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TABHAIRT ISTEACH GO

MISTEACH CEILTEACH
(Introdução à Mística Celta)

Imagem por João Eduardo Schleich Uberti (VI EBDRC)

Ávillys mac Morrigan, Mundi Tempus


~2020~
AGRADECIMENTOS

Agradecimentos especiais vão para Rowena


A. Seneween, pela parceria e pelo apoio. Ao grupo
Fidnemed an Síd que possibilitou uma conclusão
mais profunda e intensa desse trabalho com
grandiosíssimas contribuições. Ao Bellouesus
Isarnos, pelos materiais e dúvidas solucionadas. E a
João Eduardo Schleich Uberti que através de sua
palestra no VI EBDRC (2015) me encantou com o
estudo da Mística Celta; encanto esse que culminou
na presente apostila. Também agradeço a toda
comunidade céltica brasileira que, em reuniões e
saudáveis discussões, contribuem constantemente
para novas reflexões e aprofundamentos sobre a
Mística Celta.
Igual agradecimento faço ao Leanaí an
Ghealach Clann, pelo apoio e credibilidade sempre
prestados a mim, e grupo a quem dedico a presente
apostila.

~1~
O AUTOR

Ávillys mac Morrigan, Mundi Tempus


(outrora Ávillys d’Avalon) é druidista desde
2010, cofundador, druida e sumo sacerdote do
Leanaí an Ghealach Clann em Juiz de Fora / MG,
residente da mesma cidade, e apaixonado com a
mística e cultura celta. Estuda e pratica o
Paganismo desde 2004 tendo sido introduzido à
Wicca pela bruxa e escritora Ligia Amaral Lima.
Socialmente é acadêmico e professor, formado
em Antropologia (Ciências Sociais) pela
Universidade Federal de Juiz de Fora e,
atualmente, doutorando em Ciência da Religião
pela mesma instituição. Autor da página no
Facebook Mundi Tempus, e coautor do blog
institucional do Leanaí an Ghealach Clann -
Antecâmara
foto por Rosane Bianco

~2~
SUMÁRIO

Tabhairt Isteach go Misteach Ceilteach


Introdução à Mística Celta
Introdução .................................................................................................................................... 4
Druidismo...................................................................................................................................... 6
Druidismo Moderno .................................................................................................................. 6
Reconstrucionismo Céltico ......................................................................................................... 14

Parte I: Cosmologia Celta ........................................................................................................ 16


Parte II: O Sagrado Três ........................................................................................................... 19
Parte III: Os Três Reinos........................................................................................................... 21
Parte IV: Os Três Elementos e a Awen .................................................................................... 24
Os Três Raios de Luz ............................................................................................................ 25
Parte V: Os Três Povos ............................................................................................................ 28
Os ancestrais ....................................................................................................................... 28
Os sídhe ............................................................................................................................... 30
Os Deuses ............................................................................................................................ 32
Parte VI: Os Caldeirões da Poesia............................................................................................ 34
Parte VII: Os Dúile.................................................................................................................... 40
Parte VIII: As Quatro Joias dos Tuatha dé Danann.................................................................. 42
Parte IX: Ogham ...................................................................................................................... 45
A Janela de Fionn ................................................................................................................ 53
Parte X: Os doze ventos........................................................................................................... 62
Parte XI: A Roda do Ano .......................................................................................................... 64
Parte XII: A Máxima dos Fianna............................................................................................... 67
Parte XIII: As Instruções de Cormac ........................................................................................ 69
Parte XIV: As Nove Virtudes Sagradas ..................................................................................... 73

Considerações finais ................................................................................................................... 77


Biografia ...................................................................................................................................... 78

~3~
INTRODUÇÃO

A presente apostila, escrita pelo druidista Ávillys d’Avalon, Mundi Tempus, visa
trazer alguns estudos e observação a respeito da Mística Celta de maneira introdutória e
linear. Sua real intenção é fomentar e facilitar o estudo da Mística Cela entre os druidistas,
reconstrucionistas celtas e amantes dessa cultura e religiosidade.
O conceito de Mística é um tanto abrangente e muitas vezes nos faz olhar
pejorativamente a seu real significado. De acordo com Frei Vitório Mazzuco,

o termo mística, como substantivo, provém do adjetivo mistikós, derivados do


verbo múein que quer dizer: fechar os olhos e a boca. Olhos fechados para
enxergar somente o segredo, e a boca para não se revelar, a não ser no
momento ou à pessoa certa.
Deste verbo grego, múein, deriva o substantivo “mistério”, que
designa, no sentido helenístico: o rito religioso secreto de iniciação que coloca
em contato o ser humano com a divindade. (2013)

É esse conceito de “mistério”, de “fascínio” que essa apostila retoma. A Mística


como ponto de conexão entre o homem e o sagrado, como caminho para a iluminação,
em nosso caso, para alcançar Awen.
Muitas vezes nos perdemos da mística das coisas que chamamos de sagradas, e
seu estudo fica relegado a uns poucos teóricos que, muitas vezes, não passam disso. Essa
herança de origem historicamente cristã precisa ser rompida. O místico tem de ser visto
não como um teólogo, nem como um hippie ou newager, ele precisa ser entendido como
um buscador e um caminhante; um caminhante que busca alcança o sagrado e a
compreensão do sagrado manifestada em seu caminho religioso.
A cultura e religiosidade celtas são ricas em elementos místicos e totalmente
envolta em brumas. Vejo aí elementos mais do que entusiasmantes para que se desbrave
esse desconhecido mar. Muito pouco nos foi deixado pelas trilhas da história. No entanto,
esse pouco nos permite içar velas, preparar os remos e iniciar nossa jornada até a
compreensão do sagrado, até Awen.
O presente estudo não tem pretensões acadêmicas, muito menos de se tornar
verdade religiosa absoluta. É esperado e desejoso que críticas e reconstruções desse
estudo sejam feitas, pois acredito que o diálogo e a renovação constante são pontos
fundamentais no estudo da Mística, qualquer que ela seja. Concomitante, ele se
caracteriza por um estudo introdutório, com textos resumindo a compreensão mística do
autor sobre cada tema trabalhado. O convite ao leitor é que ele aprofunde e pesquise mais
e mais sobre a Mística, seguindo-a como uma forma teórica e experiencial de jornada ao
mágico, ao sagrado.
O estudo, então, está dividido em “partes”, cada uma representando, na concepção
do autor, um elemento místico, ou um círculo místico, sobre o qual deve-se buscar
aprofundamentos. Aqui se apresenta uma jornada introdutória à profundidade da Mística
Celta, de maneira em que, se o leitor embarcar nessa jornada, poderá ir trabalhando parte
por parte desse estudo, se aprofundando até alcançar a compreensão teórica e prática de
cada parte, entendendo, por fim, a completude dos elementos sagrados da cultura celta e
praticando sua religiosidade de maneira mais profunda e íntima.
Aqui entendemos que a Mística é também um processo de iniciação (fugindo
completamente dos processos sociais de iniciação religiosa ou a um grupo, mas que

~4~
também deveria estar embutida neles), e, nesse sentido, ela deve ser vivida
individualmente e atuará em cada um de maneira específica, em uma jornada coletiva ao
mesmo tempo que pessoal para o sagrado. Nesse ponto, é fundamental dizer que a Mística
jamais seria um estudo meramente teórico. Na medida em que ela desbrava os campos da
compreensão do sagrado, ela modifica o olhar do místico e concomitantemente o mundo
em que ele vive. Uma nova realidade, uma nova verdade se abrem aos olhos do místico,
tão profundamente que o transforma por completo, modificando suas ações, pensamentos
e atuações no mundo. A Mística, portanto, possibilita um novo trato com o sagrado e uma
compreensão mais limpa da sacralidade e magia desse mundo e de nossa íntima conexão
com ele.
Por fim, tornamos a ressaltar, esse estudo é o resumo de um estudo pessoal do
próprio autor, muitos elementos podem ter mais de uma interpretação e talvez o leitor –
ou outros místicos e estudiosos – o veja de forma diferente. Isso é plausível e belo, as
brumas que envolvem a cultura celta e sua religiosidade nos possibilita pegar caminhos
diferentes rumo a sua essência. Não hesite em refletir, modificar ou reformular os estudos.
Todavia, faça-o de maneira coerente. Navegar pelos embrumados mares celtas requer
cuidado, coerência, estudo e dedicação; mas pode ser uma jornada reveladora, incrível e
sem igual.

~5~
DRUIDISMO
O que é Druidismo?
O texto a seguir é uma reprodução autorizada pela autora do site
“Templo de Avalon”1.

Texto por Rowena A. Seneween.

“O Druidismo é uma religião natural da terra.” (Philip Carr-Gomm – OBOD)

O Druidismo é um caminho espiritual centrado na força da terra, que honra os


espíritos da natureza, seus ancestrais, os Deuses celtas e que respeita todas as criaturas
viventes.
A palavra druida é de origem céltica e, segundo o historiador romano Plínio, o
Antigo - está relacionada a força do carvalho, considerada uma árvore sagrada. Os druidas
foram membros de uma elevada ascendência celta. Ocupavam os trabalhos de juízes,
sacerdotes, adivinhos, magos, médicos, matemáticos, astrônomos, alquimistas, etc.
Dominavam quase todas as áreas das ciências exatas, como a matemática, a
música, a poesia, além de notáveis conhecimentos da medicina natural, fitoterapia e
agricultura. Embora possuíssem uma forma de escrita conhecida pelo nome de Ogham,
muito parecida com a escrita rúnica, não a usavam para gravar seus conhecimentos.
Após o domínio do cristianismo muitas informações históricas da cultura celta se
perderam, exceto aquilo que permaneceu guardado nos registros dos antigos historiadores
greco-romanos.
Por isto, muito da história dos Druidas até hoje é um mistério para os
pesquisadores oficiais; sabe-se que eles realmente existiram entre os povos Celtas como
seus sacerdotes, mas que não nasceram nesta civilização.
As fontes de pesquisa do Druidismo são praticamente as mesmas dos Celtas [as
mesmas do Reconstrucinismo Celta], com um pouco mais de restrições, pois não
encontramos druidas em todas as sociedades celtas, ou seja, somente em textos medievais,
de origem por vezes meramente mitológica, com dados de arqueologia e relatos romanos.
Esse estudo se inicia com a tradução de alguns textos acadêmicos de estudiosos
renomados a respeito do Druidismo e da história nos dias atuais, não pretendemos
concluir, mas fornecer informações a respeito dessa tão específica casta druídica.
Os Druidas mostram-nos que sempre podemos rever o passado para melhor
aprender o presente. Empenhemo-nos, então, neste maravilhoso mundo da pesquisa
etimológica e histórica.

Druidismo Moderno
O texto a seguir é uma reprodução autorizada pelo autor do site
“Nove Poderes – Estudos Célticos e Druidismo”2. O mesmo texto foi

1
Retirando na íntegra de Seneween, Rowena A. Druidismo IN Templo de Avalon [S. I.]. Disponível em:
<http://www.templodeavalon.com/modules/mastop_publish/?tac=Druidismo>, acessado em 01/05/2016.
Com notas do autor.
2
Retirado na íntegra de Mawr, Llewellyn. Druidismo Moderno – Parte I IN Nove Poderes – Estudos
Célticos e Druidismo [S. I.] Disponível em: <https://novepoderes.blogspot.com/2020/03/o-druidismo-
moderno-parte-i.html>. & Druidismo Moderno - Parte II IN Nove Poderes – Estudos Célticos e

~6~
publicado nas edições 1 e 2 da Ophiusa a revista da internacional Ordem
de Bardos, Ovates e Druidas (OBOD)3.

Texto por Llewellyn Mawr fab Blodeuwedd

PARTE I:
A partir do momento que o tipo celta de sociedade desapareceu, era normal
que o Druidismo desaparecesse, uma vez que já não podia ser experimentado
como uma religião. Restaram os princípios do druidismo. Mas será que tudo
se foi? Certamente que não. Daí a busca apaixonada do Druidismo Moderno,
qual seja a sua forma, para tentar encontrar o que foi o pensamento druídico,
o que foi o ritual druida. (Jean Markale, 1987)

O Druidismo Moderno é um constructo simbólico-religioso, cultural, filosófico,


social e histórico do mundo contemporâneo ou pós-moderno. Essa construção foi e é
creditada, feita e exercida por pessoas de diversas origens, olhares e valores estéticos que
se identificam em seu dia-a-dia com os horizontes e possibilidades inseridas nos
conhecimentos, saberes e fazeres célticos, tradicionais e/ou ressignificados. Há de se tecer
este comentário antes de começarmos aqui qualquer ponderação relevante.
Etimologicamente, a origem do termo Druidismo vem do seu uso atual para
denominar práticas e sistemas de crenças fundamentadas na histórica, cultura e valores
das populações celtas. A definição surgiu em estudos ingleses do século XVIII, período
que se especula o renascimento moderno da religião druídica. Nem sequer sabemos como
os Keltoi denominavam sua religião tradicional, e mesmo a palavra Druida fora
empregada na sua forma primeira por gregos e romanos que ficaram espantados em
descobrir que entre aqueles que consideravam “bárbaros” havia um grupo de filósofos
naturais. Dentre os autores clássicos estão Júlio César, Tácito, Plinio, o velho, Estrabão,
Possidônio, Diodoro, Heródoto, dentre outros. Hoje, estudos antropológicos e
arqueológicos nos revelam as diferenças consideráveis entre os povos celtas, o que nos
informa que não deviam manter uma atividade religiosa congênere por todo o extenso
território que ocupavam no continente europeu, da Áustria à Irlanda.
Ao acrescentar a palavra Moderno para complementar o seu significado, os
praticantes e estudiosos desse modo de crença querem afirmar o seu compromisso com o
tempo e espaço da modernidade onde está localizada a sua ação druídica. Da língua latina,
Modernus denota o que é próprio e pertencente ao nosso tempo, o estado de espírito do
tempo que acontece no presente. Mais do que isso, lembra que somos seres humanos que
agem e necessitam agir através da mentalidade e constituição moderna: locus de
identidades fragmentadas, comunicação rápida, arranha-céus, tecnologia, individualismo,
mundo detentor de problemas ambientais, sociais e históricos de seu tempo.
Nesse sentido a termologia Druidismo Moderno literalmente quer informar sobre
a “prática, doutrina ou sistema dos druidas de hoje”. Ou seja, é a afirmativa de que não
somos aspirantes de antiquários, nem que vivemos do remonte do passado, muito menos
queremos voltar à época La Tène, mas que participamos ativamente dos processos do
tempo em que estamos logrados. Inclusive a primeira coisa que os druidas modernos
precisam saber e compreender é que a religião clássica e original dos celtas foi esmagada

Druidismo [S. I.]. Disponível em: <https://novepoderes.blogspot.com/2020/03/o-druidismo-moderno-


parte-ii.html>, acessados em 31/03/2020.
3
As revistas podem ser acessadas e adquiridas nos links: OBOD. Ophiusa. Ed. Online, nº 1, fev. 2017.
Disponível em: <https://zefiro.pt/ophiusa-n-1-edicao-online-pdf>. & OBOD, Ophiusa. Ed. Online, nº 2,
mai. 2017. Disponível em: <https://zefiro.pt/ophiusa-n-2-edicao-online-pdf>.

~7~
pela roda do destino e que devemos deixar o trabalho da roldana continuar. O que ainda
podemos fazer é resgatar e preservar na memória, herança e conexão restante os valores
e costumes para autoconhecimento e para solucionar problemas do nosso entorno.
Dos galhos do Druidismo Moderno nasceram diversos movimentos, como as
bagas nas ramas de uma árvore, que geraram por sua vez outras denominações que grupos
e pessoas se utilizam, como: Neo-druidismo, Druidaria, Reconstrucionismo Celta, Neo-
Paganismo Celta, Mesodruidismo, Igreja Celta, Xamanismo Celta, entre outras. Embora
seja recorrente haver muita discussão, e até desavenças sobre o tema da nomenclatura
comum, ainda é no Druidismo Moderno que residem as raízes do pensamento druida
contemporâneo, que abarca o trabalho druídico acumulado do tempo com os
conhecimentos e vivências no presente.
Mas onde tudo isso começou? Quem são nossos ancestrais na espiritualidade
druídica moderna? Boa parte dos esforços que delimitamos sobre as origens do druidismo
se finda em dúvidas, já que nós não temos muito que dizer diante as lacunas existentes.
Historiadores e arqueólogos nos propõem um proto-druidismo na cultura Hallstat, que
teve início aproximadamente no século XII a.e.c. Sabemos que a atividade druida nos
acontecimentos históricos registrados data do período do século IV a.e.c., sendo que tudo
que sabemos deles, na sua maior parte, foi descrita a partir das representações que gregos
e romanos fizeram destes. Também que a tradição adormeceu nas brumas do tempo
durante o medievo e muito do que sobreviveu foi graças aos monges copistas e a tradição
oral bárdica. De forma poética, um dos mais famosos fundadores do movimento moderno
assim nos define a origem do druidismo:

O Druidismo é a forma ocidental de uma filosofia, de uma cultura ou de uma


antiga religião universal, datando dos dias dos primeiros homens, quando o
três eram um. Isto é, da cultura do círculo de pedra, dos bosques de árvores
sagradas, da dança circular. (Ross Nichols, 1990)

Fazendo um breve histórico recente, os druidas modernos e diversos autores


chegam ao consenso que o renascimento druídico se deu entre os finais do século XVII e
inícios do XVIII. Jonh Albrey, um antiquário e escritor inglês, foi um dos precursores do
movimento nos estudos de monumentos megalíticos relacionando-os aos druidas, como
por exemplo, o conhecido conjunto de megalitos Stonehenge. Nesse sentido, Jonh Albrey
preparou um campo de possibilidades do que viria depois.
O mais provável tempo-espaço do renascimento da prática druídica e o marco
histórico do Druidismo Moderno credita-se a fundação da Druid Order pelo irlandês John
Toland, nos finais do ano de 1717. Ou seja, além do Druidismo Moderno ser uma
reformulação de costumes religiosos de populações célticas que viveram no período
clássico e medieval, também estamos falando de uma religião que tem pelo menos
trezentos anos de existência contemporânea.
Outro importante nome desse período é William Stukeley, um antiquário inglês e
pioneiro na arqueologia que se interessou pelos estudos de John Toland e também realizou
seus próprios estudos sobre monumentos megalíticos e sua relação com os druidas. De
acordo com Ross Nichols e Philip Carr-Gomm, ao entrar para a maçonaria, William
Stukeley conheceu a princesa de Gales Augusta, mãe de George III da Inglaterra, e
descobriu que ela tinha também interesse no druidismo e apadrinhou um grupo que fora
ele o organizador. O poeta e desenhista inglês William Blake também atuou
principalmente com seus desenhos das construções megalíticas e afirmações de que o
druidismo era uma vertente abraâmica.
Algo importante a frisar é que o momento do Renascimento do Druidismo está
repleto de valores cristãos e sentimentos nacionalistas. As personagens históricas acima
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citadas foram importantíssimas para o reavivamento do druidismo, mas estavam ligadas
ao um grupo de intelectuais e nobres interessados em estudos ocultos, acreditando e
afirmando que o druidismo era monoteísta, que seu sistema era semelhante aos patriarcas
judaico-cristãos e de que os dolmens, menires e cromeleques eram fruto de uma
engenharia druídica. Embora ainda perdure de alguma forma essas afirmações, hoje os
druidas modernos já as desmistificam, através de estudos contemporâneos provindos da
arqueologia e da história.

Até hoje, ninguém encontrou provas documentais sólidas da reunião de 1717,


mas a tradição é suficientemente plausível. A Inglaterra do século XVIII
estava explodindo com os agrupamentos de sociedades, clubes e ordens
secretas ou semi-secretas, a maioria delas mal documentadas. Mesmo
organizações famosas como a Maçonaria, que fundaram sua primeira Grande
Loja no mesmo ano, preservaram poucos registros deste período. Uma
sociedade druida poderia muito bem ter florescido em Londres na época e
deixado apenas vestígios equivocados de sua existência. Ainda assim, se a
reunião de 1717 aconteceu ou não, é claro que nestes anos o Renascimento
Druídico mais amplo estava em andamento. (John Michael Greer, 2006)

Ainda de acordo com Philip Carr-Gomm, existem três grandes correntes do


revivalismo druídico, depois desses fundadores. O primeiro movimento é o Druidismo
Romântico ou Mesodruidismo, que surgiu entre os séculos XVIII e XIX no País de Gales,
através da instituição do Eisteddfodau e da Gorsedd dos Bardos Britânicos. Pode ser
considerado o movimento de renascimento do druidismo de hoje e um de seus mais
famosos autores e inspiradores foi Iolo Morganwg, que utilizou textos e compilações,
colaborando histórica e poeticamente com grande parte do que se constitui hoje a prática
de festivais bárdicos e rituais druídicos.
O segundo movimento é o Druidismo Esotérico ou Maçônico, este pelo qual foi
fundado pela Antiga Ordem dos Druidas, por Henry Hurle em 1781. Como está no nome,
foi organizada a partir dos moldes maçônicos, onde era incentivada a ação filantrópica,
reuniões de grupo e cerimônias inspiradas nos modos de irmandades. Segundo Philip
Carr-Gomm, as lojas druídicas se espalharam por todo Reino Unido, inclusive partes da
Europa, onde os ritos consistiam em colocar uma Bíblia em um estrado e proibições de
discussão entre membros, onde o título de Druida não era dado por mérito de estudos ou
treinamento, mas como um cargo honorífico.
O terceiro movimento é o Druidismo Filosófico-Religioso, que teve seu início em
meados do século XX, com a fragmentação dos movimentos anteriores, aliada a tentativa
de tornar o Druidismo um caminho espiritual moderno. Um dos nomes mais conhecidos
desse movimento é Philip Ross Nichols, conhecido também como Nuin, que junto a
Gerald Gardner são considerados os pais do Paganismo Moderno. Ross Nichols foi o
fundador da Ordem dos Bardos, Ovates e Druidas e quem introduziu grande parte das
noções míticas, poéticas, filosóficas, de treinamento/estudo e da celebração de oito
festivais sazonais. Desse movimento surgiram muitos autores druidas, que basearam suas
práticas em fontes da tradição e de estudiosos.
Acrescentaria um quarto movimento, denominado Reconstrucionismo Celta ou
Druidismo Academicista, surgido na década de 1990. É um tipo de manifestação druídica
recente, onde seus praticantes se baseiam primordialmente, chegando mesmo a restringir
seus rituais e práticas religiosas as estritas provas científico-acadêmicas provindas dos
estudos da História, Antropologia, Linguística, Arqueologia, dentre outros. Alguns
grupos são fechamos e até mesmo ortodoxos a determinados conceitos de movimentos
antecedentes, mas alguns tem se aberto ao diálogo e dão grande contribuição em relação

~9~
a leituras e textos provindos de diversas universidades e estudiosos, na sua maioria não-
druidas.

Mas afinal, como é praticar o Druidismo Moderno? Será que ainda há função em
uma crença inspirada em aspectos tão antigos? Para responder essas perguntas é
necessário primeiro entender do que a crença dos druidas na atualidade se nutre.

PARTE II:
O druidismo é uma jornada sagrada de descoberta sobre a beleza e a santidade
de toda a vida, física e espiritual. No entanto, não é suficiente que o druida
saiba que toda a criação é sagrada: o caminho leva além desse ponto, a um
local onde se pode tocar aquela realidade divina. A jornada do druida é sentir
o toque dos deuses, de qualquer forma que os perceba, entrando em contato –
com corpo e espírito – com o espírito que revigora o mundo. (Emma Restall
Orr, 2002)

O Druidismo Moderno é uma religião politeísta, o que quer dizer que seus
praticantes acreditam em muitas divindades, cada qual dotada de sua especificidade,
característica hábil e personalidade. A reverência do druida normalmente dedica-se a
deidades madrinhas e/ou padrinhas, que são pertencentes aos diversos panteões
mitológicos das populações célticas. Dentre as origens podemos encontrar deuses e
formas de culto da cultura britônica, gaélica, celtibérica, gaulesa, manesa, dentre outras.
Também existem as divindades pan-célticas, consideradas através de estudos amplamente
cultuadas pelos diversos povos celtas, citando como exemplo Lugh, Brigid, Belenus,
Dana e as Matronaes. Assim muitos elementos se alteram de acordo com a região e
conceitos adotados pelo praticante.
A maneira como os druidas modernos tratam a divindade de espírito para espírito
diferencia-se de outras crenças, tendo seu próprio ritualismo estruturado no trato com
respeito à espiritualidade circundante. Nesse sentido os druidas modernos entendem que
o mundo da matéria e do espirito não estejam tão distantes um do outro, sendo essa
fronteira pouco considerada já que a manifestação do sagrado está acontecendo aqui e
agora. A forma como os pássaros voam no céu, a naturalidade que o vento sopra e como
as folhas das arvores envergam com sua passagem, o sentir de como a terra úmida está
cheia de vida e como todos os seres estão conectados é onde está o alicerce da sacralidade
druídica.

A ligação entre o sagrado e o mundano é muito estreita na visão druídica,


chegando a ser quase impossível separar o profano do espiritual ou o divino
dos aspectos comuns da sociedade. O que torna todo este processo sagrado
são os pensamentos, palavras e ações, emitidas por cada ser. (Rowena
Arnehoy Seneween, 2011)

Concomitante a isso, os druidas modernos tem sua fé enraizada na reverência as


divindades que emergem a vida, aos espíritos ancestrais e aos seres da natureza. Alguns
chegam mesmo a entender o druidismo como uma religião animista, pois se acredita que
tudo a nossa volta está repleto de vida pulsante, alma, essência vital, Nwyfre. Por isso
muitos praticantes, como os xamãs, dedicam-se a figuras animais totêmicas/aliadas, a
força dos minerais e cristais, ao estudo de herbologia e plantas medicinais, produção de
amuletos e objetos de poder imbuídos de energia natural. Os druidas modernos buscam o

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equilíbrio do cosmos através da conexão com as forças que brotam da terra. Algumas
referências dessa prática podem ser encontradas em textos práticos reconhecidos de
Xamanismo Celta, do qual podemos citar os autores John Matthews e Thomas Dale
Cowan.
Já que possuem o entendimento de que são parte de um grande todo, os praticantes
do druidismo também se consideram como parte de uma grande família ou tribo. Nesse
aspecto, os deuses, ancestrais e espíritos são nossos próximos e a relação entre nós e eles
é muito semelhante a que nós temos com nossos parentes e amigos mais estimados. Ou
seja, uma relação tribal, clânica ou familiar. Porque o que está em jogo no druidismo é a
eternidade da alma e das experiências entre os mundos e reinos, o que quer dizer que
nossas relações aqui e agora são importantes para o equilíbrio e agradáveis estadias nas
diferentes jornadas. Por isso a cortesia e hospitalidade são dos valores mais caros,
clarificados nos mitos celtas, já que se preocupavam com as outras vidas que estavam por
vir. Não no sentido de arrebatamento ou salvação, mas no aspecto de como seriam
recebidos no outro mundo: como pessoas honradas ou infames?
Outra importante crença então é a transmutação da alma e a sua infinitude e
indestrutibilidade. Para os druidas modernos, assim como para os clássicos, a morte não
é mais do que a passagem de um estágio para outro. A alma se transfere para outro mundo
ou realidade, ou mesmo para ilhas ou planícies sagradas, continuando sua viagem de
desenvolvimento e autoconhecimento na aprendizagem com as divindades, os ancestrais
e todos os seres espirituais. Além disso, os druidas acreditam que a alma tem liberdade
suficiente para escolher e decidir seus caminhos na própria aprendizagem nos mundos,
sendo que buscam a espiritualidade para se aconselhar como faz um aluno com seu
mestre, e não para se prostrar a seus mandos e interferências.
Os druidas modernos também não possuem livros sagrados ou dogmas fechados.
A maior parte dos saberes e fazeres druidas que sobreviveram foram passados de geração
em geração (cultural oral) ou por meio da transcrição por monges cristãos medievais e
escritores clássicos. Sendo assim, a base da crença druídica moderna está em costumes
tradicionais ainda vivos, nas línguas célticas, nos textos clássicos e medievais, nos
compêndios e estudos mitológicos, nas pesquisas históricas e arqueológicas e nas
experiências de grupos e indivíduos.
Rituais sazonais alinhados as estações do ano, a paisagem e aos ciclos da natureza
são comumente realizados pelos druidas modernos. Nos solstícios e equinócios, assim
como datas entrepostas são feitas festividades e comemorações que tem sua origem nos
costumes, jogos e tradições das populações célticas. Prevalece hoje o sistema óctuplo
ritual, onde são realizadas anualmente oito festas sacras, dos quais os nomes também
dependem das referências culturais e históricas que os grupos e as pessoas tomam. Esses
ritos e cerimônias normalmente são dispostos em uma roda simbólica, conhecida como
Roda do Ano. Outros rituais que também os druidas realizam estão sinalizados no
transcorrer da vida como o nascimento, a puberdade, as iniciações, o casamento e a morte.

Os festivais solares, juntamente com os festivais celtas, estabeleciam uma


poderosa rede de pontos de referência que ajudavam a orientar os xamãs que
trabalhavam com o simbolismo da roda. (John Matthews, 2002)

Os grupos druídicos normalmente denominam-se por várias nomenclaturas, como


Ordem, Caer, Grove, Bosque, Gorsedd, Nemeton, Escola, Irmandade, Ramo, Assembleia
e Castro. Isso depende de região para região, como também a referência que tomaram
para nortear suas formas de ver e ser no mundo. Cada grupo possui os seus métodos,
regras e valores que cultivam para o treinamento e iniciação dos integrantes e membros.

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Muitos grupos adotam a forma de cargo tripartite (Bardo, Ovate e Druida), outros
concebem ainda profissões (como Guerreiro, Agricultor, Curandeiro,…), sendo a maneira
como se dá a graduação e titulação particular de cada um. Acrescentamos também que
ainda exista a categoria dos druidas solitários, praticantes autodidatas que buscam o seu
desenvolvimento e aprendizado por sua conta. Com o advento da internet e da
comunicação rápida, hoje são comuns cursos on-line e muitos sites que oferecem leituras
e práticas.
E então chegamos ao porquê de ainda prestar nosso tempo, dedicação e vida ao
druidismo ainda hoje. Nosso mundo vive crises próprias de seu tempo, principalmente no
meio ambiente e social. Há uma tríade muito popular entre os druidas modernos que diz
o seguinte:

“Três deveres de um Druida: Curar a si mesmo; Curar a comunidade; Curar a Terra.


Pois se assim não fizeres, não podereis ser chamado de Druida.”

Essas três afirmações nos lembram de que a função do druida não está morta.
Mesmo que muitas tradições e conhecimentos tenham sido perdidos, os druidas tem um
compromisso com a Terra. E por isso mesmo decidiram viver essa vida, nesse plano e no
tempo onde estão. É grande o número de pessoas no druidismo que se dedicam a causas
sociais e ecológicas. Muitos trabalham na preservação de reservas, no ativismo ambiental,
na reutilização dos resíduos sólidos e na luta contra a extinção de espécies de animais e
plantas. Outros se dedicam a causas sociais, envolvendo-se com a militância de povos
tradicionais, populações periféricas e alvo de violência, no combate as guerras, ou seja,
questões de crucial colaboração com a sociedade. Entendem que assim podem curar os
níveis de manifestação da comunidade e da Terra.
Fora isso, as pessoas tem no druidismo um sistema complexo de crescimento
pessoal, olhando essa crença religiosa e filosófica como uma possibilidade de melhorar
suas relações com o mundo exterior e interior, com a cura de si mesmas. Os dedicantes
do caminho druídico trabalham através de atividades e meditações com diversas facetas,
como sua saúde mental, psicossocial, física e espiritual. Logo existem interesses pessoais
em manter a prática, no âmbito de construir uma vida melhor e equilibrar-se com a
centelha divina do universo que está dentro de nós.
E o que é ser um druida hoje? Qual é o significado em ser druida e o que eu devo
fazer para me tornar um? Afinal, de acordo com Philip Carr-Gomm, o Druidismo
Moderno tem se tornado uma das religiões “alternativas” mais procuradas pelas pessoas
no mundo atual. São três os motivos que eu apontaria na colaboração de tal questão. Os
resultados do processo histórico da celtomania, movimento do século XIX e XX, onde
muitos autores europeus de cunho nacionalista investiram na literatura e cultura celta, que
deu foro para o fortalecimento do revivalismo. Os filmes épicos, romances, gibis e
seriados têm também imageticamente transmitido a ideia de como o conhecimento da
magia pode empoderar os indivíduos, com personagens sábias fortes, como o mago
Gandalf, o bruxo Alvo Dumbledore e o druida Panoramix. E, por outro lado, as pessoas
não só se atraem pelo mistério que a figura dos druidas lhes causa, mas também pela
vontade em utilizar a sabedoria que emana desse arquétipo para mudar o mundo.
A grande parte das pessoas, principalmente as mais jovens, identifica o Druidismo
Moderno como uma religião ou espiritualidade, mas ainda existem aqueles que o pensam
como uma escola de mistérios, uma filosofia de vida ou uma prática cultural folclórica.
No País de Gales, segundo Philip Carr-Gomm, a maior parte da população religiosa se
considera pertencente à Igreja Metodista e vê o Druidismo como uma parte dos seus

~ 12 ~
costumes culturais bárdicos de origem. Porém, na Inglaterra o Druidismo é oficialmente
uma religião e em muitos países os grupos aspiram ao mesmo reconhecimento.
Os druidas modernos são pessoas comuns, de diversas origens étnicas,
constituição social, religiosa, local, composição etária, de gênero, orientação sexual,
dentre outros aspectos. Encontram a sua função druídica no mundo em suas profissões,
no dia-a-dia, no contato com seus amigos, no lidar com tudo que está a sua volta. O
professor que leciona seu conteúdo. A instrumentista compondo sua música. Um jovem
traçando seu futuro vindouro. Uma anciã cuidando de um jardim. O médico atendendo a
um paciente. A artesã criando uma peça de primor. É ai que o druida está sendo
despertado!

O Druidismo tem uma visão inteiramente diferente, que celebra e revela a vida
tal como ela é agora – não como poderá vir a ser no além ou como poderia ser
se conseguíssemos quebrar o ciclo da morte e do renascimento. (…) oferece
uma abordagem que se baseia no sentir-se totalmente envolvido no Mundo –
na celebração das suas belezas e alegrias e em enfrentar as suas dificuldades
em vez de ‘nos elevarmos’ para um plano superior a elas. Sugere assim que
fomos feitos para estar aqui e não noutro sítio qualquer. (Philip Carr-Gomm,
2008)

Embora possa soar redundante, ser agora um druida é construir o caminho do


druida moderno. Requer estudo, dedicação e persistência, já que muitas das respostas que
gostaríamos de ter somos nós mesmos que vamos conjecturar. Ainda podemos nos
considerar muito felizes, já que temos acesso na contemporaneidade à muitas informações
e não vivemos em um tempo onde o conhecimento é fechado, além de já possuirmos um
bom acervo de textos de autores e autoras druidas e não-druidas que podem nos ajudar.
A nossa grande missão diante a canção da vida druídica é colaborar para que o movimento
cresça, e principalmente para que toda a comunidade possa crescer junto.
Os druidas clássicos estavam dotados de um código de conduta pautado na
verdade, na honra e na coragem. Concluindo essa pequena leitura, do qual espero que
tenha sido agradável e interessante para você, qualquer pessoa tem o potencial de ser um
Druida, desde que compreenda e pratique os valores contidos nessas palavras. Alguns
preferem desenvolver isso em grupo, outros solitariamente. Encontre a melhor forma que
você puder.

~ 13 ~
RECONSTRUCIONISMO CELTA4
O Reconstrucionismo Céltico é uma expressão bastante recente da vivência da
espiritualidade céltica. Ele é norteado por um documento chamado The CR FAQ. Esse documento
foi traduzido para o português em 2008 e ficou registrado com o nome The CR FAQ – Brasil.
Esse documento pode ser acessado no site: <https://thecrfaq-br.livejournal.com/>.
Para melhor compreensão do movimento, deixo as palavras de Rowena A. Seneween
reproduzidas abaixo, com autorização da autora.

Texto por Rowena A. Seneween.

O Reconstrucionismo Celta (RC) ou Paganismo Reconstructionista Celta (PRC)


é um movimento politeísta, animista, religioso e cultural, que surgiu como uma tradição
independente a partir dos anos 1990.
O termo reconstrucionismo foi usado pela primeira vez pelo fundador da ordem
druídica ADF. Oficialmente, o Reconstrucionismo Celta foi formado por C. Lee
Vermeers e Erynn Rowan Laurie.
Definição:
Ní Dhoireann credita a Kathryn Price NicDhàna a origem do termo
"Reconstrucionista Celta"; no entanto, NicDhàna credita seu uso precoce do
termo a uma simples extrapolação do uso de Margot Adler do termo
"reconstrucionistas pagãos", na edição original de 1979 de "Drawing Down
the Moon". Embora Adler dedique espaço a um punhado de tradições
reconstrucionistas, nenhuma das mencionadas é especificamente celta. No
capítulo onze, ao descrever seu grupo neodruídico, Novos Druidas
Reformados da América do Norte (NRDNA). Isaac Bonewits [fundador da
ordem druídica ADF] usou a frase "Reconstrucionista Eclética".
Eventualmente, esse emparelhamento de termos se tornou oximorônico
[palavras de sentido oposto]; nas comunidades pagãs / politeístas,
reconstrucionistas passaram a significar tradições que excluem
especificamente o ecletismo. (Wikipédia, 2020)5.

Os reconstrucionistas celtas buscam, através das suas práticas, reconstruir e


reviver em um contexto cultural, linguístico e religioso, as culturas celtas pré-cristãs nos
dias de hoje, inspirados em pesquisas sérias sobre: mitologia céltica, arte, história,
arqueologia, antropologia e idiomas originais, ainda existentes.
Como mencionamos anteriormente, a prática reconstrucionista visa o resgate fiel
das crenças religiosas, sem que com isso, haja uma conotação revivalista. Ao reviver uma
religião antiga, não há a pretensão de reinstituir sua política ou os costumes sociais de
uma cultura, apenas de se conhecer e entender o seu "modus operandi", adequando-o à
vida contemporânea, na medida do possível.
A trajetória dentro do Reconstrucionismo Celta está em constante crescimento,
assim como todos nós. Ao compartilhamos alguns dos princípios deste movimento, para
sua melhor compreensão em nossa jornada espiritual junto ao Druidismo Moderno,

4
Retirando na íntegra de Seneween, Rowena A. Reconstrucionismo Celta IN Templo de Avalon [S. I.].
Disponível em:
<http://www.templodeavalon.com/modules/mastop_publish/?tac=Reconstrucionismo_Celta>, acessado
em 31/03/2020.
5
A referência citada pode ser acessada em: ___. Celtic Reconstructionist Paganism IN Wikipedia, última
atualização visualizada: 16/02/2020. Disponível em:
<https://en.wikipedia.org/wiki/Celtic_Reconstructionist_Paganism>.

~ 14 ~
descreveremos a seguir, como ele é entendido e vivenciado dentro do Paganismo Celta,
que incluem esses dois caminhos.

Há elementos sobreviventes das tradições celtas pré-cristãs nos costumes e


práticas folclóricas dos países celtas e da diáspora céltica, mas após séculos
de Cristianismo sobreposto a elas, a maioria das pessoas não considera estas
tradições populares como sendo, em si mesmas, um caminho espiritual
completo ou viável. Estudando os antigos manuscritos e o folclore regional,
combinando esta informação com práticas místicas e extáticas, e trabalhando
juntos para extirpar os elementos não-célticos entremeados, tentamos nutrir o
que ainda sobrevive e ajudar as tradições politeístas celtas a crescerem fortes
e completas novamente. Buscamos isso, em parte, ao tentar imaginar como os
diferentes paganismos celtas pareceriam, nos dias de hoje, se não tivessem
sido interrompidos em sua evolução pelo Cristianismo. (The CR FAQ Brasil,
2008)6

Embasados no estudo e na inspiração desta tríade irlandesa: "As três velas que
iluminam qualquer escuridão: o Conhecimento, a Natureza e a Verdade."

6
A referência citada pode ser acessada em: ___. O que é Reconstrucionismo Celta (RC)? IN The CR
FAQ – Brasil. 2008. Disponível em: <https://thecrfaq-br.livejournal.com/>.

~ 15 ~
Parte I:

Ceilteach Fís Domhan (Cosmologia Celta)

Se aprofundar na cosmologia celta é adentrar nas brumas do tempo, e espiralar


por um passado longínquo praticamente inacessível.
Os celtas não deixaram registros escritos até muito recente em nossa história. Os
poucos registros se remetem em sua maioria a um período em que a fé celta estava
cristianizada ou em vias de sua cristianização. Compreender e ir mais fundo nos mistérios
celtas requer uma habilidade especial: saber olhar o pouco que temos disponível como
migalhas de pão de um caminho rumo a floresta, rumo ao sagrado. Um sagrado que
precisa ser sentido para ser compreendido e que dificilmente pode ser explicado por
palavras modernas.
Parte desses mistérios e conhecimentos perdidos nas brumas do tempo estão
aqueles que se remetem ao mito de criação celta. É comum que as religiões tenham seus
mitos cosmogônicos, as lendas e histórias que remetem ao princípio de tudo. Assim como
seus mitos escatológicos, que nos levam até o fim dos tempos. Contudo, os celtas não. O
que sabemos é que a grande crença celta vive no ciclo infinito. E talvez esse ciclo nos
remeta a uma ideia de eternidade e perenidade.
Mas podemos achar algo que pode, e deve, ser tomado como mito criacional. Os
celtas descreveram uma Oran Mor (Grande Canção). A Oran Mor seria nada mais que a
melodia criacional, a inspiração que tudo criou. Então tudo surgiu da música, tudo é
música, e tudo se desenvolve pela música. A inspiração criacional diz exatamente o que
o nome quer dizer: a respiração. A Oran Mor pode ser entendida como o som da
respiração cósmica que criou a tudo, um organismo universal que começa sua respiração.
Por isso, ela pode ser sentida no barulho das ondas do mar, que imitam o movimento e
som de uma respiração. Mas ela também pode ser ouvida no toque do tambor, que imita
o batimento cardíaco.
Isso tudo ainda é pouco. Escutar a Grande Canção é uma tarefa difícil
praticamente impossível. Mas podemos harmonizarmos com ela, sentir seu fluxo e nos
unirmos a ele, entrando num estágio de harmonia com tudo o que existe.
E assim, os celtas falam de Três Mundos: o mundo acima, mundo celestial; o
mundo intermediário (a Terra Média); e o submundo. O mágico na compreensão celta é
que não há nenhuma hierarquia entre os Três Mundos. Eles coexistem harmonicamente,
e assim o que está acima não necessariamente é melhor do que os que estão abaixo.
Dessa forma, portanto, é da música que tudo vem, pela música que tudo flui. É a
Grande Canção que move o mundo.
Nosso planeta faz parte dessa música, desse ser cósmico e sagrado. Faz parte e é
a Terra Média ou o Mundo Intermediário. Dessa forma, ele é sagrado, assim como tudo
que há nele. Há nos celtas um respeito primordial e inquestionável pela Natureza e pelo
mundo em que vivemos. A Terra é nossa Mãe, mas também é parte de nós e nós dela.
Essa simbiose harmônica deve ser mantida de maneira honrosa. Entender, sentir e honrar
o sagrado em nosso mundo também é uma tarefa essencial na fé celta. Esse honrar não
deve ser entendido como uma submissão e servidão, mas como respeito.
A Terra também possui Três Reinos: O Céu, a Terra e o Mar. Cada reino
representa um elemento sagrado e é ponto de conexão com outros mundos.
O Céu, representa Nwyfre, o sopro divino, o ar e o próprio céu acima de nós.
Assim, o céu, acima de nós, representa a luz, a inspiração sagrada e os Deuses.

~ 16 ~
O Mar está em nosso horizonte, representa Gwyar, as águas e o próprio mar ao
nosso redor. Representa, portanto, as emoções, os seres feéricos e os ancestrais.
Já a Terra, está sob os nossos pés e, eu a considero, no meio entre os reinos – uma
recriação dos Três Mundos Cósmicos. A Terra representa o Calas, a terra que nos
sustenta. Representa as raízes, o solo, e os seres da natureza.
No real centro dos Três Reinos, encontra-se o Bosque Sagrado onde o Fogo
queima no Poço da Sabedoria sob a Árvore da Vida. É a esse bosque que todas as
vivências e rituais devem transportar. A Árvore da Vida é o símbolo que conecta os
Reinos e os Mundos: com seu tronco no mundo do meio, no reino terreno; suas profundas
raízes que atingem as águas e o submundo; e com seus longos e altos galhos que tocam o
céu e alcançam o mundo celestial.
E dessa forma, toda árvore é sagrada, ao ser um ponto de contato com os Três
Reinos e com os Três Mundos. E toda existência está inserida no mundo sagrado, de
maneira que tudo é sagrado e tudo flui conforme a Grande Canção.
Os Três Mundos são divididos em planícies, conforme apontou João Eduardo
Schleich Uberti em sua palestra no VI EBDRC, que seriam:

❖ Magh Mór / A Grande Planície (O Mundo Acima) - o Espírito da Criação, o


Futuro

 Magh Mel (Planície das Delícias) - Inspiração e Criatividade


 Sean Magh (Planície Antiga) - Origens e Sabedoria
 Magh Findargat (Planície da Nuvem Prateada) - Luz e Esperança
 Magh Ionganaidh (Planície das maravilhas) - Milagres e Portentos

❖ Bith ou Mide / A Terra Média (o Mundo Médio) - o Espírito do Ser, o Presente

 Thuaidh (Norte) / a Lança de Lugh - Batalha e Determinação


 Oithear (Leste) / o Caldeirão do Dagda - Prosperidade e Mutação
 Dess (Sul)/ a Pedra de Fal - Música e Poesia
 Siar (Oeste)/ a Espada de Nuada - Conhecimento e Druidismo

❖ Tir Andomain (O Mundo Inferior): - o Espírito dos Ancestrais, o Passado

 Tir na mBeo (Terra da Vida Eterna) - Eternidade e Conhecimento Antigo


 Tir na mBan (Terra das Mulheres) - Beleza e Prazer
 Tir fo Thuinn (Terra sob as Ondas) - Temor e Avaliação
 Tir na n'Og (Terra da Juventude) - Necessidades e Renovação

Nós, portanto, vivemos na Terra Média, na qual temos os Três Reinos e as Quatro
direções. Os demais Mundos são mundos espirituais que, um dia, através dos mares da
vida, aportaremos em suas terras.
Um lindo poema, de Caítlin Mathews, encontrado no site Templo de Avalon,
resume os Três Reinos e nossa conexão com eles:

"Não sei qual o meu destino.


Viajo para muito longe das ondas.
Procuro minha alma, onde ela está?
Eu olho a estrela para me guiar de volta.

~ 17 ~
Há uma ilha no oeste,
Terra sob o Céu e sobre o Mar,
Viajo para muito longe em minha busca.
Procuro um guia para me conduzir.

Um ramo de prata em minha mão


Com flor de cristal e fruto dourado,
A mãe árvore cresce na praia;
É lá que eu devo encontrar minha raiz.

Há uma ilha no mar,


Onde as águas fluem e o alimento dá a vida,
Onde não há inimigo, onde o amor é livre.
Procuro um lugar onde não aja contenda.

Eu olho a estrela para me guiar para casa,


Encontro o repouso da minha alma e meu espírito,
Viajei muito além das ondas,
Pois não há fim em minha busca."

Imagem por João Eduardo Schleich Uberti

~ 18 ~
Parte II:
An Naofa Trí (O Sagrado Três)

Três é o número sagrado...


Três vezes tudo deve ser reverenciado.

Há três Mundos no Universo:


Um mundo acima, um ao meio e um abaixo.
Na Terra Média toca o Oran Mor,
Que com sua música e vibração tudo criou, cria e conduz.
Há três Reinos na Terra Média:
Um Reino acima, um ao meio e um abaixo.
Acima fica o Céu,
lar dos animais que voam e planam,
onde vive Nwyfre, e lar dos Deuses.
Ao meio fica a Terra,
lar dos animais que andam e rastejam,
Onde vive Calas, lar dos homens e dos espíritos da natureza.
Abaixo fica o Mar, que nos ronda e circunda,
lar dos animais que nadam e mergulham,
onde vive Gwyar, lar dos ancestrais e das fadas.
No centro está a Árvore do Mundo,
O Freixo sagrado...
Com seus galhos altivos toca e sustenta o Céu
Seu tronco forte está na Terra
Suas raízes firmes alcançam o Mar.
A sua frente queima Awen, o fogo sagrado,
A inspiração dos artistas, a magia e o sagrado do mundo.

Três elementos existem:


Nwyfre é o sopro que traz inspiração.
Calas é a terra que traz sustentação.
Gwyar é o mar que traz a fluidez e a emoção.
Com Nwyfre se contata os Deuses.
Com Gwyar se viaja para as outras terras.
Com Calas se fixa e se vive em harmonia.

Três povos estão entre nós:


Os Deuses, nossos mestres soberanos,
Aqueles que governam o Mundo.
A Eles reverenciamos e buscamos sabedoria e auxílio.
Os ancestrais, nossos antepassados,
Aqueles que nos ensinam toda a tradição.
Deles colhemos o aprendizado e a experiência.
As fadas, nossos vizinhos honrados,
Aqueles que conhecem o mundo e conduzem nossos destinos.
Deles buscamos amizade e harmonia.

~ 19 ~
Conviver com os Três Povos é uma lei,
Dessa convivência depende o destino de nossa raça.

Três Caldeirões conduzem nossa poesia.


Ao ventre está Coíre Goiriath, o Caldeirão do Aquecimento.
Ele nascem sempre para cima e cheio de Dán.
Dán é nossa saúde, nosso destino, nossos talentos e nossos dons.
Devemos mantê-lo sempre para cima e cheio.
Ao peito está Coíre Ermaí, o Caldeirão do Movimento.
Ele nasce sempre de lado, quase vazio.
Devemos desvirá-lo e enchê-lo de Brí.
Brí é produzido por Dán.
Brí são nossas emoções, nossa energia mágica, nossa vitalidade e essência.
Quatro são as alegrias humanas que movimenta esse caldeirão:
Sexo, saúde, Composição bárdica e Inspiração.
Quatro tristezas também o fazem:
Anseio, Ciúme, Luto e Peregrinação.
E uma alegria divina: o êxtase.
Trabalhar cada uma delas é necessário,
vivenciar todas corretamente é o caminho apontado.
Na cabeça está Coíre Sois, o Caldeirão da Sabedoria.
Ele nasce sempre para baixo e vazio.
Devemos desvirá-lo em enchê-lo de Bua.
Bua é produzido por Brí.
Bua é nossa sabedoria e nossa honra, nossa vitória, mérito e dignidade.
Alinhar os caldeirões é missão de vida.

E tudo está emaranhado, está atado.


Na Terra Média tudo está conectado.
O Reino do Céu pertence a Nwyfre,
Lar dos Deuses, contato de Coíre Sois.
O Reino da Terra pertence a Calas,
Lar das fadas, contato de Coíre Goiriath.
O Reino do Mar pertence a Gwyar,
Lar dos ancestrais, contato de Coíre Ermaí.
Perceber a relação necessário se faz,
Então três vezes três articulado está.

~ 20 ~
Parte III:
Na Trí Ríochtaí (Os Três Reinos)

“Neamh nglas, muir más, talamh cé.”


“Céu azul, belo Mar, Terra presente.”
(Invocação de Blathmac mac Cú Brettan)

Para os celtas Três Reinos compõem a existência da Terra Média. A Terra Média,
ou Mundo Intermediário é parte da concepção cosmológica celta, que acredita haver três
Mundos (um acima, um ao meio e um abaixo) – nós poderíamos hoje dizer três universos.
Nós e tudo o que conhecemos, sentimos e sabemos vivemos no Mundo do meio, ou
Mundo Intermediário ou Terra Média.
O alcance aos outros Mundos nos é vetado e tudo o que temos conhecimento está
fisicamente locado na Terra Média: Deuses, fadas, ancestrais, outras terras... E tudo isso
pode ser alcançado fisicamente por quem souber navegar para o Oeste ou tiver a “sorte”
de atravessar um portal.
A Terra Média possui então Três Reinos: o Céu sobre nossas cabeças, a Terra sob
nossos pés, e o Mar que nos rodeia. E assim, tudo o que existe, pertence a um dos reinos.7
Não nos é difícil entender porque dessa relação muito presente sobretudo nos celtas
irlandeses: a Irlanda é uma ilha com um céu sobre ela, uma terra firme para pisar e um
gigantesco mar circundante. Mas se formos parar para pensar, tudo o que existe não é
assim? Não seria o espaço sideral uma prorrogação de nosso circundante mar nos
conduzindo a outras terras (deferentes da nossa mas igual em existência)?
Desse modo, o Céu é o Reino de Nwyfre, do Ar, Reino dos Deuses e dos animais
que voam e planam. É do Céu que vem a inspiração e o contato com os Deuses. Ele é o
nosso Reino Acima.
A Terra é o Reino de Calas, da Terra, Reino dos Espíritos da Natureza (as fadas
que vivem entre nós), dos homens e dos animais que andam e rastejam. É da Terra que
vem a sustentação, e o caminho para o desenvolvimento. Ele é nosso Reino do Meio.
O Mar é o Reino de Gwyar, do Mar (das águas), Reino dos Ancestrais e das fadas
(as que não vivem entre nós), dos animais que nadam e mergulham. É do Mar que vem
as provações, a condução e os sentimentos. Ele é nosso Reino Abaixo e ao Redor.

7
Particularmente eu articulo os reinos igualmente como Acima, ao Meio e Abaixo, seguindo a seguinte
ordem: Céu acima, Terra ao meio, Mar abaixo. Minha justificativa é simples: uma árvore possuí seus galhos
altivos no céu, seu tronco está na terra, e suas raízes profundas buscam água. Mas conheço e reconheço
outras vertentes que, por exemplo, articulam Céu acima, Mar ao meio, Terra abaixo, usando duas
justificativas: a primeira relacionada ao fato de que pisamos sobre a terra, por isso ela estaria abaixo de nós;
o mar nos circunda, o que dá uma ideia de meio. A segunda justificativa que corrobora com essa visão são
as articulações dos caldeirões: Coíre Sois, na cabeça, se articula com o Céu; Coíre Ermaí, no peito, se
articula com o Mar; e Coíre Goíriath, no ventre, se articula com a Terra. Vejo profunda coerência nessa
vertente. Mas eu particularmente, tendo a entender que a posição dos Reinos não interfira em sua atuação.
O Mar, mesmo abaixo nos circunda. Referências mitológicas como a Terra Sob as Ondas (lar dos ancestrais)
também me fazem pensar no Mar como abaixo. Por fim, se recriarmos a ideia cosmológicas dos Três
Mundos estando nós habitando o intermediário, seria fácil presumir que também habitemos o Reino
Intermediário. Mas essa é uma reflexão extensa e que creio ser insolúvel. Faço aqui uso das palavras de
Bellouesus para mim no VI EBDRC: “se dá certo para você, então está certo”. Estude e escolha sua
perspectiva, se ela for coerente e funcionar, viva-a.

~ 21 ~
No centro do Mundo encontra-se então a Árvore do Mundo, aquela que conecta e
mantém os Três Reinos. Para os celtas essa árvore é um freixo com galhos altivos que
alcançam os céus, tronco firme que sustenta a terra e raízes profundas que alcançam o
mar (as águas). Na sua frente queima a Awen (ou Imbas), o fogo sagrado.

“Que o céu caia e me esmague, que o mar se erga e me afogue, que a terra se abra e
me engula se eu quebrar esse juramento.”
(juramento irlandês)

E eis um juramento muito respeitado e de grande poder entre os celtas irlandeses.


Seu maior temor era exatamente esse cenário apocalíptico em que o desequilíbrio (talvez
o fim da Árvore do Mundo) levasse ao caos entre os reinos, fazendo o Céu cair, o Mar
invadir a Terra e a Terra se abrir.

“Não sei qual o meu destino.


Viajo para muito longe das ondas.
Procuro minha alma, onde ela está?
Eu olho a estrela para me guiar de volta.

Há uma ilha no oeste,


Terra sob o Céu e sobre o Mar,
Viajo para muito longe em minha busca.
Procuro um guia para me conduzir.

Um ramo de prata em minha mão


Com flor de cristal e fruto dourado,
A mãe árvore cresce na praia;
É lá que eu devo encontrar minha raiz.

Há uma ilha no mar,


Onde as águas fluem e o alimento dá a vida,
Onde não há inimigo, onde o amor é livre.
Procuro um lugar onde não aja contenda.

Eu olho a estrela para me guiar para casa,


Encontro o repouso da minha alma e meu espírito,
Viajei muito além das ondas,
Pois não há fim em minha busca.”
(poema de Catlín Mathews para a travessia da alma apud Rowena A. Seneween)8

Conectando-se com a Árvore do Mundo:9

Antes de fazer esse exercício de conexão, relaxe por um tempo.


Respire profundamente e esqueça as questões mundanas, os problemas, os
deveres... Coloque uma música suave tocando e/ou deixe uma vela a sua

8
Retirado de Seneween, Rowena A. 4º dia: Três Reinos In Templo de Avalon [S. I.]. Disponível em:
<http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=55>, acessado em 30 de março
de 2016.
9
Meditação desenvolvida por Ávillys d’Avalon.

~ 22 ~
frente. Feche os olhos e permita-se sentir a música, ou sentir (ver a chama
– mesmo de olhos fechados), criando assim um ponto de conexão e
segurança para sua meditação.
Para se conectar com a Árvore do Mundo é preciso sentir-se criança
e alcançar um coração leve.
Respire profundamente, inspirando e expirando lenta e
pausadamente. Aos poucos, concentre toda sua energia na lombar, bem no
final da coluna. Deixe que sua energia forme dali uma raiz. Essa raiz deve
afundar no solo até alcançar um manancial de água pura e cristalina e
conectar-se com ele. Reforce a conexão.
Permita que a energia da água te nutra e sinta seu corpo como um
tronco, crescendo forte e firme. Fixe sua força.
Deixe que de sua cabeça nasçam galhos altivos que toquem os céus.
Sinta essa conexão.
Então, torne-se essa árvore, fortifique-se e deixe que a vida floresça
em você. Não só boa, mas complexa e equilibrada como de fato é a vida.
Sinta que a vida é gerada e depende de você. Veja a sua frente a
chama de Awen queimar. Um fogo luminoso e belo, altivo e forte, que não
destrói, mas que transforma, transmuta, dá e mantém a vida.
Permita-se vibrar ao som da música como uma árvore vibra ao som
do universo. Fixe e estabeleça essa conexão com a Árvore do Mundo por
alguns minutos. Por fim, retorne lentamente a sua sensação corpórea e
física. Mantenha-se conectado, mas torne a viver esse mundo, como ele
precisa ser vivido. Aterre as energias se achar necessário.
Repita esse exercício até estabelecer uma conexão rápida, linear e
segura com a Árvore do Mundo, com os Três Reinos e com Awen.

~ 23 ~
Parte IV:
Na Trí Dúile agus Imbas (Os Três Elementos e a Awen)

Diferente da concepção grega comum nos dias de hoje sobre os Elementos da


Natureza, os celtas alegavam a existência de três elementos naturais: Nwyfre, Calas e
Gwyar, respectivamente sopro / vento, terra e mar / água. O fogo então se torna a
representação e materialização de Awen (ou Imbas). Uma razão para esse fato é de que o
fogo transmuta, transforma e conduz os outros três elementos, assim sendo ele é muito
mais que um elemento, mas a manifestação do fogo divino primordial: Awen.
O primeiro elemento é Nwyfre, o sopro, o vento. Nwyfre é o elemento celestial, é
o Ar. A ele se relacionam às coisas do Reino do Céu. Dessa forma, as coisas regidas por
Nwyfre se nutrem da inspiração e dos dons divinos. É o elemento responsável pelo sopro
de vida e pela manutenção da vida.
O segundo elemento é Calas, a terra. Calas é o elemento terreno, é a própria Terra
onde se pisa. A ele se relacionam as coisas do Reino da Terra. As coisas regidas por Calas
tendem a ser firmes, sólidas, buscam e proporcionam sempre sustentação. É o elemento
responsável por da base e sustento a tudo.
O terceiro elemento é Gwyar, o mar, as águas. Gwyar é o elemento marítimo, é a
Água. A ele está relacionado a condução, os sentimentos e emoções e as jornadas. É o
elemento portal que possibilita o acesso e a viagem a outras terras (inclusive as divinas).
Também é o elemento que traz a intermediação, pois o mar não é tão sólido quanto a terra
e nem ar como o vento. É o elemento responsável pelas emoções e pelas jornadas.
Há um pouco de cada elemento em todas as coisas, mas essencialmente, cada
pessoa, cada ser, cada coisa é predominada por um ou outro elemento (independente do
elemento astrológico de regência). Reconhecer seu elemento e trabalha-lo é uma
necessidade primordial como maneira de afinar-se no mundo e entender seu papel nele.
Pessoas de elemento Nwyfre são mais dadas a inspiração, buscam suas práticas do
coração e não dos estudos que fazem. Confiam cegamente em sua intuição e no seu eu
interior para tudo. Se mostram mais voláteis a mudanças e a tomadas de decisão e tendem
a ser bem imediatistas em suas reações.
Já pessoas de elemento Calas são muito centradas, coesas e dedicadas aos estudos.
Estudam muito e analisam muito algo antes de praticar e só tomam suas decisões após
muito tempo de análise. Costumam ponderar de mais as coisas antes de atestar sua
confiança ou posicionamento. São muito estáveis em suas decisões e no que querem da
vida e não costumam demonstrar sempre o que sentem ou pensam. Costumam ser mais
analisadoras e introspectivas.
Por fim, pessoas de elemento Gwyar atuam no meio termo. Ao mesmo tempo que
pesquisam e estudam suas ações e práticas, também ouvem sua intuição e modelam as
práticas de acordo a conciliar as duas coisas: nem só estudo, nem só intuição. Igualmente
são voláteis e estáveis e passíveis a mudanças de humor. São facilmente conduzidas por
pessoas que demonstrem mais sabedoria, mas igualmente conduz aqueles que buscam
aprender com ela. Costumam ser pessoas sentimentais ou emotivas.
É necessário que reconheça e trabalhe seu elemento a fim de melhor afinar sua
relação consigo mesmo no trato de magia. Mas, acima de tudo, é necessário que se atente
aos perigos: a volatilidade do ar, o emocional da água, e o excesso de centralidade da

~ 24 ~
terra. Trabalhar os elementos é entender que tudo está conectado e nesse passo, é preciso
que também se conecte e aceite as influências dos demais elementos para aprimorar e
melhorar que você é.
Conduzindo os três elementos está Awen (gaulês) ou Imbas (irlandês), a conexão
sagrada de tudo. Awen é o fogo sagrado que queima na frente da Árvore do Mundo. É a
mais pura magia e a conexão sagrada com todas as coisas. É o fogo que queima na testa
dos artistas, é a inspiração sagrada que guia os Druidas. É a magia primordial e de onde
toda magia e toda a vida vem. Awen é o Fogo.
E o fogo transmuta a terra, transforma a água, conduz e consome o ar. Ou seja, o
fogo é aquele que transmuta a existência, transforma os sentimentos e os purifica, e
absorve o divino, alimentando-se dele. Por essa razão, todo fogo é a expressão e a
manifestação de Awen.
Alcançar Awen, seria como alcançar o Nirvana, é a meta de todo druida. Mas é
algo gradual. O estágio de conexão e comunhão com Awen possibilita o transe e a
transcendência espiritual também como manifestação corpórea, possibilitando que a
pessoa transcenda sua existência, conectando-se com tudo e se aprofundando em
mistérios muito além do mencionável. A conexão com Awen transcende a espiritualidade.

Oração de evocação dos elementos:

“Eu respiro Nwyfre e por ele sou conduzido(a).


A força e inspiração dos Deuses estão comigo.
Eu ando sobre Calas e por ela sou sustentado(a).
Eu tenho comigo a alegria das fadas.
Gwyar me rodeia e me preenche,
Através dele eu faço minha jornada.
Awen é meu espírito,
E com ele também sou sagrado(a) nessa morada.”

Os Três Raios de Luz10


Por Bellouesus Isarnos.

O mito da Awen: Em seu significado mais básico,


significa espírito, inspiração e iluminação.
Einigen, o gigante, o primeiro de todos os seres, viu
três raios de luz que desciam do céu. Esses três raios eram
também uma palavra de três sílabas, o verdadeiro nome do
deus Celi, espírito oculto da vida que cria todas as coisas.
Neles estava todo o conhecimento que já existiu, existe ou
existirá. Contemplando esses raios, Einigen pegou três
bastões de sorveira brava e neles talhou todo o
conhecimento em letras de linhas retas e inclinadas. Porém,
quando outros viram os bastões, compreenderam mal e adoraram os bastões como deuses

10
Retirados na íntegra de Isarnos, Bellouesus. Os Três Raios de Luz IN Seneween, Rowena A. Templo
de Avalon [S. I.]. Disponível em:
<http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=142>, acessado em: 01 de
maio de 2016.

~ 25 ~
em lugar de aprender o conhecimento neles escrito. Tão grandes foram a tristeza e a ira
de Einigen por essa razão que ele se rompeu e morreu.
Quando tinham se passado um ano e um dia após a morte de Einigen, Menw, filho
de Teirwaedd, deparou-se com o crânio de Einigen e viu que os três bastões de sorveira
brava tinham se enraizado dentro dele e estavam crescendo por sua boca. Dele as tradições
dos bastões passaram aos Gwydoniaidd - os antigos sábios dos celtas - e, por fim, deles
para os druidas. Assim, o conhecimento que um dia tinha brilhado em três grandes raios
de luz forma agora a sabedoria da tradição druídica.
O conto do gigante Einigen e dos três raios de luz é o mito de origem da
Renovação Druídica. Os próprios raios formam o símbolo central do Druidismo e surgem
constantemente onde quer que os ensinamentos da Renovação Druídica tenham deixado
traços. Eles representam Awen, o coração do caminho druídico.
Que é Awen? Awen é a luz interna que dá à mente a habilidade para alcançar além
de si mesma. É a Awen que transforma escritores de versos em poetas e mostra lampejos
do futuro a profetas e videntes.
Os druidas da Renovação estudaram as tradições da Awen e ligaram-na ao
conhecimento e à experiência de muitas fontes. Eles sabiam que pessoas de todas as
religiões experimentaram momentos de iluminação em que o mundo assumiu um
significado profundo. Algumas dessas experiências, eles sabiam, ocorreram quando as
pessoas voltaram sua atenção para fora, em direção à natureza ou aos grandes poderes
espirituais da natureza que o ser humano chama deuses. Eles sabiam que outras
experiências do mesmo tipo tiveram lugar quando as pessoas voltaram sua atenção para
dentro, para o centro de si mesmas.
Esses dois modos de experiência são simbolizados por duas formas de desenhar
os três raios de Luz. A primeira, a forma invocadora \|/, representa a experiência de
Einigen - a descida da Awen de uma fonte divina exterior ao indivíduo. A segunda, a
forma evocadora mais comumente usada /|\, representa a experiência de Menw - o
despertar da Awen dentro da alma individual por meio do estudo e da contemplação. As
duas formas juntas compõem o emblema chamado Tribann.
O conto dos três raios de luz é um mito, não história. Contudo, a palavra "mito"
precisa ser compreendida com cuidado. Hoje, muitas pessoas usam essa palavra
significando uma narrativa que não é verdadeira. Mitos reais, entretanto, não são simples
mentiras, ainda que não tenham nada a ver com fato histórico. Como disse o filósofo
grego Sallustius*: "Os mitos são coisas que nunca aconteceram, mas sempre são."
Assim, absolutamente não importa se uma pessoa chamada Menw ap Teirwaedd
existiu, se encontrou o crânio de um gigante com três ramos de sorveira crescendo de
dentro dele ou se isso aconteceu exatamente 366 dias após a morte do gigante. O sentido
jornalístico de fato literal que os fundamentalistas trazem aos textos sagrados não tem
lugar na compreensão druídica do mito. O âmago de qualquer mito não é se ele aconteceu
- ou, por falar nisso, quem o escreveu - mas o que ele significa e o que tem a ensinar.
O próprio discernimento está, na verdade, entre as coisas que o conto de Einigen
ensina. Einigen reconheceu os raios de luz e Menw reconheceu os ramos como portadores
de conhecimento. Os outros que viram os bastões falharam nessa compreensão e
adoraram os bastões em lugar de aprender sua mensagem. Existe aqui uma forte lição
sobre a diferença entre uma religião da crença e uma espiritualidade baseada na
compreensão. Os adoradores dos bastões trataram-nos como objetos de fé e deixaram
escapar cada ensinamento que esses objetos pretendiam transmitir. Do mesmo modo,
alguém pode acreditar no relato de Einigen e Menw e nunca entender que essa lenda tem
algo a ensinar.

~ 26 ~
Entretanto, essa não é a única lição do mito. Os três raios são também três gritos
e as três partes do nome do deus Celi, a fonte oculta de todas as coisas. Esse nome é a
própria palavra Awen, dividida em três sílabas: a-u-en. Pare um momento e pense no que
isso significa. Awen, a iluminação interior que concede dons de poesia e profecia, é o
verdadeiro nome da fonte de todas as coisas. Tocar a Awen é tocar a energia divina que
cria o universo. Escrever um poema que capture um raio de inspiração é representar o
feito de Einigen, cujos bastões de sorveira capturaram a sabedoria manifestada nos três
raios de luz. Ler um poema e captar um vislumbre da inspiração original é representar o
feito de Menw. O conto dos três raios de luz é então recontado em cada obra de
criatividade.
Na tradição druídica, os três raios são também os três primeiros raios do sol
nascente no solstício de verão, no solstício de inverno e nos equinócios, brilhando sobre
uma pedra ereta e lançando sua sombra pelo chão. Os raios do Sol traçam a forma
invocadora, enquanto as sombras traçam a forma evocadora.
Um mito antigo, encontrado em muitas lendas descreve a criação do cosmos pelo
corpo de um gigante primordial. Nessas lendas, o crânio do gigante torna-se a abóbada
celeste. O mito galês de Einigen, ecoando esses relatos antigos, mostra bastões de sorveira
brava que se erguem do crânio do gigante morto em lugar das auroras que definem o ano.
Desse modo, outro significado do ano é reencenado a cada ano quando o Sol se ergue nas
três posições fundamentais no horizonte oriental: sudeste no solstício de inverno, nordeste
no solstício de verão, exatamente no leste nos equinócios da primavera e do outono.
Cada raio possui seu próprio simbolismo e significado. O primeiro raio, ou raio
do solstício de inverno, estende-se do sudeste \|/ ou em direção ao nordeste /|\. Seu nome
é Gwron (gú-ron) e representa o Sol em seu mais baixo ponto no solstício de inverno,
entre a escuridão e o frio hibernais. Gwron é o conhecimento da Awen.
O segundo raio, ou raio do solstício de verão, estende-se do nordeste \|/ ou em
direção ao sudeste /|\. Chama-se Plenydd (plé-nith) e representa o Sol do solstício de
verão, no ápice de seu poder. Plenydd é o poder da Awen.
O terceiro raio, ou raio equinocial, estende-se do leste \|/ ou em direção ao oeste
/|\. Seu nome é Alawn (á-lon) e representa o Sol no ponto de equilíbrio, a meio caminho
entre seu percurso ascendente e descendente nos ciclos do ano. Alawn é a paz da Awen.
Gwron, Plenydd e Alawn são também os nomes de três misteriosas figuras da
lenda, os três primeiros bardos da Grã-Bretanha. Uma narrativa do Bardas afirma que
foram eles os primeiros a instituir os graus de Bardo, Vate e Druida entre os Gwydoniaidd,
os mestres da tradição entre os celtas, nos dias antes que suas perambulações os
trouxessem à Grã-Bretanha. Os Bardos, que preservam o conhecimento do passado,
correspondem ao raio do solstício de inverno. Os Vates, que encontram o poder vivo dos
reinos espirituais, correspondem ao raio do solstício de verão. Os Druidas, que unem
conhecimento e poder e tradicionalmente podiam separar exércitos à beira do combate
para trazer a paz, correspondem ao raio central dos equinócios.

~ 27 ~
Parte V:
Na Trí Daoine (Os Três Povos)

Três povos sobrenaturais habitam o mundo. Os Deuses, os sídhe (as fadas), e os


ancestrais. Esses são povos com quem compartilhamos esse Mundo, mas que, geralmente,
não vivem nas mesmas terras que nós. Pertencem a outros reinos. Contudo, eles podem,
e muitas vezes o fazem, interagir em nossas terras. Acredita-se que um véu separe nossas
terras do Outro Mundo. Esse véu é a própria bruma que cobre as vezes nosso mundo.
Viajar através das brumas é sempre um risco de atravessar o véu e ir parar em outros
mundos, em outras ilhas e terras, sobrenaturais. Além das brumas, é possível que portais
existam, se abram e se fechem, em vários lugares do mundo, conduzindo os viajantes e
transeuntes para o Outro Mundo.
Essa viagem a outras terras e mundos era algo que os celtas acreditavam poder
fazer também fisicamente, viajando pelo Oeste, rumo às brumas, ou atravessando portais.
Mas era sempre arriscado. As outras terras e seus habitantes podem ser hostis ou perversos
e podem facilmente ludibriar os seres humanos, uma vez que o tempo não passa da mesma
forma nos mundos. Assim, um viajante poderia passar dias no outro mundo sendo que se
passou anos nesse mundo. As lendas celtas são cheias desses casos e lembretes para se
tomar cuidado. Ao perceber que não está em sua terra, a recomendação é regressar o mais
rápido possível.
Contudo, acredita-se que pela corrupção do coração humano e pela baixa de sua
espiritualidade, as passagens que ligam os mundos está cada vez mais densa e mais difícil
de ser acessada. Distanciando as terras entre si, impedindo a passagem humana para
outras terras e dificultando a passagem dos Povos a esse mundo também.

Os ancestrais:
Os ancestrais são as almas, espíritos e energias dos antigos, dos antepassados e
também dos vivos (nossos pais, avós são também nossos ancestrais). Desde os ancestrais
de sangue, até os ancestrais da terra ou mesmo do mundo. Os celtas acreditam na
reencarnação. Acreditam que você tem a escolha de retornar a esse mundo para aprender
mais e você escolhe a linha e o aprendizado que irá obter. Por essa razão, não era surreal
que um celta marcasse o pagamento de suas dívidas para vidas posteriores. O que nos soa
calote, é totalmente aceitável na cosmologia celta.
O culto e às honras aos ancestrais era algo forte na cultura celta. O festival de
Samhain era também a eles dedicados. É nossos ancestrais que abriram e nos apontaram
o caminho a seguir. Eles nos deram a tradição e os ensinamentos. Harmonizar-se com
eles é manter a honra de uma família, de um povo e de uma terra. E a honra é o que um
homem pode carregar e possuir de mais sagrado.
Para explicar melhor sobre os ancestrais, usarei um texto de Roweena A.
Seneween, retirado na íntegra do site Templo de Avalon.11

11
Seneween, Roweena A. 9º dia: Ancestrais In Templo de Avalon [S. I.]. Disponível em:
<http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=60>, acessado em 30 de março
de 2016.

~ 28 ~
A ligação com as raízes ancestrais nos dão força para crescer e
amadurecer. Ancestral ou antepassado é uma relação muito mais
abrangente que vai além dos nossos queridos avôs que, talvez, já tenham
feito a passagem para o Outro Mundo; é a nossa linhagem espiritual e os
Deuses, os Ancestrais primordiais.

Ancestrais eu vos saúdo,


Da raiz à frondosa copa das árvores,
Sua essência habitará eternamente dentro de nós.

Podemos dizer que os ancestrais vão desde os antepassados mais


próximos, ou seja, as linhagens diretas das nossas quatro famílias
consanguíneas: avôs maternos e avôs paternos, e assim por diante - que no
Druidismo chamamos de Ancestrais de Sangue, até a herança nativa,
daqueles que habitaram a terra antes de nós - chamados de Ancestrais da
Terra. E, por fim, a afinidade celta que representa a tradição dos costumes
e das lendas de um povo que nos liga o passado ao presente - os Ancestrais
da Tradição.

Ancestrais eu vos saúdo,


Dos passos firmes e fortes sob a terra,
Daqueles que caminharam neste solo antes de nós.

Na visão que o universo se expande em espiral com suas múltiplas


escolhas, por meio da migração das almas, podemos ser até nossos
próprios ancestrais. Relembrando e vivenciando uma cultura tão antiga e
ao mesmo tempo tão atual, através de alguns dos seus princípios como a
honra, a verdade e a lealdade.

Ancestrais eu vos saúdo,


Da essência vivida na alma e no coração,
Tribos celtas que circulam em espiral entre nós.

Portanto, ao nos lembrarmos dos antepassados, durante nossos


ritos, estaremos conservando todo um patrimônio cultural, herdado de uma
conexão ancestral, proporcionando assim, uma relação de reciprocidade de
sentimentos de amor e amizade em todos os seus descendentes.

Ancestrais eu vos agradeço,


Pelo manto invisível que nos protege,
Da jornada às águas profundas e que renascem em nós.

Os mortos não estão longe, pelo contrário, estão muito, mas


muito mais perto do que se imagina. É um encontro com as profundezas
do "self" mais oculto da natureza. É uma viagem em direção a novos
horizontes. Num certo sentido, estamos sempre à espera do grande
momento da colheita ou do retorno às raízes, que sempre nos assombra
com uma profunda sensação de ausência. A estreita faixa de claridade
que chamamos de "vida" se estende a escuridão do desconhecido rumo
à morada dos ancestrais. Gosto de pensar na morte como um
renascimento. A alma é livre, em um mundo onde não há separação,

~ 29 ~
sombra ou lágrimas, somente reencontros. (O'Donohue, John apud.
Seneween, Roweena A.)

Os Sídhe:
As fadas são seres intrigantes que aparecem de forma repaginada várias vezes em
várias mitologias. Eu particularmente adotarei as fadas como sinônimo do termo grego
“Elemental”, seres (e não espíritos) mágicos ligados a natureza e que muitas vezes vivem
no Outro Mundo ou em trânsito constante a esses mundos.
Ao contrário do que os contos recentes descrevem, as fadas não são apenas seres
alados, pequenos que cuidam da natureza. De acordo com a origem do termo, em
inglês, Faery People, “O Povo das Fadas” ou o “Povo do Faery”. Essa categoria é uma
categoria generalizadora que engloba uma porção de seres catalogados, e outros ainda
não catalogados, que costumamos chamar de “seres mágicos”. Assim, as fadas são todos
os seres mágicos que vivem em diálogo com nosso mundo: silfos (os alados), gnomos,
duendes, dragões, salamandras, e uma porção de outros catalogados e muitos que ainda
não foram catalogados por nós.
O “Faery” pode se referir ao “País das Fadas”, uma terra pertencente a nossa
realidade, mas separada de nossa esfera por um véu mágico que separam os mundos.
Também é conhecida pelos celtas como Tír na nÓg. Esse outro mundo é tangente ao
nosso, o que significa que vivemos em realidades sincrônicas, o que acontece em um
abala o que acontece no outro e é assim que as fadas tem o poder de moldar nosso mundo.
Contudo a passagem de um para o outro nunca foi descrita como simples ou fácil, mas
um fato a ser dito é que as fadas as dominam.
Apesar dos contos modernos, as fadas não são – e nem devem ser vistas dessa
forma – seres mágicos puramente bons, dóceis e fofinhos. Pelo contrário. As mitologias
mais antigas nos contam que são um povo bem arredio, tímido e muitas vezes perversos
quando se sentem perturbados, ou envergonhados. Contudo, é possível fazer amizades e
trabalhar em conjunto com as fadas quando as entendemos bem.
Assim como nós, as fadas têm seu lado obscuro. Esse lado está vinculado em
primeiro às lendas que contam que as fadas, quando envergonhadas ou ofendidas, atacam
com maldições e as vezes até de forma letal aquele a quem elas consideram seus
agressores, seja tirando suas posses, sua visão, causando loucuras ou mesmo levando a
morte. As vezes punindo diretamente, outras através de intermediários. Outro fator que
comprova esse lado obscuro é o senso de humor sombrio ou negro das fadas, que muitas
vezes se divertem com o mal feito ou com as vergonhas humanas, por isso elas são
associadas às travessuras da noite de Halloween. A esse humor travesso e punitivo,
também se associa a chamada “possessão de fada” que se remete a influência direta,
possessiva de uma fada sobre alguma pessoa, fazendo-a realizar grandes feitos e
prodígios, ou fazerem coisas humilhantes ou mesmo enlouquecendo-a. No primeiro caso,
é costume que a pessoa não se recorde de absolutamente nada do ocorrido após o término
da possessão. Outro fator que contribui é a presença de várias lendas que descrevem as
fadas raptando seres humanos, em sua maioria bebês e crianças para o seu mundo – não
com o intuito de fazer mal a criança, mas de criá-las. Essas lendas encontram subsistência
na hipótese de que as fadas não poderiam amamentar seus próprios filhos e, por isso,
pegariam filhos humanos para criá-los, muitas vezes deixando seus filhos para que os
humanos o criassem.
Os changelings (os trocados) são geralmente filhos de fadas criados como
humanos, ou humanos criados como filhos de fada. Para reconhecer os primeiros,

~ 30 ~
precisaremos nos remeter a sua infância. As lendas contam que os filhos de fadas quando
criados por humanos são pessoas que durante a sua infância são verdadeiras pestes
ambulantes, crianças insuportáveis, muitas vezes mal-educadas, travessas e impossíveis.
Mais tarde quando a adulta, os dons de fada dessa criança podem começar a atuar e ela
pode encontrar extrema facilidade em acessar o Outro Mundo, ou mesmo em saber de
coisas que teoricamente ela não deveria saber. A pergunta que vem em seguida é como
isso é possível? Uma criança fada ser criada como humana, e sua aparência? As lendas
também respondem isso. Uma fada tem a habilidade da metamorfose e por isso, pode
estar entre nós sem ser percebida ou reconhecida fisicamente, bem como, quando
desenvolve essa habilidade, pode mudar de formas de acordo com sua vontade e
necessidade.
Enfim, esse lado obscuro das fadas nos remetem a ideia de cuidado e respeito.
Sabemos que são um povo que gosta de privacidade, liberdade, não gostam de espiões
nem de intrusos em seus territórios. Assim sendo, são bem tímidas, impulsivas, arredias,
travessas e perigosas. É preciso cautela e muito respeito e ponderação ao lidar com elas.
Elas punem ao simples fato de se sentirem ameaçadas, e não costumam ter dó.
Contudo, elas também tem o outro lado, o lado benevolente e muito ligado a
música (uma de suas dádivas). Elas ajudam àqueles a quem elas se simpatizam ou que
demonstram respeito e benevolência para com elas. E podem ser grandes aliadas. Afinal,
a elas são dadas mitologicamente o poder sobre o destino e andamento das coisas,
principalmente aquelas que envolvem maturação ou sorte. Conquistar uma fada, ter seu
auxílio e respeito é sempre algo muito nobre e honrado. Mas em troca você também
deverá sempre agradá-las e manter a reciprocidade de “bom vizinho”, e entender suas
impulsividades e genialidade difícil. Entretanto, nunca deixe-as sentir que você está sendo
caridoso em “pagamento” a um serviço que elas lhe tenham prestado ou prestarão. Elas
não são serviçais e detestam se sentir assim, e isso provavelmente as fariam mostrar seu
pior lado.
Lidar com as fadas não é tarefa fácil, nem algo que se resolva com oferendas. É
preciso que elas sintam confiança em suas intenções para se soltarem e mostrarem seus
melhores lados, mas uma vez que isso ocorra, a parceria está feita e a simbiose passa a
ser algo cotidiano, a qual não se pode descuidar. É recompensador, mas dá trabalho e leva
tempo. Isso não significa que você não possa fazer agrados e mostrar seu respeito em
horas e datas festivas, mas tenha sempre ciência de quem são as fadas e para além disso,
no perigo e no privilégio de mexer com elas. Se você for um bom vizinho em quem elas
sintam confiança, além de serem suas maiores e melhores aliadas, te ensinaram saberes
preciosos que só elas possuem. Mas lembre-se, é sempre uma simbiose: uma mútua e
continua troca, respeitosa e não comerciável.
Os celtas chamavam as fadas de sídh (singular, sidhe, plural). Mas essa palavra
nos fala mais de seu local, de suas moradas, ou dos portais até elas nesse mundo, do que
das próprias fadas. Sídh, a primeiro momento, significa “colina”, e assim as fadas
seriam Daoine Sídh, povo da colina. Contudo o termo pode ser mais amplo, e abrigar
lugares sagrados onde as fadas vivem como colinas sagradas, cemitérios, árvores
solitárias, círculos naturais (clareiras, círculos de pedras anteriores a chegada de um povo,
círculo de cogumelos, enfim qualquer formação circular encontrada na natureza), túmulos
antigos, templos, cachoeiras e nascentes, dentre outros. Sídh, portanto, também pode ser
atribuído ao Espírito Sagrado de algum local ou coisa. Um rio, por exemplo, é vivo, e
para além dos seres que habitem esse rio, esse rio possui um espírito. Esse espírito
também é chamado de sídh. Cabe ressaltar que as fadas não são Deuses, mas em alguns
casos podem ser tão poderosos quanto eles. Assim sendo, as lendas nos mostram que o
desrespeito às moradas das fadas são sempre rapidamente punidos por elas. Em alguns

~ 31 ~
países como Irlanda, ainda hoje é costume desviar estradas e construções para não destruir
árvores ou lugares onde lendas contam da existência das fadas ali.
Isso nos remete uma segunda importância, a atenção ao entrar em lugares antigos
e, principalmente naturais, devemos ser cautelosos sempre, pedir sempre permissão, e
adentrar ao espaço com respeito e honra, nunca se sabe se ali é um sidh e se for, a última
coisa que queremos é a vingança de uma fada por desrespeito ao seu espaço.
Uma coisa ainda nos resta falar. Falamos que elas podem ser agressivas e
travessas, além de ter um humor negro e abduzirem pessoas e crianças (as vezes objetos
e comidas). Alguma forma deve haver de proteção... E há! As lendas descrevem que as
fadas não tem tolerância ao metal, sobretudo a prata. Assim sendo, objetos metálicos ou
de prata podem servir de amuleto contra as influências ou ataques de uma fada, outro
método bom é portar sempre um pouco de aveia consigo, as fadas não só não digerem
aveia como não se aproximam quando a sentem por perto; erva-de-são-joão também é
usada na proteção contra abdução pelas fadas; era habitual vestir crianças como adultos
ou tampar seus rostos com máscaras e panos em noites e dias em que a proximidade com
as fadas era maior (disfarçadas as crianças teriam menos chance de serem abduzidas).
Contudo, o velho respeito e precaução são sempre as melhores proteções a meu ver. Além
de te manterem seguro, ainda te possibilita criar um elo positivo com esses seres. Assim,
além das dicas de “bom vizinho” descritas acima, os eufemismos dirigidos às fadas
ajudam muito: “povo nobre”, “bom povo”, “os bons vizinhos”. Outros costumes
importantes é que, nas noites em que o véu está mais tênue (Lua Azul
e Samhain / Halloween) é costume avisar as fadas sempre que vai esvaziar um recipiente
de água ou jogar algo no chão e afins, para evitar que as acerte e cative seu desejo de
vingança...
Por fim, ao falar de fadas também falamos dos Espíritos Guardiões. Esses são
seres ou espíritos mágicos – muitos deles são fadas – que guardam lugares e espaços.
Acredita-se que todo local, principalmente natural ou sagrado, tenha o seu. Assim como
as fadas, de seu humor e respeito dependem a (boa) estadia da pessoa naquele local.
Muitas vezes, mais de um espírito podem habitar ou guardar um determinado lugar, mas
eles sempre estão de olho e nada os escapa. Por isso, era um costume comum dos celtas
também cultuá-los e criar sempre laços respeitosos com eles, de onde, quantos e como
quer que eles fossem. Assim sendo, a dica é: nunca entre em algum território (mesmo um
seu habitual) sem prestar respeito e honras ao guardião do local, bem como sem pedir sua
permissão. Principalmente se esse local é sagrado, natural e/ou desconhecido. Você
depende do humor, boa vontade e acolhimento desse espírito para ter uma boa e saudável
estada, onde quer que seja; ou para manter um local sagrado seguro e apto para seu uso.

Os Deuses:
Os celtas eram politeístas. Cada tribo, reino, nação tinha seu próprio panteão e não
havia uma visão de um Deus ou Deusa únicos que fundissem ou unissem todos os demais
Deuses como arquétipos de sua unicidade. Igualmente, não era comum que uma tribo
cultuasse aos Deuses de outra tribo. Respeitava-se o panteão local conforme a tradição e
os ensinamentos (passados de boa a orelha). Haviam apenas cinco Deuses celtas que
historicamente estão presente em todas as tribos e nações, chamados de Deuses pan-
céticos: Danann, Dagda, Morrigan, Lugh e Brigit.
Contudo, nos dias de hoje, com o recomeço do paganismo e a globalização, é
comum que alguns grupo optem por aderir o culto a Deuses de diferentes panteões celtas,
prática realizada a partir de estudo e de forma honrosa e respeitosa. Mas também há

~ 32 ~
grupos que optam por seguir de maneira histórica e assim cultuar apenas os Deuses da
tribo ou nação que segue. Particularmente acredito que ambas as práticas são coerentes,
desde que feitas com sinceridade, estudo, respeito e honra.
Os Deuses eram cultuados como mestres divinos e seres de sabedoria e poder que
excedem incontáveis vezes às humanas. Viviam em terras do Outro Mundo, mas podiam
transitar, partilhar e até viver em nossas terras. Suas formas de atuação nesse mundo eram
através das forças da natureza e de seus animais totêmicos. Acredita-se que os Deuses
podem se transformar nas forças da natureza ou em animais para atuar e viver nesse
mundo.
A visão celta dos Deuses é descrita de maneira profundamente humanizada.
Nossos sábios mestres possuem humores, desejos, se ferem, festejam, sentem dor, ira e
prazer. E muito disso ainda nos é passado nos mitos e lendas que chegaram até nós, nos
quais os Deuses são descritos com características perfeitamente humanas, vivendo em seu
convívio nessa ou em outras terras e, muitas vezes, são aclamados como heróis. O
exemplo disso está nas lendas dos Tuatha dé Danann e na conquista de Ériu (Irlanda),
onde a tribo da Deusa Danann é conduzida, comandada e governada não apenas por heróis
nobres, mas pelos próprios Deuses que fizeram ali sua morada. Isso não é tão surreal se
lembrarmos que o véu difere terras e mundos que pertencem fisicamente ao nosso próprio
Mundo (Universo), assim o trânsito, inclusive físico, não é algo absurdo. Contudo, com
o véu se solidificando, cada vez menos os Deuses vem habitar entre os humanos e cada
vez mais nos distanciamos de suas graças, honras e heroísmos.
O contato com os Deuses é feito de maneira honrosa e amigável. É possível
conversar e indagar as coisas aos Deuses, desde que de forma respeitável, você terá sua
resposta e auxílio, basta se atentar aos sinais a sua volta. Outra forma de contatar os
Deuses é através de oráculos e vidências. Os Deuses falam e nosso íntimo, o essencial é
aprender a ouvir sua voz. A relação honrosa e o culto aos Deuses é uma forma de
agradecimento e de estreitamento de laços. Honrar e cultuar os Deuses é uma forma bela
e saudável de dizer o nosso “muito grato” a eles. Devemos lembrar que eles controlam
nosso destino e o destino de toda existência terrena. São os seres superiores de nosso
Mundo, criaturas da Grande Canção, mas também aqueles que zelam e escutam seu tocar.
Os Deuses não são autocráticos, mas zeladores do Mundo, mantenedores do
equilíbrio universal que permite a existência e a vida. Awen arde intensamente nos
Deuses, e através deles nos aproximamos ainda mais de Awen e do Oran Mor. E estar a
seu serviço é aprender e adquirir honra e sabedoria, servindo ao equilíbrio.
Entre os povos celtas, contam-se mais de cento e cinquenta Deuses. Por essa razão,
não dedicarei uma fala sobre cada um deles no momento. O que nos importa dizer é que
os Deuses celtas são pré-cristãos, existem e eram cultuado muito antes da datação de Jesus
ou da cristianização da Europa. Muitos desses Deuses foram canonizados pela Igreja
Católica – como o caso de Brigit que virou Santa Brígida (padroeira da Irlanda –; outros,
ao contrário, foram demonizados – como o caso de Cernunnos, cuja forma hibrida de
natureza, animal e humana está na base da forma do diabo medieval.
Apesar desse triste fato, os Deuses celtas nada têm a ver com os demônios cristãos.
Não há culto ao diabo ou a qualquer secto a ele relativo entre as práticas e cultos celtas.
Assim como a maioria dos grupos celtas de hoje não cultuam os elementos da cristandade
ou o Cristo. Um aprendizado que um culto politeístico semeia é o do respeito a
diversidade, não há apenas um caminho possível, há múltiplas verdades e todas são
igualmente verdadeira. Dessa forma, o respeito e a honra estão na base do culto, assim
como a busca pelo equilíbrio mais do que a noção clássica de “bem contra o mal”.

~ 33 ~
Parte VI:
Coiri Filidechta (Os Caldeirões da Poesia)

Para os celtas, os Coiri Filidechta (Caldeirões da Poesia) são parte componentes


de todas as pessoas, e representam nossa missão terrena e espiritual nesse mundo.
Três são os Caldeirões que nos compõem: Coíre Goiriath (o Caldeirão do
Aquecimento), Coíre Érmai (o Caldeirão do Movimento) e Coíre Sois (o Caldeirão da
Sabedoria).
Coíre Goiriath fica localizado no ventre, ou na barriga, é o caldeirão que serve de
receptáculo de Dán (nosso dom, destino, nossa canção ou poesia interior é o Dán que
confere Brí ao indivíduo). Graças a esse caldeirão estamos vivos e atuantes. Ele nasce em
todos os indivíduos virado para cima e cheio. Mantê-lo cheio e virado é o que nos mantém
vivos, por isso está vinculado ao mundo físico e a nossa saúde.
Coíre Érmai fica localizado no peito, é o caldeirão que serve de receptáculo para
o Brí (nossa essência, nosso vigor, nossa energia). Esse caldeirão está ligado a nossa
missão terrena, aos nossos sentimentos, nossas sensações. É aquilo que devemos lidar e
aprimorar. Afinal, Brí é um poder inerente que pode ser aprimorado ou atrofiado. Essa
caldeirão nasce lateralmente, parcialmente preenchido por Brí. É nossa missão desvirá-lo
para a posição correta e enchê-lo totalmente.
Coíre Sois fica localizado sobre a cabeça, é o receptáculo de Bua (nossa vitória,
mérito, honra, dignidade e sabedoria). Esse caldeirão está ligado a evolução ou
aprimoramento que devemos buscar alcançar. Ele representa nossa elevação humana e
espiritual, nossa sabedoria muito mais que conhecimento. Bua pode ser ganhado ou
perdido de acordo com nossas ações. Esse caldeirão nasce totalmente de cabeça para
baixo e vazio, é nossa função desvirá-lo totalmente e enchê-lo.
Coíre Goiriath está, portanto, relacionado ao nosso físico primordial, o que nos
forma como seres viventes desse mundo. Trabalhamos ele ao mantermos nossos ossos
firmes, nossa carne sadia e forte e nosso cabelo e pele saudáveis e atuantes como antenas,
como sensores. Ele nos confere nosso dom inicial, nosso poder pessoal, nossa força vital,
nosso Dán; e fabrica nosso Brí, nossa energia. Esse caldeirão precisa ser mantido
corretamente virado e cheio.
Coíre Érmai está relacionado ao nosso lado fluído, mas essencial a vida. Por isso
é regido pelas nossas emoções e fala de nossa tarefa nesse mundo. Nos ensina que
precisamos nos aprofundar em nossa sensação, em nosso eu interior, nas nossas emoções.
Sua indicação como movimento é a ideia da fluidez das coisas. Precisamos manter nossa
mente sã, nossas emoções compreendidas e não omitidas, e ter cuidado com o que
absorvemos e enviamos. Esse caldeirão precisa ser colocado na posição certa e
completado.
Coíre Sois está relacionado a nossa meta, nosso objetivo, nossa iluminação, por
assim dizer. É a aquisição de sabedoria. Está relacionado com nossas decisões, nossa
personalidade, nosso foco. É preciso entendermos mais sobre nós mesmos e desenvolver
mais da capacidade que temos em todo o conjunto que chamamos de cabeça. Esse
caldeirão precisa ser totalmente desvirado e enchido.
Se Coíre Goiriath está relacionado a Terra e a Calas, nos indica que sua
manutenção também está relacionada a habilidades desse reino e elemento: solidez,
estabilidade. E já nos fala daqueles que podem nos ajudar nisso: os sídhe (as fadas).

~ 34 ~
Aprender com os sídhe que conhecem melhor essa existência do que nós mesmos, é
ajudar-nos a manter o Caldeirão do Aquecimento, sempre cheio, pois disso depende o
trabalho dos demais caldeirões. Esse caldeirão é repleto de Dán, que é nosso dom, nosso
destino e força vital. Aceitar quem somos e nossa missão é parte indispensável para
manter Dán produzindo Brí, que encherá o próximo caldeirão.
Já Coíre Érmai está relacionado ao Mar e a Gwyar, nos fala que sua manutenção
está relacionada ao reino e elemento Mar: fluidez, movimento, emoções. E quem poderia
nos ajudar nesse processo são os Ancestrais. Nossos antepassados que deixam conosco
uma carga enorme de experiência e aprendizado em vida, que devemos aprender e
recorrer a eles para lidar com nossas emoções. Dar voz a experiência e busca-la sempre e
também buscar o afeto, o carinho que nos liga com os que já se foram. Contudo,
precisamos que Coíre Goiriath esteja cheio, e corretamente posicionado para que, com
nosso trabalho e desenvolvimento, do Caldeirão do Movimento possa acontecer. É nosso
dever desvirar esse caldeirão e preenche-lo com Brí. Enchido com Brí, começar-se-á a
produzir Bua, nossa honra, sabedoria e dignidade. Que será indispensável ao próximo
caldeirão.
O Coíre Sois, por sua vez, está relacionado ao Céu e a Nwyfre, e sua manutenção
está relacionado a esse reino e elemento: através da inspiração e condução. Nossos
ajudantes nesse processo são os Deuses, que são nossos grandes mestres e mentores, nos
inspirando e conduzindo pela vida. Entretanto, para começarmos a trabalhar esse
caldeirão, é preciso manter os dois outros alinhados, e totalmente preenchidos por Dán e
Brí, para que Bua comece a ser produzido. Mas não adianta apenas produzir Bua, é nossa
função ainda antes desvirar totalmente esse caldeirão para que ele possa ser um
receptáculo de Bua. A mensagem que nos fica é simples e direta: De que nos adianta
honra e sabedoria se não aceitamos quem somos, se não usamos nosso movimento
(emoções) em prol de nosso destino e personalidade. Onde colocaremos a honra sem
autocontrole e auto aceitação? Por fim, quando os três caldeirões estiverem totalmente
desvirados e preenchidos, teremos alcançado nossa evolução e iluminação. Entendido de
fato quem somos e compreendido o mundo a que vivemos.
Essa difícil tarefa não é creditada a uma só vida. Os celtas acreditavam que era
preciso várias vidas para atingir esse alinhamento final. Contudo, sabemos que podemos
buscar manter Coíre Goiriath e podemos trabalhar (desvirar e encher) Coire Érmai, para
que comecemos a trabalhar e a girar essa engrenagem que alinha todos os Caldeirões.
Mas uma coisa há de ser sabida: assim como é possível encher os caldeirões, é possível
perder seus conteúdos. Um caldeirão que não é trabalhado ou mantido, pode também
voltar a virar cada vez mais de cabeça para baixo. Se isso acontece com Coíre Érmai,
cairíamos numa situação de depressão. Se isso acontece com Coíre Goiriath,
minguaríamos nossa vida em doenças ou culminaria em nossa morte física. Já Coíre Sois,
está totalmente de cabeça para baixo, para nos lembrar que não sabemos absolutamente
nada desse mundo sem antes sabermos de nós mesmos, mas mantê-lo desvirado é cair em
consentimento com uma vida de ignorância.

~ 35 ~
Coíre Sois
Cabeça
Receptáculo de Bua
(honra e sabedoria)

Coíre Érmai
Peito
Receptáculo de Brí
(energia e emoções)

Coíre Goiriath
Ventre / barriga
Receptáculo de Dán
(saúde e destino)

Trabalhando o Coíre Érmai:

Endovelicon, em sua palestra no VI EBDRC iniciou um exercício


(diário, se possível) para trabalhar o Coíre Érmai. Mas manteve sua
indicação. É preciso cuidar do Coíre Goiriath, não se pode ficar extra
confiante por ele já nascer cheio. O exercício de Endovelicon visa trabalhar
o Coíre Érmai a partir de nossas emoções.
Para entendermos esse exercício, é preciso entender alguns pontos.
Segundo os textos do Caldeirão da Poesia (século VI dEC), três categorias
de sentimentos movimentam o Caldeirão do Movimento: 4 tristezas
(anseio, luto, ciúme e peregrinação / sacrifício), 4 alegrias humanas
(sexo, saúde, composição bárdica e inspiração) e 1 alegria divina (que
nunca foi descrita, mas acredita-se ser o estado de transe). A jornada de Máel
Dúin (século VIII dEC)12 também ensina e se remete a essas três categorias
quando o primeiro irmão tem seu fim na Ilha do Riso (parte XXXI), o
segundo irmão tem seu fim na Ilha do Lamento (parte XV) e o terceiro irmão
tem seu fim da Ilha do Gato Flamejante (parte XI). Ainda indicando para
esse caminho, é descrito que a Harpa mágica de Dagda possui três modos:
Goltraí, quando ela toca tristeza; Geantraí, quando ela toca alegria; e
Suantraí, quando ela toca o sono.
Desse modo, Endovelicon nos convida a seguinte relação:

12
Texto disponível no site da Ordem Ramo de Carvalho, conforme link:
<http://www.ramodecarvalho.com.br/mitologia/mitologia-gaelica/a-jornada-de-mael-duin/>.

~ 36 ~
Choro / Tristeza Riso / Alegria
Referências Sono / Transe (*)
(-) (+)
Caldeirão
do Alegrias
Tristezas Alegria divina
Movimento humanas
/ Poeisa
Jornada de Ilha do Gato
Ilha do Lamento Ilha do Riso
Máel Dúin Flamejante
Harpa de
Goltraí Geantraí Suantraí
Dagda

Seguindo essa relação, podemos constatar que as emoções


(tristezas, alegrias e alegria divina) movimentam e preenchem o Coíre
Érmai. Ou seja, precisamos aprender a controlar e usar nossas emoções a
nosso favor, sem desvalorizações, afinal as tristezas também movimentam
o Caldeirão do Movimento.
Desse modo, o exercício proposto por Endovelicon parte do
princípio de nos conectarmos e conduzirmos nossas emoções a fim de
controla-las e nos conectarmos com elas. O exercício é simples e parte da
ideia básica da meditação e da respiração.
O primeiro exercício é referente às tristezas. Deve-se sentar
relaxadamente, escolher uma das 4 tristezas (algo que remeta a situações
tristes envolvendo uma das 4 tristezas elencadas em sua vida pessoal).
Depois fecha-se os olhos, rememora a lembrança triste escolhida, e inicia
o que podemos chamar de “respiração da tristeza”, uma respiração na qual
inspiramos entrecortadamente e expiramos continuamente (essa respiração
é similar a respiração do choro). Prolongue essa respiração e deixe a
lembrança preencher você, lide com a tristeza por alguns minutos. Volte
se concentre com o aqui e agora para seguir ao próximo exercício.
Já o segundo exercício, que se recomenda fazer logo em sequência
ao primeiro, cabe escolher uma das 4 alegrias humanas listadas. Fecha-se
os olhões, revive aquele momento feliz e inicia a “respiração da alegria”,
uma respiração na qual se inspira continuamente e se expira
entrecortadamente (lembrando a respiração de uma risada). Prolongue essa
respiração e deixe a lembrança preencher você, lide com a alegria por
alguns minutos. Volte se concentre com o aqui e agora para seguir ao
próximo exercício.
O terceiro e último exercício pode ser feito depois dos exercícios
anteriores, logo em sequência, mas também é muito útil antes das práticas
mágicas e ritualísticas. Ele consiste em você esvaziar sua mente, buscar
sua conexão apenas com o divino que há em você. Sua respiração será a
clássica respiração de meditação: inspira continuamente e profundamente,
segura o ar por cerca de três segundos, expira continuamente e
profundamente, segura o ar por cerca de três segundos. Permaneça desse
estágio por alguns minutos. Depois retorne e se conecte com o aqui e
agora. O Exercício acabou, e você poderá sentir a diferença.
Se feito em prática diária, esse exercício pode ajudar a mover o
Coire Érmai, além de ajudar-nos a lidar com nossas emoções nas mais
diversas situações em que elas se mostrarem. Mas lembre-se, suas

~ 37 ~
emoções (quais sejam elas) são essenciais para sua evolução. Não as omita.
Viva-as e aprimore-se com elas.

Meditação dos Três Caldeirões13:

Sentado, relaxe os ombros, os braços e as pernas. Apoie


firmemente os pés no chão e mantenha a coluna ereta. Feche os olhos e
respire profundamente expandindo a barriga e enchendo o peito de ar,
segure durante 3 segundos e expire lentamente soltando o ar... Relaxe!
(repita três vezes).
Os pensamentos passam por você como nuvens... Respire
tranquilamente e deixe a sua mente imaginar.
Não muito longe, debaixo dos nossos pés - o fluxo de energia da
Terra encontra o seu caminho que flui em rios profundos, muitas vezes ele
sobe à superfície do mundo através de rachaduras e eixos.
Imagine agora que o fluxo se amplia, ligando-o às águas a partir da
base dos seus pés, seguindo pelas pernas até a base da sua coluna. Respire
fundo e imagine um caldeirão, no seu ventre, enchendo-se com as águas
da terra... Conforme o caldeirão enche, sinta a força do seu corpo, o calor
do sangue e a dureza dos ossos... Energizado e fortalecido pelo fluxo de
energia da Terra, no Caldeirão do Aquecimento (Coíre Goiriath), respire
profundamente e relaxe o corpo, deixando ir embora todas as tensões.
Respire tranquilamente...
Imagine agora que o fluxo de água sobe pela sua coluna. Respire
fundo e imagine um caldeirão, na altura do seu coração, enchendo-se com
as águas da terra... As águas brilhantes da terra enchem o Caldeirão do
Movimento (Coíre Érmai) e você se torna consciente da sua mente, das
suas emoções e de tudo que o conecta a grande teia da vida... Energizado
e fortalecido pelo fluxo de energia da Terra, sinta-se em harmonia com o
Todo.
Respire tranquilamente...
Imagine agora que o fluxo de água sobe do peito, até a altura dos
olhos. Respire fundo e imagine a energia de ascensão das águas preencher
o Caldeirão da Sabedoria (Coíre Sois) com o poder da Terra... Conforme
esse caldeirão enche, pense o que lhe inspira à alma e quais são os seus
objetivos na vida... Energizado e fortalecido pelo fluxo de energia da
Terra, sinta-se abençoado pelos Deuses.
Respire tranquilamente...
Sinta a energia fluindo por todo o seu corpo, preenchendo-o
completamente... O poder da terra agora se une ao poder dos céus.
Respire tranquilamente...
Imagine acima de você uma estrela que brilha como o fogo de uma
lareira. Veja o poder do fogo, irradiar um raio de luz sob o Caldeirão da
sua cabeça.

13
Retirada na íntegra de Seneween, Roweena A. Meditação dos Caldeirões In Templo de Avalon [S. I.]
Disponível em: <http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=45>, acessado
em 30 de março de 2016.

~ 38 ~
A luz nas águas da terra brilha como o ouro e lhe traz iluminação e
inspiração, que através do seu corpo, desce até encher o Caldeirão do seu
coração.
Irradiando esse brilho dourado, descendo até chegar ao Caldeirão
do seu ventre, preenchendo-o intensamente com o calor do fogo dos céus.
Respire fundo e deixe a água e a luz se misturarem em você.
Vire as palmas da mão para cima e deixe fluir, pelos braços, o poder
da terra e do céu... É através das mãos, que a magia é trabalhada. Veja uma
chama dançando, com o poder do céu, no centro da água bem na palma da
sua mão. Mantenha essa visão e abra os olhos.
Olhe para sua mão e sinta o calor e o formigamento das palmas.
Traga suas mãos e coloque-as no peito, sinta o seu corpo sendo todo
preenchido com o fogo e a água. Feche os olhos.
Respire fundo, agora a água encontra com a chama do fogo e se
transforma em névoa... Relaxe os braços sob as pernas e deixe a névoa lhe
envolver em uma enorme esfera brilhante.
Sinta a energia, você está centrado entre a terra e o céu, os dois
poderes que nos levam a Fortaleza dos Druidas - o "Caher Draoi"
(pronuncia-se “Cai-er Dree”).
Mantenha essa visão, por um tempo, para trabalhar a magia em sua
vida.
Respire fundo e lembre-se da sua conexão com os poderes da terra
e do céu... Permita que a chama recue para tornar-se menos quente,
passando pela cabeça no Caldeirão da Sabedoria, pelo peito no Caldeirão
do Movimento e pelo ventre no Caldeirão do Aquecimento.
A chama dança alegremente sobre as águas e flui, naturalmente, de
volta para a fonte, apagando-se lentamente. Energizado e fortalecido,
retorne ao nosso mundo... Fáilte!

~ 39 ~
Parte VII:
Na Dúile (Os Dúile / Elementos)

Os Dúile (Elementos) são, de acordo com Rowena, “nove elementos ou virtudes


essenciais ao homem”. Assim sendo, eles são os elementos vitais, sem os quais nada pode
existir. Compreender e articular esses elementos é fundamental para a vida e sua
manutenção, e ainda mais importantes para o bom funcionamento mágico.
Por serem constituintes de toda existência, esses elementos acabam por integrarem
a cosmologia celta, de maneira a conectar o planeta, como um organismo vivo que nos
abriga, e nós, organismos independentes e interdependentes do planeta. Em seu artigo
sobre os Dúile14, Rowena estabelece a seguinte comparação entre os Dúile e seus
correspondentes naturais15:

1°- Cnaimh (Os ossos): estrutura que sustenta o corpo. Para os celtas os ossos continham
a magia de uma pessoa. Correspondem à Cloch (pedra).

2°- Colaind (A carne): estrutura que nos dá forma e possibilita a nossa locomoção.
Corresponde à Talamh (Terra).

3°- Gruaigh (A pele / cabelo): são como "antenas", sensores corporais sensíveis ao toque,
calor, dor, frio e prazer. Indicadores de saúde e bem-estar. Correspondem às Uaine
(árvores e plantas verdes).

4°- Fuil (O sangue): fluido que dá vida ao corpo, é o rio que flui dentro de nós, que nos
aquece e reflete nosso estado emocional. Corresponde ao Muir (Mar).

5°- Anal (A respiração / sopro): é a renovação da vida, elemento que promove a limpeza
dos sentimentos e o alívio das tensões. Os celtas viam a respiração como o ar que circula
no céu. Corresponde ao Gaeth (vento).

6°- Imradud (A mente): é a responsável pela sabedoria do homem, são como as ondas
alfas da mente que controlam a natureza ondulatória do pensamento. Corresponde à
Ghealach (Lua), que controla os ciclos das marés.

7°- Drech (A face / rosto): responsável por expressar a personalidade e como o mundo as
percebe. A coragem, a reputação, a palavra e a honra eram demonstradas visualmente
pelos bardos, através da poesia. Corresponde ao Grian (Sol).

8°- Menma (O cérebro): funciona como um computador, responsável por armazenar


pensamentos e memórias, o organizador da nossa capacidade mental. Corresponde à Nel
(nuvem).

14
Seneween. Rowena A. 5º dia: Elementos IN Templo de Avalon. Disponível em
<http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=56>.
15
Idem. Transcritos na íntegra.

~ 40 ~
9°- Ceann (A cabeça): era venerada pelos celtas, que acreditavam ser o lugar onde residia
toda a essência da personalidade e o poder pessoal de cada um, geralmente, eram trazidas
como troféus de guerra ou conservadas em um local nobre. Corresponde ao Neamh (Céu).

Aqui, o que se observa é que toda a manifestação mística anterior e se funde,


junto com os Dúile, de maneira a fazer uma única mística total, que se intercambia e
conecta plenamente: Reinos, Elementos, Povos, Caldeirões e Dúile. Percebam:

Terra Média ou Mundo Intermediário


A Árvore do Mundo encontra-se no centro do Mundo, interligando os Três Reinos. A
sua frente queima Awen.
Caldeirão
Reino Elemento Povo Dúile
da Poesia
Nwyfre Drech – Grian (Rosto – Sol)
Céu (sopro / Deuses Coíre Sois Menma – Nel (Cérebro – Nuvem)
vento / Ar) Cean – Neamh (Cabeça – Céu)
Fuil – Muir (Sangue – Mar)
Gwyar Coíre
Mar Ancestrais Anal – Gaeth (Sopro – Vento)
(mar / água) Érmai
Imradud – Ghealach (Mente – Lua)
Cnaimh – Cloch (Ossos – Pedra)
Calas Sídhe Coíre
Terra Colaind – Talamh (Carne – Terra)
(terra / solo) (fadas) Goiriath
Gruaigh – Uaine (Cabelo – Plantas)

Assim, o que se pode perceber é o homem como um microcosmos do próprio


cosmos a que pertence. O homem como a própria Árvore do Mundo, tendo em si todos
os elementos: a conexão com os Reinos, a atuação e manutenção dos Elementos, a
presença e atuação dos Povos, a constituição dos Caldeirões, e as virtudes dos Dúile.
Entender essa relação mística e essa profunda conexão é fundamental para entender a
sacralidade do homem, do planeta e do Mundo e é imprescindível para a vivência da
espiritualidade celta.
Alcançar essa sabedoria é a base fundamental da essência do homem místico celta,
e o ponto de partida da espiritualidade celta. Essa conexão possibilitaria, enfim, ao místico
alcançar Awen e por consequência, ouvir a
Oran Mor (a Grande Canção).

“Grove de Aspen
Muitos braços
De uma única raiz
No fundo do útero
Mistério da Mãe
Eles são muitos ou são um?
Responda-me isto:
São muitos ou são um?
Sim, sussurra a Aspen...
Somos muitos e somos um!”
(Poema do Druida Michael R. Gorman apud Rowena A.
Seneween)16

16
Retirado de Seneween, Rowena A. 3º dia: Terra e Natureza In Templo de Avalon [S. I.]. Disponível
em: <http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=54>, acessado em 30 de
março de 2016.

~ 41 ~
Parte VIII:
Ceithri Haisceda Tuaithi de Danand (As Quatro Jóias dos Tuatha
dé Danann)

Também chamadas de “Os Quatro Dons dos Tuatha dé Danann”, “Os Quatro
Tesouros dos Tuatha dé Danann” e “As Quatro Armas dos Tuatha dé Danann”.

“As Tuatha Dé Danann das joias preciosas,


Onde encontraram elas a ciência?
Chegaram na perfeita sabedoria
Em druidismo, artes malignas.

Brilhante Iardanel, um profeta de excelência,


De Nemed filho, filho de Agnoman,
Teve como tolo descendente o ativo Beothach,
Que um herói foi na destruição, pleno de maravilhas.

Os filhos de Beothach – longa a vida de sua fama -,


A multidão chegou dos valentes guerreiros
Depois do pesar e após grande tristeza
A Lochlann com seus rebentos todos.

Quatro cidades – justo seu renome –


Em agitação contemplaram com grande força.
Por esse motivo apaixonadamente competiram
Para aprender sua genuína sabedoria.

Failias e Gorias brilhante


Findias, Muirias de grande bravura,
Fora da qual batalhas foram vencidas,
Das principais cidades os nomes.

Morfis e o nobre Erus,


Uscias e Semiath, sempre aterrador,
Nomeá-los – um discurso necessário –
Os nomes dos sábios de nobre sabedoria.

Morfis, o poeta da própria Failias,


Em Gorias Esrus dos desejos intensos,
Semiath em Murias, dos pináculos a fortaleza,
Uscias, o justo vidente de Findias.

Quatro presentes de lá com eles


Pelos nobres das Tuatha dé Danann:
Uma espada, uma pedra, um caldeirão de qualidade,
Uma lança para a morte dos grandes campeões.

~ 42 ~
De Failias para cá a Lia Fail
Que gritava sob os reis da Irlanda.
A espada na mão do ágil Lug
De Gorias – uma escolha de riquezas vastas.

De Findias distante sobre o mar


Trazida foi a lança mortal de Nuada.
Um grande e poderoso tesouro de Murias,
O caldeirão do Dagda de feitos elevados.

O Rei do Céu, o Rei dos frágeis homens,


Que ele me proteja, o Rei das regiões reais,
O Ser em quem está a permanência dos espectros
E da raça gentil a força.”

Tuatha Dé Danann.

O Fim.
(poema traduzido do Leabhar Buidhe Lecain apud Bellouesus Isarnos)17

Esse poema está registrado no Leabhar Buidhe Lecain (Livro Amarelo de Lecan),
um dos livros mitológicos medievais a respeito da Irlanda e dos celtas irlandeses. Com a
maioria dos livros desse período, esse livro foi escrito por monges copistas e
provavelmente contém itens e coisas já alterados em relação aos mitos e lendas pré-
cristãs. Contudo é uma das poucas fontes escritas que temos de mitologia celta, datada da
Idade Média. O que nos interessa no entanto, é que há um possível erro no poema
(inclusive em sua versão original em irlandês), no qual atribui a Espada a Lugh e a Lança
a Nuada. Outras lendas além do uso clássico e popular atribuem o oposto: a Lança a Lugh
e a Espada a Nuada. Nesse sentido, eu adotarei o uso popular.
O que nos interessa, então, é a história (mítica, porém sacra) da conquista da
Irlanda pelos Tuatha dé Danann...
Antes de desembarcarem e dominarem Ériu (Irlanda), os Tuatha dé Danann
habitavam e peregrinavam por quatro cidades míticas ao norte do mundo, onde
aprenderam as artes místicas, ou as artes druídicas (druidecht): conhecimento (fis),
profecia (fáistine) e habilidades mágicas (amainsecht); sob a tutela dos quatro magos:
Semias de Murias, Mofessa de Falias, Uiscias de Findias e Esras de Gorias.
Enquanto viviam sob a hospitalidade das cidades, os Tuatha sonhavam com uma
terra que fosse sua, onde poderiam ser soberanos. Os sonhos de soberania recaíram sob a
Ilha Esmeralda, cobiçada por suas verde aparência e por sua localização mais ao sul das
cidades onde os Tuatha habitavam.
Antes de partirem à conquista de Ériu sob o comando do Rei Nuada, os quatro
magos deram, cada um, um presente aos Tuatha, um talismã:

Morfessa de Falias deu a Lia Fail, ou seja, a Pedra de Fal, que gritaria ao ser
pisada pelo rei que legitimamente tomasse a soberania de Ériu (fláith Érenn).
Esras de Gorias deu a Sleg Loga, ou seja, a Lança de Lugh, capaz de assegurar a

17
Retirado de Isarnos, Bellouesus. As Quatro Joias das Tuatha dé Danann I In Bellodunon [S. I.].
Disponível em: <http://bellodunon.com/2013/01/15/as-quatro-joias-das-tuatha-de-danann/>, acessado em
30 de março de 2016. Versão original em irlandês disponível em:
<http://www.ucc.ie/celt/published/G300008/>.

~ 43 ~
vitória daquele que a empunhasse. Uiscias de Findias deu a Claideb Nuadat, ou
seja, a Espada de Nuada, que, uma vez desembainhada, jamais deixaria de atingir
o oponente. Semias de Muirias deu o Coiri in Dagda, ou seja, o Caldeirão de
Dagda, do qual nenhum bando de guerreiros valentes afastar-se-ia sem ter
encontrado todo o alimento que desejasse.18

Com essas joias, os Tuatha conseguiram assegurar a conquista, o domínio e a


soberania sobre Ériu.
Atualmente, é comum que druidistas atribuam as Armas às quatro direções
cardinais, usando-as em suas práticas ritualísticas e também associadas ao jogo oracular
do Ogham e a Janela de Fionn. Uma das correlações possíveis e comumente utilizada é a
correlação com as quatro regiões irlandesas: Leinster, Munster, Connacht e Ulster, que
respectivamente preenchem os pontos cardinais da Irlanda: Leste (Leinster), Sul
(Munster), Oeste (Connacht) e Norte (Ulster). Essas posições também recebem atributos:
Prosperidade (Leste – Leinster), Música (Sul – Munster), Conhecimento (Oeste –
Connacht) e Batalha (Norte – Ulster).
Quanto ao posicionamento das joias nas direções cardinais, não existe nenhum
registro histórico que de fato delegue as joias à qualquer posição, o que nos leva a crer
que essa prática seja referente ao druidismo moderno. Desse modo, não há um
posicionamento mais certo que o outro, mas posicionamentos que estudos específicos
levam a constatar com verdadeiros cujas finalidades são atendidas, tornando todos
igualmente verdadeiros e plausíveis.
Dentro de meus estudos, tendo a fazer o seguinte posicionamento:

Joia Mago Cidade Direção Atributo Região


Caldeirão
Semias Murias Leste Prosperidade Leinster
de Dagda
Pedra de
Morfessa Falias Sul Música Munster
Fal
Espada de
Uiscias Findias Oeste Conhecimento Connacht
Nuada
Lança de
Esras Gorias Norte Batalha Ulster
Lugh

Minhas razões para essa atribuição são simples: o


Caldeirão de Dagda é aquele que jamais deixará um nobre
guerreiro passar fome, portanto está relacionado a
Prosperidade física e terrena. Concomitante, a bandeira de
Leinster possui uma harpa, outro objeto atribuído ao Deus
Dagda. A Pedra de Fal é aquela que grita quando um
legítimo rei pisar sobre ela, dando-lhe o direito de
reclamar a soberania de Ériu, ou seja, está relacionada ao
destino e a nobreza, o que nos faz clara menção à Oran
Mor (a Grande Canção), a música celestial que é tudo e
conduz tudo. A bandeira de Munster possui três coroas, o
que faz clara referência à soberania dada pela Pedra. A
Espada de Nuada é aquela que jamais deixa de atingir um

18
Isarnos, Bellouesus. As Quatro Joias do Tuatha dé Danann II In Bellodunon [S. I.]. Disponível em:
<http://bellodunon.com/2015/08/12/as-quatro-joias-das-tuatha-de-danann-2/>, acessado em 30 de março
de 2016.

~ 44 ~
oponente e por isso requer conhecimento para que seja usada com sabedoria. Também a
bandeira de Connacht possui uma ave negra e um braço de guerreiro vestindo uma
armadura prateada e empunhando uma espada, o que pode ser uma referência à condução
de Morrigan a Nuada na vitória da primeira batalha de Mag Tured. Por fim, a Lança de
Lugh é aquela que assegura a vitória
a quem a empunha, sugerindo a
vitória nas batalhas. E a bandeira de
Ulster tem uma mão com os dedos
para cima, simulando (talvez) o
desenho de uma lança.
E assim, ao compor meu
espaço sagrado (onde quer que ele se
localize) busco evocar o poder das
Quatro Joias seguindo esses pontos
cardinais, recriando a soberania dos
Tuatha dé Danann sobre a Ilha
Esmeralda, e fazendo do centro do
meu espaço sagrado um local pleno
de assegurada Soberania.

~ 45 ~
Parte IX:
Ogham

Ogham (pronuncia-se “ôuan”) é o alfabeto celta com registros desde o ano 600
antes da Era Comum. É bastante conhecido na atualidade pelos druidistas e
reconstrucionistas celta. Sua finalidade divide os pesquisadores do assunto: alguns
afirmam que ele foi criado para ser uma linguagem secreta velada aos invasores,
principalmente os romanos, outros já os denotam caráter ritualístico e celebrativo. Ele
também é chamado de “alfabeto das árvores”, pois cada letra / símbolo representa uma
árvore sagrada para os antigos celtas.
Além disso, cabe ressaltar que, de acordo com Bellouesus Isarnos, em sua palestra
nos Encontros com o Druidismo do Rio Grande do Sul (EcD/RS), o alfabeto que chegou
até nós hoje e que é mais comumente utilizado não é a única variação e escrita possível
do Ogham.
Acredita-se que o Ogham tenha sido um presente do Deus Ogma – deus da escrita
e da eloquência – para a humanidade.

Inicialmente, ele continha 20 letras (feadha / feda) divididas em 4 Famílias ou


Raças (aicme), mas, posteriormente, foi acrescentada mais uma família de 5 letras –
os forfeda – destinada a adequar-se às inscrições em pergaminhos.
O nome das letras oghâmicas é "fid" (singular) e "feda" (plural) em irlandês
antigo. No irlandês moderno são: "fiodh" e "feadha" - que são palavras traduzidas
como "madeira" e "bosque".
Encontra-se em grupos com séries de cinco letras cada, originalmente, e
continham apenas as quatro primeiras séries. A quinta série "forfeda" tinha os
primeiro cinco e depois mais seis letras de sons importados de outras línguas e que
não existiam na língua irlandesa.
A linha central representa o tronco de uma árvore "flesc" e os traços, os
galhos. Escrito na horizontal, em manuscritos, da esquerda para a direita e na
vertical, em pedras, de baixo para cima (como se escalasse uma árvore); iniciados
pelo símbolo "eite" (pena) e terminados com "eite thuathail" (pena invertida). As
palavras eram separadas por "spás" (espaço).

As três principais fontes de estudo do Ogham são os manuscritos irlandeses:


Auraicept na n-Éces (pronuncia: aurikepet na niches), O Lebor Ogaim e o
Bríatharogam. Além da própria vivência pessoal.

~ 46 ~
"No tempo de Bres, filho de
Elatha rei da Irlanda, o Ogham foi
inventado por Ogma, um homem
bem qualificado no discurso e na
poesia e foi a partir das árvores da
floresta, que os nomes foram
dados às letras do Ogham. As
primeiras inscrições em Ogham
datam do século IV d.C. em torno
do mar da Irlanda, onde as
inscrições em pedra começaram a
florescer a partir do século V e VI.
Sua invenção pode ter uma origem
mais antiga, acredita-se que as
primeiras inscrições foram
gravadas em madeira ou metal,
sendo assim perecíveis e não
sobreviveram aos tempos
modernos." - Tratado ou Trato de
Ogham. (Rowena A. Seneween)19.

O que nos cabe ressaltar no entanto, é que o Ogham é muito mais que um mero
alfabeto para escrita. Na verdade a escrita era o seu menor uso, uma vez que ela não era
comum entre os celtas até a romanização. O Ogham nos sugere duas outras práticas: uma
mais comum que é seu uso divinatório, o Ogham Oracular; e a outra pouco falada mas de
muito maior importância que é o Ogham como um caminho místico de desenvolvimento
e crescimento tanto mundano quanto espiritual. Dessa forma, seu uso pode muito bem ser
mágico (em um encantamento, poção, ritual) ou ainda meditativo, instrutivo, vivencial e
oracular. Tudo o que existe passa ou possui as 20 feda do Ogham original. Um bom
exercício é pegar um acontecimento específico e analisa-lo pelo parâmetro do Ogham,
estudando e buscando conhecer cada uma das feda em cada momento daquela situação a
que se estuda.
Se vivenciarmos o caminho corretamente, deveremos passar por cada estágio da
vida seguindo o fluxo do Ogham, da primeira a quarta família, da primeira a quinta letra
em cada família, completando exitosamente o percurso da vida: infância, adolescência,
vida adulta e velhice.
Meditar e buscar o Ogham como forma de se harmonizar a fim de conseguir
superar ou vencer em uma determinada situação é sempre válido. O Ogham traz consigo
a sabedoria e o poder das árvores celtas, uma maneira prática de ativá-lo é entoar o nome
de cada fid como um mantra, ou canto harmônico, a fim de evocar sua energia ancestral,
mágica e poderosa para aquele momento ou situação.
Enfim, o uso do Ogham é variado. O que apresento aqui é um pequeno resumo do
estudo que eu mesmo fiz a respeito do Ogham, mas recomendo que se aprofunde sobre
cada fid a fim de compreender melhor seu significado e uso. Recomendo muito os artigos
do Templo de Avalon sobre as quatro primeiras famílias, e o artigo sobre os forfeda.

19
Trecho retirado na íntegra (incluindo as imagens) de Seneween, Rowena A. Estudos do Ogham –
Introdução In Templo de Avalon [S. I.]. Disponível em:
<http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=97>, acessado em 30 de março
de 2016.

~ 47 ~
OGHAM – significado das feda
Por Ávillys d’Avalon, Mundi Tempus
Fid Nome Árvore Letra Significado
Aicme Beithe (Família da Bétula): o começo, a infância, o descobrimento
Nascimento. Inícios. O começo de tudo em um ciclo sem
fim. Indica grandeza, flexibilidade, sobrevivência,
abertura para o novo, os novos caminhos e poucas
Beith Bétula B expectativas. Requer foco e concentração. É o banimento
do negativo em si mesmo. A bétula é o começo de todas
as coisas.
Visão. Honra. Proteção. Abnegação. Dedicação. É a
percepção material do que está ao seu redor, a devoção a
Sorveira algo maior. Indica sucesso material e é apropriada para as
Luis L buscas e batalhas, mesmo que duras. Requer
Brava
autoconfiança, força e autoconhecimento. A sorveira é a
visão que se abre a todas as coisas.
Proteção. Avanço. Determinação. Vigilância. Precaução.
O amieiro fala da singularidade de cada um, da justiça na
equidade, no beneficiar outro e atuar como ligação. Indica
Fern Amieiro F avanço, vitória e proteção. Requer altruísmo,
determinação, ousadia e noções aguçadas. É preciso que
deixe a intuição falar e que aja com altruísmo e ousadia.
O amieiro é a proteção que nos permite caminhar.
Magia. Mistério. Transformação. Morte. Ancestralidade.
O salgueiro é a árvore dos talentos, do crescimento
pessoal, do aflorar da inteligência e da intuição. Indica
autoconhecimento, inspiração, criatividade e talentos.
Requer libertação da dor e do passado, amadurecimento e
Sail Salgueiro S olhar para dentro de si mesmo. Requer também percepção,
amadurecimento, compreensão e calma. É o crescimento
(mais interior do que físico) e a conexão com as coisas já
postas, nosso lado intelectual, criativo, meditativo e
psíquico. O salgueiro é a conexão com si mesmo.
Conexão com os Mundos. Destino. Evolução.
Compreensão. Consciência. É a Árvore do Mundo, a lei e
o inevitável. Representa algo maior que existe nas
pessoas, com as pessoas e para além das pessoas. É a
Nion Freixo N consciência de si como um microcosmo inserido no
cosmo. Tudo está interligado. Indica conexão e o destino
(Dán). Requer consciência e equilíbrio, aceitar ajuda e ver
as coisas com mais amplitude. O freixo é a consciência
que transcende o ser.
Aicme hÚatha (Família do Espinheiro Branco): a adolescência, o desbravamento, as intuições
Teste. Descobertas. Dor. Sátira. Superação. O espinheiro
branco é a certeza de que se pode superar os obstáculos
com estratégia, é o merecido repouso e o júbilo após os
testes e dificuldades do dia a dia. Mas também é o
encontro feérico. E, por isso, é o inesperado, a fertilidade,
Espinheiro
hÚath H a sexualidade. Requer cautela, proteção, defesa,
Branco perspicácia e cuidado com a saúde física, mental e
espiritual. Induz a uma vida saudável, ao riso e à sátira das
más situações, a superação das provações com estratégia.
Estimula a vidência e a purificação. O espinheiro branco
é o enfrentar o mundo.
Honra. Força. Perícia. Estabilidade. Sabedoria. Ação. O
carvalho é o rei das árvores por ser a mais antiga e madura.
Dur Carvalho D Representa as habilidades difíceis de se conseguir e é a
atuação no mundo. Requer estabilidade, solidez, força,

~ 48 ~
honra e perícia. Representa a nobreza, os valores e a
sabedoria. Indica estabilidade e conhecimento tático. A
diplomacia também é uma habilidade honrada. O carvalho
é a autoridade, a força, a honra e a sabedoria que só se
aprende na prática.
Fid Nome Árvore Letra Significado
Vitória. Justiça. Transformação. O meio termo. Instinto.
Vitalidade. O azevinho é o terceiro caminho que se abre;
vincula e equilibra os opostos binários. É a causa justa a
ser ganha e o afirmar-se no mundo. Representa a luta justa
Tinne Azevinho T e o caminho do meio. Indica conflito, coragem e vitória.
Requer ponderação, escolhas informadas, equilíbrio,
justiça e esforço. O azevinho é o colocar-se no mundo e
fazer dele o seu lugar.
Intuição. Inspiração. Sabedoria. Ligação ancestral.
Doçura. Humildade. A aveleira é o arauto que aponta para
algo maior do que ela, e mesmo assim estimula os outros
com sua sabedoria humilde. É a sabedoria do cotidiano,
Coll Aveleira C suave, serena e profunda. Indica uma sabedoria essencial,
familiaridade, humildade, conhecimento, conforto,
exemplo e doçura. Requer reflexão, contemplação,
autoavaliação, paz e humildade. A aveleira é a inspiração
pura que nos infla e nos move suavemente.
Beleza. Amor. Inspiração. “Divina loucura”. Sexo.
Êxtase. Escolha. Prazeres. É a Árvore do Conhecimento.
Simboliza a segurança na viagem ao Outro Mundo e está
vinculada aos sídhe e a inspiração vinda deles. É a loucura
Quert Macieira Q e a sanidade, o amor, o sexo e os prazeres. Indica encanto,
amor, juventude, beleza, bênçãos, prazeres e a vida eterna.
É os divinos prazeres do mundo e as alegrias humanas.
Mas requer foco, escolha e determinação. A macieira é o
desenredar das paixões e do amor.
Aicme Muine (Família da Videira): a vida adulta, a responsabilidade, o conquistar da maturidade
Força. Profecia. Desejo. Trabalho. Tecedura. Obstinação.
Caos. Discórdia. Confusão. A videira fala da força interior
e do poder do domínio e do controle da situação. Indica
força e necessidade de ouvir sua real e profunda intuição,
seu interior. Representa a adequação às situações a
Muin Videira M compreensão do passado e a tecedura do futuro. Requer
força de vontade, compreensão e foco. É preciso que se
deixe nosso interior falar e que o dê atenção ao invés de
sempre buscar a razão de tudo. A videira é a força interior
e os presságios da vida.
Abundância. Conhecimento. Chamado. Desapego.
Sociabilidade. Realização. Plenitude. Dependência. A
hera é a força da abundância que se espalha e um lembrete
à responsabilidade para que nada saia do controle. Indica
Gort Hera G um chamado e a realização dos projetos e sonhos. Requer
conhecimento e conexão com as coisas a sua volta e a si
próprio. É a perda das inibições e a destruição dos
obstáculos e falsidades. A hera é a felicidade que se
projeta para quem sabe vive-la.
Cura. Restauração. Purificação. Limpeza. Harmonia.
Flexibilidade. O junto é flexível e usado para tarefas
domésticas e ordinárias, por isso está relacionado a
limpeza e o colocar ordem sobre o caos. Indica cura e
nGétal Junco nG limpeza. Requer flexibilidade, foco, ir direto ao ponto,
virtude, investigação. São os processos de cura, limpeza e
renovação – inclusive físicos: como aventuras, férias e
viagens. É a capacidade de se por ordem no caos. É a cura

~ 49 ~
e a ordem, o equilíbrio entre nossos excessos e faltas. O
junto é o que deve ser feito.
Fid Nome Árvore Letra Significado
O inevitável. Sacrifício. Luta. Negação. Morte. Destino.
Mudança. Dor. Amargura. Ressentimento. Ciúmes. Ódio.
Ferida que envenena a alma. O espinheiro negro é as
Z / St situações que não podemos evitar e que precisam ser
Espinheiro
Straiph / Ts / vividas. É o vincular-se a um projeto maior que a si
Negro mesmo e um caminho que nos controla. Indica passagem
Ss
por situações desconfortáveis e incontroláveis. Requer
autossacrifício e tomada de decisões. O espinheiro negro
é o enfrentar das consequências.
Penitência. Morte. Renovação. Términos. Vergonha.
Recomeço. Maturidade. Reconciliação. Aceitação. O
sabugueiro é a renovação da desonra e da vergonha, é o
fim e início de um ciclo, é a transformação, a punição e o
Ruis Sabugueiro R aprendizado e a reintegração. Indica términos, renovação,
vergonha. Requer penitência, aceitação, aprendizado e
maturidade. É a reconciliação e a recuperação da honra. O
sabugueiro é o acerto de contas com o passado.
Aicme Ailme (Família do Abeto / Pinheiro): a velhice bem vivida, a sabedoria, o contato espiritual
Visão. Sabedoria. Cura interior. Música. Respeito.
Consciência. Euforia. Admiração. Aprisionamento.
Opressão. Solidão. Medo. O pinheiro é a árvore da visão,
Abeto / com sua altura pode ver todo o horizonte, enxergar os
Ailm A problemas e tudo aquilo que chega. Indica sabedoria,
Pinheiro
vidência, contemplação do seu redor. Requer cautela e
planejamento. Representa o festival de Yule. O pinheiro é
a visão e a sabedoria para além das aparências.
Fertilidade. Paz. Sexualidade. Movimento. Eloquência
(sabedoria e tolice). Recebimento. Fim da busca. Divisão
do conhecimento. Talentos. Proteção. Perigo.
Complicações. Embaraço. O tojo é uma árvore flexível de
Onn Tojo O fácil polinização pelas abelhas. Por isso indica fertilidade
e sexualidade. É o fim do caminho e a conquista dos
sonhos. Requer abnegação e que se reparta aquilo que foi
acumulado. Representa o festival de Ostara. O tojo é o
dividir-se com o mundo e o êxito no caminho.
Cura. Amor. Conhecimento. Aceitação. União. Ilusão.
Desejo. Conflito. Manipulação. A urze é a planta que nos
pede para olharmos dentro de nós mesmos a fim de nos
encontrarmos e nos curarmos. Seu néctar é alimento dos
Deuses e ela nos fala da busca espiritual e do encontro
Ur Urze U com o amor verdadeiro. Indica cura (física e espiritual),
amor, união, espiritualização. Requer dedicação,
aceitação das coisas. É preciso olhar para dentro de nós
mesmos a fim de nos curarmos e elevarmos. Representa o
festival de Litha. A urze é a cura que vem do
autoconhecimento.
Orientação. Prevenção. Julgamento. Batalha espiritual.
Proteção. Coragem. Vitória sobre os desafios. Medo.
Dúvida. O choupo é uma árvore que farfalha facilmente
Choupo / ao vento, nos trazendo mensagens divinas e, por isso, está
ligada à divinação. Seus galhos se dobram e resistem aos
Eadhadh Álamo E ventos. Indica vitória sobre os desafios, orientação e
Tremedor prevenção. Requer coragem, foco, fortificação. Todo
desafio pode ser vencido. Representa o festival de Mabon.
O choupo é a coragem para enfrentar os desafios.

~ 50 ~
Fid Nome Árvore Letra Significado
Morte. Renascimento. Conhecimento ancestral. Tradição.
Longevidade. Sabedoria da idade. Transição. Portal para
o Outro Mundo. Dor. Estagnação. O teixo é a árvore que
representa o conhecimento tradicional, ancestral e,
portanto, o druidismo. É uma árvore forte e longeva cujos
buracos em seus troncos velhos são considerados portais
Iodhadh Teixo I para o Outro Mundo. Indica uma transição a ser feita, a
sabedoria da idade, a morte e o renascimento. Requer
abnegação, mudança e aceitação. É preciso que passemos
adiante o que sabemos e deixemos ir o que precisa ir.
Representa o festival de Samhain. O teixo é a transição e
o contato com o Outro Mundo.
Forfeda (letras adicionais): o trato mágico a ser desenvolvido
Mergulho na profundidade, um caminho novo, mais
intenso, primordial. Bosque sagrado. Renascimento.
Flexibilidade. Caminhos. Direcionamento. Começo.
Nutrição espiritual. Jornada mágica e/ou espiritual.
Reconhecimento. Completude. Profecia. Mensagem
Divina. Centro do Mundo. Inspiração. Sabedoria bem
aplicada. Força interior. O Álamo Branco é a mudança
interior e o despertar da sabedoria. É o domínio e a
Álamo soberania sobre si mesmo. Indica uma nova jornada e
Éabhadh Ea novos caminhos que se abrem de forma segura. É o
Brando
começo de uma jornada mais profunda. O álamo
farfalha trazendo mensagens e sabedorias divinas,
trazendo magia e inspiração. Requer busca,
discernimento, espiritualização e um olhar para a
essência das coisas. Está vinculado a Awen / Imbas e
ao festival de Imbolc. O Álamo Branco é a condução ao
centro de tudo, de onde novas revelações e caminhos
surgem.
Ouro. Fogo. Energia. Força interior. Movimento.
Inteligência repentina. Ação. Aplicação apenas do
necessário. Prosperidade no equilíbrio.
Balanceamento. Inspiração posta em prática. É a
árvore que se nutre da água e recebe o fogo do céu
(raio). É a prosperidade realizada ao ser buscada. O
Evômino é a árvore do movimento. É a roda a girar, a
atuação a partir da (do escutar da) sabedoria, a
Ór Evômino Oi confiança interior. É o moinho. Indica prosperidade,
vitória nos projetos, atuação, movimento. Requer
desapego, trabalho, autoconfiança e por-se em
movimento. Mas pode indicar o caos na estagnação
quando a balança é desrespeitada. A prosperidade só
se atinge na busca e na vitória das provações, em
constante equilíbrio (interno e externo). Está
vinculado a Beltane e aos sídhe. O Evômino é o
movimento e a tomada de decisões para prosperar.
Aparência. Colocar a tona. Questionamentos.
Inquietude. Invasão. Rapidez. Espontaneidade.
Trabalho. Mudança. Olhar para si. Regeneração.
Encanto e sedução. Ramificação. São os laços
sentimentais: a amizade, família e amor. A Madressilva
Uillean Madressilva Ui é o agir no mundo, ramificar-se e prosperar, vencer as
perturbações e os desafios. Requer mudanças,
agilidade e espontaneidade. Ela coloca os "termos" na
mesa e requer que você os enfrente com coerência.
Requer alinhamento e autoconhecimento

~ 51 ~
(autodomínio). É preciso seguir em frente e deixar o
passado no passado. Indica cura, purificação,
renovação, mudanças, rompimento das ilusões,
quebra com o passado. Mas pode também indicar
desespero, destruição, solidão quando não bem
observada. Representa o alinhamento dos Três
Caldeirões e o Destino. Está ligada ao Festival de
Lughnasadh. A Madressilva é a regeneração e a vida
nova. É o mistério que deve ser vivido e não explicado.
Fid Nome Árvore Letra Significado
Lidar com o passado: aprender a resolvê-lo.
Intensificação. Doçura. Leveza. Paz (pacificidade).
Resolução. Digestão. Revelação do que está escondido.
Ser visionário. Cuidar de si. Melhorar a imunidade.
Flexibilidade. Desafio. Proteção. Compreender o
passado para entender o presente e prever o futuro.
Passado. Antepassados. Sucesso. Conforto espiritual.
Liderança. Serenidade. A Groselha é digerir, conhecer
e compreender sobre o passado e sobre si mesmo; e
Ifín Groselha Io assim, agir com serenidade e doçura. Indica resolução,
sucesso, aprendizado, conforto espiritual e doçura.
Pode também indicar o azedo e estagnação. É a cura
que vai de dentro para fora e de fora para dentro.
Requer conhecimento sobre o passado, aprendendo
com ele; dedicação e serenidade, flexibilidade,
resolução, atitude e mudança. Está relacionada com a
história, os Ancestrais, o Festim de Tara, a bolsa
mágica de Mananann e a Lança de Lugh. A Groselha é
o desafio da doçura.
Vassoura de Bruxa. Aveleira de Bruxa. Sincronia.
Resoluções. Confirmação. Reestabelecimento.
Esclarecimento. Resposta. Cuidado. Confiança. Fluidez.
Calma. Completude. Conexão com o sagrado. Mar.
Viagem. Proteção. Coragem. Intensidade /
intensificação. Magia. Deuses. Renascimento /
recomeço. Vida nova. Compreensão. Profundidade.
Amadurecimento. Decisões. Revelações. Cura.
Esperança. O Hammamélis é o conectar com o sagrado
a partir de dentro, nos processos de cura interior
(para) e exterior. Nesse processo as verdade são
reveladas e a autonomia é reestabelecida. Para acessar
os Deuses é preciso que eles habitem internamente. É
Eamhamcholl Hammamélis Ae a viagem que se faz para renovação, transcendência e
cura. Ao entrarmos profundamente em nós mesmos,
nos tornamos aptos a viajar para fora. Indica sucesso,
revelações, intensificação, interiorização e
externalização, completude, cura espiritual e física,
proteção, magia e transcendência. Requer
compreensão, fluidez, cuidado, abnegação,
profundidade, amadurecimento, coragem, confiança e
tomada de decisões. É preciso ser o sagrado e deixá-lo
agir estando conectado a ele, em simbiose. Entretanto,
pode ser letal quando essa busca é despreparada e
errônea. Está vinculado à Árvore do Mundo e aos
Deuses. Representa Samhain. O Hammamélis é a
transcendência do ser.

~ 52 ~
A Janela de Fionn:

A Janela de Fionn é um
diagrama no qual se ver cada uma das
feda do Ogham organizadas em suas
aicme. Recebe esse nome,
provavelmente, pelo conto de Oona e
o Gigante, no qual, Fionn20, esposo de
Oona, consegue ver tudo o que se
passa e se precaver do que lhe espreita
por sua janela em sua alta casa em
uma montanha. E assim, ele e sua
esposa conseguem vencer
Cuchulainn. Daí a importância dela
nos métodos oraculares.
Bellouesus Isarnos aponta
para a Janela de Fionn como uma
construção de influência pitagórica
sobre os celtas, explicando toda uma matemática da sua constituição. Mas não entraremos
nessa rica discussão aqui.
Uma associação mais mística vem com a conceituação trazida por João Eduardo
Schleich Uberti em sua palestra sobre a mística celta no VI EBDRC. É possível
entendermos que os círculos demonstre conhecimentos ou regência de cada letra sobre
um aspecto, indicando um caminho linear – perpassando cada fid de cada família –, ou
espiralado – perpassando todas as feda de cada aspecto –, rumo a conexão sagrada, rumo
ao sagrado. Desse modo, indo do círculo mais externo para o mais interno, temos a
seguinte relação: o primeiro círculo representa o aspecto natural; o segundo círculo o
aspecto poético; o terceiro, filosófico; o quarto, divinatório; e o quinto, druídico. Os
forfeda, no entanto, deveria estar localizado no centro, representando o domínio e a
soberania; mas como são letras adicionais, foram adicionados esteticamente no segundo
círculo.
Já no camo religioso, Bellouesus também aponta para um aprofundamento, ou um
caminho a ser vivenciado ou seguido a partir da trajetória oghâmica, de modo com que
cada círculo represente um domínio ou arte religiosa a ser apreendido e vivenciado,
seguindo do círculo mais externo ao interno: primeiro círculo é louvor (a poesia sacra),
arte dos bardos; o segundo é a poesia (demais gêneros literários), também arte bárdica; o
terceiro é o aspecto religioso (administração e supervisão dos elementos do culto), arte
dos vates; o quarto é a natureza (em seu estudo amplo) arte dos vates e dos druidas; e
quinto é a essência, a natureza primordial (a filosofia moral), arte dos druidas. Assim mais
uma vez, o Ogham e a Janela de Fionn é um caminho a ser trilhado também no campo
religioso.
Além disso, a disposição das famílias representam também as quatro províncias
irlandesas e assim, quatro (cinco com o centro) quadrantes.

20
Fionn é um dos clássicos heróis celtas cujas lendas dão origens e fins variados a sua personalidade. Em
todas ele se mostra um brilhante líder, hora humano, hora um sídh.

~ 53 ~
A Aicme Beithe (Família da
Bétula) representa o primeiro
quadrante, o Norte, e por isso a
província de Ulster, que representa a
Batalha, ou seja, os aspectos
negativos que podem nos gerar
dificuldades.
A Aicme hÚatha (Família do
Espinheiro Branco) representa o
segundo quadrante, o Leste, e assim
a província de Leinster, que
representa a Prosperidade, ou seja,
as riquezas materiais, os aspectos
profissionais e práticos.
A Aicme Muine (Família da
Vinha) representa o terceiro
quadrante, o Sul, e por
consequência, a província de Munster, que representa a Música / Arte, os dons, as
habilidades, os prazeres e as emoções e sentimentos.
A Aicme Ailme (Família do Pinheiro) representa o quarto quadrante, o Oeste, a
província de Connacht, que representa a Sabedoria e o Conhecimento, os aprendizados,
os estudos e as lições.
Por fim, os Forfeda – como já dito – foram colocados a posteriori na Janela de
Fionn e, possivelmente por uma questão estética, ocupam o segundo círculo, entre os
quadrantes. Contudo, Marcela Badolatto também salienta que seu local mais indicado,
provavelmente, é o centro (Mide), simbolizando a Soberania e o Domínio, simbolizando
nosso ego, dignidade e percepção pessoal.
Desse modo, a Janela de Fionn ultrapassa um tabuleiro de jogos, e uma cartilha
alfabética. Ela indica um caminho a ser traçado rumo a nossa evolução terrena e espiritual.
Você deve trilhar e evoluir espiritualmente em cada família, primeiro nas batalhas dos
campos naturais, poéticos, filosóficos, divinatórios e druídicos; e nos campos louvor,
poesia, religioso, conhecimento da natureza e
conhecimento essencial. Fazendo o mesmo
com a prosperidade que você conquista.
Depois o mesmo com seus talentos e emoções.
E por fim, angariando conhecimento sobre
cada um desses aspectos. Em sequência a essa
evolução linear, o caminho a ser atingido é o
espiral quando você se foca no aspecto e
perpassa pelos quadrantes: as batalhas
naturais, a prosperidade natural / física, os
talentos naturais, o conhecimento natural.
Iniciando a dificuldade poética, a conquista
poética, a vivência poética e a compreensão
poética. Indo para a complexidade filosófica,
descobrindo as possibilidades filosóficas,
vivenciando a filosofia e compreendendo a
filosofia. Começando com as dificuldades
divinatórias, descobrindo seus métodos e
utilidades, vivenciando sua prática e o contato

~ 54 ~
com os Deuses, compreendendo sua profundidade. E por fim, lidando com as batalhas
druídicas, com a prosperidade druídica, alcançando a conexão e a compreensão do
mundo. E também deve fazer essa jornada espiral em seu lado religioso no louvor nas
dificuldades, no louvor nas prosperidades, no louvor com o coração e compreendendo o
louvor. Depois na dificuldade da produção escrita de conhecimento (qualquer que ele
seja), no seu êxito, na sua vivência íntima e no aprendizado que esse registro e produção
te proporciona. Seguindo pela natureza, buscando a compreensão das dificuldades
naturais, da compreensão da vivência na natureza (natureza como dádiva), em sua
compreensão profunda e sacra e, por fim, apreendendo seu significado. Alcançando, por
fim, a essência das coisas através das dualidades (batalha), das bênçãos e presentes
(prosperidades), da essência mística e profunda e compreendendo todo esse significado.
Seguir esse duplo caminho (mundano e religioso) auxiliado ao percurso do Ogham e da
Janela de Fionn nos permitiria alcançar então a soberania e o domínio.
Na primeira vivência, linear, você alcança o domínio sobre si mesmo e se torna
apto a ajudar os demais. Na segunda vivência, espiralada, você alcança o domínio sobre
o mundo, e torna-se apto a espiralar para fora, levando sua conquista aos outros ramos e
aspectos do mundo. Cabe ressaltar que só é possível fazer esse caminho dessa forma,
primeiro linear, depois espiralado. E que deve-se atentar às peculiaridades de cada fid,
sua sequência e seu desenvolvimento é fundamental para o êxito.
Esse não é um caminho fácil, muito menos rápido. É um caminho de vida. Que
nos permite pensar na Janela de Fionn como uma janela para nós mesmos, uma janela
para alma, e uma janela para a compreensão profunda e a sabedoria.

Acompanhe o diagrama da Janela de Fionn e as tabelas a seguir:

~ 55 ~
TABELA I:
Os pontos cardinais da Janela de Fionn21
Ponto Província Fortaleza Festival
Letra Significado associado
cardinal Irlandesa real associado
Batalha (Cath) e
Determinação: Batalhas,
disputas, audácia, locais
Norte Ulster
A Tailtiu Lughnasadh incultos, lutas, arrogância,
(Tuadus) (Ulaid)
inutilidade, orgulho, capturas,
ataques, severidade, guerras,
conflitos.
Prosperidade (Bláth) e
Mudança: Prosperidade,
suprimentos, colmeias,
torneios, feitos de armas,
chefes de família, nobres,
Leste Leinster Festim de prodígios, bom costume, boas
B Tara
(Airthis) (Laighin) Tara maneiras, esplendor,
abundância, dignidade, força,
riqueza, administração da
casa, muitas artes, muitos
tesouros, cetim, sarja, seda,
trajes, hospitalidade.
Música (Séiss) e Poesia:
Cachoeiras, feiras, nobres,
saqueadores, conhecimento,
sutileza, ofício dos músicos,
melodia, ofício dos
Munster menestréis, sabedoria, honra,
C Sul (Dess) Tlachtgha Samhain
(Mumhan) música, aprendizagem,
ensino, ofício dos guerreiros,
jogo de fidchell, veemência,
ferocidade, arte poética,
advocacia, modéstia, código,
séquito, fertilidade.
Conhecimento (Fis) e
Druidismo: Sabedoria,
alicerce, ensinamento, pacto,
julgamento, crônicas,
Oeste
D Connacht Uisnech Beltane conselhos, relatos, histórias,
(Íaruss)
ciência, decoro, eloqüência,
beleza, modéstia,
generosidade, abundância,
riqueza.
Centro Mide Soberania (Flaith): Fírinne
E Imbolc
(Mide) (Meath) (justiça, verdade, integridade)

21
Retirado na íntegra de Isarnos, Bellouesus, Interpretando o Diagrama de Fionn In Bellodunonn [S. I.].
Disponível em: <http://bellodunon.com/2013/05/20/interpretando-o-diagrama-de-fionn%E2%80%8F/>,
acessado em 30 de junho de 2015.

~ 56 ~
[não está no texto, mas fírinne
é a qualidade primordial
associada a flaith, como
mostra o Audacht Morainn]

TABELA II:
Os Círculos da Janela de Fionn
Coiri Filidechta (Caldeirões
Círculo Aspecto Místico22 Aspecto Religioso23
da Poesia)
Natureza (domínio
Molad (louvor), Coíre Goiriath (Caldeirão do
do que nos cerca,
1 poesia sacra. Arte Aquecimento): aspecto físico
qualidade natural
dos bardos do mundo.
das coisas)
Poesia (inspiração Aichetal (poesia),
Coíre Goiriath (Caldeirão do
e arte, outros gêneros
2 Aquecimento): aspecto físico
aprendizados e literários e artes.
do mundo.
talentos) Arte dos bardos
Coíre Goiriath (Caldeirão do
Aquecimento): aspecto físico
Filosofia Iress (religião),
do mundo.
(conhecimento administração e
&
3 profundo das coisas supervisão dos
Coíre Érmai (Caldeirão do
e do mundo, ou sua elementos de culto.
Movimento): aspecto
busca) Arte dos vates
emocional e espiritual do
mundo.
Divinação Inne (natureza),
(relacionamento estudo amplo da Coíre Érmai (Caldeirão do
divino e natureza. Arte dos Movimento): aspecto
4
compreensão dos vates e dos druidas emocional e espiritual do
presságios dos (em seu campo mundo.
Deuses) geral)
Aicned (essência),
Druidismo (atuação
filosofia moral, Coíre Sois (Caldeirão da
no mundo como
5 aprofundamento Sabedoria): aspecto profundo
intercessor do
essencial. Arte dos e divino do mundo.
sagrado)
druidas

22
Por Uberti, João Eduardo Schleich. Elementos Místicos do Druidismo e sua interconexão e uso prático
[palestra] In VI EBDRC. Circulação interna. Curitiba, 2015.
23
Isarnos, Bellouesus, Interpretando o Diagrama de Fionn In Bellodunonn [S. I.]. Disponível em:
<http://bellodunon.com/2013/05/20/interpretando-o-diagrama-de-fionn%E2%80%8F/>, acessado em 30
de junho de 2015.

~ 57 ~
Trajetória Linear da Janela de Fionn24:

Desse modo, de acordo com Bellouesus, podemos chegar à seguinte trajetória


mística linear pela Janela de Fionn (correlação entre a tabela I e II):

A) Batalha (Cath) e Determinação – Tuadus, norte (província: Ulaid; fortaleza


real: Tailtiu; Lughnasadh)

Batalhas, disputas, audácia, locais incultos, lutas, arrogância, inutilidade, orgulho,


capturas, ataques, severidade, guerras, conflitos.

Aicme B
-,-, B, beith – Cath natural & Cath Molad
-,,-, L, luis – Cath poética & Cath Airchetal
-,,,-, F, fearn – Cath filosófica &Cath Iress
-,,,,-, S, sail – Cath divinatória & Cath Inne
-,,,,,-, N, nion – Cath druídica & Cath Aicned

B) Prosperidade (Bláth) e Mudança – Airthis, leste (província: Laighin; fortaleza


real: Tara; festim de Tara a cada três anos)

Prosperidade, suprimentos, colmeias, torneios, feitos de armas, chefes de família,


nobres, prodígios, bom costume, boas maneiras, esplendor, abundância, dignidade, força,
riqueza, administração da casa, muitas artes, muitos tesouros, cetim, sarja, seda, trajes,
hospitalidade.

Aicme H
-‘-, H, úath – Bláth natural & Bláth Molad
-”-, D, duir – Bláth poética & Bláth Airchetal
-”’-, T, tinne – Bláth filosófica & Bláth Iress
-””-, C, coll – Bláth divinatória & Bláth Inne
-””’-, Q, ceirt – Bláth druídica & Bláth Aicned

C) Música (Séiss) e Poesia – Dess, sul (província: Mumhan; fortaleza


real: Tlachtgha; Samhain)

Cachoeiras, feiras, nobres, saqueadores, conhecimento, sutileza, ofício dos


músicos, melodia, ofício dos menestréis, sabedoria, honra, música, aprendizagem, ensino,
ofício dos guerreiros, jogo de fidchell, veemência, ferocidade, arte poética, advocacia,
modéstia, código, séquito, fertilidade.

Aicme M
-/-, M, muin – Séiss natural & Séiss Molad
-//-, G, gort – Séiss poética &Séiss Airchetal
-///-, Ng, gétal – Séiss filosófica & Séiss Iress
-////-, St, straiph – Séiss divinatória & Séiss Inne
-/////-, R, ruis – Séiss druídica & Séiss Aicned

24
Complementações minhas, mas retirado na íntegra de: idem nota 6.

~ 58 ~
D) Conhecimento (Fis) e Druidismo – Íaruss, oeste (província: Connacht;
fortaleza real: Uisnech; Beltaine)

Sabedoria, alicerce, ensinamento, pacto, julgamento, crônicas, conselhos, relatos,


histórias, ciência, decoro, eloquência, beleza, modéstia, generosidade, abundância,
riqueza.

Aicme A
-|-, A, ailm – Fis natural & Fis Molad
-||-, O, onn – Fis poético & Fis Airchetal
-|||-, U, úr – Fis filosófico & Fis Iress
-||||-, E, eadhadh – Fis divinatório & Fis Inne
-|||||-, I, iodhadh – Fis druídico & Fis Aicned

E) Soberania (Flaith) – Mide, o centro (província: Mide)

Realeza Reis, mordomos, dignidade, primazia, estabilidade, instituições, esteios,


destruições, ofício de guerreiros, ofício de condutores de carruagens, soldadesca,
principados, grandes reis, ofício dos mestres-poetas, hidromel, generosidade, cerveja,
renome, grande fama, prosperidade.
Aqui se inicia a trajetória com os Forfeda. Agra uma trajetória interna, pessoal e
externa. É um mergulho em nosso interior para encontrar a verdadeira soberania, que se
dá na conexão com o sagrado e no tomar o domínio de si próprio. Ao centro não mais se
tenha a dinâmica do aspecto místico e religioso. Eles aqui são integrados em um só no
processo de conexão através do autoconhecimento e da soberania de si próprio.

-X-, EA, éabhadh – mergulho em si próprio, espiritualização, inspiração.


-0-, OI, ór – movimento, caminhar, ação; caminhar na nova jornada.
-@-, UI, uillean - vivência plena do mistério.
-x- IO, ifín – superação, aprendizado, entendimento.
-#-, AE, eamhancholl – revelações, conexão, transcendência.

O que se deve reparar é que no caminho central (forfeda) não mais se realiza ou
explica questões externas. Agora o caminho é pessoal, interno e subjetivo. É o caminho
a ser trilhado no final do percurso, quando se busca alcançar a soberania e a
transcendência, a conexão íntima que tornará o místico um sábio. Só então ele poderá
iniciar a segunda jornada, em espiral pela Janela de Fionn, agora compreendendo e
vivenciando os círculos como um todo, não mais o caminho linear das famílias.
Isso explica, a meu ver, o porquê que as forfeda foram escritas no segundo círculo
da Janela de Fionn. Por representarem um conhecimento a ser adquirido, algo a ser
compreendido em sua Poesia (Aichetal). Eu ainda articulo de maneira mais profunda
propondo (totalmente passível de críticas) uma reescrita do diagrama de Fionn, de
maneira a colocar da seguinte forma:

~ 59 ~
O Éabhadh ao centro marca o início da sua interiorização, seu mergulho ao centro
de si mesmo e também ao Centro do Mundo. A partir dele se alcança as demais fid dos
forfeda e se ramifica por toda a Janela de Fionn.
Torno a dizer que essa proposta é pessoal, decorrente de meus estudos e vivências,
passível e carente de críticas e aprimoramentos. Mas fica esse desafio lançados aos que
se apaixonarem pelo Ogham como eu.

Trajetória Espiral da Janela de Fionn25:


É possível observarmos a seguinte trajetória de maneira espiralada pela Janela de
Fionn, seguindo o percurso dos círculos como prioridade em relação às famílias. A
recomendação é que esse percurso só seja feito após trilhar o percurso linear citado acima.

1) 1º Círculo (externo): aspecto místico: natureza; aspecto religioso: molad


(louvor); Coíre Goiriath (caldeirão do aquecimento): aspecto físico.

Percurso (levando em consideração o aspecto mundano e religioso, podendo


indicar dois percursos paralelos, separados ou simultâneos): Cath Beith, Bláth hÚath,
Seiss Muin, Fis Ailm.

2) 2º Círculo: aspecto místico: poesia; aspecto religioso: Airchetal (poesia); Coíre


Goiriath (caldeirão do aquecimento): aspecto físico.

Percurso (levando em consideração o aspecto mundano e religioso, podendo


indicar dois percursos paralelos, separados ou simultâneos): Cath Luis, Bláth Dur, Seiss
Gort, Fis Onn.

3) 3º Círculo: aspecto místico: filosofia; aspecto religioso: Iress (religião); Coíre


Goiriath (caldeirão do aquecimento) & Coíre Érmai (caldeirão do movimento):
aspectos físico e emocional / espiritual.
25
Esse é um estudo ainda em aprofundamento, sobretudo no que diz respeito aos forfeda.

~ 60 ~
Percurso (levando em consideração o aspecto mundano e religioso, podendo
indicar dois percursos paralelos, separados ou simultâneos): Cath Fearn, Bláth Tinne.
Seiss nGétal, Fis Úr.

4) 4º Círculo: aspecto místico: divinação; aspecto religioso Inne (natureza); Coíre


Érmai (caldeirão do movimento): aspecto emocional / esprititual.

Percurso (levando em consideração o aspecto mundano e religioso, podendo


indicar dois percursos paralelos, separados ou simultâneos): Cath Sail, Bláth Coll, Seiss
Straiph, Fis Eadhadh.

5) 5º Círculo: aspecto místico: druidismo; aspecto religioso Aicned (essência);


Coíre Sois (caldeirão da sabedoria): aspecto divino e profundo.

Percurso (levando em consideração o aspecto mundano e religioso, podendo


indicar dois percursos paralelos, separados ou simultâneos): Cath Nion, Bláth Quert,
Seiss Ruis, Fis Iodhadh.

6) Ao centro e fim da espiral: plenitude, soberania (Flaith), domínio. A descoberta


da Verdade (Fírinne). Encontro e comunhão com Awen ou Imbas. Acredito que
seja aqui que o percurso dos Forfeda comece. Novamente se inicia a partir do
éabhadh que trará inspiração e mergulho, redimensionando o caminhante às
demais feda dos forfeda, possibilitanto que ele desenvolva o trato mágico,
sagrado, místico, permitindo que ele alcance, por fim, a Fírinne.

A jornada em espiral é profunda e deve ser uma vivência intensa, realizada apenas
após o cumprimento completo da jornada linear. Ao trilhar a jornada linear, alcançando
os forfeda como soberania, acredita-se que o eamhancholl trará revelações e indícios
dessa jornada em espiral, expressada como a jornada marítima aos mistérios profundos,
ao Outro Mundo, para a total compreensão e conexão com a existência, com Awen ou
Imbas. Não tenha pressa para realizar nenhuma das jornadas. Tão pouco acredite que será
realizada em uma só vida... Se permita realizar e progredir conforme a Música lhe
conduzir.

~ 61 ~
Parte X:
Na a do dhéag gaotha (Os doze ventos)26
Tradução por Bellouesus Isarnos.

“Oito ventos dispôs o Rei,


Sem falta de plena beleza ergueu-os,
quatro ventos principais ele mantém
juntamente com quatro ventos
secundários.

“Quatro outros ventos secundários há


que doutos escritores enumeram,
de modo que seu número correto
perfaz o de doze ventos.

“Dos ventos o Rei criou as cores


e com justa beleza organizou-as em seu
arranjo
conforme os usos, um percurso de
virtudes,
com multiplicidade de cores
Os 12 ventos. Vide nota 23
numerosas.

“O branco, o púrpureo límpido,


o azul, o verde grandíssimo,
o amarelo, o vermelho, dom seguro,
violentos não são em seu brandos encontros.

“O preto, o cinzento, o matizado,


o escuro, o sombrio,
o pardo, cores trevosas:
não são brilhantes ou facilmente dominadas.

“Ordenou-as o Rei em toda parte


com os oito bravios ventos secundários,
sem defeitos formou-os, amparo contra dificuldades,
os limites dos quatro ventos principais.

“Do leste o purpúreo sem mácula,


do sul o brilhante branco admirável,
do norte o horrendo preto tempestuoso,
do oeste o pardo enganoso.

26
Retirado na íntegra de Isarnos, Bellouesus, As cores dos XII ventos In Bellodunonn [S. I.]. Disponível
em: <https://bellodunon.com/2013/03/27/as-cores-dos-xii-ventos/>, acessado em 01 de maio de 2016.

~ 62 ~
“O vermelho, o amarelo juntos
entre o branco e o púrpura
o verde, o azul, [???]
entre o pardo e o branco.

“O cinzento, o escuro, [???]


entre o pardo e o preto,
o sombrio, o malhado no leste
entre o preto e o púrpura.

“Seu formato foi corretamente ordenado


foi feita sua disposição
sob harmonias de sabedoria, sem dissimulação,
conforme qualidades, consoante condições.

“Os doze ventos, com exércitos de batalhas,


leste e oeste, norte e sul,
o Rei os dispôs, ele os mantém,
encadeia-os sob sete harmonias.

“Dirige-os o Rei de acordo com qualidades


em torno do mundo com muitas harmonias,
cada dois ventos em uma brilhante harmonia
e uma harmonia sobre todos eles.

“O Rei organizou-os conforme harmonias familiares,


de acordo com hábitos, sem infração,
em dado momento manifestamente moderadas,
em outro, turbulentas.”

NOTA: a expressão “[???]” corresponde a termos que o


tradutor não conseguiu traduzir. Sejam por estarem inelegíveis
nos manuscritos originais, ou por dificuldade de tradução do
gaélico para o português.

~ 63 ~
Parte XI:
Roth na Bhliana (A Roda do Ano)

A Roda do Ano pode ser entendida como um calendário ritualístico celta. Mas ela
é muito mais do que isso. Rowena A. Seneween descreve
simbolicamente, a roda gira sem parar nas suas infinitas jornadas,
completando o ciclo natural da grande espiral, entre a Terra e o Céu. Na linha
do tempo não existem tradições e nem contradições, existe apenas a tradição
ancestral do princípio maior da criação, em constante movimento. (2012).

Ou seja, a Roda do Ano é uma alegoria, uma metáfora, que explica o


funcionamento cíclico e espiralado do tempo. Tudo é ciclo de maneira com que o tempo
é uma espiral a girar eternamente, mas perpassando sempre pelos mesmos pontos. Pontos
esses que são definidos no calendário cerimonial como as celebrações anuais, a que
grupos wiccanos chamam de sabbats.
O ano é então dividido pelos celtas em duas metades: a metade escura, associada
ao inverno e a Samhain; e a metade clara, associada ao verão e a Beltane. Mas quatro ou
oito festivais totalizam as celebrações da Roda do Ano. Quatro são os festivais agrícolas,
festivais do fogo, clássicos dos celtas, celebrados por todos os druidistas e
reconstrucionistas celtas. E quatro são os festivais sazonais. Existe uma discussão interna
quanto a observância e celebração dos festivais sazonais, uma vez que não é preciso o
fato de que os celtas celebravam esses festivais, apesar de se ter referência ao Solstício
de Verão na Irlanda e na Gália, com as celebrações de Áine, Mananann e Epona.
Atualmente, também se discute a adaptabilidade desses festivais ao hemisfério
sul. Alguns grupos e pessoas defendem que se deve adaptar as datas de acordo com a
sazonalidade, uma vez que seu culto era inicialmente sazonal e solar. Outros já dizem que
se deve preservar as datas e as egrégoras. Ambos são considerados corretos. Minha
sugestão é que o leitor se ponha a par dessa discussão e formule sozinho sua opinião.
Minha dica pessoal é: estude a agricultura e ciclo natural da terra de sua localidade. Os
quatro festivais principais, os festivais do fogo, também eram agrícolas, então tente ver
se na sua localidade vale a pena adaptar ou não a Roda a partir da sazonalidade. Em um
culto baseado na terra e no calendário agrário, a principal observância e aprendizado deve
vir da terra e da agricultura.
O principal que a
as celebrações da Roda do Ano têm como objetivo principal honrar os Deuses,
os espíritos da natureza e os antepassados, além de nos sintonizar à energia do
local, à ancestralidade celta e às mudanças das estações. Durante os festivais,
agradecemos e pedimos aos Deuses - que comandam tais mudanças - proteção,
saúde, prosperidade, fertilidade, inspiração e paz. (Seneween, 2012).

❖ Quatro festivais agrícolas, os quatro festivais do fogo:

 Samhain / Oíche Shamhna: geralmente comemorado em 31 de outubro e 1 de


novembro (hemisfério norte) ou em 30 de abril e 1 de maio (para quem adapta ao
hemisfério sul). É o festival dedicado aos ancestrais, a morte. É um festival de
recolhimento e introspecção no qual se busca conectar com os Deuses e se renovar,

~ 64 ~
reafirmando a honra e o respeito aos ancestrais e às tradições. Era o início do inverno
celta. O inverno como um tempo de recolhimento e de caça, no qual a natureza deixava
de ser frutífera e abundante. Fim do período de colheitas e início da temporada de caça.

 Imbolc / Lá Fhaile Bríde / Oímealg: geralmente comemorado em 02 de fevereiro


(hemisfério norte) ou em 03 de agosto (para quem adapta ao hemisfério sul). É o
festival da regeneração, no qual se celebra o alimento materno e a renovação do solo.
O inverno já anuncia seu término. É tempo de recomeçar os trabalhos agrícolas. É o
fim da temporada de caça e início do arado dos campos.

 Beltane / Lá Bealtaine: geralmente comemorado em 30 de abril e 1 de maio


(hemisfério norte) ou 31 de outubro e 1 de novembro (para quem adapta ao hemisfério
sul). É o festival do verão. Época de abençoar os animais, a casa, as pessoas, a terra.
A terra se prepara para frutificar, a colheita já pode ser anunciada, os animais estão
férteis e a vida afirma sua promessa de continuidade. É o início do verão celta. O verão
como um tempo de festa, entrosamento, fertilidade, alegria, uma celebração a vida, na
qual a terra é fértil e abundante. É o preparo para as colheitas.

 Lughnasadh / Lá Fhaile Lœnasa: geralmente comemorado em 03 de agosto


(hemisfério norte) ou 02 de fevereiro (para quem adapta ao hemisfério sul). É o festival
da colheita, no qual se celebra a produtividade e bênçãos terrenas. É período de jogos
e de abundância, quando os grãos começam a ser coletados e armazenados. Quando
recebemos a colheita de nosso plantio. Mas também é um período de grande mistério.
Antigamente não se tinha como saber se a colheita seria realmente farta e boa. O
cuidado com o campo era crucial para que se alcançasse a colheita desejada nesse
período, mas era imprevisível o resultado final. Por isso, era um momento de grande
festa: a festa da boa colheita (quando alcançada).

❖ Quatro festivais sazonais:

 Solstício de Inverno: geralmente comemorado em 21 e 22 de dezembro (hemisfério


norte) ou 20 e 21 de junho (para quem adapta ao hemisfério sul). Representa o
nascimento, ou o retorno do submundo. Geralmente vinculado a algum deus que tenha
passado por essa jornada de morte/renascimento, ou de peregrinação pelo mundo dos
mortos. É um período delicado. A terra está estéril e o inverno está em sua força total.
O inverno aqui entendido como o período de pouca ou de nenhuma produção agrícola,
de morte do solo. Está associado ao nascimento, pois um recém-nascido na antiguidade
não tinha garantias claras de sobrevivência, dessa forma, o bebê ainda se encontrava
no mundo dos mortos, em transição para o mundo dos vivos, quando completada essa
transição ele se afirmaria como vivo e terreno.

 Equinócio de Primavera: geralmente celebrado em 20 de março (hemisfério norte) ou


22 de setembro (para quem adapta ao hemisfério sul). Representa as flores, o plantio e
a promessa. É a promessa da terra de fertilidade e germinação dos grãos. É a época de
plantio e de trabalho agrícola. Mas também está frequentemente relacionado ao
romance por usa associação com as flores primaveris.

 Solstício de Verão / Meio do Verão: geralmente celebrado em 20 e 21 de junho


(hemisfério norte) ou 21 e 22 de dezembro (para quem adapta ao hemisfério sul).

~ 65 ~
Representa a plenitude e a germinação dos grãos. É quando a terra se frutifica. É o
período de festa de celebração da vida, da alegria e dos prazeres. A abundância e
fertilidade da terra é celebrada entendendo o verão como o auge da fertilidade terrena.
É frequentemente associado a gravidez: a terra como útero que gesta os grãos
germinados (frutos), assim como a mãe gesta o óvulo germinado (feto).

 Equinócio de Outono: geralmente celebrado em 22 de setembro (hemisfério norte) ou


20 de março (para quem adapta ao hemisfério sul). Representa a ação de graças, a
última colheita. A colheita que deverá garantir suprimentos para o inverno. É momento
de ser generoso e de se preparar para o período de recolhimento do inverno. Aqui a
terra inicia a demonstra seu desgaste e necessidade de regeneração. É a última
celebração de abundância e de colheita do ano.

O que nos cabe ressaltar é que esses festivais marcam o início de uma temporada
e não uma data em específico. Para além disso, por mais que seja um calendário agrícola
e que hoje estejamos distantes dos campos, sua observância nos é útil. Pois eles demarcam
épocas também cíclicas em nossas vidas anuais. Podem simbolizar tempos de abonança
e de recessão. Sua observância prática em seu sentido religioso e cotidiano podem ajudar
a um planejamento familiar e orçamentário. E podem ser observados nas ofertas dos
alimentos (principalmente agrícolas) no mercado, e na natureza que nos certa, mesmo que
inserida em uma cidade.
Seneween destaca as palavras de Philip Carr-Gomm, da ordem druídica OBOD,
no livro "Os Mistérios dos Druidas":
podemos dizer que os Quatro Festivais do Fogo relacionam-se com o ciclo e
com as fases da nossa vida na terra. Já os Quatro Festivais Solares
representam, a nível psicológico, quatro funções-chave ou quatro processos
internos que são: Inspiração, Recepção, Expressão e Recolhimento. (Carr-
Gomm apud Seneween, 2012).

A compreensão desses festivais, a meu ver, é muito mais vivencial do que literal.
Por isso é importante que, aliado ao conhecimento histórico e religioso dessas cerimônias,
busque vivenciá-las em seu cotidiano, muito além das celebrações e festividades, que se
incline a um vivência diária a um
planejamento anual inserido nessa
espiral, com o objetivo de conectar-se
a esse movimento temporal de
maneira a aproveitar e sacralizar
nossa jornada anual, de vida e terrena.
Seja qual for a sua decisão quanto a
adaptação ou não dos festivais pela
sazonalidade local, a conexão
profunda com a espiral da vida
disciplinará sua própria rotina e
poderá garantir um bom ciclo anual
de trabalho, colheita e recessão.

~ 66 ~
Parte XII:
Rialacha na bhFianna (As Máximas dos Fianna)

Os Fianna são, rudemente falando, o povo seguidor de Fionn. Fionn mac Cumhaill
é um dos maiores heróis celtas. Fionn nasceu do amor proibido de Cumhaill com Muirne
e como resultado desse amor, seu pai morre em batalha perdendo a liderança dos Fianna,
que passaram a ser liderados por Goll mac Morna. Fionn foi criado e mantido em segredo
até que na idade adulta foi aprender com os druidas a arte da liderança e da batalha.
Durante seu treinamento Fionn conseguiu comer o Salmão da Conhecimento e através
dos dons atribuídos ao salmão, soube como vencer Goll. Derrotou também o sídh, Aillen,
o que fez com que sua soberania nos Fianna fosse reafirmada.
Por fim, o que nos convém aqui é que esse é um importante povo mítico celta-
irlandês, muitas vezes considerados como um povo mágico, ou sobrenatural. As máximas
que se seguem (traduzidas pelo Ramo de Carvalho e tragas literalmente) servem de
inspiração para vivência e prática druídica, seja pessoal ou seja em tribos, clãs, grupos ou
ordens.

(texto transcrito na íntegra do Ramo de Carvalho, com todos os direitos reservados)27

“Filho de Luga, se o ofício do guerreiro for teu objetivo, seja comedido na casa de um
grande homem, seja sério em uma passagem estreita.
“Não baterás em teu cão sem culpa; até que tenhas a certeza de sua culpa, não
levantará uma acusação contra tua esposa.
“Em batalha não se meta com um bufão, oh mac Luga, ele é apenas um bufão.
“Não censures aquele de grande reputação; não te levantes para tomar parte em uma
contenda; não tenha nada a fazer com um louco ou vil.
“Dois terços de tua gentileza sejam mostrados às mulheres e àqueles que engatinham
no chão e aos poetas, e não sejas violento com o povo comum.
“Não profira bravatas, nem diga que não te curvarás ao que é certo; é uma vergonha
falar com tamanha veemência, a não ser que possa provar tuas palavras.
“Pelo tempo que viver, ao teu senhor não abandonarás; nem por ouro nem por outra
recompensa no mundo abandonarás aquele a quem tu és jurado a proteger.
“Para um chefe, não abusa de teu povo, pois isso não é digno de um homem de sangue
nobre.
“Não seja um portador de contos, nem profira falsidades; não sejas tagarela nem
censure precipitadamente. Não traga conflito para ti, embora um bom homem tu sejas.
“Não sejas assíduo da casa de bebidas, nem dado a criticar aos velhos; não te envolvas
com um homem de estado mesquinho.

27
Retirado e traduzido pela Ordem Ramo de Carvalho de ROLLESTON, Thomas. Myths and Legends of
the Celtic Race.

~ 67 ~
“Distribui tua carne livremente; não tenha nenhum avarento como teu parente.
“Não te forces sobre um chefe, nem lhe dê razão para falar mal de você.
“Atenha-se à tua arte; mantenha tuas armas até que a frente de batalha, com seu brilho
das armas, esteja terminada.
“Seja mais apto a dar do que a negar, e persiga a gentileza, oh filho de Luga.”

~ 68 ~
Parte XIII:
Tecosca Cormaic (As Instruções de Cormac)
Muito pouco chegou até nossos tempos a respeito do código moral e ético dos
celtas ou de sua religiosidade e espiritualidade. Contudo, druidistas modernos, apontam
para as Instruções de Cormac como uma possível indicação para o preenchimento dessas
lacunas. Ainda que essas instruções se destinem a educação de um príncipe que se tornaria
rei antes da morte de seu pai, é preciso entender que, na vida e cultura célticas, o social,
político estavam totalmente vinculado ao religioso. Para além disso, como os mitos nos
apontam, um rei deveria ser o perfeito exemplo de integridade (física, moral e espiritual)
de sua tribo. Ou seja, as instruções dadas a um príncipe e a conduta necessária de um rei
serve de claro exemplo a todos os súditos sendo inadmissível um rei que quebre com a
honra, de moral fraca, ou mesmo com ausência de qualquer integridade.
Por essa razão, as instruções de Cormac, são, sem dúvidas um direcionamento
ético e moral a ser considerado no momento de se responder sobre as condutas morais a
serem adotadas pelos religiosos que seguem a espiritualidade céltica, sobretudo
conectado às práticas irlandesas ou ao reconstrucionismo céltico irlandês.
Assim sendo, deixo abaixo a tradução feita por Bellouesus Isarnos desse registro
mitológico encontrado no manuscrito medieval Leabhar Bhaile na Mhóta - Livro de
Ballymote - (RIA MS 23 P 12, 275 foll.). Essa tradução pode ser encontrada no site
Templo de Avalon28.

As Instruções de Cormac
Tradução por Bellouesus Isarnos.

Ethne deu a Cormac um filho, seu primogênito, Cairpre, que foi rei de Ériu depois
de Cormac.
Foi durante a vida de Cormac que Cairpre subiu ao trono, pois ocorreu que, antes
de morrer, Cormac foi ferido por uma lança e perdeu um dos olhos e era proibido que
qualquer homem com um defeito fosse rei em Ériu. Assim, Cormac entregou o reino nas
mãos de Cairpre, mas, antes de fazê-lo, transmitiu a seu filho toda a sabedoria que possuía
no governo dos homens e isso foi anotado em um livro chamado As Instruções de
Cormac. Estas palavras encontram-se entre seus ensinamentos:

- Ó Cormac, neto de Conn – disse Cairbre -, quais são os deveres de um chefe numa
taverna?
- Não é difícil dizer - disse Cormac.
- Bom comportamento em volta de um bom chefe,
Luzes para as lamparinas,
Esforçar-se pelo grupo,
Distribuição adequada de assentos,
Generosidade dos distribuidores,

28
Tradução retirada na íntegra de Isarnos, Belouesus. As Instruções de Cormac IN Templo de Avalon.
Publicado em 2013. Disponível em:
<https://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=117>, acessado em
31/03/2020.

~ 69 ~
Mão ágil ao servir,
Atendimento solícito,
Música com moderação,
Narrativas curtas,
Semblante jovial,
Amável saudação aos convidados,
Durante récitas, quietude,
Cantorias harmoniosas.

- Ó Cormac, neto de Conn – disse Cairbre -, quais teus costumes quando eras um rapaz?
- Não é difícil dizer – falou Cormac.
- Eu escutava nas florestas,
Fitavas as estrelas,
Era cego a respeito de segredos,
Silencioso nos ermos,
Palrador no meio da multidão.
Moderado no salão de festas,
Duro no combate,
Cortês para com os aliados,
Um médico para o enfermo,
Fraco para com o débil,
Forte para com o poderoso,
Não era íntimo para não me tornar inconveniente,
Não era arrogante, embora fosse instruído,
Conquanto capaz, não era dado a prometer,
Não era temerário, embora fosse rápido,
Conquanto fosse jovem, não zombava dos velhos,
Não era jactancioso, embora fosse bom lutador,
Não falaria de alguém em sua ausência,
A vituperar eu preferia exaltar,
A pedir eu preferia dar,
Pois é com tais costumes que os jovens tornam-se maduros e nobres guerreiros.

- Ó Cormac, neto de Conn – disse Cairbre -, qual é a pior coisa que tens visto?
- Não é difícil dizer: – falou Cormac – as faces de inimigos no tumulto da batalha.
- Ó Cormac, neto de Conn – disse Cairbre -, qual é a mais doce coisa que tens ouvido?
- Não é difícil dizer: – falou Cormac – o grito de triunfo depois da vitória, louvor depois
dos esforços, o convite de uma dama para seu leito.

- Ó Cormac, neto de Conn – disse Cairbre -, que é o pior para o corpo de um homem?
- Não é difícil dizer: – falou Cormac – sentar-se por muito tempo, ficar muito tempo
deitado, esforçar-se além das próprias forças, correr demais, saltar demais, cair muitas
vezes, dormir com a perna por cima da grade da cama, olhar brasas acesas fixamente,
cera, colostro de vaca, cerveja nova, carne de touro, comida azeda, comida seca, água do
brejo, levantar-se muito cedo, frio, sol, fome, beber demais, comer demais, dormir
demais, falar demais, tristeza, subir uma elevação correndo, gritar contra o vento, secar-
se ao fogo, o orvalho do verão, o orvalho do inverno, remexer cinzas, nadar de barriga
cheia, dormir de barriga para cima, fazer brincadeiras idiotas.

~ 70 ~
- Ó Cormac, filho de Conn – disse Cairpre – quais são o pior pedido e a pior
argumentação?
- Não é difícil dizer – falou Cormac.
- Combater contra o conhecimento,
Argumentar sem provas,
Escudar-se em linguagem imprópria,
Uma elocução tensa,
Falar resmungando,
Excesso de minúcias,
Provas duvidosas,
Desprezo aos livros,
Voltar-se contra os costumes,
Mudar o pedido,
Instigar a ralé,
Soprar a própria corneta,
Berrar a todo pulmão.

- Ó Cormac, neto de Conn – disse Cairpre -, quem são os piores com quem podes fazer
uma comparação?
- Não é difícil dizer – falou Cormac.
- Um homem com o descaramento de um satirista,
Com a belicosidade de uma escrava,
Com a negligência de um cão,
Com a consciência de um patife,
Com a mão de um ladrão,
Com a força de um touro,
Com a respeitabilidade de um juiz,
Com saber engenhoso e perspicaz,
Com o discurso de um homem majestoso,
Com a memória de um historiador,
Com o comportamento de um abade,
Com o juramento de um ladrão de cavalos,
E sendo inteligente, mentiroso, grisalho, violento, blasfemo, falastrão, quando diz: “a
questão está decidida, eu juro, jurarás também.”

- Ó Cormac, neto de Conn – disse Cairbre – desejo saber como devo comportar-me entre
os sábios e tolos, em meio aos amigos e estranhos, entre os jovens e os velhos, em meio
aos inocentes e perversos.
- Não é difícil dizer – falou Cormac.
- Não sejas muito douto, não sejas muito néscio,
Não sejas muito presunçoso, não sejas muito acanhado,
Não sejas muito orgulhoso, não sejas muito humilde,
Não sejas muito falador, não sejas muito silencioso,
Não sejas muito rígido, não sejas muito débil.
Se fores muito douto, esperar-se-á muito de ti.
Se fores muito néscio, serás enganado.
Se fores muito orgulhoso, acreditar-te-ão molesto.
Se fores muito humilde, serás sem honra.
Se fores muito falador, não te darão atenção.
Se fores muito silencioso, não serás estimado.

~ 71 ~
Se fores muito rígido, serás quebrado.
Se fores muito débil, serás esmagado.

Aqui terminam as Instruções de Cormac Ulfada, filho de Art, filho de Conn


Cétchathach, filho de Óenlám Gaba, filho de Tuathal Techtmar, filho de Feradach
Findfechtnach, filho de Crimthann Nia Nár, filho de Lugaid Riab nDerg, filho de Bres,
Nár and Lothar, filhos de Eochaid Feidlech, filho de Find, Grande Rei de Ériu, que o filho
de Art deu a seu primogênito, Cairpre Lifechair.

~ 72 ~
Parte XIV:
Na Naoi Suáilcí Naofa (As Nove Virtudes Sagradas)

Talvez a parte mais fundamental da vida e da ética entre os antigos povos célticos
(em especial os irlandeses, de onde esse tema é retirado) fossem o cumprimento das nove
virtudes. Elas serão sempre referenciadas como algo inquebrável nos mitos irlandes. São
o verdadeiro código ético da vida e espiritualidade desses povos, a partir das quais todas
as demais éticas podem ser pensadas. O descumprimento de uma só que fosse colocava
toda a honra e dignidade daquela pessoa em questão e, socialmente, os nobres e os reis
deveriam ser exemplares no cumprimento dessas virtudes. Poderíamos dizer que elas são
as leis ou regras morais e sociais mais fundamentais da sociedade céltica.
Na saga irlandesa, o reinado de Bres só caiu após ele quebrar a primeira das
virtudes. Bres, O Belo, foi um dos reis mais tirânicos entre as Tuatha dé Danann, eleito
para suceder o rei Nuada quando esse não mais tinha a integridade física que o cargo
exigia, Bres foi escolhido por acreditarem que ele selaria a paz entre as Tuatha dé e os
Fomorianos, já que ele era filho dos dois povos. No entanto, quando rei, Bres tendeu aos
Fomorianos instaurando um reinado de penúria e tirania sobre os Tuatha dé. Ainda que
muitos nobres e o povo estivesse descontente, foi apenas após faltar com a verdade ao
proferir um veredito falso ao julgar Dagda que seu reinado começou a ruir, levando a
Segunda Batalha de Maegh Tuired (Moytura), quando os Tuatha dé finalmente
derrotaram terminantemente os Fomorianos e os expulsaram da Irlanda.
Essa passagem claramente mostra a importância desse código ético sobre a vida
social e cultural dos gaélicos, e, compreendendo que a vida religiosa era indivisível da
vida social, podemos transpor esse código sagrado como um perfeito código ético
religioso a ser importado e respeitado nas tradições e espiritualidades célticas modernas
– principalmente as que tendem para os gaélicos.
Para além da noção legal, elas esboçam um comportamento minimamente
espiritual ou espiritualizado, uma visão ou uma busca de contemplação da realidade
integrada com a cosmologia dos povos célticos e que extrapolavam a esses povos. As
virtudes eram colocadas em práticas inclusive com os inimigos, antes, durante e depois
das batalhas. Muitas das tribos rivais, segundo os mitos, pareciam comungar dessas
virtudes (em partes ou em integridade), e alguns outros respeitar tais virtudes e costumes.
Na verdade, se repararmos em profundidade, essas ainda são virtudes e
comportamentos ético-sociais muito bem quistos pela maioria das sociedades
contemporâneas, ainda que não sejam efetivamente praticadas – nem pelas lideranças,
nem pelos povos.
Na vivência das espiritualidades célticas hoje, a prática ou a manutenção dessas
virtudes de forma prática é vista como guia básico em todos os grupos. Assim sendo,
proponho uma reflexão sobre essas nove virtudes e um trabalho prático junto a elas.

I. Verdade: a verdade é a grande base. É preciso que sejamos verdadeiros


sempre, primeiro conosco mesmo, com os nossos, com a comunidade. A
verdade requer um propósito mínimo, uma essência, um norte. Sendo
verdadeiro conosco, estaremos sempre caminhando corretamente. Essa
virtude era tão importante, que a menção de uma frase que pudesse ter a
verdade questionada, fora suficiente para colocar o reinado de Bres, o Belo
em xeque.

~ 73 ~
II. Honra: era muito importante para os celtas, ela ditava a dignidade e a
legitimidade de toda pessoa perante a sociedade. A honra devia ser mantida e
se fosse perdida, era preciso limpá-la e reconquistá-la perante a sociedade.
Honra é uma noção muito em falta hoje em dia, ela foi substituída pelo
orgulho, pelo ego. A honra requer que a comunidade, que o todo esteja antes
de você mesmo, pois você só pode ser você através da comunidade, e sua vida
e vivência devem honrar as tradições, costumes e a comunidade. A honra é
guiada pela noção de comprometimento. Sua honra recai sobre os seus, sobre
a comunidade. Igualmente, a desonra contamina a todos.
III. Justiça: é fundamental que sejamos justos, sinceros e prudentes em nossos
julgamentos e ações. A justiça requer responsabilidade, pensamento coletivo,
ouvidos e olhos atentos. Ela é imperativa em sociedade e evoca o senso de
equidade entre os membros daquela comunidade, independente de suas
posições e distinções sociais.
IV. Lealdade: é ser fiel, primeiro a você, a sua verdade, ao seu propósito; em
seguida é ser leal ao seu comprometimento. Sem lealdade tudo se torna vão,
vazio de prática e de coerência. A lealdade é algo que se tem e que se perde,
que se dá e sua manutenção requer a aplicação das virtudes anteriores. Mas
ela deve ser sempre inquestionável. Ter nossa lealdade questionada é
igualmente questionar nossa honra.
V. Coragem: é preciso ser corajoso para praticar todas as virtudes, para viver de
forma coerente e digna. Sem essa virtude não se pode lutar pela justiça ou pela
verdade. É através da coragem que se pratica todas as virtudes, é através dela
que se luta para que elas sejam igualmente praticadas. Essa virtude requer
integridade e enfrentamento digno dos obstáculos que nos opõem.
VI. Generosidade: devemos olhar ao nosso lado e redor com afeto, com carinho,
com empatia. Ela nos demanda que sejamos nobres sem o orgulho,
benevolentes sem o egoísmo. Através da generosidade podemos efetivamente
praticar as virtudes em nossas relações sociais, com empatia.
VII. Hospitalidade: profundamente sagrada para os celtas, a hospitalidade é algo
que deve ser ofertado a todos, inclusive aos inimigos. Mas ela é uma via de
mão dupla, da mesma forma que não se nega hospitalidade, deve-se honrar e
respeitar dignamente a hospitalidade recebida. Essa virtude vai para além do
efetivamente hospedar alguém em sua casa, ela tange nas nossas relações
como um todo, em como tratamos nosso próximo, nosso amigo, nossos
conhecidos, desconhecidos e até nossos inimigos. Ela é a aplicação prática da
generosidade nas relações sociais em todos os seus âmbitos. Podemos defini-
la como um compromisso recíproco de manter uma relação generosa, amistosa
e equilibrada de acolhimento. Essa virtude era tão sagrada e importante que
não são raros os casos de inimigos que ao pedir abrigo uns aos outros
receberam toda a pompa e honra durante sua hospedagem, sempre de maneira
segura. Da mesma forma, a quebra da hospitalidade provocava guerras
inclusive entre amigos.
VIII. Força / Valor: ser valoroso / forte é imperativo. É manter-se resistente e em
constante aperfeiçoamento. Ser forte está além da força física, mas se encontra

~ 74 ~
na manutenção de nosso corpo interior e exterior. Provar nosso valor é manter-
se em constate (auto)superação.
IX. Perseverança: persistir no caminho, na prática das virtudes, na busca e
realização de seu propósito é fundamental. Sem a perseverança os obstáculos
sempre serão grandes demais. Ela é o meio pelo qual podemos manter nosso
caminho devocional e nosso caminhar na vida. Ser perseverante é estar sempre
em movimento, em crescimento.

De um modo mais resumido, podemos dizer que devemos ser verdadeiros para
sermos honrados. Devemos ser justos para manter nossa honra. A justiça nos demanda
lealdade para ser aplicada. Sem coragem não conseguimos manter nossas virtudes, mas
é preciso generosidade para que essa coragem não vire tirania. A generosidade nos
ensina que a hospitalidade é a melhor maneira de viver nesse mundo, que a belicosidade
fora de hora e propósito, mesmo com o inimigo, é desonrosa. Praticar as virtudes requer
força de vontade para estar sempre se aprimorando. E no final é preciso muita
perseverança para realmente seguir sempre em frente, praticando todas as virtudes
sagradas.

A trindade nas virtudes:


Inspirado pelo trabalho da ADF (Ár nDraíocht Féin / A Druid Fellowship), nos
Estados Unidos, podemos vincular ou dividir as Nove Virtudes em três trindades
vinculadas aos Três Reinos, aos Três Caldeirões da Poesia e aos Nove Dúile (elementos
corporais e terrenos). Dessa forma, ao exercermos determinada virtude também estamos
trabalhando nossos elementos, nossos caldeirões e nos conectando com algum
determinado reino. É uma forma de compreender essa noção integralista e sistêmica tão
cara à cosmologia celta. Tudo está conectado, atuar em uma parte afeta e atua no todo.
As virtudes não eram praticadas apenas pelos homens. Elas são sagradas e
imperativas também para os Três Povos (Deuses, Sídhe / Encantados, Ancestrais) e são
veiculadas ou praticadas nesse e no Outro Mundo. Portanto, compreendê-las em sua
amplitude é necessário, pois para além de nos guiar nas relações sociais e terrenas, elas
também devem guiar nossa fé, práticas e relações com o sagrado, com o divino e com os
Outros Povos.
A seguir, apresento um quadro correlacionando as Nove Virtudes com esses
pontos focais da cosmologia e compreensão mística do mundo sagrada a espiritualidade
céltica que trabalhamos nessa apostila.

As Nove Virtudes e suas correlações com a mística céltica


Virtudes Dúile Caldeirão Reino
Verdade Ossos / Pedras
Caldeirão do
Honra Carne / Solo Terra
Aquecimento
Justiça Pele / Vegetação

~ 75 ~
Virtudes Dúile Caldeirão Reino
Lealdade Sangue / Mar
Caldeirão do
Coragem Respiração / Vento Mar
Movimento
Generosidade Mente / Lua
Hospitalidade Rosto / Sol
Caldeirão da
Força Cérebro / Nuvens (raio) Céu
Sabedoria
Perseverança Cabeça (essência) / Céu

~ 76 ~
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O intuito da presente apostila é ser uma introdução básica a mística celta de acordo
com o que é trabalhado no Leanaí an Ghealach Clann do qual o presente autor é druida
e sumo sacerdote. Visa-se com este material, portanto, uma base inicial para entendimento
e vivência celta. Mas uma base a ser transcendida e superada pelo leitor com pesquisas,
críticas e reformulações.
Não há uma verdade absoluta sobre os celtas. Sua realidade se perdeu nas brumas
do tempo. O que fazemos hoje é uma tentativa de redescobrimento, de reconstrução da
religiosidade e espiritualidade desses povos antigos. Há muitos métodos possíveis. Há
muitas maneiras de se conseguir ser exitoso nessa tarefa. O estudo da mística é uma dessas
formas.
A mística aqui é entendida como a explicação do sagrado ou da crença sagrada a
partir de textos e vivências. Muito pouco da mística celta chegou até nós, o pouco que
chegou certamente chegou corroído pelo tempo. Nossos esforços históricos,
arqueológicos e antropológicos tem sido de grande ajuda e valia nessa reconstrução.
Contudo a mística precisa ser vivenciada, acessada. Sua enunciação serve apenas para
descortinar a realidade e mostrar o sagrado que sempre esteve a sua frente, revelando um
mundo que sempre esteve ali, mas que nunca fora visto antes pelos olhos do místico. É
dessa contemplação que nascem as escritas e argumentações místicas. São essas que, em
sua maioria, se perderam no tempo. Mas acredito que ao pesquisarmos e reunirmos as
informações sobre a religiosidade e cultura celta, e ao nos depararmos com seus
fragmentos e lacunas, podemos realizar um exercício vivencial e contemplativo (místico)
e acessar novamente esse sagrado tão conhecido dos celtas e que hoje nos dispomos a
descortinar e revivenciar.
Essa é a proposta dessa apostila. Apresentar fragmentos que visivelmente podem
ser montados nesse quebra-cabeças da espiritualidade celta e, dessa forma, aguçar o leitor
à pesquisa, vivência e contemplação mística. De maneira a entender melhor e mais
profundamente a religiosidade e a beleza da espiritualidade desses povos – e que hoje
também se torna nossa religiosidade e espiritualidade.

~ 77 ~
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~ 80 ~

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