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Revista Eclesidstica Brasileira, vol. 38, fasc. 149, Marco de 1978 73 O Sentido do Pobre na Espiritualidade e na Pastoral Pelo Pe. Prof. Segundo Galilea, Santiago - Chile O especifico do sentido do pobre, no cristianismo, nao reside no fato desta realidade suscitar sentimentos de compaixdo, de solidariedade e de justica. Estes sentimentos os encontramos tam- bém em qualquer humanismo ou ideologia sécio-politica. Neste Particular, o cristianismo é revolucionario, quando, ao estabelecer a relagdo entre Deus e o pobre, atribui-lhe uma dimensao «religiosa». Os antecedentes desta visdo evangélica tém sua raiz nos antigos profetas, particularmente nos profetas do Exilio. Sabe- mos que a religiao dos judeus, naquela época, estava muito cen- trada no culto a Deus e nas prescrigdes legais e rituais. Durante o Exilio, esta mentalidade religiosa entrou em crise, pois 0 povo se encontrava sem possibilidades de realizar seu culto tradicional: «Nao temos nem mesmo um lugar para oferecer-Vos nossas primicias...» (Dn 3,38). Os profetas aproveitavam tais situagdes para educar 0 povo em outras dimensGes essenciais da religido (cf. Is 1,10-17; 58,6ss; etc.). Sua mensagem é mais ou menos a seguinte: «O que im- porta nZo € ter sacrificios a oferecer, porque a religido que Deus ama & a converséo do coracdo. Antes de tudo, quer que se faga misericérdia e justica ao oprimido, ao érfao e a vitiva. O sacrificio que agrada a Deus é este: romper as cadeias injustas, desatar os jugos, libertar os oprimidos, partilhar 0 pao com o faminto, abrigar os pobres e vestir os nus». Isto significa que a caridade para com o irmdo necessitado, 0 pobre, tem diante de Deus um valor religioso e equivale a prestar-Ihe culto; equivale a converter-se para Deus. Assim, emerge na Biblia a dimensdo teligiosa do pobre. O sentido de Deus vai, assim, sendo com- preendido cada vez mais ligado ao sentido do pobre. Tal concepgdo serd consagrada e aprofundada no Novo Tes- tamento. Quando Maria, na espera de Jesus, proclama, em scu canto do Magnificat, que a salvagéo de Deus tem a ver com a justica feita aos pobres (Le 1,52ss) situa-se na mais auténtica tradigao dos profetas, na linha dos «Pobres de Javé»: esse pe- queno resto que havia compreendido e conservado sua fé no auténtico messianismo e na auténtica religido, ensinada pelos profetas. wee Galilea, O Pobre na Espiritualidade e na Pastoral Parece desnecessdrio trazer A consideracdo o ensinamento dos apéstolos a este respeito e como eles fizeram da religiao crista a religidéo do amor: amor a Deus e ao irmio e, sobretudo, a0 necessitado (cf. Jo 3,16ss; Tg 2,14ss; 5,1ss, etc.). Esta dimensdo religiosa do pobre permanece intata na Igreja € por ela sempre foi ensinada. Este é 0 ensinamento dos padres da Igreja, dos papas e de seu Magistério mais autorizado. Todo © cristéo sabe que nado se pode agradar a Deus sem, de alguma maneira, possuir 0 que chamamos

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