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SÃO PAULO
2017
ISAACK GAITANI MDINDILE
SÃO PAULO
2017
Aos meus pais, aos professores e a toda Congregação dos Missionários da
Consolata, cujos esforços, confiança e fé permitiram-me chegar até este
momento.
A inculturação não debilita os valores verdadeiros, mas demonstra a sua
verdadeira força e a sua autenticidade, já que eles adaptam-se sem se alterar,
antes transformam pacífica e gradualmente as várias culturas. As culturas são
muito diferentes entre si, cada princípio geral, se quiser ser observado e aplicado,
precisa de ser inculturado.
(Papa Francisco- Evangelii Gaudium)
RESUMO
Este projeto tem como proposta: analisar, interpretar e traduzir a imagem, a pessoa de Jesus, O
Cristo, no contexto e tecido africano, particularmente, na África Subsaariana - a sua grande
diversidade e beleza cultural, situações da empobrecimento e exploração, fundamentalismo
religioso, secularidade, a religião tradicional e outras religiões, etc. Toda teologia deve ser
contextualizada por sua relevância e fidelidade ao evento pentecostal do Concilio Vaticano II
(1962-1965). Neste sentido, responder quem é Jesus para os africanos hoje é a preocupação e
ocupação pertinente de toda evangelização na África. Como Jesus é entendido e se faz presente no
cosmo visão africano é a pergunta central dessa pesquisa. Esse ensaio cristológico terá os seguintes
binômios: Inculturação e Libertação integral. Por isso, a religiosidade e a filosofia do povo, os
provérbios, metáforas, ditados, sem dúvida são bases cardinais para essa articulação. Dentro desta
perspectiva, se mostra como o Cristianismo é desafiado e convocado, a repensar bem a sua teologia
dentro desta realidade mutante e diversa, mas mantendo se firme e fiel na sua missão de ser
“inteligência da fé”.
The purpose of this research is to analyses, interpret, and translate the image and person of Jesus,
the Christ in the African context particularly in Sub-Saharan Africa - its great diversity and cultural
beauty, situations of poverty and exploitation, secularism, African traditional religion and other
religions, etc. For its relevance and fidelity to Council Vatican II, all theology must be
contextualized and Incultured. In this sense, responding who is Jesus to Africans today is the
concern of all evangelization in Africa. How Jesus is understood and made present in the African´s
world view is the central attention of this research. This Christological essay will have the
following binomials: Inculturation and Integral Liberation. Moreover, the religiosity, worldviews,
and popular philosophy of the people will be the base of this theological articulation.
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 8
5 CONCLUSÃO ................................................................................................................ 57
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 59
8
1. INTRODUÇÃO
O próprio Jesus de Nazaré desafiou seus discípulos quando lhes perguntou: “Mas vós,
quem dizeis que eu sou?” (Mc 8:29). Esta questão de dois milênios foi - e ainda é - determinante
na formulação da imagem de Jesus chamado Messias. A busca pela Cristologia situada num
contexto sempre existiu na tradição crista. E o cristianismo na África não ficou fora da mesma. A
pessoa de Jesus, devido sua popularidade e novidades continua desafiando e provocando novas
interpretações de sua pessoa e missão, segundo às necessidades e tradições locais.
A pertinência dessa busca cristológica não é apenas o centro da fé, mas também o
encontro da religiosidade popular e das reflexões da teologia africana contemporânea, em que,
nesta última, há uma correlação muito forte entre a comunidade, ou seja, a família e a referência
de Jesus Cristo. Ter uma teologia menos essencialista e mais consequente do ponto de vista da ação
eclesial, permitindo compreender a história de onde se vem, o contexto onde se vive e o caminho
futuro que quer trilhar. Isso nos ajuda a perceber a ênfase do Concilio Vaticano II, sobretudo a
relação da Igreja com o ministério de Cristo.
Portanto, as questões cristológicas não são meramente retóricas, mas constituem os
desafios e demandas dos africanos em ter uma imagem, conceito e práxis de Jesus Cristo
compatível, bem com as tradições e convicções profundas do povo. Eis aqui a missão da Igreja da
África, denominada com palavras-chave de Inculturação e Libertação integral. Como titular melhor
esse Jesus e como aproximar e reconciliar a pluralidade desse cristologia africana? O objetivo desse
trabalho não é oferecer respostas prontas, e sim sintetizar e responder essa busca cristológica de
forma geral.
Por outro lado, o presente estudo tem por intuito apresentar a relação dialética, existente
entre a cristologia e a eclesiologia. Isso implica dizer que não somos nós que inventamos o Cristo,
ou seja, esse Jesus Africano é fruto de uma longa história e experiência da comunidade. Aderimos
a Ele tal qual nos é apresentado pela Igreja, segundo a tradição vivida ao longo dos séculos. Um
projeto da mesma depende, sempre, da visão que se tem do Cristo. A uma imagem do Cristo
corresponde uma imagem de Igreja, e não outra. O tambor africano é um símbolo-cultural que o
povo usa no acolhimento dos hospedes/estrangeiros, nas festas, ritos e celebrações litúrgicas. É
9
uma marca ontológica de hospitalidade, comunicação, refazendo suas relações, e reforçar a coesão
social. De fato, a linguagem sobre Deus se faz de várias formas: na fala, no corpo, na dança, na
pintura, enfim na criação. Neste sentido, Jesus Cristo é recebido e acolhido com danças como
hospede. A dança se fundamenta no mito de um Deus que dança, de um movimento eterno do
cosmo. O dinamismo “pericorético” trinitário- o conceito designa dança; o que significa: uma
dança girando, rodeando em torno do outro; e o outro rodeando o primeiro. Portanto, Jesus é vivido
e anunciado nos cantos, contos, histórias dos anciãos, provérbios e danças antes de ser
dogmatizado1.
Uma Igreja samaritana, participativa e profética é indubitavelmente universal, sendo
que a mesma é a comunidade das comunidades vivas, que encontram e comungam a palavra de
Deus, e a qual se mostra aberta e dirigida pelo poder do Espírito Santo, portanto, atentos aos sinais
dos tempos. Recuperando o Concílio Vaticano II que chamou a Igreja em saída, sendo “peregrina
é chamada por Cristo a essa reforma e missão permanente. Como instituição humana e terrena, a
Igreja necessita perpetuamente dessa reforma (UR 6)”.
1
Refiro-me á literatura como a arte de contar e escutar histórias. As grandes lições de ethos comum vêm vestidas de
histórias, de lendas, de fabulas. Quase em todos os continentes, em todas as gerações, os mais velhos inventaram
narrativas para encantar/enamorar os mais novos. E por via desse encantamento passavam não apenas sabedoria, mas
uma ideia de decoro, de decência, de respeito e de generosidade.
10
2. CAPÍTULO I
METODOLOGIA E CONTEXTUALIZAÇÃO
“Eu sou africano, não porque nasci em África, mas porque a África nasceu em mim”
(NKRUMAH,)2.
2
“Eu sou africano, não porque eu nasci em Africa, mas porque a África nasceu em mim”, de Kwame Nkrumah, um
dos pioneiros do movimento “Black Identity”, ou seja, “Pan-Africanism”. Black Identity é um movimento iniciado no
século XX que propõe a união de todos os povos da África, tendo por intuito potencializar a voz do continente no
contexto internacional. Foi o primero president de Gana em 1957. (Tradução Nossa)
3
“UBUNTU” é uma palavra africana que tem origem na língua Zulu. Designa a cosmo-visão dos africana enfatizando
o valor da família, ou seja, a comunidade humana. O ditado popular “eu sou porque nós somos” (ADEYEMO,
1998:374; GERLOFF, 1998:49; NDUNGANE, 2003:102; SETILOANE, 2000:21; TUTU, 1999:35).
4
MEIRING, Arno. As below, so above; A perspective on African Theology, disponível em
http://www.hts.org.za/index.php/HTS/article/viewFile/220/154, P. 1. Acesso no dia 25 de outubro de 2016.
11
5
BRIGHENTI, Agenor. Por uma Evangelização Inculturada: Princípios pedagógicos e passos metodológicos,
Paulinas, São Paulo, 1998. P. 66.
6
APARECIDO DA SILVA, Antônio. Desafios teológico-pastorais a partir da causa dos Afro-brasileiros.
In:BRANDÃO, Carlos (Org.). Inculturação e Libertação: semana de estudo teológicos CNBB/CIMI. São Paulo:
Paulinas, 1986, P.180.
7
Desmond Tutu é um arcebispo da Igreja Anglicana consagrado com o Prêmio Nobel da Paz, em 1984, por conta de
sua luta contra o Apartheid em seu país natal - África do Sul.
8
BENEZET, Bujo. African Theology: which direction to take and what methodology to use. Paulines, Nairobi,1998.
P. 9. O método na discussão, para ser mais e especificamente da teologia cristã na africana não precisa tomar uma
forma dos outros lugares, mas pode emergir de baixo, a Cristologia de baixo (como abaixo, tal como acima-ditado
12
popular). Aproveitando a religiosidade do povo, cultura, e, em particular, de suas experiências litúrgicas que parecem
ser o lugar onde um novo vocabulário teológico é trabalhado, realista sem ser abstrato. (Traduçao livre)
9
Mensagem do Papa Francisco ao Cardeal-Arcebispo de Buenos Aires, por ocasião de centenário da Pontifícia
Universidade Católica Argentina, na terça-feira, dia 10 de março de 2015.
10
COSTA, Jose de Anchieta Lima. Conhecer Jesus; A cristologia ao alcance de todos, Paulus, São Paulo, 2014. P.29.
11
Povo do Norte de Moçambique.
12
Significa a família que aumenta de extensão, um termo que expressa numa escultura em que várias figuras humanas
se aglomeram de forma entrelaçada, simbolizando a unidade familiar.
13
lugar da reflexão. O contexto sociocultural, onde a comunidade dos crentes se encontra inserida,
provoca questionamentos, encanta e faz perguntas, embora essa mesma comunidade seja desafiada
e chamada a “dar explicação de sua esperança a quem o pedir”13.
É importante evitar o fundamentalismo cultural, isto é, justificar e aceitar tudo sobre a
cultura como base da definição teológica, sem uma crítica honesta e madura. Deve existir a relação
vital entre o texto e contexto onde teologizamos. A contextualização deve ser sincera e apresentar
teor crítico para preservar a verdade evangélica sem cair no sincretismo.
O último nível é a reflexão sistemática, em que o intuito é ir além da simples reflexão
sobre as experiências de fé que cada crente pode fazer. Para tal empreendimento, vamos utilizar os
resultados das pesquisas bíblicas, da exegese moderna, da história, da geografia, e de outras
ciências que nos ajudam a adquirir uma compreensão mais exata e o mais abrangente possível do
trabalho, que é responder à pergunta “quem é Jesus Cristo para os africanos de hoje?”
Na África, o problema central sempre foi a falta do diálogo com as culturas locais. Não
houve conhecimento mutua. A evangelização era sinônimo como colonização, propaganda
ideológica. Hoje é necessário que a Igreja se pergunte o que é a África e quem é este africano. A
questão antropológico-cultural é crucial e constituiu um ponto decisivo na produção teológica e
guia pastoral na África. É preciso que o evangelizador fale ao africano de modo que ele, como o
samaritano, possa dizer: “disse-me aquilo que eu fiz”14. É necessário que os africanos digam aos
evangelizadores o que os samaritanos disseram a Jesus: “Já não é pela tua palavra que nós cremos,
mas porque nós mesmo ouvimos e sabemos que Ele é verdadeiramente o Salvador do mundo15.
13
Cf. 1Pd 3,15.
14
Cf. Jo 4,39.
15
Cf. Jo 4,42.
16
PEREIRA, A. Danilevicz. África pré-colonial: ambiente, povos e culturas, P.15.
14
17
Idem, P. 16.
18
Idem, P. 18.
15
19
África-Subsaariana é o nome geograficamente incorreto e equivocado. Dos 55 países, a ONU coloca 46 países como
países da África subsaariana, excluindo Algeria, Djibuti, Egito, Líbia, Marrocos, Somália, Sudão e Tunísia. A união
africana não usa o termo “África subsaariana”, prefere usar organizações regionais como “Comunidade da África
Oriental”. África subsaariana é o nome dado pelos colonialistas com finalidades discriminatório de dividir a “África
branca” e “África negra”.
20
Cf. COUTO, Mia. Se Obama fosse africano? E outras intervenções, Ndjira, Maputo, 2009. P. 24.
16
A África é agora o lugar de maior crescimento do Cristianismo, tido como continente cristão mais
populoso do mundo e atualmente com pouco mais cristãos quando comparado à América do Norte
- e os números estão em expansão. Os católicos africanos representam 17% de todos os católicos
do mundo. O ritmo de crescimento dos batizados ultrapassa 40%, ainda que a população africana
cresça ao ritmo de 23,8%. A pesquisa de Pew Forum mostra que, em 2050, a África-Subsaariana
terá 1,1 bilhões de cristãos, quase o dobro de seu rival mais próximo para adeptos - o Islã21.
A África também é um continente que não há muito tempo era um dos principais
destinos para os missionários estrangeiros, é agora aquele que está enviando os padres e pastores,
os quais são chamados - por sua percepção - para despertar a fé em outras partes do mundo que
acreditam estar em estado de dormência, no inverno eclesial. O continente africano conta com 66
seminaristas para cada cem presbíteros, o que indica uma renovação geracional ativa.
O momento histórico do crescimento do Cristianismo neste território é uma das
discussões globais, especialmente entre os cristãos acadêmicos e os missionários nos ciclos
pastorais. O interessante é que tal discussão inclui não apenas a relação do Cristianismo com outras
religiões e fé - particularmente o Islã -, mas também o papel dos cristãos no mundo da política, ou
seja, os impactos e feições da fé nas orientações e decisões públicas.
Uma das articulações teológicas inquietantes sobre a ascensão do Cristianismo na
África é: se esse crescimento é apenas numérico ou tem a ver com a ad intra dinâmica teológica-
cultural que chama essa atenção global. Será preciso reconstruir as bases eclesiais mais que delegar
tarefas, descentralizar atividades que os ministros ordenados não estão alcançando assumir.
Para entender a diversidade africana, porém, é preciso conhecer os sistemas de
pensamento e os universos religiosos desses indivíduos, que frequentemente são desprovidos de
nomes. Os sistemas de pensamento da ruralidade africana - que é maior - não são facilmente
redutíveis às logicas ocidentais, isto é, das razões comerciais/ideológicas que se fecham às outras
culturas, línguas e lógicas. Porém, O que permitiu a sobrevivência da espécie humana não foi
apenas a inteligência/tecnologia, mas a sua capacidade em produzir diversidade, esta última que
tem sido negada, atualmente, por um sistema que faz as escolhas por motivos financeiros e
facilidade de sucesso22. Hoje reinam pensamentos dominantes, unificantes de tal modo que quem
não se atém a eles é discriminado, rejeitado.
21
ALLEN, John. África: maior crescimento do Cristianismo de 30 de dezembro de 2015, e maior ameaça. In:
https://cruxnow.com/faith/2015/12/30/africa-christianitys-greatest-growth-and-greatest-threat/, P.1.
22
COUTO, Mia. Se Obama fosse africano? E outras intervenções, P. 24.
17
The closeness in the world views between the Bible and Africa, the positive
significance attributed to the supernatural elements in the Gospels, and the
liveliness of belief in demons-all these points boil down to the recognition that
Africans need not and should not replicate the intellectual history of Western
Europe in order to understand what the Gospels say about Jesus24.
23
SHORTER, Aylward. The contribution of African Theology to World Church-African Theology as
“Communication”, Paulines, Nairobi, 2000. P. 24.
24
DANIEL, J. Harrington. Anglican Theological Review, Vol. LXIV, no. 3, Some Voices in the New Testament
Interpretation, P.362-370. A proximidade da concepção do Mundo entre a África e Bíblia, o significado atributo aos
elementos supernaturais no evangelho e a crença no mundo das trevas-todos esses pontos mostram que africanos não
precisam reproduzir a história intelectual do mundo ocidental para entender o que o Evangelho que fala sobre Jesus
(Tradução livre).
18
25
Idem, P. 20.
19
26
PEREIRA, A. Danilevicz. África pré-colonial: ambiente, povos e culturas, P.29.
27
Cf. BOAS, A. Villas. A dimensão social da evangelização na Evangelii Gaudium e o discernimento da caridade.
In: Revista de Cultura Teológica de Jul/Dez 2014, P. 15.
20
na formação política, social, econômica e cultural do continente, da mesma maneira que as outras
religiões e crenças em outras partes do mundo.
colonial, em que a África e outras partes do mundo foram dominadas politicamente e militarmente
pelos países europeus e sofreu a opressão cultural em suas mãos”28.
Nesse cenário, o povo africano se encontrava num dilema, em que, ao ser forçado
abandonar seus costumes, acabou por ocorrer mortes e sofrimento. Na verdade, discretamente, o
povo continuava a seguir seus costumes tribais, especialmente nos momentos de desafios como
doenças e mortes, nos quais a nova religião não conseguia dar respostas práticas aos problemas.
Os africanos eram obrigados a largar suas tradições e assistir às religiões dos colonizadores, que se
apresentavam contrários e desligados da vida cotidiana.
John Mbiti explica:
28
SHORTER, Aylward. The African Synod, Paulines, Nairobi, 2005. P. 53.
29
Idem, P. 54.
30
Lerma Francisco Martinez é um antropólogo e missionário da Consolata, nascido na Espanha e que atua como
bispo na Gurué, em Moçambique.
22
31
AZZI, Riolando. A teologia colonial na formação da sociedade colonial brasileira, P.97.
32
BAUR, John. 2000 years of Christianity in Africa. Paulines, Nairobi, 1994. P. 491.
24
33
MEIRELES, Márcia Candomblé, uma religião de resistência em Revista Brasileira de Dialogo Ecumênico e Inter
religião, Ano 02, nº 02, janeiro a julho de 2014, ISSN 2357-965X, P.63.
25
3. CAPÍTULO II
O EVENTO CRISTOLÓGICO
34
UDOH, B. Enyi. Guest Christology: Na interpretative View of the Christological Problem in Africa, Studies
in the Intercultural History of Christianity 59 (Frank-furt: Peter Lang, 1988) 263. Chapter 2, “The
Christological Problem” reviews some theologians and novelist who affirm that traditional African religions
and pratices remain alive and well within Christian commitments. Udoh cites Desmund Tutu, who observes
that “the African Christian has suffered from a form of religious schizophrenia” (19), that is, he or she pays
lip service to the white Christ while deeply sensing their africanness has been violated. Udoh is from Nigeria.
(Alguns teólogos e autores afirmam que a religião tradicional-africana e suas práticas continuam vivas dentro
e entre os cristãos africanos. O teólogo Udoh cita Desmund Tutu, quem observa que “os cristão-africanos
sofrem algum tipo de fé schizophrenica” isso é os mesmos atendem O cristo dos cristãos, mas no fundo sentindo
que a sua africanidade foi violentada (Tradução livre).
26
preocupação é fazer Cristo sentir-se em casa, ou seja, traduzir Jesus usando nomes, ideias e
a visão comum das experiências locais. Como fazer de Cristo, fonte e razão do nosso ser
cristão ad vitam para a missão toda? Muitas coisas deverão ser feitas, sem dúvida, no campo
pastoral. Catequético, litúrgico, social...., mas nada é mais decisivo do que promover a
conversão a Jesus Cristo. Oque pode significar concretamente esta conversão?
“Uma fé que não se torne cultura é uma fé não plenamente recebida, não
inteiramente pensada nem fielmente vivida” (PAPA JOÃO PAULO II, (1920-2005).
35
O nome popular de Cristo para o cristão de tribo “Sukuma-Tanzania”, que significa a vitória sobre a Morte.
Esse título é importante para essa tribo, que não acreditava na vida após a morte. Tradicionalmente, os corpos
dos mortos eram deixados no mato, portanto, Jesus que vence a morte é a verdadeira boa nova para esse povo.
36
DUPUIS, Jacques. Introdução a Cristologia, Edições Loyola, São Paulo, 1999. P.25.
27
uma face uniforme de Cristo na África (OROBATOR, 2009, p. 76-78), portanto, não há um
modelo cristológico que pode ser considerado absoluto, definido e melhor que os demais. A
pergunta crucial é como aproximar e aproveitar essa pluralidade dos títulos e modelos da
cristologia africana?
Há uma hermenêutica da continuidade na descontinuidade. Neste sentido, a
teologia da libertação e inculturação resume as figuras de Cristo na África-Subsaariana. Pois
seria, de fato, um erro histórico-teológico imaginar uma única e definida cristologia africana,
sem levar em consideração os variados contextos, diferentes etnias e mudança de situações.
Como não há uma África, também não há uma teologia/cristologia única.
Jesus Cristo, como africano/negro é essencial, isso significa costurar Jesus nos
símbolos, experiências e significados no mundo africano que se identificam mais com a
pessoa e missão de Jesus. Como evangelizar melhor as culturas africanas? Em que
maneira/área os africanos podem contribuir na teologia cristã na sua globalidade? Como
contribuir ao diálogo da intercultural-teológico/diálogo inter-religioso com a religião
tradicional? E finalmente, como africanizar o Cristianismo, não como ideologia, nem como
uma cultura estrangeira, mas como semente/anúncio de Deus preparado no tempo oportuno
- kairos - para tornar esses africanos verdadeiros cristãos? Eis um desafio antropológico e
teológico.
O que os africanos e os teólogos africanos falam sobre Jesus? Os teólogos
coincidem em definir duas possibilidades de fazer cristologia africana: indigenização - ajudar
o povo a fazer memória da sua própria história, cultura e experiência comunitária - e
conscientização, para que essa memória não seja romantizada nem idealizada, devendo se
mostrar apropriada criticamente. Os teólogos/pastores desenvolvem os títulos e nomes de
Jesus dentro dos contextos africanos, como é explicitado a seguir.
28
For example, for John S Pobee, writing from within the context of Akan
society in Ghana, Jesus is Nana, “the great and Greatest Ancestor “. For
E.J.Penoukou, whose society of origin is the Ewe-Mina of Togo, Christ is
ancêtre-joto. For Bénézet Bujo of Congo, Christ is the proto-ancestor.
Charles Nyamiti of Tanzania, who has written more about Christ as our
Ancestor. For him Christ is our Brother and Ancestor. For François
Kabaséle, also from Congo, Christ is an Elder-Brother Ancestor. The
limitation in applying the concept of ancestor to one´s interpretation of
Christ have been voiced, and yet the appeal to this tradition is strong.
Clearly, the concept of ancestor cannot be applied to Christ in a literal,
non-metaphorical way. Among the strengths of the image is that Christ as
a common ancestor can help us to overcome a destructive ethnocentrism or
tribalism. It reinforces the fact that we are one family in Christ, one tribe,
one community. We are all sons and daughter of one Ancestor named Jesus
Christ37.
Jesus não é um entre ancestral, mas ancestral por excelência, sendo que, não
apenas realiza as qualidades da mesma, mas vai além, transcendendo e dando mais
significação, considerando sua vida na terra e seu mistério pascal, que o fez “proto-ancestral”.
A encarnação é a base dessa ancestralidade, como ponte entre Deus e humanidade, com isso,
37
GOERGEN, J. Donald. The Quest for the Christ of Africa. In: opcentral.org. P. 4. Por exemplo, para John S
Pobee, escrevendo no contexto da sociedade Akan em Gana, Jesus é Nana, "o grande e o maior Ancestral". Para
E.J.Penoukou, cuja sociedade de origem é a Ewe-Mina do Togo, Cristo é ancêtre-joto. Para Bénézet Bujo do
Congo, Cristo é proto-ancetral. Charles Nyamiti da Tanzânia, que escreveu mais sobre Cristo como nosso
Ancestral. Para ele, Cristo é nosso Irmão e Ancestral. Para François Kabaséle, também do Congo, Cristo é
Ancestral Irmão. A limitação na aplicação do conceito de ancentralidade à interpretação de Cristo foi
expressada, e ainda assim o apelo a essa tradição é forte. Evidentemente, o conceito de ancestral não pode ser
aplicado a Cristo de uma maneira literal e não metafórica. Entre os pontos fortes de Jesus Cristo como ancestral
é a sua universalidade, isso nos ajuda a superar um etnocentrismo ou tribalismo e reforça o fato de que somos
uma família de Cristo, uma tribo catolica, uma comunidade humana. Somos todos filhos e filha de um Ancestral
comum chamado Jesus, O cristo.
29
o conceito desse termo deve ser “purificado” quando aplicado à pessoa de Jesus (SHORTER,
1983).
A abordagem dos ancestrais no contexto cultural-religioso da África não remete
a qualquer antepassado, mas às pessoas que já estão falecidas, embora ainda vivam na
memória coletiva do povo. Existe uma ligação muito forte entre a vida na terra e os ancestrais,
entre a terra e a espiritualidade; são as forças vitais - como Deus, que alimenta a vida
comunitária e hospitalidade - e a vida em sua totalidade, desde a concepção até à morte. A
alegria, a geração dos filhos, a harmonia com a natureza e o respeito são elementos
fundamentais da religião, ontologia e visão do mundo dos africanos, especialmente o bantus
- língua que deu origem às outras línguas africanas.
Os ancestrais não são como os santos na tradição cristã que, muitas às vezes
desconhecidos, mas ancestrais são membros da tribo, conhecidos aqueles dados como de
mesmo sangue, por isso, os filhos e seus netos carregam seus mesmos nomes – tornando
vivos e evocados sempre nos eventos da família.
Jesus não é qualquer ancestral, pois, além de ser verdadeiramente humano, Ele é
Deus - o Outrem38, portanto, transcende e vai além das categorias - ou padrões - do que se
denomina ancestral. Ele é o Proto-Ancestral, aquele que o é por excelência, é adorado e não
venerado como os demais ancestrais, além disso, é o eterno instante - brilhando de forma
incandescente e ardente. A ancestralidade de Cristo é universal, místico e sobrenatural, em
que o próprio Senhor configura a humanidade como seus descendentes39. O ser humano é
filho no Filho, ao passo que Deus é Abba de todos. O próprio Cristo é uma via e não requer
um termo, sendo que, como afirma São Paulo que o mesmo é “o princípio e o primogênito
dentre os mortos, para que tudo tenha a preeminência”40. Ele é fonte de todas as unidades e
forças vitais.
A vantagem desse enfoque cristológico é a colaboração de desenvolver um tipo
de cristologia tipicamente africana ao mesmo passo em que é cristã e, mesmo se essa
38
O assunto de Deus, diz o provérbio makwa, de Moçambique, é como o ovo: “se não seguramos cai no chão,
se seguramos demasiado parte-se”. O assunto de Deus é tão delicado e indizível, por isso, investe-se de
analogia e teologia apofática.
39
Cf. Jn 1:13; Mt 12:48 ff.
40
Cf. Cl 1:18.
30
ancestralidade não tenha significado pelo Ocidente, a mesma representa algo inerente à
África, tornando-a uma contribuição no campo da cristologia.
41
A palavra “witchdoctor” traz conotação negativa para os cristãos do Ocidente, embora em si não o seja.
Witchdoctor não se assemelha ao witchman - feiticeiro - ou mchawi - bruxa -, mas, na linguagem
contemporânea, o termo na realidade define aquele que atua com medicina alternativa (AM).
42
Cf. Mc 1;41, Lc 14;4.
43
Cf. Mc 8; 23-26.
44
Cf. Lc 7;7.
31
conhecedoras dos segredos da natureza e tradições, estas, por sua vez, que nem sempre são
substituídas pelos procedimentos da obstetrícia moderna. Elas oferecem suporte - físico e
psicológico - único, mais há ainda a confidencialidade, cuidado, confiança, incentivo e
esperança de gestantes durante o período de maternidade, bem como em ajudar as mães
durante e depois do parto45.
O desenvolvimento da ciência e da tecnologia a partir do Iluminismo trouxe a
compreensão fragmentada do ser humano como corpo, mente e alma, a tendência em
considerar a enfermidade a partir da desarmonia corporal, bem como o esquecimento de
outras dimensões e a influência da psicologia e da psiquiatria, as quais pretendem explicar a
totalidade - pela mente e seus mecanismos psicológicos etc.
No entanto, a cura, o exorcismo e a pregação formam a unidade dos Ministérios
de Jesus, sendo assim, não podem ser separados, dado que Ele curava as pessoas com ações,
gestos e palavras. A medicina que empregava provém de sua atitude misericordiosa para com
os enfermos, mais além do estabelecido pela Lei, contudo, Jesus atua de forma ainda mais
plena - por sua ação curadora - quando descobre o sentido da enfermidade e da dor em sua
paixão, morte e ressureição - o mistério pascal.
Existem ainda outras feridas que necessitam da cura de Jesus, seja da economia,
da sociedade, da tribo, da nação e da política, sendo importante, considerar, que essa cura,
no contexto africano, nunca é individual, mas comunitária e global. Os dramas e narrativas
de exploração, corrupção, guerras e doenças precisam, inquestionavelmente, de Jesus - o
mganga e libertador. A música46 e dança em muitas tribos africanas tem finalidade de cura e
libertação e não apenas diversão. Canções, arte devem ajudar o ser humano no processo de
integração e relações.
45
http://www.lishe.org/publication/2017/01/KITABU%20CHA%20MKUFUNZI_Low%20res%20(1).pdf.
Acesso no dia 13 de julho de 2016.
46
A musica deve levar nossa atenção a alguma coisa, não apenas rememorar uma espécie de tambor tribal. É
algo que deveria empurrar você para fora de si. Como dizia Buda, depois de conseguir iluminação você deve
voltar a se colocar no lugar de um macaco e praticar a compaixão com todos os seres humanos. Jesus não ficou
sentado a mesa; inclusive era considerado um criador de problemas. Confúcio foi falar com um imperador sobre
como mudar a China; e Maomé regressou a Meca para enfrentar o caos que havia ali naquele momento.
32
47
Foi um erro institucional desconsiderar a religiosidade e teologia do povo local. O missionário que comete
essa falha corre o risco que foi anunciado e denunciado pelo mestre Gamaliel em At 5,39. Paradoxalmente, se
torna theomácos (inimigo de Deus). Cf. FRIZZI, G. Faith and Interculturality: Theology and Cultures in
Interculturality a new paradigm of the Mission. Consolata Missionaries, Roma, 2009, P. 25.
48
http://www.ihu.unisinos.br/noticias/524683-a-nova-evangelizacao-segundo-francisco. Acesso no dia 10
de maio de 2015.
33
49
Superior Geral dos Jesuítas entre 1965-1983.
34
50
Cf. FRIZZI, Giuseppe. Faith and Interculturality: Theology and Cultures in Interculturality a new paradigm
of the Mission. Consolata Missionaries, Roma, 2009, P. 25.
51
È interessante ver na religiosidade popular como se relaciona o espírito santo como pomba (simboliza
alegria). E nas festas do divino Espírito santo é bastante visível, os negros dançam para o divino por meio dos
ternos de Congo e Moçambique que se organizam como um corte imperial (tem rei, rainha, capitão, embaixada,
batalhão).
35
A dinamicidade do Evangelho e uma cultura fazem com que nasça uma nova
Igreja, que traduz uma nova figura histórica do Cristianismo, uma criação inédita do Espírito
de Cristo. Nesse mundo globalizado e cada vez mais plural, o novo nome de Deus é: ad intra
e ad extra. O primeiro significa “Deus é inculturação em si” - representa a vida trinitária -,
ao passo que o segundo é sinônimo de pluralidade, diferença, diversidade, continuidade e
descontinuidade, representando a história da salvação, seja no veterotestamentário ou no
novo testamento, dentro e fora da bíblia e, nos tempos anteriores, durante e em concordância
semina verbi52.
Há duas tendências nessa linha de inculturação: uma tendência especulativa e
não-especulativa - sociocultural.
52
Cf. FRIZZI, G. Faith and Interculturality: Theology and Cultures in Interculturality a new paradigm of the
Mission. Consolata Missionaries, Roma, 2009, P. 24.
53
Lc 19,37,38.
36
tambor africano expressa a busca infinita da verdade, estética e ordem. A Igreja - eclesia ex
gentibus - é essa peregrinação e o sinal em direção à beleza, bondade e verdade eterna. Outras
semelhanças entre o mundo africano e o hebraico é certamente o território da oração e
experiência do êxodo como seus ritos, sentido profundo da terra, sangue e casamento.
Esse enfoque também trabalha com a dimensão Política e a chamada Teologia da
Reconstrução, dada pelo teólogo Ka Mana. Em 1993 publicou “L´Afrique va-t-elle mourir?”,
e em 1994 sobre “Christ d´ Afrique”, em que reflete sobre os desafios políticos, sociais,
morais e espirituais do continente. Para ele, a teologia africana não pode ser uma teologia
apenas de revolta - uma teologia da insurreição - contra o Ocidente, mas sim uma teologia
de reconstrução - de insurreição à teologia da reconstrução. Essa é uma teologia da
integração incluindo temas de identidade e libertação, mas também de reconstrução da África
e o mundo de acordo com os requisitos humanos. O que é a humanidade? Eis a pergunta
filosófica, ética e teológica levantada por Ka Mana.
A teologia da reconstrução provoca um novo pensamento, que remete à relação
entre o Cristianismo e o mundo. Mesmo este último sendo tão complexo e contendo imensa
pluralidade, o Cristianismo deve procurar o método do diálogo ao se aproximar e propor as
realidades pertinentes da humanidade. Jesus é a chave da consciência e ciência da
humanidade, em que Mana assinala:
54
MANA, Ka. Christ ď Afrique. Paris: Karthala, 1994, P. 28.
37
55
Ujamaa é o termo da lingua suaíli (Tanzânia) que significa a familia alargada. O conceito de Ujamaa é
baseado na família, onde os membros são selados juntos como parentes independemente de raca, tribo,
ideologia e genro.. Foi introduzido em 1967 como caminho para promover a economia de comunhao ou auto-
sustentável. Alguns teólogos, como o bispo Mwoleka, o articularam em uma perspectiva teológica integrando
alguns dos seus elementos essenciais na construção de pequenas comunidades cristãs em sua diocese de
Rulenge na Tanzânia. Essencialmente, foi adotado como forma de promover a justiça social, a amizade, o
senso dos relacionamentos, a solidariedade e a amizade.
56
Foi o primero presidente da Tanzânia. Devido à sua fé, simplicidade e os valores em que acreditava como
um político, é venerado. A Igreja católica ainda estuda o caso para sua canonização.
57
Kaunda’s humanismo em Zâmbia comenta que o que importa na história humana é o bem comum em todos
âmbitos. Humanismo acredita na presença de Deus misericordioso, fonte da vida.
38
como processos pedagógicos, mas atuam de forma profunda à tradução de sua experiência e
leitura verdadeira do mundo.
58
Na África, a celebração não é completa se não há cântico ou danças, por isso, mesmo que litúrgica, é
acompanhada de expressões corporais, gestos e sinais. Isso vém de uma crença popular que diz: “anything
that is good must necessarily overflow. As one African proverb says, a good pot of okra sauce cannot be
confined to the cooking pot with a lid. It must bubble up and overflow -Significa que o que é visível nos olhos
manifesta o que está escondido no fundo spiritual de um povo (Tradução livre)
39
BOGAZ; HANSEN, 2017). Não se pode negar os exageros ou desvios, muitas vezes
provocados pelo mesmo desejo de ter uma liturgia autenticamente inculturada. A sagrada
liturgia não é, porém, a única atividade da Igreja, pois, antes de ter acesso à liturgia é preciso
ser conduzido à fé e se converter59.
59
VATICANO II, Mensagem, Documentos e Decretos. São Paulo, Paulinas, 1998, P.145.
60
MANZATTO, Antônio. O Papa Francisco e a Teologia da Libertação. Revista Cultura, n. 86, ano XXIII,
Jul/Dez 2015, P. 3.
61
Apatheid Policy foi uma política de segregação racial adotada de 1948 a 1994 na África do Sul, a qual
dividia os habitantes em grupos raciais, separando as áreas residenciais - muitas vezes através de remoções
forçadas.
40
62
Na cultura africana fala-se de Nneka - Nigéria - ou Nani kama mama! -Tanzânia, que significa que o valor
da mãe é incomparável. Também se afirma que o homem pertence ao pai quando em tempos de calmaria, mas
quando a vida se torna amarga pertence à mãe. É nesse ambiente cultural em que nasce a devoção à Nossa
Senhora do Socorro - Nossa Senhora da África.
63
O Cântico de Salomão 1:5 expõe: “Eu sou negro/a e belo/a” E se as religiões na África, qualquer que seja,
falharem em abraçar a experiência estética/beleza da negritude, então nada se terá a passar à alma africana.
41
balde de água sobre sua cabeça, um segundo modo é com um bebê enrolado às costas e, por
fim, um outro em seu ventre (OROBATOR, 2008, apud INSTITUTO HUMANITAS
UNISINOS, 2016). É uma imagem da Igreja-mãe peregrina, carregando as alegrias e dramas
humanos.
64
TYLOR, E. B. Alle origini dela cultura, Ateneo, Roma 1985, in Interculturality a new paradigm of the
Mission. Roma, Consolata Missionaries, 2009, P. 261.
65
Em nível popular, existe uma analogia que diz que “tudo é floresta ou floresta é tudo”, isto é observar que
a floresta - terra - não se dá apenas na dimensão econômica ou utilitária, mas como um santuário de rezas,
peregrinação, ritos, cemitério, medicina, comida, entre outros. De forma paralela à Bíblia, afirma-se que “nós
somos terra” - húmus - em Gn 2,7.
42
66
Is africa really “rising” por Ali Mufuruki em TEDxEuston (2014) <disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=OjgJ2KpyJ5w, Acesso no dia 12 de julho de 2017.
67
É interessante notar que, nessa cultura, “ser pobre” vai além da materialidade, mas, sim, perder a rede das
relações. Um pobre” é designado como sendo “chisiwana”, expressão que quer dizer órfão.
68
HAIDER, L. Jamila; Solving Poverty means thinking beyond Money in World Economic Forum. In:
http://theconversation.com/why-thinking-beyond-money-is-vital-for-solving-the-poverty-puzzle-
77600.Acesso no dia 27 de julho 2017.
44
preenche tamanha sede existencial. Para criar a África, o povo precisa de um novo paradigma
cultural e, sua história, após se encontrar com outras culturas ocidentais estagnou-se, não
acompanhando o desenvolvimento tecnológico e ciência estrangeira, ficando, então, par trás
os avanços de história e cultura local.
O maior desafio do africano é a rejeição que o mesmo tem por si, sendo a leitura
de sua história advinda de olhos alheios. Deixa-se, assim, o que é de suas raízes e ao mesmo
tempo apropriar-se do que vem do estrangeiro - sem raízes culturais. É o que Fanon (1925-
1961) condena, quando diz que a mentalidade de imitar e procurar soluções de fora para
problemas africanos é o pior que pode ser feito. A África ficou quase estéril nesse mundo
globalizado, por falta de preparação de competir, portanto não ter fortes Instituições.
Há uma tendência geral do povo em aceitar as coisas como estão, isto é, tabus
que foram recebidos sem crítica nem atualização. Uma crítica cultural, logo, é percebida
como ameaça. Como afirma Gyekye (1997, p. 62) - de Gana -, quando diz que “os problemas
africanos são culturais no sentido que são relacionados com algumas práticas, hábitos,
atitudes e visões herdadas na cultura”.
Portanto, os valores e instituições herdados, tanto nas tradições como na
experiência colonial deve ser inculturado, isto é, reinterpretar e reavaliar segundo às
necessidades e contexto africano atuais. A busca pelo renascimento africano precisa de uma
criatividade intelectual e transformação cultural dos africanos, em primeiro lugar.
69
CHACHAGE, Change. Engenering sustainable development through Struggles for Cultural Liberty. Paper
prepared for the International Conference on African Culture and Development (ICACD) to be held in Kumasi,
Ghana (21-26 April, 2008). The author is an independent researcher and policy analyst, based in Dar-es-
Salaam, Tanzania.
45
“Não há nada mais político do que dizer que a religião nada tem a ver com a
política” (TUTU, 1931).
desenvolvimento não devem ser encaradas pela ótica da maximização do lucro, mas sim pelo
bem-estar de todos. Não é possível que apenas 20% da população atual detenha 80% da
riqueza do planeta70. A humanidade vive, neste momento, uma transformação histórica, que
podemos constatar pelo progresso verificado em vários campos. Todavia, não se pode
esquecer que a maior parte dos homens e mulheres atuais vivem sua rotina de forma precária,
com funestas consequências.
É preciso lutar para viver, e muitas vezes isso ocorre com pouca dignidade. Assim
como há o mandamento “não matar” impõe um limite claro para assegurar o valor da vida
humana, hoje devemos dizer “não à economia da exclusão e da desigualdade social”, pois ela
é uma forma de matar. Não é possível que a morte por enregelamento de um idoso sem abrigo
não seja notícia, enquanto ainda se faça muito dela pela queda de dois pontos na Bolsa de
valores. Isto é exclusão, segundo Papa Francisco (2013).
Portanto, tanto na economia como na política (polis) os cristãos devem participar,
pois é obrigação dos mesmos e assim não podem se fazer de Pilatos e lavar as mãos. Os
cristãos devem se envolver na política, dado que esta é uma das formas mais elevadas da
caridade, em que procura o bem comum. O toque cristão especifica a qualidade do bem
comum ao privilegiar as camadas pobres e marginalizadas. A fé cristã passa algo aos cristãos
que participam do mundo político e econômico. Existe, hoje, um consenso global e fatos que
revelam a péssima situação entre ambos, ou seja, uma insatisfação total dessa ligação.
Mas em que consiste preparar melhor o cristão para a prática político-partidária?
Existem duas possibilidades:
70
https://brasil.elpais.com/brasil/2017/01/13/economia/1484311487_191821.html. Acesso no dia 16 de janeiro
de 2017.
47
71
https://pt.aleteia.org/2015/10/02/catolicos-nao-se-envolvem-em-politica-e-mesmo-entao-diga-isto-ao-papa-
francisco/.Acesso no dia 24 de maio de 2016.
48
Conclui-se que, Jesus - o Cristo72 -, tanto histórico como da fé, tem relevância na
África, porém, a prioridade não está na historicidade dos evangelhos, mas na fé experimental
do povo, que inclui a apresentação Dele nos cantos, contos e símbolos que a comunidade
possa identificar e sentir-se parte. Nesse sentido, o Cristianismo e a pessoa de Jesus se tornam
relevantes a esse povo (HEALEY; SYBERTZ, 2000, p. 92).
72
The Life of Jesus Mafa series de Camaronês é o melhor exemplo da arte Africana, que mostra Jesus tipico
africano. Essas pinturas utilizam o método participativo, arte e estilo e, algumas delas foram usada num
pequeno livro para inaugurar a Celebração Eucarística do Sínodo Africano na Basílica de São Pedro em
Roma, em 10 de abril de 1994.
49
4. CAPÍTULO III
O FUTURO DO CRISTIANISMO E DA IGREJA CATÓLICA NA ÁFRICA
O sínodo Africano dos Bispos e teólogos que ocorreu em Roma em 1994 definiu
a Igreja da África como Família, devido à importância da família para o africano, dado que
a mesma é um valor importante e de dimensão religiosa, sociocultural, política e econômica.
Mbiti (1970) afirma que, na tradição africana, ser humano é pertence a toda comunidade e,
para fazê-lo, significa participar dos ritos, cerimônias e os todos acontecimentos
comunitários.
Portanto, a missão para os teólogos africanos é desenvolver uma eclesiologia
focalizada no conceito da Igreja como família. Esse processo significa explorar o significado,
implicação e consequência da Igreja como família. O espírito da comunidade em países
africanos, principalmente bantus, se chama Ujamaa, em que este termo implica
familiaridade, comunhão, partilha e corresponsabilidade das pessoas. Nesse sentido, quando
se fala da Igreja, fala-se da pessoa humana e seu compromisso no mundo começando na
família.
Pelo Concílio Vaticano II - um Concílio pastoral-eclesiológico - a abordagem da
Igreja no mundo atualmente é que o essencial do Mistério da Igreja é que seja uma comunhão
como o Pai por Jesus Cristo, no Espírito Santo, e que viva em comunhão fraterna. O Concílio
nos apresenta a Igreja como Povo de Deus (etne e laios) e, foi sobretudo com a Constituição
pastoral Gaudium et spes que o Concílio operou a passagem de uma Igreja, anteriormente
mais voltada sobre si, para aquela que se volta ao mundo como lugar próprio da sua missão.
50
A Igreja passa, então, do confronto ao diálogo crítico com o mundo. Uma igreja de portas
abertas
A Igreja, como família, simboliza sua identidade e consequentemente sua missão
global, em outras palavras, a credibilidade e relevância da Igreja africana está na sua atenção,
sensibilidade e responsabilidade às necessidades dos africanos e sua contribuição concreta
na transformação e renovação da sociedade africana. A eclesiologia africana, como
articulação teológica, ainda não é muito desenvolvida. Muitos missionários e teólogos
assinalam que há uma falta de aprofundamento na teologia, dimensão profética e consistência
com Evangelho como falta o protagonismo dos leigos Como um provérbio africano recorda:
“não pode jogar fora a água da bacia porque vai chover”, portanto, há necessidade de se
atentar ao que os teólogos abordam sobre a eclesiologia africana.
O historiador Adrian Hastings73 (1929-2001) comenta que a Igreja da África
recebeu como herança missionária uma Igreja mais jurídica e ocidental que sinal da
comunhão ou povo de Deus, embora, os esforços feitos pelos missionários na evangelização
do continente não podem ser desconsiderados. A igreja na África é a maior Instituição da
caridade, programas educacionais e cuidado de saúde. Uma Igreja ainda muito clerical. Essa
eclesiologia missionária fez com que a Igreja ficasse muito silenciosa, obediente e infantil.
Como New People Media Center (1997) afirma: “The african church is praised for its great
obedience and conformity but never for its courageous innovation and creativity, its identity
or its relevance”.
Essa uniformidade no caráter da Igreja Africana se encontra nos campos
litúrgicos, na pastoral, no exercício da autoridade e nos ministérios. Por falta de autonomia,
a Igreja a torna dependente em todos os níveis, tudo por conta de seu contexto histórico.
Desde seu início, a Igreja da África foi muito marginal e inaudível, até mesmo nos concílios.
Mesmo com essa avaliação crítica, a Igreja católica na África continua sendo uma voz ativa
nos setores da educação, saúde, assistência social, do diálogo, da paz e justiça, bem como nas
questões morais.
73
ADRIAN Hastings (1929-2001) foi teólogo, historiador e missionário britânico que trabalhou muitos anos
na África.
51
a humanidade ao desafio radical da alteridade. O mesmo Deus que Jesus anuncia é também
um Deus de todos:
Ele é o ‘Pai do céu’. Não está ligado ao templo de Jerusalém nem a qualquer outro
lugar sagrado. É o Pai de todos, sem discriminação nem exclusão alguma. Não
pertence a um povo privilegiado. Não é propriedade de uma religião. Todos podem
invocá-lo como Pai (PAGOLA, 2010, p. 20).
4.1.1 Ecumenismo
74
BERNARDINO. A. S. Concílio da Primavera na Igreja, São Paulo. Paulus, 2012, P. 9.
55
4.1.2 Inter-religiosos
75
BAUR, John. 2000 years of Christianity in Africa, Paulines, Nairobi, 2001. P. 506.
57
CONCLUSÃO
Uma das preocupações do presente estudo foi afirmar sobre a natividade de Deus
na África: Ele não é estrangeiro para os africanos, porém, o desafio maior aos mesmos é o
Cristo, dos cristãos. A crise da fé é tipicamente cristológica, e por isso muitos questionam-se
quem é Jesus, pois, como dizia meu avô a respeito: “a única novidade que os missionários
nos trouxeram é Jesus Cristo, não Deus”.
A necessidade de trazer resposta à essa pergunta levou ao desenvolvimento dos
modelos cristológicos que procuram mostrar um Jesus em visões autenticamente africanas.
Em geral, modelos são relevantes para explicar a adesão rápida e crescimento do
Cristianismo no continente. Conclui-se que as questões cristológicas são mais desafios
pastorais, no sentido de fazer o africano cristão sentir-se bem com sua adesão à fé na pessoa
e missão de Jesus Cristo.
Enquanto todos os modelos mostram implicitamente a dimensão pastoral dessa
cristologia, nenhum deles traz um projeto pastoral concreto como resposta para essa adesão,
ou seja, embora desenvolva-se os títulos e modelos de Cristo, o processo concreto de como
aplicá-los na vida dos africanos é outra questão não tão bem resolvida. O modelo cristologico
determina também que tipo da Igreja devemos ser.
Dessa forma, algumas conclusões sugestivas a respeito desses modelos
cristológicos é a missão dos teólogos em fazer uma integração entre a cristologia e a teologia
pastoral. A integração pode vir a ajudar os africanos a sair da alienação que há entre estes e
Cristo, bem como contribuir na descoberta de que Jesus não é conhecido formalmente, mas
está implícito na vida cotidiana do povo. Esse compromisso requer uma catequese de
cristologia, usando métodos e língua mais acessível à população, em que a história de Jesus
deve ser narrada, contada como uma linguagem simples, poética isto é, de Cristo como Proto-
Ancestor, hóspede, chefe, médico dos médicos e outros modelos.
De outra forma, a cristologia pode resgatar as práxis de Jesus de Nazaré, isto é,
uma que dialoga e questiona as estruturas, sistemas, costumes e leis opressoras. Deve ser
funcional e comprometida, não devocional ou apenas com intuito de batizar. Uma cristologia
58
particularmente africana assim será apenas quando esta transforma a vida e traduz a
experiência religiosa libertadora a uma teologia e pastoral cultural que salva homem de forma
afetiva e efetiva.
O futuro do Cristianismo, neste continente, não depende da quantia de Igrejas
construídas, nem de escolas assistidas pelos missionários, contudo, depende de como os
africanos sentem-se com o Cristianismo, em outras palavras, qualquer assistencialismo, seja
espiritual ou econômico, agrava a queda e alimenta infantilismo já existente. Precisamos mais
as reivindicações dos leigos em geral por novos instrumentos de participação, até mesmo no
âmbito da moral, que propiciem maior vivencia da sinodalidade e a construção da democracia
na instituição. Também precisamos um novo pensamento sobre a sexualidade sem
espiritualiza-la e que a considere como parte de uma compreensão global da pessoa humana.
A África precisa caminhar e cantar a beleza da diversidade de sua própria
história, ao passo que os africanos necessitam fazer sua própria experiência fenomenal e
teologal, que continua se revelando na vida e na história. Se o Cristianismo está polarizado e
deteriorando-se no Ocidente, deve-se a ausência da vivência em seus contextos, radicalidade
e dinamicidade, enquanto que o Cristianismo na África pode testemunhar e recuperar essa
vivacidade e universalidade da fé cristã presente.
Importante ressaltar, no entanto, que não somente o Cristianismo é relevante ao
continente africano, mas o próprio Cristo. A cristologia está no centro da teologia da
Inculturação e Libertação Integral. É imperativo e divino ter um tipo de Cristianismo africano
diferente, embora universal. Eis é a riqueza e sentido de ser a Igreja Católica e Apostólica e,
para isso, pode-se concluir que o futuro do Cristianismo africano depende de sua ousadia de
dialogar com todos, do acolhimento da dinamicidade cultural do povo e, por fim, do
testemunho de Jesus Morto e Ressuscitado com alegria e simplicidade - aquilo em que se crê
e o que a humanidade é.
59
REFERÊNCIAS
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ao Papa Francisco. [S.l.], 02 out. 2015. Disponível em:
<https://pt.aleteia.org/2015/10/02/catolicos-nao-se-envolvem-em-politica-e-mesmo-entao-
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ALLEN JÚNIOR, J. L. Africa: Christianity's greatest growth, and greatest threat. Colorado (EUA),
30 dez. 2015. Disponível em: <https://cruxnow.com/faith/2015/12/30/africa-christianitys-greatest-
growth-and-greatest-threat/>. Acesso em: 02 ago. 2017.
BENEZET, BUJO. African Theology: which direction to take and what methodology to use.
COSTA, J. A. LIMA. Conhecer Jesus: a cristologia ao alcance de todos. São Paulo, 2014.
60
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<opcentral.org>. Acesso em: 02 ago. 2017.
HAIDER, L. J.; LADE, S. J. Why thinking beyond money is vital for solving the
poverty puzzle. Massachusetts (EUA), 23 maio 2017. Disponível em:
<http://theconversation.com/why-thinking-beyond-money-is-vital-for-solving-the-poverty-
puzzle-77600>. Acesso em: 27 jun. 2017.
______ . Orobator, padre jesuíta africano, pede pela inclusão da mulher nas estruturas da
Igreja. São Leopoldo, 20 dez. 2016. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/563538-
orobator-padre-jesuita-africano-pede-pela-inclusao-da-mulher-nas-estruturas-da-Igreja>.
Acesso em: 02 ago. 2017.
MUFURUKI, ALI Is africa really “rising”. In.: TEDxEuston. Disponível em: <>. Acesso
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NEW PEOPLE MEDIA CENTER. An Analysis of the Church in Africa, in Africa Faith and
Justice Network: The African Synod. Ano de publicação.
______ . Relevance of Fides et Ratio for African Theology in Hekima. Review 25. Nairobi:
Kolbe Press, may 2001.
PAPA FRANCISCO. Exortação Evangelii Gaudium. Coleção Voz do Papa, nº 53. São
Paulo: Paulinas, 2013.
TYLOR, E. B. Alle origini dela cultura: In Interculturality a new paradigm of the Mission.
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