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Para todos que desejam viver

um romance de sessão da tarde.


Nota da autora
Antes de tudo, quero dizer que o objetivo desse livro é divertir e entreter, o livro
para você lê como se fosse um filme de sessão da tarde.
Todos os personagens desse livro são inspirados em pessoas e amigos a minha
volta que convivo, mas principalmente em mim mesma. Assim como os seus
dilemas internos, sentimentos, medos, inseguranças e todas as outras coisas que
demonstram nesse livro. Esses personagens estão vivos em mim e em pessoas a
minha volta.
Apesar de a intenção não ser demonstrar a realidade severa das coisas, ela está
presente minimamente, porque eu, como autora desse livro, acredito que precisa
existir, fazer pensar que, ainda que seja pouco provável, há sim chance de isso
acontecer em algum lugar na realidade. Além de querer que as poucas pessoas
que o leem sintam que cada personagem é real.
A maioria dos acontecimentos desse livro são reais ou inspirados em
acontecimentos que vivenciei ou outras pessoas por perto (o primeiro capítulo dos
meus livros vão ser quase sempre acontecimentos reais, e a outra maioria deles).
Dito isso, preciso avisar que poderão ter possíveis gatilhos, como: assédio,
linguagem explícita e agressiva (palavrões), bebida alcoólica, indícios de +18, etc.
Tentei minimizar o máximo que pude, porque, mais uma vez, não é o objetivo
desse livro e também por fugir dos meus princípios, mas que precisavam estar ali
para tornar o livro mais real já que estamos falando de jovens universitários que
aproveitam a vida de acordo com o que foram ensinados. Não há cenas de sexo
explícito como há em outros tipos de livros no mesmo tema pois não é o meu tipo
de escrita.
Peço perdão mesmo assim pelas demais coisas e por qualquer erro de gramática
ou edição que aparecer. Se sentir desconfortável, aconselho a procurar outra
leitura pelo seu bem estar.
Aproveitem e espero que se apaixonem por cada um deles como eu me apaixonei.
Tenham paciência com os seus dilemas, por mais que possam parecer bobos,
para eles não são. Se divirtam lendo e me enviem suas opiniões e reações.

Boa leitura!

Ps: Nada nesse arquivo vai ser alterado após o envio, essa é a história final. Então,
vivam o universo dos Mavericks como se fossem a primeira vez (para quem
conseguir).
Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15
Capítulo 16

Capítulo 17

Capítulo 18

Capítulo 19

Capítulo 20

Capítulo 21

Capítulo 22

Capítulo 23

Capítulo 24

Capítulo 25

Capítulo 26

Capítulo 27

Capítulo 28

Capítulo 29

Capítulo 30

Capítulo 31
Capítulo 32

Capítulo 33

Capítulo 34

Capítulo 35

Capítulo 36

Capítulo 37

Capítulo 38

Capítulo 39

Capítulo 40

Capítulo 41

Capítulo 42

Capítulo 43

Capítulo 44

Capítulo 45

Capítulo 46

Epílogo
Agradecimentos

Capítulo 1

MAYA

Existe um debate de “frio ou calor”, qual dos dois é o pior.

Uns dizem que é frio, outros, o calor. Mas eu tenho a resposta, chuva. Essa é a
resposta correta. Não há nada pior do que ficar molhado com as roupas grudadas
na pele do seu corpo sem nenhum meio de escapatória. No frio você pode andar
com roupas cobrindo seu corpo até poder apenas respirar, enquanto no calor,
máquinas chamadas ventiladores foram criadas exatamente para serem usadas
nessa época do ano. Porém, não temos nada para o quesito chuva.

Guarda chuvas não prestam para praticamente nada, antes eu pudesse contrapor
o meu raciocínio. Você provavelmente vai ficar 10% molhado de qualquer jeito.

E aqui estou eu, no ponto de ônibus, indo para a faculdade com meio mundo
caindo em forma de água. Isso deveria ser um crime! Acho que nós alunos
deveríamos buscar por nossos direitos. Aulas em dias assim deveriam ser
abolidas do sistema de educação. É pura tortura! Quem foi o idiota que disse que
não somos feitos de açúcar? Eu sou feita, sim. Eu odeio ficar com o meu pé
molhado. Sinto um pequeno riacho se formar dentro do meu sapato
completamente encharcado.

Moro em um pequeno e aconchegante apartamento que divido com uma amiga


que conheci no ensino médio, ele não fica tão longe da universidade, mas não dá
para ficar indo sempre de a pé. Eu tenho medo de andar de Uber e taxi sozinha e
não tenho carro, e não tenho carteira de motorista, então, a minha única opção é o
famoso ônibus.
Nessa altura do campeonato, estou me xingando mentalmente por ter adiado a
minha carteira de motorista em todas as vezes que tive a chance.
Ao avistar, faço sinal e entro percebendo que está lotado de pessoas. Quando eu
digo lotado, quero dizer que mal dá para se mover. Procuro um lugar onde possa
ficar sem que eu caia no trajeto e me posiciono segurando firme em uma das
barras do ônibus, colocando a bolsa entre minhas pernas.
O calor dos corpos a minha volta aquece a temperatura do ambiente, a lateral da
minha testa começa a molhar pelo suor. O vento gelado, com a chuva que cai do
lado de fora, corre para dentro através das janelas abertas equilibrando a
sensação térmica.

Concentro minha mente no balançar do ônibus observando a paisagem correr


pela janela. Em um minuto sinto uma pressão quente bem atrás da minha bunda,
os segundos passam e tento me virar para saber o que é, imaginando ser algum
objeto, mas tem tanta gente que é quase impossível. Está incomodando, pra
caramba!
Que merda é essa atrás de mim? Caramba, as pessoas não sabem ter senso? Está
chovendo, o ônibus lotado, e agora isso? Só pode ser brincadeira!
Deve ser nada, certo? Quero dizer…está impossível mexer nessa lata de metal.
Mas o que poderia ser? É quente.

Tento afastar a pressão quente só que é inútil. Ela começa a se mover


discretamente, deixando a sensação cada vez pior. Que…caceta! Isso incomoda!
Antes que eu possa continuar minhas tentativas em vão e minha mente associar o
que possa ser com clareza, uma mão grande rodeia a minha cintura e sou puxada
por alguém de alguma jeito pelo mínimo espaço entre as pessoas. O que diabos
está acontecendo hoje?

Um desespero se aloja dentro do meu peito. Engulo em seco o que faz a minha
garganta doer. Cenários e suposições passam pela minha cabeça a cada fração
de segundo. Sinto o tum tum tum do meu coração batendo cada vez mais rápido
dentro de mim. Começo a pedir mentalmente para que nada aconteça. Está tudo
bem. Uma voz grita dizendo que não está.

Estou prestes a perder o ar quando vejo quem é. Liam Brown. O cara mais lindo
da Mavericks, o jogador e capitão do time de hóquei e blá-blá-blá.
Vamos ser sinceras, o cara é lindo mesmo, não posso ser hipócrita. Mas ele é um
verdadeiro idiota, uma criança consegue vê. Ele tem uma fila de meninas à sua
espera e sabe aproveitar, um verdadeiro galinha, e eu, definitivamente, não estou
nessa fila.

Solto a respiração que estava presa em meus pulmões.

—Por que está me puxando? —Eu digo séria sem entender o motivo disso estar
acontecendo. Tenho certeza que minha cara fechada demonstra exatamente a
minha insatisfação.
Ele nos gira, deixando que eu fique no lugar em que estava encostado, em uma
das laterais dessa lata enorme, ficando de frente para mim fazendo uma barreira
entre mim e a multidão à nossa volta.

—Vamos dizer que se eu não tivesse puxado, você não teria uma experiência
muito boa em seguida. —Diz em um tom sério se abaixando para falar no meu
ouvido.
Pelo amor de Deus, mal acordei ainda e estou ouvindo idiotices.

—Aquele cara que estava bem atrás de você, amou a vista e ele iria se aproveitar
dela. —Termina procurando meus olhos ainda com sua mão em mim me
segurando para perto. Seu rosto está sério. Sério demais para ser uma idiotice.

O meu pensamento nos dois primeiros instantes é rir. Quem faz uma piada
dessas? Com certeza é mais uma das suas babaquices, será que ele acha mesmo
que eu acreditaria? Eu pareço ser burra para pensar que caiu em uma dessas?
Um minuto se passa, ele continua com sua expressão facial e corporal iguais.
Rígidas. Sérias. Como se estivesse sentindo raiva. Ele não está brincando.

Minha respiração está presa. Não consigo respirar. Não sei como respirar.
Leio entre as pequenas entrelinhas, me fazendo ficar completamente paralisada.
Não há reação. Não existe uma reação.
A única coisa que penso é que ele iria se aproveitar de mim. Em um ônibus cheio
de pessoas em volta. Sem importância. Elas, as pessoas, estão olhando,
encarando descaradamente. Se perguntando internamente o que aconteceu, por
que fui puxada e por que de toda a cena em seguida.
Está sufocando. O ambiente está sufocando. Quero sair daqui.

Como alguém pode prever algo assim? Como alguém pode sair de casa? Posso
não sentir medo? E se for minha mente pregando peças? E se entendi errado? E
se eu estiver pirando?
Um turbilhão de coisas vem na minha cabeça. Mas dentro de mim, nada
acontece. Estou completamente anestesiada.

Meu olho arde e me dou conta de que quero involuntariamente chorar. Mas não
posso. É errado.

—Você está bem? —Ele pergunta tentando olhar nos meus olhos, ainda
protegendo o meu corpo com o seu.

Consigo olhar nos seus olhos apenas para dizer: —Sim.

Não presto atenção no restante do trajeto, só percebo que chegamos no ponto ao


ouvir passos de pessoas contra o chão de metal junto com uma voz que é
direcionada a mim perguntar:
—Você vai descer? —Ele diz indo em direção à porta de desembarque.

—Vou, é o meu ponto. —Desço logo atrás dele e vejo que a chuva gelada
continua.

—Você tem guarda chuva? —Pergunta após o ônibus se afastar.

—Não.

—Eu trouxe um, podemos dividir se você quiser. —Oferece de forma tão sincera e
gentil que chego a questionar por cinco segundos se é o mesmo Liam Brown
galinha do campus.

—Não obrigada, eu posso ir andando. —Respondo de qualquer maneira apenas


para poder sair dali. Para poder ficar sozinha. Eu comigo mesma.
Porém, isso é tudo o que eu não consigo assim que piso meu pé no campus.

Como de costume, chego na sala e me sento nas cadeiras do fundo quando a


professora Smith entra e inicia a matéria da aula.
Tento me concentrar o máximo que posso, mas minha mente fica voltando para o
ônibus, para quando Liam me puxou, quando se inclinou e falou no meu ouvido o
que iria acontecer se não tivesse impedido.

A pressão quente, o incômodo, a forma como eu tentava escapar de alguma


maneira, mas era inútil porque ele permanecia ali, bem atrás de mim.
Ainda posso sentir o toque nos minutos antes de ser puxada. E se, eu nunca
tivesse sido puxada? O que aconteceria? Como eu me sentiria depois? Iria
demorar muito?

No fim mal presto atenção na aula com minha mente indo e voltando para aquele
ônibus, consigo apenas fazer pequenas anotações e entender o conceito da
matéria.

—Vocês irão ter que escrever uma reportagem sobre os eventos que estão
acontecendo durante o semestre na faculdade, como por exemplo a temporada de
hóquei, futebol americano, o evento de artes da primavera, etc. —Diz a professora
Smith me fazendo focar nas suas palavras e iniciar uma oração mentalmente.

—Não quero apenas sobre o evento, quero que vejam os bastidores, quero algo
mais a fundo, que falem com alguém que está participando e escrevam além de
um evento, artista ou jogador. Já me adiantei e todos estão de acordo em ajudar
vocês. O trabalho valerá grande parte da nota do semestre.
A professora começa a fazer o sorteio e meu coração dispara sabendo que algo
bom não pode sair disso.

—Maya Hawkins: temporada de hóquei. —Esse maldito acerta.

Uma menina que está sentada perto de mim vira em minha direção e diz:
—Que sorte você tem.

Sorte? Para mim está mais para azar.


Justo hoje, depois de tudo aquilo, como vou fazer isso e logo com o time de
hóquei? Os garanhões do campus, os superstars que pegam mulher igual trocam
de roupa? Devem ser um bando de babacas com egos cada um maior que o
outro. Só de imaginar cada minuto que vou ter que passar com eles por causa
desse bendito trabalho sinto minha cabeça latejar.

A professora continua fazendo o sorteio até todos serem sorteados.


Eu acho bom esse bando de jogadores ajudar porque eu não vou ir com nota ruim
por causa deles. E aí que eu percebo que eu estou ferrada. O dia não poderia ter
ficado pior.

No final do dia quando chego no apartamento, percebo que não tem ninguém.
Decidimos dividir um apartamento desde que descobrimos que iríamos para a
mesma faculdade, não queríamos lidar com um monte de gente desconhecida em
um alojamento. Nosso mini espaço pode não ser lá essas coisas, mas é muito
confortável e o mais importante, o aluguel é barato.

Apesar de dividir apartamento com minha amiga Riley, e sermos próximas, ela não
é a pessoa quem eu costumo procurar para conversas em que eu tenha que me
abrir demais.
Amo nossa amizade e sou grata por ela, e durante todo esse tempo juntas, amo
cada vez mais, mas não me sinto confortável em falar o que preciso dizer nesse
momento, por isso eu ligo para Anna. Ela é a minha pessoa. Somos amigas desde
os 13 anos e, desde então, nunca mais nos separamos.

—Você me ligando? Alguma coisa aconteceu, pode começar a falar. —Ela diz me
fazendo lembrar porque somos tão amigas, somos diferentes e iguais ao mesmo
tempo.

—Está com tempo? —Questiono antes de começar a contar tudo o que


aconteceu de manhã cedo, desde o ônibus até o momento do trabalho da senhora
Smith.

Assim que termino, Anna fica um minuto inteiro em silêncio sem falar
absolutamente nada, mas ela não precisa. Eu precisava contar isso para alguém,
contar para ela. Fazer de alguma forma meu cérebro processar tudo o que
aconteceu. E se eu estou doida? E se Liam entendeu errado? Anna é racional, vai
saber me dar uma resposta.

—Como você está se sentindo agora? —Fala finalmente, mesmo que preferisse que
continuasse em silêncio. Da para ver em seu tom de voz que não sabe o que dizer
ou agir, que tudo o que ela queria era estar comigo e me abraçar. É exatamente o
que diz em seguida.

—Queria estar aí com você e te abraçar.


“Eu também queria, muito! eu preciso desse abraço. Preciso que alguém me
pegue no colo e me diga que eu não estou doida. Que está tudo bem, e me faça
dormi para esquecer. Quero deitar do lado da minha melhor amiga e assistir a um
filme como nos velhos tempos” penso.

—Eu sei, também queria. —Digo sentindo meus olhos ficarem marejados e minha
voz fraquejar.

A dor da memória volta machucando como nunca um dia fez. Diferente de mais
cedo, há reação. Eu sinto. Os meus olhos involuntariamente se enchem da água
quente e salgada escorrendo por toda a pele do meu rosto. Eu forço a parar.
Passamos mais alguns minutos com ela me ouvindo e nós conversando antes que
eu desligue para tomar banho.
Quando entro de baixo do chuveiro, não impeço meu corpo de reagir, minhas
lágrimas se misturando com a água caindo do chuveiro. Elas não cessam. Estão
livres. Obrigo minha mente para que pare novamente, e após alguns longos
minutos, dá certo. Só que não consigo olhar para o meu corpo no espelho. Me
sinto suja, indefesa, incapaz. Ele está marcado, e machuca observá-lo.

LIAM
Não consigo parar de pensar no que aconteceu.

Como um homem não tem o mínimo de respeito por uma mulher? Como pode a
tratar como se fosse um objeto de prazer que deveria ser usado somente para
satisfazer suas vontades? Sou homem e fui ensinado a fazer o mínimo que é
respeitar.

Sou o capitão do time de hóquei da universidade e sei aproveitar as vantagens


disso, mas mesmo assim eu respeito cada uma delas. Se a minha mãe soubesse
que fui um babaca com qualquer mulher na face dessa terra, ela ficaria sem falar
comigo por uns três meses e depois ainda iria gritar no meu ouvido até a minha
morte.
A minha mão coçou tanto para dar um soco naquele cara, mas eu não queria fazer
uma cena no meio daquelas pessoas, no meio de um ônibus, iria só piorar mais.
Foi tudo muito rápido, quando vi o que estava para acontecer não pensei direito,
apenas fiz o que o meu instinto disse que era para ser feito.

Fiquei pensando depois se deveria ter falado o porquê de ter a puxado ou se


fosse melhor ter mentido. Não consigo deduzir como deve ter se sentido. “Você
está bem?” óbvio que não seu burro.
O prêmio de pergunta mais idiota do ano vai para Liam Brown capitão do time de
hóquei.

A sua reação, ou melhor, não reação, atingiu como uma bala no meu peito. Os
seus olhos, nos breves segundos que me olharam, ficaram gravados na minha
mente o resto do dia, seu corpo ficou paralisado, nem percebeu quando
chegamos. Tenho certeza de que estava segurando para não chorar, a orbes dos
seus olhos estavam brilhantes demais, repleta de confusão e incerteza e uma
correnteza de água presa. Havia medo. Definitivamente a opção de mentir era a
melhor.
Nenhuma mulher deveria passar por algo assim. Posso ter fama de babaca por aí,
mas nunca faria algo como isso.

Ao fechar a porta da casa, minha mente ainda está um turbilhão, por isso não
percebo Nicolas na sala, um dos meus melhores amigos que divido a casa, até ele
falar me fazendo sair dos meus pensamentos.

—Que cara é essa? Pegou sua mãe transando? —Disse concentrado no jogo de
hóquei na TV.

—O que rolou? —Falou Luke ao lado concentrado em acompanhar a jogada do


time.

—Vocês não têm nada pra fazer?

—Não. —Responde os dois juntos.

—Sua vida serve para não nos deixar entediados. —Nicolas adiciona.

—Por que foi de ônibus hoje? —Pergunta Luke em seguida me encarando.

—Tomaaa! —Comemora Luke, assim que vê o drible de um jogador na partida.

—Merda! —Lamenta Nick assistindo o gol acontecer.

—Meu carro estragou e o táxi tava demorando demais por causa da chuva. —
Respondo.
—Eu posso arrumar se quiser. —Oferece Luke.

—Valeu, cara. Cadê o Dylan? —Perguntou ao perceber que não está aqui na sala.

Se uma coisa que Dylan mais gosta de fazer é pegar mulher no seu tempo livre, o
que é quase sempre. Ele já se dá bem em todos os lugares públicos que vamos
para comemorar e nos divertir com a galera do time. E pode ter certeza que as
mulheres o amam. O cara parece um modelo, não precisa fazer nenhum esforço
ou falar uma palavra sequer para ter uma roda de mulheres esperando a sua
chance.

—Não sei, deve estar enchendo o seu quarto de rato. —Nick murmura da cozinha,
eu paro por uns segundos até ouvir sua risadinha em minha direção.

—Que desconfiança Liam. —Fala Luke começando a dar risada.

—Da última vez você encheu meu quarto com pombos. —Viro em direção ao Luke
que ainda está sentado no sofá na sala. —Fiquei dias limpando aquele quarto.
—Resmungo lembrando o quanto aquilo foi estressante.

—O Roberto, Aguinaldo e a Vera eram muito fofos, eu só queria te apresentar.


—Argumenta, mostro o dedo do meio para ele o que faz os dois soltar risadinhas.

Subo as escadas indo direto para o meu quarto que é a suíte principal no segundo
andar. Não sou de abusar dos meus privilégios de capitão, mas nessas situações
tem uma excessão.
Eu trabalho o verão inteiro para poder pagar minhas despesas aqui na faculdade já
que não sou bolsista igual Luke e Nick já que meus pais tem ótimas condições
financeiras.
Meu pai é advogado e ganha uma boa grana, ele é o mais famoso de New York,
mas não chega a ser podre de rico igual Dylan que tem umas três casas em cada
canto desse país, com um nome de família de grande peso e que limpa a bunda
de dinheiro. Temos uma ótima condição e estamos na parte de cima na pirâmide
da sociedade mesmo assim.
As vezes eles mandam uma grana extra com medo de não ser o suficiente, ainda
que eu insista que não é necessário, minha mãe nunca ouve. Consigo me virar
bem com o dinheiro que lucro.
Vou direto para o banho e demoro uns longos minutos processando tudo do dia
de hoje.
Capítulo 2

MAYA

Faltei aula ontem.

A realidade é que nem sei como eu consegui ir para à aula depois que desci do
ônibus. Eu quase fui abusada. Abusada.
Só de pensar nessa palavra tenho vontade de vomitar. Não, tenho vontade de
sumir. É isso que eu quero, sumir; que tudo o que aconteceu desapareça, que
tenha sido apenas um mal entendido e que, na verdade, eu não iria ser abusada
se Liam Brown não tivesse me puxado.

De todas a pessoas que pegam a merda do ônibus, tinha que ser justo o capitão
do time de hóquei da universidade. Só para coroar a situação. Por que ele? Por
que me salvou? Por que não ignorou e fingiu que nada iria acontecer como todos?
Nunca nem esbarrei pelos corredores com ele, tudo o que eu sei são as pessoas
que espalham por aí, mas lá estava ele pronto para salvar o dia.

Salvar, outra palavra que estou começando a não gostar, acho que vou começar
a fazer uma lista de palavras que não gosto. Porque a verdade, é que não fui salva.
Não quando mesmo não sendo abusada, eu ainda me sinto em completo êxtase.
Sem saber como agir e viver, como voltar a superfície. Sinto medo. Muito. Então,
pra que fui salva?

Como mulheres conseguem viver suas vidas depois disso? Não, pergunta errada.
Como mulheres conseguem viver normalmente? Se alguém tiver a resposta, por
favor, eu peço que me responda pois eu não faço a mínima ideia de como.
Milhares de cenas do que poderia ter ocorrido me cercam, os “e se” por toda a
minha volta me assombram. Cenários como esse se repetem de diversas formas.
Cenários piores.

O medo está fazendo toc toc e eu não quero atender a porta, mas ele quer entrar.
Ele me diz que já entrou, de alguma forma ele entrou e eu não vi. Ele não vai
embora. Vai permanecer aqui para sempre? Não gosto de sentir medo. Não quero
sentir medo.

Passei o dia de ontem inteiro sem sequer ter vontade de me levantar da cama para
comer, uma necessidade que temos para viver, porém que era desnecessária para
mim que não sabia como. Não consigo nem me olhar no espelho, tudo o que eu
quero é esconder o meu corpo. Eu o odeio agora. Consequências de ser uma
mulher nesse mundo. As consequências de ser mulher é uma droga.
As vezes quero sentir dor para aliviar a que sinto por dentro. Não chegou a
acontecer, então, por que me sinto assim? Por que sinto tudo isso? Eu deveria
estar normal, como se nada tivesse acontecido, pois não aconteceu, apenas iria.
Isso não tem sentido.
E se Liam tivesse mentido? Isso é uma possibilidade, ele é um babaca, talvez
estava brincando comigo.

Sei que não está, esse é o pior. Eu senti. Percebi que algo estava errado, senti
uma pressão atrás de mim, então quando me disse, mal considerei que fosse
mentira. E se eu estiver louca? E se aquela pressão nunca existiu e é apenas a
minha cabeça me pregando peças como sempre?

Agora tenho que lidar com isso. Não posso parar minha vida, não posso me
esconder e muito menos ficar com esse drama, porque é isso que eu acho que é.
Drama. A vida continua, parar agora não é uma opção.

Vou engolir tudo e seguir.


E é o que eu faço ao entrar na sala de aula hoje. Estava não imersa em meus
pensamentos que não percebi quando cheguei.

“Nada aconteceu” é o que estou repetindo para mim mesma ao me sentar em


uma das cadeiras, até me virar e ver que Liam acabou de passar pela porta.
Espero que não tenha reparado em minha presença ou que temos aula juntos,
pois não preciso disso agora, é melhor fingirmos que nada aconteceu. Que não
nos esbarramos.

Como a vida é só tristeza, o professor entra em seguida informando que hoje


teremos prova surpresa valendo uma nota preta no semestre, a cereja do bolo que
faltava. Apesar de tudo, consegui estudar um pouco as matérias ontem tentando
fazer minha mente ficar em silêncio, nada a ponto de estar preparada para uma
prova surpresa. Ainda assim, pela reação de todos na turma, tenho certeza que
estão longe de estar prontos.

Capítulo 3

MAYA

Não consigo relaxar.

Riley de manhã, antes de sair, deixou uma cartinha com chocolate em cima da
minha escrivaninha, merecia um prêmio pelo choro que segurei como nunca
naquele momento. Ela sempre está comigo e amo muito ela por isso, amo a nossa
amizade. Ela me deu incentivo para estar aqui.
Se passaram alguns dias desde aquele, estou melhor no momento. Eu acho.
Entretanto, hoje quando ando pelo corredor até a sala de aula, não consigo parar
de me sentir apavorada. Desesperada. Com medo. Meu corpo pisca em alerta a
cada passo que eu dou, pessoas e mais pessoas a minha volta como um
formigueiro, minhas mãos não param de transpirar. As vozes na minha cabeça
gritam. Berram. Não posso parar.

O coração no meu peito bate cada segundo mais rápido. Seguro a respiração por
alguns segundos, não sei quantos. Meus olhos se enchem de lágrimas. Quero
chorar de medo. Não faça isso aqui. Cenários e mais cenários surgem, flashbacks.
Quero silêncio. Quero parar de me sentir aterrorizada. Quero que as vozes fiquem
quietas. Não gosto de lugares cheios. Quero paz.

“Pare de ser dramática!” uma voz ordena. Não estou sento dramática.

Pego um livro na bolsa e tento começar a ler, porque é isso que os livros servem
para mim. Uma forma de escape da realidade. Uma nova vida. Como um
descanso da minha mente.

Eu sou aquela típica aluna que sempre tem um livro na mão e sem muitos amigos
em volta, e afirmo que os livros são os melhores amigos que você pode ter. Já vivi
mil vidas e conheci diversos lugares sem sair do lugar, me apaixonei, descobri
assassinatos, desvendei enigmas apenas deitada na minha cama. Poderia viver
tranquilamente só dentro de um quarto com um livro em mãos. Poderia viver o
resto da vida em uma página, em um livro.

Faço minhas pernas se moverem enquanto me concentro nas frases escritas de


tinta preta nos papéis grudados em minha mão. Sem querer registrar o caminho
feito por mim. Na sala, à aula não demora muito para passar. Quando está quase
chegando ao fim, as provas de Linguagens, Códigos e suas tecnologias começam
a ser distribuídas.

O professor pegou todo mundo de surpresa ao aparecer falando que iria substituir
o senhor Davis, só que, aplicar uma prova surpresa semanas depois foi um
absurdo. Ou talvez isso seja somente a faculdade. Já faz um tempo que ela foi
aplicada e acho que não fui ruim, mas quero deixar comentado aqui novamente
minha indignação.

Pelos exercícios dava para ver que ele pega pesado, não sei como os alunos dele
sobrevivem, eu estou com dó de mim mesma por ter aula com ele. A sorte que já
tive um professor igual, era um Enzo de tão chato. Sei lidar com esse tipo.
Quando vejo a nota da minha prova, agradeço mil vezes ao Enzo do professor por
ter me feito sofrer igual uma condenada, valeu super a pena por esse dez bem
grande, e pela cara do pessoal da minha turma as notas em um geral não foram as
melhores.

Eu faço faculdade de jornalismo já que minha paixão é uma boa leitura e


principalmente a escrita. É o mais próximo que eu consigo de viver uma paixão.
Sempre gostei de criar textos e poesias, ainda não consegui criar um livro inteiro,
mas quem sabe um dia. Nunca diga nunca.

Não pensei em uma especialização, mas considero na área do esporte. Sou


viciada em esportes. Acompanhar os jogos e fazer entrevista com todos aqueles
jogadores está no meu top cinco sonhos. O esporte é um amor que adquiri nos
últimos anos, sou uma torcedora apaixonada quando se trata de basquete e
futebol, mas um pouco de fórmula um entra no pacote.

—Grande parte da turma terá que fazer a segunda chamada que será daqui a
algumas semanas antes do fim do semestre. Boa sorte a todos. —Diz o professor
antes de todos começarem a se levantar e sair da sala.

Demoro alguns minutos ajeitando as minhas coisas e esperando para que o


máximo de pessoas tenha saído para quando eu passar pelo corredor ele esteja
vazio. Ergo a cabeça vendo que todos já foram, barra limpa. Vou em direção a
saída segurando minhas coisas junto com a minha prova no meu braço e lendo o
livro na mão.

LIAM

Eu vou reprovar!

Só pode ser brincadeira caralho. Justo no meu último ano com essa matéria, o
professor Davis resolve dar no pé. Durante todos os meus anos aqui, ele fazia
exercícios tão fáceis que eu, que não entendo nada, conseguia fazer de olhos
fechados, agora tenho que aturar esse professor que tenho certeza que quer me
foder.

Tenho certeza que ele deve odiar hóquei, o cara é meu inimigo sem eu ter feito
nada, e a prova disso é esse belo três que recebi. Se eu não der um jeito nisso
posso dizer adeus jogos da temporada, e como capitão tenho que dar o exemplo,
levar os caras para a vitória. E a única coisa que não posso fazer é ficar
esquentando o banco. A única.

Não é muito difícil deixar minhas notas lá em cima, diferente do que todo mundo
pensa, nem sempre os jogadores de hóquei são um bando de burros, uma fama
injusta, mas agora estou parecendo um, porque eu estou completamente zerado
em uma matéria.

Faço faculdade de jornalismo junto com especialização em jornalismo esportivo,


estou focado em ter uma carreira brilhante no hóquei, mas se não der certo, é
sempre bom ter um plano B. Quase a maioria dos atletas estuda uma aérea
voltada para o esporte, como estou no último ano em jornalismo tenho apenas
mais um ano aqui por causa da minha especialização e isso é igual a: nada de
reprovação. Principalmente quando eu tenho uma temporada para ganhar.

Não reparo se tem mais alguém na sala quando me levanto indo em direção a
porta, ouvi mais nada depois do: “boa sorte a todos” pensando em que merda eu
vou arrumar para dar um jeito nisso, já faço grupo de estudos uma vez na semana,
o que está adiantando de merda nenhuma.

Estou em uma nuvem de “eu to fodido” no instante em que ouço um estrondo


junto a um resmungo irritado e um gemido de dor, ergo o olhar dando de cara com
a cena mais engraçada que se pode ver ao andar pelo campus da Mavericks (isso
nunca mais será apagado da minha memória). Uma garota que, até esse segundo
não havia reparado, tropeça batendo na cadeira próxima a ela caindo
automaticamente de cara no chão com todos os papéis, bolsa e livro que carrega
nos braços. Seu corpo ainda rola uns degraus abaixo até conseguir se estabilizar.

Caminho para perto dela me forçando a engolir a risada e fazer uma boa ação do
dia. Sua mão está na testa pelo, o que eu suponho, amenizar a dor com os papéis
e livro agora espalhados ao seu redor.

Agacho juntando todas as suas folhas quando eu olho um maravilhoso dez na sua
prova com o nome Maya Hawkins escrito. Isso é mais do que o suficiente para
fazer a minha risada sumir e o lembrete mental de ajudá-la a levantar evaporar.
Sinto que acabei de esbarrar com a resposta das minhas orações.

Paralisado com a prova em mãos, saio do meu transe observando a garota se


levantar e reparo que é a mesma garota do ônibus. Qual é a probabilidade? Nós
fazemos aulas juntos desde quando? Acho que meu cérebro tem um bug por
alguns instantes porque ouço sua voz sem paciência segundos mais tarde.
—Muito obrigado pela ajuda. —Fala de forma irônica e irritada. Acho que não saiu
como eu estava imaginando. —Você pode devolver a minha prova, por favor?
—Esticando a mão ela pergunta me encarando irritada.

—Você vai devolver a minha prova, ou não? Desculpe, mas não tenho o dia todo.
—Ela interroga de novo.

Agora que ela está na minha frente sem aquelas pessoas no ônibus, tiro bons
segundos para analisar seus traços, coisa que não tinha tido tempo o suficiente
para fazer. Olhos castanhos mel que hipnotizam qualquer um, com os cabelos
castanhos ondulados nas pontas solto nos ombros como uma cascata, sua boca
é um rosa queimado, não muito grande, tamanho perfeito, bem desenhada.

—Popular, mal educado e surdo. O combo perfeito. —Resmunga irônica.

—Não sou surdo. —Falo chamando a sua atenção. Sorriu sarcástico como um
brinde da fala.

—Que bom pra você. Então, pode passar o papel pra cá? —Indica a mão
esticada.

—Você gabaritou. Como fez isso? —Tento distraí-la da sua impaciência.

—Simples, eu estudei. Só não imaginei que fosse ir tão bem. —Um sorriso
modesto aparece junto com a sua tentativa falha de uma resposta simpática.

—Posso ficar com a sua prova e ver as respostas?

—Meu Deus, que cara de pau, não? Nem nos conhecemos. —Suas sobrancelhas
se franzem com certa indignação. Não nos conhecemos? Sério? Tudo bem...

—Estou pedindo para ver a sua prova, não para levar você pra cama, relaxa linda.
—Abro um sorrisinho de lado.

—Não sou sua “linda”. —Rebate. Tenho quase certeza que faz um esforço para
não revirar os olhos. Qual é a dessa garota? —E você me mandar relaxar quando
está me pedindo um favor desses não vai me fazer mudar de ideia.

—Eu preciso de ajuda para não ficar reprovado, Maya. —Falo de forma séria,
dessa vez enfatizando ao dizer o seu nome, fazendo ela me encarar com uma
carranca se formando em sua testa.

—Como sabe meu nome? —Levanto a prova em uma explicação silenciosa, o que
a faz dessa vez revirar os olhos.
—Caso você não saiba, estudar funciona.

—Agradeço pela dica, mas eu já tentei isso. Por favor me ajuda nessa, me dá
umas aulas. O que você quer em troca? —Me aproximo um passo, fazendo seu
corpo se afastar automaticamente, tentando manter uma certa distância entre nós.
Guardo isso.

—De você? Não quero nada, Liam. —Enfatiza o Liam igual enfatizei o seu nome,
mas com um tom de “para de me encher a paciência e saia da minha frente”.

—Posso saber como sabe o meu nome?

—Desculpe, mas não vou massagear o seu ego.

—Massagear o meu ego? Eu fiz uma pergunta sincera. —Tenho certeza de que
revirou os olhos mentalmente agora. Ela bufa antes de falar.

—Todos na universidade sabem o seu nome.

—Ah, tinha me esquecido disso. —O comentário me escapa.

—Agora que você já diminuiu minha paciência a zero no início do dia e ainda me
obrigou a massagear o seu ego, pode sair da minha frente? —Pergunta
demonstrando no seu tom de voz a sua irritação e descontentamento.

—Eu pago. —Acrescento logo em seguida não aceitando que saia daqui sem que
aceite a minha proposta.

—Eu cobraria, óbvio, mas não posso. —Diz se desviando de mim indo em direção
a porta. Eu a sigo.

—Quebra essa pra mim, se eu não passar na segunda chamada minha média vai
pro ralo. Vou ficar no banco —Ela para se virando em minha direção bem quando
chegamos a porta.

—Nesse caso, sinto muito por você. Meus pêsames. —Seu tom é irônico.

—Não sente nada, pela sua cara da pra ver que nem queria estar falando comigo.
—O movimento de desdém dos ombros diz que eu estou certo.

—Veja pelo outro lado, pelo menos não é o único. —Um sorrisinho sarcástico
aparece em seu rosto.

—Menos você. —Bufo.


—Isso aí, boa sorte aliás. Espero que dê tudo certo no final, lindo. — Diz de forma
sarcástica se virando e andando pelo corredor vazio.

Volto à estaca zero antes de Maya aparecer e me fazer olhar a luz no fim do túnel
por alguns segundos e depois enterrar minhas esperanças. Essa é com certeza a
única garota que foge de mim igual o diabo foge da cruz, mas isso não quer dizer
que não posso dobrar ela.

Nesse momento me ocorre o seguinte pensamento: Será que ela está bem? Seria
inconveniente demais eu perguntar algo sobre o que aconteceu pra ela?

… 🏒🏒... 🏒🏒... 🏒 🏒 …
Quando chego, encontro todos os móveis da sala encostados na parede deixando
um bom espaço no centro para os tacos, disco e o gol improvisado.

—O que estão fazendo? Por favor, não destruam a casa. —Peço passando direto
para a cozinha enquanto Dylan marca Nick com o disco.

Aquela conversa me deu além de uma dor de cabeça, uma baita fome. O que me
fez ir direto preparar algo para nós jantarmos.

Sou eu que faço as refeições da casa e todos seguirem a dieta que a nutricionista
passa, se depender desses caras todo mundo morre de fome ou queimado antes
da comida ficar pronta. O único abençoado com o dom da culinária sou eu, e não
é querendo ser presunçoso, mas a minha comida é a melhor de todas, eu cozinho
muito bem.

—Exercitando para a próxima partida contra o timinho retranqueiro dos Eagles.


Uma pena que a estrelinha do time vai estar fora do show, iria amar acabar com
aquela cara horrível dele. —Nicolas sorri ao falar.

O jogador modelo dos Eagles está suspenso, o que não é nenhuma novidade. O
cara faz falta na caruda. O hóquei é um dos esportes mais brutos e intensos que
tem, mesmo a porrada estando liberada, tem alguns limites. Da última vez que vi,
o favorito do Stanley quebrou a perna de um jogador no meio da partida.

—Realmente uma pena, adoraria te ajudar. —Abro a geladeira pegando os


ingredientes que preciso.
Nicolas é o meu melhor amigo e nosso ala, arrisco dizer que o melhor ala do
hóquei universitário, a minha dupla no ataque. O cara é incrivel no gelo, além de
ser muito rápido. Um dos melhores alas que joguei até hoje, tenho certeza que vai
ser draftado. Nós dois queremos jogar na liga profissional juntos, é o nosso sonho
desde o primeiro ano, mas se não jogarmos, vai ser uma boa rivalidade. Nossa
sintonia dentro do ringue é surpreendente, apesar de sermos bons separados,
somos sensacionais juntos.

—Não tem problema, vamos enfrentar Stanford na nossa chave. Aí nós vamos
fazer a festa. —Dylan diz. Um dos nossos defensores, e com certeza um dos
melhores.

A realidade, é que nós quatro (Luke, Dylan, Nick e eu) somos os melhores. Não
estou sendo orgulhoso ao dizer isso, é um fato, e fato são fatos. Não podem ser
mudados, apenas respeitados. E até o instante que sairmos dessa universidade,
vai permanecer assim.

Minha mente entra em alerta com a informação, preciso prestar mais atenção ao
nosso calendário. Não posso ficar no banco jogando contra esses caras, todos da
nossa chave são pedreira, isso pode prejudicar o time. Muito. É menos uma opção
no banco. E se perdemos, a culpa vai ser minha.

Meu coração para.

Preciso passar nessa prova.

—Não sei se vou estar disponível pra jogar. —Disparo em seguida, fazendo os três
ao mesmo tempo pararem o joguinho deles e se voltarem para mim em silêncio.

—O que? Você tá maluco? —Nick é o primeiro a dizer.

—Ele tá tirando com a gente. —Dylan começa a dar uma risadinha de nervoso.

—Ele não tá. —Luke fala, logo que percebe que eu não estou nem um pouco
brincando, Dylan para de rir em um corte seco.

—Zerei a média em uma matéria. —Anúncio.

—Puta quê pariu. —Murmura Nick largando o taco e vindo para cozinha atrás de
mim em uma sequência rápida. Ele está surtando. —Tranca a matéria. —Ordena
simplesmente se encostando na bancada.

—Não posso, já passou o prazo.


—Droga. —Resmunga. —Qual matéria que é? O daquele pau no cu que arregou e
meteu o pé?

—Esse mesmo.

—Desgraçado

—Pois é. —Digo cortando os legumes, tentando achar alguma saída sem que seja
infernizar a vida de Maya Hawkins para me dar aulas.

—Precisa dar um jeito Liam. —Informa. —Você não pode ficar de fora. Enfia a cara
nos livros e gabarita essa prova. —Suspiro. Levanto o olhar encarando Luke e
Dylan atentos a conversa e volto para Nick.

—Tem uma menina na minha turma que foi a única que gabaritou. —Conto.

—Cacete, a menina é o Issac Newton?! —Comenta Dylan.

—Ótimo, peça pra ela te dar umas aulas. A gente te ajuda a pagar. —Responde
Nick ignorando o comentário de Dylan.

—Aí que tá, ela não quer me dar aula.

—Você é jogador de hóquei cara, dá um jeito. Convence a garota.

—Caraca, tá em desespero mesmo. —Sorrio presunçoso.

—É o Nick. —Adverte Luke.

—Tudo pelo sonho. Somos uma dupla. Um quarteto. Se um de nós está fudido,
todos nós estamos também. —Diz o nosso lema. Estica a mão e damos nosso
toque.

Uma coisa é, quando você ver que duas pessoas tem um toque só delas, você
pode saber que essa amizade é de verdade. Dylan e Luke são meus melhores
amigos também e amo esses caras pra valer, mas Nick é mais que isso. Ele é
como um irmão para mim. Eu tenho que dar algum jeito

Capítulo 4
MAYA
Achei que estava sozinha ontem na sala quando eu caí igual uma gelatina no chão.

A maior vergonha na história, e como telespectador, Liam estava bem na hora


acompanhando. Isso só acontece na minha vida. O que anda havendo?

Também estava tão concentrada lendo meu livro que nem me dei o trabalho de
prestar atenção, ou simplesmente me dar o trabalho de olhar para cima. Na
verdade, nunca presto atenção em nada, principalmente agora que parece que
ficar consciente é desconfortante demais. Por que isso justo agora? Coincidência,
destino ou a vida tentando me ferrar?! Façam as suas apostas. Afinal, mais tarde
no mesmo dia eu perdi o meu cartão. A sorte é que uma boa alma o achou,
mesmo assim, for desesperador. O que está acontecendo comigo?

Liam ainda teve a capacidade de pedir para eu dar aulas para ele, mesmo que eu
quisesse (o que eu não quero), não tenho capacidade de ficar perto dele por muito
tempo, ou de qualquer homem. Estou aliviada por não mencionar o ocorrido no
ônibus, o que agradeço, apesar de todo o meu plano de torcer para que ele não
repare na minha presença ir pelo ralo.

Agora estou sentada no chalé Bradshaw, um dos refeitórios da Mavericks. Ele é o


meu favorito por ser bem rústico e a vibe de paz que transmite é maravilhosa, só
uma leitora entenderia.

Tomando um copo de café ao ler o meu livro, que está me fazendo surtar a cada
página, sinto alguém sentar em minha frente e me observar, esperando sentir sua
presença e falar algo. Só que isso não acontece, porque estou concentrada
demais para querer parar e me dar o trabalho de ver quem é. Mesmo que isso não
seja necessário, pois só pode ser uma única pessoa.

—Oi para você também, Maya Hawkins. —Levanto o olhar para ele. —Você não é
muito difícil de achar. —Pontua.

—Vai começar a me seguir agora? —Estreitos os olhos.

—Não se você aceitar a me dar aulas.

—Sinto em ti dizer que não sou formada em letras para ser professora. —Ele
ignora meu comentário sarcástico.
—É Maya Hawkins igual a cidade de Hawkins em Stranger Things? —Suspiro e
balanço a cabeça afirmando para sua pergunta que tenho certeza que vai ter mais
uma das suas respostas engraçadinhas e irritantes.

—Então isso te torna a Eleven? Hmm, acho que mais a Joyce, ela é mais
inteligente. —Suspiro mais uma vez ao confirmar minhas suspeitas, tento manter
minha paciência intacta logo de manhã.

—Vai ser assim agora? —Fecho o livro em um baque. Ele abre aquele seu
sorrisinho que o faz conseguir tudo o que quer, mas não comigo. —Liam Brown,
não é? —Ele não me responde, então, eu continuo. —Porque não faz um brownie
pra mim? Os seus devem ser bons já que tem isso até no nome.

—Até o Vecna faz uma piada melhor que essa.

—E o mundo invertido é mais confortável do que ficar aqui na sua presença.

—Como uma pessoa tão inteligente pode ser tão irritante?

—Como uma pessoa tão burra pode ser tão arrogante? —Coloco uma mão no
queixo fingindo pensar na resposta da minha pergunta mesmo ela sendo retórica.
—Aé! Você é jogador de hóquei. —Abro um sorriso irônico.

—Agradeço o elogio. —Reviro os olhos.

—Vou ter que ficar suportando sua idiotice até quando?

—Só até você aceitar a me dar aulas.

—Desculpa, isso não está no roteiro.

—Então, vamos continuar nisso até você ceder.

—Eu não vou ceder.

—Muito menos eu. —Ele me encara com um olhar voraz, desfazendo o sorrisinho
irritante de antes. Guardo meu livro e me levanto preste a sair, mas antes inclino
meu corpo em sua direção com as mãos apoiadas na mesa e falo por fim:

—Foi dada a largada!

Saio andando sabendo a merda que acabei de fazer. Mas assim como ele, eu não
cedo fácil.

LIAM
O treino hoje foi pesado.

Vamos enfrentar os Eagles daqui alguns dias e temos que estar preparados. A
sorte é que as notas ainda não foram computadas, então ainda vou poder jogar,
mas o próximo que vamos enfrentar é o Dallas, um dos melhores da nossa chave
logo atrás de nós, claro e Stanford. O nosso maior rival.

Se fosse para escolher um dos times universitários que mais gosto de jogar
contra, com toda certeza seria Stanford. O prazer de derrotar o maior time logo
atrás do seu, é um dos melhores. Vou fazer questão de acabar com eles em todos
os jogos até o dia que ir embora da Mavericks.

A segunda chamada vai ser antes da partida contra o Dallas, então minha média
tem que estar boa, senão, eu não jogo.

A Mavericks é uma das melhores universidades com programa de hóquei e futebol


americano universitário. As instalações e equipamentos são ótimos, e uma das
mais concorridas a bolsa. Eles estão sempre investindo ao máximo na
universidade em um geral, não é à toa que é uma das mais procuradas.

Sinto a água bater nos meus ombros relaxando os meus músculos e aliviando a
tensão. Escorre por todo o meu cabelo e corpo me livrando do suor de ambos.
Após longos minutos de baixo do chuveiro, esfrego a toalha no cabelo e a enrolo
na cintura.

No vestiário após o fim do treino, enquanto tomamos banho e nos trocamos,


sempre rola uma resenha entre os caras do time, um bando de idiotas gigantes
juntos não pode sair muita coisa. Hoje não é muito diferente.

—Ordem no tribunal! Permissão para início de debate essencial para como time
vencermos a temporada com o nosso poder da amizade, capitão?! Me dá a
honra? —Fala Adam, parando as demais conversas.

Ele é um dos nossos defensores, apesar de ser aquele típico estranho engraçado
que toda turma tem que ter, ele é uma monstruosidade no gelo, nada passa por
ele.

—Toda sua. —Respondo de volta. Silêncio.

—Quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? —Como eu disse, não dá para sair
muita coisa.
—A galinha né porra, alguém tem que chocar o ovo. —Jason nosso outro defensor
é o primeiro a responder, quem vê acha que é jogador de futebol americano pelo
seu tamanho, e não faço a mínima ideia do porque não é. Tem um jeito todo Bad
boy, mas é um cara legal.

—Claro que não idiota, é o ovo. Como que a galinha vai nascer?! —Dessa vez
quem responde é Nate nosso ala, joga comigo e Nick no ataque. O cara é muito
bom no gelo, tem umas tacadas de gênio e jogadas certeiras. Como trio,
funcionamos muito bem.

—Mas para ter o ovo, tem que ter a galinha. —Rebate Stephen do chuveiro. Assim
como Adam, ele é o típico garoto do fundão da turma. O que dá corda para as
idiotices. Eu, normalmente, não aconselho deixar os dois juntos por muito tempo.
Ficava tentando decidir qual dos dois é pior, mas Adam ganha todas as vezes.

—É a galinha caralho, alguém precisa botar o ovo. —Brandon responde ficando


impaciente e fazendo todo mundo falar ao mesmo tempo começando um
verdadeiro debate.

Só consigo escutar uns “quem inventou essa merda?”, “tinha que ser o Adam
fazendo uma porra dessa”, “tá achando que eu sou Robert einstein pra saber essa
porcaria?!”, “daqui a pouco o Sherlock Homes aparece aqui para desvendar um
negócio desse”, “por que estamos fazendo isso?”.

—Ordem! Agora o negócio é sério! —Acabo com a discussão no vestiário fazendo


todos calarem a boca e se voltarem para mim que estou com a expressão séria de
capitão. — Time Homem de ferro ou Capitão América? —Jogando outra bomba,
início mais uma discussão, termino e logo saio do vestiário com a roupa já
trocada.

Vou em direção ao meu carro no estacionamento, um Jeep Suv que Luke


arrumou. Ele trabalha durante o verão em uma oficina para usar o dinheiro durante
o ano, ama aquele lugar e os carros de um jeito que nunca vi.

Paro no sinal vermelho a caminho de casa e observo uma criança com uns cinco
anos brincando no parquinho perto de uma escola. Aprecio sua afeição de alegria
e a forma como é bonita. Ouço ela chamar alguém e percebo que não está
sozinha, então, vejo que não é qualquer pessoa que está com ela.

Avisto a criança a puxando para perto do escorregador, a menina sobe a


escadinha e escorrega sendo pega no colo e girada no ar. Ao ver essa cena,
encosto o carro e desço andando até um dos bancos que tem por perto do
parquinho.

Não reparam a minha presença até que Hawkins me vê quando gira seu corpo em
direção a um dos bancos com a pretensão de se sentar, deixando a criança
brincar nos brinquedos.

—O que está fazendo aqui? —Dispara.

—Admirando a natureza. —Sorriu sonso.

—Tenho certeza que você nunca tinha notado esse parque até me ver aqui.

—Pena que o mundo não gira em torno de você.

—Mas o seu interesse na minha prova gira. —Contrapõem.

—Qual é o nome dela? —Mudo o rumo da conversar, sem argumentos e tentando


manter a paz, observo a menininha brincar no escorregador em forma de um mini
tobogã esperando Hawkins pensar se deve me responder ou não.

—Isso é uma informação que você não precisa saber. —Adverte.

—Quer fazer da forma mais difícil?! —Olho em seus olhos de maneira desafiadora.
—Então, é assim que vai ser. —Decreto.

—Por que você quer tanto? Por que tem que ser eu? —Pergunta em seguida
confusa com um pouco de irritação.

—Eu preciso da porra da nota, senão, eu vou ficar no banco. Eu já faço parte do
grupo de estudos e mesmo assim você foi a única da turma que tirou a nota
máxima.

—O problema não é meu se você vai ficar no banco. Eu não dou aulas. —Afirma
de forma curta e grossa.

—Você dá outra coisa então? —Provoco. É mais forte do que eu.

—Babaca. —Murmura baixinho revirando os olhos.

—Quantas aulas vão ser por semana? —Questiono fingindo não escutar o seu
lindo elogio a minha pessoa.

—Sem chance, já disse que não.

—Por que não?


—Porque não!

Ela começa a ficar estressada. Seu olhar é mortal. Sua expressão é fechada. Está
fazendo um esforço para não revirar os olhos a cada palavra que sai da minha
boca, e para não perder a linha.

—Isso não é uma resposta. —Rebato.

—Para mim é. —Responde dando fim a nossa discussão que mais está parecendo
duas crianças da quinta série brigando por um lápis.

—Qual o problema de me dar umas aulas? —Pergunto querendo realmente saber


a resposta, pois não vejo nada que à impeça disso.

Antes que possa responder percebo que um pequeno ser humano sorridente está
se aproximando.

—Maya, você me ajuda a balançar? —A mão agarra sua blusa a balançando,


chamando sua atenção para ela. A pequena percebe que estou sentado na ponta
do banco e pergunta. —Quem é ele?

—Eu sou Liam, um colega da Maya, qual é o seu nome? —Sorriu.

—Meu nome é Mia. Você é muito bonito, por que você não disse que namora?
—Diz inclinando a cabeça e olhando para a Hawkins, seu estresse se dissolve,
ficando pasma com a pergunta sem saber o que responder.

—Vou te contar um segredo Mia. —Chama ela com a mão para se aproximar. —
Ela não quer me ajudar no dever. Ela está sendo muito malvada comigo. —Falo
baixinho me inclinando para no ouvido de Mia como se estivesse preste a falar o
código de uma bomba nuclear.

—Vou tentar convencer ela. —Diz formando um círculo com as mãos em volta da
boca e sussurrando de volta para mim. —O Liam pode me ajudar a balançar?
—Se vira perguntando pra Hawkins que me encara tentando ler a minha alma
pelos trinta segundos seguintes.

—Pode, mas me chame se precisar de alguma coisa. —A pequena me puxa pela


mão me levando até o balanço, a empurro não deixando ir tão alto para não ter
perigo de se machucar.

Ela tem os cabelos castanhos escuros liso com cachinhos nas pontas e mechas
rosas na nuca que voam com o vento, a pele dourada com o sorriso mais
encantador de todos.
Hawkins sentada em um dos bancos nos observa atenta a qualquer movimento.
Depois do balanço, brinco com Mia de pega-pega e esconde-esconde. Sua risada
é gostosa de ouvir e parece que sua energia está ligada nos duzentos e vinte,
porque ela continua pedindo por mais brincadeiras até Hawkins se levantar vindo
para perto de nós avisando que já deu o horário e que seus pais estavam
chegando. Uma mulher aparece minutos depois e leva Mia embora, que me acena
um tchau com a mãozinha.

Mesmo sentindo o peso no meu corpo, brincar com essa garota foi divertido. É
uma missão impossível não sorrir com ela.

—Você já vai embora? Posso te dar uma carona. —Ofereço a Maya, apontando
com a cabeça para meu carro estacionado. Instantaneamente sua postura muda,
se torna rígida.

—Não obrigada, eu não moro muito longe. —Pega suas coisas em um dos bancos
espalhado pelo parque. Procuro o brilho dos seus olhos castanhos.

—É quantos minutos daqui? Tenho certeza que vai chegar mais rápido de carro.

—É apenas uma caminhada de vinte minutos. —Apoia sua bolsa em seu ombro.
Apenas?

—Não é nenhum incômodo. —Tento novamente, mas pela sua forma sei que não
vai aceitar. Diferente de segundos atrás, algo de estranho está presente nas
partículas dos seus olhos.

—Eu agradeço, mas não quero uma carona sua. —Poderia levar isso para o lado
pessoal se não visse a tensão do seu corpo ao se afastar caminhando.

Maya pode não ceder tão fácil, mas a palavra desistir não está no meu
vocabulário.
Capítulo 5

MAYA

Não acreditei quando Liam apareceu no parque ontem no momento em que estava
com Mia.
Eu trabalho como inspetora no período da tarde na escola onde Mia estuda,
auxiliando as crianças e vigiando para não aprontarem ou colocarem fogo. Tomo
conta dela todos os dias depois do horário de aula, já que seus pais não podem ir
buscá-la na hora exata da saída. Consigo ganhar um extra, o que ajuda bastante
nas minhas economias, porém não me importaria de ficar de graça, amo demais
aquela pequena.

Nunca o vi passando por lá, daqui a pouco vou começar a achar que é
perseguição e que colocou um chip em mim para me rastrear. Vai que ele
contratou pessoas para me vigiar e informar o que eu estou fazendo?! Sei que
pode parecer loucura, mas é possível. Tudo pode acontecer nessa vida.

No final ainda me ofereceu carona para ir embora. Aquilo foi uma tentação, estou
andando para todos os lados desde que meu consciente se recusa à entrar em
qualquer veículo que não me faça me sentir segura. O que inclui carros aleatórios,
táxis, úberes e ônibus. Assim que se propôs a me levar em casa, eu quis aceitar,
mas eu não poderia. Vai saber o que poderia acontecer? Eu não me sentiria
segura com ele naquele carro. Inconscientemente ou não, meu cérebro disparou
luzes vermelhas por toda parte. E quando me dei por mim, meus ombros estavam
tensos e as recusas saíam pela minha boca.

Ele pode ter me ajudado, mas isso não quer dizer nada. Não posso confiar nele. A
decepção só acontece quando uma pessoa que você confia trai a sua confiança,
a sua lealdade. Sem isso, ela não existiria.

Mesmo assim, no final de tudo, eu deveria ter aceito aquela carona. Era melhor do
que sentir o medo que senti dentro de mim por todo o caminho, que no fim, se
tornou uma corrida incessante até a minha casa. Foi desesperador. Apavorante.
Como um dia nunca havia sentido.

Parecia que o medo estava no meu cangote esperando o momento certo para me
mostrar que algo ruim iria acontecer comigo. Vai acontecer. Não importa quanto
tempo passe, ele ainda vai estar bem ali respirando na minha nuca para mim não
esquecer dele. Pisar no chão do meu quarto ontem, nunca foi tão tranquilizante.
Aprender a voltar a respirar também.

Sinto medo. O tempo todo, eu sinto medo. Sinto tanto que meu corpo fica
esperando o momento em que vai dar errado. O momento que vai acontecer de
novo. É cansativo e aterrorizante. Pensar em sair de casa me causa medo. Tudo
causa medo. E tudo faz meu corpo estar em alerta e pensar em alguma maneira
de me defender.

Agora que Liam falou para Mia sobre esse segredinho sujo seu, ela não vai me
deixar em paz. Ela o amou. Dava para ver no seu rostinho depois de brincarem
juntos. Preciso preparar o meu psicológico para os próximos dias cheios de
perguntas sobre Liam Brown. Que ótimos dias eu estou tendo...

Falando no diabo, ao sair da aula da manhã de hoje, após esperar todos terem ido
e o corredor esvaziar, vejo ele encostado na porta. Isso só pode ser sacanagem
com a minha cara. “Vamos lá Maya, você consegue” repito mentalmente.

—Sério isso? Você só pode estar de brincadeira! O que está fazendo? —Digo,
irritação começando a transparecer miseravelmente contra os meus esforços.

—Te esperando, linda. —Fala com o seu tom provocativo.

—Como descobriu meu horário? —O encaro incrédula.

—Não foi muito difícil. Vamos dizer que ser capitão do time de hóquei tem suas
vantagens. —Ele sorri presunçoso, me fazendo automaticamente revirar os olhos.
Eu deveria começar a contar quantas vezes ele me faz fazer isso para cobrar o
aluguel de estresse. Cacete de “vantagens de jogador de hóquei”. Quem inventou
esse merda na pirâmide social universitária?

—Pode esperar sentado, lindo. Não vou te dar aulas. —Respondo sendo direta e
dando as costas saindo dali. O infeliz com a vida começa me seguir.

—Para onde vamos agora? —Pergunta logo atrás de mim.

—Você, se depender de mim, vai para o caramba de asa!

—Sua mãe sabe que você fala esses tipos de palavras?

—E a sua? Como consegue te suportar todos esses anos?

—É muito amor. —Suspiro antes de revirar os olhos tão forte que achei que não
fosse voltar.

—Você não tem treino?

—Tenho bastante tempo antes de ir, não se preocupe.

Suspiro mais uma vez, sabendo que hoje vai entrar para a lista dos piores dias do
ano.

… 🏒🏒 🏒🏒..🏒🏒…
..

Ele não cala a boca!

Será que tem como ficar pior do que já está? A resposta é sim, porque nesse
momento que está sentado ao meu lado na sala da minha segunda aula do dia
com uma cadeira entre nós, ele começa a xeretar minhas coisas até pegar o meu
livro. A regra número um se você é amigo de uma leitora: nunca mecha em seus
livros sem a sua permissão. Definitivamente eu quero matá-lo.

—Que capítulo é esse Hawkins? Você lê esse cabaré? Olha só, o neném não é
neném. —Folheia as páginas parando em outra.

—Tem como você calar a boca um minuto? —O encaro arrancando o livro de sua
mão.

—Você sempre é assim?

—Assim como?
—Com a língua afiada.

—E você, é sempre tão tagarela? —Pelo visto está amando essa brincadeira pois
aquele sorriso de lado aparece em seu rosto de novo.

—Só com pessoas que não aceitam à me dar aula. —Suspiro pedindo piedade
para o cara lá em cima.

Eu devo ser uma pessoa péssima em um desses multiversos para ter que ser
punida com essa tortura.

Pego um papel pequeno que acho perdido no caderno e desenho. Estico o braço,
o entregando o bilhete.

—O que é isso?

—O número de uma psicóloga para ficar ouvindo a sua voz chata falando o tempo
todo. O tema da próxima sessão é: como aceitar a derrota. —Ele abre o papel
encontrando um desenho de uma carinha mostrando a língua para fora. Ele bufa
em resposta. Mas tenho quase certeza que prende uma risada.

—A guerra ainda não acabou, linda. —Provoca. Argh, como eu odeio esses
apelidos.

Termina a aula finalmente, e vou embora para a casa largando Liam do meu pé
pela primeira vez no dia. Não aguentava mais. Quando chego estou morta de
cansaço fisicamente e psicologicamente. Vou direto para o banho, indo comer
algo logo em seguida pois não almocei, dando de cara com Riley deitada no sofá
da sala.

—Você está bem? Pelo visto o dia hoje foi difícil. —Diz assim que passo por ela.

—Coloca difícil nisso. —Falo preparando um sanduíche na cozinha.

—O que aconteceu?

—Liam Brown ficou no meu pé hoje, isso aconteceu. —Quando escuta parece que
eu falei que esbarrei com a Taylor Swifth na rua vindo pra casa.

—Espera, o Liam Brown? O famosinho e tudo mais? O que ele quer com você?
—Levanta ficando sentada no sofá, só faltava pular, sempre gostando de uma
fofoca.

—Sim, Riley, o Liam Brown. —Respondo com indiferença para toda essa reação,
me estressando apenas por lembrar desse ser existente.
—Por que ele ficou no seu pé?

—Ele quer que eu de aulas para ele, ficou zerado em uma matéria.

—Da aula pra ele ué, por que não? —Termino o sanduíche o mais rápido que
posso para acabar logo com essa conversa.

—Porque não posso. —Resmungo de volta, mas parece que não é um argumento
plausível para Riley.

—Por que não pode? Todo mundo iria querer dar aula para ele.

—Mas eu não sou todo mundo.

—Por que realmente você não quer dar aula para ele? Não vejo nenhum motivo
para negar. —Pergunta se levantando e vindo para a nossa mini cozinha.

—Porque eu fui assediada dentro de um ônibus e me sinto apavorada ao sair de


casa imaginando que vai acontecer de novo. Estou acordando mais cedo que o
normal para ir pra faculdade pois estou com medo de pegar Uber, táxi ou um
ônibus. Não consigo nem andar no corredor da faculdade direito ou ficar com
muitas pessoas em volta por muito tempo, não consigo confiar em ninguém, muito
menos em um homem. Mesmo sendo Liam que me ajudou, não consigo ficar
perto sem me sentir incomodada. Não faço a mínima ideia do que está
acontecendo comigo e como lidar com isso. Eu sinto medo o tempo todo.
—Coloco tudo para fora de uma vez. Eu precisava disso.

Ela fica parada processando tudo o que joguei em cima dela, e me sinto mal por
ter feito isso desse jeito, deveria ter falado de outra forma, contado logo no dia
que aconteceu. Ela me abraça. E não sabia que precisava tanto disso até esse
momento. Seus braços me envolvem e por segundos sinto que está tudo bem. Eu
estou bem.

—Sinto muito Maya, não posso dizer que sei o que sente porque não sei, mas vai
ficar tudo bem. Desculpa qualquer coisa e por você ter passado por isso. Eu vou
estar aqui sempre que precisar.

—Está tudo bem, obrigada. —Abraço ela de volta, me sentindo melhor depois de
hoje. Depois de explodir.

Na realidade nada aconteceu, porém nunca me imaginei passando por nada


assim, ninguém imagina, e só de pensar me sinto apavorada por isso, nem sei
como ficaria se tivesse realmente acontecido. E nem me dei o trabalho de
agradecer a Liam por isso também. E se tiver uma próxima? E se tiver uma
próxima e não estiver ninguém lá para me ajudar?

🏒🏒 🏒🏒 🏒🏒…
... .. ..

Estou no estacionamento esperando Liam sair do treino. “Mas você disse que não
iria ceder” sim, eu disse e mesmo assim estou aqui.

Por mais que eu seja orgulhosa as vezes, isso já está começando a passar dos
limites. Mia não vai parar de me pedir para ajudar Liam, fala que estou sendo
malvada com ele e que é muito legal. Então além de aturar Liam, vou estar
aturando Mia com isso também.

Sem falar que passei o dia inteiro sendo perseguida por esse babaca enorme por
todo o campus da universidade. Recebi olhares o dia inteiro, quem aguenta? Já
estou cansada! Então quanto mais rápido eu fizer, mais rápido isso acaba.

Óbvio que não vou fazer isso de graça.

Encostada em um carro, avisto Liam saindo com mais três colegas de time
aparentemente, com uma bolsa esportiva pendurada em seu ombro por cima da
jaqueta do time. Ele me vê e vem em minha direção deixando os meninos para
trás.

—Eu aceito te dar aulas, mas não vai sair de graça. —Digo assim que se aproxima
de mim fazendo uma chama de vitória se acender no seu rosto com aquele seu
sorrisinho de lado irritante.

—Pra quem disse que não queria nada de mim, isso está bem contraditório.

Já estou começando a achar que foi uma péssima ideia vir aqui.

—Vamos fazer isso, ou você vai ficar de graça? —Ele ergue as mãos em sinal de
rendição.

—A professora Smith passou um trabalho que vou ter que escrever sobre a
temporada de hóquei e os bastidores, deve estar sabendo. Em troca das aulas vai
ter que me ajudar nessa. —Explico séria tentando ser breve com essa conversa
que está corroendo meu orgulho por dentro.
—Fechado. Como você quer fazer?

—Podemos combinar o horário conforme as aulas irão acontecendo.

—Por mim tranquilo.

—E sem atrasos ou cantadas baratas na aula. —Ele solta uma risada com a minha
fala que foi, na verdade, bem séria.

—Acha que eu iria flertar com você?

—Você é jogador de hóquei, e um idiota. Isso significa pegar qualquer coisa que
use saía nesse campus.

—Correção, eu pego qualquer uma que me interesse. Mas pode ficar tranquila,
linda, você não é uma delas.

—Só queria deixar isso garantido. Porque é um alívio saber que não vou precisar
ferir seu ego quando eu fosse te recusar.

—Todas falam isso, mas no final, ninguém recusa.

—Caso não tenha percebido, é a única coisa que tenho feito nos últimos dias.
—Ergo um sorriso vitorioso. —Te vejo na semana que vem. —Giro de costa
começando a me afastar dele.

—Você quer estudar na biblioteca? —Liam pergunta me pegando desprevenida e


impedindo de ir embora.

—Claro.

Trocamos nossos números de celular para podermos nos comunicar mediante as


aulas e os horários. Nem acredito o que fiz até chegar em casa e perceber a
merda que vai ser.
Capítulo 6

MAYA

Se arrependimento matasse, eu deveria estar morta.


Estou esperando Liam sentada em uma das mesas na biblioteca para nossa aula
como o combinado, não tenho muito tempo para pensar nisso porque ele logo em
seguida aparece.

Acho que estava tão ocupada pensando o quanto é irritante, que ao passar pela
porta da biblioteca começo a me dar conta que não é à toa que todas as meninas
dessa faculdade molham as calcinhas para ele.

Ele está vestindo uma blusa com a jaqueta do time por cima, mas ainda sim da
para perceber o seu porte físico de jogador por baixo, os ombros largos e os
braços fortes cobertos de músculos, dando o estereótipo de um brutamonte
comparado à alguém normal com seus uns 1,88 no mínimo de altura. Ele tem
nada de menino em seus traços, é um homem completo. Seus cabelos e olhos
castanhos escuros combinam com sua pele dourada levemente e sua mandíbula
marcada.

Percebo que não sou a única na biblioteca que parou para reparar em Liam ao
virar meu rosto e ver até a bibliotecária parecendo precisar de um balde de tanta
baba. Faço uma nota mental de nunca mais fazer isso.

Já prevejo tortura.

—Pronto para começar essa merda? —Se senta na cadeira ao lado deixando uma
distância razoável entre nós.

—Pronto.

Deslizo um livro para Liam aberto em uma página. Vamos começar pela base da
matéria para conseguir entender melhor quando avançarmos para as partes mais
complicadas.

—Vamos começar pela base para ver como você está e revisamos tudo depois.

—Tudo bem.

—Quero que leia e faça um resumo. —Ordeno.

Ele me surpreende ao pegar o livro sem questionar e começar a ler, abrindo


depois o caderno em uma página em branco escrevendo o resumo que pedi para
fazer. Concentrado e focado em cada detalhe, como se cada mínima letra fosse
importante. Não achei que fosse levar isso a sério, para mim, jogadores de hóquei
só se importam com um disco e eles mesmos.

Tinha certeza que eles nem precisavam se esforçar com a universidade sempre
mexendo os dedinhos para seus gloriosos jogadores não ficarem no banco. Todo
mundo sabe disso, eles ganham nota como se fossem balas sendo distribuídas.
Uma grande injustiça.

—Terminei. —Empurra o caderno em minha direção. Paro de ler o livro em minhas


mãos, o colocando aberto em cima da mesa, vendo o que escreveu.

—Muito bom, não esperava por isso.

—Está falando sério?


—Não me surpreenderia nem um pouco se tivesse me ignorado e feito nada. —E
me surpreendendo mais ainda com o fato de que as palavras estão escritas
gramaticalmente corretas.

—Sou jogador de hóquei, levamos a sério o que fazemos.

—Eu aposto que sim. —Falo de forma irônica.

—Quer provar para ver? —Provoca.

—Para quem disse que não iria flertar comigo, isso está bem contraditório.
—Sorrio provocativa em resposta, usando a sua frase de dias atrás contra ele
mesmo.

—Desculpa aí, estressadinha.

Passamos o resto do tempo revisando os pontos mais importantes e que Liam


precisava. Tivemos que parar cinco vezes por causa do senhor molhador de
calcinhas e suas fãs em cima como um bando de urubus. É a sexta no momento
que meu limite explodiu.

—Com quantas delas você transou? —Perguntou irritada com essa palhaçada de
garotas.

—Com nenhuma. —Mesmo em nenhum momento sendo ele que deu a iniciativa
ou sequer correspondendo, não acredito nenhum pouco que isso seja verdade.
—Está interessada demais em minha vida e se estou flertando com você ou não,
Hawkins.

—Acho que você deveria tomar cuidado, o seu cérebro está falhando. —Rebato.

Faço um questionário de perguntas até ver que entendeu tudo e que podemos
encerrar a revisão.

—Na próxima aula nós começamos a matéria pra valer. —Levanto da cadeira
pegando minhas coisas em cima da mesa.

—Certo, tenho que ir para o treino. —Se levanta em seguida, ficando em pé de


frente para mim.

—Vou querer passe livre para eles e para os jogos, é a sua parte do acordo.
—Lembro.

—Quer tanto assim me ver jogar? Me sinto lisongeado.

—Hahaha, muito engraçado. —Riu sarcástica. —Como se você fosse o melhor.


—Eu sou o melhor.

—Só na sua cabeça. Sabia que seu ego é muito grande?

—As vezes, e você sabia que tem sempre a resposta na ponta da língua?

—As vezes. —Dou a mesma resposta que me deu em um tom provocativo.

—Até mais, Hawkins. —Despede me encarando com aquele seu olhar que usa
todas vezes que quer me provocar.

Ele sai andando atraindo todos os olhares para si e penso que não vai ser tão ruim
assim dar aulas para ele, esperava que fosse bem pior. Aliás, não é como se
fôssemos sair disso.

LIAM
Estou pensando seriamente em falar para as nossas aulas serem na minha casa.

Pedi para ser na biblioteca porque não sabia como iria se sentir sozinha comigo
ou em um lugar com quatro homens claramente maiores que ela. Estamos na
nossa segunda aula e as meninas não param de nos interromper. De novo. E pela
expressão visível no rosto de Maya, ela claramente está à um fio de puxar o
cabelo de algumas delas.

Os meninos apelidaram elas de maria patins, a maioria normalmente só quer ficar


com a gente pelos nossos status de jogadores de hóquei. Elas faltam se jogar em
cima de nós. Acho que nunca vi a biblioteca tão cheia e eu nem venho aqui, não
estou dizendo isso no sentido de parecer um babaca, mas eu sei as vantagens
que tenho e a minha influência.

Dessa vez quem vem nos interromper é Olívia, uma das meninas da fraternidade
Phoenix que fiquei uma vez e agora não larga do meu pé. Ela foi transferida de
universidade há um ano atrás, ninguém soube o motivo mas, pelos boatos não foi
a primeira vez que isso aconteceu. Fora o tanto de problema que já arranjou com
as próprias meninas da fraternidade Phoenix.

—Oi gatinho, faz tempo que a gente não se vê. —Diz ao se aproximar de mim sem
parecer notar Maya bem ao meu lado sentada na cadeira.
Olívia é bonita, tem cabelos ruivos com os olhos verdes e sardas pelo nariz, foi
bom quando ficamos, mas a partir do momento que resolveu virar um carrapato
comigo, eu só quero distância.

—Ando muito ocupado.

—Mas a gente pode dar um jeitinho nisso qualquer dia. —Ela apoia as mãos na
mesa se inclinando para frente.

—Obrigado Olívia, mas não to no clima. —Dispenso, à observo tentando mandar


um sinal que diga “não to a fim, então larga do meu pé”, mas é Olívia, e
obviamente não vai entender.

—Vamos lá, Liam, você sempre está no clima. —Ela sorri se inclinando mais para
cima de mim. É verdade, eu sempre estou no clima.

—Eu tô ocupado agora, eu agradeço se pudermos falar disso depois.

—Para de fazer...

—Com licença, ele já disse que está ocupado, então, se você puder se retirar eu
agradeço, acho que você consegue manter sua calcinha no lugar até lá.
—Hawkins a interrompe a fazendo perceber sua presença pela primeira vez desde
que chegou. Da para ver em sua expressão que está cansada das interrupções.

Olívia à encara como se a quisesse matar com o olhar, retira suas mãos da mesa
deixando de se inclinar, virando e saindo andando da biblioteca sem argumentar.
Pela forma que seus pés batem no chão, não gostou nem um pouco do que ouviu.

—A próxima aula vai ser em outro lugar, isso está ficando ridículo. —Resmunga.

—Sim, senhora. —Levanto as mãos em sinal de rendição ouvindo ela suspirar.


—Por essa eu não esperava. —Riu alto atraindo olhares seguidos de vários
“shius”.

—Bem melhor do que essas desculpinhas esfarrapadas que você disse. —Não se
contendo, solta uma pequena risada.

—Olha, ela sabe rir. Faz de novo pra mim tirar uma foto?!

—Eu riu sempre, só que normalmente não para você.

—Pois deveria, eu gostei de ver.

—Sem flertes. —Avisa.


—Não estou flertando. —Me defendo.

—Coitada da sua namorada com essas meninas em cima de você. —Muda de


assunto.

—Eu não sou do tipo de namorar.

—Por que será que isso não me surpreendeu?! —Bufo com sua resposta.

—E você, já namorou? —Viro o jogo para ela.

—Não.

—Então, não pode falar de mim. —Ela suspira e damos sequência com à aula.

Avançamos na matéria e no fim ela me passa mais uma lista de exercícios simples
para eu começar a praticar. Quando acabamos, proponho o que estava pensando
antes de Olívia aparecer.

—A próxima aula pode ser na minha casa se você não se importar. —Em pé,
observo ela fechar o livro que estava lendo e arrumar as coisas, esperando por
uma resposta.

—Tudo bem. —Responde com os ombros um pouco mais tensos do que o normal
para uma simples pergunta dessas.

—Por que está sempre com um livro na mão? —Tento a distrair mudando de
assunto mesmo que por pequenos segundos.

—Porque gosto de ler. —Fala de forma óbvia.

Com suas coisas ajeitadas ela se levanta e, no momento que está preste a pegar o
livro em cima da mesa eu o pego sendo tarde demais, vendo aqueles olhos
castanhos entrarem em chamas ao me ver virar o livro e ler a sinopse.

—Jogadores de basquete? Sério Hawkins? Estou desapontado. —Começo a ler


sentindo ela largar suas coisas, vindo para cima de mim com a intenção de tirar o
livro das minhas mãos.

—Me dá Liam! —Ela ordena.

—Bem que eu queria te da, linda, mas hoje eu tô ocupado, podemos fazer isso
outro dia. —Provoco a vendo perder a paciência esperando eu entregar o livro,
viro ficando de costas para ela já que sou bem mais alto, impedindo de o retirar de
mim.
—Como se isso fosse acontecer, me dá o livro! —Frisa a palavra livro.

Percebendo que não vou entregar, ela esbarra em mim de leves esticando o braço
e o puxando da minha mão.

—Atrapalhou minha leitura, Hawkins, aposto que não iria gostar se fosse você.
—Viro de frente para ela novamente não deixando de reparar que é a primeira vez
que estamos tão próximos, acho que ela não percebe, senão já teria se afastado
—Deve ser por causa desses livros que não gosta de jogadores de hóquei.

—Sim.

—Okay, me senti ofendido agora. Vou te denunciar por discriminação.

—Desculpe se nem todas estão aos seus pés, Brown.

—Tudo bem, nem todo mundo é perfeito. —Revira os olhos com um pequeno
sorriso lutando para aparecer em seu rosto. —Não se esqueça que vai ter que
acompanhar nossa temporada, já está com passe livre garantido. Até o fim você
muda de ideia.

—É o que vamos ver. —Me encara.

—Vai ao nosso jogo contra os Eagles? —Ela me olha como quem diz “sério que
você está fazendo essa pergunta?”.

—Não é como se eu tivesse muita opção. —Suspira. —Vou chamar Riley pra ir
comigo.

—Riley?

—Uma amiga minha que divido o apartamento.

Acho que algo a faz dar um estalo, porque logo em seguida se afasta e pega suas
coisas, dando um fim a nossa conversa.

—Preciso ir. —Declara.

—Até a próxima, preconceituosa. —Revira os olhos saindo andando até a porta da


biblioteca.

Enquanto está andando reparo em seu corpo pela primeira vez desde que nos
conhecemos. Maya não é nenhuma modelo da Victoria Secrets, mas ainda é de
deixar qualquer um excitado com todas aquelas curvas e carne para pegar.
Pequena e compacta.
Sua cintura é mais larga, diferente das outras garotas que tem uma cintura fina, o
que me chama mais atenção, é magra, mas não é totalmente seca, com coxas
grossas, uma bela bunda e seios na medida, nem grandes nem pequenos. O
tamanho certo para caber na minha mão.

Maya Hawkins é linda pra caralho.

Deixou que ficasse tão perto mesmo que por pouco tempo, isso nunca havia
acontecido antes desde o dia no ônibus. Evito falar desse assunto com ela.
Acredito que qualquer um se sentiria incomodado e não sei se está pronta para
falar sobre isso, principalmente com alguém como eu. Se não tocar nesse
assunto, eu não vou a forçar.

A caminho de casa após sair do campus decido avisar para os meninos no nosso
grupo que minhas próximas aulas serão na nossa casa.

Eu: Aviso importante. Minha professora particular irá para nossa casa nas
próximas aulas.
Dylan: Ela é gata?
Eu: Ela não é para o seu bico, idiota.
Dylan: Deve ser gostosa se está falando isso.
Nick: Gosto de garotas inteligentes :)
Luke: Deve ser dura na queda já que não caiu na lábia do Liam.
Eu: Nada de xavecos ou flertes, se comportem! Deixem a cabeça de baixo presa
dentro da calça.
Nick: Nossa, não precisa ficar bravo.
Luke: Que sem graça.
Eu: Ninguém vai dar em cima da minha professora, entendidos?
Eu: Quero que todos mandem “estamos todos de acordo”.

Todos enviam uma mensagem dizendo “estamos todos de acordo” com um emoji
de carinha sem graça e dedos do meio. Mesmo sabendo que os caras não
forçariam nada, prefiro não correr o perigo com Maya. Não quero que se sinta
desconfortável ou desista do acordo.
Capítulo7
LIAM

Bruce Walker é um ogro.

Não contente que sua estrelinha não iria poder jogar, o Stanley arrumou um outro
para o lugar. Estou falando de um metro e noventa e seis de altura e cem quilos de
pura brutalidade, o que vai lhe render um lindíssimo contrato.

Isso se a liga ignorar o tanto de faltas que comete em um único jogo. Já foram
cinco faltas na partida, o que uma delas nos deu cinco minutos a mais, um
benefício valioso que nos permitiu empatar com uma jogada iniciada por Dylan
roubando o disco e o repassando para Nate que fez uma lindíssima assistência
para Nick, que jogou o disco para dentro da rede.

O único erro foi Nick comemorar passando em frente a torcida adversária e do


banco de reservas, agora Walker está determinado a acabar com a nossa raça.

Falta apenas um minuto, é a nossa última jogada.

O meu corpo é esmagado por Walker no vidro de proteção do ringue, sentindo o


meu cérebro ser espremido junto com meu corpo, encontro um último fio de força
e tiro o disco, conseguindo usar a última gota de raciocínio que me resta para o
assistir cair no taco de Luke que encara o marcador e passa para Nate, fazendo a
luz se acender com o som indicando que o segundo período acabou. Sinto a
adrenalina em minhas veias aumentar a mil, nunca me canso dessa sensação.

Desde a primeira vez que coloquei meus pés no gelo eu soube que era isso que
eu queria, estar nas arquibancadas torcendo não se compara a estar aqui
patinando. Meus pais me colocaram quando criança para eu poder fazer um
esporte, foi assim que me apaixonei pelo hóquei, só que meus pais não contavam
que eu iria querer viver para isso.

Eles são os típicos que queriam que o filho se formasse, conseguisse um bom
emprego e tivesse uma vida bem sucedida, o que as vezes muitos pais não
querem. Quando contei que queria viver disso, eles ficaram sem reação no início,
mas aceitaram a ideia com o tempo.
Fizemos um acordo que me dedicaria aos estudos e ao esporte; se conseguisse
um bom contrato com uma liga, ótimo, senão der certo, vou seguir em frente e
encontrar um bom emprego como o planejado.

A pressão é grande querendo ou não. O medo de não conseguir alcançar o que eu


quero, de me esforçar, dar tudo de mim e ainda não ser o suficiente. Eu não ser
bom o suficiente, não ser capaz.

Porém, não posso reclamar, mesmo meu pai sendo ausente temos uma boa
relação hoje, ele assiste aos meus jogos e torce por mim. Diferente dele, minha
mãe sempre esteve lá para tudo, já que meu pai estava sempre ocupado demais,
ela foi os dois. Fez de tudo para que nunca me sentisse jogado de lado mesmo
sendo inevitável, e não é sua culpa.

Ela é única mulher que amo. Vive esperando o momento que vou aparecer em
casa com uma namorada, mas com toda carreira que quero seguir não tenho
espaço para isso, e não é porque tenho medo de acabar perdendo o foco.

Como vou construir uma família viajando o tempo todo por causa dos jogos? Não
quero ser ausente igual meu pai foi, não quero deixar esse vazio nas pessoas que
vou amar e me amar de volta igual eu senti. Só quem vive sabe como isso é.

A dor de estar longe de quem ama é indescritível, e não quero ser o culpado por
isso, por não estar lá quando precisarem. E se nessas viagens algo acontecer? E
se eu não aguentar e acabar fazendo merda? E se eu não for bom para eles? E se
eu não conseguir fazer dar certo? É disso que tenho medo. São muitos “e se”.
Prefiro deixar esse sonho de lado do que o concretizar e o destruir depois.

Vamos para o vestiário no intervalo com uma vantagem de um ponto sobre o


adversário. Todo mundo está aliviado, mas o treinador Porter não deixa ninguém
desfocar. Poderíamos estar goleando o adversário, ele ainda iria apontar nossos
erros na partida. Ele não deixa ninguém tirar o pé do chão.

—Quem deixou eles fazerem gol? Não era nem para eles pegarem na porra do
disco. Dylan, que caralho você está fazendo? Tinha um buraco gigante na defesa.
Luke, o 35 está fazendo você de idiota, viu o que Liam fez? É isso o que eu quero,
raça. Nate e Nick quero mais jogadas daquela, nada de descanso. O jogo ainda
não acabou.
Apesar do treinador nos criticar até espumar a boca, ele sabe elogiar quando
merecemos. Sabemos o quanto vale um elogio seu, no geral, é um ótimo
treinador, frio e durão.

—Isso aí vai ficar feio. —Fala Peter, nosso goleiro, com consideração sentado do
meu lado ao me ver levantar a camisa para checar o hematoma. Estou começando
a ver o tom roxo aparecendo na minha pele.

—É bom sentir dor. —Mesmo assim admito que foi uma surra bem dada do
Walker, fazia tempo que não levava uma dessas.

Ouço as palmas do treinador nos chamando para voltar ao ringue, tiramos os


protetores de lâminas e seguimos em fila pelo túnel. Sinto um olhar sobre mim ao
sentir o deslizar das lâminas no gelo, mas não paro para ver quem é o dono, no
momento em que piso no gelo, é apenas eu e o disco.

O terceiro período é intenso. Os Eagles buscam uma virada e nós uma decisão.
Estão em desespero para não serem eliminados. Dylan e Luke lutam para não
deixar os atacantes chegarem próximos da nossa rede.

Sinto o meu cabelo molhar com o suor escorrendo pelo meu rosto.

A defesa dos Eagles está totalmente desorganizada, os caras dependem de todos


os jogadores para não nos deixar atacar e do goleiro para defender.

Dylan entra em um embate com o Walker de um contra um pelo disco atrás do


gol, ganhando e passando para o Nick que sai disparado comigo e Nate
acompanhando para a zona de ataque no campo inimigo com todos do time atrás
desesperados. O disco cai em mim que faço a luz no fim do túnel se apagar com
uma tacada de longe em direção as redes. Vejo o cronômetro zerar sinalizando o
fim do jogo com 3x1. Ganhar em casa é muito bom!

No vestiário todos estão de bom humor com a vitória de hoje. Até agora sem
nenhuma derrota, estamos confiantes que essa temporada é nossa.

—“If you say that you are mine, I'll be here till the end of time”. —Canta Adam de
toalha usando um desodorante como microfone com a caixinha de som tocando
ao fundo.

—“So you got to let me know. Should I stay or should I go?”. —Continua Nate
usando a deixa fazendo cada um do time cantar a seguinte.

Nick canta fechando a mão colocando próxima a boca:


—“It's always tease, tease, tease”.

Agora é Brandon que joga um braço em volta do ombro de Nick e puxa sua mão,
que está sendo usada como microfone, para ele:

—“You're happy when I'm on my knees”.

—“One day is fine, the next is black”. —Eu continuo dessa vez.

—“So if you want me off your back”. —Dylan e Stephen cantam juntos apontando
um para o outro.

—“Well, come on and let me know”. —Luke segue.

—“Should I stay or should I go?”—Todos do time começam a canta juntos


fazendo parecer que estamos no meio de um karaokê, com todos seminus.

—Que porra de caralho é isso? —Diz o treinador entrando no vestiário


interrompendo a música, pegando todos os seus jogadores seminus cantando
pensando ser o One Direction. — Todo mundo para o banho, já!

Sigo para o chuveiro com todo mundo ainda comemorando a vitória. Somos uma
equipe dentro e fora do ringue, isso é essencial para o nosso bom desempenho
nos jogos. Estar conectado e ter um bom relacionamento em equipe faz muita
diferença, e eu zelo muito por isso.

Deixo a arena com o cabelo molhado, roupa trocada e a bolsa de esporte pendura
em meu ombro, indo guardar no carro para comemorar com os caras no bar do
The Five. Toda a galera do campus vai para lá, principalmente após uma vitória.

Acho que hoje eu mereço relaxar um pouco.


Capítulo 8

MAYA

No domingo minha mãe me liga para a nossa conversa semanal como é de


costume.
Durante a semana trocamos apenas algumas mensagens como uma boa mãe
preocupada. Fica muito difícil nos falarmos devido aos meus horários, mas os
últimos dias foram tão corridos que nem mensagens trocamos, já estava sentindo
falta de falar com ela. Sempre tive uma boa relação com meus pais, eles
procuravam sempre estar por dentro do que estava acontecendo e insistiam que
estariam abertos para conversar, mostrar que minha opinião e participação em
suas vidas é importante.

Sinto uma falta imensa deles. Infelizmente não consigo estar frequentemente os
visitando devido a distância entre o campus e a cidade em que moram, além de
ter que guardar dinheiro. A última vez que os vi foi no último ano, desde então,
não nos vimos, mas me esforço sempre para estar nos feriados de fim de ano.
Normalmente viajávamos no ano novo para o Brasil já que o resto da família de
ambos moram lá.

—Oi minha linda. —Ouço a voz da minha mãe através do telefone como um
abraço quente nos dias frios.

—Oi mãe. —Estou sentada no sofá enrolada no cobertor assistindo a TV que está
passando qualquer coisa que coloquei.
—Como está as coisas indo por aí?

—Estás tudo bem, teve uma prova surpresa que fui bem, mas o resto da turma
reprovou.

—Meu Deus, matéria muito difícil?

—Mais ou menos, o professor que gosta de pegar pesado mesmo.

—Que bom que você foi bem.

—Como está o papai?

—Está bem, o mesmo de sempre. Vive dizendo que você não liga pra ele e que ele
tem data de validade. —Riu ao telefone me lembrando que sempre falava coisas
assim quando ainda morava com eles.

Papai sempre foi dramático e carente, mas não o troco por nada, mesmo isso
sendo irritante as vezes.

—Tem falado com seu irmão?

—Sim, trocamos mensagens. As vezes eu sinto falta dele.

—Ele pode não dizer, mas você sabe que ele sente também, você conhece seu
irmão. —Sim, eu conheço.

Matthew é seis anos mais velho. No começo não nos dávamos bem, mas depois
conforme fui crescendo, nos tornamos bons amigos, verdadeiramente irmãos.
Fazíamos um monte de coisas juntos e momentos só nossos. Nunca imaginei que
pudesse sentir tanta falta daquele mimado.

—Tem alguma novidade?

Faço uma pausa e decido não contar o que houve nos últimos dias. O quase
incidente (como decidi chamar), o trabalho, Liam, tudo. Não quero preocupa-lós,
sei como ficariam e isso só iria piorar tudo agora, então, essa é a melhor decisão a
ser tomada por enquanto. Pelo menos até eu sentir que voltei ao normal.

—Não, tudo normal por aqui. —Minto.

—Sério? Não tem ninguém em quem esteja interessada? —Volta a perguntar.


Sempre falamos de tudo abertamente, sem tabu nem nada. Gosto disso. Gosto
como podemos abordar qualquer assunto sem preocupações.

—Não mãe, você sabe como eu sou.


Não sou fã de ficar com muitas pessoas e paquerar, nunca fui, principalmente
quando estou focada em algo, como a faculdade nesse momento. Mamãe sempre
incentivou, fala que é a melhor parte de estar apaixonada.

Sempre fui intensa em relação a sentimentos. Paquerei alguns meninos, mas


nunca dei esperanças, pelo contrário, falava que não queria algo sério e fazia de
tudo para controlar o que for que eu estivesse sentindo, e não deixarem eles
saírem do meu controle. Porque sou assim, aprendi a não gostar de sentir.
Sentimentos são complicados para mim. São intensos demais. Não consigo
entendê-los.

Até chegar um momento que a Maya do passado decidiu que seria apenas um.
Um único namorado, um único beijo, um único cara a apresentar para família... um
único que ela iria se permitir ser vulnerável e sentir. Não queria ter que lidar com
corações partidos, lembranças manchadas e um “eu te amo” que não faria mais
sentido depois. Se fosse para se entregar para alguém e se tornar vulnerável, seria
para uma única pessoa, uma pessoa em que ela confia, e iria querer tudo o que
fosse permitido. Eu me conheço, sei como eu sou, e por isso essa é a melhor
opção. Idiotice? Talvez, mas não pra mim.

Então, ela decidiu esperar que esse alguém aparecesse. A pessoa que iria mostrar
que vale a pena se arriscar. A pessoa certa para ela. A pessoa ainda não apareceu.

Conversamos por mais algum tempo, voltando a falar sobre papai e meu irmão,
colocando o papo em dia antes de dizer que tinha que desligar o telefone.

Ao terminar, vejo Riley passar pela porta do seu quarto com um papel todo
dobrado na mão, vindo se sentar ao meu lado no sofá com sua expressão
aparentemente concentrada beirando ao estresse. Seu passatempo favorito é
fazer todos os tipos de dobraduras fofas que vê. É a primeira coisa que associo a
ela quando se trata de coisas que ela gosta.

—Eu desisto! —Fala após segundos de se sentar, largando o pedaço de papel no


sofá entre nós.

—Desistiu do que?

—Eu tô tentando fazer uma dobradura de flor a uma hora! Tá ficando horrível.

—Que pena. —Lamento. Ela ri parecendo agora mais calma.

Perdi a conta de quantas dobraduras já fez e quantas tenho perdidas em meu


quarto. Eu amo todas que faz, uma mais legal que a outra, acho que é a única
pessoa que eu conheço que gosta e não se estressa fazendo isso, na verdade,
essa foi a primeira vez que aconteceu, mesmo sabendo que mais tarde vai voltar a
tentar até a flor sair do jeito que quer.

—Ei, o que estava fazendo?

—Tava falando com minha mãe no telefone.

—Como ela está?

—Bem, perguntou de você. —Abre um pequeno sorriso.

—Você contou para ela? —Se vira em minha direção perguntando.

Faço uma pausa antes de responder, engolindo em seco. —Não.

Não é um assunto que eu quero lembrar. Não é um assunto que quero ouvir as
palavras “mãe” e “contar” na mesma frase.

—E quando pretende?

—Não sei, talvez nunca?!

—Olha, eu te entendo. Mas, se eu fosse mãe e minha filha tivesse quase sido
abusada, eu iria querer saber, não acha?

—Não use essas palavras juntas na mesma frase de novo, por favor. —Peço
olhando em seus olhos. —Não posso fazer isso. Não quero preocupa-los.
Passaram muito tempo se preocupando comigo e meu irmão. —Assente em
silêncio voltando-se para frente.

—Vai assistir ao jogo? —Fala dando fim ao assunto.

—Claro, tenho que ver meu time dando show em quadra. —Aproveito a brecha
para fingir que não tivemos essa conversa.

—Acho que você é a única garota que eu conheço que é apaixonada por
basquete.

—Poucas pessoas têm bom gosto como eu. Vai querer assistir comigo?

—Tem jogador bonito?

—Eu particularmente acho o Curry e o Jordan Poole bonitos. —Sorrio.

—Vou acreditar em você. —Coloco o jogo na TV que começou à alguns minutos


atrás, está quase no fim do primeiro quarto.
O meu esporte favorito sem sombras de dúvidas, apesar de amar futebol também.
Acompanho a temporada do Brasil e um pouco da Europa, a maioria das vezes os
horários não batem sendo que estamos uma hora a frente e meu trabalho na
escola junto aos estudos me ocupam a maior parte do dia. Mas sempre estou
acompanhando pelas redes sociais o que está acontecendo.

Assisto o jogo até o final, sentindo toda aquela emoção e adrenalina que me
fizeram me apaixonar pelo esporte, Riley mesmo não entendendo nada fica até o
fim assistindo comigo.

Fiquei surpresa que consegui a arrastar para ir assistir ao jogo contra os Eagles, e
que também consegui ficar bastante tempo. Assisti ao segundo e terceiro período,
porém foi um sacrifício para conseguir ir e ficar com todas aquelas pessoas em
volta e a aglomeração na entrada e saída. Ainda bem que Riley foi comigo, caso
contrário não sei como seria.

Capítulo 9

LIAM

Eu estou parecendo um idoso descendo às escadas.


A minha costela direita inteira está com o tom roxeado e doendo para um cacete,
fazia tempo que não levava uma dessas nessa região.

Abro a geladeira pegando um saco de ervilhas congeladas e pressionando contra


o machucado. Enquanto a fecho, escuto uma batida na porta. Hoje combinamos
da aula ser mais tarde do que normalmente.

Hawkins chega lá para as seis da tarde parecendo um pintinho molhado com sua
capa de chuva amarela por cima da calça legging e blusa, com seus cabelos
castanhos encharcados. Quanto tempo minha soneca durou? Está caindo uma
tempestade lá fora. Corro para o banheiro para pegar uma toalha e a entrego,
vendo se secar depois de ter tirado sua capa ainda próxima a porta.
—Está muito feio? Parecia ter doído bastante. —Pergunta secando os cabelos.
Abaixo os meus olhos vendo uma das minhas mãos ainda segurando o saco de
ervilhas, o removo mostrando para ela.

—Já tive piores. —Falo vendo sua careta ao visualizar como ficou. —Então você
foi? Não achei que realmente fosse.

—Nem eu achei. Vale a pena, tudo isso?

—Pode apostar que sim. A adrenalina, a torcida gritando, as lâminas no gelo.


Acredite, umas porradas não valem nada comparado.

—Como você começou nisso?

—Meus pais são do tipo que queriam que eu fizesse de tudo um pouco. Então me
colocaram ainda pequeno, e desde então, nunca parei.

—Então, essa é a sua paixão não é?

—Com toda a certeza. —Respondo sem pensar duas vezes.

—Podemos trabalhar um pouco no meu trabalho hoje? Me falar algumas


informações do jogo, os bastidores, etc. —Pergunta casualmente.

—Por mim tudo bem, temos mais algumas aulas antes da segunda chamada.

Ela me entrega a toalha, que coloco de volta no banheiro, e em seguida subimos


as escadas para o meu quarto no segundo andar. Seu corpo parece estar
desconfortável ao ambiente, a tensão discreta presente nos ombros, a coluna
rígida e o jeito acanhado perceptível estão ali. Sua expressão é de nervosismo,
como se estivesse internamento pedindo por ajuda.

Sentamos ambos na cama sem nenhuma outra opção, mesmo percebendo em


sua expressão uma certa dúvida. Trabalhamos em sua tarefa durante um tempo,
comigo fornecendo informações dos bastidores do jogo, respondendo suas
perguntas, lembrando uma entrevista. Porém, Maya faz de tudo para não ser uma,
tentando parecer uma conversa descontraída entre dois amigos que gostam de
hóquei, o que me faz lembrar de uma coisa.

—Você nunca tinha me perguntando sobre hóquei antes. Você é a primeira,


normalmente, é o primeiro assunto que tentam puxar comigo.
—Não gosto muito de hóquei. —Admiti automaticamente, como se não tivesse
acabado de cometer um pecado capital, concentrada anotando as últimas
informações em seu bloquinho.

—Impossível alguém não gostar de hóquei. —Afirmo.

—Já andei de patins, mas nunca precisei carregar um disco com um taco, então,
perdão se apenas assistir não é tão emocionante. —Levanta a cabeça parando de
escrever e me olhando nos olhos.

—É isso o que você acha? Mesmo assistindo ainda é emocionante.

—Sim, é o que eu acho. E sua afirmação está errada, prefiro um jogo de basquete
que tem bem mais emoção.

—Sério Hawkins, estou muito decepcionado, não esperava isso de você. Vamos
ter que rever a nossa amizade. —Coloco a mão no peito fazendo meu típico
drama. Por favor, alguém me contrata.

Mas isso não deveria ser considerado um drama, porque sério, basquete mais
emocionante? No mínimo eles estão no mesmo nível. Ela abre um sorriso ao ver o
que estou fazendo. Como eu amo quando sorri.

—Sei que tem que ter diversas habilidades, técnicas e muito treinamento, mas não
acho nada demais.

—Okay, temos que mudar isso. —Digo apontando o dedo indicador para ela
como se estivesse prometendo. —E porque justo o basquete? —Franzo a
sobrancelha.

—Só de você assistir ao jogo em casa pela TV é uma sensação incrível. Eles
dando a vida em quadra, como o placar pode mudar em apenas alguns segundos,
a adrenalina não termina até ouvir o som do apito final.

—Você já foi em um jogo ao vivo?

—Não, quero conseguir ir um dia.

—Então você foi em um jogo ao vivo de hóquei, mas nunca em um de basquete, e


ainda diz que basquete é melhor? —Meu tom de indignação ressai.

—Sim.

—Tá bom, nossa amizade termina aqui Hawkins, sinto muito.

—A verdade dói Brown.


—Tudo bem, eu cedo, mas para mim te perdoar vai ter que responder a uma
pergunta muito, muito, muito importante. —Ela me encara pedindo para
prosseguir. —Qual seu time de basquete?

—Golden State Warriors.

—Definitivamente a nossa amizade acabou. —Começa a rir soltando a melhor


risada que já ouvi na minha vida.

—Aposto que é torcedor do Boston Celtics para estar falando uma coisa dessas.
—Supõem em meio a suas risadas gostosas.

—Acertou, minha linda. —Revira os olhos para mim, ainda com a sombra do
sorriso esticando os lábios.

Apesar de hóquei ser minha paixão, gosto de acompanhar outros esportes, e o


basquete é um deles. O meu esporte favorito depois do hóquei.

Ouço um rugido tão alto que fico em dúvida se é minha barriga ou um terremoto.

—Parece que alguém está com fome. —Comenta.

—Faminto. Normalmente sou eu quem cozinho, então estava pensando em fazer


pizza, quer me acompanhar? Podemos assistir algo.

Ela fica surpresa com o convite, até eu estou surpreso com o convite, mas uma
companhia não iria fazer mal agora. Os meninos foram em uma festa por aí no
campus, mas não estava a fim de me juntar a eles e também tinha meu
compromisso com Hawkins. Em geral, não sou muito de ir à festas durante a
temporada, uma vez ou outra apenas.

—O que está pensando em assistir?

—Tem uma série, Game of Thrones, que estava pensando em começar, mas
nunca tenho tempo.

—É aquele seriado sobre uma guerra de época medieval?

—É um jogo mortal para assumir o trono, dizem que é muito boa. —Ela me olha
relutante entre ir ou ficar, então tento ajudá-la a decidir.

—O que tem para fazer hoje a noite?

—Nada, minha amiga de alojamento está com o namorado, então ia acabar


procurando algo para fazer.
—Melhor ficar aqui, sem falar que está caindo uma tempestade lá fora.

Ela olha para a janela do meu quarto e confirma o que acabei de dizer dando fim a
indecisão dentro de si.

—Gosta de pizza de que? —Pergunto a ela assim que seus olhos voltam para mim
novamente e começo a sair do quarto. Sei que está vindo atrás mesmo sem
precisar me virar.

—Com bastante queijo…hmm, e cebola. —Responde quando passo pela ilha da


cozinha. Como sempre, Maya não é como as outras. Com certeza se fosse
qualquer uma das que já fiquei responderiam que preferiam cogumelos e tomates
para depois comer uma única fatia.

—Vai querer ajudar?

—Claro, vai que você coloca veneno no lugar do sal. —Provoca.

Eu começo a gargalhar enquanto ela faz a volta na ilha para começar a me ajudar.
Ela corta os ingredientes que pedi ao meu lado, comigo amassando a massa para
em seguida abri-la.

—Não esperava que soubesse cozinhar.

—Você não esperava que eu soubesse fazer um resumo. —Acuso.

—Verdade, mas estamos falando sobre cozinhar. Poucos sabem fazer isso hoje
em dia. —Argumenta.

—É um dos meus muitos segredos. Minha mãe sempre gostou, acabei me


interessando e aprendendo com ela.

—Vamos ver se você foi um bom aluno.

—Eu sempre sou um bom aluno. —Ela bufa. —Você não vai querer comer outra
comida sem ser a minha. —Garanto.

—Não se garanta tanto. Imagina, o capitão do time de hóquei dos Mavericks faz
aluna passar mal com sua comida. —Brinca. —Iria ser uma bela fofoca.

—Eu vou fazer você pagar a língua. —Pego um punhado de farinha do saco que
está em cima do balcão e jogo em seu rosto.

—Você não fez isso! —Berra. Ela abre aqueles olhos em chamas como se
pudesse me matar com eles, observo sua cara de indignação e seguro a risada
que insisti em sair.
—Eu fiz sim! —Deixo sair a risada que estou prendendo. Sinto um pequeno
impacto no meu braço esquerdo e percebo que ela acabou de me dar um soco
como vingança, o que não faz nada além de aumentar o som da minha risada na
cozinha.

Mas, sua vingança não está completa. Vendo que seu ato número um não deu
certo, ela abre um sorriso travesso para mim e pega um punhado de farinha
jogando em meu rosto de volta.

Vejo uma expressão de diversão surgir, e quando percebo, estamos fazendo uma
guerra de farinha na cozinha. Isso seria uma cena digna de uma foto. Nunca me
imaginaria sozinho em casa com uma garota sem ser na cama, isso não havia
acontecido desde que cheguei na universidade.

As meninas chegam e querem já ir para o finalmente, é tão rápido e simples que


nem me lembrava como é passar um tempo assim com uma, sem nada dessas
coisas, apenas rindo e conversando. Não lembro nem como é correr atrás de uma
garota. As coisas são bem mais fáceis quando se é jogador de hóquei. Esse
momento acabou de entrar para a lista de “momentos impossíveis”.

Correndo depois pela cozinha jogando farinha e sujando tudo pela frente, rodamos
o balcão correndo, quando paramos cada um de um lado tentando encurralar um
ao outro. Eu estou correndo atrás de uma garota coberta de farinha com uma
altura de criança perto da minha pela minha cozinha! Eu nunca mais vou esquecer
desse dia. Nenhum de nós quer se mover do lugar, nos encaramos durante um
minuto inteiro, o que faz mais uma risada escapar de nós.

Ao cansarmos, nos entreolhamos nos vendo cobertos de farinha, continuando a rir


da bagunça que fizemos. Decidimos parar por ali e terminar o que iniciamos.

Durante o tempo que deixamos a pizza assando no forno, nos limpamos e


arrumamos a cozinha de toda a bagunça que causamos. Nesse momento não vejo
mais a tensão em seu corpo, acho que é a primeira vez que está relaxa de verdade
perto de mim e por um tempo considerável, totalmente diferente de quando
chegou. Isso é um recorde. Hoje está sendo um dia para coisas inesperadas
acontecerem.

Estou conseguindo fazê-la ficar tranquila em minha presença, sem que precise
levantar seus muros e defesas. Essa proeza deveria contar como uma vitória e
tanto.
Quando finalmente as pizzas ficam prontas, parto em várias fatias, subindo com
elas nas mãos para o quarto com Hawkins vindo atrás com as bebidas.

Nos acomodamos na cama e soltamos o play na série enquanto comemos.


Assistimos aos três primeiros episódios seguidos sem pausa, indo para o quarto
no momento em que ela vira o rosto em minha direção.

—Meu Deus! Eu não esperava que fosse tão bom. —Anuncia.

—Queria que o Bran pudesse contar a verdade. —Comento.

—Sim, mas acho que não vai rolar. E o filho da Cercei? Nem começou a série
direito e já quero que ele morre.

Durante os episódios comi minha pizza inteira e acabo de reparar que a sua foi
quase toda também.

—Parece que alguém pagou a língua. —Provoco instantaneamente.

—Nem tava tão boa assim, foi a fome. —Se defende, mas sei que não é a verdade
verdadeira.

—Olha só, Hawkins mentindo na cara dura. —Acuso.

—Não estou mentindo.

—Você comeu quase uma pizza inteira. —Retruco.

—Não tenho culpa se não como igual a um passarinho.

—Próximo episódio ou você tem que ir? —Diga que não, diga que não, diga que
não.

—Próximo episódio, por favor.

Me surpreendo com sua resposta, porém não contradigo, chego até a fazer uma
pequena comemoração internamente, e coloco o próximo episódio. Assistimos um
atrás do outro conosco fazendo comentários sobre cada episódio, criando teorias
e falando sobre cada personagem. O melhor de tudo, são as reações e
comentários que Maya solta enquanto assistimos, são completamente aleatórios e
engraçados. Parece que ela tem a necessidade de falar a sua opinião, de se
expressar e se envolver naquele universo, por incrível que parece eu não me
incomodo, ao contrário, acho fofo e divertido. Eu acabo querendo que fale.

Quando percebo já terminamos a primeira temporada inteira. É surpreendente em


como estou gostando disso, não estou sentindo aquela pressão ou algo do tipo,
estou apenas sendo eu. Estou me divertindo pra caramba, não lembro a última vez
que isso aconteceu nessas circunstâncias.

—Não consigo assistir uma série assim e não lembrar do meu irmão. —Fala.

—Ele gosta desse tipo de seriado?

—Sim, costumávamos assistir várias séries juntos. Uma vez viramos a noite
assistindo um seriado na Netflix. Nem parecíamos que brigávamos quando
crianças.

—Vocês tem muita diferença de idade?

—Temos seis anos. Uma vez quando crianças nós brigamos feio, papai ficou tão
bravo que amarrou a gente um ao outro. Achamos que era brincadeira, mas
ficamos presos por uma hora até começarmos a chorar. —Conta rindo, me
fazendo a seguir rindo atrás.

—Eu não tenho irmãos, mas uma vez eu e minha mãe decidimos assistir um filme
de suspense, ela colocou tanto medo em mim que não queria me mexer no sofá.
No final nenhum de nós dois conseguimos ir para o quarto dormi, passamos a
noite acordados achando que iam invadir a casa.

—Isso não parece legal.

—Só que em um momento a noite ouvimos um barulho do lado de fora, quando


nos aproximamos um gato aparece arranhando a janela fazendo mamãe cair no
chão de susto. —Termino de contar, nós dois desatamos a rir mais.

A quanto tempo não dou uma risada tão sincera com uma garota? Não estou
mentindo quando digo que não faço a mínima ideia.

—Seu pai não achou estranho?

—Ele estava muito ocupado. —Digo com meu humor desaparecendo aos poucos.

—Acho que você iria gostar de ter irmãos. —Fala percebendo uma pequena
mudança em mim.

—Eu também acho. Próximo episódio? —Pergunto casualmente. A conversa ficou


pesada de repente.

—Depois desse final? Claro que sim.


Assistimos ao primeiro, o segundo, o terceiro e quando me dou por mim já
estamos na metade da segunda temporada. Ouço um bocejo ao meu lado, o
acompanho e verifico o relógio para ver as horas.

—Que momento ficou tão tarde? Preciso ir. —Hawkins se levanta com seu celular
em mãos.

—Eu levo você. —Falo me levantando da cama junto.

—Não precisa, eu chamo um táxi. —Dispara automaticamente.

—São quase três da manhã, não vou deixar você pegar um táxi à essa hora. Ou
você me deixa levar você, ou fica aqui.

Eu sei que isso é apenas uma desculpa para me impedir de levá-la, até hoje não a
vi sequer dentro de um carro, ou de qualquer veículo.

—Eu não vou ficar aqui. —Cruza os braços na altura do peito.

Pequena igual a uma criança, os braços cruzados e a expressão brava no rosto.


Como consegue ficar tão fofa? Essa a partir de agora é minha postura favorita sua.
Com certeza meu novo objetivo vai ser provocá-la para a ver assim todas as vezes
possíveis.

—Então, eu levo você. —Insisto. Abaixa a cabeça passando as mãos nos cabelos.
Ela sabe que não vou ceder.

—Tudo bem, eu durmo no sofá. —Levanta a cabeça voltando com os braços


cruzados.

—De jeito nenhum, melhor dormi aqui. —Contradigo.

—Eu não vou dormi no seu quarto. —Recusa.

—Você não sabe, mas eu moro com três jogadores de hóquei que não chegaram
até agora de uma noitada, tem certeza que quer dormi no sofá? Essa cama cabe
umas cinco pessoas, não vai nem reparar que estou aqui. —Ela encara a cama e
depois olha para mim com seus olhinhos brilhando e é aí, nessa hora, que sei que
peguei no ponto certeiro.

—Vou ficar, só porque estou caindo de sono. —Justifica. —Posso usar o


banheiro? —Balanço a cabeça para cima e para baixo indicando que sim.

—Quer algum moletom ou camiseta? —Ofereço.

—Uma camiseta seria ótimo.


Eu a entrego uma camiseta minha para se trocar. Durante o tempo que está no
banheiro, eu arrumo uma cama improvisada no chão. Poderíamos dormi juntos na
cama? Sim, aliás porque a cama é bem grande, porém, depois de ver os seus
olhos brilhando após dizer aquilo, me quebrou. Então, mesmo que eu acorde com
uma puta dor nas costas, vou dormi no chão.

Ao sair, Hawkins vê minha cama improvisada no chão ao lado da cama. Antes de


passar por ela para entrar no banheiro eu sou obrigado a parar para ouvir os seus
protestos.

—Você vai dormi no chão? Sem chance, não vou fazer isso.

—Minha mãe me ensinou a ser um cavalheiro, Hawkins, me deixe ser um. — Ela
me observa por uns instantes, afirma com a cabeça antes de desviar de mim e
começar a andar em direção a cama. Acho que está cansada e tensa demais com
a possibilidade de dormi na mesma cama comigo para poder revidar.

Entro no banheiro, tomo banho e escovo os dentes. Saio vendo Maya deitada de
lado virada para a porta do banheiro no meio da cama mexendo no celular, super
concentrada.

—Posso apagar a luz? —Pergunto tirando sua concentração em qualquer coisa


que estava vendo.

—Pode.

Apago a luz e deito no meu cafofo que vai me dar uma baita dor no dia seguinte,
mas que vai valer a pena.

—Boa noite, Hawkins.

—Boa noite, Brown.

E assim eu simplesmente apa

Capitulo 10

MAYA
Odeio a sensação de acordar e não saber onde estou, o que aconteceu nesse
tempo em que dormi.
Onde tudo na sua mente está nebuloso e seus neurônios estão voltando a
funcionar. Essa manhã ao acordar, percebo que estou em um lugar diferente, em
uma cama que não é minha e com uma roupa que não é minha. Aí que me lembro
que estou deitada na cama de Liam e que a camisa que acabei de identificar que
não é minha, na verdade, é sua também.

Merda.

Na hora que me fez o convite de ficar, e devo acrescentar que ainda me


convenceu a aceitá-lo, não estava esperando nem um pouco, e muito menos
preparada psicologicamente. Avançamos da zona de desconhecidos, mas a ponto
de passar a noite juntos? Não.

Apesar de tudo, eu me diverti bastante, ele soube como me fazer rir e me distrair,
algo que não acontecia a um bom tempo. Por um momento eu tinha me
esquecido como é, o que me surpreende isso ter sido exatamente com ele. Mas
além de tudo, ele me fez eu me sentir normal. Sem estar desconfortável e tensa
por ficar sozinha com um homem. Não admiti, mas até sua comida eu gostei,
quem consegue fazer uma pizza tão boa assim?

Pensando nisso, eu percebo que estou sozinha no seu quarto, Liam não está
deitado no seu cafofo ao lado da cama. Outra coisa que me convenceu a deixar,
deve estar com uma grande dor nas costas, além daquela que ele já estava.

Porém estava com sono demais para protestar, e dormi com ele não foi uma das
ideias mais animadoras da última noite. Só que tenho que confessar que foi legal
da sua parte.

Levanto da cama indo para o seu banheiro fazer a famosa higiene matinal e trocar
de roupa. Seu quarto é bem grande e confortável, não sei se todos os outros são
assim, mas em geral a casa em si é bem espaçosa. Da claramente para saber o
porquê, com quatro jogadores de hóquei, aposto que gigantescos, morando
juntos. Estou surpresa pela casa não estar uma completa zona.

Para piorar, acabei de perceber que provavelmente vou fazer a caminhada da


vergonha. Tem como eu cavar um buraco e me esconder agora? Certeza que pular
a janela não é uma má ideia, ou é?
Saio do banheiro já trocada, pego as minhas coisas, respiro fundo antes de abrir a
porta, repensando se pular a janela realmente é uma má ideia, e saio do quarto
descendo as escadas ouvindo pessoas conversando. As vozes param ao perceber
que tem alguém descendo e se aproximando da cozinha onde estão.

Vejo os outros três de quem Liam comentou ontem. Tenho certeza que ser
gostoso e bonito é pré requisito para morar nessa casa, não é possível.

—Hawkins, gosta de panquecas? —Pergunta Liam assim que me vê, fritando as


panquecas na frigideira.

—Hawkins igual a cidade de Stranger Things? —Suspiro internamente. E lá vamos


nós de novo.

Um dos três que perguntou está pegando as panquecas já prontas e as colocando


em um prato. Ele é alto com a pele mais branca, os olhos verdes claros com os
cabelos loiros escuros. Há uma barba rala do mesmo tom do cabelo, mas não é
tão perceptível devido a tonalidade.

—Sim. —Responde ele por mim, fazendo o que perguntou parecer gostar da
referência. —Esse que perguntou é Nick. O que está pegando algo na geladeira é
Dylan e o que está secando a louça é Luke. —Apresenta cada um.

Ao terminar de falar tanto Dylan, que agora está com uma garrafinha de água na
mão, quanto Luke, que está secando as mãos no pano, se viram parecendo ter
terminado o que estavam fazendo.

Dylan é negro, diferente dos outros, mas não é qualquer um, é uma versão do
Michael B. Jordan jogador de hóquei gostoso. Tem olhos castanhos escuros,
cabelo baixo meio cacheado com afeições comuns, mas sua beleza passa longe
de ser.

Luke também é de fazer você precisar de um balde, ele tem a pele dourada, com
os olhos castanhos escuros, a mandíbula marcada, cabelos escuros lisos, mas
não um liso escorido, me lembra um estilo mais skatista ou surfista.

Meu Deus! Que tanto de homem gostoso e bonito em um único espaço.

—E aí Hawkins. —Fala Dylan primeiro, suspiro novamente.

—Oi, e é Maya aliás. —Respondo direcionando meu olhar para Liam ao corrigir.

—Acho que preferimos Hawkins. —Ele diz olhando para os outros dois que
concordam.
—Espero que esteja colocando nosso capitão de volta na linha, senão vamos ficar
muito magoados. —Falou Luke.

—Você não quer ver a gente magoado, né Hawkins? Acabamos de virar amigos,
isso não seria legal para a nossa amizade. —Quem fala é Nick dessa vez, pegando
o prato que colocou suas panquecas e começando a comê-las.

—Claro que não, quem seria eu para estragar nossa amizade. —Falo irônica para o
Nick que dá um sorrisinho pequeno enquanto mastiga.

—Vem pegar as panquecas, se não esses ogros vão comer tudo sozinhos. —
Avisa Liam terminando de por as panquecas junto a pilha de outras que estão
prontas.

—Eu não estou com fome, obrigado. Vocês não têm que seguir uma dieta?

—Temos, mas uma vez ou outra a gente pode dar uma escapadinha. —Responde
Luke.

—Entendi. Tenho que ir, mas foi bom conhecer vocês meninos. —Me despeço
indo para a saída.

—Espera, vou levar você. —Liam me faz parar no corredor da entrada da casa ao
dizer.

—Não precisa, minha casa não é longe daqui. —Recuso de volta, virando para ele
que agora está atrás de mim.

—Não é incômodo, vou para a faculdade daqui a pouco, nossas aulas são no
mesmo prédio e temos uma juntos hoje.

Fico apreensiva em aceitar sua carona, não entrei em um carro, ônibus, ou táxi
sequer depois do que aconteceu. Acho que ele percebe minha apreensão porque
logo diz:

—Te levo para a sua casa, depois vamos para a faculdade. Pode deixar a ligação
de emergência no automático durante o trajeto. Não vou tocar em você, Maya,
prometo. —Procuro seus olhos vendo se tem algum vestígio de mentira ou
qualquer coisa que seja. Mas não encontro.

—Tudo bem, pode me levar.


Durante o trajeto não conversamos, eu seguro firme o celular observando a
paisagem pela janela. A minha casa e a dele não é muito distante, levamos cerca
de uns cinco a dez minutos comigo o guiando.

O convido a subir para não precisa ficar me esperando dentro do carro. Ele me
segue até o nosso andar me observando abrir a porta e dar espaço para entrar.
Percebo que o apartamento está vazio ainda, pelo visto Riley vai dar as caras só
mais tarde.

O deixo observando o apartamento enquanto vou para meu quarto tomar um


banho e trocar de roupa. Tento não demorar muito para não o fazer ficar
esperando por muito tempo.

Ao voltar já arrumada, encontro ele sentado no sofá mexendo no celular.

—Podemos ir. —Aviso. —Você não tomou café, quer comer algo aqui? Temos
alguns minutos. —Ofereço chamando a sua atenção para mim.

—Não precisa, posso tomar algo em um dos cafés da faculdade.

Ao chegarmos no campus, agradeço a ele e seguimos nos separando no caminho,


cada um indo para um lado. Quando descemos do seu carro juntos, recebemos
olhares de quem estava transitando pelo campus, não foram muitos, mas foi o
suficiente para ser desconfortante.

Diferente de mim, Liam pareceu não se importar, provavelmente já deve estar


acostumado com esse tipo de coisa. Até quando saiu andando após se despedir,
a cada passo que dava, todos a sua volta direcionavam o olhar para ele como se
fosse o próprio Tom Cruise.

Ao terminar as minhas primeiras aulas do dia, saio do prédio caminhando pelo


campus, quero comprar algo para comer já que não tomei café da manhã.

Ouço o meu celular tocar me mostrando que Anna está me ligando, trocamos
mensagens normalmente pois nenhuma de nós duas gostamos muito de fazer
ligação, mas tem semanas que são muito corridas e não conseguimos nos falar,
como essa que passou. Estava sentindo falta de suas mensagens.

Desde que mudei do Brasil tentamos sempre visitar uma a outra, espero que esse
ano de tudo certo e ela consiga vir. Estou torcendo por isso.

Eu nasci no Brasil, porém me mudei para os EUA na minha adolescência por


causa dos meus pais, foi difícil no começo, agora já me acostumei com aqui, mas
tem momentos que ainda sinto falta. Pode falar o que for, as pessoas de lá são
únicas.

—Para você estar me ligando é porque realmente está preocupada.

—Eu precisava saber que você estava viva. Sabe que não me importo, sempre
fomos assim, porém um sinal de vida as vezes não faz mal.

—Eu sei, desculpe. A última semana foi corrida.

—Deu para perceber, pode contar tudo.

Começo a contar desde o momento da entrega das provas até os acontecimentos


de hoje pela manhã. Anna faz seus comentários enquanto vou falando.

—Meu Deus! Agora eu entendo porque você sumiu. Como você está se sentindo
com tudo isso? Depois de… —De ser assediada, é isso o que ela quis dizer, mas eu
não a deixo completar.

—Estou bem.

—Repetiu isso para si mesma quantas vezes? —Pauso por alguns segundos
sentindo minha garganta secar e uma bola do tamanho de um estado se alojar na
minha garganta. Anna me conhece mais que eu mesma as vezes.

—Até fazer sentido. Não fui abusada, Anna, foi quase. E me sinto uma fresca por
estar me sentindo como eu estou. Me sinto um alien e nem tenho direito por isso.

—Isso não é verdade. Não é porque você realmente não chegou a passar que isso
vai te impedir de sentir o que está sentindo. Ninguém pede por isso, Maya.

—Eu sei. —Murmuro.

—Fale das aulas com Liam, como está sendo? —Ela muda de assunto.

—No começo achei que seria horrível, mas mesmo não confiando nele totalmente,
ele sabe como me fazer ficar menos…tensa.

—Então agora vocês são amigos?

—Não sei, talvez sim.

Antes de ouvir a resposta de Anna, sinto o meu celular ser arrancado da minha
mão.
Meu Deus, eu estou sendo roubada! Por uns instantes eu penso que sim, meu
coração gela e estou preste à entrar em combustão até me virar vendo Liam com
meu celular no ouvido.

—Oi, seja para quem for. Ela está errada, somos melhores amigos agora. —Ele me
corrige, não consigo ouvir o que Anna está dizendo, apenas suas respostas.

—Acho que sou eu mesmo. —Ele abre aquele sorrisinho que me irrita tanto.

Eu movo meus lábios sem emitir um som dizendo “eu vou matar você”, porém, ele
me ignora continuando a falar com Anna na ligação.

—Vou cuidar dela sim, pode ficar tranquila. —Tento pular em cima dele para tentar
pegar meu celular de volta da sua mão. Por que ele tinha que ser tão alto? Ele vira
de costas para mim.

—Foi um prazer te conhecer, Anna. —Vira, entregando o telefone finalmente


depois de mais alguns minutos.

—Eu gostei dele. —Diz assim que coloco o telefone no ouvido.

—Muito engraçado. —Ironizo.

—Ele parece legal amiga, sei que tem medo, mas se ele fosse fazer alguma coisa já
teria feito, não?

—Isso é verdade. —Confesso pensando por esse lado. —Prometo mandar mais
mensagens.

—Eu agradeço.

—Tenho que desligar. —Antes que eu desligue, ela me impede.

—Amiga, eu vou dar jeito de ir —Fala.

—Tudo bem.

Desligo vendo ele ainda na minha frente. Sinto olhares em cima de nós, vejo que
todos que estão passando pelo campus nos observam. Eu detesto isso.

—O que estava fazendo? —Cruzo os braços.

—Não posso deixar você mentir para os seus amigos. Isso é feio, Hawkins. —Bufo
diante do seu comentário.

—As pessoas estão olhando, podemos sair daqui? —Peço.


—Está com vergonha de ser vista comigo? Agora você me ofendeu de verdade. —
Provoca.

—Você por si só chama atenção, e tem como parar de tentar me irritar?

—Não posso, é o meu novo passatempo favorito.

Me viro caminhando, o fazendo ficar para trás, mas ele me alcança com dois
passos.

—Vai ficar me seguindo de novo?

—Vou. O que vamos fazer?

—Eu vou almoçar.

—Então, nós vamos almoçar.

E é isso o que faz, ele me segue até o chalé Bradshaw e almoçando juntos
sentados um de frente para o outro. Juntos. Se me falassem a três semanas que
aconteceria tudo o que vivi e que eu almoçaria com Liam Brown, eu iria rir da cara
da pessoa e falaria para ela se tratar.

As pessoas como sempre olham, mas ele tenta sempre me distrair enquanto
comemos e depois ao andarmos pelo corredor indo para a única aula que temos
juntos. Gosto como é fácil me sentir confortável perto dele, sem meu corpo
endurecer no chão.

Ele se senta ao meu lado na sala. Antes nem reparávamos na presença um do


outro, e agora já é a segunda vez que se senta ao meu lado em uma aula, além de
ficar me seguindo.

—Hawkins, tem uma caneta e uma folha para me emprestar?

—Não acredito que veio para a aula sem ao menos uma caneta. —Declaro em
indignação.

—Tenho coisas mais importantes para me preocupar do que papel e caneta.


—Alega.

Pego uma das minhas canetas e entrego para ele com uma folha que arranquei do
meu caderno.

—Muito obrigado, linda —Não protesto sobre o apelido, apenas o ignoro e volto a
minha atenção na aula.
Durante a aula Liam faz comentários baixinho apenas para eu ouvir, me fazendo rir
em alguns momentos e me irritando em outros, como sempre. Pode não parecer,
mas sei que deve estar sentindo uma dor horrível nas costas, mesmo não
reclamando. A aula passa rápido, o que eu agradeço mentalmente mil vezes.

—O que acha de cancelarmos a aula hoje? Preciso descansar para começar


escrever o trabalho da professora Smith e tenho que ir trabalhar na escola da Mia.
—Falo ao sairmos da sala.

—Mas iríamos começar a parte pesada hoje.

—Vamos fazer assim. Eu mando uma lista com exercícios que o professor
passaria, você tem uma hora e meia para fazer e amanhã nós analisamos seu
desempenho. Assim vou ter uma noção do que precisamos trabalhar.

—Tudo bem. Não sabia que trabalhava naquela escola. —Fala distraidamente.

—Trabalho lá no período da tarde. Cuido da Mia depois do meu horário. —Balança


a cabeça aderindo a informação.

—Vejo você amanhã, Hawkins.

Ele bagunça os meus cabelos como se eu fosse uma criança de 5 anos, e o


observo saindo andando logo em seguida pelo corredor com sua jaqueta dos
Mavericks, calça jeans e seus tênis branco.

Pode parecer nada demais para alguém, mas desde aquele dia que fiquei perto
dele na biblioteca sem perceber, isso passou a acontecer frequentemente. Hoje no
carro, quando estava interrompendo a minha ligação, caminhando no campus,
durante a aula e agora o cabelo.

Posso não ter ficado feliz com a ideia de ver Liam com frequência, mas não estou
achando a ideia mais tão ruim, pelo contrário, estou começando a gostar.
Capítulo 11

LIAM

A minha cabeça está a um fio de explodir.


Não, eu não estou brincando.

Estou trabalhando na bancada da cozinha essa noite na lista de exercícios que


Maya corrigiu comigo na aula de hoje. Estou muito frustrado. Eu tinha certeza que
havia acertado no mínimo metade, porém tudo o que ganhei foi riscos vermelhos
por toda a folha.

Como alguém pode ser tão infeliz com a vida para passar exercícios assim para
uma pobre alma? Eu tenho pena desse homem que é meu professor. Ele deve
pensar que seus alunos são vários mini Robert Einstein para passar uma coisa
dessas e achar que vai ser moleza acertar.

Cada exercício exige um raciocínio que está longe de ser o meu. Escolhi humanas
por um motivo, e é exatamente esse que está me assombrando nesse momento,
me lembrando todos os dias o porque eu prefiro humanas.

—Pergunta. —Anúncio pra Luke que está pegando uma lata de cerveja na
geladeira.

—Manda. —Devolve ele na mesma hora.


—Você tem certeza que a letra B está correta, mas a sua professora diz que não. E
todas as outras alternativas estão erradas. —Explico.

—Eu mando minha professora a merda e digo que estou certo. —Responde
dando de ombros, mostrando que a resposta é óbvia.

—Não sei cara, to começando a achar que é a C.

—Então, marca a C.

—Não, acho que é a B mesmo.

—Então, é a B.

—Odeio essa matéria. —Murmuro.

Passo minha mão pelo coro cabeludo pensando seriamente em largar esse
negócio de lado por hoje.

—A segunda chamada é na próxima semana, não é?

—É. —Sinto um calafrio se alojar na minha barriga.

—Vai jogar contra o Dallas?

—Vou sim. —Respondo tentando espantar o enjoou.

A verdade é que não sei se vou realmente conseguir jogar, minhas notas ainda não
foram computadas no servidor, então por enquanto estou dentro. Mas, se na
segunda-feira a minha nota na prova não for seis ou mais, posso dar tchau aos
jogos até a situação mudar.

No banco. Puta merda, só de imaginar isso o enjoou volta.

Tudo o que eu quero esse ano é ganhar o Frozen Flour para o meu time como
capitão e mais tarde virar profissional. Não, quero detonar como profissional.
Quero provar para todos que consegui por mérito meu, que sou capaz o suficiente
para ser bom. Acima de tudo, quero provar para mim mesmo que posso ser um
dos melhores jogadores profissionais da liga, que eu consegui porque eu tive
capacidade.

E pensar que posso estragar tudo por causa de uma matéria com um professor
amargurado daquele, me deixa frustrado.

—É assim que eu gosto. —Luke me dá um soquinho no ombro.


—Ei, os caras do time vão vir assistir a partida dos Toronto Maple hoje. —Informa
Nick aproximando de nós na bancada.

—Que caras? —Estreito os olhos.

—Os de sempre, Brandon, Stephen, Adam e Nate. Hmm… Peter, se ele parar de
ser chato. Ah! E Ja…

—O time todo você quer dizer. —Luke interrompe secamente antes que comece a
listar até os reservas do time.

—Por mim tudo bem, desde que cada um traga as suas bebidas.

—Podia ter avisado antes cara. —Adverte.

—Foi mal, acabei esquecendo. —Se desculpa Nick.

—Tranquilo, mas não esquece na próxima.

—Pode deixar, Pai. —Nick faz uma pausa e se corrige balançando a cabeça. —Na
verdade você cozinha então é a mãe, e você é o Pai. —Aponta para mim, e em
seguida pra Luke sorrindo.

Ambos mostramos o dedo do meio.

Mais um apelido para a lista. Nós dois somos os mais pé no chão da casa,
cuidamos pra Dylan e Nick não extrapolarem acabando fazendo merda. Apesar
que isso as vezes é meio inevitável, parecem duas crianças que esperam os pais
virarem as costas para aprontarem.

—Vocês estão bravos?

—Não enche! —Falamos juntos.

E não é que a cena parece uma família pra caramba?


Capítulo 12

MAYA

Chego na casa de Liam no horário combinado que mandei para ele por mensagem
hoje, mas ele apenas visualizou.
Como tem virado costume nas vezes que venho aqui, entro sem bater. Não sei
como conseguem deixar a porta destrancada, e se invadirem a casa enquanto
estiverem dormindo? Certo, eu sou meio paranóica as vezes, porém existe uma
probabilidade enorme disso acontecer.

Ao entrar, vou em direção as escadas passando pela sala e vendo um dos seus
amigos, que pelo o que me lembro se chama Nick, jogando o que parece ser
aquelas torres de equilíbrio que tem que tirar uma peça sem deixar cair, ela está
em cima de uma mesinha no centro da sala com ele sentado em um tapete com
as pernas cruzadas. Está super concentrado pois linhas se formam em sua testa,
tendo também uma mão em seu queixo enquanto analisa a torre em sua frente.
—Sinto em te informar que Liam não esta em casa. —Paro, voltando para a sala
onde consigo o ver ainda analisando que peça tirar.

—E posso saber onde ele está? Temos um compromisso. —Pergunto ainda não
sendo o suficiente para tirar a sua atenção.

O que aquele idiota está fazendo?! Pedi para a aula ser mais cedo hoje, ele foi
avisado. E mesmo assim decidiu não comparecer me deixando com a cara de
tacho. Se ele não pode ter o mínimo de compromisso e bom senso, então, vou ter
que o informa que meu tempo é precioso demais para ficar o gastando desse
jeito.

Tenho coisas mais importantes para fazer do que ficar aqui plantada esperando o
senhorzinho ter a boa vontade de comparecer à aula. Ótimo, e ainda me fez ficar
mais estressada do que já estou.

—E por que eu falaria? —Estreito os meus olhos em sua direção.

—Você não sabe onde ele está, não é? —Suponho.

—Não. —Estava óbvio.

Suspiro antes de me concentrar na ação que está prestes a fazer.

—Está fazendo errado, se tirar essa peça vai cair. —Comento ao observar a peça
que estava preste a retirar.

—Então, me mostre como eu deveria fazer, ‘sabe tudo’. —Ele responde irônico,
finalmente me encarando. Esperando uma resposta, ele afasta a mão da peça que
iria remover.

Fico tensa por alguns segundos. Eu apenas comentei uma coisa que observei.
Sou muito boa nesse jogo, amava jogar com os meus pais e meu irmão quando
morávamos juntos. Era um dos poucos que jogávamos em família, sendo que a
maioria das vezes optávamos por assistir a um filme.

Não pensei que Nick fosse fazer um convite para mostrar como realmente deveria
estar fazendo, estou estressada demais para raciocinar agora. Nunca nem
conversei com ele antes, se eu custei um tempo para eu sequer conseguir ficar
confortável perto de Liam, como vou fazer isso com Nick?! Sem falar que um
mestre nunca releva os seus segredos.

—Cadê os outros? —Pergunto. Se ele está sozinho em casa, preciso saber.


—Os dois estão no quarto lá em cima. —Balanço a cabeça assentindo.

—Então, vai me mostrar ou não? —Ele pergunta novamente me fazendo voltar


minha atenção para ele, baixando o olhar para a torre logo depois.

Entro em uma órbita ao analisar, mesmo que de longe, observo as peças que não
podem ser retiradas e quais que podem, não interferindo em sua estrutura. Vejo as
peças que posso retirar para dificultar o jogo do meu oponente, as mais fáceis e
as mais complicadas.

Quando me dou conta, estou com as pernas um pouco agachadas, me inclinando


próxima a mesa de centro vendo de perto qual devo retirar primeiro. Puxo uma
das peças fazendo a torre dar uma pequena balançada. Comemoro internamente
ao ver que não caiu.

—Puta que pariu. Nunca que eu escolheria essa. —Fala sorrindo surpreso ao ver
minha reação.

—Eu sou a melhor nesse jogo. —Afirmo.

—Aé? Quero ver se é mesmo quando eu ganhar de você. —Desafia.

Jogadores de hóquei…sempre competitivos.

—Não me garantia tanto se eu estivesse no seu lugar. —O bom é que eu também


sou.

Sabe o que eu falei sobre não conseguir ficar perto de Nick? Até que estou me
saindo bem. Fiquei tão entretida que nem percebi o momento que me sentei e
comecei a jogar. Além do mais, que ele sabe como me manter concentrada no
jogo.

Mesmo estando com uma mesinha nos separando (o que me dá uma certa
segurança e conforto), é a primeira vez que ficamos mais próximos. Isso é um
grande avanço para mim.

Nick em momento nenhum passou uma sensação de que faria algo comigo ou
tem falas com duplo sentido, caso o contrário, no primeiro sinal meu corpo
entraria em alerta. Sabe garantir que não irá fazer nada. Só não sei se é intencional
ou não.

Me sinto bem quando isso acontece. Também fiquei tão eufórica com tudo, a
nostalgia de jogar esse jogo de novo, que meu corpo parece ter ficado em silêncio
por alguns minutos. Um verdadeiro alívio.
Sinto que passar um tempo com Liam, e agora com Nick, tem me ajudado muito
com isso que tem acontecido após o quase incidente. Não me sinto mais tão
tensa quando estou perto de um homem, andando pelo campus ou no corredor
da faculdade. Parece que meu corpo está entendendo aos poucos que é
confortável eu me aproximar de algumas pessoas.

Não sei mais em qual rodada estamos, após terminar a quinta parei de contar. Em
todas eu ganhei, vendo o seu esforço ainda maior na próxima.

Ouço o barulho da porta se abrindo, mas não me viro para ver quem é, somente
escuto o som de uma voz xingando baixinho.

—Meu Deus! Eu esqueci, desculpe Maya. —Ouço a voz de Liam ficar mais
próxima.

Não digo nada, não o encaro. Apenas me levanto e saio andando, deixando Nick
sentado com o jogo na sala.

Estou preste à abrir a porta, mas ele me para ao puxar o meu braço.

Diferente do que imaginei, não sinto desconforto. Não sinto meu corpo entrar em
alerta, minha mente não volta para aquele dia no ônibus, e não entro em
desespero. Pelo contrário.

Uma corrente elétrica passa pelo meu corpo. Sinto o local onde sua mão está,
queimar. Não estou ofegante, não sinto meu coração bater rápido e forte. Sinto
meu corpo formigar. Sinto calor. Tenho a impressão de uma descarga elétrica
subir por todo o comprimento das minhas costas até a nuca.

Não!

E daí que estou sentindo isso? E daí que ele é bonito e acho ele gostoso? Não é
sua culpa se seu corpo é todo estrutural. É normal sentir atração por um cara
assim, não é como se eu fosse querer o beijar.

Ele já tem pessoas suficiente para isso.

Abaixo os meus olhos encarando a sua mão segurando o meu braço. Ele solta,
reparando o que acabou de fazer.

—Desculpe por isso. Não deveria ter te segurado. —Vejo um traço de vergonha no
seu olhar. —Eu acabei esquecendo que mudamos o horário da aula hoje e Olívia
acabou…
—Olívia? Sério Liam, não estou nem aí para quem fica ou deixa de ficar, mas eu
espero que tenha o mínimo de compromisso comigo. —Explodo.

—Pisei na bola, tá legal?

—Não, não tá legal. Um: você obviamente não está respeitando o meu horário e o
nosso acordo, e dois: você não está dando a mínima para passar nessa matéria,
claramente.

—E você? Nunca esqueceu um compromisso? Acha que vou acreditar que não
faz nada além de estudar? —Dispara. Não, a única coisa que eu tenho feito é ficar
em casa.

Pausa.

Não sou uma pessoa de sair, porém, depois daquilo, o que eu vou fazer? Ir a um
bar me divertir como os meus amigos? Sair para uma festa e ficar com um cara
qualquer? Não obrigado, de jeito nenhum.

—Maya, você está bem? —Seu tom agora, diferente de antes, é cauteloso. Quase
que solidário demais. Quase com pena. Abaixo a cabeça olhando para o chão,
fugindo dos seus olhos.

—Olhe para mim. —Pede, mas não o faço. É o suficiente para saber que não
quero responder a sua pergunta. Porque sinceramente, as vezes nem eu sei
respondê-la.

—Estraguei tudo, eu sei. Acabei esquecendo com tudo o que rolou ontem. Me
desculpe, podemos remarcar para amanhã? —Pergunta.

—Não. —Levanto a cabeça, me mantendo firme.

—Então, vai ser assim?

—Só até você ter compromisso. Quando resolver que quer passar nessa prova e
ter o compromisso de estudar, você me avisa. —Viro abrindo a porta e saindo. Só
ouço o barulho da porta batendo.

Posso ter pego pesado? Sim, mas ficar com uma menina fazendo sei lá o que
sendo que tínhamos marcado um compromisso, é muito. Pelo menos avisa-se
antes que não poderia ao invés de me fazer vir para sua casa igual uma trouxa.

Acordei estressada hoje, então, isso contribui bastante para o meu veredito. Em
minha defesa, acredito que qualquer mulher em meu lugar concordaria comigo.
LIAM

—Ah, que pena. Não deu tempo de eu fazer a pipoca. —Lamenta ironicamente
Nick agora atrás de mim. Viro o lançando um olhar furioso. —Ei, não foi eu que fiz
merda. —Se defende.
—Vocês ficaram esse tempo todo jogando? Faz uma hora que estou atrasado.
—Questiono surpreso.

—Não esperava que fosse ficar quando indiretamente a convidei para jogar. Ela é
boa, perdi todas as partidas —Faz uma cara de desgosto ao dizer, riu, pois sei que
seu ego está levemente ferido. Ou totalmente.

—É a Maya, ela é boa em tudo. —Digo.

—Percebi. Eu gostei dela. —Estreito os meus olhos para ele. —Calma, não tô
falando nesse sentido. Não iria te apunhalar. —Concordo com a cabeça.

—Tanto faz, eu não ligo. —Ele que me estreita os olhos dessa vez, duvidando do
que acabei de afirmar.

—Bem que você podia comprar um desses colorido pra mim, e um quebra cabeça
de várias peças. —Muda de assunto e lança seu olhar brilhante de criança.

—Você tá brincando, não é? —Balança a cabeça em sinal de negativo.

—Não, é o meu presente de aniversário adiantado. —Argumenta.

—Você vai ficar viciado nisso. —Aviso.

—Claro que não. —Protesta.

—Okay, então eu sou um camaro amarelo.

—Não fala isso cara, amarelo não combina com você. —Nega com a cabeça.

—Sério?

—Confia em mim, parece que você está doente.

—Camaro azul é melhor?

—Melhor. —Nós dois nos olhamos, assimilando a decisão em conjunto.


—Tenho que pensar como vou resolver esse problema chamado Maya Hawkins.
— Murmuro, já sentindo minha cabeça doer.

—Boa sorte, ela é osso duro de roer.

—É, eu sei.

—Mas você também fez merda.

—É, eu sei.

—Ficar com uma menina justo no horário de aula não foi legal.

—É, eu sei.

—Foi muita mancada cara, até eu não faria isso.

—É, eu sei Nick! —Enfatizo dessa vez com a voz rígida.

—Calma, só estou falando. —Levanta as mãos em sinal de rendição. —Por que


não faz brownies pra ela? Os seus são maravilhosos. —Sorriu lembrando da nossa
conversa no refeitório.

—Olha, ele pensa —Brinco provocando.

—Nossa, quanta agressividade comigo. —Ele se vira subindo as escadas,


balançando a mão mandando eu arrumar o que fazer.
Capítulo 13

LIAM

Eu sei que estou ferrado.


Ontem quando cheguei em casa e me deparei com Hawkins sentada de pernas
cruzadas de frente para Nick com uma torre de peças em cima da mesa de centro
que separava os dois, eu sabia que tinha feito merda. E sabia que iria ficar puta da
vida comigo.

Infelizmente dessa vez, sou culpado. Excedi meu limite de bebidas imposto na
noite que os meninos foram assistir ao jogo dos Oilers em casa e acordei com
uma dor de cabeça da desgraça no dia seguinte. Esqueci que tínhamos mudado o
horário que normalmente estávamos tendo as aulas, e acabei a deixando fazer
papel de trouxa.

Diferente do que Hawkins pensa, não usei o nosso horário das aulas para ficar
com uma garota, especificamente Olívia, pelo menos, não intencionalmente.

Almocei fora e fui comprar um remédio para a minha ressaca que tinha acabado,
esbarrei com Olívia no caminho, o que fez somente minha dor de cabeça
aumentar. Insistiu para nós ficarmos de novo, como sempre, disse que não estava
no clima no momento, mas persistiu tanto que acabei dando um beijo nela para
ver se largava do meu pé de vez. Espero que dê certo, pois não vou fazer isso de
novo.

Apesar de tudo, nada disso importa mais do que pedir desculpas para Hawkins
agora. No segundo que segurei seu braço a impedindo de sair porta a fora, foi por
puro instinto, mas a sensação por um simples toque foi muito mais do que apenas
um toque. Foi a primeira vez que a toquei de verdade. O calor, a onda de
eletricidade, a sensação de tudo parar por milésimos de segundos, de não querer
soltar. A conexão. Eu senti. Eu sei que ela também sentiu.

Agora eu estou aqui em pé na porta da sala esperando a sua aula terminar, com
um pote cheio de brownies que vou usar para tentar a convencer a repor a aula
que eu fiz o favor de esquecer. Se isso não der certo, eu não faço a mínima ideia
do que vou fazer. Segui-la de novo, talvez?

Escuto uma movimentação de pessoas dentro da sala até ver a porta se abrir, fico
atento para ver se Hawkins está no meio, pois é pequena demais. Espero, e
quando todos já foram, a vejo passar pela porta com uma bolsa pendura em seu
ombro lendo um livro em sua mão, usando uma calça jeans, um moletom marrom
meio bege com um Adidas branco nos pés; sempre usando tons neutros tentando
não chamar atenção. Como se isso fosse possível.

Paro em sua frente com uma das mãos segurando o pote atrás das costas e puxo
o livro de sua mão para mim com a outra, isso a faz levantar o rosto com a afeição
confusa, procurando entender o que está acontecendo. Percebendo que sou eu,
revira os olhos, sua expressão mudando de confusa para irritada. Do jeito que eu
gosto.

—Tinha que ser, uma hora dessas… —Cruza os braços virando o rosto para o
lado.

Apesar de amar a ver sorrir, rindo e se divertindo, nenhuma delas supera quando
está irritada com sua pose de braços cruzados, e suas expressões com os olhos
ardendo em fogo. Ela fica linda pra caralho. Fofa demais. Nunca vou me cansar.

—Okay, já que vamos pular a parte do “oi Hawkins”, vou direto ao ponto. Me
desculpe, não estou tentando arrumar uma desculpa para o que eu fiz, só quero
me desculpar com você. Não vai acontecer de novo. —Garanto.

—Como eu posso saber que não vai acontecer de novo?

—Porque eu estou te garantindo que não vai, e eu cumpro com o que eu falo.
—Não sei por quanto tempo ela me encara, decidindo se isso é ou não o
suficiente para acreditar em mim. No entanto, acredito que uma parte sua acha
que pegou um pouco pesado comigo.

—Tá bom, mas não vou repor aula hoje. —Como é teimosa…

—Tenho treino daqui a pouco, mas imagino então que não vai precisar mais da
minha ajuda para o seu trabalho. —Como diz o ditado “amigos, amigos, negócios
a parte” e nesse momento eu estou negociando.

—Além disso, eu tenho um pote de brownies, pensei que fosse querer, mas acho
que me enganei, melhor que sobra pra mim. —Prossigo tirando o pote de trás de
mim, a mostrando.
—É sério que você trouxe um pote de brownie só para me chantagear a ti dar aula
hoje? —Questiona com um ar de insulto. Ou vai dar muita merda, ou muito certo.

—Sim, deu certo?

—Deu, passa pra cá. —Passo o pote que estava segurando com uma das mãos,
entregando. Ela o abre e tira um, levando a boca e mastigando.

—Tudo bem. —Diz ao terminar de comer me fazendo abrir o meu sorriso da


vitória. —Vamos fazer o seguinte, eu vou com você no treino como combinado no
acordo, vou trabalhar e depois repomos a aula. —Propõem.

—Como você quiser.

MAYA

Sim, eu me deixei ser chantageada.

São brownies! E não se pode negar comida, principalmente doces. Prometo que
tentei ser forte. E pode parar de me julgar, todo mundo aceitaria uma proposta
dessas, além disso, acho que talvez eu tenha pego um pouco pesado.

Ele me garantiu que não irá se repetir, espero que tenha dito a verdade, pelo bem
da sua temporada de hóquei, senão, a minha paciência vai dizer adeus junto com
as suas aulas.

Nesse instante estamos indo para o seu treino, como o combinado, em seu carro.
É até estranho entrar nesse carro novamente, se isso pode ser chamado de carro,
porque para mim está mais para uma nave.

Porém, Liam insistiu usando o argumento de: “Prometo não encostar em você
Hawkins, coloque a ligação de emergência em modo automático de novo. Nada
aconteceu da última vez e não vai ser diferente nessa”, palavras suas, não tive
muitos argumentos contra, então aceitei, ainda com o celular no automático.

Estou nervosa. Esfrego minhas mãos na calça jeans balançando minhas pernas
sutilmente no acento, inquieta. Estou prestes a ficar por sei lá quanto tempo
rodeada de vários homens possivelmente com o dobro do meu tamanho que
podem me esmagar sem nenhum esforço. Eu estou levemente surtando.
Devem ser um bando de brutamontes com os egos maiores que si mesmos,
machistas e totalmente nojentos. Estou prevendo que vai ser desconfortante ficar
lá, não vou me sentir nada segura, em nenhum momento.

Se existia uma forma de me fazer ficar totalmente desconfortável e assustada ao


mesmo tempo de uma maneira anormal, eu acabei de descobrir.

Tudo isso…por um trabalho!

O que eu posso fazer? Preciso dessa nota, senão me sair bem eu vou literalmente
sentar na graxa esperando minha reprovação. Não posso ficar esperando o dia
que vou acordar me sentindo normal, como se o que aconteceu nunca tivesse
existido. Querendo ou não, tenho que aprender a lidar com isso. Não posso
mudar. É isso, fui assediada em um ônibus, tenho que enfiar isso na cabeça.

Aquele filho do cão quase fez mais comigo, e mesmo sendo impedido, me deixou
com isso para lidar, o medo e mais caos cheio de problemas. Então preciso
aprender a cuidar de mais esse caos dentro de mim que não teve permissão e
nem pediu para entrar, e o primeiro passo é ir nesse treino, sentar e ficar até o fim.
Sem surtos, sem problemas.

Respire. Nada vai acontecer. Você está sendo idiota. Não está. Está. Vai ficar tudo
bem.

Sinto o seu olhar sobre mim quando deixo os meus pensamentos admirando a
paisagem pela janela.

—Vou estar lá, Hawkins, não vou deixar nada acontecer com você.

Pelo visto não sou tão sutil quanto imaginava.

—Não posso ter certeza disso.

—De todas as vezes que ficamos sozinhos juntos, quantas eu fiz algo com você?
—Não digo nada, pois sei que em nenhuma delas isso aconteceu, ao contrário, ele
sempre foi respeitoso.

—Nenhuma. —Forço a fala sair.

—Por isso você pode ter certeza. —Viro o pegando me observando.

Olhos. Eles transmitem tudo. São o espelho da alma. Verdade, mentira, tristeza,
confusão, amor, dor, dúvida. Pode se ver tudo através deles, eles dizem o que
muitas vezes não dizemos com palavras. E nesse momento, os dele me dizem que
está longe de estar mentindo.

Amo olhar nos olhos das pessoas, torna tudo mais profundo, íntimo e real. Você
vê neles o que se passa por dentro daquela pessoa, o que ela está te dizendo sem
pronunciar.

Gosto de olhar nos seus olhos. Nos seus olhos castanhos escuros intensos, que
me prendem e que podem ver até o fundo da minha alma. São reconfortantes e
apaziguantes ao mesmo tempo.

Não tenho tempo de dizer mais nada porque no momento em que vou dizer
percebo o carro parar, fazendo me dar conta que chegamos. Nós dois saímos do
carro; ele pega sua bolsa na parte de trás fechando a porta em seguida. O sigo até
a entrada, observando como é estar na área que só é permitida para atletas.

A Mavericks é uma das melhores universidades com programa esportivo se você


quer jogar hóquei ou futebol americano, as instalações são ótimas para ambos os
esportes, é uma das mais comentadas. Porém, nada me preparou para isso. As
instalações são realmente incríveis, tudo de ótimo estado e lindo por dentro.

Há diversas salas que não faço a mínima ideia para que servem, sei apenas
algumas que passamos, que pelo o que parecem ser onde os meninos estudando
e veem vídeos dos adversários, o escritório do treinador, a parte da academia que
está cheia de aparelhos, pesos e todas essas coisas que não sei para que servem,
e terminando o passeio, finalmente o vestiário.

Estou prestes a entrar, então, eu paro na porta igual uma estátua de pedra.

MEU SENHOR! Estão todos seminus. Tampo os olhos com as mãos o mais
depressa que consigo, evitando ver coisas que não quero nesse momento. Não
tive tempo de reparar em todo mundo, apenas vi um bando de homens
praticamente nus com músculos e partes íntimas para todos os lados.

Acho que estou traumatizada.

Isso foi um péssimo jeito de começar.

Ouço uma risada soar perto de mim e retiro as mãos devagar para ver a sua cara
divertida com a situação.

—Acho melhor você ficar sentada nas arquibancadas perto do ringue. —Sugeri
terminando de rir da minha reação espontânea.
—Eu também acho. —Concordo antes de completar. —E não teve graça.

—Teve sim.

—O que está acontecendo? —Uma voz grossa surge se aproximando de mim e


do senhor palhaço aqui.

—Treinador, essa é a Hawkins. A aluna que falei com o senhor, veio acompanhar
ao nosso treino hoje já que nos deu permissão.

—Sim, muito prazer Hawkins. —Estende a mão para mim que a aperto. Desisto de
tentar consertar o meu nome.

É visível pela sua forma que é um treinador durão. Estrutura corporal grande, voz
grossa e cara fechada. Com certeza esse cara não tem papas na língua.

—O prazer é meu treinador, obrigado pela permissão. —Agradeço soltando sua


mão da minha.

—Abri uma exceção para você pelo pedido da professora Smith e de Liam, espero
que contribua para o seu trabalho, e por favor, não espalhe informações
importantes dos treinos. —O seu jeito intimidante poderia assustar qualquer um
no meu lugar, mas não a mim.

—Sim senhor, não precisa se preocupar.

—Seja bem vinda. Pode me acompanhar se preferir.

—Claro. —Sorrio discretamente não me deixando intimidar por ele.

O acompanho enquanto me mostra a arena, cada sala que passamos,


equipamentos, e instalações, explicando cada coisa até irmos para a parte onde
fica o ringue e as arquibancadas, durante esse tempo, os garotos ficam no
vestiário colocando os protetores e todo o necessário para o treinamento. Sento
no momento em que começam a entrar no ringue para o iniciar do treino.

Todos colocam seus capacetes e o treinador passa uma série de exercícios para
começarem trabalhando com a velocidade. Se posicionam na linha de fundo do
ringue e patinam correndo indo e voltando sem parar, fazem isso tudo em
quarenta e cinco segundos freneticamente. Patinando até não sentirem mais os
dedos dos pés.

Depois desse exercício, fazem outros usando as pernas enquanto os goleiros


trabalham na outra metade do ringue. Trabalham exercícios usando o manuseio
dos tacos e os discos, manobras, tacadas no gol, fora outros que não faço a
mínima ideia. Apesar do treino ser intenso, todos se divertem.

Qualquer um consegue ver de longe como todos se dão bem, que gostam de
estar aqui e não é algo pesado de se fazer, uma hora ou outra os vejo rindo e
brincando entre si. Fico atenta no treino do início ao fim, fazendo anotações no
meu bloco de notas no celular para digitar e trabalhar depois em cima disso. Para
quem estava surtando, estou me saindo muito bem, não tive muito contato com
eles, então, tudo certo por aqui.

Fazem uma pausa no treino para beberem água enquanto vejo o treinador arrastar
um quadro branco com rodinhas e uma caneta na outra mão para o gelo.

—Ei, você que é a nossa nova capitã? —Um deles pergunta alto devido à
distância, chamando a atenção para si.

—Capitã?

—Sim, ouvi boatos sobre você. Por aqui as notícias correm rápido quando
envolvem alguém com o nosso capitão. —Esclarece após perceber minha
confusão. Ele tem os olhos verdes com a pele bronzeada. Impossível não ser
bonito desse jeito, o que é isso? Um time ou modelos?

—Infelizmente eles são verdade, eu confirmo tudo. —Respondo de forma direta, o


que os faz ficar surpresos. —O capitão de vocês é um idiota. —Falo de forma
desdenhosa, e todos riem.

Estamos falando alto agora, sendo assim, todos aqui estão nos ouvindo, inclusive
Liam que agora está murmurando algo para eles, mas não consigo identificar o
que.

—Então, acho que daqui a pouco teremos oficialmente uma nova capitã.

—Acho que você está se precipitando. —Devolvo.

—Por enquanto esse posto é seu, são as regras. —Outro cara do time fala,
também tem a pele morena, mas com tatuagens espalhadas pelo braço. Um treino
bastou para entender perfeitamente o porquê de se acharem tanto. —E nada mais
justo nós te chamarmos assim se você vai vir assistir aos nossos treinos.

—Quem criou essa regra?

—Os anjos do hóquei. —Responde outro de cabelos loiros, parece uma versão do
JJ de Outer Banks do hóquei. Será que tem um Rafe também?
—Tudo bem, eu aceito ser a capitã de vocês com uma condição. Quero que
façam um show agora, se no final eu gostar, aceito a proposta. —Essa é a ideia
mais idiota que tive até hoje. Um pouco de diversão não faz mal, não é?

Podem ser competitivos como todos os jogadores de hóquei são, mas, aceitar
uma idiotice dessas? Acho que não são tão idiotas a ponto.

—Por que nós?

—Tenho que saber se estão prontos para terem uma capitã, e pra isso preciso
saber se são tão bons quanto falam. —Param olhando para os rostos um do outro.
E assim, eles me mostram que eu estou errada.

Jogadores de hóquei são competitivos, em qualquer ocasião! Isso é um fato. Sem


“mas” e vírgulas. Eu me dou conta disso somente segundos após soltar as
palavras erradas.

—Desafio aceito. —Eles se reúnem formando uma roda decidindo o que cada um
vai apresentar. —Podemos começar?

—Quando quiserem.

O de olhos verdes, que foi o primeiro a falar comigo, apresenta o que cada um irá
fazer. Primeiro Jason, que descubro ser o de pele bronzeada com tatuagens no
braço, vai fazer uma mágica para abrir o show.

Ele mostra as duas mãos abertas para mim, esconde o polegar de uma das mãos
e as junta como se estivesse arrancando o dedão da mão com a outra, clássico. É
tão ruim que o faz se tornar bom. Sinto uma pequena sensação de saudades por
todas as vezes em que fiz isso.

Os segundos são Stephen, o de olhos verdes, Adam, a versão do JJ de Outer


Banks, e Brandon, de pele negra e olhos castanhos mais claros, um verdadeiro
gato, junto com Nick, Dylan e Luke.

Antes de começarem escuto uma música soar pela arena em um tom baixo pelo
local. Nick, Dylan e Luke se posicionam no centro do gelo e começam a dançar a
música “A night to remember” de High School musical três, eles fazem o
movimento com as mãos como se estivessem com o terno igual a coreografia.

Não acredito no que eu estou vendo! Acho que estou na Broadway. Alguém filma
isso? Homens enormes estão dançando High School Musical!
Stephen, Adam e Brandon fazem a parte das meninas dançando em pares com os
meninos, estão se saindo muito bem. Bem demais aliás. O esforço, e com certeza
a mentalidade de que estão arrasando, é o melhor.

No final, param segurando cada um o seu par pela cintura, igual nos filmes
quando a mocinha está prestes a cair, mas o cara a impede. Isso está sensacional.
Seria muito errado eu pedir para permanecerem assim até eu abrir o celular e tirar
uma foto?

O terceiro e último é Nate, um de olhos azuis com cabelos escuros, e Peter que é
ruivo de olhos castanhos, ambos não haviam falado ainda diretamente comigo.

—Peter, você sabe por que a mulher do Hulk se divorciou dele? —Pergunta rindo
antes de terminar a própria piada.

—Não sei, Nate, por que? —Peter fala rindo junto com Nate. Os dois se olham,
descaradamente segurando a risada.

—Porque ela queria alguém mais maduro. —Termina segurando a risada e


falhando totalmente. —Ele é verde. —Explica e desata a rir junto com Peter e
todos do time que assistem pacientemente.

Depois que terminam percebo que estou rindo também, rindo até a barriga doer,
sabia que iria amar desde o momento daquela mágica. Inventei esse desafio
achando que iriam ignorar e esquecer esse negócio de “capitã”, ainda bem que
pensei nisso rápido porque foi da forma mais boba e divertida possível. Esperava
chegar aqui e encontrar um monte de atletas nojentos com os egos maiores que
esse campus, mas tudo o que encontrei foi isso.

Liam apenas observou e riu durante toda a situação, acredito que deve conhecer
bem o time que lidera.

—Passamos? —Fala Adam ao me pegar rindo emocionada com a apresentação


voltando a atenção do time para mim. Eles me olham com expectativa,
aguardando a minha resposta. Seus olhos mal chegam a piscar.

—Com dificuldades, mas sim. —Digo após do que parece para eles uma
eternidade. Esse momento entrou para o ranking dos melhores.

Comemoram como se tivessem ganhado a final de um campeonato, pulando um


em cima do outro como animais.
—Todos prestando atenção aqui! —O treinador chama a atenção para o quadro ao
seu lado, acabando com a farra. Meu Deus, quanto tempo ele ficou ali quieto?

Eles se aglomeram em volta do quadro que, pelo o que eu entendi, estão vendo
sistemas táticos. Os meninos tem total atenção a toda e qualquer palavra que sai
da boca do treinador. Depois da explicação, se dividem em dois times, o primeiro
é composto por Liam, Luke, Dylan, Nick e Nate com Peter como goleiro, o
segundo time tem Jason, Brandon, Adam, Stephen, Nash um dos atacantes
reservas, e Ryan, outro goleiro reserva. São bem reservados comparado aos
outros.

Fazem uma partida de um contra um, time um contra time dois, como se
estivessem jogando uma partida real, aplicando o sistema tático e vendo o que
funciona ou não. São dois períodos menores direto, um ataca e o outro defende,
invertendo em seguida até o tempo acabar.

Analiso Liam durante toda a partida, ele é um dos que mais se dedicam dentro do
ringue, mesmo sendo apenas um treino. Está sempre focado e dando o máximo
de si; não estava brincando quando disse que é o melhor, no dia em que fui ao
seu jogo dava para ver. Evidentemente é um dos melhores da equipe, não é à toa
que sabe muito bem disso. Porém, o time em um todo é muito bom, todos jogam
muito. É certeza que vão chegar no mínimo na semifinal.

Termina o horário do treino e o time entra para o vestiário. Saio indo esperar por
Liam na parte de fora do estacionamento, depois de um certo tempo, o avisto se
aproximar junto com Nate e Jason, com a roupa que estava antes e sua bolsa
sempre pendurada em um dos seus ombros com os cabelos molhados.

Mesmo soando e ofegante durante o treino, o idiota ainda estava gato pra
caramba. Da mesma forma que está agora.

Os músculos tensos e as expressões que mostravam que estava concentrado,


além de ser fofa, o deixava ainda mais atraente. E gostoso. A forma clara como
mostrava que estava dando o seu máximo lá dentro é de fazer o corpo formigar.

—Então, quer dizer que sou um idiota? —A pergunta é direcionada a mim assim
que chega perto.

—Sim, você sempre foi e sabe disso. —Os garotos passam por nós se
despedindo de sua “capitã”, aproximando-se de outro carro.
—Desculpe por isso. —Fala receoso, esquecendo das nossas provocações
diárias.

—Eles são divertidos, eu gostei de vir ao treino. Algo que não me imaginei falando
depois de sair daqui. —Digo sincera. Seus ombros relaxam, aliviando a pequena
tensão por não saber minha opinião quanto à brincadeira. Isso faz a pontinha do
meu peito se apertar.

—Acredito que vai querer voltar mais vezes então, capitã. —Abre um pequeno
sorriso ao dizer.

—Aí meu Deus, vou ter que aturar isso daqui pra frente? De onde eles tiraram
isso?

—Não sei. —O encaro com uma expressão de dúvida. —Ei! Não tenho nada com
isso. —Pausa. —Mas eu gostei. —Bufo diante da sua declaração.

Ele insisti em me levar a escola aonde trabalho, pois não quer que eu me atrase
por culpa sua. Durante o trajeto conversamos um pouco, não por muito tempo,
visto que a escola não é tão distante assim. Como combinamos, depois do fim do
meu horário, passo em sua casa para repor à aula.
Capítulo 14

MAYA

No caminho para a casa de Liam, decido ligar para minha mãe.

Ontem não conseguimos conversar por ligação como normalmente, sei que fica
preocupada quando não conversamos, que quer estar atualizada de tudo o que
anda acontecendo por aqui. É apenas ela e meu pai em casa, mesmo tendo
amigos para conversa e sair, diz que sente falta de nós lá. Então, busco sempre
manter contato e contar como está a vida por aqui e matar um pouco a saudade
que sinto deles.

Desligo no segundo em que chego. Entro e encontro Nick na sala. Tenho meio que
um déjà vu no momento em que o vejo, está sentado com a mesa do centro da
sala em sua frente e a torre de peças empilhada em cima, exatamente como
aquele dia. A única diferença é que dessa vez Luke e Dylan também estão
presentes. Se parar sei que vou ficar tentada a jogar com ele, então, só passo
dizendo ‘oi’ e subo.

—Vamos acabar logo com isso. —Fecho a porta atrás de mim após entrar no
quarto.

—Calma aí, Hawkins. —Contesta se sentando em sua cama.

—Achei que tivesse esquecido de novo, vai que dessa vez você resolvesse trazer
sua companhia para cá.

—Muito engraçadinha.

—Eu menti, Brown? —Farpo.

—Se continuar assim vai ficar sem brownie. —Aponta o dedo para mim
ameaçando. Merda, isso é jogo sujo.

—Certo, chega de conversa. —Recuo, porque se trata de brownies.


Sento em cima da cama ao seu lado, puxo o meu fichário e um lápis de dentro da
minha bolsa.

Estudamos a parte pesada da matéria na última aula que repus e corrigi a folha de
exercícios que havia passado, temos mais uma aula depois dessa, sendo assim,
vou usar a de hoje para praticar o conteúdo em geral. Acredito que está tudo
certo, e que tem boas chances de se sair muito bem na segunda chamada.

—Quero que faça mais essa folha de exercícios, depois vou corrigir e vejo se tem
alguma coisa que precisamos revisar. —Estendo uma folha para ele que a pega,
começando a colocar a mão na massa.

Enquanto está fazendo os exercícios, leio o meu livro. Sempre tenho um em minha
bolsa, carrego para onde eu for, nunca se sabe quando se é necessário. Tenho
lido bastante nesses intervalos nas nossas aulas, devido que não tenho muito
tempo no resto do dia, ora estou na aula, ora estudando, ora trabalhando.

Depois do que aconteceu, tenho tido um pouco de problemas para sair. Não sou
uma pessoa que gosta de sair com frequência, socializar muito, etc, ainda antes
do quase incidente. Desde que me mudei de país não tive muitos amigos, as
pessoas no Brasil são mais fáceis de se socializar e fazer amizade. Com isso tudo,
acabei gostando da minha própria companhia, de ficar em casa, e principalmente
de ler.

Uma das coisas curiosas que acontecem quando estou lendo é as vezes, do nada,
eu começar a cantar uma música em minha mente totalmente aleatória. Posso
estar tranquilamente lendo uma declaração de amor e uma música de pagode
brasileiro começar a tocar em minha cabeça, e é exatamente o que acontece
agora.

A música “As it was” do Harry Style começa a tocar em minha mente, ao mesmo
tempo que ouço alguém cantarolar a mesma parte da música.

—You know it's not the same as it was. As it was, as it was. You know it's not the
same. —Viro observando Liam cantar a mesma música ao meu lado.

—Não sabia que cantava. —O interrompo.

—Porque não canto. —Diz concentrado em terminar o que estava fazendo, sem
me fitar nos olhos.

—Não foi muito bem o que pareceu. —Rebato.


Ninguém acreditaria em mim se falasse que Liam Bronw sabe cantar, e muito bem.
Qual é?! Qualquer um ficaria desacreditado, eu estou. Poderia ter esperado
qualquer coisa, menos essa. Jogador de Hóquei e cantor? Que combinação é
essa?

Se não quisesse seguir carreira profissional no hóquei, conseguiria uma carreira


incrível como cantor tranquilamente com essa voz. Certeza que faria sucesso.
Acho que deveria pedir um autógrafo, caso vire um cantor ou jogador super
famoso, posso conseguir uma boa grana depois.

—É nada demais.

—Esperava tudo, menos isso. Desde quando você canta?

—Nunca. Só gosto de cantar as vezes, me acalma. —Finalmente ele me fita ao


responder.

—Se quisesse poderia investir tranquilamente em uma carreira. Me dá um


autógrafo? Pode me render uma boa grana mais tarde. —Ele ri com o pedido.

—Claro que posso dar um autógrafo para a minha fã número um. —Sorri de lado.

—Ah, cala a boca. —Murmuro rindo, o que o faz rir ainda mais.

—Hum, não sei. Por que não cala ela pra mim? —Provoca. Que cantada de quinto
ano.

Nossas risadas aos poucos diminuem, restando apenas um sorriso enquanto nos
olhamos. Perco o rumo em seus olhos intensos e profundos que prendem,
acalmam e roubam toda a minha atenção para eles. O castanho dos seus olhos
suga todo o ar do ambiente. Ficamos assim durante um minuto, sem quebrar o
mínimo de contato.

—Gosta de Harry Style? —Uso para quebrar o clima que se instalou.

Quebrando o contato primeiro, concentrada em olhar para o livro e fechá-lo por


alguns segundos até estar recuperada para voltar meus olhos para ele novamente,
mas os dele parecem nunca terem deixado sua posição de me olhar.

—Não, mas a música é boa.

—Qual um estilo de música que você gosta, mas que ninguém espera? —Pensa
alguns segundos antes de responder a minha pergunta diferente.

—Jazz. Sou eclético, gosto de ouvir de tudo um pouco.


—Pelo menos agora não sou a única pessoa que gosta de jazz. Mas tem razão,
não é um estilo que imagino você ouvindo. —Parece surpreso com o início da
minha fala, pois seus olhos se arregalam um pouco por uns breves instantes.

—Sou uma caixinha de surpresa, Hawkins, e penso que você também é.

—Você toca? —Questiono assim que reparo em um violão encostado em sua


escrivaninha próximo à janela do seu quarto. Ele segue a direção dos meus olhos,
entendendo do que eu falo.

—Só um pouco. —Dá de ombros.

—Quantas coisas você sabe fazer? —Tento lembrar todas as tantas coisas que ele
já disse que fez.

—Não muitas, meus pais gostavam de me colocar em algumas atividades


extracurriculares.

—Se me perguntarem o que eu sei fazer, vou ficar uns vinte minutos tentando
pensar em uma. Deve ter sido ruim ser uma criança e fazer tudo isso.

—Às vezes era, mas agradeço por ter feito.

—Quero te ouvir tocar. —Levanto indo até onde o violão está, o trazendo e
estendendo para ele.

—Está falando sério?

—Estou, é só uma música. Não é como se você estivesse fazendo uma serenata
pra mim, só quero ouvir você cantar. —Ele o pega e o ajeita quando me sento de
novo, dessa vez em sua frente.

—O você quer que eu toque?

—Qualquer coisa, não me importo. —Pensa por alguns segundos e começa a


posicionar os dedos nas cordas.

Tocando a introdução da música, já reconheço qual escolheu. Fugindo totalmente


das que pensei que pudesse ser suas opções. A melodia de “Dream a little dream
of me” soa por todo o quarto. Eu amo músicas antigas.

—“Stars shining bright above you

Night breezes seem to whisper "I love you"

Birds singing in the sycamore tree. Dream a little dream of me”.


Ele canta concentrado em cada nota, o observo fazer cada dedilhar dos seus
dedos até que decido fechar os olhos e aproveitar a música.

—“Say ‘Night-ie night’ and kiss me

Just hold me tight and tell me you'll miss me

While I'm alone and blue as can be

Dream a little dream of me”.

A sua voz é tranquila e suave. Poderia ficar horas o ouvindo cantar. Ela pode
acalmar todas as vozes e barulhos existentes. É o som que você quer escutar
quando as coisas desmoronam e dentro de você habita uma profunda tristeza. Foi
uma situação bem específica, eu sei, mas seria isso que eu pediria para ouvir
quando o que eu quero é apenas sentir paz.

Sua voz é como se o Justin Bieber e o Harry Style tivessem tido um filho. Tá bom,
isso foi terrível, não sou boa em analogias, fingi que isso não aconteceu.

No fim da música, abro os olhos encontrando os dele focados em mim.

Fiquei tão concentrada na música, ouvindo sua voz nas letras da música que não
os senti sobre mim. Mas agora eu estou, e eles queimam. Incendeiam toda a
nossa bolha. Tentam ler o que se passa em minha mente, transmitindo calor pela
extensão do meu corpo. Chamam para queimar com ele. No mesmo tempo que
eles são intensos e sufocantes, são como brisas frescas e calmas. Sinto eles me
prenderem e desviar o olhar se torna impossível. Está quente. Estou pegando
fogo. Tudo está completamente…bom.

Quando me dou conta, a atmosfera de antes volta a se instalar entre nós. Uma
bolha é formada ao nosso redor. É apenas eu e ele e nossas chamas de calor.
Meu ar está acabando, preciso lembrar como respirar, mas não consigo porque
estou concentrada demais em seus olhos.

Dessa vez quem quebra o contato é ele, levantando e colocando o violão de volta
no lugar. Pisco voltando a cair em mim. Lembrando de como respirar, eu solto o ar
preso no meu pulmão.

—E aí, o que achou?

—Sua voz… é incrível! —Me viro para o olhar porque estou começando a perceber
que não consigo ficar sem o fazer.
—Não é assim…

—Eu poderia passar o dia ouvindo você. —Admito.

Silêncio. Aí não…está acontecendo de novo.

—Terminou os exercícios? —Quebro qualquer atmosfera estranha que possa


iniciar de novo.

—Faltam dois.

—Certo —Concordo engolindo em seco.

Ele pega a folha terminando os exercícios e eu volto para o meu livro. Mas estou
pensando demais para conseguir me concentrar em ler, apenas fico encarando as
letras no papel na minha mão, digerindo tudo o que acabou de acontecer.

Milhões de perguntas surgem em minha mente, criando uma confusão de


sentimentos e pensamentos dentro de mim. É a terceira vez que acontece, que
essa tensão aparece entre nós. Talvez, possa ser só atração física entre ambas as
partes, é algo totalmente normal entre duas pessoas do sexo oposto. Todo mundo
pode sentir atração por alguém, principalmente uma pessoa com a estrutura
corporal de Liam.

É estranho sentir isso depois do dia no ônibus, como se eu pensasse que nunca
mais eu poderia sentir isso com uma pessoa, que meu corpo pudesse reagir
positivamente a alguém. Porém ele está me mostrando que estou errada. Mas,
nada vai acontecer. Não com Liam. Não agora. Não confio nele a esse ponto, de
me entregar e poder me sentir vulnerável, nem sei se é recíproco da sua parte,
posso estar muito bem imaginando coisas. Não sei se sou uma pessoa boa pra
isso.

Nunca me apaixonei, não sei o que é sentir que um sentimento é recíproco, muito
menos amar uma pessoa no quesito amoroso. E talvez, isso nunca aconteça. Seja
o que for que esteja acontecendo, em breve vai passar e vai ser como se isso
nunca tivesse acontecido. Sou muito problemática para estar com alguém.

—Terminei. —Fala me estendendo a folha.

—Muito bom. —Admito após corrigir os exercícios. Vejo um lampejo de orgulho se


passando pelo seu olhar.
—Pera aí, isso foi um elogio? —Estou certa, pois pela sua expressão corporal, ele
está preste a ter uma explosão de felicidade interna. É justo, sendo que trabalhou
duro nas nossas aulas.

—Não, retiro o que disse.

—Tarde demais. —Abana o dedo indicador para mim. —Você sabe que sou
inteligente.

—Você é inteligente quando se dedica. —Solto um suspiro pesado. —Tudo bem,


sempre achei que a faculdade fosse mais fácil para vocês atletas, digo,
academicamente sabe?! Com eles distribuindo dez de graça. —Confesso.

—Quem dera, conheço uns caras da Davidson que ganham notas de graça dos
professores sem fazerem nada. Mas aqui na Mavericks eles nos fazem dar duro.

—Como esta as outras matérias?

—Bem em todas, não sou o atleta burro que pensou que eu fosse.

—Não pensei que fosse burro, talvez um pouco, só pensei com certeza que fosse
um idiota.

—Admiti então que seu julgamento estava errado?

—Talvez, nunca vamos descobrir.

—Vou levar isso como um sim.

—Pelo menos admito que é inteligente.

—Inteligente o suficiente para passar na segunda chamada? —Algo no seu tom de


voz é diferente. Medo, preocupação, insegurança talvez.

—O suficiente para gabaritar. —Asseguro vendo se alivio um pouco da sua


tensão.

—Preciso dessa nota, Hawkins. —Sua voz se suaviza levemente, mas está claro
que fala sério. Está inseguro.

—O time é tão importante assim?

—Você não tem noção, é tudo pra mim.

—Tudo pra você? Uau. É demais.


—Demais é sentir que sua vida depende disso, que se não passar, seu sonho e
sua vida foram por água a baixo por um erro estúpido seu. Por não ter dado o seu
melhor, e sua vida vai passar a ser algo monótono. Que se não der certo agora,
não vai dar nunca mais. Que não foi capaz de sequer conseguir um contrato com
uma liga sendo tão bom como dizem. Quer mesmo falar de algo ser demais?
—Meu rosto congela de espanto.

—Caramba…

—É, isso resume bem. —Fecha os olhos procurando controlar o que quer que
fosse dentro de si, organizar seus pensamentos.

—Você disse que ama o hóquei. —Falo após alguns segundos quieta.

—Amo de verdade, por isso essa pressão. No momento que estou no gelo, não
importa mais nada pra mim, é apenas eu e o disco. Todo o resto se apaga, nada
me tira a concentração. É o momento em que me sinto…vivo, vou fazer o que for
para chegar aonde eu quero. Não posso falhar. —Abre os olhos, mas ao invés de
me fitar, ele os fixa em sua frente.

—E se falhar? O que vai fazer?

—Vou virar comentarista, ou treinador. —Vira seu rosto para mim ao falar. —Estou
focado no meu plano A por enquanto.

—Vai conseguir Liam, sei que vai. Você é bom, muito bom. —Garanto.

Sorrio para ele.

—Obrigado. —Sorri pequeno de volta.

—E você, o que vai fazer?

—Quero escrever, por isso faço jornalismo.

—E o seu plano B?

—Não pensei nisso. Amo escrever, sempre gostei desde nova. Escrevia textos e
poesias no meu bloco de notas, então, por que não? —Dou de ombros. — A ideia
de ser uma escritora famosa e criar livros não é uma das que mais me atrai, mas é
algo que posso mudar de ideia e fazer um dia. De resto, não pensei muito.

—Não vai fazer fofocas falsas minha por aí, Hawkins. —Sorrio com o pedido.

—Vai que não é falsa, ninguém iria saber. Você já tem a fama necessária para isso.
—Não vou discordar.

Capítulo 15

MAYA

Não estou bem hoje.


Tem dias em que eu acordo e simplesmente não me sinto bem, ou no meio do
meu dia me sinto mal mesmo nada tendo acontecido. Hoje é uma dessas vezes.
Tudo bem, é normal nos sentirmos assim, nem todos os dias o sol vai nascer.

Nesses dias, tudo o que eu quero é me esconder para que ninguém me veja.
Apenas ficar deitada olhando para o teto, vendo o tempo correr. Sentir meus olhos
arderem e lágrimas salgadas escorrerem. A vontade de ir embora e o nada se
fazerem presentes. A solidão virar amiga e os sorrisos um estranho.
Muito antes do quase incidente, isso já acontecia, tinha crises de ansiedades e
baixa autoestima. Não me surpreende que isso piorou depois do que aconteceu,
aconteceu. Uma vez quando criança minha ansiedade e emocional estavam tão
fortes que fiquei internada por dois dias com minha mãe preocupada. Mas depois,
nesses dias, Anna estava comigo.

Não parei de ter por causa de Anna, pelo contrário, continuaram da mesma forma.
Porém ela estava lá, sempre me entendendo da melhor forma possível porque
sabia como era. Na época que me mudei sentia muito sua falta todos os dias de
alguma forma. Sinto até hoje, mas aprendi a lidar com ela. Ainda assim, tem dias
que ela parece mais forte. Parece insuportável.

Riley foi como um pequeno vagalume no túnel dessa confusão.

Em um novo país, com pessoas totalmente diferentes e com culturas diferentes,


eu sentia que não me encaixava. Que nunca iria me encaixar, um peixinho fora
d’água. Ela me mostrou que eu poderia sim ter amigos e me adaptar. Era só
questão de tempo para tudo começar a entrar no seu devido lugar.

Sempre vou ser grata pela nossa amizade, pois foi ela que me deu forças para
tentar mais um dia, e mais um outro. Mostrou que nem todas as pessoas são
iguais, tem sempre uma exceção.

Desde que decidi dar aulas para Liam, tenho negligenciado meu tempo com elas.
Não tenho muitos amigos aqui, e deixar de lado os que tenho não está correto.
Por isso, mesmo não me sentindo bem, vou tirar esse tempo agora para elas, e a
primeira coisa que eu faço é ligar pra Anna.

—Da próxima vez, vou querer um doce para compensar o meu perdão. —Informa
Anna ao atender no segundo toque.

—Tá bom, só porque você está merecendo.

—Claro, sou a melhor amiga que você tem. E ainda estou aceitando dividir você
com Liam. Falando nisso, tenho que bater um papinho com ele. Tá achando que
pode chegar assim e sentar na janelinha?! eu em. —Riu com seu resmungo.

—Eu concordo super amiga.

—Me conta as novidades da semana.

… 🏒🏒 🏒🏒 🏒🏒
.. .. …
—Okay, deixa eu ver se entendi. Ele fez brownies para você como pedido de
desculpa, ele sabe tocar e cantar bem, além de ser capitão do time de hóquei e um
gato?!

—Sim.

—Por que você ainda não está namorando com ele?

—Pelo mesmo motivo que você nunca namorou.

—É um bom argumento, mas isso não apaga o clima que rolou entre vocês. Não
pode negar isso.

—Não, não posso. —Suspiro derrotada.

—Sabe, não estou incentivando nada, mas já incentivando, ele parece ser um cara
legal, e dificilmente eu erro nas minhas análises, acho que devia dar uma chance,
pelo menos para uma amizade. Não é errado tentar ou abaixar um pouco a
guarda. Ele já deu algum indício de que você não poderia confiar nele?

—Não.

—É um bom começo. Pra você viver as coisas boas você tem que se arriscar, só vá
devagar. Eu vou estar aqui amiga, sempre vou. Estarei aqui pra te apoiar.

—Vou pensar na possibilidade. E você, tem novidades pra mim?

—Menina, você não sabe o que aconteceu…

Desligo após um bom tempo de conversa com Anna. Ouço a portar ser aberta e
bater logo em seguida, identificando que alguém entrou no apartamento, saio do
meu quarto e vejo que é Riley. Ela faz karatê três vezes por semana, é uma das
suas poucas paixões, além do seu namorado. Já a vi lutando e posso dizer com
toda certeza que é uma das melhores, pena que esportes assim ainda não são tão
valorizados, caso contrário, poderia facilmente estar ganhando uma boa grana.

Uma das vantagens de se ter uma amiga que luta, é que, se entrar em alguma
confusão ou precisar de alguém para acabar com um idiota por aí, você já sabe
para quem ligar. Eu por outro lado sei nem dar um tapa na cara de alguém, se
Riley precisar da minha ajuda para isso um dia, vou fazer o meu melhor para
acabar com a raça da alma mal amada, mas isso não quer dizer que vou ganhar a
luta, ou que não vou sair precisando ir para o hospital.

—Muito cansada?
—Meu corpo inteiro dói. O meu olho tá inchado, levei vários socos hoje, mas o
treino foi legal. —Resmunga fazendo uma careta de dor.

—Isso responde à pergunta. —Acho incrível como ela faz o que ama, que é bater
nos outros e não é presa por isso. Fazer luta realmente tem seus lados bons. E os
ruins, pelo visto. —Tem algum compromisso agora a noite?

—Tenho, com a minha cama.

—Ótimo, vamos fazer uma noite só nossa.

—Meio que uma noite das meninas? —Pergunta ainda parada próxima a porta
com sua bolsa de atleta pendurada em seu ombro.

—É exatamente uma noite das meninas.

—Por favor, vamos fazer outro dia. —Implora.

—Faz um bom tempo que não passamos um tempo juntas, qual é Riley?! Eu não
sei quando vamos ter tempo de novo. —Alego.

—Você vai fazer seu brigadeiro?

—Sim.

—E vamos jogar xadrez?

—Não poderíamos deixar de fora.

… 🏒🏒..🏒🏒…🏒🏒…
—Vamos karateca, não tenho o dia todo. —Murmuro com a demora de Riley que
analisa o tabuleiro com precisão sentada na mini bancada da cozinha comigo em
seu lado.

—Tenha calma, guria. Sua vez. —Diz após deslizar uma peça, uma que foi uma
péssima ideia nessa situação.

—Foi muito inteligente. —Admito para a sua arriscada tentativa de jogada. —Mas
não tanto dessa vez.

—Você é uma desgraçada. —Movo um dos meus cavalos a encurralando.


—Xeque-mate. Rá, ganhei de novo. —Comemoro. —Sabe o que isso significa
Riley Calloway? —Provoco.

—Que vamos maratonar Barbie pela milionésima vez seguida? —Fecha os olhos
ao falar, como se fosse uma tortura pronunciar as palavras.

—Exatamente.

Todas as vezes que jogamos xadrez fazemos uma aposta, são as regras. Posso
ganhar muitas vezes, mas ela ganha muito mais. Virou uma coisa nossa desde que
nos conhecemos, noite das meninas sem um bom jogo de xadrez é igual a “não
teve noite das meninas”. Toda amizade tem algo que é unicamente apenas dessa
amizade, e a minha com Riley é uma boa aposta em um jogo de xadrez.

—Pizza de cinco queijos? —Digita no telefone.

—Ainda pergunta? É óbvio.

Meu celular vibra com a notificação de mensagem nova, abro ao perceber que é
de Liam.

Liam: Vc tinha q ter visto uma menina ter tacado um sanduíche na cara do Dylan
hoje no refeitório.
Eu: Ñ ACREDITO! Pq?
Ele: Os meninos desafiaram ele esses dias pra ver se conseguia ficar com uma
menina em menos de 3 minutos, acho que ela descobriu.
Eu: Foi merecido, até eu jogaria. Porém tbm derramaria suco depois pra ficar um
lanche completo.
Ele: Q malvada.
Eu: Homens…
Ele: Pode terminar a frase lindinha. Homens oq? São seres irresistíveis? Obrigado
pelo elogio.
Eu: Elogio de maior babaca? Muito bem, vc é a representação perfeita.
Ele: nss, agora magoou meu coraçãozinho =(
Eu: Para de drama, não caio nessa.
Ele: sua chata sem graça.
—Quem é para você estar sorrindo assim? —A voz feminina de Riley me tira da
conversa, me pegando no pulo.

—É o Liam e não é nada importante. —Antecipo, não havendo reparado que


estava sorrindo antes dela comentar.

—Mas não parecia, desde que nos conhecemos é a primeira vez que te vejo
assim.

—Assim como?

—Passando muito tempo com um cara, não parando em casa e sorrindo para o
celular igual uma bobona.

—Estou ocupada, dou aulas pra ele e tenho feito o trabalho da professora Smith.
Não tenho muita opção em relação a passar tempo com ele

—E sorrir igual uma criança quando vê doce também não é uma opção?

—Meu Deus, quanta pergunta. —Bufo.

—Anda Maya. Desembucha, eu te conheço.

—Não é nada. —Cruzo os braços não querendo abrir o jogo. Ela me olha com
cara de tédio. —Tá bom. Nós meio que nos aproximamos.

—Aproximamos? Vocês são amigos?

—Não sei, talvez.

—Tem certeza disso? —Gasto uns bons segundos, pensativa se devo falar ou
não. Porém é Riley, minha melhor amiga também, com quem moro e que não tem
problema se eu falar.

—Rolou um clima na última aula que tivemos, foi nada demais. —Ela levemente
arregala os olhos abrindo um sorriso animado.

—Nada demais? Isso literalmente tem tudo demais.

—Para! Não vamos fazer isso. —Aponto o dedo pra ela.

—Você sabe que não tem problema, certo? Nem todos são iguais, Maya, não quer
dizer que um foi um nojento com você, que todos vão ser. Você não precisa
desconfiar de todo mundo.

—Eu fui assediada. Em um ônibus. —Cuspo as palavras sentindo minha garganta


se fechar.
—Eu sei, e isso é uma droga. Você pode dizer em voz alta. Não tenha pena de si
mesma, porque isso só faz as pessoas terem de você. São palavras, faça elas
serem apenas isso. —Balanço a cabeça afirmando, suspiro pesado.

Ela puxa minha mão nos levantando e trazendo para o centro da sala, liga a
televisão colocando a música “good4 you” da Olívia Rodrigo, que soa por todo o
apartamento.

—O que vamos fazer?

—Dançar por cinco minutos. Precisamos relaxar um pouco.

Ela começa a mexer o corpo enquanto o meu continua parado no lugar, segura
minhas mãos me incentivando a dançar junto com ela. Acho que ela não estava
brincando quando disse.

Dançamos, rodamos, pulamos nos divertindo ao som da música, gerando várias


risadas que aquecem o ambiente e o completam.

No fim, estamos cansadas, mas totalmente relaxadas, nos livrando de toda aquela
tensão, só paramos ao escutar batidas na porta nos lembrando da pizza.
Assistimos aos filmes da Barbie comendo até estarmos caindo de sono.

Passar um tempo com Riley nunca é entediante ou chato, todas as vezes são uma
memória a mais para se lembrar. Podemos passar o dia apenas deitadas sem
dizer uma única palavra, e ainda sim, não me arrependeria de todo o tempo gasto.
Coisas assim me fazem lembrar que existem amizades que valem a pena e que
mesmo que um dia isso mude, não vou me arrepender.

E pensando sobre o assunto que falei, é cedo para se preocupar. Mas uma coisa
que Riley me disse, é verdade.

São apenas palavras.


Capítulo 16

LIAM

Hoje é a última aula que tenho com Hawkins antes da segunda chamada.
A nossa última aula foi…diferente. No quesito que eu tive uma das conversas mais
sinceras na minha vida. Nunca havia sido tão verdadeiramente sincero com
alguém como fui com ela, mais que isso, eu sei que ela também foi comigo. E
também, sei que realmente quis saber sobre mim. Que sentiu. Sentiu a barreira
começar a rachar.

Não foi a primeira vez. O clima, o calor que aumentava e se alastrava por segundo,
e o olhar íntimo demais para apenas duas pessoas que se conhecem. Quebrando
a parede invisível estabelecida entre nós. Foi necessário. Não no sentido de “tinha
que acontecer”, digo no sentido de que depois eu não conseguia parar, eu
precisava olhar nos seus olhos de novo. Foi muito mais intenso do que um toque.
Porra…nenhum toque foi tão intenso como aquele olhar. Nada daquele tipo me fez
ficar como estou agora. Minutos e minutos minha mente volta para aquele
momento.

Mas sei que, não vai ser simples, nada com Maya Hawkins é simples, pelo pouco
que a conheço, sei que não vai ser igual as outras garotas. Porque Maya não é
igual as outras garotas, é Maya. Porém quero que me permita entrar. Quero que
me deixe conhecê-la, que abaixe os muros comigo, que me deixe ver seu caos.

Ainda que todo aquele momento de nossos olhares se encontrarem, a bolha


crescendo ao nosso redor e o lampejo de chamas entre nós foi incrível, a melhor
parte foi poder conversar com ela, onde havia uma troca de ouvir e falar.
Compreensão.

Uma das maiores vontades da minha mãe era que eu aprendesse a tocar um
instrumento. Assim como as outras trilhões de coisas que estava disposta a me
colocar para aprender, essa foi mais uma dessas. E com certeza sou grata a ela
por isso, por ter me proporcionado conhecer minhas paixões. Agradeço porque
consegui criar memórias com ela através de cada uma delas.

De quando ela me levava e assistia aos treinos de hóquei não importava como e
qualquer que fosse o clima daquele dia, porque sabia que eu amava mais que
tudo. Como de quando eu estava lá patinando e olhava para ela sentada na
arquibancada sorrindo ao me assistir; das vezes que toquei para que pudesse
ouvir sua voz angelical cantar junto comigo. Carrego aquele violão junto com
todas as memórias dela. Por isso não relutei quando Hawkins me pediu para tocar,
fazia tanto tempo, que pensava que tinha me esquecido o quanto aquilo era bom
e importante.

A música para mim é como uma forma de fugir dos meus pensamentos, da
realidade, mesmo que por pequenos minutos. No hóquei eu descarrego tudo o
que sinto, onde me sinto vivo. Na música eu organizo os pensamentos, me
acalmo. No momento de desespero é o refúgio que eu busco; não tem como estar
no gelo o tempo inteiro.

Sua expressão ao me ouvir tocar foi reconfortante, com seus traços e corpo
relaxados, sem nenhuma das preocupações. Totalmente concentrada em
aproveitar cada parte da letra. Fazer a sentir o que sinto quando canto foi como a
levar para o meu mundo. E farei todas as vezes que me pedir. Gosto de ter Maya
no meu mundo.

Nosso horário hoje seria mais tarde, mas, ao sair do treino vejo que enviou uma
mensagem avisando que teria que desmarcar a aula de hoje.

Eu: Pq? É a nossa última aula.


Maya: Tenho que escrever o trabalho e prometi ficar com Mia hoje até mais tarde.
E já repassamos tudo.
Eu: Td bem, eu passo aí para pegar vcs duas e nós vamos para a minha casa. Eu
fico com Mia enquanto vc faz o trabalho. Ajudo você.
Maya: Claro que não, podemos ir para minha casa.
Eu: Deixa disso Maya, sabe que gosto de ficar com ela. Não vai ser incômodo.

Eu: Vamos Hawkins, é só hoje. Eu toquei pra vc quando pediu.

Sei que está pensando pois para de digitar; assim que penso que não vai aceitar,
ela envia uma mensagem falando que tudo bem.

Vou rápido para o estacionamento, entrando no carro e dirigindo em direção à


escola onde trabalha.

Ao chegar, encosto em frente à escola após ver as duas paradas em pé esperando


de mãos dadas. Saindo do carro observo Mia virar o rosto para cima e falar com
ela. Deve ter pedido permissão, porque em seguida vem correndo ao meu
encontro. Me abaixo para a abraçar, a levantando no colo e a rodando no ar,
ouvindo sua risada gostosa.

Fico com Mia no colo a vendo se aproximar vestindo o de costume, calça legging
preta com uma blusa verde militar e tênis, porém dessa vez está com uma trança
jogada por cima do ombro. Sempre linda. Isso é fora do normal.

—Podemos ir agora? O que acha Mia? —Pergunto desviando o olhar para Mia.

—Podemos! —Responde animada jogando os braços para cima.


Abro a porta de trás do carro a colocando sentada no banco, puxando em seguida
o sinto de segurança. Entro depois junto com Hawkins. Converso com Mia por
todo o trajeto até chegarmos em minha casa.

—Vem pequenininha. Pronta pra conhecer meus amigos? —Falo após estacionar,
saindo do carro para abrir sua porta e a desprender do sinto. Ela balança a cabeça
afirmando ao descer do carro, e pega em minha mão.

Hawkins também sai e entramos dando de cara com os três patetas na cozinha
devorando tudo o que veem pela frente.

—Oh, bando de esfomeados, temos visita. Por favor, se comportem. —Peço


chamando a atenção deles para mim.

Luke está segurando a porta da geladeira aberta, Dylan com um sanduíche na


mão e Nick encostado no balcão coloca vários biscoitos na boca, mastiga
parecendo um esquilo com a boca cheia. Todos me observando caindo o olhar
para o pequeno ser humano pequeno de mãos dadas comigo, mostrando um
joinha com o dedo, sincronizados. E voltam a fazer o que estavam fazendo.

—Liam, seus amigos são sempre estranhos desse jeito? —Mia me pergunta
inclinando a cabeça para cima.

Vejo meus amigos comendo na cozinha e respondo: —Sim.

—Vou começar a escrever meu trabalho, consegue se virar sozinho por aqui? —
Hawkins pergunta com sua bolsa pendurada em um dos seus ombros.

—Consigo. Se quiser pode ficar no meu quarto, é mais silencioso pra você.

—Não seria um problema?

—Vou ficar aqui com Mia, meu quarto vai estar disponível, não tem nenhum
problema.

—Obrigado. —Agradece e se abaixa para falar com Mia. —Tenho que fazer dever
hoje, tudo bem se você ficar com Liam por um tempinho? —Mia balança a cabeça
dizendo que sim.

Ela então passa por mim, subindo as escadas indo para o meu quarto.

—O que acha de comermos primeiro? —Pergunto para o mini ser humano ao meu
lado.

—Eu acho uma ótima ideia, tô com fome. —Riu com sua declaração franca.
Vou com ela para o balcão da cozinha e a coloco sentada em cima enquanto
preparo algo para comermos.

—Qual o seu nome mocinha? —Luke pergunta se aproximando de Mia no balcão,


que agora balança os pés.

—Meu nome é Mia, e o seu?

—Eu sou o Luke, aquele é Nick e esse o Dylan. —Responde apontando para cada
um.

—Vocês são enormes. —Eles riem com o comentário. —Parecem o pé grande.


—Finaliza, fazendo todos soltar gargalhadas.

—Você já viu um pé grande? —Pergunta Luke.

—Não, mas imagino ele como vocês.

—Sabe Mia, quando crescer, você vai mudar de ideia. —Fala Dylan.

—Cara, ela é uma criança. —Repreende Nick, dando um peteleco na sua orelha.

—Ué, não deixa de ser verdade. —Rebate.

—Gosta de waffles de chocolate? —Pergunto a ela cortando os dois.

—Ei, eu gosto de waffles de chocolate. —Resmunga Nick.

—Por que você não faz waffles de chocolate pra gente? —Pergunta Dylan, bufo
diante do drama.

Faço a massa dos waffles, as coloco na máquina e depois de prontas no prato as


corto em fatias menores para ser mais fácil na hora em que for comer. No final,
jogo chocolate derretido por cima. Não faço muita quantidade, apenas o suficiente
para a pequena, não posso ficar me dando o luxo de sair da dieta direto. No
segundo em que vou a entregar, Nick me para tentando roubar.

—Tira as mãos! —Bato em sua mão preste a pegar um dos waffles.

—São meus waffles com chocolate! —Mia fala colocando os bracinhos na cintura
fazendo cara de brava. A encaro em choque. É incrível como é tão esperta.

—Desculpe, mocinha. —Ele levanta as mãos em sinal de rendição com expressão


surpresa e assustada no rosto, mas com um tom divertido.

Ela estende os braços pedindo indiretamente para eu entregar o prato, e é


exatamente isso o que eu faço. Ela come com a colher que a entrego, se
lambuzando toda de chocolate. Faço um suco para nós dois e um sanduíche
rápido para eu comer também. Limpo sua boca lambuzada com um pano quando
terminamos.

—O que vamos assistir? —Pergunto para ela ao chegarmos na sala onde os


meninos estão agora.

—Eu gosto de Dora aventureira. —Tiro o controle que estava na mão de Dylan e
sento a pequena em seu lado comigo do outro.

—O que acha de Barbie? —Pergunta Nick sentado no sofá ao meu lado. Sorte
que Mia é pequena, caso contrário não caberia os quatro sentados.

—Barbie é chato, prefiro Dora. —Fala Mia simplesmente, mas pelo som de
espanto que nós quatro fazemos ao mesmo tempo, parece que acabamos de
descobrir que o Brad Pitt terminou com a Angelina Jolie.

—Você não disse isso pequena. —Falo.

—Mas eu disse a verdade. —Retruca ela dando de ombros.

—O que estão fazendo com as crianças de hoje em dia? —Diz Nick ainda em
estado de choque.

—“Barbie é chato” não sei onde. —Fala Luke em um tom de indignação.

—Temos que mudar isso. —Propõe Dylan.

—Concordo, devemos fazer uma votação. —Sugere Nick de volta. —Quem acha
que devemos assistir Dora, levanta a mão. —A pequena é a única que levanta —
Agora, quem concorda que devemos assistir a Barbie, e provar que é melhor,
levante a mão. —Nós quatro levantamos.

—Barbie venceu. —Falo finalizando o assunto.

—Ah, não! —Resmunga Mia cruzando os bracinhos.

—Ah, sim! —Murmura Nick a imitando cruzar os braços.

—Uh! Vamos assistir “Barbie e o castelo de diamantes”? —Indaga Dylan.

—Não, “A Princesa e a Pop Star” é melhor. —Opina Luke.

—O melhor é “As doze Princesas bailarinas” —Afirmo.

—É isso aí! —Concorda Nick entendendo a mão para bater na minha.


—Quero aquela de fada. —Aponta ela para a tela da TV enquanto passo os filmes.

—Esse é legal. Eu gosto, todos de acordo? —Solto o play após todos


concordarem.

Se uma pessoa aparecesse nesse momento e visse um bando de jogadores de


hóquei universitário sentados, todos em volta de um pequeno ser humano,
pensaria que somos malucos. Fala sério, quem não gosta de Barbie? Um dos
melhores desenhos que existe, e sou homem o suficiente para admitir. Já
maratonamos todos os filmes, por mais incrível que possa parecer.

Os filmes são curtos, passam bem rápido, e quando vejo já estamos quase no fim.
Mia pediu o “Barbie e o segredo das fadas”, que na minha opinião é um dos
melhores, top dez no mínimo. Passo durante todo o filme sendo usado como
encosto pela pequena ao meu lado, por alguns segundos penso que pudesse ter
dormido, mesmo seus olhinhos estando pequenos, lutando contra a vontade de
se fecharem, está acordada esperando ansiosamente pelo final da história.

Hawkins finalmente aparece na sala com sua bolsa e uma expressão surpresa
com olhos arregalados ao ver a cena na sua frente. Sou o único a reparar na sua
presença, e me demoro ao analisar seu corpo encostar em uma parede optando
em apenas nos observar. Reparo em como essa calça deixa marcada suas coxas
e cintura larga, apesar da maldita blusa tentar esconder. Que mulher gostosa. Puta
que pariu.

Luto em evitar procurar seus olhos, mas antes de tentar sei que vou falhar porque
isso está se tornando cada vez mais impossível. É como se houvesse um imã
entre nós que nos força a procurar os olhos um do outro.

Quando percebo já estou preso na nossa bolha de novo, e sei que ela está presa
comigo. Seus olhos e sua expressão corporal dizem isso. E simples assim, tudo
está em completo em silêncio. Porque nada importa no momento em que a olho,
em que a vejo sorri.

Os castanhos mel dos seus círculos redondos me consomem e prendem todo o ar


dentro de mim. Paramos tudo o que pensamos e ficamos ali. Olhando um nos
olhos do outro, esperando para que algo quebre o contato menos nós mesmos.

Sou tirado dessa bolha ao ouvir o entusiasmo dos meninos, sendo obrigado a
cortar qualquer atmosfera que estivéssemos entrando.

—Ah, é agora! —Avisa Nick com animação em sua voz.


—Ela vai se transforma. —Completa Dylan com o mesmo tom de voz, fazendo
todos nós nos concentrarmos na tela em nossa frente.

—Segura minha mão. —Pede Luke nervoso, sentado na poltrona próximo a Nick
que segura.

Assistimos a Barbie se transformar ganhando asas grandes e coloridas que


pertencem a ela agora. Amo essa parte. É incansável.

—Nossaa! —Falamos em um coral com Mia sorrindo feliz e os olhos brilhando.


Nesse minuto já estou totalmente entretido no filme novamente.

—Ficou de respeito. —Comenta Nick em seguida.

—É isso aí Barbie! —Falo.

—Para isso que eu assisto! —Informa Luke.

—Vai salvar seu homem! —Incentiva Dylan.

—É isso aí, acaba com ela! —Nick entra na onda.

Me levanto após finalizar o filme, deixando Mia sentada no sofá com os caras que
querem colocar outro. Vou até Hawkins que ainda está em pé no mesmo lugar.

—Conseguiu fazer tudo o que precisava? —Pergunto ao me aproximar fitando


seus olhos.

—Consegui, o tempo foi muito útil. Obrigada. —Desvia o olhar de mim voltando-se
para a Mia na sala. —E como foi aqui?

—Tranquilo, acho que os caras gostaram dela tanto quanto eu. Nos divertimos
bastante. —Viro pegando a pequena de braços cruzados com a expressão séria
para Dylan.

—Estou percebendo. —Rir ao ver a cena na nossa frente.

—Amo quando você faz igual. —Confesso com franqueza sem pensar, sinto um
calor sobre mim e sei que está me analisando. Viro de volta encontrando
exatamente o que esperava. Ficaria decepcionado se não o encontra-se.

Sua agitação transparente me incentiva a aproximar mais. Agora estou perto o


suficiente para ouvir sua respiração. Nossas respirações se misturando se
tornando uma só.

Ela não se afasta. Eu não recuo.


—Você cruza os braços na altura do peito, fechando a cara como se pudesse
fazer todos se ajoelharem diante de você. —Sussurro. — Sabe o que mais?

—O que? —Murmura com a voz saindo fraca, mas ainda os olhos focados nos
meus.

Isso mesmo linda, perca os seus olhos nos meus assim como eu faço com os seus
todos os momentos.

—Seus olhos queimam. Um pequeno biquinho surge nos seus lábios. Você fica
tão fofa e gostosa que ninguém contestaria em não se ajoelhar para você. Sabe o
que tenho vontade de fazer, Hawkins? —Seus olhos deixam os meus descendo
para os meus lábios.

Tão linda…

—O que? —Sussurra.

—Tenho vontade de te ensinar a ser uma boa mocinha e a se comportar enquanto


vejo seus olhos arderem em chamas pra mim.

—Liam… —Engole em seco fechando os olhos por alguns instantes antes de os


abrir de novo, afastando o corpo. —Os pais de Mia devem estar chegando. —Ela
cai em si. Droga.

—Tudo bem. —Não tenho tempo de dizer mais nada pois logo em seguida escuto
uma buzina vindo do lado de fora.

Ela chama Mia que se despede dos meninos e vem me abraçar. Acompanho as
duas até a porta, ela fala alguma coisa que não consigo identificar com a mãe da
garota que agradece e se despede depois.

—Não teve problema ela ter vindo para cá, certo? —Preocupação transparece em
minha voz.

—Não, ela já sabia de você. Mia contou e falou muito bem, ela lembrava de ter te
visto no parque aquela vez e como eu estaria aqui também, não teve problema.
Conheço ela muito tempo, confia em mim.

—Que bom, não queria te prejudicar.

—Se me prejudicasse não teria aceitado vir, Liam. Eu informei antes e pedi
permissão. —Ela me tranquiliza.
—Posso te levar pra casa? —Pergunto. Porque eu quero. Por favor, Hawkins. Me
deixe te levar pra casa.

—Não é necessário, obrigada.

—Maya, eu…

—Preciso ir. Me conta como foi a segunda chamada depois, tá bom?!


—Interrompe saindo em disparada pela porta sem me dar tempo de processar
suas palavras.
Capítulo 17

MAYA

Eu estou apaixonada por um homem que não existi!


Infelizmente isso não é brincadeira. Adam Calrsen acabou de entrar para minha
lista do top dez homens que eu casaria sem pensar duas vezes. O cara é um
pecado para a população feminina de leitoras, alguém me fala porque esse
homem não existi? Isso não importa, porque para mim ele existi, e só minha
opinião é válida.

Oliver é muito lenta, está na cara que esse homem já está no lovers há muito
tempo. Mas não julgo, pois no seu lugar me sentiria da mesma forma. Estou
chegando no capítulo dezesseis quando sou interrompida com o barulho do meu
telefone. Ignoro sem me preocupar em ver de quem se trata, colocando
totalmente minha concentração em ler, mas pelo visto a pessoa não está
interessada em ligar mais tarde.

Atendo após verificar quem é a praga que está atrapalhando minha leitura.

—Onde você está?

—Sério que você me interrompeu pra isso? Eu não fico sentada esperando você
me ligar.

—Hoje sai o resultado da segunda chamada, esqueceu?

—Eu esqueci, desculpa. —Lamento ao me lembrar.

—Então, ou eu vou chorar igual a uma criança ou vou comemorar aos quatro
ventos, das duas formas quero você lá comigo. Agora você pode responder à
pergunta por favor?

—Estou saindo do refeitório bradshaw para a aula do professor Robert.


—Finalmente eu memorizei o nome desse professor que substitui o nosso
queridíssimo professor Davis, nunca pensei que diria isso do homem, mas sinto
sua falta.

—Ti encontro lá.

Desligo levantando de onde estou sentada decidindo que a leitura terá que ficar
para mais tarde. Chego junto com o professor na sala, indo me acomodar em um
dos assentos livres. Liam só aparece quinze minutos depois na porta procurando
por alguém com o olhar, ele me vê e vem em minha direção sentando ao meu
lado, como tem virado costume das nossas últimas aulas junto.

—Perdi algo importante?

—Não, ele só está falando por enquanto. Ansioso?

—Estou mais para nervoso. Acho que não vou conseguir prestar atenção na aula.

—E você presta atenção alguma vez?

—Para sua informação, eu presto atenção sim. —Suspira como se soltasse a


respiração que estava prendendo, virando seu rosto para a frente.

—Vai dar tudo certo. —Toco em seu braço tentando passar tranquilidade para ele.

Ainda parece nervoso após a minha tentativa falha. Resolvo fazer outra coisa que
sei que dessa vez possa dar certo. Inclino o meu corpo chegando um pouco mais
próximo para poder me ouvir com a voz baixa perto do seu ouvido.

—“Stars shining bright above you

Night breezes seem to whisper "I love you"

Birds singing in the sycamore tree

Dream a little dream of me”. —Canto com a minha voz longe de ser uma beldade
igual a sua, porém ele não parece se importa. Ele fecha os olhos respirando
durante a canção.

Quando os abre, os direciona para mim novamente e diz “obrigado” fitando a


minha alma através do seu olhar. Sinto perder o ar por alguns segundos rápidos.

A aula passa devagar. Dessa vez, não ouço seus comentários sem graça, e nada
do seu falatório. Ele não diz uma única palavra, observando unicamente o
professor em sua frente a alguns metros de distância verificando as horas sem
parar em seu celular. Não digo nada, porque estou do mesmo jeito. Não registro
nenhuma de suas palavras na aula.
Minha mente viaja com todas as possibilidades, o nervosismo de Liam sendo
transpassado para mim. No fim, desisto de tentar fazer um esforço para prestar
atenção em qualquer coisa que possa estar acontecendo nesta aula.

No momento em que meu cérebro está prestes a entrar em erupção com a hora
não passando, o professor começa a se despedir e os alunos a se levantar saindo
da sala.

—Me espera na porta?

—Claro que sim.

Ele sai em disparada atrás do professor.

Esperando do lado de fora na porta, vejo que falam algo antes dele tirar um papel
de sua pasta e o entregar. Ele o vira observando todo o conteúdo escrito e em
dois segundos está na minha frente. Não consigo decifrar sua expressão. Fico
agoniada até finalmente falar alguma coisa.

—Nove cacete! —Comemora virando para me mostrar com uma animação


indescritível no rosto.

—Mentira! —Pego a folha em sua mão vendo de perto.

—Pode apostar que não. —Sua alegria é contagiante demais. Pulo em seus
braços não conseguindo controlar.

Sei o quanto isso significa para ele, o quanto estava esperando por isso. Depois
de todo o tempo que dediquei aos estudos com ele, sinto como se parte disso
fosse um pouco meu também, meu peito está transbordando de orgulho. Fico
muito feliz por ele, muito mais.

Não esperava por essa minha reação, pois fica uns segundos raciocinando tudo o
que acabou de acontecer em um estado de choque, mas em seguida me abraça
forte com seus braços me prendendo e girando comigo no ar.

Nossa mini cena atrai vários olhares curiosos, porém estou concentrada demais
na nossa bolha para me importar ou me sentir desconfortável com isso. Eu não
pretendia fazer o que fiz, mas no calor da emoção, eu apenas fiz. Sem pensar,
sem me importar. Foi uma das melhores coisas que fiz até hoje.

Liam me faz me sentir normal. Sem nenhum incidente, sem inseguranças ou


medo. E mesmo inconscientemente tem me ajudado muito com todas as
consequências. Consertando o que não foi ele que quebrou.
—Isso significa que sua média está de volta? —Ele me põem no chão.

—Com certeza.

—Agora se certifique de mantê-la. —Exijo.

—Vou mantê-la, se você continuar me orientando. —Retruca.

—Não posso prometer nada.

—Vamos lá, Hawkins. Preciso de você. —Ele está tirando com a minha cara ou
falando sério? Acho que vou ficar com a opção 1.

—Tudo bem, vou te ajudar como um símbolo da minha amizade. —Cedo, uma
coisa que está se tornando frequente com esse cara.

—Obrigado, Maya, não teria conseguido sem você. —Sua voz soa rouca.

—Vou querer brownies como recompensa. —Sorrio em resposta.

—Vou te dar bem mais do que brownies como recompensa.

—O que seria isso? —Estreito os olhos, curiosa.

—Escuta…deveríamos comemorar. Nós dois. —Declara.

—Comemorar como?

—Estava pensando em um jogo de basquete. Os Warriors vão enfrentar os


Wizards, e eu, por acaso, consegui dois ingressos, o que acha? —Mostra dois
ingressos em sua mão que acaba de retirar do bolso. Ele tá maluco?

—Está falando sério? —Pergunto meio chocada com essa possibilidade. Ele
estava com esses ingressos a quanto tempo?

—Seríssimo. —Merda, merda, merda.

—Não posso aceitar. —Recuso.

—Está brincando, certo?

—Não quero que gaste dinheiro comigo. Não vou ao jogo com você. —Afirmo.

—Não vai porque eu gastei meu dinheiro comprando ingresso pra você? —Seu
tom é quase que revoltado.

—Sim.
—Eu comprei porque quero que esteja comigo comemorando essa vitória. Quero
que veja seu time em quadra ao vivo pela primeira vez, e quero estar lá nesse
momento com você. —Roubo um tempo refletindo o que diz.

—Quanto de dinheiro você gastou com isso? —Persisto com a consciência


pesando.

—Para que você quer saber isso?

—Porque eu quero.

—Não posso falar. É errado dizer o preço.

—Mas…

—Vamos, Hawkins. Esqueça o dinheiro, pense que é uma recompensa pela sua
ajuda. —Assinto com a cabeça. Forço a manter preso o sorriso de orelha a orelha
que quero soltar, porque dentro de mim, estou amando a ideia de ver o meu time
em quadra.

Jogo os meus braços em volta de seu pescoço, o abraçando, com seus braços ao
redor da minha cintura tirando meus pés levemente do chão. Não estou me
aguentando. Será que tem como alguém explodir de felicidade?

Isso foi uma péssima ideia. Meu nariz aspira o seu cheiro masculino inebriante que
gruda em minha memória. Posso facilmente viciar nesse aroma. Só então que me
ligo que estou o abraçando. De novo. Em menos de dez minutos.

A algumas semanas eu não queria nem estar perto dele, e agora eu estou o
abraçando pela segunda vez em minutos. Para muitos isso é uma coisa totalmente
idiota, mas para mim, é muito mais do que isso. Muito mais pelo que aconteceu
comigo, muito mais pela relação que nós temos, muito mais pela pessoa que eu
sou. E eu sei muito bem que ele sabe disso.

Isso significa que posso voltar ao normal, que vai ficar tudo bem. Um degrau que
consegui subir e uma barreira que consegui destruir.

Uma lágrima escorre pelo meu rosto molhando sua camisa, sei que percebe
porque seus braços me apertam mais forte, não deixando que eu me solte.

Posso não ter sido abusada de verdade, mas foi um choque e… aterrorizante.
Esses pequenos degraus que subo são importantes pra mim, muito mais do que
aparentam ser.
E mais uma vez, Liam está fazendo algo que não era seu dever fazer.

Eu vou a um jogo de basquete.

LIAM

Não pensei duas vezes quando vi que iria abrir a venda dos ingressos.

Faz algumas semanas que eu os comprei, não sabia qual seria o resultado da
prova, mas isso não importava, porque independente do resultado eu estaria
comemorando ou me lamentando assistindo a um jogo de basquete ao vivo.

O estádio do Golden State Warriors é trinta minutos de carro, apesar de a ter


julgado por nunca ter ido, também nunca cheguei a ir em um. Sou um cara do
hóquei, não do basquete. Vai ser uma experiência nova para nós dois, melhor para
ela do que pra mim já que vamos assistir ao seu time jogar, ainda sim, vai ser tão
bom quanto.

Além do mais, Hawkins mais do que ninguém merece isso, ela se dedicou em
cada aula nossa e fez de tudo para me sair bem nessa segunda chamada. É o
mínimo que eu poderia fazer.

E porra…aquele abraço. Não foi um abraço merecido, mas eu não estou nem aí,
quero mais mil deles. Foi algo tão surpreendente que fiquei uns instantes
processando o que tinha acabado de fazer: “Hawkins está me abraçando.
Hawkins tem o melhor abraço do mundo. Hawkins tem um cheiro viciante.
Hawkins tem o corpo com o encaixe perfeito ao meu”.

Vai demorar um bom tempo até eu cair na realidade.

Bato na porta do seu apartamento sendo atendido segundos depois por uma
menina que não é Hawkins. Seus cabelos são castanhos que batem nos ombros e
óculos redondos no rosto.

—Você deve ser a Riley. —Suponho.

—E você é o Liam. Pode entrar, Maya está quase pronta.


Ela abre espaço para eu poder entrar e vou direto para o que suponho ser o quarto
de Hawkins, pois é a única porta fechada. Bato e quando ponho a mão na
maçaneta para abri-la, ela protesta.

—Eu estou ocupada. —Ela dá uma pausa de dois segundos. —Pelada.


—Adiciona.

—Isso era para fazer eu ir embora? —Vejo a porta ser aberta em tempo recorde
revelando Maya com os seus lindos cabelos soltos no ombro.

Usa uma calça jeans e um tênis branco com detalhes azuis, na parte de cima está
usando a camisa do seu time com uma blusa preta de manga por baixo. Linda pra
cacete. Nunca me canso. Nunca vou. Sua beleza vai me matar um dia.

Gosto como suas roupas procuram ser discretas, tentando seguir um padrão de
cores pretas e neutras, mas as vezes é ousada o bastante para por uma cor
mínima que seja.

—Você chegou. —Anuncia. Seu tom tem algo diferente, só não consigo identificar
o que.

—E você está vestida, eu me pergunto quem está mais desapontado aqui.


—Resmungo ao perceber que mentiu na cara dura. —Mentiras não são do seu
perfil Hawkins, estou preocupado. —Ela revira os olhos com a minha provocação.

—Mais cinco minutos, ainda não estou pronta. —Pede, deixando passar dessa vez
minha provocação desapercebida.

—Posso esperar. —Falo despreocupado.

—Tudo bem, pode entrar aqui se quiser. Não vou demorar.

—Não precisa se apreçar, temos tempo. —A tranquilizo.

Observo seu quarto reparando que é exatamente como eu imaginei. É a cara de


Hawkins.

Uma cama grande ocupa parte do espaço, que não é muito, na parede que está
encostada, há um quadro com diversas fotos penduradas, além de uma
escrivaninha, e o principal, uma grande estante de livros. Aproximo-me verificando
os tipos de livro que lê, mesmo já supondo.

—Puta merda, você é romântica. —Meu tom um pouco apavorado não passa
batido.
—Achei que já tinha percebido.

—Não foi nesse nível que eu imaginei. —Argumento um pouco desesperado


demais.

Tudo o que consigo pensar é: “fudeo”. Esperava que Maya fosse romântica, porém
ela é um nível muito acima de tudo o que vi. Noventa por cento dos seus livros
são de romance, muito mais do que qualquer ser humano deveria ler.

—Por que lê tantos livros assim? —Pergunto sincero.

Seus olhos atordoados me dizem que esta confusa, decidindo se deve ou não ser
sincera, mas decidi responder com uma outra pergunta.

—Quer a resposta de sempre, ou a verdadeira?

—As duas.

Aguardo alguns segundos enquanto observo sua mente trabalhar, pensar em uma
resposta confortável o suficiente.

—São minha forma de sair da realidade. Quando estou mal e não tenho como
fugir, eles são minha fuga. Eles me fazem acreditar que lá no fundo ainda existe
amor. Que todos podem se apaixonar, até mesmo aqueles mais improváveis. Para
pessoas como eu acreditarem que existe um amor pra elas, que não tem problema
em sentir. Perdi a conta de quantas vidas vivi e por quantos caras conheci e me
apaixonei através de um livro. Sem riscos. —Vejo a sinceridade em seus olhos.
Poderia esperar por qualquer resposta, essa seria a última.

Percebo que fica deslocada imaginando que a devo achar uma louca dramática.

Ela sai, indo para o que reparo ser seu closet. Estou meio afoito com sua
declaração, então, em uma tentativa de deixar tudo menos estranho e fazer meu
corpo relaxar com a tensão que eu não havia percebido, eu puxo um dos livros da
estante que aparenta ser um dos poucos que não são do gênero romance. Na
frente está escrito “O pequeno príncipe”.

Folheio parando em uma das páginas que está marcada por um post it rosa.

—“Os homens do seu planeta, disse o pequeno príncipe, cultivam cinco mil rosas
num mesmo jardim… e não encontram o que procuram”.—Leio a frase destacada.

—“E no entanto o que eles procuram, poderia ser achado numa única rosa”.
—Ouço sua voz terminar a frase. Levanto os olhos do livro e vejo que está
encostada na entrada de seu closet me observando com o objeto na mão. —É a
minha frase favorita.

Os meus olhos acham abrigo nos seus. A tensão se instala entre nós mais uma
vez. Os seus olhos estão no meu. Os seus lindos olhos castanhos mel. Agora nada
mais importa, sua total atenção está em mim. Apenas em mim. Eles são tão
lindos…

Seus olhos não vacilam em nenhum momento, e os meus também não. Então eu
me dou conta que não existi coisa melhor do que mergulhar e me perder em seus
olhos. É…acho que agora tenho uma nova frase favorita também.

—Maya, você tem uma folha? As minhas acabaram. —Sua amiga Riley pergunta
aparecendo na porta do quarto.

—Tenho, vou pegar. —Seus olhos piscam e ela volta sua atenção para a amiga
que tenho certeza que percebeu o que acabou de interromper.

Vai até a escrivaninha abrindo uma gaveta retirando vários papéis de dentro e a
entregando, enquanto eu coloco o livro de volta em seu lugar fingindo estar
interessado em qualquer outro.

—Estou pronta, acho que podemos ir se quiser. —Informa. Giro o corpo em sua
direção.

—Está linda. —Falo varrendo meus olhos sobre seu pequeno corpo. Suas
bochechas ganham cor, o que me faz acrescentar mais uma coisa na minha lista
mental de “coisas que Maya Hawkins faz que eu amo”. —Só trocaria a blusa.

—Há algo de errado? —Um traço de confusão surge em sua testa.

—Não, só acho que verde cairia melhor. —Sorrio torto.

—Torcedor do Boston Celtics. —Pontua e revira os olhos sorrindo ao entender a


brincadeira.

Durante o caminho até o estádio, a conversa flui bem. É visível que está animada,
ansiosa e nervosa ao mesmo tempo. É fácil pra mim ler o seu corpo, ela não
consegue controlar suas expressões, é completamente um livro aberto.

—Aquele dia, você me perguntou um tipo musical diferente que eu gosto, mas não
me disse o seu. —Mexo no painel do carro decidindo por qual música colocar.

—Eu sou uma pessoa bem eclética, gosto de quase tudo. —Dá de ombros.
—Me fale um. —Peço.

—Não é bem um tipo de música, mas eu gosto de ouvir orquestra sinfônica as


vezes.

—Uma caixinha de surpresas, como sempre. —Murmuro sorrindo de lado.

—Sabe o que é mais incrível? Assistir um filme com uma orquestra sinfônica
tocando ao vivo. —Fala se animando de novo com um sorriso gigante.

—Você já assistiu uma?

—Não ao vivo, só por vídeos na internet. Deveria ver, é muito bom. As pessoas
tocando em sincronia, o som dos instrumentos lutando um com outro formando
uma harmonia perfeita. —A vejo pelo canto do olho falar animadamente.

Estou gostando de como tem se soltado aos poucos perto de mim; antes seu
corpo era pura tensão, respostas curtas e não podendo esquecer de manter
sempre uma certa distância. Nesse momento, Hawkins está exatamente o oposto
disso. Gosto dessa Hawkins.

Estou aguardando o dia em que vai estar confortável o suficiente perto de mim
que vai dizer e agir intimamente comigo. Sem vergonha. Existe alguma forma de
acelerar esse processo?

—Aí meu Deus, estou falando demais? —Pergunta de repente preocupada.

—Não, gosto de te ouvir falar. —Admito sincero. —Coloca uma que você goste. —
Aponto com a cabeça para o painel, com as duas mãos de volta no volante.

Posso ver que está constrangida com minha declaração pelo seu rosto rosado.

—Está falando sério?

—Estou. Você falou que é bom, quero ouvir também, tenho que ver se não tem um
gosto musical questionável. —Ela sorri dando um soquinho fraco no meu braço.

Ela mexe no painel xingando algumas vezes por não conseguir colocar o que quer.
Quando finalmente consegue, o som de uma orquestra soa por todo o carro
durante o restante do caminho.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
O estádio está lotado por um mar de azul e amarelo, nada além do esperado. Nos
sentamos em nossos lugares faltando alguns minutos para começar; Hawkins
parece ficar sem ar por alguns segundos admirando tudo ao seu redor. Consegui
bons lugares, que não ficam tão longe da quadra a nossa frente.

Depois de se passar alguns minutos, as luzes se apagam aparecendo fleches de


luzes azuis e amarelas recebendo a entrada do time. Uma mulher canta o hino
nacional antes dos pivôs de ambos os times se aproximarem do meio da quadra
para a saída de bola. O árbitro apita e joga a bola para cima, a posse de bola
ficando com os Wizards que vão iniciar o ataque.

Eles convertem dois pontos voltando correndo para defenderem agora que o
Golden State está atacando. Eles convertem dois pontos com uma infiltração no
garrafão, e Hawkins ao meu lado vibra se levantando com a torcida,
comemorando os primeiros dois pontos.

Diferente dela, estou usando uma camisa preta normal com uma jaqueta por cima,
um boné, calça jeans e tênis. Sendo o único em um mar de torcedores com as
suas respectivas camisas de time.

Ela passa o primeiro e o segundo quarto inteiro em pé, vibrando e gritando com a
torcida também em pé. Uma torcedora de verdade eu diria, até parece outra
personalidade sua. Em alguns momentos ela chega até a xingar alguns jogadores
do time adversário, como se eles pudessem a ouvir daqui. O que eu realmente
espero que não consigam.

—O que você fez com a Hawkins? —Pergunto com uma cara de assustado
quando se senta durante o intervalo.

—Pare. Vou torce igual para vocês nos próximos jogos. —Fala se defendendo.

Borboletas. Muitas borboletas.

Eu ouvi direito? Eu preciso ser internado. Uma pequena voz no fundo da minha
mente sussurra que a frase seria melhor se ela deixasse de ser no plural. “Vou
torcer igual para você”, melhor. Bem melhor.

Escuto parte da torcida gritando. Sabia que haveria uma pequena probabilidade
de isso acontecer. As pessoas acompanham os jogadores universitários, não
muitas, apenas um número considerável.
Esse ano tenho me dedicado bastante, e graças a isso, meu trabalho tem sido
reconhecido e comentado por alguns comentaristas do ramo. Só que estou em
um jogo de basquete, não de hóquei.

Decidi por um boné por essa razão, é melhor não remediar nessas horas,
principalmente com Maya comigo, não poderia prever sua reação, não queria que
passasse por isso.

No início pensei que os gritos fossem por causa do pequeno show que acontece
durante os intervalos, mas quando vejo, eu e Maya estamos no telão com todos
nos vendo através dele. Pelo canto do olho percebo que fica constrangida e um
pouco tensa pela atenção de grande parte das pessoas em cima de nós.

Independente do motivo, aconteceu. E agora, estamos fazendo parte do show.


Sinto que isso tem muito com a sorte (azar) que tenho. Que merda! Droga.

—Você está tudo bem? —Sua cabeça continua inclinada para o telão a sua frente,
não consegue deixar de o encarar a tela no alto toda cor de rosa ao redor da
nossa imagem. Cor. De. Rosa. Rosa não cacete!

Em uma ação rápida eu levanto os olhos para o telão e interajo com a torcida em
um acenar, aponto o dedo para baixo sinalizando que não vai rolar o
entretenimento que querem. Mas, para não decepcionar e acabar com a diversão,
planto um beijo na sua têmpora durante cinco segundos contados, fazendo uma
comemoração para a torcida em seguida. Sinto os meus lábios esquentarem
devido ao contato com a sua pele trazendo uma sensação de formigamento. Ela
pisca os olhos parecendo cair em si, voltando-se para mim ainda meio em
choque. Não diz nada referente ao o que eu fiz, somente responde a minha
pergunta anterior.

—Estou. —Abre um sorriso tímido. Acho que pareço preocupado porque completa
logo em seguida. —Estou bem Liam, prometo.

—Não tenho tanta certeza.

—Cadê seu celular? Vamos tirar uma foto, assim você pode ter certeza.

Respiro fundo pegando meu celular no bolso, viro meu boné para trás quando ela
se aproxima de mim. Tiramos uma foto com a câmera virada para o telão nos
mostrando nele antes que nossa imagem seja retirada. Posto nos storys do
Instagram marcando o seu.
Não sou de ficar postando com frequência, seja em qualquer rede social. A
realidade é que nem mecho muito nessas coisas.

Começo a seguir e vejo que postou um boomerang do estádio com os jogadores


em quadra. Uma stalkeada não faz mal, não é?

… 🏒🏒 🏒🏒 🏒🏒.. .. …

—O Curry amassou hoje, mas o Jordan Poole também foi incrível. Ele está
realmente criando um mini monstro. —Sua voz feminina eufórica alcança os meus
ouvidos. Quantas coisas vou precisar fazer para a ver assim?

Saímos de uma lanchonete retrô que havíamos parado para comer, iniciando esse
debate.

—Jason Tatum é melhor. —Pontuo.

—Pare! —Fala levantando o dedo me indicando para parar. —Ele pipocou na final.

—Nem todos estão prontos para uma final, Hawkins.

—O Poole está, coitado dos adversários no futuro.

—Pare! —Dessa vez quem levanta o dedo sou eu.

Estou estacionando em frente ao prédio do seu apartamento no momento em que


finalmente termino de falar. Abro a porta saindo do carro junto com ela,
acompanhando até a entrada de seu apartamento ainda rindo e conversando.

—Obrigado pela noite. —Para de costas para porta me fazendo parar em sua
frente.

—Não foi nada. —Dou um pequeno sorriso de lado.

—Você sabe que não precisava ter feito isso.

—Precisava sim. —Ela me olha com um olhar de admiração, como se não


esperasse que qualquer pessoa poderia fazer isso.

Cacete, qualquer um no meu lugar faria isso. Principalmente se soubesse que a


recompensa seria ter Hawkins o olhando desse jeito no fim da noite. Puta que
pariu, qualquer um faria o que fosse preciso apenas para ter ela como
recompensa, droga!
De novo me perco em seus olhos. Como eu amo me perder nos seus olhos...

As amêndoas pequenas redondas tiram a minha atenção, a capacidade do meu


cérebro de raciocinar. A cada vez que a olho, acho ainda mais linda. Mais única.
Por mais que sejam apenas olhos castanhos, são os seus olhos castanhos.
Aumenta o desejo de querer estender as mãos e tocar seu rosto. Tenho que
manter uma certa distância, senão posso fazer algo precipitado demais, mas os
seus olhos são tão…viciantes.

Nossos olhos não piscam. Nenhum de nós desvia.

Eu quero Maya Hawkins. Posso ter demorado a admitir com todas as letras, mas
agora tenho ainda mais certeza que a quero. O desejo aumenta a cada momento
como esse que temos, a cada momento que criamos e passamos juntos.

Cedo a vontade e o desejo de a tocar. Estendo a mão colocando-a no seu rosto,


sentindo a sua pele quente e macia, lembrando da sensação de encostar os lábios
na sua têmpora por cinco segundos. Ela fecha os olhos respirando fundo
absorvendo meu toque.

Aproximo misturando nossas respirações mais uma vez, apenas com


insignificantes centímetros de distância entre nós, mas dessa vez, sou mais
ousado. Encosto o meu nariz no dela, cravando minha mão em sua cintura e a
outra aprofundando na sua nuca enroscando meus dedos nos fios de seu cabelo.
Dizendo indiretamente que se deixar eu posso dominá-la aqui mesmo.

Seu corpo reage de forma positiva a mim.

Maya solta o ar pela boca como se estivesse o prendendo. E então percebo que
também estou.

—Quero te beijar. —Confesso na nossa confusão de respirações e desejo.

Então, pela primeira vez, ela toma uma atitude.

Leva as mãos ao redor do meu pescoço começando a fazer carinho naquela


região na nuca. Arranha com suas unhas, não muito grandes, se inclinando em
seguida plantando beijos delicados na lateral do meu pescoço.

Você é uma caixinha de surpresas, Maya Hawkins. Uma que eu quero descobrir
uma coisa nova todos os dias.

Nessa hora, percebo que é meu fim.


Meu corpo reage positivamente, acendendo e ficando excitado com sua
provocação repentina. Em que caralhos eu poderia imaginar esse lado de
Hawkins? Provocativo e confiante. É excitante pra caralho. Como eu poderia saber
que iria fazer um coisas dessas? Eu vou morrer aqui.

Não importa, vou morrer feliz, porque a palavra “gostar” é muito fraca para isso.
Seus dedos pequenos afundam nos meus cabelos puxando e acariciando. Como
posso sair de algo que eu mesmo me enfiei? Merda, merda, merda.

O desejo aumenta. A razão desaparece aos poucos. Só quero que me deixe a


beijar logo. Eu preciso que deixe.

Seus lábios deixam o que estão fazendo e se aproximam ao pé do meu ouvido.

—Não sou igual as outras garotas, Brown. —Sussurra. —Se quer me beijar, vai ter
que fazer bem mais do que isso.

Abaixo meu olhar me concentrando em sua boca agora. Sem conseguir


pronunciar uma palavra sequer. Quando me dou conta, ela se afasta totalmente
deixando o calor do seu corpo contra o meu. Mas meu corpo continua aceso.
Queimando. Ardendo.

—Obrigado pela noite. —Sorri satisfeita abrindo a porta com sua chave. Como
não me movo, ela entra e a fecha.

Meu maxilar trava, sentindo o calor ainda nas minhas veias. Fico igual um idiota
parado encarando a porta fechada na minha frente por longos segundos. Olho
para o centro das minhas pernas, mais vivo do que nunca. Vou precisar de muitos
banhos gelados. Ocupo alguns minutos antes de decidir ir embora finalmente.
Maya Hawkins é uma gostosa provocadora!
Capítulo 18

MAYA

Todos estão me encarando.


Ando pelo campus sentindo os olhares sobre mim, ouvindo cochichos baixos.
Alguns me olham como se eu fosse a Cinderela e outros como se eu fosse a
madrasta malvada manipuladora. Se antes me sentia sufocada mesmo sabendo
que ninguém estava prestando atenção em minha presença, agora eu me sinto
afogar. Engulo em seco.
“Você está bem Maya, é paranóia sua, maluca, você melhorou, está melhor” repito
para mim mesmo até as palavras fazerem efeito ou deixarem de perder o
significado.

Não sou uma pessoa de ficar verificando ou atualizando minhas redes sociais,
seja qual for. Acho que nunca tive muita paciência, as vezes que posto são apenas
para pessoas privadas, mais próximas. Só que na única vez que decido postar
publicamente, isso acontece.

Ótimo, tenho que lidar com isso agora. Os storys que postei no estádio e o que
repostei com Liam foi parar no Twitter do campus, todo mundo viu e comentou.
Não consegui ver já que não tenho Twitter, Riley que me mostrou hoje pela manhã
quando acordei, além de me encher de perguntas uma atrás da outra. Ontem
quando cheguei do jogo fui direto para o quarto cansada e capotei, nem dei
espaço para minha mente processar tudo.

Mas agora, minha mente tem tempo suficiente para digerir, e ela está sendo uma
desgraçada.

A noite de ontem foi incrível, fazia tempo que não me divertia tanto, na verdade,
não me lembrava que podia sorrir tanto em uma única noite. E jamais pensei que
Liam poderia ser parte do motivo.

Ele comprou dois ingressos para irmos assistir ao um jogo de basquete ao vivo no
estádio! (acho que nunca vai deixar de soar incrível) Inicialmente me surpreendi
que lembrou que havia comentado que nunca tinha ido em um. Para mim,
simplesmente tinha esquecido como qualquer outra pessoa faria. E mesmo ele
não sendo muito fã, ele foi e ficou comigo.

Porém, o que minha mente está fazendo questão de relembrar é o que aconteceu
em frente à porta do meu apartamento. Sim, eu devo minhas explicações.

Em minha defesa eu não esperava que iria ter coragem suficiente para fazer o que
eu fiz, fazia um bom tempo que não provocava um cara assim. O que eu posso
fazer? É mais forte do que eu, amo uma boa provocação. Sou boa no que faço.

Estou tão surpresa quanto qualquer pessoa ficaria, principalmente na hora que
admitiu que queria me beijar. Tudo bem que isso tem ficado cada vez mais claro
aos poucos (como no dia em sua casa que a minha reação foi fugir), mas não
imaginava que iria soltar aquela bomba em cima de mim, precisava reagir e reagi.
Da minha forma. E nunca fiquei tão satisfeita depois. Ficou estampado na minha
cara como fiquei feliz.

Mas junto com todos esses pensamentos me vem o que me diz que fez isso tudo
somente para conseguir me beijar, como um verdadeiro idiota que sua fama fala.
Um jogo de basquete é uma boa estratégia para ganhar mais um nome na sua
lista de meninas com quem ficou da faculdade.

Se Liam está achando que vai ser fácil assim, está muito enganado. Não sou igual
as outras meninas que ele fica, pelo contrário. Não quero ser apenas mais uma,
não quero me entregar fácil assim. Pra mim, um beijo vale muito mais que um
beijo. Quero sentir realmente o desejo de o beijar, não sentir somente uma atração
chocha e pronto. Quero realmente querer aquilo e desejar.

Caso eu descubra de alguma forma que a voz que invadi minha mente dizendo
que ele não passa de um idiota com mais uma das suas babaquices, minha
sombra não vai passar nem perto dele, apenas o meu tapa na sua cara.

Sou uma garota difícil de querer algo por muito tempo, mas quando eu quero,
nada me impede de conseguir. Mas se Liam realmente quiser isso, ele que corra
atrás. Posso ser complicada, um verdadeiro caos, mas sei me valorizar o
suficiente.

Decido parar no chalé Bradshaw que é meu cantinho de conforto; não vou deixar
essas pessoas estragarem isso. Entro na fila para comprar um cappuccino por que
não existi nada melhor que um café com um livro nessas horas.

Durante o tempo que espero a fila andar, vejo três jogadores de hóquei enormes
entrando. Identifico logo serem Adam, Stephen e Brandon. Eles me veem na fila e
vem até mim.

—E aí, capitã? —Cumprimenta Adam. Eles me encaram com sorrisos largos


demais, pelo mínimo que os conheço, sei que isso não cheira a coisa boa.

—O que vocês fizeram? —Pergunto com os olhos semi cerrados.

—Nada. —Respondem juntos.

—Mentira. Eu conheço o tipo de vocês. —Contraponho.

—E que tipo nós somos? —Quem fala é Adam.

—O do tipo besta. —Ele assimila a minha resposta, balançando a cabeça em um


sim.
—Eu acho uma afirmação muito precipitada, capitã. —Argumenta Stephen.

—Você está pré julgando a gente. Como capitã, isso é uma atitude muito errada.
Está escrito no manual. —Completa Brandon. Eles sempre usam o manual como
desculpa.

—Falem o que querem. —Peço.

—Nós vimos que você saiu com o nosso queridíssimo capitão. Só queríamos
estar atualizados dos acontecimentos. —Fala Adam.

—Não.

—Por que não? —Pergunta Brandon.

—Vocês são jogadores de hóquei, automaticamente são fofoqueiros. Como


demonstraram agora. Então, não.

—Aí! Está julgando a gente de novo sem saber. —Protesta Stephen. Faço uma
expressão o desafiando. Começo a procurar alguém em volta com os olhos,
parando quando encontro a pessoa ideal.

—O que sabe daquele professor que acabou de passar pela entrada, Adam?
—Aponto com a cabeça. Os três se viram rapidamente, vendo de quem estou
falando.

—Ah, aquele é o professor Johnson. Ele dá aula pra galera de psicologia, fiquei
sabendo que ele ficou com a professo…—Para abruptamente percebendo o que
acabei de fazer. Mostro uma expressão para eles do tipo “o que eu disse?”.

—Você é muito lerdo. —Brandon diz para Adam.

—Eu ia saber que ela iria fazer um negócio desse?

—Droga, isso foi baixo. —Stephen fala para mim ignorando os dois.

—Tenho certeza que a qualquer momento o capitão de vocês vai falar alguma
coisa. —Sorrio da situação. —Agora, todos pra aula. —Ordeno para eles que me
olham com cara de tédio e se viram indo embora sem protestar.

Quando já foram reparo que todos da fila, inclusive do chalé, nos observavam.

Bando de enxeridos, ignoro todos eles. Agora que comecei a conversar com a
galera do time de hóquei, pelo visto, vou ter que me acostumar com isso. Que
ironia, a semanas atrás ninguém sabia da minha existência, agora todos estão
atentos por onde eu passo. Tudo por causa da merda de uma foto.

Pego meu café depois de duas pessoas saírem da minha frente na fila, sento em
uma das poucas mesas livres finalmente pegando o meu livro. O alarme do meu
celular toca indicando que o horário da aula está preste a começar. Me sinto
renovada após uma boa leitura para aturar esses olhares durante o dia. Assim que
chego na sala, vejo que Riley e Anna me enviaram mensagens fazendo uma nota
mental de respondê-las depois.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
No período de trabalho normalmente não acontece muitas coisas interessantes, é
sempre uma mesma rotina. Eu chego, coloco meu jaleco colorido para deixar de
ser a Maya e virar a tia Maya. Brinco com as crianças, ajudo as professoras no
que pedem e fico com Mia um pouco depois do meu horário, as vezes corre tão
rápido o tempo que parece que eu só pisco e acabou. Apesar disso, é cansativo
na maioria dos dias.

Eu gosto do meu trabalho, de estar com as crianças. Elas podem fazer qualquer
um sorrir, são engraçadas, verdadeiras e divertidas. É cada criatividade e risada
que tiram de todos nós que trabalhamos aqui que as vezes nem percebemos que
estamos trabalhando. Queria que todas pudessem permanecer assim, sem
mudarem por causa da sociedade e das experiências que a vida nos proporciona,
acho que a vida seria melhor se tivéssemos a essência de uma criança pra
sempre.

No momento que estou me despedindo delas na hora da saída, chamo um por um


entregando para os seus pais na porta. Conheço os pais da maioria das crianças,
trabalho a um bom tempo aqui, então, é normal que eu acabe memorizando cada
um. Porém dessa vez um deles me é estranho, não me lembro de ter chego uma
criança nova nos últimos dias.

—Oi, boa tarde. Você veio buscar qual criança?

—Boa tarde, eu sou o pai do Will.


—Desculpe, mas não podemos liberar. O responsável que está na ficha da escola
deve vim permitir que outra pessoa o busque. —Antes que possa responder, a
diretora aparece ao meu lado.

—Perdão Maya, este é o senhor Miller. A mãe do Will já permitiu que o pai dele
passe a buscá-lo, esqueci de a avisar. —Ela informa.

O homem a minha frente chuto que deve ter em média quase quarenta anos de
idade, apesar disso, está bem inteiro de corpo e expressões faciais. Seus cabelos
são pretos apenas com alguns fios brancos querendo aparecer, assim como sua
barba. Eu poderia dar tranquilamente uns trinta e três anos pra ele.

Ainda assim, a forma como me olha não me agrada muito. Na verdade, ela me
sufoca. Ele está me analisando com perspicácia. Sinto um incomodo com a
avaliação, mas ignoro. Tento ser o mais profissional que posso, coloco um sorriso
no rosto e prossigo.

—Não tem problema. —Chamo pelo Will, que aparece segundos depois, se
despedindo de mim.

—Obrigado. —Agradece para a responsável pela diretoria da escola, virando-se


para mim. —Prazer em te conhecer, Maya. —Ele sorri indo embora segurando a
mão do filho.

Um calafrio percorre a minha espinha.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
—Você não me respondeu! —Resmunga Riley ao me ver passar pela porta do
apartamento.

—Eu sei, desculpa. Acabei esquecendo.

—Acho que você vai querer ver. —Paro procurando meu celular dentro da bolsa.

Entro na conversa de Riley, vendo que enviou vários links de uma página no
Twitter. Clico no primeiro, leio. Entro no segundo, leio. Entro no terceiro, leio. Ela
não questiona nada, espera eu tomar a iniciativa. Mas eu não tomo.

—É só ignorar Maya. —Ignoro o que disse pois tudo o que consigo pensar é: “Que
palhaçada é essa?”.
Nunca vi pessoas supondo coisas sobre mim ou falando sobre mim, essa primeira
vez é ruim, mas não deixo de ficar ainda mais brava. E angustiada. O que eles têm
comigo e com a minha vida?

Os links que me enviou são de sites de fofoca da faculdade, todos os posts


supondo que eu poderia estar namorando com Liam. Só que o problema não são
as postagens, são os comentários. Diversas pessoas estão me xingando, dizendo
um monte de coisas do tipo que não estou em um patamar suficiente para ele,
entre outras, a necessidade? Nenhuma.

Outras não dizem nada demais, que já haviam nos observando pelo campus e que
apenas devo ser mais uma das suas “maria-patins” que ele vai pegar e descartar
depois. Eu nem sabia que esse nome existia. Desde quando postar uma foto quer
dizer que estou namorando alguém?

Lembrei dos olhares de manhã cedo. A Cinderela ou a madrasta.

Dane-se isso tudo, estou puta demais. Deixem supor o que quiserem, eu sei da
minha vida. Sou a única que sabe. Não podem sair me xingando por puro
entretenimento. Posso ter ficado mal por dentro, mas quem não se sentiria? Com
um bando de águias em cima de você observando e cochichando por aí pelo
campus?

Daqui a dois dias todo mundo vai esquecer e vai ser como se nada tivesse
acontecido. Eu não vou ser mais notícia pelo campus por causa dessa maldita
foto e nem vou ouvir pessoas cochichando. O problema são delas, não queriam
uma fofoca da semana? Pronto, já conseguiram.

—Dane-se eles Riley, tá tudo bem. Amanhã ou depois todo mundo vai esquecer.

—Ótimo, só queria que soubesse. —Ela sorri tímida.

—Eu sei, obrigada. —Retribuo o sorriso mostrando que está tudo bem. Ela me
puxa para sentar no sofá, um pouco mais animada.

—Agora me conta como foi ontem.

Conto tudo sobre a noite, desde que saímos do apartamento até o momento em
que me trouxe de volta. Falo a parte da provocação na porta, ela arregala um
pouco os olhos rapidamente, rindo logo depois da situação e de mim descrevendo
como ele ficou. Passamos um tempo juntas, conversando sobre o dia de ambas,
mas não falo o ocorrido a tarde na escola,

Foi só um pressentimento, se algo mais concreto acontecer, eu conto. Por


enquanto não tem a necessidade.

Quando vejo que está tarde começo a me aprontar para dormi, ligando para Anna
antes de realmente deitar, porque sei que no momento que relaxar, vou apagar
igual um urso hibernando.

—Amém senhor. Se você me respondesse só amanhã eu iria surtar. —Fala no


momento em que atende. Isso também é um dos principais motivos que me levou
a ligar pra ela.

Repito tudo o que falei para Riley mais cedo, ela ri em alguns momentos e faz
comentários em outros. Acho que sou a maior forma de entretenimento na vida
das minhas amigas a partir de hoje.

Desligo ao me despedir, deitando minha cabeça no travesseiro. O alívio me atingi


junto com trilhões de pensamentos em minha mente. Ela começa a repassar os
pontos altos do meu dia fazendo o meu corpo estar relaxado, mas minha cabeça
estar fervendo.

Capítulo 19
LIAM

Eu estou suando igual um desgraçado.


Meus braços flexionam ao levantar a barra com as mãos. O suor escorrendo pelo
meu braço, a respiração forte, e a dor devido ao peso levantado. Estava
precisando disso.

Faz vinte e quatro horas desde a última vez que vi Maya, ou melhor, desde a
última vez que levei um pé na bunda bem bonito. Se eu disser que não estou com
o ego ferido, estaria mentindo igual a um idiota. Estou sim com o ego ferido, só
um pouco. Não, não só um pouco. Muito. Fazia tempo que não levava um tão bem
feito assim. Na verdade, fazia tempo que não levava um.

Quando disse que queria a beijar, porque queria e quero muito, eu sabia que tinha
uma grande porcentagem de aceitar. Eu vi que queria, a vontade estava descrita
por todas as partes do seu corpo. Mas aparentemente, vontade não é o suficiente
para Maya Hawkins. Voltei pra casa excitado igual a um garoto de quinze anos
depois de beijar pela primeira vez. Merda. Só a Hawkins pra me deixar daquele
jeito sendo que nem a beijei.

Agora eu estou aqui, levantando peso igual um desgraçado, fazendo de tudo para
esquecer nossa última despedida. Fora esse pequeno detalhe, a noite foi
sensacional, seu sorriso, a animação em sua voz, o brilho nos olhos, como não
conseguia parar de falar um segundo, como estava linda. Vou querer a ver assim
mais vezes, muitas mais. E vou fazer de tudo para isso. Quem visse Maya no
começo, não poderia imaginar que podia se divertir tanto. Além de que eu, Liam
Brown, teria saído com uma garota e não fiquei com ela. E mesmo assim foi uma
das melhores noites que já tive.

Fiquei me perguntando quanto tempo não se divertia daquele jeito. Naquele dia
que acabei esquecendo a nossa aula e discutimos, ela ficou quieta quando sugeri
que não iria acreditar se me disse-se que não saía e se divertia por aí.

Acabou que em nenhum momento me dei o trabalho para pensar no assunto, ou


no motivo.

—Pega leve aí. —Fala Nick me fazendo voltar a realidade. Seguro o peso para ele
pegar e colocar no lugar. Invertemos nossas posições. —Eu te conheço Liam, sei
que aconteceu alguma coisa. Na verdade, até sei o que é. —Entrego a barra de
peso nas suas mãos.

—Aé! sabidão, o que?

—Um nome. Maya Hawkins. —Reviro os olhos. Ele começa a rir o que o faz
precisar parar por uns segundos para regular a respiração. —Tem um outdoor na
sua testa.

—Você é um idiota.

—Vai dizer que estou errado? —Suspiro derrotado porque eu sei que não. —Foi o
que imaginei. —O vagabundo abre um sorriso presunçoso.

—Você está assim desde aquele dia que saiu com ela. —No momento em que
fala, Nate passa por nós. Tudo o que consegui pensar durante os poucos
segundos antes de quase berrar na academia é “to na merda”.

—O capitão saiu com a nossa capitã? —Quase berra como o bom fofoqueiro que
é. Todos os caras do time estão atentos a nós agora.

—Caguete. —Vou pra cima dele com um olhar endurecedor. Dou um tapa atrás da
sua cabeça.

—Sai e nem chama capitão?! —Fala Nash, agora todos participam da conversa.

—Soldado abatido! —Dylan grita parecendo que estamos em um campo de


guerra.

—Em que mundo vocês vivem? Metade da faculdade já está sabendo. —Adam
diz como se tivesse acabado de falar que erramos a conta mais óbvia de todas.

Todos o direcionam um olhar mortal em silêncio, vejo Luke fazer um gesto com as
mãos indicando para calar a boca. Ele engole em seco.

—O que? —Pergunto com indignação e sarcasmos na voz. Ninguém responde


absolutamente nada, então continuo. —Por que não termina a frase, Adam?
—Digo, talvez, com um tom ameaçador demais.

—Cara, me lembre de nunca falar as coisas pra você. —Murmura Stephen para
Adam.

—Terminar o que? —Pergunta rindo de nervoso.

—O que acabou de começar a falar.


—O que eu acabei de começar a falar, foi o que eu acabei de terminar. —Olha
inocente.

—É bom explicar logo, Adam. —Resmungo em um aviso.

Um silêncio mortal toma posse da sala de musculação. A única coisa que se ouve
é o engolir em seco de Adam. Isso mesmo seus idiotas, tenham medo. Porque
vocês acabaram de mexer com o que não deveriam, e estão escondendo uma
informação que eu preciso saber.

—Estavam falando desde o dia que vocês postaram a foto. —Adam me entrega
um celular com um site da faculdade aberto no Twitter após alguns segundos.

Há vários comentários de Maya. Não de mim. Apenas de Maya. Que porra é essa?
Não sou burro também, imaginei que iriam comentar quando postasse, mas esses
comentários são um absurdo. Essas pessoas estão falando sério?

—As pessoas já pararam de falar, foi apenas ontem. —Jason completa enquanto
ainda leio os comentários.

—Conversamos com ela no dia seguinte da foto, parecia bem. —Stephen


comenta.

É bom mesmo que esteja bem, porque se depender de mim, as pessoas desses
comentários não irão ficar. Então, é importante que eu encontre Hawkins bem
quando a ver pelo bem estar das suas vidas.

Todos me observam, esperando alguma reação. Assinto diante do seu comentário.


Respiro fundo tentando tomar alguma decisão racional.

—Dessa vez acho que está tudo bem. Só que se houver uma próxima vez, quero
que me avisem imediatamente. —Ordeno. Assentem voltando a programação
normal.

—Sim senhor, mas fala pra gente capitão. A data do casamento já tá marcado? —
Brinca Stephen. Mostro o dedo do meio para ele. Todos caindo na risada.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
—Você viu os sites no Twitter? —Pergunto sem enrolação após me atender.

—Sim.
—E você decidiu não me avisar?!

—E por que eu avisaria você? Não sou uma criança Liam, sei me cuidar. Pare!

—Somos amigos, não somos? Eu poderia dar um jeito. Você sabe que eu posso.

—Quem te disse isso? Eu ainda não gosto de você.

—Então admite que não gostava de mim?

—Admito, porque eu ainda não gosto. O ponto é, quem gosta de você?

—Tem muitas que falam o contrário. Sabia Hawkins?

—Pessoas idiotas.

—Nossa…muito obrigado pela declaração de amor.

Escuto o seu bufar impaciente pela ligação.

—São apenas sites de fofoca, Liam, nada demais. Não preciso de nenhuma
proteção.

—Eu sei - entro na sua, voltando ao assunto.

—Então pare de me tratar como criança, não gosto disso. E todo mundo já
esqueceu.

—Okay, mas se houver uma próxima, gostaria que me informa-se.

—Pensarei na possibilidade. Na verdade, para o capitão do time de hóquei dos


Mavericks, você está bem desinformado.

—Retiro o que disse, não quero saber da próxima vez.

—Negado, agora vai saber.

Maya se despede desligando a chamada. Desço as escadas, vejo Nick


concentrado com seu joguinho de torres em sua frente em cima da mesa da sala.
Porém ela não dura muito tempo em pé, sendo derrubada propositalmente por
Luke. Ele fica alguns segundos paralisado vendo as peças caídas na mesa, até..

—Mas que caralho, seu mal amado, pau no cu do cacete. Tá sem transar é? Eu te
arrumo uma transa rapidinho. —Nick resmunga, mostrando o dedo do meio. Luke
morre de rir da sua reação.
Desde que comprou esse jogo a semanas atrás, ele está viciado. Quando não está
ocupado fazendo uma das suas coisas, ele está aqui sentando na sala jogando.
Ele comprou um colorido e um quebra cabeça gigante, mas ainda não começou a
montá-lo. “Tive que comprar, já que não tenho um melhor amigo que me dá
presentes” suas palavras para mim.

Ele odeia nas vezes que o atrapalhamos, acho que em algum momento ele vai
jogar a gente, literalmente, pela janela. Duvido nada que pare de falar conosco
também.

—Que cheiro é esse?

—A gororoba que Dylan está fazendo. —Responde Luke.

—Tá pronto gente! —Ele grita da cozinha.

Me aproximo dele, que percebo estar no fogão, e vejo um frigideira com o fundo
queimado. Na verdade, tudo está queimado.

—Que merda é essa que você fez?

—Um ovo.

—Você queimou um ovo?

—Você deixou a gente passando fome, eu tive que fazer algo pra comer.

—Okay, e onde isso é um ovo?

—Aqui, seu tongo. Não tá vendo? —Aponta para dentro da frigideira

—Desculpa cara, mas não tem como comer isso. Tem casca de ovo no meio. —
Pego a frigideira, e jogo no lixo a sua gororoba queimada.

—Você matou meu ovo! Ele estava perfeito! —Do jeito que protesta eu até confiro
novamente o que eu joguei para ter certeza que não foi a sua irmã por engano.
—Vai ter que fazer um ovo pra mim agora. —Ele aponto o dedo na minha direção.

—Com todo o prazer.

—Prazer só na cama. —Grita Nick que está remontando a sua torre.

Por que eu fui morar com esses caras?


Capítulo 20

LIAM

Nós massacramos!
O jogo contra o Dallas foi na noite de hoje. No início do primeiro período abrimos o
placar com uma jogada genial de Stephen, saindo em disparada para o gol e
fazendo uma linda assistência para Nash que marcou o nosso primeiro da noite.
Ainda no final do primeiro período, Brandon marca mais um gol após uma jogada
incrível se infiltrando no buraco da defesa adversária, indo para o intervalo com
uma vantagem de dois a zero.

Essa noite o treinador decidiu que os titulares jogariam somente no segundo


período, intercalando nas suas duas escalações principais. Ao início do segundo
tempo fazemos a troca; nós titulares entramos direto para o gelo, aquecendo
antes do iniciar da partida. Se no primeiro tempo nós já havíamos arrasado com
os caras, no segundo tempo foi uma verdadeira lavada.

Sou o líder da minha equipe, quando levamos um gol não deixo os caras
abaixarem a cabeça em nenhum momento, ao contrário, incendeio ainda mais a
torcida e toda a equipe. Porém não foi isso que aconteceu com o time do Dallas.
Voltaram do intervalo parecendo totalmente derrotados, o que foi um péssimo
pensamento, pois isso só nos ajudou a passar mais por cima.
No hóquei, dois gols não querem dizer que o jogo está completamente ganho, é
muito fácil de acontecer uma virada inesperada, mas hoje não foi um desses
casos. Luke joga o disco para dentro da rede em questão de minutos após o início
da partida, animando Nate a fazer o seu logo em seguida. O placar indo para
quatro a zero.

Na metade da partida, o time adversário consegue marca o seu, mas não deixo
eles comemorarem por muito tempo porque minutos depois eu faço o meu gol da
noite, para coroar o derrota.

Ganhamos de cinco a um.

—Não é, Liam?! —Um esbarrão no meu ombro, me traz de volta a realidade.

—Uhum. —Concordo com a cabeça.

Só então me lembro que estava em uma conversa com Nick, Luke e mais dois
garotos no quintal da fraternidade. Dylan não perdeu tempo e já foi aproveitar com
uma garota. Nada melhor do que comemorar uma vitória daquelas com uma festa.
Se tornou costume todo final de jogo rolar uma comemoração com a galera do
time, hoje decidimos vim para uma das fraternidades.

Eu não fiquei com nenhuma garota ainda! Porra, não fico com ninguém a
semanas, essa é a verdade. Como todo universitário, e homem, saio regulamente
com os meus amigos para aproveitar, beijar e transar. Mas por mais estranho que
possa ser, não sinto vontade de fazer nenhuma dessas coisas, principalmente a
parte do beijar e transar.

Sim, eu já fiquei com um número considerável de garotas da faculdade. Fazia sexo


regularmente, mas vai fazer três semanas que isso não acontece, ou melhor, que
eu não fico com ninguém. Ninguém porra. Apenas saio, bebo, aproveito e só. Não
sinto mais tesão por qualquer garota que possa aparecer em minha frente,
simplesmente não funciona! Isso é preocupante pra caralho!

Pelo menos não desde quando comecei a desejar Maya Hawkins, e aquela merda
de tensão entre nós se tornar frequente. Sem eu perceber meu cérebro volta para
a noite do jogo, no momento em que estávamos em seu quarto, os seus olhos me
fitando, a forma como seu corpo reagiu ao meu, os seus dedos nos fios do meu
cabelo. Essa tortura psicológica deveria ser crime!
Faz uma semana que não a vejo, e não sei como vai ser no momento em que isso
acontecer. Hawkins não é como as outras garotas, e amo isso nela, mas não
quando a vontade de experimentar sua boca e segurar os seus longos fios de
cabelo entre meus dedos aumenta constantemente.

Merda! Estou começando a enlouquecer.

—Cara, você não prestou atenção em nada.

—O que? —Pergunto, sem fazer a mínima noção do que estavam falando de


novo. Nick e Luke ri e viro meu copo de cerveja com a mão levantada me
desculpando. Os palhaços dos meus melhores amigos nem disfarçam que sabem
exatamente o que está acontecendo comigo.

—Você não sabe disfarçar. —Sussurra Nick. Sério?! Você também não, palhaço.

—Desculpa pessoal, estou pensando no próximo jogo, contra Stanford.

Não chega a ser uma mentira, mas está longe de ser o motivo principal da
distração.

O nosso próximo jogo vai ser muito difícil e disputado, o time de Stanford vai vim
com tudo para cima da gente, além de nossas torcidas serem rivais. Um jogo de
Stanford contra os Mavericks são sempre emocionantes do começo ao fim.
Prevejo vários hematomas no corpo.

Meu melhor amigo como um bom observador e idiota que é, me fita de esguelha.
Ele sabe muito bem o porquê estou assim, o que já era de se esperar. Nick é lento
igual um jegue para muitas coisas, mas assuntos como esse não é um deles.

—Porra, nem fala. Certeza que vão pegar pesado com os alas. —Um dos garotos
diz.

—Vai ser um jogo do caralho, e ainda porque vamos jogar fora. —Luke comenta.

Não posso descrever a alegria por ter começado bem a temporada. Por enquanto
tudo está ocorrendo como o planejado para levar o time a mais uma vitória.
Estamos invictos, sem nenhuma derrota na conferência até o momento, Stanford
vem em segundo; venceram todos, estão com garra para levar o título.

Nos empolgamos conversando sobre hóquei e da probabilidade de vencer


Stanford no próximo jogo, até que Olívia com suas amigas aparecem na nossa
frente com um vestido ousado que exibe suas curvas e pernas. Todos na roda a
secam dos pés a cabeça. Ambas são da fraternidade Phoenix, onde estamos.
—Chega de falar pessoal, é hora de body shot. —Sentencia, exibi com felicidade
uma garrafa de tequila e dois copos de shot na mão. —Bora animar essa festa!

Antes que eu possa responder que não estou a fim de misturar bebidas, alguém
me abraça por trás roçando os seios nas minhas costas.

—Podemos fazer dupla, o que acha? —A voz vem sussurrada no meu ouvido, só
quando me viro que vejo de quem é a dona.

Quero sorrir e a cumprimentar de forma educada, mas os olhos verdes e o cabelo


loiro me prendem a atenção, desejando que fosse os castanhos claros e os
cachos na ponta do cabelo de Maya. Não fode Liam! Esqueça ela.

—Tá ficando ruim, já causou reações melhores! —Olívia tira sarro da loira, que
enlaça meu pescoço chocando meu peito contra o seu.

—Vamos ver até o final da noite quem aguenta mais. —Responde piscando
provocativo para líder da fraternidade Phoenix, que a lança um olhar mortal.

Chloe é uma ex amiga de Olívia, tem 21 anos, estuda cinema e está sempre
frequentando as festas que rolam. As duas eram muito próximas, viviam
competindo para ver quem pegava mais em uma única noite, mas não sei o que
aconteceu que acabaram se distanciando.

A última vez que a vi foi antes da temporada de hóquei começar, naquela época
ela me causo um bocado de reações. Não posso negar que foi delicioso, embora
não tenha causado nada em mim agora.

—Quanto tempo, Chloe, está linda! —Elogio segurando sua cintura para
cumprimenta-lá direito.

Cintura fina demais, diferente de Maya, que merda!

Balanço a cabeça, forçando a me concentrar no momento.

Não transo com ninguém a semanas, talvez seja isso que eu precise, eu posso
aproveitar essa oportunidade e tentar esquecer aqueles olhos castanhos. Gozar
vai me fazer relaxar e voltar ao normal. Talvez funcione.

—Topa um body shot comigo? —Pergunta sorrindo com malícia.

—Bora pro body shot!

—Vamos beber! —Olívia nos observava, mas disfarça chamando o pessoal


animada, e puxa uma outra garota que segura uma sacola de sal e limão na mão.
Logo um grupo de pessoas ainda maior se une a nós, gritando empolgado acima
da música que toca ao fundo.

Aponto que quero ser o primeiro, Chloe segura o meu braço e se apresenta como
a minha dupla. Aqui sempre brincamos de casal.

A cada rodada, sorteamos uma parte do corpo que será usada como apoio para
lamber o sal. Em seguida, se vira um gole de shot e chupa o limão da boca do
parceiro. Tanto o homem quanto a mulher devem fazer um no outro. Vence o casal
que aguentar repetir mais vezes, sem errar a frase “abajo, arriba, al centro,
adentro!”

A primeira parte do corpo escolhida é o ombro. Sem fazer cerimônia, Chloe abaixa
a parte do vestido vermelho que está usando e mostra a alça do seu sutiã.
Inclino-me colocando uma das minhas pernas entre as suas, degustando na pele
o sabor salgado. Esperta, a loira aproveita a posição das nossas pernas,
esfregando a cintura na minha levando a plateia ao delírio.

—Abajo, arriba, al centro, adentro! —Falo antes de virar o gole sem me mover.

Sob os gritos da plateia ao redor, e a garganta queimando, eu a beijo ao mesmo


tempo que chupo o limão dos seus lábios.

Assim que me afasto a decepção se aloja em mim ao encontrar olhos verdes me


fitando com desejo. Não olhos castanhos.

Se fosse antes, eu estaria começando a esquentar, me preparando para mais uma


aventura. Hoje, sinto uma frustração enorme ao me afastar da mesa para a outra
dupla se posicionar.

Vamos tentar até funcionar!

Coxa, braço, quadril, barriga…insisto durante cinco rodadas sem sentir uma única
chama sequer. Não é possível! Normalmente eu sinto um tesão do caralho fazendo
e recebendo.

Na sexta vez, só três casais continuam na disputa. O sorteio cai para o colo, uma
das amigas de Olívia, que não deixou de nos observar um minuto, coloca o sal no
colo derramando bem no decote do vestido entre os seios.

Abaixo para lamber e tenho a péssima ideia de enroscar meus dedos nas mechas
do seu cabelo, me remetendo instantemente ao momento e a pessoa que quero
esquecer.
Sem conseguir me controlar, fecho os olhos imaginando como seria Maya com
seu corpo pequeno embaixo de mim neste momento enquanto me permitisse
toca-la. Meu corpo acende, as chamas se espalham e me vejo salivando de
vontade.

Desço a boca para entre os seus seios, chupando o local enquanto minha mão
desce pelas suas costas a curvando para mim e a afundando em sua cintura.

Movimento a língua e paro passando o nariz em volta do bico do seu seio,


tentando ir devagar, disparando adrenalina no meu sangue fazendo eu ficar
excitado e o volume entre minhas pernas inchar no mesmo instante.

—Isso, Liam! —A voz me faz cair em si, parando imediatamente.

Arregalo os olhos, ofegante pelo calor do momento. Observo ao redor; ainda estou
nessa festa, jogando essa brincadeira idiota. Entrei realmente em uma alucinação
perigosa. A euforia de quem está acompanhando confirma que não foi apenas
uma imaginação, eu realmente fiz tudo que minha mente desejou.

Passo a língua ao redor dos lábios, sentindo o gosto do sal que havia me
esquecido. Que merda eu fiz?!

Não é como se esse tipo de coisa já não tivesse acontecido, eu dar uns amassos
em público. Mas não desse jeito! Não pensando em outra pessoa.

—Adentro…al centro, arriba! —Erro de propósito a frase, evitando uma merda


maior do que eu já fiz.

Não deveria estar usando Chloe para esquecer Maya, isso está errado. Não
deveria ter vindo. O melhor a ser feito é ir para cara.

—Que isso, Liam, já? —Nick se gaba por ganhar pela primeira vez de mim.

—O cansaço tá pesando. Estou ficando tonto, vou chamar um táxi. —As mentiras
saem por conta própria, só que eu sei que ele não acreditou em nenhuma delas.

Os meninos do time não insistem, confirmando com um aceno de cabeça. Deixo


um beijo na bochecha de Chloe que me encara entendendo nada. Quando
aproximo de Nick, nós damos o nosso toque, se despedindo.

—Cara, você tá fodido. —Diz antes de me afastar.

Não entendo o que quer dizer, mas ignoro e vou embora.


Essa garota está me enlouquecendo. Se Maya Hawkins quer fazer do jeito difícil…
eu vou dar o que ela quer!

Capítulo 21

MAYA

Não fui ao último jogo dos Mavericks.


Isso quer dizer que preciso saber como foi o resultado para o meu trabalho. Se
você pensou em Liam, você acertou. Vazou um vídeo dele na festa em uma das
fraternidades no campus junto com os meninos do time, o que não é algo nada
anormal. Pelo o que aparenta no vídeo, anda se divertido por aí nos últimos dias.
A galera da faculdade nem faz muito caso, a fama dele nunca mudou. Foi apenas
mais um vídeo comum como qualquer outro, com uns comentários ou outros.
Além de que, nunca se deve falar do famoso Liam Brown.

Não faço questão, ele decide com quem deixa ou não de ficar, ele quem toma
conta da própria vida. Mas acho que estava errada quando pensei que havia
causado algum efeito nele, caras como ele não ficam com garotas como eu. “Se
quer me beijar, vai ter que fazer bem mais do que isso”, duvido que aceitaria um
desafio desses, só querem uma transa simples e fácil, sem dificuldades.
Esse vídeo só comprovou mais esse fato, e também a minha teoria de que
somente me levou para sair pra conseguir ficar comigo, quero dizer, mais um
nome dos milhares em sua listinha, uma verdadeira atitude de babaca, como
sempre falaram que ele é.

Isso não importa, porque agora preciso da sua ajuda. A parte do meu acordo foi
cumprida, mas a sua ainda não terminou. Nesse momento, eu queria muito ter
amigos apaixonados por hóquei e que assistem aos jogos para me ajudar, assim,
não precisaria ter que ver ele depois de todo aquele clima…e do vídeo.

Esquece isso Maya, dane-se esse vídeo.

O dia para a entrega do trabalho está quase chegando, então, não vou ter que
passar por isso por muito mais tempo. Só por mais algumas semanas antes do
término desse primeiro semestre.

Como hoje não vou precisar ficar com Mia, quando o fim do meu expediente está
chegando, envio uma mensagem para saber se posso passar em sua casa. Sorte
que ele não demora a responder.

Eu: Sua parte do acordo ainda não acabou, preciso de ajuda.


Ele: Não foi ao jogo ontem? Achei que cumprisse suas promessas Hawkins.
Eu: Eu as cumpro.
Ele: Suas ações dizem o contrário.
Eu: Posso passar aí depois? - questiono antes que isso vire uma discussãozinha
idiota, o que sempre acontece entre nós.
Ele: E Mia?
Eu: Os pais irão passar pra buscá-la hj.
Ele: Você sai que horas?
Eu: Daqui a quinze minutos.
Ele: Chego em dez.
Eu: Vc não precisa vim me buscar.
Ele: Eu sei, você poderia estar a 1.000 Km de distância, eu ainda iria te buscar.

1...2...3...4…5 segundos. Leio de novo. De novo. De novo. De novo e…De novo.


Solto a respiração que não tinha percebido que estava prendendo.
Quero perguntar porque disse isso, se está brincando comigo…opto por bloquear
o celular.
Eu só ando de carro com ele, e sempre demonstrou que não havia problema em
me levar para os lugares que preciso. Mas…ler, com todas as letras, é…na
verdade, não sei o que é. Ou simplesmente não quero saber.
“É mentira”, “É só uma mensagem”, “Não caia na pilha”, “Guarde o que está
sentindo, Maya!”, “Ignore”, “Não é nada”.

Ouço o sinal bater, indicando que é a hora da saída, preciso levar as crianças para
seus pais. Forço meus pés a se moverem.
Me despeço de todas as crianças antes de uma voz familiar chamar a minha
atenção.

—Que bom te ver de novo, Maya. —Era só o que me faltava.

—Igualmente senhor Miller, o Will está guardando o material. —Um calafrio


percorre minha espinha. O sentimento de medo bate a porta.

—Sem problemas, eu aguardo alguns minutos. —Varre os olhos por cada


centímetro do meu corpo. Um sorriso brilhante e cafajeste surge em seus lábios.
—Sabe Maya, poderíamos tomar um café qualquer dia. Eu adoraria saber o que
meu filho anda aprontando na escola, e de você, é claro.

Respire. Sorria.

Preciso de água. Meu corpo está suando. “Recuse!” minha mente grita, com luzes
vermelhas piscando.

—Seria um prazer senhor Miller, mas não posso sair com pais de alunos. Obrigado
pelo convite mesmo assim. —Tento soar de forma gentil.

Estou tremendo, minhas mãos estão suando. Sua expressão mostra que não
gostou da recusa e fecha. Quero me virar e ver se não estou sozinha, mas não
posso. Quanto tempo resta para Will terminar de arrumar a mochila?

—Tudo bem, eu entendo. Caso mude de ideia, é só me avisar. Seria bom manter
uma amizade com a pessoa que cuida do meu filho no período em que não estou.

Ele volta. O sorriso volta. Quero que ele vá embora, logo.


—Papai! —A voz me traz alívio.

Will passa por mim correndo, alcançando o pai que se abaixa para o abraçar
apertado. Ele me abraça logo depois como uma despedida, se apressando para
irem embora. Apesar da cena linda, não sinto nada além da minha garganta se
fechando e os resquícios do suor nas minhas mãos.

Ergo o meu olhar avistando ao longe uma estrutura corporal encostada na sua
nave espacial chamada de carro. Os olhos estreitos me observam junto aos
braços cruzados. A quanto tempo está ali?
Faço sinal de um com o dedo sinalizando para esperar mais um minuto para eu
conseguir pegar minhas coisas e tirar o jaleco colorido. Não recebo nada de volta.
Sem aceno, joinha, movimento com a cabeça, nada!

Quando volto e me aproximo do seu carro, ele não me cumprimenta. Contorna o


carro junto comigo, parando e abrindo a porta para eu entrar.
—Obrigado. —É tudo o que eu digo, e eu recebo…nada! Nenhuma resposta.

Ele faz a volta novamente, entrando e começando a dirigir o carro em completo


silêncio. O que está acontecendo? Por que pragas está assim? Se isso for pelo o
que aconteceu entre nós da última vez que nos vimos, eu digo que esperava o
mínimo de maturidade. Não somos um bando de pré-adolescentes mais, somos
praticamente adultos, será que vou precisar informá-lo disso?

Meu Deus, Liam está sendo um tremendo idiota.

Direciono meu olhar para ele; seus olhos estão fixos em sua frente, seu maxilar
está tão tenso que me pergunto se não quebrou um dente. Apesar disso, é
perfeitamente lindo. O perfil do seu rosto é completamente perfeito. Isso de algum
jeito me arrepia e faz algo dentro de mim aquecer.

Continuo o observando tentando mandar um sinal que é para dizer o que diabos
está acontecendo. Mas não funciona, então eu quebro o silêncio.

—Você pode me dizer o que está acontecendo aqui? De verdade Liam, se isso for
pelo o que aconteceu na última vez que nos vimos, você está sendo um comple…

—Qual o nome dele? —Pergunta com o maxilar ainda travado.


—De quem?

—Do homem que estava na porta a minutos atrás falando com você.

—Miller, é o pai de uma das minhas crianças.

—E pais tem permissão para darem em cima das funcionárias da escola?

Aí, eu noto. Liam não está assim pelo o que aconteceu, está assim por que viu. Ele
viu toda a cena. Estava longe demais da entrada, então, como sabe o que
aconteceu?

—Como pode ter tanta certeza que ele estava dando em cima de mim?

—Eu sou homem Maya, sei muito bem identificar. Eu também sei ler o seu corpo.
—Minha boca se abre levemente com a confissão, me fazendo fechá-la assim que
notei o feito. — A quanto tempo isso está acontecendo? —Ele pergunta.

Agora, mesmo o maxilar ainda tenso e a irritação aparente, consigo sentir o


pequeno fio de preocupação em seu tom de voz.
—Essa foi a segunda vez.

—E quando foi a primeira?

—No dia seguinte do jogo de basquete. —Os dedos da sua mão ao volante estão
brancos, estão fazendo força demais. Ele não tem força pra quebrar, ou tem?

—Vamos fazer o seguinte. A partir de hoje eu vou te buscar todos os dias.

—Está brincando, não é? —Riu de forma sarcástica porque não pode uma coisa
dessas ser séria. Ele acha mesmo que eu aceitaria um negócio desses?

—Eu pareço estar brincando? —Não.


Sua voz é calma e controlada, mas tudo menos o que Liam está é calmo. Ele
definitivamente não parece estar brincando. Na verdade, essa é uma das únicas
vezes que o vi tão sério.

—E você acha mesmo, que eu vou aceitar um negócio desses? Vou gastar com
todo o seu combustível, te dar o trabalho de…—Sou interrompida imediatamente.
Pela segunda vez.
—Eu não estou pedindo autorização, Hawkins, e estou nem aí para a porra do
combustível. Você nunca é um incômodo pra mim. —Ele finalmente me olha. Seus
olhos me dizem que não tem negociações hoje.

Eu fixo o meu olhar no seu. Nossos olhos se encontram mais uma vez.
Ele não desvia. E eu, muito menos.
Eles me dominam, me ordenando abaixar a guarda e não protestar. Por que dessa
vez, não adianta, ele já decidiu.

—Eu sei o que eu vi. E eu não vou deixar o cara ir até o final. Você me entendeu?
—Durante suas palavras o seu olhar permanece, sem vacilos. Como se estivesse
fazendo uma promessa. Como se precisasse olhar nos meus olhos enquanto diz.

—Entendi. —Respondo. Corto o olhar por fim.

Liam está certo. Eu sei o que ouvi. O que senti. “Eu não sou louca”, essa frase se
repete. Repete. Repete. Repete diversas vezes na minha mente.

Minha garganta está seca. Minhas mãos estão tremendo. Seguro ambas em cima
do colo. Quantas vezes isso vai se repetir? Será que alguma hora vai parar? E se
em algum momento eles conseguirem? Vou parar de sentir medo?
Eu não quero sentir medo. Quero que isso pare. Por favor Deus, faça parar. Não
quero ser assim.

Ouço “Dream a little dream of me” soar por todo o carro. Me puxando de volta a
realidade. Fecho os olhos. Aproveito o som da música e relaxo. Esqueço.
Ele sabia que iria funcionar.

—Chegamos. —Informa ao sentir o carro parar enfrente sua casa minutos depois.

Entramos, mas não vejo nenhum dos meninos, a casa está em completo silêncio.
—Onde estão os meninos?

—Estudando no quarto.

—Eles? Estudando?

—Final de semestre. —Explica. —Eles estão enfiando a cara nos livros. Precisam
de nota. —Aceno com a cabeça.
Subimos sem parar para mais conversas. Não demoramos muito tempo para
finalizar tudo o que eu preciso, já guardando as minhas anotações para ir embora.
Pena que não vou conseguir escrever a temporada completa devido a data de
entrega, mas vou ainda pegar o jogo contra Stanford e o das semifinais. Então,
acho que vou ter um conteúdo bem empolgante para a minha matéria.

—Como está o andamento? Falta muito? —Pergunta.

—Nossa, estou vendo a sua empolgação por me ajudar. —Falo de forma irônica
tocando a maçaneta da porta para abri-la. —Não muito, só mais dois jogos e vou
poder entregar o trabalho para a professora Smith.

—Você vai continuar indo aos nossos jogos depois, certo?

—Não sei, acho que como capitã tenho o dever de torcer pelo time. —Sorrio ao
brincar, o vendo se levantar da cama. —E, eu vou querer ir em mais um treino,
pode avisar o treinador.

—Como quiser, capitã.


Descemos as escadas vendo Luke e Dylan com latas de cerveja sentados no chão
da cozinha colocando várias peças de dominó em pé formando uma rota por todo o
lugar, indo em direção ao corredor.
Nick está sentado também, porém, concentrado na torre de equilíbrio na sua frente
em sua posição de sempre. Pernas cruzadas, uma mão em seu queixo, sem
piscar.

—A rainha desse jogo, não vai querer perder pra mim hoje? —Provoca Nick.

—Como se eu pudesse perder. —Devolvo a provocação, aproximo-me de onde


está me sentando com as pernas cruzadas.

—Gosto da sua maneira de pensar positivo.

—Liam, vem ajudar! —Chama Dylan.

Escuto um barulho de peças caindo e imagino que Liam não ajudou da maneira
que queriam. Não preciso me virar para saber o que realmente aconteceu, pois
segundos depois eu tenho a confirmação.
—Porra, assim não! —Esbraveja.

—Você acabou com a graça, cara! —Diz Luke com uma entonação um pouco
irritada.

—Demoramos um tempão pra montar isso, seu ingrato! —Briga Dylan.

—Aí! —Resmunga Liam. Quando me viro percebo que os meninos acabaram de


jogar peças em seu rosto.

Volto minha atenção para o jogo e para Nick a minha frente.

—Qual é a de vocês? —Pergunta casualmente enquanto retiro uma peça da torre.

—Que “vocês”? —Finjo que não entendi sua pergunta, mas parece que ele não
está a fim de entrar na minha.

—Vamos lá, Maya, sei que você é inteligente. —Ele analisa a torre e retira mais
uma peça.

—Somos amigos. —Respondo como se não fosse nada demais, o que não é. Por
que estamos fazendo caso com isso?

—É o que está usando para tentar se convencer? —Eu retiro uma outra da torre. O
mais legal desse jogo é que você não joga apenas para você, e sim para o seu
oponente também.

—Não estou tentando me convencer de nada. As pessoas que estão enxergando


coisas que não existem e espalhando por aí. —Ele analisa as peças.

—Só que, nós dois sabemos que dessa vez não são apenas boatos. Liam não é o
tipo de pessoa que leva uma menina para assistir a um jogo de basquete todo dia.
— E retira a que eu queria, bingo!

—Agora, pessoas me olham como se eu fosse a Cinderella e outras, a madrasta.


—Adiciono. Nesse momento, não estamos mais jogando.

—Então, você admite que não são apenas boatos?


Abro a boca, mas nada sai.

—Vocês vão me dar trabalho. —Resmunga respirando fundo.

—Eu não sei o que está acontecendo, ou se tem possibilidade de existir um “nós”.
Saímos e foi divertido, nada demais. —Falo de forma sincera.

—Se for para ser, tudo bem. Mas, conheço ele tempo o suficiente para dizer: se
não estiver a fim, não finja que está. Porque ele está.

—Como sabe disso?

—Você não viu como ele ficou nos dias depois que saíram. Sério Hawkins, estava
começando a ficar preocupado. O cara ficou perdido, vivia no mundo da lua.
Chegou a um ponto que ele trocou o sal pelo açúcar! A comida ficou detestável
aquele dia. —Lamenta, disso, eu gostaria de rir, mas engulo a risada. —Tinha que
ver quando ficou sabendo dos boatos, ficou verde de raiva igual ao Hulk, e perdi a
conta de quantos banhos gelados ele tomou. Porra, eu perdi meu parceiro de porre
por sua causa! —Desabafa.

Nick parece um cara legal, além de parecer ser um ótimo amigo, como demonstra
ser com Liam.
—Vamos combinar uma coisa, eu cuido para ele não trocar o sal pelo açúcar de
novo, e você, para não me ligar parecendo um doido desesperado com os boatos
e nem me perseguir pelo campus. —Ele gargalha.

—Isso ele pegou pesado. —Declara.

—Ele ficou parecendo um psicopata. —Concordo.

—Fechado. —Ele estende a mão e eu a seguro selando nossa parceria. —Foi bom
fazer negócios com você, Hawkins.

—Vou pensar antes de dizer o mesmo para você. —Digo séria arrancando mais
um sorriso seu. Talvez seja bom ter Nick como amigo.

No momento em que desgrudamos as mãos, levo elas confiantes em direção a


torre para retirar uma das peças, e…
—Rá! Bingo! —Me gabo o fazendo perceber que se mexer em qualquer outra, a
torre vai cair. Eu ganhei.

—Droga! Você é boa em tudo o que faz?

—Bom, geralmente sim. —Sorrio vitoriosa.

Ele se levanta pronto para se juntar aos meninos, me passando uma informação
antes.
—Ele estava o tempo todo olhando para você. —Não…ele não está. Me viro dando
de cara com o seu olhar em cima de mim, sufocante e tranquilizador. Aí meu Deus,
ele realmente estava.

—O que vamos comer? —Ouço Luke perguntar.

—Hoje, a visita decide. —Responde Liam.

—Maya, escolha carbonara, por favor! —Implora Dylan.

Quando me levanto encontrando todos na cozinha, vejo que mantém o olhar sobre
mim. Desvio para Dylan que me encara com os olhos de cachorro pidão.

—Hmm…que tal carbonara? —Sorriu escolhendo o que pediu.

Capítulo 22

LIAM

Eu preciso de uma lista.

Quando uma garota diz que par que fazer muito mais, o que ela está querendo
dizer? Que eu devo mandar buquê de flores, chocolates e todas essas coisas
clichês? Mas Maya não parece querer dizer isso, não parece o tipo de menina que
gostaria de chocolates e flores. Pior, ela é leitora! De romance!

E isso quer dizer que eu tenho que sair do comum, fazer o que esses caras do livro
fazem. O único problema é: eu não sei o que eles fazem. Eu sou um jogador de
hóquei, não um personagem escrito por uma mulher.
Nesse momento eu estou me arrependendo profundamente de todas as vezes em
que não escutei minha mãe mandando eu ler um livro.

—O que um cara escrito por uma mulher faria para conquistar uma garota? —Bato
a caneta no bloquinho em cima da minha perna pela milésima vez. Os três
sentados no sofá erguem o olhar.

—Não sei, não sai de um livro. —Diz Dylan sem fazer muito esforço.

—Valeu, ajudou muito. —Ironizo.

—De nada. —Ele dá de ombros.

—O que está fazendo? Está a meia hora sentado aí encarando esse bloquinho. —
Luke franze o cenho.

—Uma lista de gestos românticos. —Respondo sem pensar duas vezes. Então,
fecho os olhos percebendo o que acabei de fazer.

Um silêncio mortal recai sobre a sala.


Os três trocam um olhar por longos segundos. Voltam-se na minha direção, em
sincronia, e me encaram como se eu tivesse acabo de sair de um manicômio.
O que pode muito bem ter acontecido; não existe nenhum outro motivo para eu
estar fazendo uma lista como essa.

Desde o começo eu sabia que Hawkins era diferente de todas as meninas que eu
conheci. Mas ela me subestima as vezes. Se acha que um desfio desses vai me
assustar, está muito errada. Se consigo liderar um time composto por um bando de
idiotas, consigo fazer gestos românticos.

—Uma pergunta. —Começa Luke.

—Sério, apenas uma? Eu tenho um questionário. —Comenta Dylan.


—Pode mandar.

—Está fazendo isso para Maya, certo? Porque se estiver fazendo isso por
qualquer outro motivo, é muito estranho.

—Sim, é para Hawkins. —Meu amigo acena, e se mata de rir, Dylan o acompanha.

Idiotas.

Faço uma cara feia e vejo que seus ombros tremem a cada gargalhada. Estou tão
concentrado em Luke e Dylan que não percebo o que Nick está tramando até não
ter mais como impedir. Ele olha o bloco por cima do meu ombro lendo os itens da
lista que escrevi.

—Aí meu Deus, Luke, ele vai escrever bilhetes para ela todos os dias. —Exclama.

—Mentira! Bilhetes de amor? —Gargalha Luke. Não posso me esquecer de trocar


de amigos amanhã.

—São bilhetes para ela ler durante o dia, falando sobre ela. —Explico.

Dylan balança a cabeça negativamente.


—Poderia ser poemas, seu burro.

Pela primeira vez Dylan tem razão. Como não pensei nisso? Sou tão ruim assim?

—Por que não dá um buquê diferente para ela? Sem o clichê das flores, com algo
que você saiba que ela goste. —Sugere Luke. Isso me deu uma ótima ideia.

—Sério, por que está fazendo isso? —Dylan questiona, sem entender o motivo.

—Porque quero conquistar Hawkins.

—Ele realmente está fodido. —Mostro o dedo para Nick e os outros dois que
concordam.

—Se um dia precisarem de ajuda, não contem comigo. Babacas. —Me levanto
indo subir as escadas para o meu quarto.
Os sons das risadas na sala me acompanham. Entro no quarto e fico mais uns 20
minutos pensando no que posso acrescentar a lista. Eu espero que todos esses
gestos deem certo e que Hawkins goste de cada um deles. Definitivamente ela ser
leitora dificulta tudo, vai saber qual o nível de expectativas que ela tem?!

Que o universo me deseje boa sorte.

MAYA
Eu certamente não sou a pessoa que teria paciência para viver um livro.

Se dependesse de mim, o livro acabava no primeiro capítulo. Mas, como uma boa
leitora, estou fingindo que isso não poderia ter sido facilmente resolvido porque
não a nada melhor do que ler um livro com mistério e romance envolvidos. O que
me lembra o segundo fato: eu detesto triângulo amoroso.

São facilmente irritantes, e na maioria das vezes, não são bem desenvolvidos. O
que não é o caso desse, mas me irrita mesmo assim. Eu no lugar de Avery
ignoraria esse mistério e viveria a minha vida. Estou nem aí para o passado
trágico, quero aproveitar o meu dinheiro, sou herdeira agora, não importa como.

Estou tão entretida nesse livro, quero tanto as respostas, que ultimamente estou
lendo em qualquer lugar com qualquer intervalo de tempo que tenho. Fazia um
bom tempo que um livro não me deixava assim. Amo quando eles têm esse poder.
Essa magia. Percebo que já estou do lado de fora do prédio quando sinto o calor
do sol aquecer a minha pele, sem desviar em nenhum segundo a atenção da
leitura.

Andando pelo campus, sinto meu livro ser arrancado das minhas mãos. Ergo os
olhos pronta para atacar quem me roubou, mas meu corpo se choca com uma
muralha de músculos. Aspiro o aroma masculino amadeirado. Eu poderia passar o
dia sentindo esse cheiro. Relaxo imediatamente, não sobrando dúvidas de quem
seja.

—Você só sabe ler? —Liam mostra o livro em sua mão.


—E existe algo melhor para fazer? —Estendo a mão ordenando indiretamente para
que me devolva.

Ele ignora e abre o livro na página em que parei. Por que ele sempre tem que me
irritar?

—Beijo na banheira? Isso é romance? De novo? —Fala indignado após alguns


segundos. —Temos que rever as coisas que você lê. —Eu bufo ao revirar os olhos.

—O foco não é o romance. Agora, você pode deixar de ser um chato e me


devolver o livro? —Abaixa o olhar para o livro em sua mão.

—Hmm…acho que não. —Ele começa a se afastar com pequenos passos de


costas, eu o sigo.

—Me devolva, Liam! —Ordeno. Ele não responde. Eu vou para cima dele, mas não
funciona. Acelero o passo com a intenção de o alcançar, mas ele aumenta o dele
também. Que droga!

Meu olhar ameaçador recai sobre ele que começa a correr. Sim, a correr!

Sim, estamos correndo pelo campus. Ele com o meu livro em mãos, e eu atrás
dele. Parecendo duas crianças no jardim de infância. Ei, a gente envelhece por
que deixa de brincar.

—Eu te odeio, Liam Brown! —Grito correndo com um sorriso surgindo em meu
rosto assim que deixo meu estresse voar pelos ares.

—Eu amo te irritar, Maya Hawkins! —Grita de volta.

Damos a volta por partes do campus, atropelando algumas pessoas pelo caminho.
Ele para de baixo de uma árvore. Estou me sentindo uma velha fumante com essa
corridinha idiota. Eu preciso voltar a fazer exercícios.
—Você pode me devolver agora?! —Pergunto ofegante. O seu famoso sorriso torto
dá as caras mais uma vez. Ele está amando essa brincadeira.

—Porque eu faria isso?

—Porque estou mandando. —Argumento firme.


—Gosto disso, mas prefiro a parte em que você quer me matar. —Fala com toda a
arrogância do mundo.

Antes que eu possa protestar, ele se abaixa agarrando as minhas pernas, me


jogando por cima do ombro e rodando comigo. Os meus cabelos formam uma
cortina sobre meu rosto, me impedindo de enxergar, mas não ligo porque estou
ocupada demais rindo com ele agora.

—Me coloque no chão, Brown! —Ordeno batendo as mãos em suas costas. Ele
inicialmente não obedece. Deixando que eu proteste e continue batendo como
vingança. Só quando eu desisto e cruzo os braços que me coloca no chão.
Tão...arght, idiota.

—Você só lê livros de romance? —Pergunta para mim já em terra firme.

—Não. Gosto de suspense também. —Ajeito o meu cabelo que está mais para um
ninho de passarinho, respirando fundo e estendo as mãos pedindo para me
entregar.
Dessa vez, ele me devolve. Ótimo, Liam acabou com o único tempo que eu tinha
livre para ler.

—Tem alguns autores favoritos? —Pergunta. Novamente.

Ele já me questionou outras vezes sobre essa paixão em livros que tenho, mexeu
na minha estante e vive brincando comigo. Mas, não perguntas desse jeito. O que
está havendo? Vai se render a força maior e virar leitor?

—Não em específico, mas gosto da Colleen Hoouver. Geralmente, gosto também


desses livros com capas fofas. Por que? —Não entendo o porquê disso. E muito
menos o porquê de toda essa curiosidade repentina.

—Nada. —Responde casualmente dando de ombros. Resolvo ignorar.

Observo ao redor e vejo que todos apreciam ao nosso show. Como não poderiam?
Corremos igual duas crianças pelo campus, era de se esperar que estariam
observando. Por mais que eu não esteja ligando nesse momento, é ruim receber
atenção desnecessária.
Quando volto a minha atenção para ele, percebo que está sentado debaixo da
árvore. Ele estende a mão oferecendo ajuda para eu me sentar ao seu lado, eu a
agarro.

—Sobre o que é o livro? Você disse, que não é o foco o romance, o que é?
—Pergunta enquanto ajuda a me sentar.

Eu considero essa pergunta um tanto quanto perigosa.


Acho que os motivos são óbvios, mas quando você faz essa pergunta, esteja
preparado. Porque você vai passar os próximos minutos ouvindo uma maritaca
falar no seu ouvido freneticamente, sem pausas.

—É uma garota, que vira herdeira do dia para noite. Um velho bilionário deixa toda
a herança da família pra ela.

—Nossa, e o velho é avô dela? Desculpa linda, mas isso não tem nada de
interessante.

—Você está errado, porque ela não tem nenhuma ligação com ele. É um completo
desconhecido que ela nunca tinha ouvido falar.

—Prossiga, por favor. —Fala parecendo realmente interessado. Eu sorrio.

—Só que existe um porém. Ela só pode receber toda a herança depois de morar
durante um ano na casa do velho, junto com seus netos e o resto da família dele.

—E por que ela tem que morar com eles? Expulsa todo mundo. Ela não é
obrigada, já que tudo é dela.

—Não estraga a história, Liam. —Reviro os olhos. —É simplesmente incrível, ela


começa a morar lá e a descobrir o enigma que o velho deixou para ela com a
resposta do porque fez isso. Com certeza é um dos meus livros favoritos. Eles
procurando as pistas, as pequenas partes de romance, e como tudo é importante...
Totalmente diferente dos livros que eu li.

No momento que termino de falar, reparo que está atento em cada palavra que sai
da minha boca. Ele está sorrindo. Seus olhos brilham sob a luz do sol que bate em
seu rosto enquanto me fitam.
Por alguns segundos sinto perder o ar dos meus pulmões, sendo sugado por toda
a sua beleza, os olhos e carinho.

Passamos mais alguns minutos sentados debaixo da árvore aproveitando a


sombra e a brisa de ar fresco. Amo momentos assim com ele, apenas onde
conversamos e rindo. Como se tivéssemos todo o tempo do mundo, as horas não
passassem e o assunto nunca acabasse. Parece que não existe o fim.

—Preciso ir para a minha última aula. —Pego meu celular, confirmando às horas.
— Vejo você depois? —Levanto com ele fazendo o mesmo em seguida.

—Calma, tenho uma coisa pra você. —Me entrega um pequeno papel dobrado ao
meio que retira do bolso de trás da calça jeans. Um bilhete.

—O que é isso?

—Abra, e vai descobrir. Vejo você depois. —Beija a minha testa e vai embora. Sem
dar nenhuma explicação.

“Vai ter que se esforçar mais da próxima vez.

Ps: você fica linda concentrada enquanto lê”

Um ponto de interrogação se forma em minha mente.

Capítulo 23
MAYA

Minha bunda está quadrada.

Estou sentada a duas horas na escrivaninha do meu quarto escrevendo o trabalho


da professora Smith. Além de estudar para provas, exercícios, resumos, e mais
trabalhos. Entendo agora o porquê a maioria das pessoas não finaliza a faculdade.
Você tem vontade de chorar a cada dez minutos! Isso fora os um milhão de surtos
por semana. A única vontade que um universitário tem é de sentar na graxa e
esperar o seu fim.

Tenho mais três semanas para finalizar esse trabalho, e justo nessa altura do
campeonato, eu tenho um bloqueio.
Nós escritores, ou qualquer pessoa que escreva, vai me entender. E isso, é
péssimo. Depois de duas horas fazendo trabalhos e estudando para ter paz no
momento de escrever, eu fico igual uma estátua encarando o laptop a minha frente.
A única coisa que consegui foram míseros dois parágrafos.

Eu desisto! Minha bunda nem redonda está mais, meu cérebro virou gelatina e
tudo o que eu consigo escrever são garranchos ilegíveis. Mas, por algum motivo,
eu decido piorar a minha situação.

Vou para a sala, ligo a tv e me sento no sofá assistindo ao show de horrores do


meu time de basquete. Como uma torcedora fiel, mantenho a esperança e
comemoro a cada cesta feita. Não é como se meu time estivesse jogando super
mal, a defesa precisa de alguns ajustes apenas. Mas perdemos os últimos cinco
jogos fora de casa.

Nem um brigadeiro poderia salvar a minha felicidade agora.

—Vocês têm dois metros de altura pra que? Da um toco na bola! —Berro para a tv.
—Sabe que eles não podem te ouvir daqui, né? —Riley fala entrando no
apartamento. Coloca sua bolsa em cima da bancada da cozinha e observo um
buquê gigante de papel em sua mão.

A relação de Riley é repleta de breguices de dar enjoos, apesar de achar o seu


namorado um imaturo as vezes, eles são fofos e dão certo juntos. Frequentemente
estão trocando presentes, duvido nada desse ser mais um deles. Ele tem um grupo
de amigos estranho, mas são legais e eles a tratam bem, então, não poderia estar
insatisfeita pela minha amiga. Querendo ou não, qualquer coisa que aconteça no
seu relacionamento é algo dela, eu apenas garanto que não façam nada idiota com
ela.

—Acho que alguém ganhou um buquê hoje. —Comento. Ela volta seus olhos para
o buquê negando com a cabeça.

—É pra você, estava na porta. —Vem até perto e o entrega para mim que o pego.

Sei que nem todo mundo gosta de coisas clichês ou de flores, mas eu sempre
achei lindo buquês cheios de flores ou rosas de todos os tipos de cor.
Mesmo sendo leitora, e automaticamente tendo expectativas um pouco elevadas
demais inconscientemente, um buquê de rosas seria mais que emocionante.
Nunca esperei um dia ganhar, mas, com certeza está na minha lista de desejos. E
vai continuar lá por enquanto.
Por que esse, não é um buquê de flores. É um buquê de livros.

Não, e não estamos falando de quatro ou cinco livros. Aqui deve ter uns dez.
Estamos falando de muitos livros da Colleen Hoouver, Stephen King, muitos de
capas fofas, e esses famosos nas redes sociais. Ele chega a ser pesado de
segurar.
Um sonho que eu não sabia que existia, acaba de ser realizado. Um verdadeiro
presente para uma leitora de romance.

—Quem será o admirador secreto? —Riley observa curiosa.

—Não sei. —Continuo olhando admirada para os livros em minhas mãos. Sem
dúvidas os meus olhos estão brilhando mais que vagalumes nesse momento.
Essa pessoa acertou todos na mosca. Grande parte da minha enorme lista de
livros para ler estão aqui com suas capas e páginas amareladas. Tenho que
agradecer depois, com certeza essa pessoa perdeu um rim por eles.

—Acho que podemos descobrir. —Informa.

Percebo que tem um bilhete em mãos, ela balança ele me mostrando e abre.
Ele estava junto com o buquê? Deixo os livros de lado, levanto, e paro ao seu lado.
Nós duas lemos juntas.

“Em seu planeta, disse o pequeno príncipe, as pessoas cultivam cinco mil rosas
num mesmo jardim e não encontram o que procuram…

Ps: Mais livros para você ter para onde fugir.”

Só pode ser uma pessoa, Liam.


Desde aquele dia no campus tenho recebido frequentemente bilhetes seus.

Todos os dias!

Podem aparecer em qualquer lugar, no armário, alguém do nada aparecer e me


entregar (o que já aconteceu), ou ele mesmo aparece e me entrega.

Normalmente estão escritos algum comentário engraçado, ou sobre mim, as vezes


poemas que sem dúvidas deve pesquisar na internet, mas que não me importo
porque são fofos. Acho que daqui a pouco vou ter uma coleção deles, se já não
tenho.
Devo confessar que gosto desses bilhetes, sempre arrancam um sorriso
involuntário do meu rosto e ficam gravados na memória por todo longo dia. Pode
parecer uma coisa idiota ou nada demais, mas são essas que importam.

—Parece que o admirador secreto de alguém, não é mais tão secreto. —Ela sorri.
Um sorriso suspeito demais. Um sorriso que eu conheço.

—Não! não começa. —Antecipo. Ela olha pra mim com aquele olhar que toda
amiga reconhece.

—Sim! eu começo. ELE TE DEU UM BUQUÊ DE LIVROS! —Quase berra nos


meus ouvidos. Não consigo conter o sorriso.
—Tá bom, eu entendi. —Digo gostando de ver sua empolgação.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
*Foto do buquê*

Eu: o que é isso??

Ele: um buquê. Como amigo, estou avisando que acho que está precisando fazer
exame de vista, linda.

Eu: Eu sei que é um buquê, idiota. Quero saber o porquê disso.

Ele: Você disse que eu precisaria fazer bem mais se eu quisesse te beijar. Bom, eu
estou fazendo.

Eu: É isso? Um desafio?

Ele: Não, só estou tentando conquistar a garota que eu quero.

Meu maldito coração dá um salto. Controle suas emoções.


Ele está brincando, não está?
Preciso acreditar que sim, não quero me permitir sentir. O medo sussurra no meu
ouvido. É apavorante. É um chão que se rachou todas as vezes que ameacei
colocar o pé.
Nas vezes que me permiti sentir, ser vulnerável, me abrir, bateram à porta na
minha cara e jogaram mais sete pedras em mim. Por isso aprendi a controlar os
meus sentimentos, guarda-los e saber a hora de os deixar sair. São confusos,
intensos, e não os entendo. Não consigo os controlar.

Todo mundo sempre me achou uma garota complicada, não foi muito difícil usar
esse papel de ter um coração de gelo. Por mais que eu seja estressada, chata e
mais um monte de coisas, eu tenho os outros sentimentos também, não sou um
poço de raiva. Não me resumo a um sentimento.
Às vezes eu só quero ficar sozinha, e quieta, mas para os outros, sempre parece
que eu estou brava. Não os julgo, mas também não faço por mal. Apenas me
expresso mal porque não sei me expressar, às vezes, nem isso eu consigo.
Por mais que eu me sinta incomodada, sei que a culpa é minha por trancafiar o
resto dos sentimentos em uma caixa. Sou uma pessoa difícil de sorrir, mas não
quer dizer que nunca o faça.

Portanto, sim. Não gosto de sentir, e de alguma forma, eu esqueci como é. Fiquei
com tanto medo de me machucar que criei uma barreira sem perceber. Você nunca
sabe quando isso pode ocorrer de novo. Mas com isso, eu esqueci de viver. E daí
que te machucou? O que não te mata, te deixa mais forte, não é? Mas ainda não
quero me machucar. Não quero confiar demais.
Só que não quero arriscar. E se alguma hora for tão forte, que eu morra por
dentro? Ou pior, que eu mate alguém sem perceber?!

Meu celular vibra. Uma mensagem de Liam.

Ele: Estou no caminho certo?

Eu: Não posso dizer, vai ter que descobrir sozinho.

Ele: Injusto! Você é leitora de romance!

Eu: Obrigado pelos livros. Boa sorte! ;)

É difícil de acreditar que um cara como ele possa, de verdade, querer ficar com
uma garota como eu. E o pior, que isso possa ser recíproco.
Controle-se, não se emocione com isso. Por favor não esteja mentindo. Por favor
esteja mentindo.
Pela primeira vez, meu coração briga para entrar na discussão. Os sentimentos
intensos, guardados, querem sair.

Ligo para Anna.

—Você sabe que o nosso fuso horário é diferente, não é?

—Eu sei.

Não começo falando sobre mim. Apenas converso com ela sobre como está, o
filme que assistiu, seus planejamentos, as coisas aleatórias que fala nos fazendo
mudar de assunto a cada cinco minutos, isso é o suficiente para acalmar a
confusão. Às vezes, tudo o que eu quero é conversar com ela, sobre nada, ficar
unicamente à ouvindo. Vivendo um momento nosso, como nos velhos tempos.
—Por que me ligou? —Pergunta depois de passarmos uma hora falando.

—Eu ganhei um buquê. —Solto, sem enrolação. —De livros. —Completo.

—M-E-N-T-I-R-A! —Silábica. Pausa. Grita ao telefone. Isso que eu chamo de


reações rápidas. —Maya, namore com ele. Estou implorando. —Brinca.

Riu com sua súplica.

—Não é como se isso fosse um pedido de namoro.

—E não é a mesma coisa?

—Você nem sabe quem foi. —Alego.

—Lógico que sei, eu sempre sei. Está óbvio.

—E se eu me permitir sentir, ser a pessoa que eu sou, e no fim, eu quebro a cara?


Você me conhece, Anna.

— Eu te entendo, então, pense e analise, mas também quero que viva e, deixe as
coisas acontecerem por si só. Maya, ele te deu um buquê de livros e te levou para
um jogo de basquete! Por mais que isso seja incrível, o mais importante de tudo, é
que ele sempre respeitou o seu limite, ele te faz rir, te faz querer sentir. Não
apenas sentir esses sentimentos emprestados por personagens fictícios. Se ele te
machucar, vai ser um idiota e acho que Liam não é um idiota. Pelo menos não o
suficiente. Você não acha?

Eu não acho, algo me diz que eu sei disso. Ele disse que não é um desafio, Liam
nunca mentiu. Merece no mínimo um voto de confiança, certo?
Não. Sim. Não se arrisque. Arrisque dessa vez.

Antes de dormir, organizo os novos livros na estante. Aspiro o cheiro de cada um


deles, um ritual que não se pode pular.
Com certeza, esse é um dos melhores cheiros do mundo e se discorda, é porque
não é leitora e não sabe o que está dizendo.

Folheio as páginas de um dos livros, as sentindo sob os meus dedos. Reparo que
a algo escrito logo no início. Uma dedicatória. Uma assinatura.
Confiro outro livro, e mais outro, até ver que todos estão com uma dedicatória.
Assinada por ele.

Ele está jogando duro.

Capítulo 24

LIAM
Estou indo buscar Hawkins no trabalho.

Desde o dia que peguei um dos pais escrotos flertando com ela na cara de pau,
venho a buscar todos os dias. Com todo o maior prazer do mundo.
Não gosto que ande sozinha, principalmente sabendo que só anda de a pé, nunca
se sabe o que pode acontecer. Sempre deixo claro que não é um incômodo, e vou
continuar repetindo até que comece a fazer sentido para sua cabecinha linda.

Será que ela não vê que isso é também mais uma oportunidade de passar mais
um tempo com ela?

Estaciono em frente à escola, avistando na entrada ela, verificando se todas as


crianças foram devidamente entregues aos seus pais. Acompanho de longe em
estado de alerta para que nada aconteça. Ou melhor, que aquele homem fique em
seu devido lugar.

Não demora muito para que o filho da puta apareça. Todas as crianças parecem ter
ido quando finalmente aparece, guardo essa análise. Vejo que está fazendo aquilo
de novo, seu sorriso está largo e brilhante demais. Isso me incomoda. Isso
incomoda ela!
Observo as reações corporais de Maya. Seus ombros estão tensos, a expressão
sorridente é forçada, é perceptível que está sendo simpática por pura obrigação.
Como ele não vê? Além de um pau no cu, é cego. Que ótimo.

Cerro os punhos antes de decidir me aproximar. Não sou idiota de deixar isso
prosseguir, não enquanto eu estiver por perto.
Eles não percebem minha presença até eu alcançá-los o suficiente.

—Desculpa o atraso, linda. —Coloco minha mão na sua lombar e beijo sua
têmpora. Percebo seu corpo se arrepiar com o meu toque repentino.

Assim que eu gosto, minha linda. Deixe que seu corpo mostre o quanto gosta do
meu toque.
Sorriu internamente.

—Tudo bem. —Sua voz sai um pouco embargada.

—Prazer, sou Liam. —Estendendo a minha mão me apresentando para o homem a


minha frente, que mal conheço e já tenho desgosto. —Namorado da Maya. —
Adiciona essa informação muito importante.
Se que se eu dar um soco nele, ele para de ser um filho da puta? Fazer um teste
não vai fazer mal.

Hawkins tosse ao meu lado, como se estivesse se engasgado com as minhas


palavras.

—Sou James Miller, pai de umas das crianças que ela cuida. —Aperto a sua mão
um pouco mais forte do que o necessário. Seu olhar recai de mim para Hawkins ao
meu lado, mas permaneço o meu em cima dele desejando disparar raios lasers por
eles.

Ela coça a garganta forçadamente antes de falar:


—Bom, vou chamar Will para o senhor. —Se afasta em direção a uma das salas.

Nos encaramos por longos segundos. Segundos mortais.

Seus olhos me analisam tentando ler os meus pensamentos. O fulmino com o


olhar tentando me convencer que se eu o matar aqui e agora não vou ser preso
por isso.
Tudo o que eu gostaria nesse momento, é de o colocar no seu devido lugar.
Mostrar que é melhor não entrar nesse jogo. Que sei muito bem o que quer fazer e
que ele não vai sair bem se o fizer, mas não posso. Estou no ambiente de trabalho
de Maya, isso poderia prejudicá-la.

Nunca se deve subestimar ninguém e, a última coisa que quero, é que esse cara
abra a boca e as coisas fiquem feias para ela. Então, me controlo somente e
somente por ela, mas asseguro que as coisas fiquem claras.

—Se fizer alguma coisa com ela, eu estarei sentado como a porra da morte te
esperando. —Ameaço baixo o suficiente para que as pessoas a volta não
percebam.

—Como é? —Sua expressão é de confusão. Que ótimo, temos um ator aqui. Sorriu
sarcástico.

Pode fingir que não entendeu o que eu disse, mas sei muito bem que isso é
apenas encenação.
Agora, mais do que tudo, quero socar essa sua cara. A raiva sobe pelas minhas
veias com essa sua expressão de desentendido escroto.

Hawkins volta no exato momento em que estou prestes a explodir e perder o


controle, com um menino de cabelos loiros longos e lisos com óculos de armação
azul. Ele se despede e segue até seu pai. Pela primeira vez nos últimos minutos,
minha raiva diminui e desejo do fundo do meu coração que esse menino não
cresça e tenha atitudes como o pai.

—Muito prazer em te conhecer, namorado. —Fala irônica após os dois terem ido
impedindo que eu me afunde nesses pensamentos. —Que momento exatamente
você iria me comunicar?

—Agora, o comunicado já foi dado. —Provoco. Ela revira os olhos.

—Vocês estão namorando? —Ouço uma voz feminina e suave. Mia.

—Ei, você já está aí. —Ela fala surpresa ao ver Mia parada nos olhando com a
mochila nas costas e ambas as mãos na cintura.
Abaixo os meus olhos encontrando seu rosto curioso e cheio de expectativas.
Coloco as mãos no joelho me abaixando para ficar na sua altura.

—Que tal, nós tomarmos um sorvete primeiro e depois falamos sobre isso?
—Observo um sorriso encantador surgir em seu rosto ao citar a sua palavra
favorita de todas na frase.

—Eu vou querer de morango. —Avisa jogando os braços para cima em forma de
comemoração.

—O que você quiser, pequena. —Pego ela em meus abraços, sentindo os seus se
entrelaçarem no meu pescoço.
Paramos em uma sorveteria e vamos para um parque próximo. Mia consegue ser
bem convincente quando quer, principalmente quando se trata de ir brincar em
algum parquinho. Passo os primeiros minutos correndo, me escondendo dela, e a
ajudo a ir no balanço até que um dos seus amigos da escola aparece e começam a
brincar juntos.

—Oi mãe, como está sendo a recuperação? —Ouço Maya ao telefone enquanto
me sento ao seu lado, continuo a observar a pequena brincar para não correr o
risco de se machucar.

—Está indo bem, estou amando essa vida de fazer nada. —Uma risada um pouco
aguda demais surge pelo telefone.

Viro o olhar percebendo a tela do celular preenchida por um vídeo, revelando uma
mulher de cabelos escuros lisos. Não parece com Maya, apenas alguns traços
semelhantes, e jovem demais para ter um filho adulto e outra na faculdade.

—O pai está em casa?

—Sim, mas está dormindo. —Acabo me aproximando da câmera aparecendo de


relance o meu rosto. —Quem é que está sentado do seu lado?

Será que ainda dá tempo de voltar a brincar com Mia?

—Bom dia Sra. Hawkins, sou Liam.


—Liam? —Olho para ela ao meu lado como se estivesse me sentindo ofendido por
nunca ter citado o meu nome para sua mãe.

—Sou um amigo da faculdade. —Explico.

—Hum... Como se conheceram?

—Fizemos um trabalho juntos. —Se apressa para falar na minha frente com um
olhar alarmado. Sra. Hawkins fita a câmera com uma curiosidade aguçada.

—Bom, prazer em te conhecer Liam. Vocês estudam o mesmo curso?

—Sim, mas faço especialização em jornalismo esportivo.

Respondo todas as suas várias perguntas. Não me incomodo. A mãe de Hawkins é


muito simpática e sabe conduzir uma boa conversa.
Vinte minutos se passam e nós dois continuamos ali, conversando. Consegue
descobrir mais sobre mim do que todas as meninas que já fiquei em apenas trinta
minutos de conversa. Hawkins não diz muita coisa, na verdade, está somente
segurando o celular enquanto observa Mia brincar e eu e sua mãe continuamos a
conversar.

Cinco minutos depois, ela desliga prometendo ligar outra hora. A tela volta a ficar
preta novamente.

—Estava começando a achar que estava atrapalhando. —Fala assim que desliga.

—Que bom, porque estava. —Sorrio ao afirmar. Ela bufa.

Analiso seu rosto enquanto seus olhos se voltam para frente. Estão evitando me
olhar. Sua expressão é séria, não como se estivesse estressada, mas como se
estivesse pensando. Sei exatamente sobre o que é.
Quero que fale comigo, que me permita entrar e deixe conhecer a caixinha de
surpresas que é.

—Você não contou pra ela? —Disparo em sua direção, indo direto ao ponto. Ela
volta seus castanhos mel imediatamente para mim. Fica paralisada por alguns
segundos. Sua boca se abre tentando pronunciar alguma coisa, mas nada sai.
Sei que não contou, não precisava perguntar porque eu sei que não. A forma como
falou apressada a maneira como nos conhecemos entregou. Nunca falamos disso,
parece as vezes, para mim, que nunca aconteceu. Como se nunca estivéssemos
estado naquele ônibus, naquele dia, com aquelas pessoas.
Eu queria que não estivéssemos.

Não sei como Maya era antes e não posso imaginar as consequências que teve
que enfrentar, e mesmo assim, consigo ver algumas delas nas reações do seu
corpo no dia a dia.

—Não. —Sua voz sai tensa. Ela desvia os olhos os focando em um ponto fixo a
sua frente, enquanto revive as lembranças.

—E por que não? —Procuro seu olhar.

—O que eu diria? Mãe, fui quase abusada no ônibus indo para a minha aula. Fica
tranquila porque um estranho me salvou. —Ironiza. —Desculpa se não consigo
contar para a minha própria mãe. —Sua voz é amarga, mas isso não chega nem
perto dos seus olhos sem vida. Distantes. Ela leva as mãos até os olhos se
esforçando para não deixar derramar nenhuma lágrima.

—Sabe quantas cantadas nojentas uma garota recebe na rua? Muitas. Ninguém
espera que um dia indo para faculdade alguém vai tentar se aproveitar de você.
Ninguém pede por isso. Foi horrível e apavorante. Por um segundo pequeno ele
não terminou, e não paro de pensar se tivesse. —Joga para fora o que estava
entalado.

—Eu não iria deixar. —Argumento.

Engulo em seco ao sentir como se tivessem cravado uma faca do meu peito. Cerro
os punhos com os pensamentos dos possíveis acontecimentos que poderiam
acontecer naquele ônibus. Ou em qualquer lugar, com qualquer pessoa.

Por que existem homens assim? O que eles pensam? Eu não consigo imaginar
qualquer motivo ou motivo que o levem a fazer isso. Posso cometer coisas idiotas
as vezes, mas isso? É demais. Respeito é o mínimo.

—Mas, e se você não estivesse lá? Acha que alguém naquele ônibus iria ajudar?
Não iriam, Liam. Ninguém nunca ajuda, viram o rosto e fingem que não assistiram
o que estava acontecendo. Eu senti medo de sair de casa, medo de me aproximar
de algum homem, e muito menos queria me olhar no espelho porque parecia que
tinha marcas dele em mim. Tudo o que eu queria era desaparecer e esquecer, só
que minha mente não deixava. Comigo, ele não conseguiu, imagina os outros
casos em que o abusador consegue?! Eu me sinto uma completa dramática.

A dor em sua voz é tão forte que consigo senti-la em meu peito cada vez mais
conforme as palavras saem e nos seus olhos. Ela não percebe quando ao afastar
as mãos uma lágrima escorre pelo seu rosto lindo.
Não consigo te ver assim, minha linda. Simplesmente não posso.

Levo minha mão em seu rosto e seco a lágrima que escorreu em um carinho
delicado. Um suspiro entrecortado sai assim que sente meu toque quente e
áspero, sente o meu toque como um sinal de conforto.
Tudo o que quero, se eu pudesse, era criar uma máquina no tempo para que isso
nunca tivesse acontecido. Para mim nunca ter contado.

Jogue tudo o que te machuca em mim, minha linda. Descarregue sua dor em mim.
Me diga onde dói que vou fazer parar. Me use como seu para raio.

—Desculpe por ter contado a você. Não deveria. —Lamento.

Se eu nunca tivesse sequer pensado em dar uma explicação para a ter puxado,
ela não passaria por isso, não teria todas as consequências que ações de outra
pessoa causaram. Ela não saberia e ficaria tudo bem. Fui um babaca.

—A culpa não é sua. Seria pior se você não estivesse lá. Você me salvou. —
Conforta.

—Eu não te salvei, eu só fiz o que todos deveriam fazer.


Capítulo 25

MAYA
Liam: Vamos sair hj, se tiver compromisso, desmarque.

Eu: E cadê a parte que eu sou avisada antes?

Ele: Eu acabei de fazer isso.

Eu: Okay, mas desde quando eu disse que quero sair com vc?

Ele: Eu sei que quer, vc só não disse.

Eu: E eu sei que você está fazendo isso só para poder me beijar, vc só não disse.

Ele: Muito engraçadinha, só tem um porém, eu já disse.


Ele: Passo aí em uma hora.

Sorrio para a tela do meu celular.


Decido me arrumar para seja qual for o lugar em que Liam vai me levar. O que
acabo de lembrar que deveria ter perguntado, mas duvido nada que do jeito que é,
não me responderia.

Saio do banheiro de toalha e vou para dentro do closet ficar parada pelos próximos
longos minutos. Por que essa parte sempre é a mais difícil? De repente parece que
nenhuma roupa serve, que nada fica bom. Será que fizeram um feitiço para isso
acontecer? Ainda tenho a desvantagem de não saber para que lugar eu vou. O
pior de tudo é que Riley está na casa do namorado, então, hoje eu não tenho
nenhuma ajuda.

Opto por deixar essa parte para depois antes que eu enlouqueça. Seco meu
cabelo, penteio, o finalizo e troco meus acessórios que uso sempre. Estou
terminando a única maquiagem que sei fazer no segundo que escuto batidas na
porta de entrada.
Antes mesmo de abrir, eu já sei quem vou encontrar do outro lado.
Ele aparece para mim usando uma calça social preta com uma camisa e tênis
brancos. A primeira coisa que acontece é um pensamento inconveniente invadir a
minha mente dizendo o quão gato o homem na minha frente está. E o que ferra
tudo, é que ele está certo. Liam é gostoso apenas por existir, mas com essa roupa,
sinto minhas pernas ficarem bambas.

E aí, a segunda coisa acontece. Uma coisa preocupante.


Meu coração da um pulinho. Uma segunda vez em dias. Merda! Mil vezes merda!
Que homem gostoso. Você tem um ótimo bom gosto, Maya Hawkins. Isso não
pode ser verbalizado.

Ele sorri, desce o olhar fitando todo o meu corpo. Um arrepio percorre o meu
corpo, acendendo ondas de calor que queimam a minha pele. Sinto algo dentro de
mim se agitar. Agitar em excesso.

—Gostei da recepção. —Um sorriso malicioso cresce em seus lábios.


Aí eu me lembro que ainda estou de toalha! Fecho os olhos me amaldiçoando por
ter sido tão cabeça de vento.
—Cale a boca! Isso aqui. —Gesticulo com as mãos apontando para a toalha. —Foi
um equívoco, pode ir arrancando esse sorrisinho do rosto.

—Hum, acho que não. Você está tentando me seduzir. —Ele se encosta no
batente da porta cruzando os braços. Ainda com o maldito sorriso! —Se quer
saber, está dando certo.

Reviro os olhos e largo ele na porta voltando para o quarto. Escuto a porta ser
fechada e seus passos atrás de mim.

—Vou trocar de roupa. Não me atrapalhe. —Paro dentro do closet, encaro minhas
roupas iniciando um embate de indecisão.

—Que roupa vai usar? —Passa por mim, e estica as mãos verificando cada peça
de roupa pendurada.

—Você ouviu o que eu disse? —Observo indignada. Ele não me responde.

—Que tal? —Mostra um vestido preto de alça com uma abertura na perna que
acabou de retirar de dentro do closet.

—De jeito nenhum! Ele é colado demais, chama muita atenção. —Recuso
imediatamente. Se usei esse vestido duas vezes foi muita, e não sei se quero o
usar uma terceira.

Ele acentua cada curva do meu corpo, parecendo que por onde eu passe os
olhares das pessoas estão sobre mim. Analisando e julgando. E não vou me
permitir sentir desconfortável com uma roupa.

—Um pouco de atenção as vezes, não é tão ruim. —Rebate.

Tudo bem que eu não sei para onde vamos, então, acatar a sua sugestão talvez
não seja tão errado. Mas sério? Tinha que ser justo esse vestido? Eu não sou uma
das maiores fãs do meu corpo e de roupas coladas a ele. Se posso o esconder,
vou sempre optar por isso.

Encaro a peça pendurada no cabide em sua mão. Levo minha mão até a boca,
roendo a unha de um dos meus dedos pensando no que fazer. Enganando o
nervosismo que quer dominar todo o meu corpo. Subo o olhar para o seu, me
demoro nele. Aí…que droga!

—Okay, mas se eu não gostar, eu troco. —Suspiro. Me surpreendo ao perceber


minha voz sair um pouco embargada ao dizer.

Pego o vestido da sua mão, ele acena com a cabeça concordando e sai. Retiro do
cabide em que está pendurado e o visto, o tecido abraçando todo o meu corpo,
cada curva sendo acentuada. Coloco um all star branco junto, parando em frente
ao espelho para ver o resultado. Um salto seria o ideal? Com certeza, mas não me
sinto corajosa para isso.

Analiso a imagem a minha frente, o reflexo das curvas do meu corpo marcado pelo
tecido preto. Não sei por quanto tempo fico ali, apenas parada, formando uma
opinião a respeito. Estou bonita? Meu corpo parece não...se adequar.
É lindo, sem dúvidas, mas estou longe de ter o corpo para usar esse tipo de roupa.
Olhar para mim mesma nesse tecido preto, através do reflexo desse espelho, eu
me sinto a garota mais poderosa desse mundo. Mas, e quando eu sair na rua?
Como vou me sentir?

Escuto passos pesados contra o chão ficarem cada vez mais alto quando se
aproximam. Viro e vejo Liam parado na entrada do closet com uma das mãos
tampando os seus olhos, não permitindo ver o que está a sua frente. Solto uma
pequena risada diante da cena.
—Pode olhar, já estou vestida. —Informo. Ele tira a mão dos olhos, recebendo
certa dificuldade pela claridade repentina. No segundo que seus olhos parecem
terem se acostumado, o seu rosto se ilumina como não poderia imaginar. Parece
que existi uma constelação inteira nos seu olhar.

—Você está linda. —Afirma varrendo seus olhos por todas as partes do meu corpo.

Três palavras tão importantes e insignificantes de se ouvir.


Chegando mais próximo. Ele me gira para o espelho a nossa frente, se
posicionando bem atrás de mim.

—Todas as outras belezas perdem o sentido quando olho para você. —Ele se
inclina em seguida, toca seus lábios quentes e molhados na minha clavícula,
sussurra baixinho. —Você é a minha perdição, Maya Hawkins. Sempre e
eternamente.
Meu corpo reage positivamente as palavras sussurradas. Minha respiração sai
entrecortada e dentro de mim tudo se torna puro fogo e chamas.
Se ele continuar fazendo isso, não sei até quando vou aguentar.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
—Para aonde vamos?

Já estamos no carro rumo a qualquer lugar que ele está me levando. Se fosse
outra pessoa, nesse momento, eu teria certeza que estaria sendo sequestrada. Na
realidade, eu não saberia porque não consigo identificar a estrada.

—Você já vai descobrir. —Como dá para perceber, ele não vai me falar.

Enquanto observo através da janela a paisagem correr, penso em trilhões de


coisas ao mesmo tempo. Acredito que isso acontece com todas as pessoas. O
momento em que seu corpo está na terra, mas sua mente vagando por aí. Trilhões
de pensamentos veem a mente ao mesmo tempo em questões de segundos.
Todos os últimos acontecimentos passando em meus olhos como flashs fazendo
repensar cada um deles.

Eles voltam a minha mente, me fazendo continuar a vagar. E em segundos, sorrio.


Lembro do parque e da ligação com a minha mãe. Apesar da conversa após o fim
da ligação não ter sido algo fácil de se fazer, não sei o porquê, mas ter a
aprovação da minha mãe é importante pra mim, talvez seja porque sempre me
importei com a sua opinião de certa forma.
Quero adiar o tipo de conversa que tive com Liam até o fim dos tempos com ela.
Sou uma pessoa difícil de me abrir, de falar o que eu sinto. Eu não consigo saber
nem por onde começar normalmente. São tantos pensamentos ao mesmo tempo
que fica difícil saber por onde.

—Melhor irmos antes que comece. —Fala ao estacionar o carro.

—Começar o que? —Não recebo uma resposta. Desço do carro junto a ele.

Analiso o lugar que estamos e reparo que estacionamos bem em frente a um


teatro. A primeira coisa que penso é que vamos assistir a uma peça, é o óbvio, o
que mais poderia ser? Uma orquestra sinfônica? Não, Liam não tem essa
coragem. Ele já me levou a um jogo de basquete, não faria mais isso.

Ele coloca um de suas mãos nas minhas costas e nos guia até a entrada. Faço um
esforço do tamanho do mundo para me concentrar em andar e tentar entender o
objetivo de estar aqui e não em sua mão me guiando.
Entrega dois ingressos para um homem na entrada e seguimos em frente comigo
convencida de que iremos assistir um teatro, quando milésimos de segundos se
passam e um suspiro me escapa.

Não!

Isso não é possível! Esse cara é maluco? Deve ser aquelas pegadinhas da TV e a
qualquer momento vai aparecer uma câmera na minha cara. Eu tenho certeza.
Direciono meu olhar para o cara ao meu lado. O cara que está se esforçando
demais por apenas um beijo.

—Isso é sério? —Pergunto.

Estou parecendo que acabei de ler o melhor ‘plot’ da minha vida. A expressão de
choque está estampada igual a um adesivo no meu rosto. Não consigo acreditar no
que estou vendo. Abro a boca, segundos depois levando uma das minhas mãos
até ela ao me lembrar de tampá-la.

—Pode apostar que sim, linda. —Ele sorri. Eu sorrio. E tenho vontade de gritar,
porque dentro de mim, estou pulando e soltando vários confetes agora.

Eu vou assistir Harry Potter ao som de uma orquestra ao vivo!


Isso é a merda de um sonho. Será que minha cabeça consegue ter a noção do
tamanho disso?
Liam acabou de humilhar todos os pensamentos e suposições que criei a minutos
atrás. Ele tem coragem, e faria coisas desse tipo quantas vezes quisesse.

Sentamos em nossos lugares escutando o início do soar dos instrumentos. Uma


harmonia perfeita acompanhando as cenas do filme no imenso telão atrás.
Durante a apresentação fico em dúvida de onde presto atenção, fico tão
concentrada na orquestra em minha frente que as vezes esqueço do filme e vice e
versa.
É como se eles estivessem dançando. Os movimentos sincronizados, sentindo
cada nota sendo tocada, parece que não consigo piscar. Desfocar por um segundo
parece uma perda gigantesca. Suspiro tantas vezes que me pergunto se não perdi
o ar em uma delas. É muito mais do que eu imaginei um dia que seria, acho que
nunca mais vou conseguir assistir a esse filme sem ser assim. É perfeito.
Memorável. É um daqueles momentos que você nunca mais vai conseguir viver
sem não se lembrar desse de agora.

A cena onde o Harry está voando em cima do Hipogrifo é uma das minhas
favoritas. Antes mesmo já era, simplesmente porque sou apaixonada nesse animal
e eu tranquilamente iria sequestrar um se existisse para criar como meu filho.
Porém, agora, com o som da orquestra, o ator gritando enquanto o vento bate em
seu rosto com os braços abertos, definitivamente, é a minha favorita. Não!
correção, é uma das minhas favoritas. Só não ganha do Harry e da Hermione
dançando.

A animação, nervosismo e alegria correm em minhas veias em uma dose


extremamente mais alta do que o normal para um ser humano. Não consigo deixar
de sorrir.

Quando termina não nos levantamos de imediato, ficamos ali por mais alguns
minutos. Procuro seu olhar e o pego buscando os meus, me observando antes
mesmo de encontrar os seus olhos.

—O que achou? —Pergunta abrindo caminho para as milhões de coisas que quero
dizer.

—Foi…incrível! A harmonia, a concentração deles, os movimentos, como


acompanhavam o filme, como se estivessem dançando com a música. Eu não
conseguia piscar, queria assistir cada detalhe! —Explico, quase me atropelando
nas palavras enquanto mecho as mãos com entusiasmo.

—Realmente foi incrível. —Concorda contentando somente em me deixar falar.

—Não é? Todo mundo deveria ter essa experiência. Simplesmente a melhor de


todas que tive, esse filme agora é um dos meus favoritos. —Falo. Acho que dessa
vez eu exagerei na empolgação.
Vejo que está sorrindo, e que está me olhando como se precisasse memorizar
cada detalhe desse momento. Admirando.

—O que está fazendo? —Não me olhe assim, isso me apavora e me deixa nas
nuvens. Eu não posso me sentir nas nuvens.

—Olhando pra você - seus olhos queimam sobre mim. De repente, me sinto
constrangida. Não porque está me olhando, mas como está.

—Tem que parar com isso. —Repreendo.

—Parar com o que? —Pergunta, parecendo confuso diante do que eu pedi.

—De falar essas coisas. De me olhar assim. —Disparo. Nunca, em nenhum


planeta, um cara como ele iria se sentir atraído por uma garota como eu. Fato.
Sem “mas” ou vírgulas. Isso não sai da minha cabeça. É tecnicamente impossível
e sem sentido.

O que eu acho? Que está encarando isso como mais um desafio que precisa
vencer, por mais que tenha dito que não. O que faria mais sentido? Exatamente, o
meu argumento.

—Não posso fazer isso. —Responde, os olhos totalmente fixos nos meus.

—Por que não? —Percorro os meus olhos por todo o seu rosto, os fixando de novo
em seus olhos castanhos escuros.

—Porque não sei como.

—Está fazendo isso de novo. Pare! —Ordeno, quase implorando.

—Estou apenas falando a verdade. —Retruca. Bufo cruzando meus braços e o fito
com um olhar duro, dizendo “conta outra! eu sei que está mentindo”.

—Ah, para Liam. Eu sei que um cara como você não fica com alguém como eu.
Não precisa mentir. Não precisa ter pena.

—É isso o que pensa? —Confirmo com a cabeça. Passa a mão na testa


implorando silenciosamente por paciência, como se acabasse de ouvir a coisa
mais absurda do mundo. Seu maxilar se tensiona ficando ainda mais marcado.
—Vai dizer que estou errada?!

—Sim, você está. Por que acha que estou fazendo tudo isso? —Responde como
eu o tivesse acabado de o ofender. Está indignado.

—Porque você gosta de vencer, é mais um desafio para a sua lista.

—Errado. Estou fazendo isso porque quero ficar com você. Porque só de pensar
em você eu perco o controle querendo te consumir. Perdi a conta de quantas bati
no banheiro só pensando em você, então, não. Eu nunca iria fazer de você um
desafio.

Minha boca se abre e fecha com a declaração, sinto minha garganta se fechar e
um nó do tamanho do estado de Nova York se alojar. O ar está denso e difícil de
inspirar. Não sei o que dizer, ou o que pensar. Meu corpo está ardendo em fogo, e
está se espalhando. Rápido.

Um desejo imenso de o beijar, ou de fazer qualquer coisa que seja o tocar, ainda
que seja minimamente, surge pequeno, forte e controlável. Uma vontade de fazer a
chama se apagar. Dizer que eu também quero.
Inclino, aproximando meu corpo do seu até que nossos lábios estejam a
centímetros um do outro. Um centímetro mais perto e posso sentir o roçar dos
nossos lábios. Sua respiração pesada faz cócegas em minha pele, ergo minha
mão tocando em seu rosto lindo, forte e masculino. A pele quente embaixo dela faz
parecer que acabaram de jogar gasolina e agora estamos queimando juntos.

Nossos olhos estão presos um no outro pelo desejo que os consomem. Deixando
tudo mais quente e insuportável.

—Você está quase na linha de chegada.

Capítulo 26
LIAM

Eu estou ouvindo o som do apito até agora.

Apito, patinar, apito lançar, apito, apito, apito…alguém arranca os meus ouvidos! A
palavra pesado é eufemismo para o treino de hoje, o treinador arrancou o nosso
coro. Certeza que descobriu que sua filha está namorando, porque esse é o único
motivo plausível para a tortura de graça.

Fizemos exercícios de velocidade, patinamos tanto ao ponto de eu achar que meus


pés iriam cair. Sequências a gol e vinte minutos de exercício de ataque e defesa,
duas equipes em que uma atacava e a outra defendia, invertendo as posições em
seguida. Quando vamos para o vestiário, estamos acabados, até Hawkins está
com dó pela nossa cara.

Ela veio ver nosso treino antes do jogo contra Stanford. Um que temos a obrigação
de ganhar; se perdermos, acabou a temporada esse ano. Precisamos ganhar para
ir para a semifinal contra Denver; não vai ser um jogo fácil, como todos que não
são contra esse time, mas estamos confiantes.

Saio da ducha, vou até o meu armário e pego a minha roupa me vestindo. A
maioria dos caras já foi para a sala de mídia, onde vamos estudar alguns jogos dos
adversários, analisar as jogadas, e ver estratégias para furar a defesa deles. Sou o
último a sair, andando apressado preocupado por estar atrasando.

Mas, no momento que chego, encontro uma Hawkins animada com uma caneta na
mão desenhando no quadro.

—Já sei, isso é um porco. —Jason diz.

—Burro, é claro que não. É o Adam, a cabeça de balão é igual. —Rebate Stephen.
Adam fecha a cara e todos caem na gargalhada.
Ela termina de desenhar e pelo o que vejo, está claro que isso não é um dos seus
pontos fortes.

—É um cachorro! —Nick berra pulando de sua cadeira apontando o dedo para o


desenho. Ela afirma com a cabeça e pula animada, os dois batem a mão uma na
outra.
—Onde que isso é um cachorro? —Pergunta Brandon estreitando os olhos.

—Acho que consegui identificar o focinho. —Fala Adam apontando para uma parte
do desenho.

—Aquilo não é o focinho, é a orelha. —Diz Nate inclinando a cabeça para o lado.

—Como vocês não conseguem ver? Aqui estão as patas, as orelhas e o focinho.
—Explica o desenho no quadro.

—Essas são as patas? Achei que fosse o rabo. —Fala Stephen.

—Um cachorro com quatro rabos? —Murmura Dylan.

—Ué, cada um imagina de um jeito. —Argumenta.

—Outro jogo! —Grita Nate do fundo.

—Sim, capitã. Com esse seu desenho a gente vai ganhar nunca. —Resmunga
Nash enteragindo.

—E vocês precisam ganhar sempre? —Usa seu tom de voz entediado. Que
pergunta mais idiota, minha linda.

—Sim. —Respondem em um uníssimo.

—Acho melhor você deixar a arte de desenhar de lado e procurar outro dom. —
Brandon murmura.

—Pode pedir ajuda para o capitão, tenho certeza que ele não vai se opor. —O
esperto do meu melhor amigo, Dylan, fala.

Com certeza não. Vamos começar quando?

—Cara, cala a boca! —Jason repreende. Vejo o momento em que ela revira os
olhos com um sorriso nos lábios.

—Ele concordaria comigo. —Rebate.


Ela apaga seu desenho que mais parece qualquer coisa menos um cachorro.
Começa a fazer traços com uma forca do lado, logo entendo qual jogo escolheu.

—Como que joga isso? —Nash entra na brincadeira.

—Vocês têm que acertar a palavra conforme vão sugerindo e acertando as letras.
Mas não podem deixar a menina ser enforcada. São cinco letras ao total. —Ela
explica.

—Fácil. Vou ganhar, sou o mais inteligente de todos. —Adam sorri presunçoso.

—Você é uma praga, isso sim. —Farpa Stephen.

—Coitado do mais burro. —Vai na onda Jason.

—Letra “A”. —Tenta Brandon. Ela se vira e escreve a letra “A” acima dos traços, e
desenha um círculo na forca.

—Dica! —Pede Peter.

—É um nome. —Hawkins diz.

—E existe um nome sem a letra “A”? —Questiona Stephen.

—Stephen. —Fala Luke enfatizando.

—O que foi? —Ele responde como se o tivesse chamado.

—Puta merda, eu desisto! —Peter murmura.

—Letra E. —Tenta Brandon de novo. Ela desenha um traço na bonequinha, e


escreve a letra acima.

—Você é muito ruim! Fica quieto. —Diz Nate recebendo um resmungo, que não
consigo identificar, em troca.

—Letra C. —Dessa vez é Luke que grita. Ela acrescenta em cima do primeiro
traço.

—Ae caralho! O garoto tem cérebro! —Comemora Jason com Luke.


L, M, J…insistem até a boneca na forca estiver quase completa, resta apenas um
braço, uma chance, não podem erra.
Seus rostos estão concentrados, como se fosse caso de vida ou morte. Nós como
jogadores, levamos a sério a palavra vencer.

—Letr…—Dylan tenta, mas é interrompido.

—Cuidado caralho, o boneco tá quase morto. — Adam resmunga.

—Não me apavora porra. —Ele rebate.

—Letra O. —Jason toma a iniciativa. Por cinco segundos, a sala fica em um


silêncio mortal, torcendo para que seja um tiro certeiro. E ele é!

—É isso cacete! —Todos comemoram aliviados com gritos preenchendo a sala.

—Letra N. —Em meio a bagunça, Luke berra. Novamente a atenção de todos está
na tela branca. Mas a vitória agora parece estar do nosso lado. Mais gritos e
assobios surgem na sala.

—É “Connor” —Peter sugere. Ele acerta!

Todos se levantam, dão um tapinha na nuca de Peter, depois esticam os seus


braços no centro fazendo uma roda e berrando um grito de guerra, pulando entre
os acentos como uma verdadeira manada de brutamontes.

Após um minuto de agitação um questionamento é levantado na sala.


—Existe algum Connor na sua vida, capitã? —Adam usa um tom malicioso e
suspeito.

—O capitão não vai gostar de saber disso. —Avisa Stephen. Não, eu odeio.

Sinto um incômodo com a suposição e à probabilidade disso realmente ser


verdade. Enquanto aguardo ouvir sua resposta, tenho vontade de vomitar umas
cinco vezes. Não, se houvesse alguém, eu saberia. Ou não?
—Se eu tenho ou não, não contaria. Vocês são um bando de fofoqueiros. —Um
indício de sorriso aparece. Que porra de sorriso é esse?
—Prestem atenção! —O treinador passa por mim na porta entrando na sala. Só aí
que então reparam na minha presença. Hawkins me olha e sorri da forma mais
encantadora possível. Mas não sorrio de volta.

Eles se sentam e eu entro, me aconchegando em um dos assentos da primeira


fileira. Ela apaga o quadro e se senta ao meu lado. O treinador pega o controle e
abaixa a tela de projeção, colocando os vídeos dos nossos adversários; em alguns
momentos ele pausa, fazendo explicações.

Enquanto o treinador fala e mostra as estratégicas táticas, ela faz anotações em


seu caderninho. Eu a observo, ignorando o incômodo que se faz presente e
lembrando do nosso último encontro, de quando seus olhos brilharam durante
duas horas ao ver a orquestra bem na sua frente, e de como não parou de falar
depois do final.

Não percebeu o instante quando apertou o meu pulso apoiado no braço da


cadeira, tentando de alguma forma conter toda a emoção. Naquele momento,
passei cinco minutos apenas concentrado naquele toque.
Cada momento com o mínimo de toque que sinto dela, é como eu estivesse
voando.

E naquela hora, eu tive certeza de que a quero. De que mais que tudo, eu a quero
fazer sorrir. Quero que sorria pra mim. Que me deixe dar todos os motivos
possíveis para ela sorrir.
O seu sorriso acende uma chama dentro de mim, e ilumina qualquer escuridão que
exista.

Eu vou ir até o fim para conquista-la, e sei muito bem que estou quase lá.
Suas provocações são uma obra do inferno para o meu amigo que está a mais de
muito tempo sem se divertir. Ele já está quase me xingando, porque a minha mão
não vai ser mais o suficiente daqui um tempo.

O treinador Porter mostra as jogadas que o time adversário costuma fazer.


Focando nos alas que com certeza vão ser uma pedra no nosso sapato, a
marcação tem que ser ajustada para não termos gols sofridos. A defesa também é
um pé no saco, os caras tem uma das melhores defesas universitárias, cada
defensor tem 1,94 de altura ou mais. Só de imaginar esse jogo estou ficando com
dor de cabeça. Vamos ter que dar o sangue para ganhar.
Quando terminamos de estudar o adversário, me despeço de todos na sala e saio
com Hawkins para o estacionamento. No caminho para o seu trabalho, o incômodo
volta. Só de lembrar o nome minha garganta se fecha e penso em mil idiotices para
fazer.
Que droga, sei que não tenho esse direito mas, foda-se o direito, quero saber se
vou ter que travar um daqueles duelos medievais ou se minhas chances foram
totalmente para o ralo. Quando teve tempo para conhecer esse cara?

—Vai amassar o volante desse jeito?! —Resmunga, só assim percebo que meus
dedos estão brancos com o tamanho da força que estou usando para segurar.

—Não tinha percebido. —Informo relaxando as mãos.

Minha mente ainda está berrando, perguntas e perguntas aparecendo uma atrás
da outra.
Ele é alto? É loiro ou moreno? Onde se conheceram? Será que ela gosta dele?
Onde conheceu ele? Foi no campus?
Preciso saber, preciso que fale. Preciso descobrir se ele é um babaca. Tem que ser
um babaca, pra mim poder ter um motivo plausível para dar um soco na cara dele.

—Quem é Connor? — Disparo. Ela me fita com sua expressão surpresa.


Os seus olhos se arregalam levemente, uma luz vermelha acende na minha mente.
Agora me pergunto se eu realmente vou querer saber a resposta.

—O que está falando? —Questiona, seus traços mostrando confusão. Respiro


fundo antes de responder.

—O nome que escreveu no jogo, é de algum cara que você conhece?

—O qu… —Não deixo que termine.

—Que lugar conheceu ele? —Paro no sinal, e procuro nos seus olhos qualquer
indício de resposta.

Estou começando a entrar em desespero, quero uma resposta. Por que a porcaria
desse sinal não abre? Preciso me concentrar em qualquer coisa que não seja esse
silêncio que se instalou no carro e na ansiedade por uma explicação.
Depois de um minuto, ela começa a rir, e aí, eu fico completamente confuso. A
observo rir como se tivesse acabado de ouvir a piada do século ou acabasse de
ver um palhaço passando correndo na rua com uma melancia na cabeça.

—Você está com ciúmes? —Pergunta em meio às gargalhadas gostosas.

—Não! —Nego imediatamente.

—Está sim! —Ela está sorrindo, está amando a situação.

—Pode responder à pergunta, por favor? —Tento desviar do assunto. Ela acata a
minha deixa.

—Connor é um personagem fictício do livro que estou lendo.

—Então, ele não existe? —Um vinco possui minha testa.

—Não. —Balança a cabeça negativamente. Agora, estou me sentindo um idiota,


mas, um idiota completamente aliviado. —Você me deu livros de jogadores de
hóquei, eu amei aliás, estou lendo os spin-offs. —Penso em uma provocação para
a fazer, mas a esqueço concentrado em aproveitar o peso tirado de mim.

—Sou um idiota, não sou? —Questiono já imaginando a sua resposta.

—Bom, sim. Mas isso eu já sabia. —Ela continua sorrindo ao me olhar. Deixo a
cabeça tombar para trás, descansando no banco.

Nunca senti tanto alívio na minha vida, apesar de estar me sentido um idiota. Mas
vamos ignorar essa parte. Ouço buzinas e percebo que o sinal se abriu, piso no
acelerador.

—Vai admitir que estava com ciúmes? —Provoca.

—Não, porque eu não estava. —Me recuso a admitir isso. Não estava com ciúmes,
só queria saber se eu teria concorrentes. O que não tem nada haver.

—Você estava.

—-Tudo bem, e se eu estivesse?


—Eu te falaria para não se preocupar, porque o único que eu estou interessada é
você. —Fala com tanta franqueza que me assusto, assim como percebo que ela
também.

Aí porra!
Não, não, não, não!
Não posso estragar tudo agora. Não posso puxa-la para o meu colo como um
monstro das cavernas e tomá-la para mim somente porque isso foi bom pra
caralho de ouvir.

Você é minha perdição, Maya Hawkins.


Meus desejos obscenos são todos resumidos a você.

—Não fale isso. A não ser que queira ser beijada como nunca foi um dia.
—Murmuro com a voz rouca. Ela permanece em silêncio, o rosto tomado por tons
de rosa.

Paro em frente à escola minutos depois e antes que desça do carro, entrego um
dos meus bilhetes que já se tornaram costume. Ela lê o que escrevi e responde:

—Te espero as 19:00.


Capítulo 27

MAYA
Eu amo parque de diversões.

De todas as coisas até agora, Liam acertou em todas, mas parque de diversões
sempre vai ter um espaço especial no meu coração. Vamos ser sinceros, existe
algo melhor? A resposta é: definitivamente não.

—Você já foi em um desses, certo? —Ele me pergunta quando estamos na fila


para o bate-bate, que nada mais é do que carros em constante movimento e que
se chocam. O que eu não faço a mínima ideia de como fazer pois nunca fui.

—Talvez?! —Faço uma careta. Ele se vira completamente para mim e me encara.

—O que isso quer dizer exatamente?

—Quer dizer que eu nunca fui em um desses. —Ele dá risada da situação.

—Acha que consegue pilotar um incrível carrinho de batida? —Pergunta de forma


irônica ainda com seu sorriso.

—Talvez. Nem sei andar de bicicleta. —Ele arregala os olhos com a confissão. Dou
risada.
—Tenho certeza que vai se sair bem, linda.

—Não vai oferecer pra eu ir junto com você? —Questiono indignada.

—Não. —Responde casualmente dando de ombros. —Essa é a diversão, bater em


todo mundo. —Explica mostrando o quanto é óbvio.

Quando chega nossa vez, cada um se acomoda em um carrinho. Minhas mãos


estão suando, consigo sentir o nervosismo misturado com adrenalina junto a
expectativa percorrerem minhas veias. Isso vai ser interessante.
Apenas não se mate, Maya.
É dada a largada. Meu Deus, eu sou péssima nisso! Não, isso é um completo
eufemismo. Eu não sai sequer do lugar, as pessoas estão batendo em mim sem
parar, não estou sabendo nem diferenciar o freio do acelerador. Finalmente
consigo sair do lugar, o problema agora é não destruir a pista e os outros carros.
Ouço a risada de Liam pela pista enquanto tento não bater na parede. Estou me
sentindo o pato do jogo, mas estou me divertindo demais, ocupada rindo da minha
própria desgraça para ligar pra isso. Quando consigo desviar de uma batida e em
seguida bater no carro de alguém, comemoro como se tivesse ganhado uma
Champions League.

—Acho que eu deveria ter pelo menos te explicado o que é acelerador e freio.
—Diz Liam em meio as risadas, após sair do bate-bate. —Assim pelo menos você
conseguiria sair do lugar mais rápido. —Dou risada.

—Ei, eu avisei que nunca tinha ido em um.

—Melhor você ficar longe de um por um bom tempo. —O empurro em forma de


protesto, mas seu corpo enorme e cheio de músculos nem se mexe. Agora
estamos rindo igual dois malucos.

—Aí meu Deus! —Quase grito de empolgação. Ele me olha com uma expressão
de confusão. Segue o meu olhar e se depara com o jogo de tiro ao alvo…com
arminhas de brinquedo!

A criança dentro de mim não está se aguentando. Quem não ama arminhas de
brinquedo? Só um doido mesmo. Pego em sua mão e o puxo até a barraquinha
fazendo um esforço imenso devido ao seu peso. Dou mini pulinhos de animação
ao chegar e o ver entregar o dinheiro para o homem responsável sem contestar.
—Pronta para ser derrotada, senhorita Hawkins? —Diz com um sorriso presunçoso
e com uma arminha na mão, mas seu olhar demonstra diversão.

—Eu que lhe pergunto, senhor Brown. —O fito com um olhar desafiador, mas com
um sorriso divertido nos lábios.

—Eu proponho uma aposta. Se eu ganhar, nós vamos depois para minha casa
assistir Game of Thrones.

—E se eu ganhar, nós vamos comer no lugar que eu escolher; —Completo.

—Fechado. —Damos um aperto de mão selando nossa aposta.


Pego minha arminha em cima do apoio da barraca e miro bem no meio do alvo, na
bolinha vermelha no centro. Minhas mãos transpiram um pouco sob a arma, eu
concentro, respiro, atiro…e erro. Arght!
Ele ergue a arminha em sua mão, segura de forma firme e confiante, ele mira no
alvo em sua frente, concentrado, atira e…acerta. Ponto para ele. Gemo de
frustração e irritação. Não me importo, porque isso traz uma onda de
determinação.

Segunda fase. Duas garrafas uma ao lado da outra, temos que derrubar as duas.
Fácil, essa está no papo. Sou boa com arminhas, já brinquei muito, vou acertar
dessa vez, só estava nervosa. Miro bem, procurando ter certeza que está na
direção certa. Concentro, atiro nas duas sem nem pensar antes. Bingo!

Rá! aqui somos profissionais, e profissionais também ficam nervosos na primeira


tentativa, mas agora eu estou no jogo. Comemoro abrindo um sorriso enorme
passando a língua nos lábios provocadora. Um pouco competitiva? Talvez.
Ele se vira para mim e sorri provocativo, confiante, irônico, como se já soubesse
que fosse vencer.

Ele mira, concentra e atira. Mas acho que excesso de confiança não é uma das
melhores vantagens, porque ele erra, as duas! Faço um movimento com o braço
em comemoração e felicidade. 1x1, estamos empatados.

—Rá, acho que alguém precisa fazer um exame de vista, Brown. —Provoco.
—Eu deixei você ganhar, linda. Não se garanta tanto. —Retruca. Sei que está
mentindo, mas vou deixar para acabar com seu ego depois.

Ignoro e vamos para a última fase. Uma torre, seis latas. Três na base, duas no
meio e uma no topo. Objetivo: derrubar todas. Respiro fundo e começo. Acerto a
primeira, a segunda, a terceira, e aí, as coisas começam a desandar. Erro a quarta,
a quinta, mas acerto a sexta. O único problema, é que não tenho mais chances.

Ele ergue a arminha na direção da torre, calmo e confiante. Nessa hora, eu oro em
pensamento, pedindo para o cara lá em cima para que o faça errar.
Não é problema ir para a casa de Liam depois, o problema é que me recuso a
perder. Não tenho tempo para pensar muito porque estou nervosa demais secando
meu adversário e torcendo de dedos cruzados atrás das costas.

Atira…1,2,3. Strike! Seis coelhos com uma cajadada só. Desgraçado inteligente. O
tiro pega bem na base da torre, todas as latas caindo como uma avalanche sem
dificuldades. 2x1, ele ganhou.

Abaixa a arminha, apoiando em cima da bancada, se vira e fala:


—Vai querer fazer mais alguma coisa antes de irmos? —Seu sorriso arrogante e
presunçoso aparece e tenho vontade de arrancá-lo fora. Gemo de irritação.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
—O que vai querer? —Pergunta após decidirmos parar para comermos antes de ir
para a sua casa.

Ele queria ir em uma lanchonete ou hamburgueria por perto, mas insisti para
comermos em um dos trailers que tem no próprio parque. Os lanches deles
ganham de dez a zero dos outros lugares, e sem falar que o preço é bem melhor.
Comer nesses trailers me faz lembrar da época em que estava no Brasil. Um dos
meus passa tempos favoritos era sentar e conversar com Anna enquanto
comíamos o lanche do nosso trailer predileto. É um dos melhores momentos que
guardo comigo e sinto muita falta disso. Da até uma nostalgia estar fazendo isso
novamente, dessa vez, com Liam.
—Hambúrguer com certeza! —Falo depressa.

—Vamos pedir hamburguês então. —Ele dá risada. Entrega o cardápio para mim
que percorro os olhos de forma rápida procurando o que mais me atrai.

Fazemos o nosso pedido e sentamos em uma das poucas mesinhas de madeira


que tem espalhadas. Apoio meus cotovelos na mesa o analisando.
Desde o primeiro instante sabia que Liam era lindo, nunca neguei isso, mas, é
diferente das outras belezas. No sentido de que não é enjoativa, eu poderia passar
dias apenas o olhando e ainda o acharia lindo de morrer. Seus olhos ainda me
prenderiam e sua beleza ainda me tiraria o fôlego.

—O que foi? —Acho que passei tempo demais o admirando porque agora está me
olhando sem entender.

—Animado para o próximo jogo? —Procuro um assunto para desviar sua atenção.
—Sem dúvidas. Acredito que temos grandes chances de vencer, e se vencermos
vamos para as semifinais. Estou confiante que essa temporada é nossa.

—Vocês são muito bons, tenho certeza que vão vencer essa temporada. Seus pais
assistem aos seus jogos? Nunca falou sobre eles.

—Assistem. Minha mãe nunca perdeu um único jogo, apesar de no começo ser um
susto para ambos eu querer seguir carreira no hóquei, eles me apoiaram. Bom,
minha mãe mais que o meu pai. —Responde com uma voz carregada e o olhar
distante.

—Ah…achei que tivesse uma boa relação com eles. —Despenco os ombros
imaginando que acabei com o clima da conversa.

—Hoje eu tenho. Antes, minha relação com meu pai foi um pouco conturbada. Ele
nunca tinha tempo pra nada, nem pra minha mãe, e nem pra mim. Brigamos
algumas vezes. Tinha momentos que parecia que ele nem existia, mas minha mãe
foi os dois, mesmo isso ainda não sendo o suficiente em alguns momentos. —Sua
voz diminui conforme fala, um sorriso orgulhoso junto com um olhar de saudade e
amor transparecem ao dizer.

—Você parece amar muito ela. —Sorrio ao ver a forma como fala com o brilho no
olhar.
—E amo. Muito. Costumo dizer que ela sempre vai ser a mulher da minha vida. Ela
sempre responde pra mim que eu tenho que encontrar a mulher para minha vida.
Acho que no dia que aparecer com alguém em casa ela vai sair contando pra todo
mundo na rua. —Dou risada.

—E por que nunca levou? —Pergunto com franqueza.

—Não achei a pessoa certa. E não sou de namorar. —Dá de ombros.

—Por que não? Qualquer uma daquela faculdade amaria namorar com o lindo,
Liam Brown. —Seu sorriso se alarga.

—Você me acha lindo? —Pergunta com a voz mais arrogante de todas. Reviro os
olhos.

—Sério que prestou atenção só nessa parte? —Questiono com indignação.

—Não, mas essa é a mais importante. —Fala casualmente. Liam sem suas
gracinhas não seria Liam. —E respondendo a sua pergunta, se minha carreira no
hóquei der certo, não vou ter condições para ter uma namorada, nem mesmo
construir uma família, são muitos “e se” e não quero acabar igual ao meu pai.

—Sabe que isso é idiotice, certo?

—Acabei de ser sincero com você, e me chamou de idiota? —Ele ergue as


sobrancelhas, surpresa misturada com indignação transparecendo sua afeição.

—Sim, porque é idiotice, e estou sendo sincera ao dizer isso. Você não vai acabar
igual ao seu pai, você não é ele.

—Como pode saber? —Uma voz questionadora com um tom de dúvida e


insegurança sai.

—Eu conheço você. E sei que não vai deixar isso acontecer porque vai amar essas
pessoas tanto quanto vão amar você, e por isso, vai se esforçar o máximo para
fazer dar certo. —Digo com sinceridade. Não vacilando em nenhum momento o
meu olhar no seu, demonstrando toda a certeza que tenho nas minhas palavras.
Nossos pedidos chegam, o homem que nos serve deseja bom apetite e se retira
em seguida. Apesar do assunto ser um pouco delicado e sério, o clima continua
confortável como se estivéssemos falando do que comemos no almoço.
Dou uma mordida e soltou um gemido baixo de prazer. Isso está maravilhoso!

—Você disse que quer seguir carreira no hóquei, pra qual liga gostaria de entrar?
—Tento o fazer esquecer o outro assunto e também porque estou curiosa para
saber mais sobre ele. Mais que justo, já que sabe muito sobre mim.

—Ficaria feliz de entrar para qualquer liga mas, se estamos falando da liga que
sonho, seria Toronto Maple.

—É uma ótima liga, com certeza irão te querer. —Ofereço um sorriso incentivador.

—Não tenho tanta certeza assim. —Contrapõem instantaneamente.

—Pare com isso! —Repreendo.

—Parar com o que? —Ergue os olhos do seu lanche os voltando para mim
franzindo as sobrancelhas.
—De ficar se rebaixando. Você é um dos melhores jogadores universitários! Todo
mundo sabe disso, os comentaristas ficam de olho em você. Com certeza vai
conseguir uma ótima liga, independente se for a dos seus sonhos ou não. —Falo
de uma vez sendo totalmente sincera.

Fico triste por Liam pensar coisas assim sobre si mesmo. Será que ele não
percebe o quanto ele é bom?

—Tudo bem e, se eu for bom o suficiente para entrar em uma liga profissional mas,
não dá certo?

—E se você for bom o suficiente, dar certo, se tornar um dos melhores jogadores
do hóquei e for a melhor escolha que você já fez?

—Sou apenas bom, Hawkins. Nada de incrível. Desculpa se não consigo acreditar
que posso ser tão bom como todos dizem e seguir a carreira dos meus sonhos no
hóquei.
—Liam, você é incrível no gelo! Acha mesmo que eu falaria uma coisa dessas pra
você se não acreditasse? —Ele ri com a pergunta antes de responder.

—Na verdade, você jogaria várias verdades na minha cara.

—Então, sabe que não estou mentindo. Vou fazer questão de te lembrar disso
todas as vezes até fazer sentido na sua cabeça.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…

Quando chegamos em sua casa, noto pelas janelas que está tudo escuro. O que
significa que os meninos estão festejando por aí, o que não é nenhuma novidade
já que são de longe as pessoas menos caseiras que eu conheço.
Penduro o meu casaco e retiro meu tênis deixando na entrada. Vim tantas vezes
aqui que já me sinto à vontade.

—Quer algo para beber? —Fala ao abrir a geladeira e retirar uma garrafa de
cerveja.

—Na verdade, estava pensando em um doce. —Aproximo do balcão. A formiga


que habita em mim, tem a necessidade de comer um doce todas as vezes que
come um lanche. Ou sempre que pode.

—E qual doce seria esse? —Adoto uma expressão pensativa por alguns instantes.
Meu rosto se ilumina com a ideia.

—Brigadeiro! —Animação transparece na minha voz. Meu Deus, estou a dias


querendo comer, mas nunca paro para fazer, esse é o momento perfeito.

—O que? —Franze a testa, confusão se passam pelas suas linhas de expressão.


Com certeza nunca ouviu falar nesse lugar. Que tristeza. Bom, ainda bem que eu
existo para apresentar essa oitava maravilha.

—É um doce brasileiro. Estou a dias querendo comer, é simplesmente


maravilhoso. —Explico implorando entre entrelinhas para que tope fazer. Acho que
meus olhos chegam a brilhar.
A confusão em seu rosto se esvai aos poucos. Ele balança a cabeça assentindo
em afirmação, gira o corpo em direção aos armários da cozinha, abre um e ergue o
rosto em minha direção pedindo por ajuda indiretamente.

—Qual os ingredientes que precisa? —Dou pulinhos por dentro e me aproximo


vendo se possui os ingredientes necessários. Pego o único leite condensado no
fundo do armário e o achocolatado.

—Você tem manteiga? —Confirma e coloco os ingredientes em cima do balcão


enquanto ele a pega na geladeira, depois uma panela que peço.

Com todos os ingredientes, derramo o leite condensado dentro da panela e quatro


colheres de achocolatado em seguida misturando bem. Coloco uma colher de
manteiga e levo ao fogo mexendo sem parar.

—Como conhece esse doce? —Pergunta ao encostar no balcão e me observar


mexer a panela.

—Eu sou brasileira, me mudei pra cá quando tinha 14 anos. —Ele arregala um
pouco os olhos e imagino que não esperava por essa resposta.

—Então, sabe falar português? —Riu com a pergunta.

—Sim, é minha língua de origem. —Ele revira os olhos e sorri.

—É claro, pergunta idiota. Desculpe. —Se repreende. Ofereço-lhe um sorriso


confortador. —Como é lá?

—É lindo! As pessoas são incríveis, alegres e receptivas. Não existe tempo ruim
para nós. Tem defeitos, claro, mas não tem lugar e povo melhor que lá. Sinto muita
falta. —Digo sentindo uma pontada de saudade.

—Deve ter sido difícil se mudar pra cá. Somos bem diferentes.

—Sim. Foi difícil no começo com as pessoas. No início me sentia perdida, uma
completa estranha, mas aprendi a amar aqui.

—E por que se mudou?


—Por causa dos meus pais, aqui existe melhores oportunidades, mas sempre
visitamos nossa família quando podemos.

—Você poderia me ensinar a falar português. —Sugere com um tom de diversão.

—Pode ter certeza que você não vai querer. —Informo rindo da possibilidade.

Depois de quinze minutos mexendo sem parar até desgrudar do fundo, vejo que
está pronto. Desligo o fogo e levo para a geladeira gelar durante os próximos
minutos.

—Está muito quente, temos que esperar esfriar. —Ele assente. Fecho a geladeira
e subimos para assistir mais um episódio de Game of Thrones como combinado na
aposta.
Nos acomodamos na sua cama e damos o play. Piscamos e o primeiro episódio da
noite já foi, piscamos de novo e o segundo também. A cada minuto dessa série, é
uma emoção, uma surpresa, uma intriga e uma teoria. Se existe série melhor já
produzida nesse mundo, me apresente porque tenho minhas dúvidas.

—Tyrion é o mais inteligente de todos, amo esse cara. —Comento.

—Mesmo não gostando da Cercei, ela também é muito esperta. —Opina.

—Quero muito que o Robb se vingue.

—E tire Sansa de lá, ninguém merece tanto sofrimento. —Assinto. Amo esse
momento em que dividimos nossas opiniões no fim de cada episódio.
Confiro o horário no celular.

—Acho que está pronto o brigadeiro. —Ele se levanta da cama assim que informo.

—Vou ir buscar. —Avisa passando pela porta.

Dois minutos depois ele passa por ela novamente a fechando e me entregando o
doce. Com duas colheres, cada um leva a sua a boca e soltamos um gemido de
prazer junto. Isso está muito bom.

—Essa é a oitava maravilha do mundo! —Falo fechando os olhos para aproveitar


cada segundo do meu momento de prazer.
—Estou longe de discordar. —Ele responde, abro os olhos e vejo que está
devorando.

—Esse é o momento que você me agradece por apresentar essa delícia.

—Você não me agradeceu por eu existir. —Fala indiferente, mas com um que de
provocação. Reviro os olhos e sorrio. Ele sorri. Eu amo esse sorriso, que merda.

—Ei, deixa pra mim! —Protesto ao ver que pegou uma colher cheia de brigadeiro.

—Não. —Pega a panela de mim se afastando para o outro lado do quarto, sem me
dar qualquer reação.
Levanto e vou pra cima dele tentando a recuperar de volta. Ele ergue a panela,
esticando o braço o mais alto possível. Cruzo os braços e olho com a expressão
irritada.

—Para de ser guloso, Liam!

—Você pode ter certeza de que vai saber quando eu estiver sendo guloso, linda.
—Duplo sentido, como sempre. Argh…

Ele percebe que eu fico constrangida. Ele sabe que eu sempre fico. De repente,
passa sua colher suja de brigadeiro no meu nariz, fazendo com que o clima se
rache.

—Você está deliciosa, minha linda. —Fala ao passar a colher também nas minhas
bochechas evidentemente segurando a risada. Coitado…

—Eu ainda não sou sua. —Retruco.

—Ainda? —A voz rouca ressoa. Aproveito o momento que está distraído e não
percebeu que abaixo o braço, e roubo a panela da sua mão. Essa é a melhor arma
que uma mulher pode ter.

—Rá! Quem ri por último, ri melhor. —Dou risada da sua cara que agora não está
transmitindo tanta diversão.

—Hahaha. —Imita uma risada.


Uso o banheiro para lavar o meu rosto que ele fez a questão de sujar antes de
continuarmos assistindo de onde paramos.

Capítulo 28

LIAM
Eu amo a sensação de acorda de um sono repentino de quando dormimos
assistindo a um filme ou depois de chorar por um longo tempo.

Aqueles primeiros minutos do momento em que abre os olhos, tentando enxergar


onde está e assimilar os últimos acontecimentos, sentir a preguiça sair do corpo.
Hoje ao abrir os olhos, depois de alguns segundos, sinto minha mão sobre algo
sólido e curvado, encaixando perfeitamente, assim como uma pressão que faz os
meus países baixos acordar. Então, me dou conta que se trata do corpo de Maya
Hawkins pressionado ao meu.

Claramente, dá para ver que acabamos dormindo juntos assistindo a série. Juntos.
Nesse momento estou com uma certa indecisão, tentando saber se isso é algo
bom, ou ruim. Agora, é ruim. Por que estou extremamente excitado e duro com o
meu parceiro pedindo ajuda com a bunda de Hawkins o prensando.

Ela se remexe e engulo um gemido fazendo um esforço imenso. Me concentro em


outras coisas, como o cheiro do seu cabelo é tão bom, como seu corpo é pequeno
comparado ao meu e como com uma única mão consigo segurar metade da sua
cintura. Okay, isso foi uma péssima ideia, porque agora, estou imaginando trilhões
de cenários obscenos com essas informações. Os pensamentos são bons demais
para continuarem a ser apenas pensamentos.

Penso no encontro de ontem. Eu nem lembrava a última vez que fui a um encontro
de verdade. Quando você entra no hóquei, se torna muita mais fácil ficar com as
mulheres. Elas já vêm querendo chegar no finalmente, sem muita enrolação e
dificuldade. No entanto, Hawkins está me fazendo querer jogar uma partida inteira,
sentir toda aquela expectativa que o sexo casual não proporciona.

Estou totalmente no escuro, não sei o que está achando sobre o que estou
fazendo, mas sei que está se divertindo. A cada encontro tenho mais certeza de
que a quero. Ela é linda, disso não tenho dúvidas, seu corpo não é igual a de uma
modelo como as outras garotas da faculdade. Tem curvas, uma bunda arrebitada,
cintura larga, pernas grossas, magra, mas não é seca.

A questão é: estou me apaixonando por cada parte que a pertence. Pelo seu
sorriso, pela forma como fala quando fica animada, a forma como tenta se
expressar, a facilidade de como fica estressada, como é fácil conversar com ela, o
interesse de me ouvir e de me conhecer.
Tudo o que eu disse para ela foi pura sinceridade. Tenho medo de errar, de não ser
capaz o suficiente e bom o suficiente. De fazer escolhas erradas no futuro e me
causem consequências que vou me arrepender para o resto da vida.
Por isso não namoro. Como posso ficar com alguém pensando no dia que vamos
terminar? Passando 90% do tempo ausente? Não quero fazer ninguém se sentir
“insuficiente” ou algo do tipo. Preciso de foco se quero seguir uma carreira, como
vou lidar com isso e mais um possível namoro e família no futuro?

Não quero me precipitar. Mesmo tento nem a beijado ainda, estou me apaixonando
aos poucos, algo dentro de mim me diz que estou tendo cada vez mais certeza
disso, e sou resolvido o suficiente para admitir. Além disso, existem muitas outras
coisas mais importantes que te levam a se apaixonar por alguém.

Ela se remexe mais, se esfregando inconscientemente em mim. Aí não porra! Ela


simplesmente não para. Isso se tornou uma tortura. Perdi a conta de quantas
semanas estou sem transar.
Eu to fodido, e ainda não é no bom sentido.

Engulo em seco. Depois de um minuto inteiro, que pareceram horas, ouço sua voz
sonolenta sinalizando que acordou.

—Liam, tem alguma coisa me incomodando. —Murmura suave.

—Você parar de se mexer talvez ajude. —Acho que não entende de primeira,
porque apenas alguns segundos depois que obtenho uma resposta.

—Aí meu Deus! —Ela vira de costas para a cama quase que em um pulo, me
encarando, leva as mãos a boca.

—Não gostou do que sentiu? —Minha voz acaba soando rouca e arrastada. A
provocação me escapa.
—Isso é culpa minha? —Ignora minha provocação. Seu rosto cora com uma
afeição tímida se instalando.

—Meia-bomba matinal, mas talvez você tenha ajudado um pouco. —Abro meu
sorriso de lado ao dizer com um que de provocação.
Seu rosto ganha um tom rosado maior, e tudo o que quero fazer é beija-la. Agora.
Guardar essa imagem para sempre em minha memória. Realizar os meus
pensamentos.

—Desculpe. —Sua voz sai quase como um sussurro.

Devagar, eu me movo na cama inclinando meu corpo em sua direção, primeiro


brincando com os nossos narizes antes de encostar a minha testa na sua. Ela
fecha os olhos absorvendo o calor dos nossos corpos, das nossas respirações.
Sentindo elas se unirem e se tornarem uma só. Suavemente, levo minha mão até
sua nuca e enrosco os meus dedos nos fios do seu cabelo. Por fim, sussurro com
a voz mais rouca e pesada:

—Eu não pedi para você se desculpar.

Seus olhos se abrem encontrando-se com os meus, transmitindo todo o calor que
sentimos. O calor que queima dentro de nós. Leio os seus olhos, procurando
qualquer possibilidade de desconforto, mas tudo o que vejo são chamas de
excitação, provocação e desejo.
Esfrego o meu nariz no seu mais uma vez, umedeço os lábios e o desço para o
seu queixo, deixando um beijo ali. Faço uma trilha com o nariz absorvendo o seu
cheiro e sentindo sua pele se arrepiar a cada centímetro com a sensação do meu
fôlego quente. Aperto um pouco mais seu cabelo, indicando para não se mover e
inclinando sua cabeça levemente. Mordo o módulo da sua orelha antes de descer
e plantar beijos com a boca úmida por todo o seu pescoço.

Ela leva uma das mãos ao meu ombro apertando o local e subindo até os meus
fios de cabelo curto e afundando seus dedos neles. Aperta, puxa, me instigando a
continuar e a ficar mais duro e sedento por ela. Continue, minha linda.
Puta que me pariu…estar em cima de você é tão…bom. Você é tão pequena…

Seus olhos se fecham novamente. Escutamos uma batida na porta, mas decido
ignorar.
Mais uma batida forte, e mais uma…

—Liam, tem alguém na porta. —Murmura com a voz fraca.


—Ignore. Daqui a pouco ela vai embora.

Desenrosco minha mão do seu cabelo, querendo explorar seu corpo com ela.
Passo as pontas dos dedos pela sua perna, parando no joelho com o objetivo de o
segurar e entrelaçar sua perna na minha.

Mais batidas. Mas que caralho! Quem é que veio me perturbar essa hora?!

—Acho que ela não vai. —Diz, mas resolvo continuar ignorando até ela enfim
desistir.
Ergo o rosto a procura do seu olhar, e o encontro assim que encosto minha testa
na sua.
E não há visão melhor do que Hawkins com o rosto todo rosado e os seus olhos
castanhos mel ardendo em chamas. Sedentos. Brilhando de desejo.
Sinto sua respiração um pouco descompassada e quente aquecer a minha pele.

—Preciso beijar você. —Confesso. Um desejo faminto cresce a ponto de eu querer


implorar por isso. Preciso mergulhar meus lábios no seus, saboreá-los. —Por favor
—Imploro.

Diga que sim, minha linda. Não me faça implorar mais.

—Eu preciso falar uma…—O barulho na porta nos interrompe mais uma vez. O
que ela precisa falar? —É melhor você atender. —Fala por fim. Afirmo, suspirando
de frustração.

—Antes vou precisar de um minuto para levantar. —Ela sorri tentando segurar a
risada, mas falhando miseravelmente depois. —Isso é culpa sua, Maya Hawkins!
—Riu junto não me segurando ao vê-la sorrir.

Após um minuto esperando minha meia-bomba se acalmar e deixar de ficar dura


igual uma pedra, sem o cessar das batidas. Levanto e abro a porta vendo Nick.
Tinha que ser! Em que caralhos eu pensei que arrumar um melhor amigo como
Nick fosse uma boa ideia? Empata foda do cacete.

—O que você quer? —Pergunto, a voz transparecendo um pouco de irritação


demais.

—Tem algum fone pra me emprestar?

—Sério? Só por isso que você veio aqui?

—Não, eu quero panquecas também. —O lanço um olhar furioso, mas ele não
parece se importar. —Oi Hawkins! — Cumprimenta. —Calma, o que Hawkins está
fazendo aqui? —Não respondo e viro de costas.

Vou até a escrivaninha e pego um dos meus fones, tenho vários porque tenho o
sério problema que eles sempre estragam rápido demais.
Volto e entrego o que estou usando para ele.
—Você pode ir embora agora?

—-Grosso! —Resmunga saindo.

Fecho a porta e me viro vendo que agora está sentada na cama segurando a
risada. Ando até a cama e sento ao seu lado, ela apenas me observa,
acompanhando cada movimento. Aproximo o meu corpo do seu e estico os braços,
segurando o seu rosto nas minhas mãos.

Durante um minuto, não falamos nada. Aproveitamos o momento, o calor dos


nossos corpos e a respiração quente. A presença um do outro. O toque.
Meus olhos fixam em seus lábios. Analisando como são do tamanho perfeito.
Imaginando como deve ser o gosto e a sensação de tê-los pressionados aos meus.

Um pequeno estalo vem a minha mente. Maya nunca citou que namorou ou que
beijou um cara. Tudo bem que nunca tivemos realmente essa conversa, mas ela
sabe que já fiquei com outras garotas. Só que em nenhum momento sequer
mencionou um cara que ficou ou se interessou. Era isso que queria falar?

—Você já foi beijada alguma vez? —Ergo o olhar. Ela nega. —Isso quer dizer que
nunca foi tocada por nenhum homem?

—Sim. —Puta que me pariu. Eu estou criando cenários obscenos com uma virgem.
Uma que eu quero fazer deixar de ser.

—É um problema que vamos ter que resolver, linda. O que acha? —Amo os
momentos em que não precisamos falar, porque os nossos olhares estão falando
por nós. E o dela me diz mais do que mil palavras. —Primeiro, vamos começar
pelo mais fácil.

Ela desde os olhos para exatamente o lugar que quero que estejam. Que me dá a
certeza que ela quer tanto quanto eu. Antes que eu possa fazer qualquer avanço,
ouço batidas na porta. Sério? De novo?

—Acho que alguém vai ter um dia bem pensativo hoje. —Provoca com um sorriso
divertido.
Levanto derrotado de frustração. Abro a porta e encontro quem? É claro, o pateta
do Nicolas Watson.
—O que é agora? —Estou com vontade de xingar até a sua última geração. Eu
queria muito que namorasse para eu poder fazer o mesmo.

—Dylan vai colocar fogo na cozinha.

—Volte aqui só quando começar o fogo. —Falo de forma curta e grossa.

—O que foi que eu fiz? —Pergunta confuso. O encaro de uma maneira


ameaçadora durante um minuto inteiro.

—Eu vou ao banheiro —Ela fala. Leva alguns instantes até o som da porta batendo
chegar aos meus ouvidos.

—Você é um empata foda! —Rosno.

—Sinto em te dizer que ainda não tenho bola de cristal para saber quando você
está preste a ficar com alguém.

—Idiota! —Falo e fecho a porta do quarto na sua cara.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
—O que é isso? —Dylan pergunta assim que entro na cozinha com a panela de
brigadeiro e com Hawkins atrás.

—Um doce brasileiro que eu fiz. —Ela responde. Coloco a panela em cima do
balcão.

Assim que acordou e viu o doce em cima da mesinha ao lado da cama entrou em
desespero achando que havia estragado, disse que o ideal seria ter colocado na
geladeira, mas pelo o que parece ele continua bom para comer.
O que eu particularmente fico muito feliz, é um doce totalmente diferente de tudo o
que já comi, porém, isso não quer dizer que não seja ridiculamente bom. Porque é.

Se eu soubesse que ele existia, teria feito e comido muito antes e centenas de
vezes. De verdade, não estou brincando quando digo que o negócio realmente é
bom.
—Doce brasileiro? —Luke repete sem entender.

—Hawkins é brasileira. —Falo casualmente. Vejo um sorriso malicioso se formar


nos lábios de Dylan.

—Vai patrocinar nossa viagem para o Brasil?

—Você que deveria. É o que mais tem dinheiro. —Nick adiciona.

—Deixa de ser tarado, Dylan. —Adverte ela rindo.

Nick, o empata foda, pega a panela e leva próximo ao nariz cheirando o conteúdo.
Faz uma cara de parecer estar boa e pega uma colher, levando a boca depois de
retirar um pouco do brigadeiro.

—Puta que pariu, isso é muito bom! —Exclama com os olhos levemente
arregalados de surpresa.
Luke e Dylan que observam, optam também por pegar uma colher e experimentar
o doce.

—Cacete, bom é eufemismo pra isso aqui! —Dylan murmura.

—Por que nunca comemos isso antes? —Questiona Luke com indignação.

—Ei, eu peguei primeiro. —Protesta Nick com a tentativa de Dylan e Luke de


comerem mais. Esconde a panela atrás do corpo ameaçando os dois com uma
colher, como se uma colher pudesse ferir alguém.

—Passa pra cá logo. —Ele vai para cima de Nick em uma tentativa falha de tirar o
doce de sua mão.

—Vamos fazer zerinho ou um. Quem ganhar fica com o doce. —Sugere Luke. Os
dois concordam.
Eles se fecham em uma pequena rodinha e jogam os dedos. Dylan e Nick, fazem o
um com o dedo e Luke é o único com o punho fechado em um zero.

—Ele roubou. —Nick acusa, apontando o dedo para o rosto de Dylan.


—Não roubei nada, seu idiota. —Abaixa o dedo apontado para si.

—Roubou sim, ele me esperou jogar primeiro.

—Para de chorar. Eu ganhei. —Luke encosta na pia com a panela na mão


começando a comer, dando fim aos protestos.

—Hawkins, pode fazer outro? —Nick pede, fazendo aquela carinha de cachorro
pidão.

—Não. Isso tem muito açúcar. —Passa por eles e puxa o doce da mão de Luke
que fica parado levando sua última colherada a boca, guardando na geladeira.

Os três viram o olhar para mim, pedindo por ajuda.


—Nem olhem para mim. —Bufam com a resposta.

—Vai ao nosso jogo contra Stanford? —Luke é quem pergunta.

—Você tem que ir, Maya. -—Nick declara.

Os dois tem se aproximado bastante. Admito que nos primeiros segundos que
percebi essa aproximação, fiquei preocupado por Nick estar interessado, mas logo
vi que não era nada além de amizade.
Os dois juntos são iguais a bagunça na certa. Sem falar nas milhões de zoações
com a minha cara. Eu não tenho mais um minuto de paz com os dois unidos em
um complô. Apesar disso, gosto da relação que Hawkins tem com os meus
amigos, e principalmente com Nick. Querendo ou não, é importante pra mim.

—Não, infelizmente. Vai ser um jogo fora, não tenho carro e muito menos sei dirigir.

—Você é nossa capitã, tem que estar lá. —Insisti Nick.

—Riley sabe dirigir? —Balança a cabeça afirmando que sim. —Ótimo, vocês
podem ir com o meu carro.
—Posso mesmo? —Confirmo que sim.

—Não temos torcida quando jogamos fora, vai ser importante se estiver lá. —Um
sorriso surge em seus lábios em resposta.
Capítulo 29
MAYA
—Isso aqui não é um carro, é uma nave! —Anuncia Riley do banco do motorista.

—Não é?! —Concordo me sentindo uma celebridade sempre que entro nesse
carro.

—Parte de mim está com uma vontade imensa de gravar algo meu.

—Nem se atreva! —Ameaço no assento ao seu lado.

—Não vou fazer nada, mas parece que eu preciso deixar algo meu registrado,
caso contrário, ninguém vai acreditar que já estive aqui um dia.

Nem eu posso acreditar que Riley topou vir comigo para Main Quad, sendo que
nem gosta de hóquei e não gostou muito nas vezes que fomos, mas sei que está
fazendo isso por mim, por mais sacrifício que isso possa ser para ela.
Acho que na altura do campeonato, passou a desacreditar que esse momento um
dia chegaria, então está fazendo de tudo por ele. Para me ajudar. É a primeira vez
que ela realmente vê eu me empenhando em um cara.
Acredito que está usando também para buscar detalhes a respeito de mim e Liam,
já foram pelo menos três tentativas de pergunta. Uso sempre a mesma resposta
—Só saímos algumas vezes. Algo que está se tornando cada vez mais difícil de
convencer a mim mesma.

Sou uma pessoa difícil de me expressar, e sei muito bem disso. O ponto é que, eu
não sei como me expressar e sentimentos são complicados demais para mim, por
isso não gosto de sentir. Mas todas as vezes que estou com Liam, eu sinto, de
alguma forma eu sinto, mesmo que involuntariamente. Estou decidindo ainda se
isso é bom ou ruim. Eu gosto como não é complicado estar com ele, nada é
complicado com ele.

Às vezes, eu me esqueço de pensar. Deixo apenas os sentimentos tomarem conta.


Igual aquele dia em seu quarto, quando acordei com os países baixos dele quase
explodindo atrás de mim. Eu não iria pará-lo se não fôssemos interrompidos por
Nick, eu não conseguiria. Nada nunca foi tão bom. E o pior, eu queria. Muito. Isso
que deixa complicado. Mas não vou pensar nisso agora.

Passamos o restando do trajeto aos berros, cantando a nossa playlist completa do


início ao fim. Podem criticar nossa voz porque estamos longe de ser duas
cantoras, nós estamos mais para duas taquaras rachadas cantando, mas nosso
gosto musical é indiscutível. Estamos ainda super animadas no momento em que
paramos o carro no estacionamento da arena de hóquei.
Nunca estive em Stanford antes, queria ter tempo para explorar o campus, mas se
fizermos isso iremos nos atrasar e não quero correr o risco de não encontrar
lugares para sentar. Então, vamos direto para dentro.
Fico impressionada com o tamanho, a estrutura moderna, e a quantidade de
pessoas que estão presentes essa noite. Por sorte, conseguimos dois bons lugares
na área da torcida da Mavericks na arquibancada.

Quando fazem exatos dois segundos que me sento, recebo uma mensagem de
Liam. Ele me perturbou o caminho inteiro querendo saber onde estávamos e se
estávamos bem.

Ele: Já chegou?

Eu: Acabei de chegar.

Ele: Pode vim aqui no vestiário?

Eu: Eu não sei onde fica o vestiário.

Ele envia uma mensagem enorme explicando como chegar no vestiário. Não sei
exatamente o porquê, mesmo assim, decido ir até lá. Aviso Riley que vou ao
vestiário prometendo voltar rápido e ela concorda de ficar sozinha por alguns
minutos.
Fico igual uma barata tonta quando finalmente acho o corredor correto, avisto Liam
parado me esperando. Os seus ombros estão tensos demais para alguém que não
está nervoso. A insegurança no seu olhar distante é sútil. Vou o mais rápido que
posso ao seu encontro.

—Desculpe moça, mas só é permitido membros do time, e a comissão técnica.


—Um dos gigantes seguranças informa barreirando a minha entrada e me
assustando de brinde antes que eu consiga chegar até ele.
—Tudo bem, ela está comigo. —Ele fala e logo o segurança libera a minha
passagem.

Praticamente pulo em cima dele e imediatamente sinto os seus braços me


rodearem, me abraçando. Aconchego-me neles, sentindo eles se apertarem ao
meu redor. Quase consigo sentir o seu sorriso no meu pescoço.
Seu cheiro é tão bom…gosto da sensação de estar aqui. Quero permanecer aqui.

—Está muito nervoso? —Pergunto baixo próximo ao seu ouvido ainda com seus
braços rodeados na minha cintura.

—Não muito. —Fala ao se afastar um pouco, descansando suas mãos na minha


cintura. Ele está mentindo. Eu o conheço.

—Por que me fez vim até aqui?

—O time quer te dar um negócio. —Segura minha mão e aponta com a cabeça em
direção a porta do vestiário sinalizando para entrarmos.

Isso não é algo suspeito

—O time? Me dar algo? —Estreio os meus olhos franzindo a testa junto. —O que
vocês fizeram? Não vou sair com cheia de farinha, não é? —Ele solta uma risada.

Eu fiz ele se distrair. Mesmo não aparentando, sei que fica nervoso sempre antes
dos jogos e de entrar no rinque, então, poder de alguma forma o ajudar é
importante pra mim.
Eu te fiz rir, Liam Brown. Viu, posso ser boa pra você. Posso ser boa pra alguém.

—Prometo que não vou deixar você sair cheia de farinha. —Ele me mostra o seu
sorriso bonito.

—Todos estão vestidos? —Ele dá mais uma risada. —Só estou me prevenindo,
não quero que aconteça de novo.

—Estão todos vestidos, eu garanto.

Escuto múrmuros ao passar pela porta, mas no momento em que todos percebem
a nossa presença eles param. Liam solta a minha mão se juntando a eles na minha
frente. Parecem um grupo de crianças que acabaram de aprontar e estão
decidindo em quem devem por a culpa ou qual mentira inventar.

—Você trouxe o negócio? —Questiona Stephen.

—Não vai dizer que esqueceu cacete. —Se preocupa Brandon.

—Está no armário. —Tranquiliza Liam.

—Está esperando ele se teletransporta para sua mão? —Eles começam a discutir
como se eu não estivesse bem na frente deles.
Liam volta com um pacote na mão e todos enfim calam a boca lembrando que eu
estou bem aqui ouvindo tudo.

—Como nossa capitã, decidimos fazer um presente pra você. —Anuncia Adam.
Entregam para mim o pacote, me encarando esperançosos com a minha reação.
Abro sem a pretensão de fazê-los sofrer de ansiedade.

—Você gostou? —Pergunta Nate quebrando o silêncio.

—Colocamos o número 15, assim fica combinando com o capitão com a 14.
—Dessa vez, não reconheço quem fala porque estou ocupada absorvendo tudo.

—Eu amei meninos, obrigada. —Exclamo ao sorrir e ver que é uma das suas
camisa de time azul, preto e branco só que personalizada com o meu nome e um
número só meu. É linda.

—Arrasamos como sempre. —Gaba Adam batendo a mão na de Brandon.

—A gente já sabia que você iria gostar. —Concorda Stephen. Suspiro revirando os
olhos.

Visto a blusa por cima da que estou. Agradeço com um sorriso de orelha a orelha,
sem saber como agradecer da maneira correta, me seguro para não pular e
abraçar cada um dele. Desejo boa sorte, e caminho em direção ao ringue mais que
pronta para torcer para o meu time.

—Aparentemente, alguém ganhou mais um presente na ida ao vestiário. —Brinca


Riley quando me sento ao seu lado na arquibancada.
—Foram os meninos do time. —Explico antes de qualquer suposição que possa
ter. Ela assente ainda em uma certa dúvida.

Esse é o primeiro jogo que definitivamente estou torcendo e sentindo toda aquela
energia e nervosismo de pré-jogo. Minutos depois eles entram no ringue.
Descobri hoje que Liam joga com a camisa 14, mas não preciso nem me dar o
trabalho de olhar. Está no centro da linha de ataque e, no segundo em que o
árbitro deixa cair o disco, ele ganha a disputa e faz um passe para Luke que joga
na defesa.

É hipnotizante como todos jogam. Como Liam joga. Se já é alto sem patins, agora
parece enorme. É tão rápido que quando pisco já o perco de vista. Voa patinando
atrás do disco que Stanford roubou de nós, marcando o adversário e recuperando
a posse como um profissional.

O primeiro período é duro, sem muitas chances a gol para ambos. Stanford se
fecha sem deixar brechas. Mavericks neutralizam o ataque adversário, não
querendo que jogue. O cronômetro no placar vai diminuindo. Mavericks está na
zona de ataque. Nate tenta driblar o marcador e infiltrar na área, mas dá errado. O
jogador adversário o desarma, puxando um contra-ataque com todo o time
acompanhando. Dylan empurra contra o vidro de proteção; no início penso que
deu certo, então, me dou conta que consegue passar o disco para um dos seus
companheiros. Ele marca. Stanford sai para o intervalo com uma vantagem de 1x0.

Quando o período termina e os jogadores desaparecem em seus respectivos


túneis, Riley me cutuca e diz:

—Até que não foi tão chato. —Sorriu com a confissão, apesar de estar chateada
por levarmos um gol no fim do período. Não esperava que fosse ser tão difícil.

—Isso quer dizer que vai me acompanhar em todos os jogos?

—Não, sem chance. —Caio na gargalhada.

O próximo período inicia. A posse do disco está com Stanford. Diferente do último
tempo, não estão retraídos, pelo contrário, querem matar o jogo de uma vez.
Mavericks se fecha, tentando tampar todos os buracos. Eles tocam o disco como
tática tentando encontrar uma oportunidade, até que arriscam a primeira infiltração
e o tiro pro gol. Peter defende. A pequena torcida vibra com gritos de alívio e
adrenalina.
Os Mavericks atacam com velocidade, prontos para empatarem o jogo. Nick entra
pela primeira vez no ringue, substituindo Stephen que hoje começou jogando, ele
passa o disco para Liam que o dispara para dentro da rede. Jogo empatado.
A questão, é que nossa felicidade não dura por muito tempo, porque passam
minutos e Stanford marca mais um. E mais outro um minuto depois. 3x1 para
Stanford.

O terceiro período é tenso. Os adversários vão para cima com o objetivo de manter
o disco com eles e controlar o jogo. Os meninos não desistem. O cansaço claro em
seus rostos não é o suficiente para fazê-los desistir agora. Mas é mais do que o
suficiente para pará-los por alguns minutos. Brechas na defesa começam a
aparecer involuntariamente, dando espaço para os adversários jogarem.

Peter defende. Mais uma, e mais uma, e mais uma. Não estou conseguindo reagir.
A sensação é que a cada lugar no rinque existe um jogador de Stanford pronto
para não deixar que saiam da zona de defesa.
A tensão e ansiedade surgem nas expressões da torcida dos Mavericks. O
nervosismo e aflição tomam conta de mim e começo a me desesperar. Se
perdermos, acabou a temporada. Não é uma opção perder. Não hoje pelo menos.

Subo em cima do banco na arquibancada e tiro a camisa do time, ficando apenas


com a minha e ergo a camisa com “Mavericks” escrito na frente. Sei que temos
capacidade o suficiente para vencer, somos melhores. E se eu não posso dizer
isso pra eles agora ou estar lá dentro daquele rinque ajudando, vou fazer a única
coisa que posso. Torcer.

—Let’s go Mavericks! —Cantarolo berrando em pé na arquibancada com a camisa


erguida.

—O que está fazendo? —Riley me olha com uma afeição surpresa, sem entender
o sentido disso.

—Torcendo. —Ela parece pensar por um minuto antes que suba e fique em pé
junto comigo.

—Let’s go Mavericks. —Nós duas gritamos.


Quando percebo, toda a pequena torcida está de pé gritando junto. Em um
verdadeiro coral ensurdecedor empurrando o time a vitória. O que causa um efeito
positivo.

Os Mavericks reagem.

Dylan desarma o marcador repassando o disco para Nate que puxa o


contra-ataque, ele o carrega patinando no gelo com toda a velocidade que resta.
Ele não espera e arremessa. O disco acerta na trave, sobrando o rebote para Nick
que o empurra para dentro. 3x2. A esperança se reacendendo e a adrenalina
correndo pelas veias.

Meu melhor amigo é foda!

Faltam 3 minutos para o fim do jogo. Nesse instante, estamos empatados com um
gol feito por Luke. Precisamos de mais um gol para vencer. Não temos tempo,
precisamos decidir isso agora. Nesse momento, o corpo não está mais
respondendo ao cérebro. As faltas começam a aumentar, o cansaço querendo falar
mais alto.
Nick é espremido contra o vidro pelo defensor do outro time. Eles brigam, se
debatem e ele vence; repassa o disco para Luke. Os jogadores de Stanford
ocupam a área da defesa. Não a espaço.
Isso, é o que você pensa que acha.
Luke joga o disco em um mínimo espaço calculado, caindo perfeitamente no taco
de Liam que penetra ficando frente a frente com o gol. A única coisa que ele
precisa fazer, é não errar. E ele não decepciona.

A luz se acende junto com o som indicando que é fim de jogo. As comemorações e
os gritos da torcida dos Mavericks são vibrantes com a vitória de 4x3. Estaria
mentindo se não dissesse que os meus garotos brilharam hoje. Nick entrou e
transformou a atmosfera, ele realmente é muito bom. Assim como Luke, com a
visão de jogo aguçada, Dylan com sua raça e força no gelo, Nate com sua garra e
Liam com a sua decisão. Esses são os Mavericks. Esses são os meus garotos.
Todos eles.
O meu quarteto estava no gelo, sendo as estrelas do hóquei que eles são.

Hoje foi uma noite mágica, senhoras e senhores.


… 🏒🏒 🏒🏒 🏒🏒
.. .. …

Aguardo no estacionamento Liam sair. Já fazem mais de vinte minutos que estou
esperando. Enfim o avisto saindo acompanhado de todo o time… dançando?
Eles estão dançando, mas não só isso, cantando também. A música “Should I Stay
our Should I Go” soando em uma pequena caixinha na mão de Adam com as
vozes. Imediatamente começo a rir.
Quando ele se dá conta da minha presença, se afasta e caminha até mim. Pulo em
seus braços que me envolvem e os meus que rodeiam o seu pescoço. Inspiro o
seu perfume masculino que me deixa alucinando de tão bom.

—Parabéns pela vitória!

—Uma garota que eu estou gostando ficou gritando igual uma doida na
arquibancada. Ela ajudou bastante. —Ele me coloca no chão.

—Estava apenas torcendo para o meu time. —Confesso. —E o gol nos últimos
minutos?! Você estava querendo me infartar Liam Brown, só pode. —Ele gargalha.

—Depois de hoje, acho que alguém vai pensar duas vezes antes de dizer que
hóquei não tem emoção.

—É, acho que sim.

—Liam! —Nick grita. —Estamos indo comemorar no The Five. Bora!

—Vamos? —Hesito.

Não consigo me lembrar a última vez em que fui em um bar aproveitar a noite com
os amigos, e estou preocupada em me arrepender com qualquer decisão que
tomar. Viro para Riley que está encostada no carro.

—Você quer ir? —Pergunto

—A decisão é sua. —Ótimo, ajudou muito. Detesto não saber o que fazer.

—Vamos, se não gostar podemos ir embora. —Assinto deixando Liam resolver


esse dilema.
Estou começando a falar muito sim para esse cara.

Capítulo 30

LIAM
O bar do The Five está lotado.

Quando descemos do ônibus, viemos direto para cá, enquanto Maya veio com o
meu carro. É o bar mais próximo do campus da Mavericks. O que temos que
admitir que é um ótimo negócio, todos os universitários do campus vêm pra cá;
principalmente depois dos jogos para comemorar. O lugar é grande e a decoração
descolada com a temática de esportes.

O interior do The Five está caótico. Passamos da entrada e somos recebidos por
um calor dos infernos, a galera nos recebe com gritos e nos desejando parabéns
pela vitória. Não é à toa que muitos jogadores de hóquei universitários tem uma
confiança inabalável, as pessoas da cidade e da universidade se importam de
verdade com seus times. Não é à toa que somos tratados com tantos privilégios.

Deposito minha mão na lombar de Hawkins que está ao meu lado desde que
chegou. Seu corpo claramente não sabe como agir.
Percebo que isso pode ser super desconfortável para ela, desde o momento em
que a conheci deixou claro que não é uma das maiores fãs de bares e ficou ainda
mais claro quando a convidei para vim. A hesitação de aceitar ficou evidente nos
seus olhos e afeições. Então, vou fazer o possível para que se sinta um pouco
mais confortável com o ambiente.
—O que vai querer? —Pergunto assim que nos aproximamos do balcão

—Uma lata de refrigerante. —Responde simplista.

—Não vai beber?

—Não gosto de beber e pode ter certeza que uma lata de refrigerante é o
suficiente pra me deixar animada. —Assinto.
Chamo o barman, peço uma lata de refrigerante para ela e uma cerveja pra mim.
Essa noite isso vai ser o máximo que vou me permitir beber.
Ela dá um gole segundos depois de chegar as suas mãos. Penso no que disse em
relação a ficar animada com refrigerante. O que será que quis dizer exatamente?

….🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
Agora, eu sei o que exatamente ela quis dizer.

Duas latas de refrigerante depois, Hawkins está dançando com Nick na pequena
pista de dança. Isso mesmo, ela não colocou um pingo de álcool na boca e ainda
sim, está parecendo uma bêbada sorridente.
Todos os caras do time pararam para acompanhar o show, assim como algumas
pessoas do bar.

Pego-me sorrindo feito um palhaço enquanto olho para o seu sorriso de diversão
enorme durante a dança. Não há indícios de que vai agir igual uma bêbada louca e
tirar a roupa, pode estar alegre mais do que o normal para alguém que apenas
tomou refrigerante a base de açúcar, mas está mais do que sóbria.

Ela movimenta o corpo, rindo animada, as bochechas coradas e os olhos


iluminados. Ela é tão linda que puta que pariu, chega a doer. Ela é tão... linda.
Tão…apaixonante.

Quero muito seu beijo. Sentir seus lábios, seu gosto, seu corpo entregue a mim.
Às vezes eu acho que quero isso mais do que um dia quis qualquer coisa.
Parte de mim sabe que estou começando a me apaixonar por ela, a desejá-la mais
do que jamais desejei alguém até hoje. Mas quero acreditar que isso não vai durar
por muito tempo, afinal, não é isso que é uma paixão? Um fogo que se apaga?

No término da música, um dos caras no bar se aproxima e fala com Hawkins.


Parece estar tentando chamá-la pra dançar com ele também, não há dúvidas no
desconforto nos seus olhos. Ele está perto demais enquanto usa da sua lábia, seu
corpo paralisa. A sorte é que Nick está por perto, passa o braço ao redor do seu
pescoço e a tira de lá, abrindo caminho entre a multidão até chegar à mesa que
estamos.
Isso Nick, a tire do meio dos lobos e a traga para o lugar seguro.

Ela se espreme se sentando ao meu lado.


—Isso é muito divertido! Vamos fazer isso mais vezes! —Diz animada e sorridente.

A pessoa que visse Hawkins agora, nunca imaginaria que chegou a hesitar antes
de decidir vim. Antes, ela jamais aceitaria estar aqui rodeada de homens com o
dobro do seu tamanho, sequer conseguia ficar perto de um.

Amo ver que conseguiu, que está feliz e finalmente se divertindo.

MAYA
Não sei porque hesitei em vim, fazia muito tempo que não me divertia tanto assim.
Porém, ainda mais feliz e realizada por não sentir desconforto em estar rodeada de
homens e pessoas sufocando.
Nesse instante, estou espremida ao lado de Liam no banco da mesa envolvida em
um debate com Luke e Peter sobre, entre tudo, pais liberais e pais conservadores.
Na opinião de Peter, nenhum dos dois são bons, mas que deve haver um
equilíbrio, e concordo totalmente. Liam e Luke não, acham que pais conservadores
são caretas e liberal é melhor, desde que eles estejam a par do que acontece.

Estamos a vinte minutos trocando nossas opiniões. Tenho que admitir que não
esperava que jogadores de hóquei tivessem opiniões perspicazes sobre assuntos
não referentes ao esporte. Estava completamente errada.
—Tem que existir um equilíbrio entre os dois. —Insisti Peter. —Se for conservador,
irão fazer tudo escondido, mas existi partes conservadoras que são boas e úteis. E
liberal vão ter liberdade demais para poderem sair por aí e fazer merda.

—Concordo com tudo. —Declaro ao sentir o açúcar no meu sangue diminuir.

—Por isso, estaria a par de tudo para que não venham a fazer merda. Não tem
nada que me faça ter opiniões conservadoras. Eles têm que viver e fazer loucuras.
—Contrapõe Luke.

—Isso, a vida é uma só. Se tornar amigo do seu filho é a melhor opção. —Afirma
Liam.

—Cansei. —Anúncio. Minha bateria social está entrando na reserva.

—Que bom, já estava querendo procurar o botão de desligar. —Brinca.

—Babaca! —Sorrio ao dizer.

—Meu Deus! Alguém tem que parar aquela senhora de colocar essas músicas.
—Declara Luke.

Olhamos na direção da culpada de vestido colorido e sem se importar com a


opinião alheia. Tem mais de trinta minutos que a senhora correu para o jukebox e
digitou uma lista de Elvis Presley que só consiste em, Elvis Presley. Finalmente a
música acaba e é substituída por “Dream a little dream of me”.É só ouvir os
acordes de abertura que sinto uma nostalgia me atingir. Essa música nunca vai
deixar de ser incrível.

—Dança comigo? —Peço voltando o rosto para o seu para que eu consiga o olhar
nos olhos.

—Não sei dançar. —Murmura.

—Vamos Liam, por favor. É a nossa música. —Argumento choramingando.

—Não sabia que tínhamos uma música.

Viro meu corpo de frente para ele fazendo com que nossos joelhos fiquem
encostados um no outro, o que impede uma aproximação maior. Ele segura ambas
as pernas com uma única mão, colocando-as por cima das suas e aproveitando
para me puxar para mais perto. Nossos corpos ficam grudados, meu peito
facilmente podendo causar atrito contra o seu, os nossos rostos a meros
centímetros de distância.

—Acho que não vai ser mais nossa, já que você não quer dançar comigo.
—Resmungo erguendo a cabeça em sua direção e cruzando os braços em
protesto.

Encaro os dois a nossa frente considerando a possibilidade de pedir para um


deles, mas percebo que iniciaram uma conversa sobre hóquei. Antes mesmo de
pensar nisso, meu rosto é virado de volta em sua direção encontrando seu olhar
duro e escuro.

—Não tem o direito de usar nossa música com outra pessoa. Ela é apenas nossa.
—Quero retrucar que a poucos segundos atrás não sabia que tínhamos uma
música, mas opto por colocar mais lenha na fogueira. Não vou deixar que saia por
cima.

—Então, dance comigo. —Sussurro sentindo sua mão manter meu rosto firme de
frente para o seu de uma forma possessiva.

—Não sei dançar. Podemos fazer outra coisa ao invés disso. —Sugere, sua voz é
rouca. Maliciosa.

Ele consegue de alguma maneira aproximar ainda mais os nossos rostos. Seu
nariz toca de relance o meu, sua respiração quente assoprando os meus lábios
que agora formigam. Encaro sua boca por alguns segundos antes de subir os
meus olhos e encontrar o seus famintos. Escuros como a noite.

—Fez tudo isso para me beijar no meio de um bar? —Provoco.

—Tem razão, não vou fazer isso aqui. —Sua outra mão pousa no meu joelho,
subindo e acariciando a minha coxa. —Não quero pessoas assistindo quando eu
for te ensinar a como beijar.

—Vai.. me.. en-sinar? —Droga, não gagueje!


—Vou. —Sussurra com a voz arrastada. Arrastada demais. Sua mão segura o meu
queixo enquanto toca os meus lábios com o seu dedo de relance. —Ainda quer
dançar nossa música? —Ele diz, seu olhar deixando minha boca para fitar os meus
olhos.

—Quero. Quero dançar nossa música. —Falo, fazendo um esforço para a minha
voz não fraquejar.

—Então vamos embora. —Ordena, ainda com a voz rouca e arrastada. Ainda
sussurrando. Ainda tocando os meus lábios com o seu dedo.
Pera…vamos embora? Que sentido isso faz?

Estou formigando. Tudo está formigando.


Meu corpo queima assim como eu sei que meus olhos estão. Assim como os seus
está. Cada toque, cada olhar, cada aproximação é uma chama que se acende. O
calor está insuportável. O calor entre nós é insuportável. E o que eu quero é que
me mostre como apagá-lo.

—Como assim vamos embora?


—Quero dançar com você, mas não aqui. Quero fazer tantas coisas com essa
música com você, que depois nunca mais você vai conseguir ouvi-la sem lembrar
de mim. De nós. Mas não quero fazer isso no meio de pessoas. Quero que apenas
eu e você saiba o porquê de ser a nossa música. E quero começar por agora.

Nós levantamos e nos despedimos dos meninos, vou até Riley que chamou seu
namorado junto com seu grupo de amigos para vim também, falo que vou para
casa e ela avisa que hoje deve dormi na casa do namorado. Os dois são muito
fofos juntos, do jeito deles, são as únicas pessoas de perto que me fazem perceber
que qualquer pessoa pode fazer um relacionamento dar certo.

Entro no apartamento minutos depois com Liam que me trouxe de carro.


Assim que acendo as luzes, ele me puxa pela cintura aproximando nossos corpos
e jogo os meus braços em volta do seu pescoço. Ele me olha, como se quisesse
memorizar cada traço do meu rosto. O jeito que me olha...parece que sou o ser
mais bonito que seus olhos já viram, eu me sinto assim.

—Obrigado pela noite. —Agradeço com franqueza.


—Ainda não terminamos a noite. —Encosta nossas testas uma na outra, as
respirações se misturando.

—Esqueceu que você não sabe dançar?

—Por você eu sei. —Beija os nossos narizes carinhosamente. —Desculpe por não
ser em um lugar melhor. —Lamenta.

—Não importa o lugar. O que importa é o que vamos fazer. —Digo. — Você está
me devendo uma dança.

—E um por que. —Completa.

Ele me solta para pegar o celular e segundos depois o som de “Dream a little
dream of me” alcança os nossos ouvidos.
Sua mão esquerda envolve minha cintura enquanto me puxa para perto, sem colar
o corpo ou tentar se esfregar em mim. Estende a sua outra mão e eu a seguro,
descansando a que está livre no seu ombro. Ele nos guia em meio ao ritmo da
dança.

Durante a dança, não consigo segurar o sorriso que se força a aparecer. Estou
sentindo como se estivesse em um filme de sessão da tarde.
Por fim, deixo a cabeça tombar, encostando em seu ombro, ele abaixa a sua e
apoia delicadamente na minha. A cada respiração quente, sinto um arrepio
percorrer por minha coluna. Inspiro seu perfume, enchendo os meus pulmões.
O calor do seu corpo junto ao meu me faz ter a sensação de que vou entrar em
combustão. Eu poderia dizer que sinto minha respiração acelerar, mas eu não
sinto, porque tudo o que sinto quando estou com Liam é paz. Felicidade e leveza.
Nada de complicações, tudo se torna simples e fácil quando estou com ele. Isso é
uma das coisas que eu mais gosto.
Quando a música termina, nós não nos afastamos. Como se o fizéssemos, iríamos
quebrar.
Volto meu olhar para ele após minutos se passarem. Ele me olha como se eu fosse
a pessoa mais linda que já existiu, e como todas as vezes como essa, eu
realmente me sinto assim.
Segundos se passam sem que falemos nada. Não precisamos, estamos dizendo
sem usar palavras.

—Vou te beijar, okay? —Antecipa. Eu assinto.


Ele me beija. Não há hesitações, apenas certezas e desejo.
Nossos lábios se tocam e ondas pulsantes de calor se espalham dentro de mim,
meu corpo inteiro formiga.
Por alguns instantes me assusto com todas as sensações que estou sentindo, mas
nem por um segundo sequer penso em parar.

Seus lábios são macios e com um encaixe perfeito com os meus. Sua língua pede
permissão para abrir caminho e permito. Quando nossas línguas se envolvem, ele
deixa escapar um ruído grave e rouco. Liam enfia os dedos no meu cabelo
enquanto acaricio sua bochecha. O prazer em meu corpo se intensifica e um
gemido me escapa.
Ele é viciante. A boca de Liam se move sobre a minha com uma habilidade que
acabam com o fôlego dos meus pulmões.

—Boa noite, Maya Hawkins. —Sussurra ao separar nossos lábios e encostar sua
testa na minha.

—Boa noite, Liam Brown.

Capítulo 31

LIAM
Faz exatas doze horas desde que meus lábios tocaram os de Hawkins.

Malditas doze horas que não consigo esquecer o seu beijo, ou melhor, que estou
implorando por mais. Uma única vez não foi o suficiente, e não sei quantas vão ser
necessárias. Preciso de mais.
Segundos se passaram entre o término do beijo e eu passar pela porta do seu
apartamento indo embora. Não sei como foi pra ela, mas para mim, foi como se
tudo parasse e só existisse nós dois. Como se os nossos mundos se colidirem
virando uma explosão perfeita. Ardendo juntos em chamas.

Nenhuma sensação vai ser igual àquela.

A sua boca se encaixava perfeitamente com a minha, sendo feita sob medida para
isso. Para mim. Se aquele foi o seu primeiro beijo, estou ansioso para ver os
próximos. Apenas eu vou poder ter esse privilégio.
Antes, eu já ficava louco só de fantasiar sentir seus lábios nos meus e em toca-la,
agora que sei, não vou ter paz.
Você beija alguém porque é prazeroso, é bom. Mas quando você beija alguém que
gosta, ou está apaixonado…você beija porque precisa daquilo. E agora, eu
preciso.

Por isso, nesse momento, estou rodando o campus a procura de Hawkins. Mandei
mensagens para seu celular, porém nenhuma foi respondida. Desde o minuto que
acabou a minha aula, estou andando pelo campus com os olhos como águia atrás
de seu corpo minúsculo e cheio de curvas. E não vou deixar que suma, se precisar,
vou cobrar um beijo por cada surpresa que fiz.

Estou andando pelo corredor com o intuito de entrar na biblioteca, a minha última
esperança de achá-la, senão vou ter que ir até a sua casa ou atrás de Riley, no
instante que sou abordado por uma pessoa que não queria ver. Tudo estava bom
demais para ser verdade. Olívia com seus longos cabelos ruivos e olhos verdes
abre um sorriso em minha direção.

—Estava começando a sentir saudades. —Estende o braço acariciando o meu


com um daqueles seus sorrisos estampado no seu rosto que diz “estou tentando
extremamente chamar a sua atenção”.

—Esses últimos dias foram corridos, estou focado na temporada de hóquei.


—Invento qualquer desculpa para acabar logo com isso, mas que não deixa de ser
verdade.

A partir de agora, os jogos irão ser uma loucura com toda a certeza. Apesar de
estar feliz por termos chegado às semifinais, não deixo de estar nervoso pelos
próximos.
Chegarmos até aqui, fazermos tudo isso, e não ganhar? Uma puta merda, e vou
fazer de tudo para isso não acontecer. Mesmo que seja na força do ódio, nós
vamos ganhar.

—Pode passar na fraternidade para se distrair. As festas não são as mesmas sem
você e o time. —Caramba garota, será que você é sonsa? Faz tempo que mostro
que não estou mais a fim, e na fase que estou com Hawkins que não vou querer
mesmo.

—Não estou no clima para festas, estou concentrado em outras coisas mais
importantes. —Forço um sorriso, com suas mãos ainda acariciando meu braço.
Fazendo questão de me tocar o máximo possível, ou melhor, de se jogar para cima
de mim. Tento manter certa distância durante essa conversa.

—Certo. Sempre que quiser ajuda pra relaxar um pouco, eu estou livre.
—Blá-blá-blá, o mesmo de sempre.

—Obrigado, mas acho que não vai ser necessário. Foi bom te ver mesmo assim.
— Com o sorriso forçado no rosto, sou direto com minhas pretenções. Ela abre a
boca meio em choque com a resposta e por ter sido rejeitada. Os olhos cheios de
incredulidade.
Veja pelo lado bom, agora ela pode conhecer pessoas novas.

A deixo sozinha no corredor, caminhando determinado em passar pela porta da


biblioteca. Avisto a pessoa que estou procurando, dando fim a minha busca.
Está sentada em uma das mesas com um copo de café, um livro e um computador
bem em sua frente onde digita com a expressão concentrada.
Linda pra caralho.

Maya Hawkins é tão…extraordinária.

Às vezes me pergunto como alguém como ela realmente pode existir. Ela não
precisa de nada além do que ela mesma para ser surpreendente.

Vou ao seu alcance que não percebe minha presença até eu puxar uma cadeira da
mesa ao seu lado e sentar.
—Eu te mandei mensagem. —Informo. Ela desvia sua atenção do aparelho a sua
frente para me encarar e pegar o celular, que vejo agora estar em cima da mesa
também. Ela o olha, verificando o que eu disse e o abaixando segundos depois.
Leva as mãos ao rosto o tampando, suspirando contra as próprias mãos,
aparentemente cansada, ela diz em seguida:

—Desculpa. Estou aqui desde o fim da aula, tenho que entregar o trabalho daqui a
alguns dias.

—Falta muito? —Pergunto voltando minha atenção para o computador na mesa.

—Não, só vai levar mais algum tempo. —Responde voltando seu olhar para onde o
meu está por alguns segundos, voltando-os para mim depois. —O que queria?

Uma das minhas mãos alcança seu queixo, erguendo-o para mim. Aproximo meu
rosto do seu, centímetros separando nossos lábios um do outro.

—Um beijo.

—E desde quando eu quero um beijo seu? —Seus olhos me desafiam. Um indício


de sorriso arrogante e provocador surgindo em sua afeição.

—Desde o momento em que você gemeu durante o nosso primeiro beijo. —Abro o
meu sorriso de lado que faz com que ela queira o arrancar do meu rosto todas as
vezes.

—Achei que sua missão tivesse sido cumprida.

—O negócio é, isso não é uma missão. Um beijo não vai ser o suficiente pra mim.
E acredito que pra você também não, estou errado? —Desço meus olhos para
seus lábios.
—Não. —Admite.

—Sei que não. —Meu sorriso se amplia.

Seus olhos não desviam dos meus, nem sequer piscam. Ela engole em seco, se
recompondo. Ajeita a postura na cadeira, soltando seu queixo da minha mão.
Observa as pessoas ao redor, vendo se alguém percebeu nossa pequena
interação antes de dizer:
—Regras. —Assinto, me recomponho com os ouvidos atentos a tudo o que vai
falar.

—Nada de beijo pelos corredores da faculdade, não quero ser morta indo para
aula, e nada de me atrapalhar enquanto estiver ocupada.

—Como você quiser. Isso quer dizer que vou ganhar outro beijo? —Seu estômago
ronca antes mesmo de qualquer ação que eu possa ter. Nós dois rimos.

—Melhor eu almoçar antes.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
Quinze minutos depois estamos entrando na minha casa. Decidimos por eu fazer o
almoço ao invés de comer em algum lugar no campus ou na rua. Bom que se eu
quiser beijar Hawkins não vou ter problema em ser impedido.
Não tenho tempo nem para pensar nisso, porque quando fecho a porta Nick
aparece na sala.

—Nick! —Exclama ela sorrindo e se aproximando dele. Ele aperta sua bochecha
até que forme um biquinho engraçado em seus lábios, abrindo espaço para suas
risadas. Automaticamente ela bate em sua mão se soltando e fechando a cara,
mas dá para perceber que não está realmente brava.

—E aí, tampinha?! —Desde quando começaram com os apelidos? —Comprei uma


torre diferente, chegou a alguns dias. O que acha?

—É colorida? —Pergunta.

—Sim, como o arco íris.

Eles seguem até a sala, esquecendo totalmente da minha existência. Quando me


dou conta, ambos já estão sentados no chão com diversas peças espalhadas pela
mesa de centro na sala entrosados em uma conversa divertida. Fácil assim, eu
perco a minha garota para o meu melhor amigo.
Opto por ignorar os últimos acontecimentos e fingir que foi um surto da minha
cabeça. Me direciono para a cozinha, decidindo o que cozinhar hoje para o almoço
dos caras e para Hawkins. Estou tentando ao máximo fazer os caras seguirem à
risca a dieta que a nutricionista do time passou. É um saco as vezes, mas estou
me saindo bem por enquanto.

Abro os armários fazendo uma nota mental de ir no mercado depois, as coisas


estão começando a faltar. Tudo aqui nós dividimos, aluguel, compras, luz e água. É
meio difícil pensar que quatro idiotas morando juntos conseguem sobreviver e
pagar tudo sem enrolação, mas por incrível que pareça, dá certo. As vezes até
escolhemos por pagar alguém para limpar. O difícil é não destruirmos a casa.

Somos meio doidos algumas horas e parece que vamos colocar casa a baixo, mas
nunca aconteceu e ela continua intacta, então, acho que está tranquilo. Os
vizinhos nunca reclamaram também. Compreendem que somos universitários e
que tenham que ser compreensíveis algumas horas, mas, nunca também
chegamos a exagerar.

Começo a cozinhar enquanto observo os dois montarem a torre. Especificamente


Maya. Eu já disse que ela é linda pra caralho? Nossa, tenho que colocar isso no
bilhete de hoje. Mesmo que coloque isso, ou algo do gênero, todas às vezes,
foda-se, não consigo para de dizer. Por mim, diria isso para ela a cada cinco
minutos.
Meia hora depois, parecendo que estava esperando a sua deixa, ela vem até mim
na cozinha, largando Nick na sala. Chega perto da panela no fogão, fechando os
olhos e aspirando o cheiro.

—Eu estou morrendo de fome! —Resmunga. Sua falta de paciência misturado com
irritação transparecem em sua afeição. —Está quase pronto?

—Mais dez minutos. —Falo. Ela bufa forte, tomba a cabeça para trás ao ver que é
muito tempo para sua fome esperar. Resolve, então, sentar na bancada.

—Fico inquieta com fome! Preciso comer alguma coisa. —Cruza os braços na
altura do peito. Linda demais nessa pose.

—Quer uma colher para experimentar? —Seu rosto se ilumina com a proposta.
Pego uma colher enfiando dentro na panela, retirando um pouco do conteúdo.
Assopro antes de levar a colher a sua boca. Ela geme enquanto mastiga com os
olhos fechados, enviando o som até meu amigo lá embaixo que fica excitado
instantaneamente. Porra! Esse é o resultado de muitas semanas sem transar.

—Bom? —Abre os olhos e balança a cabeça várias vezes.

—Muito bom!

—Então diz: “o Liam é o melhor cozinheiro do mundo e eu amo a sua comida”. —


Ela gargalha. O som mais gostoso de se ouvir.

—Idiota! —Murmura sorrindo.

—O idiota que você quer beijar. —Provoco, me aproximando do seu corpo sentado
na bancada. Revira os olhos.

—Posso ter mudado de ideia. —Abre as pernas para me acomodar entre elas.
Ficando ainda mais próximo.

—Impossível!

—Como pode ter tanta certeza? Nem sabe se gostei do beijo. —Seus olhos
brilham de provocação.

—Se não tivesse gostado, não estaria olhando para mim dessa forma. —Sorrio
com toda a arrogância que posso.
Ela cora. Seus olhos descem até meus lábios assim como os meus até os seus.
Tão rosados. Tão brilhantes. Tão perfeitos. Tão…meus.

—E você? Gostou do beijo? —Pergunta. Corto atenção dos seus lábios por alguns
segundos, voltando-os para os seus lindos olhos mel que agora transparecem
insegurança e desejo.

—Nota oito. Para o primeiro, foi perfeito. Só precisa de um pouco mais de prática.
—Respondo.

Enrosco uma das mãos nos fios do seu cabelo e a puxo para um beijo. Mantenho a
outra mão em sua coxa grossa. Seus lábios macios me recebem e segundos
depois me dão permissão para deslizar minha língua para dentro da sua boca.
Ondas de calor e adrenalina percorrem minhas veias.
Entrelaça suas pernas nas minhas costas e leva suas mãos pequenas ao meu
cabelo, o apertando e puxando, o que me faz soltar um gemido gutural.
Puta merda, quero muito essa mulher.

—Nota?

—Esse foi um nove, está ficando melhor. Um pouco mais de prática e vai ser um
dez. —Ela ri. —Preciso de mais para avaliar. —Declaro.

—Não vai esquecer a comida? —Esfrega o seu nariz no meu. Viro o rosto
verificando a comida e vejo que ainda dá tempo.

—Não. —Volto os meus olhos para ela novamente.

—Cuidado, Brown. Eu ainda estou com fome, e vou ficar muito brava se queimar a
comida. —Ameaça.

Não respondo. Desenrosco minha mão do seu cabelo, segurando seu pescoço de
leve e o trazendo para mais um beijo. Nossos lábios se tocam mais uma vez,
segundos antes de nossas línguas entrarem em um embate. Queimando juntas.
Maya chupa e morde meu lábio, disparando ondas de desejo para os países
baixos. Meu senhor. Engulo um gemido.
Sinto falta do sexo, por mais que ainda bata umas de vez em quando, não é a
mesma coisa. Mas sei que tenho que ir com calma, ela nunca fez isso, então,
quero fazer tudo direito e no seu tempo.

Tento me controlar ao máximo, desacelerando o meu ritmo. Aperto sua coxa com a
outra mão e deslizo a outra até sua nuca, distribuindo beijos molhados pelo seu
pescoço, ganhando fôlego. Ela arfa baixinho.

Um cheiro começa a subir na cozinha.

—Liam, a comida! —Berra em aviso.

Paro correndo para desligar o fogo. Verifico se está tudo certo e suspiro aliviado
com o susto, percebendo que não há nada queimado. Caminho até ela,
encaixando entre suas pernas de novo. Abraço sua cintura e encosto minha testa
no seu ombro enquanto ela desata a rir.
—Muito engraçado. —Ironizo, o som saindo abafado.

Segura minha cabeça com as mãos, a erguendo e forçando a encarar.

—Isso é culpa sua! —Acuso.

—Minha? Você que pediu para me beijar! —Devolve entre risadas.

—Acho que alguém nem está com fome mais. —Provoco começando a rir junto.

—Não começa. Eu ainda quero comer. —Encosta sua testa na minha, sorrindo.

—Eu também quero comer! —Dylan fala entrando na cozinha, xereteando para ver
o que tem.

—Quero comer, casal feliz. —Fala Luke logo vindo atrás.

—Acabou a agarração na cozinha? —Nick pergunta, sendo o último a entrar.

Maya esconde o rosto no meu pescoço com vergonha. Apenas mostro o dedo do
meio para os idiotas que ri.
Capítulo 32

MAYA
—Parada aí, mocinha! —Exclama uma voz, assim que passo pela porta do meu
quarto, apressada em direção a saída do apartamento.

Dou meia-volta, me deparando perplexa com Riley sentada nas banquetas na ilha
da cozinha e com uma folha em mãos. Na pressa, não tinha percebido sua
presença.
O que diabos de dobradura está fazendo agora? Suspeito ser uma rosa, mas que
rosa mais feia. Definitivamente não é um dos melhores que já fez. Nossa, seria
muito legal se conseguisse fazer aqueles cisnes, o que me lembra que preciso
pedir para que faça marcadores de coração pra mim.

—Onde você estava? —Tira da minha viagem em pensamentos.

—O que está fazendo em casa? —Surpresa, respondo com outra pergunta.


—Pensei que tivesse karatê hoje.

—Foi cancelado. Justo no dia que queria bater naquela garota. —Sua expressão
se fecha com olhos irritados ao se lembrar de quem fala.

—Que garota? —Enrugo a testa, não acompanhando o que está dizendo.

—Aquela filha de uma égua que eu te contei que mexeu na minha bolsa escondido
no meio do treino. Certeza que foi ela que roubou meus dois dólares. E além do
mais, se faz de santa pra cima do meu namorado quando vai me buscar no treino.
—A cada palavra que fala sua voz se eleva um pouco. O ódio transparente na voz.
Assinto durante todo o seu desabafo.

—Não pode falar assim da sua best, Riley! —Brinco rindo da sua cara.
—Jesus me defenda. Eu quero é socar aquela praga.

—E você ainda falava que ela era a sua amiga. Ainda bem que arrependimento
não mata, caso contrário, eu estaria nesse momento indo para o seu velório.

—Ei, pode ir parando! Não tente me enrolar. —Aponta o dedo para mim.

—Quem mudou de assunto foi você. —Me defendo.

—Não importa. —Contrapõem.

—De qualquer forma, tenho que ir. Passei apenas para deixar as minhas coisas da
faculdade antes de ir para o trabalho.

—De jeito nenhum! Pode sentar sua bunda aqui, precisamos ter uma conversa.
—Abaixa o dedo, indicando com a cabeça a banqueta em sua frente.

—Mas não posso me atrasar. —Informo.

—Vou ser rápida. —Indaga ela.

Com um suspiro, ando até o lugar e me sento.


—Tudo bem. O que é? Temos dez minutos.

—Quer rapidez? Certo. Que tal assim: o que, nesse universo, está acontecendo
entre você e Liam?

Meus olhos se fecham. Merda. Eu fui pega de supetão. Quer dizer, ontem eu
mandei uma mensagem para ela dizendo “Na casa de Liam. Vou chegar tarde”.
Não imaginei que fosse dar atenção, Riley passa parte do tempo na sua bolha de
namorado, karatê, faculdade e dobraduras. Fiquei a tarde fora trabalhando e
acabei voltando para a casa de Liam, pensei que não iria se importa muito.

—Não tem nada acontecendo. —Respondo, dando de ombros.

O “nada” na frase se traduz para “Ele me levou pra sua casa e cozinhou pra mim e
ficamos nos pegando na cozinha. Foi muito bom e quero repetir isso mais vezes”.

Riley estreita os olhos através da minha tentativa de mentir.


—Vou perguntar isso mais uma única vez. Maya Brooke Hawkins, você está vendo
o piu-piu do Liam Brown? —Diz da forma mais séria possível.

—Não. —Seguro o riso, tentando manter a expressão neutra.


Riley continua estreitando os olhos. —Vou perguntar mais uma vez. Você está…

—Não estou. —Suspiro. —Mas a gente tá se divertindo.


Seus olhos arregalam. Um segundo se passa, dois, e em seguida seus olhos
acendem vitoriosos.

—Rá! Eu sabia! Segura meu poodle, eu preciso fazer uma comemoração.

—Você não tem um poodle. —Devolvo.

—Não estraga a minha alegria!

—Não precisa disso tudo. Provavelmente vai esfriar logo.

Quando Liam se cansar.


Droga…será que eu vou me cansar? Demorou muito pra chegar ao ponto que
estamos. Então, não tenho dúvidas do que eu quero. Mas eu não sei até quando
isso entre nós vai durar. Sei que não vamos passar disso. Liam não é do tipo que
namora, e não sei se é agora que vai mudar de ideia.
Eu nunca sequer me apaixonei por alguém. Sou igual um fogo de palha, assim que
me dou por mim, tudo apagou. Além de todas as outras questões minhas que
sinto. Acho que vou pirar.

Mas não vou me concentrar nisso agora, vou aproveitar o momento e deixar tudo
acontecer. Me concentrar em todas as coisas que quero tentar com Liam, em como
estar com ele é bom e fácil.

Deixo tudo isso de lado enquanto Riley continua a falar de como isso é incrível.

—Sei que vocês ainda não avançaram, mas pelo o que eu ouço, ele é bom em
tudo o que faz, então, por favor, diz que está sendo bom! E que você quer mais.

É bom. Muito bom.

—Não decidi se vou avançar com ele. —Anúncio.


—Por que não?

—Por que…não pensei nisso ainda. Quero que seja com alguém que eu goste de
verdade. E não fizemos nada nesse nível.

—Sei que é importante pra você. Então, se decidir que vai ser com ele, quero que
me conte. Somos melhores amigas, é meu dever te ajudar e estar ao seu lado. —
Meu rosto esquenta.

—Eu te amo, mas não quero ajuda. —Ela faz beicinho.

—Chata! Não pode falar depois que não sou uma boa amiga, você que não ajuda.
—Revirando os olhos me levanto.

—Estamos conversadas? Porque vou me atrasar. —Ando em direção a porta.

—Só mais uma coisa. —Impede. —Você vai saber, e pode ter certeza que vai estar
ferrada depois.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
Eu estou no meu pesadelo.
Há crianças por todos os lados. Correndo, brincando e se pendurando nos
brinquedos. Eu que vou enlouquecer.
Respiro fundo e presto atenção para que nenhuma criança caia e quebre o
pescoço. Grito uns dez nomes diferentes pedindo aos céus para que eles me
obedeçam.

Com certeza a hora do intervalo não é uma das minhas preferidas, mas é um dos
momentos que mais exerço o meu trabalho. Sou inspetora, meu trabalho é fazer
com que eles fiquem vivos até o término da aula e que não destruam a escola.
Não lido muito bem com crianças, porém, isso tudo mudou quando me vi aceitando
esse emprego. Não tinha outra escolha, eu precisava de grana pra pagar as
contas. Hoje eu amo meu trabalho e essas crianças. Elas alegram meus dias
tristes e nublados com suas brincadeiras e sorrisos.

Em dois minutos sou puxada por três pequenos seres humanos sorridentes para
pular amarelinha. O que eles acabam se cansando rápido e fazendo que mudemos
de brincadeira. Rodamos, ensino brincadeiras do meu tempo e empurro eles no
balanço.
Em momentos assim que a criança dentro de mim desperta e ela finalmente pode
viver a infância que ela não viveu. Não aproveitar a infância como deveria, é uma
das maiores tristezas que alguém pode ter. Não aconselho a ninguém. A infância é
um período da vida onde ela tem que ser aproveitada com memórias coloridas
únicas cheias de alegria e histórias engraçadas para nos lembrar quando estiver
com os nossos filhos e netos.

Quando chega o horário do lanche, confiro se todos estão bem e sem


machucados, tendo a certeza que todos entrem para o refeitório.
Observo todas sentadas comendo nas enormes mesas brancas do refeitório,
curiosamente, avisto Mia sentada sozinha comendo uma banana. Nesse horário eu
normalmente aproveito para comer em algum lugar calmo, mas decido me
aproximar e me sentar junto com ela.

—Posso me sentar? —Pergunto vendo seus olhinhos castanhos brilhantes me


olharem. Ela balança freneticamente pra cima e para baixo sinalizando que sim.
Passo minhas pernas por cima do banco os deixando por de baixo da mesa.

—Por que está sentada sozinha? —Faço outra pergunta enquanto a observo
morder e em seguida mastigar um pedaço da banana.
Seu rostinho está sem brilho e triste. Seus olhos, agora distantes, olham para
frente demonstrando o quanto sua mente está longe e vaga por aí em
pensamentos.

—Minha amiga faltou hoje. —Responde sua voz baixa e rouca.

—E o resto da sua turma? —Da mais uma mordida em sua banana, mastigando.
Volta seus olhinhos para mim ao dar de ombros.

—Ninguém gosta de mim.

Meu coração da uma pequena apertada diante da confissão. O que posso


responder? Por mais que tenha aprendido a amar e lidar com crianças, ainda não
sei como reagir nessas situações.

—Não fale isso, Mia. É por isso que está triste? —Opto por tentar entender tudo
antes que possa dizer qualquer coisa.
Detesto ver Mia desse jeito. Sem seu falatório, sorrisos e brincadeiras tirando meu
sarro. É como se ela não fosse ela. O mundo estivesse sem cor. E me aperta o
coração vê-la assim. Eu poderia fazer qualquer coisa para poder ver um dos seus
sorrisos e fazer essa tristeza ir embora.

—Não. —Fala me surpreendendo, ela continua. — A professora me chamou de


boca de sacola hoje.
Tento manter minha expressão neutra, afinal, estou no meu ambiente de trabalho.
Isso ainda não me impede de sentir um pouco de raiva. Sei que Mia fala demais as
vezes, mas é uma criança! Tem apenas cinco anos. Não é como se quisesse fazer
qualquer coisa por mal, não precisa virar e chamar uma criança assim na cara
dela. Existe outras formas de chamar a atenção.

—E por que ela falaria algo assim? —Busco entender exatamente o que
aconteceu. Conheço bem como Mia é, não posso tirar minhas próprias conclusões,
tenho que ver os dois lados da moeda. Apesar de, como disse, achar isso
desnecessário.

—Ela fez uma pergunta para uma menina sentada ao meu lado na sala. Mas ela
não sabia responder, e como antes ela tinha me ajudado, eu tentei ajudar também.
Acho que a professora não gostou e me chamou de boca de sacola. —Conta.

Quando termina, volta a comer calmamente sua fruta que está na metade. Penso
enquanto a vejo terminar de mastigar o último pedaço que mordeu.

Acredito que nem sempre você vai se dar bem com todas as crianças da turma em
que é professora, tudo bem com isso. O problema é falar coisas que não precisam
ser faladas. São apenas crianças que ainda irão crescer e aprender. No minuto em
que decide que quer seguir essa profissão, precisa amá-la. Em muitos lugares não
é uma profissão valorizada, o que eu acho muito que deveria ser, por isso precisa
amar e saber que não vai ser fácil.

Hoje, muitas meninas fazem porque é uma boa chance de começar a trabalhar e
ganhar um dinheiro. O que é o caso de uma das professoras de Mia. Ela é nova,
assim como eu, mas eu esperava que tivesse um pouco de paciência que é o
mínimo.
Respiro fundo antes de responder qualquer coisa. Ela segura sua cabeça com uma
das mãos que o braço está apoiado em cima da mesa enquanto a outra segura a
banana.

—Bom…acho que ela está errada. —Começo, despertando interesse da pequena


a minha frente que me olha com seus olhos que acendem.

—Sério?

—Sim. Você tentou ajudar a menina, e tudo bem. Você não é nenhuma boca de
sacola por isso. —Sou sincera com as minhas palavras. Um sorriso de orelha a
orelha surge no seu rosto.
Gosto como ela conversa igual uma pequena adulta. Falo com jeitinho para que
entenda exatamente o que estou dizendo, sem que possa magoá-la, mas de
qualquer jeito, sei que posso ser sincera com as palavras.

—Mas, da próxima vez, deixe que a professora a ajude. É o trabalho dela ajudar
vocês, por mais que tenha sido legal da sua parte e da menina se ajudarem.
Entende? —Continuo.

Ela balança a cabeça mais uma vez, dizendo que sim. Acabamos por entrar em
outro assunto, esquecendo esse.

—Dia de parquinho hoje, o que acha? Ou prefere por jogos de tabuleiro em casa?
—Pergunto divertida. Sua afeição se ilumina como o nascer do sol com a minha
fala. O que uma ida no parque não faz...

—Parquinho! —Responde em menos de cinco segundos. Sorriu com sua


animação presente. —Liam vai ir também?

—Por que? Você quer que ele venha? —Morde o último pedaço da fruta afirmando
com a cabeça para a minha pergunta.

—Quero fazer uma cartinha pra ele. Acha que ele vai gostar? —Fala após alguns
segundos.

—Tenho certeza que sim. Vou começar a ficar com ciúmes desse jeito. —Brinco.
—Não precisa ter ciúmes, Maya. Eu também amo você. —Ela se levanta vindo até
mim, entrelaçando seus braços em volta do meu pescoço resultando em um
reconfortante abraço. Aperto levemente seu pequeno corpo, retribuindo.

—Hora de voltar pra aula, mocinha. —Digo a soltando.


Mia pega a casca da banana em cima da mesa e a joga no lixo antes de ir para a
sala com a professora que aguarda.

Passa uma hora e meia desde o intervalo até esse momento em que estou me
despedindo de cada criança e a entregando para seu responsável.
Quando finalmente há uma pausa, esperando o restante dos pais chegarem, sou
surpreendida com braços enormes que parecem do tamanho das minhas pernas
prenderem minha cintura.
Se eu não tivesse certeza de quem os pertence, eu estaria gritando igual uma
doida pedindo por ajuda. O seu cheiro amadeirado e masculino alcança as minhas
narinas que o aspira profundamente, me acalmando o suficiente para perder todos
os sentidos. Como alguém pode ter o cheiro tão bom? Só de passar o dia inteiro
aspirando o seu cheiro, seria perfeito para mim.

—Estou no meu ambiente de trabalho, Liam. —Digo enquanto sinto sua respiração
na lateral do meu pescoço, o que faz a região ficar extremamente quente.

Minhas costas estão coladas no seu peito que está mais para uma muralha, tento
me soltar do aperto dos seus braços ao redor da minha cintura. A qualquer
momento eu posso ser pega e me fuder.

—Só mais um minuto. Gosto de sentir seu cheiro. —Pede.

—Não! Podemos ser pegos, sabia? E não vai dar bom para o meu lado. —Dou
batidinhas no seu braço pedindo para que solte.

Ele afrouxa os braços, mas não solta, me virando para si. Estamos de frente um
para o outro agora. Quando me olha, tudo o que diz é:

—Linda e mandona, como sempre. —O seu famoso sorriso aparece. De lado.


Provocativo. O que eu amo e odeio ao mesmo tempo. E acho que isso nunca vai
mudar.

Reviro os olhos antes de responder:


—Se comporte! —Aponto o dedo em sua direção.

—Sim senhora, capitã.

Termino o meu trabalho enquanto Liam espera pacientemente em pé na entrada,


como se fosse um tipo de guarda costa. O que não deixa de me fazer rir. Depois
que todas as crianças já foram, tiro meu jaleco de tia oficial, pego minhas coisas e
saio de mãos dadas com Mia ao encontro do senhor guarda costas do lado de
fora.
Assim que o vê, ela pula em seu colo dando o abraço mais apertado que
consegue. Um minuto inteiro se passa e desgruda os braços do seu pescoço e o
entrega uma cartinha.

—Isso é pra mim? —Pergunta sorrindo para a pequena em seu colo. Ela diz que
sim com a cabeça e recebe em agradecimento um beijo em sua bochecha que aos
poucos ganha um tom rosado. —É lindo, pequena! Obrigado.

Na uma hora que fico com Mia depois do horário escolar, passamos no parquinho
como o combinado de hoje. Liam e eu brincamos de pique esconde, pega-pega e
no balanço com ela. No final, quando sua mãe a vem buscar, me encontro cansada
sem querer fazer mais nenhum esforço pelo resto do dia.

—Minha casa? —Pergunta. Viro para ele que está bem atrás de mim.

No segundo que encontro seus olhos, vejo fogo e desejo neles. Minha boca seca
como o deserto do Saara e não consigo responder. Sei que está vendo a mesma
coisa nos meus olhos nesse instante.
Capítulo 33

MAYA

Eu não faço a mínima ideia de como eu cheguei até aqui.

Sei que respirei, levando oxigênio até os meus pulmões como uma pessoa normal,
que observei a paisagem voando pelas janelas e que nós conversamos, só não
consegui registrar nenhum desses acontecimentos.

No instante em que adentramos, escuto o barulho da porta ao ser fechada e não


esperamos. Liam vem pra cima de mim e me beija. Jogo os meus braços ao redor
do seu pescoço arranhando levemente sua nuca com minhas unhas médias e
acariciando os seus curtos fios de cabelo.
Sou levado pela chama que nossas línguas se encontram e agora tudo está em
silêncio. É apenas eu e ele.

Antes que eu possa perceber, o desejo aumenta e o que era calmo está fervoroso.
Um incômodo cresce entre as minhas pernas fazendo minhas coxas se contraírem.
Mordo o seu lábio inferior delicadamente e solta um ruído rouco em seguida. Ele
chupa meus lábios quando sua mão que a segundos atrás estava na minha
cintura, desce para a minha bunda apertando forte.
Agarrando-a, me levanta e entrelaço minhas pernas nas suas costas. Ele começa
a nos mover subindo as escadas para o que imagino ser em direção ao seu quarto.

—Onde estão os meninos? —Questiono. Seu rosto entra na curva do meu pescoço
passando sua língua quente e habilidosa, plantando beijos. Eu arfo em resposta.

—Em seus quartos. —Fala.

Uso esses pequenos segundos para recuperar o fôlego, antes de que eu aperte
mais seus cabelos o afastando do meu pescoço e trazendo de volta para o cento
do meu rosto colidindo nossas bocas novamente, no mesmo segundo minha língua
entra, queimando com a sua uma outra vez.

Percebo que chegamos no quarto quando sinto Liam se sentar na cama macia
comigo em seu colo. Arrasta para mais perto, segurando minha cintura, como se
quisesse fundir meu corpo no seu, solto um gemido, ouvindo ele fazer o mesmo.
O seu cheiro, o seu gosto, o seu toque são o suficiente para me fazer esquecer
qualquer coisa que me assombre. Não importa o que eu esteja sentindo ou
pensando, quando estou com ele, quando o beijo e sinto seu cheiro, tudo evapora.

Meus pensamentos são silenciados, os embates dentro de mim se acalmam e tudo


o que eu sinto é paz. Eu sei, é brega. Mas a cada dia que passo com Liam, ele tem
se tornado cada vez mais o meu pequeno refúgio. Os livros me salvaram e agora
ele é o que tem me mantido a salvo.
Cada mínima coisinha que faça, tem apagado os medos dentro de mim. Não. Tem
me feito supera-los.

Nossas respirações estão pesadas. Morde o meu lábio e, mais uma vez, solto um
gemido com ele me acompanhando. Seus dedos descem até a bainha da minha
blusa e tocam a pele por baixo. São um pouco ásperos, devido aos pequenos
calos que tem, o que só faz o calor e meu incômodo aumentar mais.
Meu Deus! Isso está se tornando insuportável!

Enquanto suas mãos passeiam por minha pele, passo instintivamente uma das
minhas mãos por de baixo da sua camisa, o tocando. Sinto seu abdômen marcado
pelos gominhos e a pele quente sob meus dedos, minha mão explora cada vez
mais, deslizando até o seu peito.
As pontas dos seus dedos passam para a frente, ficando entre nós dois. Sobe aos
poucos até que alcançam meus seios por de baixo do sutiã.

Isso é…bom.

Minha mão acaricia seu corpo, vendo que sua respiração se torna mais afetada.
Seu dedo belisca de leve meu mamilo duro por cima do tecido, o que rende outro
gemido. Sem que eu perceba, esfrego meu corpo no seu colo procurando por alívio
no espaço entre minhas pernas. Seu membro pulsa em resposta de baixo de mim.
No exato momento em que Liam arfa um dos seus gemidos roucos.
Eu entro em desespero.

Eu nunca fiz isso. Ou cheguei perto. Não faço a mínima ideia de como faz e não
tenho certeza se estou preparada para isso. Ou se quero.

Um trilhão de pensamentos invade a minha mente.


Vai ser bom? E se for péssimo em todos os sentidos? E se eu me arrepender?
Todo o desejo e fogo que se alastrava queimando pelo meu corpo é apagado em
segundos. Um estalar de dedos, meu corpo esfria.

—O que foi? —Sua voz sai preocupada.


Suas mãos voltam para a minha cintura e seus castanhos negros intensos
percorrem todo o meu rosto, analisando cada traço até que param nos meus olhos.
Diferente das outras vezes, não deixo passar muito tempo me sentindo possuída
por eles. Porque é isso o que acontece quando olho para eles. Me perco nos seus
olhos e esqueço tudo o que há em volta. Esqueço a razão.
Eu me perco, e é uma das melhores formas de se perder.

Saio do seu colo tão rápido que minha mente nem consegue acompanhar.
Viro de costas e ajeito a blusa de volta para o lugar. Fico de frente para a janela do
seu quarto enquanto observo a paisagem lá fora. Pensando.
Desde o momento que Liam levou a sério aquele desafio idiota, sei o que estou
fazendo. Eu sei. Todos os dias ele me entrega bilhetes e não teve um dia que eu
não sorri com eles.
Não estou fazendo isso por pena ou por gratidão. Estou fazendo porque eu quero.
Tenho certeza. Mas disso que estava prestes a acontecer?! Não. Nenhum pouco.

Isso é novo. Os sentimentos e os desejos são novos. Tudo é.


Eu não cogitei a possibilidade de transar com ele.
Preciso analisar todos os pontos, os prós e contras, decidir o que fazer.
Só preciso pensar.

—Converse comigo, Maya. —Pede.

Fecho os olhos e respiro fundo. Uma. Duas. Três vezes.


Sinto suas mãos grandes e quentes nos meus ombros. De alguma forma, seu
toque me ajuda a organizar meus pensamentos. Viro de frente para ele que está
atrás de mim, ficando de costas para a sua janela e escrivaninha.
Olho em seus olhos de novo. Eles não transmitem confusão, como se estivesse
tentando entender o que houve. Mostram preocupação.

—Eu…não sei…se consigo. Não sei…como fazer isso. —Ele continua me olhando.
Sempre vou afirmar o quanto eu amo a forma como não precisamos usar palavras
para nos comunicar em momentos iguais a esse. Seus olhos me dizem que
entendem.
Como uma confirmação disso, ele fala em seguida:

—Acha melhor pararmos? —Leva uma das suas mãos em minha bochecha
fazendo carinho com o polegar. Confirmo com a cabeça para a sua pergunta.
—Okay. O que acha de traçarmos uma linha? Quando estivermos prestes a
atravessar, você para.

—Tudo bem pra você?

—Vamos fazer tudo no seu ritmo. Não precisa se preocupar comigo, mas se quer
saber, está tudo bem pra mim. —Trás meu rosto para próximo do seu, encostando
nossas testas uma na outra. —O que você quer fazer agora?
… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…

Eu vou perder essa aposta. Que merda!

O Golden State Warriors está perdendo por vinte pontos para os Spurs. A porcaria
dos campeões da NBA estão perdendo!
Certo, todo mundo sabe da zica da temporada seguinte. Nenhuma liga nos últimos
anos ganhou duas vezes seguidas. A questão é: eu vou perder a maldita aposta.

Depois daquele momento com Liam no seu quarto, decidimos descer e assistir ao
jogo de basquete após eu dizer que fazia um tempo que não assistia. A partir
desse momento que as coisas começaram a desandar.
Os meninos se juntaram a nós e, como eu não sei se meu melhor amigo, Nicolas
Watson, é meu fã incubado ou hater declarado, ele está torcendo para o time
adversário do meu. Então, depois de muitas provocações, resolvemos apostar um
prato de brigadeiro. O time de quem está torcendo vencer, ganha o brigadeiro feito
pelo oponente.
Os outros acabaram por participar também. Dylan se juntou a Nick e obriguei Liam
a se juntar a mim. Luke está apenas sentado torcendo para quem ganhar.

Agora todos nós estamos sentados na sala de frente para uma TV torcendo com
os nervos à flor da pele e surtando a cada cesta. Pera. Na verdade, quem está
surtando é somente eu.

—É tão difícil acertar uma cesta? —Grito com a tv. Junto minhas pernas próximas
do meu corpo mordendo minha unha, nervosa com o ataque dos Spurs.

—Seu time vai perder, tampinha. Aceite. —Provoca Nick sentado na poltrona ao
lado do sofá.

—Esse brigadeiro já está no papo. —Dylan entra na brincadeira, batendo sua mão
na de Nick. Ignoro os dois e me concentro em apoiar o meu time.

Não provoque de volta, Maya. Seu momento vai chegar.

Eu sei que posso estar exagerando um pouco, mas quem liga? Eu quero ganhar,
mesmo que o prêmio seja apenas o prazer de vencer. Alimentar meu espírito
competitivo é sempre muito importante. Aliás, estamos falando de um prato de
brigadeiro! Ninguém recusa isso. Se você recusa, você é doido.

O jogo está na metade do terceiro quarto quando Jordan Poole faz uma cesta de
dois pontos infiltrando no garrafão e usando a tabela. Todas as vezes que esse
homem acerta um arremesso eu fico mais apaixonada nele. Toda torcedora é
assim, né?

—É isso caramba! É tão difícil infiltrar no garrafão e fazer uma cesta de dois?
Usem a cabeça! —Berro.

Depois que termino de falar olhando diretamente para a tela na minha frente,
percebo que todos me olham assustados, a não ser Liam.
Talvez eu realmente esteja exagerando um pouco.

—Ela é sempre doida assim? —Dylan pergunta para ele que está ao meu lado no
sofá. O único que está completamente normal diante dos meus gritos.

—Sim.

—Eu estou ouvindo vocês dois. —Rosno.

Volto a me concentrar no jogo que temos que ganhar. Precisamos começar a


vencer os jogos e subir na tabela de classificação. A defesa está péssima e nosso
melhor jogador ficou de fora por um tempo por estar lesionado, mas conseguimos
aguentar a barra. Curry está calando a boca de todo mundo hoje com a sua volta
para as quadras.

Meu coração está preste a sair pela boca. A cada cesta que cai é uma pontada de
esperança de que vamos conseguir virar esse jogo.
Estamos indo já para a metade do quarto período, e os torcedores sabem que é
um dos melhores momentos do Golden State Warriors. Conseguimos evoluir nossa
defesa e duas cestas do adversário não caíram.

Nossa diferença caiu para cinco pontos, precisamos de mais duas cestas de três
para virar. Os Spurs estão atacando mas, acho que o universo resolveu me fazer
feliz hoje porque mais uma vez a bola deles não cai. Como resposta, Jordan lança
a bola e, é cesta. Mais três pontos.
—Que homem gostosooo! —Solto. Sinto um olhar queimar em cima de mim.

—Prefere ele? —Ouço a voz de Liam perguntar. O encaro e vejo que me fuzila
com os olhos.

—Talvez? —Ergo o canto dos meus lábios em um meio sorriso como provocação.
Ele revira os olhos, fechando a cara e cruzando os braços. Igual a uma criança
birrenta quando não ganha doce. Caio na gargalha não me aguentando com a
cena.

—Ela sabe como acabar com o ego de um homem. —Luke murmura.

Paro de rir e levo uma das minhas mãos para o seu queixo, o forçando a virar o
rosto para mim. Aproximo dele até que nossos lábios estejam grudados um no
outro, plantando vários selinhos.

—Pare de ser um chato porque eu preciso torcer para o meu time. —Aviso. Ele
retribui com um sorriso presunçoso de lado.

Viro para a frente atenta aos poucos minutos restantes.


Faltando dois minutos para o término do jogo, a diferença ainda é de dois pontos.
O sentimento se divide entre acreditar até o último segundo e aceitar a derrota,
independente do resultado, tivemos um bom desempenho.
No segundo que penso que não temos mais chances, Curry aparece passando por
Green que faz a parede, impedindo a passagem do adversário, e arremessa a
bola. Cesta.
O tempo está acabando, mas meu time consegue segurar o resultado. Nos últimos
trinta segundos, DiVincenzo um dos reservas, apenas bate a bola dando fim ao
jogo. O Golden State Warriors vence.

—Rá! Que brigadeiro está no papo agora, hein? —Provoco Dylan e Nick que
diferente de antes, agora estão com carrancas no rosto. Levanto chegando perto
deles. —Parece que o gosto da derrota não é muito bom. Que peninha. —Finjo
cara de choro passando a mão em seus cabelos como se fossem cachorrinhos
abandonados.

—Com licença que, agora, eu vou fazer a minha dança da vitória enquanto um dos
dois faz o meu brigadeiro. —Sorrio provocativa, eles reviram os olhos.
Começo a dançar uma coreografia brasileira de uma música do TikTok que vi dias
atrás.

—Tem como você dar um jeito na sua garota? —Nick resmunga.

—Eu não. Você que começou. —Liam responde.

—Que merda! —Murmura.

—Se fuderam. —Zoa Luke.

—Lição do dia, nunca mexa com Maya Hawkins. —Declara Dylan.

—Anotado. —Fala se levantando, andando em direção a cozinha.

Quando finalmente paro de dançar, reparo que Liam está me encarando achando
toda a minha cena divertida.

—Terminou?

—Por enquanto, sim. —Sento ao seu lado no sofá, jogando as minhas pernas por
cimas das suas.

—Folgada. —Resmunga.

—Vocês viram o vídeo do Adam que o Jason enviou no grupo? —Dylan questiona
com o celular nas mãos prendendo a risada.

—Não, por que? —Luke se vira para ele com as sobrancelhas franzidas. Antes que
possa responder, ele desata a rir de forma eufórica.

—Os caras colocaram bombinhas debaixo da tampa da privada. Quando Adam


sentou, as bombas estouraram e ele pensou que fosse um tiroteio dentro da casa.
Saiu correndo do banheiro para se esconder debaixo da cama. —Explica.

Desato a rir acompanhada dos meninos que logo pegam o celular para assistir ao
vídeo.

—Deveríamos fazer algo desse tipo no aniversário do Liam. —Opina Nick da


cozinha.
—Seu aniversário? —Analiso o seu rosto, surpresa com a informação, esperando
por uma resposta.

—É daqui a dez dias. —Luke é quem responde.

A forma como sua expressão muda é quase imperceptível. O sorriso risonho


continua nos seus lábios e as afeições divertidas com o vídeo ainda estão ali, mas
sei que só está apenas mantendo a postura.
Consigo ver o pequeno traço de desconforto nos seus olhos e quero fazer mil
perguntas do porque está reagindo assim.

—Por que não me contou? —Pergunto com o tom surpreso e brincalhão. Se não
quer que percebam, não sou eu que vou estragar isso.

—Não gosto que muitas pessoas saibam.

—Obrigado pela consideração. —Ironizo.

—Desculpa. Só não ligo muito de comemorar meu aniversário. —Ele dá de


ombros. Abro a boca para perguntar o porquê, mas sou impedida por Luke.

—Que cheiro é esse? —Percebo o cheiro ruim vindo da cozinha.

—Acho que queimei o brigadeiro. —A voz grita revelando o motivo. Levanto e vou
até a bancada da cozinha vendo Nick com um sorriso nervoso olhando para a
panela.
Ergue a cabeça, olha nos meus olhos e sussurra um pequeno “desculpe”.

Capítulo 34

MAYA
Música.

Assim que retomo a minha consciência, ainda estou com os olhos fechados e a
mente nebulosa, mas não o suficiente para não escutar a melodia musical que soa
pelos meus ouvidos.
Meus neurônios estão lentos, tentando se conectar para ter a capacidade de
pensar e fazer escolhas. Só que estão funcionando o bastante para reconhecer a
música sendo cantada por uma voz rouca e suave. A voz cantando a letra de
“Dream a little dream of me” me acorda com a maior calmaria que poderia existir.
Graças a Deus por isso, caso contrário, estaria dando um soco em quem foi o
infeliz que me acordou.

—“Stars shining bright above you


Night breezes seem to whisper "I love you"
Birds singing in the sycamore tree. Dream a little dream of me” —Ele canta. Sinto
seus dedos deslizar pelo meu cabelo, acariciando.

Quando a música chega ao fim, abro os meus olhos encontrando os intensos


castanhos escuros dele me observando. Como se precisasse saber onde cada
traço fica em meu rosto, sua forma e tamanho. Não dizemos nada por longos
segundos, apenas nos encaramos, presos em nossa bolha com o mundo
silenciado.

—Bom dia. —Quebra o silêncio. Virado para mim com a mão segurando sua
cabeça, tira a mão que estava em meus cabelos trazendo para o meu queixo
puxando para mais perto de si, colando nossos lábios em um selinho.

—Bom dia. —Respondo depois que volta a posição inicial e começa a fazer
carinho na minha bochecha.

—Desculpe te acordar, mas poderíamos nos atrasar. —Esclarece.

Então, me dou conta de que estou deitada na cama de Liam ainda com a mesma
roupa de ontem. Acho que peguei no sono depois que decidimos subir e assistir a
série. Não poderia acordar de uma forma melhor.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
Como pode fazer tanto calor em um único lugar?
Depois de acordar, nós tomamos café e fomos para o meu apartamento para que
eu pudesse me arrumar antes de irmos para o campus.
Só nos vimos no final das aulas e quando me trouxe para o trabalho, que é a onde
eu estou nesse exato momento suando a ponto de parecer uma salsicha molhada.

Apesar de nascer em um dos que eu considero um dos estados mais quentes do


Brasil, faz um bom tempo que moro aqui; todas as vezes em que viajo para lá, me
sinto um sorvete derretendo do momento em que eu acordo até o momento em
que vou dormi. Todos os dias. Acostumei com a temperatura daqui, nos dias que
são um pouco mais quentes igual lá, eu sofro.

No final do expediente, enquanto estou entregando as crianças para os seus pais,


percebo que Liam demora a chegar dessa vez. Normalmente ele sempre aparece
nesse horário, mas não perco tempo em me preocupar, imaginando que o treino
deve ter atrasado e que vai chegar mais tarde.
O processo de despedida das crianças ocorre bem rápido, a maioria dos pais já
estavam à espera na porta. Os pais de Mia estão livres hoje, por isso não vou
precisar ficar com ela depois do horário como todos os dias.

O último pai a buscar é o Sr. Miller. Fazia uns dias em que não o via, sua esposa
que agora está passando a vim pegar o seu filho Will e, nas vezes que ele veio,
não falou comigo igual antes.
Não me pergunte do porque eu ainda não fiz um bolo em comemoração.
O que foi um certo alívio por ver apenas me cumprimentar educadamente. Se me
perguntar o porquê da mudança repentina, vou dizer que não faço a mínima ideia.

Despeço de Will, o entregando para o seu pai e indo direto buscar as minhas
coisas pois preciso muito de um bom banho gelado.
Saio para fora pensando que Liam já esteja lá me esperando. Ele não está.
Eu começo a me preocupar. O meu corpo começa a se preocupar. A minha mente
começa a se preocupar. Com ele. Comigo.

Respire. Um, inspira. Dois, expira. Cheira a florzinha e assopra a velhinha.


Não está dando certo. Não está dando certo!
Está tudo bem, Liam está bem. Você está bem. Você vai chegar bem em casa.
Meus batimentos estão rápidos demais. Estou com medo. Muito medo. Estou em
um filme de terror. Preciso correr. Sinto o medo e o perigo rosnando em meu
pescoço.
Verifico a hora pensando se devo mandar uma mensagem falando que posso ir de
a pé, supondo que algum imprevisto tenha acontecido. Mas sou impedida pelo Sr.
Miller que não havia percebido que estava próximo a um carro não muito longe de
onde estou parada.

Ai droga…

—Como está, Maya? Faz um tempo que não conversamos. —Diz puxando
assunto. Ele caminha poucos passos, ficando mais perto.

—Estou bem e o senhor? —Respondo educadamente gritando mentalmente para


o meu corpo que está tudo bem. Dizendo para minha mente que ela está errada.

Você é forte, Maya. Nada vai acontecer.

—Estou bem. —Ele sorri. Detesto esse sorriso, ele me faz querer vomitar. —Você
é uma mulher muito bonita.

Pisco um par de vezes sentindo minha saliva descer em seco pela minha garganta.
—Obrigada. —Forço um sorriso de gratidão.

—Espero não ter te assustado.

—Não, eu agradeço o elogio. —Sinto seu olhar desconfortante preso demais em


mim e olho para os lados procurando qualquer sinal que possa dizer que Liam está
chegando. Ou que alguém está por perto, qualquer pessoa.

—Por que não sai comigo? —Toca meu pulso de surpresa, fazendo um pequeno
carinho com o dedo. Não me toque.

—Sr. Miller… —Tento negar.


—Ninguém vai saber, não se preocupe. Considere isso apenas algo entre
possíveis amigos. —Insisti. Agora o medo não é o único sentimento em que se
passa dentro de mim, a irritação está ganhando espaço.

Está de brincadeira comigo, caramba!


Será que poderia fazer o favor de me largar e sair do meu pé?!
Respiro fundo, colocando na minha cabeça que está tudo bem e que não tem o
porquê se desesperar. É só recusar e ir embora.

—Desculpe, mas não posso aceitar. —Tento me afastar, mas o toque em meu
pulso aperta. O encaro com o cenho franzido.

—Por que não pode? —Como alguém pode ser tão burro? Seu olhar parece
frustrado e irritado. Ele quer uma explicação. Uma plausível para a sua mente
nojenta.

Eu me desespero. Engulo em seco com o meu coração acelerando mais, como um


carro a 200 km/h no meu peito e as mãos formigando. Preciso pensar em como
sair daqui, imediatamente. Pense, Maya.

—Uma chance. Tenho certeza de que vamos nos dar muito bem.

Não respondo, pois logo em seguida tudo acontece rápido demais. Sua mão é
arrancada do meu pulso assim que cai no chão levando as mãos no rosto. Observo
se contorcer de dor com Luke em pé ao lado.

—É melhor isso não acontecer de novo, caso não queira ficar internado no
hospital. —Avisa com o maxilar rígido e a voz tão ameaçadora que me pergunto
como nunca vi esse seu lado. Ele sorri vingativo para o homem caído.

Mãos vão para o meu rosto, tirando minha atenção da cena diante de mim, levanto
os olhos e vejo Nick parado na minha frente, preocupado.

—O treino atrasou e o treinador pediu para o Liam ficar até mais tarde. Ele disse
para que viéssemos te buscar. Está tudo bem com você? —Sorrio aliviada por
vê-lo.

—Estou bem, obrigada. —Jogo os meus braços em volta do seu corpo enorme e
grande demais para o meu tamanho, e o abraço. Forte. O medo se esvai do meu
corpo e sinto o ar voltar aos meus pulmões. Pode ser coisa da minha cabeça, mas
também percebo os ombros de Nick relaxarem.
—Sorte que fui eu que dei o soco. Se fosse Nick, ele estaria deformado agora e
seríamos obrigados a tirar ele daqui. —Riu em meio ao abraço com a declaração
de Luke. Agradecendo aliviada pela distração.
Eu amo esses caras.

—Estaria mesmo. —Afirma Nick.

—Por isso que o combinado foi, eu bato e você cuida dela. —Diz Luke assim que
me solto do abraço.
Caminhamos até o carro estacionado a alguns passos de onde estamos.

—Chato! Eu nem pego pesado. —Os dois param e Luke o encara com o olhar
claramente dizendo: “eu não caio nessa”. Nick revira os olhos. —Um nariz, um
braço quebrado e olho roxo está tranquilo.

—E é por isso também que você é o último a ser chamado para as brigas. —Vira o
boné preto que está usando para trás, dando a volta e entrando no banco do
motorista comigo e Nick o acompanhando.

—Posso saber que papo é esse? —Pergunto me preocupando com esse assunto.

—Se você quiser umas boas surras, eu, Liam e Dylan damos conta e fazemos isso
perfeitamente. Mas se quiser que o cara pare em uma maca de hospital, é só
chamar o Nick. —Explana.

—Você é burro? —Indago, nós três já dentro do carro. Será que ele não pensa que
pode ser preso?

—Não tenho culpa se sei acabar com um cara. Relaxa, não é sempre que faço
isso. Só as vezes. —Sorri brincalhão.

—Vai contar para o Liam? —Questiona Luke dando partida no carro.

—Não decidi ainda. —Suspiro ao me lembrar desse pequeno importante detalhe.

—Sabe que ele pode muito bem abrir a boca, não é? —Aponta com a cabeça para
Nick no assento do lado.

—Você vai abrir a boca? —Falo me virando e olhando para ele.

—Eu já abri. —Confessa.


—Quando? —Não, merda!

—Eu enviei uma mensagem assim que entramos no carro. —Fecho os olhos e
suspiro pesado. Contar para Liam não estava sendo uma opção a se cogitar.
Passa dois segundos e ouvimos o barulho do celular tocar. Ele o atende, ficando
claro quem é do outro lado.

—Sim, ela está bem. —Murmura na ligação. Ele me olha pelo retrovisor do carro
por breves segundos pensando o que responder. —Já estamos indo, é melhor falar
com ela quando chegarmos. ––Isso! Isso é ótimo. Continua sua série de
múrmuros. —Você consegue não destruir a casa durante os dez minutos que
vamos levar até aí? Por favor, quero chegar e ter uma casa construída para eu
dormir, e estou começando a me preocupar com isso pelo seu jeito. —Pausa.
—Ela está bem! Por favor, se concentre em não destruir nada. —Outra pausa.
—Obrigado pelas palavras carinhosas, eu sei que sou um amor.

Quando termina de dizer as suas palavras o seu cenho se franze. Uns instantes se
passam até que retire o celular do ouvido e fale:
—Ele desligou na minha cara. —Seu tom é de indignação.

—Porque será?! —Ironiza Luke do banco do motorista.

O restante do trajeto é em silêncio. Não demora mais que cinco minutos para o
carro parar em frente a casa dos meninos. Adentramos dando da cara com Liam
logo na entrada. Seus ombros e maxilar estão rígidos, os punhos fechados ao lado
do corpo, andando de um lado para o outro. Parece a beira de um surto.
No segundo em que nos vê, vem direto para cima de mim colocando as mãos em
meu rosto e olhando nos meus olhos. Os seus iluminados de alívio me observam
minuciosamente intenso e profundo. Olhar nos seus olhos é como estar em uma
noite escura com a brisa fresca batendo em sua pele. Como se pudesse voar.
Seguro os seus punhos retribuindo de alguma forma o seu toque quente em meu
rosto.
—Estou bem. —Afirmo. Ele suspira forte e puxa meu rosto levemente até que
nossas testas estejam encostadas uma na outra, fechando os olhos. Consigo sentir
toda a sua preocupação saindo do seu corpo. Todos os agradecimentos em sua
mente por eu estar bem. Consigo ouvir as batidas do seu coração se acalmarem
dentro do seu peito. É do mesmo jeito que estou.
—Quero socar esse cara. —Sussurra.
—Não precisa, o Luke já fez isso. —Sorrio ao dizer. Ele sorri e beija a minha testa,
nos afastando depois.
—Ainda bem que não foi o Nick. —Diz.
—O que está acontecendo para eu receber tantos elogios de vocês hoje?
—Reparo que os dois não estão mais aqui, e sim, atacando os armários da
cozinha.

—Voltou a usar boné por quê? —Questiona observando Luke, só que, quem
responde é Nick.

—Ele quer voltar ao estilo skatista.

—Cabelo tá grande e estou com preguiça de cortar. —Explica.

—Daqui a pouco vai virar a Rapunzel. —Riu junto com Liam da brincadeira de
Nick, que em troca recebe de Luke um tapa na cabeça.

Ele nos guia para a sala quando os meninos sobem para os seus quartos, nos
acomodando no sofá. Sento ao seu lado virada em sua direção com as pernas em
cima das suas. Seu braço envolve ao meu redor enquanto o outro descansa na
minha perna.

—Quer conversar? —A voz compreensiva e casual me atinge.

—Não. Foi apenas um susto, está tudo bem. —Assente, passando a encarar os
meus olhos. Mil e uma palavras para serem ditas, mas ele não diz nenhuma delas.
Ele permanece em silêncio.

Não quero contar do medo que se apossou de mim. Não quero contar que pensei
que não chegaria bem em casa, porque sei o quanto isso pode mexer com ele. O
quanto de culpa vai sentir. Não posso deixar que sinta isso por algo que não é sua
culpa. Por algo que não vai se repetir, porque nunca mais vou deixar o medo me
dominar daquele jeito.

Há tantas coisas se passando entre os seus olhos que demoraria para falar cada
uma delas. Quer tanto que eu converse com ele, que eu conte o que estou
sentindo, o que aconteceu, mas também transmite compreensão e não irá forçar
nada. Está preocupado comigo, porém aliviado por nada ter acontecido. Não vou
deixar você passar por isso, Liam. Agora me pergunto, se quem precisa conversar,
realmente sou eu.
—Converse comigo, Brown. —Peço. Toma alguns segundos pensando, optando
por falar no fim.

—Eu fiquei desesperado. —Admiti. —Pensei que ele fosse usar você, que fosse te
machucar e, que dessa vez, eu não estaria lá. Sei que nem sempre vou estar
quando você precisar, mas ele iria te machucar Maya. Justo no único dia em que
me atrasei. No momento em que Nick me mandou a mensagem, uma das piores
sensações do mundo tomou conta do meu peito. Nunca fiquei tão aliviado e feliz
por saber que estava tudo bem com você, porque tudo o que eu estava pedindo
era que você viesse pra casa bem.

Seus castanhos escuros intensos brilham como se a noite fria fosse receber uma
tempestade hoje.

Aproximo dele selando nossos lábios com um beijo cheio de ternura. Nossas
línguas se movimentam delicadamente absorvendo todo o sentimento que esse
beijo carrega. Travando uma batalha com tudo o que estamos sentindo nesse
momento.

Nos afastamos encostando nossas testas e assimilando tudo o que acabou de


acontecer.

—Eu estou bem e em casa. Foi só um susto. —Garanto com toda a certeza que
resta dentro de mim, tentando fazer com que nós dois acreditemos nas minhas
palavras.

Uma coisa que eu aprendi com um assédio dentro do ônibus é que você se torna
mais resistente. Fiquei com medo? Sim, e provavelmente vou ficar quando eu ver
aquele homem novamente todos os dias no meu trabalho, mas quer saber? Sou
mais forte do que penso e não vou deixar que o medo me domine de novo.
Infelizmente o mundo é um saco para nós mulheres, então, tudo o que podemos
fazer é mandar ele para o caramba.

—Vou sair mais cedo do treino a partir de hoje pra te buscar, prometo.

—Não me prometa isso. O hóquei é a sua paixão e o seu sonho! Não vou permitir
que o esqueça por minha causa. Estou aqui para te apoiar e te escutar. Já é o
suficiente você me levar para todos os lados, não vou permitir que saia mais cedo
do treino. Posso esperar junto com as outras funcionárias, ou ir para um local
movimentado. —Suspiro antes de continuar. —Foi apenas um susto, eu vou ficar
bem. Você tem um campeonato para ganhar e vou te bater se não fizer isso.

O silêncio recai sobre nós e quando penso que tudo isso foi esquecido, ele me
surpreende.
—Você é tudo o que eu não mereço, Maya Hawkins. Mesmo assim está bem aqui
comigo.

Capítulo 35

LIAM

Faz três dias que não vejo Hawkins.


“Não ver” acho que é uma expressão muito forte. Eu a levo todos os dias para o
trabalho e a busco. Mas nesses últimos dias não conseguimos passar disso. As
nossas únicas conversas são durante o trajeto de carro que duram cinco minutos
apenas! Nem no campus conseguimos nos esbarrar. Ela anda ocupada com a
faculdade e o serviço; eu com a agenda de hóquei que está apertada.

Era de se imaginar que nem sempre teríamos tempo um para o outro, mas pensei
que iríamos dar um jeito. Por isso estou cogitando todos os possíveis motivos para
as suas desculpas. Talvez o que eu tenha dito no sofá foi demais.

Será que fui muito apressado com as palavras? Há dias que o sentimento dentro
de mim cresce cada vez, tem vezes que quero falar tantas coisas como uma forma
de tentar dizer o que estou sentindo que parece que vou explodir. Mas, também
estou com medo de todos os “e se” que vem junto. E se esse sentimento crescer
tanto que vou sonhar em ter uma família com ela? E se eu decidir pela primeira vez
enfrentar todos esses medos e depois dar errado? E se eu fuder tudo quando
minha carreira no hóquei começar?

Isso seria tão ruim assim? Não vela a pena arriscar?

São tantas possibilidades que só de pensar minha cabeça dói.

Ainda sim, isso tudo não é nada comparado a saudades que estou de estar com
ela. De sentir seu cheiro, de tocar aquele minúsculo corpo de 1,65 cheio de curvas
e de beijar a sua linda boca. Quero estar com ela. Eu gosto de estar com ela.

Quando o horário das suas aulas está prestes a acabar, caminho até a porta da
sua sala e espero. Minutos depois a porta se abre. Uma multidão de pessoas
passando por ela enquanto eu aguardo pacientemente, porque eu sei que Hawkins
vai esperar todos saírem, ficando por último como sempre faz.

Assim que vejo seus lindos cabelos castanhos escuro enrolado nas pontas meu
peito se aquece igual uma maldita fogueira. Vestindo o de sempre, calça jeans,

uma blusa preta curta e um tênis branco nos pés. Linda pra porra. Abraço o seu
corpo pequeno por trás envolvendo meus braços na sua cintura.

—Surpresa! —Falo ao pé do seu ouvido, sorrindo por conseguir um tempo para a


abraçar e sentir seu cheiro que lembra a sol, praia e maracujá.

—Você me assustou! —Resmunga colocando a mão no peito.

—Desculpa, mas precisava te ver.

—Foram só três dias, seu idiota. —Fala sorrindo pequeno.

—Pois é, estava começando a enlouquecer.

Afrouxo o aperto em sua cintura, deixando apenas minhas mãos descansarem ali.
Ela vira de frente para mim, olhando em meus olhos e jogando os braços ao redor
do meu pescoço.

—Vou começar a pensar que você é um obsessivo.

—Quando se trata de você, eu sou.

A sua afeição está séria, totalmente. Ela está cansada, o sorriso está ali, só que os
seus olhos estão claramente caídos. Estão tristes. Não estão brilhando.

—Você está cansada. —Declaro com os braços ao redor da sua cintura.

Seu corpo trava. Pelos próximos cinco segundos o seu corpo fica estático. O que
aconteceu? Porque está agindo assim? Eu falei alguma coisa errada?

—Sim, estou ocupado com os traba…Calma, como…você…sabe? —Pergunta.


Inicialmente tenho vontade de rir por parecer uma pergunta completamente idiota,
porque está visível quando olho nos seus olhos. Mas então, eu percebo como a
maneira que perguntou foi franca. Ela de verdade quer saber a resposta.

—Por causa da expressão no seu rosto. —Respondo simplista.

—Mas…como sabe a diferença? Qualquer pessoa iria me dizer que estou brava.
Porque você não disse? —Suas sobrancelhas se franzem e percebo como a
resposta dessa simples pergunta é importante pra ela.
—Os seus olhos. Estão caídos, eles parecem tristes. Há diferença neles quando
você está brava. O seu corpo também. —Revelo. O ar corta os seus pulmões
enquanto os olhos voltam a brilhar pra mim.

Nossos rostos se aproximam e selamos os nossos lábios em um beijo lento com


gosto de casa. Queimar com ela tem se tornado uma das minhas coisas favoritas.
Porra, estava com tantas saudades. Nos separamos e percebo que todos a nossa

volta acompanham tudo o que acontece. Entrelaço a minha mão na sua andando
com a intenção de sair dali porque sei que não gosta de chamar atenção. Eu sou
obrigado a conviver com isso quase sempre, foi uma escolha que eu fiz querendo
ou não, a fama é uma das consequências de escolher ser jogador. Mas Hawkins
não escolheu isso em nenhum momento.

Mesmo assim existe algumas coisas que não consigo evitar. Como os comentários
nas fotos ou no Twitter do campus. Ultimamente as pessoas tem falado algumas
coisas sobre nós, já que as vezes postamos mídias juntos e por normalmente nos
verem andando pelo campus ou em qualquer lugar pela redondeza. Sabe como é,
as fofocas correm rápido. Isso acabou espalhando para universidades por perto, e
as visualizações no meu Instagram não ajudaram muito. Mas, nada de mais,
apenas algo novo que ficaram sabendo. Nessa altura do campeonato todo mundo
já deve ter se esquecido.

Entretanto, isso tudo não passam de boatos. Eu e Hawkins não oficializamos nada
e nem demos um rótulo para o que há entre nós. Estamos bem assim, não
precisamos ter pressa para decidir isso. Estamos juntos e pronto. Certo?

—Adivinha quem tirou nota máxima no trabalho?! —Pergunta retoricamente.

—Sério? —Paro a vendo confirmar com a cabeça. A envolvo nos meus braços,
levantando seus pés do chão em sinal de alegria. —Sabia que iria conseguir. Estou
muito orgulhoso!

A coloco no chão novamente, soltando meus braços. Ela pega minha mão voltando
a caminhar com um sorriso contagiante no rosto.

—Não sabia que já tinha entregado o trabalho.

—Devo ter esquecido de falar. —Aceno com a cabeça.

—Que tal uma comemoração? Por como somos incríveis.

—Eu quero, mas estou sem tempo hoje. —Lamenta. O que tanto anda fazendo?
—E agora? Temos um tempo antes de eu te levar para o trabalho e ir para o treino.
—Ela olha para o nada, fingindo pensar na minha proposta. —Estava pensando
em brownie e brigadeiro. —Acrescento.

—Eu acho uma ótima ideia Sr. Brown.

Trinta minutos depois uma assadeira de brownie sai fresquinha do formo com a
fumacinha ocupando toda a cozinha junto com uma panela de brigadeiro quase no
ponto que Hawkins está mexendo sem parar. Coloco a assadeira quente em cima
da bancada no momento que os três brutamontes, jogadores de hóquei, entram.

Dylan está com uma cara de quem bebeu todas e transou a noite toda, o que não
duvido nada, já que saiu ontem à noite. Nick parece que foi atropelado por um
caminhão e Luke com seu cabelo que cresce a cada dia, escondido por seu boné,
está com cara de quem comeu e não gostou.

Os olhos se arregalam assim que caem na panela e no brownie bem a frente


deles. Voltam seus olhares um para o outro antes dos três virem para cima de nós.
Porém Hawkins desliga o fogo e levanta a mão indicando para que não deem mais
um passo sequer.

—Um pedaço para cada. Vocês têm treino daqui a pouco, não podem comer
porcaria, além de ter um campeonato para ganhar. Então, sem sair da dieta até lá.
—Eles a encaram e viram-se para mim, ela continua quando percebe o que está
acontecendo. —Vão querer discutir?

Eles murcham os ombros e reviram os olhos, indo cada um para um lado da


cozinha. —Foi o que eu pensei. —Sorri satisfeita.

—Ela namora um do bonde e os outros três tem que obedecer igual? —Dylan
questiona ao abrir a geladeira e pegar uma garrafa de água.

—Você vai querer contrariar? —Luke pergunta.

—Não.

—Preferia o método do zerinho ou um. —Nick resmunga.

Ela derrama o brigadeiro por cima de todo o brownie e nós dois decidimos esperar
esfriar para comer. Subimos para o meu quarto, aproveitar os minutos que temos
antes de termos que encarar nossas rotinas e responsabilidades. Deito de costas
na cama com ela se aconchegando no meu peito. Aspiro o aroma do shampoo do
seu cabelo enquanto seus dedos brincam com os gominhos na minha pele.
—Naquele dia que bom…aquilo tudo aconteceu, Nick disse que o treinador pediu
para conversar com você. Era algo importante?

—Ele queria falar que na semifinal e na final do Frozen Flour, alguns olheiros das
ligas profissionais vão vim observar os times. Disse que estão muito interessados
em mim, mas explique que não quero me escrever no draft agora.

—Por quê?

—Quero terminar a faculdade primeiro. Não quero pular etapas.

—Certo. Mas, só pra deixar claro, eu sabia que iriam se interessar por você. Tenho
certeza de que vai conseguir ganhar o Frozen Flour.

—Só faltou me chamar de idiota igual todas as vezes. —Ironizo. Ela ri.

—Idiota. —Brinca —Pronto, tudo normal.

—Sabia que você tem sempre a resposta na ponta da língua? —Provoco.

—Sabia que você é um idiota, seu idiota? —Retruca. Ela sorri. Sorri pra mim. E
quero emoldurar esse momento pra sempre. Então, eu sorriu de volta.

Vejo traços de diversão com provocação em seus lindos olhos castanhos mel. Ela
é tão linda que deveria ser um pecado para a humanidade não poder admira-la,
mas isso, é algo que só eu posso fazer. Eu deveria agradecer a Deus todos os dias
por ter o chamado atenção o suficiente para ele colocar Maya na minha vida.

Com o rosto mais lindo, os olhos mais alucinantes, o sorriso mais contagiante e a
boca mais bonita, não consigo entender como nunca, em algum lugar, um cara
pode deixar essa garota passar por seus dedos. Por alguma razão sem lógica, eu
não fui um desses caras. Eu faria tudo de novo, mil vezes e esperaria mil anos, se
fosse para vê-la sorrir para mim.

Pensamentos como esses flutuando em minha mente, eu a beijo. Como se só


tivéssemos esse único momento. Ela me dá passagem e enfio minha língua na sua
boca, a chamando para queimar comigo mais uma vez. Enfio os meus dedos nos
fios do seu cabelo e mordo o inferior dos seus lábios macios.

Isso é o bastante para que tudo o que poderia parecer calmo, se tornar fervoroso.
Puxo os seus cabelos, a mantendo no lugar e inclinando o seu rosto para mim.
Ergo meu corpo sobre o seu, colocando o meu peso nos meus antebraços sem
perder contato com os seus lábios e acomodando meus quadris e o corpo entre
suas pernas.
Suas mãos exploram meu abdômen, deslizando para o meu peito até alcançarem
os fios do meu cabelo. Chupo os seus lábios, a ouvindo soltar um gemido que puta
que pariu, me deixa mais duro do que já estou. Quando o fôlego começa a falta, é
que me afasto, mordiscando seu queixo e descendo para o seu pescoço. Puxa o
meu cabelo levemente percebendo que, assim como eu, está morrendo de desejo.
Minhas mãos exploram o seu corpo pequeno embaixo do meu sentindo cada
curva, provocando, instigando e memorizando cada parte, ouvindo arfadas saindo
dos seus lábios entreabertos.

Movo o meu quadril instintivamente, esfregando o meu sexo rígido no seu através
dos tecidos finos das nossas roupas ouvindo mais um gemido soar da sua boca.
Chega a doer o tanto que estou excitado, faz meses que não tenho relação com
ninguém. Volto para a beijar, encostando os meus lábios nos seus mais uma vez,
não querendo que isso pare. Mas isso não é uma escolha minha.

Vejo que, sem que perceba, os seus quadris se erguem a procura de mais contato.
Murmuro um “porra” com o roçar dos nossos corpos e sei que não vou parar se ela
não fizer isso em algum momento.

—Maya. —Chamo com a minha voz rouca e arrastada, usando o resto de sanidade
mental que tenho. —Precisa parar antes de atravessarmos a linha.

—Vamos passar um pouco da linha hoje. —Propõem com seus braços ao redor do
meu pescoço.

—Sabe que quando começar não vou parar, certo?

—Eu sei, e eu não quero que pare. —Cola seus lábios no meu por alguns
segundos, mordendo antes de se afastar. —Só vamos com calma, okay?

—Okay.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
Não consigo parar de pensar em Hawkins. Ou melhor, em sentir ela de novo em
meus dedos. Não fomos nada muito além disso, porém, ainda foi a melhor
sensação de todas. Poderia ficar e transar com várias meninas que, mesmo assim,
não chegaria nem perto do que foi com ela. Eu sei que todos falam isso, e é
sempre a mesma coisa, mas o que eu posso fazer?! Só de voltar para aquele
momento no quarto em que pude a tocar, a sentindo quente e apertada, posso
perceber meu membro endurecer.
Desde o minuto que deixei aquele quarto, milhões de cenários obscenos que quero
fazer com ela passam em minha mente. Imaginando como seria ouvir os sons da
sua boca preencherem o quarto como foi quando estava na minha cama, só que
mais altos e mais necessitados.

A cada minuto que passei com meus dedos nela, não cortei um segundo sequer o
contado dos seus olhos. Prestando atenção em cada reação e movimento em
resposta, nas sensações que seus olhos transpassavam, querendo conhecer o seu
corpo como a palma da minha mão. O semblante de prazer e confusão que se
instalou em seu rosto quando finalmente atingiu seu máximo é algo que quero ver
repetidas vezes. Espero nunca ter a capacidade de esquecer. Os olhos mel
brilhando no momento em que se abriram. Tenho certeza que perdi o ar naquele
segundo.

Eu poderia passar o dia inteiro com ela, e dentro dela. Estou mais que ansiando
esse momento. Sem falar as mil fantasias que se passaram na minha cabeça de
como deve ser a sensação. Vou esperar o tempo que for para isso, torcendo para
não enlouquecer até lá.

Forço minha mente a voltar para o treino ao ouvir o apito do treinador preencher o
ringue verberando por todo o local. Mantenho minha expressão séria e
concentrada, como todos do time, que se mantém atentos também a cada palavra
que sai da boca do treinador que aponta nossos erros. O que ele sempre está
fazendo. Um dos motivos por ser tão bom no que faz, ele está frequentemente nos
mostrando formas de melhorar.

Hoje passou exercícios básicos para melhorar nossa técnica, tiros a gol, habilidade
e velocidade. Posso não sentir minhas pernas todas as vezes após os treinos, mas
a recompensa é muito satisfatória. Nos jogos me sinto flutuar no gelo. Bate palmas
quando termina de explicar suas propostas táticas, algo que começou a falar
depois que terminou de gritar conosco. Ele informa que agora vamos fazer um
exercício para aplicar e desenvolver os pensamentos táticos. O momento mais
esperado e que já se tornou costume de todos os treinos e que usamos
exatamente para táticas, o x1.

Na realidade, x1 no sentido de ser uma equipe contra a outra, não uma pessoa.
Porém, a zoação e competitividade é a mesma. O treinador nos separa em dois
times. A minha equipe é formada por Stephen, Brandon como os alas, Jason e
Dylan como os defensores e Peter como o goleiro. Enquanto a outra é formado por
Nash como central, Nick e Nate como os alas, Luke e Adam como os defensores e
Ryan como goleiro.
Fico animado com a formação dos times até me dar conta de que Nick vai ser meu
adversário.

Não duvide da afirmação que diz que “todo jogador é competitivo” porque isso é
um fato. Entretanto, Nick ultrapassa todos eles. Assim como todos desse time, não
gosto de perder e luto até o final, só que, não igual a ele. Pode não parecer, mas
Nicolas Watson é extremamente perfeccionista. O cara quer ser o melhor em tudo
o que faz. Não é à toa que o meu melhor amigo está no top três melhores da sua
posição. Se não, o melhor. Vai ter uma chuva de propostas.

Podemos arrasar com a equipe adversária, mas se o cara cometer dois erros
mínimos, passa o resto da noite se martirizando por dentro. O único motivo pelo
qual sei disso é porque o conheço o suficiente.

Estou xingando mentalmente quem decidiu colocar ele para jogar contra mim
nessa porcaria de x1. O bom é que, assim como ele, eu detesto perder.

—Preparado para ser amassado? —Provoca. Virando para ele, fazemos o nosso
toque antes de ir para a minha posição.

—Estou preparado para mostrar para o treinador que sou melhor que você. —
Retruco. Nick solta uma risada.

—É isso o que vamos ver, Brown.

—Qual a aposta de hoje? —Stephen começa.

—Vinte pratas de cada? A equipe que ganhar leva tudo. —Jason propõem.

—Fora a foto dos perdedores do dia. —Nate completa com todos deslizando pelo
gelo, prontos para iniciar.

—Fechado. —Respondo.

Que ganhe o melhor.


Capítulo 36

MAYA
—Não acredito! Repete por favor, acho que não entendi direito. —Anna parece
prestes a atravessar o telefone. Sinto meu rosto esquentar com a sua reação, sem
que eu possa impedir.

—Pare com isso! Você entendeu. —Riu de nervoso não querendo repetir as
últimas palavras que foram ditas nessa conversa.

Faz semanas que não conseguia ligar para ela. Eu detesto como nossas vidas são
corridas, como estamos a milhares de quilômetros de distância e como não
podemos nos ver frequentemente como costumava ser. Não me entenda mal, nós
conversamos diariamente, mesmo com a nossa demora para responder as
mensagens, mas todo mundo sabe que não é a mesma coisa. Nunca vai ser.

Por isso, tomei a iniciativa dessa vez de fazer uma ligação por vídeo. Outra coisa
que eu detesto, porém, que tem sido muito útil nos últimos anos. Precisava ver seu
sorriso e olhos verdes que emolduram o seu lindo rosto que sinto tanta saudade. E
por mais que odeie vídeo chamada também, sei que está amando me ver pela tela
de celular enquanto cozinho um delicioso prato de strogonoff. Minha boca estava
salivando de vontade nos últimos dias.

—Meu neném deixou de ser neném! —Anuncia.

—Está parecendo uma mãe falando, igual quando a filha menstrua pela primeira
vez.

—Por que a situação é a mesma! —Reviso os olhos, mas sabendo que no fundo
ela está certa. Não é todo dia que você deixa um cara enfiar dedos em você. Quer
dizer, para alguns apenas.

—Termina a fofoca. Quero saber mais. —Fala com empolgação.

—O que você quer saber exatamente?

—Tudo?! Menos os detalhes sórdidos, isso não precisa ser incluído na nossa
conversa. Quero continuar sendo um neném, obrigado.

—Tudo bem. Eu gostei amiga, de verdade. Sendo sincera, quero saber quando vai
ser a próxima vez. —Falo concentrada em picar o frango em cubinhos com a faca.

Ouço um barulho de indignação e espanto vindo dela através da ligação.

—Soldada abatida! —Vejo quando põem a mão no peito fingindo sentir dor e
apertar os olhos. —Definitivamente, minha melhor amiga cresceu. —Dou risada
com sua reação.

—Foi muito bom. Nunca que eu poderia imaginar sentir algo parecido. Realmente
Liam sabe bem o que está fazendo, não é à toa que tem toda essa fama aqui na
universidade. —Continuo.

Estou sendo sincera ao dizer isso. O homem é bom! Muito, muito, muito bom!
Talvez seja algo que não posso afirmar com toda a convicção porque, afinal, ele é
o meu primeiro. Mas, acho difícil uma pessoa ser considerada ruim fazendo o que
ele faz.

Aconteceu de novo dois dias depois daquele dia no seu quarto, mas dessa vez no
seu carro antes de ir para os nossos compromissos. Essa parte não foi contada a
ninguém. Pretendo que continue assim. Apenas de imaginar seus dedos e a
sensação, sinto o meio das minhas pernas se contrair. A forma como você se sente
após atingir o seu clímax é tão bom e intenso… O sentimento de se sentir perdida
e aliviada. Posso sentir a sensação de prazer ao lembrar do momento em que eu
apenas apreciava os segundos pós clímax com os dedos dele ainda em mim.

Consegui ser ousada no dia e, não deixei que saísse no prejuízo igual da primeira
vez. O ajudei enquanto ele me guiava. Sim, foi impossível não considerar a
possibilidade daquilo em mim e não quero me preocupar com isso agora. Porque o
tamanho dele é, consideravelmente grande. Eu acho.

—Eu to vendo, pela sua cara. —Nós duas rimos. —Você se arrependeu? Quer
dizer, no conceito de que sei que isso era algo importante pra você.

—Resposta curta e comum ou resposta grande e verdadeira?

—Grande e verdadeira sempre!

Horas após o ocorrido no seu quarto, a primeira pessoa para quem contei foi Riley.
A única coisa que faltou ela fazer foi chorar de emoção, parecia minha irmã mais
velha orgulhosa que por final disse: “finalmente, não sei como você aguentou tanto
tempo”. Além, claro, de todas as perguntas e curiosidades de como foi e de como
eu estava. Tanto ela quanto Anna, me conhecem e as vezes me pergunto se sou
tão fácil de ler.

Amo Riley, ela foi minha luz no fim do túnel e, continua sendo. É a pessoa que está
comigo quando eu preciso, a que me alegra e que eu sei que se um dia eu for
presa ela vai lá me ajudar a fugir. Uma das poucas pessoas que eu confio nesse
mundão. Uma das únicas que sinto conforto em ser eu assim como com Anna.

E por mais que eu converse de tudo com ela e sei que posso ser sincera, ela não é
a minha pessoa. Anna é. Isso nunca vai mudar. Ela é minha influência positiva e
todas essas coisas fofas que dizem por aí em séries. Ela é a pessoa que se eu
puder, vai estar presente para o resto da minha vida.

—Não me arrependo. Sei que eu tinha a intenção de fazer isso apenas com a
pessoa que eu soubesse que era a certa pra mim. Foi uma escolha minha. Mas,
mesmo sendo inesperado, eu sinto que eu fiz exatamente isso. Fiz com a pessoa
certa pra mim. Ele me faz sentir isso todos os dias de diversas maneiras. Então,
não poderia ter sido com alguém melhor. —Confesso. Solto a faca terminando de
cortar para respirar fundo.

—E quando você pretende entregar a sua preciosidade? —Me mato de rir com a
forma da pergunta, sendo acompanhada por ela.

—Não sei. O aniversário dele é daqui a três dias. —Digo quando consigo uma
trégua na risada.
—Hmmm…está pensando em dar isso de presente de aniversário?

—Eu nem pensei em um presente de aniversário específico. —Argumento.

—Bom, para quem é tão chata com presentes, isso é uma raridade. —Reviro os
olhos.

—Não pensei sobre isso ainda, talvez role. —Falo tentando soar indiferente.

—Estou sentindo um amor no ar. —Brinca. Ela está sorrindo. Sorrindo muito.
—Por favor, não pire. —Se apressa. Ela me conhece.

Tarde demais, porque eu já estou. Um estalo cai sobre mim, me obrigando a


analisar tudo o que estou sentindo, tudo o que eu venho falando em pensamentos.
Claramente algo não está como deveria estar.

Pela primeira vez estou sentindo verdadeiramente. Como se os sentimentos


estivessem livres e vivos dentro de mim. Liam me faz sentir todos eles até quando
não percebo.

Dizer que o amo, é cedo. Eu sei que gosto dele. Gosto da forma como me trata,
como se preocupa comigo, como me ajudou mesmo não percebendo. Como foi
tudo o que eu precisava na hora que eu precisava, quando nem mesmo eu sabia
disso. Isso tudo é novo, então, é normal achar que algo está errado, não é?
Porque você fica tanto tempo presa que esquece como se vive. Mas, fico feliz que
estou me lembrando como é. Não me importo se não for recíproco ou se é apenas
algo passageiro, porque estou feliz. Quero viver e aproveitar cada momento, sem
me preocupar com o que pode causar. Sem arrependimentos. No final, o pior que
pode acontecer é eu ter uma boa história pra contar.

—Estou bem. —Tranquilizo, encarando ela do outro lado da tela e jogo os cubos
de frango cortados na panela. —Alguma fofoca para contar? —Pergunto a fazendo
mudar de assunto após perceber que está tentando decidir se acredita em mim ou
não.

—Não, só o Leonardo que começou a namorar. —Fala de uma das pessoas da


nossa antiga roda de amigos.

—O que? Sério? —Levanto as sobrancelhas em surpresa.

—Sim, uma tal de Melissa. —Diz casualmente.

—Ele não estava ficando com aquela menina lá? Não lembro o nome.
—Sei lá, ele pega qualquer coisa que veste saia. —Riu com sua sinceridade. O
melhor é que isso está longe de ser mentira. —Deus me livre de namorar um cara
assim. Quando isso acontecer, me interne. —Afirmo com a cabeça ainda rindo.

—Você mora no Rio de Janeiro garota, todo mundo se pega aí. —Ela para e olha
pra cima pensando.

—Tá bom, isso é verdade. —Confessa.

—Ela é bonita? —Mexo na panela com a comida enquanto a espero responder.

—Por foto, sim.

—Coitada, alguém tinha que avisar ela.

—Eu que não vou. Se fosse eu, ninguém iria.

—Eu iria! —Rebato.

—Porque é a sua obrigação como minha melhor amiga! —Contrapõem.

—Saudades de quando sentávamos e tínhamos essas conversas por horas.


—Revelo relembrando todas as vezes que saímos ou simplesmente fofocávamos
até de madrugada na sua casa.

—Bom, se der tudo certo, vamos poder ter de novo. —Mentira.

É isso mesmo que eu ouvi?

Alguém me dá um cotonete? Eu acho que estou surda. Meu Deus, como a vida de
universitária é triste, já estou começando a ter alucinações. Porque isso não pode
ser possível de ser verdade.

—Não brinque com uma coisa dessas Anna Beatriz! —Ameaço.

—Não estou brincando. —Um sorrio animado e esperançoso surge no seu rosto.

Meu coração erra uma batida. Será que se eu sair gritando pelo prédio eu posso
ser expulsa? Dou pulinhos pela cozinha em frente a câmera do celular vendo que
se levantou para pular junto comigo. Tomo o cuidado para que eu não esbarre no
fogo e precise chamar o corpo de bombeiros.

—Você vai se mudar para onde estou morando, certo? —Paro de pular e olho para
a tela a minha frente lembrando desse pequeno detalhe. Garantindo que não estou
pulando de felicidade em vão.

—Sim. —Um sorriso do tamanho da ponte de São Francisco ergue em meus


lábios.
—Você vai se mudar! —Digo praticamente gritando.

—Eu vou me mudar! —Sua voz também sai em um tom não muito baixo.

Nesse momento, estamos parecendo duas adolescentes de treze anos depois que
o ‘crush’ finalmente as notou.

—Como conseguiu? —Questiono após me acalmar dos segundos de euforia. Ela


pega o celular o aproximando mais do seu rosto antes de responder.

—Eu fui pesquisar universidades que aceitam estrangeiros e, curiosamente, a


Mavericks é uma delas. —Explica. —Depois de longas pesquisas e tentativas,
consegui uma transferência com bolsa integral.

—Você não falou nada esse tempo todo! —Resmungo.

—Precisava ter certeza de que daria certo. —Se defende. Não a julgo porque no
seu lugar, eu faria o mesmo.

—Sabe que pode ficar comigo o quanto precisar, não é?

—Sei, e obrigada. Pelo menos só até eu conseguir um emprego.

—Como foi a reação dos seus pais?

—Um misto de surpresa e desespero. —Abro um mini sorriso ao imaginar a cena.


Conheço os tios que eu tenho.

—Suas irmãs devem ter ficado doidas.

—Não tenha dúvidas disso. —Tenho certeza de que essas duas irão chorar
horrores quando a ver embarcar no avião.

—Quando você vem?

—Daqui a algumas semanas, provavelmente depois do Natal.

Eu não poderia receber uma notícia melhor.


Capítulo 37

LIAM
Estou sendo arrastado para uma festa.

Nick, Dylan e Luke decidiram que vamos todos sair para nos divertirmos. Alegaram
que não posso ficar em casa sem fazer nada como todos os anos no dia do meu
aniversário, e que faz tempo que não saio com eles, por isso, me obrigaram a vim
para essa festa. Tudo bem que eles não estão errados, mas isso não precisa ser
destacado.

Agora estamos todos dentro do meu carro indo para a casa que Stephen, Adam,
Jason e Brandon moram, onde vai acontecer a festa. São os únicos jogadores do
time que, assim como nós, moram juntos, e eu não faço a mínima ideia de como
não foram expulsos de lá ainda. Deveria existir uma lei que proibisse Adam e
Stephen de viverem debaixo do mesmo teto.

Estaciono o meu Jeep Suv, sendo o motorista da noite, próximo ao local que
aparenta estar vazio. Saímos todos do carro, os três mais apressados do que
normalmente, andando a minha frente e adentrando a casa primeiro. Assim que
passo pela porta da entrada tudo está escuro e em completo silêncio, sem nenhum
ser humano vivo presente. Chamo os meninos, mas ninguém responde. Começo a
pensar que é melhor dar o fora antes que apareça um infectado de The Last of us
aqui e me morda.

Caminho até o que percebo ser a sala, quando as luzes se acendem e me


encontro rodeado de confetes coloridos e brilhantes voando com buzinas
ressoando por todo o lugar. No segundo que meus ouvidos param de zunir reparo
um bando de patetas cheio de músculos preenchendo a sala com um pontinho
rosa pequeno e sorridente entre eles.

Eles estão de chapéus de aniversário? Aí merda, onde está o meu celular?

—Happy birthday to you... Happy birthday to you... Happy birthday Capitão! Happy
birthday to you! —Cantam em coral de maneira mais desafinada possível.
Nate estoura mais um confere fazendo um barulho que verbera por toda a sala
com mais papéis coloridos voando.

—A capitã tentou ensinar a gente a música em português. —Murmura Brandon.

—É, mas não deu tempo de aprender tudo. —Completa Nash.

—Negócio difícil, nunca vi. —Resmunga Adam largando um apito.

—Se você quiser ouvir, procura no Youtube. —Fala Jason a contragosto.

Hawkins revira os olhos e vem para perto de mim com um sorriso apreensivo no
rosto.

—Você gostou? —Indaga com os olhos transmitindo preocupação.

Não sei como eu pensei que teria conseguido esconder qualquer desconforto dela
naquele dia em minha casa, ou em qualquer lugar. Claramente Hawkins percebeu
pelo medo que seu olhar transmiti agora.

—Eu gostei. Muito. —Falo deixando o sorriso que seguro aparecer nos meus
lábios.

—Então, não está bravo né? —Ela me olha como fosse uma criança que aprontou
e está com medo.

—Não estou. Obrigado pela surpresa. —Agradeço sincero. Ela sorri e joga os seus
braços ao redor do meu pescoço me envolvendo em um abraço que retribuo
instantaneamente.

Toca a minha nuca suas mãos pequenas, aproximando o seu rosto do meu afim de
selar os nossos lábios. Mantenho as mãos paradas em sua cintura, me
contentando apenas em aperta-la ali.

Não desça a mão, Liam! Os caras estão aqui!

Há dias nós temos nos esforçados para administrar a nossa rotina para passarmos
mais tempo um com o outro, e estamos indo bem, acredito que principalmente a
partir de hoje, já que, organizar uma festa surpresa para mim vai sair da sua lista
de tarefas.

Coloco nossas línguas para um embate e aproveito esse beijo igual a todos os
outros, como se precisasse disso para sobreviver. Porque eu preciso. E tenho
duvidado cada vez mais da minha capacidade de viver sem eles. Nem me deixe
começar a falar dos nossos amassos ultimamente. A cada vez fica melhor. A última
ela não quis que eu saísse por baixo e, puta quê pariu, agradeço por isso.
A única coisa ruím é que sempre são rápidos por causa do tempo, o que é um erro
porque Hawkins é deliciosa demais para mim apreciar apenas em poucos minutos.
Por isso que quando ela decidir ir até o final quero que seja sem pressa.

Duvido muito da minha capacidade de parar tudo depois. Quero uma partida
inteira. Para que eu possa aprecia-la como deve ser.

Quando me dou conta, sons de buzinas e assobios ecoam pela sala. Parecendo
uma manada, eles vêm para cima formando uma roda em volta, comemorando o
beijo como se nunca tivessem ouvido os boatos pelo campus. Mãos pesadas
batem em minhas costas me fazendo separar os meus lábios dos de Maya.

—Hora do túnel! —Avisa Nick.

—É a tradição capitão! —Grita Nate.

Eles formam duas filas uma ao lado da outra, deixando um espaço entre elas.
Solto minhas mãos da cintura de Hawkins e passo pelo túnel recebendo tapas e
socos durante a passagem. Isso ainda é melhor do que ovo e farinha.

—Antes de começarmos a beber, vou avisar que talvez chegue mais algumas
pessoas. —Anuncia Adam esfregando a nuca após o fim da tradição.

—Algumas pessoas? —Questiona Hawkins com a sobrancelha levantada.

—Quantas exatamente? —Luke fala.

—Não sei, a galera do futebol e umas fraternidades talvez?

Ela leva as mãos ao rosto, tampando para que possa suspirar. —Adam, nós
falamos para chamar mais ninguém. —Resmunga após retirar as mãos.

—Quando eles chegam? —Nick pergunta o impedindo de responder.

Ouvimos uma batida na porta.

—Agora? —Fala abrindo um sorriso trêmulo.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
A casa está fervendo.

O time de futebol e as fraternidades foram só o começo. Tenho certeza de que


metade do campus veio para essa festa. Recebi tantos parabéns que comecei a
confundir, e ao invés de agradecer, estava dando parabéns para as pessoas
também.

Essa casa está uma verdadeira lata de sardinha, o calor dos corpos aquecendo o
local faz parecer que estou no inferno. Seguro a mão de Maya que não saiu de
perto de mim em nenhum momento, estou surpreso por querer ficar com todas
essas pessoas a sua volta sufocando. A puxo para a cozinha com a intenção de
pegarmos algo para beber; única coisa boa de toda essa gente foi que todos
trouxeram bebidas, o mínimo na verdade.

Entro e fico aliviado por ter poucas pessoas transitando por ali, além de não ter
nada derramado ou bagunçado. Ela encosta na ilha no meio da cozinha enquanto
eu abro a geladeira pegando uma garrafa de cerveja e procurando alguma latinha
de refrigerante perdida por ali.

—Não precisa…—Não termina de falar porque no exato momento a entrego uma


lata de refrigerante que encontro perdida. —Obrigado.

Entrelaço os nossos dedos nos levando para o amplo jardim mais aos fundos.
Passamos por uma mesa de beerpong ao lado da piscina que jogam os caras do
time de hóquei e futebol americano.

—É a primeira vez que vejo o pessoal do futebol em uma festa. Não que eu tenha
muita experiência nisso. —Comenta.

—Eles só aparecem mais nas festas dadas por nós jogadores. As outras não são
todos que vão, somente em algumas, de certas repúblicas.

—Nossa, que individualistas. —Crítica.

—Poucos são. A maioria é gente boa, é apenas o jeito deles.

—Pensei que eles não se dessem bem com vocês. —Pontua.

—Isso é fofoca. Os times sempre foram amigos, apenas nos provocamos, mas é
algo saudável entre os jogadores. A geração de agora se tornou ainda mais
próxima que as outras. Eu e os meninos somos amigos do capitão do time de
futebol, o Mason, e também do amigo dele Ethan. Isso ajuda a manter a paz.

Ouço um dos seus suspiros antes de falar: —Não era a intenção chamar todas
essas pessoas. Desculpe, percebi seu desconforto no assunto aquele dia. —Volta
ao assunto de mais cedo.
Encosto em uma árvore no fundo do jardim posicionada no início do gramado após
passar pelos ladrilhos em torno da piscina. Coloco nossas bebidas no chão para
que possa a puxar para mim, descansando minhas mãos na sua cintura.

—Meu pai nunca esteve presente em um aniversário meu. —Confesso suspirando.


—Não tenho nenhuma foto com ele nessa data e muito menos uma lembrança. Na
verdade, não me lembro de nenhum momento especial com o meu pai. Todo ano
minha mãe fazia um bolo pequeno e nós dois comíamos sozinhos na cozinha. Por
isso sou apegado a ela, porque em todos os momentos em que me lembro, ela
estava lá com o seu sorriso radiante. Ela é a mulher da minha vida.

Seus castanhos mel brilham sob a pequena iluminação do jardim. Eles estão
atentos as minhas palavras e transbordam empatia. Minha voz é rouca pra
caramba quando continuo:

—Durante todo esse tempo, já cogitei a ideia de ter traído a minha mãe. Ele nunca
estava presente. Parecia um estranho em casa, apenas via ele na hora do jantar
quando não chegava tão tarde. Até pensei uma vez em mexer no seu celular para
ver se encontrava alguma coisa, mas percebi que não iria mudar nada. Não iria
mudar o fato que eu não tenho lembranças com ele. Que a única coisa que ele não
me deu e que eu precisava, era de um pai. Não iria mudar o sentimento de que eu
não era o suficiente pra ele, e todas perguntas a mim mesmo que eu fiz. Eu ficava
tentando achar algum motivo pra isso, quando na verdade, acho que nunca existiu.

Levo uma das minhas mãos no seu cabelo colocando uma das mechas, que
tampava a visão dos seus olhos, atrás da orelha.

—Por isso não ligo para o meu aniversário, porque era apenas uma data para me
fazer lembrar de tudo isso. —Exemplifico. —Mas, uma baixinha de língua afiada
apareceu e me deu o que eu mais queria. Um aniversário rodeado por pessoas
que eu amo. Uma lembrança boa para apagar a ruim.

Estica sua mão até o meu rosto limpando a lágrima que eu não havia percebido ter
escorrido. Ela sorri para mim. Encosta nossas testas antes de esfregar seu nariz
no meu em um gesto de carinho. Sinto a dor em meu peito diminuir aos seus
dedos quentes se entrelaçar aos meus.

—Podemos criar mais lembranças para você substituir. —Sussurra.

—É uma ótima ideia.

—Que tal, começarmos a partir de agora?


Ela avança para cima de mim e busca a minha boca. Seu beijo é doce e quente.
Eu a devoro desejando ter feito isso desde o primeiro instante em que ficamos a
sós. Seus dentes resvalam nos meus lábios, mordendo o inferior delicadamente
enquanto puxa e acaricia o meu cabelo. Desço minhas mãos que foram para sua
cintura até a bunda, apertando e puxando para mais próximo de mim. O corpo
encaixando de maneira perfeita.

—Vamos para casa? —Pergunto ofegante querendo falar e beijar seus lindos
lábios de novo. —Não quero perder o controle aqui e muito menos ter
espectadores para ouvirem seus gemidos quando eu tocar você. Eles pertencem
somente a mim.

Maya Hawkins é apenas minha, assim como eu sou todo dela. E quando ela se
entregar para mim enquanto grita o meu nome, quero que seja somente eu e ela.

A afasto com dificuldade e pego a sua mão de novo. Passamos pelos meninos nos
despedindo e aviso que já estou indo embora com uma desculpa qualquer que
veio à mente. Após atravessar toda a multidão, caminhamos até o carro. Por mais
que a distância seja curta, tanto eu como ela não conseguimos ficar parados.

Acaricia meu cabelo, mordisca minha orelha, beija meu pescoço…cedo ao desejo
e ordeno com a voz rouca que abra as pernas para mim. Vejo se ajeitar no banco
ofegante. Afundo meus dedos a sentindo repleta de desejo pisando os pés no
acelerador com a outra mão posicionada no volante.

Tento me manter concentrado no trânsito trabalhando meus dedos que são


engolidos escutando seus gemidos preencherem todo o espaço, compensando o
fato que não posso admirá-la nesse momento. Tenho a vontade de parar a porra
desse carro e fazer isso aqui mesmo, mas me contenho lembrando que não quero
que sua primeira vez aconteça dentro de um carro no meio da rua.

No momento em que estaciono em frente a casa, ela chega ao seu máximo


dissipando à excitação em prazer tombando a cabeça para trás e fechando os
olhos, aproveitando os segundos.

Salto do carro depressa, dando a volta e abrindo a porta. A pego no colo, forçando
as suas pernas para que se entrelaçam nas minhas costas. Com o raciocínio
voltando, joga seus braços ao redor do meu pescoço e distribuo beijos por todo o
seu rosto fechando a porta com o pé.

Entro, fecho a porta de entrada e a beijo afoito. Com um dos meus braços a
segurando, enrosco minha mão nos fios do seu cabelo. Chupo o seu pescoço
subindo as escadas e em um minuto estamos no meu quarto com a porta trancada,
comigo em cima de uma Hawkins deitada nos lençóis macios da minha cama com
seus fios de cabelos encaracolados nas pontas espalhados pelo meu travesseiro.
A imagem dos céus.

—Eu necessito de você. Só de você. —Esfrego meu nariz no seu carinhosamente.


—Você consegue fazer isso, minha linda?

Ao invés de responder, ela me beija. Doce e suave. Me deixando sentir seu cheiro
de sol, praia e maracujá.

—Feliz aniversário, Liam. —É o que diz antes que eu deixe marcado que Maya é a
minha garota.

Capítulo 38

LIAM
Faz trinta minutos que Hawkins está dormindo com a cabeça no meu peito e os
braços abraçados ao meu corpo. E faz trinta minutos que estou ouvindo as vozes
na minha cabeça gritar. Revirando os últimos acontecimentos. Revirando os meus
sentimentos.

Olho para ela e sinto o meu peito inchar. Eu me sinto em paz. Não sei em que
momento isso aconteceu, pode ter sido muito antes do que imagino, a única coisa
que eu sei é que aconteceu.

Amo admira-la. Amo seu sorriso. Amo como sempre tem uma resposta na ponta da
língua. Amo como é estressada. Amo seu jeito mandão. Amo seus olhos castanhos
mel. Amo seu beijo. Amo o seu abraço. Amo o seu toque. Amo como estar com ela
é fácil. Amo como silencia o mundo a nossa volta para me escutar. Amo como é
sincera. Amo os seus defeitos. Eu amo Maya Hawkins. Inteiramente e
verdadeiramente.

Amo como é o caos mais belo e lindo de se ver. Amo o furacão tranquilo e
avassalador que é. Não importa o quanto possa ser complicada, porque continuo a
amando do mesmo jeito. Com tudo o que ela é.
A observo dormir suavemente, os cabelos caídos nas costas nuas e a respiração
quente batendo em meu peito. Essa imagem me faz ignorar tudo o que um dia
gritou na minha mente, todos os “e se” e medos. Uma dose de foda-se é
acrescentada nas minhas veias e decido que essa é a mulher para minha vida. A
que quero que esteja comigo. A que eu quero arriscar.

Levanto da cama cuidadosamente para que não possa a acordar e sento em


minha escrivaninha. Abro uma gaveta, pego um caderno arrancando um papel
junto a uma caneta. Escrevo mais um dos meus bilhetes diários para ela, bem
maior do que normalmente. Deixo que flua, escrevendo as palavras mais sinceras
possíveis.

Quando termino, não leio. Guardo para entregar a ela no momento certo.
MAYA

A vida anda bem.


E quando eu digo “bem” traduza para risos, carinhos e sexo. Essas duas últimas
semanas foram maravilhosas, o que é assustador. Estou esperando para que a
qualquer momento alguém me acorde ou a vida me dê uma rasteira feia.

Apesar de parecermos dois coelhos, a nossa rotina agitada continua a mesma. Ou


pior. A agenda de treinos e jogos do Liam está mais abarrotada do que nunca,
além dos últimos trabalhos do semestre que estamos nos ajudando, e o meu
serviço. Não que tenha mudado muita coisa antes dessas últimas semanas, só que
detesto professores que deixam tudo para última hora, dificulta mais a vida.

Riley vem me provocando pela suposta reviravolta da minha parte em relação a


tudo o que estou vivendo, principalmente a respeito de Liam. A respeito de um
relacionamento.

Não me arrependo de nada. Tudo está funcionando muito bem. A nossa conexão
me pegou ainda mais de surpresa. Percebo que toda essa situação só deixa meu
coração mais ferrado. Não oficializamos nada e estou com medo de que no final eu
saia me dando mal com toda essa história, mas estou tentando ao máximo não
ficar me preocupando com isso. Quero deixar acontecer, ver onde isso vai dar.

Todo segundo que passo ao seu lado, meu peito dói. Dói por saber que eu estou o
amando. Saber que amo estar com ele, que amo sentir seu toque. Sentir nós dois
queimarmos juntos. Amo olhar em seus intensos olhos castanhos escuros
viciantes. Amo suas provocações. Amo como posso ser eu mesma com ele. Amo
como me conhece. Amo tudo nele. Isso dói, porque não sei até que ponto isso é
recíproco. Dói porque chegou a um ponto que tenho que me policiar para não
verbalizar.

Assusta saber que não estou apavorada. Estou feliz. Em paz, porque estar com ele
me traz paz. É fácil. Pela primeira vez estou sentindo e não estou assustada, não
está sendo aterrorizante. Cada mínima coisinha que faça, tem aos poucos
silênciado os medos dentro de mim.

Saio do prédio da universidade, caminhando para casa querendo comer e


esquecer todos esses pensamentos por alguns instantes antes que Liam passe
para me buscar e irmos para o seu treino. Como consegui folga hoje, decidi entrar
de penetra com ele uma última vez. Só não sei se vou cumprir a parte de ser a
última vez.

No momento em que estou passando pelo campus com minha bolsa e um livro na
mão, uma das coisas que não estava conseguindo fazer devido ao tempo, sinto

meu ombro trombar com outro fazendo a pessoa desequilibrar, quase caindo no
chão junto com o seu celular. Ergo os olhos vendo de quem se trata. Reconheço os
olhos verdes e cabelos laranjas.

—Presta atenção por onde anda, primeira dama. —Resmunga irritada. Reviro os
olhos em resposta.

Primeira dama? Era só o que me faltava, podia pelo menos ser um apelido melhor.
Sinto um instinto possessivo crescer dentro de mim ao lembrar da vez que se
atirou para cima de Liam no meio da nossa aula. A senhora calcinha molhada. Riu
do codinome que acabei de inventar.

Ela abaixa o braço com um prendedor de cabelo cheio de pérolas preso no pulso e
pega o celular que ainda bem não quebrou. Duvido que pagaria um novo, tenho
dinheiro nem para comprar um para mim. Coloca o celular no bolso da calça e
começa a prender o cabelo em um rabo de cavalo alto.

—Obrigado pela preocupação. E você, tome cuidado para não perder a calcinha
por aí. —Sorrio sarcástica para ela. —Dica de ouro da primeira dama.

Volto a andar percebendo como consegui perder minha paciência do dia em cinco
segundos.

… 🏒🏒..🏒🏒..🏒🏒…
—1..2..3..Já! —Grito no rinque vendo Adam, Nick e Brandon patinarem o mais
rápido possível até mim que estou do lado oposto do gelo.

Tem virado costume nosso (dos meninos principalmente) em todos os treinos em


que venho acabarmos a fazer algo no intervalo. Por isso estou em pé em uma pista
de gelo com um medo do caramba de cair de bunda a qualquer momento. O risco
em eu fazer um mínimo movimento é muito grande. Estou pedindo mentalmente ao
cara lá de cima para que meu tênis não deslize.

O resto do time assiste tomando água ou esperando a hora de voltar para o treino.
Como bons espíritos de crianças competitivas que eles têm, o jogo idiota inventado
por mim está acirrado entre Nick e Brandon. Adam patina mais rápido chegando
até mim primeiro, batendo na minha mão. Brandon e Nick chegam segundos
depois.

—Qual o maior planeta do sistema solar? —Pergunto.

—Sol. —Gargalhadas preenchem o ringue acompanhadas de toses vindo do canto


do gelo onde os meninos estão.

—Planeta…—Brandon murmura rindo colocando a mão na barriga como se


estivesse doendo.

—Não é? —Pergunta confuso, sem entender o que está acontecendo.

—Não, Adam. —Informo com carinha de dó.

—Sol não é planeta, cabeça de balão. —Um deles do time adverte.

Os meninos dão um peteleco em sua orelha e ele sai desclassificado, patinando


para junto do restante do time. Sobra Nick e Brandon, ainda empatados. Voltam
para o início, se posicionando, prontos para a rodada de desempate. Flexionam as
pernas, os rostos atentos a minha contagem regressiva.

—1..2..3..Já! —Eles voam até mim. Por segundos fico em dúvida de quem irá
chegar primeiro, mas por um segundo, Nick bate na minha mão antes.

—Qual a língua falada no Brasil?

—Dica. —Pede Nick.

—Não pode isso. —Reclama Brandon ao lado.

—Como você não sabe uma coisa básica dessas?! —Sentencia Stephen.

—Você sabe? —Ele se volta questionando.

—Não.
—Então fica quieto.

—É um idioma falado em Portugal. —Falo.

—Português. —Responde Nate assim que eu falo.

—Caralho cara, não é pra falar! Dedo-duro! —Repreende Jason.

Os dois voltam para refazer a rodada novamente. Patinando como um raio, eles
vêm para cima de mim e por milésimos de segundos tenho a absoluta certeza de
que vão me derrubar e me fazer cair como gelatina no gelo, mas sinto a mão
grande de Brando bater na minha antes dos dois passarem ao meu lado como um
vulto e baterem a cara no vidro de proteção logo atrás de mim. Os meninos do time
largam a risada.

Viram de frente para mim, ambos com a mão na testa. —Vocês estão bem?
—Indago em uma careta, os dois fazem um joia com o dedo em resposta.

—Manda a pergunta. —Pede.

—A cebola é o único alimento que faz chorar, verdadeiro ou falso? —Respondo


para Brandon.

—Hm…verdadeiro?

—Deixa eu jogar uma melancia na sua cabeça pra ve se você não chora. —Berra
Stephen.

O apito do treinador soa trazendo nossa atenção em sua direção. Todos se juntam
com seus focos inteiramente nas palavras que serão ditas a seguir pelo homem
alto e durão. Com o maior cuidado, aos poucos consigo sair do gelo e me sento em
um dos bancos na arquibancada.

Uma hora e meia se passa e agora Liam e eu andamos pelo corredor em direção a
saída. Apressamos o passo do lado de fora da arena ao perceber as nuvens pretas
junto com as gotas d´água que caiem delas. Mas quando já estamos dentro do
carro sendo conduzido com cuidado por conta da pista escorregadia, a chuva que
cai engrossa tornando difícil de enxergar a estrada.

Ele encosta o carro optando como opção mais segura esperar que a chuva
acalme.

—Estava chovendo no dia em que vi você pela primeira vez. —Comenta. A cabeça
descansando na parte de cima do acento.

Olho para o seu rosto de lado, analisando como é lindo seu perfil nesse ângulo. O
maxilar marcado e o nariz reto.
—Posso fazer uma pergunta? —Acena com cabeça, virando para me olhar em
seguida. —O que pensou quando percebeu o que iria acontecer?

Um minuto inteiro se passa sem que nada seja dito. Um completo silêncio. Seus
olhos não deixam os meus nem por um segundo, os encaram profundamente. Viro
e encosto minha cabeça de lado no acento pensando que não vai responder
quando fala:

—Eu não sei. —Admiti. —Foi puro instinto, fiz o que achei que era o certo a ser
feito. Eu não pensei em nada. —Dá de ombros. —A única coisa que pensei foi em
socar a cara dele depois, mas não queria piorar as coisas pra você. —Pausa.
—Lembro até hoje de como ficaram seus olhos naquele dia. —Suspira.

Seu olhar cai para o meu colo e pega a minha mão, entrelaçando os nossos
dedos.

—Lembro exatamente tudo o que aconteceu naquele dia. Eu chamo de incidente.


—Sorrio fraco para ele que volta seus castanhos intensos como a noite para mi.

—Lembro da chuva, do ônibus, de como não consegui me expressar durante o


resto do dia. De tudo. Acho que nunca mais vou esquecer.

Leva nossas mãos ao seu lábio que o beija. Encara o para-brisa do carro
observando as gotas de água molharem o vidro.

—A chuva diminuiu um pouco. —Murmura. Vejo, confirmando o que acabou de


dizer. A chuva ainda está grossa, porém melhor do que minutos atrás.

Quando me dou conta, ele solta nossas mãos abrindo a porta do seu lado do carro
se molhando completamente na chuva. Da a volta e abre a minha porta, também
com as gotas invadindo o carro e me molhando levemente.

—Lembranças boas para substituir as ruins. —É tudo o que ele diz.

Seu cabelo liso começa a ficar encharcado junto com suas roupas. Uso alguns
segundos pensando, mas decidindo por aproveitar o momento. Seguro na sua mão
que é estendida para mim e ele me puxa até a rua bem em frente ao carro parado.

Aproxima nossos corpos, posicionando uma mão na minha cintura e a outra segura
a minha. Apoio meu braço livre no seu ombro com ele iniciando o movimento dos
nossos corpos. Balançamos para um lado e para o outro em sintonia. Dançando.
Sentindo a chuva cair sobre nós, molhando nossa pele, cabelo e roupa. Mas isso
não importa.
O que importa é que esse momento é nosso. Apenas nosso. Eu e ele. Dançando.
Ouvindo nossas respirações enquanto o mundo se faz em completo silêncio. Não
sentimos frio porque o toque e o calor dos nossos corpos queimam, aquecendo
tudo a nossa volta.

Liam começa a cantar “Dream a little dream of me” e me gira, arrancando um


sorriso sincero dos meus lábios. Puxa colando meu corpo ao seu de novo, e aí
acontece. Os mundos se colidem entrando em chamas. Queimando. O fogo inteiro
se alastrando. Consumindo. Estou preso no seu olhar. E ele está no meu. O vento
correndo na noite intensa dentro dos seus olhos.

E simples assim, não consigo evitar as palavras que escapam da minha boca:

—Eu te amo.

Não há reações. Ele fica estático. Ignoro todo o medo e insegurança que possam
me impedir. Todas as vozes.

—Meu Deus! Eu realmente amo você! Amo tudo que possa existir em você.
Somente de olhar para você eu me sinto segura. Porque, caramba, que sensação
boa é de olhar para a pessoa que eu amo. Que sensação boa é de olhar para
você, como se eu viajasse mil milhas para outro mundo. Não ligo se você não
sentir o mesmo, tudo o que eu quero é que saiba que eu te amo. —E que estou
tendo coragem para dizer. Sem medo. Sem estar assustada. —Amo tanto as
vezes, que me pergunto se é possível amar tanto alguém como eu amo você.

Respiro fundo depois de fazer a confissão mais difícil da minha vida de uma vez
só. Seus olhos continuam me analisando. Ele não diz nada. Penso em sair
correndo de vergonha quando finalmente ele fala.

Que droga, Liam. Quer me matar de vergonha?

—Como pode pensar que eu não poderia amar você? —A voz rouca alcança os
meus ouvidos com o questionamento. —Às vezes eu olho para você e não
entendo como alguém antes de mim não viu o que eu vejo. Eu te amo, Maya. Amo
mais que os dias ruins que virão, mais que qualquer distância que possa existir.
Isso nunca vai mudar. Você é a mulher para a minha vida. Sempre foi.

Suas mãos vão para o meu rosto e antes que possa perceber, seus lábios se
colidem com os meus e me beija. Doce e delicadamente. Sem precisarmos usar
mais palavras. Queimamos juntos.
Capítulo 39

LIAM

Seguimos invictos.
Ganhamos mais um jogo, hoje sobre Denver, mantendo uma temporada sem
derrotas. O primeiro tempo foi duro, sem nenhum gol marcado pela nossa equipe.
Fomos para o vestiário com uma desvantagem de 1 a 0.

Deixamos que o cansaço da pequena trajetória até o estádio adversário


controla-se o nosso corpo. Jogar fora de casa é sempre uma droga. Você não tem
torcida, além da probabilidade de perder aumentar consideravelmente. Mas, em
meio a isso tudo, uma coisa é boa: o prazer de ganhar é mais intenso, menos para
o time da casa que passa vergonha por isso.

No segundo tempo aumentamos o desempenho, jogando como deveríamos ter


feito desde o início. Sendo emoção do início ao fim. Nate marca o gol do empate
nos primeiros minutos com uma jogada iniciada por Luke. Só que, minutos depois
Denver dá um tapa na nossa cara ao pontuar mais um gol.

Nossa defesa foi uma verdadeira guerreira com o tanto de faltas sofridas. Na
metade do terceiro período Dylan é jogado contra o vidro de proteção recebendo
uma pancada forte que o faz sair deslizando pelo gelo. Por um minuto penso que
pode estar lesionado, mas aí ele bate os patins no gelo sendo levantado por Nick.

Trocamos as linhas e eu entro. Faltando dez minutos para o final do jogo, o placar
estava 2x1 para Denver. Nash voa em direção à zona neutra com o disco. Ele
lança, me colocando para correr. O jogador central do outro time me persegue,
cotovelos se erguendo à medida que tenta ganhar vantagem, querendo impedir a
jogada. Dou a volta no gol atirando em uma tacada rápida e forte. O goleiro
defende, mas deixando um rebote fácil para Stephen que chega na área.

Ele lança o disco para o goleiro que não consegue fazer a segunda defesa rápida
o suficiente. Empatamos o jogo.

Nos aproximando dos últimos quatro minutos. Conformados com o desconfortável


placar da noite e os pensamentos de consolo em mentes. Adam enxerga um
pequeno espaço entre as linhas e dá uma tacada de longe ao gol, ficando quase
impossível a defesa para o goleiro.

Desliza de joelhos pelo gelo comemorando com as vaias da torcida adversária na


arquibancada ao redor. Dominamos os últimos minutos restantes do jogo que
termina 3x2.

—Estou pensando em pintar meu cabelo de loiro se ganharmos o Frozen Flour.


Como acham que vai ficar? —Nate pergunta tentando acertar a bolinha em dos
copos.

—Loiro. —Responde Jason.

—Parecendo uma calopsita. —Contrapõem Brandon ao mesmo tempo.

Converso com eles enquanto observo jogarem beerpong na mesa da cozinha.


Dylan convenceu a todos sobre a comemoração acontecer na nossa casa, por isso
todos do time de futebol e universitários do campus da Mavericks e vizinhança
preenchem os ambientes. Parte de nós do time está com o cansaço da viagem de
duas horas de ônibus, mas não o bastante para deixar de comemorar. Então,
prefiro fazer isso na minha casa do que em outro lugar.

Minhas tentativas foram falhas de fazer com que Maya viesse dessa vez. O jogo da
noite foi fora de casa e acabou não conseguindo ir à arena assistir por esse motivo.
Tudo está ocorrendo mais do que bem desde a três dias atrás quando ouvi as três
palavras que me fizeram perder o fôlego ao sair da sua boca:

Eu te amo.

Tenho certeza que eu congelei igual uma estátua idiota, mas eu nunca poderia
imaginar como essas pequenas palavras poderiam me fazer o cara mais feliz do
mundo. Estava esperando tanto por isso que quando ouvi, não imaginei que
fossem reais.

Saio de perto indo pegar uma cerveja quando eles iniciam um debate idiota, abro
uma exceção me permitindo beber mais de um copo essa noite. Entro na cozinha
indo direto abrir a geladeira e retirando uma garrafa. Abro e dou um gole. Giro de
costas prestes a sair assim que uma voz grita ao fundo do cômodo.

—E a sua peguete capitão? Vai demorar muito para terminar de brincar com ela?
Não pode esquecer do resto de nós.

Minhas narinas se dilatam e meu maxilar fica rígido em modo automático. Eu me


viro com um sorriso presunçoso no rosto procurando o dono da maldita fala.
Encontro um cara alto com uma estrutura corporal legal e os olhos azuis,
acompanhado de alguns amigos. É um desses hipster qualquer de fraternidade.

—Não muito. —Digo casualmente, dando de ombros. Fingindo entrar nessa sua
brincadeirinha sem a menor graça.

—Quando terminar, avisa. —Pede com um sorriso largo e orgulhoso.

Eu também sorrio. Um sorriso de escárnio. Uso um minuto inteiro apenas para o


encarar profundamente. Ponho a garrafa em cima da bancada e dou passos em
direção a ele.

Quando estou cara a cara com o idiota, meu sorriso some e serro os punhos ao
lado do corpo. Sinto o cheiro de maconha vindo dele. Seus olhos ainda não estão
vermelhos, mas claramente o efeito está começando a bater. Aposto que foi só o
primeiro da noite.

—Qual o seu nome? —Minha voz é tranquila e incrivelmente ameaçadora.

—Caleb.
—Vou te dar um pequeno aviso, Caleb. —Ergo de volta o meu sorriso mais irônico
de todos. —Da próxima vez que você falar assim da minha garota na minha frente
ou em qualquer lugar na porra desse campus, eu vou descobrir, pode ter a
certeza disso. Eu vou arrancar um por um dos seus dentes. E tenha certeza que eu
vou ter o prazer de fazer isso. —Minha mandíbula está cerrada quando termino.

Dou as costas pronto para sair da cozinha finalmente. Mas, existe pessoas que
gostam de brincar com o perigo.

—Eu não caio nessa, seu filho da puta. —Berra de volta. Quer brincar, Caleb?
Então vamos. Só não se esqueça que eu não sei perder.

Não me dou o trabalho de virar para ele novamente, apenas respondo:

—Você já caiu. E por favor, seja mais educado ao falar da minha mãe. Não quero
quebrar mais partes do seu corpo. —Pego de volta a garrafa em cima da bancada
e dou um gole. —Sorte que foi comigo e vou te perdoar, se fosse meu amigo você
já estava no hospital. Vou deixar isso como um segredinho nosso.

Viro o rosto dando uma última encarada fulminante nele com um sorriso arrogante.
Ergo a garrafa para cima como um “tchau seu caralho de merda” e saio.

Passo os próximos minutos da festa dividido em conversar com os caras, e a


galera do time de futebol, e em dar fora na metade das garotas presentes que
faltam implorar para eu ficar com elas. Como podem passar tanta vergonha por um
homem? No fim, quando todos os meus amigos já arranjaram a sua foda da noite,
sento no sofá da sala e retiro o celular mandando mensagem para a minha
Hawkins.

Eu: Estou me sentindo solitário. Preciso de alguém para me fazer companhia.


Ela: Seus amigos já te abandonaram para transar?
Eu: Sim. Poderíamos estar fazendo o mesmo.
Ela: Tenho certeza que pode sobreviver até amanhã.
Eu: E eu tenho certeza que Riley não vai se importar de você dar uma
escapadinha rápida da noite de vocês e vim me ajudar.

Antes de ver a resposta que enviou, olho para o lado e vejo Nick em cima da mesa
de beerpong fazendo o seu próprio show ao som de “Should i stay or should i go”,
claramente essa noite foi uma das que ele decidiu extravasar. Filmo com a minha
mente tentando entender como não caiu durante a sua dança.
Envio para Maya e guardo na minha pasta da galeria “armas para usar contra meu
melhor amigo, Nick Watson”. Sinto os meus olhos pesarem e o meu cérebro
começar a viajar em pensamentos aleatórios. Eu realmente não me dou bem com
bebidas, já prevejo uma ressaca do cacete de manhã.

—Ele não vai se lembrar de nada amanhã. —O quarterback principal do time de


futebol, Mason, aparece se sentando do meu lado.

Não acompanho a temporada do futebol americano, mas sei que estão se saindo
bem a medida do possível. Tem uma boa equipe, a metade sendo novata e a outra
veterana. Acho que as equipes futuras vão ser ainda melhores depois que os
novatos pegarem experiência, a maioria deles são muito bons. A universidade
acredita que eles têm boas chances de trazer o troféu para casa em breve.

—Eu vou fazer a questão de lembrar.

—Me envia o vídeo? —Pede virando a garrafa de cerveja que está em sua mão na
boca.

—Com prazer.

—É sempre bom ter uma arma para usar contra um de vocês. —Comenta. É…isso
não deixa de ser a verdade.

—Sem acompanhante hoje Brown?

—Estou deixando o caminho livre pra você.

—Nós dois sabemos que eu não preciso disso.

—E por que está sem ninguém até agora?

—Porque ainda vou escolher a próxima. —Levanta indo à caça.

Meus olhos pesam mais e minha mente não está mais raciocinando como deveria,
os pensamentos lentos e o impulso querendo dominá-los. Decido me levantar
também e subir para o quarto antes que eu possa fazer alguma merda.
Capítulo 40

MAYA

Alguma coisa aconteceu.


Estou caminhando pelo campus e sinto como se estivesse vivendo um déjà-vu
mais uma vez. Mas nessa vez, as pessoas estão se esforçando. Sim, se
esforçando.

Não sei o que é pior, elas se esforçarem para não olhar na minha cara ou para não
cochichar enquanto passo por elas. Preferia que estivessem fazendo isso na cara
dura que me sentiria melhor. Além disso tudo, vem o fato de que eu não faço a
mínima ideia do por que.

Eu detesto ter atenção, sempre fui assim. Entendo que a partir do momento que
passei a ficar cada vez mais próxima de Liam e dos meninos do time, isso iria
acontecer. Não pedi por isso, mas aceitei. Não me importo quantas fofocas ou
quantas pessoas saiam falando por aí de mim, não ligo para o que elas pensam e
muito menos vou me afastar de alguém por esse motivo.

Vou andando até a casa dos meninos com a intenção de descobrir alguma coisa a
respeito, uma preciosa vantagem quando se tem amigos fofoqueiros, e também
para eu conseguir ver Liam. Ontem foi a comemoração de mais uma das suas
vitórias, só que na casa deles. É difícil eles darem alguma festa, normalmente, eles
que vão. Diante disso, tenho certeza que nenhum dos patetas vai estar acordado a
essa hora, que é no caso, a hora do almoço. Acabei optando por não ir à festa
ontem, já que não sou a maior fã, e também porque fazia dias que não tinha um
tempo digno com Riley e estava com saudades.

Vinte minutos depois estou batendo na porta, me preparando mentalmente para


ver caos, bagunça, copos para todos os lados, calcinhas, caminhadas da vergonha
(sim, no plural) e sentir um cheiro enorme de cerveja, drogas e sexo.
Surpreendentemente Dylan atende a porta dando a linda (traduza para quase
horrível) visão da sua cara de manhã. Antes que eu possa dizer qualquer coisa,
uma menina toda descabelada pede licença saindo correndo pela fresta da porta.

Como eu disse: caminhada da vergonha. Vou contar mentalmente para ver


quantas vão ser ao total.

—Que caminhão te atropelou? —Pergunto irônica. Seguro a risada vendo sua


expressão de quem acabou de acordar. —Anotou a placa pelo menos?

—Muito engraçado, Hawkins. O que está fazendo aqui a essa hora?

—São meio dia para a sua informação. Vai me deixar entrar ou não?

—Claro que vou. Liam chuta a minha bunda se descobrir que te deixei pelo lado de
fora.
Ele abre a porta dando passagem. Sendo surpreendida mais uma vez em menos
de cinco minutos não encontro calcinhas pelo chão e não está tão ruim como
imaginei. O cheiro de cerveja com certeza está presente, há copos espalhados,
mas não muitos. Da para sobreviver.

—Liam está lá em cima?

—Sim. Apenas eu e o Luke estamos acordados.

—Okay, obrigado.

Subo as escadas, esbarrando em uma morena bonita no processo. Atualizo a


contagem para duas. Chegando no segundo andar, dou de cara com uma loira que
se assusta ao me ver. Uh, essa é mais bonita. Bom gosto para quem foi o sortudo.
Atualizando a contagem para três.

Abro a porta do quarto encontrando um Liam derrubado em um sono pesado


deitado de frente para a cama e abraçando um travesseiro. Uso alguns minutos
para dar uma boa secada nas suas costas delimitada por músculos. Aproximo da
cama, deito ao seu lado e distribuo diversos beijos pelo seu rosto. Canto “Dream a
little dream of me” como sempre faz comigo para acordar, só que da minha
maneira desafinada.

Aos poucos seus olhos se abrem me privilegiando da ampla visão dos seus
castanhos escuros intensos que me prendem e fazem voar. Faço cafuné nos seus
curtos fios de cabelo esperando o Windows do seu cérebro reiniciar, o raciocínio
volta para o seu corpo aos poucos. Quando se dá conta de que eu estou deitada
ao seu lado, um pequeno sorriso surge em seus lábios.

—Bom dia. —Sussurro com um sorriso no rosto.

—Bom dia. —Ficamos segundos em silêncio antes de perguntar. —Dormi muito?

—Não sei, acabei de chegar. Você parecia cansado.

Suspira e vira de lado, ficando de frente para mim. Tiro a mão do seu cabelo e a
deixo descansar em cima do lençol branco da cama.

—Acho que bebi mais do que deveria na festa. —Resmunga.

—Não mais que o Nick. —Retruco.

Nós dois rimos lembrando do icônico vídeo de Nicolas Watson em cima de uma
mesa dançando e cantando como se fosse a própria Beyonce. A única coisa que
faltou para que tudo ficasse ainda melhor nesse vídeo, foi ele tirar a roupa.

—Esse vídeo merece o prêmio de melhor do ano. —Opina.


—Ah, o vídeo do Adam foi muito bom também.

—Verdade, acho justo um empate.

—Hoje eu já contei três caminhadas da vergonha. —Informo.

—Qual foi a pior?

—Com certeza a primeira, ela estava toda descabelada. Fiquei com dó. —Ele ri
com a minha franqueza.

Passamos mais alguns minutos deitados na cama conversando e trocando carícias


durante o tempo que Liam toma coragem para se levantar. Depois de muita
enrolação, por fim, decidi ir tomar banho. Ele realmente está precisando. Seu rosto
está acabado, com certeza vai ficar com dor de cabeça mais tarde. Impressionante
como mesmo assim consegue continuar lindo de modo a fazer qualquer uma
babar.

Admiro descaradamente seu tanquinho no abdômen cheio de gominhos e a sua


marcação em v, mais conhecido como o: caminho para o pecado. Assim que some
dentro do banheiro, continuo deitada por mais alguns minutos antes de decidir
levantar e pegar meu celular na bolsa que joguei em cima da sua mesa de
escrivaninha quando entrei.

Sento na cama e encaro o chão de baixo dos meus pés reparando em um elástico
de cabelo caído. O pego vendo as várias pérolas que o decoram. Tenho a
sensação de que reconheço esse elástico de algum lugar, mas nada me vem à
mente. Alcanço a escrivaninha, retirando meu celular de dentro da bolsa. Levo um
susto ao ver a barra de notificação de mensagens de Riley na tela de bloqueio.
Clico pressentindo que uma bomba está prestes a ser estourada na minha mão.

E odeio como nesses momentos eu consigo estar certa.

Ela: Maya, você já está sabendo?


*link* *link*
Ela: clica nos links.

Ela: Sinto muito.

Ela: Me manda mensagem assim que puder.

Abro o link e sinto meu coração quebrar a cada segundo que ouço ao áudio.
Imaginando que não poderia piorar, a foto postada por um site de fofocas do
campus da Mavericks no segundo link que Riley me enviou mostra completamente
o contrário.
Quero chorar. Muito. Você não pode chorar, não aqui. Os meus olhos ardem
lacrimejando, mas nenhuma lágrima cai.

Ouço o barulho da porta do banheiro da suíte de Liam se abrindo.

—Que elástico é esse na sua mão? Você nunca prende o cabelo. —Fala de
repente segundos depois.

Baixo o olhar para o objeto em que está preso em minha mão. Pérolas. Um estalo
vem à mente.

—É o elástico da Olívia, eu a vi usando alguns dias atrás. —Respondo. Fazendo


um esforço do tamanho do mundo para que minha voz soe normal.

—Olívia? Por que você estaria com o elástico dela?

—Não sei. Por que o elástico dela estava caído ao lado da sua cama? —Rebato.

Crio coragem e me viro de frente para ele, encarando os seus olhos que tanto
amo, e que agora, tudo o que eu quero é apagá-los da minha memória. Apagar
todas as vezes em que me senti viajar ao olhá-los.

Sua expressão é de confusão. Seus malditos olhos transmitem isso.

—Do que está falando? —Em outra ocasião, estaríamos nos beijando nesse
momento, aproveitando o tempo que temos antes de continuar a viver o nosso dia.
Pensando nisso agora, fico dividida entre chorar ou vomitar.

—Por favor, se você tem o mínimo de respeito a mim, seja sincero cacete!

—Eu estou sendo sincero! Você pode explicar do que está falando? —Sua voz
rígida me atinge.

Jogo meu celular na cama que nos separa para que veja. Veja o quão babaca é.
Que fui uma idiota em cair na sua. Em acreditar que um cara como ele poderia
gostar de mim de verdade. Que eu poderia ser amável.

—Tem mais um link na conversa com Riley. —Informo.

Ele não tira os olhos da tela a sua frente pelos próximos dois minutos inteiros. Um
silêncio recai sobre nós antes da avalanche chegar.

O som do áudio preenche o cômodo, mas o barulho de tudo se quebrando é


ensurdecedor.

“—E a sua peguete capitão? Vai demorar muito para terminar de brincar com ela?
Não pode esquecer da gente.
—Não muito.
—Quando terminar, avisa.”

Um. Dois minutos se passam.


—Acredita mesmo nisso? Isso é uma montagem. —Argumenta e larga o celular em
cima da cama.

Os olhos cravam nos meus. Não me olhe, a dor de olhar em seus olhos é uma filha
da mãe.

—Eu acredito no que estou vendo, e nesse momento eu vejo uma foto com Olívia
atrás de você subindo a escada, a merda do elástico dela que encontrei no chão
do seu quarto e um maldito áudio que insinua claramente que você é um grande
escroto!

Seu maxilar está rígido e a expressão em seu rosto demonstra como se estivesse
um gosto amargo na boca. Mas eu estou muito concentrada no som dos cacos se
quebrando para analisar toda a sua reação. Estou concentrada no barulho das
coisas dentro de mim se rasgando. Desvio os olhos dos seus porque olhar para ele
dói. Dói pra cacete.

Raiva corre pelas minhas veias enquanto lágrimas quentes de tristeza enchem os
meus olhos, insistindo em cair. Faço uma escolha. A raiva. Contenho toda a dor,
todos os meus sentimentos, toda a tristeza e os guardo para mim. Somente para
mim. Deixando apenas a raiva. A usando para as minhas próximas palavras que
saem frias.

—Pobrezinha da menininha do ônibus. Você deve ter sentido tanta pena, não é?
Porque não brincar com ela para poder se sentir melhor?! —Ironizo.

—Não. Eu não senti pena de você, e muito menos brinquei com você. —A sua voz
rouca e firme retruca.

—Então, olha nos meus olhos e diz que você não fez isso. —Desafio. Seus olhos
transmitem dor assim como os meus.

Ele abre a boca, mas por um segundo, nada sai.

—Eu não…

—Você contestou. —Interrompo. Um suspiro pesado corta meu peito. Levo a mão
ao rosto não querendo acreditar no que está acontecendo.
Solto uma risada sarcástica com a sua falsidade. Inclino sobre a cama para pegar
meu celular e colocar dentro da bolsa. Apoio ela nos meus ombros e me viro com o
objetivo de ser última vez para ele.

—Obrigado por mostrar que eu estava certa desde o início. Você é a merda de um
babaca! —Finalizo.

Saio sem deixar que possa falar qualquer coisa a respeito. Uma lágrima irritante
escorre pelo meu rosto, limpo ela com a mão rápido, mas já é tarde. Meus olhos
ardem e se enchem. A avalanche do caos querendo sair para fora.

Esbarro com Nick que sai do quarto olhando para o meu rosto e me assistindo
descer as escadas. Ouço passos pesados e firmes correndo atrás de mim. Tento
acelerar a passada, mas ele é mais rápido e me alcança antes que eu possa sair
porta a fora. Seu braço segura o meu pulso, girando meu corpo obrigatoriamente
para ele.

Nossos corpos estão próximos e consigo sentir o seu cheiro masculino


amadeirado. Fecho os meus olhos lembrando de tudo. Todos os beijos. Todas as
palavras. Todos os toques. Todos os momentos que criamos. Tudo.

Quero fugir para onde não tenha nenhuma lembrança do que ele foi para mim.
Quero esquecer que isso um dia aconteceu. Que um dia eu estive em seus braços.

Os medos, as palavras que minha mente sussurra, as inseguranças…tudo volta de


uma só vez. E mais uma lágrima cai.

—Eu confiei em você. —Sussurro. Abro os olhos para olhar nos seus enquanto
digo as minhas palavras.

—Eu sei. —Ele diz.

—Eu me entreguei pra você. —Olhos machucados passeiam pelo meu rosto.

—Eu sei.

—Eu amei você.

—Eu sei. —Sussurra com a voz soando rouca e dolorosa.

—Mas quer saber de uma coisa?! Eu nunca fui sua namorada de verdade. Você
tem todo o direito de foder quem quiser. —A voz cortante coloca um fim em
qualquer coisa que possa acontecer.

Sua mão afrouxa o aperto no meu pulso. Viro de costas e saio batendo a porta.
Respiro fundo não me permitindo chorar por algo que, no fim das contas, não
existiu.
LIAM

Maya foi embora.


Maya estava chorando. Eu fiz Maya chorar.

Seus castanhos mel brilhavam devido às lágrimas que segurava e que persistiam
em permanecer ali. Dez minutos. Em dez minutos meu coração quebrou como a
porra de um vidro. Em dez minutos eu perdi a garota que eu amo. Meu peito está
como se alguém tivesse cravado uma lâmina de patins e girado. É assim como me
sinto agora.

A cada palavra que saía da sua boca sentia mais uma faca ser enfiada por todo o
meu corpo. Dor e decepção passavam por seus olhos e, caralho, cada vez que me
forçava em encara-los tinha vontade de socar a parede até que minhas mãos
estejam quebradas e ensanguentadas.

Tudo o que eu queria era a fazer sorrir, e no final, o motivo do desaparecimento do


seu sorriso, foi eu.

Tudo o que me lembro da noite passada são flashs. A última coisa que lembro com
certeza é de conversar com Mason no sofá da sala. Então, sim. Estou com receio
de ter feito merda. Sim, eu contestei.

Os meus medos que eram aparentemente idiotas batem na porta como


verdadeiros filhos da puta, me assombrando como sempre fizeram. Desejando
“boas vindas” de volta a mim muito antes do que eu poderia imaginar. E junto com
eles, a vontade de que Maya volte. Que passe por aquela porta, me abrace e
nunca mais me solte. Que seja apenas eu e ela.

Encaro a porta como se isso fosse fazer com que a qualquer momento seu corpo
pequeno e compacto passe por ela. Mas não vai acontecer.

As palavras que disse se repetem em minha memória, como um looping infinito


forçando a minha própria tortura mental, porque eu mereço. Por ter a feito chorar.
Por ter quebrado o seu coração.

—Posso passar a coroa de babaca pra você? —A voz de Dylan alcança os meus
ouvidos, obrigando minha mente a voltar a realidade.

Desvio o olhar em sua direção o vendo sentado no sofá da sala. Não havia
reparado a sua presença até então. Pelo o que percebo, acompanhou todo o show
de camarote. Luke surge da cozinha segurando uma xícara escrita “Melhor pai do
mundo”. Presente que ganhou de mim, Dylan e Nick de brincadeira, argumentando
que é por sempre agir como um verdadeiro pai do grupo. E agora o usa como um
símbolo de honra.

—Exatamente por essa pergunta que você vai continuar com a coroa de babaca
para sempre. —Ele sorri irônico e toma um gole da sua belíssima xícara.

Sem cabeça para piadas nesse momento, viro para subir as escadas e me trancar
pelo resto do dia com uma garrafa de uísque no meu quarto. Só que sou impedido
por um Nicolas Watson furioso que me para antes que eu possa alcançar a
maçaneta da porta do quarto.

—O que aconteceu? —Fecha a passagem da porta.

—Quando eu já estiver bêbado, você faz a pergunta de novo.

Desvio do seu corpo alto, mas mais uma vez sou impedido por ele que persiste em
ficar na minha frente e manter essa conversa.

—O campus inteiro já está comentando no Twitter. Como meu melhor amigo estou
te dando a chance de se explicar e eu não meter um murro na sua cara como eu
quero agora. —Ameaça, sua voz me diz que não está para brincadeira.

Já o vi muitas vezes desse jeito. Nervoso. Parecendo que vai quebrar alguém ao
meio. Mas nunca comigo.

—Acha mesmo que eu faria tudo o que estão comentando? Como você disse, eu
sou o seu melhor amigo.

—É exatamente por isso que quero esmurrar a sua cara. Ela é minha melhor
amiga! Minha irmã porra! E eu a vi sair chorando do seu quarto! —Suspira. O seu
tom de voz a seguir é compreensível. —Você é o meu melhor amigo, Liam, então,
me fale. —Suspiro pesado.

Antes de começar a explicar os últimos minutos, ele vai ao seu quarto retornando
um minuto depois com sua garrafa de Jack Daniel´s estendendo para mim em uma
boa ação. Presta atenção a cada palavra enquanto bebo da garrafa dele.

Ele me encara com empatia quando termino, mas sei que deve estar imaginando
como Maya está nesse momento. Assim como ela se tornou importante para mim,
sei que se tornou para ele também. De formas diferentes.

Só que apenas um de nós quebrou seu coração.

Capítulo 41
LIAM

Seu cheiro está se perdendo.

Viro o rosto no travesseiro da cama aspirando fundo o seu cheiro que está
deixando de existir aqui. E por toda a parte.
Durante as últimas quarenta e oito horas passei cada segundo delas com o rosto
enfiado nesse objeto macio que estava impregnado pelo seu cheiro composto de
maracujá, sol e praia. Porém agora, ele se perdeu. Não tem mais nada. Seu cheiro
não existe mais nesse quarto, como se ela nunca estivesse aqui um dia. Só que
ela esteve.
Diferente do seu cheiro, a sua presença está em todo canto desse quarto. Para
onde quer que meus olhos se movam, eles enxergam fragmentos seus perdidos. E
mesmo que não tenham coisas suas em alguma parte, tudo lembra ela. As
memórias que criamos. Os momentos que vivemos.

Me obrigo a abrir os olhos e enxergar sua presença em cada parte desse lugar.
Obrigando a não me deixar esquecer que ela não está mais aqui. Ela não está
mais comigo, onde deveria estar. Apenas a lembrança que um dia esteve e, agora,
que não vai estar mais.

Ainda posso ouvir sua risada e ver o vislumbre do seu sorriso. A sua cara de brava
quando a provoco e seu entusiasmo ao perguntar que livro está lendo. Consigo ver
seu jeito bobo ao ler um dos meus bilhetes, como estava quando dançamos na
chuva, a primeira vez que dormiu no meu quarto, sua concentração ao jogar com
Nick, da sua torcida na arquibancada. Tudo. Maya Hawkins ainda está mais
presente em minha memória como nunca esteve, e sempre vai estar.

Deixo que meu braço caia na lateral da cama, procurando pela garrafa de Jack
Daniel’s em pé no chão. Agarro o gargalo e o levo até a boca, fazendo com que o
conteúdo alcance minha garganta, mas está vazio. Largo no chão, novamente
forçando a cabeça tombar sobre o algodão macio que não tem mais o cheiro de
Hawkins.

Somente a menção em seu nome faz meu peito doer mais do já está.
Não lembre dos olhos, Liam. Não lembre deles opacos por sua causa. Não lembre.
Lembre. Das lágrimas escorrendo pelo seu lindo rosto. Sinta como dói.
Volte pra mim, minha linda. Eu te amo.
Eu te amo… tanto!
Você é tudo o que eu não mereço.
Brigo com a minha mente quando eu sinto o meu corpo sóbrio começar a dar as
caras sem permissão. Xingo a mim mesmo no segundo que a porta do meu quarto
é escancarada com o barulho da maçaneta batendo na parede. Imediatamente
minha cabeça lateja com o estrondo.

—Saia da cama, agora! —A voz ameaçadora de Luke alcança os meus ouvidos.


Uso o travesseiro para tampar todo o meu rosto, mas o desgraçado o arranca a
força de mim junto com o cobertor que cobria o meu corpo.

—Você está fedendo a álcool, seu quarto está parecendo um chiqueiro, está nos
fazendo passar fome e faz quatro dias que não sai do quarto a não ser para ir ao
treino. O que na verdade está fazendo um trabalho de merda e temos uma final
daqui a sete dias! —Resmunga parecendo prestes a gritar no meu ouvido.

—Eu estou de ressaca. Sério que você vai me dar um sermão agora? —Murmuro.

—Sim, eu vou. Você é o nosso capitão, e está agindo como a porra de um bêbado
derrotado. Ainda temos uma temporada para ganhar, cara. —Suspira. Espera por
alguns segundos alguma reação minha, mas não recebe nada de volta.

—Nada? Sério mesmo? Vai me fazer ficar aqui gritando com você até eu cansar?
—Não respondo. —Tudo bem, a escolha foi sua. —Não entendo de imediato até
pronunciar o nome de Nick em um grito.

Puta que partiu, se já estava ferrado com Luke me dando um sermão de pai (o que
vai durar pelos próximos três dias), agora, eu estou literalmente fudido.
Uma água gelada é derramada, me molhando inteiro junto com o lençol que cobre
todo o colchão. Que droga porra!
Levanto imediatamente ficando sentado na cama. Como se não bastasse uma
cachoeira de água jogada em mim, aperta uma buzina próximo ao meu ouvido
soando por todo o quarto e quase me fazendo ficar surdo de uma orelha. Bando de
mal amados. Estou com a cabeça latejando, fecho a cara.
—Só pra deixar claro, estava óbvio desde o início que iria dar errado do seu jeito.
Eu avisei. —Ouço a bufada de ar de Luke em relação ao seu comentário.
Forço os meus olhos a ficarem abertos, deparando com Luke e Nick parados ao
lado da cama e Dylan em pé no batente da porta com uma vasilha de cereal na
mão acompanhando tudo.

—Você tá péssimo, cara. —Ele informa. É, eu sei.


Levo uma das minhas mãos ao rosto esfregando os olhos e tentando seca-lo de
alguma maneira.

—Você foi ver ela? —Questiono olhando para Nick dessa vez. Por favor, diga que
sim. Diga que ela está melhor. Não vou aguentar imaginar seus olhos brilhando
pelo motivo errado.

—Não. Quis dar um tempo pra ela. —Fala. Eu aceno com a cabeça.

—Eu sinto muito, cara. —Lamenta Luke. É, eu também sinto. Sinto muito.

—Mas, você continuar aqui não vai fazer ela voltar. O que você pode fazer é
levantar dessa cama e lidar com as suas merdas. —Ele dá um tapinha no meu
ombro como o seu verdadeiro papel de pai.

—Precisamos de você. —Completa Nick.

—É verdade. Não aguento mais comer as coisas que eu faço, minha comida é uma
porcaria. —Concorda Dylan.
Os três saem do quarto dizendo que vão me esperar no carro para irmos juntos
para o treino.

Tenho que lidar com as minhas merdas. Tenho uma final para ganhar. Tenho que
parar de me martirizar e agir. A minha Hawkins se me visse assim estaria gritando
e brigando comigo, obrigando a me levantar. A minha Hawkins estaria brava
porque eu poderia perder a final com o jeito em que estou agindo. A minha
Hawkins estaria aqui. Não estaria chorando. Estaria brava com os braços cruzados
e olhos pegando fogo. A minha Hawkins…
Eu sinto…tanto…a sua falta, minha linda.
Me desculpe por te machucar. Você é o meu caos. O meu lindo caos. E eu sinto
falta dele. Sinto falta de você.
Por favor, Deus, por favor… não esteja triste por minha causa…
Com todos esses pensamentos tomo a coragem de levantar e tomar um banho.
Vinte minutos depois encontro com eles dentro do carro de Luke e partimos para a
arena. Quando chegamos vamos direto para o vestiário colocar os equipamentos,
ninguém do time ousa falar absolutamente nada relacionado as fofocas que
correram pelo campus, muito menos ao meu desempenho nos treinos dos últimos
dois dias. Melhor assim.
Entramos no ringue. Aproveito a sensação da lâmina deslizando no gelo. O calor e
o suor escorrendo pelo meu rosto. Toda a minha energia canalizada é despejada
depois de dias presa. A raiva e a dor sendo usadas ao meu favor. O treino é
intenso e com pausadas de cinco minutos, somente. O treinador Porter está focado
em vencer. E nós vamos. Estou de volta agora, e com um único objetivo.
As horas que se passam deixam a sensação de ter sido segundos. Que saudades
eu estava disso. Tenho a vontade de passar mais cinco horas aqui, sem dor,
apenas eu e o gelo.

Sou o último a sair do ringue (sendo obrigado), para poderem limpar a pista.
Caminho parcialmente cansado pelas minhas pernas que latejam. Essa que é a
consequência de não treinar direito por dois dias. Quando abro a porta do vestiário,
todos os rostos se voltam para mim. A galera do time para o que está fazendo
esperando a minha reação. Só que não sei que diabos de reação é essa. Não pelo
menos até eu chegar ao meu armário.

—Ninguém vai dizer nada para o treinador, entenderam? —Aviso em um tom de


ameaça. —Vamos deixar isso apenas aqui. Nesse vestiário. —Todos concordam.

Retiro o meu capacete e paro para analisar a obra de arte na minha frente.

O meu armário está pichado com tinta preta por todas as partes junto as minhas
roupas, incluindo a sua e a minha camisa do time (o que estou tentando pensar em
algum modo para entender como ela a conseguiu), que tem desenhos de um dedo
do meio e cortes em determinadas partes.
Que pena, minha linda. Ela ficava tão bonita em você. Mas isso não é problema, eu
compro uma nova.

As palavras “filho da puta”, “idiota” e a frase “Voe e queime sozinho no inferno”


estão escritas em letras maiúsculas. Eu sorrio. Sorriu como um verdadeiro idiota.
Porque isso é exatamente a cara de Hawkins, e por esse motivo não me encontro
nenhum pouco surpreso.
Quanta criatividade, minha linda. Leonardo da Vinci estaria chateado pela sua obra
ter superado as dele. Eu vou ter o prazer de te fazer pagar por tudo isso depois.

Ela está brava. E isso não poderia me deixar imaginar a cena mais linda do mundo;
dela com a boca em formato de bico, os braços cruzados e os olhos ameaçadores.
É quase como se eu pudesse vê-la agora. É lindo pra cacete. Admiro sua
esperteza, meu amor, esperou todos nós estarmos no ringue para fazer isso. Mas,
se o seu objetivo era se vingar, só fez que surtisse o efeito contrário, porque agora,
eu estou mais que decidido em ir atrás de você.
Você vai ser minha de novo, Maya Hawkins. Como sempre foi.

—Um de vocês, pegue algo para limparmos antes que alguém veja. —Ordeno.
Logo ouço o barulho da porta ser aberta e fechada.

—O negócio tá feio mesmo. —Brandon murmura observando a alguns metros de


distância.

—Precisamos resolver isso. —Nate anuncia.

—Urgentemente. —Adam concorda. —O capitão já estava mal, depois dessa eu


estou com medo por ele. Vai que ela organiza uma multidão de meninas para
destruir a casa e o carro dele.

—A capitã não faria isso. —Defende Stephen.

—Não duvide cara, mulher é vingativa. —Jason alega.

—Temos que montar um plano. —Adam sentencia.

—Um plano? Igual “missão impossível” e “velozes e furiosos”? —Questiona


Brandon.

—É!

—Desde que não seja você a montar o plano, é uma boa ideia. —Dylan entra na
onda.

—Como seria? Fazer uma serenata de amor e jogar pedrinhas na janela igual nos
films de romance? —Zomba Brandon.
—Isso não seria uma má ideia. —Rebate Adam.

—Ou poderiamos fazer um back vocal e o Liam cantar uma música em declaração.
—Sugere Stephen.

—Meu Deus. —Peter sussura em indignação.


—Eu estou ouvindo vocês! —Resmungo chamado a atenção e me virando de
frente para eles.

—Que bom, alguma sugestão? —Adam interroga.

—Vocês querem colocar o meu relacionamento em risco com um plano?


—Protesto.

—Tecnicamente não está em risco pelo motivo óbvio bem atrás de você. —Nick é
quem fala agora. Muito engraçado, Nicolas Watson. Quero ver quando for a sua
vez.

—Quer mesmo recusar a nossa ajuda? Tenho quase certeza de que você vai
precisar dela. —Nate desvia o olhar rapidamente demonstrando o porquê da sua
fala.
Volto a minha atenção para Luke que já está trocando de roupa pedindo
indiretamente para que me dê uma opinião sensata do que fazer.

—Bom, não sendo um plano completamente idiota, acho que pior não fica. —Diz.
Que ótimo…parece mesmo que estou no fundo do poço.

Suspirando, eu concordo:
—Tudo bem.

Vinte minutos depois estamos todos sentados ao redor de um quadro que os caras
pegaram emprestado do treinador. Parece que estamos mais resolvendo o mistério
do baú de ouro na terra do nunca do que montando um plano. As perguntas “o que
aconteceu”, “quem filmou o vídeo”, “quem tirou a foto”, e mais dez como essas
estão escritas e sem respostas. Tento repassar todos os acontecimentos e
possíveis motivos para alguém ter feito isso.

Crio uma lista em mente, cortando nome por nome em ordem de eliminação.
—Você bebeu quanto aquela noite? —Pergunta Nate.

—Não muito, umas duas cervejas.

—Então, como não se lembra de nada? Nick bebeu bem mais que você. —Dylan
fala.

—É uma boa pergunta. —Murmura Luke.


—Com certeza isso foi mais uma das coisas que essa pessoa misteriosa fez. Fora
isso, não faz nenhum sentido. —Declara Nate.
É verdade, mas não me lembro de ter visto ninguém mexendo na minha bebida
aquela noite.

—Sabe alguém que pode ter feito isso? —Stephen pergunta.

—Não, só algumas suposições. —Suspiro. Os próximos dois minutos são em


completo silêncio. Todos estão pensando. Procurando resposta.
Lembre. Lembre dos detalhes. Lembre de tudo.

—Maya encontrou um elástico de cabelo no meu quarto no dia seguinte. Esse foi o
ponto crucial para ela achar que tudo era verdade. —A atenção de todo o time está
voltada para mim. —Ela havia dito que era de Olívia.

—Olívia? A da fraternidade Phoenix? —Questiona Brandon. Eu aceno em um sim


com a cabeça.

—Não duvidaria nada com o histórico que ela tem. —Adam confessa. Acho que ter
amigos fofoqueiros tem os seus benefícios.

—Que histórico? —Dylan faz a pergunta que está se passando na cabeça de


todos.

Os próximos dez minutos são resumidos a olhares surpresos e arregalados com


tudo o que Adam sabe, além de todos os boatos que correram pelo campus. Em
que mundo eu estava vivendo?
Agora me vem à mente como Hawkins está lidando com o que todas as pessoas
estão comentando sobre ela, sobre mim, sobre nós e sobre o que aconteceu. Puta
merda, tinha me esquecido dessa parte.
Montamos o plano. Passo por passo, tentando pensar em todos os detalhes.
Suspiro de alívio em perceber que o cérebro do plano não é Adam, caso contrário
a sua solução resultaria em uma expulsão de todo o time da Universidade.

Trinta minutos depois estamos em pé ao redor do quadro encarando e revisando


tudo o que pensamos e planejamos. Espero mesmo que isso de certo.
Passos são ecoados do lado de fora, nos entreolhamos alarmados nos
apavorando no processo de tirar foto e esconder durante os cinco segundos antes
da porta ser aberta.

—O que estão fazendo aqui ainda? —A voz grossa do treinador Porter faz com
que fiquemos em silêncio. Merda, merda, merda.

—Hmm…estudando? —Stephen murmura. Que resposta de merda. Porra…isso


não era pra estar acontecendo.

—Então, porque tem um quadro mal escondido e produtos de limpeza no armário


do Liam? —Silêncio. Aí caralho, esquecemos de limpar a obra de arte de Hawkins.
E fomos idiotas o suficiente para esconder.

Brandon cossa a garganta antes de responder.


—Estávamos pensando em limpar os armários, sabe como é…—Ele cossa a nuca
tentando enrolar o treinador.

—E quem foi que pichou? —A merda…

—Foi a nossa capitã. —Solta Adam. Será que eu sou suspenso se bater muito
nele?

—Adam! —Jason repreende chamando a sua atenção.

—Não era pra falar caralho! —Esbraveja Nate.

—Foi mal, mas essa tensão estava me deixando nervoso! —Protesta. Suspiramos
derrotados.

—É nesse momento em que vocês me dizem o porquê não devo contar a ninguém.

—Porque ela acha que Liam a traiu. —Responde Dylan simplista.


—Ela fez muito bem então. Você mereceu. —Vira indo embora ordenando para
não contarmos a mais ninguém e limpar a bagunça antes de trancarmos o
vestiário.

Que comece o plano.

Capítulo 42

MAYA
Só resta a dor.

Cinco dias depois de assistir o vídeo pela primeira vez, sobrou apenas as lágrimas.
A partir daquele dia raiva e tristeza percorriam as minhas veias. Eu fiz uma
escolha. A raiva.
Pichei todo o seu armário do vestiário, cortei e desenhei ambas camisas de time e
despejei toda a minha raiva ali, nas almofadas da minha cama, em duas das
dobraduras de Riley (o que me arrependo muito) e agora, a raiva não existi mais.
Somente a dor que está dilacerando o meu peito. Por que…droga, eu o amo.

Perdi a conta de quantas vezes eu assisti aquele vídeo me obrigando a ver como
fui idiota e romântica.
Caras como Liam não se apaixonam por pessoas como você, Maya.
Porque, Deus? Porque isso dói tanto…?
A sensação de facadas sendo distribuídas por todo o meu peito cada vez mais
fundo não cessa. Diferente da raiva, a dor não vai embora. Ela ainda está aqui,
junto com as lágrimas que querem virar as minhas companheiras.
Ainda consigo sentir o seu cheiro que está gravado em minha memória. Fecho os
olhos impedindo que qualquer lágrima quente escorra pelo meu rosto.
Não faça isso, abra os olhos!
O vislumbre dos seus olhos castanho escuro como a noite preenchem toda a
minha mente e visão. Brilhantes e sufocantes. Eles são a causa de todo o calor
que estou sentindo nesse instante e o motivo do meu coração partido.

Quero estar nos seus braços. Quero que me abrace e diga que está tudo bem, que
faça carinho e me beije como sempre fez, com calor, necessidade e desejo. Como
se eu fosse o ar que ele respira. Quero que me faça me sentir amada como
sempre fazia. Quero Liam. Quero minha casa de volta.

Pare de doer cacete! Porque isso não para de doer?!


No dia seguinte do ocorrido, eu voltei ao campus. Mas ouvir os cochichos, os
olhares de pena, as piadas e as risadas só me faziam lembrar da escolha que eu
fiz. A escolha de amar alguém. De me deixar ser vulnerável. Isso é o que dói.
A primeira vez que isso aconteceu de verdade comigo, na realidade, não existiu.
Voltar ao campus significaria enfrentar a dor, e eu não quero enfrentá-la. Por isso
estou trancada desde o momento em que voltei do vestiário na arena da
Mavericks.

Os livros ultimamente não conseguem me ajudar. Todos são de romance. Todos


me lembram que aquilo não existi, que coisas daquele tipo não acontece com
pessoas como eu. Todos me lembram ele. Todos me lembram o que nunca vai
acontecer. Isso é injusto, frustrante e machuca.
Estou juntando todos os mil caquinhos que Liam quebrou do meu coração,
sozinha, e tudo o que eu menos preciso é ser lembrada disso, ler histórias de amor
que não são reais. Que iludem.

Escuto uma batida na porta. Forço os meus olhos a abrirem novamente. Seco a
lágrima solitária que escapou antes de gritar em resposta.

—Não quero comer, Riley. Obrigado.

—Sou eu, tampinha. —A voz de Nicolas chega aos meus ouvidos. Eu suspiro.

—Abra a porta pra mim, tampinha. Eu sei que você está aí. —Ainda continuo em
silêncio. Inclinada a abrir ou deixar que vá embora. —Eu não vou embora.
—Droga! —Nós somos irmãos, não somos? Abra pra mim, por favor. —Pede
parecendo como se fosse uma súplica.
Não quero te ver. Por que você é meu irmão, mas me lembra ele. Tudo nesse
momento me lembra ele.
Ele é seu irmão, Maya. Também faz parte da sua casa. Deixe que ele seja a sua
agora.

Levanto e vou em direção a porta. Eu à abro me deparando com Nicolas em pé


atrás dela, e simplesmente não dou um único segundo para raciocinar a minha
presença bem a sua frente. Eu pulo em cima dele em um abraço, porque ele é
enorme demais para a minha altura, e eu preciso dele agora. Preciso do meu
irmão. O meu melhor amigo. Anna poderia estar aqui também.

Involuntariamente eu molho sua camisa de time, desmoronando na frente dele.


Que vergonha. Ele nos afasta para olhar nos meus olhos que estão molhados
pelas lágrimas.

—Você está me fazendo querer travar uma batalha com o meu melhor amigo. —Eu
sei, e me detesto por isso também. Você tem que ficar do lado dele, ele ainda é
seu melhor amigo. Eu sorriu pra ele.

—Você é a minha irmãzinha, a minha tampinha. Detesto de ver assim. —Ele


continua. Isso é uma das coisas que Anna me diria agora.

—Desculpa. —É tudo o que consigo dizer.

Afasto da porta derrotada e me sento no chão encostando as costas na parede do


quarto. Nick se senta ao meu lado.

Não dizemos nada. Porque há nada a dizer. Ele já sabe. Ele já viu como eu estou.
Eu começo a divagar em turbilhões de pensamentos.

—Sua obra de arte ficou linda. Todo mundo gostou. —Ele rir ao comentar. O que
me tira uma risada. —Só de ver você rindo, a minha missão aqui já está cumprida.
—Eu o encaro ainda sorrindo com os braços em volta das minhas pernas. Mas o
sorriso aos poucos vai se desmanchando com o que eu deixo escapar da minha
divagação.

—Eu me odeio. —Ele me olha surpreso com a confissão. —Sou um monstro, Nick.
Sou tão caótica e problemática que acho que eu não deveria estar com ninguém.
Liam se livrou pelo resto da vida.

—Não diga…
—É a verdade. No começo pensei que talvez fosse drama ou exagero, mas ouvi
tantas vezes… a mesma fala se repetiam tanto pelas pessoas a minha volta, que
elas passaram a fazer sentido pra mim. Se tornaram um fato. Ser eu mesma
passou a ser cansativo e errado. —Explico. —Sou um caos, Nick. Ninguém
merece conviver comigo. Ninguém merece ter problemas de graça.

—Você não é problemática. Ele não pensava isso sobre você.

—Por favor. —Solto um riso um pouco irônico, só que na verdade, triste. —Não
vamos falar do que ele pensa, ou sobre ele.

—Tudo bem…—Concorda. Agradeço mentalmente.

Silêncio recai entre nós, mais uma vez. As divagações ainda estão acontecendo e
se multiplicando em frações de segundos. Encaro um ponto fixo enquanto todas
elas surgem.

—Continue falando, Hawkins. —Ele pede, forçando as divagações a pararem e me


fazendo sentir que preciso dizer elas.

—Por isso que quis deixar de sentir. —Falo sem dar uma explicação

—Por se achar problemática? —Pergunta tentando acompanhar.

—Sim. —Suspiro. —Parei de sentir porque eu não podia deixar que alguém se
sujeita-se a me amar, a passar a querer conviver comigo pelo resto da vida. Mas,
tinha momentos em que eu queria experimentar como era, saber como era se
sentir amada, só que os sentimentos se tornavam tão confusos e complicados
que quando eu percebia, eles haviam sumido porque eu tinha os trancafiados de
novo. Passei a ter medo. Medo de amar e me sentir vulnerada. Eu me sentia
apavorada. —Explico, finalmente admitindo isso para mim mesma. —Até Liam.
—Adiciono, sentindo a dor que essa confissão trás ao lembrar.

—Você não se acha amável. —Ele diz em tom de afirmação.

—Não.

—É uma pena, porque você é uma das pessoas mais amáveis que eu conheço.
—Ele fala.

—Você é o meu melhor amigo, é claro que vai dizer uma coisa dessas. —Devolvo.

—Sim, eu sou o seu melhor amigo e não existi pessoa melhor para ocupar esse
cargo, apenas eu. —Ele fala presunçoso. Eu sorrio, mas com um revirar de olhos.
—Todos somos caóticos em alguma área dentro de nós. Isso é ser humano. Você
não é menos incrível por causa disso, pelo contrário, te torna ainda mais. Vivemos
para viver a vida, e você deixa de vivê-la a partir do instante em que não sente.
—Sinto suas palavras como belos tapas na cara bem feitos.

Ele continua:

—Você não é um monstro. É boa. Só porque não sabe demonstrar isso, não quer
dizer que não é. O amor é algo bonito que merece ser vivido. Por todas as
pessoas. E todas podem viver, não importa como elas são ou deixam de ser.
—Cada palavra dita trás a sensação de que eu preciso ouvi-las. Preciso acreditar
nelas. —Se uma pessoa te ama, ela vai te amar não importa todos os trovões e
tempestades que possam acontecer, porque pra ela, vai ser como mais uma garoa
passageira.

—Eu não sou um peso morto? —O questionamento franco escapa. Você é uma
boca de sacola, Maya!

—Não.

—Não sou um monstro? —As palavras são arrancadas da minha boca.

—Não, você não é. Você é a minha irmãzinha. A nossa capitã. A Maya Hawkins.
Você é uma pessoa boa e amável. Você não é um peso morto. —Ele afirma com
toda a confiança que poderia ter.

—Acha que ele sentiu alguma coisa por mim? —Diga que sim.

—Ele sentiu tudo por você.

—Eu não…—Minha incerteza grita.

—Os olhos dele brilhavam como vagalumes na noite escura quando te olhavam.
Você era o caos mais belo pra ele, o que ele queria afundar e admirar todos os
dias. —Suas palavras carregam certeza quando ele fala. —Pode ter certeza, ele
sentiu.

—Então, porque agora estou sentindo dor? —Questiono. Preciso entender.


Recebo as ameaças das lágrimas querendo reaparecer. —Estou sentindo dor por
causa dele. —Isso sai em um sussurro doloroso.

—Eu não sei, tampinha. —Confessa.

—Faça com que pare de machucar, Nick. —Imploro. —Por favor.


Uma lágrima solitária escorre.

—Eu sinto muito... —Responde com empatia.

Quando Anna chega? Preciso do abraço dela.

Faço meu corpo encolher ainda mais, como um casulo, igual o meu coração está
se encolhendo agora. Você é Maya Hawkins, não chora por ninguém! Levante de
novo! Isso é apenas mais uma das suas dores, e você não vai deixar ela vencer.
Liam não está aqui. Aceite e viva, como sempre viveu.

Estou no meu embaraço de pensamentos e sentimentos quando Nick chama a


minha atenção de novo. Ele se aproximou como uma forma de consolo a mim.
Retira do bolso um pedaço de papel e me entrega.

—O que é isso?

—Eu não sei. —Admiti.

—Como não sabe? —Ele suspira.

—Encontrei isso no quarto de Liam. Sei que não quer saber ou ter nada dele
agora, mas, vi seu nome escrito na primeira linha e achei que fosse bom te
entregar. —Explica. —Não se preocupe, não cheguei a ler.

Desdobro o papel confirmando que é realmente a sua letra, mas não tenho a
curiosidade de o ler. Simplesmente guardo.
Capítulo 43

MAYA

Anna chega hoje.


Dois dias após eu implorar internamente por seu abraço, em uma hora ela estará
aqui. Em uma hora vou poder a abraçar. Em uma hora vou poder ter a minha
melhor amiga perto de mim de novo.

Sei que vai ser difícil o início dessa adaptação radical, lembro até hoje como foi a
minha, mas vou fazer o possível para a ajudar, para estar por perto, porque agora,
Anna só tem a mim (e a Riley). Mesmo assim, a animação e nervosismo no meu
corpo estão a mil. Um sorriso do tamanho da lua está preso em meu rosto.

Um sorriso que há dias não aparece. Esqueça isso agora. Anna vai estar aqui. Não
podemos contar a Anna. Não, nós temos.

Anna não sabe de absolutamente nada do que aconteceu entre mim e Liam desde
aquela ligação na cozinha. Ela estava muito ocupada resolvendo o que faltava
para o dia de hoje, e eu, bom, estava ocupada tentando não chorar demais e ser a
pessoa fria que um dia eu fui. E eu admito que estou adiando o máximo de tempo
para contar. Anna pode ser uma amiga protetora feroz, igual a Riley, mas dela eu
não tinha como fugir.

Sua primeira ação foi ficar preocupada comigo, em estar ali enquanto eu chorava
e não queria sair do quarto. Sua segunda ação foi querer bater em Liam devido a
todos os dias em que me viu mal e não sabia como fazer aquilo parar. Impedi ela
umas boas vezes de não o fazer, mas tenho certeza de que em algum momento
ela vai, principalmente se Anna descobrir. As duas juntas vão convencer uma à
outra de que devem defender a minha honra. Sei que eu poderia muito bem pedir
para não o fazer e elas respeitariam, só que se esbarrarem com ele, não vou poder
me responsabilizar. Por isso, não vou dizer nada a ela por enquanto.

Já estou bem. Não tenho mais vontade de chorar, e não tenho mais vontade de
ficar trancafiada sozinha. Estou bem. Estou vivendo. Mesmo que eu ainda sinta
falta dele, mesmo que ainda eu não queira vê-lo porque sei que vai doer. Mesmo
que eu ainda o ame.

Há momentos involuntários que me pego analisando o que aconteceu e como


aconteceu, assim como todos os acontecimentos que se antecederam aquilo.
Perguntas começam a surgir e algo dentro de mim diz que está errado. As peças
do quebra-cabeça estão erradas. Eu entendi errado. Porém, em seguida, eu
lembro do momento em que contestou dando ampla incerteza a tudo, e faço essa
sensação ficar de lado junto as perguntas e peças.

Olho para Riley sentada ao meu lado nas cadeiras do aeroporto. Pegamos um táxi
já que nenhuma de nós duas tem carro. Sua expressão está concentrada no
celular em sua mão, tenho até a impressão que não está piscando.
Que…estranho.

—O que você está vendo? —Pergunto, mas está tão concentrada que parece não
me ouvir.
Tento mais duas vezes e ela continua vidrada na tela. Ela não me escuta! Puxo o
seu celular de supetão da sua mão, fazendo ela finalmente prestar atenção em
mim. Ela me encara indignada e surpresa. É a primeira vez que isso acontece.

—Porque você fez isso?

—Eu te chamei umas três vezes e você não me ouviu. O que é que você está
vendo? —Decido olhar para a tela do celular na minha mão e tirar minha própria
conclusão antes mesmo de responder a minha pergunta.

Encontro algo que eu não esperava. Nunca.

—Desde quando você stalkea Dylan Howard Clifford? —Okay, que


sobrenome…grande e bonito. —Você namora! —Eu completo, voltando ao
verdadeiro assunto que importa.

—Não mais…—Murmura. O que? Como assim ela não namora mais? Quanto
tempo eu fiquei chorando?

—Como assim você não namora mais? Porque não me contou? —Ela suspira
deixando os ombros caírem.

—Faz alguns dias. Estava com ele e decidimos ir em uma festa que estava
acontecendo no campus com o seu grupo de amigos. Eu o peguei dando em cima
de outra garota enquanto tinha ido ao banheiro. —Conta. Meu Deus! Eu sou uma
péssima amiga.

—Riley, desculpa. Eu sou…—Lamento por ela, mesmo ainda estando surpresa.


Porque eu entendo…realmente, entendo.

—Não precisa disso. Você estava mal, não te culpo por isso. A forma que você
descobriu foi pior. —Nós soltamos uma risadinha juntas por toda a situação. —E

também, já não estava dando certo. Ele estava me tratando mal e agindo como
um babaca comigo há dias, e eu estava começando a fazer isso também. Fiquei
triste no início por ver tudo o que eu perdi e como as coisas iriam ser diferentes,
mas aliviada por ter conseguido e parar de ficar o tratando mal.

—Você poderia ter me contado mesmo eu estando trancada dentro de um quarto.


Somos amigas. Você é a minha melhor amiga. Nossa amizade é para esses
momentos também.

—Eu sei. Chorei um pouco no começo, mas depois passei a ficar irritada pelo
tanto de mensagem e falas que ele estava fazendo. —Solto uma risada baixa.
Levanto para a abraçar apertado. Uma forma para nos aliviar de tudo o que
vivemos nos últimos dias, e para dizer que eu a amo e sou grata por estar na
minha vida. Você é incrível, Riley Calloway.

—Agora, me fale a parte do porque o Dylan está na tela do seu celular. —Ela dá de
ombros indicando que é nada demais.

—Eu o vi na festa, achei bonito e estou vendo o perfil dele. —Não sei se acredito,
mas não faço nada para forçar. Apenas assinto com a cabeça, concordando.

Eu sei que uma coisa é verdade. Dylan realmente é muito bonito. Espero que o
que disse seja verdade, e somente isso. Riley é namoradeira, não sei se poderiam
dar certo.

Conversamos o restante do tempo em que esperamos o voo pousar,


compartilhamos os sentimentos em que sentimos. Sou tirada da nossa conversa
quando o meu celular toca mostrando uma ligação de Anna no visor.

—Onde você está? —Ela fala assim que atendo.

—Estou indo para o local de desembarque. Te encontro em dois minutos.

—Tudo bem, vou te esperar aqui.

Saímos andando com pressa pelo aeroporto com a intenção de encontrar a área
de desembarque. Quando chegamos, pessoas e seus familiares ocupam todo o
espaço, procuro por ela, mas não a encontro.

Meu Deus! Essa menina é vinte centímetros mais alta e conseguiu desaparecer.
Ou eu que sou muito baixa.

Penso em ligar para ela de novo, mas antes que eu possa, eu ergo os olhos a
enxergando ao longe perdida. Ela me avista segundos depois evaporando sua
confusão. Nós sorrimos. Instantes após, me pego andando (quase correndo) em
sua direção. O seu abraço chega junto à saudade que senti. Junto a nostalgia de
todas as lembranças que vamos poder criar e as que já foram criadas. Anna está
de volta. Agora somos nós três, Riley, Anna e eu. Um grupo de três.

Por favor, não sintam ciúmes uma da outra. Mentira, achou que isso não vai…

—Chega, estou começando a ficar com ciúmes. —Riley resmunga. Eu rio por
saber que está apenas brincando. Nos separamos.
—Tudo bem. Riley, essa é Anna. E Anna, essa é Riley. —Faço as devidas
apresentações. Elas se cumprimentam, e Anna logo vai a abraçando. Sorriu.

Isso é muito coisa de brasileira. Espero que jamais perca essa essência boa.

A ajudamos com as malas e vamos caminhando enquanto conversamos e ela nos


conta como foi a viagem com a correria de documentos e organização para
mudança. Pedimos um táxi durante toda a conversa. Optamos por parar em uma
lanchonete para almoçar primeiro, antes de decidirmos todo o resto.

Anna está pirando um pouco em como vai fazer para trabalhar e encontrar um
lugar para morar, a acalmo e digo que pensamos nisso depois. Ela e Riley
conversam muito durante o trajeto e fico feliz por isso. Acredito que vão se dar
muito bem. Estou torcendo por isso.

Paramos na lanchonete logo fazendo os nossos pedidos. Eu com um sanduíche,


Riley com o seu almoço saudável de sempre, e Anna com um suco e sanduíche,
mas sei que gostaria de estar comendo uma comida de verdade. Comemos
tranquilamente aproveitando esse momento para guardar na memória. Sorriu por
estar vivendo isso novamente, e por estar, depois de dias, feliz. Vivendo. Sem
medos. Corações quebrados, e lágrimas. Eu não poderia ter pessoas melhores na
minha vida.

O sino na porta verbera pelo local. Não me importo com qual for a pessoa que
tenha passado pela porta, até eu encontrar os três caras mais populares da
Mavericks passando ao meu lado e se sentando a algumas mesas de distância.

Mas que droga! Está de sacanagem comigo né universo?! Justo agora?

Observo Dylan, Luke e Liam fazerem os seus pedidos. Nenhum deles reparam a
minha presença no local. Não falei com nenhum dos três depois daquele dia,
somente Nick.

Por favor, não me vejam, por favor não me vejam, por favor não me vejam. Por
favor, que ele não me veja. Por favor, que Liam não me veja…

Seus olhos se desviam dos meninos na mesa, se deparando com os meus no


exato momento. Não, Não, Não, Não. Eu me desvio deles instantaneamente. Ainda
dói olhá-los. Pensei que essa seria a parte mais difícil. Parar de olhar para ele. No
entanto, machuca olhá-los, porque isso me faz lembrar de tudo. Tudo o que
perdemos. Tudo o que fomos e não fomos. Toda a enganação. Mas de certa
forma, ainda é a parte mais difícil, porque os meus olhos sempre voltam para ele.
Para os olhos dele.

Consigo sentir o seu olhar queimar sobre mim. As meninas continuam falando,
mas se tornam apenas vozes soando aos meus ouvidos, pois não presto atenção
em uma sequer palavra, incomodada com a sua presença, com o calor dos seu
olhar sobre mim.

Como eu cheguei até aqui? Eu nunca diria que estou incomodada com a presença
de Liam. Ela costumava ser a minha favorita.

Meus olhos voltam-se por conta própria em alguns momentos. Como um


verdadeiro imã. Eles ainda estão presos nele.

Meu celular acende em cima da mesa com uma notificação sua.

Ele: Podemos conversar?


Eu: Não. Não quero falar com você agora.
Ele: Agora? Isso quer dizer que vai falar comigo depois?
Eu: Sério? Vamos voltar a fase de provocações?
Ele: Nós nunca saímos dela, minha linda.
Eu: Pare! Não sou sua “linda”, nunca fui.
Ele: Sim, você foi. E ainda é.
Eu: Pare de me mandar mensagem, senão vou te bloquear.
Ele: Ainda temos que conversar.
Eu: Não temos.
Ele: Quem é a menina junto de vocês? Nunca vi ela.
Eu: Uma pessoa que você não precisa saber.
Ele: Você está linda.
Eu: Pare com isso!
Ele: Você é tão linda que chega a doer.
Eu: Pare de falar isso!

Ele: Está sentindo a minha falta? —Estou.


Suspiro soltando todo o ar dos meus pulmões que estava preso. Ergo o olhar para
sua mesa a alguns metros de distância. Seus olhos escuros como a noite me
encaram, como se de alguma forma pudessem me consumir. Ainda parecem
machucados.

Sinto tanta falta deles. Sinto falta de me perder neles.

Encaro as meninas a minha frente que me observam com um daqueles olhares


que dizem: “Você está estranha. Sei que tem algo acontecendo”.

—Podemos ir embora? —Questiono tentando transparecer a maior sinceridade


que posso.

—O que está acontecendo? —Anna é quem pergunta. Encaro Riley que também
transmiti através da sua expressão o mesmo questionamento. Desvio rapidamente
em direção aos meninos para que ela perceba. Ela entende. Mas Anna não.
Porque Anna não sabe.

—É…acho que já terminamos por aqui. —Ela me ajuda. Anna apenas concorda,
mesmo sem entender, e nos levantamos indo até o balcão para pagar.

Liam e os meninos param logo atrás de nós no balcão para pagar a conta,
esperando pacientemente a sua vez. Pacientemente demais. Que filho da mãe
insistente!

—Fale comigo, por favor. —Pede sussurrando bem atrás de mim.

—Já dei a minha resposta.

—Você está sendo injusta. —Ele diz.

—Não, eu não estou sendo injusta. —Contraponho.

—Por favor, minha linda. —Sussurra em uma súplica.

—Eu pedi para que pare de me chamar assim. —Respondo calma, me virando
abruptamente para ele. —Não percebe? Ainda me machuca olhar para você, me
machuca falar com você, me machuca te ouvir me chamar assim.

Seus olhos passeiam pelo meu rosto. Querem relembrar como ele é. Admira-lo.

—Por favor, quando eu quiser conversar, eu vou atrás de você. Agora eu só quero
que me dê espaço.

—É isso o que você quer?


—É o que eu quero. —Digo sentindo minha saliva descer raspando a minha
garganta.

—Tudo bem. —Diz com os olhos se demorando cada vez mais em meu rosto.
Vidrados. —Mas isso não quer dizer que vou deixar você escapar de mim. Você
vai ser minha de novo, Maya Hawkins. E dessa vez, vou fazer direito.

Quando termina, percebo que tenho certeza nas suas palavras. Nenhum de nós se
move. Permanecemos ali parados na nossa bolha, como sempre aconteceu,
esquecendo que o mundo não parou conosco. Não precisamos dizer nada,
nenhuma palavra sequer. Nossos olhos estão dizendo por nós. Nesse momento,
dizem mil coisas.

Mas aí, todas as memórias voltam, como uma verdadeira avalanche. E todas elas
ficam cinza. Quebro a bolha procurando as meninas que me esperam na porta.
Vou até elas sem dizer absolutamente nada com ele, somente me despeço dos
meninos. Anna não pergunta nada no trajeto, só quando estamos no apartamento
que decide dar sinal verde para qualquer explicação que eu queira dar.

—Era Liam na lanchonete, não é?

—Sim.

—Vamos falar sobre o que aconteceu lá…ou não? —Viro para ela e conto todos
os detalhes. Desde o ponto em que paramos naquela ligação até o dia de hoje.

Após me ouvir, ela surta, fica com raiva, e por fim mostra que compreende.

Capítulo 44

LIAM
Ela estava linda.
Ela é linda. Tão linda que meu peito doeu ao vê-la de novo. Os seus olhos, aqueles
olhos, quase os esqueci. Quase esqueci o quão alucinante são. Por um segundo
fiquei aliviado por saber que ela estava sorrindo, mas no segundo seguinte senti a
culpa por ver o seu sorriso desaparecer somente por ter a consciência de que eu
estava no mesmo local. A minha presença a estava incomodando, porra. A minha
presença que antes a fazia sentir segura o suficiente para abaixar todas as
barreiras de proteção.

Mesmo assim a força da conexão entre o nosso olhar é tão incompreensível que a
cada instante nos pegávamos fitando um ao outro. Ainda com ela lutando contra
isso, sei que também sentiu. Sentiu seus olhos presos aos meus. E tenho certeza
que sentiu o meu olhar sobre ela. Poderia passar todas as horas de todos os dias
de cada semana a admirando e ainda acharia pouco tempo. Por que a beleza de
Maya é daquelas que poucos à enxergam e sabem como a apreciar.

Eu pedi. Implorei. Para que pudesse me dar um minuto da sua atenção, para que
me ouvisse, para que eu pudesse dizer que a amo. Amo mais do que amei ontem
e menos do que vou amar amanhã. Para que eu pudesse pedir desculpas por a ter
feito chorar. Por ter contestado e aberto feridas cicatrizadas. Para dizer que vou
concertar as coisas. Não vou deixar ela ir embora. Maya Hawkins é o meu caos. O
caos que eu quero que nunca acabe.

Sinto falta dela, bem mais do que eu imaginei que pudesse sentir por alguém. Eu
queria mais do que tudo, nesse momento, invadir o seu apartamento e a obrigar a
ouvir tudo o que eu tenho a dizer. Mas não posso. Tenho que respeitar o seu
espaço. Tenho que respeitar o seu pedido. Eu disse que faria isso.

“Não percebe? Ainda me machuca olhar para você. Me machuca falar com você.
Me machuca te ouvir me chamar assim”. Merda. Não era pra eu deixar isso
acontecer!

Preciso que esse plano de certo. Eu vou fazer dar certo. Mas preciso de uma
ajuda específica. Preciso da ajuda de Riley.

O problema é que, a última coisa que ela irá fazer é me ouvir. Ou melhor, olhar na
minha cara. Na verdade, nós nunca nem conversamos, sequer tivemos muito
contato. E agora, eu sou o cara que feriu a sua melhor amiga. Essa é a equação
perfeita para um resultado igual a, vou chutar as suas bolas. Mas tenho coragem o
suficiente para enfrentar isso. Eu preciso do seu favor. Preciso que Maya a escute.

É por esse motivo que estou parado a cinco minutos na frente do seu prédio
pensando em alguma forma de entrar sem que o final seja uma porta batida na
minha cara e minhas bolas doendo.

Puta que pariu. Pense em alguma coisa, Liam. Pense em qualquer coisa!

Estou andando de um lado para o outro enquanto outros moradores do prédio


transitam pela entrada me encarando de forma estranha, em algumas situações
tenho vontade de responder: —Sim, eu estou pirando. Ainda tento criar coragem
quando a porta do prédio é aberta e uma garota de cabelos pretos e olhos verdes
âmbar passa por ela. Ela é bonita. Muito bonita. Mas o mais importante é que ela
não é qualquer garota. Ela é a garota que estava com Maya na lanchonete.

Ela não repara na minha presença. Passa reto por mim caminhando determinada
até o entregador em pé na calçada que só agora eu percebo. Após alguns
segundos, volta prestes a entrar novamente assim que seus olhos recaem em
mim. Pela sua expressão, sei que sabe de mim. No mínimo alguma coisa. Essa é a
minha oportunidade, e eu vou agarra-la.

O universo está do nosso lado, Hawkins. Do meu lado.

—Você pode me ajudar? —Paro em sua frente atrapalhando a passagem. Ela para
com uma caixa de pizza na mão e um sorriso trêmulo no rosto.

—Ajudar você? —Ela franze o cenho.

—Só preciso que passe um recado para Riley.

—Riley? Veio até aqui para falar com Riley? Esperava mais. —Resmunga o último
comentário em um tom mais baixo. As linhas nas suas testas se aprofundam mais.
Que merda. Isso não é algo bom.

—Você me conhece? —O questionamento me escapa, pois pela sua forma de


falar, o meu pedido de ajuda não é algo que a agrada, e tem um motivo para isso.
Um único motivo.

—Nós falamos ao telefone uma vez. —Confessa. Eu a observo por alguns


segundos tentando recordar.
Quando isso aconteceu? Nunca vi essa garota na minha vida, e eu nem falo ao
telefone. A última vez que isso aconteceu foi com Hawkins, e em outras vezes que
atrapalhei suas ligações com sua mãe e…

—Você é a Anna?

—Prazer em te conhecer. —Se apresenta com seu sorriso. Ela está se esforçando
muito para ser educada. Tenho certeza que na sua cabeça se passa: “Pra isso
pelo menos você tem cérebro”. Agora com atenção, consigo reparar no sotaque
diferente quando fala. A língua ainda não está tão natural.

—Maya não avisou que vinha visitar.

—Acho que ela estava ocupada demais para te avisar. —Farpa com um tom de
voz irônico.

—Já percebi o porquê da amizade. —Devolvo.

—As apresentações seriam melhores se você não fosse tão idiota. Deu nem
tempo para eu fazer a minha ameaça. —Ela dispara logo em seguida.

—Ainda dá tempo da sua ameaça. Posso provar que eu não sou um idiota, se
você me ajudar. —Retruco. Ela ri irônica.

—Está brincando, não é? Te ajudar é a última coisa que eu faria agora. —Desvia
do meu corpo com a intenção de entrar no prédio.

—Eu só preciso de um favor. —Peço. Ela para despencando os ombros e gira de


volta pra mim. —Por favor. —Adiciono.

—Não posso te ajudar. Eu queria, mas não posso. —Lamenta. —Eu te pedi para
cuidar dela, você me prometeu que cuidaria, porque fez isso? No começo, eu
incentivei Maya a tentar com você. A dar uma chance. Eu sei que se ela não
quisesse, não teria feito. Mas, eu também sei que a minha opinião vale de alguma
coisa pra ela. Eu disse que você não parecia ser um idiota por tudo que estava
demonstrando, e que eu nunca errava as minhas avaliações. Para no final você
mostrar exatamente o contrário. Pela primeira vez eu errei em avaliar alguém por
sua culpa, seu idiota! Então, eu vou ficar do lado da minha melhor amiga agora.
—Desabafa.

“Você não parecia ser um idiota por tudo que estava demonstrando, que eu nunca
errava as minhas avaliações”. Ela é lógica. Isso mostra que ela é lógica. Não toma
decisões antes de pensar.
—Pela forma como disse, mostra que você é bem racional. Então, aqui vai a minha
pergunta: acha mesmo que eu fiz o que parece? —Rebato. Ela não me responde.

Dez segundos depois ela corta o silêncio.

—O que mais?

—O que? —Digo ficando confuso.

—Quero mais argumentos. Um não é o suficiente, e já fiz muito não atacando


você. —Explica. —Não demore muito, a pizza está esfriando.

Droga. Pense rápido. Pense em algo, agora!

—Você não erra as suas avaliações e ainda está me ouvindo. —Argumento.

—São bons, mas não o suficiente. —Como não é o suficiente?

—Você não ter dado um chute em mim e não acreditar que eu realmente fiz isso
são argumentos bons o suficiente. —Insisto. Ela suspira. —Eu sei que ela é sua
melhor amiga e pode se sentir um pouco culpada por ter a incentivado no
começo, mas eu não fiz o que parecer ter sido. Posso ter contestado, mas não fiz.
—Uso toda a certeza que tenho. O tom de súplica é claro nas minhas próximas
palavras —Só…me faz esse favor.

—Vai provar que eu não erro nas minhas avaliações?

—Vou.

—E não vai fazer eu me arrepender por não ter dado um chute em você quando
tive a chance?

—Não vou, prometo. Deixo você me dar um chute depois se quiser. —Garanto.
Pela sua forma, sei que riria agora se não estivesse tão ocupada no seu papel de
amiga protetora durona.

—Certo. —Assente. 1…2…3…4…—O quanto você a ama?

—Mais do que ontem e menos do que amanhã.

—Se você magoar ela de novo, eu prometo que vou parar com um machado na
porta da sua casa. E se no final nada disso der certo, se considere morto. Okay?
—Fala com a expressão séria e o tom surpreendentemente ameaçador.

—Okay. —Ergo os braços em forma de rendição. —Vai me ajudar?

—Depende. Vai comprar outra pizza? Essa já esfriou.


MAYA
—Porque demorou? —Questiono assim que Anna passa pela porta com uma
caixa de pizza na mão.

—Hmm…acabei parando para dar informação para um idoso.

—Mas você não sabe andar aqui. —Contraponho.

—Pois é. —Diz coçando a garganta. —Não consegui ajudar ele, mas pelo menos
batemos um papo. —Sorri nervosa.

—Isso é bem a sua cara. —Falo me aproximando dela. Coloca a caixa em cima do
balcão da cozinha abrindo e pegando uma fatia.

—Vou sair para procurar um emprego e um lugar para ficar amanhã. —Informa.

—Sabe que não precisa se preocupar em encontrar um lugar, certo? Eu disse que
pode ficar aqui quanto tempo precisar.

—Eu sei, mas preciso do meu espaço também. Por enquanto vou ficar ocupada
procurando algum trabalho, não se preocupe, vamos ter tempo o suficiente vendo
a cara uma da outra amaçada de manhã para matar a saudade. —Nós duas rimos.
Eu definitivamente preciso matar a saudade.

—Acho isso ótimo.

—Nós deveríamos ter pedido mais de duas. —Riley murmura assim que para do
nosso lado na cozinha.

—Verdade. A última coisa que fazemos é comer igual a passarinhos. —Anna


concorda.

“—Parece que alguém pagou a língua.


—Nem tava tão boa assim, foi a fome.
—Olha só, Hawkins mentindo na cara dura. —Acuso.
—Não estou mentindo.
—Você comeu quase uma pizza inteira.
—Não tenho culpa se não como igual a um passarinho.”

Por que tudo tinha que acabar assim? Por que ele contestou? Por que eu ainda
continuo me lembrando dele droga?!

—Podemos pedir mais uma. —Forço a nuvem de lembranças a se desfazer.

—Ah, não precisa. Eu já me adiantei com isso. —Se antecipa.

—Como?

—O idoso ficou com pena que fez a pizza esfriar, então ele comprou outra pra
mim. —Ela sorri esclarecendo. Em qualquer outra situação, eu pensaria que algo
está errado, mas não nessa. Porque ironicamente coisas desse tipo existem uma
probabilidade gigante de acontecer com ela. Por isso eu só assinto em
concordância.

—O que vamos fazer até a pizza chegar? —Riley pergunta.

—Poderíamos jogar. —Anna diz.

—Porque não dançamos primeiro? —Proponho.

Nós nos entreolhamos por um segundo e começo a dar passos de costas,


puxando elas indiretamente até o centro da sala. O som da música em um dos
nossos celulares ressoa pelo local contagiando os nossos corpos e as nossas
almas. O balançar dos nossos corpos começam a acompanhar o ritmo da música
e as risadas a combaterem a melodia.

Pelos próximos minutos não há nada de pensamentos. Não há questionamentos,


nem lembranças passadas. Há eu e minhas amigas dançando no centro da sala.
Balanço a minha cabeça sentindo os fios do meu cabelo baterem no meu rosto
junto a uma sensação de alívio e liberdade. Música e dança, o elo perfeito.

A música acaba, e uma nova inicia. Nós paramos e Anna vai até o celular para
pausar. Infelizmente não há tempo o suficiente para meu cérebro não identificar a
música. A nossa música.

“—Dança comigo?
—Não sei dançar - murmura.
—Vamos Liam, por favor. É a nossa música.
—Não sabia que tínhamos uma música.”


“—Ainda não terminamos a noite. —Encosta nossas testas uma na outra, as
respirações se misturando.

—Esqueceu que você não sabe dançar?

—Por você eu sei. —Beija os nossos narizes carinhosamente. —Desculpe por não
ser em um lugar melhor. —Lamenta.

—Não importa o lugar. O que importa é o que vamos fazer. Você está me devendo
uma dança.

—E um por que.”

Estou melhor, isso não quer dizer que as lembranças foram embora, porque elas
ainda estão aqui mais vivas do que esse momento. Ainda tenho os momentos que
minha mente se pergunta se o que parece ter acontecido realmente aconteceu. Se
isso não é um engano e que, na verdade, estou perdendo o meu tempo.
Os olhos deles estavam machucados demais naquela manhã. Sua expressão era
de confusão e, enquanto vivíamos os momentos que criamos eram tão reais e
verdadeiros, eu via em seus olhos, que me pego pensando se Liam seria capaz de
fazer daquilo tudo uma bolinha de papel jogada no lixo.

Tempo depois a nossa outra pizza chega, comemos, jogamos, assistimos a uma
nova série, conversamos até tarde da noite. Quando estou finalmente deitada na
cama em meu quarto a minha mente racional ainda trabalha. A pontinha de
incerteza está semeando os meus pensamentos. Começo a pensar. A analisar os
fatos. Analisar os acontecimentos e suas reações. Exatamente o que eu faria se
estivesse lendo um livro.

Primeiro fato: Dias antes eu esbarrei com Olívia.


Segundo fato: Liam não sabia o que estava acontecendo aquela manhã, o que
abre um leque de possibilidades, só que aí vem o nosso terceiro fato.
Terceiro fato: Liam contestou. Ele não tinha certeza.

Como Liam poderia não ter certeza de algo? Mais alguma coisa aconteceu naquela
noite? Porque contestaria?
Uma peça está faltando.

Suspiro. Passeio os olhos no quarto escuro iluminado apenas pela luz da lua
refletindo através da janela próximo a minha escrivaninha. Meus olhos fixam no
papel que Nick me entregou no dia em que veio me ver, e que não tive coragem
de abrir. Talvez essa seja a peça que falta, ou me leve até ela.

Isso não é um dos seus livros, Maya! Essa é a sua vida. Pare de agir como se
estivesse em um. Mas…e se o que estiver escrito naquela carta faça esclarecer
algum dos meus pensamentos? Ou esquecê-los? Dane-se, vou ler.

Levanto da cama e me sento na cadeira de frente a escrivaninha, me preparo


mentalmente para qualquer coisa que possa estar escrito e, abro.

“Minha linda, Maya Hawkins.


Eu amo os seus olhos.
Eles brilham e sorriem pra mim. Assim como pegam fogo quando você está
irritada. Eles ficam opacos quando você está cansada e sem vida quando você está
triste. Eles transmitem as coisas que passam dentro de você. Que passam dentro
da sua alma. Eles fazem meu corpo vibrar e em segundos me pego procurando por
eles. Assim como você procura pelos meus. Quando duas pessoas se amam, você
consegue ver em seus olhos, você consegue sentir, pelo jeito o qual eles se olham,
como eles se olham, cheios de admiração e amor, eles estão sorrindo. Mesmo sem
dizer uma única palavra, existe um fio invisível conectando os dois. Nós estamos
conectados, Hawkins. Desde a primeira vez que trocamos as palavras pelos
olhares. Desde que deixamos de dizer “eu te amo” e passamos a nos querer presos
nos olhos um do outro. Presos na nossa bolha. Faz apenas alguns dias que tivemos
coragem de dizer as três palavras que estamos dizendo através dos nossos olhares
a muito tempo, e quero deixar registrado aqui que espero continuar as dizendo
para você todos os dias pelo resto de todos os meus anos. Não me importo com os
medos que me assombram, vou enfrentá-los desde que você esteja lá comigo. Vou
enfrentá-los por você. Por nós. Eu torço com todas as minhas forças que você
queira isso tanto quanto eu. Você é o meu caos. A minha tempestade. E eu torço
ainda mais para que você entenda que essa é a coisa mais bonita que eu já fiz.
Amar você. Admirar você. Quero afundar na tempestade que você é. Quero estar
lá quando você estiver emburrada com os braços cruzados e o bico se formando
em seus lábios, para mim poder admirar o quão fofa e gostosa você fica desse
jeito. Quero está lá quando seus olhos pegarem fogo de raiva, quando estiver
mandando em mim e sorrindo para mim após eu fazer uma piada sem graça.
Quero criar tantos momentos que vamos ficar indecisos em qual história contar
para os nossos filhos. Porque quero muito ter filhos com você. Você é o meu caos,
Maya Hawkins. O caos mais amável, gentil e determinado que eu conheci. O caos
que eu quero viver para sempre e acordar ao lado todos os dias. Eu amo os
castanhos mel dos seus olhos. Eu amo o caos que você é. Eu amo você, minha
linda.”

Uma lágrima escorre. Solitária. Escorregando na pele molhada do meu rosto pelas
lágrimas que se desfizeram. Como vou dormir depois de ler isso?
Capítulo 45

LIAM

Respiro fundo antes de bater.


O barulho da minha mão fechada contra a porta verbera. Após segundos, ela se
abre e me deparo com um sorriso sincero a minha frente. A ruiva de olhos verdes
e sardas pelo nariz se afasta dando permissão para entrar. Não há pessoas na
entrada, continuo caminhando em direção a dentro e também não encontro mais
pessoas. É somente eu e ela. Ótimo.

Ela passa por mim com passos na direção da cozinha. Eu a sigo.

—Quer alguma coisa para beber? Temos cerveja. —Oferece casualmente.

—Uma cerveja, seria ótimo.

Abre a geladeira retirando duas garrafas e me entrega uma. Ergo o melhor sorriso
que posso oferecer em agradecimento encostando em uma bancada bem atrás de
mim antes de abrir a garrafa e encarar a mulher a minha frente.

—Não pensei realmente que fosse vim quando recebi a mensagem. —Comenta.

—Estava precisando esfriar a cabeça. —Falo simplista. É verdade, eu estou


precisando. —Desculpe se acabei atrapalhando.

—Ah, não. Claro que não. —Ela sorri. —Pode vim quando quiser.

—Que bom. —Respondo. —Não devo demorar muito aqui.

—Ainda ocupado com a temporada?

—Sempre. —Solto o ar forte.

—Melhor sermos rápido então. —Diz em tom de voz malicioso correspondente ao


pequeno indicio de sorriso.

—É, melhor. —Correspondo.


Ela que está do outro lado da cozinha começa a se aproximar. Coloca a garrafa
em cima da ilha da cozinha e se encosta ali. Estamos de frente um pro outro.
Perto. Dois passos e vamos estar colados. Não me deixo pensar muito antes das
próximas ações que eu tomo.

—Vou fazer exame toxicológico depois do treino. —Informo.

—Espero que não seja pego. —Brinca em meio a um sorriso, agora, divertido.

—Não sei, você poderia me responder. —Rebato.

—Como eu poderia te responder? —Indaga, as sobrancelhas franzidas em


indicação de confusão são expressas junta a uma risada descontraída.

—Dizendo se colocou droga na minha cerveja.

—E por que eu colocaria droga? —Um vinco de confusão se aprofunda mais em


sua testa.

—Outra pergunta que você pode me responder. Por que você colocaria droga na
minha cerveja?

—Por que está agindo assim? —Contesta.

—Porque você começou isso. —Declaro.

—Por enquanto eu comecei nada porque você está ocupado me fazendo


perguntas estranhas.

—Responda a minha pergunta. —Ordeno.

—Não coloquei droga na sua cerveja. Nunca fiz isso com ninguém, e muito menos
sei onde encontrar. —Diz simplista.

—Não sabe? Tem certeza? —Interrogo transparecendo calma e alguém que


apenas quer entender.

—Não, eu não sei.

—Caleb. Conhece esse nome? —Balança a cabeça em negação. —Nenhum


chute?

—Um cara de fraternidade qualquer? —Supõe.

—Chute certeiro. Sabe a probabilidade disso em um campus com diversas


pessoas e grupos? Muito poucas.
—O nome entrega. —Esclarece.

—Ou você o conhece. —Contraponho.

—E o que isso tem haver? —Dá de ombros despreocupada.

—Isso tem haver que você sabe muito bem onde encontrar drogas.

—Não, eu apenas conheço um cara. Assim como conheço você.

—Verdade. —Concordo. —Mas, como você poderia conhecer o mesmo cara que
briguei na noite em que fui drogado? Muita coincidência, não acha? —Minha testa
se franze.

—Pode ser, mas isso também não quer dizer que fui eu que coloquei droga na sua
bebida.

—Quem seria então?

—Não sei, qualquer um. Eu não estava naquela festa para saber. —Ops, erro de
roteiro.

—Mentira. Você estava. —Seu nariz se franze levemente. Quase imperceptível.


Quase. —Eu não te vi, mas Jason viu. Conversando com o mesmo cara que me
provocou na cozinha.

—Isso ainda não quer dizer nada. Posso muito bem ter ido embora mais cedo
aquela noite.

—Só que você não foi. —Alego. —Você tinha que ficar para ter certeza que iriam
tirar uma foto nossa para ser divulgada pelo campus no dia seguinte.

—Alguém poderi…—Tenta se defender. Eu não deixo.

—Você tinha que ter certeza que eu iria beber a cerveja depois que você colocou
droga enquanto eu estava ocupado demais para prestar atenção.

—Eu não…—Tenta de novo.

—Você tinha que ter certeza que Caleb iria fazer o serviço direito. —Sua
respiração é forte. A expressão séria. O nariz claramente franzido. —E você tinha
que ter certeza que eu iria ficar drogado o suficiente para não me lembrar de tudo
o que você fez. —Concretizo.

Pausa. Ela continua me observando. Pensando.


—Pelo menos você não é tão burro como eu imaginei. —Confessa. Um sorriso de
canto me escapa, e eu ainda não terminei.

—Então, eu estou certo. —Digo em uma afirmação, mais para mim mesmo.

—Até que não foi muito difícil, sabia? Homens caem muito fácil na pilha quando
provocados no ponto certo.

—Deixa eu adivinhar, você sabe muito bem identificar o ponto certo?!

—Claro que eu sei, eu sou mulher. —Fala presunçosa.

—Pra que?

—Argh, a clássica pergunta clichê. —Cruza os braços ao revirar os olhos.


—Precisa mesmo que eu diga? Conseguiu desvendar tudo isso para não saber
essa mínima resposta? —Eu continuo a encarando. —Eu sou apaixonada por
você. Eu amava você. Aí veio essa puta e tirou você de mim. Do nada você
passou a nem olhar para mim. Eu. Cheguei. Primeiro. —Fala pausadamente —Me
entendeu? Eu que decido quando algo termina. Somente eu. —Esbraveja em seu
tom de voz rígido e ameaçador.

Eu cairia facilmente no seu papo senão soubesse com quem eu estou lidando. Ela
é boa, isso não é possível negar, dou mérito para todo esse esforço. Realmente fez
um estrago…hm…legal.

—Só isso? —Vamos, Olívia. Você é melhor que isso.

—O que poderia haver mais? —Atuação uma hora dessa? O jogo já está rolando,
meu amor.

—Ainda tem a parte que eu falo que isso tudo o que você acabou de falar é papo
furado e que, na verdade, você é uma filhinha do papai.

—Talvez. —Inclina um pouco a cabeça. Sorrindo sarcástica. —Mas não sou idiota
de abrir o jogo com você. —Declara.

—Então, vamos fazer um jogo. O que acha? —Proponho sarcástico. Eu estou


gostando mesmo de jogar esse negócio. —O nome é duas mentiras e uma
verdade. Se você acertar, eu falo uma curiosidade e, se você acertar, você fala. Eu
começo. —Finjo fazer um esforço para pensar. —Primeira: Você colocou droga na
minha bebida. Segunda: Você combinou com Caleb para me provocar. Terceira:
Você me falou toda a verdade. Qual é a mentira? —Provoco sarcástico.
Ela demora um minuto para responder. Está pensando de novo.

—A última. —Admiti.

—Boa garota. —Sorriu quase como o coringa, diabólico. —A minha curiosidade


é…—Aproximo um passo do seu corpo para sussurrar as minhas próximas
palavras. —Eu sei que você foi expulsa da sua última universidade. E o motivo.
—Volto com a minha voz normal ao me afastar. —Agora, se quiser saber mais,
vamos ter que continuar brincando. Sua vez. —Eu estou no comando desse jogo.

Uma risada divertida a escapa.

—Primeira: Eu sou uma filhinha de papai. Segundo: Eu planejei cada detalhe


desse jogo. Terceiro: Eu não ligo de você saber o porquê eu fui expulsa. Qual é a
mentira?

—A última. —Respondo em seguida.

—Tem certeza? —Insisti.

—Está pensando demais e vi você engolir em seco quando sussurrei. Sim, eu


tenho certeza.

—Até que você é bom. —Admiti.

—A minha curiosidade. —Peço, a voz soando rouca.

—Esse não era o plano inicial.

—Qual era? —Revira os olhos suspirando impaciente. Percebe que isso não vai a
afetar em nada e revela.

—Eu iria investigar o histórico do passado dela para acabar com esse negócio de
vocês logo. Sabe, algo menos trabalhoso?!

—Mas, você não encontrou nada porque Maya é certinha demais. —Adiciono.
—Uma pena que você não é igual. —Murmuro baixo.

—Está afirmando algo que não sabe?

—Estou, porque eu sei. Você toma remédios controlados e faz terapia porque já
teve casos clínicos. Seduziu um professor, o que fez ele perder o emprego e você
ser expulsa. Perseguiu e ameaçou uma garota por algo que ela fez que você não
gostou, colocou fogo no quarto da sua antiga melhor amiga porque ela ficou com
um cara que você gostava e socou o peito do seu ex-namorado tantas vezes que
descolou a cartilagem do coração devido ao seu ciúme doentio. Estou mentindo?
—Pressiono.

—Eu não sou idiota. —Diz firme.

—Não vai falar a verdade pra mim? —Desafio. —O que vai acontecer se eu chegar
amanhã na direção dessa universidade e contar tudo o que você fez? Contar tudo
o que descobri e que seu papai fez questão de encobrir? Quem se fode mais? Eu
ou você? —A voz que sai é a linha fina entre o berro e a calma.

—Você é gentil demais para fazer algo assim. Está apenas fazendo uma ameaça.
—Devolve confiante.

—Será mesmo? Por que nós não testamos? No final nós vemos quem acertou. —
Seu olhar me fulmina. O ódio evidente nos orbes. —Conte a verdade. —Ordeno.

—Eu não menti quando disse que apenas eu decido quando algo termina.
Ninguém passa por cima de mim. Muito menos uma puta como ela. Mas existe
prioridades. E a minha prioridade sempre vai ser eu mesma. —Confessa. A voz
impaciente e enraivecida.

A doida acordou. Eu poderia muito bem xinga-la por chamar minha Maya de puta,
mas não quero sair daqui direto para a cadeia.

—Por isso eu coloquei droga na sua bebida e gravei o áudio enquanto estava
ocupado demais sendo o macho alfa para cima de Caleb. Depois que estava
drogado o suficiente ele me ajudou a tirar a foto. Coitado, a porra de um trouxa
por cair na sedução de uma mulher. —Comenta irônica. —Plantei o meu
prendedor de cabelo no seu quarto e te coloquei na cama com um beijo de
agradecimento por ser tão burro. —Vomita tudo de uma única vez. Ela ainda não
para.

—Todo esse trabalho apenas pra você largar daquela filha de uma puta, porque eu
precisava de alguém depois do meu pai enfiar na cabeça que eu estava muito
bem e tinha que aprender a viver sozinha. Você é perfeito. Tem tudo, o status, o
dinheiro, e é bom. Eu já gostava de você, só precisava me livrar de uma pedrinha
no caminho.

Sua confissão não me afeta, pois era exatamente isso o que eu estava esperando
quando bati na sua porta. Xeque-mate.

—Eu fiz isso e tudo o que você disse. E faria tudo de novo. —Finaliza.
—Acho ótimo que admitiu isso para si mesma. —Sorriu de lado. Coloco a garrafa
que estava segurando em cima do balcão atrás de mim e ajeito a minha postura
pronto para dar o fora daqui. —Preciso ir. Eu disse que tinha que ser rápido.

—O que vem agora? —Questiona segundos depois, impedindo a minha saída.

—Vamos fazer um trato. —Falo como uma afirmação, não em uma proposta.
—Você não mexe comigo e muito menos com a minha vida, e eu, não conto nada
dessa conversa.

—Certo. —Assente. Que garota inteligente…estou começando a gostar dela.

Viro com a intenção de sair da cozinha, mas antes eu me lembro de um último


recado importante.

—Eu…hm…deixei um recado pintado no seu carro. Espero que não se importe. —


Digo querendo soltar um gargalha sincera. —Não se esqueça de quem sai se
fudendo antes de fazer qualquer coisa. —Relembro. Ela é louca, se eu puder me
livrar o quanto antes, eu vou fazer.

Passo pela entrada batendo a porta e me deparando com os meninos que saem
dos fundos da fraternidade com a sacola nos ombros.

—Conseguiu?

—Sim, já estou te enviando. —Jason responde concentrado no celular em suas


mãos.

—Isso foi foda! —Murmura Brandon.

—Deveríamos fazer coisas desse tipo mais vezes. —Stephen concorda.

—Faz você sozinho. Garota daquele jeito é maluca. —Adam fala. Nós soltamos
uma pequena risada.

—Espero nunca fazer a merda de ficar com uma dessas. —Dylan resmunga.

—Liam já vivenciou por nós o suficiente. —Adam acrescenta.

—Vamos, precisamos ir para o treino. Temos uma final para ganhar.

Caminhamos pela calçada em direção aos respectivos carros, antes, dando uma
conferida no nosso recado em forma de arte.

—Acha que ela vai colar fogo na sua casa por isso? —Jason pergunta pra mim. Eu
espero que não.
“Quando entrar em uma briga, garanta de ser o mais inteligente na sala.
Xeque-mate, maluca.”

Capítulo 46

MAYA

O jogo começa em cinco minutos.


Eu fui arrastada pelas minhas duas melhores amigas com a desculpa de que é a
primeira vez que Anna pode assistir a um jogo de hóquei, e não poderíamos deixar
essa oportunidade passar. Como uma pessoa madura, deixe todas as minhas
merdas de lado. Afinal, eu não vou deixar um problema entre mim e Liam
atrapalhar a minha vida. Amo esportes e vou continuar vindo assistir ao time da
minha universidade jogar, além do mais, continuo sendo amiga de todos aqueles
idiotas. Não vou deixar de apoiá-los em um momento como esse.

A carta ainda está guardada. Guardada como as lembranças que tenho com Liam.
Para ela me lembrar o quão bom e importante foi o nosso ciclo. Não posso dizer
se esse ciclo se encerrou, mas depois de lê-la, eu tive certeza de uma coisa, eu o
perdoo. Independentemente do que tenha acontecido. Porque isso não apaga a
forma como foi gentil comigo, a forma como me ajudou e todos os momentos
ensolarados que vivemos. Sou grata por isso. Mesmo assim, não quer dizer que
estou pronta para manter contato. Porque uma parte minha ainda está conectado
a ele. E não gosto de me questionar se ela sempre vai estar.

—Acha que vai ser um jogo difícil? —Anna me puxa das minhas reflexões.

—Provavelmente, mas eles são bons.

O jogo de hoje é fora. Poucas pessoas como nós estão vestidas de azul, preto e
branco. O mar de torcedores de vermelho domina os assentos da arquibancada.
Jogar fora sempre é uma droga. Mais um dos motivos importantes de estarmos
aqui para assistir, mesmo que seja um sacrifício vim.

Ainda não faço a mínima ideia como Riley e Anna tiveram a coragem de querer vir,
e muito menos me arrastar junto. O que está acontecendo universo?

Observo o ringue a minha frente. Eles já estão posicionados. Liam no centro da


linha. O juiz deixa o disco cair, ele perde a disputa, a posse fica para Minnesota.

O time adversário patina para a nossa zona de defesa prontos para o ataque. Os
Mavericks se protegem, mas os jogadores adversários parecem ter se
multiplicado.

Rodam o disco passando por de trás do gol de uma forma rápida, o chute é
disparado. Peter defende sobrando um rebote perfeito para um contra-ataque da
Mavericks.

Nick, Liam e Nate patinam em direção à zona de ataque. Liam, que está com o
disco, é interceptado por um defensor adversário. Ele é jogado contra o vidro de
proteção, ainda lutando, a aflição de toda torcida adversária é expressa. Eles
torcendo para que consiga recuperar o disco, nós para manter a posse. O barulho
de comemoração da torcida é de latejar os ouvidos, nós desperdiçamos o
contra-ataque. Nós mal piscamos e os jogadores de Minnesota fazem uma jogada
rápida resultando em mínimas possibilidades de defesa para Peter. Eles abrem o
placar logo no início do primeiro período.

O restante desse tempo não é muito diferente. Mavericks criam chances a gol,
jogadas rápidas e criativas, mas contra-ataques promissores são desperdiçados.
A defesa adversária é um muro de aço, nossos jogadores tentam ao máximo
quebrar a linha, mas hoje eles não estão para muita brincadeira. Faltas são
cometidas. A cada jogada um dos nossos jogadores do ataque é espremido no
vidro de proteção. Eles estão sendo implacáveis.
O time adversário faz um restante de tempo satisfatório para a sua torcida. A cada
troca de passes são pessoas no mar de vermelho fazendo barulho e apoiando a
sua equipe. Suas chances são ótimas, mas ainda que os Mavericks não estejam
100%, a sorte parece se compadecer, porque o Minnesota perde grandes
oportunidades a gol indo para o intervalo com um placar final de 2x0. Pouco para
o tanto de chance que tiveram.

Antes do jogo retornar, eu e as meninas nos encaramos sem trocar uma sequer
palavra. Apenas olhares que correspondem a: estamos em uma situação muito
preocupante. Nosso time realmente está se fudendo no gelo, e queria muito nesse
momento perguntar para eles o que está acontecendo. Fizemos uma temporada
espetacular, não perdemos nenhum jogo. Uma temporada perfeita, para chegar no
final e não ganhar? Porra nenhuma. Temos capacidade de empatar esse jogo. A
Mavericks ainda não está morta, e a nossa esperança é última que vai sair do
ringue.

Essa tarefa se torna cada vez mais difícil conforme o outro tempo inicia por uma
série de erros. Tenho um desejo imenso de brigar com cada um deles de onde
estou, mas não faço, nem tenho capacidade mental para isso agora. Continuo me
convencendo e acreditando que vamos empatar pois, mesmo com as falhas, o
Minnesota não amplia o placar.

Vejo que as meninas estão sofrendo e vibrando tanto quanto eu desde o instante
que o juiz deixou o disco cair no gelo. As expressões de irritação e aflição delas
representa toda a nossa pequena torcida agora.

Após os primeiros cinco minutos do terceiro período, o time finalmente estabiliza,


o que pareceu uma eternidade depois de tanto sufoco no segundo tempo. Os
meninos ficam concentrados, pacientes e confiantes. Luke e Dylan estão sendo
uns guerreiros junto a Jason e Adam que revezaram no segundo período. Nada
está passando por eles. Voltaram do intervalo com o objetivo de fecharem as
portas da nossa defesa, e estão fazendo isso muito bem com garra. Chega a ser
bonito de ver. Brigam, disputam e recuperam o disco. Parece que nunca se
cansam. Faltam doze minutos para o jogo acabar. Ainda estamos perdendo de
2x0. Ou agimos agora, ou nos rendemos. Mas os Mavericks nunca se rendem. É a
regra.

A torcida emocionada pelo andar da partida, começa a comemorar


antecipadamente. Músicas provocativas com xingamentos e falas são proferidas
ao nosso time, aos nossos jogadores. Não demonstram estarem afetados, suas
mentes estão focadas nas lâminas de patins que deslizam no gelo, no taco em
suas mãos e no disco que protegem com toda a raça que tem. Isso pelo menos
até uma fala em específica ser soada por toda o estádio. Uma fala para um
jogador em específico. Uma que envolve a mim.

A expressão: “Maya Hawkins não sabe cozinhar” é verberada por parte da torcida
com outras expressões do gênero e xingamentos. A mim. Ao time. Ao Liam.

As meninas olham para mim alarmadas e com risos presos na garganta. Sou o
mais novo motivo de piada, ótimo.

O que eu tenho haver com isso? Eu sei cozinhar, sim! De onde tiraram? Esse é o
ponto ruim de se namorar um jogador, você se ferra junto.

Liam observa toda a arquibancada repleta por pessoas de vermelho, aparentando


percorrer os olhos por cada um. Em um momento tenho a impressão que ele me
vê, só que rapidamente ele encara as pessoas próximas ao vidro de proteção que
gritam bem atrás dele e sorri. Na verdade, eu acho que é mais uma risada. Nos
primeiros instantes acredito que está se divertindo, porém, quando volta a sua
mente para os últimos minutos da partida, a afeição no seu resto é oposta. Seu
maxilar fica rígido, exatamente como eu o vi diversas vezes.

Os próximos doze minutos são como uma avalanche emocionante e avassaladora.


Liam não tem piedade. Luke joga o disco para ele que patina para a zona de
ataque com velocidade. Nenhum momento ergue a cabeça para visualizar Nick e
Nate patinando ao seu lado. A jogada é dele. Ele quer calar os torcedores. Quer
amedronta-los. Ele consegue.

Engana os marcadores, dando a volta pelo gol e, Nate que está bem de frente,
simula que vai tocar para ele quando na verdade está enganando o goleiro para
chutar. O que sai exatamente como o esperado. Liam converte um gol.

Para de frente para a torcida rival, erguendo os braços para o alto chamando os
xingamentos que ressoam mais altos. Ele sorri. Sorri com uma puta satisfação.

Um grito de esperança e comemoração soa por nós três entre pessoas com
blusas vermelhas. A comemoração é explícita por toda as pessoas usando a
camisa de time da Mavericks. Nós pulamos e agradeço mentalmente por essas
duas terem me arrastado até aqui, por estarem sentindo essa mesma adrenalina
comigo. Um “chupa” automático é disparado por mim. Isso aqui são os Mavericks.
Liam, o melhor jogador que um dia vai atuar na NHL. O melhor jogador que eu
sempre acreditei que fosse.

A partida continua, mas os Mavericks de agora são impiedosos. Aos nove minutos
finais Liam marca mais um gol em uma jogada fenomenal iniciada por um passe
de Nate que patina rápido dando um toque surreal para ele que chuta nas costas
do goleiro. Esse gol foi nojento de tão bonito.

Estamos fazendo o Minnesota de graxa e sapato. Estão abismados com o empate


que levaram em três minutos em um placar que construíram em dois períodos. Se
tornaram nulos a partir do instante em que passamos a jogar pra valer. A regra diz:
Mate os Mavericks enquanto há tempo, porque se não, eles te matam depois.

Restando dois minutos finais, estamos convencidos de que iremos para os


acréscimos mais dolorosos e cansativos que existem. Entrelaço as minhas mãos
na altura da boca, respirando fundo com as possibilidades de viver os próximos
minutos mais tensos da minha vida. Anna puxa uma delas entrelaçando na sua,
assim como faz com Riley ao seu lado. Tenho vontade de esconder o meu rosto
em seu ombro, mas preciso continuar assistindo. Nós três permanecemos atentas
a cada jogador dentro daquele gelo.

Em um último ataque da Mavericks, Nick puxa a responsabilidade e mostra o


porquê já poderia estar atuando em uma liga profissional com um chute de média
distância certeiro, oficializando os pesadelos do Minnesota essa noite. Meu
Nicolas Watson é foda.

Eu e as meninas soltamos as mãos e pulamos em uma comemoração aliviante.


Sinto o ar voltar aos meu pulmão ao ver o placar ser atualizado. Olho paras as
meninas sorrindo. O jogo termina em uma virada de 3x2. Com uma temporada
brilhante, somos os campeões do Frozen Fluor. Os Mavericks são os
incontestáveis campeões do Frozen Fluor!

Saímos da arena pretendendo esperar por Anna que, ainda com os resquícios de
adrenalina nas suas veias, assim que o som indicando o fim da partida verberou
pelo local, saiu a caça de um banheiro. Ouço a música “Should I stay our Should I
go” ergo os olhos encontrando os meus meninos desfilando sorrindo e cantando
igual aos idiotas campeões que são.

O pequeno grupo de torcedores, amigos e familiares que os aguardavam do lado


de fora, irrompem em aplausos.
—Você deveria os parabenizar. —Riley fala ao meu lado plantando a sementinha
incentivadora necessária para os meus sentimentos. Sim, eu deveria.

Eles ainda são o meu time, e fizeram uma final incrível.

Caminho passos mais próximos de onde eles estão com uma caixa de som
ressoando a música que suas vozes pronunciam. Entre comemorações, danças,
cantorias e risadas, Nick é o primeiro a me ver. Ele vem até mim e me abraça,
igual a um de irmãos orgulhosos.

—Olha a nossa capitã, aí! —Brando grita chamando a atenção de todos. Solto
Nick encarando o bando de brutamontes a minha frente.

—A capitã foi o nosso amuleto da sorte hoje. —Stephen afirma. Não tenho certeza
se amuleto da sorte é a expressão mais correta.

—Vocês deixaram a torcida me xingar para reagir, seus idiotas! —Repreendo.

—Que bom, por isso ganhamos. Não poderíamos deixar eles mexerem com você.
É a nossa capitã porra! —Adam pontua.

—Mas vamos a questão importante. Você sabe cozinhar ou não? —Nate


questiona.

—Claro que sei.

—Acho que Liam descordaria disso. —Luke diz.

—Ninguém se importa com o que Liam descorda.

—Bom, foi ele que, na verdade, fez a torcida calar a boca. —Defende Nick.
Estreito os olhos para todos eles que me analisam.

—Eu sei o que estão fazendo. —Aviso.

—Não estamos fazendo nada. —Antecipa Brandon.

—Tanto que nem sabemos onde ele está. —Argumenta Jason. Isso é mentira.

—Vai se juntar a nós na comemoração, capitã? —Stephen questiona.

—Não, essa eu passo.

—Tudo bem. Você que perde em ver o Nick dançando em cima do bar, mas a
gente grava o vídeo e te envia. —Eu dou uma risada. Não duvido de nada disso
acontecer quando se fala em Nicolas Watson.
—Parabéns pela vitória. Vocês fizeram um jogo memorável. Mas saibam que da
próxima vez que fizerem eu ter um ataque igual hoje, eu acabo com vocês. —Nada
ameaçador talvez.

—Precisa ter emoção, capitã. —Alega Nate.

Despeço de cada um deles com um toque rápido e um abraço com Luke e Dylan.
Eles se direcionam ao ônibus de viagem do time estacionado, já preparados para
a chegada no The Five. Quando estou prestes a me juntar a Riley novamente,
observo o cara que impediu um assédio dentro do ônibus, que ajudou a concertar
o que não foi ele que quebrou, fez eu me sentir amada, os meus muros racharem,
escreveu cartinhas todos os dias para mim, comprou meus livros e me deu
lembranças boas para substituir as ruins. O cara que eu amo.

Permaneço parada esperando. Esperando que ele venha até mim, porque eu sei
que ele vai. E depois de semanas, quero falar com ele. Eu preciso.
Independentemente do que tenha acontecido aquele dia, eu o perdoo, e preciso
dizer a ele. Por ele. Por mim. Por tudo o que vivemos.

—Você está aqui. —É a primeira coisa que diz ao parar na minha frente com sua
bolsa atleta pendurada no ombro, os cabelos molhados e os olhos intensos. Liam
está como sempre. Lindo.

—Estou. —É tudo o que eu digo. Nós nos olhamos. Seus olhos puxam os meus
como um imã. Meu ar é sugado de mim e vejo a noite escura igual a noite de hoje
é, e a brisa gelada através do seu olhar. Estamos na bolha novamente. Consigo
sentir o fino fio nos conectando. É estranhamente bom, como todas as vezes.

Coço a garganta antes de falar.

—Eu…

—Ainda machuca olhar pra mim? —Pergunta atropelando as minhas palavras.

—Não.

—Ótimo, porque eu ainda amo olhar para você. —Ele confessa.

—Eu perdoo você. —Disparo.

—Perdoa? —Questiona com certa dúvida, suas sobrancelhas franzidas.

—Perdoou. —Afirmo. — Eu presenciei as experiências mais incríveis e bonitas


com você. Eu amei e aprendi com você. Eu vivi e senti com você. Nada vai apagar
isso. Você ainda é o meu amor e eu não sei por quanto tempo vai ser. E
independente de tudo, as nossas memórias ficaram para o resto da vida comigo.
Eu te perdoo, porque por mais que tenha machucado, eu não conseguiria não o
fazer.

Ele sorri. Um sorriso sincero, cheio de alívio e esperança. Eu o retribuo.

—Posso te pedir uma coisa? —Pedi. Balanço a cabeça afirmando. Retira do bolso
da calça o seu celular junto a um fone. —Escute o que vou colocar, tudo bem?!
Delicadamente, ele encaixa os fones nos meus ouvidos e me dá o celular aberto
em um vídeo, dou o estarte. Nele estão Liam e Olívia em um lugar que não faço a
mínima ideia, muito menos quem está gravando. O diálogo é um pouco longo,
mas o escuto atentamente como me pediu. Dois minutos depois estou tirando o
fone e devolvendo o seu celular. Fico em silêncio durante um minuto inteiro. Ele
apenas me fita esperando que eu fale.

—Isso. —Aponto para o celular. —Quer dizer que perdemos o nosso tempo, eu
perdi o nosso tempo, por causa dessa maluca? —Questiono em um tom
indignado, quase irritado. Ele sorri. Um sorriso enorme.

—Sim. —Fala em uma meia risada.

—Que vaca desgraçada! —Resmungo. Sua risada aumenta.

—É. —Concorda.

—Eu poderia dar um soco nela agora. —Digo. Ele ainda está rindo. Como ele
pode estar rindo em uma situação como essa? —Pare de rir, não é engraçado.

—Eu te amo sabia? —Sabia. —Nós não perdemos o nosso tempo. Quero dizer,
perdemos porque foi uma puta droga ficar sem você e muito mais fazer você
chorar. Só que isso fez somente eu perceber que eu odeio não ter você por perto.
Odeio não sentir seu cheiro, te abraçar, beijar e ver o bico se formando nos seus
lábios quando eu te irrito. Odeio poder não estar te amando o tempo inteiro.
Serviu para perceber que eu quero você em todos os dias que virão na minha vida.

Ele se aproxima mais envolvendo suas mãos livres no meu rosto, tocando a minha
pele após dias, olhando no fundo dos meus olhos.

—Você é o meu caos, Maya Hawkins. A minha linda. A minha garota. A minha
Hawkins, e todos os apelidos que você quiser. Você é o caos mais belo que eu
quero afundar e viver. —Declara. —Eu te amo.
Fecho os olhos sentindo o efeito que as palavras ditas causam dentro de mim.
Liam sempre fez isso, com seus gestos, palavras, toques, olhares e sendo ele
mesmo. Sempre causando efeitos em mim.

—Eu te amo, Liam Brown. Nunca deixei de te amar, e nunca vou deixar. Você é o
livro que eu quero para sempre ler.

Encostando as nossas testas uma na outra, após segundos em silêncio ele


sussurra por fim:

—Maya? —Sussura. —Eu encontrei a minha rosa.


Epílogo

LIAM.

Agosto.
Maya bate a porta ao entrar no carro pelo banco do copiloto.

Gira o corpo no assento para fazer o seu toque com Nick sentado no banco de trás
em um cumprimento. Sim, eles tem o próprio toque agora. Depois de muita
perturbação, eu desisti, aceitei que a minha namorada tenha um toque com o meu
melhor amigo, um só deles. Se um dia o lema “Nada de mulheres” existiu, ele
acabou de receber seu atestado de óbito.
—Oi, campeão do Frozen Flour. —Volta para mim, aproximando o seu rosto para
me dar um breve selinho.
Campeão do Frozen Flour. Ainda posso sentir todas as sensações daquela noite, a
sensação da nossa vitória. Fizemos uma final universitária verdadeiramente
memorável, um trabalho em equipe perfeito. Uma temporada perfeita.

Estou muito orgulhoso do time. Estou orgulhoso de mim. Orgulhoso por ter
conseguido trazer o time até aqui, por cada jogo, por todo o esforço, por ter sido
capaz. Virei o jogo naquela noite, mostrei que posso muito bem ser decisivo
quando necessário, que sou tão bom jogador quanto dizem. Estou orgulhoso, e
ainda mais pelo meu incentivo estar sentado ao meu lado neste carro, acreditando
em mim sempre.
Nada teria acontecido sem ela. O incentivo dos dois gols veio dela. Eu poderia
facilmente me tornar um jogador professional e atua rem uma ótima liga da NHL,
mas não seria a mesma coisa se ela não estivesse comigo. Hoje, meu conforto tem
os olhos castanhos mel mais lindos existentes que me dizem “eu te amo” todas as
vezes que me olham e faz com que minhas pipulas dilatem automaticamente.
Dilatam da mesma forma que fazem quando está escuro e os olhos tentam deixar
a luz entrar. Os meus precisam frequentemente se ajustar ao amor que os seus
demonstram, assim como o amor que eu sinto e preciso corresponder.
Eu amo o caos que Maya Hawkins é, acho que nunca vou me cansar de dizer,
pensar, mostrar e viver.
—Eu também sou campeão. —Rosna Nick igual uma criança birrenta, falta só os
braços cruzados.
—Eu sei, assisti o seu gol na final, campeão do Frozen Flour. —Sorte que não sou
ciumento. Estou descobrindo que ter sua namorada agindo como uma mãe do seu
grupo, as vezes, não é muito divertido.

—Podemos passar para buscar Anna no trabalho? —Puxa o sinto de segurança e


o prende quando dou partida. —Ela vai lá para casa hoje, vamos comer pizza.

—Do jeito que vocês duas vivem juntas, é capaz de eu ser deixado de lado. Vocês
são o chaveirinho uma da outra.

—Ela é meu chaveirinho. Você tem Nick, Dylan e Luke como seus chaveiros.
—Rebate.

—Eles moram comigo. —Alego. —E são os meus melhores amigos a muito tempo.

—Estou impressionado que pela primeira vez você não negou o seu amor infinito
pela gente. Eu sempre soube. —Comenta, eu solto uma bufada de ar ouvindo a
gargalhada dela ao meu lado.

—Anna também é a minha melhor amiga a muito tempo. —Contrapõe. —Você tem
a eles, e eu, tenho a Riley e a Anna.

—Você tem os meninos também. —Falo.

—E você as meninas.

—Vocês sempre são assim? Se provocando e tendo discussões idiotas?

—Sim. —Respondemos juntos. Sorriu pensando que sempre fomos assim. E


vamos ser pra sempre.

—Por que não comemos todos pizza na nossa casa? —Sugiro. —Estou devendo a
Anna um agradecimento. —Revelo.

—Tudo bem, vou mandar mensagem pra elas no grupo.

Dirijo por mais dez minutos como destino o local de trabalho da Anna, Riley vai
direto nos encontrar lá. As meninas toparam uma noite da pizza com os caras, o
que pode sair disso? Eu espero que algo bom, estou com o pressentimento que
todos nós vamos nos dar muito bem. A noite vai ser interessante.
Paro de frente ao lugar, a porta do carro é aberta mais uma vez, mas por Anna que
se senta no banco de trás.

—Você de novo? —Um murmuro misturado indignação e surpresa de Nick é


direcionado a Anna que fica paralisada.

—Vocês se conhecem? —O cenho de Hawkins se franze em confusão. Uma boa


pergunta.

—Não. —Dizem em uníssono. É, eles se conhecem.

Quando pensei que a noite fosse ser interessante, não imaginei que fosse tão,
principalmente começando a partir de agora.

Definitivamente, eu acho que o lema “nada de mulheres” teve o seu velório.


Agradecimentos
Quero agradecer a cada uma das meninas que me inspiraram, apoiaram e
brigaram comigo para essa história ser finalizada.
Obrigada por gostarem tanto de cada um deles como eu gostei. Obrigado por
ansiarem e amarem o universo dos Maverciks. Obrigado pela paciência e
motivação. Esse livro é para vocês.
Vocês são incríveis.

Obrigado a você que está lendo, e a mim mesma do passado por ter tido coragem
o suficiente para criar esse mundo.

De: Eu.
Para: Anna, Thalita, Kamily e eu mesma de 2022.

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