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O Conceito de Formação Política


Der Begriff der Politische Bildung

Theodor W. Adorno

Tradução: Frederico Schornbaum Côrtes Costa


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Nota do Tradutor
O presente texto é uma tradução de uma palestra oferecida por
Adorno em Dornbusch – Frankfurt, no dia 1 de fevereiro de 1963 para um
grupo de bolsistas do Hessenkollegs sobre o conceito de formação política.
As notas de rodapé contadas em números dizem respeito as notas de rodapé
originais do editor das palestras publicadas pela Surhkamp. As notas de
rodapé contadas em letras são do tradutor do texto. Devido ao fato do texto
tratar-se de uma transcrição de uma fala, e visto as limitações do meio de
capturar certos maneirismos típicos da fala, como a pausa e a entonação (a
edição original não conta com essas marcações) é recomendado ao leitor,
que durante sua leitura tenha em mente essa limitação do meio, e que a
compreensão do texto se torne mais fácil a partir do conhecimento dessa
limitação e do reconhecimento desses maneirismos, especialmente das
pausas na fala nas seções longas de orações subordinadas.
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O Conceito de Formação Políticaa

I. 2. 1963

“Isso, o que eu então gostaria, é, na verdade, algo muito modesto.


Gostaria de trazer principalmente, que os senhores percebam, que a vossa
educação política não tem permissão para se contentar com que os senhores
conheçam assim agora as regras de conduta ou o sistema político ou a
passagem da responsabilidade política ou qualquer fenômeno desse tipo e
são capazes, por exemplo, de declarar ao exame exatamente, o que é
urgente, para que uma proposta de lei se torne uma lei, e como o conselho
federal tem que se comportar assim e Deus saiba o que mais. Mas que, para
que o senhores realmente consigam um entendimento vivo da política, em
outras palavras, que a política para os senhores não seja um fenômeno de
fachada, que os senhores precisam pensar desse modo socialmente, que os
senhores precisam pensar sociologicamente, que os senhores precisam ter
consciência do jogo social real de força, que se encontra debaixo das
instituições oficiais

Eu gostaria de em seguida dizer algumas palavras sobre o fenômeno


da personalização, que para mim pode ser um exemplo de demonstração de
uma falsa consciência de si, daí se segue a condição que vem, da esfera
política enquanto isolada, e de alguém que determine a política unicamente
pela sua prática, e pelos homens decisivos da política. Que tem sua própria
base social. O quão frio o mundo se torna, o quão menos capazes todos nós
nos tornamos, a respeito de decidir na sociedade o nosso próprio destino, o
quão mais percebemos a partir dessa posição, de que tudo já está dado, e [je]
a Der Begriff der Politischen Bildung In: Nachgelassene Schriften, Abteilung V_
Vorträge und Gespräche, Band 1 Theodor W. Adorno - Vorträge_ 1949–1968 (2019,
Suhrkamp) p. 377.
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até [para] as relações entre os homens que são mediadas, e cada vez mais
estreitas e determinantes da base do Homem, que estão repousadas sobre as
leis do mercado, da troca, tem um momento no estranhamento, que para
cada um que no seu modo doloroso de garantir a sua sobrevivência nesse
mundo, pois sobreviver é preciso, cada vez mais esse processo, o qual na
tradição filosófica como na grande teoria social foi chamado de alienação
social, ou reificação (Vergegenständlichung), ou objetificação
(Verdinglichung), avança, e cada vez mais os homens tendem para uma
consciência falsa e cega, o mundo, nesse desenvolvimento, não teria outra
opção se não congelar até a morte. Para humanizar a consciência dos
homens, o próprio mundo desumano deverá ser posto, como se fosse
humano, um mundo no qual os homens dependem (abhängt) diretamente. E
então as figuras proeminentes se tornam necessariamente monstruosas,
como se disso chegasse-se, qual pessoa é esta nesse momento na política, e
qual papel cumpre. Isso se torna, se assim posso dizer, a política vista a
partir de uma mesma maneira como um modelo das revistas ilustradas, que
nós fazem acreditar, portanto, sobre como a Princesa Margharet encontrou
com uma criança e sobre como a ex-imperatriz Soraya casou novamente,
como se fossem fenômenos da maior importância para nós, durante essas
questões, a parte de duas ou três pessoas que se importam diretamente, essas
são questões de completa indiferença em relação a nós. Agora, não é de uma
indiferença similar o papel da pessoa na política. Os senhores conhecem
sobre isso, os exemplos relativos a observação do sistema eleitoral
americano, o quão completamente personalizado é, o quão claro é sobre os
Tickets, e como os programas dos partidos funcionam, dentro dos quais
estão grupos de poder bem definidos. Bastante objetivos, o quão o poder se
torna reificado, e tão mais daí os homens tendem, a si personalizarem. Isso
também se torna um conflito entre interesses, e move sobre os homens as
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constelações de poder. E desse ponto, advém soluções falsas para os


conflitos políticos presentes, como se, senhores, essas soluções pudessem
contemplar as nossas próprias vidas políticas, a respeito da forma como a
substituição de alguns políticos impopulares por outros, que talvez seu
carácter tendo disposto dos outros [fosse a solução], mas sim da sua função
objetiva e de seu efeito, a partir disso, para onde ele está posicionado e
apoiado, é a partir daí, o que ele afeta no jogo de forças político, em relação
ao seu antecessor possivelmente ele não apresenta nenhuma diferença
significativa.

Nós observamos com bastante frequência, que os alunosb , no sentido


de sua formação política existe a isolação da política do jogo de forças
sociais, então o seu julgamento político não é orientado para as forças reais,
mas sim a uma ideia e a uma norma moral, a qual os políticos devem acatar.
Também o é assim, em relação ao direito e aos processos, de qualquer
maneira, a consciência deduzida/abstraída (abgeleitete), o conceito, toma a
posição, da realidade política que está dada. É impressionante, em qualquer
grau, que os alunos sempre nos perguntam, quando somos perguntados
sobre coisas da política, que daí conversamos sobre ideias e conceitos
políticos, em quais grais esses, o poder e o conflito de poder, efetivamente
definem as nossas vidas, como as nossas percepções são vazias, como as
ignoramos. Então o que acontece é um tipo de idealização da política, que se
torna a partir da luta real uma luta de sombras, e isso efetivamente se torna
um mecanismo não reconhecido ou se torna meramente reduzido a um
conflito de indivíduos. A consequência que se segue imediatamente daí é
inofensiva. E ela é especificamente desse lugar, que é a esfera ideal, onde
em seu interior esse tipo politico ideológico se movimenta, também na luta,

b Schüler – Aluno da educação básica ou média.


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e na luta de sombras dos conceitos, que então também se move para uma
forma de idealização da política, pela tomada, que da política enquanto uma
coisa da ideia, uma coisa idealizada se torna, determinada por grupos
específicos, que a força de sua posição social em relação a essas ideias teria
uma proximidade e afinidade, e que então seriam qualificados nesse sentido
ideal para funcionar, mas na verdade este não é o caso.

Isso também é a transição, em outras palavras, da idealização da


política para a teoria das elites, aí sim, como os senhores sabem, o papel
decisivo que esse pensamento teve para o fascismo e para o nacional
socialismo, mas para a totalidade da consciência política, como nós no
Instituto de Pesquisa Social tivemos a oportunidade de estudar, na
consciência geral da população e também em nossa democracia esse
pensamento tem uma vida tenaz. Os senhores podem só, damas e
cavalheiros, e eu não posso ser insistente o suficiente em dizer, e por isso o
repito, a forma política, sob a qual vivemos, não se iguala a consciência
social real dos homens. Alguém pode viver em uma democracia e pode
ainda ter a sua consciência plena e ser cheia de conceitos e formas que a
operam, que junto da democracia, um pode até dedicar seu próprio ser a ela,
como muitos homens o fazem hoje, ainda assim são incompatíveis.

A teoria das elites tem então a tendência, de ser apolítica, como a de


se abster do jogo de forças reais a favor de uma ideia ou uma representação
ideal de um pequeno grupo inexistente que se torna em si uma questão
política, principalmente a vocação e preparo do controle social que é
concedido a essas elites, que não tem mais em si uma consciência de uma
responsabilidade, de uma maturidade a ser tida, no geral não há mais uma
possibilidade que é assegurada, a realidade em relação a nós de qualquer
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forma acaba se tornando extraordinariamente mais difícil, principalmente no


que diz respeito ao destino do nosso ser social enquanto livre e
independente para se auto determinar. O conceito de massa, e o conceito
oposto de elite, já tem hoje experienciado um destino estranho, peculiar.
Alexander Mitscherlich uma vez em um ensaio já havia dito a anedota do
demagogo: que em uma enorme multidão uma conclusão rugiu: 20.000
ouvintes estão lá, -:«E quem, caros compatriotas, é o culpado? O estereotipo
[Vermassung], é sempre o estereotipo!» E então seguiu-se 10 longos
minutos de aplausos dos 20.000 homens.1

Ao mesmo tempo essa técnica já foi desenvolvida – o nacional


socialismo – a teoria das raças foi particularmente engenhosa, então a teoria
das elites se torna, que na verdade uma maioridade, que todos fazem parte,
exceto os judeus, que então a maioridade esmagadora se tornou, si própria
uma elite, talvez os escolhidos, talvez os especiais tenham podido sentir.
Isso é algo confuso e um compromisso paradoxal, que entre as condições
reais as massas sociais e a ideologia elitista foram atingidas. Os senhores
sabem que essa é uma representação aproximada, que é do conjunto da
massa antagônica e da teoria das elites, que se originou a partir dos
desenvolvimentos do teórico fascista italiano Vilfredo Pareto. E agora, esse
potencial de um pensamento elitista, como nós o chamamos na sociologia,
se desenvolve com um grande papel como por um potencial antidemocrático
na análise da consciência política.

Sobre algumas poucas turmas, nessas a disciplina da sociologia,


categorias efetivamente sociológicas e questões problemas são
compreendidas, onde também se é compreendido sobre o verdadeiro jogo de

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forças da sociedade, em vez disso, meramente se chega somente até as


categorias formais do conhecimento procedural, nós sabemos o contraste
que se estabelece entre isso e a investigação científica, a partir daí eu já falei
com os senhores, e vocês agora se encontram nos últimos minutos para a
anotação, determinem, que a porção mais confidente dos democratas entre
os alunos é notavelmente maior, também o é o caso nas turmas, onde uma
tal única, acentuada e disciplina da sociologia está. Nós aqui praticamente
reconhecemos o aspecto «democrático» em equidade com a negação
determinada do conceito de elites em seu sentido, de que qualquer grupo
pode a si próprio explicar e estilizar como uma elite, isso pertence
principalmente a um conceito substancial de elite, daí –, e também a respeito
a negação da formação de estado autoritária. A efetividade de uma
orientação sociológica para uma disciplina de formação política sobre as
estruturas da consciência política, que a mostra a partir de dentro, que nessas
turmas, também as quais, em que se aprendeu sociologia, a tendência para
se afiliarem a uma reação autoritária, a disposição a preconceitos, sobre o
antisemitismo ou o racismo, é muito mais baixo nessas turmas, nelas um
aluno não se aprofunda somente agora na política formal ou na história
política, e nelas os tópicos sociológicos não aparecem.

Também é o caso [em tradução...]

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