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Introdução

Nós viemos das estrelas e é pra elas que voltamos algum dia.

Sempre me perguntei qual era a sensação do infinito. Como era saber que a sua existência
não se limitaria a morte nem ao tempo e que você apenas existiria por toda a eternidade, mas
então vem a questão, o que é a eternidade? Como seria viver para sempre? Pessoas tem medo
da morte e então fazem de tudo para prolongar os seus dias, porém você já se perguntou o
que faz de fato as pessoas quererem viver mais. O que as motiva? Seria somente o medo da
morte que os faz não querer conhecê-la ou seria porque não fomos feitas para passar por ela?
Eu nunca tive medo da morte, nunca sequer me tremi ao ouvir a palavra, porque eu sabia que
não seria ela o meu fim e enquanto todos choram pela minha perda eu digo à vocês que serei
o sobrenatural e meus passos perduraram por todo o universo e eu continuarei existindo em
algum lugar dele. Somos todos poeira interestelar.
Capítulo 1
“ o amor é a única loucura de um sábio e a única sabedoria de um tolo” -William Shakespeare

Era uma terça chuvosa, com nuvens tão pesadas que nem mesmo a lua ou as estrelas eram
capazes de serem vistas. Eu costumava amar dias chuvosos. Eu ainda amo, mas apenas quando
ela cai ao longo da noite. A hora quando a maioria das pessoas dormem e tudo fica em
silêncio, mas ainda sim a chuva desta noite era estranha. O céu tão escuro e nuvens tão
densas, a ponto de tudo não passar de um breu a céu aberto. Eu estava no meu quarto,
olhando para janela, observando a chuva ficar cada vez mais voraz, quando o meu celular
ligou. Era uma notificação de mensagem. Pego o celular e só então, me dou conta de que já
passa da meia-noite. Ótimo, era o meu horário predileto. Eu sempre achei que era a hora mais
bonita. A hora onde tudo começava e tudo terminava, era a hora do começo e do fim. O início
de um novo dia, e o término de outro. Quando olhei meu celular descobri quem havia me
mandado a mensagem, sendo tão tarde, eu estava preparada para o pior.

Minha amiga tinha acabado de perder o pai. Fora á alguns meses atrás, mas foi tão de repente
que chegava a ser meio inacreditável. Para um homem que sempre esteve tão bem disposto
com uma personalidade proativa e energética, foi uma completa supresa quando chegou a
notícia de que ele não mais estava entre nós. Os Hapers tinham uma certa pré disposição a ter
ataques fulminantes, só não esperávamos que Benjamim Haper também teria um, não ele que
sempre esteve com a saúde em dia. Quando aconteceu ele estava sentado em sua cadeira na
improvisada oficina que ficava na garagem, onde costumava fazer suas peças de madeira e
marcenaria. Era uma tarde e Alizah e eu estávamos voltando da escola, já muito perto da casa
dela que ficava apenas a algumas quadras de onde eu morava, quando ouvimos as peças de
ferro da garagem caírem. O portão estava aberto e Alizah já atravessava para ver o que tinha
acontecido. Ele estava deitado no chão, jogado com diversos outros pedregulhos que não mais
jaziam sobre a mesa. Não parecia respirar e quando Alizah e eu notamos, tudo se desenrolou
rápido demais e, em um piscar de olhos, eu já estava chamando a ambulância enquanto minha
amiga chorava e gritava em prantos. Eu continuei em puro choque. Não sabia o que fazer, e
minhas mãos não paravam de tremer. Eu nunca tinha visto alguém morrer na minha frente,
como também não estava preparada para o que aconteceu por diante. Nem para os gritos e
pedidos de socorro da minha amiga, nem para os choros e crises que vieram depois que todos
da família descobriram o que havia acontecido. A real era que, ninguém estava preparado para
isso. Foram tempos sombrios para os Hapers, sobretudo para a minha amiga, visto que, de
todos os quatro irmãos ela era a mais nova, e a única menina. O seu pai só tinha olhos para a
filha, fazia tudo o que ela queria e os irmãos tão pouco pouparam-na de mimos e presentes.

Eu tento ler o que Alizah disse na mensagem, mas meus olhos já estavam pesados demais com
o sono que começou a me desnortear, após tantas horas acordada. Preciso que venha aqui.
Era meia noite e cinco, o que ela queria comigo uma hora dessas? Eu não estava conseguindo
entender, aconteceu algo com a sua mãe? A Sra. Haper era uma mulher frágil, sempre foi e
depois da morte de seu marido, o que até então era visto em sua personalidade como calma,
passou a ser um caso grave de depressão. Ouço a notificação de outra mensagem. Explico
quando você chegar. Isso estava cada vez mais estranho, não era uma boa hora para se estar
na rua principalmente com uma chuva dessas, mas não era o feitio de Alizah me chamar tão
tarde se realmente não fosse necessário. Então eu me levantei e pus o moletom que estava
sobre a cadeira onde eu costumo estudar, era o meu moletom predileto com uma cruz e letras
“k” enormes bordadas com formas de rasgo. Vesti por cima da blusa e sai do quarto na ponta
dos pés para não acordar minha mãe, não que ela fosse acordar, nem mesmo se eu ligasse
uma cerra elétrica ela acordaria. A embriaguez não deixaria. Mesmo assim, sai sem fazer
barulho ao descer as escadas e passar pela porta. Estava caindo uma chuva grossa então fui
até o carro de mamãe e dei partida.

A casa de Alizah ficava a duas quadras de distância da minha, em menos de dez minutos eu já
estava na casa dela. Vi que as luzes todas da casa estavam apagadas, o que só serviu para me
deixar mais confusa sobre o que estava acontecendo então resolvi mandar uma mensagem.
Estou em frente a sua casa, cadê você? Ela não respondeu. Esperei mais dois minutos até ela
responder, mas a resposta não veio. Aquela história toda estava me dando arrepios, mas já era
tarde demais para voltar para a casa agora e sem saber o que aconteceu, também não
conseguiria dormir. Desci do carro e corri em direção à varanda para escapar da chuva e toquei
a campainha, o pior que podia acontecer era eu e Alizah levarmos um esporro da mãe dela.
Provavelmente ela brigaria por eu estar ali, tão tarde da noite e na chuva e em Alizah por ter
me chamado aquela hora. Fiquei esperando que isso acontecesse, mas nada aconteceu.
Ninguém veio até a porta e as luzes ainda continuavam apagadas. Resolvi mandar outra
mensagem avisando que eu estava enfrente a porta, mas dessa vez a mensagem nem chegou.
Tá legal, eu vou invadir a casa dela e saber que brincadeira de mal gosto é essa. Olhei em volta
procurando a chave reserva que Alizah deixava de baixo de um jarro ao lado na cadeira de
balanço na varando, só para em casos como esse eu pudesse entrar. O que dizer sobre isso, eu
era basicamente da família. Fui até o jarro levantei e peguei a chave de baixo dele, quando
destranquei a porta cena toda me deu arrepios.

A casa tava completamente escura. Não havia um único só barulho sequer, só o completo e
mais absoluto silêncio. Se antes eu já estava nervosa agora eu estava prestes a desmaiar ali na
porta mesmo, não existe nada que eu odeie mais do que o escuro, mas entrei mesmo assim.
Depois de dar o primeiro passo tentei achar o interruptor atrás da porta para ligar as luzes da
sala, mas quando eu tentei ligar elas não acediam. Então resolvi ligar a lanterna do celular.
Assim que liguei atravessei o hall de entrada e fui em direção a sala, havia um cheiro ali que
tava impregnando o lugar. Chegando perto vi que era um pedaço de pizza velho e já estragado
na mesa de centro. Isso só podia ser obra de um dos irmãos dela, muito a cara do Mike de
fazer isso, mas só aí que me dei conta de que se já esteva estragando a pizza então a quanto
tempo ela tá ali? A mães deles jamais ia deixar qualquer um dormir sem antes limpar aquela
bagunça e havia uma diarista que cuidava também dessas tarefas de manter tudo limpo.
Aquele lugar não parecia ser limpo a um bom tempo. Quando me dei conta disso virei em
direção as escadas e subi ás pressas, porque havia um péssimo pressentindo dentro de mim de
que algo estava muito, muito errado.

Fui logo em direção ao quarto de Alizah e quando abro a porta um raio estoura do lado de fora
iluminando todo o quarto e percebo que ela não está ali. Caminho eu direção em cada um dos
quartos, checando cada um deles à procura de alguém, enquanto chamo o nome de todos da
família, mas não havia ninguém em nenhum dos quartos. Não tinha pessoa alguma na casa
inteira.

Já passava das sete horas da manhã quando todos os polícias chegaram, e às oito todos os
repórteres da região também já estavam ali. Todos enfrente a casa dos Harpers que agora não
havia nenhum deles, porque todos haviam desaparecido. Depois que eu terminei de checar a
casa inteira procurando por qualquer um da família e não tive sucesso voltei para a casa e
acordei minha mãe e meu irmão e contei o que tinha acontecido. Mamãe começou a ligar para
a mãe de Alizah pelas últimas duas horas sem parar, eu para o celular da minha amiga e meu
irmão para os três irmãos dela, mas ninguém atendia. Naquela noite ninguém dormiu e
quando notamos que eles não iriam atender desistimos e ligamos para a polícia logo quando o
sol nasceu. Dava para ver o olhar de angústia da minha mãe, afinal era a sua única amiga e já
se conheciam desde o ensino médio. É tempo o suficiente para se considerar próximas como
irmãs. Eu estava do lado dela, enquanto esperávamos do lado de fora da casa vendo todo o
lugar ser interditado com fitas e fotografado por repórteres.
⁃Eles vão achar todos, mãe!
⁃Gostaria de ter mais certeza com relação a isso, mas espero de verdade que sim
filha.
Ela passou a mão na minha cabeça e eu concordei até que voltamos a ficar caladas e a
observar a casa. Não tinha muito o que ser dito, ainda estávamos em choque com aquela
situação. Como uma família inteira pode sumir desse jeito sem deixar rastros? O carro ainda
estava no lugar, a louça na pia, as camas por fazer e a pizza continua mofando em cima da
mesa. Essa era pergunta que me fiz por muito tempo até que me assombrasse e destruísse
qualquer esperança de que algum dia, esse episódio, parecesse algo semelhante a normal.

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