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o--TCC/UNICAMP

.
R571f
2331 FEF/799

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS


FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA

FORMAÇÃO ACADÊMICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA:


O ESPAÇO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

ODILON JOSÉ ROBLE

CAMPINAS
1995
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
-'
FACULDADE DE EDUCAÇAO FISICA

FORMAÇÃO ACADÊMICA EM EDU~AÇÃO FÍSICA:


O ESPAÇO DAS REPRESENTAÇOES SOCIAIS

ODILON JOSÉ ROBLE

Monografia apresentada
para a obtenção do título
de licenciado em
Educação Física.

ORIENTADOR: PROF. MS. JOCIMAR DAOLIO

CAMPINAS
1995
TCCjUNICAMP Ã!&.
R571f V"

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO Pág.01

1- NOÇÕES DE CORPO E CULTURA Pág.04

2- AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PRÁTICAS


CORPORAIS Pág.07

3 - AS PRÁTICAS CORPORAIS NA ESCOLA Pág. 10

4 -FORMAÇÃO ACADÊMICA EM EDUCAÇÃO


FÍSICA- ANÁLISE DAS PROPOSTAS
CURRICULARES DE USP, UNESP (RIO CLARO)
E UNICAMP Pág. 13

CONCLUSÕES Pág.33

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Pág. 36


INTRODUÇAO

Nos dias de hoje, podemos assistir a urna super valorização do


corpo. A mídia veicula insistentemente padrões de beleza e hábitos corporais
que devem ser seguidos para compor um modelo de corpo integrado à
sociedade moderna. Essa "moda corpo" traz consigo valores que penetram no
meio social e acabam por influenciar os comportamentos de seus integrantes.

Dessa maneira, expectativas se fonnam em tomo das atividades


que se relacionam ao corpo. Na academia, no clube, no lazer ou na escola, as
práticas corporais são construídas não só através das ações, mas também são
condicionadas pelas representações que carregam. Em outros tennos, podemos
dizer que as pessoas envolvidas com as práticas corporais, esperam encontrar ..
nas mesmas, uma relação com detenninados valores vigentes em nossa
sociedade, expressos pelos meios de comunicação e aceitos pelo seu grupo.
Nesse trabalho, estaremos observando quais são esses valores que
habitam as representações e geram expectativas nas pessoas de nossa cultura
em relação às práticas corporais. A partir disso, pretendemos realizar urna
discussão que observe o tratamento reservado a tais questões pela fonnação
profissional em Educação Física e como isso pode estar influenciando as aulas
dessa disciplina na escola.
Esses valores constituintes das representações e expectativas dos
alunos precisam ser de conhecimento do professor se este visar a urna atuação
contextualizada e reflexiva. Toma-se então evidente a necessidade de

I
abordagem e tratamento de tais valores, além de outros aspectos culturais,
como importantes componentes do campo de conhecimento da Educação
Física. No entanto, parece-nos marcante que os aspectos biológicos do
movimento humano receberam historicamente uma atenção maior na formação
acadêmica em Educação Física que a reservada a aspectos de outra ordem. Não
obstante a validade dos estudos com base nas ciências biológicas, é preciso
entender a Educação Física, sobretudo a escolar, como uma ciência muito
próxima dos fenômenos humanos.
Nesse estudo estaremos utilizando um referencial vindo das
ciências humanas. Realizaremos uma discussão com base no estudo da cultura.
Mais especificamente, estaremos trazendo conceitos da Antropologia Social,
que nos ajudem na compreensão e interpretação acerca das representações
sociais e valores culturais envolvidos com a prática corporal.
Uma vez expostas nossas convicções sobre quais são os valores
que suscitam as representações sociais sobre práticas corporais, representações

estas, que o professor de Educação Física certamente encontrará em sua prática


junto aos alunos, resta-nos saber que tratamento tal problemática recebe na
formação profissional. Para isso, estaremos aqui realizando uma discussão
sobre a visão de área da Educação Física a partir da estrutura de seus
curriculos. As propostas curriculares de três grandes universidades do Estado
de São Paulo: USP, UNESP (Rio Claro) e UNICAMP, podem nos possibilitar
interpretações sobre a relação existente entre o conhecimento profissional e
valores sociais, revelando-nos que importãncia os valores de nossa sociedade,

2
expressos pelos alunos através de suas expectativas e representações, recebem
atualmente por parte da formação acadêmica em Educação Física.
Acreditamos assim, ser possível enxergar uma atuação mais
contextualizada do professor de Educação Física, a partir de uma compreensão
das representações sacias que habitam o imaginário de seus alunos e compõem
os símbolos culturais vigentes. Os valores expressos pelas representações dos
alunos devem, ou deveriam, ser do conhecimento do professor, pois cabe a
este, organizar conteúdos de aula que lide de maneira consciente e adequada
com tais valores, fornecendo ao aluno, condições de reavaliar sua relação com
os conceitos de corpo e práticas corporais de sua sociedade.
Enfun, é possível afirmar que tais valores constituem-se,
consequentemente, como aspectos fundamentais do objeto de estudo da
Educação Físic~. Sua abordagem pela formação acadêmica se faz necessária
portanto, não somente pela proposta de uma visão antropológica para se somar
a tantas outras, mas pela carência que tal área possui de se aproximar
definitivamente do movimento humano como um fenômeno de características e

determinantes eminentementes sociais.

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I -NOÇÕES DE CORPO E CULTURA

Em praticamente todas as suas atividades, o homem expressa sua


corporeidade. Todos os significados de sua cultura estão de alguma maneira
inscritos em seu corpo. Sua ação é fruto desses significados e condiciona-se a
partir de seus valores enquanto indivíduo e elemento de um grupo social
determinado.

A maneira que o homem encontra para se relacionar com seu


mundo, com seus semelhantes e com sua cultura, é através do seu corpo. Essa
relação nos permite concluir que o homem é seu corpo, em uma unidade
indivisível que o projeta em sua cultura ao mesmo tempo que esta é
incorporada, como ilustra DAOLIO ( 1995, p.31):

No corpo estão inscritos todas as regras, todas as normas


e todos os valores de uma sociedade especifica, por ser
ele o meio de contato primário do indivíduo com o
ambiente que o cerca.

Parece-nos claro, portanto, que o gesto humano, a sua expressão,


revelará não só a individualidade de seu autor mas trará consigo aquilo que sua
cultura lhe ensinou. O discurso corporal revela, através do indivíduo, as
estruturas de uma sociedade. Essas estruturas são manifestadas pela sua ação e
pela sua representação. Quer seja em casa, na rua, no clube ou na escola, os
significados culturais estarão sempre presentes, condicionando de alguma
maneira o comportamento das pessoas. Estudar o comportamento motor dos

4
indivíduos de nossa sociedade é, portanto, compor, inevitavelmente, uma
relação entre os significados culturais que definem as representações desses
indivíduos e as ações dos mesmos.
As diversas ordens do pensamento são sempre carregadas de
símbolos que guiam as pessoas e lhes fornecem pistas para sua atuação em seu
grupo social. Segundo GEERTZ (1989, p.l85):

(. .. ) tanto os símbolos ou sistemas de símbolos chamados


cognitivos como os chamados expressivos têm pelo menos
uma coisa em comum: eles são fontes extrínsecas de
informaçóes em termos das quais a vida humana pode ser
padronizada mecanismos extrapessoais para a
compreensão, julgamento e manipulação do mundo. Os
padróes culturais religioso, filosófico, estético,
cientifico, ideológico - são "programas": eles fornecem
um gabarito ou programa para a organização dos
processos sociais e psicológicos, deforma semelhante aos
sistemas genéticos que fornecem tal gabarito para a
organização dos processos orgânicos.

Em resumo, toda pessoa trará em seu corpo os signos de sua


cultura e os expressará no seu discurso corporal. Através desse discurso, estará
agindo para se integrar à sua cultura e, ao mesmo tempo, integrá-la a si.
Na escola, como em qualquer outro espaço público, os valores de
uma sociedade, as estruturas de símbolos que compõem determinada cultura,
estarão presentes e se manifestarão em todos os momentos da prática
educativa. De igual maneira, o conjunto de significados culturais que definem
as relações de nossa sociedade com as práticas corporais, estarão presentes no

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comportamento dos alunos e serão, certamente, os condicionantes da prática
em Educação Física.
O valor atribuído às práticas corporais alcançou em nossa cultura
uma difusão muito ampla. Praticamente toda pessoa confere à atividade física
detenninados valores positivos, praticando-a ou não. Mais que simplesmente
fornecedoras de um caráter pragmático individual, as práticas corporais
constituem-se atualmente em um estilo de vida. Esse estilo, que confere à
pessoa adjetivos que a projetam positivamente em seu meio, impõe hábitos que
alteram substancialmente o dia-a-dia do indivíduo. Mesmo aqueles que não se
empenham de fato em uma prática sistematizada, podem de alguma maneira se
relacionar com esse universo através dos produtos de consumo que se referem
a esse universo. Pela mesma orientação, é esperado que uma pessoa ao
enfrentar uma prática corporal, tente se comportar de acordo com os padrões
estabelecidos pela sociedade para esse universo, urna vez que tais padrões são
suficientemente conhecidos e bastante considerados.
Não pretendemos aqui enveredar pela discussão dos aspectos de
consumo que penneiam as práticas corporais, mas sublinhar a importância que
tal universo alcança em nossa cultura, gerando representações e expectativas,
modelando ações e comportamentos.

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2- AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PRÁTICAS CORPORAIS

No sentido de compreendennos os valores que se manifestam nas


práticas corporais, acreditamos ser necessário a interpretação dos significados
que as pessoas atribuem a essas práticas. É preciso, como propõe GEERTZ
(1989, p.l7) realizar uma "descrição densa", uma "hieraquia estratificada de
estruturas significantes". Assim, o que buscamos foi uma análise interpretativa
sobre o sentido que as pessoas assumem ao se envolverem em atividades
corporais.
Em recente pesqmsa do Programa de Iniciação Científica do
Conselho Nacional de Pesquisa (PIBIC/CNPq), intitulada "Expectativas sócio-
culturais de consumidores de práticas corporais", realizamos uma interpretação
dos significados culturais referentes às práticas de atividades que possivelmente
animam atividades corporais atuais. Através de uma análise etnográfica,
buscamos reconstruir o universo simbólico referenteàs práticas de atividades
corporais dos frequentadores de academias da cidade de Campinas.
Podemos, através dos resultados desse estudo, inferir algumas
relações com o objeto do trabalho atual. Sendo as academias um espaço
moderno reservado ao corpo, valorizado pela sociedade e incentivado pelos
meios de comunicação, é possível entender as representações sociais contidas
nos discursos de seus frequentadores como constituintes da retórica de um
grupo caracteristico da sociedade, uma espécie de tribo urbana, mas também (e

7
obviamente) como importantes símbolos do que caracterizam nossa cultura
atual como um todo.
Concluiu-se no citado estudo que as expectativas dos
consumidores de práticas corporais eram animadas por quatro grandes valores
que, em conjunto compunham uma "rede de sociabilização". São eles: a saúde,
a beleza, o convívio social e a ocupação do tempo disponível (ROBLE,
MOREIRA & DAOLIO, 1995).
Cada um desses valores expressa alguns dos fatores essenciais do
pensamento do brasileiro acerca do corpo e das práticas corporais. Os
conceitos de saúde e beleza expressam um padrão cultural de corpo "saudável"
e "belo" que parece ser atrelado a deteminados hábitos de vida, entre os quais a
prática de exercícios físicos ou de esporte. A ocupação do tempo disponível e o
convívio social, por sua vez, revelam os significados que conferem às
atividades físicas um status social em nossa cultura.
CARDOSO (1995, p.l75), revela também nesse sentido, uma
noção de corporeidade que pode ser entendida à partir de determinados valores
de nossa cultura, alguns semelhantes ao que apontamos: o valor estético (o
belo), o valor homeostático (funcional), o valor interativo (a comunicação) e o
valor sexual (o sensual).Tais valores parecem definir modelos de atuação das
pessoas frente a seu meio social. Dessa forma, os padrões corporais de beleza
aparecem como possivelmente condicionados pelos valores estéticos de nossa
cultura, assim como o papel sexual do corpo assume elevada importância na
personalidade das pessoas uma vez que a sociedade confere especial atenção
ao tema. Por sua vez, a importância que parece receber o valor funcional do

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corpo em nossa cultura pode, inclusive, atribuir ao corpo um caráter
instrumentalizado onde este é visto através de suas potencialidades de trabalho.
A comunicação aparece também como uma importante característica de nossa
sociedade o que, indubitavelmente, altera os comportamentos sociais das
pessoas frente às suas necesssidades de trasmitir suas idéias, se relacionar com
suas crenças e com seu grupo social através de seu corpo.

Parece-nos evidente então, que as representações compõem um


conjunto de valores que, de uma forma mais ampla, modelam a corporeidade
do brasileiro, e se expressam, portanto, não só na academia, mas em qualquer
espaço reservado à pratica corporal em nossa sociedade.
Assim, é de se esperar que também na escola, os alunos que se
relacionam com tais valores cotidianamente, os carreguem para as aulas de
Educação Física, o que de determinada maneira, alteraria seus comportamentos
frente às propostas oferecidas pelo professor. Faremos a seguir algumas
reflexões sobre as representações sacias na escola, para introduzirmos a idéia
básica desse trabalho que é a de argumentar sobre a necessidade de uma
formação acadêmica mais voltada a esses aspectos, a f1TI1 de conferir para o
professor condições ao professor de lidar conscientemente com esses valores,
representações e expectativas sócio-culturais.

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3 -AS PRÁTICAS CORPORAIS NA ESCOLA

A escola é wna instituição inserida em wn determinado contexto


cultural. As pessoas que a frequentam são representantes de wna sociedade em
questão. Assim, os valores que nela habitam são confrontados com os valores
vigentes em nosso momento histórico. Dessa forma, a prática de atividades
corporais na escola, representada principalmente pela Educação Física, não se
constitui em wn fenômeno alheio à sociedade, condicionado unicamente por
preceitos técnicos e pedagógicos.
Quando os alunos se deparam com uma atividade escolar,
relacionada com práticas corporais, como em aulas de Educação Física, seus
comportamentos serão, provavelmente, modelados não só pelas suas ações em
si, mas também pelas representações sociais que carregam. A sua relação com
o mundo, com sua cultura, confere a cada aluno um conjunto de expectativas
frente às propostas de práticas corporais oferecidas pelo professor. O
comportamento dos alunos, sendo justamente fruto dessas expectativas, é
definido pelo que GEERTZ (1989, p.l85) define como "pensamento
. . . ":
~
tmagmano

O pensamento imaginário nada mais é do que construir


uma imagem do ambiente ,fazendo o modelo correr mais
depressa do que o ambiente e predizendo que o ambiente
se comportará segundo o modelo.

10
Nesse sentido, o professor fica submetido à seguinte realidade: se
sua proposta não se relaciona com os valores dos alunos, baseando-se
unicamente nos preceitos de obrigatoriedade escolar, é provavel que o desânino
se instaure e os anseios dos alunos se restrinjam às práticas que de alguma
forma venham a suprir suas expectativas como, por exemplo o "racha" no fmal
da aula ou determinados momentos da aula onde eles possam agir livremente,
expressando seus desejos. Um grande número de professores, frente a essa
realidade, lançam mão de uma espécie de barganha, onde o aluno é obrigado a
suportar a "aula" para poder disputar o "racha" no final da mesma, ou ter um
momento onde ele conduza a atividade da maneira que ele deseja. Não raro,
esse desejo nada mais representa senão os significados culturais que fomentam
suas expectativas frente às práticas corporais, expectativas essas que ele não
sacia no desenvolvimento normal da aula devido ao caráter anacrônico e
determinista que o professor conferiu à mesma.
O ponto chave nesta questão é, portanto, a inadequação do
tratamento conferido à aula por parte do professor que, ao desconhecer as
representações sociais que habitam os anseios de seus alunos, fica escravizado
a conteúdos descontextualizados ao dia-a-dia do aluno, ultapassados frente ao
conjunto de informações que esse vislumbra.
Para nós, a função da Educação Física escolar é a de ensinar o
aluno a conhecer e se relacionar com o universo do movimento humano
expresso por sua cultura, como alguns autores já sugenmm (BETTI, 92;
COLETIVO DE AUTORES, 1992; DAOLIO, 1993; DAOLIO, 1995). Nesse
sentido, toma-se inconcebível um profissional que detenha somente referencial

11
técnico, adequar-se a wn profícuo processo educativo. O que tratamos aqui por
educação é a capacidade de entender, integrar-se e transformar a própria
cultura, a partir da reflexão, elemento indispensável para wna profícua prática
educativa.
No entanto, para que wn professor possua wna atuação que vise a
contextualização e propicie a reflexão, é preciso que tenha além de
competência técnica e pedagógica, a compreensão dos significados culturais
que constituem seu campo de atuação.
Parece que a estrutura dos cursos de graduação em Educação
Física não tem conseguido dar conta dessa tarefa. Dividindo-se em wna
quantidade exagerada de disciplinas, o currículo em Educação Física, ao invés
de conferir à área wna multidisciplinaridade e ao profissional, wn discurso
pluralista, gera especializações teóricas, culminando com a falta de
aplicabilidade dos conhecimentos transmitidos aos alunos.
Acreditamos ser preciso, portanto wna reavaliação da estrutura de
formação acadêmica em Educação Física. É nesse sentido que prosseguiremos
nossas análises, reservando atenção agora à formação profissional, através das
propostas curriculares da USP, UNESP (Rio Claro) e UNICAMP.

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4 - FORMAÇÃO ACADÊMICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA - ANÁliSE DAS
PROPOSTAS CURRICULARES DE USP, UNESP (RIO CLARO) E UN!CAMP

Pretendemos agora analisar as propostas curriculares da USP,


UNESP (Rio Claro) e UNICAMP, a fim de observarmos qual o espaço,
provavelmente reservado para abordagens de natureza sócio-culturais, como as
que levantamos há pouco,
O que podemos observar a princípio, no oferecimento do curso de
Educação Física nas universidades em questão, é a divisão entre a Educação
Física escolar e a não-escolar.
Na UNICAMP, a divisão se dá após um período de estudo
denominado núcleo comum, com disciplinas consideradas básicas ao objeto de
estudo da Educação Física. Opta-se então pela licenciatura ou pelo
bacharelado, sendo este dividido em treinamento esportivo ou recreação e
lazer. Na UNESP a opção entre licenciatura e bacharelado, deve ser realizada
já no ato da inscrição ao vestibular. Na USP, desde 1992, o curso de Educação
Física separou-se do curso de esporte.
A distinção entre licenciatura e bacharelado legalmente se deu
através da resolução 03/87 do CFE, mas até hoje algumas habilitações não
foram reconhecidas pelo Ministério do Trabalho.
Centraremos nossas análises na opção por licenciatura por ser esta
a mais tradicional. Porém, acreditamos que os resultados de nossas reflexões

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sejam úteis não só para a licenciatura mas para o conhecimento científico em
Educação Física como um todo.
Observando-se as propostas curriculares das três universidades, a
divisão entre licenciatura e bacharelado parece não ter conferido uma
reformulação do curriculo da licenciatura, visando uma maior atenção às
expectativas dos alunos. O que parece ser o principal motor para a mudança
refere-se a uma adequação de um novo profissional ao mercado de trabalho, o
bacharel em Educação Física, que se ocuparia de um espaço próprio da
Educação Física que está sendo apropriado por outras áreas do conhecimento.
OLIVEIRA (1986), ao discorrer sobre a proposta curricular, que hoje já se
estabeleceu na Universidade de São Paulo, preocupa-se com interferências e
indefiniçoes com a Medicina e a Fisioterapia em área não-escolar e afirma:

Aqui, novamente sem pretender-se enveredar para o lado


corporativista do problema, mas sim preocupar-se com o
processo do reconhecimento da significância e da
necessidade de atuação e com equilíbrio entre
corporativismo e compromisso social de uma classe
profissional, o oferecimento do curso de bacharelado em
Educação Física torna-se um elemento facilitador e
possibilitador da regulamentação da profissão, não de
professor de Educação Física, mas de profissional de
Educação Física (... )

Outro dado que podemos abordar neste estudo, que nos revela
uma importante característica social do que vem acontecendo com a Educação
Física e como isto está se fazendo sentir em termos de formação profissional, é

14
o baixo interesse dos ingressantes em trabalharem na escola como aponta o
estudo a seguir organizado por OLIVEIRA (1986, p, 6):

15
FIG. 01:

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1981 (n=-4.::5) 1 982(n=32) 1 98.::5(n=40) 1 984(n=B6)


Ano de Ingresso no EEFUSP

Fonte: Preparação profissional em Educação Física e em Esporte.


(OLIVEIRA, 1986, p.6)

16
Nesta pesquisa, os ingressantes em Educação Física, ao serem
questionados sobre seu interesse de vir a atuar como professores de 1o ou 2°
grau, poderiam responder a pergunta dizendo sim ou não.
O gráfico (fig.Ol) esboça as respostas de alunos da Escola de
Educação Física da USP, ingressantes nos anos de 1981 a 1984. O que

podemos observar pelos seus dados é que o número de respostas não sempre
foi superior ao de respostas sim. Também é possível observar que a difença
entre as respostas aumentou ao longo dos anos da pesquisa, sendo que em 1981
(1 o ano da pesquisa) a diferença era de 6,98 pontos percentuais e em 1984

(último ano da pesquisa) essa diferença já aumentara para 40,7 pontos.


A seguir veremos uma ampliação dos dados deste estudo rea lizado
por OLIVEIRA (1986, p.9):

17
FIG. 02:

O seu objetivo principal. como aluno/aluna do Curso


de Licenciatura em Educaçâo Ffsica. e em termos de
formaç~o profissional. é preparar-se para atuar
como professor/professo~a em Escolas de lo. e/ou
2o. Graus?

--
LEGENDA

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~ ~irn
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no o

USF'/1 91!4 USP/1 81!5 UNESP/'1 91!0 UNIMEF'/1 81!5


3orocai:)O/HlBO 9t.Ancuajl Slee CUOn.JihOA/1 9BB UNICAMP/1 9BB
1gressantes ern Cursos de Licenciatura ern Edu~ocao Fisica

Fonte: Preparação profissional em Educação Física e em Esporte.


(OLIVEIRA, 1986, p.9)

18
Nesse segundo estudo o autor esboça um gráfico (fig.02) que se
refere às respostas obtidas para a mesma pergunta, agora realizada em
instituições diferentes a saber: UNESP (1985), UNIMEP (1986), Sorocaba
(1985), Santo André (1986), Guarulhos (1986) e UNICAMP (1986), além de
retomar os dados da USP (1984 e 1986). Também neste caso é possível
detectar o baixo interesse pelo magistério nas faculdades de Educação Física da
UNESP, de Sorocaba e da UNICAMP nos anos da pesquisa. A faculdade da
UNIMEP apresentou valores praticamente iguais entre respostas sim e não
para a citada pergunta (diferença de apenas 1,74 pontos percentuais). Já as
faculdades de Santo André e Guarulhos apresentaram um maior índice de
respostas sim (com uma diferença relativa de 33.98 e 26.39 pontos percentuais
respectivamente). Dessa forma o autor conclui que os cursos de graduação em
Educação Física ínflam-se de alunos que de antemão não pretendem assumir o
compromisso com a Educação Física escolar (OLIVEIRA, 1986, p.8)
Este estudo revela que o desinteresse pela atuação profissional em
escolas não só é muito alto, como parece que tende a aumentar (é preciso
observar que tal estudo não é atual o que não nos permite traçar convicções
maiores). Este fato confirma a tendência de se procurar novos horizontes para a
Educação Física. Parece que universidade, mercado e aluno estão envolvidos
em um processo de novas conquistas, com promessas de novos empregos e,
talvez, melhores remunerações.
A miséria do sistema educacional brasileiro não é de fato
estimuladora para jovens que, representantes de uma minoria privilegiada,
alcançam o sonho universitário. No entanto, a formação acadêmica deve

19
preocupar-se, sobretudo, em melhorar o nível de ensino, pois este deve ser seu
melhor argumento para valorizar a atuação profissional e combater o descaso.
O aluno que optar pela licenciatura deve ser não um romãntico predestinado à
pobreza, mas uma pessoa com condições de alterar significativamente o quadro
social através de sua condição de indivíduo que reflete, transformando seu
ambiente, além de exercer sua capacidade profissional que propicia a reflexão,
através do processo educacional. Portanto a criação do bacharelado em
Educação Física não deve ser, e não estamos afirmando que seja, um bote
salva-vidas para a Educação Física brasileira. Mas deve ser tão relevado e
avaliado quanto a licenciatura; nem mais, nem menos.
A separação entre licenciatura e bacharelado parece não ter
alterado a estrutura da licenciatira. Nem sequer na Escola de Educação Física
da USP onde houve a separação entre os cursos de Educação Física e Esporte,
a divisão das disciplinas se alterou substancialmente. Ainda é possível
observar, como antes, um amplo predomínio das disciplinas de natureza
biológica, mesmo na licenciatura.
Além da predominãncia das disciplinas biológicas, a estrutura
curticular apresenta outra característica marcante; a fragmentação do
conhecimento. Um número consideravelmente grande de disciplinas é
oferecido, oriundas de áreas diversas do conhecimento. Na maioria dos casos
existem inclusive disciplinas que são oferecidas em outros institutos como
Anatomia, Fisiologia e Bioquímica que são oferecidas por institutos de
Biologia, disciplinas pedagógicas que são oferecidas por institutos de Educação
e disciplinas de Estatística que são pertinentes aos institutos de Ciências

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Exatas. Neste sentido, como aponta TOJAL (1989, p.68), "( ... )a fragmentação
do conhecimento compromete a formação". Um espaço voltado à reflexão da
estrutura cultural que determina a corporeidade, fica reservada, na maioria das
vezes, a uma pequena lacuna correspondente às disciplinas das ciências
humanas.
Os conhecimentos de Anatomia, Fisiologia ou Bioquímica, entre
outros dessa natureza, são bastante sólidos e interessa à qualquer pessoa bem
informada. Conhecer aspectos biológicos de nosso corpo e seu funcionamento
orgânico saudável não deve ser privilégio somente dos profissionais da saúde.
No entanto, daí a se pressupor que tais conhecimentos são fundamentais para a
aplicação da Educação Física escolar, existe uma distância razoável.
Toma-se irônica a revolta de se ter uma fatia de seu mercado de
trabalho apropriado por profissionais da saúde, uma vez que a formação
profissional nos sucumbe a isto. A estrutura do curso de Educação Física
mudou, dividindo-se, mas as disciplinas de natureza biológica continuam sendo
muito valorizadas. No entanto, não são abordadas de forma que nos
caracterizem como profissionais da saúde, como médicos ou fisioterapeutas.
Tal realidade toma-se especialmente contestável na formação do
professor de escola, que não tem como função promover o condicionamento
físico de seus alunos. Mesmo o seu papel de ensinar o aluno a como atuar de
maneira equilibrada e adequada em uma prática corporal fora da escola deve se
basear mais na reflexão sobre o que a sociedade incita ao aluno a fazer para se

integrar ao "culto ao corpo", do que em questões de ordem médica. O


conhecimento de alguns fundamentos que otimizem a prática são, sem dúvida,

21
desejáveis ao profissional da Educação Física, mas isso nos parece muito mais
uma competência de ordem técnica, do que oriunda de estudos da estrutura
biológica, cada vez mais minuciosos, como vem propondo a grade curricular e
as ementas das disciplinas.
A seguir iremos expor as grades curriculares dos cursos de
Educação Física da USP, UNESP (Rio Claro) e UNICAMP, para que
possamos ampliar nossas reflexões no sentido em que estamos desenvolvendo.
No caso da UNICAMP, essas grades se referem ao núcleo
comum, o que representa um conjunto de disciplinas consideradas básicas para
a formação profissional em licenciatura ou bacharelado, somadas às disciplinas
específicas da opção por licenciatura. Na UNESP apresentamos o quadro de
formação geral e específica para a licenciatura. E no caso da USP
apresentamos a grade do bacharelado em Educação Física (uma vez que este é
pré-requisito para a licenciatura) e o curriculo específico da licenciatura.
Os curriculos estão organizados a seguir nas tabelas 1, 2 e 3:

22
TABELA 01:

Grade curricular do curso de graduação em Educação Física, modalidade


licenciatura, da UNICAMP:

• Currículo Pleno
Núcleo Comum 40 C11.r4o:

BAilO Anatomia HumAna I HS:o.4 C:04


B..\210 Anatomia Humana li HS:04 C:04
BBllO Bioquímica HS:03 C:03
BF310 Fisilogia Humana I HS:03 C:OJ
BF410 Fisiologia Human11 li HS:03 C:03
EL241 Fund. Educação I: Filosofia da Educação HS:02 C:02
EL341 Fund. Educação li: História da Educação HS:02 C:02
MHlOl lntroduçaão à Educação F ísica HS:02 C:02
MH102 História d11 Educ. Física e Esportes HS:02 C:02
MH103 História da Ed. Fís. e Esp. do Brasil HS:04 C:o.4
MH104 lntrod. a Metod. Pesq. Cient. Ed. Física HS:OJ C:OJ
MHlOS Teorias da Educ. Física e Esportes HS:OJ C:OJ
MH106 lnionna.ção em Educ. Fís., Esp. e Laur HS:02 C:02
MH200 Bases Biológicas da Atividade Física HS:04 C:o.4
MH201 Noções BM. de Saúde e Urg. Ed. Física HS:OJ C:03
MH202 Nutrição em Educação Fis. e Esportes HS:02 C:02
MH103 Bases Neurofuncionais do Movimento HS:OJ C:03
MH204 Desenvolvimento Neuromotor HS:OJ C:OJ
MH20S Cinesiolopa HS:04 C:o.4
MH206 Antropologia Física HS:03 C:OJ
MH207 Introdução a Educ. Física Especial HS:04 C:o.4
MH300 Ludornotricidade I HS:04 C:04
MH301 Ludomotricidade Il HS:o.4 C:o.4
MH302 Ludomotricida.d.e III HS:04 C:04
MH303 Pedagogia do t-.fovimento I HS:04 C:o.4
MH304 Ped&gogia do Movimento li HS:O-t C:04
MH30S Ped&gogia do Movimento Ill HS:04 C:o.4
MH306 Vivências Corporais HS:03 C:03
MH307 Introdução à Recr. e aos Est. do Laoz.er HS:04 C:04
MH400 Introd. ao Treinamento em Esportes HS:04 C:o.4
MH401 Pedagogia e Esportes 1 HS:04 C:Q.4

MH~02 Ped&gogia e Esportes 11 HS:04 C:04


MH403 Ped&gogia e Esportes Ill HS:04 C :0 4
MH ·IO~ Pedagogia e Esportes IV HS:04 C:04
PBIOI Estudo de Problemas Brasileiros HS:Ol C:Ol
P8201 Estudo de Problemas Brasileiros HS:Ol C:Ol

Diuiplin44 Eletiv44

20 créditos dentre:
Qualquer disciplina oferecida pela UNICAMP

23
Licenciatura em Educação Fisica:

Afim d~ núcle~ c~m,.m, ~ alun~ de1Jerd cumprir:

EL200 Estr.Func.Ens.l.e 2.Graus:E<Iuc.Soci~dade HS:04 C:04


EL300 PsicologiA E<lucacional - Adol~scência HS:04 C:04
EL406 Paic.E<Iuc.Aprend.Apl.Ens. C. Biológicas HS:04 C:04
EL501 E<lucação Física Escolar I H$:04 C:04
EL502 Educação Física Escolar li HS:04 C:0-4
EL503 Educação Física Escolar IIl HS:06 C:06
EL0 50 Didática para o Ens. da Ed. Fis. Escolar HS:04 C:04
ELi85 Prát Ens.Educ.Fís.Est. Supervisionado 1 HS:08 C:08
EL895 Prát.Ens.E<!uc.Fis.Est. Supervisionado li HS:03 C:OB
MH504 Educação Física Escolar Especial HS:04 C:0·1
MHSOS Seminário de Monografia I - Licenciatura HS:02 C:02
MH506 Semin. de Monografia li - Licenciatura HS:04 C:04

Diuiplina$ Eletiva$

lO créditos dentre:
Qualquer disciplina oferecida pela UNICAMP

Fonte: Catálogo dos cursos de graduação


(UNICAMP, 1992, p.227-229)

24
TABELA 02:

Grade curricular do curso de graduação em Educação Física, modalidade


licenciatura, da UNESP (Rio Claro):
Fnrm:~l.'iit~ Geral SU 0/y
c~d /ll,.:.r'-'-'---"'f)""i~lin:!_l- - -- - ----------- ------~B ;Il harclado Liccnc!:liUf:l
Conhccinll~nlo Filo~ólir,•
3 hlosolia - X
D!mcnsOes Filosôricas da M()lricidaJc llumaJia - X
•: Filosofl:~ 1b Eúuc:~ç:io X
_ _ __;,.;,.__ _..;l,_t\lõ\lduç:'\o a T cM_i:~ ,;a Mo.!ric_i~l:ulc lll.'-'ll.!!ll.:.:.:ll"'l:l,___ _ _ __.:..._ _ _.:;__ __:..._ __ _,X~·---!2X,__ _
Con!lt~'1'rntq_0;t S•>ricd!!J~
Sociolo~ia X
D!.~~cnsõcs Sr...:i;~i~ da Molri<:id::dc I k11l:l.:~a
·. So,;iclo~ia da i:úucJ~;:io X
4 ; :!s:óri<l u.1 Euul':t\':'o Fi:;t..:a. Espm te c D:w;a
_____..;___ .J..LiL!{!Ci.éu!.:.;_!.;.~I~J.f_:l!:'i'bdi!:::!:;: kira :.._ _ _...;____..:.~----=----.:;_ ___:.____,x~·---
Conlwc·i:nc::Jo úo S~:r l! un.l!!.ill!
!3.o!o)!in - X X
3 :'.n::tom!a lll:man:a Geral X X
.,' :\n:~lomi:~ Jo Sislc:n:a Ncuromotor X X
, .s :ol<'1~ia liumana Gera l X X
Fi::ioiogia Jos Si:-tcm:>.s llumanos X X
lbsc:; :--.;.:t~ril:isiolôgicns da Molri.:iuadc llumaua X X
CJ•ncnsik.s Fisiológic:~s Ja MotnciJ::dc llumana X
·' P~;:t:~logia X
!)i:::c·;.:...),•s P.si..:olôgi,·as d;.~ 1\·lolrit:idaJc llunwna X
-· :': :.:v!vgi.l d.l Fdltl'<l\';\,1 >:
;~,,;~,•lo:ti:l
dv D...-scnvolviulC"IIIO X
_ ___.o..f____ D..;,~t;.~)].;_tji:l çJ!J.::,t·nl:g.h,t.QI::lll_o__ ..;:.,_~_ _;:__. X
r("nl!ç_~i_!!.l..~n<o TC:-g)jco
...
lti!~c..!uç:~o a Educoçào (!O Movimento - X X
Ali\'JJ:l:.ks Físic:ls c Exercícios Btssicos X X
:\ltviêaJcs Rt!m!c:~s c Dança X X
:\ti·vidndcs ::xprc->sivn:\ \'
·' X
:'co :i:! c Pr;!tica do ConJi..:ionamcnlu FÍ$Íl:O X X
:\j'lr~ndizaccm c Conlolc Motor X X
Cmcsiolo!tia X X

... An:\!isc Btomcc;inica do Movimento


Administt::\·::o em Euuc<~ç;\o Fisi..:a c Espm1c
X
X
' ;{
í:d:JC::lç;lo Físir:a t\d:lpl:Jd:l X
Educ!!.Ç~to em Saútlc X X
Socorros Jc Urgência X X
Es!at!stica X X
PrcgrNTI:!S de Ativi©úc Flsica (inclui csl:lg:o) X
""'!:lU.1<1:lmcntos de Ath:Lismo, Gin:istica Místicn, GRD, Capoeir:~,
N:1::<ç~o c J udo. (,.. E$CO Ih :a quatro). X X
" Fuml:;;;~cnlos de Andcbol. 13:lsquctchol, Futebol c Futebol de Sal:\n,
Voleibol. (• E$cOlti:l du:as) X X
)\lélol!os c Tccnícas de Pesquisa .:m Molricidadc Iluman:J- X X
;,,.l',!ai:::; c i\\':dia~·;1o cntl\lotricid::tlc llumana X X
EJuc:~ç:lo Prc-E$colõ:r c Ensino B.isico- X
Educaçi!o Física lnf:~ntil X
Didálica d:1 Educaçilo Física - X
Proct~nas de Educaç:'\o Fisic:~
no I P c 2ij graus X
Estruíura c Funcionamento Jo Ew.;uo de lij c 2P Graus X

25
A:"lrCifund:uncnto de Conhccinu:nlus 20°/o

l .ir!:'llriulura
l1 Pr;'~:i\·a de En.~ino -
lO Tr.1b:llho de Fvm~atura

Qptatiy;1~
- P:!ç_l.:l!~ L;~Io ~:;;_f.1ulu: 2._J-<~m~j.~ll.il.:.Ls~~·~lh.~4..t'!\llllt' !l'l.l.oJ
D.::1..;as Fok lú ri~as-
.•
I
Dan,·as th: Sal:)o
;:st;:,!u:-1\v:>::·;a,:os cm,\prcnJiJ.ag~:nll' ColiiiiJic 1\·lutor
.; ~~~iudos 1\.\·::nç;:dos em i\h-1:1bolismo do Excrckiu
J·:sa1dos 1\.v;m!,:ados rm Fisiologia da MotlicidaJc llu111ana
hr r,1dt:\·.)v :\ Ci.::ll:i:ss da Ctnnput:•\·;i,l
-~ 1\ i l\ 1d:1d<:s Físicas para a Tcrct'lra Idade
0:·8ili'IÍJ~IÇôlo de Evcutos Esj)ortivos
Musculaç;Jo
4 TJcologia c Esporte- ~ -
4 Nutri\·ào c Ati,·idauc Física - X
Ln:roduç:1o ;\ Fisiol(lgÍô'l Expcrimculal B;isic.l X
Gi i:i!stic~ c D:uv,;a Acru bica - X
Din:1mica Social Oô\ Atividade Física -
!. E~tlld v s Av:lltÇóldus em Educ;:,·ào Fisica lnfautil - X
; .. 31ÓfÍ:l ,:a Fducnç~(l Bra:;ikira: Nov:Js AbtHdagcus X
Ti:H:i j10iim :\crolx'ctico X
t~ O\'il t\J~lfO!>Oiollia
d:1 Corporci..Ja,h: X
..; ,',,:p,Jstas. ~1oddliS c Estilvs de l:usino r111 Etl uca~·;io Fisil·a X
!:,hl.::J.,:.h> Espcl·ial X
., :\S[:l"'.·to ..; P~icoprdagógicos do Esporte hcobt - X

C.;:·>l ; :<·:·.:r::, tv::l!: B :~ c harc.lndo Cun<:cutraç:io em bporlcs 2')25 huraslaul:l.


· Bnch;\l'l'lado Cou•:cntra~·flo em A tiv idades Fisiras vrnaa Iit.adas 21/ IOhot asi;ntla.
Lic<~nçi:u~ora 291 O hor:1~/:wla.

Fonte: Revista Motriz


(BARROS, 1995, p.79 e 80)

26
TABELA 03:

d _ m Educação Física, modalidade


Grade curricular do curso de gra uaçao e
licenciatura, da USP:

São Disciplinas específicas do Curso de Ba-


charelado em Educação Física: • Dimensões Econômicas e Administrativas da
• Introdução ã Educação Física Educação Física
• Citologia e Histologia • Socorros de Urgência
• Bioquímica • Educação Física na Primeira Infância
• Anatomia Geral • Educação Física na Segunda Infância
• Anatomia do Aparelho Locomotor • Educação Física na Adolescência
• Fisiologia Geral • Educação Física Adaptada
• Crescimento e Desenvolvimento Humano • Educação Física na Idade Adulta
• Controle Motor • Educação Física na Idade Senil
• Biomecânica • Estágio Supervisionado em Educação Física
• Noções de Estatística • Monografia em Educação Física
• Noções é! e Economia
• Noções de Administração
• Fundarrientos de Psicologia
• Fundamentos de Saúde Pública
• Elementos de Informática e Computação
• Introdução à Pesquisa Científica
• Bioquímica da Atividade Motora
• Fisiologia da Atividade Motora
• Nutrição e Atividade Motora
• Aprendizagem Motora
• Medidas e Avaliação da Atividade Motora
• Dimensões Filosóficas da Educação Física
• Dimensões Antropológicas da Educação Física
• . Dimensões Históricas da Educação Física
• Dimensões Psicológicas da Educação Física
• Dimensões Sociológicas e Políticas da Edu-
r.ação Física

27
São Disciplinas específicas do Curso de Li-
enciatura em Educação Física:
• Introdução aos Estudos da Educação
• Psicologia da Educação
• Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1° e
2° Graus
• Didática
• Desenvolvimento Curricular em Educação
Física
• Processo Ensino-Aprendizagem em Educa-
ção Física
• Dimensões Filosóficas da Educação Física
Escolar
• Dimensões Antropológicas da Educação Fí-
sica Escolar
• Dimensões Históricas da Educação Física Es-
colar
• Dimensões Sociológicas e Políticas da Edu-
cacão Física Escolar
• Dimensões Econômicas e Administrativas da
Educação Física Escolar
• Medidas e Avaliação da Educação Física Es-
colar
• Educação Física na Pré-EsCola
• Educação Física no 12 Grau
• Educação Física no 2° Grau
• Educação Física Escolar Adaptada
• Prática de EnsiJ:lQ em Educação Física

Fonte: Manual de informações


(FUVEST, 1992, p.63 e 64)

28
Observando-se as tabelas I, 2 e 3 é possível confinnar nossas
expectativas acerca do predomínio das disciplinas de ordem biológica, Elas
representam a maioria do curso não só no número de disciplinas oferecidas,
como também na carga horária reservada a elas. A distribuição das disciplinas
básicas parece tentar abordar basicamente três ramos: o conhecimento
biológico do homem, o conhecimento de sua sociedade e o conhecimento
técnico específico. As disciplinas específicas da licenciatura se baseiam
principamente em aspectos pedagógicos e psicológicos, muitos desses tendo
aparecido também na formação básica.
O objetivo do presente trabalho é justamente realizar uma
discussão que tente observar, através das propostas curriculares dessas três
universidades paulistas, como estudos referentes aos significados culturais
estão, provavelmente, sendo pouco considerados na formação acadêmica em
Educação Física. Para isso, com base nas tabelas que apresentamos, referentes
às grades curriculares do curso de licenciatura em Educação Física dessas
universidades, iremos supor que somente as disciplinas concernentes à área de
humanas podem possuir tal função. Isto já restringe as possibilidades
consideravelmente, pois podemos observar que:
I -No caso da UNESP (Rio Claro) um máximo de 25 o/o do curso
(supondo que o aluno opte pelas disciplinas da área de humanidades em seus
créditos optativos) trata a Educação Física com um referencial humano.
2 - No caso da UNICAMP o valor é de aproximadamente 20%.
No entanto, se observarmos a quantidade de créditos fornecidos a essas
disciplinas sua contribuição cai para aproximadamente 17%.

29
3 -Finalmente no caso da USP, a quantidade de disciplinas que se
intitulam relacionadas à Educacação Física em uma abordagem de natureza
humana é de aproximadamente 17%.
Esses valores são, ao nosso ver, insuficientes para compor uma
formação com condições de se ater aos significados culturais das práticas
corporais próprios do meio em que o profissional da Educação Física irá atuar.
As interpretações do professor dificilmente vislumbrarão as representações
sociais presentes nos cotidianos de seus alunos e que, inevitavelmente, alteram
o ambiente das aulas. Resta ainda observar que esses valores representam o
número máximo de disciplinas que supomos poder lidar com tais questões,
ainda que saibamos que o simples fato de uma disciplina se caracterizar como
da área de humanas, não garante que seu conteúdo irá se ater às questões
culturais.
Ainda no tocante à distribuição das disciplinas por área do
conhecimento, é evidente a sobrecarga da área biológica, não só em quantidade
mas na expressão do discurso, como em BARROS (1995, p.75), que apresenta
um quadro de percentagens, fazendo referência à divisão do conhecimento
dentro da estrutura curricular da UNESP (Rio Claro):

minimu 00"/u

.; Cv·'·-· .; ..
i '··'•'-'-····'-·'• .
,~ ... o Filc..;0íico
J, ............................
7'X
" Al~.:ndcr o intcre~sc dn aluno, uiticar
; (_\wi~..:,imcnto da SucicJ;~dt.• ....................... 7% c pmjctur o mcrc;~Uo de trabalho
l Cü:::;ccimc:-::u do Sei Humano .................. 2ó%
' '-',:;J•:.c.~i::J.::n~r; TCC!1kO ............................. 60%

·-·---------· -------------------
Fonte: Revista Motriz- junbo de 1995, p.75.

30
Neste quadro aparece uma interessante classificação que pode dar
indícios sobre as concepções que se fazem presentes na formação acadêmica.
Disciplinas pertinentes à área das ciências biológicas ou da psicologia são
classificadas como de "Conhecimento do ser humano", enquanto que as que se
referem às disciplinas das ciências humanas são tratadas como de
"Conhecimento da sociedade". O homem aparece portanto como algo diferente
de sua sociedade, de sua cultura.
Ainda sobre os dados desse quadro, observamos que apenas 7%
da formação geral corresponde ao "conhecimento da sociedade". Como é
possível então, um licenciado possuir "(... ) um profundo conhecimento das
funções sociais da escola, sua história, problemas e perspectivas na sociedade
brasileira( ... )"? Como propõe o autor (BARROS, 1995, p.71).
Nessa estrutura, parece existir uma procura por certo pluralismo
de conhecimentos. Há uma distribuição dos conteúdos entre aspectos
biológicos, psicológicos, técnicos, pedagógicos, filosóficos, históricos, sociais,
antropológicos e outros. Tal preocupação, no caso da licenciatura, se manifesta
no receio que certos autores possuem em que a Educação Física se configure
somente como um instrumento da Educação, o que não justificaria sua posição
no ensino superior (OLIVEIRA, 1986, p.l9-20).
É possível considerar, no entanto que esta estrutura se refira mais
a paradigmas de aptidão física e valores higiênicos do que a processos
educacionais e sociais ou a um discurso eclético, fruto de uma inevitável
interdisciplinaridade. O número de disciplinas de referencial biológico é
superior ao de disciplinas de ordem humana e o enfoque dado aos temas da

31
área, na maioria das vezes acaba sendo próprio de um profissional da saúde,
tomando-se difícil urna capacitação para lidar com questões sociais presentes
no cotidiano de sua atuação. A visão que o professor possuirá de seu trabalho
provavelmente estará mais atrelada ao caráter biológico ou higiênico e,
portanto, seus esforços serão no sentido da promoção destes.
De urna maneira mais conclusiva, podemos dizer que, o que essas
grades nos apresentam é um conjunto exagerado de disciplinas, oriundas de
diversas áreas do conhecimento, com pequena relação entre os assuntos e
carregada de aspectos psico-biológicos. Esta variedade exacerbada vem a
contribuir para um grave problema da área, que merece muita atenção: a
dificuldade de definição do objeto de estudo da Educação Física. É nesse
sentido que afirma LOVISOLO (I 992, p.39):

De fato, este é um problema sério da formação, as


disciplinas podem ser entendidas como compartimentos
sem graus de intercomunicação. O curriculo pode então,
com bastante razão, ser entendido como justaposição de
fragmentos ou como um mosaico de disciplinas.

As pesquisa em Educação Física, por sua vez, em muitos casos se


aproximam mais de estudos pertinentes à psicologia, fisiologia, histologia ou
enfim, não se constituem como especificamente concernentes à Educação
Física. Não se trata de desmerecer tais estudos, nem sequer considerá-los
alheios ao campo da Educação Física. Em ciência, a contribuição de outras
áreas quase sempre abre novos horizontes que muitas vezes podem ser
incorporados proveitosamente pelo conhecimento da área em questão. O

32
cuidado é para que haja, obviamente, um conhecimento científico próprio da
Educação Física.
Em nossa opinião, os estudos dos significados culturais que
carregam as práticas corporais, constituem-se como um objeto de estudo
próprio e extremamente relevante à area da Educação Física. Através de
estudos dessa ordem o professor pode encontrar infonnações muito pertinentes
à sua realidade, o que lhe permite mapear o sentido conferido pelo seu grupo de
alunos e pela sociedade como um todo acerca dos temas da Educação Física.
Assim sendo, tal referencial não pode ser deixado em segundo plano na
formação profissional em Educação Física. Como aponta LARAIA (1993.
p.70):

O modo de ver o mundo, as apreciações de ordem moral


e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e
mesmo as posturas corporais são produtos de uma
herança cultural, ou seja, o resultado da operação de
uma determinada cultura.

Assim, não existe o conhecimento do homem sem o conhecimento


da sociedade ou o inverso. Não existe escola sem influências sacias. Não
existem alunos sem expectativas culturais. Não existirá, por fim, a paciência de
se suportar uma Educação Física que trata de um assunto tão próximo dos
alunos, de uma maneira tão distante.

33
CONCLUSÕES

No sentido de realizar uma discussão sobre a importãncia dos


valores culturais nas aulas de Educação Física e se esta importãncia esta sendo
considerada na formação acadêmica dos profissionais da área, este trabalho
buscou caracterizar tais valores e analisar as propostas curriculares para o
curso de graduação em Educação Física, modalidade licenciatura, de três
universidades paulistas: UNICAMP, UNESP (Rio Claro) e USP.
Partindo de nosso referencial teórico próprio das ciências
humanas, mais especificamente da Antropologia Social, buscamos observar os
valores que provavelmente compõem as representações dos alunos acerca de
temas ligados ao corpo e às práticas corporais. A partir disso, pudemos sugerir
que padrões de comportamento podem ser modelados à partir de tais
representações, fazendo com que a conduta dos alunos assuma um certo
sentido lógico dentro de seu grupo, sentido este, que lhe propicia a transmissão
de determinada imagem pública.
Parece-nos inevitável portanto, que o professor de Educação
Física se depare com situações onde o ambiente da aula se transforme ou se
modele de acordo com uma adequação do grupo a esses valores que habitam
suas representações. É nesse sentido que julgamos o conhecimento e
tratamento consciente de tais valores como uma condição básica para a atuação
candente e contextual do professor de Educação Física.

34
Os tratamentos conferidos pelos alunos a determinadas atividades
propostas podem estar distantes de urna reflexão sobre ela, baseando-se, por
exemplo, em preconceitos ou condutas que se preocupem em não se desviar do
padrão de comportamento incentivado pelo grupo. A condição consciente do
professor acerca desses valores e de sua expressão na ação e representação do
aluno, pode contribuir portanto para um tratamento mais reflexivo dos temas
envolvidos com a aula, propiciando ao grupo e ao indivíduo possibilidades de
reavaliação de seus conceitos e condutas.
Isso posto, resta-nos saber que importãncia a formação acadêmica
em Educação Física reserva ao tratamento de assuntos dessa ordem. Deve, ou
deveria ser, de domínio do professor urna análise de tal realidade a fun que seja
possível urna intervenção consciente na prática educativa. Pensamos que tal
referência! possa estar presente em disciplinas do ramo das ciências humanas
devido à própria natureza das questões envolvidas. No entanto, vale ressalvar
que o fato de urna disciplina fazer parte do ramo das humanas, não garante que
ela abordará assuntos pertinentes às representações sociais em aulas de
Educação Física.
O que pudemos observar nas propostas curriculares das citadas
universidades foi um predomínio das disciplinas de natureza biológica, com
uma carga horária bastante superior que a reservada para disciplinas da área de
humanas. Isto nos leva a crer que o profissional terá urna formação que se
atenha mais a questões técnicas ou relacionadas com o universo do
conhecimento biológico.

35
Não obstante a validade da formação técnica e dos conceitos de
biologia humana, pensamos que o licenciado poderia estar recebendo uma
formação mais pertinente ao seu universo de trabalho que é a escola. Isso
provavehnente lhe aproximaria mais do fenômeno humano, fornecendo-lhe
condições de uma atuação possivelmente menos anacrônica e mais consciente.
Este trabalho será ampliado futuramente pois faz parte de uma
pesquisa, sob o mesmo título, para o Programa Institucional de Bolsas de
Iniciação Científica do CNPq.

36
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, J. M. C. "Educação Física na Unesp de Rio Claro: bacharelado e


Iicenciatura".In: Revista Motriz, n° I, 1995, vol.l, pp.?l-80.

BETII, M. Educação Física e sociedade. São Paulo, Movimento, 1991.

CARDOSO, J. L. "Noções de corporeidade: de quem e para quem"? In:


Revista Motrivivência -Pesquisa, n° 5,6,7, 1994, pp.I?0-177.

COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino em Educação Física. São


Paulo, Cortez, 1992.

DAOLIO, J. "Educação física escolar: uma abordagem cultural". In:


PICCOLO, V. L. N. Educação física escolar: ser ... ou não ter? Campinas,
Unicamp, 1993.

_ _ _ _ .Da cultura do corpo. Campinas, Papirus, 1995.

FUVEST. Manual de informações. São Paulo, 1992.

GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro, Guanabara


Koogan, 1989.

37
LARAIA, R. B. Cultura: um conceito antropológico. 2° ed. Rio de Janeiro,
Zahar, 1993.

LOVISOLO, H. "Educação física como arte da mediação" In: Contexto e


educação, n° 29, Unijuí, 1992.

OLIVEIRA, J. G. M. Preparação profissional em educação física e em


esporte. São Paulo, 1986 (texto mimeografado).

TOJAL, J. B. Currículo de graduação em educação física - a busca de um


modelo. Campinas, Unicamp, 1989.

UNICAMP. Catálogo dos cursos de graduação. Campinas, 1992.

38

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