DE QUEM É ESSE PAPEL?
André Acioli
Por motivação, força das circunstâncias,
oportunidade... sei lá, desde 2001 estou
envolvido em atividades docentes. Durante
os seis primeiros anos, em cursos de pós-
graduação de algumas instituições de
ensino do Rio de Janeiro. Trabalhava
durante o dia em empresas e, à noite,
trocava experiências em sala. Muitos dos
alunos que ali estavam disponibilizaram-
me conhecimentos de que não prescindo
até hoje.
Apesar de ainda em início de carreira
profissional, já haviam experimentado
situações onde seus conhecimentos “além-
livros” foram decisivos. Discutíamos sobre
a importância da vivência no mercado de
quem se propõe a ocupar a parte da frente
de uma sala de aula – mormente em cursos
de pós-graduação. Tal ponto de vista tinha
forte eco também junto a meus pares,
professores.
Com o tempo, oportunidades de
consultoria foram aparecendo e por
necessidade, abri uma empresa de
consultoria e treinamento.
Grandes projetos de consultoria têm, por
vezes, partes terceirizadas. Empresas de
consultoria menores são contratadas para
somar esforços à contratada. Como
sempre, as oportunidades surgem através
dos relacionamentos que construímos ao
longo da vida.
Numa dessas, em março de 2009, deparei
com uma situação inusitada: a duas
empresas terceirizadas, caberia o lançava perguntas que me permitissem
reposicionamento do produto carro-chefe
do portfólio da contratante: uma era a
minha, a outra, a de um professor –
daqueles que faziam eco nos idos de
2003/2004, lembra?
Fiquei bastante feliz quando, na reunião do
projeto, soube que nossas empresas
comporiam uma equipe de trabalho. Meu
conhecido era (era não, é!) um excelente
professor; decerto teria tanta bagagem
prática quanto teórica.
Nossa primeira atividade consistiria em,
juntos, entrevistar pessoas chave na
organização a fim de elaborar um
diagnóstico que nos permitisse, dentre
outras coisas, desenvolver a proposta e
fazer o orçamento da nossa prestação de
serviços.
Alguns dias depois, iniciamos o trabalho de
coleta de informações, em campo.
Pois é, achei .... e quem acha, procura! O
professor, logo no contato com o primeiro
entrevistado, mostrou o quanto havia
apurado de informações sobre a empresa
contratante. Quando foi fundada, como
começou, onde está presente, quantos
funcionários tem, quanto faturou no ano
anterior etc. etc. etc. – informações, sem
dúvida, importantes. Fez menção a tantas
coisas sobre tantos assuntos, coisas como
benchmarking, long tail, skimming ... como
quem quisesse fazer transparecer todo o
seu conhecimento. Não deixava o coitado
do gerente de produto falar.... sinais da sua
pouca experiência em consultoria.
Nas pausas do meu colega para respirar,
começar o mapeamento do problema,
anotava as respostas e registrava as
minhas impressões. Seria leviano de minha
parte não dizer que boas perguntas
também foram feitas por ele; com todas,
fiz o mesmo: anotei as respostas e registrei
impressões. As respostas e impressões são
de grande valia para a pesquisa de
identificação do real problema e para a
posterior proposição de alternativas de
solução. De caderno e caneta na mão, ele
sequer anotava.... outro sinal.
A Via Crucis se repetiu nas duas outras
entrevistas que fizemos: uma com o diretor
de marketing e vendas e, outra, com o
gerente de comunicação.
Agendamos para dois dias depois a reunião
sobre os dados coletados e a estratégia de
atuação que adotaríamos.
Na tal reunião, vi que estava sozinho! Não
poderia prescindir do trabalho – tanto pela
grana quanto pela indicação. Meu amigo
não tinha conhecimentos práticos sobre o
que se propôs a fazer, apesar de ter a
teoria de cor. Proposta, projeto, execução
e acompanhamento.
Cumprimos o cronograma. Minha equipe e
eu passamos uns bons dobrados, mas o
resultado final ficou muito bom.
Não sou dono de uma grande consultoria.
Decerto, outros poderão relatar várias
experiências como esta que, no meu caso,
foi única.
Com tudo isso, vi que também alardeava
teorias sobre as quais não tinha
conhecimento prático. A da “ importância
da vivência no mercado de quem se
propõe a ocupar a parte da frente de uma
sala de aula”, por exemplo, somente agora
foi comprovada.
Há excelentes professores que são,
também, excelentes consultores. Suas
aulas são recheadas com suas experiências
e relatos sobre experiências dos outros.
Isso enriquece os encontros e os faz mais
efetivos. Nem de longe quero macular a
imagem dos docentes; nem a dos
consultores. Quero sim, sugerir uma maior
integração entre a academia e o mercado,
quiçá, um mesmo ator em dois papéis (o
ideal).
Academia e mercado não vivem um sem o
outro e, pelo que tenho percebido, há
muito não dividem o mesmo palco.