use of real investigations in the classroom
environment. Finally, we exemplify the defended ideas by presenting some of the activities developed by
students of the mentioned courses.

Keywords: Statistical thinking; statistical literacy; investigative cycle.

104 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


INTRODUÇÃO

Sendo professores de Matemática, lecionar Estatística Básica pode engendrar certo conflito. Há
aqueles que conferem ao ensino da Estatística um caráter tipicamente matemático. Os conceitos e técnicas
sendo, em geral, introduzidos por meio de problemas abstratos e consonante com o modos operandi da
tradição2 em educação matemática. Os estudantes acabam sendo expostos a um ensino com abordagem
essencialmente algorítmica, desvinculada do seu contexto e com exemplos bem distantes de sua área de
interesse e com pouca ou nenhuma relação com o que futuramente terão que realizar (VIALI, 2008). Os
conteúdos, quase sempre, trabalhados em consonância com a abordagem adotada nos livros didáticos
e sua aprendizagem se dando pela capacidade de reprodução dos conceitos, técnicas, procedimentos e
fórmulas em longas séries de exercícios padrão. Nesse cenário, muitas vezes, os resultados numéricos, por
conseguinte, acabam sendo mais importantes que o significado.
Por outro lado, nas literaturas da Educação Matemática e da Educação Estatística estudos têm
apontado para a incorporação de investigações reais nas aulas de estatística, implicando que sua
aprendizagem deve ter como meta o desenvolvimento de capacidades, quais sejam: pensamento, letramento

Mario de Souza Santana


e raciocínio estatísticos. Esse ideário pedagógico se contrapõe ao ensino limitado aos aspectos matemáticos
da Estatística, esse que se dá através da aplicação mecânica de algoritmos, fórmulas e procedimentos.
Lopes (2013) cita o projeto o projeto da American Statistical Association (ASA), financiado para
elaboração das Diretrizes para Avaliação e Ensino em Educação Estatística, salientando que o documento
destaca a preocupação com cursos que trazem muito material, o que leva os alunos a uma compreensão
superficial dos conceitos. Reforça também que se eles não compreenderem os conceitos importantes, haverá
pouco valor em conhecer um conjunto de procedimentos. Mas se compreenderem bem os conceitos, então
os procedimentos particulares serão mais fáceis de aprender. Ainda de acordo com Lopes (2013), é preciso
reconhecer que dar mais atenção aos conceitos do que aos procedimentos pode ser difícil politicamente,
tanto para os professores quanto para os estudantes, mas que, no entanto, os alunos com uma boa base
conceitual estarão melhor preparados para estudar outras técnicas estatísticas, como métodos de pesquisa,
regressão, desenho experimental ou métodos estatísticos em um segundo curso.
Como destaca Malara (2008), também concordamos com a ideia de Moore (1998), segundo a qual
o pensamento estatístico não é natural e as ideias mais básicas devem ser aprendidas e esse aprender é
um aprender fazendo. Segundo a autora, Moore compara fazer estatística com tocar piano. Ninguém se
transforma num bom pianista só de ver tocar. Acrescenta-se que comunicar estatística é como aprender a
ser um orador, deve haver muito preparo e a prática é que vai trazer o melhor desempenho.
A literatura destaca também que Estatística não é Matemática. Elas são ciências distintas, o que
deverá ter implicações na abordagem didática. Cobb e Moore (1997), citados por Lopes (2013, p. 905),
afirmam que “a estatística é uma disciplina metodológica que não existe para si, mas, sim, para oferecer aos
outros campos de estudo um conjunto coerente de ideias e ferramentas para lidar com dados.” Ao comparar
o pensamento matemático e o estatístico Lopes (2013, p.908) afirma que “para ensinar estatística, não é
suficiente entender a teoria matemática e os procedimentos estatísticos; é preciso fornecer ilustrações reais
aos estudantes e saber como usá-las para envolver os alunos no desenvolvimento de seu juízo crítico”

2
Tradição em Educação Matemática aqui é entendida como apresentada em trabalhos do educador Ole Skovsmose (“Educação matemática crítica: a questão
da democracia”, “Diálogo e Aprendizagem em Educação Matemática”, por exemplo).

Volume 1 105
Isso posto temos optado por metodologia mais coerente com essa segunda visão conduzindo as
atividades, ao longo da disciplina, a partir do pressuposto que aprender estatística é desenvolver pensamento
e letramento e raciocínio estatísticos. Assim, com vistas a alcançar tal propósito, temos implementado uma
metodologia de ensino (e aprendizagem) baseada no ciclo investigativo defendido na dissertação de mestrado
Santana (2011), e apresentada mais detidamente no livro Santana (2012), adaptando-a para o nível superior.
Trata-se, em suma, de um projeto de ensino no qual o arcabouço metodológico que norteia as aulas tem seu
início num tema a ser problematizado e estudado através dep um processo de investigação estatística, conforme
discorreremos mais adiante. Desse modo, a partir de um problema que deva suscitar a necessidade de coleta de
dados, desencadeia-se o planejamento da investigação decidindo, por exemplo, se será feita por meio de censo ou
amostragem, elaborando-se o instrumento para coleta e o plano amostral, realizando-se entrevistas, entre outros.
Coletados os dados, passa-se à organização representando-os e interpretando-os, isto é, fazendo-se as análises
exploratórias, com foco no problema estabelecido. Por fim, a tomada de decisões onde serão feitas inferências
e tiradas as conclusões. Nesse contexto, a cada fase do ciclo investigativo são operacionalizadas diversas
atividades concernentes às investigações dos temas propostos pelos estudantes e os conteúdos estatísticos vão
se materializando ao longo das mesmas.
Assim, pretendemos nesse texto relatar as vivências experimentadas durante toda a execução desse
projeto de ensino. Serão destacados seus fundamentos teórico-metodológicos, norteadores de nossas ações, para
em seguida descrever e analisar nossa prática, além de exemplificá-la com produtos resultantes das atividades
de investigação desenvolvidas pelos estudantes.
As ações desse projeto foram realizadas no ensino (e aprendizagem) da Estatística nos cursos de
Bacharelado em Administração e de tecnologia em Gestão Ambiental do Instituto Federal do Norte de Minas
Gerais, Campus Araçuaí. Podemos destacar uma primeira fase no período de 2013 a 2015. No primeiro semestre
letivo de 2016 foi realizada nova intervenção com o propósito de um estudo mais rigoroso acerca dessa prática.
Isso se deveu a certas razões.
Primeiramente em virtude de que algumas particularidades e necessidades emergentes impostas pelo
contexto foram provocando certas inquietações. Acrescenta-se a isso a crença no professor como um agente
crítico-reflexivo de sua própria prática pedagógica que deve buscar, autônoma e/ou colaborativamente, subsídios
teóricos e práticos que o ajudem a compreender e a enfrentar os problemas e desafios do trabalho docente
(FIORENTINI; NACARATO, 2005). Dessa forma, julgamos necessário dirigir um olhar mais sistemático para
essas práticas, o do pesquisador, com vistas a dar um caráter mais científico a todo o processo e maior legitimidade
aos resultados de modo a aprimorar e, também, a democratizar seu uso por parte de outros educadores.
Assim, assumindo a figura de professor-pesquisador, coletamos os dados no decurso das aulas, ao longo
do primeiro semestre letivo de 2016. Os instrumentos utilizados para a coleta dos dados foram: os escritos
produzidos pelos estudantes, diário de campo e entrevistas realizadas com os estudantes, que foram gravadas
em áudio e, posteriormente, transcritas e analisadas.
Resultados dessa pesquisa foram publicados e nos auxiliaram também na continuidade desse projeto
no ano letivo seguinte, em 2017, último semestre em que tal projeto foi trabalhado. Isso porque em 2018 a
disciplina regular foi extinta e incorporada à EaD.

APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO

A metodologia de ensino (e aprendizagem) que utilizamos foi embasada na ideia do ciclo investigativo.
Tal proposta fundamenta-se no pensamento estatístico envolvido nas investigações empíricas, na perspectiva de
estrutura proposta por Wild e Pfannkuch (1999), e está em consonância com as propostas didáticas anteriormente
citadas.
A noção de ciclo investigativo emerge, então, da estrutura de pensamento estatístico proposta por Wild
e Pfannkuch (1999). De acordo com os autores, eles construíram com base na literatura, na experiência própria
e em entrevistas realizadas com estudantes de estatística envolvidos em projetos de pesquisa e com estatísticos
profissionais em exercício uma estrutura para o pensamento estatístico envolvido nas investigações empíricas.

106 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


Essa estrutura é composta por quatro dimensões, a saber: o ciclo investigativo, tipos de pensamento, o ciclo
interrogativo e as disposições.
Wild e Pfannkuch (1999) afirmam que a primeira dimensão é uma adaptação do modelo PPDAC
(Problem, Plan, Data, Analysis, Conclusions) de Mackay e Oldford (1994) e se relaciona com a forma
como uma pessoa atua e o que pensa durante o curso de uma investigação estatística. Essa dimensão
evidencia a importância da formulação do problema, inserido em um dado contexto, e do planejamento do
sistema de medição, plano amostral etc., etapas iniciais do modelo. Além disso, o conhecimento obtido e
as necessidades identificadas dentro do ciclo podem originar novos ciclos investigativos (Quadro 1).

Quadro 1 – Esquema do ciclo investigativo

Problema Planejamento Dados Análise Conclusão


- Sistema de - Análise
- Completa medição - Coleta de dados exploratória

Mario de Souza Santana


compreensão da - Desenho amostral - Gerenciamento - Análises - Interpretação
dinâmica do sistema - Gerenciamento dos dados planejadas - Conclusão
- definição do dos dados - Purificação dos - Análises - Novas ideias
problema - Orientação e dados emergentes - Comunicação
análise - Hipóteses

Fonte: Wild; Pfannkuch, 1999.

Para Silva (2007), este modelo, no tocante à sala de aula, objetiva que o estudante sinta necessidade
de resolver um problema, o que poderá garantir seu envolvimento. Dessa forma, o problema deixaria de
ser resolvido apenas porque o professor o pede, pois o estudante estando envolvido passaria a desejar a
solução e buscaria ferramentas necessárias para isso.
As outras dimensões dessa estrutura acabaram por se configurar, principalmente, como orientações
na condução e planejamento em várias etapas do processo e nas reflexões críticas sobre aquilo que se
estava fazendo.
Há tipos de pensamento, 2ª dimensão da estrutura proposta, categorizados e agrupados por Wild e
Pfannkuch (1999) em fundamentais e gerais.
Os tipos fundamentais de pensamento estatístico, de acordo com a estrutura proposta pelos autores, se
referem à:
1) reconhecer a necessidade dos dados, uma vez que nossas experiências pessoais podem ser insuficientes
para fundamentar tomadas de decisão. Fazer isso com base em dados deliberadamente coletados são um
impulso estatístico/científico;
2) Transnumeração, que perpassa todas as análises de dados estatísticos ocorrendo cada vez que mudamos
nossa maneira de observar os dados para que isso nos conduza a novos significados sendo, portanto, um
processo dinâmico de mudança de representações para engendrar compreensão;
3) Variação, que é de grande importância para a definição do pensamento estatístico. Ela é onipresente e
pode ter sérias consequências práticas e a Estatística nos dá um meio de entender um mundo caracterizado
pela mesma. Ela é a razão pela qual as pessoas tiveram que desenvolver métodos estatísticos sofisticados
para filtrar mensagens de dados do ruído externo. Os estatísticos modelam a variação com os propósitos de
predição, explicação ou controle;
4) Um conjunto distinto de modelos (estatísticos): todos os pensamentos usam modelos e a principal
contribuição da Estatística para o pensamento tem sido o seu próprio conjunto característico de modelos,
de estruturas para reflexão sobre certos aspectos da investigação de uma forma genérica. Em particular, os

Volume 1 107
métodos para design e análise do estudo têm sido desenvolvidos a partir de modelos matemáticos que incluem
componentes aleatórios;
5) Matéria-prima com que trabalha o pensamento estatístico, que são o conhecimento estatístico, conhecimento
do contexto e a informação oriunda dos dados. O pensamento em si é a síntese desses elementos para produzir
implicações, ideias e conjecturas. Desse modo, os tantos exemplos utilizados no ensino da Estatística construídos
em um panorama árido, livre de contexto, garantem que um grande número de estudantes nunca engaje no
pensamento estatístico. Os autores trazem essa reflexão e explicam que as etapas iniciais são conduzidas quase
completamente pelo conhecimento do contexto e que o conhecimento estatístico contribui mais à medida que
o pensamento se materializa e se estabelece um diálogo constante nas esferas do contexto e da Estatística por
meio do processo PPDAC.

Os tipos gerais de pensamento são:

1) o Estratégico: que está relacionado com o planejamento: o que fazer? Como fazer?; Tem a ver com antecipação
de problemas a fim de evitá-los; leva em conta as limitações sob as quais se está trabalhando. Discutiremos mais
adiante sobre essas limitações, uma vez que podem configurar-se como restrições à profundidade e qualidade
do pensamento estatístico;
2) a Modelagem: construir modelos e usá-los para compreender e prever o comportamento de aspectos do
mundo que nos preocupam parece ser uma maneira geral do pensamento. Informações buscadas e obtidas da
realidade do contexto às vezes estão nos dados estatísticos. Constroem-se, então, modelos estatísticos para ter
uma visão dessa informação, que retroalimenta o modelo mental;
3) a Aplicação de técnicas: a estratégia de se abordar um problema com base em problemas arquétipos aplicando
ou adaptando sua solução é comumente utilizada em estatística. A implementação dessa estratégia ou a aplicação
prática de qualquer técnica envolve reconhecimento, aplicação do método e interpretação no contexto, de
maneira cíclica.
A terceira dimensão da estrutura proposta por Wild e Pfannkuch (1999) concerne a um ciclo interrogativo
que diz respeito aos questionamentos e às críticas a ideias e informações enquanto se resolve problemas. O
pensador deve imaginar e ter ideais para gerar possibilidades, que pode ser a partir do contexto, dos dados
ou do conhecimento estatístico; buscar internamente (conhecimento próprio) ou externamente (na literatura,
consultando outras pessoas etc.) essas ideias e informações; extrair e processar os resultados da busca visando
a encontrar relações entre as ideias e à ampliação dos modelos mentais para compreender essas inter-relações;
julgar a confiabilidade das informações, a utilidade das ideias, a necessidade de mais investigações etc. para
tomar decisão sobre o que deve ser mantido e o que deve ser descartado. É, portanto, um processo genérico de
pensamento de uso constante na resolução de problemas estatísticos.
A quarta dimensão refere-se às disposições. Está relacionada a qualidades pessoais que afetam a
entrada nos modos de pensamento. Deve-se ter: (a) Curiosidade e consciência: Perceber e questionar: por quê?
Como isso aconteceu? Isto é algo que acontece em geral? Como posso aproveitar isso?; (b) Compromisso:
este intensifica os outros elementos de disposição. Refere-se a alguma conexão pessoal com o problema. Se o
problema é interessante ou importante a curiosidade, a consciência, a imaginação ou a perseverança ficam mais
aguçados; (c) Imaginação: a formação de modelos mentais que capturam a dinâmica essencial do problema é
profundamente imaginativa; (d) Ceticismo: conduz a que se critiquem as ideias, informações ou planejamentos.
Questiona-se a adequação das medições, do design do estudo, a qualidade dos dados, método de análise, ou se
as conclusões alcançadas estão justificadas nos dados; (e) Ser lógico: a capacidade para detectar quando uma
ideia segue a partir de outra e quando não, e para construir um argumento lógico é claramente importante para
todo o pensamento. O raciocínio lógico é o caminho para se chegar a conclusões válidas.
Wild e Pfannkuch (1999) destacam, ainda, a existência de restrições que limitam a profundidade e a
qualidade do pensamento. De acordo com eles, algumas dessas restrições advêm de fatores internos ao pensador
e outras do entorno. Baixos níveis de habilidade nos tipos de pensamento envolvidos e nas atitudes mencionadas
na dimensão de Disposições, pobres habilidades de comunicação, falta de perseverança ou confiança, são

108 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


exemplos que concernem ao primeiro tipo de restrição. Além disso, reforçam que muito do que julgamos
conhecer, nossas preconcepções, pode nos cegar diante de outras possibilidades, insensibilizar-nos em
face de informações relevantes dificultando o discernimento. Outras restrições estão relacionadas à falta
de tempo, dinheiro e materiais.
Aspectos importantes da natureza do conhecimento estatístico se manifestam na estrutura descrita.
Defendemos que podem ser considerados nas aulas de Estatística. A partir de um problema que deva
suscitar a coleta de dados – necessidade dos dados – desencadeia-se o planejamento para a investigação
decidindo, por exemplo, se será feita por meio de censo ou amostragem, elaborando o instrumento para
coleta, realizando entrevistas, entre outros. Coletados os dados, passa-se à organização representando-os
e interpretando-os, isto é, fazendo as análises, com foco no problema estabelecido. Por fim, a tomada de
decisões onde serão feitas inferências e tiradas as conclusões.
As demais estruturas do pensamento perpassam toda a condução do processo sobressaindo algumas
em certo momento da investigação, mas sempre como fio condutor das várias etapas percorridas ao longo
do processo de investigação.

Mario de Souza Santana


Adicionalmente, na experiência pesquisada no ano de 2016, incluímos um caráter interdisciplinar
em nossa proposta. Isso se deu através da participação de outros docentes, membros da equipe do projeto
de pesquisa, especialmente na fase de problematização/contextualização do ciclo investigativo, propondo
temas da área de formação dos estudantes para serem investigados através da abordagem quantitativa das
pesquisas, com vistas ao desenvolvimento do pensamento estatístico.
Nessa conjuntura, a problematização dos temas pode remeter a distintas abordagens de pesquisa –
por exemplo: levantamentos e experimentos. Um dos resultados de nosso estudo é que os levantamentos
por amostragem apresentam características pertinentes indicando sua importância e convergência com
nossa proposta. Desse modo, os evidenciamos como opção de prática no ambiente da sala de aula com
vistas ao alcance de nossos propósitos no ensino e aprendizagem na disciplina de Estatística Básica.
Por fim, no tocante ao letramento estatístico, adotamos em nosso trabalho o modelo de Gal (2002)
no qual o conhecimento estatístico considerado necessário ao seu desenvolvimento está fundamentado
em cinco partes: 1-saber por que os dados são necessários e como podem ser produzidos; 2-familiaridade
com conceitos e ideias básicas relacionadas à estatística descritiva; 3-familiaridade com conceitos
básicos e ideias relacionadas a representações gráficas e tabulares; 4-compreensão de noções básicas de
probabilidade; 5-saber como conclusões ou inferências estatísticas são obtidas.
Nas próximas seções mostraremos as várias fases do projeto pondo em destaque aquilo que foi feito
em cada uma. Desse modo, configura-se um produto educacional que defendemos ser viável para o ensino
e aprendizagem em Estatística Básica.

AS FASES E ATIVIDADES DO PROJETO

As fases do ciclo investigativo (mostradas no quadro 1 anteriormente apresentado) foram


operacionalizadas tomando como arcabouço o conjunto de atividades sugeridas por Santana (2012)
(mas não necessariamente limitado a elas), quais sejam: 1 Problematização: divisão da turma em grupos;
escolha dos temas; estudos sobre o tema (levantamento bibliográfico) e estabelecimento dos objetivos
(ou questões problema) do estudo. 2 Planejamento: população alvo; censo x amostragem; plano de
amostragem; variáveis; instrumento de coleta (questionário); discussão sobre os erros não amostrais e suas
influências na pesquisa (procedimentos de campo). 3 Dados: Coleta dos dados; inserção dos dados em
planilha eletrônica. 4 Análises univariadas: construção de tabelas e gráficos e sua interpretação; medidas
descritivas e interpretação; análises bivariadas. 5 Conclusões: índice e intervalos de confiança e teste de
hipóteses; relatórios e divulgação; avaliação da credibilidade dos dados.

Volume 1 109
A PROBLEMATIZAÇÃO

O uso do ciclo investigativo envolve, necessariamente, a resolução de problemas contextualizados. O


ciclo se inicia a partir de um problema e o pensamento estatístico é a síntese do conhecimento estatístico,
do conhecimento do contexto e da informação oriunda dos dados (contextualizados). Na Estatística, os
dados são vistos como números em um contexto, decorrendo daí a necessidade do trabalho com dados reais
contextualizando-os por meio de investigações. Como explicam os autores da concepção de pensamento
estatístico adotada, as etapas iniciais são conduzidas quase completamente pelo conhecimento do contexto e
o conhecimento estatístico contribui mais à medida que o pensamento se materializa e que se estabelece um
diálogo constante nas esferas do contexto e da Estatística por meio do processo PPDAC.
Para iniciar o ciclo investigativo as turmas são divididas em grupos, em geral com 3 ou 4 estudantes, e
procuramos dar voz ativa a eles permitindo que sugiram e escolham os temas a serem investigados. Todavia,
para estimulá-los, começamos mostrando algumas possibilidades e dando exemplos de questões que poderiam
ser pesquisadas dentro dos temas exemplificados. O intuito é incentivar que deles surjam outras ideias.
Nesse momento, os outros docentes podem participar diretamente apresentando exemplos de suas áreas de
conhecimento.
Em geral, optamos por ter cada grupo com um tema específico. Mas o professor pode escolher ainda
ter um tema único para a turma sendo desdobrado em enfoques de interesse de cada grupo, isto é, cada grupo
investiga um objeto distinto ou tema único e objetivo único para todos os grupos (SANTANA, 2012). Todavia,
em qualquer uma das situações, cada grupo deve trabalhar separado, cada qual elaborando todas as atividades ao
longo da investigação sendo que, findada cada uma, os grupos expõem suas soluções em assembleia. Isso permite
que aprendam uns com os outros por meio da comparação e possibilita a percepção de que não necessariamente
uma solução só pode estar certa ou errada. Após o debate escolhe-se qual solução entre as apresentadas será
mais adequada à continuidade da investigação (no caso de todos trabalharem mesmo tema e objetivos).
Definidos os temas, os estudantes devem-se concentrar-se na elaboração de objetivos para o trabalho – na
maioria das vezes o geral e os específicos. Tem sido comum nesse início do trabalho os estudantes sentirem
certa dificuldade ou ficar meio apreensivos. Primeiramente, por se tratar de uma disciplina, segundo esperam,
“matemática”, a atividade acaba transparecendo para eles meio estranha. Em segundo lugar, conforme salientam
Bolfarine e Bussad (2005), uma das maiores dificuldades de qualquer pesquisa é a formulação correta dos
seus objetivos gerais e operacionais, o que exige muito conhecimento específico da área de interesse, muito
trabalho de pesquisa bibliográfica e grande habilidade criativa por parte dos pesquisadores envolvidos. Portanto,
é natural que alguma dificuldade apareça.
O levantamento teórico-bibliográfico acerca do tema é sempre uma atividade que solicitamos e pedimos
que seja feita em seguida a redação de um relatório contendo ele e as atividades até ali realizadas. Sempre
sugerimos incluir nesse levantamento teórico estudos semelhantes já feitos. Conforme Bolfarine e Bussab (2005)
eles podem configurar-se boas fontes para identificar e operacionalizar objetivos, bem como obter sugestões de
como o problema pode ser resolvido. Além disso, no levantamento teórico boas definições dos constructos
necessários ao estudo ajudarão bastante na operacionalização dos objetivos no momento da elaboração do
sistema de medição.
Por fim, temos observado uma grande variedade de temas escolhidos pelos estudantes. Geralmente,
dizem respeito a área de formação dos estudantes (como a Educação Ambiental nas escolas ou a questão do lixo,
no curso de Gestão Ambiental, ou pesquisas de mercado, pesquisas de satisfação, no curso de Administração)
bem como temas que estão socialmente em evidência naquele momento (como a questão da criminalidade no
munícipio, que vinha aumentando assustadoramente; ou o levantamento da opinião da população da cidade e
da região a respeito de demandas de novos cursos a serem ofertados pela instituição no momento em que se
elaborava o Plano de Desenvolvimento Institucional).
Reconhecer a necessidade dos dados fica evidente nessa fase uma vez que os estudantes percebem que
não é possível responder aos objetivos colocados apenas por meio de experiências pessoais.

110 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


O PLANEJAMENTO

Em geral, colocamos como primeiras atividades do planejamento a escolha do público-alvo – que


possibilita apresentar o conceito de população e suas unidades elementares (uma pessoa, família ou o
domicílio, estudantes, turmas de estudantes ou escolas, por exemplo) e as diversas populações possíveis
(população alvo, população acessível) – e a decisão entre censo ou amostragem – define-se cada qual e
discutem-se as vantagens e desvantagens de cada um.
Passamos então à elaboração do sistema de medição. Um dos desafios das pesquisas quantitativas é a
criação de bons indicadores (variáveis, escalas) que representem adequadamente os conceitos (constructos)
de interesse (BOLFARINE; BUSSAB, 2005). A pesquisa bibliográfica e a habilidade criativa por parte
do pesquisador será de grande valia. Também o será pesquisar levantamentos semelhantes realizados
anteriormente (caracterizando um tipo geral de pensamento, A aplicação de técnicas – estratégia de se
abordar um problema com base em problemas arquétipos). Como afirma Babbie, se a conceituação e a
medição de variáveis não são adequadas, correlações observadas entre elas podem não fazer sentido.
Nesse momento o professor apresenta a definição de variáveis, sua classificação – qualitativas
ordinal ou nominal e quantitativa discreta ou contínua –,exemplifica mostrando que (e como) as mesmas

Mario de Souza Santana


devem estar diretamente vinculadas a cada objetivo específico colocado.
Assim, pode-se passar à criação do instrumento de coleta, geralmente o questionário. Esse é um
momento rico, permeado de criatividade. Os estudantes elaboram perguntas representando as variáveis e
criando escalas de medição.
A primeira parte do questionário exige a identificação de quem faz a pesquisa: nome da empresa,
entrevistador, crítico, supervisor, para compor o controle de dados (data da entrevista, local, tentativas, se
houve recusa, se a entrevista foi totalmente ou parcialmente realizada etc.), bem como o seu número (em
geral questionários são numerados). Solicitamos então a criação de uma Folha de Rosto contendo alguns
desses dados, aqueles de fato necessários ao trabalho. Depois orientamos na criação de uma parte inicial
constando a apresentação do questionário, solicitando a colaboração, explicando os objetivos, a promessa
de sigilo das informações, algumas orientações para o preenchimento e agradecendo a colaboração. Por fim,
discutimos questões específicas para a elaboração das perguntas e os impactos das mesmas na qualidade e
confiabilidade dos dados.
Assim, os estudantes elaboram uma primeira versão do questionário. Essa primeira versão pode
ser corrigida pelos pares, onde um grupo corrige o de outro apresentando sugestões de melhoria, e pelo
professor. Elabora-se, então, uma segunda versão abarcando as correções. Depois, os estudantes realizam
um pré-teste do mesmo aplicando a um certo número de pessoas pertencentes à população alvo e, se
necessário, efetuam-se novas correções.
Aqui é sempre interessante observar o pensamento estratégico no sentido da antecipação de
problemas a fim de evitá-los. É comum os estudantes elaborarem questões que permitem ao respondente
assinalar mais de uma resposta, o que ferirá princípio básico das variáveis e poderá tornar inviável a análise
posterior da mesma. É comum também colocarem questões abertas. Isso implica que, para as análises,
terão observar o conteúdo de cada resposta a fim de codificá-las em categorias.
A atividade seguinte é de elaboração do plano amostral. Será necessário definir as unidades
amostrais; o método de seleção dessas unidades (o tipo de amostragem) e o tamanho da amostra. O professor
explica questões relativas às amostragens probabilísticas e não-probabilísticas, as principais técnicas, o
dimensionamento da amostra e outras questões que julgar necessárias.
Aqui se pode propor aos grupos a seguinte questão:
Definida a amostragem como o melhor caminho, de que modo então selecionar aleatoriamente a amostra
para o estudo? Caso o grupo perceba que as técnicas de amostragem probabilísticas não são convenientes
[ou viáveis ou possíveis por não existir um cadastro para sorteio prévio não viciado, por exemplo], justificar
o porquê e propor uma alternativa, isto é, uma amostragem não probabilística (SANTANA, 2012, p. 55).

Volume 1 111
Em nossas experiências o ambiente educacional tem se destacado para as amostragens. É o caso de
investigações realizadas no próprio campus ou em escolas do município e/ou região. Nesses casos, por existir
listagens dos elementos que compõem a população, tornam-se viáveis as amostragens probabilísticas. Além
disso, a aplicação dos questionários fica mais prática uma vez que se pode aplicá-los aos grupos (turmas) de
informantes simultaneamente.
Por outro lado, tem sido comum também que os estudantes proponham pesquisas domiciliares (algumas
vezes selecionando-os via amostragem por conglomerados) ou nas ruas em pontos de fluxo.
Para finalizar o planejamento da pesquisa, julgamos importante discutir os erros não amostrais – erros
de cadastro, erros associados a não resposta e erros de medição e os procedimentos de campo (por exemplo, a
postura nas entrevistas). Algumas vezes os estudantes elaboraram uma espécie de manual para o entrevistador.

A COLETA DOS DADOS

Passa-se agora à coleta dos dados. Os estudantes realizam as entrevistas ou aplicam os questionários.
Se o professor julgar necessário, pode trabalhar atividades paralelas dando mais tempo aos estudantes para a
coleta. Deve-se, também, ir preparando as planilhas. Sugerimos o uso do Excel ou do Calc por mais serem
mais acessíveis. Lançar as variáveis nas colunas e utilizar as listas suspensas (validação de dados). Alertar os
estudantes quanto a necessidade de padronização. Tão logo se conclua a inserção dos dados dos questionários
passe-se a elaboração das primeiras construções – tabelas, gráficos, tabelas de dupla entrada, média, mediana,
entre outras.

AS ANÁLISES

A partir dos dados inseridos na planilha passamos às análises exploratórias. Essa é uma etapa também
muito propícia à exploração de diversas técnicas e conceitos estatísticos a partir do contexto subjacente. É
um momento que exige muita criatividade e perspicácia dos estudantes e do professor. Como afirmam Wild e
Pfannkuch (1999), a matéria-prima com que trabalha o pensamento estatístico são o conhecimento estatístico,
do contexto e a informação oriunda dos dados e que o pensamento em si é a síntese destes elementos para
produzir implicações, ideias e conjecturas.
Nessa fase do ciclo investigativo enfocamos a natureza das variáveis a fim de nortear as representações e
análises mais adequadas a cada tipo (qualitativa nominal e ordinal e quantitativa discreta e contínua). É possível
explorar as tabelas de distribuição de frequência, os gráficos estatísticos, as medidas de tendência central e
dispersão e outras medidas descritivas que se fizerem pertinentes. Ao analisar possíveis relações de associação
entre as variáveis podemos adentrar nos conceitos de correlação e regressão a partir de dados reais. Nesse
cenário, hipóteses acerca das questões investigadas serão levantadas.
Didaticamente, sugerimos primeiro que se realizem análises univariadas descrevendo as variáveis
independentemente da ocorrência de outras, análises pertinentes às variáveis qualitativas e às quantitativas.
Depois, as análises bivariadas buscando associações entre variáveis (qualitativas com qualitativas, qualitativas
com quantitativas e quantitativas com quantitativas).

CONCLUSÕES

Nessa fase o trabalho se concentra em elementos de inferência estatística, probabilidades e variáveis


aleatórias. É discutida a estimação (pontual e intervalar) dos parâmetros populacionais proporcionando aos
estudantes compreenderem os índices de confiança e margens de erro nas pesquisas. Também hipóteses
levantadas na fase anterior podem ser testadas permitindo operacionalizar as regras e conceitos dos testes
clássicos de hipóteses.
Em seguida os estudantes retomam os objetivos colocados no início do estudo a fim de respondê-los
chegando às conclusões; constroem relatórios estatísticos descrevendo todas as etapas da pesquisa, apresentando

112 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


dados e resultados alcançados; apresentam em seminários as investigações. Já a divulgação dos resultados
tem variado, algumas vezes limitando-se à sala de aula quando da apresentação dos seminários. Contudo,
alguns vão além, apresentando em eventos científicos do campus ou proferindo palestras em escolas de
educação básica.
Por fim é feita uma atividade de avaliação/reflexão da confiabilidade dos resultados do estudo. Destacamos
ainda que o ciclo interrogativo se faz notável em vários momentos da investigação. E que se o problema
investigado for interessante ou importante os elementos de disposição se aguçam.

EXEMPLIFICANDO O PRODUTO

Intencionamos nessa seção exemplificar nosso produto educacional com dois dos trabalhos
desenvolvidos pelos estudantes. Eles concernem às práticas de ensino e aprendizagem realizadas na
disciplina Estatística (Básica) nos cursos de Bacharelado em Administração, 3° período, e de Tecnologia
em Gestão Ambiental, também 3° período, vivenciadas no primeiro semestre letivo de 2014.

Mario de Souza Santana


O CONTEXTO MOTIVANDO A PROBLEMATIZAÇÃO

Um dos trabalhos, produzido por estudantes do curso de Administração, teve sua origem – na fase
problematização – em um momento vivido pela instituição naquela ocasião. Discutia-se a construção de
indicadores para abertura de novos cursos nos campi. Foi proposto, então, pelos estudantes, investigar
quais eram os cursos almejados pela população da área de abrangência do IFNMG/Araçuaí justificando
que levantar a demanda junto à comunidade poderia subsidiar a tomada de decisão para implementação de
novos cursos. Alegaram que isso estaria em consonância com o plano de desenvolvimento institucional
(PDI, que também se encontrava em construção para o período 2014-2018), pois o documento retrata
que o mapeamento das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico e cultural, no âmbito de
atuação do campus, deve atender aos anseios da região na qual está inserido, com vistas a promoção do
desenvolvimento. Sendo assim a consulta à sociedade local torna-se um método imprescindível para
referenciara deliberação de cursos novos.
A partir desse contexto assim ficou definido para o estudo: Objetivo Geral: Investigar quais os
cursos almejados pela população da área de abrangência do IFNMG/Araçuaí. Objetivos específicos:
Identificar quais os cursos técnicos almejados pela população pesquisada; Identificar quais os cursos
tecnólogos almejados pela população pesquisada; Identificar quais os cursos bacharelados almejados pela
população pesquisada; Identificar quais os cursos de licenciaturas almejados pela população pesquisada;
Verificar em qual medida os cursos existentes atendem aos anseios da população; Verificar a preferência
da população em relação aos cursos que o IFNMG/Araçuaí já tem estrutura para oferecer; Apresentar os
cursos de maior interesse e paralelamente identificar qual área mais demandada.
O segundo trabalho que exemplificaremos surgiu de interesse em tema relativo ao próprio curso
(de tecnologia em Gestão Ambiental): a educação ambiental. Justificaram que esse tema nas escolas é
essencial para a formação de cidadãos conscientes e preparados para garantir um desenvolvimento social e
econômico com sustentabilidade e que sua inserção no ambiente escolar como tema para debates, reflexões,
palestras e atividades escolares é base para ter na sociedade pessoas com atitudes sustentáveis e capazes de
perceber os problemas ambientais ao seu redor e se posicionar de forma a minimizar tais problemas.
Assim, propuseram investigar se as escolas da rede pública de Itaobim de ensino fundamental desenvolvem
alguma ação de Educação Ambiental, e qual o grau de conhecimento dos alunos sobre conservação e
proteção ambiental. Objetivo Geral: Verificar se as escolas públicas de Itaobim ofereceram algum tipo
de Educação Ambiental e avaliar o nível de conhecimento dos alunos sobre o meio ambiente. Objetivos
específicos: Analisar se as escolas do município realizam projetos e/ou trabalhos de Educação ambiental
aos alunos; Identificar os métodos que as escolas utilizam para inserir o tema no ensino oferecido; Conhecer
meios de informação que os alunos utilizam para aprender sobre o meio ambiente; Avaliar o quanto os

Volume 1 113
alunos conhecem sobre os problemas ambientais; Conhecer as atitudes ecológicas e sustentáveis que os alunos
utilizam no cotidiano; Avaliar o interesse dos alunos sobre o tema Meio Ambiente e os problemas ambientais.

PLANEJAMENTO DAS INVESTIGAÇÕES

Problematizados os temas de estudo seu planejamento avança desencadeando a necessidade de


aprendizagem de conceitos como: população (alvo, acessível, subpopulações), amostra, censo ou amostragem
(vantagens e desvantagens), dados primários ou secundários, parâmetros populacionais, entre outros. Além
disso, ao se pensar a coleta das informações, nos deparamos com a construção dos instrumentos e o modo
de coleta (entrevista direta, observação, individual, em grupo, por carta, telefone, por instrumento, etc). Isso
acarreta o estudo das variáveis e atributos e elaboração de questionários. Em seguida, a discussão acerca dos
erros não amostrais e a construção de planos de amostragem, estudados do ponto de vista teórico, mas planejados
e percebidos na prática.
Os estudantes do grupo que pesquisava a educação ambiental nas escolas públicas assim argumentaram:
“a amostra será composta por 400 alunos do 6º ao 9º ano da rede pública de Itaobim e obtida por meio de uma
amostragem estratificada proporcional com margem de erro de 5% e nível de confiança de 95%”. No outro
estudo em questão, porém, os estudantes perceberam que as limitações de ordem prática os levaram a utilizar
uma amostragem não probabilística realizando as entrevistas sem sorteio prévio, devido à falta de um cadastro,
em pontos de grande fluxo de pessoas em diversos municípios da região, praticando-se se uma amostragem
tomada a esmo. Entrevistaram um total de 465 pessoas em alguns municípios a área de abrangência.

COLETANDO DADOS

Os procedimentos de campos foram analisados em debate a respeito dos erros não amostrais e suas
possíveis implicações na confiabilidade do levantamento. Nesse cenário, o erro (como possíveis falhas no
questionário, nos procedimentos de entrevista etc.) é entendido como fonte de aprendizagem, a partir do qual se
pode aguçar ainda mais o letramento estatístico.
Após a coleta foi utilizada a planilha eletrônica Excel para tabulação dos dados e para a elaboração das
primeiras construções – tabelas, gráficos, tabelas de dupla entrada, média, mediana, entre outras.
Análises
A partir dos dados inseridos na planilha passamos a análise exploratória. Essa é uma etapa também muito
propícia à explorar diversas técnicas e conceitos estatísticos a partir do contexto subjacente. É um momento
que exige muita criatividade e perspicácia dos estudantes e do professor. Nessa fase do ciclo investigativo
enfocamos a natureza das variáveis a fim de nortear as representações e análises mais adequadas a cada tipo
(qualitativa nominal e ordinal e quantitativa discreta e contínua). É possível explorar as tabelas de distribuição
de frequência, os gráficos estatísticos, as medidas de tendência central e dispersão e outras medidas descritivas
que se fizerem pertinentes. Ao analisar possíveis relações de associação entre as variáveis podemos adentrar
nos conceitos de correlação e regressão a partir de dados reais. Nesse cenário, hipóteses acerca das questões
investigadas serão levantadas. Tudo em conformidade com o que apresentamos na seção 3.4.

FASE DE CONCLUSÕES

Nessa fase o trabalho se concentrou, portanto, em elementos de inferência estatística. Foi discutida a
estimação (pontual e intervalar) dos parâmetros populacionais proporcionando aos estudantes compreenderem
os índices de confiança e margens de erro nas pesquisas. Também hipóteses levantadas na fase anterior podem
ser testadas permitindo operacionalizar as regras e conceitos dos testes de hipóteses.
Em seguida os estudantes retomaram os objetivos colocados no início do estudo a fim de respondê-los
chegando às conclusões; constroem relatórios estatísticos descrevendo todas as etapas da pesquisa, apresentando
dados e resultados alcançados; apresentam em seminários as investigações.

114 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação


A divulgação dos resultados tem variado, algumas vezes limitando-se à sala de aula quando da
apresentação dos seminários. Contudo, alguns vão além. O trabalho de levantamento de demanda de novos
cursos, por exemplo, foi apresentado em evento científico do campus (na Semana de Ensino, Pesquisa
e Extensão – SEPEX). Já o trabalho de levantamento sobre práticas de educação ambiental nas escolas
desencadeou a apresentação de palestras – proferidas pelos estudantes do grupo em questão – em algumas
escolas municipais e em uma ONG (Associação da Criança e do Adolescente de Itaobim) nas quais foram
abordados temas como a importância da Educação Ambiental e uma melhor compreensão dos elementos
que compõem o meio ambiente e como preservá-lo, problemas ambientais, principalmente os que envolvem
resíduos sólidos e alternativas para evitar ou resolver essas situações.
Por fim foi feita uma atividade de avaliação/reflexão da confiabilidade dos resultados do estudo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Propomo-nos nesse trabalho a descrever e analisar uma proposta didática que temos nos apropriado
e implementado em turmas dos Cursos de Bacharelado em Administração e de Tecnologia em Gestão

Mario de Souza Santana


Ambiental. Essa experiência nos tem levado a crer, como apontado em Santana (2011) e em outros
trabalhos similares citados anteriormente, que a mesma traz grandes contribuições no desenvolvimento do
pensamento e do letramento estatístico dos estudantes envolvidos. Eles realizam investigações percorrendo
todo o caminho do tratamento da informação percebendo suas dificuldades e seus limitantes, tomando
decisões nas várias etapas, aprendendo através do contexto que vai dialogando com a aplicação das técnicas
estatísticas. Percebem também que os dados são necessários para responder às questões propostas e como
eles são produzidos.
Temos observado, no entanto, que tal experiência tem suscitado dificuldades e limitações. Já no
início nos deparamos com situação de incerteza quanto aos rumos que tudo tomará. Aí se inclui os possíveis
conteúdos estatísticos que teremos de dar conta para que o trabalho aconteça. Na fase de análise, por
exemplo, percebemos que se poderiam aplicar técnicas mais robustas, mas que o tempo não nos permite.
As amostragens tem sido outra dificuldade. Estas, entretanto, contribuem muito para o desenvolvimento do
pensamento crítico uma vez que os estudantes vivenciam a as limitações que impedem o uso de técnicas
probabilísticas.
Por fim, é válido salientar que sair da zona de conforto de nossa tradição do ensino da matemática
nos leva a aventurarmos em um caminho aberto à possibilidades diversas. Destacamos, porém, que,
embora dificuldades permeiem o desenvolvimento desse tipo de atividade – como é o caso dos conteúdos
necessários à condução do processo –, a visão de educação (estatística) de que estamos imbuídos será
decisiva para se levar a cabo qualquer alternativa metodológica a essa tradição.

REFERÊNCIAS

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116 Institutos Federais: Educação, Gestão e Atuação

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