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001968/2023-38

Nota Técnica nº 86/2023-STD/ANEEL

Em 14 de setembro de 2023.

Processo: 48500.005218/2020-06.

Assunto: Entendimento regulatório a ser utilizado em


atividades de ouvidoria setorial nos casos que
envolvam a aplicação do art. 83 da Resolução
Normativa nº 1.000/2021.

I - DO OBJETIVO

1. Decidir sobre o entendimento regulatório a ser utilizado em atividades de ouvidoria setorial


nos casos que envolvam a aplicação do art. 83 da Resolução Normativa nº 1.000/2021.

II - DOS FATOS

2. A Resolução Normativa – REN nº 1.000, de 7 de dezembro de 2021, consolidou as Regras


de Prestação do Serviço Público de Distribuição de Energia Elétrica.

3. O art. 83 da REN nº 1.000/2021 disciplina condições de validade, aprovação e cumprimento


do orçamento de conexão, bem como elenca situações de perda de validade.

4. Em 10 de fevereiro de 2023, foi publicada a Resolução Normativa – REN nº 1.059, de 7 de


fevereiro de 2023, que aprimorou as regras para a conexão e o faturamento de centrais de microgeração
e minigeração distribuída em sistemas de distribuição de energia elétrica.

5. Após a publicação da REN nº 1.059/2023, distribuidoras do Grupo Energisa invalidaram


centenas de orçamentos de conexão emitidos, inclusive de consumidores com contratos já celebrados,
sob alegação principal de que estariam inválidos por implicarem comprometimento do sistema de
distribuição.

6. Em 13 de julho de 2023, após fiscalização da AGER-MT, a Energisa Mato Grosso recebeu o


Relatório de Fiscalização - Análise da Distribuição - RA 0003/2023-AGER/MT-SFT, que identificou conduta
irregular de invalidação de 607 orçamentos de conexão e fez a seguinte recomendação:

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Documento assinado digitalmente.


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P. 2 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

31. A EMT deve adotar todas as providências necessárias visando a observância dos
regulamentos setoriais na prestação de serviço de distribuição conforme apontamentos
deste Relatório de Fiscalização. Nesse sentido, a Distribuidora deverá adotar as seguintes
providências:
a) Comunicar, pela mesma forma adotada para a invalidação, de que os orçamentos de
conexão que foram indevidamente invalidados, estão válidos e serão cumpridos pela
Distribuidora, e;
b) Restabelecer de forma integral o prazo de validade do orçamento de conexão
invalidado, contado a partir do recebimento da nova comunicação.

7. Em 19 de julho de 2023, por meio do Ofício Circular nº 8/2023-SFT-SMA-STD/ANEEL1, foi


dado conhecimento ao Grupo Energisa do teor do Relatório de Fiscalização – Análise da Distribuição (RA)
nº 0003/2023-AGER/MT-SFT, bem como recomendado a adoção das medidas contidas no relatório nas
demais distribuidoras do grupo.

8. Em 16 de agosto de 2023, por meio do Memorando nº 174/2023 – SMA/ANEEL2, a STD


recebeu consulta da SMA, informando da existência de dezenas de reclamações sobre cancelamento de
orçamentos de conexão, que estariam pendentes de solução no Sistema de Gestão de Ouvidoria – SGO,
e requerendo o entendimento regulatório sobre o tema.

9. Em 14 de agosto de 2023, por meio da correspondência ENERGISAMT/DPRE-


OFC/Nº112/2023, a Energisa Mato Grosso apresentou à AGER-MT sua manifestação ao Relatório de
Fiscalização - Análise da Distribuição - RA 0003/2023-AGER/MT-SFT.

10. Em 21 de agosto de 2023, por meio da correspondência ENERGISA/VPR-


ANEEL/Nº113/20233, o Grupo Energisa apresentou sua manifestação ao Ofício Circular nº 8/2023–SFT-
SMA-STD/ANEEL.

III - DA ANÁLISE

11. A SMA informa do registro de dezenas de reclamações no Sistema de Gestão de Ouvidoria


– SGO sobre cancelamento indevido de orçamentos de conexão praticado por distribuidoras do Grupo
Energisa.

12. A SMA categorizou as reclamações em 4 grupos:

 Grupo 1: Orçamento de Conexão sem participação financeira do consumidor e que


foram cancelados após a aprovação tácita do orçamento;

 Grupo 2: Orçamento de Conexão sem participação financeira do consumidor e que


foram cancelados antes da aprovação tácita orçamento;

1
48532.004259/2023-00
2
48542.003853/2023-00
3
48513.019826/2023-00

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P. 3 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

 Grupo 3: Orçamento de Conexão com participação financeira do consumidor e que


foram cancelados após o aceite do orçamento pelo consumidor;

 Grupo 4: Orçamento de Conexão com participação financeira do consumidor e que


foram cancelados antes da aprovação do orçamento;

13. De acordo com a SMA, a distribuidora pretende afastar o disposto no § 5º do art. 83 da


REN n° 1.000/2021, que dispõe que “A distribuidora e o consumidor e demais usuários devem cumprir o
orçamento de conexão aprovado, que somente pode ser alterado mediante acordo entre as partes”.

14. A seguir passa-se a análise do tema para fins de dar o entendimento regulatório a ser
utilizado em atividades de ouvidoria setorial nos casos que envolvam a aplicação do art. 83 da REN nº
1.000/2021.

III.1. Do art. 83 da REN nº 1.000/2021

15. O art. 83 da REN nº 1.000/2021 disciplina condições de validade, aprovação e cumprimento


do orçamento de conexão, bem como elenca situações de perda de validade e de cancelamento,
conforme transcrito a seguir:

“Art. 83. O consumidor e demais usuários devem aprovar o orçamento de conexão e


autorizar a execução das obras pela distribuidora nos seguintes prazos:

I - 10 dias úteis: no caso de atendimento gratuito ou que não tenha participação


financeira; e

II - no prazo de validade do orçamento de conexão da distribuidora: nas demais situações.

§ 1º A distribuidora deve estabelecer o prazo de validade do orçamento de conexão,


contado de seu recebimento pelo consumidor e demais usuários, e que deve ser de pelo
menos 10 dias úteis, exceto se prazo maior for disposto na regulação.

§ 2º A validade do orçamento de conexão se prorroga pelo período estabelecido para


assinatura dos contratos.

§ 3º No caso do inciso I do caput, a não manifestação até o término do prazo caracteriza


a aprovação do consumidor e demais usuários do orçamento de conexão recebido.

§ 4º A devolução dos contratos assinados e o pagamento da participação financeira e


adicionalmente, no caso de minigeração distribuída, dos custos de adequação no sistema
de medição, caracterizam a aprovação do orçamento de conexão e a autorização para
execução das obras.

§ 5º A distribuidora e o consumidor e demais usuários devem cumprir o orçamento de


conexão aprovado, que somente pode ser alterado mediante acordo entre as partes.

§ 6º O consumidor e demais usuários não respondem por custos ou acréscimos

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decorrentes da contratação de serviços de terceiros não previstos no orçamento de


conexão.

§ 7º O orçamento de conexão perderá a validade nos casos de:

I - não aprovação nos prazos estabelecidos;

II - não pagamento da participação financeira nas condições estabelecidas pela


distribuidora; ou

III - não devolução dos contratos assinados no prazo.

IV - não pagamento dos custos de adequação no sistema de medição, no caso de


minigeração distribuída;

V - desistência do consumidor e demais usuários, por meio de manifestação expressa à


distribuidora, observadas as demais disposições previstas nesta Resolução; ou

VI - transferência de controle societário de empresa para a qual foi emitido o orçamento


de conexão referente à conexão de unidade consumidora com microgeração ou
minigeração distribuída antes da aprovação ou solicitação da vistoria, nos termos do art.
91.

§ 8º É vedada a comercialização de orçamento de conexão referente à conexão de unidade


consumidora com microgeração e minigeração distribuída, e a sua caracterização implica
aplicação do art. 655-F e cancelamento do orçamento de conexão.

§ 9º Nos casos de conexão de microgeração ou minigeração distribuída enquadrados no


§ 1º do art. 73, ao aprovar o orçamento de conexão o consumidor deve formalizar à
distribuidora sua opção entre as alternativas viáveis apresentadas, indicando, no mínimo:

I - no caso de redução da potência injetável, a forma como será realizada, inclusive se


haverá instalação de sistemas de armazenamento de energia; e

II - proposta, se houver, de uso de funcionalidades dos dispositivos de interface com a rede.

§10. No caso do §9º, o consumidor deve reapresentar as informações que necessitem ser
adequadas e a distribuidora deve dar continuidade ao processo de conexão.

16. Em breve resumo, o art. 83, na parte que trata do assunto demandado pela SMA, pode ser
segmentado nas seguintes regras:

a) Prazo de Validade: o orçamento possui prazo de validade de no mínimo 10 dias úteis,


podendo esse prazo ser maior se estipulado pela distribuidora ou previsto na regulação;

b) Aprovação: o orçamento será aprovado:

b1. de forma tácita: após o prazo de 10 dias úteis, no caso de atendimento gratuito ou

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que não tenha participação financeira; ou

b2. de forma expressa: na devolução dos contratos assinados e pagamento da


participação financeira e, se aplicável, dos custos de medição;

c) Alteração: a distribuidora e o consumidor devem cumprir o orçamento de conexão


aprovado, que somente pode ser alterado mediante acordo entre as partes. Não podem
ser acrescentados custos ou acréscimos decorrentes da contratação de serviços de
terceiros não previstos no orçamento de conexão;

d) Perda de Validade: o orçamento perde a validade nos casos do §7º;

e) Cancelamento: o orçamento é cancelado no caso do § 8º (comercialização);

17. Além da hipótese prevista no art. 83, §8º da REN nº 1.000/2021, o cancelamento do
orçamento de conexão pode ser realizado pela distribuidora se caracterizada a divisão da central geradora
em unidades de menor porte para o enquadramento como microgeração ou minigeração distribuída, o
que tem fundamento no art. 11, §2º da Lei nº 14.300/2022 e está disposto no art. 655-E, §2º:

“Art. 655-E. É vedada a divisão de central geradora em unidades de menor porte para se
enquadrar nos limites de potência instalada da microgeração ou minigeração distribuída.

...
§ 2º Caso seja constatado o descumprimento do caput deste artigo, a distribuidora deve:

I - negar a adesão ao SCEE, não emitir ou cancelar o orçamento de conexão e encerrar


os contratos, caso a constatação ocorra antes do início do fornecimento; ou [...]”

18. O art. 83 da REN nº 1.000/2021 tem fundamento no Código de Defesa do Consumidor


(CDC), Lei nº 8.078/1990, que assim estabelece:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
...
VI - executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do
consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes;

Art. 40. O fornecedor de serviço será obrigado a entregar ao consumidor orçamento prévio
discriminando o valor da mão-de-obra, dos materiais e equipamentos a serem empregados,
as condições de pagamento, bem como as datas de início e término dos serviços.

§ 1º Salvo estipulação em contrário, o valor orçado terá validade pelo prazo de dez dias,
contado de seu recebimento pelo consumidor.

§ 2° Uma vez aprovado pelo consumidor, o orçamento obriga os contraentes e somente


pode ser alterado mediante livre negociação das partes.

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§ 3° O consumidor não responde por quaisquer ônus ou acréscimos decorrentes da


contratação de serviços de terceiros não previstos no orçamento prévio.

19. Assim, é o CDC que fundamenta as disposições contidas no art. 83 da REN nº 1.000/2021
sobre a validade e aprovação do orçamento, bem como que o orçamento aprovado obriga as partes.

20. O art. 83, §5º da REN nº 1.000/2021, que tem mesmo teor do art. 40, §2º do CDC, dispõe
sobre a possibilidade de alteração do orçamento de conexão aprovado, mediante acordo entre as partes.
Esse dispositivo não trata, portanto, de cancelamento ou de invalidação unilateral por parte da
distribuidora ou de permissão para que a distribuidora intervenha no processo durante a etapa em que o
orçamento está válido e que o consumidor deve se manifestar em relação à aprovação.

21. Ademais, não há manifestação de vontade livre e consciente se o consumidor não detém
as informações necessárias para formar seu convencimento, o que implica que qualquer proposta de
alteração por parte da distribuidora deve ser acompanhada de, no mínimo, os seguintes esclarecimentos:

a) quais itens do orçamento de conexão a distribuidora propõe alterar, com os respectivos


impactos nos valores, condições e justificativas técnicas e dispositivos legais e
normativos que fundamentam as alterações;

b) qual a versão completa do orçamento de conexão alterado, para que o consumidor


avalie a possibilidade de acordo;

c) que em caso de não existir acordo prevalece o orçamento de conexão original; e

d) que a concordância com eventual acordo é opcional e deve ser por escrito.

22. De forma relacionada, do CDC também se originam as seguintes disposições:

Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer
forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou
apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato
que vier a ser celebrado.

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações


corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características,
qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre
outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos
consumidores.
[...]

Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta,


apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:

I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou


publicidade;

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II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;

III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada,


monetariamente atualizada, e a perdas e danos.

23. Conforme dispõe o CDC, a proposta do serviço manifestada por meio do orçamento de
conexão entregue ao consumidor e demais usuários vincula a distribuidora. Assim, pode o consumidor
exigir da distribuidora o cumprimento forçado da obrigação, conforme art. 35, I, principalmente porque
o serviço de distribuição é prestado no regime de monopólio e não haverá outro fornecedor para prestar
o mesmo serviço.

Nesse sentido, a exceção das hipóteses de cancelamento (art. 83, §8º e art. 655-E, §2º, I) e
de perda de validade (art. 83, §7º) expressamente dispostas na REN nº 1.000/2021, a ação da distribuidora
para cancelar ou invalidar o orçamento de conexão, em quaisquer das etapas do processo de conexão,
inclusive nos casos em que ainda não tenha sido aprovado e esteja dentro do prazo de validade,
caracteriza descumprimento da regulação, constituindo infração que sujeita a distribuidora às
penalidades estabelecidas na Resolução Normativa nº 846, de 11 de junho 2019.

24. Assim, embora a distribuidora possua ampla liberdade na direção de seus negócios,
conforme assegurado expressamente em seu contrato de concessão, não há liberdade da distribuidora
para não prestar um serviço adequado ou para descumprir a legislação e a regulação da ANEEL.

25. Além da penalidade decorrente do descumprimento da regulação, avalia-se que em caso


de orçamento de conexão e demais atos indevidamente invalidados ou cancelados, a distribuidora deve
ser obrigada a restaurar a validade do orçamento e, de forma a tornar essa medida efetiva, deve reabrir
integralmente os prazos que foram comprometidos pela conduta irregular, o que significa devolver ao
interessado o prazo integral para a prática dos atos que foram prejudicados.

26. Em outras palavras, avalia-se que, a partir da constatação de conduta irregular, a


distribuidora deve notificar o consumidor de que o orçamento indevidamente invalidado ou cancelado
foi restaurado, e que o prazo dado ao consumidor para a prática do próximo ato (aprovação, devolução
do contrato assinado etc.) se reinicia “do zero”.

27. Nessa situação de conduta irregular da distribuidora, avalia-se que as condições e prazos
do orçamento originalmente entregue devem ser integralmente cumpridos, ainda que tenha a
distribuidora que, como consequência de seus próprios atos, custear e realizar obras adicionais em seu
sistema de distribuição para viabilizar o orçamento que teve a validade restaurada e para manter a
prestação do serviço adequado aos seus consumidores e demais usuários.

28. De fato, ao invalidar ou cancelar indevidamente o orçamento de conexão, a distribuidora


pode ter afetado o direito do consumidor de que sua solicitação de orçamento fosse analisada conforme
critério de priorização pela ordem cronológica de protocolo junto à distribuidora (art. 72, IV), o que
poderia resultar em alternativa de conexão mais onerosa, ainda que de mínimo custo global.

29. Caso o consumidor tenha recebido um novo orçamento de conexão em função do

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orçamento de conexão original ter sido irregularmente invalidado ou cancelado pela distribuidora e tenha
pagado valor maior de participação financeira, entende-se caracterizada a cobrança pela conexão sem
observância da regulação, com direito à devolução do dobro do valor pago em excesso em relação ao
orçamento originalmente entregue, aplicação direta do art. 103 da REN nº 1.000/2021.

30. Importante observar que o consumidor não é obrigado a aprovar o orçamento restaurado,
tendo liberdade para permanecer com outra opção de conexão que tenha sido informada pela
distribuidora, especialmente no caso de entender que eventual alteração pode não lhe ser mais benéfica.
De forma relacionada, o orçamento restaurado também não pode ser aplicado a empreendimento diverso
do que foi informado na solicitação de conexão original.

31. Outra questão que merece análise é que ao invalidar ou cancelar indevidamente o
orçamento de conexão a distribuidora pode, ainda que restabeleça a validade do orçamento
originalmente entregue, causar atrasos no processo de conexão e prejudicar o início da injeção de energia
por empreendimentos de microgeração ou de minigeração distribuída, resultando em não
enquadramento como GD I, assunto tratado no art. 655-O, §§4º e 5º. Nesse sentido, avalia-se que essa
perturbação causada pela distribuidora no processo de conexão deve ser entendida como pendência de
responsabilidade da distribuidora, nos termos do art. 655-O, §5º:

Art. 655-O [...] § 5º A contagem dos prazos estabelecidos no § 4º fica suspensa enquanto
houver pendências de responsabilidade da distribuidora que causem atraso na conexão,
na vistoria e na instalação dos equipamentos de medição, ou em caso fortuito ou de força
maior, devidamente comprovados pelo consumidor, sendo a suspensão limitada ao
período em que durar o evento.

32. Nos casos de ação indevida da distribuidora em relação ao orçamento de conexão de


consumidores e demais usuários que já possuíam o contrato formalizado, inclusive o de adesão, entende-
se igualmente ter incorrido a distribuidora em conduta irregular, na medida em o orçamento de conexão
já estava convalidado.

33. Ademais, observa-se que o contrato é a espécie mais conhecida do gênero "ato jurídico
perfeito", ou seja, de negócio jurídico consolidado, e possui forte proteção, não só regulatória, mas
também pela Constituição, não podendo ser prejudicado por conduta irregular da distribuidora.

34. Ainda sobre o art. 83, observa-se que o orçamento de conexão contém, no caso de
necessidade de obras, os itens essenciais para avaliação do consumidor:

“Art. 69. O orçamento de conexão deve conter, no mínimo:

I - havendo necessidade de obras de responsabilidade da distribuidora para a conexão:

a) relação das obras e serviços necessários no sistema de distribuição, discriminando o


valor da mão-de-obra, dos materiais e equipamentos a serem empregados;

b) prazo de conexão, que compreende o prazo de conclusão das obras e o prazo de vistoria
e instalação dos equipamentos de medição, contendo o cronograma físico-financeiro para

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execução e as situações que podem suspender os prazos;

c) memória de cálculo dos custos orçados;

d) custo atribuível ao consumidor e demais usuários a título de participação financeira e


as condições de pagamento, discriminando o cálculo do encargo de responsabilidade da
distribuidora, o fator de demanda e o detalhamento da aplicação da proporção e dos
descontos; [...]”

35. Tais informações, principalmente o custo atribuível ao consumidor e demais usuários a


título de participação financeira, irão gerar, após a aprovação do art. 83 e na sequência do processo de
conexão, a emissão e entrega pela distribuidora dos contratos e, caso aplicável, do documento ou meio
de pagamento, conforme caput do art. 84. Esse documento de pagamento, inclusive, pode ser recebido
pelo consumidor junto com o orçamento de conexão, conforme disposições do art. 68, I e art. 69, §2º.

36. Assim, avalia-se que nos casos em que o consumidor não tenha exercido a opção disposta
no art. 68, I, de receber junto com o orçamento de conexão os contratos e o documento ou meio para
pagamento de custos de sua responsabilidade, não pode a distribuidora emitir o documento de
pagamento (art. 84) posterior com alteração de valores de responsabilidade do consumidor em relação
ao orçamento originalmente entregue e aprovado, visto que isso representaria alteração unilateral do
orçamento de conexão.

37. Caso isso ocorra, o consumidor terá o direito de retorno ao valor originalmente informado
e, caso já tenha pagado o novo valor, o direito à devolução do dobro do valor pago em excesso, conforme
disposto no art. 103 da REN nº 1.000/2021, por se caracterizar cobrança pela conexão sem observância
da regulação.

III.2. Do caso Energisa

38. Importante avaliar a manifestação do Grupo Energisa relatada pela SMA em sua consulta,
conforme transcrição a seguir:

“(...)sobre o comprometimento do sistema de distribuição no posto de transformação da


distribuidora ou no disjuntor do alimentador, indicado no ponto de conexão e nível de
tensão pretendido, em razão da identificação de inversão de fluxo da rede.

No que tange à aplicação do §1º e seguintes do artigo 73, da Resolução 1.000/21, incluído
pela Resolução 1.059/23, ambas da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, a
Energisa pondera que a preocupação primordial ao informar acerca da inversão do fluxo
de potência identificada é de preservar a segurança do sistema elétrico de potência. Sem
prejuízo, foi apresentada condição para solução alternativa no intuito de possibilitar a
conexão requerida, adequando à compatibilidade do sistema, não havendo que se falar
em perda de direito ao pedido de conexão e tão unicamente de adequação à
possibilidade viável da rede de distribuição, sem prejuízo aos demais usuários. (grifo
nosso)

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Além disso, é imperioso que a regulação seja interpretada em todo seu conjunto de modo
a garantir a harmonia da norma, havendo que se destacar a previsão de correção na rede
por parte do usuário que gere impacto no sistema.

O artigo 44, II da Resolução Normativa ANEEL n° 1000, de 7 de dezembro de 2021


estabelece que “caso as instalações do consumidor ou dos demais usuários provoquem
distúrbios e/ou danos ao sistema elétrico de distribuição, ou a outras instalações e
equipamentos elétricos, desde que comprovados, a distribuidora deve exigir, por meio de
comunicação escrita, específica e com entrega comprovada” “a instalação dos
equipamentos corretivos necessários e o prazo de instalação, descumprimento pode
resultar na suspensão do fornecimento de energia elétrica”, “o pagamento das obras
necessárias no sistema elétrico destinadas à correção dos efeitos dos distúrbios,
informando o prazo de conclusão e o orçamento detalhado” e ainda “o reembolso das
indenizações por danos a equipamentos elétricos que tenham decorrido do uso da carga
ou geração provocadora dos distúrbios, informando a ocorrência dos danos e as despesas
incorridas, garantindo o direito à ampla defesa e ao contraditório”.

Portanto, não se sustenta o argumento de que as condições ora discutidas infringiriam ato
jurídico perfeito e direito adquirido. A própria regulação autoriza a distribuidora a exigir
ajustes posteriores uma vez identificado que a operação tem o condão de causar prejuízos
ao sistema elétrico de distribuição.

Adicionalmente, esta concessionária reitera que está apenas aplicando a regulação


setorial vigente, conforme os termos do artigo 73 da Resolução ANEEL nº 1000, de 2021.
A Agência reguladora trouxe alternativas de viabilidade para a análise das conexões de
geração distribuída, de modo a garantir a estabilidade sistêmica e o propósito original de
incentivo à instalação das gerações distribuídas que é adicioná-la junto ou próximo,
gerando benefícios sistêmicos de redução de perdas elétricas, redução de carregamento
das linhas de distribuição e melhoria da estabilidade sistêmica. Nesse sentido, aplicar tal
avaliação da inversão do fluxo de potência é buscar a manutenção desses princípios, com
base no regulamento, em especial pelo impacto causado pelo grande volume de
solicitações de geração distribuída que foi realizado durante outubro de 2022 e janeiro de
2023.

Assim, em cumprimento ao disposto no §3º do artigo 73, da REN 1.000/21 – ANEEL,


apresentamos as alternativas viáveis de conexão para o pedido em referência (Anexo I),
pelo que Vossa Senhoria poderá manifestar a esta distribuidora a opção desejada, dentro
do prazo de 10 dias úteis. 8. A não manifestação no prazo indicado acarretará o
encerramento deste pedido, independente de nova notificação .”

39. Para melhor contextualizar a conduta da distribuidora, transcreve-se a seguir o texto da


correspondência encaminhada pela Energisa aos seus consumidores (cópia no Anexo I), em que a
concessionária comunica que o orçamento entregue ao consumidor estaria inválido:

“Assunto: Comprometimento do sistema de distribuição - Inversão de Fluxo.

Prezado Cliente:

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Documento assinado digitalmente.


Consulte a autenticidade deste documento em http://sicnet2.aneel.gov.br/sicnetweb/v.aspx, informando o código de verificação 6477532A007530F4
48552.001968/2023-38

P. 11 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

Informamos a V. Sa. que conforme o disposto no Orçamento de Conexão emitido e na


Resolução Normativa 1.059/2023, que incluiu o §1º ao artigo 73 da Resolução Normativa
ANEEL nº 1.000/21, esta distribuidora de energia reavaliou os orçamentos de conexão.

A ação tem por escopo o atendimento da norma vigente, em especial para preservar os
parâmetros técnicos necessários ao não comprometimento do sistema de distribuição de
energia1, identificando os casos em que a conexão proposta no orçamento acarreta
inversão de fluxo de potência na subestação de distribuição e/ou no alimentador.

Pelo exposto, esta distribuidora esclarece, que em conformidade com o regulamento


vigente e para preservar o sistema elétrico de potência, os orçamentos das solicitações
citadas nesta carta encontram-se inválidos por implicarem no comprometimento do
sistema de distribuição de energia para o ponto de conexão informado na documentação
em referência e o nível de tensão.

Informamos também, que em atendimento ao §2º do art. 73, da REN 1.000/21 e para que
esta distribuidora possa avaliar os estudos pertinentes às alternativas de conexão, V.Sa.,
poderá manifestar a esta distribuidora, dentro do prazo de 10 dias úteis, o interesse em
conexão em nível de tensão superior, compatível ao sistema de transmissão da região. A
não manifestação no prazo indicado acarretará o encerramento deste pedido,
independente de nova notificação.

Caso seja de interesse de V. Sa., novos pedidos de conexão poderão ser realizados
mediante a abertura de novo protocolo.

Sendo o que temos para o momento.”

40. Da análise da correspondência da Energisa acima transcrita, observa-se que a distribuidora


comunica ao consumidor que os orçamentos de conexão estariam inválidos por acarretarem inversão de
fluxo de potência (art. 73, §1º e seguintes). Conforme abordado no item III.1 desta Nota, trata-se de
motivo de perda de validade não previsto na REN nº 1.000/2021 e que não se enquadra nas hipóteses
expressamente dispostas no art. 83, §7º para perda de validade do orçamento, ou seja, resta
caracterizada a conduta irregular da distribuidora.

41. Na correspondência ENERGISA/VPR-ANEEL/Nº113/20234, em resposta ao Ofício Circular nº


8/2023–SFT-SMA-STD/ANEEL, a argumentação do Grupo Energisa é bem semelhante às anteriormente
transcritas:

“...o que se verifica no caso concreto é que a Distribuidora, em aplicação ao disposto no


mesmo art. 73, §1º, informou aos clientes cuja conexão gerasse inversão de fluxo (o que
causa problemas à segurança do sistema e à qualidade da energia entregue aos demais
clientes), que os orçamentos emitidos foram revistos e nos termos da referida resolução,
comunicou aos clientes que tivessem interesse em novos estudos e orçamentos visando
soluções que não impusessem ao sistema elétrico os problemas causados pela inversão de
fluxo, que procurassem a empresa visando alternativas de conexão que eliminassem o
distúrbio identificado.

4
48513.019826/2023-00

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Documento assinado digitalmente.


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48552.001968/2023-38

P. 12 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

....
[...] Agindo assim, a EMT cumpriu o disposto na regulamentação, buscando alternativas
para viabilizar tecnicamente a conexão requerida, garantindo a qualidade do
fornecimento a todos os clientes conectados no mesmo sistema e evitando que os demais
usuários do sistema tivessem que arcar com o ônus dos investimentos para resolver
problema técnico causado única e exclusivamente pela ligação de uma unidade geradora
de interesse específico do solicitante, ou seja, garantindo que o interesse coletivo fosse
preservado.

Portanto não houve negativa ao pedido de conexão de qualquer um dos acessantes aqui
em tela, mas unicamente a adequação à possibilidade viável da rede de distribuição, sem
prejuízo aos demais usuários, que inevitavelmente teriam os custos das adequações do
sistema para o atendimento individual inseridos na modicidade tarifária, suportando o
ônus que pode ser adequado por meio de novas alternativas de conexão.
...
Neste sentido é importante ainda destacar que o parágrafo 4º, do art. 83 da REN 1.000/21,
que estabelece condições especificas de aprovação de orçamentos de conexão para as
minigerações distribuídas:

§ 4º A devolução dos contratos assinados e o pagamento da participação


financeira e adicionalmente, no caso de minigeração distribuída, dos custos
de adequação no sistema de medição, caracterizam a aprovação do
orçamento de conexão e a autorização para execução das obras.

O dispositivo inserido deixa claro que apenas após a devolução dos contratos assinados e
o pagamento dos custos imputados aos clientes (eventual participação financeira e
obrigatória adequação no sistema de medição) caracterizam a aprovação do orçamento
de conexão. Sem estas etapas, sequer o orçamento de conexão pode ser considerado
aprovado.

Neste contexto, vale ainda destacar a previsão regulatória de que a distribuidora exija
medidas corretivas para a correção de instalações elétricas que impactem a coletividade,
mesmo que em momento posterior da própria conexão, tal qual disposto no artigo 44, II
da Resolução Normativa ANEEL n° 1000, de 7 de dezembro de 2021, que por sua vez,
estabelece de forma expressa que caso seja identificado que as instalações do consumidor
ou demais usuários provoquem distúrbios e/ou danos ao sistema elétrico, de modo a
prejudicar a coletividade, a distribuidora deve exigir meios para correção necessária do
problema, cujo descumprimento pelo usuário pode resultar na suspensão do pedido de
fornecimento de energia elétrica. Outra não poderia ser a visão normativa, uma vez que
o sistema de distribuição é um bem coletivo, sendo imperioso que regulação seja
interpretada em todo seu conjunto e sempre de modo a garantir a harmonia da norma e
a qualidade do fornecimento de energia dentro do menor custo à coletividade, de modo
que o interesse individual não se sobreponha a esse princípio.
...
A própria regulação autoriza a distribuidora a exigir ajustes posteriores uma vez
identificado que a operação tem o condão de causar prejuízos ao sistema elétrico de
distribuição.”

42. Não obstante a manifestação da distribuidora de que não teria havido negativa ao pedido

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Documento assinado digitalmente.


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P. 13 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

de conexão, é fato que a REN nº 1.059/2023 não conferiu à distribuidora a possibilidade de aplicação
retroativa das alterações do art. 73 relacionadas à inversão de fluxo a orçamentos de conexão já emitidos
ou a consumidores com contratos já celebrados.

43. Como regramento geral, inclusive, observa-se que as normas são, em essência,
irretroativas, ou seja, não incidem sobre fatos e atos passados. O princípio da irretroatividade busca
preservar a segurança jurídica, visto que sem ele os conflitos seriam intermináveis. Assim, deve ser
respeitado o ato já consumado segundo o regramento vigente ao tempo em que se efetuou.

44. De fato, a REN nº 1.059/2023 estabeleceu em seu art. 13 que a distribuidora deveria
implementar as alterações promovidas até o dia 1º de julho de 2023, ou seja, até essa data os orçamentos
emitidos não precisavam conter obrigatoriamente a análise de inversão de fluxo disposta no art. 73.

45. Nesse sentido, não há como se reconhecer que o orçamento entregue ao consumidor,
emitido de acordo com a REN nº 1.000/2021 vigente sem as alterações promovidas pela REN nº
1.059/2023, conteria erro pela não aplicação da análise de inversão de fluxo do art. 73 e que tal erro
permitiria à distribuidora invalidar e substituir o orçamento.

46. Nas análises no âmbito do Poder Judiciário de casos concretos envolvendo violação do
princípio da vinculação da oferta do art. 30 do CDC, existe uma tese de excepcionalidade fixada pelo
Supremo Tribunal de Justiça5 de que apenas o erro sistêmico grosseiro poderia “afastar a falha na
prestação do serviço e o princípio da vinculação da oferta”, entendendo-se por erro grosseiro o “erro
material escusável facilmente perceptível pelo homem médio” ou seja, situações em que o próprio
consumidor perceberia facilmente o erro pelas demais informações constantes no orçamento, e exigir o
seu cumprimento evidenciaria a má- fé do consumidor.

47. Nesses casos da Energisa, entende-se não existir erro grosseiro nos orçamentos emitidos
pela distribuidora pela não aplicação da análise de inversão de fluxo do art. 73 da REN nº 1.000/2021 no
período compreendido desde a publicação da REN nº 1.059/2023 até 1º de julho de 2023. Ademais,
observa-se que o reconhecimento do erro grosseiro no orçamento deve ser facilmente perceptível pelo
próprio consumidor, o que não é o caso.

48. Assim, não é possível o acolhimento de mera alegação de erro, pois a distribuidora sempre
poderia alegar que agiu em erro na elaboração do orçamento para benefício próprio, para negar-se a
cumprir o orçamento entregue ao consumidor, o que é afastado no Direito Brasileiro no instituto da
proibição de alegação da própria torpeza para proveito próprio (“nemo auditur turpitudinem allegans”).

49. Sobre a alegação de atuação com respaldo no art. 44 da REN nº 1.000/2021, observa-se
que esse dispositivo normativo tem outra hipótese de aplicação:

Art. 44. Caso as instalações do consumidor ou dos demais usuários provoquem distúrbios
e/ou danos ao sistema elétrico de distribuição, ou a outras instalações e equipamentos
elétricos, desde que comprovados, a distribuidora deve exigir, por meio de comunicação

5
STJ. 3ª Turma. REsp 1.794.991-SE, rel. min. Nancy Andrighi, julgado em 5/5/2020 — Info 671

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P. 14 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

escrita, específica e com entrega comprovada:

I - o reembolso das indenizações por danos a equipamentos elétricos que tenham


decorrido do uso da carga ou geração provocadora dos distúrbios, informando a
ocorrência dos danos e as despesas incorridas, garantindo o direito à ampla defesa e ao
contraditório;

II - a instalação dos equipamentos corretivos necessários e o prazo de instalação, cujo


descumprimento pode resultar na suspensão do fornecimento de energia elétrica; e

III - o pagamento das obras necessárias no sistema elétrico destinadas à correção dos
efeitos dos distúrbios, informando o prazo de conclusão e o orçamento detalhado.

50. Portanto, o art. 44 somente se aplica às situações em que as instalações do consumidor e


demais usuários já foram conectadas, visto que os distúrbios e danos devem ser comprovados, não se
tratando, portanto, de danos ou distúrbios em tese ou em potencial.

51. Esses problemas que o art. 44 trata decorrem, por exemplo, de alterações nas instalações
dos usuários que não tenham sido comunicadas, por defeitos ou outros aspectos de funcionamento não
informados adequadamente por ocasião da conexão inicial, e que venham a causar distúrbios ou danos
no futuro.

52. Na fase de emissão do orçamento de conexão e até que a conexão se efetive, o art. 44 não
se aplica, na medida em que compete à distribuidora, conforme arts. 72 e 73, realizar os estudos, projetos
e elaborar o orçamento de mínimo custo global que viabilize a conexão pretendida e mantenha a
prestação do serviço adequado, conforme dispositivos transcritos a seguir:

Art. 69. O orçamento de conexão deve conter, no mínimo:


I - ...
a) relação das obras e serviços necessários no sistema de distribuição, discriminando o
valor da mão-de-obra, dos materiais e equipamentos a serem empregados;
...
Art. 72. Para realização dos estudos, elaboração do projeto e orçamento, a distribuidora
deve observar:

I - a manutenção do serviço adequado aos consumidores e demais usuários;


...
VII - o critério de mínimo custo global; e [...]

Art. 73. A distribuidora deve, se necessário, realizar estudos para:

I - avaliação do grau de perturbação das instalações do consumidor e demais usuários em


seu sistema de distribuição;
II - avaliação dos impactos sistêmicos da conexão;
III - adequação do sistema de proteção e integração das instalações do consumidor e
demais usuários; e
IV - coordenação da proteção em sua rede de distribuição e para revisão dos ajustes

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Documento assinado digitalmente.


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P. 15 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

associados, incluindo o ajuste dos parâmetros dos sistemas de controle de tensão, de


frequência e dos sinais estabilizadores.

53. Caso a distribuidora identifique nos estudos realizados que as instalações do consumidor
impactam o sistema de distribuição e demandam a instalação de equipamentos de correção ou ações de
mitigação, deve informar ao consumidor no próprio orçamento de conexão:

Art. 69. O orçamento de conexão deve conter, no mínimo:


...
XI - indicação da necessidade da instalação pelo consumidor e demais usuários de
equipamentos de correção ou implementação de ações de mitigação, decorrente de
estudos de perturbação ou de qualidade da energia elétrica realizados pela distribuidora;

54. Nos casos em que a distribuidora tenha elaborado orçamentos de conexão sem realizar os
estudos necessários ou tenha realizado de forma inadequada, incorre em má prestação do serviço, e deve
se responsabilizar posteriormente pelas correções e reforços necessários no sistema de distribuição.

55. No mesmo sentido, não procede a alegação da distribuidora de que, ao invalidar os


orçamentos, estaria agindo para que o interesse individual não se sobreponha ao coletivo, na medida em
que a distribuidora é obrigada a realizar as conexões de caráter permanente solicitadas, pela obra de
mínimo custo global e de acordo com as regras de participação financeira dispostas no regulamento, o
que remunera adequadamente os investimentos necessários.

56. Portanto, reitera-se a avaliação feita nesta Nota Técnica, de que a invalidação do
orçamento de conexão pela distribuidora com fundamento na aplicação retroativa ao art. 73, na aplicação
do art. 44 ou para supostamente sobrepor o interesse coletivo ao individual não encontra respaldo
regulatório e não se enquadra nas hipóteses expressamente dispostas no art. 83, §7º para perda de
validade do orçamento, ou seja, trata-se de conduta irregular da distribuidora.

57. Do exposto, conclui-se que a distribuidora errou ao invalidar os orçamentos de conexão,


pois tal conduta não encontra amparo legal ou normativo, conforme já identificado no Relatório de
Fiscalização - Análise da Distribuição - RA 0003/2023-AGER/MT-SFT.

IV - DO FUNDAMENTO LEGAL

58. A presente Nota Técnica está fundamentada na Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996,
na Portaria nº 6.823, de 4 de maio de 2023 e na Resolução Normativa nº 1.000, de 7 de dezembro de
2021.

V - DA CONCLUSÃO

59. O art. 83 disciplina condições de validade, aprovação e cumprimento do orçamento de


conexão, bem como elenca situações de perda de validade (§7º) e de cancelamento (§8º). O
cancelamento do orçamento de conexão também pode ocorrer na hipótese prevista no art. 655-E, §2º.

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

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P. 16 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

60. A análise realizada no item III.1 desta Nota resultou nos entendimentos regulatórios que
devem ser utilizados em atividades de ouvidoria setorial nos casos que envolvam o orçamento de
conexão, em especial a aplicação do art. 83 da Resolução Normativa nº 1.000/2021, conforme itens a
seguir:

(i) É vedado à distribuidora cancelar ou invalidar o orçamento de conexão após sua


entrega ao consumidor e demais usuários, exceto nas hipóteses previstas nos §§7º e
8º do art. 83 e §2º do art. 655-E da Resolução Normativa nº 1.000/2021.
(ii) No caso de cancelamento ou invalidação do orçamento de conexão sem fundamento
nos §§7º e 8º do art. 83 e §2º do art. 655-E da Resolução Normativa nº 1.000/2021,
a distribuidora deve restaurar a validade do orçamento originalmente entregue,
notificar com entrega comprovada e restabelecer ao consumidor e demais usuários
o prazo integral para a prática dos atos que foram prejudicados, contados a partir do
recebimento da notificação, sem prejuízo das sanções cabíveis.
(iii) O acordo de alteração do orçamento de conexão disposto no §5º do art. 83 da
Resolução Normativa nº 1.000/2021 deve ser formalizado por escrito e assinado por
ambas as partes, não sendo suficiente o envio por qualquer uma das partes e a
consideração de concordância tácita pelo silêncio em caso de ausência de
manifestação.
(iv) Em caso de proposta da distribuidora de alteração do orçamento de conexão, nos
termos do §5º do art. 83 da Resolução Normativa nº 1.000/2021, o consumidor e
demais usuários devem, previamente à formalização, receber a proposta do
orçamento alterado e ser esclarecidos, por escrito de quais itens propõe-se alterar,
os respectivos impactos e as justificativas, de que não são obrigados a aceitar o
acordo e que em caso de não existir acordo prevalece o orçamento de conexão
originalmente entregue.
(v) Em caso de invalidação, cancelamento ou alteração do orçamento de conexão
realizados em desacordo com a regulação e que tenha resultado em pagamento de
valor maior em relação ao orçamento originalmente entregue, o consumidor e
demais usuários têm direito à devolução disposta no art. 103 da Resolução Normativa
nº 1.000/2021.
(vi) O custo atribuível ao consumidor e demais usuários a título de participação financeira
informado no orçamento de conexão, aprovado nos termos do art. 83 da Resolução
Normativa nº 1.000/2021, não pode ser alterado pela distribuidora quando da
entrega dos contratos e documento ou meio para pagamento, exceto se apenas o
valor for revisto para menor.
(vii) O atraso para injeção de energia de unidade consumidora com microgeração ou
minigeração distribuída decorrente de conduta da distribuidora de invalidação,
cancelamento ou alteração do orçamento de conexão em desacordo com a regulação
deve ser enquadrado como pendência de responsabilidade da distribuidora, nos
termos do §5º do art. 655-O da Resolução Normativa nº 1.000/2021.

* A Nota Técnica é um documento emitido pelas Unidades Organizacionais e destina-se a subsidiar as decisões da Agência.

Documento assinado digitalmente.


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48552.001968/2023-38

P. 17 da Nota Técnica nº 86/2023 – STD/ANEEL, de 14/09/2023.

61. A STD possui, conforme Portaria nº 6.823, de 4 de maio de 2023, delegação para decidir
sobre o entendimento regulatório a ser aplicado nos casos de ouvidoria setorial:

Art. 1º Delegar ao titular da Superintendência de Regulação dos Serviços de Transmissão


e Distribuição – STD e ao seu adjunto as seguintes competências:
[...]
IV - decidir acerca do entendimento regulatório a ser utilizado em atividades de ouvidoria
setorial nos casos que envolvam a aplicação direta de dispositivos constantes de
regulamentos associados às competências da Superintendência estabelecidas no
Regimento Interno da ANEEL;

62. Assim, propõe-se que o entendimento regulatório a ser utilizado em atividades de


ouvidoria setorial nos casos que envolvam a aplicação do art. 83 da Resolução Normativa nº 1.000/2021
seja firmado pela publicação de despacho da STD.

63. Adicionalmente, avalia-se que, como ação complementar à publicação do referido


despacho, deve ser encaminhado ofício circular às distribuidoras dando ciência do entendimento
regulatório.

VI - DA RECOMENDAÇÃO

64. Diante do exposto, recomenda-se a emissão de despacho pela STD para decidir sobre o
entendimento regulatório a ser utilizado em atividades de ouvidoria setorial nos casos que envolvam a
aplicação do art. 83 da Resolução Normativa nº 1.000/2021.

(Assinado digitalmente) (Assinado digitalmente)


DANIEL JOSÉ JUSTI BEGO DANIEL VIEIRA
Especialista em Regulação Especialista em Regulação

(Assinado digitalmente) (Assinado digitalmente)


HENRIQUE TAVARES MAFRA MARÍLIA BRASIL DE MATOS BARBOSA
Especialista em Regulação Especialista em Regulação

(Assinado digitalmente)
PEDRO MELLO LOMBARDI
Gerente de Regulação do Serviço de Distribuição

De acordo:

(Assinado digitalmente)
CARLOS ALBERTO CALIXTO MATTAR
Superintendente de Regulação dos Serviços de Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica

Documento assinado *
digitalmente por Henrique
A Nota Técnica é umTavares Mafra,emitido
documento Coordenador(a) Adjunto(a) Organizacionais
pelas Unidades de Acesso ao Sistema de Distribuição
e destina-se e Atendimento
a subsidiar ao Consumidor
as decisões e
da Agência.
Demais Usuários, em 15/09/2023 às 09:08; Marilia Brasil de Matos Barbosa, Especialista em Regulação, em 15/09/2023 às 08:31; Pedro Mello Lombardi, Gerente de
Regulação do Serviço de Distribuição, em 14/09/2023 às 18:43; Daniel Vieira, Especialista em Regulação, em 14/09/2023 às 18:42; Carlos Alberto Calixto Mattar,
Superintendente de Regulação Dos Serviços de Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica, em 14/09/2023 às 18:38; Daniel Jose Justi Bego, Coordenador(a) de
Acesso ao Sistema de Distribuição e Atendimento ao Consumidor e Demais Usuários, em 14/09/2023 às 18:09
Número: 48552.001968/2023-00-1 (ANEXO: 001)

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