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Do autor best-seller da Amazon

Jhonatas Nilson
Copyright © 2022 Jhonatas Nilson
Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a transmissão total
ou parcial, sob qualquer forma. Todos os personagens desta obra são fictícios. Qualquer semelhança
com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência.
Histórias curtas, clichês e muito românticas!

Livro 1: Como encontrar um namorado em 10 dias


Livro 2: Como sair do armário em 5 minutos
Sumário
Querido leitor,
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Epílogo
Querido leitor,
Foi muito divertido criar as histórias dos irmãos Lee. Enquanto
Stephanie tem uma personalidade aventureira e corajosa, Josh é muito
tímido e por vezes inseguro. Juntos, possuem uma conexão única!
Em “Como encontrar um namorado em 10 dias”, você terá a
oportunidade de acompanhar a jornada de Stephanie nesse processo de
descoberta do primeiro amor e seus sonhos.
Luke Barber, o garoto pelo qual ela está interessada, aparenta ser
descolado e misterioso, mas certamente possuí muitas inseguranças para
resolver consigo mesmo.
Espero que você goste da leitura tanto quanto eu amei escrevê-la.
Trata-se de uma história leve e fofa, sem dramas pesados. Perfeita para
deixar o coração quentinho!
Não deixe de conferir também “Como sair do armário em 5
minutos”, o livro que narra as aventuras de Josh Lee!
Com carinho
Jhonatas Nilson
(Autor)
Para acompanhar as aventuras do autor
Jhonatas Nilson ao redor do mundo, não
deixe de segui-lo no Instagram:
@Jhonatas1025
Prólogo

— Vocês dois irão ficar responsáveis pelo restaurante por dez dias.
— A minha mãe apontou para mim e em seguida para o meu irmão mais
novo enquanto falava sem preâmbulos, como se essa fosse a notícia mais
típica do mundo. — Conversei com o seu pai e nós dois decidimos que está
na hora de visitar a Coreia do Sul depois de tanto tempo.
Os meus pais nasceram na Coreia do Sul, mas decidiram tentar a
vida em Londres muitos anos atrás. Isso faz tanto tempo que eu arriscaria
dizer que foi na época dos dinossauros.
Acho que eles são felizes aqui, quero dizer, eles abriram um
restaurante de comida típica coreana que faz bastante sucesso entre os
turistas e também conseguiram comprar uma casa boa o suficiente
localizada no andar de cima do nosso negócio. Para além de tudo,
conseguem pagar as contas sem ter muitas dificuldades.
Temos uma vida boa, sem grandes reviravoltas. Somos pessoas
normais vivendo vidas normais.
Imagino que, obviamente, eles devem sentir saudades de Seoul e
talvez por isso tenham decidido que chegou a hora de visitar a Ásia
novamente. Eu adoraria visitar também. Na verdade, eu nunca sequer saí do
Reino Unido. E para ser muito sincera, não acho que eu vá poder visitar
qualquer país sozinha em um futuro próximo.
Apesar de tentarem parecer muito descolados e super bem-
humorados, os meus pais ainda são bastante conservadores e guardam
muito da cultura coreana dentro de si. Consequentemente, pensar na
possibilidade de permitir que a filha deles, com apenas dezenove anos,
pegue uma mochila e comece a viajar sozinha pelo mundo seria
simplesmente absurdo demais.
Eu consigo entendê-los. O mundo é grande, é perigoso e apresenta
pessoas com personalidades bastante questionáveis. Trabalhando no
restaurante da nossa família, pude perceber as diferenças e observar turistas
do mundo inteiro. Alguns são simpáticos, outros nem tanto. Então não acho
que eu esteja preparada para viver aventuras ao redor do mundo.
Talvez eu precise apenas começar a viver aventuras aqui em
Londres, afinal, pelo amor de Deus, eu nunca sequer tive a oportunidade de
visitar os museus daqui. E devo dizer que a maioria dos museus de Londres
são gratuitos, então se eu não os visitei é porque sou preguiçosa.
Bem, eu também trabalho muito no restaurante. Com isso, acho que
eu poderia dizer que não tenho tanto tempo, muito menos interesse. Sou
uma péssima aventureira.
Não sei em que momento eu comecei a divagar acerca das
probabilidades de visitar o mundo. E eu, na verdade, até me perdi no que a
minha mãe estava falando. Só sei que agora o meu irmão mais novo está
com os olhos arregalados, tentando descobrir como nós dois, sozinhos,
vamos controlar um restaurante cheio de turistas todos os dias. Meu Deus,
será um inferno.
— Eu acho que vocês deveriam nos levar. Nós nunca visitamos o
vovô e a vovó. — Enquanto fala, percebo que às vezes Josh ainda soa como
um bebê, como o irmãozinho fofo e adorável que ele foi um dia. Não que
ele já não seja adorável hoje em dia, pois ele é.
Nós nos damos muito bem. Eu diria até que ele é o meu melhor
amigo. Nós conversamos o tempo inteiro e vamos ao cinema sempre que
possível. É engraçado. Há algo de muito especial e mágico e fantástico na
possibilidade de sair com o meu irmão mais novo, na possibilidade de
escrever algum tipo de história bonita ao lado dele. Juntos, passamos horas
descobrindo livros e séries, tomamos sorvete e comemos hambúrgueres ou,
quando não temos tanto dinheiro, optamos por ficar em casa e
simplesmente dar risada sobre qualquer coisa.
Muitas pessoas não se relacionam muito bem com os irmãos. Mas
eu sou sortuda em relação a isso. Na verdade, eu sou sortuda em relação a
toda a minha família, pois temos um vínculo extremamente poderoso.
Somos incríveis. Talvez tal conexão esteja relacionada ao fato de que os
meus pais vieram da Coreia do Sul muito novos. Isso os obrigou a
permanecer juntos, a criar raízes, a confiar no poder do amor que há entre
eles. E provavelmente tudo foi passado de maneira bastante silenciosa para
Josh e eu quando nascemos.
Não é fácil sair de um país e passar a morar em outro. As culturas
são muito diferentes. Londres, por ser uma cidade tão grande, cheia e
diversa, às vezes pode ser vista como igualmente solitária.
As pessoas aqui são frias, eu diria. Inclusive, tenho medo de parecer
tão fria quanto a maioria. Porque gosto de ser simpática, gosto de sorrir.
Gosto de fazer com que as pessoas se sintam especiais. E isso também foi
mais uma coisa que a minha mãe tratou de me ensinar.
Quando as pessoas se sentem especiais, elas sempre voltam, filha...
— Um dia vocês dois poderão visitar o vovô e a vovó, mas agora
não. Alguém da família precisa ficar aqui e cuidar do restaurante. Levar
apenas um de vocês seria injusto. — O meu pai dá de ombros. — Além
disso, os outros funcionários ajudarão com tudo.
— Stephanie e eu iremos roubar todo o dinheiro do caixa. — Josh
fala com um sorrisinho ousado e irônico. — Vamos roubar o dinheiro e
comprar drogas.
Eu sinto que Josh é simplesmente uma das pessoas mais incríveis da
minha vida. Ele tem dezoito anos, ou seja, é um ano mais novo do que eu. E
apesar disso, tenho a impressão de que sou muito mais velha do que ele,
como se eu tivesse a obrigação de cuidar dele. Para mim, ele ainda é um
bebê.
Talvez os meus pensamentos não façam tanto sentido, mas tenho a
total certeza de que Josh desperta o que há de mais protetor em mim.
— Vocês dois são certinhos demais para tentarem algo assim. Nós
confiamos em vocês. — A minha mãe sorri e se levanta da mesa. A reunião
familiar repentina aparentemente terminou. — São apenas dez dias. O que
poderia acontecer de tão importante em tão pouco tempo?
Bem, acho que muita coisa pode acontecer em tão pouco tempo.
Muita coisa mesmo.
Capítulo 1

Os meus pais viajaram há quatro dias e eu não estou acostumada ao


silêncio ensurdecedor da nossa casa. É estranho não ter a minha mãe
gritando o tempo inteiro dizendo que o jantar já está pronto e que eu preciso
descer rápido para continuar atendendo os clientes no restaurante. E é
estranho não ter o meu pai ouvindo rádio alto demais, fazendo com que
músicas coreanas antigas ecoem por todos os cômodos.
Mas confesso que ao mesmo tempo sinto que estou começando a me
adaptar. Não estou me adaptando à ausência deles, claro, até porque
acredito que eu nunca me adaptaria a algo assim. Porém as coisas não estão
sendo tão trágicas quanto imaginei.
Josh ainda não apareceu com nenhum tipo de droga e acho que não
vai aparecer. Esse é um bom sinal. Além disso, o restaurante está indo bem,
conseguimos atender todos os clientes de maneira bastante eficaz e o
estoque de ingredientes está razoavelmente reposto. Óbvio que em breve
nós precisaremos fazer mais compras para reabastecer tudo, mas não estou
nervosa. Já fiz tudo isso um bilhão de vezes.
Eu, como uma boa filha mais velha que sou, estou conseguindo
controlar tudo.
— Stephanie, será que você poderia me ajudar aqui? — Lukas me
chama no outro lado do restaurante.
Lukas Barber começou a trabalhar aqui cerca de seis meses atrás.
Pelo que os meus pais me disseram, ele nasceu na Alemanha, não sei
exatamente em qual cidade, e decidiu passar a viver em Londres porque
estava cansado de morar no mesmo lugar.
Ou seja, suponho que certo dia ele acordou, pegou uma mochila e
simplesmente saiu viajando por toda a Europa. Assim, sem mais nem
menos.
Eu até consigo compreendê-lo, mas não seria capaz de fazer o
mesmo.
Nem todo mundo tem uma família barulhenta, unida e repleta de
comidas e pratos deliciosos. Algumas têm a péssima sorte de nascer em
famílias frias, desapegadas, sem grandes conexões. Por isso, sinceramente,
eu consigo compreendê-lo.
Olho na direção dele. Lukas sempre foi um mistério para mim,
desde o primeiro dia. Devo confessar que nunca tivemos a oportunidade de
conversar profundamente. Então eu não posso afirmar com certeza que ele
tem uma família fria e chata. Posso apenas presumir, afinal ninguém que
tem uma família incrível vai querer abandonar tudo para viver em Londres.
Ou será que os meus pensamentos estão indo longe demais? Sinto que em
alguns momentos enxergo a vida através da ótica de uma pessoa que sempre
teve raízes muito profundas em casa. E isso pode ser considerado até
mesmo um pouco egoísta. Por isso, é difícil conseguir entender as pessoas
que simplesmente viajam o mundo, que abandonam tudo sem pensar duas
vezes sem olhar para trás.
Lukas e eu somos bem distantes um do outro, mas confesso que
tenho curiosidade em conhecê-lo melhor. Nós nos falamos apenas durante
os expedientes do restaurante, nada mais. É que, na verdade, eu me sinto
um pouco nervosa quando estou diante dele.
Ele é simplesmente muito bonito, talvez o homem mais bonito que
eu já vi na minha vida. Eu arriscaria dizer que ele tem cerca de vinte e dois
ou vinte e três anos, ou talvez um pouco menos. Talvez tenha, sei lá, vinte
anos. Mas, definitivamente, Lukas é mais velho do que eu e tem mais
experiência também.
Algo em seu olhar de tons verde e em sua expressão estranhamente
desconfiada faz com que o meu coração se acelere um pouco. Porém eu
tento ignorar tudo isso. Ele é um funcionário do restaurante. E eu não
combinaria com seu jeito desprendido.
Sua personalidade aparenta ser muito descolada e ao mesmo tempo
muito sombria. Lukas quase nunca ri, ao contrário de mim, que estou rindo
o tempo inteiro.
Tentando colocar todos os meus pensamentos acerca da beleza de
Lukas em algum ponto muito secreto da minha mente, trato de caminhar na
direção dele. Mas ele não me vê e acaba tropeçando em mim, derrubando os
pratos de comida no meu cabelo.
— Você está cego? — sem pensar, o empurro com as duas mãos,
fazendo-o escorregar no molho que começou a escorrer no chão.
Solto um gemido que se torna uma mistura de surpresa e raiva.
Droga, eu tinha lavado os meus cabelos hoje e os fios estavam sedosos,
muito cheirosos. Estavam. Isso mesmo, no passado. Porque agora
certamente estão com cheiro de molho apimentando e algas.
— Eu te chamei e você demorou demais para vir. Estou carregando
uns dez pratos de uma vez, então é claro que algo assim iria acontecer em
algum momento! — enquanto fala, o tom de voz dele soa alto com seu
sotaque que mistura inglês e alemão. E estranhamente, tudo isso me parece
extremamente sexy.
— Eu estava ocupada lá dentro. Eu estava... — Bem, na verdade eu
não estava tão ocupada assim. Passei os últimos cinco minutos pensando
sobre a beleza arrebatadora de Lukas, nada mais. — Você derrubou molho
no meu cabelo. Acho que não sou eu quem precisa pedir desculpas.
— Você não vai me ajudar a levantar? — Lukas ainda está caído no
chão. Ao olhar fixamente na direção dele pela primeira vez, percebo que
suas roupas também estão muito sujas. Enquanto isso, uma das clientes está
sentada, em silêncio, apenas observando toda a nossa cena ridícula.
— Sim, é claro. Não sou tão grosseira quanto você. — Me
inclinando, trato de puxá-lo, ajudando-o.
— Me desculpe, ok? Estou dando o meu máximo aqui. — Ao
terminar de falar, Lukas me dá as costas e caminha com passadas rápidas na
direção do banheiro.
Eu não sei exatamente por que que ele está tão bravo comigo sendo
que foi ele quem derrubou o molho apimentado no meu cabelo.
Ele atuou quase como se eu o tivesse ofendido, quase como se eu
tivesse feito algo muito errado. Isso me deixa um pouco tonta, perdida.
Afinal, não sei o que foi que eu fiz.
Talvez ele esteja tendo um péssimo dia e eu apenas aflorei tudo. Por
outro lado, a verdade é que as pessoas não deveriam descontar o mau
humor uma nas outras nas outras, isso é ridículo.
Acho que Lukas me odeia. E eu odeio saber que ele me odeia.
Capítulo 2

Eu gosto dela. Talvez, se eu não fosse tão cínico, eu até me


permitiria admitir a mim mesmo que estou apaixonado por ela. Por
Stephanie Lee. Mas algumas coisas não fazem sentido. E me apaixonar pela
filha do meu chefe conservador é, sem dúvidas, uma dessas coisas.
O problema é que Stephanie é encantadora. Consegue ser tudo o que
eu não consigo. Ela tem um sorriso imenso e brilha, simplesmente brilha. E
sinceramente eu nunca tinha visto alguém brilhar com tamanha facilidade.
Para piorar a minha perdição, ela tem cabelos negros que são longos
e sedosos. E uma mecha rosa. Eu poderia compará-la a algum tipo de
pintura contemporânea, mas isso seria extremamente brega.
O fato é que desejo tocá-la, senti-la. É estranho, pois desde o
primeiro momento em que a vi seis meses atrás, percebi que o meu corpo
reagia à presença dela. Acho que eu não deveria sentir esse tipo de coisa.
Na verdade, quando deixei a minha casa na Alemanha e parti para tentar
recomeçar a vida em Londres, eu não planejava sequer me apegar a outras
pessoas. Porque apego pode ser doloroso de vez em quando. Ou quase
sempre.
Irritado com os meus próprios pensamentos e com o fato de que as
minhas roupas estão totalmente sujas, me tranco dentro do banheiro e me
sento em cima da privada. Acho que estou agindo como um adolescente
inseguro, algo que não combina com a minha personalidade em geral.
Tenho vinte anos e basicamente já não me enxergo na idade para
ficar agindo de maneira tão infantil, mas é que às vezes eu me sinto assim...
Simplesmente infantil por não conseguir lidar muito bem com os
sentimentos que pulsam dentro de mim cada vez que tenho que lidar com
Stephanie.
É muito difícil fingir que não estou sentindo nada, fingir que não me
importo. É muito difícil ser obrigado a vê-la todos os dias por horas e horas
e simplesmente fingir que sou durão.
— Lukas, você está aí? — a voz feminina e muito familiar ecoa por
todo o banheiro do restaurante. Sinto o meu corpo se retrair em reação
instantânea. — Eu gostaria de falar com você.
Ela dá duas batidinhas na porta.
Desde que o casal Lee decidiu viajar para a Coreia do Sul, sinto que
as coisas pioraram um pouco. Porque agora Stephanie está trabalhando
muito mais. E sempre que eu preciso realizar alguma tarefa específica
demais, sou obrigado a conversar com ela, a ter que lidar com ela, a ter que
observá-la fazer as coisas. Isso está me enlouquecendo. Pelo que eu soube,
o casal Lee vai ficar longe por dez dias. Quatro já se passaram e é como se
um verdadeiro inferno estivesse acontecendo na minha vida.
Tudo bem, acho que estou sendo um pouco dramático, talvez
exageradamente dramático, mas esse é verdade: Ter que lidar com
Stephanie e fingir que os meus sentimentos não existem ao mesmo tempo
está tornando a minha vida um verdadeiro inferno.
— Lukas não pode responder. Ele morreu afogado em molho
apimentado. — Falo ainda com a porta fechada. — Vá embora.
— Se você sair, te pago um tteokbokki. — Ela fala e volta a dar
duas batidinhas na porta.
— Levando em consideração o pequeno detalhe de que você é
literalmente a dona de um restaurante de comida coreana e também sem nos
esquecermos do fato de que eu trabalho aqui tendo que servir tteokbokki
todos os dias, eu não diria que essa é uma oferta lá muito tentadora. — Ao
terminar de falar, solto um longo suspiro ainda mais dramático.
— Não sou literalmente a dona daqui. Talvez eu seja um dia, mas
não sou agora. Sou tão funcionária quanto você. Se eu fizer merda, os meus
pais não vão em hesitar em me demitir. — Ela fala rapidamente e eu quase
sou capaz de acreditar que algo assim poderia acontecer.
Mas é claro que o casal Lee nunca demitiria um dos filhos. Primeiro
que tanto Stephanie quanto Josh são extremamente certinhos e nunca fazem
nada de errado. Segundo que a família inteira tem uma conexão invejável.
Inseparável. Então é óbvio que eles nunca, nem em um milhão de anos,
teriam a ousadia de demitir os próprios filhos. Isso é impensável, absurdo.
Me arrancando dos meus próprios pensamentos, Stephanie abre a
porta do banheiro.
E eu estou sentado na privada, exatamente como um perdedor faria.
— Eu poderia estar pelado, sabe? Eu poderia estar cagando. Eu
poderia estar pelado. Sem roupas. — Me levanto da privada e saio do
banheiro, caminhando na direção da pia para lavar as mãos. — Você
planejava me ver pelado? Pois saiba que fracassou.
— Eu não planejava ver você pelado! — Stephanie caminha
firmemente e para ao meu lado. — Eu só vim pedir desculpas.
— Espere... — Paro de esfregar as mãos por alguns instantes e olho
na direção dela. — Você veio me pedir desculpas?
— Mas já me arrependi, você é insuportável.
— Eu podia te pagar um sorvete, mas sou insuportável, então saia
da minha frente. Preciso voltar ao trabalho. — Termino de lavar as mãos e
me seco. Em seguida, empurro Stephanie para o lado. — Ao contrário de
você, tenho certeza de que o casal Lee me demitiria sem pensar duas vezes.
Eu juro que no geral não sou tão dramático quanto estou
aparentando ser nesse momento. Juro que sou mais maduro também.
Maduro para caramba. É que na verdade, acho que estou me aproveitando
um pouco do fato de que Stephanie veio me pedir desculpas. Até porque, se
formos sinceros em relação a toda essa situação, ela nem deveria se
desculpar. Eu que estou devendo mais desculpas para ela, afinal esbarrei
nela e derramei comida em suas roupas estilosas.
Meu Deus, sou ridículo.
Como é possível que eu esteja apaixona... bem... como é possível
que eu tenha derramado comida na roupa e nos cabelos da filha do meu
chefe?
— Aceita as minhas desculpas ou não? — ela já está começando a
perder a paciência.
— Aceita sair para tomar sorvete comigo mais tarde ou não? —
lanço a pergunta de maneira bastante direta.
— Aceito, mas só se o sorvete for de morango.
— Fechado. — Lanço uma piscadela na direção dela e em seguida
volto a trabalhar no restaurante.
Bingo, é assim que se faz uma saída triunfal.
Capítulo 3

Começo a pensar que provavelmente o universo está um pouco


desalinhado ultimamente. Talvez muito desalinhado. Primeiro, os meus pais
decidem visitar a Coreia do Sul pela primeira vez em trinta mil anos.
Depois, de repente, Lukas decide me chamar para tomar sorvete após o
expediente do restaurante. Qual a probabilidade de algo assim acontecer?
Nos seis meses desde que ele começou a trabalhar aqui, acho que sequer
tivemos uma conversa profunda.
Eu não deveria estar dando muita atenção para tudo isso, afinal é
apenas um sorvete. Ou, pensando bem, confesso que um sorvete de
morango nunca é apenas um sorvete, mas nessa situação... é apenas um
sorvete.
Mesmo assim, quando o expediente termina e por fim posso ser
livre outra vez, não consigo deixar de parar em frente ao espelho do
banheiro feminino por alguns minutos para tentar arrumar os meus cabelos
antes de irmos tomar o tal sorvete.
Sou terrível. É simplesmente ridículo pensar que estou me
arrumando toda para sair com o Lukas, um cara totalmente descolado, que
nunca sequer olhou duas vezes na minha direção. E nas vezes em que
olhou, parecia estar vendo algum tipo de ser irritante. Ou talvez tudo isso
seja apenas uma criação minha resultante da minha insegurança — e
também da minha falta de terapia.
— Não roube dinheiro do caixa e não compre drogas. — Digo ao
colocar o meu avental nas mãos de Josh. Tenho repetido isso todos os dias
desde que os meus pais viajaram, quase como algum tipo de nova piada
interna. — O seu expediente começa em oito minutos, então foque no
trabalho.
— Você é uma chata. Chata. — Josh revira os olhos. — Deixe de ser
chata, menina.
— Até mais tarde, Josh. — Saio sem olhar para trás.
Geralmente, pais coreanos querem, exigem, que os filhos façam
faculdade e estudem muito. Alguns muitos pais coreanos, inclusive, chegam
a ser muito tóxicos quando o assunto é estudo, futuro e dinheiro.
Essa cobrança faz parte de uma cultura que já está enraizada demais
para simplesmente desaparecer de uma hora para outra. Mas no meu caso é
um pouco diferente, pois eu ainda não comecei a ir à faculdade.
Quando terminei o ensino médio e pedi aos meus pais que me
deixassem trabalhar no restaurante até que eu me sentisse um pouco mais
segura para começar a fazer faculdade, eles simplesmente deixaram e
falaram que queriam que eu tivesse a liberdade de escrever o meu futuro de
uma maneira mais calma, sem que a pressão de tomar decisões cedo demais
pesasse arduamente em meus ombros. E sou grata por isso. Nem todo
mundo tem essa sorte.
Para ser sincera, apesar de ser muito cansativo ter que trabalhar por
horas e horas no restaurante atendendo clientes muitas vezes extremamente
grosseiros, gosto do que faço. Gosto de perceber que o negócio da família
está crescendo. E fico feliz em perceber que as coisas estão dando certo, em
poder observar que em breve os meus pais planejam aumentar o espaço do
salão de refeições, multiplicando as mesas e, consequentemente, recebendo
mais clientes.
Quanto mais trabalho no restaurante, mais percebo que quero estar
aqui. Que quero que o meu futuro esteja intimamente ligado a esse lugar.
Porque de alguma forma, tenho a impressão de que as minhas raízes estão
aqui. Foram fixadas aqui. Porque os meus pais construíram tudo isso com
sangue e suor, com esperança e amor. Eu quero continuar o legado, me
orgulho de tudo isso.
Portanto, está em meus planos começar a estudar culinária já no
próximo ano. Assim, com o passar do tempo, quero me especializar nas
comidas típicas coreanas, servindo cada vez mais qualidade ao cardápio do
nosso negócio e mostrando para os muitos turistas que aparecem
diariamente que o meu país é maravilhoso, que a minha cultura é
maravilhosa.
E me parece muito divertido pensar que acredito em tudo isso
mesmo sem nunca ter visitado a Coreia do Sul antes. Como os meus pais
mesmo disseram, o dia certo irá chegar. Apenas não chegou ainda.
— Vamos? — Lukas aparece de repente ao meu lado e sorri. Seu
sorriso é avassalador. Eu adoraria que ele sorrisse com mais frequência. Ou
provavelmente não, afinal cada vez que ele sorri, tenho a mais plena certeza
de que desaprendo a ter controle das minhas próprias emoções. Então talvez
seja melhor que ele permaneça tão sério e carrancudo quanto tempo foi.
— Vamos. — Respondo e juntos começamos a caminhar
rapidamente pela Picadilly Circus.
Apesar de ter vivido a vida inteira em Londres, admito que ainda
fico maravilhada cada vez que preciso caminhar através da grandiosidade
da cidade. Há uma mixagem de culturas, idiomas e cheiros. Pessoas
olhando enfeitiçadas para tudo ao redor. Encantadas, como se não
acreditassem que Londres realmente existe.
— Percebo que geralmente você fala muito quando está com o seu
irmão ou com os seus pais, mas comigo aparentemente não tem muita coisa
para falar. — Lukas coloca as duas mãos nos bolsos do moletom verde que
está vestindo. — Acho que nunca conversamos, não é?
— Confesso que não estou muito acostumada a fazer novas
amizades no geral. Mantenho apenas as amizades que já conheço há muito
tempo. — Faço uma pequena pausa antes de continuar falando. — Admito
que na verdade o meu melhor amigo é Josh. Não há ninguém melhor do que
ele no mundo.
— Há espaço para mais um amigo no seu seleto grupo de amizades
especiais? — Lukas levanta uma das sobrancelhas ao perguntar.
— Você está interessado?
— Talvez. — Ele dá de ombros e desvia o olhar, focando nas lojas
ao redor.
E conforme conversamos, percebo que Lukas não é tão mal-
humorado quanto pensei que fosse. Acho que eu só não tinha lhe dado a
chance para que demonstrasse quem realmente é. E admito que quanto mais
o ouço falar, mais tenho vontade de ouvi-lo. É estranho, mas bom ao
mesmo tempo.
— Sim, Lukas. Com certeza há espaço no meu grupo de amizades,
principalmente se o interessado for você.
Ao terminar de falar, fico chocada com a minha própria sinceridade.
Capítulo 4

Acho que eu ainda não mencionei isso, mas nasci na menor cidade
de toda a Alemanha. E não estou exagerando. Acho que a população era de
trezentas pessoas ou algo assim. Literalmente, todo mundo se conhecia e
era impossível passar despercebido.
Todos sabiam da vida de todos. Mas não era tão desagradável assim
viver em uma cidade pequena. Eu meio que sentia que havia certo
pertencimento no fato de que a população inteira do lugar estava conectada
de alguma maneira. Por outro lado, a vida não era o suficiente, ao menos
não parecia o suficiente para mim.
Então talvez você possa imaginar o quão especial é poder estar em
Londres, uma cidade grande, cheia de vida, cheia de cores, cheia de pessoas
diferentes, sons e personalidades. Totalmente diversa. Às vezes, quando eu
estou caminhando pelas ruas bem arborizadas da cidade, ainda sinto como
se estivesse em um filme desses antigos que passam durante a madrugada
em que os protagonistas correm em direção ao metrô segurando um copo de
café na mão. Me sinto assim. Me sinto como se estivesse em um filme
incrível.
Acho que envolve muita coragem deixar uma cidade pequena como
a minha e simplesmente se aventurar em um lugar tão grande quanto
Londres. É quase como se eu saísse de um universo para tentar viver em
outro totalmente diferente. No início foi um pouco difícil, até porque todos
nós sabemos que em cidades grandes as pessoas não são tão simpáticas
assim. Eu me sentia sozinho. Me sentia excluído. Porém os meses se
passaram e estou me adaptando. Estou vivendo.
Nos últimos meses, aluguei o meu próprio apartamento — fato que
não é tão fácil assim, considerando que o aluguel em Londres é caríssimo
— e encontrei um bom emprego.
Apesar do restaurante não pagar tão bem assim, eu diria que pagam
o suficiente para que eu possa viver de maneira adequada. Sem grandes
riquezas, mas também sem passar por complicações financeiras.
O casal Lee é bastante generoso. Sempre me dei muito bem com
eles. Quando eu sinto fome, eles não hesitam em me dar um prato de
comida, não importa se é pela manhã, pela tarde ou à noite. Sempre há
comida, então muitas das vezes não preciso me preocupar em manter a
despensa cheia no meu apartamento.
Às vezes eu só preciso me preocupar em pagar o aluguel em dia e
nada mais. Tudo isso já é uma grande vitória, sem dúvidas.
Confesso que eu dei muita sorte ao encontrá-los. Não é muito
comum conseguir um emprego tão facilmente, ainda mais quando o salário
é bom. Às vezes é praticamente impossível, afinal sou imigrante. Então,
mesmo que eu me sinta parte do grande universo que Londres representa,
eu não nasci aqui. Eu não sou inglês. Nunca serei, sou alemão. Nascido em
uma cidade minúscula chamada Arnis.
De repente, ao olhar para o lado, percebo que Stephanie também
está olhando em minha direção como se tentasse descobrir o que é que está
se passando na minha cabeça.
É engraçado porque passei os últimos minutos analisando a minha
própria vida desde que cheguei em Londres enquanto na verdade eu deveria
estar conversando com ela. Mas é que os pensamentos surgem de vez em
quando, principalmente em momentos como esse, em que tenho a
oportunidade de caminhar pela cidade. E confesso que estou orgulhoso de
mim mesmo, do fato de que eu tive a coragem de simplesmente pegar
minha mochila e partir.
Contudo, não foi apenas sobre coragem, foi sobre necessidade. Eu já
não podia permanecer na minha cidade. Eu já não podia continuar fingindo
que tudo ficaria bem, porque não ficaria. E até hoje, eu admito que não me
sinto tão bem assim. É difícil seguir em frente quando a vida tenta nos
destruir, é simplesmente muito difícil ter forças para acreditar. E por mais
forte que eu tente parecer ser, às vezes me sinto fraco. Muito fraco.
E conforme eu analiso tudo o que estou sentindo por Stephanie, me
sinto mais fraco ainda, porque eu prometi a mim mesmo que não permitiria
mais que as pessoas se aproximassem tanto assim. Mas convenhamos que
ninguém consegue viver sozinho, é impossível. Eu sei que é impossível.
Ainda mais quando se está em uma cidade grande sem família, sem
nenhuma possibilidade de criar laços afetivos.
A família Lee tem laços afetivos. Eles criaram raízes, têm um
negócio juntos e eu os admiro por isso. Gostaria de participar disso. Talvez
por esse motivo que eu esteja tão encantado por Stephanie. Observar o
respeito que ela tem pelos pais e o amor que sente pelo irmão é incrível.
— Eu não tenho amigos aqui. — Digo de repente, quase como se os
pensamentos tivessem escapado sem permissão. E ao falar, coro
violentamente. Eu não tinha vontade de soar como um garoto abandonado
na cidade grande.
— Suponho que não seja assim tão fácil recomeçar a vida em um
lugar diferente, principalmente no seu caso, afinal você passa boa parte do
dia trabalhando. — Ela olha diretamente nos meus olhos e faz uma
expressão repleta de questionamento. — Já saiu com alguma garota desde
que chegou?
— Não. — Respondo rápido demais.
Será que ela não percebe que estou interessado nela?
Será que ela não percebe que eu não desejava estar interessado por
pessoa alguma e tive a má sorte de simplesmente me interessar pelo sorriso
dela?
— Bem, eu sou uma garota. — E, quase como se ouvisse os meus
pensamentos, ela simplesmente ri, fazendo o meu coração saltitar.
— Então você é a primeira garota com quem eu saio.
Nós paramos diante da sorveteria e compramos os nossos sorvetes.
Depois disso, ficamos parados um ao lado do outro, na calçada, enquanto as
centenas de pessoas surgem e desaparecem.
— Talvez eu devesse ir embora. Está ficando tarde. — Ela volta a
sorrir.
— Talvez devêssemos caminhar mais um pouco, nós quase não
conversamos. Posso te levar para casa depois, não se preocupe.
E, sem dizer nada, ela apenas concorda com a cabeça.
Então caminhamos e conversamos. No percurso, eu descobri que a
cor favorita dela é rosa, mas não qualquer tipo de rosa. Há uma cor, um tom
específico que fica entre o rosa choque e o rosa queimado, se é que isso faz
sentido. Porém confesso que essa não é nenhuma surpresa, afinal
basicamente todos os moletons delas são desse tom. Acho fofo. É como se
ela tivesse criado algum tipo de branding pessoal, ou algo assim.
Também descobri que adora filmes de comédia e não gosta muito de
assistir a filmes de horror extremo. Ela lê vários livros por semana e possui
a meta de finalizar a leitura de dez livros por mês, detalhe que me pareceu
impressionante.
Stephanie nunca namorou, mas gostaria de namorar alguém.
Alguém bom o suficiente, segundo as palavras dela. Não gosta de praia,
mas gosta de sol e odeia frio. A chuva, apesar de ser frequente em Londres,
faz com que ela se sinta confortável. E seu prato favorito é qualquer um que
sua mãe faça.
No final da noite, quando já estávamos exaustos, eu já havia
descoberto bastante coisa acerca dela e gostaria de descobrir ainda mais,
mas nos sentíamos cansados demais para continuar caminhando, então
decidimos que talvez fosse hora de voltar para casa.
— Por que você decidiu conversar comigo só agora? — ela
perguntou pouco antes de nos despedirmos.
— Porque os seus pais estão viajando, então me senti um pouco
mais livre para... — Coloco as mãos nos bolsos e dou de ombros. — Bem,
para não ser mal compreendido.
— Entendi. — Ela balançou a cabeça em sinal de entendimento e
acenou em minha direção. — Até mais, Lukas. Fico feliz em ter você como
amigo.
Enquanto a observo partir, continuo imóvel, apenas admirando-a.
Tenho a impressão de que conheci muito mais dela em um dia do que nos
seis meses desde que eu cheguei aqui.
E quanto mais a conheço, mais quero conhecer.
Capítulo 5

— Que espécie de sorrisinho é esse? — Josh pergunta no instante


em que chego em casa. Já passa da meia noite e eu tenho certeza de que ele
está com muitos questionamentos em mente.
— Mal cheguei e você já está atirando perguntas? — tiro os sapatos,
deixando-os na entrada. Em seguida, apenas com as minhas meias, me
sento ao lado do meu irmão no sofá.
Josh é um garoto bonito, tenho certeza de que vai fazer muito
sucesso com as garotas no futuro. Mas acho que nós não falamos muito
sobre esse assunto, digo, sobre romances e finais felizes. Talvez exista
alguma regra entre irmãos que proíba que nós simplesmente tenhamos a
liberdade de falar sobre esse tipo de coisa. É um pouco embaraçoso.
Os cabelos dele são muito mais sedosos do que os meus e sua pele é
simplesmente perfeita. Eu nunca vi alguém da idade dele que não tem
nenhuma espinha.
Às vezes costumo brincar dizendo que ele parece um cantor de K-
pop ou algo assim. Ele é fofo e seu sorriso é contagiante. Inclusive,
arriscaria dizer que na nossa família, um dos nossos maiores poderes é o
sorriso. A gente consegue encantar qualquer pessoa ao sorrir.
— Sei que você saiu para tomar sorvete com o Lukas. Eu nunca
imaginaria que precisariam de mais de quatro horas para um passeio como
esse. — Ele levanta uma das sobrancelhas. — Vocês se beijaram?
— É claro que não! Nós somos amigos. — Dou de ombros. — Ele
me falou um pouco da vida dele, conversamos bastante e é isso.
— Lukas é um gostoso. Acho que você deveria beijar ele. — Josh
lança uma piscadela na minha direção e ri.
Por um milésimo de segundo, fico um pouco chocada. Não estou
acostumada a ouvir o meu irmão falando que garotos são gostosos. Nem sei
se isso é muito adequado, mas tento ignorar, afinal Josh e eu temos uma boa
relação e talvez ele se sinta simplesmente muito confortável em falar
qualquer tipo de merda que vem à mente.
— Sim, Lukas é um gostoso. E ele é bem mais simpático do que eu
imaginava. — Me aproximo um pouco mais do meu irmão. — Ele até ri. Ri
de verdade. Gargalhando. Você consegue acreditar?
— Consigo totalmente. Todo mundo ri de vez em quando. — Josh
pressiona o dedo indicador contra o meu braço e fala baixinho, em tom de
segredo. — Beije ele. Não perca a oportunidade.
— Josh, eu nunca beijei nenhum garoto. Além disso, Lukas é...
Lukas é misterioso, um pouco sombrio. Ele tem a capacidade de
fazer com que as pessoas falem muito acerca de si mesmas e, ao mesmo
tempo, nunca revela nada muito profundo acerca da própria existência. É
estranho. Nós passamos uma noite inteira conversando e eu não sei muito
sobre a personalidade dele ou sobre o seu passado, ou sobre as razões que
fizeram com que ele viesse viver em Londres.
Eu sei apenas que Lukas ama ler livros de horror, mas isso eu já
sabia, final todos os dias pela manhã, antes de começar o expediente, ele
costuma chegar mais cedo e passa mais ou menos trinta minutos apenas
lendo em silêncio, quase como se tentasse fazer com que seu espírito
voltasse ao corpo enquanto lê.
Também sei que ele não toma chá de limão e prefere roupas em tons
escuros, contidos. Ou seja, tudo nele envolve mistério.
E admito que acho esse tipo de personalidade bastante sexy.
— Lukas é o quê? — Josh me incentiva a continuar falando.
— Lukas é descolado e eu sou apenas eu.
— Você é incrível e seus cabelos têm mechas em tons de rosa. Acho
que já é o suficiente. — Ele se levanta e começa a caminhar para o próprio
quarto. — Aproveite que os nossos pais não estão aqui e simplesmente
continue saindo com o Lukas. Beije ele. Faça s...
— Não complete a frase, por favor.
— Faça sexo com ele. — Ao falar, ele corre para dentro do quarto e
tranca a porta, me deixando sozinha com os meus pensamentos doidos.
Confesso que eu já tinha imaginado como seria beijar Lukas.
Sempre que olho na direção dele e me permito observar seus lábios, penso
acerca disso. Acho que seria maravilhoso. Mas fazer sexo? Talvez isso seja
demais.
Acho que se os meus pais descobrissem que algo assim está
passando pela minha cabeça, eles simplesmente me trancariam em casa por
um ano.
Porém se eu for pensar de maneira bastante madura, não há dúvidas
de que já estou preparada para esse tipo de experiência. Acredito que não
seria desagradável fazer sexo com o Lukas. Ele parece saber muito bem
como fazer esse tipo de coisa, ao contrário de mim.
Pelo amor de Deus, eu cresci assistindo k-dramas, então é óbvio que
eu imagino que as coisas aconteçam de uma maneira muito mais lenta. Mas
tudo bem. Não vou permitir que Josh coloque esse tipo de coisa na minha
cabeça, não vou criar expectativas irrealistas em relação a tudo o que está
acontecendo. A noite de hoje representa apenas uma saída para tomar
sorvete de morango. Nada mais. Não deveria significar nada mais, e não
significa.
E apesar de eu tentar ignorar tudo isso, tenho a impressão de que
uma semente foi plantada. Talvez agora seja impossível fingir que não
desejo beijar Lukas.
Capítulo 6

Eu não dormi muito bem durante a noite. Passei horas e horas


pensando em algumas coisas um tanto quanto inadequadas e outras nem tão
inadequadas assim. Bem, confesso que pela maior parte do tempo fiquei
relembrando os momentos que passei com Stephanie. Também imaginei
como seria beijá-la, como seria tocá-la, como seria ter a oportunidade de
agir como se realmente tivéssemos intimidade. Mas é uma pena porque não
temos. Não ainda.
Por outro lado, penso que já dei um grande passo desde que os pais
dela viajaram. Preciso aproveitar o tempo que tenho porque depois que eles
retornarem, será um pouco mais difícil agir de maneira tão... liberal.
Acho que sou um bobo. Não conheço ninguém da minha idade que
age dessa maneira. Quero dizer... Apesar de eu ver Stephanie basicamente
todos os dias no restaurante, não a conheço, não de verdade.
Tudo o que eu gosto nela foi criado pela minha própria cabeça.
Porém, conforme conversávamos na noite passada, tive a impressão de que
ela é muito melhor do que tudo aquilo que eu criei. Ela é mais engraçada,
tem camadas que ainda não desvendei. E eu gostaria de descobrir cada um
desses detalhes que não conheço. Porque apesar de eu gostar muito da
versão que criei na minha cabeça, a versão verdadeira parece ser ainda
melhor. Parece ser ainda mais interessante.
Hoje pela manhã, depois de dormir quase nada, despertei sentindo
como se minha cabeça estivesse cheia de vento. Ou algodão, não sei. O fato
é que não consigo pensar com muita clareza quando sinto muito sono e
agora estou com dificuldades de me manter concentrado.
É difícil pensar tanto em alguém e não poder revelar nada.
Às vezes penso que talvez eu esteja criando muito drama
desnecessário.
Todo garoto comum já se apaixonou por uma garota alguma vez na
vida e simplesmente decidiu se declarar de maneira fácil, rápida e eficaz.
Mas esse não é o meu caso. E na verdade, acho que não estou apaixonado.
Seria ridículo me apaixonar por uma menina que eu sequer conheço,
seria ridículo admitir que me apaixonei por alguém com quem eu só
conversei verdadeiramente uma única vez. Para além de tudo isso, existem
coisas que não podem ser arriscadas, perdidas. E definitivamente o meu
emprego não é uma coisa que eu gostaria de perder.
Algumas relações não podem existir. E talvez tudo isso que eu sinto
por Stephanie deveria simplesmente desaparecer da minha cabeça. Afinal,
ela é a filha do meu chefe.
— Lukas, poderia me ajudar a empilhar as caixas lá dentro do
armazém? — Ouço a voz de Stephanie soando atrás de mim.
— Sim, é claro! — respondo prontamente na tentativa de parecer
sempre ágil e prático.
Confesso que quando eu cheguei ao restaurante essa manhã, fiquei
com um pouco de medo de que as coisas se tornassem estranhas demais.
Quero dizer, chamei Stephanie para sair e foi tudo muito bom, então eu não
sabia exatamente o que esperar no dia seguinte.
Porém, conforme as horas se passaram, percebi que a minha
ansiedade estava fazendo com que eu criasse coisas sem sentido. Percebi
que tudo ficou ainda melhor, porque agora tenho a impressão de que
Stephanie e eu compartilhamos algo, momentos, conversas. Sorvetes.
Inclusive, durante o expediente, nós conversamos um pouco quando
sobra tempo.
— Se vocês dois demorarem demais trancados no armazém, tenham
a total certeza de que eu vou bater na porta. — Josh, que está carregando
uma bandeja cheia de pratos sujos rumo à cozinha, estalou a língua. — Eu
não aceito lavar a louça enquanto vocês transam em algum tipo de aventura
sexual estranha.
Agora, ao anoitecer, os clientes já não estão lotando as mesas do
restaurante, então as coisas estão levemente mais calmas.
— Do que diabos você está falando? — Stephanie praticamente
grita, fazendo com que os poucos clientes olhem em nossa direção. —
Ninguém vai transar aqui!
Acho que ela falou alto demais mais uma vez, pois agora todos os
clientes estão olhando em nossa direção.
— Venha, vamos entrar no armazém de uma vez. — Sem pensar,
trato de puxá-la pela mão. E o contato faz com que o meu corpo inteiro
enrijeça em resposta. De repente, me sinto quente. Com calor.

O local é abafado e não tem luz. Por isso, acendo a luz do meu
celular antes mesmo que ela peça. Em seguida, trato de colocar o aparelho
em uma região estratégica que ilumina boa parte do ambiente.
— O meu irmão não sabe o que diz, estou falando sério. —
Stephanie me dá as costas e começa a empilhar as caixas repletas de lámen.
— Eu nunca transaria nesse lugar sujo e abafado.
— Isso quer dizer que você transaria comigo em outros lugares? —
falo sem pensar e logo em seguida engulo em seco, sabendo que acabei de
soar como um verdadeiro assediador.
Mas ao contrário do que eu imaginava, ela dá risada como se a
minha piada não tivesse sido ofensiva.
— Não me faça perguntas difíceis, ok? — ela empurra uma caixa de
lámen na minha direção. — Agora pare de conversa e comece a trabalhar.
Aposto que você não estaria conversando tanto caso os meus pais
estivessem aqui para te vigiar.
— Pelo visto você é tão mandona quanto eles. Entendi. —
Respondo, dando-lhe as costas.
Stephanie está certa. Com certeza eu nunca estaria conversando
tanto se o casal Lee estivesse no restaurante. Por isso, levando em
consideração o fato de que não posso perder o emprego, volto a focar no
trabalho.
Você precisa pagar o aluguel do seu apartamento. Se você ficar
desempregado, será obrigado a morar na rua. É isso o que você quer?
Literalmente converso comigo mesmo enquanto empilho as caixas.
Quando saí da Alemanha, eu tinha apenas algumas libras no bolso.
Foi a minha avó quem me deu. Inclusive, acredito que aquela foi a primeira
e única vez em que chorei sem vergonha alguma na frente de alguém na
minha fase adulta.
Doeu precisar ver a minha avó juntando algumas poucas notas e
moedas para que eu pudesse viajar. Mas ao mesmo tempo, me senti
extremamente grato por tê-la comigo, por saber que eu tinha alguém que me
apoiava. Me apoia.
Apesar da distância, faço questão de falar com ela regularmente.
Trocamos mensagens e fazemos chamadas de vídeo. Sinto falta dela. Na
verdade, ela é a única pessoa que faz com que eu sinta o que mais se
aproxima do que eu definiria de saudade de casa. Digo casa, porque não
considero que eu tenha tido um lar. Não tive um lar na infância, não tive na
adolescência e não tenho um lar agora. Eu diria que o mundo é o meu lar. O
universo é o meu lar.
Por outro lado, começo a ter a impressão de que as raízes que eu
tanto desejei ter estão sendo criadas. Porque todos os dias me sinto muito
animado com o fato de que posso simplesmente acordar no meu próprio
apartamento, de que posso caminhar nas ruas de Londres e depois chegar ao
trabalho. É bom ter uma vida assim. É bom olhar ao redor e ver rostos
conhecidos de pessoas que são emocionalmente saudáveis, ou aparentam
ser.
Nem todo mundo têm a possibilidade de crescer em uma família
saudável, em uma família que não é tóxica, em uma família que tenta
compreender tudo aquilo que você sente. Inclusive, eu arriscaria dizer que a
maioria das pessoas não tem essa possibilidade. Porque a sociedade é
doente. As pessoas estão cada vez mais doentes. E é triste pensar que nem
todo mundo vai encontrar a oportunidade que eu tive de simplesmente
recomeçar em um país distante. É triste pensar que nem todo mundo tem
uma avó disposta a juntar as poucas moedas e notas para que o neto possa
viajar para bem longe.
— Você poderia pegar aquela caixa lá de cima? — Stephanie me tira
dos meus devaneios, fazendo com que eu dê um pulo.
Eu estava tão imerso nos meus próprios pensamentos que até me
esqueci que ela estava presente.
Meio perdido, subo em um dos banquinhos e levanto os braços para
pegar a caixa. Mas, levando em consideração o fato de que o meu cérebro
está totalmente prejudicado pelo sono, me desequilibro e caio.
Caio em cima de Stephanie.
Todas as caixas desmoronaram comigo, fazendo um barulho imenso.
Sim, eu sou um desastre.
Capítulo 7

Começo a ter a leve impressão de que Lukas nutre algum tipo de


fetiche relacionado ao ato de derrubar coisas em mim. Céus, será que é tão
difícil prestar um pouco mais de atenção e simplesmente não acertar as
caixas do armazém inteiro na minha cabeça?
— Ontem você derrubou o molho apimentado nas minhas roupas.
Agora você acabou de simplesmente jogar todas as caixas cheias de lámen
na minha cabeça. Qual será o seu próximo passo, Lukas? Me matar? —
digo, sem fôlego. — Se continuarmos nessa velocidade, amanhã você
provavelmente vai me acertar com uma faca ou com um martelo, ou com
qualquer coisa perigosa desse tipo.
Estranhamente, não me sinto tão irritada quanto eu deveria estar. Na
verdade, estou mais irritada com a reação do meu corpo do que qualquer
outra coisa. E talvez isso esteja intrinsecamente ligado ao fato de que Lukas
está em cima de mim. Ele literalmente está em cima de mim. Posso sentir o
calor da sua pele, o cheiro do seu cabelo, a essência amadeirada do seu
perfume.
Tudo ao mesmo tempo parece me acertar diretamente, fazendo com
que eu me sinta tonta, ainda mais tonta do que quando as caixas me
acertaram com força.
Para piorar toda a situação, eu não consigo ignorar a noção de que
corpo de Lukas é rígido. Eu apostaria um milhão de libras que ele tem a
barriga trincada. Não há dúvidas disso. Antes eu imaginava, mas agora
tenho certeza. Portanto, é difícil resistir ao impulso de tocá-lo.
Eu gostaria de passar a mão por baixo da sua camisa, acariciando a
pele quente. Mas não, eu preciso manter o controle, preciso fingir
minimamente que estou irritada com o fato de que ele bagunçou todo o
estoque, bagunçou toda a minha segurança.
— Você se machucou? Me desculpe. Eu me desequilibrei e... —
Lukas começa a se afastar.
— Espere, eu... — Seguro o braço dele, impedindo-o de se
movimentar, impedindo-o de sair de cima de mim.
O que diabos estou fazendo?
Eu juro que eu não planejava segurar o braço dele, aconteceu sem
que eu pudesse sequer raciocinar. Mas agora é tarde demais. Agora é
efetivamente tarde demais. Eu não sei mais o que fazer. Meu Deus, por que
que eu segurei o braço dele?
— Stephanie? — ele olha diretamente nos meus olhos e o meu
corpo inteiro fica languido, instável.
O que será que eu deveria dizer agora?
Me beije, me beije com força, entre essas caixas de lámen e faça
com que eu perca totalmente a noção da minha própria vida.
Tire as minhas roupas e faça com que eu deixe de ser virgem agora
mesmo
Eu quero transar com você, Lukas. Aqui, agora.
Mas ao invés de falar qualquer um desses absurdos, eu
simplesmente fico calada com os olhos arregalados, esperando que ele tome
algum tipo de atitude porque eu sou simplesmente incapaz de fazer
qualquer coisa.
Meu coração está cada vez mais acelerado. O meu corpo está
quente, quase como se eu estivesse levando algum tipo de choque, quase
como se algum acontecimento da natureza estivesse me atingindo nesse
exato momento e não seria um exagero dizer que os olhos de Lukas são um
acontecimento da natureza.
Os tons de verde são intensos. Repletos de verdades não ditas,
repletos de mistério. De repente, eu sinto a necessidade urgente de conhecer
mais acerca dele. Sinto a necessidade de descobrir o que fez com que ele
passasse a viver em Londres, o que fez com que ele se tornasse tão fechado
consigo mesmo.
Apesar de tudo, apesar de observá-lo sempre solitário com seus
livros de horror e suspense, apesar do seu silêncio, apesar do seu olhar
triste, eu consigo ver todo o potencial que há nele, consigo ver a felicidade
esperando para se libertar da armadura que ele criou em volta de si mesmo,
consigo ver a possibilidade de me apaixonar por alguém assim.
Isso me assusta porque eu nunca senti o interesse de me apaixonar
por ninguém. Mas tampouco me fechei. Não me considero fechada para o
amor.
Porém, como eu poderia saber que o amor chegou para mim? Como
eu poderia saber que tal pessoa é a pessoa certa? Será que existe algum tipo
de resposta para tudo isso? Ou será que eu posso simplesmente arriscar me
atirando de algum tipo de penhasco imaginário acreditando e esperando que
tudo possa dar certo? Talvez realmente exista alguém lá embaixo esperando
para me segurar. Ou talvez eu simplesmente caia, me chocando contra o
chão e me quebrando, me quebrando em milhares de pedaços, sangrando,
descobrindo que às vezes o amor não é tão bonito quanto os filmes dizem.
Mas como eu poderia saber? Nunca me apaixonei, nunca provei do amor.
Então qualquer coisa que eu possa dizer ou pensar acerca do assunto
seria, inevitavelmente, sem profundidade. Seriam apenas os pensamentos e
as noções de uma mulher que nunca se apaixonou. Uma mulher virgem.
E antes de tudo isso, antes de começar a ter um contato verdadeiro
com Lukas, eu nunca realmente me sentir incomodada com o fato de que
sou virgem, mas de repente isso me incomoda, de repente os meus seios
parecem clamar por um toque que sequer reconheço, clamar por serem
descobertos por alguém. Descobertos por Lukas.
Acho que na noite anterior Josh de fato ativou algum tipo de gatilho
em mim ao fazer aquele tipo de brincadeira. Porque, desde então, não
consigo pensar em outra coisa. E para piorar tudo, os meus pensamentos
não são somente carnais, porque se fossem, eu poderia simplesmente agir
de maneira maluca e transar com qualquer um sem pensar duas vezes.
Para além disso, estou pensando acerca do fato de que os olhos de
Lukas me enfeitiçam e que o sorriso dele parece começar a fazer muito
sentido para mim.
— Lukas, eu quero beijar você. Aqui. Agora. — Desvio o meu olhar
do dele apenas para observar ao redor. As muitas caixas estão bagunçadas e
a lanterna do celular brilha no outro lado do armazém. Mesmo assim,
apesar de toda essa desorganização, sinto que falar o que eu falei é uma
escolha certa.
E desse segundo em diante, eu meio que me permito admitir que
sempre tive interesse nele. Interesse verdadeiro. Eu só não tinha espaço. E
agora que os meus pais estão viajando, percebo que a oportunidade surgiu.
E que eu não era tão livre quanto imaginava ser.
Estou sendo livre agora. Não vou me prender. Ao menos não nesse
minuto, não nesse breve instante de coragem louca.
Tentando colocar todos os meus pensamentos e inseguranças em
algum canto silencioso da minha cabeça, pouso uma das mãos na parte de
trás da nuca de Lukas.
Ele não diz mais nada. Apenas me puxa com força e une seus lábios
aos meus. O movimento é rápido e firme, me deixando totalmente sem
fôlego, me deixando ainda mais perdida do que antes.
As nossas línguas aos poucos começam a se entrelaçar quase como
se estivessem em algum tipo de dança erótica. É algo que eu nunca senti
antes, então eu não saberia como descrever tudo com exatidão.
As sensações explodem e eclodem dentro de mim. Eu fecho os
olhos e me perco dentro de mim mesma. Mas também me perco através da
proximidade de Lukas. E é bom me perder, percebo que é bom estar nos
braços dele. Porque seus beijos têm gosto de futuro, têm gosto de liberdade.
Têm gosto de algo que ainda não sei o nome. Porém eu gostaria de saber,
gostaria de descobrir tudo o que eu ainda não descobri.
Tentando parecer um pouco mais segura de mim mesma, passo os
dedos por entre seus cabelos sedosos, sentindo seus cachos encaracolados e
loiros. Ao mesmo tempo, aprofundo o beijo, permitindo que se torne mais
selvagem.
Para a minha surpresa, ele lentamente passa uma das mãos por baixo
da minha camisa. Subindo, mas não muito, apenas o suficiente para me
deixar louca. Um arrepio percorre todo o meu corpo e, de maneira ousada,
também coloco a minha mão livre por baixo da camisa dele. Sinto os
pelinhos, sinto a pele quente. E quero sentir ainda mais.
Ele toca a minha barriga de maneira respeitosa. Apenas
descobrindo, desvendando.
Eu poderia seguir em frente, eu poderia simplesmente explodir aqui
mesmo. Mas então me lembro que estou no restaurante e que Josh
literalmente está no lado de fora.
Não quero passar pela vergonha de ser vista pelo meu irmão mais
novo fazendo esse tipo de coisa. Por isso, tento retornar ao presente. Tento
recuperar o controle, mas não consigo. É difícil demais parar de beijá-lo.
Capítulo 8

Se alguém no passado me dissesse que algum dia chegaria o


momento em que eu teria a oportunidade de beijar Stephanie Lee dessa
forma, eu provavelmente riria. Gargalharia. Porque até então, na minha
cabeça, um acontecimento assim seria impossível. Ou talvez pudesse
acontecer apenas nos meus sonhos. No entanto, conforme os nossos lábios
se unem cada vez mais profundamente, sei que tudo isso é real. Mágico. É
como se eu pudesse viajar sem sair do lugar, flutuando, indo ao céu apenas
por tê-la em meus braços.
Todos esses meus pensamentos são bastante incoerentes, afinal eu
nunca me considerei um cara romântico. Muito pelo contrário. Costumo ser
considerado o tipo de pessoa distante e invisível que passa despercebido em
relação a praticamente todas as pessoas ao meu redor. Eu não tenho o
costume de ser notado. Não tenho o costume de simplesmente poder me
abrir sem temer ser machucado logo em seguida. E eu sei que nada disso se
trata apenas de um beijo. É mais. É algo que foi construído através de seis
meses, mas permaneceu totalmente intacto. Totalmente em silêncio.
Invisível como eu.
Sem saber se devo continuar ou não, subo as minhas mãos um
pouco mais, sentindo a pele quente queimar na palma da minha mão. O meu
membro está rígido dentro da calça.
Me pergunto se eu deveria me afastar um pouco. Não sei até que
ponto Stephanie quer chegar. Além disso, estamos no restaurante E apesar
de não estarmos em um horário de pico, existem muitos clientes lá fora.
Droga, espero que Josh não cumpra com a promessa de aparecer de
repente.
Às vezes tenho a impressão de que alguns sentimentos preferem
permanecer encubados, quase como se o nosso coração tentasse se precaver,
se prevenir de possíveis ferimentos desnecessários. Acho que foi isso o que
aconteceu comigo.
Eu preferia dizer para mim mesmo que sentir tanto interesse em uma
garota não significava tanto. Mas significava muito. Significava tudo. E
agora que o nosso primeiro beijo finalmente aconteceu, sei que é impossível
continuar fingindo. Eu gosto dela, estou apaixonado por ela. E não faço a
menor ideia do que isso pode significar para o meu futuro.
Em breve, o casal Lee irá voltar. E depois, o que vai acontecer? Será
que eu vou poder assumir tudo isso que estou sentindo? Ou será que vou ser
obrigado a simplesmente continuar escondendo? O grande problema é que
esconder já não é muito uma opção. Tenho certeza que não. Porque cada
vez que eu olhar na direção de Stephanie de agora em diante, certamente
irei me lembrar muito bem da sensação que estou sentindo agora. Porque
algumas sensações não são esquecíveis, algumas sensações permanecem. E
a sensação de beijá-la parece estar sendo forjada em minha pele, em minhas
entranhas, segundo após segundo. Sei que me lembrarei disso pelo resto da
minha vida.
Não pelo beijo em si, mas pela sensação de tê-la tão entregue em
meus braços depois de seis meses desejando fazer exatamente isso que
estou fazendo agora.
Claro que nunca imaginei que nós nos beijaríamos dentro de um
armazém escuro, repleto de caixas fechadas de lámen. Mas tudo bem, afinal
primeiras vezes nem sempre são exatamente planejadas. Porém acontecem.
E estou feliz que o nosso primeiro beijo aconteceu.
O nosso primeiro beijo.
O pensamento ecoa dentro de mim porque parece surreal demais
para ser palpável.
E para piorar tamanha loucura, também tomo a consciência de que o
que há entre nós é muito maior do que eu poderia sonhar. Porque é o tipo de
conexão que eu nunca tive com ninguém. Ou que talvez eu nunca tenha me
permitido construir com alguém.
Porque conexões são perigosas, eu aprendi isso da pior maneira.
Contudo, pela primeira vez em muito, muito tempo, desejo ter conexões
verdadeiras. Desejo me conectar com Stephanie. Conhecendo-a,
descobrindo cada um dos pontos que a deixam tão entregue quanto nesse
momento.
— Precisamos parar... — Stephanie geme baixinho ainda com os
lábios muito próximos aos meus. Estou sem fôlego, sem controle, porém
mesmo assim trato de me afastar e dessa vez, para a minha tristeza, ela não
puxa o meu braço. O momento acabou. E, assim como surgiu, a bolha que
criamos ao redor de nós dois desapareceu. — Lukas, nós não deveríamos
fazer esse tipo de coisa. Não aqui, não com o risco do meu irmão aparecer a
qualquer segundo.
As palavras dela me trazem certo conforto porque me passam a
mensagem de que talvez ela queira continuar com tudo isso. Não no
restaurante, claro. Mas em outro lugar, talvez...
— Jante comigo. Hoje. Posso preparar hambúrgueres. Podemos
passar algum tempo juntos. Eu... — Faça uma pausa e passo uma das mãos
na minha cabeça, tentando recuperar a minha capacidade de formar uma
frase que faça sentido. — Eu nunca imaginei que nós nos beijaríamos, mas
nós nos beijamos. Então talvez possamos fazer mais, talvez possamos nos
beijar por mais tempo. Sei que são muitas as mudanças. Sei que nós nos
aproximamos ontem. Mas é possível que a gente se aproxime ainda mais.
Os seus pais não estão aqui e eu sei que quando eles voltarem tudo ficará
mais difícil. Por isso, quero aproveitar a sua companhia agora. Hoje. Nesse
momento, eu prefiro evitar pensar no amanhã. Porque talvez o amanhã seja
complicado demais. Eu não quero pensar em nada que seja complicado, não
agora. No momento, apenas os seus beijos me importam.
Não sei de onde tantas palavras surgiram, mas as frases
simplesmente escapam da minha boca. E, para ser sincero, não me
arrependo. Por muito tempo eu fiquei calado e agora que a oportunidade
surgiu, não vou perdê-la.
Sei que é um pensamento clichê, mas a verdade é que a vida é feita
de oportunidades. E às vezes perdemos bons momentos por medo de tentar,
por medo de perguntar. Eu não vou ter medo, eu quero tentar. No entanto,
tudo isso não depende apenas de mim. Preciso também esperar pela
resposta dela.
— Lukas, eu estou com medo. — Ela fala quase como se estivesse
lendo os meus pensamentos. — Mas eu quero. Quero ir ao seu apartamento,
quero comer hambúrgueres com você. Então sim, eu aceito o seu convite.
Eu aceito jantar com você.
Assim, através das palavras dela, senti que posso ser infinito. Basta
ter coragem. E eu tenho.
Capítulo 9

Josh não é bobo, então é claro que ele percebe quando as coisas
estão diferentes. É como se ele pudesse captar no ar tudo o que está
acontecendo, tudo o que está girando na minha cabeça e escapando para
todos os lados. Me sinto um pouco tensa porque não tenho o costume de
tomar atitudes socialmente questionáveis. Sempre fui uma boa garota,
nunca sequer faltei uma aula na escola. Portanto, suspeito que não seja
muito difícil perceber que estou agindo de maneira diferente desde que
beijei Lukas.
Ao anoitecer, depois de fecharmos o restaurante, eu volto para casa
e tento não conversar muito com o meu irmão, mas é claro que ele não
deixaria de puxar conversa comigo, então, apesar de eu tentar fugir de
possíveis assuntos comprometedores demais, Josh surge do quarto dele com
os braços cruzados e olhar avaliador, como se estivesse buscando alguma
coisa, como se soubesse tudo o que eu fiz antes mesmo de eu falar qualquer
coisa.
— Quando você vai me dizer o que aconteceu no armazém de
estoque? — ele dá mais quatro passos na minha direção e abre um
sorrisinho curioso.
— Do que você está falando? Não sei do que você está falando. —
Balanço as duas mãos e dou de ombros. — Fumou alguma coisa?
— É claro que você sabe do que estou falando. Vocês passaram um
tempão trancados no armazém e quando saíram, estavam vermelhos,
desarrumados e descabelados. Eu não sou bobo, Stephanie. Eu sou o seu
irmão, te conheço a vida inteira, então é claro que eu percebo quando
alguma coisa está diferente. — Ele aponta o dedo indicador na minha
direção. — Não adianta mentir para mim.
Eu estou horrorizada. Josh não deveria falar comigo dessa maneira.
Como ele é capaz de me colocar contra a parede? É como se eu realmente
tivesse a obrigação de revelar todos os meus segredos. E eu não tenho,
simplesmente não tenho.
Tudo bem que nós somos irmãos, tudo bem que somos os melhores
amigos da vida inteira, mas nada poderia fazer com que a maneira com que
Josh está me perguntando as coisas soe aceitável.
— Eu acho que você está sendo muito indelicado ao me perguntar
coisas assim dessa maneira. — Dou dois passos na direção dele e agarro seu
dedo. — Aponte esse dedo na minha direção de novo e eu vou quebrar a
sua mão.
— Indelicado? Eu só estaria sendo indelicado se de fato algo tivesse
acontecido entre vocês. Ou seja, se você está ofendida e não quer falar
sobre isso, significa que algo realmente aconteceu. — Ele faz uma pequena
pausa e sorri outra vez. — Me diga, vocês tiraram a roupa?
— Tirar a roupa? — Eu praticamente grito, mortificada por ter essa
conversa com o meu irmãozinho. — Em que mundo você vive? Que tipo de
coisa você está pensando? Acha que estamos em algum tipo de filme
pornô? — dou-lhe as costas e começo a caminhar pela casa, tentando buscar
qualquer tipo de distração que me permita fugir de Josh.
Apesar de sermos melhores amigos e de termos uma conexão
maravilhosa, é bem difícil falar sobre assuntos sexuais tão abertamente, até
porque eu nunca fiz esse tipo de coisa. Confesso que Lukas foi o primeiro
garoto que beijei na vida.
E foi bom, foi muito bom. Depois que saímos do armazém, passei
horas pensando na proximidade dos nossos corpos, no fato de que ele tocou
a minha barriga. E quando eu me lembro de tudo, não consigo controlar o
sorriso que surge nos meus lábios. Não consigo não permitir que o meu
coração acelere dentro do peito.
É como se eu estivesse sob efeito de drogas, sob o efeito de algum
tipo de alucinógeno que me impede de pensar em outra coisa. Inclusive me
sinto um pouco aérea, como se fosse impossível me controlar.
— Então tudo bem, Stephanie Lee! Você não quer falar? Não fale!
Mas eu sei que alguma coisa aconteceu. Eu sei mesmo que você negue,
mesmo que você diga que não. — Ele estala a língua e começa a se afastar.
— Estou um pouco decepcionado porque eu sempre imaginei que nós
tínhamos uma boa conexão. Eu imaginava que nós podíamos falar sobre
tudo um com o outro.
Paro de caminhar e olho na direção do meu irmão mais novo. Ele
parece estar realmente magoado comigo apenas porque eu não estou
falando a verdade.
— Você sempre me diz tudo, Josh? Sempre fala sobre tudo o que
acontece na sua vida? — balanço a cabeça negativamente. — Sem mentiras,
sem nunca ocultar nada? Acho difícil. É possível existir sem segredos? Eu
acho que não. Eu acho que todo mundo precisa ter segredos em algum
momento.
Josh fica calado por alguns instantes. E parece reflexivo. Por um
milésimo de segundo, penso que ele vai falar alguma coisa, mas então volta
a fechar a boca. É estranho. É como se ele tivesse algum segredo de fato
para me dizer, mas não diz.
— Não é possível viver sem segredos, mas não acho que a sua
relação com o Lukas deveria ser um segredo entre nós. Logo eu, que
sempre te apoiei. — Ele solta um longo suspiro. — Quanto mais segredos
surgem, maior é o muro que se forma entre nós dois.
— Eu acho que você está sendo um pouco dramático. Mas tudo
bem, eu vou falar... — Faço uma pausa repleta de suspense e inspiro
profundamente. — Lukas e eu nos beijamos, ele tocou a minha barriga e
depois me chamou para jantar na casa dele. Hoje. Inclusive eu preciso me
arrumar porque logo ele vai vir me buscar.
— Espere, vocês vão sair para jantar? Sozinhos? — Josh arregala os
olhos.
— Sim, eu vou jantar no apartamento dele. Só nós dois. Ele vai
fazer hambúrgueres.
— Stephanie, isso é incrível! — Josh bate palmas e sorri,
caminhando na minha direção. Na verdade, ele praticamente corre. —
Então quer dizer que você beijou o gostoso do Lukas? Eu não consigo
acreditar que isso por fim aconteceu de verdade.
— Por fim aconteceu? — arregalo os olhos, curiosa. — Como assim
“por fim aconteceu?”
— Era óbvio que Lukas tinha interesse em você. Ele olhava na sua
direção quase como se fosse um caçador desejando devorar algum tipo de
pedaço de carne. Todo mundo percebia.
— Eu não percebia. — Rebato mais rápido do que eu gostaria de
admitir.
— Você é lerda. — Ele joga a almofada do sofá na minha direção.
— Doeu me dizer a verdade? Viu só? Eu sou compreensivo.
— Josh, eu poderia te quebrar em dois nesse exato momento, mas
preciso me arrumar. — Corro para o meu quarto. — Até depois.
E assim, tentando ignorar o fato de que Josh acabou de revelar que
Lukas sempre esteve interessado por mim, trato de me arrumar.
Hoje eu tenho um encontro, o meu primeiro encontro de verdade.
Espero que tudo saia bem.
Capítulo 10

Acho que todo cara da minha idade encontraria dificuldades em


manter um apartamento constantemente organizado. Por isso, depois que
encerrei o meu expediente no restaurante, voltei correndo para casa na
tentativa de limpar tudo o máximo possível.
Sequer me lembro quando foi a última vez que lavei o banheiro.
Meu Deus, agora meio que me arrependo por não ter mantido tudo
limpo antes!
Em uma velocidade assustadora e impressionante, eu lavo os pratos
que estão empilhados na cozinha, jogo as caixas de pizza fora, troco os
lençóis da minha cama e literalmente esfrego todo o banheiro. Na tentativa
de melhorar ainda mais a situação, uso um spray com cheiro de baunilha em
todo o ambiente.
Fico exausto ao terminar, pois faço tudo em mais ou menos quarenta
minutos. Inclusive, exasperado, crio uma nota mental de nunca mais voltar
a acumular sujeira em nenhum cômodo do apartamento. É terrível.
Inclusive, o fato é que eu já não sou mais um adolescente que pode
deixar as caixas de pizza no chão e esperar que a minha mãe limpe. A
minha mãe não vai aparecer, tudo vai permanecer sujo se eu não fizer o
trabalho duro.
Ansioso, não parei para respirar e procurei a melhor roupa possível.
Até penteei o meu cabelo de uma maneira diferente. Depois de tudo, não
demorou muito para que a hora de buscar Stephanie chegasse.
Quero impressionar, digo para mim mesmo. Quero que ela perceba
que eu sou um cara que vale a pena, porque eu valho a pena. Apesar da
minha dificuldade em me abrir emocionalmente, acho que eu mereço uma
chance.
Por outro lado, nem sei definir que chance seria essa que eu estou
querendo.
Quando chego na casa dela, fico caminhando de um lado para o
outro perto da porta, esperando até que ela apareça.
Não demora muito para que Stephanie surja diante de mim trajando
um moletom rosa. Está com os cabelos presos em um rabo de cavalo, calças
confortáveis e sapatos que combinam com os tons do moletom. São roupas
simples, típicas de uma jovem comum. Mas de alguma forma, há algo de
muito interessante nisso. Na aparência dela. É como se ela atraísse a minha
atenção apenas por existir. E talvez seja exatamente isso. Talvez ela
realmente atraia a minha atenção apenas por existir, por ser quem é.
Porque não preciso de nada mais além da beleza do seu sorriso, da
intensidade do seu olhar, para me sentir atraído.
— Espero não estar atrasado. — Digo e coloco as duas mãos nos
bolsos. Sinto a pele do meu rosto esquentar e tenho certeza de que estou
corando.
Nunca me considerei um garoto tímido. Geralmente sou
razoavelmente despojado e apesar das minhas poucas amizades e da minha
pouca capacidade de me manter sociável, eu não sou exatamente
envergonhado, nunca fui. Contudo, por alguma razão, cada vez que
Stephanie está diante de mim, tenho a impressão de que estou fazendo tudo
errado. E coro, simplesmente coro violentamente.
— Não, você não está atrasado. Inclusive fiquei com medo de me
atrasar também. Depois que deixei o restaurante, não tive muito tempo para
escolher roupas mais interessantes. — Ela aponta para o moletom rosa e
sorri. — Na verdade, o meu irmão ficou me enchendo o saco por longos
minutos tentando descobrir o que aconteceu no armazém mais cedo.
Ela fecha a porta atrás de si e juntos começamos a caminhar um ao
lado do outro pelas ruas de Londres.
A cidade é sempre muito caótica. Não importa a hora ou o
momento, sempre vão existir pessoas caminhando de um lado para o outro.
Por isso, apesar da maioria dos restaurantes mais típicos já estarem
fechados, ainda há pessoas procurando outros lugares para visitar.
Eu arriscaria dizer que Londres sempre tem algum lugar interessante
para se ver durante o dia ou durante a noite. Não importa. Às vezes, basta
estar no meio da rua para encontrar alguma atração ou apresentação legal.
Gosto disso, gosto de ter milhares de opções sempre sem me
preocupar com o risco de me sentir entediado.
Quando eu morava em Arnis, não tinha muito o que fazer. Eu quase
nunca conhecia pessoas novas e permanecia em contato com os mesmos
amigos de sempre. Amigos que nem eram tão amigos assim. Talvez por isso
eu também não seja muito bom em lidar com desconhecidos hoje em dia.
Porém, sinto que isso está mudando um pouco desde que comecei a
trabalhar no restaurante, afinal sou obrigado a literalmente atender pessoas
do mundo inteiro todos os dias. Para além disso, os meus próprios patrões
possuem uma cultura totalmente diferente da minha. Tudo isso é incrível,
mágico.
— E você disse o que a gente fez no armazém? Meu Deus, eu acho
que se os pais descobrirem que nós nos beijamos, eles seriam capazes de
me demitir. — Olho na direção dela por apenas breves segundos e em
seguida desvio o meu olhar, tentando focar em alguma outra coisa.
As memórias voltam à minha cabeça, fazendo com que eu deseje
beijá-la outra vez, mas não vou arriscar. Ainda não. Acho que não estou
preparado para isso. Tampouco ela. Confesso que espero que um dia nós
tenhamos esse tipo de intimidade. Eu adoraria poder beijá-la quando bem
entender, quando me der vontade. Sem reservas. Sem vergonha.
— Eu tive que falar porque ele estava começando a me encher o
saco. Infelizmente, ou felizmente, Josh me conhece bem demais, então é
claro que ele sabia que alguma coisa estava diferente. Se eu não contasse,
ele continuaria me perguntando dia após dia até que eu revelasse toda a
verdade, então decidi falar de uma vez.
— Como ele reagiu? — pergunto, realmente curioso.
— Reagiu muito bem, não teve problema algum em saber que eu
beijei você. — Ao falar, ela faz uma expressão engraçada que parece uma
mistura de vergonha e orgulho, prazer. O meu coração acelera ao apreciar
sua reação. — Acho que ele ficou muito feliz.
Agora foi a vez dela de corar violentamente, e isso me agradou, pois
serviu como algum tipo de prova que eu não sou o único tímido entre nós
dois.
— Geralmente os irmãos são muito protetores em relação às irmãs.
— Comento enquanto observo as pessoas caminhando rapidamente pela
rua.
— Ele falou que já sabia que você tinha interesse em mim, quero
dizer, que você desejava me beijar de alguma forma. Não sei se ele está
realmente certo, mas fiquei reflexiva em relação a isso.
— Sim, Josh está certo. Eu não fazia ideia de que era tão óbvio
assim. Desde que passei a trabalhar no restaurante e te vi pela primeira vez,
senti vontade de te conhecer melhor, mas eu não sabia como. Tive medo de
ter que lidar com os seus pais. Bem, você sabe... — Paro por alguns
instantes, pensando na minha própria resposta. — Eu não posso me dar ao
luxo de perder o emprego, preciso pagar o meu apartamento. Você mora
aqui há mais tempo do que eu, então certamente deve imaginar que o
aluguel em Londres não é muito barato e as regras de locação são muito
rígidas. Por isso, preciso me manter seguro economicamente.
— Eu nasci em Londres e fui obrigada a observar os meus pais
sofrendo com aluguéis caríssimos por anos até o dia em que eles tiveram
dinheiro o suficiente para comprar uma casa. — Stephanie tem um tom de
voz gentil e repleto de compreensão, me trazendo certo conforto.
— Se eu arriscasse tentar alguma coisa com você, seus pais podiam
ficar muito bravos comigo. Eu tinha medo, muito medo. — Respiro
profundamente, me perguntando se estou falando demais. Mas não importa,
agora que comecei a falar, não pretendo parar. — Agora que os seus pais
estão longe, tenho a impressão de que posso me expressar melhor, de uma
maneira mais livre. Talvez isso possa soar quase como se eu fosse um
covarde, afinal, aparentemente eu esperei que os seus pais viajassem para
que pudesse tentar algum contato com você, mas não é isso. Acho que eu
não sou um covarde. Eu precisava apenas do momento certo. E acredito
verdadeiramente que algumas coisas acontecem apenas quando devem
acontecer.
Eu aprendi isso da pior forma, penso ao me calar. Aprendi que às
vezes não adianta muito você sonhar em acelerar as coisas porque tudo
acontece exatamente quando precisa acontecer. Não antes, não depois,
porque o destino simplesmente não anda de acordo com as nossas
necessidades. O destino anda de acordo com as próprias vontades. De
acordo com as próprias verdades. Não aceitar isso é o mesmo que carregar
ansiedades que sequer valem a pena serem carregadas.
Já há algum tempo optei por simplesmente viver a minha vida dia
após dia sem tentar compreender muito o que é que o destino reserva.
A vida é cheia de surpresas. Algumas boas, algumas não tão boas
assim. Mas no final, acho que sempre ficamos com algo, sempre temos algo
a carregar, quase como se o nosso cérebro fosse uma sacola enorme,
recheada de memórias, repleta de possibilidades, repleta de aprendizados e
novas ferramentas. E algumas dessas ferramentas podem ser utilizadas
outras vezes, outras só servem para fazer peso. Não servem para nada, mas
estão ali machucando. Pesando. Incomodando.
Ultimamente, tenho aprendido a simplesmente ignorar os pesos que
não me servem, deixando-os pelo caminho mesmo que seja difícil. E foi
exatamente por essa razão que decidi partir da Alemanha. Porque eu
precisava abandonar alguns pesos. Porque eu precisava recomeçar. Porque
eu precisava encher a minha sacola de memórias com novas cores, novos
brilhos, novos acontecimentos.
— Os meus pais podem até parecer rígidos, mas são legais. Eles não
demitiriam você apenas por tentar falar comigo. Não é assim que as coisas
funcionam na nossa família. Mas com certeza eles surtariam caso
soubessem que nós nos beijamos. Josh, por outro lado, é mais moderno. Às
vezes sinto que ele é moderno até demais. — Ela revira os olhos. Ao
continuar a falar, ela dá risada e olha na minha direção, mais uma vez. —
Talvez mais do que eu.
Nesse instante, os nossos olhares se encontram e eu sinto como se o
mundo todo pudesse parar. Inevitavelmente, eu tropeço, quase me chocando
contra uma das pessoas que estavam passando ao meu lado.
— Viu só? Eu não tropeço apenas em você. — Falo de maneira
bem-humorada. Em seguida, não demora muito para que cheguemos ao
meu apartamento. — Juro que tentei dar o meu melhor para que o
apartamento ficasse bonito e cheiroso o suficiente. Espero que você se sinta
confortável.
O lugar não é muito grande. Na verdade, é minúsculo. Só tem um
quarto, um banheiro, uma cozinha e uma sala que cabe apenas um sofá e
uma televisão igualmente minúscula. Mas tudo bem. É o meu espaço, é o
meu lar, o meu universo. Então me sinto orgulhoso de tudo isso.
— Você realmente vai preparar hambúrguer para nós dois? — Ela
levanta uma das sobrancelhas, quase como se estivesse tentando me
desafiar. — Você consegue cozinhar bem?
— Claro que eu não cozinho tão bem quanto a sua mãe ou tão bem
quanto os chefes do seu restaurante, mas com certeza eu sou capaz de fazer
hambúrgueres deliciosos. — Faço um sinal positivo com os polegares das
duas mãos tentando parecer confiante.
— Ótimo, estou ansiosa para conhecer os seus dotes culinários. —
Parecendo pensativa de repente, Stephanie faz uma pequena pausa. —
Confesso que na verdade estou ainda mais ansiosa para conhecer detalhes
sobre você. Nas nossas últimas conversas, percebi que você não revela
muito sobre o seu passado, sobre quem você é. Espero que esta noite você
me diga mais sobre quem é Lukas Barber.
Em silêncio, apenas balanço a minha cabeça em sinal positivo. Não
sei exatamente o que eu poderia dizer acerca de mim, acerca da minha
história. Eu não gostaria de tornar esse encontro em uma possibilidade de
falar sobre o meu passado. Acho que eu gostaria apenas de ouvi-la falar,
mas ao mesmo tempo sou capaz de compreender que é necessário falar
sobre mim mesmo também. Não posso passar a vida inteira calado, preso
no meu próprio casulo.
Pode ser que Stephanie esteja realmente disposta a me ouvir. Deus
sabe o tanto que eu gostaria de ser ouvido por alguém. Me sinto sozinho às
vezes. Quase sempre. E nunca, nunca tenho a oportunidade de falar sobre
tudo o que me machuca, sobre tudo o que me machucou.
— Primeiro vou preparar os hambúrgueres e somente depois eu
falarei mais sobre mim. Os hambúrgueres são mais importantes. — Com
um sorriso, caminho na direção da cozinha e finjo que tudo está bem.
No meu interior, no entanto, sinto medo. Sinto medo do que
Stephanie poderia pensar acerca da minha história, da vida que tive antes de
vir para Londres. Eu odiaria que ela sentisse pena de mim.
Capítulo 11

Imaginei que eu me sentiria desconfortável quando chegasse ao


apartamento de Lukas, afinal estou completamente sozinha com um garoto
extremamente gostoso. Para a minha surpresa, no entanto, não está sendo
desconfortável.
Ele faz com que tudo pareça leve e divertido. Inclusive, ao observá-
lo, percebo que há algo de extremamente sexy no seu jeito de preparar os
hambúrgueres.
Lukas é másculo, tem um corpo poderoso. Firme. Eu adoraria vê-lo
totalmente sem roupas.
Céus, no que diabos eu estou pensando?
Tentando voltar a minha atenção para a comida, desvio o olhar para os
temperos que estão em cima da mesinha da cozinha.
A receita não é tão intricada. Ele basicamente aperta a carne moída
temperada, formando bolinhos e em seguida passa o rolo de madeira em
cima de cada um, transformando cada bolinho em camadas finas.
Quando ele começa a fritar a carne na frigideira, o cheiro delicioso
de hambúrguer frito inunda todo o apartamento. No pequeno rádio ao lado
da televisão na sala de estar está tocando uma música antiga em inglês.
Me sinto como se eu pudesse fazer com que esse momento durasse
para sempre. Porque é bonito observá-lo. É bonito poder ouvir uma música
e esperar por hambúrgueres. Nunca passei por nada disso. É como se eu
estivesse florescendo, como se estivesse vivendo verdadeiramente pela
primeira vez em muito tempo.
Antes eu imaginava que uma verdadeira aventura era somente sobre
viajar pelo mundo, mas não. Uma grande aventura também pode significar
visitar o apartamento de Lukas Barber.
— Você prefere comer na mesa ou prefere que nós dois nos
sentemos no sofá e coloquemos os pratos em cima das almofadas? — Lukas
olha minha direção e aponta para a frigideira. Os hambúrgueres já estão
prontos e parecem deliciosos.
Ironicamente, apesar de ser filha de pais que possuem um
restaurante, estou ansiosa para provar a receita simples dele. Não para
criticá-lo, mas por saber que ele se esforçou para preparar tudo para mim.
— Prefiro que fiquemos no sofá, acho que é mais confortável. —
Para ajudá-lo, pego os pratos e os refrigerantes que estavam na geladeira.
Pensei em roubar uma das garrafas de soju que o meu pai coleciona,
mas decidi não fazer isso. Eu não queria ficar bêbada no meu primeiro
encontro oficial. Prefiro me lembrar de cada detalhe para que eu possa
guardar tudo no meu coração, pois não sei quantos encontros mais terei com
o Lukas.
Ainda não sei se ele realmente está interessado em mim ou se
pretende apenas me seduzir. Odeio pensar na possibilidade de que talvez ele
deseje apenas me usar para sexo sujo e rápido. Prefiro acreditar que deseja
algo mais.
Apesar de parecer tão desapegado e descolado, talvez possa existir
um coração de verdade pulsando em seu peito. Talvez ele possa até ter
interesse em manter um relacionamento.
Mesmo com tantas dúvidas e inseguranças, no entanto, estou aqui.
Estou disposta a seguir adiante.
— Você está prestes a experimentar o melhor hambúrguer artesanal
de toda a Inglaterra! — Ao falar, ele se senta no sofá.
Juntos, nós começamos a comer os hambúrgueres e de fato estão
muito bons, maravilhosos. Há um toque especial. Acho que regado com
algum tipo de tempero que somente ele deve saber usar.
— Está delicioso, simplesmente maravilhoso. Onde você aprendeu a
fazer esse tipo de hambúrguer? — olho na direção dele, na direção das
mãos dele. Seus dedos são grandes. Parecem ser ótimos com o toque, com a
descoberta.
Sinceramente nem sei o porquê de eu estar pensando nesse tipo de
coisa. Estamos falando de hambúrgueres. Da comida. E na verdade, parece
que eu que quero ser a comida dele.
Meu Deus, estou perdida...
— Eu aprendi com a minha avó. Ela sempre gostou de fazer esse
tipo de hambúrguer para mim. — Ele parou por alguns instantes apenas
para saborear o pão que está mastigando. — Ela prefere preparar tudo em
casa do que comprar porque segundo ela, as empresas estão cada vez mais
gananciosas e devem colocar algum tipo de veneno nos animais para que a
carne pareça maior do que realmente é.
— Os meus pais também pensam assim. — Sorrio e dou de ombros.
— Eles odeiam que eu coma muita porcaria, preferem sempre fazer a minha
comida. Acho que os dois me protegem demais de vez em quando.
— Eu também gostaria de ser protegido de vez em quando. Às vezes
me sinto um pouco sozinho em Londres. — As palavras escapam dos lábios
dele e pairam ao nosso redor.
Não sei exatamente a razão, mas um silêncio desconfortável se
forma entre nós por alguns instantes.
— Lukas, por que você decidiu morar em Londres? O que te fez
deixar a Alemanha para tentar a vida aqui? Não é fácil ser um imigrante,
ainda mais em uma cidade tão grande quanto essa. Você não sente saudade
da sua família? — os questionamentos saem sem que eu sequer consiga me
controlar. E me arrependo ao ver a expressão de Lukas mudar rapidamente.
Ao perguntar, sinto que talvez eu possa estar sendo intrometida
demais. O grande problema é que eu realmente tenho interesse em saber
sobre o Lukas.
Durante nossas conversas anteriores, sempre tive a impressão de que
ele não fala sobre si mesmo. No geral, eu falo muito sobre mim e ele apenas
escuta sorrindo e acenando. Porém, agora eu quero saber sobre ele, sobre o
verdadeiro Lukas.
Como poderíamos manter mais intimidade se eu sequer sei acerca
da história dele? Não há profundidade. Apesar de nos conhecermos há mais
de seis meses, é como se ele fosse um estranho, uma pessoa que eu vejo
todos os dias, mas que não conheço em seu interior.
De repente me lembro da conversa que tive mais cedo com o meu
irmão sobre segredos. Todas as pessoas guardam segredos. É impossível
revelar tudo o tempo inteiro. E talvez seu passado e sua história antes de
Londres sejam exatamente os segredos que Lukas não tem vontade de
revelar. Porém considero importante saber, perguntar.
— Eu até poderia dizer que sinto falta da minha família, mas não
sinto. Sinto falta apenas da minha avó. Na verdade, os meus pais não eram
pessoas muito agradáveis. — Lukas dá uma mordida no hambúrguer e
abaixa o olhar. Parece estar desconfortável, como se fosse muito difícil falar
dos próprios pais.
— Se você não quiser falar sobre isso, tudo bem. Eu perguntei
porque eu gostaria de saber mais sobre você. Gostaria de conhecer você
melhor. — Digo meio sem jeito.
— Mas faz sentido, é totalmente compreensível, afinal eu quase não
falo sobre mim mesmo. — Ele volta a levantar o olhar, fixando-o em mim.
— Eu posso te contar a minha história, mas por favor não me enxergue
como uma pessoa que precisa da sua pena. Nunca precisei da pena de
ninguém. Vou te falar sobre o meu passado porque é importante que você
compreenda melhor os meus motivos. Mas quero que saiba que eu nunca
realmente me senti interessado em falar sobre o meu passado para ninguém.
Desde que cheguei à Londres, a minha vida se tornou apenas o que eu vivo
aqui. Não há o passado. Apenas o presente. E o futuro ainda não conheço,
então não tenho muito o que dizer.
— Eu me sentiria muito grata se você pudesse falar sobre isso.
Sobre a sua história. — Tento não desviar o meu olhar do dele, mas sua
presença é forte, irradiando por todo o apartamento minúsculo.
— O meu pai era o típico cara ciumento e agressivo que repetia o
tempo inteiro que amava a minha mãe, mas tratava de agredi-la sempre que
tinha a oportunidade. Durante a minha infância, fui obrigado a crescer
ouvindo-o gritar com ela, chamando-a de inútil e tola. Quando criança, eu
não entendia muito bem os motivos para tantos gritos e às vezes eu até
pensava que tudo fosse culpa minha, que eu estava fazendo alguma coisa
errada.
Ao ouvi-lo falar, sinto a vontade avassaladora de protegê-lo, mas sei
que não há nada que eu possa fazer, não agora.
— Eu imagino que você provavelmente sentisse muito medo e...
Ele me interrompeu e balançou a cabeça.
— Eu sentia raiva, Stephanie. Não conseguia entender as razões
para que minha mãe aceitasse permanecer ao lado do meu pai. Mas
conforme os anos se passavam e eu crescia, eu percebi que a minha mãe era
apenas uma vítima. Uma vítima que não conseguia escapar das garras do
próprio casamento. — Lukas fez uma pequena pausa e colocou o
hambúrguer em cima do prato. Aparentemente, ele perdeu o apetite ao falar
sobre o próprio passado. — Sei que a minha história é clichê. Sei que
existem milhões de mães e filhos que sofrem com homens agressivos, com
pais que deveriam dar amor e carinho, mas que na verdade agem como
monstros. Sei que essa história já se repetiu milhares de vezes na vida real,
nos livros, nos filmes, nas séries. Mas a verdade é que isso acontece. A
verdade é que as pessoas sofrem muitas vezes caladas principalmente
porque é difícil demais lutar contra a agressão.
Quando Lukas para de falar, um silêncio ensurdecedor se faz na
sala. Sinto o meu coração doer cada vez mais conforme ele vai revelando os
detalhes acerca de si mesmo e acerca da história que o envolve.
— Eu sinto muito, Lukas. Sinto muito que você tenha sido obrigado
a conviver com o tipo de dor que criança nenhuma deveria precisar
conviver. — As minhas palavras soam frágeis demais, vazias demais.
— Mas essa não foi a pior parte. — Lukas acrescenta e solta um
longo suspiro. — O pior estava por vir. Se eu soubesse que tudo aconteceria
da maneira que aconteceu, talvez eu tivesse agido de maneira diferente,
talvez eu nunca tivesse saído de casa naquele dia.
Quando Lukas abaixa o olhar mais uma vez, percebo que lágrimas
estão se formando, se avolumando debaixo dos seus olhos. De repente, não
sei muito bem o que fazer. Por isso, pouso a palma da minha mão em sua
perna, sentido o calor do seu corpo.
— Você não precisa se sentir obrigado a me falar as coisas, Lukas.
— Digo mais uma vez, tentando trazer algum tipo de conforto.
No entanto, torço para que ele me fale porque quero que a nossa
conexão seja mais forte. Quero que as dores deles sejam compartilhadas
comigo. Talvez assim possamos construir algo que vai além de um beijo,
além de comer hambúrgueres juntos. Depois de tudo isso talvez possamos
criar algo que seja mágico e bonito. E pela primeira vez desde que tudo isso
começou sinto que provavelmente algo grandioso está acontecendo entre
nós. Ainda não sei o nome, mas sei que é grandioso. Sei que irá se expandir.
— Esse é o problema, eu quero falar, quero ser ouvido. Durante a
minha vida inteira, eu me calei e engoli a minha dor. Quando o meu pai
gritava e a minha mãe chorava, eu fingia que não estava ouvindo, fingir que
não era comigo. Mas agora eu quero falar. Porque eu sinto que talvez você
possa me ouvir. Não através de um olhar de pena, mas através de um olhar
de uma pessoa que simplesmente pode ouvir. Você me passa essa sensação
de conforto e eu sequer saberia explicar o motivo. — Enquanto fala, Lukas
parece estar muito indefeso, exposto. Frágil.
Me inclino diante dele e passo os dedos em sua bochecha, sentindo
os pelinhos da barba falhada. As lágrimas escorrem e o meu coração dói
ainda mais, acelerando.
Durante os seis meses desde que nos conhecemos, sempre pensei
que Lukas me passava a imagem de uma pessoa sombria. Por outro lado,
essa é a primeira vez em que eu vejo a dor que ele esconde, que eu percebo
que a armadura que ele criou ao redor de si fala muito sobre o sofrimento
que ele passou na infância, na vida.
Nunca imaginei que teria esse tipo de conversa com o Lukas, nunca
imaginei que o nosso encontro nos levaria a isso, porém sinto que essa
situação toda é correta.
Sinto que devemos falar sobre as nossas dores para que deixem de
pesar em nossos corações em algum momento. E eu espero, espero
verdadeiramente, que Lukas se sinta seguro comigo. Que saiba que posso
me tornar um porto seguro caso ele me permita.
Capítulo 12

Estou me sentindo patético. Não acredito que não consegui segurar


o meu choro. Agora as lágrimas estão escorrendo por minhas bochechas
copiosamente e eu sequer sei o que fazer. Mas é difícil falar sobre o meu
passado, é difícil voltar à época em que eu sofria tentando compreender as
ações da minha mãe, tentando não odiar o meu pai. Tentando não me odiar.
Inclusive, conforme tentava superar os meus próprios traumas,
percebi que uma criança nunca passa a odiar os pais verdadeiramente. Na
verdade, ela passa a odiar a si mesma, incapaz de compreender os motivos
para que todos estejam brigando ao seu redor. Na minha mente, eu era
incapaz de enxergar a razão pela qual o mundo simplesmente parecia
desmoronar cada vez mais dia após dia.
Sempre que penso na minha infância e em tudo o que precisei ver
sem ter nada que pudesse ser feito, sinto que o mundo é um pouco injusto.
Ou melhor, é muito injusto. Porque eu não merecia ver tudo o que vi, eu
não merecia passar por tudo o que passei. Mesmo assim, o destino
simplesmente fez o que bem entendia. Por isso, às vezes é um pouco difícil
tentar enxergar a beleza da vida.
Apesar de ter recomeçado e ter vindo viver em outro país, tenho
medo de que a vida volte a ser um pesadelo outra vez.
É irônico pensar que não importa o lugar em que eu esteja, não
importa o dinheiro que eu tenha e não importa as companhias que eu
mantenha ao meu lado pelo resto da minha vida, o fato é que sempre levarei
comigo as dores da criança que fui no passado. Porque minha criança foi
ferida, foi subjugada. Foi amedrontada. E apesar de eu ter me tornado um
adulto muito diferente do que fui na infância, ainda há uma versão minha
que é muito triste e chorosa, temendo que o pior aconteça a qualquer
momento.
E ao olhar na direção de Stephanie, percebo que a razão pela qual
estou chorando não é causada apenas pela dor do passado. É também
porque me enxergo como um cara quebrado. Sou quase como uma garrafa
de vidro que se chocou contra o chão e se despedaçou em milhares de
pedaços.
Os pedaços nunca voltarão a se reconstruir, nunca voltarão a ser os
mesmos. E eu sei que também nunca voltaria a ser quem eu era antes dos
traumas que mancharam a minha existência.
Entrelaço os meus dedos nos dedos de Stephanie. Sua pele é quente
e macia. Percebo que seus dedos estão um pouco trêmulos.
Há certo conforto nisso, em saber que ela está aqui, diante de mim,
disposta a me ouvir. Apesar de não termos tanta intimidade ainda, acredito
que teremos em breve. Estamos construindo alguma coisa, sei que sim.
— Como estão os seus pais hoje em dia, Lukas? — Stephanie aperta
a minha mão com um pouco mais de força, quase como se temesse a
resposta.
— Os meus pais morreram. — Faço uma pequena pausa e tento
recuperar o meu próprio controle. — Os meus pais...
Engolindo o choro por apenas alguns instantes, me permito voltar ao
passado, à dor que senti quando tudo aconteceu. Permito que a dor me
rasgue uma última vez enquanto falo tudo para Stephanie.
Em detalhes, descrevo o inferno que vivi pouco antes de partir da
Alemanha.

Eu havia conseguido um trabalho em um supermercado e passava


praticamente o dia inteiro lá. Na verdade, eu detestava ficar em casa por
muito tempo. O meu pai estava cada vez pior, bebendo mais e mais, e era
até difícil encontrá-lo sóbrio. A minha mãe, por outro lado, parecia estar
perdendo peso rápido demais. Existiam marcas roxas em seus braços e
aparentemente ela já não se importava em escondê-las como antes, já
estava cansada demais para qualquer coisa desse tipo.
Ela já não saía com as amigas, já não saía para jantar. Apenas
ficava em casa cozinhando e limpando. E apanhando do meu pai.
Ele parecia tentar descontar todas as frustrações da vida na minha
mãe. Apesar de ela tentar arduamente ser uma boa esposa, nada era o
suficiente. Porque a vida machucava meu pai. E ele machucava a minha
mãe. Ela era o alvo dele.
Me lembro que certa vez, durante o café da manhã, o meu pai
simplesmente pegou uma xícara cheia de café e jogou no rosto dela. As
marcas das queimaduras permaneceram em sua pele por dias.
Sempre que eu precisava olhar na direção dela, me lembrava do
horror que senti ao observar a cena toda. Por isso, desse dia em diante,
passei a não olhar diretamente nos olhos dela, passei a olhar para o chão,
para a geladeira, para o jardim através da janela. Eu precisava focar a
minha visão em qualquer coisa, menos nela, pois eu sentia que já não podia
olhar a tragédia estampada em seu rosto. E hoje eu meio que me
arrependo. Porque talvez eu devesse ter observado um pouco mais, talvez
eu devesse ter tentado ajudar um pouco mais, só que não sabia como. Eu
tinha medo também.
Apesar de já ser um homem formado e já ter forças para enfrentar o
meu pai, havia um medo monstruoso dentro de mim, afinal eu cresci vendo
tudo o que ele era capaz de fazer com a minha mãe. Então eu apenas me
calava e tentava ao máximo ficar longe de casa. Porém, até mesmo essa
atitude foi totalmente equivocada porque permitia que o meu pai se
tornasse cada vez mais agressivo sem que existisse qualquer outra pessoa
para julgá-lo.
Não que a minha presença fosse capaz de pará-lo, porque nunca foi.
Mas talvez ele me respeitasse um pouco, apenas o suficiente para não fazer
com que minha mãe sangrasse até a morte.
Me lembro que era uma tarde de inverno e o sol estava se pondo
muito mais rápido do que o comum. Quando eu terminei o expediente no
supermercado, passei um bom tempo caminhando na rua e só cheguei em
casa quando a noite já estava totalmente escura, sem estrelas e sem lua.
Ao abrir a porta, tudo estava silencioso dentro de casa. As luzes
encontravam-se apagadas e havia apenas um parco brilho de luz na sala de
estar. Acho que era um abajur aceso, não me lembro muito bem. Me lembro
apenas que caminhei rapidamente. E senti um cheiro estranho, cheiro de
sangue, cheiro de dor e de morte.
No instante em que pisei na sala, soube que algo havia acontecido.
Quando caminhei para a área atrás do sofá, encontrei o corpo sem vida da
minha mãe.
O meu estômago se revirou ao ver os buracos causados por
machadadas.
O sangue empapado estava escorrendo e manchando todo o piso de
linóleo. Chocado, fiquei congelado no mesmo lugar por alguns segundos.
Após esse período de total inutilidade, eu gritei, gritei como se minha vida
estivesse também acabando naquele instante. Clamei por ajuda, chamei por
meu pai. Mas não tive ajuda, eu estava sozinho.
Desesperado e com as mãos cheias de sangue, corri pela casa e
encontrei o meu pai dentro do quarto principal. Ele estava bêbado e
drogado. Acho que havia cheirado pó ou algo assim, não faço ideia.
Eu gritei com ele. Porque eu precisava gritar, precisava fazer com
que o mundo descobrisse acerca da minha dor. Eu estava
desesperadamente cansado de me calar e fingir que tudo parecia bem.
— O que você fez? Por que a minha mãe está estirada morta na
sala de estar? O que você fez? — Eu queria explodir, queria destruir o
mundo inteiro.
— A sua mãe foi estúpida e tentou lutar contra mim. Eu descobri
que ela estava roubando o meu dinheiro para tentar fugir de casa. Ela era
minha. Minha. A vida dela era minha. E nós éramos casados, então ela não
tinha o direito de tentar fugir de casa. — Meu pai falava de maneira
engrolada, quase como se estivesse totalmente perdido na própria
realidade. — Ela planejava levar você para longe. Lukas, eu sou o seu pai,
você não pode me abandonar desse jeito. Você seria um traidor igual a ela.
Meu pai parecia em processo de delírio. Seus olhos estavam
vermelhos e ele tinha dificuldades até mesmo para se levantar.
— Eu vou chamar a polícia. Vou acabar com tudo isso. Você vai
passar o resto da sua vida trancado em uma cela. Você merecia a morte
assim como ela! — continuei a gritar e gritar, mas nada parecia o
suficiente.
— Você acha que eu mereço morrer assim como a sua mãe? E o que
você faria sem nenhum de nós dois? Você é um mimado, Lukas. A sua mãe
mimou você desde o primeiro segundo do seu nascimento. Você não saberia
viver sozinho, não saberia caminhar pelo mundo sem ajuda. Porque você é
um fraco, não viu nada da vida. Tudo o que viu foi eu que mostrei e deveria
me agradecer. — Ele falava com tanta convicção que quase cheguei a
acreditar.
— Cale a boca! Você não percebe? Está falando apenas idiotices!
— ao terminar de gritar, me virei de costas e peguei o meu celular na
tentativa de ligar para a polícia, mas então o meu pai me chamou pelo
nome uma última vez
— Lukas. — Sua voz ecoou em meus ouvidos, dentro de mim. Ele
pausou por alguns instantes e eu voltei a olhar em sua direção. Ele estava
segurando uma arma. — Vou cumprir o seu desejo. Vou fazer exatamente o
que você quer que eu faça.
Ao terminar de falar, ele colocou o cano da arma na própria cabeça
e apertou o gatilho. O som do disparo ecoou por toda a casa. Por todo o
vazio da noite. Sinto que até hoje o som ainda ecoa dentro de mim.
Meu pai foi ruim comigo até o último instante. Ele morreu para me
causar dor. E apesar de eu tentar perdoá-lo, sei que nunca serei capaz. Sei
que não preciso. Na verdade, nada disso faz sentido, afinal ele está morto.
A minha mãe está morta. E acredito que algo em mim também morreu
naquele dia.
Hoje sou um novo Lukas, um Lukas que vive em Londres, que tem
uma nova vida em um apartamento pequeno.

Por alguns instantes, Stephanie ficou totalmente calada, absorvendo


tudo o que eu falei nos últimos minutos. E confesso que fiquei satisfeito
pelo fato de que ela não me interrompeu, deixou apenas que eu falasse e
falasse.
Rasguei o meu coração em milhares de pedaços mais uma vez
apenas para tentar cicatrizar no futuro. Sei que uma parte de mim sempre
continuará quebrada. Mas a partir do momento em que eu me permito falar
sobre o que me machuca, me liberto um pouco.
— Acho que não há nada no mundo que eu possa falar que te
ajudaria a esquecer todo o horror que você passou, mas eu gostaria de dizer
apenas que você é uma pessoa incrivelmente forte, Lukas. E quanto mais eu
te conheço, mais tenho vontade de conhecer. Apesar da sua história ser
triste, você não precisa ser a sua história. Você pode ser muito mais. Você é.
Por isso que você está em Londres, por isso você recomeçou a sua vida. —
Uma lágrima solitária escorre pela bochecha de Stephanie e trato de limpá-
la.
— Eu precisava seguir em frente. Não tinha como continuar
morando na mesma cidade em que os meus pais morreram de maneira tão
trágica. Era uma questão de sobrevivência, caso contrário talvez eu
acabasse morrendo também.
Stephanie levanta uma das mãos e acaricia os meus cabelos. Nesse
momento, tenho a impressão de que sou sublime, tenho a impressão de que
estou chegando à algum tipo de porto seguro após um longo percurso. É
mágico, encantador e estranho ao mesmo tempo. Porque apesar de desejar
conhecer Stephanie melhor há meses, nunca poderia imaginar que eu teria
essa conversa com ela. Contudo, agora percebo que eu precisava ter essa
conversa com alguém. Precisava ser compreendido.
—Você não está sozinho, Lukas, não mais. A partir de agora, eu
prometo estar ao seu lado. Vamos escrever uma história bonita juntos.
Os meus olhos se fixam no rosto dela. E de repente, compreendo
que a minha vontade de criar intimidade com ela não era apenas sobre o
desejo, não era apenas sobre a vontade de beijá-la. Era sobre amor. Por isso,
com a voz calma, sussurro.
— Eu amo você, Stephanie. — Falando isso, me inclino e pressiono
o meu corpo contra o dela, beijando-a profundamente, fazendo com que os
nossos corpos se tornem um só.
Capítulo 13

Pensei que já não me sentiria tão impactada quando beijasse Lukas


pela segunda vez, mas eu estava totalmente enganada. No instante em que
os lábios dele se chocam contra os meus, o mundo parece paralisar. E eu
entro em algum tipo de vácuo, como se um simples beijo fosse capaz de me
colocar dentro de uma bolha invisível. Como se um simples beijo fosse
capaz de me colocar em um espaço em que só há Lukas e eu, nada mais.
Eu te amo.
As palavras dele ecoam dentro de mim.
Claro que os meus pais falam que me amam o tempo inteiro, até
mesmo Josh fala isso com frequência. Mesmo assim, nunca tive a
oportunidade de receber uma declaração como essa vinda de uma pessoa de
fora da minha família. Estou chocada, impactada e sequer sei como deveria
reagir.
Eu te amo.
Conforme o beijo se aprofunda, o meu coração se acelera e o meu
corpo fica inteiramente lânguido. Eu perco o controle de mim mesma e ao
me perder, percebo que também estou me encontrando.
Nesse instante, compreendo que o amor é sobre escuta, é sobre
sentir-se segura. É sobre permitir que o outro fale sobre as próprias dores
sem que se sinta culpado. E eu percebo, simplesmente percebo, que amo
ouvir tudo o que Lukas tem a dizer, amo que ele revele cada detalhe acerca
de si para que assim eu possa admirá-lo cada vez mais.
Eu também amo Lukas Barber. É impressionante pensar que essa é a
primeira vez em que estou apaixonada por alguém, apaixonada de verdade.
Não apenas pela beleza dele, mas por tudo o que ele representa.
Nos últimos meses, apesar de não termos tido contatos muito
intensos no restaurante, nós trocávamos olhares enquanto a tensão sexual
que existe entre nós crescia sem controle algum.
Eu te amo.
A afirmação pulsa dentro de mim de maneira intensa e rígida, e ao
mesmo tempo parece flutuar ao redor de mim, dentro de mim, em todo o
apartamento. E conforme tudo isso chega ao meu coração, tenho a
impressão de que sou capaz de explodir em milhares de pedaços.
— Eu também te amo, Lukas. — Permito que a frase fuja dos meus
lábios e chegue até ele, quebrando o silêncio entre um beijo e outro.
Permito porque é exatamente o que eu quero dizer, é exatamente o que eu
sempre desejei dizer a alguém, mas nunca me senti segura. Porém agora eu
me sinto. Porque Lukas parece ser a pessoa certa. Ele é a pessoa certa. E
estar aqui nesse apartamento com ele, nos braços dele, me parece certo,
parece mais certo do que qualquer aventura que eu já tive na vida.
E é engraçado pensar que até pouco tempo atrás eu pensava que
aventuras só podiam acontecer longe de casa. Estava totalmente
equivocada. Às vezes as grandes aventuras podem estar ao nosso lado sem
que sequer possamos perceber. Basta olhar com atenção, basta tentar
enxergar a vida com olhos de turista. Porque de vez em quando a gente se
acostuma com tudo o que está ao nosso redor e acabamos não enxergando
os pequenos detalhes.
Eu percebia que Lukas estava ali, mas eu preferia ignorar. Preferia
fingir que não estava percebendo. E agora chego à conclusão de que talvez
eu tenha perdido muito tempo fingindo, ocultando coisas que não deveriam
ser ocultas. Porém tudo acontece quando deve acontecer, acho. Não sou
muito especialista em relacionamentos amorosos, mas sei que que amar
Lukas é algo que me faz bem. E também sei que ser amado por mim, faz
com que Lukas se sinta uma pessoa melhor.
Com os meus pais, aprendi que um relacionamento deve ser
formado por companheirismo e por reciprocidade. Somente dessa maneira
que raízes podem surgir. Caso contrário, o relacionamento estará fadado ao
fracasso. E apesar de eu ter apenas dezenove anos, quero estar com alguém
que tenha a intenção de produzir tudo isso ao meu lado.
Companheirismo, reciprocidade. Segurança.
Não gosto da ideia de estar com alguém por estar, definitivamente
não gosto. Então se eu estou declarando os meus sentimentos para Lukas, é
porque planejo que ele fique na minha vida pelo resto dos meus dias.
Provavelmente muitas pessoas pensariam que eu estou exagerando,
afinal sou jovem e não tenho muita experiência. Mas o amor também é
sobre exageros, é sobre se permitir, é sobre acreditar que possibilidades
existem para serem vividas. Eu quero viver cada uma dessas possibilidades
ao lado de Lukas. Basta que eu me permita.
Eu estou totalmente disposta a me permitir.
— Eu nunca poderia imaginar que você me amava reciprocamente.
— Lukas interrompe o beijo por apenas alguns segundos e levanta o olhar
na minha direção. — Você é linda, Stephanie. Admirei a sua beleza e a sua
presença desde o primeiro segundo em que te vi. Seus cabelos são bonitos,
são brilhantes, e o seu sorriso parece me enfeitiçar, quase como se eu
pudesse me tornar algum tipo de escravo dos seus encantos.
As palavras são bonitas e me fazem pensar que Lukas parece ser
muito mais maduro do que deveria ser para a idade. Ele fala coisas que só
seriam faladas por pessoas que já viram e ouviram muito da vida. Esse
detalhe em sua personalidade faz com que eu fique ainda mais apaixonada,
maravilhada.
— O amor pode surpreender de vez em quando. — Isso é tudo o que
eu digo. Em seguida, coloco uma das mãos em sua nuca, acariciando,
sentindo.
Sem dizer mais nada, Lukas apenas pressiona seu corpo ainda mais
firmemente contra o meu. De repente, sinto sua ereção contra a minha
barriga, sinto sua respiração descontrolada, sinto o poder de todos os seus
músculos se movendo. De repente, desejo apenas que todas as roupas
desapareçam e que não exista nada mais entre nós, apenas os nossos corpos
se encontrando, se conhecendo.
— Passe a noite comigo, Stephanie. — Ele pede já totalmente sem
fôlego. — Me permita que eu continue descobrindo tudo o que você tem
para me oferecer. Caso contrário, me diga de uma vez que eu preciso parar.
Estou prestes a perder o meu próprio controle e não quero faltar ao respeito
com você.
— Continue, Lukas, apenas continue. Também quero descobrir tudo
o que você tem para me oferecer. — Falando isso, abro um sorriso e sinto
um bolo se formar em minha garganta numa mistura de emoção e
encantamento.
Ao ouvir o meu pedido, Lukas retribui o sorriso. Tudo parece se
expandir dentro de mim, pois ele tira as minhas roupas, me deixando
totalmente exposta.
É estranho estar pelada diante de um garoto, afinal nunca fiz nada
disso. Porém de alguma forma me sinto segura. Algo no fato de que Lukas
abriu o próprio coração e falou acerca das próprias inseguranças faz com
que eu me sinta totalmente preparada para estar nos braços dele. Estamos
juntos em um mesmo barco.
— Seu corpo é lindo, Stephanie... — Lukas passa um dos dedos por
minha barriga, levando um arrepio por todo o meu corpo. Me
surpreendendo, abaixa a cabeça e passa a língua lentamente por entre as
minhas pernas, sorvendo o líquido que escorre em abundância da minha
vagina molhada em pleno sinal de excitação.
Acho que nunca me senti dessa maneira, acho que nunca estive tão
húmida. E mesmo assim, quero apenas continuar. Quero que ele me leve à
algum lugar que sequer sei o nome.
— Eu sou virgem. — Sussurro, incapaz de manter o segredo. —
Nunca estive com nenhum garoto antes, então...
— Eu também sou. — Ao falar, Lukas parece quase... aliviado. —
Podemos descobrir tudo isso juntos.
— Sim, podemos. Quero você, Lukas. Quero muito. — A minha
voz parece rouca demais aos meus ouvidos. Quase não me reconheço.
E sem esperar por mais nada, Lukas se inclina diante de mim
novamente, beijando o meu pescoço, descendo cada vez mais rápido e
sugando um dos meus mamilos enquanto trata de me acariciar com as duas
mãos.
No passado, eu costumava pensar que a minha primeira vez seria
horrível, mas não é nada disso o que está acontecendo. Eu me sinto plena,
completa e certa de que quero tudo o que está acontecendo. Não há dúvidas
de que Lukas tem o talento de me seduzir até mesmo quando não está se
esforçando.
Por isso, quando ele se abaixa e passa a língua por minha barriga,
um arrepio percorre o meu corpo inteiro. Não estou acostumada a esse tipo
de proximidade.
Ele continua a descer cada vez mais e o meu corpo parece se tornar
cada vez mais sensível. Ao chegar à minha intimidade mais uma vez, ele
passa a língua em minha vagina, me deixando impossibilitada de falar
qualquer coisa. O meu corpo reage ao prazer. Me sinto pulsar, girar.
A sensação é avassaladora. Porque apesar de Lukas ser virgem tanto
quanto eu, tenho a impressão de que ele sabe exatamente o que está
fazendo. Na verdade, ele sempre me passou essa sensação de que sabe
como seduzir, de que sabe como agir diante de uma garota.
E de certa forma, me sinto grata por ser a garota que ele tem nos
braços nesse momento.
Devo confessar que estou impressionada com o fato de que ele é
virgem. Eu nunca poderia imaginar. Na minha cabeça, Lukas era o homem
mais pegador que conheço. Por outro lado, agora me sinto mais confiante
por saber que nenhum de nós dois têm experiência.
Somos apenas duas pessoas tentando descobrir caminhos que levam
ao prazer e pensar nisso é mágico. É lindo.
Ele continua a rodopiar a língua em minha feminilidade e eu não
consigo pensar em mais nada, apenas fecho os olhos. E inspiro
profundamente, incapaz de agir. Incapaz de recuperar o meu próprio
controle.
De repente, quase como se eu estivesse caindo de algum tipo de
precipício, a explosão de sensações toma o meu peito e se alastra por todo o
meu corpo. O orgasmo me atinge. Sequer sou capaz de controlar o grito que
escapa da minha garganta, ecoando por todo o apartamento. Tenho total
certeza de que todos os vizinhos dele me escutaram.
Mas Lukas sequer espera que eu me recupere, pois se afasta por
alguns segundos e veste a camisinha. Lentamente, com cuidado, ele me
penetra com uma estocada firme. No início, confesso que senti dor. O tipo
de dor que se assemelha a algum tipo de queimadura.
Bem, é como se eu estivesse me queimando sem ser consumida. E a
dor só aumenta. Por alguns instantes, penso que não conseguiria continuar.
Mas conforme o meu corpo se adapta ao dele, simplesmente começo a
ignorar a sensação de desconforto.
Aos poucos, ele aumenta a velocidade, me penetrando cada vez
mais fundo, indo cada vez mais rápido. E eu já não quero mais saber se
estou sentindo dor ou não. Nada mais importa, apenas o prazer. Preciso
sentir novamente a explosão de cores que me tomou apenas alguns
segundos atrás.
Muitas pessoas dizem que é basicamente impossível uma garota
virgem ter um orgasmo na primeira noite de sexo. Mas eu sou a prova viva
de que é totalmente possível. Porque estou prestes a ter o segundo.
— Por favor, Lukas, continue. Continue... — Pareço estar prestes a
chorar com essa mistura de dor e prazer que me consome inteira. Nunca me
senti tão, tão perdida. E nunca me senti tão satisfeita por estar perdida. É
irônico, é assustador, é maravilhoso. — Continue...
E tudo acontece de maneira tão rápida que quando gozo mais uma
vez, o meu corpo estremece, incapaz de manter-se imóvel.
Puxo Lukas para mim, beijando-o nos lábios com força, fazendo-o ir
mais fundo uma última vez. Ao me ver atingir o orgasmo novamente, ele
também goza, soltando sussurros enquanto fala o meu nome.
A sensação é prazerosa. Tê-lo tão profundamente é prazeroso.
Único.
— Porra, eu imaginava que isso seria bom, mas nada poderia ter me
preparado para o que estou sentindo agora! — Ele fala e se senta ao meu
lado, completamente desnudo. Sua ereção ainda está pulsante e abro um
sorrisinho ao vê-lo remover a camisinha, amarrando-a para jogá-la no lixo.
— Foi simplesmente maravilhoso. Incrível. E agora me sinto
exausta. Será que eu posso dormir aqui? — Na verdade, eu sei que posso
dormir aqui, afinal ele já me fez o convite, mas pergunto novamente apenas
para ter certeza
— É claro que você pode dormir aqui. — Ele sorri e se aproxima
apenas para passar uma das mãos nas minhas bochechas, me acariciando.
— Amo você Stephanie Lee.
Ao olhá-lo diretamente nos olhos, percebo total sinceridade. E meu
coração acelera. Depois de tudo o que aconteceu, amor significa exatamente
o que consigo enxergar no olhar de Lukas.
Amor é sobre honestidade, é sobre respeito. É sobre prazer e desejo.
Amor é sobre conseguir encontrar tudo isso em apenas uma pessoa.
— Também amo você, Lukas. Amo muito. — Me aproximo dele um
pouco mais e, ignorando o fato de que nós estamos sem roupa, começo a
beijá-lo. O primeiro beijo é na bochecha. Em seguida, trato de beijá-lo nos
lábios também. — Obrigada por ser tão incrível. Eu arriscaria dizer que
você é basicamente tudo o que eu sonhei, tudo o que eu sempre busquei em
um garoto.
— E você basicamente é tudo o que eu sempre busquei em uma
garota.
Depois disso, nós dois nos encaminhamos para o banheiro e
tomamos um banho rápido. O sono parecia me dominar depois de tudo o
que aconteceu, então no instante em que me deitei na cama, adormeci
abraçada a Lukas, sentindo seu cheiro de sabonete de camomila.
Meu coração está repleto de paz. Pela primeira vez na minha vida
inteira, durmo ao lado da pessoa pela qual estou apaixonada.
Não há sensação melhor do que amar alguém como Lukas.
Capítulo 14

Na manhã seguinte, obedecendo o meu relógio biológico, acordei no


horário de sempre. Infelizmente, eu não posso me dar ao luxo de dormir até
tarde, afinal preciso ir trabalhar no restaurante.
Quando abri os olhos, olhei para o lado e vi Stephanie ressonando.
Senti o meu coração perder o compasso por alguns segundos. Observá-la
dormindo ao meu lado, na minha cama, totalmente sem roupa, parece tão
surreal quanto incrível.
De maneira cuidadosa, me movimento na cama e deixo o quarto
silenciosamente. Tentando fazer tudo rapidamente antes que ela acorde,
começo a agir na cozinha, fazendo um café da manhã simples, mas gostoso.
Em uma bandeja prateada, coloco pães, ovos e salsicha. E não me
esqueço de incluir uma xícara de café forte, pois nos últimos seis meses,
reparei que ela adora se sentir revigorada pela manhã.
Enquanto preparo a comida, sinto como se estivesse em algum tipo
de sonho, um sonho que não quero acordar.
Noite passada foi incrível. Confesso que até me arrependo um pouco
por ter me permitido dormir tão rápido. Talvez eu devesse ter aproveitado
mais, talvez eu devesse ter passado a madrugada inteira acordado, apenas
tratando de observá-la e admirá-la. Mas prefiro acreditar que teremos outras
oportunidades, pois esse é apenas o começo.
Agora que tive a chance de me aproximar de Stephanie, quero me
aproximar ainda mais e quero que criemos laços juntos, pois eu a amo.
Desejo descobrir ainda mais motivos para continuar amando tudo o que ela
representa, cada detalhe.
Depois de finalizar o café da manhã, caminho na direção do quarto e
olho no relógio, reparando que já está quase na hora de irmos para o
restaurante.
De maneira cuidadosa, toco seu braço e falo baixinho.
— Stephanie, acho que já está na hora de acordar. Precisamos ir ao
trabalho, caso contrário, o seu irmão pode ficar chateado com você... —
Faço uma pausa e limpo a garganta. — Bem, ele pode ficar chateado
conosco.
Aos poucos, Stephanie se movimenta na cama e abre os olhos,
soltando um longo suspiro. Ela parece estar muito relaxada e seus cabelos,
sedosos e brilhantes, se espalham por entre os lençóis.
— Bom dia, acho que dormi demais. — Ela pisca algumas vezes.
Sua voz soa sonolenta e sexy ao mesmo tempo. Se tivéssemos tempo, eu
tentaria possuí-la mais uma vez. — Depois de tudo o que fizemos,
simplesmente apaguei. Eu estava exausta. Você me deixou exausta.
Ao ouvi-la falar, percebo que o meu membro está começando a ficar
duro por baixo da calça.
Esses meus pensamentos sujos não combinam muito comigo, afinal
permaneci virgem durante todo esse tempo. E na verdade, se eu pensar
muito sobre o assunto, não há dúvidas de que permaneci virgem por escolha
própria.
Tive chances de me relacionar antes, mas eu queria que a minha
primeira vez fosse especial. Queria que fosse inesquecível.
Geralmente garotos não pensam muito sobre isso. Inclusive, eu
arriscaria dizer que garotos geralmente procuram qualquer buraco que
possam possuir, nada mais. Porém, acho que sou diferente. Sou um pouco
estranho e procuro dar significado real às coisas.
Na noite passada, tudo teve muito significado, cada minuto, cada
fala e cada sensação, então eu não me arrependo de ter esperado até agora.
Contudo, ao mesmo tempo, temo que talvez algo tenha sido destravado
dentro de mim. Uma fera provavelmente foi solta, porque quero fazer mais,
quero possuir Stephanie o tempo inteiro. Mas claro que não vou falar isso
para ela, ao menos não agora, pois ainda não temos tamanha intimidade,
acho. Isso será construído com o tempo.
— Ainda temos cerca de duas horas antes de precisarmos estar no
restaurante. Não precisamos exatamente correr para ficarmos prontos, mas
também não podemos demorar muito. — Dou de ombros e abro um
sorrisinho. — Infelizmente, somos dois empregados, então não há muito
que se possa fazer.
— Se eu não estivesse trabalhando no restaurante, nós
provavelmente nunca teríamos a chance de... — Ela olha de maneira doce
na minha direção. — Vivermos tudo isso, então estou feliz por trabalharmos
lá, muito feliz.
Fico em silêncio por alguns instantes, reflexivo. Em seguida,
percebo que ainda não fiz o pedido. Ainda não falei o que eu gostaria de ter
falado desde o início. Por isso, sem mais nem menos e de maneira
totalmente aleatória, crio coragem e falo.
— Stephanie, você gostaria de namorar comigo? Sei que sou apenas
um empregado do restaurante e não tenho nada de muito interessante para
te oferecer, mas sei que posso te oferecer amor. E sei que amor também é
importante. Então, por favor, você aceitaria namorar comigo?
Quando faço o pedido, sinto meu corpo inteiro tremer em uma
reunião de nervosismo e ansiedade. Apesar de termos feito sexo na noite
passada, não sei exatamente qual resposta irei receber, mas a dúvida não
dura muito tempo. Stephanie começa a falar em questão de segundos.
— Sim, Lukas, é claro que eu aceito namorar com você. Como eu
recusaria? Você é incrível e não tenho dúvidas de que podemos construir
muita coisa juntos. Você tem muito a me oferecer, assim como eu tenho
muita a te oferecer. Somos incríveis juntos. — Ao falar, Stephanie soa leve
e não aparenta ter nenhuma dúvida do que está falando.
— Sim, somos incríveis juntos e eu amo a nossa conexão, amo o
fato de que me interessei por você desde o primeiro instante. — Ao falar,
coloco a xícara de café nas mãos dela e dou-lhe um beijo na bochecha. —
Preparei um café da manhã para você. Espero que goste. Não sei o que
vocês costumam comer na sua casa, mas fiz tudo o que eu geralmente gosto
de comer.
— Muito obrigada por ser tão atencioso. — Enquanto fala comigo,
tenho a sensação de que seus olhos estão brilhando em encantamento. — Se
a nossa história fosse um livro, eu arriscaria dizer que poderia se chamar
“Como encontrar um namorado em 10 dias”. Acho que esse seria o título
perfeito.
— Mas ainda não se passaram dez dias desde que os seus pais
viajaram. — Levanto uma das sobrancelhas, curioso.
— Sim, ainda não se passaram dez dias desde que os meus pais
viajaram, mas o fato é que nós dois somos rápidos. — Ela se aproxima e me
toca na bochecha. — Para pessoas mais lentas, talvez sejam necessários os
dez dias inteiros para que consigam encontrar um namorado, entendeu?
Quando os meus pais avisaram que iriam viajar, eu nunca poderia imaginar
que começaria a namorar em um período tão curto.
— Gosto disso, gosto das surpresas da vida, das coisas que
acontecem quando nós não estamos esperando. — Lentamente, me inclino,
permitindo que ela acaricie o meu rosto. É difícil me manter concentrado
enquanto recebo tanto carinho. — Confesso que foi mais fácil tentar me
aproximar de você enquanto seus pais estão viajando. É como se eu me
sentisse um pouco mais seguro. Mas não se preocupe, prometo que quando
eles voltarem, irei me apresentar formalmente. Porém convenhamos que o
casal Lee já me conhece, afinal ambos me contrataram seis meses atrás.
Talvez me conheçam mais do que você.
— Te conheço o suficiente para te amar. Durante todo esse tempo
desde que você começou a trabalhar no restaurante, eu tentava capturar
cada detalhe, me aprofundando aos poucos em tudo o que você apresentava.
E eu tinha muita vontade de iniciar conversas, de falar muito mais do que o
meramente profissional. Estou feliz que agora já não temos essa barreira,
Lukas. — Ela se inclina e me beija. É um breve tocar de lábios, mas isso é o
suficiente para fazer com que o meu coração se encha de alegria.
— Amo você Stephanie. — Agora que posso, não quero deixar de
demonstrar tudo o que sinto o tempo inteiro.
— Eu também amo você, Lukas. — Ela responde e eu poderia
passar o resto do dia na cama, ouvindo-a falar. Ouvindo-a se declarar. Mas
não podemos.
Com isso, tratamos de tomar o café da manhã juntos e em seguida
nos arrumamos para ir ao restaurante. Enquanto caminhamos lado a lado
pelas ruas de Londres, não tenho dúvidas de que encontrei o meu final feliz.
A minha história pode até ter sido triste no passado, mas eu não sou
triste. Sou muito mais do que as coisas que me machucaram. E eu sei,
simplesmente sei, que o meu processo de cura já começou. Agora tem uma
nova vida, tenho uma pessoa que amo ao meu lado. Portanto, estou
totalmente disposto a escrever a felicidade em meu caminho, pois apesar
das dores que o mundo apresenta, o amor continua sendo incrível.
Sou grato por isso.
Epílogo

Com o decorrer dos dias seguintes, sinto que a vida está se tornando
cada vez mais incrível. Todas as noites depois do expediente no restaurante,
saio com o Lukas e nós sempre encontramos alguma coisa nova para fazer,
para descobrir. Às vezes nós vamos ao cinema ou então passamos um bom
tempo sozinhos, apenas conversando, deitados no sofá do apartamento
pequeno dele. É confortável sentir que faço parte de alguma coisa. Sentir
que posso amar alguém. Sentir que estou em um relacionamento de
verdade.
Quando o dia do retorno dos meus pais por fim chega, me sinto
nervosa porque eu não sei exatamente como eles irão reagir ao fato de que
estou namorando agora.
Muitas coisas podem mudar em dez dias, coisas demais.
É incrível pensar que quando reflito acerca da garota que fui apenas
poucos dias atrás, sequer sou capaz de me reconhecer. Aprendi muitas
coisas, descobri novos sentimentos. Passei por sensações incríveis,
sensações que quero continuar descobrindo.
Ao entardecer, quando os meus pais chegam do aeroporto Heathrow,
Josh e eu decidimos preparar uma surpresa para eles.
Nós não somos muito bons em cozinhar comidas deliciosas, então
optamos por pedir alguma coisa, mas não o de sempre, não o que está no
cardápio do restaurante da família.
Passamos um bom tempo em dúvida e quando chegamos a um
consenso, optamos por comida tailandesa. Após realizar o pedido no
aplicativo, corremos para preparar a mesa e limpar todo o ambiente.
Deixamos tudo organizadamente perfeito, tal como a minha mãe gosta.
Depois ficamos sentados um ao lado do outro, esperando até que nossos
pais cheguem. E eles chegam.
Ao abrir a porta, a minha mãe parece estar nas nuvens. Leve. Porque
apesar de amar viver em Londres, tenho certeza de que ela sentia muita
saudade de visitar a Coreia do Sul.
Apesar da Inglaterra ter se tornado o seu novo lar, existem alguns
lares antigos que nunca se desfazem, existem conexões que permanecem
pela vida inteira. Então apesar de eu nunca ter saído do país, sei que a
minha mãe sempre se sentirá em casa cada vez que visitar seu lugar de
nascimento. Porque aquele lugar fez parte da história dela e nunca será
esquecido.
Meu pai, por outro lado, esboça pouco menos emoção. É o jeito
dele. Ele não é tão aberto e não reage tão claramente quanto a minha mãe.
Mas posso ver em seu rosto que há felicidade estampada em suas
expressões faciais. Vejo que parece um pouco mais corado, mais animado.
Acho que a experiência foi ótima para ele também.
— Céus, eu estava morrendo de saudade de vocês! A viagem foi
incrível! — A minha mãe foi a primeira a falar. Em seguida, tirou os
sapatos e entrou em nossa casa. — Sei que enviei milhares de fotos para o
celular de vocês, mas quero mostrar tudo o que filmei. Eu estava com
muitas saudades de visitar Seoul. Além disso, até encontramos tempo para
passar alguns dias em Busan. Estou tão feliz, mas ao mesmo tempo eu
sentia saudades de trabalhar no restaurante.
— Ah, então quer dizer que você estava com mais saudades do
restaurante do que de nós? — Josh brinca e em seguida abraça a nossa mãe.
— Não diga besteiras, Josh Lee. Se não fosse por vocês dois, nós
ainda estaríamos lá. A vida não é tão interessante quando vocês não estão.
— O meu pai fala e me abraça. Depois disso, abraça o Josh.
Eu não consigo deixar de sorrir. Agora que a nossa família está
reunida novamente, sinto que a vida está completa. Sinto que os nossos
laços estão prontos para serem fortalecidos mais uma vez. Porque apesar de
ser incrível ter mais liberdade e de não precisar me explicar para os meus
pais o tempo inteiro, é ainda mais incrível tê-los por perto. É ainda mais
incrível poder observar o sorriso da minha mãe, poder sentir o cheiro da
colônia do meu pai. É simplesmente incrível ter uma família.
— Eu tenho uma novidade. — Falo, incapaz de aguentar a minha
própria ansiedade. — É uma coisa inacreditável. Espero que vocês não
fiquem chateados comigo.
A minha mãe sempre foi o tipo de mulher um pouco nervosa, que se
preocupa com tudo, então, no instante em que falo isso, um pouco de cor
desaparece do seu rosto, deixando-a levemente pálida.
— O que vocês dois fizeram? Josh realmente vendeu drogas? Eu
vou matar vocês. — A minha mãe praticamente grita. Logo após, se recosta
contra a mesa da sala de estar.
— Estou namorando com o Lukas. — Digo, sem preâmbulos. Olho
na direção da minha mãe e do meu pai, tentando interpretar suas reações.
— Com o funcionário do restaurante? — o meu pai é o primeiro a
perguntar, ficando levemente pálido também.
— Sim, estou namorando o Lukas, funcionário do restaurante.
Começamos a namorar há alguns dias, espero que vocês não briguem
comigo.
Os meus pais reagem de uma maneira que eu realmente não
imaginava que eles reagiriam. A minha mãe me abraça, me olha nos olhos e
sorri.
— Lukas é um bom garoto, filha. Nos últimos seis meses, foi um
dos funcionários mais esforçados do nosso restaurante. Então, se ele te faz
feliz... É claro que estou feliz também. Extremamente. — Tenho a
impressão de que a minha mãe parece estar muito orgulhosa pelo fato de
que eu comecei a namorar. É estranho. Na minha cabeça, imaginei que ela
simplesmente surtaria com a novidade.
— Mas avise ao Lukas que deve tomar cuidado. Se ele quebrar o
seu coração, eu vou obviamente quebrar as pernas dele. — O meu pai fala,
mas dá uma longa gargalhada. —Meu Deus, estou ficando velho. A minha
filhinha já está namorando.
— E você, Josh? — a minha mãe olha na direção do meu irmão
mais novo e caminha até ele. — Quando você pretende começar a namorar?
Tem alguma garota em mente?
Por algum motivo estranho um silêncio desconfortável se forma na
sala. O meu pai não fala e Josh muito menos. Todos ficamos olhando um
para o outro. E eu realmente não sei o que é que está acontecendo. É como
se de repente o ar tivesse se tornado rarefeito, difícil respirar.
— Quero dizer, não é porque eu comecei a namorar que Josh precisa
começar a namorar também. — Digo na tentativa de salvar o meu irmão do
momento indelicado. Não sei se gosto dessa cobrança que a minha mãe fez.
Talvez por isso eu esteja me sentindo desconfortável também. — Josh é
mais novo do que eu, ele ainda tem muito tempo para encontrar alguém.
— Ele é muito bonito. Tenho certeza de que poderia ficar com
qualquer garota que bem entendesse. Na idade dele, eu já estava começando
a conhecer a sua mãe. — O meu pai fala e em seguida aponta o dedo na
direção de Josh. — Por que ficou tão calado, filho?
Nada poderia ter me preparado para o que Josh falou logo em
seguida.
— Eu sou gay, pai.
Continua...
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