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“Dê conteúdo de Amor à


sua vida”

Foto: Pixabay

29 Outubro 2021

A reflexão bíblica é elaborada por Adroaldo


Palaoro, padre jesuíta, comentando o
evangelho do 31º Domingo do Tempo
Comum, ciclo B do Ano Litúrgico, que
corresponde ao texto de Marcos 12,28-34.

Eis o texto.

“Amarás o Senhor teu Deus... amaras o


teu próximo como a ti mesmo” (Mc
12,30-31).

Este é o contexto do Evangelho deste


domingo: Jesus já está em Jerusalém há
alguns dias; realizou a purificação do tempo,
discutiu com os chefes dos sacerdotes, mestres
da lei e anciãos sobre sua autoridade para fazer
tais coisas; com os fariseus e herodianos
discutiu sobre o pagamento do tributo a César;
com os saduceus discutiu sobre a
ressurreição...

Nesse ambiente marcado por tantos conflitos,


um “mestre da lei” se aproxima de Jesus; não
demonstra nenhuma agressividade e nem lhe
estende uma armadilha, mas vive uma
angústia existencial, marcada por um forte
legalismo. Sua vida está fundamentada num
emaranhado de leis e normas que lhe
determinam como comportar-se em cada
circunstância, sem dar margem à criatividade e
ao desejo de abrir-se ao novo. Do seu coração
brota uma pergunta decisiva: “Qual é o
primeiro de todos os mandamentos?” Qual é
o mais importante para acertar na vida?
Onde centrar a vida para livrar-se do peso das
exigências da lei?

A pergunta do mestre da lei tem sentido


porque na Torá encontravam-se 613 preceitos.
Para muitos rabinos todos os mandamentos
tinham a mesma importância, porque
procediam de Deus. Para alguns, o
mandamento mais importante era o
cumprimento do sábado. Para outros, o amor a
Deus era o primeiro.

Jesus entende muito bem o que sente aquele


homem que dele se aproxima. Quando na
religião vão se acumulando normas e preceitos,
costumes e ritos, doutrinas e dogmas, é fácil
viver dispersos, sem saber exatamente que é o
fundamental para orientar a vida de maneira
sadia.

Tanto naquele tempo como hoje somos


sufocados por uma abundância de leis, tanto
religiosas como civis. No fundo, estão
sobrando leis, mas está faltando o amor. O
amor não cabe nas leis, só cabe no coração.
Quem ama não precisa de leis.

Papa Francisco: O amor é inc…

A novidade da resposta de Jesus está no fato


de que o mestre da lei lhe perguntou pelo
mandamento principal (“amarás o Senhor teu
Deus...”), mas Ele acrescenta um segundo, tão
importante como o primeiro: “Amarás o teu
próximo como a ti mesmo”. Ambos
mandamentos estão no mesmo nível,
devem ir sempre unidos; Jesus faz dos dois
mandamentos um só. Ele não aceita que se
possa chegar a Deus por um caminho
individual e intimista, esquecendo o próximo.
Deus e o próximo não são magnitudes
separáveis. Por isso, tampouco se pode dizer
que o amor a Deus é mais importante que o
amor ao próximo.

Diante da pergunta do mestre da lei pelo


mandamento mais importante (no singular),
Jesus responde dizendo que são dois (no
plural). E não há mandamento maior que eles.

A resposta de Jesus aponta para os dois eixos


centrais na vida dos seus seguidores: Deus e o
próximo; ambos eixos se exigem
mutuamente, a ponto de um levar ao outro, e a
ausência de um provoca a ausência do outro.
Quem está sintonizado em Deus, está
necessariamente aberto ao amor e à
solidariedade; e quem está centrado no amor
ao próximo está aberto à iniciativa e graça de
Deus.

O(a) seguidor de Jesus não se caracteriza por


pertencer a uma determinada religião, nem
por doutrinas, nem ritos, nem normas
morais... mas por viver no “fluxo do amor”
que tem sua fonte no coração do Pai.

O mandamento do amor não é apresentado


como uma lei que torna nossa vida dura e
pesada, mas uma resposta ao que Deus é em
cada um de nós, e que em Jesus se manifestou
de maneira contundente. Nosso amor será “um
amor que responde a seu Amor”.

O Amor que é Deus, temos de descobri-


lo dentro de nós, como uma realidade que
está unida intimamente ao nosso ser. Por isso,
só há um mandamento: manifestar esse amor
que é Deus, em nossas relações com os outros;
o amor é o divino germinando nos meandros
do humano. O amor é a realidade que nos faz
mais humanos.

Linda musica de amor ao pró…

Ser seguidor(a) de Jesus, portanto, é uma


questão de amor. Amar como Ele é
transformar-se n’Ele.

O seguimento de Jesus nos convida a esta


liberdade que se encontra na palavra “Ágape”,
o amor da superabundância, o amor de
gratuidade, o amor que transborda, que nada
pede em troca. Amar sem ter nada de
particular para amar. Amar não a partir de
nossa carência, mas amar a partir de nossa
plenitude. Amar não somente a partir de nossa
sede, mas amar a partir de nossa fonte que
corre.

Só o “ágape” expressa o amor sem mistura


de interesse pessoal. Seria um puro dom de
si mesmo, só possível em Deus. Deus não é
um Ser que ama, é o Amor. N’Ele, o Amor é
sua essência; se Deus deixasse de amar um só
instante, deixaria de existir. Não podemos
esperar de Deus “amostras pontuais de amor”,
porque não pode deixar de demonstrar o amor
um só instante.

Ágape é o amor divino. Esse amor é o mais


raro, o mais precioso, o grau mais elevado do
dom de si mesmo. Estas são algumas
características do ágape cristão: é um amor
espontâneo e gratuito, sem motivo, sem
interesse, até mesmo sem justificação,
oblativo, expansivo... o puro amor.

O amor (ágape) impregna o ser humano.


“Afeta a totalidade humana; roça a
sensibilidade, aloja-se na medula dos ossos,
pulsa nos batimentos cardíacos, arfa na
respiração, circula pelo sangue, aquele o
pensamento, rola pelos braços, agita as mãos,
baila na consciência, escorre no olhar,
sonoriza-se na palavra, recolhe-se no silêncio,
peregrina nos passos, oculta-se no
inconsciente, murmura na oração...”
(Juvenal Arduini). O Amor é onipresença.
“É um estado de ser” (Rollo May). O amor é a
habitação do ser humano. “O amor jamais
acabará” (São Paulo).

O amor é esvaziar-se do “ego” dentro de si


mesmo, para que haja lugar para o outro. O
amor tem um rosto. Assim como Deus, que se
“esvaziou de sua divindade”, o ágape se
esvazia de si mesmo para dar mais lugar, para
não invadir, para deixar ao outro um pouco
mais de espaço, de liberdade... “Amar é
encontrar sua riqueza fora de si” (Alain).

Para o poeta Rilke, o amor é constituído por


“duas humanidades que se inclinam uma
diante da outra”.

Amor como dom gratuito de si mesmo. Não é


motivado pelo valor do outro, isto é, pela
recompensa que os gestos de amizade podem
trazer. Com efeito, neste caso, não se ama o
outro porque ele é bom (como na amizade
verdadeira), mas para que seja bom, já que
o amor quer o bem do amado.

Tal como a água de um rio escavando seu leito


profundo, o amor é a força que nos escava, que
alarga e aumenta nossa capacidade de irmos
para além de nós mesmos. Uma das maiores
razões para o amor ser uma experiência de
expansão se deve à sensação de imortalidade e
eternidade que nos proporciona.

O amor carrega em si a marca da eternidade.


Quem ama vê o tempo se ampliar e a vida
ganhar mais sentido. Alguns dizem que há
lugares de nós mesmos que só passam a existir
após o sofrimento ter penetrado ali. Há lugares
em nosso interior que não existem enquanto o
amor não tiver penetrado.

Para meditar na oração:

- Entoar um hino de louvor e gratidão a Deus


pelo Seu “amor em excesso” que se revela no
cotidiano da vida;

- Ter sempre presente na memória que fomos


criados para viver em relação de amor e
solidariedade com todos;

- Considere que toda a Criação saiu das mãos


do Criador como presente especial e gratuito,
como uma mensagem de Amor a cada um de
nós.

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