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Londrina
2022
Marcelo Ruas de Sousa
Londrina
2022
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1.1. Introdução
1.3. Objetivo
Qual é a mensagem do evangelho que foi proclamada por Cristo e que deveria
ser anunciada até os dias de hoje por sua Igreja? A palavra grega ευαγγελιον utilizada
nos textos bíblicos para se referir ao que deve ser anunciado pela igreja, significa
“Boas Novas”, uma mensagem que em sua essência traz esperança, paz e alegria. A
análise hermenêutica das ocorrências deste termo nos evangelhos de Mateus, Marcos
e Lucas demonstra que eram Boas Novas vindas da parte de Deus e a respeito de
Seu reino (βασιλεια) significando seu governo e domínio, não uma localização
geográfica. É, portanto, uma mensagem de libertação de dentro para fora, a qual
estava sendo anunciada por Jesus, a chegada de uma nova realidade. Como observa
Newbigin (1989, p. 133), em Jesus o reino de Deus foi revelado e confrontou a
humanidade a reconhecer a verdade que se apresentava e crer, ou então continuar a
perseguir o caminho pelo qual andavam e que não traz o reino de Deus. Para o autor,
a mensagem do evangelho é “[...] um chamado ao arrependimento, a uma conversão,
a se obter um novo e radical mind-set, encarar o caminho contrário como uma
condição para ser capaz de reconhecer a nova realidade – a presença aqui e agora
do reino de Deus” (Newbigin, 1989, p. 6).
Há, entretanto, um desenrolar desta mensagem da revelação do reino de Deus
em Jesus para sua centralidade como garantidor desta realidade, a partir do evento
ressurreição e ascensão de Jesus aos céus. Nas cartas paulinas vemos claramente
esta evolução do evangelho que agora inclui não apenas os ensinamentos de Jesus,
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incluindo elementos dentro da própria igreja. Desta forma, a igreja e as culturas estão
inter-relacionadas, uma dentro da outra, pois é através das culturas que ela se moveu
e cresceu ao longo dos séculos. A mensagem do evangelho é, no entanto, maior que
ambas e as inclui ao mesmo tempo como agentes da revelação do novo que chegou.
No cerne desta relação complexa está a necessidade de compreensão da
linguagem cultural e da interpretação correta dos princípios das escrituras para um
anúncio do evangelho significativo e que traga respostas às pessoas. Para Bosch
(2002), a cultura não é um obstáculo para a missão da igreja, mas sim um aspecto
fundamental da realidade humana que deve ser valorizado e respeitado. A tentativa
de se afirmar que uma cultura de determinado povo ou denominação é mais
“evangélica” do que outras é pura arrogância de quem pensa estar além das culturas,
praticamente separado em outra realidade. Embora a mensagem do evangelho traga
uma nova realidade, ela opera neste contexto e, portanto, é anunciada por meio de
elementos naturais a fim de promover a comunicação dos princípios e verdades que
serão os motores de transformação do mundo, incluindo os elementos culturais
distorcidos que não conversam com a realidade do reino de Deus.
Importante ressaltar o que nos lembra Newbigin (2003, p.100) ao afirmar que a
implantação do reino de Deus não aconteceu por meio de movimentos políticos que
substituíram governantes por outros que operassem a justiça de Deus, mas por uma
derrota humilhante que se transformou num glorioso triunfo pela ressurreição,
desmascarando toda a pretensão humana, principados e potestades que achavam
saber algo. A igreja tem o papel de desmascarar estas pretensões que levam o mundo
à ruína, sem, no entanto, tornar-se ela mesmo hipócrita como se tudo soubesse.
seu amor, para se admitir que a visão de mundo que eu tenho, inclusive teológica,
pode estar equivocada; complexa, porque não há uma resposta única e simples para
que esta tarefa seja concretizada considerando os contextos de convivência
multicultural que se apresentam hoje em nossa sociedade contemporânea.
Rossi (2008, p.77) expõe a pasteurização da mensagem de salvação ao
concluir que uma teologia incapaz de ir além de seus limites dogmáticos é refém de
um medo auto imposto e incapaz de caminhar em direção àquele que sofre e precisa
de Deus, negando a estender o braço da compaixão ao necessitado. Em sua análise
da teologia da retribuição, com sua visão binária de mérito, benção e maldição, ele
demonstra como a exposição moderna do evangelho mais parece um processo de
consumo, que vende uma visão descontextualizada, rasa e completamente centrada
na autossatisfação ao invés de estar centrada no Cristo. Isso ocorre por causa da
insistência em adaptar a mensagem do evangelho à cultura próspera vigente,
negando assim a contextualização tão necessária a cada diferente grupo humano,
dentro de sua cultura, a fim de apresentar os princípios de salvação em Jesus que
são eternos e imunes aos ventos da mudança cultural ou aos caldos culturais
proporcionados pela globalização.
É certo a necessidade de uma mudança de mentalidade nas lideranças cristãs
para a priorização do trabalho evangelístico e missionário no sentido em que foi
orientado por Jesus em Mateus 28:16-18: a autoridade emana dEle, a mensagem é a
que foi por Ele entregue e todas as etnias devem conhecê-Lo por quem Ele é, não por
quem nós somos. Conforme afirma Bosch (2002, p.542), “nesse paradigma, não se
trata tanto de a igreja ser expandida, mas de ela nascer de novo em cada novo
contexto e cultura”. O autor afirma que o evangelho sempre estará revestido
culturalmente em sua apresentação às pessoas, portanto, não estará isolado desta,
mas contextualizado a fim de que seja compreendido.
Conclui-se que uma maturação de nossas igrejas para abandonarem suas
boas intenções e orgulhosas pretensões de estarem corretas em suas estratégias e
crenças é necessária para que haja um genuíno bálsamo derramado entre as nações
por meio do anúncio da mensagem pura do evangelho, sem vieses ou preconceitos
culturais que impeçam a contextualização sadia e necessária da mensagem de
salvação aos que ainda não a conhecem. Conforme relembra Winter (2009, p.453),
“trabalhos missionários bem-intencionados às vezes fracassam na comunicação do
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evangelho porque a fonte adotou um papel que impede a identificação eficaz com os
que precisam ser alcançados”.
NEWBIGIN, Leslie. The Gospel in a pluralist society. Grand Rapids, Mich.: W.B.
Eerdmans; Geneva [SZ]: WCC Publications, 1989.
TILLICH, Paul. The New Being. New York Charles Scribner’s sons, 1955
STOTT, John. A Missão Cristã no Mundo Moderno. Viçosa, MG: Editora Ultimato,
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NEWBIGIN, Leslie. Foolishness to the Greeks: The Gospel and Western Culture.
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TILLICH, Paul. Theology of Culture. New York, Oxford University Press, 1959
ROSSI, Luiz Alexandre Solano. Jesus vai ao McDonald’s. São Paulo: Fonte Editorial,
2008
WINTER, Ralph (org). Perspectivas no Movimento Cristão Mundial. São Paulo: Vida
Nova, 2009.