Você está na página 1de 307

CHEGA DE R EGRAS

Larry Crabb
Traduzido por: Neyd Siqueira
Digitalização: FB

http://semeadoresdapalavra.topforum.net/portal.htm
Nossos e-books são disponibilizados
gratuitamente, com a única finalidade de
oferecer leitura edificante a todos aqueles que
não tem condições econômicas para comprar.
Se você é financeiramente privilegiado, então
utilize nosso acervo apenas para avaliação, e,
se gostar, abençoe autores, editoras e livrarias,
adquirindo os livros.
SEMEADORES DA PALAVRA e-books evangélicos

CHEGA DE REGRAS CATEGORIA: ESPIRITUALIDADE / VIDA CRISTÃ


Copyright © 2002 por Lawrence J. Crabb Jr.
Publicado originalmente por Water Brool Press, Colorado, LUA.
Título original: The pressure`s off
Revisão: Theófilo José Vieira,
Supervisão: Vicence Gesualdi
Central de Arte
Capa: Magno Paganelli

2
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Crabb, Larry
Chega de regras / Larry Crab; traduzido por
Neyd Siqueira. — São Paulo: Mundo Cristão,
2003.
Titulo original: The pressure's off. ISBN 85-
7325-325-8
1. Vida cristã 1. Título
02-6414 CDD248.4

Indice para catálogo sistemático:


1. Vida cristã: Cristianismo 248.4
Os textos das referências bíblicas foram extraídos da versão
Almeida Revista e Atualizada, 2a ed., salvo indicação
específica.

Publicado nu Brasil com a devida autorização e com todos os


direitos reservados pela:
Associação Religiosa Editora Mundo Cristão
Rua Antônio Carlos Tacconi, 79 — CEP 04810-020 — São
Paulo - SP - Brasil
Telefone: (11) 5668-1700 — Home page:
www.mundocristao.com.br
3
Editora associada a:
• Associação Brasileira de Editores Cristãos
• Câmara Brasileira do Livro
• Evangelical Christian Publishers Association

A 1a edição brasileira foi publicada em maio de 2003, com uma


tiragem de 4.000 exemplares.

Para meu pai


Larry Crabb Sr.
16 de agosto de 1912 A
vida começou, o fruto do
amor de Charles e Laura
pelo seu Senhor e um pelo
outro.

31 de agosto de 2001 A
vida verdadeira teve início,
o fruto do amor do Pai,
Filho e Espírito um pelo
outro e por meu pai.

4
S UMÁRIO

Uma Parábola: Pergunta noturna ........................................... 8


INTRODUÇÃO: Os dois caminhos ........................................ 18
Primeira parte: Um novo estilo de vida ................................ 21
Penso Que Nós o Estamos Perdendo .................................. 21

Regras pelas quais viver ....................................................... 21

Nossos padrões fixos ............................................................ 29

Três passagens contam a história ....................................... 38

Segunda Parte: A geração desanimada ............................... 51


O Novo Caminho: O Que Não é ............................................ 51

Um verme na maçã................................................................. 51

Que forças da escuridão? ..................................................... 65

O dragão abandonado ........................................................... 77

O que há de tão errado com o que queremos? ................... 93

Engano espetacular ............................................................. 108

Terceira parte: Você sente o vento? ............................... 122


O Novo Caminho: O Que é .................................................. 122

Por trás de uma porta marcada particular ......................... 122

Chegando sujo e dançando ................................................ 129

Colhendo o que semeamos................................................. 142

O plano emanuel .................................................................. 153

A porta do celeiro está aberta ............................................. 161

5
A História de Deus .......................................................... 171

Quarta parte: Deixe a revolução começar ...................... 186


O Novo Caminho: Como Viver Nele ................................. 186

Gozo EM DEUS .................................................................. 186

Cinco blocos de construção da vida do novo caminho


.......................................................................................... 202

Onde estou? Encontrando o sinal vermelho ................ 211

Sua escolha de ciclos ..................................................... 227

Foco nas primeiras coisas ............................................. 241

Deus está no controle - do quê?.................................... 253

A oração do novo caminho ............................................ 278

Epílogo: Com Deus no banheiro......................................... 292


Agradecimentos ................................................................... 299
Notas ..................................................................................... 302

6
Mais está à nossa disposição em Jesus Cristo do que ousamos
imaginar.
Em 1654, Blaise Pascal encontrou Jesus Cristo de um
modo diferente. Ele registrou o êxtase do momento numa
série de sentenças fragmentadas, inclusive estas:
"certeza, alegria sincera, paz"
"alegria, alegria, alegria, lágrimas de alegria"
"renúncia completa e doce"
"entrega total a Jesus Cristo, meu guia"
Amigo que busca, você ousaria imaginar o que por tanto
tempo temeu que poderia não estar disponível? Quer juntar-
se a mim, peregrino trêmulo, pondo de lado o cinismo que
evita habilmente o risco da esperança? Quer aceitar o seu
desejo por uma única coisa que daria a fim de ganhar tudo o
mais - um encontro real com Jesus Cristo, agora, antes do
céu?

• É possível que você, como eu, tenha se esforçado ao


máximo para entender a vida, a fim de que as coisas possam
ir bem. A Bíblia chama essa abordagem de antigo caminho
do código escrito. Por mais que esteja vestido de linguagem
cristã, o velho caminho não irá formá-lo espiritualmente. Ele
leva ao vazio interior, pressão violenta, insuportável. Isso
talvez esteja ficando claro para você, como acontece comigo.

7
• Existe outro estilo de vida. A Bíblia o chama de novo
caminho do Espírito. Os que tomam este rumo na vida se
descobrem flutuando na direção do Pai em ritmo com o Espírito
enquanto ele abre seus olhos para ver a beleza de Cristo. Este
novo caminho conduz nossa vida que não funciona muito bem
até uma certeza misteriosa que nos serve de âncora nas
tempestades da dúvida, em momentos de êxtase que mantêm
vivas grandes esperanças quando os sonhos bons morrem, na
experiência aterradora da morte que permite que nosso
verdadeiro "eu" saia da sepultura para a luz do dia.

• Você pode sentir o ritmo do Espírito convidando-o para a


dança sagrada? Ele talvez esteja libertando a sua imaginação
para voar, como a das crianças na véspera de Natal.

• Há um novo estilo de vida. É o estilo do Espírito. Ousemos


sonhar nosso maior sonho. Ele não vai despedaçar-se!

U MA P ARÁBOLA :

P ERGUNTA NOTURNA

— O que estou fazendo de errado? — A pergunta nunca


esteve muito distante da mente da mulher. Nesta noite ela

8
gritava de lugares profundos em seu íntimo, exigindo a
resposta que nunca veio.
— Veja minha vida. As coisas não estão saindo como eu
esperava. Por que não me sinto melhor a respeito de mim
mesma? Por que a vida é às vezes tão difícil? Devo estar
fazendo algo muito errado.
A mulher não acreditava que estava sendo castigada por
uma divindade vingativa por causa de erros cometidos,
embora esse pensamento fosse às vezes difícil de afastar.
Ela cria, porém, que havia um estilo certo de vida, o qual
facilitaria as coisas. É claro que havia. Mas, não conseguia
encontrar o caminho.
Aqui em casa, à noite, não conseguia fingir tão bem como
fazia nos dias ocupados, fazendo de conta que estava
satisfeita, que Deus a abençoara o suficiente para chamá-lo
de bom. Na solidão que sufocava sua alma, as lembranças
voltavam — tempos em que se sentira viva, feliz e boa, e das
ocasiões em que se sentira muito mal.
Essas lembranças voltavam com freqüência, especialmente
depois do cair da noite, e elas haviam moldado sua visão da
vida no que almejava de melhor, das bênçãos pelas quais
estava disposta a lutar e, portanto, esperava que recaíssem
sobre ela. A mulher ansiava por sentir novamente a alegria
que conhecera antes e também evitar o sofrimento do qual
não podia se esquecer. Sabia o que desejava... mas não
conseguia encontrar o caminho. Sua vida era disfuncional.
9
— Obrigada, Deus — a mulher se obrigou a orar enquanto
se enfiava nas cobertas. — Sei que vai me levar para o céu
quando esta vida terminar. Obrigada, pelo dom da vida eterna
que eu nunca poderia alcançar por mim mesma. Sei que tem
um plano para mim agora, antes que eu vá para casa. Vou
confiar na possibilidade de pô-lo em prática.
Antes de o sono chegar, ela acrescentou: — Qual o
obstáculo que estou criando: O que estou fazendo de errado?
Na escuridão silenciosa do quarto, a mulher esperou. Deus
certamente responderia à sua pergunta e lhe mostraria o que
fazer para receber as bênçãos de uma vida melhor agora, as
bênçãos que tinha certeza de que Deus pretendia que o seu
povo gozasse. — Eu faria tudo que fosse preciso... se apenas
soubesse o que é. — Esse foi o seu último pensamento antes
que o sono a resgatasse da pressão de imaginar o que seria.
Quanto tempo depois aconteceu, ela nunca soube. A mulher
sentou-se na cama, completamente acordada, mas de maneira
diferente quando o despertador tocou. Este despertar foi
novidade. Se tivesse olhado para o relógio ao lado do leito,
teria visto o mostrador brilhar com quatro zeros. Entrara num
mundo além do tempo.
A voz não a despertara, mas ouviu-a claramente: — Vim para
mostrar-lhe o novo caminho.
Quem estava ali? Quem falara? Não conseguia ver ninguém.
Se houvesse um corpo por trás da voz, ela não conseguiria vê-
lo. A escuridão era total.
10
— É um sonho — disse para si mesma. Deitaria de novo e
ele iria embora.
A voz falou outra vez no mesmo tom nítido. — É a sua
hora. Vim para mostrar-lhe o novo caminho. Está
suficientemente escuro agora para que possa ver.
Isto não é um sonho, pensou a mulher. — Estou contente
que veio — disse ela em voz alta. — Preciso
desesperadamente encontrar um novo caminho. Orei muito
para saber como melhorar a minha vida. Nada que tentei até
agora deu certo. Preciso descobrir o novo caminho de que
está falando.
— Você está procurando outra versão do antigo caminho.
Vim para mostrar-lhe o novo caminho.
A mulher ficou intrigada, mas não silenciou. — Concordo
que há muitos meios que não funcionam. Minha vida é uma
prova disso. Tentei tudo que podia para mudar o modo como
me sinto para melhorar minha vida. Por favor, se tem
qualquer misericórdia, mostre-me o que estou fazendo de
errado que me impede de ser o que tanto desejo. Estou
pronta a aprender um novo caminho. E para isso, serei uma
discípula obediente.
— Você procura um método para fazer a vida funcionar.
Esse é o velho caminho. — A voz mostrava paciência, como
a voz de um avô ensinando o neto enquanto caminham
juntos. — Qualquer método que escolher se torna o seu
senhor. Você serviu a muitos senhores em sua vida, mas o
11
seu alvo se manteve constante. Não quer nada além da vida
melhor que sua experiência mostrou ser desejável. Esse alvo é
o seu ídolo e, portanto, deve ser abandonado.
— Vejo o que está querendo dizer — replicou a mulher,
embora não visse nada. — Sim, acredito que esteja certo.
Muito certo, na verdade. Seu ponto é revolucionário. Preciso
encontrar um caminho espiritual. Meu alvo deve ser Deus e
meu método a obediência. E a oração. Sim, devo fazer o que é
certo e confiar a Deus os resultados. Está dizendo exatamente
o que acabei de ouvir de uma mulher sábia, mais idosa, em
minha igreja. Foi muito interessante.
— Ela disse a verdade, mas você não ouviu. Foi por isso que
vim.
— Bem, penso que ouvi o que ela tinha a dizer. — A mulher
estava mais indignada do que desanimada. — Agradeço por ter
vindo reforçar a mensagem dela. Vamos ver. Sim, me lembro.
Ela disse que eu estava me esforçando para compreender e
viver pelo princípio da seqüência. Sabe, a idéia de que B
segue-se a A, de modo que se eu quiser B, devo descobrir o A
que fará isso acontecer. Ela estava totalmente certa. Quero
saber o que deve ser feito para mudar minha vida para melhor
e me manter longe de problemas no futuro. Disse, também, que
em vez de me esforçar tanto devo aprender a orar. Tinha
novamente razão. É claro que continuo tendo de obedecer,
mas desde minha conversa com ela, estou orando muito mais.

12
— Por que você ora? — Um ar gelado varreu
repentinamente o quarto. A mulher procurou defender-se
dele.
— Por que oro? Que pergunta estranha. Estou certa de
que sabe os ensinamentos: peça e receberá; agarre-se a
Deus e não deixe que se vá até que o abençoe; importune,
se necessário, até obter uma resposta; não aceite menos do
que todas as bênçãos que ele reservou para você.
— Esse é o antigo caminho.
A mulher franziu a testa. A voz não conhecia os
ensinamentos do Livro Sagrado? Um pensamento
amedrontador cruzou então sua mente. A pessoa por trás da
voz talvez soubesse os Ensinamentos, mas não cresse
neles. Estaria conversando com um demônio? Um falso
profeta? Uma serpente estaria no quarto com ela?
— Como pode ser isso? — respondeu ainda mais
indignada. — Minha vida é difícil. É certo orar. Levo todos os
meus problemas a Deus. Está, por acaso, querendo dizer
que a oração é o antigo caminho?
— A oração não é o antigo caminho. A sua oração é que é.
A mulher começou a chorar. — Por que zomba de mim?
Estou desesperada. Pensei que me mostraria um novo estilo
de vida. O que fez até agora foi induzir-me a perder a pouca
esperança que me restava.
— Seus desejos ainda não estão amadurecidos. Os
pequenos afetos criam ídolos, deuses sem valor aos quais
13
sacrifica a sua vida. Suas orações destinam-se à adoração de
ídolos. Você foi aprisionada pelo seu desejo da vida melhor,
que define pelas suas experiências de prazer e dor. Vim para
mostrar-lhe o novo caminho que leva à melhor esperança.
As lágrimas da mulher se transformaram em soluços, e estes
em queixumes. — Só quero fazer o que é certo, para receber
as bênçãos de Deus. Há algum erro nisso? Por que não me diz
o que devo fazer?
— Se a voz viera de Deus, ela tinha certeza de que seus
lamentos o fariam apiedar-se e dizer-lhe o que fazer.
A voz disse: — Você quer saber o que é eficaz. Não pediu
para saber o que é santo.
O choro da mulher diminuiu. — São duas coisas diferentes?
— Sua busca por um caminho eficaz para a vida melhor a
levará a seguir os princípios básicos deste mundo e não os
caminhos da santidade. Seguir esses princípios pode às vezes
tornar sua vida mais agradável, mas jamais satisfará a sua
alma. Nunca a levará à melhor esperança.
— Além do mais, sua determinação de fazer o que é eficaz é
inútil, porque não tem soberania sobre nada. Não controla
nada. O princípio da seqüência não garante nada.
— Está dizendo que nada que eu faça afeta o que acontece
em minha vida? Que não tenho qualquer influência?
— A influência é real. Ela traz a alegria da responsabilidade e
impacto. Controle sobre o que mais importa é uma ilusão.
Agradeça por não ter nenhum.
14
A mulher começou a sentir-se diferente, como um neto que
acabou de compreender que seu avô era sábio. Até este
ponto seu diálogo com a voz tinha sido um debate. Agora
começou a ouvir para aprender.
A voz continuou. — A ilusão de controlar as coisas tem
suas exigências, as quais criam pressão que leva à
escravidão, e esta, por sua vez, ao fato de se tentar imaginar
o que é a vida para fazê-la funcionar. Os que se apegam à
ilusão do controle perdem o prazer da liberdade.
— Não sei se entendi bem. Os bons pais não criam filhos
bons? Os que ofertam fielmente não gozam da promessa da
segurança financeira? As orações dos filhos de Deus não são
sempre respondidas por seu Pai amoroso?
— Conforme a vontade do Senhor. Ele é soberano sobre
tudo. Tenha cuidado para nunca exigir promessas que ele
não fez. Os que cometem esse erro pensam que por agir
certo obrigam o Senhor a abençoá-los segundo a sua
compreensão da vida melhor.
A voz tornou-se então infinitamente amável. — Minha filha,
você se deixou escravizar pela lei da linearidade, o que a
mulher idosa e sábia chamou de princípio da seqüência. Ela
a obriga a fazer o que é certo para ganhar as bênçãos que
deseja. Essa lei não é mais a regra que guia os filhos de
Deus. Ela já serviu o seu propósito. A conclusão é clara. Ao
agir certo, ninguém pode ganhar a vida perfeita mais tarde ou
a vida melhor agora. Pela graça do Mestre, essa lei foi
15
substituída pela lei da liberdade. Sob a lei da liberdade, você
fica livre para viver no mistério da confiança.
— Você, porém, não aceitou a autoridade desta nova lei
porque exige que desista da ilusão do controle. Você reduziu
as exigências da santidade, supondo que possa fazer coisas
suficientes para produzir a vida melhor. Isso, às vezes, dá
certo, mas outras, não. Você vive, então, com incerteza e sob
pressão e exige conhecer o modo de vida que fará sua vida
funcionar como quer. Você manipula, mas não confia. Negocia
e não adora. Analisa e interpreta para obter controle sobre o
que acontece; mas não depende. Busca a vida melhor das
bênçãos de Deus acima da melhor esperança da presença
dele.
A mulher sentiu como se águas estivessem subindo acima da
sua cabeça. — Mas eu quero que minha vida funcione. Tenho
me sentido tão infeliz. Preciso saber o que estou fazendo de
errado! Por favor, quer dizer-me o que devo fazer?
— Procure apenas a bênção da sua presença e saberá o que
fazer. Isso encherá sua alma de alegria.
— Mas... só as bênçãos de Deus me trarão a verdadeira
alegria. Preciso saber como alcançá-las!
— Está errada. Você só precisa de Deus.
— Pensei que precisava de Deus porque só ele poderia
tornar minha vida melhor.
— Quando o Mestre caminhou nesta terra, ele se afastou das
pessoas que queriam usar seu poder para obter a vida melhor.
16
Ele não se utilizará dos fracos de espírito. Existe uma
esperança melhor do que acreditar que somente a vida seja
melhor. O novo caminho a levará até ela.
Essas foram as últimas palavras ditas pela voz. No
momento em que terminaram, a mulher perdeu a
consciência. Ela reentrou no tempo.
O mostrador digital do relógio marcava 6h30. A manhã
chegara. A mulher esfregou os olhos. A pergunta que fizera
ao adormecer continuava presente ao enfrentar o novo dia,
mas não parecia mais tão urgente. Ela continuava sem saber
o que tornaria sua vida melhor, mas não mais parecia ter
tamanha importância. Sentiu um desejo de algo que fosse
maior do que as bênçãos da vida melhor. Mas nada do que
eu fizer, disse a si mesma, fará com que ela aconteça.
Uma pressão que há longo tempo vinha pesando em sua
alma estava desaparecendo. Sentiu-se mais leve, mais
serena. Será isto o que procurei por tanto tempo?
Ela virou a cabeça para a janela para ver o sol da manhã.
Ouviu nesse momento uma voz familiar sussurrando: — Está
prestes a encontrar o novo caminho para viver. — Estranho,
pensou. Era a voz de uma mulher idosa e sábia.

17
INTRODUÇÃO:

O S DOIS CAMINHOS

Neste momento exato, você está andando por um dos dois


caminhos da vida.
Ou decidiu que aquilo que mais deseja na vida está ao seu
alcance e se empenha em fazer o que acredita ser necessário
para obtê-lo, ou compreendeu que aquilo que mais deseja está
além do seu alcance e vai confiar em Deus para a satisfação
que almeja. Você quer Deus. Nada menos, nem sequer a sua
bênção irá bastar.
Se estiver andando pelo primeiro caminho, sua vida está
cheia de pressão. No íntimo, onde ninguém vê, sua alma está
cansada. Não vê meios de sair da monotonia. Ou talvez a vida
esteja indo bem e você, satisfeito. Mas, sente que há algo
errado, falta alguma coisa. A pressão continua.
Se estiver andando pelo segundo caminho, tem esperança.
Sua alma pode estar cansada, seu mundo interior cheio de
conflitos que ninguém vê, mas tem esperança. Algumas vezes
descansa. Algo está vivo em você; o desejo de seu coração
não foi sufocado. Pode saborear a liberdade, e este sabor traz
alegria.
O primeiro caminho é o antigo caminho. Ele envolve um
arranjo confuso com Deus ou, se não com Deus, então com a
ordem do universo, com as regras que fazem a vida funcionar.
18
Se fizer o que deve, obtém o que deseja, seja de um Deus
moral que recompensa o bom comportamento ou de um
mundo ordeiro no qual vive eficientemente. Isso o deixa no
controle de como as coisas acontecem em sua vida. O antigo
caminho promete uma vida melhor cheia de coisas boas que
o fazem feliz.
Mas ele nunca cumpre com o que promete, embora pareça
fazer isso durante um bom tempo. O antigo caminho não
funciona por uma razão. Você nunca cumpre completamente
com o seu lado do acordo. Ninguém faz isso.
A segunda estrada é o novo caminho. Neste arranjo, Deus
primeiro planeja um desejo em seu coração, um anseio que
valoriza a presença dele mais do que as suas bênçãos; ele
então o convida para viver esse desejo, abandonar-se ao que
mais almeja. Isso faz com que perca o controle, mas o liberta.
O novo caminho promete uma esperança melhor do que as
boas coisas da vida. Ele promete proximidade de Deus e
cumpre com ela, embora não imediatamente, e no geral
mediante sofrimento.
A maioria das pessoas vive no antigo caminho a vida
inteira; a maioria dos freqüentadores da igreja vive uma
versão religiosa do antigo caminho, mais ou menos assim:
Se quiser bons filhos, deve educá-los de acordo com os
princípios cristãos.
Se quiser um bom casamento, procure conhecer o modelo
bíblico para o casamento e procure segui-lo ao máximo.
19
Se quiser que Deus abençoe o seu ministério, siga princípios
piedosos da liderança.
Se você quer ser emocionalmente saudável, pratique a dis-
ciplina espiritual e confie a Jesus suas necessidades.
Se quiser amigos íntimos, aprenda a aceitar a si mesmo
como um ser vulnerável, autêntico e perdoador.
As pessoas que vivem de acordo com o antigo caminho
crêem na lei da linearidade, uma lei que declara que existe um
A que leva ao B que você quer. Calcule A, faça o que manda, e
terá a vida que mais deseja. A pressão está ligada.
Os que vivem no novo caminho crêem na lei da liberdade.
Eles se aproximam como estão. Não se banham antes de se
achegar a Deus. Vão a Deus para se banhar dele. Não se
sentem pressionados para mudar apenas a vida interior ou a
exterior, mas desejam mudança em ambas as esferas. Estão
interessados em criar a oportunidade para a mudança, mesmo
que isso signifique mergulhar sete vezes num rio lamacento ou
marchar ao redor do muro de um inimigo durante sete dias e
soprar trombetas. Eles vivem para o desejo mais sincero de
seus corações: conhecer a Deus e satisfazer-se nele. Não
vivem para uma vida melhor neste mundo. Quando a vida aqui
é difícil, quando as coisas desmoronam, revelam mais
claramente quem são. São cidadãos de outro mundo, que
desejam mais o que está do outro lado que este mundo não
pode oferecer. Então, sabiamente, se entregam ao seu mais

20
profundo desejo e confiam em Deus para revelar-se a eles.
Essa é a lei da liberdade.
Quase todos estamos vivendo no antigo caminho. Alguns
sentem o vazio que ele nunca enche. Trabalhamos duro para
fazer a vida funcionar, a fim de nos sentirmos bem. A pressão
está ligada.
Há um novo estilo de vida que remove a pressão. Junte-se
a mim enquanto procuramos por ele.

P RIMEIRA PARTE :

U M NOVO ESTILO DE VIDA

Penso Que Nós o Estamos Perdendo

REGRAS PELAS QUAIS VIVER

Enquanto escrevo, um novo livro de auto-ajuda está fazendo


sucesso. O título é: The Rules for Marriage (As regras para o
casamento), e seus dois autores estão dando entrevistas em
vários programas de televisão.
Não li o livro. Só assisti a alguns minutos da última
entrevista dos autores. Uma regra, penso que a de número
doze, diz o seguinte: "Não compare o seu cônjuge com o de
outra pessoa".
Bom conselho. Experimente mencionar a seu marido, por
mais doce que seja a sua voz, que o marido de Sally faz o
21
jantar várias vezes por semana e certamente terá uma noite de
discussões com ele. É verdade. As coisas funcionam assim.
Mas, se disser a ele que aprecia seu esforço para sustentar a
família, mesmo que isso signifique o fato de ele chegar sempre
se arrastando de cansaço em casa, afunde no banco da
cozinha e engula em cinco minutos um jantar que você levou
três horas para fazer, haverá menos conflito. Você pode até
sentir-se bem consigo mesma por encorajar seu marido
cansado em vez de queixar-se, e — quem sabe - ele pode até
sorrir para você e ajudá-la a tirar a mesa. Pelo menos nessa
noite e talvez em outras. Se você seguir com perseverança as
regras para o casamento, irá provavelmente gozar de uma vida
melhor.
Mas, estará mais longe de Deus. Não por ter sido boa, mas
porque sua bondade foi dirigida para um alvo que valorizou
mais do que a intimidade com Deus. Você definiu erradamente
a vida.
Sua bondade era um jogo de poder. Você decidiu o que
queria e foi em busca disso. Você não dependeu dos recursos
que o Espírito fornece nem deu prioridade máxima à glória de
Deus. Ele não foi o centro de suas afeições, nem a fonte ou o
objetivo do seu movimento.

22
Ele quer algo mais

Alguns criticariam sua bondosa afirmação sobre seu marido


de modo diferente. O problema, diriam, é a covardia, a
fraqueza e a recusa temerosa de se arriscar em um conflito
em consideração a algo ainda melhor do que uma noite livre
de tensão. Segundo esse pensamento, uma regra melhor a
ser seguida poderia ser: "Exponha seus pensamentos
francamente, mas sem antagonismo. Faça isso para ajudar
seu marido a se tornar uma pessoa mais sensível".
Os que conhecem bem a Bíblia poderiam exigir apoio
divino para tal conselho: "Fale a verdade em amor", um autor
inspirado escreveu. Esta regra, caso seja adotada, tem a
possibilidade de gerar um relacionamento mais aproximado,
um verdadeiro encontro de almas. Note, porém, que a
fórmula permanece a mesma. Decida o que você quer,
depois calcule como obtê-lo.
No que concerne às Regras para o Casamento, não me
compete indicar se são boas ou más, se são eficazes para
produzir uma vida realmente melhor ou apenas para reduzir o
conflito, tampouco se elas são cristãs ou não-cristãs. Minha
intenção também não é sugerir um plano melhor para
conseguir uma vida melhor. Não tenho estratégias em mente
que dêem a você um casamento melhor, filhos obedientes,
terapia eficaz na recuperação de quem sofreu abuso sexual,

23
ou a cura mais rápida para os que se divorciaram. Nem Deus
tem, creio eu.
Quero todas essas coisas para você. Deus também quer.
Quero uma vida melhor para mim. Deus concorda. Mas ele
quer algo mais para nós dois. E só quando buscamos o mais é
que ele concede o menos. Ou, talvez, só nos conceda na
próxima vida.
Fico perturbado por ver como vivemos sem questionar nossa
determinação para fazer a vida dar certo. Todas as nossas
esperanças de felicidade estão envoltas nisso. É como se
acreditássemos que este é o único mundo em que planejamos
habitar.
Fico ainda mais perturbado pela suposição quase nunca
declarada e incompreendida que jaz debaixo da nossa decisão
de experimentar uma vida melhor. A suposição poderia ser
chamada de lei da linearidade. É mais ou menos assim:
Escolha o que você quer da vida, calcule o que tem de fazer
para obtê-lo, depois siga as regras. Escolha o B que deseja,
faça em seguida o A que leva a ele. Existe um A — uma
estratégia — que leva a cada B — o alvo.
Essa é a lei da linearidade. Vou oferecer alguns exemplos.

 Você quer ser espiritual? Pratique então disciplinas


espirituais, não para criar espaço para um Deus misericordioso
e soberano trabalhar nas profundezas de sua alma faminta e
humilde, mas para gerar o nível de espiritualidade que deseja.
24
Existe uma linha entre a prática de disciplinas espirituais e a
experiência da espiritualidade, uma flecha apontando da
prática (A) para a experiência (B). Você está no controle. B
segue-se a A.
 Você quer que a crise com sua filha seja bem
resolvida? Consulte um conselheiro experiente especializado
em adolescentes, não para discernir onde o Espírito está se
movendo em meio a esta provação em suas vidas, mas para
construir uma ponte entre você e sua filha para que vocês duas
possam se reencontrar num abraço caloroso e reconfortante.
Há um A que leva ao B que você deseja. Não se preocupe com
o fato de essa reconciliação com sua filha ter-se tornado uma
prioridade maior do que a aproximação de Deus. Vá em busca
da vida melhor que deseja.
 Você quer vencer seu vício sexual? Junte-se a um grupo
de homens que sejam sérios sobre a pureza moral, não para
deleitar-se na graça de Deus e descobrir como anseia
conhecê-lo, mas para encontrar a ajuda que precisa a fim de
manter-se afastado da pornografia. O ponto é firmar a sua vida,
e não fechar-se para Deus. Existe um meio de fazer isso. A lei
da linearidade declara. Seja prático. Calcule o que é necessário
para resolver o seu problema. Em termos gerais, todos
queremos que a nossa vida funcione bem, para tornar-nos
melhores do que eles ou permanecermos tão bons quanto eles.
Quando esse desejo se torna nosso alvo, o objetivo ao qual
damos mais valor, acreditamos que a lei da linearidade é
25
eficiente. Queremos crer que existe um A que podemos fazer
nos levar ao B que desejamos. Nossas vidas se tornam então
um esforço contínuo para descobrir e seguir os princípios que
irão prover uma vida que nos faça sentir bem.
Isso dá certo algumas vezes. Fique calmo em vez de gritar
quando sua filha adolescente lhe conta que está grávida, e
você poderá preservar um relacionamento bastante bom para
enfrentar a crise. Seja honesto com um grupo de homens sobre
seus problemas sexuais, e você poderá resistir melhor à
tentação. Passe tempo em oração contemplativa e lectio divina
(um modo especial de ouvir o Espírito enquanto lê a Bíblia), e
poderá sentir-se mais perto de Deus.
Mas, pode acabar mais distante de Deus se pensa que esses
princípios e métodos produzirão a vida melhor que deseja.

Não é assim que as coisas funcionam?

O livro As Regras para o Casamento é um novo best-seller. A


Bíblia, o maior best-seller de todos os tempos, é julgado por
muitos como aquele que oferece as verdadeiras regras para a
vida. Em nosso juízo, entretanto, acreditamos que o recente
sucesso editorial, As Regras..., nos ensina a depender da lei da
linearidade para obtermos a vida que desejamos. Ele oferece
princípios a serem seguidos para alcançarmos o que queremos
da vida. Essa é a nossa opinião. Não admira que seja tão

26
popular. E não admira que mude tão pouco as vidas de seus
leitores.
Quando vivemos para fazer a vida funcionar, quer sigamos
a sabedoria natural ou os princípios bíblicos, tornamo-nos
orgulhosos ou desanimados, presunçosos ou passamos a
odiar a nós mesmos.
Os cristãos não são exceção. Quando um pai cristão adota
com perseverança um método piedoso ao criar os filhos, a
fim de que venham a ser cidadãos respeitados, quando isso
funciona, esse pai se torna mais orgulhoso do que grato.
Mas, o orgulho é disfarçado.
— É verdade, meus filhos saíram melhor do que o
esperado. Mas, não me surpreendo. O tempo que passei
com eles foi proveitoso. Orei por cada um, pelo nome, todos
os dias. E Deus sempre responde às orações. Sei que
devemos fazer a nossa parte. Pela sua graça, penso que fiz a
minha, não perfeitamente é claro, mas com um bom
resultado. Mantive limites definidos. Envolvi-me e brinquei
com eles, mas eles sempre souberam de quem provinha a
autoridade. Era pai deles e não um amiguinho.
— As crianças querem isso. Elas se sentem mais seguras
quando brincam num quintal fechado. Deus é fiel. Ele é bom.
Eduquei meus filhos segundo a sabedoria divina, e Deus
providenciou que eles se tornassem jovens excelentes. É
assim que funciona.

27
O pior sermão que já ouvi foi feito por um homem de meia-
idade que me fez pensar num pavão empertigado quando
falou. Durante trinta e cinco minutos ele explicou como
removera a insensatez de seus filhos com uma vara de
correção e incutira sabedoria neles mediante devoções
regulares em família. A mensagem era clara: — Fiz o que me
competia fazer. Deus abençoou meus esforços. Folgo agora a
vida melhor de ter filhos piedosos.
Quando a lei funciona, tornamo-nos orgulhosos, embora
finjamos ser gratidão. E desanimamos profundamente os pais
que se esforçaram ao máximo para fazer a "coisa certa" e
agora sofrem por causa de um filho viciado em drogas e uma
filha rebelde, sexualmente ativa.
Quando a lei não funciona, supomos que simplesmente não a
seguimos como devíamos. Acreditamos que alguém falhou,
geralmente nós. Tornamo-nos mais derrotados do que
confiantes. Não nos ocorre que a lei pode não estar mais
vigorando.
O marido de Maria a abandonou há dez anos, depois de 22
anos de casamento. Ela ficou desnorteada. Nunca pensou que
isso pudesse acontecer. Depois de ouvir minha palestra sobre
a lei da linearidade, ela quis falar comigo. Eis o que disse:
— Nunca pensei nisso antes, mas os meus pensamentos
são governados por essa lei. Desde o divórcio, acordo de
manhã pensando no que fiz de errado que resultou em dormir
sozinha. Tenho me sentido tão confusa. Nunca consegui
28
acreditar que fosse uma esposa tão má assim. Não era. Na
verdade penso que fui uma excelente esposa. Muitas
mulheres que conheço não são nem a metade da esposa que
fui — e continuam casadas, algumas felizes. Não sei o que
pensar.
— Tento convencer-me de que a culpa cabe toda a ele.
Era realmente um crápula. Mas, vejo agora que se culpar a
ele ou a mim, estaria procurando uma explicação. E isso é
pensamento linear. Afinal, depois de um A o que se segue
não é um B? Essa pergunta cria muita pressão. Já errei uma
vez. Quero agora entender direito.
A seguir acrescentou: — Não é assim que as coisas
funcionam? Está dizendo que não existe linearidade, não
existe causa e efeito? Se a lei da linearidade não é a base da
nossa vida, o que é? Há outro modo de pensar?
Há. Como veremos, as regras da vida foram substituídas
pela oportunidade de viver.
A pressão acabou!

NOSSOS PADRÕES FIXOS

Enquanto escrevo este livro, estou me encaminhando para a


sexta década da minha vida. Meu cabelo ficou branco, duas
criancinhas me chamam de vovô, vinte e cinco minutos de
trabalho árduo me parecem equivaler a escalar o monte
29
Everest, mas posso fazer um retrospecto de quase meio século
de vida como cristão.
Decidi tornar-me seguidor de Jesus aos oito anos, quando
um monitor do acampamento deu instruções aos seus alunos
para olharem fixamente para a fogueira ao redor da qual nos
reuníramos. — Meninos — disse ele — , vocês têm uma
escolha a fazer. Confiar em Jesus como seu Salvador ou
queimar para sempre no fogo do inferno.
Dita dessa maneira, a escolha não parecia exigir muito de
nosso cérebro. Eu sabia o que fazer para fugir do inferno e ir
para o céu. E foi o que fiz. Eu queria. Eu sabia que ao A segue-
se o B, coloquei então o A no lugar.
O padrão foi fixado. O que mais que eu quisesse que Deus
providenciasse, supus que poderia obter fazendo a escolha
certa. Minha parte era calcular o A requerido e fazê-lo; a dele
era prover o B que eu desejava.
Entendi mal. Eu não fiz nada meritório para ganhar o céu.
Apresentei-me simplesmente a Deus. Aproximei-me como
estava. Não posso fazer nada de bom para organizar a vida
que desejo, certamente nada que a garanta.
Lembro-me da pressão que senti quando me tornei pai ainda
jovem. Para compreendê-los é preciso envolver-se
calorosamente com eles, despender tempo e ser firme em suas
colocações. Para formá-los bem, reitere com freqüência a
disciplina com amor santo e não ira descontrolada, e seus
filhos vão se tornar homens de caráter.
30
Durante muito tempo, embora não tivesse expressado isto
desta forma, considerava o cristianismo o melhor sistema
disponível para fazer a vida funcionar. Entramos na vida
cristã "sendo salvos", confiando em Jesus para pagar pelos
nossos pecados; vivemos como cristãos fazendo "o que é
certo" para que Deus "nos abençoe muito". Somos salvos
achegando-nos como estamos. Isto garante o céu mais
tarde. Vivemos fazendo o que é necessário. Isso garante
bênçãos agora. Era isso o que eu pensava.
Se fizermos as coisas certas, gozaremos de paz profunda.
Nossos filhos vão amar-nos, nossas almas serão revigoradas
e tranqüilizadas, nossos ministérios vão nos satisfazer de
modo que nos sintamos realmente bem com nós mesmos e
entusiasmados com a vida enquanto vivermos.
Levo uma vida linear e desejo que ela funcione. Por isso
estou disposto a fazer o que for necessário para que isso
aconteça. Pergunto-me agora por que sinto tanta pressão e
luto com tantas desilusões e dúvidas. Quando as coisas vão
bem, digo publicamente: — Louvado seja Deus —, e
sussurro em surdina: — É claro. Fiz o que me mandaram. Fiz
a coisa certa. — Quando as coisas não andam bem, declaro
publicamente: — Deus está trabalhando para o meu bem.
Confio nele —, e dizia com meus botões: — O que fiz de
errado?

31
Em todo lugar

Sem culpar ninguém, creio que absorvi a suposição da


linearidade da cultura cristã. Sou naturalmente atraído para a
linearidade porque ela me permite maior controle dos meus
atos. A idéia que tenho dela me foi comunicada de inúmeras
maneiras como a base apropriada da vida cristã. A maioria dos
sermões que ouvi, dos livros cristãos que li,
assim como quase todos os conselhos que recebi ensinavam a
linearidade de maneira explícita ou implicitamente, sendo esta
última mais contundente.
A idéia está em todo lugar. É o nosso modo de pensar. Ouço
apenas algumas sentenças de que me lembro que causaram
impacto. Tenho milhares dentre as quais escolher.
Tive ocasião de ouvir um conhecido líder cristão, um homem
que admiro e respeito, dizer certa vez a um grupo de outros
líderes:
— Devemos convencer o mundo de que o cristianismo é
verdadeiro e produz muitos frutos. A família é um meio
adequado. Precisamos de pais cristãos para demonstrar que
educar filhos segundo o plano de Deus produz o tipo de filhos
que todo pai deseja.
Outro homem, este um presbítero numa igreja que freqüentá-
vamos quando nossos filhos estavam na pré-escola, estava
contando sobre seu filho adulto. Com o rosto brilhando de
prazer, ele compartilhou:
32
— Ele acabou de receber uma ótima promoção no
trabalho. Seu salário quase dobrou. Deus é tão fiel. Lembro-
me de quando nosso filho entregou sua carreira a Deus.
Vejam o que está acontecendo agora!
Uma missionária não conseguiu conter as lágrimas quando
me contou que a filha estava grávida de um nativo num
povoado vizinho.
— Deveria ter passado mais tempo com ela. Estive tão
ocupada com meu trabalho de tradução para a missão que
pensei estar fazendo a coisa certa.
Um jovem solteiro meneou a cabeça, perplexo:
— Tudo que queria era uma família. Segui Deus toda a
minha vida. Minha oração mais constante era pedir uma
esposa e filhos. Não entendo.
Um empresário que enfrentava um processo judicial que
poderia arruiná-lo financeiramente declarou:
— Se houver qualquer tipo de justiça no mundo, vamos
ganhar este processo. Não fiz nada de errado. Entreguei
minha empresa a
Deus a partir do dia da sua inauguração e me conduzi com
integridade desde então.
Um profissional aposentado lamentou:
— Deus achou por bem fazer-me alvo de várias provações.
Permaneci fiel a ele em meio a todas elas. Por que, em
minha idade, sinto-me como um hipócrita? Por que continuo

33
perturbado e desanimado, cheio de dúvidas e odiando a mim
mesmo?
Vou propor um pensamento radical: Talvez tenhamos
entendido tudo errado! A vida cristã talvez não seja sobre
"fazer o que é certo" para "ser abençoado". A vida cristã talvez
não seja sobre as bênçãos que tanto desejamos nem sobre o
que buscamos tenazmente. Nossa obediência e fidelidade
talvez devam ser motivadas por uma razão muito diferente
daquela de receber as boas e legítimas bênçãos que
experimentamos nesta vida. Nossos pais talvez não devessem
ficar tão surpresos quando, depois de anos dedicados na
educação dos filhos, um deles resolve sair do armário para
anunciar seu estilo de vida homossexual.
Um marido amoroso, que falhou como todos os maridos fa-
lham, mas cumpriu com o seu compromisso de casamento e
honrou-o o melhor possível, não deveria ficar atônito ao
descobrir que sua mulher o deixou por outro homem.
A jornada espiritual não é sobre viver como devemos, para
que a vida funcione como desejamos. O caminho não é linear.
Não se trata de alcançar a maturidade de uma boa auto-
imagem e desenvolver a energia para fazer coisas boas; é
preciso descer até o quebrantamento do autodesespero e
aprofundar nosso discernimento de quão pobremente amamos
em comparação com os padrões trinitarianos. Não é necessário
esforçar-se muito para fazer o que é certo, a fim de nos
apresentarmos diante de Deus para receber as bênçãos que
34
desejamos; é saber chegar até ele como somos, honesta-
mente, sem pretensões, convencendo-nos cada vez mais de
que não podemos fazer as coisas certas por mais que
tentemos depois de ouvir o sussurrar do Espírito: — Bem-
vindo! Você está em casa. É amado. Terá poder para falar
com a sua própria voz e ouvir a voz de Deus que se derrama
sobre você como um canto cheio de amor.
A jornada secular arraiga-se na linearidade, a servidão do
controle: faça isto e aquilo acontece. É assim que as coisas
funcionam. Você terá a vida que deseja se viver bem e
sabiamente.
A jornada espiritual arraiga-se na liberdade da graça: venha
como está, mesmo temeroso, mas em paz. Depois viva a
vida de acordo com o que é certo porque tem esse privilégio
e deseja ser piedoso. As atitudes corretas são o único
caminho para uma vida prazerosa. A vida pode prover-nos de
ricas bênçãos. Ou talvez não. De qualquer modo você pode
conhecer a Deus.

Defeitos graves

Três passagens (que representam, segundo creio, toda a


mensagem da Escritura) me persuadiram de que uma
compreensão linear da vida cristã tem defeitos graves. Vou
listar cada uma com um breve comentário, antes de discutir o
seu significado no próximo capítulo.
35
A primeira passagem estabelece a lei da linearidade como a
base da vida melhor das bênçãos de Deus, enquanto resume
as condições de um arranjo que Deus efetuou com seus filhos
do Antigo Testamento:

"Guardai, pois, as palavras desta aliança e cumpri-as, para que


prospereis em tudo quanto fizerdes. " (Deuteronômio 29:9)

Na segunda passagem, o escritor nos diz que Deus anulou


essa lei da linearidade.

"Portanto, por um lado, se revoga a anterior ordenança, por


causa de sua fraqueza e inutilidade (pois a lei nunca
aperfeiçoou coisa alguma), e, por outro lado, se introduz
esperança superior, pela qual nos chegamos a Deus. "
(Hebreus 7:18, 19)
O primeiro acordo de fazer o bem para assegurar as bênçãos
de Deus foi substituído por outro. A lei da liberdade foi
estabelecida como o meio de alcançar uma esperança superior
em vez de uma vida melhor. Essa esperança superior é a
intimidade com Deus. Em qualquer circunstância ou condição,
podemos nos achegar a Deus e extrair dele a nossa
identidade, encontrar a força para perseverar e experimentar a
alegria da antecipação, com uma prelibação ocasional do que
está para vir.
Agora a terceira passagem:
36
Lembre-se das palavras de Paulo: "Mas agora, morrendo
para aquilo que antes nos prendia, fomos libertados da Lei,
para que sirvamos conforme o novo modo do Espírito, e não
segundo a velha forma da Lei escrita."1
A pressão acabou!
Vamos considerar agora um pouco mais essas três
passagens-chave.

"Estávamos servilmente sujeitos aos rudimentos do mundo...


mas agora que conheceis a Deus ou, antes, sendo conhecidos
por Deus, como estais voltando, outra vez, aos rudimentos
fracos e pobres, aos quais, de novo, quereis ainda escravizar-
vos?" (Gálatas 4:3,9)

O apóstolo Paulo mostra surpresa e confusão ao ver que o


povo que tinha a oportunidade de se aproximar de Deus
valorizava mais a vida melhor de bênçãos do que a
esperança superior de intimidade. Esse mesmo povo se
colocava novamente sob pressão de "entender o que é certo"
a fim de "fazer a vida funcionar".
Milhares de cristãos estão seguindo Jesus para obter uma
vida melhor de bênçãos agora. Pensamos que é nosso direito
de nascimento. Estamos fazendo isso de mil maneiras, cada
uma delas uma variação do antigo caminho do código escrito.
O Espírito está convidando cada um de nós para andar por
um caminho diferente e embarcar numa jornada radicalmente
37
diferente. Somos chamados para ir como estamos,
ousadamente, sem temor, embora nossas almas pareçam, às
vezes, uma fossa enlameada sem água corrente à vista.
Entregamo-nos a Deus para que ele decida revelar quão perto
já estamos dele em cada circunstância da vida e possa nos
atrair ainda mais. Esse é o novo caminho do Espírito.

TRÊS PASSAGENS CONTAM A HISTÓRIA

Pense em como você se sentiria se Deus aparecesse e lhe


dissesse: — Este é o trato. Você segue os meus princípios e
providenciarei para que a vida seja exatamente como você
quer.
Você poderia primeiro reagir com entusiasmo. — Diga-me
quais são as suas regras e vou segui-las.
Começaria então a trabalhar. Faria provavelmente o seu
melhor para comportar-se como foi instruído. Se as coisas
caminharem bem, ficaria inclinado a dar o crédito da sua boa
sorte ao fato de agir corretamente, à sua justiça. Se fossem
mal, poderia ficar ressentido ou desanimado: — O que mais ele
queria de mim? Fiz quase tudo que me mandou fazer! — Ou:
— Não consigo fazer a coisa certa. Devo ter feito algo muito
errado para a vida ficar deste jeito!

38
Não são boas notícias

Grande parte dos evangélicos rejeita os ensinamentos


geralmente conhecidos como o evangelho da prosperidade
ou o evangelho da saúde e da riqueza. Sabemos que esses
ensinos são errados. O sofrimento acontece
independentemente de as pessoas orarem ou não. Indivíduos
piedosos ficam velhos e fracos. Os servos fiéis de Cristo
falham no ministério. Alguns morrem jovens. Seguidores
sinceros de Jesus sentem-se deprimidos e desajustados,
odiando o orgulho, a sensualidade e a insegurança que
permanecem dentro deles depois de anos dedicados a viver
para Cristo da melhor maneira possível.
Deus não é uma máquina automática de vendas. Não
colocamos o troco certo e pegamos na bandeja a doce
bênção que desejamos. A vida não é assim. Sabemos disto.
Mas, algumas vezes introduzimos nossa própria versão
dessa idéia em nosso entendimento da vida cristã. Embora
deploremos a noção de que saúde e riqueza estejam
disponíveis quando exigidas, gostamos da idéia de que
bênçãos legítimas são dadas aos que satisfazem os
requisitos. A Bíblia diz isso, bem ali na primeira dessas três
passagens representativas:

"Guardai, pois, as palavras desta aliança e cumpri-as, para que


prospereis em tudo quanto fizerdes." (Deuteronômio 29:9)
39
Encontramos o mesmo pensamento em vários outros
lugares, tais como:
"Reconhece-o em todos os teus caminhos, e ele endireitará
as tuas veredas"2
"Ensina a criança no caminho em que deve andar, e, ainda
quando for velho, não se desviará dele."3
Queremos uma vida boa. Podemos defini-la mais
espiritualmente do que os pregadores do tipo diga - o - que -
quer - e - se - aproprie-da bênção. Podemos levar em
consideração o lamento do salmista de que as trevas eram seu
único amigo e sua preocupação de ter lavado as mãos
inutilmente. Mas, continuamos afirmando que a vida boa de
bênçãos legítimas é um objetivo valioso e pode ser alcançada
vivendo de maneira fiel e obediente aos princípios bíblicos.
Bons relacionamentos familiares e experiências comunitárias
aliados a um bom ministério que nos dê algum significado e
satisfação pessoal das boas experiências de Deus podem nos
trazer bênçãos. Tudo que temos a fazer é viver piedosamente,
orar muito e esperar grandes feitos do nosso grande Deus.
Note-se, porém, algo que é facilmente ignorado. Uma vez que
aceitemos este arranjo linear - A e depois B; você faz isto,
Deus fará
aquilo — não só a pressão se instala, mas o fracasso é
garantido. Descobrimo-nos no mesmo apuro que Israel. Não

40
podemos cumprir nossa parte do trato. Quando Deus instruiu
seu povo para "seguir
cuidadosamente os termos da aliança", ele não estava
estabelecendo um padrão razoavelmente alto. Não estava
preparado para conceder bênçãos a pessoas que seguissem
suas regras razoavelmente bem. O padrão era a perfeição -
perfeito para Deus e para outros a cada momento, em cada
intercâmbio.
Não puderam fazer o que era certo, tampouco nós.
Nos versículos que seguem de perto a nossa passagem,
Deus tornou terrivelmente claro o que aconteceria se o povo
escorregasse: "Porém, se o teu coração se desviar, e não
quiseres dar ouvidos... então, hoje, te declaro que,
certamente, perecerás".4
A lei da linearidade não constituiu então boas notícias —
"Mas, se me não ouvirdes e não cumprirdes todos estes
mandamentos; então... porei sobre vós terror, a tísica e a
febre ardente, que fazem desaparecer o lustre dos olhos e
definhar a vida... Porque enviarei para o meio de vós as feras
do campo, as quais vos desfilharão... eu lhes meterei no
coração tal ansiedade, nas terras dos seus inimigos, que o
ruído de uma folha movida os perseguirá; fugirão e cairão
sem ninguém os perseguir".5
E essas não são boas notícias hoje.

41
A razão para a vida reta mudou

Imagine viver sob um governante poderoso que poderia fazer


sua vida prosperar ou atirá-lo para longe. Suponha que ele
desse uma série de ordens que, se seguidas, seriam
recompensadas com magníficos presentes, mas se
desobedecidas no menor detalhe, resultariam em tortura
agonizante.
Imagine também que suas leis incluíssem exigências de
nunca se queixar, nunca se irritar com ninguém, reconhecer as
necessidades dos outros antes das suas. Obedeça
perfeitamente a lei e goze de bênçãos ilimitadas. Infrinja um
item, apenas um, e você passa o resto da vida na prateleira.
Tenha cuidado, seu governante tem olhos em toda a parte.
Nenhum erro passa despercebido.
Se você se subjugar aos padrões dele por algum tempo, não
poderia descansar nas bênçãos concedidas. Ficaria
preocupado demais com a idéia de cometer algum erro. E,
quando falhasse, iria provavelmente gritar: — Injustiça! —
enquanto era levado para a prisão. — Você sabia que eu jamais
poderia alcançar seus padrões. Não me deu uma chance.
A vida sob a dura lei da linearidade seria insuportável. Mas,
se alguém o livrasse desse arranjo (não porque a lei fosse
injusta, mas porque você não era suficientemente bom para
cumpri-la), se alguém descobrisse um meio de permitir que
vivesse como um filho ou filha amada do rei, com uma posição
42
real não estabelecida pelo desempenho, mas pelo
relacionamento, você ficaria profundamente grato. Seu único
pensamento seria conhecer essa pessoa e aproximar-se dela.
Essa história é verdadeira. Não se trata de um conto de
fadas. Aconteceu. O Salvador veio. E este é o resultado:

"Portanto, por um lado, se revoga a anterior ordenança, por


causa de sua fraqueza e inutilidade (pois a lei nunca
aperfeiçoou coisa alguma), e, por outro lado, se introduz
esperança superior, pela qual nos chegamos a Deus" (Hebreus
7:18, 19).

Fomos libertados do cativeiro para um sistema anterior


justo, mas impossível de ser cumprido. A regra anterior foi
posta de lado. Embora a ordem permaneça tanto na esfera
física quanto na moral, a lei moral da linearidade foi abolida
como base mediante a qual bênçãos e maldições são
distribuídas.
Considere agora o que isso significa. Nosso arranjo com
Deus mudou. A prosperidade e a provação não dependem
mais do nosso desempenho. Maus pais têm, às vezes, bons
filhos. Bons pais têm, às vezes, maus filhos ou filhos que
fazem coisas terríveis.
O princípio da influência naturalmente permanece. Cem
pais que amam a Deus e educam seus filhos irão criar um
número maior de filhos responsáveis do que cem pais
43
egoístas, que não se envolvem. É preciso senso prático para
viver sabiamente como pais, cônjuges, amigos e trabalhadores.
O Livro de Provérbios torna isso claro.
Mas, agora, sob o novo trato, a razão para viver retamente
mudou. Não dependemos mais de uma relação linear entre
performance e bênção para obter a vida que desejamos. Esse
arranjo foi misericordiosamente declarado obsoleto, tendo sido
substituído por algo novo e melhor.6
O trato sob o qual a vida melhor de bênçãos é prometida aos
que seguirem perfeitamente os princípios de Deus foi
substituído por outro novo. Está agora disponível a melhor
esperança de intimidade com um Deus que determina ou retém
soberanamente as bênçãos segundo um plano invisível. Ela
está disponível a qualquer momento e em qualquer
circunstância para aqueles que se aproximam de Deus
agarrados a Jesus.
Um bom amigo derramou recentemente seu coração numa
carta para mim:
"Sou tão absorvido em mim mesmo que isto me desgosta.
Luto para viver bem em meio às exigências esmagadoras sobre
a minha vida e o meu tempo. Algo parece estar falindo,
faltando, que não posso explicar ou descrever. Alguma coisa
em mim parece estar à deriva, solta — e isso me dá medo."
Meu amigo está falido, embora não completamente. Duvido
que qualquer um de nós se torne completamente arruinado a
ponto de não ver a piedade. Mas ele está significativamente
44
arruinado, mais pela sua desgraça do que pela sua
indigência. Ele se sente terrível. Deus parece ausente.
Quando as coisas vão mal, esse homem fica tentado a
culpar seu infortúnio pelo seu fracasso. — Se eu pudesse ser
mais bondoso, um pouco menos ocupado, meu casamento
seria melhor. Talvez Deus me abençoasse mais.
Esse é o modo de pensar do antigo caminho. O sangue de
Jesus abriu um novo e vivo caminho, uma direção diferente a
ser tomada, quer a vida esteja funcionando bem ou
desmoronando, quer estejamos mais conscientes de nossa
bondade ou nosso egocentrismo. No novo caminho, a
pressão foi removida. Viver melhor pode ou não melhorar as
circunstâncias da nossa vida. Mas agora o nosso apetite é
diferente. Queremos algo melhor do que a vida melhor de
bênçãos.
Se meu amigo pudesse ler nas profundezas de seu coração
(e, como eu, ele pode ocasionalmente), descobriria um desejo
de aproximar-se de Cristo que é na verdade mais forte do que
o seu desejo de tornar-se uma pessoa melhor ou gozar uma
vida melhor. Ele é convidado, da maneira como está, a
passar pela pesada porta que agora permanece aberta para a
presença literal de Deus.
Seu coração partido está agora livre para fazer o que mais
deseja; descansar ou relaxar diante da aceitação pela qual
nada fez por merecer ou suplicar por uma misericórdia que
lhe foi prometida e sofrer um colapso por causa de graça tão
45
abundante. Ao fazer isso, seu coração vibrará com o desejo de
agradar aquele que o tirou de sob a lei esmagadora da
linearidade. Estará agora livre para viver melhor e não para
fazer com que ela corra mais suavemente, não para arranjar
bênçãos adicionais, mas agradar essencialmente aquele que o
livrou da pressão.

Você deseja ser escravizado?

Este arranjo apresenta, porém, duas dificuldades.


Primeira, requer que entreguemos o controle do que acontece
em nossas vidas e confiar em Deus para fazer o que ele acha
melhor. Momentos tranqüilos e oração fervorosa não garantem
que o câncer não vai voltar; nem asseguram ampliação e maior
eficiência do ministério. Preferimos pedir que sejamos mais
influentes, caso não saibamos controlar as bênçãos que nos
forem dadas.
Segunda, é mais difícil desfrutar de Deus do que de suas
bênçãos. Ofereça a uma criança pequena a escolha de ter o
papai em casa na manhã de Natal sem presentes ou o papai
ausente e uma pilha de presentes debaixo da árvore. A criança
talvez escolhesse os presentes. Só os que alcançaram a
maturidade dão mais valor à bênção da presença do que à
bênção dos presentes.
Até que desenvolvamos preferência por Deus, preferimos
uma vida melhor de bênçãos de Deus a uma esperança melhor
46
de intimidade com ele. E por preferirmos o controle acima da
confiança, voltamos a uma espécie mais aceitável de
linearidade, uma versão pessoal — que podemos manipular
— para que a vida funcione como desejamos.
É a situação refletida na nossa terceira passagem
representativa:

"Estávamos servilmente sujeitos aos rudimentos do mundo...


Mas agora que conheceis a Deus ou, antes, sendo conhecidos
por Deus, como estais voltando, outra vez, aos rudimentos
fracos e pobres, aos quais, de novo, quereis ainda escravizar-
vos?" (Gálatas 4:3,9)

Nossa resposta: — Claro que sim!


A palavra traduzida "rudimentos" significa literalmente
"seqüência". É usada pelos gregos para referir-se a
elementos em seqüência como letras no alfabeto. A
seqüência básica que poderia ser observada ao analisar
como as coisas funcionam não era a seqüência rígida da
linearidade santa estabelecida por Deus. Por "rudimentos do
mundo" ou "princípios básicos do mundo" (NVI), Paulo queria
indicar a ordem natural pela qual a vida podia ser
administrada, princípios de vida eficaz comuns a todos os
sistemas religiosos e éticos. O objetivo deles era sempre o
mesmo - melhorar a vida.

47
Esforce-se muito e irá provavelmente ganhar dinheiro sufi-
ciente para gozar a vida.
Persevere, e o fracasso pode vir a transformar-se em sucesso.
Poupe para os dias chuvosos e você não vai se afogar quando
as tempestades vierem.
Seja um pai, não um amiguinho, para seus filhos, e eles se
sentirão provavelmente mais seguros.
Esses princípios expressivos apelam tanto para os cristãos
como para os não-cristãos. Um orador no dia da formatura diz
aos formandos que o trabalho árduo e a paciência produzem
dividendos. E isso é verdade. Nem sempre, mas com
freqüência.
Ouço Paulo observando os cristãos gálatas e imaginando: —
Como vocês podem viver para as bênçãos de Deus quando a
bênção suprema da sua presença está disponível? E como
podem menosprezar seus padrões santos, rebaixando-os a
princípios éticos gerais, que então seguem a fim de conseguir
as bênçãos que desejam?
— Quão insensatos podem ser? Por terem admitido os seus
fracassos e fraquezas e confiado em Cristo, Deus concedeu a
vocês a vida. Acham que vão agora viver essa vida fazendo um
número de coisas suficientemente certas para persuadir Deus a
dar-lhes o que querem? Foram salvos pela graça e crescerão
pela graça. A lei da linearidade terminou. Sejam gratos. Essa lei
impunha a pressão intolerável de viverem perfeitamente a fim

48
de viver bem. Vocês agora se encontram na lei da liberdade.
Fiquem firmes. Vivam como homens e mulheres livres.
Bastam alguns minutos de busca numa livraria cristã para
ver como preferimos a linearidade barata em vez da liberdade
pura. Rebaixamos a barra dos padrões não-rebaixáveis de
Deus a um nível que possamos alcançar com sucesso.
Seguimos então os princípios de Deus, nunca perfeitamente,
mas o mais de perto possível para poder esperar que as
bênçãos venham sobre nós. Quando isso acontece, ficamos
presunçosos. — É claro que ganho bem. Dei regularmente o
dízimo desde que recebi o meu primeiro ordenado.
Quando as bênçãos não chegam, ficamos confusos. — Eu
não era uma esposa tão má assim. Por que ele me deixou?
Essas são as nossas dificuldades com o novo caminho.
Insistimos em reter algum controle sobre os resultados de
nossos atos. Dizemos: — Confio no Senhor — quando na
verdade queremos dizer: — Confio nele para honrar meus
esforços de viver bem, concedendo-me as bênçãos que
desejo. — Ser agradável a Deus não é tão fácil assim.
Dizemos: — Amo o Senhor —, mas queremos realmente
dizer: — Gosto das bênçãos que ele me dá nesta vida agora.
Permitam que eu faça um esboço do que apresentei até este
ponto.
Como nunca antes, a igreja moderna está vivendo como se
não houvesse nada melhor à sua frente. E nós vivemos como

49
se não houvesse alegria maior agora do que experimentar as
bênçãos disponíveis nesta vida.

Dois Caminhos, Duas Escolhas, Dois Estilos de Vida


O velho caminho de Moisés O novo caminho de Cristo
Nossa busca: A vida melhor de Nossa busca: A esperança
bênçãos de Deus melhor de proximidade de
 Seguir princípios Deus
 Esperar bênçãos  Pedir misericórdia
 Perseverar  Descobrir a graça
 Experimentar descanso
A PRESSÃO ESTÁ LIGADA A PRESSÃO ESTÁ
DESLIGADA
Você está sob a lei da Você está sob a lei da
linearidade liberdade

Estamos vivendo o antigo caminho por intermédio de um


código corrompido e depreciado; reduzimos a lei santa de Deus
a princípios eficazes e pensamos que, ao segui-los
razoavelmente bem, a vida vai funcionar como queremos. A
seguir, ficamos orgulhosos quando acontece e derrotados
quando não acontece. De qualquer modo, a pressão está
ligada. Insistimos em bênçãos e aceitamos a responsabilidade
pelo seu desempenho a fim de obtê-las.
Há um novo modo de viver. A pressão do desempenho é
aliviada. E uma alegria maior do que uma "vida boa", como quer
50
que a definamos, se torna disponível. O novo caminho é um
arranjo melhor.
Para milhares de cristãos em todo o mundo, porém, ele não
tem atração. Vou dedicar o restante deste livro à
apresentação do novo caminho do Espírito de tal modo que,
quando eu orar, venha a despertar o apetite para a esperança
melhor de aproximar-se de Deus. No entanto, não tenho
poder para fazer com que isso aconteça. Espírito Santo,
revela aos nossos corações que, por causa de Cristo, a
pressão acabou, há um novo estilo de vida, e ele é melhor do
que o antigo.

S EGUNDA P ARTE :

A GERAÇÃO DESANIMADA

O Novo Caminho: O Que Não é

UM VERME NA MAÇÃ

Desde o Éden as pessoas tiveram a capacidade singular de


crer que estão indo para o norte quando seus pés as levam
para o sul. Nosso compasso moral, o sentido interno que
aprova ou reprova o que estamos fazendo e para onde estamos
indo, encontra-se gravemente fora dos eixos.

51
Ao observar a igreja e refletir sobre a minha própria
peregrinação de cinqüenta anos, fico imaginando: Será que
criamos uma versão religiosa do antigo caminho pela qual
viver? Os seguidores sinceros de Cristo têm estado viajando
pelo antigo caminho, pensando que estão andando pelo novo?

Por baixo da superfície

A direção espiritual é uma idéia que surgiu. Sua prática, é


claro, é tão antiga quanto o homem. Desde que nosso Senhor
visitou a terra e voltou depois para casa, a presença do seu
Espírito na vida de cada cristão apenas aumentou a
oportunidade e a importância da direção espiritual. Durante dois
mil anos, seguir de perto em resposta à iniciativa de Deus na
vida das pessoas - discernir o movimento contínuo do Espírito
Santo nas profundezas da alma e abrir caminho para o mundo
interior onde o Espírito fala mais claramente - tem sido o
trabalho valioso de um diretor espiritual, visto como essencial
entre os cristãos sinceros.
Somente agora, entretanto, a igreja evangélica está
começando a compreender que sem direção espiritual, sem
conversar com cada integrante de grupos pequenos em que
nossas vidas são expostas na presença de uma pessoa
habilitada a discernir as operações de nossa vida íntima, a
moléstia do engano não será curada. Sem direção espiritual,

52
milhares de cristãos continuarão a andar pelo antigo caminho,
pensando que estão na estrada do conhecimento de Deus.
James Houston comentou em algum lugar que um amigo
espiritual é necessário em nossa viagem, por causa da nossa
tendência para a autodecepção. Algumas vezes só outra
pessoa pode ver que estamos indo para o sul quando
acreditamos sinceramente que a estrada se dirige para o
norte.
Ouça Thomas Merton avaliar a importância da direção
espiritual: Todo o propósito da direção espiritual é penetrar
abaixo da superfície da vida humana, a fim de observar por trás
dos gestos e atitudes convencionais apresentados ao mundo, e
fazer aflorar sua liberdade espiritual interior, sua verdade mais
secreta, que chamamos de semelhança de Cristo em sua
alma.7 A grande tragédia no cristianismo moderno é que poças
de água viva estão borbulhando na areia ardente de nossas
almas e não sabemos disso. Não cavamos o suficiente em meio
às ruínas de nosso auto-engano, embora sigamos as
estratégias cuidadosamente para fazer a vida funcionar e poder
beber da corrente divina interior. Estamos bebendo água
poluída, pensando ser pura, ou pior, estamos nos sentindo
refrescados.
Mas, é um falso alívio. É tanto inventado como falso. Não
tem poder para nos transformar em pessoas que perseveram
e atravessam sonhos desfeitos para agradar a Deus e por
causa da fé possuída por outros. O antigo caminho gera
53
refrigério sentimental, do tipo de sentimentos bons, temporários
e superficiais, que não evitam o nosso narcisismo natural.
Nesta parte do livro, quero oferecer toda direção espiritual
possível mediante a página escrita, a fim de ajudar-nos a entrar
em nossos mundos interiores e ver qual a estrada que estamos
palmilhando.
Lembre-se da parábola dos dois construtores contada pelo
Senhor. Um construiu na areia e o outro na rocha. Até que
viessem as tormentas, as duas casas podiam ser aproveitadas.
Até que os sonhos se despedaçassem, até que a vida se
tornasse difícil (como acontece com todos nós), os dois homens
estavam satisfeitos e gozando de suas bênçãos.
Suponho que se tivéssemos conversado com cada um, se os
conhecêssemos como membros da nossa igreja, talvez como
amigos íntimos que se conhecem há anos em seus pequenos
grupos, poderíamos ter considerado ambos homens piedosos,
que amavam o Senhor e o estavam seguindo. Mas, um vivia no
antigo caminho; não estava construindo a sua vida sobre a
verdade de Jesus. Ele queria algo mais do que achegar-se a
Deus.
Isto não ficou visível por longo tempo, não até a chegada da
estação de furacões. Quando as coisa aconteceram e sua
abordagem da vida não pôde sobreviver, sua vida desmoronou.
Com nossa capacidade quase ilimitada de enganar a nós
mesmos, é possível (e a possibilidade tem alcançado
proporções epidêmicas) que as pessoas venham a crer
54
sinceramente que estão vivendo como cristãos quando, de
fato, estão seguindo uma versão altamente cristianizada do
antigo caminho. Por esta razão vários capítulos a seguir
discutirão o que o novo caminho não é.

Aproxime-se um pouco mais

Não é possível expor imitações do novo caminho sem que


isso se torne tanto profundo quanto pessoal. Durante anos
guardei uma imagem de mim mesmo que me fazia querer
aprofundar-me, mas não demais, e me manter pessoalmente
vulnerável, até certo ponto. Vou contar-lhe qual a imagem.
Desde a escola secundária, e talvez antes, eu me via como
uma maçã vermelha brilhante em uma fruteira colocada no
centro de uma mesa na sala de jantar. Olhe para mim de uma
certa distância e vai sentir-se atraído. A maçã é grande, não
há machucados visíveis, e ela é bem formada.
Aproxime-se um pouco mais — leia um livro que escrevi, vá
a um seminário que estou dando, ouça-me ensinar a Bíblia —
e sua impressão de que a maçã é uma boa fruta talvez se
fortaleça. Quem sabe queira pegá-la e mordê-la.
Se fizer isso, com certeza vai gostar do sabor. Converse
comigo, procure-me para dar-lhe direção espiritual, junte-se a
um grupo pequeno em minha companhia, combine os seus
dons com os meus para formar um ministério — e pode

55
concluir que de fato sou a maçã suculenta, substancial e doce
que aparento ser.
Eu, porém, sei. Sei o que você não sabe e que estou
determinado a que nunca descubra. Há um verme no centro.
Algumas mordidas a mais e você vai cuspir-me. Tenho de
impedir que se aproxime demais. Conhecer-me bem é gostar
de mim. Conhecer-me completamente vai revelar como sou
realmente desagradável.
Tenho falado em público há trinta anos. Sou um bom orador.
Deus me deu talentos e me abençoou por trás de um púlpito ou
pódio. Depois de ter falado, ouço com freqüência: — Você é tão
vulnerável, tão honesto. Deixou que eu visse que também se
esforça, que também não consegue tudo que quer.
Essas palavras são ditas com admiração. Eu sorrio com um
sorriso forçado por dentro. Quando permito que veja um pedaço
do verme, fica ainda mais atraído por mim. Mas, se deixar que o
veja inteiro, nunca mais me ouvirá. Escolho meu nível de
vulnerabilidade. Sei o que estou fazendo. Não sou tolo. Sei
como sobreviver no mundo cristão.
Alguns que lêem esta descrição suporiam que sofro de um
distúrbio psicológico. Estou certo de que há vários rótulos que
poderiam ser pregados em mim. Outros pensariam mais
simplesmente: — Esse sujeito tem com certeza um problema
de baixa auto-estima. Parece que se odeia.
O aconselhamento, mesmo o aconselhamento cristão, no
geral tenta remover o ódio que o indivíduo tem por si mesmo e
56
promover o amor em seu lugar. Fazer isso é esforçar-se para
tornar o antigo caminho mais confortável. Não envolve
quebrantamento, a compreensão de que meu ódio por mim
mesmo é fraco demais, nem arrependimento, uma mudança
em meu modo de pensar que muda o foco de como me sinto
a respeito de mim mesmo para como me sinto sobre Cristo —
ou, mais ao ponto, como ele se sente sobre mim.
Veja bem, há realmente um verme na maçã. Não adianta
tentar convencer-me de que é um verme simpático. Isso não
existe. Deus o vê e o odeia. Devo também odiá-lo. Conheço-
me muito bem para saber que sou com freqüência muito
introspectivo. Tenho ressentimentos contra pessoas que me
prejudicam. Sou capaz de odiar outros. Minhas inseguranças
têm menos que ver com uma falta de afirmação necessária,
quer durante a infância ou agora, e mais com a exigência de
ser honrado acima de outros.
É claro que tenho valor intrínseco como portador da
imagem de Deus. É claro que posso deleitar-me na maravilha
e plenitude do amor de Deus por mim. Sou naturalmente
privilegiado como alguém único, como uma obra-prima sendo
preparada pelo gênio criativo de Deus que tem algo de
significado eterno para dar a este mundo.
Meu ódio pessoal não tem origem na falta de apreciação
dessas verdades. Ele vem de uma exigência de que eu seja
mais especial do que você, de que meus esforços sejam
reconhecidos e efetivos, que eu nunca seja ofendido ou
57
depreciado, de que tenha os recursos para obter o que desejo
na vida.
Meu ódio pessoal está arraigado no orgulho. Insisto que
alguém veja valor em mim, que eu veja valor em mim. Quando
uma dessas coisas não acontece, atiro-me no abismo de
lamentar sobre a vida e odiar tudo nela, inclusive a mim
mesmo.
Quando estou ali, afundando-me na lama do desespero,
afirmação alguma pode tirar-me desse poço. Até que
compreendo que pertenço a ele, até que veja que não há um
grama de amor por ninguém em mim (pelo menos nenhum que
esteja sendo expresso), até que sou quebrantado pela minha
falta de mérito, que me impede de juntar-me a uma comunidade
de perfeito amor, vou pensar que alguém deve resgatar-me. Se
alguém tentar, não serei grato. Vou imaginar por que levou
tanto tempo para chegar.
Como você, sou capaz de sair de um cinema quando a razão
para ter sido classificado como de má qualidade se torna
aparente, ou de estender bondade, inclusive dinheiro, a amigos
em dificuldades, ou pregar um sermão sobre santidade - e
fazendo tudo isso com um poço de orgulho e auto-absorção
produzindo a energia. Posso construir uma casa atraente na
areia. Posso polir a maçã até que brilhe e o convença de que
nenhum verme poderia viver nessa fruta tão bela.

58
Mas, algumas vezes, como você, fico em pé na rocha. A
bondade flui realmente de mim. Dou pelas razões certas.
Amo outrem sem me preocupar comigo mesmo.
Quem sou eu? Sou o covarde moral que com freqüência sei
que sou, cheio de orgulho e medo? Ou sou o homem de Deus
que almejo ser, centrado na pessoa de Cristo e capacitado
pelo Espírito para revelar a sua glória por meio da minha
vida?
Sou um mistério para mim mesmo. Algumas vezes o
Espírito flui livremente em meu interior e fico cheio de alegria
e poder espiritual. Outras vezes, outra fonte de energia se
apossa de mim, e sinto-me mal, a ponto de ficar
ocasionalmente amuado e mostrar falta de fé em meu
desespero. É então que me sinto mais facilmente tentado a
procurar prazer onde quer que possa.
Vou dar um exemplo.

Fora de controle

Voltei para casa há alguns dias depois de um dia cheio e


difícil. Beijei casualmente minha mulher e agarrei o último
exemplar da revista Christianity Today, esticando-me então
no sofá e esperando encontrar alguns minutos de alimento
espiritual. Fiz o que sempre faço ao abrir um número dessa
excelente revista, fui até a penúltima capa para ler um breve
artigo de Chuck Colson ou Philip Yancey. Era a vez de Philip.
59
Philip Yancey é um amigo pessoal. Eu o conheço não só
como um dos escritores mais bem dotados de nossa época,
como também um amigo bondoso, humilde e genuinamente
terno. Olhei para a sua foto no canto à esquerda da página,
reconheci o sorriso pensativo e o cabelo inconfundível e
comecei a ler.
No espaço de duas curtas colunas, ele citou Henry David
Thoreau, um filósofo de quem já ouvira falar mas nunca lera;
Walter Wink, um teólogo de quem nunca ouvira falar; e um
romancista holandês com um nome que nunca ouvira e que não
tenho idéia de como se pronuncia.
Ao terminar o artigo, pude sentir o verme rastejando em meu
coração. Se você tivesse escutado minha conversa comigo
mesmo, teria ouvido mais ou menos isto:
— Nunca leio os livros certos. Leio fragmentos de muitas pes-
soas, mas não conheço muito bem qualquer delas. A maioria
nunca li. Se tivesse lido Thoreau e outros filósofos, pensaria
com muito mais clareza. Mas, não tenho tempo. Philip é um
escritor que lê muito, portanto, consegue escrever bem. Seu
trabalho lhe fornece o tempo necessário para ler todos esses
livros.
— Minha vida está tão fora de controle. Nunca faço o que
quero. São tantos os que querem que me una ao seu ministério,
que me encontro com eles para um café para conversar sobre
direção espiritual; quando terei tempo para seguir o chamado
de Deus em minha vida? Quando terei oportunidade para
60
desenvolver a escola que desejo começar para direção
espiritual? E quando terei oportunidade de apenas divertir-
me?
— Já li Irvin Yalom; terei de perguntar a Philip se ele sabe
quem ele é. Alguém - quem foi mesmo? - disse-me na
semana passada que gostava mais dos meus livros do que
dos de Philip. Será que sou mesmo assim mesquinho? Esse
comentário me fez bem. Isto não está me levando a nada.
Cansei-me de pensar. Não consigo descobrir de qualquer
maneira. Tenho pensado assim há trinta anos. E continuo
empacado. Que desperdício! Estou cansado de tudo. Ótimo.
São 6h30. A Roda da Fortuna começou.
Está vendo? Você mordeu agora o verme. Tem esperança
para mim? Pode ver o Espírito trabalhando em mim? Acredita
que minha identidade essencial é santa e não pecadora?
Consegue imaginar em quem eu me poderia tornar, em quem
já sou por causa de Cristo, embora isso permaneça oculto?
Sabe como empurrar-me para a maturidade que anseio
experimentar? Você está sofrendo por mim, amando-me,
apesar de ver o verme, sabendo que Cristo está em mim e
querendo vê-lo formado mais visivelmente em minha vida?
Qual o meu problema? Sou apenas um pecador invejoso
que necessita de repreensão? Sou um neurótico inseguro que
precisa ainda crer em si mesmo o suficiente para dizer não
aos outros que queiram usar-me, um homem perturbado,

61
inseguro, que precisa aceitar quem é e viver o seu chamado,
um candidato para um bom aconselhamento?
Ou sou um cristão vivendo no antigo caminho, não sonhando
mais alto do que ver a minha vida acertada e me esforçando
para que isso aconteça, depois frustrado e irado quando não
acontece? É isso que sou. Ou pareço ser. Algumas vezes.
Os recursos para viver segundo o novo caminho estão,
porém, em mim. Agüente agora outra história, bem melhor.

O verme fora de vista

Minha mulher e eu fomos para as montanhas em dois carros


numa tarde de sexta-feira para dois centros de retiro, cerca de
80km de distância um do outro. Ela dirigiu um fim de semana
com oitenta mulheres de uma igreja de Denver. Eu falei a
duzentos estudantes de uma Universidade Cristã do Colorado,
onde trabalho.
Combinamos nos encontrar em Denver para almoçar num
restaurante de salada e sopa no domingo, pouco depois do
meio-dia. No momento em que vi minha esposa, soube que seu
fim de semana fora bom. Ela estava radiante. Eu disse algo
como: — Você parece entusiasmada. Como foi o retiro?
Por mais de uma hora, ela repetiu todas as histórias do que o
Espírito fizera. Muitas delas eram realmente maravilhosas, uma
clara evidência da presença do Espírito e de seu poder atuante.
Ele estava aparentemente ocupado demais abençoando o retiro
62
dela para aparecer no meu. Os estudantes foram ótimos.
Ouvi mais tarde alguns relatórios esparsos de que vários se
sentiram desafiados pelo que eu dissera.
Eu, porém, me sentia vazio. Algo em mim não se
encaixava. Tinha sido um fim de semana comum para mim,
nada notavelmente sobrenatural.
Todavia, embora sentindo que o Espírito havia ungido o
retiro de minha esposa de certo modo que não abençoara o
meu, escutei-a com alegria. Não só fiquei entusiasmado com
o que acontecera mediante os ensinamentos de Rachel,
como também senti-me atraído pela parte mais profunda de
minha mulher.
Fiquei embevecido ao ouvi-la, ao vê-la tão disponível para o
Espírito, glorificando a Cristo. Mais tarde, naquela mesma
noite, com toda sinceridade eu lhe disse: — Você sabe, o
Espírito usa você em minha vida como não usa qualquer
outra pessoa. Quero aprender de você tudo que puder sobre
Deus. Quer descrever o que significa para você ouvir o
Espírito?
Ela respondeu: — Verdade? — Eu disse: — Sim! — E ela:
— Isso é realmente bom. — Foi um momento agradável. O
verme não estava à vista. Eu estava vivendo no novo
caminho.
Algumas vezes a estrada que estamos tomando é óbvia.
Algumas vezes posso sentir a rocha debaixo dos meus pés e
enfrento a tormenta com firmeza. Outras vezes sei que estou
63
perdendo o equilíbrio quando a areia debaixo de mim se
movimenta.
Quase nunca penso a respeito. Estou demasiado ocupado
preparando-me para a próxima viagem, brincando com meus
netos, perguntando por que meu taco de titânio bate na bola de
golfe tão longe da parte lisa do campo, preocupado com meus
pais idosos e querendo tanto melhorar a qualidade de vida
deles, respondendo pilhas de correspondência, chamando o
encanador para substituir a tampa da nossa banheira que deixa
escapar vagarosamente a água. Algumas vezes estou cansado
demais para me preocupar com o caminho que estou tomando.
Mas, sinto então a pressão. Compreendo que Deus se tornou
um parente distante e estou lidando com a vida por conta
própria. Cristo é o meu bilhete para o céu, mas não o meu
melhor amigo. O que penso que representa os empurrões do
Espírito só faz aumentar a pressão. — Por que não está lendo
mais a Bíblia? — Por que se recusou a encontrar seu amigo
para o café? — Acha que é importante demais para ele?
Depois quero viver no novo caminho. Quero saber que a
pressão acabou. Mas, não tenho certeza de qual é o caminho
antigo e qual o novo. Preciso aprofundar-me mais em minha
alma.

64
QUE FORÇAS DA ESCURIDÃO?

O reavivamento na igreja precisa começar com uma revolução


da alma. Não adianta, e na verdade até prejudica, preocupar-se
demais com a igreja até que tenhamos nos preocupado com
nós mesmos. Não alcançaremos poder para ajudar a libertar a
igreja, a fim de que se torne uma comunidade, enquanto não
tivermos nos esforçado bastante até descobrir o que significa
pessoalmente para nós viver o novo caminho.
A mudança significativa em nossa cultura baseia-se no
aperfeiçoamento do caráter e só pode ocorrer depois que o
reavivamento toma conta da igreja. Bancamos os
reformadores quixotescos quando atiramos nossas espadas
contra a pornografia, o aborto, a ausência de pais e a
violência de adolescentes sem primeiro chorar sobre a
comunidade superficial em nossas igrejas. Quando o Espírito
Santo se move, ele nos une antes de nos enviar para a
batalha.
A ordem é importante:
primeiro, revolução espiritual em nosso mundo interior, mu-
dança do antigo para o novo caminho;
segundo, verdadeiro reavivamento no mundo da igreja, onde o
Espírito opera mediante liderança em segundo plano, a fim de
liberar as congregações para se tornarem comunidades se-
guras, que exaltam o Pai mais que o pastor; que têm seu centro

65
em Cristo e não no sucesso visível; que ouvem o Espíritoe não
as expectativas das pessoas;
terceiro, reforma cultural em nosso mundo diário que exalta a
satisfação da virtude e da humildade acima do entusiasmo das
realizações e do poder, valorizando a relação reta com Deus
acima do progresso da auto-estima. Vamos ser claros: Nossa
maior necessidade não é de maior comunhão em nossos
pequenos grupos ou de melhor pregação do púlpito. Nosso
maior desafio não é cristianizar a cultura secular com a
finalidade de aceitar os valores familiares e a moral bíblica.
Nossa maior necessidade é um novo encontro com Deus que
exponha o pecado como repulsivo de modo que nossa
determinação em fazer esta vida funcionar leve em conta a sua
espiritualidade, em particular.
Nosso maior desafio é reconhecer o antigo caminho do
código escrito, a fim de compreendermos com que freqüência o
vivemos, para vermos o novo caminho do Espírito abrir-se
diante de nós, e descobrirmos nosso desejo ardente de seguir
esse caminho até a presença de Deus.
Quando oramos de joelhos: "Venha o teu reino, seja feita a
tua vontade, assim na terra como no céu", não devemos
levantar-nos depressa demais para ocupar-nos com a obra do
reino. Devemos permanecer por algum tempo nessa posição,
humilhados e dependentes, suplicando a ajuda do Espírito para
vermos qual o caminho que estamos tomando.

66
Estamos determinados, de acordo com a nossa vida moral,
a contribuir de maneira generosa e fiel, a alcançar a vida me-
lhor das bênçãos de Deus? Planejamos estratégias sobre
como obtê-la, dependendo da lei da linearidade para produzir
os resultados que queremos?
Ou estamos almejando com paixão inflexível achegar-nos a
Deus, desesperadamente ansiosos para conhecer Cristo, ten-
tando ouvir atentos a voz do Espírito em nossas vidas
repletas de ruídos de todo tipo? Abraçamos a lei da liberdade,
aproxi-mando-nos ousadamente, exatamente como estamos,
da comunidade divina?
Primeiro, revolução espiritual que nos leva da vida do antigo
para o novo caminho; a seguir, reavivamento verdadeiro da
comunidade
segura em nossas igrejas; e, finalmente, uma reforma cultural,
objeto de muita oração, em que os cristãos possam tornar os
incrédulos
sedentos de Cristo. Essa é a ordem.

Os desejos se tornam exigências

Quero continuar a revolução espiritual que está apenas


começando em minha jornada. Um bom início seria refletir
sobre meu mundo interior ao ler o artigo de Yancey. Enquanto
minha alma for governada por um espírito que permite
ciúmes, julgamentos e obstinação em geral, despertando com
67
tamanha facilidade e depois me dominando, não serei capaz de
adorar a Deus, de relacionar-me bem com meus irmãos e
irmãs, ou de atrair incrédulos para Cristo. Vou manchar o nome
de Deus pela minha maneira de viver.
Mas, pelo preço do sangue de Jesus, Deus me ofereceu um
estilo de vida que me capacita não só a honrar o nome dele,
mas também a revelar o seu caráter mediante minha maneira
de relacionar-me. Pensei que estava caminhando desse modo
no dia em que reagi tão negativamente a um excelente artigo
escrito por um bom amigo que é pelo menos tão ocupado
quanto eu. O que eu não estava percebendo?
Vou fazer esta pergunta em termos mais gerais. Que forças
da escuridão algumas vezes controlam meu mundo interior? O
que permite emoções repulsivas que não aprecio e não
escolheria que se desenvolvessem e governassem com tanta
facilidade e tão completamente?
Paulo escolheu com cuidado suas palavras quando escreveu
sobre O fruto da carne. Não penso que ele me diria: — Larry,
suas emoções carnais foram uma escolha. Você escolheu
senti-las. Livre-se delas agora. Você deve sufocar sua
expressão até que desapareçam.
O problema, julgo eu, é que fiz a escolha apaixonada,
aparentemente razoável, de viver segundo o antigo caminho
muito antes de sentar no sofá para ler a revista. Foi a escolha
anterior que permitiu que o mau fruto surgisse. Qual foi a
escolha? Como eu escolhera o antigo caminho?
68
Não gosto de me sentir como um verme. Não tiro muito
proveito da vida quando ele está visível. As pessoas não
gostam de mim, e eu também não. Não me importo com os
que me julgam, embora concorde com o julgamento deles.
Vou então em busca de uma vida melhor.
Deus me abençoou com discernimento e habilidades
verbais. Quando aconselho pessoas, alegro-me em vê-las
crescer na fé. Gosto das impressões favoráveis que
desenvolvem em mim. Quando dirijo seminários, no geral fico
imaginando se algo sobrenatural está acontecendo. Algumas
vezes acontece, e outras posso ver os resultados. Isso
produz grande alegria.
Quando escrevo um livro, como faço neste momento, fico
entusiasmado quando as idéias fluem e um ritmo se
desenvolve. Isso me dá a esperança de que Deus possa usar
minhas palavras para fazer crescer o seu reino. A perspectiva
de boas vendas também ocorre em minha mente.
Veja como estou definindo a vida melhor. Não cobiço um
escritório impressionante, luxos adicionais e posição mais
exaltada. Imagino um ministério mais positivo, alguma
apreciação pelos meus esforços e evidência de que faço
parte da história mais ampla de Deus. Avanço para esse alvo
estudando mais, preparando-me bem e orando regularmente.
A decisão de viver segundo o antigo caminho parece no
geral inocente, até certa. Como Israel, somos capazes de
chamar o mal de bem e o bem de mal. Isaías falou por Deus
69
quando disse: "Ai dos que ao mal chamam bem e ao bem, mal;
que fazem da escuridade luz e da luz, escuridade; põem o
amargo por doce e o doce, por amargo!8
É uma pílula difícil de engolir, mas nossa alma precisa desse
remédio.
Quando qualquer ambição além da de nos achegarmos a
Deus ocupa o primeiro lugar em nossos corações, quer a
ambição seja abertamente de auto-serviço ou claramente de
avanço do reino, estamos vivendo no antigo caminho.
Aproximar-nos de Deus irá purificar nossos desejos e
revigorar ambições piedosas no sentido de aconselhar de modo
positivo por meio de pregações poderosas e de livros úteis. E
isso é bom. Quando privilegiamos a aproximação de Deus,
permanecemos na videira; os desejos de segunda classe se
transformam em bênçãos almejadas. O fruto cresce então no
ramo. Essa é a vida do novo caminho.
No momento, porém, em que permitimos que nossos desejos
de bênçãos se tornem exigências, no momento em que
esperamos que as bênçãos venham porque satisfizemos os
requisitos para que Deus as conceda, no momento em que
pensamos que qualquer bênção além da proximidade de Deus
é essencial à vida, sendo, então, prometida agora, escolhemos
viver segundo o antigo caminho. Isso significa que perdemos a
oportunidade de experimentar a realidade sobrenatural e
devemos agora depender de nossos próprios recursos para as
bênçãos que desejamos. Nossa vida acaba sendo uma vida
70
natural, energizada pela carne, por mais que esteja disfarçada
pela religião.
Pregar bons sermões, criar bons filhos, cultivar boas
amizades, desenvolver bons ministérios, administrar bons
negócios: tudo são atividades da carne. A pressão se instala.
Temos de fazer a coisa certa para obter o que mais
desejamos.
Na conversão, o Espírito colocou quatro recursos distintos
em nós que tornam possível a vida sobrenatural:
uma nova pureza que nos torna limpos aos olhos de Deus,
mesmo quando rolamos na lama;
uma nova identidade que não permite rótulos além daqueles
como santo, filho de Deus, amado, e peregrino a caminho do
céu, a serem pregados cuidadosamente em nós; uma nova
disposição que prefere realmente a santidade ao pecado; um
novo poder para achegar-nos a Deus como um herdeiro
perdoado que anseia contemplar a beleza do Senhor.9
Quando escolhemos buscar a vida melhor de bênçãos em
vez da esperança melhor da intimidade, esses recursos se
tornam inúteis. Ouça Paulo falar severamente aos cristãos
que estavam sendo influenciados a alcançar certos padrões a
fim de ganhar todo favor de Deus: "Eu, Paulo, vos digo que,
se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará...
De Cristo vos desligastes... da graça decaístes".10

71
O ponto de Paulo é este: Cristo não promete ajuda quando
você tem como alvo supremo alcançar certas bênçãos
mediante boas obras.
Pode orar, jejuar, comparecer a seminários, comprar livros,
dar o dízimo em dobro e recusar serviço a cabo na sua
televisão, praticar a oração contemplativa e jamais se esquecer
de um aniversário ou dos jogos de bola de seu filho - os
recursos do Espírito não terão valor algum para você. Deus não
vai nos ajudar a viver no antigo caminho.
Eu me pergunto quantas vezes pais cristãos sinceros oram
por seus filhos e se esforçam para educados bem, apenas para
ficarem frustrados por não receberem resposta às orações.
Imagino com que freqüência cônjuges cristãos oram para que
seu casamento perturbado melhore e quase não atentam para
o fato de estarem ou não se aproximando de Deus em meio às
suas dificuldades. Imagino quantos empresários piedosos
observam o mais alto grau de integridade e esperam que Deus
abençoe assim seu resultado final.

Judaizantes modernos

A igreja moderna foi infiltrada por uma versão atualizada de


judaizantes. Nos dias de Paulo, especialmente na igreja da
Galácia, certos professores estavam reconhecendo que Cristo
era de fato o Messias, mas acrescentavam depois a idéia de
que os cristãos tinham de conformar-se à lei para obter posição
72
plena com Deus. Estavam encorajando o antigo caminho. Em
vista de a igreja moderna estar sendo influenciada por um tipo
de doutrina judaizante refinada, será útil compreender a forma
que ela assumiu no passado.
Fé versus mérito era a questão essencial. Em tempo algum,
nem mesmo quando o Sinai trovejou, o mérito foi a base para
o favor de Deus. Abraão foi justificado pela fé. Assim também
Moisés, Davi, Jonas e Ló. Nenhum santo do Antigo
Testamento foi suficientemente bom para merecer as
bênçãos de Deus. Abraão mentiu, Moisés perdeu a calma,
Davi cometeu adultério, Jonas resistiu ao chamado de Deus.
E Ló cometeu o mais vil dos pecados. Todavia, Pedro o
chamou de homem justo.11 Em que base? Ele, como os
demais, cria em Deus. Nenhum deles ganhou o favor de Deus
por desempenhar-se de acordo com os padrões divinos.12
Paulo disse a respeito dos judaizantes: "Acautelai-vos dos
cães! Acautelai-vos dos maus obreiros!"13 A frase "maus
obreiros" significa literalmente obreiros do mal, implicando
que eles lutavam ativamente contra o verdadeiro evangelho.
Eles "confiam na carne";14 ou seja, tinham a convicção de que
o mérito trazia bênçãos nesta vida.
Uma conhecida autoridade diz o seguinte:
Os judaizantes não tentaram introduzir a economia do Antigo
Testamento na igreja, mas uma visão falsa dessa economia. Os
pecadores eram salvos nos dias do Antigo Testamento
mediante pura graça, assim como o são hoje. Esta era uma
73
tentativa da parte de Satanás... arruinar a igreja de Cristo, não
por introduzir o judaísmo do Antigo Testamento, mas uma falsa
concepção dele.15
A mensagem deles era direta: "Vocês querem gozar da plena
aceitação de Deus e das bênçãos que a acompanham? Devem
então conformar-se com certos padrões da lei mosaica,
inclusive a circuncisão!" Os cristãos da Galácia foram atraídos
por este ensino. Ele devolvia o controle às suas mãos e
restaurava o orgulho em seu próprio valor.
Paulo ficou furioso. "Admira-me que estejais passando tão de-
pressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro
evangelho, o qual não é outro."16 Em lugar de depender dos
recursos da nova aliança doados a eles para que pudessem
achegar-se a Deus em perfeita liberdade, os gálatas estavam
pensando que talvez fosse uma boa idéia tornarem-se
"religiosos" para gozar assim de bênçãos superiores.
Ouça outra vez a lei da linearidade: Faça as coisas certas
para obter o que deseja. Coloque o A como seqüência dos
princípios bíblicos em seu lugar e espere o B das bênçãos
desejadas.bênçãos devem ser mais valorizadas do que o
relacionamento com Aquele que abençoa. Eles negam
implicitamente que possuímos a imagem da comunidade eterna
e, portanto, só podemos encontrar profunda satisfação
mediante uma relação íntima como um amante perfeito. Nada
menos que isso será admissível.

74
Eles disfarçam bem o seu engano. "Deus é bom", afirmam.
"Ele é fiel. Anseia abençoado. Agora que o conhece, espere
as bênçãos que ele está pronto a derramar sobre a sua vida.
Siga as suas regras, cumpra as condições, convença-o a
olhar para você com favor e terá o que quer - uma vida farta
de bênçãos, proporcionadas pelo nosso generoso Deus."
Chamam a isso de viver segundo os princípios bíblicos.
Paulo, por sua vez, considerou isso voltar aos princípios
fracos e miseráveis deste mundo.
É um pensamento surpreendente e um tanto perturbador, a
idéia de que a obediência a princípios bíblicos possa estar
errada. Quando agir certo é uma estratégia para obter o que
desejamos, nossa energia é orgulho e nosso foco é o ego.
Os princípios bíblicos são reduzidos aos princípios básicos
do mundo quando seguidos a fim de ganhar a vida melhor
que exigimos. Os princípios bíblicos permanecem bíblicos
quando se tornam oportunidades guiadas para os cristãos
que se achegam a Deus a fim de expressar a outros o caráter
de Cristo. Foram sempre comandos a serem obedecidos,
mas quando estamos em contato com nossos novos
corações, eles são também considerados privilégios que
ansiamos por agarrar.

Apaixonados mas insensatos

75
Minhas experiências anteriores me mostraram que a mentira
da vida pode ser encontrada na demonstração da competência
pessoal e na participação em uma história mais ampla. Essa,
para mim, é a vida boa, a vida melhor que desejo.
Sou cristão. Deus me deu talentos para fazer bem algumas
coisas e juntar-me a ele para contar a sua história. Se orar e me
mantiver corretamente, mantendo-me dentro de minha escala
de competência, posso viver suficientemente bem a vida cristã,
a fim de receber as bênçãos que acredito precisar.
Vou então trabalhar. Tento fazer o que é certo, orar o
suficiente, não pecar demais, aproveitar todas as oportunidades
para o ministério. A pressão se instalou.
Devo receber as bênçãos de que preciso. Devo pensar bem,
ensinar bem, escrever bem. Qualquer evidência de estar
falhando me desanima até a alma.
Leio o artigo de um amigo e sou forçado a admitir que poderia
fazer muito melhor se tivesse tempo para ler mais. Sei tão
pouco.
Estou cansado de tentar fazer o que é certo. A performance é
como um moinho de vento. As bênçãos que gozo agora podem
não continuar, e as que ainda espero gozar talvez nunca
cheguem. Devo me aperfeiçoar! Mas, estou tão cansado!
Chego então a um ponto em que uma chave interna dá um
estalo. Tudo que quero é alívio. Não posso continuar meu
desempenho. Preciso de uma folga. Menos pressão. Mesmo

76
que seja apenas por um momento. Entretenimento superficial
ajuda. Ligo a televisão.
Compreendo nosso vício epidêmico. Paixões profundas
agitam cada um de nós. Somos pessoas apaixonadas, mas
insensatas. Com energia decidida, vivemos o antigo caminho,
consumidos pela necessidade de nos sentirmos vivos, de
fugir do tédio, de nos envolvermos numa experiência ardente.
Cansamo-nos do esforço, vivemos para encontrar alívio.
Isso descreve o que estava acontecendo em meu mundo
interior quando li o artigo de Philip. A escolha fatal já fora
feita. Eu estava à procura da vida melhor que desejava. A
energia da carne, controlan-do-me intimamente, gerou o seu
fruto. Emoções inferiores corromperam meu coração em
relação a um amigo. Já acontecera antes. Acontece quando
vivemos no antigo caminho.
Será que reconheço claramente o antigo caminho? Posso
identificar o ensino dos modernos judaizantes e compreender
que me afastarão da bênção maior e farão voltar a pressão?
Preciso aprender como fazer isto. Deve haver mais
discussão sobre o que o novo caminho não é.

O DRAGÃO ABANDONADO

O antigo caminho se recusa a ser sincero, seja sobre a


imprevisibilidade das boas obras ou da inevitabilidade das más.
Quando Bilbo Baggins, o hobbit de J.R.R. Tolkien, encontrou as
77
riquezas que ele e seus companheiros procuravam, eles
conversaram alegremente sobre a recuperação do seu tesouro.
A seguir, ouviram um enorme ronco que vinha do interior da
montanha, "como se um antigo vulcão tivesse resolvido entrar
novamente em atividade". Smaug, o dragão maligno, fora
provocado. Tolkien comenta: "Não é bom deixar um dragão fora
dos seus cálculos, caso viva perto dele".20
Moramos perto de um dragão de três cabeças. O mundo nos
rodeia, o diabo nos espreita, e a carne está dentro de nós.
Quando este dragão ruge, nem sempre parece um vulcão em
erupção. Parece mais um amigo chegando para jantar.
Nosso inimigo conversa amigavelmente sobre as boas coisas
que podem acontecer em nossas vidas e o que poderíamos
fazer para aumentar as chances de que elas acontecerão. Ele
parece amigável, bem intencionado e preocupado com os
nossos interesses. Não vacila em nada ao introduzir religião no
assunto. Longe disso. O que Cristo pode fazer por nós, o que
nos dizem que ele quer fazer, faz parte regular da conversa.
É difícil reconhecer quando acontece, mas em algum ponto
uma mudança ocorre em nossos pensamentos. Em algum
momento da conversa, paramos de pensar em Cristo como
soberano Senhor (se é que o fizemos alguma vez) e o
consideramos mais como um amigo útil. A partir do momento
em que o conhecemos, a vida tornou-se boa para nós.

Fechando a boca do dragão


78
Paulo não cometeu o erro de deixar o dragão fora de seus
cálculos. Vale a pena notar um de seus métodos para resistir
ao apelo da mensagem do dragão: Paulo falou abertamente
sobre o seu sofrimento, não em tom de queixa, mas como
uma lembrança de que a vida abundante de seguir Jesus
significa oportunidades abundantes de achegar-se a ele nos
tempos difíceis e não uma abundância de circunstâncias e
sentimentos agradáveis.
Ouça as suas palavras aos coríntios, cristãos mais atentos
para o fato de sentir agora o que Deus prometera que
sentiriam apenas no céu. "Em tudo somos atribulados, porém
não angustiados; perplexos, porém não desanimados;
perseguidos, porém não desamparados; abatidos, porém não
destruídos."21
A vida de Paulo não foi uma experiência agradável. Ao
admitir isso e abandonar toda a esperança de que poderia vir
a ser algum dia agradável, a pressão de procurar um meio de
fazer a vida funcionar foi removida. Paulo viveu para conhecer
a Deus e não para usá-lo. Viveu para achegar-se a Deus,
para tornar-se como Jesus, para seguir o Espírito e não para
viver de certo modo que agradasse suficientemente a Deus a
fim de levá-lo a derramar as bênçãos de uma vida melhor.
Sua angústia admitida tornou-se uma reação efetiva para o
convite do dragão no sentido de viver o antigo caminho. — Se
a única esperança oferecida pelo cristianismo é uma vida
79
melhor aqui — ouço Paulo dizer —, então tudo é falsidade. Os
cristãos que seguem Jesus com a intenção de obter uma vida
agradável ou até mesmo repleta de aventuras e com muitos
significados têm suas cabeças escondidas na areia. Se as
levantassem por um minuto e olhassem em volta, seriam os
mais miseráveis de todos os homens".22
Paulo, no entanto, não é um arauto de condenação e tristeza.
Pelo contrário. Ele colocou o dragão em seus cálculos, mas
também considerou Deus. Para ele era uma seqüência de dois
passos. Examine melhor esta passagem em Coríntios.
"Eu cri; por isso é que falei", disse Paulo. Se não lermos o
pensamento inteiro, perderemos o que Paulo tem em mente
aqui e pensaremos que ele estava expressando a confiança de
que Deus iria abençoar a sua vida, dando então uma palavra de
testemunho. Mas, Paulo estava citando um salmista, um
homem cuja vida não estava indo bem, mas, por causa de sua
fé em Deus, conseguiu se libertar para falar sinceramente sobre
quão terrível era a sua vida.
O salmista citado por Paulo disse isto: "Eu cria, ainda que
disse: estive sobremodo aflito. Eu disse na minha perturbação:
todo homem é mentiroso".
O apóstolo então acrescenta, "Tendo, porém, o mesmo
espírito de fé... Também nós cremos; por isso, também
falamos".23 Falou sobre o quê? Sobre quão bem o antigo
caminho está funcionando? Sobre como ele ora, depois vê tudo
dar certo em seus relacionamentos, ministério e senso de
80
inteireza pessoal? Não! Sobre a sua aflição! Paulo estava
contando à sua comunidade como se sentia desanimado e
abatido com as circunstâncias. Mas, não se queixava. Estava
reconhecendo que o antigo caminho era uma mentira. Estava
fechando a boca do dragão.
Ouça o salmista continuar. Depois de compartilhar
abertamente que se sentia dilacerado e infeliz e que a sua
comunidade não era confiável, ele exclama, "Que darei ao
SENHOR por todos os seus benefícios para comigo?"24
Benefícios de Deus? A vida do homem não ia bem. Ele não
estava claramente vivendo no antigo caminho. Não estava
supondo que a bondade de Deus se traduzia constantemente
numa vida melhor de bênçãos neste mundo.
A seguir acrescenta: "Preciosa é aos olhos do SENHOR a
morte dos seus santos. SENHOR, deveras sou teu servo...
quebraste as minhas cadeias".25 Quando o salmista pensava
na bondade de Deus, não se referia às bênçãos divinas nesta
vida. Sabia que a sua jornada seria uma luta contínua. Mas
continuou em uma longa obediência
— "Sou teu servo" — e gozou da liberdade provida pela
esperança da presença de Deus agora e das bênçãos mais
tarde. As cadeias se soltaram. A pressão acabou. Ele não
estava tentando viver corretamente, a fim de tornar sua vida
mais confortável e compensadora.
Paulo faz eco ao pensamento. Depois de afirmar possuir o
mesmo espírito de fé que permitiu ao salmista admitir que sua
81
vida era difícil, ele nos diz que podemos enfrentar uma vida que
não funciona, "sabendo que aquele que ressuscitou o Senhor
Jesus também nos ressuscitará com Jesus e nos apresentará
convosco".26
Vamos entrar na mente de Paulo. Chegar ao seu coração.
Ver o que ele pensa constantemente e as paixões que o
inflamam. Paulo não está interessado em fazer esta vida
funcionar. Como o hobbit, Baggins, Paulo deixou o túnel de
uma vida confortável e partiu para encontrar o tesouro. Baggins
deixou sua caverna bem estocada e espaçosa, onde ouvia o
assobio do bule anunciando que estava na hora do chá. Paulo
abandonou sua posição poderosa e respeitada de líder religioso
entre os judeus em que podia gozar do prestígio do seu
chamado.
Ambos se afastaram da vida melhor de bênçãos e entraram
numa jornada difícil e cheia de obstáculos que prometia um
tesouro melhor. Para Paulo, era a proximidade de Deus —
agora em medida, então, face a face.
Ele não era, entretanto, um cristão do tipo "vida após a
morte". Não era possível acusá-lo de se tornar um recluso
monástico, alguém tão preocupado em aproximar-se de Deus
que esqueceu a batalha ao seu redor. Todas as suas
provações, disse ele, eram suportadas "por amor de vós, para
que a graça, multiplicando-se, torne abundantes as ações de
graças por meio de muitos, para a glória de Deus".27

82
Recusa em viver realmente

Um amigo me convidou para o café, pedindo que ficasse a


maior parte da manhã. — Gostaria de ser o foco da sua
atenção por algumas horas — disse. — Minha vida está
desmoronando de todo lado. Perdi toda a esperança de que
as coisas melhorem.
Cerca do meio-dia, depois de procurarmos juntos para
saber onde o Espírito trabalhava em sua alma, ele disse: —
Tenho plena confiança de que Deus está me abençoando
com a oportunidade de conhecê-lo como nunca antes. E está
acontecendo. Nunca tive tamanha confiança na sua bondade,
e de alguma forma essa confiança e minhas provações
fizeram com que não me importasse tanto com o que as
pessoas pensam ou sequer como as coisas mudam, embora
deseje que isso ocorra. Estou infeliz, mas confiante. Ao
perder a esperança de que as coisas venham a ficar boas,
estou recobrando-a na boa obra que Deus vai fazer em mim.
Repliquei: — Quero que saiba como isso me encoraja
profundamente. Sua vida, como poucas outras, aumenta meu
compromisso de buscar a Deus como meu maior tesouro.
— Que bom —, disse ele. Não se tratava de palavras
vazias. Ele estava verdadeiramente satisfeito de que suas
provações me beneficiassem e dessem glória a Deus.
83
O antigo caminho é uma recusa em viver realmente. Ele
envolve a exigência de que algo menos do que meu "eu" mais
verdadeiro desperte. O antigo caminho identifica desejos reais
no coração humano, desejos de significado, amor, satisfação e
liberdade, mas não os aprofunda. Deixa de descobrir nosso
desejo puro, consumidor, inexorável de estar na presença de
uma pessoa perfeita, de contemplar a beleza da absoluta
santidade, da maneira que um artista principiante olha para
uma obra-prima de Rembrandt. O antigo caminho só vê desejos
que apontam para o íntimo, para o ego, e supõe que o
cristianismo esteja concentrado em corresponder a esses dese-
jos mediante o que quer que possa satisfazê-los.
— Descubra um meio de chegar ao topo da vida —, sussurra
o dragão encorajadoramente. — Você não precisa sentir-se
pressionado, perplexo, perseguido ou abatido. Já esteve na
última conferência sobre a vida espiritual? Talvez devesse ler o
best-seller que promete desvendar o segredo de uma família
feliz. Há um novo terapeuta na cidade que parece estar
ajudando muita gente a superar a depressão e obter uma vida
muito mais satisfatória. E com orações. Há várias novas
abordagens intrigantes que você talvez queira considerar. Elas
parecem dar certo.
O dragão parece um pregador, um professor da Bíblia que
conhece a sua audiência e sabe como tornar a Bíblia relevante.
Ele começa com conversa religiosa que não só pode, mas no
geral vem de um púlpito. Mas, está só a um passo de encorajar
84
o divórcio, a pornografia, ou o compromisso ético, porque se
vivemos para a satisfação de uma vida melhor, os prazeres
do pecado parecem bastante razoáveis quando essa vida
desmorona.
O antigo caminho trata de mim, de minha saúde emocional,
de minha maturidade espiritual, da satisfação da minha alma,
da minha felicidade circunstancial, do meu ministério
significativo, do meu negócio ou sucesso familiar, entre
outros. Ele me ensina a ser astuto, a saber como navegar
pela vida para que as coisas saiam bem. A astúcia requerida
para ser eficiente substitui a sabedoria necessária para
honrar a Deus. Se criarmos nosso filho deste modo, isso
nunca vai acontecer. Caso contrário, determinaremos o que
deu errado e consertamos. Aproximar-se de Deus assume o
significado de ser pouco mais do que uma ida apressada à
sala de emergência para aliviar a dor de uma pedra nos rins.
— Obrigado, doutor —, dizemos e vamos embora sem sequer
conhecer o médico que nos ajudou. Mas nos sentimos
melhor.
Tenho 56 anos enquanto escrevo, daqui a uma semana
farei 57. Sou cristão há quase cinqüenta anos. Duas coisas
estão ficando mais claras para mim do que nunca antes.
Primeiro, sou atraído pelo antigo caminho de vida, o caminho
de um código escrito, um plano para obter as bênçãos que
quero nesta vida. Eu o tenho vivido, não completamente mas

85
com bastante consistência, durante a maior parte da minha vida
cristã.
A segunda coisa que está se tornando clara é que o novo
caminho é o caminho do Espírito. O Espírito é a terceira pessoa
da Trindade. Ele conhece o Pai e é gerado por ele. Conhece o
Filho e é o Espírito literal de Cristo. O Espírito é Deus, santo e
amor. Cada vez que fala, é para apontar o caminho santo, o
caminho para a presença de Deus.
Cada sentimento seu, enquanto sonda e vê quanto o meu
coração deseja mais as bênçãos de Deus do que o próprio
Deus, está saturado de bondade e esperança. Suas paixões o
levam a incentivar minha paixão por Cristo, a colocar meu
coração na direção de casa, a posicionar meus pés na estrada
para a presença de Deus, a permitir que eu veja o brilho do
diamante que é Cristo.
A sua voz, porém, não é a única que ouço. Ouço uma voz
doce, bondosa e persuasiva que me faz lembrar quão solitário e
decepcionado estou e quão profundamente anseio sentir-me
bem a respeito de mim mesmo, ser honrado, ajustar-me em
algum lugar, sentir-me importante e seguro. Essa voz me
encoraja a crer que esses anseios podem e devem ser
satisfeitos; que a única coisa que separa o caminho espiritual
do secular é como posso conseguir satisfação para eles.
Quando ouço essa voz, não vejo valor mais alto do que a minha
plenitude, sentida e gozada agora ou, se não neste momento,
então em breve.
86
E a voz do dragão.
Está na hora de ouvir outra voz. Eu a ouvi recentemente, e
meu mundo interior está virando de cabeça para baixo. O que
julguei ser bom, vejo agora que é mau. O que pensei ser
elitismo espiritual e suspeitosamente místico, vejo agora
como disponível para rodos e intensamente prático. Vou
contar-lhe o que aconteceu.

Saia da caverna

Há alguns meses, eu estava escovando os dentes às três


da tarde. Não sei por que a essa hora, pois esse não é um
hábito meu.
Sem qualquer aviso, entrei num mundo diferente. A pia, o
balcão, a escova tornaram-se menos reais, parte de um
mundo que não era a minha casa. Foi o mais perto que estive
de sair pelo fundo de um guarda-roupa e entrar em Nárnia.
No mais profundo do meu coração, onde o inaudível se fez
ouvir, escutei o Espírito dizer — e essas foram as suas
palavras exatas: — Quero contar uma coisa a você. Contar o
que está desejando saber.
Minha experiência de um "outro mundo" durou dez
segundos, talvez quinze. Desci rapidamente para a minha
cadeira favorita junto à lareira. Ajoelhei-me. Abri a Bíblia e
fiquei à espera.

87
Nada. Não ouvi nada. Depois de alguns minutos senti enorme
necessidade de entrar na sala de estar para assistir à televisão.
Estava inclinado a dispensar o momento com a escova de
dentes como uma insensatez momentânea, uma aberração
psicológica de satisfação auto-induzida.
Telefonei a vários amigos. Contei o acontecido e pedi que
orassem e suplicassem a Deus para que o Espírito me levasse
a ouvi-lo a fim de entender o que a voz queria dizer-me. Para
isso, seria necessário humilhar-me o suficiente para chegar a
ouvir a Deus.
Nada. Fiquei sentado três horas, lendo as Escrituras,
esperando em espírito de oração. Nada.
Várias semanas se passaram. Acordei certa manhã às 5h30 e
senti o desejo de levantar-me e sentar-me na cadeira junto à
lareira. Fiz isso. Abri a Bíblia em Romanos 7:6, o versículo que
inspirou minha nova direção vocacional, que chamo Ministérios
do Novo Caminho. Ouvi Paulo dizer-me novamente que fora
libertado da escravidão para poder viver de um novo modo, o
que Paulo chama de "novo caminho do Espírito". Fiquei
imaginando outra vez o que ele queria dizer quando anunciou
as boas novas de que eu não podia mais viver "no velho estilo
do código escrito".
Passei, então, para Hebreus 7:18, 19. Li nesse trecho as
palavras familiares que desta vez quase me fizeram levantar da
cadeira. "A anterior ordenança — o velho modo de fazer as
coisas certas para que Deus possa abençoar - é revogada".
88
Meu coração bateu descompassado. Li que me fora dada
uma "esperança superior" à promessa de bênçãos pela
obediência; fomos também convidados a "nos chegar a
Deus"; pessoas como eu podem ter intimidade com Deus.
Surpreendente! Meu coração bateu mais forte.
Comecei a falar em voz alta: — Está no texto! — Aprendi a
desconfiar das impressões que sentia no estômago, mas
também aprendi a confiar plenamente no que lia na Bíblia.
Chorei de alegria. De esperança. — A pressão terminou —,
gritei finalmente. — Não preciso encontrar um meio de me
sentir bem antes de amar. Não tenho de fazer minha vida
funcionar antes de dar glória a Deus ou beneficiar a outros. —
Compreendi que era isso que eu queria. Anseio por sentir-me
completo, inteiro, amado e valorizado. Mas, anseio ainda
mais conhecer melhor a Deus.
Senti a seguir uma comoção no fundo da minha alma.
Fechei os olhos e escutei. Senti-me como Lázaro, ouvindo
uma voz do céu entrando em minha cova. Só posso fazer
uma tentativa de colocar palavras no que ouvi. Elas fluíam do
texto.
— Larry, há um novo modo de viver. Você esteve vivo com
a minha vida divina durante cinco décadas. Na maior parte
desses anos, esteve vivendo uma visão inferior da antiga
aliança; vivendo no antigo caminho de seguir os princípios
básicos do mundo28 a fim de tornar esta vida melhor. Você
também esteve enfeitando o espaço escuro em que escolheu
89
habitar na tentativa de fazer de conta que é um lar. Meu Espírito
está falando agora a você por meio da sua desilusão com esta
vida — a morte de seu irmão, o seu câncer, a doença de
Alzheimer de sua mãe, os relacionamentos que se romperam,
problemas de família, tão pouca realidade em seu mundo
interior. Ele está lhe dizendo, por mim, que a verdadeira alegria
nesta presente era maligna nunca depende da vida melhor de
bênçãos e que é tanto insensato quanto fútil valorizar a sua
satisfação acima do meu conhecimento. Compreenda isto:
Tente me conhecer. Logo descobrirá a felicidade.
— Você está começando a perceber a vida que possui e o
privilégio singular que ela proporciona. Pode agora achegar-se
a Deus, pode apresentar-se a ele como está e quando aprender
o que isso significa e a obediência que traz em sua esteira,
então, meu Pai e eu iremos aproximar-nos de você. Não existe
bênção maior que esta! Você ficará cheio de uma alegria que
nem sempre parecerá satisfazê-lo, mas tomará consciência de
um desejo profundo de me conhecer e revelar-me a outros, não
importa o que esteja acontecendo em sua vida ou quais sejam
os seus sentimentos. Você se tornará sólido, não mais um
fantasma etéreo fingindo ser real.
— Está na hora! Na hora de deixar o velho caminho que vem
causando tanta pressão — que o obriga a manter as pessoas
felizes com você, a ter sucesso em seus relacionamentos e
ministério, a sentir-se pelo menos um pouco bem — e viver no
novo caminho, o caminho que o meu sangue abriu para você.
90
— Larry, saia da caverna, está na hora!
Tempo para viver

Alguns meses mais tarde passei uma noite agradável com


um amigo íntimo. Ficamos três horas em meu quarto de hotel,
com ele afundado numa cadeira com os pés pousados numa
das camas gêmeas e eu esticado na outra.
Ele me convidou a entrar em sua caverna pessoal. Seu
espaço escuro tinha algumas lâmpadas, fornecendo claridade
suficiente para ver bênçãos consideráveis em sua vida. A
desilusão, no entanto, fizera o seu trabalho. Ele perdera toda
a esperança de que a vida pudesse consistir de bênçãos
suficientes para dar-lhe a verdadeira alegria. Descobrira o seu
desejo por Deus. Mas, como Lázaro, as mortalhas ainda o
retinham. Temia a reprovação do pai, lutava com sentimentos
de baixa auto-estima, seu ministério parecia fútil. Sua jornada
espiritual o colocara numa verdadeira montanha-russa de
incríveis aclives e devastadores declives.
Enquanto ele falava, senti que me achegava a Deus, mais
aos percalços de um caminhar dificultoso - fiquei tropeçando
em minhas mortalhas. Mas, ia para ele. Era o que mais queria
fazer.
Pude ver o coração de meu amigo explodindo. A vida em
seu interior forçava a saída. Sentei-me na cama. Inclinei-me
para a frente. Com lágrimas de esperança correndo pelos
meus olhos, eu disse: — É chegado o momento de nós dois e
91
de muitos outros ao redor do mundo, sedentos de conhecer a
Deus, de viver a vida que nos foi dada. Está na hora de viver no
novo caminho!
Repito isso hoje. Está na hora de viver no novo caminho do
Espírito, de deixar para trás o antigo caminho do código escrito.
Há, porém, um problema: Continuo gostando do antigo cami-
nho. Quero que minha vida funcione. E posso fazê-la funcionar,
não de modo perfeito e duradouro, mas tenho os recursos
necessários para conseguir algumas satisfações e evitar certas
dificuldades. Mesmo quando elas se tornam inevitáveis, há
certas coisas que posso fazer que trazem alívio. Por exemplo,
enganar-me que não é assim, mas no geral essa é a minha
prioridade.
E nada parece errado. O antigo caminho parece razoável,
normal e até bom. As chamas da boca do dragão estão
reduzindo minha alma a cinzas e me achego a elas como um
homem cansado que senta diante da lareira numa manhã fria
de inverno.
Não enxergo o perigo. Não reconheço o mal do antigo
caminho. Mas, devo. Não se deve deixar um dragão vivo fora
dos nossos cálculos se ele mora nas vizinhanças.

92
O QUE HÁ DE TÃO ERRADO COM O QUE QUEREMOS?

O que torna errado o antigo caminho? É realmente mau viver


para as bênçãos disponíveis neste mundo? Ou, para alguns
desafortunados, é simplesmente frustrante?
Como alguém pode afirmar seriamente que esforçar-se ao
máximo para tornar este mundo um lugar melhor para viver é
imoral, especialmente se fizermos isso do modo "cristão", se
não nos aproveitarmos injustamente de outros e resistirmos à
sedução dos prazeres ilegítimos? Suponhamos que nosso
objetivo seja o significado espiritual e enchamos nossos dias
com atividades de ministério, seguindo cuidadosa e
seriamente nossos princípios bíblicos o melhor que pu-
dermos? Podemos corromper a busca por satisfação numa
procura egoísta — e isso seria errado — mas, se confiarmos
em Cristo para suprir nossa vida com aventura, realização e
senso de comunidade não estaremos andando por um bom
caminho? Não somos então seus discípulos?

Um Salvador do sofrimento e não do pecado

O dragão pode parecer uma pomba. Ele pode encorajar-


nos a odiar filmes obscenos, aborto e estupro, a nunca perder
o culto e a simpatizar com os amigos que estão sofrendo,
enquanto todo o tempo nosso compromisso com uma vida
melhor, como quer que a definamos, ocupa o primeiro lugar
93
em nosso coração. A única mensagem firme que vem do
mundo, da carne e do diabo é esta: Procure a sua maior
satisfação em qualquer outro lugar, menos em Deus.
Jesus veio à terra para dizer-nos que ele é o caminho, e a
verdade, e a vida. Sua morre abriu o caminho para a presença
de Deus, a maior bênção de todas. Seus ensinamentos
tornaram clara a verdade de que a vida não consiste numa volta
aos confortos do Eden nem na entrada das bênçãos do céu. A
vida verdadeira é conhecer a Deus. Jesus afirmou isso.29 E a
vida é o próprio Cristo, não o pão que pôde multiplicar ou o
cadáver que ressuscitou, mas ele mesmo. Estar nele, tê-lo em
nós, viver com a sua energia, buscar seus propósitos, amar o
que ele ama, vê-lo formar-se em nós até que sejamos
realmente como ele — isso é vida. Ela pode ser desfrutada
tanto no infortúnio quanto na riqueza, num leito de hospital ou
numa cadeira de convés num cruzeiro, ou quando se deixa um
tribunal de divórcio no qual nunca pensou que estaria ou numa
festa-surpresa celebrando cinqüenta anos de seu maravilhoso
casamento.
Quando vivemos no antigo caminho, não acreditamos no que
Jesus disse. Anne Graham Lotz não está cometendo esse erro.
Eu ouvi uma fita dela onde recapitulou algumas dificuldades em
sua vida, depois disse: "Não me dêem simpatia. Não me dêem
conselhos. Nem sequer me dêem um milagre. Dêem-me
apenas Jesus!"

94
O antigo caminho vê as coisas de modo diferente. O dragão
sugere pensativamente: — Você quer realmente Jesus. É ele
que pode restaurar seu casamento, proporcionar grandes
idéias que realmente funcionam sobre como criar seus filhos,
e fazer progredir o seu ministério. Jesus ensina princípios
pelos quais viver, ele oferece métodos para seguir que lhe
darão a vida que deseja. O que deve fazer para ser salvo de
uma vida insatisfatória e relacionamentos tensos? O que deve
fazer para ser salvo da perseguição e dos problemas? Ele lhe
dirá. Vá até ele para descobrir o que deve fazer para que a
sua vida funcione!
Estou aprendendo a distinguir entre a voz do dragão e a do
Espírito. O dragão tira minha atenção da pessoa de Cristo
como fonte da alegria mais profunda para as bênçãos da vida
como o que realmente preciso para ser feliz. Se essas
bênçãos só podem ser obtidas mediante pecado evidente,
ótimo; se viver uma vida cristã positiva mantém a vida
operante, isso também é ótimo. O dragão não se importa,
contanto que eu busque a vida melhor de bênçãos. Depois de
ouvir esse dragão de três cabeças por algum tempo, tento ver
Cristo como um salvador do sofrimento e não do pecado; um
benfeitor responsável e não um Senhor Santo. O Espírito
sempre aponta para o Cristo da Bíblia, aquele que não
oferece garantias de que meu casamento vai sobreviver, que
as notícias da biópsia vão ser boas, ou que não vou perder o
emprego. O Espírito expõe um problema em minha alma pior
95
do que o meu sofrimento, depois revela o Deus da graça. Ele
me diz que posso conhecer esse Deus; posso conhecer o seu
coração, descansar em seu poder e esperar nos seus
propósitos. Posso ver tudo isso em Cristo. Ele continua
incentivando meu coração para dizer: — Dê-me apenas Jesus!
Gosto, porém, das palavras do dragão. Quero ter uma vida
funcional. Alegro-me quando isso acontece. Odeio quando se
dá o contrário.
Só quando meus sonhos se despedaçam, e então apenas por
um momento, sinto às vezes o desejo de me achegar ao Deus
que sei que é mais forte do que meu desejo de bênçãos
restauradas. Só durante tempos especialmente intensos com
Deus — raros em sua freqüência e de curta duração - anseio
mais por ele do que pelas suas bênçãos.
Escrevi seis capítulos neste livro. Meu prazo está
rapidamente se esgotando. Prefiro conhecê-lo melhor ou desejo
que ele me habilite a escrever os últimos capítulos a tempo?
Digo que a pressão acabou. Será que sei do que estou
falando? Alguém sabe? Estou descrevendo um estilo de vida
impossível de ser vivido por alguém? Estou saindo de minha
habitação coletiva para o sujo cortiço que todos chamamos de
lar e falando de um refúgio que jamais gozaremos? Talvez
fosse melhor pegar uma mangueira e limpar a rua, tratar de
melhorar nosso casamento, tornar nossos filhos mais
responsáveis, nossas amizades mais íntimas, nossos

96
ministérios mais eficazes e nossos corpos mais esbeltos e
saudáveis.
Em vez disso, estou escrevendo um livro sobre como viver
para a melhor esperança de me achegar a Deus, sobre como
viver não para tornar melhor a nossa vida mas para agradá-lo
e revelá-lo aos outros. Será que tenho idéia do significado
disso? E possível que dê realmente valor ao que Cristo pode
fazer por mim nesta vida mais do que valorizo a oportunidade
de conhecê-lo melhor. Será que já obtive mais prazer
passando tempo com ele do que viajando de férias com
minha mulher, observando meus filhos estarem em boa
situação ou carregando os meus netos? Há realmente mais
alegria em conhecer Cristo do que ficar de pé diante de
grandes multidões, ver coisas boas acontecerem e ganhar
dinheiro além disso?
É sobre isso que estou escrevendo. Estou em águas
profundas, não tenho certeza de que sei nadar.
Este capítulo está difícil de ser escrito. É a minha quinta
tentativa. Joguei fora mais de cinqüenta páginas de rabiscos
que pareciam importantes quando os escrevi. E estou
reescrevendo agora o que pensei que fosse a versão final.
Comecei este livro declarando que há mais coisas à nossa
espera em Jesus Cristo do que ousamos imaginar. Deixar
tudo para conhecê-lo melhor é realmente bom para nós. Creio
nisso? Quando escrevi essa sentença introdutória, a paixão
fluía de mim. Será que desapareceu?
97
Não devo tentar recuperá-la. Esse seria o antigo caminho.
Devo, pelo contrário, buscar a Jesus. Devo achegar-me a Deus.
É útil saber que isso pode ser feito, que o caminho para Deus
foi aberto, que os recursos necessários para a viagem foram
previstos e que o Espírito pode agitar as águas que nos levarão
para a presença de Deus, como uma fonte carrega uma folha. É
bom também nos convercermos de que qualquer outra
prioridade é maligna. Vamos falar mais sobre dois pontos - que
o novo caminho pode ser e foi palmilhado e que o antigo
caminho é mau.

Temos mais à nossa disposição do que ousamos imaginar

Primeiro, algumas lembranças de que o novo caminho foi


palmilhado. Pascal, cujas sentenças fragmentadas de êxtase
estão nas linhas de abertura deste livro, é apenas um da
grande nuvem de testemunhas da verdade de que a realidade
sobrenatural pode entrar em nossas vidas e jorrar de nossas
almas, e que algumas vezes faz realmente isso! João é outra.
Era um domingo, há cerca de dois mil anos. Quando João
escreveu sobre o acontecido, ele nos conta que foi "em
espírito"30 - indicando, segundo penso, que uma sensação de
expectativa o dominou, provavelmente depois de muitos dias
desesperados esperando em Deus para encontrá-lo na rocha
que chamava de lar. O apóstolo era um homem velho, vivendo
preso em uma ilha deserta, exilado ali pelo crime de pregar os
98
ensinamentos de Jesus, comendo mal, dormindo sem
conforto, trabalhando arduamente, como nem um rapaz de
vinte anos suportaria, sabendo que o grupo de discípulos se
fora (a maioria deles martirizada), e desanimado pela
condição espiritual de várias igrejas locais.
Se tivesse seguido a Cristo na esperança de uma vida
melhor, estaria àquela altura dolorosamente desiludido. Mas,
então, Cristo apareceu a ele. Note-se, porém, o que não
aconteceu nessa ocasião. Cristo não levou um colchão para
João. Não pôs uma mesa com iguarias finas. Não tirou João
magicamente de Patmos e o colocou no continente para
dirigir seminários em Sardes e Laodicéia.
O que aconteceu realmente foi muito melhor. O Espírito
revelou Jesus Cristo. Posso ouvir João dizendo: — Minha
vida é triste, mas não peço simpatia, nem ajuda, nem um
milagre. Apenas dê-me Jesus! — E foi isso que o Espírito
deu. E uma oração a que Deus quase sempre responde.
O Jesus que João encontrou naquele dia não apareceu como o
marceneiro amável, o professor bondoso, o bom amigo que
certa vez convidara João para inclinar-se sobre o seu peito
depois do jantar. Ouça João descrever o Jesus que viu naquele
dia:
A sua cabeça e cabelos eram brancos como alva lã, como
neve; os olhos, como chama de fogo; os pés, semelhantes ao
bronze polido, como que refinado numa fornalha; a voz, como
voz de muitas águas.
99
Tinha na mão direita sete estrelas, e da boca saía-lhe uma
afiada espada de dois gumes. O seu rosto brilhava como o sol
na sua força.31
Não é de admirar que quando João o viu, caiu a seus pés
31
como morto. Não lhe ocorreu nem por um momento dizer: —
Pode tirar-me desta rocha? Eu gostaria muito de uma xícara de
café quente. Este lugar terrível está muito frio.
Jesus Cristo está mais ao nosso dispor do que ousamos
imaginar. Há mais em Jesus Cristo do que jamais sonhamos.
Experimentamos tão pouco dele quando nos aproximamos da
sua pessoa só para pedir. Saboreamos tão pouco do respeito
que silencia a boca, interrompe as queixas, aprofunda o desejo
criado pela sua presença quando pensamos mais sobre os
nossos problemas e como resolvê-los do que sobre encontrar-
nos com ele. Experimentamos tão pouco da alegria que nos
sustenta no sofrimento e da esperança que nos serve de
âncora em meio aos sonhos estilhaçados quando vamos a ele
procurando um caminho que nos leve para longe das
dificuldades em vez do caminho para a sua presença.
Em suas expressões imprevisíveis de misericórdia, o Espírito
nos dá vislumbres de Cristo que nos enchem de realidade
sobrenatural e fazem brilhar uma luz na entrada do novo
caminho. Levei recentemente meu filho mais moço ao
aeroporto. Enquanto nos despedíamos, ele me entregou um
cartão do dia dos pais. Antes de ir embora, li as palavras
pessoais que escrevera. Elas vieram do Espírito de Deus
100
trabalhando em meu filho para a minha alma árida, para um
coração mais sensível à ausência de Deus do que à sua
presença.
Elas são pessoais demais para compartilhar. Senti-me
tocado em pontos profundos enquanto voltava para casa.
Dentro de minutos estava chorando, por alguma razão
visualizando meus últimos momentos na terra antes de ver
Jesus. Minha família me rodeava. Senti amor indescritível
enquanto olhava para eles, grato, além das palavras, por
cada um. Depois disse a ele: — Deus me deu vocês, e agora
estou prestes a vê-lo. Vou ver Jesus. Vou vê-lo. Em breve
estarão comigo, contemplando a ELE! Alegria além da
alegria. Plenitude de alegria. Morro feliz.
O momento então passou. Meus olhos secaram e segui
para casa. Paguei algumas contas, molhei as plantas e
respondi a alguns telefonemas. Mas o momento foi real!
Jesus Cristo está ao nosso dispor mais do que ousamos
imaginar. Aceitamos tão menos. Deleitamo-nos tão pouco
nele. Por quê?
É porque não vivemos como deveríamos? Se nossa falha
em corresponder aos padrões divinos é a causa de nossa
experiência pobre de Jesus, não há esperança. Jamais
corresponderemos, nem por um minuto, e nunca faremos isso
até estarmos em casa.
Um insulto a Deus

101
Esse não é, no entanto, o problema central. Vou abordar
agora o meu segundo ponto. O obstáculo central para a vida de
Jesus fluir em nós e jorrar de nós é este: Queremos mais outra
coisa. E isso é perverso. Queremos as bênçãos de uma vida
melhor mais do que desejamos nos achegar a Jesus. Nós nos
aproximamos dele como uma criança se achega a um Papai
Noel no shopping, que pergunta pela centésima vez: — O que
você quer no Natal? Aposto que nenhuma criança jamais se
apertou no peito de Papai Noel, olhou em seus olhos e disse: —
Você! Eu quero só você! —Nenhuma criança acredita que
Papai Noel ao jantar com ela poderia alegrá-la mais do que
quando empilha presentes debaixo da árvore. Nosso problema
é incredulidade no que pode ser chamado de seu "Plano
Emanuel", a obsessão inflexível que ele tem de formar uma
família para reunir-se à sua mesa de jantar, com ele na
cabeceira, e cada um de nós vibrando de alegria por estar
presente.
Deus está decidido a formar uma comunidade em que ele
seja o nosso Deus e nós, o seu povo. Esse tem sido o seu
plano desde o Éden. Quando vamos em direção diferente,
somos como o filho pródigo dizendo ao pai: — Pouco me
importa estar com você. Só quero a sua riqueza. Pode morrer
no que me concerne. Apenas dê-me a minha herança.
Esse é o antigo caminho. Ele não é apenas insensato. É
perverso.

102
É insensato porque a vida nunca funcionará
suficientemente bem para criar a alegria que desejamos.
Deus providencia isso. Quando Adão e Eva foram expulsos
do paraíso, Deus preparou o mundo para certificar-se de que
nunca teríamos uma base razoável para nos estabelecermos
nas alegrias que a vida neste planeta confere. O mato cresce
em todo jardim. Toda vez que tentamos removê-lo, um espi-
nho pica nosso dedo. Os relacionamentos nunca alcançam a
plena alegria da completa intimidade. A competição
egocêntrica barra o caminho. Todo nosso esforço para a
harmonia é prejudicado pela nossa atitude: "Estou magoado,
você falhou", e nosso foco está voltado para o que o outro
pode fazer para satisfazer nossos desejos.
Não conseguimos agir como devemos. Não conseguimos
ter uma vida funcional; isso nunca acontecerá até o céu.
Todavia, como cavadores de poços, passando por um poço já
cavado e forçando nossas pás na terra seca, tentamos
descobrir o que podemos fazer para encontrar a água
desejada. A maioria de nossas orações consiste de um
pedido para que Deus guie nossas pás para onde as fontes
se escondem por baixo da terra endurecida.
Certo dia, Jesus dirigiu-se a um grupo de cavadores de
poços. — Vocês estão com sede. Sabem disso. Mas não
sabem que estão com sede de mim! Venham até mim.
Deixem as pás. O poço já foi cavado. Venham beber a água
que eu dou. Venham à minha mesa. Comam o que é bom.
103
Deixem suas almas se deleitarem no melhor dos alimentos.
Não há alimento mais rico do que o relacionamento comigo.
Estou à disposição. Venham!32
Todavia, continuamos no antigo caminho, dando mais valor à
vida melhor que Jesus pode dar-nos do que à esperança
melhor de conhecê-lo bem. Isso é inútil e perverso. Nós o
tratamos com desprezo, rejeitando seu convite para nos
achegarmos a ele, e tentamos, em vez disso, esforçar-nos para
seguir os princípios que julgamos nos trarão as bênçãos
desejadas.
Podemos encontrar Jesus. Isso já aconteceu antes. E a
esperança desse encontro supera de muito a esperança de
uma vida melhor neste mundo. Essa é a primeira coisa que
devemos saber.
Viver para uma vida melhor neste mundo, com mais energia
do que perseguimos um relacionamento mais profundo com
Jesus é perverso. Esta é a segunda coisa que devemos saber.
É um insulto a Deus. Ele nos dá o melhor que o céu pode
oferecer, e pedimos outra coisa.

Uma paz diferente

104
Cada um de nós está palmilhando seja o antigo caminho ou
o novo.
Um dos principais seguidores de Cristo, Agostinho, disse a
mesma coisa. Agostinho sabia o que era viver por uma vida
melhor. Ele conhecia também o vazio da alma que não podia
ser satisfeito com nada e ninguém senão Deus. Esse vazio o
levou a uma atividade sexual que não conseguia controlar. Só
depois de um encontro com Jesus e de começar a busca da
melhor esperança de intimidade com Deus é que descobriu
uma alegria preferível ao prazer sexual. Não existe qualquer
outra cura real para qualquer vício.
Ele escreveu mais tarde sobre duas cidades que juntas
afirmam que toda pessoa viva habita nelas, seja numa ou
noutra: "Uma das cidades é a dos homens que vivem
segundo a carne. A outra é a dos que vivem segundo o
Espírito. Cada uma escolhe seu próprio tipo de paz e, quando
conseguem o que desejam, vive na paz de sua própria
escolha".33
Há uma paz dada pelo mundo. É a tranqüilidade de uma
vida que funciona razoavelmente bem — relacionamentos
decentes, saúde adequada, recursos suficientes para gozar a
vida, trabalho significativo. Os cidadãos da cidade do homem
seguem os princípios básicos deste mundo a fim de alcançar
sua meta e, ao alcançá-la, gozam de certa paz por algum
tempo. Essa espécie de paz, porém, nunca sobrevive à
morte.
105
Jesus oferece uma paz diferente. "A minha paz vos dou; não
vo-la dou como a dá o mundo".34 A paz de Jesus não depende
de bênçãos merecidas. Depende inteiramente da única bênção
suprema que ele garante a todos os seus seguidores: a
oportunidade de nos achegarmos a ele, de estar com nós,
mesmo quando sua ausência é tudo que sentimos, depender
dele para fazer boa obra em nós, mesmo quando tudo que
acontece parece mau.
Um amigo descreveu ainda ontem o inferno que ele e a
mulher suportaram com seu filho rebelde. — Isso quase nos
destruiu. Não sabíamos o que estava havendo com ele, nem
conosco; não tínhamos idéia do que fazer. — Faltava-lhe a paz
que o mundo dá.
Ele foi à sua procura. — Lemos uma porção de livros,
conversamos com as pessoas mais sábias que conhecíamos e
oramos. E como oramos! Suplicamos a Deus que nos dissesse
o que fazer, que nos desse sabedoria, que nos mostrasse como
chegar até nosso filho. Não conseguíamos. Nenhuma tentativa
dava certo.
Esse é o antigo caminho — discernir quais os princípios a
seguir que trarão as bênçãos que desejamos, depois colocá-las
em prática da melhor forma possível, depois orar, confiando em
Deus para honrar nossa obediência, tornando nossas vidas
mais funcionais. De todo o coração, alma, mente e forças,
acerte as coisas para que a vida funcione. Deseje a paz
disponível neste mundo.
106
— Não adiantou —, confessou meu amigo. — Ficamos cada
vez mais confusos. Não sabíamos o que fazer. Não
conseguíamos entender a rebeldia de nosso filho. A pressão,
a culpa e a frustração eram insuportáveis. Quase destruíram
nosso relacionamento. Então desistimos.
Deus preparou o mundo para que nossos melhores
esforços de jardinagem nunca pudessem livrar-se de todas as
ervas daninhas. O anjo com a espada flamejante impediu
aqueles pais de voltarem ao Éden. Ele impede a todos nós.
— Finalmente, deixamos de ser bons pais que podiam
endireitar os filhos. —Os sonhos despedaçados criaram um
sofrimento insolúvel que os ajudou a abandonar o antigo
caminho.
— Decidimos que a única coisa a fazer era nos agarrar a
Deus, conhecê-lo melhor, ver o que nos estava separando da
verdadeira adoração, e descansar na sua soberania. Só o
Espírito pode alcançar nosso filho, e não podemos controlá-
lo. Nosso filho ainda parte nossos corações de algumas
formas, mas estamos menos envolvidos em mudar seja
nossa tristeza ou a sua rebelião. A pressão acabou. Pelo me-
nos diminuiu. O conflito de poder para tornar nosso filho
melhor é muito menos intenso. Penso que nos tornamos em
pais mais sábios. Com certeza mais relaxados. E nosso filho
está mostrando alguma evolução. Somos sinceramente
gratos. Nós o amamos, mas endireitá-lo não é mais a nossa

107
meta. Continua sendo certamente um desejo, bastante forte,
mas não é o nosso alvo.
Meu amigo está descobrindo o novo caminho. Ele descobriu o
seu desejo por Deus e está vivendo para a esperança melhor
de achegar-se a Jesus em vez da vida melhor de cuidar de seu
filho para levá-lo à maturidade responsável.
O antigo caminho é perverso, como Agostinho nos lembra:
"Quando o homem vive 'de acordo com os homens' e não 'de
acordo com Deus', se compara ao diabo."35
Mas, a pressão cessou; o novo caminho está disponível.
"Vinde a mim, todos os que estais cansados e
sobrecarregados, e eu vos aliviarei".36

ENGANO ESPETACULAR

Nunca somos mais enganados do que quando pensamos que


estamos vivendo para Deus, mas na verdade vivemos para as
suas bênçãos. Quando nos persuadimos de que nosso dever é
orar adequadamente, viver moralmente e amar
significativamente, e a vontade de Deus é nos recompensar
com as bênçãos que mais desejamos, estamos enganados.
Temos uma visão carnal da vida cristã. Vivemos separados da
graça.
C.H. Spurgeon, o grande pregador inglês, sofreu durante toda
a sua vida adulta de artrite e gota dolorosas, assim como de
108
depressão. Ele pastoreava a maior igreja de seu tempo, seus
livros eram best-sellers, e era aclamado como orador
poderoso. Como justificar a mescla de provações e bênçãos
em sua vida?
Como justificamos a mistura surpreendente de provações e
bênçãos na nossa vida? Spurgeon fazia algumas coisas
certas para ter direito a um grande ministério mas faltavam-
lhe alguns outros requisitos que o deixavam doente?
Deus provê bênçãos de ministério, se orarmos
apropriadamente, mas permite má saúde, se tivermos
ressentimento de alguém? Como tudo isso funciona
exatamente? A pergunta é muito importante se estivermos
decididos a fazer arranjos para as bênçãos que mais dese-
jamos e evitar as provações que mais tememos.

Nenhuma outra bênção é garantida

Há ordem no mundo. Em muitas áreas da vida, o que


fazemos determina ou pelo menos influencia o que nos
acontece a seguir. Olhe para cima enquanto estiver andando
e talvez tropece no meio-fio. A reação apropriada é não ficar
olhando para cima e orar por proteção. O correto é olhar para
onde vai enquanto ora. Coloque combustível em seu carro se
quiser que ele ande. Só os fanáticos religiosos viram a chave
da ignição no carro com o tanque vazio e, por estarem indo

109
para a igreja, esperam que o carro dê a partida. Deus poderia
fazer o carro mover-se, mas raramente o faz.
E as bênçãos e provações sobre as quais não temos controle
evidente, influência clara? Os maridos continuam fiéis para as
mulheres maravilhosas? A resposta é sim, mas nem sempre. A
relação entre esposa quase-perfeita e a fidelidade do cônjuge
não é linear.
Os ministérios são abençoados se orarmos, mas se
extinguem se não fizermos isso? No geral, sim. Sempre, não.
Quando as coisas dão errado, devemos supor que não oramos
devida ou suficientemente? Certa oração sempre funciona?
Essa é a suposição do antigo caminho.
Embora alcance níveis mais profundos de quebrantamento
ao dizer isto, é preciso que o diga: Sempre que nos
concentramos nas bênçãos que queremos, mesmo que sejam
bênçãos de valor, e estudamos o cristianismo para
compreender como alcançar essas bênçãos, estamos
semeando para a carne. Estamos vivendo segundo o antigo
caminho.
Falamos com freqüência do favor de Deus. E é necessário. É
uma bênção esplêndida. Um pastor amigo contou-me
recentemente como Deus favorecera a sua igreja na
comunidade. Eles haviam sido diligentes em tratar bem os
vizinhos. Deus abençoara. E eu me alegrei.
Mas, não me alegraria se esse pastor escrevesse agora um
livro intitulado: Como Sua Igreja Pode Ganhar o Favor de Deus!
110
É possível que as vendas fossem boas. Somos tão
facilmente desviados de Cristo para uma bênção à qual
damos grande valor e a uma fórmula que a introduza em
nossas vidas.
Compreenda isto: A carne sempre dá mais valor a alguma
coisa do que a Cristo. Não precisa ser pornografia; pode ser
uma família de sucesso ou uma igreja em crescimento. Mas,
o Espírito indica um tesouro maior. Ele sempre mostra Cristo.
A batalha entre afetos em competição define a guerra entre a
carne e o Espírito. Qual tesouro será nossa principal paixão?
A que damos mais valor?
O maior erro da igreja moderna talvez seja sua tendência
irreconhecível de encorajar o antigo caminho de vida. Livros,
sermões e seminários apresentam uma bênção atraente,
depois nos dizem como obtê-la. — Deus quer abençoar
vocês —, ouvimos. — Vivam de modo que suas bênçãos
caiam sobre as suas vidas.
Estamos sendo enganados. A bênção suprema que Deus
quer nos dar é a si mesmo. Nenhuma outra bênção é
garantida até o céu. As bênçãos que pedimos agora não são,
no geral, aquelas que nos conduzem a um encontro com um
Deus capaz de destruir o nosso orgulho e nos manter
confiantes e alegres em um primeiro plano.
Este engano muito propagado tem conseqüências. Vou
listar quatro:

111
1. Gera confusão e pressão. Não fui um bom marido? Foi
por isso que ela me deixou? Tentei tanto ser um bom pai. O
que fiz de errado? Fui severo demais? Permissivo demais? O
que faço para melhorar as coisas? Deus, por que não me diz o
que fazer para que as coisas funcionem? Prometo cumprir
tudo! Qualquer coisa! BASTA ME DIZER!
2. Enfraquece nossa perspectiva de Deus. Se a vida cristã
trata de bênçãos, então, quando chegam as provações,
concluímos que não estamos vivendo de maneira correta ou
que Deus não está realmente no controle. Nesta situação, pelo
menos, Satanás deve estar por cima.
Quando fiquei com câncer, disseram-me que era coisa do
diabo e que deveria envolver-me numa batalha espiritual contra
Satanás pela minha saúde. A linha de frente da guerra
espiritual, desse ponto de vista, não é entregar-me a Deus em
meio à provação, mas alinhar-me ao lado dele para derrotar o
diabo. E a medida da vitória é a saúde recuperada.
Creio que esse é o antigo caminho. No novo caminho,
resistimos à exigência carnal de que a bênção substitua a
provação e seguimos em vez disso o Espírito, aconteça o que
acontecer, até um encontro mais profundo com Deus. No novo
caminho, lutamos contra a exigência de bênçãos em nome do
conhecimento de Deus.
No antigo caminho, lutamos contra as provações em nome
das bênçãos. As nossas afeições mais enganosas estão nesta
vida. E, durante o processo, Deus e eu juntamos forças para
112
derrotar um inimigo comum. Minha vida reta liberta Deus para
fazer o que ele de outra forma não poderia fazer, destruir as
obras do diabo e nos devolver as bênçãos que Satanás
removeu. Nossa visão da soberania de Deus cai um ponto.
3. No antigo caminho, a humildade se torna uma técnica.
Humilhamo-nos e nos aproximamos de Deus na esperança
de que ele se achegará a nós; não para permitir que o
encontremos, mas com bênçãos nas mãos. A humildade se
torna uma manobra. Chegamos com as mãos vazias, mas
com um dedo apontando. Dê-nos isso! A dependência cede o
seu lugar para a metodologia.
Quando o método funciona, nos sentimos muito satisfeitos
com a nossa humildade. Compartilhamos da glória. Fizemos
algo certo, neste caso, a humildade, e Deus abençoou. Que
equipe!
Quando vivemos sob o engano do antigo caminho, as
conseqüências destrutivas surgem de muitas formas. Acabei
de mencionar três delas:
Confusão e pressão
Um Deus pequeno
Orgulho
Há mais uma conseqüência que quero mencionar.
Desenvolvemos uma visão errada dos problemas
psicológicos. A cultura terapêutica, creio, é construída sobre
uma base defeituosa. Vou passar o resto deste capítulo
sugerindo o que quero dizer. Acho que é importante.
113
Debaixo do distúrbio psicológico

Eu aparentemente freqüentei a faculdade na idade média.


Durante meus cinco anos de doutorado em psicologia clínica,
nunca me pediram para fazer um curso sobre distúrbios da
alimentação. Penso que também não ofereciam esse curso.
Algumas palestras num curso do segundo ano sobre
psicopatologia básica me familiarizaram com termos como
anorexia e bulimia, mas foi só. Li o clássico de Hilde Bruche,
The Golden Cage, e, depois de formado, sabia pouco mais a
respeito de anorexia do que a teoria de uma mulher.
Em meu segundo ano de prática privada, um médico amigo
enviou-me uma cliente jovem, 17 anos penso eu, que estava
sofrendo de uma perda de peso anormal. Peguei um exemplar
do livro Golden Cage da estante e folheei-o rapidamente para
preparar-me. Comecei a entrevista aparentando confiança. Não
tinha uma pista sequer.
Nos primeiros minutos fiquei sabendo que ela estava cerca
de 13kg abaixo do peso normal, ela corria 64km todas as
semanas e diminuía sua já fina cintura com 500 abdominais
todos os dias, e comia como um pássaro. A seguir, me disse,
com os olhos fitos no chão e uma voz dura como aço: — Sei
que vai tentar fazer com que eu engorde. Mas ainda estou
gorda. Não adianta insistir.

114
Eu tinha 29 anos na época. Aquele foi meu primeiro
encontro direto com o enigma perigoso chamado anorexia,
com uma mulher magrinha e rígida que insistia estar acima
do peso e decidida, contra qualquer pressão, a descartar-se
de mais alguns quilos.
Depois de 40 minutos sem chegar a lugar algum, ainda
sem uma pista sobre a causa de seu distúrbio, murmurei: —
Na verdade acho que você tem de ganhar algum peso.
Não tinha idéia do que ia enfrentar. Seria o mesmo que
dizer a meu filho de quatro anos: — Tente não pecar mais.
O que me esperava?
Desde Sigmund Freud, os psicólogos têm geralmente
concordado que algo deu errado no desenvolvimento de um
ser inocente. Toda criança quer sentir-se amada e valiosa,
tendo algum tipo de intuição sobre qual a bênção necessária
para satisfazer esses anseios. A experiência aguça o foco.
Traumas penosos nos ensinam o que evitar, e encontros
agradáveis moldam a nossa compreensão do que esperar e,
se possível, do que arranjar.
Dois problemas podem surgir. Se forem suficientemente
graves, nós os rotulamos de patológicos. Por causa de
relacionamentos especialmente disfuncionais, vamos em
busca de alvos irreais — tais como não-rejeição, perfeição
total, ou sentimentos constantes de prazer -ou dependemos
de estratégias ineficazes que nos levem aonde queremos ir.
Ou ambos. (Compreender os métodos ineficazes para alcan-
115
çar metas irreais é agora um campo de estudo em si. Nós o
chamamos de psicodinâmica.)
Quando um terapeuta descobre um alvo irracional de alguém
no mundo real, e quando reconhece que as tentativas de obter
alívio interno dessa pessoa são custosas demais, o processo
de cura pode começar. O processo, quase sempre, envolve um
esforço de ajudar alguém a comportar-se com maior eficácia a
fim de experimentar maior satisfação mediante alguma bênção
disponível nesta vida. É o antigo caminho.
Tenho imaginado: A vida no antigo caminho poderia ter mais
a ver com nossos problemas do que suspeitamos? Nossa
insistência em que esta vida oferece mais satisfação do que
pode, e nossa determinação de arranjar algum meio de obtê-la,
estão por trás do que chamamos distúrbio psicológico?
"Porquanto, tendo conhecimento de Deus," disse Paulo, "não
o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se
tornaram nulos em seus próprios raciocínios... Inculcando-se
por sábios, tornaram-se loucos e mudaram a glória do Deus
incorruptível" em outra coisa. "Por isso, Deus entregou tais
homens à imundícia, pelas concupiscências de seu próprio
coração... os entregou Deus a paixões infames... a uma
disposição mental reprovável, para praticarem coisas
inconvenientes, cheios de toda injustiça, malícia, avareza e
maldade."37
As pessoas vão em busca de uma fonte de satisfação
primária que não é Deus. Elas não lhe dão valor acima de
116
todos os outros tesouros. Esse é o antigo caminho. Seus
pensamentos se tornam fúteis. Suas vidas giram ao redor
dos falsos deuses de filhos melhores, boa saúde,
relacionamentos satisfatórios, ministérios eficazes —
qualquer coisa menos Deus. Essa devoção a um deus menor
liberta toda espécie de problemas. Regras egoístas. As
fontes da natureza humana ficam poluídas. Água
contaminada jorra.
Como alguém que compra por engano uma roupa do
tamanho errado, trocamos a glória de Deus por um traje que
julgamos irá ajustar-se um pouco melhor à nossa alma.
Afastamo-nos de Deus e vamos atrás de outras bênçãos.
O que fizemos pode ser simplesmente explicado:

Três resultados são possíveis:


1. Podemos experimentar bênçãos suficientes para
persuadir-nos de que estamos no caminho certo. O modo
de pensar do caminho antigo é confirmado como certo.
Estamos fazendo o que é necessário e a vida está
117
funcionando. Tornamo-nos seguidores bem-sucedidos da lei,
judaizantes modernos, fariseus felizes.
2. Uma mistura de bênçãos e provações pode manter-
nos no jogo e abrir-nos para qualquer método que torne a
vida melhor. Tornamo-nos pragmatistas. Os principios bíblicos
são distorcidos se descobrirmos vantagens pessoais na
transigencia. Ou nos tornamos legalistas, mais rigidamente
resolvidos do que nunca a fazer o que é certo para que a vida
funcione. O trabalho pode virar neurose, en-volvendo-nos em
comportamentos estranhos que nos protegem do sofrimento
interno.
3. A vida pode tornarse tão difícil, e nossos esforços
para melhorar as coisas podem parecer tão fúteis, que
desistimos. 'Entramos, então, em depressão profunda, vida
inconsciente, ou insanidade — neurose grave, distúrbio do
caráter, ou psicose.

A luz que não vemos

Com esses pensamentos em mente, leio outro versículo de


Paulo e tremo:
"O deus deste século cegou o entendimento dos incrédulos,
para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de
Cristo, o qual é a imagem de Deus".38
Os incrédulos não vêem a Cristo como seu maior tesouro.
Nem a maioria dos cristãos. Vivemos como cegos, perseguindo
118
uma luz que podemos ver - a satisfação trazida pelas
bênçãos - e não dando valor à luz que não podemos ver — a
glória de Cristo.
Poderia ser diferente. Poderíamos viver de um novo modo.
"Porque Deus, que disse: Das trevas resplandecerá a luz, ele
mesmo resplandeceu em nosso coração, para iluminação do
conhecimento da glória de Deus, na face de Cristo".39
Deus não é só capaz de remover as remelas dos nossos
olhos para que possamos contemplar a beleza de Cristo. Ele
já fez isso! Os cristãos podem agora ver Cristo como seu
maior tesouro. Podemos viver no novo caminho. "E quando
nos satisfazemos nele", diz John Piper, "estamos crucificados
para o mundo",40 e para a carne. O diabo perde seu suporte
em nossa vida. Podemos aprender a exultar, não na ex-
pectativa de uma vida melhor de bênçãos, mas na esperança
melhor da "glória de Deus".41
O trauma talvez não seja o verdadeiro culpado. Um "eu"
traumatizado talvez não seja o verdadeiro mal. Ouça Piper
novamente:
Somos feitos para conhecer e entesourar a glória de Deus
acima de todas as coisas; quando trocamos esse tesouro por
imagens, tudo fica confuso. O sol da glória de Deus foi feito
para brilhar no centro do sistema solar da nossa alma. Quando
isso acontece, todos os planetas da vida são mantidos em sua
órbita apropriada. Mas, quando o sol é deslocado, tudo
desaparece.42 No último cálculo havia mais de quatrocentos
119
sites na Internet e salas de bate-papos disponíveis para ajudar
os anoréxicos a continuar magros, ajudá-los a resistir à pressão
dos pais, conselheiros e amigos para recuperar um peso
saudável. Os sites têm nomes como Minha Amiga Ana,
Santuário Pró-Ana, aNOreXIC Wanna B e Continuem Magras,
Amigas. Um site declarou: "A anorexia é um estilo de vida ou
uma amiga, não uma doença". Outro disse, "Pró-Ana: Junte-se
a nós e torne-se PEREEITA!"
O que está acontecendo? Por que as garotas estão aos
milhares procurando hábitos alimentares destrutivos e se
apegando a eles como se fossem um pedaço de madeira num
oceano encapelado? Ouça Katybelle em um site da web:
— Sempre achei que estava sozinha e que ninguém me
entendia, portanto um dia resolvi navegar na net, procurando
alguém que fosse como eu e pensasse como eu.43
Outra escreveu:
— Para mim, a anorexia é TUDO, é a minha vida e tudo que
quero e preciso... sim, PRECISO disto. Ela se tornou uma parte
tão grande da minha vida... mas, certamente, não algo que
apenas decidi que queria... ela me dá o controle que necessito,
me dá um sentimento de realização que não recebo de
qualquer outra coisa, me faz feliz quando nada mais consegue
isso.
Quando trabalhei com minha primeira cliente anoréxica há al-
guns anos, o que tinha de enfrentar? Certamente tive de lutar
com pais controladores, com o profundo ressentimento de
120
minha cliente por estar sendo despojada de qualquer senso
de identidade separada, e com seu profundo terror de que
iria desaparecer na areia movediça de um mundo sufocante.
Porém, nenhuma dessas coisas, por mais terríveis,
obstinadas e penosas que fossem, achava-se na raiz dos
problemas daquela menina. Ela fora cegada pelo deus deste
mundo. Não podia ver a glória de Deus na face de Cristo. Em
sua mente, não havia nada pelo que viver, além do controle
que a sua anorexia lhe dava. Era isso que eu tinha de
enfrentar.
A anoréxica grita: — Para mim, a anorexia é tudo. — E nós
gritamos com ela: — Para nós, uma vida melhor é tudo. —
Pode não ser a sensação de poder que a anorexia oferece.
Pode não ser o prazer instantâneo que a pornografia traz.
Pode ser a onda de realização de ver o bem que nossos
filhos nos dão, ou a alegria silenciosa de entrar num carro
confortável que podemos comprar, ou o prazer profundo de
passar uma noite com um cônjuge muito amado, ou o
entusiasmo de um ministério crescente.
Se algo além de Cristo for a razão pela qual vivemos, se
dependemos para nossa maior alegria de algo além de ver
Cristo, se a vida melhor de bênçãos é tudo para nós,
estamos então vivendo no antigo caminho.
A pressão então está ligada. E ficamos vulneráveis a
problemas de todo tipo.

121
Mas, se vivemos segundo o novo caminho, a pressão
acabou. Podemos ainda experimentar várias provações, mas
nossas almas estarão em linha com o Plano Emanuel — Deus
será o nosso Deus e nós seremos o seu povo.
Está na hora de sentir o vento do Espírito de Emanuel.

T ERCEIRA PARTE :

V OCÊ SENTE O VENTO ?

O Novo Caminho: O Que é

POR TRÁS DE UMA PORTA MARCADA PARTICULAR

Uma revolução silenciosa está a caminho, e os que fazem


parte dela não são, em sua grande maioria, membros de igreja.
São decididamente descrentes. Não vivem para melhorar suas
vidas, quer fazendo boas obras, orando mais, ou se oferecendo
para servir no comitê de missões.
Eles não fazem tudo que podem para afastar-se do
sofrimento. Vivem no meio dele. E vivem assim com alegria.
Não são impelidos pelo seu desejo de sucesso, como quer
que o definam. Querem sucesso, mas não é o seu ídolo, e têm
suficiente percepção para saber quando é.
Os revolucionários do novo caminho compreendem o que os
conformistas do antigo caminho não conseguem. Eles sabem
que carecer da glória de Deus não consiste apenas de sua

122
impaciência, murmuração, inveja ou concessões sexuais.
Com um quebrantamento que varre toda a confiança em
seus recursos para fazer com que coisas boas aconteçam,
eles compreendem que carecer da glória de Deus significa
que "nenhum de nós confiou nele e o valorizou como de-
víamos. Temos procurado satisfação em outras coisas e as
temos tratado como mais valiosas do que Deus".44
Eles reconhecem o antigo caminho pelo que realmente é,
uma filosofia de vida e uma abordagem à vida que pensa que
Deus deveria fazer com que as coisas andem suavemente e
pouco se importa que ele se revele a quem quer que seja.

Ver e saborear Jesus

Os cristãos são de dois tipos: os que confiam em Jesus


para levá-los ao céu, ao mesmo tempo que confiam nele
para prover uma vida de bênçãos até que cheguem ali, e os
que confiam em Jesus para levá-los ao céu e descobrir que o
que desejam no momento é "ver e saborear Jesus Cristo".45
Estes estão na verdade dispostos a perder todas as bênçãos
e sofrer qualquer indignidade, se isso os levar a um relaci-
onamento mais profundo com Jesus.
A segunda variedade de cristãos — os revolucionários do
novo caminho - se decepcionou com a abordagem do antigo
caminho da vida. Problemas inesperados, que não podem
ser traçados a uma falha específica da sua parte,
123
destroçaram seus sonhos de como suas vidas cristãs viriam a
ser. Sofrimento sem sentido, do tipo que não têm garantia de
evitar no futuro, os confrontou com uma escolha entre duas
respostas:
1. Abandonar a Deus. De que ele adianta quando a vida
desmorona? Era seu dever verificar que isso não acontecesse.
Ele falhou. É uma mercearia com as prateleiras vazias,46 que
não atrai o homem faminto. Se não estocar o que precisamos,
ou se não tivermos dinheiro para pagar o seu preço pelo que
está disponível, por que nos preocupar com ele? Para alguém
que acabou de perder o emprego, que chora todas as noites de
solidão sem alívio, cujos sonhos mais importantes foram
despedaçados, um Deus que declara a sua benevolência não
vale nada.
2. Abandonar-se a Deus, humilhar-se o suficiente para
deixar de dizer o que ele deveria estar fazendo em sua
vida, comprometendo-se com o que quer que ele esteja
fazendo, e crendo que é bom.47
Os cristãos que vivem segundo o novo caminho não passam
pela mercearia sem nada e vão para um centro de
conveniência bem estocado ou a um restaurante fast-food. Eles
entram na mercearia, olham por um momento as prateleiras
vazias, depois descem pelo corredor até uma porta na qual
está inscrita a mensagem de passagem particular e passam
por ela corajosamente na expectativa de encontrar do outro

124
lado alimentos de melhor qualidade aos existentes do lado de
cá.
Quero apresentá-lo a alguns desses revolucionários do
novo caminho:48
— No ano passado, meu casamento de 31 anos foi
destruído por meu marido adúltero. Alguns meses mais tarde,
recebi um diagnóstico de câncer de mama. Dois dos meus
três filhos se afastaram de Deus. E minha situação financeira
é grave.
— Mas Deus — esse é o slogan dessas pessoas: Mas
Deus — nunca foi tão real para mim. Encontrei um ponto de
comunicação tão completamente transparente com ele que
não trocaria por todo o alívio que o mundo pode oferecer.
Tenho medo de novos sonhos destroçados, mas sei agora
que existe um caminho melhor, uma relação melhor do que
qualquer outra imperfeita neste mundo, um sonho mais
elevado, um amor mais perfeito do que posso pedir ou
imaginar, na pessoa do meu Senhor Jesus.
Um segundo revolucionário diz: — Tantos sonhos foram
despedaçados nos últimos seis anos que é difícil contar.
Todavia, há algo novo - melhor — acontecendo no meu
coração.
Ouça um terceiro, este querendo juntar-se à revolução,
mas sem saber como inscrever-se:
— Divorciei-me duas vezes e lutei terrivelmente durante
anos. Procuro a comunidade espiritual de que você fala em
125
seus livros,49 e quero a intimidade com Jesus que descreve.
Estive deprimida e estou lutando para superar o sofrimento,
desapontamento e solidão. Deus tem sido bastante silencioso.
— Minha comunidade quer que eu tome remédios, faça
terapia, e/ ou encontre a esperança e a paz que não sinto nas
promessas de Deus. — Suspeito que a esperança e a paz que
seus amigos lhe desejam pertençam ao antigo caminho;
querem que ela se sinta bem, mais do que conheça a Deus.
Ela confirma minhas suspeitas enquanto continua:
— Querem que me sinta melhor. Já tentei a maioria dessas
coisas e também encontrar a "felicidade" temporária ou pelo
menos o alívio da dor que o mundo oferece. NÃO QUERO
MAIS FAZER ISTO! Quero viver o novo caminho de que fala,
mas não sei como.

Só a família além deste ponto

Dedico o restante deste livro para o número crescente de


pessoas cuja jornada pela vida tem sido profundamente
decepcionante. Você talvez se sinta como Oswald Chambers
quando disse: — Se o que senti até agora é tudo na vida cristã,
a coisa toda então é uma falsidade.
Sua vida não está funcionando, e você está perdendo a
esperança de que isso jamais acontecerá. Está preocupado
com o enfraquecimento da sua fé, com a perda de confiança
em Deus. Considere a possibilidade de sua fé e confiança, que
126
desvanecem, precisarem enfraquecer mais ainda, até
desaparecer completamente; que a sua fé está nas
promessas que Deus nunca fez; que o deus no qual está
perdendo a confiança é um deus que não existe, um deus
que não poderia ser amoroso se lhe desse algo menor do
que ele mesmo e esperasse que ficasse feliz com isso.
Essa fé precisa terminar. O deus em quem colocou esse
tipo de confiança não é o Deus da Bíblia.
Mesmo quando as coisas vão bem, quando a fé mal
direcionada e a confiança mal colocada parecem válidas,
você sente na alma uma ânsia por algo mais. Seu casamento
e filhos, seus amigos e igreja, a saúde, o emprego e o
ministério, embora tenham sido, todos, muito bons, não o
satisfizeram. Você recebe as bênçãos que lhe são dadas
como misericórdias de Deus e fica agradecido. Alegra-se
nelas, e assim deve ser. (Anedônia, a perda da capacidade
de gozar com o que dá prazer, é uma evidência de distúrbio e
não de maturidade, e certamente, não de maturidade
espiritual.) Mas, em meio ao prazer gozado, você não pode
suprimir a pergunta: "Isso é tudo?". Está desiludido com o
vazio das bênçãos.
De qualquer modo, quer mediante o vazio das bênçãos
quer a angústia das provações, você está decepcionado. A
dor não vai embora. Algo está faltando, mas é difícil
descobrir. A dor continua e se aprofunda. Fantasias
pornográficas, viagens dispendiosas, sobremesas deliciosas,
127
ministério frenético, ou endurecimento cínico, oferecem mais
alívio do que a oração. Ou não oferecem alívio, e você se sente
miserável.
Você quer um novo estilo de vida, mas não sabe bem qual é,
e não tem certeza de como vivê-lo.
Convido-o a juntar-se a mim enquanto viajamos por uma vida
profundamente decepcionante, uma vida cheia de
oportunidades para o prazer superficial e temporário, e repleta
de experiências imprevisíveis de tristeza profunda e duradoura.
Ande comigo pela mercearia da existência neste planeta e note
que há apenas umas bolachas endurecidas nas prateleiras.
Vamos, porém, manter a cabeça erguida e os olhos voltados
para a frente. Posso ver a porta com a inscrição de passagem
particular. Por baixo dessa palavra proibitiva posso ver em
letras impressas: Só a família além deste ponto.
Vamo-nos lembrar de que o sangue de Jesus abriu um novo
caminho, um caminho vivo - não para um método de fazer a
vida funcionar, mas para a presença de Deus.50 Não nos
esqueçamos de que Cristo morreu pelo pecado não para tornar
nossa vida aqui agradável, mas para nos levar a Deus,51 e se
nos achegarmos a ele, ele se achegará a nós.52
Há um novo estilo de vida. Ele não aceita nada menos do
que os melhores alimentos. Os revolucionários do novo
caminho crêem que há água viva que realmente sacia a
verdadeira sede. Portanto, alegremente, deixam passar a
oportunidade de engolir o xarope doce que os deixa mais
128
sedentos. O novo caminho reconhece que o corte de carne
na geladeira do açougueiro é alimento que só serve para
cães, comparado à fatia que nos espera por trás da porta que
tem a inscrição advertindo ser entrada particular.

CHEGANDO SUJO E DANÇANDO

Comecei este livro sugerindo que cada um de nós, em dado


momento, está viajando por um dos dois caminhos da vida: Ou
estamos sob pressão para fazer alguma coisa certa, a fim de
que a vida funcione, ou estamos vivendo para a melhor
esperança de conhecer Cristo. Um espírito de arrogância toma
conta do primeiro caminho — pensamos que podemos fazer
coisas certas o suficiente para merecer que coisas boas
aconteçam. A humildade caracteriza o segundo — tudo é sobre
Cristo. Ele fez o que nunca poderíamos ter feito.
No segundo caminho, o novo caminho, nos achegamos a
ele como estamos, com completa transparência. Embora não
nos sintamos pressionados para ser melhores ou diferentes,
desejamos intensamente a santidade pessoal mais do que o
alívio do sofrimento pessoal, e nos sentimos quebrantados ao
ver como estamos distantes dela. As lágrimas pelo nosso
egocentrismo e arrogância queimam mais em nossos olhos
do que as que derramamos por causa das provações.
Nós nos aproximamos da cruz de maneira humilde, grata,
confiante e ousada porque Deus irá achegar-se, não para
129
destruir-nos, mas para abraçar-nos, transformar-nos (algumas
vezes penosamente) e nos usar para os seus propósitos.
Mantemo-nos próximos e confiantes, mesmo quando não
temos um traço de evidência de que ele está se movendo
cordialmente em nossa direção ou que nossa santidade está
aumentando significativamente. Continuamos a caminhar em
direçao à luz, quando tudo que podemos ver é escuridão,
porque não temos para onde ir. Eis a nossa dependência
absoluta.

Uma paixão suprema

Quer viajemos pelo antigo ou pelo novo caminho, uma certa


paixão abastece o nosso movimento ao longo da estrada.
Considere comigo o que é essa paixão. Se examinarmos a
fundo o nosso coração e se fecharmos os olhos por tempo
suficiente para tudo o mais, vamos descobrir um motivo básico,
um desejo supremo, um impulso constrangedor ao redor do
qual nossa vida gira. O que mais desejamos se torna o centro
de nossas vidas. Como membros de tribo dançando ao redor
de um ídolo, nossos movimentos são todos orientados ao redor
do objeto de nosso desejo.
Vamos chamá-la de paixão número um. Não é a única em
nossas vidas, mas quando uma escolha deve ser feita,
dançamos ao redor da coisa que nos atrai mais. Todos somos

130
leais adoradores de algo. Deus só faz uma pergunta: — Sou
eu a sua suprema paixão ou é outra coisa?
No antigo caminho, a paixão que governa surge de várias
formas, mas tem sempre como alvo seu valor central - uma
vida melhor agora! Algo precisa acontecer — alguma emoção
precisa ser sentida, algum acréscimo em nosso senso de
valor pessoal deve ser experimentado, alguma vibração deve
deleitar-nos, alguma bênção deve ser concedida — antes,
que a vida valha a pena ser vivida. Uma mulher me disse
depois que preguei sobre este assunto: — Por que devo
aproximar-me de Deus se ele não me deu o que eu queria?
— Ela ainda não compreendera que o que seu coração mais
queria realmente era o próprio Deus - e é isso que ele anseia
dar-lhe.
No novo caminho, as bênçãos são esperadas, a cura é
objeto de oração, famílias felizes são edificadas, sentimentos
de maravilha e alegria em servir a Deus são universalmente
esperados, e quaisquer bênçãos que jorrem sobre nós são
alegremente comemoradas — embora nada, absolutamente
nada, seja exigido. A paixão por uma vida melhor, embora
real e profunda e sentida sem qualquer sentimento de
vergonha, não está no centro. Uma vida melhor não é o
ponto; ela não governa nossos atos; não é a primeira paixão
no coração de um revolucionário do novo caminho.
Dançamos ao redor de um Deus diferente.

131
Os revolucionários do novo caminho são geridos por uma
paixão suprema, o anseio de Deus, de encontrá-lo, de
conhecê-lo, deleitar-se com ele e revelá-lo aos outros. Não
exigimos nada, mas confiamos em Deus para o melhor que ele
tem a dar. Mesmo em circunstâncias agradáveis ou difíceis, por
exemplo, quando um filho tenha acabado de anunciar que vai
deixar a esposa para viver com um homem ou a bancarrota
prevista é evitada por um bom negócio inesperado, a paixão
por Deus continua a imperar.
A satisfação desse desejo é outra questão. Podemos desejar
Deus, mas experimentar Deus não é uma realidade previsível.
Podemos arranjar condições favoráveis para encontrar Deus,
mas não temos controle sobre a sua presença ou ausência.
Os seguidores do novo caminho compreendem que são
apenas iniciantes na Escola das Delícias Divinas.
Os revolucionários do novo caminho aceitam seu lugar no jar-
dim-de-infância; compreendem que não sabem muito, mas têm
ânsia de aprender. São concentrados. Sabem o que procuram.
Meses no jardim-de-infância, ou anos, ensinam apenas um
pouco do que significa encontrar o Deus triúno.
Algumas vezes conseguem ouvir algo, ver algo. O recreio é
suspenso. A oportunidade de ouvir a voz de Cristo, de obter
outro vislumbre da sua beleza, os mantém nas cadeiras. A
antecipação envia arrepios pela sua espinha. Esse som e esse
relance os enchem de alegria. Por um momento apenas.

132
As distrações os afastam. A criança ruidosa na carteira ao
lado, talvez um membro do mesmo grupo pequeno, lança um
ataque ino-lensivo contra eles. Surge uma dor de cabeça. A
vida na escola fica difícil. Como alunos lutando com a
aritmética, eles se esforçam cada vez mais; às vezes,
conseguem, às vezes, não. Quando fazem isso, passam para
questões mais difíceis, e o ciclo continua.
Continuam em suas carteiras. Outro vislumbre talvez
apareça!
No primeiro dia do primeiro ano, aprendem a descansar,
não em tapetes trazidos de casa e colocados no, chão frio da
classe, mas no escritório do Diretor. Chega o aviso: — O
Diretor quer vê-lo. — Pânico! Coração saltando de terror! O
que fiz de errado? O seguidor do novo caminho reúne toda a
sua coragem para andar pelo corredor e bater na porta com a
inscrição: Diretoria. Uma voz se faz ouvir: — Entre. — Com o
nariz escorrendo, rosto riscado de sujeira e roupas rasgadas,
o primeiranista entra.
— Você parece ótimo. Que bom vê-lo! — O Diretor abraça
o aluno e começa a cantar, cheio de emoção por estarem
juntos — Diretor e aluno. O aluno se olha no espelho
pendurado na sala da diretoria. Seu nariz está seco e seu
rosto limpo, suas roupas são novas. Ele não tem idéia de
como isso aconteceu.

133
Como eu poderia amá-lo mais?

Os revolucionários do novo caminho encontram Deus porque


é isso que eles mais desejam. Eles constroem toda a sua
esperança de encontrar Deus sobre a cruz, mais exatamente
naquele que ali morreu. Parece extremo, talvez pouco realista,
mas os seguidores do novo caminho querem conhecer Deus
mais do que qualquer outra coisa. Crianças adoráveis que os
amam; amigos íntimos em quem podem confiar; louvor pelo
que fazem; sucesso em relação à família, emprego e ministério;
uma experiência de aventura e prodígio em sua vida — todos
os desejos, mas tudo paixões em segundo plano. Nenhuma
bênção significa mais para essas pessoas do que a bênção do
encontro.
Para os seguidores do novo caminho, os empurrões do
Espírito se tornam reconhecíveis. O vento espiritual estica suas
velas. Descobrem o seu centro; abraçam a sua identidade
como espiritual, pessoas dirigidas pelo Espírito; deixam de
definir a si mesmos pelo seu reflexo nos milhares de espelhos
das expectativas de outros.
Quando falam, ouvem a si mesmos como ovelhas balindo. Só
então podem distinguir a voz do Pastor.
Com o passar do tempo, depois de tentativas embaraçosas e
desajeitadas, começam a mover-se segundo o ritmo do
Espírito. Sentem seu empurrão da maneira como uma mulher
sente a direção de seu parceiro de dança. Fixam os olhos em
134
Cristo, como a mulher que dança fita com adoração aquele
em quem confia para estabelecer o passo. E eles se vêem
dançando na direção de um trono cheio da glória do mais
puro amor. O Espírito os faz ajoelhar. O Filho sobe os
degraus e fica ao lado do trono, à direita. O Pai fala: — Bem-
vindos à minha presença. Venham como uma criança e
sentem-se no meu colo. —Alegria! Alegria! Alegria! Paz!
Amor! Contentamento inexprimível! Um encontro com Deus!
Uma prelibação do que virá. Uma amostra nunca antes
saboreada pelos seguidores do antigo caminho.
Os seguidores do novo caminho dançam com Cristo ao
ritmo do Espírito até a presença de Deus. Mas, eles não
dançam especialmente bem. Algumas vezes tropeçam em
seus passos. Outras, perdem o ritmo e pisam nos dedos do
Senhor.
Um bom amigo estava morrendo de câncer. Seus dias
estavam contados, e ele sabia disso. Os amigos também
sabiam. Mas, só ele podia sentir a agonia de suas dores
físicas e a angústia de sua alma de experimentar Deus em
meio à negativa de cura.
Deus podia curar o câncer. Se não fizesse isso, por que
não aliviava a sua dor? Se até mesmo essa bênção fosse
recusada, ele iria então certamente garantir uma sensação
reconfortante da sua presença.
Mas isso não aconteceu. Nada. A experiência
simplesmente não houve. Sua paixão número um era Deus,
135
mas ele se abandonara a um Deus que não conseguia
encontrar. Suas esperanças frustradas revelaram como era
forte a sua paixão número dois. Ele queria uma vida melhor,
apenas uma migalha de bênção.
A que possível propósito tal agonia intensa poderia servir?
Com lágrimas amargas, pensando que imitava Cristo, ele
muitas vezes suplicou a Deus por algo. Se não a cura, pelo
menos o alívio. Se não o alívio, então a experiência de Deus.
Alguma coisa!
— O que devo fazer? Como devo orar? O Senhor diz que
quer abençoar-me! O que estou fazendo de errado? Satisfarei
os seus termos. Apenas me diga o que fazer!
O pensamento lhe ocorreu: Se Deus existe, deve ser o diabo.
Talvez, não exista. Talvez, tudo não passe de uma fábula,
inventada astuciosamente pelos líderes religiosos para que
pudessem apossar-se do poder e ganhar algum dinheiro
enquanto isso.
Ele ficou indo e vindo entre os dois caminhos. As paixões
número dois, às vezes, governavam. Tentou descobrir o que
fazer para obter alguma evidência de que Deus estava com
ele. Nada aconteceu. Nada deu certo. Tinha feito tudo que
sabia, inclusive dizer a Deus que estava grato pela cruz que
precisava carregar. Tentou mostrar que era sincero. Deus não
deu sinais de vida. A lei da linearidade falhou. Sua falha o
levou de volta ao novo caminho, à dependência radical da lei
da liberdade. Veja como aconteceu.
136
Certo dia, vários amigos apareceram para orar. O primeiro
a orar disse: — O Senhor, dê ao nosso irmão a paz que só o
Senhor pode dar. Pedimos a cura. Pedimos conforto e
descanso físico. Acreditamos que o Senhor pode realizar um
milagre que irá confundir os médicos. Faça isso para a sua
glória! Mas, se não for essa a sua perfeita vontade, pedimos
então um espírito de gratidão. Encha nosso irmão de
agradecimento pela sua bondade para que a sua paz reine
no coração dele. E, Senhor: —
Meu amigo não pôde mais suportar. Ele interferiu na
oração do amigo. — Deus —, interrompeu ele —, no
momento eu o odeio. Gostaria de sentir amor profundo e
gratidão pelo que está fazendo, mas não sinto. Estou
realmente perturbado e furioso. Não sei outro meio de
aproximar-me do Senhor, mas, sinceramente, não quero
mais participar de nenhum jogo. Não posso mais. Vou
achegar-me como estou. Sei que é terrível. — Nariz
escorrendo, rosto sujo, roupas rasgadas, ele entrou na sala
do Diretor.
Levantou-se então da cadeira, com dificuldade, com ajuda,
e disse aos amigos: — Vou para a cama agora, estou
cansado.
Depois de algumas semanas, já prestes a falecer, ele
perguntou a seu mentor espiritual: — Será que sentirei mais
amor por Jesus quando eu o vir do que sinto agora?
O homem mais velho observou: — Bem, sim, acho que sim.
137
Retendo as lágrimas, o homem agonizante, ainda sofrendo,
disse: — Não sei como isso é possível.
Ele aprendera a dançar. Fora levado pelo parceiro à
presença de Deus. Sua paixão número um tinha sido satisfeita,
talvez só por aquele momento. Esse é o novo caminho.
Se faltasse poder ao sangue de Cristo, o anjo da morte nos
mataria se disséssemos que odiamos a Deus. Como
ousaríamos falar assim ao Deus Todo-Poderoso? Arão não
podia sequer entrar na presença de Deus sem primeiro banhar-
se e colocar roupas especiais. Era também necessário que se
fizesse uma cortina de fumaça para ocultar a tampa da arca. O
lugar em que Deus se revelava. Arão não teve permissão para
ver a glória de Deus. A visão o teria matado.
E agora meu amigo diz a Deus que o odeia — e Deus
derrama amor em seu coração. O novo caminho foi aberto para
a presença de Deus pelo sangue de Cristo. Sem isso, faríamos
bem em guardar distância.
Lembro-me, quando tinha cerca de nove anos, de dizer à
minha mãe que a odiava. Ela recusara-se a deixar que eu
fosse brincar até terminar as lições. Não gostei das regras dela
e, então, expressei-me.
Uma surra era merecida. Em vez disso, ela olhou para mim.
Jamais me esquecerei dos seus olhos. Estavam cheios de
mágoa profunda e de profunda ternura. Começou a chorar.
Naquele instante olhei para além do meu egoísmo e vi o
coração de minha mãe. Comecei a chorar: — Mamãe, não
138
odeio você —, gritei. — Amo você. Amo mesmo! Estou tão
contente porque é minha mãe! -Naquele momento não sabia
como poderia tê-la amado mais.
Os revolucionários do novo caminho crêem na graça
radical. Eles sabem que não há outro meio de tornar-se santo
além de ser primeiro declarado santo, depois de desejar ser
santo e eventualmente por tornar-se realmente santo.
Apresentam-se, então, como estão — insolentes, sujos,
choramingando, exigindo — mas, se aproximam. De que
outra forma podem chegar? É isso que sabem que são. Mas,
comparecem humildemente. Sabem que não são atraentes.
Querem Deus — ele é o seu desejo supremo, sua paixão
número um; dependem da graça — ela é a sua única
esperança. É a nossa única esperança. É suficiente. Então
vamos.
E Deus se aproxima — no seu tempo, nunca em resposta
automática ao nosso pedido. Mas se aproxima. O Espírito
nos envia à sala do Pai. O Filho nos leva até lá. Quando
entramos, percebemos que nosso nariz está escorrendo,
nosso rosto está sujo, e nossas roupas rasgadas. Não vemos
ainda que Cristo nos limpou durante o caminho. O Pai olha
para nós, radiante de alegria, como se fôssemos os filhos
mais lindos do universo.
Compreendemos então: Somos tão belos para o Pai como
Cristo, porque estamos nele! O Pai canta. E caímos com

139
gratidão a seus pés. Cheios de alegria. O Filho toca nosso
ombro. Ficamos de pé.
Como eu poderia amá-lo mais?

Só por uma coisa

Falta ao antigo caminho a bênção principal de ver a Deus.


Ele exige fingimento da nossa parte. Enxugamos o nariz,
lavamos o rosto e costuramos o rasgo em nossas roupas -
tornamo-nos apresentáveis. Dizemos então a Deus: — Veja o
que fiz. Fiz o que era cerro. Meu nariz está limpo. Dê-me agora
a bênção que desejo.
Outro amigo está fazendo a mudança do antigo para o novo
caminho. Ele tentou tornar a vida funcional, mas a lei da
linearidade falhou. Sonhos que lhe importavam tanto acabaram
destroçados. Ele escreveu estas palavras em seu diário e me
deu permissão para compartilhá-las com você:
Minha tendência é ver a vida como prescritível. Quero
crer, quero desesperadamente crer, que se fizer "as coisas
certas", tudo irá bem. Quer na posição de pai, no emprego,
casamento, o que quer que seja — espero por um
relacionamento de causa e efeito na vida.
Vi isso especialmente neste último ano. Em meus piores
pesadelos, nunca esperei que aquilo que aconteceu viesse
a acontecer em minha família. Tantas vozes me disseram
para ver meu fracasso como pai, marido e cristão, como
140
uma explicação do que aconteceu pelo que não fiz de
certo. Se tivesse feito ISTO, então AQUILO nunca teria
acontecido.
Passei a compreender que fiz um trato com Deus. Apro-
ximei-me arrogantemente dele, não para conhecê-lo, mas
para ostentar meus esforços. — Deus, li os livros. Segui
os princípios. Fiz devoções familiares. Disse a meus filhos
que os amava, assisti aos jogos deles, às suas peças de
teatro e aos seus recitais!
Depois apresentei minhas listas a Deus e disse: — Fiz
tudo isto, QUERO AGORA A RECOMPENSA! — Meu
punho fechado apontava para a sua face. Eu não o vi.
Pensava que estava orando por bênçãos.
De acordo com muitos padrões, dei-me bastante bem.
E isso criou expectativas — ótimos filhos, netos lindos,
celebrações escolares como todo o mundo. A lista conti-
nua. A realidade raramente satisfaz minhas expectativas.
Fiz uma porção de coisas certas, mas a minha vida não
está funcionando muito bem. Tudo o que sei fazer agora é
aproximar-me de Deus, suplicar que me permita conhecê-lo
melhor. — Deus, quero achegar-me ao Senhor. Quer queira
abençoar a minha vida segundo o meu desejo quer não, só
peço uma coisa: Por favor, Deus, achegue-se a mim. Não
podemos fazer a vida funcionar — mas, a pressão acabou. A
desilusão nos transformou. Não queremos mais a vida
funcional, tanto quanto queremos a ele.
141
Um caminho se abriu, o novo caminho do Espírito, pata irmos
a ele e dançarmos.

COLHENDO O QUE SEMEAMOS

Quero compartilhar duas lições que estou aprendendo


enquanto continuo em meu comprido jardim-de-infância. Com
essas duas lições, minha alimentação pode estar mudando do
leite para a carne. Posso estar quase pronto para entrar na pré-
escola.
A primeira é esta:
O Espírito de Cristo está sempre nos levando na direção do
novo caminho, se ainda não estivermos nele, e sempre nos
fazendo avançar nele se estivermos. Em cada circunstância,
em cada momento, ele incentiva nosso afeto por Deus até
torná-lo o sentimento mais forte em nossos corações.
Quando um ex-marido envenena a mente do filho
adolescente contra a mãe, ela tem todo o direito de gritar:
"Injustiça!" Foi ela que trocou cada fralda, trabalhou em dois
empregos porque ele não conseguia sustentá-los, levou seu
garoto a todos os jogos e ficou lá para aplaudi-lo sempre que
podia; passando noites incontáveis ensinando gramática e
matemática, a fim de prepará-lo para as aulas do dia seguinte.
Ela não pode estar em falta por sentir-se terrivelmente
magoada. O que aconteceu foi injusto e dói, talvez ainda mais
do que o divórcio. Quando o segundo sapato cai, no geral
142
parece pior do que o primeiro. Seu desejo de restaurar a
relação com o filho merece apoio. A não ser que chegue ao
nível de uma paixão número um.
Se isso acontecer, e quase sempre acontecerá, ela vai
estar palmilhando o antigo caminho. Talvez, não se dê
conta, mas estará seguindo outro espírito e não o de Deus.
O Espírito de Deus será apagado. Não haverá paz, nem
descanso, até que a vida melhor que exige seja obtida. A
paz e o descanso vão ser, então, os concedidos pelo
mundo.
Quando algo terrível acontece em nossa vida, a primeira
pergunta que nos vem à mente é geralmente esta: — O que
devo fazer?
— Para conseguir o quê? — pergunta o Espírito.
— Para ter de volta a afeição de meu filho, é claro. Nunca
sofri tanto. Preciso saber o que é necessário para que isso
aconteça.
Os conselheiros e amigos que oferecem compassivamente
idéias para alcançar esse objetivo estão trabalhando contra
Deus. Os orientadores espirituais acertam mais quando
encorajam ouvir em silêncio o que o Espírito pode estar
dizendo. Eles o ouvem sussurrando para a mãe aflita e
querem que ela também escute suas palavras.
— Conheço o seu sofrimento. O Filho passou por isso
quando o seu povo se voltou contra ele. Mas, ele sentiu
contentamento ao ficar próximo ao Pai. Deixe-me levá-la à
143
presença dele. Ele é maravilhoso e tem poder para libertá-la, a
fim de amar seu filho.
A Palavra de Deus talvez penetre no coração da mãe para
que ela o ouça dizer: — Você vai ser "minha propriedade
peculiar".53 Ele nos oferece comunhão quando sofremos, para
aprendermos o valor superior da intimidade em comparação
com a bênção.
O Espírito está constantemente nos incentivando em direção
ao novo caminho e para longe do velho, em direção à melhor
esperança, e nos impedindo de exigir a vida melhor. Esta
primeira lição que estou aprendendo inclui uma verdade radical
e maravilhosa: Buscar meu mais profundo prazer e mover-me
no ritmo do Espírito faz com que eu siga numa mesma direção
— para Cristo! O interesse pessoal e a adoração se unem
quando a adoração vem em primeiro lugar.

Movendo-se para a direita

Imagine-se entrando num shopping center grande e


desconhecido. A primeira coisa que procura é uma lista de
endereços. Seus olhos examinam os números e lugares até ver
um sinal vermelho com as palavras: Você Está Aqui.
Onde essa mãe se encontra? Está furiosa com o ex-marido,
sozinha em suas responsabilidades e destruída com a rejeição
do filho. Em que direção deve ir? Ela pergunta a si mesma: —
O que faço agora?
144
A sua esquerda, há uma grande loja de departamentos
chamada a vida melhor. A lista indica que essa loja oferece
"relacionamentos restaurados". O coração dela salta. Olha
cuidadosamente o mapa e grava as direções.
Antes de ir à loja, por razões que não consegue explicar,
examina outra vez a lista. Seus olhos vão para a direita.
Escondida num canto há uma pequena loja chamada de a
melhor esperança. Ela anuncia: "O melhor cardápio para a
sua alma". Por alguma razão, a mulher cede a um forte
estímulo e se dirige para a melhor esperança.
A imagem pode ser ilustrada como segue.
Primeiro o antigo caminho:

Você Está Aqui


A VIDA MELHOR 
Relacionamento (Mãe com filho que a
restaurado com o rejeita)
filho "O que devo fazer?"

Você Está Aqui


 A MELHOR
ESPERANÇA
(Mãe com filho Relacionamento mais
que a rejeita) profundo com Deus
"Venho como
estou"
145
Há, porém, mais no novo caminho do que apresentar-se a
Deus. A mãe ainda tem de tratar com o filho:

Ao mover-se para a direita, quando esta mãe compreende a


diferença entre as paixões número um e número dois, quando
compreende que seus desejos mais fortes são conhecer,
glorificar e ter gozo em Jesus Cristo, ela ouvirá o Espírito guiá-
la para falar com o filho de maneira que reflita Cristo.
A luta pelo poder estaria terminada. Sua exigência de que o
filho a ame, disfarçada de preocupação com ele, se dissolveria.
Ela passaria a amar verdadeiramente o filho.
E ele seria confrontado pela sua liberdade. Libertado de uma
determinação de resistir ao controle, teria mais acesso aos
anseios do seu coração, sepultados sob a sua confusão e ira.
O Espírito poderia mover-se mais profundamente em sua alma
para realizar uma obra de valor.

146
A mãe poderia descansar. A pressão para calcular o que
fazer cederia lugar à liberdade, liberdade de expressar
sabiamente a seu filho o seu coração governado pelo
Espírito. Saberia o que fazer sem que um especialista tivesse
de ensiná-la.54 Continuaria não tendo idéia de como
conseguir a vida melhor de ter um filho mudado, embora
continue a desejar e orar por essa bênção. Esse, porém, não
seria mais o seu alvo. O Espírito a libertaria para glorificar a
Deus, revelando seu coração já transformado na presença do
filho.
Tal libertação poderia tomar muitas formas, algumas
inesperadas e outras insensatas, segundo os pensamentos
do antigo caminho. Talvez uma censura: — Filho, sua atitude
está errada. Você tem um espírito ingrato. — Ou poderia abrir
a alma para dizer: — Sofro muito com o modo como está me
tratando. — Posso imaginar uma verdade que seria
pecaminosa se dita com o espírito errado, mas não se falada
na sabedoria e amor do Espírito: — Seu pai o enganou.
Penso que está na hora de ouvir mais sobre a história do
nosso divórcio.
O segredo não está na escolha das palavras. Está na
energia com que são ditas. A mãe está ansiosa para se
chegar ao filho ou para representar e agradar a Deus? Está
tentando fazer algo acontecer ou apresentar o que possui
como uma dádiva de amor, talvez um amor inquebrantável,
ao filho?
147
Se estiver seguindo o Espírito até a presença de Deus, se
ouvir as boas-vindas do Diretor e sentir o seu abraço antes que
fale com o filho, nenhuma de suas palavras terá como objetivo
controlar, manipular, pressionar, ou vingar-se. Cada uma
conterá um espírito de perdão, misericórdia, descanso sem
ameaças e graça.

Nossos frios corações são aquecidos

O Espírito sempre guia os filhos de Deus numa boa direção


— primeiro em direção a Deus na adoração, depois em direção
a outros em amor como o de Cristo.
Essa é a primeira lição. A segunda é esta:
Minha ânsia de conhecer Cristo sempre parece mais fraca do
que o meu desejo de bênçãos. Se isto não mudar, não viverei
constantemente o novo caminho. Devo, portanto, pensar com
disciplina em como meu desejo por Cristo pode ser incentivado.
Minha tendência é para uma vida superficial. Se a vida
apresentar apenas alguns tropeços, especialmente se forem
pequenos, não me importo particularmente se vier conhecer
bem a Cristo ou não. Penso que ele está fazendo seu dever de
me abençoar e eu o meu de viver com responsabilidade. Em
vez de uma corça suspirando pela corrente de águas, sou mais
como um urso hibernando com as patas sobre o estômago. O
filho pródigo teria voltado, se seu dinheiro não se acabasse?
Como alguém disse: O arrependimento começa na barriga.
148
As bênçãos podem ser perigosas. Nos dias de Amós, Israel
gozou de prosperidade. Em vista de a vida estar correndo
bastante bem, eles supuseram que quando Deus viesse,
seria para cumprimentá-los e julgar seus vizinhos pagãos.
Estavam errados.
Mas, é assim que geralmente pensamos. Supomos que o
crescimento da igreja e grandes vendas de livros são uma
prova da bênção de Deus. Podem, no entanto, ser apenas
resultado de bom marketing e apelo carnal.
Minha vida no momento está sendo ricamente abençoada.
Há provações, mas tenho suficientes fontes de consolo para
experimentar certo nível de felicidade sem conhecer melhor a
Deus do que já conheço. Nem sempre vejo necessidade de
instigar minhas paixões número um quando as de número
dois estão bastante satisfeitas.
Quando lhes é negada satisfação, é fácil reagir com
desalento ou fortalecer minha decisão de solucionar qualquer
problema que tenha surgido. Ambas as reações apagam o
Espírito. Elas me levam ao antigo caminho.
Em meio a bons ou maus momentos, ouvimos, às vezes, o
convite de Deus para conhecê-lo e respondemos com um
bocejo. Levantamos as mãos e cantamos: "Ó Senhor, és
belo; teu rosto é tudo que busco", enquanto nossos corações
exigem: "Continua derramando agora as bênçãos e devolve
as que perdi".

149
O que aconteceu ao nosso desejo de Deus plantado pelo
Espírito? É como se ainda estivéssemos ao pé do monte Sinai,
ouvindo os mandamentos que queremos obedecer só para
ficarmos livres de um Deus ameaçador. Nossos corações
permanecem frios, imóveis e indiferentes. A perspectiva de
conhecer a Deus não nos anima muito.
O puritano Thomas Chalmers falou certa vez do "poder
expulsivo de um novo afeto". Poderíamos falar quase do
mesmo modo do poder sufocante de nossos velhos afetos.
Nosso desejo da vida melhor impede a nossa chama de anseio
pela esperança melhor de tornar-se uma fogueira ao ar livre.
Deus, porém, nos tirou do monte Sinai e nos colocou diante
do monte Sião. Nossos corações frios foram aquecidos. A lei
do Sinai — inteirinha, cada expressão da santidade de Deus —
foi gravada no centro do nosso ser. Quando Deus ordena,
ouvimos agora um convite.
— Ame sua mulher!
Quer dizer que tenho de fazer isso? Que maravilha!
Obrigado! Obrigado!
Somos filhos cujos paladares foram alterados. As cenouras
agora têm sabor de biscoitos. Essa é a verdade. É o centro da
teologia da nova aliança, e a teologia da nova aliança é o
centro da vida do novo caminho.

150
Alegria garantida

Por que, então, não sinto isso? Por que os biscoitos ainda
têm gosto de biscoitos e as cenouras de cenouras? Prefiro
biscoitos. Quero uma vida doce agora. Escolho, então, o
antigo caminho.
Essa escolha tem conseqüências. Notei antes a passagem
em Hebreus que dizia que a antiga lei fora abolida.55 A partir
dessa declaração, sugeriu que a fórmula de linearidade do
antigo caminho foi cancelada. Não podemos mais trabalhar
duro para fazer as coisas certas e exigir uma garantia de que
a vida irá, então, funcionar. Os judaizantes estavam
completamente errados. A lei da linearidade da qual
dependiam não está vigorando.
Mas, outro relacionamento linear ainda permanece.
Quando vemos o que é, vamos ficar profundamente
interessados em nutrir o desejo que irá sustentar-nos no novo
caminho de vida.
Ouça o apóstolo Paulo: "Porque o que semeia para a sua
própria carne da carne colherá corrupção; mas o que semeia
para o Espírito do Espírito colherá vida eterna".56
Essa linearidade continua em efeito. Colhemos o que
plantamos.
Note, no entanto, que não é a linearidade do antigo
caminho. A promessa de um relacionamento causa-efeito

151
entre fazer o que é certo e uma vida que funciona acabou.
Deus estabeleceu um novo arranjo linear:
Se escolhermos o antigo caminho, acabaremos infelizes. Po-
demos nos sentir bem por longo tempo, mas todo seguidor do
antigo caminho terminará no infortúnio. GARANTIDO!
Se escolhermos o novo caminho, vamos experimentar
alegria, talvez só depois de um longo tempo de sofrimento e
busca. Mas, vamos nos encontrar e nos sentiremos cheios,
vivos e felizes. GARANTIDO!
Escolher o novo caminho vale a pena. Uma vez que for salvo,
não há mais qualquer escolha importante.
Não poderemos manter essa escolha, a não ser que nossa
paixão por Deus se torne mais forte do que a nossa paixão por
qualquer outra coisa, inclusive um relacionamento restaurado
com um filho que nos rejeita.
Vou declarar de maneira diferente essas duas lições que
estou aprendendo sobre a vida no novo caminho.
Primeiro, o Espírito está sempre me incentivando a segui-lo,
e isso é sempre no sentido de conhecer melhor a Cristo. Esta é
a sua palavra para mim quando a vida vai mal e quando vai
bem. É sempre isso que ele diz: Venha como está para
encontrar a Deus.
Segundo, não vou segui-lo, a não ser que colabore de
alguma forma com a sua obra de aprofundar meu desejo por
Cristo. Enquanto desejar mais as bênçãos, vou acabar no
antigo caminho.
152
Minha conclusão é também dupla:
Primeiro, se não aprender a ouvir o que o Espírito está
dizendo, vou andar pelo antigo caminho, e os resultados
serão desastrosos. B segue-se a A. É nesse ponto que a
linearidade ainda permanece.
Segundo, se aprender a ouvir mais claramente a voz do
Espírito, tanto me guiando no novo caminho como me
fortalecendo na minha paixão número um por Cristo, vou
experimentar grande alegria e significado em meio a
quaisquer circunstâncias. Minha alma estará alinhada com o
Plano Emanuel. Deus será o nosso Deus, e nós seremos o
seu povo. Garantido!

O PLANO EMANUEL

João, filho de Zebedeu, escreveu três livros que passaram a


fazer parte das Escrituras. O primeiro, o evangelho de João, foi
escrito para nos ajudar a crer em Jesus.
Depois de refletir sobre todas as coisas incríveis que Jesus
fez, e compreender que incluíra apenas algumas delas, João
escreveu o seguinte: "Estes, porém, foram registrados para
que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que,
crendo, tenhais vida em seu nome".57
Em Apocalipse, seu último livro, João desvenda a glória de
Jesus. Esses vinte e dois capítulos ajudam a manter a nossa
fé em Jesus quando a evidência torna isso difícil. Mesmo
153
quando João Batista certa vez ficou imaginando se deveria
procurar outro Messias para seguir. Há ocasiões, às vezes
longos períodos, em que a vida simplesmente não funciona
muito bem, e por mais que busquemos, Jesus parece ter
desaparecido. Quem sabe nunca esteve lá.
— Ele está aqui —, declara João58 —, e não desapareceu.
Deus permitiu que eu visse tudo que está acontecendo do
ponto de vista do céu. É de tirar o fôlego. O Cordeiro está
abrindo com estrondo seu caminho através da história para
completar o Plano Emanuel.
— Vi a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do céu.
Está descendo para nós, para você e para mim. Enquanto
observava, ouvi grande voz dizendo: "Eis o tabernáculo de
Deus com os homens.
Deus habitará com eles. Eles serão povos de Deus, e Deus
mesmo estará com eles e será o seu Deus."
Ouço João dizendo: — Foi por isso que Deus enviou Jesus.
É o Plano Emanuel: Deus vai estar conosco! Quando isso
acontecer, quando a melhor esperança de achegar-se a Deus
for plenamente cumprida, não iremos desejar mais nada. E isto
vai ser além de toda e qualquer coisa que possamos imaginar.
Não há razão para choro, nem suspiro. E tudo isso com Jesus
no centro.
— Fiquem firmes no curso, peregrinos cansados. Não
percam o ânimo. O Plano Emanuel está para ser completado.
Ouvimos João e dizemos:
154
• Mas, João, meu marido me negligencia. Não sei se
posso continuar mais com este casamento.
• Mas, João, meu sofrimento diário é insuportável. Só
as bênçãos de uma vida melhor agora poderão aliviá-lo.
• Mas, João, isso é bom para o passado. Mas, agora
estou só. Não consigo pagar minhas contas. Não tenho
verdadeira comunhão na igreja. Não gosto do meu
emprego. Preciso de alguma ajuda agora.
Ouço a resposta de João:
Filhinhos, se pudessem ver a esperança melhor à frente,
não precisariam de uma vida melhor agora. Aquele que
estava sentado no trono disse — eu o ouvi com meus
próprios ouvidos -: "Eis que faço novas todas as coisas". A
seguir, olhou diretamente para mim e disse: "Escreve, porque
estas palavras são fiéis e verdadeiras. Meu povo precisa
ouvi-las". Escrevi Apocalipse para que nunca, por mais difícil
que se torne a sua vida, venham a perder a confiança em
Jesus."59
Paulo disse quase a mesma coisa para pessoas que
achavam que a viagem para o céu incluía mais algumas
bênçãos. "Se a nossa esperança em Cristo se limita apenas
a esta vida, somos os mais infelizes de todos os homens".60
Em outras palavas, se você se inscreveu no cristianismo a
fim de obter uma vida melhor agora, cometeu um erro grave.
Há alegria agora, mas toda ela está arraigada na esperança
futura. Elimine isso e será difícil resistir aos prazeres fáceis.
155
As preciosidades

O livro do meio de João, na verdade três cartas curtas, foi


escrito para ajudar-nos a nos achegar a Jesus agora, quando a
vida não é aquilo que gostaríamos que fosse, e provar as
alegrias profundas da comunhão com Deus até que nos
sentemos no céu para a refeição completa.
Ouça o grande puritano John Owen falar sobre a primeira
epístola de João:
Os cristãos naquela época eram pobres e desprezados. Os líderes
cristãos eram tratados como o refugo do mundo. Convidar pessoas para
se tornarem cristãs, para se juntarem à sua comunidade e gozar das
coisas preciosas de que gozavam, parecia o cúmulo da insensatez. —
Que proveito teremos se nos unirmos a esses cristãos? Eles estão nos
convidando para compartilhar de seus problemas? Querem que sejamos
perseguidos, injuriados, escarnecidos e soframos todo tipo de mal?

João escreve com essas objeções em mente. Não obstante


todas as desvantagens que a comunidade dele sofre sob um
ponto de vista mundano, todavia, na verdade, ela era muito
desejável, e eles logo descobririam isso. "Ora, a nossa
comunhão é com seu Filho, Jesus Cristo".61 Na opinião de
Owen, o apóstolo João dizia que o apelo do cristianismo não
está numa vida melhor agora. "O que aproveitaremos se nos
juntarmos a esses cristãos?" Os que querem menos problemas
nesta vida fariam melhor seguindo outro messias.
156
Existe, porém, algo disponível agora que é "muito
desejável". João não nos convida para uma vida que vai
ficando melhor, mas para as "coisas preciosas" da comunhão
com Deus. Sua epístola nos chama para aproximar-nos de
Deus, achegar-nos a Cristo, e não para uma vida melhor
agora; mas para a esperança melhor de um relacionamento
com a Trindade agora, que satisfaz a alma, até que a vida
melhor seja nossa para sempre, um futuro que significará
Deus conosco em plena medida, Jesus diante de nós à plena
vista, e o Espírito não competindo com qualquer outro desejo
ao apontar-nos Jesus.
Para João, as "desvantagens" de seguir Jesus, que
incluíam a ausência das bênçãos legitimamente desejadas e
nenhuma garantia de que elas seriam dadas até o céu, eram
nada em comparação com as "coisas preciosas que
gozavam", a intimidade da melhor esperança com a
Trindade.
Se pudéssemos provar essa intimidade, se soubéssemos o
que é aproximar-nos de Deus e sentir que ele se achega a
nós, se compreendêssemos como são aqueles a quem o Pai
e o Filho, por meio do Espírito, se revelam e em quem
passam a habitar, iríamos manter a vida melhor de bênçãos
em seu lugar, como algo simplesmente desejado, nunca
como uma paixão número um.
Saberíamos que experimentamos tão pouco de um
encontro real com Jesus porque o cristianismo moderno se
157
dedicou a prover uma vida melhor para os seus seguidores.
Saberíamos que por não termos encontrado verdadeira
comunhão com Deus, vivemos para as vantagens de nosso
relacionamento com ele, e concluiríamos que essas vantagens
— menos sofrimento, mais bênçãos, alguma forma de uma vida
melhor agora — nos são devidas.
Saberíamos que nos entregamos à linearidade, que vimos a
jornada espiritual como uma aventura desvairada, uma
experiência satisfatória de impacto sobre outros e de
significado para nós mesmos, ou como um cheque em branco
no qual podemos incluir as bênçãos que desejarmos, assinar
por procuração no lugar de Jesus, depois pegar o dinheiro no
guiché do drive-in da oração. O único requisito é a obediência,
não perfeita, mas um tipo consistente de fidelidade aos
princípios bíblicos.
Saberíamos que as bênçãos se tornaram as nossas coisas
mais preciosas: Faça isto, e aquilo acontecerá, garantido; é a
promessa de Deus.
Saberíamos que nos vendemos à linearidade e que o resultado
— e isto é linear - tem sido o amplo fracasso dos cristãos em
dar valor à oportunidade de achegar-se a Deus. Queremos as
bênçãos. Ele nos convida para manter comunhão, para o Plano
Emanuel.
Chegamos e dizemos:
— Deus, meu casamento está cheio de tensão.

158
— Deus, as conseqüências do meu divórcio são tão
piores e duradouras do que previ.
— Deus, viver sozinho nesta casa de idosos é tão difícil.
Não consigo deixar de ter pena de mim mesmo.
— Deus, estou com tanto medo do diagnóstico médico.
Por favor, não deixe que eu tenha câncer.
— Deus, minha inclinação para relações lésbicas é
implacável. Sei que é errado, mas não consigo controlar-
me.
— Deus, nunca pensei que pudesse sofrer tanto. Minha
filha de 14 anos está grávida.
Em cada uma dessas vidas, e na sua, o vento do Espírito
está soprando. Mas, ele não está movendo nosso barco para
os mares calmos de uma vida mais agradável. Pelo contrário,
somos levados ao olho da tempestade, à presença de Deus.
E devemos ajustar nossas velas adequadamente. Se
quisermos águas calmas, vamos sozinhos. Resistimos ao
vento do Espírito.

A agenda está em dia

O apóstolo João nos convida para gozar preciosidades e


não para a satisfação e prazeres de circunstâncias melhores,
relacionamentos mais íntimos, sentimentos mais felizes, mas
para a alegria inexprimível de nos achegarmos a Deus.
Ouça-o falar sobre isso:
159
"O que temos ouvido, o que temos visto! O que as nossas
mãos apalparam! A vida se manifestou! E vo-la anunciamos.
Podemos ter agora comunhão com Deus. Ora, a nossa
comunhão é com o Pai
Eterno do amor infinito e com seu Maravilhoso Filho, Jesus
Cristo, que morreu por nós. Podemos nos achegar a Deus.
Conheço a alegria de estar na sua presença. Quero que
também conheçam essa alegria. Minha alegria será então
completa".62
Em seu evangelho, João nos diz: "Vocês podem confiar em
Cristo. Ele é quem diz ser. A vida é conhecê-lo."
Em sua revelação (nosso livro de Apocalipse), ele diz: "Vocês
vão ficar firmes no curso diante de qualquer tempestade, se
souberem o que está para vir. Neste momento, quando tudo
está contra vocês, o Cordeiro da cruz é o Leão do céu
movendo-se em direção ao seu propósito infalível. E é um bom
propósito. Não desistam!"
Em suas epístolas, João faz um convite: "Em meio a uma
vida difícil, aproxime-se de Jesus. Essa a fonte da sua maior
alegria."
Em tudo que escreveu, João está apresentando o Plano
Emanuel. Desde o princípio do tempo, Deus decidiu estar
conosco. Ele será o nosso Deust desde que não demos maior
valor a coisa alguma além de conhecê-lo, e seremos o seu
povo, nos apegando alegremente a ele em adoração e
absoluta dependência, aconteça o que acontecer nesta vida.
160
O plano está em ordem. Deus está conosco agora. Ele está
aqui. Não como estará quando a Cidade Santa nos sobrevier,
mas está aqui para nosso gozo. Nosso supremo chamado,
nossa mais profunda alegria é comemorar sua presença
achegando-nos a ele, não para que torne nossa vida melhor,
mas para desfrutá-lo pelo que ele é.
Essa é uma compreensão diferente da jornada espiritual.
João convida seus leitores para seguir um novo caminho,
para viver de um novo modo. É-nos pedido para
experimentar sem queixas as desvantagens de uma vida
difícil, a fim de apreciar mais profundamente a "preciosidade"
da comunhão com Deus.
A vida melhor de bênçãos agora para os que fazem o que é
certo? Não! A esperança melhor de comunhão agora, com a
Trindade, para os que mais a valorizam — essa é a vida
cristã!
A pressão acabou. Fomos libertados da obrigação de fazer
o que devemos para obter o que queremos. Há um novo
caminho de vida, e ele está de acordo com o Plano Emanuel.

A PORTA DO CELEIRO ESTÁ ABERTA

Aguém da congregação me procurou depois de ter


pregado e disse: — Será que ouvi direito? Com certeza não
está dizendo que vamos a Deus apenas para conhecê-lo. A
não ser que ele me dê as bênçãos de que preciso para ser
161
feliz, não consigo entender por que me aproximar então dele.
Seus ensinamentos me fazem até não querer me preocupar
com Deus.
Já mencionei esta mulher num capítulo anterior. Penso que é
parente (como somos todos nós) de um homem que chamou
Jesus enquanto ele ensinava.

Rico para com Deus

Ouça Lucas contar a história: "Um homem que estava no


meio da multidão lhe falou: Mestre, ordena a meu irmão que
reparta comigo a herança".
Ele queria uma vida melhor de mais dinheiro. É provável que
tivesse esse direito. A justiça estava talvez do seu lado. Note
que o Senhor nem entra no debate de "quem está certo", algo
que costumo fazer quando um cônjuge me diz como o outro
está errado.
"Mas Jesus lhe respondeu: Homem, quem me constituiu juiz
ou partidor entre vós?"
Pensei, na verdade, que Cristo era o juiz. Quem poderia ser
mais qualificado?
Jesus devia conhecer o coração dos dois irmãos e devia
saber quem tinha razão. Aparentemente, seu plano de tornar
esta vida justa era diferente.
"Então, lhes recomendou [a toda multidão, deixando o
homem abatido ainda indignado com seu problema]: Tende
162
cuidado, e guardai-vos de qualquer avareza; porque a vida
de um homem não consiste na abundância do que ele
possui."
Ele desviou-se completamente da questão da justiça. Não
era da sua conta. Seria difícil imaginar uma advertência mais
clara contra a vida no antigo caminho: Não tenha o propósito
de obter o que você quer da vida. Chamou isso de avareza. É
o fundamento do antigo estilo de vida. A fim de destacar seu
ponto, fez o que costumava, ofereceu uma história.
Contou então esta parábola: "O campo de um homem rico
produziu com abundância".
Alguns indivíduos são abençoados. Conheço homens e
mulheres piedosos que são ricos. Conheço homens e
mulheres piedosos com ministérios eficazes, de longo
alcance e muito honrados. As bênçãos são boas. Devemos
gozá-las e utilizá-las bem. Mas, elas são perigosas.
"E arrazoava consigo mesmo, dizendo: Que farei, pois não
tenho onde recolher os meus frutos". Ele nem sequer
menciona a Deus. Tudo que tem em mente é gozar sua boa
sorte e mantê-la. Quando o seu alvo é uma vida melhor, você
se torna absolutamente egoísta.
"E disse: Farei isto: destruirei os meus celeiros, reconstruí-
los-ei maiores e aí recolherei todo o meu produto e todos os
meus bens. Então, direi à minha alma: tens em depósito
muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e
regala-te!"
163
Ele se esforçara e valera a pena. A levou a B. E isso o
agradou. O antigo caminho é bastante satisfatório - não,
porém, nas maiores profundezas e não por muito tempo.
"Mas Deus lhe disse: Louco!" Esperamos cumprimentos hoje.
"Parabéns!" seria a atitude mais esperada. Trabalhamos duro,
fomos diligentes na administração das riquezas e podemos
gozar agora a vida melhor de bênçãos. Honramos as pessoas,
inclusive nós mesmos, cuja prioridade é realização e que foram
bem-sucedidas. Deus chamou este homem de louco, e disse:
"Esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para
quem será?" Isto é o que vai acontecer, prometeu Jesus, com
quem "entesoura para si mesmo e não é rico para com Deus".63
Jesus passou então a advertir contra a ansiedade com a
nossa vida nesta terra, o que vamos comer, como está o nosso
corpo, se teremos capacidade para prover o que precisamos.
Ele terminou este pensamento dizendo que nossos corações
pertencem ao que mais damos valor.64
Vivemos para acumular coisas para nós mesmos ou para
tornar-nos ricos para com Deus. Não é possível fazer ambas as
coisas. Ninguém pode viver segundo o antigo caminho e o
novo ao mesmo tempo. Este homem acumulou bens. Nós
buscamos satisfação, importância, uma comunidade à qual
pertencer, segurança nos relacionamentos, saúde emocional,
boa reputação, honra e apreciação, uma alma autoprotegida,
famílias felizes — a lista não tem fim. Muitos itens contidos nela

164
não parecem egoístas. São bênçãos que Deus quer que
tenhamos. Mas, nunca como nosso principal tesouro.
Quando as bênçãos, mesmo as mais nobres, se tornam
nosso tesouro maior, nós as acumulamos. Podemos parecer
generosos e dadivosos, mas nunca sacrificamos o que mais
importa. Os cristãos que acumulam tesouros além de Deus
no celeiro das suas almas, não adoram a Deus e nem
poderiam fazê-lo. Sua adoração central está dirigida para
outro ponto. Viver segundo o antigo caminho nos torna
insensatos e egoístas, não importa como os outros nos
considerem. Esse é o ponto da parábola.
Ouço Jesus dizer:
— Não viva segundo o antigo caminho. Se der maior valor
às bênçãos da vida do que à comunhão com Deus, vai
acabar infeliz. Garanto! Mas, se viver no novo caminho, se
achegar-se a Deus, não para explorar o seu poder mas para
gozar da comunhão com ele, então ele irá suprir tudo que
você precisa para participar do avanço do Plano Emanuel.
Garanto! E vai conhecer a minha alegria, a ale-gria que
experimento na comunhão da Trindade.
Substituímos o plano do homem rico pelo Plano Emanuel.
Ele combina mais com nosso ponto de vista natural: Se nos
esforçarmos muito, mantivermos o nariz limpo e vivermos
uma vida decente, acontecerão coisas suficientes para que
nos sintamos bastante bem.

165
Jonathan Edwards disse certa vez que a jornada espiritual
exige uma "intensa concentração sobre a perspectiva de
Deus". Tal concentração, disse ele, irá "causar um grande
estreitamento de todos os nossos interesses na terra e uma
imensa ampliação de nossos interesses no céu".65
Quando mudamos para o novo caminho, quando
substituímos o plano do homem rico pelo Plano Emanuel,
damos mais valor a Deus do que a celeiros cheios de bênçãos.
Nossos interesses terrenos diminuem.
Não se trata de nos importarmos menos com as coisas aqui
de baixo - ainda desejamos fervorosamente uma comunidade
íntima, bons filhos, biópsias negativas — mas, passamos a
desejar mais outra coisa. Nosso maior tesouro, nossa bênção
principal, nossa paixão suprema, torna-se o próprio Deus. Sua
glória ocupa o centro do palco. A comunhão com ele torna-se a
nossa maior alegria.

Aproximação

Devemos ser claros: Seguir o plano do homem rico é o antigo


caminho. O novo caminho considera a vida segundo o ponto de
vista divino e experimenta uma "imensa ampliação de nossos
interesses no céu". Os revolucionários do novo caminho se
alinham alegremente com o Plano Emanuel. Eles
compreendem o que os velhos diretores espirituais queriam
dizer com atender a Deus (onde ele está indo), abandonar-se a
166
Deus (seguir para onde ele levar), e união com Deus (ter
prazer nele durante a jornada).
Devemos compreender o que Deus está fazendo sempre
que ele retém as bênçãos que legitimamente desejamos: ele
está seguindo o Plano Emanuel. Irá estar com um povo que
lhe dê valor acima de qualquer outra bênção. Vai criar esse
povo às custas da morte de seu
Filho e de ser ferido a cada dia pelos filhos que não o querem
exceto para aproveitar-se dele. Deus está permitindo que
sonhos bons se despedacem para despertar o sonho melhor
de conhecê-lo.66
Se devemos resistir ao plano do homem rico e adotar o
Plano Emanuel, um artigo de fé sobre todos os outros é
requerido. É o artigo de fé que mais falta no cristianismo
contemporâneo. Ou seja:
Experimentar Deus é em si mesmo uma fonte de maior
prazer do que experimentar qualquer outra coisa.
Um pai não pode deixar um legado melhor para seu filho
do que viver de modo que este possa dizer: — Meu pai
desejava Deus mais que tudo. — Estamos vivendo de
maneira que o orador em nosso funeral diga: — Este
seguidor de Jesus queria Deus mais do que qualquer outra
bênção?
Uma amiga de muitos anos telefonou-me recentemente
para pedir que eu proferisse algo em seu enterro, caso seu
próximo tratamento de câncer falhasse. Ela escreveu ainda
167
ontem contando que está tirando as perucas do armário. —
Venha visitar-me —, foi o convite feito a Raquel e a mim —, se
não se importa em fazer companhia a uma senhora calva e
doente.
Se falar em seu funeral, talvez mencione seu maravilhoso
senso de humor. Mas, esse não será o meu foco. Alguns
incrédulos morrem bravamente, com um gracejo nos lábios.
A carta dela terminou com estas palavras: — Deus não é
maravilhoso? Eu o amo tanto!!!
Por que ela o ama? Por saber que o tratamento vai dar
certo? Porque Deus vai impedir que perca os cabelos? Porque
tem a garantia de um mínimo de sofrimento? Não! Essas são
bênçãos de uma vida melhor que desejamos e pela qual
oramos. Mas, não há nada que nenhum de nós possa fazer,
inclusive orar fervorosamente, para assegurar que elas
venham; a lei da linearidade não está mais vigorando. Oramos,
porém, mesmo assim, principalmente para tomar nosso lugar
como filhinhos dependentes. E ele talvez atenda aos nossos
pedidos. Mas, nossa paixão número um está dirigida para outro
ponto.
Em meio a uma vida difícil, tornada ainda mais difícil pelas
suas limitadas oportunidades de ministrar e pelo fato de viver
sozinha como divorciada, ela está se achegando a Deus. E ele
se achegando a ela. E disso que vou falar a respeito dela em
seu funeral.

168
Posso ouvir o apóstolo João, enquanto nos olha lá do céu,
dizer à minha amiga: — Minha satisfação está agora
completa. Você está gozando comunhão com Deus acima de
todas as outras alegrias. Sabe que é a sua maior bênção.
Oh! filha, se essa comunhão é tão doce aí, pode imaginar
como vai ser aqui em cima?
Posso ouvir Tiago interrompendo: — A quimioterapia deve
ser terrível. Uma medonha provação. Você a está aceitando
como uma oportunidade de aproximar-se de Deus, de ser
como Jesus. Está vivendo no novo caminho, se achegando a
Deus, e ele a você. Imagine quando o Plano Emanuel se
completar.
Paulo insiste: — Quando nos concentramos intensamente
no ponto de vista de Deus, e só se fizermos isso, então
coisas terríveis como a solidão e os problemas econômicos e
recidiva de câncer podem ser considerados como aflições
leves e momentâneas que estão obtendo para nós uma
glória eterna que supera de muito tudo isso. Combata o bom
combate, como eu fiz.
É claro que Pedro não pode resistir, juntando-se à
conversa com sua sabedoria confiável: — Querida irmã,
embora não o tenha visto, você o ama. Que milagre
esplêndido do seu gracioso Espíriro Santo! Embora não o
veja com seus olhos físicos, você crê nele e sente-se cheia
de alegria inexprimível, pois está recebendo o que mais
deseja -sendo salva do distanciamento de Deus para a
169
proximidade dele. Está vivendo o novo caminho do Espírito. A
pressão acabou!Aleluia! Espere para ver quem é que está
chegando! É ele!
Os revolucionários do novo caminho se apegam à sua
esperança de que estão realmente recebendo a salvação de
suas almas, mesmo quando passam pela porta chamada
Departamento de Oncologia. Sabem que estão libertos da
busca inútil do prazer da alma em qualquer coisa ou em
alguém senão Deus. Seus celeiros podem estar cheios ou
vazios de bênçãos; de qualquer modo, a porta do celeiro está
aberta e seus corações fixos em outra parte. São remidos para
ter gozo em Deus.
Como seguidores de Cristo, podem beber água viva que
sacia a sua sede e comer coisas que deleitam sua alma. Não
importa como a vida os esteja tratando, por mais desanimados,
irados ou vazios que se sintam, por mais que tenham
fracassado, podem entrar ousadamente no Santo dos Santos.
Têm um verdadeiro encontro com Deus. Encontram o Diretor e
ele os abraça.
Esse é o propósito de Deus em tudo que faz. Tem sido o seu
objetivo desde a Criação — e continuará sendo até que venha
a ser inteiramente realizado. É o Plano Emanuel.
A pressão foi removida.
Podemos abandonar o plano do homem rico. Há um novo
modo de viver.

170
Ele trata de Deus e sua glória e nossa sarisfação nele. Esse
tem sido o seu plano desde o Éden.

A HISTÓRIA DE DEUS

Deus tinha feito um acordo conosco. Ele não pediu nossa


participação. Nem sempre gostamos dos termos. Fazemos
então de conta que são diferentes. Se pudéssemos ver o
quadro maior, não fingiríamos nada. Cairíamos de joelho em
adoração.
Um dos maiores e desconhecidos pregadores da Escócia,
Arthur J. Gossip, perdeu a esposa de repente. Seu primeiro
sermão depois da morte dela tinha como título: Quando a
Vida Desmorona, o Que Fazer?
Ele disse nesse sermão: — Vocês que estão ao sol podem
crer na fé, mas nós que estamos nas sombras devemos crer
nela. Não temos nada além disso.67
Essas palavras me comovem. Pergunto, no entanto,
também, exatamente no que devemos crer quando a vida
desmorona? Para muitos, é o pensamento do antigo
caminho? Se fizermos a nossa parte, se orarmos e vivermos
como Jesus quer, Deus irá então melhorar a nossa vida. Vai
transformar as coisas más em boas. Ficaremos livres da
queda do outro sapato, ou pelo menos de outro caindo no
chão.

171
Não há outra corrente

Em The Silver Chair (A cadeira de prata), o quarto livro de


CS. Lewis, As Crônicas de Nárnia, uma menina chamada Jill se
perde numa floresta perigosa. Ela grita muito e fica com uma
sede terrível. Enquanto procura água, chega a um rio e corre
alegremente até ele. Mas, nota que um leão está deitado ao
lado dele.
A menina pára de repente. O leão, sabendo que ela tem
sede, a convida para se aproximar e beber.
— Posso? Será que se importa de sair enquanto bebo?
— pergunta Jill.
O leão respondeu a isso com um olhar e um rugido
baixinho. Enquanto Jill contemplava sua forma imóvel,
compreendeu que seria o mesmo que ter pedido à
montanha inteira que se movesse para sua conveniência.
O ruído delicioso das águas correndo a deixava quase de-
sesperada.
— Promete que não fará nada comigo, se me
aproximar? — perguntou Jill.
— Não prometo nada — disse o leão.
Jill estava com tanta sede que, mesmo sem perceber, dera
um passo à frente.
— Você come meninas? — indagou.
— Já engoli meninas e meninos, homens e mulheres,
reis e imperadores, cidades e reinos — disse o leão. Ele
172
não falou como se gabando, nem como se lamentasse, ou
como se estivesse zangado. Só falou.
— Não tenho coragem de ir até aí e beber — disse Jill.
— Então vai morrer de sede — respondeu o leão.
— Nossa! — replicou Jill, dando mais um passo. —
Acho que tenho de procurar, então, outro rio.
— Não há outro rio — disse o leão.68
Lewis colocou essas palavras na boca de Aslan, a figura de
Cristo, ao falar com uma menininha amedrontada: — Não
prometo nada. — Com relação a quê? O leão não promete
que Jill não vai sofrer. Não lhe promete uma vida melhor.
Mas, a convida a beber a água que precisa.
O que precisamos? Quase sempre respondemos: este
conjunto especial de bênçãos, segurança de que as coisas
não vão dar errado. Deus diz: comunhão comigo, segurança
para entrar na minha presença.
Mudamos os termos do acordo. Queremos a vida melhor e
a esperança melhor, as bênçãos da vida e comunhão com
Deus — ambas as coisas, agora. Se tivéssemos de escolher
uma, poderíamos ser tentados a preferir as bênçãos. —
Deus, tire meu filho das drogas. Farei tudo o que disser.
Quando o leão não se move e quando se recusa a garantir
passagem segura ao rio de água viva, procuramos outro rio e
calculamos como chegar até ele. Não há outro, mas fingimos
que há.

173
Um homem cujo diagnóstico era de câncer inoperável ouviu a
garantia do amigo: — Tudo vai dar certo. Acabei de colocar a
sua situação na Internet. Antes de a semana acabar, haverá
vinte mil pessoas orando por você. — Aproximar-se de Deus
não é o objetivo principal; alcançar a saúde é. E muitas
orações são o meio; poucas orações não terão efeito.
Essa é a linearidade do antigo caminho.
O novo caminho começa com uma promessa diferente: A
água está à disposição, e você pode bebê-la, mas a vida pode
ser difícil quando se aproximar. O foco do novo caminho,
porém, não são as provações; é a disponibilidade de água pura
e alimento abundante.
"Quem crer em mim... do seu interior fluirão rios de água
viva."69
Essa é a linearidade do novo caminho: Creia, e a água flui.
"Ah! Todos vós, os que tendes sede, vinde às águas... Comei
o que é bom e vos deleitareis com finos manjares".70
Mais linearidade do novo caminho. E uma promessa! Siga o
caminho que Deus abriu para a sua presença por meio de
Cristo — e será satisfeito!
"Inclinai os ouvidos e vinde a mim; ouvi, e a vossa alma
viverá; porque convosco farei uma aliança perpétua".71
Esse é o acordo. É um bom acordo. Se ouvirmos o que ele
oferece, não desejaremos mudar coisa alguma.
É segunda-feira de manhã. Raquel e eu passamos a noite de
domingo na sala de emergência. Por volta das seis horas,
174
voltou a sentir a mesma dor. Outra pedra nos rins. Minha
primeira reação foi: — Tenho tanto a fazer. A vida estava
finalmente caminhando muito bem. A hora era péssima.
Deus, não seria possível impedir que isso acontecesse? Não
orei o suficiente? Ou talvez tenha me descuidado com a
quantidade de comida que deixava cheio o meu prato?
A resposta natural à provação é viajar pelo antigo caminho,
domesticar o leão (como se pudéssemos) e pedir que nos
leve ao Tanque de Siloé, onde a vida fica melhor. Se eu
achasse que vinte mil orações fariam diferença, iria espalhar
meu problema pela Internet.
Ouço, então, o leão dizer: — Não faço promessas sobre o
seu sofrimento. Sua pedra pode ou não passar. Venha até
mim e beba.
A visão de um quarto de UTI não inspira fé. Revigora a
exigência. — Deus, faça alguma coisa. Aquela pobre
criancinha está berrando. A mulher idosa junto a mim, por
trás da cortina, sente-se terrivelmente mal. E eu também não
estou tão bem assim. Onde o Senhor está? O que tenho de
fazer para que entre em ação?
Enquanto ficava ali a noite passada durante várias horas,
perguntei com o que podia contar que Deus fizesse. O que
exatamente ele prometera? Ele disse que fizera uma aliança
eterna, um arranjo pelo qual, por sua escolha, o obriga a
fazer o que prometera. Mas, qual é a promessa? Qual o

175
acordo? No que devo crer quando uma sombra cai em minha
vida?

O quadro maior

Em vista de nós, cristãos modernos, estarmos tão


condicionados a supor que o antigo acordo ainda esteja em
vigor, que se agirmos certo a vida vai funcionar, talvez
devamos retroceder um pouco, dar alguns passos grandes e
ver o quadro maior. Quando a tragédia se abate, dizemos
facilmente: — O que será que Deus está me ensinando nesta
provação? — Ouça por trás dessa sentença a sua motivação e
talvez escute isto: — Se aprender minha lição, poderia fazer o
que é certo da próxima vez para que não venham mais
provações. — O antigo caminho é instintivo.
Supomos que esse seja o acordo: Andamos corretamente e
Deus abençoa. Mas, Deus tem um acordo diferente conosco e
ele irá durar até o céu.
Vou descrever a história de Deus, a maneira como ele se
moveu através da história guiado pelo Plano Emanuel para
chegar ao acordo presente, ao qual a Bíblia chama de nova
aliança.72
É uma história de sete capítulos que começou há muito
tempo.

176
Capítulo Um: Quando Só Havia Deus

Tudo é criado, menos Deus. Nossas mentes diminutas só


conseguem entender que, durante o passado infinito, só
Deus existia. Antes de criar qualquer coisa, só havia Deus.
Nada mais. Ninguém mais.
Imagino uma festa divina. A comunidade eterna estava se
divertindo. Havia paz e as pessoas se relacionavam de
maneira harmoniosa. Deus gosta de ser Deus. Sempre
gostou e sempre gostará.
Mas faz parte da sua natureza compartilhar. Ele criou então
os anjos.

Capítulo Dois: Deus e os Anjos

Deus criou seres angélicos e imediatamente os colocou em


seu lugar. Era um lugar maravilhoso. Eles foram designados
para experimentar reverência na presença de sua majestade
e se deleitar no seu serviço. Algo, porém, aconteceu, como
Deus sabia que aconteceria; fazia parte do Plano Emanuel.

Capítulo Três: O Início do Mal

Lúcifer era o mais belo de todos os anjos. Por razões que,


provavelmente, nunca saberemos, isso o envaideceu. O
nascimento do orgulho. Ele decidiu que queria compartilhar
177
da glória que pertencia a Deus. Queria algo além do que Deus
já estava dando. Com essa paixão, o mal começou. O mal é
desejar algo mais do que
Deus; no caso de Lúcifer, foi a oportunidade de sentir-se de
uma certa forma.
Ele conseguiu persuadir um bom número de anjos menores a
buscar uma vida melhor em separado de Deus. Deixaram
então o lugar que Deus lhes designara. Satanás e seus
demônios eram agora uma força a ser considerada.

Capítulo Quatro: Pessoas Entram em Cena

Deus criou os céus e a terra. Na terra, designou um paraíso


chamado Éden, palavra que significa "deleite". Foi ali que ele
criou as primeiras pessoas. Seu propósito desde o início era
compartilhar as delícias da comunidade perfeita e as bênçãos
de uma vida maravilhosa.
Os seres humanos foram formados com a capacidade de não
só curvar-se em reverência diante da majestade e servir ao
Mestre, como também gozar das profundezas do coração de
Deus. Nisso, somos diferentes dos anjos.
Ele é amor, e a extensão do seu amor vai até a graça. Está
disposto a perdoar os que o odeiam e descobrir um meio de
abraçar os sujos e pequenos maltrapilhos. Ele na verdade os
ama — e nós somos eles.

178
Até que Adão e Eva pecaram, tinham uma apreciação
limitada da bondade de Deus. A graça ainda não era
requerida e, portanto, não estava visível. O primeiro acordo
de Deus com as pessoas foi direto: Sigam as minhas regras
e continuarão a gozar a vida maravilhosa do paraíso. Havaí
para sempre. Viagens a Fiji. Nunca uma pedra nos rins. E um
grande casamento com sexo do melhor.
Mas, havia uma coisa da qual não podiam gozar no paraíso
— um relacionamento construído sobre a graça. Deus ficou
de lado e observou o diabo persuadi-los a pecar.

Capítulo Cinco: Uma Raça Corrupta Passa a Existir em


Pecado

Esse primeiro pecado libertou um vírus mortal no coração


humano, um vírus até então contido nos anjos caídos. A partir
desse ponto, todo ente nascido de um homem e de uma
mulher chegou à vida com a idéia de que havia algo melhor do
que conhecer a Deus. Acreditávamos que poderíamos
encontrar maior prazer nas provisões de
Deus do que na sua Pessoa. Vivemos então para o prazer,
sem nos preocupar se nos aproximávamos ou não de Deus.
Se os prazeres não viessem, sentir-nos-íamos justificados
em buscar alívio do sofrimento da maneira que fosse
possível. Quando Deus nos disse que estávamos errados,
ficamos furiosos e perguntamos o que ele tinha feito
179
ultimamente por nós. Se os prazeres aconteciam, sentíamo-nos
complacentes, pensando que de alguma forma os merecíamos.
Afinal de contas não havíamos pedido para nascer; quem nos
pôs aqui devia cuidar de nós.
Estava na hora de Deus girar a ignição do Plano Emanuel.

Capítulo Seis: Deus Vai Trabalhar

A primeira coisa que Deus fez, depois de observar as


pessoas ficando cada vez piores, foi destruir todos — todos
exceto um homem e sua família.
Passado o dilúvio, ele entrou em aliança com Noé deste modo:
— Olhe, Noé, está vendo aquele arco-íris? Ele é a minha
promessa de que, mesmo que você, seus filhos e os filhos de
seus filhos se afastem de mim para buscar sua alegria, jamais
destruirei todas as criaturas vivas como acabei de fazer.73
Qual a idéia dele? Creio que foi esta: Revelar apenas que o
seu juízo jamais poria em prática o Plano Emanuel. Nunca
poderia castigar as pessoas para valorizá-lo acima de todas as
outras alegrias. Entrou então em aliança com Noé, o primeiro
de cinco acordos especiais com pessoas.
Os anos se passaram. As coisas não melhoraram. A próxima
fase da agenda Emanuel foi introduzida - a aliança abraâmica.
Ele apareceu a um homem e ordenou que partisse numa
viagem. — Siga-me

180
— Deus disse — a um lugar que lhe mostrarei mais tarde.
Tenho um plano. Quero abençoar as pessoas por seu
intermédio.
Embora Abraão não soubesse disso quando a viagem
começou, o plano era para Deus colocá-lo num terrível apuro
que só um milagre poderia resolver.
— Abraão, você vai ter um filho.
— Mas, Deus, minha mulher e eu não temos filhos. Meu
servo será então o meu herdeiro?
— Não! Confie em mim. Sei o que estou fazendo.
Deus fez então um trato.74 Ele instruiu Abraão para cortar
alguns animais e pássaros em pedaços e dispô-los em duas
fileiras, formando um caminho no meio.
O costume da época de fazer aliança era aquele que exigia
de quem andasse pelo caminho fizesse a seguinte afirmação:
— Corte-me em pedaços se não cumprir a minha palavra. —
Nessa ocasião, é surpreendente observar75 que Deus andou
sozinho pelo caminho, como se dizendo: — O Plano
Emanuel está avançando. Garanto o seu progresso até a
execução final. — Deus imaginou um povo que, pela fé, vivia
nas trevas, um povo que; se achegaria a ele não importava o
que acontecesse, por acreditar quê ele era o seu maior
tesouro.
Com o passar dos anos, os descendentes de Abraão por
intermédio de Isaque, nascido de Sara e Abraão quando
tinham noventa e cem anos respectivamente, eram agora os
181
filhos de Israel. Deus os tirou do Egito, depois mandou que
ficassem imóveis diante de um monte a fim de ouvir a fase
seguinte do acordo. Chamado, hoje, de Aliança Mosaica.
— As coisas vão ser assim: Pretendo ser o Deus de um povo
que não desejará nada mais senão a mim. Se for essa a sua
intenção, vejam como vão viver: Façam tudo que eu mandar,
provem que me amam acima de tudo, e providenciarei para
que tenham uma vida boa. Façam o que eu quero e suprirei as
bênçãos que vocês querem. Esse é o acordo.
Ninguém cumpriu os termos. Ninguém pôde. Em seu coração
eles queriam uma vida melhor, mais do que queriam um
relacionamento com Deus; queriam uma vida boa mais do que
queriam revelar a outros como Deus é bom. Continuaram
egoístas, dedicados a proteger suas próprias almas e perseguir
seus próprios interesses. Deus, então, os amaldiçoou. Colocou
dificuldades em suas vidas.
A única solução seria Deus despertar o afeto por ele em seus
corações que fosse mais poderoso do que o vírus do pecado.
Antes disso, ele fez avançar o Plano Emanuel com mais um
arranjo preparatório, chamado de Aliança Davídica. Ele a fez
com Davi, rei de Israel.
— Davi — disse ele -—, vou estabelecer um trono no meio de
meu povo e providenciar para que o meu homem o ocupe.
Pretendo criar uma comunidade que dance de alegria ao redor
do meu trono, em minha cidade, com o meu homem em pleno

182
domínio. Você é uma figura desse homem. Seu trono durará
para sempre.
Cada uma dessas alianças avançou o Plano Emanuel de
certas maneiras que continuam hoje.
O arco-íris de Noé continua ainda sobre nós. A terra não
será destruída até que a nova raça seja removida.
Como Abraão, somos agentes de bênçãos para este
mundo. Mas, a nossa influência nunca depende de causas
naturais. Ismael, filho de uma mulher jovem e fértil, foi
expulso. Isaque, o filho de dois velhos já distantes da idade
de concepção de filhos, é o nosso modelo. Só quando o
Espírito opera sobrenaturalmente por nosso intermédio é que
o plano de Deus avança.
A lei que veio através de Moisés está agora em nossos
corações. O acordo de Deus com Israel - faça as coisas
certas e a vida funcionará - foi abolido. Mas, a lei continua em
pé. A diferença é que agora ansiamos pela santidade; os
requisitos da lei são agora a delícia de nossos corações. E
nós obedecemos a fim de gozar comunhão com Deus e não
para tornar nossa vida funcional. Essa a diferença. É um
novo caminho.
O reino prometido a Davi está agora presente. Cristo já se
encontra no trono e já reinamos com ele, embora não como
será um dia.

183
O estágio final do Plano Emanuel na terra já foi instalado.
Deus estabeleceu um novo acordo com seu povo. É a nova
aliança, firmada no sangue de Jesus.
A peça central deste novo arranjo é esta: Temos agora
acesso direto a Deus a qualquer tempo, em qualquer
circunstância.
A melhor esperança de acesso a ele, que leva a um encontro
cheio de alegria, ancorado na esperança, com cada membro
da Trindade, já se acha no lugar.
Este novo arranjo é eterno. Vai continuar até a vinda do
último capítulo desta história.

Capítulo Sete: Comunhão para Sempre

À medida que o último capítulo se desenrola, não mais nos


aproximaremos de Deus; estaremos com ele para sempre. O
Plano Emanuel estará então completo - e permanente. Deus
será o nosso Deus, e nós seremos o seu povo.
Não será impossível, mas inconcebível, pecar. O grito do
nosso coração: Dê-me apenas Jesus, será plenamente
satisfeito. Nós o veremos. Sem um momento de hesitação,
inclinar-nos-emos a seus pés e diremos: — Meu Senhor e meu
Deus. Tu és o meu maior tesouro. Além de ti, nada mais
almejo.
Quando a esperança melhor for conquistada e não houver
possibilidade de valorizar as bênçãos acima do Abençoador,
184
Deus irá remover todos os obstáculos. O prodígio do Éden
empalidecerá em comparação. Tudo dará certo, não porque
façamos tudo certo -embora seja assim; mas, tudo dará certo
porque Jesus fez tudo certo e Deus agora nos dá todas as
bênçãos que seu coração infinitamente generoso pode
conceber. Sua presença e suas bênçãos — isso é o céu!
Estamos, porém, ainda no capítulo 6 da História de Deus. É
um bom lugar onde estar, não importa o que aconteça, se
vivermos no novo caminho do Espírito. O Antigo caminho se
foi. A pressão acabou. Quando nossos filhos se comportam
mal, não precisamos pensar sobre o que fazer para ajudá-los
a melhorar. Por mais estranho que pareça, isso não é só
desnecessário, mas errado. Essa estratégia dá mais valor a
nossos filhos do que a Deus. Podemos nos achegar a Deus e
depois nos dirigirmos a eles com a paixão e a sabedoria do
Espírito.
Esse é o novo modo de viver. Está disponível para todos
cujo supremo tesouro é Deus, que se curvam diante dele e
não fazem exigências, que sabem que ele está sempre nos
beneficiando, mesmo quando uma pedra se aloja num lugar
difícil em nosso rim.
Podemos rejeitar o velho caminho e viver no novo. Mas,
como? Continuo querendo que a pedra passe, talvez mais do
que desejo a Deus. E se eu for francamente sincero, algumas
vezes prefiro meus filhos sadios e felizes a conhecer melhor
a Deus. Como viver no novo caminho?
185
Essa é a questão que vou tratar a seguir.

Q UARTA PARTE :

D EIXE A REVOLUÇÃO COMEÇAR

O Novo Caminho: Como Viver Nele

GOZO EM DEUS

E realmente possível ter gozo em Deus. É o ponto alto da vida.


É a razão de estarmos vivos. Entrar no novo caminho depende
de essa idéia introduzir-se em nossas cabeças e corações.
Ouça novamente as palavras de John Owen:
O conhecimento de que Deus e o homem podem viver em comunhão
está oculto em Cristo. É algo maravilhoso demais para a natureza
humana pecadora e corrupta descobrir. Mas, em Cristo, temos o
caminho para a presença de Deus sem qualquer temor... Os que gozam
desta comunhão estão gloriosamente unidos a Deus por meio de Cristo
e compartilham de todos os gloriosos e excelentes frutos de tal
comunhão.
Se estivesse na companhia de Owen, gostaria de perguntar-
lhe: — O que podemos conhecer dessa alegria agora, nesta
terra decaída, nesta vida cansativa e, às vezes, difícil?
Ele responde:

186
Esta comunhão será aperfeiçoada e completa quando entrarmos no
pleno gozo das glórias de Cristo. Então, nos daremos totalmente a ele,
descansando nele como o cumprimento de todos os nossos desejos...
Esta comunhão é agora apenas parcial, porque no presente gozamos
apenas as primícias dessa perfeição futura.

Gozo parcial agora, mas gozar parcialmente a Deus é


melhor do que gozar totalmente qualquer outra coisa. Penso
que isso é verdade. Todavia, insistimos em gozar a plenitude
de algo hoje. Esse é o apelo do pecado. É o apelo do
controle. Essa a razão de o antigo caminho ter tamanha
influência sobre nós. Aquilo a que nos entregamos total-
mente, queremos gozar plenamente. Mas, o cristianismo
pede completa entrega e só promete gozo parcial mais tarde.
Imagino-me dizendo tudo isto ao professor Owen. Eu o vejo
recostado em sua cadeira, com os olhos fechados, e
provando uma refeição que ainda não consigo distinguir. Se
pudesse entrar nos seus pensamentos, penso que eu o
ouviria testando-me em silêncio: — Você disse isso, mas
talvez não creia no que esteja dizendo: O gozo parcial de
Deus é tão infinitamente maior do que o gozo completo de
qualquer outro prazer que é insensato buscar qualquer coisa
além do conhecimento de Deus. — Depois, abrindo os olhos,
mas olhando através de mim para algo superior, ele fala em
voz alta. Está conversando com Deus sobre mim e comigo
sobre Deus.
187
É isto que diz:
Oro para que o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que, pelas
riquezas de sua graça, levou-nos de um estado de inimizade a esta
gloriosa comunhão com ele, possa dar-lhe tal prova da sua doçura e
excelência nesta comunhão, a ponto de ser estimulado a um desejo
maior desse gozo eterno dele na glória eterna.76

É possível que o Espírito esteja incentivando você como faz


comigo. Quero viver no novo caminho. Se existe uma estrada
que leve a qualquer prazer em Deus disponível nesta vida,
quero caminhar por ela.
Minha oração é que você também faça isso. Confio que este
livro tenha despertado até aqui seu desejo de deixar para trás a
pressão de buscar sua própria satisfação e viver na liberdade
do conhecimento de Deus. Se for possível deparar-se com
Deus num encontro que produza alegria (e até alegria parcial
ao encontrar Deus é inexpressiva), você desejará então
palmilhar os caminhos que levem à sua presença. Esta é a
minha oração por você e também por mim.

Uma encruzilhada

Se você acredita que é possível ter gozo em Deus e se está


começando a perceber o seu desejo de encontrá-lo, então você
chegou a uma encruzilhada. O antigo caminho - esforçando-se
para fazer direito o que lhe cabe, a fim de obter as boas coisas
188
da vida — ainda continua disponível. A sedução é poderosa.
O pássaro em sua mão (controle sobre as bênçãos) parece
valer mais do que dois pássaros voando (a promessa de que
se você achegar-se a Deus, ele se achegará a você).
Mas, você vê outro caminho. O sinal que marca sua
entrada tem a forma de uma cruz, e as palavras na trave
dizem: "O novo caminho do Espírito". É preciso escolher. Vou
examinar meu coração e ver se consigo entender o que está
acontecendo no seu, enquanto confronta essa escolha.
Você sentiu a superficialidade e pressão da vida por longo
tempo. Os prazeres que experimenta não parecem chegar
até sua alma. Eles o deixam vazio e pressionado a buscá-los.
Sente-se como Atlas carregando o mundo nos ombros, mas
seus ombros não são tão largos quanto os dele.
A vida mostrou-se decepcionante. Você não sente a
decepção enquanto está fechando um negócio, fazendo
sexo, comendo ou envolvido em atividades divertidas e
significativas. O que, como é natural, explica seu vício nessas
coisas. Um líder cristão bem-sucedido declarou: — Quando
sua vida está funcionando como deseja e os prazeres
continuam chegando, é difícil interessar-se muito por uma
jornada espiritual. Aquela que está palmilhando é ótima. Nós
a chamamos então de vida cristã e relaxamos. Mas, quando
as coisas ficam difíceis, ou quando compreende que sua vida
apesar de boa não está satisfazendo algo profundo, seu

189
interesse num novo modo de viver se desenvolve rapidamente.
Você talvez já esteja lá. Não se entusiasma mais com o
seminário ou o sermão que promete ensinar "maneiras de obter
da vida o que você deseja" ou "técnicas para tirar proveito do
poder de Deus". O que você quer é poder para conhecer a si
mesmo e conhecer a Deus (o que os teólogos chamam de
"conhecimento duplo") e poder para fundir ambos. Você anseia
por comprazer-se em Deus.
Sua alma, seu verdadeiro eu, o qual quase perdeu de vista
por baixo de todas as atitudes e ocupações, está vazia,
solitária, entediada. Poderia ser diferente. Você sabe disso.
Deve ser diferente. Sabe disso também.
A frase imagem de Deus começa a significar algo. Você tem
noção de que a sua identidade, sua alegria e seu propósito
estão completamente envoltos em seu relacionamento com
Deus. Ele é a fonte, a única fonte, a fonte completa, de tudo
que você foi feito para gozar. Mais dinheiro, casamento
excelente, filhos lindos, amigos íntimos, bom ministério — nada
mais faz isso. Você talvez tenha tentado alguns prazeres
extras. Foram bons, mas só por alguns momentos. Depois,
vazios ainda maiores. Mais vícios. Você começou a entender
que comprou mercadorias falsas. Mentiras, tudo mentira.
Alguma coisa está faltando. Alguma coisa está errada. A
maneira como está vivendo, a maneira como a maioria dos
seus amigos está vivendo, não leva a um bom lugar.

190
A vida abundante oferecida por Jesus não consiste no que
geralmente chamamos de bênçãos da vida, apesar do que
ouviu de muitos púlpitos e leu em muitos livros. As bênçãos
são boas, mas não bastam. Não para a sua alma. E agora
você sabe que tem uma alma. Você é uma alma, criada por
Deus para Deus, para encontrar-se em Deus, e depois viver
por meio de Deus.
Você não pode descansar até que descanse em Deus. Não
pode celebrar como deve até que celebre a Deus mais do
que tudo que é bom — ou mau.
É possível que nunca lhe ocorresse antes que o que está
faltando é o gozo parcial de Deus,
 não mais obediência,
 não mais disciplina,
 não mais bênçãos,
 não mais ministério,
 não mais segurança emocional,
 não mais oração,
 não mais auto-estima.

O que está faltando em sua vida é uma experiência


genuína, profunda, da presença de Deus, uma experiência
satisfatória nos recessos mais profundos da sua alma.
O que está errado é que se acha vivendo no antigo
caminho. Isto explica por que não está tendo prazer em
Deus. Está vivendo para usar Deus a fim de gozar outra
191
coisa. Nunca considerou seriamente o convite radical para viver
o novo caminho, a entregar tudo a Deus e correr o risco,
aproximar-se dele na esperança que conhecê-lo irá torná-lo
inteiro, mas só quando deixar de exigir inteireza e alegrar-se
apenas na sua glória.

Hora de avançar

Você já pensou que viver para a vida melhor é um insulto a


Deus? E o mesmo insulto do filho pródigo ao pai: — Seu único
valor é o que pode fazer por mim. Não me interessa conhecê-
lo. Dê-me apenas o que necessito para ter prazer nesta vida.
— E praticamente assim que pensamos.
Nana Mareia, uma amiga íntima, com seu marido,
Randyman, trazem sempre presentes para nossa neta de
quatro anos, Josie. Na festa de aniversário da mãe, Josie ficou
imaginando o que Nana Marcia lhe trouxera. — Josie, esta
noite todos estamos dando presentes à sua mãe. Não é
maravilhoso?
Quando a expressão de Josie mostrou que ela não tinha
muita certeza, Nana Mareia acrescentou: — Mas, eu sempre
dou a você o maior presente de todos — meu coração.
Josie sorriu. Penso que ela ainda queria uma boneca nova —
qual a menininha que não deseja isso? Ela quer bênçãos como
nós, mas algo em sua alma em desenvolvimento se alegrou
naquele momento especial com uma amiga especial. Ela não
192
compreendeu tudo, mas o mais importante conseguiu
entender. Experimentou uma alegria passageira no
relacionamento com alguém que a ama. Pode ter avançado
mais do que muitos de nós.
Algo está faltando em nossas vidas. É o prazer em Deus
como nosso supremo tesouro. Algo está errado com nossa
abordagem da vida. E a determinação insensata de ter
satisfação em outra coisa tanto quanto em Deus e de
valorizar nosso prazer mais do que a glória de Deus.
Todo indivíduo que goza de qualquer forma de prazer
sexual fora do casamento comete um erro. O mesmo
acontece com aquele que dá mais valor a um grande
ministério para Deus acima de uma comunhão profunda com
ele. Não há muita diferença entre os adeptos da pornografia
e os fariseus e muitos dos primeiros estão mais próximos de
se encontrarem com Deus.
O antigo caminho é perverso. É guiado pela nossa paixão
de que algo além de Deus "satisfaz nossa alma. A pressão
está ligada; temos de conseguir "essa outra coisa". É a
pressão de gozar algo além de Deus que nos mantém
ocupados demais, religiosos demais, comprometidos demais
com o ministério, envolvidos demais com nossa família,
responsáveis demais pelos amigos, conscienciosos demais
como pais e determinados demais a viver como devemos.
Esta é a geração cansada. Os cristãos estão tão
corrompidos quanto os pagãos, algumas vezes mais.
193
Estamos desanimados com nós mesmos e com a maneira
como a vida está se desenrolando para nós. Pensamos
durante anos que seria diferente. Algumas vezes imaginamos
se vale a pena viver como cristãos. Verifique se o sangue está
cobrindo você para assegurar seu lugar no céu, depois viva
para esta vida. Se o cristianismo ajudar, ótimo, caso contrário...
Está na hora de pôr de lado nosso cinismo, de avançar para
além da vida sacrificial e abandonar tudo que impeça uma
experiência profunda com Deus. Espero que esteja
desesperado por um encontro divino, um encontro genuíno,
não-planejado, profundamente sentido, que tanto exponha os
prazeres pecaminosos como imitações baratas da alegria da
alma como nos revele que nosso nervosismo sobre a nossa
vida vir a ser ou não boa é um insulto ao Deus que dá de si
mesmo a nós e diz: — Aproveitem a festa!
É claro que continuaremos a sofrer quando coisas más
acontecem. Sofrimento com as provações, como a dor de uma
pedra nos rins, é humano e não pecaminoso. Mas, desespero é
pecado. É su-bumano sentir como se a sua fonte de verdadeira
alegria fosse tirada quando um filho se rebela ou um ente
querido morre, um negócio fracassa, ou uma tentação imoral
vence.
A presença de Deus continua. Não há motivo para rasgar as
roupas.77 Ouvi certa vez uma definição de adoração como o ato
de celebrar a disponibilidade de Deus.

194
Um antigo mentor, agora festejando no céu em pleno gozo
de Deus, disse-me um dia: — O cristão sempre tem razão
para celebrar. Quando fracassamos, celebre a sua graça.
Quando somos abençoados, celebre a sua misericórdia.
Quando outros nos rejeitam, celebre o seu amor.

Será mesmo possível?

Ao descobrir o seu desejo de Deus, você pode estar


também descobrindo sua vontade secundária por um
relacionamento com outros. Você anseia por conversas
significativas. Em algum ponto, compreende como deseja
abençoar a outros, mesmo que não seja abençoado por
outros. Se não estiver onde estou na jornada, discerne
melhor seu desejo de relacionar-se de tal modo que o elevem
a um nível mais alto de experiência espiritual.
Você almeja envolver-se em alguns relacionamentos onde
possa ser conhecido em segurança amorosa, explorado com
genuíno interesse, descoberto pela sabedoria esperançosa, e
tocado pela fonte de poder espiritual. O novo caminho do
Espírito é uma estrada que leva a um encontro com Deus, à
comunhão com outros, e a uma formação espiritual em seu
íntimo.
Isso é realmente possível? Um novo caminho realmente
existe?

195
Contemplo a minha vida e algumas vezes me admiro. A idéia
de um novo caminho parece passageira, como uma declaração
exagerada feita por um bom merchandising. Até a discussão
bíblica deste novo caminho, o que se leu até agora neste livro,
pode parecer teologia de algodão-doce. Embora a frase "o
novo caminho do Espírito" tenha sido inspirada pelo Espírito e
escrita pelo apóstolo Paulo, pode parecer-nos uma porção de
palavras soltas e doces que nada oferecem de sólido enquanto
vivemos neste mundo.
O telefone toca. Algo deu errado, e você deve resolver a
situação. Nesse momento, falar de prazer em Deus soa como
um chavão inoportuno, uma irrelevância piedosa, algo só
interessante para os monges, os contemplativos, as pessoas
afastadas dos desafios da vida real, pessoas tão místicas que
estão mais interessadas em recuar espiritualmente do que em
enfrentar a vida.
Você tem um problema nas mãos, um incêndio a apagar.
Está aberto a qualquer ajuda de Deus — mas comprazer-se
nele? Isso parece no momento tão inútil quanto conversar
socialmente com seu cirurgião a caminho da sala de operação.
Comunhão? Não! Não agora! Basta funcionar! Faça o seu
trabalho! Não me mostre fotos de seus filhos — não me importo
se seu filho joga futebol. Lave as mãos, ponha as luvas, depois
pegue o bisturi e me cure. Pelo amor de Deus, cure-me!
O que queremos dizer, na verdade, é "cure-me por minha
causa, e não por causa de Deus". Dizemos "pelo amor de
196
Deus" porque não podemos imaginar que um Deus bom teria
um interesse maior do que consertar o que está errado em
nossas vidas. Temos a verdade "instrumentada". A verdade,
inclusive a verdade bíblica, foi reduzida a idéias úteis, a uma
compreensão das coisas que podemos controlar para
alcançar nossos fins. Perdemos a verdade como uma pessoa
a quem amar. Não é de surpreender que os pós-modernos
introduziram uma versão falsa do novo caminho. Não é de
admirar que as idéias da Nova Era continuem populares e
influentes.
Comprazer-se em Deus?
 Quando nosso filho foi preso?
 Quando o seu casamento está desmoronando?
 Quando sua mulher está com Alzheimer?
 Quando a sua solidão alcança novas dimensões que não
consegue mais suportar?
 Quando o conflito sexual que pensava ter controlado
surge mais incontrolável do que nunca?
Comprazer-se em Deus? Em meio a tudo isso? Pura fantasia!
Insensatez espiritual! Escapismo! Teologia de algodão-doce!
Ou será?
A Bíblia nunca erra. Deus diz que nela há um novo modo
de viver. É o caminho do Espírito. O Espírito se alegra em
revelar a beleza de Cristo. Cristo não tem maior prazer do
que revelar o amor do Pai. O novo caminho do Espírito nos

197
convida a participar dos prazeres de Deus, a entrar em alegre
comunhão com cada membro da Trindade.
Comprazer-se em Deus? Sim. Em meio às dificuldades?
Sobretudo estas.
As mesmas dificuldades e escolhas enfrentam tanto os
revolucionários do novo caminho quanto os seguidores do
antigo. Ambos devem decidir se devem pagar fiança pelo filho
preso. Deixar de ceder à autopiedade e obrigar-se a sair do
seu apartamento solitário. Às vezes, ambos precisam esforçar-
se ao máximo para manter-se sexualmente puros e certas
vezes os dois falham.
Mas, a razão de fazerem o que fazem é diferente. Os que
continuam no antigo caminho sentem a pressão para calcular
que curso de ação irá produzir os resultados que almejam —
um filho arrependido, novos amigos, tentação enfraquecida. A
vida cristã para eles é uma técnica, uma fórmula para gerar um
resultado, uma receita para tornar a vida saborosa. A verdade é
instrumentada.
No novo caminho, tudo que fazemos vem de um coração que
já se achegou a Deus, que está ancorado nesse
relacionamento, que procura em Deus qualquer alegria e
esperança necessárias para continuar vivendo, que não exige
nada mas celebra Deus em tudo. No novo caminho, a verdade
é personalizada. Para os revolucionários do novo caminho,
viver é Cristo - e não criar filhos piedosos, fazer novos amigos
ou até viver de maneira correta do ponto de vista moral.
198
Deixe Isaque nascer!

O novo caminho é possível? Pode alguém viver realmente


o novo caminho do Espírito?
Abraão não tinha tanta certeza. Quando Deus apareceu ao
patriarca e disse: — Você, meu idoso amigo, e sua esposa
avançada em anos vão ter um filho daqui a um ano —,
Abraão não ficou muito entusiasmado. — Deus — replicou
ele (a história é contada em Gênesis 17) —, já ouvi isso
antes. Anos atrás, tu disseste que Sara e eu teríamos um
filho. Mas, isso não aconteceu, e agora é tarde demais. Seria
necessário um milagre para que concebêssemos agora. Não
estou certo se quero aumentar minha fé até esse ponto. Já
vivi pela fé em várias situações. Deixei minha casa sem
qualquer outra garantia além da tua palavra. Mas agora, isso
é demais. Estou um pouco cansado de viver pela fé.
Francamente, Deus, estou quase perdendo as esperanças.
Acho que prefiro uma vida controlável, natural.
Abraão olhou então para a planície na direção da sua
tenda. Ali se achava sua linda esposa de outrora, agora uma
mulher de noventa anos, pouco atraente para o sexo e
provavelmente desinteressada e inadequada para ele.
Ismael, seu filho adolescente, concebido com outra mulher,
se encontrava também ali. Um jovem de boa aparência e
saudável.

199
Abraão teve uma idéia. — Deus, e se me deres as bênçãos
prometidas por meio do filho que já tenho? Ismael nasceu de
maneira natural, afirmo isso. Nenhum milagre foi necessário,
apenas um momento de comprometimento. Isso tornaria as
coisas muito mais fáceis. Já fiz algo que deu certo. Isso não
seria suficiente? Oh! Deus, tomara que viva Ismael!78
Esse tem sido o meu clamor por cinqüenta anos. Quero
saber que posso fazer algo que trará as bênçãos que desejo.
Esperar por um milagre me deixa fora de controle. Não gosto
disso. Quero crer que se fizer as coisas certas, minha vida vai
funcionar, que Deus me abençoará com o que eu pensar que
necessito a fim de me sentir contente.
— Por favor, Deus, não fizeste isso para Abraão, mas tinhas
planos especiais para ele. Em minha vida, por favor, tomara
que viva Ismael!
Para começar no novo caminho, temos de mudar nossa
oração.
— Deus, não sei como vais produzir o fruto de um amor
consumidor por ti em meu coração. Pareço encontrar muito
maior prazer nas boas coisas da vida, e algumas vezes no
pecado, do que em conhecer-te. Gosto mais das bênçãos que
do amor que sinto por ti. Tenho mais satisfação em outras
coisas do que em ti. Será necessário um milagre para mudar
isso.
— Tu me dizes que o milagre já aconteceu, que tenho um
novo coração que o deseja como seu prazer supremo. Mas,
200
não sei como tornar isso real. Posso achegar-me a ti na
condição em que estou, como Abraão aproximou-se de Sara
como um velho idoso e cansado. Foi necessário um milagre
para eles conceberem. Mas, tu o fizeste. Confiarei em ti para
um milagre semelhante em minha vida. Deus, expulso agora
Ismael e sua mãe.79 Não quero ser mais tentado para voltar
ao velho caminho de fazer minha vida funcionar. Aspiro a
uma vida sobrenatural. Vou a ti como estou. Deus, deixa
Isaque nascer!!
Que essa seja a nossa oração, enquanto examinamos
juntos o que significa viver no novo caminho.
Estamos cansados de controlar a vida. O antigo caminho
nos esgotou. Queremos crer agora que é possível
comprazer-se em Deus, embora não como acontecerá no
céu; cremos também que o gozo parcial de Deus disponível
agora ultrapassa de muito a alegria completa de qualquer
outra coisa.
Estamos prontos para ir a Deus, como estamos — nariz
escorrendo, rosto sujo, roupas rasgadas, desesperados para
encontrá-lo, clamando pela graça como nossa única
esperança, insistindo em não marcar um horário para o
nosso Deus soberano seguir, mas confiando em que ele se
revelará a nós porque é isso que quer fazer. É isso que
prometeu fazer, mesmo às custas da morte terrível e bela de
seu Filho. É o Plano Emanuel.
O que fazemos então?
201
Agora que estamos dispostos, como vivemos no novo
caminho do Espírito? Essa é a pergunta que vou discutir nos
capítulos finais deste livro.
A pressão acabou!
Está na hora de experimentar nossa liberdade.

CINCO BLOCOS DE CONSTRUÇÃO DA VIDA DO NOVO


CAMINHO

Não existe uma relação linear segura entre a escolha de viver


como cristãos e a distribuição de bênçãos por Deus para nós
nesta vida. Um padrão geral, sim, mas não uma relação linear
invariável de causa e efeito. Nada que fazemos garante as
bênçãos que desejamos.
Os bons pais têm mais freqüentemente bons filhos do que os
maus. Mas, nem sempre. Não temos controle sobre o
desenvolvimento de nossos filhos. É errado — faz parte do
antigo caminho — tentar educar bem nossos filhos se nosso
principal motivo for criá-los para nossa satisfação. Isto é
idolatria. É amar alguma coisa mais do que a Deus. É
contemplar algo além de Deus para nosso supremo prazer.
Se você tiver sucesso, ficará orgulhoso. Se fracassar,
vacilará entre o desprezo por si mesmo ("O que fiz de errado?")
e a falta de consideração de seus filhos ("Como puderam agir
assim depois de tudo que fiz por eles?").

202
Os líderes cristãos que servem fielmente a Deus gozam no
geral da sua bênção em sua vida e ministério. Mas, nem
sempre. Servos humildes podem trabalhar sem ser
reconhecidos em ministérios visivelmente ineficazes durante
anos, depois morrer na obscuridade, enquanto egoístas
talentosos podem ter ministérios bem financiados,
internacionalmente conhecidos, que atraem seguidores aos
milhares.

Não rapidamente, mas acontece

Não existe uma linearidade garantida entre a vida reta e a


bênção visível. O antigo caminho pensa que existe.
Existe, no entanto, uma relação linear entre a escolha de
viver no antigo ou no novo caminho e nossa experiência de
Deus. A vida no antigo caminho nunca nos leva a comprazer
com Deus nem nos torna semelhantes a ele. Ela se preocupa
em usar Deus e não conhecê-lo. O fruto do antigo caminho
não inclui verdadeira adoração, real comunhão ou formação
espiritual.
Se semearmos para a carne, só colheremos o que a carne
produz. Ismael vive. Isaque é natimorto. Só temos a garantia
de uma vida apenas natural e seu fruto inevitável, uma alma
faminta e contenciosa, embora bem disfarçada. Nosso vazio
interior nos leva então a um estilo de vida que gira ao redor
das necessidades e anseios que sentimos. Vivemos como
203
cristãos a fim de satisfazer nosso apetite. Não vivemos para
Deus nem para desfrutar e compartilhar da sua glória, mas
para uma plena satisfação do nosso ego, cuja jornada de
aventura e significado nos rendem uma vida cheia das bênçãos
que apreciamos. Algumas vezes, as escolhas que fazemos em
busca da vida melhor são visivelmente erradas. Outras vezes,
são reconhecidamente erradas somente quando os motivos
pessoais por trás delas são expostos.
Se semearmos para o Espírito, colheremos o que só o
Espírito pode produzir: amor, alegria, paz, longanimidade,
benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio.80
No útero de nossas almas, Isaque é concebido e finalmente
nasce. Se nos mantivermos no novo caminho, ele cresce até a
maturidade. Milagrosamente, encontramos Deus,
experimentamos a comunhão e nos tornamos como Cristo. Não
acontece rapidamente, mas acontece.
Viver para a glória de Deus, e não para as bênçãos que esta
vida pode prover, garante a presença ativa de Deus conosco,
algumas vezes sentida e apreciada, outras em que a sua
presença não é sentida durante noites longas e escuras, em
que não há nem bênçãos visíveis dele nem experiências de
intimidade com ele.

O Espírito, porém, está sempre ativo. Cremos nele e temos


esperança. Passamos finalmente a experimentá-lo e a
conhecer alegria. Ao longo da estrada, o novo caminho, somos
204
libertados do impulso de abastecer-nos, de nos manter
satisfeitos com base nas coisas boas em nossas vidas, e
libertados para viver para Cristo e amar tanto a Deus quanto
a outros. Entramos em comunhão com a Trindade, como
escolares aprendendo as primeiras letras, mas nossa alegria
é real: ela é parcial, mas real. Chega a seu tempo, com toda
certeza. Existe uma relação linear entre viver no novo
caminho e comprazer-se; com Deus.
Surge então a pergunta: Como vivemos o novo caminho?
Queremos fazê-lo, mas como?
A revolução que visualizo será incentivada pelo novo
caminho para pensar, viver e relacionar-se. Começa com o
ato de pensar. Somos transformados pela renovação das
nossas mentes e não das nossas circunstâncias; não somos
mudados ao reorganizar as bênçãos em nossa vida ou usar
de estratégias para torná-la um pouco melhor do ponto de
vista funcional ou vencendo a nossa baixa auto-estima e
emoções conturbadas, mas renovando a maneira como
pensamos sobre esta vida.
Quero propor cinco blocos de construção da vida do novo
caminho, cinco elementos que juntos colocam um
fundamento e indicam a direção para tudo que fazemos.
Essas cinco idéias são derivadas da natureza da nova
aliança, o trato que vigora hoje entre Deus e nós. Eles levam
a sério o que Deus nos revelou na cruz de Cristo, tanto sua

205
estimativa do nosso pecado, como a revelação de sua
santidade, ira e amor.
Em certo sentido, são idéias não lineares. A forma como nos
aproximamos de Deus não garante a maneira como ele virá a
nós ou quando permitirá que sintamos a sua presença entre
nós. Nada do que fazemos faz qualquer coisa acontecer.
Mas, desde que a nova aliança está agora vigorando,
achegar-se a Deus garante que ele irá achegar-se a nós,
conforme a sua conveniência e ao seu próprio modo, não por
causa do mérito da nossa aproximação, mas por causa da sua
graciosa promessa de achegar-se a nós se nos achegarmos a
ele.
Se seguirmos o seu Espírito, se andarmos pelo novo
caminho, vamos experimentar o amor do Pai e contemplar a
beleza de Cristo. Jesus prometeu manifestar-se aos que o
amarem mais do que às bênçãos.81 É uma relação linear:
Semeie para o Espírito e irá colher do Espírito.

Cinco idéias básicas

A nova aliança oferece tanto os recursos de que precisamos


para ir a Deus como a garantia de que ele virá a nós. O novo
caminho leva à intimidade com Deus.

206
1. Com o grito crescendo em nossos corações

Vou expulsar Ismael; deixe Isaque viver! quero agora


sugerir as cinco idéias básicas que irão guiar-nos à vida do
novo caminho e descrever brevemente cada uma delas. (Vou
dedicar o restante do livro para apresentá-las mais com-
pletamente.)
Se você quiser viver no novo caminho do Espírito, então: 1.
Reflita sobre onde está.
Não são muitos os cristãos que encontram o sinal vermelho
na lista do shopping, mostrando onde se encontram. Muitos
nem sequer o procuram.
Cada nova jornada começa onde você se encontra. Saber
o que está acontecendo em seu íntimo é importante. Um
duplo conhecimento também: Você não pode conhecer a si
mesmo, sem conhecer Deus e não pode conhecer Deus, sem
conhecer a si mesmo.
Prometa, então, diante de Deus e da sua Palavra, não fingir
a respeito de nada.
Tome tempo para refletir, algumas vezes com outros que
lhe darão uma opinião sincera sobre onde você está,
especialmente sobre o que está acontecendo em seu mundo
interior.
Você saberá que esta reflexão está agindo quando
começar a sentir a libertação penosa do quebrantamento,

207
não das mágoas em sua vida que não pode reviver, mas do
orgulho que não consegue eliminar.
A energia do antigo caminho continua em nós. Até
chegarmos ao céu, ela sempre estará e não vai melhorar. Mas,
a energia do novo caminho também está em nós, se formos
cristãos. Reflita sobre a batalha pelo domínio entre as duas
fontes de energia.

2. Reconheça a encruzilhada no caminho que está


sempre diante de você.

Dois caminhos se apresentam constantemente diante de


você. Especialmente quando algo errado acontece em sua vida
- problemas financeiros, um relacionamento perdido, o
aparecimento de um problema emocional -, você tem uma
escolha a fazer entre o antigo caminho, tentando manipulá-lo
bem a fim de melhorar as coisas, ou o novo caminho de
achegar-se a Deus e depois enfrentar seus problemas com
nova energia, sabedoria e propósito.
O antigo caminho pode identificar anseios pessoais
profundos, mas são sempre sobre você, o seu bem-estar e
conforto. A sabedoria do antigo caminho nunca revela sua
ânsia mais profunda, seu desejo de Deus, seu desejo ardente
pela sua glória acima de tudo o mais. Pelo contrário, ele enfoca
como você deseja apaixonadamente que a vida funcione e se

208
concentra em desenvolver estratégias eficazes para que isso
aconteça.
O novo caminho oferece uma estrada diferente. Não
começa com a identificação de seus anseios mais profundos,
mas com seu maior defeito. Do quebrantamento vem o
arrependimento que evidencia seu anseio pela glória de
Deus, uma ânsia que então o atrai para o novo caminho.

3. Focalize novamente suas metas.

Admita quais foram as suas paixões principais, quais os


alvos que tem buscado.
Lembre-se de que nossos corações foram feitos para Deus
e, como disse Agostinho, não descansaremos até
encontrarmos descanso nele.
Buscar com entusiasmo um encontro com Deus nunca é
natural, ou uma comunhão espiritual onde as pessoas são
conhecidas, exploradas, descobertas e tocadas, ou a
transformação que nos faz mais semelhantes a Cristo. Se
não pensarmos a respeito, iremos perseguir alvos que
surgem naturalmente — afluência material, conforto pessoal
e físico, e eficiência socialmente aceitável no arranjo da vida
que desejamos.
Os revolucionários do novo caminho focalizam
continuamente suas metas, a fim de buscar aquilo para o
qual foram criados para gozar: encontro espiritual, encontro
209
comunitário e formação espiritual. O novo caminho é o caminho
do Espírito.

4.Compreenda o que Deus oferece como o um meio da


graça.

Só a graça dará à luz Isaque. A graça para isso está à


disposição, seu suprimento é ilimitado, em qualquer
circunstância.
Devemos nos humilhar para receber graça da maneira que
Deus se agrada em dá-la. Se isso significa mergulhar sete
vezes num rio lamacento, devemos fazê-lo. Receber graça
sempre requer humilda-de; requer a morte do orgulho e auto-
suficiência.
O meio essencial da graça inclui adoração, meditação sobre
a Palavra de Deus e aprender sobre e depender da obra
septuplicada do Espírito Santo (que irei destacar especialmente
mais tarde). Há, porém, outros.

5.Reoriente sua vida de oração para corresponder á vida


do novo caminho.

Se vivemos para as bênçãos, oramos de certo modo.


Se vivemos para conhecer Deus, oramos de outro modo.

210
Há um modo de orar que surge da apreciação do acesso
que a nova aliança nos dá à presença de Deus e que nos faz
avançar na viagem pelo novo caminho.
Você pode ajustar as velas da sua vida de oração de
acordo com o vento do Espírito de Deus. É uma estrutura de
oração com ritmo espiritual. Eu a chamo de Oração do Pai e
irei também examinar isto com você em mais detalhes
posteriormente.
A pressão acabou!
Podemos viver em um novo caminho.
Vamos começar o próximo capítulo refletindo sobre a nossa
jornada e admitindo sinceramente onde realmente estamos.

ONDE ESTOU? ENCONTRANDO O SINAL VERMELHO

Convido você agora para juntar-se a mim e examinar melhor


nosso mundo interior. Ao fazermos isso, tenha em mente uma
verdade vital que irá sustentar-nos: Quebrantamento é o
caminho para a liberdade. Quando vemos em nós coisas que
desejaríamos não ver e compreendemos que não é possível
fazer absolutamente nada para limpar as impurezas
encontradas, entramos na experiência libertadora do
quebrantamento.
Quanto tempo ficamos ali antes de sentir liberdade é
responsabilidade do Espírito. Pode ser dias, semanas, anos.
Algumas vezes o fruto da nossa aflição só é visível em nossa
211
herança. Devemos simplesmente confiar no Espírito. O consolo
é sua obra soberana.
Deus ordena aflições e problemas,82 mas sempre com o
propósito de nos libertar para servi-lo no novo caminho do
Espírito. Esse Espírito, em seu calendário, coloca o holofote na
graça e permite que sintamos quando ele derrama o amor do
Pai em nossos corações por mais que falhemos e nos
esforcemos.
É o provar do amor divino, diferente de qualquer amor que
conheçamos, que nos atrai para a mesa a fim de comermos
novamente. Quase podemos ver o Espírito sorrir, às vezes,
enquanto nos empurra para a mesa e puxa a cadeira para
sentarmos.
Preste atenção e talvez ouça quando ele diz:
— Você pode vir como está, neste momento. Nenhum
castigo, só arrependimento. Sei que está vendo a desordem.
Eu o ajudei a vê-la. Mas o Pai só vê a beleza de Cristo. Venha,
coma e beba. Entre na sua presença, sob os termos da nova
aliança. Você é tão puro quanto Cristo. Pertence ao Pai. Você
o deseja acima de todos os outros desejos. Vou agora
aprofundar a sua percepção de tudo que é verdadeiro,
libertando-o para entrar sem medo num lugar onde muitos
morreram. Entre nos méritos da cruz.
Quebrantamento e liberdade andam juntos, nessa ordem;
primeiro sofrimento, depois consolo; primeiro aflição, depois
alegria; primeiro sentimento de indignidade, depois sentimento
212
de amor; primeiro a morte do "eu", depois a ressurreição da
alma.
É um ciclo. Primeiro desce, depois sobe, desce em
seguida, outra vez, mais ainda, sobe de novo, desta vez
mais alto. Quando descobrimos o sinal vermelho que marca
onde estamos em nossa jornada, vamos sempre
experimentar quebrantamento. É o ponto de partida contínuo
para cada novo passo em direção a Deus. O quebrantamento
nos ajuda a desviar nossos olhos, não para as bênçãos de
uma vida melhor — essas bênçãos nunca curam o
quebrantamento, apenas o cobrem — mas, para a intimidade
prometida como nossa melhor esperança.
E a falha em descobrir onde estamos em qualquer
momento que nos impede de compreender aonde mais
desejamos ir. Até confrontar um quebrantamento interior que
nenhuma bênção desta vida pode consertar, seremos
irresistivelmente atraídos para o antigo caminho.
Vejamos, agora, como isto acontece. A viagem pelo novo
caminho começa com uma surpreendente revelação, não
sobre nós, mas sobre Deus. O Deus Santo e Inigualável, por
ser magnífico, deseja que tenhamos prazer ao nos
aproximarmos dele, a fim de que nos sintamos realmente
bem. Ele nos fez para o seu prazer quando nos
comprazemos nele.
No entanto, adequadamente, ele é um Deus zeloso. Isso é
apenas razoável para ele. Ele exige que o apreciemos como
213
nosso bem supremo porque é isso que ele é. Não vemos isso,
porém, desse modo, sem a ajuda sobrenatural.
Deus jamais permitirá que gozemos plenamente dele
enquanto pensarmos nele como um bem entre muitos. A razão
é simples: Não pode ser feito. Nenhum comensal aprecia a
primeira fatia de carne colocada à sua frente, se interromper
regularmente a refeição e correr para a casa do vizinho a fim
de experimentar o naco de carne de outra pessoa.
Quando o povo de Deus declara lealdade a ele, mas exige
prazer de outra fonte — cônjuge, filhos, amigos, ministério,
saúde, sucesso — Deus os acusa de adultério. Essa é uma
ofensa capital. Deus, então, mata primeiro o seu Filho, no lugar
deles. Depois, como Oséias com Gômer, separa-se deles, mas
só para fazer com que voltem com prazer a aproximar-se outra
vez. A separação se destina a despertar o apetite deles pelo
que está faltando, para aumentar a percepção de que só a
presença de Deus pode satisfazer a profundidade do desejo
humano.
Considere o convite de Deus para nós. Não se trata de: —
Ore deste modo e não daquele; e, como um gênio da garrafa,
vou dar-lhe o que quer que ache que o fará feliz.
Não, o seu convite é muito diferente. Como nosso Pai, Deus
dá as boas-vindas a seus filhos à mesa da família e oferece ali
uma esplêndida festa — ele mesmo. — Venham, tomem seu
lugar assegurado por meu Filho. Meu Espírito os trouxe aqui.
Contemplem agora a Cristo para ver-me. Bebam-me. Comam-
214
me. Satisfaçam-se com o meu amor que os deixa ver-me e
viver. Sintam reverência pelo meu esplendor e majestade até
compreenderem que não há nada que brilhe mais do que eu,
que vocês são peixes e eu sou o oceano. Qualquer outra
água não passa de uma poça de lama em comparação.

Onde você está


Estamos agora preparados para perguntar: Onde estou?
Onde está o sinal vermelho?
Na autoridade da Palavra de Deus, posso dizer-lhe onde
você está. É onde também estou. Posso dizer-lhe o que se
passa em seu íntimo. E se conseguir ver, se reconhecer onde
se encontra, será atraído para o novo caminho. Vai
abandonar seu flerte com as bênçãos e se curvará diante de
Deus, sem nada exigir. Farei também isso.
Há duas atitudes distintas em nosso íntimo. A primeira está
em todos, cristãos ou não. Isaías olhou para o povo de sua
época e viu que todos eles, como ovelhas, haviam seguido
por um caminho errado. Todos foram pelo caminho que
parecia natural: Faça o que achar melhor e espere que a vida
funcione. O diagnóstico de Isaías é severo: "Desde a planta
do pé até à cabeça não há nele coisa sã, senão feridas,
contusões e chagas inflamadas".83
Ele está descrevendo a energia natural que governa cada
filho e filha de Adão até que se tornem filhos de Deus. Essa
energia, que ainda existe em nós depois da conversão, pode
215
ser tida como nossa resposta ao convite de Deus. Deus nos
oferece a oportunidade de deleitarmos nossas almas nas
iguarias mais ricas, de sentarmos à mesa e nos
banquetearmos em Cristo, e não aceitamos. Somos como
crianças a quem é oferecida uma nota de mil dólares e que
prefere uma moeda brilhante de dez centavos.
— Obrigado, muito obrigado. Faço isso aos domingos
durante uma hora. Eu adoro Cristo. Sem ele iria para o inferno.
Sou imensamente grato.
— Agora que a questão da minha eternidade está felizmente
estabelecida, estive pensando. Ficaria muito mais feliz,
realmente satisfeito e até alegre, se me concedesse esta
bênção particular. Significaria muito para mim. E eu cantaria os
seus louvores. Daria testemunho em voz alta de sua bondade
inesgotável e amor fiel se apenas...
— O quê? Estás me dizendo que o teu amor já foi
plenamente manifestado em Cristo? Oh! concordo. E agora que
o tenho, gostaria de receber o restante. É claro que estou
disposto a fazer a minha parte. Vou criar meus filhos, amar
meu cônjuge, relacionar-me com meus amigos, orar pelo meu
ministério, dar o dízimo de meus ganhos, tudo de acordo com
os seus ensinamentos. Farei o que exigires. Apenas faze-me
saber o que devo fazer, e tentarei fazer o melhor. Tu podes
contar comigo. E sei que posso contar com o Senhor. Tu já me
deste Cristo, sei então que não vais reter qualquer outra coisa
boa. Traze agora o que realmente desejo. Grande é a tua
216
fidelidade. Agradeço-te antecipadamente as bênçãos que
estás prestes a derramar sobre a minha vida. Obrigado!
Essa é a energia do antigo caminho. Eu a sinto movendo-
se em mim. E sei que é forte. Sei que é tão forte que só um
encontro direto com Deus vai estimular a energia melhor em
mim até que ela governe a minha vida.
Quero falar-lhe muito pessoalmente. Experimentei a
energia melhor em mim, que prefere achegar-se a Deus a
usá-lo para abençoar a minha vida. As Escrituras me
asseguram que ela existe, quer eu a sinta ou não. É o novo
coração prometido e provido na nova aliança.
Esforço-me, porém, para crer que, durante a minha
jornada na terra, vou encontrar Deus tão imediatamente que
a melhor energia do Espírito irá fazer-me vibrar com Cristo,
aconteça o que acontecer. Não estou ali. Minha idéia de vida
continua a ser o céu mais tarde e as bênçãos agora.
Continuo esperando o encontro com Deus que irá mudar
isso. Aconteceu para Isaías. Aconteceu para Paulo, Lutero,
Wesley e Bunyan. Acontecerá um dia para mim? Algumas
vezes perco a esperança.
Quando faço isso, tento controlar minha vida sem Deus.
Ele me convida a comprazer-me nele. Bastante frustrado,
replico: — Mas tu deves revelar-te a mim. Posso achegar-me
a ti, mas é preciso que te aproximes de mim. Não
experimento a tua presença como a realidade mais viva e
agradável em minha vida. Até que isso aconteça, por favor,
217
deixe que faça uso de ti para obter o que parece mais
disponível — menos depressão, mais autoconfiança, um
ministério mais poderoso, um casamento ainda melhora filhos
que continuem seguindo o Senhor.
A lista é longa. Mas parece razoável e possível. Os itens da
lista definem o que julgo ser uma vida melhor. Tento, então,
viver bem, esperando as bênçãos que virão. É o antigo
caminho.
O que Jesus tinha em mente quando disse que há um
caminho para a vida abundante de conhecer e gozar a Deus,
mas "estreita é a porta, e apertado, o caminho que conduz para
a vida, e são poucos os que acertam com ela"?84
Por que há tão poucos John Bunyans hoje? Reflita sobre a
vida dele um momento. Ele encontrou essa porta estreita.
Considerou Deus precioso sobre todas as outras bênçãos.
Viveu o novo caminho.
Durante seus doze anos de prisão, longe da mulher e dos
quatro filhos (a mais velha, Mary, era cega), ele entrou pela
porta estreita e seguiu a estrada apertada. Podia ter saído da
prisão quando quisesse, se prometesse nunca mais pregar
Jesus Cristo. Ouça as palavras de um homem entrando no
novo caminho, palavras que revelam a segunda atitude, a
melhor energia na alma de cada cristão que com freqüência
fica ignorada e inerte:
Decidi, o Deus Todo-Poderoso sendo meu socorro e meu
escudo, se a vida frágil continuar por muito tempo, mesmo
218
até que o musgo cresça em minha sobrancelha, que prefiro
então sofrer a violar minha fé e meus princípios.85
Que visão de Deus liberou essa paixão consumidora por
Deus? Mais do que simples força de vontade estava
envolvida.
O primeiro passo para nos achegarmos a Deus,
experimentarmos qualquer paixão e visão dele, é identificar
onde estamos. Se nos aproximarmos dele, ele irá achegar-se
a nós. É uma promessa. O que mais poderíamos desejar?
Especialmente no sofrimento podemos ver os dois
caminhos à nossa frente e as duas energias em nós. Somos
atraídos tanto pelas bênçãos de uma vida melhor como para
a alegria de uma esperança melhor, comunhão com Deus.
Procure o sinal vermelho. Se descobri-lo, sentirá a guerra
em seu interior, a batalha entre as duas energias.
Pode sentir seu desejo de bênçãos e sua disposição para
fazer o que for necessário para obtê-las? Pode reconhecer
isso como idolatria, como preferindo o deus das bênçãos em
vez do Deus que é? Vou
fazer o que é certo, apenas me abençoa. E isso o que mais
desejo!
Essa é a metade do sinal. Pode sentir a outra metade, uma
energia que o move na direção de Deus, não para usá-lo,
mas para absorverse nele, honrá-lo, a qualquer custo? Há
um apelo em relação à idéia de apresentar-se simplesmente,
com todos os seus desapontamentos, exigências e
219
desânimos, ao Pai, e depois permanecer firme e fiel enquanto
espera que ele se achegue a você? Deus, me achego a ti.
Permite que te conheça. É isso que mais quero.

Sempre o quebrantamento

A escolha diante de nós não é fácil. Não foi para Bunyan. A despedida de
minha mulher e pobres filhinhos tem sido muitas vezes para mim neste lugar
como arrancar a carne de meus ossos... Ó, os pensamentos das dificuldades
que minha ceguinha poderia passar partiriam meu coração em pedaços.86

Escolher o novo caminho custa caro. Se não considerarmos


Deus como nossa maior alegria, não teremos o suficiente para
pagar o preço. É pela fé que o vemos como a fonte do
supremo, prazer; é a fé que nos leva a ele até que nos deixe
provar o prazer que cremos estar disponível, e depois ir
novamente até ele.
Se considerarmos Deus como nosso principal tesouro e
vivermos nessa conformidade, iremos parecer inumanos para
alguns; pareceremos excêntricos radicais que levam Deus a
sério demais e acabam tendo uma vida desequilibrada.
Ouça mais uma vez Bunyan enquanto ele expressa duas
crenças que o capacitaram a escolher o novo caminho. A
primeira extraiu de 2 Coríntios 1:9 — "Contudo, já em nós
mesmos, tivemos a sentença de morte, para que não
confiemos em nós, e sim no Deus que ressuscita os mortos".
220
Mediante esta Escritura - disse Bunyan -, pude ver que se viesse
a sofrer retamente, deveria primeiro passar uma sentença de morte sobre
tudo que pode ser chamado apropriadamente desta vida, considerar até a
mim mesmo, minha esposa, meus filhos, minha saúde, minha alegria, e
tudo, como mortos para mim, e eu morto para eles. A segunda maneira
era viver no Deus invisível, como Paulo afirmou em outro ponto; o meio de
não desmaiar é não atentando nós nas coisas que se vêem, mas nas que
se não vêem; porque as que se vêem são temporais, e as que se não
vêem são eternas" (2 Co 4:18).87

Veja o que Bunyan fez. Ele listou todas as bênçãos de uma


vida melhor, tudo de que podia dispor e tudo que desejava, e
declarou-se morto para tudo isso. É claro que ainda ansiava
por gozá-los, mas sua decisão era achegar-se a Deus; em
suas palavras, "viver no Deus invisível".
Isso nos atrai? Para uma igreja sobre a qual a glória de
Deus repousa levemente, para pessoas que crêem que uma
vida de bênçãos neste mundo é necessária e que lhes é
devida, a atitude de Bunyan parece temerária, até um pouco
exagerada. Preferimos um Deus máquina-de-vender a um
Deus soberano e pessoal. Ninguém se achega a uma
máquina-de-vender. Colocamos o dinheiro necessário,
puxamos a alavanca apropriada, pegamos nossa compra e
depois a saboreamos enquanto vamos embora.
Não é essa a vida abundante que Jesus veio dar, um bufê
pródigo de bênçãos?
221
Ou será uma abundância dele?
Esforce-se ao máximo, disse Jesus, para encontrar a porta
estreita que leva à vida, porque "muitos procurarão entrar e não
poderão".88
Lembra-se do orgulhoso fariseu que entrou no templo, ficou
de pé e orou a respeito de si mesmo? "Ó Deus, graças te dou
porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos
e adúlteros, nem ainda como este publicano; jejuo duas vezes
por semana e dou o dízimo de tudo quanto ganho".89
Em outras palavras, faço tudo certo. Agora abençoe-me!
Note a diferença entre o arrogante fariseu e o humilde
cobrador de impostos. Nenhum tinha qualquer direito de exigir
as bênçãos de Deus. Um sabia disso. O outro, não. O fariseu
ainda acreditava na lei da linearidade modificada: Se
cumprirmos quase tudo da lei, então tudo que fizermos irá
prosperar. O cobrador de impostos colocou todas as suas
esperanças na lei da liberdade - venha como está, indigno,
quebrantado, desesperado, e confie que Deus irá achegar-se a
você em vez de bani-lo da sua presença - que é tudo que
merece.
Um princípio valioso emerge desta parábola: A autodescoberta
guiada pelo Espírito de Deus sempre gera quebrantamento,
aumenta a humildade e energiza a dependência e a gratidão.
Tremo quando penso em tudo que passou por
autodescoberta nos consultórios de terapia nas últimas
décadas. Vimos nosso sofrimento, sentimos nossos anseios,
222
enfrentamos o abuso de que fomos alvo, abraçamo-nos
como vítimas e descobrimos a liberdade para buscar
quaisquer sonhos que prometam vida. O efeito foi um
aprofundamento do narcisismo e humildade mais superficial.
Somos mais orgulhosos e menos quebrantados do que
nunca antes. Descobrimos em nós mesmos somente aqueles
apetites que mais bênçãos podem satisfazer. Como cultura, o
cristianismo moderno está comprometido com o antigo
caminho.
Poderia ser diferente.

Os poucos que encontram

Está na hora de uma revolução, afastando-se do antigo


caminho e na direção do novo. A fim de ajudar-nos a avançar
em nossa jornada espiritual, quero terminar este capítulo
listando três características das pessoas que nunca
encontram o seu sinal vermelho, que nunca reconhecem a
energia negativa em si como má e que nunca se deliciam
agradecidas na nova energia que está ainda mais
profundamente alojada em seu ser. Mencionarei em seguida
três características opostas dos poucos que encontram o
sinal vermelho, que reconhecem ambas as energias em seu
interior, que descobrem a porta estreita e que, como Bunyan
e o cobrador de impostos, passam por ela quebrantados para
andar pelo novo caminho apertado.
223
Os seguidores do antigo caminho organizam a vida num
sistema.
Eles odeiam o mistério, fazem tudo que podem para resolver
a tensão, trabalham para encontrar um meio de receber em
suas vidas as bênçãos que, acreditam, os farão felizes. Gostam
da idéia de linearidade; ela sustenta a ilusão de controle.
Encontre o sistema que faz a vida funcionar - encontre o A que
leva ao B. Ele prolonga a esperança de uma vida melhor agora.
Os seguidores do antigo caminho negam qualquer realidade
que contradiga o seu sistema.
Quando alguém que dá o dízimo fica sem dinheiro, sempre
descobre um meio de se justificar. Quando criança, eu nunca
conseguia saber por que, às vezes, tirava nota boa em
matemática quando tinha tido mau comportamento no dia
anterior. Explicava isso, supondo que tinha sido
suficientemente bom para apagar o mal que tinha feito.
Os seguidores do antigo caminho confundem vulnerabilidade
com quebrantamento.
Estão dispostos a ser "francos" e "dizer a verdade", supondo
que a sua vulnerabilidade é uma virtude que merece
compaixão. Reconhecem seus anseios, talvez até sua sede de
conhecer melhor a Deus, mas permanecem ignorantes de sua
sede do próprio Deus ou de suas falhas que os desqualificam
para receber qualquer bênção além de misericórdia. É
característico do antigo caminho perceber esses anseios de

224
que alguma bênção, além da presença de Deus, possa
satisfazer. Isso sustenta o orgulho da independência.
Agora as características opostas.
Os seguidores do novo caminho aceitam a tensão insolúvel
da vida. O mistério sempre permanecerá. Eles compreendem
que nenhum sistema que possa tornar a vida previsível pode
ser conhecido ou controlado. Os behavioristas como B.E
Skinnet estão errados. Os existencialistas como Jean-Paul
Sartre se aproximam mais da realidade. Embora algumas
vezes aterrorizados, os seguidores do novo caminho entram
no mistério da vida sem qualquer esperança além de um
Deus gracioso e soberano, que se move de maneira
misteriosa.
Eles não são existencialistas. Crêem no significado
objetivo. Ele está apenas oculto agora. Sua disposição para
viver sob tensão permite um tipo de diálogo que aqueles que
procuram pelo sistema nunca podem tolerar. Sua esperança
está no Deus invisível.
Os seguidores do novo caminho se esforçam para ser
realmente autênticos.
Quando a vida os confunde ou enraivece, eles admitem
isso. Quando Deus os desaponta ou frustra, conversam a
respeito com ele - e com outros. Entram nas noites escuras
com trêmula confiança de que em algum lugar há luz e algum
dia a verão. Seu descanso está no Deus presente.

225
Os seguidores do novo caminho são cautelosos sobre a
vulnerabilidade, mas vulneráveis ao quebrantamento.
Eles reconhecem que o que chamamos de vulnerabilidade é
no geral um desfile narcisista para atrair apoio. Esses
indivíduos preferem enfrentar em si mesmos apenas o que os
atrai para mais perto de Deus. Compartilhar o sofrimento é
secundário. Compartilhar a fome de Deus e enfrentar o que
impede sua busca por ele é primordial. Seu entusiasmo está no
Deus relacional.
Onde você se encontra? Já descobriu o sinal vermelho? Se
gosta do sistema, preferindo o que é previsível e o controle ao
mistério e à confiança, se tende a negar o que não se ajusta
bem ao seu sistema, se está disposto a compartilhar suas
mágoas mas determinado a ocultar suas falhas, então não
encontrou o sinal vermelho. Onde você pensa que está, o que
sabe sobre si mesmo, só irá encorajar o antigo caminho de
vida.
Se, porém, aceitar a tensão, sabendo que o mistério é a
oportunidade de confiar em vez de planejar, se enfrentar aquilo
que vê com integridade por valorizar a autenticidade, e se o
quebrantamento devido à fraqueza e ao pecado for mais
importante para você do que a vulnerabilidade às feridas que
outros têm infligido a você, então é provável que tenha
encontrado o sinal vermelho. O que descobriu em si mesmo
criou um momento - é um milagre do Espírito - para avançar na
direção de Deus. Você encontrou a porta estreita e está pronto
226
para fazer o esforço de entrar na estrada apertada do novo
caminho.
Se nos tornarmos suficientemente pequenos para nos
esgueirar pela porta, talvez possamos agora ver o que torna
o novo caminho apertado - e ser atraídos por ele.

SUA ESCOLHA DE CICLOS

Penso que estou começando a entender por que Jesus nos


disse para "esforçar-nos ao máximo" a fim de seguir o novo
caminho. Às vezes, pode ser difícil lembrar e crer que Deus é
bom e que ele está presente com a sua bondade em cada
circunstância da vida.
Uma manchete de primeira página hoje dizia: "Buscando
uma cura, vivendo um pesadelo".90 O artigo perturbador
conta a história de duas famílias, cada uma com um filho
sofrendo de uma doença rara, chamada neurofibromatose.
Bob Terrill olha para o rosto inchado da filha de 24 anos e,
com os dedos, soletra: P-A-P-A-I E-S-T-Á A-Q-U-I. V-O-C-Ê
E-S-T-Á S-E-N-T-I-N-D-O A-L-G-U-M-A D-O-R?
Não há resposta. Denise não pode baixar mais o olho
direito, seu modo anterior de dizer "Sim". O pai fala ao
entrevistador: — Não sabemos se ela está sofrendo. Não
sabemos como está se sentindo. Apenas não sabemos.

227
Não há menção de Deus na artigo. Nenhuma evidência da
sua presença na história. Se essa história fosse a minha única
informação, eu não creria em Deus. Como poderia?
O antigo caminho dentro de mim insiste em que vá depressa
para a seção de esportes. O time Tiger Woods está preparado
para um terceiro desafio. Depois para a seção de quadrinhos.
As historinhas de Peanuts continuam ótimas.
Não há nada de errado em apreciar um torneio de golfe ou rir
com os quadrinhos. As diversões oferecem alívio das
dificuldades da vida. Mas meu impulso quase frenético de
mudar de página me faz lembrar da razão para escrever este
livro.

Se o amanhã desmoronar

Há realmente um meio de conhecer a Deus que mantenha a


esperança viva, não a esperança de melhora nesta vida, mas
de podermos experimentar alegria, aconteça o que acontecer?
Ou o que chamamos de fé é algo que só funciona com certas
bênçãos? A vida no antigo caminho é inevitável até para o
cristão mais sincero? Quando a vida se torna amarga, minhas
únicas opções são a distração ou o desespero, aceitar ou
desistir?
Algumas vezes penso que sim. A alegria parece, às vezes,
tão dependente de minha esposa permanecer sadia, meus
filhos e netos estarem bem, minha saúde, ministério e conta
228
bancária em ordem, meus amigos continuarem amigos.
Claro, as coisas dão errado. Como diz o adesivo no pára-
choque: "A vida acontece!" Meu pai está numa cadeira de
rodas e declinando rapidamente. Minha mãe nunca deixa a
unidade Alzheimer. Quando a visito, ela me cumprimenta
como se eu fosse um estranho.
Eu costumava gostar do hino: "Conte as Suas Bênçãos".
Ele agora parece ajustar-se facilmente demais às idéias do
antigo caminho. É duro, mas ainda tenho algumas bênçãos
maravilhosas para contar.
Eu poderia louvar a Deus sem elas? Pelo quê? Sua
presença significa algo em minha vida? Eu me deleitaria na
melhor esperança se minha vida melhor se desintegrasse, se
minha mulher morresse, se um de meus filhos se afastasse
de Deus, e o outro ficasse imóvel com neurofibromatose, se
nenhuma editora quisesse o meu novo manuscrito, se meus
netos ficassem doentes ou se rebelassem gravemente?
O que me faltaria para concordar com a mulher de Jó de
que está na hora de amaldiçoar a Deus e morrer? Será que
chego a esse ponto?
Eu realmente experimentei a Deus? Essa experiência foi
bastante boa e suficientemente forte para me abandonar
alegremente à sua presença invisível?
Não se trata de mórbida especulação. Não estou
preocupado com todas as coisas más que podem acontecer.
O Senhor nos disse para não fazermos isso. "Não vos
229
inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus
cuidados. Basta ao dia o seu próprio mal."91 Bom conselho. É
claro! Vem de Deus.
Coisas más, entretanto, ocorrem hoje. E fico imaginando.
Minha fé na bondade de Deus sobreviveria ao que aconteceu
com outros? Posso me regozijar da presença de Deus hoje?
Poderia contar com esta mesma presença, se o futuro
desmoronasse? Se todo outro alimento fosse removido, eu
poderia ouvir ainda o Espírito de Deus me convidar para a
mesa a fim de banquetear-me de Cristo? Eu atenderia? Será
que desejaria atender?
Estou indo agora? Ou continuo tentando fazer o que é certo
para que a vida funcione? Estou vivendo no antigo ou no novo
caminho? E você?
Um meio de saber talvez seja examinar três ciclos da vida,
três abordagens sobre ela e perguntar qual delas descreve
melhor como estamos avançando em nossa vida. Os dois
primeiros são baseados na energia do antigo caminho e se
dirigem para o seu alvo de uma vida melhor agora. O terceiro
requer energia sobrenatutal, do tipo que nos faz seguir o novo
caminho e fixar os olhos na esperança melhor de conhecer
bem a Deus.
No último capítulo, discuti a primeira de cinco idéias básicas
para entrar e viver no novo caminho: Reflita onde está. Neste
capítulo, considero a segunda: Reconheça a encruzilhada no
caminho que está sempre à sua frente.
230
Como os pais de uma filha que está sofrendo resistem? A
cada dia têm de enfrentar a condição dela, sabendo que não
vai mudar. Não há cura. Nada seria mais cruel do que sugerir
que se apenas tivessem fé, ela seria curada. Isto é
pensamento linear em sua forma mais perversa. Crer que ela
poderia ser curada e orar fervorosamente por isso são
atitudes cristãs; crer que ela só seria curada se muitas
pessoas com fé suficiente orassem é ser anticristão. É o
velho caminho. É demoníaco. Eleva a nossa bênção acima
da glória de Deus.
Mas, se o nosso fundamento para pensar sobre a vida é o
antigo caminho, se acreditamos que fazer algo certo fará com
que a nossa vida funcione melhor, se nosso foco não for mais
alto do que almejar uma vida melhor, iremos então
provavelmente ver apenas dois caminhos abertos à nossa
frente. Chamo o primeiro de ciclo de ajuste. Veja como
funciona.

Antigo caminho: Plano 1 - Ciclo de ajuste

Comece negando tudo que não puder resolver. Se for


preciso uma bebida todas as noites — ou de manhã -beba.
Se assistir o seu time atacar o oponente, ou rir das piadas do
Snoopy ajuda, excelente! Ou, talvez, uma hora de oração
seja melhor. Ou decorar o Salmo 23. Faça o que for
necessário para ficar distante das realidades complexas que
231
podem esmagá-lo, quer essa realidade esteja no interior do seu
coração, ou fora, em suas circunstâncias.
Depois, se levante por si mesmo. Faça uso de artifícios. A
vida é difícil. Admita isso. Mas você pode manobrá-la. Vamos
ver como? Clubes de strip-tease? Não, pelo menos por
enquanto. Eles agridem o seu comportamento moral. Saia
mais. Faça exercício. Junte-se a um grupo pequeno na igreja.
Reforme sua cozinha. Leia bons livros. Dê um jantar. Namore
alguém. Não, você continua casado. Bem, pense apenas a
respeito.
Agora que experimentou várias estratégias para resistir,
avalie. Veja quais as que funcionam melhor. Você talvez
perceba que tomar decisões morais, seguir conselhos
espirituais, assistir a conferências bíblicas e orar bastante
parece ajudar. Ótimo. O cristianismo funciona. O estudo bíblico
em que se envolveu, porém, é tedioso. Você sai mais sozinho
do que quando chegou. Desista. Não está dando certo. Con-
sidere algumas alternativas. Você talvez aprecie jardinagem.
Se tiver dinheiro, contrate um jardineiro para ajudá-lo.
Agora você está pronto para refinar a sua abordagem para
recuperar sua vida. Deixe do estudo bíblico. Continue moral.
Plante rosas. Continue lendo. E talvez mude de emprego. Pelo
menos mantenha abertas as suas opções. Você nunca sabe
como Deus vai guiá-lo.
Pronto! Conseguiu. Ainda tem dias maus e as noites são
especialmente difíceis, mas está vencendo tudo bastante bem.
232
Às vezes, você se sente realmente bem. É verdade que está
comendo muito, mas o alimento é uma fonte confiável de
prazer. E você não está gordo. Só parece próspero. O
importante é sentir-se restaurado. Gosta de si mesmo. Gosta
de quase tudo na vida. E consegue manter distância da dor
em sua alma que lhe diz que algo está terrivelmente errado.
A necessidade de continuar negando, usando estratégias,
avaliando e aperfeiçoando os seus métodos continua. Mas,
por agora, você está bastante estável. O antigo caminho está
ativo. Louvado seja Deus! Ou seja quem for.

O Ciclo de Ajuste

A terapia cristã encoraja a vida do novo caminho. Muita


terapia que afirma ser cristã não passa de abrandar alguns
baques no antigo caminho. Lembre-se da energia básica que
nos mantém avançando para a vida melhor de bênçãos: É a
determinação de descobrir um meio de fazer esta vida
funcionar unida à crença de que tal possibilidade existe. Deve
233
existir. Como poderia ser de outro modo num mundo criado e
controlado por um Deus amoroso?
Essa mesma energia determina a direção tomada em muitas
horas de terapia. Veja como o ciclo terapêutico se desenvolve.
Comece removendo a negação. A sinceridade de como você
"realmente se sente" dá início ao ciclo. A terapia cria um
espaço seguro para a vulnerabilidade emocional. Alguém o
ouve sem desprezo ou julgamento. Isso ajuda. Quando você
compartilha suas emoções secretas e enfrenta aquelas que
enterrou, sente-se melhor. O fardo parece mais leve. Pronto!
Você começou bem. Sente esperança.
A seguir, vem o discernimento. Se o seu terapeuta é quem
dirige, o discernimento pode ser cuidadosamente apresentado.
De outra forma, sob a influência de perguntas investigativas,
comentários esclarecedores e silêncio oportuno, você pode
chegar a novas compreensões sozinho. Sim, está zangado.
Com o quê? Que necessidades sente que continuam
insatisfeitas? Como é bom saber que Deus o ama e quer que
sinta a alegria de necessidades satisfeitas da maneira certa.
Você sente gratidão por estar consultando um conselheiro cris-
tão. Pode ver agora que o caso extraconjugal de seu marido
mexeu com seu medo oculto de ser abandonada. Seu pai
nunca serviu-lhe de apoio, nem mesmo nos momentos críticos.
Você vê, agora, claramente a relação entre decepções
anteriores e as mágoas atuais.

234
A direção acompanha o discernimento. Que curso de ação
a sua nova percepção sugere? Como lidou com a negligência
de seu pai? Você se tornou uma moça boazinha reprimida,
sempre tentando agradar, desesperada por qualquer bocado
de atenção. Foi isso que fez com seu marido! Muito bem,
esse é um novo discernimento. Agora sabe o que fazer. Está
na hora de contar a ele os seus sentimentos, deixar de ser
uma mocinha neurótica e se tornar uma mulher positiva,
adulta, que respeita a si mesma. Ao pensar em tornar-se
esse tipo de mulher, sente que está viva. A energia do "eu"
invade todo o seu ser. Você se sente forte, inteira, pela
primeira vez na sua vida. Tem também necessidades, e ele
vai saber quais são. Você se empolga com a sua liberdade
recém-desenvolvida.
Mas, dá medo. O que ele fará? Mais rejeição seria difícil de
suportar. É preciso, no entanto, que corra o risco. Deve
tornar-se autêntica; ponha de lado o medo. Apoio ajuda, da
parte de seu terapeuta, de amigos que a amam, acreditam
em você e estão do seu lado. Você ficou muito tempo presa a
um nível infantil de desenvolvimento. Com ajuda pode sair
dele. Pode fazer isso!
Agora vem a parte difícil. Está na hora de alinhar o seu
comportamento com seu discernimento, a fim de avançar nas
direções que agora parecem tão certas, e fazer isso com
apoio. Lembre-se de que Jesus ama você. Ele está a seu
favor. Quer que ame a si mesma e sinta liberdade para ser
235
quem é. Imagine Deus aplaudindo você. Deixe que ele seja,
juntamente com o Espírito, seu principal grupo de apoio
enquanto segue o antigo caminho para uma vida melhor.

O Ciclo Terapêutico

Enfrente a vida. Peça ajuda, se precisar. Conforme-se com


este mundo. Deixe sua mente permanecer fixa na idéia de que
a vida gira ao seu redor e que Deus está aqui para ajudar. E o
antigo caminho.
Existe, no entanto, um novo modo de viver, radicalmente
diverso. Fique imóvel. Reflita sobre onde está. Você tem usado
Deus para fazer sua vida funcionar. Isso o coloca acima dele.
Está insistindo para receber bênçãos, pelo menos algumas.
Você não está desejando bênçãos, está exigindo. Está
dependendo delas para sua alegria. Deus não é seu supremo
tesouro. Cristo não é proeminente em sua vida. O Espírito
permanece apagado em seu interior. Seu convite para você
banquetear-se em Deus continua ignorado.

236
Como vê, o que está acontecendo em seu íntimo, quando
identifica o sinal vermelho, o faz sentir-se mais do que um
pouco constrangido. Na sua humildade, você ouve o Espírito
sussurrar: — Há um novo modo de viver. Há outro caminho a
seguir.

O único plano do novo caminho - O ciclo espiritual

A nova vida começa na cruz. É ali que você compreende


quão arrogante é. Não acolhe as provações. Não viver para
um propósito maior do que evitá-las ou anulá-las caso
venham. Sua ambição não ultrapassou a idéia de uma vida
que funcione bastante bem. É possível que tenha disfarçado
o seu narcisismo, vestindo-o; com roupagem cristã. É
possível que encontre satisfação no ministério, purifique a
sua vida, vença o seu vício sexual, viva segundo o Livro.
Você percebe, entretanto, agora, que nada disso tinha Deus
como centro. A glória de Deus nunca teve muita importância
para você. Qualidade de vida é o que busca. O cristianismo,
ou a cultura cristã, lhe dá significado, o senso de comunidade
e o respeito que deseja. O ciclo espiritual começa com
quebrantamento. Ele faz sofrer. Os dois ciclos do antigo
caminho são muito mais amáveis.
Depois do quebrantamento, o Espírito o leva ao
arrependimento. Você supôs que merecia satisfação. Pensou
que, com a ajuda de Deus, poderia conseguir isso. Acreditou
237
estar vivendo a vida cristã. Como pôde se deixar enganar a tal
ponto? Pensou que Deus estava aqui para colaborar com o seu
programa. Mas, só ele pode dizer: "EU SOU". Você só pode
afirmar: — Sirvo conforme o teu prazer.
Este é, de fato, um novo modo de pensar. Sua mente mudou.
O arrependimento teve início. E ele parece ser puro, certo,
estranhamente positivo.
O Espírito então o move do quebrantamento, mediante o
arrependimento, para o abandono. Quando bênçãos encheram
sua vida, viveu para elas. Não confiou em Deus. Negociou com
ele para manter a vida funcionando. Mas, agora, olhando para
o rosto inchado de sua filha, deixando sozinho o tribunal de
divórcio, orando por seu filho que vive um relacionamento
homossexual com um amigo, você resiste ao impulso de correr
para os quadrinhos, assistir à TV ou beber um martini. Resiste
também à tentação muito real de amaldiçoar a Deus e afogar
suas mágoas como puder. Mais difícil ainda, resiste ao desejo
de prosseguir nobremente e apresentar-se a outros como um
mártir corajoso. Em vez disso, ouve o Espírito falar por meio da
Bíblia. Este mundo está em decadência. Acontecem coisas
sem motivo aparente. De alguma forma, entretanto, em meio a
tudo, Deus está contando uma boa história. Sem o final, a
história não é boa. Mas nada acontece, nem acontecerá, sem
que Deus possa remir os pecados a fim de permitir o avanço da
história ao seu glorioso clímax. Você crê nisso. Abandona-se,

238
portanto, ao Deus invisível, aquele que por um instante se
tornou plenamente visível enquanto pendia da cruz.
O abandono, talvez surpreendentemente, desperta
confiança. O Espírito testemunha ao seu espírito que você
pertence a Deus, que ele está fazendo com que todas as
coisas cooperem para o bem, que a eternidade irá justificar a
sua escolha de abandonar o conforto da sua alma a este
Deus misterioso, quase sempre invisível, aparentemente
volúvel, certamente imprevisível. Quando você vivia no antigo
caminho, não tinha plena confiança de que ele se achava
presente em você, colaborando com os seus propósitos.
Porque não estava. Agora que está vivendo para a sua glória
e se achegando a ele para gozar da sua natureza, sente uma
confiança cada vez maior de que ele se acha realmente
presente, mesmo durante a sua noite mais escura. Você
sabe, porque o Espírito lhe diz, que ele está presente
enquanto você anda pelo novo caminho em direção à melhor
esperança de conhecer, glorificar, gozar e revelar a outros o
Deus maravilhoso, espetacular que se encontra realmente
ali.
A confiança dada pelo Espírito de que Deus está ali e
merece que creiamos absolutamente nele gera a liberdade
de expor o que está mais vivo em você. Você começa a
sentir algo no mais íntimo do seu ser. Pode levar algum
tempo mas em algum ponto você percebe. Essas são as
fontes de água viva! Quando tropeça feio, continua ouvindo
239
Deus cantar; tem uma nova pureza. Quando se lembra do
abuso sexual que sofreu, pode caminhar de cabeça erguida;
tem uma nova identidade. O impulso para o pecado sexual,
embora forte, não é o que você realmente deseja; tem agora
uma nova inclinação. O sofrimento que antes o esmagava não
está mais no controle; você tem um novo poder. Sente-se livre
para ser quem ansiava — amoroso, alegre, tranqüilo, paciente,
bondoso, amável. Nunca com perfeição, mas algumas vezes,
pelo menos, sinceramente. E agora louva a Deus e a ninguém
mais.
Os dois ciclos do antigo caminho nos tornam dependentes do
funcionamento da vida, pelo menos razoavelmente, e de
nossos re-cursos para fazer com que isso aconteça. Ao
encorajar o movimento em direção à vida melhor de bênçãos,
eles mantêm a pressão. Temos de fazer as coisas darem certo.
Esses dois ciclos nos deixam vulneráveis ao orgulho quando a
vida funciona e ao desespero enfurecido quando isso não
acontece.
O ciclo do novo caminho, o caminho do Espírito, atrai-nos
para a melhor esperança de nos comprazer em Deus. Ele
oferece tudo de que precisamos para nos aproximar sempre
dele, sem levar em conta o que a vida nos traga.
Em vista de o Espírito suprir os recursos necessários para
alcançar nosso alvo, a pressão acabou. O novo caminho aguça
o nosso foco sobre a razão da vida.

240
Esta é então a terceira das cinco idéias básicas sobre
como viver o novo caminho e a que examinaremos a seguir:
Reorientar nossas metas.

O Ciclo Espiritual

FOCO NAS PRIMEIRAS COISAS

A mudança foi gradual, imperceptível exceto em retrospecto.


Como sapos em água aquecida aos poucos até chegar à
ebulição, não compreendemos que o calor que agora sentimos
está prestes a nos matar. A superfície já está fervendo.
No sentido da cultura, o cristianismo de nossos dias
redefiniu a maturidade espiritual. Os reformadores sabiam
que fomos salvos para dar glória a Deus. Nós, modernos,
vivemos para ser abençoados. Os amadurecidos dentre nós
são agora considerados bem-sucedidos, felizes, pessoas

241
competentes, estão em evidência e se dão bem. Estamos tão
comprometidos com a descoberta e aplicação dos princípios
divinos para fazer a vida funcionar que não mais valorizamos a
intimidade com Deus como nossa maior bênção. Somos mais
atraídos por sermões, livros e conferências que revelam os
segredos da satisfação em tudo que fazemos, do que pela
direção espiritual que nos leva através da aflição à presença do
Pai.
Parece que a nossa maior ambição foi reduzida a produzir
pessoas cujas circunstâncias sejam suficientemente agradáveis
para tornar-lhes fácil louvar a Deus.,Não mais nos identificamos
como uma comunidade de santos visivelmente quebrantados,
homens e mulheres profundamente agradecidos pela graça,
quando sabemos que estaríamos mortos sem ela; por
dependermos do Espírito para a existência, estamos
conscientes de que não iremos perseverar sem ele; e
obstinadamente permanecemos esperançosos na luz, às vezes
obscura, da eternidade, sabendo que as bênçãos desta vida
vêm e vão.
Parecemos mais interessados em ter uma existência
confortável do que em permitir que Deus nos transforme
espiritualmente mediante as dificuldades da vida. O encontro
divino, a comunhão espiritual e a transformação da alma, as
três metas principais do peregrino, não são o que buscamos.
Adaptamo-nos a este mundo e estamos nos esforçando ao

242
máximo para fazer dele uma casa confortável, pedindo cura,
realização e sucesso como ponto para conhecer Cristo
Não temos visto o perigo. Quando as bênçãos das
circunstâncias positivas, o sucesso e a realização pessoal
aquecem nossas vidas, não compreendemos que estão
queimando nossas almas, reduzindo-as a cinzas com o calor
do inferno.
Pascal previu a parábola dos sapos em água fervente há
quatrocentos anos quando escreveu: "Quando tudo se move
ao mesmo tem-po, nada parece estar se movendo, como a
bordo de um navio. Quando todos estão avançando para a
depravação, ninguém parece estar se movendo. Mas quando
alguém pára, este revela os outros ao agir como um ponto
fixo".92
Observe dois pontos fixos do passado que, por ficarem
imóveis e contemplarem a visão de um Deus que satisfaz,
podem ajudar-nos a ver o nosso movimento de desvio de
Deus. O Cardeal Nicholas de Cusa, bispo tirolês do décimo
quinto século, declarou:
O que, Senhor meu, é a minha vida, salvo o abraço em que
tua doçura deleitosa me envolve com tanto amor? Amo
supremamente a minha vida porque tu és a sua doçura...
Contemplo agora... esse olhar abençoado com que nunca
cessas de contemplar-me amorosamente, sim, até os
lugares secretos de minha alma... Ali está a fonte de todos
os deleites que podem ser desejados; não só nada melhor
243
pode ser ambicionado pelo homem ou anjos, mas nada
melhor pode existir em qualquer espécie de ser! Pois é o
máximo absoluto de cada desejo, desde que um maior não
pode haver.93
Não permita que a linguagem arcaica o faça perder a força
de seu modo radical de pensar. O que ele está dizendo é isto:
"Amo a vida porque conheço a Deus e sei que ele me ama, não
porque as coisas vão bem". Esse é o novo caminho.
Volte um pouco mais, ao terceiro século. Ouça Clemente de
Alexandria:
Jesus Cristo, ao vir a este mundo, transformou o ocaso do
tempo na alvorada da eternidade.94
Não foram só os pais da igreja que pensaram no novo
caminho. Thomas Dubay, diretor espiritual católico-romano, é
um ponto fixo em nossa geração. Em seu livro excelente,
Seeking Spiritual Direction, ele escreveu: "Tudo no plano divino
tem como foco o êxtase eterno do céu iniciado na terra".95 Ele
imitou com isto Jean Pierre de Caussade, que acreditava que
tudo que ocorria com ele, tanto bênçãos como provações, o
levava a Deus.
O êxtase do céu irá fluir da presença literal de Cristo. O
começo desse êxtase, neste mundo, depende da presença
apreciada de Cristo. O antigo caminho, pelo seu foco nas
bênçãos tangíveis agora, limita severamente a profundidade
dessa apreciação. No novo caminho, é possível apreciar a
presença de Cristo como a "alvorada da eternidade". Não é
244
algo automático, nem completo. Mas, possível. E as pos-
sibilidades são inconcebíveis.

Deseje e espere

Se tivermos de compreender as possibilidades, isso


depende em parte dos alvos que perseguimos'. Permita que
ilustre o ponto.
Passei uma hora, na noite de ontem, da uma às duas da
madrugada, chorando em oração. O telefone me acordou à
meia-noite e quarenta e cinco. Já tinha ouvido notícias piores
antes e já respondi com menos emoção a crises mais
perturbadoras.
Por razões que não sei muito bem, esta causou um
impacto profundo. A dificuldade era real embora vaga, as
questões que tornavam as coisas difíceis eram obscuras, e
um grupo de sábios não poderia ter concordado sobre a
coisa certa que eu deveria fazer.
Em certas ocasiões, um evento severo não imediatamente
visível reúne toda a dor e terror da existência, e nossas
almas ficam praticamente arruinadas. A agonia toma posse
do nosso coração, expulsando qualquer experiência de
alegria ou esperança. Tudo escurece, trevas tão espessas
que não deixam ver sequer um pontinho de luz. Tudo que
nos resta é lamentar.

245
Tiago escreveu aos seguidores de Jesus, dizendo: "Está
alguém entre vós sofrendo? Faça oração".96 Pelo quê? Ele nos
havia dito antes que devemos nos achegar a Deus, para que
Deus se aproxime de nós.
Muitas Escrituras apoiam nossa oração por coisas tangíveis,
alívio do sofrimento e uma sensação de bem-estar. É certo
sofrer e é certo orar por bênçãos. É certo também ficar feliz
quando as bênçãos são recebidas. Mas, não é certo lançar
nossa âncora de alegria na vida melhor de bênçãos.
Quando surgem problemas, nosso primeiro foco deve ser
entrar na presença de Deus (encontro), participar com outros
da jornada para Deus (comunhão) e colaborar com o Espírito
para formar Cristo em nós (transformação). Por causa da nova
aliança e seu lugar no Plano Emanuel, o foco deve ser o desejo
que já é. Devemos simplesmente entrar em contato com ele.
Nosso desejo mais ardente nos dirigirá para a meta do novo
caminho.
Tudo começa com o encontro. Segundo o apóstolo João, a
comunhão com o Pai, o Filho e o Espírito Santo é o centro da
mensagem cristã,97 e essa comunhão é o máximo absoluto de
todo desejo. Ele muda o pôr-do-sol da terra na alvorada do céu
e nos move na direção do êxtase celestial.
Era uma hora da manhã. O telefonema terminara de tocar. A
vida melhor não estava à vista. Nem a esperança melhor. Se
me fosse dada a escolha, eu teria avançado para as bênçãos.

246
Podia sentir em mim ambas as energias. O impulso de
endireitar a vida fez-se sentir mais forte. Provavelmente por
me achar escrevendo este livro, eu sabia que o outro impulso
devia ser mais poderoso, mas não tinha meios de fazer isso.
Fui como estava, lamentando a falta do que queria em
minha vida. Pensei em John Bunyan, em São João da Cruz,
em Paulo — e em Jesus — e pude sentir um desejo
crescendo em mim de que a esperança melhor significasse
mais do que significava. Naquele momento, algo se tornou
claro: Quer a paixão por Deus se tornasse constrangedora
neste ou em qualquer momento, era responsabilidade do
Espírito. Era uma obra soberana da graça. Tudo que posso
fazer é desejar isso e esperar.
Essa compreensão reduziu minha cabeça inchada o
suficiente para permitir que eu entrasse pela porta estreita.
Nosso progresso no novo caminho está ligado à humildade e
dependência.
A seguir, do lado de dentro da porta, a encruzilhada no
caminho ficou clara. Podiam-se ver duas estradas, aquela em
que eu já estava e a outra ainda disponível caso recuasse.
Ambos, o ciclo de ajuste e o terapêutico, as duas trilhas no
antigo caminho, tinham sua atração.
Mas, tendo entrado pela porta estreita, o ciclo espiritual se
achava também à vista, o novo caminho, o caminho
apertado. A esperança de encontrar Deus, de unir-me à

247
comunidade e de crescer espiritualmente me estimulou
profundamente.
Por mais estranho que pareça, o quebrantamento tornou-se
atraente - o que quer que seja necessário para encontrá-lo!
Pude ver que o arrependimento oferecia liberdade e que o
abandono despertava entusiasmo. Senti também uma
confiança crescente no que ele está fazendo
— ou deixando de fazer. Senti um momento interno em
direção ao livramento. Vi-me saltando de um penhasco num
abismo escuro só apoiado pela corda do amor de Deus.
Parecia um privilégio.
A seguir, a imagem mudou. A corda quebrou-se e mergulhei
no nada. O terror tomou conta de mim. Mas, em vez de me
arrebentar nas rochas ou cair sem parar nas trevas, descobri-
me aterrissando docemente no oceano do amor de Deus. A
água estava suficientemente quente para aliviar e fria o
bastante para refrescar. O sapo não ferveu. Em vez disso, um
santo, acalmado e fortalecido começou a nadar. Pude ver-me
entrando no mundo de problemas com um novo propósito.
Isso me levou à terceira das cinco idéias básicas: Reorientar
alvos. Esta tem grande importância, talvez seja a mais vital das
cinco.

Os alvos do peregrino

248
Vou reunir agora o que já disse numa discussão sobre os
alvos de um peregrino.
Teresa de Ávila escreveu certa vez com toda franqueza:
Tudo o que o iniciante (na vida do novo caminho) tem a
fazer.... é ser decidido e preparar-se com toda a diligência
possível para conformar sua vontade à de Deus... Quanto
mais perfeitamente a pessoa praticar isso, tanto mais rece-
berá do Senhor.98
Isso não vai acontecer, não pode acontecer, até crermos
que todas as coisas da vida, inclusive telefonemas de
madrugada, façam parte de um grande plano. Elas são
designadas por uma divindade incontrolável, misteriosa,
inflexivelmente determinada a nos imergir na sua vida
relacional. Essa, Deus sabe, é a maior de todas as bênçãos
que ele pode dar-nos. E essa, Deus também sabe, é o desejo
mais profundo em cada coração no qual o seu Espírito
habita.
Permita que eu volte à minha história matutina. Depois do
telefonema, desci imediatamente. Queria solidão e liberdade
para ache-gar-me à presença de Deus exatamente como
estava. Aproximar-se de Deus é algumas vezes melhor
sozinho. Outras vezes, é melhor na companhia de
companheiros peregrinos. Esta era uma ocasião de ir
sozinho.

249
As primeiras palavras a escaparem da minha boca foram: —
Isto não devia estar acontecendo comigo. O que fiz para
merecer tal coisa? — O sinal vermelho começou a aparecer.
O dique então rompeu-se. A indignação cobriu a tristeza. E
eu não conseguia acessar a tristeza até que a indignação fosse
expressa.
Tinha de ir como estava, nariz escorrendo, rosto sujo e vestes
rasgadas. Não era um aspecto agradável de ver.
Todo o meu íntimo se desfez em lágrimas. Algumas fluíram
de mágoas legítimas sobre bênçãos negadas; outras, da
indignação arrogante que insistiu, por alguns minutos, em
gritar: Injustiça! Outras ainda, do centro, surgiram de um desejo
de encontrar Deus num momento difícil.
O sinal vermelho ficara agora claro: podia sentir as duas
energias em minha alma, competindo pelo domínio. Ao ver
essas energias, meus olhos se concentraram na porta estreita
que se abria para o novo caminho. Tinha uma escolha a fazer.
Senti-me quebrantado ao compreender que uma parte de mim
queria realmente usar Deus, como o filho pródigo usou o pai.
Nesse ponto, a encruzilhada no caminho era evidente. Um
dos cursos prometia uma vida melhor, o outro uma esperança
melhor. — Deus —, clamei, quase como um reflexo — quero
uma vida melhor, mas quero ainda mais conhecer-te. Por favor!
Não deixes que estas lágrimas e este terrível momento em
minha vida sejam desperdiçados. Apresento-me a ti. Sei que
estás aí. Entrego-me ao teu Espírito com a confiança de que
250
ele vai libertar-me para viver na tua presença - e encontrar a
alegria e poder verdadeiros para seguir a tua vontade.
O véu ergueu-se. Faltavam agora 15 minutos para as
duas da madrugada. Eu podia ver a linha final. Podia ver a
guirlanda do vencedor a ser colocada em minha testa nesta
vida. Não era um casamento cada vez mais abençoado.
Não era a exaltação da virilidade concretizada. Não era a
liberdade total do câncer.
Eu queria conhecer a Deus, experimentar a revolução
interior obtida por meio da nova aliança. Eu queria...
encontrar Deus, ter comunhão com cada membro da
Trindade, participar da festa deles.
juntar-me à comunidade de outros santos quebrantados,
desesperados e gratos que, atônitos pela graça, estavam
caminhando em direção a Deus, não desejando aceitar
uma alegria menor.
experimentar a transformação, ser espiritualmente formado
até que outros, sobretudo o Pai, pudessem ver em mim
uma semelhança real com Jesus.
Às duas da manhã, pude provar as probabilidades à minha
frente. Eu estava "destinado a ficar cativo eternamente ao
contemplar o Pai, o Filho e o Espírito, sendo, então,
transfigurado na beleza divina".99 Os de Laodicéia não eram
o meu povo. Aos meus olhos, pareciam sapos contentes com
a água morna, sem saber que estava prestes a ferver. Eu
não queria ser meramente "decente e respeitável... gozar
251
moderadamente os prazeres da vida... e cuidar para que a
religião" não me monopolizasse.100
De todo o coração, eu não queria aceitar a felicidade que
vem de uma vida mais fácil. Durante alguns momentos
sobrenaturais, numa terça-feira cedo, não quis nada senão
Deus. No que se refere a milagre, esse se rivaliza com o mar
Vermelho. Todo o louvor a Deus! Eu queria um encontro com
Deus mais do que as suas bênçãos.
Queria abençoar a outros, fazer com que experimentassem o
tipo de relação que existe na Trindade o tempo todo. Eu queria
ainda ser conhecido, explorado, descoberto, tocado, mas só
por um momento, queria mais abençoar a outrem, participar da
comunidade oferecendo comunidade. Outro milagre, não
permanente, nem sequer duradouro — na hora do café eu
voltara a ser o mal-humorado de sempre — mas foi real.
Ainda olhando o caminho estreito, pude ver a alvorada da
minha transformação. Eu sabia que pelo poder do Espírito,
algum dia, nesta vida, eu poderia ser
ainda amoroso, embora desanimado, ainda generoso,
embora exausto,

ainda paciente, embora exasperado,


ainda sensível, embora ofendido,
ainda esperançoso, embora esgotado pela vida.

252
Eu. Como Jesus! Stalin poderia ter amado como a Madre
Teresa? Hitler poderia ter pregado como Billy Graham? O
que Deus pode fazer?
Por instantes o sol brilhou. O êxtase do céu teve início. E
tudo começou com um telefonema difícil.
A melhor esperança sobrevive à pior tragédia. E vem à tona
por causa disso. Podemos entrar na presença de Deus para
encontrá-lo, para juntar-se a uma comunidade de
indagadores quebrantados, conturbados, que querem mais
dele e querem ser transformados pelo Espírito até que
venhamos a nos assemelhar realmente a Jesus. Não mais
morrendo na água fervente das bênçãos exigidas, mas
nadando agora o oceano refrescante da presença de Deus —
essa é a vida no novo caminho.
Reformule seus objetivos: Esta é a terceira das cinco idéias
básicas para viver este novo caminho. O movimento em
direção a esses alvos é obra do Espírito de Deus. Devemos
aprender a depender dele. E esta é a quarta idéia.

DEUS ESTÁ NO CONTROLE - DO QUÊ?

No ano 410 d.C. aconteceu o inconcebível. Roma foi


saqueada. Ambrósio, um líder religioso proeminente da época,
perguntou: - Se Roma pode perecer, o que então é seguro?
Em setembro de 2001, os centros econômico e militar da
nação mais poderosa da terra foram atacados. Aviões
253
seqüestrados por terroristas chocaram-se contra o World Trade
Center de Nova York e contra o Pentágono, situado
orgulhosamente próximo do Congresso da nação. Tratava-se
de algo inconcebível, inimaginável - todavia, aconteceu. Os
líderes religiosos, todos juntos em uma só voz, tentaram
acalmar os cidadãos nervosos dizendo: — Deus está no
controle.
Fiquei perguntando a mim mesmo: do quê? A intenção das
palavras era ajudar-nos a nos sentir seguros — do quê? Se
pensamos realmente que edifícios podem ser destruídos
daquela maneira pela vontade de Deus, então algo mais — e
pior — poderia acontecer?

Nada contraria o seu plano

Ao afirmar o controle supremo de Deus sobre todas as


coisas, ninguém estava atribuindo a ele responsabilidade pelos
feitos perversos de outras pessoas. O holocausto, as
atrocidades de Stálin e o terrorismo são adequadamente
atribuídos à pura maldade e sobre os que fazem uso dela.
Assim também, cada caso de acidentes por embriaguez,
abuso sexual, maledicência, negligência dos pais, gula,
mentira, imoralidade sexual e covardia, estes em um nível
menor de gravidade em comparação com os do parágrafo
anterior. Deus não pode ser acusado de qualquer dessas
coisas. Por razões que não compreendemos bem, ele permite
254
o mal, embora nunca seja a causa deles. Desastres
"naturais" podem ser obra dele, mas não as escolhas
pecaminosas de suas criaturas depravadas.
Quase todos concordam nesse ponto. Todavia,
continuamos a insistir que Deus está no controle. O que
queremos dizer com isso? O que deveríamos dizer? E que
tipo de vantagem ou comodidade podemos extrair dessas
nossas afirmações?
Não posso sequer pensar numa resposta para essas
perguntas seculares, sem primeiro fixar com firmeza dois
pensamentos em mente. Primeiro, esta vida é apenas uma
introdução para outra, para os seguidores de Jesus uma vida
melhor. Se isso não fosse verdade, eu não abraçaria um alvo
mais alto do que o alívio pessoal agora, primeiro para mim e
depois para você. Se esta vida é tudo que existe, não posso
então reconciliar minha fé num Deus cheio de bondade e oni-
potente com minha experiência e observação do sofrimento.
Se esta vida é tudo que existe, se ela termina com a morte
sem uma existência consciente em outro mundo, a única
resposta razoável e compassiva para o sofrimento é fazer
tudo que pudermos para aliviá-la. Todos, inclusive qualquer
que seja o Deus existente, deveriam dedicar seus recursos a
essa finalidade. Os que não fazem isso não são confiáveis e
não agem de maneira correta. O que nos deixa num aperto.
Se Deus existe e se está realmente no controle, fica

255
aparentemente claro que ele não está fazendo tudo que pode
para aliviar o sofrimento.
Mas, se esta vida não passar da sombra de uma era
vindoura, então, é concebível que o sofrimento possa ter um
ponto futuro que justifique a sua continuação a fim de realizar
sua tarefa. Se o ponto futuro for eternamente bom e se esse
bem não pode ser alcançado de outra forma, então posso
continuar crendo em um Deus bom e poderoso, mesmo quando
as pessoas sofrem.
Esse é o primeiro pensamento. O segundo é este: Deus está
dedicando o seu poder a um plano que não valorizo
adequadamente. Pergunte às pessoas qual a sua maior
necessidade. Como resultado do terrorismo, muitos falariam de
segurança em nossas fronteiras nacionais.
Deixe o tempo passar. Depois de milhares de aviões
levantarem vôo e aterrissarem sem incidentes, depois que os
trabalhadores chegarem de metrô à cidade, subirem de
elevador aos seus escritórios em prédios altos, e voltarem de
metrô para casa mais tarde nesse mesmo dia, as pessoas
recuperam uma compreensão mais pessoal de sua maior
necessidade. Uma vez que nossa necessidade de bem-estar
físico for satisfeita, atendemos mais aos desejos pessoais de
famílias felizes, filas curtas, trabalho produtivo e bem pago,
amizades íntimas, gasolina barata, satisfação profunda, netos
sadios, paz interior, café quente e prosperidade material.

256
Queremos a vida melhor e confiamos em Deus para
garanti-la. Afinal de contas, ele está no controle. Ele pode
dar-nos tudo. A única pergunta é: ele fará isso? Começamos,
então, a persuadi-lo a usar o seu poder a nosso favor.
Tentamos fazer as coisas certas para que a vida funcione
bem.
Perdemos de alguma forma a arrogância neste modo de
pensar. Cremos que a nossa maior necessidade é sermos
felizes, seguros e satisfeitos. Cremos, bem no fundo, que
merecemos o que quer que em nossa opinião necessitamos.
Precisamos disso. Deus deve então prover. Esse é o seu
trabalho. Não podemos imaginar um Deus bom cumprindo
qualquer agenda além de satisfazer as nossas necessidades,
assim como meu filho de um ano fica choramingando quando
a mãe não o deixa brincar com uma faca. Ele a quer. Deve
te-la. É assim que pensa. E nós também.
Não há nada de errado em desejar vôos seguros,
casamentos perfeitos e uma renda satisfatória e folgada. Mas
nenhuma dessas coisas, nenhuma de nossas esperanças de
uma vida melhor de bênçãos, representa a agenda prioritária
de Deus. Não precisamos ser protegidos do sofrimento físico
ou da dor pessoal. Não precisamos ser ricos ou sequer
saudáveis. Só precisamos ser protegidos de qualquer poder
que se oponha ao plano de Deus para as nossas vidas. E
nós somos!

257
Por que é que Deus está no controle? Para verificar que nada
contrarie o plano que ele tem para o seu povo. Qual é esse
plano? Dar-nos uma vida melhor agora, como a definimos?
Não. É revelar-se como o maior tesouro que o coração humano
pode imaginar, atrair pessoas a um relacionamento com ele
que deleite absolutamente suas almas. É o Plano Emanuel.
Qual é então nossa maior necessidade?

Precisamos de... perdão radical que torne possível pessoas ímpias se


aproximarem de um Deus santo e viver; amor sobrenatural que capacite
realmente indivíduos egoístas a se importarem mais com os outros do que
consigo mesmos, revelando, assim, Deus; poder espiritual que mude as
pessoas más em boas, não apenas boas segundo os padrões sociais -
temos muita gente assim -, mas boas como Deus, boas o suficiente para
valorizar a suprema bondade.

Quando Roma mostrou-se vulnerável, Agostinho escreveu A


Cidade de Deus. Ele descreveu duas cidades, uma feita pelo
homem, a outra por Deus. Seu ponto central era que Deus está
no controle da construção da sua cidade, seu reino, e está
fazendo tudo que é necessário para povoar essa cidade com
cidadãos que o amem acima de tudo. O fato real que nós,
modernos, temos problema em compreender é que Deus não
está colaborando com nossa agenda para tornar este mundo
seguro e maravilhoso para morar. Construir a cidade do
258
homem é o nosso propósito e não dele. Não podemos dizer:
"Deus está no controle", como se isso significasse a ajuda
dele na construção de nossa cidade.
Deus, porém, está no controle do que ele quer realizar. Ele
está se movendo através de toda a história — por meio dos
terremotos e piqueniques, do terrorismo e dos jantares da
igreja, dos divórcios e festas de aniversário - na direção de
uma só coisa: o Plano Emanuel. E vai executálo. Terá um
povo que vai considerá-lo o maior, que dará valor ao
conhecê-lo, adorá-lo e servi-lo acima de todas as outras
bênçãos.
Esse é o seu propósito. Ele está no controle. Seu propósito
será alcançado. Nem Osama bin Laden, nem Hugh Hefner
poderão bloquear o seu caminho.
Sinto um grande peso de ser indiscutivelmente claro: Não
podemos contar com Deus para nos proteger do sofrimento
de qualquer espécie ou medida. O maior mal pode acontecer
ao melhor cristão. Mas podemos contar com Deus para nos
capacitar a aproximar-nos dele, aconteça o que acontecer, e,
finalmente, a experimentar profunda alegria ao fazer isso.
Se estivermos vivendo para qualquer outro objetivo, se
dermos valor supremo à vida melhor, não somos seus
discípulos. Estamos nos reprimindo em não seguir o Espírito
Santo. Estamos colaborando com o mundo, a carne e o diabo
em oposição ao Plano Emanuel, e o poder Emanuel irá
transformar-nos ou destruir-nos.
259
Se formos, no entanto, seus discípulos, se suspirarmos por
Deus como a corça pela água, se buscarmos apenas uma
coisa — contemplar a beleza do Senhor por acreditarmos que
prazer incomparável pode ser obtido na comunhão com ele101
— encontramo-nos então na jornada espiritual. Aprenderemos
a depender radicalmente do Espírito Santo. E, ao fazermos
isso, experimentaremos milagres; vamos testemunhar em
nossas vidas o poder sobrenatural do Deus que está no
controle de todas as coisas.
Conte com Deus

No restante deste capítulo, desenvolvi dois pontos: Primeiro,


podemos contar com Deus para realizar três milagres em
nossas vidas. Ele quer isso. Pode realizá-los e irá realizá-los na
vida dos seguidores do novo caminho. Segundo, não há nada
que possamos fazer para que estes milagres aconteçam.
Seguindo o novo caminho, de certa forma, criamos espaço
para ele trabalhar. Mas permanecemos inteiramente
dependentes dele na sua graça soberana de abençoar-nos
conforme lhe apraz e quando lhe apraz. A dependência é boa,
porque Deus enviou seu Espírito para fazer uma obra sétupla
que torna possível para nós viver no novo caminho.
O que quer que aconteça, os seguidores do novo caminho
podem estar certos de participar de três milagres da graça.
Eles vão acontecer. Não acontecerão na vida dos que seguem
o antigo caminho.
260
Primeiro Milagre: Vamos Encontrar Deus

Podemos entrar na presença de Deus como estamos -


cobiçosos, invejosos, desanimados, feios o suficiente para
ser insultados, egoístas o suficiente para merecer rejeição,
suficientemente arrogantes para ser pisados - e sermos
acolhidos e apreciados.
Ao sentirmos a recepção de Deus e sentir seu
encantamento, à medida que a graça nos incentiva,
descobrimos que por baixo de todas as manchas e mau
cheiro, somos na verdade belos e até desejáveis.
Compartilhamos da beleza de Cristo. Somos puros, temos
lugar à mesa do Pai, gostamos de ser bons e o poder de agir
bem está em nós.
Quando a graça de Deus nos surpreende, e só então,
iremos adorar. Até esse momento, negociamos. Mesmo
quando o tumor cresce e é declarado inoperável, mesmo
quando nossos melhores esforços de reconciliação com o
cônjuge ou os filhos falham, mesmo quando o terrorismo
mata milhares, continuamos adorando. Vamos sofrer muito,
às vezes, mas iremos adorar. O milagre do encontro será
desejado dignamente.

Segundo Milagre: Experimentaremos Comunhão

261
Com pelo menos outra pessoa, algumas vezes com várias,
entraremos em níveis de intimidade que criam conflitos
capazes de acabar com qualquer relacionamento — e emergirá
a intimidade espiritual. Depois de sentir o impacto do fracasso e
da mágoa e cambaleando com o instinto de defesa,
recriminação e recuo, podemos esperar, se estivermos no novo
caminho, descobrir um poder em nós suficiente para enfrentar
qualquer força destruidora de relacionamentos e que nos leve à
verdadeira comunhão.
Os não-cristãos no geral "se dão bem". Só os cristãos são
capazes de amar no verdadeiro sentido da palavra. Quando
reconhecemos que estamos sendo dominados pelo egoísmo,
quando não vemos um meio de fuga, e quando a maneira
como nos relacionamos nos sufoca e nos leva ao desespero é
que amaremos de modo sobrenatural. Iremos de vez em
quando ainda fazer estardalhaço, exigir e ficar de mau humor,
mas iremos amar. O milagre da comunhão será celebrado com
gratidão.

Terceiro Milagre: Seremos Transformados

Um encontro com Deus e uma experiência em comunidade


irá abrir nossos olhos para vermos como somos bem diferentes
de Jesus. Vamos ficar espantados. Como Jó, quando
finalmente ouviu Deus falar, reconheceremos: — Sou
indigno.102 — Quando virmos a Deus, iremos novamente
262
exclamar como Jó: "Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os
meus olhos te vêem. Por isto me abomino e me arrependo no
pó e na cinza".103
O quebrantamento e o arrependimento levam à entrega.
Jamais nos abandonaremos ao Espírito enquanto pensarmos
que podemos mudar sem ele. Mas, quando desejamos não
só nos sentir bem com nós mesmos e gozar a vida, mas
também nos assemelhar a Jesus e compreender como
somos incapazes de dar sequer um passo nessa direção
sem a sua ajuda sobrenatural, entregar-nos-emos então mais
plenamente ao Espírito Santo.
Em momentos não planejados, saberemos então que a
água viva está jorrando dentro de nós. Algo maravilhoso
surgirá em nós e exultaremos de alegria. Quando olhamos
para o abismo que separa quem somos de quem queremos
ser e compreendemos que não temos meios de passar de
um lado para outro na carne, só então iremos mudar. O
milagre da transformação será humildemente gozado.
Três milagres terão lugar em cada seguidor do novo caminho:
encontro com Deus, comunhão que sobrevive à honestidade, e
transformação surpreendente à semelhança de Cristo.
Ouça, porém, esta recomendação. Não devemos definir
esses milagres como a vida melhor que desejamos e depois
tentar fazer com que aconteçam. Isso representaria um
desvio do novo caminho para o antigo.

263
Não devemos esperar milagres que não podem acontecer até
no céu. Três me vêm à mente.
Primeiro, nunca iremos gozar Deus constantemente nesta
vida e tão plenamente a ponto de adorar com perfeição.
Sempre haverá razão para quebrantamento sobre as nossas
falhas em apreciar Deus como nosso maior tesouro.
Segundo, nunca experimentaremos neste mundo o impacto
da graça em suficiente profundidade para nos relacionar
perfeitamente com quem quer que seja. Sentimentos de
superioridade, insegurança e críticas injustas irão turvar todo
esforço para amar. Sempre haverá razão para arrependimento
sobre nosso fracasso em oferecer comunhão espiritual.
Terceiro, jamais dependeremos o suficiente do Espírito de
Deus para revelar completamente quem já somos em Cristo.
Até o céu, nossa transformação será sempre incompleta.
Haverá sempre razão para nova entrega a Deus, confiança
maior e libertação irrestrita por intermédio de Deus.
A bem da verdade, continuaremos cometendo erros até o
céu. Jamais faremos tudo que devemos. Não dependeremos
totalmente do Espírito Santo — até virmos Cristo.

Tudo o que o Espírito faz

O Espírito continua, porém, fazendo a sua obra. Quanto mais


vemos tudo que ele está operando, tanto mais a pressão
diminui. A dependência aumenta. Repousamos na obra sétupla
264
do Espírito de Deus.104 Esse descanso e essa dependência
são a quarta idéia básica no aprendizado da vida no novo
caminho.
Quero descrever agora a obra sétupla e sugerir como
podemos depender de tudo que o Espírito faz enquanto
buscamos nos achegar a Deus.

A Primeira Obra do Espírito: Lembrar

Pouco antes de prometer-lhes paz, Jesus disse aos


discípulos: "O Consolador, o Espírito Santo, a quem o Pai
enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e
vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito".105
Quando os sonhos se despedaçam, quando os terroristas
vencem e os casamentos se dissolvem, o Espírito não fica
silencioso. Ele nos lembra que o que mais importa não está
ameaçado. O plano do Pai continua nos trilhos. Cristo fez
tudo o que era necessário para nos aproximarmos de Deus e
para ele se aproximar de nós. E o Espírito nos dirá que a
Trindade não pode conceber bênção maior que essa.
Se vivermos no novo caminho, passaremos tempo lendo a
Escritura, não para dominar seu conteúdo, mas para ouvir o
Espírito. Vamos sentir uma âncora pesada firmando o nosso
barco na pior tempestade. Como uma enfermeira experiente
chegando ao nosso leito e dizendo: — Acabei de falar com o
médico. Sua enfermidade foi curada. Vai ficar bom — , o
265
Espírito nos lembra do que Jesus disse: "No mundo, passais
por aflições; mas tende bom ânimo, eu venci o mundo".106

A Segunda Obra do Espírito: Glorificar

Quando o Espírito vier, disse Jesus: "Ele me glorificará,


porque há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar".107
Ir a Deus pode parecer sem sentido. A assistente acabou de
tirar sangue do meu braço. Ela franziu a testa ao sentir a veia
em que estava prestes a colocar a agulha. Em um gesto
reflexo, orei rapidamente para que a entrada fosse sem dor e
certeira. A seguir me ocorreu o pensamento: — O que quero
realmente é uma enfermeira experimentada e hábil. — Deus
pode responder a essa oração, mas parece mais importante
administrar a vida insistindo numa atendente com experiência
do que orando.
O que o Espírito me fará saber enquanto espero pela agulha
ou suporto uma provação bem maior? Algumas vezes tenho
medo de orar. Achegar-me a Deus pode despertar esperanças
que talvez sejam frustradas, como muitas vezes o são.
Quando me achego, devo fazer isso principalmente para
conhecê-lo e não para melhorar minha vida, para que o sangue
266
seja tirado sem dor logo na primeira tentativa. Quando ajo
assim, o Espírito glorifica Cristo tomando o que pertence a
ele - o valor eterno da sua vida, morte e ressurreição — e
sussurrando para mim: — O caminho está aberto; o que quer
que aconteça, Deus está no controle do que é mais
importante. Venha sem medo. Aproxime-se o suficiente para
ouvir o Pai cantando alegremente para você.
Independentemente de meu estado, em meio a qualquer
situação que esteja enfrentando, serei aceito na presença de
Deus. Vou ser ouvido, compreendido e receberei o que meu
Pai amoroso sabe que é melhor. Cristo tornou isso possível.
A ele seja a glória. É isso que o Espírito está dizendo. É a
sua segunda obra.

A Terceira Obra do Espírito: Derramar

O Espírito inspirou Paulo a dizer: "O amor de Deus é


derramado em nosso coração pelo Espírito Santo, que nos foi
outorgado".108
É difícil crer que somos amados. Não só as circunstâncias
são negativas e Deus não age, como também nunca
experimentamos plenamente por parte da família ou de
amigos o tipo de amor que ansiamos conhecer. Como em
tudo que importa mais para as nossas almas, somos
absolutamente dependentes do Espírito para nos convencer
de que somos de fato amados e podemos descansar no
267
amor de Deus por nós. Ele nos persuade, derramando o amor
do Pai em nossos corações, que é um processo místico.
Sem esta terceira obra do Espírito, continuaremos a sentir
que não somos amados, a esconder-nos do amor com medo
que ele não seja genuíno, a esforçar-nos ao máximo para gerir
nossa vida sem ser plenamente amados, a viver com qualquer
tipo de amor que nos seja dado.
Tenho dificuldade em receber amor. Acho mais seguro dar,
sem ficar na posição vulnerável de precisar realmente de
alguma coisa. É difícil pedir significativamente ao Espírito Santo
que penetre no centro exato do meu coração, encontre o
buraco vazio, e o encha com o amor de Deus. Parece algo tão
carente, tão fraco.
Outros parecem deleitar-se com essa oração, crendo que
estão livres da responsabilidade de seguir a Deus até que esse
vazio seja preenchido. Eles convertem a provisão graciosa do
Espírito em uma exigência egocêntrica de que suas
necessidades sejam satisfeitas.
Mas, quando medito sobre a cruz, quando me abro para o
toque de outros em mim com o amor de Cristo, quebrantando-
me perante eles, posso então experimentar o amor divino em
sua totalidade. Sou indestrutível, nenhum sofrimento me
abaterá. Sinto-me entusiasmado com a idéia de marchar
corajosamente em meu mundo sob a bandeira do amor cristão.
É isso que acontece em mim quando o Espírito derrama o amor

268
de Deus em meu coração. Gostaria que acontecesse mais
vezes.

A Quarta Obra do Espírito: Afirmação

Há palavras mais belas para os fracassos morais, pessoas


solitárias e vítimas de abusos de qualquer ordem do que
ouvir que "o próprio Espírito testifica com o nosso espírito
que somos filhos de Deus"?109
A seção do tribunal começou. Todos ficam de pé. O réu
também deve levantar-se. Você é acusado de hipocrisia e
fraude. Afirma ser filho de Deus. E mesmo? Este é o assunto
para o qual este tribunal se reuniu para decidir.
A evidência contra nós é esmagadora. E nada ficou oculto.
Cada pecado secreto é exatamente relatado. Nós nos
encolhemos. O acusador apresenta suas provas, o mundo
zomba, a carne duvida.
Então, no tribunal reunido em nossas almas, entra o
Espírito, o Deus Todo-Poderoso, o Escrutinador da verdade
final. Ele fala baixinho, com a autoridade de um general cinco
estrelas comandando suas tropas ou o principal médico
especialista dando sua opinião. — Este pertence a Deus. —
Quem pode discutir? O caso está encerrado. O Plano
269
Emanuel está em progresso na vida desta pessoa. Esta pessoa
sou eu. Vou encontrar Deus. Vou participar da verdadeira
comunhão. Vou me assemelhar a Cristo. O Espírito falou. Eu o
ouvi. Caso encerrado.
O diabo ficou certa vez perto de um filho de Deus e disse: —
Olhem para ele. Suas roupas cheiram mal. Como pode fingir
parentesco com a realeza?
Satanás tinha razão. As roupas do sumo sacerdote Josué
estavam sujas, cobertas de excremento.110 Josué baixou a
cabeça. A acusação tinha fundamento.
O Senhor então deu um passo à frente. "Tirai-lhe as vestes
sujas", ordenou ele aos servos. A Josué disse: "Eis que tenho
feito que passe de ti a tua iniqüidade e te vestirei de finos
trajes". Voltando-se para os servos, mandou: "Ponham-lhe um
turbante limpo sobre a cabeça". O turbante usado pelo sumo
sacerdote de Israel tinha inscritas numa placa na frente as
palavras "Santidade ao Senhor".
Se olharmos só para as nossas vidas, ficaremos imaginando
se somos realmente dele. Se avaliarmos o nosso progresso ao
longo da jornada espiritual, surgirão dúvidas. Mas, se
aprendermos a ouvir o Espírito, saberemos que somos de
Cristo. Iremos comprazer-nos em comunhão santa com Deus.
Sairemos do tribunal e iremos para a casa do juiz. Somos seus
filhos.

A Quinta Obra do Espírito: O Selo


270
Quando viemos a Cristo, não só fomos incluídos em Cristo,
como também, por termos crido, fomos "selados com o santo
Espírito da promessa.”¹¹¹

Selar significa segurança. O Espírito é o próprio selo. As


pessoas seladas são separadas das que não o foram. Pense
nisso! Você e eu fomos entregues à guarda do Espírito a fim
de garantir nosso encontro com o Pai e o Filho. Estamos
salvos, não de bombas, câncer ou problemas familiares, mas
de ficarmos separados do Deus que está no controle do
Plano Emanuel, nem um centímetro sequer. Podemos entrar
destemidamente na sua presença.
No último mês de vida de meu pai, enfrentando uma
fraqueza cada vez maior, tristeza contínua pela saúde cada
vez mais decadente da esposa com Alzheimer e muita
solidão, ele me disse várias vezes: — Tenho a onipotência do
meu lado. Estou a salvo. Pensar nisso me faz sentir uma
serenidade estranha por trás de todo o sofrimento.
Meu pai foi selado com o Espírito de Deus e, pelo fato de o
Espírito ter-lhe revelado isso, ele conheceu a paz de Deus.

A Sexta Obra do Espírito: Previsão

271
"Mas aquele que nos confirma convosco em Cristo e nos
ungiu é Deus, que também nos selou e nos deu o penhor do
Espírito em nosso coração".112
O Espírito é o penhor da nossa herança, o depósito do que
está para vir e a garantia do que virá. Ele é uma parte do todo,
uma prova da refeição, uma amostra do que podemos esperar.
Agostinho entendeu a graça (corretamente, penso eu) como
uma experiência de alegria que excede a tal ponto os prazeres
do pecado, que desistimos prazerosamente deles. O Espírito
deposita em nossas almas um ímpeto de alegria que
experimentamos ocasionalmente, uma esperança inabalável
que fica à disposição quando precisamos dela, uma visão de
beleza que algumas vezes temos ocasião de contemplar.
Vislumbramos o que está para vir e perseveramos impetuo-
samente em meio ao que ocorre agora.
Quando falo com franqueza aos cristãos, encontro o que vejo
com freqüência em mim mesmo, uma atitude cínica sobre a
idéia de alguém experimentar realmente esse tipo de alegria
em Deus. Ganhar na loteria? Sim, isso proporciona grande
entusiasmo. Tempo com Deus? Francamente, algo um tanto
tedioso, uma paixão só para alguns místicos e contemplativos.
Mas, Deus é essencialmente uma comunidade de pessoas
apaixonadas que gostam profundamente umas das outras.
Quando ele criou as pessoas, embutiu nelas a capacidade
dessa mesma espécie de paixão e alegria. Quando nos remiu,
colocou em nós um membro da Trindade como um depósito,
272
poderíamos dizer algo que chame atenção para o que está
por vir. Em vista de quão vividamente a Bíblia fala do prazer,
satisfação e alegria que Deus provê, só podemos supor que
o depósito em nós é algo a ser experimentado, um prazer a
ser sentido, uma emoção palpável, uma pequena amostra do
que espera a todos nós.
Há muito mais no tocante ao conhecimento de Deus do que
ousamos imaginar. Está na hora de pôr de lado nosso
cinismo e nos achegar a ele, esperando consciente,
deliberada e disciplinadamente que o Espírito deleite nossas
almas com o rico alimento de Deus.

A Sétima Obra do Espírito: Unção

"E vós possuís unção que vem do Santo e todos tendes


conhecimento... a unção que dele recebestes permanece em
vós, e não tendes necessidade de que alguém vos
ensine".113
Tenho lutado há anos com uma depressão que vai e vem.
Meu mundo interior é quase sempre a cena de uma luta
contra o ódio por mim mesmo, preocupação obsessiva,
inatividade desanimada e hipersensibilidade. O que devo
fazer? Um médico e mais de um amigo recomendaram
antidepressivos. Terapia prática como a reestruturação
cognitiva ou terapia dinâmica que explora as emoções

273
ocultas e questões de ansiedade existencial poderiam ser
úteis.
Minha opinião é esta. O primeiro passo para tratar qualquer
dificuldade em nossa vida - filhos rebeldes, casamentos tensos,
indecisão, gula ou depressão — não é estabelecer o alvo de
tornar as coisas melhores e depois preparar um plano de ação.
Esse é o antigo caminho.
O primeiro passo é apresentar-se a Deus.
Admita onde está; encontre o sinal vermelho.
Identifique os dois caminhos à sua frente, o antigo e o novo
caminho.
Faça do encontro com Deus a sua maior ambição e tente se
assemelhar a Jesus por meio de sua comunhão.
Aprenda a depender do Espírito Santo e espere que essas
três ambições sejam concedidas como milagres.
Ore como um peregrino numa viagem (vou discutir como no
próximo capítulo).
Aproximar-se de Deus para a melhor esperança da
intimidade com ele (que dá glória ao seu nome) liberta algo em
nós. Amor ardente e sabedoria com discernimento são-nos
dados pelo Espírito. Sentimos a sua direção no que fazemos.
Essa é a unção que recebemos dele. É um plano de jogo
divinamente dirigido para lidar com o que quer que esteja
acontecendo em nossa vida.
Estou sentindo muita liberdade para comer com maior
responsabilidade, exercitar-me com mais perseverança e
274
confessar um espírito de temor e autocomiseração. O estudo
mais constante da Palavra, orar mais vezes como peregrino e
encontrar tempo para fazer as coisas com mais vagar, a fim
de desfrutar melhor a família, os amigos, a diversão e o lazer,
me parecem uma unção do Espírito. Se, depois de avançar
nessas direções, não houver um alívio da minha opressão
ocasional, poderei concluir que luto com uma depressão
quimicamente induzida, só então devo considerar o uso de
antidepressivos. Ou posso, como Spurgeon, aceitar minha
depressão como um instrumento ordenado por Deus para
ajudar-me a viver em maior dependência e ministrar mais
poderosamente.
Acredito que esta sétima obra do Espírito Santo, a unção
espiritual, significa que os seguidores do novo caminho
receberão o amor e a sabedoria de Cristo para responder a
qualquer desafio que encontrem na vida. Quando o Espírito
desceu sobre o Cristo encarnado, foi-lhe concedido
sabedoria, poder e temor que produzia deleite.114 E agora em
Cristo estão ocultos todos os tesouros de sabedoria e
conhecimento.115 Se aprendermos o que significa ir a ele,
receberemos uma unção que nos esclarecerá o que fazer e
nos capacitará para agir em qualquer circunstância da vida.
Se crêssemos nisso, o aconselhamento cristão mudaria
completamente de aspecto. Deixaríamos de pensar em
aconselhamento ou terapia como um especialista oferecendo
conhecimento específico a um paciente. Ele se tornaria uma
275
oportunidade para um peregrino amadurecido se juntar a outro
numa jornada à presença de Deus. O aconselhamento como o
conhecemos seria transformado em direção e amizade
espiritual entre dois companheiros indo a Deus para esperar
pela sua orientação e serem fortalecidos com a sua energia.

Temos o que precisamos

Esta é a quarta idéia básica sobre o que significa viver no


novo caminho: Depender do Espírito e da sua obra sétupla.
Podemos depender dele para...
• ficar sabendo que o fundamento está certo. O plano que o
Pai julga melhor para nós está funcionando, não importa o
que possa estar ocorrendo em nossa vida.
• mostrar-nos o caminho aberto por Cristo para a presença de
Deus. Temos uma nova pureza, uma nova identidade, uma
nova disposição e um novo poder que torna possível, em
qualquer tempo, em qualquer condição, apresentar-se
diante de Deus.116
• derramar o amor de Deus em nossos corações até ficarmos
surpresos por ver que aquele que é indigno de amor é
realmente amado.
• convencer-nos de que pertencemos a Deus, mesmo quando
a evidência é lamentavelmente inadequada.
• manter-nos protegidos de qualquer poder que possa
desviar-nos de nossa colaboração com o Plano Emanuel.
276
• oferecer prova suficiente da presença de Deus e realidade
para nos manter desejosos de conhecê-lo melhor.
• conceder-nos a motivação e o método, a paixão e a
sabedoria para lidar com todas as nossas decisões e
responsabilidades de um modo que glorifique a ele e nos dê
alegria, mesmo quando os problemas da vida não
diminuem.
Deus está no controle - do quê? Do Plano Emanuel. Em
meio aos escombros dos edifícios destruídos e vidas
conturbadas, ele está se movendo poderosamente na
direção do seu propósito. Os seguidores do novo caminho
compartilham seu entusiasmo por esse propósito e, mediante
a dependência do Espírito Santo, viajam para o dia em que
Cristo será tudo em todos e Deus, nosso supremo tesouro
em todos os momentos.
No Espírito temos o que precisamos para continuar a
viagem. A pressão acabou. Não temos necessidade de fazer
esta vida funcionar. Há um novo modo de viver.
Grande parte do combustível para a jornada é provida pela
oração, um certo tipo de oração, a oração da criança indo
para casa. Eu a chamo de Oração do Papai. É a quinta idéia
básica (e a última) para entrar e viver no novo caminho.

277
A ORAÇÃO DO NOVO CAMINHO

Aguém a quem amo muito está sofrendo. Sofro por ela e


estou assustado. O que acontecerá? Não sei. Portanto, oro.
Mas, enquanto oro, a pressão aumenta. Fico mais assustado,
quase desesperado e um tanto raivoso. Essas emoções são
inaceitáveis; então, as sufoco e oro mais alguns minutos, mas
agora sem paixão, indiferente, cínico. Espero realmente que
ele mude o que me preocupa e perturba a pessoa que amo por
causa da minha oração?
Durante anos supus que a ordem bíblica para "pedir com fé,
em nada duvidando",117 quando oramos, tem que ver com a
oração intercessória, com nossos pedidos para que Deus torne
a nossa vida melhor. Sob essa suposição, tentei obter
confiança de que ele faria tudo o que eu pedisse, desde que
meus pedidos fossem apenas para coisas boas. Apesar dos
meus maiores esforços, a incredulidade e a dúvida continuam a
importunar-me enquanto oro. E, penso eu, por boas razões.
Antes de Tiago nos dizer para termos fé e não duvidarmos
quando oramos, ele fala sobre o sofrimento, sobre dificuldades
que ninguém incluiria em sua definição de uma vida melhor.
Também nos instrui para receber essas coisas como amigos,
permitir que façam seu trabalho de amadurecimento. Nada
nessa passagem é dito sobre a oração para livrar-se de
provações.

278
Isso me faz pensar que Tiago supõe que estamos orando
no novo caminho e não concentrando nossos desejos em
uma vida melhor, mas ansiando pela esperança melhor de
conhecer a Deus e nos tornarmos como ele.
Em seu último ano de vida, meu pai me disse mais de uma
vez: — Eu sei que Deus podia curar sua mãe do Alzheimer
num momento. Creio nisso e oro por isso. Mas não acredito
que ele o fará. Ou, pelo menos, não tenho certeza. Se não
curar, então este sofrimento será de alguma forma útil para
um bom propósito que não consigo ver. Quando oro para que
esses propósitos sejam realizados na vida dela e na minha,
tenho a certeza de que ele irá responder a essa oração.
Quanto a isso não tenho dúvidas.

A essência da oração do novo caminho

Comecei a perceber recentemente que há um antigo e um


novo caminho de oração. Os cristãos que almejam uma vida
melhor de bênçãos de Deus acima da esperança melhor de
intimidade com ele oram segundo o antigo caminho. A
petição precede a entrega. Os pedidos afastam a adoração.
A gratidão depende das bênçãos.
As orações segundo o antigo caminho são de pelo menos
três tipos:

279
Muda isso.
Peço-te que mudes o que estiver causando sofrimento em
minha vida. Endireita minha filha, dá-me um marido, res-
tabelece minha saúde, providencia uma renda.
Usa isto.
Mostra-me quais os princípios que devo seguir para fazer com
que aconteça. Dirige-me à pessoa ou aos recursos que preciso
para fazer com que aconteça.
Satisfaze-me.
Quero sentir-me viva, contente, satisfeita e feliz. Faze o que for
necessário para que me sinta satisfeita comigo mesma, com a
vida e contigo.

Não há nada de errado com essas orações a não ser que


representem nosso anelo mais profundo. Neste caso seriam
orações do antigo caminho com mais exigências do que
petições.
As orações do novo caminho incluem petição, mas nunca
começam com ela. O começo, o conteúdo principal e o fim das
orações do novo caminho são todos iguais: Venho. "Senhor,
venho a ti como estou. Só peço uma coisa: permite que veja a
tua beleza. E, ao vê-la, permite que te ame e viva como tu."
A petição pode acompanhar essa oração, mas nunca se
torna prioridade. — Deixa-me aproximar de ti, quer por meio de
bênção ou provação, e achega-te a mim para que eu possa ser
um instrumento do teu amor em todos os aspectos da minha
280
vida. Como tua filha, peço pela minha filha - faze com que ela
abra o coração para ti. Peço um marido - dá-me um
companheiro de vida. Peço saúde - que o câncer não volte. E
peço uma renda - permite que pague minhas contas e goze
de algumas coisas que só o dinheiro pode comprar. Mas, não
a minha vontade e sim a tua seja feita. Com fé e em nada
duvidando, peço-te que permitas achegar-me a ti e viver na
tua presença."
Esta manhã orei pelo ente querido que está sofrendo. Não
estou errado em desejar e depois pedir que Deus mude o
que está difícil. Não estou errado em pedir que Deus me
mostre o que fazer ou a quem pedir que possa melhorar as
coisas. E também não erro em pedir a Deus que tanto eu
quanto a pessoa que amo experimentem contentamento e
descanso profundos.
Estarei, porém, errado se quiser que o problema se afaste
mais do que desejo me aproximar de Deus e comprazer-me
nele ou refleti-lo nesta situação. Desejar minha bênção mais
do que a sua glória deveria resultar em quebrantamento e
não em petição por mais bênçãos. Paulo opôs-se fortemente
aos que "nãoprocediam corretamente segundo a verdade do
evangelho";118 o Espírito tem falado energicamente comigo
contra não orar de acordo com a verdade do evangelho.
Mude isso! Use isto! Satisfaça-me! Oro assim todo o
tempo. Faça de mim um pai sábio para que possa ajudar
meus filhos a andarem mais próximos do Senhor! Dê-me a
281
sabedoria que preciso para me dar bem com minha mulher a
fim de nos aproximarmos ainda mais um do outro. Abençoe
minha médica com sabedoria a fim de que ela possa
diagnosticar corretamente a dor nas costas que venho
sentindo.
Essas orações estão erradas? Sim, quando expressam a
paixão mais profunda do meu coração. Não, quando
expressam desejos subordinados à minha paixão por Deus,
pela sua glória a ser revelada quando eu o valorizo acima de
tudo o mais.
Podemos orar de um novo modo. Podemos deixar de insistir
em que Deus mude isso, use isto e nos satisfaça. Quando
alguém a quem amamos está sofrendo, quando estamos com
medo e nos sentimos inadequados, quando a dor em nossas
almas parece insuportável, quando nossa incredulidade sobre
a resposta à oração nos leva a orar mecanicamente, podemos
orar, não para mudar aquilo, usar isto, ou satisfazer-me, mas,
em vez disso, Senhor, eu venho. Esta é a essência da oração
do novo caminho.

Expressando-se a Deus

Eu a chamo de oração do novo caminho


Apresente-se a Deus como está.

282
Observe quando notar a presença ou ausência de Deus. Purifique-se de
qualquer coisa que, nesse momento, possa estar impedindo você de
atentar mais em Deus. Aproxime-se de Deus com paixão e confiança,
dedicando-se novamente a se aproximar dele a fim de conhecê-lo,
comprazer-se nele e revelá-lo, e não usá-lo para tornar sua vida melhor.

Sugiro que reserve pelo menos vinte minutos para fazer a


oração do novo caminho. Utilize cinco minutos em cada uma
das quatro partes. Faça isto de maneira deliberada várias
vezes por semana. Escreva uma carta a Deus expressando-
se em cada categoria, cinco minutos apresentando-se a ele,
depois mais cinco minutos ouvindo-o, outros cinco minutos
purificando-se conforme a orientação do Espírito, e os últimos
cinco minutos achegando-se a ele.
O mesmo ritmo de oração pode ser facilmente seguido a
qualquer hora do dia ou da noite em apenas alguns
momentos, falando simplesmente com Deus na cama,
dirigindo o carro ou assistindo a um filme monótono. — Deus,
estou aqui. Sinto a tua presença aqui, mas não lá. Percebo
que isto me impede de ouvir a tua voz. Mas declaro outra
vez, agora, meu desejo de aproximar-me de ti, seja por que
maneira, quer me abençoes ou não.
Vou descrever a oração do novo caminho. Ela representa
como os seguidores do novo caminho podem aproximar-se
de Deus para glorificá-lo, em vez de sentir a pressão de obter
algo para que a vida funcione bem.
283
Apresente-se a Deus

Reflita sobre a sua vida. Seja completamente honesto,


sabendo pela graça de Deus revelada na Nova Aliança que
não descobrirá nada que faça Deus rejeitá-lo e creia, por causa
dessa mesma graça, que por baixo da pior sujeira se encontra
beleza radiante.
Que desejos em seu íntimo parecem mais fortes? Peça a
alguns (apenas alguns) amigos confiáveis que o ajudem: Como
é conviver com você? O que as pessoas sentem que está
querendo delas, qual o seu efeito sobre elas, no momento?
Tome a inconcebível e difícil decisão de enfrentar a si
mesmo, sentir sua ira, cobiça e terror, assim como sua
compaixão, bondade e alegria. Não finja a respeito de nada.
Mas, ao honrar esse compromisso, evite os erros da negação
("Só enfrentarei aquilo com que puder lidar, o que não me fizer
sentir muito ameaçado.") e da obsessão ("Vou enfrentar tudo o
tempo todo.")
Lembro-me de uma manhã, há pouco tempo, quando não
conseguia desviar a mente das minhas dificuldades. Declamei
as Escrituras, pedi paz, preparei um plano de ação para o dia.
Nada deu certo. Ocorreu-me, então, que estava contando a
mim mesmo os meus problemas em vez de apresentar-me a
Deus.
Esta é uma parte do que escrevi naquela manhã em meu
diário da oração do novo caminho sobre apresentar a oração:
284
Àquele que aceita, muito amado:
Estou muito aflito no momento. Minha conversa com meu
pai a noite passada foi difícil. Senti-me dispensado,
repreendido, desacreditado. Ele é um homem cheio de
bondade. Como pude sentir-me assim? Penso que minha
raiva tem mais a ver com coisas para as quais não consigo
respostas - o que estou fazendo é realmente importante?
Ouvi de ti, ou estou envolvido em meus preconceitos e
insensatez? Sou uma mistura de pressão e alegria. E sou
esquisito. Enquanto me vestia de manhã, vi um cinto para
colocar, botões da camisa para serem abotoados, meias
para pôr nos pés - e sinto que devo fazer tudo ao mesmo
tempo. O que será tudo isso?
Para mim era o sinal vermelho marcando onde eu me
encontrava naquela manhã. Isso começou minha oração do
novo caminho.

Observe a Deus

Quando notou a presença de Deus na hora ou no dia que


passou? Quando percebeu um desejo de sentir que ele
estava com você, mas só sentiu a sua ausência?
A jornada espiritual está centrada na experiência de Deus e
arraigada na verdade revelada de Deus. Cuide do que você
experimenta de Deus, mas durante esta parte da oração,
concentre-se também no que sabe que é verdade, quer
285
experimente ou não isso. Lembre-se da obra sétupla do
Espírito enquanto reflete sobre o texto bíblico que acabou de
ler.
Escute o Espírito lembrá-lo de tudo o que Jesus disse,
especialmente que tudo está sob controle. Nada surpreende a
Deus. O Plano Emanuel segue seu curso.
Ouça o Espírito dar glória a Cristo. Tudo que precisa para
experimentar a vida de verdadeira abundância está em Cristo e
na nova aliança feita no seu sangue.
Note quando ele derrama amor em seu coração. Fique
quieto, sintonize seu ouvido com a música do céu, ouça o Pai
cantar alegremente sobre você.
Dependa do testemunho do Espírito de que você é um filho
de Deus, mesmo quando a evidência parece contrária.
Descanse na segurança do seu selo em sua vida. Nenhum
ato de terrorismo, nenhuma vacilação do mercado de ações,
nenhum problema de saúde, nenhuma rejeição, nenhum
rompimento na família tem poder para frustrar a obra de Deus
em sua vida. Tudo pode ser remido pelo Espírito para bons
propósitos.
Prove qualquer amostra que ele lhe der da refeição que está
chegando. Pode ser um momento de alegria desmesurada ou
um profundo alívio da pressão construída para fazer as coisas
certas a fim de obter bênçãos de Deus.

286
Confie na unção do Espírito. Espere que ele lhe conceda o
desejo ardente e a sabedoria para lidar com cada situação de
um modo que honre a Cristo e faça avançar o seu plano.
Este é um breve trecho do meu diário da oração do novo
caminho expressando uma oração de quem ouve:
Amada âncora que só me deixa ir até certo ponto, Falaste
comigo ontem à noite por meio de Bilbo Baggins no livro, The
Hobbit. Ele travou sozinho a batalha importante no túnel. A
questão é coragem. Eu te ouvi dizer: "Tende bom ânimo!" e
espere com fé e coragem. Caí realmente, mas não fiquei caído.
Estás comigo no túnel. Notável. Tolkien escreveu esse livro há
anos. E tu te comunicaste comigo por meio dele, ontem. O
resultado final é certo. Estou seguro, não me acho sozinho, e
sinto-me vivo. Não espere que o seu sentimento da presença
de Deus corresponda diretamente ao que você apresentou a
ele. Pode ser que sim ou pode ser que não.

Purifique-se Diante de Deus

Comece recitando a oração de Davi:


“Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração, prova-me
e conhece os meus pensamentos; vê se há em mim algum
caminho mau e guia-me pelo caminho eterno.”119
Reflita sobre o que se encontra em você - atitude, motivo,
determinação — e no que está fazendo que torna difícil para
você ouvir o Espírito, crer na sua Palavra, confiar em Deus.
287
Pressuponha que, o que quer que seja, tem raízes numa
preocupação consigo mesmo. O foco no seu desejo, nos seus
sonhos, nas suas esperanças, nos seus desapontamentos e no
seu sofrimento pode levá-lo à vida do antigo caminho. O efeito
do foco no ego, embora encorajado pela cultura terapêutica e
sancionado por muitos ensinamentos cristãos, é aceitar outro
evangelho, o evangelho de que Deus está aqui mais para nós
do que nós estamos para ele.
A purificação, para mim, no geral, inclui quebrantamento e ar-
rependimento enquanto confesso quão comprometido estou
em nunca parecer insensato e quanto penso que devo ser
notado e apreciado pelo que faço. Reflito sobre a minha
experiência de grande vexame e grande satisfação por
compreender o que devo evitar para poder ganhar em minha
vida. Aquilo causou terrível sofrimento. Nunca deve acontecer
de novo. Mas isto trouxe enorme prazer. Quero vê-lo repetido.
Para mim, viver é evitar o que magoa e obter aquilo de que
se gosta. — Deus, peço-te que arranjes minha vida desse
modo. — Que coisa terrível! Para Paulo, viver era Cristo.
Isto é do meu diário de oração do novo caminho:
Amado e Gentil Senhor,
Quero tanto melhorar minha vida de modo que me sinta bem.
É tão mais fácil e previsível gozar uma bênção evidente do
que ter prazer em achegar-me a ti. Passo direto pela tua
água da vida e vou cavar outro poço que vaza.

288
Aproxime-se de Deus por Desejá-lo

Quando se apresentar a Deus — com tudo que é, com tudo


que sabe que Deus é, com todos os seus conflitos com a
carne —, responda pela fé aos convites de Deus:
Venham, todos os que estão cansados.
Venham, todos os que não conseguem fazer o que devem.
Venham, todos os que estão lutando para fazer a vida
funcionar. Você percebe a pressão irresistível da vida no
antigo caminho e a arrogância abominável que ela esconde,
mas percebe também um forte desejo espiritual, uma ânsia
de aproximar-se de Deus para...
glorificá-lo e comprazer-se em um encontro com ele,
juntar-se à comunhão do seu povo,
ser transformado pelo seu Espírito até assemelhar-se
realmente a Jesus.
Espere sentir uma alegria inexcedível que substituirá
qualquer outra afeição além de Deus no centro do seu
coração. Espere que, pelo Espírito, o Pai e o Filho se revelem
a você. Confie no Espírito para prover a paixão amorosa e a
sabedoria espiritual que precisa para lidar com todas as
situações da vida de modo que faça avançar o Plano
Emanuel.
Conte a Deus, com lágrimas se houver, com toda a
sinceridade de sua alma, que o deseja mais do que qualquer
outra bênção — que quer conhecê-lo, adorá-lo, comprazer-se
289
nele, servi-lo, revelá-lo, tornar-se como ele. Enquanto ora, verá
as suas súplicas pelos outros fluindo de seu coração,
especialmente pela sua salvação e crescimento, e por você
mesmo, para vir a ser um instrumento da graça. Vai achegar-se
com confiança, tornando conhecidos todos os seus fardos sem
um espírito de ansiedade ou exigência, mas com confiança
num Pai em cujo amor pode acreditar.
Escrevi estas palavras como parte de uma oração de
aproximação:
Amado Pai que estás à espera,
Neste momento, 10h30 do dia 22 de junho de 2001, sem um
sentimento definido, mas mesmo assim verdadeiro, entrego
meu coração ao OBJETIVO ÚNICO de te conhecer. Resolvo:
- desconfiar de qualquer alegria vinda de todas as outras
fontes, todavia celebrá-las como dons vindos de ti,
- escrever meu próximo livro num espírito de dependência de ti,
- viver na liberdade provida por ti, com tudo que me pareça um
risco.
Enquanto escrevo, sinto-me incentivado. Desejo realmente a ti,
glorificar-te em minha vida.
AMÉM!

290
Creia, não duvide

Emocione-se com o milagre que está ocorrendo em sua


alma. A pressão se foi! Você deseja mais achegar-se a Deus
do que usá-lo. Está vivendo no novo caminho!
O amanhã vai chegar. A vida continuará confusa e talvez
até piore. Vai sentir-se acorrentado. Está na hora de o ciclo
espiritual continuar -quebrantamento, arrependimento,
entrega, confiança e libertação.
Encontre o sinal. Reconheça os dois caminhos. Reformule
seus alvos. Ouça o Espírito. Faça novamente a oração do
novo caminho. Repita muitas vezes.
Quero terminar com uma paráfrase do apóstolo Tiago:
"Caros amigos, quando as dificuldades vierem, não tentem
calcular o que podem fazer para melhorar as coisas. Aceitem
o que está havendo de errado como uma oportunidade para
um encontro mais profundo com Deus, para entrarem na
comunhão e experimentar transformação.
"Se não souberem como fazer isso, não peçam a Deus
circunstâncias melhores ou experiências mais felizes, mas
peçam sabedoria para fazerem com que os seus sofrimentos
provoquem seu desejo por Deus. Quando pedirem isso,
saibam que ele lhes concede generosamente e nunca os
critica por encontrar-se em determinada situação. Creiam,
não duvidem. Se vacilarem entre desejar o novo caminho e
continuar agarrado ao velho, não receberão nada do Senhor.
291
"Está na hora, irmãos e irmãs, de nos entregarmos
inteiramente a Deus. Há um novo caminho para viver.
Acheguem-se a Deus e ele se achegará a vocês. Irá encontrá-
los, supri-los abundantemente, deleitá-los e usá-los para
promover o grande plano secular, o Plano Emanuel. Depois
iremos todos para casa".120
Você está cansado?
Com dificuldades para fazer o que é certo? Esforçando-se para
ter uma vida funcional? A pressão acabou! Há um novo
caminho para viver.

E PÍLOGO :

C OM D EUS NO BANHEIRO

— Adão —, disse Deus — não é bom para você não ter uma
companhia humana. Sou seu principal deleite, mas quero que
goze também muitos outros prazeres e vou providenciar todos.
Um pouco mais tarde, a segunda bênção maravilhosa de
Adão tornou-se a primeira em sua mente. Ele preferiu ficar com
Eva afastando-se de Deus, não lhe dando o devido valor. Cada
um de seus descendentes, desde então, fez a mesma escolha
— valorizar alguém ou algo mais do que a Deus.
— Temos agora um objetivo —, falou o Pai. — Devemos
mudar o coração das pessoas para que nos estimem mais do
que a qualquer outra coisa. Até que isso aconteça, não
podemos prover todas as coisas boas que gostaríamos - e
292
poderíamos — dar. Fazer isso seria encorajar a inclinação
natural humana de encontrar alegria nas coisas menores e
impedir que experimentem a verdadeira alegria.
— Todos os homens são culpados do maior mal
imaginável, Pai, — disse o Filho. — Eles não vêem em ti toda
a beleza que seus corações poderiam desejar. Esse primeiro
pecado levará a outros. A justiça requer que os entregues à
sua compreensão errada do prazer. Isso, porém, significaria
deixá-los num mundo eterno onde todo prazer é possível,
menos a tua pessoa. O que não seria absolutamente prazer,
mas inferno.
— Pai, vou satisfazer a justiça para revelar a tua graça.
Vou tornar-me um deles, mas, diferentemente deles, sempre
amarei a ti acima de Tudo. Como poderia ser de outro modo?
Vou assumir responsabilidade pela sua insensatez perversa
em amar qualquer coisa mais do que a ti. Castiga-me, então,
Pai, em vez de castigá-los. Deixa que eu experimente o
horror da separação absoluta de ti. A justiça será então
satisfeita. Poderás perdoar o mal de todos os que aceitarem
o castigo que infligires sobre mim como punição pelo que
merecem.
O Pai declarou: - Esse é o meu plano.
Muitos anos se passaram. Depois de o Filho ter
experimentado o afastamento do Pai e ter sido acolhido de
volta no céu com grande celebração, o Espírito falou: —
Posso agora entrar na alma de cada um daqueles que
293
perdoaste. Incutirei neles uma ânsia de conhecer-te, Pai, e
aumentarei esse desejo até que te tornes seu supremo
tesouro.
— Vou usar cada minuto de sofrimento que permitires para
guiar seus corações a ti, até que te desejem mais do que
qualquer outro prazer. E então, quando decidires, nós os
traremos aqui para verem o Filho e, por meio dele, para verem
a ti. A partir desse momento serás seu principal tesouro, seu
maior prazer, sua maior alegria. Como poderia ser de outro
modo? Como poderia ter sido de outro modo? E então — que
dia maravilhoso — iremos derramar sobre eles cada bênção
que nosso infinito amor pode conceber, sem a menor
possibilidade de que alguém se torne mais apegado às tuas
bênçãos do que a ti mesmo.

Os dois fundamentos

Vivemos agora entre o Calvário e a volta, entre Pentecostes


e a Parousia (a aparição de nosso grande Deus e Salvador).
Vivemos neste mundo. Ocupamo-nos neste mundo. Lidamos
com os acontecimentos deste mundo. E devemos. Mas temos
uma escolha. Vivemos em um dentre dois fundamentos.
A maioria de nós aceita o desafio de viver eficaz, sábia e
moralmente neste mundo) com a expectativa, ou pelo menos a
esperança, das bênçãos que se seguirão. Alguns aceitam o
convite de ir a Deus para encontrar nele tudo que seus
294
corações desejam e depois viver neste mundo conforme ele
dirige e capacita, sem nenhuma ambição mais forte do que
exaltar o seu Nome.
Se construirmos no primeiro fundamento, a carne, nossa
paixão maior será as bênçãos, às quais damos maior valor. E
nossa experiência básica, que subjaz tudo o mais que
sentimos, será a pressão que faz com que vivamos de certa
maneira para obter a vida que desejamos.
Se construirmos no segundo fundamento, o Espírito, nossa
paixão fundamental será Deus, conhecê-lo e honrá-lo em
qualquer circunstância. E nossa experiência básica será a
liberdade que nos aproxima de Deus por meio de uma ponte
que não construímos nem mantemos. Nessa liberdade,
descobriremos tanto a paixão de viver bem, como a
sabedoria para descobrir o que isso significa.
Viver no fundamento da carne se assemelha a isto:

Atitude Básica: Fazer a minha vontade



Esperança Básica: Espero que boas coisas aconteçam

Estratégia Básica: Calcularei o que fazer e farei

Experiência Básica: Devo agir certo para receber bênçãos

Paixão Básica: Vivo para ser abençoado
295
O novo caminho de vida, o caminho do Espírito, parece bem
diferente:

Atitude Básica: Seja feita a tua vontade



Esperança Básica: Espero tornar-me como Jesus

Estratégia Básica: Confiarei na provisão dele

Experiência Básica: Vou a ele para celebrar a sua glória

Paixão Básica: Vivo para conhecer Cristo

Permita que eu o conheça

Vou apresentar uma última ilustração.


Quando eu tinha três anos, minha família morou por algum
tempo na casa grande e antiga de meus avós. O único
banheiro ficava no segundo andar.
Numa tarde de sábado (eu sabia que era sábado porque meu
pai estava em casa), decidi que já era grande para usar o
banheiro sem ajuda de ninguém. Subi as escadas, abri e
tranquei a porta atrás de mim, e durante os minutos que se
seguiram me senti muito auto-suficiente.

296
Chegou a hora de sair. Não consegui abrir a porta. Tentei
com toda a minha força de três anos, mas nada. Entrei em
pânico. Senti-me outra vez um menininho pequeno quando
este pensamento cruzou minha mente: — Talvez passe o
testo da vida neste banheiro.
Meus pais — e provavelmente os vizinhos — ouviram
meus gritos desesperados. — Você está bem? — Minha mãe
gritou através da porta, porque não pôde abri-la do lado de
fora. — Você caiu? Machucou a cabeça?
— Não consigo abrir a porta: —, gritei. — Tire-me daqui.
Eu não sabia então, mas meu pai desceu correndo os
degraus e foi até a garagem para pegar uma escada, tirou-a
do gancho e a encostou do lado da casa bem embaixo da
janela do banheiro. Com sua força de adulto, ele a abriu,
depois entrou na minha prisão, passou por mim e com a
mesma força virou a fechadura e abriu a porta.
— Obrigado, papai — disse-lhe, e saí para brincar.
Era assim que eu supunha que a vida cristã devia
funcionar. Quando fico preso em algum lugar, devo fazer
tudo que posso para livrar-me. Quando não consigo, devo
orar. Depois Deus aparece. Ele ouve os meus gritos. — Tira-
me daqui! Quero brincar! — e abre a porta para as bênçãos
que desejo.
Ele, às vezes, faz isso. Mas agora que não tenho mais três
anos e em breve farei sessenta anos, estou compreendendo
que a vida cristã não funciona assim. E imagino: alguns de
297
nós estão contentes com Deus? Será que sequer gostamos
dele quando não abre a porta que mais queremos ver aberta -
quando um casamento não se recupera, quando os filhos
rebeldes continuam se rebelando, quando os amigos traem,
quando os revezes financeiros ameaçam nossa vida con-
fortável, quando a expectativa do terrorismo nos espreita,
quando a saúde piora apesar de muita oração, quando a
solidão aumenta e a depressão se aprofunda, quando os
ministérios morrem?
Deus subiu pela pequena janela até meu quarto escuro. Mas
ele não passa por mim para girar a fechadura que eu não
consegui abrir. Em vez disso, ele senta-se no chão do banheiro
e diz: — Venha sentar-se aqui comigo. — Parece pensar que
entrar no quarto comigo é mais importante do que me deixar
sair para brincar.
Nem sempre concordo com isso. — Tira-me daqui! — grito.
— Se me amas, abre a porta!
Querido amigo, a escolha é nossa. Podemos ficar pedindo a
ele que nos dê o que julgamos nos fará feliz — sair do quarto
escuro e correr para o playground de bênçãos - ou podemos
aceitar o seu convite para sentar-nos com ele, por enquanto
talvez no escuro, e aproveitar a oportunidade para conhecê-lo
melhor e representá-lo bem neste mundo difícil.
Vamos escolher o antigo caminho, o caminho da pressão? —
Farei tudo o que quiseres; só me tira daqui!

298
Ou vamos descobrir tanto o coração de Deus como o
nosso e escolher o novo caminho, o caminho da liberdade e
alegria? — Vou me sentar contigo em qualquer lugar, no
escuro ou na luz, basta-me conhecer-te e servir-te!
Está na hora de escolher o novo caminho do Espírito e
segui-lo até que brinquemos para sempre nos campos do
céu, sempre contemplando Jesus como a nossa maior
bênção.
Está na hora de ficar com Deus no banheiro até que ele
abra a porta para a eternidade. E o que desejamos.

A GRADECIMENTOS

Sempre pensei: se tivesse de desistir de toda


atividade do ministério menos uma, qual sobreviveria?
Escrever livros sobre a nossa jornada pela vida e falar
com as pessoas enquanto viajamos juntos — esta foi a
minha resposta. (Eu sei; cometi um engano. Essas são
duas atividades.)
Mas, na verdade são apenas uma. As histórias de um
número incontável de pessoas em cujas vidas entrei formam
o pano de fundo para cada livro que escrevo. Sem
elas,escrever seria um ato árido, acadêmico, sem vida. Este
livro reflete os conflitos e satisfações de uma porção de
indivíduos que tenho encontrado recentemente e que estão

299
caminhando no escuro em direção à luz. A cada um de vocês,
o meu obrigado.
Meu pai morreu três semanas antes que eu tivesse terminado
o último capítulo e posto de lado a caneta. Nenhuma história de
fé me influenciou mais do que a dele. Com profunda gratidão e
respeito, dedico este livro à sua memória.
Quando entrego um manuscrito ao editor, sempre tremo um
pouco, como um pai apresentando seu filho recém-nascido em
público pela primeira vez. O capítulo 8 vai tornar-se capítulo
12? Minha ilustração favorita será cortada? Será que vou ouvir:
— Olhe, pode haver um livro aqui. Vamos trabalhar nele? —
Vale a pena quando você confia no seu editor. Thomas
Womack compreende a minha mensagem, aceita meu estilo
idiossincrático e, com um coração que ama a beleza e a
franqueza da verdade, trabalha para tornar meus escritos tão
úteis quanto possível para o bem do reino.
Agradeço também a Steve Cobb e toda a equipe de
WaterBrook! E ótimo trabalhar com vocês. Seu evidente
compromisso com Cristo fortalece o meu.
Sealy Yates, agente e amigo, orienta habilmente o processo
de publicação e me anima enquanto escrevo. Obrigado, meu
amigo.
Escrevo em blocos de papel amarelo, à mão, com canetas
especiais, como Paulo e Isaías escreveram seus livros. Claudia
Ingrams traduz meus rabiscos, ataca agilmente um teclado,
depois me remete por fax cada capítulo para várias revisões
300
minuciosas. Sua paciência ilimitada vem de um coração
voltado para Deus e que se expressa num espírito de servo.
Para Claudia e seu marido, Bob, a mais profunda apreciação
de um irmão agradecido.
São tantos os que oram fielmente por mim, enquanto
escrevo. Phoebe, Trip e Judy, Kent e Karla, Jim e Suzi,
Dwight e Sandy, Randy e Mareia, Wes e Judy, Tom e Jenny,
Frank e Chris, e muitos outros cujos nomes merecem
menção, obrigado.
Tudo que faço é com amor e respeito inexprimíveis por
meus dois filhos, Kep e Ken, e com a oração de que cada um
deles continue seguindo fielmente a Cristo. O mesmo amor e
oração flui de meu íntimo para três bênçãos maravilhosas em
minha vida, minha nora, Kim, e meus dois netos, Jake e
Josie.
Escrever é trabalho duro, mais ainda, penso eu, para o
cônjuge do autor do que para ele mesmo. Cada vez que
termino um livro, imagino o Senhor acrescentando um novo
aposento à mansão já magnificente de Rachel. Ninguém é
mais significativamente apoiado do que eu pela minha
parceira de vida. Nenhum agradecimento é suficiente. Meu
amor cresce cada vez mais. Jornadeamos juntos.

301
N OTAS

1. Romanos 7:6, NVI.


2. Provérbios 3:6.
3. Provérbios 22:6.
4. Deuteronômio 30:17, 18.
5. Levítico 26:14,16,22,36.
6. Veja Hebreus 8:13.
7. MERTON, Thomas. Spiritual Direction and Meditation.
Collegeville,
Minn.: Liturgical, 1960, p. 16.
8. Isaías 5:20.
9. Veja EDWARDS, Dwight. Revolution Within, Colorado
Springs: WaterBrook, 2001, para uma excelente discussão
desses quatro recursos.
10. Gálatas 5:2,4.
11. Veja 2 Pedro 2:7.
12. Não sigo a opinião de que já houve um dia dois caminhos
de salvação. A fé em Deus, satisfeita pela sua graça
perdoadora, que ele tornou disponível mediante a expiação
substitutiva de Cristo, sempre foi o meio de acesso a Deus,
tanto na justificação (aceitação por Deus) como na
santificação (oportunidade de aproximar-se).
13. Filipenses 3:2.
14. Filipenses 3:3.

302
15. WUEST, Kenneth S. Galatians. Grand Rapids, MI:
Eerdmans, 1994, p. 21.
16. Gálatas 1:6,7. I
17. Gaiatas 3:1-5.
18. Deuteronômio 28:13.
19. Citado em Gálatas 3:10 de Deuteronômio 27:26.
20. TOLKIEN, J.R.R. The Hobbit. Nova York: Ballantine Books,
1982, pp. 214,5.
21. 2 Coríntios 4:8,9.
22. 1 Coríntios 15:19, minha paráfrase: "Se tivermos
esperança em Cristo apenas nesta vida, devemos ter mais
compaixão do que todos os homens".
23. 2 Coríntios 4:13, citado do Salmo 116:10.
24. Salmo 116:12.
25. Salmo 116:15,16.
26. 2 Coríntios 4:14.
27. 2 Coríntios 4:15.
28. O pensamento se encontra também num texto diferente,
Gálatas 4:3,8-11. Naquela manhã passei algum tempo tam-
bém nessa passagem.
29. Veja João 17:1-3.
30. Apocalipse 1:10.
31. Apocalipse 1:14-16.
32. Veja João 7:37-39 e Isaías 55:1-3.
33. AGOSTINHO, City of God, ed. Vernon J. Bourke. Nova York:
Doubleday, 1958, p. 300.
303
34. João 14:27.
35. AGOSTINHO, City of God, p. 300.
36. Mateus 11:28.
37. Romanos 1:21-29.
38. 2 Coríntios 4:4.
39. 2 Coríntios 4:6.
40. PIPER, John. Seeing and Savoring Jesus Christ. Wheaton,
IL.: Crossway, 2001, p. 26. Sou devedor a Piper pela
orientação de meus pensamentos neste capítulo,
especialmente. Qualquer orientação errada é minha.
41. Romanos 5:2.
42. PIPER, Seeing and Savoring Jesus Christ, p. 21.
43. As citações e informação apresentadas aqui foram
extraídas de "Anorexia Battle Undone Online", Denver Post,
terça-feira, 17 de julho de 2001, sec. A, pp. 1,13.
44. PIPER, Seeing and Savoring Jesus Christ, p.125.
45. Recomendo o livro de Piper, Seeing and Savoring Jesus
Christ como leitura vital para compreender o novo caminho.
46. Veja Jeremais 2:5-13; 15:16-18.
47. Veja Tiago 4:10; 5:7-11.
48. Essas histórias são autênticas. Só alguns detalhes foram
mudados — nunca piorados - para proteger as identidades.
49. O autor se refere a Connecting (Nashville, TN: Word,
1997), The Safest Place on Earth (Nashville, TN: Word,
1999) e Shattered Dreams (Colorado Springs: WaterBrook,
2001).
304
50. Veja Hebreus 10:19-23.
51. Veja 1 Pedro 3:18.
52. Veja João 14:21,23; Tiago 4:8.
53. Êxodo 19:5.
54. Jeremias 31:34: "Não ensinará jamais cada um ao seu
próximo, nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece ao
SENHOR, porque todos me conhecerão, desde o menor até
ao maior deles, diz o SENHOR".
55. Hebreus 7:18, 19.
56. Gálatas 6:8.
57. João 20:31.
58. O que se segue é minha paráfrase de Apocalipse 21:2-4.
59. Minha paráfrase de Apocalipse 21:5.
60. 1 Coríntios 15:19.
61.OWEN, John. Communion with God, ed. R.J.K. Law. Carlisle,
PA: Banner of Truth, 1991, p. 1.
62. Minha paráfrase de 1 João 1:1-4.
63. Veja Lucas 12:13-21.
64. Lucas 12:34: "Porque, onde está o vosso tesouro, aí
estará também o vosso coração".
65. Citado do periódico Closer Walk 15, n.° 8, agosto de 2000,
p. 13.
66. Veja meu livro Shattered Dreams (Colorado Springs:
WaterBrook,
2001) para uma discussão completa deste ponto.

305
67. Citado em Richard S. Hipps, ed., When a Child Dies.
Macon, GA.: Smyth and Helwys, 1996, p. 38.
68. LEWIS, C.S. The Silver Chair. (Nova York: Macmillan,
1953, p. 17.
69. João 7:38.
70. Isaías 55:1, 2.
71. Isaías 55:3.
72. Só um livro em vários volumes faria justiça à História de
Deus. Ele já foi escrito. Nós o chamamos de Bíblia. Ofereço
apenas o mais breve dos esboços. Para um tratamento mais
completo, veja ROBERTSON, O. Palmer, The Christ of the
Covenants, Phillipsburg, NJ: Presbyterian and Reformed
Press, 1980.
73. Veja Gênesis 8:21; 9:8-17.
74. A palavra cortar é o termo bíblico para fazer uma aliança.
Ela implica que o derramamento de sangue estava
envolvido.
75. Veja Gênesis 15.
76. Todos, menos os pensamentos que imaginei na mente de
Owen,
são citações dele, Communion with God, pp. 2,3.
77. Embora rasgar as vestes fosse um meio reconhecido para
expres-
sar agonia sobre uma catástrofe, era proibido aos
sacerdotes do Antigo Testamento agirem desse modo. Só
os sacerdotes tinham acesso à presença de Deus e, na sua
306
presença, nunca há motivo para o desespero. Veja Êxodo
28:31, 32; Levítico 10:1-6; Mateus 26:62-65.
78. Veja Gênesis 17:18.
79. Veja Gálatas 4:21-31.
80. Veja Gálatas 5:22, 23.
81. Veja Tiago 4:7-10; João 14:21,23.
82. Veja Hebreus 12:5, 6.
83. Isaías 1:6. Veja também Isaías 53:6.
84. Mateus 7:14.
85. Citado em John Piper, The Hidden Smile of God.
Wheaton, IL: Crossway, 2001, p. 56.
86. Citado em Piper, The Hidden Smile of God, p. 56.
87. Citado em Piper, The Hidden Smile of God, pp. 42,3.
88. Lucas 13:24.
89. Lucas 18:9-14.
90. Dallas Morning News, 18 de agosto de 2001, sec. A, p. 1.
91. Mateus 6:34.
92. Citado em Peter Kreeft, Christianityfor Modern Pagans.
São Fran-
cisco: Ignatius Press, 1996, p. 95.
93. Citado em Benedict J. Groeschel, The Journey Toward
God. Ann Arbor, MI: Servant, 2000, p. 19.
94. Citado em Groeschel, The Journey Toward God, p. 13.
95. DUBAY, Thomas. Seeking Spiritual Direction. Ann Arbor,
MI: Servant, 1993, p. 19.
96. Tiago 5:13.
307

Você também pode gostar