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Ribeirão Preto
2009
PATRÍCIA PÁFARO GOMES ANHÃO
Ribeirão Preto
2009
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
FICHA CATALOGRÁFICA
Aos meus pais, Nelsinho e Cida, que sempre se esforçaram para possibilitar a minha
formação, dedico este trabalho
Agradecimentos
Ao Prof. Dr. Jair Lício Ferreira Santos, pela orientação, paciência, disponibilidade, incentivo
e auxílio sempre.
À Prof. Dra. Luzia Iara Pfeifer, pela co-orientação, amizade e carinho que sempre me
direcionaram.
Aos professores que participaram das bancas de qualificação e defesa, por lerem tão
cuidadosamente este trabalho, contribuindo com sábias e válidas sugestões para o seu
enriquecimento.
À futura Terapeuta Ocupacional, Renata Lucisano, pela ajuda durante a coleta de dados e
observação das filmagens.
Aos meus familiares, que sempre me apoiaram diante dos obstáculos da vida, sendo co-
responsáveis por todos os meus sucessos.
À jornalista Luciane (minha irmã) e ao professor Laurindo (meu sogro), pelo auxílio nas
correções gramaticais e outras questões da vida.
E, principalmente, às crianças que participaram do estudo, pelo carinho, amor e alegria que
possibilitaram a realização deste trabalho.
Sonhe...
(Clarice Lispector)
RESUMO
A atualidade do tema inclusão escolar na rede pública de ensino traz à tona uma
série de discussões pertinentes e constituintes deste novo paradigma social, principalmente
para as crianças com Síndrome de Down, as quais têm seu processo de desenvolvimento cada
vez mais estudado. Pesquisas têm demonstrado as consequências do processo de inclusão
junto a esta população. O objetivo geral desta Dissertação é verificar e analisar quali-
quantitativamente como se dá o processo de interação social de crianças com Síndrome de
Down e crianças com desenvolvimento típico, na rede regular de educação infantil do
município de Ribeirão Preto. Os participantes foram crianças com Síndrome de Down, na
faixa etária de três a seis anos, que já frequentaram o setor de estimulação precoce da Apae de
Ribeirão Preto, e crianças com desenvolvimento típico que frequentavam as mesmas salas dos
pares com Síndrome de Down, também na faixa etária de três a seis anos. As filmagens foram
analisadas quali-quantitativamente, por meio de categorias que identificaram o processo de
interação social desta criança junto aos seus pares, em ambiente escolar. Os resultados
apontam que, de maneira geral, não foram observadas diferenças significativamente
relevantes entre os comportamentos apresentados pelo grupo de estudo, composto por
crianças com Síndrome de Down, e pelo grupo comparado, composto por crianças com
desenvolvimento típico. Os comportamentos que apresentaram diferença significativa foram:
“Estabelece contato inicial com outras pessoas” (p=0,017) e “Imita outras crianças”
(p=0,030). O grupo de estudo apresentou maior frequência do comportamento “Imita outras
crianças” quando comparado ao grupo de crianças com desenvolvimento típico. Já o grupo
comparado apresentou maior frequência do comportamento “Estabelece contato inicial com
outras pessoas” quando comparado ao grupo de crianças com Síndrome de Down,
demonstrando um déficit das habilidades sócias assertivas e mostrando que as habilidades
sociais passivas estão mais presentes neste grupo de crianças. O estudo concluiu que nos
comportamentos observados e de acordo com a faixa etária estudada, o grupo de crianças com
Síndrome de Down abordado, não apresentou características de interação social muito
diferentes das crianças com desenvolvimento típico estudadas. Reforçando a importância do
processo de inclusão escolar desta população.
The current issue of school inclusion in the public school system brings to light a
series of discussions and relevant components of this new social paradigm, especially for
children with Down syndrome, which have their development process increasingly studied.
Polls have shown the consequences of the inclusion process with this population. The aim of
this is to verify and analyze quali - quantitatively how it gives the process of social interaction
of children with Down syndrome and typically developing children in the regular network of
child education in the municipality of Ribeirão Preto. Participants were children with Down
syndrome, aged from three to six years, which have attended the area of early stimulation of
APAE of Ribeirão Preto, and typically developing children who attended the same room of
peers with Down syndrome also in age of three to six years. The films were analyzed quali -
quantitatively, using categories that identified the process of social interaction of this child
with their peers in the school environment. The results show that in general no significant
differences were observed between the behaviors presented by the study group, composed of
children with Down syndrome, and the comparison group, composed of children with typical
development. The behaviors that were significantly different: "It establishes initial contact
with others" (p = 0017) and "He imitates other children (p = 0030). The study group showed
higher frequency of behavior "He imitates other children" when compared to the group of
children with typical development. But the comparison group showed greater frequency of
behavior "establishes initial contact with other people" when compared to the group of
children with Down syndrome, showing a deficit of social assertions skills and showing that
passive social skills are more present in this group of children. The study concluded that the
behaviors observed and according to the age group studied, the group of children with Down
syndrome approached showed features of social interaction not very different from typically
developing children studied. Reinforcing the importance of the school inclusion in this
population.
1 - INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 15
2 - OBJETIVOS ............................................................................................................................. 33
4 – RESULTADOS ........................................................................................................................ 51
5 - DISCUSSÃO ............................................................................................................................ 65
6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................... 73
7 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................................... 77
1
Reflexo de Moro: também chamado de ‘reflexo de abraçamento’, consiste quando da queda da cabeça (com a
criança segura pelo dorso e nuca no braço do examinador), no rompimento do equilíbrio, havendo resposta de
extensão e abdução dos membros e, a seguir flexo-adução, principalmente dos membros superiores (NITRINI,
2003, p.402).
2
Hipotonia: diminuição da tonicidade ou tensão muscular normal (Dicionário Médico Blakiston, p.538).
3
Braquicefalia: cabeça curta, com índice cefálico – relação da maior largura da cabeça e maior comprimento
multiplicado por 100 (p.562) – de 81.0 a 85.4 (Dicionário Médico Blakiston, p.162).
4
Displasia: desenvolvimento ou crescimento anormal (Dicionário Médico Blakiston, p.329).
5
Clinodactilia: defeito congênito, que consiste no encurvamento anormal dos dedos ou artelhos (Dicionário
Médico Blakiston, p.230).
18 Introdução____________________________________________________________________________
Se for considerado que a idade média para estas aquisições em crianças com
desenvolvimento típico é de sete meses (5-9 meses) para sentar, oito meses (7-12 meses) para
ficar em pé com apoio e 12 meses (9-17 meses) para andar, é possível constatar algo que se
aplica a todas as áreas do desenvolvimento de crianças com SD, na qual a variabilidade no
desenvolvimento é muito mais ampla do que a observada em grupos de crianças com
desenvolvimento típico; ficando evidente que um atraso no desenvolvimento motor desta
criança irá interferir no desenvolvimento geral de outras áreas de atuação consequentes
(ROGERS; COLEMAN, 1992).
Estudos demonstram que crianças com SD passam pelas mesmas fases do período
sensório-motor e na mesma sequência do que a observada nas crianças com desenvolvimento
típico, porém de forma mais lenta. O que se pode perceber, a julgar pelos resultados de
algumas pesquisas, é que a trissomia perturba o aprendizado e torna certas habilidades
aprendidas mais instáveis (SCHWARTZMAN et al., 1999).
6
Aqui o autor não está discutindo as diferenças do processo de integração ou inclusão da criança com
Síndrome de Down, aborda apenas o convívio entre pares durante esta faixa etária.
_____________________________________________________________________________Introdução 21
Não é possível abordar o processo de inclusão no Brasil sem antes traçar um perfil
histórico da educação para pessoas com deficiências, e o que de fato levou a esta mudança de
paradigmas que culmina com as propostas inclusivas. Segundo Mazzotta (1996), pode-se
afirmar que a história da educação de pessoas com deficiência no Brasil está dividida em três
grandes períodos:
O período de 1854 até 1956 foi marcado por iniciativas de caráter privado.
Durante esse período foi enfatizado o atendimento clínico especializado, mas incluindo a
educação escolar. Foram fundadas as instituições mais tradicionais de assistência às pessoas
com deficiência mental, física e sensorial, seguindo quase sempre modelos que primam pelo
assistencialismo, pela visão segregativa e por uma segmentação das deficiências
(MAZZOTA, 1996).
O período de 1957 até 1993 foi definido por ações oficiais de âmbito nacional. A
educação especial foi assumida pelo poder público em 1957 com a criação de “Campanhas”,
que eram destinadas especificamente para atender a cada uma das deficiências. Em 1972 foi
constituído pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC o Grupo-Tarefa de Educação
Especial e também foi criado o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), hoje
conhecido como Secretaria de Educação Especial (SEESP). Durante esse período ocorreram
iniciativas de caráter privado e beneficente, lideradas pelos pais, no atendimento clínico e
escolar de pessoas com deficiência, assim como na formação para o trabalho protegido em
oficinas monitoradas. Um exemplo desse processo foi a formação das APAEs por todo o
Brasil (MAZZOTA, 1996).
o verdadeiro alunado da educação especial, ou seja, qual é a sua clientela específica. Pois os
alunos que predominam nas classes especiais ainda hoje não são, na maior parte dos casos,
aqueles a quem esta modalidade se destina e pela ausência de diagnósticos precisos e de
queixas escolares bem fundamentadas, correm o risco de serem todos rotulados como alunos
com deficiências (MAZZOTA, 1996).
O que se pode observar com base em estudos bibliográficos é que a partir dos
resultados positivos com a prática da inclusão escolar em países desenvolvidos, o sistema
educacional brasileiro vive um momento de transição no atendimento de alunos com
necessidades educativas especiais.
A palavra inclusão remete a uma definição mais ampla, indicando uma inserção
total e incondicional. Integração, por sua vez, transmite a idéia de inserção parcial e
condicionada às possibilidades e habilidades de cada pessoa. A inclusão exige uma
transformação na escola, devendo esta se adaptar às necessidades dos alunos, ou seja, a
inclusão acaba por exigir uma ruptura com o modelo tradicional de ensino (WERNECK,
1997).
24 Introdução____________________________________________________________________________
ser responsabilizada pela inclusão da criança com deficiência na rede regular de ensino e arcar
com as consequências desse processo. A autora conclui ainda que as mudanças provocam
ansiedade, medo do desconhecido, no caso, a inclusão escolar. Mas a mudança se faz
necessária, principalmente para que a sociedade possa conhecer melhor as pessoas com
deficiências. Enquanto estas forem consideradas seres especiais, a sociedade continuará
estigmatizando-as como “coitadinhos” e “incapazes”, e elas não conseguirão chegar ao
patamar de cidadãos comuns.
Del Prette e Del Prette (2005) afirmam que a socialização, neste caso, o processo
de interação social, é uma das mais importantes tarefas do desenvolvimento inicial da criança.
Ela se caracteriza pela ampliação e refinamento do repertório de comportamentos sociais e,
simultaneamente, pela compreensão gradual de valores e de normas que regulam o
funcionamento da vida em sociedade. A aprendizagem de comportamentos sociais e de
normas de convivência inicia-se na infância, primeiramente com a família e depois, em outros
ambientes como vizinhança, creche, escolas de Educação Infantil. Essa aprendizagem
depende das condições que a criança encontra nesses ambientes, o que influi sobre a
qualidade de suas relações interpessoais subsequentes.
_____________________________________________________________________________Introdução 27
Para Glat (1995), o grande drama das pessoas estigmatizadas que afeta
principalmente os indivíduos com deficiências, é que o estigma funciona como um rótulo. E,
a partir do momento em que o indivíduo é identificado como um desviante ou anormal, no
caso o deficiente mental, tudo o que ele faz ou é, passa a ser interpretado em função dos
atributos estereotipados do estigma. As pessoas anormais, ou desviantes, nos perturbam
porque não sabemos exatamente como lidar com elas (GLAT, 1988, 1991, 1994, 1995). A
mesma autora afirma ainda que o homem é um ser social, sua concepção de mundo e sua
identidade pessoal são determinadas pelo lugar que ele ocupa no universo social que, por sua
vez, é um reflexo das representações dos outros homens em relação a ele. Dessa maneira, o
homem desempenha os chamados papéis sociais que são comportamentos aprendidos, pois
ninguém é geneticamente programado para representar determinado papel. Mesmo nos
primeiros anos de vida, quando ainda não está biologicamente desenvolvido, o homem já se
encontra inserido em uma ordem cultural e social estabelecida, a qual implica uma
determinada concepção de mundo.
Ter contato ou conviver com uma pessoa com deficiência, para uma pessoa sem
deficiência, é algo perturbador. Isso tende a ocorrer, porque ela funciona como um espelho no
qual o homem vê refletida a ameaça da deficiência humana potencial, assim, devido à
fragilidade natural do ser humano, o mesmo gosta de pensar-se como pessoas completas,
constantes, e permanentes, porém, o deficiente faz lembrar a própria falta, instabilidade e
efemeridade (GLAT, 1995). Então, para não ver a própria imagem caricaturada, ele tem
vontade de quebrar ou esconder o espelho e, dessa maneira, fica difícil aceitar o deficiente
como igual. Aceitá-lo, significa aceitar a própria imperfeição e alteridade (GLAT, 1995).
Durante a evolução histórica que abrange os aspectos das pessoas com deficiência,
existe uma preocupação mundial constante em integrá-las na sociedade e, como para qualquer
cidadão, a vida cívica começa na escola, nada mais justo que tais pessoas sejam inseridas,
28 Introdução____________________________________________________________________________
desde o início de sua formação. Atualmente ocorre uma crise de paradigmas sobre qual a
melhor maneira de realizar esse processo, e a Educação Especial ainda é vista por muitos,
como o melhor caminho para as pessoas com deficiências atingirem seus objetivos de
cidadãos, mas a inclusão escolar já é uma realidade presente em muitas situações (GLAT,
1995). Tais aspectos serão melhor discutidos a seguir.
Quando Vygotsky (1988) diz: “Eu me relaciono comigo tal como as pessoas se
relacionam comigo”, ele enfatiza a idéia proposta pelo materialismo histórico dialético que
propõe o homem como ser social em constante mudança pelo meio ao qual está inserido.
Dessa maneira, a criança, com necessidades educacionais especiais, irá se relacionar consigo
mesma de acordo com o ambiente em que estiver inserida. Se esse ambiente for acolhedor e
_____________________________________________________________________________Introdução 29
produtivo, ela tenderá a se sentir acolhida e produtiva, em contrapartida, se esse ambiente for
discriminatório e improdutivo, a tendência é se sentir discriminada e incapaz.
Del Prette e Del Prette (2005) afirmam ainda que em estudos sobre competência
social de pessoas com retardo mental, os participantes com SD, indicam dificuldade na
estruturação de frases, déficits em componentes comunicativos verbais e não-verbais e baixa
competência na habilidade de reformular a própria fala. As deficiências cognitivas, afetivas,
perceptivas e motoras incidem sobre a capacidade de identificar as demandas do contexto
social, bem como sobre o planejamento e emissão dos desempenhos esperados sob tais
demandas, reduzindo, portanto, o nível de proficiência desses desempenhos. As limitações
próprias desses indivíduos podem comprometer tanto o acesso e processamento cognitivo da
estimulação social do ambiente como o desempenho de respostas socialmente competentes.
30 Introdução____________________________________________________________________________
Dessa maneira, o presente estudo busca, por meio de uma abordagem analítica
descritiva observacional, levantar alguns aspectos significativos das habilidades sociais de
crianças com SD, quando inseridas em ambientes inclusivos através do processo de interação
com outras crianças com desenvolvimento típico.
A partir das informações apresentadas, é possível observar uma forte ligação entre o
processo de inclusão e o desenvolvimento da interação social de crianças com SD, assim
como também em relação àquelas com desenvolvimento típico. Diferenças ou até mesmo
semelhanças entre o desenvolvimento dos aspectos sociais de crianças com SD, e de crianças
com desenvolvimento típico, quando inseridas num mesmo ambiente, no caso a escola,
justificam uma abordagem observacional descritiva que o presente estudo pretende abordar. A
partir dos dados apresentados, a pergunta a qual esta pesquisa busca elucidar é: Qual a relação
entre o desenvolvimento das habilidades de interação social de crianças com SD e de crianças
32 Introdução____________________________________________________________________________
com desenvolvimento típico, quando inseridas no mesmo ambiente, neste caso, o ambiente
escolar possibilitado pelo processo de inclusão?
A hipótese que este estudo busca defender é a de que crianças com SD apresentam um
repertório de habilidades sociais semelhantes, quando comparadas ao de crianças com
desenvolvimento típico, incluídas na rede regular de ensino durante a faixa etária estudada, ou
seja, incluídas nas escolas de Educação Infantil.
2 - OBJETIVOS
______________________________________________________________________________Objetivos 35
3.1 - PARTICIPANTES
Para a seleção do grupo de estudo foram analisadas seis crianças com SD, na faixa
etária de três a seis anos, inseridas na rede regular de ensino de Ribeirão Preto, em EMEI –
Escolas Municipais de Educação Infantil, egressas do Programa de Estimulação Precoce da
APAE-RP. E, para a seleção do grupo de comparação, foram analisadas seis crianças com
desenvolvimento típico, com características semelhantes e correspondentes a cada indivíduo
presente no grupo de estudo. As crianças do grupo comparado têm idade e sexo semelhantes e
correlacionados às crianças do grupo de estudo, e estavam inseridas no mesmo ambiente
escolar (sala de aula) dos referidos pares.
SD, na faixa etária de três a seis anos, para o grupo de estudo. E, para o grupo de comparação,
os critérios de inclusão foram crianças com desenvolvimento típico, na faixa etária de três a
seis anos, que frequentavam a mesma sala da criança correspondente do grupo de estudo.
Todas as crianças envolvidas no estudo estavam matriculadas e frequentavam uma Escola
Municipal de Educação Infantil (EMEI).
Ribeirão Preto, devido alguns pais de crianças com SD egressas da Apae-RP optarem pelo
ensino particular, automaticamente excluindo-se dos critérios de inclusão do estudo.
3.2 - LOCAL
Consiste em espaço amplo, porém restrito, isto é, mais fechado, mobiliado com
mesas, cadeiras e armários para armazenamento dos materiais didáticos e brinquedos,
caracterizando-se como uma sala de aula. Neste ambiente, as crianças desenvolvem atividades
pedagógicas dirigidas e propostas pela educadora. Normalmente ficam sentadas em pequenas
42 Material e Método_______________________________________________________________________
cadeiras e mesas, nas quais realizam atividades direcionadas. Neste espaço é frequente o uso
de diversos materiais como folhas de papel A4, apostilas de atividades, lápis de cor, giz de
cera, tinta e pincéis, massinha de modelar, cola, materiais de sucata entre outros.
Foi utilizada uma câmera filmadora digital, para registrar as situações em que as
crianças em questão, estiveram inseridas no contexto social abordado. Foram realizadas
quatro sessões de 15 minutos para cada criança participante do estudo, em dois ambientes,
totalizando uma hora de filmagem para cada indivíduo, sendo meia hora no ambiente externo
e meia hora na sala restrita. Cada filmagem foi realizada em dias diferentes, a fim de realizar
uma abordagem mais ampla de cada participante.
Para a coleta de dados na sala restrita, o início da filmagem foi determinado pelo
início da atividade dirigida. Já no ambiente externo, o início da filmagem foi determinado
apenas pela presença do participante naquele ambiente.
3.4 - MATERIAL
também utilizou como base a categorização das habilidades sociais proposta por Del Prette e
Del Prette (2005) e Cavalcante e Galvão (2007).
Habilidades Comportamentos
6. Tem autodefesa;
10. Chora;
11. Sorri;
HABILIDADES DE AUTO-
12. Fica sozinho;
EXPRESSÃO
13. Canta;
Fonte: Baseado em Cavalcante e Galvão, 2007 ; Del Prette e Del Prette, 2005.
1. “Ocorre interação com outra criança”: estão englobadas ações verbais e não verbais que, o
participante realiza, com ou para outra criança, bem como quando outra criança realiza
ação verbal ou não verbal, para com o participante.
a. Ações verbais consistem em chamar o outro, vocalizar tentando mostrar alguma coisa,
gritar, cantar músicas, conversar sobre a brincadeira que estão realizando.
2. “Ocorre interação com adulto (educador)”: estão englobadas ações verbais e não verbais
que o participante realiza direcionado ao educador, que normalmente é o adulto presente
nas filmagens, assim como quando o adulto estabelece interação com o participante.
a. Ações verbais neste caso consistem em chamar o educador, vocalizar tentando mostrar
alguma coisa, gritar pedindo ajuda para desempenhar alguma atividade solicitada, cantar
músicas conjuntamente com o educador.
3. “Ocorre interação com objetos (brinquedos, material didático)”: estão englobadas as ações
que envolvem a manipulação de objetos diversos durante a realização, tanto de atividades
lúdicas quanto pedagógicas. Foram contabilizados os momentos em que a criança esteve
48 Material e Método_______________________________________________________________________
em contato e dando função a algum objeto, e que variou muito de acordo com a situação,
pois em ambiente de sala, os objetos manipulados normalmente são papéis, canetas, giz de
cera, massinha, já em ambientes externos, os objetos manipulados são normalmente
brinquedos como carrinhos, bonecas, bolas, brinquedos de areia.
4. “Disputa a atenção da educadora com outra pessoa”: refere-se àquelas situações em que o
educador está ocupado com alguma outra tarefa, como solucionando as dúvidas de outros
colegas de classe, ou conversando com outra pessoa da escola e o participante fica
chamando, insistentemente, a atenção do educador, mesmo após a solicitação de espera.
Outra situação vivenciada durante este comportamento ocorre quando a educadora fica
muito tempo com atenção voltada ao participante e outros membros da turma também
solicitam-lhe a atenção.
8. “Brinca junto, mas com objetos diferentes”: observam-se situações em que os participantes
estão inseridos em um grupo, mas manipulam diferentes tipos de objetos, como por
exemplo, quando todos estão desenvolvendo uma atividade pedagógica, mas o participante
está brincando com um objeto o qual nada tem a ver com a situação daquele momento.
9. “Brinca junto com o mesmo tipo de objeto”: observam-se situações em que o participante
exerce o princípio da cooperação, dividindo com o outro o objeto a ser manipulado.
_______________________________________________________________________Material e Método 49
Normalmente no ambiente de sala, os participantes brincam junto, com objetos como giz de
cera ou lápis de cor, pois para cada grupo de quatro crianças, é fornecido um potinho com
giz de cores variadas. Já no ambiente externo, o objeto com o qual as crianças mais
brincam junto, é a bola.
10. “Chora”: observa-se como o participante expressa as emoções; se através do choro, tal
comportamento é contabilizado.
11. “Sorri”: contabilizam-se quantas vezes o participante realiza esta forma de expressão de
sentimentos.
12. “Fica sozinho”: refere-se a situações em que o participante se mantém por mais de um
minuto de filmagem, alheio às atividades desenvolvidas no ambiente ao qual está inserido,
sem realizar contato visual ativo, ou contato físico com qualquer outra pessoa presente
nesse ambiente.
13. “Canta”: diz respeito a situações em que o participante canta (pode ser uma lalação), em
algum momento de descontração, ou quando todos estão cantando e o participante
acompanha o cantarolar.
14. “Imita outras crianças”: refere-se a momentos em que o participante observa o fazer do
outro (criança) durante a realização de uma atividade pedagógica ou na brincadeira, e
reproduz, à sua maneira, aquele fazer.
Foi realizado o tratamento dos dados obtidos através das filmagens. A análise
estatística realizada por meio do Teste de Mann-Whitney gerou os resultados apresentados na
Tabela 1.
Cada comportamento teve o teste aplicado nos dois ambientes: Sala restrita –
ambiente 1 (A1) e Espaço Externo – ambiente 2 (A2) e, também, nas duas filmagens F1 e F2,
formando quatro situações distintas em que os dois grupos (estudo e comparado) foram
cotejados. As quatro situações são descritas como: A1F1, A1F2, A2F1, A2F2.
Resultados___________________________________________________________________________
Whitney (valores de p)
Comparado
Comparado
Comparado
Comparado
Estudo
Estudo
Estudo
Estudo
P
p
p
1 14,5 15,0 0,367 14,0 14,5 0,613 13,0 15,0 0,072 12,5 15,0 0,231
2 8,0 6,5 0,936 9,0 7,0 0,682 1,5 3,5 0,806 1,5 1,0 0,403
3 15,0 15,0 0,400 15,0 15,0 0,902 14,0 12,5 0,934 13,0 11,0 0,618
4 0 1,0 0,666 2,0 2,0 0,739 0 0 1,000 0 0 0,317
5 0 0,5 0,653 0,5 0 0,367 0 0 0,847 1,0 0 0,204
6 0 0 0,138 0 1,0 0,212 0 0 0,460 1,0 0,5 0,203
7 1,0 0 0,180 2,0 1,5 0,805 0 0,5 0,718 0,5 5,0 0,017
8 1,5 1,5 0,805 11,5 7,0 0,573 2,0 0,5 0,317 5,0 1,5 0,748
9 12,0 13,0 0,323 4,0 8,0 0,420 7,0 11,5 0,146 7,5 10,0 0,333
10 0 0 0,317 0 0 (a) 0 0 1,000 0 0 (a)
11 1,5 2,5 0,743 3,0 2,0 0,465 1,5 1,5 0,934 0,5 1,0 1,000
12 0 0 0,138 0 0 0,317 0 0 0,139 1,0 0 0,152
13 0 1,5 0,105 0 0,5 0,211 0 0 0,902 0 0 0,317
14 1,5 0 0,730 1,0 1,0 0,733 3,5 0 0,030 2,0 5,0 0,126
15 0 0 0,317 1,0 0 0,484 0 0 0,317 0 0 (a)
TODOS 1,0 1,0 0,872 1,0 1,5 0,849 1,0 0,0 0,257 1,0 1,0 0,605
Nota: (a)- Teste não aplicado, todas as observações coincidentes.
Resultado significante
_________________________________________________________________________Resultados 55
A1F1 0,945
A1F2 0,870
A2F1 0,944
A2F1 0,885
A2F1 0 0 1,000
A2F2 0 0 0,317
60 Resultados__________________________________________________________________________
A1F1 0 0 0,138
A1F2 0 0 0,317
A2F1 0 0 0,139
A1F1 0 0 0,317
A2F1 0 0 0,317
A2F2 0 0 (a)
faz-se necessária uma amplificação das informações que estes resultados propõem, por
meio de uma discussão mais aprofundada de cada um dos comportamentos observados,
correlacionando-os ao que a literatura sobre o tema tem argumentado. Dessa maneira, a
discussão apresentada a seguir procura conciliar os resultados obtidos com o presente
estudo, com outros estudos já realizados que abordaram o processo de interação social,
durante a inclusão escolar de crianças e adolescentes com SD.
5 - DISCUSSÃO
______________________________________________________________________________Discussão 67
Segundo Soresi e Nota (2000), muitos estudos têm fundamentado que pessoas com
retardo mental demonstram interações pobres com as outras. Estes mesmos autores, mediante
uma meta-análise de vários estudos realizados, incluindo os seus, afirmam que crianças em
idade escolar com SD e com distúrbios de desenvolvimento (moderado ou severo)
demonstram uma adaptação pobre para as demandas escolares e, geralmente, experimentam
dificuldades, alcançando níveis razoáveis de aprovação escolar. Em particular, elas exibem
dificuldades em duas classes amplas de comportamento que são cruciais para a adaptação
escolar: relações com pares e relações com professores. Esta última diz respeito à habilidade
para responder adequadamente às solicitações dos professores dentro do contexto escolar, e a
anterior, à habilidade para participar da dinâmica do grupo, mediante habilidades de
negociação e iniciar relações positivas com colegas de escola. Estas dificuldades diminuem a
qualidade e quantidade de experiências sociais, resultando potencialmente em sérios efeitos
negativos em suas habilidades para se adaptar à vida adulta e para a sua integração social.
Entende-se que essa deve ser uma habilidade estimulada no ambiente escolar para um amplo
desenvolvimento dos aspectos de vida, tanto das crianças com SD quanto para aquelas com
desenvolvimento típico. Dessa maneira, a inclusão está fundamentada na dimensão humana e
sociocultural, que procura enfatizar formas de interação positivas, possibilidades, apoio às
dificuldades e acolhimento das necessidades, tendo como ponto de partida a escuta dos
alunos, pais e comunidade escolar.
68 Discussão_____________________________________________________________________________
nos próprios alunos. Das estratégias utilizadas, cinco apresentaram maior impacto: facilitação
de interação social; brincadeiras para todas as crianças; construindo grupos em sala de aula;
modelagem da aceitação; e criação de suportes organizacionais com pares tutores. Verificou-
se que houve uma melhora entre as crianças com e sem deficiências, tanto em relação à
colaboração quanto à qualidade de interação. Os autores sugerem que este conjunto de
estratégias deveria ser explorado nos processos de inclusão.
Para Del Prette e Del Prette (2005), a comunicação verbal e não verbal, as quais os
comportamentos 1 e 3 pretendem verificar, são os componentes básicos ao desenvolvimento
social, e a capacidade de utilizá-los de forma coerente e complementar é ingrediente
fundamental para um desempenho socialmente competente. Dessa maneira, observa-se que,
tanto no grupo de estudo quanto no grupo comparado, os comportamentos 1 e 3 foram os que
tiveram maior frequência, tendo, muitas vezes, ocorrido de forma assoviada.
educação. Pois as crianças com qualquer tipo de deficiência, independente de suas condições
físicas, sensoriais, cognitivas ou emocionais, são crianças que têm as mesmas necessidades
básicas de afeto, cuidado e proteção, e os mesmos desejos e sentimentos das outras crianças.
Elas têm a possibilidade de conviver, interagir, trocar, aprender, brincar e serem felizes,
embora, algumas vezes, de forma diferente. Essa forma diferente se ser e de agir é que as
tornam seres únicos e singulares. Elas devem ser olhadas não em seus defeitos, mas como
pessoas com possibilidades diferentes, com algumas dificuldades, que, muitas vezes, tornam-
se desafios com os quais pode aprender e crescer, como pessoas e profissionais que buscam
ajudar o outro. Com a inclusão, é possível fazer com que alunos com necessidades
educacionais especiais sejam expostos a formas positivas de comunicação e interação, de
ajudas e trocas sociais diferenciadas, a situações de aprendizagem desafiadoras, enfim, que
sejam solicitadas a pensar, a resolver problemas, a expressar sentimentos, desejos, a formular
e tomar iniciativas.
Segundo Vieira e Denari (2005), para se efetivar uma real inclusão escolar, além
das transformações escolares, estruturais, ideológicas e de capacitação profissional, é
essencial que se considerem os aspectos sociais e objetivos envolvidos no processo. A
desinformação e a falta de contato cotidiano entre pessoas com o desenvolvimento típico e
pessoas com necessidades educacionais especiais, podem contribuir para a construção de
preconceitos e dificuldades nas interações sociais entre elas. Por isso, é necessário que sejam
ampliadas as oportunidades de contato direto e de acesso a informações e reflexões acerca da
diversidade, desde a primeira infância.
6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
____________________________________________________________________Considerações Finais 75
Uma vez realizada a análise dos resultados, é possível considerar que o estudo
atingiu o objetivo proposto ao conseguir descrever o processo de interação social de crianças
com SD quando inseridas em ambiente de educação infantil inclusivos.
Demonstrou-se assim, entre outros aspectos, que as crianças com SD revelam sim,
um déficit nas habilidades sociais assertivas, ou seja, aquelas que dependem de uma maior
iniciativa, mas também desenvolvem melhor as habilidades sociais passivas, ou seja, aquelas
em que a atuação do meio é determinante.
Vale lembrar, ainda, que a observação seguiu os critérios propostos pela autora e
os comportamentos contabilizados não encerram as possibilidades de observação sobre novos
comportamentos que venham também representar os aspectos da interação social e suas
habilidades sociais envolvidas.
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APÊNDICE A –
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
________________________________________________
Assinatura
____________________________________________________________________________ Anexos
APÊNDICE B –
85
86 Anexos_______________________________________________________________________________