Você está na página 1de 250

AMBIENTE:

Percepções 2021
Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental

Organizadores:
Annette Droste
Catiuscia Marcon
Haide Maria Hupffer
Jairo Lizandro Schmitt
Associação Pró-Ensino Superior em Novo Hamburgo - ASPEUR
Universidade Feevale

AMBIENTE:
Percepções 2021

Organizadores:
Annette Droste
Catiuscia Marcon
Haide Maria Hupffer
Jairo Lizandro Schmitt

Novo Hamburgo | Rio Grande do Sul | Brasil


2022
PRESIDENTE DA ASPEUR
Marcelo Clark Alves

REITOR DA UNIVERSIDADE FEEVALE


Cleber Cristiano Prodanov

PRÓ-REITORA DE ENSINO
Angelita Renck Gerhardt

PRÓ-REITOR DE PESQUISA,
PÓS-GRADUAÇÃO E EXTENSÃO
Fernando Rosado Spilki

EDITORA FEEVALE
Mauricio Barth (Coordenação)
Tiago de Souza Bergenthal (Revisão textual)
Tífani Müller Schons (Design editorial)

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)


Universidade Feevale, RS, Brasil
Bibliotecária responsável: Verônica Augusta da Silva – CRB 10/2549

Ambiente [recurso eletrônico] : percepções 2021 / Annette Droste


organizadores ... [et al.]. – Novo Hamburgo, RS:
Universidade Feevale, 2022.
Dados eletrônicos (1 arquivo : 9 megabytes).

Sistema requerido: Adobe Acrobat Reader.


Modo de acesso: <www.feevale.br/editora>
ISBN: 978-65-86341-14-0

1. Qualidade ambiental. 2. Ecologia. 3. Aspectos


socioambientais. I. Droste, Annette. II. Marcon, Catiuscia. III.
Hupffer, Haide Maria. IV. Schmitt, Jairo Lizandro. V. Título.

CDU 504.75

© Editora Feevale - TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - É proibida


a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio.
A violação dos direitos do autor (Lei n.º 9.610/98) é crime
estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.

Universidade Feevale
Câmpus I: Av. Dr. Maurício Cardoso, 510 - CEP 93510-235 - B. Hamburgo Velho - Novo Hamburgo/RS
Câmpus II: ERS 239, 2755 - CEP 93525-075 - B. Vila Nova - Novo Hamburgo/RS
Câmpus III: Av. Edgar Hoffmeister, 500 - CEP 93700-000 - Zona Industrial Norte - Campo Bom/RS
Homepage: www.feevale.br
ORGANIZADORES
Annette Droste
Catiuscia Marcon
Haide Maria Hupffer
Jairo Lizandro Schmitt

CONSELHO EDITORAL CONSULTIVO


Dra. Ana Luiza Ziulkoski
Dra. Andressa Müller
Dra. Daiane Bolzan Berlese
Dra. Daniela Müller de Quevedo
Dr. Gabriel Grabowski
Dra. Ivanete Teresinha Mallmann
Dr. João Alcione Sganderla Figueiredo
Dr. Luciano Basso da Silva
Dra. Mara B. Brizola Cassanego
Dr. Marcelo Pereira de Barros
Dr. Marco Alésio Figueiredo Pereira
Dra. Maria Salete Marchioretto
Dra. Vanusca Dalosto Jahno
COMO MELHOR
UTILIZAR ESTE E-BOOK
Não desperdice papel, imprima
somente se necessário.

Este e-book foi feito com a intenção de facilitar o acesso à


informação. Baixe o arquivo e visualize-o na tela do seu
computador sempre que necessitar. No entanto, caso seja
necessário, o arquivo pode ser impresso.

É possível também imprimir somente partes do texto, se-


lecionando as páginas desejadas nas opções de impressão.
SUMÁRIO

- 08 -
APRESENTAÇÃO
Annette Droste

- 11 -
ANÁLISE DA DISTRIBUIÇÃO DE Cattleya intermedia GRAHAM (OR-
CHIDACEAE) NO RIO GRANDE DO SUL
Delio Endres Júnior, Márcio Hisayuki Sasamori, Paula Rodrigues de Almeida,
Daniela Müller de Quevedo, Marco Alésio Figueiredo Pereira e Annette Droste

- 37 -
EFEITOS DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS NA BIODIVERSIDADE
DOS RECIFES DE CORAIS: REVISÃO DA LITERATURA
Ana Valéria de Oliveira, Bruna Haubert, Bruna Saraiva Hermann,
Daiene Dorfey e Haide Maria Hupffer

- 63 -
IMPACTS OF GLOBAL WARMING IN SEXUAL DETERMINATION
OF MARINE TURTLES: A SYSTEMATIC REVIEW
Aline Belem Machado, Marco Antonio Mabilia Martins, Meriane Demoliner,
Rafael Nunes dos Santos e Jairo Lizandro Schmitt

- 79 -
BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO MEARIM: CENÁRIO DE
IMPACTOS E VULNERABILIDADES AMBIENTAIS
Rosângela Maria Paixão Pinheiro, Daniela Montanari Migliavacca Osório
e Daniela Müller de Quevedo
- 110 -
A PANDEMIA POR COVID-19 E OS IMPACTOS NA GERAÇÃO
E DESCARTE DE RESÍDUOS SÓLIDOS DOMÉSTICOS
Camila Favretto, Jenifer Panizzon, Marcos Tenedini,
Luciano Gonçalves e Haide Maria Hupffer

- 133 -
PRESENÇA DE SARS-COV-2 EM ESGOTO BRUTO: ANÁLISE DA
POSSÍVEL RELAÇÃO COM O NÚMERO DE CASOS ATIVOS DE
COVID-19 EM CIDADES DO VALE DO SINOS/RS
Michel Vinicius Flach, Júlia Carolina Illi, Maíra de Andrade Peixoto,
Catiana Masiero Bresolin, Delio Endres Júnior e Jairo Lizandro Schmitt

- 159 -
GESTÃO MUNICIPAL DE DESASTRES HIDROLÓGICOS
OCORRIDOS NO RIO GRANDE DO SUL
Eloir Dutra Lourenço, Fabrício Wilbert, Paula Santos,
Sabrina Antunes Vieira e Günther Gehlen

- 186 -
ENGENHARIA DE RESILIÊNCIA EM DESASTRES NATURAIS
HIDROLÓGICOS: UM ESTUDO NO RIO GRANDE DO SUL
Karin Luise dos Santos, Malisia Balestrin Lazzari e Márcia Lourenço

- 211 -
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E SUAS CONSEQUÊNCIAS NA
PERCEPÇÃO DE ESTUDANTES DE LICENCIATURA
Crístian Yan Montana da Rocha, Márcia Isabel Käffer,
Vanessa Schweitzer dos Santos e Jairo Lizandro Schmitt

- 243 -
AUTORES
AMBIENTE: Percepções 2021

APRESENTAÇÃO
A presente obra reúne temas estudados por discentes e docentes da disciplina “Se-
minários Interdisciplinares em Ciências Ambientais” e por orientadores e membros de
equipes de pesquisas do Programa de Pós-graduação em Qualidade Ambiental da Uni-
versidade Feevale. A referida disciplina objetiva a articulação e a integração de conheci-
mentos, buscando a orientação de redação, análise e direcionamento de discussões para
o desenvolvimento de projetos de pesquisa interdisciplinares, visando à inovação, à atua-
lização do conhecimento, ao domínio metodológico e à execução dos projetos elaborados.
Visa-se, também, à formação de recursos humanos capacitados a elaborar e desenvolver
projetos de pesquisa interdisciplinares. A cada edição da disciplina, uma determinada te-
mática integradora norteia as abordagens em distintos projetos elaborados pelos grupos
participantes, formados pelos alunos e supervisionados pelos professores responsáveis
pela disciplina, trazendo os enfoques das diferentes áreas de conhecimento para o enten-
dimento dos processos.

Pelo expressivo caráter interdisciplinar da área de concentração “Qualidade Am-


biental” do Programa, e pela natureza multidisciplinar dos corpos docente e discente,
naturalmente os integrantes das linhas de pesquisa “Diagnóstico Ambiental Integrado”
e “Tecnologias e Intervenção Ambiental” têm trabalhado de forma conjunta e articulada,
direcionados ao aprofundamento das investigações das questões ambientais e dos atri-
butos bióticos e abióticos associados, interconectados com os problemas sociais. Assim,
também na disciplina “Seminários Interdisciplinares em Ciências Ambientais” ocorre a con-
junção dos elementos norteadores das duas linhas, que, de forma cooperativa, permitem
o avanço do conhecimento e a descoberta da sua aplicabilidade por meio dos múltiplos
olhares dos integrantes de cada edição da disciplina.

Questões ambientais prementes são abordadas na disciplina “Seminários Interdisci-


plinares em Ciências Ambientais”, reveladas nos estudos dos quais os presentes capítulos
são uma representação concisa e objetiva. Os nove capítulos que compõem a presente
obra “Ambiente: Perspectivas 2021” abordam variados temas relacionados aos impactos
causados direta ou indiretamente pelas atividades antrópicas. A leitura evidencia diversas
faces de abordagem acerca da amplitude das interrelações estabelecidas no ambiente,
assim como as consequentes problemáticas vividas na atualidade.

8
AMBIENTE: Percepções 2021

O primeiro capítulo, “Análise da distribuição de Cattleya intermedia Graham (Orchida-


ceae) no Rio Grande do Sul”, analisa a relação da distribuição de C. intermedia, uma espécie
de orquídea epifítica ameaçada no estado do Rio Grande do Sul, com fatores climáticos,
vegetacionais, de altitude e os territórios de bacias hidrográficas, permitindo a caracteri-
zação dos ambientes de ocorrência das populações naturais. São propostas e discutidas
estratégias de conservação para a espécie.

O segundo capítulo, “Efeitos das mudanças climáticas na biodiversidade dos recifes


de corais: revisão da literatura”, desenvolve uma análise reflexiva sobre a influência das
mudanças climáticas sobre a redução da biodiversidade dos corais, abordando aspectos
biológicos e socioeconômicos. O texto traz à luz a capacidade de adaptação, mas também
a limitação de espécies de corais a alterações climáticas, assim como aborda o efeito sobre
a rede ecológica com a redução da biodiversidade destes organismos.

No terceiro capítulo, “Impacts of global warming in sexual determination of marine


turtles: a systematic review”, é investigada a influência do aquecimento global sobre a
determinação sexual de tartarugas marinhas e, por consequência, sobre a continuidade
das populações desse grupo. O comportamento adaptativo das tartarugas às alterações
climáticas demonstra não ser suficiente para fazer frente às mudanças de temperatura
projetadas para o futuro.

O quarto capítulo, “Bacia hidrográfica do Rio Mearim: cenário de impactos e vulne-


rabilidades ambientais”, analisa características físico-ambientais da Bacia Hidrográfica do
Rio Mearim, no estado do Maranhão, com base em multiparâmetros. É apresentado um
modelo de cenário de impactos e vulnerabilidades ambientais para a referida bacia.

No quinto capítulo, “A pandemia por Covid-19 e os impactos na geração e descarte


de resíduos sólidos domésticos”, são abordados os impactos da COVID-19 na gestão dos
resíduos sólidos domésticos e é apontado para a fragilidade, na época do desenvolvimento
do estudo, das informações sobre a doença e sobre os cuidados a serem tomados, alertan-
do para a disseminação da contaminação pelo vírus.

O sexto capítulo, “Presença de SARS-CoV-2 em esgoto bruto: análise da possível


relação com o número de casos ativos de COVID-19 em cidades do Vale do Sinos/RS”,
apresenta os resultados da investigação sobre a possibilidade de relação entre o número

9
AMBIENTE: Percepções 2021

de casos ativos de COVID-19 e a presença do SARS-CoV-2 no esgoto bruto, apresentando


dados de casos ativos de Covid-19 em dois municípios da região metropolitana de Porto
Alegre, no Rio Grande do Sul. O texto sugere o monitoramento em redes de esgoto como
ferramenta complementar à vigilância clínica, à época do desenvolvimento do estudo.

O sétimo capítulo, “Gestão municipal de desastres hidrológicos ocorridos no Rio


Grande do Sul”, avalia a gestão de desastres naturais decorrentes de eventos críticos de
precipitação em municípios do Rio Grande do Sul. O texto alerta para a necessidade do in-
cremento da execução de medidas relacionadas ao planejamento e ao controle do uso da
terra concomitantes com projetos de engenharia.

No oitavo capítulo, “Engenharia de resiliência em desastres naturais hidrológicos:


um estudo no Rio Grande do Sul”, são avaliados os desastres naturais hidrológicos no Rio
Grande do Sul, com análise das áreas de risco e investigação relativa à abordagem dada à
engenharia de resiliência.

O nono capítulo, “Mudanças climáticas e suas consequências na percepção de estu-


dantes de licenciatura”, traz um estudo sobre a compreensão de estudantes de cursos de
licenciaturas relativa aos efeitos das alterações climáticas. O texto aponta a necessidade
do alinhamento de políticas voltadas às temáticas ambientais e climáticas nos diferentes
níveis de ensino.

Desejo uma agradável e proveitosa leitura.

Annette Droste

10
1
ANÁLISE DA DISTRIBUIÇÃO
DE Cattleya intermedia
GRAHAM (ORCHIDACEAE)
NO RIO GRANDE DO SUL

Delio Endres Júnior


Márcio Hisayuki Sasamori
Paula Rodrigues de Almeida
Daniela Müller de Quevedo
Marco Alésio Figueiredo Pereira
Annette Droste
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUÇÃO

Cattleya intermedia Graham é uma espécie de Orchidaceae nativa da América do Sul,


por vezes citada internacionalmente, ocorrendo, além do Brasil, no Uruguai e no Paraguai
(ORCHIDROOTS, 2021). De acordo com a Lista das Espécies da Flora do Brasil (FLORA DO
BRASIL, 2020), a espécie é considerada endêmica do Brasil, podendo ser encontrada natu-
ralmente nas regiões Sul e Sudeste deste país, principalmente em seu hábito epifítico, em-
bora possa ser também encontrada vegetando sobre rochas (BUZATTO et al., 2010; FLORA
DO BRASIL, 2020). Esta orquídea é amplamente cultivada devido ao seu valor ornamental,
já que apresenta alta variabilidade genética (NETO; VIEIRA, 2011), sendo internacional-
mente utilizada em cruzamentos interespecíficos e intergenéricos (ORCHIDROOTS, 2021).

Cattleya intermedia é uma planta que pode ser propagada por sementes em larga
escala sob condições de laboratório, crescendo rapidamente quando cultivada in vitro, o
que permite a obtenção de muitas plantas em um pequeno espaço e tempo de produção
(SASAMORI et al., 2015). Apesar de essas plantas serem produzidas para comercializa-
ção, as coletas irregulares ainda compõem uma das principais ameaças à manutenção das
populações naturais de C. intermedia, de forma que essas tiveram uma redução de 30%
nas últimas décadas e atualmente a espécie compõe o Livro Vermelho da Flora do Brasil
(MARTINELLI; MORAES, 2013) e a Lista das Espécies da Flora Ameaçada de Extinção do
Rio Grande do Sul (RS) (RIO GRANDE DO SUL, 2014).

Existem estudos que desenvolvem iniciativas de conservação ex situ de Cattleya in-


termedia, inclusive realizando a reintrodução de indivíduos na natureza, na tentativa de
desenvolver também a conservação in situ, atuando no sentido contrário à degradação e
à coleta predatória. Estes estudos relatam sobre a desinfestação das sementes, a germi-
nação, o crescimento in vitro, a aclimatização e a reintrodução das plantas desta espécie,
compondo um importante acervo teórico que pode e vem sendo utilizado para a conser-
vação destas plantas (ALVAREZ-PARDO et al., 2006; DORNELES; TREVELIN, 2011; SA-
SAMORI; ENDRES JÚNIOR; DROSTE, 2014; SASAMORI; ENDRES JÚNIOR; DROSTE, 2015;
ENDRES JÚNIOR et al., 2015; ENDRES JÚNIOR et al., 2018, 2019). Entretanto, para que as
plantas sejam reintroduzidas na natureza, é necessário que sejam selecionadas áreas de
preservação ambiental compatíveis ao estabelecimento da espécie.

12
AMBIENTE: Percepções 2021

Apesar de estudos apontarem pontos de ocorrência de C. intermedia (GONÇALVES;


WAECHTER, 2002, 2003; BRUSTULIN; SCHMITT, 2008; BECKER et al., 2015), não há pu-
blicações dedicadas à análise de sua distribuição frente às condições ambientais. Assim,
o objetivo do presente estudo foi analisar a relação da distribuição de C. intermedia no RS
com a umidade relativa e a temperatura do ar, a precipitação, a vegetação, a altitude e os
territórios de bacias hidrográficas, a fim de discutir e propor estratégias de conservação. O
estudo foi realizado a partir de dados secundários e de informações coletadas diretamente
na natureza, nos hábitats de C. intermedia, de forma que as informações foram interpola-
das com uso de ferramentas de georreferenciamento e Sistemas de Informação Geográfi-
ca (SIGs), permitindo a construção de uma discussão acerca dos resultados.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O território brasileiro abriga uma importante flora de Cattleya Lindl., um dos mais
importantes gêneros comercialmente e também dentre os mais conhecidos dentre as or-
quídeas. Das 104 espécies atualmente aceitas para este gênero no Brasil, 97 (93,3%) são
endêmicas (VAN DEN BERG, 2020). Cattleya intermedia apresenta uma série de ameaças,
intrínsecas da família e do gênero, bem como aquelas relacionadas a suas características
e sua história.

As plantas desta espécie apresentam crescimento simpodial, o que significa que


cada novo eixo de crescimento é interligado aos demais por um rizoma. Estes eixos de
crescimento surgem sequencialmente e cada um é composto por uma região caulinar (ri-
zoma) e seus apêndices: folhas, gemas florais e foliares, bem como um conjunto de raízes
adventícias (HOLTTUM, 1955; RASMUSSEN, 1986; BUZATTO et al., 2010). Entre o rizoma
e os apêndices, ocorrem os pseudobulbos cilíndricos e heteroblásticos, portando vários
entrenós (BUZATTO et al., 2010).

As inflorescências de C. intermedia ocorrem no ápice dos eixos de crescimento mais


jovens e em cada haste floral ocorrem normalmente de duas a cinco flores com pétalas
e sépalas róseas e membranosas (BUZATTO et al., 2010; Fig. 1A). Quando adultos, os in-
divíduos de C. intermedia formam touceiras, e uma única planta pode apresentar várias
inflorescências em antese ao mesmo tempo (Fig. 1B), conferindo um aspecto bastante or-

13
AMBIENTE: Percepções 2021

namental de beleza cênica aos hábitats entre os meses de agosto e outubro no RS (BRUS-
TULIN; SCHMITT, 2008). Assim como na maioria dos representantes de sua família botâni-
ca, as flores de C. intermedia apresentam três sépalas e três pétalas com simetria bilateral,
e, ao contrário de plantas melhoradas geneticamente ao longo de gerações, o fenótipo
das flores de indivíduos selvagens da espécie é caracterizado por apresentar peças florais
estreitas (observação do autor). Quando em floração, os indivíduos de C. intermedia selva-
gens no estado do RS são inconfundíveis, uma vez que as demais espécies deste gênero,
simpátricas, são bastante distintas, como pode ser observado detalhadamente no estudo
de Buzatto et al. (2010).

Os estados brasileiros com registro de C. intermedia são Rio Grande do Sul, Santa Ca-
tarina, Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro (FLORA DO BRASIL, 2020; SPECIESLINK, 2021). A
espécie ocorre na Mata Atlântica, que, por sua vez, é considerada hotspot de biodiversidade
e que atualmente se encontra bastante degradado, restando apenas 8,5% de remanescen-
tes bem preservados no país (SOS MATA ATLÂNTICA, 2021). Além disso, a distribuição da
espécie também se dá para o bioma Pampa stricto sensu, no RS, o qual é considerado o se-
gundo bioma mais impactado do Brasil (IBGE; MMA, 2004; RIO GRANDE DO SUL, 2021a).

A distribuição restrita em biomas com alto grau de degradação e em uma das áreas
mais desenvolvidas economicamente do país faz com que as populações naturais de C.
intermedia estejam ameaçadas de desaparecimento (MARTINELLI; MORAES, 2013; FLORA
DO BRASIL, 2020; SOS MATA ATLÂNTICA, 2021). A espécie compõe duas listas vermelhas
regionais, a Lista das Espécies da Flora Ameaçadas de Extinção do RS (RIO GRANDE DO
SUL, 2014) e de SP (SÃO PAULO, 2016), ambas na categoria Vulnerável – VU, assim como
o Livro Vermelho da Flora do Brasil (MARTINELLI; MORAES, 2013), indicando seu status
em nível nacional.

Segundo Neto e Vieira (2011), ao estudarem a diversidade e a composição genética


de C. intermedia nativas e também melhoradas geneticamente, grande parte das plantas
desta espécie cultivadas comercialmente são geneticamente relacionadas a plantas nati-
vas oriundas do RS e SC. As plantas oriundas do RS foram originalmente as mais cobiça-
das, devido à qualidade de suas flores, sendo que os exemplares de maior valor e que com-
punham coleções já na década de 1980 eram provenientes do Banhado do Taim, região
mais a sul do estado (GOMES, 2002). Relatos sobre as coletas demonstram que, no RS,

14
AMBIENTE: Percepções 2021

a espécie tem sido amplamente explorada desde a década de 1940, na busca por exem-
plares de cor e forma ainda mais atrativos (HÜBNER, 2013). Estas informações indicam
especial atenção em estudos e na implementação de ações para a conservação da espécie
na região Sul do Brasil. As espécies de orquídeas ameaçadas de extinção podem ser pro-
pagadas por meio da cultura de tecidos em condições de laboratório, a partir de material
biológico coletado tanto de espécimes adultos quanto de indivíduos jovens germinados in
vitro. Assim, podem se obter indivíduos saudáveis, fenotipicamente uniformes e citogene-
ticamente estáveis, características desejáveis às plantas propagadas in vitro (SEENI; LA-
THA, 2000). Entretanto, para fins de conservação, a cultura in vitro pelo desenvolvimento
direto através de sementes é mais interessante, pois cada semente germinada apresenta
composição genética única, permitindo que exista variabilidade genética entre as plantas
(GRATTAPAGLIA; MACHADO, 1998; BENSON, 1999; PEDROSO-DE-MORAES et al., 2009;
PINTO; FREITAS; PRAXEDES, 2010).

Esta variabilidade genética está relacionada à biodiversidade intraespecífica, fator


primordial para a manutenção da capacidade reprodutiva das plantas e do equilíbrio am-
biental para a continuidade de vida na Terra (FRANKEL; BROWN; BURDON, 1995; BRASIL,
1998). Assim, associada à reintrodução, a cultura in vitro de sementes compõe uma das
mais importantes ferramentas para a recuperação e a regeneração de espécies de orquí-
deas ameaçadas de extinção (RUBLUO et al., 1993; DECRUSE et al., 2003). As duas estra-
tégias são complementares e se fazem mais eficientes por atuarem quanto às condições
de conservação ex situ e in situ, sendo altamente recomendadas de acordo com o tratado
da Convenção de Diversidade Biológica (CDB), assinado durante a Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), realizada no Rio de Janeiro
em junho de 1992. Este tratado teve seu texto ratificado pelo Decreto Federal 2.519, de
16 de março de 1998, sancionado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (BRASIL,
1998).

Segundo o artigo 2 do texto originário da convenção, o termo “diversidade biológica”


significa:

A variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre


outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e
os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade
dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas.

15
AMBIENTE: Percepções 2021

Baseado nestas informações, o grupo de pesquisa do Laboratório de Biotecnologia


Vegetal da Universidade Feevale vem concentrando parte de seus esforços em uma incia-
tiva única na região, visando à propagação ex situ e ao desenvolvimento de estudos para
a reintrodução de C. intermedia, garantindo assim a sua conservação in situ. Após com-
preender os aspectos mais iniciais da vida desta planta, passando pela coleta de material
biológico, desinfestação, germinação e crescimento in vitro, aclimatização, reintrodução
e estabelecimento da C. intermedia na natureza (SASAMORI; ENDRES JÚNIOR; DROSTE,
2014; SASAMORI; ENDRES JÚNIOR; DROSTE, 2015; ENDRES JÚNIOR et al., 2015; ENDRES
JÚNIOR et al., 2018, 2019), o trabalho se expandiu. Isso significa que o projeto passou para
uma etapa de implementação das ações de conservação ao mesmo tempo em que per-
mitia a obtenção de informações técnicas sobre a reintrodução, ou seja, contemplando os
objetivos biológico e de projeto da reintrodução, os quais são propostos por Pavlik (1996)
e discutidos por Guerrant e Kaye (2007).

Descrições iniciais indicam que a ocorrência da espécie é restrita à região litorânea


do RS e às áreas próximas aos rios afluentes do lago Guaíba (Caí, Taquarí, Sinos, Jacuí e
Gravataí), seguindo ao sul nas margens da Laguna dos Patos até a Estação Ecológica do
Taim (VAN DEN BERG, 1996; ENGLERT, 2018). Estudos com maiores detalhamentos ci-
tam a distribuição de C. intermedia para a Depressão Central, Encosta do Sudeste, Encosta
Inferior do Nordeste e Litoral, com ocorrência em áreas rurais e urbanas, podendo suas
populações habitar parques e praças inseridos em áreas de matriz urbana (BRUSTULIN;
SCHMITT, 2008; BUZATTO et al., 2010; BECKER et al., 2015).

Os herbários são importantes para a taxonomia botânica e para áreas de conheci-


mento afins, podendo atuar na disponibilização de informações sobre a diversidade e a
riqueza da flora de determinada região (PEIXOTO; MORIM, 2003). A informatização das
coleções conservadas em herbários é de grande importância para que as perguntas acerca
de determinados grupos sejam respondidas de forma ágil, reduzindo custos e os riscos aos
exemplares, devido ao transporte e manuseio do material (PEIXOTO; MORIM, 2003).

O SpeciesLink, o Sistema global de Informação sobre Biodiversidade (GBIF) e o Reflo-


ra são projetos que integram informações sobre a biodiversidade, que estão catalogadas
em coleções biológicas de múltiplas instituições, nacionais e internacionais. Estas infor-
mações estão disponibilizadas on-line de forma aberta e utilizam ferramentas de georre-

16
AMBIENTE: Percepções 2021

ferenciamento e Sistemas de Informação Geográfica (SIGs) para apontar os locais de ocor-


rência e a localização das plantas catalogadas (GBIF; REFLORA, 2018; SPECIESLINK, 2021).
A integração destes dados com os aspectos bióticos e abióticos das regiões de ocorrência
de C. intermedia com uso dos SIGs pode permitir a composição de documentos cartográfi-
cos georreferenciados para a análise de fatores preditivos à ocorrência e à determinação
de áreas de conservação da espécie.

3 METODOLOGIA

3.1 ÁREA DE ESTUDO E COLETA DE MATERIAL BIOLÓGICO IN SITU


O estudo foi desenvolvido no estado do RS, selecionado como unidade amostral por
ser um dos principais estados com coletas de C. intermedia para fins ornamentais, onde a
espécie se encontra vulnerável (RIO GRANDE DO SUL, 2014). Além disso, o território do RS
está localizado na porção subtropical do Brasil, totalmente inserido numa região climática
onde o clima é úmido e com chuvas bem distribuídas ao longo do ano, categorizada como
Cfa e Cfb de acordo com a classificação de Köppen (ALVARES et al., 2013).

Foram realizadas saídas de campo nos anos de 2017 e 2018 para que plantas de
C. intermedia fossem encontradas e se fizessem registros de suas populações (Fig. 1ª-B).
Os locais visitados foram selecionados a partir de registros realizados previamente, com
uso de bibliografia específica, bem como em pontos já conhecidos pelos autores. Como
a espécie está relacionada principalmente com Ficus organensis Miq. (Fig. 1C) e Erythrina
crista-galli L., a busca pelas orquídeas ocorreu em áreas onde estas duas espécies arbó-
reas estavam presentes e nas matas em seu entorno, pelo método de caminhamento. Os
pontos foram classificados em rural, urbano e parque, de acordo com as características
diretas do entorno do ponto de ocorrência das orquídeas. Como algumas populações es-
tavam em árvores localizadas na área urbana, estas foram consideradas naturais quando
não haviam indícios de cultivo artificial – em número de >10 plantas, contendo indivíduos
jovens; ocorrendo nos mesmos forófitos e galhos com indivíduos de Tillandsia L., Rhipsalis
Gaertn. e/ou Microgramma C. Presl (Fig. 1D-E), plantas normalmente associadas à espécie
e não cultivadas para ornamentação.

17
AMBIENTE: Percepções 2021

Foi solicitada autorização de coleta do material biológico, mediante projeto apresen-


tado ao Instituto Chico Mendes de Biodiversidade – ICMBio – via sistema de atendimento
eletrônico – Sisbio. As coletas foram realizadas manualmente, com auxílio de podão e es-
cada retrátil, e os hábitats foram georreferenciados com uso de GPS. Ramos de C. interme-
dia foram coletados, contendo folhas, pseudobulbos, caule, raízes e, quando presentes,
flores e frutos. Foram preparadas exsicatas, as quais foram depositadas no Herbarium An-
chieta – PACA (Fig. 1F) e o número do tombo pode ser conferido via SpeciesLink (2021). Em
algumas áreas, não foram coletadas amostras para preparação de exsicatas, mas frutos
para cultivo de indivíduos no Laboratório de Biotecnologia Vegetal da Universidade Fee-
vale. Estas plantas servem como uma das estratégias de conservação ex situ da espécie e
poderão ser utilizadas em iniciativas de reintrodução in situ.

3.2 COLETA DE DADOS DE OCORRÊNCIA DA ESPÉCIE


Procurou-se nas plataformas on-line do SpeciesLink, do GBIF e Reflora por registros
de exemplares de C. intermedia que fossem originárias do RS. Uma revisão bibliográfica
também foi realizada, buscando registros da espécie em artigos científicos. Após, os dados
foram analisados de forma a remover aqueles registros que estivessem com as coorde-
nadas geográficas faltando ou apresentando alguma incongruência e também os registros
que estavam duplicados, tendo sido depositados em mais de um herbário (mesmo ano,
localidade e coletor), ou então quando o mesmo registro estivesse em duas plataformas.
Além disso, como a maioria dos dados obtidos das plataformas virtuais eram desprovidos
das coordenadas geográficas exatas dos locais de coleta das plantas, muitos pontos foram
marcados em regiões centrais dos municípios, ou então, quando presentes, foram utiliza-
das informações sobre a localidade, a fim de aumentar a precisão das análises. Os dados
de ocorrência foram também analisados temporalmente para verificar se existem padrões
quanto à presença das plantas na natureza e os estudos desenvolvidos com elas.

18
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 1 - Registros das plantas de Cattleya intermedia durante as incursões ao campo. Planta adulta flori-
da (A); touceira da espécie com muitas hastes florais, mostrando o hábito (B); figueira em meio a campo de
criação de gado em área rural, a seta indica o local de fixação das plantas, na copa externa da árvore (C); C.
intermedia em hábitat, crescendo junto a Tillandsia sp. e Microgramma vaccinifolia (D); figueira em pátio de
residência em área urbana, a seta indica o local de fixação das plantas, na copa interna (E); e exsicata para
tombo em herbário (F).

Fonte: Miguel da Silva Santos; Delio Endres Júnior.

19
AMBIENTE: Percepções 2021

3.3 COLETA DE DADOS AMBIENTAIS, CONSTRUÇÃO E ANÁLISE DOS MAPAS


Dados de umidade relativa do ar (%), temperatura (ºC) e precipitação (mm) foram ob-
tidos da Base de Dados para Pesquisa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (BD-
MEP-INPE), de 14 estações meteorológicas localizadas na região do estudo (Encruzilhada
do Sul, Lagoa Vermelha, Bom Jesus, Passo Fundo, Pelotas, Bagé, Cruz Alta, Santa Maria,
Caxias do Sul, Santa Vitória do Palmar, Bento Gonçalves, Porto Alegre, Rio Grande e Tor-
res). Para cada variável abiótica, foi calculada a média para o período de 20 anos. Para
umidade relativa do ar e temperatura, esta média foi baseada nas médias mensais. A mé-
dia de precipitação nos 20 anos foi calculada a partir dos valores de precipitação acumu-
lada mensais. Foram tabulados os dados de 20 anos, abrangendo o período entre outubro
de 1998 e 2018. Subsequentemente, os dados obtidos foram inseridos no formato CSV,
interpolados e espacializados através do programa QGIS 3.2 (QGIS.org, 2021). Mapas de
altitude, unidades vegetacionais e de bacias foram obtidos junto a estudos realizados pelo
Laboratório de Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) (WEBER;
FERREIRA, 2004; UFRGS-IB, 2009), à Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique
Luiz Roessler – FEPAM (FEPAM, 2018a,b) e ao Ministério do Meio Ambiente (MMA, 2018).
A partir da compilação destes dados, foram inseridos os pontos de ocorrência de C. inter-
media sobre os mapas com as caracterizações das variáveis, os quais foram analisados
a fim de entender os padrões de distribuição da espécie e suas relações com os fatores
ambientais vigentes. O programa utilizado foi o ArcGIS 10.3 (ESRI, 2015).

4 RESULTADOS

4.1 COLETA DE MATERIAL BIOLÓGICO IN SITU


Foram registrados 16 pontos de ocorrência de C. intermedia a partir das incursões
ao campo, das quais sete ocorreram no ano de 2017 e nove no ano de 2018. Destes, 11
resultaram em coleta de amostras e preparação de exsicatas para tombo, os quais estão
dispostos no Quadro 1. Na figura 1, é possível verificar detalhes sobre o hábito destas
plantas. A maior parte estava crescendo sobre árvores localizadas em área rural (43,8%),
próximas das rodovias de acesso ou estradas de chão batido, na vegetação que compõe a
mata ciliar de cursos hídricos ou próximas às áreas de banhado. Todas as plantas encon-

20
AMBIENTE: Percepções 2021

tradas em área urbana (37,5%) estavam crescendo sobre Ficus organensis ou sobre outras
espécies arbóreas de grande porte próximas a esta espécie, nos pátios de residências ou
em terrenos baldios. O restante das plantas (18,7%) estava em pontos localizados em par-
ques, considerados unidades de conservação, como o Parque Natural Municipal Banhado
da Imperatriz, a Área de Relevante Interesse Ecológico Henrique Luís Roessler, de âmbito
municipal, o Parque Nacional da Lagoa do Peixe e a Estação Ecológica do Taim, de âmbito
federal.

Quadro 1 - Pontos de ocorrência de Cattleya intermedia registrados pelos autores, com a localização geo-
gráfica e o número de tombo das exsicatas no Herbarium Anchieta – PACA.

Município Local Nº de tombo Ano


Taquara Rural 117996 2018
Novo Hamburgo Parque municipal 2018
Portão Rural 2017
Sto. Ant. da Patrulha I Rural 117992 2018
Sto. Ant. da Patrulha II Rural 2018
Sto. Ant. da Patrulha III Rural 2017
São Leopoldo Parque municipal 2017
Osório Urbano 2017
Capivari do Sul Urbano 117995 2018
Viamão Rural 117991 2018
Palmares do Sul Rural 117990 2018
Tapes Urbano 117987 2017
Arambaré Urbano 117988 2017
Mostardas Parque Nacional 117989 2018
São Lourenço do Sul Urbano 117986 2017
Pelotas Urbano 117993 2018
Rio Grande Parque Nacional 117994 2018
Fonte: Elaborado pelos autores.

4.2 OCORRÊNCIA DA ESPÉCIE


No total, foram verificados 67 registros de C. intermedia, dos quais 58 estão inseridos
nas plataformas estudadas, três em publicações que não tiveram coletas tombadas ou
informatizadas para cadastro nas plataformas e seis outros registrados pela presença das
plantas e coleta de material biológico para propagação in vitro. Os dados obtidos indicam a

21
AMBIENTE: Percepções 2021

ocorrência da espécie entre as latitudes 29°19’45,63”S e 32°32’21,03”S (de Torres a Rio


Grande, respectivamente) e entre as longitudes 49°48’41,12”O e 52°29’0,68”O (de Torres
a Capão do Leão, respectivamente). O primeiro registro de coleta para o RS data de 1928,
para o município de Pelotas, e os últimos registros datam de 2018, quando também houve
uma coleta para Pelotas. A década com maior número de coletas foi aquela compreendida
entre os anos de 2008 e 2018, sendo que, das 26 registradas, 16 foram coletas realizadas
por nossa equipe de pesquisa (Fig. 2).

Figura 2 - Registros de Cattleya intermedia ao longo das nove décadas decorrentes da primeira coleta veri-
ficada nas plataformas estudadas.

Fonte: Elaborado pelos autores.

4.3 ANÁLISE DOS DADOS AMBIENTAIS E ANÁLISE DOS MAPAS


No Quadro 2, estão as estações meteorológicas dispostas na área de estudo. Foram
apresentados os dados daquelas estações que tivessem pelo menos a latitude ou a longi-
tude dentro da área com registro da distribuição de C. intermedia. A precipitação acumulada
mensal variou de 80,8 a 169,3 mm (Pelotas e Passo Fundo, respectivamente) e os pontos
de ocorrência das plantas estão em sua maioria em locais com mais baixa precipitação,
como o próprio município de Pelotas (Fig. 3A). De acordo com a coloração dos mapas e a
inserção dos registros das plantas, as áreas de maior precipitação são aquelas nos municí-
pios de Estrela, Lajeado e Cruzeiro do Sul (aprox. 150,0 mm/mês). A umidade relativa do ar

22
AMBIENTE: Percepções 2021

média variou de 63,4% (Passo Fundo) a 83,6% (Torres). O ponto de ocorrência de C. interme-
dia com menor umidade relativa do ar média (Fig. 3B) se localizou na região de Porto Alegre
(70,5%). As áreas mais frias com pontos de ocorrência das plantas têm média de 15,5ºC, no
município de Pelotas, e as áreas mais quentes ficam em Torres, onde a média é de 19,6ºC.

Em relação à hidrografia, verifica-se que a distribuição C. intermedia se dá nas regiões


hidrográficas do Guaíba e do Litoral, em 11 das 25 bacias hidrográficas do RS. As bacias
com pontos de registro são, em ordem decrescente: Sinos (12 pontos), Litoral Médio (9),
Mirim-São Gonçalo (7), Taquari-Antas (5), Camaquã (4), Guaíba (3), Gravataí, Tramandaí,
Mampituba (2, respectivamente), Baixo Jacuí e Caí (1, respectivamente) (Fig. 4). Em relação
às unidades vegetacionais, o maior número de pontos de ocorrência esteve concentrado
nas Áreas de Formação Pioneira (27), seguida da Floresta Estacional Semidecidual (14),
da Floresta Estacional Decidual (3) e Estepe (1) (Fig. 4B). Não foram registrados pontos de
ocorrência na Floresta Ombrófila Mista, que é caracterizada por ocorrer em regiões mais
altas do estado do RS, assim como na Floresta Ombrófila Densa. Quanto à altitude, veri-
ficamos que os registros de ocorrência se deram principalmente nas áreas mais baixas do
estado, próximas às margens de rios e lagos e da Laguna dos Patos (Fig. 4C).

Quadro 2 - Estações meteorológicas da região de ocorrência de Cattleya intermedia e médias de 20 anos


dos dados de precipitação pluviométrica (média dos valores acumulados mensais em mm), umidade relati-
va do ar (%) e temperatura (ºC) (média dos valores médios mensais).

Município Estação Latitude Longitude Precipitação Umidade Temperatura


Lagoa Vermelha 83916 28°12’36” 51°30’0” 123 66,7 15,1
Passo Fundo 83914 28°12’36” 52°23’60” 169,3 63,4 15,5
Bom Jesus 83919 28°39’36” 50°25’48” 150,4 79,7 15,2
Bento Gonçalves (BG) 83941 29°8’60” 51°30’36” 143,8 76,3 17,4
Caxias do Sul (CS) 83942 29°8’60” 51°30’36” 151,9 77,6 17
Torres (TO) 83948 29°21’0” 49°43’48” 132,2 83,6 19,6
Santa Maria 83936 29°41’60” 53°42’0” 159,5 66,8 17
Porto Alegre (PA) 83967 30°3’0” 51°9’36” 100,4 70,5 17,7
Encruzilhada do Sul (ES) 83964 30°31’48” 52°30’36” 134,2 66,3 15,1
Bagé 83980 31°19’48” 54°6’0” 133,6 65,2 16,2
Pelotas (PE) 83985 31°46’48” 52°24’36” 80,8 72,4 15,5
Rio Grande (RG) 83995 32°1’48” 52°6’36” 110,5 80,3 18,5
Fonte: Elaborado pelos autores.

23
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 3 - Distribuição de Cattleya intermedia em relação aos fatores climáticos. Precipitação acumulada
mensal (mm – A), umidade relativa do ar média mensal (% - B) e temperatura média mensal (ºC – C).

Fonte: Elaborado pelos autores.

24
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 4 - Distribuição de Cattleya intermedia no RS em relação às bacias hidrográficas (A), unidades de


vegetação (B) e altitude (C).

Fonte: Elaborado pelos autores.

25
AMBIENTE: Percepções 2021

5 DISCUSSÃO

Os esforços de amostragem de C. intermedia tiveram início em 1928 no RS, com a co-


leta realizada por Josué Deslandes, no município de Pelotas (SPECIESLINK, 2021). Confor-
me observamos, um dos períodos no qual ocorreram mais registros foi aquele entre 1978
e 1988, com um decréscimo nas duas décadas posteriores. O maior número de registros
ocorreu entre os anos 2008 e 2018, quando nossa equipe de pesquisa realizou os levan-
tamentos e as coletas do presente estudo. A redução das coletas científicas não parece
ter relação com a diminuição das populações naturais da espécie, pois, apesar de esta ter
sofrido intensa pressão devido às coletas para fins lucrativos após a década de 1940 (CN-
CFLORA, 2012), nós ainda encontramos vários pontos de ocorrência nos mesmos locais já
conhecidos ou em novos locais.

Essas variações são decorrentes, principalmente, do direcionamento de esforços


amostrais. Apesar de dados de herbários constituírem importantes fontes para estudos
de populações vegetais relacionados a seu declínio (WILLIS et al., 2003), nem sempre os
resultados permitem o estabelecimento de projeções ou inferências acerca do impacto
sobre o tamanho populacional. A amostragem dos taxa pode variar ao longo do tempo, de
acordo com o direcionamento das pesquisas científicas ou mesmo pela implementação de
políticas públicas sobre a biodiversidade (PEIXOTO; MORIM, 2003). Os estudos que apon-
tam a ocorrência de C. intermedia, até o presente momento, são baseados principalmente
em pesquisas direcionadas a plantas epífitas no geral (WAECHTER, 1998; GONÇALVES;
WAECHTER, 2003; BRUSTULIN; SCHMITT, 2008; BARBOSA et al., 2015; BECKER et al.,
2015; GRAEFF et al., 2015; COSTA et al., 2020) e levantamentos de Orchidaceae (FREITAS;
JASPER, 2001), sendo apresentadas coletas esparsas e não direcionadas à espécie.

A coleta de dados informatizados de herbários e o georreferenciamento destas


amostras permitiu, juntamente com trabalho de campo e associação a informações bióti-
cas e abióticas, a análise de ocorrência e distribuição de C. intermedia no RS. Dentre as va-
riáveis ambientais analisadas, conseguimos compreender que a ocorrência da espécie está
relacionada principalmente com a umidade relativa do ar, com a altitude e a proximidade
de corpos hídricos. Apesar de a área de ocorrência da espécie não estar inserida em uma
parte do estado com altos índices pluviométricos, sabe-se que o RS abrange uma região
com clima do tipo Cfa e Cfb, que é caracterizado por não apresentar estação seca bem de-

26
AMBIENTE: Percepções 2021

finida, de acordo com a classificação climática de Köppen (ALVARES et al., 2013). Nesses
locais, a amplitude da precipitação acumulada mensal foi alta (80 a 150 mm), enquanto as
médias de umidade relativa do ar ficaram em um intervalo de aproximadamente 70 a 80%,
o que corrobora com Sanford (1968), que descreve que o comprimento do período seco e a
umidade atmosférica são mais importantes para a distribuição de orquídeas epifíticas do
que a precipitação absoluta.

Apesar de os indivíduos adultos de C. intermedia apresentarem importantes adap-


tações para garantir a rápida absorção e para evitar a perda de água (GONÇALVES; WAE-
CHTER, 2003), a limitação de distribuição em áreas mais úmidas pode estar relacionada
às etapas iniciais de desenvolvimento. As orquídeas dependem de interações com fungos
micorrízicos para sua germinação e crescimento até o desenvolvimento do metabolismo
autotrófico, sendo que a habilidade de dispersão e estabelecimento, combinadas aos fato-
res ambientais limitantes vão determinar o recrutamento de novas plantas (RASMUSSEN,
1995). Além disso, como plantas jovens de C. intermedia apresentam maior mortalidade
em períodos de maior temperatura e fotoperíodo, associado à baixa umidade relativa do ar
(ENDRES JÚNIOR et al., 2018), é possível que sua distribuição seja restrita a locais onde a
umidade se mantenha acima de um valor mínimo requerido pela espécie nas etapas mais
críticas do desenvolvimento ontogenético.

Os registros de C. intermedia foram a maioria em áreas de baixa altitude, conforme já


citado anteriormente por Buzatto et al. (2010), e com temperaturas médias iguais ou su-
periores a 15,5°C, onde a vegetação pertence às Áreas de Formações Pioneiras ou então
de domínio da Floresta Estacional Semidecidual. Nesta segunda, apesar de as médias de
temperatura se apresentarem mais amenas, os invernos são caracterizados pelo frio in-
tenso, com valores inferiores a 15°C (IBGE, 1992). Foram verificados registros de plantas
em uma grande amplitude média de temperatura (cerca de 4°C), desde que em locais com
elevada média da umidade relativa do ar. Na região mais à oeste da Laguna dos Patos, por
exemplo, onde a umidade do ar média é mais baixa, assim como a temperatura, não exis-
tem dados de ocorrência da espécie. Mesmo assim, sabemos que a C. intermedia sobrevive
a eventos de geada, comuns no outono e no inverno do RS, e a períodos de baixa umidade
relativa do ar, já registrados em estudos de conservação da espécie (ENDRES JÚNIOR et al.,
2015, 2018).

27
AMBIENTE: Percepções 2021

Cattleya intermedia ocorre na maioria das unidades vegetacionais presentes no RS,


com maiores valores para as Áreas de Formação Pioneira e de Floresta Estacional Semi-
decidual, que por sua vez estão localizadas nas regiões mais baixas do relevo da região.
O registro da espécie em local de maior altitude no RS foi no município de Caraá, área na
qual a elevação é de aproximadamente 400 m (BARBOSA et al., 2015) e que, de acordo com
os autores, tem características climáticas e vegetacionais típicas da Floresta Ombrófila
Densa. Entretanto, de acordo com a disposição de pontos em nosso mapa de unidades
vegetacionais, está inserido na Floresta Estacional Semidecidual. Freitas e Jasper (2001)
registraram a sua ocorrência em área de banhado no município de Lajeado, onde a vegeta-
ção pertence à região fitoecológica da Floresta Estacional Decidual, com características de
floresta ombrófila. A única unidade vegetacional da região na qual C. intermedia claramente
não teve registros foi a Floresta Ombrófila Mista, típica de áreas com altitude entre 500m
e 1.000m (IBGE, 1992).

Verificamos registros de C. intermedia e populações se desenvolvendo em vários pon-


tos ao longo das margens dos principais rios e lagos do RS, o que já é conhecido há muitos
anos por orquidófilos que cultivam a espécie (ENGLERT, 2018) e vai além do que relatam
alguns textos científicos até o momento, que relacionam a sua ocorrência às regiões fi-
siográficas (VAN DEN BERG, 1996; BUZATTO et al., 2010). A distribuição dessas plantas
se dá próxima aos corpos hídricos que compõem a região hidrográfica do Guaíba e do Li-
toral, cujas delimitações podem ser observadas nos mapas de hidrografia apresentados
pela Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura e pelo Atlas Socioeconômico do RS (RIO
GRANDE DO SUL, 2021b; SEMA, 2021), seguindo da bacia hidrográfica do Mampituba ao
norte, pela margem da Laguna dos Patos, até a bacia do Mirim-São Gonçalo ao sul (Fig.
4A). Assim, como as estratégias de conservação de C. intermedia in situ estariam bastante
ligadas às ações de preservação e manejo dos recursos hídricos e como sua distribuição
é relativamente ampla em relação às bacias hidrográficas do RS, diferentes estratégias
devem ser utilizadas de acordo com as características locais específicas.

O RS é um dos estados brasileiros com maior disponibilidade de águas superficiais,


as quais compõem uma densa malha hidrográfica superficial, e, como as unidades hidro-
gráficas podem ser utilizadas para a gestão de recursos hídricos e para a conservação da
biodiversidade (SEMA, 2021), recentemente o estado tem avançado muito em políticas

28
AMBIENTE: Percepções 2021

para esses fins. A Lei Estadual nº 10.350, de 30 de dezembro de 1994, instituiu o Sistema
Estadual de Recursos Hídricos (RIO GRANDE DO SUL, 1994), visando a regulamentar o Ar-
tigo 171 da Constituição do Estado do RS e definindo que o gerenciamento destas bacias
deveria ser garantido por comitês, denominados comitês de bacia (RIO GRANDE DO SUL,
1989). Dessa forma, de acordo com os dados encontrados no presente estudo e junta-
mente aos dados disponibilizados na literatura, o estado conta com 14 comitês de bacia
nas regiões hidrográficas do Guaíba e do Litoral, dos quais onze possuem em seu território
C. intermedia: Baixo Jacuí, Caí, Camaquã, Gravataí, Lago Guaíba, Sinos, Taquari-Antas e Gra-
vataí. Tais comitês poderiam atuar no desenvolvimento de estratégias de conservação da
espécie, juntamente às instituições de ensino superior e ao poder público.

A Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos (BHRS) foi aquela com mais pontos de ocorrên-
cia de C. intermedia. Estudos relacionados à composição e estrutura comunitária de epífitos
vasculares indicam que na BHRS a frequência da espécie em seus locais de ocorrência é
muito baixa (BARBOSA et al., 2015; BECKER et al., 2015; ROCHA-URIARTT, 2015) quan-
do comparada às frequências encontradas em estudos desenvolvidos na planície costei-
ra, onde a espécie não é considerada rara (WAECHTER, 1998; GONÇALVES; WAECHTER,
2002; GRAEFF et al., 2015). Nos trechos médio e inferior da bacia dos Sinos, estão localiza-
dos a maior parte das áreas úmidas e também os maiores centros urbanos (PLANO SINOS,
2009; COMITESINOS, 2021), de forma que, além das taxas de urbanização, há um aumen-
to da densidade populacional e da frota veicular, as quais causam impactos sobre a flora
epifítica (BECKER et al., 2017). Acredita-se, portanto, que o maior número de pontos de
ocorrência de C. intermedia na Bacia dos Sinos esteja relacionado à diversidade de hábitats
da espécie na área que compõe a bacia, já que a espécie é fortemente relacionada com as
áreas úmidas e com os maiores esforços amostrais nessa região.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conclui-se que os dados provindos de herbários e coleções biológicas foram bastan-


te eficientes para o entendimento da distribuição de C. intermedia e suas relações com os
fatores ambientais. Como muitas informações são esparsas, antigas e ainda incomple-
tas, principalmente quanto à localização geográfica do ponto de ocorrência específico das

29
AMBIENTE: Percepções 2021

plantas, novos estudos que realizem coletas sistemáticas devem ser desenvolvidos para a
determinação do status das populações desta espécie. A mesma importância atribuímos
às séries históricas de dados abióticos, que permitiram estudar e fazer inferências sobre
as necessidades ecoficiológicas de C. intermedia.

Como C. intermedia é associada a regiões de banhado ou áreas próximas a corpos hí-


dricos, muitas de suas populações podem ter a sua ocorrência discutida junto aos comitês
de bacia, garantindo o desenvolvimento de ações de conservação conjuntas. O Comitê de
Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos pode ser o primeiro a discutir a te-
mática, uma vez que é a bacia com maior número de pontos de ocorrência desta orquídea
e onde acredita-se que as populações estejam mais impactadas pela urbanização e pelas
atividades antrópicas.

Como a espécie vem sendo estudada quanto às estratégias de conservação ex situ,


por meio da cultura in vitro de plantas, conclui-se que, com os dados obtidos neste estudo,
podem-se selecionar novas áreas para coleta de sementes para a propagação e também
que possam receber as plantas no futuro, através da reintrodução, visando à conservação
in situ integrada às estratégias ex situ.

REFERÊNCIAS
ALVAREZ-PARDO, V. M.; FERREIRA, A. G.; NUNES, V. F. Seed disinfestation methods for in
vitro cultivation of epiphyte orchids from Southern Brazil. Horticultura Brasileira, v. 24, p.
217-220, 2006.

ALVARES, C. A.; STAPE, J. L. et al. Köppen’s climate classification map for Brazil. Meteorolo-
gische Zeitschrift, v. 22, p. 711–728, 2013.

BARBOSA, M. D. et al. Vascular epiphytes of the Atlantic Forest in the Sinos River basin, state
of Rio Grande do Sul, Brazil: richness, floristic composition and community structure. Brazil-
ian Journal of Biology, v. 75, n. 2, p. 25-35, 2015.

BECKER, D. F. P. et al. Riqueza e composição de epífitos vasculares em áreas urbanas da Ba-


cia Hidrográfica do Rio dos Sinos, RS, Brasil. Pesquisas, Botânica, v. 68, p. 227-238. 2015.

30
AMBIENTE: Percepções 2021

BECKER, D. F. P.; LINDEN, R.; SCHMITT, J. L. Richness, coverage and concentration of heavy
metals in vascular epiphytes along an urbanization gradiente. Science of the Total Environ-
ment, v. 584-585, p.48-54, 2017.

BRASIL. Decreto nº 2.519 de 16/03/1998. Promulga a Convenção sobre Diversidade Bioló-


gica, assinada no Rio de Janeiro, em 05 de junho de 1992. 1998. Disponível em: http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2519.htm. Acesso em: 06 set. 2021.

BRASIL. Lei Federal Nº 9.985 de 18/07/2000. Regulamenta o artigo 225 da Constituição


Federal e institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação e dá outras providên-
cias. 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9985.htm. Acesso
em: 14 dez. 2018.

BRUSTULIN, J.; SCHMITT, J. L. Composição florística, distribuição vertical e floração de orquí-


deas epifíticas em três parques municipais do estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Pesqui-
sas, Botânica, v. 59, p. 143-158, 2008.

BUZATTO, C. R. et al. O gênero Cattleya Lindl. (Orchidaceae: Laeliinae) no Rio Grande do Sul,
Brasil. Revista Brasileira de Biociências, v. 8, p. 388-398, 2010.

CNC FLORA – CENTRO NACIONAL DE CONSERVAÇÃO DA FLORA. Cattleya intermedia. Dispo-


nível em: http://cncflora.jbrj.gov.br/portal/ptbr/profile/Cattleya%20intermedia. Acesso em:
22 jan. 2020.

COMITESINOS – COMITÊ DE GERENCIAMENTO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO DOS SI-


NOS. Caracterização da Bacia Hidrográfica dos Sinos. Disponível em: http://www.comitesi-
nos.com.br/bacia-hidrografica-do-rio-dos-sinos. Acesso em: 06 set. 2021.

COSTA, G. M. et al. Genotoxicidade do ar atmosférico e epífitos vasculares em uma unidade


de conservação de uma região metropolitana no sul do Brasil. Revista Brasileira de Geogra-
fia Física, v. 13, n. 6, p. 2515-2530, 2020.

DECRUSE, S. W. et al. Micropropagation and ecorestoration of Vanda spathulata, an exquisite


orchid. Plant Cell, Tissue and Organ Culture, v. 72, p. 199-202, 2003.

DORNELES, L. T.; TREVELIN, V. Aclimatação e reintrodução de Cattleya intermedia Graham ex


Hook (Orchidaceae) obtidas por propagação in vitro. Iheringia, Série Botânica, v. 66, p. 167-
174, 2011.

31
AMBIENTE: Percepções 2021

ENDRES JÚNIOR, D. et al. Reintrodução de Cattleya intermedia Graham (Orchidaceae) em bor-


da e interior de um fragmento de Floresta Estacional Semidecidual no sul do Brasil. Revista
Brasileira de Biociências, v. 13, n. 1, p. 33-40, 2015.

ENDRES JÚNIOR, D. et al. Survival and development of reintroduced Cattleya intermedia plants
related to abiotic factors and herbivory at the edge and in the interior of a forest fragment in
South Brazil. Acta Botanica Brasilica, v. 32, n. 4, p. 555-566, 2018.

ENDRES JÚNIOR, D. et al. Host tree bark traits and development of reintroduced Cattleya in-
termedia (Orchidaceae) plants in Southern Brazil. Rodriguésia, v. 70, p. 1-10, 2019.

ENGLERT, S. Hibridação e melhoramento genético (II). Disponível em: http://www.delfina-


dearaujo.com/on/on33/pages/senglert.htm. Acesso em: 01 de out. 2018.

ESRI – ENVIRONMENTAL SYSTEMS RESEARCH INSTITUTE. ArcGIS. Sistema de Informação


Geográfica para área de trabalho de computador, versão 10.3. 2015.

FEPAM - FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PROTEÇÃO AMBIENTAL HENRIQUE LUIZ ROESSLER -


RS. Programas e projetos – Mata Atlântica. 2018a. Disponível em: http://www.fepam.rs.
gov.br/programas/kfw.asp. Acesso em: 09 dez. 2018.

FEPAM - FUNDAÇÃO ESTADUAL DE PROTEÇÃO AMBIENTAL HENRIQUE LUIZ ROESSLER


- RS. Unidade de Paisagem Natural x Bacias Hidrográficas. 2018b. Disponível em: http://
www.fepam.rs.gov.br/biblioteca/geo/bases_geo.asp. Acesso em: 10 out. 2018.

FRANKEL, O. H.; BROWN, A. H. D.; BURDON, J. J. The Conservation of Plant Biodiversity.


Cambridge: Cambridge University Press, 1995.

FREITAS, E. M.; JASPER, A. Avaliação da flora Orchidaceae em uma porção de Floresta Es-
tacional Decidual no município de Lajeado, Rio Grande do Sul. Pesquisas, Botânica, v. 11, p.
113-127, 2011.

FUNDAÇÃO SOS MATA ATLÂNTICA. Disponível em: https://www.sosma.org.br/conheca/ma-


ta-atlantica/. Acesso em: 06 set. 2021.

GBIF – GLOBAL BIODIVERSITY INFORMATION FACILITY. Disponível em: https://www.gbif.


org/occurrence/search. Acesso em: 02 nov. 2018.

GOMES, C. Cattleyas intermedias e orquidófilos – Viagem ao Sul. 2002. Disponível em: http://
www.orquidariocarlosgomes.com.br/Arquivos_site/Artigos/Cattleyas%20intermedias%20

32
AMBIENTE: Percepções 2021

%20e%20orquid%C3%B3filos%20-%20Viagem%20ao%20sul%20%E2%80%93%20(2002).pdf.
Acesso em: 01 out. 2018.

GONÇALVES, C. N.; WAECHTER, J. L. Epífitos vasculares sobre espécimes de Ficus organensis


isolados no norte da planície costeira do Rio Grande do Sul: padrões de abundância e distri-
buição. Acta Botanica Brasilica, v. 16, n. 4, p. 429-441, 2002.

GONÇALVES, C. N.; WAECHTER, J. L. Aspectos florísticos e ecológicos de epífitos vasculares


sobre figueiras isoladas no norte da planície costeira do Rio Grande do Sul. Acta Botanica
Brasilica, v. 17, p. 89-100, 2003.

GRAEFF, V. et al. Composição, estrutura comunitária, distribuição vertical e horizontal da si-


núsia epifítica em fragmento de restinga, no Rio Grande do Sul, Brasil. Pesquisas, Botânica,
v. 68, p. 239-255, 2015.

GRATTAPAGLIA, D.; MACHADO, M. A. Micropropagação. In: TORRES, A. C.; CALDAS, L. S.;


BUSO, J. A. Cultura de tecidos e transformação genética de plantas. Brasília: Embrapa-SPI/
Embrapa-CNPH, 1998. p. 183-260.

GUERRANT, E. O.; KAYE, T. N. Reintroduction of rare and endangered plants: Common fac-
tors, questions and approaches. Australian Journal of Botany, v. 55, p. 362–370, 2007.

HOLTTUM, R. E. Growth habits of monocotyledons: variation on a theme. Phytomorphology,


v. 5, p. 399-413, 1955.

HÜBNER, M. Orquídeas – Aventuras e causos de um orquidófilo. São Leopoldo: Impressos Por-


tão, 2013.

IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Manual Técnico da Vegeta-


ção Brasileira. Rio de Janeiro: IBGE, 1992.

MARTINELLI, G.; MORAES, M. A. Livro Vermelho da Flora do Brasil. Rio de Janeiro: Andrea
Jakobsson: Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, 2013.

MMA. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Geoprocessamento: Igeo, 2018. Disponível em:


http://mapas.mma.gov.br/i3geo/datadownload.htm. Acesso em: 20 nov. 2018.

NETO, N. B. M.; VIEIRA, L. G. E. Assessment of genetic diversity in Cattleya intermedia Lindl.


(Orchidaceae). Brazilian Archives of Biology and Technology, v. 54, n. 5, p. 939-946, 2011.

33
AMBIENTE: Percepções 2021

ORCHIDROOTS. Cattleya intermedia, Graham ex Hook. 1828. 2021. Disponível em: https://
www.orchidroots.com/detail/information/?pid=35963&role=. Acesso em: 23 ago. 2021.

PAVLIK, B. M. Defining and measuring success. In: FALK, D. A.; MILLAR, C. I.; OLWELL, M.
(eds.). Restoring diversity: strategies for the reintroduction of endangered plants. Washing-
ton, DC: Island Press, 1996. p. 127-155.

PEDROSO-DE-MORAES, C. et al. Desenvolvimento in vitro de Cattleya loddigesii Lindl. (Or-


chidaceae) utilizando os fertilizantes comerciais. Revista Brasileira de Biociências, v. 7, p.
67-69, 2009.

PEEL, M. C.; FINLAYSON, B. L.; MCMAHON, T. A. Updated world map of the Köppen-Geiger
climate classification. Hydrology and Earth System Sciences, v. 11, p. 1633-1644, 2007.

PEIXOTO, A. L.; MORIM, M. P. Coleções Botânicas: Documentação da Biodiversidade Brasilei-


ra. Ciência e Cultura, v. 3, p. 21-24, 2003.

PINTO, J. R. S.; FREITAS, R. M. O.; PRAXEDES, S. C. Stimulation of in vitro development of Cat-


tleya granulosa by sucrose. General and Applied Plant Physiology, v. 36, n. 3-4, p. 183-188,
2010.

PLANO SINOS. Plano de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio Dos Sinos - Meta 3:
Atividade 3.3 - Síntese da Situação Atual dos Recursos Hídricos. Disponível em: http://www.
prosinos.rs.gov.br/downloads/Meta%203%20-%20Ativ.%203.3%20-%20Situa%C3%A7%-
C3%A3o%20Rec.%20H%C3%ADdricos.pdf. Acesso em: 16 dez. 2018.

QGIS. QGIS Geographic Information System (version 3.2). 2021. Disponível em: http://www.
qgis.org. Acesso em: 17 out. 2021.

RASMUSSEN, H. Terrestrial orchids from seed to mycotrophic plant. Cambridge: Cambridge


University Press, 1995.

RASMUSSEN, H. The vegetative architecture of orchids. Lindleyana, v. 1, n. 1, p. 42-50, 1986.

REFLORA – Herbário Virtual. Disponível em: http://reflora.jbrj.gov.br/reflora/herbarioVir-


tual/ConsultaPublicoHVUC/ConsultaPublicoHVUC.do. Acesso em: 12 dez. 2018.

RIO GRANDE DO SUL. Constituição do Estado do Rio Grande do Sul. 1989. Disponível em:
http://www2.al.rs.gov.br/dal/LinkClick.aspx?fileticket=IiPguzuGBtw%3d&tabid=3683&-
mid=5358. Acesso em: 14 dez. 2018.

34
AMBIENTE: Percepções 2021

RIO GRANDE DO SUL. Lei nº 10.350, de 30 de dezembro de 1994 (publicada no DOE n.º 1, de
1º de janeiro de 1995). Institui o Sistema Estadual de Recursos Hídricos, regulamentando o
artigo 171 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul. Disponível em: http://www.al.rs.
gov.br/filerepository/repLegis/arquivos/10.350.pdf. Acesso em: 06 set. 2021.

RIO GRANDE DO SUL. Decreto n° 52.109, de 01 de dezembro de 2014. Declara as espécies


da flora nativa ameaçadas de extinção no Estado do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, Lex-
-Diário Oficial do Rio Grande do Sul, ano LXXII, nº 233, 2-11. 2014.

RIO GRANDE DO SUL. Atlas Socioeconômico – Meio Ambiente – Biomas. 2021a. Disponível
em: https://atlassocioeconomico.rs.gov.br/biomas. Acesso em: 01 set. 2021.

RIO GRANDE DO SUL. Atlas Socioeconômico - Bacias e sub-bacias hidrográficas. 2021b.


Disponível em: https://atlassocioeconomico.rs.gov.br/bacias-e-sub-bacias-hidrograficas.
Acesso em: 01 set. 2021.

RIO GRANDE DO SUL. Decreto Nº 53.885, de 16 de janeiro de 2018. Institui subdivisão


das Regiões Hidrográficas do Estado do Rio Grande do Sul em Bacias Hidrográficas. 2018.
Disponível em: http://www.sema.rs.gov.br/upload/arquivos/201803/08095109-decre-
to-53885-2017.pdf. Acesso em: 01 set. 2021.

ROCHA-URIARTT, L. D. Epifitismo vascular como indicador de qualidade ambiental: análise


da mata ciliar do Rio dos Sinos, no sul do Brasil. 2015. 115 f. Tese (Doutorado em Qualidade
Ambiental) – Programa de Pós-graduação em Qualidade Ambiental, Universidade Feevale,
Novo Hamburgo, 2015.

RUBLUO, A. et al. Strategies for the recovery of endangered orchids and cacti through in-vitro
culture. Biological Conservation, v. 63, p. 163-169, 1993.

SANFORD, W. The distribution of epiphytic orchids in Nigeria in relation to each other and to
geographic location and climate, type of vegetation and tree species. Biological Journal of
the Linnean Society, v. 1, n. 3, p. 247-285, 1968.

SÃO PAULO. Resolução SMA n° 57, de 05 de junho de 2016. Publica a segunda revisão da
lista oficial das espécies da flora ameaçadas de extinção no Estado de São Paulo. São Paulo,
DOE n° 126 (120) de 30-06-2016, SEÇÃO I, p. 55-57. 2016.

SASAMORI, M. H.; ENDRES JÚNIOR, D.; DROSTE, A. Sobrevivência e desenvolvimento de


plântulas de Cattleya intermedia Graham (Orchidaceae) micropropagadas e aclimatadas em
substrato com fibra de coco. Pesquisas, Botânica, v. 65, p. 293-303, 2014.

35
AMBIENTE: Percepções 2021

SASAMORI, M. H.; ENDRES JÚNIOR, D.; DROSTE, A. Asymbiotic culture of Cattleya intermedia
Graham (Orchidaceae): the influence of macronutrient salts and sucrose concentrations on
survival and development of plantlets. Acta Botanica Brasilica, v. 29, p. 292-298, 2015.

SEENI, S.; LATHA, P. G. In vitro multiplication and ecorehabilitation of the endangered Blue
Vanda. Plant Cell, Tissue and Organ Culture, v. 61, p. 1-8, 2000.

SEMA - SECRETARIA DO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO RIO GRANDE


DO SUL. Bacias Hidrográficas do Rio Grande do Sul. 2021. Disponível em: http://www.sema.
rs.gov.br/bacias-hidrograficas. Acesso em: 06 set. 2021.

SPECIESLINK. Plataforma de busca. 2021. Disponível em: http://www.splink.org.br/in-


dex?lang=pt. Acesso em: 06 set. 2021.

UFRGS-IB-Centro de Ecologia. Mapeamento da cobertura vegetal do Bioma Pampa: Ano-


-base 2009. Porto Alegre: UFRGS-IB-Centro de Ecologia. 2016.

VAN DEN BERG, C. Estudo dos padrões de variabilidade intra e interespecífica em espécies
brasileiras de Cattleya Lindley (Orchidaceae-Laeliinae). 1996. 154 f. Dissertação (Mestrado
em Ciências Biológicas) – Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas, Universidade
Estadual de Campinas, Campinas, 1996.

VAN DEN BERG, C. 2020. Cattleya in Flora do Brasil 2020. Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
Disponível em: http://reflora.jbrj.gov.br/reflora/floradobrasil/FB11329. Acesso em: 06 set.
2021.

WAECHTER, J. L. Epifitismo vascular em uma floresta de restinga do Brasil subtropical. Ciên-


cia e Natura, v. 20, p. 43-66, 1998.

WEBER, E.; HASENACK, H.; FERREIRA, C. J. S. Adaptação do modelo digital de elevação do


SRTM para o sistema de referência oficial brasileiro e recorte por unidade da federação.
Porto Alegre: UFRGS Centro de Ecologia. 2004. Disponível em: http://www.ecologia.ufrgs.br/
labgeo. Acesso em: 10 out. 2018.

WILLIS, F.; MOAT, J.; PATON, A. Defining a role for herbarium data in Red List assessments: a
case study of Plectranthus from eastern and southern tropical. Biodiversity and Conserva-
tion, v. 12, p. 1537-1552. 2003.

36
2
EFEITOS DAS MUDANÇAS
CLIMÁTICAS NA
BIODIVERSIDADE DOS
RECIFES DE CORAIS:
REVISÃO DA LITERATURA

Ana Valéria de Oliveira


Bruna Haubert
Bruna Saraiva Hermann
Daiene Dorfey
Haide Maria Hupffer
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUÇÃO

Recifes de corais constituem um dos ambientes aquáticos biologicamente mais di-


versos e produtivos da Terra, que fornecem bens e serviços à população, incluindo prote-
ção costeira e segurança alimentar (REAKA-KUDLA, 1997; DONNER; POTERE, 2007; KEN-
NEDY et al., 2013). São sistemas que dependem estruturalmente de corais construtores,
que depositam grandes quantidades de carbonato de cálcio, e de uma simbiose obrigatória
entre o hospedeiro coral e sua alga parceira. Tais condições biológicas, quando atingidas
por episódios de estresse, são quebradas, originando um fenômeno denominado de bran-
queamento (HUGHES et al., 2003; KENNEDY et al., 2013; LOGAN et al., 2014; PALUMBI et
al., 2014).

A mudança climática é o resultado da corporificação dos erros do processo de indus-


trialização contínua, consumismo e financeirização, sendo na atualidade a maior ameaça
ao planeta. O risco de mudança climática é muito mais que um problema de produção de
poluição, pois tem o potencial de aniquilar a existência de ecossistemas inteiros e à pró-
pria existência do ser humano (BECK, 2018). Como testemunho de perturbação ambiental,
ocasionado pela mudança climática, cita-se o branqueamento em massa de corais que
ameaça a sobrevivências de recifes de corais.

A degradação global dos recifes de corais está rapidamente se tornando um legado


do Antropoceno (SUGGETT; SMITH, 2020). O branqueamento pode ser induzido por agen-
tes esgotantes, como as mudanças climáticas que aumentam a temperatura da água e
causam a acidificação dos oceanos (WILLIAMS et al., 2008; DARLING et al., 2012). Estas
condições levam ainda a mudanças de longo prazo na estrutura da comunidade bentôni-
ca, mudanças na complexidade topográfica dos recifes e modificação do funcionamento
destes. De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), as
temperaturas médias globais excederam 2-3°C dos níveis pré-industriais, configurando
risco de extinção estimado de 20 e 30% das espécies mundiais, acarretando a perda de
biodiversidade (BARNOSKY et al., 2011).

A acidificação e o aquecimento dos oceanos estão desafiando organismos marinhos


e ecossistemas ao redor do mundo. Os oceanos mitigam o efeito estufa armazenando o
excesso de calor do aquecimento global e absorvendo e armazenando CO2 antropogênico.

38
AMBIENTE: Percepções 2021

Contudo, essa contribuição resulta negativamente no aumento da temperatura da água


do mar e na diminuição gradual do pH, conhecido como acidificação oceânica. Os efeitos
do aquecimento dos oceanos e da acidificação oceânica (OA) estão sendo estudados para
avaliar suas consequências sobre a fisiologia dos organismos e tendências futuras de po-
pulações (ENRIQUE-NAVARRO et al., 2021).

Além de alterar a distribuição biogeográfica dos organismos marinhos, o aumento


da temperatura dos oceanos e a acidificação contribui para a perda de espécies sensíveis
de comunidades de recifes de corais, além de provocar uma mudança para ecossistemas
marinhos simples, em vez dos complexos sistemas tropicalizados dominados por corais.
A simplificação dos habitats marinhos pelo aumento dos níveis de CO2 gera graves con-
sequências na prestação de serviços ambientais desses ecossistemas (AGOSTINI et al.,
2021).

Desde o início dos anos 80, os eventos de branqueamento em massa de corais au-
mentaram, em extensão e frequência, em resposta ao aquecimento constante das tempe-
raturas da água do oceano (WILD et al., 2011). Como reflexo, a frequência destes eventos
pode tornar-se maior e mais severa, expondo os recifes de corais a um ambiente cada vez
mais hostil, afetando de forma significativa o habitat, alterando a produtividade e distri-
buição de peixes e impactando em atividades como a pesca, por exemplo (REASER; PO-
MERANCE; THOMAS, 2000; BUDD et al., 2013). Tais alterações impactam de forma direta
comunidades que dependem economicamente das estruturas de recifes de corais, onde a
vulnerabilidade dos recifes de corais pode provocar, por conseguinte, a vulnerabilidade de
suas comunidades humanas (FOLKE, 2006).

Atualmente, sabe-se que existem mecanismos de resiliência de corais, decorrentes


das mudanças nas características biológicas que, por sua vez, são induzidas pelas mu-
danças climáticas (JIGUET et al., 2007; DAWSON et al., 2011). Uma forma de aumentar a
tolerância ao estresse térmico é mudar para um simbionte com maior resistência a tem-
peraturas elevadas (PETTAY et al., 2015). Contudo, o rearranjo destas espécies pode com-
prometer a integridade dos recifes de corais, uma vez que os atributos fisiológicos são
limitantes. Como exemplo, os corais maciços contribuem consideravelmente para o acú-
mulo de carbonato de cálcio, diferente de outros grupos funcionais que não possuem tal

39
AMBIENTE: Percepções 2021

capacidade e, desta forma, comprometem a integridade estrutural e o refúgio para outras


espécies (WILLIAMS et al., 2008; DARLING et al., 2012).

Nesse contexto, o presente estudo visa desenvolver uma análise reflexiva para com-
preender de que forma as mudanças climáticas (principalmente o aumento da temperatura
d’água e acidificação dos oceanos) afetam os corais de forma a reduzir sua biodiversidade.
Para facultar a referida reflexão do objetivo proposto, realizou-se uma revisão sistemática
da literatura na base de dados Scopus, submetendo à análise de conteúdo os artigos mais
citados. Os aspectos evidenciados dialogam entre si e versam, além dos aspectos biológi-
cos da biota, sobre aspectos socioeconômicos.

2 METODOLOGIA

Utilizando-se a base de dados Scopus foi realizada uma revisão sistemática baseada
em critérios pré-definidos. A escolha por esta base de dados ocorreu devido à sua abran-
gência internacional de periódicos e por dispor de funcionalidades que contribuem com
a análise dos artigos, como a identificação de publicações, autores, análise de citações,
dados geográficos, filiações a universidades e índice H (HIRSCH, 2005).

Desta forma, utilizaram-se os seguintes termos nos campos de busca: “Biodiversity”;


foi adicionado um segundo campo de busca contendo o termo “Climate Change”; seguido de
um terceiro campo de busca contendo o termo “Corals”. Os três termos foram descritos em
inglês, por se tratar de uma base de abrangência internacional, sendo, portanto, a língua
inglesa predominante. Os termos foram propostos entre aspas para abranger o contexto
semântico desejado e não envolver estudos que empregam as palavras separadamente,
com outra finalidade semântica. Assinalou-se a opção “Article title, Abstract, Keywords” ao
lado de cada termo, para que a pesquisa identifique os termos solicitados em títulos, re-
sumos ou palavras-chave de cada documento. Como filtro de refinamento, assinalou-se a
opção “Article” no campo “Document Type”, no intento de buscar apenas artigos científicos,
excluindo as demais formas de publicação.

Para estabelecer o ponto de corte, utilizou-se o princípio do índice H (HIRSCH, 2005).


Neste caso, optou-se por identificar o ponto em que o número da posição do artigo supera
o número de citações deste, na lista de resultados obtidos da busca na base. Foram defi-

40
AMBIENTE: Percepções 2021

nidos, também, os critérios de elegibilidade. Assim, para serem elegíveis para a presente
revisão sistemática, as pesquisas relatadas nas publicações precisavam ser experimentais
e enquadrarem-se no tema de biodiversidade e mudanças climáticas. Não houve restrição
linguística.

3 RESULTADOS E ANÁLISE

A partir da aplicação dos critérios definidos na metodologia, a busca foi realizada na


base de dados Scopus em 04 de março de 2020, retornando um total de 286 artigos que
foram ordenados por número decrescente de citações por obra. Conforme citado, adotou-
-se o princípio do índice H (HIRSCH, 2005), sendo assim, o ponto de corte foi estabelecido
no 56º artigo. Os 56 artigos selecionados foram analisados criticamente, a fim de análise
dos conteúdos e dos tópicos abordados. Utilizando-se dos critérios de elegibilidade, foram
aceitos para revisão 14 artigos (Quadro 1). Dos 42 artigos excluídos, 20 tratavam-se ape-
nas de revisões teóricas e os demais 22 abordavam temas não abrangentes à temática do
presente estudo (corais, mudanças climáticas e biodiversidade). O Quadro 1 apresenta os
14 artigos selecionados, sendo ordenados pelo número de citações recebidas, utilizando o
princípio do índice H.

41
AMBIENTE: Percepções 2021

Quadro 1 - Artigos selecionados para revisão sistemática

42
AMBIENTE: Percepções 2021

Fonte: elaborado pelos autores

43
AMBIENTE: Percepções 2021

Ao observar o Quadro 1, identifica-se que, dos 14 artigos selecionados para compor


a revisão sistemática proposta, as regiões geográficas mais evidenciadas como escopo da
coleta de dados foram: Quênia, com 4 estudos, representando 28% do total; 3 estudos das
ilhas Seychelles, 21%; Austrália e Caribe, com 2 artigos cada região, representando 14% dos
estudos, cada área respectivamente. Os artigos estudados foram publicados no período de
2004 a 2016. Em geral, o estressor amplamente citado é a mudança climática, mais espe-
cificamente, o aumento de temperatura. A análise qualitativa dos artigos evidenciados no
Quadro 1 foi dividida em 2 subtítulos, conforme temas mais evidentemente enfatizados.

3.1 EFEITOS DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS SOBRE OS CORAIS


Compreender e interpretar as mudanças na distribuição geográfica das espécies de
corais, que ocorrem em resposta ao aquecimento global, são evidenciados por Greenstein
e Pandolfi (2008) como dois dos principais desafios que os ecologistas enfrentam. O litoral
da Austrália Ocidental é considerado um laboratório natural, pois favorece a avaliação do
efeito das mudanças climáticas nas comunidades de recifes de corais em uma escala tem-
poral indisponível para estudos realizados exclusivamente em comunidades modernas.

Greenstein e Pandolfi (2008) enumeraram e avaliaram a composição das assem-


bleias de recifes do Pleistoceno tardio, expostos a cinco localidades distintas ao longo da
costa oeste da Austrália, e os resultados foram comparados com dados de ocorrência de
corais publicados para os recifes modernos no alto mar de cada localidade. Para os recifes
modernos, o gradiente inclui a zona de sobreposição entre as províncias Dampieriana e
Flindersiana. As comunidades modernas de recifes de coral mostram, ainda, um gradiente
pronunciado na composição de corais ao longo da faixa latitudinal abrangida pela pesquisa,
enquanto o gradiente na composição de comunidades não é tão forte para as comunida-
des do Pleistoceno. Os táxons adaptados dos trópicos contraíram suas faixas para o norte
desde o final do Pleistoceno, ocupando duas províncias biogeográficas em uma região em
que uma única província existia anteriormente.

Conforme evidenciado por Greenstein e Pandolfi (2008), os valores da diversidade


beta (mudança de espécies ao longo de um gradiente ambiental) para comunidades adja-
centes também demonstram essa mudança. Os recifes modernos demonstram um pico
distinto na diversidade beta no meio da região; o pico não é correspondido pelos recifes do

44
AMBIENTE: Percepções 2021

Pleistoceno. A diversidade beta está correlacionada com a distância apenas para compara-
ções entre os recifes modernos no Norte e nas assembleias fósseis, apoiando ainda mais
a mudança na distribuição das províncias biogeográficas na área de estudo.

Os resultados indicam que os táxons de coral presentes nas comunidades modernas


claramente aumentaram e contraíram suas faixas geográficas em resposta às mudanças
climáticas. Aqueles táxons que diferenciam os recifes do Pleistoceno dos recifes modernos
são previstos para migrar para o Sul em resposta às mudanças climáticas futuras e poten-
cialmente persistem em refúgios de temperatura, à medida que as comunidades de recifes
tropicais se distanciam mais ao norte (GREENSTEIN; PANDOLFI, 2008).

Gatti et al. (2015) também avaliaram os efeitos geográficos nas mudanças das as-
sembleias de corais em virtude das mudanças climáticas. Os autores analisaram os da-
dos históricos mais antigos existentes do Mar Mediterrâneo: assembleias coralligenous
do Recife Mesco (Mar de Ligúria, noroeste do Mediterrâneo), incluindo: revisões observa-
cionais com informações desde 1937; análises quantitativas desde 1961 e reconstrução
descritiva dos principais impactos climáticos e antropogênicos atuando na área. Os recifes
coralligenous são um habitat biogênico profundo, endêmico do Mediterrâneo, moldados
pelo equilíbrio dinâmico entre a bioconstrução (algas vermelhas incrustantes, com uma
contribuição acessória de poliquetas, briozoários e corais escleractinianos) e processos de
destruição (espécies de moluscos e abrasão física).

Gatti et al. (2015) relatam que o recife rochoso foi investigado em 2008 usando dados
Multibeam echosounder (sonar de mapeamento do fundo do mar) e pesquisas de mergulho.
Um modelo de elevação digital foi extraído dos dados multibeam. Em relação aos dados
quantitativos, buscou-se observar se a quantidade de cobertura das espécies reduziu, au-
mentou ou se manteve constante. Segundo os autores, as mudanças mais percebidas por
dados qualitativos foram relatadas entre 1985 e 1996, quando Savalia savaglia e Alcyonium
coraloides desapareceram e algas nativas (Eunicella singularis), corais escleractinianos colo-
niais e ectoproctos ficaram escassos. Após esse período, espécies como Eriphia verrucosa,
Leptogorgia sarmentosa, Parazoanthus axinellae e Leptopsammia pruvoti se tornaram mais
abundantes e algas não características da região apareceram. Todas as análises quanti-
tativas foram consistentes ao indicar que a maioria das mudanças ocorreu entre 1990 e

45
AMBIENTE: Percepções 2021

1996. Até 1990, assembleias coralligenous dos Recifes Mesco eram, no geral, dominados
por Alcyonacea (Paramuricea clavata) e Ectoproctos.

Gatti et al. (2015) citam que, desde 1996, as assembleias passaram a ser dominadas
por algas filamentosas e grandes Hydrozoa. O aspecto mais óbvio de mudança climática
é, sem dúvida, o aumento da temperatura da água. O aquecimento tem sido considerado
como a principal causa da mortalidade em massa de Alcyonacea e outros organismos ben-
tônicos na área.

Outra forma de avaliar os efeitos provocados pelas mudanças climáticas e, mais di-
retamente, pelo aquecimento das águas dos oceanos, é verificar a presença de simbiontes
termotolerantes. Neste sentido, foi investigada por Hume et al. (2016) a origem de Sym-
biodinium thermophilum, permitindo avaliar se a simbiose emergiu como rápido resultado
evolutivo das condições extremas do Golfo Pérsico/Arábico (PAG), ou se esta espécie teve
origem em outro lugar.

Hume et al. (2016) examinaram 23 locais em mais de 5 mil km da costa do noroeste


do PAG até o Golfo de Eilat/Aqana (Mar Vermelho), quanto à filogenia de S. thermophilum.
Uma ampla gama de genótipos previamente não identificados foram detectados, princi-
palmente no Golfo de Omã. Uma comparação de diversidade avaliando S. thermophilum
- psbA ncr evidenciou que a diversidade genética no PAG é reduzida em comparação com
locais fora deste curso d’água, sendo considerada um indicativo de acontecimentos re-
centes de gargalo ou efeito fundador. Entretanto, distâncias genéticas dentro dos grupos
de S. thermophilum representam divergências evolutivas que ocorreram há vários milhares
de anos, período consideravelmente maior que a idade do PAG, evidenciando que esse
simbionte é membro de um grupo antigo e habitante de zonas foras do PAG. Ainda assim,
acredita-se que fatores ambientais da região do PAG promoveram uma forte seleção po-
sitiva de simbiontes com predisposições evolutivas (mais adaptados).

Além da avaliação das mudanças nas composições geográficas e de simbiontes, pre-


dizer quais as vulnerabilidades das espécies de corais torna-se uma importante ferramen-
ta na avaliação dos efeitos das mudanças climáticas. Foden et al. (2013) desenvolveram
uma estrutura de identificação de espécies mais vulneráveis à extinção, utilizando como
fator estresses induzidos pelas mudanças climáticas. Para classificação das espécies fo-

46
AMBIENTE: Percepções 2021

ram realizadas consultas a mais de 30 especialistas com experiência conjunta que atinge
uma ampla gama de grupos taxonômicos, ecossistemas e regiões, aliando-se a uma ex-
tensa pesquisa bibliográfica. Identificaram-se mais de 90 características biológicas, ecoló-
gicas, fisiológicas e ambientais que podem exercer influência na sensibilidade às mudan-
ças climáticas. Tendo como base essas estruturas, foram avaliadas a vulnerabilidade às
mudanças climáticas de cada umas das aves do mundo (9.856 espécies), anfíbios (6.204
espécies) e corais que constroem recifes de água quente (797 espécies).

Observando especificamente os resultados evidenciados para os corais, Foden et al.


(2013) utilizaram avaliações baseadas na acidificação dos oceanos e branqueamento de
corais. Os dados compilados refletem as espécies que provavelmente correm o maior risco
de extinção, decorrente das mudanças climáticas, sem inferir em quantas espécies serão
de fato afetadas. Desta forma, os autores identificaram entre 121 e 253 espécies de corais
(de 15 a 32%) que são mais vulneráveis ​​às mudanças climáticas.

A maior concentração de corais altamente vulneráveis está no triângulo de Coral,


Sumatra e Java. Já a proporção de espécies com maior vulnerabilidade às mudanças cli-
máticas não demonstra padrões espaciais específicos, porém há uma leve concentração
de tais espécies no Caribe. Já, cerca de 30 a 55% das espécies de corais (109 a 150) não
possuem características de alta sensibilidade e baixa adaptabilidade, podendo ser consi-
deradas como como espécies que têm potenciais para adaptação e/ou demonstram per-
sistência para se adaptarem. Há também as concentrações de espécies que possuem alta
sensibilidade e baixa capacidade adaptativa, mas que, no entanto, não encontram ou não
estão expostas às mudanças climáticas, ou seja, espécies que possuem um risco laten-
te, concentradas no Oceano Índico, Mar vermelho, Austrália e Oceano Pacífico. Quando
comparadas as espécies altamente vulneráveis presentes na lista vermelha de espécies
ameaçadas da IUCN (International Union for Conservation of Nature), 47 a 73 espécies de
corais (6 a 9%) são consideradas altamente vulneráveis às
​​ mudanças climáticas e já estão
na lista (FODEN et al., 2013).

Como evidenciado por Serrano et al. (2014), a estimativa dos refúgios de recifes pro-
fundos propõe que esses recifes podem operar como fontes locais de recrutamento para
recifes rasos após distúrbios. Para ensaiar esta hipótese, nove locos microssatélites po-
limórficos de DNA foram desenvolvidos e usados para mensurar a conectividade vertical

47
AMBIENTE: Percepções 2021

em 583 colônias do coral generalista de profundidade Montastraea cavernosa do Caribe. As


amostras foram coletadas em três zonas de profundidade (≤10, 15-20 e ≥25 m) em locais
na Flórida (dentro de Upper Keys, Lower Keys e Dry Tortugas), Bermudas e Ilhas Virgens
Americanas.

De acordo com os autores, as taxas de migração foram medidas para determinar a


probabilidade de migração larval de coral do raso para o profundo e do profundo para o
raso. Por fim, a diferença e distribuição das algas simbiontes (Symbiodinium spp.) foram
medidas em um subconjunto de corais para testar se a zonação de simbionte de profun-
didade pode indicar conectividade vertical limitada. As análises revelaram, na maior parte
dos casos, diferenciação genética significativa por profundidade na Flórida, mas não em
Bermudas ou nas Ilhas Virgens Americanas, a despeito dos altos níveis de conectividade
horizontal entre essas localizações geográficas em profundidades rasas. Uma maior co-
nectividade vertical, na Flórida, foi observada em Dry Tortugas em comparação com Lower
Keys ou Upper Keys. Em todos os locais, entretanto, e independentemente da extensão
da conectividade vertical, a migração ocorreu assimetricamente, com maior probabilidade
de migração de habitats rasos para habitats intermediários/profundos (SERRANO et al.,
2014).

Serrano et al. (2014) concluem que a maioria das colônias alojava um único tipo de
Symbiodinium (C3), descartando a zonação de simbionte de profundidade do tipo de sim-
bionte dominante como fator estruturante. Juntos, esses estudos sugerem que o potencial
de recifes rasos de se recuperar de refúgios em águas profundas em M. cavernosa é espe-
cífico da localização, variando entre e dentro de localizações geográficas, provavelmente
como efeito da hidrologia local.

As taxas de mortalidade de corais em episódios de branqueamento são grandes,


contudo, no estudo de Graham et al. (2015), são documentadas as respostas em longo
prazo dos recifes a um grande evento de branqueamento de corais ocorrido pela variação
climática que causou a mortalidade de corais, em larga escala, em toda a região do Indo-
-Pacífico. Os autores relatam que, após a perda de mais de 90% da cobertura de corais
vivos, 12 dos 21 recifes se recuperaram para estado de corais vivos, enquanto 9 recifes
enfrentaram mudanças de regime para macroalgas carnudas.

48
AMBIENTE: Percepções 2021

O estudo realizado por Graham et al. (2015) baseou-se em um conjunto de dados


de 17 anos do interior das ilhas Seychelles. O referido recorte temporal abarca um grande
evento de branqueamento induzido pelo clima, o El Niño. O evento climático El Niño ocor-
reu em 1998 e afetou brutalmente os recifes de Seychelles, ocasionando o branqueamen-
to. Os resultados do estudo evidenciam que as reservas marinhas podem ter um papel im-
portante no auxílio à recuperação de corais em países onde os peixes herbívoros são mais
explorados ou onde artes de pesca, que reduzem a complexidade estrutural, são usadas.
Os autores indicam que fatores como a profundidade da água e a complexidade estrutural
do recife influenciam diretamente na trajetória do ecossistema do recife, permitindo, de
certa forma, uma previsibilidade na dinâmica de recuperação dos recifes de corais. O co-
nhecimento destes fatores pode contribuir com o manejo.

Com resultado da somatória de todas as questões abordas acima, deve-se conside-


rar a vulnerabilidade destes ecossistemas, tanto no efeito sobre a biodiversidade quanto o
impacto social (principalmente de comunidades que tem nos corais fonte de alimentação).
Corroborando esse pensamento, Cinner et al. (2013) investigaram 15 locais quanto aos in-
dicadores ecológicos de vulnerabilidade (impactos do branqueamento de corais associados
às mudanças climáticas), onde os recifes mais impactados apresentam maior cobertura de
coral (>50%), maiores assembleias de corais (25 gêneros), comunidade de peixes mais pro-
dutivas, maior diversidade de herbívoros e maior pastejo de herbívoros. Além disso, locais
com maior intensidade de atividade pesqueira possuíam vulnerabilidade ecológica margi-
nalmente mais alta que locais situados em reservas marinhas. Já a vulnerabilidade social,
relaciona-se com a composição ocupacional de cada comunidade, ou seja, fatores como o
grau de importância de atividade de pesca em relação a outras ocupações influenciam no
grau de vulnerabilidade.

3.2 EFEITO DAS MUDANÇAS DOS RECIFES SOBRE A BIODIVERSIDADE


É de extrema importância para os recifes que haja uma biodiversidade de peixes.
Sendo assim, Duffy et al. (2016) basearam-se em 4.556 pesquisas padronizadas de peixes
do banco de dados global da Reef Life Survey, para testar a importância da biodiversidade
na produção de peixes em relação a 25 fatores ambientais. Dentre os fatores mais forte-
mente associados à variação global na biomassa de peixes de recifes, os autores apontam:
temperatura, biodiversidade e influência humana que, juntas, representam 47% nesta va-

49
AMBIENTE: Percepções 2021

riação. Os resultados indicam que temperaturas mais altas influenciaram no aumento da


biomassa de peixes, aumentando o metabolismo e indiretamente a diversidade, enquanto
a variação de temperatura reduziu a biomassa; ratificando que a temperatura é um fator
controlador dominante na biomassa de peixes.

O homem se tornou um grande predador, por meio da pesca, reduzindo a biomassa


de peixes e consequentemente alterando a diversidade em ecossistemas marinhos. Há
sugestões de que a perda de biodiversidade está se aproximando de um ponto de inflexão
planetário, bem como ecossistemas podem ser irreparavelmente comprometidos. As co-
munidades de peixes que apresentam maior diversidade demonstram-se mais resistentes
aos impactos das mudanças climáticas. Duffy et al. (2016) evidenciam, ainda, que tanto a
riqueza de espécies, quanto a diversidade de características funcionais contribuíram igual-
mente para a biomassa dos peixes em todo o mundo, generalizando consequências locais
que mostram que as interações tróficas dos peixes e a diversidade funcional são modera-
dores da estrutura da comunidade e também da resiliência dos ecossistemas dos recifes
de coral.

Graham et al. (2006) evidenciam também os efeitos causados pelas mudanças cli-
máticas em recifes de corais, principalmente no que se refere à perda de corais vivos, ex-
tinções e perda de espécies funcionais de peixes nas ilhas Seychelles. A pesquisa realizada
baseou-se em 21 locais nas ilhas Seychelles em 1994 e em 2005, compreendendo mais
de 50.000m² de três habitats distintos de recifes de corais. Em uma análise do período
anterior ao evento El Niño, em 1994, identificou-se que os corais possuíam alta cobertura
de ramificações vivas e corais maciços, corais moles e alta complexidade estrutural. Em
contraponto, analisando os mesmos recifes, observou-se que a cobertura de corais caiu
para 7,5%, apresentando baixa complexidade, entulho, corais de galhos mortos e campos
de algas. Após o evento climático, notou-se o aumento considerável de macroalgas, apro-
ximadamente sete vezes mais que anteriormente ao evento.

A referida mudança que ocorreu no habitat, como resposta ao evento climático, im-
pactou diretamente na diversidade de peixes associados aos recifes. Dentre as espécies
mais afetadas pelo branqueamento, citam-se as famílias: Monacantídeos, Chaetodon-
tídeos e Pomacentrídeos. Conforme evidenciam Graham et al. (2006), possivelmente as
espécies Labrichthys unilineatus, Chaetodon lineolatus, Plectroglyphidodon johnstonianus e

50
AMBIENTE: Percepções 2021

Thalassoma hardwicke foram extintas. Seis espécies foram criticamente reduzidas: Oxy-
monacanthus longirostris, Chaetodon trifascialis, Chaetodon melannotus, Chaetodon meyeri,
Plectroglyphidodon dickii e Chromis ternatensis, por serem dependentes dos corais para seus
principais processos vitais.

O estudo realizado por Graham et al. (2006) evidencia que os peixes pequenos em
geral foram perdidos, enquanto peixes grandes foram parcialmente perdidos. Tal evidência
deve-se ao fato de os corais perderem espaços que são considerados refúgio às espécies,
aumentando a competitividade e consequentemente a predação entre peixes grandes
e pequenos. Adicionalmente, cabe ressaltar que as espécies coralívoras são diretamen-
te impactadas, pois na ausência de corais vivos, perdem sua fonte alimentar. Em relação
aos motivos que podem levar os recifes a se recuperarem mais lentamente, Graham et al.
(2006) citam variações estocásticas, isolamento físico, perda de complexidade do habitat
e incapacidade de grupos de peixes herbívoros em controlar as algas. Graham et al. (2006)
complementam citando que, embora a pesca tenha um histórico no passado como um
estressor aos corais, as evidências elucidadas por meio desta pesquisa demonstram que a
perda de corais é causada principalmente por anomalias climáticas.

De acordo com McClanahan et al. (2007), é de suma importância que se avalie a es-
trutura da comunidade dos corais, resposta ao branqueamento, suscetibilidade das comu-
nidades ao branqueamento, bem como o risco relativo de extinções nos recifes de corais.
Para tal, foi realizado um estudo de campo de branqueamento de corais e comunidades de
corais, abrangendo 8 países, em 2005. Estes dados foram combinados com estudos no Sul
do Quênia e Nordeste de Madagascar em 1998 e Ilhas Maurício em 2004, para desenvolver
uma análise sinóptica da estrutura da comunidade dos corais do Oceano Índico ocidental.

Conforme dados evidenciados por McClanahan et al. (2007), foram identificadas,


através das análises de grupo, 8 comunidades de corais distintas entre 91 áreas amos-
tradas, com 2 comunidades distintas no Norte da África do Sul e Centro de Moçambique,
uma terceira comunidade nos Atóis Centrais das Maldivas e 5 grupos menos diferencia-
dos, em uma faixa do Sul do Quênia a Maurício, incluindo Tanzânia, as ilhas graníticas de
Seychelles, Nordeste de Madagascar e Réunion. Os autores expõem que os gêneros de
corais como Porites maciços, Pavona e Pocillopora dominaram as áreas Central e Norte do
Oceano Índico e, dos registros históricos, o domínio foi substituído por Acropora e Monti-

51
AMBIENTE: Percepções 2021

pora. Do Sul do Quênia a Maurício, as comunidades de corais foram menos perturbadas,


com espécies como Acropora e Montipora dominando, e uma mistura de subdominantes
incluindo ramificação de Porites, Fungia, Galaxea, Porites maciços, Pocillopora e Synarea.
Foi identificado que há uma área mais ao Sul do Quênia a Tanzânia com maior diversidade
de recifes, contendo os menos perturbados e, também, sendo uma região prioritária para
gerenciamento. Táxons vulneráveis a uma futura extinção, baseado na resposta ao aque-
cimento da água, densidade populacional e comunidade incluem grandemente gêneros de
baixa diversidade com faixas ambientais estreitas, como as espécies Gyrosmilia interrupta,
Plesiastrea versipora, Plerogyra sinuosa, e Physogyra lichtensteini.

Ainda sobre os efeitos do branqueamento, McClanahan et al. (2004) avaliaram efei-


tos do evento de 1998 comparando a resposta ao branqueamento e mortalidade de 19
corais escleractinianos de duas regiões (sul do Quênia e leste da Austrália) para determinar
o grau de variação entre profundidades, locais e regiões. Na Austrália, dois locais foram
selecionados em cada grupo de ilhas: baía Nelly e baía Geoffrey na Ilha Magnetic e Baía
Little Pioneer e sudeste de Pelorus nas Ilhas Palm. Duas profundidades (rasas: 2-4 m,
profundas: 5-8 m) foram pesquisadas em cada local. Um total de 4.160 colônias de corais,
representando 45 gêneros e 15 famílias, foram registrados. Os locais de estudo no Quênia
estavam localizados em lagoas dos recifes com águas rasas (<3 m) nas marés baixas (o
Quênia tem um alcance de 4 m). A pesquisa incluiu 1.257 colônias de coral amostradas em
5 locais, dois no Parque Nacional Marinho (PNM) de Watamu e três no PNM de Mombaça.

Para todos os locais australianos estudados por McClanahan et al. (2004), o limiar
de estresse térmico ocorre a 29,7ºC e o limiar de branqueamento a 30,7ºC. Em Mombaça
os limiares são ligeiramente inferiores, respectivamente a 29,25 e 30,25ºC. Em todos os
locais da Austrália, as temperaturas do verão excedem o estresse térmico e os limites de
branqueamento por períodos variáveis. Os mínimos de temperatura são consistentemente
mais quentes em Mombaça ao longo do tempo e os máximos não são tão quentes quanto
os locais australianos. O táxon do coral explica 52% da variação na resposta das colônias ao
clareamento entre essas duas regiões. Stylophora e Pocillopora foram consistentemente
suscetíveis, enquanto Cyphastrea, Goniopora Galaxea e Pavona foram consistentemente
resistentes em ambas as regiões. Conforme dados evidenciados, dois táxons, Acropora e
Porites ramificados, foram notavelmente mais afetados no Quênia do que na Austrália.

52
AMBIENTE: Percepções 2021

Pavona foi notavelmente mais afetada na Austrália do que no Quênia. Os autores relatam
que, enquanto fatores múltiplos e não controlados dificultam a conclusão sobre a impor-
tância relativa de amostragem, o ambiente e fontes genéticas influenciam a resposta das
colônias aos estresses ambientais.

McClanahan et al. (2004) concluem que os dados obtidos sugerem que exista uma
relação consistente da resposta dos táxons ao aquecimento da água. Além disso, as pre-
visões sobre a resposta das assembleias de corais locais às mudanças de temperatura
e estresses precisam considerar a influência potencial do coral hospedeiro bem como a
composição taxonômica do Symbiodinium nos padrões de mortalidade e adaptação. Esses
padrões de suscetibilidade de táxons à água quente existem apesar da dominância conhe-
cida dos clados genéticos de Symbiodinium nesses dois locais. Essas observações sugerem
que os táxons ou a filogenia dos corais provavelmente são um melhor preditor dos padrões
de suscetibilidade das espécies ao aquecimento da água do que a identidade genética do
simbionte.

Graham et al. (2015) destacam que o branqueamento de corais, que ocorre em de-
corrência das mudanças climáticas, está entre as maiores ameaças atuais que acometem
os recifes de corais. O branqueamento provoca ampla perda de cobertura de corais vivos
e é largamente citado como efeito nocivo que ocorre em consequência do aquecimento
global. Graham et al. (2006) elucidam, também, a expulsão dos simbiontes fotossintéticos,
resultando na mortalidade de corais. Um fato histórico atribuído ao maior branqueamento
de corais é o El Niño, ocorrido em 1998, o qual afetou bruscamente os recifes das ilhas
Seychelles. Conforme dados evidenciados, os corais do oceano índico perderam de 75 a
99% de corais vivos (GRAHAM et al., 2006).

Segundo Baker et al. (2004), a resposta a longo prazo dos recifes de corais às mu-
danças climáticas depende da habilidade da simbiose dos corais construtores de recifes
em se adaptar ou aclimatar às temperaturas mais elevadas. Logo, os autores investigaram
se o branqueamento severo e a mortalidade podem selecionar combinações estáveis de
hospedeiro-simbionte termicamente tolerantes, aumentando a resistência dos recifes ao
branqueamento.

53
AMBIENTE: Percepções 2021

Para isso, Baker et al. (2004) realizaram uma pesquisa molecular das algas dino-
flageladas (gênero Symbiodinium) hospedeiras dos corais escleractinianos de águas rasas
(menos de 7m de profundidade) de cinco localidades do Indo-Pacífico que foram diferente-
mente afetadas pelo evento El Niño – Oscilação do Sul (ENOS), ocorrido em 1997 – 1998,
causando o branqueamento de corais. Os simbiontes Symbiodinium foram distinguidos em
clado A, C ou D. Os autores observaram que, no Panamá, colônias contendo Symbiodinium
do clado D já eram comuns (43%) em 1995 e não foram afetadas pelo branqueamento
ocorrido em 1997, diferente das colônias contendo clado C. Em 2001, colônias contendo
clado D tornaram-se dominantes (63%) nos recifes da região. Além disso, os autores rea-
lizaram estudos nos corais do Golfo Pérsico (Árabe) que são sujeitos a altas temperatu-
ras (>30ºC) e verificaram que inclusive esses recifes foram severamente branqueados em
1998, quando as temperaturas em alguns locais excederam 38ºC. Os corais foram compa-
rados aos do Mar Vermelho, cuja temperatura costuma ser mais baixa, em torno de 29ºC,
e que não foram afetados com o branqueamento em 1998.

No estudo de Baker et al. (2004), foi observado que, em 2000-2001, os recifes do


Golfo foram dominados pelo mesmo clado D de simbiontes encontrados nos recifes do
Panamá, enquanto os recifes do Mar Vermelho pouco continham desse simbionte. Os au-
tores observaram situação semelhante no Oceano Índico em 2000-2002, onde os recifes
do Quênia afetados pelo evento de branqueamento foram comparados com os recifes das
Ilhas Maurício, que não sofreram com o evento de branqueamento, e observaram que, no
Quênia, de 15 a 65% das colônias continham o clado D (dependendo do local), enquanto
apenas 3% estavam presentes nas colônias das Ilhas Maurício.

Logo, com os resultados, Baker et al. (2004) observaram que corais contendo o sim-
bionte termicamente tolerante Symbiodinium do clado D eram mais abundantes em recifes
após episódios de branqueamento severos e mortalidade. Ainda segundo os autores, é
possível que os recifes afetados possam reverter as comunidades simbióticas originais. Os
autores também verificaram que alguns corais (principalmente do gênero Porites) perma-
necem sendo comuns em recifes devastados, mesmo não contendo os simbiontes do cla-
do D. Ainda assim, propõem-se que as alterações dos simbiontes sejam uma característica
comum de eventos de branqueamentos e mortalidade e acredita-se que essas mudanças
adaptativas aumentarão a resistência desses recifes para recuperação em futuros epi-

54
AMBIENTE: Percepções 2021

sódios de branqueamentos. Porém, mesmo sem mudanças no Symbiodinium, pode haver


adaptações.

Para Silverstein, Correa e Baker (2012), alguns corais construtores de recifes respon-
dem às mudanças ambientais através da alteração da composição de suas comunidades
de algas simbiontes (gênero Symbiodinium). Essas mudanças foram propostas como um
mecanismo potencial pelo qual os corais podem sobreviver aos estressores climáticos,
como o aumento da temperatura. Os métodos moleculares convencionais sugerem que
essa capacidade adaptativa pode não ser generalizada, devido ao fato de poucas espécies
de corais (aproximadamente 25%) terem sido associadas a múltiplos clados de Symbio-
dinium. No entanto, esses métodos podem falhar na detecção de simbiontes quando esses
estiverem em baixa abundância (geralmente menos de 10 a 20% da comunidade total de
algas simbiontes). Para determinar quando clados de Symbiodinium estão presentes, mas
não foram detectados usando técnicas convencionais, Silverstein, Correa e Baker (2012)
aplicaram o ensaio de PCR em tempo real para pesquisar Symbiodinium (nos clados A–D)
em um total de 321 amostras de 39 espécies de corais escleractinianos filogeneticamente
e geograficamente diversos, representando 28 gêneros e 14 famílias.

A pesquisa de Silverstein, Correa e Baker (2012) abordou 26 espécies de corais que


se acredita que sejam restritas a hospedar um único clado de Symbiodinium (especialistas
em simbióticos), baseado em estudos anteriores utilizando metodologias convencionais,
e 13 espécies consideradas generalistas em simbióticos, ou seja, que hospedam múltiplos
clados de Symbiodinium. Conforme citam os referidos autores, as amostras foram cole-
tadas em vários locais do mundo no período entre 1995 e 2009. Das espécies de corais
examinadas no estudo, 38 de 39 foram associadas a um clado Symbiodinium que não havia
sido relatado anteriormente usando técnicas convencionais. Em todos os 39 táxons de
coral foram identificados Symbiodinium nos clados C e D, em pelo menos uma das colônias
analisadas (n=4-12 colônias por táxon hospedeiro). Dos 26 táxons de coral considerados
especialistas em simbiontes, 14 (54%) estavam associados a todos os quatro clados de
simbiontes (A+B+C+D) em uma ou mais amostras, enquanto 21 (81%) hospedaram pelo
menos três clados (A+C+D ou B+C+D) em uma ou mais amostras. Dos 13 táxons de coral
considerados generalistas simbióticos, oito (62%) hospedaram os quatro clados em uma

55
AMBIENTE: Percepções 2021

ou mais amostras e todos (100%) estavam associados a pelo menos três clados em uma
ou mais amostras.

Conforme resultados expostos, Silverstein, Correa e Baker (2012) citam que o clado
A foi detectado pela primeira vez em amostras das Bermudas (Madracis mirabilis, n=6), e
o clado D foi detectado pela primeira vez em Galápagos (Pavona gigantea, n=1; Pavona cla-
vus, n=4; Pocillopora damicornis, n=3). Em qualquer espécie de coral, a maioria das colônias
individuais (média de 68% de todas as colônias de uma dada espécie de coral) hospedava
mais de um clado de Symbiodinium. Em 23% (n=9 de 39) das espécies de coral examinadas,
todas as colônias analisadas hospedavam vários clados. Em média, para uma determinada
espécie de coral, 40% das colônias analisadas hospedavam dois clados, enquanto 24% hos-
pedavam três clados. As espécies de coral da região Indo-Pacífica estão mais associadas
aos simbiontes dos clados C e D do que as cinco espécies de coral do Caribe incluídas no
estudo, que estão mais associadas aos clados A e B.

Portanto, segundo Silverstein, Correa e Baker (2012), colônias que hospedam vários
clados de simbionte representam a maioria (média: 68%) das colônias individuais analisa-
das para uma dada espécie. Isso indica que a capacidade das colônias de coral de hospedar
vários clados é comum nas populações e não se limita a alguns indivíduos incomuns den-
tro de uma espécie de coral. A diversidade intraespecífica na simbiose entre coral e algas
pode fornecer um mecanismo pelo qual os corais dos recifes podem responder às rápidas
mudanças ambientais. Mudanças na composição das comunidades simbiontes dentro dos
corais podem permitir que os corais otimizem aspectos de sua fisiologia em resposta ao
estressor ambiental. Foi sugerido, no entanto, que essas mudanças simbiontes podem
ocorrer apenas em uma minoria de espécies de corais. Embora os corais dos recifes clara-
mente se associem preferencialmente a certos tipos de simbiontes dominantes, os resul-
tados do estudo mostram que muitas espécies de corais escleractinianas são capazes de
se associar a vários clados de Symbiodinium, incluindo membros dos clados C e D.

Embora a detecção de diversas comunidades simbiontes em corais não atenda dire-


tamente às mudanças na tolerância ao estresse ou nas mudanças de simbiontes ao longo
do tempo, de acordo com Silverstein, Correa e Baker (2012), esses dados mostram que as
espécies de corais não são biologicamente restritas a se associar exclusivamente a deter-
minados clados e/ou tipos de simbiontes.

56
AMBIENTE: Percepções 2021

A perda de biodiversidade também pode afetar outros fatores nas assembleias de


corais, como exposto por Alvarez-Filip et al. (2013), que apresentam um modelo de quatro
gêneros de corais do Caribe, que demonstram como as assembleias de corais combinantes
influenciam as taxas de calcificação da comunidade e a respectiva rugosidade. Além disto,
foram comparadas mudanças nos padrões de assembleia de corais (atribuídas ao aqueci-
mento e a acidificação dos oceanos) avaliando as variações de calcificação.

Com o estudo de Alvarez-Filip et al. (2013) foi possível verificar que mudanças nas
assembleias de corais resultam em perdas rápidas na calcificação e rugosidade, sendo
mais severamente afetadas com a perda do gênero Acropora e, em um menor grau, a Or-
bicella. A perda do gênero Acropora foi tão significativa que não houve recuperações nas
taxas de calcificação das comunidades e suas complexidades, resultando em recifes com
estruturas muito limitadas. Quando avaliados somente os efeitos do estresse térmico e
da acidificação dos oceanos no processo de calcificação e rugosidade, estes demonstram
resultados mais brandos, com mudanças comparativamente menores à mudança nos pa-
drões de dominância.

Sendo assim, segundo Alvarez-Filip et al. (2013), a mudança das principais espécies
de corais construtores compromete a complexidade estrutural do ecossistema e a esta-
bilidade a longo prazo da biodiversidade associada aos recifes. Apesar dos efeitos climá-
ticos não serem, em massa, os responsáveis pela perda de calcificação, as mudanças na
composição das espécies são, em partes, motivadas por estes estressores, influenciando
de forma sinérgica nas taxas de calcificação dos corais. É de conhecimento que simbiontes
mais termotolerantes resultam em taxas de calcificação mais reduzidas. Nesse cenário,
mudanças no clima e temperaturas mais elevadas (tornando necessária a simbiose com
termotolerantes) comprometerão ainda mais o potencial de calcificação das espécies.

O fluxograma representado na Figura 1 sintetiza de modo geral os apontamentos


evidenciados pelos autores dos artigos submetidos à análise.

57
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 1 - Fluxograma dos efeitos das mudanças climáticas na biodiversidade presente nos recifes de corais

Fonte: Elaborado pelos autores

A partir da interpretação deste estudo, entende-se que as mudanças climáticas, am-


plamente citadas como um estressor aos recifes de corais, são inteiramente associadas
como provedoras do aumento de temperatura das águas oceânicas, bem como a sua acidi-
ficação. Tal fato implica na perda de algumas espécies de corais, por vezes levando à sua ex-
tinção, bem como estimula a migração de determinadas espécies para regiões geográficas
com águas mais frias e/ou mais profundas, como forma de proteção à espécie do aumento
de temperatura.

O aumento de temperatura das águas oceânicas perturba as assembleias de corais, de


modo que se alteram os clados das comunidades simbiontes para o clado D, conhecido por
ser termo tolerante, ou alteram-se os gêneros dominantes nas comunidades de corais para
os gêneros Montipora e Acropora. Tais alterações nos recifes de corais levam a consequências
como a perda de calcificação, resultando em alterações estruturais e redução da complexi-
dade dessas estruturas.

Tais evidências supracitadas acarretam perda de biodiversidade de um modo geral,


afetando não somente os corais, mas todas as espécies que se relacionam direta e indireta-
mente com recifes de corais.

58
AMBIENTE: Percepções 2021

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os efeitos das mudanças climáticas afetam os corais de maneiras diversas. Foi de-
monstrado que, ao longo dos séculos e após severos eventos climáticos, os recifes de
corais mudaram suas posições geográficas, migraram para regiões menos afetadas pelos
estressores climáticos, adaptaram-se a simbiontes mais termo tolerantes e reconstituí-
ram seus domínios para espécies mais resistentes. Contudo, e apesar de tais alterações
proverem, de certa maneira, uma resiliência aos corais, com sobrevida até mesmo após
fortes eventos de branqueamento, há de se avaliar as consequências de tais mudanças.
Fica evidente que certos simbiontes, bem como determinadas espécies de corais, são de-
ficientes em garantir uma taxa de calcificação adequada, afetando a forma estrutural dos
recifes e, além disso, mudanças na composição dos ecossistemas como, por exemplo, a
presença de macroalgas, que afetam de forma significativa as assembleias de corais.

Tais alterações são prejudiciais, também, à biomassa de peixes que, além do estres-
sor humano, perdem seu habitat, ocorrendo a extinção de determinadas espécies. Além
dos peixes, comunidades que dependem especialmente dos recifes de corais, de forma a
garantir a segurança alimentar, ficam vulneráveis a perdas significativas da biomassa de
peixes e assembleias de corais. Sendo assim, pode-se concluir, com base nos dados aqui
compilados, que corais e os recifes de corais possuem capacidades limítrofes de suporta-
rem os estresses causados pelas mudanças climáticas e, portanto, perdas na biodiversi-
dade são inerentes a este processo.

O estado atual do conhecimento sugere que estudos adicionais de mais espécies de


corais e o grau de determinismo genético em espécies para branqueamento e mortalidade
em águas quentes serão críticos para ajudar a determinar os limites da adaptação ambien-
tal nos corais de recifes.

59
AMBIENTE: Percepções 2021

REFERÊNCIAS
AGOSTINI, S. et al. Simplification, not “tropicalization”, of temperate marine ecosystems un-
der ocean warming and acidification. Global Change Biology, v. 27, n. 19, p. 4771-4784,
2021.

ALVAREZ-FILIP, L. et al. Shifts in coral-assemblage composition do not ensure persistence of


reef functionality. Scientific reports, v. 3, n. 3486, p. 1-5, 2013.

BAKER, A. C. et al. Corals’ adaptive response to climate change. Nature, v. 430, p. 741, 2004.

BARNOSKY, A. D. et al. Has the Earth’s sixth mass extinction already arrived? Nature, v. 471,
n. 7336, p. 51-57, 2011.

BECK, U. A metamorfose do mundo: novos conceitos para uma nova realidade. Rio de Janei-
ro: Zahar, 2018.

BUDD, A. F. et al. Taxonomic classification of the reef coral family Mussidae (Cnidaria: Antho-
zoa: Scleractinia). Zoological Journal of the Linnean Society, v. 166, n. 3, p. 465-529, 2012.

CINNER, J. E. et al. Evaluating social and ecological vulnerability of coral reef fisheries to cli-
mate change. PloS one, v. 8, n. 9, p. e74321, 2013.

DARLING, E. S. et al. Evaluating life‐history strategies of reef corals from species traits. Ecol-
ogy Letters, v. 15, n. 12, p. 1378-1386, 2012.

DAWSON, T. P. et al. Beyond predictions: biodiversity conservation in a changing climate. Sci-


ence, v. 332, n. 6025, p. 53-58, 2011.

DONNER, S. D.; POTERE, D. The inequity of the global threat to coral reefs. Bioscience, v. 57,
n. 3, p. 214-215, 2007.

DUFFY, J. E. et al. Biodiversity enhances reef fish biomass and resistance to climate change.
Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 113, n. 22, p. 6230-6235, 2016.

ENRIQUE-NAVARRO, A. et al. Impact of ocean warming and ocean acidification on asexual


reproduction and statolith formation of the symbiotic jellyfish Cotylorhiza tuberculata. PLoS
ONE, v. 16, n. 8, p. 1-22, 2021.

60
AMBIENTE: Percepções 2021

FODEN, W. B. et al. Identifying the world’s most climate change vulnerable species: a sys-
tematic trait-based assessment of all birds, amphibians and corals. PLoS ONE, v. 8, n. 6, p.
e65427, 2013.

FOLKE, C. Resilience: The emergence of a perspective for social–ecological systems analy-


ses. Global Environmental Change, v. 16, n. 3, p. 253-267, 2006.

GATTI, G. et al. Ecological Change, Sliding Baselines and the Importance of Historical Data:
Lessons from Combing Observational and Quantitative Data on a Temperate Reef Over 70
Years. PLoS ONE, v. 10, n. 2, p. 1-20, 2015.

GRAHAM, N. A. et al. Predicting climate-driven regime shifts versus rebound potential in cor-
al reefs. Nature, v. 518, n. 7537, p. 94-97, 2015.

GRAHAM, N. A. et al. Dynamic fragility of oceanic coral reef ecosystems. Proceedings of the
National Academy of Sciences, v. 103, n. 22, p. 8425-8429, 2006.

GREENSTEIN, B. J.; PANDOLFI, J. M. Escaping the heat: range shifts of reef coral taxa in coast-
al Western Australia. Global Change Biology, v. 14, n. 3, p. 513-528, 2008.

HIRSCH, J. E. An index to quantify an individual’s scientific research output. Proceedings of


the National Academy of Sciences of the United States of America, v. 102, n. 46, p. 16569-
16572, 2005.

HUGHES, T. P. et al. Climate change, human impacts, and the resilience of coral reefs. Sci-
ence, v. 301, n. 5635, p. 929-933, 2003.

HUME, B. C. et al. Ancestral genetic diversity associated with the rapid spread of stress-tol-
erant coral symbionts in response to Holocene climate change. Proceedings of the National
Academy of Sciences, v. 113, n.16, p. 4416-4421, 2016.

JIGUET, F. et al. Climate envelope, life history traits and the resilience of birds facing global
change. Global Change Biology, v. 13, n. 8, p. 1672-1684, 2007.

KENNEDY, E. V. et al. Avoiding coral reef functional collapse requires local and global action.
Current Biology, v. 23, n. 10, p. 912-918, 2013.

LOGAN, C. A. et al. Incorporating adaptive responses into future projections of coral bleach-
ing. Global Change Biology, v. 20, n. 1, p. 125-139, 2014.

61
AMBIENTE: Percepções 2021

McCLANAHAN, T. R. et al. Comparing bleaching and mortality responses of hard corals be-
tween southern Kenya and the Great Barrier Reef, Australia. Marine Pollution Bulletin, v. 48,
p. 327-335, 2004.

McCLANAHAN, T. R. et al. Western Indian Ocean coral communities: bleaching responses and
susceptibility to extinction. Marine Ecology Progress Series, v. 337, p. 1-13, 2007.

PALUMBI, S. R. et al. Mechanisms of reef coral resistance to future climate change. Science,
v. 344, n. 6186, p. 895-898, 2014.

PETTAY, D. T. et al. Microbial invasion of the Caribbean by an Indo-Pacific coral zooxanthella.


Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 112, n. 24, p. 7513-7518, 2015.

REASER, J. K.; POMERANCE, R.; THOMAS, P. O. Coral bleaching and global climate change:
scientific findings and policy recommendations. Conservation biology, v. 14, n. 5, p. 1500-
1511, 2000.

REAKA-KUDLA, M. L. The global biodiversity of coral reefs: a comparison with rain forests.
Biodiversity II: Understanding and protecting our biological resources, v. 2, n. 551, 1997.

SERRANO, X. et al. Geographic differences in vertical connectivity in the Caribbean coral Mon-
tastraea cavernosa despite high levels of horizontal connectivity at shallow depths. Molecu-
lar ecology, v. 23, n. 17, p. 4226-4240, 2014.

SILVERSTEIN, R. N.; CORREA, A. M. S.; BAKER, A. C. Specificity is rarely absolute in coral–al-


gal symbiosis: implications for coral response to climate change. Proceedings of the Royal
Society B, v. 279, p. 2609–2618, 2012.

SUGGETT, D. J.; SMITH, D. J. Coral bleaching patterns are the outcome of complex biological
and environmental networking. Global Change Biology, v. 26, p. 68-79, 2020.

WILD, C. et al. Climate change impedes scleractinian corals as primary reef ecosystem engi-
neers. Marine and Freshwater research, v. 62, n. 2, p. 205-215, 2011.

WILLIAMS, S. E. et al. Towards an integrated framework for assessing the vulnerability of


species to climate change. PLoS Biology, v. 6, n. 12, p. e325, 2008.

62
3
IMPACTS OF GLOBAL
WARMING IN SEXUAL
DETERMINATION OF
MARINE TURTLES:
A SYSTEMATIC REVIEW

Aline Belem Machado


Marco Antonio Mabilia Martins
Meriane Demoliner
Rafael Nunes dos Santos
Jairo Lizandro Schmitt
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUCTION

Species with temperature-dependent sex determination have suffered negative ef-


fects due to climate changes. Sea turtles are an example of animals in which the sex of
young turtles is defined from the embryonic incubation temperatures. Temperatures in-
cubation above 29 °C enhance the production of female offspring, whereas, temperatures
under 29 °C increase the production of male offspring. Today, with the predictions of global
warming, it is possible to estimate that in the future the sea turtle’s population could be-
come 100% female or lead to extinction risk. Therefore, the aim of this study was to identify
the influence of global warming on the sexual determination of marine turtles through a
systematic review of the literature. For this review, Science Direct, Springer Link, and Wiley
Online library were used, and three groups of keywords were chosen. Of the total of 4548
references, 223 were selected, but only 18 articles presented adherence to the central
scope of the research. The Caretta caretta was the specie with the greatest number of stud-
ies (13), followed by Eretmochelys imbricata and Chelonia mydas (3), Lepidochelys olivacea (2),
Dermochelys coriacea (1) and no studies with Lepidochelys kempii and Natator depressus spe-
cies. In these studies, the rate of female offspring ranged from 1.46 to 100% and it is pos-
sible to observe an increase of female population over the years. Most of the studies used
the indirect methods to predict the sexual determination of turtles, only three research cap-
tured the turtles and evaluated their gonads (direct method). It is possible to observe that
the global warming has negative impacts on sea turtle population. The turtles have been
showing an evolutionary advantage under the climate changes, however, this adaptive be-
havior can be not enough with the temperature levels projected to the future. In conclusion,
it is necessary more studies for monitoring the turtle population and to elucidate better this
problematic so that actions can be made to mitigate the climate change effect.

2 THEORETICAL FUNDAMENTATION

Climate changes, like temperature, have been highly reported as having a profound
impact on the functioning of the ecosystem (HOEGH-GULDBERG; BRUNO, 2010). Specifi-
cally, in relation to fauna, species that presents temperature-dependent sex determina-
tion (TSD) are particularly susceptible to these changes.

64
AMBIENTE: Percepções 2021

Sexual determination in vertebrates may occur by genetic or environmental (environ-


mental sex determination – ESD) reasons. ESD is characterized by environmental factors
which influences the sexual determination of developing embryos or change of sex in in-
dividuals already physiologically developed (LOLAVAR; WYNEKEN, 2017). One manner of
environmental sex determination is the temperature-dependent sex determination (TSD)
(JULIANA et al., 2004). TSD occurs when the embryonic incubation temperatures affect the
sex of turtles’ hatchling during a critical window of development known as thermosensiti-
ve period (TSP), which occurs during the middle third embryo development (MROSOVSKY;
YNTEMA, 1980).

The reproductive biology system of some animals, in particular reptiles, is directly


linked to the environmental temperature (CLARKE et al., 2021). The discover by Charnier
(1966) regarding the TSD in vertebrates increased the scientific studies and verified that
many animals present TSD (DEEMING; FERGUSON, 2004; EWERT et al., 2004; HARLOW,
2004), among these animals are the marine turtles.

In sea turtles a variety of studies demonstrated that the pivotal temperature (PT),
temperature in which the probability of hatching male and female turtles are equivalent, in
general is around 29 °C (BRODERICK et al., 2001; GODFREY; MROSOVSKY, 2006; HAWKES
et al., 2009; POLOCZANSKA et al., 2009). Temperatures above 29 °C enhance the production
of female offspring, whereas temperatures under 29 °C enhance the production of male
offspring (TEZAK et al., 2017).

Furthermore, once climate change estimations are projecting a rising temperature


between 1° and 4°C by the end of the 21st century, most of the hatchlings could become
100% female (TOMILLO et al., 2015). This fact could lead to extinction risk of turtles once
there would have male scarcity and an increase in feminization levels which would result in
a decrease in reproduction and a loss in genetic variation (VALENZUELA et al., 2019).

Unfortunately, six of the seven marine turtle species are considered critically endan-
gered, endangered, or vulnerable, according to the Red List (IUCN, 2021), and the increase
in the temperature is very concerning for the conservation of marine turtles (LALOË et al.,
2016). Associated with this, some studies showed that the feminization process occurs in
different species, in some cases at high rates (PORTER et al., 2021; BENTLEY et al., 2020).

65
AMBIENTE: Percepções 2021

Two investigations carried out in Brazil and Africa found an average percentage of
feminization of 94% and 79.15% in loggerhead turtles (Caretta caretta), respectively (MAR-
COVALDI et al., 2016; PEREZ et al., 2016). In El Salvador, Liles et al. (2019) investigated the
feminization rate in hawksbill turtles (Eretmochelys imbricata) for four consecutive years.
These authors found average percentages between 68.6% and 84.9%. Similarly, high per-
centages of feminization were also observed in green turtles (Chelonia mydas) and olive
ridley turtles (Lepidochelys olivacea), with mean feminization rates of 84 and 71.8% respec-
tively (KING et al., 2013; DORNFIELD et al., 2015).

According to While and Wapstra (2019), the main phenotypic target in the experi-
ments was offspring sex, because it was the main categoric variable that has a good sig-
nificance with other variables. In many turtles, sex is determined by temperature during
critical periods in embryonic development. In Mauremys reevesii (THE REPTILE DATABASE,
2019), high temperatures produce females whereas low temperatures produce males. So,
at a narrow range of pivotal temperatures (26–30 ºC) sex switches from male to female.
As a result, offspring sex may be particularly susceptible to subtle movements across this
narrow temperature window. When these studies are examined, they suggest that subtle
shifts in movement within an egg, in response to the internal thermal gradient, can have
significant phenotypic consequences.

Furthermore, according to Arendt et al. (2021), Loggerhead turtles (Caretta caretta)


are long-lived and late-maturing reptiles, whose sex is determined by the proportion of
development at temperature equivalents during the middle third of incubation. The tran-
sition between strong male (long, cool incubation periods) versus female-biased clutches
spans just a few degrees, with pivotal temperatures that produce equal numbers of each
sex around 28–30℃ for most sea turtle species. Bentley et al. (2020) state that increasing
ambient temperatures associated with anthropogenic climate change are expected to lead
to increases in the phenotypes produced at higher temperatures and increased embryonic
mortality. Therefore, if populations are to persist in the face of rapid climate change, they
must adapt in ways that allow the production of male phenotypes and high emergence
success of hatchlings from natural nests.

Finally, according to Porter et al. (2021), their study indicated that beaches in Western
Australia, have heavy rainfall events that reduce nest temperature by 3 °C for as short as

66
AMBIENTE: Percepções 2021

three days can result in some male production. Previously, it was assumed that nest tem-
perature needed to remain within another specific temperature range in order for some
male production to occur. Prolonged rainy and cloudy weather have been associated with
increased male sea turtle hatchling production but short‐term drops in sand temperature
have only recently been considered a possible mechanism to increase male hatchling pro-
duction. These results are similar to those founded in laboratory by While and Wapstra
(2019), where capsazepine treated eggs (where thermoregulation was limited) exhibit-
ed greater male biased sex ratios compared to control eggs. This suggests that embryos
in control eggs moved towards warmer parts of the egg which, in turn, mediated sexual
development. However, the results from the semi natural nests, the effect of treatment
was highly dependent on the underlying incubation conditions. Subtle shifts in movement
within an egg, in response to the internal thermal gradient, can have significant phenotypic
consequences.

Therefore, given the problems above mentioned concerning the increase of tempera-
ture and the temperature-dependent sex determination of marine turtles, the aim of this
study was to identify the influence of global warming on the sexual determination of sea
turtles through a systematic review of the literature.

3 METHODOLOGY

The chapter performs a subjective interpretation of information contained in articles


and scientific journals, and for this reason is classified as a qualitative research. The te-
chnical procedure of the research was performed by systematic review of the literature,
searching to gather and synthetize the results found in previous research that analyzed the
theme pertinent to marine turtles and global warming. According to Sampaio and Mancini
(2007), the systematic review is a way of research that utilizes as database the literature
under certain topic, besides allowing to incorporate a bigger spectrum of relevant results,
instead of limiting the conclusions to the reading of few manuscripts. According to the au-
thors, the following steps must be observed: a) definition of the aim; b) search of evidence,
defining terms or keywords, search and databases strategies; c) review and selection of
the results; d) analyze the methodological quality of the studies.

67
AMBIENTE: Percepções 2021

With the aim established, we sought to identify the manuscripts about the subject,
therefore, researches were performed in Science Direct, Springer Link, and Wiley Online
databases from March 2021 to August 2021, with the following research strategies Turtle
global warming biodiversity, Turtle global warming sexual determination and Turtle global
warming pivotal temperature. It was defined that the group of keywords should be present
in the article title, abstract, and in keywords. The materials were limited to manuscripts
that presented an evaluation by double blind review, containing consistent information
content. The time cut begins in 1994, evolving until August 2021, and the non-related
articles were excluded from the search. Besides, the following marine turtle species were
considered in the research, non-marine turtles were not considered:

*Leatherback - Dermochelys coriacea

*Loggerhead - Caretta caretta

*Green Turtle - Chelonia mydas

*Flatback - Natator depressus

*Hawksbill - Eretmochelys imbricata

*Kemp’s Ridley - Lepidochelys kempii

*Olive Ridley - Lepidochelys olivacea

Finally, it is worth highlighting that the methodological analysis of the study is the
critical, in which presents an elaboration of critical judgment, positioning against the infor-
mation analyzed.

4 RESULTS AND ANALYSIS

The total of references resulting from this research was 4548 demonstrated in Figu-
re 1. After the reading of the respective titles, abstracts, and references of all articles, 223
were selected. These selections occurred by analyzing the content of the bibliography to
the central theme. After the selection, the 223 manuscripts were fully read, and only 18
articles presented adherence to the central scope of the research.

68
AMBIENTE: Percepções 2021

Figure 1 - Scheme of the number of articles found in each database analyzed

Source: Elaborated by the authors

From the 18 articles evaluated, it was evidenced that the marine turtle loggerhead
(Caretta caretta) was the most reported turtle, with 13 articles describing their sexual
determination worldwide. Table 1 describes the quantity of marine turtles studied in
the articles. The total number of evaluated turtles does not correspond to the number
of articles selected to this review, once some of them studied more than one species.

Table 1 - Number of published articles classified by species


Species Quantity of reported turtles
Loggerhead - Caretta caretta 13
Hawksbill - Eretmochelys imbricata 3
Leatherback - Dermochelys coriacea 1
Green Turtle - Chelonia mydas 3
Olive Ridley - Lepidochelys olivacea 2
Kemp’s Ridley - Lepidochelys kempii 0
Flatback – Natator depressus 0
Data referent to the total amount of turtle species evaluated in the selected articles
Source: Elaborated by the authors

69
AMBIENTE: Percepções 2021

Table 2 express the localization of marine turtles of the selected articles. It is worth
noting that the studied turtles were more located in the South, more specifically in Brazil,
and Central America.

Table 2 - Localization of marine turtles and female ratio

Turtle Localization % female Reference


Loggerhead – C. caretta Madeira Island (Portugal) 67 Delgado et al., 2010
Rio de Janeiro and Espírito
Loggerhead – C. caretta 53 Marcovaldi et al., 2016
Santo (Brazil)
Loggerhead – C. caretta Bahia and Sergipe (Brazil) 94 Marcovaldi et al., 2016
Loggerhead – C. caretta Australia 54 Fuentes; Porter, 2013
Loggerhead – C. caretta Praia do Forte (Brazil) 64.5 Fuentes et al., 2017
Loggerhead – C. caretta
Zakynthos (Greece) 52.3 Katselidis et al., 2012

Loggerhead – C. caretta
Western Australia 79 Bentley et al, 2020

Loggerhead – C. caretta
Western Australia 56.0 Porter et al., 2021

Loggerhead – C. caretta
Southeast USA 65.8 Arendt et al., 2021

Boa Vista Island (Republic of


Loggerhead – C. caretta 79.15 Perez et al., 2016
Cape Verde, Africa)
1991 - 1995: 53.1
1996 - 2000: 53.7
Bald Head Island (North Car-
Loggerhead – C. caretta 2001 - 2005: 56.9 Reneker; Kamel, 2016
olina - EUA)
2006 - 2010: 71.5
2011 - 2015: 71.9
2012 – 2014
Loggerhead – C. caretta Boa Vista, Cape Verde (Africa) Clarke et al., 2021
1.46 - 69.02
Estero Padre Ramos (Nica-
Hawksbill – E. imbricata 2011 - 2015: 64.2 - 78.3 Liles et al., 2019
ragua)
Hawksbill – E. imbricata Jiquilisco Bay (El Salvador) 2011 - 2015: 68.6 - 84.9 Liles et al., 2019
Red Sea (Egypt and Saudi 2018
Hawksbill – E. imbricata Tanabe et al., 2020
Arabia) 8 – 99%
2005 - 2006: 85
Leatherback – D. coriacea Playa Grande (Costa Rica) 2009 - 2010: 100 Tomillo et al., 2014
2010 - 2011: 41
Red Sea (Egypt and Saudi 2018
Green Turtle – C. mydas Tanabe et al., 2020
Arabia) 8 – 99%
Green Turtle – C. mydas Taiwan 84 King et al., 2013
Green Turtle – C. mydas Playa Grande (Costa Rica 82 While; Wapstra, 2019
Olive Ridley – L. olivacea South Atlantic Coast (Brazil) 56.4 Casteheloge et al., 2018
Olive Ridley – L. olivacea Playa Grande (Costa Rica) 71.8 Dornfield et al., 2015
Source: Elaborated by the authors

70
AMBIENTE: Percepções 2021

Regarding the methodologies used by the authors to evaluate the sexual determination
of marine turtles, only three articles used the direct method, which consists of capturing the
turtles and evaluating their gonads. Table 3 express the methods used in the manuscrip-
ts. While direct methods refer to observation that is made directly, indirect methods, as the
name suggests, use theories and calculations that make assumptions about the same object
of study.
Table 3 - Description of the methods used on the selected articles
Direct method
King et al., 2013 Register of the temperature and desiccation of turtles’ hatchling (histological evaluation of
gonads)
Direct method
Castheloge et al., 2018
Capture and biopsy of gonads
Direct method
Delgado et al., 2010
Capture and biopsy of gonads
Indirect method
Marcovaldi et al., 2016 Data that related the duration of incubation with sex ratio based in experiments with in-
cubator of constant temperature in previous studies
Indirect method
Liles et al., 2019 Data that related the duration of incubation with sex ratio based in experiments with in-
cubator of constant temperature in previous studies
Indirect method
Reneker; Kamel, 2016 Data that related the duration of incubation with sex ratio based in experiments with in-
cubator of constant temperature in previous studies (air temperature and precipitation)
Indirect method
Dornfield et al., 2015
Nesting temperature
Indirect method
Katselidis et al., 2012
Air, nest, and sand temperature
Indirect method
Fuentes; Porter, 2013 The microclimate submodel was used to estimate the soil temperature at nesting sites
“conservative”, “intermediate”, and “extreme”
Indirect method
Fuentes et al., 2017 Assessment of the study area, climatic processes at nesting sites, climatic scenarios, ge-
neration of indicators
Indirect method
Perez et al., 2016
Primary sex ratio
Indirect method
Tomillo et al., 2014
Measurement of nest temperature
Indirect method
Clarke et al., 2021
Nesting temperature
Indirect method
Tanabe et al., 2020
Evaluated sand temperature in two different depth nests
Indirect method
While; Wapstra, 2019
Sex ratio, measurement of nest temperature
Indirect method
Arendt et al., 2021
Nesting temperature, hastlings numbers
Indirect method
Bentley et al., 2020
Variation in thermal traits describing sex determination
Indirect method
Porter et al., 2021
short‐term and long-term temperature drops on sex‐determination
Source: Elaborated by the authors

71
AMBIENTE: Percepções 2021

King et al. (2013) evaluated the influence of the nest temperature on the thermo-
sensitive period (TSP) in the sex ratio of green turtles (Chelonia mydas). This study was
performed in three islands in Taiwan in 2010 and 2011. A total of 24 nests and 251 turtles’
hatchlings were examined. Only two of the 24 nests originated a bigger proportion of male
hatchlings, being both from the island in which the average temperature during the TSP
were under 29 °C. On the other nests, the average temperatures in the TSP were above 30
°C, and in all cases, there was a bigger percentage of female hatchlings.

Marcovaldi et al. (2016) estimated the sex ratio of loggerhead offspring nests (Caretta
caretta) in 21 beaches in Brazil for 25 years. It was verified a strong female bias (94%) in the
states of Sergipe (SE) and Bahia (BA), in which presented higher temperatures. A balanced
sex ratio (53% of female hatchlings) was estimated to the states of Espírito Santo (ES) and
Rio de Janeiro (RJ), in which presented lower temperatures. The findings of this study, in
general, evidenced a tendency to feminization of marine turtle populations in Brazil.

Some effects on sea turtles as increasing the number of females in the population
and producing lethal incubation conditions are consequences caused by an increased sand
temperature (SANTOS et al., 2017). Extremely high temperatures increase the frequency
of female production and that can result in a primary sex ratio of 100% female. However,
the emergence success can be minor, as observed in a population of leatherback turtles at
Playa Grande in the eastern Pacific, whereas the primary sex ratio was 85% female, in the
secondary the sex ratio was 79% of hatchlings (TOMILLO et al., 2014).

A study performed in the north of Africa evaluated different approaches to relieve the
climate change effects in sea turtles by altering nest environment. One nest was placed in
a shadow ambient; another nest was split into two and buried separately; and the control
group. When evaluated the sex ratio, control group had 69.02% of female hatchling, split
clutch with 45.38% and shadow clutch with 1.46%. By splitting the clutches, the reduction
incubation temperature (0.89 °C) was sufficient to alter sex ratios, which is evidenced
when comparing the female hatchling with the control group (reduction of > 20%). On the
other hand, the clutch shading reduced the temperature by 1.08 °C which resulted in a
decrease of 67.56% in female hatchling when compared to the control clutch (CLARKE et
al., 2021).

72
AMBIENTE: Percepções 2021

High temperature, besides increasing the ratio of female hatchlings produced, also
significantly affects the incubation period, which can have an average decrease of seven
incubation days (RENEKER; KAMEL, 2016). Based on this difficulty, a study performed in
Japan aimed to aid the hatchling efficiency by producing a shadowed environment, resul-
ting in an improvement in hatch and emergence success (KOBAYASHI et al., 2020). Also,
events of extreme rainfall can help in diminishing the temperature in the nests, therefore,
increasing the male hatchling. However, based on predictions of climate warming where
the temperatures may increase above the pivotal temperature, the rainfall could not be
sufficient to prevent female-biased hatchlings (LALOË et al., 2020). Another factor that
may contribute to female-biased sex ratios is the depth that the nests are buried. A study
performed in the Red Sea, in Egypt and Saudi Arabia, evaluated two different depths (30
and 50 cm) of nests of hawksbill and green turtle. The female hatchling ranged from 17.5
% to 97% at 30 cm depth and 8% to 99% at 50 cm depth. However, the study was conduc-
ted during the summer, which is characterized by high air temperatures, reaching 39 °C,
and low rainfall, about 2.5 mm. All these factors contribute to a female hatchling, once
the sand temperatures were 36 and 35.3 °C at 30 and 50 cm depth, respectively, and the
pivotal temperature is around 39 °C, resulting in a feminization (TANABE et al., 2020).

One study performed with green sea turtles at Akumal, Mexico, showed that the
temperatures at cloaca depth at the time of nesting are significantly correlated to hatching
success and female turtles selected lower temperatures than those along the crawl, the
variable may be an important cue for females (SANTOS et al., 2017). Another study sug-
gests that repeatability of nest sites may indicate that females are selecting sites to ma-
nipulate offspring sex ratios or may be a result of larger females producing larger clutches
and having the ability to travel further from the water’s edge (PINTUS et al., 2009)

The cloaca depth sand temperatures in the preferred medium temperature range
(27.6–28.3 °C) were associated with significantly higher hatching success to green turtles
(SANTOS et al., 2017). To leatherback turtle the optimal range of mean temperatures is
between 28.2 °C and 30.0 °C (TOMILLO et al., 2014).

Researchers estimate that sea turtle population appears to have medium to high
resistance under future expected climate change (PATRÍCIO et al., 2019). Temperature-de-
pendent sex determination population has been shown to be more resilient to increased

73
AMBIENTE: Percepções 2021

nest temperatures; such fact confers to sea turtle a better resilience to high temperatures.
This evolutionary advantage occurred because the sea turtles increase the production of
female offspring when high temperatures increase mortality of early stages (TOMILLO et
al., 2015). Today, female turtles can decide to lay their clutches at higher elevations to be
safer from flooding. In addition, they look for cooler conditions, as the forest region and,
also later season, because they may have enhanced fitness under climate change scenar-
ios. That suggests that nest site choice is an adaptive behavior that has been under se-
lection (PATRÍCIO et al., 2019). However, in the future, this mechanism can be not enough
with the temperature projected by current climate change models (TOMILLO et al., 2015).

To mitigate the climate change effect, the clutch relocation has been alternative to
the future, as a management tool to reduce egg loss. However, there is a reduction in hat-
ching success in 20% in comparison to in situ clutches. This reduction to hatchling success
can be caused by the physical handling of eggs during relocation, because probably this
action may cause shock to developing embryos (PINTUS et al., 2009). The researchers re-
commend that a large proportion of clutches remain under natural conditions whenever
possible, and the site change may only be done under extreme conditions, because the
nature clutches which provide important ionic conditions, sand characteristics for gas ex-
change, water balance, magnetic, and other signals important for setting migration cues
for returning adults, allowing adaptation to the changing climate (TOMILLO et al., 2014).

5 FINAL CONSIDERATIONS

Although there are many studies about marine turtles, there are few studies focusing
on the influence of global warming on the sexual determination of turtles. However, it is
possible to observe an increase of the female population over the years caused by high
temperatures that influence the nesting sand. In addition, global warming could lead to
extinction risk, not only because of the risk of a 100% female population, but also because
high temperatures increase mortality of early stages. The sea turtles have shown an evo-
lutionary advantage under the actual situation. However, this adaptive behavior can be not
enough with the climate changes levels projected to the future. Moreover, of the seven
species of turtles, only Caretta caretta has a reasonable number of studies on the subject

74
AMBIENTE: Percepções 2021

and the lack of studies on the species Lepidochelys kempi and Natator depressus is worrying.
Therefore, it is necessary more studies involving all species of sea turtles, focusing on the
influence of global warming on the sexual determination of turtles so that actions could be
developed to mitigate the climate change effect while there are no measures more effec-
tive to stop climate change.

REFERENCES
ARENDT, M. D. et al. Theoretical modeling and neritic monitoring of loggerhead Caretta caret-
ta [Linnaeus, 1758] sea turtle sex ratio in the southeast United States do not substantiate
fears of a male-limited population. Global Change Biology, v. 00, p. 1-11, 2021.

BENTLEY, B. P. et al. Variation in thermal traits describing sex determination and develop-
ment in Western Australian sea turtle populations. Functional Ecology, v. 34, p. 2302-2314,
2020.

BRODERICK, A. C.; GODLEY, B. J.; HAYS, G. Metabolic heating and the prediction of sex ratios
for green turtles (Chelonia mydas). Physiological and Biochemical Zoology, v. 74, n. 2, p. 161-
170, 2001.

CASTHELOGE V. D. et al. Pivotal temperature and hatchling sex ratio of Olive Ridley sea tur-
tles Lepidochelys olivacea from the South Atlantic coast of Brazil. Herpetological Conserva-
tion and Biology, v. 13, n. 2, p. 488-496, 2018.

CHARNIER, M. Action of temperature on the sex ratio in the Agama agama (Agamidae, Lacer-
tilia) embryo. Comptes Rendus des Seances de la Societe de Biologie et de ses Filiales, v.
160, n. 3, p. 620-622, 1966.

CLARKE, L. J. et al. Low-cost mitigate climate change during reproduction in an endangered


marine ectotherm. Journal of Applied Ecology, v. 58, p. 1466-1476, 2021.

DEEMING, D. C.; FERGUSON, M. W. F. Physiological effects of incubation temperature on em-


bryonic development in reptiles and birds. In: DEEMING, D. C.; FERGUSON, M. W. F. Egg in-
cubation: its effects on embryonic development in birds and reptiles. Cambridge: Cambridge
University Press, 1991. p. 147-171.

DELGADO, C.; CANÁRIO, A. V. M.; DELLINGER, T. Sex ratios of loggerhead sea turtles Caretta
caretta during the juvenile pelagic stage. Marine Biology, v. 157, n. 5, p. 979-990, 2010.

75
AMBIENTE: Percepções 2021

DORNFELD, T. C. et al. Ecology of solitary nesting Olive Ridley sea turtles at Playa Grande,
Costa Rica. Marine Biology, v. 162, n. 1, p. 123-139, 2015.

EWERT, M. A.; ETCHBERGER, C. R.; NELSON, C. E. Turtle sex-determining modes and TSD
patterns, and some TSD pattern correlates in temperature-dependent sex determination in
vertebrates. In: VALENZUELA, N.; LANCE, V. A. Temperature-dependent sex determination
in vertebrates. Washington: Smithsonian Institution Scholarly Press, 2004. p. 21-32.

FUENTES, M. M. P. B. et al. Sex ratio estimates for species with temperature-dependent sex
determination differ according to the proxy used. Ecological Modelling, v. 365, p. 55-67,
2017.

FUENTES, M. M. P. B.; PORTER, W. P. Using a microclimate model to evaluate impacts of cli-


mate change on sea turtles. Ecological Modelling, v. 251, p. 150-157, 2013.

GODFREY, M. H.; MROSOVSKY, N. Pivotal temperature for Green Sea Turtles, Chelonia mydas,
nesting in Suriname. The Herpetological Journal, v. 16, n. 1, p. 55-61, 2006.

HARLOW, P. S. Temperature-dependent sex determination in lizards. Temperature-de-


pendent sex determination in vertebrates. Washington: Smithsonian Institution Scholarly
Press, 2004. p. 42-52.

HAWKES, L. A. et al. Climate change and marine turtles. Endangered Species Research, v. 7,
n. 2, p. 137-154, 2009.

HOEGH-GULDBERG, O.; BRUNO, J. F. The impact of climate change on the world’s marine
ecosystems. Science, v. 328, n. 5985, p. 1523-1528, 2010.

IUCN - INTERNATIONAL UNION FOR CONSERVATION OF NATURE. The IUCN Red List of
Threatened Species. Available at: <https://www.iucnredlist.org/>. Accessed at: 19 Aug 2021.

JULIANA, J. R. S.; BOWDEN, R. M.; JANZEN, F. J. The impact of behavioral and physiological
maternal effects on offspring sex ratio in the common snapping turtle, Chelydra serpentina.
Behavioral Ecology and Sociobiology, v. 56, n. 3, p. 270-278, 2004.

KATSELIDIS, K. A. et al. Females first? Past, present and future variability in offspring sex ra-
tio at a temperate sea turtle breeding area: Variation in turtle sex ratios at temperate sites.
Animal Conservation, v. 15, n. 5, p. 508-518, 2012.

76
AMBIENTE: Percepções 2021

KING, R. et al. Estimating the sex ratio of Green Sea Turtles (Chelonia mydas) in Taiwan by the
nest temperature and histological methods. Journal of Experimental Marine Biology and
Ecology, v. 445, p. 140-147, 2013.

KOBAYASHI, S. et al. Investigating the effects of nest shading on the green turtle (Chelonia
mydas) hatchling phenotype in the Ogasawara island using field-based split clutch experi-
ment. Journal of Experimental Zoology, v. 333, p. 629-636, 2020.

LALOË, J. O. et al. Sand temperatures for nesting sea turtles in the Caribbean: Implications for
hatchling sex ratios in the face of climate change. Journal of Experimental Marine Biology
and Ecology, v. 474, p. 92-99, 2016.

LALOË, J. O. et al. Extreme rainfall events and cooling of sea turtle clutches: Implications in
the face of climate warming. Ecology and Evolution, v. 11, p. 560-565, 2021.

LILES, M. J. et al. Potential limitations of behavioral plasticity and the role of egg relocation in
climate change mitigation for a thermally sensitive endangered species. Ecology and Evolu-
tion, v. 4, 1603-1622, 2019.

LOLAVAR, A.; WYNEKEN, J. Experimental assessment of the effects of moisture on logger-


head sea turtle hatchling sex ratios. Zoology, v. 123, p. 64-70, 2017.

MARCOVALDI, M. A. G. et al. Identification of loggerhead male producing beaches in the south


Atlantic: Implications for conservation. Journal of Experimental Marine Biology and Ecolo-
gy, v. 477, p. 14-22, 2016.

MROSOVSKY, N; YNTEMA, C. L. Temperature dependence of sexual differentiation in sea


turtles: Implications for conservation practices. Biological Conservation, v. 18, p. 271-280,
1980.

PATRÍCIO, A. R. et al. Climate change resilience of a globally important sea turtle nesting pop-
ulation. Global Change Biology, v. 25, n. 2, p. 522-535, 2019.

PEREZ, E. A. et al. Is this what a climate change-resilient population of marine turtles looks
like? Biological Conservation, v. 193, p. 124-132, 2016.

PINTUS, K. J. Impact of clutch relocation on green turtle offspring. The Journal of Wildlife
Management, v. 73, n. 7, p. 1151-1157, 2009.

POLOCZANSKA, E. S.; LIMPUS, C. J.; HAYS, G. C. Vulnerability of marine turtles to climate


change. Advances in Marine Biology, v. 56, p. 151-211, 2009.

77
AMBIENTE: Percepções 2021

PORTER, E. et al. Influence of short-term temperature drops on sex-determination in sea


turtles. Journal of Experimental Zoology Part A: Ecological and Integrative Physiology, v.
335, n. 8, p. 649-658, 2021.

RENEKER, J. L.; KAMEL, S. J. Climate change increases the production of female hatchlings at
a northern sea turtle rookery. Ecology, v. 97, n. 12, p. 3257-3264, 2016.

SAMPAIO, R.; MANCINI, M. Estudos de revisão sistemática: um guia para síntese criteriosa da
evidência científica. Revista Brasileira de Fisioterapia, v. 11, n. 1, p. 83-89, 2007.

SANTOS, K. C. et al. Climate change implications for the nest site selection process and sub-
sequent hatching success of a green turtle population. Mitigation and Adaptation Strate-
gies for Global Change, v. 22, n. 1, p. 121-135, 2017.

TANABE, L. K. et al. Potential feminization of Red Sea turtle hatchling as indicated by in situ
sand temperature profiles. Conservation Science and Practice, v. 2, p. e266, 2020.

TEZAK, B. S. M.; GUTHRIE, K.; WYNEKEN, J. An immunohistochemical approach to identify


the sex of young marine turtles. The Anatomical Record, v. 300, n. 8, p. 1512-1518, 2017.

THE REPTILE DATABASE. Available at: http://www.reptile-database.org/. Access at: 19 Oct.


2019.

TOMILLO, P. S. et al. High beach temperatures increased female-biased primary sex ratios
but reduced output of female hatchlings in the leatherback turtle. Biological Conservation,
v. 176, p. 71-79, 2014.

TOMILLO, P. S. et al. Climate change overruns resilience conferred by temperature‐dependent


sex determination in sea turtles and threatens their survival. Global Change Biology, v. 21,
n. 8, p. 2980-2988, 2015.

VALENZUELA, N. et al. Extreme thermal fluctuations from climate change unexpectedly ac-
celerate demographic collapse of vertebrates with temperature-dependent sex determina-
tion. Scientific Reports, v. 9, n. 1, p. 4254, 2019.

WHILE, G. M.; WAPSTRA, E. Developmental biology: Embryonic movement influences sex


determination in a turtle. Current Biology, v. 29, n. 18, p. R883-R886, 2019.

78
4
BACIA HIDROGRÁFICA
DO RIO MEARIM:
CENÁRIO DE IMPACTOS
E VULNERABILIDADES
AMBIENTAIS

Rosângela Maria Paixão Pinheiro


Daniela Montanari Migliavacca Osório
Daniela Müller de Quevedo
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUÇÃO

Ao longo do tempo, os estudos técnicos e científicos em torno da natureza de ecos-


sistemas, como das bacias hidrográficas, têm relações com discussões, pressupostos e
episteme sobre a relação homem-natureza, na perspectiva da variante ambiental holística
da teoria dos sistemas, como mostram os estudos de Brito e Câmara (2002), Christofoletti
(1986), Capra (1996), Ab’saber e Muller-Plantenberg (2002), entre outros. Mas é a partir
das décadas de 50 e 60 que se consolidou tal visão sobre as áreas do conhecimento que
têm como objeto de análise o meio ambiente, suas relações, dinâmicas e populações; rela-
ções do homem com o espaço geográfico; relações do homem em sociedade etc. Ciências
como ecologia, geografia, sociologia, economia, entre outras, já expressavam preocupação
com a forma e intensidade de exploração dos elementos naturais enquanto recursos que
alimentam o círculo de atividades socioeconômicas e culturais1, em relação conflituosa
homem X natureza.

Desse modo, começaram a refletir sobre problemas de poluição e alterações do meio


ambiente e consequentemente sobre ecossistemas, como as bacias hidrográficas, visto
que, em torno ou proximidades dos aportes de águas superficiais (continentais, marítimas
ou estuarinas) ocupações humanas se organizaram e expandiram suas atividades de for-
ma complexa.

Nesse âmbito, estudos em bacias hidrográficas deixam de ser tão somente unilate-
rais, do ponto de vista da natureza e composição física – uma estrutura geomorfo-hidro-
lógica, como expressam Guerra (1987), Garcez e Alvarez (2004), entre outros –, e passam
a receber também análises sistêmicas, compreendidas enquanto unidades de paisagem,
ecossistemas ou geossistemas, sendo essa a episteme que gravita em torno da compo-
sição dos arranjos e estruturas nas ciências ambientais. Essa postura científica é con-
solidada entre proposições manifestadas através da ecodinâmica de Tricart (1977); nas
classificações de Sotchava (1977, 1978) e Bertrand (1972), entre outras, como destacou
Fierz (2008).

1
Representada em quantidades, volumes e/ou avanço sobre áreas, territórios e regiões, enquanto matérias-
-primas para atividades industriais, produções agropecuárias (pastos, rebanhos, monoculturas de grãos e
tantas outras plantas e vegetais cultiváveis), áreas urbanizadas e suas infraestruturas de engenharias, como
vias de circulação (rodovias, hidrovias, portos etc.), construções prediais, reservatórios e redes de aquedutos,
usinas de energia elétrica, entre outras.

80
AMBIENTE: Percepções 2021

Portanto, diante do cenário de complexidade ambiental, a bacia hidrográfica é um


geossistema que reflete e resulta das evidências morfoestruturais – componentes e ele-
mentos organizados em uma porção territorial “abaciada” em planos de curvaturas com
subsidência côncava na superfície do terreno, de onde divergem divisores de águas (geoló-
gico e morfológico), em nascentes e rede de drenagem até pontos ou áreas de confluência,
deflúvios e vertedouros –, das condições hidrológicas e características hidráulicas, condi-
ções edafobotânicas e ecológico-biológicas em geral, compondo assim as componentes
abióticas e bióticas, integrados em interações e inter-relações em arranjos complexos com
agentes e fatores socioeconômicos, políticos e culturais em curso. Perspectiva identificada
em trabalhos como de Tundisi e Tundisi (2016), Coelho Netto (1995), Odum (1983), entre
outros.

Estudos em geossistema, como as bacias hidrográficas, exigem, por natureza, aná-


lises integradoras, sob abordagens na perspectiva de diferentes áreas do conhecimento
científico e técnico com relação às dinâmicas naturais e complexidades ambientais (en-
tenda-se condições socioeconômicas, políticas e culturais), apoiadas em métodos que
permitam aplicação de metodologias que reflitam essa visão de conjunto, cada vez mais
importantes frente aos problemas ambientais nessas unidades e outros ecossistemas,
contemplando, assim, bases epistemológicas norteadas pela interdisciplinaridade – en-
tendida enquanto “[...] seleção de variáveis e dimensões significativas para apreender
uma problemática a partir dos enfoques de diferentes disciplinas [...]”, como explicitou Leff
(2001, p. 95). Visão analítica, que se sabe não ser nova; mas intensamente fortalecida em
nossos dias pelas consequências de contínuas crises e profundas mudanças planetárias,
regionais e locais que têm impactado economias, sociedades e seus modos de vida.

Essas referidas mudanças são temas centrais de painéis internacionais, como as


Conferências da ONU sobre o meio ambiente humano (1972), meio ambiente e desenvolvi-
mento (ECO- 92), os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS), as Conferências
da ONU sobre Mudanças Climáticas, os Relatórios do IPCC da ONU, entre outros. Sendo
assim, são envolvidas abordagens relacionadas à vulnerabilidade, sustentabilidade, qua-
lidade ambiental e demais termos aplicáveis às análises ambientais, amplamente inves-
tidos na episteme da interdisciplinaridade, sendo possibilidades interativas e integrativas
para estudos e áreas diversificadas da Ciência e perspectivas dialógicas com as sociedades

81
AMBIENTE: Percepções 2021

atuais e oportunidades de assegurar o futuro para as próximas gerações. Análise essa que
está presente em compêndios científicos de Silva e Tundisi (2018) que, entre outros estu-
dos, tratam da problemática da água no mundo, apontando a necessidade de implantar re-
des de apoio, com integração de laboratórios e outras pesquisas, explicitando a importância

Sobre análise de risco e vulnerabilidade das populações humanas, na avaliação de


situação de escassez ou deterioração da qualidade da água e na compreensão de im-
pactos das mudanças climáticas sobre a qualidade da água, três campos de pesquisa
e manejo que precisam ser fortalecidos. Paralelamente, [...] investir na educação e no
treinamento de pessoas com uma abordagem sistêmica e interdisciplinar (VAL et al.,
2018, p. 285).

Diante da proposição fundamentada em conhecimentos interdisciplinares sobre bacia


hidrográfica, nosso objetivo é analisar cenários de impactos e vulnerabilidades ambientais,
apoiado em modelo sistêmico conceitual, tendo como referência espacial a Bacia Hidrográ-
fica do Rio Mearim, localizada na região nordeste do país, Estado do Maranhão. Na classi-
ficação pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), corresponde a uma
bacia hidrográfica inserida no Atlântico NE Ocidental.

No percurso metodológico, foi realizada revisão sistemática ou integrativa, como des-


crevem Sampaio e Mancini (2007), Donato e Donato (2019), sobre referenciais teóricos,
relatórios técnicos e cartográficos sobre a Região e Bacia Hidrográfica em estudo, meto-
dologias de estudos interdisciplinares e afins – estudos sobre vulnerabilidade, qualidade
ambiental, entre outros. Seguindo-se com a identificação de levantamentos de informações
secundárias, dos principais elementos e processos no comportamento das condições físi-
co-ambientais sobre a bacia hidrográfica em foco, com o tratamento sobre as informações
levantadas e organizadas, deu-se a organização da proposição final, ou seja, estruturação
de um modelo conceitual das características em dinâmica físico-ambiental e outro modelo
conceitual sobre cenários de impactos e vulnerabilidades ambientais para a Bacia Hidrográ-
fica do Rio Mearim.

As análises são apresentadas em duas partes: a primeira com fundamentação teó-


rica, embasamento, conceitos e a organização das estruturas em perspectiva sistêmica e
ambiental. A segunda parte diz respeito às análises sobre impactos e vulnerabilidades, or-
ganizadas em estruturas sistêmicas conceituais, trazendo como pano de fundo a Bacia Hi-
drográfica do Rio Mearim.

82
AMBIENTE: Percepções 2021

2 ANÁLISES AMBIENTAIS EM INTEGRAÇÃO GEOSSISTÊMICA

2.1 TEORIAS SISTÊMICAS E O MODELO CONCEITUAL


Segundo Christofoletti (1986), a Teoria Sistêmica, em visão estritamente geomorfo-
lógica, diz respeito ao “conjunto de elementos e das relações em si e entre os seus atri-
butos”; discorre também que a bacia hidrográfica dá-se através das relações entre seus
elementos topográficos, como área de cimeira, vertentes e talvegue, que em altitudes de-
clinantes, inter-relacionam-se com fluxos das águas correntes (águas fluviais) em rede de
drenagem, composta por: nascentes, canais tributários, canal principal e seus vertedouros
e desembocadura; configurados na circulação de fluxos de águas e sedimentos, por ação
da gravidade e força cinética.

Para esse estudioso, a Teoria Geral dos Sistemas (General Systems Theory) chega à
Geomorfologia pelos trabalhos de Arthur Strahler (1950, 1952), seguido das contribuições
importantes de Jonh T. Hack (1960), Richard J. Chorley (1962) e Alan D. Howard (1965).
Mas a busca de sistematização dessa teoria, enquanto conhecimento universal, emergiu
simultaneamente em várias disciplinas na primeira metade do século XX, especialmente
na década de 20, em estudos da Biologia, Psicologia/Gestalt, Ecologia e Física Quântica,
fatos que estão presentes em considerações realizadas por outros estudiosos, como Leff
(2001), Lopes, Silva e Goularth (2015), Paz e Rosário (2018), entre outros.

A complexidade da dinâmica sobre o meio ambiente traz, nessa teoria, os fenômenos


identificados enquanto sistemas. Os sistemas não atuam de modo isolado, fazem parte de
um ambiente, conjunto maior (Universo), por onde circula a “retroalimentação” (feedback),
entre os sistemas antecedentes e os subsequentes. Então, esse Universo corresponde ao
conjunto de todos os fenômenos e eventos que sofrem alterações e mudanças por causa
do comportamento do sistema particular (CHRISTOFOLETTI, 1986).

Diversificados estudos utilizam-se da teoria sistêmica como instrumentação na


identificação de processos interrelacionados, fenômenos de forma sistêmica, entre eles:
as classificações geossistêmica de Bertrand (1972); a ecodinâmica de Tricart (1977); as
classificações de Sotchava (1977, 1978); entre outras. E, em tempos mais recentes, apli-
cados para análises de fragilidades ambientais, como identificado nos estudos de Fierz
(2008), Marques Neto (2008), Lima e Silva (2015), Silva (2016), entre outros.

83
AMBIENTE: Percepções 2021

Portanto, as análises e discussões ambientais na visão de conjunto dada pela Teoria


dos Sistemas, por si, empregam clareza ao encadeamento dos fenômenos em proces-
so na bacia hidrográfica, com localização expressa das possíveis alterações ambientais
impelidas pela dinâmica da natureza e das atividades humanas. Nesse sentido, também
contribuindo para a organização de modelo conceitual sobre a dinâmica físico-ambiental e
sistêmica em bacia hidrográfica.

2.2 CONCEITOS SOBRE IMPACTOS E VULNERABILIDADES AMBIENTAIS


A partir da dinâmica e intensificação dos problemas ambientais, acontece o marcan-
te fortalecimento de conceitos, como impactos, vulnerabilidades, sustentabilidades, entre
outros termos, fazendo-se referências com a temática e com saberes científicos correla-
tos e destacando, assim, necessidades de aprofundamento e entendimentos que coadu-
nam com posturas de salvaguarda da natureza e os recursos explorados pelas sociedades.

Esse é um conceito expandido sobre as bacias hidrográficas, que passaram a ser


analisadas enquanto unidade ambiental, por conseguinte, classificadas como Ecossiste-
ma/Geossistema, em que todas as componentes mantêm relações entre si, com trocas de
energia e matéria, que proporcionam perdas ou recebimentos de fluxos em circuitos, ou
seja, com entradas e saídas, alimentações e retroalimentações, que mantêm a dinâmica
do sistema. Isso acontece tanto em perspectivas das componentes naturais quanto das
socioeconômicas, que no âmbito dos estudos ambientais são denominados componentes
socioambientais, diante da integração, interrelação entre essas componentes e o reflexo
das necessidades em caráter multissetorial. São termos apresentados de forma recor-
rentes, em discussões e posturas analíticas como indicadores de avaliação da qualidade
ambiental postos em estudos de Bellen (2005), Christofoletti (2007), Tundisi e Tundisi
(2014, 2016), entre outros.

Nesse contexto, os recursos hídricos aí existentes são consumidos desde o simpli-


ficado uso pessoal – saciar a sede, higiene – até o complexo desenvolvimento e manu-
tenção de atividades econômicas – agrossilvopastoris, industriais, infraestrutura urbana,
transporte e comunicação, entre outras – que de acordo com o tamanho ou intensidade
da escala de uso e exploração projetam susceptibilidade às alterações sobre o ambiente.
Cenários assim denotam discussões e são genericamente associados às situações de im-

84
AMBIENTE: Percepções 2021

pactos e vulnerabilidades ambientais; ao que explicitamos alguns fundamentos que orien-


tam nossa compreensão em torno desses termos aqui aplicados, para além da simples
fundamentação de conceitos.

Do ponto de vista técnico para avaliação ambiental no Brasil, a Resolução CONAMA


01/1986 considera impacto ambiental como:

[...] qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio am-
biente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das ativida-
des humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I - a saúde, a segurança e o
bem-estar da população; II - as atividades sociais e econômicas; III - a biota; IV - as
condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos
ambientais (BRASIL, 1986).

É possível notar que tal conceituação perpassa e sintetiza saberes em diferentes


áreas do conhecimento, possivelmente decorrendo de análises realizadas em painéis ou
compêndios técnicos e científicos.

Na discussão posta por alguns desses estudos, ressaltamos Trepl (2002), que traz
profunda e consciente discussão em torno do termo “impacto ambiental”, explicitando ar-
gumentos sobre pressupostos científicos até a construção do termo enquanto ideia polí-
tica e conduzindo-nos a refletir, ao destacar que o arcabouço da episteme ambiental não
traz como “evidência” que, antes das “intervenções” no “meio ambiente” “natural”, deva-
-se estudar o “impacto” dessas ações. Ideia relativamente comum, na atualidade, entre
proposições de EIA – Estudos de Impactos Ambientais, explicitando entre as razões: 1
– pode-se achar que é desnecessário (para os que acreditam que o meio ambiente é mui-
to resistente); 2 – o próprio conceito de “meio ambiente” é ambíguo; 3 – por si só, não é
evidente que “haja” realmente um meio ambiente. E segue fundamentando entre fatos e
situações, postos como exemplos em uma linha de tempo histórico da humanidade.

No contexto, o estudioso explica que, cerca de 200 anos atrás ou 25 anos mais atuais,
muitos dos termos e denominações pelas quais hoje tratamos a natureza antes não exis-
tiam, sob a perspectiva ambiental, entre eles: “meio ambiente”, “destruição do meio am-
biente”, “catástrofes ambientais”. Esses termos não eram utilizados de forma comum ou
vistos como ameaças. A exemplo das epidemias como a peste negra, na Idade Média; os
acontecimentos durante a conquista da América Central e do Sul foram situações em que a

85
AMBIENTE: Percepções 2021

morte dizimou um povo que, no período de uma geração, decresceu para uma fração. Acon-
tecimentos (síndrome de causas) que atualmente seriam relacionadas como “ecológicos”,
“guerra ambiental”, “catástrofe ambiental” e, naquele tempo, não tinha como imaginar e
relacionar de que o “meio ambiente” estaria entrando em “colapso”2, assim foram tratados
apenas como consequências de guerra, fome, seca, epidemia (saúde) e problemas de higie-
ne etc.

Situação bem diferente no século XXI, com a pandemia da COVID -19 e todas as cepas
em evolução e circulação na sociedade de humanos. Pandemia viral que até agosto de 2021
havia dizimado 4 milhões de vidas humanas no mundo e 574 mil no Brasil, ao longo de dois
anos (PAHO.ORG, 2021), e tem, como pano de fundo, várias discussões quanto a sua origem
e causas. No cenário mundial, ambientalistas e cientistas das mais diferentes áreas, insti-
tuições e movimentos expressaram suas posições, convergindo para o pensamento geral
de que essa situação – intensidade de carga viral e poder transmutante e letal do vírus – é
uma resposta da natureza ao nível de destruição realizada pela humanidade. Aqui ilustrados
nas reflexões realizadas por Ailton Krenak – brasileiro da nação Krenak, ativista do movi-
mento socioambiental e de defesa dos direitos indígenas – na publicação “O amanhã não
está à venda” (KRENAK, 2020), e Fritjof Capra – cientista, físico, Diretor do Centro de Alfa-
betização Ecológica, na Califórnia (EUA) – em entrevista a um periódico semanal (MENA,
2020). O primeiro expressou que o vírus é como um organismo do planeta, respondendo
ao pensamento doentio dos humanos, atacando a forma de vida insustentável adotada por
livre escolha. Liberdade a qual faz a crítica, que todos querem o que ela pode proporcionar,
mas sem perguntar qual o preço. E o segundo interpreta a pandemia da Covid-19 como
uma resposta biológica da Terra diante das emergências sociais e ecológicas amplamente
negligenciadas.

Ainda sobre impactos ambientais, Spindler (2002) pontuou, na apresentação da obra


“Previsão de Impactos”, que as discussões e movimentos coadunaram com a organização
de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e de política ambiental que vêm à tona ao final da
década de 60 (século XX), através do que foi então denominado Environmental Impact Asses-
sment – EIA, defendendo a simples ideia: “Prevenir em vez de remediar”, bem como o lema:
“Primeiro Pensar, Depois Planejar e Depois agir Ecologicamente”.

2
Alguns termos ambientais aqui estão entre aspas pois indicam ser, nas considerações do autor, estranhos àque-
le tempo histórico; ou seja, não existiam para expressar os problemas que as sociedades de então vivenciavam.

86
AMBIENTE: Percepções 2021

Tritin (2002) não explicita conceito sobre impacto ambiental, mas discute a incompa-
tibilidade existente no cenário econômico; no desenvolvimento humano e na relação com
natureza em escala mundial, extrapolando fronteiras no que diz respeito aos riscos am-
bientais. Tendo, por um lado, países do Sul e do Leste, seguindo a postura do crescimento
desenfreado em detrimento da proteção ambiental, e, de outro, os países industrializados
do Oeste, com a exportação de danos ambientais para as regiões mais pobres do globo,
ainda que tenham elaborado leis ambientais e procedimentos para a preservação do meio
ambiente. Assim, traz, em seu posicionamento quanto ao impacto ambiental, a neces-
sidade de construção de novos pactos que ultrapassem essas fronteiras e que realizem
controle social local dos meios de produção, dos fluxos financeiros e das rotas de comércio
para que seja concretizada uma nova ordem na economia mundial, com “desenvolvimento
duradouro” em todo o mundo, consolidando o novo pacto de validade internacional.

Ab’Saber e Muller-Plantenberg (2002), em torno do tema, chamam atenção para a


necessidade de aprofundamento dos estudos de previsão de impactos ambientais e so-
ciais, no mundo, em consenso com a prevenção de impactos sobre projetos de caráter de-
senvolvimentista. Esses são “estendidos para todos os tipos de projetos industriais, agrá-
rios e urbanísticos, independentemente do tamanho e volume, desde que seja reconhecida
a periculosidade, ainda que potencial”.

O termo “vulnerabilidade ambiental” também transita na mesma base de pressu-


postos e epistemologias erigidas pelas necessidades sociais do nosso tempo, em que os
desequilíbrios na relação homem-natureza aceleraram as mudanças físico-ambientais no
mundo e, através delas, o fortalecimento das ciências ambientais, pelas prerrogativas de
enfrentamento aos problemas de crises ambientais.

Em estudo, Tunner et al. (2003) explicitam vulnerabilidade enquanto “o grau em que


um sistema, subsistema ou componente do sistema provavelmente sofrerá danos devido
à exposição a um perigo, seja perturbador ou estressor/estresse”, sendo identificada pelo
registro de exposição de riscos, através de perturbações e tensões do sistema, diante da
condição de sensibilidade e resiliência (recuperar, superar). A avaliação de vulnerabilidade
ambiental está para além das análises, tão somente, de fenômenos físico-ambientais e
ecológicos; deve incluir o “sistema humano-ambiente acoplados e aquelas ligações dentro
e fora dos sistemas”. E, também, que o surgimento das análises de vulnerabilidade “emer-

87
AMBIENTE: Percepções 2021

giram de pesquisas e práticas sustentadas sobre riscos e perigos, impactos climáticos e


resiliência”, citando Cutter (2001).

Pelo exposto, consideramos que a consolidação e uso dos termos “impacto” e “vul-
nerabilidade” ambiental têm relação e semelhanças em pressupostos nas ciências am-
bientais. O primeiro evidencia alterações (químicas, físicas ou biológicas) no meio ambien-
te relacionadas às intervenções antrópicas, a partir das suas atividades socioeconômicas.
Enquanto o segundo termo está relacionado à capacidade suporte de um ambiente, siste-
ma e suas comunidades de seres vivos de reagir às alterações e/ou transformações do seu
meio ambiente. Mas, ainda que esta (vulnerabilidade) se dê independente de intervenções
humanas, fica claro, diante da complexidade ambiental, que é incompatível qualquer análi-
se ou avaliação que menospreze as relações homem-natureza (relações socioambientais).

3 ANÁLISE SISTÊMICO CONCEITUAL SOBRE A BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO


MEARIM

3.1 LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DAS ÁGUAS SUPERFICIAIS


A localização geográfica de uma unidade de paisagem, como a bacia hidrográfica,
pode nos revelar, ainda que indiretamente, características associadas às condições as-
tronômicas, climáticas e as demais inter-relacionadas; bem como noção de extensão do
território ocupado. Situação que aqui aplicamos à Bacia Hidrográfica do Rio Mearim.

Trata-se de extensa bacia hidrográfica (área de 99.058,68 Km²), distribuída de sul a


norte no território do estado do Maranhão (ocupando 29,84%), localizada na zona tropical,
que traz reflexos sobre as condições e características climatobotânicas e morfopedológi-
cas ocorrentes na dinâmica natural. A Figura 01 ilustra a localização e distribuição da bacia
em foco.

A Bacia Hidrográfica do Rio Mearim tem em destaque três cursos fluviais de consi-
derável extensão. Informações técnicas do IBGE (1997) identificam no curso principal – rio
Mearim – nascentes na serra da Menina, aproximadamente 650 metros de altitude, em
terras dos municípios de Formosa da Serra Negra, Fortaleza dos Nogueiras e São Pedro
dos Crentes e, após percorrer 930 km de extensão, deságua na baía de São Marcos, no

88
AMBIENTE: Percepções 2021

Golfão Maranhense, entre os municípios de São Luís e Alcântara. Os outros dois grandes
rios – Pindaré e Grajaú – são afluentes pela margem esquerda. O rio Pindaré com 466,3
km de extensão, nascentes na serra do Gurupi (na região de Montes Altos e Amarante do
Maranhão), a 300 metros de altitude e desagua na confluência, apenas 20 km da foz, em
área da cidade de Vitória do Mearim; enquanto o rio Grajaú tem nascentes na serra da
Cinta, 450 m de altitude, extensão de783 km até confluir com o curso principal, na região
dos lagos da Baixada maranhense, através do canal Rigó no Golfão Maranhense.

Figura 1 - Localização e distribuição da Bacia Hidrográfica do Rio Mearim no Estado do Maranhão

Fonte: ANA, 2015; CODEVASF, 2019

Esses dois afluentes confluem com o rio Mearim pela margem esquerda, onde estão
dispostos os subafluentes, pelo rio Pindaré. Os rios Buriticupu, Negro, Paragominas, Zitiua,
Água Preta e Santa Rita são subafluentes do Mearim através do rio Pindaré; enquanto os
riachos e rios, como: Brejão, Derrota, Santana, rio Grajauzinho, riacho S. Domingos, riacho
as Cunhãs, Igarapé da Cigana, entre outros, figuram entre os subafluentes através do rio
Grajaú, de acordo com cruzamento de informações do relatório técnico Maranhão/Sema-
tur (1991) e dados da plataforma Hidroweb (ANA, 2021).

89
AMBIENTE: Percepções 2021

A divisão por trechos de uma bacia hidrográfica – em alto, médio e baixo curso ou a
organização do sistema de drenagem organizado de forma hierárquica, entre outros – tem
fundamento básico nos processos hidromorfológicos, como apontam estudiosos da Geo-
morfologia, entre eles Penteado (1983), Christofoletti (1986), Casseti (1994), Coelho Netto
(1995), entre outros – dos clássicos aos contemporâneos.

A partir dessa condição, relatórios técnicos da CPRM (CORREIA FILHO et al., 2011), e
do IBGE (1997), apresentam para a Bacia Hidrográfica do Rio Mearim, os aspectos a seguir:
O alto curso, das nascentes até a confluência do rio Corda ou Capim, na cidade de Barra do
Corda, é o trecho com predominância de morfologias de chapadas, superfícies em tabu-
leiros e superfícies colinosas, cobertos com vegetação de Savanas (Cerrado stricto sensu),
entremeados com riachos e ribeirões de pequeno volume, como: Bem Aceito, da Barra,
Prata, Brejão, Água Boa, Midubim, Porção dos Ovos, com descarga reduzida, muitos deles
com descarga fluvial intermitente, mas a cerca de 160 km, recebendo contribuições dos
rios perenes – rios Corda e Enjeitado. Sendo um importante afluente do curso principal,
pela margem direita, o rio Corda traz em suas características: nascente na serra Branca,
450 m de altitude, extensão de 240 km com águas rápidas e límpidas.

De acordo com Porto, Motta e Souza (2019), o Médio Mearim está localizado entre
a barra dos rios Flores e Seco das Almas/Porto das Mulatas, com extensão de 156,7 km
(Trizidela do Vale; Esperantinópolis, Bacabal). Nesse trecho, a largura do canal principal é
muito variável, de 40m a 90m (CORREIA FILHO et al., 2011), largura entre 50 e 100m, com
declividade média de 11cm/km, com desnível total de cerca de 20m (CUNHA, 2003 apud
PORTO; MOTTA; SOUZA, 2019), sendo aí a navegação dificultada pelo acúmulo de depósi-
tos aluviais que reduz a profundidade. Nesse trecho da bacia hidrográfica, predominam re-
levos e superfícies dissecados e acentuado processo erosivo, por onde a rede de drenagem
do curso principal – rio Mearim e os afluentes, rios Corda e Grajaú – esculturam a paisa-
gem, percorrendo em forma de meandros, entre relevos residuais, com topos preservados
por uma fina cobertura argilosa, assim correspondendo em parte à área de distribuição das
unidades Relevo Dissecado do Médio Mearim e Superfície Dissecada do Pindaré, de acordo
com a compartimentação geomorfológica realizada por Lima (2013).

A CPRM indica que baixo Mearim estende-se desde Porto Seco das Mulatas até a foz,
na baía de São Marcos, onde se bifurca em dois braços que contornam a Ilha dos Caran-

90
AMBIENTE: Percepções 2021

guejos, sendo sua maior característica, nesse trecho, a existência de meandros (CORREIA
FILHO et al., 2011). A partir de Arari, no Golfão Maranhense, suas margens tornam-se
alagadiças e pantanosas. Relacionando a compartimentação de Lima (2013), esse trecho
dispõe-se sobre as unidades geomorfológicas denominadas Relevo Dissecado do Baixo
Curso e Planície Flúvio-Lacustre e Marinha, apresentando “relevo baixo em pequenos tes-
temunhos que variam em altitudes entre 1 e 50 metros. Com planícies flúvio-lacustres
constituídas por material síltico-argiloso e material arenoso e areno-argiloso, nas mar-
gens próximas à foz da bacia”, “a planície marinha se estabelece na margem direita da
desembocadura, caracterizada pelos cordões arenosos e pelo mangue” (LIMA, 2013).

3.2 ELEMENTOS E PROCESSOS PARA INTEGRAÇÃO GEOSSISTÊMICA NA


BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO MEARIM
No contexto científico, ocorrem eventos de toda ordem no meio natural, como exem-
plo: “[...] fluxos das águas seguindo topografia superficial, subsuperficial ou subterrânea
que por ação da gravidade fluem, confluem e compõem áreas individualizadas – divisores
de águas superficiais ou geológicos – constituindo diferentes bacias de drenagem” (ANA,
2015).

Tais eventos imprimem aí a dinâmica processual e evolutiva através de interações e


inter-relações de seus elementos constituintes e característicos; são fenômenos naturais
que ocorrem nos ecossistemas, suas divisões e subdivisões – ecotópos e ecotónos, entre
outras – compostas por elementos que impulsionam a movimentação dos processos que
os caracterizam.

3.2.1 Elementos e processos ecossistêmicos hidrológicos e climatológicos


De acordo com Naghettini e Pinto (2007), “fenômenos hidrológicos são aqueles que
definem os mecanismos de armazenamento e transporte entre as diversas fases do ciclo
da água em nosso planeta, com atenção especial para as áreas continentais”. Por con-
seguinte, para análise de processos hidrológicos em bacias hidrográficas tropicais, como
a Bacia Hidrográfica do Rio Mearim, eminentemente localizada em território do Estado
do Maranhão, foram realizados levantamentos de informações secundárias sobre: pre-
cipitação; escoamento e armazenamento superficiais; evapotranspiração; infiltração; es-
coamento e armazenamento subsuperficiais; propriedades físico-químicas e biológicas da

91
AMBIENTE: Percepções 2021

água; conformações geomorfológicas; e transporte de sedimentos, a fim de apresentar as


principais dinâmicas aí existentes, decorrentes da interação dos elementos e processos,
dando estrutura aos fenômenos resultantes.

Dentre os processos hidrológicos em bacias hidrográficas tropicais, compreende-se


que a dinâmica pluviométrica apresente considerável, se não a maior, variabilidade espacial
e temporal nas previsões para tempo e clima sobre tais regiões e as devidas unidades de
paisagens; por conseguinte, incidindo também sobre processos determinísticos (aqueles
resultantes da aplicação direta das Leis da Física, Química e Biologia) e estocásticos (aque-
les governados por leis de probabilidades, ou seja, por componentes aleatórias – eventos
aleatórios e possíveis que supõem regularidades e/ou irregularidades aí ocorrentes).

Portanto, buscando referenciar o comportamento pluviométrico para a bacia hidro-


gráfica em foco (MARANHÃO; UEMA; NUGEO, 2016), apresenta-se a distribuição de pre-
cipitação pluviométrica 720 a 2.200 mm/anuais, com menores volumes médios distribuí-
dos na parte sul e volumes médios crescentes, do médio ao baixo curso, em todo o setor
norte da bacia hidrográfica, com registros de índices pluviométricos mais baixos na região
do município de Grajaú e para os mais elevados na região do município de Viana, para a
evapotranspiração potencial média anual de 1.511,4 mm; sendo que os maiores totais
semestrais totalizam 1.948,8 mm e os menores totais anuais de evapotranspiração po-
tencial totalizam 896,7 mm.

A partir dos índices pluviométricos e evapotranspiração potencial, através do mes-


mo estudo, tem-se a referência para o comportamento de Deficiência Hídrica e Excedente
Hídrico para a bacia do Mearim. A deficiência hídrica apresentou ocorrência de maio a de-
zembro (08 meses), com registro de média histórica de 505,4 mm, 917,0 mm e 145,1 mm
respectivamente, maiores e menores totais, apontando a localidade de Flores, município
de Presidente Dutra para os registros de maior deficiência hídrica, durante os meses de
agosto, setembro e outubro, com 164,0 mm, 192,0 mm e 180,6 mm, respectivamente.
Enquanto sobre o excedente hídrico mais significativo nos seis primeiros meses anuais,
período de concentração das chuvas na região, registram-se 435,7 mm para a média de
excedentes hídricos totais, 856,4 mm para os maiores totais semestrais e 154,3 mm para
os menores totais semestrais. Assim foi possível observar localidades do município de

92
AMBIENTE: Percepções 2021

Esperantinópolis – 235,3 mm, no mês de fevereiro e, em Pindaré-Mirim, nos meses de


março e abril, 303,4 e 254,3 mm – sendo esses os maiores excedentes hídricos mensais.

As informações adquiridas, em torno das condições meteorológicas registradas para


a bacia hidrográfica do Mearim, nos permitem entendimento geral acerca do percurso na-
tural da água na rede de drenagem, no que diz respeito à entrada de água, através da
precipitação pluvial, movimentação e permanência a partir dos dados de eficiência e exce-
dentes hídricos e, ainda, de saída através da evapotranspiração.

A fim de maior compreensão para a dinâmica em discussão, foram levantadas in-


formações sobre estatísticas para vazões médias, máximas e mínimas na perspectiva do
comportamento e a dinâmica de escoamento superficial. Portanto, tendo-se como base de
cálculos e regionalização do relatório técnico da CPRM (2002) – período 1985 a 1999 – foi
possível inferir para a Bacia Hidrográfica do Rio Mearim.

De acordo com Maciel (2017), para o conhecimento adequado dos processos hidro-
lógicos é essencial a análise do regime de vazões que permite o equacionamento da oferta
e volume de água dos cursos d’água, utilizado em tomadas de decisões orientadas à racio-
nalização e preservação deste recurso.

Desse modo, sendo a vazão média a representação do escoamento anual em deter-


minado rio – “representa a média das vazões médias anuais” – “é compreendida como
a maior vazão possível de ser regularizada numa bacia hidrográfica” (TUCCI, 2004 apud
MACIEL, 2017). Para a Bacia Hidrográfica do Rio Mearim foi possível inferir vazões médias,
com taxa de retorno para 10 anos. Os resultados são apresentados no Quadro 1 a seguir.

93
AMBIENTE: Percepções 2021

Quadro 1 - Aspectos das vazões médias na Bacia Hidrográfica do Rio Mearim

Cursos
Área P médio C= Q MLT/P
N da Código Estação Q MLT (m3/s)
(Km2) (mm) (m3/s)
Bacia
1 33330000 Fortaleza 961578312 3.547 1224 13,4560263
2 33340000 Gado Bravo 1017358273 3.720 1224 14,23659364
ALTO
3 Grajaú+Grajaú II 494519,6632 4.520 1170 48,85399341
4 33205000 Fazenda Remanso 414142,8241 3.687 1125 40,91350112
6 33025000 Vale do Pindaré 2,05316E+50 5.503 1398 17,22231696
7 Rio Corda+Rio Corda II 382689,2111 3.072 1150 37,80617353
8 33250000 Barra do Corda 927564,6098 13.097 1161 91,63484841
MÉDIO
10 33260000 Santa Vitória 5049368226 15.681 1178 70,65928047
11 33270000 Flores 271678313,7 1.309 1186 3,801781393
12 33360000 Madail 4371390038 12.907 1217 61,17186566
13 33170000 Esperantina 4,01854E+50 5.527 1456 33,7083717
14 33190000 Pindaré Mirim 4,08239E+51 34.944 1522 36,74866802
15 BAIXO Pedreiras + Pedreiras II 9379951354 24.193 1226 131,260107
16 33290000 Bacabal 10133296299 25.267 1238 141,8021807
17 33380000 Aratoí Grande 9961539661 20.380 1354 139,8867197
N – Indicação de estações fluviométricas; Q MLT – Vazão média
Fonte: Elaborado pelas autoras, baseado em dados do Relatório Técnico de Regionalização da Sub-bacia
33 (CPRM, 2002)

A partir de considerações dos mesmos autores, compreendemos que “a vazão máxi-


ma representa os valores extremos que podem resultar em enchentes”; por conseguinte,
as previsões e estimativas são relevantes para o controle de inundações, através de medi-
das, obras hidráulicas, entre outras. No Quadro 2 estão as informações regionalizadas para
rios no alto, médio e baixo curso da bacia hidrográfica em análise.

94
AMBIENTE: Percepções 2021

Quadro 2 - Aspectos das Vazões Máximas na Bacia Hidrográfica do Rio Mearim

Cursos
P médio
N da Código Estação Q MC (m3/s) Área (Km2) C= Q MC
(mm)
Bacia
1 33330000 Fortaleza 12803072,04 3.547 1224 251,8033393
2 33340000 Gado Bravo 27017824,64 3.720 1224 531,370787
ALTO
3 Grajaú + Grajaú II 1,25706E+64 4.520 1170 454,9941725
4 33205000 Fazenda Remanso 6,23279E+63 3.687 1125 225,5962568
6 33025000 Vale do Pindaré 1,86753E+82 5.503 1398 97,68569165
7 Rio Corda + Rio Corda II 363448,1173 3.072 1150 47,21901296
8 33250000 Barra do Corda 6,22605E+63 13.097 1161 225,3522024
MÉDIO
10 33260000 Santa Vitória 7,65442E+63 15.681 1178 277,0522227
11 33270000 Flores 179800,5186 1.309 1186 23,35960102
12 33360000 Madail 28915282,21 12.907 1217 568,6888737
13 33170000 Esperantina 5,56385E+82 5.527 1456 291,0305439
14 33190000 Pindaré Mirim 2,78841E+83 34.944 1522 1458,545282
15 BAIXO Pedreiras + Pedreiras II 1,39295E+64 24.193 1226 504,1792282
16 33290000 Bacabal 1,66413E+64 25.267 1238 602,3348389
17 33380000 Aratoí Grande 46090700,14 20.380 1354 906,484957
N – Indicação de estações fluviométricas; Q MC – Vazão média de cheia anuais
Fonte: Elaborado pelas autoras, baseado em dados Relatório do Técnico de Regionalização da Sub-bacia 33
(CPRM, 2002)

Sobre as vazões mínimas, os estudiosos expressaram que se caracterizam como


aquelas que representam os menores valores das séries anuais. E são importantes em de-
cisões referentes ao abastecimento de água e irrigação, aos estudos de qualidade da água,
dentre outros. O Quadro 3 expressa o comportamento para a bacia hidrográfica em análise.

95
AMBIENTE: Percepções 2021

Quadro 3 - Aspectos das vazões mínimas na Bacia Hidrográfica do Rio Mearim

P mé-
Cursos Q mim, 270 Área C= Q mim, 270
N Código Estação dio
da Bacia média (m3/s) (Km2) média (m3/s)T/P
(mm)
1 33330000 Fortaleza 2733219,388 3.547 1224 5,842713
2 33340000 Gado Bravo 2927839,154 3.720 1224 6,258745
ALTO
3 Grajaú + Grajaú II 3587918,042 4.520 1170 7,669774
4 33205000 Fazenda Remanso 128080,883 3.687 1125 18,10062
6 33025000 Vale do Pindaré 6486720,185 5.503 1398 13,86645
7 Rio Corda + Rio Corda II 3.072 1150
8 33250000 Barra do Corda 294110,9701 13.097 1161 41,56428
MÉDIO
10 33260000 Santa Vitória 335146,224 15.681 1178 47,36345
11 33270000 Flores 1.309 1186
12 33360000 Madail 17483270 12.907 1217 37,37341
13 33170000 Esperantina 7003118,685 5.527 1456 14,97034
14 33190000 Pindaré Mirim 6,46049E+54 34.944 1522 111290,6
15 BAIXO Pedreiras + Pedreiras II 461842,4552 24.193 1226 65,26839
16 33290000 Bacabal 480335,983 25.267 1238 67,88193
17 33380000 Aratoí Grande 4,34086E+53 20.380 1354 7477,483
N – Indicação de estações fluviométricas; Q min – Vazão mínimo.
Fonte: Elaborado pelas autoras, baseado em dados do Relatório Técnico de Regionalização da Sub-bacia
33 (CPRM, 2002)

Os estudos de classificação da paisagem, fundamentados em Bertrand (1972), estão


circunscritos no âmbito dos integradores onde as bacias hidrográficas estão postas en-
quanto geossistema e são resultantes da combinação local e única de fatores e dinâmicas
comuns. A Bacia Hidrográfica do Rio Mearim estende-se em porções dos biomas Cerra-
do e Amazônico, que, por sua vez, associados aos condicionantes regionais bioclimáticos,
geológicos e geomorfológicos, resultam em fisionomias diversificadas classificadas em
Unidades Geoambientais de acordo com IBGE (1997), aqui organizados nos Quadros 4 e 5.

96
AMBIENTE: Percepções 2021

Quadro 4 - Unidades Geoambientais para a Bacia Hidrográfica do Rio Mearim

Unidades Sistemas
Características Características
Geoambientais Naturais
Planos rampeados em níveis altimétricos
que variam de 200 a 500 m. Morros resi-
Patamar das
duais. Domina um clima regional subúmido
Cabeceiras do
com pluviosidade anual variando de 1.000 a
Mearim
1.200 mm e a cobertura vegetal é a Savana
Parte centro-leste da Parque mais a Savana Arbórea Aberta.
área estudada, esta Basaltos da Formação Mosquito; Formação
região, que engloba Sambaíba. Cotas altimétricas 650m na par-
Patamar de
seis sistemas naturais, te leste; Pluviosidade anual entre 1.300 e
Porto Franco/
marca a transição dos 1.600 mm; vegetação Savana em suas três
Fortaleza dos
climas úmidos para fisionomias: Savana Arbórea Aberta e Densa,
Chapadas, Tabulei- Nogueiras
os semiáridos, com e Savana Parque. Ocorrência da atividade
ros e Depressões na
a dominância do tipo agropecuária.
Região da Savana
climático subúmido. Unidade atípica [...]. Várzeas e terraços flu-
Essa transição também viais, dispostos ao longo dos rios principais,
é marcada pela área compostos por aluviões holocênicas e su-
de Tensão Ecológica da jeitos a inundações durante as enchentes.
Savana com a Floresta Cobertura vegetal – domínio Formações
Estacional. Planícies Flu-
Pioneiras com influência fluvial – devastada
viais
pela agricultura de subsistência e/ou pasta-
gem. Ambiente instável com vulnerabilidade
alta e muito alta. Os principais rios onde as
planícies são representadas são o Pindaré,
Grajaú e Mearim.

Posicionada na parte
centro-leste da área
Na parte central, caracteriza-se por relevos
estudada, esta região,
planos com dissecação em lombadas e em
que engloba seis sis-
amplos interflúvios tabulares, talhados em
temas naturais, marca
coberturas detríticas com níveis lateríticos,
Chapada, Tabuleiros a transição dos climas
com [...] cotas altimétricas de 80 a 300 m. A
e Depressão na área úmidos para os semiá-
Chapada de leste, [...] arenitos friáveis da Formação Gra-
de Tensão Ecológica ridos, com a dominân-
Barra do Corda jaú com relevo dissecado em colinas [...], as
da Savana/Floresta cia do tipo climático
litologias basálticas da Formação Mosquito.
Estacional subúmido a semiárido.
Pluviosidade anual de 1.000 a 1.300 mm.
Essa transição também
Savana com a Floresta Semidecidual com
é marcada pela área
trechos devastados para agropecuária e agri-
de Tensão Ecológica da
cultura de subsistência.
Savana com a Floresta
Estacional.

Várzeas e terraços fluviais, dispostos ao


longo dos rios principais, compostos por
aluviões holocênicas e sujeitos a inundações
durante as enchentes. Domínio Formações
Planícies Flu-
Pioneiras com influência fluvial – devastada
viais
pela agricultura de subsistência e/ou pasta-
gem. Ambiente instável com vulnerabilidade
alta e muito alta. Os principais rios onde as
planícies são representadas são o Pindaré,
Grajaú e Mearim.
Fonte: Elaborado pelas autoras, adaptado de IBGE (1997)

97
AMBIENTE: Percepções 2021

Quadro 5 - Unidades Geoambientais para a Bacia Hidrográfica do Rio Mearim

Unidades Sistemas
Características Características
Geoambientais Naturais
Topos planos e vertentes disse-
Na parte central ocorrem dois cadas em coberturas detríticas,
planaltos dissecados, variação níveis lateríticos, idade pleistocê-
climática que vai do úmido na Planalto nica, altitudes 100 a 300 m, limi-
Planaltos na Região porção norte, ao subúmido a Dissecado tados por escarpas.
das Florestas Esta- semiárido no sul. Essa variação do Pindaré/ Pluviosidade anual de 1.000 a
cional e Ombrófila gerou o aparecimento de duas Grajaú 1.800 mm. Na cobertura vegetal
feições florestais na área: a da ocorre o extrativismo vegetal de
Floresta Ombrófila e a da Flores- madeira; e na vegetação secun-
ta Estacional. dária e a agropecuária. A sudeste,
áreas de Savana Arbórea Aberta.
Superfície rampeada, níveis al-
Esta região está situada na parte
timétricos de 70 e 100m, relevo
noroeste do Estado, superfícies
plano com dissecação incipiente
dissecadas em baixas colinas (...)
em lombas e colinas, alguns
que contornam a Baixada Ma-
trechos, com morros residuais.
ranhense, além dos tabuleiros
Formas modeladas nos siltitos,
Superfícies e Tabu- costeiros. Correspondem a cinco Superfície
argilitos e/ou arenitos argilosos
leiros na Região da sistemas naturais. A Floresta Sublitorâ-
da Formação Itapecuru. A dinâ-
Floresta Ombrófila Ombrófila que caracteriza a re- nea de Ba-
mica é de domínio de ambientes
gião é própria de clima úmido cabal
em transição ou tendência à
com chuvas distribuídas durante
instabilidade. As florestas foram
o ano e com temperaturas acima
devastadas para grandes pasta-
de 25° C, o que determina uma
gens. O clima regional é úmido
situação em que as árvores não
com pluviosidade anual de 1.700
perdem suas folhas.
a 1.900 mm.
Áreas inundadas e/ou sujeitas a
inundações, cotas variando de 20
a 55 m, depósitos flúvio-mari-
nhos holocênicos onde dominam
Posicionada na parte norte do
os Gleissolos e Solos Aluviais,
Estado, nas proximidades do li-
vegetação de Formações Pionei-
toral, esta região está inserida no
ras Aluviais. Atividade pesqueira e
domínio das Formações Pionei-
cata de mariscos. Na planície flú-
ras submetidas a um clima úmi-
Planícies e Tabuleiro Baixada vio-marinha com Solos Indiscri-
do. Corresponde às áreas planas
na Região das For- Maranhen- minados de Mangue e, nos planos
em cotas altimétricas que variam
mações Pioneiras. se interfluviais, cobertura vegetal é
de 0 a 50 m, talhadas sobre os
vegetação secundária da Floresta
depósitos sedimentares incon-
mais Formações Pioneiras Alu-
solidados quaternários. Abrange
viais. Ocupadas pela agropecuária
três sistemas naturais.
com criação de bubalinos. Clima
úmido com pluviosidade anual de
1.700 a 1.900 mm. Ambientes
instáveis com vulnerabilidade
muito alta.
Fonte: Elaborado pelas autoras, adaptado de IBGE (1997)

98
AMBIENTE: Percepções 2021

3.3 MODELO CONCEITUAL SOBRE A DINÂMICA NATURAL NA BACIA


HIDROGRÁFICA DO RIO MEARIM
Na perspectiva de análise sistêmica – teorias integradoras, interdisciplinares –, ba-
seando a metodologia ecodinâmica de Tricart (1977) à bacia hidrográfica do Mearim, é
possível identificar os seguintes processos e características naturais, sintetizados na Fi-
gura 02.

Figura 2 - Modelo Conceitual da Dinâmica na Bacia Hidrográfica do Rio Mearim, MA

Fonte: Elaborado pelas autoras

A conformação geológica característica da Bacia Hidrográfica do Rio Mearim sofre in-


terferências de variáveis climáticas remotas e atuais – recebendo fluxos de energia –, em
ondas de calor por radiação solar e temperaturas médias elevadas e circulação da água,
em diferentes estágios físicos – vapor d’água, umidade do ar e precipitações pluviomé-
tricas, em decorrência das condições climáticas aí predominantes. Estas condições litoló-
gicas inter-relacionadas apresentadas resultam no modelamento das formas de relevo e
composição de ambientes erosionais e deposicionais, pela atuação de agentes intempéri-

99
AMBIENTE: Percepções 2021

cos/denudacionais e sedimentológicos, com transporte e acumulação de material mobili-


zado e/ou solubilizado, dispostos em diferentes níveis altimétricos revelados em formas
que variam entre Planaltos, Chapadas, Tabuleiros entremeados por Depressões, com vale
dos grandes rios. Em níveis topográficos mais baixos encontram-se a Depressão sublito-
rânea até as Planícies de inundação – fluvial, lacustre e de maré – denominada de Baixada
Maranhense.

Essa mesma dinâmica aciona também a pedogênese, quando encontramos na área


da bacia hidrográfica, entre os solos predominantes, Latossolo amarelo Distrófico, Argis-
solo vermelho-amarelo Distrófico, Argissolo vermelho-amarelo Eutrófico e Plintossolos
háplicos Distróficos. E identificando entre suas características: avançado estágio de in-
temperização, intenso processo de lixiviação, pobreza em nutrientes naturais consequen-
temente relacionados às elevadas temperaturas e consideráveis volumes pluviométricos,
responsáveis pela intensificação de intemperismos físicos e químicos, sobre as superfícies
planialtimétricas, expressando a relação com profundidades ou caráter rasos. Assim po-
dendo ser distribuídos, respectivamente, de acordo com a correlação das feições a seguir:
topos de planaltos, chapadas e tabuleiros; baixios de depressões relativas e vertentes,
rampas e frentes de cuestas. Já em níveis topográficos de planícies alagadiças – fluviais,
lacustres e de marés –, destacam-se a influência de fenômenos químicos, caracterizados,
enquanto solos, como hidromórficos, drenagem com algum impedimento e condições fa-
voráveis à inundação, sujeitos aos processos de evaporação e, quando associado à proxi-
midade do mar, pode elevar as concentrações de sais solúveis.

A distribuição da cobertura vegetacional natural, seguindo essa perspectiva ecodinâ-


mica, tem reflexo no caráter fisionômico com a composição de diferentes mosaicos, loca-
lizando-se as fisionomias de Cerradão, Cerrado e Cerrado e campos sujos (Savana e suas
variações), de acordo com a variação altimétrica e variáveis de maior ou menor umidade do
ar e do solo. Com registros de gradientes fisionômicos entre os pendimentos em direção
a canais fluviais, onde ocorrem a composição de matas ciliares e a presença de estruturas
arbóreas e palmeiras – buriti (Mauritia flexuosa), nos demais setores dessa bacia hidrográ-
fica – em seu médio ao baixo curso – é possível identificar, respectivamente, formações de
florestas semideciduais, vegetação secundária (áreas naturais de Florestas Ombrófilas) e
Formações Pioneiras Aluviais (campos alagados).

100
AMBIENTE: Percepções 2021

Dentro dessa dinâmica integrada, o geossistema fluvial em foco tem no canal prin-
cipal o rio Mearim – Izu, rio das águas pardacentas, chamada pelos índios Gajajaras – que
pela margem esquerda tem como destaque os rios Grajaú Pindaré e Zitiua e, na esquerda,
rios Corda e Flores. São rios perenes, extensos e volumosos; pelo regime tropical e confor-
mação morfológica as águas sobem em cheias naturais, em períodos chuvosos de março,
abril e maio. E, nas áreas da bacia, com intenso grau de ocupação e uso do solo, manifes-
tam-se em eventos de danos socioeconômicos em potencial.

3.4 CENÁRIO PARA MODELO CONCEITUAL DE VULNERABILIDADES NA BACIA


HIDROGRÁFICA DO RIO MEARIM
A partir da dinâmica natural e socioeconômica posta sobre a Bacia Hidrográfica do
Rio Mearim, destacamos fenômenos como indicativos de vulnerabilidades ambientais,
sistematizados nos eixos temáticos, representados na Figura 3.

Figura 3 - Modelo Conceitual de Vulnerabilidades na Bacia Hidrográfica do Rio Mearim, MA

Fonte: Elaborado pelas autoras

101
AMBIENTE: Percepções 2021

Diante do cenário apresentado, destacamos três grandes eixos de vulnerabilidades


ambientais, para a Bacia Hidrográfica do Rio Mearim:

• Alterações sobre o regime hidrológico; aumento de temperatura e emissões de


gases do efeito estufa (CO2, N2O, CH4, outros) coadunam para modificações no
ritmo e intensidade de variáveis climáticas locais, regionais, entre elas, aumento
de temperatura nas áreas de aglomerações urbanas e no volume e distribuição
da pluviosidade.

• A retirada da cobertura vegetal natural provoca modificação nos padrões fisio-


nômicos, tornando-se mais abertas, menor porte e características mais secas,
refletindo perdas da biodiversidade e mudanças na biocenose.

• Ambiente mais seco é forte indicativo de redução nos fluxos do balanço hídrico no
geossistema em análise, levando à redução no nível do volume de água no siste-
ma fluvial, consequentemente desencadeando impactos sobre a disponibilidade
hídrica em quantidade e qualidade, com fortes limitações sobre uso e consumo
nas atividades socioeconômicas e culturais.

É importante destacar fenômenos que se configuram enquanto fatores de vulnerabi-


lidades ambientais nesse cenário, podendo destacar a intensificação do uso dos recursos
hídricos, o uso do solo e a ocupação desordenada do espaço urbano.

Nesse sentido, estudos como de Tritin (2002), Ab’Saber e Muller-Plantenberg (2002),


Tunner et al. (2003), sobre impacto e vulnerabilidade ambiental e as condições ecossistê-
micas aqui apresentadas, através das informações técnicas: IBGE (1997), CPRM (CORREIA
FILHO et al., 2011), Porto, Motta e Souza (2019), ANA (2021), entre outras, nos levam a
considerar que a intensificação na forma crescente de pressão sobre múltiplos usos dos
recursos naturais, a partir do último século até os nossos dias, não levam em considera-
ção a diversificação das variáveis ecossistêmicas existentes na Bacia Hidrográfica do Rio
Mearim.

Esse avanço indiscriminado sobre diferentes morfoestruturas e pedogêneses pro-


vocam os fenômenos de intemperização e lixiviação, consequentes processos erosionais,
carreando sedimentos pelas vertentes aos canais da rede fluvial, resultando em perdas de

102
AMBIENTE: Percepções 2021

nutrientes nos solos e rios; concomitantemente havendo a supressão da cobertura, que


não só fragmenta e destrói habitats, como provoca mudanças sobre respiração e albeto
nos ecossistemas da bacia hidrográfica, sendo potencializadas as emissões de gases do
efeito estufa, que, por sua vez, contribuem para as alterações hidroclimáticas, ou seja,
aumento de temperaturas no período de estiagem, intensificação pluviométrica (fortes e
rápidas) no período chuvoso, contribuindo respectivamente para eventos de baixas vazões
(secas) e altas vazões (enchentes) fluviais, com pontos críticos das vazões médias para rios
de regime tropical.

Portanto, a ocorrência concomitante e inter-relacionada de tais processos constitui


fatores de vulnerabilidades à degradação/deterioração da qualidade ecossistêmica na Ba-
cia Hidrográfica do Rio Mearim.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O contexto das finalidades desse estudo – Bacia Hidrográfica do Rio Mearim: cená-
rio de impactos e vulnerabilidades ambientais – coadunou para o entendimento de que
a episteme integradora, interdisciplinar nas análises e trabalhos das ciências ambientais
torna-se basilar para a sistematização de raciocínio lógico e percurso metodológico a ser
desenvolvido (seguido) por aqueles que tratam da complexidade ambiental de ecossiste-
mas, como bacias hidrográficas.

Sendo assim, a fim de melhor indicar níveis de qualidade ou vulnerabilidade ambien-


tal, as análises que envolvem as dinâmicas sobre as questões ambientais nas bacias hi-
drográficas devem considerar uma visão sistêmica e holística para o conjunto de fatores,
processos e fenômenos naturais, socioeconômicos, e demais ordens.

Portanto, bacias hidrográficas em condições semelhantes às da bacia hidrográfica do


Rio Mearim, têm recebido, de maneira cada vez mais intensa e em períodos cada vez mais
curtos, fenômenos desencadeados por dinâmicas que refletem o desequilíbrio ambiental
em potencial.

Esses fenômenos são influenciados por fatores, como as variáveis climáticas atuais,
que desencadeiam mecanismos, tais como: a circulação e variação de aportes fluviométri-

103
AMBIENTE: Percepções 2021

cos “desnivelados” em períodos chuvosos e estiagem, que em circuito sistêmico – entra-


das e saídas, alimentações e retroalimentações – incidem sobre superfícies geomórficas e
pedogênicas proporcionando movimentações de cargas sedimentares – produção, trans-
porte e deposição – com tendências à tornarem-se cada vez mais volumosas, potencia-
lizando os solapamentos ou os arrastamentos sobre as vertentes e a cobertura vegetal,
de comunidades aí constituídas; expressando, assim, a degradação físico-ambiental que
potencialmente, em circuitos dinâmicos desajustados, tendem a espalhar-se pelo geos-
sistema em foco.

Nesse arcabouço epistemológico, as atividades antropogênicas – com múltiplos usos


dos recursos naturais nas bacias hidrográficas – sobressaem-se dentre os fatores de de-
sestabilização do equilíbrio ecossistêmico; por conseguinte, também são postos enquanto
fenômenos potenciais indicadores de deterioração/degradação, colocando a bacia hidro-
gráfica em condições de vulnerabilidade contínua, diante dos consequentes e recorrentes
problemas em diferentes aspectos e ordens.

Por conseguinte, metodologias postas em perspectivas, como a do presente estu-


do, são importantes mecanismos de suporte para identificação e localização pontual e
em conjunto de eixos, categorias, fluxos de matéria e energia, entre outros componentes,
servindo, assim, como referências aos tomadores de decisões, empreendedores em dife-
rentes escalas e para a sociedade em geral, na perspectiva das devidas e reais mitigações
– com mudanças de posturas e ações – dos riscos potenciais de alterações e impactos
ambientais, buscando, assim, evitar ou diminuir os impactos e vulnerabilidades decorren-
tes para não colapsar o sistema.

Por fim, a estruturação de metodologias dentro da perspectiva ora apresentada con-


figura também como importante mecanismo de indicação e instrumentalização para sus-
tentabilidade ambiental em bacia hidrográfica e seus desdobramentos sobre a dinâmica
local regional em escala planetária.

104
AMBIENTE: Percepções 2021

REFERÊNCIAS
AB’SABER, A. N.; MULLER-PLANTENBERG, C. Prefácio. In: AB’SABER, A. N.; MULLER-PLAN-
TENBERG, C. (Org). Previsão de Impactos: o estudo de impacto ambiental no leste, oeste
e sul – experiências no Brasil, na Rússia e na Alemanha. 2a ed. São Paulo: EDUSP, 2002. p.
15-19.

ANA - AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS E SANEAMENTO BÁSICO. Conjuntura dos recursos


hídricos no Brasil: regiões hidrográficas brasileiras. Edição Especial. Brasília: ANA, 2015.
Disponível em: https://www.snirh.gov.br/portal/centrais-de-conteudos/conjuntura-dos-re-
cursos-hidricos/conjuntura_informe_2015.pdf. Acesso em: 04 abr. 2019.

ANA - AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS E SANEAMENTO BÁSICO. Portal HidroWeb - Plata-


forma de informações e dados hidrometeorológicos das bacias hidrográficas do Brasil. 2021.
Disponível em: https://www.snirh.gov.br/hidroweb. Acesso em: 20 ago. 2021.

BELLEN, H. M. Indicadores de Sustentabilidade: uma análise comparativa. Rio de Janeiro:


FGV, 2005.

BERTRAND, G. Paisagem e geografia física global: esboço metodológico. Caderno de Ciên-


cias da Terra, n. 13, p. 1-27, 1972.

BRASIL. CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (CONAMA). Resolução nº 1, de 23 de ja-


neiro de 1986. Dispõe sobre critérios básicos e diretrizes gerais para a avaliação de impacto
ambiental. Diário Oficial da União, Brasília, de 17 de fevereiro de 1986.

BRITO, F. A.; CÂMARA, J. B. D. Democratização e gestão ambiental: em busca do desenvolvi-


mento sustentável. 3a ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

CAPRA, F. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo:
Editora Cultrix, 1996. Disponível em: http://www.communita.com.br/assets/teiadavidafrit-
jofcapra.pdf. Acesso em: 20 ago. 2021.

CASSETI, V. Elementos de Geomorfologia. Goiânia: Editora da UFG, 1994.

CODEVASF. COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO DOS VALES DO SÃO FRANCISCO E DO


PARNAÍBA. Plano Nascente Mearim. In: PORTO, Leila Lopes da Motta Alves; MOTTA, Eduardo
Jorge de Oliveira; SOUZA, Camilo Cavalcante de. Plano Nascente Mearim - Plano de preser-
vação e recuperação de nascentes da bacia do rio Mearim. 2. ed. Brasília: CODEVASF, 2019.
Disponível em: https://www.codevasf.gov.br/linhas-de-negocio/revitalizacao/protecao-de-

105
AMBIENTE: Percepções 2021

-nascentes-e-conservacao-de-agua-solo-e-recursos-florestais/arquivos/plano-nascente-
-mearim.pdf. Acesso em: 25 abr. 2021.

COELHO NETTO, A. Hidrologia de encosta na interface com a Geomorfologia. In: GUERRA, A.


T.; CUNHA, S. B. (Org.). Geomorfologia: uma atualização de bases e conceitos. 2a ed. Rio de
Janeiro: Bertrand Brasil, 1995. p. 93 -148.

CORREIA FILHO, F. L. et al. (Org.). Projeto Cadastro de Fontes de Abastecimento por Água
Subterrânea, estado do Maranhão: relatório diagnóstico do município de Grajaú. Teresina:
CPRM - Serviço Geológico do Brasil, 2011. Disponível em: https://rigeo.cprm.gov.br/xmlui/
handle/doc/15482. Acesso em: 10 jan. 2021.

CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL. Relatório-síntese do trabalho de Regionalização


de Vazões da Sub-bacia 33. Fortaleza: CPRM, 2002. Disponível em: https://rigeo.cprm.gov.
br/handle/doc/20931. Acesso em: 20 mar. 2021.

CHRISTOFOLETTI, A. Geomorfologia. 2ª ed. Rev. e Apl. São Paulo: Edgard Blucher, 1986.

CHRISTOFOLETTI, A. Modelagem de Sistemas Ambientais. 1ª ed. São Paulo: Edgard Blucher,


2007.

DONATO, H.; DONATO, M. Etapas na Condução de uma Revisão Sistemática. Acta Médica
Portuguesa, v. 32, n. 3, p. 227-235, 2019.

FIERZ, M. S. M. Abordagens sistêmicas do equilíbrio dinâmico da fragilidade ambiental


do litoral do estado de São Paulo: contribuição à geomorfologia da planície costeira. 2008.
394 p. Tese (Doutorado em Geografia) - Programa de Pós-Graduação em Geografia Física,
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo,
2008. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8135/tde-17032009-
141618/pt-br.php. Acesso em: 20 mar. 2021.

GARCEZ, L. N.; ALVAREZ, G. A. Hidrologia. 2ª ed. São Paulo: Edgard Blucher, 2004.

GUERRA, A. T. Dicionário geológico-geomorfológico. 7ª ed. Rio de Janeiro: IBGE; 1987.

IBGE. Zoneamento geoambiental do estado do Maranhão: diretrizes gerais para ordenação


territorial. Salvador: IBGE, 1997. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/
livros/liv95885.pdf. Acesso em: 15 jan. 2021.

KRENAK, A. O Amanhã não está à venda. São Paulo: Companhia das Letras, 2020. Disponível
em: https://ds.saudeindigena.icict.fiocruz.br/bitstream/bvs. Acesso em: 20 mar. 2021.

106
AMBIENTE: Percepções 2021

LEFF, E. Epistemologia Ambiental. São Paulo: Cortez, 2001.

LIMA, A. S. Análise geomorfológica da Bacia Hidrográfica do Rio Mearim – MA a partir do


quadro geológico regional. 2013. 142 p. Tese (Doutorado em Análise Ambiental) - Progra-
ma de Pós-graduação em Geografia, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,
2013.

LIMA, E. C.; SILVA, E. V. Estudos geossistêmicos aplicados a bacias hidrográficas. Revista


Equador, v. 4, n. 4, p. 3-20, 2015.

LOPES, L. G. N.; SILVA, A. G.; GOULARTH, A. C. O. A Teoria Geral do Sistema e suas aplicações
nas ciências naturais. Natureza on line, v. 13, n. 1, p. 1-5. 2015.

MACIEL, S. A. Análise da relação chuva-vazão na bacia Hidrográfica do Rio Paranaíba, Bra-


sil. 2017. 214 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Programa de Pós-Graduação em
Geografia, Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2017.
Disponível em: https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/18164/1/AnaliseRelacao-
Chuva.pdf. Acesso em: 22 abr. 2021.

MARANHÃO. Diagnóstico do Plano Diretor da Bacia Hidrográfica do Mearim – MA. São


Luís: Secretaria de Estado das Cidades e Desenvolvimento Urbano do Maranhão, 2014. Dis-
ponível em: https://secid.ma.gov.br/2014/07/26. Acesso em: 22 ago. 2020.

MARANHÃO/UEMA/NUGEO. Bacias Hidrográficas e Climatologia no Maranhão. São Luís:


UEMA/NUGEO, 2016. Disponível em: https://www.nugeo.uema.br/upnugeo/publicacoes.
Acesso em: 22 ago. 2020.

MARANHÃO/SEMATUR. Diagnóstico dos principais problemas ambientais do estado do


Maranhão. São Luis: PNMA- SEMATUR, 1991.

MARQUES NETO, R. A abordagem sistêmica e os estudos geomorfológicos: algumas inter-


pretações e possibilidades de aplicação. Geografia. v. 17, n. 2, p. 67-87, 2008.

MENA, F. “Pandemia é uma resposta biológica da natureza”, diz FÍSICO Fritjof Capra. São
Paulo: Jornal Folha de São Paulo. Reportagem de 9/08/2020. Entrevista da 2a. Disponível
em: www1.folha.uol.com.br. Acesso em: 22 ago. 2020.

NAGHETTINI, M.; PINTO, É. J. A. Hidrologia estatística. Belo Horizonte: CPRM, 2007. Disponí-
vel em: https://rigeo.cprm.gov.br/xmlui/handle/doc/454. Acesso em: 20 mar. 2021.

ODUM, E. Ecologia. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan. 1983. 434 p.

107
AMBIENTE: Percepções 2021

PAZ, M. P.; ROSÁRIO, J. M. Fundamentos da Teoria do Conhecimento aplicados ao desen-


volvimento científico e tecnológico do País. Parceria Estratégica, sessão 2 - Ciência da In-
formação, v. 23, n. 46, p. 91-132, 2018. Disponível em: http://seer.cgee.org.br/index.php/
parcerias_estrategicas/article/viewFile/892/810. Acesso em: 20 mar. 2021.

PAHO.ORG. ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DE SAÚDE. Disponível em: https://www.paho.


org/pt/brasil. Acesso em: 20 ago. 2021.

PENTEADO, M. M. Fundamentos de Geomorfologia. 3a ed. Rio de Janeiro: IBGE, 1983.

PORTO, L. L. M. A.; MOTTA, E. J. O. SOUZA, C. C. (Orgs.). Plano Nascente Mearim: plano de


preservação e recuperação de nascentes da bacia hidrográfica do rio Mearim. 2ª ed. Brasília:
Codevasf, 2019. Disponível em: https://www.codevasf.gov.br/linhas-de-negocio/revitaliza-
cao/protecao-de-nascentes-e-conservacao-de-agua-solo-e-recursos-florestais/arquivos/
plano-nascente-mearim.pdf. Acesso em: 10 jan. 2021.

SAMPAIO, R. F.; MANCINI, M. C. Estudos de revisão sistemática: um guia para síntese criterio-
sa da evidência científica. Brazilian Journal of Physical Therapy, v. 11, n. 1, p. 77-82, 2007.

SILVA, R. C. Estudo da dinâmica da fragilidade ambiental na Bacia Hidrográfica do rio Gra-


vataí, RS. 2016. 307 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Programa de Pós-graduação em
Geografia, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2016. Disponível em: https://repositorio.
ufba.br/handle/ri/20630. Acesso em: 21 abr. 2021.

SILVA, J. L.; TUNDISI, J. G. Projeto de Ciência para o Brasil. Rio de Janeiro: Academia Brasileira
de Ciências, 2018. Disponível em: http://www.abc.org.br/wpcontent/uploads/2018/05/Pro-
jeto-de-Ciencia-para-o-Brasil.pdf. Acesso em: 20 ago. 2021.

SPINDLER, E. A. Primeiro pensar, depois planejar e depois agir ecologicamente. In: AB’SABER,
A. N; MULLER-PLANTENBERG, C. (Org). Previsão de Impactos: o estudo de impacto ambien-
tal no leste, oeste e sul – experiências no Brasil, na Rússia e na Alemanha. 2a ed. São Paulo:
EDUSP, 2002. p. 13-14.

TREPL, L. O que pode significar “Impacto Ambiental”. In: AB’SABER, A. N.; MÜLLER-PAN-
TENBER, C. (Org.). Previsão de Impactos Ambientais: o estudo de impacto ambiental no les-
te, oeste e sul - experiências no Brasil, na Rússia e na Alemanha. 2ª ed. São Paulo: EDUSP,
2002, p. 329-350.

TRICART, J. Ecodinâmica. Rio de Janeiro: IBGE, Diretoria Técnica, SPREN - Superintendência


de Recursos Naturais e Meio Ambiente, 1977.

108
AMBIENTE: Percepções 2021

TRITIN, J. O estudo de impacto ambiental necessita de pactos. In: AB’SABER, A. N;


MULLER-PLANTENBERG, C. (Org). Previsão de Impactos: o estudo de impacto ambiental no
leste, oeste e sul – experiências no Brasil, na Rússia e na Alemanha. 2a ed. São Paulo: EDUSP,
2002. p. 11-12.

TUNNER, B. L. et al. A framework for vulnerability analysis in sustainability science. Proceed-


ings of the National Academy of Sciences, v. 100, n. 14. p. 8074 -8079, 2013.

TUNDISI, J. G.; TUNDISI, T. M. The ecology of UHE Carlos Botelho (Lobo-Broa Reservoir) and
its watershed, São Paulo, Brazil. Freshwater Reviws, v. 6, p. 75-91, 2014.

TUNDISI, J. G.; TUNDISI, T. M. Integrating ecohydrology, water management, and watershed


economy: case studies from Brazill. Ecohydrology & Hydrobiology, v. 16, p. 83-91, 2016.

VAL, A. et al. Água em Foco. In: SILVA, J. L.; TUNDISI, J. G. Projeto de Ciência para o Brasil. Rio
de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 2018. p. 283-299. Disponível em: http://www.
abc.org.br/wp-content/uploads/2018/05/Projeto-de-Ciencia-para-o-Brasil.pdf. Acesso
em: 20 ago. 2021.

109
5
A PANDEMIA POR
COVID-19 E OS IMPACTOS
NA GERAÇÃO E DESCARTE
DE RESÍDUOS SÓLIDOS
DOMÉSTICOS

Camila Favretto
Jenifer Panizzon
Marcos Tenedini
Luciano Gonçalves
Haide Maria Hupffer
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUÇÃO

Fatores socioeconômicos, como o rápido crescimento populacional, a expansão ur-


bana, a industrialização e a migração de áreas rurais para urbanas, reforçam o crescente
aumento de resíduos sólidos (RS) em cidades e bairros, tornando-o um problema am-
biental público (KEBEDE; ALENE; ENDALEMAW, 2021). A má gestão de resíduos sólidos
urbanos (RSU) pode levar à propagação de vetores de doenças (que podem carregar vírus
e bactérias), odor fétido devido, à degradação orgânica, queima de biomassa, levando a
problemas de poluição do ar, lixiviação de compostos tóxicos, que afetam a qualidade das
águas subterrâneas, mudanças climáticas, degradação da paisagem existente e contami-
nação do solo e corpos d’água superficiais (ALSHEHREI; AMEEN, 2021; BABU; VERAMEN-
DI; RENE, 2021). Com isso, torna-se parte fundamental do sistema de gerenciamento de
resíduos uma disposição final adequada.

A cada ano, há um aumento de aproximadamente 83 milhões de pessoas na popu-


lação mundial e, em 2017, o Brasil figurava como o quinto país mais populoso do mun-
do, correspondendo a 209 milhões de pessoas (SANTOS et al., 2020). Apesar de ter caído
uma posição, o País conta atualmente com mais de 211 milhões de habitantes, segundo
estimativa do Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE, 2020). Esse aumento
implica em uma maior demanda de recursos básicos para a manutenção da vida huma-
na, como água potável, saneamento e alimento. No entanto, para suprir as necessidades
contemporâneas, são diversos os efeitos advindos da exploração da natureza, como a di-
minuição de fontes de recursos não renováveis e a perda da biodiversidade (SANTOS et
al., 2020). Consequentemente, um maior consumo é, por sua vez, acompanhado por uma
grande quantidade de resíduos gerados.

No ano de 2020, com a pandemia de Covid-19, causada pelo coronavírus (SARS-


-CoV-2), a sociedade e a economia tiveram que mudar seus hábitos, adotando medidas
rigorosas para controlar a disseminação desse vírus. A proteção de vidas e a recuperação
de meios de subsistência estão em primeiro lugar nas políticas e ações sociais, contudo,
a gestão adequada de resíduos domésticos, de saúde e dos considerados perigosos são
serviços essenciais para minimizar possíveis impactos secundários sobre a saúde e o meio
ambiente (UNEP, 2020). De acordo com Sarkodie e Owusu (2021), a pandemia reduziu a
poluição do ar, o ruído ambiental e melhorou a biodiversidade e os locais turísticos. Porém,

111
AMBIENTE: Percepções 2021

os impactos causados pela permanência em casa e pela gestão inadequada de resíduos


sólidos são considerados alarmantes, devido ao descarte incorreto de aventais, luvas,
máscaras e outros equipamentos de proteção, tanto em residências quanto em instala-
ções de saúde.

Através do despreparo notório dos governantes com a situação pandêmica, a ge-


ração de resíduos sólidos domésticos, que já sofre um crescimento exacerbado em de-
corrência do aumento demográfico, cresceu no período da pandemia devido ao uso dos
“telesserviços” e do uso de descartáveis diante da situação de isolamento, gerando um
impacto significativo na coleta e manuseio destes resíduos. Dentro deste modelo, pode-
-se observar que a pandemia age na camada mais baixa da sociedade, onde sobrevivem
os catadores que na grande maioria são sexagenários e com diversas comorbidades, que
não conseguem parar suas atividades justamente pela necessidade de sua subsistência e
a não “suspensão” de atividades (MAIA et al., 2020).

A Organização Mundial da Saúde (OMS) postula que o isolamento social é a ferramen-


ta de prevenção ao contágio mais eficaz, até o momento. No Brasil, mediante o Decreto
Federal n° 10.282/2020, foram estabelecidos os serviços públicos e atividades essenciais
no país, o que desencadeou mudanças profundas na sociedade, sejam de ordem psicosso-
ciais ou de ordem econômica (MAIA et al., 2020). Logo, os serviços de coleta e tratamento
de resíduos, considerando os recicláveis, estão no rol de atividades imprescindíveis e que
não poderiam ser paralisadas.

Observa-se que há uma emergência em relação aos resíduos gerados devido à pro-
dução incomum e exponenciada pela pandemia (MA et al., 2020). A falha em gerenciar
adequadamente os resíduos gerados em residências pode aumentar a disseminação do
Covid-19 por meio da transmissão secundária. Além disso, pode haver sérias consequên-
cias para os países em desenvolvimento sem tecnologias padrão de gestão de resíduos e
políticas adequadas para conter a pandemia (SARKODIE; OWUSU, 2020).

Pensando nisso, foram publicadas algumas recomendações a partir do Relatório


Waste Management during the Covid-19 Pandemic, elaborado pelas Nações Unidas (UNEP,
2020). No Brasil, um documento intitulado Recomendações para a Gestão de Resíduos Sóli-
dos durante a Pandemia de Coronavírus foi elaborado pela Associação Brasileira de Empre-

112
AMBIENTE: Percepções 2021

sas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (ABRELPE, 2020a). As publicações trazem


informações práticas, sugestões e diretrizes tanto acerca do gerenciamento de resíduos
de saúde, bem como para a gestão municipal de resíduos sólidos, considerando as restri-
ções e limitações impostas pelo cenário pandêmico.

Nesse sentido, o objetivo geral deste estudo consistiu em entender o impacto gerado
pela produção de resíduos sólidos urbanos, mais especificamente os resíduos domicilia-
res, durante a pandemia, e apresentar os resultados de uma pesquisa de opinião, a partir
da aplicação de um questionário, sobre os fatores relacionados à geração, à informação e
ao descarte de resíduos domésticos contaminados durante a pandemia, visando a, então,
avaliar os impactos da Covid-19 na gestão dos resíduos sólidos domésticos, ao relacio-
nar as medidas tomadas pelo público respondente com as recomendações das UNEP e
ABRELPE.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 PANORAMA GERAL DOS RESÍDUOS SÓLIDOS


A palavra resíduo representa qualquer material gerado pela atividade humana utili-
zando recursos naturais que são transformados em produtos industrializados e, após sua
vida, útil são descartados, sendo classificados em resíduo municipal, clínico, perigoso e
radioativo. Os RSU são resíduos descartados de áreas residenciais, atividades comerciais
e industriais, incluindo alimentos, papéis, plásticos, vidros, têxteis, metais, madeiras, entre
outros (AL-GHOUTI et al., 2021; KEBEDE; ALENE; ENDALEMAW, 2021; YAASHIKAA et al.,
2020; DE OLIVEIRA et al., 2021). Mesmo com legislação que obriga a segregação entre re-
síduos industriais, comerciais e domésticos, devido ao custo para tal segregação, e/ou pela
não existência de benefícios ou benesses aos empresários, a destinação acaba de forma
comum, aos aterros domésticos (ABRELPE, 2020b). Devido ao aumento desordenado da
população, urbanização e industrialização, os RSU têm se tornado um grave problema am-
biental, e a má gestão desses resíduos impacta em contaminação de águas subterrâneas,
solos, poluição do ar e aquecimento global, devido à emissão de gases de efeito estufa
(AL-GHOUTI et al., 2021; ALSHEHREI; AMEEN, 2021; BABU; VERAMENDI; RENE, 2021; DE
OLIVEIRA et al., 2021; SAXENA et al., 2021).

113
AMBIENTE: Percepções 2021

A gestão de resíduos sólidos inclui várias atividades e depende de cada país, cidade
ou estado. As etapas básicas envolvidas no sistema de gerenciamento de resíduos são:
segregação de resíduos na fonte, quando é feita a separação desses em diferentes ca-
tegorias (orgânico, plástico, vidro, papel, metal, entre outros); coleta; transporte para um
local intermediário, aterro ou reciclagem; tratamento e eliminação (SAXENA et al., 2021).
A produção anual de resíduos sólidos municipais globais é de cerca de 2,01 bilhões de to-
neladas, e a taxa mundial de geração de resíduos varia de 0,11 a 4,54 kg/pessoa/dia. De
acordo com Gutierrez-Gomez et al. (2021), aproximadamente 40% dos resíduos sólidos ur-
banos gerados no mundo são tratados em aterros sanitários, enquanto 30% são dispostos
em lixões a céu aberto, contribuindo de 3 a 5% na emissão global de gases de efeito estufa
(MIR et al., 2021; ALSHEHREI; AMEEN, 2021; AL-GHOUTI et al., 2021).

Alshehrei e Ameen (2021) relatam em seu estudo que o Pacífico e o Leste Asiático
são os que apresentam a maior geração de resíduos no mundo, de forma que 23% de todo
o volume global é produzido nestas regiões. A África do Norte e o Oriente Médio têm as
menores taxas (6,6%.) Em relação à coleta de resíduos, países desenvolvidos localizados
em continentes como Europa, América do Norte e Ásia Central coletam 90% dos resíduos
gerados, ao passo que países em desenvolvimento coletam em torno de 48%. Na América
Latina e na região do Caribe, cerca de 50% dos resíduos gerados são de alimentos e resí-
duos verdes, seguidos de papel e papelão (13%) e plástico (12%) (GUTIERREZ-GOMEZ et al.,
2021). No ano de 2018, a produção de plástico atingiu 359 milhões de toneladas no mun-
do, setor no qual a Ásia foi o maior produtor com 50,1% e a América Latina (México, Brasil,
Argentina e Colômbia) o menor produtor, responsável por 4% da produção e fabricação de
produtos plásticos voltados para indústrias de embalagens (ARDUSSO et al., 2021).

No Brasil existe uma normativa da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT,


a NBR 10004:2004, a qual dispõe sobre RS e semissólidos oriundos de atividades in-
dustriais, domésticas, hospitalares, comerciais, agrícolas, de serviços e varredura e suas
devidas classificações para que os resíduos sejam gerados de forma adequada. Classe I:
perigosos; classe II: não perigosos; classe II A: não inerte; classe II B: inerte, levando em
consideração o risco potencial para a saúde pública e o meio ambiente (DE OLIVEIRA et al.,
2021). No ano de 2010, foi sancionada a Lei Federal 12.305, que instituiu a Política Nacio-
nal de Resíduos sólidos com o objetivo de promover uma gestão integrada e ambiental-

114
AMBIENTE: Percepções 2021

mente correta. Essa lei preconiza que a gestão de RS deve seguir a ordem de prioridade da
seguinte forma: não geração, redução, reúso, reciclagem, tratamento de resíduo sólido e
destinação final ambientalmente adequada (BRASIL, 2010).

No ano de 2019, de acordo com a ABRELPE, foram geradas 79 milhões de toneladas


de RSU no Brasil, dos quais 40,5% têm destino inadequado, ou seja, lixões e aterros con-
trolados, que não possuem medidas necessárias para proteger o meio ambiente contra
danos e degradações, e os 59,5% restantes têm como destino os aterros sanitários. Ainda,
segundo Gutierrez-Gomez et al. (2021), a disposição de resíduos em aterros sanitários
aumenta 1,9% na emissão de gases de efeito estufa no Brasil. O estado de Roraima, lo-
calizado na região Norte do país, foi o estado que gerou menos resíduos no ano de 2019,
0,30% do total, enquanto a cidade de São Paulo, localizada na região Sudeste do Brasil, foi
a responsável pela maior geração de resíduos no país, com 29% do total. Na região Sul, dos
1191 municípios, apenas sete (2%) não contam com iniciativas de coleta seletiva, tendo o
melhor índice do país (ABRELPE, 2020b). Os últimos dados sobre geração de resíduos só-
lidos são de 2019, tanto o Sistema Nacional de Informação sobre o Saneamento (SINIRS)
como a ABRELPE indicam que é possível perceber um aumento cada vez maior da quan-
tidade de resíduos gerados. A defasagem de informação está relacionada à pandemia da
Covid-19, já que parte de diversos órgãos públicos, devido à pandemia, não tiveram seus
dados atualizados do ano de 2020 até junho de 2021.

2.2 EFEITOS DA PANDEMIA DA COVID-19 NO GERENCIAMENTO E GESTÃO


DOS RESÍDUOS SÓLIDOS
A Covid-19 é caracterizada como uma síndrome respiratória aguda grave que incide
em humanos e é causada pelo vírus SARS-CoV-2 (BOJKOVA et al., 2020; YAN et al., 2020),
sendo a transmissão respiratória sua principal via de infecção (WU et al., 2020), poden-
do ser transmitida por contato direto ou indireto pessoa a pessoa (KITAJIMA et al., 2020;
MOHSENI et al., 2020) e por superfícies e objetos contaminados.

A Covid-19 apresentou rápida disseminação pelo mundo e, em função disso, ela foi
oficialmente declarada como uma pandemia pela OMS em 12 de março de 2020 (MOH-
SENI et al., 2020). Os números totais de casos acumulados de Covid-19, desde o início da
pandemia até o dia 09 de junho de 2022, mostram que está presente em mais de 220

115
AMBIENTE: Percepções 2021

países, sendo registrado no mundo mais de 530 milhões de casos, com aproximadamente
511 milhões de indivíduos recuperados e mais de 6,3 milhões de óbitos (WORLDOME-
TERS, 2022). Ainda, diariamente, os números de novos infectados e óbitos continuam au-
mentando.

A pandemia tornou-se uma emergência de saúde pública, refletindo em enormes


desafios para governos, empresas, comunidades locais e público em geral (GREENBERG et
al., 2020), com repercussões além da ordem biomédica e epidemiológica, ganhando noto-
riedade no que se refere aos impactos sociais, políticos, econômicos, históricos e culturais,
de forma jamais vista quando comparada a outras pandemias recentes (BHOWMICK et
al., 2019). Chen et al. (2020) destacam que a estimativa de infectados e mortos está di-
retamente ligada ao impacto dos sistemas de saúde, haja vista a exposição de grupos de
risco, sustentação econômica, saúde mental da população em tempos de confinamento e
o próprio acesso a bens essenciais, como medicamentos, alimentos, transportes e tantos
outros.

As ameaças à saúde pública, seja por restrições de atividades, necessidade de iso-


lamento social, pressões financeiras e demais impactos, desencadearam diversos proble-
mas psicológicos na população em geral, incluindo sintomas de medo, estresse, ansiedade
e até mesmo a depressão (BROOKS et al., 2020). Problemas estes que ganham importân-
cia no contexto criado pela pandemia e que provavelmente continuarão por algum tempo
destacando, assim, o apelo pela saúde e qualidade mental pública (WANG et al., 2020).

Um dos efeitos observados em relação à pandemia está na má qualidade da trans-


missão da informação, em possível detrimento de algumas gestões governamentais, ou
por mudança de gestores em decorrência do processo eleitoral e sua permanência em
caso de reeleição, pois os dados atualizados poderiam causar impactos negativos, como o
aumento de contaminados ou a notoriedade de uma má gestão de resíduos sólidos, tan-
to urbanos quanto industriais. A defasagem de informação é um dos principais sintomas
dessa pandemia (WANG et al., 2020).

Como já registrado, antes mesmo da pandemia o Brasil já enfrentava problemas de


gerenciamento de resíduos e, no mês de março de 2020, alguns municípios restringiram
a coleta seletiva devido ao risco a que os trabalhadores estavam expostos ao manusea-

116
AMBIENTE: Percepções 2021

rem os resíduos secos recicláveis (ABES, 2020). Segundo Kampf et al. (2020), o vírus pode
sobreviver nove dias na superfície de embalagens e com isso se tornam necessários a
movimentação e os cuidados que devem ser tomados em relação aos resíduos sólidos
gerados por pessoas contaminadas. Urban e Nakada (2021) realizaram um estudo onde
foi revisada a persistência do coronavírus em diferentes superfícies. Conforme o estudo,
no alumínio o vírus consegue sobreviver por até 8h, no vidro por 4 dias, no papel de 4 a 5
dias, no plástico por até 5 dias e no metal por até 5 dias. Com relação à estabilidade, o vírus
SARS-CoV-2 permanece viável em superfícies de papelão por até 24 horas, aço inoxidável
até 48 horas e plástico por até 72 horas. A Resolução n. 222/2018 da Diretoria Colegiada
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária classifica todos os resíduos provenientes de
pacientes suspeitos ou confirmados de infecção pelo novo coronavírus como categoria A1,
sendo que este patógeno se enquadra como agente biológico classe de risco 3, com trans-
missão de alto risco individual e moderado risco para a comunidade.

Levando em consideração o tempo de sobrevida do agente etiológico, é válido men-


cionar que a coleta seletiva coloca em risco a vida dos Catadores de Materiais Recicláveis.
Uma característica do isolamento social é a mudança no padrão de consumo dos brasilei-
ros, pois, de acordo com dados referentes ao mês de abril de 2020 publicados pela ABREL-
PE, houve redução de 7,25% da geração dos resíduos domiciliares, mas com aumento entre
25 a 30% de recicláveis quando comparado ao mesmo período do ano de 2019. Porém,
mesmo com o aumento da massa de recicláveis, dados do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) mostram que a indústria da reciclagem apresentou taxa de crescimen-
to negativo no primeiro trimestre de 2020, comparado ao último trimestre de 2019 (MAIA
et al., 2020).

A ABRELPE (2020a) estima que no período de emergência sanitária da pandemia de


Covid-19 deverá ter um aumento significativo na quantidade de resíduos de serviços de
saúde (10 a 20 vezes). Além do aumento na geração de resíduos, separação e manuseio
inadequado, a proliferação da Covid-19 se dá também em decorrência da pouca informa-
ção sobre como realizar a separação de resíduos contaminados e de como evitar a conta-
minação dos profissionais da limpeza urbana. Mesmo que boas práticas para a gestão de
resíduos sólidos durante a pandemia tenham sido difundidas pela própria ABRELPE e pela

117
AMBIENTE: Percepções 2021

OMS, pode-se dizer que a questão ainda está muito carente da percepção dos governos
em âmbito municipal, estadual e nacional (ABRELPE, 2020a).

É importante registrar que os serviços de coleta regular de resíduos sólidos são rea-
lizados, geralmente, por autarquias municipais ou terceirizadas de empresas privadas,
sendo que o serviço de coleta seletiva comumente é realizado por associações ou coo-
perativas de catadores (formalizados e não formalizados). Em empresas terceirizadas, o
fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPIs) é obrigatório. No entanto, em
associações e cooperativas ocorre a falta de recursos, o que coloca a saúde do trabalhador
em risco, face à exposição a resíduos contaminados com elevada carga viral, principal-
mente pelos trabalhadores do processo de triagem que manuseiam os resíduos potencial-
mente contaminados por períodos mais extensos que na coleta e transporte (PUGLIESI;
SANTIAGO, 2020).

Os catadores e catadoras de materiais recicláveis, categoria profissional reconhecida


pelo Código Brasileiro de Ocupações (CBO) desde 2002, são a parte mais frágil e os mais
expostos aos riscos de resíduos sólidos contaminados. Não há informações precisas sobre
o número de profissionais que atuam no Brasil, que pode variar de 400 mil, segundo dados
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2021), a mais de 1 milhão de traba-
lhadores, segundo o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR).
De acordo com o censo demográfico de 2010, Dagnino e Joahansen (2017) apontam que
pouco mais de 170 mil brasileiros se autodeclararam (ou foram declarados por terceiros)
catadores. Porém, os autores fizeram um alerta sobre possível inconsistência na codifica-
ção dos microdados, por se tratar de uma pesquisa domiciliar, e não foram considerados
os indivíduos em situação de rua, que, de acordo com o censo realizado em 2007 sobre
esse grupo populacional, 27,5% afirmaram desenvolver o labor da catação de materiais
recicláveis (REIS Jr., 2012). Não há registros numéricos sobre doenças que pode acometer
essa relevante categoria profissional, pois durante algum tempo as informações apresen-
tadas não vinham diretamente do ministério da saúde.

Nas recomendações da ABRELPE (2020a) aos trabalhadores da gestão de resíduos


sólidos foi exposto que não há evidências de que o contato com os resíduos descartados
tenha resultado na transmissão de Covid-19. Entretanto, Viana (2020) reflete que a coleta
de materiais recicláveis é o único modo de sobrevivência para a grande maioria dos cata-

118
AMBIENTE: Percepções 2021

dores, e o risco de esses profissionais contrair o vírus é muito maior, principalmente, por
não terem condições financeiras para comprar máscaras e usar produtos de higiene, em
especial, para catadores que tiram o sustento de lixões, que ainda existem em muitos mu-
nicípios brasileiros. Muitos dos resíduos domiciliares também contêm resíduos de serviços
de saúde, o que torna ainda mais perigoso o trabalho do catador (VIANA, 2020).

Seguindo orientações internacionais, a ABRELPE publicou, no ano de 2020, o docu-


mento Recomendações para a Gestão de Resíduos Sólidos durante a Pandemia de Coronavírus
(Covid-19), com cinco páginas e organizado em tópicos, sintetizando “as boas práticas para
assegurar uma adequada gestão dos resíduos sólidos” (ABRELPE, 2020a). Após uma in-
trodução e contextualização geral são relacionadas orientações e recomendações como
medidas de prevenção e contenção das possibilidades de transmissão de pessoa a pes-
soa. No documento, são recomendadas a adoção de ações combinadas conforme padrões
e protocolos já existentes e em uso. Na sequência, o documento é subdivido em quatro
partes: i) orientações gerais para operadores; ii) da gestão de resíduos domiciliares sem/
com a confirmação e/ou suspeita de contaminação por Covid-19; iii) da gestão de resíduos
contaminados ou com suspeita em Unidades de Atendimento à Saúde; iv) orientações para
a população em geral tanto em caso positivo quanto negativo de contaminação.

Registra-se também a Recomendação Waste Management during the Covid-19 Pande-


mic – From Response to Recovery, publicada em 2020 pelo Programa Ambiental das Nações
Unidas em conjunto com o Centro Internacional de Tecnologia Ambiental (IETC, em inglês)
e o Instituto para Estratégias Ambientais Globais (IGES) em colaboração com o Programa
das Nações Unidas para o Meio Ambiente - UNEP (em inglês). São 60 páginas, divididas em
quatro grandes eixos, partindo de: i) uma introdução e contextualização, onde são apre-
sentados os objetivos e a metodologia utilizada para sua elaboração; ii) aspectos estatís-
ticos, políticos e regulamentares no gerenciamento de resíduos de serviços de saúde sob
Covid-19; iii) práticas atuais de gerenciamento de resíduos de saúde e por fim, iv) apre-
sentam as conclusões e lições aprendidas. O relatório ainda traz estudos de casos de três
países: Indonésia, Quênia e Sri Lanka.

119
AMBIENTE: Percepções 2021

3 METODOLOGIA

3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA


A pesquisa é descritiva, com abordagem quanti-qualitativa e apoio em bibliografias e
levantamento de dados (PRODANOV; FREITAS, 2013). A participação foi anônima, através
de um formulário, e, por se tratar de uma pesquisa de opinião, não foi necessário o regis-
tro nem aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa e da Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa - CEP/CONEP, conforme as normas da Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016.

3.2 PERÍODO DE ABRANGÊNCIA, INSTRUMENTO DE COLETA E ANÁLISE DE


DADOS
A plataforma utilizada para elaboração e aplicação do questionário foi o Google Forms
e a divulgação foi feita através de e-mail pessoal e institucional (via Programa de Pós-Gra-
duação ao qual os autores estão vinculados), bem como por aplicativo de redes sociais,
como o WhatsApp. O instrumento de coleta de dados foi um questionário semiestruturado
e semiaberto composto de 12 questões, sendo 8 objetivas e nem todas obrigatórias, utili-
zando como base as recomendações publicadas pelas Nações Unidas e pela ABRELPE, de
acordo com a tabela 1. Na questão dissertativa, em especial, as respostas foram analisa-
das e categorizadas através da Análise de Conteúdo desenvolvida por Bardin (2011). Se-
gundo a autora, essa abordagem pode ser dividida em três fases, sendo elas: a pré-análise,
a exploração do material e o tratamento dos resultados (inferência e interpretação).

Em abril de 2020, foi elaborado o questionário junto à plataforma on-line, e o tempo


disponibilizado para os participantes responderem as perguntas foi de 30 de abril a 12
de maio/2020. Após este período até abril de 2021, foi realizada a análise das respostas
obtidas.

120
AMBIENTE: Percepções 2021

Tabela 1 - Questões apresentadas no questionário

Questão
1) Qual sua idade?
2) Qual é o seu grau de instrução?
3) Qual o seu município de residência? (Município/Estado)
4) Quantas pessoas moram na sua residência?
5) Você foi testado positivo para Sars-Cov-2 (vírus causador da Covid-19)?
6) Você separa (não mistura) o seu resíduo doméstico, incluindo a fração orgânica?
7) Se você testou positivo para Sars-Cov-2: separou os resíduos contaminados dos outros gerados na sua
residência?
8) Se você testou positivo para Sars-Cov-2: identificou sacolas/sacos/outros como resíduo contaminado
antes de descartar para a coleta municipal?
9) Você recebeu alguma recomendação da administração pública de onde mora sobre como proceder com
seus resíduos durante a pandemia?
10) Se recebeu: descreva brevemente como foi feita essa comunicação. Via SMS, pelas redes sociais ofi-
ciais, carro de som no bairro, etc...*
11) De maneira geral, considerando o período de abril de 2020 até abril de 2021: você gerou mais resí-
duos?
12) De maneira geral, considerando o período de abril de 2020 até abril de 2021: você acredita que reco-
mendações oficiais poderiam ter contribuído positivamente na gestão dos resíduos sólidos municipais?
*Resposta dissertativa.
Fonte: Elaborado pelos autores

4 RESULTADOS E ANÁLISE

Foram recebidas 228 respostas de 74 municípios brasileiros, sendo a maioria do Es-


tado do Rio Grande do Sul. A região do Vale do Rio dos Sinos/RS foi responsável por 43,0%
das respostas obtidas, sendo os municípios de Novo Hamburgo, São Leopoldo e Canoas
com o maior número de maiores participantes (Fig. 1).

A maior participação de pessoas residentes no Vale do Rio dos Sinos pode ser asso-
ciada ao fato de a pesquisa ter sido realizada com alunos do Programa de Pós-Graduação
residentes em Novo Hamburgo ou cidades próximas, assim como pelos contatos pessoais
deles. É possível também observar que esse fator pode ser levado em consideração com
relação à idade dos participantes, em que 77% dos participantes têm idade acima de 18
anos, mas menos de 60 anos, vindo de encontro com o público atingido na questão an-

121
AMBIENTE: Percepções 2021

terior (Fig. 2). Com relação à quantidade de moradores por residência, observa-se que a
maioria dos entrevistados, ou seja, 31%, moram com uma ou duas pessoas, como pode ser
observado na figura 3.

Figura 1 - A) Representação gráfica dos estados onde residem os entrevistados e B) da maior quantidade
de entrevistados

Fonte: Elaborado pelos autores

Figura 2 - Representação gráfica com relação à idade dos entrevistados

Fonte: Elaborado pelos autores

122
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 3 - Relação de moradores por residência

Fonte: Elaborado pelos autores

Na questão que abordava sobre a realização da separação dos resíduos domésticos


(Fig. 5), 86% dos entrevistados relataram fazer a separação de resíduos em sua residência,
separando a fração orgânica das demais. A separação dos resíduos é importante para que
um não contamine o outro, pois os resíduos secos atrapalham na qualidade do composto
orgânico (ZULAUF, 2000). O resíduo orgânico representa 44% dos resíduos gerados global-
mente e varia de acordo com a renda da população, sendo que os países de baixa renda
(57%) são os que mais descartam alimentos e resíduos verdes, seguidos pelos de média
renda (53%), e os de alta renda são os que menos descartam alimento e resíduos verdes
(32%) (BABU; VERAMENDI; RENE, 2021).

Na questão a respeito da separação dos resíduos contaminados no caso de haver


pessoa infectada com Covid-19 (Fig. 5), a maior parte dos entrevistados (61%) relatou não
ter feito a separação. De acordo com as recomendações da ABRELPE (2020c), nas residên-
cias onde existem moradores com a confirmação ou com a suspeita da contaminação, os
resíduos gerados pelo infectado ou até por quem lhe presta cuidados devem ser acondi-
cionados em sacos plásticos resistentes e devidamente lacrados. Logo após, os mesmos
sacos devem ser colocados dentro de um segundo saco plástico que também deverá ser
devidamente fechado e destinado para a coleta seletiva na modalidade não recicláveis (re-
síduos comuns), sendo estritamente proibida a destinação dos mesmos para fração seca
(recicláveis).

123
AMBIENTE: Percepções 2021

O aumento da produção de resíduos sólidos foi relatado por Usman e Ho (2021)


como uma das ameaças ambientais relacionadas à Covid-19. Este relato vem ao encontro
das respostas obtidas no presente estudo, nas quais 47% dos participantes relataram um
aumento na geração de resíduos no período de abril/2020 a abril/2021. A quantidade de
participantes que relatou não ter aumentado a quantidade de resíduos gerados foi próxima
à de participantes que não soube responder (Fig. 5). No que se refere ao grau de instrução
dos participantes, nota-se, conforme figura 6, que 72% dos participantes possuem ensino
superior ou atribuições acima, demonstrando uma pesquisa com um elevado grau de ins-
trução dos participantes.

Figura 5 - Apresentação de alguns dos resultados obtidos no questionário

Fonte: Elaborado pelos autores

124
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 6 - Apresentação do grau de instrução dos respondentes

Fonte: Elaborado pelos autores

Na figura 7, são apresentados os percentuais de participantes entrevistados que tes-


taram positivo para a Covid-19 e o percentual dos entrevistados que identificaram o seu
resíduo contaminado antes do descarte para a coleta municipal. Do total de participantes
desta pesquisa, apenas 18% testaram positivo para SARS-CoV-2, destes, apenas 12% rea-
lizaram a identificação do seu resíduo contaminado antes do descarte para a coleta muni-
cipal. Uma vez que o coronavírus persiste em diferentes superfícies, alcançando de horas
a dias de sobrevivência, seria necessário no mínimo uma identificação dos sacos plásticos
contaminados gerados nas residências para que esses resíduos não fossem processados
com os demais, levando a uma exposição dos trabalhadores que fazem a coleta e recicla-
gem dos RSU. Ademais, 64,6% dos materiais de reciclagem são plásticos, papel ou papelão,
e a coleta seletiva no Brasil é manual, o que aumenta ainda mais o risco de infecção por
Covid-19 em trabalhadores dos centros de reciclagem (URBAN; NAKADA, 2021). Araújo e
Silva (2020) descrevem em sua pesquisa que vários países europeus adotaram a mesma
prática sugerida pelas recomendações da ABRELPE, inclusive evitando em muitas vezes
a coleta de resíduos recicláveis a fim de evitar a proliferação do contágio em unidades de
triagem e reciclagem em função de segregações inadequadas.

125
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 7 - A) Apresentação da testagem dos participantes frente ao vírus Sars-Cov-2 e B) identificação dos
resíduos contaminados antes do descarte para coleta municipal

Fonte: Elaborado pelos autores

Ao serem questionados sobre o recebimento de alguma recomendação da adminis-


tração pública do município em que reside sobre como proceder com seus resíduos du-
rante a pandemia, 81,1% dos respondentes responderam não terem recebido nenhuma
instrução, enquanto 18,9% responderam que sim. Nos casos afirmativos, foi questionado
sobre a maneira com que foi feita esta comunicação, e os meios mais utilizados foram as
redes sociais (47%), televisão (12%) e por carro de som nos bairros (7%). Todos os meios
citados estão apresentados na figura 8.

Figura 8 - Meios de comunicação citados pelos respondentes, referente ao recebimento de recomendações


por parte da administração pública

Fonte: Elaborado pelos autores

126
AMBIENTE: Percepções 2021

Por fim, ao serem questionados sobre se, de maneira geral, recomendações oficiais
poderiam ter contribuído positivamente na gestão dos resíduos sólidos municipais, 91,7%
responderam acreditar que sim, 3,5% que não e 4,8% não souberam dizer. Penteado e Cas-
tro (2021), em uma revisão recente acerca das principais recomendações relacionadas à
gestão de resíduos sólidos urbanos durante a pandemia, discutiram também a sua apli-
cabilidade à realidade brasileira. Uma das recomendações analisadas pelo estudo é a da
ABRELPE (2020a), que, assim como a maioria, está dirigida a empregadores e empresas
envolvidas na coleta, tratamento e disposição final de resíduos sólidos. Recomendações
oficiais dependem fortemente de conscientização e engajamento pelos cidadãos, bem
como da atenção pública municipal no planejamento e investimento em campanhas infor-
mativas, como trazem os autores, corroborando os resultados apresentados. Da mesma
forma, devem preocupar-se com toda a população, portanto, é imprescindível que sejam
elaboradas e veiculadas de maneira abrangente.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Relacionando a pesquisa realizada ao referencial teórico e às informações existentes,


ressalta-se que a precariedade de informações, tanto em relação à doença, quanto aos
cuidados possíveis e conhecidos a serem tomados, podem aumentar a disseminação da
contaminação pelo vírus. Por exemplo, estão defasados os dados de coleta e destinação
final de RSU em alguns municípios da região de maior abrangência das respostas, des-
de 2019, quando consultados pelo Sistema Nacional de Resíduos Sólidos (SINIR) e pela
ABRELPE, pois não há ainda nenhuma publicação referente à geração e gerenciamento
dos resíduos produzidos no ano de 2020.

Com a pesquisa, pode-se notar que não houve a divulgação nem alcance necessários
por parte das prefeituras acerca dos procedimentos para o descarte de RSU contaminados,
estes já existentes perante órgãos oficiais como a OMS e a própria ONU, de como deve-
-se proceder em caso positivo da doença. Também, denota-se que os respondentes pos-
suíam, em sua maioria, ensino superior completo e demonstraram não estar cientes das
recomendações, podendo o maior impacto estar sendo direcionado à população de menor
acesso à instrução. No caso do presente estudo, são os catadores de resíduos que podem

127
AMBIENTE: Percepções 2021

ser mais afetados diretamente por RSU contaminados, o que traz riscos à saúde de quem
depende de exercer a atividade.

Como observado, houve aumento na geração de resíduos, mas essa geração pode
ter sido transferida de ambiente, em função do home office e do aumento da utilização de
material descartável, como trazido por alguns autores. A diminuição da produção pelas
empresas neste período de pandemia também pode ter contribuído para isso. Mais estu-
dos são necessários para que se tenha um retrato mais realista e detalhado dos impactos
causados pela Covid-19 na gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos domiciliares em
todo o país.

REFERÊNCIAS
ABRELPE – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE LIMPEZA PÚBLICA E RESÍDUOS
ESPECIAIS. Recomendações para a gestão de resíduos sólidos durante a pandemia de co-
ronavírus (Covid-19). 2020a. Disponível em: https://abrelpe.org.br/abrelpe-no-combate-a-
-covid-19/. Acesso em: 02 jul. 2021.

ABRELPE – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE LIMPEZA PÚBLICA E RESÍDUOS


ESPECIAIS. Panorama dos resíduos sólidos no Brasil 2020. 2020b. Disponível em: https://
abrelpe.org.br/panorama/. Acesso em: 02 jul. 2021.

ABRELPE – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE LIMPEZA PÚBLICA E RESÍDUOS


ESPECIAIS. Medidas para proteção da saúde e segurança dos profissionais de limpeza ur-
bana. 2020c. Disponível em: https://abrelpe.org.br/abrelpe-no-combate-a-covid-19/. Aces-
so em: 02 jul. 2021.

AL-GHOUTI, M. A. et al. Recent advances and applications of municipal solid wastes bottom
and fly ashes: Insights into sustainable management and conservation of resources. Envi-
ronmental Technology & Innovation, v. 21, p. 101267, 2021.

ALSHEHREI, F.; AMEEN, F. Vermicomposting: a management tool to mitigate solid waste.


Saudi Journal of Biological Sciences, v. 28, n. 6, p. 3284-3293, 2021.

ARAÚJO, E. C. S.; SILVA, V. F. A gestão de resíduos sólidos em época de pandemia do Co-


vid-19. GeoGraphos, v. 11, p. 192-215, 2020.

128
AMBIENTE: Percepções 2021

ARDUSSO, M. et al. Covid-19 pandemic repercussions on plastic and antiviral polymeric tex-
tile causing pollution on beaches and coasts of South America. Science of the Total Environ-
ment, v. 763, p. 144365, 2021.

BABU, R.; VERAMENDI, P. M. P.; RENE, E. R. Strategies for resource recovery from the organic
fraction of municipal solid waste. Case Studies in Chemical and Environmental Engineering,
v. 3, p. 100098, 2021.

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.

BHOWMICK, G. D. et al. Coronavirus disease 2019 (Covid-19) outbreak: some serious conse-
quences with urban and rural water cycle. npj Clean Water, v. 3, p. 1-8, 2019.

BOJKOVA, D. et al. Proteomics of SARS-CoV-2-infected host cells reveals therapy targets.


Nature, v. 583, p. 469-472, 2020.

BRASIL. Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional sobre Resíduos
Sólidos, altera a Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998 e dá outras providências. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 3 ago. 2010. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm. Acesso em: 02 jul. 2021.

BRASIL. Resolução nº 510, de 7 de abril de 2016. Dispõe sobre as normas aplicáveis a pes-
quisas em Ciências Humanas e Sociais. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 mai. 2016. Dis-
ponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2016/res0510_07_04_2016.
html. Acesso em: 05 jun. 2021.

ABES – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENGENHARIA SANITÁRIA E AMBIENTAL. Câmara Te-


mática Resíduos Sólidos. O impacto da pandemia pela Covid-19 na gestão dos Resíduos
Sólidos Urbanos: situação das capitais brasileiras. 2020. Disponível em: https://www.abes-
-dn.org.br/wp-content/uploads/2020/08/Pesquisa-ABES-2.1-Pandemia-COVID-19-RSU-
-Capitais-26.8.2020-2.pdf. Acesso em: 11 abr. 2022.

BROOKS, S. K. et al. The psychological impact of quarantine and how to reduce it: rapid review
of the evidence. The Lancet, v. 395, n. 10227, p. 912-920, 2020.

CHEN, J. et al. Covid-19 infection: the China and Italy perspectives. Cell Death & Disease, v.
11, n. 6, p. 438, 2020.

DE OLIVEIRA, U. R. et al. Risk management applied to the reverse logistics of solid waste.
Journal of Cleaner Production, v. 296, p. 126517, 2021.

129
AMBIENTE: Percepções 2021

GUTIERREZ-GOMEZ, A. C. et al. Energy recovery potential from Brazilian municipal sol-


id waste via combustion process based on its thermochemical characterization. Journal of
Cleaner Production, v. 293, p. 126145, 2021.

GREENBERG, N. et al. Managing mental health challenges faced by healthcare workers during
covid-19 pandemic. BMJ, v. 368, p. m1211, 2020.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTATÍSTICA E GEOGRAFIA. Brasil. Cidades e Estados.


Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados. Acesso em: 05 jun. 2021.

IPEA – INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Disponível em: https://www.ipea.


gov.br. Acesso em: 05 jun. 2021.

KAMPF, G. G. et al. Persistence of coronaviruses on inanimate surfaces and their inactivation


with biocidal agents. The Journal of Hospital Infection, v. 104, n. 3, p. 246-251, 2020.

KEBEDE, Y. S.; ALENE, M. M.; ENDALEMAW, N. T. Urban landfill investigation for managing
the negative impact of solid waste on environment using geospatial technique. A case study
of Assosa town, Ethiopia. Environmental Challenges, v. 4, p. 100103, 2021.

KITAJIMA, M. et al. SARS-CoV-2 in wastewater: state of the knowledge and research needs.
Science of the Total Environment, v. 739, p. 139076, 2020.

MA, Y. et al. Suggested guidelines for emergency treatment of medical waste during Covid-19:
Chinese experience. Waste Disposal & Sustainable Energy, p. 1-4, 2020.

MAIA, C. V. A. et al. Reflexões sobre o impacto da pandemia por coronavírus na atuação do


catador de materiais recicláveis. Revista Pegada, v. 21, n. 3, p. 416-432, 2020.

MIR, I. S.; CHEEMA, P. P. S.; SINGH, S. P. Implementation analysis of solid waste management
in Ludhiana city of Punjab. Environmental Challenges, v. 2, p. 100023, 2021.

MOHSENI, A. H., et al. Body fluids may contribute to human-to-human transmission of se-
vere acute respiratory syndrome coronavirus 2: evidence and practical experience. Chinese
Medicine, v. 15, n. 58, 2020.

PENTEADO, C. S. G.; CASTRO, M. A. S. Covid-19 effects on municipal solid waste manage-


ment: What can effectively be done in the Brazilian scenario? Resources, Conservation and
Recycling, v. 164, p. 105152, 2021.

130
AMBIENTE: Percepções 2021

PRODANOV, C. C.; FREITAS, E. C. Metodologia do trabalho científico: métodos e técnicas da


pesquisa e do trabalho acadêmico. 2. ed. Novo Hamburgo: Feevale, 2013.

PUGLIESI, E.; SANTIAGO, C. D. Gestão de resíduos sólidos e a pandemia Covid-19: (des)pre-


paro para enfrentamento da crise. In: VALENCIO, N.; OLIVEIRA, C. M. (orgs) Covid-19: crises
entremeadas no contexto de pandemia (antecedentes, cenários e recomendações). São Car-
los: UFSCAR/CPOI, 2020.

SANTOS, K. L. et al. Food losses and waste: reflections on the current Brazilian scenario. Bra-
zilian Journal of Food Technology, v. 23, p. e2019134, 2020.

SARKODIE, S. A.; OWUSU, P. A. Impact of Covid-19 pandemic on waste management. Envi-


ronment, Development and Sustainability, v. 23, n. 5, p. 7951-7960, 2021.

SAXENA, S. et al. Optimization of solid waste management in a metropolitan city. Materials


Today: Proceedings, v. 46, p. 8231-8238, 2021.

UNEP – UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME. Waste Management during the


Covid-19 Pandemic. UNEP IETC: Osaka, 2020. Disponível em: https://wedocs.unep.org/bits-
tream/handle/20.500.11822/33416/WMC-19.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em:
05 jun. 2021.

URBAN, R. C.; NAKADA, L. Y. K. Covid-19 pandemic: Solid waste and environmental impacts
in Brazil. Science of the Total Environment, v. 755, p. 142471, 2021.

USMAN, M.; HO, Y. Covid-19 and the emerging research trends in environmental studies:
a bibliometric evaluation. Environmental Science and Pollution Research, v. 28, n. 14, p.
16913-16924, 2021.

VIANA, E. Lixões são mais uma fonte de perigo para os catadores durante a pandemia. En-
trevista cedida à Patricia Fachin. IHU On-Line: Revista do Instituto Humanitas Unisinos, São
Leopoldo, 12 jun. 2020. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevis-
tas/599854-lixoes-sao-mais-uma-fonte-de-perigo-para-os-catadores-durante-a-pande-
mia-entrevista-especial-com-ednilson-viana. Acesso em: 02 jul. 2021.

WANG, C. et al. Immediate psychological responses and associated factors during the initial
stage of the 2019 coronavirus disease (Covid-19) epidemic among the general population
in China. International Journal of Environmental Research and Public Health, v. 17, n. 5, p.
1729, 2020.

131
AMBIENTE: Percepções 2021

WORLDOMETERS. Covid-19 Coronavirus Pandemic. 2021. Disponível em: https://www.


worldometers.info/coronavirus/. Acesso em: 02 jul. 2021.

WU, Y. et al. Prolonged presence of SARS-CoV-2 viral RNA in faecal samples. The Lancet,
Gastroenterology & Hepatology, v. 5, p. 434-435, 2020.

YAASHIKAA, P. R. et al. Bioconversion of municipal solid waste into bio-based products: A re-
view on valorization and sustainable approach for circular bioeconomy. Science of the Total
Environment, v. 748, p. 141312, 2020.

YAN, R. et al. Structural basis for the recognition of SARS-CoV-2 by full-length human ACE2.
Science, v. 367, n. 6485, p. 1444-1448, 2020.

ZULAUF, W. E. O meio ambiente e o futuro. Estudos Avançados, v. 14, n. 39, p. 85-100, 2000.

132
6
PRESENÇA DE SARS-COV-2 EM
ESGOTO BRUTO: ANÁLISE DA
POSSÍVEL RELAÇÃO COM O
NÚMERO DE CASOS ATIVOS
DE COVID-19 EM CIDADES DO
VALE DO SINOS/RS

Michel Vinicius Flach


Júlia Carolina Illi
Maíra de Andrade Peixoto
Catiana Masiero Bresolin
Delio Endres Júnior
Jairo Lizandro Schmitt
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUÇÃO

Desde o início de 2020 o mundo vem enfrentando as consequências da pandemia de


Covid-19, caracterizada como uma síndrome respiratória grave que ocorre em humanos,
causada pelo SARS-CoV-2. A transmissão respiratória é a principal via de infecção do vírus,
porém, ainda se discutem outras rotas de contaminação e disseminação, e uma possibi-
lidade em constante discussão é a mediada por esgoto e água natural contaminada com
fezes e outros excrementos de pessoas infectadas com SARS-CoV-2. Utilizando como mé-
todo a epidemiologia baseada em águas residuais, Wastewater Based Epidemiology (WBE),
o presente estudo propõe verificar, a partir de dados secundários coletados de órgãos de
saúde do Rio Grande do Sul, sob coordenação do Centro Estadual de Vigilância Sanitária
(CEVS), uma possível relação entre o número de casos ativos de Covid-19 e a presença do
SARS-CoV-2 no esgoto bruto, apresentando dados de casos ativos de Covid-19 e da carga
viral do SARS-CoV-2 no esgoto bruto das cidades de São Leopoldo e Canoas. A hipótese
do presente estudo, sobre a relação entre a carga viral no esgoto com o número de casos
ativos não se confirmou. Porém, de maneira qualitativa, a detecção do SARS-CoV-2 se
mostrou útil, pois pode auxiliar na indicação de locais onde há a disseminação da doença,
pela detecção do RNA no esgoto, onde o órgão de saúde não detectou casos ativos. Desta
forma, o monitoramento em redes de esgoto complementa a vigilância clínica atual, que se
concentra principalmente nos pacientes com sintomas.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Historicamente, de tempos em tempos, epidemias impactam o mundo e desestabi-


lizam os sistemas de saúde pública existentes, levando a um grande número de mortes,
requerendo melhorias e desenvolvimento científico na busca de tratamento e imunização.
Pandemia é o termo usado para designar uma determinada doença que rapidamente se
espalha por diversas regiões, por meio de contaminação sustentada, em que a gravidade
da doença não é determinante e sim o seu poder de contágio e sua rápida proliferação
geográfica. Dentre as pandemias que o mundo já enfrentou, pode-se citar a Peste Negra
(1343-1353), que matou entre 75 e 200 milhões de pessoas; a Gripe Espanhola (1918-
1919), que causou a morte de 20 a 50 milhões de pessoas; a Gripe Suína – H1N1 (2009-

134
AMBIENTE: Percepções 2021

2010), que matou cerca de 17 mil pessoas; e, mais recentemente, a Covid-19 (2019-atual-
mente), que já matou mais de 4,3 milhões de pessoas até 10 de agosto de 2021 (JONES et
al., 2020; WHO, 2021).

A Covid-19 é caracterizada como uma síndrome respiratória grave que ocorre em hu-
manos. É uma doença causada pelo SARS-CoV-2, cuja transmissão respiratória é a princi-
pal via de infecção, com alto poder de disseminação por contato direto ou indireto, pessoa
a pessoa (BOJKOVA et al., 2020; MOHSENI et al., 2020; WU et al., 2020a). O coronavírus
teve origem zoonótica, sendo que o primeiro paciente com sintomas da Covid-19 surgiu na
região Wuhan, capital da província de Hubei, na China, em 1º de dezembro de 2019, como
uma “pneumonia misteriosa”. Trinta dias depois, a Organização Mundial da Saúde (OMS)
recebeu o primeiro alerta sobre a doença, que causava febre, tosse seca e graves proble-
mas respiratórios (HUANG et al., 2020).

Estudos de sequenciamento genômico apontaram que o SARS-CoV-2 foi transmitido


aos humanos por animais. A principal hipótese é que tenha sido originário dos morcegos,
uma vez que seu genoma tem alta identidade com o genoma desse animal, cerca de 96%.
Em busca de um hospedeiro intermediário que ajudou o vírus a cruzar a barreira das es-
pécies infectando humanos, pesquisadores consideram que o elo mais provável entre o
SARS-CoV-2, morcego e humanos seja o pangolim, uma vez que as sequências genéticas
de coronavírus de pangolins possuem alta identidade ao novo coronavírus, cerca de 99%.
Dada essas semelhanças entre genomas do SARS-CoV-2 com o coronavírus do tipo SARS-
-CoV de morcego, é razoável dizer que o vírus foi transmitido de morcegos para os pango-
lins, que serviram como hospedeiros reservatórios e, destes, o vírus passou para os seres
humanos, uma vez que esse animal é muito utilizado, ilegalmente, na medicina tradicional
chinesa (YE et al., 2020). Tendo em vista que os primeiros casos de Covid-19 foram asso-
ciados ao mercado Huanan em Wuhan, iniciaram-se investigações para relacionar o vírus
à uma fonte animal que estivesse presente no local. Os pangolins malaios, importados
ilegalmente para a província de Guangdong, também contém coronavírus semelhantes ao
SARS-CoV-2 (ZHOU et al., 2020).

Mesmo sendo as vias aéreas as principais fontes de transmissão, por meio de go-
tículas geradas quando uma pessoa infectada tosse ou espirra e outro indivíduo próximo
tem contato com elas, incorporando-as ao seu organismo, ainda se discutem outras rotas

135
AMBIENTE: Percepções 2021

de contaminação/disseminação da Covid-19. Uma possível rota de infecção em constante


discussão é a mediada por esgoto e água natural contaminada com fezes e outros excre-
mentos de pessoas infectadas com SARS-CoV-2. Ainda não há casos confirmados, mas
pouco se sabe sobre a possibilidade de infecção pelo contato com esgoto ou água conta-
minada (GIACOBBO et al., 2020).

A presença de ácido ribonucleico (ribonucleic acid - RNA) de SARS-CoV-2 em águas


residuais ocorre por meio de sua eliminação nas fezes de indivíduos infectados, indepen-
dentemente de seus sintomas, incluindo crianças assintomáticas que tinham o vírus SAR-
S-CoV-2 nas amostras de fezes coletadas (HARAMOTO et al., 2020; HATA et al., 2021;
JONES et al., 2020; TRAN et al., 2021). No período sintomático há o pico da eliminação fecal
do vírus, que pode persistir por algumas semanas. Porém, na fase pós-sintomática ocorre
uma diminuição da carga viral (JONES et al., 2020). Um estudo indicou que o SARS-CoV-2
pode sobreviver por mais tempo nas fezes, na média de 22 dias, do que no sistema res-
piratório, que tem a média de 18 dias, e no soro, que tem a média de 16 dias (HATA et al.,
2021; TRAN et al., 2021). Apesar disso, cabe salientar que a carga viral nos fluidos nasofa-
ríngeos é muito mais elevada, cerca de 105-1011 gc/ml, do que nas fezes, cerca 102-107 gc/
ml, e na urina, cerca de 102-105 gc/ml (JONES et al., 2020). Contudo, em alguns casos em
que o vírus não é detectado no trato respiratório superior, ele já pode ser encontrado nas
fezes. A eliminação do vírus nas fezes pode acontecer cerca de três a cinco dias antes de
outros sintomas clássicos, como febre ou diarreia, sendo detectado assim na fase pré-sin-
tomática. Por isso, pessoas assintomáticas, pré-sintomáticas ou pós-sintomáticas podem
estar disseminando o vírus em níveis consideráveis, mesmo que eles não apresentem uma
carga viral alta e um tempo de eliminação grande quando comparado com os indivíduos
gravemente infectados (JONES et al., 2020).

Traços de coronavírus SARS-CoV-2 foram recentemente detectados em lodos deriva-


dos de estação de tratamento de águas residuais, no esgoto municipal ou águas residuais,
em águas residuais de hospitais e áreas médicas, em águas residuais de navios de cruzeiro
comerciais e aeronaves comerciais de passageiros, em água não potável, em esgoto com
tratamento secundário e em água de rio (HARAMOTO et al., 2020; TRAN et al., 2021). O
RNA do SARS-CoV-2 foi detectado em afluentes de esgoto e nas amostras tratadas se-
cundariamente. Já em amostras de efluentes de estações de tratamento de água (ETAs), o

136
AMBIENTE: Percepções 2021

RNA não foi detectado, atestando que as estações de tratamento são capazes de remover
o material genético do SARS-CoV-2 (MOHAN et al., 2021). Os níveis de SARS-CoV-2 redu-
zem no decorrer do tratamento das águas residuais, sugerindo que o vírus é degradado ou
acaba se associando à fração de sólidos, durante a floculação. Essa evidência foi coerente
com outros estudos que mostraram eficiência na remoção de 2 a 3 log10 na carga de RNA
viral ao comparar os níveis virais no afluente e no efluente e o acúmulo de SARS-CoV-2 na
fração de lodo (JONES et al., 2020; MOHAN et al., 2021). As operações da unidade de uma
estação de tratamento de águas residuárias desempenham um papel crucial na remoção
do vírus. A desinfecção de águas residuais por meio de tratamentos químicos ou físicos
causa a inativação do vírus modificando o genoma viral e as proteínas. A presença de sol-
ventes e detergentes nas águas residuais também pode comprometer o envelope viral e,
portanto, afetar sua persistência. Os vírus envelopados são mais absorvidos em partículas
suspensas como no lodo e nos biossólidos do que vírus não envelopados, isso quer dizer
que a separação de sólidos e flocos do lodo ativado pode contribuir para a remoção do ví-
rus por meio da sedimentação sólida (MOHAN et al., 2021).

Outro ponto a ser destacado quanto à presença de SARS-CoV-2 em estações de tra-


tamento de esgoto é sobre a liberação de bioaerossóis durante a aeração de águas resi-
duais, pois é uma área potencial, onde pode ocorrer um risco de exposição (JONES et al.,
2020; MOHAN et al., 2021). No entanto, baseado nas estimativas atuais da dose infec-
ciosa de SARS-CoV-2, a probabilidade de que isso represente risco para os trabalhadores
é extremamente baixa, com base na quantidade de esgoto que precisaria ser inalado por
esta via para causar infecção (JONES et al., 2020). Apesar do risco pequeno, a OMS indica
que algumas precauções devem ser tomadas para a proteção dos profissionais contra in-
fecções por meio da inalação de aerossóis contaminados, durante o tratamento de águas
residuais. O uso de ferramentas de proteção essencial, como equipamento de proteção
individual (EPI), roupa de trabalho, máscaras, protetor facial, luvas, botas, entre outros, é
indispensável. Procedimentos que ainda poderiam ser adotados incluem, quando possível,
cobrir a câmara de remoção de areia e o tanque de aeração para evitar a liberação de aeros-
sóis no ar. Além disso, os geradores de microbolhas podem ser mais adequados, quando
comparados com o tipo de macrobolhas, para mitigar a emissão de aerossol, reduzindo a
quantidade de bolhas que possam atingir a superfície da água (ELSAMADONY et al., 2021).

137
AMBIENTE: Percepções 2021

Segundo Tran et al. (2021), mesmo o coronavírus SARS-CoV-2 sendo detectado em


amostras de água de rios, esgotos e águas residuais, o seu risco à saúde humana e ao
meio ambiente é mínimo. A probabilidade de infecção devido ao contato com a água con-
taminada com esgoto, em atividades como natação, surf e pesca, ou através da comida,
em saladas e mariscos, por exemplo, é extremamente baixa ou insignificante, com base na
sobrevivência ambiental limitada do SARS-CoV-2 (JONES et al., 2020). Por isso, mesmo na
presença de grande quantidade de cópias de RNA de SARS-CoV-2, um estudo recente, em
uma estação de tratamento de águas residuárias na Itália, demonstrou que a viabilidade
do SARS-CoV-2, ou seja, o efeito citopático, não foi observado (ELSAMADONY et al., 2021).
Assim, é incerto afirmar que o RNA viral detectado era infeccioso no momento da amos-
tragem, pois o material genético viral detectado nas fezes não indica necessariamente
vírus infecciosos viáveis (HARAMOTO et al., 2020; MOHAN et al., 2021).

Como a eliminação do vírus nas fezes pode acontecer cerca de 3 a 5 dias antes de
outros sintomas clássicos, alguns estudos relataram a presença do RNA de SARS-CoV-2
em águas residuais antes mesmo da identificação do primeiro caso de Covid-19 na área de
estudo, sendo detectado até três semanas antes do primeiro caso confirmado (JONES et
al., 2020; HATA et al., 2021; MOHAN et al., 2021). Logo, a epidemiologia baseada em águas
residuais, Wastewater Based Epidemiology (WBE), é potencialmente eficaz para o alerta
precoce de um surto de Covid-19 (HATA et al., 2021; MOHAN et al., 2021). Em Milão, frag-
mentos de SARS-CoV-2 foram detectados em uma amostra de esgoto poucos dias após o
primeiro caso de infecção de SARS-CoV-2, sugerindo que o monitoramento epidemiológi-
co diário das águas residuárias pode se tornar um indicador da circulação do vírus, de sua
recorrência e de seus surtos epidêmicos para as comunidades (TRAN et al., 2021).

O SARS-CoV-2 pode ser detectado em águas residuárias e esses dados podem ser
utilizados para WBE, que é de particular importância para analisar os dados retrospecti-
vamente na estimativa da população provável afetada pelo vírus. Sua importância decorre
do fato de que pacientes assintomáticos, que são subdiagnosticados pela vigilância clínica,
também podem eliminar o vírus nas fezes (HARAMOTO et al., 2020). Hata et al. (2021) es-
timaram uma população muito maior de infecções assintomáticas e levemente sintomáti-
cas, em 10 locais nos Estados Unidos, demonstrando que o número estimado de infecções
foi de 6 a 24 vezes maior do que o de casos confirmados.

138
AMBIENTE: Percepções 2021

Dessa forma, o SARS-CoV-2 excretado de indivíduos assintomáticos e pré-sintomá-


ticos pode estar presente em águas residuais e, portanto, a WBE está potencialmente
prevendo o estado geral da epidemia. Com isso, a WBE pode ser um preditor de epidemia
precoce mais sensível do que a vigilância clínica e eficaz na verificação da cobertura da
vigilância clínica, em várias situações médicas. Para avaliar a aplicação da WBE como fer-
ramenta de alerta precoce para surtos de Covid-19, é premente verificar relações entre
a ocorrência de SARS-CoV-2 em águas residuais e o número de casos de Covid-19, em
diferentes países. A WBE pode fornecer um método imparcial de avaliação da propagação
da infecção em diferentes áreas, mesmo quando os recursos para o diagnóstico clínico são
limitados e quando os sistemas de notificação estão indisponíveis (HATA et al., 2021).

Para realizar a detecção e quantificação da presença de SARS-CoV-2 em esgoto e


águas residuais, diversas técnicas podem ser aplicadas. Kitamura et al. (2021) aplicaram
quatro diferentes metodologias de recuperação do vírus em suas amostras. Elas incluíram
a adsorção por membrana eletronegativa, a precipitação com polietilenoglicol, a ultrafil-
tração e a precipitação sólida. Os autores realizaram a quantificação, por meio de ensaios
da Reação em Cadeia de Polimerase (RT-qPCR), visando ao genoma da nucleoproteína do
vírus (N1 e N2). Em outro estudo, desenvolvido por Chavarria-Miró et al. (2021), a me-
todologia aplicada foi a concentração de amostras de águas residuais de 24 horas por
precipitação com polietilenoglicol, realizando cinco diferentes ensaios de RT-qPCR para
detecção do RNA viral. Os alvos dos ensaios foram a polimerase (IP1 e IP4), o envelope (E)
e o genoma da nucleoproteína (N1 e N2).

No estudo de Peccia et al. (2020), as análises da presença de SARS-CoV-2 em lodo


primário de esgoto foram realizadas utilizando um kit comercial otimizado para o isola-
mento do RNA total das amostras (RNeasey PowerSoil Total RNA Kit, Qiagen). A análise
quantitativa foi realizada por ensaios RT-qPCR de cada amostra, usando o mesmo conjun-
to de primers N1 e N2, empregados em testes individuais Covid-19. No Brasil, Prado et al.
(2021) avaliaram em um total de 223 amostras, a presença SARS-CoV-2 no esgotamento
sanitário do município de Niterói/RJ. Eles utilizaram a ultracentrifugação das amostras,
quantificando a presença do vírus com primers e sondas direcionadas ao genoma N2.

Ao longo do período de pandemia, a rede de esgoto de algumas cidades brasileiras foi


monitorada, a fim de observar a presença de SARS-CoV-2. No país, o estudo é coordenado

139
AMBIENTE: Percepções 2021

pela Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) que, durante o período de um
ano (2020-2021), realizou o monitoramento de esgotos no sudeste do país. Como eviden-
ciado na literatura, concluiu-se que é possível identificar a incidência e circulação do vírus
nas cidades, auxiliando os gestores de saúde na tomada de decisões sobre a pandemia.
Esses indicadores permitiram que essa iniciativa fosse ampliada para outros locais (ANA,
2021).

No Rio Grande do Sul, extremo sul do Brasil, essa estratégia é realizada pelo Centro
Estadual de Vigilância Sanitária (CEVS) em parceria com diversas instituições públicas e
privadas, através de boletins de acompanhamento do monitoramento ambiental de SAR-
S-CoV-2 (SES/RS, 2021a). Conforme Sodré et al. (2020), resultados significativos deman-
dam uma atuação técnico-científica permanente e em rede, agregando gestores públicos
das áreas de saúde e saneamento que contemplam as cidades.

O Boletim de Acompanhamento do Monitoramento Ambiental de SARS-CoV-2 teve


periodicidade mensal e divulgou informações, notícias, estudos e publicações referentes
às atualizações de tratamento de água e esgoto. Em um contexto linear, os resultados en-
contrados apresentam os valores de concentrações de cópias de coronavírus por litro, que
demonstram uma tendência de desaceleração ou aceleração no ritmo de crescimento da
prevalência da Covid-19 na Região Metropolitana, em seus 17 pontos de coleta ativos. O
estudo aconteceu mensalmente, abrangendo nove estações de tratamento de esgoto, 13
pontos de água superficial, três pontos de esgoto bruto, num total de 10 cidades abran-
gidas, com cerca de 3.242.897 habitantes, correspondendo a 28,4 % da população do Rio
Grande do Sul (IBGE, 2021; SES/RS, 2021a).

Canoas e São Leopoldo, na Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos, são importantes ci-
dades da Região Metropolitana de Porto Alegre, tanto pelo seu potencial industrial quan-
to pelo populacional. Canoas tem a terceira maior população do Estado, enquanto São
Leopoldo ocupa a nona posição. Esta demografia é acompanhada pela dinâmica de infec-
ções, sendo que Canoas tem incidência de 12.377,4 casos por 100.000 habitantes, en-
quanto São Leopoldo tem 11.137,7 casos por 100.000 habitantes, valores observados na
data de 10 de agosto de 2021, dados próximos ao que se observa na média estadual,
12.163,4 (IBGE, 2021; SES/RS, 2021b).

140
AMBIENTE: Percepções 2021

Diante disso, o presente estudo propõe verificar, a partir de dados secundários co-
letados de órgãos de saúde do Rio Grande do Sul, uma possível relação entre o número
de casos ativos de Covid-19 e a presença do SARS-CoV-2 no esgoto bruto, apresentando
dados de casos ativos de Covid-19 das cidades de São Leopoldo e Canoas, e de carga viral
do SARS-CoV-2 no esgoto bruto.

3 METODOLOGIA

Foram selecionadas, para o estudo, duas cidades do Vale do Rio dos Sinos/RS, per-
tencentes à região metropolitana de Porto Alegre. Com relação aos casos de Covid-19
nestas duas cidades, em São Leopoldo, até a data de 10 de agosto de 2021, foram conta-
bilizados 26.378 casos, enquanto na cidade de Canoas, foram contabilizados 42.902 (SES/
RS, 2021b).

A Cidade de São Leopoldo possui uma área territorial de 103,009 km2, com população
de 214.087 e densidade demográfica de 2.083,82 hab/km2. O Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH) do município é de 0,739, com um produto interno bruto (PIB) per capita de
R$ 38.317,82. A segunda cidade selecionada para o estudo, Canoas, possui uma área ter-
ritorial de 130,789 km2, com população de 323.827 e densidade demográfica de 2.470,15
hab/km2. O IDH do município é de 0,750, com um PIB per capita de R$ 55.594,20. (IBGE,
2021).

Os dados quantitativos utilizados nesse estudo foram obtidos a partir dos Boletins
de Monitoramento Ambiental de SARS-CoV-2 no RS, sob responsabilidade do Centro Es-
tadual de Vigilância em Saúde (CEVS/RS). A coleta de amostras, análises de dados e emis-
são de boletins de monitoramento pelo CEVS/RS iniciou em 11 de maio de 2020. Foram
emitidos nove boletins no total, contemplando de três a cinco semanas epidemiológicas
em cada boletim. O último boletim emitido tratou de quatro semanas epidemiológicas,
sendo a última destas do período da semana epidemiológica (SE) 13 de 2021, de 28 de
março de 2021 a 03 de abril de 2021 (SES/RS, 2021a). Todo o monitoramento foi realizado
em parceria com diversas instituições, entre elas: Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), Universidade Feevale, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz-RJ), Fundação Esta-
dual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (FEPAM), Departamento Municipal de

141
AMBIENTE: Percepções 2021

Água e Esgotos (DMAE), Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Porto Alegre e de Novo
Hamburgo, Companhia Municipal de Saneamento de Novo Hamburgo (COMUSA), Serviço
Municipal de Água e Esgoto de São Leopoldo (SEMAE) e Companhia Riograndense de Sa-
neamento (CORSAN) (SES/RS, 2021a).

A metodologia de monitoramento da carga viral foi realizada pela avaliação de frag-


mentos genômicos para os genes alvo E, N1 e N2 de SARS-CoV-2, utilizando a técnica de
RT-qPCR, nas amostras coletadas. Nos boletins de monitoramento, os dados são apresen-
tados, correspondendo às informações obtidas em cada semana de monitoramento, com
objetivo realizar a vigilância epidemiológica de SARS-CoV-2 em efluentes e mananciais e
dar suporte às autoridades de saúde, ao longo da epidemia, para tomada de decisão em
relação às medidas de prevenção contra a Covid-19, através de análise molecular a ocor-
rência e quantificação do RNA viral do SARS-CoV-2 em águas residuais e arroios (SES/RS,
2021a).

Em São Leopoldo, o local de coleta de amostras e quantificação da carga viral foi


a Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) Vicentina (Figura 1), sob responsabilidade do
Serviço Municipal de Água e Esgotos (SEMAE). Na cidade, 93,15% do esgoto é manejado de
forma adequada, sendo 76,88% por meio de coleta e tratamento do esgoto e 16,27% por
soluções individuais. Somente 6,85% do esgoto de São Leopoldo não é coletado e não tra-
tado (IAS, 2021). Para a ETE Vicentina, foram utilizados os dados da carga viral no esgoto
de 28 períodos de coleta, sendo o primeiro deles de 05 de julho de 2020 a 11 de julho de
2020, e o último entre 28 de março de 2021 e 03 de abril de 2021, conforme dados dos
Boletins de Monitoramento Ambiental de SARS-CoV-2 no RS (SES/RS, 2021a).

Na cidade de Canoas, a ETE Mato Grande (Figura 1), sob responsabilidade da Compa-
nhia Rio-Grandense de Saneamento (CORSAN), foi selecionada para a coleta de amostras
e quantificação da carga viral. Em Canoas, 88,74% do esgoto é manejado de forma adequa-
da, sendo 67,72% por meio de coleta e tratamento do esgoto e 20,75% por soluções indivi-
duais. A parcela restante do esgoto é dividida entre 4,53% que é coletado, mas não é trata-
do, e outros 7% de esgoto que não é coletado e não tratado (IAS, 2021). Foram utilizados os
dados da carga viral de 24 períodos de coleta na ETE Mato Grande, que é responsável pelo
tratamento do esgoto de Canoas. Sendo o primeiro período de 20 de setembro de 2020 a
26 de setembro de 2020 e o último período de coleta, entre 28 de março de 2021e 03 de

142
AMBIENTE: Percepções 2021

abril de 2021, conforme dados dos Boletins de Monitoramento Ambiental de SARS-CoV-2


no RS (SES/RS, 2021a).

Figura 1 - Localização do estudo. (A) Brasil; (B) Rio Grande do Sul e em destaque a Região Metropolitana
de Porto Alegre; (C) Região Metropolitana de Porto Alegre e em destaque os municípios de São Leopoldo e
Canoas; (D) Localização das ETEs Vicentina e Mato Grande em São Leopoldo e Canoas, respectivamente.

Fonte: Elaborado pelos autores

Para avaliação da relação entre o número de casos ativos de Covid-19 em cada uma
das cidades do Vale dos Sinos e a carga viral de SARS-CoV-2 no esgoto bruto das estações
de tratamento de esgoto das duas cidades, foram realizadas análises estatísticas dos da-
dos. Utilizando os dados de carga viral nas amostras de esgoto e o número de casos ativos
acumulados em cada período, realizou-se um teste de normalidade de Shapiro-Wilk. Rea-
lizou-se, também, o teste de correlação de postos de Spearman, para dados não normais,
com significância de 5%. O programa utilizado para a realização das análises estatísticas
foi o PAST, versão 4.03.

143
AMBIENTE: Percepções 2021

4 RESULTADOS E ANÁLISE

Considerada uma pandemia pela OMS devido ao rápido avanço no contágio, a Co-
vid-19, até o dia 10 de agosto de 2021, conforme dados da Universidade Johns Hopkins
(2021), já havia registrado mais de 200 milhões de casos confirmados de pessoas infec-
tadas pelo SARS-CoV-2 no mundo. E o Brasil, na mesma data, ocupava o terceiro lugar
em número de casos de pessoas infectadas, com mais de 20 milhões de casos confirma-
dos, correspondendo a cerca de 10% da população mundial positivada para o vírus (WHO,
2021). No estado do Rio Grande do Sul, o primeiro caso identificado de Covid-19 ocorreu
em 29 de fevereiro de 2020. Até o término da Semana Epidemiológica (SE) 30 de 2021, em
31 de julho de 2021 no estado, foram contabilizados 1.371.426 casos (SES/RS, 2021c).

A partir dos dados de presença do vírus em amostras de esgoto das cidades de São
Leopoldo e Canoas obtidos do monitoramento ambiental realizado pela Divisão de Vigilân-
cia Ambiental do Centro Estadual em Saúde do estado do Rio Grande do Sul, foi verificada
uma constante presença de SARS-CoV-2 nas amostras de águas residuais das cidades
estudadas.

Na Tabela 1, são apresentados os períodos amostrais e a data em que cada coleta foi
realizada, nas cidades de São Leopoldo e Canoas. São detalhadas as informações com as
datas dos períodos amostrais, de acordo com cada respectiva estação de tratamento de
esgotos das cidades de São Leopoldo e Canoas.

Diante dos dados apresentados, foi possível verificar que existem lacunas nas cam-
panhas amostrais, porque não houve a coleta do esgoto e, portanto, há ausência de alguns
dados. Logo, na estação de tratamento de esgoto de São Leopoldo, apresenta-se dados
da carga viral no esgoto para 28 períodos de coleta, enquanto para a estação da cidade de
Canoas, são 24 períodos de coleta.

Observa-se, a partir dos dados, que a metodologia utilizada para a elaboração dos
boletins trata de períodos amostrais que compreendem sete dias. Porém, a coleta das
amostras ocorreu somente em um dia específico para cada período amostral, ou seja, a
partir do dado pontual, infere-se a carga viral do período semanal. Enquanto isso, os dados
dos casos ativos de Covid-19 compreendem o somatório das semanas inteiras.

144
AMBIENTE: Percepções 2021

Tabela 1 - Período amostral correspondente à cada coleta realizada

São Leopoldo Canoas

Período amostral Data da coleta Período amostral Data da coleta

05/07/20 - 11/07/20 08/07/20 20/09/20 - 26/09/20 25/09/20

12/07/20 - 18/07/20 15/07/20 27/09/20 - 03/10/20 28/09/20

26/07/20 - 01/08/20 29/07/20 11/10/20 - 17/10/20 13/10/20

02/08/20 - 08/08/20 05/08/20 18/10/20 - 24/10/20 20/10/20

09/08/20 - 15/08/20 12/08/20 25/10/20 - 31/10/20 26/10/20

16/08/20 - 22/08/20 19/08/20 01/11/20 - 07/11/20 03/11/20

30/08/20 - 05/09/20 02/09/20 08/11/20 - 14/11/20 09/11/20

07/09/20 - 19/09/20 08/09/20 15/11/20 - 21/11/20 16/11/20

06/09/20 - 12/09/20 09/09/20 22/11/20 - 28/11/20 23/11/20

20/09/20 - 26/09/20 25/09/20 06/12/20 - 12/12/20 07/12/20

04/10/20 - 10/10/20 05/10/20 13/12/20 - 19/12/20 14/12/20

11/10/20 - 17/10/20 13/10/20 20/12/20 - 26/12/20 21/12/20

18/10/20 - 24/10/20 20/10/20 27/12/20 - 02/01/21 28/12/20

25/10/20 - 31/10/20 26/10/20 03/01/21 - 09/01/21 04/01/21

08/11/20 - 14/11/20 09/11/20 10/01/21 - 16/01/21 11/01/21

15/11/20 - 21/11/20 16/11/20 17/01/21 - 23/01/21 18/01/21

06/12/20 - 12/12/20 07/12/20 24/01/21 - 30/01/21 25/01/21

10/01/21 - 16/01/21 11/01/21 31/01/21 - 06/02/21 01/02/21

17/01/21 - 23/01/21 18/01/21 14/02/21 - 20/02/21 17/02/21

24/01/21 - 30/01/21 25/01/21 21/02/21 - 27/02/21 22/02/21

31/01/21 - 06/02/21 01/02/21 28/02/21 - 06/03/21 01/03/21

07/02/21 - 13/02/21 08/02/21 07/03/21 - 13/03/21 08/03/21

14/02/21 - 20/02/21 17/02/21 21/03/21 - 27/03/21 22/03/21

21/02/21 - 27/02/21 22/02/21 28/03/21 - 03/04/21 29/03/21

28/03/21 - 06/03/21 01/03/21

07/03/21 - 13/03/21 08/03/21

14/03/21 - 20/03/21 15/03/21

28/03/21 - 03/04/21 29/03/21


Fonte: Adaptado de SES/RS (2021a, 2021b)

145
AMBIENTE: Percepções 2021

Diante dos dados apresentados, foi possível verificar que existem lacunas nas cam-
panhas amostrais, porque não houve a coleta do esgoto e, portanto, há ausência de alguns
dados. Logo, na estação de tratamento de esgoto de São Leopoldo, apresenta-se dados
da carga viral no esgoto para 28 períodos de coleta, enquanto, para a estação da cidade de
Canoas, são 24 períodos de coleta.

Observa-se, a partir dos dados, que a metodologia utilizada para a elaboração dos
boletins trata de períodos amostrais que compreendem sete dias. Porém, a coleta das
amostras ocorreu somente em um dia específico para cada período amostral, ou seja, a
partir do dado pontual, infere-se a carga viral do período semanal. Enquanto isso, os dados
dos casos ativos de Covid-19 compreendem o somatório das semanas inteiras.

Nas Figuras 2 e 3, estão representados os dados de carga viral e dos casos ativos
acumulados em função do tempo, nas cidades de São Leopoldo e Canoas, respectivamen-
te. Na avaliação dos dados das figuras, nota-se uma variação numeral elevada no parâme-
tro carga viral e, para este, foram calculados os valores do desvio padrão. Como resultado
dos cálculos, foram obtidos valores de desvio padrão de 606361, para os dados de São
Leopoldo e de 650781, para os dados de Canoas.

Figura 2 - Casos ativos acumulados e carga viral por período amostral em São Leopoldo

Fonte: Adaptado de SES/RS, 2021a, 2021b

146
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 3 - Casos ativos acumulados e carga viral por período amostral em Canoas

Fonte: Adaptado de SES/RS, 2021a, 2021b

Diante dos dados de quantificação da carga viral de São Leopoldo (Figura 2), foram
apresentados nos relatórios de monitoramento do governo do estado valores de 0 cg/L. O
valor zero foi obtido quando houve a detecção do vírus, porém não foi quantificado (SES/
RS, 2021a).

Após realização do teste estatístico de Shapiro Wilk para os dados coletados, não
foi obtido o pressuposto da normalidade, por isso, procedeu-se com o teste de postos de
Spearman. Os resultados para São Leopoldo foram de r=0,16331 e p=0,40635, e, com
relação a Canoas, os resultados foram r=0,2687 e p=0,20424. A partir dos resultados das
análises estatísticas, verifica-se que não foi encontrada relação entre a carga viral do es-
goto das cidades e o número de casos ativos da população. Assim, a hipótese de que a me-
todologia seria adequada para estimar o número de casos ativos em relação à carga viral
no esgoto não se confirmou. Ressalta-se que o monitoramento realizado forneceu resul-
tados que podem e devem ser considerados pelo sistema de saúde, já que nas amostras
analisadas encontraram-se resultados de carga viral positiva e quase contínua no esgoto,
atuando como uma análise qualitativa do mesmo. Portanto, os testes se demonstram vá-
lidos para determinar a presença de SARS-CoV-2 na população geradora do esgoto.

147
AMBIENTE: Percepções 2021

A falta de relação entre a carga viral no esgoto das cidades selecionadas e do nú-
mero de casos ativos da população pode estar relacionada a diferentes fatores. Um dos
fatores a ser considerado é a diluição das cópias do vírus nas águas residuais ou no es-
goto sanitário. Sabe-se que as cópias virais nas fezes de pessoas com teste positivo para
SARS-CoV-2 variaram de 5x103 a 107,6 cópias/mL. A diluição de fezes positivas em águas
residuais causa uma queda na concentração de 4-5 ordens de magnitude ou mais. Esta
diluição pode ocorrer devido a fatores como: vazão diária descarregada no esgoto por uma
pessoa (estima-se que seja cerca de 80% da oferta média diária de água potável per capita
com uma diluição de aproximadamente 103 vezes), água da chuva ou infiltrações nas redes
de esgoto. Além disso, cabe frisar que nem toda a população contribui para a carga viral
e isso depende do percentual de casos positivos entre a população atendida pela Estação
de Tratamento de Águas Residuais (ETAR). Outro ponto a ser considerado é que a carga
viral presente nas fezes apresenta grandes variações e, dessa forma, não permite a com-
paração direta entre a carga viral diária nas águas residuais e as cópias virais nas fezes de
pessoas infectadas por SARS-CoV-2. Por isso, faz-se necessário ampliar as pesquisas para
propor valores razoáveis que possam ser usados como referência (FOLADORI et al., 2020).
A contribuição viral de portadores assintomáticos e pré-sintomáticos para a transmissão
da SARS-CoV-2 também se mantém desconhecida. Embora seja provável que as cargas
virais em portadores assintomáticos sejam relativamente baixas, são necessárias mais
pesquisas para comprovar esse fato (NGHIEM et al., 2020).

O procedimento de amostragem adotado para a realização do monitoramento da


presença de SARS-CoV-2 nas cidades de São Leopoldo e Canoas pode ser outro fator que
contribuiu para o resultado do presente estudo. O procedimento de amostragem é consi-
derado fundamental para garantir uma caracterização robusta e confiável da carga viral no
esgoto, já que as taxas de fluxo quanto às concentrações de poluentes nas águas residuais
estão sujeitas a fortes variações durante o dia. Observa-se que as coletas foram realiza-
das em um único dia, de forma simples e pontual, sendo recomendável a coleta de amos-
tras compostas ao longo de um período, como na metodologia adotada por Foladori et al.
(2020), em que a avaliação da carga viral ocorreu a partir de amostras compostas. No estu-
do dos autores, alíquotas fixas foram coletadas em intervalos de tempo definidos durante
o dia e assim representaram as características médias das águas residuais durante o dia.

148
AMBIENTE: Percepções 2021

Utilizando a amostragem composta, pode-se garantir resultados mais precisos e


confiáveis, levando em consideração que as amostras devem ser mantidas em baixas tem-
peraturas durante o período de coleta, preservando, assim, a carga viral e a viabilidade
(FOLADORI et al., 2020). Segundo Hata et al. (2020), uma amostra aleatória é variável na
concentração de SARS-CoV-2, especialmente quando o número de indivíduos infectados é
baixo e a contaminação do SARS-CoV-2 em águas residuais ocorre intermitentemente em
um nível próximo ao limite de detecção. A concentração de SARS-CoV-2 em uma amostra
composta é considerada média e mais representativa, portanto, para haver uma correla-
ção entre o número de infectados com o patógeno de Covid-19 e a concentração de SAR-
S-CoV-2 em águas residuais, o emprego de amostras compostas pode ser mais eficiente
(HATA et al., 2021).

No presente estudo, a metodologia de monitoramento da carga viral foi realizada


pela avaliação de fragmentos genômicos para os genes alvo E, N1 e N2 de SARS-CoV-2,
utilizando a técnica de RT-qPCR, nas amostras coletadas. Estas são algumas das meto-
dologias de detecção disponíveis, dentre os vários ensaios moleculares projetados para a
detecção de SARS-CoV-2 em águas residuais, porém, um método padrão ouro ainda não
foi determinado. Assim, a não correlação entre os dados de quantificação da carga viral,
em comparação com os casos ativos, pode estar ligada também à metodologia de moni-
toramento implementada, sendo que outros autores também demonstraram resultados
inconsistentes entre diferentes genes-alvo (HATA et al., 2021; MEDEMA et al., 2020; RAN-
DAZZO et al., 2020).

Nesse sentido, verifica-se, a partir dos dados do estudo de Hata et al. (2020), a in-
consistência de dados entre diferentes ensaios de RT-qPCR comparativamente. No estu-
do, os autores verificaram, entre 45 amostras testadas, que o ensaio CDCN3 (Controle e
Prevenção de Doenças dos EUA, visando ao genoma da nucleoproteína do vírus N3) resul-
tou na maior frequência de detecção e tendeu a mostrar concentrações detectadas mais
altas. O ensaio NIID (Instituto Nacional de Doenças Infecciosas do Japão) resultou em uma
frequência de detecção muito menor e parecia ser ineficiente. Esses verificaram ainda que
algumas amostras negativas, de acordo com o ensaio CDCN3, foram positivas de acordo
com o ensaio CDCN2 (Controle e Prevenção de Doenças dos EUA, visando ao genoma da
nucleoproteína do vírus N2). Houve, portanto, resultados inconsistentes entre os ensaios,

149
AMBIENTE: Percepções 2021

e isso se deve à falha de alguns deles em amplificar genes de cepas específicas de SARS-
-CoV-2 (HATA et al., 2021).

A inexistência de relação encontrada nos resultados do presente estudo pode estar


também associada à metodologia de testagem da população, uma vez que não se tem
um protocolo adotado pelo sistema de saúde no Estado do Rio Grande do Sul, incluindo
entidades públicas e privadas, para a testagem clínica dos pacientes. Neste sentido, o es-
tudo de Wu et al. (2020b) também observou uma discrepância na relação entre os casos
confirmados esperados e confirmados. O estudo destes foi realizado em uma grande ETAR
de Massachusetts, nos Estados Unidos, na qual foram detectados altos títulos de SAR-
S-CoV-2, por RT-qPCR e sequenciamento direto de DNA (ácido desoxirribonucleico) nas
águas residuárias coletadas entre 18 e 25 de março de 2020. Os títulos virais encontrados
foram consideravelmente mais altos do que o esperado em comparação aos casos clinica-
mente confirmados em Massachusetts a partir de 25 de março de 2020. Os autores não
souberam a razão para esta discrepância, porém consideraram que os resultados corrobo-
ram com a ideia de que uma fração significativa de casos não é detectada pelos atuais al-
goritmos de teste e nessa fração poderia inserir os pacientes assintomáticos. Também, no
estudo, foi indicada a importância de que suas águas residuárias sejam investigadas para
que seja possível estimar a prevalência da doença independentemente de se conhecer o
título viral médio nas fezes infectadas.

Diante dos resultados positivos de SARS-CoV-2 nas amostras analisadas nas cida-
des de São Leopoldo e Canoas, pode-se considerar que a metodologia foi eficaz no acom-
panhamento da circulação do vírus. Isto corrobora as conclusões de Medema et al. (2020),
que detectaram a presença de SARS-CoV-2 em águas residuais de algumas ETARs, que
atendem duas grandes cidades e três médias e o aeroporto principal na Holanda. Estes au-
tores obtiveram resultados positivos para os primers selecionados, quando a prevalência
de Covid-19 era baixa na ordem de 1,0 a 3,5 casos entre 100.000 pessoas, embora nem
sempre de forma consistente. Contudo, sugeriram que, mesmo assim, o monitoramento
de esgoto pode ser sensível para prever a circulação do vírus em uma comunidade.

No Brasil, estudos já foram realizados para discutir a relação entre a carga de SAR-
S-CoV-2 no esgoto e o número de casos ativos de Covid-19, e, assim como no presente
estudo, os autores não obtiveram correlação entre os dados. Prado et al. (2020) realizaram

150
AMBIENTE: Percepções 2021

seu estudo na cidade de Niterói, no Rio de Janeiro, e verificaram que o aumento do SARS-
-CoV-2 no esgoto não acompanhou um número proporcionalmente grande de casos noti-
ficados de Covid-19 ou óbitos relacionados pelo sistema de saúde. Os autores propuseram
duas hipóteses para isso ter ocorrido. A primeira de que é provável que grande parte da
nova onda de infecção ocorreu em jovens que costumam apresentar sintomas leves e que
frequentam bares, academias e atividades esportivas coletivas, dispensando atendimento
médico ou hospitalar na maioria dos casos. A segunda hipótese está relacionada à subno-
tificação ou atraso na atualização do número de casos diários/semanais notificados pelo
sistema de saúde.

As análises em redes de esgoto e ETARs são constantemente empregadas para


monitorar de forma qualitativa e quantitativa a presença de compostos químicos, poluentes
e patógenos nas comunidades, sendo, assim, capazes de compreender os hábitos e com-
portamentos das populações de forma não-invasiva (MAINARDI; BIDOIA, 2021). O moni-
toramento de águas residuais serve como uma ferramenta de vigilância epidemiológica,
conhecida como Epidemiologia Baseada em Águas Residuais ou WBE e tem sido conside-
rada como uma forma rápida, econômica, não-invasiva e robusta de rastreamento viral e
controle epidemiológico (FOLADORI et al., 2020; MAINARDI; BIDOIA, 2021). Em termos ge-
rais, a WBE significa “a aplicação e o desenvolvimento do uso da medição quantitativa de
biomarcadores humanos em esgotos para avaliar estilo de vida, saúde e exposição no nível
da comunidade. Até o momento, tem sido bastante empregada em estudos relacionados
a medicamentos ou consumo farmacêutico, mas também para o poliovírus e vigilância de
doenças infecciosas e alerta precoce (FOLADORI et al., 2020; NAKAMURA et al., 2015). Em
Israel, um programa de WBE robusto identificou “o surto silencioso de poliomielite” de
2013-2014 antes que qualquer caso de poliomielite fosse detectado, permitindo assim
uma rápida implantação de uma campanha de vacinação (BROUWER et al., 2018; THERMO
FISHER SCIENTIFIC, 2020).

Durante a pandemia de Covid-19, a WBE continua sendo uma ferramenta epidemio-


lógica inovadora, com potencial para complementar os sistemas de vigilância de doenças
infecciosas e subsidiar sistemas de alerta precoce para surtos de doenças, principalmente
quando associada às políticas públicas e em regiões menos desenvolvidas e com condições
inadequadas de saneamento (SODRÉ et al., 2020). Visto que o SARS-CoV-2 foi detectado

151
AMBIENTE: Percepções 2021

nas fezes de pessoas sintomáticas e assintomáticas, a WBE pode ser uma ferramenta
importante para monitorar a propagação do vírus, uma vez que pode fornecer informações
sobre surtos quase em tempo real (THERMO FISHER SCIENTIFIC, 2020).

Entretanto, para estabelecer a WBE no monitoramento de doenças infecciosas, há


desafios que necessitam ser vencidos, como as seleções de biomarcadores estáveis nas
águas residuárias, as possíveis incertezas relacionadas à contribuição da população e o
intervalo de tempo entre a coleta e análise dos dados (SODRÉ et al., 2020). Por isso, para
a WBE ser aplicada com sucesso, a coordenação de metodologias e o compartilhamento
de dados entre diferentes cientistas são imprescindíveis. A padronização dos métodos de
amostragem e o compartilhamento de métodos analíticos e informações coletadas forne-
ceriam uma base sólida para estimar a consistência da população atendida (FOLADORI et
al., 2020).

Apesar dessas dificuldades, o monitoramento de águas residuais pode ser proposto


também como um sistema de detecção semiquantitativo ou, na pior das hipóteses, para
detectar a presença/ausência na vigilância precoce da difusão de SARS-CoV-2 (NGHIEM
et al., 2020). Assim sendo, o monitoramento em redes de esgoto poderia complementar
a vigilância clínica atual, que se concentra principalmente em pacientes com sintomas de
Covid-19, enquanto os indivíduos infectados, mas assintomáticos, são excluídos. A WBE
pode ser uma ferramenta promissora para a vigilância da propagação de SARS-CoV-2,
contudo, estudos extensos e altamente coordenados, incluindo a quantificação da carga
viral individual nas fezes, no período da infecção, devem ser registrados, afinal, os dados
quantitativos sobre a carga viral nas fezes e águas residuais e sua relação, atualmente in-
certa, são fundamentais para as aplicações da WBE, no pressuposto de alerta precoce de
surtos. Em particular, a grande incerteza na carga viral nas fezes torna difícil determinar
valores parâmetros que seriam extremamente úteis neste diagnóstico (FOLADORI et al.,
2020). Diante dessa realidade, os resultados do presente estudo contribuem de maneira
positiva, já que foi verificado de maneira qualitativa a presença de SARS-CoV-2 no esgoto
na população geradora do esgoto. Portanto, estes dados trazem argumentos para a ges-
tão da pandemia pelo sistema de saúde.

A hipótese do presente estudo sobre a relação da carga viral no esgoto com o número
de casos ativos não se confirmou, mas a detecção do SARS-CoV-2 pode ser útil para indi-

152
AMBIENTE: Percepções 2021

car a disseminação da doença, se houver a detecção do RNA em locais onde não há casos
ativos. O estudo de Prado et al. (2021) foi realizado neste sentido. Os autores investiga-
ram, além da ETARs, também as redes de esgoto, a fim de encontrar novos indicadores que
orientassem a alocação de recursos e investimentos para o controle da disseminação da
doença, promovendo intervenções nas áreas mais afetadas. Dessa forma, o SARS-CoV-2
foi detectado pela primeira vez em esgotos em 22 de abril de 2020, contudo, naquela lo-
calidade, nenhum caso de Covid-19 havia sido relatado. Com isso, foi possível lançar uma
vigilância ativa para procurar indivíduos que apresentassem sintomas relacionados ao pa-
tógeno de Covid-19, identificar os indivíduos infectados por meio de testes e implementar
medidas para controlar a propagação da doença nessa região (PRADO et al., 2020).

Logo, o maior trunfo da WBE é a capacidade de determinar rapidamente o status e


as tendências das infecções nas comunidades, possibilitando identificar regiões com ca-
sos não notificados da doença, principalmente em áreas de vulnerabilidade social, e de-
finir estratégias de enfrentamento regionalizadas em áreas prioritárias para focar a dis-
tribuição de exames e outros recursos, assim servindo como uma prevenção mais rápida
e permitindo ações de saúde pública por parte do Estado (PRADO et al., 2020; SODRÉ et
al., 2020). Sendo assim, A WBE poderia ajudar a determinar uma tendência de aumen-
to ou diminuição da propagação de SARS-CoV-2 (FOLADORI et al., 2020). Alguns grupos
de pesquisa estão direcionando os esforços no monitoramento de águas residuais para o
RNA do SARS-CoV-2, especificamente, para esse propósito. A ferramenta WBE pode ser
útil também em relação a uma nova onda de infecção de vírus e, a partir da otimização das
metodologias de quantificação da taxa de infecção da população e da presença do vírus, o
nível de infecção e as tendências temporais podem ser determinados comparando (ou as-
sociando) a carga viral nas águas residuais com a população atendida (DAUGHTON, 2020;
FOLADORI et al., 2020).

As ETARs não oferecem precisão para identificação de surtos, mas são eficazes
para monitorar tendências, ou seja, para avaliar se as concentrações de SARS-CoV-2
estão aumentando ou diminuindo em uma população mais ampla, indicando um risco de
ocorrência da doença nas comunidades (PRADO et al., 2020). Com a seleção cuidadosa de
pontos de amostragem juntamente com as redes de esgoto, com o uso de campanhas de
amostragem bem planejadas no contexto espaço-temporal, com a adição de novas variá-

153
AMBIENTE: Percepções 2021

veis, como dados de precipitação e sócio-ambientais, o monitoramento de águas residuais


pode se tornar uma ferramenta útil para monitorar e avaliar a incidência da doença Co-
vid-19 nas populações e dessa maneira informar a política de saúde pública relacionada
(NGHIEM et al., 2020).

A avaliação quantitativa real da infecção comunitária por SARS-CoV-2 seria extre-


mamente desafiadora devido ao grande número de fatores envolvidos e à variabilidade
desconhecida desses fatores (por exemplo, grande variabilidade nas taxas de eliminação
viral de SARS-CoV-2 entre as pessoas e também entre os diferentes estágios de infecção,
a persistência desconhecida de RNA viral em águas residuais e as condições de fluxo va-
​​ sistemas de esgoto) (DAUGHTON, 2020; NGHIEM et al., 2020).
riáveis em

No entanto, mesmo diante das dificuldades, o monitoramento de águas residuais


pode se qualificar como um eficiente sistema de detecção precoce semiquantitativo para
a SARS-CoV-2, ou como um método qualitativo de presença ou ausência do vírus. Essa
ferramenta, se utilizada de maneira contínua, pode estabelecer respostas políticas ju-
risdicionais para a gestão do Covid-19. Os testes de rotina de águas residuais poderiam
estar previstos nos planos de contenção de avanço da pandemia, sendo utilizados como
parâmetro para estabelecer as restrições de distanciamento social. Essas informações,
disponibilizadas de maneira ágil, teriam grande relevância social, dado o custo diário dos
bloqueios relacionados à pandemia (NGHIEM et al., 2020), uma vez que o distanciamento
social foi uma estratégia adotada para conter o avanço do contágio, através da restrição
temporária da realização de algumas atividades públicas e a ocorrência de aglomerações.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma possível rota da infecção pode ser mediada por esgoto contaminado, pelas fe-
zes e outros excrementos de pessoas infectadas com SARS-CoV-2. Contudo, pouco se
sabe sobre a dinâmica dos níveis do patógeno em águas residuais. Atualmente, os meca-
nismos para garantia da qualidade e testes de proficiência para a testagem ambiental para
SARS-CoV-2 precisam ser estabelecidos. É preciso explorar as metodologias a fim de vali-
dar como o esgoto pode retratar o cenário de contaminações, suas potencialidades como

154
AMBIENTE: Percepções 2021

instrumento para auxiliar nos sistemas de vigilância da pandemia e identificar a circulação


do vírus em uma comunidade sem o consentimento para a testagem.

O levantamento quantitativo de dados e das relações entre variáveis não encontrou


relação entre a carga viral do esgoto bruto coletado e analisado e os casos ativos das cida-
des observadas, ambas com 92,9% da população com esgotamento sanitário, concluindo
que se faz necessário ampliar as pesquisas para propor valores razoáveis que possam
ser usados como referência. Assim sendo, o monitoramento em redes de esgoto pode-
ria complementar a vigilância clínica atual, que se concentra principalmente em pacientes
com sintomas. Com a seleção cuidadosa de pontos de amostragem juntamente às redes
de esgoto, coletas mais representativas, o monitoramento ambiental pode ser empregado
para obter informações relativas a populações selecionadas por determinada instalação
ou área e com o desenvolvimento e o uso de campanhas de amostragem bem planejadas
com resolução espaço-temporal adequada.

O desafio passa a ser projetar um sistema de vigilância amplamente aceito para de-
tectar a presença potencial de infecções por SARS-CoV-2 nas comunidades e utilizar esses
dados da WBE como ferramenta para futuras intervenções na saúde pública e parte das
estratégias de combate à Covid-19. Além do mais, esses dados podem ser úteis para ava-
liar a eficácia de diferentes medidas de controle, como o distanciamento social.

REFERÊNCIAS
ANA - AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS E SANEAMENTO BÁSICO. 2021. Disponível em: ht-
tps://www.gov.br/ana/pt-br/. Acesso em: 10 ago. 2021.

BOJKOVA, D. et al. Proteomics of SARS-CoV-2-infected host cells reveals therapy targets.


Nature, v. 583, p. 469–472, 2020.

BROUWER, A. F. et al. Epidemiology of the silent polio outbreak in Rahat, Israel, based on
modeling of environmental surveillance data. Proceedings of the National Academy of Sci-
ences, v. 115, n. 45, p. E10625–E10633, 2018.

CHAVARRIA-MIRO, G. et al. Time evolution of severe acute respiratory syndrome Coronavi-


rus 2 (SARS-CoV-2) in wastewater during the first pandemic wave of Covid-19 in the met-

155
AMBIENTE: Percepções 2021

ropolitan area of Barcelona, Spain. Applied and Environmental Microbiology, v. 87, n. 7, p.


e02750-20, 2021.

DAUGHTON, C. The international imperative to rapidly and inexpensively monitor communi-


ty-wide Covid-19 infection status and trends. Science of the Total Environment, v. 726, p.
138149, 2020.

ELSAMADONY, M. et al. Possible transmission of viruses from contaminated human feces


and sewage: implications for SARS-CoV-2. Science of the Total Environment, v. 755, p.
142575, 2021.

FOLADORI, P. et al. SARS-CoV-2 from feces to wastewater treatment: what do we know? A


review. Science of the Total Environment, v. 743, p. 140444, 2020.

GIACOBBO, A. et al. A critical review on SARS-CoV-2 infectivity in water and wastewater.


what do we know? Science of the Total Environment, v. 774, p. 145721, 2021.

HARAMOTO, E. et al. First environmental surveillance for the presence of SARS-CoV-2 RNA
in wastewater and river water in Japan. Science of the Total Environment, v. 737, p. 140405,
2020.

HATA, A. et al. Detection of SARS-CoV-2 in wastewater in Japan during a Covid-19 outbreak.


Science of the Total Environment, v. 758, p. 143578, 2021.

HUANG, C. et al. Clinical features of patients infected with 2019 novel coronavirus in Wuhan,
China. The Lancet, v. 395, p. 497-506, 2020.

IAS - INSTITUTO ÁGUA E SANEAMENTO. Plataforma Municípios e Saneamento. 2021. Dis-


ponível em: https://www.aguaesaneamento.org.br/municipios-e-saneamento. Acesso em:
10 ago. 2021.

IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Informações geográficas e


estatísticas do Brasil. 2021. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br. Acesso em: 10 ago.
2021.

JONES, D. L. et al. Shedding of SARS-CoV-2 in feces and urine and its potential role in per-
son-to-person transmission and the environment-based spread of Covid-19. Science of the
Total Environment, v. 749, p. 141364, 2020.

KITAMURA, K. et al. Efficient detection of SARS-CoV-2 RNA in the solid fraction of wastewa-
ter. Science of the Total Environment, v. 763, p. 144587, 2021.

156
AMBIENTE: Percepções 2021

MAINARDI, P. H; BIDOIA, E. D. A importância do monitoramento do SARS-CoV-2 em redes de


esgoto e estações de tratamento de águas residuárias. Brazilian Journal of Health Review,
v. 4, n. 2, p. 5051-5066, 2021.

MEDEMA, G. et al. Presence of SARS-Coronavirus-2 in sewage. Environmental Science &


Technology Letters, v. 7, p. 511-516, 2020.

MOHAN, S. V. et al. SARS-CoV-2 in environmental perspective: occurrence, persistence, sur-


veillance, inactivation and challenges. Chemical Engineering Journal, v. 405, p. 126893,
2021.

MOHSENI, A. H. et al. Body fluids may contribute to human-to-human transmission of se-


vere acute respiratory syndrome coronavírus 2: evidence and practical experience. Chinese
Medicine, v. 15, n. 58, 2020.

NAKAMURA, T. et al. Environmental surveillance of poliovirus in sewage water around the


introduction period for inactivated polio vaccine in Japan. Applied and Environmental Micro-
biology, v. 81, n. 5, p. 1859-1864, 2015.

NGHIEM, L. D. et al. The Covid-19 pandemic: considerations for the waste and wastewater
services sector. Case Studies in Chemical and Environmental Engineering, v. 1, p. 100006,
2020.

PECCIA, J. et al. Measurement of SARS-CoV-2 RNA in wastewater tracks community infec-


tion dynamics. Nature Biotechnology, v. 583, n. 10, p. 1164-1167, 2020.

PRADO, T. et al. Wastewater-based epidemiology as a useful tool to track SARS-CoV-2 and


support public health policies at municipal level in Brazil. Water Research, v. 191, p. 116810,
2021.

RANDAZZO, W. et al. SARS-CoV-2 RNA in wastewater anticipated Covid-19 occurrence in a


low prevalence area. Water Research, v. 181, p. 115942, 2020.

SES/RS - SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Boletins de Acom-


panhamento. 2021a. Disponível em: https://coronavirus.rs.gov.br/boletim-ambiental. Aces-
so em: 10 ago. 2021.

SES/RS - SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Painel Coronavírus


RS. 2021b. Disponível em: https://ti.saude.rs.gov.br/ covid19/. Acesso em: 10 ago. 2021.

157
AMBIENTE: Percepções 2021

SES/RS - SECRETARIA DA SAÚDE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Boletim Epidemio-


lógico Covid-2019 nº 30/2021. 2021c. Disponível em: https://coronavirus.rs.gov.br/upload/
arquivos/202108/10160614-boletim-epidemiologico-covid-19-coers-se-30.pdf. Acesso
em: 10 ago. 2021.

SODRÉ, F. F. et al. Epidemiologia do esgoto como estratégia para monitoramento comuni-


tário, mapeamento de focos emergentes e elaboração de sistemas de alerta rápido para
Covid-19. Química Nova, v. 43, n. 4, p. 515-519, 2020.

THERMO FISHER SCIENTIFIC. SARS-CoV-2 in wastewater: a potential early-Warning meth-


od. 2020. Disponível em: https://www.thermofisher.com/blog/behindthebench/sars-cov-
-2-in-wastewater-a-potential-early-warning-method/. Acesso em: 30 jun. 2021.

TRAN, H. N. et al. SARS-CoV-2 Coronavirus in water and wastewater: a critical review about
presence and concern. Environmental Research, v. 193, p. 110265, 2021.

UNIVERSIDADE JOHN HOPKINS. Coronavirus Resource Center. 2021. Disponível em: https://
coronavirus.jhu.edu/map.html. Acesso em: 30 jun. 2021.

WHO - WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO Statement regarding cluster of pneumonia


cases in Wuhan, China. 2019. Disponível em: https://www.who.int/china/news/ detail/09-
01-2020-who-statement-regarding-cluster-of-pneumonia-cases-in-wuhan-china/. Aces-
so em: 09 ago. 2021.

WHO - WORLD HEALTH ORGANIZATION. WHO Coronavirus (Covid-19) Dashboard. 2021.


Disponível em: https://covid19.who.int/. Acesso em: 10 ago. 2021.

WU, Y. et al. Prolonged presence of SARS-CoV-2 viral RNA in faecal samples. The Lancet,
Gastroenterology & Hepatology, v. 5, n. 5, p. 434-435, 2020a.

WU, F. et al. SARS-CoV-2 titers in wastewater are higher than expected from clinically con-
firmed cases. Applied and Environmental Science, v. 5, n. 4, p. e00614-20, 2020b.

YI, Y. et al. Covid-19: what has been learned and to be learned about the novel Coronavirus
disease. International Journal of Biological Sciences, v. 16, n. 10, p. 1753-1766, 2020.

ZHOU, P. et al. A pneumonia outbreak associated with a new Coronavirus of probable bat
origin. Nature, v. 579, p. 270-273, 2020.

158
7
GESTÃO MUNICIPAL DE
DESASTRES HIDROLÓGICOS
OCORRIDOS NO RIO
GRANDE DO SUL

Eloir Dutra Lourenço


Fabrício Wilbert
Paula Santos
Sabrina Antunes Vieira
Günther Gehlen
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUÇÃO

Os desastres naturais estão cada vez mais presentes no cotidiano das pessoas pelas
inúmeras ocorrências registradas nos últimos anos, tanto no Brasil como em outras partes
do mundo, mas, principalmente, pelo aumento da população e do número de pessoas que
habitam áreas de risco.

Um desastre natural pode ser conceituado como um desastre causado por fenôme-
nos naturais, que podem implicar em perdas humanas, impactos à saúde, danos ao meio
ambiente e à propriedade. Podem ser classificados como biológicos, geofísicos, climatoló-
gicos, hidrológicos, meteorológicos e extraterrestres (MI, 2012).

Ainda que em um primeiro momento o termo nos leve a associá-lo com terremotos,
tsunamis, erupções vulcânicas, ciclones e furacões, os desastres naturais contemplam,
também, processos e fenômenos mais localizados, tais como deslizamentos, inundações
e erosão, que podem ocorrer naturalmente ou induzidos pelo homem (TOMINAGA et al.,
2009).

No Brasil não costumam ocorrer desastres de grande magnitude, como os terre-


motos e tsunamis. Os desastres naturais mais comuns em nosso território decorrem de
escorregamentos e de inundações, fenômenos diretamente relacionados com variáveis hi-
drológicas como a precipitação. Esses são agravados pela ação do homem, principalmente
interferindo no uso e ocupação do solo de uma região.

Muitas pessoas morrem anualmente devido às consequências de desastres de vei-


culação hídrica. Outras perdem todo o patrimônio familiar alcançado com muitos anos de
trabalho e esforço. Nas cidades litorâneas, que se desenvolveram em cotas baixas, a coin-
cidência de marés altas também contribui para agravar o problema (CEPDEC, 2018).

No sul do Brasil, os desastres naturais que ocorrem com maior frequência têm ori-
gem hidrometeorológica (estiagem, vendaval, enxurrada, inundação e granizo). Histori-
camente, essa região chama atenção não apenas pela ocorrência de grandes desastres,
como também pela frequência e variedade de eventos, inclusive de eventos atípicos, como
o Furacão Catarina (UFSC, 2012). Essa região fica atrás apenas da região Sudeste quando
se compara o número de registros de desastres naturais no Brasil. No Rio Grande do Sul,

160
AMBIENTE: Percepções 2021

os eventos que ocorrem com maior frequência são as estiagens (45%) seguidas pelas en-
xurradas e inundações (31%).

Em termos econômicos, o impacto destes eventos também é crescente (CHARVÉ-


RIAT, 2000; RAUCH, 2011). Obviamente a magnitude do impacto depende diretamente
da intensidade do fenômeno, mas também do estágio de desenvolvimento econômico do
país, do estágio de evolução de suas instituições e do investimento realizado em preven-
ção (KOUSKY, 2012).

Os custos envolvidos com desastres abrangem também investimentos em preven-


ção e gestão de riscos de desastres, pois esses, além de auxiliarem na minimização dos
impactos causados pelos eventos, também reduzem os danos econômicos e os investi-
mentos pós-desastre.

Diante disso, esse estudo tem como objetivo principal analisar como os municípios
do estado do Rio Grande do Sul realizam a gestão de desastres naturais ocorridos nos úl-
timos 10 anos, decorrentes de eventos críticos de precipitação (enxurradas e inundações).

Para tanto, foram definidos os seguintes objetivos: verificar os principais desastres


com enxurradas e inundações que ocorreram no RS nos últimos 10 anos (2007-2016);
identificar a forma de gerenciamento implementada pela administração pública dos dados
relacionados aos desastres, inclusive quanto aos custos aplicados; caracterizar os investi-
mentos e ações da administração pública em prevenção a desastres; e verificar a situação
atual dos municípios do Estado quanto à gestão e prevenção dos riscos.

Para atingir os objetivos, a metodologia consistiu em pesquisa bibliográfica, levanta-


mento de dados e aplicação de questionários para os municípios mais atingidos por inun-
dações e enxurradas no RS.

Este capítulo será apresentado em quatro seções, quais sejam: Seção 1: Fundamen-
tação teórica abrangendo todos os conceitos pertinentes do assunto estudado; Seção 2:
Metodologia, com detalhamento da área de estudo e dos procedimentos utilizados na pes-
quisa; Seção 3: Resultados e Análise, contemplando todos os resultados obtidos através
da aplicação do método com as devidas considerações e fundamentações teóricas; Seção
4: Considerações finais.

161
AMBIENTE: Percepções 2021

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 DESASTRES NATURAIS


Desastre natural pode ser definido como o efeito do impacto de fenômenos naturais
extremos ou intensos sobre determinado meio social, causando danos e prejuízos de gran-
de monta, excedendo a capacidade da comunidade atingida em conviver com o impacto
(TOBIN; MONTZ,1997; MARCELINO, 2008).

Mundialmente, nas últimas décadas, verificou-se um aumento de ocorrências de de-


sastres naturais e também nos prejuízos decorrentes. Constata-se uma tendência global
deste aumento a partir da década de 70, passando de 50 registros por ano para 350 em
2008. Além disso, os prejuízos estimados, que em 1975 eram de aproximadamente 5 bi-
lhões de dólares, passaram a 180 bilhões em 2008 (TOMINAGA et al., 2009).

De acordo com Guha-Sapir, Hoyos e Below (2016), em um levantamento realizado


para o Centro de Pesquisa em Epidemiologia e Desastres (CRED), no ano de 2015 foram
registrados 376 desastres naturais em todo o mundo. Nesse levantamento, os desastres
foram divididos em quatro categorias, sendo elas: climatológicos (secas e incêndios natu-
rais), geofísicos (terremotos/tsunamis, atividades vulcânicas e movimentos de massa de
origem geológica), hidrológicos (alagamentos e movimentos de massa de origem hidroló-
gica) e meteorológicos (tempestades e temperaturas extremas).

Em muitas regiões do sul de América do Sul observa-se um aumento na frequência


de eventos de chuva intensa, que em parte explicam a ocorrência cada vez maior de desas-
tres naturais, como deslizamentos de terras e inundações (MARENGO, 2009).

Teoricamente, os desastres naturais ameaçam da mesma forma qualquer pessoa,


mas, o que se observa na prática, é que os mais desfavorecidos são afetados de forma
mais significativa, o que pode ser explicado por diversos fatores, como o número muito
maior de população de baixa renda vivendo em áreas mais densamente povoadas, com
terrenos mais suscetíveis aos perigos e moradias mais frágeis. Do total de populações em
risco, mais de noventa por cento encontra-se nos países em desenvolvimento, com recur-
sos econômicos menores e maior carga de exposição ao desastre. Dessa forma, as estra-

162
AMBIENTE: Percepções 2021

tégias para redução de desastres devem ser acompanhadas do desenvolvimento social e


econômico (ALCANTARA-AYALA, 2002; UN-ISDR, 2004).

2.2 DESASTRES NO RIO GRANDE DO SUL


Os principais desastres nessa região têm origem hidrometeorológica, sendo que
neste estudo iremos focar apenas nos desastres hidrológicos, sendo estes enxurradas e
inundações.

De acordo com Castro (1998), inundação pode ser conceituada como o transborda-
mento de água da calha normal de um recurso hídrico, ou acumulação de água por dre-
nagem ineficiente em áreas habitualmente não submersas. Geralmente a inundação é
popularmente tratada como enchente. As inundações são o tipo de desastre que possui
o maior número de eventos, com várias pessoas afetadas e maiores perdas econômicas
(aproximadamente 72,5% do total de perdas mundiais) (SAUSEN; NARVAES, 2015).

Já a enxurrada ocorre devido às chuvas intensas e concentradas. As enxurradas têm


um período de duração bem menor do que as inundações, entretanto, devido ao fato de as
águas se elevarem rápida e repentinamente, as enxurradas causam mais mortes do que as
inundações, apesar da área de impacto ser geralmente menor (KOBIYAMA, 2006).

De acordo com um levantamento realizado pela CODEX (2017), para o período de


1985 a 2015 foram notificadas 1.657 ocorrências de enxurradas e 802 ocorrências de
inundações.

2.3 CUSTOS ENVOLVIDOS EM DESASTRES


De forma geral, podemos determinar que os custos envolvidos em desastres são
definidos como Danos Tangíveis e Intangíveis, podendo ser diretos ou indiretos. Entre os
principais danos tangíveis diretos podemos citar: danos físicos aos domicílios, danos físi-
cos no comércio e serviços, danos físicos aos equipamentos e plantas industriais e danos
físicos à infraestrutura. Entre os danos intangíveis podemos destacar: ferimentos e perda
de vida humana, doenças pelo contato com a água, perda de objetos de valor sentimental,
perda de patrimônio histórico ou cultural e perda de animais de estimação (CANÇADO,
2009).

163
AMBIENTE: Percepções 2021

De acordo com levantamentos realizados pela Universidade Federal de Santa Ca-


tarina – UFSC (2016), o Brasil teve danos e prejuízos com desastres hidrológicos de
R$ 72.332.318.263,00 com 9.002 registros entre os anos de 1995 a 2014, sendo que,
destes, a Região Sul representou um prejuízo de R$ 19.512.801.745,00 em 2.804 regis-
tros, conforme observado na Figura 1.

Figura 1 - Número de registros e respectivos danos e prejuízos em R$ para a Região Sul do Brasil no
período de 1985 a 2014

Fonte: UFSC, 2016

Ainda de acordo com este estudo, foram contabilizadas perdas totais de R$ 182,7
bilhões, sendo que R$ 137,3 bilhões se referem aos prejuízos públicos e privados infor-
mados e R$ 45,4 bilhões aos danos materiais. Os danos materiais de maior relevância re-
portados foram referentes à infraestrutura, seguidos por habitações. Os maiores prejuízos
reportados na área privada são referentes à agricultura, seguidos pela pecuária, serviços
e indústria.

2.4 AÇÕES DE PREVENÇÃO E GESTÃO DE RISCOS DE DESASTRES


Devido ao crescimento populacional e ao intenso processo de urbanização das últi-
mas décadas, há mais pessoas vivendo em áreas de risco e expostas ao perigo de eventos
extremos. A cada ano, mais
m de 226 milhões de pessoas são afetadas por desastres e,

164
AMBIENTE: Percepções 2021

quaisquer que sejam as causas, o fato de haver tantas incertezas torna imprescindível o
uso de conhecimentos e inovações para construção de sociedades sustentáveis e resilien-
tes (TRAJBER et al., 2015).

No Brasil, a gestão de desastres começou a se estruturar na década de 60, mas so-


mente no ano de 2011, com a catástrofe ocorrida no Rio de Janeiro, que o país começou a
desenvolver estratégias para gestão de riscos de um desastre.

De modo geral, a gestão de risco tem como finalidade a redução, prevenção, controle
e gerenciamento de riscos de desastres, apresentando um conjunto de ações, conforme o
quadro abaixo (TOMINAGA et al., 2009).

Quadro 1 - Atividades de gestão de riscos de desastres

Antes do desastre Durante desastre Pós-desastre


Prevenção: ações para evitar Reabilitação: logo após a situação
evento danoso de emergência. Restabelecimento
Resposta ao desastre: atividades de serviços essenciais para comu-
Mitigação: ações para minimi-
que ocorrem no momento do nidade.
zar impactos
desastre ou logo após. Envolvem
Preparação: estrutura as ações ações de assistência aos feridos, Recuperação: Ações de
de resposta resgate dos sobreviventes, eva- reconstrução para reparar danos
cuação da área, etc. causados pelo desastre e apoiar
Alerta: aviso formal de um peri- o restabelecimento da rotina da
go iminente comunidade.
Fonte: Adaptado de Tominaga et al., 2009

De acordo com a Confederação Nacional de Municípios - CNM (2016), a prevenção


de desastres trata-se de “ações continuadas realizadas pelos órgãos de proteção e defesa
civil para se antecipar às consequências decorrentes de um desastre, com a missão de
prevenir e minimizar seus efeitos negativos”. O trabalho de prevenção é executado por dois
procedimentos, que são: a análise e a redução de riscos; enquanto a gestão de riscos foca
na “prática de reduzir o risco mediante esforços sistemáticos voltados à análise e à gestão
dos fatores causadores dos desastres”. A gestão de riscos deve incluir a redução do grau de
exposição aos perigos; a diminuição da vulnerabilidade da sociedade; e a gestão adequada
dos solos e do meio ambiente.

As ações de prevenção e gestão de riscos de desastres são bem abrangentes, de-


pendendo das características de cada município e de cada região. Entretanto, o Sistema

165
AMBIENTE: Percepções 2021

Nacional de Proteção e Defesa Civil sugere algumas ações básicas que podem ser desem-
penhadas para prevenir e gerir os riscos de desastres, sendo elas (CNM, 2016):

Quadro 2 - Ações de prevenção e gestão de riscos

Ações de Prevenção Ações de gestão de riscos


Elaborar planos e exercícios simulados, destinados Monitoramento ininterrupto da probabilidade de
ao desenvolvimento e aperfeiçoamento do sistema que as ameaças de um evento adverso ou acidente
de autodefesa determinado se concretizem
Avaliação permanente dos riscos existentes e do
Trabalhar ininterruptamente na capacitação e no
grau de vulnerabilidade do sistema receptor a seus
aperfeiçoamento de agentes
efeitos
Redução dos danos e prejuízos causados por um
Escolher e implantar medidas preventivas
desastre
Fazer a análise de risco, que engloba a identifica- Identificação e a antecipação ao risco, ou seja, pre-
ção, avaliação e hierarquização, tanto dos tipos de ver o que pode dar errado, para execução continua-
ameaça quanto dos elementos em risco da da prevenção de desastres;
Identificação da natureza, extensão, intensidade e a
Definir as áreas de maior risco
magnitude da ameaça
Reduzir os riscos a fim de garantir a seguridade da Determinação da existência e do grau de vulnerabi-
população lidade
Atuar sobre as ameaças e as vulnerabilidades iden-
tificadas e priorizadas na análise de risco para redu- Identificação de medidas e recursos disponíveis
ção dos riscos de desastre
Construção de cenários de riscos prováveis, deter-
Fazer mapeamento (redução de riscos, planejamen-
minando os níveis aceitáveis de riscos, bem como
to das ocupações e/ou da utilização dos espaços)
considerações custo-benefício
Fixação de prioridades (recursos versus distribuição
Aperfeiçoar a legislação local
ao longo de um período determinado)
Desenho de sistemas de administração efetivos e
Tomar medidas para otimizar a resposta do sistema
apropriados para implementar e controlar proces-
local de defesa civil aos desastres
sos anteriores
Fonte: Adaptado de CNM, 2016

3 METODOLOGIA

3.1 LOCAL DO ESTUDO


O estudo foi realizado no estado do Rio Grande do Sul que, de acordo com o último
censo do IBGE (2010), possui 10.693.929 habitantes, em uma área de 281.737,888 km²,

166
AMBIENTE: Percepções 2021

com uma densidade demográfica de 37,96 habitantes por km². De acordo com a classifi-
cação climática de Köppen (1948), o tipo climático predominante na maior parte do estado
é o Cfa –Clima subtropical quente sem estação seca –, porém, de acordo com Moreno
(1961), a região nordeste do estado é classificada como tipo Cfb – Clima subtropical tem-
perado sem estação seca. Esta subdivisão ocorre em função das diferenças de altitude,
sendo que o tipo Cfb é observado em altitudes maiores de 600 metros, enquanto que o Cfa
é encontrado na região da Serra do Nordeste e nas partes mais elevadas das regiões do
Planalto e Serra do Sudeste (KUINCHTNER; BURIOL, 2001).

Ambos os tipos climáticos possuem a característica de estações de inverno e verão


bem definidas, com precipitações pluviométricas bem distribuídas ao longo de todo o ano,
sem presença de estação seca, com acumulados anuais que variam de 1000mm a mais de
2000mm (PESSOA, 2017).

O Rio Grande do Sul é formado por províncias geomorfológicas chamadas: Planície


das Lagoas dos Patos e Mirim, Planalto Sul-rio-grandense, Planaltos e Chapadas da Bacia
do Paraná e Depressão Periférica Sul rio-grandense. As diferentes formas de relevo e tipos
de solo resultam em diferentes graus de fragilidade para o Estado (RIBEIRO; WERLANG,
2010). A ocorrência de relevos caracterizados por planícies e alta concentração de popu-
lação pode auxiliar na ocorrência de enxurradas.

3.2 MÉTODOS E TÉCNICAS


A Figura 2 demonstra o delineamento da pesquisa que foi utilizado. As etapas serão
discutidas separadamente abaixo.

167
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 2 – Fluxograma de delineamento da pesquisa

Fonte: Elaborado pelos autores

Conforme demonstrado no fluxograma, a metodologia consistiu nas seguintes etapas:

a) Busca bibliográfica

A pesquisa iniciou‐se com o levantamento e revisão bibliográfica acerca da temática


e da área estudada, realizando um levantamento dos principais desastres hidrológicos no
RS para o período entre 2007 e 2016. Esta metodologia buscou analisar informações já
publicadas em diferentes mídias, levando em consideração as principais instituições rela-
cionadas ao estudo e à pesquisa, como Metroplan (RS), CPRM, Defesa Civil, Scielo e Sprin-
ger. Utilizaram-se as seguintes palavras-chaves: desastre natural, inundação, precipitação
pluviométrica, enxurrada, custos e prevenção de desastres.

As informações coletadas foram avaliadas quanto: tipos de eventos hidrológicos, ca-


racterísticas descritas do evento, sua localização, custos descritos e o impacto na comu-
nidade.

168
AMBIENTE: Percepções 2021

b) Quantificação dos desastres

Foram consultados os dados disponibilizados pelo Sistema Integrado de Informações


sobre Desastres e pela Defesa Civil do Rio Grande do Sul para quantificar as inundações e
enxurradas que foram registradas pelos municípios do estado para o período de janeiro de
2007 a dezembro de 2016.

Nesta etapa também foram levantados alguns dados de precipitação das estações
pluviométricas da Agência Nacional das Águas (ANA), disponibilizados através do Hi-
droweb, para verificar em qual situação ocorreram os desastres.

Estes dados foram confrontados com os registros disponíveis na literatura quanto a


sua descrição e efeitos observados.

c) Questionários

Após a caracterização dos principais desastres, foram enviados questionários (Apên-


dice 1) para os órgãos públicos de alguns dos municípios afetados, buscando informações
sobre as ações e os custos envolvidos para conter a emergência e para prevenir a recor-
rência do desastre.

Para envio do questionário foram selecionados os municípios que apresentaram


quatro ou mais eventos no período relacionado, contatando-se cada órgão municipal para
verificar o responsável por ações quando do acontecimento de desastres.

4 RESULTADOS E ANÁLISE

4.1 LEVANTAMENTO DOS DESASTRES NO RS


Através de consulta no banco de dados do Sistema S2ID (Sistema Integrado de In-
formações sobre Desastres) foi constatado que, entre os anos de 2007 a 2016 no estado
do Rio Grande do Sul, ocorreram 2.262 desastres naturais, sendo que o ano de 2010 foi o
que apresentou maior ocorrência de eventos, conforme pode ser observado na Figura 3.

169
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 3 - Número total de desastres registrados no RS entre 2007 e 2008

Fonte: Elaborado pelos autores

Dentre o total de desastres, foram verificados 713 eventos de inundações e enxur-


radas, sendo 116 registros de inundação e 597 registros de enxurradas, compreendendo
355 municípios dos 497 presentes no estado, conforme Figura 4.

Figura 4 - Número de eventos ocorridos no RS entre os anos de 2007 e 2016

Fonte: Elaborado pelos autores

Percebe-se que nos anos de 2008, 2009 e 2012 praticamente não houveram regis-
tros de enxurradas e inundações, sendo que, nestes anos, houveram vários decretos de
situação de emergência para estiagens. De acordo com Chechi e Sanches (2013), para o
Rio Grande do Sul, os anos de 2008 e 2009 foram classificados como secos, enquanto que
o ano de 2012 foi classificado como extremamente seco, com 381 registros de estiagens.

170
AMBIENTE: Percepções 2021

De acordo com o Centro de Estudos e Pesquisas sobre Desastres da UFSC (UFSC,


2013), entre os anos de 1991 e 2012, ocorreram 1.006 enxurradas no estado, sendo que
o ano de 2010 foi o que apresentou maior registro de eventos, com o maior número de re-
gistros nos meses de novembro a janeiro e julho. Os eventos de enxurrada no Rio Grande
do Sul durante o período analisado afetaram 2.197.335 pessoas, deixando 20 mil desabri-
gadas e 57 mil desalojadas e ocasionando ainda 30 mortes.

Já para as inundações, foram registrados 413 eventos, com maior ocorrência nos
meses de junho e julho e de setembro a novembro. No período de 1991 a 2012 registrou-
-se 16 mortos, 375 feridos, 884 enfermos, 27 mil desabrigados, 89 mil desalojados e 10
mil pessoas atingidas por outros tipos de danos.

Quando do levantamento dos dados pluviométricos de alguns municípios nas datas


em que foi solicitado decreto de situação de emergência, verificou-se que, na maioria dos
casos, houveram precipitações de mais de 100 mm em 24horas, ou com precipitações
acumuladas de mais de 200 mm em 72 horas.

4.2 RESULTADOS DOS QUESTIONÁRIOS


A aplicação do questionário foi realizada em 36 municípios que apresentaram no mí-
nimo 4 eventos e no máximo 7 eventos, conforme Tabela 1.

Tabela 1 - Número de ocorrências de enxurradas e inundações x número de cidades levantadas


Número de ocorrências de inundações e enxurradas Número de cidades levantadas
4 24
5 10
7 2
Nota: não houve nenhum município com seis ocorrências no período avaliado.
Fonte: Elaborado pelos autores

Dos 36 munícipios questionados, somente 13 responderam os questionários por


e-mail ou por telefone, conforme Tabela 2. Supomos que este baixo percentual de retorno
dos questionários por parte das prefeituras se deva, principalmente, pela não identificação
de responsável por este assunto, ou até mesmo pela falta de estrutura dos municípios
para tratar deste tema, visto que, além de enviarmos os questionários, buscamos entrar
em contato com cada prefeitura para obter maior retorno.

171
AMBIENTE: Percepções 2021

Tabela 2 - Percentual de respostas obtidas dos municípios questionados

Número de ocorrências de Número de cidades que Número de cidades que


inundações e enxurradas apresentaram os eventos responderam ao questionário
4 24 7 (29,2%)
5 10 4 (40%)
7 2 2 (100%)
Fonte: Elaborado pelos autores

Na sequência serão apresentadas as respostas obtidas através da aplicação dos


questionários.

As primeiras quatro perguntas do questionário foram relacionadas à identificação da


pessoa que estava fornecendo os dados, abordando sua cidade, nome e cargo público ocu-
pado. Dos 13 entrevistados, 12 eram Coordenadores da Defesa Civil e 1 bombeiro efetivo
do Corpo de Bombeiros Militar (CBM), com experiências de 1 até 16 anos na função.

Neste item, percebeu-se que a grande maioria dos municípios possui uma Coordena-
doria Municipal de Defesa Civil.

A quinta pergunta abordou as responsabilidades atribuídas à pessoa que respondeu


ao questionário caso ocorra um evento catastrófico. As respostas contemplam desde so-
mente realizar levantamento de dados junto às secretarias dos munícipios até emissão de
alerta, mobilização da população usando meios de comunicação, orientação dos atingidos,
mapeamento dos pontos atingidos, acompanhamento da evolução do evento, acionamen-
to das equipes de resgate, cadastramento das famílias atingidas, retiradas de famílias que
se encontram em vulnerabilidade social, realizar acomodação dos desabrigados em casas
de parente ou alojamento, fornecimento de materiais de higiene, cestas básicas, roupas e
utensílios, vistoria nos locais de risco e acompanhamento das famílias após o atendimento
e retorno às casas.

Percebe-se que as responsabilidades estão relacionadas a ações após o evento de


inundação e enxurrada ter ocorrido, bem como acompanhamento e elaboração de proces-
so junto aos órgãos estaduais e federais para liberação de verbas.

Quando questionados sobre os eventos relacionados às catástrofes hidrológicas que


ocorreram em suas cidades nos últimos anos, podemos observar uma variedade de res-

172
AMBIENTE: Percepções 2021

postas que apontam o conhecimento ou não do histórico de inundações e enxurradas. Na


Tabela 3, segue mapeamento das respostas obtidas, sendo que a última coluna se refere
ao número de eventos ocorridos no período de 2007 a 2016 nestes Municípios, confron-
tando o levantamento com o que foi respondido.

Tabela 3 - Conhecimento sobre os eventos de inundações e enxurradas

Número de Número de eventos


Respostas sobre conhecimento dos eventos
cidades no período
Não souberam responder 1 5
Informação que eventos sempre ocorreram 1 7
Informação do nº de eventos e ano 5 3-4 e 2-5
Informação do nº de eventos, ano e precipitação 2 4e5
Informação dos decretos 2 4
Informação dos decretos e precipitações 2 4e7
Fonte: Elaborado pelos autores

Quando questionados sobre os custos envolvidos nos eventos de inundações e en-


xurradas pode-se perceber a mesma diversidade de respostas, conforme descrito na Ta-
bela 4.

Tabela 4 - Conhecimento sobre os custos envolvidos nos eventos

Respostas sobre conhecimento dos custos Número de cidades


Não souberam responder 2
Informação que os custos não são mapeados, mas gastam o orçamen- 2
to disponível
Informação que os custos são mapeados, mas não citaram valores 5
Informaram o custo mapeado em valores gastos, mas não forneceram 4
dados relativos em quanto tempo o valor foi gasto
Fonte: Elaborado pelos autores

Sete municípios relataram o responsável pelo mapeamento dos custos quando


questionados. A maioria destes sete municípios declarou que os custos são levantados
individualmente por cada secretaria ou órgão público municipal, sob a coordenação da De-
fesa Civil Municipal. Os custos citados se referiram à reconstrução de pontes, bueiros e
estradas e gastos com pecuária, agricultura, indústria, serviços e poder público.

173
AMBIENTE: Percepções 2021

Os quatro municípios que apresentaram os custos envolvidos com inundações e en-


xurradas foram: Vicente Dutra, Esteio, Soledade e Sebastião do Caí e totalizaram valores
na ordem de R$ 26.000.000,00 de reais sem fornecer detalhes em relação ao período
considerado.

A Tabela 5 resume as respostas recebidas quando questionados sobre a metodologia


empregada para mapear estes custos e sobre a existência de alguma divisão de custos
para atender a emergência e custos com prevenção.

Tabela 5 - Respostas sobre a metodologia e existência de divisão de custos para atender emergência e
prevenção

Respostas sobre a metodologia e existência de divisão de custos para atender Número de


emergência e prevenção cidades
Não respondeu à pergunta 1
Não existe metodologia e nem divisão de custos 4
Não existe metodologia e há divisão de custos 1
Declararam que a metodologia consiste no levantamento das secretarias e órgãos pú- 6
blicos municipais, sem citar divisão de custos
Declararam que a metodologia consiste no levantamento das secretarias e órgãos pú- 1
blicos municipais e citam divisão de custos
Fonte: Elaborado pelos autores

Com exceção da cidade de Montenegro, todas as demais cidades não citaram a


existência de metodologia para mapeamento de custos bem como divisão de custos para
atendimento de emergências e prevenção.

A maior parte das cidades (Vicente Dutra, Liberato Salzano, Esteio, Soledade, Casca
e São Sebastião do Caí) apresentaram respostas sobre o mapeamento dos custos envolvi-
dos em enxurradas e inundações, relacionando o levantamento de custos das secretarias
e órgãos públicos municipais, o que foi considerado como a metodologia aplicada.

A nona questão abordou sobre o que é feito a partir dos dados levantados de custos
de enxurradas e inundações, com as respostas apresentadas na Tabela 6.

174
AMBIENTE: Percepções 2021

Tabela 6 - Ações realizadas após levantamento dos custos

Ações realizadas após levantamento de custos Número de cidades


Não souberam responder ou não existe controle 3
Custos são passados para Defesa Civil Municipal, inseridos no Sistema
8
S2ID e são usados para obtenção de recursos estaduais e nacionais
Dados passados para Defesa Civil Municipal e Prefeitura 1
Dados passados para órgão Municipal e Defesa Civil Estadual 1
Fonte: Elaborado pelos autores

A maioria das cidades consultadas (oito cidades) informou que utiliza o Sistema In-
tegrado de Informações sobre Desastres (S2ID) para declarar os custos relacionados aos
desastres ambientais. A partir de informações dirigidas aos órgãos estaduais e federais,
os municípios buscam obter recursos para tratar os desastres ocorridos, fazendo uso de
Decretos Municipais para formalizar situações de emergência.

A décima e última questão abordou as ações de prevenção aos desastres e os custos


relacionados a ações de prevenção.

Bom Princípio, Igrejinha, Rolante, Liberato Salzano, Esteio, Soledade, São Sebastião
do Caí e Terra de Areia citaram ações de prevenção que são realizadas, porém não forne-
ceram valores detalhados relacionados à prevenção de desastres.

Apenas a cidade de Montenegro informou que há no orçamento anual R$ 5.000.000,00


para prevenção de desastres, através de ações de canalização, construção de ponte, de-
sassoreamento dos arroios, contenção de encostas, bem como compra de telhas e lonas.

As cidades de Constantina, Vicente Dutra e Casca declararam a inexistência de ações


de prevenção a desastres, sendo obviamente inexistente os custos relacionados a elas.

A cidade de Pareci Novo não respondeu à pergunta.

Alguns resultados desta pesquisa merecem destaque, que serão apresentados a se-
guir:

A partir dos 13 questionários recebidos, três cidades enviaram documentos anexos


que possibilitaram um detalhamento maior das ações relacionadas a eventos de enxurra-
das e inundações, que são: São Sebastião do Caí, Montenegro e Liberato Salzano.

175
AMBIENTE: Percepções 2021

a) São Sebastião do Caí

Um dos documentos enviados pela cidade é o “Relatório de Diagnóstico para cada


meta”. Com data de 20/12/2017, assinado pelo prefeito e pelo Coordenador da Defesa
Civil do município, o relatório está focado na ação de prevenção de retirada de famílias si-
tuadas nas margens do rio Caí, no bairro Navegantes. Esta região da cidade é considerada
de alto risco, pela frequência de inundações (enchentes) e pela alta velocidade de trans-
bordamento da calha do rio Caí neste bairro.

Este documento tem por objetivo detalhar com fotos, reportagens de jornais e jus-
tificativas um plano para remoção de 65 famílias que, a cada inundação (enchente) en-
frentada pela cidade, devem ser alojadas em abrigos municipais. A proposta consiste na
construção de um loteamento de 65 casas populares de 56,36m2 cada. O estudo não cita
o local pretendido para a construção nem os custos envolvidos no projeto. Além disso,
evidencia que são necessários pareceres técnicos de outras secretarias do município para
fundamentar a proposta.

A cidade de São Sebastião do Caí se destaca por ser a única a apresentar dois docu-
mentos diferenciados para informação dos desastres, a Declaração Municipal de Atuação
Emergencial (DMATE) e o Formulário de Informações do Desastre (FIDE). A coordenadoria
da Defesa Civil da cidade repassou um exemplo preenchido de cada um dos documentos
referentes a uma ocorrência de desastre ocorrido em 8/6/2017.

O DMATE é composto pelos seguintes dados: caracterização da situação de emer-


gência, informações relevantes sobre o desastre, informações sobre a capacidade geren-
cial do município e medidas e ações em curso. O FIDE define o tipo de desastre, a área afe-
tada, causas e efeitos do desastre, danos humanos, materiais ou ambientais e os prejuízos
econômicos, públicos e privados (quantificando todos os custos).

Além disso, São Sebastião do Caí apresentou em suas respostas ao questionário da-
dos relativos a cheias do Rio Caí do ano de 1878 até o ano e 2017, bem como um plano
detalhado de contingência elaborado pela Defesa Civil municipal, que estabelece os proce-
dimentos adotados pelos órgãos municipais para atendimento à emergência a desastres
naturais. Este plano de contingência tem por objetivo reduzir os danos e prejuízos de um

176
AMBIENTE: Percepções 2021

desastre (inundação e deslizamento), definindo aspectos relacionados ao monitoramento,


alertas, ações de socorro, ajuda humanitária e reabilitação dos locais atingidos.

b) Montenegro

A cidade de Montenegro, também localizada às margens do rio Caí, enviou o histó-


rico de enchentes do ano de 1928 ao ano de 2017, um plano de contingência e o plano de
auxílio mútuo. Ambos planos recebidos relacionam qualitativamente os custos envolvidos
através das ações tomadas, sem os quantificar.

O plano de contingência de Montenegro, semelhante em estrutura ao recebido de


São Sebastião do Caí, também elaborado pela Defesa Civil municipal, detalha todos os
procedimentos a serem adotados em qualquer tipo de desastre (natural ou não). Este pla-
no contempla condições pré-estabelecidas para acionamento do mesmo, as ações neces-
sárias para serem desenvolvidas, bem como os responsáveis e recursos envolvidos para
execução do plano (nomes dos responsáveis, contatos, materiais que são mantidos em
estoque emergencial e a localização dos abrigos para remoção das famílias atingidas).

O plano de auxílio mútuo da cidade de Montenegro, elaborado pela Defesa Civil Muni-
cipal, consiste em um plano para organizar ações básicas da iniciativa privada e de órgãos
municipais e estaduais, bem como assegurar maior eficiência em situações de emergência
enfrentadas pelo município. Conforme este documento, este plano também pretende pro-
mover, dentre outros objetivos apresentados, a conscientização da população para preser-
vação de vidas humanas, do patrimônio público, patrimônio privado e do meio ambiente.
Não foram encontradas ações que abordem detalhadamente o atendimento a todos os
objetivos apresentados.

c) Liberato Salzano

A cidade de Liberato Salzano enviou documentos detalhados em relação aos custos


envolvidos em evento de enxurrada ocorrida em 2014. Sobre este evento, a coordenação
da Defesa Civil municipal enviou detalhadamente: os prejuízos da agricultura, os custos
(máquinas e materiais) relacionados aos danos para recuperar estradas e o Plano de Res-
posta Municipal. O Plano de Resposta Municipal detalha os custos do evento ocorrido, as
ações para socorro e assistência a vítimas e as ações para restabelecimento de serviços
essenciais, buscando obter recursos federais.

177
AMBIENTE: Percepções 2021

Liberato Salzano também enviou um parecer técnico após enxurrada ocorrida em


2017 ocasionada por precipitações de 283mm em curto espaço de tempo. Este parecer,
que embasou a decretação de Situação de Emergência municipal, detalha os danos mate-
riais ocorridos (pontes, bueiros e estradas) e cita os prejuízos enfrentados pela agricultura,
pecuária e comunidades.

4.3 GESTÃO E AÇÕES FRENTE AOS DESASTRES AMBIENTAIS


Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), tudo indica que os desastres me-
teorológicos vão aumentar com o aquecimento do planeta nos próximos anos. Diante dis-
so, nosso estudo demonstrou que, entre as 13 cidades que responderam aos questiona-
mentos dentre as 36 selecionadas, apenas São Sebastião do Caí, Montenegro e Liberato
Salzano demonstraram, através de documentos, as ações relacionadas aos eventos de
enxurradas e inundações. Isso revela que a maioria das cidades estudadas não estão devi-
damente preparadas para esses eventos.

Conforme Assumpção et al. (2017), a Política Nacional de Recursos Hídricos, a Polí-


tica Federal de Saneamento e a Política Nacional de Defesa Civil são as políticas nacionais
relacionadas aos desastres naturais. Tais políticas, apesar de serem bastante avançadas,
não são efetivamente aplicadas e fiscalizadas. Ações concomitantes de planejamento ur-
bano, bem como educação e participação popular podem contribuir para a ocorrência de
desastres com inundações. Em nosso trabalho junto às cidades gaúchas, com exceção de
ações ligadas a Defesa Civil, monitoramento do nível dos rios e propostas de retirada de
famílias das áreas mais afetadas por enxurradas e inundações, não há evidência alguma
de ações integradas ao saneamento e à prevenção efetiva dos desastres no que diz res-
peito aos leitos dos rios. As Políticas relacionadas aos Recursos Hídricos e ao Saneamento
sequer foram citadas.

Os resultados do nosso trabalho também corroboram a Pesquisa do Instituto Bra-


sileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada em novembro de 2012, indicando que
apenas 6,2% dos municípios do país possuem um plano para redução do impacto de desas-
tres naturais. Em outros 10,1%, medidas para prevenção e resposta a enchentes, desliza-
mentos, secas e outros fenômenos estão em processo de elaboração (IBGE, 2012).

178
AMBIENTE: Percepções 2021

O estado de Santa Catarina, conforme Medeiros, Reani e Santos (2016), enfrenta


amplos problemas relacionados a desastres naturais de causas hidrológicas e apresenta
sistemas de monitoramento e alerta de riscos. Contudo, ações de georreferenciamento
das ocorrências, acompanhamento dos alertas enviados e o aprofundamento dos impac-
tos socioambientais no setor de transporte rodoviário deveriam ser consideradas na pre-
venção de desastres. Em nenhum dos municípios gaúchos abordados neste trabalho fo-
ram relatadas ações com este foco.

Na região sudeste do Brasil, conforme a Coordenadoria Estadual de Proteção e De-


fesa Civil do Espírito Santo (CEPDEC, 2018), a Defesa Civil estadual capixaba elaborou um
plano para detalhar os desastres ocorridos neste estado quanto ao tipo de desastres, ce-
nários de risco, bem como ações relacionadas à prevenção e ao atendimento das ocorrên-
cias. Porém, tal como acontece nas cidades gaúchas que apresentaram algum documento
oficial frente ao nosso questionamento, os planos existentes são focados no atendimento
eficaz ao desastre e não à sua prevenção.

Siqueira, Lemos Filho e Mendes (2016) realizaram estudos no estado do Rio de Ja-
neiro e destacaram que os eventos de inundação são os mais comuns neste estado. Em
sintonia com as ações propostas pelo município de São Sebastião do Caí em nosso traba-
lho, no estado carioca as ações governamentais se resumem a programas habitacionais de
remoção da população em área de risco, ou seja, novamente não são evidenciadas ações
efetivas de prevenção aos desastres.

Bandeira, Nunes e Lima (2016) estudaram os desastres naturais ocorridos na região


nordeste brasileira (estado do Ceará) e relataram que cidades com ocupações desordena-
das, quando passam por eventos atmosféricos extremos, sofrem degradações ambientais
e prejuízos à saúde humana. As ações públicas mais expressivas são evidenciadas, con-
forme os autores, após a ocorrência das tragédias, ou seja, não são focadas em ações de
prevenção. Em nosso trabalho, apesar do tipo de tragédia ambiental no território gaúcho
ser diferente do evidenciado na região nordeste brasileira, nota-se uma similaridade nos
tipos de atitudes tomadas pelos governantes (raras ações de prevenção) e os fatores que
favorecem a ocorrência dos desastres, principalmente, devido ao desordenado desenvol-
vimento urbano.

179
AMBIENTE: Percepções 2021

Em paralelo a todos os fatores já citados, convivemos com o crescimento desorde-


nado das cidades, a ausência de políticas públicas mais efetivas para assegurar à popu-
lação os direitos básicos de cidadania, entre diversos outros fatores que têm contribuído
para aumentar a vulnerabilidade das populações aos desastres naturais. Uma comunidade
que vive sem saneamento básico ou nas proximidades de um rio, em uma área sujeita a
enchentes e inundações, com casas frágeis e sem acesso à água potável, luz e educação,
é muito mais vulnerável aos desastres naturais. E os efeitos desses eventos podem com-
prometer definitivamente suas perspectivas de melhoria das condições de vida (UN-ISDR,
2009). No entanto, essas comunidades podem se tornar muito mais bem preparadas para
enfrentarem eventos hidrológicos se forem contempladas com ajuda para construções
mais seguras e a implantação de um sistema de coleta de lixo apropriado para evitar seu
acúmulo a céu aberto (LIRA; CÂNDIDO, 2013).

Não há como diminuir a incidência de desastres sem ampliar a presença do poder


público nas localidades mais vulneráveis, afinal a assistência social é direito de todo ci-
dadão e dever do Estado, fato observado pelo estudo, onde três municípios declararam
inexistência de ações de prevenção a desastres.

Em relação às ações de prevenção e gestão de riscos de desastres, apenas duas


cidades em nosso estudo se preocupam com esse tema. Infelizmente, antes do desas-
tre, ações de prevenção e a mitigação, que são concebidas como ações necessárias e
prudentes, não foram objetos de grande atenção por parte dos governos e da sociedade
em geral. Quando se promovem estas ações, em geral estão concentradas na modificação
das ameaças, utilizando medidas estruturais tais como diques, muros de contenção, entre
outros, relacionadas com a engenharia estrutural e as ações esporádicas de reabilitação
das comunidades localizadas em áreas vulneráveis às ameaças físicas.

Há um crescente reconhecimento de que a redução do risco ou a prevenção e miti-


gação de desastres é uma prática social complexa. Outro tipo de prevenção a desastres
naturais, em âmbito municipal, chama-se Plano de Contingência, que é uma ferramenta
de gestão de risco que contribui para atuação em diferentes momentos, entre eles, nas
situações de emergência e/ou de calamidade pública, tendo como base o cenário de risco.
Em nosso estudo, apenas Montenegro e São Sebastião do Caí relataram que trabalham
com esse plano.

180
AMBIENTE: Percepções 2021

O Plano de Contingência facilita muito a resposta inicial aos desastres, pois quando
o evento ocorre, as informações básicas já foram reunidas e organizadas previamente; a
divisão de autoridade e responsabilidade entre os órgãos já foi combinada; as estratégias,
as táticas e alguns aspectos operativos já foram definidos e, se o plano tiver sido adequa-
damente divulgado e treinado, todos conhecem o seu papel. Muitos planos deixam de ser
colocados em prática por não serem ativados em um desastre. E isso acontece simples-
mente porque as pessoas encarregadas desses planos se esquecem de fazer isso quando
estão sob a pressão de uma situação que evolui rapidamente, o que demonstra o des-
preparo e falta de planejamento dos gestores responsáveis. Por isso, o plano deve prever
quais são os indicadores que determinarão a sua ativação, por exemplo, para a prevenção
contra chuvas intensas diante do alerta meteorológico da Defesa Civil local. Já no caso de
enchentes e de inundações, a ativação do plano pode depender do alcance de determina-
das cotas no nível das águas.

Diante disso, podemos afirmar que um Plano de Contingência contribuirá para que a
comunidade construa processos preventivos de desastres, mas também para que esteja
preparada para responder de forma mais efetiva à situação de um desastre.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Cada dia que passa torna-se mais evidente o crescimento no número e na intensi-
dade dos impactos causados por enxurradas e inundações, principalmente nos últimos 10
anos no Estado do Rio Grande do Sul, ocasionando perdas humanas, impactos à saúde,
danos ao meio ambiente, à propriedade, dentre outros.

No intuito de entender a gestão dos munícipios frente a esses desastres, foi aplicada
uma metodologia de pesquisa, em forma de questionário, junto aos gestores municipais,
para verificação de ações preventivas, mitigadoras e corretivas, bem como os custos re-
lacionados. Após a análise dos resultados desta pesquisa, podemos verificar um número
pequeno de munícipios que possuem alguma gestão relacionada a esse tema. Alguns pos-
suem um bom levantamento quantitativo de dados após a emergência, com melhorias de
monitoramento e atendimento à população sendo implantadas, mas sem levantamento
adequado de custos e planejamento de ações preventivas frente aos eventos de inunda-

181
AMBIENTE: Percepções 2021

ção e enxurrada. Nos órgãos pesquisados (defesa civil municipal e corpo de bombeiros),
é perceptível que o conceito de prevenção existe somente para remoção de pessoas nas
áreas de risco, mas não prevenção na ocorrência do evento de inundação e enxurrada.

Nossa pesquisa demonstrou que mais medidas relacionadas ao planejamento e con-


trole do uso da terra deveriam ser executadas em paralelo com projetos de engenharia que
aperfeiçoem o sistema de drenagem urbano e previnam a emergência de novas áreas de
risco, e que isto seria de responsabilidade dos municípios e da federação brasileira.

REFERÊNCIAS
ALCÁNTARA-AYALA, I. Geomorphology, natural hazards, vulnerability and prevention of nat-
ural disasters in developing countries. Geomorphology, v. 47, n. 2-4, p. 107-124, 2002.

ASSUMPÇÃO, R. F. et al. Possíveis contribuições da integração das políticas públicas brasilei-


ras à redução de desastres. Saúde Debate, v. 41, p. 39-49, 2017.

BANDEIRA, A. P.; NUNES, P. H. S.; LIMA, M. G. S. Gerenciamento de riscos ambientais em


municípios da região metropolitana do Cariri (Ceará). Ambiente & Sociedade, v. XIX, n. 4, p.
65-84, 2016.

CANÇADO, V. L. Consequências Econômicas das Inundações e Vulnerabilidade: Desenvolvi-


mento de metodologia para avaliação do impacto nos domicílios e na cidade. UFMG, Tese de
Doutorado, Belo Horizonte, 2009.

CASTRO, A. L. C. Glossário de Defesa Civil Estudos de Riscos e Medicina de Desastres. 2. ed.


Brasília: Ministério do Orçamento e Planejamento, 1998.

CEPDEC – Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa Civil. Plano Estadual de Proteção e


Defesa Civil. Espírito Santo: CEPDEC, 2018.

CHECHI, L.; SANCHES, F. O. O uso do índice de anomalia de chuva (IAC) na avaliação do fe-
nômeno do El Niño Oscilação Sul (ENOS) no Alto Uruguai Gaúcho entre 1957-2012. Revista
Brasileira de Geografia Física, v. 6, n. 6, p. 1586-1597, 2013.

CNM - CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. Defesa Civil e Prevenção de Desastres:


como seu município pode estar preparado – Coletânea Gestão Pública Municipal: Gestão
2017-2020. Brasília: CNM, 2016.

182
AMBIENTE: Percepções 2021

CODEX - CODEX REMOTE CIÊNCIAS ESPACIAIS E IMAGENS DIGITAIS LTDA. Diagnóstico dos
Desastres no RS - Proposição da Arquitetura do Sistema Estadual de Gestão Integrada de
Riscos de Desastres. Porto Alegre: SEMA, 2017.

GUHA-SAPIR, D.; HOYOIS P.; BELOW, R. Annual Disaster Statistical Review 2015: the num-
bers and trends. Brussels: CRED, 2016.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo demográfico Rio


Grande do Sul 2010. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br /brasil/rs/panorama. Acesso
em: 22 abr. 2021.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa informações bá-


sicas municipais. Perfil dos municípios brasileiros 2012. Rio de Janeiro: IBGE, 2012. Dis-
ponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=deta-
lhes&id=284062. Acesso em: 22 abr. 2021.

KOBIYAMA, M. et al. Prevenção de desastres naturais: conceitos básicos. Florianópolis: Or-


ganic Trading, 2006.

KÖPPEN, W. Climatologia. México: Fundo de Cultura Econômica, 1948.

KUINCHTNER, A.; BURIOL, G. A. Clima do Estado do Rio Grande do Sul segundo a classifica-
ção climática de Köppen e Thornthwaite. Disciplinarum Scientia, v. 2, p. 171-182, 2001.

LIRA, W. S.; CÂNDIDO, G. A. Gestão sustentável dos recursos naturais: uma abordagem par-
ticipativa. Campina Grande: EDUEPB, 2013.

MARCELINO, E. V. Desastres Naturais e Geotecnologias: Conceitos Básicos. Caderno Didáti-


co nº 1. Santa Maria: INPE/CRS, 2008.

MARENGO, J. A. Impactos de extremos relacionados com o tempo e o clima - Impactos so-


ciais e econômicos. Boletim do Grupo de Pesquisa em Mudanças Climáticas, n. 8, p. 1-5,
2009.

MEDEIROS, M. D. S.; REANI, R. T.; SANTOS, L. B. L. Nota Técnica Nº 1/2016 – CGOM/CEMA-


DEN. São José dos Campos: CEMADEN, 2016. 6 p. Disponível em: http://ambientemobilidade.
wix.com/site#!publica—es/cfvg. Acesso em: 19 abr. 2021.

MI - MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL. Instrução Normativa nº01, de 24 de agosto


de 2012. Disponível em: http://www.mi.gov.br/c/document_library/ get_file?uuid=822a4d-
42-970b-4e80-93f8-daee395a52d1&groupId=301094. Acesso em: 22 abr. 2021.

183
AMBIENTE: Percepções 2021

MORENO, J. A. Clima do Rio Grande do Sul. Boletim Geográfico do Rio Grande do Sul, n. 11,
p. 49-83, 1961.

PBMC – PAINEL BRASILEIRO DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS. Contribuição do Grupo de Tra-


balho 1 ao Primeiro Relatório de Avaliação Nacional do Painel Brasileiro de Mudanças
Climáticas. Sumário Executivo GT1. Rio de Janeiro: PBMC, 2013.

PESSOA, M. L. (Org.). Clima do RS. In: PESSOA, M. L. Atlas FEE. Porto Alegre: FEE, 2017. Dis-
ponível em: http://atlas.fee.tche.br/rio-grande-do-sul/socioambiental/clima/. Acesso em:
22 abr. 2021.

RIBEIRO, M. S.; WERLANG, M. K. Modelado do relevo e potencial de fragilidade à erosão no


Estado do Rio Grande do Sul. Ciência e Natura, v. 32, n. 2, p. 121-140, 2010.

SAUSEN, T. M.; NARVAES, I. S. Sensoriamento remoto para inundação e enxurrada. In: SAU-
SEN, T. M; LACRUZ; M.S.P. (org.). Sensoriamento Remoto para desastres. São Paulo: Oficina
de Textos, 2015. p. 119-147.

SIQUEIRA, A. M. M.; LEMOS FILHO, A. J.; MENDES, J. N. Desastres Ambientais e Conflitos so-
cioespaciais no Brasil. Geografares, v. 1, n. 22, p. 109-121, 2016.

TOBIN, G. A; MONTZ, B. E. Natural hazards: explanation and integration. New York: The Gui-
lford Press, 1997.

TOMINAGA, L. K.; SANTORO, J.; AMARAL, R. Desastres naturais: conhecer para prevenir. São
Paulo: Instituto Geológico, 2009.

TRAJBER, R.; OLIVATO, D.; MARCHEZINE, V. Conceitos e termos para a gestão de riscos de
desastres na educação. Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais
- CEMADEN, 2015. Disponível em: http://educacao.cemaden.gov.br/medialibrary_publica-
tion_attachment?key=EDtGLgxTQiYlb8yFZUCUND1dSaw=. Acesso em: 22 abr. 2021.

UFSC - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA. Centro Universitário de Estudos e


Pesquisas sobre Desastres. Atlas brasileiro de desastres naturais 1991 a 2010: volume
Brasil/Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres. Florianópolis: CEPED
UFSC, 2012.

UFSC - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA. Centro Universitário de Estudos e


Pesquisas sobre Desastres. Atlas brasileiro de desastres naturais: 1991 a 2012 / Centro

184
AMBIENTE: Percepções 2021

Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres. 2. ed. rev. ampl. – Florianópolis: CE-
PED UFSC, 2013.

UFSC - UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA. Centro Universitário de Estudos e


Pesquisas sobre Desastres. Relatório de danos materiais e prejuízos decorrentes de de-
sastres naturais no Brasil: 1995 – 2014. Florianópolis: CEPED UFSC, 2016.

UN-ISDR - United Nations Office for Disaster Risk Reduction. Living with risk: a global re-
view of disaster reduction initiatives. New York: ISDR, 2004.

UN-ISDR - United Nations Office for Disaster Risk Reduction. Terminología sobre reducción
del riesgo de desastres. New York: ISDR, 2009.

185
8
ENGENHARIA DE RESILIÊNCIA
EM DESASTRES NATURAIS
HIDROLÓGICOS: UM ESTUDO
NO RIO GRANDE DO SUL

Karin Luise dos Santos


Malisia Balestrin Lazzari
Márcia Lourenço
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUÇÃO

As mudanças climáticas atuam na biodiversidade, na saúde humana e nos recursos


hídricos, assim como as atividades humanas junto ao leito dos rios atuam no desmata-
mento, no uso e na ocupação do solo sem planejamento e na intensa urbanização, au-
mentando a biota terrestre e aquática e das populações humanas (TUNDISI, 2014). Sob
essa percepção, aglomerações urbanas, principalmente às margens dos corpos hídricos,
dificultam a manutenção da biodiversidade, potencializam a emissão de gases causadores
do efeito estufa e deterioram a qualidade da água dos mananciais, ocasionando, conse-
quentemente, uma série de respostas negativas.

Os desastres relacionados aos recursos hídricos geralmente estão associados ao ex-


cesso de água ou à sua escassez (LONDE et al., 2014), logo, quando fatores deflagradores,
como eventos extremos pontuais, atingem locais habitados, podem ocorrer desastres na-
turais.

Nos últimos anos, o número de ocorrências e o número de pessoas afetadas vêm


aumentando significativamente (EM-DAT-CRED, 2018). Devido à grande escala de ocor-
rência do fenômeno, a terminologia associada a ele acaba variando de local para local:
cheia, enchente, enxurrada, inundação, alagamentos. Contudo, segundo a Classificação e
Codificação Brasileira de Desastres - COBRADE (BRASIL, 2012), que foi instituída por meio
da Instrução Normativa nº 01, de 24 de agosto de 2012, os desastres naturais hidrológicos
podem ser classificados em 3 tipologias principais:

Inundações: Submersão de áreas fora dos limites normais de um curso de água em


zonas que normalmente não se encontram submersas. O transbordamento ocor-
re de modo gradual, geralmente ocasionado por chuvas prolongadas em áreas de
planície;

Enxurradas: Escoamento superficial de alta velocidade e energia, provocado por


chuvas intensas e concentradas, normalmente em pequenas bacias de relevo aci-
dentado. Caracterizada pela elevação súbita das vazões de determinada drenagem
e transbordamento brusco da calha fluvial. Apresenta grande poder destrutivo;

Alagamentos: Extrapolação da capacidade de escoamento de sistemas de drena-


gem urbana e consequente acúmulo de água em ruas, calçadas ou outras infraes-
truturas urbanas, em decorrência de precipitações intensas (BRASIL, 2012).

187
AMBIENTE: Percepções 2021

Além dessas, podem estar relacionados aos desastres hidrológicos algumas varia-
ções geológicas, tais como queda de lascas, deslizamentos (rotacional, solo-solo e solo-
-rocha), quedas e rolamentos de blocos, erosão e solapamento de margens e ainda corri-
das de detritos, conforme cita o Serviço Geológico do Brasil.

Devido à essa problemática que assola milhares de pessoas todos os anos, em 2012
também foi instituída a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC, Lei Fede-
ral 12.608/2012), que estabeleceu uma abordagem sistêmica e interligada para a gestão
de risco, dentro das ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação
(BRASIL, 2017).

Estas ações vão ainda ao encontro do Marco de Sendai, estabelecido em março de


2015 no Japão, como um acordo internacional correlato à gestão de risco, que têm como
prioridades a compreensão dos riscos de desastres; o fortalecimento da governança para
gerenciar o risco de desastres; o investimento na redução dos riscos de desastres para a
resiliência; e a melhoria na preparação para desastres com foco em resposta efetiva e na
máxima “reconstruir melhor que antes”, aplicável às ações de recuperação, reabilitação e
reconstrução (UN, 2015).

O termo resiliência tem sua origem na física para definir a resistência dos mate-
riais, contudo, o ecólogo Holling (1973) apresenta o termo como ecossistemas capazes de
absorver mudanças e continuar existindo. Ao encontro destes, a resiliência é apresenta-
da como um meio de entender a dinâmica não-linear observada nos ecossistemas, acar-
retando uma nova forma de integrar a gestão dos recursos naturais com as pessoas. A
resiliência se faz presente em sistemas caracterizados como complexos, dinâmicos, im-
previsíveis e não lineares, nos quais nenhum ator tem o poder de direcionar o sistema e
não existe certeza de como o sistema vai responder a cada ação (GONÇALVES, 2014). Em
outras palavras, a submissão se faz presente, mas não a resignação.

Do exposto, a dinâmica não-linear dos ecossistemas foi ressignificada no estudo


dos territórios urbanos, focada na interface da vulnerabilidade e da sustentabilidade, com
propósito de equacionar os problemas relacionados ao planejamento urbano (CHELLERI,
2012). Somando-se a esses, a crescente urbanização traz consigo um palco de incerte-
zas e de imprevisibilidade, no que tange o processo de evolução das cidades e, também,

188
AMBIENTE: Percepções 2021

enquanto paradigma norteador das intervenções de planejamento urbano, cabendo ple-


namente o conceito de resiliência para interpretar os conceitos evolutivos das cidades e
corroborando as soluções de planejamento (ALEXANDER, 2013).

Ciente dos benefícios e serviços prestados pelos ecossistemas para as cidades e go-
vernos locais e da falta de planejamento no desenvolvimento urbano e crescimento da
economia, percebe-se a necessidade de gerar condutas de porte mundial para evitar ações
negativas em tal recurso natural. Desta forma, iniciativas internacionais e multilaterais
voltadas para a redução do risco de desastres hidrológicos, como o já citado Marco de
Sendai, também são apresentadas através dos programas Marco de Ação de Hyogo e a
campanha “Construindo Cidades Resilientes”. As iniciativas citadas objetivam aumentar a
resiliência das nações e comunidades frente aos desastres, reduzindo as perdas conside-
ráveis advindas dos desastres, sejam elas humanas, bens sociais, econômicas e ambien-
tais, tanto de comunidades como de países, assim como incentivar gestores municipais na
elaboração de práticas sustentáveis de urbanização.

O Marco de Ação de Hyogo, principal resultado da conferência realizada pela ONU em


2005, objetiva aumentar a resiliência das nações e das comunidades frente aos desastres,
reduzindo perdas de vidas humana, bens sociais, econômicos e ambientais (UNISDR/ONU,
2005). Somando-se a esse, a UNISDR cria, em 2010, a campanha “Construindo Cidades
Resilientes – Minha Cidade está se preparando! 2010-2015”, com o propósito de incen-
tivar os gestores municipais a regularem suas cidades através de uma abordagem que
aumente a resiliência aos desastres (GUIA GESTORES PÚBLICOS, 2012).

O estudo realizado por Viana (2016) indica, aproximadamente, 3000 cidades distri-
buídas por todo o planeta como aptas a receber o certificado de cidade resiliente, como
reconhecimento dos esforços empreendidos em nível local. O Brasil se destaca como sen-
do o segundo lugar global em número de cidades participantes, com mais de 300 cidades
certificadas como resilientes. Sua atuação iniciou em 2011 através da Secretaria Nacional
de Proteção e Defesa Civil – SEDEC. Entretanto, observa-se uma elevada concentração de
cidades resilientes apenas nas regiões sul e sudeste do país, sendo que os estados de São
Paulo e Paraná apresentam o maior índice de cidades resilientes a desastres socionaturais
do país. A dimensão do programa vem crescendo gradualmente a cada ano, colocando

189
AMBIENTE: Percepções 2021

também o estado do Rio Grande do Sul como um ator ativo na busca por uma nova visão
acerca dessa problemática.

Tendo em vista os fatos mencionados, é necessário que se diminua a vulnerabilidade


aumentando a resiliência da população. Isso significa identificar áreas de risco e proibir a
ocupação, apresentar edificações e a infraestrutura das cidades preparadas para os peri-
gos e arquitetar a população, criando uma cultura de prevenção de riscos e desenvolvendo
sistemas de alerta (AMORIM; QUELHAS; MOTTA, 2014).

Portanto, este trabalho busca avaliar os desastres naturais hidrológicos no Estado


do Rio Grande do Sul, analisando as áreas de risco e verificando de que forma a engenharia
de resiliência está sendo abordada.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 MAPEAMENTO DAS ÁREAS DE RISCOS NO BRASIL


A definição de risco está diretamente condicionada à vulnerabilidade de elementos
expostos a um perigo. O risco de desastre depende de alguns fatores como as característi-
cas, as possibilidades e intensidades das ameaças (grau de perigo), bem como a quantida-
de e vulnerabilidade dos elementos expostos, em função das condições naturais, sociais,
econômicas e ambientais existentes. E para compreender, planejar, coordenar e executar
ações e medidas preventivas destinadas a reduzir os riscos de desastres e evitar a instala-
ção de novos riscos, faz-se necessária a gestão destes riscos (BRASIL, 2018).

De acordo com o Programa Gestão de Riscos e de Desastres – PPA 2016-2019 (BRA-


SIL, 2015), o Ministério de Minas e Energia é responsável pela identificação dos riscos de
desastres naturais, por meio da elaboração de mapeamentos em municípios críticos, onde
são identificados riscos de inundações e deslizamentos. A CPRM, foi a responsável pela
setorização de riscos em todo o território nacional no início desta década.

Alves, Santos e Cartagena (2011) afirmam que os mapeamentos de risco servem


para saber quais são os locais onde existe o risco e que, portanto, devem receber maior
atenção nas ações de redução de risco e desastre, servindo assim como base para deci-

190
AMBIENTE: Percepções 2021

sões ideológicas que busquem reduzir vulnerabilidades com políticas de ocupação urbana,
moradias sociais, mobilidade, saúde, saneamento, educação e segurança pública.

Os autores também apontam que, para o mapeamento de risco, não há um modelo


padrão a ser seguido. Porém, existem alguns itens fundamentais que devem ser conside-
rados, como: levantamento de dados históricos de recorrência de desastres; reconheci-
mento de ameaças e vulnerabilidades (físicas e sociais); as capacidades das comunidades
que estão em áreas de risco e a representação gráfica. Neste âmbito, considera-se que,
para esta tarefa, é necessário um conhecimento técnico interdisciplinar de hidrologia, me-
teorologia, física, engenharia, psicologia social, comunicação, geologia, geotécnica, socio-
logia e assistência social. Ou seja, quanto maior o número de profissionais de áreas varia-
das o mapeamento envolver, bem como o envolvimento da comunidade, mais completo e
preciso será o mapeamento de risco (ALVES; SANTOS; CARTAGENA, 2011).

2.2 DESASTRES HIDROLÓGICOS E A SAÚDE HUMANA


Segundo Kobiyama et al. (2006), o aumento dos desastres naturais pode estar asso-
ciado com o crescimento populacional, concentração da população nos centros urbanos e
com o mau planejamento e utilização das bacias hidrográficas pelo homem. Portanto, para
Freitas et al. (2014), as condições de vulnerabilidade socioambiental resultam de proces-
sos sociais e mudanças ambientais que combinam: a) a precariedade das condições de vida
e proteção social, que tornam determinados grupos populacionais, principalmente entre
os mais pobres, vulneráveis aos desastres; b) as mudanças ambientais resultantes da de-
gradação ambiental que tornam determinadas áreas mais vulneráveis frente à ocorrência
de ameaças e seus eventos subsequentes.

Dessa forma, os impactos ambientais podem ser citados pela contaminação biológi-
ca e química da água para consumo humano, alimentos e solo, comprometimento da rede
e fontes alternativas de abastecimento de água, da rede de serviço de coleta e tratamento
de esgoto, dos serviços de coleta e disposição do lixo, alteração nos ciclos dos vetores,
hospedeiros e reservatórios de doenças e nas formas de exposições ambientais dos hu-
manos (LONDE et al., 2014).

Concomitante a isso, os impactos dos desastres naturais sobre a saúde podem ocor-
rer em tempos diferentes. No curto prazo de tempo, entre horas a alguns dias, se produ-

191
AMBIENTE: Percepções 2021

zem a maior parte dos registros de feridos leves e graves e mortalidade, incluindo como
resposta as ações de resgate e urgência. Um segundo momento se dá no período entre
dias a semanas, caracterizando-se pela ocorrência de algumas doenças transmissíveis, a
exemplo da leptospirose e doenças diarreicas, podendo agravar quadros de doenças não
transmissíveis em pacientes crônicos, como a hipertensão. Num espaço maior de tempo,
entre meses e anos, os impactos na saúde se relacionam à desnutrição, à intensificação
de doenças crônicas e, especialmente, aos transtornos psicossociais e comportamentais
(FREITAS et al., 2014).

2.3 O CONTEXTO DA ENGENHARIA DE RESILIÊNCIA


A Engenharia de Resiliência, voltada para a resiliência urbana, está articulada com a
habilidade que um sistema urbano apresenta em voltar (ou não) ao equilíbrio, após sofrer
uma influência externa. Esse entendimento não se aplica aos processos e transforma-
ções das cidades ao longo de sua história, mas sim a movimentos oriundos de desastres.
A dinâmica processual neste estudo não caracteriza as falhas como uma avaria ou mau
funcionamento das funções normais do sistema, mas sim como uma ação de adaptação
necessária para lidar com a complexibilidade dos ecossistemas do mundo real (FORESTI et
al., 2015).

Dessa ótica, comunidades resilientes e sustentáveis são organizações que aprestam


uma estrutura construtiva para reduzir os efeitos dos desastres, concomitantemente com
competências para resgatar a ordem socioeconômica. Neste sentido, as alterações do sis-
tema urbano contemplam a flexibilidade para captar oportunidades geradas por oscilações
e incidentes singulares, impulsionando ações para o desenvolvimento, em diferentes ce-
nários. (CHELLERI, 2012).

As estratégias apontadas na Engenharia de Resiliência focam na manutenção do sis-


tema, de forma a deixá-lo o mais próximo do ponto de equilíbrio, destacando a confiabili-
dade e eficiência do sistema, apresentando maior vulnerabilidade a perturbações. Kruse et
al. (2017) aludem que a resiliência não pode ser vista como uma oportunidade para a refor-
ma social e transformação no contexto da incerteza na redução de riscos de desastres que
não atendem à necessidade de aprender e mudar. Os mesmos autores informam que esta

192
AMBIENTE: Percepções 2021

deve considerar diferentes pressões (desenvolvimento de processos e mudanças climá-


ticas) de modo a apreender e adaptar riscos existentes a uma gestão a nível comunitário.

Cabe destacar a importância de gerir protocolos que sintetizem o estado do sistema


em cada momento, identificando alterações presentes e efetuando seu monitoramento,
possibilitando a avaliação dos resultados das estratégias implantadas e inferindo com pra-
zo na sua correção. Conjectura que, enquanto as cidades não compreenderem a dimensão
do risco a que estão expostas, o planejamento para a redução de perigos socionaturais
poderá ser ineficaz, pois somente com análise e avalição de riscos torna-se possível ge-
renciar e planejar decisões para redução deles. Os critérios de resiliência urbana associa-
dos a desastres socionaturais, a partir da Engenharia de Resiliência, são descritos a seguir
(Fig.1).

Figura 1 – Critérios de sistema resilientes na literatura sobre desastres socionaturais

Fonte: Adaptado de Foresti et al. (2015)

A resiliência está adaptando o formato como a redução de riscos a desastres é estru-


turada e as responsabilidades atribuídas aos atores públicos e privados. Como exemplo,
cita-se o Reino Unido, onde a resiliência, no que compete à redução de desastre, deixa de
estar vinculada ao poder nacional e passa a ser responsabilidade de nível local (DEEMING
et al., 2018). No cenário nacional, a influência do desempenho dos atores a nível individual,

193
AMBIENTE: Percepções 2021

coletivo ou organizacional norteia-se na legislação e na literatura específica, referente aos


critérios para que um sistema se configure resiliente.

2.4 ESTRUTURAÇÃO DE SISTEMAS RESILIENTES


Os sistemas organizados pelas ideias da engenharia procuram antecipar e resistir
aos rompimentos, mas não a findar os efeitos da vulnerabilidade diante de desastres. Com
esse propósito, busca-se fatores que almejam se recuperar após serem submetidas a si-
tuações traumáticas. Latente a essa visão da resiliência, apresentam-se os conceitos de:
equilíbrio, flexibilidade, previsibilidade e eficiência (FIKSEL, 2003).

Tais propósitos, aplicados a territórios movidos por catástrofes ou programas de mi-


tigação para áreas expostas a riscos ambientais, respondem a ideia da Engenharia da Re-
siliência (ER) de retornar uma posição ao equilíbrio. Essa visão aborda uma metodologia
que mobiliza os atores afetados, de modo que a estrutura socioambiental e econômica
se recoloque no mesmo padrão de “desenvolvimento” que se encontrava anterior à crise
(FINGLETON et al., 2012). Ciente desses, o Quadro 1 estabelece uma relação entre níveis
locais, critérios de resiliência e a sua configuração de acordo com a campanha “Construin-
do cidades Resilientes”.

194
AMBIENTE: Percepções 2021

Quadro 1 – Processo de adaptação de Engenharia de Resiliência para critérios de sistema resilientes na


literatura sobre situações de desastres socionaturais

Categorias ER Categorias: 1Local, 2Municipal, Estadual e 3Federal Configuração


• Ensinar a portar-se diante de desastres hi- • Envolvimento de comunidades
droambientais, apontar meios materiais e hu- locais na construção de solu-
manos disponíveis1. ções.
Reação • Estabelecer programa de treinamento perma- • Compreensão da percepção de
nente e sustentável para identificar os recursos riscos para melhorar respostas.
humanos e materiais necessários2. • Compreensão da cultura dos
desastres a partir do olhar.
• Treinar os atores afetados com grupos específi- • estabelecido à população an-
cos (defesa civil, bombeiros, equipes médicas de tiga.
emergências)2, 3.
• Implementar ações de primeiros socorros, aten- • Inclusão de usuários à tecnolo-
dimento pré-hospitalar, triagem e evacuação gia, possibilitando os mesmos
médica2,3. a realizarem diagnósticos de
• Identificar e classificar os problemas apresenta- realidade.
dos (percebidos, vulneráveis, mensuráveis) 1, 2. • Boletim de risco orientando a
• Identificar, nas inundações, os níveis de água imprensa na divulgação e am-
Monitoramento que configuram cheias e a drenagem urbana2. pliando os elementos de prote-
ção comunitária.
• Resgatar dados históricos2, 3.
• Criação de sistema de infor-
• Desenvolver atividades de planejamento local,
mação de monitoramento de
avaliação e mapas de ocupação ordenada e nor-
desastre.
mas de construção2, 3.
• Promover atividades de proteção à saúde men-
tal2.
• Proceder às atividades de comunicação social1, 2. • Manter o questionamento críti-
• Reconhecer que a tendência adaptativa do sis- co sobre o desenvolvimento da
tema está em declive (estabelecer uma comu- tecnologia permite o seu avan-
nicação entre Defesa Civil Municipal e CENAD ço e evita contradições.
– Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos • Confiar nas autoridades e cre-
e Desastres)1, 2. dibilidade nas informações que
Antecipação • Definir um orçamento para a redução do risco são disponibilizadas.
de desastres2, 3. • Políticas públicas que atendam
• Atualização permanente de todos os dados so- à comunidade afetada.
bre os riscos e vulnerabilidades existentes – su- • Reabilitar os serviços essen-
por estudo de risco como base de todos os pla- ciais.
nos de desenvolvimento urbano e decisões2, 3. • Sepultar seres humanos e ani-
mais mortos.
• Capacidade de investir e manter as estruturas
que reduzem o risco (sistema de drenagem plu-
vial)2.
• Existência de programas de educação/formação/
sensibilização sobre a redução do risco de de-
sastres nas escolas1, 2.

195
AMBIENTE: Percepções 2021

Configuração
Categorias ER Categorias: 1Local, 2Municipal, Estadual e 3Federal
(conclusão)
• Proteção dos ecossistemas naturais como for-
ma de mitigar inundações, tempestades e outros
perigos a que a cidade possa estar vulnerável1, 2,
3
.
• Aprender a gerir conhecimento sobre desastres • Processo de multiplicação e ou
através de simulados, tomando a norma defini- difusão das tecnologias sociais
da pelo plano de contingência2, 3. se configura como aprendizado
• Aprender como minimizar e/ou eliminar as difi- em prática.
culdades oriundas dos meios de comunicação 1,
• Modelo de gestão de riscos
2, 3
. baseado em conhecimento
• Mover os multiatores envolvidos na gestão de interdisciplinar.
riscos de desastres em relação a identificar: ris- • Processo de certificado de
cos, tecnologia social, protocolos de prevenção produtos e metodologias para
e alertas de desastres hidrológicos2, 3. redução da pobreza.
Aprendizado
• Adotar o desenvolvimento de ações de educa- • Criação de banco de dados de
ção em saúde e mobilização social2. registros de desastres.
• Aprender como gerar projetos de moradia com • Participar de projetos sociais
segurança de construção e estudos para esco- voltados para áreas de risco.
lha adequada das áreas mais apropriadas para • Desenvolver mecanismos que
ocupação2, 3. comovam e instruam a popu-
• Aprender a sintetizar o aprendizado acumulado lação, de modo a ser possível
sobre o tema: criar um Banco de Dados dos re- transmitir emergência.
gistros de ocorrência de desastres e dos simu-
lados2, 3.
Fonte: Adaptado de Foresti et al. (2015) e Guia Gestores Públicos (2012)

Corroborando com a Lei Federal 12.608/12, a campanha “Construindo Cidades Resi-


lientes” (GUIA GESTORES PÚBLICOS, 2012) estabelece responsabilidades para as diferen-
tes entidades envolvidas, seja no processo de construção dessas ou nas ações voltadas
para a redução do risco, delimitando as ações a serem adotadas nos diferentes níveis go-
vernamentais e associações comunitárias, sugerindo os processos que seguem (Quadro 2):

196
AMBIENTE: Percepções 2021

Quadro 2 – Responsabilidades para as diferentes entidades envolvidas no processo de adaptação à Enge-


nharia de Resiliência

Categoria Atribuições

• Configure e fomente plataformas nacionais de atuação multidisciplinar


e inclua governos locais e associações na discussão sobre redução de
riscos de desastres.
• Favoreça e incentive a aplicação de recursos para urbanização susten-
tável.
• Garanta que seus ministérios e demais instituições federais pautem a
redução de risco de desastres e invistam recursos para desenvolvimen-
Governos Nacionais
to de políticas públicas na área.
• Incentive o desenvolvimento econômico de áreas rurais e pequenas
cidades, com o objetivo de reduzir a migração acelerada para grandes
centros urbanos.
• Faça da redução de riscos de desastres uma prioridade nacional e iden-
tifique, em todos os níveis, quais as instituições responsáveis por redu-
zir os riscos de desastres.

• Inclua o tema “risco de desastres” no topo de sua agenda.


• Entre em contato com a EIRD (Estratégia Internacional para Redução
Governos locais de Desastres das Nações Unidas) para articular-se com autoridades de
sua área de atuação.
• Implantação da campanha em níveis locais e comunitários.

• Participe da campanha e incentive sua organização a participar tam-


bém.
• Promova atividades de engajamento de lideranças comunitárias, utili-
zando os recursos e materiais promocionais da campanha.
• Construa projetos em parceria com os governos locais, ONGs, iniciativa
privada etc., para tornar sua localidade mais segura.
Associações Comunitárias • Compartilhe o conhecimento local e suas experiências com outros ato-
res.
• Desenvolva atividades como planejamentos locais, avaliações e mapas
de risco, mutirões para manutenção de prédios públicos, capacitações
sobre ocupação ordenada e normas de construção.
• Colabore na avaliação de riscos em sua cidade, e sugira um monitora-
mento participativo dos riscos.

• Assegure-se de que seus negócios não ampliam os riscos de desastres


ou degradam o meio ambiente.
• Fortaleça parcerias em projetos locais (governamentais ou comunitá-
rios) que promovam a participação de sua instituição na construção de
Iniciativa Privada
cidades seguras e lembre-se que apenas uma cidade resiliente pode
sustentar o crescimento econômico.
• Invista recursos em pesquisa e desenvolvimento de projetos sobre
redução de riscos urbanos. (BRASIL, 2011, p. 24-25).
Fonte: Adaptado da campanha “Construindo cidades Resilientes” (GUIA GESTORES PÚBLICOS, 2012)

197
AMBIENTE: Percepções 2021

Esse panorama serve de “pano de fundo” para uma cidade tornar-se resiliente, apre-
sentando uma estrutura complexa e que exige um esforço significativo para execução de
práticas de governo local junto à atuação efetiva com a sociedade, a médio e longo prazo.
Visto que as cidades constituem sistemas altamente complexos, com propriedades físicas
organizacionais, sociais e econômicas, a resiliência urbana remete a ampla e complexa
compreensão dos papéis e dos atores envolvidos em seu organismo, levando a uma cons-
cientização lenta, porém contínua, da responsabilidade de cada um e suas consequências.

3 METODOLOGIA

Inicialmente foram compilados e analisados os dados disponíveis na plataforma on-


-line do CPRM (2016), referentes à setorização dos riscos geológicos identificados no Rio
Grande do Sul. O trabalho desenvolvido pelo CPRM está baseado em visitas de campo às
áreas com histórico de desastres naturais ou naqueles locais onde já foram identifica-
das situações de risco, ainda que sem registro de acidentes. Nestes locais, são realizadas
observações das condições das construções e seu entorno, além de ser verificada a
situação topográfica, a declividade do terreno, o escoamento de águas pluviais e de águas
servidas e ainda indícios de processos desestabilizadores dos terrenos ou possibilidades
de inundação. Essas avaliações são complementadas com a análise de imagens aéreas e
de satélites. Portanto, a definição de um setor de risco é realizada de acordo com um con-
junto de situações similares dentro de um mesmo contexto geográfico.

Atualmente estão catalogados 50 municípios, para os quais foram elaboradas ações


emergenciais para reconhecimento de áreas de alto e muito alto risco a movimentos de
massas e enchentes1.

Referente a estes dados, foram levantados:

a. o município;

b. o número de setores de risco identificados;

1
Enchente (ou cheia): é o aumento do nível da água no canal de drenagem em função do aumento da vazão,
atingindo a cota máxima do canal, porém, sem que isso gere transbordamento. Inundação: é o transborda-
mento das águas de um curso de água.

198
AMBIENTE: Percepções 2021

c. a tipologia do risco;

d. as principais causas de geração do risco;

e. a quantidade de imóveis em risco;

f. a quantidade de pessoas em risco;

g. as sugestões de medidas estruturais.

Após a tabulação destes dados, avaliou-se aspectos como:

• Verificar as cidades atingidas pelos desastres hidrológicos no Rio Grande do Sul,


bem como quem são os principais envolvidos e suas principais causas;

• Identificar os principais desafios para reduzir a vulnerabilidade dos atingidos por


desastres naturais hidrológicos;

• Verificar o que está sendo feito pelos gestores públicos para minimizar os impac-
tos causados, no que tange à prevenção e suporte;

• Sugerir ações para um gerenciamento integrado de recursos hídricos, saúde pú-


blica e desastres, baseado na engenharia de resiliência para o município com
maior número de pessoas vivendo em áreas de risco.

Com base nesses resultados, identificou-se o município com maior número de pes-
soas vivendo em áreas de risco e, a partir desta identificação, estudou-se os meios atra-
vés dos quais a engenharia de resiliência pode contribuir para minimização dos efeitos
causados pelos desastres hidrológicos, promovendo o gerenciamento integrado entre os
recursos hídricos, os desastres e a saúde pública.

4 RESULTADOS E ANÁLISE

Dos dados disponíveis dos 50 municípios gaúchos mapeados pelo CPRM referen-
tes aos desastres hidrológicos, apenas cinco não puderam ser compilados. Os municípios
de Cruzeiro do Sul e Porto Alegre apresentaram falha no arquivo disponibilizado para
download. Já os arquivos disponíveis referentes aos municípios de Caxias do Sul e Santa

199
AMBIENTE: Percepções 2021

Maria correspondiam a Planos Municipais de Redução de Riscos, os quais não contempla-


vam os objetivos deste estudo. Por fim, para o município de Lajeado, o documento acessa-
do era relativo ao município de mesmo nome, porém pertencente ao Estado do Tocantins.

Quanto aos riscos, apenas quatro municípios apresentam risco muito alto, enquan-
to 29 apresentam risco alto e um risco médio. Alguns municípios apresentaram mais de
um grau de risco em seu território. Torres apresentou setores com grau de risco médio e
alto. Eldorado do Sul, Farroupilha, Parobé, Portão e São Leopoldo foram identificados com
risco alto e muito alto. Além disso, cinco municípios não classificaram o grau de risco nos
setores mapeados: Encantado, Fontoura Xavier, Igrejinha, Itati e Novo Hamburgo, todos
relatórios datados de 2011.

Ao encontro da Figura 2, observa-se que quase 75% dos municípios rio-grandenses


possuem setores com grau de risco alto ou muito alto para desastres hidrológicos.

Figura 2 – Classificação do grau de risco hidrológico dos municípios analisados

Fonte: Adaptado de CPRM, 2018

Para identificar-se a classe do grau de risco, são considerados aspectos como o ar-
ranjo entre cenários hidrológicos, a vulnerabilidade das habitações e a periculosidade do
processo segundo a distância das moradias ao eixo da drenagem. Goerl, Kobyana e Pellerin
(2012) e Goerl e Kobiyama (2013) descrevem em seus trabalhos mais detalhadamente
como esta classificação é realizada e ainda conceituam vulnerabilidade, perigo e risco.

200
AMBIENTE: Percepções 2021

Para analisar os dados compilados sobre as tipologias do risco, suas respectivas cau-
sas, quantidade de imóveis e pessoas em risco e sugestões de medidas estruturais, foi
aplicado o critério de seleção de municípios com mais de 3.000 pessoas afetadas conco-
mitante a quatro ou mais eventos ocorridos nos 45 municípios avaliados.

Na Figura 3 estão representadas todas as tipologias de risco descritas nos relatórios


do CPRM, que se intitulavam como: Ação emergencial para reconhecimento de áreas de
alto e muito alto risco a movimentos de massas e enchentes. Contudo, tais documentos
descrevem ainda outras tipologias e graus de risco diferentes daquelas propostas, como
já descrito na Figura 2.

O risco hidrológico à inundação foi observado em todos os municípios, seguido do


risco de solapamento de margem de rio e/ou arroio e queda/rolamento de blocos, ambos
na mesma proporção. Além disso, o município de Três Coroas foi o que apresentou maior
diversidade de tipologias de risco, seguido pelo município de Igrejinha. Quanto ao número
de setores de risco identificados, Três Coroas e Parobé recebem destaque.

201
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 3 – Setores de risco por tipologia para os municípios avaliados

Fonte: Adaptado de CPRM, 2018

Ao encontro dos objetivos propostos, a análise foi direcionada para a busca de ocor-
rência de setores de risco que apresentem tipologias referentes a desastres naturais hi-
drológicos: inundação, enxurrada e enchente. Como já evidenciado na Figura 3, constatou-
-se que setores de risco para inundação são citados em todos os 17 municípios, seguido
de enxurrada e enchente. Todavia, o número de setores de risco para enchentes supera o
de enxurradas (Fig. 4).

202
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 4 – Setores de risco para desastres hidrológicos

Fonte: Adaptado de CPRM, 2018

Contrapondo os resultados apresentados na Figura 3, na qual o município de Três


Coroas destacou-se com maior diversidade e número de setores de risco apontados pelos
relatórios do CPRM, quando voltado apenas para os riscos de desastres hidrológicos, o
cenário aponta o município de Cachoeira do Sul como mais suscetível.

Conforme indicado pelo CPRM, neste município as principais causas relacionadas à


geração de risco são a ocupação inadequada de áreas situadas na planície de inundação
de rios e arroios, a falta de drenagem e a disposição incorreta de resíduos. Já para Três
Coroas, o órgão citado descreve como causas: ocupação inadequada de áreas situadas na
planície de inundação e/ou margens de rios, arroios e/ou canais; ocupação inadequada de
encostas, cristas e/ou linha de drenagem natural; sistema de drenagem pluvial ineficiente

203
AMBIENTE: Percepções 2021

e/ou ausente; deposição inadequada de resíduos, entulhos e outros materiais no leito dos
rios, córregos, arroios e/ou margens; sistema de coleta e tratamento de esgoto ineficiene
e/ou ausente e erosão. Na sequência, a Figura 5 representa o total de pessoas em risco.

Figura 5 – Total de pessoas em risco

Fonte: Adaptado de CPRM, 2018

No que tange à população vivendo em áreas de risco, o município de Pelotas apresen-


tou o maior número de pessoas nestas regiões, seguido de Novo Hamburgo, com 24.200
e 16.612, respectivamente. O município de Pelotas apresenta um total de oito setores de
risco, cujas principais causas foram identificadas como: ocupação inadequada de áreas
situadas na planície de inundação e/ou margens de rios, arroios e/ou canais; sistema de
drenagem pluvial ineficiente e/ou ausente e sistema de coleta e tratamento de esgoto ine-
ficiene e/ou ausente. Já Novo Hamburgo apresenta 11 setores de risco em que as causas
se assemelham às de Pelotas e ainda inserem-se: ocupação inadequada de encostas, cris-
tas e/ou linha de drenagem natural; deposição inadequada de resíduos, entulhos e outros
materiais no leito dos rios, córregos, arroios e/ou margens e erosão.

Quanto às medidas estruturais propostas pelo CPRM para prevenção e mitigação dos
riscos de desastres hidrológicos no município com maior número de habitantes suscetíveis
aos mesmos, que foi identificado como Pelotas, foram elaboradas as seguintes ações:

204
AMBIENTE: Percepções 2021

a) Evacuação preventiva durante evento de inundação;

b) Implantação de sistema de alerta hidrológico a nível de bacia hidrográfica;

c) Determinação das cotas de inundação e adoção de medidas de controle de ocupação;

d) Elaboração de plano de contingência;

e) Desassoreamento do leito do arroio/canal e seus afluentes e dos canais de drenagem;

f) Estudo hidrológico para redimensionamento dos canais de drenagem pluvial.

Do ponto de vista da engenharia de resiliência, busca-se gerar ações que conduzam


a reação, monitoramento, antecipação e aprendizado. Desta forma, as medidas de eva-
cuação preventiva durante o evento de inundação e implantação de sistemas de alerta,
utilizadas na cidade de Pelotas, expressam medidas de reação. Tais ações focam no saber
se posicionar frente a problemas reais, reagindo ao inesperado, atenuando a perda ou ma-
ximizando o ganho, ou seja, iniciando uma ação.

No que tange à habilidade de monitoramento, destaca-se a medida “c” da referida


cidade, pois esta habilidade preocupa-se em assegurar proteção e prevenção de resulta-
dos divergentes, projetando um sistema proativo e antecipando mudanças significativas.
Já, as medidas “d” e “e” se somam à antecipação de futuras ameaças, as quais atentam
em saber o que esperar. Esta é uma fase complexa, pois a percepção dos padrões sinaliza
com antecedência que a capacidade adaptativa está em declive, ressaltando a importância
do banco de dados. A literatura descreve cinco padrões potenciais para esta habilidade
(WOODS, 2011):

• São aqueles capazes de reconhecer que a capacidade adaptativa está caindo ou é


inadequada para as circunstâncias, possibilitando o surgimento de gargalos, cita
o retardo e ruptura como indicadores;

• São capazes de reconhecer as ameaças das reservas se exaurindo;

• São capazes de reconhecerem quando se deve mudar as prioridades a partir das


metas de resultados;

205
AMBIENTE: Percepções 2021

• Navegam em direção a mudanças independentes através de papeis, atividades,


níveis e metas;

• São capazes de reconhecer a necessidade de aprender novos caminhos para a


adaptação.

Por fim, o aprendizado remete à capacidade de se adaptar ao novo e torna-se pre-


sente no item “f”. Dessa forma, apresenta-se uma abordagem de processo, elucidado para
reconhecimento de conflito de valores, encaminhado para uma estruturação do processo
de comunicação, coordenação e cooperação entre todas as partes envolvidas nas tomadas
de decisões, administrando indicadores de performance qualificáveis e valores públicos
qualitativos (FORESTI et al., 2015).

Sem embargo, as características de um sistema que contribuem para sua capacidade


adaptativa ou resiliência geral, no olhar de Hollnagel et al. (2011), são processos e carac-
terísticas estruturais que cooperam para a flexibilidade, a variabilidade de experiências e
processos de comunicação e aprendizagem. O autor destaca:

• Sistemas com diversidade e redundância têm maior resiliência que sistemas que
maximizam a produtividade de apenas um benefício;

• Reservas de recursos e estoques de capital – financeiro, natural, humano, social


e fabricado – permitem que o sistema se recupere depois de pequenas pertur-
bações;

• Capital social, liderança e confiança contribuem para resiliência;

• Instituições têm um papel fundamental na resiliência;

• Sistemas com estrutura modular (por exemplo, redes descentralizadas) têm


maior resiliência que sistemas centralizados.

Portanto, há necessidade eminente de buscar soluções em nível global, potenciali-


zando o sucesso no entendimento da dinâmica do sistema, as quais podem contribuir para
a governança adaptativa e a melhoria da gestão dos recursos naturais.

206
AMBIENTE: Percepções 2021

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considera-se que este tipo de análise é fundamental para o avanço tanto no desen-
volvimento de políticas públicas, como para as ações de prevenção, mitigação, preparação,
resposta e reabilitação para reduzir o impacto dos desastres sobre a saúde. Este estudo
permitiu rever conceitos importantes para a gestão de riscos através de ações eviden-
ciadas na Engenharia de Resiliência, dessa forma, nota-se a necessidade de gerar ações
atreladas a entidades não governamentais, academia, sociedade e simpatizantes. Tais
ações não medem esforços para melhorar a qualidade da vida humana, assim como as
campanhas de porte mundial que conjecturam em todo o mundo para amenizar impactos
e ações, tornando as cidades resilientes a desastres socioambientais.

REFERÊNCIAS
ALEXANDER, D. E. Resilience and disaster risk reduction: an etymological journey. Natural
Hazards and Earth System Sciences, v. 13, n. 11, p. 2707-2716, 2013.

ALVES, A.; SANTOS, J.; CARTAGENA, S. Capacitação básica em defesa civil: livro texto para
educação a distância. Florianópolis: CEPED UFSC, 2011. Disponível em: https://www.ceped.
ufsc.br/wp-content/uploads/2012/01/Capacita%C3%A7%C3%A3o-B%C3%A1sica-em-Defe-
sa-Civil-livro-texto.pdf. Acesso em: 02 maio 2018.

AMORIM, M. F.; QUELHAS, O. L. G.; MOTTA, A. L. T. S. A resiliência das cidades frente a chuvas
torrenciais: Estudo de caso do ano de contingência da cidade do Rio de Janeiro. Sociedade &
Natureza, v. 26, n. 3, p. 519-534, 2014.

BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Secretaria Nacional de Defesa Civil. Centro Na-
cional de Gerenciamento de Riscos e Desastres. Anuário brasileiro de desastres naturais:
2011. Brasília: CENAD, 2012. Disponível em: https://antigo.mdr.gov.br/images/stories/Ar-
quivosDefesaCivil/ArquivosPDF/publicacoes/Anuario-de-Desastres-Naturais-2011.pdf.
Acesso em: 2 maio 2018.

BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Planejamento e In-


vestimento Estratégico. Plano Plurianual 2016–2019: anexo I. Desenvolvimento, produti-
vidade e inclusão social. Brasília: Ministério do Planejamento, 2015. Disponível em: http://

207
AMBIENTE: Percepções 2021

www.planejamento.gov.br/assuntos/planejamento-e-investimentos/plano-plurianual.
Acesso em: 2 maio 2018.

BRASIL. Ministério da Integração Nacional. Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil.


Departamento de Prevenção e Preparação. Módulo de formação: noções básicas em pro-
teção e defesa civil e em gestão de riscos: livro base. 1 ed. Brasília: Ministério da Integração
Nacional, 2017. Disponível em: https://defesacivil.es.gov.br/Media/DefesaCivil/Material%20
Did%C3%A1tico/M%C3%B3dulos%20SEDEC/M%C3%B3dulo%20IV%20-%20RECONSTRU%-
C3%87%C3%83O%20-%20Livro%20Base.pdf. Acesso em: 2 maio 2018.

BRASIL. Ministério das Cidades. Capacitação em Mapeamento e Gerenciamento de Risco.


2018. Disponível em: http://www.defesacivil.mg.gov.br/images/documentos/Defesa%20Ci-
vil/manuais/mapeamento/mapeamento-grafica.pdf. Acesso em: 18 maio 2018.

CHELLERI, L. From the «Resilient City» to Urban Resilience. A review essay on understanding
and integrating the resilience perspective for urban systems. Documents d’Anàlisi geogrà-
fica, v. 58, n. 2, p. 287-306, 2012.

CPRM - Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais. Serviço Geológico do Brasil. 2016.


Disponível em: http://www.cprm.gov.br/. Acesso em: 18 maio 2018.

CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL. Setorização de Riscos Geológicos - Rio Grande do


Sul. 2018. Disponível em: http://www.cprm.gov.br/publique/Gestao-Territorial/Prevencao-
-de-Desastres/Setorizacao-de-Riscos-Geologicos---Rio-Grande-do-Sul-4888.html. Aces-
so em: 21 abr. 2021.

DEEMING, H. et al. River and surface water flooding in Northern England: the civil protec-
tion‐social protection nexus. In: DEEMING, H. et al. Framing Community Disaster Resilience:
Resources, Capacities, Learning, and Action. Nova Jersey: Wiley-Blackwell, 2018. p. 177-196.

EM-DAT-CRED - The International Disaster Datebase - Centre for Research on the Epide-
miology of Disasters. File dated 02/07/2018. Brussels: Université catholique de Louvain,
2018. Disponível em: https://www.emdat.be/Glossary. Acesso em: 18 set. 2019.

FINGLETON, B.; GARRETSEN, H.; MARTIN, R. Recessionary shocks and regional employment:
evidence on the resilience of UK regions. Journal of regional science, v. 52, n. 1, p. 109-133,
2012.

FIKSEL. Designing Resilient, Sustainable Systems. Environmental Science & Technology, v.


37, n. 23, p. 5330-5339, 2003.

208
AMBIENTE: Percepções 2021

FORESTI, A. J. et al. Engenharia da Resiliência: uma aproximação com a gestão de risco de


desastres socionaturais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE GEOLOGIA DE ENGENHARIA E
AMBIENTAL, 15. Anais... Bento Gonçalves: Associação Brasileira de Geologia de Engenharia
Ambiental, 2015.

FREITAS, C. M. et al. Desastres naturais e saúde: uma análise da situação do Brasil. Ciência &
Saúde Coletiva, v. 19, p. 3645-3656, 2014.

GUIA GESTORES PÚBLICOS. Como Construir Cidades Mais Resilientes - Um Guia para Ges-
tores Públicos Locais. Uma contribuição à Campanha Global 2010-2015. Construindo Ci-
dades Resilientes – Minha Cidade está se preparando! Genebra, UNISDR, 2012. Disponível
em: http://www.unisdr.org/files/26462_guiagestorespublicosweb.pdf. Acesso em: 18 maio
2018.

GOERL, R. F.; KOBIYAMA, M. Redução dos desastres naturais: desafio dos geógrafos. Am-
biência, v. 9, n. 1, p. 145-172, 2013.

GOERL, R. F.; KOBIYAMA, M.; PELLEIN, J. R. G. M. Proposta metodológica para mapeamento


de áreas de risco a inundação: Estudo de caso do município de Rio Negrinho - SC. Boletim de
Geografia, v. 30, n. 1, p. 81-100, 2012.

GONÇALVES, C. J. A. Resiliência, sustentabilidade e qualidade de vida em sistemas urbanos


efeitos da crise (pós-2008) em Portugal e no sistema urbano do Oeste. 2014. 600 f. Tese
(Doutorado em Geografia - Planeamento Regional e Urbano) – Instituto de Geografia e Or-
denamento do Território, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2014.

HOLLING, C. S. Resilience and Stability of Ecological Systems. Annual Review of Ecology


and Systematics, v. 4, p. 1-23, 1973. Disponível em: https://www.annualreviews.org/doi/
abs/10.1146/annurev.es.04.110173.000245. Acesso em: 21 abr. 2021.

HOLLNAGEL, E. et al. Resilience Engineering in Practice – a guidebook. Farnham: Ashgate


Publishing Limited, 2011.

KOBIYAMA, M. et al. Prevenção de desastres naturais: Conceitos básicos. Curitiba: Organic


Trading, 2006.

KRUSE, S. et al. Conceptualizing community resilience to natural hazards – the emBRACE


framework. Natural Hazards and Earth System Sciences, v. 17, p. 2321–2333, 2017.

209
AMBIENTE: Percepções 2021

LONDE, L. R. et al. Desastres relacionados à água no brasil: perspectivas e recomendações.


Ambiente & Sociedade, v. XVII, n. 4, p. 133-152, 2014.

UN - UNITED NATIONS. Sendai Framework for Disaster Risk Reduction 2015-2030. In:
THIRD UNITED NATIONS WORLD CONFERENCE ON DISASTER RISK REDUCTION. Japão: An-
nual Conference nº 224/L.2. p. 1 – 24, 2015. Disponível em: https://www.preventionweb.
net/files/43291_sendaiframeworkfordrren.pdf. Acesso em: 18 set. 2019.

UNISDR/ONU - ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A REDUÇÃO DE RISCOS DE DESAS-


TRES. Marco de Ação de Hyogo 2005-2015: Aumento da resiliência das nações e das comu-
nidades frente aos desastres. 2005. Disponível em: https://urbanismo.mppr.mp.br/arquivos/
File/MarcodeAcaodeHyogoCidadesResilientes20052015.pdf. Acesso em: 21 abr. 2021.

TUNDISI, J. G. Recursos hídricos no Brasil: problemas, desafios e estratégias para o futuro.


Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 2014.

VIANA, V. J. Gestão de risco de desastres no Brasil: leitura das estratégias locais de redução
de risco de inundação em Nova Friburgo, RJ. 2016. 410 f. Tese (Doutorado em Meio Ambien-
te) - Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente, Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

WOODS, D. D. Resilience and the Ability to Antecipate. In: HOLLNAGEL, E. et al. Resilience
Engineering in Practice – a guidebook. Farnham: Ashgate Publishing Limited, 2011.

210
9
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E
SUAS CONSEQUÊNCIAS NA
PERCEPÇÃO DE ESTUDANTES
DE LICENCIATURA

Crístian Yan Montana da Rocha


Márcia Isabel Käffer
Vanessa Schweitzer dos Santos
Jairo Lizandro Schmitt
AMBIENTE: Percepções 2021

1 INTRODUÇÃO

Na esfera pública atual, um dos mais relevantes e graves problemas ambientais vi-
venciados pela sociedade são as mudanças climáticas. A ação humana sobre a natureza
que se verifica pela emissão de gases poluentes e outros desastres tem sido objeto de
preocupação dos cientistas (PETRAGLIA et al., 2016). As consequências das atividades an-
trópicas, principalmente em relação ao período pós-Revolução Industrial, estão relaciona-
das com depreciação da qualidade de vida e o avanço do progresso econômico. A associa-
ção desses fatores tem despertado a atenção da humanidade para este tema relevante,
ocasionando discussões a nível mundial, especialmente relacionadas com a degradação
ambiental provocada pelas mudanças climáticas (BLANK, 2015).

A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, sigla


em inglês), em 1992 (UNITED NATIONS, 1992), descreveu as mudanças climáticas em seu
artigo 1 como:

Mudanças no ambiente físico ou biota resultantes de mudanças climáticas que têm


efeitos deletérios significativos sobre a composição, resiliência ou produtividade de
ecossistemas naturais e gerenciados, ou na operação de sistemas socioeconômicos
ou de saúde e bem-estar.

A Conferência da ONU sobre Meio Ambiente foi realizada em Estocolmo, em 1972,


e, de acordo com Petraglia et al. (2016), quatro décadas já se passaram desde sua reali-
zação, e o planeta contabiliza inúmeras convenções, protocolos, declarações e legislações
nacionais e internacionais no intuito de reverter o agravamento das condições ambientais,
sociais e econômicas. Muitos desses compromissos firmados ainda não tiveram imple-
mentação e tudo o que se sabe desde então é o prevalecimento da preponderância do as-
pecto econômico junto ao poder político nos debates. A questão ambiental propriamente
dita não tem sido incluída.

A degradação do ambiente tem gerado profundas interferências na capacidade de


suporte dos ecossistemas. Os impactos antropogênicos vêm violando os limites aceitáveis
de operação global, por exemplo, relacionados com o ciclo global do nitrogênio, da taxa de
perda de biodiversidade e das mudanças climáticas (ROCKSTRÖM et al., 2009). Crutzen
(2002) cita que o planeta está entrando em uma nova época geológica, denominado de

212
AMBIENTE: Percepções 2021

Antropoceno, em que as ações do homem se constituem como a força dominante de mu-


danças da biosfera. Tais ações indicam os impactos antropogênicos nos ecossistemas que
derivam do processo de busca de recursos materiais e melhores condições de vida para as
populações que estão em constante crescimento (JACOBI, 2014).

Rockström et al. (2009) afirmam que a situação de violação dos limites seguros de
operação global visa ao estabelecimento do imperativo de funções socioecológicas de re-
siliência para atenuar os efeitos combinados das mudanças ambientais. Entretanto, todas
as possibilidades características à resiliência, mitigação e adaptação primeiramente re-
querem o reconhecimento de toda a sociedade, tanto em nível individual quanto coletivo.
Sendo assim, os autores propõem que, para a tomada de decisões, bem como para o es-
tabelecimento de ações e de agendas, é imprescindível a percepção do problema e de sua
relevância em caráter principal.

Desde o surgimento do mundo moderno, talvez as mudanças climáticas sejam o


maior desafio já imposto à humanidade (BLANK, 2015). Lovelock (2006) sustenta que as
perspectivas são negativas e alega que, mesmo que consigamos reagir positivamente, a
humanidade passará por tempos difíceis, como em uma guerra qualquer, levando todos
ao limite, estando em risco toda a civilização. Porém, não restam dúvidas de que os gases
poluentes que ocasionam o efeito estufa estão elevando a temperatura em todo o planeta.
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês), em suas
projeções recentes, relata que as mudanças climáticas estão ocorrendo em consequência
da influência de forças antrópicas (INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE,
2014a).

Farmer e Cook (2013) revelam o que acontece quando o planeta fica mais quente,
citando um clima mais extremo com o desaparecimento de calotas de gelo no Ártico, o
que contribui para uma queda nas geleiras no mundo inteiro, trazendo consequências
como áreas costeiras inundadas, perda de espécies e o declínio das reservas de água doce.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) também alerta para a relação perigosa entre o
aquecimento global e doenças tropicais negligenciadas, explicando que, com o aumento
da temperatura, a zona de clima tropical do planeta deve se expandir, ampliando as áreas
acometidas por doenças tropicais, como a malária e a dengue (WHO, 2015). Entretanto,
essas alterações no clima não são um consenso na comunidade científica, porém é um

213
AMBIENTE: Percepções 2021

dos sinais que reforçam a existência da relação entre o aquecimento global e as doen-
ças tropicais negligenciadas, sustentando um ponto de partida importante no combate ao
aquecimento do planeta.

Bonita, Beaglehole e Kjellström (2010) afirmam que:

No caso da malária e da dengue, onde o mosquito é o vetor, as áreas endêmicas são


limitadas pelas condições climáticas. Se uma região é muito fria ou seca, o mosquito
não consegue sobreviver ou reproduzir e a doença não se torna endêmica. O aque-
cimento global está mudando o clima em algumas partes do mundo, facilitando o
surgimento de áreas endêmicas, o que facilitará a disseminação dessas doenças
nessas novas áreas.

No entanto, Farmer e Cook (2013) relatam que o aquecimento global não é sobre o
clima diário e não há uma conexão clara entre ele e qualquer furacão, tempestade de neve
ou seca. Referem-se ao aumento geral na quantidade de energia em todo sistema climá-
tico terrestre, causado por um aumento de gases de efeito estufa captadores de calor e
explicam que:

A mudança climática mais óbvia que está acontecendo agora ocasiona mais evapo-
ração dos oceanos e dos solos. A evaporação aumenta a umidade do conteúdo da
atmosfera da Terra e resseca o solo e a vegetação. Essa umidade está sendo avalia-
da com o aumento da precipitação e esta elevação provoca inundações, quebra de
barragens e diques e mais desastres naturais do que antes do aquecimento ocorrer.
O ressecamento do solo e da vegetação resulta em mais incêndios florestais, espe-
cialmente em áreas que sofreram longos períodos de seca (FARMER; COOK, 2013,
p. 122).

Desde dezembro de 2011, no território brasileiro é celebrado o Dia Nacional da Cons-


cientização sobre as Mudanças Climáticas, em 16 de março, data criada pela Lei Federal
12.533 que, em seu Art. 2º, cita que as escolas devem promover atos, eventos, debates e
até mesmo mobilizações relacionados a medidas de proteção dos ecossistemas brasilei-
ros. E ainda anteriormente, no ano de 1998, também em 16 de março, houve a abertura do
processo de reconhecimento ao Protocolo de Kyoto, tratado internacional articulado que
busca a redução de emissões de gases do efeito estufa em países desenvolvidos, princi-
palmente o dióxido de carbono (CO2), tanto por queima de combustíveis fósseis para gera-
ção de energia como por desmatamento em grande escala.

214
AMBIENTE: Percepções 2021

Nesse sentido, está evidente que as mudanças climáticas estão exigindo uma am-
pliação urgente nas medidas mitigadoras e é perceptível que as atividades antrópicas em
grande intensidade têm prejudicado a saúde humana ao mesmo tempo em que coloca o
planeta em grande risco, podendo provocar um colapso ambiental. Portanto, é de grande
importância que haja a inserção da temática juntamente aos espaços de ensino em todos
os níveis. E, no contexto atual, a preocupação da comunidade científica sobre os efeitos
resultantes das mudanças climáticas tendem a se tornar, na pior das perspectivas, uma
grande ameaça que encaminhará para a extinção total da biodiversidade existente.

Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi investigar as percepções, sobre os efeitos
das alterações climáticas, de estudantes de cursos de licenciaturas de uma universidade
comunitária da região metropolitana de Porto Alegre.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 AQUECIMENTO GLOBAL: O QUE REALMENTE HÁ POR TRÁS?


Marengo (2007) retrata que a Terra, desde os seus primórdios, passa por ciclos na-
turais de aquecimento e resfriamento, de forma semelhante, períodos de atividade geo-
lógica intensa lançaram à superfície quantidades gigantescas de gases que, de tempos
em tempos, foram contribuindo para a formação de uma espécie de bolha gasosa sobre
o planeta, resultando em um efeito estufa natural. Entretanto, atualmente, a atividade
industrial está intimamente ligada ao clima terrestre, afetando-o na sua variação natural,
demonstrando que a atividade do homem é um fator determinante no aquecimento. Des-
de a metade dos anos de 1700, no breve pulsar da Revolução Industrial, a concentração
de carbono na atmosfera aumentou em 31% e mais da metade desse crescimento teve
ocorrência nas últimas décadas.

Atualmente, existem meios promissores de monitoramento da concentração de ga-


ses de efeito estufa, como o Observatório de Mauna Loa, no Havaí, que possui uma página
virtual que divulga concentrações diárias/mensais. A concentração de CO2 registrada na
atmosfera em abril de 2020 foi de 416.18ppm, contrastando com o mesmo mês do ano

215
AMBIENTE: Percepções 2021

anterior, soma-se 413.52ppm, onde se percebe um acréscimo significativo. Primavesi, Ar-


zabe e Pedreira (2007) dizem que:

As emissões de CO2 de origem antrópica ocorrem a partir da queima proposital ou


acidental de diferentes produtos orgânicos pelo ser humano: carvão, madeira e
combustíveis fósseis (óleo diesel, gasolina e outros derivados de petróleo), princi-
palmente. Assim, a geração de CO2 ocorre em atividades corriqueiras, domésticas,
comerciais e industriais (produção de aço, de cimento, de alumínio, de papel), tais
como queima de carvão ou de lenha para churrasco, de folhas secas, de pastagens,
de florestas e de carvão ou de madeira em padarias, em cerâmicas e em outras
indústrias. Também gera CO2 o uso de veículos motorizados, como motocicletas,
caminhões, automóveis, aviões, tratores e até mesmo aqueles movidos com bio-
combustíveis.

Tanto os processos naturais como as atividades humanas resultam em emissão de


gases de efeito estufa. Dentre esses gases, estão o gás carbônico (CO2), o metano (CH4),
conhecido como gás dos pântanos, e o óxido nitroso (N2O), sendo esses últimos 25 e 250
vezes mais potentes em absorver calorias do que o CO2 (COTTON; PIELKE, 1995). Prima-
vesi, Arzabe e Pedreira (2007) apontam que a maior fonte de CO2 nos países de clima
temperado é proveniente de combustíveis fósseis, responsáveis pela geração dos maiores
volumes globais por ano. Já nas regiões tropicais a maior fonte são as queimadas. Um
exemplo é a queimada ocasionada pelo desmatamento, que emite de 180 a 200 milhões
de toneladas de carbono por ano, duas vezes mais do que se produz pela queima de com-
bustível fóssil (SANTILLI et al., 2003).

Há dois tipos de CO2, sendo o primeiro denominado fóssil e o segundo recente. O fós-
sil se encontra em depósitos de plantas fossilizadas, em torno de 4 trilhões de toneladas
e em depósitos de carbonatos, cerca de 66 quatrilhões de toneladas (PIDWIRNY; JONES,
2006). Já o recente é encontrado incorporado nas plantas vivas ou em seus resíduos re-
centes, dentro ou sobre o solo ou da água. Este tipo de CO2 é derivado do processo fotos-
sintético, no qual a planta retira o CO2 atmosférico, utilizando-o para acumular energia
solar em forma de glicose, fornecendo assim energia para herbívoros, carnívoros, onívoros
e organismos decompositores (BEGON; TOWNSEND; HARPER, 2007).

Em contrapartida, Maruyama (2009), não convencido de que o CO2 é realmente uma


das causas principais do aquecimento da Terra, em seu livro Aquecimento Global?, ressalta

216
AMBIENTE: Percepções 2021

que as atividades da atmosfera, da hidrosfera e da biosfera se determinam pela energia


solar. O autor aponta, em uma tabela, os principais elementos da atmosfera terrestre, acu-
sando, através disso, a participação mínima do CO2 em razão de massa que corresponde a
0,0054%, e em razão de volume, apenas 0,040%, citando que:

Em 10 mil moléculas, apenas quatro são de CO2. O aumento anual do CO2 é de 1


ppm. Será que o aumento de uma molécula em um milhão é a causa do aquecimen-
to? O mais provável é que não tenha nenhuma influência. Esse é o raciocínio normal
de um cientista comum, pois não há dúvidas quanto aos registros que acusam o
aumento desses teores ao longo dos anos (MARUYAMA, 2009, p. 38).

Muitos estudos oferecem uma perspectiva alternativa de análise ao Painel Inter-


governamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês), considerando veemen-
temente, por exemplo, a influência de fenômenos extraterrenos, como manchas solares
(MOLION, 1994) e raios cósmicos (STOZHKOV; POKREVS; OKHLOPK, 2000) na variabili-
dade climática da Terra. Stozhkov, Pokrevs e Okhlopk (2000) concluem que o aumento da
radiação solar na atmosfera contribui para o aceleramento de formação de aerossóis ou
de grupos moleculares que se aglutinam, compondo a base de formação de gotículas nas
nuvens. Então, com a intensificação desse processo, o percentual de refletância de luz
solar se torna mais estável e eficiente, posteriormente produzindo um efeito contrário do
que é anunciado pelos relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas
(IPCC, sigla em inglês). Os autores propõem que a variabilidade do clima global tende para
o resfriamento.

Molion (1994) ressalta que o resfriamento climático em escala global, mesmo levan-
do em consideração as eras glaciais nos últimos dois milhões de anos, possuem como base
as variações dos parâmetros orbitais da Terra, a variabilidade da energia solar e o aumento
do albedo planetário derivado da intensidade vulcânica por longos períodos. Sendo assim,
as emissões vulcânicas de enxofre, carbono e aerossóis podem auxiliar na contribuição
para o resfriamento da troposfera. Fazendo uma ligação com o discurso de Maruyama
(2009), ele aponta que uma grande produtividade de magma por vulcanismos vai originar,
como exemplo, cinza vulcânica que, “ao atingir a estratosfera, envolverá a superfície ter-
restre e, assim, atuará na obliteração da energia solar, impulsionando o esfriamento da
Terra” (MARAUYAMA, 2009). O mesmo autor exemplificou este fenômeno com a erupção

217
AMBIENTE: Percepções 2021

de 1991 nas Filipinas, associado ao Vulcão Pinatubo, que desempenhou grande influência
sobre o clima terrestre.

Considerando que o ar atmosférico integra o meio ambiente natural, existe a preocu-


pação da comunidade científica em relação à poluição atmosférica, que é considerada uma
pauta bastante recorrente desde o século XX, através de autores pioneiros como Lawther,
Martin e Wilkins (1962) e Barker et al. (1961). Desta forma, a poluição atmosférica ocorre
quando existe uma alteração da composição do ar que resulta em danos reais ou poten-
ciais. A presença de contaminantes no ar causa interferência na saúde humana e/ou no
bem-estar da população, produzindo efeitos negativos no ambiente (USEPA, 2009).

A qualidade do ar atmosférico contém grande relevância na relação com os direitos à


vida e à existência digna, que são garantidos constitucionalmente (art. 5º, caput e art. 1º,
inciso III, da Constituição Federal, de 1988). A atmosfera é um sistema dinâmico que altera
suas condições constantemente, e tais alterações originam os fenômenos climáticos. As
emissões de poluentes de uma região, além de alterar a qualidade do ar, também podem
influenciar a dinâmica atmosférica em todo o planeta. A composição básica da atmosfera
se originou na emissão de gases em várias fontes naturais como: florestas, oceanos e
vulcões. No entanto, emissões de fontes não naturais, ou seja, produtos da atividade hu-
mana podem alterar as concentrações de alguns gases e trazer mudanças significativas
no comportamento climático da atmosfera. As fontes emissoras de origens antrópicas são
divididas em duas classes: fontes móveis e estacionárias. As principais fontes de emissões
móveis são os veículos automotores e as fontes estacionárias oriundas de processos in-
dustriais (CASTRO; SILVA; ARAÚJO, 2013).

Utilizando de base estudos comparativos da Administração Nacional da Aeronáutica


e Espaço (NASA, sigla em inglês) entre a atmosfera terrestre e de outros planetas de nosso
sistema solar, Boff (1997) conclui que é o equilíbrio entre a composição dos seus elemen-
tos que propicia condições de vida no nosso planeta, quando cita que:

[...] O dióxido de carbono em Vênus é da ordem de 96,5%, em Marte de 98% e na


Terra alcança apenas uma percentagem de 0,03%. O oxigênio, imprescindível para
a vida, é totalmente inexistente em Vênus e Marte (0,00%), enquanto na Terra é da
ordem de 21% [...]. Há milhões de anos que o nível do oxigênio na atmosfera, a partir
do qual os seres vivos e nós mesmos vivemos, permanece inalterado, na ordem de
21%. Caso subisse para 23% produzir-se-iam incêndios por toda a Terra a ponto de
dizimar a capa verde da crosta terrestre.

218
AMBIENTE: Percepções 2021

Entre 2011 e 2013, o Escritório Regional da Organização Mundial da Saúde (OMS)


para a Europa coordenou dois projetos internacionais cofinanciados pela União Europeia:
Revisão de evidências sobre aspectos de saúde da poluição do ar e Riscos à saúde da po-
luição do ar na Europa (WHO REGIONAL OFFICE FOR EUROPE, 2013a,b). O primeiro forne-
ceu à Comissão Europeia e às suas partes interessadas conselhos baseados em evidências
sobre os mais recentes aspectos científicos da poluição e saúde do ar na forma de respos-
tas a uma série de perguntas relevantes para a política. O resultado do segundo projeto foi
um relatório técnico recomendando Função Concentração-Respostas (FCRs) para análise
de custo-benefício para vários efeitos de mortalidade e morbidade associados à exposi-
ção a curto e longo prazo de material particulado, ozônio e NO2. Uma das recomendações
específicas de especialistas do primeiro projeto, no entanto, foi que a organização deveria
iniciar o processo de revisão das diretrizes atuais para poluentes do ar no ambiente.

A atualização das diretrizes de qualidade do ar globais da Organização Mundial da


Saúde (WHO, 2017) está recebendo financiamento e apoio em espécie da Comissão da
União Europeia através da Direção-Geral do Meio Ambiente e os governos da Alemanha,
Suíça e Estados Unidos da América. É esperado que as próximas diretrizes forneçam li-
mites de concentração numéricos atualizados e, sempre que possível, uma indicação do
formato dos FCRs para MP10, MP2,5, ozônio, NO2, SO2 e CO, a curto e/ou longo prazo de
exposição. Além disso, também será desenvolvida uma declaração sobre a relação entre a
exposição ao pó mineral de origem natural e os resultados para a saúde, com base em uma
revisão das evidências mais recentes.

Visando as mudanças climáticas em território nacional, um estudo publicado recen-


temente por Zhang, Held e Fueglistaler (2021) concluiu que, caso o aquecimento global
não seja limitado a 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais, residir em regiões tropicais,
como o Brasil, se tornará insuportável. Os resultados são baseados em uma medida cha-
mada de temperatura bulbo úmido, usada para contabilizar o calor e umidade e que se
assemelha ao que os cientistas do clima chamam de índice de calor. Os autores afirmam
que a resistência ao calor é algo variável de pessoa para pessoa, mas um bulbo úmido de
35ºC é inviável para qualquer ser humano que se exponha ao ar livre. Em relação aos níveis
citados no estudo, os mesmos coincidem com o que é proposto no Acordo de Paris, tra-
tado internacional sobre as mudanças climáticas de 2015 que busca limitar o aumento da

219
AMBIENTE: Percepções 2021

temperatura do planeta em níveis abaixo de 2ºC, possuindo o objetivo principal de alcançar


1,5ºC.

Hanna et al. (2021) relatam que o Acordo de Paris criou uma expectativa de que os
governos mundiais finalmente estariam entrando em um consenso relacionado a uma ati-
tude responsável ao aquecimento global. No entanto, mesmo antes da pandemia mundial
da Covid-19, os cortes reais nas emissões estavam muito longe de acontecer por trás de
toda a ambição parisiense. Como resultados disso, as emissões continuam aumentando
em torno de 1-2% por ano, e a meta de estabilizar a temperatura em 1,5ºC não está sendo
devidamente executada. No entanto, como uma alternativa viável, cientistas descobriram
que as sociedades devem remover da atmosfera o CO2 emitido anteriormente, usando
tecnologias de emissões negativas (NETs) ou reduzindo significativamente o uso de ener-
gia, visto que a pandemia mundial cortou temporariamente as emissões, causando um
impacto positivo, mas infelizmente os padrões históricos sugerem que as elas voltarão a
se elevar.

No entanto, Fuhrman et al. (2020) contrapõem quando advertem que, se tratando


das mudanças climáticas, o mundo está apostando em algo que pode não ser capaz de
sustentar futuramente e afirmam que as tecnologias de emissões negativas (NETs) não
resolverão a crise climática. Porém, a análise dos autores mostra que a captura direta de ar
começaria removendo até três bilhões de toneladas de CO2 da atmosfera por ano por volta
de 2035, ou seja, mais de 50% das emissões dos Estados Unidos da América em 2017, ano
mais recente para o qual dados confiáveis estão disponíveis.

2.2 A VISÃO DISCENTE E O PARADOXO DA CEGUEIRA CLIMÁTICA


Martirani e Peres (2016) explicam que as percepções sobre a presença e sobre os
efeitos das mudanças climáticas nos mais variados setores estudados podem ter relação
com a influência da mídia em massa, especialmente da internet, considerando que a maior
parte dos indivíduos obtém informações sobre o tema por tal meio de comunicação. Atual-
mente, é perceptível que a problemática ambiental ganhou notoriedade e relevância social
através da mídia sensacionalista que difundiu com velocidade temas como as mudanças
climáticas.

220
AMBIENTE: Percepções 2021

Morin e Wulf (2003) apontam a percepção das incertezas socioambientais que carac-
teriza esse planeta através de uma reflexão sobre mudanças climáticas quando afirmam
que:

Por toda parte reina agora o sentimento, difuso ou agudo, do incerto. Por toda parte
firma-se a consciência de que não estamos nos momentos finais da história que
antecedem sua grande plenificação. Por toda parte desapareceram os balizamen-
tos em direção ao futuro. O mundo não vai nem bem nem mal, vai aos trancos e
barrancos, de solavanco em solavanco, sem estar ainda nem totalmente nem para
sempre submerso pela barbárie. A nave Terra navega pela noite bruma numa aven-
tura desconhecida.

A busca por entender de que maneira as novas demandas impostas pelas mudanças
climáticas se repercutem em ações para além das tecnológicas considera a justiça am-
biental e climática como dependentes do grau de informação e organização da sociedade
e por meio disso se configura como questão autoritária na resolução dos problemas atuais
e futuros (NEVES; CHANG; PIERRI, 2015). Saber as percepções de estudantes de ensino
superior sobre a temática climática é de grande auxílio para que se possa entender o que
está sendo discutido fora do ambiente estritamente científico. Para Maddison (2007), as
percepções são importantes para o processo de adaptação às mudanças climáticas, e o
primeiro passo é a percepção dos indivíduos de que essas mudanças estão ocorrendo.

É explícito que boa parte da estrutura atual da educação não contempla os anseios
da dimensão ambiental, pois, nas últimas décadas, perpetuou-se uma formação técnica,
científica e competitiva com o intuito de atender o modelo de produção e consumo no
qual a sociedade está inserida. Ao priorizar excessivamente uma formação científico-tec-
nológica, as questões humanas de ética e políticas ambientais são deixadas em segundo
plano, instruindo o sistema educacional às sociedades consumistas (LIMA, 2013). Jacobi
et al. (2011) afirmam que a Educação em Mudanças Climáticas ainda busca assentar seus
pilares e encontrar uma identidade definida. Entretanto, a urgência da dimensão climática
ambiental é categórica, uma vez que suas alterações de média intensidade já podem cau-
sar transtornos socioeconômicos consideráveis. Diversos são os relatórios que fornecem
cenários sobre as consequências das mudanças climáticas e neles a educação é citada
como instrumento relevante no combate às suas causas e seus efeitos (INTERGOVERN-
MENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE, 2014b; MOTTA et al., 2011; STERN, 2007).

221
AMBIENTE: Percepções 2021

A criação de disciplinas com teor ambiental e a adaptação de outras que seriam po-
tencialmente problematizadoras da questão referente iniciaram um movimento no ensino
superior, que vem percorrendo os programas de pós-graduação e de centros de pesqui-
sa interdisciplinares, responsáveis pela produção de conhecimento ambiental (CATALÃO;
LAYRARGUES; ZANETI, 2016). No estudo de (2019), um número significativo de estudan-
tes relata que não só suas ações podem auxiliar no enfrentamento às mudanças climá-
ticas, mas também que possuem consciência de que são capazes de influenciar outras
pessoas. Os autores também afirmam que “tal indicação do potencial de sua ação perante
a sociedade não representa de fato uma mudança no comportamento e ação em prol das
mudanças climáticas, sendo importantes estudos futuros para verificar de que forma seus
hábitos são modificados” (MESQUITA et al., 2019, p. 190).

Dessa forma, Ribeiro et al. (2012) consideram a pesquisa da percepção ambiental ne-
cessária, pois é o ponto de partida para compreender convivências que decorrem entre ser
humano e a natureza. Tuan (2012) relata a importância da pesquisa em percepção ambien-
tal quando cita que a auto compreensão é essencial para encontrar as soluções adequa-
das para os desafios ambientais, que também não deixam de ser humanos. No entanto,
é fundamental que as instituições formais de ensino estejam receptivas às atualidades e
aos meios de comunicação e informação, e que os docentes analisem profundamente tais
informações. Em contrapartida, há um maior agravamento quando se considera a forma-
ção de alguns professores do ensino fundamental que, sem a devida compreensão sobre
essas mudanças que afetam o clima, podem vir a reproduzir erros veiculados na mídia
(MESQUITA et al., 2019).

Porém, em âmbito nacional, há inúmeras preocupações governamentais em relação


às ementas dos componentes curriculares da educação básica, tanto que houve a cria-
ção da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), com a inclusão da etapa do Ensino Mé-
dio, justamente elaborada por especialistas de todas as áreas do conhecimento no intui-
to de corresponder às demandas dos estudantes do século XXI, com vistas à preparação
para o futuro. Este documento normativo se aplica exclusivamente à educação escolar,
tal como define o 1º do Artigo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº
9.394/1996 (BRASIL, 1996).

222
AMBIENTE: Percepções 2021

No entanto, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), além de fundamentar as


propostas pedagógicas das instituições escolares, deve também contribuir para a coorde-
nação nacional do devido alinhamento das políticas e ações educacionais, especialmente
a política para formação inicial e continuada de professores. Sendo assim, é categórico
inserir o tema da formação profissional para a docência no contexto de mudança que a
implementação da Base desencadeia na educação básica. A Lei de nº 13.005/2014, que
instituiu o Plano Nacional de Educação (PNE), prevê a revisão e melhoria dos currículos do
ensino superior para formação de professores da educação básica e cita a 13ª meta como
estratégia para:

Promover a melhoria da qualidade dos cursos de pedagogia e licenciaturas, por


meio da aplicação de instrumento próprio de avaliação aprovado pela Comissão Na-
cional de Avaliação da Educação Superior – CONAES, integrando-os às demandas e
necessidades das redes de educação básica, de modo a permitir aos graduandos a
aquisição das qualificações necessárias a conduzir o processo pedagógico de seus
futuros alunos (as), combinando formação geral e específica com a prática didática
(BRASIL, 2014).

Portanto, correlacionar a formação de professores da educação básica com a aqui-


sição e divulgação do conhecimento a respeito dos processos relacionados às mudanças
climáticas oportuniza a criação de condições favoráveis para desenvolver adaptações e
mitigações competentes. Mochizoki e Bryan (2015) afirmam que são inúmeros os campos
de abordagem da Educação em Mudanças Climáticas, tais como: o uso da relação entre
a educação ambiental, alfabetização científica e mudança climática; mudança curricular
formal e não formal; a história da mudança climática e sua relação com o modelo social; o
conhecimento melhorado dos eventos climáticos, modelos de consumo, incertezas e es-
tatísticas climáticas; o aproveitamento do seu caráter polêmico no ensino de ciências na-
turais e a análise de mitigações eficientes.

Em 2015, a Agenda 2030, que lista 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável,


reuniu representantes dos 193 Estados-membros da Organização das Nações Unidas
(ONU) nos Estados Unidos da América para adotarem o documento de comprometimento
com medidas transformadoras para promover a sustentabilidade nos próximos 15 anos,
buscando também a erradicação da pobreza em todas as suas formas e dimensões, con-
siderando-o como o maior desafio global e um requisito indispensável para o desenvol-

223
AMBIENTE: Percepções 2021

vimento sustentável, incluindo a pobreza extrema. A Ação Contra a Mudança Global do


Clima é o 13º objetivo do documento e justifica que tomar medidas urgentes é necessário
para combater a mudança do clima e seus impactos. E uma Educação de Qualidade é o 4º
objetivo e complementa a importância de assegurar a educação inclusiva e equitativa de
qualidade e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos (UNI-
TED NATIONS GENERAL ASSEMBLY, 2015).

Neste sentido, a vulnerabilidade social está muito atrelada aos impactos das mudan-
ças climáticas e, através disso, alcança o território educacional em seus diversos ramos,
refletindo nos processos sociais por meio de rupturas socioeconômicas, culturais e demo-
gráficas importantes, principalmente dentro da educação básica, como no deslocamento
dos alunos até a escola e até mesmo na área que circunda a moradia desses, principal-
mente dos que vivem em situação de pobreza.

Silva, Costa e Borba (2016) apontam que os efeitos das mudanças climáticas são im-
placáveis, restando-nos buscar adaptações aos cenários climáticos do futuro. Entretanto,
ainda há a possibilidade desses efeitos serem minimizados com o aumento da compreen-
são e divulgação do conhecimento, formas de adaptação e o uso de mitigações com efi-
ciência. Os autores enfatizam que esses são os caminhos em que a Educação em Mudan-
ças Climáticas pode contribuir, auxiliando na transformação do cidadão e possibilitando a
criação de espaços de reflexão sobre a dinâmica destas mudanças, sendo feito por meio
do aumento do engajamento pelo processo de reflexão, na busca incessante de alterar os
currículos, conteúdos e abordagens didáticas, com o intuito de construir competências e
habilidades para enfrentar as suas consequências.

3 METODOLOGIA

A pesquisa foi realizada no segundo semestre de 2020 através de um questioná-


rio composto por 21 questões assertivas e respondido por estudantes dos cursos acadê-
micos de licenciatura (Artes Visuais, Ciências Biológicas, Educação Física, História, Letras
e Pedagogia) (Quadro 1). Os questionários foram distribuídos em diferentes turnos e/ou
semestres, totalizando 65 indivíduos, sem distinção de gênero, na Universidade Feevale,
localizada no município de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul.

224
AMBIENTE: Percepções 2021

O questionário foi adaptado do trabalho realizado por Mesquita et al. (2019). Durante
a análise dos resultados referentes à pesquisa foi mantido o anonimato da identidade dos
acadêmicos. Houve a divulgação da pesquisa nas redes sociais de cada curso e também
nas disciplinas disponíveis no respectivo semestre. As perguntas foram inseridas na pla-
taforma de formulários do Google.

A pesquisa seguiu o método misto de investigações que, conforme Creswell (2010, p.


27), “consiste em uma abordagem de investigação que combina ou associa as formas qua-
litativa e quantitativa”. Creswell e Clark (2011) também definem métodos mistos como um
procedimento de coleta, análise e combinação de técnicas quantitativas e qualitativas em
uma mesma pesquisa. Nesse sentido, os métodos mistos se constituem pela combinação
de métodos predeterminados relacionados às pesquisas quantitativas com os métodos
emergentes da análise qualitativa, empregando questões abertas e fechadas e com for-
mas múltiplas de dados (DAL-FARRA; LOPES, 2013).

Quadro 1 – Lista de perguntas utilizadas no questionário

Nº da
Perguntas
questão
Você acredita que o clima está mudando no mundo?
1
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
Você acredita que as mudanças climáticas têm causas:
2
( ) Naturais ( ) Humanas ( ) Os Dois ( ) Outras ( ) Não sei
Nos próximos anos, você acredita que as mudanças climáticas vão:
3
( ) Aumentar ( ) Diminuir ( ) Ficar iguais ( ) Não sei
Você acredita que os impactos das mudanças climáticas nas áreas URBANAS são/serão:
4
( ) Positivos ( ) Negativos ( ) Não haverá impacto ( ) Não sei
Você acredita que Novo Hamburgo (já) é afetada pelas mudanças climáticas?
5
( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei
Você se preocupa com os efeitos das mudanças climáticas?
6 ( ) Sim, muito preocupado ( ) Sim, mas pouco preocupado ( )
Não estou preocupado ( ) Não sei
Você acredita que a temperatura da Terra está:
7
( ) Aumentando ( ) Diminuindo ( ) Estável
Você acredita que a agropecuária é a maior responsável por emissões de metano na atmosfe-
ra assim como também pelo desmatamento que contribui em grande escala para o aumento
8
do efeito estufa?
( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei

225
AMBIENTE: Percepções 2021

Você acredita ou considera que as mudanças climáticas impactam mais as pessoas:


9
( ) Ricas ( ) Pobres ( ) Igualmente ( ) Não afetam as pessoas ( ) Não sei
São importantes disciplinas que adotem a temática ambiental dentro dos cursos de Ensino
Superior. Sendo assim, houve alguma disciplina em sua grade curricular durante a graduação
10
que esteve relacionada com Mudanças Climáticas ou Educação Ambiental?
( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei
Nos próximos anos, se tudo continuar como atualmente, você acha que as Mudanças Climáti-
11 cas vão causar que tipos de impactos no Meio Ambiente e Biodiversidade?
( ) Positivos ( ) Negativos ( ) Não haverá impactos ( ) Não sei
E na Indústria e Atividades de comércio?
12
( ) Positivos ( ) Negativos ( ) Não haverá impactos ( ) Não sei
E na Infraestrutura e Áreas construídas?
13
( ) Positivos ( ) Negativos ( ) Não haverá impactos ( ) Não sei
E no Uso e fornecimento de energia?
14
( ) Positivos ( ) Negativos ( ) Não haverá impactos ( ) Não sei
E no Fornecimento de água e alimentos?
15
( ) Positivos ( ) Negativos ( ) Não haverá impactos ( ) Não sei
E na Saúde e educação?
16
( ) Positivos ( ) Negativos ( ) Não haverá impactos ( ) Não sei
No seu ponto de vista, já é muito tarde para se fazer algo sobre o problema climático?
17
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
Você acredita que sua ação individual pode ajudar a diminuir os problemas climáticos?
18
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
Você acredita que possa influenciar outras pessoas a adotarem estilos de vida mais adequado
19 ambientalmente para combater as mudanças climáticas?
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
Os governos e empresas têm considerado cada vez mais os impactos das mudanças climáti-
20 cas?
( ) Concordo ( ) Discordo ( ) Não sei
Qual(is) a(s) sua(s) principal(is) fonte(s) de informação sobre Mudanças Climáticas?
21 ( ) Internet ( ) Universidade ( ) Família ( ) Amigos ( ) Trabalho ( ) Televisão/Rádio
( ) Outros ( ) Nenhuma
Fonte: Elaborados pelos autores, adaptado de Mesquita et al. (2019).

Foi utilizado o formato estudo de caso, que, segundo Gil (2002, p. 57), “consiste no
estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo
e detalhado conhecimento, tarefa praticamente impossível mediante outros delineamen-
tos já considerados”.

Creswell (2010) afirma que a pesquisa no formato de estudo de caso é uma estra-
tégia de investigação em que o pesquisador explora profundamente um programa, um

226
AMBIENTE: Percepções 2021

evento, uma atividade, um processo ou indivíduos. E que a coleta de dados detalhada pode
ser feita de maneiras variadas, por um curto ou longo período de tempo.

Por meio de um levantamento bibliográfico, houve a revisão da literatura científica


sobre as principais informações que norteiam as mudanças climáticas. Lima e Mioto (2007)
ressaltam que a revisão de literatura é apenas um pré-requisito para a realização de toda e
qualquer pesquisa, ao passo que a pesquisa bibliográfica é uma etapa fundamental ante-
rior à elaboração ou desenvolvimento de um estudo, artigo, tese ou dissertação.

Após o encerramento do período de acesso ao questionário, houve a busca pelas


ementas dos cursos que estão disponíveis no site da universidade e fornecem uma versão
digital das grades curriculares com textos discursivos que identificam o que será traba-
lhado em cada disciplina. As ementas tiveram o intuito de revelar possíveis categorias de
análise e, para isto, utilizou-se uma análise textual que, para Moraes (2005), estrutura-se
por meio da identificação e isolamento de enunciados, categorização destes itens e, se-
guidamente, a produção de um novo texto, utilizando o sistema de categorias elaborado.

Os dados coletados foram inseridos e analisados com auxílio do software Excel. Tam-
bém foi explorada a análise de porcentagens, a partir das respostas dos acadêmicos ao
questionário aplicado.

4 RESULTADOS E ANÁLISE

A Figura 1 mostra que a maioria dos acadêmicos participantes acreditam que o clima
no mundo está mudando e que as causas principais relacionadas às mudanças climáti-
cas são tanto humanas quanto naturais (67,7%), já 32,3% deles acreditam que são causas
apenas humanas, reconhecendo a sua influência nas mudanças ocorridas. Essa percepção
já vem sendo observada nos documentos que abordam a problemática do clima, compac-
tuando com resultados obtidos pela Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS, 2014),
que relata que há provas concretas sobre a mudança do clima da Terra e da forma rápida
que está acontecendo, principalmente devido às atividades humanas. Uma das previsões
é o aumento da temperatura e nível do mar, alterações na distribuição das precipitações
e fenômenos extremos que tendem a acrescentar uma diversidade de riscos para a saúde

227
AMBIENTE: Percepções 2021

que abrange desde os efeitos diretos, como inundações e tormentas, até condições mais
favoráveis para a transmissão de doenças infecciosas. O Painel Intergovernamental sobre
Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês), em 2018, alertou que um aquecimento acima
da média global anual está acontecendo em muitas regiões e estações, e que é maior na
superfície terrestre que nos oceanos (INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHAN-
GE, 2018).

Figura 1 – Percentuais de acadêmicos que responderam à pergunta “Você acredita que o clima está mu-
dando no mundo?”

Fonte: Elaborado pelos autores

Em relação aos próximos anos, 94% acreditam que as variações climáticas irão ter um
contínuo aumento temporal e que os impactos nas áreas urbanas já são e serão negativos
(94%). De acordo com Marengo (2007), o aquecimento global é um fenômeno já detectado
a nível mundial e tende a ser mais intenso nas grandes cidades devido aos impactos da
urbanização. As consequências dessas mudanças climáticas em longa escala, como secas
rigorosas, invernos intensos, ondas de calor e outros desastres naturais, têm sido atri-
buídas ao aquecimento do planeta, ainda que as evidências não permitam com certeza o
estabelecimento de relações entre eles. A cidade referente à pesquisa, Novo Hamburgo,
já estaria sendo afetada pelas variações do clima de acordo com 83% dos participantes, os

228
AMBIENTE: Percepções 2021

quais mostraram preocupação com a problemática em maior ou menor escala: 75% muito
preocupado e 23% pouco preocupado. 2% não souberam responder.

Para 95% dos participantes, a temperatura terrestre está aumentando, seguida-


mente das emissões de metano na atmosfera derivadas da agropecuária, assim como
o desmatamento que possuem influência no aumento do efeito estufa. 77% dizem que
acreditam nesta indução, 8% que não e 15% não souberam responder. O Painel Intergover-
namental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês), em 2019, publicou que a pro-
dução agropecuária contribui entre 10% e 12% de todas as emissões de gases de efeito de
estufa (GEE) geradas pela atividade humana (INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE
CHANGE, 2019). Esta proporção sobe para mais de 20% quando se inclui as mudanças no
uso da terra, o desmatamento e o processamento dos alimentos, e essas emissões são
crescentes: da agropecuária aumentarão em 30% até 2050.

Quanto ao aspecto socioeconômico da população, verifica-se uma divisão de opi-


niões mediante análise das respostas dos acadêmicos. Na Figura 2, os acadêmicos de-
monstram que não há diferença entre as classes mais e menos favorecidas, mas sim áreas
de maior aglomeração urbana, acompanhadas de infraestrutura precária, que são mais
sensíveis aos impactos ambientais e climáticos. Independentemente dos motivos que
desencadeiam as ações do clima no planeta, a constatação mais preocupante é que as
populações mais pobres são as mais atingidas por todos os eventos adversos do clima,
apesar de não terem consciência se poluem ou não o ambiente, se influenciam ou não nas
mudanças climáticas (BRUNA; PISANI, 2010).

Atualmente, a importância de disciplinas que adotam a temática ambiental dentro


dos cursos de Ensino Superior é imprescindível, dessa forma, o questionamento realiza-
do foi em relação ao contato com temáticas relacionadas às mudanças climáticas ou até
mesmo à educação ambiental durante a graduação. Do total de acadêmicos, 66% afirmam
que tiveram alguma disciplina relacionada às áreas, 29% que não e 5% não souberam res-
ponder. Nesse aspecto, a nível nacional é escasso o conhecimento referente às mudanças
climáticas por parte dos estudantes brasileiros e como está o desempenho da educação
ambiental na transformação e na emancipação de buscar uma sociedade com justiça am-
biental, no entanto, considerando o ensino superior em uma visão histórica, as universida-

229
AMBIENTE: Percepções 2021

des têm contribuído para a internalização de valores e práticas sustentáveis na sociedade


(JACOBI, 2014; CATALÃO; LAYRARGUES; ZANETI, 2016).

Figura 2 – Percentuais de acadêmicos que responderam à pergunta relacionada ao impacto causado pelas
Mudanças Climáticas nas classes sociais

Fonte: Elaborado pelos autores

A percepção dos acadêmicos quanto à natureza dos impactos das mudanças climá-
ticas nos próximos anos, em todos os setores pesquisados, foi de impacto negativo acima
de 80%, considerando-se que todas as condições atuais permaneçam. Segundo os aca-
dêmicos, as áreas do meio ambiente e biodiversidade, fornecimento de água e alimentos,
da saúde e educação, uso e fornecimento de energia, indústria e atividades de comércio
e infraestrutura e áreas construídas serão as áreas mais afetadas com agravamento da
situação no decorrer dos anos e dos avanços das alterações climáticas. Pinto et al. (2010,
p. 14) relatam que:

230
AMBIENTE: Percepções 2021

As alterações climáticas previstas certamente afetarão os ecossistemas e poderão


colocar em risco a sobrevivência de várias espécies do nosso planeta. Como con-
sequência do aquecimento global, a biodiversidade de vários ecossistemas deverá
diminuir e mudanças na distribuição e no regime de reprodução de diversas espé-
cies ocorrerão.

Os autores também acrescentam que:

Com o aumento da vulnerabilidade da produção de alimentos às mudanças climá-


ticas, cresce também o risco de a fome atingir um número muito maior de pessoas
no mundo. Isto ocorreria principalmente nos países pobres, os quais são os mais
vulneráveis aos efeitos do aquecimento global e os menos preparados para enfren-
tar seus impactos (PINTO et al., 2010, p. 14-15).

Nas questões referentes à percepção sobre as ações quanto às variações climáticas,


83% discordaram em estar tarde para fazer algo quanto à problemática, 11% concordam e
6% não souberam responder. De outro lado, 94% afirmam acreditar que sua ação individual
poderia ajudar a diminuir os problemas climáticos, 3% discordam e 3% não souberam res-
ponder. Cerca de 80% acreditam que possam influenciar as pessoas a adotarem um estilo
de vida mais adequado ambientalmente em relação às mudanças do clima. Quanto aos
governos e empresas estarem considerando as mudanças climáticas, 65% discordam, 18%
não souberam responder e 17% concordam.

Na Figura 3, dentre as fontes de informação listadas na pesquisa, a maioria dos aca-


dêmicos afirmaram ser a internet o principal meio de conhecimento sobre Mudanças Cli-
máticas. Rodas e Di Giulio (2017) concluem em seu estudo que:

A mídia é, de fato, uma mediadora relativamente poderosa e é um dos agentes que


intervêm no processo de construção social da realidade. Por isso mesmo, e reco-
nhecendo a complexidade e o desafio envoltos no tema das mudanças climáticas,
ela deve ser objeto de mais estudos compreensivos e analíticos.

231
AMBIENTE: Percepções 2021

Figura 3 – Percentuais de acadêmicos que responderam à pergunta relacionada ao principal meio de co-
nhecimento sobre as Mudanças Climáticas

Fonte: Elaborado pelos autores

O ciclo avaliativo dos dados coletados do questionário e das ementas foi suficiente
para confirmar a hipótese de que a temática, ainda que informalmente, tende a ser cita-
da dentro dos cursos acadêmicos de licenciatura. As quatro categorias de análise textual
a priori (Educação ambiental, Sustentabilidade, Desenvolvimento socioambiental e Meio
ambiente) são encontradas dentro das ementas dos cursos, porém incluídas em discipli-
nas em sua maioria de cunho optativo. Foi observado que apenas os cursos de Ciências
Biológicas e Pedagogia possuem a temática ambiental como obrigatória em suas grades,
gerando um resultado diferente do esperado. Portanto, esse entendimento foi necessário
para a tabulação dos critérios categóricos de análise, com o intuito de entender a forma
como é abordada a questão ambiental para aqueles acadêmicos que tiveram contato com
a temática ou áreas relacionadas.

Para Giddens (2009), na percepção da maioria das pessoas, existe um abismo entre
as preocupações e rotinas cotidianas e os impactos que uma alteração ambiental deste ca-
ráter pode ocasionar. Mesmo com o conhecimento já existente sobre as consequências da
mudança climática, a humanidade como coletividade está apenas começando a tomar as
medidas necessárias para responder de forma adequada às novas demandas em termos
do desenvolvimento de mudanças de hábitos, políticas e práticas. Muitos participantes re-

232
AMBIENTE: Percepções 2021

latam estarem preocupados com os efeitos do clima, porém a sociedade ainda demonstra
um despreparo considerável para lidar com um futuro próximo de variações mais drásticas
no clima terrestre.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Existe uma contínua sucessão de informações sobre as mudanças climáticas pro-


pagadas pelos meios de comunicação em geral que frequentemente não possuem sus-
tentação de evidências com embasamento de cientistas e pensadores que contribuem na
formação de uma visão clara e panorâmica da realidade ambiental contemporânea. Essa
imprecisão difundida desperta o interesse em relação às coerências e verdades sobre a
temática acerca da comunidade científica.

Blank (2015), Nobre, Reid e Veiga (2012), Giddens (2009), Marengo (2007), Primave-
si, Arzabe e Pedreira (2007) apontam importantes teorias que buscam a compreensão das
transformações ocorridas no contexto atual, destacando tudo o que aconteceu, vem acon-
tecendo e as consequências posteriores dessa era onde as mudanças climáticas estão se
afirmando como um fator alarmante que ameaça a biodiversidade existente. Contudo, ain-
da poucos são aqueles que como cidadãos alcançaram visualizar os impactos resultantes
dessa desordem ambiental. Diante dessa realidade, evidencia-se a necessidade da popu-
lação humana, como um todo, avaliar corretamente suas influências, presentes ou futuras,
sobre o bem-estar da humanidade e todo o universo de suas atividades.

Os resultados obtidos se mostraram de grande relevância para as reflexões sobre


uma visão mais consciente acerca dos impactos das alterações climáticas, no que se refere
à abordagem de questões ambientais que permeiam os espaços de ensino. Porém, para
que seja possível ter mais êxito na divulgação visando à compreensão dos fatores antró-
picos e da temática propriamente dita, é necessário o alinhamento de políticas voltadas
às questões ambientais e climáticas nos diversos níveis de ensino e também à Educação
Ambiental na formação inicial e continuada docente, pois refletem na abordagem das mu-
danças climáticas na educação básica.

233
AMBIENTE: Percepções 2021

As percepções sobre os efeitos das alterações climáticas de estudantes de cursos


de licenciaturas em uma universidade comunitária da região metropolitana de Porto Ale-
gre evidenciam que há uma preocupação considerável sobre as mudanças climáticas. Por-
tanto, a metade dos participantes afirma que tiveram contato com a temática durante a
graduação, concordam que a temperatura terrestre está aumentando e concluem que o
principal meio de informação é através da internet.

A educação do nível superior tem demonstrado o conhecimento acerca das mudan-


ças climáticas de forma imprecisa, não trazendo disciplinas que abordem a temática ex-
pressivamente. E os caminhos em que o ensino relacionado à temática pode contribuir são
por meio do auxílio na transformação do cidadão, possibilitando a criação de espaços de
reflexão sobre a dinâmica dessas alterações ambientais, com o intuito de construir com-
petências e habilidades para enfrentar as possíveis consequências.

REFERÊNCIAS
BARKER, K. et al. Air pollution. Genebra: World Health Organization (WHO Monograph Se-
ries, No. 46), 1961. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/41722. Acesso
em: 19 abr. 2021.

BEGON, M.; TOWNSEND, C. R.; HARPER, J. L. Ecologia: de indivíduos a ecossistemas. 4. ed.


Porto Alegre: Artmed, 2007.

BLANK, D. M. P. O contexto das mudanças climáticas e as suas vítimas. Mercator, v. 14, n. 2,


p. 157-172, 2015.

BOFF, L. Ecologia: grito da terra, grito dos pobres. 2. ed. São Paulo: Ática, 1997.

BONITA, R.; BEAGLEHOLE, R.; KJELLSTRÖM, T. Epidemiologia básica. 2. ed. São Paulo: San-
tos Editora, 2010.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da edu-


cação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, de 23 de dezembro de 1996. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm. Acesso em: 19 abr. 2021.

BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE
e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, de 25 de junho de 2014. Disponível

234
AMBIENTE: Percepções 2021

em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm. Acesso


em: 19 abr. 2021.

BRUNA, G. C.; PISANI, M. A. J. Mudanças Climáticas e Pobreza: Reflexões. Revista Brasileira


de Ciências Ambientais, n. 18, p. 58-66, 2010.

CASTRO, A. H.; SILVA, G. M.; ARAÚJO, R. S. Qualidade do ar – parâmetros de controle e efeitos


na saúde humana: uma breve revisão. HOLOS, ano 29, v. 5, p. 107-121, 2013.

CATALÃO, V. M. L.; LAYRARGUES, P. P.; ZANETI, I. C. B. B. (Org.). Universidade para o século


XXI: educação e gestão ambiental na Universidade de Brasília. Brasília: Cidade Gráfica e Edi-
tora, 2011.

CRESWELL, J. W. Projeto de Pesquisa: Método Qualitativo, Quantitativo e Misto. 3. ed. Porto


Alegre: Artmed, 2010.

CRESWELL, J. W.; CLARK, V. L. P. Designing and conducting mixed methods research. 2. ed.
Los Angeles: SAGE Publications, 2011.

CRUTZEN, P. J. Geology of mankind. Nature, v. 415, p. 23, 2002.

COTTON, W. R.; PIELKE, R. A. Human impacts on weather and climate. Cambridge: Cambri-
dge University Press, 1995.

DAL-FARRA, A. R.; LOPES, P. T. C. Métodos mistos de pesquisa em educação: pressupostos


teóricos. Nuances: estudos sobre educação, v. 24, n. 3, p. 67-80, 2013.

FARMER, G.; COOK, J. Climate change science: A modern synthesis - Volume 1 - The physical
climate. Suíça: Springer, Dordrecht, 2013.

FUHRMAN, J. et al. Food–energy–water implications of negative emissions technologies in a


+1.5°C future. Nature Climate Change, v. 10, p. 920–927, 2020.

GIDDENS, A. The politics of climate change. Cambridge: Polity Press, 2009.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

HANNA, R. et al. Emergency deployment of direct air capture as a response to the climate
crisis. Nature Communications, v. 12, n. 368, p. 1-13, 2021.

INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Climate Change 2014: Impacts, Ad-


aptation, and Vulnerability. Part A: Global and Sectoral Aspects. Contribution of Working

235
AMBIENTE: Percepções 2021

Group II to the Fifth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change.
Cambridge: Cambridge University Press, 2014a.

INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Climate Change 2014: Synthesis


report. Geneva: IPCC, 2014b. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar5/Syr. Acesso
em:19 abr. 2021.

INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Global Warming of 1.5°C - An IPCC


Special Report on the impacts of global warming of 1.5°C above pre-industrial levels and
related global greenhouse gas emission pathways, in the context of strengthening the global
response to the threat of climate change, sustainable development, and efforts to eradicate
poverty. 2018. Disponível em: https://www.ipcc.ch/site/assets/uploads/sites/2/2019/06/
SR15_Full_Report_High_Res.pdf. Acesso em: 19 abr. 2021.

INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Chapter 11: N2O emissions from


managed soils, and CO2 emissions from lime and urea application. Volume 4: Agriculture,
Forestry and Other Land Use. 2019. Disponível em: https://www.ipcc-nggip.iges.or.jp/public/
2006gl/pdf/4_Volume4/V4_11_Ch11_N2O&CO2.pdf. Acesso em: 19 abr. 2021.

JACOBI, P. R. Mudanças climáticas e ensino superior: a combinação entre pesquisa e educa-


ção. Educar em Revista, v. 30, n. esp. 3, p. 57-72, 2014.

JACOBI, P. R. et al. Mudanças climáticas globais: a resposta da educação. Revista Brasileira


de Educação, v. 16, n. 46, p. 135-148, 2011.

LAWTHE, R. P. J.; MARTIN, A. E.; WILKINS, E. T. Epidemiology of air pollution: report on a sym-
posium. Genebra: World Health Organization (WHO Public Health Papers, n. 15), 1962. Dis-
ponível em: https://extranet.who.int/iris/restricted/handle/10665/39725?locale=en&null.
Acesso em: 19 abr. 2021.

LIMA, G. F. C. Educação ambiental e mudança climática: convivendo em contextos de incerte-


za e complexidade. Ambiente & Educação, v. 18, n. 1, p. 91-112. 2013.

LIMA, T. C. S.; MIOTO, R. C. T. Procedimentos metodológicos na construção do conhecimento


científico: a pesquisa bibliográfica. Revista Katálysis, v. 10, n. esp., p. 37-45, 2007.

LOVELOCK, J. A vingança de Gaia. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2006.

MADDISON, D. J. The perception of and adaptation to climate change in Africa. Policy Resear-
ch Working Paper, n. 4308, p. 1-51, 2007.

236
AMBIENTE: Percepções 2021

MARENGO, J. A. Mudanças climáticas globais e seus efeitos sobre a biodiversidade: carac-


terização do clima atual e definição das alterações climáticas para o território brasileiro ao
longo do século XXI. 2. ed. Brasília: MMA, 2007.

MARTIRANI, L. A.; PERES, I. K. Crise hídrica em São Paulo: cobertura jornalística, percepção
pública e o direito à informação. Ambiente & Sociedade, v. 19, n. 1, p. 1-20, 2016.

MARUYAMA, S. Aquecimento global? São Paulo: Oficina de Textos, 2009.

MESQUITA, P. S. et al. Percepções de universitários sobre as mudanças climáticas e seus im-


pactos: estudo de caso no Distrito Federal. Ciência & Educação, v. 25, n. 1, p. 181-198, 2019.

MOCHIZOKI, Y.; BRYAN, A. Climate Change Education in the Context of Education for Sus-
tainable Development: Rationale and Principles. Journal of Education for Sustainable Del-
opment, v. 9, n. 1, p. 4-26, 2015.

MOLION, L. C. B. Efeitos de vulcões no clima. Caderno de Geociências, n. 12, p. 13-24, 1994.

MORAES, R. Mergulhos discursivos: análise textual qualitativa entendida como processo in-
tegrado de aprender, comunicar e interferir em discursos. In: GALIAZZI M. C.; FREITAS J. V.
Metodologias emergentes de pesquisa em educação ambiental. 2. ed. Ijuí: Editora Unijuí,
2005. p. 85-114.

MORIN, E.; WULF C. Planeta: a aventura desconhecida. São Paulo: Editora UNESP, 2003.

MOTTA, R. S. et al. (eds.) Mudança do clima no Brasil: aspectos econômicos, sociais e regu-
latórios. Brasília: IPEA, 2011. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?op-
tion=com_content&view=article&id=10196. Acesso em: 19 abr. 2021.

NEVES, F. M.; CHANG, M.; PIERRI, N. As estratégias de enfrentamento das mudanças climá-
ticas expressas nas políticas públicas federais do Brasil. Desenvolvimento e Meio Ambiente,
v. 34, p. 5-23, 2015.

NOBRE, C. A.; REID, J.; VEIGA, A. P. S. Fundamentos científicos das mudanças climáticas.
São José dos Campos: Rede Clima/INPE, 2012.

OPAS - ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Proteger a saúde frente à mudança


climática: avaliação da vulnerabilidade e adaptação. Brasília, DF: OPAS, 2014. Disponível em:
https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/9999/9789275716984_prt.pdf?sequen-
ce=1&isAllowed=y. Acesso em: 19 abr. 2021.

237
AMBIENTE: Percepções 2021

PETRAGLIA, I. et al. Mudanças climáticas na visão de estudantes do ensino médio de escolas


da cidade de São Paulo, Brasil. Revista Científica Hermes, n. 16, p. 223-245, 2016.

PIDWIRNY, M.; JONES, S. Chapter 9: Introduction to the Biosphere - the carbon cycle. In:
Fundamentals of Physical Geography. Physical Geography.net, 1999. Disponível em: http://
www.physicalgeography.net/fundamentals/9r.html. Acesso em: 21 abr. 2021.

PINTO, E. P. P. et al. Perguntas e respostas sobre aquecimento global. 5. ed. rev. e atual.
Belém: IPAM, 2010. Disponível em: https://ipam.org.br/wp-content/uploads/2010/05/per-
guntas_e_respostas_sobre_aquecimento_.pdf. Acesso em: 21 abr. 2021.

PRIMAVESI, O.; ARZABE, C.; PEDREIRA M. S. Mudanças climáticas: visão tropical integrada
das causas, dos impactos e de possíveis soluções para ambientes rurais ou urbanos. São
Carlos: Embrapa Pecuária Sudeste, 2007.

RIBEIRO, W. C. et al. A concepção de natureza na civilização ocidental e a crise ambiental.


Revista da Casa da Geografia de Sobral, v. 14, n. 1, p. 7-16, 2012.

ROCKSTRÖM, J. et al. Planetary boundaries: exploring the safe operating space for humanity.
Ecology and Society, v. 14, n. 2, art. 32, 2009.

RODAS, C. A.; DI GIULIO, G. M. Mídia brasileira e mudanças climáticas: uma análise sobre
tendências da cobertura jornalística, abordagens e critérios de noticiabilidade. Desenvolvi-
mento e Meio Ambiente, v. 40, p. 101-124, 2017.

SANTILLI, M. et al. Proposta para manter a floresta em pé. São Paulo: Folha de São Paulo,
2003. p. 16-17. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe2311200301.
htm. Acesso em: 21 abr. 2021.

SILVA, C. M. L. F.; COSTA, F. A.; BORBA, G. L. A educação em mudanças climáticas: uma abor-
dagem interdisciplinar. HOLOS, ano 32, v. 4, 176-188, 2016.

STERN, N. The Stern Review: The Economics of Climate Change. Cambridge: Cambridge Uni-
versity Press, 2007. Disponível em: http://mudancasclimaticas.cptec.inpe.br/~rmclima/pdfs/
destaques/sternreview_report_complete.pdf. Acesso em: 21 abr. 2021.

STOZHKOV, Y.; POKREVS, P.; OKHLOPK, V. P. Long-term negative trend in cosmic ray flux.
Journal of Geophysical Research, v. 105, n. A1, p. 9-17, 2000.

TUAN, Y. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. Londrina:


EDUEL, 2012.

238
AMBIENTE: Percepções 2021

UNITED NATIONS. United Nations framework convention on climate change.1992. Dispo-


nível em: https://unfccc.int/resource/docs/convkp/conveng.pdf. Acesso em: 21 abr. 2021.

UNITED NATIONS GENERAL ASSEMBLY. Transforming our world: the 2030 Agenda for Sus-
tainable Development. 2015. Disponível em: https://www.refworld.org/docid/57b6e3e44.
html. Acesso em: 21 abr. 2021.

USEPA - UNITED STATES ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY. Terms of Environment:


Glossary, Abbreviations and Acronyms. 2009. Disponível em: http://www.epa.gov/OCEPA-
terms/. Acesso em: 21 abr. 2021.

WHO - WORLD HEALTH ORGANIZATION. Investing to overcome the global impact of


neglected tropical diseases: third WHO report on neglected diseases - 2015. Genebra:
World Health Organization, 2015. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/hand-
le/10665/152781/9789241564861_eng.pdf;jsessionid=C56A84EFF617D177C2B84CEC-
6F9F9D5A?sequence=1. Acesso em: 21 abr. 2021.

WHO - WORLD HEALTH ORGANIZATION. Evolution of WHO air quality guidelines: past,
present and future. Copenhague: WHO Regional Office for Europe, 2017. Disponível em: ht-
tps://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0019/331660/Evolution-air-quality.pdf.
Acesso em: 21 abr. 2021.

WHO REGIONAL OFFICE FOR EUROPE. Health risks of air pollution in Europe – HRAPIE proj-
ect - Recommendations for concentration–response functions for cost–benefit analysis of
particulate matter, ozone and nitrogen dioxide. Copenhague: WHO Regional Office for Europe,
2013a. Disponível em: https://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0006/238956/
Health_risks_air_pollution_HRAPIE_project.pdf. Acesso em: 21 abr. 2021.

WHO REGIONAL OFFICE FOR EUROPE. Review of evidence on health aspects of air pollu-
tion – REVIHAAP project: final technical report. Copenhague: WHO Regional Office for Europe,
2013b Disponível em: http://www.euro.who.int/en/health-topics/environment-and-health/
air-quality/publications/2013/review-of-evidence-on-health-aspects-of-air-pollution-re-
vihaap projectfinal-technical-report. Acesso em: 21 abr. 2021.

ZHANG, Y.; HELD, I.; FUEGLISTALER, S. Projections of tropical heat stress constrained by at-
mospheric dynamics. Nature Geoscience, v. 14, p. 133–137, 2021.

239
AMBIENTE: Percepções 2021

ÍNDICE REMISSIVO
A
Ação Contra a Mudança Global do Clima 222
Acidificação oceânica 37
Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico 80, 138
Agência Nacional de Vigilância Sanitária 115
Água contaminada 134, 136
Antropoceno 36, 211
Aquecimento global 7, 36, 42, 51, 111, 211, 212, 213, 214, 217, 218, 226, 229

B
Bacia hidrográfica 7, 26, 27, 28, 77, 79, 80, 81, 82, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98, 99, 100,
101, 102, 138, 203
Biodiversidade 7, 12, 13, 14, 16, 24, 26, 35, 36, 38, 39, 47, 48, 55, 56, 57, 100, 109, 185, 210, 213, 224, 228,
229, 231
Branqueamento de corais 45, 46, 47, 49, 51, 52

C
Carga viral 84, 116, 132, 134, 139, 140, 141, 142, 144, 145, 146, 147, 150, 151, 153
Catadores de Materiais Recicláveis 115, 116
Cattleya intermedia 7, 9, 10, 11, 17, 19, 20, 21, 22, 23, 26
CDCN2 147
CDCN3 147
Cidades resilientes 187, 192, 194, 195, 205
Comunidades de corais 49, 50, 56
Comunidades resilientes 190
Covid-19 7, 8, 108, 109, 110, 111, 113, 115, 116, 117, 119, 121, 122, 123, 126, 131, 132, 133, 134, 136,
137, 138, 139, 140, 141, 142, 144, 147, 148, 149, 150, 151, 152, 153, 218
CPRM 88, 91, 92, 93, 94, 100, 166, 188, 196, 197, 198, 199, 200, 201, 202

D
Desastres hidrológicos 8, 157, 161, 162, 166, 186, 187, 189, 194, 197, 198, 201, 202
Desastres naturais 8, 158, 159, 160, 167, 174, 176, 177, 178, 184, 185, 188, 189, 196, 197, 200, 212, 226
Desastres socioambientais 205

E
Educação básica 220, 221, 222, 231
Educação em Mudanças Climáticas 219, 221, 222
Emergência sanitária 115
Engenharia de Resiliência 8, 184, 188, 190, 191, 193, 195, 197, 203, 205
Epidemiologia Baseada em Águas Residuais 132, 136, 149
Erythrina crista-galli L. 15
Esgoto 7, 8, 131, 132, 134, 135, 136, 137, 138, 139, 140, 141, 142, 144, 145, 146, 148, 149, 150, 151, 152,
153, 189, 202
Estresse térmico 37, 50, 55

F
Ficus organensis 15, 19

240
AMBIENTE: Percepções 2021

G
Gestão de riscos de desastres 159, 162, 163, 178, 194
Global Warming 7, 61, 62, 65, 66, 72, 73

I
Impacto Ambiental 83, 84, 85
Índices pluviométricos 24, 90
IPCC 36, 79, 211, 215, 226, 227

M
Marco de Sendai 186, 187
Marine Turtles 7, 61, 62, 63, 65, 66, 67, 68, 69, 72
Mudanças climáticas 7, 8, 35, 36, 37, 38, 39, 42, 43, 44, 45, 47, 48, 51, 56, 57, 79, 80, 109, 185, 191, 209,
210, 211, 212, 213, 215, 217, 218, 219, 220, 221, 222, 223, 224, 225, 226, 227, 228, 229, 230, 231,
232

O
ODS 79
Orchidaceae 7, 9, 10, 24

P
Pandemia 7, 84, 108, 109, 110, 111, 113, 114, 115, 117, 119, 124, 125, 126, 132, 137, 138, 142, 149, 150,
152, 153, 218
Percepção ambiental 220
Plano de Contingência 174, 175, 178, 179, 194, 203
Política Nacional de Defesa Civil 176
Política Nacional de Recursos Hídricos 176
Política Nacional de Resíduos Sólidos 112

R
Recifes de Corais 7, 35, 36, 37, 42, 47, 48, 49, 51, 56, 57
Resíduos Sólidos 7, 108, 109, 110, 111, 112, 113, 114, 115, 116, 117, 119, 122, 125, 126
Resíduos Sólidos Domésticos 7, 108, 110, 111
Resiliência 8, 37, 48, 57, 85, 86, 184, 186, 187, 188, 190, 191, 192, 193, 195, 196, 197, 203, 204, 205, 210,
211
Revisão sistemática da literatura 38
Risco hidrológico 198, 199
Riscos ambientais 85, 192
RT-qPCR 137, 140, 147, 148

S
SARS-CoV-2 7, 8, 109, 113, 115, 119, 123, 124, 131, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138, 139, 140, 141, 142,
145, 146, 147, 148, 149, 150, 151, 152, 153
Sistemas resilientes 192
Sociedades sustentáveis e resilientes 163
Symbiodinium 44, 46, 51, 52, 53, 54
Systematic Review 7, 61, 62, 65

241
AMBIENTE: Percepções 2021

T
Teoria Sistêmica 81
Turtle global warming biodiversity 66
Turtle global warming pivotal temperature 66
Turtle global warming sexual determination 66

V
Vulnerabilidade ambiental 85, 100

W
WBE 132, 136, 137, 149, 150, 151, 153

242
SOBRE OS AUTORES

Aline Belem Machado


Master and Doctoral Student in Environmental Quality at Feevale Univer-
sity in Rio Grande do Sul/Brazil. Biomedicine graduation at Feevale Uni-
versity.
E-mail: linebmachado@hotmail.com

Ana Valéria de Oliveira


Doutoranda em Qualidade Ambiental na Universidade Feevale.
E-mail: anafarmavida@gmail.com

Annette Droste
Doutora em Genética e Biologia Molecular – UFRGS. Genética e Biolo-
gia Molecular – UFRGS. Graduação em Ciências Biológicas - UNISINOS.
E-mail: annette@feevale.br

Bruna Haubert
Doutoranda em Qualidade Ambiental pela Universidade Feevale (bolsista
Capes). Mestre em Indústria Criativa pela Universidade Feevale.
E-mail: brunahaubert@feevale.br

Bruna Saraiva Hermann


Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental
pela Universidade Feevale (bolsista CNPq-GD). Mestra em Virologia e
graduada em Biomedicina, pela Universidade Feevale.
E-mail: bruna-s-h@hotmail.com
Camila Favretto
Mestra em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela Universidade de Passo
Fundo. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Am-
biental, Universidade Feevale.
E-mail: camila.favretto@hotmail.com

Catiana Masiero Bresolin


Mestre em Qualidade Ambiental – FEEVALE. Graduação em Ciências Bio-
lógicas – UNISINOS.
E-mail: catianabresolin@gmail.com

Crístian Yan Montana da Rocha


Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Feevale.
E-mail: cristianyan@gmail.com

Daiene Dorfey
Doutoranda em Qualidade Ambiental pela Universidade Feevale, Bolsista
CNPq. Mestre em Nanociências pela Universidade Franciscana.
E-mail: daienedorfey11@gmail.

Daniela Montanari Migliavacca Osório


Doutora em Ecologia. Pesquisadora Colaboradora da Faculdade de Tecno-
lógica da UNICAMP.
E-mail danielamigliavacca@hotmail.com
Daniela Müller de Quevedo
Doutora em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental – UFRGS. Mestre
em Estatística e Probabilidade Matemática – UFRGS. Graduação em Mate-
mática - UFSM.
E-mail: danielamq@feevale.br

Delio Endres Júnior


Doutor em Qualidade Ambiental – FEEVALE. Mestre em Qualidade Ambien-
tal – FEEVALE. Graduação em Ciências Biológicas – FEEVALE.
E-mail: deliojendres@hotmail.com

Eloir Dutra Lourenço


Doutor em Qualidade Ambiental pela FEEVALE, Mestre em Diagnóstico Ge-
nético e Molecular pela ULBRA, Biomédico pela FEEVALE.
E-mail: eloirdl@feevale.br

Fabrício Wilbert
Doutor em Qualidade Ambiental, Mestre em Tecnologia de Materiais e
Processos Industriais pela FEEVALE, Engenheiro de Plásticos pela Ulbra.
E-mail: fabricio.wilbert@gmail.com

Günther Gehlen
Doutor em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul. Professor do Programa de Pós-graduação em Qualidade Ambiental.
E-mail: guntherg@feevale.br
Haide Maria Hupffer
Pós-Doutora em Direito pela Unisinos. Doutora e Mestre em Direito pela
Unisinos. Professora e Pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em
Qualidade Ambiental e no Curso de Direito da Universidade Feevale. Líder
do Grupo de Pesquisa Direito e Desenvolvimento – CNPq/Feevale.
E-mail: haide@feevale.br

Jairo Lizandro Schmitt


Doutor em Botânica – UFRGS. Mestre em Biologia – UNISINOS. Graduação
em Ciências Biológicas – UNISINOS.
E-mail: jairols@feevale.br

Jenifer Panizzon
Mestra em Qualidade Ambiental. Doutoranda do Programa de Pós-Gradua-
ção em Qualidade Ambiental, Universidade Feevale.
E-mail: panizzonj@gmail.com

Júlia Carolina Illi


Mestre em Engenharia Química – UFRGS. Especialista em Gestão de Re-
cursos Hídricos – UNINTER. Graduação em Engenharia Industrial Química
– FEEVALE.
E-mail: juliacarolinailli@gmail.com

Karin Luise dos Santos


Doutora em Qualidade Ambiental pela Universidade Feevale.
E-mail: karinluise@feevale.br
Luciano Gonçalves
Mestre em Tecnologia de Materiais e Processos Industriais pela Universi-
dade Feevale. Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Qualidade
Ambiental, Universidade Feevale.
E-mail: lucianorg@save.ind.br

Maíra de Andrade Peixoto


Mestre em Engenharia Química – UFSC. Engenheira de Bioprocessos e Bio-
tecnologia – UERGS.
E-mail: mairapeixoto@hotmail.com

Malisia Balestrin Lazzari


Doutora em Qualidade Ambiental pela Universidade Feevale.
E-mail: mali_lazzari@hotmail.com

Márcia Isabel Käffer


Pós-Doutora em Qualidade Ambiental pela Universidade Feevale.
E-mail: mkaffer9617@gmail.com

Márcia Lourenço
Doutora em Qualidade Ambiental pela Universidade Feevale.
E-mail: marcialourenci@feevale.br

Márcio Hisayuki Sasamori


Doutor em Qualidade Ambiental – FEEVALE. Mestre em Qualidade Ambien-
tal – FEEVALE. Graduação em Ciências Biológicas – FEEVALE.
E-mail: marcio_sasamori@yahoo.com.br
Marco Antonio Mabilia Martins
Master in Business at Federal University of Rio Grande do Sul and Doctoral
Student in Environmental Quality at Feevale University in Rio Grande do
Sul/Brazil. Business Administration graduation at PUC-RS.
E-mail: marcoamm@gmail.com

Marco Alésio Figueiredo Pereira


Doutor em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental – IPH - UFRGS.
Mestre em Engenharia Civil – UFSM. Especialista em Informações Espaciais
Georreferenciadas – UNISINOS. Graduação em Geografia - UFSM. E-mail:
marco@feevale.br

Marcos Tenedini
Mestre em Qualidade Ambiental. Doutorando do Programa de Pós-Gradua-
ção em Qualidade Ambiental, Universidade Feevale.
E-mail: marcos.tenedini@yahoo.com

Meriane Demoliner
Master and Doctoral Student in Environmental Quality at Feevale University
in Rio Grande do Sul/Brazil. Biomedicine graduation at Feevale University.
E-mail: merianedemoliner@gmail.com

Michel Vinicius Flach


Mestre em Qualidade Ambiental – FEEVALE. Especialista em Segurança do
Trabalho – UCAM. Graduação em Engenharia Industrial Química – FEEVALE.
E-mail: flachmichel@gmail.com
Paula Rodrigues de Almeida
Doutora em Qualidade Ambiental – FEEVALE. Mestre em Ciências Veteriná-
rias – UFRGS. Graduação em Medicina Veterinária – UFRGS.
E-mail: paulapaulapla@gmail.com

Paula Santos
Doutora em Qualidade Ambiental, Mestre em Engenharia: Energia, Ambien-
te e Materiais pela ULBRA, Engenheira Química pela Ulbra.
E-mail: paula,goncalves@feevale.br

Rafael Nunes dos Santos


Master and Doctoral Student in Environmental Quality at Feevale University
in Rio Grande do Sul/Brazil. Agronomy graduation at Federal University of
Rio Grande do Sul. Researcher at the Rio Grande do Sul Rice Institute.
E-mail: rafael-santos@irga.rs.gov.br

Rosângela Maria Paixão Pinheiro


Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Doutoranda pelo Programa
em Qualidade Ambiental – Universidade Feevale. Professora – IFMA (Cam-
pus Monte Castelo).
E-mail: rosangela.pinheiro@ifma.edu.br

Sabrina Antunes Vieira


Doutoranda em Qualidade Ambiental, Mestra em Qualidade Ambiental pela
FEEVALE, Engenheira Ambiental pela UPF.
E-mail: sah.vieira@hotmail.com

Vanessa Schweitzer dos Santos


Doutora em Qualidade Ambiental pela Universidade Feevale.
E-mail: schweitzer.vanessa@gmail.com
ISBN:
978-65-86341-14-0

Você também pode gostar