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SANTOS À CONTRAPELO

Aula aberta
1 ) Contrapelo
Sobre o conceito de história, Walter Benjamin, 1940

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Pensa na escuridão e no grande frio
Que reinam nesse vale, onde soam lamentos.
Brecht, Ópera dos três vinténs

Fustel de Coulanges recomenda ao historiador interessado em ressuscitar uma época que esqueça tudo o que
sabe sobre fases posteriores da história. Impossível caracterizar melhor o método com o qual rompeu o
materialismo histórico. Esse método é o da empatia. Sua origem é a inércia do coração, a acedia, que
desespera de apropriar-se da verdadeira imagem histórica, em seu relampejar fugaz. Para os teólogos
medievais, a acedia era o primeiro fundamento da tristeza. Flaubert, que a conhecia, escreveu: "Peu de gens
devineront combien il a fallu être triste pour ressusciter Carthage" [“Pouca gente entende como é preciso
estar triste para ressuscitar Cartago”.]. A natureza dessa tristeza se tornará mais clara se nos perguntarmos
com quem o investigador historicista estabelece uma relação de empatia. A resposta é inequívoca: com o
vencedor. Ora, os que num momento dado dominam são os herdeiros de todos os que venceram antes. A
empatia com o vencedor beneficia sempre, portanto, esses dominadores. Isso diz tudo para o materialista
histórico. Todos os que até hoje venceram participam do cortejo triunfal, em que os dominadores de hoje
espezinham os corpos dos que estão prostrados no chão. Os despojos são carregados no cortejo, como de
praxe. Esses despojos são o que chamamos bens culturais. O materialista histórico os contempla com
distanciamento. Pois todos os bens culturais que ele vê têm uma origem sobre a qual ele não pode refletir sem
horror. Devem sua existência não somente ao esforço dos grandes gênios que os criaram, como à corvéia
anônima dos seus contemporâneos. Nunca houve um monumento da cultura que não fosse também um
monumento da barbárie. E, assim como a cultura não é isenta de barbárie, não o é, tampouco, o processo de
transmissão da cultura. Por isso, na medida do possível, o materialista histórico se desvia dela. Considera sua
tarefa escovar a história a contrapelo.

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A tradição dos oprimidos nos ensina que o "estado de exceção" em que vivemos é na verdade a regra geral.
Precisamos construir um conceito de história que corresponda a essa verdade. Nesse momento, perceberemos
que nossa tarefa é originar um verdadeiro estado de exceção; com isso, nossa posição ficará mais forte na luta
contra o fascismo. Este se beneficia da circunstância de que seus adversários o enfrentam em nome do
progresso, considerado como uma norma histórica. O assombro com o fato de que os episódios que vivemos
no século XX "ainda" sejam possíveis, não é um assombro filosófico. Ele não gera nenhum conhecimento, a
não ser o conhecimento de que a concepção de história da qual emana semelhante assombro é insustentável.

Contra o pessimismo de Benjamim


Kracauer, O ornamento da massa, p. 280.

Carlo Ginzburg
O Fio e os rastros:
p.11

Estranhamento e distância (ver também Olhos de Madeira)


p.238 e p. 244

Relações de força (pp. 43 e 47)

“Contrapelo”, “estranhamento”, “distância” e “relações de força” fazem partede um conjunto de expressões


nada herméticas, fechadas em si mesmas, que tenho usado para as pesquisas sobre História e Literatura. Entre
elas acrescento “espessura” (Luiz Costa Lima), “movimento do cavalo” (Carlo Ginsburg), “espellhos”, etc.

“A forma geográfica ao menos sugere…” de Franco Moretti, toda uma aproximação aos temas que podem ser
reunidas como procedimentos ensaísticos.

Benjamin e Kracauer em Marselha (p. 237), o ponto de vista portuário, um panópio, não de controle, mas sim
de observação.

2) Um ato falho
Centralidade de Navios Iluminados em minha pesquisa
Busca pelo que só a Literatura diz, o sabor do Macuco; Perspectiva de dentro do incêndio na Vila Socó de
Marcelo Ariel; o cemitério do Paquetá em Alberto Martins.

Da identidade à ambiência
Geografia da Estiva
Guinada subjetiva sem dominar a dissertação (conclusão que nega gênero literário próprio)
Crítica à identidade
Ambiência Gumbrecht e Mishima

Beatriz Sarlo
Perspectiva para além da experiência, La Razón Blindada
Vila Socó como um emorial

Eagleton Benjamim
Nova leitura após o livro
Corpo do trabalhador
Antepassados e Netos

Apresentação do curso

Da identidade à ambiência: as leituras que me formaram


A partir de uma crítica à sua própria pesquisa – o uso da Literatura como fonte histórica – Atanes fará uma
exposição de suas influências, autores e autoras que marcaram suas leituras, uma trajetória afetivo-intelectual
que reúne nomes como Carlo Ginzburg, Beatriz Sarlo, Franco Moretti, Luiz Costa Lima, além da produção
ensaística de ficcionistas como Jorge Luis Borges, Italo Calvino e Marguerite Yourcenar, entre outros.

Bibliografia discutida:

A geografia da estiva, monografia da especialização em História e Historiografia; dissertação de mestrado


História e Literatura a partir do Porto de Santos: o romance de identidade portuária Navios
Iluminados; e o livro Esquinas do Mundo: Ensaios sobre História e Literatura a partir do Porto de
Santos.

Primeira aula (29/4)

De Barcelona Brasileira a Dubai do Brejo: uma conversa sobre toponímia ideológica

“Barcelona Brasileira”, “Cidade Vermelha”, “Moscouzinha Brasileira”. Mais do que categorias fixas, esses
epítetos ideológicos da cidade de Santos serão mostrados como bandeiras usadas tanto pelo movimento
operário quanto pela opressão policial ou pela imprensa de acordo com as circunstâncias e contextos da luta
operária na cidade. Pensando nas mudanças ideológicas pelas quais passou a cidade, lembraremos também de
alguns novos nomes como Miami Brasileira e Dubai do Brejo.

Bibliografia discutida
História:
TAVARES, Rodrigo Rodrigues. A “Moscouzinha” Brasileira. Cenários e Personagens do Cotidiano
Operário de Santos (1930-1954). São Paulo: Humanitas, 2007.
TAVARES, Rodrigo Rodrigues. O Porto Vermelho: A maré revolucionária. Inventário DEOPS. Módulo
6. Porto Vermelho. São Paulo: Imprensa Oficial, 2001.
SILVA, Fernando Teixeira. Operários sem patrões: Os trabalhadores da cidade de Santos no
Entreguerras. Campinas: Editora da Unicamp, 2006.
DIEGUEZ, Carla. Trabalho à deriva. Privatização e Cultura do Trabalho no Porto de Santos. São
Paulo: Annablume, 2016.
CORVO, Luiz Rodrigues. Lembrança de seis greves gerais (1960-1964). Santos: Realejo, 2021.
FARIA, Luiz Henrique Portela; PEREIRA, Maria Apparecida Franco. Santos na modernidade capitalista
(1870-1930): novas abordagens e releituras de velhas fontes. São Paulo: Manuscrito, 2019.
BULCÃO, Clóvis. Os Guinle: a história de uma dinastia. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2015.

Segunda aula (6/5)

Imigração e urbanização: as relações de força dentro da cidade

A partir das informações demográficas do censo de 1913, a aula terá como tema os registros literários e
historiográficos sobre as transformações urbanas, imigração e relatos de viajantes sobre a cidade de Santos.
Bibliografia discutida:
FARIA, Luiz Henrique Portela; PEREIRA, Maria Apparecida Franco. Santos na modernidade capitalista
(1870-1930): novas abordagens e releituras de velhas fontes. São Paulo: Manuscrito, 2019.
TAVARES, Rodrigo Rodrigues. A “Moscouzinha” Brasileira. Cenários e Personagens do Cotidiano
Operário de Santos (1930-1954). São Paulo: Humanitas, 2007.
VALENTE, Heloísa A. Duarte. Canção d’Além-Mar: o fado e a cidade de Santos. Santos: Realejo, 2008.
KIPLING, Rudyard. As Crônicas do Brasil. Edição bilíngue. Tradução Luciana Salgado. São Paulo:
Landmark, 2006.
CÁNOVAS, Maria Dalva Kalumann. Santos e imigração na Belle Époque. São Paulo: Edusp, 2017.
EDSON, Paulo (organização, introdução e notas) O corsário de Ilhabela. O manuscrito do corsário
Thomas Cavendish que em 1591 se refugiou em Ilhabela e saqueou a vila de Santos. Tradução de Paulo
Edson e John Milton. Itu: Ottoni, 2008.
KNIVET, Anthony. As incríveis aventuras e estranhos infortúnios de Anthony Knivet. Memórias de um
aventureira inglês que em 1591 saiu de seu país com o pirata Thomas Cavendish e foi abandonado no
Brasil, entre índios canibais e colonos selvagens. Organização, introdução e notas de Sheila Moura Hue.
Tradução de Vivien Kogut Lessa de Sá. Mapas de Teodoro Sampaio. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,
2007.
HUE, Sheila / SÁ, Vivien Kogut Lessa de. Ingleses no Brasil - Relatos de viagem (1526-1608). São Paulo:
Chão, 2020.
HUE, Sheila Moura. Primeiras cartas do Brasil, 1551-1555. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006.

Terceira aula (13/5)

Personagens a contrapelo: Braz Cubas, Vicente de Carvalho, Saturnino de Brito e Patrícia Galvão

Neste encontro, a ideia é polemizar o senso comum sobre essas figuras históricas: Braz Cubas será lido a
partir de um texto de jornal sobre a inauguração da estátua em sua homenagem em 1908; Vicente de
Carvalho, por sua vez, não será tratado como “poeta do mar”, mas como “cineasta” e agente político da
cidade; Saturnino de Brito, o herói do saneamento, será lido como o engenheiro que requisitou ao governo do
Estado intervenção na cidade para impor sua planta arquitetônica ao município; Patrícia Galvão, lembrada
usualmente como musa do Modernismo, será apresentada como escritora e crítica cultural.

Bibliografia comentada:
RUEDA, Waldir. Braz Cubas: homenagem a uma vida. São Paulo: Comunicar, 2007.
COSTA, Márcia. De Pagu a Patrícia: o último ato. São Paulo: Dobra, 2012.
PEREIRA, Odair José. Não somos bandidos: a história da Escola de Samba X-9 (1944-1954). Santos:
Ateliê de Palavras, 2016.
BERNARDINI, Sidney Piochi. Os Planos da Cidade: as políticas de intervenção urbana em Santos - de
Estavan Fuertes a Saturnino de Brito (1892-1910). São Paulo: Rima, 2006.
MOTA, Rafael. Tarquínio: Começar de Novo. Santos: Leopoldianum, 2012.
GONÇALVES, Adelto. O reino, a colônia e o poder. O governo Lorena na Capitânia de São Paulo 1788-
1797. São Paulo: Imprensa Oficial, 2021
Quarta aula (20/5)

Conclusão: novos problemas, novos temas, novas abordagens

Na conclusão, um leque de novas pesquisas que apontam para temas, alguns até conhecidos, mas pouco
estudados da cidade de Santos.

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